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Copyright © 2023 Vania Freire

Capa:
Leitura crítica: Natalia Souza
Revisão: Natalia Souza, Mariana Santana
Diagramação: Vania Freire
_________________________
UM CEO EM MINHA VIDA

Vania Freire
1ª Edição — 2023
______________________
Registro:
EA274E4A4E793988AF0863B1810B82F17C382124

Todos os direitos reservados.


São proibidos o armazenamento e / ou a reprodução de qualquer parte dessa obra, através de
quaisquer meios — tangível ou intangível — sem o consentimento escrito da autora.
A violação dos direitos autorais é crime estabelecido na lei nº. 9.610/98 e punido pelo artigo 184 do
Código Penal.
Esta é uma obra de ficção. Nomes, personagens, lugares e acontecimentos descritos são produtos da
imaginação da autora. Qualquer semelhança com nomes, datas e acontecimentos reais é mera
coincidência.
Índice
Mensagem da autora
Sinopse
PlayList
Capítulo 1
Capítulo 2
Capítulo 3
Capítulo 4
Capítulo 5
Capítulo 6
Capítulo 7
Capítulo 8
Capítulo 9
Capítulo 10
Capítulo 11
Capítulo 12
Capítulo 13
Capítulo 14
Capítulo 15
Capítulo 16
Capítulo 17
Capítulo 18
Capítulo 19
Capítulo 20
Capítulo 21
Capítulo 22
Capítulo 23
Capítulo 24
Capítulo 25
Capítulo 26
Capítulo 27
Capítulo 28
Capítulo 29
Capítulo 30
Capítulo 31
Capítulo 32
Capítulo 33
Capítulo 34
Capítulo 35
Epílogo
Agradecimento
Outras obras
Redes Sociais
Mensagem da autora

Querida leitora, muito obrigada pelo carinho e pelo interesse em


minha obra.

A uma história de Maria e Felipe é cheia de gatilhos emocionais.


Uma mulher que foi traída por quem ele mais protegia e de um homem que
não é perfeito, mas fará de tudo para protegê-la.

O romance deles aborda; relacionamento abusivo familiar,


decepções, traições, recomeços e claro muito amor e paixão. Eu não
romantizo nenhum desses tópicos.

Desejo que se encantem com a história dessa mulher que como uma
flor de lótus negra, vai renascer depois de ser jogada na lama...
Sinopse
Manuela Souza sempre sonhou em ser mãe e ter um casamento feliz. Ela
não media esforços na busca por seus objetivos, e acreditava estar no
caminho certo. Até perceber que tudo desmoronaria.

Entre revelações, surpresas e decepções, Manu conhece Felipe, um homem


mais velho e sedutor que a faz esquecer de todo o sofrimento que a afligia.

O instinto protetor de Felipe é aflorado diante da fragilidade de Manuela.


Contudo, o CEO calculista e vingativo tem muito a esconder da jovem
mulher que inesperadamente se tornou sua protegida.

E, quando a verdade vem à tona, Manuela precisa decidir entre acreditar no


homem que se tornou sua tábua de salvação ou afastá-lo de vez de sua vida.
PS: Esse livro é recomendado para maiores de 18 anos, contém cenas de sexo explícito,
gatilhos emocionais para pessoas sensíveis, pois há cenas de violência.
PlayList
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Spotify, basta clique aqui → PlayList
Capítulo 1

Manuela

Acordo com o coração acelerado.

— Que sonho maluco! — murmuro, passando as mãos pela cama e


encontrando-a vazia.

Sento-me ainda aérea e depois rio baixinho, fazendo um meneio


negativo de cabeça.

— Não surta, Manuela! Só porque você sonhou que seu marido


estava te traindo, não significa que realmente está! — Bufo, me levantando
e buscando o robe.

O dia hoje será agitado, pois iremos receber um convidado especial,


Felipe Sampaio, CEO da Sampaio Construções, uma das maiores empresa
do ramo imobiliário do país. Não o conheço, sequer vi uma foto, dizem que
o homem é muito reservado, talvez porque é uma das pessoas mais ricas do
país. De todo modo, minha sogra e meu marido estão ansiosos para recebê-
lo, e eu não estou poupando esforços para que a noite seja perfeita.

Sigo distraída para o banheiro, mas paro abruptamente quando ouço


a voz sussurrada do meu marido.

Prendo a respiração, volto a caminhar devagar na intenção de ouvir


melhor, tomando o cuidado de não fazer barulho, e sinto um frio na espinha
quando o ouço falar para alguém:

— Não se preocupe, querida. Nós vamos dar um jeito.

Arregalo meus olhos e levo uma mão à boca para impedir um grito.
Por sua vez, ele continua:

— Acho que ela acordou, nos falamos depois — diz rapidamente.

Volvo meu corpo, querendo voltar para a cama, mas acabo caindo.

— Droga! — xingo, ainda atordoada pelo que ouvi.

— O que houve? — indaga Jonas se aproximando de mim com um


olhar desconfiado.

Não seguro seu olhar, não consigo, ali está explícito tudo o que ele
queria me esconder. Em uma atitude covarde, eu abaixo a cabeça, evitando
confrontar e tentando, de forma desesperada, formular uma desculpa em
minha mente.

— Você caiu? — aponta o óbvio, já que estou sentada no chão com


a mão no meu tornozelo, olhando para baixo.
— Sim — murmuro já me levantando, ainda sem querer olhar para
ele, fitando meu pé como se a dor fosse insuportável, quando, na verdade, o
que me incomoda é o bolo na minha garganta, o aperto em meu peito e a
confusão em minha mente.

— Estava falando com a Sofia, ela é uma das designers da empresa,


todos estão em polvorosa por causa da chegada do CEO — explica,
caminhando em direção ao closet, e eu forço um sorriso.

Era apenas uma colega de trabalho, nada de mais, estou me


preocupando à toa. — Penso, mentindo para mim mesma, tentando me
agarrar a essa justificativa.

— Vamos nos encontrar para alinhar os detalhes dos projetos para o


CEO e estamos torcendo para que ele aprove! — Vibra, alheio à minha
confusão mental.

Balanço a cabeça em um movimento afirmativo e não tento falar


nada, acho que não conseguiria. Tenho que pensar, preciso ficar calma para
digerir tudo o que ouvi. Observo-o se arrumar apressadamente, como se
quisesse sair rápido.

Jonas é um homem bonito, temos a mesma idade, 25 anos; ele tem


1,70m de altura, é negro, magro, de cabelos curtos, olhos castanhos, e muito
elegante, seu sorriso sedutor e cativante me conquistou de imediato.

— Já conversou com o Dr. Guilherme? — meu marido se refere ao


meu advogado.

— Vou me encontrar com ele hoje, mas você precisa entender que
ele está seguindo um pedido da minha mãe — informo, me esforçando para
manter minha voz tranquila.
Minha mãe lutou contra o câncer de mama por muitos anos e como
era menor de idade, antes de falecer, ela fez um testamento nomeando Dr.
Guilherme, seu amigo de infância e meu padrinho, como meu tutor legal.

Ela deixou uma herança considerável que me oferecia uma vida


confortável. Naquela época, eu já pintava, cheguei até a expor meus
quadros em uma galeria. Então, mesmo depois de atingir a maioridade,
preferi mantê-lo cuidando de tudo, não queria me preocupar com dinheiro,
pois preferia focar nas minhas pinturas e terminar a faculdade de Belas
Artes.

E essa decisão não mudou depois de me casar, pois meu padrinho


nunca foi a favor do meu casamento e até hoje tenta me alertar sobre Jonas.
Não levei a sério, sempre achei que ele estava exagerando.

— Eu acho um absurdo! Somos casados há mais de cinco anos, eu


quem deveria cuidar de tudo ao seu respeito! — exclama meu marido,
saindo do quarto.

Reparo que ele deixou o celular em cima da mesinha ao lado da


cama. De forma ágil, pego o aparelho e desbloqueio a tela. Olho
rapidamente para a porta com o coração batendo acelerado, com medo de
que ele entre a qualquer momento, mas a curiosidade grita dentro de mim.

Acesso a galeria e levo uma mão à boca ao ver várias fotos dele com
uma mulher loira, alta e muito bonita; em algumas, eles estavam abraçados,
se beijando na cama e, em uma delas, ela está nua.

Ouço passos se aproximando e, com as mãos trêmulas, fecho o


aplicativo, travo o aparelho e devolvo ao lugar em que peguei.

— Esqueci meu celular — comenta ao entrar no quarto.


Ele pega o aparelho e logo em seguida volta a sair sem sequer me
dirigir um olhar.

Dou alguns passos e paro na frente do espelho, deslizo o robe até


que o tecido caia no chão e fito meu próprio reflexo. Não sou uma beldade,
mas gosto do meu corpo, minha pele é negra, sou baixinha, tenho 1,59m de
altura e um corpo mignon, com curvas suaves e discretas; meus cabelos são
cacheados e longos, meus olhos castanhos e lábios grossos que sempre
carregam um sorriso, mas que agora tremem.

Fungo enquanto vejo uma lágrima deslizar pelo meu rosto, a deixo
correr livremente e a acompanho até pousar em meu peito.

Percorro meu corpo com minhas mãos, meus seios pequenos, a


cintura fina, o quadril estreito...

— Talvez se eu tivesse ido mais à academia e ganhado mais


músculos, aumentado minhas coxas ou minha bunda — sussurro enquanto
arfo.

Analiso cada detalhe do meu corpo, julgando e procurando


imperfeições, e paro com a mão na minha barriga.

— Se tivesse conseguido engravidar ou se não tivesse sofrido tantos


abortos...

Abraço minha cintura e deixo o pranto me tomar.

— Chega! A culpa não é minha! Nos últimos cinco anos, me doei a


ele e sua família.

Respiro fundo e limpo meu rosto com raiva.


— Não vou me torturar, nem justificar, não ouvi errado, e as fotos
confirmaram minhas suspeitas — verbalizo.

Mas é tão mais fácil falar do que agir...

Fecho meus olhos e respiro fundo algumas vezes, caminho devagar


em direção ao banheiro e tomo um banho sem pressa. Enquanto me arrumo,
decido que não seguirei com este casamento, não vou conseguir. Em minha
mente, surgem vários questionamentos:

Há quanto tempo eles estão juntos?

Por que não percebi antes?

Ou melhor, por que ignorei todos os sinais?

Eles estavam ali, bem na minha cara. Não fazemos amor há mais de
cinco meses. Ele estava a cada dia mais irritado, distante. E eu, inventando
desculpas, achando que era estresse no trabalho. Seu pedido constante para
passar meus bens para o seu controle e a recusa do meu padrinho também
estavam em evidência.

— Acho que vou ficar louca! — grito, enfiando a cabeça debaixo da


água fria, me permitindo chorar.

Algum tempo depois, saio do quarto à procura de Jonas, e somente


então me recordo de que hoje vamos oferecer um jantar para vários
convidados, entre eles, o CEO da empresa que meu futuro ex-marido
trabalha.

— A última coisa que eu preciso agora é de um CEO em minha


vida! — resmungo, olhando minha sogra andar agitada de um lado para o
outro.
— Manuela, sei que você entende o quanto a visita do Felipe
Sampaio, é importante para a nossa família, ele é um dos empresários mais
influentes e ricos do país tudo aqui tem que estar perfeito! Portanto,
verifique como estão as coisas na cozinha — Raquel, mãe do meu marido,
ordena.

Mordo meu lábio para conter uma resposta e, por fim, apenas
assinto, giro meu corpo e caminho devagar até o outro cômodo. Contratei
um buffet sofisticado para que o jantar seja perfeito. Normalmente, estaria
olhando cada pequeno detalhe para garantir que nada desse errado, mas
hoje quero apenas ficar quieta e pensar no que vou fazer da minha vida.

— Pelo amor de Deus, Manuela! O que está havendo com você? —


Raquel ralha, passando por mim e indo conferir como está a cozinha.

— Está se sentindo bem, Manuela? — Jonas me fita com um vinco


na testa.

Me casei nova demais, tinha apenas vinte anos quando me apaixonei


por ele, ambos fazíamos faculdade. Com poucos meses de namoro,
engravidei, mas infelizmente perdi o bebê. Tenho endometriose, e entre os
problemas da doença está a dificuldade em engravidar. Por isso, essa não
foi minha única perda e todas foram devastadoras, perdi a vontade de pintar
e tranquei a matrícula da faculdade. Nos últimos cinco anos, sofri sete
abortos e senti cada perda, cada luto me devastou física e emocionalmente.

Sinto saudades da forma como me olhava, amoroso, apaixonado,


como se eu fosse a pessoa mais importante de sua vida.

Ele não me olha mais assim; as rugas em sua testa já não são de
preocupação sobre como estou.
Quando isso mudou?

— Está no seu período? Se for para ficar com essa cara no jantar, é
melhor nem sair do quarto — avisa.

Como pensei, seu receio é de fazer feio na frente do CEO.

Talvez, em um outro momento, imaginaria que ele está me tratando


assim porque está estressado. De fato, justifiquei diversas vezes esse
comportamento para mim mesma.

Ele está estressado.

Ele se aborreceu no trabalho.

Ele está irritado.

Viro-me, pego um copo, o encho de água quase até a borda e fico


observando algumas gotas caírem nele e imaginando qual será a gota que o
transbordará. Na minha vida, a gota que me fez acordar foram palavras
sussurradas e uma galeria cheia de fotos de encontros furtivos.

— Manuela, estou falando com você! — Jonas vocifera.

— Ela está aérea — minha sogra comenta, irritada. — Logo hoje


que vamos receber um dos homens mais ricos do país em nossa casa. —
Bufa.

Forço um sorriso, estou tão acostumada a fazer isso que é


automático e, por alguns segundos, me pergunto: há quanto tempo venho
sorrindo sem notar, fingindo que está tudo bem, que o modo como estão me
tratando não está me magoando?

Quando foi que me tornei tão dependente emocionalmente deles?


Conheci Jonas em uma época que estava me sentindo muito triste e
sozinha. Meu padrinho Guilherme, e sua esposa, Bruna, haviam viajado e,
depois do sucesso da minha primeira exposição e a venda de todos os meus
quadros, eu estava sofrendo muita pressão de como seriam os próximos.

Ele chegou de mansinho, tomando meu coração aos poucos e


quando engravidei, sua mãe foi tão carinhosa que me fez lembrar da minha,
e em pouco tempo eles, junto com seu irmão Rodolfo, a esposa Juliana e a
sobrinha Cristina se tornaram minha família.

— Precisamos conversar — digo com firmeza, girando meu corpo e


o fitando. Ele e sua mãe param o que estão fazendo e me olham.

Não costumo usar esse tom de voz, sou calma, equilibrada, falo
suavemente, de forma carinhosa e sempre evito conflito.

— Seja lá o que for, pode esperar. Hoje é um dia importante,


Manuela. Se o CEO aprovar os projetos de Jonas, ele ganhara muito
prestígio na empresa. — Minha sogra abranda o tom de voz e tenta me fazer
mudar de ideia.

Ela dá alguns passos em minha direção.

— Você não quer que nada estrague este dia, não é mesmo? — Sorri
enquanto acaricia meu ombro. — Seja lá o que for, nada é mais importante
que o jantar, e você tem que autorizar alguns pagamentos.

— Pagamentos? O buffet que eu contratei cuidaria de tudo —


questiono, confusa.

— Eu tomei a liberdade de contratar uma florista para decorar o


ambiente de forma mais refinada, o buffet ficará responsável somente pela
comida. Ah! Também contratei um pianista, afinal, precisamos de música.
Você não imagina o quanto isso nos deixará felizes, esta noite será perfeita!
— Sorri, exaltante, me deixando atordoada.

— Estou atrasado, Manuela, nos falamos depois da festa. E não se


esqueça de ir ao advogado!

Tento protestar, mas Jonas sai sem me dar a chance de falar mais
nada.
Capítulo 2

Manuela
Perco a noção de quanto tempo fiquei olhando para a porta que
Jonas saiu, mas algo que minha sogra fala chama a minha atenção.

— Precisamos reformar esta cozinha. De agora em diante, nós


ofereceremos mais jantares, e ela se mostra muito pequena. Na verdade,
precisamos nos mudar para uma casa maior, vi que, no final do condomínio,
está à venda uma mansão maior que esta. Seria perfeita para nós.

Eu em meio ao caos emocional; e ela sonhando com uma cozinha


maior.

— O que você acha de falar com o seu advogado para liberar


recursos para comprarmos? Ela tem dez quartos, eu já olhei por dentro e
achei linda! Seu marido precisa de um lugar à altura da sua nova posição —
sugere.

Levo minhas mãos às minhas têmporas, inspiro profundamente e


solto o ar devagar. Mas, antes que consiga falar algo, minha sobrinha
Cristina me chama.

— Titia! — A criança me abraça pelas pernas e me oferece um


sorriso enorme.

Sem pensar duas vezes, me abaixo e a abraço. Ela é filha de


Rodolfo, irmão mais velho de Jonas, e Juliana, sua esposa. Eu amo tanto
essa criança, e sei que ela retribui o carinho.

— A Cris estava ansiosa para chegar aqui e te ver — Juliana


comenta, cumprimentando a mim e a nossa sogra.

— Minha neta é muito linda e educada. — Raquel beija as


bochechas da pequena. — Em breve, talvez tenhamos mais um bebê em
casa, não é mesmo, Manuela? Quem sabe a sua próxima gestação não
vingue. Ah! E como seria interessante criar uma criança em uma nova casa!
— sugere, me fazendo engolir em seco. Gestação é um assunto delicado
para mim, e ela sabe disso.

— Vocês vão se mudar? Não acabaram de reformar a cozinha? —


Juliana inquire, me olhando.

— Não... — balbucio, ainda atordoada com tudo.

— Ainda bem que você chegou mais cedo, Juliana, assim me ajuda
a organizar tudo. Manuela hoje está muito avoada — diante da minha
negativa, Raquel volta a reclamar.
— Está tudo bem, Manu? — minha cunhada questiona, preocupada.
Sempre nos demos bem, ela sempre foi carinhosa e amorosa comigo.

— Ela deve estar naqueles dias, ou deve estar para entrar — Raquel
sugere em um tom irritado.

Juliana a ignora, segura minha mão e me fita com o cenho franzido.

— Manu, o que está acontecendo? — insiste.

— A única coisa que está acontecendo é que temos um jantar


importante hoje e as flores ainda não chegaram, e o pianista, então, nem
sinal! — A mais velha eleva as mãos, exasperada.

— Pelo amor de Deus, cale a boca! — Juliana reprende nossa sogra,


que a fita indignada, mas minha cunhada volta seu olhar para mim.

As duas vivem discutindo, pois, ao contrário de mim, Juliana é o


tipo de pessoa que não engole desaforo de ninguém e, como Raquel é
autoritária, nunca se deram muito bem. Sempre tento apaziguar as brigas,
mas hoje nem forças tenho para isso.

Juliana tem 30 anos, ela é uma mulher linda, ruiva, alta, com um
corpo escultural. É daquele tipo de pessoa pronta para uma boa briga, que
nunca corre de uma discussão. Já minha sogra é loira, está com 60 anos, é
uma mulher altiva e autoritária, com seus cabelos pintados de preto e um
porte sofisticado, não aparentando a idade que tem.

Abaixo o corpo na altura de Cristina e cochicho ao seu ouvido para


ir ver televisão na sala. Ela fita sua mãe e sua avó, revira os olhos, faz uma
cara engraçada e caminha para o outro cômodo emburrada.

E as duas seguem brigando.


— Você me respeita! — Raquel ordena.

— Então se dê ao respeito! Será que ficou cega e não percebeu que


a Manuela não está bem? — Juliana ralha, apontando para mim.

— Ela nunca está bem! — nossa sogra devolve no mesmo tom.

— Não seja injusta! Se vocês estão oferecendo este jantar ou sequer


têm esta casa, é por causa dela! — Juliana pontua.

— Você ama jogar isso na minha cara! — Raquel aponta um dedo


para Juliana.

— É sempre bom te lembrar de quem paga as contas — Juliana


rebate.

— Ora, sua... — Minha sogra abre a boca, mas eu a interrompo.

— Pelo amor de Deus, parem! — grito, e as duas me olham.

Eu sou o tipo de pessoa que nunca levanta a voz, meu tom é sempre
manso e suave, mas, neste momento, minha cabeça está a ponto de explodir,
eu sequer sei como ainda estou de pé.

— Juliana, eu não estou bem — confirmo, e ela me observa


preocupada. — E acho que vai levar um bom tempo até que esteja. — Mal
consigo segurar as lágrimas.

— Vamos sair daqui. — Minha cunhada segura minha mão e me


puxa para fora da cozinha.

— Aonde vocês vão? Temos várias coisas para resolver...


— Manu já contratou o buffet completo, você apenas tem que
monitorar tudo, nós vamos sair e, quando ela estiver bem, voltaremos —
decreta.

— O que está acontecendo aqui? Vocês estão discutindo de novo?


— Rodolfo, irmão de Jonas, inquire.

— Meu filho, elas estão saindo e tem várias coisas para resolver.
Manuela tem que autorizar os pagamentos da florista e do pianista. Eu já
tenho certa idade, preciso de ajuda. — Raquel muda completamente seu
tom de voz ao se dirigir ao filho.

— Sua mãe, como sempre, é um amor de pessoa — Juliana soa


irônica ao marido.

— Juliana... — Ele até tenta, mas ela não o deixa terminar.

— Seu filho está aqui, pede para ele te ajudar e pagar a florista e o
pianista. — Indica o marido, depois segura sua gravata, puxando-o para
próximo de si, e o beija rapidamente. — Vou sair para conversar com
Manuela, depois nos falamos — avisa.

— Leve Cristina — ele pede, ao que ela assente e me leva para fora
da cozinha.

— Você não precisava fazer isso — comento, encostando a cabeça


no banco do carro.

— Precisava, sim! — salienta, ligando o veículo.

Resolvo ficar em silêncio enquanto Juliana nos leva até a praia de


Ipanema. Ela ama o mar, perdi as contas de quantas vezes viemos aqui e eu
a ouvi desabafar sobre o relacionamento com a nossa sogra.
Paramos em um quiosque em que tem vários brinquedos infantis,
Cristina ama este lugar! Compramos água de coco e, mal nos sentamos,
minha sobrinha pergunta se pode brincar com as crianças, ao que sua mãe
assente sorrindo.

Por alguns bons minutos, não falamos nada, apenas observamos a


pequena brincar, é era como se Juliana estivesse me dando tempo para
desabafar.

— Eu vou me divorciar — solto depois de um longo suspiro.

— Por quê?

— Descobri que Jonas está me traindo — revelo e prendo a


respiração por alguns instantes. Elevo a cabeça e fixo meus olhos nas
nuvens, o céu hoje está como meu interior, cheio de nuvens escuras,
deixando tudo embaçado e confuso, e não controlo as lágrimas que descem
por meu rosto.

— Aquele cretino teve coragem de te trair depois de tudo o que você


fez por ele e pela mãe dele? — soa indignada.

— Sim.

— Quando descobriu?

— Hoje de manhã. — Solto uma risada triste. — Eu sonhei que


estava sendo traída e, quando fui ao banheiro, ouvi ele falando com uma
mulher. Fiquei tão atordoada que nem consegui questionar, quando ele saiu
do quarto, verifiquei seu celular e vi várias fotos dele com uma loira. Em
algumas delas, eles estavam se beijando ou ela estava nua na cama.

— E o que você fez depois de ver as fotos?


— Nada, não consegui falar nada.

— Como assim “nada”?

— Ele ficou falando sobre meu advogado, que era um absurdo ele,
como meu marido, não controlar minha herança. Enquanto isso, minha
cabeça estava explodindo. Eu não conseguia acreditar que ele tinha feito
isso! Naquele momento, eu perdi minha voz, mas, quando lembro, eu só
sinto raiva, muita raiva.

— Espero que não o perdoe!

— Não vou!

— Sabe que sempre pode contar comigo, não sabe? Estarei sempre
ao seu lado.

— Ele é seu cunhado.

— E você é minha amiga! Só Deus sabe se eu ainda estaria casada


se não fosse por todas as vezes que me escutou, só você sabe o quanto
estive perto de jogar tudo para o alto. Raquel é manipuladora e controla os
filhos.

— Nisso, tenho que concordar.

— E me deixa louca o quanto você concorda com tudo, eles se


aproveitam de você porque é boa demais. Isso me dá um ódio!

— Evite brigar com Raquel por minha causa.

— Se eu não fizer, quem vai fazer? Esse era o papel do seu marido.
Quando me lembro do quanto você é carinhosa, amorosa, gentil e faz de
tudo pelo bem daquele safado... — Bufa, indignada. — Me desculpe a
explosão, estou com tanta raiva, isso é tão injusto!

Ela me abraça e acaricia minhas costas.

— Ah, se fosse comigo, eu dava para o primeiro homem bem bonito


e gostoso que aparecesse na minha frente! — Segura meu rosto. — Você
deveria se vingar, tirar a casa e o carro das mãos deles e pôr um belo par de
chifre nele!

— Meu Deus, Ju! — Pela primeira vez no dia, eu sorrio e limpo


minhas lágrimas.

— Eu faria um inferno na terra, mas você é doce demais para isso.


Você sabe que meu casamento com Rodolfo foi por conveniência.

— Isso no começo, agora vocês se amam.

— Sim, mas, no começo, foi meio que um acordo comercial. Meu


pai tinha o dinheiro; e eles, o nome. — Ela balança os ombros. — Enquanto
meu pai fazia fortuna, a família do meu marido ia à falência, foi um bom
acordo, ambos conseguiram o que queriam, meu pai quitou todas as dívidas
deles, e meu marido pôde fazer a faculdade de psiquiatria que tanto queria.

Ela olha para sua filha e sorri.

— Por uns sete anos, mal nos víamos, ele tinha sua vida, e eu, a
minha, até que, em uma noite regada a muito álcool, tudo mudou entre nós.
Alguns meses depois, fiquei grávida. A gestação não estava no acordo, acho
que primeiro engravidei e depois nos apaixonamos e decidimos rasgar o
contrato.

— Eu acho sua história tão romântica!


— Mas, para garantir minha felicidade, eu tive que exigir ao meu
marido que nós comprássemos uma casa e morássemos sozinhos, porque
aquela mulher inferniza a minha vida! — Ela bufa, e eu rio pela forma
como ela comenta.

Sei cada detalhe dessa história, e acho que ela a está repetindo
apenas para me distrair e me fazer sorrir, e eu a admiro mais por este gesto.

Ingiro um longo gole da água de coco e ela continua:

— Em pouco tempo, nossa sogra e Jonas, dois gastadores natos,


ficaram sem dinheiro, e foi nessa época que ele te conheceu. — Ela faz um
meneio negativo com a cabeça.

— Eu não me importei de ajudá-los, eu o amava e estava grávida.


Mas agora só quero ficar longe dele e me curar.

— Espero que você não desista do divórcio. Ele não te merece,


venho há anos falando isso.

— Não vou desistir, essa foi a gota que transbordou um copo quase
cheio. Por meses, venho arrumando desculpas pela forma como ele vem me
tratando.

— Fico feliz por estar agindo e decidindo algo por você e para você,
mas triste por ter se magoado no processo.

Ela segura minha mão, e eu assinto.

— Obrigada.

— O que você pretende fazer de agora em diante? Quer dizer, qual é


o seu próximo passo? Além do divórcio, claro.
— Primeiro, vou conversar com Guilherme, tenho uma reunião com
ele daqui a pouco; depois, pretendo conversar com Jonas, ele saiu tão
apressado que não consegui falar com ele.

— Vai falar mais o quê? Deixa seu advogado agir! — Juliana não
esconde a raiva.

Eu a abraço forte, não sei como serão as coisas de agora em diante,


mas sei que posso contar com ela.
Capítulo 3

Manuela

Adentro o escritório do meu padrinho e advogado, e ele me recebe


com um abraço.

— Me desculpe por te fazer esperar, estava em uma reunião —


esclarece, me convidando a sentar.

— Tudo bem. — Sorrio antes de me acomodar.

— Confesso que minha intenção era de esperar até mudar de ideia e


desistir de passar uma procuração para Jonas. — Meu padrinho não esconde
o seu desagrado com meu marido.

Ele solta um suspiro e estica um documento em minha direção.


— Está aqui, este foi o documento que menos gostei de redigir —
reclama. — Eu conheci sua mãe quando tínhamos dez anos, fomos amigos
a vida inteira.

— Eu conheço essa história, você foi apaixonado por ela. —


Ofereço um sorriso carinhoso.

— Mas ela escolheu seu pai, e a vida seguiu seu rumo. Me casei,
não tive filhos, mas, quando você nasceu, ela me convidou para ser
padrinho. Fiquei ao seu lado quando seu pai morreu e, quando ela ficou
doente, prometi que cuidaria de você.

— O senhor sempre me deu apoio — asseguro. — E não precisa se


preocupar com este documento.

— Finalmente desistiu dessa loucura de fazer uma procuração para


o seu marido? — indaga, exaltante.

— Ela não será mais necessária, porque vou me divorciar —


informo, fazendo-o me fitar com o cenho franzido.

— Você está falando sério? — inquire, abrindo um largo sorriso.

— Sim.

— Por qual motivo?

— Descobri hoje que ele está me traindo — revelo, constrangida.

Odeio esse sentimento, não fui eu que errei, não deveria sentir
vergonha, mas sinto.

— Aquele desgraçado! Nunca deveria ter permitido que você se


casasse com ele.
— Estava grávida e apaixonada, ninguém conseguiria me impedir.

— Mesmo assim, poderia ter me esforçado mais.

— Se tem algum culpado nesta história, sou eu, não você.

— Em que você é culpada?

— Deveria ter percebido antes, pois, pelo que descobri, o caso entre
eles já dura alguns meses.

— Não pense assim, Manuela. Só espero que não volte atrás em sua
decisão de se divorciar.

— Não voltarei — afirmo sem desviar meu olhar do dele.

— Então posso rasgar este documento? — Aponta para o papel com


um sorriso enorme.

— Sim, e pode dar entrada no divórcio. Quero que tudo se resolva o


mais rápido possível!

— Perfeito! — comemora.

— Também gostaria de comprar um apartamento para mim.

— Por que você compraria um apartamento se o lugar em que você


mora é seu? Por acaso está pensando em deixá-lo para o seu ex-marido? Se
sim, saiba desde já que não vou permitir!

— Guilherme...

— Não, nem pensar. — Faz um meneio negativo com a cabeça. —


Você gastou uma pequena fortuna naquela mansão, seu futuro ex-marido
não tem direito ao seu dinheiro e aos poucos bens que te restaram. Pelo
menos uma coisa eu consegui: que você se casasse com separação total de
bens. Não que isso tenha sido de grande ajuda, pois, para ajudá-lo, você
usou praticamente toda a sua herança.

Essa informação me faz prender a respiração. Para ser sincera,


Guilherme vem me alertando há muito tempo, mas não quis lhe dar
ouvidos, julguei que ajudar Jonas em seus projetos era o meu dever como
esposa.

— O dinheiro que eu tenho não daria para comprar um apartamento


pequeno? — indago, receosa.

— Você não tem uma grande soma em dinheiro no banco, mas


recebe aluguéis de três salas comerciais, também tem cinco imóveis na zona
norte que não estão alugados, mas nenhum deles é residencial, então, no
momento, eu não aconselharia comprar um imóvel.

— Mas a minha mãe... — Não concluo a frase.

— Manuela, nos últimos anos, eu venho te alertando sobre essa


situação. Você pagou viagens com valores exorbitantes para sua sogra,
comprou uma mansão e a reforma saiu uma fortuna, fora os carros, roupas
de grifes e relógios que seu marido ama exibir.

— Sempre gostei de vê-los felizes.

— Para mim, parecia que estava completamente cega e surda, já que


não ouvia os meus conselhos.

— Me desculpe.

— Não se desculpe, pelo menos você acordou, e fico feliz que tenha
sido antes de passar a procuração para ele. Como lhe disse, restam os
imóveis comerciais, eles lhe garantirão uma boa renda, portanto, apesar de
que não viverá mais em meio a tantos luxos, terá uma vida digna.

— E esse foi um dos pontos de maior discordância entre nós, ele


exigia uma procuração para cuidar dos meus bens. Como pude ser tão cega!

— Usurpador desgraçado! Nos últimos cinco anos, você sustentou a


ele e sua mãe, e todas as vezes que nos encontrava, você forçava um
sorriso. Na última vez que perdeu um bebê, eu cheguei ao hospital e te
encontrei sozinha, chorando, e minha vontade foi de dar um murro naquele
homem, mas você sempre dava uma desculpa por ele — explode.

E eu abaixo a cabeça, porque não tenho o que argumentar, ele não


disse uma única mentira.

— Me desculpe — pede, se levantando, contorna a mesa e me puxa


para um abraço. — Prometa que desta vez vai me deixar cuidar de tudo? —
indaga, ainda me abraçando.

— Sim.

— Então, você vai voltar para a sua casa, e eles que vão sair!

— Guilherme, não sei se consigo!

— Você terá que ser forte. E, principalmente, me mantenha a par de


tudo o que acontecer, eu prepararei os documentos do divórcio e nós
faremos uma reunião o mais rápido possível. Aconselho você a pôr a
mansão à venda e aí, sim, comprar um apartamento e investir o valor
restante.

— Tudo bem, farei como você diz, mas pelo menos hoje não quero
voltar para lá, tem um jantar importante para o Jonas e...
— Minha doce criança, você é tão boa que, mesmo magoada, ainda
está pensando em não prejudicar quem te machucou.

— Eu sou uma idiota, não é mesmo? — Abaixo a cabeça.

— Você tem bom coração.

Meu padrinho solta um longo suspiro.

— Você sabe que pode ficar na minha casa o tempo que quiser,
Bruna te adora e vamos amar te receber — sugere, se referindo à sua
esposa.

— Obrigada, mas prefiro ficar sozinha. Eu tenho que lidar com a


situação, mas não sei se quero voltar para lá. Posso ficar em um hotel sem
comprometer a minha renda?

— Claro que sim, Manuela. — Solta um suspiro.

— Fiquei bastante assustada agora que me dei conta da realidade,


por isso a pergunta.

— Você tem um saldo razoável na sua conta, o que não dá é para


manter os altos gastos, vou lhe passar tudo por e-mail. E não se preocupe,
vou resolver tudo, fique em um hotel por uns dias, mas é imprescindível
que não passe disso, algo me diz que Jonas não aceitará o divórcio.

— Apenas quero que tudo termine para seguir em diante.

Ele me olha por alguns segundos, faz menção de falar algo, mas
desiste, assente e me despeço dele com a promessa de que me ligaria no dia
seguinte para conversarmos novamente sobre o divórcio. Na saída do
escritório, recebo uma ligação de Juliana.
— Manu, como você está? Como foi a conversa com seu advogado?
— questiona assim que atendo.

— Foi tudo bem, Guilherme me conhece desde criança, ele ficou


preocupado e com um pouco de raiva, também me disse que torrei boa parte
da minha herança e que, no momento, só conseguirei comprar um
apartamento se vender a mansão. Ah, Ju! Como pude me deixar nesta
situação? Meus pais trabalharam tanto para que eu não me preocupasse com
dinheiro — respondo, melancólica, enquanto aperto o botão para chamar o
elevador.

— Eu posso te ajudar, não se preocupe com dinheiro. E esse é o


sentimento que todos que te conhecem e gostam de você irão experimentar
ao descobrir essa situação. O que você vai fazer agora? Está voltando para
cá? — indaga.

Sinto um nó se formar na minha garganta com a mera possibilidade


de voltar para casa. Parece que estou pisando em areia movediça, me sinto
afundar lentamente. Primeiro abri meus olhos para a traição e agora para o
que eu fiz com minha herança, e não posso culpar a ninguém além de mim
mesma, pois eles pediram, mas eu poderia ter negado, poderia ter falado
não, mas era como se essa palavra não existisse no meu vocabulário.

A cada vez que sofria um aborto, eu queria morrer com meu bebê, o
sentimento de impotência e incompetência me agarrava de tal forma que
não sentia vontade de fazer mais nada e, nesses momentos, sempre ouvia
que deveríamos viajar para esquecer, ou comprar algo bonito, seja carro,
joias, ou até mesmo uma mansão.

Acreditava que tudo o que fazia não era para Jonas e sua mãe, era
para o homem que julgava me amar, era para a sogra que vivia conosco. Eu
os queria felizes, não fazia por eles, era por nós, pela nossa família, mas a
verdade é que a felicidade chegava até eles, mas não me alcançava e, nessas
horas, eu forçava um sorriso, porque era a única coisa que poderia fazer.

Agora penso que toda pessoa tem que ter um limite para se doar,
deveríamos ter algo que alertasse no exato momento em que estivesse
ultrapassando a barreira, como um semáforo vermelho piscando, para evitar
que fosse além, que nos magoássemos, nos feríssemos, nos arrebentássemos
inteiros por dentro.

— Eu, neste momento, me sinto uma idiota por não ter percebido
antes o que estava acontecendo. Meu Deus, eu fazendo planos para
reacender nosso casamento, pensando em viagens, ignorando as ligações de
Guilherme enquanto ele queria me alertar de que meu dinheiro estava se
esvaindo, e eu arcava com os luxos deles. Fui uma completa insana!

Tomo fôlego quando sinto meus olhos arderem.

— Passei tanto tempo fingindo não ver a frieza que ele me tratava,
disfarçando com problemas do trabalho.

A porta do elevador abre, e eu sequer noto quem está dentro de tão


envolta em minhas memórias que me corroem por dentro.

— A culpa não foi e nunca será sua.

— Mas eu deveria ter percebido. — Fungo e perco a luta contra as


lágrimas. — Não quero voltar hoje. Para ser sincera, não quero mais ver
Jonas, acho que sou capaz de agredi-lo.

— Finalmente a raiva está começando a tomar conta, se agarre a ela,


tire essa noite, dias, ou o tempo que for necessário para você se estabilizar.
— Obrigada. — Limpo meu rosto, mas as lágrimas insistem em cair.

— Você quer que eu fique com você? Dou uma desculpa aqui e vou
te encontrar.

— Não precisa, você já saiu comigo. Vou ficar bem, não se


preocupe — falo firme, tentando transmitir uma perseverança que de fato
não sinto.

— Tem certeza?

— Sim. Qualquer coisa, te ligo.

— Promete?

— Sim.

— O que você vai fazer agora?

— Vou a uma loja comprar algumas roupas e me hospedar em um


hotel.

— E vai sair para jantar!

— Tudo bem, vou sair para jantar.

Termino a ligação e meus olhos voltam a se encher de lágrimas


quando me lembro que há muito tempo não saio para jantar e que, em todos
os jantares românticos que planejei, meu marido deu uma desculpa e não
foi.

— Uma mulher tão linda como você não deveria chorar assim. —
Me surpreendo ao ouvir uma voz forte e rouca.
Levanto minha cabeça e noto que tem um homem no elevador
comigo, eu sequer havia notado antes.

Ele eleva uma mão e me oferece um lenço. Não sei o que me deixou
mais surpresa, o fato de me oferecer um lenço ou de ter um lenço. Faço um
meneio de cabeça e aceito, notando que o tecido é branco com uma linda
flor de lótus negra.

— Uma flor lótus negra — murmuro.

— Poucas pessoas reconhecem essa flor. — Reparo que há certa


admiração em seu tom de voz.

E isso me faz sorrir.

— Diz a lenda que ela nasce na lama, mas é um símbolo de pureza,


renovação e vida eterna, mas, nunca foi comprovado que a lótus negra
existe de fato — sussurro enquanto acaricio a flor bordada no lenço de seda
branco, causando um contraste lindíssimo.

— Estou impressionado. — Seu tom de voz forte volta a chamar


minha atenção, e eu finalmente o observo.

Ele é alto, bem alto mesmo, a ponto de eu ter que levantar a cabeça
para fitar seus olhos azuis, bem claros, seus cabelos são pretos, com alguns
fios brancos, sua pele é clara, sem barba, e, ao redor dos seus olhos, percebo
algumas marcas de expressão que em nada diminuem a sua beleza.

O homem é lindo!

Desço meu olhar para seus lábios finos e reparo que sorri de lado,
provavelmente achando graça da minha avaliação minuciosa. Constrangida,
desvio dele e limpo meu rosto com as mãos.
— Não vai usar o lenço que te dei? — indaga, apontando para o
tecido.

— Ele é lindo demais para sujar com maquiagem. — Sorrio,


devolvendo o delicado objeto, mas ele recusa.

— É seu. Espero que na próxima vez que nos encontrarmos você


esteja sorrindo. — Sai do elevador, deixando um perfume marcante no ar.

— Nossa, que homem bonito! — solto, impressionada.

Acaricio o lenço em minhas mãos e abro um sorriso.

— Ele me fez sorrir e, por alguns momentos, me esqueci do quão


caótica minha vida está.
Capítulo 4

Manuela
Após passar em algumas lojas e comprar peças de roupas e lingerie,
me hospedo em um hotel em Ipanema, de frente para a praia. Assim que
entro no quarto, jogo as bolsas no sofá próximo à cama e me aproximo da
janela. A vista é linda! Estamos no verão, a praia está lotada, o céu azul e as
pessoas felizes, caminhando e se divertindo.

— Agora entendo por que Juliana gosta tanto de ir à praia, é


revigorante ver pessoas felizes andando de um lado para outro. — Respiro
fundo. — Há quanto tempo eu não sou feliz — sussurro, me afastando da
janela.

Me jogo na cama, pouso um braço no meu rosto e fecho meus olhos,


tentando afastar todos os pensamentos recriminatórios da minha mente.
Quero silenciar as acusações que estou me fazendo, não desejo me sentir
assim, sei que a culpa não é minha por meu marido ter me traído, contudo, a
culpa foi minha por deixá-lo me tratar de forma tão vil.

Não consegui conter as lágrimas, também não percebi quando


adormeci, mas acordei no susto com o toque do meu celular. Me arrasto da
cama e, ainda sonolenta, me sento no sofá e vasculho minha bolsa em busca
do aparelho, atendendo sem sequer ver quem está me ligando.

— Alô — falo e, em seguida, solto um bocejo.

— Onde você está? — O berro de Jonas me desperta


completamente.

Olho ao redor, momentaneamente atordoada, e demoro alguns


segundos para me lembrar de onde estou. Fito a janela e reparo que já
anoiteceu, me dando conta de que dormi por algumas horas.

— Estou hospedada em um hotel — respondo após me recompor.

— Você ficou doida? — inquire, irritado.

— De forma alguma, para ser sincera, acho que só agora estou sã.
— Tento soar calma.

— Que merda você está falando, Manuela? — berra, me fazendo


afastar o aparelho da orelha.

— Nós precisamos conversar — começo, mas ele me interrompe.

— O que você precisa é voltar para casa agora! Em uma hora, o


CEO chegará com sua noiva, como você pôde deixar minha mãe fazer tudo
sozinha? — recrimina.
— Ela não fez nada sozinha, contratei um buffet, que cuidou de
tudo, o máximo que ela fez foi verificar se tudo estava correndo bem —
rebato, firme.

E ele fica em silêncio por alguns segundos, com certeza ficou


surpreso, não costumo usar esse tom de voz. Está acostumado com a mulher
mansa, calma e obediente que sempre fui.

Nunca mais serei assim.

Nunca mais permitirei que me tratem mal.

Eu tenho que aprender a me pôr em primeiro lugar e tenho que


começar agora.

— Manuela, não importa o que houve, mas você tem que voltar
agora, você vai me deixar sozinho em um momento importante, sabe o
quanto estou ansioso para conhecer o CEO e o quanto ele pode ajudar na
minha promoção? Você sabe o quanto estudei, me preparei e ansiei por este
momento, então como pode sequer pensar em não estar ao meu lado para
me dar apoio? — Suaviza o tom de voz, e eu fecho meus olhos,
reconhecendo a tentativa de manipulação.

E mais uma vez meus olhos se enchem de lágrimas, minha garganta


aperta e uma parte de mim se sente culpada, mas balanço a cabeça para
afastar esse sentimento.

— Não vou mais permitir que você faça eu me sentir assim —


sussurro.

— Me diga onde está que envio um carro de aplicativo para te


buscar — insiste, como se não tivesse ouvido o que falei, ou ouviu e
simplesmente ignorou.

— Não vou voltar, Jonas, pelo menos não hoje, talvez daqui a
alguns dias, quando resolver as coisas dentro da minha cabeça nós
poderemos conversar.

— Que porra você está falando, Manuela?

— Eu sei de tudo! — solto em um grito amargo. — Sei que está me


traindo. — Não consigo controlar as lágrimas.

Não era assim que eu queria falar sobre isso, pretendia conversar,
pôr um ponto-final na nossa história e seguir em frente.

— Sabe do quê? Não faço ideia do que você está falando. Pare de
besteira e venha para casa agora!

— Jonas, como você pôde!

— Isso é mais um sintoma da endometriose, seus hormônios estão te


abalando mentalmente?

— A única pessoa que me abala mentalmente é você. Eu quero o


divórcio!

— Você está louca!

— Não me chame de louca! — Rosno.

— Está completamente desequilibrada, me fale agora onde você


está!

— Você não ouviu o que eu disse? Eu quero o divórcio, sei que está
me traindo.
— Você só pode estar delirando, por acaso bebeu? De onde tirou
uma loucura dessas?

— Pare! Apenas pare! Não adianta negar, porque eu vi!

— Isso não faz nenhum sentido. Vamos, me diga onde está, estou
realmente preocupado.

— Meu Deus, Jonas! Eu vi as fotos no seu celular!

— Que fotos? Meu celular só tem coisas da empresa.

Faço um meneio negativo com a cabeça.

— Como pode ser tão sonso?

— Meu amor... — Novamente muda seu tom de voz, e eu explodo


de vez.

— Não me chame assim, nunca mais me chame assim! —


esbravejo.

Desligo o telefone sem lhe dar chance de falar mais nada.

— Meu Deus! Como ele pode fingir que não está com alguém? —
Aperto minhas mãos com tanta força que meus dedos ficam brancos, minha
vontade é de arrancar meus cabelos.

Meu celular volta a tocar e pego-o com a raiva correndo solta pelo
meu corpo.

— Seu desgraçado! — solto e levo minha mão à boca quando ouço


a voz calma de Juliana.

— Manuela? — ela soa preocupada.


— Me desculpe, pensei que era Jonas.

— Vocês brigaram?

— Sim. Acredita que ele teve a coragem de me dizer que me


enganei, que eu estava delirando? Juliana, eu sei o que ouvi, sei o que vi! —
Fecho meus olhos, tentando adquirir algum controle.

— Manu, se acalme, é isso que todo homem safado, narcisista e


manipulador faz, desequilibra a mulher, a faz parecer doida e depois ainda a
faz se sentir mal, quando, na verdade, ele que é o culpado.

— Eu estou tão indignada!

— Onde você está?

— Segui sua sugestão, comprei algumas peças de roupa e me


hospedei em um hotel — revelo e inspiro profundamente. — Pretendo
jantar, dormir e esquecer tudo isso.

— Comprou algum vestido?

—O quê? — questiono, confusa com a pergunta sem sentido.

— Você comprou algum vestido? — insiste.

— Sim, algumas peças, pretendo ficar aqui alguns dias, vou tomar
um banho e dormir até esquecer tudo o que houve.

— Pois vai tomar banho, pôr um vestido e jantar fora.

— Juliana, não quero sair do quarto.

— Quer ficar pensando no idiota do seu ex-marido?


— Ele é seu cunhado.

— Não muda o fato de ser um idiota.

— Nisso, tenho que concordar com você.

— Manuela, não pense mais nele, sei que é difícil, mas tente tirar o
foco. Vai jantar em um lugar bonito, ver gente linda, depois volta e
descansa — aconselha, e eu sorrio, sentindo o carinho em sua fala.

— Para ser sincera, aconselho que você faça sexo com o primeiro
gostoso que ver.

— Jesus, Juliana! — Gargalho.

— Estou falando sério.

— Pior que eu sei que está. — Não consigo controlar a risada. —


Obrigada por me fazer rir.

— Não estou falando de fazer amor, de conexão, estou me referindo


a sexo gostoso, quente, passar a noite sem pensar em problemas, focando
apenas no prazer e depois nunca mais ver a cara do homem — insiste.

— Eu nunca fiz isso na minha vida, não teria coragem.

— Pois deveria.

— Isso seria pagar na mesma moeda — recrimino.

— É exatamente isso, só que, no seu caso, seria sexo de vingança.

Volto a rir.

— Obrigada, Juliana, por me fazer rir em um dia tão complicado.


— Quantas vezes você fez isso comigo nos últimos anos! Me passa
o seu o endereço por mensagem que amanhã eu vou te buscar para
almoçarmos e conversarmos mais.

Nos despedimos e envio para ela o endereço do hotel e o quarto no


qual estou. Jogo o telefone na cama e sigo para o banheiro, tomando um
banho demorado. Confesso que choro um pouco debaixo do chuveiro, não
tinha como ser diferente, hoje meu dia foi uma montanha-russa de emoções
e decepções, sequer sei como ainda estou de pé depois que todo o castelo
perfeito que criei durante anos foi destruído, quebrado em tantos pequenos
pedaços que seria impossível reconstruir.

Eu posso estar muito confusa, magoada, com raiva, mas, desde que
soube da traição, nunca pensei em perdoá-lo. A partir do momento em que
absorvi e confirmei com as fotos, algo se quebrou dentro de mim.

Volto para o quarto vestida com um roupão, decidida a me deitar na


cama e dormir até o incômodo no meu peito passar, até minha mente parar
de me torturar, mas, no caminho para a cama, desvio e sigo para janela, a
abro e solto um suspiro ao ver as pessoas caminhando. Mesmo à noite, a
orla do Rio de Janeiro é movimentada.

Movo minha cabeça, fito a cama, volto a olhar para a janela e a


vontade de estar no meio de pessoas sorridentes me pega em cheio.

— Quem sabe este peso em meu peito não alivia se sair e andar um
pouco — sussurro, decidida a não ficar na cama chorando e sofrendo.
Capítulo 5

Manuela
Fecho meus olhos, forçando meu corpo a se mover. Mal coloquei
meus pés para fora do hotel e tive vontade de entrar novamente, mas me
contive e segui em frente. Atravessei a rua com passos pequenos e
hesitantes, mas não parei, não podia parar.

O vento quente da noite de verão acaricia minha pele, inspiro, sorrio


e vejo as pessoas caminhando, rindo, se divertindo. E quero sentir isso,
quero essa felicidade, mas, por dentro, sinto que tudo desmoronou. Não sei
por quanto tempo andei, quantos rostos sorridentes vi enquanto em minha
mente passavam os últimos anos que vivi, o quanto me doei, o quanto
ignorei as coisas ao meu redor, o quanto me anulei e me machuquei no
processo.
A traição é algo corrosivo, ela machuca e destrói todos os
sentimentos bons que temos. Ontem à noite, eu estava fazendo planos para
reacender meu casamento e planejando um jantar para o chefe do meu
marido, uma pessoa que nunca vi na vida, apenas para fazer Jonas feliz e
hoje eu nem quero o ver na minha frente.

— Eu não aguento mais pensar nisso! — Bufo, parando


abruptamente e levando a mão à cabeça.

Giro meu corpo rápido com a intenção de retornar ao hotel e vou ao


encontro de um corpo, batendo meu rosto em um peito másculo.

— Oh, me desculpe! — peço, desviando, sem ao menos olhar o


rosto da pessoa, e fazendo uma careta com a mão na testa.

— Você se machucou? — A voz grossa e profunda me faz virar o


rosto.

— Flor de lótus... — sussurro, reconhecendo o homem que me deu


o lenço hoje mais cedo.

— Desculpe, não entendi — soa confuso.

— Nada. Enfim, desculpe o esbarrão — falo, constrangida.

Desvio o olhar dele e respiro fundo com a intenção de desviar e


seguir em frente, mas sua fala me para.

— Você está bem? — insiste.

Miro seu rosto e reparo num vinco na sua testa, demonstrando


preocupação, e algumas marcas de expressão na sua face que em nada
diminuem a sua beleza.
Bem? Eu não estou nada bem.

Sinto uma vontade de sumir, de dormir até essa dor e angústia


passarem, vontade de chorar baixinho enrolada debaixo do cobertor. Sinto
um bolo na garganta, mas não falo nada disso e faço o que sempre costumo
dizer e fazer.

— Estou bem. — Sorrio após um longo suspiro.

Ele me avalia por algum tempo com o cenho franzido e depois sorri
de lado, e eu vejo em seu olhar que me reconheceu.

— Você tem algo que é meu. — Levanta uma sobrancelha.

— Mas você me deu o lenço. — Movimento os ombros.

Ele abaixa o olhar, morde o canto dos lábios e depois volta a me


fitar.

Esses movimentos foram rápidos, mas o suficiente para mostrar que


este homem exala sensualidade.

— Tem razão, eu te dei. E disse que na próxima vez que nos


víssemos você estaria sorrindo, apesar de este sorriso não parecer sincero,
mas nunca imaginei que se jogaria em meus braços. — Pisca um olho
matreiro, me fazendo soltar uma gargalhada, desta vez sincera.

— É a segunda vez que você me faz sorrir hoje.

— Por que está triste?

