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3º ANO – 2º SEMESTRE
Ano letivo 2018/2019
ESTRUTURA DO EXAME
CIÊNCIAS FORENSES
As ciências forenses aplicam-se a tudo o que tem a ver com o esclarecimento de alguma questão
que seja preciso esclarecer em que esteja em causa a aplicação do direito. Assim, as ciências
forenses estão relacionadas com o crime, enquanto objeto da criminologia e, por isso, interessa-
nos as ciências direcionadas para factos que estão relacionados com a prática de crimes.
É de referir que o crime é uma ação humana tipificada na lei, ou seja, é um comportamento
praticado por um indivíduo que tem as suas consequências previstas na lei penal e, por isso
partimos do crime e de um comportamento criminal.
Podemos assim distinguir diferentes tipos de abordagens partindo deste objeto que é o crime:
1. Biopsicologia criminal
Esta é uma perspetiva que visa perceber quem é que pratica crimes e como é que os pratica tendo
em conta uma abordagem essencialmente pessoal. Assim, sendo esta uma abordagem direcionada
a quem pratica crimes estão aqui inerentes os fatores pessoais como a idade, sexo, antecedentes
patológicos, hábitos de consumo de álcool e outras drogas, comportamentos desviantes, etc.
2. Criminologia ambiental
Podemos também perceber o crime através do estudo das condições em que as pessoas vivem,
das relações que estabelecem entre si, da sua interação entre o meio, etc. Nesta abordagem são
estudados diversos fatores do meio, como o espaço/área de residência, situação profissional,
situação económica, contextos relacionais e inserção social, sendo estes fatores tanto do ambiente
físico como relacional.
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Ciências Forenses I | Margarida Oliveira e Tânia Soare
O crime é o comportamento que está previsto na lei penal e processual penal. Deste modo, uma
das abordagens da criminologia é o estudo da descriminalização e criminalização das condutas
que procura perceber porque certos comportamentos são crimes e outros não, porque
consideramos um determinado comportamento como crime num momento e depois já não e vice-
versa.
Esta é uma abordagem que se debruça sobre a forma como os serviços, as entidades e os órgãos
respondem ao crime, sendo que estas instâncias, na prática, levam a acabo as nossas escolhas
sociais de resposta ao crime. Deste modo, esta abordagem pretende perceber como essas
instâncias formais de controlo do crime reagem perante o mesmo, de que recursos dispõem, que
trabalho realizam, como abordam o fenómeno criminal e qual o resultado da sua ação.
Assim, vemos que é objeto da criminologia o funcionamento desse tipo de serviços, como os
tribunais e as prisões.
6. Vitimologia
Com o estudo da evolução do crime, como este aumenta, diminui, como se desenvolve ao longo
do tempo, surgiu dentro dos efeitos do crime uma preocupação muito grande com a vítima
emergindo assim a vitimologia.
Tendo em conta estas abordagens, percebemos que estes são então os objetos da criminologia,
verificando-se o estudo das interações entre os diversos sujeitos e contextos.
Por um lado, as ciências forenses, em termos de disciplina científica, vão dever parte da sua
importância a questões que dizem respeito ao estudo de fatores biológicos, psicológicos, psíquicos
e a qualquer outra circunstância que possa indiciar a prática de um facto que é crime. Por outro
lado, na sua outra vertente, as ciências forenses dirigem-se ao conjunto de instâncias,
procedimentos e regras que é preciso observar para apurar estes factos criminais através daquilo
que se designa por perícias e exames médico-legais e forenses que fazem parte destas ciências.
As ciências forenses são assim um instrumento de investigação criminal e estão relacionadas com
a produção de prova pericial, sendo que quando falamos de ciências forenses fala-se
essencialmente da questão da prova na administração da justiça penal.
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As ciências forenses existem porque são úteis, necessárias e imprescindíveis para afirmar que
algo efetivamente aconteceu.
Segundo o art. 341º CC, provar algo é demonstrar a realidade dos factos. Isto é, provar/demonstrar
que as coisas se passaram de determinada forma. Deste modo, provar significa formar a convicção
de quem tem de decidir, nomeadamente o juiz e os órgãos criminais.
No entanto, este objetivo de convencer uma autoridade que atribui essas consequências legais não
é uma ideia e concretização do novo, mas sim algo muito antigo. Já em 1700 A.C existia um
código – código de Hamurabi – que estava inscrito numa pedra que era um código de conduta e
procedimentos da justiça.
Também na bíblia sagrada – Antigo Testamento (1300 A.C – 0) – verifica-se esta situação da
prova, na seguinte passagem:
“Rei Salomão, julgando a causa de duas mulheres prostitutas que moravam juntas e que tinham
dado à luz recentemente.
− Então disse o rei: Esta diz: Este que vive é meu filho, e teu filho o morto; e esta outra diz:
Não, o morto é teu filho e meu filho o vivo.
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− Disse mais o rei: Trazei-me uma espada. E trouxeram uma espada diante do rei.
− E disse o rei: Dividi em duas partes o menino vivo; e dai metade a uma, e metade a outra.
− Mas a mulher, cujo filho era o vivo, falou ao rei (porque as suas entranhas se lhe
enterneceram por seu filho), e disse: Ah, senhor meu! dai-lhe o menino vivo, e de modo
nenhum o mateis. Porém a outra disse: Nem será meu, nem teu; dividi-o.
− Respondeu, então, o rei: Dai à primeira o menino vivo, e de modo nenhum o mateis; ela
é sua mãe.
− E todo o Israel ouviu a sentença que o rei proferira, e temeu ao rei; porque viu que havia
nele a sabedoria de Deus, para fazer justiça”.
Este é um caso onde era necessário meio de prova, uma vez que tínhamos a palavra de uma
contra a outra.
A preocupação e a dificuldade da prova consiste no facto de que demonstrar a realidade dos factos
é importante porque não queremos imputar ao indivíduo factos mais gravosos do que os que
praticou ou factos que não praticou ou factos menos graves do que aqueles que praticou, isto
porque a reação social ao crime implica um constrangimento dos direitos fundamentais do ofensor
(e.g. pena de prisão → constrangimento do direito à liberdade) e, por isso, é necessário ter especial
cuidado neste âmbito da prova.
MEIOS DE PROVA
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A prova pericial tem lugar quando a apreciação dos factos exigir especiais conhecimentos
técnicos, científicos ou artísticos (art. 151º CPP).
A obtenção da prova pericial médico-legal está condicionada pela organização dos serviços
especializados que realizam as perícias médico-legais e, sobretudo no domínio penal, pela
articulação com as restantes instâncias formais de controlo (atendendo à especificidade dos atos
cautelares urgentes para deteção e recolha dos vestígios do crime). Mas, independentemente das
vicissitudes inerentes às formas da sua concreta obtenção, a prova pericial assume fundamental
importância enquanto meio de materialização da prova e de lhe conferir credibilidade.
No âmbito civil (no processo civil), a força probatória das respostas dos peritos é fixada
livremente pelo tribunal (cf. art. 389º do Código Civil) – vigora aqui, sem exceções, o princípio
da prova livre. Por igual, é afirmado no processo civil, a propósito do valor das perícias, o
princípio da livre apreciação da prova pelo tribunal (artigo 591º do Código de Processo Civil).
Assim, segundo o princípio da livre apreciação da prova, salvo quando a lei dispuser
diferentemente, a prova é apreciada segundo as regras da experiência e a livre convicção da
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entidade competente (art. 127º CPP). Contudo, no domínio penal, o juízo técnico, científico ou
artístico inerente à prova pericial presume-se subtraído à livre apreciação do julgador e quando
este divergir do juízo contido no parecer dos peritos, deve aquele fundamentar a divergência (art.
163º CPP). Pode ainda, eventualmente, a posição dos peritos ser questionável pela sua falta de
clareza, tornando inútil o seu testemunho.
