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Criado no Brasil.
SINOPSE
CAPÍTULO 1
CAPÍTULO 2
CAPÍTULO 3
CAPÍTULO 4
CAPÍTULO 5
CAPÍTULO 6
CAPÍTULO 7
CAPÍTULO 8
CAPÍTULO 9
CAPÍTULO 10
CAPÍTULO 11
CAPÍTULO 12
CAPÍTULO 13
CAPÍTULO 14
CAPÍTULO 15
CAPÍTULO 16
CAPÍTULO 17
CAPÍTULO 18
CAPÍTULO 19
CAPÍTULO 20
CAPÍTULO 21
CAPÍTULO 22
CAPÍTULO 23
CAPÍTULO 24
CAPÍTULO 25
CAPÍTULO 26
CAPÍTULO 27
CAPÍTULO 28
CAPÍTULO 29
CAPÍTULO 30
CAPÍTULO 31
CAPÍTULO 32
CAPÍTULO 33
CAPÍTULO 34
CAPÍTULO 35
CAPÍTULO 36
CAPÍTULO 37
CAPÍTULO 38
CAPÍTULO 39
CAPÍTULO 40
EPÍLOGO
BÔNUS 1
BÔNUS 2
AGRADECIMENTOS
Davi Filipo Sintori sempre consegue tudo o que quer.
Baixista da banda universitária Five Stars, o estudante de
Administração chama a atenção com sua atitude confiante e seu
corpo repleto de tatuagens.
Aos 28 anos, Sin é o filho caçula de Domenico, um magnata
viúvo "bon vivant". O rapaz não lida bem com o desfile de
madrastas, seguindo a regra de nunca as tocar.
Até o pai levar para casa Madah, uma garota de programa
intrigante demais...
Só que nem tudo é o que parece.
Um veterano popular que luta para sustentar uma fachada
de força e indiferença, escondendo medos e traumas que o
assombram. Uma mocinha resiliente com uma trajetória marcada
por experiências degradantes.
Alternando os pontos de vista dos protagonistas, o livro
mostra o surgimento de uma paixão avassaladora, capaz de
transformar vidas.
Conteúdo maduro +18: sexo explícito, linguagem informal,
palavreado adulto, consumo de álcool e drogas, bem como
gatilhos relacionados a questões de saúde mental e abuso sexual.
Para você que, assim como eu,
acredita que os melhores mocinhos literários
são aqueles que começam como vilões.
Bem-vindo ao mundo de Davi Filipo Sintori, mais conhecido
como Sin. Um legítimo vilão-mocinho para você odiar e amar.
Vamos lá... O livro não é um romance “água com açúcar”.
Pelo contrário, é um bully romance.
Para quem não está familiarizado com o termo, explico: bully
romance é um subgênero do romance em que a relação dos
protagonistas se inicia através do bullying (ofensas, xingamentos,
provocações etc.) e, depois, se desenvolve para o amor.
Aproxima-se também do dark romance por retratar violências
físicas e/ou psicológicas.
Não custa dizer: mulheres, fujam de homens assim na
vida real!
Continuando... A história contém gatilhos por abordar temas
sensíveis, como sexo explícito, questões de saúde mental e abuso
sexual (sem romantização).
Inclusive, as cenas mais pesadas estão sinalizadas dentro
dos respectivos capítulos, cabendo a você optar por ler o trecho,
ou não, sem que haja prejuízo do entendimento dos
acontecimentos. São lembranças gráficas que podem incomodar
quem é sensível ao tema.
Vale lembrar que as falas e atitudes problemáticas dos
personagens, em especial as que destilam machismo e
LGBTfobia, são inerentes à construção e desconstrução deles, e
não reproduzem minhas ideias e convicções.
Além disso, a linguagem do texto é propositalmente mais
informal, coloquial, por se tratar de um romance contemporâneo,
com protagonistas entre vinte e trinta anos, jovens e
descontraídos.
Relembro que se trata de um relançamento, com
significativas mudanças na história. A principal delas: os detalhes
do romance envolvendo o personagem secundário Enrico foi
retirado, pois, será contado em um livro à parte, com mais cuidado
e profundidade.
No mais, para quem aprecia leitura com música, segue o
código para a playlist no Spotify:
Ela é a Madah?!
Sob a luz branca do interior do elevador, observo melhor a
garota. Sua pele é lisa e clara, contrastando com os cabelos
castanhos. Mas o que mais chama a atenção é a magreza...
Porra, seu corpo é um saco de ossos.
Pelo jeito, o gosto do meu pai está se diversificando.
Domenico sempre preferiu as ratas de academia, como a minha
atual "madrasta". Aliás, quero só ver a cara de Bárbara quando
descobrir sobre Madah. Vai perder a cabeça, soltando aqueles
gritinhos irritantes que quase perfuram meus tímpanos.
— Pai. Ela desmaiou ou o quê? — Aponto com a cabeça
para ela.
— Desmaiou. Em cima de mim. Não sei se por fraqueza, por
abuso de drogas ou por outro motivo. Não tenho culpa — garante,
mudando o peso de um pé para o outro.
Certo. Eu acredito no meu pai. Ele não doparia uma garota
para sequestrá-la ou coisa pior. Domenico não precisa disso.
Com a aparência impressionante e as contas bancárias
recheadas, as mulheres quase brigam para ficar com ele. E,
modéstia à parte, comigo é a mesma coisa.
— Ela vai mesmo para casa com a gente? Pretende bancar
o "Sugar Daddy" de novo? — disparo, sem disfarçar a crítica nas
entrelinhas. — Bárbara vai surtar.
— Não quero falar sobre isso. — Ele me corta, saindo do
elevador. — Vamos até o quarto, não podemos levá-la assim para
o aeroporto. Quando Madah despertar, iremos embora. Está
resolvido — diz, com o tom enfático de um CEO ao final de uma
reunião de negócios.
Nada semelhante a uma conversa entre pai e filho.
— Beleza — murmuro resignado, esfregando a nuca.
Estou com mil perguntas na cabeça, mas sei que não
adianta insistir quando ele decide um assunto assim. Domenico
sabe o que quer e não aceita interferências. Seu modo CEO pode
ser irritante, mas devo admitir que não costuma falhar. Tanto que
construiu praticamente sozinho uma maldita multinacional.
Ele caminha pelo corredor acarpetado, carregando a garota
sem qualquer esforço. A magrela não deve pesar nem cinquenta
quilos.
Ao parar junto à última suíte, vira o rosto para o guarda-
costas.
— Raul, faça a gentileza de abrir a porta.
O homem o atende, encaixando a chave-cartão na fechadura
eletrônica.
Quando entramos, o ambiente luxuoso nos recebe com o ar-
condicionado gelado. Dois sofás e uma mesa de jantar para
quatro pessoas delimitam a saleta, com as portas de vidro da
varanda à esquerda e as de madeira do quarto à direita.
Meu pai segue para o lado direito e eu me adianto na frente,
escancarando as portas para que ele consiga passar com a garota
nos braços.
Duas camas king ocupam o centro do recinto, arrumadas
com lençóis que parecem custar uma pequena fortuna. Nas
laterais, duas poltronas de leitura em couro reforçam o ar refinado.
Entre elas, um apoiador retangular com as nossas bagagens.
Domenico coloca Madah em uma das camas, o corpo ainda
coberto com meu paletó dos ombros para baixo.
Umedeço os lábios, tentando não encarar seu rosto
desacordado.
Sua maquiagem pesada está borrada, com o rímel preto
espalhado e o batom vermelho desbotado. Combinando com a
lingerie vulgar que vi em seu corpo, não me resta muito espaço
para a imaginação. Aposto que o papo de massagem é
eufemismo para prostituição.
Mas, embora seu estado decadente seja caótico, na atual
situação — com os olhos fechados e os lábios entreabertos —,
Madah aparenta estar relaxada e tranquila.
Em absoluta paz… Ao contrário de mim.
Porra, estou me corroendo por dentro, com o coração
martelando descompassado no peito, e sequer compreendo o
porquê de tanto nervosismo.
— Raul, me passe as coisas dela — Domenico pede,
estendendo a mão para o guarda-costas.
O homem entrega a ele uma pequena mochila cinza. Eu nem
tinha percebido que ele a trazia em um ombro.
Meu pai despeja o conteúdo na outra cama. Vários objetos
se espalham pelo lençol imaculado: maquiagem, chocolate,
perfume, carteira etc.
— Che cavolo[1], nenhuma roupa — resmunga, passando a
mão pela barba.
Abrindo a carteira pink, tira um documento de dentro,
analisando os dois lados devagar, com atenção.
Quando ele o larga, eu o pego. É um RG do Brasil. De
acordo com o papel, Madah se chama Madeleine Laurent e é
gaúcha, natural de Santa Maria/RS. Que mais? Vinte e oito anos
e... Ah, não.
Essa porra só pode ser falsa. De jeito nenhum ela tem a
minha idade. Parece ter dez anos a menos… Merda, só espero
que não seja menor.
— Sin, tem alguma roupa sua que sirva nela? — Meu pai
toca no meu braço.
Deixo o documento de lado e caminho até as bagagens.
— Deixa eu ver — murmuro, abrindo a mala de mão. —
Trouxe duas camisetas brancas, calça jeans, jaqueta preta...
— Me dá a jaqueta. Vai servir.
Quando a entrego a ele, Domenico alcança meu paletó com
a outra mão. Ele joga a peça social para mim e cobre o corpo da
garota com o lençol, deixando apenas a cabeça para fora. Por fim,
posiciona a jaqueta ao lado dela.
— E agora? — pergunto. — Não é o caso de chamar um
médico?
— Nada de médico. Vamos aguardar — Domenico decide,
se afastando da cama. — Pelo que pude sentir, a respiração está
regular e a temperatura corporal normal. Mas pode levar horas
para que desperte. Ela parecia exausta.
— Ok. — Visto meu paletó, suspirando fundo. — Vou dar
uma volta, preciso de um cigarro.
Andando até a porta, apalpo o bolso para conferir a
presença do maço de Marlboro. Positivo.
— E eu vou apostar na roleta. — Domenico alisa a gravata
em frente ao espelho. — Raul, fique aqui. Me avise assim que a
menina acordar.
Enfim, sábado.
Depois daquela maldita abordagem dos nerds no vestiário,
tive uma manhã de merda na faculdade.
Ainda bem que hoje não preciso voltar para lá.
Ao abrir a varanda do quarto, fico cego com a luminosidade
que bate na minha cara.
Esfrego os olhos para tentar recobrar a visão, apreciando o
calor dos raios solares no rosto.
Quando volto a enxergar, reparo que meus irmãos estão na
piscina. Visto uma bermuda de tactel, coloco o celular no bolso e
pego uma toalha de praia.
Desço rapidinho até eles, aproveitando que estão sozinhos.
