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enquadrado
bem na minha visã o periférica.
Será que eu poderia trabalhar em um estú dio de tatuagem?
Pensei por um segundo sobre o ú nico outro lugar de onde eu tinha
recebido um e-mail de retorno, e a vaga de garçonete no clube de strip
nã o era exatamente atraente. Eu tinha uma amiga que trabalhava em
um salã o depilando as partes íntimas das pessoas. O que era visto nã o
podia ser desvisto, ela me disse uma vez.
Entã o, sim. Eu poderia. Nã o tinha escolha.
— Você é a garota do Sonny? — a profunda voz de barítono
perguntou do fim do corredor, no ritmo do guinchado baixo de botas no
piso de ladrilho.
Meio que aconteceu em câ mera lenta. Virando. Ficando cara a cara
com ele.
Devo dizer que a primeira ― e ú nica ― vez que vi Dex Locke havia
sido na semana anterior, no Mayhem.
Sonny tinha me arrastado para o bar por pura manipulaçã o. Eu
acabara de chegar em Austin, nã o fazia nem duas horas.
E, provavelmente, nã o ajudava que eu meio que… tinha ido sem
avisar.
Foi uma viagem de ú ltima hora. Até o instante em que entreguei as
chaves do meu apartamento, nã o tinha certeza do que exatamente
estava fazendo. Nã o que houvesse muitas opçõ es. Poderia ir de carro
até a casa de Sonny no Texas ou rumar para o norte e morar no sofá da
casa de Lanie, em Cleveland. Depois de ter morado com ela por um ano
e sabendo que ficaria com ela e seus pais, ir para a casa de Sonny nã o
parecia uma decisã o difícil.
Era inevitável.
Mas, por outro lado, meus pais haviam me mantido na Costa Leste
por um motivo. Uma razã o que eu estava claramente jogando no lixo e
possivelmente tocando fogo.
— Vai ser divertido — ele tinha me dito a princípio. — Muitas
pessoas se lembram de você de quando era criança — ele continuou,
sabendo que eu era louca por ele.
Sonny queria me convencer de alguma coisa, porque nã o parava de
tagarelar.
— Só porque você viveu na Fló rida nã o significa que nã o nasceu
aqui.
Como uma idiota, e porque eu amava Will e Sonny na mesma
medida, mesmo que ele fosse apenas meu meio-irmã o, eu me apaixonei
por essa ideia. Nó s havíamos nos arrastado para o Mayhem para que ele
pudesse me dar as boas-vindas ao seio da família da qual eu havia sido
separada.
Durante o trajeto, eu só havia pensado na minha mã e. Era uma
bênçã o ela nã o estar por perto para me estrangular com as pró prias
mã os, sorrindo durante todo o processo de me sufocar até a morte.
Surpreendentemente, foi tudo bem.
O Mayhem era enfumaçado e tinha um leve cheiro de mijo e um
cheiro nã o tã o leve de cerveja. O lugar era velho, com balcõ es
manchados e pisos de madeira desgastados que tinham visto décadas
melhores. Mesas de sinuca posicionadas do outro lado do bar
cheiravam a… sim, aquilo era maconha. Eu tinha certeza ― apenas cerca
de 99% de certeza ― de que era ilegal fumar lá dentro, mas nã o ia
reclamar da abundâ ncia de homens tatuados e com coletes de couro
que lotavam o recinto.
Como um pavã o orgulhoso, Sonny havia me acompanhado pela pista,
por entre multidõ es de pessoas que beiravam a condiçã o de chapados e
foi classificando aquela cena ridícula. Barulhento, extrovertido,
espalhafatoso, jovem, velho, peludo, nã o tã o peludo, tatuado, nã o tã o
gordo. As características que definiam os integrantes do MCFV
variavam em todo o espectro.
Depois que fui direcionada para um banquinho no meio do bar,
Sonny e seu amigo muito loiro, muito paquerador e muito barbudo,
Trip, vieram e ficaram um de cada lado meu.
Era um pouco estranho, eu acho. Durante a infâ ncia e a adolescência,
tinham sido apenas Will e eu. Sendo a mais velha, sempre cuidei do
meu irmã o; era a pessoa que ameaçava arrancar ó rgã os pelos orifícios
se alguém nã o o deixasse em paz. Eu tinha sido a protetora. Aquela que
limpava sua bunda quando ele era muito pequeno para fazer isso
sozinho sem se sujar mais de cocô do que limpar.
Entã o, ter Sonny por perto, preocupado que seus amigos se
aproximassem demais ou me dessem olhadas de que ele nã o gostava,
era estranhamente bom.
Eu mal estava sentada lá fazia um minuto, um minuto inteiro,
solitá ria e minú scula em um bar que tinha sido tã o fortemente
defumado ao longo dos anos que o cheiro escorria da madeira como
suor em um atleta profissional. Um bar que pertencia a um grupo de
pessoas perto do qual meus pais nã o queriam que eu fosse criada. Um
total de sessenta segundos antes que a multidã o barulhenta explodisse
em gritos bem perto da porta.
Trip resmungou, lançando um olhar de soslaio para Sonny,
balançando a cabeça como se o que quer que estivesse acontecendo
fosse notícia antiga.
— Tem alguém de chico.
— Para de ser tã o dramá tico, ele nem sempre está de TPM. — Ele me
deu uma olhada. — Sem ofensas.
Levantei as mã os e dei de ombros.
— Ah. — Eu seria hipó crita se dissesse que nã o virava um zumbi
mal-humorado quando estava menstruada.
Trip revirou os olhos com o comentá rio do meu irmã o.
— Só estou dizendo, Son, que já era de se esperar que ele estivesse
de boa a essa altura. Nã o ensinam coisas melhores do que contar até
dez naquelas aulas que ele teve que fazer? — Ele riu, olhando por cima
do meu ombro. — Babacã o.
Minha vadia bisbilhoteira interior se animou com todas as pistas que
eles estavam deixando. Aulas de controle de raiva?
— O que aconteceu? — perguntei em um sussurro conspirató rio.
— Está tudo bem, Ris. — Sonny lançou a Trip um olhar irritado. —
Ele teve problemas de raiva há muito tempo. Agora ele está bem.
— Nã o sei de quem vocês estã o falando. — Com certeza, o homem a
quem eles estavam se referindo nã o tinha “Problemas de Raiva” tatuado
na testa. Eu nem o tinha visto ainda.
— Dex.
Pisquei sem entender, mesmo com a explicaçã o de Trip.
— Locke? — ele disse como se isso significasse algo para mim. Nã o
significava.
Sonny segurou o topo da minha cabeça e balançou.
— Nã o se preocupe com isso, garotinha. Tenho certeza de que vou te
apresentar para ele uma hora ou outra.
Naquela época, pensei comigo mesma que nã o era como se eu
realmente me importasse se conheceria ou nã o alguém que estava
constantemente zangado.
Ombros e peito.
O cara, de alguma forma, era todo mú sculos, trapézio e peitorais
elegantes quando o vi pela primeira vez de perto. Uma camiseta preta
justa com decote em V esticada sobre ombros largos, mal escondendo
duas mangas completas de tatuagem chamativas que subiam do pulso e
desapareciam sob a camisa justa.
Isso por si só já me provocou uma leve morte cerebral, embora eu
devesse ter pensado melhor antes de deixar meus hormô nios correrem
desenfreados. Eu realmente nunca tinha tido uma opiniã o muito
definida sobre tatuagens serem ou nã o um grande obstá culo quando eu
desejava um cara, mas… pelo calor que subiu pelo meu pescoço, eu era
fã . Estava distribuindo ingressos para a temporada.
Continuei olhando enquanto ele reduzia a distâ ncia entre nó s, uma
pasta portfó lio enfiada sob um braço longo e musculoso que chamou
minha atençã o para os centímetros de pele colorida de vermelho que o
decote da camiseta mostrava tatuados no peito. No Mayhem, eu estava
muito longe naquela loucura para ver mais do que apenas manchas de
cor só lida na sua pele.
Puta merda.
Eu deveria ter ficado feliz pelo boné esconder seus traços faciais no
bar e eu ter tido tempo de apreciar a magnificência que era a parte
superior do seu corpo tatuado, sem a distraçã o adicional de um rosto
que fazia meus ová rios gritarem glória, glória, aleluia. Seus ombros
largos e antebraços com veias grossas eram mais do que suficientes
para fazer uma garota ficar olhando. Porque o rosto dele… Jesus, putz.
Jesus. Putz.
Eu ia pedir de Natal ao Papai Noel o irmã o gêmeo bonzinho dele.
— Oi! — gritei, a voz esganiçada. Homens gostosos estavam na
minha lista de pessoas que me deixavam nervosa e, portanto, me faziam
agir como uma idiota mais do que o normal. Como se saber que eu
trabalharia para um homem que tinha sido preso por agressã o nã o
fosse estressante o suficiente. — Sou a irmã dele, Iris — eu o corrigi.
Meu sorriso estava torto, com certeza. — Meia-irmã , para ser específica.
O cara com o rosto mais marcante já criado piscou para mim.
Caramba, ele era muito lindo de uma forma muito masculina e
visceral. Diferente dos homens que eu via com tanta frequência na
minha cidade, que usavam mais produtos para a pele do que eu. As
maçã s do rosto altas e angulosas, que pareciam afiadas o suficiente
para cortar granito, e eram talhadas junto com um maxilar duro e
quadrado que precisava ter sido barbeado no dia anterior. Tinha os
olhos mais puramente azuis que eu já tinha visto. Eram profundos e
ficavam acima de um nariz quase reto. Quanto aos seus lá bios meu-pai-
do-céu, eu sabia que deviam ter sido usados milhares de vezes ― seria
uma pena se nã o fossem. O cara era dono da estrutura ó ssea masculina
mais impecável que eu já tinha visto.
Aqueles olhos azuis estavam fixos no meu rosto, sem piscar e sem
expressã o.
Eu tinha feito algo de errado?
Olhei para o que eu estava vestindo: um cardigã bege cobria minha
camisa social rosa-clara de manga curta que milagrosamente nã o tinha
amassados ― graças a Deus ― e calça de alfaiataria marrom-escura. Era
algo que eu usaria em um dos meus antigos empregos. Olhei com mais
detalhe para ter certeza de que minhas roupas nã o estavam manchadas.
Nã o estavam.
Ainda assim, ele me fixava com um olhar intenso, parecendo
completamente indiferente. Tã o distinto do homem carrancudo que eu
tinha visto sangrar e puxar uma pequena loira atrá s dele quando saiu
do Mayhem na semana anterior. Havia apenas uma pequena casquinha
na ponta da sua sobrancelha que servia de lembrança daquela noite.
— Você está atrasada.
à h, o quê?
Olhei para o meu reló gio azul metá lico barato e vi que eram quatro
da tarde em ponto.
— Ah. Eu pensei que deveria estar aqui à s quatro.
Nã o foi isso que Sonny disse? Pensei na ligaçã o. Nã o havia como eu
ter ouvido errado.
Ele olhou para mim, sua expressã o imó vel. Aquele rosto bonito e
duro era um bloco de concreto com barba por fazer.
— Tenho um negó cio para administrar, garota. Estou fazendo um
favor ao Son contratando você. O mínimo que pode fazer é chegar na
hora.
Foi a deixa para minha boca ficar escancarada.
Esse cara era louco?
— Desculpe — respondi ao homem, olhando para o cabelo preto-
azulado que despontava em dez direçõ es diferentes, apenas
ligeiramente domado pelo boné. Nã o havia como eu errar a hora, eu
sabia, mas de que valia discutir com ele? Eu precisava do emprego.
— Realmente pensei que Sonny tinha dito quatro da tarde. — Lancei
a ele um sorriso cuidadoso e desconfiado. — Nã o vai acontecer de novo.
Ele nem se incomodou em responder. Balançando dois dedos
tatuados na minha direçã o, acenou para que eu avançasse. Com isso, ele
estava me levando a uma vida à qual eu nã o tinha tanta certeza de que
estava destinada.
— Vamos, nã o tenho o dia todo para te mostrar como fazer as
merdas.
— Preciso que você atualize isso toda sexta-feira. Entendeu?
Entendeu? Entendeu?
Eu estava era f… Nã o, nã o tinha entendido.
Como diabos alguém percorria o funcionamento interno do
QuickBooks em menos de vinte minutos? Eu ia precisar de alguém para
me explicar como isso era possível, porque nã o tinha ideia.
Eu nã o era idiota, nem uma pessoa lenta em qualquer medida ― pelo
menos eu gostava de pensar assim ―, mas ele havia maximizado a tela
do programa com cliques mais rá pidos do que meus pobres olhos
conseguiam acompanhar. Em um minuto, ele estava explicando algo
sobre despesas e, no seguinte, começou a tagarelar sobre como salvar
os arquivos em uma pasta específica. Eu tinha entendido… talvez
metade.
Ok, sendo realista, tipo um quarto.
Por um breve momento, enquanto eu estava olhando para o bloco de
anotaçõ es que ele havia deslizado sobre a mesa quando eu o havia
seguido para aquele lugar, pensei em lhe pedir para me mostrar mais
uma vez para que eu pudesse fazer anotaçõ es melhores. Porque isso
nã o era desnecessá rio, era? Quero dizer, quem aprendia as coisas
perfeitamente de primeira por aí? Eu tinha levado pelo menos três
tentativas para descobrir como usar corretamente o recurso de gelo em
cubos na geladeira do Sonny.
E entã o olhei para ele, Dex Locke. Seu corpo grande se inclinava
sobre a borda da mesa marrom-escura, uma tatuagem vermelha
espreitando o mundo sob a gola da sua camiseta, o canto da boca
surpreendentemente carnuda torcido apenas um pouco para o lado… e
eu amarelei.
— Entendi.
Que. Mentirosa.
Uma covardezinha e uma mentirosa. Patética.
Ele acenou para mim rapidamente e começou a abrir um arquivo na
á rea de trabalho intitulado “Isençõ es”. Lá íamos nó s de novo.
Monossílabos. Acenos rá pidos. Estritamente profissional.
A certa altura, ele se levantou para “ir mijar” e aproveitei para olhar
em volta pela primeira vez depois de segui-lo como um cachorrinho
perdido. Quando eu havia entrado, aqueles olhos azuis cristalinos e
duros eram uma forma de impaciência, entã o me concentrei em me
sentar na cadeira que ele arrastou ao redor da mesa e segui junto.
