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Cláudia Morgado

DIREITO PROCESSUAL PENAL – Práticas

Dra. Sónia Fidalgo

16 de março 2021
Alguém para ser punido pela prática de um crime, para que se possa dizer que alguém cometeu um crime essa
pessoa tem de ter praticado um facto típico, ilícito culposo e punível – isto foi o que estudámos no 3º ano.
No 1º semestre do 4º ano estudámos a consequências jurídicas do crime a aplicar à pessoa quando se prova
que a pessoa praticou facto típico, lícito, culposo e punível, essa pessoa vai ser punida com pena ou MS.

Agora vamos estudar direito processual penal, vamos ver quais são os passos que temos de percorrer para que
aquela pessoa que praticou o crime venha efetivamente a cumprir uma pena ou MS. Vamos estudar o percurso
que tem de ser feito desde que se adquire a notícia do crime até à efetiva condenação ou absolvição do agente.
Sabemos que à partida essa pessoa vai ser aplica pena ou MS através de um processo penal. Qual o percurso que
tem de ser feito para que lhe seja aplicável pena ou MS ou pelo contrário pode haver suspeita da prática do crime
e o processo penal redonda numa absolvição. O processo penal não leva sempre à condenação muitas vezes leva
à absolvição.
Dizemos que o direito processual penal regula o modo de averiguar se o agente cometeu um certo facto e qual
a sanção que lhe deve corresponder. O nosso direito processual penal tem uma característica que o distingue de
todos os outros ramos de direito processual, p.ex., direito processual civil. Não é possível realizar o direito civil na
prática sem recurso ao processo civil? Sim, repare-se como chegar a um café e em troca pagar o preço, isto é um
contrato de compra e venda estamos a realizar direito civil. Quando nos casamos estamos a realizar o direito civil.
Quando arrendamos uma casa estamos a realizar direito civil. O direito civil não precisa do processo civil para ter
aplicação na prática. E o direito penal realiza-se na prática sem o processo penal? Não. O processo penal tem esta
característica muito particular, é um direito processual como outros direitos processuais, mas o nosso direito
processual penal tem a particularidade de só através dele se pode realizar o direito penal. Se o direito penal é o
ramo do direito que nos diz quais os comportamentos que são crimes e quais as consequências jurídicas que lhes
correspondem, mas só há direito penal com o processo penal respetivo. A comete crime contra B mas se nunca
foi descoberto, se nunca houver processo penal, na prática é como se não tivesse havido crime, não vai haver
intervenção do direito penal, o direito penal não vai ser chamado. O direito penal só vai ser chamado através de
um processo penal. Por isso dizemos que o direito processual penal é a concretização do direito penal substantivo.
Não há pena sem processo penal. Sem processo penal não há direito penal.
O direito penal substantivo só se realiza na prática com o processo penal e a relação que se estabelece entre
o direito penal e o processo penal é uma relação íntima. Apesar do direito processual penal estar muito ligado ao
direito penal substantivo, ele é um direito autónomo, com características próprias, regras próprias. Dizemos que
a relação entre o direito penal e o direito processual penal é uma relação mútua de complementariedade
funcional. Por um lado, a tramitação a conformação do direito processual penal é influenciada pelo direito penal
substantivo, mas o direito processual penal também influencia o direito penal substantivo. São dois ramos do
direito autónomos, mas que se influenciam mutuamente. Há até certos institutos como p.ex., o instituto da
prescrição do procedimento criminal, o instituto da queixa e o instituto da acusação particular cuja pertinência ao
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direito penal e direito processual penal é duvidosa. A queixa, a acusação particular são reguladas quer no CP quer
no CPP. Há certas dimensões que são reguladas no CP e outras notas características destes institutos que são
reguladas no CPP. Apesar desta íntima relação entre o direito processual penal e o direito penal substantivo não
deixa o direito processual penal de ser um ramo do direito autónomo com uma teleologia própria. Dizemos que o
processo penal tem um interesse material específico que é o interesse da administração da justiça.

Para que serve o processo penal? Quais as finalidades do direito processual penal?
São três:
 A realização da justiça e a descoberta da verdade material. Na verdade, são quatro, porque a realização
da justiça e a descoberta da verdade material têm uma autonomia entre si. P.ex., as medidas de
garantia patrimonial visam a realização da justiça, mas não tanto a descoberta da verdade material.
Mas nós costumamos dizer tradicionalmente que são 3 as finalidades do processo penal.
 A proteção dos direitos fundamentais dos cidadãos perante o Estado.
 O restabelecimento da paz jurídica comunitária e do arguido posta em causa com a prática do crime.

Estas são as 3 grandes finalidades do processo penal, é para isto que serve o processo penal. É por isto que
nós dizemos que não há pena sem processo, não há ninguém que possa ser condenado pela prática de um crime
se não tiver havido previamente um processo penal.

Estas finalidades conseguem harmonizar-se facilmente ou entram constantemente elas mesmas em


conflitos umas com as outras? Estão constantemente em conflito. Um ex., de uma matéria em processo penal
em que se nota esse conflito entre as diversas finalidades são as escutas telefónicas e generalidade dos meios de
obtenção de prova. Temos que obter prova no processo penal, o problema fundamental é o problema da prova,
temos de provar os factos na audiência de julgamento. Obviamente que para obter a prova vamos ter na
generalidade dos casos que comprimir os direitos fundamentais dos cidadãos. Todo o regime de obtenção de
prova em processo penal e o exemplo das escutas telefónicas que é um dos meios de obtenção de prova mais
intrusivos nos direitos fundamentais que são um meio oculto de obtenção de prova. Há outros meios que
também são muito intrusivos como a busca domiciliária. Mais intrusivo é estar a falar ao telefone e alguém estar
a escutar porque não sei que estou a ser escutada. Existem programas informáticos que se instalam nos sistemas
informáticos e que podem ter as demais variadas funções podem apenas aceder à informação que está nesse
sistema informático ou pode-se conseguir obter informação em tempo real, a pessoa que instalou esse software
malicioso está a ler em tempo real aquilo que estamos a fazer e nos casos mais complexos este software
malicioso pode até ativar as câmaras e microfones dos computadores e a questão é saber se isto pode ser
utilizado pelos órgãos de policia criminal para obter prova em processo penal, sito é utilizado pelo hacker quem
faz isto pratica um crime, crime de acesso ilegítimo, eventualmente crime de bulas informáticas. A questão é se
o Estado pode usar estes meios para obter prova. Portanto, temos aqui um exemplo obvio do conflito entre por
um lado a descoberta da verdade e por outro a proteção dos direitos fundamentais das pessoas,
designadamente do arguido.
Medidas de coação, como prisão preventiva, durante o processo penal aplicam-se medidas de coação para
descobrir a verdade e todo este regime é marcado por uma tensão entre a descoberta da verdade material e
proteção dos direitos fundamentais do arguido. As medidas de coação são aplicadas a um arguido que se
presume inocente. Presume-se inocente até ao trânsito em julgado da decisão condenatória. Para alguém
aplicar medidas de coação, neste caso o juiz, entre nós é sempre o juiz que aplica medidas de coação tem de

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verificar um conjunto de apertado de condições porque estamos a meter em causa os direitos fundamentais do
arguido.
Também podemos ter conflito entre a finalidade de descoberta da verdade e restabelecimento da paz
jurídica, ex., recurso extraordinário que é possível interpor depois do trânsito em julgado, que é o recurso de
revisão que está previsto no art.449º CPP que é admitido mesmo depois do trânsito em julgado. Quando uma
decisão transita em julgado à partida entende-se que está restabelecida a paz jurídica posta em causa pela
prática do crime. com trânsito em julgado alcança-se a paz jurídica quer da comunidade quer do próprio arguido,
este que foi condenado a sua decisão transitou em julgado e a comunidade vê reafirmada a validade das normas
com o trânsito em julgado com determinada decisão. Mas a lei permite nos termos do art.449º aquilo que se
chama o recurso de revisão que é um recurso extraordinário, que se permite que se interponha depois do
trânsito em julgado, quando houver suspeitas sérias sobre a justiça de uma condenação. P.ex., quando surgirem
novos meios de prova que infirmem aquela condenação. Este art., tem várias al., onde se prevê os fundamentos
de revisão de uma sentença. Aqui está um conflito entre o restabelecimento da paz jurídica e a descoberta da
verdade.

O que podemos fazer perante estas situações de conflitualidade? Qual a solução? Perante este conflito que
encontramos entre as diversas finalidades devemos operar a concordância prática das finalidades em conflito, é
isto que diz o Doutor Figueiredo Dias. Isto é uma ideia que tiramos do direito constitucional, quando há colisão
de direitos fundamentais.
Portanto, devemos proceder à concordância prática das finalidades em conflito, de modo a salvar em cada
situação o máximo conteúdo possível de cada finalidade. É isto que vimos quer p.ex., no regime de medidas de
coação, quando aplicamos medida de coação a um arguido que se presume inocente, estamos a limitar os
direitos fundamentais do arguido em prol da finalidade de descoberta da verdade. Mas esta limitação dos
direitos fundamentais é feita em termos muito restritos, os direitos fundamentais são limitados apenas na
medida em que isso for essencial para a descoberta da verdade. O mesmo acontece para os meios de obtenção
de prova, mesmo o regime de escutas telefónicas é um regime apertado, só nos casos mais graves é que é
possível recorrer às escutas telefónicas e o regime de admissibilidade deste meio de obtenção de prova é um
regime muito restrito, porque estão em causa os direitos fundamentais da pessoa, mas por vezes podem estar
envolvidos também terceiros, porque a pessoa fala com outra pessoa, por isso que se diz que o processo penal
visa proteger os direitos fundamentais das pessoas.
O regime das medidas de coação, o regime da generalidade dos meios de obtenção de prova são a prova
dessa concordância prática entre as finalidades em conflito.
Há sempre um limite para esta concordância prática que o limite da dignidade da pessoa, em regra a
dignidade do arguido. Quando está em causa a dignidade da pessoa, não é possível qualquer transação, não é
possível qualquer concordância, porque a dignidade da pessoa é um valor absoluto e por isso não cede perante
qualquer outro direito ou interesse.
Quando em causa está a dignidade da pessoa deve ser dada prevalência à finalidade do processo penal que
der total cumprimento à garantia constitucional da dignidade da pessoa humana. É o que acontece p.ex., no
regime dos métodos proibidos de prova, nós temos uma norma art.126º do CPP que nos fala dos métodos
proibidos de prova. As provas obtidas através de métodos proibidos p.ex., prova obtida mediante tortura, se
recorrêssemos à tortura conseguíamos obter prova em muitos casos em que é difícil alcançar essa prova, mas
isso poria em causa a dignidade da pessoa. Está aqui claro o conflito entre a descoberta da verdade e proteção
dos direitos fundamentais do arguido, mas vamos operar a concordância prática e dizemos que torturamos só
um bocadinho? Isto não é possível, porque está em causa a dignidade da pessoa e por isso não é possível operar
qualquer concordância prática, devemos dar prevalência à finalidade que acautela essa dignidade da pessoa, ou
seja, na prática devemos dar prevalência à finalidade de proteção dos direitos fundamentais do arguido. Ex.,

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claro é a norma do art.126º CPP que estabelece um conjunto de métodos proibidos de prova. As provas
proibidas através de métodos proibidos, p.ex., tortura ou ofensa à integridade física de uma pessoa, essa provas
são nulas e não podem ser utilizadas no processo penal. Esta matéria introdutória é muitas vezes perguntada no
exame.

Art.187º nº1 CPP – temos um exemplo claro da concordância prática. Vamos ou não limitar os direitos do
arguido quando fazemos escuta telefónica? Sim, estamos a limitar os direitos do arguido para obter a verdade,
na busca da verdade material. Mas desde logo a lei diz que só pode haver escutas telefónicas se se tratar de
crime punível com pena de prisão superior a 3 anos. não pode haver uma escuta telefónica quando o processo é
o por um crime de furto simples ou quando o processo é por um crime de ofensa à integridade física simples. Só
pode haver esta limitação dos direitos do arguido quando o processo for por um crime mais greve, um crime de
criminalidade média ou de grave criminalidade. Quando o MP requer escuta telefónica no seu requerimento tem
de fundamentar todos os pressupostos. Quem autoriza a escuta telefónica tem de ser um juiz, mas nunca pode
ser o próprio MP a determinar uma escuta telefónica, tem de ser o juiz que é o garante dos direitos
fundamentais. o facto de ter de ser um juiz, o facto de só poder ter lugar quando de outro modo a prova for
impossível de obter, o facto da escuta telefónica só poder ter lugar quando for indispensável para a descoberta
verdade, o facto de ela só poder ser possível quando em causa estiver um crime punível com pena de prisão
superior a 3 anos. todo este regime nos mostra a concordância prática das finalidades em conflito. Por um lado,
estamos a dar palco à finalidade da descoberta da verdade porque estamos a admitir a escuta telefónica e a
comprimir os direitos fundamentais do arguido, mas por outro lado, estamos a dizer que só vamos comprimir os
direitos fundamentais do arguido nos casos mais graves. Não seria um ex., de qualquer harmonização se
permitíssemos p.ex., uma escuta telefónica no âmbito de crime de injuria que é punível com pena de prisão até
6 meses, era completamente despropositado não havia qualquer concordância prática, estaríamos a dar
preponderância óbvia à descoberta da verdade.

Art.202º CPP – prisão preventiva, medida de coação mais grave. Limitamos os direitos fundamentais do
arguido em nome da descoberta da verdade material, mas só vamos limitá-los na medida em que tal for
estritamente necessário para essa descoberta, só nos casos mais graves. Aplica-se a prisão preventiva quando
nenhuma das outras medidas de coação for suficiente e desde logo se o crime for punível com pena de prisão
superior a 5 anos.
O próprio regime dos meios de obtenção de prova e das medidas de coação é revelador desta concordância
prática, porque permite que haja intromissão nos direitos fundamentais, mas só quando os crimes são graves e
só quando essa intromissão for indispensável para a descoberta da verdade, neste caso quando está em causa o
conflito entre estas duas finalidades.

Conformação jurídico-constitucional do processo penal português:


Costumamos dizer que o direito processual penal é direito constitucional aplicado e isto numa dupla
dimensão, porque por um lado os fundamentos do direito processual penal são simultaneamente os alicerces
constitucionais do Estado e, por outro lado, a concreta regulamentação de singulares problemas processuais
deve ser conformada jurídico-constitucionalmente.
No fundo encontramos na CRP um conj., muito vasto de normas que relevam diretamente para o direito
processual penal.

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Fundamental é o art.32º. No nº3 a própria lei estabelece atos em que a assistência por advogado é obrigatória.
Nº5 estabelece na própria constituição qual a estrutura do nosso processo penal. Nosso processo penal tem uma
estrutura acusatória e isso decorre da própria CRP, com repartição das funções processuais de investigar, acusar
e julgar entre a magistratura judicial e a do MP.
Nº7 o ofendido tem o direito de intervir no processo e vamos ver mais à frente que se ele quiser intervir
ativamente no processo tem o dever de se constituir assistente.
Todos os nº são nº que dizem respeito a normas do nosso processo penal, são respostas em muitos casos a
problemas concretos do processo penal.
É suposto saber o art.32º decore.

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O art.34º refere as regras da admissibilidade de entrada no domicílio contra a vontade do cidadão, para
obtenção de prova.
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Art.207º fala da possibilidade de constituição de tribunal de júri. Em PT os tribunais são diferentes, há vários
tipos de tribunais. O caso pode ser julgado por um tribunal singular, constituído por um só juiz. Pode ser julgado
por um tribunal coletivo, constituído por 3 juízes. Ou pode ser julgado por um tribunal de júri, constituído por 3

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juízes e por 4 jurados, mas a própria CRP estabelece regras em relação ao tribunal do júri. Entre nós p.ex., nunca
pode haver um tribunal do júri a julgar um crime de terrorismo, isso é expressamente proibido pela CRP.

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Art.219º diz expressamente que é ao MP que compete exercer a ação penal orientada pelo pp., da legalidade.

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Referência ao Direito da União europeia, esta referência não está expressamente nas lições, não temos que
decorar quais a diretivas da União Europeia relevantes no âmbito de processo penal. Mas quis-se dizer que na
União Europeia tem havido também uma preocupação com a proteção dos direitos do arguido e, por isso, reuniu-
se um conjunto de diretivas da União Europeia em que nós em PT não temos tido necessidade de transpor porque
muitos destes direitos já estavam consagrados na nossa legislação. Ninguém vai perguntar quais as diretivas da
União Europeia. Muitas das opções que temos na nossa legislação portuguesa atual são opções que não são
tomadas livremente pelo legislador português em muitos casos resultam de obrigações assumidas no âmbito da
União europeia, às vezes também de Convenções do Conselho de Europa, não são opções autónomas, não está
na estrita autonomia do legislador português, mas resulta de diretivas da União Europeia ou de convenções
ratificadas pelo Estado português. Não somos autónomos na generalidade das matérias jurídicas, mas também
em matéria de direito penal e direito processual penal.

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O direito processual penal é direito constitucional aplicado ainda sobre um outro ponto de vista, porque muitas
vezes a conformação do processo penal se traduz numa restrição dos direitos fundamentais do arguido e terceiros
e, por isso, envolve todo o regime constitucional de restrição dos direitos, liberdades e garantias dos cidadãos.
Quando falamos de processo penal falamos na generalidade dos casos de restrição de direitos fundamentais e,
por isso, todo o regime do art.17º e 18º CRP, o regime das restrições de direitos, liberdades e garantias aparece
muitas vezes também no âmbito do processo penal. Portanto, para além das normas já vista, também conformam
o direito processual penal as normas dos art.17º e 18º normas relativas à restrição dos direitos fundamentais do
arguido e terceiros.

23 de março de 2021

Hoje vamos falar da estrutura do processo penal e da tramitação do processo penal.

Estrutura do processo penal:

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Temos duas estruturas a inquisitória e acusatória.

Pp de estrutura inquisitória é típico da aquisição e estados absolutistas e totalitários. Finalidade que prevalece
é a finalidade da descoberta da verdade o pp., é dominado pelo interesse do estado na descoberta da verdade e
realização da justiça. O arguido não é visto como um verdadeiro sujeito do processo penal é visto como um objeto
do ppenal, não tem um verdadeiro direito de defesa. além disso, o ppenal é essencialmente um processo escrito
e secreto em que a confissão é a “rainha das provas” pretende-se encontrar a verdade a todo o custo e a confissão
é um meio para se alcançar a verdade e, por isso, não se exclui o recurso à tortura para que assim se alcance a
verdade. O juiz é um dependente do poder político e desempenha a 3 tarefas de investigação, acusação e
julgamento.

