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ACIONAMENTOS

ELÉTRICOS

Maikon Lucian Lenz


Máquinas CC
Objetivos de aprendizagem
Ao final deste texto, você deve apresentar os seguintes aprendizados:

„„ Caracterizar máquinas CC.


„„ Discutir o funcionamento de máquinas CC.
„„ Demonstrar o dimensionamento de máquinas CC.

Introdução
No passado, os motores de corrente contínua (CC) representavam a
maior parte das máquinas elétricas, cenário que vem mudando a partir
dos avanços nos circuitos de controle, que permitiram que motores de
corrente alternada fossem controlados com uma flexibilidade próxima a
de um motor CC. Entretanto, ainda são muitas as situações que exigem
os motores e geradores CC.
Para usar esses equipamentos, é necessário compreender o seu as-
pecto construtivo para, somente então, analisar o seu mecanismo de
funcionamento. Em geral, muito da teoria envolvida em máquinas CA
está presente também nas máquinas CC.
Neste capítulo, você conhecerá o que possibilita o funcionamento de
uma máquina rotativa em corrente contínua ou, no sentido inverso, será
capaz de produzir corrente contínua a partir de um movimento rotativo,
além de aprender como dimensionar corretamente esses equipamentos.

Características
Em sua maior parte, as máquinas elétricas de corrente contínua (CC) são
máquinas de movimento rotativo que têm como função produzir movimento
a partir de uma corrente contínua ou produzir corrente contínua a partir de
um movimento, como no caso de um gerador (CHAPMAN, 2013).
2 Máquinas CC

As máquinas elétricas podem atuar de três maneiras: com bobinas que


giram ao redor de um campo magnético; com um campo magnético girando
próximo às bobinas; ou com a variação da relutância de um circuito magnético
durante a rotação. Em todos os casos, o fluxo magnético concatenado e a
tensão variam de maneira cíclica (UMANS, 2014).
O conjunto de bobinas, conhecido como enrolamento de armadura, nas
máquinas de corrente alternada (CA) se faz presente na maioria das vezes no
elemento estático denominado estator. Já nas máquinas de corrente contínua
(CC), o enrolamento da armadura está disposto no elemento rotativo chamado
rotor (UMANS, 2014).
A Figura 1 apresenta a imagem de um rotor de um motor de corrente
contínua.

Figura 1. Rotor de uma máquina CC.


Fonte: Umans (2014, p. 191).

Além da diferença de disposição do enrolamento da armadura, nas máquinas


de corrente contínua, e nas máquinas síncronas, é comum haver um segundo
enrolamento, denominado enrolamento de campo, que produz o fluxo principal
da operação (UMANS, 2014).
Apesar da semelhança entre máquina síncrona e máquina CC, é preciso
lembrar que ambas diferem quanto à disposição do enrolamento de armadura,
mesma situação do enrolamento de campo. Enquanto para máquinas síncronas
o enrolamento de armadura está presente no estator e o enrolamento de campo
no rotor, na máquina CC ocorrerá o inverso, com o enrolamento de campo no
estator (UMANS, 2014).
Máquinas CC 3

A disposição de enrolamento — seja de campo, seja de armadura — exigirá


da máquina um contato mecânico para manter a alimentação das bobinas.
Pode-se, no entanto, substituir o enrolamento de campo pelo uso de ímãs
permanentes, que também produzirão fluxo magnético contínuo, dispensando,
nesse caso, o contato mecânico (UMANS, 2014).
O contato mecânico é feito por meio de escovas de carvão em contato
com um comutador, como se pode observar no gerador da Figura 2 em que
somente as escovas de carvão permanecem estáticas, enquanto o rotor com o
comutador e o enrolamento da armadura giram.

Figura 2. Comutador de uma máquina CC.


Fonte: Umans (2014, p. 201).