Minha chance de bisbilhotar finalmente se apresentou.
O escritó rio nã o era nada do que eu esperava. As paredes eram de
um branco claro e brilhante, quase nuas, com exceçã o de dois artigos
emoldurados e… aquelas televisõ es eram telas montadas no canto?
Podia ser. Ele nã o parecia o tipo de pessoa que via novela de tarde.
A arte colorida foi a primeira coisa a chamar minha atençã o. Um
polvo vermelho furioso e flamejante circulava pelo papel no que parecia
ser tinta a ó leo. Tentá culos giravam e se curvavam em linhas que se
partiam. Com cores fortes e cheio de tanta vida, parecia estranho ser
mantido cativo no papel.
A outra moldura, logo ao lado do polvo, exibia uma arte feita com
tinta preta. Tinta preta que esboçava uma imaculada réplica da insígnia
do Moto Clube Fá brica de Viú vas. A que eu tinha visto no bíceps do meu
pai por anos. Aquela que, até eu vir para ficar com Sonny, tinha sido
apenas um sinal das coisas supostamente terríveis das quais eu estava
protegida.
Coisas ruins que minha mã e me contava para me deixar com medo,
mas afastei esse pensamento e continuei olhando em volta. A memó ria
da minha mã e era para uma época diferente. Ela já ocupava tanto
espaço naquela pequena á rea designada que deixei sua memó ria
descansar. Um lugar para o qual eu nã o queria ser sugada.
O resto do pequeno escritó rio consistia na grande escrivaninha, duas
cadeiras acolchoadas combinando e um armá rio que ocupava o canto.
Era quase imaculadamente limpa. Havia também uma pitada de fumaça
de cigarro no ar.
Hum.
— Tem cheiro aqui ou algo assim? — aquela voz profunda e rouca
que ouvi na ú ltima hora perguntou da porta.
Olhei para ele e sorri. Ele sorriu de volta? Nã o. Mas ignorei e levantei
um ombro.
— Você fuma?
Dex respirou tã o profunda e longamente que pareceu durar um
minuto inteiro.
— Quando estou a fim.
Quase torci o nariz. Quase. Porque eu odiava cigarros, embora
duvidasse de que o resquício quase inexistente me incomodasse.
Balancei a cabeça para ele novamente, observando o boné escuro dos
Rangers que ele havia puxado para baixo sobre a cabeça, as pontas do
seu cabelo muito preto aparecendo em tufos. Percebendo que minhas
mã os ainda estavam ú midas ― nã o paravam de suar desde o momento
em que eu havia entrado no carro ―, limpei-as nas calças.
Ele piscou, quebrando o silêncio.
— Você tem identidade legal?
Havia identidades ilegais? Sim, eu nã o ia pedir esclarecimentos.
A
legenda estava logo abaixo de uma foto de Dex parado na frente do
estú dio, com os braços cruzados à frente do peito. Típico.
— Flor.
Faça parar.
— Flor.
Ai, Deus. Por favor. Pare.
Eu mal havia pegado no sono apó s uma hora de olhar para o teto. A
tensã o no meu corpo, depois do dia de merda, havia finalmente saído
dos meus ossos o suficiente para me permitir relaxar. Eu nã o tinha
conseguido parar de pensar em Sonny. Sonny sequestrado. Sonny
desaparecido. Sonny possivelmente ferido. Eu nã o me permitia pensar
no que mais poderia acontecer com ele, mas nã o era isso que as pessoas
faziam nos filmes e na vida real? Tortura e… outras coisas?
Enterrei o rosto mais fundo no travesseiro.
Eu tinha ficado preocupada durante o dia todo. Depois que Dex me
chutou delicadamente para fora de casa, fui ao shopping. Assisti a uma
matinê sozinha no cinema para matar o tempo até a hora do trabalho,
além de me distrair um pouco do desconfortável peixe dourado que
estava nadando no meu estô mago. Nã o conseguia me lembrar de nada
com clareza, nem do filme nem das coisas que eu tinha visto nas lojas,
ou mesmo dos rostos dos clientes que eu agendara ao longo do dia na
Pins.
Blake e Blue deviam saber que algo estava acontecendo, porque
foram ainda mais agradáveis comigo do que o habitual. Eles me deram
espaço ao nã o fazer um milhã o de perguntas que eu nã o podia
responder, mas vinham ver como eu estava, em silêncio, a cada
oportunidade que tinham. Tentei ligar para Dex algumas vezes, mas ele
só atendeu da primeira vez, parecendo irritado pra caramba, mas
prometendo me ligar se descobrisse alguma coisa. Nunca cheguei a
receber essa ligaçã o, entã o liguei para ele novamente e nã o recebi
resposta.
Puta que pariu, Sonny.
Quanto mais eu matutava sobre o que tinha acontecido, mais
aborrecida ficava. Ele sabia que os caras estavam em algum lugar. Os
homens nã o haviam invadido a casa e o levado. Sonny tinha que ter
saído da droga da casa e ido até eles. Que merda ele estava pensando?
Obviamente, eu nã o era a ú nica idiota.
Entã o fiquei nervosa o dia todo. Pensando na droga do Sonny e no
quanto ele era um idiota. Pensando nas razõ es pelas quais esses
homens poderiam querer levá -lo.
Sonny nã o me contava o suficiente sobre o que ele fazia quando eu
nã o estava por perto ou quando ele desaparecia num passe de má gica à
noite, entã o eu nã o tinha ideia do tipo de porcaria em que ele estava
metido. Principalmente, havia uma confiança cega entre nó s. Nenhum
de nó s estava acostumado a ter alguém a quem dar satisfaçã o.
Assim que fechamos o estú dio naquela noite, Blue me perguntou se
eu precisava de alguma coisa ― o que era ainda mais doce da parte dela,
porque Blue raramente falava com alguém, muito menos comigo ―, e
entã o todos nó s seguimos caminhos separados. O pensamento de nã o ir
para a casa do Sonny nem sequer passou pela minha cabeça, entã o fui
direto para lá , tomei banho de novo, me forcei a comer sobras de dois
dias, verificando duas vezes para garantir que todas as fechaduras
estivessem bem fechadas, e fui para a cama. A cama onde fiquei me
virando de um lado para o outro por mais de uma hora antes de
conseguir pegar no sono, afastando aquela voz pequena que ficava me
lembrando de que eu estava diante de uma outra pessoa de quem
gostava e que poderia perder.
E agora, eu estava perdendo rapidamente esse doce alívio da
realidade.
— Flor, acorde — alguém sussurrou no escuro. Alguém?
Merda!
Me sentei de repente na cama, meu coraçã o martelando
violentamente. Pisquei para afastar a sonolência, esperando ver um dos
motoqueiros, ou nã o sei, um assassino em série sentado ao meu lado
com as mã os no meu braço, polegares fazendo círculos preguiçosos na
minha pele.
— O que…! — ofeguei, piscando no escuro para ver aquela estrutura
facial surpreendentemente familiar a centímetros de distâ ncia.
— Calma, Ritz — Dex murmurou suavemente, os polegares ainda
circulando.
Minha mã o voou para apertar meu coraçã o, tentando fazê-lo
desacelerar.
— Jesus, você me assustou — ofeguei.
Na verdade, à moda normal de Dex, ele nã o sorriu de diversã o ou se
desculpou.
— O que você está fazendo aqui?
— Dormindo?
Ele suspirou.
— Blake nã o recebeu minha mensagem?
Do que ele estava falando? Balancei a cabeça.
— Levante-se — ele ordenou. — Você precisa falar com seu irmã o
antes de sairmos daqui.
Pisquei de novo lentamente enquanto suas palavras iam fazendo
sentido. Conversar com o meu irmã o?
— Sonny está aqui? — Minha voz enganchou na garganta.
Dex assentiu.
— Ele está colocando uma merdas na mala. Arrume uma mala para
você nã o precisar voltar para cá por um tempo, depois fale com ele.
A confusã o me inundou de um milhã o de maneiras diferentes. Para
onde Sonny ia? Para onde eu ia? Mas, principalmente, estava me
perguntando o que estava acontecendo, ponto final. Havia muito sigilo
para eu me sentir bem.
Como uma boa garota, tentei me focar no que levar para que pudesse
me concentrar o mais rá pido possível em entender as coisas.
Felizmente, tinha tido bom senso o bastante antes de adormecer para
vestir um short de pijama, porque geralmente eu dormia só de calcinha
e sutiã . Dex acendeu a luz enquanto eu pegava um monte de roupas
aleató rias da cô moda.
— Onde ele estava? — perguntei, enquanto enchia minha mochila
com o que havia escolhido, sem prestar atençã o. Nã o conseguia nem
olhar para Dex enquanto fazia a pergunta, de tã o nervosa que fiquei. Eu
queria saber se Sonny estava bem, mas ele nã o estaria em casa se nã o
estivesse.
— Hospital do Condado.
Minha espinha ficou rígida; meus mú sculos das costas enrijeceram.
— O quê? — Tenho certeza de que gritei as palavras.
— Hospital do Condado, flor. Alguma senhora o encontrou no parque
inconsciente hoje de manhã e chamou uma ambulâ ncia — explicou Dex.
Sem nem sequer pensar nisso, senti minhas pernas ficarem bambas
e começarem a me levar ao redor da cama para pular a coisa toda de
fazer as malas e encontrar Sonny. Mas Dex levantou o braço, me
impedindo de dar a volta nele.
— Se acalme, Ritz. Ele só teve uma leve concussã o, uns hematomas.
Ele está bem — disse Dex, suavemente. — Termine de fazer a mala.
Que carvalhos era uma leve concussã o?
Eu ia vomitar. Respirando e soltando o ar pelo nariz algumas vezes,
olhei para os olhos de Dex para ver se conseguia entender se ele estava
sendo honesto comigo ou nã o. Aqueles olhos azul-escuros inescrutáveis
tinham intençã o e eram claros em um confronto de vontades, como se
ele pudesse perceber que eu estava tentando pegá -lo em uma mentira.
— Ele está bem — insistiu Dex, me segurando com os mú sculos do
antebraço. — Termine, flor.
Caramba. Ele provavelmente nã o estava mentindo. Pela centésima
vez em cinco minutos, assenti, afastando aquela sensaçã o doentia no
meu peito.
— Ok. — Fechando o zíper da mochila pela metade, eu a arranquei
da cama de qualquer jeito e olhei para ele. — Acho que peguei tudo.
Vou caçar o idiota.
Nã o me incomodei em esperar uma resposta antes de disparar pelo
corredor até a porta aberta do quarto de Sonny. A luz do ventilador
estava acesa, iluminando o cô modo e a figura sentada na beira da cama
com uma mochila ao lado. Mesmo de costas, seus traços pareciam
soltos. Cansado. Esgotado.
Mas nã o foi até eu dar a volta na cama e ver o lado do seu rosto que
fiquei boquiaberta.
— Meu Deus, Son!
Sua bochecha estava inchada, com o dobro do tamanho que deveria
ter. A pele estava partida e roxa, apenas um pouco pior do que o terrível
corte no canto da boca. No entanto, ele conseguiu me dar um sorriso.
— Ris — ele me cumprimentou em voz mais baixa do que o normal.
Deu um tapinha na cama. — Estou bem, garotinha. Sente aqui.
— Meu rabo que você está bem — eu disse, dando um passo para
ficar na frente dele.
Sonny inclinou a cabeça para trá s para me dar uma visã o melhor da
surra que aqueles filhos da fruta de uma meretriz tinham lhe dado.
Todo o lado direito do seu rosto parecia deformado devido ao inchaço.
Eu estava meio preocupada que talvez ele tivesse perdido dentes, mas
nã o tinha certeza.
— Já passei por coisa pior, acredite em mim — ele argumentou com
a voz baixa. — Venha aqui e pare de se preocupar.
Dei uma olhada que dizia que era mais fá cil o inverno congelar do
que eu parar de me preocupar com ele.
— Venha, nã o tenho muito tempo antes de Trip chegar — continuou,
dando um tapinha na cama novamente.
Eu queria discutir com Sonny, mas a ló gica me disse para nã o fazer
isso. O pobre coitado estava com uma aparência dos infernos. Isso
deixou meu estô mago tenso de uma maneira horrível, como se eu
estivesse tendo contraçõ es ou algo assim. Minha mã o estava estendida
e se apegando instintivamente à de Sonny.
— Você se lembra de que eu disse que o doador de esperma
apareceu e me pediu dinheiro?
Como se eu pudesse esquecer.
— Ele pediu dinheiro ao Luther, nã o foi?
Sonny assentiu devagar.
— Foi, e ele também nã o deu — explicou. — Ele nã o queria dizer
para ninguém por que precisava do dinheiro, só que estava precisando
muito.
— Quanto foi?
Pareceu que ele tentou fazer uma careta, mas imediatamente
conteve o esforço quando se lembrou de que parecia o primo do
homem-elefante.
— Dez mil.
Fiz um ruído feio na garganta.
— O quê?
Sonny assentiu outra vez.
— Exato. Ninguém na porra da sã consciência emprestaria tanto
dinheiro para ele sem motivo. Entã o, ninguém no clube emprestou. —
E, de repente, tive um sentimento muito ruim sobre as escolhas de
palavras do meu irmã o. Ninguém na porra da sã consciência.
— Entã o, o que isso tem a ver com você exatamente? — perguntei,
hesitante.
— Acontece que nã o foi a primeira vez que o querido papaizinho
pediu dinheiro. Alguns meses atrá s, ele veio e pegou emprestado um
belo valor dos Ceifadores.
Ah, droga. Ah, droga, droga.
Eu nunca tinha ouvido falar dos Ceifadores, mas as peças do quebra-
cabeça estavam fazendo muito sentido.
— Aqueles homens?
Ele suspirou.
— Sim, Ris. O papaizinho nã o cumpriu o plano de pagamento e, de
acordo com que Trip descobriu hoje, eles nã o estã o exatamente felizes
por ele ter aparecido na cidade e depois se mandado. Eles querem o
dinheiro deles.
Isso tinha que ser um pesadelo. Um pesadelo daqueles.
— Mas você nem mesmo… — O que eu ia dizer? Que ele nã o
importava para o nosso pai? Era a verdade dura.