— Porque quebraram meu coração — desabafo sem tirar o sorriso


do meu rosto, sem desviar o olhar e sequer sei por que falei, apenas saiu e
nem passou pela minha cabeça segurar.
— O coração é um órgão muscular oco, não tem como ser quebrado
— soa sério.

— Forma figurativa de falar. — Bufo, movimentando os ombros.

— Agora você está sorrindo, prefiro você assim. E na próxima vez


em que nos encontrarmos, estará com um lindo sorriso no rosto.

— Nem sei por que revelei isso, nem te conheço, não temos
intimidade o suficiente para comentar algo tão íntimo, sequer sei seu nome,
mas acho que é melhor assim. — Rio pela situação.

Ele abre um lento sorriso, daquele tipo que te convida a sorrir junto,
que cria rugas ao redor dos olhos e te transmite uma sensação gostosa, é o
que estou sentindo agora. Existem pessoas que são assim, têm uma energia
tão boa que nos fazem sentir bem, mesmo mal as conhecendo.

— Talvez seja por causa da flor de lótus negra, ela criou uma
ligação entre nós — sugere.

— Talvez. — Abaixo a cabeça e chuto uma pedra imaginária. —


Bem, desculpe pelo esbarrão. — Aceno e giro meu corpo com a intenção de
ir embora.

— Não vai me dizer seu nome? Assim, na próxima vez em que nos
encontrarmos, poderíamos nos cumprimentar.

— E quem disse que vamos nos ver novamente? — indago, mas,


para ser sincera, gosto da atenção que ele me dá.

Essa é a segunda vez que o vejo e, nas duas vezes, ele me fez
esquecer o quão triste estou.
— Eu não tenho a menor dúvida disso — decreta.

— Por acaso é um profeta? — zombo, fazendo-o gargalhar.

Neste meu dia tão caótico, esse homem desconhecido foi o ponto de
calmaria em meio ao caos. Nas duas vezes em que estava a ponto de
desabar, ele apareceu. Talvez seja a minha mente fantasiosa e romântica
querendo, ansiando por uma fuga da realidade, ou talvez, apenas talvez, ele
seja um anjo enviado para me fazer sorrir em um dos dias mais tristes da
minha vida.

— Seu sorriso é lindo — elogia, mas não devolve o sorriso, apenas


me observa em silêncio, e eu não consigo decifrar o seu olhar.

Achando que já tomei demais o seu tempo, solto um suspiro antes


de me despedir.

— Foi bom te rever, obrigado por me fazer sorrir.

— Você já vai? — Faço menção de me virar e mais uma vez ele me


para.

— Sim, tenho que voltar para o hotel. — Afirmo movimentando a


cabeça.

— Não vai me dizer o seu nome? — insiste, sem tirar o sorriso do


rosto.

— Manuela — revelo. Até penso em dizer um nome falso, mas


desisto.

— Somente Manuela? — questiona, e sinto meu sorriso se desfazer


aos poucos.
Daqui a algum tempo, não serei mais Manuela Torres Fonseca
Souza, voltarei a ser Manuela Souza. No momento, não me sinto mais
casada, contudo, ainda não legalizei a situação.

— Apenas Manuela — afirmo por fim, desviando meu olhar dele.

— Meu nome é Felipe... — começa, mas eu o interrompo,


levantando as mãos.

— Vamos apenas dizer nossos primeiros nomes.

— Por quê? Gosta de mistérios? — inquire, elevando uma


sobrancelha.

Notei que este é um movimento que ele faz com frequência, vindo
acompanhado de um sorriso matreiro.

— Não, apenas prefiro assim. Como disse, acho difícil nos


encontrarmos novamente.

— Já que na sua opinião será nosso último encontro, aceita


caminhar um pouco no calçadão comigo?

Desço mais uma vez meu olhar e vejo que ele veste terno e gravata
muito refinado e sua sofisticação destoa completamente das outras pessoas
que caminham pelo calçadão. E, parecendo que pouco se importa, coloca
uma mão no bolso e me fita com atenção.

Esse homem atiça a minha curiosidade.

— Você parece estar atrasado para um compromisso importante —


sondo.
— Na verdade, eu faltei a um compromisso enfadonho. Prefiro
caminhar com você.

— Vestido assim, no calçadão? — Aponto, rindo.

— Estou muito confortável e não me importo com a opinião alheia,


mas, se preferir, podemos ir para um restaurante.

— Por que você quer caminhar comigo? — indago, curiosa.

— Porque você disse que eu te fiz sorrir, e hoje isso era algo que eu
precisava ouvir.

— Alguém também quebrou seu coração?

— Não, eu não acredito nisso, mas alguém feriu o meu orgulho —


soa sincero e sem sorrir, e eu apenas assinto e escolho não fazer mais
perguntas.

— Eu estou a mais ou menos quarenta minutos do hotel em que


estou hospedada. Se quiser, pode caminhar comigo até lá, mas é o caminho
inverso ao que você estava fazendo.

— Não tem problema, meu motorista e o segurança estão próximos,


eu volto com eles — informa, apontando para um carro preto estacionado
do outro lado da rua.

— Então é uma pessoa importante? — questiono em um tom de


brincadeira.

— Quer saber quem eu sou? — devolve no mesmo tom.

— Não! — nego, rindo.


— Você está hospedada em um hotel? — questiona.

— Sim. — Limito-me a dizer e o fito, ele morde o lábio inferior


como se estivesse formulando outra pergunta, e eu escondo um sorriso,
gostando cada vez mais da nossa conversa e sem intenção de revelar muitas
informações pessoais.

— Você sempre viveu aqui? — indaga quando começamos a andar.

— Sim, sou carioca da gema — falo com orgulho. — E você?

— Sou de São Paulo. Por que está hospedada em um hotel? — Paro,


ponho as mãos na cintura e o encaro.

— Não decidimos que não perguntaríamos sobre a vida um do


outro?

Ele volta a sorrir e a morder o lábio inferior.

— Então me diga um sonho? — inquire após alguns segundos em


silêncio.

É uma pergunta boba e, para muitos, fácil de responder, mas me faz


segurar a respiração, engolir em seco e desviar meu olhar dele.

Um sonho?

Eu tinha um sonho, ser feliz com a pessoa que eu escolhi me casar,


ter filhos, amar e ser amada.

Nos meus últimos cinco anos, vivi em função desse sonho, mas ele
não existe mais. Perdi cada gestação que tive, meu relacionamento era uma
mentira e ainda não sei o que vou fazer a seguir.
— Não sei mais quais são os meus sonhos. — Solto o ar devagar. Eu
queria não chorar a cada vez que me lembro da traição, queria me manter
forte, mesmo que, por dentro, esteja em frangalhos.

Limpo meu rosto discretamente e noto que ele eleva a mão e me


oferece um lenço assim como fez mais cedo, e este também tem uma flor de
lótus negra bordada.

— Este será o segundo lenço que te dou — murmura, pondo a peça


em minhas mãos.

E assim, mais uma vez, ele me faz sorrir.

— Obrigada.

— Você gosta de vir à praia? — pergunta quando voltamos a andar.


Noto que não me pergunta o motivo pelo qual chorei ou insiste na resposta
sobre sonhos, e meu sorriso aumenta.

— Quase nunca venho.

— Eu achei que você fosse o tipo de jovem que ama passar as tardes
na praia e depois curtir a noite — especula, fazendo-me gargalhar.

— Nem de longe! Sou caseira e tímida demais para passar a noite


curtindo e, para ser sincera, só estou falando com você porque hoje não
estou no meu normal.

— Pois eu acho que gosto do seu anormal.

— Estou começando a achar que eu também. — Sorrio largo. — Por


que você veio à praia? Disse que tinha desistido de um compromisso.
— Devo confessar que estava a caminho desse compromisso quando
algo me impulsionou a pedir para meu motorista parar o carro.

— O quê?

— Como você conhece a lótus negra? — retruca, desviando da


minha pergunta.

— Eu amo todas as flores de lótus, todas as cores e seus significados


me encantam! Eu adorava retratá-las, me recordo de que minha mãe
comprava várias telas e decorava seu escritório com os quadros que eu
pintava delas. Você sabia que a flor de lótus rosa é muito importante, pois
representa o próprio Buda? — questiono, empolgada. Eu não costumo falar
dessa minha paixão com ninguém.

— Sim. Na Índia, as flores de lótus têm um grande significado.

— Nossa, meu sonho é conhecer a Índia! Já fiz algumas viagens


internacionais, mas nunca visitei esse país.

— Por quê?

— Porque eu escolhi realizar os sonhos de outras pessoas em vez


dos meus.

— E valeu a pena?

— Não.

— O que faria diferente?

— Eu acho que ajudaria, mas evitaria me machucar no processo.

— Você é uma pessoa abnegada ou sente algum desejo de vingança?


Eu rio da pergunta.

— E de quem eu me vingaria? Bem, chegamos ao meu hotel. —


Aponto para o prédio do outro lado da rua.

— Queria ficar mais tempo conversando com você. Aceitaria jantar


comigo?

— Hoje não, pois andei mais do que imaginei. Mas foi bom
conversar com você, me lembrar de que gostava de pintar, enfim, obrigada
por me ouvir.

— Então aceita almoçar comigo amanhã? — pergunta com aquele


sorriso faceiro.

— Por quê?

— Pelo mesmo motivo que te convidei para caminhar. Gosto da


sensação de saber que te faço sorrir, você parece uma flor de lótus negra
que eu tive a sorte de achar.

— Uma coisa eu e ela temos em comum: neste momento, minhas


emoções estão na lama.

— Então me dê sua mão e me deixe ajudá-la a emergir e florescer


— oferece, mas não sorri, fala sério.

Eu deveria negar, é uma loucura! Eu o conheci hoje, apesar de vê-lo


duas vezes, uma total insanidade. Porém, nos últimos anos, eu fiz tudo
certinho e vivi de modo que fizesse todos felizes.

Menos eu.
Então, somente uma vez, eu me escolho e cometo a maior insensatez
de minha vida.

— Sim, eu aceito.
Capítulo 6

Manuela
Sorvo um gole de café enquanto me recordo da noite passada, talvez
seja por causa daquele passeio, daquela conversa que consegui dormir tão
bem. Não me arrependo de ter saído ou de ter revelado tanto de mim para
aquela pessoa.

Por causa dele, consegui dormir sem chorar, sem pensar no passado
e fazendo vários planos para o futuro. Quero terminar a faculdade, voltar a
pintar e, quando der, quero visitar a Índia.

Sorrio, pensando em meus planos focados em mim, mas eles


morrem em meus lábios ao ouvir o toque do meu celular novamente.
Escorrego meus olhos para o aparelho em cima da mesa e bufo ao ver o
nome de Jonas na tela.
Não quero atender, não desejo perder esta sensação boa que estou
sentindo, e sei que, quando falar com ele, tudo desaparecerá, e a angústia, a
tristeza e a decepção voltarão a me envolver.

Sei que é uma fuga, uma euforia momentânea, mas, por enquanto,
quero me segurar a ela por mais um dia. Amanhã eu volto para casa e
converso com meu futuro ex-marido.

Mais uma vez meu celular toca e, desta vez, é o nome de Juliana que
aparece na tela, portanto não demoro a atender.

— Bom dia, Juliana! — cumprimento, sorrindo.

— Bom ouvir sua voz animada! Bom dia, como você está?

— Fazendo planos para o meu futuro. Ontem, eu parecia uma barata


tonta e desorientada, hoje estou começando a visualizar um norte, mas sei
que ainda tenho muitas coisas a enfrentar, creio que viverei entre altos e
baixos até me estabilizar.

— E não teria como ser diferente, tudo o que você acreditava


desmoronou.

— Isso é verdade.

— Você vai voltar para casa hoje? Ou resolveu tacar o foda-se e não
pisar mais lá?

— Bem que eu queria, mas não posso, aquela casa é minha, e


Guilherme já disse que não me deixará desistir dela.

— E ele está certo, cada pequena coisa naquela casa foi você que
comprou. Você está precisando de alguma algo?
— Não, estou bem, obrigada por se preocupar.

— Vamos nos encontrar mais tarde?

Me lembro que aceitei almoçar com Felipe, e este encontro é algo a


que quero ir, quero sentir novamente a leveza que ele me proporciona e, por
mais que ame e confie em Juliana, não quero comentar com ela sobre ele,
pois sei que, em breve, Felipe desaparecerá da minha vida e será apenas
uma doce lembrança em tempos confusos e tristes.

— Podemos nos encontrar amanhã? Estou esperando Guilherme me


ligar para me dar maiores informações sobre o processo, além disso, quero
descansar mais um pouco.

— Tudo bem, nos encontramos amanhã. Você quer que eu vá te


buscar?

— Não precisa. Eu estou bem.

Pergunto sobre minha sobrinha e evito fazer questionamentos sobre


as coisas em casa, não quero saber nada, pelo menos até amanhã.

Ponho o aparelho no mudo e vou escolher a roupa que vou vestir


para almoçar com Felipe. Não tenho muitas opções, pois comprei poucas
peças, jamais imaginei que aceitaria almoçar com um quase desconhecido,
como também em momento algum supus que estaria em um quarto de hotel,
me recuperando após saber da traição do meu marido.

Separo um vestido branco simples, sem muitos detalhes, além dele,


comprei um short e uma blusa que usei ontem quando caminhei no calçadão
e um conjunto de lingerie da mesma cor.
Após tomar banho e me vestir, me recordo de que a única coisa que
tenho como maquiagem é um batom vermelho que não sai da minha bolsa,
portanto passo-o nos meus lábios, me olho no espelho e sorrio, gostando da
minha imagem. O vestido não é grudado no corpo, ele tem alças grossas e
corte reto. Junto da sandália da mesma cor, me deu um ar despojado.

— Está bom para um almoço. — Movimento os ombros, me


sentindo satisfeita.

Dou alguns passos até a mesa e pego meu celular, verifico que tem
diversas ligações de Jonas e uma de Guilherme, então escolho retornar à
ligação do meu advogado. Após me questionar como estou, ele começa a
me pôr a par da minha situação financeira.

Ontem ele fez um resumo por alto, hoje me passou o saldo que
tenho no banco, quantos imóveis, valores de aluguéis, as despesas da
mansão, limites do meu cartão de crédito e quanto Jonas e minha sogra
gastam nos cartões em meu nome.

— Tudo que eu relatei, enviei por e-mail. Chego a estar com um


pouco de dor de cabeça, é muito revoltante esta situação.

— Me desculpe por ter lhe dado todo esse trabalho, não tinha
pressa, poderia ter resolvido isso mais devagar.

— Não foi agradável rever certas informações, mas confesso que fiz
tudo com um sorriso no rosto, você não tem noção de quantos anos esperei
por isso, da vontade que eu tinha de te sacudir para você acordar a cada
negativa que me dava quando tentava passar essas informações para você.
Tive pressa por puro medo de você desistir.
— Estava completamente alienada, não tem outra explicação, como
pude não te ouvir? Parece que a paixão tampou meus olhos e ouvidos —
murmuro, sentindo algumas lágrimas caírem.

— Não adianta ficar pensando no que já aconteceu, o importante é


que você acordou antes de perder tudo — aconselha.

— Certo, então, qual é o próximo passo a seguir? — indago após


inspirar fundo, tentando clarear minha mente, mesmo que o aperto em meu
peito continuasse.

— O documento do divórcio já está pronto, vamos juntos falar com


seu marido — oferece.

— Prefiro conversar com ele sozinha primeiro.

— Manuela, eu não acho...

— Prefiro assim, eu quero dar uma chance de acabar com este


relacionamento sem uma briga judicial. Por favor, encaminhe o documento
para o hotel que amanhã volto para casa e entrego a ele.

— Manuela, Jonas já ligou várias vezes para o escritório, querendo


saber se você esteve aqui ontem, se assinou a procuração. Não se preocupe
que nenhuma informação foi passada para ele, aquele cretino não vai
desistir de você tão fácil assim.

— Ele desistiu de mim quando me traiu, meu casamento era tóxico,


a forma que me tratava não era legal. E o mais triste nesta situação foi que
eu só abri meus olhos depois da traição, isso é que mais me chateia. Eu
preciso resolver isso sozinha, por mim, para dar um desfecho, para seguir
em frente com o mínimo de dignidade.
— Você tem certeza disso? Está realmente bem ficando sozinha no
hotel, não prefere vir para minha casa? — pergunta, preocupado.

— Sim, estou. — Sorrio largo com a sua insistência.

— Não quero que pense que será incômodo. Conversei com Bruna
sobre o que está acontecendo, e ela também está preocupada com você.

— Por favor, informe a ela que estou bem — insisto.

— Pedi que esperasse um pouco para te ligar e ela me sugeriu te


convidar para ir para nossa casa.

Uma sensação gostosa se apodera do meu coração, é muito bom


sentir que sou amada, querida, que existem pessoas que realmente gostam
de mim, sem nenhum interesse obscuro. E, neste momento, isso é o que eu
mais preciso.

— Eu agradeço o carinho de vocês, mas volto a dizer, estou bem, é


um processo que tenho que passar, mas vou almoçar com vocês em breve,
gosto demais da Bruna e você sabe o carinho que tenho por você.

— Quero que você entre em contato comigo assim que terminar de


conversar com ele. Você sabe que é a filha que eu não tive, não sabe? —
pede, soando carinhoso.

— Sim, eu sei, sinto muito por todas as vezes que não te ouvi.
Prometo te ligar.

— Não vamos mais pensar no passado. De agora em diante, você


terá uma batalha a enfrentar, tem que tomar muitas decisões e se manter
firme.
— Eu sei, vou seguir todos os seus conselhos, prometo.

— Pois eu acho bom! — fala de um jeito engraçado. Eu gargalho, e


ele continua: — E em relação aos cartões? Posso mandar bloqueá-los?

— Sim, os dois cartões adicionais.

— Perfeito.

— Você teria como mandar o motoboy antes das onze da manhã?

— Tenho sim.

— Obrigada por sempre cuidar de mim, Guilherme. E, por favor,


faça uma pausa até essa dor de cabeça passar, não quero que passe mal por
causa dos meus problemas.

Meu padrinho tem pressão alta e saber que está com dor de cabeça
me deixa preocupada.

— Irei tomar meu remédio de pressão e ficar bem, nada mais me


estressa hoje, estou feliz e ansioso para começarmos e por aquele
desgraçado em seu devido lugar.

Acertamos os últimos detalhes e, após encerrar a ligação, verifico o


e-mail, vejo o saldo no banco e confirmo que posso ficar despreocupada por
enquanto. Mas, quando vi as faturas dos cartões, levei uma mão à boca. O
que mais me chamou atenção foi a quantidade de vezes que o cartão que
está no nome do Jonas foi a joalherias e motéis nos últimos meses.

— Além de me trair, ele usou o meu dinheiro para dar presentes


caros à amante e pagar os motéis a que iam juntos.
Fecho meus olhos por um momento e tento duramente controlar as
lágrimas, mas não consigo, a cada coisa que descubro, me sinto mais idiota
por não ter percebido e por ter me escondido atrás de uma fantasia de um
casamento perfeito que só existia na minha cabeça.

Será que ele sempre me traiu?

Será que nunca me amou?

Será que foi apenas por causa de dinheiro?

— Não, não é possível, nós vivíamos bem, até que... — murmuro.

Jogo o celular na cama e começo a andar de um lado para o outro.

Puxo na minha memória quando foi que deixamos de viver bem,


quando comecei a forçar o sorriso, quando passei a inventar desculpas para
não encarar a realidade.

Volto a me aproximar da cama com a intenção de pegar o aparelho e


pedir a Guilherme que me envie todas as faturas antigas para saber desde
quando ele dá presentes caros para amante, mas paro no meio do caminho,
desistindo da ideia.

Seguro meus cabelos e balanço a cabeça negativamente,

— Do que vai me adiantar agora saber desde quando isso acontece,


apenas vai me torturar mais.

Sigo para o banheiro e me olho no espelho, meus olhos estão


vermelhos, o rosto, banhado pelas lágrimas, e cabelo, desalinhado.

Abro a torneira, encho um punhado de água e jogo no rosto, repito o


processo algumas vezes até sentir minha pele fria. Tapeio a parede com as
mãos em busca de uma toalha e, quando a encontro, enxugo meu rosto e
volto a me olhar no espelho.

Embora esteja sofrendo, tenho que ter amor-próprio e


principalmente proteger o meu coração. Mereço muito mais que isso, me
doei de corpo e alma, mas vou aprender com esta experiência e me tornar
mais forte.

— Nunca mais você vai passar por isso — asseguro, apontando o


dedo para minha imagem. — Nunca mais você vai amar alguém a ponto de
se perder, de ficar cega para tudo ao seu redor! Nunca mais! — prometo.

Saio do banheiro decidida a não pensar mais neste assunto. Meia


hora depois, um mensageiro do hotel bate em minha porta e me entrega os
papéis que meu advogado enviou. Leio tudo e ligo para Guilherme para
esclarecer alguns pontos. Após sanar todas as minhas dúvidas, assino e
envio uma mensagem para Jonas, avisando que voltaria para casa amanhã e
que precisaríamos conversar. Em seguida, silencio o aparelho, não quero
ver mais suas ligações ou mensagens, assim que ele reparar que os cartões
foram bloqueados, ficará doido atrás de mim.

Passo o restante da manhã na varanda, observando o mar e tentando


relaxar. Por volta de uma da tarde, recebo uma ligação do hotel avisando
que Felipe está me aguardando no hall do hotel. Por alguns segundos, penso
em dizer que desisti de encontrá-lo. Por fim, eu respiro profundamente
antes de sair do quarto e o encontrar.

Felipe se aproxima assim que me avista e noto que franze o cenho


ao me ver, e eu faço algo que sei fazer muito bem, forço um sorriso,
fingindo que está tudo bem.
— Demorei muito? — indago, risonha.

Mas ele não sorri, me fita sério, analisando meu rosto com cuidado
e, ao terminar, fixa seus olhos nos meus.

— Você está bem? — sua voz soa receosa enquanto analisa meu
rosto.

— Claro. — A resposta vem no automático, com um sorriso largo e


uma postura rígida.

— Hoje há uma tristeza que não havia em seu olhar ontem. Não,
para ser sincero, ela estava ali, só que bem escondida, o que a fez emergir
novamente? — insiste, ainda me fitando com atenção.

Engraçado como meu marido, com quem eu convivi por cinco anos,
não sabia reconhecer quando meu sorriso era forçado ou não, mas um
homem que conheci ontem consegue perceber. Notar isso faz meus olhos
pinicarem, um bolo se forma em minha garganta e respiro fundo antes de
responder.

— Você parece ser bom em analisar as pessoas — murmuro sem


fitá-lo.

— Somente quem me interessa — sua voz soa branda.

— E você se interessa por mim? — questiono, elevando a cabeça e


fixando meus olhos nele.

— Mas do que você possa imaginar. — Dá um passo em minha


direção e para perto de mim, bem pertinho, a ponto de sentir seu perfume,
uma fragrância marcante como ele.
— Então hoje, apenas por hoje, me ajude a esquecer — peço em um
fio de voz.

— Apenas por hoje? — indaga com uma sobrancelha levantada.

— Sim, sem questionamentos, sem falar sobre dores e mágoas,


apenas quero a leveza de almoçar com uma pessoa agradável e que me faz
sorrir.

Ele passa mais alguns segundos me observando, depois me oferece


o braço, pisca um olho e, em silêncio, saímos do
hotel.
Capítulo 7

Manuela
De todos os lugares que imaginei que Felipe me traria, um iate não
estava entre as opções. Com certo receio, aceitei entrar na luxuosa
embarcação quando ele me estendeu a mão e me pediu para confiar nele.
Assim que entramos, deu partida, e eu aproveitei para olhar ao redor.

Reparei que a área do convés é espaçosa e projetada para oferecer


todo conforto possível, o espaço interior é elegante e oferece privacidade,
com três pavimentos, grandes janelas de vidro, uma ampla área de
sofás, espaços para banho de sol, além de área gourmet. O iate é elegante,
confortável e grita exclusivo por todos os lados.

Foco no homem que está pilotando, hoje ele veste camisa e bermuda
brancas. Felipe é o tipo de homem que se destaca em qualquer lugar que
esteja, ele deve ter por volta de 1,80 de altura e seu corpo é bem
constituído, provavelmente resultado de genética com academia.

Me surpreendi por seus braços e pernas serem fortes, era óbvio que
ele era alto, mas a maioria das pessoas é mais alta que eu, contudo, todas as
vezes que o vi, ele estava de terno, e isso me deu uma visão errônea do seu
corpo, reparei que a camisa de manga curta e a bermuda revelaram braços e
pernas fortes.

Ele vira o rosto para mim rapidamente, pisca um olho e volta a


atenção para frente.

— Vou parar daqui a pouco, estamos quase chegando ao lugar que


quero ir e depois almoçamos — informa.

O que não mudou, de ontem para hoje, foi o impacto que o seu rosto
marcante causa, sem barba e com penetrantes olhos azuis. Seus cabelos são
pretos, com alguns fios brancos, ele os mantém para trás, mas, às vezes,
alguns fios caem em sua testa, lhe dando um ar maroto e atrevido. Perdi as
contas de quantas vezes tive vontade de perguntar sua idade, mas desisti,
manter esse clima misterioso me dá a sensação de que estou vivendo uma
aventura parecida com os livros que amo ler.

Felipe é um charme, não posso negar, o seu sorriso é um enigma, às


vezes ele vem fácil, largo, cativante, em outras vezes, vem com uma pitada
de malícia, audacioso, e tem aqueles momentos que não sorri, apenas me
olha como se soubesse tudo que se passa em minha alma.

Sacudo a cabeça, afastando os pensamentos, o conheço há muito


pouco tempo para ele me olhar e saber por todas as merdas que estou
passando.
— Tudo bem — respondo por fim, desviando meus olhos dele.

Ele é um homem maduro, por volta dos 35 a 40 anos, envolvente e


carismático, e é óbvio que é rico, muito rico.

Por que um homem desses perderia seu tempo comigo?

Quando me viro para questionar, noto que o iate parou.

— Chegamos — anuncia, animado.

Olho ao redor e vejo algumas ilhas de diversos tamanhos e


formatos.

— Onde estamos? Não tem nem meia hora que saímos? —


questiono, curiosa.

— Aqui é chamado de As Sete Ilhas. A Redonda é aquela pequena


rochosa de formato arredondado. A Ilha Cagarras está aqui na frente. Como
pode ver, é a maior de todas. Aquela ali ao lado é a Filhote de Cagarra,
aquela ali é a Ilha de Filhote de Redonda, é a menor do conjunto. Aquela
outra grande é a Ilha Palmas. Aquela estreita e alongada é a Ilha Comprida
e, a mais afastada, é a Ilha de Rasa — informa, apontando para as ilhas.

— Eu nem sabia que este lugar existia — comento, impressionada.

— Essas ilhas têm acesso restrito por serem reprodução de aves


marinhas, por isso é um local calmo, privativo e perfeito para passar um
tempo agradável.

— Você me trouxe para o meio do nada, por acaso tem más


intenções a meu respeito?
— Não estamos no meio do nada, tem várias aves nos olhando. —
Sorri matreiro, apontando para as ilhas, e volta a sua atenção para mim. —
E, quanto a você, eu só desejo coisas boas. — Pisca um olho, sorrindo de
lado, e estende a mão para mim. — Vamos, vou te mostrar o iate, minha
ânsia de vir para cá e ficar sozinho com você era tanta que fui indelicado e
não lhe mostrei tudo.

— Tudo bem, mas já vi tudo por aqui. — Giro o dedo, dando de


ombros.

— Então vou te levar lá embaixo.

Aceito sua mão e o acompanho ao pavimento inferior. Lá, há duas


cabines e dois banheiros, cada cômodo sofisticadamente decorado.

— Você quer dar um mergulho ou prefere almoçar?

— Eu não trouxe biquíni, não imaginava que viríamos para um


lugar assim.

— Caso queira, pode nadar com roupa, com lingerie, ou nua,


estamos só nós dois aqui.

— Eu prefiro almoçar — falo, rápido e constrangida, e ele solta uma


gargalhada.

— Vamos ver o que o meu chefe preparou para nós. — Sigo-o até a
área gourmet. — Ele preparou meu prato favorito, lagosta à thermidor
acompanhada de arroz branco — explica após pôr as travessas na mesa,
puxando a cadeira para mim.

— O aroma está delicioso — elogio enquanto ele me serve e logo


depois me oferece uma taça de vinho branco.
— Realmente delicioso — declara após experimentar.

— Há quanto tempo você sabe pilotar um iate? Confesso que isso


me surpreendeu, pensei que teria um profissional fazendo isso. Para ser
sincera, ele é tão grande que não sei como conseguiu fazer isso sozinho.

— Não se preocupe, sou habilitado. Apesar de grande, consigo


navegar sozinho quando o trajeto é curto, e preferi não ter mais pessoas
aqui, porque queria privacidade, não queria dividir sua atenção com mais
ninguém. — Me fita tão intensamente que desvio o olhar

— Percebi, parece que navega há muitos anos — sondo.

— Querendo saber a minha idade, Manuela? — questiona com um


meio-sorriso, me fazendo engasgar.

— Não, imagina. — Sorvo um longo gole do vinho e desvio meus


olhos dele.

— Tenho 42 anos e tenho habilitação amador desde os meus 25


anos, gosto de fazer as coisas sozinho. Para ser sincero, amo ficar sozinho,
mas isso é algo bem difícil no meu dia a dia.

— Por quê?

— Curiosa ao meu respeito, posso ser curioso também?

— Não — respondo, rindo.

— Hum, então gosta mais de receber do que de dar?

— Eu não disse isso.


— Não tem importância, estou amando satisfazer suas vontades,
fique à vontade e me pergunte o que quiser.

Mesmo estando muito curiosa, em vez de questionar, me mantenho


em silêncio.

— Ainda não consigo definir sua personalidade, e isso me intriga,


pois normalmente é algo que assimilo no primeiro contato com as pessoas.
Contudo, percebo alguns traços. Você é meiga e amável, mas também é
curiosa, aventureira e intrigante.

— E te disse ontem que não estou normal. — Sorrio sem fitá-lo. —


Em dois dias, minha vida foi virada de ponta-cabeça, e coisas que estava
ignorando foram esfregadas na minha cara sem dó nem piedade. Não sou
uma pessoa agressiva, eu apenas quero esquecer, apagar da minha memória
que fiz papel de trouxa, que abusaram da minha boa vontade e me culpo por
ter permitido que fizessem isso.

Paro de falar quando minha voz embarga, respiro fundo e continuo:

— Eu sou uma pessoa calma, pacífica, do tipo que cede para não
causar divergência, que pensa mais na pessoa que ama do que em si mesma,
que se doa a ponto de esquecer quem é, de não ver os sinais, que tenta a
todo custo consertar o que não está bom e vai se arrebentando no processo.
Então, neste momento, eu sou uma confusão completa e absoluta!

Perco a batalha contra as lágrimas e limpo meu rosto discretamente.

— Você ainda ama a pessoa que te magoou? — inquire suavemente

Sinto meus lábios tremerem e levo uma mão ao peito.


— Não se arranca um sentimento de um dia para noite, mas a
emoção que me domina é mágoa, raiva, por não ter percebido certas coisas,
e rancor, por ter cedido tanto. — Fungo e tomo um longo gole do vinho.

— É interessante ver que nenhum desses sentimentos é voltado


contra a pessoa que te feriu, e sim a você — julga, me analisando.

— Fizeram porque eu deixei, quero remendar todos os pedaços que


foram danificados dentro de mim e quero ser feliz. Acho que o que mais
está me ferindo é a constatação de que eu não sou feliz há muito tempo,
mas tentava fazer todos felizes ao meu redor. Vivo em uma casa luxuosa,
com pessoas que achei que me amavam, porém agora vejo que estava
errada, e isso é o que mais me magoa. — Respiro fundo e forço um sorriso.
— Este era para ser um almoço descontraído, no entanto, estou desabafando
minhas lamúrias.

— Eu gosto de saber mais sobre a mulher que tanto me intriga.

Pisca enquanto enche a minha taça e me oferece mais um sorriso


avassalador.

— Para não se sentir desconfortável, vou falar mais sobre mim. Fui
adotado aos cinco anos por um casal que tinha duas filhas mulheres de 7 e 8
anos e tinha acabado de perder seu filho com a mesma idade que a minha.
Eles me tiraram de uma situação de extrema pobreza e violência, meu nome
foi mudado para o do filho deles e todo amor que eles tinham pela criança
foi passado para mim.

— E isso é legal?

— Quando se tem muito dinheiro, as burocracias são meros


detalhes.
— E como foi viver com eles? — indago, realmente interessada.

— Fui amado e idolatrado incondicionalmente por eles, não me


recordo da minha família biológica, nem nunca tive interesse em procurar.
Nunca me faltou afeto, me tornei seu filho preferido, o protegido. Contudo,
eu era aquele que tinha de ser o exemplo de perfeição para todos. — Ele faz
uma pausa e enche sua taça de vinho.

— Emergiu como a flor de lótus negra. — Tento descontrair o clima


que ficou pesado e fico animada ao ganhar um sorriso dele.

— Meus pais me moldaram para comandar os seus negócios e para


que quando eles falecessem eu garantisse que minhas irmãs tivessem
nenhuma preocupação com dinheiro. Desde muito novo, eu sabia que
cuidaria de tudo. Estudei em colégios na Suíça e fiz faculdade nos Estados
Unidos e, quando me formei, comecei a trabalhar com meu pai. Ao meu
comando, os negócios prosperaram ainda mais, porém, meus cunhados
também estavam em busca de assumir o controle dos negócios.

— E isso gerou um conflito entre vocês?

— Conflito não é uma palavra que defina a situação, o que gerou foi
uma guerra! Meu relacionamento com as minhas irmãs sempre foi bom,
nunca houve ciúmes ou desavenças, isso até elas se casarem. — Sua
expressão é severa enquanto faz o seu relato. — E só piorou quando meu
pai informou que se aposentaria e me deixaria no controle de tudo, desde
que eu me casasse e tivesse os netos que eles queriam, o que não deixou
minhas irmãs e cunhados felizes. Infelizmente, minhas duas irmãs têm
problemas de infertilidade e não podem ter filhos.
Queria dizer quão errada é esta imposição, mas prefiro ficar em
silêncio, e ele continua:

— Devido às constantes brigas entre mim e meus cunhados pelo


controle dos negócios, uma se divorciou e mora com meus pais. A mais
velha segue casada, pelo menos por enquanto.

— A sua vida é realmente emocionante. E você fez o que seu pai


pediu, se casou e teve filhos porque eles queriam? — indago, curiosa.

— Ainda não me casei, mas até bem pouco tinha uma noiva por
contrato.

E mais uma vez ele me surpreende.

— Você a amava?

— Não, mas firmamos um acordo que era benéfico para ambos, no


qual a fidelidade, respeito e companheirismo estavam inclusos, e eu cumpri
todas as regras, mas ela não.

— Você ia se casar com quem não ama só porque seus pais querem
um neto para você manter o controle das empresas que eles moldaram você
para comandar? — questiono, incrédula.

— Ah, mas não se engane, eu não sou bonzinho e nem uma vítima
indefesa, eu fui implacável com meus adversários, destruí seus negócios e
suas reputações no mercado, coloquei detetives particulares para descobrir
traições e desvio de dinheiro e, sem dó, nem piedade, mostrei para minhas
irmãs. Eu fui o motivo de uma se separar, e a outra estar com o
relacionamento abalado, para proteger o meu patrimônio e as pessoas que
eu amo, não tenho nenhum escrúpulo.
Sua fala me deixa desconcertada, não esperava por isso.

— Você se abriu para mim, e eu estou fazendo o mesmo. Não quero


que me veja como um príncipe encantado. Só quero que saiba que eu
defendo os meus e a minha felicidade se torna plena e absoluta a partir do
momento em que eu me vingo de quem tentou me enganar ou magoou
quem eu amo.

— Por isso que você me questionou ontem se eu me vingaria de


quem me magoou?

— Sim, você mexeu comigo de uma forma que não sei explicar.
Não vou dizer que me apaixonei à primeira vista, porque esta é a fala de um
adolescente, e não de um homem que já viveu muitas coisas. Mas posso
afirmar que você mudou a química do meu cérebro, Manuela, e eu queria te
roubar para mim e garantir que nunca mais ninguém te fizesse chorar, mas,
como não posso, me contento em te fazer sorrir e esquecer, mesmo que por
alguns momentos, o que te magoou.

E ele fez de novo, me fez sorrir quando, há alguns momentos, estava


chorando.

— Eu deveria estar com medo de você, mas sua sinceridade me


deixou mais intrigada ao seu respeito.

— Não precisa ter medo de mim, não farei nada que não queira.

— Interessante, pensei que diria que nunca me magoaria.

— Isso seria impossível, já que todo ser humano é passível a erros e,


às vezes, os erros são irresistíveis e deliciosos. — Levanta uma sobrancelha
e degusta o vinho sem tirar os olhos dos meus. — Mas a verdade é que não
estou sendo completamente sincero com você.

— O que você quer dizer com isso? — indago, confusa.

— Meu nome é Felipe Sampaio, e eu sou, ou melhor, era, o noivo


da mulher que está transando com o seu marido — revela sem tirar os olhos
dos meus, me fazendo perder o fôlego.
Capítulo 8

Felipe
Vejo a mulher à minha frente abrir e fechar a boca várias vezes sem
nada dizer. Observo-a atentamente enquanto lhe dou tempo de absorver a
minha revelação. Manuela é absurdamente linda, não teria outra forma de
descrevê-la.

A primeira coisa que atraiu minha atenção foram seus olhos


castanhos, apesar dos vestígios de uma dor e tristeza e certa melancolia,
eles eram expressivos e marcantes. E eles me atingiram em cheio e
mudaram o curso da minha vingança.

Eu sei tudo sobre a mulher à minha frente, decorei cada detalhe da


sua vida. Minha intenção era de seduzi-la antes de massacrar seu marido, eu
não queria apenas acabar com ele. Para minha vingança ser completa, eu
precisava humilhá-lo, não somente a ele, mas minha até então noiva
também. E o meu plano perfeito e sórdido era foder a mulher dele, demiti-
lo, expulsar minha noiva, cancelar o patrocínio no evento que ela fará e
acabar com a reputação deles no mercado.

Por um mês, eu planejei cuidadosamente minha vingança, fingi que


não sabia da traição e contratei um detetive para vigiar os passos da
Manuela para, no momento perfeito, dar início ao meu plano.

Mas eu não contava que esta pequena mulher me arrebatasse de tal


forma. O instinto de proteção que aflorou em meu íntimo é algo que nunca
experimentei, não menti quando disse que queria roubá-la para mim.

Sei dos seus abortos e de como seu marido e sogra sugam seu
dinheiro e sei também que é o tipo de pessoa mansa, educada e amável, que
evita conflito e é abnegada.

Mas não sabia que o aroma doce dos seus cabelos longos e
cacheados, que moldam seu rosto angelical, me inebriaria a tal ponto que
ficaria desnorteado por alguns segundos. Também não imaginava que seus
lábios fossem tão cheios e convidativos. As fotos que o detetive tirou não
fazem jus à sua beleza. Em seu rosto, ela carrega um sorriso encantador e
um pouco inocente, seu corpo é esbelto, com uma silhueta delicada e
encantadora.

Seu estilo de vestir é discreto, ela não usa roupas que acentuam a
sua beleza ou joias chamativas, apenas uma maquiagem mínima, como se
não quisesse chamar muita atenção. O que é impossível, pois Manuela é
uma mulher marcante, e eu não entendo o que ela viu naquele idiota.
Manuela tem 25 anos, 17 anos mais nova que eu, sou mais
experiente e malicioso, e ela está frágil e magoada, seria muito fácil levá-la
para minha cama, mas o caralho é que eu não quero ser mais uma pessoa
magoando esta mulher! Quero ser aquele a secar suas lágrimas, e eu nem
sei por que este sentimento está me dominando. E por mais que eu tente
arrancá-lo da minha mente, não consigo.

— O que você disse? — questiona, atordoada.

— Não faça isso, não destrua a imagem que fiz de você, sei que está
magoada e ferida, mas é uma mulher inteligente, sei que entendeu o que eu
disse.

— Você disse há pouco tempo que não conseguia me definir, então,


como eu acabaria com a imagem que você tem de mim? — retruca no
mesmo tom.

A pequena e meiga Manu está me mostrando que tem garras.

— Além do mais, nos conhecemos há muito pouco tempo para


sabermos tanto um do outro.

— O nosso encontro no elevador não foi uma coincidência, eu sabia


que estaria ali. Para ser sincero, há pouco mais de um mês eu conheço todos
seus passos e cada detalhe da sua vida — revelo, fazendo-a empalidecer. —
Não estou falando para te assustar, apenas não quero que crie a fantasia de
que sou um homem perfeito, passo longe disso, mas o principal motivo de
estar te dizendo tudo isso é porque eu quero que confie em mim.

— Sequer sei o que pensar, estou tão atordoada que não consigo
raciocinar direito.
— Me faça qualquer pergunta que serei o mais sincero possível.

— O que você quer com tudo isso?

— Eu queria vingança.

— Não quer mais?

— Sim, mas não vou mais usar você para isso.

— Você pretendia me usar? Achou que estava sofrendo pouco?


Tudo que eu acreditava ser real foi bagunçado, revirado e destruído, estou
me segurando para não surtar, para não cair, estou fazendo um esforço
enorme para manter minha cabeça de pé, para não me afundar em um mar
de tristeza e desilusão. Sinceramente, não aguento mais, sempre que acho
que encontrei uma tábua de salvação, me vejo afundar novamente —
desabafa, incapaz de conter as lágrimas.

Manuela se levanta abruptamente da mesa e caminha a passos


trêmulos em direção ao convés.

Eu a acompanho, mas me mantenho a distância, vê-la assim, tão


frágil e sofrendo me faz sentir um amargor em meu íntimo.

— Este foi o motivo pelo qual desisti. Você já sofreu demais —


confesso.

— Acho que estou em um pesadelo. Desde ontem minha vida é uma


montanha-russa de emoções, e eu achei que você fosse um lugar de
conforto, para onde eu fugia da realidade enquanto estava conversando
contigo...
— Quero ser seu porto seguro, por isso estou sendo sincero com
você, e eu nunca sou assim com ninguém que não seja minha família,
absolutamente ninguém!

— Não entendo, por que tudo isso? — Leva as mãos ao rosto.

Penso em me aproximar e segurar suas mãos fortemente e passar a


segurança de que ela tanto precisa, também quero abraçá-la e confortá-la
em meus braços, mas desisto e apenas aperto minhas mãos tão forte que
meus dedos ficam brancos.

— Há quanto tempo você sabe que eles estavam juntos? — indaga


de cabeça baixa, em um fio de voz.

Desvio meu olhar, porque é torturante vê-la assim. Queria sua


explosão, sua raiva, cólera, indignação, mas vê-la oprimida, indefesa, me
corta por dentro. Preferiria vê-la arrancando os cabelos, queria sacudi-la
para vê-la gritando, xingando, me batendo, mas ela parece um passarinho
que foi tão machucado que não aguenta sequer se mexer, quanto mais voar
ou ressoar toda a sua dor.

— Há pouco mais de um mês — confesso após um longo suspiro.


— Desde então, planejei minuciosamente a minha vingança.

Manuela se abraça, se retraindo ainda mais, como se minhas


palavras a tivessem machucado fisicamente, e eu resolvo tirar o band-aid de
uma vez só.

— Eu sei tudo sobre o que aconteceu com você nos últimos anos, as
vezes que foi ao hospital, o descaso do seu marido nesses momentos, as
compras exacerbadas da sua sogra e como aquele safado usa seu dinheiro
para mostrar um luxo que de fato não tem.
— Meu Deus! Como você sabe disso? — Dá alguns passos para
trás, como se estivesse com medo de mim.

— Não precisa ficar com receio, não vou te fazer mal. Acho que, na
sua bolha, sou uma das poucas pessoas que não pretende te machucar.

— Como posso acreditar, você mesmo disse que, até pouco tempo,
queria me usar para se vingar de Jonas.

— Admito, contudo, também disse que havia desistido.

— A cada coisa que descubro, fico mais confusa. — Leva as mãos à


cabeça e mais uma vez tenho vontade de confortá-la, mas, de novo, me
seguro.

Fico em silêncio, vendo-a andar de um lado para o outro com


lágrimas caindo do seu rosto, e engulo em seco, sentindo como se cacos de
vidros descessem pela minha garganta. Ela não solta sequer um murmúrio,
como se tentasse conter tudo dentro de si e as lágrimas fossem as únicas
que não conseguisse segurar.

Do nada, ela para, respira fundo, limpa o rosto e me encara. Seus


olhos estão vermelhos, mas algumas lágrimas seguem descendo pela sua
face, e ela volta a limpá-las, mas insistem em cair.

— O lenço, a lótus negra, também foi planejada? — indaga em um


sussurro.

— Não. Não imaginava que você conhecesse algo sobre a flor-de-


lótus. Nos meus relatórios, não tinha nada sobre isso. A lótus negra, para
mim, significa tudo o que eu era antes de ser adotado e o que me tornei
depois.
— Mas o encontro no elevador foi planejado.

— Não exatamente, o detetive me disse que você tinha ido visitar


seu advogado. Eu estava curioso para te conhecer e queria que aquele
encontro fosse antes do jantar, mas não tive oportunidade, você quase não
sai sozinha de casa. Então, minha intenção era esbarrar com você na porta
do prédio, mas a ansiedade me fez entrar naquele elevador e o acaso fez o
encontro acontecer daquela forma.

Dou um passo em sua direção, e ela dá outro para trás, nos


distanciando.

— O encontro na praia não foi planejado, estava indo para o jantar


na sua casa quando te vi andando. O nosso encontro não saía da minha
cabeça, sequer pestanejei antes de pedir a meu motorista para parar o carro.
Te segui por cerca de quinze minutos sem que você notasse minha presença.

— Por que ainda estava decidindo se iria me usar, ou não?

— Estava apenas confuso com as emoções conflitantes que você me


causava e, quando disse que eu te fazia sorrir...

Faço uma pausa e inspiro profundamente.

— Naquele momento, eu soube que queria te proteger de toda essa


sujeira. Quando te convidei para almoçar hoje, não foi com a intenção de te
seduzir, mas de contar toda a verdade.

— Isso é loucura. Você é um homem milionário e bonito, pode ter a


mulher que quiser, por que se preocupar com uma traição?

— Porque, além do meu ego ter sido ferido, também descobri que
minha ex-noiva, com seu marido, estava passando informações para o
marido da minha irmã com o intuito de me prejudicar e, de certa forma,
conseguiram. Creio que Jonas almejava uma posição mais vantajosa na
empresa; já Sofia, ainda não sei ao certo quais eram as suas intenções e, ao
contrário de você, eu não consigo ter uma atitude pacificadora diante desse
fato. Desisti de te usar, mas não de me vingar.

— Tenho certeza de que vai dar um jeito em relação aos seus


negócios, simplesmente deixe tudo para lá e siga em frente, como estou
tentando fazer, mesmo sendo derrubada por ondas gigantescas a todo
momento.

— Já disse, não consigo ser como você, não era apaixonado, mas
existia cumplicidade e, principalmente, confiança em nosso acordo, traição
era proibida.

— O que você pretende fazer?

— Fazê-los pagar.

— Você não está sofrendo por amor, por que insistir nisso?

— Já expliquei. Ego, honra, orgulho, egoísmo, egocentrismo, dê o


nome que quiser, não me importo — afirmo, soando firme. — Sei que já te
fiz uma pergunta semelhante hoje, mas você está querendo poupá-lo porque
ainda o ama? — Suavizo o tom de voz.

Ela me olha, parecendo chocada com as minhas palavras, e demora


a me responder.
Capítulo 9

Manuela
Estática, é assim que fico com o seu questionamento.

Eu ainda amo Jonas?

A negativa, junto da raiva, vem forte, mas também o ressentimento


e a dor acompanham. É muito sentimento junto, são muitas coisas
acontecendo ao mesmo tempo e me tirando o chão, o Norte.

Cada vez que acho que encontrei uma estabilidade, descubro algo
que me desestabiliza, como se eu estivesse navegando em cima de uma
prancha em um mar revolto, tentando, a todo custo, ficar de pé.

Eu achei que o homem à minha frente fosse como uma tábua de


salvação, uma pessoa fora do meu tormento pessoal, e fiz dele meu lugar de
conforto, o motivo dos meus sorrisos desde ontem, e a sua confissão me
sacudiu tão forte que ainda estou desnorteada e confusa.

Tentando assimilar que este homem à minha frente é o CEO que


Jonas idolatrava há meses, para quem eu passei a última semana pensando
em cada detalhe do jantar que iríamos oferecer para ele, com o intuito de
ajudar o meu marido. Além disso, descobri que meu ex está transando com
a mulher do homem que ele diz tanto admirar, tentando derrubá-lo na
empresa e, pior, tirando o meu dinheiro para sustentar os luxos da amante.

— Ainda o ama? — insiste, me trazendo de volta à conversa.

Demoro a responder, o analisando, tentando entender por que não


desconfiei, por que nenhum alerta ressoou em meus ouvidos, por que, mais
uma vez, fiz um castelo de areia e fantasiei uma linda história de amizade
entre dois estranhos com uma conexão tão forte.

Ele não quer ser meu amigo, sou um dos alvos da sua vingança, um
caminho para o seu objetivo, porém, ao contrário do meu marido, ele teve a
coragem de me dizer a verdade.

— Como disse antes, um sentimento cultivado por tantos anos não


se esvai do nada, mas, a cada descoberta, mais asco eu sinto e mais tenho
certeza de que quero me divorciar — respondo por fim.

—Toda a admiração e respeito que tinha por minha noiva acabaram


quando descobri a traição. — Felipe sequer hesita antes de responder.

— Posso afirmar que agora a mágoa é o sentimento predominante


em meu peito quando me lembro de Jonas. Me sinto como se estivesse em
um pesadelo.
— Pretende perdoá-lo? — indaga suavemente.

— Nunca! Ele me traiu de todas as formas possíveis — asseguro e o


vejo abrir um lento sorriso.

Até uma hora atrás, este sorriso era o que mais ansiava ver hoje, ele
era a certeza de bons momentos longe de toda tristeza que me assolava.
Contudo, agora, não me sinto mais assim.

Levo a mão à garganta, me sentindo sufocada, e me viro de costas,


olhando as ilhas rochosas, e elas já não me parecem mais tão bonitas quanto
antes. O local já não é mais o paraíso que imaginava e a companhia também
não é mais agradável.

Fito minhas mãos e as vejo trêmulas, minha visão fica embaçada


pelas lágrimas, torço-as, tentando obter algum controle, tentando não
desabar, querendo não desmoronar. Meu corpo cambaleia, o pranto sobe à
garganta, tento respirar fundo, fecho meus olhos, desisto de torcer as mãos e
abraço meu corpo, me sentindo sozinha, desamparada e, quando acho que
vou cair, fortes braços me enlaçam.

Seguro a respiração, fungando e tremendo.

— Não vou deixar você cair — sussurra próximo ao meu ouvido.

— Você tirou o último apoio que eu tinha — murmuro.

— Então eu crio algo mais forte e resistente o suficiente para você


se sentir segura. — Aperta o laço, me trazendo para mais perto do seu
corpo.

— Como posso me sentir segura com a pessoa que mentiu para mim
desde o primeiro momento em que encontrei?
— Eu te contei a verdade para você confiar em mim, para que este
detalhe não seja um trunfo nas mãos daqueles que eu quero me vingar.

— Isso não entra na minha cabeça. — Solto um longo suspiro e


somente então reparo que parei de tremer. Me desvencilho dele e me afasto.

— Quero que saiba que, de agora em diante, você conta com minha
proteção e amizade.

— O que pretendia fazer? Como pretendia me usar para se vingar de


Jonas? — inquiro sem olhar para ele, fitando uma gaivota que voa à
distância.

— Pretendia seduzi-la. Acabar com ele não somente nos negócios,


mas também ferir seu ego.

— Pretendia fazer sexo comigo e depois mostrar para ele? —


questiono, horrorizada.

— Não precisaria mostrar, confiava que você mesma diria, você é


franca e honesta demais para esconder algo assim.

— A cada momento, essa história fica mais sórdida. — Levo as


mãos às têmporas, sentindo uma pontada de dor. Quando ele se aproxima,
vou para bem longe dele. — Não me toque! — exijo.

— Quanto mais te conhecia...

— Nos conhecemos há dois dias! — saliento, o interrompendo.

— E, nesses dois dias, você criou uma conexão tão forte comigo a
ponto de me ver como seu lugar de conforto — devolve no mesmo tom.

Ele me faz abrir e fechar a boca, e não consigo retrucar.


— Você mexeu comigo de um jeito que nem sei definir.

— Ontem você disse que não acreditava em amor à primeira vista.

— E não acredito, em momento algum eu disse que estava


apaixonado por você — fala friamente, me fazendo pestanejar.

E ele continua, intercalando um dedo entre nós dois:

— Isso que temos é uma química inexplicável, algo que nunca senti
por nenhuma mulher antes, eu quero te proteger, não quero que nada te
machuque, mas não vou mentir dizendo que me apaixonei à primeira vista,
nunca te enganarei. De mim, você só terá a verdade.