No polo oposto temos o ppenal de estrutura acusatória surgiu na europa continental com o pensadores
iluministas como Rosseau e a revolução francesa e a declaração dos direitos do homem. Aqui a finalidade principal
do ppenal de estrutura acusatória é a de proteção dos direitos fundamentais. o arguido aqui é visto como um
sujeito do ppenal e além disso o arguido é titular de um verdadeiro direito de defesa e o ppenal passa a ser visto

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como um processo de partes, a acusação e a defesa são partes de uma lide de que podem dispor, é necessário
que se afirme uma igualdade de armas. É um processo penal de partes, acusação e defesa. o juiz surge sobretudo
como um juiz passivo, não te verdadeiros poderes de investigação, vale a ideia de autorresponsabilidade
probatória das partes e a verdade que se alcança é uma verdade formal, resulta do ppenal afirmando-se a
presunção de inocência do condenado até à condenação.
Afirmação de um pp., de acusação que é fundamental e significa que há uma cisão entre a entidade que
investiga e acusa por um lado que é o MP e a entidade que julga por outro lado que o juiz. Isto é assim para garantir
a imparcialidade.
Pp., da acusação e estrutura não são a mesma coisa. Uma estrutura acusatória tem mais características para
além do pp., da acusação.

Entre nós ao longo dos tempos que estruturas de ppenal tivemos: o CPP anterior era de 1929 e neste tínhamos
um ppenal de estrutura mista, inquisitória mitigada ou moderna. Esta estrutura é uma estrutura própria de estado
favoráveis a ideologia totalitárias ou autoritárias como era o Estado Novo. A descoberta da verdade é a finalidade
principal do ppenal e respeita-se o pp., da acusação, mas só de um modo formal e por isso que no esquema temos
estrutura do acusatório formal, porque a entidade que acusa é o MP e a entidade que julga é o juiz, mas este pp.,
da acusação nesta estrutura mitigada só era respeitado formalmente e por isso dizemos que era pp., da forma
acusatória porque quem dirigia a investigação era o juiz a investigação chamava-se a instrução preparatória e era
o juiz que ordenava ao MP que acusasse ou não acusasse. Na prática o juiz dirigia a investigação o MP acusava sob
comando do juiz e depois era o juiz que julgava, no fundo só formalmente havia separação de funções, na pratica
era também o juiz que desempenhava estas 3 tarefas.

Atualmente qual a estrutura do ppenal em vigor: temos o CPP de 1987 que entrou em vigor no dia 1 de janeiro
de 1988. Atualmente o nosso ppenal é de estrutura acusatória integrada por um pp., de investigação (isto é
sempre perguntado). Esta é a estrutura que melhor dá cumprimento á concordância prática das finalidades do
ppenal.
Se é estrutura acusatória quer dizer que se respeita o pp., da acusação a entidade que investiga e acusa é o
MP e quem julga é o juiz por questões de imparcialidade. Entre nós esta estrutura acusatória é integrada por um
pp., de investigação, que significa que o trib., tem o poder-dever de investigar os factos independentemente do
contributo dos outros sujeitos processuais, criando ele mesmo as bases necessárias à sua decisão. Por outro lado,
esta afirmação de que o juiz tem o poder-dever de investigação está ligada à ideia de que a verdade que se procura
no processo é uma verdade material. o juiz não é um juiz passivo tem poderes de investigação. Além disso, dizemos
que a nossa estrutura é acusatória integrada por um pp., de investigação e dizemos que este pp., no âmbito de
um ppenal de estrutura acusatória é um pp de natureza subsidiária e limitada, isto significa que é subsidiário no
sentido de que este poder-dever de investigação só ocorre quando os contributos de acusação e defesa (dos
outros sujeitos processuais) não forem suficientes para o juiz formar a sua convicção, além disso o seu poder de
investigação é limitado porque o juiz está sempre limitado pelo objeto do processo, é sempre a instância que
investiga que é o MP que vai decidir aquilo sobre que vai incidir a decisão da instância que julga, ou seja, entre
nós é o MP é a acusação que define o objeto do processo, os poderes de investigação do juiz estão sempre
limitados ao objeto do processo, ideia de indisponibilidade do objeto do processo que está relacionada com a
finalidade de proteção dos direitos dos sujeitos. O juiz tem poderes de investigação, mas está sempre limitado ao
objeto do processo que é definido pelo MP na acusação, portanto, vale a ideia do pp., da indisponibilidade do
objeto do processo.
Este pp., da investigação está referido em várias normas do CPP, mas numa está referido de imediato art.340º.
art.348º que mostra a sua natureza subsidiária e limitada (isto é muitas vezes perguntado qual a norma que mostra
a natureza subsidiária e limitada do pp., da investigação). No nº4 o arguido indica determinada uma testemunha

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e é o advogado do arguido que faz perguntas à testemunha é o defensor que diretamente questiona a testemunha.
No ppenal de estrutura inquisitória as perguntas são questionadas pelo juiz, o nº revela claramente a nossa
estrutura acusatória, as testemunhas são questionadas por quem as indicou. Natureza subsidiária – em último
termo o próprio juiz pode fazer as perguntas ao juiz. Nº4 e 5 espelham a nossa estrutura acusatória integrada por
um pp., da acusação subsidiário e limitado.
Reconhecimento de um leque alargado de sujeitos processuais típico da estrutura acusatória: há uma
participação constitutiva da acusação e da defesa na declaração do direito no caso concreto. Entre nós o arguido
é um verdadeiro sujeito processual. Não é uma estrutura acusatória pura porque vigora o pp., da acusação que
tem natureza subsidiária e limitada.

Distinção entre sujeitos processuais e participantes processuais:


 Sujeitos processuais são as pessoas que intervêm no processo e que através do exercício de direitos
autónomos de que são titulares influenciam concretamente a tramitação do processo. Os sujeitos têm
por isso, uma participação constitutiva na declaração do direito do caso. quem são os sujeitos
processuais? São o juiz, MP, o arguido, assistente e o defensor (isto é muitas vezes perguntado). O
defensor é o advogado do arguido, o assistente corresponde por regra ao ofendido, para que possa ter
uma participação ativa no processo penal tem de se constituir assistente. São as pessoas que intervêm
ativamente no processo, através do exercício de direitos autónomos.
 Os participantes processuais são pessoas que participam no processo, mas que não configuram o
concretamente o processo. Não exercem direitos autónomos no processo. Ex., testemunhas, peritos,
órgãos de polícia criminal, suspeitos e o ofendido (vai só lá contar o que aconteceu) que para ser
verdadeiro sujeito do processos tem de se constituir assistente.

Sistematização do CPP:

Artigo 1.º e ss. – disposições gerais;


Artigo 8.º e ss. – dos sujeitos processuais;
Artigo 85.º e ss. – dos atos processuais;
Artigo 124.º e ss. – da prova;
Artigo 191.º e ss. – das medidas de coação e de garantia patrimonial;
Artigo 241.º e ss. – da notícia do crime;
Artigo 248.º e ss. – das medidas cautelares e de polícia;
Artigo 262.º e ss. – do inquérito;
Artigo 286.º e ss. – da instrução;
Artigo 311.º e ss. – do julgamento;
Artigo 381.º e ss. – dos processos especiais;
Artigo 399.º e ss. – dos recursos.

Tramitação do ppenal comum:


Porque além do ppenal comum estão previsto no CPP processos especiais que estão previstos no art.381º e
ss., têm duração mais curta (sumário, abreviado e sumaríssimo), ideia de brevidade.
As várias fases de que vamos falar são as fases do ppenal comum.
Ppenal comum tem uma tramitação tendencialmente unitária isto significa que independentemente da
natureza e da gravidade do crime o ppenal é igual para todos os casos, tanto faz estarmos a julgar um homicídio

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ou crime de furto, o ppenal é sempre o mesmo, tem sempre a mesma tramitação. Mas não dizemos que a
tramitação é unitária tout court. Utilizamos o advérbio tendencialmente porque na fase de julgamento existem
certas especificidades que decorem da natureza e gravidade do crime.

Temos uma 1ª fase do processo que é a fase de inquérito que acaba com acusação ou arquivamento. Pode
haver fazer fase intermédia que é a de instrução que é facultativa e que é redigida pelo juiz de instrução e termina
com pronúncia ou não pronúncia depois temos a fase de julgamento que é dirigida pelo juiz de julgamento e há
absolvição ou condenação e depois pode ainda haver recurso eventualmente.

Quanto à 1ª fase que é a fase do inquérito: o ppenal tem início com o conhecimento de que houve um
crime e a entidade competente para adquirir a notícia do crime é o MP (art.241º CPP). E nos termos do art.262º
nº2 do CPP a notícia de um crime dá sempre lugar a um inquérito. O inquérito é a fase do processo em que se
vai investigar se houve ou não um crime, em que se vai determinar que foram os sues agentes e qual a sua
responsabilidade e em que se vai descobrir e recolher as provas (art.262º nº1). Quem dirige o inquérito é o MP
que é assistido pelos órgãos de polícia criminal (art.263º). MP abre o inquérito e depois dirige o inquérito.
Entre nós o MP é visto como uma autoridade judiciária.
Quem são as autoridades judiciárias: art.1º al. b). O art.1º tem um conjunto de definições e na al. b) tem a
definição de autoridade judiciária. São o juiz, o juiz de instrução e o MP.
Uma coisa são as autoridades judiciárias e outra as autoridades judiciais:
Judicial – são os juízes não entra o MP. Quando falamos de autoridade judiciária já entra o MP.
Entre nós o MP tem certas características que o distinguem de outros sistemas, entre nós não é visto como
um puro acusador, não é um advogado do Estado. Nós temos o art.53º que se refere à posição e atribuições do
MP no processo estabelecendo que o MP tem como função no ppenal colaborar com o tribunal na descoberta
da verdade e realização do direito obedecendo a critérios de estrita objetividade. O art.53º nº2 al. d) estabelece
que compete ao MP interpor recursos ainda que no exclusivo interesse da defesa. o nosso ppenal não é um
processo de partes, é um sujeito que tem sujeitos processuais. Processo de partes é o que existe no ppenal de
estrutura acusatória pura, a estrutura do nosso ppenal é acusatória integrada por um pp., de investigação. Deve
investigar quer no sentido de uma condenação, quer no sentido de uma absolvição. P.ex., no final de um
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julgamento se no julgamento não se tiver produzido prova deve o MP pedir absolvição do arguido, na prática
isto não é muito recorrente.
Durante o inquérito o MP é assistido pelos órgãos de polícia criminal (art.263º nº1 CPP e no art.2º nº2 da Lei
de Organização da investigação criminal – a lei 49/2008 de 27 de agosto).
Quem são os órgãos de polícia criminal de competência genérica? Art.1º dá nos uma definição al. c) – polícia
judiciaria, GNR e PSP art.3º da Lei da Organização da investigação criminal. Qualquer um pode atuar como órgão
de polícia criminal desde que esteja afeta a uma investigação criminal no ppenal e sob orientação de uma
autoridade judiciária. A polícia judiciária é a única que está sob tutela do Ministério da Justiça. E o GNR e PSP sob
tutela do Ministério da Administração interna.
Há certos crimes cuja competência é reservada à PJ, como crime de homicídio, art.7º da LOIC. Os outros
crimes podem ser investigados pela PSP e GNR que têm competência residual em matéria de investigação
criminal.
Os órgãos de polícia criminal atuam sob a direta orientação do MP e na sua dependência funcional, isto
resulta de várias normas do CPP nomeadamente do art.263º nº2, art.55º e 56º do CPP.
Há também órgãos de competência específica.
Modelo de relação entre os órgãos do MP e órgãos de polícia criminal: dependência funcional entre as
policias e o MP é o MP que dirige o inquérito. Direção funcional. Quem faz investigação no terreno são as
polícias. Quem faz a investigação material, na prática são as polícias e não propriamente o MP.

Como o MP adquire a notícia do crime? Art.241º - o MP pode adquirir a notícia do crime por conhecimento
próprio, por intermédio dos órgãos de polícia criminal ou denuncia.
Em regra, não existe o dever de denunciar os factos criminosos. Sei que durante a noite houve homicídio, eu
não tenho dever de denunciar a prática deste crime. a denúncia é por regra facultativa art.244º.
Excecionalmente o art.242º prevê situações em que a denuncia é obrigatória, para as entidades policiais quanto
a todos os crimes que tomarem conhecimentos e para os funcionários (ideia de funcionário público) quanto aos
crimes que tomarem conhecimento no exercício das suas funções e por causa delas.

Ler o acórdão do STJ nº4/2019 que tem a ver com a aplicação da lei processual no tempo e que está no infor.

06 de abril de 2021

Última aula estávamos a falar da tramitação do processo penal: vimos que é composto por 3 fases e a fase de
instrução é facultativa.
O inquérito é dirigida pelo MP e o inquérito inicia-se com a aquisição da notícia do crime. e esta pode ser
adquirida pelo MP por conhecimento próprio, por denuncia ou mediante os órgãos de polícia criminal.

Ainda na fase de inquérito, apesar de ser o MP a dirigir o inquérito, há certos atos que têm de ser praticados,
ordenados ou autorizados pelo juiz. Mas qual juiz? O juiz de instrução. Entende-se que o juiz é o guardião dos
direitos, liberdades e garantias e quando certos atos põe em causa os DLG o juiz terá de intervir. Ex., buscas
domiciliárias e aplicação de uma prisão preventiva que nunca é determinada pelo MP, tem de ser determinada
pelo juiz. Mas repare-se que não somos nós que dizemos quando o juiz tem de intervir isso está previsto no
art.268º e art.269º. As medidas de coação são aplicadas sempre por um juiz apesar da fase de inquérito ser do
domínio do MP, é ele que dirige o inquérito, mas há certos atos que têm de ser aplicados pelo juiz porque se
considera que o juiz é o guardião de DLG.

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Cláudia Morgado

Como termina o inquérito? Termina de uma de duas formas, ou deduz acusação nos termos do art.283º ou
arquiva o inquérito (despacho de arquivamento) art.277º:

 O MP deduz despacho de acusação sempre que durante o inquérito tiver recolhido indícios suficientes
de se ter verificado o crime e de quem foi o seu agente, aí o MP tem o dever de deduzir acusação
art.283º nº1. Quando os indícios são suficientes? A resposta está no art.283º nº2. Os indícios são
suficientes quando o MP considerar que em julgamento é mais provável a condenação. A partir do
momento em que entende que já colheu os indícios suficientes tem o dever de deduzir a acusação em
10 dias.
 Casos há em que o inquérito termina com despacho de arquivamento, temos que distinguir 4 hipóteses
distintas:
o O MP pode concluir que não houve crime;
o Pode o MP ter estado a investigar determinado suspeito e passado uns meses concluir que
aquele arguido não foi a pessoa que cometeu o crime;
o Pode ter iniciado a investigação e a dada altura concluir que o procedimento criminal não é
legalmente admissível. Conclui p.ex., que foram factos praticados há muitos anos e já
prescreveu o prazo (art.118º CP) e aí tem o dever de arquivar;
o Por último, o MP teve notícia do crime, mas durante o inquérito não colheu indícios suficientes
da prática do crime e de quem foi o seu agente. Isto está indicado no art.277º nº1 e 2.
Vamos estudar mais à frente que há dois casos que são consideradas alternativas à despacho de acusação
art.280º e art.281º. neste casos o MP recolheu indícios suficientes, mas em vez de acusar lança mão destes
institutos, que são o arquivamento em caso de dispensa de pena e suspensão provisória do processo.

O art.276º estabelece um conjunto de prazos de duração máxima do inquérito. Nº2 e nº3 prevê um conj., de
circunstancialismos que permite um alargamento dos prazos no nº1. A lei estabelece 6 meses no caso de estar
preso ou sob obrigação de permanência na habitação e 8 meses nos restantes casos e depois há alargamento no
nº2 e 3. Estes prazos nunca são cumpridos. Discute-se a natureza destes prazos. Tem se entendido que a
população não pretenderia ter acusações precipitadas se estendêssemos estes prazos como obrigatórios, o MP
poderia deduzir acusações à pressa, precipitadas e, por isso, entende-se que o melhor é dar mais tempo ao MP
para que decida bem, arquivar quando deva arquivar e acusar quando o deva fazer.

Quando temos despacho de acusação em princípio isto significa que o caso segue para julgamento.
Quando temos despacho de arquivamento temos o fim do processo penal.

Havendo acusação seguimos para a fase de julgamento sempre que não é requerida fase de instrução. Mas
nem sempre isto acontece, nem sempre se passa do inquérito para o julgamento, porque tem de haver forma de
controlar a decisão que o MP tomou, uma reação. Forma normal de reação por regra seria o recurso, só que só se
pode recorrer de decisões judiciais, de uma decisão de um juiz, mas aqui não é uma decisão do juiz, mas de um
magistrado do MP. Só se pode recorrer de decisões judiciais.
O legislador teve de encontrar uma forma de reação de controlar a decisão que o MP tomou no final do
inquérito e há dois mecanismo:
 Um é o mecanismo judicial que é a fase de instrução, art.286º e ss.
 O outro mecanismo é o mecanismo não judicial ou hierárquico que está previsto no art.278º este só
funciona nos casos de arquivamento e nestes casos, o superior hierárquico do MP pode determinar
que seja formulada uma acusação ou que as investigações prossigam art.278º. No caso de
arquivamento pode haver esta reação ou através de requerimento ou oficiosamente.

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Cláudia Morgado

Vamos falar agora da segunda fase que é a fase de instrução:


Coloca-se entre o inquérito e o julgamento e não é obrigatória. Só há instrução se ela for requerida pelos
interessados, ela é por isso uma fase eventual, art.286º nº2.
A fase de instrução é dirigida pelo juiz de instrução que é um juiz diferente do juiz de julgamento, isto resulta
do art.32º nº4 CRP e do art.288º do CPP.
Na fase de instrução o juiz de instrução é auxiliado pelos órgãos de polícia criminal. Entre nós o juiz de instrução
desempenha dois papeis fundamentais (duplo papel ou dupla função do juiz de instrução), por um lado o juiz de
instrução é visto como guardião dos DLG das pessoas na fase de inquérito, praticando ou ordenando os atos
constantes do art.268º e art.269º, por outro lado, é ele quem dirige a fase de instrução quando ela for requerida
controlando a decisão que foi tomada pelo MP no final do inquérito, art.288º.