Ele devia saber o que eu estava tentando explicar porque levantou
um ombro em uma concordâ ncia fraca.
— Eu sei, Ris. Eu sei. Mas nã o vou pagar pelas merdas dele, e nã o vou
deixá -los chegar até aqui porque agora eles sabem que você mora na
minha casa. Tenho certeza de que eles sabem que você também é filha
dele.
Engasguei e ganhei um tapa nas costas do meu irmã o.
— Pare com isso, garotinha. Está tudo bem. Vou encontrar esse filho
da puta e garantir que ele pague as merdas dele agora. Nã o vou ficar
sentado, esperando por Deus sabe o quê acontecer. A ú ltima coisa que
ele merece é ser resgatado por um de nó s. Nã o vou mais pagar pelos
erros dele, e você também nã o — afirmou, sério.
Cada minuto parecia fazer com que todo esse cená rio se
assemelhasse mais e mais a um sonho. Um sonho muito duro que eu
nã o conseguia engolir.
— Entã o vamos atrá s dele?
Sonny nã o confirmou. A mã o que ele tirou das minhas costas, depois
de dar um tapinha, deslizou para descansar no ombro mais longe dele.
— Nã o, Ris. Eu vou atrá s dele. Trip vai comigo. Nã o sabemos em que
outro tipo de merda ele está metido e é melhor você ficar aqui com Dex
até que toda essa merda seja resolvida.
O som que saiu da minha boca parecia um grito.
— O quê?
— Você vai ficar hospedada com Dex. Essa casa nã o é segura e nã o
confio em deixar você com mais ninguém do Clube — explicou ele,
apertando meu ombro. — Espero poder encontrá -lo em alguns dias.
Mas o que ele faria quando o encontrasse? O velho obviamente tinha
se mandado porque nã o tinha dinheiro para pagar os idiotas dos
Ceifadores. Quase, quase perguntei a Sonny, mas pelo aspecto na
metade do rosto dele que nã o parecia ter feito amizade com um taco de
beisebol, Sonny nã o tinha limites para o que era capaz.
Entã o, fazer Curt Taylor arranjar dez mil teria que acontecer de uma
maneira ou de outra. De repente, eu nã o tinha dú vida.
— Merda, Sonny — sussurrei. Como essa zona toda foi cair no nosso
colo? No dele? O filho de Curt Taylor que tinha menos a ver com o pai
do que os outros dois. Cristo.
A mã o no meu ombro aumentou o aperto.
— Ris — ele sussurrou, me puxando para mais perto, o lado da testa
descansando contra o topo da minha cabeça. — Eu vou voltar, tudo
bem? Juro por Deus, nã o vou deixar você aqui. Só vou encontrar esse
idiota para que a gente possa voltar aos dias comuns e sem graça e
essas merdas — me garantiu. — Eu vou voltar.
A determinaçã o por trá s das suas palavras pesava no meu esterno.
Ele ia embora. Ia me deixar em uma cidade nova, sozinha com seu
amigo. Eu nã o ia ter um ataque de pâ nico. Tive um ataque de pâ nico
uma vez quando Will saiu de casa e depois superei. Mas Sonny ia voltar.
— É apenas por um tempo — prometeu.
Me inclinei ao seu lado e assenti, encostada nele. Nã o conseguia me
lembrar da ú ltima vez que alguém tinha me abraçado assim. Com tantas
garantias e promessas, eu nã o duvidava de forma alguma que ele fosse
voltar. Nã o era como quando Will partiu. Meu irmã o mais novo, da
mesma mã e, que me deu o abraço mais rá pido da histó ria e beliscou
meu braço antes de sair.
— Tem certeza de que você está bem? — perguntei, afastando o fato
de que nã o tinha notícias de Will fazia meses.
Sonny riu um pouco, baixo e dolorido.
— Já tive dias melhores. Vou ficar bem quando tudo isso entrar nos
eixos.
Deslizei o braço em volta das costas dele.
— Sinto muito que você tenha sido arrastado para essa confusã o.
— Eu também, garotinha, mas prefiro que seja eu e nã o você que seja
pego por esse turbilhã o de merda no qual ele se meteu. — Sonny
suspirou, o que me causou uma dor no coraçã o. — Preciso continuar.
Fique com Dex até eu voltar, ok?
Eu queria discutir com ele, mas qual era o sentido? Todos nó s
tínhamos que fazer coisas que nã o queríamos em algum momento, e se
os Ceifadores haviam espancado Sonny pelos erros do nosso pai, que
nã o era pró ximo de nó s, do que mais eles eram capazes?
— Talvez eu deva ir para a casa da Lanie — sugeri. — Se eles fizeram
isso com você, nã o vã o tentar e…
— Nã o, Ris. Sou um farol para o doador de esperma, e Dex sabe
muito bem que nã o deve ser um idiota. Você vai ficar bem.
Ah, cara. Isso estava indo de mal a pior. Uma zona enorme e surreal,
tudo causado por um homem que nã o tinha mais conexõ es com nossa
vida.
— Você nã o vai ter problemas no trabalho?
Sonny riu antes de afrouxar o abraço e se levantar lentamente.
— Nã o se preocupe. Está tudo bem.
Soltei um suspiro e assenti, levantando da cama. Seu rosto estava
com uma aparência ruim, muito ruim, mas Sonny já era adulto e sabia o
que estava fazendo. Eu nã o podia e nã o imploraria para ele ficar.
— Você pegou todas as suas coisas?
Assenti.
— Suas coisas de banheiro também? — ele perguntou.
Naquele momento, de repente, desejei ter tido Sonny na minha vida
desde o início. Quero dizer, quem mais se lembraria de coisas de
banheiro, dentre todas as outras?
— Nã o, esqueci.
Ele bagunçou meu cabelo de leve.
— Vá buscar. Te encontro lá fora.
Fui atrá s dele, mas me separei para pegar meus produtos de higiene
pessoal no banheiro. Nã o havia muito, entã o levei apenas um
segundinho para colocar na mochila. Assim que eu estava prestes a sair
de casa, ouvi Sonny e Dex falando do outro lado da porta.
— … passou por coisas demais, cara. Ela nã o precisa passar por mais
nada — falou Sonny.
— Falei que vou cuidar dela. — Foi Dex quem respondeu.
— Porra, eu fico e este pode ir com você — sugeriu outra voz. Trip,
provavelmente.
Dex fez um barulho que eu nã o conseguia reconhecer através da
porta.
— Eu vou ficar.
Houve uma pausa.
— Fique com o pau dentro das calças, Dex, porra. Juro por Deus…
Sonny murmurou outra coisa que nã o ouvi, porque ele devia estar
mais longe da porta do que Dex. Sentindo-me bizarra por bisbilhotar,
abri a porta da frente para encontrar os três no deque. Sonny de pé,
perto das escadas, Trip e Dex bem na minha frente ― bem, na porta.
Um sorriso cansado surgiu no rosto do meu irmã o.
— Está pronta?
— Estou. — Olhei para o loiro ao lado de Dex.
— Oi, Trip.
— Oi, gata — ele murmurou. A cor debaixo dos seus olhos deixava
claro que ele nã o dormia havia algum tempo.
A mã o de Dex pousou na minha lombar, me forçando para a frente.
— Vamos indo, Ritz. Estou cansado.
— Está bem. — Fui até Sonny e passei os braços em volta do peito
dele. — Se cuide, ok?
Ele me abraçou.
— Volto o mais rá pido que puder.
Recuei um pouco e beijei sua bochecha coberta de barba.
— Ok. Deixe Trip dirigir.
Sonny bufou e colocou as duas mã os em cima da minha cabeça,
empurrando meu rosto para baixo para dar um beijo na minha testa.
— Como quiser, garotinha.
Ah, a ironia de tudo aquilo. Se alguém sabia que a gente nem sempre
conseguia o que queria, esse alguém era Sonny.
— A gente se vê, Son. — Acenei para ele. — Tchau, Trip. Se cuide. —
Sonny inclinou a cabeça para a frente, com um leve sorriso.
— A gente se vê, garotinha.
Trip acrescentou um suspiro ao seu adeus, mas eu já estava olhando
para a frente, logo atrá s de Sonny.
Dex e meu irmã o trocaram um olhar estranho quando o de cabelos
escuros desceu as escadas. Comecei a contornar o para-choque
dianteiro do meu carro para entrar quando ele estendeu a mã o para
envolver os dedos em volta do meu cotovelo.
— Aonde você está indo?
à h…
— Vou te seguindo.
Ele estalou a língua.
— Nã o. Você dirige muito devagar. Suba na minha moto e nó s
pegamos seu carro amanhã .
Hesitei, olhando para o meu carro.
— Iris. — Eu realmente gostava um pouco demais quando ele usava
meu nome. — Flor, venha. Vamos pegar seu carro depois.
Devo ter esperado muito tempo porque a pró xima coisa que notei foi
que ele tinha um braço enganchado na minha cintura e estava meio me
conduzindo meio me arrastando para sua Dyna. Dex pegou minha
mochila, me entregou um capacete que tinha sido deixado no banco e
substituiu o local vazio pela minha mochila, amarrando-a.
Ele voltou para mim, pegou o capacete das minhas mã os e depois
abaixou-o na minha cabeça em silêncio. Uma vez que estava afivelado,
virou a cabeça na minha direçã o.
— Suba.
Está bem, entã o. Mandã o do caramba.
Havia cerca de vinte centímetros entre as costas de Dex e minha
mochila, mas o que eu poderia fazer? Tinha a sensaçã o de que, se
discutisse mais se ia andar com ele ou nã o, eu perderia de qualquer
maneira e, para ser sincera, estava realmente cansada. Por já ter andado
de moto com Sonny, era fá cil me acomodar, mas estranho quando eu
tinha que me mexer tanto no assento que minha virilha e coxas nã o
deixavam espaço para uma folha de papel entre elas e a parte externa
das coxas de Dex e sua bunda robusta. A contragosto, meus braços
deslizaram em volta das costelas dele quando Dex deu partida na moto
e recuou para a rua.
A casa do Sonny já ficava nos arredores de Austin, entã o, quando Dex
entrou na estrada e começou a nos levar mais para fora da cidade,
fiquei me perguntando onde ele morava, mas nã o falei nada. Minha
bochecha estava tecnicamente colada nas suas costas, braços apertados
em volta do seu peito. Até entã o, eu nã o tinha me dado conta de que ele
estava vestindo uma jaqueta de couro que nã o fazia nada para esconder
como seu corpo era grande e só lido.
Caramba.
Estava escuro demais para enxergar alguma coisa direito, mas eu
poderia dizer que estávamos praticamente no meio do nada. As á rvores
eram enormes à medida que passávamos em velocidade saindo pela
alça de acesso da estrada, com apenas o rugido alto da moto quebrando
a monotonia do trajeto.
Apó s cerca de cinco minutos, ele virou em uma estrada rural que nã o
tinha nome nem sinalizaçã o que pudesse ser chamada assim. Um
contorno de uma casa era visível ao longe, sobre uma colina. Quanto
mais perto chegávamos, mais eu era capaz de enxergar à luz do luar. A
residência era uma grande casa daquelas térreas e amplas. Um enorme
quintal da frente pontilhado com á rvores altas deu lugar ao painel de
madeira de cores claras da casa. Nã o era o tipo de lugar onde eu
esperava que Dex morasse. Ele parecia o solteiro típico com um
apartamento sujo.
Mas talvez eu estivesse apenas presumindo que todos os membros
do Fá brica eram assim. Para ser justa, Trip fazia jus ao estereó tipo que
eu havia construído. Até havia meias enfiadas nos cantos do sofá .
Quando ele estacionou a moto bem em frente à garagem
pavimentada, desmontou primeiro antes de estender a mã o e me
ajudar. Tirei o capacete enquanto ele soltava minha mochila, inclinando
a cabeça na direçã o da porta, me chamando para entrar sem palavras.
Fui em seguida, absorvendo a imagem dos parcos mó veis em sua
sala de estar: um sofá modular de microfibra marrom, uma grande
televisã o de tela plana pendurada na parede, um console multimídia
embaixo e… era isso. Dex largou minha mochila no sofá antes de virar
para mim.
— Você pode ficar com a cama, flor. Eu tenho dois outros quartos,
mas só uma cama — explicou.
Eu ainda estava olhando em volta, passando da sala para espionar
uma cozinha que se abria para ela diretamente, mas com as palavras
dele, balancei a cabeça.
— Nã o, vou ficar no sofá . Posso dormir em qualquer lugar.
Embora fosse a verdade, eu nã o ia apontar que nossa diferença de
peso de uns trinta quilos em cima de uma diferença de altura de quase
vinte centímetros faria de mim uma candidata melhor para seu sofá
longo, mas, ainda assim, um pouco estreito.
Ele abriu a boca para discutir comigo, mas o interrompi.
— Sério, Dex. Vou ficar no sofá , nã o se preocupe com isso. Se você
puder me dar um travesseiro e um cobertor, por favor…?
Sua expressã o direta e completamente contrariada me fez pensar
que ele queria discutir mais a situaçã o de quem ia dormir onde, mas
acho que ele entendeu meu raciocínio secreto e provavelmente estava
cansado demais para brigar. Com um aceno de cabeça, ele desapareceu
em um corredor à direita da sala de estar por alguns minutos, voltando
com um travesseiro coberto por uma fronha azul-escura e um cobertor
branco debaixo do braço.
Dex entregou-os a mim em silêncio, observando enquanto eu
estendia o cobertor com um bocejo e deixava cair o travesseiro no canto
do sofá mais pró ximo da porta da frente.
— O banheiro fica no corredor, a primeira porta à direita, e meu
quarto é ali. — Ele apontou para outro corredor no lado esquerdo da
sala. — Ú ltima porta.
— Obrigada — murmurei com outro bocejo, sentando de qualquer
jeito no estofado.
Ele deu um passo para trá s, travando os olhos azuis como giz de cera
em mim.
— Fique à vontade e me acorde se precisar de qualquer coisa.
Assenti em resposta, sorrindo para ele, sonolenta.
— Tudo bem. Boa noite, Dex. — Eu parei. — Obrigada por tudo.
Seu aceno de cabeça foi lento.
— Boa noite, flor.
Nã o perdi mais tempo tentando vê-lo desaparecer no corredor. No
momento em que escorreguei embaixo do cobertor e minha cabeça
acertou o travesseiro, percebi como eu estava desperta.