No entanto, “a regra da livre apreciação da prova em processo penal (…) não se confunde com
apreciação arbitrária, discricionária ou caprichosa da prova, de todo em todo imotivável”. Assim,
“o julgador, ao apreciar livremente a prova, ao procurar através dela atingir a verdade material,
deve observância às regras da experiência comum utilizando como método de avaliação e
aquisição do conhecimento critérios objetivos, genericamente suscetíveis de motivação e
controlo”.
Deste modo, “a livre convicção não significa liberdade não motivada de valoração, mas constitui
antes um modo não estritamente vinculado de valoração da prova e de descoberta da verdade
processualmente relevante, isto é, uma conclusão subordinada à lógica e à razão e não limitada
por prescrições formais exteriores” (Ac. STJ de 9/2/2005).
O juízo pericial não tem, pois, um valor probatório pleno, mas um valor presuntivamente pleno –
presunção que pode ceder perante uma contraprova. Ora, sendo a contribuição da perícia médico-
legal, no domínio penal, fornecer à autoridade judiciária indicações quanto ao caminho a seguir
em termos de investigação criminal e de fundamentação da decisão, tais indicações revelam-se
preciosas, atento o valor conferido à prova pericial.
Graças à referida presunção de subtração da prova pericial à livre apreciação do julgador, pode a
perícia médico-legal, atendendo à sua natureza técnica e científica e à sua grande especialização,
superar outros meios de prova recolhidos durante a investigação, dos quais se destaca a «prova
testemunhal» (declarações da vítima, do arguido e os depoimentos das testemunhas). Ou seja,
uma eficaz intervenção dos serviços médico-legais pode (obviamente salvaguardada a
especificidade de cada caso), depender sobretudo das declarações da vítima e do exame da vítima,
bem como do exame do arguido, devido à inexistência de outros meios de prova ou à sua diminuta
fiabilidade.
Os meios de prova em processo penal valem o mesmo: a entidade competente (MP, juiz de
instrução e o tribunal de julgamento) aprecia-as segundo as regras da experiência e a sua livre
convicção, salvo quando a lei disponha diferentemente (art. 127º CPP).
O juiz pode ter uma interpretação dos factos muito diferente daquela que é descrita no relatório
pericial. Por exemplo, temos uma infeliz vítima (homicídio, agressão…) e sobre esse
acontecimento temos a testemunha que nos diz que essa ação foi efetuada em determinado
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contexto por determinada pessoa. E temos uma outra testemunha que nos diz que essa ação foi
praticada por outra pessoa em outras circunstâncias. A partir desta explicação como é que o
julgador forma a sua convicção?
A lei diz-nos que o legislador aprecia a prova segundo a sua livre convicção.
Neste caso temos dois meios de prova – pericial e testemunhal. A apreciação da prova faz-se
sempre através de um conjunto de meios de prova possíveis que provêm de diferentes fontes. A
apreciação do conjunto dos meios de prova é feita segundo a convicção do julgador, contudo o
juízo científico inerente à perícia encontra-se subtraído aquela livre convicção.
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Assim, quando é necessário resolver uma questão, que nem os tribunais nem os polícias têm
conhecimento especializado, é necessário recorrer a estes conhecimentos especializados →
Ciências ≠ Direito.
Todos os momentos, instrumentos e vias adequadas para convencer o juiz de determinado facto
estão previstas na lei de acordo com o princípio da legalidade. No entanto, para além das perícias
estarem previstas na lei, estas são obrigatórias quando o juiz carece de informação especializada
e, por isso, tem o dever de se dirigir ao instituto de medicina legal e ciências forenses, ou seja,
aos peritos. Assim, as perícias, embora existam como meio privilegiado, são obrigatórias no
sentido em que o juiz não pode substituir essa informação por outra em determinados casos.
Deste modo, quando temos um facto, como uma morte, vestígios de sangue em virtude de um
assalto, questões de saúde mental do arguido ou da vítima, ou seja, quando é preciso apreciar
factos que requeiram especiais conhecimentos técnicos e científicos, designadamente médicos e
biológicos ou de outras ciências recorre-se a perícias que são realizadas por peritos, sendo que há
um conjunto de normas que estão no CPP que dizem que os serviços médico-legais e forenses e
o laboratório de polícia científica da polícia judiciária e criminalística da PSP e da GNR são
obrigados a intervir nestes casos – princípio da legalidade.
Esta prova pericial diz-se médico-legal (ou/e forense) porque, precisamente, assenta na aplicação
de um conjunto de conhecimentos médicos e biológicos através da qual se visa apreciar
determinado facto, auxiliando o julgador no esclarecimento de determinados pressupostos para a
aplicação do Direito no caso concreto.
Esses peritos dominam um conjunto de saberes que constituem as ciências forenses, saberes que
visam explicar factos para os quais os tribunais não são especializados tendo por isso que recorrer
a parceiros. Alguns exemplos desses saberes das ciências forenses são:
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• Criminalística e outras
• Toxicologia forense
• Antropologia e odontologia forenses
Assim, todo o conjunto de saberes científicos que vão produzir conhecimento para terceiros pode
ser entendida como uma ciência forense.
Posteriormente, em 1863, foi criada nas Escolas Médicas de Lisboa e Porto a Cadeira de Hygiene
Publica e Policia Legal.
A contribuição das perícias médico-legais para os tribunais começa a surgir com as recém-criadas
faculdades de medicina. Só mais tarde em 1899 foram criadas as morgues, o local onde se
depositavam os cadáveres e onde se realizavam também os exames aos mesmos.
Já em 1918 foram criados institutos de medicina legal que eram autónomos, ainda que
dependentes das faculdades de medicina, mas que se dirigiam a um conjunto mais amplo e
diversificado de disciplinas científicas. Estes permaneceram assim até 1998, passando a realizar-
se um conjunto de exames e perícias mais complexos com um conjunto de novas tecnologias.
Por sua vez, em 2000, foi criado um único instituto nacional de medicina legal, sendo que em
2014, houve um reforço das competências forenses, balística, criminalística, que eram apenas
competências da PJ. Este instituto passou assim a assumir a designação de Instituto Nacional de
Medicina Legal e Ciências Forenses.
Em Portugal, relativamente às áreas afins da biologia ou das ciências naturais em geral temos uma
instituição, o Instituto Nacional de Medicina Legal e Ciências Forenses, que tem quase o
monopólio legal da realização dos exames e perícias sobre determinados factos e pessoas.
Contudo, este instituto não tem o completo monopólio legal, tendo associado o laboratório
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científico da PJ e diversos órgãos de polícia criminal que realizam também exames e perícias,
como por exemplo a análise a pegadas e os rastreios a substâncias proibidas.
Assim, o regime de monopólio legal não significa que é esta instituição a fazer todas as perícias
e exames, significa sim que o juiz e o MP têm obrigatoriamente de pedir a esta instituição a sua
intervenção. Isto porque, em concreto, o instituto não tem a capacidade ou competência para fazer
todas as perícias que o tribunal solicita e, por isso, o instituto ou contrata pessoas ou máquinas ou
indica ao tribunal qual é a instituição que está melhor vocacionada para realizar o tipo de perícias
e exames que são solicitados, mas é obrigatório passar sempre pelo instituto.
Os momentos e as formas das perícias legais estão previstos em normas processuais, ou seja, na
lei. A intervenção das ciências forenses conduz e influencia o desfecho processual de cada caso.
Assim, a importância da intervenção das ciências forenses na apreciação dos factos coloca-se
desde logo na prestação de informação ao MP, na apreciação dos factos do MP e dos tribunais.
a) Conselho Diretivo;
b) Conselho Médico-Legal.
c) Fiscal único.