— Você já me machucou.

— Me desculpe por isso, mas eu prefiro que você saiba a verdade


por mim e agora, antes que nos aprofundemos mais nisso que está
nascendo.

— Nada está nascendo aqui. — Imito seu movimento com os dedos.


— A única coisa que temos em comum é que nós dois fomos traídos, e eu
acho que quem mais saiu perdendo nessa história fui eu. Por cinco anos, eu
achei que era amada.

Ele bufa, me fazendo parar de falar.

— Você não era amada! E está desnorteada porque finalmente


entendeu isso — pondera sem um pingo de dó nem piedade, trazendo
novamente lágrimas aos meus olhos e me fazendo ofegar.

Mais uma vez não consigo retrucar, inspiro e solto o ar devagar,


tentando não desabar novamente.
— Eu quero ir embora, desejo voltar para o hotel — peço em um fio
de voz.

— Quero que você se acalme antes de irmos, ou, pior, pensando que
pretendo fazer algo para te prejudicar.

— Preciso tomar um banho frio e ficar sozinha.

— Você quer chorar sozinha e não gritar e arrancar o cabelo do seu


marido ou xingar a amante dele, e isso me irrita.

— E o que essa agressão me beneficiaria? Por que eu a xingaria?


Quem tinha o compromisso comigo era ele, quem me devia respeito era ele,
não ela. Bater ou agredir Jonas não fará a minha dor passar — retruco após
um longo suspiro.

— Mas ajudaria a pôr essa raiva para fora — revida, não


escondendo o quão incomodado está pelas minhas atitudes.

— Iria somente perder a minha razão. — Movo meus ombros, me


sentindo cansada.

— Ainda assim não quero que fique sozinha — afirma.

Meu celular começa a tocar várias vezes, e eu ignoro todas as


chamadas, focando minha atenção em uma pedra no ponto mais alto de uma
das ilhas, e tento controlar a minha respiração e as lágrimas.

— Por favor, atenda o celular — pede, suavizando a voz.

— Deve ser Jonas, ele tentou falar comigo hoje algumas vezes. —
Evito fitá-lo.
— Você acha que ele não te dará o divórcio? — pergunta,
deslizando um dedo pelo meu braço, o arrepiando no processo.

— E o que isso te interessa? — Puxo meu braço de forma brusca,


odiando a reação do meu corpo a ele.

— Você realmente não sabe o porquê de eu estar interessado neste


assunto? Pensei que tivesse deixado claro que quero e vou proteger você —
afirma, se aproximando mais e tocando meus ombros. Suas mãos estão
quentes, em contraste com meu corpo frio.

Até faço menção de falar alguma coisa, mas meu celular mais uma
vez toca e, querendo sair da sua frente o mais rápido possível, desvio dele e
vou em busca do aparelho, atendendo-o sem sequer verificar quem está
ligando.

— Ah, graças a Deus! Estava desesperada para falar com você. —


Uma voz angustiada me faz ficar em alerta, e eu a reconheço como sendo
de Bruna, esposa de Guilherme.

— Bruna? — indago.

— Sim, minha querida, Guilherme sofreu um infarto e estamos no


hospital. — Solta a bomba com uma voz chorosa de uma vez só, me
fazendo segurar na mesa.

Mais uma vez sinto fortes braços circularem minha cintura, me


mantendo em pé. Estou tão descompensada que sequer penso em sair do seu
enlace, tudo perdeu a importância para mim, minha atenção está toda
voltada para o que a esposa do meu padrinho está relatando.
— Mas nós estávamos conversando há algumas horas... — Minha
voz falha. — Por favor, me diga que ele está vivo. — Prendo a respiração
enquanto aguardo a resposta.

— Ele está vivo, mas requer cuidados. — Sua voz está cansada.

— Ele comentou que estava com dor de cabeça e pedi que


descansasse — choramingo.

— Foi repentino, os funcionários do escritório me disseram que ele


discutiu com um cliente e depois passou mal, por isso o levaram para o
hospital. Em seguida, entraram em contato comigo e, desde então, estou
tentando falar com você.

— Por favor, me diga em qual hospital está, vou para aí


imediatamente. — Apesar de estar com a cabeça cheia de questionamentos,
evito fazer mais perguntas enquanto ela me passa o endereço do hospital.
Eu nem preciso anotar, conheço o lugar, já fiquei algumas vezes internada
lá enquanto me recuperava da perda de um bebê.

Assim que desligo o telefone, Felipe gira meu corpo e segura meu
rosto com ambas as mãos, me fazendo fitá-lo.

— O que houve? — questiona suavemente.

— Meu padrinho... — Soluço e não consigo terminar a frase.

— Calma, estou aqui com você, me fala o que está acontecendo para
que eu possa te ajudar — pede, acariciando meu rosto e limpando minhas
lágrimas.

— Meu padrinho infartou, a esposa dele me ligou e disse que ele


está no hospital. Tenho que ir para lá, não posso perdê-lo, não posso! Não
ele. Eu aguento tudo, mas não posso perdê-lo — balbucio, e ele me abraça
forte.

— Vamos voltar agora, direto para o hospital. Prometo que não


sairei do seu lado — assegura, beijando minhas mãos.

E eu me sinto como uma massa frágil, sem nenhuma força e em


pânico, esperando que algo terrível aconteça. Então, me deixo ser levada até
a cadeira. Ele me dá um copo de água, mas apenas o sigo com olhar
enquanto anda apressado, de um lado para o outro, trabalhando com
agilidade e, em pouco tempo, faz a embarcação começar a se movimentar
para voltarmos o mais rápido possível para o continente.
Capítulo 10

Manuela
Acaricio devagar as costas de Bruna enquanto ela segura a minha
outra mão fortemente. Já se passaram duas horas desde que cheguei e ainda
não conseguimos ver Guilherme. Apenas recebemos informações de que ele
segue em cirurgia.

Dois copos plásticos com café aparecem à minha frente. Elevo a


cabeça e fito Felipe. Ele oferece um copo a Bruna, que agradece, e outro a
mim.

— Obrigada. — Pego o copo e sorvo a bebida quente em pequenos


goles.

— Vocês gostariam de comer algo? Posso comprar na lanchonete


ou, se preferirem, podemos nos sentar um pouco.
— Pode ser uma boa ideia, Bruna. Você está muito tempo em pé,
esperando notícias. Vamos nos sentar um pouco. Eu vou a todo momento na
recepção para saber sobre ele — sugiro, e ela me olha receosa.

— Vocês duas precisam estar bem para dar força a ele. Venham,
vamos nos sentar um pouco — acrescenta Felipe.

— Obrigada pelo apoio, minha querida. — A esposa do meu


padrinho dá pequenas batidinhas em minha mão.

— Eu não poderia estar em outro lugar senão ao seu lado em uma


situação dessas.

Caminhamos devagar até a lanchonete do hospital e ao chegarmos,


nos sentamos.

— Obrigada por nos acompanhar. Tem certeza de que não estamos


te atrapalhando? — Bruna indaga.

— De forma alguma — ele assegura.

— Obrigada por me trazer aqui, mas você pode ir. Não sabemos a
hora que iremos sair e, como Bruna mencionou, você deve ter outros
compromissos — recomendo, ele se acomoda na cadeira e cruza as pernas.

— Não tenho a mínima intenção de te deixar sozinha em um


momento tão delicado. — A intensidade com que me olha me faz desviar o
olhar e focar em Bruna.

— A senhora almoçou, quer comer algum sanduíche?

— Não almocei, mas acho que não consigo comer nada — responde
com um suspiro desanimado.
— Vou comprar suco de laranja e sanduiche, e a senhora come o
quanto conseguir — Felipe propõe enquanto se levanta. — Comprarei para
você também, mal tocou no almoço — se dirige a mim antes de ir em
direção ao balcão.

— Quem é este homem? Ele é muito gentil e parece estar


interessado em você — a esposa do meu padrinho indaga, movendo a
cabeça em direção a Felipe.

— Ah, Bruna, é uma história tão enrolada!

— Guilherme me contou que quer se divorciar. Fiquei muito feliz


com esta notícia. Você não imagina o quanto nos preocupou sua relação
com Jonas.

— Me desculpa ter causado tantas preocupações, e sim, vou me


divorciar, mas não vamos falar sobre isso. Nossa prioridade agora é o
Guilherme.

— Ele vai ficar bem, tem que ficar.

— Com certeza vai ficar — asseguro.

Movo minha cabeça para a direção onde Felipe foi e o encontro me


olhando. Desde que saímos do iate, seus olhos estão em mim. Ele se
mostrou solicito a Bruna, e as únicas vezes que saiu do meu lado foram para
atender algumas ligações ou buscar café.

Logo depois que recebi a ligação de Bruna, nossa conversa foi


apagada da minha mente. Não, essa não é a verdade. Não esqueci nada do
que ele me disse, apenas sinto como se fosse um monstro adormecido. É
como se eu estivesse cantando uma canção de ninar para ele continuar
inerte até essa situação de Guilherme se resolver.

Não quero pensar em Jonas, na traição, na minha situação


financeira, nem nas coisas que Felipe me revelou. Minha atenção agora está
voltada para Bruna e meu padrinho. Porém, não consigo ignorar sua
presença. Ela é tão marcante que é impossível ele passar despercebido.

Percebi também o quanto andava carente de atenção e cuidado.


Estava tão acostumada a ficar em hospitais sozinha e resolver na solidão
minhas dores e traumas, que estranho o comportamento de alguém que é
solícito em uma situação complicada.

Solto um suspiro e volto a atenção para Bruna, que bebe seu café,
pensativa. Pouco tempo depois, Felipe volta com os sanduíches e sucos. A
esposa do meu padrinho dá pequenas mordidas e eu faço o mesmo. Não
sinto fome, um bolo em minha garganta não me deixa saborear o sanduíche.

— Vou ver se tem alguma informação de como ele está — falo,


fazendo menção de me levantar, mas Felipe me interrompe.

— Continue comendo, eu vou. — Ele pisca um olho e se levanta.

E eu o sigo com o olhar.

— Ele parece querer ficar ao seu lado — Bruna comenta.

— É, parece que sim — confirmo, ainda o observando.

— Quem é ele?

— O CEO da empresa em que Jonas trabalha — revelo e reparo no


olhar de espanto de Bruna. — Como disse antes, é uma situação complicada
— me limito a dizer. Levaria muito tempo e um esforço mental, que não
estou disposta a fazer, para revelar a ela toda a complexidade desta situação.

— Entrei em contato com ele, com Jonas.

— Por quê?

— Como não estava conseguindo falar com você, eu liguei para ele,
tanto para ele, quanto para sua sogra.

— E nenhum dos dois está aqui, e sim um estranho que conheci há


dois dias, que me deu mais apoio neste tempo que Jonas, que julgava ser a
minha família.

— A melhor coisa que você tem que fazer é ficar bem longe deles.

— Eu sei, farei isso.

— Ainda não tem nenhuma informação, ele segue no centro


cirúrgico e, assim que terminar, o médico vai nos chamar — Felipe
esclarece quando se senta à nossa frente.

— Obrigada — agradeço.

— Coma mais um pouco. — Ele escorrega o prato na minha frente.

— Não consigo.

— Pelo menos bebe um pouco mais do suco.

— Não, o café é o suficiente.

— E a senhora, quer mais alguma coisa? — questiona a Bruna, que


também recusa.
As próximas horas foram tensas e angustiantes. Por volta das 10h da
noite, recebemos a notícia de que a cirurgia havia ocorrido bem, mas que
ele só poderia receber visita na manhã seguinte.

Após muito tentar, consigo convencer Bruna a ir para casa e me


ofereço a acompanhá-la, e ela não recusa. Felipe nos leva até a sua casa, ela
entra primeiro, nos dando um pouco de privacidade.

— Obrigada por ter ficado ao nosso lado — agradeço assim que


ficamos sozinhos.

— Eu te disse que ficaria.

— Isso é algo novo para mim.

— O quê?

— Alguém ficar ao meu lado em momentos difíceis.

— Seu padrinho ou a esposa dele não ficavam com você quando


sofria os abortos?

— Não, porque eles só ficavam sabendo alguns dias depois, nunca


falava quando acontecia.

— Por quê?

— Não queria que sofressem por minha causa.

— Mas seu marido e sua sogra sabiam?

— Sim, eles sabiam.

— Por que aguentou tantos anos nesta situação?


— Porque eu justificava tudo em nome do amor. Quando me casei,
eu jurei que seria para sempre, na doença, na tristeza, e na dor.

— Mas as amarguras, você passou sozinha.

— Sim, passei sozinha.

— Não passará mais.

— Não faça isso, estou fragilizada e carente demais, não brinque


comigo. Meu emocional está em frangalho, estou desprotegida e abalada,
sou uma presa frágil e fácil.

— Você tem que aprender a não ser tão sincera, não se sangra em
mar de tubarão, porque eles te engolem.

— Eu não sei ser assim.

— Eu te ensino.

— E se você também me machucar novamente?

— Farei o meu melhor para que isso nunca aconteça.

— Você não pode garantir.

— Vamos deixar o tempo dizer. Por enquanto, quero que saiba que
estarei ao seu lado em qualquer momento, em qualquer situação.

— Não faça promessas que não possa cumprir.

— Esta, cumprirei.

— Acho melhor entrar.


— Posso te ligar amanhã?

— É melhor não.

— Então te enviarei mensagens, e isso não é negociável. — Eleva


um dedo, fazendo uma expressão engraçada que me faz sorrir.

Ele respira fundo e abre um meio sorriso.

— Gosto do seu sorriso, gosto mais ainda quando eu sou o motivo


de você sorrir. — Desvio o olhar. — Amanhã levo vocês ao hospital.

— Não precisa.

— Eu sei, mas farei mesmo assim. Boa noite, Manuela, e não sinta
como se estivesse enfrentando tudo sozinha.

— Mas, no final do dia, o peso recai em minhas costas. Desde que


recebi a ligação de Bruna, não consigo me livrar do pensamento de que
talvez eu tenha culpa nisso.

— Como você poderia ser culpada de um infarto?

— Guilherme tinha comentado que ele estava se sentindo mal e ele


passou a noite revendo a minha papelada sobre o divórcio.

— Pelo que Bruna comentou, os funcionários também disseram que


ele discutiu com um cliente. Então, Manu, não se culpe, não carregue um
fardo que não é seu.

Não retruco, apenas assinto e saio do carro.

E eu, muito menos Bruna, tínhamos ânimo para ir à cozinha, então,


resolvemos pedir algo para comer. E, após jantarmos, ela vai para o seu
quarto, e eu, para o de hóspede.

Ao me deitar na cama, certifico que o meu celular esteja com o


volume alto para acordar caso o hospital entre em contato. Então reparo que
Jonas não enviou nenhuma mensagem. Bruna havia comentado que tinha
falado com ele e informado o que houve.

Bufo, não me surpreendo com o descaso. Acho que mais nada


relacionado ao meu marido me surpreende, e isso apenas me leva a crer que
eu não o conhecia. Mesmo depois de cinco anos dormindo ao seu lado, o
amando e fazendo de tudo para sua felicidade, eu não o conheço.

Meu celular vibra quando recebo uma mensagem.

“Lembre-se, a culpa não é sua. Desejo que tenha uma boa noite e
que relaxe. Amanhã cedo enviarei uma mensagem quando estiver saindo de
casa”.

Sorrio, mas não respondo. Deixo o celular na mesinha ao lado da


cama e não desvio meus olhos dele.

— E você, senhor Felipe, será o mocinho ou o vilão da minha


história? — sussurro.

A experiência me mostrou que anos de convivência não asseguram


conhecimento. Vivi cinco anos com Jonas e não sei que tipo de pessoa ele é.
Conheço Felipe há dois dias e, mesmo com tudo que ele me revelou, me
passou mais segurança do que meu marido nos últimos anos.
Capítulo 11

Manuela
Como prometera, Felipe enviou uma mensagem meia hora antes de
parar o carro na frente da casa do meu padrinho. Após nos
cumprimentarmos, fizemos o trajeto em silêncio. Acreditei que ele iria
embora em seguida, mas me surpreendi quando o vi entrando no hospital.

— Apenas fui estacionar o carro —explica ao ver minha expressão


interrogativa.

Assinto, escolhendo não dar muita atenção ao assunto no momento,


e volto o olhar para a enfermeira que busca informações sobre meu
padrinho.

Aguardamos por mais um tempo até que o médico vem falar


conosco. Após passar que Guilherme está estável e foi transferido para
semi-intensiva, o doutor autoriza sua esposa a entrar por vinte minutos.
Assim que ela sai, me viro para Felipe, contudo, não consigo falar nada,
pois meu celular toca. Solto um longo suspiro ao notar que é Jonas.

— Oi, Jonas — atendo sem um pingo de paciência.

— Você disse que vinha para casa hoje.

— Estou no hospital com Guilherme e Bruna, ela me disse que


informou a você o que houve.

— Que horas você chega? Não estamos conseguindo usar os


cartões, você precisa resolver isso! — exige, e eu olho para o teto,
incrédula.

Quando eu acho que absolutamente nada do que ele fizer pode me


surpreender, ele vem e me mostra o contrário.

— Você tem noção do que está dizendo? Meu padrinho está no


hospital, e você vem me perguntar sobre cartões? Eu bloqueei todos os
cartões!

— Você ficou louca?

— Doida e cega eu estava para não ver tudo o que acontecia à


minha volta.

— Volte para casa agora! — ordena.

— Eu vou quando Guilherme melhorar, até lá eu não quero que você


sequer entre em contato comigo!

— E como iremos fazer? Não consigo usar os cartões.


— Se vira, Jonas!

Desligo o telefone, exaltada.

— O que houve? — Felipe segura meu braço quando me afasto


dele.

— Eu preciso tomar um ar. — Saio do seu aperto e caminho para


fora do hospital.

Felipe me assusta quando segura minha mão e me puxa até uma área
urbanizada perto do estacionamento.

— O que aconteceu, era Jonas ao telefone?

— Nada que eu não possa resolver. — Forço um sorriso.

— Não faça isso, não se esconda de mim, já disse que estou ao seu
lado — reafirma.

— Não estou me escondendo, apenas tem assuntos que eu tenho que


resolver sozinha.

— Não precisa resolver sozinha.

— Não quero te envolver nisso.

— Já estou envolvido, e você não foi o motivo, mas com certeza é


um incentivo para não desistir.

— Não complica mais a situação, Felipe.

— Ela já está deliciosamente complicada.


E ele me oferece aquele sorriso que mexe com algo dentro de mim e
me faz querer sorrir junto. Desvio o olhar para que ele não veja as reações
que provoca em mim.

— Seu padrinho também é seu advogado? — indaga, mudando


completamente de assunto, e me faz olhá-lo com atenção.

— Sim — afirmo, desconfiada, querendo saber onde ele quer


chegar.

— Na situação em que ele está no momento, não terá como resolver


as questões judiciais do seu divórcio. Pretende adiar o processo até ele se
restabelecer?

E somente neste momento me dou conta do quão complicada as


coisas estão. Guilherme não é só meu advogado como também meu
procurador legal e responsável pela minha vida financeira.

— Pela sua expressão, você não levou em conta esse detalhe.

— Não quero pensar nisso agora, minha prioridade é o Guilherme.

— Mas seu marido pensa da mesma forma? Ele não vai usar a
situação do seu padrinho para tentar te fazer mudar de ideia?

— Não há a menor chance disso acontecer!

— Você gostaria que eu indicasse um advogado para te auxiliar?

— Agora meu foco é meu padrinho, se você quer realmente me


ajudar, respeite este meu momento — digo, séria.

— Me desculpe, apenas quero te apoiar.


— Você já está ajudando.

— Estou em uma situação na qual não consigo agir da forma que


gostaria, porque prometi que faria de tudo para não te magoar mais e
qualquer ação que eu tome agora, levaria mais angústia a você.

— Eu não posso impedir você de fazer algo que queira.

— O que eu quero é você livre desse casamento, e isso, no


momento, eu não posso ter.

— Felipe...

— Não precisa terminar, vou me conter, por você. Vamos, Bruna


deve voltar a qualquer momento, pense só nisso agora, e o restante
resolvemos depois, a única coisa que peço é que me deixe ficar ao seu lado,
te apoiando e assegurando que não desabe.

— Eu nem sei o que falar.

— Não fale nada, apenas não me afaste.

Ele segura a minha mão e me dá um leve puxão, apontando a cabeça


para a recepção. Resisto um pouco, mas acabo desistindo e o
acompanhando. Guilherme e Bruna vêm em primeiro lugar agora.

Pouco tempo depois, Bruna volta e sua expressão alegre me faz


suspirar aliviada, o médico autoriza a minha entrada por breves dez
minutos, mas, ao entrar, meu peito aperta ao vê-lo tão debilitado.

— Não faz essa cara assustada, não estou tão mal assim — sua voz
soa cansada.
Assinto, engulo em seco e forço um sorriso, mas falho
miseravelmente, então me viro de costas para que não veja minhas
lágrimas.

— Desculpa. — Respiro fundo, limpo meu rosto, giro meu corpo e


caminho até ele.

— Não fique assim, sou mais forte do que pareço.

— Tenho certeza de que você sairá daqui rápido.

— Dei um grande susto em vocês, não foi?

— O maior susto da minha vida!

Ele respira fundo e aperta minha mão com força.

— Sobre o seu divórcio...

— Pare! Não fale sobre isso, tudo pode esperar, não vou fazer nada
até você melhorar.

— Manuela, Jonas foi ao meu escritório e discutimos, ele me


ameaçou e exigiu que eu liberasse os cartões novamente e, quando neguei,
só não me agrediu porque os funcionários o seguraram. Logo depois, passei
mal e não sei como cheguei aqui ou como ele saiu de lá.

— Meu Deus! — Levo minha mão à boca, horrorizada com o que


ele está dizendo.

— Vou passar seu caso para outro advogado enquanto me


restabeleço.
— Não vamos mais falar sobre isso agora, quero que pense apenas
na sua saúde.

— Você não pode ficar perto dele, seu marido já percebeu que não
vai mais conseguir te manipular e é capaz de fazer qualquer coisa para ter
acesso ao seu dinheiro, Jonas pode te fazer assinar algum documento ou
coisa pior.

Ele toma folego e segue me alertando com voz cansada.

— Eu sou a pessoa que detém uma procuração total dos seus bens e
estou incapacitado. Como ainda são casados, juridicamente ele pode anular
esta procuração se conseguir provar que você também está debilitada. Não
volte para casa. Não assine nada. Não se aproxime dele. Não se ponha em
perigo, fique com Bruna até eu me restabelecer.

— Por favor, não se preocupe — peço preocupada com o seu


cansaço.

— Manuela me escute...

— Fique calmo, você passou por um grande trauma.

— Me prometa que vai dar andamento ao divórcio.

— Eu prometo, mas, por favor, foque na sua recuperação.

Assim que saio, me encosto na parede e levo minha mão à boca.


Meu corpo inteiro treme, eu fecho meus olhos e respiro algumas vezes,
tentando recuperar algum controle antes de voltar para a recepção.

Caminho devagar, a cada passo sendo torturada pela revelação de


Guilherme, a indignação crescendo dentro de mim, a vontade de gritar presa
na garganta, o choro contido, a raiva aumentando. Como Jonas tem
coragem de me ligar exigindo saber sobre os cartões? Aquele infeliz sequer
perguntou como o meu padrinho estava e muito menos mencionou que ele
quase o agrediu.

Paro abruptamente e levo a mão ao peito, fecho as mãos em punho e


meu coração bate acelerado.

— Está tudo bem? — uma enfermeira indaga ao ver meu estado.

Me recomponho minimamente e apenas assinto, sem condição


nenhuma de falar. Volto a andar e encontro Bruna na recepção. Falo
vagamente que me emocionei ao vê-lo para que não desconfie do meu
estado abalado, obviamente não menciono nada sobre o ocorrido, a última
coisa que ela precisa agora é se preocupar com algo além do seu marido.

A esposa do meu padrinho me convida para ficar com ela, quando


recuso ela acrescenta que seu marido pediu, mais uma vez declino e ela
assente. Normalmente teria aceitado o seu convite, mas hoje não, preciso
resolver esta situação com Jonas, já protelei demais.

Me despeço dela e saio do hospital sendo acompanhada por Felipe.

— Você quer que te leve para onde? — indaga assim que entramos
no carro.

— Vou para o hotel. — Minha voz não passa de um sussurro.

Aperto minhas mãos com a voz do meu padrinho em minha mente,


me dizendo que Jonas foi ao seu escritório e tudo que fez.

Tento segurar as lágrimas.


Tento não desabar.

Tento me manter forte.

Mas não consigo!

Então eu vejo a primeira gota cair em minhas mãos, depois a


segunda, não limpo meu rosto, não adiantaria, elas continuariam a cair,
deixo as lágrimas rolarem sem fazer ruído.

Braços fortes me enlaçam, Felipe me aconchega em seu peito, me


dando apoio no silêncio, sem questionamentos, sem cobranças.

Soluço, porque não aguento mais segurar, sinto suas mãos


acariciando minhas costas, meus cabelos e, por fim, meu rosto. Ele busca
um lenço em seu bolso e seca minhas lágrimas, e eu forço um sorriso ao
notar que é um dos seus lenços brancos bordados com uma flor de lótus
negra.

— Você tem um estoque desses lenços? — brinco, me afastando,


mas ele me traz de volta ao seu peito.

— Fica assim mais um pouco, me deixe ter só mais um pouquinho a


sensação de que posso de proteger te tudo e de todos — murmura.

— Você disse que não estava se apaixonando por mim, esta é a fala
de um homem apaixonado. — Rio, me afastando novamente.

— Digamos que estou encantado por você e te fiz sorrir de novo em


um momento triste. Isso me faz muito bem.

Acaricia meu rosto e me faz abrir um enorme sorriso.

— Podemos almoçar e depois te deixo no hotel? — pede.


— Não posso aceitar, tenho que resolver a situação com Jonas —
recuso, enchendo meu peito de ar e o soltando lentamente.

— O que aconteceu agora? Seu corpo está tenso — questiona,


segurando a ponta do meu cabelo e o enrolando em seus dedos.

— Guilherme disse que Jonas foi ao escritório e quase o agrediu,


então meu padrinho passou mal. Quero me livrar desta situação o mais
rápido possível, os documentos do divórcio estão no hotel, se ele não
aceitar, procuro outro advogado para dar entrada no processo. Cheguei ao
meu limite! — desabafo.

— Vou te ajudar com a questão do advogado e te acompanhar até


sua casa — oferece.

— Não, quero falar com ele sozinha. — Nego com um movimento


de cabeça.

— Manuela, não acho que seja uma boa ideia — insiste, segurando
a minha mão.

— Eu preciso, tenho que liberar esse grito que está preso em minha
garganta, me consumindo. — Puxo minha mão lentamente, e ele fica
olhando para ela, como se quisesse pegá-la novamente.

Ele me fita como se fosse protestar, mas não tece nenhum


comentário.

Seguimos em silêncio para o hotel e, quando para o carro, viro meu


rosto para ele.

— Mais uma vez obrigada por ter ficado ao meu lado, porém, creio
que seja melhor você ir.
— Vou esperar você fechar a conta e te levar para sua casa.

— Não, daqui em diante, faço sozinha. Como disse antes, é algo que
eu tenho que fazer.

— Continuo achando que não é uma boa ideia, Jonas parece estar
desesperado, e uma pessoa assim comete loucuras. De todo modo, vou
acatar o seu pedido. Irei te dar alguns dias para resolver sozinha esta
situação, contudo, se não conseguir, invado aquela casa te tiro de lá e estou
pouco me fodendo para que merda isso vai dar.

Sua fala me fez abrir e fechar a boca, ele faz algo inesperado, segura
meu rosto, se aproxima devagar, como se me desse tempo para desviar, mas
não me movo, quero saber até onde ele irá. Pouco segundos antes de
encostar os lábios nos meus, ele sorri de lado, daquele jeito que gosto, me
fazendo morder o lábio inferior. Sua boca encosta na minha delicadamente,
seus dedos acariciam meu rosto e sua respiração aquece minha pele.

Foi rápido, apenas um encostar de lábios, mas fez meu coração bater
acelerado e só piorou quando encostou a testa na minha e esfregou o nariz
no meu.

— Este sou eu deixando claro que quero você em minha vida, sem
jogos, sem mentiras e sendo o mais honesto possível. Você já sabe que não
sou perfeito, já te falei todos os meus defeitos e não escondi que estou
obcecado por você — confessa.

— Isso não vai dar certo, tenho muitos problemas — balbucio com a
respiração acelerada.

— E eu estarei ao seu lado para resolver cada um deles — assegura.


— É muito cedo para afirmar isso.

Seu dedo percorre meu rosto, arrepiando minha pele, me fazendo


segurar a respiração, e para na minha boca, resvala e aproxima o rosto com
a intenção de me beijar, mas eu me afasto com um meneio negativo.

Felipe solta um suspiro, sai do carro, o contorna e abre a porta, e eu


saio, mas mal tenho tempo de um segundo respiro quando, sem nenhuma
cerimônia, ele inclina a cabeça e me dá um beijo na curva do pescoço.

Todo meu corpo treme, sinto minha pele arrepiar e o gemido fica
preso na garganta enquanto ele se afasta e desliza as mãos pelos meus
braços, e mais uma vez estremeço.

— Isso, minha querida Manuela, é química forte pra caralho, e eu


vou me dedicar com afinco para te mostrar o quanto podemos ser bons
juntos.

Ele tira um cartão preto com seu nome escrito em letras douradas do
bolso e me entrega.

— Se precisar de ajuda, me liga; se quiser desabafar ou xingar


quando as coisas estiverem muito tensas, me ligue, em qualquer momento,
em qualquer ocasião, estarei à sua disposição.

Beija a ponta do meu nariz e vai embora, me deixando sem fôlego.


Capítulo 12

Manuela
Tomo uma forte respiração antes de entrar na minha casa e fecho
meus olhos quando o cheiro de lavanda me envolve.

— Finalmente se lembrou que tem casa! — A voz raivosa de Raquel


me faz morder o interior da minha bochecha.

Desvio dela e sigo em direção às escadas com a intenção de ir para o


meu quarto, mas ela segura meu braço, me parando.

— Você tem noção da confusão que causou? — Finca os dedos no


meu braço com força.

— E o que exatamente eu fiz? —Solto do seu aperto com


agressividade, e esse meu ato a assusta. Normalmente eu estaria pedindo
desculpas.

Mas, desde que saí daqui, muitas coisas aconteceram em minha vida
e acho que não consigo mais ser a mesma pessoa de antes.

— O que houve com você? Jonas disse que você estava estranha,
inventando coisas, passou dias fora de casa, não estava presente no jantar
que foi um verdadeiro fiasco. Você sumiu e, no meio desse caos, seu
advogado cancelou os nossos cartões. Aquele homem mesquinho nunca
gostou do meu filho, você tem que passar logo a procuração para Jonas! —
exige de forma arrogante.

— Você sempre me tratou assim? — questiono, intrigada.

— Do que você está falando?

— Em algum momento você sentiu carinho por mim? Não amor,


porque creio que este sentimento jamais passou por você, mas o mínimo de
afeição? — pergunto, sentindo meus olhos pinicarem.

Raquel, nos últimos anos, foi uma figura materna para mim, pois
julgava que minha sogra poderia substituir o lugar da minha mãe, mas
somente eu pensei assim.

— Pensei que esta conversa seria difícil apenas com Jonas, mas não,
com você também será complicada. Por cinco anos, eu busquei algo
inalcançável, que você me amasse como se fosse sua filha e, quando notei
que o meu afeto não era correspondido, comecei a te dar presentes caros e a
me iludir, achando que aqueles sorrisos e abraços eram o começo de um
sentimento verdadeiro. Eu fui tão ingênua, não é mesmo?
Queria me expressar sem me emocionar, sem sentir o coração
apertando, sem sentir que fui uma perfeita idiota.

Mas não consigo.

Então eu limpo as lágrimas traiçoeiras, engulo em seco, travo a


mandíbula e fixo meus olhos nela, esperando sua reação, e ela me avalia por
algum tempo antes de começar a falar.

— Fez um discurso apenas para desviar do problema, você nos


deixou em uma situação terrível! Se me amasse mesmo, teria resolvido a
situação dos cartões desde o momento em que Jonas falou com você. Se me
amasse mesmo, não teria me deixado sozinha, resolvendo tudo sobre o
jantar mais importante para o seu marido. Aquela noite foi terrível, o CEO
simplesmente não apareceu, ficamos envergonhados perante os convidados,
principalmente porque a minha nora também não estava presente. Foi muito
constrangedor! — Acusa.

Ouço suas reclamações com um meneio negativo.

— Houve um tempo, não muito distante, em que a sua mera


reclamação me deixava com um sentimento de culpa e imediatamente
queria resolver os seus problemas, mesmo não sendo meus, mesmo não
tendo nada a ver com eles ou me prejudicando emocionalmente, mas isso
não vai mais acontecer — afirmo, soando fria.

— Você não tem noção do quanto está me machucando, em vez de


pedir desculpas por tudo o que fez, está sendo agressiva e...

— Para! — grito quando chego ao meu limite.

— Manuela! — revida, berrando mais alto.


— Se você quiser fazer um teste de quem grita mais alto, por mim,
tudo bem — rebato no mesmo tom. — Essas chantagens emocionais não
vão mais surtir efeito em mim, então, simplesmente pare!

— Chantagem? Como você pode pensar isso de mim? — queixa-se


pouco antes de se debulhar em lágrimas.

Cambaleia até o sofá, leva as mãos ao rosto e começa a chorar, e eu


olho para o teto.

— Choros, gritos, cara feia, tristeza, ou seja lá o que você fizer, não
vão mais me manipular, eu finalmente acordei — asseguro, cruzando os
meus braços.

— Como você pode me tratar assim! — Soluça.

— Apenas estou retribuindo o mesmo tratamento que você me deu


por anos, engolia tudo pelo bem-estar da família, para fazer vocês felizes, a
diferença é que não tenho mais nenhum interesse nisso.

Ela para de chorar quando repara que nada do que fizer irá me
sensibilizar.

— Quando Jonas chegar, por favor, avise que estou no quarto, o


esperando.

— Você vai me deixar assim? Nossa conversa ainda não terminou,


não falou nada sobre os cartões, quando resolverá esta situação?

— Eu que mandei Guilherme cancelar os cartões.

— Por que cometeu essa insensatez? — Volta a se exaltar.


— Porque vou me divorciar do seu filho e não tem nenhum sentido
continuar bancando as suas contas — esclareço, esperando o próximo
drama que ela fará.

Conheço sua narrativa: primeiro, é agressiva, e esta reação me


deixava assustada, amedrontada; logo em seguida, chorosa, e eu ficava com
um terrível sentimento de culpa que me esmagava a ponto de me sentir
incapaz de negar qualquer coisa que pedisse; e, por fim, vem a falsa afeição
quando consegue o que quer.

Porém, eu nunca a confrontei desta forma direta. Franzo o cenho ao


notar que ela me observa assustada e, em seguida, desvia para um ponto
atrás de mim.

— Ah, que bom que vocês chegaram, Manuela está completamente


transtornada, nunca a vi assim! — reclama. Viro minha cabeça e vejo Jonas
parado, observando a cena, com seu irmão Rodolfo e sua cunhada Juliana.

Jonas e seu irmão vão em direção à mãe e se sentam ao redor dela, a


consolando.

— O que está acontecendo? Ouvimos seus gritos lá fora. Está tudo


bem? — Juliana indaga, se aproximando de mim.

— Apenas não vou mais ouvir besteira e ficar calada. — Tento


moderar meu tom de voz, mas, por dentro, ainda sinto tudo tremer.

— Pois eu acho justo — Juliana me apoia.

— Juliana, pelo amor de Deus, não piore a situação — o marido


pede, e ela revira os olhos.
— Você sabe que nunca gostei da forma como sua mãe a trata —
Juliana revida.

— Manuela precisa de ajuda urgente, ela está descontrolada —


Raquel choraminga para os filhos.

— Sinto te informar, mas a Manuela cega, tonta, que fazia tudo o


que vocês queriam morreu no dia em que descobri que seu filho estava me
traindo — esclareço.

— Você está com a ideia fixa nessa bobagem. — Jonas bufa, se


levantando e caminhando de um lado para o outro.

— A senhora está bem, mãe? — O irmão do meu marido questiona.

— Estou muito nervosa, meu filho, ela está doida. — Soluça, e


Rodolfo a abraça.

— O que está acontecendo com você? Olha o estado que deixou a


minha mãe — Jonas reclama, apontando para a mãe abraçada ao irmão.

— Apenas a tratei da mesma forma que ela me trata. — Respiro


fundo antes de voltar a falar. — Já que você está aqui, vamos resolver logo
isso. — Abro minha bolsa e tiro o envelope contendo os papéis do divórcio.

— Filho, ela não resolveu a situação dos cartões — choraminga.

— Como assim não? — Jonas me fita com olhos acusatórios. —


Você tem noção das dores de cabeça e constrangimentos que está causando?
Tivemos nossos cartões recusados!

— Vocês realmente achavam que eu continuaria bancando tudo


depois de descobrir suas traições? — Incrédula, faço um meneio negativo.
Em seguida, aponto o envelope para ele. — Estes são os papéis do divórcio,
e vocês têm uma semana para se mudar daqui — aviso.

Jonas puxa o envelope e o rasga.

— Manuela, isso está indo longe demais! — avisa.

— Não, isso... — Intercalo um dedo entre nós dois. — ... já foi


longe demais, já ultrapassou a linha faz muito tempo, e eu só acordei
quando escutei aquela ligação e vi as fotos em seu celular e parei de negar
os fatos. Não foi ninguém que me contou, eu vi! — berro, jogando em cima
dele toda a minha raiva.

Por alguns segundos, não falamos nada, só nos encaramos, medindo


força, vendo quem cede primeiro, e não há a menor chance de eu abaixar a
cabeça, nunca mais farei isso.

Meu corpo está todo tenso, minha respiração rasa, meus olhos fixos,
focada, alerta, com a raiva correndo solta pelas minhas veias. Percebendo
que não recuaria, ele desvia e segura seus cabelos.

— Você não pode culpar meu filho por essa pequena falha —
Raquel exige, se tornando, mais uma vez, agressiva.

E eu, antes de responder, encaro Juliana, que bufa, balançando a


cabeça. Noto que ela está fazendo um enorme esforço para não se meter,
essa briga é minha, eu finalmente estou lutando as minhas batalhas.

— Pequena? E eu deveria culpar a quem? Por acaso fui eu quem o


traí? Não! Ficava em casa feito uma idiota, fazendo de tudo para vê-lo feliz,
para ver vocês dois felizes, passando por cima dos meus próprios
sentimentos para manter a paz familiar! — protesto, indignada.
— Você não conseguiu lhe dar filhos, vivia doente, chorando na
cama, depressiva, que homem aguenta isso? Toda gestação era um drama
para o meu filho, você o fazia se sentir inferior aos outros homens, por isso
ele acabou falhando. Aposto que deve ter homem no meio desse pedido de
divórcio do nada, você sumiu por dias! — acusa, se levantando e apontando
um dedo para mim.

Levo uma mão ao peito, sentindo como se tivesse levado um soco


na boca do estômago e meu ar todo fugisse de mim. Cambaleio, Juliana me
segura, meus olhos pinicam, as lágrimas vêm antes que eu consiga impedir.
Respiro fundo, tomando fôlego, absorvendo suas palavras, deixo a fúria
tomar conta do meu corpo a ponto de ficar cega, avanço para cima dela e
dou um tapa de mão aberta em seu rosto, o suficiente para sentir minha mão
pinicar.

— Como tem a coragem de dizer que ele me traiu por causa dos
meus abortos? — berro, Jonas me segura e me puxa para longe da sua mãe.

— Você está parecendo uma maluca! — Jonas aperta meu braço.

— Maluca! Não, eu apenas abri meus olhos. — Puxo meu braço


com força e me afasto dele.

— Por que você não a segurou, Juliana? — Rodolfo exige uma


resposta da esposa.

— Mas você não disse para não me meter? — Juliana responde,


sarcástica. Se eu não estivesse tão puta, teria rido da expressão que ela faz.

— Eu sempre me culpei pelos abortos, sempre achei que, se tivesse


feito isso ou aquilo, não teria acontecido. Mas, por ele ter me traído, eu não
tenho culpa — vocifero, avançando para cima da Raquel novamente.
Jonas se põe na minha frente e segura meus braços.

— Se acalme, Manuela, não vamos resolver nada assim — exige.

— Pelo amor de Deus, o que os empregados vão pensar desse


escândalo? — Raquel diz, olhando para os lados com medo de alguém ter
ouvido.

— Estou pouco me lixando para o que vão pensar. Não vou mais
ouvir suas merdas e ficar calada, a culpa não é minha se seu filho é um
cretino!

Não abaixo o tom de voz, não tenho a menor intenção de esconder


nada.

— Todos ficarão sabendo em algum momento. Por mim, tanto faz


que seja agora ou depois, isso não é algo que fará diferença na minha
decisão — decreto.

— Oh! — Ela leva as mãos aos lábios, horrorizada.

— Tudo bem... Cometi um erro, fui fraco, mas nós podemos superar
isso. — Jonas usa um tom derrotado. — Por favor, Manu, podemos
esquecer isso, não vamos jogar nossa história no lixo por uma besteira.

— Meu filho, não se culpe, você foi o que mais sofreu nessa
história. — Raquel aponta para mim. — Você deveria se envergonhar por
tudo que está fazendo. Me agrediu física e verbalmente e nos humilhou com
o cancelamento dos cartões. Seu comportamento é vergonhoso!

— Eu não acredito que estou ouvindo isso. — Olho para o teto


tentando controlar as lágrimas.
— A endometriose agora está atingindo o seu cérebro, por acaso?
Você nunca foi assim, está completamente doida, o que fez por nós não foi
mais que sua obrigação por causa das vergonhas que sofremos a cada vez
que falava para nossos amigos que minha nora havia perdido mais um bebê.
Não conseguia segurar uma gestação nem por três meses. No último, eu
nem falei com ninguém, já imaginava que iria perder. — Cada fala dela é
carregada de desprezo, a forma como me olha, de cima a baixo, mostra o
quanto me odeia.

— Mãe, a senhora está exagerando! — Rodolfo fita a mãe,


assustado.

— E depois você quer que eu fique do lado da sua mãe! — Juliana


implica.

— Não estou exagerando! Manuela está completamente insana,


precisa ser controlada! — Raquel diz, exaltada, com a mão no rosto. — Ela
me deu um tapa, está doida, maluca, precisa ser internada!

— Estou furiosa, sua cretina! Você tem noção do quanto eu sofri


cada vez que perdia um bebê e me recuperava sozinha?! Você nunca me
visitou ou ficou comigo, porque dizia que o clima do hospital te fazia mal e,
quando chegava em casa machucada, destruída por dentro e por fora, tinha
que fingir que estava tudo bem, porque vocês diziam que estava sofrendo
demais com a perda do meu filho e somente uma viagem melhoraria o
clima. E eu, como uma perfeita idiota, pagava tudo. — Soluço, porque não
consigo controlar.

Sou invadida por recordações de cada perda, de cada vez que eu via
o sangue descer pelas minhas pernas, de cada dor, das noites no hospital,
olhando o teto enquanto chorava e sofria sozinha, porque não queria
incomodar ninguém.

Cada luto do qual tive que me recuperar em silêncio porque meu


choro não agradava, e cada gestação era uma nova esperança, meu peito se
enchia de alegria para logo depois ser devastado pela perda novamente.

Sentindo um bolo oprimindo meu peito, eu curvo o tronco e aperto


minhas mãos tão forte que elas ficam brancas.

Grito!

Respiro fundo e volto a berrar.

Jogando tudo que estava preso para fora até quase perder o fôlego.

— Me solta! — exijo quando Jonas tenta me abraçar.

— Manuela, se acalme — pede, tentando mais uma vez me abraçar,


e eu o empurro para longe.

— Não vou me acalmar, eu quero você e sua mãe fora daqui! —


Aponto para a porta.

— Não vamos sair, essa casa também é nossa! — Raquel grita e


dessa vez ela avança para cima de mim.

Rodolfo tenta segurar a mãe, mas ela consegue pegar um jarro e


arremessa em minha direção, o objeto acertou em cheio minha cabeça.
Cambaleio com a dor absurda que me invade, levo a mão ao local e vejo o
sangue. Minha visão fica turva e, pelo canto do olho, vejo Juliana tentando
me segurar, mas ela não foi rápida o suficiente, pois sinto meu corpo
desabar e tudo ficar escuro.
Capítulo 13

Felipe
Entro em meu escritório sendo seguido pela minha secretária,
Vitória, e meu advogado, João. Sento-me em minha cadeira e levo minhas
mãos às têmporas. Os últimos três dias foram tensos, o tempo que dediquei
exclusivamente a Manuela cobraram seu preço.

Por causa dela, tirei o foco dos meus objetivos. Por alguns dias,
botei os seus problemas acima dos meus, contudo, não me arrependo, teria
feito mais, muito mais, se ela não tivesse me impedido.

Resolvi lhe dar espaço, Manuela passou por muitas coisas em um


curto período, mesmo os mais fortes ficariam um pouco desorientados. Tem
três dias que a deixei na frente do hotel e, desde então, envio mensagens
que não são respondidas ou visualizadas.
— Vitória, você conseguiu alguma informação sobre o estado de
saúde do Dr. Guilherme Lopes? — indago ainda de olhos fechados.

— Sim, ele segue internado, mas já passou do estado mais crítico e,


por este motivo, foi transferido para o quarto — informa mantendo o tom
de voz neutro.

— João, como anda a situação em relação ao Heitor? — questiono o


meu advogado, me referindo ao meu cunhado.

— Nos últimos dias, ele comprou mais algumas ações da empresa e


fez alguns encontros com os acionistas menores. Todos esses movimentos
foram feitos de forma discreta, com o intuito de não chamar a atenção.

— Quantas ações ele já conseguiu?

— Dez por cento. Não chega a ser uma ameaça para você.

— Mas, caso ele venha a se separar da minha irmã, ele garantiu que
eu não o ponha para fora daqui como fiz com Davi e, para piorar, tem poder
de voto.

— Sim, isso é um fato. Contudo, você não corre nenhum risco, seu
número de ações é muito superior ao dele, sem contar as dos seus pais.

— Não quero contar com isso, prevejo muitos acontecimentos que


poderão mudar a opinião do meu pai. — Bato com os dedos em meus
lábios, pensativo.

O fato de estar interessado na mulher do amante da minha ex-noiva


provocará fortes emoções na minha família conservadora. Meu pai não
gostará nem um pouco do possível escândalo e isso pode fazê-lo mudar de
ideia em relação a quem comandará os negócios.
—Você sabe que seus outros negócios são até mais rentáveis do que
a Sampaio Construções. — João lembra.

— Não é questão de dinheiro, nunca foi e jamais será. Esta empresa


é minha, passei minha vida me dedicando a ela do jeito que meus pais
queriam, não vou deixar outra pessoa tomar o meu lugar.

— Então sugiro que comece a comprar ações de acionistas maiores,


seu poder aquisitivo é mais amplo do que do Heitor e pode oferecer ofertas
melhores.

— Cuide disso imediatamente de forma silenciosa, não quero que


ninguém saiba deste movimento.

— Tudo bem, vou cuidar disso. — João se despede, e eu fito


Vitória, que começa a me passar alguns documentos para assinar e me pôr a
par da minha agenda pelos próximos dias.

— Mais alguma coisa?

— A senhora Sofia Alcântara segue ligando todos os dias.

— Não repasse as ligações. Isso é tudo?

— Aconteceu algo curioso. Como o senhor exige saber de tudo o


que acontece por aqui, acho melhor te falar.

— O que houve? Alguém tentou entrar em contato comigo? —


inquiro e tento esconder minha curiosidade, mas doido para saber se
Manuela me procurou.

— Ainda não sei se foi um trote ou se é algo importante, mas enfim,


hoje, enquanto o senhor estava em uma reunião com os acionistas, houve
um momento em que vim ao escritório para pegar alguns documentos e
nesse instante atendi a uma ligação estranha de um hospital psiquiátrico.
Uma pessoa que se identificou como Paula Silvia queria falar com o senhor.

— Hospital psiquiátrico? — questiono com a informação aleatória.

—Sim — confirma, com uma expressão confusa.

— Não faço ideia de quem seja. Como conseguiram entrar em


contato com o meu escritório? — pergunto, curioso.

— Ligaram para recepção e eles transferiram para cá — esclarece.

— Provavelmente é um trote. Por favor, informe à recepção para


não passar mais esse tipo de ligação.

— Já fiz isso, descobri que a atendente é nova no cargo e não tem


muita experiência. E por último, sua mãe entrou em contato para lembrá-lo
do jantar desta noite. Isso é tudo.

Agradeço e, em seguida, Vitória sai da minha sala, me deixando


sozinho. Contudo, pouco tempo depois, anuncia que Sofia está na recepção
do prédio, ameaçando fazer um escândalo caso não consiga falar comigo.
Autorizo a sua entrada e fixo meus olhos na porta enquanto a espero entrar.

Vejo-a caminhar em minha direção com passos decididos e a face


demonstrando inquietação, mas em nada abala sua beleza etérea e angelical.
Sofia Alcântara é, de longe, uma das mulheres mais lindas do Brasil, loira,
magra, alta, de corpo e pele perfeitos e exalando sofisticação e refinamento
pelos poros.

Como eu, ela foi criada em meio ao luxo e moldada para ser esposa
de uma pessoa com alto padrão aquisitivo. Nosso relacionamento não era
baseado em sentimentos, e sim em negócios, mas, desde que assinamos o
contrato, eu nunca a traí, levo a sério meus compromissos.

Sofia era uma das designers de interiores da Sampaio Construções,


mas sua maior paixão é a moda e, junto da minha irmã Isabela, estava
organizando um evento que contaria com várias personalidades nacionais e
internacionais, e eu iria patrocinar, mas cancelei tanto o noivado, quanto o
patrocínio e a demiti da empresa.

— Não tive alternativa a não ser vir aqui pessoalmente. Você não
atende minhas ligações — explica, se sentando.

— Autorizei a sua entrada por dois motivos, primeiro por respeito a


seu pai; segundo para avisar que não vou mais aceitar esse tipo de ameaça
ridícula e infantil. Não temos mais nenhum assunto pessoal a tratar, nosso
acordo foi encerrado e hoje irei anunciar à minha família.

— Felipe, por favor, eu cometi um erro... — começa, mas eu a


interrompo.

— Você traiu minha confiança — pontuo.

— Não deixe que isso atrapalhe o nosso acordo, sua empresa


financiará o meu evento, não é nem pelo dinheiro, mas pelo peso da sua
marca, a imprensa, tanto nacional quanto internacional, já noticiou; o
cancelamento seria meu suicídio social — implora.

— Então você deveria ter levado esse fato em consideração antes de


ferir uma cláusula do nosso contrato. — Levanto uma sobrancelha, e ela
torce as mãos, nervosa.
— Você não me dava atenção, eu apenas queria que você me
olhasse, me visse e sentisse ciúmes. Só nos víamos em jantares ou almoços
de negócios, e nessas ocasiões fazíamos sexo e você logo ia embora, eu
queria mais! — choraminga.

— E achou que dormindo com um dos arquitetos me faria te olhar


de forma diferente? Não consigo compreender a sua lógica. Por que não
expôs que não estava satisfeita com o nosso acordo?

— E como eu faria isso? Você sequer atendia as minhas ligações se


fossem fora do horário comercial ou se não fossem relacionadas a algum
compromisso de negócios.

— Deixei minhas intenções em relação ao nosso contrato bem


explícitas, nada estava obscuro.

— Eu me apaixonei por você. Apesar de ser frio com quase todo


mundo, você é carinhoso e amoroso com suas irmãs e seus pais, e isso me
encantou, também queria receber a mesma atenção que dispensa à sua
família — confessa.

— E criou uma fantasia romântica em sua mente e achou que eu a


seguiria sem ao menos me comunicar e, quando minhas atitudes não foram
ao encontro das suas expectativas, em vez de me informar que queria rever
as condições do nosso contrato, você preferiu ter um caso.

— E você nunca me traiu? Nunca transou com outras mulheres? Só


fazíamos sexo uma ou duas vezes por semana e às vezes nem isso!

Nisso, ela tem um ponto. Eu fazia o mínimo para manter as


cláusulas do contrato, mas, de fato, nunca senti por ela um tesão alucinante
que me fizesse perder o rumo ou mudar meus planos.
Julgava que não era capaz de sentir esse tipo de rompante
emocional.

Até que conheci Manuela...

— Não te traí, levei a sério nosso contrato.

— Meu caso com Jonas não foi nada sério, não houve sentimento
envolvido, ele já está se reconciliando com a esposa, foi apenas uma
distração para nós dois. Por favor, não deixe que algo insignificante
atrapalhe nosso acordo, nossos pais querem muito essa união.

Sofia segue falando, mas a revelação de que Jonas está tentando se


reconciliar com Manuela, junto ao fato de ela não estar respondendo as
minhas mensagens, me enerva a tal ponto que me mexo desconfortável na
cadeira.