Caso Madah também apareça por lá, eu saio. Simples.
— E aí, caras?
Aceno para os dois ao subir os degraus do deck. Luca está
dentro da água e Enrico sob o chuveiro, tomando uma ducha. Eles
me cumprimentam de volta.
Nem sinal do meu pai, nem da protegida dele. Olho ao redor,
esquadrinhando o espaço inteiro, para ter certeza. As
espreguiçadeiras estão vazias.
— Cadê Domenico? — pergunto, caminhando devagar até a
borda da piscina. A madeira sob os meus pés está morna do sol.
Ainda na água, Luca bagunça os cabelos molhados antes de
falar:
— Foi viajar.
"Viajar"?
Do nada?
Porra, será que levou Madah com ele?
E se foram para Punta? E se ela não voltar para cá? Nunca
mais?
Eu deveria ficar feliz.
Deveria.
— A trabalho? — Salto para dentro da piscina, submergindo
o corpo inteiro. Mesmo a temperatura fria da água não ajuda a
aliviar a agitação do meu estômago.
— Milagrosamente, não. Estava todo empolgado… — Luca
dá risada. — Foi para a casa de praia curtir o final de semana.
Acompanhado, lógico.
— Entendi.
— Sabe o que isso significa? — ele quer saber e eu suspiro
fundo.
Significa que Domenico irá transar pra caralho. Significa que
Madah não terá mais como bancar a santa, fingindo que não
existe um lance sujo entre eles. Significa que…
— Festinha! — Luca passa um braço pelo meu pescoço, me
puxando para perto. — Vamos chamar todo mundo?
Sua animação não me contagia. Pelo contrário, estou
enjoado aqui, quase passando mal.
— Vamos. — Saio da piscina, me enxugando com a toalha.
Alcanço o celular sobre a mesinha e digito a mensagem:
"Casa liberada. Trazer bebida. Oito da noite."
Mando nos grupos certos, convidando uma galera em cinco
segundos.
— Já avisou ao pessoal da FGV? — Luca pega o celular
dele depois de se enxugar. — Estou vendo aqui a mensagem no
grupo da banda, vou repassar para a turma do MBA. Pediu para
os Fontini chegarem mais cedo?
— Sim, sim.
Jogo a toalha úmida na cara dele, mas o espertinho é ligeiro
e pega a peça no ar com a mão livre, rindo adoidado.
É sempre assim. Toda vez que Domenico viaja, eu e Luca
organizamos festinhas em casa, com a ajuda de Marco e Paolo
Fontini, os filhos do tio Giuliano.
E, modéstia à parte, as nossas festas são as melhores.
Não vejo a hora de pegar uma garota. Qualquer garota, para
acalmar meus hormônios e voltar a pensar racionalmente, mais
centrado e tranquilo.
Se por fora consigo disfarçar, brincar e manter o sorriso no
rosto, a verdade é que por dentro estou absurdamente
incomodado.
Não aguento mais a presença daquela prostituta na minha
casa, com os demônios do passado ameaçando me engolir todos
os dias.
Não aguento mais, mesmo.
HORAS ANTES
Estou enfiada no quarto desde cedinho.
Mais especificamente, desde que Domenico veio falar
comigo.
Ele avisou que viajaria com a namorada, ou seja, que me
deixaria sozinha na mansão com os filhos por um final de semana
inteirinho.
Meu Deus, como vou ficar até segunda, sem o homem por
perto para me resguardar?
Tudo bem que Sin mal para em casa, porém Luca vive
aparecendo no meu caminho, soltando aqueles comentários
ridículos. Sei que os dois se comportam um pouquinho melhor na
presença do pai. Agora, com a ausência prolongada de Domenico,
quero só ver…
Por sorte, tenho Enrico do meu lado.
E por falar nele…
— Madah? — Ele coloca a cabeça no vão da porta. — Você
sumiu… Aconteceu alguma coisa?
Continuo sentada na cama, abraçando meus joelhos.
— Nada de mais. Só não estou muito empolgada para o final
de semana.
— Ah… — Ele passa a mão pela franja, ajeitando os fios
lisos. — Já está sabendo da festinha dos meus irmãos?
— Pois é… Eu estava na cozinha agorinha, e seu irmão mais
velho apareceu para dar umas instruções aos empregados. "Sin e
eu vamos receber uns amigos, sabem como é…", blábláblá. Pediu
que os móveis da sala fossem afastados e sei lá mais o quê. Nem
olhou na minha direção, ainda bem.
Luca parecia muito entretido com os preparativos da festa.
Até tinha mudado o corte dos cabelos. Raspados à máquina dois
ou três, o novo estilo o deixou ainda mais atraente. Pois é, ele era
um babaca atraente e sorridente, visivelmente animado para a
noitada.
Ao contrário dele, não me sinto nada empolgada para o
evento. Os tais "amigos" deviam ser tudo farinha do mesmo
saco… Um bando de machos riquinhos, mimados e idiotas.
— Eu nunca participo das festas dos meus irmãos. Podemos
passar a noite aqui em cima. Você, eu e Netflix, que tal? — Enrico
sugere.
— Boa ideia. Obrigada, Rico.
Quando ele vai embora, esboço um sorriso, me sentindo
mais leve.
"Aqui é melhor do que o Uruguai. Aqui é melhor do que o
Uruguai", repito várias vezes, tentando me manter positiva.
É, vai dar tudo certo.
No final do dia, tomo uma boa ducha.
O chuveiro da casa é maravilhoso.
Mil vezes melhor do que o que tinha nas dependências de
funcionários do hotel, com suas duas únicas temperaturas de
água: fria congelante ou quente escaldante.
Depois de me enxugar, desembaraço os cabelos e visto um
pijama, me preparando para a noite de filmes.
Quando o relógio marca 19h30, vou atrás de Enrico, não sei
se ele já está pronto.
Bato na porta dele.
Nem cinco segundos depois, ele a abre, vestindo apenas
uma bermuda de moletom. Pelos cabelos molhados, acabou de
sair do banho.
Quando um aroma quente de especiarias vem até mim,
identifico os cheiros de cravo e canela. Deve ser de incenso, já sei
que Enrico gosta deles.
— Oi. Eu estava lá no meu quarto, mas não sabia se você
iria aparecer para o filme. Não combinamos o local… Será no meu
ou no seu?
— Melhor no seu. Estou reorganizando os livros aqui. —
Indica as pilhas instáveis pelo chão. Estão espalhadas por todo o
ambiente. — Fiz uma bagunça.
— Tudo bem. Tem pipoca nessa casa? Sem querer abusar…
— emendo e ele dá risada.
— Tem, sim. Na cozinha, no armário acima do forno. Quer
que eu pegue?
— Pode deixar. Vou até lá rapidinho, antes que a festa
comece. Até já. — Aceno, já me afastando.
— Combinado. Vou acabar de me vestir. Te encontro no seu
quarto em dez minutos.
Desço a escada com calma, feliz até… É bom estar aqui, e
não no Uruguai.
Aos sábados, a balada VIP ficava lotada e eu chegava a
atender até cinco clientes em uma noite. Meu estômago revira
quando me lembro daqueles velhos nojentos gemendo de prazer.
Sim, é bom estar aqui.
Entro na cozinha, tranquila e distraída, até que…
Congelo ao me deparar com três pares de olhos virando com
violência na minha direção, sem um pingo de simpatia. Os
homens estão sentados junto ao balcão e, pela cara deles,
estraguei o clima.
Luca, Sin e mais um, que parece mais forte do que os
demais, com a cabeça raspada à máquina zero e o pescoço
musculoso coberto por desenhos coloridos.
Os três são parecidos na quantidade de tatuagens, no estilo
das roupas e nas posturas confiantes, mas Sin se destaca com
aquele seu magnetismo único.
Só ele é capaz de fazer meu coração disparar com um
simples olhar.
"Simples", não. Porque nada nele é simples… Os olhos
intensos, os cílios longos, as sobrancelhas espessas, o nariz
bonito, a boca carnuda.
Com os cabelos bagunçados, se destaca entre os outros
dois de cabeças raspadas, atraindo minha atenção como um sol
reluzente em meio a planetas sem graça.
— A festa já vai começar, caralho. Vai se trocar — ele rosna
para mim. — E vê se bota um sutiã.
Ridículo. Não me conformo em ter sido simpática com ele na
viagem, para em seguida ser tratada como lixo… "Não encoste
em mim", "Tenho nojo de gente podre como você."
Suas palavras duras me feriram mais do que eu gostaria.
Não podia mais lhe dar abertura para que me machucasse. Nunca
mais.
Com o rosto quente, passo por eles e abro o armário alto.
Fico na ponta dos pés para alcançar a prateleira, sentindo os
olhares deles em mim.
— Para sua informação, Davi Filipo… Eu uso sutiã se quiser,
o corpo é meu. E não vou participar de festa nenhuma —
acrescento, pegando o pacote de pipoca e jogando no micro-
ondas.
— E o que vai fazer em pleno sábado à noite, sem
Domenico? — Luca quer saber.
— Não que seja da sua conta, mas… Combinei de ver Netflix
com Rico.
Um silêncio pesado preenche a cozinha.
Nunca os três minutos para estourar uma pipoca se
arrastaram tanto.
Então, o homem que não conheço puxa assunto.
Antes não o tivesse feito…
— Essa que é a nova "aquisição" do tio Domenico?
— Sim, Marco. Madah… Aposto que está mal-humorada
porque meu pai foi viajar com a namorada oficial, deixando o
brinquedinho novo largado em casa — Luca me alfineta e os três
caem na risada.
Meu coração me ensurdece e a humilhação me queima, me
transportando para…
Para outros ambientes luxuosos. Para outros dias sombrios.
Para outras risadas masculinas maldosas.
Por fim, o micro-ondas apita, aleluia, me trazendo de volta
para a realidade.
Pego a pipoca e fujo da cozinha, sem olhar para trás.
Já no meu quarto, decido trocar de roupa.
Mais cedo, vesti o pijama por pensar que não teria problema,
mas me senti exposta demais depois do embate com os três
ogros na cozinha. Não quero correr o risco de me sentir assim
novamente. Caso me depare com mais gente pelas próximas
horas, preciso estar mais preparada. Por hoje chega.
Por isso, coloco um vestidinho de alcinhas, com sutiã, e
espero pela chegada de Enrico.
DIAS DEPOIS
Sete noites, sete caixinhas de música.
Cada uma delas roubando mais um pedacinho do meu
coração.
Pensei que Sin tentaria me seduzir ao longo da semana,
mas ele tem cumprido sua palavra e se comportado. Exceto pelas
caixinhas, que me arrancam sorrisos e suspiros, derretendo meu
muro de gelo aos pouquinhos.
Estou a um fio de ceder e me jogar nos braços dele.