Quem são os interessados em requerer a abertura de instrução?


 Quando a fase de inquérito termina com despacho de acusação quem tem interesse em requerer
abertura de instrução é o arguido (art.287º nº1 al. a)), porque se ele nada fizer o caso segue para
julgamento, pode requerer abertura de instrução que pode terminar com pronúncia ou não pronuncia
e ele espera que termine com despacho de não pronúncia, dizendo o juiz de instrução diga que não
concorda com o MP e o processo termina. Se o despacho for de pronuncia o processo segue para a fase
de julgamento.
 Se for despacho de arquivamento quem te interesse em requerer fase de instrução é o assistente
(art.287º nº1 al. b)). O ofendido intervém como se fosse mera testemunha e não pode requerer
abertura do processo, para isso tem de se constituir assistente. O prazo para requerer a abertura de
instrução é de 20 dias, art.287º.

Três hipóteses:
 Imagine-se que o MP está a investigar os factos A, B e C e arquiva. Tem legitimidade para requerer a
abertura de instrução o assistente.
 O MP investiga factos e acusa. Quem te legitimidade para requerer abertura de instrução é o arguido.
 O MP investiga factos e A, B e C e só acusa pelos factos A e B. o MP deixa cair o facto C, não acusou
pelo facto C. Quem pode requerer a abertura de instrução são ambos, o arguido pode requerer
abertura de instrução em relação aos factos acusados e o assistente pode requerer abertura de
instrução pelos factos pelo qual houve arquivamento. O juiz de instrução só vai apreciar o que é pedido
pelo arguido ou assistente, se o assistente não requer abertura de instrução então em relação àquele
facto houve arquivamento.

Em rigor o arguido só deve pedir abertura de instrução quando tiver expectativa fundada que em relação a
alguns factos ou todos vai haver despacho de não pronúncia. Se o mais provável for haver despacho de pronuncia
o arguido vai chegar com duas decisões uma de acusação e outra de pronúncia, duas entidades a entenderem que
aquele arguido praticou o facto, isso de certo modo tem peso negativo. Não está correto dizer que em fase de
acusação o arguido deve sempre requerer abertura de instrução.

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Cláudia Morgado

Fase de instrução termina com despacho de pronúncia ou não pronúncia art.308º. ou seja, se tiver sido
recolhidos indícios suficientes sobre a prática do crime o juiz pronúncia, caso contrário profere despacho de não
pronúncia.

Como é composta a fase de instrução: é composta por atos de instrução facultativos que o juiz de instrução
entender serem necessários e é composta por ato obrigatório um debate de instrução oral e contraditório (1h 6)
obrigatório em que pode participar o MP, arguido, defensor, assistente e seu advogado, mas não podem participar
as partes civis art.289º

Qual a natureza da fase de instrução? Qual a função da fase de instrução? Servirá para fundamentar melhor a
conclusão de que houve ou não crime, terá a natureza de fase de investigação? Ou pelo contrário terá ela uma
mera função de controlo judicial da decisão do MP, ou seja, uma função essencialmente judicial e não tanto função
de investigação? Isto é muito discutido.
A fase de instrução é presidida pelo juiz de instrução que é um juiz diferente do juiz de julgamento e o juiz de
instrução tem também certas funções de investigação, porém, esta função de investigação é apenas uma função
subsidiária. A fase de instrução é essencialmente uma fase judicial e só subsidiariamente ela se apresenta como
uma fase de investigação. Para Maria João Antunes a finalidade da fase de instrução é de comprovação judicial da
decisão do MP, isto resulta do art.286º nº1, não é fase de investigação. Não concorda com o autores que dizem
que esta fase é um suplemento autónomo de investigação.

Fase de julgamento:
Está regulada no art.311º e ss.
O julgamento de 1ª instância pode ser feito por um de 3 tribunais. Pode ser feito por um tribunal singular nos
termos do art.16 que é composto por um só juiz e tem competência residual e julga crimes menos graves, punidos
com pena de prisão igual ou inferior a 5 anos.
Mas o julgamento pode ser feito também por um tribunal coletivo cuja competência está no art.14º, este é
composto por 3 juízes, um é o juiz presidente e os outros juízes asas. São da competência do tribunal coletivo
processos que digam respeito a morte de pessoa, crimes puníveis com penas superiores a 5 anos de prisão e é
ainda competente para julgar crimes contra identidade cultural e integridade pessoal art.240 e ss. do CP e é ainda
competente para julgar crimes contra segurança do Estado que estão os previsto no art.308 e ss. do CP e ainda os
crimes previstos na lei penal relativa às violações do direito internacional humanitários lei nº31/2004 de 22 de
junho.
Além destes dois tribunais, pode ser ainda competente o tribunal do júri art.13º. É constituído pelos 3 juízes
do tribunal coletivo, mais 4 jurados. O tribunal do júri só intervém quando for requerido pelo MP, pelo assistente
ou pelo arguido. Este tribunal julga crimes contra identidade cultural e integridade pessoal previsto no art.240º e
ss., julga crimes contra segurança do Estado art.308º e ss., do CP e ainda os crimes previsto na lei penal relativas
às violações do direito internacional humanitário e crimes puníveis com pena superior a 8 anos de prisão.

Na fase de julgamento assume especial importância a audiência de julgamento, art.321º e ss.

Os crimes menos graves são julgados em regra por um tribunal singular e à partida os crimes mais graves são
julgados por um tribunal coletivo, com 3 juízes e quando for requerido pelos sujeitos processuais pode intervir um
tribunal de júri.

Julgamento pode terminar com sentença condenatória art.375º ou pode terminar com decisão de absolvição
art.376º. Desta decisão quer num caso ou noutro pode haver recurso que está regulada no art.399º e ss. Pode se

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Cláudia Morgado

recorrer para o tribunal da Relação ou para o STJ. Há certos casos em que se admite o duplo grau de recurso,
recorrer da 1ª instância para a Relação e desta para o STJ.

13 de abril de 2021
Aplicação da lei no tempo:
Acórdão sobre esta matéria 4/2009 do TC.
Art.5º CPP - lei processual penal é de aplicação imediata.
A regra quanto à aplicação da lei processual penal no tempo é diferente da aplicação lei penal no tempo.
Qual a regra quanto à aplicação da regra processual penal é de aplicação imediata a lei nova. Diferente é
quanto aplicação da lei penal art.2º CP. A lei processual penal nova se aplica a processos iniciados antes da sua
vigência.
O processo está a decorrer entra nova lei, esta aplica-se quer aos processos pendentes, a lei processual penal
nova aplica-se de imediato mesmo aos processos iniciados antes da sua vigência. Mas há desvios a esta regra no
nº2, são dois desvios:
Al. a) está em causa o direito de defesa do arguido e a proteção das suas expectativas processuais.

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Cláudia Morgado

Al. b) foi por o motivo desta al., que levou que o atual CPP de 1987 antes deste o CPP em vigor era de 1929,
foi esta eventual implicação na harmonia e unidade dos vários atos de processo elas novas regras do pp não se
aplicasse aos processos pendentes, por causa da estrutura que era inquisitória mitigada.

Regra: é de que a lei nova é de aplicação imediata mesmo aos processos pendentes, com as exceções das al.,
do nº2 do art.5º.

No acórdão: em 2007 CPP sofreu alterações na matéria de recursos, art.400º. até 2007 havia casos em que se
permitia que se recorresse duas vezes de uma decisão condenatória, isto é, casos em que se admitia o duplo grau
de recurso, ou seja, o condenado podia recorrer da primeira instância para o tribunal da Relação e depois podia
ainda recorrer do tribunal da Relação para o STJ, desde que o crime em causa fosse punível com pena de prisão
superior a 8 anos. ou seja, desde que a pena abstratamente aplicável fosse superior a 8 anos. deste modo, o
critério para aferir da admissibilidade do recurso era o da pena abstratamente aplicável ao crime em causa. Com
a revisão de 2007 o legislador alterou a redação do art.400º nº1 al. f), desde então a norma fala não de pena
abstratamente aplicável, mas sim de pena concretamente aplicada.

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Cláudia Morgado

Acórdão do Supremo Tribunal de Justiça n.º 4/2009, de 18 de fevereiro


Fixou jurisprudência no sentido de que: “Nos termos dos artigos 432.º, nº 1, alínea b), e 400.º, n.º 1, alínea f),
do CPP, na redação anterior à entrada em vigor da Lei nº 48/2007, de 29 de Agosto, é recorrível o acórdão
condenatório proferido, em recurso, pela relação, após a entrada em vigor da referida Lei, em processo por crime
a que seja aplicável pena de prisão superior a oito anos, que confirme decisão de 1ª instância anterior àquela
data”.

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Cláudia Morgado

- Recurso extraordinário de fixação de jurisprudência (artigos 437.º ss. do CPP): há lugar a este recurso quando,
“no domínio da mesma legislação, o STJ proferir dois acórdãos que, relativamente à mesma questão de direito,
assentem em soluções opostas”; bem assim quando “um tribunal da relação proferir acórdão que esteja em
oposição com outro, da mesma ou de diferente relação, ou do STJ, e dele não for admissível recurso ordinário,
salvo se a orientação perfilhada naquele acórdão estiver de acordo com a jurisprudência já anteriormente fixada
pelo STJ”.
- Neste caso, havia oposição entre o acórdão do STJ de 20 de fevereiro de 2008, proferido no recurso n.º
4838/07, e o acórdão do STJ de 10 de janeiro de 2008, proferido no recurso n.º 4376/07, na decisão sobre a
interpretação do disposto no artigo 400.º, n.º 1, alínea f), do CPP, na redação da Lei n.º 48/2007, de 29 de Agosto,
em conjugação com o disposto no artigo 5.º, n.º 2, alínea a), do CPP, sobre a aplicação no tempo das normas de
processo penal.
- No caso, a aplicação imediata da nova lei comportaria a supressão de um grau de recurso: já não seria possível
interpor recurso do Tribunal da Relação para o STJ. A questão era, pois, a de saber se esta hipótese deveria ou não
ser subsumida na previsão do artigo 5.º, n.º 2, alínea a), do CPP.

A regra em ppenal é da recorribilidade em princípio é sempre possível recorrer das decisões, exceto se a lei
disser o contrário. Se o crime fosse punível com pena superior não a 8 anos não se poderia recorrer para o STJ
quando houve condenação na 1ª estância e condenação no trib., da Relação. A partir de 2007 a norma passou a
dizer coisa diferente, o critério deixou de ser o da pena abstrata e passou a ser o da pena concreta.

Caso prático:
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Cláudia Morgado

A foi julgado pelo crime de ofensa à integridade física grave previsto no art.144º CP. A pena aplicável é de 2 a
10 anos. A foi condenado em 1ª instância numa pena de prisão de 6 anos. A recorreu para o tribunal da Relação
que confirmou a decisão de 1ª instância poderá A recorrer desta decisão do trib., da Relação para o STJ.

R: Atualmente de acordo com a redação atual da lei, não pode. De acordo com a lei anterior poderia porque
era a pena aplicável.
Alterou-se em 2007 o art. 400º que diz que não é possível recorrer se for aplicada pena não superior a 8 anos,
o critério passou a ser o da pena concreta.
Antes o condenado tinha duplo grau de recurso e com a nova lei ficou privado a um grau de recurso.
A pergunta que se faz é se esta nova lei processual poder-se-ia aplicar ou não aos processos pendentes que já
estavam a decorrer. Houve várias decisões contraditórias.
STJ fixou jurisprudência no sentido de que deve ser aplicada a lei que estava em vigor no momento em que foi
proferida a decisão de 1ª instância. Doutora concorda com esta decisão. Se pessoa foi condenada em 1ª instância
e se o crime fosse punível com pena abstrata a 8 anos, logo nesse momento a pessoa tinha expectativa de poder
recorrer duas vezes. Mas se a lei nova entrou em vigor antes da 1ª condenação, não tinha expectativa de recorrer,
porque a lei já estava em vigor no momento em que foi condenado. A lei aplicada devia ser a lei em vigor no
momento em que foi proferida a decisão em 1ª instância porque é nesse momento que surgem expectativas do
condenado quanto ao recurso.

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Cláudia Morgado

Caso prático:
Alberto foi notificado para prestar declarações perante a PSP, em virtude de ter sido visto a abandonar,
pelas 3 horas da manhã, um estabelecimento comercial que havia sido assaltado nessa mesma noite.

Houve notícia de que determinado estabelecimento foi assaltado e ele foi notificado para prestar declarações
porque alguém o viu nas imediações.

1. Sendo suspeito da prática de um crime de furto qualificado (art. 204º do CP), terá Alberto de ser
constituído arguido? Qual o relevo desse ato do ponto de vista processual?

O arguido entre nós é um sujeito do processo e é titular de um conj., de direitos e deveres que lhe permitem
ter um comportamento constitutivo, isto é, contribuir para aquilo que vai ser a decisão final. O próprio arguido
pode apresentar meios de prova e requerer diligências probatórias. São os art., 57º e ss., que nos falam do arguido.
Esta regra do art.57º parece que nos leva a admitir que o inquérito pode decorrer sem constituição de arguido e

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Cláudia Morgado

essa constituição só se dá no momento de acusação ou requerida instrução. Mas isto é mais uma exceção que
uma regra. Art.58º se estiver a correr um inquérito contra um suspeito determinado e se em relação a esse
suspeito houver suspeita fundada da prática do crime ele deve ser constituído arguido e ser ouvido enquanto
arguido. na generalidade dos inquérito temos a constituição de arguido muito antes do final da fase de inquérito.
Art.57º diz-nos, portanto os caso em que é obrigatório a constituição de arguido.
Art.60 fala-nos da posição processual do arguido. A partir do momento em que é constituído arguido é
assegurado o exercício de direitos e deveres processuais.
Art.61º tem elenco não taxativo dos direitos e deveres do arguido.

O arguido é entre nós um verdadeiro sujeito processual, ao contrário do que acontece com o suspeito que é
um mero participante processual.
Art.1º al. e) – noção de suspeito.
Comparar com o art.58º nº1:
 Arguido suspeita fundada da prática do crime.
 Suspeito há indício de que cometeu um crime.
Art.59º nº2 – o suspeito pode pedir para ser constituído arguido. O suspeito não tem direito ao silêncio como
tem o arguido. Enquanto arguido tem direitos que o mero suspeito não tem, como o direito ao silêncio.

Resposta ao caso: no fundo a resposta poderia ser depende. Se já houver suspeita fundada então terá de ser
constituído arguido ao abrigo do art.58º nº1 al. a). Porque ver alguém a passar ali perto pode não ser uma suspeita
fundada. Se a pessoa disse que viu a pessoa a fugir por uma janela aí já há suspeita fundada e é obrigatório
constituir arguido.

A não constituição de arguido nos casos em que tal é obrigatório, constitui uma nulidade dependente de
arguição art.272º nº1 e art.120º nº2 al. d).

Exames anteriores já saiu distinga suspeito de arguido.

2. Poderá a PSP proceder à constituição de arguido? De que forma?

Órgãos de polícia criminal entre nós são meros participantes processuais. Art.1º al. c).
Temos órgãos de polícia criminal de competência genérica como PSP, PJ, GNR e temos órgãos de polícia de
competência específica como ASAE.
Quando estamos na fase de inquérito quem dirige a fase é o MP.
Resposta: sim pode seguindo as regras do art.58º nº2, 3, 4 e 5 – conjunto de formalidades que devem ser
seguidas no momento de constituição de arguido.

3. Procedendo-se à constituição de arguido, será obrigatória a presença de defensor?

Depende, só se fosse um dos casos integrado no art.64º - casos em que é obrigatória a assistência do defensor.

Já saiu em exames: o defensor é um sujeito processual, comente.

O direito de escolher defensor e de por ele ser assistido em todos os atos do processo constitui uma das
garantias de defesa do arguido. art.32º nº3 CRP e a CRP estabelece ainda que é a lei que estabelece os casos

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Cláudia Morgado

em que a assistência por advogado é obrigatória. E é precisamente por haver casos em que assistência de
defensor é obrigatória que se entende que o defensor é verdadeiro sujeito processual e não mero participante
processual. Ao defensor não cabe a mera representação dos interesses do arguido, o defensor desempenha
antes o papel de órgão de administração da justiça que atua no exclusivo interesse da defesa. A atuação do
defensor é exclusivamente em favor do arguido, pelo que se compreende que ele intervenha ainda que sem a
vontade do arguido ou mesmo contra a vontade do arguido. Há casos em que a lei diz que a presença do
defensor é obrigatória mesmo que o arguido diga que não quer. A lei diz que o defensor atua em favor do
arguido, por isso deve atuar sem a vontade do arguido ou mesmo contra a sua vontade, por isso que é sujeito
processual. O assistente também é representado por advogado, mas a lei não diz que o advogado é sujeito do
processual, o advogado está no processo para fazer o que o assistente lhe pede. O defensor é verdadeiro órgão
de administração da justiça, atua no interesse da defesa e pode ser contra a vontade do arguido.
O defensor não está ali a representar o arguido, não está ali a fazer o que o arguido quer. Isto é muitas vezes
perguntado.

Há partida para a mera constituição de arguido não se exige/não é obrigatória a presença de defensor, nem
para os casos em que vai prestar declarações. O facto de a lei não exigir a presença de defensor a lei não
impede que a pessoa se faça acompanhar de defensor.

4. O facto de a constituição de arguido ser feita pela PSP significa que é a PSP que, neste caso, vai dirigir o
inquérito?

R: sabemos que o MP é um verdadeiro sujeito processual e o MP é uma autoridade judiciária (art.1º al. b)).
Tem o seu estatuto constitucional no art.219º da CRP e tem uma posição processual que está definida no
art.53º.
É o MP que dirige sempre o inquérito, podendo ser assistido pelos órgãos de polícia criminal – art.263º nº1,
art.55º nº1, art.56º e 270º (relações entre o MP e os órgãos de polícia criminal - dependência funcional, mas
autonomia técnica e tática para a investigação).

Nunca é um órgão de polícia criminal que dirige o inquérito, o inquérito é sempre dirigido pelo MP que pode
ser assistido pelos órgãos de polícia criminal.

20 de abril de 2021
Aula passada estávamos a falar dos sujeitos processuais.