— Fui leal, mas não posso falar o mesmo de você, que, além de
foder com um funcionário, com ele, passou informações para o Heitor, e
isso acabou me prejudicando. Ou você achou que eu não saberia disso?

Sofia fica pálida e faz um meneio negativo de cabeça.

— Creio que sabia que eu descobriria se você se encontrasse


diretamente com meu cunhado, por este motivo enviou seu amante. O que
ofereceu a ele além do seu corpo, um cargo maior na minha empresa? —
inquiro, e ela abre e fecha a boca.

— Não, você está enganado — nega, desviando o olhar do meu.

— Passava informações de quem ia aos jantares ou almoços de


negócios que participava comigo e isso me levou a perder vários acordos
vantajosos. E nem tente negar, não estou fazendo perguntas, estou
afirmando — certifico quando percebo que segue movimentando a cabeça
de forma negativa.

Reparando que não acreditarei em suas mentiras, ela se debulha em


lágrimas. Abro minha gaveta e vejo um dos meus lenços brancos bordados
com uma flor de lótus negra, mas desvio dele, pego uma caixa de lenços de
papel e escorrego em sua direção. Ela pega alguns e limpa seu rosto. Eu não
teço nenhum comentário, espero para ver até onde irá.

— Julguei que seria mais vantajoso se você focasse nas suas


empresas ao invés da sua família, nos negócios do meu pai e em nós —
justifica com os olhos cheios de lágrimas.

— E aí está novamente a narrativa fantasiosa completamente longe


da realidade. Nunca dei indícios de que me interessaria pelos negócios dos
seu pai e muito menos de que meus planos mudariam no futuro.

— Por que eu acho que você está com mais raiva disso do que por
eu ter ficado com outra pessoa? — Demonstra irritação.

— De fato, este é o motivo que mais me incomodou e foi


determinante para o término do nosso contrato.

— Como pode ser tão frio? Fala do nosso relacionamento como se


fosse um mero contrato, passamos quase dois anos juntos, iríamos nos casar
em breve e, mesmo assim, você fala e age como se não fosse nada. Eu
fiquei com outra pessoa, e você me enviou um e-mail de distrato de
contrato.

— E o que mais você queria que eu fizesse? Que exigisse que o


largasse e ficasse comigo? Que ficasse de joelhos, fizéssemos amor de
reconciliação apaixonados e depois dormíssemos de conchinha? — zombo.
— Seu desgraçado!

— Há alguns minutos, estava me pedindo para considerar, agora


passou para a fase do xingamento? Se já acabou, por favor, vá embora, não
temos mais nada a falar. Assim que informar aos meus pais, a imprensa será
notificada, junto à revelação do nosso término, que a minha empresa não irá
mais patrocinar seu evento. E, é claro, você não poderá citar meu nome ou
da minha empresa no futuro, bem como não terá permissão para utilizar
nenhuma das minhas instalações. Ou seja, também terá que procurar outro
lugar para o seu evento.

Durante algum tempo, eu analisei como poderia me vingar dela sem


criar um atrito com seu pai, que é um grande empresário do ramo
imobiliário com quem temos vários contratos em andamento, e a melhor
opção foi mexer no seu ego como ela mexeu no meu.

Não a amo, mas a traição mexeu com meu brio mesmo lá no fundo
sabendo que não lhe dei a devida assistência. Bem, a verdade é que julguei
erroneamente que o contrato seria o suficiente e não levei em conta as suas
necessidades; por outro lado, ela poderia ter manifestado sua insatisfação
em vez de me trair.

Este evento significava muito para ela, Sofia anseia em fazer


carreira no mundo da moda e quer ser influencer nesse nicho e acreditou
que o evento seria o pontapé inicial.

— Você falará sobre o meu caso? — questiona, temerosa.

— Não serei tão vil a esse ponto.

— Você sabe que está acabando com meu sonho, não sabe? Se
esqueceu que sua irmã também faz parte do projeto?
— Sim, eu sei.

— E isso não te faz mudar de ideia.

— Nem um pouco.

— Você não tem coração, é frio e insensível. — Volta a chorar.

— Pensei que esse fato havia ficado claro quando te propus o


contrato — falo calmamente.

Sofia perde completamente a compostura e solta um berro, fazendo


meu segurança e minha secretária entrarem na sala.

— Se já terminou, retire-se, minha agenda está cheia e não tenho


tempo a perder com insanidades — soo frio. — Por favor, acompanhe a
senhorita Alcântara até a porta de saída do prédio.

— Eu vou me vingar de você, Felipe!

— Ficarei à espera do seu revide. — Elevo uma mão e aceno


enquanto ela é retirada da minha sala.

Volto a abrir minha gaveta e busco um dos meus lenços com uma
flor lótus negra.

— Para ser sincero, eu menti para você, Sofia. Uma mulher


conseguiu quebrar meu gelo, me fazer mudar meus planos e se infiltrou na
minha mente a tal ponto que não consigo arrancá-la. E agora terei que
encontrar uma forma de roubá-la para mim, porque não há a menor chance
de deixá-la escapar.

Sorrio enquanto acaricio o lenço.


Capítulo 14

Felipe
Estaciono na frente da mansão dos meus pais e noto que o carro do
meu cunhado já está estacionado, indicando que Heitor e Isabela já
chegaram.

Ajeito meu terno e entro, sendo recebido por minha irmã Cecilia,
que abraça minha cintura. Apesar de ser sete anos mais novo que ela, a trato
como uma irmã mais nova. Seguro sua testa e a beijo, arrancando um
sorriso dos seus lábios.

Minha irmã sofreu muito com o término do seu casamento. A


traição, junto da tentativa de extorsão do ex-marido, a abalou psicológica e
profissionalmente, ela buscou refúgio no álcool e nas drogas e foi uma
época complicada para todos que a amamos. Enquanto se recuperava,
voltou a morar com meus pais e conseguiu se livrar das drogas, mas do
álcool, ainda não.

Indico o copo em suas mãos com a cabeça e recebo uma careta


como resposta.

— Para, é apenas uma dose para relaxar, mamãe está uma pilha e
papai quase explodindo, eles já sabem que você terminou com Sofia.

— Deixe-me adivinhar, nosso querido cunhado revelou? — indago,


e ela nega com a cabeça.

— Isabela, ela também está bem chateada, parece que ia participar


do tal evento que Sofia ia fazer, ou algo parecido.

Este é um dos efeitos colaterais que previ quando arquitetei minha


vingança em relação a Sofia, sabia que não atingiria somente a ela, seria
como um efeito dominó, onde várias peças cairiam, entre elas, minha irmã.

— Não se preocupe, vou propor algo interessante a ela. Na verdade,


para vocês duas.

— Para nós? Terá que ser algo muito grande, porque ela está
bufando.

— E você se tornou a fofoqueira oficial da família. — Aperto o seu


nariz.

— E o que mais eu posso fazer? Estou praticamente enclausurada


dentro dos muros desta mansão, sequer posso interagir com meus amigos.
Para a nossa mãe, eles são um bando de desordeiros sem nenhuma classe,
apenas porque fizemos uma festa na piscina. E nosso pai não quer que eu
manche o nome da família.
— Regada a sexo, álcool e drogas.

— Não havia droga!

— Mas havia muito álcool e camisinha espalhada por todo o jardim,


nossa mãe faltou pouco infartar quando voltou de viagem e viu a cena. Você
sabe o quanto eles são conservadores. — Não escondo um sorriso quando
me lembro da cena.

— Passei a minha vida fazendo tudo o que eles queriam, me


vestindo, me comportando e até me casando com quem eles queriam, e o
que isso me trouxe? Um par de chifres, humilhação pública e minha saúde
mental no ralo.

— Por que não sai daqui? Você sabe que, na hora que quiser, eu te
ajudo. Se quiser fazer uma viagem ou até mesmo morar fora do país, pode
contar comigo.

— Eu já pensei nisso.

— E por que não faz?

— Acho que gosto mais de reclamar do que de agir. — Seus olhos


se enchem de lágrimas, e eu a puxo para um abraço. — Sou uma grande
bagunça, meu irmão — admite com voz embargada.

— Como sempre, confabulando escondidos. — A voz irritada de


Isabela faz Cecilia se afastar, limpar sua face discretamente e depois
imprimir um sorriso em seu rosto.

— Estávamos falando de você — soa implicante, e esta ação me faz


lembrar de Manuela.
Talvez seja por causa da minha irmã que eu reconheci a sua
fragilidade imediatamente. Creio que, por tanto ver Cecilia forçar um
sorriso e pôr a máscara de indiferença no rosto, reparei de imediato quando
Manuela usou este mesmo artifício, sendo que, ao contrário da minha irmã,
que revida e é implicante, Manuela se retrai e não consegue mascarar seus
sentimentos.

Respiro fundo, afastando meus pensamentos dela, e volto meu olhar


para minha irmã, Isabela. Abro meus braços e sorrio, logo depois pisco um
olho e lhe envio um beijo.

Minha irmã mais velha até tenta manter a expressão irritada por
algum tempo, mas logo um sorriso furtivo brota no canto da sua boca.

Ela não resiste ao meu charme.

— Você não vale nada. — Bate no meu braço antes de enlaçar


minha cintura.

Dedico o mesmo carinho a ela, beijo sua testa e a vejo soltar um


longo suspiro.

As duas são parecidas fisicamente, ambas têm cabelos pretos, são


magras, tem olhos azuis e estatura mediana. Nenhuma das duas tiveram
filhos, as duas esperaram tempo demais para se casarem e só o fizeram
quando nossos pais aprovaram.

Mas as coincidências terminam aí. Enquanto Cecilia é mais


emocional, Isabela é o oposto disso, o relacionamento de ambas nunca foi
algo calmo e tranquilo.
Cecilia é artista plástica, mas, desde seu divórcio, deixou seu
trabalho de lado; já Isabela, é uma socialite que ama moda e vive
aparecendo em revistas e colunas sociais. Eu as amo, mesmo que meu
relacionamento com Isabela, às vezes, tenha rusgas por causa do seu
marido, nada abala meu amor por ela.

— Tem noção da dor de cabeça que causará quando revelar que,


além de terminar o noivado, também cancelará o patrocínio ao evento? —
indaga.

— Sim, eu tenho — confirmo, fazendo um movimento afirmativo


de cabeça.

— E mesmo assim vai seguir em diante — Isabela soa indignada.

— Sim.

— Às vezes, eu me assusto com sua dualidade, como pode ser tão


amoroso e carinhoso conosco quando, ao resto do mundo, não desprende o
mínimo de empatia?

— Somente com quem merece.

— Felipe, várias pessoas esperam por esse evento — minha irmã


insiste.

— Se fosse algo relacionado à caridade, eu jamais ousaria tirar meu


patrocínio, mas não é, então não mudarei de ideia.

— Eu estava diretamente envolvida com a produção, sou


responsável por trazer os grandes nomes da moda internacional, como eu
fico com isso? Não pensou em sua irmã, sequer pensou no quanto isso me
envergonharia?
— Claro que pensei, tanto que te proponho que, em vez de se
dedicar a um evento que não levará seu nome, faça um com o seu, ou não
está cansada de ajudar as pessoas e somente elas levarem o holofote?

— Meu próprio evento de moda? — O assombro em sua voz me


leva a crer que jamais pensou nesta possibilidade. — Eu não conseguiria!

— E por que não? Você convidou influencers, atores, músicos e


modelos internacionais, além disso, durante os últimos anos, viveu nesse
meio. Acho que está mais do que na hora de trabalhar com isso, e Cecilia
pode te ajudar.

— Eu? — Minha irmã do meio aponta o copo para ela, e Isabela


bufa.

— Como ela poderia me ajudar em algo se mal larga o copo de


bebida?

— Pois saiba que eu sou uma artista plástica renomada!

— Em vez de brigarem, pensem no que pretendem fazer, sugiro que


abram uma galeria de arte onde poderiam ocorrer desfiles ocasionais e
outros eventos relacionados à moda e arte, eu financio cem por cento.

— Estou completamente atordoada! — Cecilia exclama.

— Você nunca sugeriu algo assim, e me recordo que negou todos os


pedidos de patrocínio para eventos que te pedi. Esta sua oferta é somente
para aplacar minha raiva por causa do cancelamento do evento? — indaga,
cruzando os braços.

— Isto é óbvio, minha querida irmã. — Beijo sua bochecha. —


Apenas quero compensar as dores de cabeça que terá. Façam um plano de
negócio e me envie o mais rápido possível, se quiser, posso contratar uma
equipe para ajudar vocês.

— Eu gostei da ideia de uma galeria, me deu até vontade de fazer


uma escultura — Cecilia diz, empolgada.

— Fico feliz em ouvir isso, lhe fará muito bem. — Pisco um olho
para ela.

— Uma galeria requer muito trabalho e... — Isabela começa, mas eu


a interrompo.

— Como disse, contrato uma equipe para ajudar. Amanhã peço


Vitória para entrar em contato com vocês.

— Já, amanhã? — ambas falam ao mesmo tempo.

— Sim, afinal, vocês têm muito trabalho pela frente.

— Mas você acabou de sugerir, sequer pensei a respeito — Isabela


reclama com um sorriso nos lábios.

— Ter minha própria galeria onde posso exibir minha arte sem que
tenha que me submeter ao crivo de alguém — Cecilia fala, emocionada.

— Nossa galeria! — Isabela retruca. — Contudo, devo admitir que


suas obras são belíssimas, já imagino as modelos desfilando peças
exclusivas entre as obras de arte, os convidados encantados com tanta
beleza e luxo. Ai meu Deus, minha cabeça vai explodir! — Isabela
exclama, excitada.

— Será do jeito e da forma que vocês quiserem, não pouparei


nenhum recurso. Entretanto, quando indicar um artista, quero que seja
aceito sem excitação.

Ambas bufam.

— Você não conhece artistas, nunca gostou desse mundo, se fosse


uma livraria, até entenderia — Cecilia aponta.

— Você tem alergia ao mundo da moda e da arte — Isabela lembra.

E eu sorrio, pensando que recentemente conheci uma artista,


Manuela comentou que amava pintar e tinha a intenção de voltar à sua
antiga paixão, e talvez este seja o caminho para tê-la em minha vida.

Deslizo meu olhar sobre cada pessoa sentada à mesa de jantar da


casa dos meus pais. Minha mãe, Olívia, passa todo tempo com um sorriso
forçado em seus lábios, ela segue tentando que todos se deem bem. Não é
uma situação fácil para ela, desde que os seus genros deixaram claras suas
intenções de fazerem parte da diretoria da empresa, a harmonia que ela
tanto preza foi destruída.

Meu pai, Paulo Sampaio, evita a todo custo os atritos familiares, ele
não admite que absolutamente nada suje o nome da família Sampaio.

— Felipe, vi no noticiário que uma das suas empresas está


concorrendo a um prêmio. — Meu pai não esconde o orgulho em sua fala.

— Tenho mais de uma empresa concorrendo a alguns prêmios, pai.


— Foco minha atenção nele e reparo que sorri largo. — Mas a que foi
noticiada recentemente foi a FS Invest, minha empresa de consultoria e
investimento.

— Você tem tantas que às vezes me confundo. — Ele solta uma


gargalhada.

— Nosso filho faz muito sucesso! — Minha mãe me olha com


carinho.

Nossa família não é perfeita, muito pelo contrário, tem muitas


camadas obscuras e traumas submersos, mas eu a amo, e eles me ama. Fito
minhas irmãs e vejo o mesmo sentimento emanando delas, a forma como
meus pais as tratam é muito desigual, o machismo estrutural está
empregado em seus atos e elas sofrem por isso, mas não conseguem sair
desse emaranhado de preconceitos. Para os meus pais, uma mulher tem que
ser dona de casa, ter filhos e servir ao marido e, na concepção deles, ambas
falharam em algum grau.

— Hoje me propus a financiar uma galeria de arte para Isabela e


Cecilia — começo e, pelo canto do olho, as vejo engolir em seco. Meu pai
retira o sorriso do rosto e minha mãe o fita, apreensiva.

— Não vejo necessidade para isso — meu pai comenta e seu tom de
voz não é nada agradável.

— Mas eu, sim, pai, será um bom investimento cultural e aposto na


capacidade das minhas irmãs de gerir este negócio que irei patrocinar e,
como o senhor mencionou que viu um anúncio sobre o prêmio que uma das
minhas empresas está concorrendo, achei por bem comunicar essa decisão,
já que muito provavelmente o senhor verá e ouvirá muito sobre isso. Afinal,
não pretendo poupar recursos — informo e vejo meu pai se mexer na
cadeira, incomodado.

Por mais que ele comande a vida das minhas irmãs e, apesar de eu o
respeitar muito, ele sabe que não consegue me controlar. Este foi um dos
motivos para ter me esforçado tanto para ter minhas próprias empresas e
patrimônio independente da fortuna dos meus pais, não dependo
financeiramente deles para nada, mas esta posição nos negócios da família é
uma questão de honra.

— Por acaso usará recursos da nossa empresa para financiar essa


insensatez? Nem Isabela e muito menos Cecilia saberiam gerir um negócio.
Minha mulher só cuida de bazares beneficentes, e Cecilia, bem, ela não está
bem e todos nós sabemos disso — Heitor indaga, e é impossível não notar o
escárnio em sua voz.

Esta foi a forma que ele encontrou para conseguir a afeição do meu
pai, compartilhar os mesmos sentimentos de superioridade.

Desvio para Isabela e a vejo empalidecer e virar o rosto para mim. É


impossível não notar a decepção em seu rosto com a fala do marido, seus
olhos ficam cheios de lágrimas e ela abaixa a cabeça.

— Não se preocupe, Heitor, o capital investido sairá do meu bolso.


E volto a afirmar que confio plenamente na capacidade das minhas irmãs,
tenho certeza de que esta galeria será um enorme sucesso, tanto de crítica,
quanto de produtividade. Mas, de certa forma, compreendo a sua
preocupação, pois anda comprando ações de acionista menores, mesmo
após meu pai ordenar que não mais o fizesse. — Vejo-o empalidecer e
sorrio. Ele não esperava um ataque direto.
Não estava em meus planos confrontá-lo, mas não me controlei ao
ver a reação da minha irmã com o descaso do seu marido.

— Você comprou mais ações da minha empresa? — meu pai


inquire, soando rude.

— Sim, pai, agora Heitor detém cerca de 10% das ações da empresa
e tem direito a voto — esclareço antes que meu cunhado possa falar algo.

— O que você está pretendendo com isso? — meu pai questiona, se


dirigindo ao seu genro e eu elevo uma sobrancelha enquanto degusto um
gole de vinho.

— Eu iria falar com o senhor após o jantar, os acionistas me


procuraram e, em vez de deixá-los vender para outras pessoas, acabei
comprando para manter as ações na família. — Heitor se defende fitando
meu pai.

— Nossa, como é benevolente, se for esse o caso, venda-as para


mim, pago o dobro do valor que pagou por elas — sugiro com seriedade.

— Não vejo motivos para isso, acaso o senhor não confia em mim,
meu sogro? Desde que o conheci, algum uma vez o fiz duvidar da minha
índole? — Heitor segue falando sem desviar os olhos do meu pai.

— Caso queira, posso ditar uma lista bem longa de atitudes no


mínimo estranhas.

— Por que você está me atacando assim, Felipe, é por medo? Sei
que sente ciúmes da minha relação com seu pai, mas não há motivos para
isso.
— Ciúmes? Heitor, julga que está lidando com um moleque? Estou
bastante seguro quanto à minha posição nesta empresa e na minha família.

— Heitor, Felipe será meu sucessor na empresa e preferiria que


vendesse essas ações para ele. Por favor, não volte a comprar ações no
futuro. — Meu pai determina.

— Meu sogro, o senhor acabou de o elogiar por uma das suas


empresas, não acha que é muita coisa para ele gerir?

— Felipe é meu filho, meu herdeiro, e é ele quem vai comandar


meus negócios, as outras empresas dele apenas o preparam para quando
assumir a presidência, e esta não é uma decisão que mudará no futuro —
meu pai decreta.

— Mesmo com o futuro escândalo do noivado? — Heitor solta


malicioso.

— Fiquei tão empolgado com a premiação que me esqueci


completamente deste assunto. — Meu pai se vira para mim. — Por que
terminou o noivado?

— Porque Sofia me traiu com um arquiteto da minha empresa e, de


quebra, ambos passaram informações para Heitor sobre meus encontros de
negócios e, assim, ele conseguiu comprar as ações e roubar alguns contratos
que tinha a pretensão de fechar — esclareço calmamente enquanto corto um
suculento pedaço de carne e, em seguida, o degusto.

— Oh, meu Deus! — Isabela exclama.

— Aquela vaca! — Cecilia xinga.


Minha mãe leva a mão à boca. Meu pai, às têmporas. Heitor me fita
com tanta raiva que parece que em poucos segundos voará por cima da
mesa e me dará um soco.

E eu sorrio, vendo o caos se formar e sabendo que isso é apenas o


começo, a confusão mesmo virá quando meus pais souberem com quem eu
pretendo me casar. Porque eu terei Manuela e nada me impedirá.
Capítulo 15

Felipe
Saio do banho e ouço meu celular tocar mais uma vez, enrolo uma
toalha na cintura e busco o aparelho, que indica algumas ligações perdidas
das minhas irmãs, uma do meu pai e duas da minha mãe.

Desde a noite do jantar, eles estão alvoroçados. Escolho ignorar a


todos e envio mais uma mensagem para Manuela, mas não consigo falar
com ela e eu preciso saber se o que Sofia comentou é verdade, quero
confirmar se ela realmente está tentando se reconciliar com o marido.

— Essa mulher será minha! — decreto e solto uma gargalhada. Já


imagino o inferno na terra que será tudo isso. — Eu estou pouco me
fodendo para a confusão que isso dará.

Visto uma cueca e um moletom largo e caminho descalço pela


minha cobertura até a sala, encho um copo de uísque e sigo para a varanda.
Me sento em uma espreguiçadeira e observo a paisagem, moro na Barra da
Tijuca, em uma cobertura com vista para o mar e para a Pedra da Gávea.
Gosto de ficar próximo à natureza, isso me ajuda a pensar.

E preciso encontrar uma forma de me aproximar de Manuela, não


queria forçar um encontro como foi na primeira vez, porém, já que não
consigo contato com ela, não vejo outra alternativa.
Enquanto decido se ligo para o detetive que contratei para seguir os
passos dela e de seu marido, meu celular toca mais uma vez e, ao pegá-lo,
reparo que é minha irmã Cecilia. Desistindo de ignorar a ligação
novamente, atendo.

— Boa noite, Cecilia — cumprimento.

— Isabela está me deixando louca! — reclama, fazendo-me rir.

Fiquei feliz quando, no dia seguinte ao jantar, minha irmã mais


velha me ligou e disse que aceitava abrir a galeria com Cecilia, creio que as
palavras depreciativas do seu marido foram o principal incentivo.

— Vitória me disse que passou o contato da equipe que ela


selecionou para auxiliar vocês. Já ligaram para eles? — indago, ingerindo
um pouco da bebida.

— Sim, tivemos uma reunião hoje, mas não conseguimos concordar


com nada, não sei como isso dará certo — desabafa.

— Cecilia, apesar de minha intenção inicial ter motivos obscuros, eu


realmente quero ajudar vocês. As duas precisam ter sua independência, seja
emocional, ou financeira; porém, eu só posso fazer até certo ponto, vocês
também precisam querer, precisam se entender, fazer disso um sonho, uma
meta, um objetivo — aconselho.

— Por que está fazendo isso agora? O que está acontecendo? —


questiona.

— Já expliquei: no começo, meus motivos eram somente para me


vingar, mas agora percebo o quanto vocês precisam disso, tenho certeza de
que notou o quanto Heitor é malicioso, por isso, também tenho receio de
que... — Minha irmã me interrompe.

— De que Isabela termine como eu — conclui, soando triste.

Não nego, porque esta é a verdade, fui eu que revelei as traições de


Davi, ex-marido de Cecilia, e logo em seguida ela se separou e mergulhou
no fundo do poço. Não imaginava que minha irmã, tão alegre e sorridente,
fosse ficar tão depressiva depois do divórcio. Ainda assim, isso não me
impediria de fazer tudo novamente.

Estou na cola de Heitor, buscando todos os seus erros em relação a


empresa e a mulheres. Isabela o ama, creio que perdoaria quase tudo, menos
traição, ainda não peguei nenhum indício, mas, se houver, tenho medo de
que ela afunde tanto quanto Cecilia.

A galeria é uma ótima saída, pois, se elas ficarem com a mente


focada em um projeto que ambas amam, talvez recuperem o emocional
afetado. Todavia, confesso que não estou pensando somente nas minhas
irmãs, quero que este projeto seja benéfico tanto para elas, quanto para
Manuela.

— Vou tentar manter a calma na próxima reunião — fala após um


longo suspiro.

— Por que vocês não conversam antes de se encontrarem com os


profissionais novamente? Tentem alinhar o que cada uma quer e o que não
quer. Façam isso por vocês! — sugiro.

Após conversarmos por mais algum tempo, terminamos a ligação e,


em seguida, Isabela me liga e digo algo semelhante a ela. Aproveito
também para tranquilizar meus pais, que estão receosos desde o jantar.
Aquela noite terminou com Heitor saindo abruptamente da casa deles,
puxando Isabela e sem responder nenhuma das acusações que fiz.

Também saí da casa dos meus pais sem dar maiores detalhes, e é por
este motivo a preocupação deles.

Perco um tempo olhando o celular, decidindo se ligo ao não para o


detetive. Já faz quase uma semana desde que tive contato com Manuela, e
esse sumiço já está mais que estranho. Assim, incapaz de me controlar, ligo
para ele e peço que me mantenha informado sobre os movimentos daquela
família.

Na noite seguinte, recebo o primeiro relatório do detetive, e ali


constam apenas movimentações de Jonas, da mãe e da cunhada, Juliana;
nada de Manuela. Acho estranho, mas me recordo do quanto foi difícil para
ela nos últimos dias.

Contudo, no dia seguinte, recebo um relatório similar, e a única


coisa incomum entre eles é que Jonas e Juliana visitaram um hospital
público psiquiátrico no subúrbio do Rio de Janeiro.

— Puta que pariu! — xingo ao me lembrar de que, há alguns dias,


minha secretária me disse que recebi uma ligação estranha de alguém de um
hospital psiquiátrico e, na ocasião, achei que fosse trote.

Imediatamente, entro em contato com Vitória e peço para confirmar


o nome da pessoa e do hospital e, assim que me passa, ligo para o lugar.

— Boa noite, é do Hospital Psiquiátrico Clemente Ferreira? —


indago, ansioso.

— É, sim, em que posso ajudá-lo? — uma voz masculina pergunta.


Até penso em perguntar sobre Manuela, mas, imaginando que não
me dariam essa informação, inquiro sobre a pessoa que me ligou.

— Paula Silva trabalha aí?

— Sim, uma enfermeira, só um instante que vou passar para o setor


dela.

Aguardo ansioso até que a ligação é atendida.

— Boa noite.

— Falo com Paula Silva?

— Sim, quem está falando?

— Meu nome é Felipe Sampaio, há alguns dias você entrou em


contato com a minha empresa.

— Felipe... não conheço ninguém com esse nome — soa confusa.

— Por acaso tem uma mulher chamada Manuela Torres Fonseca


Souza internada aí? — inquiro, e ela leva um tempo para responder.

— O senhor tem celular? Eu não posso falar por este número.

— Me passe o seu telefone que retorno — peço e, após ela me


passar, digo: — Você receberá uma ligação restrita.

— Não posso falar agora. Me dê dez minutos e então pode ligar —


pede, desligando em seguida.

Durante esse tempo, confabulo várias teorias e todas dão merda.


Após o tempo corrido, retorno a ligação com a raiva correndo solta pelas
minhas veias.
— A Manuela está aí, foi ela que pediu para você entrar em contato
comigo? — questiono assim que ela atende.

— Ela me pediu para entrar em contato com você ou com a


cunhada.

A enfermeira sussurra apressada, como se estivesse com medo de


ser pega passando informações.

— A paciente foi internada aqui há sete dias, a cunhada e o marido


vieram visitá-la. Meu turno é à noite, por isso não consegui falar com a
cunhada ainda, mas os enfermeiros da manhã dizem que apenas ela entra no
quarto e, nesse horário, a paciente está dopada. Não é o primeiro caso
desses que acontece aqui, já vi muita gente sendo internada quando a
família quer o dinheiro deles — informa.

— Eu pago o que você quiser se me ajudar a vê-la. Posso te


transferir 500 mil reais agora se me ajudar a tirá-la daí — ofereço, puto. Se
já tinha raiva daquele verme, agora piorou.

— Não estou fazendo isso por dinheiro, sou vítima de violência


doméstica e prometi ajudar sempre que visse alguém passando por isso —
esclarece.

E, quando ela fala sobre violência, meu sangue gela.

— Manuela está machucada? — inquiro, tentando controlar a minha


voz.

— Está com um ferimento na cabeça. Para resumir de forma leiga,


na ficha dela diz que ela surtou, bateu a cabeça e perdeu a consciência, só
que os remédios a mantêm dopada — relata, e, dessa vez, não impeço o
xingamento.

— Puta que pariu! — rosno.

— Para um hospital público perto de uma comunidade carente, uma


mulher que parece ter uma ótima situação financeira não bate, entende? —
ela continua. — Aí, há uns quatro dias, ela acordou e me pediu para ligar
para sua empresa, mas não consegui falar com você.

— Obrigado por ajudar. Por favor, me passe o endereço daí!

— Você não vai conseguir tirá-la daqui fácil, vai precisar envolver
justiça, polícia e advogados.

— Mais uma vez muito obrigado pela ajuda, vou tirá-la daí o mais
rápido possível.

Termino a ligação e ligo para o meu advogado.

— João, eu preciso de uma liminar para tirar uma mulher de um


hospital público psiquiátrico— ordeno, buscando a chave do meu carro e
saindo de casa.

— O quê? É Cecilia, ela foi internada na clínica novamente?

— Não é minha irmã — esclareço, ajustando o fone bluetooth no


meu ouvido esquerdo, jogando o celular no banco carona e, em seguida,
dando partida.

— Felipe, se não é da sua família, será muito complicado fazer isso.


Você precisará de um médico psiquiatra, e, no máximo, conseguiremos
transferi-la para uma clínica particular para uma segunda avaliação.
— Pois consiga isso, e eu preciso para hoje!

— A única forma de conseguir é rolando propina.

— Não me importa quanto ou como, eu vou tirá-la de lá nem que


tenha que pôr o lugar abaixo!

— Calma, eu vou resolver, sempre consigo as coisas. Me passe o


endereço e o nome dela e não faça nada até eu entrar em contato com você.

— Estou indo para lá agora.

— Felipe, quem é esta mulher? Você nunca fez algo assim, seus atos
são sempre muito bem calculados, nada é por impulso.

— Manuela está se separando e pelo jeito ela foi internada de forma


escusa pelo marido. O desgraçado a enganou e a roubou por anos e
provavelmente deve ter feito isso para conseguir pôr as mãos no dinheiro
dela. O padrinho, que também é seu procurador, sofreu um infarto há alguns
dias e, antes disso, teve uma severa discussão com o filho da puta do
marido dela! — resumo.

— Essas informações mudam completamente o caso, mas eu


precisaria de mais tempo para analisar.

— Você tem esta noite! Vou te passar o nome dele, aposto que, se
fizer uma busca rápida por processos, encontrará algo. Com ela e o
procurador incapacitados, ele tem acesso ao dinheiro dela.

— Por que você está se envolvendo nisso? Este é o tipo de situação


da qual você sempre correu. Sempre foi metódico e coerente.
— Porque eu vou me casar com esta mulher. — Ouço sua
exclamação e volto a ordenar. — Você tem algumas horas para resolver
isso!

— Tudo bem, vou começar a trabalhar e entro em contato assim que


conseguir resolver, mas tenta se segurar, se não, em vez de me ajudar, irá
atrapalhar.

— Vou tentar!

Desligo e acelero o carro tentando chegar o mais rápido possível lá.


Ao chegar ao hospital, me deparo com um lugar em péssimas condições.
Ainda dentro do carro, entro em contato com a enfermeira Paula, que me
atende no segundo toque.

— Estou no estacionamento — informo.

— Vou dar um pulinho aí, como reconheço o senhor?

— Meu carro é um Aston Martin.

— Não reconheço marcas de carro.

— É o único carro prata no estacionamento.

— Tudo bem, em dez minutos, chego aí.

Assim que ela desliga, retorno para o meu advogado.

— Alguma atualização? — indago assim que ele atende.

— Estou na delegacia. Parte da minha equipe foi para uma clínica


psiquiátrica na Barra da Tijuca e os outros estão tentando uma liminar. Ao
todo, além de mim, são mais seis advogados envolvidos. Creio que em mais
meia hora já terei uma posição.

— Não quero uma posição, quero vocês aqui, tirando Manuela deste
lugar terrível! — exijo.

— Felipe, tente manter a calma, estou trabalhando para resolver


isso. Já conversei com a delegada, pois achei melhor vir a uma delegacia da
mulher, e ela já está apurando os fatos. No máximo, em quarenta minutos,
já terei a resposta sobre a liminar e os outros advogados terão me passado a
informação sobre a clínica.

— Tudo bem, aguardarei.

Termino a ligação e saio do carro quando vejo uma mulher vestida


de branco se aproximar.

— Você é o Felipe? — questiona, me fitando com admiração.

— Sim, como está Manuela, posso vê-la? — pergunto, ansioso.

— Ela está dormindo. Quanto a vê-la, o plantão acabou de trocar e


os médicos estão visitando os pacientes. Talvez eu consiga te deixar entrar
daqui a duas horas, você pode esperar? — explica, sempre olhando para os
lados.

Mais uma vez, agradeço a ajuda, e ela, novamente, diz que apenas
está sendo solidária com outra mulher como um dia foram com ela.

Demorou uma hora para João entrar em contato comigo, mais uma
hora e meia para que a equipe médica da clínica particular chegar com dois
advogados e logo depois meu advogado apareceu acompanhado da
delegada e dos outros advogados.
Entramos no hospital, e eu queria ir direto ver Manuela, mas fui
impedido, pois não sou da família, legalmente não sou nada dela. Isso me
subiu uma raiva surreal, estou acostumado a dar ordens e ser obedecido
imediatamente, contudo, agora, para não prejudicar os profissionais que
estão tentando ferrenhamente tirar Manuela daqui, eu tenho que ficar
calado, com o grito preso na garganta, puto da vida, mas se isso for para
ajudá-la, tudo bem.

Eu faço qualquer coisa para mantê-la segura e prometo me vingar de


cada um que a fez sofrer.
Capítulo 16

Manuela
Tento abrir meus olhos uma, duas vezes, mas não consigo, minhas
pálpebras estão pesadas. Forço mais uma vez e vejo tudo nublado,
desfocado. Volto a fechar meus olhos e ouço algumas vozes, mas não
consigo identificá-las.

Estou me sentindo confusa e sonolenta, não sei onde estou. Tento


mais uma vez abrir meus olhos, tento me manter acordada, forço minha
vista, me esforço para manter o foco e, quando consigo, movimento minha
cabeça, buscando identificar onde estou.

Vejo parede e teto branco, estou deitada em uma cama que não é
minha; viro a cabeça e noto um suporte para soro, desvio para meu braço e
me dou conta de que estou recebendo algum medicamento. Percorro o
ambiente com o olhar e percebo mais uma cama, só que está vazia.

— Hospital? — murmuro e sinto minha garganta seca.

Tento engolir saliva e desce arranhando goela abaixo.

— Você acordou! Fiz o que me pediu, consegui contato com o


Felipe, ele está aí fora, disse que vai te ajudar e está tentando te transferir
daqui — uma mulher branca e baixa fala, e eu me esforço para tentar
compreendê-la.

— Há quanto tempo estou aqui? — Minha voz soa rouca.


— Sete dias — informa, me ajudando a me sentar. — Beba um
pouco de água, vai ajudar.

— Obrigada — murmuro após alguns goles. Gemo ao sentir uma


pontada de dor na cabeça. — Por que estou aqui? Sofri algum acidente?
Não me lembro de nada. — Entrego o copo e levo uma mão à região que
está doendo, tapeio com cuidado e identifico um curativo.

— A sua ficha diz praticamente que você surtou e bateu a cabeça,


você foi internada pelo seu marido. Me pediu ajuda há alguns dias e hoje o
homem que você me pediu para procurar entrou em contato comigo e está
fazendo uma tremenda confusão no hospital. Tem vários advogados,
delegada, policiais, médicos e enfermeiros. Estão tentando te transferir para
uma clínica particular. — Assinto, mas compreendo pouco o que ela fala.

Reparo que ela retira meu soro e, em seguida, meu acesso.

— Obrigada por me ajudar — peço, minha voz novamente soando


fraca, ainda não tenho muita noção do que aconteceu.

— Não precisa agradecer, recebi ajuda quando meu marido me


agrediu e prometi que, se um dia visse algo assim, ajudaria, mesmo que
pusesse minha carreira em risco. Todos os enfermeiros acham o seu caso
estranho, o diretor daqui é corrupto, já aconteceram várias situações
parecidas com a sua, tem família que interna idoso para pegar a herança,
marido que faz isso com a esposa. Hospital público perto de comunidade
carente não chama a atenção, você poderia ficar aqui por meses. Graças a
Deus que conseguiu se comunicar, e eu ajudei! — conclui.

A enfermeira me passa um monte de informações que eu não


consigo assimilar, nunca me senti tão confusa e desorientada.
Abro a boca para fazer mais questionamentos, mas desisto quando a
sala é invadida por várias pessoas, e uma delas é Felipe. Meus olhos se
enchem de lágrimas ao vê-lo, meu peito aperta, e ele se aproxima de mim.

— Eu vou te tirar daqui — promete assim que para ao meu lado.

— Olá, Manuela, sou a psicóloga Luiza Abrão, você acha que


consegue me responder algumas perguntas? — questiona, me fitando com
atenção.

— Acho que sim — murmuro, me ajeitando na cama.

Ela apresenta cada pessoa na sala antes de se voltar para mim.

— Vocês têm que esperar um membro da família, já entrei em


contato com o seu marido! — diz, nervoso, um homem de cabelos brancos,
que provavelmente é médico, dada a sua vestimenta.

— O que nós temos é que nos resguardar de que os direitos desta


mulher estão sendo preservados! Peço que, por favor, fiquemos aqui apenas
eu e a psicóloga. Muitas pessoas podem constrangê-la — retruca outra
mulher, que a psicóloga identificou como a delegada.

— Esperarei lá fora. — Felipe segura minha mão, aperta levemente


e em seguida sai, sendo seguido pelas outras pessoas, me deixando com a
psicóloga e a delegada.

— Por favor, quero que saiba que, caso se sinta angustiada ou não
quiser mais falar, me avise e interrompo as perguntas, tudo bem? — a
psicóloga aconselha.

— Tudo bem — digo, ainda assustada.


— Manuela, sabe como veio parar aqui? — a delegada indaga.

— A enfermeira acabou de me revelar que estou aqui há sete dias.


— Mais uma vez olho em volta e novamente constato que é um quarto
comum de hospital.

— Compreendo — a voz da psicóloga soa calma.

— Eu não deveria estar em uma UTI, já que meu caso foi sério? Eu
fiquei em coma por 7 dias, por que estou em um quarto comum? Ela
também me disse que Jonas me internou, eu não estou compreendendo o
que está acontecendo. — Aponto para o meu machucado, confusa,
intercalando o olhar entre elas.

— Estamos aqui para te ajudar a resolver isso, sei que deve ser
difícil e confuso, mas lembre-se de que, quando não quiser mais falar, é só
me sinalizar — a psicóloga mais uma vez lembra.

— Tudo bem, posso continuar — asseguro.

— Qual é a última lembrança que você tem? — a delegada inquire.

— Estava em minha casa, dei os papéis do divórcio para o Jonas. A


mãe, o irmão dele e a cunhada estavam presentes, depois houve uma
discussão com a mãe dele, e isso é tudo que eu me lembro. — Forço mais a
minha mente, mas não me recordo de mais nada depois disso.

— Você está se divorciando? — a delegada pergunta.

— Sim — confirmo. — Ainda não assinamos os papéis, mas vamos


nos divorciar — afirmo.
— Já esteve em algum hospital psiquiátrico? Tem alguma pessoa
que pode atestar o que houve? — a delegada inquire.

— Sim, a minha cunhada Juliana, ela estava presente. Mas por que
você perguntou sobre hospital psiquiátrico? — indago, cada vez mais
confusa.

— Você está internada em um hospital psiquiátrico e foi mantida


sedada pelos últimos sete dias — a psicóloga revela.

Intercalo meus olhos entre as duas mulheres e confirmo que é


verdade. A compreensão do que está acontecendo chega para mim em
ondas e, a cada batida, eu fico mais assombrada, enjoada e indignada.

Julguei que já tivesse passado pela pior fase da minha vida, que
Jonas já tivesse me mostrado o seu pior lado, que absolutamente nada do
que ele fizesse me magoaria e me machucaria. Eu estava enganada!

— Como ele pôde ter feito isso, principalmente depois de tudo o que
me fez! — Levo minhas mãos ao rosto e começo a chorar.

— Calma, nós vamos te tirar daqui. — A psicóloga segura a minha


mão.

— Eu quero ir para minha casa — peço, soluçando.

— Infelizmente os médicos não podem te liberar, somente após uma


avaliação clínica. Mas não se preocupe, pois ela não será feita aqui, e sim
em outro lugar — assegura a psicóloga.

Raiva, ódio, não sei definir o sentimento que me envolve, mas não é
algo bom, é corrosivo e me pega em um rompante, me fazendo agir. Quero
sair deste lugar, quero confrontar Jonas, mas, antes de tudo, quero sair desta
cama.

— Eu não sou louca! — falo nervosa, chorando.

Saio da cama, cambaleio e quase caio, mas a psicóloga e a delegada


me amparam.

— Eu não sou doida, fui enganada, traída, roubada, mas não estou
maluca! Como ele pôde fazer isso comigo, como pôde me internar em um
hospital psiquiátrico, como ele conseguiu isso? — Me desespero, me debato
tentando sair do aperto delas e fugir daquele lugar.

— Será aberto um inquérito para descobrir tudo o que houve —


assegura a delegada.

— Quando Jonas descobriu que eu bloqueei os cartões, ele brigou


com meu advogado, levando-o a um infarto. Meu padrinho pediu para ficar
longe dele, cega pela raiva não lhe ouvi e achei que conseguiria resolver
sozinha, queria confrontá-lo por isso fui a minha casa entregar o documento
do divórcio e acabei aqui. Aquele homem quer arrancar tudo de mim, até a
minha liberdade! — desabafo, sem conseguir conter o pranto.

Eu me sinto sem chão, sem rumo, sem direção, em um beco escuro,


perdida no meio do nada. Por isso, eu grito, berro em pleno desespero,
dobro meu corpo e levo minhas mãos à cabeça, urro mais forte, mais alto, a
ponto de sentir minha garganta doer e arder, mas não paro, não consigo. É
como se tudo que levei preso por anos estivesse saindo de uma vez, me
debulho em lágrimas me sentindo no meio de um furacão, do caos, sem
conseguir achar uma saída.

— O senhor não pode entrar aqui — a delegada soa rude.


E então fortes braços me enlaçam e me puxam em direção a um
corpo quente, em seguida, uma mão segura minha cabeça com cuidado e a
pousa em seu peito. Seu calor me envolve, um beijo casto toca minha
cabeça, minha testa e sinto as batidas do seu coração. Ele está acelerado, e
isso vai me acalmando aos poucos, a ponto de transformar meus gritos em
murmúrios melancólicos.

— Me desculpe, delegada, mas não vou sair, não existe força na


terra que me faça ouvir o choro dela e ficar parado no outro lado da porta,
esperando para entrar. Ela é muito importante para mim, e eu sou o seu
ponto de conforto.

Não sei qual a reação da mulher a quem Felipe se dirige, minha


cabeça está virada para o lado oposto, mas eu abraço forte a sua cintura, me
agarrando nele como um náufrago, como se ele fosse uma ponta de luz na
minha escuridão, como se tivesse uma corda que me tirasse do meio
daquele tormento.

— Nós vamos resolver, vou te tirar daqui, e eu prometo que nunca


mais ninguém vai ousar te machucar novamente! — Felipe assegura, me
apertando mais contra seu corpo, me acalmando, me guiando para longe da
escuridão e me fazendo acreditar em suas palavras.
Capítulo 17

Manuela
Abro meus olhos e constato que mais uma vez estou em uma cama
hospitalar. Contudo, desta vez, o quarto é bem diferente, mas nem tenho
tempo de analisá-lo com calma, pois vários médicos entram, atraindo minha
atenção.

— Bom dia, Manuela, sou o Dr. Marcos Pinheiro, serei o seu


médico enquanto estiver aqui. Como você está se sentindo hoje? — um
homem vestido de branco indaga.

— Bem, acho que bem — respondo, olhando para as pessoas que


entraram com ele no quarto e, entre elas, está Felipe, que pisca o olho para
mim e se mantém perto da porta enquanto os médicos se aproximam da
minha cama.

O doutor Marcos segue falando:

— Você já conhece a psicóloga Luiza. Eu sou psiquiatra, e Roberto


Abreu, neurologista — informa, apontando para os médicos.

— Tantos especialistas só para confirmar que não sou doida! —


Tento fazer graça, mas falho, não é uma situação engraçada, nada do que
aconteceu comigo é.

— Como te expliquei ontem, você passará por uma avaliação clínica


que será feita por esses profissionais, tudo bem para você? — Luiza indaga.
Assinto. O doutor Marcos explica que tipo de exames farei, a
psicóloga sugere que conversemos na parte da tarde, após os exames e,
antes de sair, me avisam que, em breve, uma enfermeira me acompanhará
até a sala de exames.

— Bom dia, como você está? — A forte voz de Felipe chega até a
mim, me fazendo abrir um sorriso.

— Você está diferente. — Sorrio ao reparar que ele está vestido com
terno e calça preta, blusa branca e o cabelo jogado para trás, assumindo um
ar mais sério, elegante.

— Você já me viu de terno antes. — Levanta uma sobrancelha e se


aproxima da cama.

— Sim, mas estávamos caminhando na praia, seu cabelo não estava


assim.

— Fico mais bonito assim? — pergunta, passando a mão no cabelo


e fazendo uma expressão sexy.

— Acho que não tem como você ficar feio. — Brinco, me ajeitando
na cama.

— Ah, mas você faz muito bem ao meu ego! — Senta-se ao meu
lado e acaricia meu rosto.

— Você não pode se sentar na cama de uma paciente — ralho,


afastando-o.

— Se alguém reclamar, eu compro o hospital e demito a pessoa que


questionou — soa sério, e eu não tenho dúvida que de fato faria algo assim.
— Jesus, como você é arrogante! — repreendo, fazendo um
movimento negativo de cabeça.

— Nunca disse que era perfeito. — Movimenta os ombros. —


Como você está? — volta a indagar, me olhando com atenção.

E, então, o clima agradável vai embora quando me lembro do


porquê estou em uma cama hospitalar.

— Não sei, sinceramente, ainda não sei. Ontem parecia um


pesadelo, como se não tivesse sido comigo, se não fosse por você, eu... —
Viro meu rosto quando a dor me invade, respiro fundo, mas não consigo
conter as lágrimas.

Felipe volta meu rosto para si, limpa minhas lágrimas, inclina a
cabeça e me beija levemente nos lábios.

— Me desculpe por ter demorado tanto, nunca vou me perdoar por


isso. — Desliza o dedo pela minha face, limpando minhas lágrimas.

— Você não tem pelo que se desculpar, eu que tenho que agradecer.
Se não fosse por você, ainda estaria naquele hospital.

Depois que soube da minha real situação, achei que demoraria a sair
dali, mas os advogados de Felipe tinham uma liminar judicial e, com o
parecer da psicóloga e o aval da delegada, rapidamente fui transferida para
uma clínica particular.

Felipe esteve comigo em cada parte desse processo, não me deixou


sozinha nem um minuto.

— Me recordo de que dormi segurando sua mão. — Busco sua mão


e a aperto.
— Você me disse que eu era seu porto seguro, e eu levo a sério esse
papel. — Faz uma expressão engraçada, entrelaçando nossos dedos.

— Você foi para casa? Dormiu? Você falou com Bruna ou


Guilherme? Não gostaria que eles se preocupassem — questiono, receosa.

— Ainda não comentei com eles, imaginei que você pediria algo
assim, visto que o marido dela ainda está se recuperando. E fui para casa
por duas horas, queria estar aqui quando os médicos viessem conversar com
você.

— Obrigada.

— Passei a noite te olhando e planejando acabar com as pessoas que


fizeram isso com você, mas não vou fazer nada até que tenha o seu aval. Me
recordo do quanto é contra a vingança.

— Isso foi até me internarem em uma clínica psiquiátrica, tirando


toda a minha liberdade.

— Isso quer dizer que devo seguir adiante?

— Sim.

— Vou te pôr a par de cada processo.

— Não quero saber, não me importo mais.

— Gosto de ouvir isso, gosto muito. — Abaixa a cabeça e mais uma


vez me beija. Eu desvio, mas ele segura meu rosto.

— Por que está desviando? — pergunta, levantando uma


sobrancelha.
— Alguém pode entrar. — Indico a porta com a cabeça.

— Você se importa de nos verem juntos? — indaga, me fitando com


atenção.

— Nós não estamos juntos — lembro, intercalando os dedos entre


nós dois.

— Nós ainda não estamos juntos — pontua com um sorriso


matreiro.

— Apesar de tudo o que houve, ainda sou casada.

— Por pouco tempo, pedi que meu advogado cuidasse do seu


divórcio, só estávamos esperando você aprovar para dar andamento.

— Apenas me traga os documentos que eu assino.

— Perfeito, você pode conversar com o advogado agora?

— Agora, ele está aqui?

— Sim, apenas esperando para entrar.

— Tudo bem, falo com ele.

Felipe aperta minha bochecha e, em seguida, convida dois homens


para entrarem no quarto. Um, eu reconheço, seu nome é João, ele estava
ontem à noite na clínica; o outro, não.

— Manuela, este é André Martes, ele é especialista em divórcios,


seu escritório ficará responsável pelo seu caso. — Felipe o apresenta, e eu o
cumprimento.
— Eu ficarei responsável pelos processos civis e criminais — João
revela.

— Eu gostaria que Jonas ou a mãe não se aproximassem de mim,


tem como conseguir isso? — pergunto, ansiosa.

— Vamos cuidar disso — João assegura.

— Meu advogado estava cuidando do divórcio. Ele, além de meu


advogado, é o tutor da minha herança.

— O senhor Felipe já havia nos adiantado, entraremos em contato


com o escritório do Dr. Guilherme — André esclarece.

Concordo e, em seguida, eles me apresentam os documentos para


autorizar o início dos processos. Eu sequer penso antes de assinar, quero
resolver isso o mais rápido possível, anseio por me ver divorciada. Logo
depois, eles saem e fico sozinha com Felipe.

— Quero que esse divórcio saia rápido!

— Gostei de ver que suas atitudes mudaram.

— Ninguém passa pelo que eu passei e segue com o mesmo


pensamento. Tentarei me manter firme, não quero mais fraquejar,
enfrentarei tudo de frente. Mas a primeira coisa que quero fazer é sair
daqui.

— Em breve receberá alta.

— Queria ir para minha casa, mas eu não quero ver nem Jonas e
muito menos a mãe dele, e eles não vão sair de lá tão rápido.

— Sequer me passou pela cabeça deixá-la voltar para a sua casa.


— Eu posso ficar com a Bruna, ou em um hotel.

— Você ficará comigo.

— Felipe!

— Não correrei o risco de te ver machucada novamente.

— Mas não posso ficar em sua casa!

— E por que não? Você achou que estava blefando quando disse que
quero você comigo?

— Mas, Felipe...

Ele me cala, colando os lábios nos meus, me fazendo suspirar.

— Não vou forçar uma intimidade maior que alguns beijos roubados
e muito carinho. Você virá para a minha cama no momento que quiser;
enquanto isso, eu só quero te proteger. Por favor, aceite, me deixe tomar
conta de você, apenas te quero perto de mim, só assim ficarei tranquilo —
pede com a testa encostada na minha.

— Você me disse que não iria se apaixonar por mim, e está


parecendo um homem apaixonado com esse olhar. — Não controlo um
sorriso. — Eu já te disse hoje que você é meu porto seguro? — indago.

Ele segura meu rosto e esfrega seu nariz no meu.

— Pare de falar essas coisas, você corre o risco de se tornar a dona


do meu coração.

— Você disse que o coração é um órgão muscular oco.


— Sim, confirmo, mas o meu está batendo acelerado apenas por
estar perto de você. — Beija minha testa e a ponta do meu nariz.

— Já pedi para não fazer e falar essas coisas, estou carente,


magoada e posso me apaixonar por uma pessoa que só quer me ajudar
porque teve pena de mim.

Ele segura minha mão e a leva até o peito, fazendo-me constatar que
realmente bate acelerado.