PQP.
Pequenos sons rangiam por toda a casa. O fluxo da á gua através dos
canos atraiu minha atençã o enquanto eu ficava ali deitada, queixo no
peito, olhando para a escuridã o. Fechei os olhos e tentei fazer meu
corpo sossegar.
E entã o tentei um pouco mais.
Acordei na manhã seguinte, muito mais cedo e quase da mesma
maneira como havia acordado sobressaltada apenas algumas horas
antes, na casa de Sonny. Dex estava no sofá , apoiado na mesma á rea dos
meus quadris, uma das mã os no meu ombro me sacudindo.
— Hora de levantar.
Abri um olho, focando imediatamente no reló gio digital do seu DVD.
Gemi e os fechei outra vez.
— Sã o só sete. — Nã o sei ao certo se o que eu disse era o que
pretendia, mas deve ter sido suficiente para Dex entender.
— Sim, flor, mas temos um dia agitado. Tenho algumas coisas para
fazer na rua.
O que eu queria dizer era: “Nã o sei o que você tem para fazer na rua
à s sete da manhã”, mas provavelmente pareceu algo como: “Nã o… rua…
sete…”.
Os dedos afastaram os cabelos pretos colados no meu rosto, um
gesto que eu estava cansada demais para apreciar.
— Preciso dar um jeito nas merdas do Sonny.
Sonny. Certo.
Com um grunhido, rolei de costas e pisquei para o teto branco-
pipoca. Sentei-me meio delirante, soando mais como um homem do que
uma mulher.
— Está bem, está bem. Já levantei.
Depois de me dar instruçõ es sobre onde estavam as toalhas e como
usar a á gua quente complicada, Dex jogou minha mochila no banheiro
de hó spedes, onde havia uma banheira protegida da vista por uma
cortina arrumadinha listrada de azul e verde. Tomei um banho rá pido e
passei uma escova pelo cabelo antes de prender em um rabo de cavalo.
Quando saí, ainda meio adormecida, encontrei Dex sentado no sofá
assistindo à televisã o com meu travesseiro e cobertor bem dobrado ao
seu lado.
— Pronto — bocejei.
Ele olhou para cima, de volta para a tela da TV por meio segundo e
entã o prendeu sua atençã o como um dardo em mim. Bem,
especificamente nas minhas pernas. Na pressa, horas antes, eu havia
jogado roupas aleató rias na bolsa. Aparentemente, havia escolhido
peças NSPT ― nã o seguras para o trabalho. Tudo o que encontrei na
bolsa foram shorts, calças folgadas e as três minissaias jeans que eu
possuía. As saias eram uma memó ria do calor e da umidade no sul da
Fló rida. Calor e umidade que, eu juro, podiam ser comparados aos de
Austin.
E nã o havia dinheiro no mundo que me faria usar uma das minhas
saias quando eu estava presa em ter que andar na garupa da moto de
Dex.
Entã o, meu short curto teria que servir.
No tempo que Dex levou para parar de olhar minhas pernas ―
felizmente ― depiladas, eu já nã o estava mais lisonjeada e, sim, me
sentindo desconfortável. A ú nica vez que as pessoas me encaravam
desse jeito era quando estavam olhando para o meu braço. Um braço
para o qual, felizmente, eu havia conseguido de forma subconsciente
escolher roupas de maneira inteligente o bastante, pegando cardigã s
que iam até a altura do cotovelo.
— Estou pronta — repeti.
— Certo. — Ele se levantou, suspirando para si mesmo enquanto
desligava a televisã o e caminhava em direçã o à porta. Ele me deu outro
olhar de soslaio. — Você pode querer tirar essa blusa. Na moto, lá fora,
vai estar muito quente em dois tempos.
Droga. Eu nem tinha pensado nisso. Só tinha uma blusa embaixo do
cardigã e… sim. Eu preferia ter pizzas debaixo dos braços a olhares de
pena.
— Vou ficar bem.
Parecia que Dex queria discutir comigo, mas felizmente abandonou a
questã o.
O trajeto de volta à cidade foi em silêncio, e pude apreciar o cená rio
do que havia fora dos limites de Austin. Exceto pelo trâ nsito e a
poluiçã o, e a sensaçã o do bíceps e do antebraço nus de Dex tocando
meu joelho a cada poucos minutos, foi tudo bem, ao longo do caminho.
— Aonde estamos indo? — perguntei em um semá foro quando já
havíamos chegado à cidade.
Ele inclinou a cabeça para o lado, conversando alto acima do rugido
da moto.
— Casa do Luther — ele respondeu. — Você se lembra dele?
Assenti, me lembrando de quando levei o envelope para ele e da
noite em que o vi passando a mã o em uma moça de vinte e poucos anos.
Continuava sendo uma lembrança nojenta.
Partimos para uma grande casa de tijolos vermelhos de dois andares
em um bairro de classe média alta. A caminhonete que tínhamos levado
para Austin estava estacionada na entrada da garagem, ao lado de uma
Harley que parecia diferente da de Sonny e Dex. Assim que ele saiu da
moto e me ajudou, bateu à porta tã o alto que tenho certeza de que os
vizinhos ouviram.
A porta se abriu muito mais rá pido do que eu esperava, e um Luther
sem camisa, de aparência desgrenhada e olhos turvos surgiu ali parado.
— Caralho, Dex, você sabe que é o meu dia de folga; é cedo demais
para essa merda.
Os ombros largos de Dex se mexeram firmemente debaixo da
camiseta branca comum que ele estava usando. Alguém estava prestes a
ser um ranzinza mal-humorado.
— Sonny zarpou ontem à noite.
Luther soltou um suspiro longo e prolongado antes de fazer um
gesto para Dex ― e para mim porque eu estava junto ― entrar.
— O que você quer dizer com ele zarpou?
— Ele saiu para procurar o Curt, Lu. Levou Trip junto.
As feiçõ es do homem mais velho ficaram tensas, a mandíbula
travando no lugar antes de ele esfregar uma palma grande sobre ela.
— Porra.
— O que você esperava? Você o viu em Seton. Sabe o que aqueles
bostas vã o fazer se nã o forem pagos.
Nã o me escapou o instante em que os dois olharam para mim
enquanto Dex dizia essa ú ltima frase.
Talvez eu tenha me encolhido um pouco por dentro.
Luther gemeu outra vez, esfregando as mã os no rosto. Quando
baixou as palmas, lentamente se virou para me olhar. Naquele instante,
me dei conta de que o homem mais velho tinha os mesmos olhos azul-
céu de Trip. Hum.
— Querida, nã o vá a lugar nenhum sem estar acompanhada por um
dos membros do clube.
Era a segunda vez na minha vida que o “Prez” falava comigo, e ele
estava me dando um alerta. O desejo de visitar Lanie me acertou bem
no meio da testa, mas eu sabia que nã o deveria.
Dex soltou um longo suspiro.
— Deixe isso comigo. Nã o se preocupe com essa histó ria — ele
assegurou ao homem mais velho.
Eu, por outro lado, tinha um sentimento muito ruim sobre tudo
aquilo.
Tentei dizer para mim mesma que nã o havia nada com que ficar com
raiva.
Fiquei mesmo assim.
Nã o deveria estar preocupada que Dex nã o tivesse voltado para casa
naquela noite, que ele nunca tivesse chegado a responder depois que
enviei mensagem para dizer que tinha chegado. Ele era um garoto
crescido. Poderia fazer o que quisesse.
Juro, eu realmente tentei nã o ficar irritada, mas estava.
Adormecer no sofá nã o era novidade. Ficar paranoica que alguém
invadisse a casa no meio do nada ― sem alarme! ― era demais. Eu
continuava imaginando que aqueles homens que tinham levado Sonny
iam aparecer. Quando esse desastre terminasse, eu começaria a pensar
em assassinos em série com má scaras quebrando uma janela para me
matar, e depois esfolar minha pele para pendurar na parede.
Dramá tica? Talvez um pouco.
Bem, talvez minha falta de sono fosse parte da razã o pela qual eu
havia ficado tã o irritada ― nã o surtada ― por Dex nã o ter voltado. Ou
me mandado mensagem.
Enviei outra mensagem ― à qual ele nã o respondeu.
Sentindo-me estranha em estar na sua casa e também nã o querendo
mais lidar com isso, deixei um recado na mesa da sala de jantar, dizendo
que ia fazer algumas coisas na rua. Primeiro, parei na academia e nadei
o má ximo de voltas que aguentei. Entã o acabei indo ao shopping e
comprando calças novas e algumas blusas para que nã o andasse por aí
me preocupando com cardigã s limpos que cobrissem o que minhas
regatas nã o cobriam. Depois disso, assisti a outro filme e fui trabalhar.
Quase imediatamente, me arrependi.
Eu estava no meio de tentar procurar vídeos sobre como consertar o
fax quando apareceu uma assanhadinha ― eu digo no diminutivo, mas
ela facilmente tinha cinco ou dez centímetros a mais que eu, enquanto
eu provavelmente tinha uns dois ou três quilos a mais que ela. Ela veio
com uma minissaia que parecia algo feito para alguém da minha altura
― ou de dez anos de idade ― e cabelos ruivos grossos que me deixaram
com um pouco de inveja. E ela estava carregando um colete que parecia
familiar.
Seu rosto magro e bonito se franziu em uma careta quando ela parou
na frente da minha mesa, olhando para mim através da tonalidade
escura dos seus enormes ó culos de sol.
— Preciso deixar isso para o Dex.
— Tudo bem — eu disse a ela, já estendendo os braços para pegar,
pois meu fator de aborrecimento havia subido cerca de vinte graus.
— Ele deixou na minha casa ontem à noite — acrescentou. Por que
ela mencionou isso, eu nã o fazia ideia.
Por que senti uma contraçã o no meu olho, eu também nã o fazia
ideia.
Apenas pisquei para ela, tirando o colete das suas mã os antes de me
levantar, meu estô mago vibrando.
— Tudo bem.
— Tudo bem — ela repetiu em voz baixa. — Até logo.
E assim ela se foi.
Entã o, assim, fiquei ainda mais irritada.
Fiquei preocupada que o maldito Dex fizesse algo idiota para nos
ajudar com os Ceifadores, enquanto, nesse meio-tempo, ele estava na
casa de alguma mulher? Juro que senti frustraçã o até o olho do cu
enquanto carregava a jaqueta de Dex nas costas e pendurava em uma
cadeira na sala dos funcioná rios.
Eu sabia que nã o valia a pena me preocupar com um homem adulto
como Dex. Eu sabia, mas ainda havia perdido o sono por causa disso.
Idiota.
— Skyler também me irrita.
Me virei para ver Blake parado na porta da sala, as mã os enfiadas
nos bolsos.
— Você sabe quando vê alguém e essa pessoa te dá nos nervos
imediatamente?
Ele riu.
— É o rosto dela, e talvez aqueles ó culos de sol do tamanho de um
para-brisa que ela está sempre usando.
Realmente pareciam para-brisas coloridos; a imagem me fez sorrir
para Blake enquanto eu ignorava o fato de ele ter sugerido que ela já
tinha vindo à loja outras vezes.
— Sim, você está certo. Deve ser isso.
A expressã o descontraída de Blake derreteu em outra de
preocupaçã o enquanto atravessava a sala em direçã o à má quina de
venda automá tica.
— Fiquei sabendo do Sonny.
Droga. Eu nã o queria o lembrete.
— Você teve alguma notícia dele?
Bem que eu queria.
— Nã o, mas também ninguém me fala nada. — Parei por um
segundo para olhar para minhas unhas. — Tenho certeza de que ele
está bem.
Ah, cara. Quantas vezes eu tinha usado e ouvido alguém usar a
palavra “bem” para descrever como eles estavam? Esperava poder
passar o resto da minha vida sem ouvir esse termo vago.
Blake suspirou.
— Parece que o negó cio está feio. Essa galera nã o está de
brincadeira. — Ele ergueu as sobrancelhas pretas. — Você precisa ter
cuidado até que tudo seja resolvido. — O desejo de rir estava na ponta
da minha língua. Dormir na casa de Dex sozinha era definitivamente
tomar cuidado. Conta outra.
Me encolhi um pouco com o pensamento. Por que eu estava tã o
negativa? Era estranho.
Ele deu de ombros.
— Bom, me fale se souber alguma notícia dele. Preciso preparar as
coisas para o meu pró ximo cliente.
O homem careca que eu tinha visto duas vezes passou pela minha
cabeça. Entã o a lembrança de estar aterrorizada na casa de Dex havia
colocado isso de lado.
A necessidade de resolver o problema com meu pai parecia muito
importante de repente para deixar Sonny lidar com aquilo sozinho. Nã o
era justo para nenhum de nó s. Além disso, eles realmente fariam algo
comigo? Ah, cara, eu esperava que nã o.
— Espere! Blake!
Ele parou na porta, olhando por cima do ombro.
— Sim?
Estalei os dedos para fazer a pergunta que estava na ponta da minha
língua.
— Qual é o nome do presidente desse clube mesmo? O cara careca.
— Eu estava com a minha cara lavada falando com ele, mas sabia que
Blake nã o me diria se eu fizesse parecer que Dex havia escondido algo
assim de mim.
O rosto de Blake se franziu todo.
— Liam?
Estalei os dedos como uma mentirosa.
— Isso, eu nã o conseguia me lembrar. — Sorri para ele. Blake deu de
ombros e foi para a frente do estú dio, me deixando nos fundos para
tentar descobrir uma maneira de conseguir o sobrenome do cara sem
dar muita bandeira.
E isso seria perguntar ao Magrã o quando Blake estivesse ocupado.
À s vezes, uma garota tinha que fazer o que precisava. No meu caso, era
encontrar um caminho de volta para Sonny.
Parada em frente ao clube de strip, eu sabia que o que estava prestes
a fazer era monumentalmente burro. Astronomicamente imbecil. E se ―
ok, quando ― meu irmã o descobrisse, ele provavelmente tentaria me
estrangular.
Mas que se dane. Momentos desesperados pediam medidas
desesperadas, e eu estava acostumada a lidar com as coisas por conta
pró pria. Se a situaçã o fosse outra e eu fosse a que tinha apanhado
daquele jeito, tinha certeza absoluta de que Sonny teria feito algo
igualmente idiota para me recuperar.
Eu nã o ia decepcioná -lo quando ele precisava de mim pela primeira
vez.