Continuação do caso prático:

5. Quem poderia constituir-se assistente no processo? Como e quando poderia fazê-lo?

Distinção entre 4 noções a propósito disto de quem se pode constituir assistente: vítima, lesado, ofendido e
assistente.
 Noção de vítima – a palavra vítima é mais usada num sentido criminológico do que no sentido
processual penal. Na versão originária do CPP encontrávamos apenas duas 2x a utilização da expressão
vítima. Nas sucessivas alterações ao CPP fomos assistindo a um alargamento da referência à vítima e
com a Lei 130/2015 de 4 de setembro o legislador aditou ao CPP o art.67º-A que tem como epígrafe
precisamente vítima e em anexo à referida lei o legislador criou o estatuto de vítima. Tem se

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Cláudia Morgado

questionado se tendo em conta estas alterações se a vítima deve ser considerada um sujeito do ppenal
e a resposta tem sido negativa. A Dra. Maria João Antunes não elenca a vítima como sujeito do ppenal.
 Lesado – em ppenal quando falamos de lesado estamos normalmente a falar de uma parte civil, não
estamos a falar de um sujeito processual penal em sentido material. Quanto muito os lesados, ou seja,
as partes civis podem ser considerados sujeitos do processo penal em sentido formal, mas não são
sujeitos do processo penal em sentido material. ex., âmbito de crime à ofensa de integridade física, o
ofendido teve de se dirigir ao hospital, comprar medicação e tem direito a uma indemnização civil, o
que acontece que o direito a indemnização civil por perdas e danos emergentes da prática do crime é
por regra este pedido é deduzido ppenal respetivo – pp., da adesão referido no art.71º CPP. É comum
termos no ppenal uma sentença em que o juiz condena o arguido numa pena de multa ou prisão e
condena numa indemnização civil. Está aqui uma ideia de economia processual, muitas vezes a mesma
que testemunha que serve para auxiliar o juiz para decidir se houve crime ou não, bem como para
auxiliar o juiz acerca da indemnização civil e também pretende-se evitar contraditórios julgados. Não
são verdadeiros sujeitos do ppenal porque não vão influenciar o ppenal, ele vai ao ppenal fazer pedido
de indemnização civil.
 Ofendido – o ofendido no ppenal é o titular dos interesses que a lei especialmente quis proteger com
a incriminação. É um mero participante processual, se ele quiser tornar-se um verdadeiro sujeito
processual tem de se constituir assistente.
 Assistente – a partir do momento em que o ofendido se constitui assistente ele adquire um conjunto
de direito que lhe permitem intervir na conformação do processo. P.ex., se o ofendido quiser requerer
diligências probatórias ele terá de se constituir assistente. Regras quanto à constituição de assistente
estão no art.68º e o art.69º estabelece a posição processual e as atribuições do assistente. Há uma
ideia importante de para se constituir assistente o ofendido tem de pagar o regulamento das custas
judiciais prevê uma unidade de conta processual que perfaz atualmente os 102 euros.

Estas noções são muito importantes e costumam calhar nos exames.


Uma mesma pessoa no ppenal pode assumir as 4 partes. Se for vítima é ofendido com a prática do crime e
pode pedir indemnização fundada na prática do crime e surge no processo também como lesado e pode querer
participar ativamente no processo penal e para isso constitui-se assistente. Também podem ser pessoas
diferentes, A e B discutiram e lutaram B sofreu lesões, mas A empurrou B e B caiu para cima de um automóvel e
partiu os vidros, o dono do automóvel o A pode ser arguido, B o ofendido que pode se constituir assistente, mas
o proprietário do automóvel pode vir ao ppenal fazer pedido de indemnização civil. Neste caso o lesado não é
simultaneamente ofendido com a prática do crime, mas sofreu danos emergentes com a prática do crime.
Lesado é sempre a pessoa que faz pedido de indemnização civil, não tem que ser a mesma pessoa do ofendido.

Resposta ao caso prático: o ofendido art.68º nº1 al. a), o proprietário do estabelecimento, a pessoa que foi
ofendida com o crime de furto. A partir do momento em que se constitui assistente passa a ser sujeito processual
e passa a ter a posição processual e atribuições do art.69º. Nos termos do art.70º tem de ser representado por
advogado.
Quando e como poderia fazê-lo?
Quando: desde logo, o requerimento para constituição de assistente tem de ser dirigido ao juiz de instrução,
mesmo que estejamos na fase de inquérito (art.68º nº4). Sempre que na fase de inquérito temos de dirigir
requerimento é sempre ao juiz de instrução. A intervenção do juiz de instrução durante o inquérito nada tem a
ver com a fase de instrução. Mesmo quando não há fase de instrução pode haver e na maioria dos casos há a
intervenção de um juiz de instrução durante a fase de inquérito, mesmo que não haja fase de instrução. Em cada
inquérito há sempre um eventual juiz de instrução. Portanto, a constituição de assistente é dirigida ao juiz de

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Cláudia Morgado

instrução. O juiz que vai praticando atos durante a fase do inquérito em abstrato pode ser o juiz que preside a fase
de instrução. Art.268º - atos a praticar pelo juiz de instrução durante o inquérito.
Como: se se tratar de um crime público ou semipúblico o ofendido pode requerer a sua constituição como
assistente em qualquer altura do processo seguindo os prazos que estão referidos no art.68º nº3. Se se tratar de
um crime particular a constituição de assistente obedece ao prazo estabelecido no art.68º nº2º.

6. Suponha que o juiz que, durante o inquérito, autorizou a realização de buscas domiciliárias à casa de
Alberto vem a ser juiz do julgamento. Assumirá esta circunstância algum relevo processual?

Ato que tem de ser durante o inquérito autorizado pelo juiz de instrução art.268º e 269º.
Nas comarcas mais pequenas isto é muito frequente, há um ppenal que é aberto durante esse processo o MP
requer buscas domiciliárias, o juiz autoriza e depois pode ser juiz de julgamento? Isto acontece muitas vezes
na prática. A questão é saber se neste caso muito concreto pode ser depois juiz de julgamento?
Vamos falar sobre o tribunal/juiz enquanto sujeito processual. Um dos pp., em que se funda o estatuto de
sujeito processual de trib., é o pp., de independência judicial. Este pp., implica obviamente uma exigência de
imparcialidade e esta exigência de imparcialidade justifica que um dos pp., relativos à promoção processual
seja o pp., da acusação (a entidade que investiga e acusa é diferente da entidade que julga) e justifica também
que haja uma previsão de casos que podem levar à suspeição do juiz (suspeita). A matéria dos impedimentos
e suspeições está relacionada com as ideias de objetividade e imparcialidade e está prevista nos art.39º e ss.
 Os impedimentos estão previstos no art.39º de forma objetiva e taxativa. Sempre que se verificar uma
das circunstâncias previstas nesta norma do art.39º o juiz fica impedido de intervir no processo por
razoes de objetividade e imparcialidade. Caso da al. c) acontece muitas vezes. Se a pessoa intervir no
processo como advogada não pode depois intervir como juiz. Estes casos objetivos determinam que o
juiz fique impedido de intervir nesse mesmo processo. Nº3 esta norma não existia na versão originária
do CPP porque antes do 25 não existiam muitas mulheres juízas.
 Porém o legislador não tem capacidade para prever todas as situações de vida em que a imparcialidade
do tribunal/do juiz possa se pôr em causa, por isso para além dos impedimentos o legislador criou uma
cláusula geral de suspeições. Esta cláusula geral de suspeição está prevista no art.43º e é composta
pelas recusas e escusas. Qual a diferença entre escusa e recusa? A escusa acontece quando é o próprio
juiz que pede ao tribunal que o escuse de intervir. É preciso uma razão forte para que a escusa seja
aceite. A lei refere-se à recusa quando são os outro intervenientes processuais que levantam a
suspeição, MP, arguido, assistente ou partes civis. Pode se pedir a recusa a partir do momento em que
há suspeitas. Ex., apercebemo-nos que ao longo do processo o juiz trata de forma muito familiar o
assistente, nesse momento pode pedir a recusa. Não há definido um prazo é a partir do momento que
surge a suspeita, art.44º.

Todas estas normas que vimos não valem só para os juízes, valem também para o magistrados do MP nos
termos do art.54º e valem ainda para os peritos, para os intérpretes e funcionários de justiça art.47º.

Outro fundamento de impedimento: casos em que o juiz fica impedido de intervir no julgamento por ter
participado ou intervindo anteriormente no mesmo processo. Estes são os chamados impedimentos por
participação em processo que estão referidos no art.40º e nos termos do art.40º al. a) não pode intervir em
julgamento, recurso ou pedido de revisão o juiz que no processo tiver aplicado medida de coação prevista nos
art.200º a 202º, ou seja, o juiz que tiver aplicado a proibição e imposição de condutas art.200º a obrigação de
permanência na habitação art.201º ou a prisão preventiva art.202º. Estas são 3 medidas de coação e a questão

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Cláudia Morgado

que colocamos colocar é a de saber porque o legislador só se refere a estas 3 e não às outras? P.ex., a caução
também é medida coação, mas a lei não impede que o juiz que aplica caução seja juiz de julgamento.
Estas 3 medidas de coação só podem ser aplicadas quando houver fortes indícios da prática do crimes e é o
juiz que aplica estas medidas de coação que tem de averiguar se estão ou não presentes estes fortes indícios. O
legislador considera que esta averiguação implicará um conhecimento profundo do processo por parte do juiz,
por isso, o legislador presume que a imparcialidade estaria posta em causa se ele interviesse depois no julgamento
desse processo.
Quando o juiz participa num processo enquanto juiz de instrução quer se trate da sua intervenção pontual no
inquérito, quer se trate da sua intervenção durante a fase de instrução, tal juiz só ficará impedido de participar no
julgamento do mesmo processo nos casos expressamente previstos nas al. a), b) e e) do art.40º. Quanto a outros
atos isolados que o juiz tenha praticado, ordenado ou autorizado funcionará o regime das recusas e escusas nos
termos do art.43º. Compreende-se que nem todos os atos praticados pelo juiz de instrução põe necessariamente
em causa a objetividade e imparcialidade do juiz é o que acontece p.ex., quando o juiz aplica durante o inquérito
uma medida de coação diferente das al. a) do art.40º ou quando o juiz durante o inquérito autoriza uma escuta
telefónica ou p.ex., quando durante o inquérito autoriza uma busca domiciliária. A prática destes atos não
determina o impedimento imediato do juiz. Neste caso, funcionará a cláusula geral de suspeição nos termos do
art.43º nº2.
Entende-se que o juiz de instrução enquanto juiz das liberdades só deve ficar afastado da participação no
julgamento quando a sua intervenção processual prévia, tenha contendido verdadeiramente com o objeto do
processo.

Resposta ao caso: não há um impedimento imediato taxativamente previsto na lei, os impedimentos são
apenas no que estão previstos no art.40º, mas se o juiz entender ou os outros intervenientes que pode estar em
causa a imparcialidade do juiz, pode-se invocar uma escusa ou recusa nos termos do art.43º (cláusula geral de
suspeição).

Princípios gerais do ppenal:

Costumamos fazer uma classificação destes princípios gerais em 4 grupos:


 1º grupo: pp., relativos à promoção processual – são o pp., da oficialidade, o pp., da legalidade e o pp.,
da acusação.
 2º grupo de pp., relativos à prossecução ou decurso processual - pp., do contraditório, da suficiência,
da concentração e da investigação.
 3º grupo de pp., relativos à prova – pp., da legalidade da prova, pp., da livre apreciação da prova e o
pp., in dubio pro reu.
 4º grupo de pp., relativos à forma – pp., da publicidade, pp., da oralidade e o pp., da imediação.

Esta classificação não é estanque. P.ex., dos pp., da oralidade e imediação também dizem respeito à matéria
da prova para além da forma.

Começando por falar dos pp., relativos à promoção processual:

Pp., da oficialidade – trata-se da questão de saber a quem compete a iniciativa, o impulso de investigar a
prática de uma infração e a decisão de a submeter ou não a julgamento. O que estamos a perguntar é se esta

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Cláudia Morgado

iniciativa e decisão devem caber a uma entidade pública estadual oficial ou se devem pertencer antes a quaisquer
entidades particulares designadamente ao ofendido pela infração.
O pp., da oficialidade desdobra-se em dois momento:
1º momento é a uma entidade pública que cabe a iniciativa de investigar a prática de uma infração, ou seja, é
uma entidade pública que decide sobre a promoção do processo penal.
2º momento é a uma entidade pública que cabe a decisão de submeter ou não a infração a julgamento.
Quem é essa entidade pública? É o MP, desde logo nos termos do art.219º da CRP é ao MP que compete
exercer a ação penal. Deste modo, no primeiro momento é ao MP que compete nos termos do art.48º promover
o processo penal, após a aquisição da notícia do crime, art.241º cabendo-lhe receber as denúncias, as queixas e
participações e apreciar o seguimento a dar-lhes. Art.53º nº2 al. a).
No segundo momento é também o MP que no final do inquérito vai decidir se deduz acusação ou se arquiva
o processo, nos termos do art.276º.
Deste modo, o artt.48º por um lado e o art.276º por outro lado, concretizam ao nível legislativo o pp., da
oficialidade nos seus dois momentos.

Esta matéria é muito importante, saí sempre nos exames o pp., da oficialidade.

27 de abril de 2021

Quem dirige entre nós a fase de inquérito é o MP auxiliado pelos órgãos de polícia criminal. Mas há certos atos
durante o inquérito que têm de ser praticados, ordenados ou autorizados pelo juiz de instrução. Chamamos de
juiz de instrução independentemente de haver ou não fase de instrução. São os atos elencados no art.268 e 269º.
Impedimentos do art.40º, mas pode levantar-se em relação ao juiz uma escusa ou recusa. Não há nenhum
impedimento direto de que o juiz que pratique atos na fase de inquérito seja o juiz de instrução.
Pode haver inquéritos em que não há intervenção do juiz de instrução. Sempre que for necessário praticado
um ato do art.268º ou 269º é necessário juiz de instrução.

Exame: quando não há fase de instrução, pode ainda assim haver juiz de instrução? claro que sim, na fase de
inquérito, art.268º e 269º.

Pp., da oficialidade:

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Cláudia Morgado

Pp., da oficialidade tem dois momentos:


1º momento a iniciativa de investigar a prática de uma infração;
2º momento decisão de submeter a julgamento cabe a uma entidade pública – ao MP.

Art.48º - está a legitimidade do MP para promover o ppenal. restrições do art.49º a 52º.


Art.276º - norma juntamente com o art.48º onde se manifesta o pp., da oficialidade.

 Este pp., vale inteiramente aos crimes públicos.


 Mas tem limitações decorrentes de crimes semipúblicos.
 E exceções derivadas de crimes particulares.

Entre nós quanto ao procedimento os crimes podem ser crimes, públicos ou particulares.

Crimes públicos: são aqueles que num 1º momento é o MP que decide acerca da promoção processual. E num
2º momento é também o MP que decide da submissão ou não da infração a julgamento, por isso, em relação aos
crimes públicos vale inteiramente o pp., da oficialidade. Imagine-se que se trata de um casal já idoso em que numa
discussão o marido mata a mulheres. O filho podia até preferir que o pai não fosse julgado e não passasse os
últimos anos de vida na prisão. Mas a vontade dos particulares é totalmente irrelevante quando o crime é público,
porque é o MP que toma estas decisões.

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Cláudia Morgado

Crimes semipúblicos: são aqueles em que o MP só pode abrir o inquérito depois de haver uma queixa por
parte do ofendido ou de outras pessoas. É o art.113º do CP que nos diz quem são os titulares do direito de queixa.
O regime dos crimes semipúblicos está previsto no art.49º e estes crimes constituem uma limitação ao pp., da
oficialidade. O MP só pode abrir inquérito depois de haver uma queixa, por isso, o pp., da oficialidade não vale no
seu 1º momento, no entanto, os crimes semipúblicos são apenas uma limitação do pp., da oficialidade no seu 1º
momento porque depois de haver uma queixa o MP abre inquérito, investiga e no final do inquérito é o MP que
decide se arquiva ou acusa, por isso, vale inteiramente o 2º momento do pp., da oficialidade.

Crimes particulares: são aqueles em que para além da queixa é necessário que haja também uma acusação
particular, ou seja, o ofendido tem de se queixar e tem de se constituir assistente, depois o MP abre inquérito,
investiga e no final do inquérito é o assistente que decide se deduz ou não acusação. O regime dos crimes
particulares está no art.50º e 285º. São uma exceção ao pp., da oficialidade, afastam o pp., da oficialidade nos
seus dois momentos.

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Cláudia Morgado

Não há exame escrito ou oral em que não seja necessário falar do pp., da oficialidade. É preciso saber isto
muito bem!

Qual o fundamento para a existência de crimes semipúblicos e particulares? Porque os crimes não são todos
públicos?

 Por vezes os crimes têm uma natureza pouco grave, p.ex., ofensa à integridade física simples, injúria,
furto simples. E quando assim é, quando têm os crimes natureza pouco grave a comunidade não sente
a necessidade de reagir automaticamente contra o infrator. Deste modo, faz-se depender o
procedimento criminal de uma iniciativa particular, ou seja, se o ofendido considerar que não há
necessidade de reagir então a comunidade considera que o assunto não deve ser apreciado em ppenal.
Quando dizemos ofendido dizemos o titular do direito de queixa.
 Outras vezes a existência de um processo-crime pode ser mais prejudicial para vítima do que a
inexistência desse processo e nestes casos, independentemente da gravidade do crime, por vezes é
dado ao ofendido a possibilidade de escolher se ao mal do crime quer juntar aquilo que nós podemos
chamar o mal do processo penal. Ex., crimes sexuais, são crimes graves, mas quando está em causa
crimes sexuais contra adultos defendemos a intimidade da vítima. P.ex., furto entre familiares é
particular, estamos perante situações de toxicodependentes. As pessoas podem preferir não dar início
ao ppenal, está em causa a intimidade, privacidade da vida familiar.
 Outra razão: relacionada com uma ideia de descriminalização real e não legal, porque na prática
quando estamos perante um crime que não é público se não existir queixa, na prática é como se o
crime não tivesse ocorrido e os tribunais acabam por ficar mais aliviados. Fui vítima de crime de furto,
se não apresentar queixa é como se na prática nunca tivesse acontecido – certa ideia de
descriminalização real. Só chega aos tribunais aquilo que o ofendido quer que chegue.

Quem decide afinal acerca da natureza do crime?