— Uma pessoa com pena teria esta reação física? Manuela, eu sou o
CEO de uma das maiores construtoras do Brasil, além disso, tenho várias
outras empresas, nunca me desviei dos meus negócios e objetivos, jamais
botei qualquer coisa pessoal na frente deles. Sempre considerei desejo,
paixão e amor coisas que desviam do alvo, então, as evitava. Contudo,
estou aqui, respirando aliviado por tê-la tirado daquele lugar, querendo te
levar pra minha casa, te proteger e te fazer minha, te marcar de tal forma
que você não se lembre mais de que um dia sofreu por alguém.

Segura meu queixo e fala bem pertinho da minha boca:

— Não vou dar nome ao que eu estou sentindo, mas pena,


Manuela, é a última coisa que sinto por você. — Me beija levemente
nos lábios. — Volto mais tarde. — E novamente me beija.
Capítulo 18

Manuela
Aproveito que estou sozinha, reparo no quarto e constato que é
semelhante ao de um hotel. O recinto é sofisticado, elegante e em tons
pastel de rosa. Há um sofá, mesa com duas cadeiras, um vaso com flores e
uma porta que imagino dar para o banheiro.

Deito minha cabeça no travesseiro e evito pensar no quão caro deve


ser esta clínica. Em vez disso, foco em tentar me lembrar o que aconteceu
nos últimos dias. Mas, por mais que me esforce, só tenho pedaços de
memórias desconexos; recordo-me de ter acordado em um quarto onde
Jonas conversava com um homem ao fundo, as pequenas lembranças que
tenho são de Juliana ao meu lado, além de algumas conversas.
“Preciso que me ajude a deixá-la aqui por um mês...”, Jonas pediu
isso a uma pessoa, mas não sei quem. Fecho meus olhos e, por mais que me
esforce, não consigo me lembrar.

Corto a linha do pensamento quando uma enfermeira entra no


quarto para me levar para a sala de exames, é revoltante eu ter que provar
que estou em meu estado são de saúde e que apenas sou uma mulher com
muita raiva por tudo o que me fizeram passar.

Passo a manhã inteira fazendo exames e tendo consultas com


psiquiatra e psicóloga, que me fazem várias perguntas, e eu desabafo tudo o
que houve desde a semana passada.

Conforme falo, não consigo evitar as lágrimas após todo o ocorrido,

— Quem você gostaria de receber como visita? — a psicóloga


indaga.

— Além do Felipe, apenas Juliana; meu padrinho está se


recuperando em um hospital e a esposa o está acompanhando. Não quero
que Jonas se aproxime de mim — peço.

— Não se preocupe, seus advogados já conseguiram uma medida


protetiva — me tranquiliza.

Eu apenas assinto, imaginando que isso é coisa de Felipe. Após


saírem, acabo adormecendo. Creio que, depois de ter sido sedada por tanto
tempo, levará alguns dias até que esteja completamente ativa. Porém, ao
acordar, noto que Juliana está sentada no pequeno sofá, chorando.

— Juliana, por que está chorando, o que houve? — questiono.


— Desculpa, não queria te acordar. — Limpa o rosto
apressadamente.

— Eu já dormi demais — brinco, me ajeitando na cama.

— Eu sinto muito. — Leva as duas mãos ao rosto.

— Juliana, por favor, não chore, eu estou bem. Em pouco tempo,


saio daqui — asseguro, me levantando e me sentando ao seu lado.

— Não, volte para a cama. — Segura meu braço e me leva de volta


para onde estava deitada.

— Não estou inválida, Juliana, só acham que estou louca — brinco.

— Não diga isso nem brincando — ralha. — Já me sinto péssima


por tudo o que houve, se eu soubesse o que realmente estava acontecendo,
teria tirado você de lá à força.

— Você não tem culpa de nada.

— Manuela, eu vim te ver quase todos os dias, mas sempre te


encontrava dormindo, não podia ficar muito tempo, o horário de visita era
somente meia hora e, quando questionava a Jonas, ele dizia que os médicos
estavam cuidando de tudo. Tentei fazer Rodolfo interferir, disse que o lugar
em que você estava internada era estranho, mas ele dizia que não poderiam
te transferir até que acordasse. Raquel ficou pressionando para ele não se
meter, ela praticamente se mudou para nossa casa, mal me deixava
conversar com meu marido sobre o assunto e, quando recebi a ligação da
delegacia hoje, nossa...

Juliana fala rápido, gesticulando, faz uma pausa e olha para o teto.
Em seguida, volta a levar as mãos ao rosto.
— Conforme a delegada questionava se você alguma vez já tinha
sido internada em outros hospitais psiquiátricos ou apresentado algum
desequilíbrio, eu fiquei horrorizada e, quanto mais descobria, com mais
raiva ficava, porque, se Jonas conhece aquele homem, aquele psiquiatra
corrupto, foi por intermédio de Rodolfo, que também é psiquiatra, e só de
imaginar que meu marido pode estar envolvido nessa merda, me dá vontade
de vomitar.

— Quem fez isso comigo foi Jonas. Nas vagas memórias que eu
tenho, só aparece ele, eu nem me lembro de como fui parar lá. — Seguro
suas mãos e as aperto. — Me diga o que aconteceu depois que desmaiei,
tudo que me lembro são pequenos fragmentos.

Ela respira fundo antes de começar a falar.

— Tudo aconteceu tão rápido, você caiu e bateu a cabeça, a nossa


sogra desmaiou, Rodolfo foi acudir a mãe; eu, a você. Foi uma confusão!
Rodolfo quis levar a mãe ao médico e me pediu para a acompanhá-lo, e eu
queria ficar com você, mas Jonas disse que te levaria também, então
ficamos de nos encontrar no hospital. Eu, Rodolfo e Raquel chegamos
primeiro, ela foi atendida e ficou em observação, e nada de vocês chegarem.
Então, liguei para Jonas, e ele disse que te levou para outro hospital.

Fico em silêncio, tentando me lembrar daqueles acontecimentos,


mas nada vem à minha mente.

— A princípio, pensei que você voltaria logo para casa, mas, depois
de dois dias, comecei a achar estranho e pressionei Jonas, que acabou me
dando o endereço do hospital em que você estava. Um lugar terrível!
Quando entrei no quarto, te encontrei dormindo e recebendo medicamento
na veia, não consegui te ver acordada em nenhuma das vezes que fui te
visitar e, quando pressionava Rodolfo, Raquel dizia que era melhor deixar
você se recuperar, que você não gostava que fossem hospital enquanto
estava internada, então ontem recebi a ligação da delegacia. — Relata
nervosa e reparo que suas mãos estão trêmulas.

— Não me lembro de nada disso.

— Minha cabeça está rodando, contei tudo o que sabia para a


delegada, inclusive que meu marido é psiquiatra e que ele pode, sim, estar
envolvido nisso. — Ela não esconde a decepção.

— Juliana, eu nem sei o que falar. — Esfrego minhas duas mãos. —


Achei que já havia passado por tudo, mas isso aqui é outro nível.

— Manuela, se Rodolfo realmente estiver envolvido nisso, vou me


separar, não vou criar minha filha no meio de gente podre. Passei os últimos
dias pedindo para ele ver o que estava acontecendo, ele sempre dizia que
veria, mas depois inventava mil desculpas quando a mãe pedia para não se
envolver. Os médicos daquele hospital não davam nenhuma informação.
Nunca vou me perdoar — se recrimina.

— Já disse que a culpa não foi sua, se tem uma pessoa que eu tenho
certeza de que não tem culpa pelo que houve comigo, é você. — Inspiro
profundamente e solto o ar com força. — Eu saí de lá, isso que é o mais
importante, mas, desta vez, não vou fingir que nada aconteceu.

— E nem eu deixaria, Jonas foi longe demais. O que ele fez é crime!

— Ainda não sei quais eram suas intenções, mas ele vai responder
na justiça.
— Mesmo em meio à toda tristeza que sinto, fico feliz de te ver tão
determinada, estava com medo de te encontrar deprimida, o que seria
compreensível, depois de tudo o que você passou. — Ela aperta minha mão.

— Não quero mais chorar. A cada vez que me lembro, tenho


vontade de chorar. Mas eu não quero mais, só quero sair daqui, processar
todos que me fizeram mal e recomeçar minha vida.

— O que você precisar, pode contar comigo. — Ela me abraça.

A emoção vem forte, a vontade de chorar também, mas engulo tudo


em seco.

— Eu sei, obrigada. — Sei que suas palavras são sinceras.

— Como você saiu de lá? A delegada não me disse. Como veio


parar aqui? — Juliana indaga, apontando para o quarto.

— Felipe me ajudou — revelo e vejo a confusão em seu olhar.

—Felipe? Acho que não o conheço.

— Felipe Sampaio é o CEO da empresa em que Jonas trabalha.

Vejo a surpresa em seu rosto e ela arregala os olhos.

— Ele não é o noivo da... — completa, fazendo um movimento


giratório com o indicador.

— Sim, ele é o noivo... ou melhor, era o noivo da amante de Jonas


— confirmo.

— Mas como você o conhece? Isso é tão aleatório! — questiona,


confusa.
— Essa é uma longa história, mas, no geral, ele me ajudou a sair de
lá e está me ajudando com as questões do meu divórcio e com os processos
contra o crime que houve.

— Este é um daqueles casos em que o inimigo do meu inimigo é


meu amigo? — Seu olhar ainda é incrédulo.

— Pode-se dizer que sim. — Rio da sua expressão engraçada.

— Me sinto muito mais aliviada em te ver sorrindo, eu já estaria


quebrando tudo, na verdade, vou quebrar tudo quando chegar em casa —
ameaça.

— Não faça isso, pense em Cristina, sua filha tem que vir em
primeiro lugar.

— Por isso preciso fazer isso, Manuela: por ela, por mim. Como
posso viver com um homem que é conivente com uma merda dessa?

— Mas não sabemos se ele foi conivente.

— Se ele tivesse feito o que pedi, se tivesse vindo uma única vez te
visitar comigo, conversado com os médicos ou mesmo questionado o
irmão, você não teria ficado tanto tempo lá! — Cada palavra é carregada de
fúria. — Eu pensei que Rodolfo era diferente daqueles dois, mas acho que
estava enganada.

— Juliana, não tome nenhuma atitude precipitada, converse com ele


primeiro. Não quero que você e Cristina sofram.

— Como você pode sequer ainda pensar em alguém depois de tudo


que aconteceu com você? — inquire, indignada. — Tudo bem, antes de
quebrar tudo, vou conversar com ele — ela fala séria, me fazendo rir
novamente.

— Não estou pensando nele, mas sim em você, não quero contato
com Jonas ou com a mãe dele, apenas peço que você pense em sua filha.

Seguro sua mão.

— Como está sua pequena? Desde que começou essa confusão em


minha vida, eu quase não a vi, fico com receio de que minha separação de
Jonas me afaste dela.

— Ela está com saudades de você. E isso não ocorrerá, jamais


afastaria Cristina de você.

— Fico feliz de ouvir isso.

— Seja lá o que acontecer entre mim e Rodolfo, nossa amizade vai


permanecer intacta, pode ter certeza disso — assegura, segurando a minha
mão.

Não sei o que o futuro me reserva, ainda passarei por muitas coisas,
não tenho dúvida disso. Mas quero que Juliana esteja presente nesta nova
fase da minha vida.
Capítulo 19

Manuela
Demorei três dias para receber alta da clínica, pensei que seria mais
rápido, porém tive que esperar o resultado de todos os exames e as
avaliações dos profissionais para ser liberada. Durante esse tempo, eu
prestei depoimento e tive mais consultas com a psicóloga e com os
advogados.

Não vou dizer que foi ruim, o auxílio psicológico me ajudou a


superar esse turbilhão de acontecimentos. Inclusive, continuarei com a
terapia, sei que me ajudará a não cair em depressão.

Felipe esteve comigo durante todo o processo, todos os dias vinha à


clínica, às vezes apenas me abraçava e ficávamos um tempo assim, sem
falar nada, apenas sentindo o calor dos seus braços e as batidas do seu
coração. Ele não forçava uma interação maior, era como se soubesse que eu
queria ficar em silêncio e me respeitasse; contudo, sempre mostrando que
estava ali, do meu lado.

Como prometera, ele não me deixou ir para um hotel, também não


impus muita resistência, pois eu queria ficar perto dele, queria ter por mais
tempo a sensação de apoio e proteção.

— Este será seu quarto, o meu é aqui na frente. — Indica o local


com a cabeça. — Quando quiser conversar, xingar, me beijar ou apenas me
abraçar, saiba que minha porta nunca estará trancada para você. — Beija
minha testa.

— Obrigada, não vou ficar por muito tempo — aviso.

— Manuela, eu quero que você fique para sempre. — Desliza um


dedo pelo meu rosto. — Não vou impedir se um dia quiser ir embora, mas
saiba que farei o meu melhor para que fique comigo.

— Você sabe que tenho dependência emocional, não sabe? Não


brinque comigo, por favor, estou me esforçando para te ver como um
amigo.

Felipe se aproxima de mim, segura meu rosto e me beija, mas esse


beijo é diferente dos outros, é intenso e sexy, ele introduz a língua na minha
boca, enlaça minha cintura e me aproxima do seu corpo.

Suspiro contra seus lábios. Felipe chupa minha língua, aperta minha
bunda, e eu gemo, sentindo meu corpo estremecer.

— Quando será que entenderá que eu quero você no sentido mais


amplo da palavra? — indaga com a testa encostada na minha.
E eu sorrio, experimentando um sentimento gostoso tomar conta do
meu corpo.

— Vamos devagar.

— Ao seu tempo.

Tento me afastar, mas ele me puxa mais uma vez ao encontro do seu
corpo. Segura meu queixo, vira minha cabeça e deposita um beijo molhado
na minha garganta, me fazendo arfar. Depois, arrasta os lábios pela minha
pele até o meu ouvido e sussurra:

— Por enquanto, você dorme neste quarto, mas, quando quiser, virá
para minha cama. — Escorrega as mãos pelo meu corpo e aperta a minha
bunda, e eu não seguro um gemido.

Esfrega o nariz no meu e mais uma vez me beija, apertando minha


bunda, introduzindo uma perna entre as minhas. Sinto meu corpo arrepiar e
a excitação tomar conta, meu corpo exige satisfação imediata. Faz muito
tempo que não sou tocada, amada, e o jeito como ele desliza a mão pelo
meu corpo devagar, mas, ao mesmo tempo, exigente, apertando os pontos
certos, me faz ficar nas pontas dos pés. Porém me afasto, ofegante, com o
coração batendo acelerado e meu centro pulsando.

Viro-me de costas e suas mãos seguram a minha cintura, mas não


me puxam, apenas ficam ali. Felipe encosta a cabeça nos meus cabelos e
suspira.

— Isso só voltará a acontecer quando você der o primeiro passo.

— Não sou de dar os primeiros passos — brinco, me afastando dele.


— Não tem importância, eu dou todos os passos que precisar até
você. — Enquanto fala, ele caminha lentamente em minha direção e para
bem pertinho de mim, invadindo meu espaço pessoal.

— E o que sua família achará de eu morar aqui? — questiono,


mudando de assunto.

— Creio que será interessante.

— Eles não gostarão.

— Tenho 42 anos, não estou interessado no que eles gostarão ou


não.

— Ainda acho isso uma loucura.

— Uma deliciosa loucura. — Inclina o corpo para me beijar, mas eu


desvio.

— Pare de tentar me beijar, eu não consigo raciocinar direito com


você tão perto.

— Eu serei muito malvado se disser que não quero que pense tanto,
que apenas deixe acontecer, sem medos, sem reservas?

— Felipe! — brigo, mas não consigo segurar o riso.

— Apenas estou sendo honesto. — Movimenta os ombros. — Não


se preocupe tanto, esta semana quase não pararei em casa, tenho algumas
pendências para resolver na empresa. Mas você não estará sozinha, tenho
algumas pessoas que trabalham aqui, vou avisá-los de que tenho uma
hóspede. Os advogados estão empenhados em resolver as questões
jurídicas, não fique tão ansiosa se demorarem a entrar em contato, o
importante é que agora você está segura e, o que você precisar, é só entrar
em contato comigo. Este tempo será bom para você.

— Obrigada. Sinceramente, não sei o que eu faria sem você.

— Não precisa agradecer, e eu tenho certeza de que você daria um


jeito sem mim, mas isso aqui é o que nós dois queremos. E quanto mais
rápido admitirmos, melhor será para ambos.

— Você disse que não me apressaria.

— E não vou, mas também não vou esconder o quanto te quero, e


essa vontade só aumenta a cada minuto que passa.

— Você é um conquistador.

— Só com você. — Pisca um olho. — Não se esqueça, qualquer


coisa que precisar, me ligue.

Antes de sair, ele me beija rapidamente nos lábios, e eu respiro


fundo, giro meu corpo e vejo a impressionante vista da cobertura de Felipe.
Depois, percorro o lugar, conhecendo cada cômodo. Felipe não me mostrou
o lugar, ficou menos de meia hora, me deixou de pernas bambas e saiu.

— Eu não tenho forças para resistir a este homem! — Solto um


gritinho, levando as duas mãos ao rosto.

Abraço meu corpo e acaricio meus braços, sorrindo.

— Pode não dar em nada, mas eu não vou evitá-lo mais, eu quero
todos os momentos de prazer que ele pode me proporcionar, quero carinho,
aconchego e conforto — murmuro, caminhando a passos lentos até a área
externa e não me surpreendo a constatar que é muito luxuosa, é uma ampla
sacada com piscina, ofurô, área gourmet, mesas e algumas espreguiçadeiras
esbanjando refinamento para todos os cantos

O sol do fim de tarde aquece minha pele. Elevo meu rosto, me sinto
leve e livre e quero que este pensamento perdure por muito tempo.

Me sento em uma das espreguiçadeiras, busco meu celular e ligo


para Bruna. Ainda não contei sobre o que houve, pois a situação do meu
padrinho, apesar de melhor, ainda inspira cuidados, apenas falei que estava
bem, que não precisava se preocupar comigo e pedi que continuasse a focar
no seu marido e avisei que no dia seguinte iria fazer uma visita para ele.

Fiz o mesmo com Juliana. Além de me ligar com frequência, ela foi
me visitar novamente na clínica e me trouxe duas malas com minhas roupas
e objetos pessoais, que agradeci demais a ela.

Juliana apenas me abraçou e disse que eu não tenho noção do


tamanho do escândalo que ela fez com Raquel para pegar as minhas coisas,
e eu preferi me preservar e não saber dos detalhes. Ela se separou do marido
e está morando com o pai. Rodolfo jura que não estava envolvido, mas não
pode negar que não tentou verificar o que estava acontecendo.

Juliana não o perdoou, eu espero que eles se entendam, porque não


quero que se separem por causa do que seu irmão fez comigo.

Falando no mau-caráter, meu telefone vibra com a sua ligação.


Meus advogados me aconselharam a trocar o número e, a princípio, neguei,
não quero perder mais nada por causa dele. Mas as ligações não param,
então não estou vendo alternativa.

Como sempre faço, não atendo, não tenho mais nada a falar com ele,
tudo será tratado pelos advogados. Ainda não entendi muito bem o que
houve e já aceitei que essa lacuna sempre existirá, a psicóloga disse que é a
forma que meu cérebro encontrou para me recuperar do trauma.

Volto para o quarto com a intenção de arrumar minhas coisas.

— Duas malas — murmuro, olhando minhas roupas.

São em momentos como este, em que estou sozinha, que a tristeza


me pega em cheio. Sei que os advogados estão resolvendo as questões
jurídicas, compreendo que ainda levará tempo até que tudo seja acertado,
mas isso não me impede de ficar arrasada ao me recordar de todas as
minhas coisas que ficaram naquela casa, as fotos da minha mãe, minhas
telas, recordações do passado.

Tenho medo do que eles possam fazer com esses objetos que, para
muitos, não são nada, mas, para mim, são tão preciosos.

Ligo para o advogado João. Nossa conversa é rápida, ele está no


tribunal, resolvendo algo sobre meu caso, e promete que em breve me
atualizará sobre tudo que está acontecendo. A preocupação não vai embora,
mas resolvo focar no que eu posso resolver agora, ou seja, somente arrumar
minhas malas.
Capítulo 20

Manuela
Nos dias seguintes, minha rotina se resumia a ir ao hospital para
visitar Guilherme e Bruna e conversar com Juliana. Além disso, matei as
saudades da sua filha, Cristina.

Quero voltar para a faculdade e, principalmente, voltar a pintar, mas,


para isso, preciso mexer no meu dinheiro, coisa que ainda não consegui. Os
advogados de Felipe conseguiram me ajudar em muitas coisas, como sair da
clínica, processar Jonas e ter uma medida cautelar que o impeça de se
aproximar de mim, mas ainda não conseguiram reaver o meu dinheiro; meu
ex-marido tirou todo o valor que havia na minha conta, por isso, ainda estão
fazendo um levantamento de todas as merdas que ele fez.
O inquérito policial também ainda não foi concluído, Jonas alegou
que estava descontrolada, e o médico que me internou no hospital atestou
isso. Dizer que fiquei furiosa foi pouco, mas os advogados pediram que eu
mantivesse a calma, pois a briga estava apenas começando, e me deram
uma boa notícia: já haviam dado entrada no divórcio litigioso, já que Jonas
não aceitou o acordo.

Solto um longo suspiro enquanto tento afastar essas angústias do


meu peito.

— Estou sentindo falta de Felipe — murmuro enquanto caminho


para a sacada.

Aqui é o lugar que mais gosto do apartamento, perco a noção das


horas debruçada sobre o guarda-corpo. Suspiro, pensando que faz quase
uma semana que não o vejo, ele não mentiu quando disse que estava
atarefado. Eu sonho com seu toque e seus beijos, trocamos algumas
mensagens durante esse tempo, mas não houve nenhuma ligação.

Acho que me apeguei a ele rápido demais, Felipe também não


facilitou, me cobrindo de mimos e, mesmo à distância, se faz presente com
mensagens preocupadas, sobre minha alimentação ou perguntando se estou
precisando de alguma coisa, pois havia um segurança e um carro com
motorista à minha disposição para me levar onde quiser.

Mas, apesar de querê-lo por perto e de toda proteção que ele me dá,
ainda tenho medo de que seja por causa da sua vingança. Minha relação
com Jonas causou um dano enorme na minha autoestima, tenho receio de
mais uma vez estar idealizando um relacionamento e de não estar
percebendo coisas que estão na minha cara.
E esta insegurança me deixa ansiosa, mas perco a linha de
pensamento quando o vento traz o seu aroma até a mim, seu perfume já
ficou gravado em minha memória. Em seguida, ouço os sons dos passos, até
que sinto suas mãos deslizarem pelo meu corpo, me fazendo arrepiar.

— Eu amo as suas reações quando te toco — Felipe sussurra,


beijando meus ombros. — Senti tanto a sua falta que cancelei um
compromisso hoje só para te ver.

— Você poderia ser um cavaleiro e fingir que não notou! — brigo,


mas gosto de como ele me faz sentir, e foi assim desde o primeiro dia.

E gosto mais ainda que ele esteja aqui, não consigo, nem quero,
controlar o sorriso.

— Seria impossível fingir que não vejo. — Gira meu corpo de modo
que fique de frente para ele.

Ele sobe um dedo pelos meus braços, ouriçando meus pelos, eleva o
olhar e para nos meus. Suas mãos percorrem minha clavícula e levanta meu
queixo, e eu suspiro enquanto ele acaricia minha bochecha lentamente.

— Você é linda demais — elogia com um olhar tão intenso que me


faz arfar.

Espero que ele me beije, anseio pelo toque dos seus lábios, mas
Felipe não se aproxima.

— Está querendo me seduzir? — minha voz soa rouca.

— Pensei que já tivesse deixado isso claro.

— Você ainda quer fazer sexo de vingança?


— Eu já disse o que eu quero. — Salienta num tom divertido.

— Então repita muitas vezes para mim, repita todos os dias, até eu
acreditar.

— Por que é tão difícil acreditar em mim quando eu ainda não dei
nenhum motivo para duvidar?

— Porque, por anos, eu acreditei em uma ilusão que criei, então,


ainda não sei se isso entre nós dois é real ou uma fantasia.

Sua boca toca a minha em um casto beijo.

— Isso é real! — afirma.

Desce a mão pelo meu peito e seu dedo passeia pelo bico do meu
seio, sem realmente o tocá-lo, fazendo-o endurecer. Estremeço, sinto minha
boceta umedecer, a excitação tomar conta de tudo, então prendo a
respiração quando mais uma vez ele me beija.

— Isso é real! — volta a afirmar, me fazendo morder o lábio


inferior.

Sua mão desliza até a cintura enquanto a outra alcança minha nuca e
segura com força, me fazendo gemer.

Estou tão excitada que a calcinha começa incomodar, de tão


molhada, sinto um forte aperto no quadril e solto o ar que mantive preso
quando ele sobe a barra do meu vestido. Sinto suas unhas arranharem minha
pele e fecho as pernas quando meu clitóris começa a latejar.

Felipe resvala o dedo na calcinha, e eu fico na ponta dos pés com


meu coração batendo acelerado.
— Você está tão molhada que encharcou sua calcinha. E isso, minha
querida, não é fantasia, não é ilusão, isso é real — assegura.

Fecho meus olhos e mordo ambos os lábios, sentindo seu dedo me


tocar por cima do fino tecido.

Em um ato rápido, ele desloca a mão para trás, agarra minha bunda
e me puxa ao encontro do seu corpo, me permitindo sentir o seu pau duro e
grosso contra a minha barriga.

— Alguém vai nos ver — alerto, gemendo baixinho, segurando seu


braço, mordendo meu lábio e ficando zonza de tanto tesão.

Solto um grito quando ele me levanta, me segurando pelas axilas.

— Abrace meu quadril com suas pernas — ordena.

— Você é louco! — Rio e faço o que me pede.

— Estou louco por você, imaginei te levar a um restaurante


romântico, passar a noite conversando, mas, ao chegar perto de você, só
penso em te beijar e te tocar — confessa, me encostando na parede.

— Também senti sua falta. — Gemo quando o sinto morder meu


pescoço. — É melhor entrarmos.

— Aqui está escuro, ninguém vai nos ver.

— Mas ainda estamos do lado de fora. — Suspiro quando sua língua


percorre a curva do meu pescoço até minha orelha.

— Quero te fazer gozar aqui, olhando para as estrelas e o mar.


Felipe ajusta minha altura para acomodar seu pau em cima do meu
clitóris e roça rapidamente, me fazendo perder o fôlego, aperta minha
bunda, põe calcinha de lado e faz um lento carinho antes de introduzir um
dedo na minha boceta.

— Ahh! — gemo alto e depois mordo ambos os lábios, seguro seu


ombro e jogo a cabeça para trás, tudo ao mesmo tempo, intenso e gostoso.

— Me diz como você quer gozar? Com o meu dedo entrando e


saindo de você, enquanto roço meu pau no seu clitóris? — indaga,
introduzindo mais um dedo e entrando e saindo de modo malditamente
lento, sem cessar os movimentos do quadril em cima do meu clitóris duro.

— Ou prefere que eu fique de joelhos e ponha sua perna em meus


ombros enquanto você esfrega sua boceta melada na minha cara,
lambuzando tudo enquanto te faço gozar na minha língua.

Enquanto fala, ele retira os dedos, molha o dedão na minha umidade


e introduz devagar no meu ânus, antes de voltar a meter dois dedos na
minha boceta. Felipe roça a calça com vigor, e eu tremo, abro mais as
pernas, finco meus dedos nos seus ombros, desesperada, sentindo o suor
descer pelas minhas costas, tentando conter os gemidos ao mesmo tempo
que ele me fita com fascínio.

Grudo minha boca na dele, beijando-o desesperada, gemendo, então,


circulo meus braços em seus ombros e gozo assim, com ele chupando
minha língua enquanto entro em êxtase.

— Isso foi intenso! — Tomo fôlego.

— Foi rápido.
— Desculpe, estava gostoso demais.

— Nunca se desculpe por gozar, minha querida. — Beija minha


testa, e eu rio.

— Preciso me sentar, minhas pernas estão bambas e trêmulas —


peço.

— Nem começamos — avisa e se ajoelha à minha frente. — Te fiz


gozar do jeito que você queria, agora você vai gozar do jeito que eu quero.

— Não sei se consigo, acabei de gozar.

— Vai gozar de novo, e de novo — promete, tirando minha


calcinha, pondo minha perna direita no seu ombro e, sem tirar os olhos do
meus, transpassa sua língua na minha boceta, causando um choque no meu
corpo.

— Ainda estou sensível. — Seguro seu ombro.

— Assim é mais gostoso — assegura, pincelando com a língua meu


clitóris duro do recente orgasmo.

— Ahhh! — gemo, estremecendo.

Sua língua percorre minha boceta de cima a baixo, ele a introduz no


meu interior e depois gruda os lábios no meu clitóris, sugando com força,
me fazendo arfar e gemer descontroladamente e causando arrepios por todo
meu corpo.

— Quero que segure o seio direito e aperte o bico forte — ordena, e


eu demoro a entender o que me pede, a chupada forte está me deixando
zonza, minha respiração está acelerada e o coração batendo forte.
Aperto o meu bico do jeito que ele pediu no exato momento em que
ele introduz um dedo no meu ânus, e eu arfo, esfregando minha boceta no
seu rosto.

— Você gosta do meu dedo aqui. — Entra e sai com o dedo


enquanto desliza a língua pela minha boceta.

— Sim... — Minha voz não passa de um murmúrio. — Acho que


vou gozar novamente.

— Goza na minha boca, gostosa — pede sem cessar os movimentos


com o dedo e a língua.

Puxo o seu cabelo, giro o bico do meu seio e, mais uma vez, gozo.

— Ahh, Felipe... — chamo seu nome repetidamente.

E ele não para de sugar; sinto minha excitação descer pelas minhas
pernas e meu corpo tremer descontroladamente. A agonia não passa, o tesão
à flor da pele, meu clitóris duro, latejando, meus pelos arrepiados... É como
se o orgasmo não fosse o suficiente, eu preciso de mais, muito mais.

— Me ajuda... — peço, desesperada. — Preciso de você dentro de


mim — imploro, apertando minhas pernas, excitada, molhada e ofegante.

Ele enlaça minha cintura, me suspende, e eu me esfrego nele,


buscando aliviar o furor que sinto, a ânsia que está me deixando louca de
paixão.

Felipe pincela o pau na entrada da minha boceta, e eu grito seu


nome quando o sinto introduzir dentro de mim. Ele é grande, grosso e me
alarga, clamo quando entra tudo.
Me agarro nele e cruzo minhas pernas trêmulas em seu quadril. Seu
rosto está todo molhado da minha essência, ele me beija enquanto soca
forte, então o orgasmo vem tão avassalador que esguicho, expulsando seu
pau, mas ele volta a meter, volta a socar gostoso, a me fazer gozar, a me
deixar doida, desesperada, sem pudor e rouca de tanto gritar.

Me esqueço de onde estamos, não olho para o céu estrelado ou para


o mar, só me importo com o homem que me segura forte, mete gostoso,
rebolando enquanto eu arranho suas costas e tenho múltiplos orgasmos.

Não me lembro de quantas vezes gozei, urrei e gritei seu nome até
ficar sem forças, até sentir sua essência me invadir, até ficar mole em seus
braços. Ele me leva com cuidado para dentro, me deu banho com carinho e
fizemos amor novamente. Felipe segurou minhas pernas, me deixou aberta,
exposta e entrou em mim, o jeito como ele me olhava, como metia,
ondulando o quadril para sua pélvis tocar meu clitóris, causando um atrito
delicioso e como sugou meu seio me fez gozar mais uma vez.

— Você pode ainda não aceitar, ou nem mesmo acreditar, mas você
é minha — declara, ofegante, após gozar, e eu sorrio, porque é a única coisa
que tenho forças para fazer.
Capítulo 21

Manuela
Sinto uma deliciosa carícia em minhas costas, seguida de um casto
beijo.

— Bom dia — Felipe sussurra ao meu ouvido.

— Bom dia! — respondo, me virando, e agarro o lençol ao constatar


que estou nua.

Ele abre um sorriso ao notar meu constrangimento.

— Não sinta vergonha de mim, pretendo te ver nua muitas vezes. Na


verdade, prefiro você assim do que com roupas.
Levo minhas mãos ao rosto e solto um murmúrio envergonhado
quando me recordo da noite passada.

— Eu não sei o que houve, isso nunca aconteceu comigo — revelo


com um meio-sorriso.

— Você teve alguns squirts, também conhecidos como ejaculação


feminina. Não é algo para se envergonhar, mas sim se orgulhar.

— Eu berrei tanto que acho que seus vizinhos ouviram. — Aponto


para a janela.

— Moro na cobertura e, se alguém ouviu, apenas saberá que minha


futura mulher é muito bem fodida.

— Futura mulher? Felipe, o que dissemos sobre ir devagar?

— Mas nós vamos devagar, devagar nessa direção. Eu preciso de


uma esposa, essa é uma das condições do meu pai para me passar a
presidência, e você sabe que eu ia me casar por contrato, então quero que
você seja minha mulher.

— Você quer que eu seja a sua esposa por contrato?

— Sim, essa será a sua vingança perfeita contra seu ex junto ao


processo, ou melhor, nossa vingança contra os nossos ex. Além de, claro, te
manter segura. Mas confesso que tenho um fundo egoísta nessa proposta.
Eu te quero em minha cama gozando e gritando meu nome todas as noites.

— Você ainda está pensando em vingança. — Solto um suspiro e


tento me levantar da cama, mas ele me segura.

— Nunca disse que não estava.


— Mas afirmou que eu não fazia parte da sua vingança.

— E não faz.

— Você está sendo contraditório, Felipe!

— Digamos que quero unir o útil ao agradável.

— Não quero me casar, não sei se um dia me casarei novamente,


também não quero engravidar, não quero passar pela dor da perda, e você
precisa de uma mulher que te dê um herdeiro.

— Eu preciso de você.

— Não posso ter filhos.

— Podemos adotar.

— Ainda não me divorciei, minha vida está uma bagunça.

— Eu ajudo a pôr tudo no lugar. Além disso, em breve assinará o


divórcio; hoje teremos uma reunião com os advogados para saber como
andam os processos.

— Que reunião? Como você sabe disso? Eles não entraram em


contato comigo... Não gosto disso, não quero que eles falem com você
primeiro, eu sou a principal interessada — reclamo e mais uma vez tento
sair da cama, mas Felipe novamente me segura.

Com facilidade, me põe em seu colo, me fazendo sentar de frente


para ele, e me prende, enlaçando minha cintura.

— João também é meu advogado, estávamos em uma reunião


quando ele recebeu uma informação importante sobre o seu caso, por isso
fiquei sabendo primeiro.

— E por que ele ainda não entrou em contato comigo?

— Porque eu pedi.

— Felipe!

— Eu queria estar junto quando ele te revelasse o que descobriu,


não queria que soubesse sozinha. Ele virá até aqui hoje à tarde e te explicará
tudo.

— Não importa o que for, não faça mais isso. Não sou indefesa,
passei por muitas coisas e não quebrei, não vou dizer que não sofri, mas não
quero que esconda nada de mim — ralho.

— Me desculpa, isso não vai acontecer novamente — promete, mas


o fato de não retrucar me deixa intrigada.

— Não vai falar nenhum “mas”?! — Fito-o, receosa.

— Não, porque você está certa. Eu quero te proteger, mas não quero
tirar seu poder de decisão e nem sua individualidade, já cometi esse erro
antes e hoje estou tentando repará-lo.

— O que quer dizer com isso? — questiono, confusa.

— Te disse que minha irmã Cecilia se separou porque expus tudo o


que seu marido fazia, não foi?

— Sim. — Me lembro vagamente de ter mencionado que a irmã se


separou por sua causa.
— Acontece que, depois disso, ela ficou completamente dependente
dos meus pais, e eu incentivei. Realmente julguei que seria melhor para ela
ficar cercada de cuidados excessivos, mas ela lidou com o sofrimento de
outra forma, creio que, por não tê-la deixado enfrentar aquela situação, foi
pior; ela demorou a superar e, em meio ao seu tormento, recorreu ao álcool
e as drogas.

Ouço seu relato com surpresa, mas evito fazer comentários. E ele
continua:

— Demorei a perceber por que me conectei tão rápido contigo, você


me lembrava Cecilia nos primeiros dias, perdida, sem rumo, como se
estivesse no meio de um furacão. Então, desde o dia em que te conheci, o
meu instinto de proteção aflorou tão forte que minha primeira reação é
sempre de te proteger, e me esqueci que você só vai saber enfrentar, superar
e se defender de algumas coisas se passar pelo processo de cura. Por isso
quero que me desculpe, prometo que não voltará a acontecer novamente —
confessa, segurando minha mão e a beijando.

— Sua sinceridade é desconcertante — falo.

— Prometi que sempre seria sincero com você. No meio da tensão


de te tirar do hospital e depois da clínica e de te trazer para cá, acabei não
percebendo que estava novamente ultrapassando os limites e tomando conta
de tudo. Vou me policiar mais para que isso não volte a acontecer, quero
que você se sinta livre para fazer suas escolhas. Mas quero que saiba que
seguirei te apoiando no que precisar.

— Eu ainda não sei como lidar com você.


— Você é a pessoa que melhor sabe lidar comigo, apenas não se deu
conta disso ainda, talvez porque ainda não me viu interagindo com outras
pessoas.

— Ah, eu vi o quão arrogante e autoritário você é, mandava nas


pessoas na clínica como se eles fossem seus empregados! — Cutuco seu
peito.

E ele segura minha mão e mais uma vez a beija, mas não nega nada
do que eu falei.

— Sua irmã, hoje em dia, está bem? — indago, curiosa.

— Está caminhando para ficar, não usa mais drogas e aos poucos
está se livrando do álcool. Estou patrocinando uma galeria de arte que
Cecilia abrirá com nossa irmã mais velha, Isabela. Será bom para elas e,
quando você estiver pronta, quero que também seja um lugar para expor
seus quadros.

Arregalo os olhos.

— O quê?

— Não agora, mesmo porque o projeto da galeria está começando a


sair do papel, mas, futuramente, quando você se sentir à vontade para
pintar, eu prepararei tudo para que isso aconteça. Quando pensei nessa
galeria, não foi somente para ajudar minhas irmãs, também estava pensando
em você, pois tomei essa decisão depois de te conhecer.

— Eu nem sei o que falar.

— Não fale nada, apenas quero que comece a pensar na nova fase
da sua vida.
— A exposição na galeria está vinculada a me casar com você?

— Não, você iria expor se casando ou não comigo. Mas ambos


sabemos que você já é minha. — Segura meu queixo e me beija levemente
nos lábios.

— Você nunca viu um quadro meu, como sabe que seriam bons para
expor em uma galeria? — saliento.

O levantar de sobrancelha junto do sorriso de lado me faz franzir o


cenho.

— Você já viu alguma pintura minha?

— Sim, quando o detetive me apresentou o seu relatório, nele


constavam algumas reportagens sobre uma jovem pintora promissora.

— Ah! Eu me lembro dessas reportagens, minha mãe estava viva na


época, e ficou tão feliz, mostrou para tanta gente! Ela até enquadrou e
colocou no seu escritório. Minha mãe me incentivava muito a seguir a
carreira artística, dizia que estava trabalhando dia e noite para eu não me
preocupar com dinheiro. Tudo para, no final, eu ser idiota o bastante e
deixar um cretino me levar quase tudo!

Olho para o teto quando sinto uma lágrima descer pelo meu rosto.

— Vamos resolver isso. — Felipe me abraça e me traz para perto do


seu corpo.

Sinto como se tivessem aberto um baú que eu mantive fechado nos


últimos dias e, dentro dele, estavam todas as lembranças tristes. Sinto uma
dor física no peito sempre que me lembro das coisas que aconteceram, da
minha ingenuidade. Nos últimos anos, eu tive mais perdas do que ganhos.
Elevo a cabeça e o fito.

— Me ajude — peço entre lágrimas.

— Em tudo que você precisar — assegura, limpando meu rosto.

— Faça essa dor passar, me faça sentir como ontem, livre, poderosa
e desejada. — Esfrego meu rosto com raiva. — Não quero mais pensar ou
sofrer pelas coisas que passei, quero passar uma borracha em tudo. Mas eu
não quero me casar com você agora, não quando estou tão no fundo do
poço, não quero entrar em uma relação assim, porque, mesmo quando eu
tive todas as vantagens, deu tudo errado, e eu não quero passar por aquilo
novamente.

— Manuela, em relação a mim, você tem todas as vantagens, porque


eu acho que, pela primeira vez na vida, estou amando alguém. Estou
amando você — declara, deslizando uma mão pelo meu rosto.
Capítulo 22

Felipe
Não há mais como negar ou fingir que não estou apaixonado por ela.
Pensei que com ela segura seria melhor me manter longe para recuperar
meu foco, então passei uma semana sem vê-la, viajei, fechei novos
negócios, impedi que Heitor comprasse mais ações da empresa, jantei com
meus pais, almocei com minhas irmãs para acalmar os ânimos das duas e
parece que finalmente entraram em um acordo. Porém Manuela não saía
dos meus pensamentos.

Não importava o quanto me esforçava, ou o quanto trabalhava, não


conseguia esquecê-la. Até que ontem a ânsia em vê-la falou mais alto, eu
queria apenas jantar com ela, sentir seu aroma, ver seu sorriso e seus olhos
brilhando, precisava apenas olhar para ela.
Mas Manuela me atraiu como um ímã e não consegui resistir, sabia
que seria intenso quando ficássemos juntos, mas nunca imaginei que seria
tão avassalador.

Sua entrega e paixão me deram a certeza de que a quero em minha


vida. Meus pais não vão aceitar, ela não tem o perfil da nora que eles
querem, não faz parte da alta sociedade, não tem família influente e muito
menos é rica, mas eu a quero em minha cama, gozando, gritando meu
nome, me fazendo delirar.

Eu a quero como minha esposa, minha amiga, minha companheira,


minha para proteger e amar.

Eu quero Manuela em minha vida e vou passar por cima de qualquer


um que interferir.

— Me faça esquecer, não quero mais pensar no quanto fui idiota por
acreditar nele — pede com a cabeça deitada em meu peito.

Sinto suas lágrimas molhando minha pele e um desconforto toma


conta de mim, sempre sinto isso quando ela menciona seu relacionamento
com Jonas. E o que mais me deixa agoniado é que ela ainda não sabe que
ele vendeu vários imóveis seus e tentou vender a casa em que viviam.

Este também foi um dos motivos pelos quais eu vim para casa
ontem, não queria que ela recebesse essa informação sozinha.

— O que você quer que eu faça? Sabe que estou aqui para você e
por você, então, me diga, do que precisa? Quer que eu mande dar uma surra
nele? Posso fazer isso! Quer que o ponha na cadeia? Está sendo
providenciado! — revelo.
— Cadeia?

— Sim. Ou você achou que ele iria te pôr em um hospital


psiquiátrico e te roubar, mas apenas levaria uma advertência?

Ela se afasta e tenta sair de cima de mim, mas eu seguro sua cintura
e a mantenho em meu colo.

— Deveria esperar e deixar João te revelar, mas não vou conseguir


aguentar até ele chegar — começo, mas ela me interrompe.

— O que você está me escondendo? — indaga, cruzando os braços.

— Além de tirar todo o dinheiro da sua conta, Jonas vendeu quatro


imóveis seus que não estavam alugados. Na verdade, ele tentou vender
todos os imóveis, inclusive a casa em que viviam, mas só conseguiu fechar
quatro desses negócios.

— Meu Deus! — exclama, horrorizada.

Desta vez, ela levanta, e eu não a impeço. Manuela está tão


desnorteada que nem se importa com sua nudez e anda de um lado para o
outro, segurando seus longos cabelos cacheados.

— Mas, como? Quer dizer, eu só fiquei alguns dias internada, como


ele vendeu tão rápido, essas coisas não demoram? Tem a burocracia dos
cartórios, não entendo muito bem, mas me lembro de que, quando comprei
a mansão, demorou quase dois meses até ter a escritura, como ele conseguiu
tão rápido? — questiona, inconformada.

— Com a sua internação ele se tornou o seu procurador legal, com


este documento em mãos ele vendeu os imóveis, fez uma promessa de
compra e venda, recebeu parte do dinheiro e os compradores deram entrada
no cartório. A parte burocrática ainda não foi concluída, e João está
resolvendo isso. Você não perderá os seus imóveis — asseguro.

— Guilherme me alertou que isso poderia acontecer se tanto eu


quanto ele estivéssemos incapacitados. Implorou para ficar longe de Jonas,
mas deixei o ódio me dominar, sequer pensei antes de ir a mansão
confrontá-lo. — Lamenta. — E o dinheiro dos compradores? Precisarei
devolver? Como farei? — Manuela se desespera.

— Jonas terá que resolver isso.

— Como ele pode fazer isso comigo! O que eu fiz a ele? Será que
tudo se resumiu a dinheiro? Todos esses anos sempre foi por causa do meu
dinheiro? Nunca houve sentimento? Meu Deus! Há algumas semanas, eu
podia jurar que ele me amava, será que sou tão idiota assim para não
perceber quais eram suas intenções? — Ela leva a mão ao rosto e começa a
chorar.

Me levanto da cama e sigo até ela, a abraço forte e acaricio suas


costas.

— Não sei se aguento mais isso, quero ser forte, quero enfrentar
tudo, mas não param de acontecer coisas, não paro de receber rasteiras.
Quando acho que Jonas já fez a pior coisa que podia para mim, descubro
que ele ainda pode fazer mais — queixa-se.

Seguro seu rosto, limpo suas lágrimas e beijo cada lado da sua
bochecha.

— Você não está enfrentando sozinha, eu estou ao seu lado —


asseguro, acariciando seu rosto.
— Até você um dia vai se cansar.

— Eu te pedi em casamento há pouco tempo e já sabia de tudo o que


estava acontecendo, você acha que essa é a atitude de um homem que vai se
cansar? — Esfrego meu nariz no dela. — Não sou um moleque que corre
quando vê um problema, Manuela. Sou um homem que os resolve e garante
que a pessoa pague — afirmo, elevando seu queixo.

— Não quero me casar, não quero mais me apaixonar. Eu prometi


que nunca mais amaria alguém a ponto de esquecer quem eu sou. — Seus
olhos estão tristes, sua voz soa tão sofrida que me faz engolir em seco.

— Posso aceitar isso, contanto que seja minha para adorar, proteger
e cuidar. Vou te amar por nós dois, tanto, mas tanto que você vai esquecer
cada mágoa em seu coração, irá esquecer cada vez que chorou, todas as
vezes que se sentiu sozinha, triste, desnorteada, tudo isso será apagado,
porque eu estarei ao seu lado e serei seu ponto de conforto e o homem que
ama você — declaro.

Por um tempo, não falamos nada, apenas nos olhamos, sem desviar.
É como se ela estivesse procurando alguma dúvida em mim, mas não
encontrará, demorei muito para achar a mulher com quem eu quero passar o
resto da minha vida.

A princípio, julguei que este amor chegaria devagar, nos


conhecendo aos poucos, mas ele nunca chegou, nenhuma mulher me fez
perder o rumo. É óbvio que tive vários relacionamentos e casos, mas nunca
me senti assim, e cheguei a achar que isso não aconteceria, por esse motivo,
aceitei o contrato de casamento que meus pais sugeriram.
Sua boca encontra a minha em um rompante, desajeitada e exigente,
deixo que ela conduza o beijo, que me empurre até cair sentado na cama,
que suba em cima de mim, enlaçasse meu pescoço e volte a me beijar.

Meu peito bate acelerado quando seguro sua cintura e ajeito nossos
corpos na cama. Apoio minhas costas na cabeceira e deslizo minhas mãos
pelas suas curvas enquanto ela me beija e meu pau endurece. Aperto seu
quadril quando ela morde meu lábio inferior, desejando deitá-la na cama e
comandar, mas sinto que ela precisa disso, ela necessita sentir algum
controle em sua vida.

E eu dou esse controle a ela, sem nenhuma reserva, sem ser ativo,
apenas sentindo e a deixando fazer o que quiser.

Manuela desliza a língua pelo meu pescoço, causando arrepios pelo


meu corpo, me fazendo arfar, desce com a boca e morde meu peito. Meu
pau pulsa, eu aperto minhas mãos, segurando a vontade de tocá-la, beijá-la,
pôr seu seio em minha boca e mamar gostoso.

Ela percorre meu abdômen com beijos e mordidas, e eu mordo meus


lábios, segurando um xingamento quando chega no meu pau; seguro a
respiração, ansiando por vê-la me sugar, chupar gostoso. E, com os olhos
fixos nos meus, Manuela passa a língua devagar na cabeça do meu pau,
causando arrepios no meu corpo.

Solto o ar em um sopro forte quando lambuza meu pau com saliva e


depois o introduz na sua boca. Sou grande e grosso, ela não consegue pôr
tudo, não chega nem na metade, mas vê-la subindo e descendo a cabeça,
gemendo e respirando com dificuldade é uma das visões mais linda que já
tive.
Sem conseguir mais me conter, seguro seus cabelos, elevo meu
quadril e entro mais na sua boca, fazendo-a arregalar os olhos. Meu corpo
se arrepia, o tesão corre solto, sua saliva desce pelo pau, molhando minha
pele, sua boca quente, seus gemidos e sucções me deixam doido.

Do nada, ela para, me fita com um sorriso faceiro, e eu sorrio junto,


porque adoro vê-la feliz e porque nunca a vi sorrir assim. Manuela sobe
pelo meu corpo, coloca uma perna de cada lado, segura meu pau e esfrega
na sua boceta. Me esforço para ficar parado sentindo todas as emoções,
paixão, tesão, e deslizo minhas mãos por sua perna. Seguro sua cintura
quando começa a introduzir meu pau em sua boceta e gememos juntos
quando ele entra todo.

Perco a batalha quando ela começa a rebolar, seguro seu cabelo e


puxo sua cabeça ao encontro da minha; beijo sua boca, sugando sua língua
e mordo seu lábio inferior quando sinto sua boceta pulsar, apertando meu
pau.

— Gostosa! Minha gostosa! — murmuro contra os seus lábios.

Ela sorri e joga a cabeça para trás, aperto o bico dos seus seios e
mais uma vez sinto sua boceta esmagar meu pau, me fazendo gemer. Meu
corpo fica tenso, com o tesão correndo solto em minhas veias, a pele
arrepiando, delirando, quase sucumbindo. A visão de Manuela cavalgando é
deliciosa demais, mas me seguro, quero vê-la gozando muitas e muitas
vezes.

Substituo meus dedos por minha boca e faço o que tanto ansiava,
mamo gostoso seu seio, fazendo barulho, deixando-o molhado. Minha
garota começa a gemer mais alto, agarra meus cabelos e começa a rebolar
no meu pau, descontrolada, chamando meu nome, a pele suando, os olhos
fechados, uma visão deliciosa. Procurando deixá-la mais louca de desejo,
deslizo uma mão pela sua barriga e toco seu clitóris com vigor.

Ela goza gritando meu nome, e eu dou atenção ao outro seio, sem
parar de tocar seu clitóris. Manuela começa a fazer movimentos intensos de
vaivém com o quadril, sinto meus pelos arrepiarem e a respiração acelerar.
Minha garota está cada vez mais molhada, com a boceta pulsando ao redor
do meu pau; subo minha boca, a beijo e estou no meu limite, sentindo o
gozo vir. E, sem conseguir mais me segurar, gozo na sua boceta, chupando
sua língua, gemendo, e ela não para de cavalgar, nem eu de tocar seu
clitóris, de beijá-la, de amá-la.

Meu tesão não diminui, nem o dela, e quando goza novamente,


Manuela arranha meus braços e rebola tão forte que me leva mais uma vez
ao êxtase. E, no momento em que desaba em cima de mim, eu a abraço.
Nossos corações batendo no mesmo compasso, a respiração descompensada
e a pele grudada pelo suor, com um sorriso imenso no rosto.

— Nunca vou te deixar ir embora — sussurro ao seu ouvido


enquanto acaricio suas costas.

— Me faça querer ficar — pede, mordendo meu queixo.

— Vou garantir que você fique para sempre ao meu lado — afirmo,
acariciando seu rosto.
Capítulo 23

Manuela
Acordo assustada, levando a mão à minha barriga. Sonhei que
estava grávida, já no final da gestação, sentindo o meu bebê mexer.

— Meu Deus! Na última vez, sonhei que estava sendo traída, em


seguida, descobri a traição — murmuro, pensativa. Mas depois faço um
meneio de cabeça.

— Eu e Felipe transamos algumas vezes sem camisinha, mas, já há


quase um mês, todas as vezes que fizemos amor usamos preservativo. Foi
só um sonho como tantos outros que tive. — Tento me acalmar e me
espreguiço na cama.

Um mês!
Estamos juntos há um mês e, durante este período, em todas as
vezes que fiquei triste ele me fez sorrir logo em seguida.

E foram muitas vezes.

Os meus advogados conseguiram impedir as vendas dos meus


imóveis, cancelaram a procuração e enfiaram um monte de processos em
Jonas, o inquérito policial está quase completo e, assim que for concluído,
eles farão de tudo para pôr Jonas na cadeia. De todos os processos o que
mais me interessa é o da audiência de divórcio que ocorrerá daqui a alguns
dias.

Quando saí da clínica, pensei que tudo se resolveria rápido, pela


quantidade de advogados, junto ao poder de Felipe, julguei que não
demoraria. Mas os dias foram passando e as coisas demoram a se
desenrolar.