Para efeito de intervenção dos serviços médico-legais ao nível da prova pericial, o território
nacional encontra-se dividido em três zonas geográficas – que constituem as áreas territoriais das
três delegações do INMLCF, – com sede em Lisboa, Porto e Coimbra – e que correspondem,
genericamente, às áreas dos correspondentes Distritos Judiciais. De entre os diversos órgãos e
serviços do INMLCF, assumem especial destaque, precisamente, as Delegações do INMLCF, que
são as instituições de suporte da atividade pericial médico-legal no nosso país, cabendo-lhes, pois,
proceder aos exames e perícias de medicina legal tendo em vista coadjuvar os tribunais na
administração da justiça. Nessa função de apoio pericial, e de acordo com as regras de
competência territorial e material dos serviços técnicos das delegações, compete a cada uma das
delegações realizar:
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No âmbito de cada delegação e nas zonas fora da respetiva competência territorial exclusiva
funcionam Gabinetes Médico-Legais, que são serviços periféricos das respetivas delegações –
diretamente dependentes destas – nas localidades de maior movimento pericial, aos quais compete
a realização, nas comarcas integradas na sua área de atuação, das perícias de tanatologia forense
e dos exames e perícias em pessoas, para descrição e avaliação dos danos provocados no corpo
ou na saúde, no âmbito do direito penal, civil e do trabalho.
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• Para descrição e avaliação dos danos provocados na integridade psicofísica, nos diversos
domínios do Direito, designadamente no âmbito do Direito Penal, Civil e do Trabalho,
nas comarcas do âmbito territorial de atuação da delegação.
• De natureza psiquiátrica e psicológica forenses.
• Outros atos neste domínio, designadamente avaliações de natureza social.
A este serviço cabe a realização de perícias e exames laboratoriais de hematologia forense e dos
demais vestígios orgânicos, nomeadamente os exames de investigação biológica de paternidade
ou outros, no âmbito das atividades da delegação e dos gabinetes médico-legais que se encontrem
na sua dependência, bem como a solicitação dos tribunais, da Polícia Judiciária, da Guarda
Nacional Republicana da respetiva área, e do Presidente do Conselho Diretivo.
A este serviço cabe assegurar, a nível nacional, no âmbito dos diversos domínios do direito, e das
atividades das delegações e dos gabinetes médico-legais, bem como a solicitação das autoridades
para o efeito competentes, a pesquisa, registo, colheita e tratamento de vestígios, e a realização
de perícias nas diferentes áreas das ciências forenses não enquadráveis nas competências dos
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Assim, as principais áreas disciplinares que se realizam neste instituto e que se dirigem ao maior
número de ocorrências de criminalidade dirigida contra pessoas são:
A Patologia forense é a área que estuda a causa da morte. As suas perícias principais são as
autópsias médico-legais, a identificação de cadáveres e restos humanos, o estudo de peças
anatómicas e os embalsamamentos que servem, no fundo, para dar informações aos tribunais.
Contudo, os embalsamamentos não são uma perícia, mas sim um conjunto de técnicas que visam
a conservação do cadáver, eliminando os fenómenos de decomposição do mesmo, sendo que isto
faz-se, muitas vezes, para efeito de transporte dos cadáveres após a autópsia. Assim, não é uma
perícia forense porque não tem como objetivo esclarecer o tribunal de nenhum facto.
Assim, tendo em conta as finalidades da patologia forense é visível que o objetivo da autópsia
não é apenas esclarecer a causa da morte. Por exemplo, imaginando que alguém é baleado e morre.
Neste caso, um polícia experiente conclui que a causa da morte é uma hemorragia causada pela
bala. Assim, aqui a causa da morte pode ser facilmente determinada, mas para a investigação
criminal, mais importante do que saber do que a pessoa morreu, neste caso a hemorragia causada
pela bala, é saber e apurar as circunstâncias e o contexto em que o facto foi produzido e quem o
praticou. Deste modo, pode apurar-se, por exemplo, a que distância foi cometido o disparo, se só
ocorreu um disparou ou mais, em que posição estava o corpo quando baleado, etc. A autópsia
serve assim para explicar o contexto em que a agressão se produziu, sendo que tudo o que
alegamos tem de ser demonstrado e comprovado em tribunal.
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Inclui-se ainda no âmbito da patologia forense perícias e exames de anatomia patológica forense,
nomeadamente o estudo microscópio de tecidos do cadáver.
Esta é uma área disciplinar nas ciências forenses que pela sua importância tem vindo a ter cada
vez mais relevância. Esta permite a identificação e o estudo de vestígios da cena/local do crime.
Assim, esta área visa identificar, descrever, interpretar, colher e preservar vestígios.
Um exemplo do trabalho nesta área é a fotografia do local do crime que é feita para perceber o
cenário do crime, uma vez que quando são recolhidos os vestígios do local do crime estes são
removidos do local e, por isso, a fotografia ajuda a ter uma ideia e perspetiva do que aconteceu
na cena de crime.
Artigo 16º, nº1 da lei 45/2004, de 19-8 – Óbito ocorrido fora de instituições de saúde (em
situações e morte violenta ou de causa ignorada)
3. Clínica Forense
A clínica forense é a área que explica factos de natureza psíquica e psicológica e estuda o estado
de saúde das pessoas. Esta é uma área direcionada ao auxílio da autoridade judicial e, por isso se
denomina de clínica forense.
A clínica forense partilha alguns aspetos com a patologia forense, sendo as suas principais perícias
as perícias em pessoas para descrição e avaliação dos danos na integridade psicofísica, no âmbito
do direito penal, civil e do trabalho e as perícias para avaliação do estado de toxicodependência,
avaliação psiquiátrica, psicológica, etc.
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1. Psiquiatria
• Diagnóstico de doença ou anomalia
• Imputabilidade
• Perigosidade
• Dano pós-traumático
2. Psicologia
• Estudo e apoio às vítimas
• Perícias à personalidade
• Avaliação psicológica
• Avaliações psicométricas (uso de testes estandardizados, quando se justifica)
• Avaliações neuropsicológicas
• Avaliação da capacidade de custódia parental
• Autópsia psicológica
• Psicologia do testemunho
4. Toxicologia Forense
A toxicologia forense é a ciência ou área disciplinar que trata do estudo, pesquisa, identificação
e análise de tóxicos e da sua ação no organismo. O grosso das suas competências de intervenção
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5. Genética Forense
6. Intervenções Multidisciplinares
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Na maior parte dos casos, as intervenções periciais são multidisciplinares, ou seja, requerem a
intervenção de mais do que uma ciência forense, sendo esta uma intervenção completa e
complexa. Por exemplo, a investigação de uma causa de morte ou um exame a uma vítima de
violação implicam uma intervenção multidisciplinar, uma vez que nestes casos há mais vestígios
e, por isso, mais disciplinas são chamadas a intervir no caso.
O modus operandi, isto é, as regras de realização e elaboração dos exames e as perícias, como
por exemplo uma zaragatoa, e as técnicas analíticas de como se devem utilizar determinados
exames e perícias decorrem da realização científica que se vai fazendo através da PJ, do Instituto
de Medicina Legal e Ciências Forenses e de institutos internacionais sobre estas áreas. Assim,
decorrendo desta permanente atualização e acompanhamento do que é decidido pelas instâncias
nacionais e internacionais, as instituições nacionais aprovam recomendações para a realização
correta dos exames e das periciais.
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Os exames em pessoas e/ou para o estado de saúde são perícias da clínica forense que só podem
ser elaboradas por médicos.
Os peritos do Instituto de Medicina Legal e Ciências Forenses e as entidades às quais este defira
os exames médico-legais encontram-se obrigados a respeitar as normas, modelos e metodologias
periciais em vigor no Instituto de Medicina Legal e Ciências Forenses, bem como as
recomendaçoes decorrentes da supervisao técnico científica dos serviços.
Os atos que legitimam a intervenção pericial e quem pode pedir a realização dos exames e perícias
são os seguintes:
Se não existir um despacho corremos o risco de, ao realizar a perícia, estarmos a praticar um
crime. A intervenção dos peritos recai sempre sobre cadáveres, pessoas, coisas, objetos ou
vestígios biológicos. No entanto, se essa intervenção não tiver enquadramento processual
constitui uma violação do direito fundamental e uma ofensa ao direito da pessoa.