A caixinha de hoje tem o formato redondo e toca a melodia
de “You’re My Sunshine”. O bilhete, por sua vez, traz um
pedacinho da letra:
You are my sunshine, my only sunshine
You make me happy when skies are grey
(Você é meu raio de sol, meu único raio de sol
Você me faz feliz quando o céu está nublado)
Fico tão emocionada que preciso falar com ele.
Falar o quê?
Não sei.
Mas sinto que preciso.
Ao alcançar a porta do seu quarto, enxergo suas costas
tatuadas por meio segundo.
Sin está trocando de camiseta.
À sua frente, espalhadas pela cama, estão umas peças de
roupas dobradas.
Com os gestos apressados, ele passa a colocá-las em uma
mochila.
— Aonde você vai? — pergunto, entrando devagar no
recinto. Ele não responde.
— Não sei. Eu… Preciso de um tempo — murmura, sem se
virar de frente para mim. Seus ombros estão tensionados, sua
postura inteirinha rígida.
Sem falar mais nada, volta a enfiar as roupas na mochila.
Dou dois passos para trás, prestes a sair do quarto.
— Ok. Tchau, então — balbucio.
Ele se vira com tudo, me encarando.
Minha boca cai ao vê-lo tão…
Apagado.
Uma sensação elétrica corre pela minha espinha.
Um déjà-vu ao contrário, do futuro para o presente, que me
deixa em alerta.
Como se meus instintos me sinalizassem que aquele
momento era importante.
De que aquele momento poderia mudar tudo.
As palavras escapam de mim:
— Posso ir com você?
Sin franze a testa, formando um vinco entre as sobrancelhas
espessas. Sua expressão varia entre confusão e surpresa,
beirando a incredulidade.
Seus dedos tatuados mergulham nos seus cabelos
castanhos, bagunçando mais as mechas, quase arrancando os
fios.
Seu corpo permanece parado no lugar, em uma postura
estoica. Ao mesmo tempo, seus olhos estão agitados, entregando
que sua mente está girando a mil.
Quando penso que ficarei no vácuo para sempre, escuto:
— Pega umas roupas. Vamos passar a noite fora.
Sua última frase me acerta em cheio, quase me
desestabilizando. Meu Deus… O que ele quer dizer com "passar a
noite fora"?
Dormir juntos? Onde? Como? Por quê?
— Co-como assim? — Chego a gaguejar. — Explica melhor.
Ele dá passos lentos na minha direção. Sua postura agora é
outra. Não parece mais triste ou abatido como há um minuto.
Está mais animado.
Mais vivo.
Seus olhos até cintilam, acesos.
Esticando uma mão, Sin segura meu queixo entre os dedos.
— Quero te levar para conhecer um lugar. Um chalé. Fora da
cidade.
Pisco duas vezes, tentando assimilar as informações.
Dormir juntos. Em um chalé. Fora da cidade.
Isso significa que…
Ele espera que…
Façamos sexo?
— Para de pensar tanto, criatura. — Esboça um sorriso torto.
— Te convidei para conhecer um chalé nas montanhas, não para
nadar com tubarões no Pacífico.
— E esse bendito "chalé nas montanhas"... — Umedeço os
lábios com a ponta da língua. — Tem quantos quartos? Porque,
dependendo do número, Davi Filipo, talvez eu prefira os tubarões.
Seria a opção mais segura para mim, sabe?
Ele dá uma risada.
Não, ele dá uma gargalhada.
O som é delicioso, e repercute por todo o meu corpo.
— Sete. Relaxa, Magrela, não vou dar em cima de você.
Esqueceu do que falei? Sou um homem de palavra.
— Não esqueci. Você disse que só iria avançar se eu pedir.
— Se, não. Quando pedir. É uma certeza. — Dá uma
piscadinha arrogante. — Mais cedo ou mais tarde, não vai resistir.
— Tá bom, reizinho irresistível. — Bufo. — Vou lá pegar as
roupas.
Estou flutuando, mas sou pesado
E vou lhe mostrar se deixar, garota
Slow Down ~ Chase Atlantic
— Bom dia!
Acordo animada, pulando da cama para escancarar as
janelas.
Do outro lado, a visão da Serra da Mantiqueira é de tirar o
fôlego. As montanhas formam um manto verde aveludado, infinito,
me transmitindo muita paz.
Sin permanece deitado, preguiçoso, com as pálpebras
pesadas.
Volto a falar:
— Precisamos definir quando vamos voltar para São Paulo.
Hoje é segunda-feira, já estamos perdendo aula.
Me sento na beirada do colchão.
Como ele está nu, evito olhar lá para baixo para não me
distrair. Já eu estou vestindo uma camiseta de manga comprida
dele que peguei durante a madrugada quando senti frio.
— Precisamos mesmo? — Agarra minha cintura por baixo da
camiseta, me arrastando para perto, me deitando.
Seus dedos quentes me desmancham inteira, me tocando
dos seios ao umbigo. Ele me aquece o corpo e a alma.
Porém algo me incomoda lá no fundo.
Uma insegurança chatinha e persistente.
A pergunta que não quer calar grita na minha mente:
O namoro é pra valer?
Quero perguntar a ele se o pedido de namoro continua de
pé, ou se foi apenas uma loucura da madrugada, mas não sei
como o fazer.
— Precisamos, sim — respondo sobre a faculdade,
suspirando fundo. Por mim ficaria com ele no chalé a semana
inteira. Só que não dá. — Não acho certo perder aula à toa.
Me sento na cama e ele faz o mesmo. Quando estou prestes
a me levantar, segura meu pulso, acariciando minha pele.
— Magrela... Espera. Agora que estamos namorando, me
peguei pensando em uma coisa — começa, respondendo à minha
dúvida silenciosa, me deixando feliz.
O namoro é pra valer!
— Continua — peço, sorrindo como uma idiota.
Não me seguro e acaricio seu rosto, desfazendo uma ruga
de preocupação entre suas sobrancelhas.
— Temos que dar alguma satisfação para o Enrico? Sei lá,
não queria magoar o meu irmão. Não nos damos bem, eu sei, mas
me preocupo com o pentelho. Sei que ele tá cagando para mim,
mas...
— Ei... Não precisa se preocupar. Eu e ele só ficamos duas
vezes, não foi nada demais. E sabe o que mais? Enrico também
se preocupa com você. Um dos motivos que o fez sugerir sermos
apenas amigos foi precisamente você. Sabia?
— Não sabia — diz, pensativo. Coça a nuca antes de me
olhar de novo. — E tem mais motivos? Você disse "um dos
motivos."
— Tem. Ele não está na minha... Está em outra — afirmo,
fazendo Sin arregalar os olhos, surpreso. Faz menção de pedir os
detalhes, mas o corto. — Mas não cabe a mim fazer a fofoca. Se
quiser saber mais, você que converse com ele.
Nem morta que vou contar a ele sobre Paolo. E, só de
lembrar dos amassos deles dentro da Mercedes, quase solto uma
risada nervosa.
Sin vai ficar tão indignado...
— Sacanagem. Namorados não guardam segredos, sabia?
Namorados que se gostam de verdade, que confiam um no outro
— tenta me chantagear emocionalmente, mas seu sorrisinho torto
entrega que é brincadeira.
— Jogo baixo. Mas não vai me convencer. Pode desistir,
amor. Então, o que vamos fazer hoje? — Apoio o queixo no seu
peito.
— Você é quem manda.
— Nenhuma ideia? — Me deito por cima dele e encaixo as
mãos sob o queixo, sentindo seus batimentos contra as palmas.
Seus olhos escurecem um tom.
Sin leva as mãos pesadas à minha bunda, aperta as
nádegas e lambe os lábios com a ponta da língua, como se
estivesse com fome.
— Tenho uma ideia para a programação, então. Te fazer
gozar na minha boca. Posso?
Massageia a minha bunda, pressionando meu quadril mais
para baixo, em cima da sua ereção. Mordo a bochecha para não
gemer ao sentir seu volume na direção da minha calcinha.
Me remexo de leve e ele arfa baixinho, prendendo o lábio
com os dentes. Minha nossa... Minha intimidade inteira lateja,
espalhando um formigamento gostoso.
Com o rosto quente e o estômago gelado, tomo uma
decisão.
— Pode, mais tarde. Já sei o que vou querer primeiro —
sussurro, com o coração disparado. — Umas coisas… que vão te
deixar de queixo caído.
— Fala logo — diz, sem desviar os olhos dos meus. Ainda
com as mãos na minha bunda, me esfrega descaradamente
contra si.
— Duas coisas. Perder a minha virgindade. Dirigir a sua
Mercedes. Posso?
Me toque como você toca
O que está esperando?
Love Me Like You Do ~ Ellie Goulding
DIA SEGUINTE
De volta à realidade.
De volta a São Paulo, depois daquela viagem perfeita.
Viagem que mudou tudo.
Nem acredito que finalmente conquistei a minha garota...
É hora do almoço.
Me sento à mesa com Madah e Enrico.
Apenas nós três, em vez de cinco. Para variar, meu pai se
encontra na empresa. Luca, não faço ideia de onde esteja.
Ao meu redor, a conversa entre os dois flui sobre inutilidades
— filmes, séries, livros —, enquanto me sirvo de mais
parmeggiana, alheio a eles. Nunca tenho muito assunto com o
meu irmão do meio.
A nítida intimidade entre a Magrela e ele me incomoda de
leve. Mesmo porque poucas semanas atrás se pegaram e…
— Princesa, me passa a salada? — pede Enrico.
Me seguro para não xingar o otário, mas decido estabelecer
limites:
— Se você puder parar com a palhaçada de chamar a minha
namorada de princesa, agradeço.
Enrico solta os talheres com tudo, o ruído metálico
ressoando pela sala silenciosa. Completamente mudo, ele me
encara em um misto de surpresa e incredulidade, com os olhos
muito abertos, como se eu tivesse falado que a Terra é quadrada.
— Ah, ainda não tive a oportunidade de te contar, Rico… —
Madah toma a iniciativa. — Eu e Sin começamos a namorar.
Concordo com a cabeça e seguro a mão dela por cima da
mesa, abrindo um sorriso orgulhoso.
Ele olha bem para os nossos rostos, um de cada vez, indo e
vindo.
Por fim, murmura um: "Ok."
Otário.
Após o almoço, Madah pede licença, dizendo que precisa
dormir um pouquinho.
Para não atrapalhar seu descanso, eu a deixo sozinha no
seu quarto e vou direto para o meu.
De repente, escuto duas batidas na porta.
— Pode entrar! — falo, esparramado na cama.
Será que ela resolveu vir se deitar comigo?
Legal.
— Oi. — Enrico coloca a cabeça no vão da porta, arriscando
um sorrisinho sem graça.
Nada legal.
— O que foi? — resmungo, esfregando o rosto.
— Podemos conversar?