Quem decide se um crime é público, semipúblico ou particular é o legislador. Deste modo, se no tipo legal de
crime ou nos art., ss., nada se disser quanto ao procedimento significa que o crime é público. Ex., art.131º CP crime
de homicídio.
36
Cláudia Morgado

Se no tipo legal do crime ou nos art., ss., o legislador disser que o procedimento depende de queixa isso
significa que o crime é semipúblico. Ex., art.143º nº2 CP, crime de ofensa à integridade física simples, art.203º nº3
crime de furto, art.212º nº3 crime de dano, art. 163º e ss., juntamente com o art.178º nº1. Ex., sai caso prático de
violação art.164º temos de saber que temos de procurar mais à frente norma a falar sobre procedimento.
Se no tipo legal de crime ou nos art., subsequentes o legislador disser que o procedimento depende de
acusação particular, isso significa que o crime é um crime particular. Mas nestes casos não podemos esquecer que
antes da acusação particular o procedimento depende sempre da queixa e da constituição como assistente. Ex.,
crime contra a honra art.180º e 181º + art.188º (natureza do procedimento); furto entre parentes art.207º CP.
Furto de coisa de valor diminuto é considerado crime particular. A acusação particular surge só no fim do inquérito,
antes tem de haver apresentação de queixa e constituição como assistente.

Temos de ler o tipo legal de crime, ver todos os nº e a ver se diz algo sobre o procedimento se nada se disser
ver artigos a seguir.

CASO PRÁTICO
Descreva a tramitação processual anterior ao julgamento em cada uma das
hipóteses seguintes:
a) O António matou o Bernardo (art. 131º do CP);
b) O Carlos ofendeu a integridade física do Daniel (art. 143º do CP);
c) A Emília injuriou a Fernanda (art. 181º do CP)

a) A iniciativa de abrir inquérito compete ao MP nos termos do art.48º, o MP investiga e é o MP que no final
decide se arquiva ou acusa art.276º. Estamos perante um crime público em que vale inteiramente o pp.,
da oficialidade.

Quando o crime é público e também quando é semipúblico quem deduz acusação é o MP mas nestes casos o
assistente também pode deduzir acusação pelos factos acusados pelo MP, por parte deles ou por outros que não
importem alteração substancial daquele art.284 nº1. Havendo acusação do MP o assistente também pode
acompanhar essa acusação.

b) Nos termos do art.143º nº2 o procedimento depende de queixa, significa que estamos perante crime
semipúblico, temos limitação do pp., da oficialidade. Pode o assistente acompanhar a acusação do MP
pelos mesmos factos, por parte deles ou por outros que não importem alteração substancial daquele
art.284 nº1.

c) Trata-se de um crime particular nos termos do art.181º + art.188º.

Tramitação processual dos crimes particulares: são crimes que dependem de queixa e acusação particular.
Quem pode apresentar queixa e deduzir acusação particular? O ofendido enquanto tal pode apresentar uma
queixa nos termos do art.113º nº1 CP, mas a acusação particular tem de ser sempre deduzida pelo assistente, por
isso, o ofendido que apresentou queixa tem de se constituir assistente, para apresentar depois a acusação
particular, nos termos do art.285º.
Quando estamos perante crime particular, temos de ter em atenção ao art.246º nº4 uma vez que quando o
crime é particular no momento em que ofendido apresenta a queixa ele é advertido da obrigatoriedade de se
constituir assistente e tem obrigatoriamente de declarar que se quer constituir assistente. E nos termos do art.68º
nº2 o requerimento para constituição de assistente tem de ser apresentado no prazo de 10 dias a contar da

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Cláudia Morgado

advertência referida no art.246º nº4. Deste modo, quando o crime é particular o ofendido queixa-se declara que
quer se constituir assistente. Constitui-se assistente no prazo de 10 dias, depois o MP abre inquérito, investiga e
no final do inquérito notifica o assistente para que ele querendo deduza acusação particular. E o assistente tem
10 dias para deduzir a sua acusação particular e em 5 dias o MP pode acompanhar a acusação particular acusando
pelos mesmos factos, por parte deles ou por outros que não importem alteração substancial daqueles, art. 285º
nº4.

Antes de uma revisão do CPP de 1998 não se exigia que o ofendido se constituísse assistente naquele prazo
de 10 apos a queixa. Antes de 98 o ofendido só tinha de se constituir assistente para deduzir acusação particular,
mas o MP e os órgãos de polícia criminal aperceberam-se que muitas vezes acontecia o seguinte: o ofendido
apresentava queixa o MP abria o inquérito e investigativa com auxílio dos órgãos de polícia de criminal e depois
de todo este trabalho muitas vezes o ofendido acaba por se desinteressar do processo. P.ex., porque se apercebia
que a constituição como assistente implicava o pagamento de uma quantia monetária. Nestes casos, no final do
inquérito ninguém deduzia acusação e perdia-se tempo, dinheiro e justiça.
Desde 1989 e de acordo com os atuais art. 246º nº4 e 68º nº2 o MP só abre o inquérito, só se inicia
verdadeiramente as investigações depois de o ofendido ter apresentado queixa e se ter constituído assistente.
Teoricamente esta opção não tem sentido, mas é uma opção legislativa para obstar ao referido desperdício de
meios. O legislador quis que o particular tivesse uma maior ponderação.
A pessoa queixa-se, manifesta vontade em se constituir assistente, tem prazo de 10 dias e só depois é que o
MP abre inquérito.
Nos crimes particulares quem deduz acusação é o assistente e nestes casos, o MP pode acompanhar a
acusação particular acusando pelos mesmos factos, por parte deles ou por outros que não importem alteração
substancial daqueles, art. 285º nº4.

Esquema mais completo que nos fala de todos os momentos referidos.

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Cláudia Morgado

Se sair caso prático de crime particular temos de explicar todos os passos, o que é pp., da oficialidade, que os
crimes particulares são exceção ao pp., da oficialidade e todos estes passos que temos de percorrer até ao final do
inquérito.

Há dois tipos crimes cuja natureza tem sido muito discutida, crime de violência doméstica e crimes de natureza
sexual.
Em 2000 o crime de violência doméstica passou ser a crime público.
Crimes sexuais a tradição entre nós era a de que todos eles quer contra adultos quer contra crianças eram
semipúblicos.
Quanto aos crimes sexuais contra menores em 95 eram semipúblicos, mas o MP podia dar início ao processo
se o interesse da vítima assim o impusesse. Desde 2007 os crimes sexuais contra menores passaram a ser públicos.
Crimes sexuais contra adultos – por tradição têm sido considerados sempre crimes semipúblicos. E tem se
invocado o que é dito na Convenção de Istambul que foi ratificada por Portugal em 2013 tem o art.55º e a partir
daqui há quem defenda a necessidade de passarem a ser crimes públicos. Entre nós, os crimes sexuais contra
adultos continuar a ser crimes semipúblicos, mas desde 2015 há norma especial no art. 178º nº2. Este nº2 foi
introduzido em 2015. O MP pode dar início ao procedimento sem queixa sempre que o interesse da vítima o
aconselho.
4 de maio de 2021
Qual a diferença entre queixa e denúncia?
Queixa e denúncia não são a mesma coisa. O conceito de denúncia é mais amplo que o conceito de queixa. A
queixa é uma forma de denúncia. Todas as queixas são denúncias, mas nem todas as denúncias são queixas. A
queixa é uma denúncia de um crime semipúblico ou partilhar.
A denúncia pode ser feita por qualquer pessoa, mas a queixa só pode ser apresentada pelos titulares do direito
de queixa, referidos no art.113º do CP. A queixa tem de ser apresentada em regra no prazo de 6 meses a contar
da data em que o titular tiver tido conhecimento do facto e dos seus autores (art.115º CP).
Todas as queixas são denúncias, mas nem todas as denúncias são queixas.
A denunciou crime de homicídio – crime público;
B apresentou queixa por crime de furto – crime semipúblico ou particular dependem de queixa.

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Cláudia Morgado

Quem são os titulares do direito de queixa? Art.113º CP. O ofendido é titular do direito de queixa, mas pode
acontecer que o ofendido morra sem ter apresentado queixa (nº2). Ofendido menor de 16 anos – nº4. P.ex.,
menor de 16 anos que leva um computador para a escola e no intervalo furtam-lhe o computador, o ofendido é o
menor mas quem apresenta queixa são os representantes, que são os pais.
Nº5 tem regra importante – se o crime for semipúblico ou particular. Em certos casos quando o procedimento
criminal depender de queixa, há uma exceção, abertura no nº5, neste caso o MP pode dar início ao procedimento
mesmo sem queixa, quando o interesse do ofendido o aconselhar, o ofendido for menor, ou o direito de queixa
não pode ser exercido. Esta ideia de o MP dar início ao procedimento tinha grande aplicabilidade na prática
quando crimes sexuais contra menores eram semipúblicos, deixou de ter tanta aplicabilidade. Atualmente os
crimes sexuais contra menores (de 18 anos) são públicos desde 2007.
Art.113º nº6 – quando o ofendido é menor e queixa não é apresentada por representante legal, nem o MP dá
início ao procedimento, o menor pode apresentar queixa a partir do momento em que perfizer 18 anos. Art.115º
nº2 – 6 meses para apresentar queixa a contar da data em que o ofendido perfizer 18 anos, ou seja, tem até aos
18 anos e meio para apresentar queixa, falamos aqui de crimes semipúblicos ou particulares.

Art.178º CP: especialidade que há quanto à natureza dos crimes sexuais. Este art., fala-nos de queixa. Se forem
praticados contra adultos os crimes são semipúblicos, se forem praticados contra menores os crimes são públicos.
Nº2 crime de violação e coação sexual depende de queixa mas o MP pode dar início ao procedimento. Este nº2
foi introduzido em 2015 e esta introdução resultou da ratificação por PT da Convenção de Istambul, que é
convenção para proteção e combate contra a violação contra as mulheres. Quando se tratar de um crime de
coação sexual ou de violação e quando o procedimento depender de queixa, ou seja, quando for conta um adulto,
o MP pode dar início ao procedimento mesmo sem queixa, quando o interesse da vítima o aconselhe.
Crimes sexuais contra adultos são semipúblicos mas tem esta porta aberta quando a queixa não é apresentada
por razões alheias à vítima pode o MP dar início ao procedimento mesmo sem queixa.
Ex., violação sendo o ofendido uma pessoa adulta o crime tem natureza semipúblico, mas nos termos do
art.178º nº2 o procedimento pode ser aberto pelo MP mesmo sem queixa se o interesse da vítima o aconselhar –
pode ser pergunta de exame.

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Cláudia Morgado

O pp., da oficialidade pergunta – quem tem competência para dar início ao procedimento e quem tem
competência para decidir se acusa ou arquiva? O MP que entidade pública oficial.
Quando falamos do pp., da legalidade a pergunta que fazemos é: e nesta sua atuação no processo penal o MP
é livre de decidir se abre ou não o inquérito se deduz ou não acusação? Resposta: não. Não decide livremente
porque ente nos vale o pp., da legalidade. Também se decompõe em 2 momentos:
1º momento significa que sempre que adquire a notícia do crime nos termos do art.241º e ss. O MP está
obrigado a abrir inquérito (art.262º nº2).
2º sempre que tiver recolhido indícios suficientes de se ter verificado um crime e de quem oi o seu agente o
MP está obrigado a deduzir acusação (art.283º nº1).

Caso prático:

O Guilherme assistiu ao furto do computador portátil do Humberto e denunciou o facto ao Ministério


Público.

1. O Ministério Público está obrigado a abrir inquérito?


Art.203º - crime de furto.
Nº3 – procedimento criminal depende de queixa.
Se depende de queixa significa que se trata de um crime semipúblico – constitui limitação ao pp., da
oficialidade art.49º, para que se dê início ao procedimento é preciso que alguém apresente queixa que é o

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Cláudia Morgado

ofendido nos termos do art.113º do CP. Ele denunciou, mas para que haja início do procedimento tem de haver
apresentação de uma queixa.
Por um lado, o crime de furto é crime de semipúblico e pro isso limitação ao pp., da oficialidade, mas também
que entre nos vale o pp., da legalidade.
O pp., da oficialidade e o pp., da legalidade são pp., diferentes. Num determinado sistema poderá ser o MP a
promover o processo e deduzir acusação, mas poderá o MP ser livre de abrir ou não inquérito e deduzir ou não
acusação. P.ex. nos sistemas anglo-saxónicos o pp., da oportunidade tem uma grande relevância. De acordo com
o pp., da oportunidade o MP decide abrir ou não o inquérito e decide arquivar ou acusar, tendo em conta p.ex.,
considerações de ordem política financeira ou social. No entanto, entre nós não vale em termos genéricos o pp.,
da oportunidade, entre nós além do pp., da oficialidade, vale o pp., legalidade.
O pp., da legalidade conduz-nos ao pp., da igualdade na aplicação da lei entre nós o MP não vai decidir se dá
ou não início a um processo ou se deduz ou não acusação segundo critérios de conveniência, o que poderia
conduzir ao arbítrio, é por isso que se diz que o pp., da legalidade acaba por ter uma matriz constitucional no
art.13º da CRP e desde 1997 a CRP consagra expressamente o pp., da legalidade enquanto pp., da atuação do MP
no exercício da ação penal (art.219ºda CRP).
Entre nós vale o pp., da oficialidade associado ao pp., da legalidade.

Pessoa denuncia prática de crime, mas não é essa pessoa o ofendido. O MP só dá início ao procedimento se o
ofendido apresentar a queixa. A partir desse momento o MP está obrigado a abrir o inquérito.
Nos crimes semipúblicos e particulares continua a valer inteiramente o pp., da legalidade. A partir do momento
em que há queixa o MP está obrigado a dar início ao procedimento. O pp., da legalidade é o oposto do pp., da
oportunidade.
Neste nosso caso era crime semipúblico o MP para dar início ao processo precisa que o ofendido apresente
queixa, mas a partir do momento em que há queixa está obrigado a dar início ao processo (art.49º e 266º nº2).
O MP tem o dever de abrir o inquérito sempre que receber notícia do crime – vale o pp., da legalidade.
No crime particular a partir o momento em que o ofendido apresenta queixa e se constitui assistente o MP
está obrigada a abrir inquérito. Se o MP notifica o assistente que recolheu indícios suficientes da prática do crime
então o MP está obrigado a acompanhar a acusação do assistente a sua acusação (art.285º nº4) – o “pode” que
se diz no art., é um poder-dever.

Portanto, o MP estava obrigado a abrir inquérito a partir do momento em que Humberto o titular do direito
apresentasse queixa.

2. Após a queixa, o Ministério Público abriu inquérito e recolheu indícios suficientes da prática do crime e
de quem foi o seu agente.
2.1. O Ministério Público tem o dever de acusar?

R:
Sim tem o dever de acusar se tiver recolhido indícios suficientes, trata-se aqui do pp., da legalidade no seu 2º
momento (art.283º).
O que é recolher indícios suficientes – art.283º nº2. São suficientes sempre que em julgamento for mais
provável a condenação que a absolvição.

Como se controla o cumprimento do pp., da legalidade? Se o MP não acusar ou se tiver tido a noticia do crime
e não tiver dado início ao procedimento?

42
Cláudia Morgado

Se o MP não cumprir o pp., da legalidade, desde logo há possibilidade de responsabilizar disciplinarmente o


MP por violação dos seus deveres profissionais, além disso em certos casos há também a possibilidade de
responsabilizar o MP criminalmente nos termos do art.369º CP pelo crime de denegação de justiça e prevaricação.
O funcionário, neste caso o magistrado do MP tendo recolhido indícios suficientes da prática do crime não fizer
nada pode ser punido pela prática de um crime. É suscetível de responsabilidade criminal por crime de denegação
de justiça o magistrado do MP que no fim do inquérito não cumpre os seus deveres, pode ocorrer no seu 2º
momento, mas não no seu 1º momento. Só pode ser punido quando tem o dever de acusar e não o faz, não pode
ser punido se não abre o inquérito porque no próprio art., diz no âmbito de inquérito processual.
Outros mecanismos de controlo da decisão do MP quanto à decisão de acusar ou não acusar:
 Chamado controlo judicial – através de requerimento para abertura de instrução art.287º
 Controlo hierárquico nos casos em que for proferido despacho de arquivamento e a instrução não for
requerida art.278º.
Deste modo, para controlar o cumprimento do pp., da legalidade temos as seguintes possibilidades:
1º responsabilidade disciplinar;
2º responsabilidade criminal;
3º a possibilidade de controlo judicial por via da abertura de instrução;
4º possibilidade de intervenção hierárquica.

Todos estes mecanismos servem efetivamente para controlar a decisão do MP no 2º momento. Mas já é mais
difícil controlar a decisão do MP no 1º momento, ou seja, quando o MP devia abrir o inquérito e não o abre. O
controlo da decisão do MP é mais visível, mais evidente quando ele devia acusar e não acusa.
Quanto ao 1º momento, haverá certamente responsabilidade disciplinar e pode haver também um certo
controlo político, porque o Procurador-Geral da República é nomeado pelo poder político, é nomeado e exonerado
pelo PR sob proposta do Governo (art.133º CRP).

Portanto, o pp., da legalidade é mais facilmente controlável no 2º momento do que no 1º momento.

2.2. Haveria, no caso, alguma alternativa à dedução de acusação?

Desvios ao pp., da legalidade ou alternativas/limitações à dedução de acusação – entre nos não vale o pp., da
oportunidade mas o pp., da legalidade, mas dois desvios art.280º arquivamento em caso de dispensa de pena e
281º suspensão provisória do processo.
Normalmente o inquérito termina com despacho de arquivamento art.277º ou com um despacho de acusação
art.283º e os institutos previstos nos art., 280º e 281º surgem como alternativas ao despacho de acusação, ou
seja, nestes casos o MP recolheu indícios suficientes de se ter verificado o crime e de quem foi o seu agente, mas
em vez de acusar vai aplicar um destes institutos. A aplicação destes institutos depende de vários pressupostos e
se faltar um dos requisitos previstos no código para que se aplique qualquer um destes institutos o MP só pode
acusar.
 No fim do inquérito não temos 4 alternativas! Só temos duas alternativas ou acusação ou arquiva.
 Mas no caso de ter recolhido indícios suficientes pode optar por uma destas alternativas à acusação.
 Mas tem de ver se estão reunidos os pressupostos do art.280º ou 281º.
 Se falhar um dos requisitos o que o MP tem de fazer é acusar.
 Se não tiver recolhido indícios suficientes tem o dever de arquivar.
Isto é muitas vezes perguntado no exame.