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Os Órgãos de Polícia Criminal podem pedir todas as perícias na prossecução das suas atribuições
legais e nos termos de competências próprias ou delegadas pela autoridade judiciária competente
(cf. Art.2º da Lei de Investigação Criminal – Lei nº49/2008, de 27 de agosto, e circular da PGR
nº6/2002, de 8 de março), exceto a perícia que envolva a realização de autópsia médico-legal,
bem como a prestação de esclarecimentos e realização de nova perícia nos termos do art. 158º do
CPP (art. 270º, nº2, do CPP).
Para além disso, sempre que tal se mostre necessário para a boa execução das perícias médico-
legais, os serviços médico-legais podem praticar atos cautelares necessários e urgentes para
assegurar meios de prova, procedendo, nomeadamente, ao exame, colheita e preservação dos
vestígios, sem prejuízo das competências legais da autoridade policial à qual competir a
investigação.
Assim, verifica-se que existem três conjuntos de atos que legitimam a intervenção dos serviços
médico legais, nomeadamente haver um despacho da autoridade judiciária competente, uma
solicitação de órgão de polícia criminal e/ou atos periciais urgentes. É, deste modo, necessária a
presunção de legalidade dos atos processuais que determinaram a presença do examinado nos
serviços médico-legais para exame pericial.
Declaro que me foi prestada informação detalhada quanto ao exame a ter lugar, bem como ao
objetivo do mesmo.
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Declaro que me foi prestada informação detalhada quanto ao exame a ter lugar, bem como ao
objetivo do mesmo. Compreendo que:
Critério para determinação da idade para prestação do consentimento pela própria vítima: 16
anos (e possuir o discernimento necessário para avaliar o seu sentido e alcance no momento em
que o presta) – artigo 38.º do Código Penal.
A intervenção pericial médico-legal enquanto atividade probatória engloba dois momentos que
se podem autonomizar e que correspondem à realização de exames e de perícias.
Por um lado, o exame é um meio de obtenção da prova que consiste no ato de observação e
descrição de vestígios da prática de determinado facto, incluindo a respetiva recolha. O exame
permite um conjunto de constatações e subsequente formulação de conclusões que constituem a
perícia. Por exemplo, se recolher sangue de uma pessoa e o colocar num tubo que guardo estou a
fazer um exame, uma vez que há a recolha de informação que vai ser alvo posterior de análise e
discussão. Em termos metodológicos e cronológicos, o exame trata-se de uma fase inicial do
processo.
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No âmbito das perícias podemos distinguir as perícias médico-legais das perícias forenses. As
perícias médico-legais são as que se dirigem à apreciação de factos que são obrigatoriamente
apreciados pela medicina, ou seja, só podem ser realizadas por médicos, e têm como objetivo
servir como meio de convencimento dos juízes e de demonstração da verdade de factos. São
exemplos destas perícias as autópsias e exames de psiquiatria. Já as perícias forenses são todas
as outras perícias, ou seja, as que visam interpretar e dar informação sobre factos e conhecimentos
que fogem ao conhecimento que os juízes e os tribunais têm que não a medicina.
Por exemplo, no caso de uma morte que se suspeita que se deveu a um ato que constitui homicídio,
a principal perícia diz respeito ao estudo do cadáver para se perceber qual foi a causa da morte,
ou seja, quais foram as lesões que levaram a morte, sendo que a ciência forense que tem como
objeto o estudo do cadáver para compreensão da causa da morte é a patologia forense que é uma
ciência forense principal na investigação de homicídio. No entanto, há outras ciências forenses
que intervêm para ajudar a verificar a causa da morte, como a balística, no caso de haver uma
arma de fogo envolvida ou balas no corpo. Deste modo, a balística é auxiliar da perícia principal
que é a patologia forense.
Outro exemplo poderá estar relacionado com uma questão de perícia de violação em que temos
uma perícia principal que averigua o dano que resultou no corpo, mas depois pode haver uma
perícia para saber se a vítima estaria ou não alcoolizada e aí recorre-se a uma perícia de outra área
disciplinar que é a toxicologia. A toxicologia surge aqui como coadjuvante da perícia principal
que é uma perícia corporal.
Assim, verifica-se que as ciências forenses podem surgir como perícia principal ou articulando-
se com outras, sendo coadjuvantes.
Deste modo, o exame pericial é a expressão que visa qualificar a natureza do exame, distinguindo
a finalidade do mesmo de outros, como o exame clínico. Assim, quando falamos de exame
pericial ou de exame médico-legal, falamos da recolha e análise dos vestígios materiais de
determinado facto, civil ou criminal, momento indispensável para o surgimento da perícia; esta é
uma elaboração mental, um juízo científico que exige um exame (chamemos-lhe pericial ou
médico-legal) que lhe é anterior, do ponto de vista cronológico e metodológico. Ou seja, em geral,
quando falamos em perícia médico-legal estamos já a incluir nesta o respetivo exame; por seu
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turno, quando falamos em exame, estamos a considerá-lo como uma fase ou parte integrante da
perícia, sem a qual o sentido útil daquele não existe.
Enquanto serviços de apoio técnico aos tribunais e ao Ministério Público, na área da medicina
legal e de outras ciências forenses, os serviços médico-legais têm as sua regras de intervenção
fixadas nos Estatutos do INMLCF e na lei regulamentadora das perícias médico-legais, devendo
ainda considerar-se as diferentes disposições processuais aplicáveis à área do Direito em questão.
No domínio processual penal determina o artigo 159º do CPP (na redação que lhe foi dada pela
Lei n.º 48/2007, de 29 de agosto), sob a epígrafe “Perícias médico-legais e forenses”:
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descendentes e adotados, ascendentes e adotantes, ou, na falta deles, dos irmãos e seus
descendentes.
Esta regulação específica da prova pericial encontra-se também na área do Direito Civil: o
respetivo Código de Processo Civil, no seu artigo 467.º, n.º 3, dispõe que “as perícias médico-
legais são realizadas pelos serviços médico-legais ou pelos peritos médicos contratados, nos
termos previstos no diploma que as regulamenta”. Ou seja, remete para a lei própria dos serviços
médico-legais a definição dos peritos e dos serviços competentes e das regras de realização das
perícias. Por igual, em matéria do Direito do Trabalho, no que respeita ao Código de Processo do
Trabalho (Decreto-Lei n.º 295/2009, de 13 de outubro), valem as diversas disposições que aí
expressamente referem a competência dos serviços médico-legais para a realização de exames e
perícias no âmbito laboral.
Estas regras referem que tipo de exames podem ser realizados, por quem e em que circunstâncias.
Alguns exemplos são:
1 - As autópsias médico-legais são realizadas por um médico perito coadjuvado por um auxiliar
de perícias tanatológicas.
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1 - Os exames e perícias de clínica médico-legal e forense são realizados por um médico perito.
2 - Os exames de vítimas de agressão sexual podem ser realizados, sempre que necessário, por
dois médicos peritos ou por um médico perito auxiliado por um profissional de enfermagem.
3 - O disposto no n.º 1 não se aplica aos exames em que outros normativos legais determinem
disposição diferente.
4 - Dado o grau de especialização dos médicos peritos e a organização das delegações e gabinetes
médico-legais do Instituto, deverá ser dada primazia, nestes serviços, aos exames singulares,
ficando as perícias colegiais previstas no Código de Processo Civil reservadas para os casos em
que o juiz, na falta de alternativa, o determine de forma fundamentada.
2 - As juntas médicas que devam ser presididas por juiz podem realizar-se em instalações do
tribunal quando as delegações do Instituto ou os gabinetes médico-legais em funcionamento não
disponham de condições para tal, ou mediante acordo previamente estabelecido com o diretor da
delegação ou coordenador do gabinete médico-legal.
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3 - Estes exames podem também ser diretamente solicitados pelos tribunais às entidades terceiras
referidas no n.º 5 do artigo 2º.