Pela sua cara de bunda, já sei que lá vem merda…
Solto um longo suspiro antes de assentir devagar,
desanimado. Aposto que terei outra dor de cabeça.
Me sento na cama, com as costas apoiadas na cabeceira, e
ele se acomoda na cadeira de rodinhas do computador.
— Fala logo — murmuro, cruzando os braços.
— Que história é essa de namoro? Pode me explicar?
— Não tenho nada para explicar a você. Estamos
namorando, é isso. Algum problema?
— É que… — Parece pesar as palavras, coçando a nuca. —
Até ontem você tratava a Madah mal pra cacete, brigavam como
gato e rato… Ok, eu percebia uma tensão sexual entre vocês,
mas… Namoro, cara? Você nunca namorou. O que está fazendo?
— Rá. Falou o expert em relacionamentos — debocho, rindo.
— Nunca pega ninguém e quer dar uma de entendido para cima
de mim? Você tá viajando, cara…
— Pois é, "viajei" ao supor que pudesse ter uma conversa
madura e civilizada com você. De irmão para irmão. Eu queria
falar o que penso sobre isso, mas pelo jeito não vale a pena…
Ok. Talvez eu não tenha sido muito maduro.
— Tá legal. Sou todo ouvidos. O que você pensa, Enrico?
— De verdade? Promete não surtar?
— Prometo. Anda logo. — Gesticulo com a mão no ar para
que ele pare de enrolar.
— Acho que você só quis "namorar" a garota porque a
flagrou comigo, e porque a viu de conversinha com o Bruno no dia
da festa. Você surtou, Sin… Enfim, acho que você a pediu em
namoro por ser egoísta, mimado, competitivo, possessivo,
qualquer merda, menos apaixonado. Vocês dois mal se
conhecem, e isso é uma puta sacanagem da sua parte.
Porra, por que ele quer estragar tudo?
— Você tá falando merda! — Meu sangue ferve tanto que
mal consigo organizar os pensamentos. — Eu a conheço o
suficiente!
— Conhece? Qual é o nome da mãe dela? Do que ela
morreu? Qual é a cor favorita dela? E o sabor do sorvete? E o
personagem de Friends preferido?
— Eu… — Esfrego o rosto, nervoso pra caralho, sem saber
uma única resposta.
— Heloise. Câncer. Azul. Baunilha. Ross.
— Foda-se! Não obriguei a Madah a namorar comigo! Se ela
aceitou, foi por que quis!
— Madah aceitou porque ela não sabe nada do mundo, cara!
Vivia presa naquele inferno, fazendo coisas que não queria, com
homens que lhe davam ânsia de vômito.
Ele se levanta, com o rosto pintado de vermelho.
Nunca tinha visto o Enrico tão irritado assim.
— Do que você está falando?
Fico em pé também, apertando as mãos em punhos,
possesso.
— Pelo jeito, não conversaram sobre o passado dela, e
aposto que não conversaram sobre o seu. — Ele se aproxima de
mim a passos lentos. — Eu sei que você já passou por muita
merda, mas ela não fica atrás. Madah não estava em uma fase
nada fácil lá no Uruguai antes de vir para cá. Vocês dois agem
como se fossem fortes e durões, mas não são. Sabe que daqui de
casa sou o mais sensato e responsável de todos, às vezes até
mais do que o nosso pai. Enfim, me preocupo com ela, e me
preocupo com você. Sim, me preocupo com os dois, por terem se
enfiado nesse namoro precipitado fadado ao fracasso. Pensa
melhor antes de dar continuidade com isso, cara… Vão acabar se
machucando. Vão acabar se machucando feio.
— Dispenso sua preocupação — murmuro a primeira merda
que me vem à cabeça, atordoado demais com tudo o que
despejou em mim.
— Uma última coisa… Todo mundo sempre passou a mão na
sua cabeça, por causa das merdas do seu passado, mas não sei
até que ponto isso te ajudou. Você tem vinte e oito anos e muitas
vezes age como um moleque de dezesseis. Está mais do que na
hora de amadurecer.
E, com essas últimas palavras, Enrico vai embora.
Ele bate a porta atrás de si, me deixando sozinho e confuso.
Mais sozinho e confuso do que nunca.
INÍCIO DO GATILHO
— Bebê, você é tão bonito. Vai se tornar um homem
maravilhoso quando crescer. E isso aqui também vai crescer. —
Uma mão mexia no meu pinto e eu nem piscava olhando para as
unhas pintadas de vermelho.
Sua outra mão segurava a minha no meio das suas pernas,
onde eu podia sentir que era quente, molhada e peluda.
Com o estômago embrulhado, me perguntei se as meninas
da minha idade eram assim também por dentro da calcinha.
Nós estávamos no meu banheiro. Ela tinha trancado a porta
ao entrar, enquanto eu terminava o banho depois de jogar bola,
me enxugando com a toalha do Pac-Man.
Sem falar nada, tirou as roupas e me puxou para o chão.
Nos deitamos no tapete felpudo ao lado da banheira e ela passou
a alisar meu corpo magro, ainda úmido, do umbigo para baixo.
Eu estava com aflição, enjoado e com o coração disparado.
Não entendia o porquê, mesmo assim, o meu pinto ia crescendo e
crescendo. Toda vez que ela começava a mexer nele acontecia
isso…
— Você não está fazendo direito. Mexe os dedos como
ensinei. Entra e sai, entra e sai…
Ela tinha me feito jurar que eu não contaria para ninguém. "É
um segredo só nosso. Tudo que vou lhe ensinar a fazer… É como
um presente que quero lhe dar. Todos os meninos da sua idade
gostariam de ganhar. Você é tão sortudo em receber."
— Tia Rita, meus pais... — Tentei fazê-la desistir.
Eu sabia que aquilo, "o nosso segredo", era errado e
nojento.
— Bebê lindo da tia… Sua mãe está dormindo pesado, seu
pai só vai voltar à noite. Continua ou vou contar para ele que o
seu boletim está cheio de notas vermelhas. — Assustado,
movimentei os dedos como sabia que ela queria, enfiando e
tirando.
— Ai… — deixei escapar, suando frio, nervoso.
— Isso... Continua, Davizinho... Ah... — gemeu comprido.
Ao mesmo tempo, estalou os dedos, o que significava que
eu não devia mais tocar nela.
Então, se inclinou sobre mim e acelerou a mão que mexia no
meu pinto, para cima e para baixo, até saírem aquelas gotinhas
esbranquiçadas.
Minha respiração falhou e eu fechei os olhos, com a cabeça
girando.
Meu coração batia mais rápido do que nas partidas de
futebol.
— Bom menino. Meu turno está acabando, mas amanhã eu
volto. — Ela se levantou e, depois de vestir a roupa branca, saiu
do banheiro.
Ela se foi, mas seu cheiro forte ficou na minha mão. Senti
ânsia de vômito e me segurei. Odiava vomitar.
Agoniado, resolvi tomar outro banho.
Fiquei pensando… Era sempre assim. Quando ela
começava a mexer em mim, o meu pinto crescia. Alguma coisa
estranha acontecia com o meu corpo, como uma descarga
elétrica. Eu sabia que era errado e me sentia sujo, principalmente
quando eu mexia nas partes dela.
Depois eu ficava inquieto, irritado, tomava outros banhos e...
Fechei o chuveiro e, pronto para me enxugar, enxerguei a
mulher parada de novo ao lado do boxe. Seus olhos brilhavam
para mim. Abraçando meu próprio corpo, tentei conter os arrepios
que me gelavam de um jeito ruim.
— Mudei de ideia, bebê. Já quero mais.
— Ah, não! Tia Rita, eu…
FINAL DO GATILHO
— Acorda, Davi Filipo! Acorda!
Sua voz doce me chamando com firmeza faz com que eu
desperte no susto.
Um pesadelo. Ou melhor, uma lembrança podre, nada bem-
vinda, que esfregou aqueles abusos nojentos na minha cara.
Aquela maldita enfermeira da minha mãe era um monstro…
— Caralho. — Me sento na cama, suado, com o coração
pulando na garganta.
Madah me observa com os olhos repletos de preocupação.
— Conversa comigo, Sin. — Ela acaricia meu braço, os
dedos delicados subindo e descendo. — O que te perturba tanto?
Quem é "tia Rita"?
— Preciso de um minuto. — Escondo o rosto nas mãos, com
a respiração forte, tentando encaixar as peças.
Nem eu me lembrava daquilo.
Aos poucos, os anos de abusos despencam sobre a minha
cabeça, me atordoando. Como se uma cortina pesada tombasse
em um palco, revelando toda a podridão por trás dela.
Dias. Noites. Cenas. Cheiros. Sussurros. Gritos. Sujeiras.
Desastres.
Tudo volta à memória. Tudo me assola.
Talvez, com a ajuda daqueles malditos remédios, meu
cérebro tivesse bloqueado o trauma e…
Agora libertei meus fantasmas.
Não tomei mais os comprimidos. Será que tem mesmo a
ver?
Agora o trauma veio à tona.
Trauma que tem nome e sobrenome, cabelos ruivos e cheiro
de hospital.
Agora tudo faz sentido.
Meu horror ao apelido "bebê". Quase vomitei quando Madah
usou a palavra comigo.
Minha antipatia às namoradas do meu pai.
Minha aversão a ruivas. Nunca quis me aproximar de
mulheres com os cabelos vermelhos. Não fui com a cara da
Bárbara desde o primeiro dia e agora compreendo o motivo.
Meu pé atrás com Enrico. Tentei contar tudo a ele no início,
mas o infeliz não ligou… Imerso no seu mundinho mágico, estava
cagando para mim.
Minha maldita tatuagem no pau. Agora sei por que a fiz…
— Pode confiar em mim… — Madah insiste. — Sou a sua
namorada, lembra? Põe tudo para fora, meu amor.
Ela quer que eu conte para ela.
Ninguém sabe de todos os detalhes.
Nem mesmo o meu pai.
Mas quer saber? Que se foda… Vou falar tudo. Seja o que
Deus quiser.
— Eu tinha onze, quase doze anos…
Respiro fundo e, deitando a minha cabeça nas pernas da
Magrela, fecho os olhos.
— Estou ouvindo — incentiva, acariciando meus cabelos, me
acalmando com os toques leves.
— Meu pai contratou uma enfermeira para cuidar da minha
mãe. Eu e os meus irmãos a chamávamos de Tia Rita.
— O que sua mãe tinha?
— Fibromialgia e depressão. Foi piorando até que chegou
uma hora que quase não saía da cama, dormindo praticamente o
dia inteiro. Às vezes, ficava tão dopada que nem me reconhecia.
— Nossa… É compreensível que isso lhe perturbe. As
lembranças devem ser pesadas.
— Não é isso — corto sua fala, abrindo os olhos. Encontro
seu olhar confuso.
Fico em silêncio, sem saber como prosseguir.
— O que é, então?