Era exatamente isso que eu continuava dizendo para mim mesma
enquanto mostrava minha carteira de motorista para o segurança na
entrada. Ele olhou para mim, depois para o documento, e entã o de volta
para mim antes de fazer um aceno para eu entrar.
Eu realmente era uma idiota.
Depois de perguntar a Magrã o como quem nã o quer nada qual era o
sobrenome daquele “tal de Liam”, eu perguntei “onde mesmo que os
Ceifadores se reú nem?”. Dex me disse para nã o passar de carro por lá ,
“mas nã o me lembro do nome”. Meu pobre e doce Magrã o respondeu de
maneira tã o indiferente que ele nunca poderia esperar que eu estivesse
planejando visitar o Moto Clube rival.
Ou… talvez ele simplesmente nã o estivesse esperando que eu fosse
ser tã o burra. Você sabe, ser filha de um ex-membro do Fá brica e esse
membro específico estar devendo um monte de dinheiro para eles. E a
meia-irmã de um membro atual que eles tinham espancado.
Multiplique o fator merda por três, e também a funcioná ria de um cara
de pavio curto do Fá brica.
Bem, eu tive uma boa chance de fuga enquanto era tempo.
Usando a desculpa de que eu tinha uma “emergência feminina”, saí
da Pins um pouco depois das sete. Levei quase uma hora para dirigir
até o clube de strip onde os Ceifadores se reuniam, nos arredores de
San Antonio. A julgar pelas cinco motos que vi paradas no
estacionamento, imaginei que pelo menos alguns dos membros
estavam lá .
Com sorte, talvez o careca estivesse entre eles. Ele tinha que ser um
dos caras principais do MC.
Assim que entrei no clube infestado de fumaça com duas dú zias de
luzes estroboscó picas e luzes pretas ofuscando o salã o, vi o canto onde
cinco homens muito durõ es e rudes estavam sentados como reis.
O careca estava acomodado na ponta do assento, parecendo mais
entediado do que fascinado pelos monstruosos seios de melã o no palco.
Minhas mã os começaram a tremer em algum momento, entã o as
apertei em punhos e respirei fundo.
Sonny faria pior do que isso por mim.
Além disso, eles nã o me matariam ou fariam algo louco assim em
pú blico. Certo? Eu realmente esperava que nã o.
Aqueles vinte passos ao redor do clube na esquina do inferno foram
os mais longos da minha vida. Com cerca de quinze dentre os vinte, o
careca ― que nã o parecia ser careca de verdade, à medida que eu me
aproximava ― me avistou. Ele nã o ficou tenso ou pareceu alarmado
quando inspirei fundo e me revesti de coragem para fazer uma sú plica.
Era isso que eu ia fazer? Implorar? Pelo meu pai?
Aparentemente, eu ia, mas gostava de pensar que estava fazendo isso
mais por Sonny do que pelo nosso pai vagabundo.
Os outros homens se viraram para olhar também, todos pelo menos
dez anos mais velhos que eu, ou até vinte. Eles pareciam mais
interessados do que eu gostaria. Podia ser porque eu era a ú nica
mulher no recinto que estava usando mais do que shorts minú sculos e
um top que terminava quinze centímetros acima da cintura.
Eu estava a meio metro de distâ ncia do careca ― nã o careca, seu
cabelo parecia crescer em todos os lugares, mas devia ser raspado com
frequência ―, quando ele inclinou o queixo para mim, e meu
nervosismo deu o ar da graça. Quando isso acontecia, eu me
transformava em uma idiota ― uma idiota tagarela sem habilidades
sociais.
— Oi — falei, esganiçada. E entã o acenei.
Qual era o meu problema?
O homem careca, Liam McDonaugh, de acordo com a informaçã o que
eu havia extraído dos meus colegas de trabalho inocentes, ergueu uma
ú nica sobrancelha escura.
— Oi — ele respondeu hesitante, provavelmente acreditando que eu
era louca.
Se eles nã o me matassem, eu me mataria por essa burrice.
Um ou dois dos outros homens grunhiram em resposta, piorando
meu nervosismo.
Em que porra eu estava pensando? Sério? Em quê? Que esses
homens iam atender ao meu pedido? Que iam aumentar o prazo de
pagamento da dívida do meu pai? Deus, por que eu nã o havia contado
pelo menos ao Magrã o ou ao Blake para onde estava indo?
— Nã o que nã o me importe com um rosto bonito na minha frente,
mas parece que você vai vomitar, boneca. Eu nã o quero me sujar —
emendou o homem chamado Liam.
Alguém me mate. Alguém me mate agora.
— Nã o vou vomitar em você. Eu juro. — Sorri com nervosismo,
tentando muito nã o pensar em me debulhar em lá grimas frustradas.
Liam apenas olhou para mim da mesma maneira intensa de Dex, me
despojando da minha dignidade e força lentamente.
Merda!
— Meu pai… — Droga! Essa nã o era a imagem que eu deveria pintar.
— Curt Taylor deve dinheiro ao clube e você foi atrá s do meu irmã o por
isso… — Tive que inspirar com força para tentar firmar minha voz.
Parecia que eu estava tremendo. — Existe alguma maneira de vocês
aumentarem o prazo dele? Ele nem gosta da gente — concluí, sem
pensar.
O homem careca, Liam, sorriu torto. Suas sobrancelhas se inclinaram
para cima.
— Ah, é?
— Eu nã o o vejo há quase dez anos — falei, sincera. — Juro que ele
nã o vai dar a mínima para o que acontecer com nenhum de nó s.
Aquele sorriso presunçoso e torto permaneceu no lugar.
— Acho isso difícil de acreditar, boneca.
Cará coles. Minhas mã os tremiam, apesar de ainda estarem fechadas
em punhos ao meu lado.
— Olha, nã o sei por que ele nã o te pagou, mas sinto muito. De
verdade. — Eu podia sentir as lá grimas nos cantos dos meus olhos
conforme o pâ nico inchava como uma onda de maré no meu peito. — Se
eu tivesse o dinheiro, pagaria de volta para que vocês nã o fossem mais
atrá s do meu irmã o.
Tive que travar os lá bios para nã o começar a fungar.
Os olhos de Liam se arregalaram. No prédio sombrio, eu nã o
conseguia ver exatamente de que cor eles eram, mas tenho certeza de
que pareciam escuros em seu rosto pá lido. Na verdade, era um rosto
pá lido e bonito, se você gostasse daquele tipo de homem meio bad boy
de trinta e tantos anos.
Ele se inclinou para a frente, cotovelos nos joelhos, mã os suspensas
entre as pernas. Aqueles olhos escuros me percorreram rapidamente,
uma vez, duas vezes, três vezes.
— Você é nova aqui?
Tinha certeza de que ele já sabia a resposta, mas assenti de qualquer
maneira.
— Entã o eu te garanto que você nã o sabe como as merdas sã o feitas
por aqui, boneca. Você nã o sabia que as putas… Desculpe… as mulheres
não se metem nos assuntos dos homens. A ú ltima coisa que sua bunda
fofa precisa fazer é chegar ao meu territó rio e me pedir uma coisa que
nã o tenho obrigaçã o de te dar — disse Liam, pausadamente.
Isso nã o estava indo muito do jeito que eu queria.
Devo ter feito uma careta porque ele levantou um dedo para me
interromper.
— Mas você está aqui e posso dizer que está apavorada. — Isso era
verdade. Completamente verdade. Nesse momento, Liam nã o se elevou
exatamente sobre mim como um poste, como Dex quando ficava em pé,
mas ele ainda tinha pelo menos um metro e oitenta. Sua constituiçã o
física era do tipo ampla e mais fisiculturista do que magro e cheio de
força. E sua personalidade? Ahhh. Fazia-o parecer ainda maior. Podia
ser sua expressã o inteligente e louca que parecia estranhamente
familiar. Hum.
— Sei valorizar a coragem de que você precisou para vir até aqui,
pedindo em nome do seu irmã o — falou, vindo ficar diretamente diante
de mim enquanto eu permanecia praticamente plantada no lugar de
medo. Seus olhos, que eu podia confirmar agora que eram castanhos,
encontraram os meus. — E você é gata pra caralho. Isso também ajuda
na minha opiniã o.
Havia um sapo na minha garganta. Talvez vá rios, porque levei um
susto quando ele se inclinou para mim. Um desejo violento de dar um
empurrã o no peito dele estava no primeiro plano do meu cérebro, mas,
sendo bem realista, nã o havia como sair do clube inteira.
— Me faça um agrado que te deixo sair daqui sem problemas. Posso
até pensar em só cobrar do porra do seu papaizinho nove, em vez de
dez de juros. — Ele suspirou.
Jesus, apague a luz. Nove mil? De juros? Em cima de dez mil? Droga.
— O que você diz? — Liam esticou o queixo, olhando para mim.
Fiquei dura.
— Você quer um agrado? — Tive a sensaçã o de que ele nã o estava só
pedindo para ser bem-tratado.
Ele assentiu devagar.
Minha boca tinha que estar escancarada. Tinha que estar.
— Acho que nã o — sussurrei, ainda sem sair do lugar.
Se finja de morta, Ris. Se finja de morta!
Liam deu um sorriso enorme. Ok, era tarde demais para me fingir de
morta. O movimento o fez parecer ainda mais bonito do que antes.
— Você acha, sim. — Ele riu, chegando ainda mais perto. — Nove em
vez de dez, boneca.
Nã o sei por que inspirei fundo, mas inspirei e ele cheirava a uma
colô nia almiscarada. Era muito boa, mas tudo o que conseguiu provocar
em mim foi um pouco de ná usea. Minhas emoçõ es e medos estavam
desgovernados.
— Ele nã o dá a mínima para nó s. — Engoli em seco, ficando de olho
nos lá bios, que vinham descendo cada vez mais.
Putz, cara, sua boca estava literalmente a alguns milímetros da
minha. Não faça nada imbecil, Iris! Não faça isso!
Liam riu de novo, desta vez em um tom mais profundo.
— Você que sabe — ele sussurrou… logo antes de me beijar.
Eu queria me socar.
Sentada ao volante do meu Focus com os lá bios ainda formigando do
seu encontro com a boca de Liam, e o que parecia um peso de cinco
quilos assentado bem na minha barriga, eu estava passando mal. Como
se tivesse feito algo horrivelmente errado. Terrivelmente, terrivelmente
errado.
Também nã o ajudou que eu soubesse que eu era uma idiota
completa por entrar naquele clube de strip. Uma bela de uma idiota…
O toque do meu celular, como um lamento, me tirou do sermã o
mental que eu estava me dando. Um pavor puro e doentio estava
aninhado na minha barriga. Porque eu sabia, sabia, de alguma forma,
que nã o ia querer atender à ligaçã o. Nã o me pergunte como eu sabia,
mas eu sabia.
E quando peguei o celular da minha bolsa ― a que deixei no banco de
trá s do carro quando entrei ―, a tela exibia o nome do possivelmente
ú nico homem com quem eu temia falar de vez em quando.
Dex.
Alguém me dê um tiro agora.
Respirei fundo e exalei assim que apertei o botã o para atender.
— Alô ? — Minha voz podia ter saído um pouco mais estridente do
que eu gostaria.
— Onde você está , caralho?
Ah, cara.
— Entã o…
Dex nem esperou um segundo para vociferar:
— Onde diabos você está , Ritz?
— Estou voltando para a Pins — respondi, apertando o botã o do
mudo enquanto virava a chave na igniçã o e colocava o carro em marcha
à ré, para que ele nã o ouvisse nada do que eu fizesse.
— Sozinha? — ele perguntou em uma voz lenta e cautelosa que nã o
fez nada para aliviar minha ansiedade.
— Sim. — Eu nã o iria mentir.
A pausa necessá ria para ele responder me fez endurecer minha
espinha e me preparar para o que quer que fosse sair da sua boca.
— Iris — disse ele, em voz baixa, muito baixa. — Me encontre no
Mayhem. — Seu tom era controlado demais. Droga!
— Eu deveria voltar para a Pins. Já faz tempo que estou fora.
Eu podia ouvi-lo respirando do outro lado da linha.
— Nã o. Me encontre no Mayhem.
Antes de eu ter a chance de discutir mais, ele desligou. Desligou na
minha cara. Aquele babaca. Que merda! Nã o!
A percepçã o de que eles nã o faziam ideia de que eu tinha ido até San
Antonio estava no primeiro plano dos meus pensamentos. Precisaria
dirigir em alta velocidade para talvez me salvar, porque nã o havia como
eu dizer para onde tinha ido se ele havia ficado irritado só com o fato de
eu ter saído.
Infelizmente, acelerei. O excesso de velocidade me levou a chegar ao
Mayhem muito mais rá pido do que eu gostaria, mesmo que soubesse
que ainda nã o havia voltado rá pido o suficiente para, de fato, fingir que
estava por perto.
O estacionamento do bar estava muito cheio para ser uma noite de
semana, se bem que eu provavelmente nã o deveria me surpreender.
Duvidava de que a maioria das pessoas ali dentro se importasse se
estavam bebendo durante a semana de trabalho ou nã o. Eu mal tinha
entrado no Mayhem depois de mostrar minha identidade ao segurança,
quando avistei a loira com quem eu tinha visto Dex na oficina havia
muito tempo. Ela estava sentada no bar, ao lado de um cara do Fá brica,
a julgar pelos apliques bordados em seu colete bem gasto.
Bem, acho que Son nã o estava brincando sobre a garota ser rodada.
Nã o vi Dex em lugar nenhum, mas isso nã o aliviou meu nervosismo.
Quero dizer, ele nã o podia me matar com tantas testemunhas por perto.
— Você viu o Dex? — perguntei à primeira bartender que passou por
mim.
A moça inclinou a cabeça.
— No andar de cima, fofa.
Puuutz.
Parecia que eu estava fadada a participar de uma marcha da morte.
Deus. Respirando fundo, lembrei que Dex nã o faria nada comigo. Ele
nã o faria. Exceto talvez me esfolar viva com a boca. Bem, com as
palavras.
O mesmo membro do MCFV que entrou na Pins quando eu tinha
começado no emprego ― aquele com a barriga de cerveja ― estava na
base da escada que tenho certeza de que estava prestes a me levar ao
inferno. Ele ergueu uma sobrancelha para mim.