2 - Sempre que a delegação não disponha de especialistas nestas áreas em número suficiente para
assegurar a resposta às solicitações, pode deferir os exames e perícias a serviços especializados
do Serviço Nacional de Saúde.
3 - A distribuição dos exames e perícias nos termos do número anterior deverá ter em conta as
possibilidades de resposta desses serviços e, sempre que possível, a sua área assistencial e o local
de residência habitual dos examinandos.
O examinado pode fazer-se acompanhar, durante o exame, de pessoa da sua confiança (art. 6º,
nº3 da Lei nº45/2004, de 19 de agosto), inclusivamente pelo seu advogado (art. 20º. nº2 da CRP),
mas também pode excluir a presença de qualquer outra pessoa para além do perito, a não ser que
a presença dessa ou dessas pessoas seja imprescindível para a realização do exame.
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Segundo o artigo 172º, nº3 do CPP, os exames suscetíveis de ofender o pudor das pessoas devem
respeitar a dignidade e, na medida do possível, o pudor de quem a eles se submeter. Ao exame só
assistem quem a ele proceder e a autoridade judiciária competente, podendo o examinando fazer-
se acompanhar de pessoa da sua confiança, se não houver perigo na demora, e devendo ser
informado de que possui essa faculdade.
Acesso à informação
O instituto pode solicitar diretamente aos diversos serviços e organismos públicos, nomeadamente
ao Ministério da Saúde, bem como a entidades privadas, as informações e os elementos
necessários ao desempenho das suas funções, no âmbito de processos judiciais em curso (art. 15º,
da Lei orgânica do INMLCF).
Por razões de celeridade processual, a requisição dos exames periciais deve ser acompanhada das
informações clínicas disponíveis ou que possam vir a ser obtidas pela entidade requisitante até à
data da sua realização (art. 3º, nº2, da Lei nº 25/2004, de 19 de agosto).
1 - No exercício das suas funções periciais, os médicos e outros técnicos têm acesso à informação
relevante, nomeadamente à constante dos autos, a qual lhes deve ser facultada em tempo útil pelas
entidades competentes por forma a permitir a indispensável compreensão dos factos e uma mais
exaustiva e rigorosa investigação pericial.
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Ciências Forenses I | Margarida Oliveira e Tânia Soare
Interessa aqui destacar que em qualquer caso, tanto as autoridades policiais, judiciárias, judiciais,
como os serviços médico-legais, «devem velar por que os elementos clínicos sejam solicitados,
fornecidos e utilizados sem desvio do fim a que se destinam e com o máximo de preservação do
sigilo». Se o documento é requisitado para resolver determinada questão jurídica ou para provar
determinado facto, não poderá ser utilizado para outra finalidade, devendo, quanto possível, serem
apenas fornecidos, pelos serviços de saúde, os elementos que importam para a elucidação da
questão médico-legal a esclarecer através da perícia. Nos casos em que essa destrinça não é
possível devem os peritos médicos (bem como os serviços) cumprir o dever de guardar sigilo
sobre tudo aquilo que não importe para a avaliação pericial e para o processo. Essa garantia de
confidencialidade ficará plasmada no Termo de Consentimento, atrás referido, a utilizar pelas
delegações e pelos gabinetes médico-legais.
1 - Ninguém pode eximir-se a ser submetido a qualquer exame médico-legal quando este se
mostrar necessário ao inquérito ou à instrução de qualquer processo e desde que ordenado pela
autoridade judiciária competente, nos termos da lei. Esta norma é geral e dirige-se a qualquer
norma do direito (penal, civil, trabalho) → Esta é uma orientação genérica das perícias médico-
legais que faz recair sobre o examinando o dever de colaboração com o tribunal. Assim, se a
pessoa não colaborar pode ser condenada em multa por parte do tribunal. Por exemplo, se a pessoa
foi ordenada pelo tribunal para a verificação de um exame e o tribunal entende que é necessário,
então o agente pode ser condenado em multa se não comparecer.
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judiciária competente → este número diz respeito à comparência das pessoas a examinar → Esta
é uma consequência do dever de colaboração das pessoas, há assim uma consequência caso
faltem.
No processo civil, “todas as pessoas, sejam ou não partes na causa, têm o dever de prestar a sua
colaboração para a descoberta da verdade, respondendo ao que lhes for perguntado,
submetendo-se às inspeções necessárias, facultando o que for requisitado e praticando os atos
que forem determinados. Assim, aqueles que recusem a colaboração devida serão condenados
em multa, sem prejuízo dos meios coercitivos que forem possíveis” (art. 519º, nº2 do Código de
Processo Civil).
Sobre a sujeição de pessoas vivas a exame médico-legal, é no domínio processual penal que
encontramos a respetiva referência legislativa na lei dos serviços médico-legais (cfr. o art. 6º da
Lei n.º 45/2004, de 19 de agosto).
Porém, pela sua natureza (sobretudo em sede de clínica forense e especialmente no âmbito das
perícias de natureza sexual), os exames podem ser suscetíveis de ofender o pudor das pessoas, ou
atentar contra a sua dignidade, daí que devam ser realizados em condições que respeitem aquele
sentimento e valor (cf. o art. 172º, n.ºs 2 e 3, do CPP), podendo a vítima fazer-se acompanhar de
pessoa da sua confiança, se não houver perigo em eventual demora, e devendo ser informado de
que possui essa faculdade (cf. o disposto no art. 6º, n.º 3, da Lei n.º 45/2004, de 19 de agosto). A
autoridade judiciária competente pode assistir à realização dos exames periciais (cf. o n.º 4 do art.
6º da Lei n.º 45/2004, de 19 de agosto).
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Ciências Forenses I | Margarida Oliveira e Tânia Soare
Deve discutir-se se a recolha das amostras de material biológico (por exemplo, sangue, cabelos,
pelos, saliva, tecido epitelial) porque esta poderá implicar, na pessoa a que pertencem e da qual
são colhidas, uma perturbação da integridade corporal morfológica podendo mesmo constituir, se
não consentida – e ainda que não provoque «lesão, dor ou incapacidade para o trabalho» – uma
ofensa à integridade física na sua dimensão «ético-social», para isso bastando uma afetação da
saúde, tomada esta como o «estado de completo bem-estar físico, mental e social e não apenas a
ausência de doença ou enfermidade» (Preâmbulo da Constituição da Organização Mundial de
Saúde).
Levanta-se então a questão de saber em que medida é que a prossecução do objetivo da descoberta
da verdade material pode comprimir os direitos individuais das pessoas que se entende deverem
ser submetidas a exame, designadamente em caso de recusa injustificada de sujeição a exame.
Poderemos reconduzir as situações em que se coloca a necessidade da intervenção pericial
médico-legal à formulação da seguinte questão: a sujeição forçada à recolha de material biológico
mediante, por exemplo, colheita de sangue, ou extração de cabelos, ou colheita de saliva na
cavidade bucal, constituirão atentados à dignidade e integridade física de um indivíduo enquanto
direitos indisponíveis para o próprio titular e absolutamente inatacáveis?
Sobre o tema há a considerar a indicação que a propósito nos fornece quer o CPP, no seu art. 172º,
n.º 1, quer a Lei n.º 45/2004, de 19 de agosto, no seu art. 6º, n.º 1: ambos estabelecem a
obrigatoriedade de sujeição a exame, sendo que o primeiro daqueles artigos se refere aos exames
em geral e o segundo aos exames médico-legais.
Nos termos do nº 1 do art. 172º do CPP, «se alguém pretender eximir-se ou obstar a qualquer
exame devido ou a facultar qualquer coisa que deva ser examinada, pode ser compelido por
decisão da autoridade judiciária competente», sendo correspondentemente aplicável o disposto
no n.º 2 do artigo 154.º e nos n.ºs 5 e 6 do artigo 156.º (n.º 2 do art. 172 do CPP).