Me sinto inquieto com ela me encarando dessa forma.
Prefiro mudar de posição, me sentando na cama.
Madah faz menção de chegar mais perto, mas sinalizo com
uma mão para que mantenha distância. Ficamos os dois em cima
do colchão, sem nos encostar. Ela, abraçando os joelhos; eu, com
as pernas cruzadas.
— Vou tentar resumir. É uma história muito fodida, que eu
mesmo tinha esquecido. Ou melhor, a minha mente tinha
bloqueado. Quer mesmo saber?
— Quero. Se você quiser me contar. Não se sinta
pressionado.
— Lá vai. — Coço a barba, tomando coragem. — A
enfermeira começou a dar em cima de mim. Com o passar do
tempo, me ensinou a fazer coisas que nenhum menino deveria
fazer com uma mulher dezoito anos mais velha… Ela tinha quase
trinta e eu era uma criança… No máximo, um pré-adolescente.
— Meu Deus, ela era pedófila? — Seus olhos bonitos estão
assustados.
— Era. E o pior era que na hora eu ficava excitado. Só que
depois me sentia mal pra caralho. Sujo, sabe? Tomava trocentos
banhos. Porra, perdi a virgindade com ela.
— Caramba! Sinto muito. — Aperta os próprios joelhos com
força, aflita, à beira das lágrimas. — E ela… — Morde a boca, se
interrompendo.
— Pode perguntar, imagino que tenha mil questionamentos.
— E ela vinha aqui todos os dias? Sempre conseguia abusar
de você? Você era um menino e… Com essa idade, eu era uma
criança inocente, estudava em período integral. Você não passava
o dia na escola, amor?
— Eu estudava só de tarde. Ela vinha em casa de manhã,
cinco vezes por semana, quando minha mãe era viva. Mas nem
sempre rolavam os abusos. Só quando ela me flagrava sozinho.
Por isso, eu tentava ficar o tempo todo com os meus irmãos, mas
depois o Luca passou para o Ensino Médio e começou a estudar
de manhã. Já o Enrico, pra variar, não saía do seu mundinho,
enfiado nos livros, alheio a tudo e a todos. Ou seja, pelo menos
uma ou duas vezes por semana ela conseguia o que queria. E
essa merda começou a me prejudicar em outras coisas… Minha
concentração foi para o lixo, minhas notas caíram. Domenico se
preocupou um pouco e me levou para umas avaliações
pedagógicas. Recebi o diagnóstico de TDAH e ele relaxou,
acreditando que os remédios me colocariam na linha. Passei a ter
umas vantagens na escola, provas com consulta e etc., e minhas
notas subiram. "Fim do problema", disse ele. — Sinalizo as aspas.
— Minha nossa… Ele pensou que seu problema estava
resolvido? Seu mau desempenho na escola não era a causa. Por
Deus, era a consequência.
— Pois é, Domenico não enxerga um palmo na frente do
nariz quando o assunto são os filhos. Era a enfermeira abusadora
que me fazia mal, não a porra do TDAH, que nem sei se tenho
mesmo para falar a verdade. Ele não tem noção de nada. Escuta
só… Minha mãe acabou morrendo e depois de um tempo meu pai
veio contar que estava namorando. Adivinha quem era a nova
namorada? — Esboço um sorriso sem graça.
— Não acredito! Ela e Domenico namoraram? — Madah
está boquiaberta.
— Namoraram. Até tudo sair do controle de vez… Quer
mesmo saber?
— Quero. — Aperta os olhos, agoniada.
— Quando eu estava com treze anos, não suportava nem
que ela chegasse perto de mim. Gritava com a mulher, saía de
casa quando ela chegava, explodia mesmo. Todo mundo achava
que eu tinha raiva dela por ser a nova namorada do meu pai, que
eu não tinha superado a morte da minha mãe. Passei a ficar cada
dia mais ansioso, perturbado e agressivo. Meu pai já não sabia o
que fazer comigo… O "filho problemático".
— Espera um pouco… Só para eu entender. Como você
lidou com a morte da sua mãe?
— Eu fiquei mal, é lógico. Mas o que me transformou no
"filho problemático" não foi a morte dela, e sim o assédio da
namorada do meu pai, que não desistia de me procurar para sexo.
Nem dormir tranquilamente eu podia… Perdi a conta de quantas
vezes acordei de madrugada com ela me chupando. Eu a xingava,
a humilhava e mesmo assim a mulher não me deixava em paz.
— Que coisa horrível…
— Calma que vai piorar ainda mais. — Suspiro fundo, me
preparando para o episódio mais pesado.
— Ah, não… Mais? — Ela coloca as mãos na cabeça.
— Mais. Até que um dia a filha da puta veio com um papo de
que não iria mais insistir naquilo. Que estava cansada de ser
humilhada por um garoto que a rejeitava no sexo. Que queria ser
uma boa madrasta, se dedicar ao meu pai, cuidar da família, etc.
Eu vivia sempre tão ansioso… Já fumava cigarro há um tempo,
mas a nicotina não fazia nem cócegas. Então, ela disse que sabia
de uma coisa que iria me acalmar.
— Sei. E o que ela aprontou? — Madah pergunta, mordendo
a boca.
— Ela me apresentou ao Diazepam. Não me esqueço das
suas palavras na primeira vez que me dopou: "É como uma
picadinha de mosquito, bebê. Você vai conseguir dormir, relaxar…
Sou enfermeira, lembra? Sei o que estou fazendo. Vamos contar
até dez para a mágica acontecer. Um, dois, três…"
— Desgraçada. — Madah passa a chorar e eu paro de falar
para enxugar suas lágrimas.
Suas bochechas ficam molhadas e quase desisto da
narrativa para beijá-la. No entanto, me seguro. Já fui longe demais
e preciso prosseguir até o final.
— Vou encerrar logo. Aguenta aí, Magrela. Resumindo, a
maldita me viciou no remédio, me dopando para continuar
abusando em mim. Foi a pior época. Eu não resistia e nem
tentava fugir, muitas vezes ficava até inconsciente. Fora que eu
sabia que o meu pai também transava com ela, o que era nojento
pra caralho. Até que…
— Até que…? — Madah balbucia, enxugando as lágrimas.
— Até que um dia eu surtei de vez. Ela vivia elogiando o
meu pau e, durante o surto, meio dopado, tive uma "brilhante
ideia". Se eu não tivesse mais ele, a mulher me deixaria em paz.
O que fiz? Com a faca de cozinha, tentei me mutilar, cortar fora…
— Não! — Madah cobre a boca com a mão. — Como
conseguiu lidar com a dor?
— O Diazepam é um sedativo potente, sabia? Mexe com os
receptores do cérebro. Sei disso porque eu continuava tomando,
mas em doses controladas, até antes da viagem. Por isso a dor
não foi nada… Só que desmaiei quando começou a sangrar sem
parar, até que Enrico me encontrou quase morto no chão do
banheiro por causa da hemorragia. Só assim ele saiu da sua
bolha e finalmente percebeu que tinha algo de muito errado com o
irmão caçula.
— Minha nossa… Seus irmãos não sabiam mesmo? Ela
nunca mexeu com eles? E seu pai, nunca desconfiou dela?
— Não. Domenico só pensa em trabalho, diversão e mulher.
E, dos meninos, fui o único escolhido. O "sortudo." Talvez por ser
o mais novo.
— Faz sentido. — Balança a cabeça em concordância. — E
depois?
— Depois da tentativa de automutilação, fui hospitalizado.
Como você deve saber, salvaram meu pau, mas fiquei cheio de
cicatrizes. Anos mais tarde, tatuei por cima, cobrindo as marcas.
Fim.
— Fim? E a pedófila? Foi presa?
— Foi nada. Eu não queria sair do hospital e voltar para
casa enquanto ela continuasse morando lá. Por isso, contei por
alto o que rolou para o meu pai e os meus irmãos, mas…
Domenico apenas terminou o namoro com ela e a expulsou. É
engraçado como as pessoas não enxergam a porra da gravidade
quando a pedofilia é feita por uma mulher contra um menino. Luca
até deu risada, falando que perdi a virgindade antes, que eu era
"sortudo." Enfim, que se foda, já passou — afirmo, tentando
convencer a minha namorada.
Tentando convencer a mim mesmo.
Porque a falta de um desfecho para essa podridão é uma
merda.
Madah não concorda com a minha fala final.
— "Já passou" nada. — Ela me encara com os olhos
preocupados. — Os traumas ficam, meu amor. Mais do que
nunca, vou insistir para que faça uma boa terapia. Meu Deus…
Estou tão chocada, você...
— Sou todo fodido, eu sei.
— Não. Eu ia falar que você é tão forte! — Leva as mãos ao
meu rosto. Esboço um sorriso, apreciando o toque delicado. — É
um sobrevivente! E, agora entendo o porquê de algumas coisas.
Os pesadelos. A falta de diálogo com seu pai. O desprezo pelas
namoradas dele. A mágoa com Enrico. O medo que todos têm das
suas recaídas.
— E isso não te assusta? Sou todo fodido. Um namorado
com defeito de fábrica. Você não é obrigada a aceitar. — Pego
suas mãos, nervoso, inseguro.
Não me abandone, torço mentalmente, quase desesperado.
— Não, não me assusta. Eu também vim com defeito, mas a
minha história fica para outro dia. Nós dois fomos quebrados, meu
amor. E isso nos torna perfeitos um para o outro — declara, me
presenteando com um sorriso bonito.
Quase me desmancho em lágrimas. Porra, Madah é perfeita.
É ela.
Ao contrário do que planejei mais cedo, não vou voltar
atrás.
Nada de terminar o namoro com a Magrela.
Nunca.
Você não percebe que sinto o mesmo?
November Rain ~ Guns N’ Roses
Meu Deus...
O que será que Domenico quer comigo?
— Pois não? — Me aproximo da porta e Sin pousa uma mão
no meu ombro.
— Na verdade, eu queria falar com os dois juntos. —
Domenico empertiga as costas e enterra as mãos nos bolsos. —
Creio que me excedi aquela hora no deck. Além disso, precisei
sair às pressas e deixamos as coisas no ar. Gostaria que me
acompanhassem à mesa para acertarmos as arestas. Enfim,
vamos jantar? — pergunta, com aquela tranquilidade polida que
lhe é característica.
Não sei o que responder.
Olho de soslaio para Sin, que continua imóvel, com a
postura ereta.
O silêncio é incômodo, pesando sobre nós três.
— Aceitem o convite, por favor. Confesso que não reagi bem
à "novidade" naquele momento. Passado o susto, me permitam
melhorar os ânimos — insiste diante da nossa hesitação.
— Aceitamos — decido, abrindo um sorriso. Pelo jeito, ele
está de boa vontade. — Descemos em cinco minutos, tudo bem?
— Tudo, querida. Vou esperar por vocês na sala de jantar —
diz, indo embora.