— Irmã do Sonny? — Assenti.
Um sorriso se abriu devagar em seu rosto.
— Lá em cima, no fim — foi a ú nica coisa que ele disse.
Não vou vomitar. Não vou vomitar. Não vou vomitar.
— Obrigada — murmurei, subindo o primeiro e depois o segundo
lance de escadas. Apesar da mú sica alta que bombava no andar
principal, pude ouvir o profundo estrondo de vozes vindo do terceiro
andar.
A porta levava a uma grande sala com duas namoradeiras e um futon
mais pró ximo da porta virado de um jeito meio aleató rio. Logo atrá s
dos assentos na parede oposta, três mesas ocupavam o espaço restante.
E sentado à mesa no canto, cercado por Luther e dois outros
integrantes do clube, estava Dex.
Dex, que estava olhando para mim como se estivesse planejando
meu assassinato.
Fiz a ú nica coisa que uma pessoa ló gica que temia por sua segurança
― mais ou menos ― faria. Fingi que nada tinha acontecido, exibindo o
sorriso mais falso do mundo.
Ele olhou para mim, o tremor em sua mandíbula perceptível mesmo
tã o longe.
O olhar de Dex nã o vacilou nem por um segundo.
— Traga seu traseiro aqui, Ritz — ele exigiu com uma voz fria.
Nada ia acontecer. Nada.
Meus pés se moveram por conta pró pria, sem considerar o destino
ao qual estavam nos levando.
— Oi.
Se eu recebi um “oi” de volta? Nã o. Quatro rostos me encararam,
completamente sem emoçã o.
Parei ao lado do integrante que reconhecia do dia em que Dex
apareceu com Trip apó s o desaparecimento de Sonny. Por acaso, ele era
o ú nico que parecia nã o ter tido seu castelinho de areia destruído por
mim.
— Flor. — Dex se recostou na cadeira, cruzando aqueles braços
longos e fortemente tatuados à frente do peito.
Engoli em seco.
— Por onde você andou? — Ele enunciou as palavras com um pouco
de cuidado demais.
Bem, nem que a vaca tossisse eles tirariam a verdade de mim e, em
retrospecto, o que deixei sair da minha boca realmente nã o era melhor.
De forma alguma.
— Fui comprar absorvente. — Isso nã o era tã o ruim, mas o resto…?
— E aí tive que correr para casa do Sonny para trocar de calça porque
sangrei por toda parte.
Me mate. Me. Mate.
Absorvente. Sangrar na calça. Casa do Sonny.
Dex se inclinou para a frente sobre a mesa, os cotovelos batendo com
força na superfície. Eu podia ver o movimento da sua língua
percorrendo os dentes na boca fechada. E entã o ele travou a mandíbula.
— Você foi na casa do Son? — Ele arreganhou os lá bios para revelar
uma linha de dentes brancos retos. — Sozinha?
Eu tinha me perdido nessa explicaçã o toda, nã o tinha? Agora nã o
dava para voltar atrá s, droga.
— Sim — tentei dizer com o má ximo de segurança.
Ele piscou, desviando os olhos para a figura de Luther se
agigantando logo ao lado dele antes de voltar para mim. Piscou mais
uma vez, estendendo a mã o para passar o polegar e o dedo indicador
nas laterais da boca. A pausa pesada era cheia de expectativa.
Pelo canto do olho, vi o cara que eu nã o conhecia balançar a cabeça.
— Você é uma puta de uma idiota.
à hh, o quê?
Os mú sculos do bíceps de Dex apareceram enquanto ele rilhava os
dentes, conversando comigo. Eu! Uma puta de uma idiota?
— Você sabe que seu pai deve vinte mil aos Ceifadores?
Ora, sim, sim, eu sei, mas nã o podia dizer isso e, de qualquer modo,
nã o parecia que ele queria uma resposta porque continuou falando.
— Que porra você acha que eles vã o fazer com você, Ritz? — Acho
que nessa hora ele trincou os dentes. — Eles vã o espancar o Son de
novo antes de decidirem aumentar a dívida. Que porra você acha que
eles vã o fazer se te pegarem? — ele perguntou em um tom de voz mais
alto do que eu já o tinha ouvido usar normalmente. Sua expressã o
estava muito contrita, muito zangada. — Hein? Você nã o pode ser tã o
burra, pode?
Caramba. Algo desagradável se atou no meu peito e, de repente, eu
nã o suportava mais olhar para ele.
— Iris! — ele gritou comigo. Gritou! — Isso nã o é uma piada, porra.
Você nã o pode correr pela cidade fazendo que porra quiser. Ninguém
tem tempo para ficar de babá para você o dia todo, está entendendo?
Não chore. Não chore. Não chore.
Levei um segundo para perceber que estava piscando muito.
Piscando enquanto olhava para o teto em vez do rosto do meu chefe.
— Iris — ele grunhiu, seu tom ainda sustentando a nota ligeiramente
histérica que transmitia a extensã o da sua raiva. — Você entende?
Nã o tive forças para responder com palavras, entã o tive que me
contentar com um aceno de cabeça. Um aceno de cabeça que dirigi ao
teto, enquanto tinha que dizer a mim mesma que nã o choraria na frente
dele ― deles.
Quero dizer, eu entendia que ele tinha razã o. E entendia
completamente que ele estava cuidando de mim. Mas de verdade? Era
assim que ele ia fazer as coisas?
Assim que minha explicaçã o toda atrapalhada saiu, o mesmo
aconteceu com a pequena quantidade de orgulho que ainda me restava
depois de ter levado grito.
Também podia ser um pouco infantil, mas eu estava muito magoada
e humilhada para me importar.
— Nã o achei que isso importava depois que me deixaram sozinha a
noite toda, Charlie. — Por Charlie, eu realmente queria dizer Babaca.
Ele abriu a boca apenas uma fraçã o antes de fechá -la. Seus olhos
azul-escuros se estreitaram.
— Volte para a porra do estú dio — ele estrilou.
Esse idiota ia levar um chute no saco. Se eu nã o fosse obrigada a ficar
na casa dele, ele levaria o chute no saco e eu colocaria detergente de
louça na comida dele. Dex tinha razã o. Desse jeito, nã o havia dú vida,
mas ter razã o nã o significava que você precisava ser um completo
imbecil.
Além disso, Sonny nã o tinha me dito que Dex precisava que alguém
contasse para ele quando ele estava sendo um idiota? Claro, eu tinha
feito pior, mas essa nã o era a questã o. Ele nã o sabia disso, e nunca
saberia se isso era alguma indicaçã o de como ele lidava com as coisas.
Entã o ele que se fodesse. Inspirei brusca e profundamente para
afastar as lá grimas que estavam ali e forcei um sorriso. Era feio e
antinatural, mas, naquele momento, eu nã o me importava. O cara era
um homem de palavra. Ele me aguentaria até Sonny voltar.
Eu acho.
Dando aquele sorriso assustador, fiz uma reverência para ele,
olhando direto naqueles olhos escuros.
— Como quiser, Vossa Majestade.
Luther deu um sorriso irô nico quase imperceptível.
Mas Dex? Dex só me encarou de volta.
— Você vai deixar ela falar com você assim, cara? — perguntou o
sujeito que eu nã o conhecia.
Aqueles olhos azuis oscilaram diretamente de mim para o homem.
Dex olhou para o homem ainda mais agressivamente do que tinha
olhado para mim.
— Nã o me lembro de pedir sua opiniã o, cérebro de bosta, entã o cale
a porra da boca.
Se eu nã o estivesse tã o irritada e magoada, provavelmente ia
apreciar suas palavras, mas eu estava.
O homem fez um barulho na garganta.
— D…
Tossi e dei um passo para trá s.
— Vou voltar para o estú dio — eu disse em uma voz tranquila,
observando Dex enquanto ele mantinha o olhar firme em seu irmã o do
MC.
— Me mande mensagem quando estiver indo para casa mais tarde
— ele grunhiu, ainda sem desviar a atençã o do homem.
Olhei para Luther para vê-lo observando os dois homens mais novos.
Ah, dane-se!
Nã o me incomodei em dizer mais nada antes de me virar e ir em
direçã o à porta. Desci a escada correndo o mais rá pido que pude,
porque, de repente, senti vontade de chorar de novo.
A expressã o do Magrã o quando empurrei a porta da Pins dizia muita
coisa.
Se ele fosse propenso a roer as unhas, acho que estava prestes a
fazer justamente isso. No entanto, ele sorriu se desculpando, linhas
enrugando sua testa.
— Você está bem?
Inclinei a cabeça de lado e o observei com os olhos arregalados, ao
dar a volta na recepçã o para soltar minha bolsa no chã o. Por algum
milagre, consegui nã o chorar.
Assim que eu havia entrado no carro, percebi que nã o conseguia
exatamente chorar de tanto que eu estava chateada e envergonhada.
Fazia sentido que Dex ficasse puto. Eu entendia. Realmente entendia. O
problema era que ele tinha me insultado de novo, e o fato de ter sido
feito em pú blico piorou ― um pouco mais. Ficou claro que eu era um
inconveniente, mas era necessá rio colocar as coisas como se eu fosse
uma criança burra?
Meu peito doía e eu havia começado a chorar de soluçar como louca
enquanto dirigia os dois quarteirõ es até a Pins.
Mas dane-se, eu nã o ia fazer isso. Nã o ia chorar sem motivo.
Tudo bem, havia um motivo, mas isso era outra histó ria. No fundo, eu
sabia que o que tinha feito era para lá de idiota. Se alguém tivesse
descoberto, eu só podia imaginar que tipo de tempestade de merda o
Babaca teria levantado. Merda, Sonny provavelmente teria descoberto e
eu realmente duvidava de que ele tivesse algum problema em enfiar
juízo na minha cabeça.
Entã o eu levaria esse pequeno sermã o para o tú mulo comigo, pelo
visto.
— Estou bem, sim — falei, mas a realidade era que minha voz
parecia mais esganiçada que o normal. Obviamente, eu nã o estava
completamente bem.
A ú ltima coisa que eu queria era ver qualquer integrante do Fá brica
de Viú vas num futuro pró ximo, menos ainda Dex. O que nã o funcionava
exatamente, já que eu estava hospedada na casa do cara. Que saco.
Magrã o me deu um olhar incrédulo que mal ofuscou seu olhar de
desculpas.
— Ele estava puto?
Funguei, fazendo meu amigo ruivo franzir o rosto.
— Sei. Foi mal, Iris. Sabe que a gente nã o liga se você der uma saída,
mas Dex ligou logo depois de você sair. Entã o ele ligou de novo de dez
em dez minutos depois disso para saber se você tinha voltado. — Ele
mostrou os dentes. — Desculpe.
Como se eu pudesse ficar brava com o Magrã o por ser sincero. Dei de
ombros e remexi na bolsa para encontrar um chiclete e joguei outro
para ele.
— Está tudo bem. Eu nã o deveria ter desaparecido por tanto tempo.
— Isso meio que era verdade.
— Ficamos todos um pouco preocupados. — Ele deu um sorriso
radiante para mim. — Isso só significa que a gente gosta de você.
Se chamar alguém de uma puta de uma idiota era uma maneira de
mostrar afeto, entã o eu definitivamente nã o queria ter nenhum amigo.
— Flor.
— Flor.
Me senti ser movida, sendo empurrada de um jeito que meu rosto
pressionou as almofadas do sofá em que vinha dormindo nos ú ltimos
dez dias. Um corpo grande e quente se aninhou à s minhas costas,
deslizando um braço pela minha cintura.
— Dex? — perguntei, com a voz rouca, abrindo um pouquinho os
olhos na sala escura. A contar pelo tanto que minha garganta parecia
seca, eu devia estar dormindo havia muito tempo.
— Sim — ele murmurou no meu ouvido. A mã o que estava no meu
quadril escorregou para tocar minha bochecha com as pontas macias
dos dedos.
Olhei por cima do ombro, para ele, tentando piscar para afastar o
sono.
— O que você está fazendo?
Porque sério? O que ele estava fazendo? Mesmo depois de eu ter me
desculpado por algo que nã o era inteiramente culpa minha, ele tinha
continuado me dando gelo lá no estú dio, na volta para casa e nos trinta
minutos que tínhamos passado perto ao jantarmos no sofá . Babaca. A
ú ltima coisa que eu esperava era ele deitar no sofá comigo no meio da
noite, pronto para ficar de conchinha.
Nã o que eu fosse reclamar, mas ainda assim…
Dex moveu os quadris até meu traseiro estar encaixado na sua
virilha.
— Nã o consigo dormir — ele sussurrou, por alguma razã o. Eu nã o
tinha como ter certeza, mas acho que ele pode ter pressionado os lá bios
na minha orelha. — Tenho sido um merda, flor.
Ai, Senhor, eu queria dar uma resposta sarcá stica, mas me segurei.
Também precisei me segurar para nã o pedir para ele sair do sofá . O que
era uma idiotice, porque os alarmes na minha cabeça tinham disparado,
me dizendo que essa proximidade era péssima.
Mas, bem, eu nã o havia deixado meu juízo na Fló rida? Meu juízo e a
droga do meu cérebro.
— Sei que sou um imbecil, flor. Você sabe que eu sou um imbecil. —
Dex pontuou cada declaraçã o movendo a ponta do dedo da minha
orelha para o queixo. — Principalmente quando eu fico irritado. — Ele
pontilhou o fim da frase com suspiros, como se admitir aquilo fosse
doloroso ou esquisito, e eu tenho certeza de que era. O nú mero de vezes
que ele tinha se desculpado na vida tinha que ser tã o pequeno quanto o
nú mero de caras que eu havia beijado.
Ele afagou a curva da minha orelha com o dedo.
— Eu nã o tenho noçã o de que porra estou fazendo com você, sabe?
Ah, caramba.
Virei a cabeça para trá s, para poder olhar para ele.
— Nem eu, Dex.
Sua expressã o era suave e mais sincera do que eu já havia visto. Ele
passou a ponta do dedo pela minha orelha de novo, arrancando
arrepios do meu braço. Repetiu o gesto algumas vezes, seu fô lego
quente contra o meu pescoço.
— Flor, você me faz querer matar cada filho da puta que te olha. Sabe
como é isso?
Eu me lembro como tinha me sentido horrível ao ver o braço dele ao
redor daquela ruiva. Afff. Naquele momento, me senti sincera o
bastante para assentir.