O esquema básico de uma máquina CC pode ser visto na Figura 3a, na qual
estão destacados o eixo direto, de direção do fluxo magnético do entreferro
produzido a partir das bobinas de campo, e o eixo em quadratura, formado
pelas escovas que conectarão as bobinas de armadura ao circuito elétrico por
meio do comutador.
4 Máquinas CC

É especialmente importante que as escovas estejam alinhadas corretamente,


mantendo-se perpendiculares ao eixo direto, o que pode ser simplificado pela
representação da Figura 3b. Nesse ponto, a comutação pode ser feita de maneira
segura e sem desgastes ou riscos para os componentes elétricos da máquina, já
que as bobinas estarão distantes tanto do polo sul do campo magnético quanto
do polo norte, estando expostas a um campo nulo, não existindo uma tensão
induzida. Assim, por mais que possa existir um breve período de curto-circuito
durante a comutação, não haverá corrente na bobina. Do contrário, ocorreriam
faiscamentos com consequente deterioração dos componentes do motor. Essa
região de campo nulo é conhecida como zona neutra de comutação.

Figura 3. (a) Máquina CC básica; (b) representação simplificada.


Fonte: Umans (2014, p. 404).

Uma vez alimentadas com tensão contínua, as bobinas de campo farão


com que o fluxo magnético do entreferro tenha direção e sentido constantes,
mantendo a polarização magnética durante todo o funcionamento. Por esse
motivo, as bobinas de campo devem ser conectadas em série.
A máquina pode conter, ainda, interpolos (Figura 4), ou bobinas auxiliares
no enrolamento de campo, dispostas 90° das bobinas de campo. O intuito
dessas bobinas é melhorar a comutação reduzindo a força magnetomotriz
presente na comutação quando há corrente na armadura criando um campo
que alterará o eixo neutro, fenômeno conhecido como reação de armadura
(CHAPMAN, 2013).
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IA

VT

IA

Figura 4. Motor CC com interpolos perpendiculares aos polos.


Fonte: Adaptada de Chapman (2013).

Perceba ainda na Figura 4 que o estator acompanha a circunferência do


rotor a fim de manter um entreferro o mais uniforme possível, o que diminuirá
variações de fluxo e força magnetomotriz suavizando as variações de tensão
nos geradores e de movimento em motores contínuos.
Uma vez que o fluxo magnético percorrerá o caminho mais curto de uma
extremidade à outra, a superfície curvada do estator com entreferro uniforme
garantirá que as linhas de fluxo fiquem perpendiculares à superfície do ro-
tor em todos os pontos, bem como a relutância, que também será constante
(CHAPMAN, 2013). A disposição das linhas de fluxo desse método construtivo
pode ser vista na Figura 5.
6 Máquinas CC

Figura 5. Linhas de fluxo para um entreferro uniforme.


Fonte: Chapman (2013, p. 406).

Funcionamento
Havendo um campo magnético no estator, seja por ímãs permanentes, seja
por bobinas alimentadas por corrente contínua, sempre que o rotor entrar em
movimento, a variação do campo magnético ao longo de suas espiras durante
a movimentação fará com que uma tensão seja induzida nestas (CHAPMAN,
2013).
Uma vez que cada bobina do rotor muda de posição em relação ao campo
magnético em que está imersa, a intensidade e o sentido da corrente induzida
durante a rotação também mudarão. A corrente somente será contínua à medida
que o gerador compensar essa movimentação pelo comutador.
A tensão induzida em uma bobina quadrada pode ser facilmente determi-
nada dividindo-a em quatro segmentos (Figura 6), ainda que em todos eles a
tensão obedecerá à Equação (1).

eind = l. (v × B) (1)

onde para a bobina ou segmento analisado, têm-se que:


l: comprimento [m];
v: velocidade [m/s];
B: densidade de fluxo magnético [T].
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edc
c ωm

d eba

eind etot

Figura 6. Bobina disposta entre as ranhuras do rotor dividida em segmentos


entre os pontos a, b, c e d.
Fonte: Adaptada de Chapman (2013).

Os segmentos ab e cd são perpendiculares ao campo magnético e produzirão


tensão induzida, enquanto os segmentos bc e da estão alinhados ao campo e não
produzirão tensão induzida. Atente ainda para o fato de que os segmentos que
terão tensão induzida (ab e cd) estão dispostos próximo a polos diferentes do
campo magnético, o que estará de acordo com a corrente induzida ao longo de
toda a bobina; do contrário, haveria correntes concorrentes e que se anulariam.
Para a disposição do campo magnético como apresentado na Figura 6,
espera-se que a corrente induzida entre no terminal a e saia pelo terminal d.
A partir disso, é possível determinar o somatório total de tensão induzida,
conforme as Equações (2) a (5).

eind = e ba + ecb + edc + ead (2)

eind = e ba + 0 + 0 + ead (3)