Ufa... Me sinto aliviada por ter contornado a situação,
amenizando o clima chato.
Fecho a porta do quarto e me viro para Sin.
O homem parece perdido em pensamentos.
De repente, ele dispara:
— É verdade aquilo que disse mais cedo para o meu pai? Eu
te faço feliz? Ou falou por falar, só para se livrar dele?
Sua voz é baixa, quase frágil. Sua insegurança mais uma
vez dá as caras, o deixando instável. Droga.
Sofro com ele. Sofro por ele.
— Ah, meu amor... — murmuro, chegando mais perto.
Sin me envolve pela cintura e eu deito a bochecha no seu
peito. Seu coração bate descontrolado lá dentro.
— Davi Filipo. Quantas vezes vou ter que repetir? — Ergo o
olhar para ele. — Você me faz muito feliz! É tão difícil assim
acreditar em mim?
Me esticando na ponta dos pés, distribuo beijos leves pelo
seu rosto bonito. Mandíbula forte. Barba macia. Nariz salpicados
por sardas.
— É. Uma antiga terapeuta dizia que eu tinha problemas de
confiança. — Alisa minhas costas, sem deixar de me olhar nos
olhos. — Aprendi a esconder, a sufocar a insegurança e os
medos. Na escola, nas festas, ninguém nunca imaginou. Até que
me mostrei de verdade para você, mas... Fiquei vulnerável pra
caralho. É uma merda.
Ai, queria ser capaz de arrancar tudo de ruim que aflige seu
peito, para que consiga enxergar o quanto é maravilhoso...
— Obrigada por se mostrar a mim. Me sinto honrada, de
verdade. Todo mundo age como você por autopreservação. Por
fora, pode parecer que está tudo bem. Mas por dentro... —
Acaricio sua nuca, contornando a gola da camiseta, apreciando o
contato com a pele. — Todos levamos cargas que não mostramos
às pessoas. Algumas são mais leves, outras mais árduas. Sinto
muito que a sua seja tão pesada.
— Tenho tanta sorte. Você... — Agarra meus cabelos e
aproxima nossos rostos, apoiando a testa na minha. — Você me
faz tão bem.
Dou um pequeno sorriso, sustentando seu olhar. Posso
perceber que sua cabeça está a mil pelo modo aflito que me
encara.
— Queria poder ler os seus pensamentos — murmuro,
desfazendo o vinco entre suas sobrancelhas com a ponta do
dedo.
— E eu queria poder não pensar mais em porra nenhuma.
Me ajuda a silenciar minha mente. Me beija.
Eu o atendo no mesmo segundo. Desço as mãos pelas suas
costas firmes, nos unindo ainda mais. Nos beijamos sem pressa,
com intensidade e paixão.
Até que Sin se afasta, sem ar, abrindo um sorriso torto.
Lindo.
— Pronto. Estou bem melhor. Já posso encarar meu pai lá
embaixo. Vamos? — Faz um sinal de cortar a garganta com a
mão, deslizando a lateral do indicador como se fosse uma faca.
Imagino que se sinta mesmo como um novilho a caminho do
abate. Domenico pegou muito pesado com ele...
— Amor... — Passo a língua pelos meus lábios que ainda
formigam do beijo. — Posso dar uma sugestão? Não leve tão a
sério as críticas do seu pai. Se controle, respire fundo, pense em
coisas relaxantes para não explodir outra vez. Mostre que está
crescendo e evoluindo. Você já melhorou tanto, Davi Filipo.
— Hum, vou pensar. — Abre a porta do quarto e inclina o
tronco, exagerando de propósito no cavalheirismo.
Seguimos juntos pelo corredor, de mãos dadas, em um clima
leve e gostosinho.
— Você tem razão, Magrela. Vou tentar me comportar com o
meu pai — diz enquanto descemos a escada. — Já até sei em
que coisa relaxante posso pensar.
— Lá vem... — Sorrio ao notar um brilho diferente nos seus
olhos. Estamos entrando no hall, iluminado com o lustre chique de
cristal.
— No meu pau, na sua boceta, entrando e saindo bem
devagar. Sabe? Me enterro até o talo, depois saio quase que por
inteiro, deixando a cabecinha encaixada na portinha, entro de
novo, saio... — sussurra perto do meu ouvido, me arrepiando
inteira.
— Que delícia, digo, que pecado. — Dou risada, me
segurando para não apertar as coxas. — Se controle, Davi Filipo.
— Falou a freira. Eu queria um banho sem putaria e você
quase engoliu o meu pau. Se controle, Madeleine.
Solto uma gargalhada e, ainda de mãos dadas, entramos na
sala de jantar.
Domenico já está nos aguardando.
— Boa noite, crianças — diz, sentado na cabeceira da mesa,
erguendo sua taça de vinho.
— Boa noite — respondemos.
Me acomodo à direita do homem e Sin à esquerda.
— Tudo bem? Faz tempo que não colocamos os assuntos
em dia. Me contem sobre a faculdade. Sin continua no time de
futebol? Como andam os jogos?
— Continuo. Amanhã à noite teremos um jogo importante em
Guarulhos. Semifinal — completa, se servindo de água.
— Verdade? De manhã ou à noite? — Domenico quer saber,
parecendo interessado. Um bom sinal.
— Às oito da noite.
— Vamos ver o jogo deles em Guarulhos, Madeleine? Posso
levá-la de carro. Sin deve ir de ônibus com o time.
A pergunta de Domenico me pega de surpresa.
Quero muito ver o jogo, só se fala disso na faculdade, mas
tenho medo de atrapalhar de alguma forma... Sei que o jogador
pode se sentir mais pressionado quando tem namorada ou família
na torcida.
Além disso, não desejo parecer grudenta, impondo minha
presença, me convidando para ir.
— Boa ideia. Se ela quiser ir... — Sin olha para mim. —
Queria mesmo que você fosse, Magrela. Mas ficar sozinha na
arquibancada é um porre... Por isso, se puder mesmo ir, pai,
agradeço.
— Você quer ir comigo, querida? — Domenico pergunta e eu
assinto. — Então, está decidido. Nós vamos.
E, pelos próximos minutos, conversamos sobre assuntos
banais enquanto nos servem o jantar. Pai e filho não se
estranham mais nenhuma vez.
Aleluia.
Não, o amanhã não nos é prometido
Então, vou te amar como se fosse te perder
Like I'm Gonna Lose You ~ Meghan Trainor feat. John
Legend
Estou na sala de espera com Marco e Enrico, que não deve mais
ter unha para roer. Meu amigo está um caco.
— Eu tinha que ter ido procurá-lo mais cedo... — Rico sopra as
palavras, destruído. — Ele saiu para fumar, não voltou... Estava bravo
comigo, preferi dar um tempo para se acalmar. Quando finalmente fui
atrás... Tarde demais.
Fica se lamentando, sem parar, e eu não faço perguntas. Ele não
está em condições de conversar agora.
— Parentes de Paolo Fontini? — Uma voz masculina ressoa pelo
ambiente frio.
— Aqui! — Marco levanta o braço, acenando para o médico
grisalho.
Quando ele se aproxima, ficamos todos em pé. O bordado no
jaleco indica seu nome: Dr. Érico Novaes.
— Serei direto. Tenho uma boa e uma má notícia. Primeiro, a
boa. Conseguimos estabilizá-lo, mas por pouco tempo. O paciente
perdeu muito sangue e precisará de uma transfusão com urgência. E
essa é a má notícia... Seu sangue é um dos mais raros de todos. Não
o temos em estoque. Sem ele, em poucas horas perderemos o
paciente.
Levo um choque com as palavras, percebendo Marco estremecer
do meu lado.
— E não podem trazer as bolsas de outros hospitais...? —
balbucio.
— Já ligamos em todos os hospitais parceiros. Ninguém tem esse
sangue e...
— Que sangue? — Marco intervém. — Sou irmão dele, posso
doar!
— Isso é bom. Vamos testar o seu sangue para verificar a
compatibilidade. Paolo tem o chamado Falso O, também conhecido
como Bombay ou Bombaim. É herdado geneticamente de um dos pais.
— Talvez seja do meu pai. A merda é que ele está trabalhando
fora do país. Já telefonei para contar o que houve e me garantiu que
voltaria no primeiro voo, só que deve demorar mais de um dia...
— Não temos tanto tempo, infelizmente — diz o médico, em um
tom grave. — Vamos torcer para que você seja compatível, rapaz.
— Posso me oferecer também para o teste de compatibilidade?
— Enrico aperta as mãos em oração, desesperado. — Vai que...
— Sim. Porém é praticamente impossível que alguém que não
seja da família apresente o sangue Falso O. Pelo que me lembro, há
apenas uma dúzia de famílias no país com esse sangue.
— Eu me ofereço para o teste também — digo, tentando ajudar.
— Ótimo. — Assente o médico. — Vamos pegar as amostras de
vocês três.
Minutos mais tarde, na sala de espera da UTI, aguardamos o
resultado em um silêncio tenso.
Sin e Domenico já estão conosco, as expectativas à flor da pele.
De repente, o médico passa pela porta, sorridente, balançando
um papel no ar.
— Boa notícia! Temos uma compatibilidade! — avisa, sorrindo, e
Marco já se levanta.
Respiro fundo, aliviada.
Agora é torcer para Paolo ficar bem e...
— Você, não. — O médico gesticula para que ele se sente de
novo. — Você. Venha, garota. Vamos fazer a transfusão agora mesmo.
Eu?!
Me levanto em um pulo, com os olhos arregalados.
Ao meu redor, todos parecem em choque, menos Domenico.
O homem fica em pé e, sorrindo, aperta meu ombro em um gesto
amistoso.
— Vamos logo. — O médico me chama e eu o sigo, quase
cambaleando. Estou completamente entorpecida, sem entender nada.
— Pai, o que você sabe que nós não sabemos? — Escuto Sin
perguntar. — Você nem ficou surpreso com o resultado...
— Tio Domenico? — Marco está com a voz instável.
— É uma longa história. Marco, eu queria esperar o retorno do
seu pai para confirmar a hipótese com um teste de DNA, mas... As
circunstâncias não permitiram isso. Enfim, tudo indica que Madeleine é
filha de Giuliano. Você tem uma irmã caçula.
Faça-me sentir que estou respirando
Sentir que sou humano
A Little Death ~ The Neighbourhood
DIAS DEPOIS
Meu Deus... É hoje que me mudo para a casa de Giuliano.
A casa do meu pai, onde passarei a viver, com ele e meus
irmãos.
Sentada no banco do passageiro da Branca, estacionada em
uma das vagas para visitantes da mansão Fontini, sinto a
apreensão me corroer.
Ainda sem coragem de descer do carro, agarro a mão do
meu namorado, percebendo que está tão fria quanto a minha.