O que mais dificultou foi que, antes de iniciar os processos, meus


advogados tiveram que provar na justiça que eu estava em plenos poderes
das minhas faculdades mentais, ou seja, que eu não era louca.

Este era o objetivo de Jonas, me desqualificar mentalmente, afirmar


que não estava sã para me divorciar e tentar quebrar a medida protetiva com
essas alegações. Ele tentou de todas as formas se aproximar de mim, ia ao
hospital para tentar me encontrar, e Bruna me avisava para não ir lá, apenas
para evitar que ele tivesse êxito.

Após alguns dias me perguntando o que estava acontecendo, fiz um


resumo para Bruna e concordamos não revelar nada para o meu padrinho.
Guilherme finalmente terá alta hoje, foi um período complicado, ele teve
algumas complicações hospitalares que o fizeram permanecer por todo esse
período internado, mas agora está bem para ir para casa.

Juliana também me disse que Jonas pergunta insistentemente sobre


mim, a ponto de ela ter que bloquear seu número e, como também mudei o
meu, ele não tem mais como me ligar. Além disso, Felipe me cerca de
seguranças quando saio, então, mesmo se tentar, meu ex-marido não
conseguirá. Minha amiga ainda não voltou com o marido, ela quer esperar
para saber se o pai de sua filha ficará ao lado do irmão depois de tudo o que
Jonas fez e só depois poderá pensar se retomará o casamento ou não.

Apesar de todo infortúnio das últimas semanas, sinto uma paz que
há muito tempo não experimentava, uma sensação de leveza, sem cobrança.
Felipe não exige nada além da minha presença, me dá tanto carinho e me
faz sentir protegida, amada e segura.

Não tenho mais a necessidade de agradar alguém para aliviar o


clima tenso, a terapia me ajudou nisso; a psicóloga me informou que
provavelmente, por anos, eu sofri gaslighting, um tipo de violência
psicológica e emocional que, às vezes, ocorre nos relacionamentos afetivos.
Quem passa por isso, mesmo que perceba que algo está errado, não
consegue se desvencilhar do relacionamento por temer estar equivocada,
deixando de acreditar nos sinais, ficando vulnerável e dependente
emocionalmente.

Depois que ela me disse isso, eu me desculpei comigo mesma, a


culpa que eu sentia por achar que fui uma idiota ao não perceber o que
estava acontecendo começou a sair dos meus ombros, não vou dizer que às
vezes não fico ressentida — porque fico — mas sei que será um longo
processo.
Também compreendi que nunca esquecerei, acho que, no máximo,
conseguirei deixar tudo para trás e seguir em frente.

E, nisso, Felipe está me ajudando; tenho me policiado muito em


relação a ele, ainda fico em dúvida quando ele diz que me ama, mesmo que
tenha passado o último mês se declarando todos os dias, mesmo quando
meu coração palpita quando ele sussurra ao meu ouvido seu amor por mim.
Ainda assim, uma grande parte de mim se reserva, acho que isso foi o pior
mal que Jonas me fez, me tornou insegura a ponto de não conseguir definir
se algo é real ou não.

— Bom dia. — Felipe entra no quarto e corta a minha linha de


pensamento.

— Bom dia. — Sorrio quando ele acaricia meu rosto.

— Quero te mostrar uma coisa. — Levanta a sobrancelha de uma


forma engraçada.

— Você vai me dar mais um presente? Felipe, você tem que parar
com isso! — ralho.

— Eu não vou parar de te mimar. Venha, acho que você vai gostar
da surpresa.

— Calma, eu estou nua!

— Não tem ninguém além de nós dois no apartamento.

— O que você fez com as pessoas que trabalham aqui? — indago,


rindo e vestindo uma camisola.
— Pedi para virem mais tarde. — Pisca um olho, segura minha mão
e me puxa.

— Calma. — Rio da sua empolgação.

Essa cobertura é imensa, tem cinco quartos, escritório, biblioteca,


sala de estar, de jantar, cinema, área gourmet na sacada, piscina e cozinha.
Durante a semana, vi uma movimentação em um dos quartos, mas, como
Felipe não falou nada, preferi não fazer comentários, e ele me leva
exatamente para esse lugar.

— Sei que quer voltar a pintar e só está esperando conseguir tirar


Jonas da sua casa para começar a fazer isso. Mas, como pretendo te manter
aqui... — Interrompo-o com um riso.

— Você, todo dia, me dá algo e diz que quer me manter aqui, por
acaso quer me comprar com presentes e joias?

— Volto a dizer que apenas quero mimar a mulher que amo, e você
poderia aceitar sem rir! — reclama de um jeito tão engraçado que seguro
seu rosto e o beijo.

— Desculpa, não vou rir — prometo, beijando-o novamente.

— Como estava dizendo, eu fiz para você, quero que você saiba que
sempre irei te incentivar a realizar seus sonhos — declara e abre a porta.

E é a minha vez de para de sorrir, pois conforme entrava no quarto,


eu fiquei completamente sem reação.

— Bem-vindo ao Ateliê da Manu! — Indica o local com os braços.

— Meu Deus! — sussurro, encantada.


Havia uma estante verde com livros de artes e, em um canto, um
sofá amarelo com duas poltronas na frente e uma mesinha no meio, além de
outra estante vermelha pequena com vários tubos de tinta e mais uma
estante branca com diversos pincéis. Vejo também um suporte com uma tela
em branco, um banco na frente dela e, ao lado, uma mesa com mais tintas e
pincéis, mas nada se compara à pintura na parede.

Levo minha mão à boca ao ver diversas flores de lótus desenhadas,


de várias cores, envoltas por uma grande flor de lótus negra e uma frase
escrita com letras cursivas abaixo dela:

Emerja como uma lótus negra e mostre ao mundo toda a sua beleza.

Não consigo segurar a emoção e começo a chorar, cada pedaço


desse lugar foi decorado com tantas cores e são nítidos o cuidado e carinho.
A última pessoa que fez algo assim por mim foi minha mãe, nem eu fiz isso
por mim, mas Felipe fez.

— E então, gostou? — indaga, ansioso.

— Está tudo lindo! — murmuro, tocando os pincéis e observando a


pintura na parede. — Quando você fez isso?

— Durante a semana, todos os dias, corria o risco de você descobrir,


realmente gostou? — Enlaça minha cintura e beija minha nuca.

Giro nos seus braços e envolvo seu pescoço.

— Obrigada por acreditar no meu potencial mesmo sem ver meus


quadros.

— Eu já vi suas antigas pinturas por foto, já te disse isso.


— Mas aquelas são antigas, faz muito tempo que não pinto.

— Um talento como o seu não se apaga, no máximo fica


adormecido, esperando pelo momento certo para despertar. E eu fico feliz
de incentivá-la a começar, mas sem pressão, no momento em que você
sentir que está pronta, você criará, e este espaço é seu.

— Ateliê da Manu — digo com um sorriso.

— Sim, o lugar onde você criará arte. — Esfrega o nariz no meu, me


fazendo sorrir.

— Você está tornando difícil a minha decisão de não me apaixonar


mais. — Mordo seu queixo.

— Minha querida, a minha meta de vida é fazê-la se apaixonar. —


Desliza o nariz pelo meu rosto até a minha orelha e sussurra: — Eu vou
jogar sujo se for preciso, minha doce Manuela, te fazer gozar gostoso, te
encher de presentes e de mimos e te amar desesperadamente.

Um arrepio delicioso passa pelo meu corpo enquanto ouço sua voz
rouca. É impossível segurar o sorriso e o suspiro quando ele desliza a
camisola pelos meus ombros, deixando meu seio exposto.

Antes de sugar meu mamilo esquerdo, Felipe passa a língua nos


lábios enquanto se abaixa ao chão e deixa uma perna flexionada.

— Vou te dar as primeiras boas memórias neste lugar — murmura,


tirando minha camisola e me deixando nua.

— E como pretende fazer isso? — gemo baixinho ao sentir suas


grandes mãos passarem lentamente pelo meu corpo.
— Te fazendo gozar muito.

— Não temos camisinha aqui.

— Não vamos precisar de uma, por enquanto. — Morde os lábios


antes de resvalar a língua na minha boceta.

— Ah, Felipe!

— Grite, meu nome amor, adoro te ver descontrolada — pede e


começa a sugar meu clitóris.

Ele sobe uma mão até o meu seio e a outra mão segura minha
bunda, me mantendo no lugar e me fazendo delirar. Seguro seus cabelos e
fecho meus olhos, movimento o quadril, esfregando minha boceta no seu
rosto.

Estremeço quando ele introduz a língua dentro de mim e abro mais


as pernas, querendo senti-lo mais fundo. Felipe tira a mão do meu seio e
mete dois dedos na minha boca, então eu sugo com a mesma ânsia que ele
me chupa; retira o dedo e enfia os dois na minha boceta. Arregalo os olhos
e busco o seu olhar enquanto me lambe como um devasso, entrando e
saindo com os dedos. Minhas pernas tremem, estou com a respiração
acelerada, o coração batendo a mil. Sinto minha excitação descer pelas
minhas pernas e, na sala, só se ouve meus gemidos, suas sucções e o som
dos movimentos que seu dedo faz em minha boceta encharcada.

Levo uma mão ao bico do meu peito e aperto, e isso é o estopim


para uma explosão avassaladora tomar meu corpo.

— Ah, Felipe... — clamo, gozando e esguichando, com corpo


tremendo, pegando fogo, minha boceta latejando e a respiração falha,
querendo mais, querendo-o dentro de mim.

Ele entende meu desespero, me pega no colo, me leva para o quarto


e me põe na cama. Sem conseguir me segurar, me toco, buscando algum
alívio.

— Quem vai te fazer gozar é o seu homem! — promete enquanto


veste uma camisinha em seu pau.

Felipe retira minha mão, abre minhas pernas e entra em minha


boceta de uma vez só. Berro quando o sinto me preencher por completo.
Sua boca encontra meu seio enquanto ele rebola, enfiando gostoso, fazendo
sua pélvis tocar no meu clitóris.

Envolvo minhas pernas no seu quadril e ondulo, procurando maior


impacto, arranho suas costas, e seguro os lençóis. E então, ele dá atenção ao
outro seio, me fazendo gemer; meus dedos ficam brancos pela força que
faço, uma camada de suor cobre meu corpo, ele segue metendo rápido,
intenso, passando um braço pelo meu pescoço enquanto toma meus lábios,
me beijando com a mesma volúpia que soca, me deixando em êxtase e
transtornada. Gemo contra seus lábios quando mais um orgasmo rompe
meu corpo.

Felipe me surpreende, se afastando de mim.

— Volta aqui, ainda preciso de você — peço, manhosa e sedenta,


esfregando minhas pernas.

— Amo quando você tem múltiplos orgasmos e esguicha.

— Isso nunca aconteceu comigo antes, você me deixa doida de


tesão, insaciável. Sempre quero mais de você, quero tudo do jeito que
quiser.

— Do jeito que eu quiser? — indaga, trocando a camisinha.

— Sim — confirmo, abrindo as pernas sem nenhuma vergonha e


sentindo meu centro pulsar em expectativa.

— Até mesmo aqui? — questiona, descendo um dedo pela minha


boceta, molhando-o e introduzindo devagar no meu ânus.

— Ahhh, Felipe! — Ele sabe que eu gosto que meta o dedo ali
quando estamos fazendo amor.

— Posso meter meu pau aqui? — pergunta, enfiando mais um dedo.


— Posso foder esse buraco? — Entra e sai com os dedos, me fazendo elevar
o quadril.

— Sim... — gemo quando ele abaixa a cabeça e chicoteia meu


clitóris. — Não para, não para — imploro.

Mas ele para, segura minha perna e me vira na cama, me deixando


de bunda para cima. Dá um tapa na minha bunda, me fazendo arfar, e a
ardência faz minha boceta pulsar.

— Gostou disso? — pergunta, dando mais um tapa, e minha


resposta é um gemido alto. — Eleve o quadril — pede.

Quando faço, ele introduz um travesseiro embaixo de mim, volta a


bater na minha bunda, e eu abaixo a cabeça, levantando mais a bunda.

— Você ficou mais molhada — sua voz soa baixa e rouca enquanto
abre minha bunda. — Vou meter devagar, me avise se for demais para você.

— Tudo bem, eu quero isso — afirmo, virando a cabeça e o fitando.


Seguro a respiração quando o vejo cuspir, sinto meu ânus molhado e
logo depois solto o ar devagar quando ele começa a enfiar o pau.

— Ahhh. — É o único som que emito.

A pressão é muito forte, ele me abre aos poucos, entrando e saindo


devagar, me fazendo respirar fundo. Felipe mete a mão por debaixo de mim
e começa a tocar meu clitóris, dor misturando com prazer, e mete mais um
pouco. Gemo alto, minha testa molha de suor, meus bicos dos peitos duros
arrastam no travesseiro. E então ele mete um, dois dedos na minha boceta, e
eu fico louca.

Abaixo a cabeça e mordo o travesseiro, sentindo-o meter mais


fundo, me arreganhando, ardendo e, ao mesmo tempo, sendo gostoso. Sem
me dar conta, começo a mexer o quadril e a gritar seu nome, ao que ele
passa a meter mais fundo no meu ânus e socar mais rápido na minha boceta.

— Felipe! — berro quando gozo e esguicho, fazendo-o retirar os


dedos e tirar o pau do meu ânus.

O homem me gira na cama, me deixando de frente para ele, abre


minhas pernas e volta a meter no meu ânus e, dessa vez, entra mais fácil;
ainda arde, faz pressão, mas me enlouquece. Felipe eleva minhas pernas e
as põe nos seus ombros, seus dedos vão para o meu clitóris e soca com
força enquanto grito com um misto de prazer e ardor. Nunca pensei que
essa combinação seria atraente, gostosa, sedutora. Jamais imaginei que
estaria gozando várias vezes fazendo anal e que o prazer fosse tão
avassalador que eu esguichasse, mas é exatamente o que acontece, mais
uma vez esguicho ao gozar e grito seu nome. Novamente, ele me deixa com
as pernas bambas, sem forças e completamente saciada.
Quando ele também goza, apoia os braços ao lado do meu corpo e
me beija.

— Você disse que só sairá na parte da tarde, certo?

— Sim — respondo, quase sem fôlego.

— Ótimo, então tenho a manhã inteira para te fazer gozar muito


mais vezes.

Sorrio, reconhecendo que Felipe não mentiu quando disse que faria
de tudo para eu me apaixonar por ele.
Capítulo 24

Manuela
O carro para na frente do hospital e Felipe segura meu queixo e me
beija.

— O motorista virá para levar vocês até a casa do seu padrinho, mas
eu te buscarei. Deixei meu dia quase livre, tenho apenas duas reuniões que
não consegui cancelar — avisa, acariciando meu rosto.

— Não precisa se preocupar, eu, Guilherme e Bruna podemos pegar


um táxi e depois eu volto para casa.

— De forma alguma! Ele levará vocês. — Segura minha mão e a


beija. — Ficarei tranquilo sabendo que está em segurança. Você é muito
preciosa para mim, quero te manter segura.
— Você quer me proteger ou me controlar? — Afasto meu rosto e o
fito, analisando sua reação.

— Ainda desconfia de mim? —questiona com um sorriso.

— Sim, acho que vai demorar até eu confiar totalmente em alguém,


e não sei se você aguentará isso por muito tempo.

— Você não tem noção do que eu sou capaz de aguentar por você.
— Seu sorriso morre no rosto.

Felipe segura meu pescoço e aproxima nossos rostos.

— Eu tenho muitos traumas, muitos monstros que ainda não


consegui eliminar, minha segurança foi quebrada, às vezes não confio nem
em mim mesma. Tenho um medo absurdo de estar fantasiando coisas e
alimentando algo que só existe na minha mente.

— Quando disse que quero você, eu sabia de todo o seu passado,


medos e angústias.

— E se ficar insuportável?

— Eu suporto, aguento. Sei que não consigo eliminar os monstros,


isso é algo que somente você pode fazer, mas eu os afasto para bem longe.
Não se esqueça de que eu sou seu ponto de conforto. — Me beija, e eu
sorrio contra seus lábios.

— Você ainda não me respondeu, está tentando me controlar?

— Não consigo te controlar nem na cama, quanto mais fora dela. —


Me beija, morde meu lábio e depois encosta a testa na minha. — Você ainda
não entendeu que me tem em suas mãos?
E ele sorri daquele jeito que faz tudo dentro de mim estremecer.

— E quero me apresentar formalmente para o seu padrinho e a


esposa — declara, me surpreendendo.

— Você não acha que é um pouco recente? — inquiro, surpresa.

— Não acho, porque não pretendo mudar de ideia em relação a


você, isso não irá acontecer. Quero que ele saiba que eu a amo e estarei ao
seu lado em qualquer ocasião. Eu também quero que conheça minha
família, primeiro minhas irmãs, vocês têm algo em comum: a arte. Será um
encontro interessante; se aceitar, eu marco um almoço.

— Eu gostaria de conhecer suas irmãs, você sempre fala muito bem


delas.

— Vou marcar. Nos vemos mais tarde, meu amor. — Me beija


levemente nos lábios.

— Até mais tarde. — Beijo-o e saio do carro com um sorriso


imenso.

Caminho em direção ao hospital com uma sensação tão gostosa!


Pouco tempo depois, estou dando duas batidas na porta do quarto em que
meu padrinho está internado.

— Boa tarde, como vocês estão? — indago ao entrar, abraço e beijo


Bruna e dedico o mesmo carinho a Guilherme.

— Estamos bem, não precisava vir aqui, conseguimos ir sozinhos —


Guilherme fala com um sorriso, mas, em seu olhar, eu vejo a felicidade por
eu estar aqui.
Eu mordo meus lábios ao me lembrar de que, há poucos minutos,
falei a mesma coisa para Felipe, e que talvez ele tenha se sentido como eu,
apenas querendo cuidar da pessoa que ama.

— Jamais deixaria vocês irem sozinhos. E então, já estão liberados?


— indago, vendo algumas bolsas arrumadas.

— Eu estou doido para me ver livre deste lugar! — meu padrinho


reclama.

— O senhor passou por maus bocados aqui. — Rio, abraçando-o.

— Já estou bem há dias e já posso ir para casa — resmunga.

— Temos que esperar o médico passar as últimas recomendações e


ele já estará liberado — Bruna responde, ao que Guilherme bufa.

— Você está linda, Manuela. Sempre foi linda, mas hoje está
diferente.

— Tenho que concordar com Bruna, está com um sorriso que não
tira dos lábios.

— Tem a ver com aquele rapaz que veio algumas vezes aqui, o
Felipe? — Bruna indaga com uma piscada.

— Bruna comentou algumas coisas sobre ele e estou bastante


curioso para conhecê-lo.

— Irão conhecê-lo mais tarde, ele irá me buscar e quer conhecer


vocês — aviso.

— Vocês estão realmente juntos? — meu padrinho questiona, e eu


penso por alguns instantes antes de responder.
— Sim, nós estamos juntos — confirmo.

Eles abrem um enorme sorriso e, antes que consiga falar algo mais,
um médico entra na sala com dois enfermeiros. Os profissionais tiram o
acesso do meu padrinho enquanto o médico passa as instruções e informa a
data do seu retorno para avaliação clínica.

Quando estamos saindo do quarto, recebo uma mensagem de Felipe


avisando que o motorista já está à minha espera na porta do hospital. Não
demoramos a sair do hospital e a chegar na casa deles, o motorista nos
ajuda com as bolsas, e eu o agradeço quando vai embora.

Enquanto Bruna ajeita as coisas de Guilherme, vou para a cozinha


para preparar um almoço leve. Após almoçarmos, nos sentamos na sala e
Guilherme indaga:

— Agora me fale tudo o que você vem escondendo de mim —


exige.

— O senhor não tem que pensar em meus problemas, apenas na sua


recuperação.

— Eu estou muito bem, obrigado, e não pretendo voltar para o


hospital tão cedo. Me diga o que aquele desgraçado fez com você? Certo
dia, peguei Bruna chorando, e eu tenho certeza de que é em relação a você.

— Guilherme... — começo, mas ele me para.

— Prometi à sua mãe que cuidaria de você. Por força do acaso,


fiquei fora da sua vida por um mês, mas preciso saber o que está
acontecendo — insiste.

Viro meu rosto para Bruna, e ela movimenta os ombros.


— É melhor contar, uma hora ele saberá de tudo — Bruna
aconselha.

Solto um longo suspiro e começo a falar, sem esconder nada, de


cabeça baixa, evitando encará-lo, torcendo as mãos e sentindo minhas
lágrimas pingarem na minha pele.

Bruna se senta ao meu lado e me abraça. Levanto a cabeça e vejo


meu padrinho limpar o rosto discretamente.

— Aquele desgraçado! — xinga e soca a mão. — Como você


conseguiu sair do hospital?

— Mesmo grogue, consegui que uma enfermeira entrasse em


contato com Felipe, que me ajudou a sair de lá. Mas não fui para minha
casa, tive que ficar mais três dias em uma clínica para provar que estava em
plenas funções mentais. — Limpo meu rosto e respiro fundo.

— Ele tentou te desacreditar perante a justiça!

— Ah, Guilherme, Jonas fez tantas coisas ruins. Conseguiu uma


procuração de plenos poderes e tirou todo o dinheiro da minha conta, pôs
todos os meus imóveis à venda... Quatro deles, que não estavam alugados,
ele conseguiu vender. — Fungo enquanto explico.

— Ele conseguiu vender em apenas uma semana? Isso é impossível!


Me recordo de que certa vez Jonas mencionou que tinha alguns conhecidos
interessados em algumas salas suas, mas eu me recusei a saber de mais
detalhes, pois não tinha a intenção de vender. Talvez sejam as mesmas
pessoas — meu padrinho exclama.
— Os advogados que Felipe contratou me informaram que, usando a
procuração de plenos poderes que ele conseguiu em meu nome, Jonas fez
um contrato de compra e venda, recebeu parte do dinheiro e as
documentações estavam correndo no cartório, mas eles já travaram isso.

— Advogados? Ele contratou mais de um?

— Sim, um escritório especialista em divórcio e outro, que trabalha


direto com Felipe e está cuidando das partes civil e criminal.

— Conversei brevemente sobre o divórcio com um advogado por


telefone enquanto estava internado, meu escritório precisava da minha
autorização para liberar as suas documentações, mas não imaginei o quanto
a situação estava complicada.

— Mas está tudo se resolvendo, minha audiência de divórcio será


daqui a alguns dias e, em breve, o inquérito policial também será concluído.
Creio que, por esses dias, assim que conseguir, ele será denunciado e talvez
emitam um mandado de prisão.

— Ele segue te importunando?

— Os advogados conseguiram uma medida protetiva, ele não pode


entrar em contato comigo. Também troquei meu número de celular e Felipe
sempre deixa um carro com motorista e segurança comigo.

— Quanto mais você fala desse homem, mais curioso eu fico para
conhecê-lo — meu padrinho diz, admirado.

— Ele é... intenso, acho que esta é a melhor forma de defini-lo.


Felipe é 17 anos mais velho que eu e está me ajudando muito.

— Ele está te fazendo feliz? — Bruna indaga.


— Sim, está sim. — Sorrio.

— Você está morando onde? — Bruna questiona.

— Com Felipe — confesso, aliviada por estar falando tudo.

— Está morando com ele porque não tem para onde ir? Pensei que
estavam apenas namorando, e não morando juntos. Você pode e deve vir
para cá — meu padrinho pede.

— Estou com Felipe porque nunca um homem me fez sentir o que


ele faz. Mesmo com toda a confusão que está minha vida, quero acreditar
nele, quero ficar com ele. E tem mais uma coisinha.

— Tenho até medo de saber o que é.

— Felipe é o CEO da empresa em que Jonas trabalhava, e ele me


traiu com a noiva do Felipe. Ele já terminou com ela, porém, quando se
aproximou de mim, foi em busca de vingança pelo que meu ex-marido fez,
mas acabou se apaixonando por mim — revelo em um único fôlego.

Vejo Bruna e meu padrinho abrirem a boca ao mesmo tempo, ambos


se olham e voltam a me fitar. Meu celular vibra e, ao olhar, noto que é uma
mensagem de Felipe avisando que chega em quinze minutos.

— Felipe está chegando, vou esperar lá fora, desculpa falar tudo de


uma vez, prometo explicar melhor quando ele chegar — digo, me
levantando.

Caminho rápido em direção à porta de saída e, assim que passo por


ela, levo a mão à boca. Não planejei revelar que a noiva de Felipe e Jonas
tiveram um caso, simplesmente saiu.
Rio da situação inusitada, mas meu sorriso morre em meus lábios ao
notar quem está atravessando a rua e vindo em minha direção com uma
expressão de raiva.

Jonas.

Os poucos segundos que levei para decidir o que fazer foram os


mais longos da minha vida. Eu só tinha duas opções: fugir dele e entrar na
casa do meu padrinho e correr o risco de ele fazer um escândalo do lado de
fora e novamente comprometer a saúde de Guilherme ou ficar aqui fora e
enfrentá-lo.

E foi o que decidir fazer. Nunca mais eu vou dar a ele o poder de me
machucar, nunca mais vou baixar a guarda ou estar vulnerável diante de
Jonas, então eu o aguardo se aproximar, olhando em seus olhos, sem
demonstrar fraqueza ou medo, porque a única coisa que eu sinto por ele
agora é desprezo!
Capítulo 25

Manuela
Jonas para na minha frente e me fita de cima a baixo.

— Onde você anda se escondendo? — inquire.

— Não é da sua conta. — Cruzo meus braços, assumindo uma


postura defensiva.

— Tem noção do quanto fiquei preocupado? Você não entrou em


contato, simplesmente sumiu! — Bufo quando ele abre um sorriso.

— O que você está fazendo aqui? Se esqueceu de que existe uma


medida protetiva que te impede de se aproximar de mim? — inquiro,
soando fria.
Ele tenta se aproximar, mas eu me afasto.

— Quem está te ajudando? Onde conseguiu todos aqueles


advogados? — Faz uma breve pausa, como se decidisse mudar sua
abordagem. — Não conseguia te encontrar em lugar nenhum, estava com
saudades. Precisamos conversar para resolver nosso desentendimento. —
Mais uma vez tenta se aproximar, ao que eu novamente me afasto.

— Não acredito que você vai fazer de conta que nada aconteceu! —
Fito-o, incrédula.

— Várias coisas aconteceram, minha esposa está há mais de um mês


fora de casa, vários advogados me processando, tenho que comparecer à
delegacia frequentemente. Mas relevo tudo, já que encontrei você.

— Você releva tudo?! Você só pode estar brincando! Não é possível


que esteja falando sério — solto, incrédula.

— Vamos para a nossa casa e... — Tenta mais uma vez, mas o
interrompo.

— A minha casa! Minha. — Bato o dedo indicador no meu peito. —


E eu quero que você e sua mãe saiam de lá o mais rápido possível!

— Quem está fazendo sua cabeça contra mim, falando mentiras, se


metendo no nosso relacionamento? Nós sempre resolvemos tudo juntos, se
lembra dos momentos tristes após todos os abortos? Sempre superamos as
crises e vamos superar esta também — soa convencido.

— Superar a crise? É assim que você se lembra? Eu ia ao inferno


sozinha a cada vez que perdia um bebê, passava calada o pão que o diabo
amassou e ainda dava presentes e viagens caras para vocês ficarem felizes
porque você e sua mãe faziam eu me sentir culpada por ter sofrido um
aborto e deixar vocês abalados. Nunca superamos nada, eu engolia toda a
minha dor goela abaixo e forçava um sorriso! — retruco com meu corpo
tremendo de raiva.

— Por que você está tão agressiva e nervosa? Se tivesse continuado


o tratamento... — Mais uma vez o interrompo.

— Que tratamento, Jonas? Você me internou contra a minha vontade


e de forma fraudulenta em um hospital psiquiátrico.

— Fala como se eu não quisesse te ajudar. Tudo o que fiz foi por
você. Não se lembra de que estava descontrolada e agrediu minha mãe,
falava coisas ilógicas e absurdas, alucinando? — Faz um meneio negativo,
e meu queixo quase cai.

— Não é possível que esteja ouvindo isso! — digo, incrédula.

— Você não tem noção do quanto minha vida ficou complicada por
tentar te ajudar, perdi meu emprego por causa de todas as faltas, não queria
deixar minha esposa desamparada e não tinha como ir trabalhar com você
internada naquele hospital. Sua sogra foi hospitalizada após você agredi-la,
levou semanas se recuperando, até hoje não se encontra bem. Ficamos em
dificuldades financeiras e, por esse motivo, vendi alguns imóveis com o
intuito de ajudar no seu tratamento, mas gastei quase todo o dinheiro
contratando detetives para te encontrar. Até o casamento do meu irmão foi
abalado, você deveria ter vergonha de tudo que fez.

Enquanto ele fala, eu me lembro da minha conversa com a psicóloga


quando ela mencionou o gaslighting. Jonas está, mais uma vez, tentando me
manipular, me fazer sentir culpada e achar que estou enganada, me
convencer de que nada do que eu vivi aconteceu.

Se eu não estivesse fazendo terapia e vivendo em um ambiente


saudável há um mês, talvez eu acreditasse, porque eu já ouvi muitas vezes
esse discurso, mas com acusações diferentes. Só que agora eu sei que o
objetivo é me fazer sentir culpada para conseguir continuar me controlando.

— Se afaste! — ordeno, firme.

— Você não ouviu tudo o que eu disse? — indaga, frustrado.

— Oh, sim! Eu ouvi cada absurdo que saiu da sua boca, eu ouvi! A
única diferença é que não caio mais no seu jogo sórdido, você não me
manipula mais. Pode falar o que bem entender, pois, no final, ainda será
processado, terá que devolver o dinheiro das pessoas que enganou e ainda
correrá o risco de ser preso — retruco, tentando me manter calma, mesmo
que por dentro esteja com vontade de gritar.

Mas me contenho, estou na frente da casa do meu padrinho, não


quero que ele se preocupe.

— Por que você está falando assim comigo? — Seu tom de voz
muda, se tornando baixo e ameaçador.

— Eu nem deveria falar absolutamente nada com você, uma única


ligação e você será preso por infringir uma medida protetiva — retruco no
mesmo tom.

— Quem está te ajudando? — Ele me surpreende ao chegar mais


perto e segurar meus ombros com força.
— Não te interessa! — rebato, sentindo seus dedos machucarem
minha pele. — Saia de perto de mim! — Empurro-o.

— Você virá para casa agora! Eu tentei ser gentil e educado e te


explicar a situação, mas você não entende! — Segura meu pulso, e eu sinto
seus dedos afundarem na minha pele, me puxando.

— Me solte, Jonas! — Tento puxar meu braço, mas não consigo. —


Vou ligar para polícia, e você será preso.

Começo a ligar para o 911, entretanto, ele dá um tapa na minha


mão, fazendo o aparelho cair no chão.

— Você está louco! Me solte! — Começo a socar seu braço


enquanto ele me puxa em direção ao carro.

Jonas é mais forte e maior do que eu; por isso, quando noto que não
vai parar até me pôr dentro do veículo, o medo começa a dominar meu
corpo. Bato nele mais forte, puxo meu braço com mais força, porém, ele
segue me segurando e, quanto mais perto fico do carro, mais me desespero.
Então, por não saber mais o que fazer, começo a gritar.

— Socorro! Alguém me ajuda! Estou sendo levada à força. Socorro!


— berro a plenos pulmões.

— Cale a porra da sua boca! — Sua mão cobre minha boca, me


machucando. Enquanto ele abre a porta do carro, eu tento mordê-lo e chutá-
lo, mas ele consegue me pôr no veículo. E é nesse momento que vejo Bruna
sair da casa com meu padrinho.

— Meu Deus, Jonas! O que você está fazendo? — Bruna indaga,


atravessando a rua e correndo em nossa direção.
— Seu desgraçado! Deixe minha afilhada em paz! — Guilherme
grita, se aproximando mais devagar.

— Eu e Manuela precisamos conversar — fala enquanto me força a


entrar pela porta do veículo.

Tento sair, puxo seu cabelo, bato em sua cabeça, chuto a porta, mas
ele segura meus braços com uma mão e me dá um soco na cara que me
deixa momentaneamente desnorteada.

Ouço uma gritaria, xingamentos e demoro a perceber o que está


acontecendo até ver Jonas sendo arrastado do carro e Felipe desferindo
vários socos e chutes nele.

— Seu filho da puta, como você ousa tocar nela! — Felipe urra.

Eu saio do carro, ainda meio zonza, cambaleando, mas tentando me


manter longe deles. Bruna me ajuda, segurando meus braços e me levando
para o outro lado da rua.

— Esse cafajeste está há muito tempo aqui? — Guilherme indaga.

Demoro um pouco a responder, fitando os dois homens brigando, ou


melhor, observando Felipe dar uma surra em Jonas.

— Uns 10 ou 15 minutos — respondo, levando uma mão à cabeça.

— Por que você não nos chamou antes, querida? — Bruna


questiona.

— Eu achei que conseguiria enfrentá-lo e não queria preocupar


vocês. — Deslizo minha mão até meu rosto ao sentir o lugar em que ele
bateu latejar. Tateio e verifico se está sangrando, percebendo que não,
apenas dói muito.

Volto a olhar para os homens brigando, Felipe segue enchendo Jonas


de socos e chutes, os seguranças dele estão parados e não fazem nenhum
movimento para impedi-lo.

— Ele vai acabar matando Jonas de tanto soco! — Guilherme soa


contente.

E eu começo a andar em direção a Felipe, não para salvar Jonas,


mas para impedir que ele se complique por causa do meu ex-marido.

— Felipe, por favor, pare! — peço.

Ele imediatamente se vira para mim.

— Liguem para a polícia! — Felipe ordena aos seguranças e depois


me fita. — Eu deveria matá-lo por ele ter ousado agredir você! — Seu olhar
desce pelo meu rosto, braço e pulso.

Eu nunca o vi olhar com tanto ódio e raiva a ponto de sua respiração


sair profunda como agora. Felipe frisa os lábios e volve o corpo com a
intenção de alcançar, novamente, Jonas.

— Não, esquece ele, não quero que se prejudique por causa desse
infeliz — imploro. — Olha seus dedos, você se machucou por minha causa.
— Não seguro mais as lágrimas ao ver seus dedos cheios de sangue.

— Este sangue é da cara dele, e eu acho que bati foi pouco. —


Desliza um dedo pelo meu rosto, meu braço e pulso. — Poderia matá-lo
pelo que fez com você — confessa.
— Você é amante do CEO da empresa em que eu trabalhava? É esse
homem que está te ajudando? Ele me agrediu, e você ainda fica ao lado
dele! — Jonas grita, e só então eu olho para ele.

Seu nariz, testa e boca estão sangrando, uma de suas mãos está
sobre a barriga e seu corpo, um pouco curvado, talvez esteja sentindo dores
por causa dos chutes.

— Fui demitido da empresa por ajudá-la e é assim que você me


recompensa, me traindo! — Volta a inventar mentiras.

— Você foi demitido porque estava passando informações


confidenciais da minha empresa e ainda fodendo minha noiva. E, sim... —
Felipe faz uma pausa, segura minha cintura e, por alguns segundos, me olha
como se quisesse que eu desse a autorização para confirmar que estamos
juntos.

Eu viro meu rosto para Jonas, com seu rosto sangrando, corpo
dobrado e com uma expressão de dor, e percebo que talvez uma outra
versão minha sentisse pena, até mesmo iria querer cuidar dele depois de
tudo que me fez, mas meu ex-marido me quebrou de tantas formas que
jamais serei daquele jeito novamente.

Sem perder mais nenhum segundo, volto minha cabeça para Felipe e
grudo meus lábios nos dele.

— Sua vagabunda! — Ouço Jonas gritar enquanto beijo Felipe.

— Olha como fala, porque você está falando da minha futura


esposa. Eu e Manuela estamos juntos, sim, ela está sob minha proteção, é
minha mulher e, se você ousar encostar nela de novo, eu acabo com você!
— Felipe ameaça, parece estar pouco se fodendo para as pessoas que estão
olhando, a única coisa que importa para ele sou eu.

O olhar de Jonas encontra os meus e ali está refletida toda a


humilhação que ele está sentindo. Eu o feri... Ou melhor, eu e Felipe o
ferimos física e emocionalmente, ele está machucado e humilhado, assim
como eu me senti ao descobrir sua traição, a manipulação, quando acordei
naquele hospital psiquiátrico, e seu roubo.

— Doí, né, quando sentimos na pele o que fizemos com o outro?


Mas te aviso que isso é só o começo, a minha vingança ainda nem
começou!

Saio dos braços de Felipe e caminho lentamente em direção a Jonas


enquanto falo:

— Eu quero você fora da minha casa, quero cada centavo que você
me roubou, te quero na cadeia, preso, humilhado e que passe por tudo o que
eu passei. Não vou ter dó, nem piedade, porque você não teve comigo, e
você vai pagar por tudo que me fez. — Paro perto dele e lhe dou um tapa no
rosto, usando toda a minha força, meu ódio, meu remorso e minha ira.

Jonas não reage, creio que esteja em choque por minha reação ou
talvez por medo dos seguranças de Felipe que o cercam. Giro meu corpo e
volto para Felipe, que me recebe de braços abertos, me acolhendo e
protegendo como sempre fez desde que me conheceu.

— Agora me diga se a vingança não é deliciosa? — sussurra ao meu


ouvido, me fazendo sorrir enquanto ouço as sirenes dos carros de polícia
chegando.
Me recordo da primeira vez que conversamos sobre vingança e do
quanto eu era contra, lembro-me também da vez em que ele revelou seus
planos de foder com a mulher do cara que estava transando com sua noiva.
O que ele não imaginava é que se apaixonaria por mim e sequer poderia
supor que ele seria meu ponto de conforto, o homem que me cerca de
carinho, amor e segurança, que faz tudo se alinhar ao meu redor, que me faz
sorrir e me apoia.

— Sim, você tem razão. Ela é deliciosa. — Volto a beijá-lo.


Capítulo 26

Felipe
Orgulho!

Esse é o sentimento que preenche meu peito neste momento ao ver


Manuela rebater a agressão, sem abaixar a cabeça ou se retrair, fingindo que
não sente nada. Minha mulher está emergindo, florescendo, mostrando que
não aceitará mais merdas de Jonas e de ninguém.

Estou feliz por ela, mas puto pela situação. Se eu demorasse mais
um pouco, ele a teria levado, e só Deus sabe o que faria.

Os policiais se aproximam, atraindo a minha atenção.

— Eles me agrediram, eu exijo que sejam presos! — Jonas grita,


apontando para mim e Manuela.
— Ele me agrediu primeiro e tentou me levar à força! — Manuela
rebate.

— Nós somos testemunhas de que ele a agrediu — Bruna


acrescenta.

— Existe uma medida protetiva o impedindo de chegar perto dela


— meu padrinho salienta. — Tenho câmera na entrada da minha casa e
meus vizinhos também, não será difícil provar que ele tentou sequestrá-la
— Guilherme conclui, apontando para Jonas.

— É só vocês olharem para mim! Levei uma surra do amante da


minha mulher! — berra.

— Eu teria vergonha de falar algo assim — zombo.

Um dos policiais pede o documento de Manuela para verificar a


medida protetiva e, assim que confirma, algema Jonas.

— Estou sendo preso? Eu fui agredido, quero denunciá-los! —


exige.

— Mas eu faço questão de ir, você agrediu minha afilhada! — meu


padrinho exclama.

Os policiais pedem que nós os acompanhemos até a delegacia e, no


caminho, ligo para João e aviso sobre o que houve. Ao chegarmos,
aguardamos pouco tempo até nosso advogado chegar, então, cada um é
chamado individualmente para prestar depoimento, Manuela é a primeira a
entrar e João a acompanha.

— Não era dessa forma que eu gostaria de conhecê-lo. — Me sento


ao lado do padrinho de Manuela. — O senhor está se recuperando, não
precisava vir. Se quiser, mando meu motorista enviá-lo para casa.

— Amo aquela menina lá dentro como se fosse minha filha, por


anos me recriminei por não conseguir tirá-la das garras de Jonas. Quero
ficar, prestar depoimento como testemunha da atrocidade que ele fez e
garantir que receba mais um processo — Guilherme fala, exalando raiva.

— Ninguém conseguirá tirá-lo daqui — Bruna comenta, se


referindo ao marido. — E fico triste de te reencontrar em uma situação
como essa, mas feliz por você estar cuidando de Manuela. Eu estava muito
preocupada.

— Eu a amo — declaro, e os dois se olham antes de me fitar com


um sorriso. — Este não é o momento, nem o lugar para essa conversa, mas
gostaria que tivessem em mente que farei de tudo para manter Manuela
segura — digo.

Bruna me oferece um sorriso enquanto Guilherme apenas assente.

— Quero muito conhecer você melhor, mas agora realmente não é o


melhor momento — ele diz, por fim.

Ficamos em silêncio, apenas esperando que toda a burocracia seja


concluída. Nosso advogado informou que Jonas ficaria detido por infringir
a medida protetiva, contudo, ele denunciou a mim e a Manuela por
agressão. Em contrapartida, minha pequena também o denunciou por
tentativa de sequestro, injúria e agressão.

E, quando achei que estava quase tudo concluído, uma mulher entra
na delegacia, seguida por outro homem, e assim que vê Manuela, vai para
cima dela.
— Quem você pensa que é para mandar prender meu filho, sua
louca! — Ela levanta a mão com a intenção de dar um tapa na minha
garota, mas ela a segura no ar, impedindo de concluir o ato.

Eu me levanto imediatamente, mas Guilherme segura meu braço.


Fito-o de forma interrogativa.

— Essa mulher é a mãe de Jonas, que por anos manipulou Manuela


ao seu bel-prazer. Portanto, essa briga é dela, pois, se não conseguir se
defender agora, ela nunca conseguirá seguir adiante. — O padrinho indica a
mulher com a cabeça.

— Não vou interferir, mas não ficarei longe — informo, saindo do


seu aperto e caminhando para perto da minha mulher.

Conforme me aproximo, me recordo de ter lido sobre ela e seu filho


mais velho no relatório que os detetives me enviaram, Raquel e Rodolfo.
Sobre ele, ainda não tenho um pensamento concreto, mas, sobre ela, sim:
não gosto dessa mulher por tudo o que ela fez a Manuela.

— Seu filho me agrediu e tentou me pôr à força dentro do carro para


me levar Deus sabe para onde — Manuela rebate no mesmo tom.

— Você é a esposa dele e sumiu por mais de um mês, ele queria


levá-la para casa, mesmo depois de tudo o que você fez. A vida do meu
filho se transformou em um inferno por sua causa! — a senhora acusa,
enraivecida.

— Eu estou me divorciando! E o que ele me fez? O que vocês me


fizeram? Tudo o que acontecer com ele será pouco perto do que sofri nesses
últimos anos! — Manuela replica no mesmo tom.
— Rodolfo, não estou me sentindo bem. — A mulher leva uma mão
às têmporas e procura o auxílio do filho ao seu lado.

— Estamos em uma delegacia, Raquel, não conseguirá enganar


ninguém aqui — Manuela zomba.

A outra avança novamente, mas o filho a segura, e eu levo minha


mão às costas da minha mulher. Raquel observa esse movimento com uma
sobrancelha levantada.

— E quem é o homem ao seu lado, ele é o seu amante? É por causa


dele que está pedindo o divórcio e causando todos esses problemas? Eu
sabia que tinha algo estranho, você estava diferente! Mas nunca imaginei
que fosse tão mau-caráter, vagabunda! Desde que mudou, desconfiei que
estivesse traindo meu filho, e ainda o pôs na cadeia, você quer tirar tudo
dele! — acusa aos berros.

Aperto a cintura de Manuela, me controlando para não rebater.

— Meu nome é Felipe Sampaio! — anuncio, altivo, imponente, com


um olhar afiado em sua direção, aproximando a mulher que eu amo do meu
corpo.

Vejo o arfar de Raquel ao reconhecer meu nome; não cheguei a


conhecê-la pessoalmente, afinal, em vez de comparecer ao jantar que eles
ofereceram, preferi caminhar na praia com Manuela.

— E ele não é meu amante, estou separada e com um processo de


divórcio que será concluído em poucos dias, ele é meu namorado! — ela
completa minha fala.

Me esforço para esconder um sorriso quando abraça minha cintura.


— O que foi, está surpresa? Não creio que pensou que eu ficaria
eternamente em um canto, sozinha e chorando por tudo que vocês me
fizeram. Sério que julgou que isso aconteceria? — Bufa.

Por um momento, cheguei a pensar que ela evitaria falar que


estávamos juntos, mas confirmou e ainda debochou. A cada momento que
passa, Manu me mostra que a dor a fez mudar, se tornar mais forte; está
radiante, segura, provocadora, desafiante, altiva.

— Você quer dizer meu dinheiro! — Manuela continua, apontando


para o peito. — Minha casa, meu carro, até as joias que você está usando
agora fui eu que comprei, e não se preocupe, não vou exigi-las de volta,
pode ficar. Mas, da minha casa, eu quero você e Jonas fora dela o mais
rápido possível! — cospe.

Há algo fascinante em ver uma mulher rebater um insulto à altura,


sem que, para isso, tenha que usar palavras chulas. A maioria das pessoas já
teria mandado a outra para a puta que pariu há muito tempo, talvez um dia
Manuela seja assim, talvez não, mas o orgulho que estou sentindo dela neste
momento é imenso.

Ela ainda pode ter muitos receios e traumas internos, sentimentos


conflitantes e confusos em relação ao nosso relacionamento e sobre si
mesma, porém não posso negar que ela aprendeu a se defender. Queria
beijá-la agora e dizer o quanto a amo, mas me esforço para ficar em
silêncio, apenas vibrando por dentro pela minha mulher.

— Você não vai ajudá-lo? Irá deixar Jonas dormir em uma prisão
imunda? — a outra segue falando. Pelo visto, mudou a tática de persuasão,
primeiro tentou humilhar Manuela, não conseguiu e agora tenta fazê-la se
sentir culpada.
Se está fazendo isso aqui, na frente de todos, imagino o quanto
minha mulher sofreu com ela por todos esses anos. E o pior é saber que,
além de não se defender, Manu ainda inventava desculpas para a forma
como era tratada. Já imaginava, os relatórios me deram uma ideia de como
era a narrativa entre as duas, mas isso não diminui o impacto ao presenciar.

Volto meu olhar ansioso para ela, doido para agir, ávido para tomar
conta da situação, mas me controlo, este não é o meu lugar de fala, não
agora; mesmo querendo muito, não posso invadir o espaço de Manuela.
Apesar de ela ter falado que discutiu com Raquel no dia em que foi
internada, desta vez é diferente, ela está segura de si, não se
descompensando como outrora. Este momento é importante para ela, então
permaneço mudo ao seu lado e alerta para o caso de precisar de mim.

— Não posso ajudar a pessoa que me agrediu — minha mulher


responde, soando calma.

— Se ele fez algo é porque você o levou a agir dessa forma — a


outra revida.

Manuela ri e faz um meneio negativo, mas, em vez de rebater


Raquel, se vira em direção para João.

— Já estamos liberados? — indaga ao nosso advogado.

— Sim. — Ele confirma após trocar olhares comigo.

— Vamos? — questiona, me fitando.

Assinto e seguro a sua mão.

— Você vai embora sem me responder? — Raquel inquire, exaltada.


— Eu não tenho mais nada para falar com você, seu filho apenas
está tendo o que merece e, se quiser tirá-lo daqui, sugiro que fale com um
advogado, não comigo.

Seguimos em direção aos seus padrinhos ouvindo Raquel gritar,


mas, assim que leva uma advertência do policial, a mulher fica em silêncio.
Manuela não olha para trás nenhuma vez antes de sair.

Deixamos seu padrinho e a esposa em casa e prometemos marcar


um jantar para conversarmos melhor. Assim que voltamos para o carro,
seguro seu rosto e a beijo, e ela solta um resmungo.

— Desculpe, me esqueci que seu rosto está machucado. Está doendo


muito? — pergunto, acariciando seu queixo.

— Um pouco — admite. — Por que está sorrindo assim? — indaga.

— Estou muito orgulhoso de você, a cada dia que passa, me


surpreende mais.

— Hoje fiz tudo o que julgava que jamais faria. — Ela sorri e
balança a cabeça de um lado para o outro. — Mas a sensação foi
libertadora. — Solta uma gargalhada, mas, em vez de levar a mão ao rosto,
a põe na barriga.

— Me segurei muito para não interferir na delegacia, seu padrinho


me aconselhou a deixar você lidar com a situação, e eu já havia prometido
deixar você resolver os seus problemas.

— Eu imagino, você ama cuidar de tudo ao seu jeito... Aiii! —


Interrompe a fala com um gemido de dor.
— Manuela, o que houve? O que está sentindo? — inquiro,
preocupado.

— Cólica, estou sentindo desde que chegamos à delegacia, mas


agora piorou. Até que demorou, desta vez, já era para ter vindo há algumas
semanas. — Se contorce no banco.

— Vou te levar ao hospital — aviso.

— Não precisa, é só passar em uma farmácia e comprar o remédio


que alivia.

— Remédio apenas alivia? Não quero algo paliativo, quero que


melhore. Vamos para o hospital — decreto e, dessa vez, ela nem reclama.

Demoramos cerca de quarenta minutos para chegar ao hospital. Ao


sairmos do carro, Manuela mal consegue ficar de pé, por isso, a pego no
colo e logo somos encaminhados para a emergência.

— Você está grávida? — a médica indaga enquanto a analisa.

— Não, eu tenho endometriose, por isso as cólicas — Manuela


responde com o rosto contorcido pela dor.

— Compreendo. Quando foi seu último ciclo?

— Há quase dois meses — mal sussurra.

— A senhora não poderia receitar logo um remédio? — pergunto,


aflito.

— Até descartar gestação, somente dipirona — me responde e se


volta para Manuela. — Você tem alergia a algum medicamento?
— Não, mas dipirona e nada dá no mesmo quando sinto essas dores
— minha pequena reclama. Vê-la sentindo dor me deixa angustiado.

— Vou pedir para colherem o sangue com urgência no resultado.

— Doutora, eu não estou grávida, além de ter endometriose, faço


tratamento e o meu período é irregular por causa disso e, com os
medicamentos e a doença, a chance de estar grávida é mínima, só engravido
quando paro de tomar os remédios. Não estou grávida! — Manuela insiste,
mas de nada adianta.

— Quer que eu te leve para outro lugar? — pergunto, segurando sua


mão.

— Não adianta, é sempre assim. — Faz uma careta quando a


enfermeira colhe o sangue e depois injeta o medicamento. — Eles sempre
querem saber se estou grávida antes de me dar algo mais forte. — Respira
fundo.

Me resigno a somente segurar a sua mão, quero poder tirar a dor


dela e transferir para mim, mas não posso, então eu fico ao seu lado,
beijando sua mão e a trazendo para meu peito.

Estava a ponto de ir atrás da médica quando a avisto caminhando


em minha direção, e seu sorriso me faz franzir o cenho.

— Fui pessoalmente buscar o resultado! Como disse antes, é sempre


bom ter cautela quando existe a possibilidade de gestação, mesmo que seja
mínima, e neste caso, que bom que esperamos um pouco, pois você está
grávida — conclui, me fazendo prender a respiração. Manuela empalidece
rapidamente olhando para a médica.
Solto o ar devagar enquanto absorvo a informação.

Manuela está grávida do meu filho.


Capítulo 27

Manuela
Você está grávida!

Ouço as palavras que me levam para um lugar sombrio serem


proferidas pela médica. Nos últimos anos, as ouvi sete vezes e, em todas, eu
fiquei feliz; em todas me agarrei à esperança de que tudo fosse dar certo, de
que, em alguns meses, teria meu bebê em meus braços e seria feliz e plena.

Mas não foi o que aconteceu, houve muitas dores e sofrimento, de


corpo e alma. Não imaginei que as ouviria novamente após tudo que houve
comigo, simplesmente deixei de pensar na possibilidade de ser mãe.

Sinto uma lágrima descer pelo meu rosto, a agonia tomar conta do
meu corpo, a dor de todas as perdas me dominar, parece que estou caindo
em um abismo escuro e profundo. Meu corpo gela, eu abaixo a cabeça e
levo minhas mãos trêmulas à barriga, meus lábios tremem e vejo a primeira
gota cair em minha mão, sendo seguida por outras e, quando o pranto
começa a me dominar, Felipe acaricia meu rosto, levanta meu queixo e
gruda seus lábios nos meus.

— Nós vamos passar por isso juntos, em cada processo, cada passo,
estarei ao seu lado — sussurra contra a minha boca e logo depois sinto sua
mão cobrir a minha.

E novamente ele vem me tirar de um lugar escuro, mais uma vez ele
é meu ponto de conforto.

— Desta vez, não vou passar por isso sozinha — murmuro,


respirando fundo e tentando me controlar.

— Está tudo bem? — a médica questiona.

— Por causa da endometriose, ela teve alguns abortos, por isso, a


gestação é um tema sensível para ela — Felipe informa, enlaçando meus
ombros e aproximando meu corpo do seu.