Características comuns a estes dois institutos:


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Cláudia Morgado

1. Surgem com um certo desvio/limitação ao pp., da legalidade;


2. São vistos como mecanismos de diversão. No plano do direito substantivo falamos de descriminalização e
no plano do direito adjetivo falamos de diversão, isto significa que vamos resolver o conflito fora do sistema
formal de aplicação de justiça penal, ou seja, vamos aplicar uma forma divertida (no sentido de diferente
da formal, da normal). Forma divertida de resolver o conflito. A decisão de aplicação destes institutos não
é suscetível de impugnação (art.280º nº3 e art.281º nº6) e também não é suscetível de controlo judicial
nem de intervenção hierárquica nos termos previstos no art.287º e 278º, porque aquelas decisões
pressupõe sempre a concordância do próprio juiz de instrução.
3. Trata-se de institutos que valem apenas para a pequena e média criminalidade, ou seja, crimes puníveis
com pena não superior a 5 anos. isto mostra que o CPP faz tratamento diferenciado entre a pequena e
média criminalidade por um lado e a criminalidade grave por outro, nota-se aqui na possibilidade de
aplicação destes institutos, em relação aos efeitos da confissão e também no que diz respeito à
competência dos tribunais.
Pergunta-se isto às vezes nos exames do tratamento diferenciado.
Esta última característica tem vindo sendo posta em causas nas últimas revisões do CPP que se traduziram na
previsão dos nº7 e 8 do art.281º - já não estamos perante média e pequena criminalidade.
4. Trata-se de soluções consensuais, ou seja, é preciso haver um acordo entre os diferentes sujeitos
processuais. Por regra, o ppenal é uma zona de conflito e aqui verifica-se o consenso.

11 de maio de 2021

Pp., da oficialidade e da legalidade são pp., diferentes. Crimes semipúblicos e particulares são limitação e
exceção ao pp., da oficialidade, mas não o são em relação ao pp., da legalidade. A partir do momento em que
houver queixa o MP está obrigado a abrir inquérito e a partir do momento em que à queixa e constituição de
assistente o Também está obrigado a abrir o inquérito.
Art.262º nº2 – está previsto o pp., da legalidade no seu primeiro momento. Quais as exceções previstas no
CPP? A notícia não dá lugar à abertura do inquérito, casos dos crimes semipúblicos e particulares e denúncias
anónimas. Ver pág.. 90 da lições. As denúncias anónimas só dão lugar à abertura do inquérito – art.246º nº6.
São casos em que a mera notícia do crime não dá logo lugar à abertura do inquérito, é necessário queixa nos
casos de crimes semipúblicos e no caso de crimes particulares é necessário queixa e constituição de assistente.
Se fui vítima de crime de furto apresento queixa o MP não está livre em decidir se abre ou não inquérito, está
obrigado a abrir inquérito.
Isto sai sempre em orais.

Institutos que são desvio/limitação ao pp., da legalidade:

Arquivamento em caso de dispensa de pena, art.280º: se o processo for crime em relação ao qual estiver
prevista na lei penal a possibilidade de dispensa de pena e se estiverem reunidos os pressupostos dessa dispensa,
nos termos do art.74º do CP o MP em vez de deduzir acusação, pode arquivar o processo nos termos do art.280º
a ideia é a seguinte, se no final tudo vai acabar em dispensa de pena então o melhor é pôr fim ao processo logo
no final do inquérito. Estão aqui presentes razões pragmáticas de economia e celeridade processual, mas também,
estão aqui presentes mais nobres relacionadas com a prevenção geral e especial. Deve entender-se que este
arquivamento é suficiente para acautelar as exigências de prevenção. Para além disso, evita-se a ida do arguido a

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Cláudia Morgado

julgamento, evitando-se por isso, uma estigmatização desnecessária do arguido. Garfinkel dizia que julgamento é
cerimónia degradante.
Para no final do inquérito, o MP arquivar o processo em caso de dispensa de pena é necessário que ele tenha
a concordância do juiz de instrução que vai controlar aqui a proposta do MP. se houver concordância do juiz de
instrução há arquivamento nos termos do art.280º nº1. Mas pode acontecer que o processo siga para a fase de
instrução e só neste momento o juiz se aperceba que se trata de um caso de dispensa de pena. neste caso o juiz
de instrução pode também proceder ao arquivamento em caso de dispensa de pena com a concordância do MP e
do arguido, nos termos do art.280º nº2. Note-se assim, que quando o arquivamento em caso de dispensa de pena
se aplica na fase de instrução é preciso que o arguido concorde porque sobre ele já impende uma acusação.
Costuma-se dizer que nestes casos o arguido tem direito ao processo e pode querer que o processo continue para
que ele seja considerado inocente. Isto é muitas vezes questionada – quando o arquivamento se dá ao fim do
inquérito é necessário concordância do MP e do juiz de instrução. No caso de arquivamento na fase de instrução é
necessário concordância do MP, juiz de instrução e do arguido porque sobre este já há uma acusação e pode querer
que seja declarado inocente.
Este regime era compreensível até à revisão de 2007 porque até aqui o inquérito era secreto e não fazia sentido
no final de um inquérito secreto ir perguntar ao arguido se ele concordava ou não com o arquivamento em caso
de dispensa de pena. Mas desde 2007 a regra é de que o processo é público desde o início e, por isso, podemos
questionar se não seria mais adequado permitir que um arguido pudesse se opor ao arquivamento em caso de
dispensa de pena mesmo nos casos em que este se aplica no final do inquérito. Até 2007 fazia sentido exigir-se a
concordância do arguido só nos casos em que a aplicação do arquivamento em caso de dispensa de pena se dava
só no final da fase de instrução porque após a dedução de acusação o processo podia tornar-se público, hoje as
coisas não são assim, como por regra o processo é público desde o início pode questionar-se a razão de ser da
distinção quanto à concordância do arguido conforme o arquivamento se dê no final do inquérito ou no final da
instrução. Isto já tem sido vindo a ser questionado.
Como se trata de uma solução que exige o consenso dos vários sujeitos processuais esta decisão de arquivar
o processo em caso de dispensa de pena não é suscetível de recurso – art.280º nº3.

Suspensão provisória do processo, art.281º:


Nº2 elenco não taxativo de regras de conduta.
Al. m) cláusula aberta.
Se se verificarem os pressupostos do art.281º o MP determina a suspensão provisória do processo durante
certo prazo impondo ao arguido injunções ou regras de conduta. Para que se aplica a suspensão provisória do
processo é necessário o consenso entre o MP, juiz de instrução, assistente e arguido 8art.281º nº1) e precisamente
por se exigir este consenso alargado uma vez tomada a decisão de suspender provisoriamente o processo depois
não há possibilidade de recorrer desta decisão 8art.281º nº6). Claro que se exige o acordo do assistente se houver
assistente constituído no processo, mas se porventura não existir um assistente no processo isso não impede a
aplicação da suspensão provisória do processo.
Uma questão muito controversa entre nós foi a de saber se quando o juiz de instrução não concorda com a
suspensão provisória do processo se pode haver recurso deste despacho de discordância do juiz de instrução. na
altura houve várias decisões quer a admitir quer a não admitir o recurso deste despacho de não concordância do
juiz de instrução e na sequência destas decisões divergentes surgiu um acórdão uniformizador de jurisprudência
desta matéria acórdão 16/2009 em que se estabeleceu que o despacho de discordância do juiz de instrução em
relação à suspensão do processo não é passível de recurso. O juiz vai apenas averiguar se estão reunidos todos os
pressupostos, se não concorda é porque não estão reunidos.
Se falhar um pressuposto, por exemplo se o arguido ou o juiz de instrução não concordar, o MP só pode
acusar.

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Cláudia Morgado

A suspensão provisoria do processo implica sempre a aplicação ao arguido a aplicação de regras de conduta
ou injunções por isso se diz que este é um caso de diversão com intervenção, enquanto o arquivamento em caso
de dispensa de pena se trata de um fenómeno de diversão simples. Pergunta que é feita porque um é diversão
com intervenção (tem de haver intervenção do arguido, cumprimento de deveres ou regras de conduta) e o outro
diversão simples.
As injunções são obrigações que podem ser cumpridas de forma instantânea e extinguem com o seu
cumprimento. As regras de conduta são obrigações de cumprimento continuado.
Indemnizar o lesado é injunção.
A suspensão provisória do processo tem por regra uma duração que não pode exceder 2 anos, art.282º nº1.
Se durante a suspensão provisória do processo, o arguido cumprir as injunções e regras de conduta o MP vai
depois arquivar o processo (art.282º nº3). Se o arguido não cumprir as injunções e regras de conduta ou se
cometer um crime da mesma natureza pelo qual venha a ser condenado, então o processo procede ou seja, o MP
vai deduzir acusação e o processo seguirá para a fase de julgamento (art.282º nº4).
A suspensão provisória do processo também pode vir a ser aplicada na fase de instrução art.307º nº2.

Estes institutos dos art. 280º e 281º aplicam-se apenas no caso de crimes públicos ou também nos casos de
crimes semipúblicos e particulares?
No caso dos crimes semipúblicos quem deduz acusação é o MP, por isso, não há nenhuma razão para que não
se apliquem estes institutos. São alternativas ao despacho de acusação e se é o MP que deduz acusação então não
há aqui nenhum problema.
Em relação aos crimes particulares quem deduz acusação é o assistente. Se no caso de um crime particular o
assistente não pretender acusar é claro que o MP não pode aplicar os institutos previstos no art.280º e 281º tem
de arquivar. Mas se no âmbito de um crime particular o assistente pretender acusar será que têm ou não aplicação
estes institutos? A aplicação do art.281º não suscitará muitas dúvidas uma vez que para haver suspensão
provisória do processo tem de haver a concordância do próprio assistente. Num crime particular não há qualquer
razão para que não se aplique suspensão provisória do processo, o próprio assistente é depois chamado para dar
concordância à suspensão provisoria do processo. O problema coloca-se verdadeiramente em relação ao
arquivamento em caso de dispensa de pena no caso de crimes particulares porque a aplicação do disposto no
art.280º não está dependente da concordância do assistente e, por isso, aqui suscitam-se dúvidas quanto a saber
se pode ter aplicação este instituto quando o crime é particular. De facto, quando o assistente acusa ele está na
verdade a manifestar a sua intenção de levar o arguido a julgamento, mas mesmo após uma acusação do
assistente nada obsta a que o arguido requeira a abertura de instrução e o juiz de instrução pode vir a proferir um
despacho de não pronúncia, além disso, quando há uma acusação particular e não for requerida a fase de instrução
o tribunal pode proferir um despacho no sentido de rejeitar a acusação se a considerar manifestamente infundada
(art.311º nº2 al. a). Ou seja, isto mostra que o facto de se tratar de um crime particular não significa que a vontade
do assistente de levar o arguido a julgamento venha efetivamente a concretizar-se. E parece que a razão de ser
subjacente ao art.280º se mantém mesmo nos casos dos crimes particulares, por isso, a Dra. Maria João Antunes
entende que os institutos previstos quer no art.280º e 281º têm aplicação independentemente do crime ser
público, semipúblico ou particular, ou seja, estes institutos são alternativas quer à acusação do MP, quer à
acusação particular.
Isto é muitas vezes perguntado nos exames, se calhar crime particular temos que levantar a possibilidade de
aplicar estes institutos.

No caso prático era crime de furto, crime semipúblico. Havia possibilidade de suspensão provisória do
processo porque é aplicável a crimes puníveis com pena até 5 anos e não há nenhum problema maior, porque
quem deduz acusação é o MP. Não se poderia aplicar o art.280º porque era necessário que se verificassem os

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Cláudia Morgado

requisitos do art.74º e porque o crime era punível até 3 anos e não com pena não superior a 6 meses não se
poderia aplicar o 280º.
Em primeiro temos de ter atenção que a dispensa só se aplica se o crime não for punível com pena não superior
a 6 meses e depois temos de ver o art., em concreto se é um caso especial em que é permitido dispensa de pena.

Estudar também casos especiais de violência doméstica e crimes sexuais contra menores que são muitas vezes
questionados – art.281º nº7 e 8.

3.Suponha agora que o autor do crime foi Igor, irmão de Humberto. Quem decidiria, neste caso, sobre a dedução
de acusação?

Art.207º nº1 al. a) CP passa a ser um crime de natureza particular. Art.202º al.c).
Sendo crime particular é exceção ao pp., da oficialidade logo o ofendido teria de apresentar queixa, constituir-
se assistente o MP abria o inquérito e no fim seria Humberto notificado para caso quisesse apresentar queixa.
Podíamos problematizar a inda a possibilidade de aplicação do instituto da suspensão provisória do processo.

4.No final do inquérito foi deduzida acusação. Como poderia o arguido reagir processualmente?

Se o crime fosse semipúblico teria sido o MP a deduzir acusação, se fosse particular seria o assistente, mas em
qualquer dos casos há mecanismo de controlo judicial desta decisão de acusação de que o arguido pode lançar
mão que é o requerimento para abertura de instrução, nos termos do art.287º nº1 al. a).
Fase de instrução é a uma fase que tem finalidade de comprovação judicial da decisão do MP – art.286º nº1.
Por isso, Dra. Maria João Antunes não concorda com os autores que dizem que é suplemento autónoma da
investigação, além da própria letra do art.286º nº1 há ainda mais dois argumentos que nos mostram que a fase
de instrução não é fase de investigação. Desde logo, o facto de a instrução ter caráter facultativa, nos termos do
art.286º nº2. Por isso, a fase de investigação por excelências trem de ser a fase de inquérito, a partir desta fase a
investigação está feitas e por isso a investigação que se faz na fase de instrução tem sempre um carater subsidiário.
Outro argumento, nos termos do art.309º nº1 do CPP esta norma comina a nulidade da decisão instrutória na
parte em que pronunciar o arguido por factos que constituam uma alteração substancial dos descritos na acusação
do MP ou do assistente ou no requerimento para abertura de instrução. não pode haver alteração substancial do
factos, os poderes de investigação do juiz de instrução são subsidiários.

5. Poderia o Ministério Público encerrar o inquérito com um despacho de arquivamento? Com que
fundamento? Como poderia o assistente reagir a este despacho?

O inquérito acaba o com acusação ou arquivamento.


Razões que podem levar a arquivamento – art.277º:
 Pode se abrir o inquérito, se investigue e concluir que noa houve crime – alguém aparece morto pensa-
se que houve crime, mas foi morte natural.
 Pode constituir-se suspeito arguido, investiga-se, conclui-se que houve crime, mas não foi aquela
pessoa que o cometeu.
 MP concluir que o procedimento criminal p.ex., já prescreveu – legalmente inadmissível o
procedimento.
 Art.277º nº2 há suspeita de que houve crime, investigou-se, mas não conseguiu-se obter prova
bastante e uma vez em julgamento é mais provável a absolvição.

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Cláudia Morgado

No nosso caso, tratando-se de um crime semipúblico, quem deduz acusação é o MP e o arquivamento poderia
ter fundamento em qualquer uma destas causas.
Havia uma especificidade porque sendo o crime semipúblico a queixa tem de ser apresentada no prazo de 6
meses. Imagine-se que apresentou queixa passado 10 meses, MP não se apercebe abre inquérito e só depois se
apercebe que a queixa não foi tempestivamente apresentada.
Se fosse crime particular – ofendido constitui-se assistente, MP investiga e ao fim notifica o assistente para
caso este queira acusar. Imagine-se que recebida a notificação o assistente não faz nada, o MP tem de arquivar
por inadmissibilidade legal do procedimento. A única possibilidade é portanto tendo sido o assistente notificado
para deduzir acusação e não acusar o MP arquivar com fundamento de o procedimento ser legalmente
inadmissível.

Como o assistente pode reagir a um despacho de arquivamento? Em geral há duas formas de controlar a
decisão de arquivar, há o controlo judicial nos termos do art.287º nº1 al. b) e há também a possibilidade de
intervenção hierárquica nos termos do art.278º (esta só vale para os casos de arquivamento). Portanto, o
assistente o requer abertura de instrução ou intervenção hierárquica.

Se for decisão de acusação – há lugar a requerimento para abertura de instrução.


Se for arquivamento – abertura de instrução ou intervenção hierárquica.

E quando o crime é particular pode o assistente reagir contra despacho de arquivamento? Há partida quando
há despacho de arquivamento nestes casos porque quem tinha dever de acusação era o assistente não há lugar a
reação por parte do assistente e não pode requerer abertura de instrução nem intervenção hierárquica (art.287º
al. b). Mas pode haver casos de erro do MP, o MP arquiva neste caso entende-se que o assistente pode requerer
a intervenção hierárquica ou mesmo requerer abertura de instrução. outro caso em que pode o assistente
requerer abertura de instrução, em que o MP por erro no final do inquérito, por lapso não se apercebe que é crime
particular entende que não recolheu indícios suficientes e arquiva, nem sequer notificou o particular, também o
particular pode lançar mão quer de intervenção hierárquica, quer abertura de instrução. Isto às vezes é
questionado.

6. Encerrada a instrução, foi proferido despacho de pronúncia. Poderia o arguido recorrer de tal despacho?

A fase de instrução termina com despacho de pronúncia ou despacho de não pronúncia, nos termos do
art.307º. se até o encerramento da instrução o juiz tiver recolhido indícios que tornem provável a condenação
então ele profere um despacho de pronúncia. Caso contrário, o juiz vai proferir um despacho de não pronúncia
(art.308º).
E como se pode reagir contra despacho de pronúncia ou de não pronúncia? Estamos nestes casos perante uma
decisão de um juiz, por isso, a forma de reação será o recurso e entre nós um dos pp., em matéria de recursos é o
pp., da recorribilidade segundo o qual é permitido recorrer de todas as decisões cuja irrecorribilidade não esteja
expressamente prevista na lei (art.399º). No entanto, há certos casos em que a lei estabelece a impossibilidade
de recurso e um desses casos é a recorribilidade da decisão instrutória em certas circunstância. Quando chegamos
ao fim da fase de instrução podemos distinguir 4 situações:
1ª o MP acusa o arguido, o arguido requer abertura de instrução e o juiz de instrução pronúncia;
2ª o MP acusa o arguido, o arguido requer abertura de instrução e o juiz de instrução não pronúncia;
3ª o MP arquiva, o assistente requer abertura de instrução e o juiz de instrução;
4ª MP arquiva, o assistente requer abertura de instrução e o juiz de instrução não pronúncia.