Por seu turno, o art. 6.º, n.º 1, da Lei n.º 45/2004, de 19 de agosto, estabelece: «1 - Ninguém pode
eximir-se a ser submetido a qualquer exame médico-legal quando este se mostrar necessário ao
inquérito ou à instrução de qualquer processo e desde que ordenado pela autoridade judiciária
competente, nos termos da lei.».
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Assim, em caso de recusa de submissão a exame médico-legal, parece poder defender-se que a
invasão na esfera corporal da pessoa, eventualmente cometida para permitir a colheita de material
biológico, ou dela resultantes (e que nos exemplos referidos são insignificantes do ponto de vista
médico-legal) não deverão ser consideradas ofensas à integridade física, desde que a força ou a
coação física eventualmente para tanto empregues o sejam na medida do estritamente necessário
à realização do exame, devidamente avaliada que seja, também, a imprescindibilidade da perícia,
e ponderando sempre a importância da respetiva finalidade, atenta a natureza do bem jurídico
violado pela conduta criminosa contra a qual se pretende reagir.
Reconhecendo embora a complexidade das questões que podem ser levantadas pela imposição, a
uma pessoa, de «tolerar que o próprio corpo seja utilizado como meio de prova», poderá admitir-
se a validade processual das provas assim obtidas sempre que a lei expressamente preveja esse
meio de prova e as condições do seu exercício – em tais situações, como sejam as dos exemplos
enunciados no âmbito médico-legal, estar-se-á porventura ainda longe de «invadir o campo da
inadmissível autoincriminação coerciva» do examinando.
É este também o entendimento do Tribunal Constitucional, o qual, através dos Acórdãos n.ºs
155/07, de 2-3-2007, e 228/07, de 28-3-2007, veio esclarecer que é constitucionalmente
admissível a colheita coativa de vestígios biológicos de um arguido, ao abrigo do art. 172, n.º 1
do CPP, ordenada por um juiz, para determinação de perfil genético.
Nos casos em que se prescinde do consentimento do arguido para a colheita de produto biológico,
a correspondente perícia só será validamente realizada consequentemente podendo assumir
eficácia probatória no processo penal se estiverem reunidos no Despacho judicial (que determina
a colheita) os elementos que espelham a ponderação da medida e dos termos da compressão do
direito à autodeterminação corporal do arguido. Assim, tal Despacho deverá conter:
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Além destes requisitos essenciais, deve também constar do referido Despacho a designação do
órgão de polícia criminal, ou autoridade policial, ou força de segurança, à qual incumbirá, quer o
acompanhamento do arguido ao, e no, local da colheita, quer a eventual execução da coação física
sobre o examinando, em caso de recusa de colaboração no exame (na colheita).
O consultor técnico é uma pessoa que é um profissional da área disciplinar à qual se refere o
exame ou a perícia que vai ser realizada. Assim, quando é realizada uma perícia, um dos sujeitos
processuais pode determinar uma pessoa da área científica para estar presente no momento da
perícia. Assim, o consultor técnico é uma figura que pode estar presente no momento da realização
de uma perícia para acompanhar a regular realização da perícia para possibilidades de inspeção.
É um profissional da área do perito (médico, por ex.) para acompanhar a realização da perícia
(para ver o que se fez; como se fez; pode tecer comentários; tirar notas; oferecer sugestões).
1 - As perícias médico-legais solicitadas por autoridade judiciária ou judicial são ordenadas por
despacho da mesma, nos termos da lei de processo, não sendo, todavia, aplicáveis às efetuadas
nas delegações do Instituto ou nos gabinetes médico-legais as disposições contidas nos artigos
154.º e 155.º do Código de Processo Penal.
Por sua vez, segundo o acórdão do Tribunal Constitucional nº133/2007, a proibição de consultores
técnicos nos exames realizados pelo INML não ofende as garantias previstas nos n.os 1 e 2 do art.
35º da Constituição ou qualquer outra norma constitucional.
Estamos perante uma das manifestações do princípio da especialidade do regime das perícias
médico-legais face ao regime da restante prova pericial, ou seja, no caso apontado, da
especialidade da Lei n.º 45/2004, de 19 de agosto, face às disposições processuais penais relativas
à prova pericial, como de resto transparece da redação do artigo 159º do CPP, em consonância
com o regime da Lei n.º 45/2004, de 19 de agosto.
Importa sublinhar, a propósito, que da nova redação do artigo 159º do CPP (dada pela Lei n.º
48/2007, de 29 de agosto) resulta que se encontra reservada ao sistema médico-legal a gestão
exclusiva do reconhecimento da qualificação dos peritos médico-legais e da escolha dos peritos
para a realização das diversas perícias. Consequentemente, não mais se vislumbram situações em
que, devendo em princípio cometer-se a realização de perícia médico-legal a um serviço médico-
legal – ou a um perito ou entidade contratado(a) ou indicado(a) pelo INML – se revele impossível
ou inconveniente deferir-lhes a realização dessa perícia. É que por motivo de carência de recursos
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Outra informação pericial com relevância processual (para objeto da perícia). Assim, a
informação pericial tem como destinatária a autoridade judiciária (Juiz ou MP consoante a fase
do processo). A informação pericial pertence ao processo e não à pessoa que é sujeita aos testes.
Para aceder ao relatório pericial é necessário observar-se as regras que estão dispostas no código
de processo penal, nomeadamente os arts. 89º, 90º, e 86º, n.os 7 a 12 do CPP. Podemos através
destes artigos concluir que só a autoridade judiciária titular do processo é que pode dizer quem,
quando e se pode aceder ao relatório pericial.
CONCLUSÃO
As normas desta lei têm natureza processual e são em si mesmas imediatamente exequíveis,
constituindo um regime especial face ao da demais prova pericial, derrogando as normas do
processo civil, laboral, e penal que disponham diferentemente sobre o mesmo objeto normativo.
PATOLOGIA FORENSE
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A vida é um direito e bem jurídico fundamental e essencial. Assim, existem diferentes níveis de
proteção deste bem jurídico:
1. 1º Nível
Este direito está plasmado na Constituição da República Portuguesa.
2. 2º Nível
Este direito está protegido nas leis ordinárias, como no artigo 131º do CP (crime de
homicídio) e demais tipos legais de crimes que prevejam como resultado a produção da
morte. Assim, há aqui uma responsabilidade penal, uma vez que se prevê uma
consequência que é a privação da liberdade para quem atente contra esse bem jurídico
fundamental que é a vida.
3. 3º Nível
Normas que responsabilizam os indivíduos em termos cíveis nos termos dos artigos 483º
do CC e artigos 129º e 130º do CP.
A morte é um facto que determina a cessação da personalidade jurídica (art. 68, nº1 CC). De notar
que a personalidade jurídica é a suscetibilidade que cada pessoa tem, a partir do nascimento
completo e com vida, de ser titular de um conjunto de direitos que visam garantir os seus direitos
essenciais. Por outro lado, a existência desta personalidade jurídica permite à pessoa estabelecer
relações com outros membros da sociedade, tidas como válidas pelas outras pessoas e pelo Estado.
Neste sentido, a morte é a cessação dessa personalidade, no sentido em que quando uma pessoa
morre deixa de existir o titular de um conjunto de direitos e relações que existia enquanto pessoa.
Segundo a lei nº141/99, de 28 de agosto, art. 2º, a morte é a cessação irreversível das funções do
tronco cerebral, formalmente atestada por um médico, em documento oficial especialmente
destinado a tal fim.
A verificação dos óbitos é da competência dos médicos, nos termos da lei (art. 14º, lei 45/2003,
de 19 de agosto).
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Verificar o óbito é apenas dizer que perante um corpo estamos perante uma pessoa sem vida e,
por isso, aquele corpo é um cadáver. Isto pode ocorrer na via pública, na casa das pessoas, nos
centros de saúde e hospitais, entre outros. Para além disso, na verificação do óbito não se pode
dizer qual é a causa da morte, ou seja, não se pode dar como certa a causa da morte.