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eind = l.(v × B) + l˙(v × B) (4)

eind = 2 × l × (v × B) (5)

Para todos os segmentos, deve-se considerar que o campo está confinado


abaixo das faces dos polos, ou seja, não ter em conta qualquer campo disperso
(CHAPMAN, 2013). Isso porque a permeabilidade magnética do material do
rotor é tão maior quanto a do entreferro, que pode ser considerada infinita
(UMANS, 2014).
Após um giro de 180° do rotor, o segmento ab da Figura 6 estará debaixo
do polo norte e o segmento cd debaixo do polo sul, invertendo a direção
da corrente. A tensão da bobina produzirá uma tensão alternada similar à
densidade de um fluxo magnético e alternaria ciclicamente de 2vBl à –2vBl.
Por se tratar de um movimento rotativo, a velocidade pode, ainda, ser
expressa em termos angulares, como nas Equações (6) e (7).

v = r × ωm (6)

onde:
r: raio de rotação da espira [m];
ωm: velocidade angular [rad/s].

eind = l × (2rωm × B) (7)

A equação pode ser simplificada eliminando-se as variáveis raio e com-


primento e substituindo-a por uma equação equivalente em termos de área do
rotor. Para tanto, é necessário calcular a área do rotor sobre cada um dos polos.
Sendo a Equação (8) a área total do rotor, e havendo dois polos, a área sobre
a face de cada polo corresponderá à metade da área total, como na Equação
(9) (CHAPMAN, 2013).

AR = 2πrl (8)

onde:
AR: área total do rotor [m²];
r: raio da circunferência e de rotação da espira [m].
Máquinas CC 9

(9)

onde:
AP: área do rotor sobre a face de cada polo [m²];
P: quantidade de polos.

Ou, ainda, o raio em função da área, como na Equação (10).

(10)

A Equação (10) pode, então, ser substituída na Equação (7) para expressar
a tensão induzida em termos de velocidade angular, como visto nas Equações
(11) e (12).

(11)

(12)

Por fim, sabe-se que a densidade de fluxo (B) é constante, sendo o produto
da área do rotor por essa densidade o fluxo total que passa por meio do rotor,
como na Equação (13). Conhecido o fluxo, a tensão induzida poderá ser
determinada pela Equação (14) (CHAPMAN, 2013).

ϕ = Ap × B (13)

(14)

Assim, é possível compreender que a tensão induzida na máquina depen-


dente do fluxo total (ϕ), da velocidade de rotação (ωm) e de uma constante
referente aos seus aspectos construtivos (2/π) (CHAPMAN, 2013).
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O fluxo no entreferro será diferente de uma onda senoidal e terá os picos


achatados. Com o auxílio da comutação no momento da inversão do fluxo
no entreferro, inverte-se a polaridade do circuito elétrico produzindo uma
tensão quase contínua, com variações apenas nas proximidades do ponto de
comutação (Figura 7b).

Figura 7. (a) Densidade de fluxo no entreferro; (b) tensão gerada entre as escovas.
Fonte: Umans (2014, p. 202).

O comutador é mantido em contato com as escovas para permitir a condução


da corrente e montado sobre a superfície do eixo do rotor, embora fortemente
isolado deste. Na construção do comutador, materiais comuns costumam
envolver cobre, que deve ter boa condução com as escovas, e mica, capaz de
garantir bom isolamento entre o comutador e o rotor (UMANS, 2014).
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Nesse tipo de máquina, apesar do movimento rotativo, a comutação pro-


duzirá um sinal retificado, ou seja, de apenas uma polaridade. Ainda que
seja necessária a suavização do sinal para garantir a geração de corrente
contínua com a menor oscilação possível, outros elementos de retificação
são dispensados.
Por conta da necessidade de comutação, dispõem-se os enrolamentos da
armadura sobre o rotor, ao contrário das máquinas de corrente alternada. As
bobinas produzirão tensão alternada, mas, a cada meia-volta do gerador, elas
trocarão a escova a que estão conectadas evitando a mudança de polaridade
(UMANS, 2014).
Se, em vez de utilizar a máquina como geradora de tensão a partir da energia
mecânica existente no rotor, as bobinas deste forem alimentadas como uma
tensão contínua, um campo será criado na bobina que tenderá a se alinhar ao
fluxo magnético já existente no meio. O comutador, no entanto, inverterá a
polaridade da alimentação na bobina no exato instante em que esta deveria
atingir a zona neutra, forçando o rotor a continuar seu movimento sempre
tentando equilibrar sua condição.
A força produzida pela corrente com que a bobina é alimentada é calculada
a partir da Equação (15).