Ele passou a mã o pelo meu pescoço, cobrindo toda a extensã o com a
palma grande.
— A droga da minha cabeça doeu quando você disse que aquele
merda colocou a boca em você. E sabe no que nã o consegui parar de
pensar? No quanto aquele filho da puta ia amar machucar você para se
vingar do Clube e do seu pai, flor. Quando você me disse que esteve no
Busty’s… eu perdi a cabeça. — Dex passou o dedo pelo canto da minha
boca, me afogando em uma bruma profunda que nada tinha a ver com o
sono. — Desculpe por ter gritado com você daquele jeito. Desculpe por
ter te magoado. Se outra pessoa tivesse feito a merda que você fez, eu
teria cortado a porra da língua dela fora, Ritz. Pensei que Lu fosse fazer
exatamente isso comigo depois que você saiu. — Ele deu uma risadinha
soturna.
Dex soltou outro suspiro, chegando tã o perto que era como se fosse
um cobertor humano.
— Eu ferrei com tudo na minha vida, mas gosto de aprender com
meus erros e dar um jeito neles. Eu deveria ter dito algo para você lá na
Pins esta noite, quando você falou com o meu pai, mas nã o consegui.
Tenho dificuldade para superar quando as pessoas mentem para mim,
flor, mas você ter feito aquela merda e a apariçã o do Liam quase me
fizeram ter um troço. Aí você foi e me protegeu do meu pai, e me disse
que pensava que todo mundo achava que você fosse um estorvo. Isso
quase acabou comigo.
Ah, caramba.
Foi a minha vez de suspirar na almofada do sofá , esmagando meu
rosto para que eu nã o soltasse nenhum som vergonhoso.
— Entendo… mas alguém gritando comigo daquele jeito foi
constrangedor.
Ele soltou um gemido que era pura culpa.
— É , eu sei.
Eu nã o disse nada, o que me rendeu um resmungo baixinho.
— Nã o vai se repetir — adicionou ele, naquela voz sedosa que nã o
estava acostumada a pedir desculpas.
— Acho que você já disse isso.
O mesmo som abriu caminho dentro dele.
— Flor, vou dar o meu melhor, desde que você nã o volte a mentir
para mim.
A droga da sinceridade dele me pegava de jeito todas as vezes.
Suspirei de um modo um pouco mais exagerado que o necessá rio ao me
lembrar do tom duro que ele tinha usado.
— Você falou como se me odiasse — confessei, afundando ainda
mais o rosto no sofá .
Dex estendeu a mã o para me puxar de volta e inclinou meu rosto
para o seu. Seu olhar era intenso, decidido.
— Jamais pense isso. Posso ficar com raiva, e posso descontar as
merdas em você, mas isso… nunca. Nunca mesmo, caralho, você ouviu?
O rosto dele estava sincero e solene. Verdade estava estampada nas
linhas dos seus lá bios e nas dobras das suas pá lpebras.
— Revirei a cidade atrá s de você, Ritz. Você acha que eu faria isso
por outra pessoa?
Ele? Nã o. De jeito nenhum. E a realidade daquilo me deixou mais
feliz do que provavelmente deveria.
A pura emoçã o que eu sentia emanar de Dex, o temor, a necessidade,
o arrependimento… era tudo tã o estranho. E eu estava destroçada em
pedacinhos tã o minú sculos que aquilo me fez me sentir insignificante,
mais carente do que queria. Ainda nã o entendia a situaçã o, nã o
entendia Dex, mas talvez isso jamais acontecesse.
— Ei… o que houve com o seu rosto?
Um rosnado baixo veio rolando por sua garganta. Ahhh, caramba.
Devia ser algo relacionado a mim.
— Vamos apenas dizer que alguém pensou que se safaria dizendo o
mesmo tipo de merda que você.
Foi todo aquele meu discurso de “vá se foder”. Eu sabia.
— Foi um dos membros do Clube?
A resposta dele foi outro grunhido minú sculo de aviso.
É , tinha sido alguém que estava na sala com a gente. Ah, bem. Se Dex
achava que eu ia mudar de ideia e me desculpar por dizer aquilo, ele
poderia tirar o cavalinho da chuva.
— Estamos de boa? — ele sussurrou no meu pescoço.
— Estamos. — Assenti. — Estamos de boa.
— Que bom. De verdade. — Os quadris dele se moveram inquietos
atrá s de mim, inclinando-se para frente em um movimento brusco que
fez parecer que estava tentando se acomodar melhor no sofá .
O ú nico problema era que ele nã o cabia lá . Era estreito demais
mesmo quando estávamos cada um de um lado. Entã o nã o era
nenhuma surpresa o fato de ele nã o parar de se remexer.
— Acho que isso nã o vai dar certo, Ritz — disse ele, por fim, depois
do que pareceu ser um rebolado contra o meu traseiro que me mandou
de cara para o encosto.
Gemi minha resposta.
Ele rosnou, depois se moveu, e rosnou de novo.
— Caralho, isso é uma merda.
Com um bufo frustrado, o calor do corpo dele desapareceu antes de
eu sentir seus dedos se esgueirarem pelas minhas axilas e me puxarem
para trá s.
— Vamos.
— Quê? — perguntei, conforme ele me puxava, me arrastando do
sofá . Firmei os pés no chã o e me empurrei para ficar de pé.
— Minha cama.
Minhas juntas travaram.
— Humm… — Deitar ali no sofá tinha parecido ok, mas deitar na
cama era outra conversa.
E ele sabia, porque revirou os olhos e prendeu minha mã o na sua.
— Flor, pare de pensar demais.
— Ah.
Dex entrelaçou os dedos com os meus, me puxando.
— O que está te incomodando?
Que tal tudo? Deitar na cama com um Dex sem camisa? A forma
como meus ová rios tinham estado superaquecidos ultimamente? Ai,
caramba. Nã o que eu pudesse dizer isso. Seria como jogar isca em á guas
infestadas de tubarõ es.
— Eu nunca… — Engoli em seco.
— Você nunca o quê? — ele grunhiu as palavras.
Senhor. Afundei um dedo nas costelas dele e olhei para o seu rosto
tenso.
— Nunca dormi na mesma cama com um cara, Charlie. Além de você,
naquele dia.
Ele fez uma das ú ltimas coisas que eu teria esperado. Dex me
encarou por um momento antes de jogar a cabeça para trá s e bufar para
o teto.
— Você está acabando comigo, flor. Você está acabando comigo.
Dex puxou minhas mã os ao baixar o queixo para me olhar nos olhos.
Sua mã o livre avançou para segurar meu queixo. A expressã o dele era
límpida e séria.
— A gente nã o vai fazer nada que você nã o queira. Prometo. Só
dormir.
Minha nossa.
Assenti para ele de forma vaga, confiando implicitamente.
— Tudo bem. — Minha respiraçã o acelerou um pouquinho. — Nã o
faço isso com todos os meus amigos, sabe?
Foi o sorriso adulador que ele abriu para mim em seguida que me fez
ir para a cama com ele, mesmo meus nervos estando à flor da pele.
Quero dizer, só se vive uma vez. E era ele.
Alguém que gostava de mim tanto quanto eu gostava dele.
Eu confiava nele.
E, naquele momento, nã o estava assustada nem preocupada
enquanto o seguia até a cama. Mas, quando nos deitamos, no escuro,
com todo o nervosismo do universo se empoçando no meu ventre, ele
tocou minha testa com a ponta dos dedos e murmurou:
— É melhor você entender de uma vez, flor. Isso nã o é apenas
amizade para mim.
Havia alguma coisa encostada na minha bunda, sem dú vida.
E nas minhas costas.
E no meu pescoço.
E sem dú vida foi a coisa na minha bunda que me acordou.
Geralmente eu nã o sonhava, entã o quando senti aquele calor
desconhecido apertando minha bunda nua, eu sabia que nã o era um
sonho.
De uma coisa eu tinha certeza: estava na cama do Dex, e os lençó is
estavam puxados até minha cintura.
Eu tinha caído no sono por cima deles. Sabia disso com toda certeza.
Piscando para afastar o que parecia um sono irresistível, olhei para trá s
para ver o que estava em cima de mim.
E nã o deveria ter ficado surpresa.
A protuberâ ncia sob o lençol estava ligada a um braço musculoso
conectado a um bíceps enorme com uma impressionante definiçã o,
mesmo quando nã o estava sendo flexionado.
A maldita mã o de Dex estava dentro da minha calcinha, espalmando
minha bunda nua.
Só dormir, ele disse?
Tentei rolar para longe, mas aquela coisa nas minhas costas era
pesada e forte, o que me dizia que era o peito do Dex, me esmagando.
Entã o o que estava no meu pescoço só podia ser parte da anatomia
dele.
Minha nossa.
Em que eu estava pensando quando tinha aceitado vir dormir com
ele?
Estava pensando que você gostava dele. Que você confiava nele.
Se ele nã o fosse um cara do Fá brica, talvez eu nã o estivesse tã o
assustada, nã o é? Meu instinto sabia que era um sonoro sim. Era
mesmo só aquilo que me mantinha afastada dele? Nã o era o pavio
curto, eu poderia lidar com aquilo, a menos que ele gritasse comigo.
Dex, Charlie, era muito mais do que sua aparência insinuava. Ele parecia
babosa: á spero e espinhento por fora, mas por dentro todo molenga e
delicioso.
Provavelmente ele reviraria os olhos se eu dissesse isso em voz alta,
mas era verdade.
E foi por isso que tentei fingir naturalidade enquanto seus dedos
longos agarravam minha bunda. E seu há lito soprava no meu pescoço.
Quando tentei deslizar de debaixo dele, a mã o na minha bunda foi
para as minhas costelas para me segurar no lugar.
— Aonde você vai? — perguntou Dex, as cordas vocais tensas por
causa do sono.
Congelei e sussurrei:
— Banheiro.
Ele bocejou e flexionou os dedos.
— Mentirosa. Volte a dormir — murmurou, já se aninhando naquele
ponto de pele que ficava entre o ombro e o couro cabeludo. Mais
desperta agora do que antes, eu conseguia sentir o calor da sua boca a
milímetros de mim.
— Dex — sussurrei.
Suas mã os se moveram por minhas costas e deslizaram por
completo dentro da minha calcinha de algodã o, e seu polegar desenhou
círculos preguiçosos na pele embaixo.
— Dex! — É , nã o soou nada convincente.
— Por favor, volte a dormir. — O calor da sua boca só se intensificou
em uma proporçã o de mil para um quando ele murmurou em resposta.
O coitado do meu corpo nã o conseguia lidar com o grande e quente Dex
aninhado em mim.
— Vou dormir no sofá .
Ele resmungou, fazendo arrepios irromperem pela minha pele.
— Dex, se liga — tentei pedir, mas ele nã o se moveu um centímetro.
Ele nã o disse nada, e seu polegar simplesmente continuou
desenhando círculos lâ nguidos bem no meio da minha bunda. Parecia
que a parte superior do corpo dele tinha se aproximado ainda mais.
— Relaxe, flor — murmurou, por fim.
Como se isso fosse acontecer. Todo o meu corpo estava tenso. Dizer a
mim mesma que aquilo nã o era certo era como lutar contra a maré do
oceano. Nã o era natural.
— Nã o consigo.
— Consegue, sim. — A palma macia da sua mã o agarrou minha
bunda, e respirei fundo. Por que eu estava resistindo, caramba?
— Nã o sei o que estou fazendo — falei, e fechei os olhos com força.
Sua risada era suave e misteriosa.
— Eu sei, minha florzinha.
Eu deveria simplesmente desistir de viver depois dessa. De viver, de
resistir, de existir. De tudo isso.
Antes que eu desse por mim, a mã o dele tinha saído da minha
calcinha, e o peso do seu corpo tinha sido arrancado das minhas costas.
Duas mã os grandes e familiares agarraram meus tornozelos logo
depois, me virando de costas.
E, em seguida, ele estava em cima de mim.
Ele se apoiou sobre as mã os e os joelhos, e seu rosto lindo e má sculo
coberto pela barba por fazer estava bem ali. Lá bios macios, olhos azul-
carbono e Uriel, todos me cumprimentaram.
Se tudo isso nã o bastasse para me capturar, ele estava sem camisa. A
pele suave e beijada pelo sol era firme sobre os mú sculos muito bem
delineados, os quais ele desenvolvia uma boa parte da semana na
academia de casa. Mas entã o ele se posicionou acima de mim, sem a
estranheza de uma amizade recente, como tinha sido antes. Caramba,
nã o era a mesma da semana anterior, depois do aniversá rio da sobrinha
dele…
Minha nossa. Minha. Nossa.
Nã o fazia muito tempo que eu o tinha visto sem camisa e isso nã o
valia de nada porque o torso dele era uma dessas coisas que só
melhoravam todas as vezes que eu via.
A primeira coisa que notei de novo foram as argolinhas de aço
inoxidável atravessando os mamilos perfeitos e escuros. Mamilos
pequenos em um peito musculoso e acima de uma barriga tanquinho
perfeitamente desenhada. Um tanquinho que levava para a placa reta e
deliciosa dos mú sculos em formato de V que desapareciam sob a boxer
preta… que nã o fazia nada para esconder a barraca enorme que estava
armada ali.
E foi quando me lembrei que ele tinha um piercing no pau.
Era um mistério nã o resolvido o fato de eu nã o ter desmaiado. O que
nã o era um mistério nã o resolvido era a razã o para minha boca ter
ficado seca. Eu tinha certeza de que havia parado de respirar. Qualquer
mulher ou homem teria feito o mesmo.
Dex era… melhor que qualquer coisa que eu já tinha visto impresso
ou na televisã o. E eu poderia até mesmo dizer “celestial” se ele nã o
parecesse trabalhar para o diabo em vez de para os caras bonzinhos. As
linhas escuras e coloridas que se espalhavam praticamente pelo seu
torso todo realçavam sua beleza assombrosamente etérea. Ao longo dos
ú ltimos meses, eu nunca o tinha visto usando algo que nã o fosse jeans e
camiseta, exceto pela viagem a Houston e da outra vez que tínhamos
dormido juntos na cama.