Com a mão livre, Sin mexe no som, colocando a "nossa"
música, “Patience”, do Guns N’ Roses.
Ele joga a cabeça para trás, suspirando fundo.
Minha mudança de casa não será fácil.
Nem para mim, nem para ele.
Não falamos nada no curto trajeto da casa dele até aqui. Seu
olhar fixo à frente e sua mandíbula travada refletem sua
insatisfação. Pelo menos não tentou me convencer a mudar de
ideia.
Nós dois sabemos que isso é o certo e, portanto, temos que
nos resignar.
É apenas uma questão de tempo... Logo vamos nos
acostumar com a nova realidade. Nosso namoro vai prosseguir,
cada um morando na sua casa, como a esmagadora maioria dos
casais universitários.
Com a voz de Axl Rose quebrando o silêncio e nos
lembrando de que é preciso ter paciência, fecho os olhos para me
acalmar, relembrando os últimos acontecimentos.
No dia anterior, saiu o resultado do teste de DNA que, como
já esperávamos, deu positivo. Sin estava sentado do meu lado,
junto da mesinha do computador, quando acessei o site do
laboratório. Com os dedos trêmulos, digitei o número do protocolo
e a senha, e depois aguardei a tela carregar por dois segundos
que pareceram uma eternidade.
Com o coração latejando nos ouvidos, eu nem conseguia ler
as primeiras linhas, que começavam com: "A investigação
genética etc.", focando meu olhar no retângulo vermelho com a
palavra mais importante em destaque: POSITIVO.
Eu e Sin soltamos o ar juntos, sem falar nada. Senti sua mão
firme na minha cintura, arrastando minha cadeira para mais perto.
— É isso, Magrela. Você vai embora — disse, com a voz
triste.
— Ei, está tudo bem... — Virei para ele, tentando sorrir,
disfarçando a angústia e o medo que apertavam meu coração. —
Vamos morar pertinho, vai dar tudo certo... Sempre virei aqui, e
você poderá ir lá.
— Fazer o quê? — resmungou, esboçando um sorriso
desanimado. — Não vejo a hora de me formar, trabalhar na
empresa e te pedir em casamento.
— Casamento? — repeti, sorrindo de canto a canto.
Minha nossa... Ele realmente fazia planos para a gente.
Para o nosso futuro.
— Por que a dúvida? Não disse que você é o amor da minha
vida? E você não falou que sou o amor da sua? — pergunta com
a característica nota de insegurança.
— Dúvida nenhuma. Davi Filipo. Você é a minha certeza.
Mas tudo a seu tempo, meu amor. — Uni nossos lábios em um
beijo simples.
Em seguida, ele me puxou para um abraço e, quando soltou
o ar quente com o nariz roçando no meu pescoço, quase torci
para que já estivéssemos formados e empregados, e já
pudéssemos nos casar.
Ter a nossa casa, a nossa vida.
Uma coisa de cada vez, Madeleine. Uma coisa de cada vez.
Algum tempo depois, Paolo me chamou no celular,
mandando uma selfie com Giuliano, os dois sorridentes apontando
para o computador, com o resultado POSITIVO aberto na tela.
“Bem-vinda à família Fontini, irmã!”
Respondi no mesmo instante:
“Obrigada! Pelo jeito já está em casa?”
“Sim, saí daquele hospital chato. Ei... Fiquei sabendo
que me deu o sangue. Obrigado.”
Seu agradecimento acalmou meu coração aflito, o deixando
mais quentinho.
“Irmãos servem para isso...”, digitei, sorrindo.
“Vamos comemorar a sua chegada e a minha alta
hospitalar! Festinha aqui?”
“Só se a minha banda preferida tocar.”
“Fechado! Fala para o arrombado do seu namorado
trazer o contrabaixo”, respondeu, me arrancando uma
gargalhada.
“Não fala assim dele! É seu cunhado em dose dupla.”
“Então. Se cunhado fosse bom, não começava com cu!”,
e se despediu.
A lembrança daquela sua piadinha ridícula me faz rir.
— Rindo do quê, Magrela? — Sin pergunta, me trazendo de
volta para o momento presente. — Vai, vamos lá... Chega de adiar
o inevitável.
Ele toma a iniciativa de sair da Branca.
Dá a volta e abre a porta do passageiro, estendendo a mão
para mim. Seu olhar está arrasado.
— Vamos. — Solto o ar devagar, aceitando sua ajuda para
descer do carro.
Sin pega no banco de trás minha pequena mala e seguimos
até a frente da casa em silêncio, de mãos dadas.
Com a mão livre, aperto contra o peito a bolsa com a minha
mais preciosa coleção: as caixinhas de música que ganhei de Sin
tempos atrás. É a única coisa que eu faria questão de salvar em
um naufrágio, entre todos os meus pertences.
— Buongiorno! — Giuliano nos cumprimenta, sentado nos
degraus sob o alpendre. — Lindo domingo, não? Vi a Mercedes
estacionar na vaga para visitantes. Sabia que eram vocês.
— Boa tarde. — Não consigo falar mais nada.
Meu namorado murmura um cumprimento qualquer, sem me
soltar.
Giuliano se levanta e aperta a mão de Sin.
Depois, se vira para mim, me abraçando apertado. Meu
Deus... Está mesmo acontecendo. Me sinto deslocada, perdida,
confusa.
— Bem-vinda, Madeleine. — Afasta o corpo, sorrindo. —
Estou muito feliz com a sua chegada. Vamos entrar?
Concordo e ele educadamente pega minha mala da mão de
Sin, enganchando a alça no antebraço. Com a outra mão, abre a
porta da casa.
— Obrigada. E eu estou feliz por estar aqui — digo,
brincando com uma mecha do cabelo.
— Gosto de saber! — Sorri, espiando o relógio de pulso. —
Já são quase três e meia. Vamos subir para que escolha um dos
quartos. Depois, podemos tomar um café. Domenico disse que
chegaria umas quatro horas. Ele acabou de pousar em Guarulhos
e vai vir direto para cá.
Giuliano segura a porta aberta e nos dá passagem, falando
sem parar, agitado.
Ele engata o assunto:
— Paolo está ansioso para a festa. Não parou quieto o dia
todo, enfiado na bagunça do estúdio, testando os aparelhos de
som. Nem parece que esteve internado até ontem. Trouxe o
contrabaixo, Davi? Se não me engano, os convidados vão chegar
a partir das seis.
— Trouxe. Deixei na Branca, depois pego — responde,
subindo a escada atrás dele, sem sorrir.
— Viram a nota que saiu da coluna social? Você está
famosa, Madeleine! Todo mundo já sabe sobre a festa de boas-
vindas da nova integrante da família Fontini — Giuliano fala com
os olhos brilhantes, se voltando para mim.
Ele parece estar se esforçando para me agradar, mas
sinceramente não aprecio a ideia de aparecer em coluna social.
Aposto que virão fotógrafos para a festa, e sei que a atenção
exagerada me deixará sem jeito.
— Nota na coluna social? Pensei que fosse preferir mais
discrição. Por causa da tia... — Sin aponta, se referindo à falecida
esposa do homem, traída há tantos anos.
Sim, sou fruto de um adultério. A sensação é esquisita,
mas... Me recuso a sentir culpa por isso. Meus pais se envolveram
porque quiseram, anos antes que eu existisse. Não sou a causa
das suas decisões. Sou a consequência delas.
— Infelizmente, ela não está mais entre nós. — Ele para de
andar no corredor. — Não podemos nos prender a quem já se
foi... Precisamos celebrar a vida.
Ele parece mais apagado, triste, com os olhos baixos.
— Sinto muito pela sua perda... Giuliano — murmuro, sem
conseguiu chamá-lo de “pai”.
Não sei dizer se algum dia serei capaz de o chamar pela
palavra que, embora pequena, carrega um significado enorme.
— Obrigado. Já estou acostumado... Mas agora ganhei uma
filha. — Esboça um sorriso triste. — Temos dois quartos de
hóspedes desse lado e dois daquele outro. Vamos vê-los?
Dizem que estou enlouquecendo
Somebody To Love ~ Queen
UM MÊS DEPOIS
Finalmente, as coisas estão entrando nos eixos. Meu pai se
recuperou do ferimento à bala, ao contrário da desgraçada da
Rita, que não resistiu ao acidente de carro e morreu.
Ainda me lembro do calafrio que senti ao receber a notícia
de Enrico. Admiti:
“Eu que sou o responsável pela morte, Rico. Não foi um
acidente. Soltei o cinto de segurança dela, pisei no acelerador e...
Porra. Ela queria bater o carro para que a gente morresse junto!
Isso que fiz foi muito errado? Não sei o que pensar.”
Ele apertou meu ombro e disse:
“Não. Pode parar com isso, Sin. Você fez o que tinha que ser
feito. O lugar dela é no inferno.”
Enrico me tranquilizou e tentei não pensar mais no
acontecimento. Quem diria que o caos daquele dia me
aproximaria tanto do meu irmão? Hoje somos amigos, como
nunca fomos na vida.
Pelo menos algo de bom saiu daquela maldita confusão.
Aliso a camisa antes de tocar a campainha, me remexendo
inquieto, em expectativa.
— Meu Deus... — Madah me olha espantada ao abrir a
porta.
Ainda não me acostumei com ela morando nessa casa, mas
aqui é o lugar dela. Afinal, é uma Fontini.
— "Meu Deus", não. "Meu namorado" seria o mais
adequado. — Sorrio torto, enfiando uma mão no bolso.
Seus olhos se apertam levemente por causa do sol atrás de
mim, mas ainda assim posso vê-la me secar da cabeça aos pés.
Estou todo de preto, com um paletó por cima da camiseta.
— Caprichou, hein... Nunca te vi assim, Davi Filipo. — Sorri
contente, disparando o meu coração. Não sei como é possível,
mas eu a amo cada dia mais.
Com um vestido claro, branco, a Magrela exala feminilidade
e leveza.
Eu de preto, ela de branco.
Os opostos que se atraem, se completando com perfeição.
— Linda. — Dou um beijo simples nos seus lábios,
segurando sua mão. — Vamos?
É noite quando chegamos ao nosso destino. Assim que
desligo o motor da Branca, arrasto Madah para o meu colo.
Seu vestido delicado sobe e ela rapidamente puxa a barra
para baixo, a alisando.
— Sin! Vai me deixar toda amassada! — Dá risada, sentada
de lado nas minhas pernas. — Queria ficar com a roupa impecável
para o nosso primeiro jantar. O que as pessoas grã-finas vão
pensar...?
Aponta para a fachada do Figueira Rubayat, restaurante que
escolhi para o nosso encontro. Não foi fácil conseguir as reservas
em cima da hora, em pleno sábado à noite, porém a minha nova
"madrasta", Audrey, já trabalhou como hostess aqui e tinha os
contatos certos.