— Compreendo. Bom, devido ao seu histórico, vou te deixar em


observação e vamos fazer alguns exames para descobrir o porquê dessa dor,
também vou te receitar Buscopam simples.

— Eu posso estar abor... — Não consigo concluir a frase, escondo


meu rosto no peito de Felipe e choro.

A médica faz um ligeiro carinho na minha perna.

— Essa dor pode ser por vários motivos. Sei que é difícil, mas tente
manter a calma. Você teve sangramentos ou algum estresse? — inquire.
Eu respiro fundo antes de responder:

— Não tive sangramento ou dor anteriormente, porém, hoje foi um


dia bem estressante.

— Vamos investigar para descobrir, vou pedir uma enfermeira para


te encaminhar para uma sala de exames de imagem.

Apenas faço um movimento afirmativo com a cabeça, porque não


consigo emitir uma única palavra. Só consigo definir as próximas horas
como angustiantes.

Pelas próximas quatro horas, fiz vários exames, mas um me fez ficar
mais apreensiva: ultrassom transvaginal. Segurei a respiração enquanto a
médica fazia o procedimento. Eu olhava para a tela preta e branca do
monitor, já estive nessa situação algumas vezes, era nesses momentos que
eles diziam que não havia feto na bolsa gestacional ou que ele havia
morrido.

Mordi o interior da minha boca, esperando, e Felipe não saiu do


meu lado em momento algum, segurava minha mão, me beijava, me
transmitia segurança e me enchia de apoio, carinho e amor.

— Este pontinho pequeno aqui é o seu bebê. — Indica na tela.

Apenas um grão, tão pequeno, e eu sei o quanto é frágil. Seguro


mais forte a mão de Felipe, busco o seu olhar, focado na tela, nunca vi essa
expressão no seu rosto, ele está fascinado e, ao mesmo tempo, surpreso.

— Você está com pouco tempo de gestação, apenas 4 semanas,


ainda não dá para ouvir os batimentos, mas a bolsa gestacional e o feto
estão adequados para o período de gestação. Além da dor, não houve
sangramento, e você relatou que hoje foi um dia de grande estresse, certo?

— Sim, hoje foi um dia tenso — confirmo, um pouco mais calma.

— E como está a dor após o medicamento?

— Melhor, agora sinto apenas um pequeno incômodo. Se fosse uma


dor por causa da endometriose, não melhoraria apenas com dipirona. —
Faço uma pausa e levo uma mão à barriga. — Então, eu não abortei? Tem
certeza de que estou realmente grávida?

— Fique tranquila, você não abortou. Vou te liberar, mas recomendo


repouso e que procure por um especialista, tudo bem?

Assinto e olho para Felipe, que faz um movimento negativo com a


cabeça.

— É seguro para ela ir para casa? Não seria melhor ficar internada
pelo menos esta noite? — questiona, preocupado.

— Não vejo necessidade, se houvesse alguma alteração nos exames


de sangue ou de imagem, eu a internaria, mas esse tipo de dor é normal no
início da gestação, deve ter se agravado devido ao estresse que passou.
Porém, volto a salientar, é imprescindível procurar por um especialista —
conclui.

Quando noto que Felipe irá retrucar, seguro seu braço.

— Estou me sentindo melhor, apenas quero ir para casa, não gosto


de hospitais. — Após um longo suspiro, ele assente.
Assim que entramos no carro, Felipe liga para a secretária e pede
para marcar uma consulta para o dia seguinte com o doutor Marcos
Pinheiro, um dos maiores especialistas em obstetrícia no Rio de Janeiro.

— Por que você ligou para ela agora? São duas horas da manhã,
poderia ter esperado até o amanhecer. — Sorrio do olhar que me envia. —
Além do mais, é provável que não consiga, existem outros bons
profissionais, há anos que tento uma consulta com esse médico e não
consigo, a fila de espera dele é imensa, e eu nunca fiquei grávida por tempo
suficiente para me consultar — comento com um suspiro triste.

— Minha querida, há poucas coisas que seu futuro marido não


consegue — diz em um tom de brincadeira. — Mas a verdade é que eu o
conheço pessoalmente, minhas irmãs já foram pacientes dele. E eu não
quero um médico bom, quero o melhor!

Evito tecer comentários, me recordo de que ele disse que suas irmãs
tinham dificuldades em engravidar ou não podiam ter filhos, algo assim, e
isso pode estar relacionado à perda, e disso eu entendo, e muito.

Acaricio minha barriga, tentando não pensar em nada, mas não


consigo afastar o medo do meu coração desde que ouvi a médica dizer que
estou grávida. Tenho receio de me apegar, de sonhar novamente e mais uma
vez sofrer. Ficamos em silêncio até chegar à cobertura, tomamos banho
juntos e, quando estamos deitados na cama, ele sussurra enquanto acaricia
minhas costas:

— Vai dar tudo certo — promete.

— E se não der? — murmuro.


— Podemos tentar de novo e, se você não quiser mais tentar,
podemos adotar. Independentemente do que acontecer, estarei ao seu lado,
sempre.

Abraço-o forte, bem forte, apertando meu rosto contra seu corpo.

— Sempre estarei aqui com você e para você. Eu te amo, Manuela,


e vamos enfrentar juntos.

— Não quero falar para ninguém por enquanto, até ter passado o
primeiro trimestre, nunca consigo passar por ele, sempre perco antes.

— Tudo bem, não vamos falar para ninguém, será um segredo


nosso. — Ele se abaixa até a minha barriga e a beija. — Nosso bebê está
aqui, meu e seu, a amplitude disso está me tomando aos poucos. Em
primeiro lugar, veio a dor, o seu sofrimento, e somente agora que estou
absorvendo que aqui dentro tem uma parte minha e sua.

Felipe beija várias vezes minha barriga. Eu choro, tocando seus


cabelos, e ele me olha com tanto amor, tanto carinho, com um sorriso tão
lindo que eu seguro seu rosto e o beijo lentamente.

— Acho que não vou mais ter receio de te amar.

— Eu nunca me segurei.

— Na verdade, você negou várias vezes que estava apaixonado por


mim — brinco e o beijo.

— Eu apenas não queria admitir o óbvio.

Esfrega o nariz no meu e sussurra:


— Não tenha receio, apenas segure a minha mão e vamos ser
felizes, desafiando a tudo e a todos, por nós, por nosso bebê, dia após dia,
derrubando os obstáculos.

Pego a sua mão, entrelaço nossos dedos e a beijo. Ele repete o gesto
e a encosta em seu peito.

Foi como se estivéssemos selando um pacto, um acordo invisível,


apenas com os nossos sentimentos. Nós dois vamos enfrentar tudo o que
vier pela frente, não importa o que.

Na manhã seguinte, fomos nos encontrar com o médico que tento


consultar há muito tempo, e Felipe conseguiu em uma única ligação. Após
fazer vários exames, questionar sobre a minha doença, os abortos e a dor
que senti ontem, o doutor me tranquilizou e basicamente disse as mesmas
coisas que a médica do dia anterior: descanso e evitar estresse.

Ele me passou muita segurança, mesmo depois de ter contado meu


histórico; salientou que existe, sim, o risco de acontecer novamente, mas
que, por agora, está tudo bem; receitou algumas vitaminas e informou que
acompanharia a minha gestação semanalmente.

Saí do consultório com a esperança querendo nascer dentro do meu


peito, talvez porque sempre sonhei em me consultar com esse especialista,
pela segurança que ele me passou ou porque, desta vez, me sinto diferente,
mais leve, sem pressão, cobranças ou julgamentos.
Felipe me deixou na cobertura e seguiu para a empresa, me
garantindo que voltaria, e eu apenas assenti, queria e precisava ficar
sozinha, e parece que ele entendeu quando parou o carro na frente do prédio
e disse que não iria subir.

Ao entrar, fui direto para o ateliê, me sentei no sofá, levei a mão à


minha barriga e chorei. Não sei especificar por qual motivo específico,
porque era tanta coisa acumulada que é complicado definir.

Resolvi muita coisa dentro de mim, não aceito mais ser manipulada,
controlada e nem me deixarei de lado em benefício de outra pessoa. No
entanto, ainda estou tratando outros pontos, será um longo caminho, eu sei
disso, mas não mencionei os meus abortos na terapia, havia coisas mais
urgentes a falar. Provavelmente vou tocar nesse assunto na próxima
consulta.

— Por agora, está tudo bem — sussurro, acariciando meu ventre.

Respiro fundo e limpo meu rosto.

Vou viver por esse agora está tudo bem, seguir as recomendações do
médico e os conselhos da terapeuta e o apoio de Felipe. Abro um enorme
sorriso ao me lembrar dele, tão companheiro, presente, carinhoso dedicado,
fui casada por cinco anos, mas nunca tive isso.

— Vou viver, por agora. — Mordo meu lábio inferior correndo os


olhos pelo ambiente.

O médico me disse para me manter tranquila e, outrora, quando


pintava, minha mente esvaziava, era consumida pela paixão e transmitia
toda a emoção que sentia para a tela. Me movo, seguida por esse instinto,
visto o avental e gargalho ao ler “Ateliê da Manu”.
Me sento no banco em frente à tela em branco, pego o pincel e,
depois de anos, volto a pintar, deixando a emoção tomar conta de mim e
transformar medo, dores e angústias em arte.
Capítulo 28

Manuela
Conforme os dias foram passando, fui me acostumando ao fato de
estar grávida, não senti mais dores, segui uma dieta balanceada, passava
boa parte do meu tempo no ateliê e estava quase concluindo meu primeiro
quadro depois de anos. Também liguei para o meu padrinho, conversei com
Juliana, mas a nenhum deles revelei a gestação, cumprindo o acordo que fiz
com Felipe. Mas falei para minha terapeuta; para ela, desabafei todos os
medos que me afligiam.

À noite, na cama, abraçada ao pai do meu bebê, ficava quietinha,


sentindo-o acariciar meus cabelos.

Até que chegou o dia da audiência do divórcio, André Martes, meu


advogado nesse processo, me instruiu sobre como agir na frente do juiz.
Enquanto ele falava, eu apenas assentia. João aconselhou Felipe a não ir ao
fórum, algo que ele acatou com muita relutância, e marcamos de fazer uma
reunião após a audiência para conversarmos sobre os processos criminais
que movo contra Jonas.

Guilherme e Bruna me acompanharam com os advogados do


escritório do Dr. André. Achei que ficaria nervosa por estar diante de Jonas
novamente, não procurei saber quando ele saiu da cadeia, simplesmente me
recusei a pensar naquele dia, eu tinha algo muito mais importante em
mente.

Meu bebê.

— Seu amante não veio com você? Ele já te largou? Imaginei que
isso aconteceria, um homem como Felipe Sampaio não ficaria com alguém
como você. — Raquel acompanhava Jonas, segurando seu braço e o
alisando como se desse apoio.

Houve um tempo em que comentários assim me deixariam triste,


mas hoje senti vontade de rir, ao que me contive.

— Raquel, você deveria estar mais preocupada com a situação do


seu filho do que com a minha vida pessoal, prevejo que nos encontraremos
muitas vezes nos corredores dos fóruns pelos próximos meses — rebato,
irônica.

— Ora, sua... — começa, mas meu padrinho a interrompe.

— Sugiro à senhora medir as palavras ao se dirigir à minha afilhada,


porque, além de processar seu filho, ela também pode processar você —
Guilherme soa rude.
Sorrio para ele, mesmo ainda não estando completamente
recuperado, ele está aqui comigo. Nem pensei em tentar fazê-lo mudar de
ideia, sei que esperou por este dia desde o momento em que falei que iria
me casar com Jonas.

Na frente do juiz, o advogado de Jonas me descreveu como uma


mulher emocionalmente instável, que estava sendo manipulada pelo amante
e procurava destruir o marido, diante disso, tive que morder ambos os
lábios para não falar nada.

Quando ele sugeriu que eu pagasse uma pensão para Jonas e que os
bens fossem divididos, porque ele sofreu danos emocionais e financeiros
por causa da minha traição, apertei minhas mãos com tanta força que senti
minhas unhas entrarem na minha pele.

Procuro o olhar do Dr. André, e ele faz um gesto negativo de


cabeça, então eu entendo que devo me manter calada. Meu advogado foi o
primeiro a expor tudo o que aconteceu comigo e agora tenho que ouvir as
asneiras da parte de Jonas.

Fiquei ansiosa quando o juiz proferiu sua decisão, mas suspirei


aliviada ao ouvir que Jonas não conseguiria a pensão, indenização e que eu
não teria que dividir meus imóveis com ele. Além disso, o desgraçado teria
trinta dias para sair da mansão.

Assinamos o divórcio, mas ele disse que contestaria a partilha, ao


que pouco me importei; estava feliz demais por finalmente estar divorciada.
Saímos dali, eu e meu padrinho, e fomos para a cobertura de Felipe, queria
mostrar o lugar em que estou morando para Guilherme e Bruna.
Felipe me avisou que só chegaria mais tarde com João, e eu sorri ao
ler sua mensagem. Ele parece me conhecer tão bem, sei que sua vontade é
de me pôr debaixo de suas asas e me defender de tudo e de todos, mas se
contém e se afasta quando percebe que preciso de espaço.

Queria ficar um tempo sozinha com Guilherme, quero mostrar o


ateliê e o quadro que estou pintando, sei que ele iria se emocionar; meu
padrinho me viu crescer, sabia do quanto minha mãe se orgulhava por eu
ser artista, ficou triste quando a tristeza me dominava a tal ponto que não
conseguia sequer pensar em pintar.

E eu não me enganei: ao entrar no ateliê, seus olhos se encheram de


lágrimas.

— Ah, Manuela, que lugar lindo! — Bruna exclama, olhando ao


redor.

— Ficou lindo demais, Felipe ama me dar presentes, mas este foi o
que mais gostei.

— Você voltou a pintar? — a voz de Guilherme soa embargada.

— Sim — digo, fazendo um meneio afirmativo com a cabeça.

Meu padrinho desvia os olhos do quadro e me fita, se aproxima e


me abraça forte.

— Sua mãe ficaria tão feliz! Você está livre, Manuela, finalmente,
livre para ser feliz! — sussurra, me abraçando.

E eu me debulho em lágrimas. Seguro a vontade de falar que estou


grávida, ainda não é o momento, mas posso mostrar que estou bem, que
estou segura, sendo amada de verdade, sem segundas intenções, sem ser
manipulada.

Apesar de recente, não é um relacionamento criado em minha


mente, é real, não estou fantasiando uma relação perfeita, porque nenhum
de nós dois é assim, e nem mesmo eu quero que sejamos. Primeiro ele se
tornou meu porto seguro, depois me ajudou a curar minhas feridas, me
sentir protegida, acolhida, e então me tornei mais forte e agora eu não tenho
mais nenhuma dúvida de que ele é dono do meu coração.

E eu estou irremediavelmente apaixonada pelo CEO Felipe


Sampaio.

— Sim, estou livre e feliz! — confirmo, sorrindo largo.

Quando Felipe e João chegaram, estávamos conversando na sala.

— Desculpe a demora — Felipe fala, se abaixando e me beijando


antes de cumprimentar Guilherme e Bruna.

João cumprimenta a todos e mal se senta, eu já indago:

— Quando será a audiência criminal?

— Bem, são alguns processos que estamos movendo contra ele, por
enquanto, nenhum deles tem data marcada para a audiência.

— E em relação ao inquérito? Ele já foi concluído, já descobriram


como Jonas conseguiu me internar naquele hospital psiquiátrico? —
questiono, cruzando minhas pernas.

— O diretor do hospital o ajudou — João informa. — E parece que


não é a primeira vez que ele fez algo parecido.

— Então o irmão de Jonas também está envolvido? Ele também é


psiquiatra — Guilherme inquire.

— No inquérito, Rodolfo confirmou que apresentou o diretor do


hospital ao irmão em um encontro casual, mas negou que tivesse algo
relacionado à sua internação. Ele e sua mãe não foram arrolados no
processo, pois, na época da sua internação, ela provou que estava doente.

— Juliana comentou que ela havia sido hospitalizada e que ficou em


sua casa — revelo. — Então Rodolfo pode não ter nada a ver com isso?

— No depoimento, ele disse que há muito tempo não tem contato


com o diretor e as investigações mostraram que eles não conversaram por
telefone; ao contrário de Jonas, que nos últimos meses ligou várias vezes
para o diretor.

Essa informação me deixa um pouco aliviada, não quero que Juliana


fique separada do marido por minha causa, sei que eles se amam e desejo
que se entendam e fiquem bem longe do restante da família dele.

— Isso mostra que ele estava planejando isso há muito tempo —


Felipe comenta.

— Acho que só estava esperando Manuela passar a procuração para


o nome dele para interná-la, me disse várias vezes que conhecia pessoas que
estavam interessadas em comprar os imóveis — Guilherme lembra. —
Sempre soube que Jonas não prestava, mas nunca imaginei que planejava
algo assim.

— Ainda fico tão constrangida por não ter percebido nada disso
antes... — confesso.

— Não pense assim, sabe que não teve culpa. — Felipe segura
minha mão, e eu aperto a dele.

— É difícil não pensar dessa forma. — Solto um longo suspiro. — E


a Paula, a enfermeira que me ajudou? Ela teve algum problema? — inquiro.

— Ela foi demitida, mas não se preocupe, agora ela está trabalhando
naquela clínica que você foi transferida. Lá as condições de trabalho e
salário são melhores. — João comenta e eu tenho certeza de que tem o dedo
de Felipe nisso.

— E em relação aos meus imóveis que Jonas tentou vender? Hoje,


ao terminar a audiência de divórcio, ele afirmou que recorreria em relação
aos meus bens — questiono a João.

— Provavelmente o fará, assim ele consegue enrolar o processo em


relação à venda ilegal dos imóveis. O que talvez ele tente provar é que,
como os imóveis também eram dele, ele poderia vendê-los.

— Corre o risco de conseguir? — pergunto, preocupada.

— Acho muito difícil isso ocorrer, vocês se casaram com regime de


separação total de bens, ele só conseguiu vender porque estava com a
procuração e, mesmo assim, já entramos com o processo para anular a
venda.

— Compreendo.
— Nossa batalha será longa — ele esclarece.

— Estou percebendo. — Tento sorrir, mas não consigo. — E ele


usará o dinheiro que me roubou para bancar esses processos.

— Você não estará sozinha. — Felipe eleva minha mão e a beija. —


Vamos enfiar tanto processo naquele desgraçado que ele ficará desnorteado,
vamos tirar tudo dele, inclusive a liberdade, como ele tentou fazer com
você. — Há uma raiva imensa no seu tom de voz.

Logo ele continua:

— Vamos deixá-lo sem casa, sem dinheiro e sem dignidade, ele se


sentirá no fundo do poço, no meio do furacão, sem rumo, achando que não
há saída. Eu prometo para você que não medirei esforços e nem dinheiro
para que ele se sinta como você se sentiu.

Felipe não pisca e não desvia os olhos, me fazendo acreditar em


cada palavra que proferiu.
Capítulo 29

Felipe
Observo Manuela dormindo nua ao meu lado, sua expressão está
serena e tranquila. Quando descobriu que está grávida, ela ficou muito
angustiada, preocupada, e não poderia ser diferente. Minha garota passou
por muitas coisas, e essa gestação, mesmo não planejada, é o seu sonho.

Manuela quer ser mãe, e eu quero ser o pai dos filhos dela.

Aos poucos, ela foi relaxando, a cada consulta ficava um pouco


mais tranquila, começou a viver um dia de cada vez, seguiu todas as
recomendações médicas e passou muito tempo no ateliê. Adaptei a minha
rotina para passar mais tempo com ela, a levei a jantares, teatro, viajamos,
fizemos passeios românticos de mãos dadas e dançamos abraçados na sala
enquanto uma música suave tocava.

E assim se passaram dois meses, nos quais focamos um no outro e


no nosso bebê, criamos laços fortes e profundos. Ela me tornou mais leve,
menos focado no trabalho e me fez repensar meus objetivos e anseios.

Manuela se tornou o centro do meu universo.

Abaixo a cabeça e beijo suas costas.

— Bom dia, meu amor — sussurro, deslizando o lençol do seu


corpo, deixando-o exposto

— Bom dia! — Se espreguiça. — Hoje será um dia importante.


— Sim, mas tenho certeza de que tudo dará certo. Você está
sentindo alguma coisa?

— Não, desde aquele dia, não senti mais nenhuma dor ou incômodo,
mas também não senti os sintomas normais da gestação, enjoos, tonturas,
essas coisas.

— Acho que isso é uma coisa boa. — Solto uma gargalhada e a


beijo.

— Apenas estou preocupada, não cheguei a esta fase antes, meu


primeiro trimestre.

— Na consulta da semana passada, estava tudo bem; nesta também


estará.

— Desculpa ter evitado ouvir o coração do bebê, é que... — Ela


fecha os olhos e respira fundo.

— Vai ser no seu tempo, a única coisa que quero é que ele e você
estejam bem, só isso me importa.

— Ele? Você acha que é um menino?

— Sim, acho que sim.

— Às vezes eu não quero criar expectativas, mas me pego


sonhando, imaginando, desejando. — Seu sorriso é tão lindo que me
contagia.

— Em alguns meses, teremos nosso bebê em nossos braços. —


Acaricio sua barriga. — Hoje também iremos almoçar com minhas irmãs,
elas estão ansiosas para conhecê-la. As duas dizem que estou te escondendo
do mundo.

— Você poderia ter marcado antes.

— Confesso que elas têm razão, te queria, e ainda quero, só para


mim. Mas isso as deixou bem curiosa ao seu respeito, nunca me viram
apaixonado antes.

— Está me deixando mais nervosa. — Leva a mão ao rosto.

Abaixo a cabeça e circulo o bico do seu seio com a língua enquanto


escorrego minha mão e toco sua boceta.

— Não te quero nervosa. — Sugo seu mamilo devagar.

— Felipe... — diz, manhosa, se contorcendo e gemendo.

Escorrego o dedo até o seu ânus.

— Assim é covardia.

— Eu sei que você gosta. — Surpreendo-a girando nossos corpos de


modo que ela fique em cima de mim. — Sente-se no meu rosto, esfrega sua
boceta na minha cara e me deixa te fazer gozar gostoso.

Minha mulher engatinha até a altura do meu rosto, põe uma perna de
cada lado da minha cabeça, segura meu cabelo e ordena:

— Chupa bem gostoso, não quero que use os dedos, só a língua.


Quero gozar na sua língua.

Faço o que me pede, passeio minhas mãos pelo seu corpo até seu
seio, aperto o bico e o prendo entre meus dedos enquanto sugo seu clitóris.
Não demora para ela começar a rebolar, lambuzando meu rosto, me
deixando de pau duro, cheio de tesão. Dou atenção aos seus seios enquanto
chupo sua boceta, sedento, lambo, enfio a língua no seu interior e volto paro
o clitóris.

Desço uma mão e começo a me masturbar, o tesão tomando conta de


tudo, Manuela geme alto, chama meu nome, esfrega a boceta na minha
língua, segura meu cabelo desesperada, alucinada, e eu me toco mais rápido
enquanto ela goza gritando meu nome, com o corpo tremendo e o clitóris
pulsando.

Manu desloca o corpo para baixo, segura meu pau e o põe na boca,
chupando e o masturbando ao mesmo tempo.

— Manuela, não vou aguentar... — aviso.

— Goza na minha boca — pede, sedenta.

Soco na sua boca, ela engole o máximo que consegue e gozo


chamando seu nome, alucinado de tesão, com a respiração acelerada, então
a vejo se sentar e passar a língua nos lábios.

— Eu amo você — sussurra com um sorriso safado, sai da cama e


corre para o banheiro.

— O que você disse? Volte aqui! — ordeno, ouvindo a sua


gargalhada.

Depois, fazemos amor debaixo do chuveiro, devagar, e ela sussurra


novamente ao meu ouvido que me ama.
Chego à empresa e encontro João me aguardando.

— Bom dia! — cumprimento, me sentando, com um sorriso no


rosto.

— Bom dia. Trabalho com você há mais de 15 anos e nunca te vi


sorrir tanto quanto ultimamente. Para ser sincero, acho que sorriu mais nos
últimos meses que todos os últimos anos juntos — aponta, me fazendo
gargalhar.

— É porque nunca estive tão feliz quanto agora.

— Sinto lhe informar, mas trarei um pouquinho de dor de cabeça.

— O que houve? — Assumo uma postura mais séria.

— Heitor convocou uma assembleia para escolherem o novo CEO


da empresa — informa.

— Heitor? Com que autoridade ele fez isso?

— Ele fez muitas movimentações nos últimos meses,


principalmente nas últimas semanas.

— Comprou mais ações? Não me lembro de você ter comentado


sobre isso?

— Não, mas fez muitas reuniões e se aproximou de outros


acionistas.
— Meu foco está em outro lugar ultimamente, como não vi
movimentações dele em relação à compra de mais ações e como começou a
ter problemas financeiros na sua própria empresa, achei que daria mais
atenção aos próprios negócios, por isso, acabei relaxando em relação a ele.

— Você finalmente está vivendo a sua vida e não somente


trabalhando em prol da empresa como nos últimos anos, era difícil você não
estar cem por cento focado, nem mesmo quando estava doente, mas hoje
em dia está delegando funções. Não que esteja desleixado, seus negócios
continuam crescendo, só que está priorizando outras coisas.

— Nunca pensei que falaria isso, mas já não sei se quero continuar
com essa briga. Às vezes sinto como se meu pai quisesse incentivar a
competição, mas nunca me importei, porque meu objetivo sempre foi
permanecer no topo.

— Eu acompanhei sua trajetória, foi e ainda é brilhante, não creio


que corra o risco de ser destituído como CEO desta empresa, mas, se
acontecer, não se esqueça de que você tem várias outras. Como seu
advogado e amigo, fico feliz em ver que não está mais abdicando da sua
vida pessoal.

— Que base Heitor usou para conseguir essa assembleia? Ainda


possuo a maioria das ações, não houve queda de receita nos últimos meses,
nem escândalo algum.

— Não sei se está relacionado, mas hoje um jornalista entrou em


contato com a sua assessoria de imprensa e eles me passaram o contato.

— Jornalista?
— Sim, desses de fofoca. Ele queria confirmar se você estava tendo
um caso com uma mulher casada.

— Não participo de eventos com artistas ou socialites para evitar


esse tipo de jornalista e especulação sobre minha vida pessoal, somente
ciclos empresariais. Então por que eles estariam interessados em mim se
nunca houve qualquer matéria a meu respeito?

— Consegui segurar a notícia.

— Dinheiro? — Ele faz um movimento afirmativo.

— Se quiser, posso oferecer mais em troca da informação de onde


veio a notícia — sugere.

— Acho que não precisamos, creio que isso foi coisa de Heitor com
a ajuda de Sofia, que está mais inclinada a esse tipo de nicho. Sem falar no
fato de que meu cunhado não teria como saber do meu envolvimento com
Manuela se não fosse através da minha ex-noiva.

— Ele pode ter contratado um detetive, como você mantém um na


cola dele — João sugere.

— Sim, é uma possibilidade, mas, se tivesse alguém seguindo a


mim ou a Manuela, minha equipe de segurança teria notado e me
informado.

— Quer que eu confirme se ele e Sofia estão envolvidos nisso?

— Essa matéria sairia quando? — pergunto.

— Amanhã.

— E a assembleia foi marcada para quando?


— Daqui a dois dias.

— Então ele queria me envolver em uma exposição na mídia e dizer


que isso interferiu nas ações. Mas só isso não seria suficiente. Nunca fui
envolvido em um escândalo e meu desempenho nos negócios é impecável.

— E se ele queria apenas um motivo, por menor que seja, pense


comigo, se ele tiver o apoio de vários acionistas, conseguirá o que quer.

— Já que tenho a maioria das ações, a única forma de Heitor


conseguir é se meu pai lhe der apoio ou se eu abdicar do cargo, e isso não
vai acontecer. Por favor, verifique se tem mais alguma coisa e se Sofia está
envolvida nisso.

Minha secretária entra na sala e avisa que meu pai pediu uma
reunião urgente comigo e, quando confirmo, ela sai.

— Seu pai vindo aqui falar com você? Acho que não vejo isso há
anos.

— Provavelmente tem a ver com a assembleia e com a nota, não


duvido que já tenha chegado aos seus ouvidos de forma maliciosa.

— Tentarei conseguir as informações que me pediu o mais rápido


possível.

— Obrigado.

João sai da minha sala, e eu me preparo para receber meu pai.


Capítulo 30

Felipe
Vejo meu pai entrar na minha sala e me levanto para cumprimentá-
lo. Nos sentamos nos sofás, um de frente ao outro. A secretária oferece
água e café, mas ele recusa e, assim que ela sai, ele começa a falar:

— Tem um bom tempo que não venho aqui — começa, cruzando as


pernas. — Não mudou muita coisa.

— Normalmente nos encontramos na sua casa. — Imito o seu


movimento.

— Você tem recusado todos os convites que sua mãe lhe faz
ultimamente.

— Falha minha, me remediarei o quanto antes.


— O que o mantém tão ocupado? — meu pai sonda.

— Algumas coisas ocorreram, contudo, não se preocupe, em breve


jantaremos juntos. — Fixo meus olhos nele, esperando o que vem a seguir.
Comigo, meu pai sempre foi cauteloso, me rondando e tentando descobrir
as coisas sem ir direto ao alvo.

— Ouvi alguns rumores ao seu respeito.

— E quais seriam?

— De que não anda dando a devida atenção à empresa. Sei que tem
suas próprias empresas e todas elas têm bastante renome no mercado, mas a
empresa da família sempre foi sua prioridade.

— O senhor, junto de todos os acionistas, recebeu o relatório do


último trimestre, nossa receita e o valor das ações subiram, esses números
parecem de um CEO que está ausente da empresa? — pontuo.

— Porém estão abaixo do esperado — replica.

— A nossa empresa foi uma das poucas que tiveram um bom


desempenho no último trimestre, a situação do mercado não está muito
favorável. O senhor sabe como são essas variantes.

— Você está deixando assuntos pessoais interferirem nos negócios,


e nunca foi assim antes.

— Onde o senhor quer chegar, pai? Vá direto ao ponto.

Ele faz uma pausa e frisa os lábios antes de voltar a falar:

— Sei que está se relacionando com uma mulher que não é do nosso
nível e isso está interferindo no seu desempenho, sugiro terminar essa
relação.

— E como o senhor sabe disso? — questiono.

— Vejo que não nega. — Desvia da minha pergunta.

— Pretendia apresentá-los a ela em um futuro próximo.

— A demora apenas demonstra que você sabe que não a


aprovaremos.

— Pai, respeito demais o senhor, mas não sou mais um jovem que
precisa da autorização dos pais para se casar com uma mulher.

— Casar?!

— Sim, casar. Irei me casar com ela.

— Isso é completamente insano.

— O senhor ainda não respondeu, como sabe do nosso


relacionamento?

— Não importa como sei, o fato é que você está com uma mulher
casada!

— A pessoa que te passou essa informação está muito equivocada.


Manuela é divorciada.

— Também é mentira que quando vocês se conheceram ela era


esposa do amante de Sofia? — retruca.

— Esse é um assunto somente meu, pai — aviso, soando frio.


— Deixou de ser seu quando mais de uma pessoa sabe e pode vir a
manchar sua reputação. Você representa a nossa empresa.

— E por que a minha vida pessoal interferiria nos meus negócios?

— Haverá muitos falatórios inconvenientes e irão relacionar a nossa


família a tal assunto. Portanto, termine essa relação enquanto está no
começo e, assim, isso não interferirá na sua posição aqui.

— Isso é uma ameaça? — indago.

— É um alerta — replica.

— Não será possível, como disse antes, pretendo me casar com ela.

— Mesmo que o relacionamento interfira nos negócios?

— Sim.

— O que está acontecendo com você? Nunca foi assim, sempre


focou apenas nos nossos objetivos.

— Focos mudam no decorrer dos anos, não deixei meus negócios de


lado. O fato de ter outros objetivos não interferirá nos meus negócios, e a
maior prova disso são os números positivos, não só da empresa da família,
como também das minhas, todas fecharam o trimestre no positivo. Minha
vida pessoal não mudou a forma exemplar com que eu administro os
negócios — saliento.

— Os negócios da família sempre vieram em primeiro lugar.

— Inverti as posições, agora a minha família vem em primeiro


lugar.
— Se pensa assim, termine esse relacionamento, nossa família já
passou por muitos escândalos em tão pouco tempo.

— Quando disse minha família, me referia a Manuela, nosso bebê e,


obviamente, minhas irmãs e meus pais.

— Bebê? Ela está grávida? — questiona, indignado.

Não era minha intenção revelar a gestação de Manuela, porém,


queria fazê-lo entender que absolutamente nada me fará mudar de ideia,
muito menos ameaças.

— Sim.

— E quem garante que seja seu filho? Ou, pior, quem sabe não está
tentando dar o golpe da barriga? — Enquanto ele fala, eu não me contenho
e gargalho.

Só uma pessoa que não conhece Manuela poderia pensar em tanta


besteira.

— Você está rindo? Esse é apenas mais um motivo para terminar


esta relação imediatamente! — ordena, autoritário.

— Por acaso o senhor acha que eu seria facilmente enganado? Me


vê como uma pessoa fraca e manipulável? O mero pensamento em relação a
isso me fez rir. Manuela é a pessoa mais sincera e honesta que eu já conheci
em toda a minha vida.

— Essa questão está mais séria do que eu imaginei.

— Pai, quando eu dei qualquer abertura para o senhor, ou seja lá


quem for, interferir na minha vida pessoal? — digo com seriedade. —
Acaso pensou que, por ter aceitado o noivado com Sofia, o senhor tinha
plena liberdade para ditar com quem eu me caso ou não?

— Essa mulher não é boa o suficiente para você, será que não nota
isso? Tem noção de quantos problemas terá? Você acha que um pai gostaria
de ver o filho em uma situação assim, correndo o risco de perder a posição
que batalhou por anos?

— Não sou o tipo de homem que foge de um problema, o senhor


deveria saber, pois me criou para desafiá-los e vencê-los.

— Te criei para liderar a minha empresa.

— E estou fazendo isso há quinze anos! E devo salientar que muito


bem. Além disso, durante esse período, abri diversas empresas particulares,
e o senhor ama me parabenizar e se orgulhar dos meus feitos.

— Então por que mudar agora? Sempre foi um homem de sucesso,


prestigiado, sempre foi meu orgulho, meu e da sua mãe, por que correr risco
por uma mulher dessas?

— Porque eu a amo, e não irei desistir dela. Se eu sou o seu orgulho,


deveria ficar feliz por mim, porque, pela primeira vez na minha vida, estou
feliz, estou vivendo para mim, não para o que o senhor idealizou. Não estou
seguindo os seus planos, contudo, não deixei seus objetivos de lado, a
empresa da família segue próspera e os meus negócios, também. Eu apenas
aprendi a conciliar com a minha vida privada.

— Você nunca acreditou nessa bobagem de amor, sempre disse que


era coisa para pessoas tolas.

— Realmente pensava assim, mas Manuela me fez mudar.


— Não aceito esse relacionamento!

— Então é algo que deverá resolver internamente, porque não


mudarei de opinião.

— Não deixarei meu legado para uma pessoa que se deixa ser
guiado por instintos fúteis.

— Retirará seu apoio em relação a mim aqui na empresa?

— Se continuar com esse relacionamento, sim.

— Então terá que achar alguém melhor do que eu para comandar


isso aqui, e nós dois sabemos que não encontrará! Se está pensando em
Heitor, ele não consegue nem cuidar dos próprios negócios, quem dirá dos
da família.

— Você está sendo insolente.

— Estou sendo realista! O senhor impôs que me casasse e te desse


netos para manter o seu apoio, e irei fazer isso.

— Com a mulher errada! — Aumenta o tom de voz.

— Com a mulher que eu amo! Quem o senhor julgou como certa me


traiu com um funcionário da minha empresa que manipulava e destruía
psicologicamente a esposa — revido no mesmo tom.

— Esta mulher é 17 anos mais nova, não tem contatos, não é de


família influente e está envolvida em várias questões jurídicas. Entendo que
Sofia não foi uma boa opção, mas podemos encontrar outra que faça jus à
sua posição.
— Isso não é uma opção, irei me casar com Manuela, pai, e nada do
que o senhor disser me fará mudar de ideia.

— Mesmo se perder o cargo de CEO?

— O senhor, por acaso, julga que consegue me controlar ao seu bel-


prazer como faz com as minhas irmãs? — inquiro. — Volto a salientar, nada
me fará desistir de Manuela, se quer tirar o seu apoio, vá em frente e faça,
dê para quem o senhor achar melhor, mas saiba que, quando fizer isso,
estará contra mim, e o senhor foi quem me ensinou a esmagar os meus
opositores, e eu faço isso com primor.

— Como você ousa falar assim comigo?

— Apenas estou reagindo à forma como está me tratando.

— Meu problema não é e nunca será com você. É meu filho, meu
herdeiro, mas não aceito essa mulher na sua vida e farei o que for preciso
para afastá-la de você.

— Pense bem no que fará, pai. Por toda a minha vida fiz tudo do
jeito que o senhor quis, vivi conforme as suas regras, porque elas iam ao
encontro das minhas, mas, desta vez, não! Vou me casar com Manuela,
teremos nosso filho e pretendo ter muitos bebês com ela; continuarei a fazer
as minhas empresas prosperarem e depende somente do senhor para que eu
faça o mesmo com os negócios da família e que, principalmente, ainda faça
parte dela!

— Está ameaçando se afastar de nós por causa daquela mulher! —


soa indignado.
— O senhor está exigindo que eu me afaste da mãe do meu filho, e
isso jamais acontecerá. Se não pode aceitá-la e a meu filho como membros
da família, então não posso fazer parte dela.

Meu pai se levanta exalando raiva pelos poros.

— Daqui a dois dias ocorrerá a assembleia da empresa, depois disso,


todos os acionistas terão um mês para decidir se você permanece como
CEO ou se será substituído. Você tem esse tempo para pôr a cabeça no lugar
e desistir desta loucura — avisa, se levantando, e eu imito o movimento.

— Faço minhas as suas palavras, a partir de hoje, o senhor tem um


mês para aceitar o meu relacionamento, minha mulher e o meu bebê; caso
isso não ocorra, ninguém precisará me tirar o cargo de CEO desta empresa,
eu mesmo sairei e quero ver quem conseguirá mantê-la de pé. O senhor
pode tê-la fundado, mas, nos últimos quinze anos, eu a fiz crescer e se
tornar o que é hoje, não se iluda achando que preciso desta empresa para
manter meu patrimônio, pois é o senhor que precisa de mim aqui. E, no
momento em que eu sair dela, me afastarei de você também, porque, como
disse antes, não ficarei perto de quem não aceita minha mulher e meu filho.
— Elevo meu tom de voz.

Nunca falei assim com meu pai, sequer imaginei que um dia
teríamos uma conversa assim. Nos encaramos em silêncio, medindo forças,
com mágoas e rancor nos envolvendo.

Ele sai sem dizer nada. Sigo para o bar, encho um copo com uísque,
bebendo-o em um gole, e arremesso o copo longe.

Não importa o que aconteça, não vou mudar de ideia, e eu só desejo


que um dia ele entenda isso.
Capítulo 31

Felipe
Levanto o olhar quando vejo João entrando na minha sala, ele foca
na pessoa que está limpando os cacos de vidro do copo que arremessei e
depois desvia para mim. Ele espera a funcionária sair para somente então
questionar:

— O que houve aqui?

— Digamos que a conversa com meu pai foi desafiadora — limito-


me a dizer. — Conseguiu alguma informação sobre aquele assunto?

— Sim, não foi difícil, somente precisei usar um pouco de


incentivo. A fonte dele é realmente Sofia — informa.

— Ela tem mais brio do que imaginava.


— Creio que esteja mais para desespero. Parece que, após se
separarem, o pai dela cortou todos os gastos depois de descobrir sobre o
caso com Jonas. Ao que parece, ele tentou fazer parte da família, mas não
deu muito certo.

— Isso explica por que ele foi atrás de Manuela naquele dia.
Quando viu que não conseguiria entrar na família de Sofia, quis garantir o
dinheiro da ex-mulher.

— Provavelmente.

— Quero que faça duas coisas para mim: primeiro, peça para esse
jornalista publicar uma matéria sobre a galeria das minhas irmãs, quero que
ele exalte as duas e saliente que Cecilia é uma artista voltando após uma
pausa de reflexão, e que Isabela tem uma vasta experiência na organização
de eventos de moda, inclusive auxiliou no último evento que minha
empresa estava patrocinando, o mesmo que retirei o patrocínio devido a
uma má gestão.

— Você sabe que não me lembrarei nem da metade do que você


falou, né? — João zomba. — Às vezes você se esquece de que sou apenas
seu advogado.

— Você não é apenas meu advogado, também é a pessoa em quem


eu mais confio, além de entender muitos dos meus negócios, é meu braço
direito e esquerdo, não só aqui, mas em todas as minhas empresas, também
é muito inteligente e pega rápido o que quero dizer.

— Está me adulando porque vai me pedir mais coisas, tenho até


medo.
— É óbvio que vou. A segunda coisa que tenho a pedir é que
contate outro tipo de jornalista, relacionado ao mundo dos negócios, e
explane o que Heitor está tentando esconder tão firmemente, que sua
empresa está mal das pernas.

— Obviamente quer manter sigilo quanto a quem é a fonte dessas


informações.

— Viu como você me entende?

João faz um meneio de cabeça, solta uma gargalhada e sai da minha


sala.

Entro na clínica e vejo Manuela sentada de pernas cruzadas, lendo


uma revista. Aproximo-me e ela eleva o olhar e sorri.

— Me desculpe, meu amor, não consegui sair mais cedo e te buscar


em casa. — Sento-me ao seu lado e a beijo.

Não quero contar para ela o motivo do meu atraso, não desejo que
se preocupe em relação ao meu pai.

— Não se preocupe, sei o quanto é ocupado e, mesmo assim, se


esforça para estar nas consultas. Eu te amo mais ainda por isso! — Segura
minha mão, a acaricia e me fita amorosamente.

Manuela não se declara muito, ela não é o tipo de mulher que fala
“eu te amo” de forma leviana, como se fossem palavras soltas, mas, quando
ela fala, me faz sentir tudo, me faz sorrir e amá-la mais ainda. Minha
vontade é de beijá-la mais profundamente, mas somos chamados por uma
enfermeira para a consulta.

Minha mulher aperta minha mão com força antes de entrarmos, ela
fez três meses de gestação e está mais apreensiva do que nas últimas
semanas. Após o médico questionar como ela passou a semana e avaliar o
resultado do exame de sangue que fez mais cedo, ele nos encaminha para a
sala de exames de imagem.

— E então, doutor Gustavo, como nosso bebê está? — indaga,


segurando forte minha mão.

— Está tudo bem, peso e altura compatíveis com o tempo


gestacional, seus exames de sangue também estão normais.

— Graças a Deus! Estava muito apreensiva. — Manuela solta um


longo suspiro.

— Você está seguindo todas as minhas recomendações e estamos


acompanhando a sua gestação semanalmente, tudo está fluindo bem.

— Em todas as vezes que fiquei grávida, perdi antes de completar a


12ª semana.

— Bem, para ser exato, você está no meio da 13ª.

— Oh! Eu sempre me confundo com as contas das semanas. —


Sorri. — Então passamos da fase mais crítica do primeiro trimestre.

— Você já entrou no segundo trimestre gestacional. Nesta fase, os


exames mudam um pouco e o desenvolvimento do feto será mais rápido.
— O senhor ainda acha necessário ela vir toda semana? —
questiono.

— Eu prefiro vir toda semana, fico mais tranquila — Manuela


salienta.

— Devido ao seu histórico e se te deixa mais tranquila, tudo bem.

Manuela leva minha mão ao peito e a aperta forte antes de fazer ao


médico um pedido que rouba meu fôlego.

— Eu gostaria de ouvir o coração do nosso bebê — pede e, em


seguida, me olha.

O médico assente, movimenta o transdutor na barriga dela e, de


repente, o primeiro tum invade a sala, sendo seguido por outro, alto, forte,
profundo.

Eu seguro a respiração ao ouvir os batimentos cardíacos do nosso


bebê, busco o olhar de Manuela e reparo que ela está olhando para o
monitor fascinada, solto o ar devagar, sentindo meu coração em frenesi,
uma emoção diferente me invade. Conheço o amor que sinto pelos meus
pais, pelas minhas irmãs e por Manuela, mas este sentimento que nasce
agora é diferente e ainda não sei definir, me sinto atordoado, recebendo
ondas e ondas de uma emoção avassaladora.

— É o coração do nosso bebê. — Sua voz não passa de um sussurro.

— Sim, e ele bate forte e saudável.

Ela vira o rosto para mim e não controlo o impulso de beijá-la.


— Nosso bebê vai ficar bem, nós vamos ficar bem! — prometo, ao
que ela assente com um sorriso enorme no rosto.

Saímos da clínica com a imagem do nosso bebê em 4D e o som do


seu batimento cardíaco preso em nossa alma.

— Eu poderia explodir de tanta felicidade! — Manuela beija várias


vezes a imagem. — Por que eu demorei para ouvir o coração do nosso
bebê? Me desculpe, meu amor, desculpe por privá-lo dessa emoção.

Minha mulher ri e chora ao mesmo tempo, pousa uma mão na


barriga e leva a outra ao peito.

— Eu te disse antes que seria no seu tempo, fiquei feliz em esperar,


mas confesso que não estava preparado para tudo que senti, estou abalado
até agora.

— Nunca imaginei que seria tão feliz assim. — Volta a beijar a


imagem.

— Já podemos contar para as outras pessoas? — questiono, sabendo


que quebrei nossa promessa hoje de manhã ao revelar ao meu pai, mas isso
direi em outra ocasião, não quero diminuir nossa felicidade.

— Sim, agora eu quero contar para o mundo! — festeja.

— Então vamos almoçar com minhas irmãs e depois vamos até a


casa do seu padrinho.

— Tudo bem, vou ligar para eles e contar para Juliana, eles ficarão
felizes por mim, pois sabem o que passei.

— Gosto muito que você tenha mantido a amizade com a Juliana.


— Uma das coisas que Jonas fez primeiro foi me afastar de todos os
meus amigos, só tinha Juliana, nós duas passamos por muitas coisas juntas.
Ela se reconciliou com o marido, mas, em nossas conversas, não tocamos
no assunto da família dela, é melhor assim. — Prefiro não tecer
comentários.

Entramos de mãos dadas no restaurante em que marcamos com


minhas irmãs. Foi interessante vê-las interagindo, Cecilia foi a primeira a
quebrar o gelo, mencionando que ela e Isabela abririam uma galeria, daí em
diante a conversa entre elas fluiu de forma adorável, descobriram várias
coisas em comum, a paixão pela arte, música, teatro. Foi uma tarde
deliciosa, cheguei a pensar que Manuela ficaria tímida, mas creio que a
felicidade ao ouvir o coração do nosso bebê ainda bombeava forte em suas
veias.

— Nós temos algo para revelar. — Seguro a mão de Manuela e


busco o seu olhar, e ela faz um meneio afirmativo e só então continuo. —
Estamos grávidos! — informo com um sorriso imenso.

— Meu Deus! — Cecília exclama.

— É verdade? — Isabela indaga.

— Sim, hoje ouvi o coração do meu bebê pela primeira vez, apesar
de já ter ficado grávida outras vezes, nunca tinha completado o primeiro
trimestre. Estou com tanto medo de sofrer mais uma perda! Mas, por outro
lado, estou tão esperançosa de que seja diferente, estou vivendo um dia de
cada vez, demorei a querer ouvir o coração dele bater, mas ouvi hoje.
Nossa, estou me repetindo, falando tudo atrapalhado, desculpe. — Manuela
leva a mão ao rosto, e eu fito minhas irmãs.
— Manuela sofreu alguns abortos, por isso está tão sensível.

Cecilia está com os olhos cheios de lágrimas, e Isabela não segura as


dela. Cada uma tem um problema diferente, Cecilia é por causa de
hormônios, já Isabela tem um problema no útero, ambas sofreram abortos e,
infelizmente, não conseguiram engravidar, elas entendem o quanto esse
tema é sensível.

Dou um lenço para cada uma, e Cecilia ri.

— Felipe tem um estoque infinito desses lenços com flor-de-lótus


— zomba, limpando o rosto.

— Deve andar com uns cinquenta no bolso. —Isabela repete o


movimento. — Eu tenho certeza de que dará tudo certo com sua gestação.

—Sim, dará tudo certo e, em breve, teremos um bebê na família —


Cecilia acrescenta.

— Obrigada. — Manuela funga, limpando o rosto.

— Meu Deus! Temos que planejar um casamento! — Isabela fica


empolgada.

— Mas eu e Felipe não falamos sobre casamento ainda — Manuela


diz, rindo.

— Eu a pedi em casamento há meses, mas você ainda não me deu a


resposta — lembro.

— Ora, não seja boba, ele não iria nos apresentar a você se não
estivesse pensando em casamento. Ah! Também temos que organizar o chá
de revelação! — Cecilia lembra, animada.
— Deixem tudo comigo, será perfeito! — Isabela exclama.

Elas seguem falando, e eu beijo a mão de Manuela, que não tira o


sorriso imenso dos lábios. Confesso que estava preocupado, principalmente
depois da reação do meu pai, mas minhas irmãs agiram melhor do que o
esperado.

O clima de comemoração foi quebrado ao visualizar Sofia entrando


no restaurante e, pela sua expressão, creio que a matéria que mandei
publicar já deve ter saído, só não esperava encontrá-la tão cedo.
Capítulo 32

Manuela
Eu imaginei este encontro de muitas formas, mas em nenhuma previ
que me sentiria tão confortável com as irmãs de Felipe. Elas são tão
diferentes dele, mais sorridentes, brincalhonas e implicantes entre elas. Não
parecem ser mais velhas que ele, mas sim o contrário, e ele as trata como se
fossem irmãs mais novas. Achei tão linda e amável a relação deles!

Felipe já tinha mencionado que ama e protege os seus, mas, ao


assistir ao cuidado ao tocar em certos assuntos, ao orgulho impresso em
suas palavras ao apresentar cada uma delas, exaltando suas qualidades,
fazendo-as olhar para ele com um sorriso tão lindo me deu a certeza do
quanto eu tive sorte!

Eu tenho muita sorte por ser a mulher que ele ama.


E mais sorte ainda por ser ele o pai do meu filho.

Há muito tempo que não conversava com pessoas que entendessem


tanto de artes, que amassem esse assunto e, quando ele mencionou minha
gestação, fiquei aliviada ao constatar que elas aprovavam e ficaram
animadas e planejando festas. Não cheguei a pensar em nada disso, nem um
único sapatinho comprei para meu bebê, eu apenas queria que tudo ficasse
bem.

Em certo momento, reparo que eles ficam tensos e olham para a


mesma direção. Quando viro a cabeça, vejo a linda e enfurecida mulher
adentrar o restaurante, ela segue em direção à nossa mesa, e eu a reconheço
imediatamente.

Sofia.

Esse é o único nome que sei dela, não sei seu sobrenome, nem
mesmo procurei descobrir mais nada em relação a ela, simplesmente a
apaguei da minha mente. Acho que esta foi uma forma que meu cérebro
usou para me proteger, já que, na época em que descobri a traição de Jonas,
levei uma porrada atrás da outra, eram tantas coisas acontecendo ao mesmo
tempo que não poderia me dar ao luxo de ficar pensando na mulher com
quem meu ex-marido me traiu.

Contudo, parece que o meu destino e o dessa mulher estão


entrelaçados e, de uma forma irônica, quis o acaso que eu conhecesse seu
noivo.

Isso é uma enorme mentira!

Não foi ao acaso, mas sim algo muito bem planejado por Felipe, que
arquitetou um plano sórdido de vingança e, no meio do caminho, se viu
preso a mim. Hoje, eu vejo que não importa quais foram as motivações
iniciais que o levaram a me encontrar naquele elevador tantos meses atrás, o
que me interessa é que, naquele dia, ele trouxe um pouco de alívio ao caos
em que eu vivia e, desde então, se tornou meu porto seguro, o pai do meu
bebê e o meu amor.

Talvez eu devesse sentir raiva dela, mas, depois de tudo o que eu


vivi, o sentimento que prevalece em mim, neste momento, é de alívio.

Graças a Deus que ela teve um caso com meu ex-marido e eu


descobri, porque, se não fosse por isso, ainda estaria vivendo naquela ilusão
macabra, ou teria acontecido coisa pior comigo, pois descobri
posteriormente que os planos de Jonas ao meu respeito eram sórdidos.

Vejo Sofia puxar uma cadeira com agressividade e se sentar entre


mim e Cecilia. Observo-a com atenção, ela é linda, tão bonita quanto me
pareceu nas imagens que vi no celular de Jonas, mas seus olhos estão
vermelhos, denunciando um recente choro.

— O que está fazendo aqui, Sofia? — Isabela indaga.

— Ora, eu vim almoçar com vocês! — Seu hálito indica que


também bebeu. —Como vai, meu querido noivinho, há muito tempo que
não nos vemos?

— Não faça uma cena, Sofia — Felipe alerta com frieza.

— Vamos, vou te levar para casa — Isabela oferece.