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Cláudia Morgado

A regra geral é a da recorribilidade pode recorrer-se sempre exceto quando a lei disser que não é possível
recorrer e quando há acusação seguida de um despacho de pronúncia não pode haver recurso do despacho de
pronúncia, porque o art.310º nº1 estabelece expressamente que a decisão instrutória que pronunciar o arguido
pelos factos constantes da decisão do MP formulada nos termos do art.283º é irrecorrível.
1ª hipótese – irrecorrível.
Neste caso a decisão é irrecorrível, porque temos duas decisões de duas magistraturas distintas no mesmo
sentido. Há uma concordância entre as duas magistraturas pelo que não se justifica o recurso. O arguido poderá
sempre depois defender-se na fase de julgamento. Estão aqui presentes também razões de celeridade e economia
processual.

Em todas as outras hipóteses é possível recorrer-se do despacho que põe fim à fase de instrução, vale a regra
da recorribilidade. Só na 1ª hipótese é que não pode haver recurso.

Então mas na última hipótese também há concordância das duas magistraturas – nos casos em que o MP
arquiva e o juiz de instrução profere despacho de não pronúncia, também há duas decisões concordantes de duas
magistraturas distintas e neste caso é admissível recurso, porquê? Neste caso, é admissível recurso, porque a
última decisão tomada é decisão de não pronúncia. Nos casos previstos no art.310º nº1 em que há uma acusação
seguida de uma pronúncia a causa segue para julgamento e o arguido poderá defender em julgamento, mas na
nossa 4ª hipótese, se houver arquivamento seguido de não pronúncia se não fosse possível recorrer do despacho
de não pronúncia esta decisão tornar-se-ia a decisão final daquele processo e , por isso, a lei admite o recurso
neste caso, no entanto Maria João Antunes salienta que também no caso em que há arquivamento seguido de
não pronúncia continua a valer a razão que justifica o disposto no art.310º nº1 e que radica no juízo concordante
de duas magistraturas distintas, por isso, segundo, Maria João Antunes anda impede que se defenda também a
solução da irrecorribilidade da decisão instrutória que não pronunciar o arguido na sequência de um despacho de
arquivamento do MP.

E se no caso de haver um despacho de pronúncia o mesmo tiver sido prosseguido de uma acusação particular?
Neste caso também temos duas decisões no mesmo sentido, mas não são duas decisões de duas magistraturas
distintas, trata-se de uma acusação de um assistente e de uma pronúncia do juiz de instrução e obviamente há
diferenças entre uma acusação particular e uma acusação do MP porque o MP tem de se orientar por critérios de
legalidade e objetividade e o assistente não tem naturalmente que seguir. Esta questão era muito discutida
anteriormente à revisão de 2007, mas em 2007 o legislador veio esclarecer este problema e nos casos de crimes
particulares o despacho de pronúncia será recorrível exceto se o MP tiver acompanhado a acusação do assistente,
nos termos do art.285º nº4. Neste caso, no fundo, quando o MP acompanha a acusação particular e depois o juiz
de instrução pronúncia, voltamos a ter acordo entre duas magistraturas distintas. Art.310º.
Se à acusação do assistente, mas não é acompanhada de acusação do MP e o juiz de instrução pronúncia-
neste caso é recorrível.

18 de maio de 2021
Medidas de coação:

Joel, suspeito da prática de um crime de violação (artigo 164º, n.º 2, do Código Penal), foi detido.

1. Um suspeito pode ser detido?

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Cláudia Morgado

A detenção é um meio processual privativo da liberdade que consiste num ato material de captura que pode
ser realizado pela polícia e em certos casos por qualquer outra pessoa. A detenção distingue-se, por isso, da prisão
preventiva que é uma medida coação.
As finalidades da detenção são as referidas no art.254º.
Concretamente, quanto à questão se pode o suspeito ser detido a verdade é que a pessoa detida não tem de
ser arguido e não tem que ser sequer suspeito. Pode deter-se também uma testemunha, para se assegurar a sua
presença em ato processual, isto resulta do art.254º nº1 al. b).
Quanto à questão de saber quem é que pode deter um cidadão devemos atender à distinção entre detenção
em flagrante delito nos termos do art.255º e 256º e detenção fora de flagrante delito nos termos do art.257º.
No caso da detenção em flagrante delito á também especificidades quando se trata de crimes semipúblicos e
particulares. Quando o crime é semipúblico a detenção efetua-se mas só se mantém se o titular do direito de
queixa o exercer (art.255º nº3). Quando o crime for particular não há lugar a detenção em flagrante delito, há
apenas possibilidade de identificação do infrator (art.255º nº4).
Coisa diferente acontece em relação às medidas de coação estas são sempre aplicadas a um arguido. Além de
ser sujeito do processo, o arguido é também objeto de aplicação das medidas coação (art.60, 1ª parte e 61º nº6
al. d)). O art.192º nº1 estabelece expressamente que a aplicação de MC depende da prévia constituição como
arguido.
Podemos deter um suspeito, mas não podemos prender preventivamente um suspeito.
Exames anteriores: distinguir detenção de prisão preventiva.

Resposta ao caso: Detenção em flagrante delito e a detenção só se manteria se o titular do direito de queixa o
exercesse, porque estamos perante crime semipúblico (art.255º nº3).

3. Na sequência do primeiro interrogatório judicial de arguido detido, poderia o juiz de instrução aplicar
como medida de coação a prestação de trabalho a favor da comunidade?

Não está prevista no elenco de MC está aqui em causa o pp., da legalidade conjunto de princípios que norteiam
a aplicação de MC – prestação de trabalho a favor da comunidade não é uma MC, logo o juiz não poderia aplicar
isto porque não é MC.

As MC são meios processuais que vão limitar a liberdade do arguido, para salvaguardar outros direitos ou
interesses constitucionalmente protegidos. Existe um catálogo taxativo de MC previstas no art.196º e ss., por uma
ordem crescente de gravidade e de acordo com o pp., da legalidade, só podem ser aplicadas as MC previstas na
lei, porque só a lei pode restringir direitos, liberdades e garantias (art.61º nº6 al. b9, art.191º nº1 parte final CPP
e art.18º nº2 e 3 CRP).
Quais são as MC previstas na lei? A partir do art.196º até 202º.

4. Poderia o juiz aplicar uma medida de coação invocando apenas como fundamento a gravidade do crime
em causa?

Nosso caso era um caso de violação será que o juiz podia dizer que era um crime gravíssimo e que por isso
aplica a MC X.
Está aqui em causa o pp., da necessidade. Este pp., da necessidade decorre do art.191º nº1, 1ª parte, 193º
nº1, 1ª parte e art.204º.

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Cláudia Morgado

Este pp., significa que a liberdade das pessoas só pode ser limitada por aplicação de uma MC em função de
exigências processuais de natureza cautelar. Norma que nos diz quais as exigências processuais de natureza
cautelar que justificam aplicação de uma MC – art.204º (isto é muitas vezes perguntado nos exames).
Aplicação de uma MC nunca pode ser fundamentada na gravidade do crime em causa ou na culpa do agente,
o juiz tem sempre de indicar uma destas exigências processuais de natureza cautelar do art.204.
Não podemos esquecer que as exigências processuais de natureza cautelar, são diferentes das exigências da
punição. As primeiras legitimam a aplicação de MC a alguém que se presume inocente, as segundas legitimam a
condenação em uma pena de alguém que é declarado culpado, por isso, as exigências processuais de natureza
cautelar devem ser sempre interpretadas à luz das finalidades do processo penal. Por isso, para aplicação de MC
nunca pode ser invocada qualquer razão que diga respeito p. ex., à culpa do arguido, às finalidades da punição ou
à proteção do ofendido (isto é muito importante). A culpa grave do agente nunca é fundamento de aplicação de
uma MC. Num caso prático ter sempre muito cuidado com isto – exigências processuais de natureza cautelar que
são a única razão de aplicação de uma MC, art.204º.

5. Verificando-se perigo de fuga, poderia o juiz aplicar apenas a medida de coação de suspensão do exercício
do poder paternal?

Esta suspensão do exercício do poder paternal está prevista no art.199º al. b) – não está aqui em causa o pp.,
da legalidade.
Está aqui em causa o pp., da adequação. Este pp., significa que a MC a aplicar em concreto deve ser adequada
à exigência cautelar que o caso requerer, art.193º nº1, 2ª parte. Suspensão do exercício do poder paternal não é
adequado a acautelar o perigo de fuga, mas a caução pode se revelar adequada a acautelar o perigo de fuga bem
como a prisão preventiva.

Parêntesis para falarmos do pp., da proporcionalidade, a MC deve ser proporcional à gravidade de um crime
e à sanção que previsivelmente venha a ser aplicada (art.193º nº1, parte final). O próprio legislador concretiza
este pp., da proporcionalidade, por um lado em geral a aplicação de MC depende da gravidade da pena aplicável
ao crime (art.195º) e, por outro lado, nos termos da lei a aplicação de MC mais gravosas previstas nos art.200º a
202º depende de verificação de fortes indícios da prática de crime doloso.

2. Poderia o órgão de polícia criminal sujeitar Joel a termo de identidade e residência?

Por regra, só o juiz pode aplicar MC (art.194º e 268º nº1 al. b)), mas esta regra não vale para uma das MC
precisamente para o termo de identidade e residência que está previsto no catálogo das MC, mas tem várias
caraterísticas que o distinguem das outras MC, por isso, questionamos se o termo de identidade e residência será
uma MC em sentido próprio.
Características que distinguem das demais MC:
 Enquanto as MC têm de ser aplicadas pelo juiz, o termo de identidade e residência pode ser aplicado
para além do juiz, também pelo MP ou por um órgão de polícia criminal (art.196º nº1).
 Por outro lado, por regra, de acordo com o pp., da necessidade as MC só podem ser aplicadas quando
se verificarem as exigências cautelares referidas no art.204º. Esta regra não vale para o termo e
residência. Nos termos do art.61º nº6 al. c) sobre o arguido impende o dever de prestar termo de
identidade e residência e nos termos do art.196º nº1 o termo de identidade e residência é aplicado a
todo aquele que for constituído arguido e a sua aplicação não está sujeita a qualquer dever de
fundamentação (art.194º nº6).

51
Cláudia Morgado

 Nos termos do art.214º nº1 al. e) o termo de identidade e residência não se extingue com o trânsito
em julgado da sentença condenatória como acontece com as demais MC. O termo de identidade e
residência extingue-se somente com a extinção da pena (art.196º nº3 al. e).

Todas estas características fazem com que o termo de identidade e residência sendo uma MC tem todo um
conj., de características que a distinguem se é MC é sentido próprio. Isto calha nos exames e temos de saber
porque questionamos se é verdadeiramente MC e temos de dizer estas características que indicámos.

Portanto resposta à pergunta é sim, pode ser aplicada pelo juiz, M; ou órgão de polícia criminal.

6. Suponha que no inquérito o ministério público requereu a aplicação da obrigação de permanência na


habitação e o juiz aplicou prisão preventiva. Quid iuris?

A questão é sim dependendo dos casos.

Conceito de fortes indícios – art.200º, 201º, 202º, a aplicação destas 3 MC está dependente da verificação de
fortes indícios de prática de crime doloso punível com pena de prisão de máximo superior a 3 anos.
Falámos antes do conceito de indícios suficientes que é diferente de fortes indícios.
A existência de fortes indícios da prática de crime doloso é um pressuposto de aplicação das MC previstas nos
art.200º a 202º. Deste modo, para aplicação destas MC se o processo estiver na fase de inquérito tem de haver
um juízo positivo no sentido de que em face dos indícios já existentes há uma possibilidade já razoável de ser
deduzida acusação sendo esta mais provável que o arquivamento. Se o processo estiver na fase de instrução para
que se possam aplicar as MC referidas tem de haver um juízo positivo no sentido de que em face dos indícios já
existente há uma possibilidade já razoável de ser proferido um despacho de pronúncia sendo este mais provável
que a decisão de não pronúncia. Por isso o juízo de indícios suficientes da prática de um crime é um juízo que tem
de estar presente no momento da acusação (art.283º nº1) ou no momento da pronúncia (art.308º nº1) e para que
haja indícios suficientes é necessário que o material probatório já reunido permita concluir que será mais provável
a condenação do que a absolvição do agente e este material pode por conseguinte não estar ainda reunido no
momento em que se aplica uma das MC previstas nos art.200º a 202º. Deste modo, pode acontecer que os
elementos de prova que seriam insuficientes para uma acusação ou para uma pronúncia sejam considerados
bastantes para dar como verificado o conceito de fortes indícios para a aplicação de uma MC até porque se a MC
em causa for aplicada na fase de inquérito ela está a ser aplicada numa fase que é ainda uma fase de recolha de
prova. Há autores que entendem que o conceito de fortes indícios é um conceito mais exigente que o conceito de
indícios suficientes, mas em rigor trata-se de conceitos diferentes que não permitem uma comparação.
Uma coisa é haver fortes indícios no sentido de ser mais provável uma acusação ou uma pronúncia para efeitos
de aplicação de uma MC, outra coisa é haver indícios suficientes no sentido de ser mais provável a condenação
que a absolvição, para efeitos de ser deduzido um despacho de acusação ou proferido um despacho de pronúncia.

Muitas vezes tem sido confundido entre nos estes dois conceitos em termos de língua portuguesa o conceito
mais exigente seria o de fortes indícios e há entre nós quem tenha vindo a dizer isso, mas isto não é verdade. O
conceito de fortes indícios é indicado no âmbito de aplicação destas 3 MC mais graves e a aplicação destas 3 MC
depende da verificação de fortes indícios da prática do crime. prisão preventiva aplicada durante o inquérito é
aplicada num momento em que ainda não se recolheram indícios suficientes da prática do crime. Ao fim de 5
meses de investigação consideram que há indícios suficientes da prática do crime e o MP deduz acusação porque
em julgamento é mais provável a condenação que absolvição (art.283º). São conceitos diferentes com âmbitos de

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Cláudia Morgado

aplicação diferentes e que não admitem comparação. Isto é muitas vezes questionado nos exames – distinga fortes
indícios de indícios suficientes.

Último pp., de aplicação das medidas de coação: pp., da subsidiariedade da aplicação da obrigação de
permanência na habitação e prisão preventiva – art.193º nº2, 201º nº1 e 202º nº1.
Deste pp., decorre que como estas são as MC mais gravosas elas só podem ser aplicadas quando todas as
outras se revelarem no caso inadequadas ou insuficientes. Por sua vez, a prisão preventiva só pode ser aplicada
em última instância, deve ser dada preferência à obrigação de permanência na habitação sempre que esta se
revelar suficiente em função das exigências de natureza cautelar (art.193º nº3). O caráter subsidiário da prisão
preventiva resulta ainda do disposto no art.28º nº2 da CRP.

Voltando à questão:
Quem aplica as MC: a regra é a de que só o juiz pode aplicar MC (art.194º e 268º nº1 al. b)). Na fase de inquérito
é o juiz de instrução que aplica as MC a requerimento do MP. Na fase de instrução é o juiz de instrução que aplica
as MC a requerimento do MP ou oficiosamente, sendo sempre ouvido o MP. Na fase de julgamento é o juiz de
julgamento que aplica MC a requerimento do MP ou oficiosamente sendo sempre ouvido o MP. Esta matéria é
muito importante e calha sempre.

Tem se colocado entre nós a seguinte questão, na fase de inquérito o juiz de instrução tem de aplicar a MC
que for requerida pelo MP ou poderá aplicar uma MC diferente da requerida.
Até à revisão e 2007 o CPP não dava resposta expressa a esta questão. Em 2007 o art.194º foi alterado e passou
a prever-se que durante o inquérito o juiz de instrução poderia aplicar MC diferente da requerida pelo MP desde
que não fosse uma medida mais grave do que a requerida. Em 2013 o art.194º foi novamente alterado passando
a prever-se a seguinte distinção quando a MC é aplicada com fundamento nas al. a) e c) do art.204º o juiz pode
durante o inquérito aplicar MC diversa ainda que mais grave que a MC requerida pelo MP (art.194º nº2). Por sua
vez, quando a MC for aplicada com fundamento na al. b) do art.204º o juiz pode durante o inquérito aplicar MC
diversa da requerida pelo MP desde que não seja uma medida mais grave (art.194º nº3).
Doutora Maria João Antunes sempre defendeu que sendo o MP o dominus do inquérito, intervindo o juiz o de
instrução como juiz das liberdades a solução coerente seria a de o juiz dever respeitar o pedido feito pelo MP. O
juiz de instrução ou aplicaria a MC requerida pelo MP ou caso entendesse que não estavam reunidos os
pressupostos não a aplicaria. Mas o juiz de instrução não deveria poder aplicar uma MC diferente da requerida.
Esta solução defendida por Maria João Antunes seria justificada atendendo também aos pp., da necessidade, da
adequação e da proporcionalidade na aplicação das MC, pois é o MP que está em condições de avaliar as
exigências processuais de natureza cautelar que no caso se fazem sentir. Além de que a aplicação de uma MC
diferente da requerida pelo MP pode pôr em causa o desenrolar do plano de investigação traçado pelo próprio
MP.
Imagine-se que está em causa investigação por tráfico de dono e o MP quer a aplicação de caução e o juiz
analisa o caso e diz que está em causa perigo de fuga e impõe prisão preventiva, mas ao MP poderia dar interesse
que os arguidos continuassem em liberdade para continuarem o tráfico de droga para conseguirem adquirir
provas.
Maria João Antunes critica ainda a incoerência que resulta do atual regime previsto nº2 e 3 do art.194º. não
se percebe que se considere o MP a autoridade mais bem posicionada para avaliar a repercussão que as MC podem
ter nas situações previstas na al. b) do art.204º, ou seja, quando há perigo de perturbação do decurso do inquérito
e permitir depois que o juiz de instrução possa aplicar uma MC diferente da requerida desde que ela seja menos
grave. Por outro lado, fica ainda em aberto a questão de saber se o juiz de instrução pode aplicar uma MC mais

53
Cláudia Morgado

grave que a requerida pelo MP quando o requerimento se fundar não só na al. b) do art.204º mas também em
uma das outras al., da mesma norma.

Resposta: sim seria possível desde que tivesse requerida a MC com fundamento no art.204º al. a) ou c) nos
termos do art.194º nº2.

7. Admitindo que foi legalmente aplicada a prisão preventiva no inquérito, poderia o juiz, por iniciativa
própria, durante a fase de instrução, substituir essa medida por caução?