Pela primeira vez na vida, Domenico arranjou uma namorada
decente, gentil e inteligente, que não dá em cima de mim ou dos
meus irmãos.
— Você é linda de qualquer jeito, Magrela. — Ataco seu
pescoço, beijando sua pele quente, subindo os dedos pela sua
coxa. — Amassada ou não. Fodam-se os grã-finos.
Beijo sua boca, enfiando a língua possessivamente, sentindo
seu gosto quente. Com a outra mão na sua nuca, puxo seus
cabelos macios, liberando das mechas o familiar aroma de
caramelo que senti naquele primeiro dia.
— Ainda não entendi o porquê do convite para o jantar, todo
formal. Ai... — geme quando alcanço sua calcinha. E, em vez de
reclamar, a safada abre mais as pernas, me roubando um sorriso.
— Porque eu te amo. E porque eu vi a sua cara de cachorro
sem dono quando o meu irmão contou que Paolo o levou para
jantar fora. — Passo a subir e descer os dedos pela renda da
calcinha, gostando de sentir a umidade da sua boceta. — Vamos
dar uma rapidinha agora? De aperitivo. Depois do jantar a gente
vai ficar com preguiça.
— Aqui? Davi Filipo, é um estacionamento movimentado...
— Os vidros do carro são filmados e estamos de frente para
o muro. Ninguém vai ver nada. — Escorrego dois dedos por baixo
do elástico da calcinha, acompanhando a bordinha da renda, de
cima a baixo, percebendo sua lubrificação escorrer. — Me lembrei
de que um dia você falou que queria cavalgar no meu pau...
Chegou a hora.
Lá no comecinho, quando a gente só se estranhava, sua voz
provocadora me soprou: "Admita que morreu de ciúmes. Admita
que me deseja. Admita que não consegue parar de pensar em
mim. E, talvez, se admitir tudo isso, quem sabe eu não possa
cavalgar no seu pau."
Foi na noite da primeira festinha com a Magrela em casa e,
na época, eu a tratava mal pra cacete. Fora que ela me provocava
e eu surtava. Um círculo vicioso fodido.
Respiro fundo, sentindo um puta alívio ao perceber que
aquela merda ficou para trás. A única coisa que não mudou foi o
desejo que sempre senti por ela.
— Espera. Amor... — Madah começa, mordendo o lábio,
pensativa. Tiro a mão da sua boceta para prestar atenção no que
vai falar. — Eu me lembro de falar em cavalgar... Só que naquele
dia eu te detestava. A gente ainda vivia como gato e rato. Mas...
— Mas...?
Madah se remexe para descer a calcinha, se sentando de
frente para mim, um joelho de cada lado das minha pernas, com o
olhar cheio de malícia.
— Eu fugia de você, mas, no fundo, já queria me pegasse de
jeito — confessa.
Sem tirar os olhos dos meus, leva as mãos aos botões da
minha calça, fazendo a familiar onda de tesão subir pela minha
coluna.
— E eu fugia de você, mas, no fundo já queira te pegar. —
Agarro sua cinturinha fina, sorrindo com seu vai e vem,
esfregando sua boceta no meu volume. Me animo ao perceber
que ela tinha topado o sexo de aperitivo. — Mudou de ideia,
safada? Sou irresistível, pode falar.
— Não vou transar por causa disso — diz, levando uma mão
ao meu pau que pulsa de tão rígido. — Ok, você é mesmo
irresistível, amor. Porém tenho um motivo ainda mais forte.
— Que seria...? — Mordo o lábio quando passa a me
punhetar devagar. Porra, mãos de fada...
— Transar na sua Branca. É um evento raro. Só fizemos
uma vez até hoje. — Acelera a punheta, me deixando ainda mais
duro. — Me deixa contar para o Rico? — Dá risada, sem parar de
me masturbar.
— Caralho, Magrela. Conta para quem você quiser. Bota no
jornal se preferir. — Ergo a bunda para me livrar das calças e da
cueca, as chutando para o chão. — Pronto. Pode sentar.
Abro um pouco os joelhos, descendo as mãos da sua
cinturinha até os ossinhos dos seus quadris.
— Amor... Eu ainda não tenho muita coordenação assim, por
cima. Me ajuda? — pede, encaixando a cabeça do meu pau entre
seus lábios íntimos melados, se mexendo de leve para ajeitar a
posição.
— Pode deixar. Só... Desce. — Aperto os olhos ao sentir
meu comprimento ser engolido pela sua boceta quente,
escorregando lentamente, arrastado até o final. — Puta que pariu!
— Espera, deixa eu me acostumar — sussurra, mordendo o
lábio. — Me sinto empalada! — Ri, me arrancando um sorriso.
Com as mãos nos seus ossinhos, eu a mexo para os lados,
ainda todo enterrado nela, extasiado com a sensação das suas
paredes internas me pressionando.
— Preparada? — pergunto, com o coração batendo rápido.
Ela assente com a cabeça e eu passo a erguer e descer o
seu peso-pena em um ritmo preciso, me arrepiando ao entrar e
sair da sua boceta.
— Que delícia... — Ela sorri, me encarando com as pupilas
dilatadas. — Quero fazer sozinha, me solta.
Tira as minhas mãos dos seus quadris, as posicionando nos
seus seios.
Madah começa a se impulsionar para cima e para baixo
enquanto brinco com seus biquinhos, que ficam tão duros que
quase furam o tecido do vestido.
O calor, os olhos fixos nos meus, os sons molhados de entra
e sai, a maciez dos seus peitinhos, o roçar das nossas peles
quentes das coxas... Puta merda.
— Estou quase, amor... — avisa, ofegante.
Desço mais uma vez as mãos até seus quadris, acelerando
a movimentação, socando com força, quase brutalidade, nos
tirando de órbita.
— Caralho! — Me arrepio inteiro com seu orgasmo. Gozo um
segundo depois dela, ejaculando forte, sem parar, com o corpo
todo sensível, entorpecido. — Te amo, porra!
— Te amo mais. — Ela se inclina, me dando um beijo
simples nos lábios, misturando nossas salivas e nosso suor.
Eu a puxo para um abraço, sentindo nossos batimentos
descontrolados no peito.
Ficamos parados assim por um tempo, sem falar nada, ainda
encaixados.
Depois, ligo o ar-condicionado para desembaçar os vidros e
pego um pacote de lencinhos no porta-luvas.
— Pode sair — digo, dando um beijo casto na sua testa. —
Já peguei lencinhos para você.
Eu a ajudo a se sentar no banco do passageiro.
Madah se limpa antes de reposicionar a calcinha e ajeitar o
vestido. Me arrumo também em silêncio.
— Ai, estou com as pernas doloridas. — Massageia as coxas
finas.
— É falta de exercício. Você é preguiçosa pra caralho. Em
vez de fazer musculação comigo, fica lá perdida com seus livros
no celular. — Abro o espelhinho e passo as mãos pelo cabelo. —
Livros de putaria que eu sei... Uma falta de vergonha.
— Me deixa! — Ela gargalha. — Fazer eu posso, ler não?
Então é melhor a gente não praticar mais essa “falta de
vergonha”.
Touché. Me fodi, caindo na risada.
— Nem inventa. Você não conseguiria me negar, Magrela.
— Para a sua sorte, não mesmo. — Madah termina de
retocar a maquiagem e pentear os cabelos. — Pronto. Podemos ir
para o restaurante.
— Ainda não — digo, abrindo o compartimento na lateral do
meu banco, perto do câmbio. — Falta uma coisa.
Ela arregala os olhos ao me ver puxar uma caixinha preta.
Entrego o objeto a ela, que o pega com os dedos trêmulos.
Sorrio de lado, observando sua reação ao analisar as
alianças de compromisso com a palavra Patience gravada nelas.
— Mandei fazer as alianças para a gente há um tempinho.
Demorou para ficarem prontas... A joalheria não tinha a pronta-
entrega porque seu dedo é fino como o de uma criança. Gostou?
Tagarelo, um pouco nervoso com seu silêncio. Madah
simplesmente não abre a boca, parecendo em choque olhando
para a caixinha.
— Ei... Fala alguma coisa. — Toco no seu queixo, erguendo
seu rosto delicado.
Meu coração pula ao ver os seus olhos cheios de lágrimas.
— Davi Filipo. — Ela ri, piscando devagar, derrubando uma
lágrima solitária. — Se eu gostei? Isso foi a coisa mais linda do
mundo... Eu te amo, tanto!
Com o olhar emocionado, Madah põe a sua aliança e me
entrega a minha. E, assim que a deslizo pelo meu dedo, a minha
namorada agarra meu pescoço, me beijando com devoção.
Sorrio sem quebrar o beijo. Depois, com nossas testas
unidas, respondo sua declaração, com o coração batendo feliz.
Em paz.
— Eu te amo mais, Magrela. Para sempre.
FIM
Não posso evitar me apaixonar por você
Can’t Help Falling in Love ~ Elvis Presley
A reunião é um sucesso.
Adam gosta da nossa proposta de serviços de tecnologia e
logo assinamos o contrato, com o respaldo dos advogados, o
nosso e o dele.
Depois que o nosso advogado sai, continuamos na sala,
batendo papo por horas. Eu, Adam e Johnny. Até combinamos de
sair para um bar qualquer dia desses.
Mais tarde, estou pronto para comemorar meu aniversário
com Madah.
Dentro da Branca com a minha garota, antes mesmo de dar
a partida no motor, ligo o rádio e o som do Guns, tocando “Sweet
Child of Mine”, me deixa ainda mais animado.
— She's got eyes of the bluest skies, as if they thought of
rain... — Cantarolo, arrancando um sorriso bonito da Magrela. —
Lembra...?
— Lembro. Você cantou para mim na noite do nosso primeiro
beijo — diz, reflexiva, olhando pela janela.
— Uma moeda pelos seus pensamentos. — Levando a mão
ao seu rosto, acaricio sua bochecha.
— Nada demais. Só estou... — Me encara com os olhos
brilhantes. — Sei lá... Está tudo tão bom. Sabe? Estou feliz. É
isso. Te amo.
— Sei. — Me inclino na sua direção, passando lentamente a
língua pelos meus lábios.
Ela entende o recado e me puxa para mais perto, me
presenteando com um beijo calmo, cheio de emoção.
— Eu também estou feliz, Magrela. Te amo.
Não há dúvida, você está no meu coração agora
Patience ~ Guns N' Roses
[1]
Che cavolo: expressão em italiano que demonstra descontentamento. Literalmente, a
palavra “cavolo” quer dizer “repolho”, mas na expressão ganha outro sentido. “Che
cavolo” seria “que droga”, “porcaria”.
[2]
Fonte: https://brasil.elpais.com/brasil/2021-03-23/homens-e-meninos-tambem-sofrem-
abuso-sexual-eles-estao-aprendendo-a-pedir-ajuda.html