F = i × (l × B) (15)

onde:
i: corrente da bobina [A];
F: força sobre cada segmento da bobina [N].

E o conjugado, ou torque, sobre esse mesmo segmento é dado pela Equação


(16).

τ = r × F × senθ (16)

onde:
θ: ângulo entre o raio (r) e a força (F);
F: força sobre cada segmento da bobina [N].

O conjugado só será diferente de zero quando o segmento calculado estiver


abaixo de uma das faces dos polos (CHAPMAN, 2013).
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Assim como ocorria com a tensão induzida, a força também será nula nos
segmentos bc e da, uma vez que o comprimento do segmento (l) é paralelo
à densidade de fluxo (B).
Logo, o torque será resultado da soma do torque resultante das forças nos
segmentos ab e cd, conforme as Equações (17) a (23).

Fbc = Fda = i × (l × B) = 0 (17)

Fab = Fcd = i × (l × B) = ilB (18)

τ bc = τda = rFsen90° = 0 (19)

τab = τcd = rFsen90° = rilB (20)

τind = τab + τ bc + τcd + τda (21)

τind = rilB + 0 + rilB + 0 (22)

τind = 2rilB (23)

A expressão pode ser simplificada substituindo as variáveis raio (r) e


comprimento (l) pela área do rotor abaixo do polo para a tensão induzida,
como na Equação (24), e, por fim, reduzindo a multiplicação da área pela
densidade de campo pelo fluxo total, conforme a Equação (25).

(24)

(25)

Similarmente à tensão induzida, o torque produzido por uma corrente


dependerá do fluxo total (ϕ), da corrente (i) e de uma constante referente aos
seus aspectos construtivos (2/π) (CHAPMAN, 2013).
Máquinas CC 13

Dimensionamento
O dimensionamento de motores e geradores CC depende, respectivamente,
do cálculo de torque e corrente, no primeiro caso, e da tensão e velocidade,
no segundo.
Para determinar a tensão induzida em uma máquina CC, deve-se multiplicar
a Equação (1) pelo número total de condutores e dividir pelos caminhos de
corrente, conforme as Equações (26) a (29).

(26)

(27)

(28)

(29)

onde:
Z: número total de condutores;
a: caminhos de corrente.

As características construtivas e independentes de outros elementos são


substituídas por uma única constante de aspecto construtivo, como nas Equa-
ções (30) e (31).

(30)

EA = Kϕωm (31)
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A velocidade, por sua vez, costuma ser expressa em termos de rotações


por minuto em vez de radianos, como nas Equações (32) a (35).

(32)

(33)

(34)

EA = K´ ϕ nm (35)

onde:
nm: rotações por minuto.

No sentido contrário, pode-se calcular o torque produzido por uma corrente


que alimenta as bobinas de um rotor, conforme as Equações (36) a (43).

τcond = r Icond l B (36)

(37)

(38)

(39)

(40)

(41)
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(42)

τind = K × ϕ × IA (43)

onde:
τcond: conjugado (torque);
Icond: corrente de cada condutor;
IA: corrente total da máquina;
a: quantidade de caminhos de corrente;
Z: quantidade de condutores.

CHAPMAN, S. J. Fundamentos de máquinas elétricas. 5. ed. Porto Alegre: AMGH; Book-


man, 2013. 700 p.
UMANS, S. D. Máquinas elétricas de Fitzgerald e Kingsley. 7. ed. Porto Alegre: AMGH;
Bookman, 2014. 728 p.

Leituras recomendadas
FALCONE, A. G. Eletromecânica: máquinas elétricas rotativas. São Paulo: Edgard Blücher,
1979. v. 2. 280 p.
FITZGERALD, A. E.; KINGSLEY JUNIOR, C.; UMANS, S. D. Máquinas elétricas: com introdução
a eletrônica de potência. 6. ed. Porto Alegre: Bookman, 2006. 648 p.
PETRUZELLA, F. D. Motores elétricos: e acionamentos. Porto Alegre: AMGH; Bookman,
2013. 372 p. (Série Tekne).

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