— Não vou embora, ainda não foi apresentada à mulher que Felipe
quer pôr no meu lugar.

Ela volta a cabeça na minha direção e sorri.


— Vocês sabiam que ela é esposa do meu ex-amante? — fala em
tom de confidência, virando o rosto para as irmãs de Felipe. — Mesmo não
a conhecendo pessoalmente, eu sei tudo sobre ela.

— Estou te avisando, Sofia, é melhor você ir embora — Felipe


alerta.

— Foi você, não foi? O artigo, foi você. — Aponta para ele, e eu
fico sem entender nada, mas prefiro não tecer comentários, por enquanto.

— Você parece ter se esquecido de com quem estava lidando


quando procurou aquele jornalista. — Ele não nega, mas também não
admite, soando frio e meio ameaçador.

O seu tom de voz parece calmo, porém, impõe autoridade e medo,


nunca o vi falar assim.

— Está vendo? — Sofia chama a minha atenção. — Este é o


verdadeiro Felipe, eu já fui noiva dele e, naquela época, ele não falava
comigo assim. Saiba que, em breve, você receberá o mesmo tratamento.

— Se eu não conhecesse toda a história, ficaria do seu lado apenas


por ele ser homem, e um homem me fez passar o pão que o diabo amassou.
Por outro lado, este mesmo homem ao meu lado foi a pessoa que mais me
ajudou quando descobri que você tinha um caso com meu marido enquanto
ainda era noiva dele. Não vou defender o Felipe, porque não tenho noção do
que ele fez, mas também não vou ficar ao seu lado porque, de uma coisa eu
tenho certeza, ele apenas reage quando é atacado.

— Você será descartada em breve! — Quase cospe no meu rosto.


— Eu não sei o que houve com você e nem me interessa, como você
também não se interessou se me magoava ou não naquela época, mas desejo
que fique bem, que refaça sua vida e que supere.

— Superar? Ele acabou comigo! Me jogou no fundo do poço! —


grita.

— Fundo do poço! — Rio triste. — Conheço esse lugar, estive lá


várias vezes e posso te garantir que você não ficará por muito tempo. Foque
em você, esqueça o que aconteceu, pense em seu futuro e busque ajuda, foi
assim que eu saí do lugar sombrio, e você também sairá — aconselho.

— Baboseira inútil e ridícula. — Me fita com desprezo.

— Vamos, Cecilia, me ajude a tirá-la daqui — Isabela pede, se


levantando. — Em breve marcaremos um novo encontro, Manu. Amei te
conhecer!

Ela e Cecilia me abraçam e saem do restaurante levando Sofia, que


segue falando alto. Felipe pede a conta com uma expressão fechada, nós
saímos do restaurante em silêncio e seguimos assim até o carro.

— Meu padrinho enviou uma mensagem informando que podemos


passar por lá, tudo bem para você?

Ele apenas faz um gesto afirmativo e segue em silêncio por um


tempo antes de indagar:

— Você não irá me perguntar o que eu fiz para Sofia ficar com tanta
raiva? — pergunta, me olhando rapidamente e se voltando para o trânsito.

— Não, este é um assunto seu com ela, se não quiser me contar,


tudo bem. Eu confio em você. — Aperto seu braço, e ele sorri. — Para ser
sincera, não quero saber, já tenho muitos problemas na minha vida para
adicionar mais alguns, agora só quero focar no meu bebê, nas minhas
pinturas e em nós dois.

— Gosto desse plano.

Ele volta a sorrir e a olhar para frente. Levamos cerca de meia hora
até chegar à casa do meu padrinho, Bruna e Guilherme estavam nos
esperando na entrada. Quando revelei que estou grávida, meu padrinho me
abraçou tão forte quanto no dia em que me divorciei e sussurrou ao meu
ouvido:

— Estou tão feliz por você, minha criança! — Ele segurou meu
rosto e beijou minha testa. — Em breve, teremos um lindo bebê.

Assinto, fungando.

— E vocês já sabem o sexo? — Bruna questiona, empolgada.

— Ainda é muito cedo, mas, para mim, não importa qual seja o
sexo, apenas quero que o bebê e Manuela fiquem bem — Felipe informa,
orgulhoso.

— Fico muito feliz de ouvir isso, principalmente por ter certeza de


que ela não estará sozinha. — Enquanto Guilherme fala, me abraça forte, e
eu pouso a cabeça no seu peito e fito Felipe com um sorriso.

Bruna nos convida para jantar e ficamos por mais tempo que o
esperado. À noite, adormeço após fazermos amor e desperto de madrugada,
procurando por ele na cama, mas não o encontro. Visto um robe e vagueio
pelo apartamento em busca dele, encontrando-o na varanda, sentado e
tomando um vinho.
— Senti sua falta na cama — solto, me aproximando dele e me
sentando no seu colo. — Não sei mais dormir sem você.

— Gosto disso, gosto muito disso. — Sorri e me beija.

— Por que esta ruga de preocupação na sua testa? — Inclino a


cabeça e beijo o lugar que indiquei. — É algo relacionado ao que houve
hoje com a sua ex-noiva?

— Problemas na empresa — Felipe se limita a dizer.

— Para ficar mais perto de mim, você está se prejudicando. Eu nem


imagino a complexidade que deve ser seu trabalho. Na verdade, nunca
procurei saber quantas empresas tem e quais são elas, mas imagino que isso
tome muito do seu tempo.

— Você e nosso bebê são minha prioridade agora, estou me


adaptando para passar mais tempo com vocês, delegando algumas funções e
cedendo um pouco do controle, mas garantindo resultados excelentes nas
minhas empresas e na da minha família.

— Agora percebo que não fui só eu que mudei, você também


mudou. — Beijo-o levemente nos lábios.

— Em relação às minhas prioridades, sim.

— Antes você botava a vingança e os negócios à frente de tudo e


não acreditava no amor — lembro em um tom brincalhão.

— Você não vai esquecer isso, não é mesmo? — Segura meu


queixo.

— De jeito nenhum! — Faço uma careta.


— Mudei por você e para você. Parece clichê, mas é a verdade.
Compreendi rápido que teria que me adaptar para tê-la em minha vida,
porque ficar sem você não é uma opção para mim.

— Quando você fala essas coisas, tenho vontade de me beliscar para


garantir que não estou fantasiando.

— Isso entre nós dois — intercala um dedo entre nós — é real e a


prova está aqui. — Acaricia minha barriga.

— Eu amo você, seu cuidado, proteção, carinho. Amo como me dá


espaço para resolver as coisas dentro de mim, como não me força a nada e
espera o meu tempo. Adoro quando me deixa cuidar dos meus problemas,
mesmo sabendo que sua vontade é de entrar na frente e resolver tudo, você
segura, recua, aguarda, mas fica ao meu lado. Eu te amo, Felipe, mais tanto!
E fico feliz por você ser o pai do meu bebê.

Ele segura meu rosto e me beija com tanto carinho que me faz
suspirar.

— Case-se comigo?

— Seus pais precisam me conhecer antes, não sei se aceitarão essa


união, dado ao meu histórico de tantos problemas.

— Se eles não aceitarem, você não se casará? Deixará outras


pessoas ditarem sua felicidade? — A forma como ele indaga, soando tão
sério, me faz ficar curiosa.

— E você, se casaria comigo se eles não me aceitassem? Me


recordo que iria se casar com Sofia para cumprir um desejo do seu pai —
devolvo a pergunta e foco em seu rosto, analisando sua resposta.
— Sim, não me importa com quem aceite ou não, no final da noite,
é você que estará ao meu lado, será com você que compartilharei a minha
vida. Muitas pessoas serão contra, devido à nossa diferença de idade ou
pela forma que nos conhecemos, mas não me importo com isso, a única
decisão que me interessa é a sua. Aceita se casar comigo? — volta a
indagar.

Talvez os pais dele já saibam e sejam contra.

Talvez outras pessoas também sejam.

Talvez seja criticada e julgada.

Mas ele tem razão, no final da noite, quem segura minha mão e me
abraça quando o mundo está desabando é ele.

— Eu aceito me casar com você — decido, sabendo que é a melhor


decisão que tomarei em minha vida.
Capítulo 33

Felipe
Deslizo o olhar por cada pessoa na sala de reuniões, os acionistas
estão desconfortáveis, o escândalo de Heitor caiu como uma bomba na
empresa. Nem eu imaginei que uma simples nota seria como uma
avalanche, derrubando o castelo de areia que meu cunhado criou.

Ele prometeu coisas demais a muitas pessoas, se baseava na certeza


de que se tornaria o CEO da empresa da minha família e, quando a nota
saiu, falando que seus negócios iam mal das pernas, as pessoas foram
denunciar conforme os boatos cresciam e mais coisas foram aparecendo.
Várias situações que nem mesmo eu sabia, empresas pequenas que ele
comprava e depois vendia para lavagem de dinheiro, sonegação de impostos
e vínculos com políticos corruptos.
Sempre soube que havia algo de errado, mas achei que seria sobre
traição, cheguei a pôr um detetive na sua cola, porém nunca imaginei que
seria tão sério.

Busco o olhar do meu pai, mas ele desvia dos meus; fixo nele,
desafiando-o a tocar no assunto da substituição do CEO, contudo, ele recua
e muda o foco da assembleia para o escândalo de Heitor. Ao contrário da
uma fofoca boba sobre a minha vida pessoal, as acusações que foram feitas
contra meu cunhado são sérias e podem, sim, manchar o nome da empresa,
já que ele faz parte da diretoria.

Seguro um sorriso quando vejo meu pai, muito a contragosto e


exalando raiva, sugerir o afastamento de Heitor da empresa. E a votação foi
unânime, todos aceitaram. Apesar de ter um problema grande nas mãos, que
é tentar desvincular a empresa do nome do meu cunhado, eu consegui o que
sempre desejei, mantê-lo bem longe dos meus negócios.

Meu pai foi um dos primeiros a sair da sala de reuniões. Já eu, me


retiro após conversar com alguns acionistas. Sigo para minha sala e minha
secretária e a assessora de imprensa caminham ao meu lado enquanto eu
dito uma nota para a mídia, notificando o afastamento de Heitor. João segue
para uma reunião com a equipe jurídica para saber o quanto isso irá nos
prejudicar.

Entro em minha sala com um sorriso no rosto, mas ele cede ao ver
meu pai sentado de pernas cruzadas, me esperando. Aproximo-me, sento-
me à sua frente e o fito.

— Foi você que fez isso?


— A primeira nota, sim — admito, cruzando as pernas. — Mas as
outras denúncias, não; foram como um efeito dominó, parece que estavam
apenas esperando um mero empurrão para derrubá-lo. Por mais que eu
quisesse eliminar a concorrência aqui dentro da empresa, nunca faria algo
que colocasse a nossa reputação em risco, então sequer imaginei que algo
assim poderia acontecer. Se eu soubesse, não teria feito a denúncia, por
outro lado, se ele se tornasse CEO, aí, sim, o nome da empresa iria para a
lama.

— Isso tudo iria explodir mais cedo ou mais tarde.

— Concordo.

— Você investigou?

— Sim, mas nunca recebi nenhuma informação sobre isso, só sobre


as ações. Meu foco nunca foram os negócios dele, queria evitar o que fiz
com o marido de Cecilia, então investiguei para tentar descobrir a
existência de uma amante.

Meu pai respira fundo antes de falar:

— Você mantém o cargo de CEO — avisa.

E minha vontade é de falar que ele só está me mantendo porque sabe


que não tem ninguém para pôr no meu lugar, principalmente na situação em
que a empresa se encontra agora, mas me controlo e espero para ver até
onde ele vai chegar.

— Mas continuo contra seu relacionamento — completa.

— Sinto muito por ouvir isso, mas, não se preocupe, diante da


situação da empresa, não vou condicionar a minha permanência no cargo à
sua aceitação do meu relacionamento — começo, fazendo-o levantar uma
sobrancelha.

— Esta, sim, é uma decisão sábia, botando os negócios da família à


frente de pequenas rusgas.

— Contudo, até que você aceite meu casamento e meu filho, nosso
único contato será dentro da empresa — concluo.

— Não seja insolente.

— Estou apenas deixando minhas condições expostas. Já lhe disse,


não ficarei onde minha mulher e filho não são aceitos.

— Não mudarei de ideia, e você não conseguirá manter essa decisão


por muito tempo, logo compreenderá que essa mulher não está à sua altura.

— Isso não acontecerá, ela já aceitou meu pedido de casamento e,


em breve, vamos nos casar. Não se preocupe, mandarei um convite para o
senhor. Inclusive, se quiser conhecer minha esposa e meu filho, saiba que
será sempre bem-vindo em minha casa — aviso, soando calmo.

Meu pai sai da minha sala sem falar mais nada, eu fecho meus olhos
e solto um longo suspiro. Eu o amo, mas não cederei, não é apenas por um
capricho, é por minha mulher e meu filho.

Passo o restante do dia entrando e saindo de reuniões, o mesmo


acontece nos dias e semanas seguintes, foi uma época complicada e
exaustiva. Heitor corria o risco de ser preso a qualquer momento e fugiu,
deixando minha irmã desolada.

João, com sua equipe, se esforçou ao máximo para deixar nossa


empresa fora dessa confusão e, a muito custo, a Sampaio Construções não
foi envolvida nos processos que ele está respondendo.

Apesar de estar sobrecarregado, sempre encontrava um tempo para


ir às consultas de Manuela. Durante esse período, chegava de madrugada,
porém, quando ela acordava, estava ao seu lado, a beijava, fazíamos amor,
conversávamos, tomávamos café juntos e me fazia presente como podia.

Trocávamos mensagens e ligações entre os meus compromissos, e


fiquei feliz quando ela disse que iria almoçar com minhas irmãs. Isabela
estava passando por momentos difíceis e, aos poucos, elas estavam criando
um laço de amizade.

E, assim, passou um mês, minha mulher entrou no quarto mês de


gestação. Preferimos esperar para saber o sexo do bebê no nascimento, o
importante era que minha criança e ela estivessem saudáveis.

Nós demos entrada nos papéis do nosso casamento, nenhum de nós


dois queria algo muito grande, apenas um jantar entre a família e, como
queríamos oficializar antes do bebê nascer, decidimos nos casar em três
meses.

As únicas vezes em que eu e meu pai trocamos poucas palavras


foram nas reuniões da empresa. Enviei o convite de casamento para ele e
minha mãe e, assim que recebeu, ela me ligou, até pensei em recusar a
ligação, mas aceitei, e as palavras que ela proferiu ainda estão marcadas em
mim:

— Esperava isso das meninas, mas nunca pensei que me magoaria


assim. Por anos, sonhei e idealizei uma esposa para você, planejei sua
cerimônia, os convidados e a festa. Como pode fazer isso comigo? —
choraminga.
— Eu te amo, mãe, e adoraria que a senhora e o papai
comparecessem ao meu casamento, não será a cerimônia dos seus sonhos,
mas me casarei com a mulher que eu amo. Não a levei para conhecê-la
ainda porque não quero impor nada à senhora, sei que será um processo de
aceitação e adaptação da sua parte, mas também sei o quanto me adora.
Meu filho, seu neto, nascerá em alguns meses, e quero a senhora presente
na vida dele, quero que meu bebê tenha a sorte de tê-la como avó, assim
como eu tive a sorte de ser escolhido como seu filho. Nós dois sabemos que
a senhora e o papai me escolheram, e esse amor é mais forte do que
qualquer laço sanguíneo.

Ouço seus soluços e sinto uma dor física por a estar fazendo sofrer,
não queria isso, mas não é algo que posso evitar. Não existe outra mulher
para mim, e ela terá que aceitar minha Manuela e meu filho.

— Leve o tempo que precisar, minha casa está sempre aberta para
meus pais. Meu casamento será em três meses, se não se sentir confortável
em ir, tudo bem, isso não diminui meu amor pela senhora, mas, por favor,
mãe, deixe meu filho ter a mesma sorte que eu tive ao ser amado de forma
tão completa e absoluta pela senhora. Quero vê-la segurando seu neto em
seus braços e o enchendo de amor, não só ele, mas todos os meus filhos.

Ela desliga sem falar nada, e o som de seus soluços me angustiou a


tal ponto que tive que tomar uma bebida forte para me recompor.

Ao sair da empresa, parei em uma loja de artigos para bebês, agi por
impulso, estava triste pela situação com meus pais, queria mimar meu filho,
mesmo que ele não tivesse nascido ainda. Talvez esse mimo não seja para
ele, mas sim para mim, quero provar que, mesmo que meus pais não
queiram fazer parte da vida do meu filho, não lhe faltará nada,
absolutamente nada! Eu e Manuela o encheremos de amor, carinho e
atenção.

Acabei me empolgando e comprei várias coisas. Ao chegar na


cobertura, meu primeiro pensamento é esconder e mostrar para Manuela em
outra ocasião, mas me surpreendo ao encontrá-la na sala, comendo
brigadeiro de panela com pipoca.

Ela está adorável, com o rosto sujo de brigadeiro e enfiando pipoca


na boca, não me contenho e solto uma gargalhada.

— Acho que nunca te vi tão linda. — Deixo as bolsas no chão, me


sento ao seu lado e a beijo. — Reclamou tanto que não sentia enjoos, agora
come coisas estranhas.

— Senti uma vontade incontrolável de comer brigadeiro com


pipoca. — Leva a mão ao rosto, envergonhada.

— Nosso bebê gosta de combinações peculiares. — Volto a beijá-la.

— Entregou o convite do nosso casamento para os seus pais? —


pergunta enquanto começa a se levantar do sofá, a ajudo a levar as coisas
para a cozinha e, em seguida, voltamos para a sala. Somente então
respondo:

— Sim, minha mãe me ligou, não sei se ela irá comparecer. — Não
escondo a tristeza. — A conversa com meu pai foi mais um jogo de
autoridade e orgulho, mas, com minha mãe, foi emocional e triste.

— Eu sinto muito. — Minha garota me abraça forte.

— Também, e espero que, com o tempo, as coisas se normalizem —


admito.
— E o que são aquelas bolsas? — indaga, apontando para o chão.

— Me empolguei um pouco, sei que planejamos esperar para


comprar as coisas do bebê, mas hoje eu precisava mostrar para mim que
consigo suprir todas as necessidades do meu filho.

— Ah, meu amor, nosso bebê será muito amado por nós, ele sentirá
este amor o envolver e o aquecer. — Ela me beija. — Vamos, me mostre o
que você comprou! — incentiva.

E eu pego as bolsas e mostro os sapatinhos, meias, luvas e roupas


para recém-nascido em tons pastéis.

— Ah, Felipe, é tudo tão lindo! Agora foi você que me deixou
emocionada. — Manu se senta no meu colo e me abraça. Mas, de repente,
ela se afasta e leva uma mão à barriga.

— O que houve? Está sentindo alguma dor? Quer ir ao médico?

— Tem uma coisa estranha acontecendo, não é dor, é só... — Faz


uma pausa e arregala os olhos. — Acho que o bebê está se mexendo —
revela, levando a mão aos lábios.

— Mexendo... — balbucio, pousando minha mão em sua barriga. —


Não sinto nada.

— Senti de novo! — Ela sorri, seus olhos estão cheios de lágrimas.

— Estou com ciúmes, só você está sentindo! — reclamo,


emburrado, e abaixo a cabeça. — Papai também quer sentir você, filho. Me
diz o que está sentindo? — Busco o olhar da minha mulher com um sorriso.
— Ah, meu amor! Talvez seja porque começou agora, sinto apenas
uma leve ondulação, acho que, de agora em diante, ficará mais forte, ele
está reagindo a você, dizendo para não se preocupar, pois ficará tudo bem,
nós ficaremos.

Suas palavras me emocionam a tal ponto que não consigo falar


nada, apenas a braço forte, acreditando em tudo o que ela fala.
Capítulo 34

Manuela
Levanto o olhar quando saio do carro e fito o imponente prédio à
minha frente. Felipe para ao meu lado e segura a minha mão.

— Tudo bem? — questiona, acariciando minha barriga e abrindo


um largo sorriso ao sentir nosso bebê mexer.

Ele sempre sorri quando o sente, fiz seis meses recentemente, agora
nosso bebê se mexe com mais frequência, às vezes amanheço com meu
noivo conversando com minha barriga, beijando e acariciando.

É tão bom saber que ele está curtindo cada processo desta gestação,
cada descoberta! Ele guarda todas as imagens do ultrassom e fica tão
emocionado quanto eu a cada vez que conseguimos ver nosso bebê.
— Sim, está tudo bem. Espero por este dia há muito tempo!
Finalmente, Jonas e todos os envolvidos vão ser julgados por terem me
posto naquele hospital psiquiátrico e tentado me desqualificar mental e
juridicamente.

De mãos dadas, subimos os degraus do fórum. João, desta vez, não


pode nos acompanhar, Felipe me disse que ele estava enrolado com
algumas questões da empresa, mas mandou três advogados do seu
escritório.

No decorrer dos processos, eu compreendi que o João não era


apenas o advogado de Felipe, ele é dono de uma das maiores firmas de
advocacia do país e cuidava de todas as questões jurídicas do meu noivo,
seja nas empresas ou na vida particular. Além disso, também são muito
amigos, nos encontramos algumas vezes com ele e sua esposa, que, por
sinal, é muito simpática; almoçamos e jantamos juntos em algumas
ocasiões.

No corredor do fórum, encontro Guilherme, ele sempre faz questão


de acompanhar minhas audiências, também reencontro a enfermeira Paula,
ela é minha testemunha, a abraço forte, questiono se está tudo bem, e ela
confirma que está, comenta que está amando o trabalho na clínica, fico
muito feliz, sempre serei grata a ela. Conversávamos coisas triviais
enquanto aguardávamos, até que ouço a voz de Raquel.

— Você não cansa de querer prejudicar o meu filho? Quer nos tirar
tudo? Você é uma mulher muito rancorosa, sua traidora! — fala, enfurecida.

Viro meu corpo e vejo Jonas, a mãe e seu advogado, todos


caminhando em nossa direção, e me preparo para a discussão que sempre
acontece quando nos encontramos. Automaticamente, levo minha mão à
barriga. Nos últimos meses, todas as vezes que os encontrava nos
julgamentos do processo, conseguia esconder minha gestação.

Também pedi a Juliana para não comentar nada, e ela acatou meu
pedido, ainda não queria que eles soubessem, mas agora não tenho mais
como esconder, minha barriga está grande e linda. Noto o olhar de Raquel
descer por mim de forma debochada antes de arregalar os olhos.

Meus lábios tremem ao me recordar do quanto essa mulher me fez


sofrer, das vezes que me fez acreditar que eu nunca teria um filho, que fazia
eles sofrerem a cada vez que perdia um bebê.

Mas eu consegui! Minha gestação está se desenvolvendo bem. A


cada dia que passa, eu digo para mim mesma que serei uma boa mãe e que
realizarei meu sonho de ter meu bebê em meus braços.

Suas palavras maldosas ainda me machucam, ainda me causam


medo, mas luto contra elas todos os dias.

Eu acho que não consigo explicar em palavras o sentimento que me


domina neste momento, essa vitória é maior e melhor do que qualquer
causa jurídica ganha. Estou mostrando para ela que eu posso, sim, gerar um
bebê; que, com o acompanhamento médico adequado e a saúde mental
estável e, principalmente, estando cercada de pessoas que me amam, tudo
dá certo.

— Você está grávida?! — O assombro na voz de Jonas me faz fitá-


lo.

E é impossível não lembrar de cada vez que eu perdi um bebê e tive


que me virar sozinha porque ele dizia que estava abalado demais para me
acompanhar ao hospital, de como tive que engolir o choro, porque me
falava que eu os estava fazendo ficar tristes e deveria esconder o sofrimento
e aliviar o clima depressivo com presentes.

Me internar no hospital pode ser o crime que o levou a julgamento,


mas o que ele fazia comigo há anos era muito pior.

Desvio deles, fito Felipe e sorrio, é impossível não fazer


comparações, agora eu tenho um homem ao meu lado, não um moleque
manipulador. Volto a fitar Jonas e Raquel esperando por diversas acusações
e xingamentos, mas isso não acontece, acho que me ver grávida os abalou a
ponto de ficarem mudos.

Então, eu respiro fundo e, quando solto o ar, é como se estivesse


jogando para fora todo o peso que tenho carregado por anos.

Logo fomos chamados, Felipe me explicou que ainda haveria


algumas audiências antes que o juiz tomasse uma decisão. Ao terminar,
saímos juntos, e Jonas segura meu braço, mas eu o puxo com brusquidão.

— Manuela, eu... — ele começa, mas eu o interrompo.

— Nada do que sair da sua boca me interessa, não temos mais nada
a falar, nem a ouvir, agora é somente com nossos advogados.

Me afasto, dou a mão a Felipe e vamos embora sem olhar para atrás.

Observo Cristina brincando na areia com outras crianças enquanto


ouço sua mãe falando sobre coisas de bebês. Sorrio e ingiro um pouco da
água de coco que está em minhas mãos.
— Acho que nunca te vi tão linda, Manuela! — Juliana elogia.

— Obrigada. Eu estou feliz, muito feliz, talvez isso esteja refletindo


na minha pele — brinco.

Estou com sete meses de gestação, meu bebê segue bem e, com os
meses, acabei relaxando e curtindo o momento. Hoje, eu e Felipe vamos
escolher a decoração para o quarto do nosso filho. Preferi esperar até
completar sete meses para fazer isso, e ele aceitou, eu amo como ele
respeita os meus medos, inseguranças e cautelas, não me força a tomar
nenhuma decisão, apenas espera ao meu lado e me apoia no processo de
cura.

Porque é isso que estou passando, enquanto gero meu bebê, estou
curando cada dor que ainda carregava pelas minhas perdas. Não vou dizer
que esqueci, porque é como uma ferida profunda que deixa uma cicatriz na
pele, mas ela não está doendo mais, apesar de ainda estar ali para me
lembrar do que houve.

A terapia também me ajudou, além de pintar e me aproximar das


irmãs de Felipe que vivenciaram algo parecido, também, recebi conforto de
vários lados, e isso me ajudou a afastar as sombras.

— Vai mesmo vender a casa sem nem pisar nela novamente? —


Juliana questiona em dado momento.

— Sim, obrigada por ir lá e separar alguns itens pessoais como as


fotos da minha mãe e meus antigos quadros. — Acaricio minha barriga
quando sinto meu bebê chutar. — Aquele lugar não me traz boas
lembranças.
Ganhei o processo que movi contra Jonas em relação à venda ilegal
dos meus imóveis, quando ele usou uma procuração falsa; também ganhei o
que ele moveu sobre a partilha dos meus bens após nosso divórcio, e ele e
sua mãe não tiveram alternativa a não ser sair da minha casa. Mas não
voltei lá, preferi pôr à venda e investir o valor.

Ele também perdeu o processo criminal, o diretor do hospital perdeu


seu licenciamento (CRM), sendo destituído de sua função como médico,
além de ter sido condenado a cinco anos de prisão; já Jonas foi sentenciado
a sete anos. Ambos recorreram, as próximas audiências ainda não foram
marcadas, e meu advogado me informou que será um processo demorado.

Raquel e Rodolfo não foram envolvidos no processo, minha ex-


sogra ainda acompanha Jonas nas audiências, mas não discutimos mais, isso
porque Guilherme enviou uma notificação extrajudicial informando que, na
próxima vez que ela me agredisse verbalmente, eu iria processá-la. Mas
uma coisa que não mudou é o seu olhar abismado para minha barriga
sempre que me vê.

Viro meu rosto para Juliana.

— Está mais aliviada pela comprovação de que Rodolfo não estava


envolvido com a minha internação?

— Sim, mas nos afastamos daquela família, só assim vamos


conseguir seguir em frente.

Assinto e não teço mais comentários a esse respeito, compreendo


seus motivos.

— Está nervosa para o casamento? Será em dois dias — lembra,


animada.
— Uma pilha de nervos! — Solto uma gargalhada. — Isabela havia
me prometido que seria um jantar pequeno, mas, a cada dia, ela inclui mais
alguém. Fico assustada, mas sempre cedo, ela está cuidando de tudo com
tanto carinho, fazendo de tudo para que eu não me preocupe! Já Cecilia está
fazendo uma escultura para nos presentear, é a primeira que ela faz em
muito tempo. — Sorrio.

— É tão bom te ver sendo mimada, amada e valorizada, estou tão


feliz por você! — Minha amiga me abraça, mas logo somos interrompidas
por Cristina, que busca atenção.

Após algum tempo, me despeço delas e me encontro com o Felipe,


nós vamos a um shopping de decorações para nos encontrar com uma
designer de interiores. Já havíamos conversado com ela e apenas aprovamos
as modificações que ela fez no projeto e decidimos pequenos detalhes.

Saímos da loja e me surpreendo ao encontrar Sofia andando de mãos


dadas com um homem muito bonito e bem mais velho que ela. Ele segura
algumas bolsas, e ela estampa um sorriso enorme no rosto.

Trocamos olhares e faço um cumprimento de cabeça, que ela


retribui e enlaça o braço do homem. Um sentimento bom me envolve ao
perceber que ela está bem, diferente da primeira vez em que nos vimos,
alguns meses atrás. Eu sabia que ela não ficaria triste e deprimida por muito
tempo! Sofia não voltou a nos incomodar desde então, não me importa que
ela tenha ficado com meu então marido e traído Felipe, ela também se
machucou no processo, e vê-la feliz me fez bem e foi como o fechamento
de uma situação que, na época, foi dolorosa.

Busco o olhar de Felipe e reparo que está olhando para uma loja de
carrinhos de bebês, provavelmente não a viu, então prefiro não comentar.
— Vamos entrar? Você quer comprar o carrinho do nosso bebê hoje?
— Sua empolgação me faz sorrir.

— Sim, vamos entrar — confirmo, enlaçando nossos dedos.

Além do carrinho e do bebê-conforto, compramos mais algumas


coisas para o nosso bebê. As pequenas, levamos, já as mais pesadas, eles
ficaram de entregar.

Felipe e eu almoçamos e depois ele me deixa na porta do nosso


prédio.

— Não vou subir com você, tenho alguns compromissos na parte da


tarde. — Me beija enquanto solta o cinto de segurança.

— Tudo bem, meu amor, nos vemos à noite! — Ele acaricia minha
barriga e, em seguida, eu saio do carro.

Ao entrar no apartamento, noto que há uma mulher loira sentada no


sofá, não preciso pensar muito para imaginar que é a mãe de Felipe. Diante
da rápida constatação, mordo meu lábio e respiro fundo antes de me
aproximar.
Capítulo 35

Manuela
Deixo as bolsas no chão e caminho em direção à mãe do meu noivo.

— Boa tarde, a senhora deve ser a mãe do Felipe, me chamo


Manuela, é um prazer finalmente conhecê-la. — Sorrio, estendendo minha
mão.

Ela é muito sofisticada e grita dinheiro por todos os poros. A


senhora demora a estender a mão e a apertar a minha delicadamente
enquanto desce o olhar por mim.

— Boa tarde, me chamo Olívia Sampaio. E, sim, sou a mãe de


Felipe — confirma.
— A senhora chegou há muito tempo? Me desculpe por não estar
aqui, não a estava esperando. Deseja beber alguma coisa, água, suco? —
indago, nervosa, mas ainda sorrio.

Quero muito me dar bem com ela, não só por mim, mas por Felipe e
pelo meu bebê.

— Por favor, sente-se — pede, indicando o sofá à sua frente.

— Ah, sim, claro. — Sento-me, mas não consigo ficar quieta. —


Normalmente, neste horário, eu fico em casa, pintando, mas hoje tive um
compromisso com uma amiga, e eu e Felipe também fomos conversar com
a designer do quarto do nosso bebê — explico, torcendo minhas mãos. Ela
demora o olhar nelas e depois sobe para o meu rosto.

— Está com quantos meses de gestação? — questiona, sua fala é


calma, mas sigo nervosa.

— Completei sete meses há pouco tempo. — Abro um imenso


sorriso.

— Quantos anos você tem?

— Tenho 25 anos, daqui a alguns meses faço 26.

— É 17 anos mais nova que meu filho, tem consciência dessa


diferença de idade?

— Sim, tenho.

— E isso não lhe incomoda?

— Nem um pouco. Fui casada com um homem da mesma idade que


eu, que me destruiu emocionalmente, me traiu e me internou em um
hospital psiquiátrico para conseguir roubar minha herança. Felipe foi a
primeira coisa boa que aconteceu comigo desde a morte da minha mãe,
anos atrás. Ele me protegeu, acolheu, defendeu, amou e me cercou de
carinho, tenho muita sorte em tê-lo em minha vida e o amo demais! —
revelo, prefiro me abrir com ela e não esconder nada, sem meias-verdades,
quero que ela me conheça e saiba de tudo que passou e o que seu filho
significa para mim.

— Então você pode estar confundindo gratidão com amor?

— Por um tempo, cheguei a pensar que sim. Depois de tudo o que


houve comigo, eu fiquei com medo de estar fantasiando uma relação com
Felipe, imaginando coisas, que ele só estava me ajudando por pena, e me
segurei para não o amar, mas foi impossível. Felipe se tornou meu porto
seguro, meu Norte, ele me tirou de um lugar escuro e me mostrou que posso
ser feliz. Eu tenho endometriose, sofri sete abortos e, quando descobri que
estava grávida, nossa, foi aterrorizante! O medo de passar por aquela dor de
novo era apavorante, mas novamente ele estava lá, segurando minha mão,
estando ao meu lado, me protegendo, dizendo que tudo ficaria bem.

— Está tudo bem com o bebê? — inquire com uma expressão


preocupada.

— Está, faço acompanhamento semanal, e ele não falta a nenhuma


consulta. Como disse antes, já fui casada e, quando sofri os abortos, passei
pelo processo sozinha, desde a ida ao hospital a voltar para casa, eu engolia
o luto para não incomodar as pessoas ao meu redor. A senhora me
perguntou se me incomodo com a nossa diferença de idade, e mais uma vez
afirmo que não, porque talvez seja por ter mais experiência que ele tem
tanta calma e entende meu tempo para algumas coisas. Eu amo Felipe, amo
o que ele representa para mim, amo-o por ser o pai do meu filho e amo a
atenção e o amor que ele dá a nós dois. — Me emociono e abaixo a cabeça,
tentando me recompor.

Perco a luta contra as lágrimas quando ela me entrega um lenço e


sorrio ao perceber que ele é branco e tem uma flor de lótus vermelha
bordada.

— A lótus vermelha significa amor e compaixão, esta é uma das


sete flores de lótus que se encontram na natureza, as outras são a púrpura,
laranja, amarela, branca, rosa e azul, mas somente cinco têm significado
especial — murmuro, acariciando o lenço.

— Conhece as flores de lótus e entende seus significados? —


pergunta, curiosa.

— Felipe me fez a mesma pergunta quando nos vimos pela primeira


vez, estava num elevador, havia acabado de descobrir a traição do meu
marido e acordado para toda manipulação que sofria. Ao contrário desta, a
lótus que ele borda em seus lenços é preta, que, de fato, só existe no
imaginário das pessoas, mas posso afirmar que a lótus negra nos uniu. Eu
estava na lama, naquela época, e Felipe me ajudou a emergir e florescer.

Ela assente, mas não comenta nada.

— A senhora quer conhecer meu ateliê? — pergunto assim que me


recomponho.

A pergunta inusitada a faz me olhar surpresa.

— Por favor, me acompanhe, talvez entenda melhor o que as flores


de lótus significam para mim. — Me levanto e indico o local com a cabeça.
Abro a porta com um sorriso enorme.

— Este é o meu lugar preferido no mundo, seu filho me deu de


presente. Passei muitos anos sem pintar, mas voltei no dia em que descobri
que estava grávida e não parei mais — explico, mostrando a tela que estou
pintando.

— Você realmente gosta das flores de lótus. — Ela sorri pela


primeira vez desde que a vi. — Fui eu que ensinei o significado das flores
para meu filho, sou botânica. Mas a lótus sempre foi a paixão dele,
principalmente a negra.

— Meu primeiro quadro foi de uma flor de lótus negra. — Procuro


entre os quadros que trouxe da casa em que morava e solto uma exclamação
quando o encontro. — Esse! — Aponto, empolgada.

— É muito bonito — elogia.

— Minha mãe nunca me deixou vendê-lo, na verdade, ela não me


deixou vender vários quadros. Felipe e minha mãe foram as únicas pessoas
que me incentivaram a pintar.

Ela desloca os olhos dos meus e observa o ateliê.

— Felipe deseja, na verdade, anseia que a senhora faça parte da vida


do nosso bebê. Sei que não sou a nora que um dia sonhou e nem mesmo
teremos um casamento muito glamuroso. Mas quero que saiba que eu o
amo demais e, para mim, ele é o homem com quem minha mãe sempre
sonhou que eu me casasse.

— Eu não sei o que pensar — murmura. — Vim aqui disposta a te


tirar da vida do meu filho, não imaginava que compartilhavam o amor pela
flor de lótus, sei o quanto a lótus negra é importante para ele.

— Por favor, venha ao nosso casamento, ele ficará muito feliz em


ver seus pais lá. — Sinto meu bebê mexer e me aproximo dela, hesitante, e,
em um ato impulsivo, pego sua mão e a levo até a minha barriga. — A
senhora sentiu? Aqui dentro tem uma parte do seu filho, e nós desejamos e
muito que senhora queira ser avó dele.

— Vocês já sabem o sexo? — indaga, olhando para minha barriga,


mas não retira a mão, nem se afasta.

— Preferimos esperar pelo nascimento, porque, não importa o sexo,


eu só quero segurá-lo em meus braços, só quero ser mãe. Sempre desejei
isso, sempre sonhei em ser amada e ter filhos. Uma parte do meu sonho já
conquistei, sou verdadeiramente amada por Felipe e, em dois meses, vou
conquistar a segunda e terei meu bebê em meus braços. — Não controlo as
lágrimas.

— Isabela mencionou que você era emotiva — comenta, se


afastando.

— Ah, eu sou chorona mesmo! — Sorrio e levo as minhas mãos ao


rosto.

Ela assente e vira as costas, saindo do ateliê. Chego a pensar que ela
vai para a sala, mas segue para a saída.

— A senhora virá ao nosso casamento? — questiono, ansiosa.

— Irei pensar. — Faz um cumprimento de cabeça e sai.

— Pelo menos ela não disse não. — Solto um longo suspiro.


Preferi não falar com Felipe que sua mãe esteve aqui, não queria lhe
dar esperança sem ter certeza de que ela iria ao nosso casamento. E, quando
chegou o dia da cerimônia, eu estava nervosa. Mesmo que estivessem lá
apenas nossos amigos, ainda assim estava me casando com o homem que eu
amo.

Os pais de Felipe não compareceram, mas enviaram um buquê de


lírios, seria mentira se dissesse que não senti uma ponta de esperança. Sei
que Felipe também desejou, mas nenhum de nós dois deixou de sorrir,
apesar de sentirmos a falta deles, nossa cerimônia foi linda, após o juiz de
paz nos declarar marido e mulher nos beijamos e brindamos com nossos
amigos, mas não fizemos nenhum discurso, preferimos assim, todos que
estavam presentes sabiam da nossa história e do nosso amor, meu marido se
declara todos os dias para mim, me mostra com atos e ações o quanto me
adora. Queríamos apenas oficiar nossa união e celebrar o nosso amor ao
lado de pessoas que nos amávamos.

Sinto uma leve carícia em meu rosto e abro meus olhos.

— Acho que adormeci. — Bocejo e alongo o corpo. — Já


chegamos?

— Sim. — Meu marido solta o meu cinto de segurança e me ajuda a


descer do carro.

Optamos por passar um final de semana em Angra em nossa lua de


mel, meu médico me aconselhou a não viajar de avião e escolhemos seguir
sua recomendação. Após os funcionários de Felipe tirarem nossas malas do
carro, embarcamos em uma lancha até a ilha que ele alugou para ficarmos.

— Este lugar é lindo! — Sorrio largo com a bela paisagem.

— Daqui a alguns meses, te levo a qualquer lugar no mundo que


você preferir — promete, me abraçando por trás.

— Qualquer lugar fica perfeito ao seu lado. — Acaricio os seus


braços. — Tenho algo a confessar, não falei antes porque não queria te
deixar ansioso ontem, mas você ficou, de qualquer forma.

— E como não ficaria, foi o nosso casamento, seria impossível não


ficar. — Morde meu ombro.

— Mas eu já era sua mulher e até já estou grávida — brinco.

— Mais ainda não era o seu marido, agora sou.

— Para sempre. — Viro minha cabeça e o beijo.

— O que queria me revelar?

— Sua mãe foi me ver antes de nos casarmos, conversamos, mostrei


o atelier, pedi para que me aceitasse como sua nora e que fizesse parte da
vida do nosso filho, então acreditei que seus pais fossem comparecer ao
casamento, mas só mandaram um buquê de lírios. Me desculpe se
prejudiquei a relação com seus pais — falo, desanimada.

Felipe me gira em seus braços e me beija.

— Não faça isso, não se culpe.

— Mas, se eu... — Ele me interrompe com um beijo.


— Você é a mulher que eu escolhi, meus pais se acostumaram a me
ver fazendo tudo o que queriam, porque pensamos da mesma forma e,
quando nossas opiniões convergiram, eles agiram de forma autoritária,
como sempre fizeram com minhas irmãs, e dava certo. Mas, comigo, não
deu.

— Ainda assim, me sinto mal com esta situação.

— Ela mudará em pouco tempo. — Sorri e acaricia meu rosto.

— Como você pode afirmar?

— Minha mãe é botânica.

— Sim, eu sei, ela me disse quando mostrei meu atelier.

— E ela nos enviou lírios.

— Desculpa, não entendi.

— Quando pequeno, minha mãe me ensinou os significados de cada


flor e, quando meu pai me repreendia e eu ficava triste, ela me enviava um
lírio. O mesmo ocorreu quando fui estudar fora do Brasil ou quando assumi
as empresas da família. O lírio tem muitos significados e, entre eles, estão
maternidade, matrimônio, sentimentos positivos e renovação.

— Ah, que lindo! Vocês se comunicam através das flores —


comento, impressionada.

— Sim, minha mãe sempre faz isso quando quer me passar alguma
mensagem e, quando vi o arranjo ontem, eu soube que ficará tudo bem.
Portanto, não se preocupe, com o tempo, tudo irá se ajustar.
— Uma flor de lótus me ligou a você, acho que nunca jogarei aquele
lenço fora. Naquele dia, você me fez sorrir pela primeira vez.

— Flores, rosas e seus significados sempre fizeram partes da minha


vida. Apesar de não exercer a profissão, minha mãe as ama, mas a flor de
lótus negra sempre me intrigou, mesmo não tendo a comprovação da sua
existência. Assim, naquele dia no elevador, ao descobrir que você conhecia
a lótus negra, nossa... foi arrebatador!

— Como uma flor de lótus negra, eu estava na lama.

— E, como ela, você emergiu e floresceu lindamente.

— Eu amo você, Felipe.

— Eu amo muito mais. — Ele me beija, segura minha mão e indaga:


— Vamos conhecer a ilha?

Assinto e saímos de mãos dadas.


Epílogo

Felipe
Ando de um lado para o outro naquele corredor de hospital,
Manuela entrou em trabalho de parto há três horas. Estava tudo correndo
dentro do previsto, até que sua pressão começou a subir, ela entrou em pré-
eclâmpsia e foi encaminhada para o centro cirúrgico para fazer uma
cesariana de emergência.

Não me deixaram entrar com ela, então eu fiquei ali, olhando para a
porta, torcendo minhas mãos.

— Filho. — Fecho meus olhos ao ouvir a voz da minha mãe.

Liguei para ela há uma hora, mas não imaginei que viria tão rápido,
nossa relação progrediu, saímos para almoçar e conversamos. Em algumas
ocasiões, Manuela foi comigo, não posso dizer que é o ideal, mas é um
começo.

Encho meu peito de ar e solto em um forte sopro.

— Não posso perdê-los, mãe, não vou suportar — verbalizo meu


maior medo.

Curvo meu tronco e sinto um aperto firme me segurando.

— Vai ficar tudo bem, filho. — A voz do meu pai me faz elevar a
cabeça e fitá-lo.

Sequer penso duas vezes antes de abraçá-lo forte. Ao contrário do


que houve com minha mãe, minha relação com meu pai continuou a
mesma, mas esqueço qualquer desavença dos últimos meses, todo
desentendimento, ou discussão e jogo o orgulho na terra. Este é o momento
mais aterrorizante que já vivi em minha vida, agora eu quero o abraço do
meu pai e o aconchego da minha mãe.

Quando me senti mais calmo, avisei às minhas irmãs e, em seguida,


liguei para Guilherme, que veio com a esposa. Eles me questionaram sobre
por que não entrei em contato antes, mas, pela primeira na vida, não
consegui pensar com coerência, então achei melhor explicar quando todos
estavam juntos.

— Manuela começou a se sentir mal por volta das 2h da manhã,


liguei para o seu médico e viemos para o hospital. Como era de madrugada,
pensei em ligar para vocês de manhã, mas ela teve algumas complicações,
então optaram por não ser mais por parto normal, e sim cesariana, e eu acho
que está demorando muito!
Minha mãe acaricia meu braço, estamos todos apreensivos, à espera
de notícias. E, quando avisto o doutor Marcos e noto um sorriso em seu
rosto, respiro aliviado, porque sei que tudo ficará bem.

Manuela

Ainda de olhos fechados, tento me mexer, mas uma forte fisgada no


abdômen me faz ficar imóvel e arregalar os olhos. Olho ao redor e constato
que estou no hospital.

— Meu filho? — inquiro, aflita, e somente então percebo que Felipe


está de costas para mim.

E, quando ele se vira, percebo que está com nosso filho em seus
braços. Levo minhas mãos ao rosto e começo a soluçar.

— Por um momento, eu pensei... — Não consigo concluir a frase.

— Calma, meu amor, nosso filho está bem. — Ele se aproxima e,


com cuidado, o transfere para o meu colo.

— Filho? É um menino? — questiono, vendo tudo turvo pelas


lágrimas.

— Sim, meu amor, um menino lindo — confirma, limpando meu


rosto.
Perco um tempo olhando cada pedacinho dele, os cabelos ralinhos,
os dedinhos pequenos, conto todos, tanto das mãos, quanto dos pés, suas
orelhas e nariz pequenos, e boca rosinha.

— Ele é tão perfeito, é meu sonho realizado. Não, ele é mais


perfeito do que um dia sonhei! — murmuro, fungando.

— Que nome você quer dar para ele?

— Pedro Henrique, o que você acha?

— Perfeito. Meus pais queriam entrar para te visitar, tudo bem para
você?

— Seus pais estão aqui?

— Sim, minhas irmãs, Guilherme e a esposa também estão.

— Tudo bem. — Abro um enorme sorriso, sei o quanto Felipe


queria isso.

Ele assente, sai em seguida e entra com os pais.

— Pai, mãe, eu gostaria de apresentá-los ao meu filho e seu neto,


Pedro Henrique — meu marido anuncia. — Posso? — pergunta, indicando
nosso filho. Faço um gesto afirmativo de cabeça e somente então ele o pega
de meus braços e o leva até seus pais.

Sua mãe leva uma mão trêmula aos lábios e seu pai ofega e vira a
cabeça para a esposa, que também o fita. Não sei o que passa na cabeça de
ambos, eles se olham emocionados, lágrimas descem pelo rosto da mãe de
Felipe e o pai respira fundo algumas vezes.
Seu pai desvia deles, caminha em minha direção e me surpreende ao
pegar a minha mão.

— Prazer, Manuela, sou o Paulo Sampaio, sou o pai de Felipe e avô


do seu filho — diz com voz firme e aperta minha mão com força.

Fito Felipe e vejo o quanto está emocionado, com seus olhos cheios
de lágrimas. Sua mãe acaricia suas costas.

— Ele é tão lindo, filho! — Ela me olha. — Parabéns, Manuela, é


perfeito! Meu neto é perfeito!

Eu não consigo falar nada, a emoção me domina a tal ponto que eu


soluço, então apenas assinto e procuro pelo olhar de Felipe, que está como
eu, vejo-o respirar fundo e sorrir largo, e eu repito esse gesto.

Nove meses depois

Manuela
Circulo entre os convidados com Felipe caminhando ao meu lado.
Hoje é a inauguração da galeria das irmãs dele. Era para ter acontecido
antes, mas, devido ao escândalo que envolveu o ex-marido de Isabela, elas
preferiram esperar até o falatório abaixar.

Vejo Cecilia e Isabela sorridentes caminhando, conversando com os


convidados, e sorrio. Isabela passou por um período difícil, ela pediu o
divórcio quando o seu então marido foi preso depois de meses foragido, e o
trabalho na galeria a ajudou.
Minha sogra e meu sogro se aproximam de nós, nos
cumprimentamos com beijos e abraços. Nosso filho nos uniu, hoje temos
uma relação muito amigável e sociável.

— Em breve, seus quadros estarão expostos aqui — Felipe sussurra


ao meu ouvido.

E eu apenas sorrio. No último ano, pintei dois quadros, mas a maior


parte do meu tempo dediquei ao nosso bebê, não queria perder nada de seu
primeiro ano, e tantas coisas ocorreram nesse ano.

Jonas perdeu novamente e não conseguiu se livrar da prisão, assim


como o diretor do hospital. Já o valor que meu ex retirou da minha conta,
meus advogados me disseram que será muito difícil tê-lo de volta, eu já
esperava por isso.

Para a infelicidade de Juliana, com a prisão de Jonas, Raquel foi


morar com o filho mais velho, e a vida não anda fácil para a minha amiga.

Guilherme e Bruna saíram de férias após meu bebê nascer, acho que
eles queriam ir assim que meu padrinho se recuperou completamente, mas
ele queria ficar ao meu lado nas audiências e no momento mais importante
da minha vida, o nascimento do meu filho.

No próximo semestre, eu retorno para a faculdade e me matriculei


em alguns cursos de pintura, quero aprimorar minha arte antes de pensar em
expor.

— Vamos? Não quero ficar muito tempo longe do nosso filho —


Felipe indaga.
— Venham almoçar em nossa casa amanhã e tragam nosso neto,
estou com saudades dele! — convida minha sogra, me abraçando.

— A senhora o viu ontem, mãe — Felipe implica quando ela o


abraça.

— Deixe de ser insolente! O vimos rapidamente, amanhã vocês


podem deixar meu neto conosco e passarem o dia livre — seu pai sugere, e
eu seguro o riso diante da expressão horrorizada que Felipe faz.

— Concordo, e quando forem para a Índia no mês que vem,


poderiam deixar nosso neto conosco, assim vocês curtem uma lua de mel
mais tranquila — minha sogra propõe, nos fazendo rir.

— Vocês estão falando isso desde que comentamos que vamos para
a Índia em uma segunda lua de mel — brinco.

— Segunda, não, primeira, porque não considero aquele final de


semana em Angra como nossa lua de mel. — Meu marido segura minha
cintura e me puxa para mais perto. — E mandaremos fotos e vídeos de
Pedrinho e a babá dele nos acompanhará, não se preocupem.

Eles seguem tentando nos fazer mudar de ideia, é tão bom vê-los
assim! Graças a Deus aqueles momentos tristes e tensos ficaram no
passado.

Após nos despedirmos dos familiares, seguimos para casa e, assim


que chegamos, verifico como nosso bebê está. Ao entrar no quarto, percebo
que ele está choramingando no colo da babá.

— Acho que é o dentinho nascendo — explica.


— Oh, meu amor! — murmuro, trazendo-o para os meus braços. —
Muito obrigada, Lurdes, pode ir descansar, eu cuido dele.

Ela faz um movimento afirmativo de cabeça e sai.

— Me dê ele, meu filho sempre para de chorar no meu colo —


Felipe diz, convencido, enquanto retira o terno.

Passo nosso menino para os seus braços e não contenho o sorriso ao


vê-lo conversar com Pedrinho enquanto o nina. Nosso garoto reclama por
mais um tempo, mas acaba adormecendo.

— Você é o melhor pai do mundo! — Dou pequenos tapinhas nas


suas costas.

E ele realmente é, desde o primeiro momento, participou de todas as


etapas, desde as noites mal dormidas por cólicas às dores dos primeiros
dentinhos. Meu marido nunca reclamou de levantar de madrugada quando
ouvia nosso filho chorar, mesmo tendo uma babá.

Assim que saímos do quarto do bebê, Felipe me pega no colo e me


leva para o nosso quarto.

— Não grita, se não irá acordar nosso filho e a babá, vamos fazer
amor bem baixinho.

Assinto com um sorriso. Fazemos amor devagar, olho no olho, com


a paixão nos envolvendo e, quando gozamos, eu sussurro ao seu ouvido:

— Eu amo você!

— Eu amo muito mais!

FIM!!!
Agradecimento
Primeiramente, gostaria de agradecer a Deus, pois sem ele nada
seria possível. E a minha amada e luz da minha vida, minha filha, Gabi.

Agradeço às parceiras e amigas literárias, pelas indicações e ajuda


nas divulgações, a Mariana Santana e Natalia Souza revisoras desta obra, a
Vanessa Pavan que cuidou de tudo para que conseguisse fechar a história,
obrigado por tudo, adoro vocês. E agradeço ainda a você leitor pelo desejo
de conhecer minha obra.
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