Isto seria possível, está aqui em causa o pp., da precariedade. Este pp., está referido no art.212º nº1 al. b) e
no art.212º nº3 e decorre ainda do art.28º nº2 CRP.
Este pp., da precariedade não é mais do que uma consequência dos pp., da necessidade e da adequação. Nos
termos deste pp., a MC é imediatamente revogada sempre que tiverem deixado de subsistir as circunstâncias que
justificaram a sua aplicação, ou seja, sempre que ela tiver deixado de ser necessária. Além disso, a MC será
substituída por outra menos grave ou por uma forma menos gravosa da sua execução sempre que se verificar uma
atenuação das medidas cautelares que determinaram a sua aplicação, ou seja, sempre que a MC tiver deixado de
ser adequada.
O pp., da precariedade tem implicações especiais no caso de obrigação de permanência na habitação e no da
prisão preventiva uma vez que o art.213º nº1 determina que o juiz oficiosamente de 3 em 3 meses está obrigado
a verificar se os pressupostos de aplicação destas MC se mantém. Mas o art.213º não afasta a aplicação também
em relação à prisão preventiva e à obrigação de PH do disposto do art.212º que se refere à revogação e
substituição das MC pelo juiz oficiosamente ou a requerimento do MP ou do arguido.
Nos casos em que tenha havido uma apreciação oficiosa ou a requerimento do MP ou do arguido ao abrigo do
art.212º e em que tenha sido decidida a não revogação nem substituição da prisão preventiva, só 3 meses depois
desta decisão é que obrigatório o reexame dos pressupostos nos termos do art.213º ainda que entre este reexame
e o reexame anterior feito nos termos do art.213º tenham decorrido mais de 3 meses.
Imagine-se que foi aplicada prisão preventiva a 10 novembro do ano passado. passado 3 meses tem de haver
reexame 3 meses depois em 10 de janeiro. E no fim do março há um requerimento do arguido para apreciação
dos pressupostos e o juiz mantém prisão preventiva quando é obrigatório fazer o próximo exame? Será em junho,
pode passar mais de 3 meses porque conta-se desde a última decisão tomada ao abrigo do art.212º.

Voltando à nossa questão: poderia oficiosamente ou a requerimento nos termos do art.212º ou no âmbito do
reexame obrigatório (art.213º).
Pp., que costuma sair no exame.

8. Como poderá Joel reagir se a prisão preventiva se prolongar para além dos prazos referidos no artigo
215.º do Código de Processo Penal?

Sendo as MC aplicadas por despacho do juiz a forma normal de reação será recurso. Se forem aplicadas em
violação de qualquer de um dos pp., referidos pode haver recurso do despacho do juiz de instrução para o trib.,
da relação art.219º conjugado com o art.427º. Além disso tratando-se de privação da liberdade ilegal (seja caso
de prisão preventiva ilegal, detenção ilegal) poderia ainda o arguido lançar mão da providência habeas corpus,
art.222º e no nosso caso o nº2 al. c).
Estes são os modos de impugnação: recurso do despacho do juiz de instrução para o trib., da Relação ou no
caso de prisão ilegal providência habeas corpus.

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Cláudia Morgado

Meios de prova:
Luís foi pronunciado pela prática de um crime de tráfico de pessoas (artigo 160º, n.º 1, do Código Penal). O
processo encontra-se, presentemente, na fase de julgamento.

1. Poderá Luís recusar-se a responder às perguntas sobre a sua identidade?

Quando falamos das declarações do arguido é preciso fazer uma distinção entre as declarações do arguido em
relação aos factos e a declarações do arguido em relação à sua entidade.
O arguido tem o dever de responder e de responder com verdade às perguntas sobre a sua identidade (art.61º
nº6 al. b), 141º nº3 e 342º), sob pena de incorrer num crime de falsas declarações art.359º nº2).
Logo, Luís não pode recusar-se a responder.

2. Luís negou os factos que lhe eram imputados, prestando sobre eles declarações falsas. Poderá ser
criminalmente responsabilizado por estas falsas declarações?

Quando o arguido é questionado em relação aos factos ele pode ter 1 de 3 comportamentos. Ele pode negar
os factos, pode confessar os factos, como pode nada dizer quanto aos factos remetendo-se ao silêncio.
Quando o arguido nega os factos vale inteiramente o pp., da livre apreciação da prova e se a negação dos
factos for uma mentira, não há qualquer responsabilização do arguido. O arguido diferentemente do que acontece
com as testemunhas não tem de responder com verdade às questões que lhe são colocadas em relação aos factos.
A testemunha tem o dever de responder com verdade nos termos do art.132º nº1 al. d) e a testemunha tem de
prestar juramento (art.132º nº1 al. b)). Por sua vez, o arguido não presta juramento em caso algum (art.140º nº3).
Não podemos dizer que o arguido tenha direito a mentir, mas o arguido não tem é um dever de colaboração com
a administração da justiça, o arguido não tem o dever de falar a verdade.
Quando o arguido nega os factos vale inteiramente o pp., da livre apreciação da prova – o que significa? É um
pp., muito importante em matéria de prova (art.127º) e significa que a prova é apreciada segundo as regras da
experiência e a livre convicção da entidade competente. Deste modo, não vale entre nós o sistema da prova legal,
segundo este é o próprio legislador que estabelece o valor a atribuir a cada meio de prova. Há regras legais que
determinam o valor da prova. Entre nós vale sim o pp., da livre apreciação da prova. Dizemos que este pp., tem
uma dimensão positiva e uma dimensão negativa.
Dimensão negativa – pela negativa o pp., da livre apreciação da prova significa a ausência de critérios legais
pré-determinados do valor a atribuir à prova.
Dimensão positiva – a apreciação da prova de acordo com a livre convicção do julgador não significa que a
apreciação seja imutivável ou incontrolável. Esta liberdade do julgador na apreciação da prova não é uma
liberdade puramente subjetiva. A apreciação da prova tem de ser sempre racionalizável, motivável e motivada
para se impor à generalidade das pessoas e designadamente ao arguido que tem que compreender o sentido das
várias decisões que o afetam, sobretudo quando se tratar de uma decisão de condenação. Costuma por isso dizer-
se que esta liberdade na apreciação da prova é uma liberdade de acordo com um dever que é o dever de perseguir
a verdade material. A decisão do julgador tem de ser sempre uma decisão fundamentada, isto é, o julgador tem
sempre que dizer quais foram as provas que conduziram àquela decisão, isto resulta de várias normas art.365º
nº3, 374º nº2, 375º nº1 e 379º nº1 al. a).

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Cláudia Morgado

O pp., da livre apreciação da prova vale no nosso ppenal para todo o domínio da prova produzida, há situações
em que se verificam limitações ao pp., da livre apreciação da prova.

Portanto, o arguido pode negar os factos mesmo que seja mentira não é criminalmente responsabilizado
valendo o pp., da livre apreciação dos factos, mas é sempre uma liberdade de acordo com o dever, as decisões
têm de ser fundamentadas.

3. Suponha que Luís confessou os factos que lhe eram imputados. Quais os efeitos desta confissão?

A confissão dos factos é entre nos admitida como meio de prova e ela tem um valor diferente conforme a
gravidade do crime em causa e o regime da confissão está no art.344º (isto é muitas vezes questionado). Nos
termos desta norma, tratando-se de pequena ou média criminalidade, ou seja, se for um crime punível com pena
de prisão não superior a 5 anos e sendo a confissão livre integral e sem reservas tal confissão vale por si só como
meio de prova e tem os efeitos previstos no art.344º nº2, ou seja:
1º não se produz mais prova;
2º os factos dão se como provados;
3º passa-se de imediato para a fase das alegações orais;
4º a taxa de justiça é reduzida a metade.

Neste caso há uma limitação ao pp., da livre apreciação da prova, porque se houver uma confissão integral e
sem reservas os factos dão-se como provados. Porém, isto acontece somente nos casos em que a confissão for
livre e, quando o juiz aprecia o caráter livre da confissão vale o pp., da livre apreciação da prova. Por isso, podemos
dizer que quando um arguido confessa a prática de um crime punível com pena de prisão não superior a 5 anos,
só aparentemente é que há uma limitação ao pp., da livre apreciação da prova. Já nos casos referidos no art.344º
nº3 e 4 vale inteiramente o pp., da livre apreciação da prova.
Quando confessa temos sempre que averiguar de que crime se trata se for punível com pena não superior a 5
anos e for confissão integral e sem reservas há limitação aparentemente ao pp., da livre apreciação, mas essa
limitação pode ser aparente porque para funcionar a limitação o juiz tem de previamente considerar que a
confissão é livre. Se não for livre, sem reservas e com pena superior a 5 anos vale inteiramente o pp., da apreciação
da prova.
Depende sempre da gravidade do crime em causa; mesmo quando não for superior a 5 anos a apreciação do
caracter livre da confissão é apreciação pelo juiz.

Resposta à pergunta: o crime é de trafico de pessoas art.160º nº1 – neste caso nunca a confissão implicaria
limitação ao pp., da livre apreciação da prova porque não é punível com pena não superior a 5 anos al. c) do
art.344º nº3.

4. Considere agora que Luís se recusou a responder às perguntas que lhe foram dirigidas pelo juiz sobre os
factos que lhe eram imputados. Qual o efeito deste silêncio do arguido? E se o juiz se convencer de que,
naquelas circunstâncias, a única explicação plausível para o arguido se remeter ao silêncio é o facto de
ser culpado?

Terceiro comportamento possível. O arguido tem direito ao silencio art.61º nº1 al. d) e 141º nº4 al. a) este
direito ao silêncio é novamente afirmado nas normas que se referem ao julgamento art.343º nº1 e 345º.

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Cláudia Morgado

Quanto aos factos o arguido não tem o dever de colaborar com a justiça e não é pelo facto de ele nada dizer
que vai incorrer em responsabilidade criminal. Se o arguido optar por exercer o seu direito ao silêncio, não
vale aqui o pp., da livre convicção do julgador na apreciação da prova está estabelecido no próprio CPP que o
silêncio do arguido nunca pode ser valorado contra ele (art.343º e 345º).
O silêncio nunca pode desfavorecer o arguido trata-se aqui do exercício do direito à não autoincriminação que
resulta do art.32º da CRP.
O juiz não tem de se convencer que o facto de se remeter ao silêncio significa que é culpado – o silêncio nunca
pode fundamentar a responsabilidade criminal do arguido. Jamais o juiz fundamentar a sua decisão de
condenação com base no silêncio do arguido, o juiz não pode apreciar livremente o silêncio do arguido, o
silêncio jamais pode desfavorecer o arguido.

5. Poderia o juiz de julgamento ordenar oficiosamente a realização de uma perícia psiquiátrica a Luís? Qual
o valor desta prova?

Pp., da investigação que é simultaneamente relativamente à prova e prossecução processual o juiz não é um
juiz passivo. Art.340º.
Estamos no domínio da prova pericial, art.151º e ss. E tem lugar quando a perceção e apreciação dos factos
exigirem especiais conhecimentos técnicos, científicos ou artísticos. É por vezes no ppenal chamar peritos.
Poderá o juiz apreciar livremente a prova pericial? Não, art.163º o juízo técnico, científico, artístico inerente á
prova pericial presume-se subtraído à livre convicção do julgador, vale aquilo que o perito disser na sua perícia
por isso a prova pericial constitui um limite ao pp., da livre apreciação da prova. Todavia o art.163º nº2 estabelece
que o juiz pode divergir do juízo apresentado pelo peito desde que fundamente a divergência, isto pode acontecer
p. ex., se houver erro obvio, lapso na perícia ou então se o próprio juiz também for perito na matéria. Portanto,
em relação à prova pericial não vale o pp., da livre apreciação da prova.
Pode haver outras provas produzidas no processo que permitam ao juiz fundar a sua convicção num outro
sentido. Não há livre apreciação da prova pericial, não pode divergir do que é dito pelo perito, mas não são os
peritos que decidem o processo, ou seja, acerca da decisão do juiz é apenas uma prova produzida no processo
juntamente com outros meios de prova.

ALTERAÇÃO DOS FACTOS ≠ ALTERAÇÃO DA QUALIFICAÇÃO JURÍDICA

Caso prático: A matou o pai, B.

1ª Hipótese:
O ministério público deduz acusação contra A, sabendo que A matou o pai, B. O ministério público acusa por
homicídio simples (artigo 131º do Código Penal), porque considera que a morte não foi produzida em
circunstâncias que tenham revelado uma especial censurabilidade ou perversidade do agente. Em julgamento,
perante os mesmos factos, o tribunal considera que o comportamento de A revelou especial censurabilidade e

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Cláudia Morgado

pretende condenar o arguido por homicídio qualificado (artigo 132º, n.º 1, e n.º 2, al. a), do Código Penal). Poderá
fazê-lo?
Identificação do problema: alteração da qualificação jurídica dos factos.

2ª Hipótese:
O ministério público deduz acusação contra A por homicídio simples (artigo 131º do Código Penal) porque,
durante o inquérito, não tomou conhecimento de que B era pai de A. Em julgamento descobre-se que B era pai
de A e o tribunal pretende condenar o arguido por homicídio qualificado (artigo 132º, n.º 1, e n.º 2, al. a), do
Código Penal). Poderá fazê-lo? Identificação do problema: alteração substancial dos factos. 3ª Hipótese: O
ministério público deduz acusação contra A por homicídio simples (artigo 131º do Código Penal), por A ter matado
B às 10h do dia 20 de dezembro. Tendo-se apurado em julgamento que os factos aconteceram às 12h, o tribunal
pretende condenar A por homicídio simples (artigo 131º do Código Penal), ocorrido às 12h. Poderá fazê-lo?
Identificação do problema: alteração não substancial dos factos.

3ª Hipótese:
O ministério público deduz acusação contra A por homicídio simples (artigo 131º do Código Penal), por A ter
matado B às 10h do dia 20 de dezembro. Tendo-se apurado em julgamento que os factos aconteceram às 12h, o
tribunal pretende condenar A por homicídio simples (artigo 131º do Código Penal), ocorrido às 12h. Poderá fazê-
lo?
Identificação do problema: alteração não substancial dos factos.

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Cláudia Morgado

CASO PRÁTICO
Manuel foi acusado da prática de um crime de furto (artigo 203º do Código Penal).

1. Supondo que em julgamento se descobriu que o agente fazia da prática de furtos modo de vida,
pronuncie-se sobre a possibilidade de Manuel vir a ser condenado por furto qualificado (artigo 204º, n.º
1, alínea h), do Código Penal).

Tópicos de resolução:
- identificação do problema: alteração substancial dos factos na fase de julgamento;

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Cláudia Morgado

- definição de “alteração substancial dos factos” (artigo 1º, alínea f), do CPP);
- uma alteração substancial dos factos descritos na acusação não pode ser tomada em conta pelo tribunal para
o efeito de condenação no processo em curso, sob pena de nulidade da sentença (artigos 359º, n.º 1, e 379º, n.º
1, alínea b), do CPP);
- ressalvam-se as situações em que o ministério público, o arguido e o assistente estiverem de acordo com a
continuação do julgamento pelos novos factos, caso em que é dado ao arguido, se requerido, prazo para
preparação da sua defesa (artigos 359º, n.ºs 3 e 4, do CPP);
- em caso de acordo e continuação do julgamento pelos novos factos, há uma entorse ao princípio da acusação
em nome da celeridade e da economia processuais, legitimada a partir de uma ideia de abertura a soluções
processuais de consenso;
- no caso concreto, seria pouco provável que Manuel concordasse com a continuação do julgamento pelos
novos factos;
- na sequência das alterações ao CPP introduzidas em 2007, na ausência de acordo, a instância não é extinta
(artigo 359º, n.º 1, do CPP) e a comunicação ao ministério público da alteração substancial dos factos vale como
denúncia, para que ele proceda pelos novos factos, apenas se estes forem autonomizáveis em relação ao objeto
do processo (artigo 359º, n.º 2, do CPP);
- no caso concreto, os novos factos não são autonomizáveis em relação ao objeto do processo;
- o julgamento prossegue com sacrifício dos novos factos não autonomizáveis (o julgamento prossegue, como
se não tivessem sido descobertos os novos factos);
- crítica: sacrifício das finalidades do processo penal de descoberta da verdade material, de realização da justiça
e da pacificação social; sacrifício do mandamento da esgotante apreciação da matéria tipicamente ilícita
submetida à cognição do tribunal, que decorre do artigo 29º, n.º 5, da CRP (cf., porém, Acs. do TC n.ºs. 226/2008
e 711/2019).

2. Supondo agora que Manuel foi condenado pelo crime de furto (artigo 203º do Código Penal) numa pena
de 2 anos de prisão, diga qual o tribunal competente para conhecer um eventual recurso e quais os seus
poderes de cognição.

Tópicos de resolução:
- a repartição da competência para julgamento pelos diferentes tribunais (tribunal singular, tribunal coletivo e
tribunal do júri) assenta na gravidade do crime, na natureza do mesmo e na maior ou menor facilidade de
apreciação e valoração da prova por parte do tribunal;
- no caso concreto, o tribunal competente para julgamento do crime de furto será o tribunal singular (artigo
16º, n.º 2, alínea b), do CPP); - a sentença condenatória, no caso, seria recorrível – princípio da recorribilidade das
decisões (artigo 399º do CPP);
- o tribunal competente para conhecer o recurso (ordinário) seria o tribunal da relação (artigos 12º, n.º 3,
alínea b), 427º, e 432º, n.º 1, do CPP);
- poderes de cognição: as relações conhecem matéria de facto e matéria de direito (artigo 428º do CPP); - no
caso, poderia ser interposto:
- um recurso de apelação, para o tribunal da relação; ou
- um recurso de revista, para o tribunal da relação;
- de acordo com o princípio do duplo grau de recurso é ainda admissível recurso da decisão proferida em
recurso, com a consequência de haver um triplo grau de jurisdição, ainda que restrito a matéria de direito; este
princípio sofre amplas limitações no direito vigente, podendo mesmo defender-se que, com algumas exceções, o
princípio regra é, em bom rigor, o do grau único de recurso;

60
Cláudia Morgado

- no caso concreto nunca seria admissível recorrer do acórdão do tribunal da relação para o STJ (não haveria
duplo grau de recurso):
- se o tribunal da relação proferisse um acórdão de absolvição, a irrecorribilidade resultaria do disposto no
artigo 400º, n.º 1, alínea d), do CPP;
- se o tribunal da relação proferisse um acórdão de condenação, a irrecorribilidade resultaria do disposto no
artigo 400º, n.º 1, alínea e) e/ou alínea f), do CPP.

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