Por sua vez, o certificado de óbito é uma declaração médica onde, para além de se certificar o
óbito, o médico especifica a causa da morte. Contudo, há casos excecionais em que pode haver o
suprimento do certificado de óbito (art. 195º do CRC).
Assim, a morte deve ser prontamente declarada na Conservatória do Registo Civil (art. 192º, nº1
do Código do Registo Civil), e confirmada através da apresentação do documento legal que
certifica o óbito (art, 194º do CRC).
1. Causa natural
2. Acidente
3. Homicídio
4. Suicídio
Para se saber de que é que a pessoa morreu e como morreu é necessário recorrer-se ao estudo do
cadáver, sendo que isto implica a realização de uma perícia médico-legal que é a autópsia médico-
legal.
AUTÓPSIA MÉDICO-LEGAL
A autópsia médico-legal tem lugar em situações de morte violenta ou de causa ignorada, salvo se
existirem informações clínicas suficientes que associadas aos demais elementos permitam
concluir, com segurança, pela existência de suspeita de crime, admitindo-se, neste caso, a
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dispensa de autópsia (artigo 18º, nº1 da Lei 45/2004, de 19 de agosto). Por exemplo, em caso de
suicídio não é preciso autópsia médico-legal.
A autópsia médico-legal pode ser realizada após a constatação de sinais de certeza de morte,
competindo à autoridade judiciária ordenar aos serviços médico-legais a realização de autópsia
médico-legal (artigo 18º, nº5 da Lei 45/2004, de 19 de agosto).
Compete à autoridade judiciária autorizar a remoção do corpo com vista à realização da autópsia
médico-legal e assegurar a sua preservação até à remoção (artigo 18º, nº6 da Lei 45/2004, de 19
de agosto).
A autópsia não é um ato, nem um momento de apreciação da prova, mas é antes um processo que
é composto por diversas fases de recolha e apreciação da informação sobre o cadáver e das
circunstâncias do facto. São as informações que vão permitir determinar as conclusões e as causas
da morte.
1. EXAME DO LOCAL
Este exame costuma ocorrer em primeiro lugar, mas não é obrigatório e permite obter informações
fundamentais sobre o que aconteceu e o que provocou a morte, sendo por isso muito importante
compatibilizar as lesões com os objetos que poderão ter provocado as lesões.
Para além disso, é necessária uma identificação correta dos vestígios e correto manuseamento das
coisas, dos objetos e dos cadáveres que sejam encontrados de modo a não alterar os vestígios,
pois caso contrário vamos ter informação errada. Por essa razão é também importante fotografar
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o local do crime para que quando se analisar em laboratório os objetos que se encontravam no
local se saber como é que estes se encontravam no mesmo para ser mais fácil recriar o
acontecimento e se perceber o que aconteceu.
Por sua vez, é importante que o cadáver seja remetido a exame tal e qual como se encontra no
local para se perceber o contexto da causa da morte e para se saber aquilo que é premente
investigar na autópsia médico-legal.
Assim, a investigação da causa da morte é feita pelo MP, pelos órgãos de polícia criminal e pelos
serviços médico-legais.
A autoridade judiciária competente pode assistir à realização dos exames periciais (art. 6º, nº4, da
Lei 45/2004, de 19 de agosto).
2. RECOLHA DE INFORMAÇÃO
A recolha de informação consiste não na observação direita do cadáver nem do exame do local,
mas decorre da recolha de informação através de outras fontes que não o cadáver e o local do
crime, como da informação recolhida pela polícia, informação dada pelos familiares, documentos,
jornais, etc.
3. AUTÓPSIA
A autópsia consiste nos exames realizados sobre o cadáver, como a observação e análise de
produtos biológicos.
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O primeiro local onde as ações externas são realizadas é na roupa, o que pode permitir saber que
lesões foram causadas e pelo quê. A roupa é também um elemento importante para a identificação
do indivíduo quando não há documentos para identificar o corpo.
Por sua vez, o exame do hábito externo é o exame do cadáver sem roupa para identificação de
lesões, sinais e marcas que possam indiciar doenças, traumatismos ou informações que nos digam
algo sobre a posição do cadáver. É, no fundo, o exame do cadáver tal e qual como este aparece,
ou seja, sem remover, por exemplo, objetos espetados no corpo.
Já o exame do hábito interno consiste em encontrar a falência do organismo que levou a morte.
Por exemplo, numa agressão com um corte de uma garrafa é preciso examinar o hábito interno
para saber se foi a lesão com a garrafa que provocou a hemorragia ou foi outro problema qualquer.
É preciso estabelecer uma relação causal entre o objeto externo e a parte interna do organismo.
Para além disso, para ajudar a confirmar os achados objetivos constatados com os nossos olhos
pode ser necessário realizar exames laboratoriais e analíticos a produtos biológicos para deteção
de tóxicos, por exemplo. Alguns desses exames são de genética forense que é realizada quando
tentamos identificar produtos biológicos de terceiras pessoas no cadáver, como por exemplo
esperma ou saliva; a toxicologia forense que é realizada quando queremos saber se o indivíduo
possui álcool ou outras substâncias no organismo; e a entomologia forense à qual se recorre
quando o corpo apresenta insetos.
Relatório pericial
O relatório pericial é o documento no qual se verte a informação recolhida nestas diferentes fases,
ou seja, do exame do local, das informações recolhidas através de diferentes fontes e da autópsia.
Assim, este é um documento informativo que é entregue ao MP.
A autópsia é realizada por uma equipa multidisciplinar constituída por um perito médico
coadjuvado por um técnico de diagnóstico e terapêutica e/ou um técnico ajudante de medicina
legal.
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Ciências Forenses I | Margarida Oliveira e Tânia Soare
O primeiro lugar onde o cadáver é observado é numa mesa própria para a autópsia. No final da
autópsia, se o destino do cadáver for a cremação, este só pode ser cremado com a autorização do
MP e com a confirmação dos serviços médico-legais, isto porque podem não ter sido efetuadas
todas as ações necessárias sobre o cadáver.
Qualquer intervenção no cadáver deve ter em atenção, que, se possível, não se deve desfigurar a
forma externa do mesmo, particularmente as partes que ficam a descoberto depois de vestido
(cabeça, mãos e punhos). Depois do cadáver ser vestido e entregue à família o trabalho ainda não
acabou porque só foi realizada a autópsia, é ainda necessário interpretar os elementos que se
apuraram na autópsia e fazer exames complementares se necessário.
1. Nas situações de morte violenta ou de suspeita de morte violenta, bem como nas mortes de
causa ignorada e quando o óbito for verificado em instituições públicas de saúde ou em
instituições privadas de saúde, deve o seu diretor ou diretor clínico:
1. Em situações de morte violenta ou de causa ignorada, e quando o óbito for verificado fora de
instituições de saúde, deve a autoridade policial:
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c) Providenciar, nos casos de crime doloso ou em que haja suspeita de tal, pela comparência do
perito médico da delegação do Instituto ou do gabinete médico-legal que se encontre em serviço
de escala para as perícias médico-legais urgentes, o qual procede à verificação do óbito, se
nenhum outro médico tiver comparecido previamente, bem assim como ao exame do local, sem
prejuízo das competências legais da autoridade policial à qual competir a investigação.
7. (…) Compete às autoridades policiais promover a remoção dos cadáveres, consoante o local
em que se tiver verificado o óbito, para a casa mortuária do serviço médico-legal da área ou, na
sua inexistência, para a do hospital ou do cemitério mais próximos:
a) Após a verificação do óbito e a realização do exame de vestígios nos casos referidos na alínea
c) do n.º 1; ou
Para a remoção e transporte dos cadáveres, as entidades policiais podem requisitar a colaboração
dos bombeiros, dos serviços médico-legais, dos serviços de saúde ou de agências funerárias
a) Disponibilizar-se a ir ao local;
c) Verificar o óbito;
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O SICO é um portal eletrónico onde é colocada a causa da morte, as circunstâncias que ocorreu e
as consequências que daí derivaram, como as perícias médico-legais. Assim, todas as informações
relacionadas com o óbito passam pelo SICO.
Verificação do óbito por médicos do INEM, autoridade de Saúde Pública e Médico Legista
(excecionalmente). Estes não podem certificar o óbito, podendo fazer apenas a sua verificação.
Por sua vez, a verificação do óbito deve ser feita por preenchimento do boletim de informação
clínica e/ou circunstancial e posteriormente deve ser comunicada ao MP, sendo que é este que vai
tomar uma decisão no SICO.
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Ciências Forenses I | Margarida Oliveira e Tânia Soare
É também no SICO que se faz o registo dos dados da autópsia que depois podem ser exportados
para o certificado de óbito. Assim, o MP só tem conhecimento das ocorrências sobre o óbito
quando estas lhe são transmitidas.
Toda a informação que foi produzida e que resultou da realização de perícias e exames médico-
legais e informação relativa ao estado clínico do doente é informação pericial e processual,
podendo aceder-lhe quem o MP autorizar. Deste modo, o acesso ao certificado de óbito, acesso à
informação sobre a causa da morte, acesso à informação pericial e acesso a informação processual
vai depender da autorização do MP.
A utilização do cadáver fora das situações e para fins legalmente previstos é suscetível de
constituir a conduta prevista no artigo 254º CP – profanação de cadáver.
No direito penal, a parte do ordenamento jurídico que estabelece quais são os comportamentos
humanos qualificados como crimes e os estados de perigosidade criminal, define os agentes dos
crimes e os sujeitos dos estados de perigosidade e fixa as penas e as medidas de segurança a
serem-lhes aplicadas.
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Ciências Forenses I | Margarida Oliveira e Tânia Soare
Por sua vez, o direito penal deve ser tomado no sentido amplo de toda a legislação penal e
processual penal incluindo a legislação codificada e a legislação avulsa e ainda a jurisprudência
relevante do domínio em causa.
A legislação penal aplicável diz respeito ao código penal, tanto a parte geral (teoria geral da
infração criminal) como a parte especial que diz respeito ao catálogo dos tipos de crime:
a) O agente for médico no exercício da sua profissão e do ato médico não resultar doença ou
incapacidade para o trabalho (resultado específico da conduta) por mais de 8 dias; ou
b) Da ofensa não resultar doença ou incapacidade para o trabalho por mais de 3 dias.
3 - Se do facto resultar ofensa à integridade física grave, o agente é punido com pena de prisão
até 2 anos ou com pena de multa até 240 dias.
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Ciências Forenses I | Margarida Oliveira e Tânia Soare
Existem diversos tipos legais de crime que têm em comum a ofensa do bem jurídico que é a saúde.
Contudo, espalhados pelo código existem outros tipos legais que visam proteger este bem jurídico.
DANO
O dano é o resultado de uma conduta típica e consiste na alteração física ou psíquica da pessoa.
Existem diferentes tipos de dano (de acordo com o bem jurídico lesionado): dano da morte, dano
corporal e dano no património.
O dano corporal consiste num conjunto das sequelas lesionais, funcionais e situacionais nas
quais se refletem os danos morais, que um indivíduo apresenta em consequência de uma doença,
traumatismo ou estado fisiológico, influenciadas por fatores da pessoa e do meio e que foram
causadas através de uma conduta prevista num tipo legal de crime.
Para além disso, constitui uma ofensa à saúde, tomada esta como “o estado de completo bem-
estar físico, mental e social e não apenas a ausência de doença ou enfermidade” (Preâmbulo da
Constituição da Organização Mundial de Saúde).
A lei pune no artigo 142º CP a mera ofensa no corpo e esta tem lugar quando uma agressão
voluntária é praticada no corpo de alguém, designadamente cometida por meio de bofetada sobre
uma pessoa, ainda que esta não sofra, por via disso, lesão, dor ou incapacidade para o trabalho.
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Quando se verifica um facto considerado crime por queixa do ofendido ou iniciativa do MP inicia-
se o processo penal. Assim, ocorre a subsunção da conduta no tipo legal de crime através da
verificação dos pressupostos da punição criminal. Deste modo, verifica-se o resultado (ofensa no
corpo ou na saúde; perigo para a vida; perigo para o corpo ou para a saúde), assim como o nexo
causal entre a conduta e o resultado. É necessário então realizar-se uma perícia médico-legal para
se avaliar o dano corporal (natureza e extensão) e efeitos para a saúde do ofendido.
A avaliação do dano corporal vai permitir obter informação sobre as consequências da ação, sobre
o dano, colaborando com o tribunal na determinação do tipo legal que em concreto foi cometido,
pelo preenchimento ou não das realidades que os termos médico-legais sintetizam.
Relatório pericial
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A acusação do MP
O despacho acusatório deve conter a indicação da prova pericial que serve de suporte à acusação
e às descrições ou conclusões médico-legais que fundamentam a acusação.
As perícias e pareceres solicitados aos serviços médico-legais são realizados pelos peritos
designados pelas entidades médico-legais para o efeito competentes.
No exercício das suas funções técnicas os peritos gozam de independência e autonomia técnica e
científica, sendo responsáveis pelas perícias, relatórios e pareceres por si efetuados.
Para o exercício da função de perito no âmbito dos serviços médico-legais há que considerar dois
tipos de requisitos habilitacionais:
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médico-legal já não estará, por via de regra, habilitado a realizar uma perícia de
toxicologia forense; um bioquímico habilitado para realizar uma perícia de criminalística
biológica já não estará, por via de regra, habilitado a realizar uma perícia de clínica
médico-legal para avaliação do dano corporal, etc.).
Do código deontológico da ordem dos médicos são de salientar os seguintes artigos acerca do
médico perito:
DIREITOS E DEVERES
a) Dever de desempenhar a função para que tiver sido nomeado (cf. art. 469º, n.º 1 do CPC;
art. 153º, n.1 do CPP);
b) Dever de prestar compromisso de honra (cf. art. 479º, n.º 1 do CPC; art.s 156, n.º 1 e 91º,
n.ºs 2, e 6, b), do CPP – os funcionários públicos no exercício das suas funções não
prestam compromisso);
c) Dever de resposta a quesitos (cf. art. 156º, n.º 1 do CPP; art. 475º e 476º do CPC);
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d) Dever de elaborar relatório (cf; art. 483, n.º 1 e 484º, n.º1 e 3 do CPC; art. 157º, n.ºs 1 e
5 do CPP);
e) Dever de prestar esclarecimentos (cf. art. 485º, n.ºs 3 e 4 do CPC; art. 158, n.º 1, a) do
CPP);
f) Dever de solicitar autorização para destruição de objetos, para a realização da perícia (cf.
art.s 481º, n.º 2 e 3 do CPC; art. 161º do CPP);
g) Dever de comparecer aos atos para que é nomeado (cf. art.s 417º, n.º1, 469º, n.º 1 e 486º,
do CPC; art.s 350.º, n.º3, 353º, n.º 1, e 354.º do CPP);
h) Dever de respeitar o segredo de justiça. O segredo de justiça impõe-se a todos os
intervenientes processuais, de acordo com o estabelecido no art. 86º, n.º 8 do CPP.
a) Casos de impedimentos (cf. art. 470, n.º 1 do CPC ; art. 47º do CPP; art. 115º CPC);
b) Casos de recusa (cf. art.s 43º, n.º 1 e 153, n.º1 do CPP; art. 120º CPC);
c) Casos de escusa (cf. art. 470º, n.º 3 do CPC; art. 153, n.º 2 do CPP);
d) Casos de dispensa legal do exercício da função (cf. art. 470º, n.º 2 do CPC; art. 571º, n.º
2 do CPC, por força do art. 4º do CPP).
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Assim, os médicos e peritos médicos têm obrigação de denunciar o crime ou receber a denúncia
do crime e transmiti-la de imediato ao MP.
ESTRUTURA DO EXAME
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