E, naquele momento, eu estava grata por ter levado tanto tempo para
que o visse tã o de perto. Cada um dos braços cobertos de tinta que eu
via, dia apó s dia, se espalhava para seus ombros, trapézio e peitoral. Só
a barriga tinha sido poupada do preto, azul, cinza e vermelho intensos
que coloriam sua pele. Uriel, o polvo tatuado nele, me cumprimentou
com seus belos e grandes detalhes e sua clá ssica pele vermelha
marcante.
Arrastei o olhar das cores vívidas e o direcionei para entre suas
pernas, e voltei para cima de mim. Eu o encontrei me observando com
aqueles olhos azuis brilhantes encobertos pelas pá lpebras pesadas.
— Caramba. — Sua voz havia assumido um tom profundo, parecia
efeito de algo mais que apenas o sono. — Em que caralho de universo
achei que poderia dar ouvidos ao seu irmã o?
Bom Senhor.
Ao que parecia, mesmo que eu pudesse evitar desmaiar por causa
daquela gló ria em que eu estava presa, minha voz tinha morrido umas
mil vezes por causa da perfeiçã o de Dex. Entã o precisei responder com
um sorriso trêmulo e nervoso.
— Iris.
Deus do céu.
— Eu jamais machucaria você, linda — murmurou Dex.
Aquilo era surreal.
Eu o desejava, o que era ruim, porque sabia que deveria sair dali e
agir como uma garota séria. Como uma garota que havia visto a mã e
desmoronar sob os efeitos que um motoqueiro poderia causar a um
coraçã o… a uma vida. Mas o homem em cima de mim nã o era do tipo
que sumia no mundo. Ele era leal e afetuoso, e sua proteçã o me envolvia
em um casulo que era todo fogo e sensaçã o. Eu poderia viver sem
aquilo, é claro. Eu poderia viver sem aquilo e ficaria perfeitamente bem,
mas… esse cená rio mais parecia o inferno.
Eu aceitaria, droga. Eu aceitaria esse Dex com seu gênio horroroso
que nunca tinha me feito duvidar de que ele se importava e se
preocupava, embora ele nã o soubesse lidar consigo mesmo a maior
parte do tempo. Meu corpo decidiu se comprometer e aceitar a
realidade das tatuagens, o foco dos olhos azuis que estavam me
capturando.
Dex me observou parecer hipnotizada, como um animal pego pelos
faró is de um carro, imó vel e assustado. As linhas do seu corpo eram
meu canto de sereia, me mantendo em sua teia enquanto ele
permanecia no lugar, completamente parado. A barriga, os bíceps, as
coxas musculosas, as quais apreciei rapidamente ao passar os olhos por
elas, tudo isso me chamava.
Ele pegou meu pulso com uma das mã os, e apertou a parte de trá s do
meu pescoço com a outra. O calor do seu corpo irradiava através das
minhas roupas, embora estivéssemos separados por cerca de trinta
centímetros. Nã o ajudou nada eu poder sentir, de mais perto do que
nunca, aquele aroma que era todo Dex.
— Soube, no instante em que te vi, parada em frente ao estú dio, com
medo, que você era uma coisinha inocente. Tã o meiga. Tã o boa. — Ele
baixou a cabeça para prender meu queixo entre os dentes. — Você nã o
faz ideia do que é para mim você me entregar sua confiança, Ritz. Se eu
fosse um homem bom, diria para você ir atrá s de alguém melhor,
alguém que nã o fosse perder o controle porque um filho da puta está te
comendo com os olhos. — A língua dele traçou a forma oval do meu
queixo. — Mas nã o sou um homem bom, e vou tomar tudo o que você
quiser me dar e tudo o que nã o quiser me dar também.
Raios me partam. Ao meio. Em pedacinhos.
Sua voz estava tã o á spera e exposta, o efeito era como se houvesse
milhares de pisca-piscas se acendendo nos meus nervos. E as palavras
dele. Minha nossa. Meus neurô nios nã o conseguiam nem processar o
que ele estava dizendo sem me fazer perder o fô lego.
A testa de Dex tocou a minha bem de leve, como se ele pudesse
sentir a emoçã o borbulhando dentro de mim.
— Eu quero tudo, linda.
Minha expiraçã o saiu trêmula enquanto eu olhava para a beleza
má scula daquela boca perfeita de Dex a poucos centímetros de mim.
— Por quê? — Eu precisava lembrar.
— Por quê? — perguntou ele, naquele tom cá lido e submisso.
— Nã o entendo por que você gosta de mim. Nã o sou seu tipo. —
Porque essa era a minha ú nica defesa. Eu nunca tinha desejado nada,
que dirá alguém, do jeito que eu desejava esse homem tatuado e
grosseiro. Mas uma parte enorme de mim estava preocupada de
verdade com a razã o para ele ter se prendido a mim.
Ele soltou uma risadinha profunda.
— Tentando ganhar elogios de novo? — Seu fô lego verteu sobre os
meus lá bios.
— Nã o.
Eu podia dizer que ele estava sorrindo.
— Claro que nã o — murmurou, mordendo meu lá bio inferior. — Por
onde você quer que eu comece, linda? Quer saber o que gosto em você
além dessa bunda linda? E dessas pernas cobertas por esse shortinho
branco minú sculo?
Os lá bios dele roçaram o canto da minha boca.
— Você tem o rosto mais lindo que eu já vi. — Os lá bios vagaram
pela minha mandíbula, e embora seu há lito estivesse quente, eu me
arrepiei. — E aquele sorriso que você me dá quando nã o está nem aí
para mim? A porra de um sorriso é a ú ltima coisa pelo que eu me
interessaria antes de te conhecer. — Havia uma boa possibilidade de ele
ter tocado meu maxilar com a ponta da língua, porque talvez eu tenha
deixado escapar um som esquisito em resposta. — Mas você me faz rir
como ninguém mais. É disso que mais gosto. — Dex fez um barulho em
sua garganta. — Talvez.
Eu me debatia por dentro. Me debatia e morria de novo e de novo.
Joguei a cabeça para trá s e olhei para a cabeceira.
— Você é demais para mim.
Uma risadinha suave abriu caminho por sua garganta.
— Eu meio que te acho um tesouro.
Foi quando parei de resistir.
Eu nã o me importava mais. Ele era meu chefe, amigo do meu irmã o,
um integrante do MCFV, um ex-presidiá rio e um homem que eu tinha
visto se envolver com outras mulheres. Mas ele era tudo o que me
capturava, para o bem e para o mal. Na pior das hipó teses, se as coisas
ficassem estranhas entre nó s, eu poderia ir para outro lugar. Eu já havia
superado uma má goa épica antes, outra nã o me mataria.
Tomara.
O que eu tinha a perder além de continuar a viver minha vida atrá s
de paredes muito bem construídas?
Nada. Absolutamente nada.
Tive que juntar toda a minha coragem e determinaçã o antes de
pressionar os lá bios no lá bio superior dele. Foi um encaixe lento, fá cil.
Mas, ainda assim, o nervosismo comeu o revestimento do meu
estô mago quando afastei a boca só o suficiente para beijar seu lá bio
inferior da mesma forma. Dois dos meus, para um dos dele.
Repeti. Beijando o lá bio superior primeiro, depois o inferior. Beijos
simples e castos que Dex enfrentou com paciência. O tipo de beijo que
ele devia ter superado no ensino fundamental. Eu tinha acabado de
lamber meus lá bios com toda a intensã o de beijá -lo de novo quando ele
franziu os dele em resposta, me beijando com aquela boca macia. Suave,
suave, suave. Sua boca tocou meu lá bio superior, depois o inferior. Um
canto da minha boca, depois o outro.
Aqueles beijos foram tudo o que os outros dois nã o foram.
Explorató rios de um jeito que me deixou ofegante e agitada. Foram
puros e pacientes até que ele começou a sugar um lá bio e depois o
outro. Porque, depois disso, ficou tudo molhado. Lento e sensual. Dex
inclinou a boca, deslizando a língua de forma tã o discreta que nã o a
percebi até ela roçar a minha.
Choraminguei quando seu braço deslizou pelas minhas costas. Ele
abaixou o corpo até estarmos no mesmo nível. Meus seios no seu peito,
barriga com barriga, virilha com virilha. Com apenas a barreira da
minha camiseta térmica, da nossa roupa de baixo e o short fino com que
eu dormia, eu podia sentir cada centímetro dele. E isso incluía a
cutucada dura dos seus piercings de mamilo no meu peito sem sutiã .
Minha nossa.
Eu tinha sido beijada antes, e entre aqueles beijos, eu tinha posto
minha mã o e boca em um dos meus dois namorados. Entã o, exceto por
essas poucas vezes, os poucos beijos, o pornô a que eu assistia e os
romances que eu lia, sabia por alto como as coisas eram. Mas com Dex,
e sua boca cá lida e insistente, as mã os fortes e possessivas, e aquele
corpo forte, tatuado e angelicamente dotado, eu me sentia como se
tivesse acabado de me formar na escola e entrado na faculdade. Melhor
ainda, ter ido da escola direto para o mestrado.
Minhas mã os, de alguma forma, conseguiram encontrar o caminho
até a cintura de Dex enquanto sua boca controladora assumia. Meus
dedos se curvaram nos mú sculos fortes que protegiam seus quadris.
Senti dedos ao redor da minha cintura começarem a vagar mais para
baixo, segurando a bainha da minha camiseta bem devagar. Tive um
mini ataque de pâ nico, pronta para detê-lo caso ele tentasse tirar minha
blusa. Eu nã o tinha um corpo espetacular, mas sempre havia me
considerado medianamente bonita pela maioria dos padrõ es. Minha
barriga até que era chapada, e minha pele tinha uma pinta ou outra.
Eu era bonitinha, meu corpo era bonitinho, mas eu nã o estava pronta
para que ele soubesse do meu braço. Ainda nã o.
Entã o, embora eu soubesse que nã o tinha o corpo de uma modelo
nem de uma gostosona, como as mulheres com que eu imaginava que
Dex estava acostumado, a contar por aquelas que tinha visto com ele
antes, eu nã o estava muito insegura. Mas ele puxou minha blusa para
cima, para cima, para cima. Passou pelo umbigo, pelas costelas e seios
até que parou. Obrigada, obrigada, obrigada. Ele parou, amontoando
minha blusa logo abaixo da clavícula. Mas quando os olhos de Dex
pousaram no meu torso, trilharam um caminho ardente até minha
clavícula e pousaram específica e, ao que parecia, permanentemente
nos meus seios, e fiquei um pouco autoconsciente demais, mas nã o
tanto ao ponto de me cobrir.
Com um suspiro, ele resvalou as costas dos dedos pelos meus
mamilos, fazendo-os enrijecerem no mesmo instante. Dex estendeu a
outra mã o, e o polegar se apoiou bem debaixo do seio. Ele verificou o
peso ao erguê-lo com o dedo.
— Iris — disse ele, alongando a consoante final em um sibilo.
— Humm?
As costas dos dedos voltaram a resvalar o meu mamilo.
— Perfeito, linda — murmurou, beliscando o bico ereto com o
polegar e o indicador, me fazendo arquejar com a sensaçã o.
— Amo esses seus peitos lindos.
Eu estava prestes a agradecer o elogio que eu tinha certeza de que
ele estava sendo bonzinho demais ao dar, quando sua cabeça desceu e
seus lá bios se fecharam ao redor do mamilo que ele tinha beliscado. Ele
sugou devagar, passando a língua por ele a cada vez.
A boca de Dex se abriu mais, engolindo o má ximo da minha carne
macia que conseguia. Com dentes e lá bios, ele mordiscou, sugou e
lambeu sem parar.
Tudo em que eu conseguia pensar era: minha nossa, é gostoso demais.
Olhos azuis iridescentes observavam meu rosto a cada puxar da
sugada forte, e se o que ele estava fazendo nã o fosse a coisa mais
sensual da histó ria do mundo, entã o ele me observar enquanto fazia
isso, era. Aqueles lamentos profundos em sua garganta vibravam
através de mim, me excitando tanto quanto o que ele fazia.
Eu murmurava coisas sem sentido. Um misto de “Dex… Deus… Dex…
merda” e palavras entre elas que eram contrá rias à ló gica.
Seu fô lego estava quente no meu peito quando ele se moveu para
morder o outro mamilo de leve. Queria tocá -lo antes que eu queimasse
até a morte por causa da intensidade do nosso contato. Minhas mã os se
moveram para segurar sua cabeça, seus ombros. Uma trilha que ia e
voltava que me fazia roçar as pontas curtas e sedosas do seu cabelo
escuro bagunçado pelo sono.
Sua boca enfim se afastou do meu peito depois de uma lambida
preguiçosa em cada mamilo molhado. Os intensos olhos de Dex
estavam em mim, seus lá bios ligeiramente entreabertos antes de sua
boca atacar a minha de novo, tomando tudo sem nem pensar duas
vezes enquanto sua mã o agarrava por cima do meu short. Seus dedos
deslizaram por uma das minhas pernas acima, puxando o short e a
calcinha para o lado, e a parte macia do seu dedo roçou a abertura do
meu sexo.
Ele soltou um ruído rouco e profundo.
— Jesus — murmurou, sobre a minha boca, com os dedos roçando a
linha ú mida da parte inferior do meu corpo.
Eu estava excitada demais para me importar que, na verdade,
estivesse muito molhada e envolvida demais no meu mundinho para
dar a mínima para o fato de eu ter uma mancha ú mida na minha
calcinha para contar a histó ria. E aquele pequeno, ou talvez nã o tã o
pequeno assim, pontinho estava cativo sob a palma de Dex.
Todos os seus dedos, exceto o polegar, se afastaram, deixando apenas
o mais grosso para roçar a fenda bem de leve.
— Você é tã o gostosa, linda.
Minha nossa. Minha nossa.
Dex passou o polegar em mim de novo e de novo. Ele nã o pediu
permissã o quando o indicador me abriu, e seu polegar roçou em mim
mais uma vez com um toque tã o leve quanto uma pena.
Ai, meu bom Senhor. Socorrooooo.
Deixei a cabeça cair no travesseiro debaixo de mim, respirando com
dificuldade enquanto ele me abria, deixando o calor da sua mã o me
inundar.
— Iris, Iris, Iris — entoou ele, e um dos seus dedos foi descendo
entre minhas pernas e continuou o caminho até que a ponta mergulhou
em mim. Em seguida, foi mais e mais fundo. Os olhos de Dex se
fecharam antes de ele os deslizar aos poucos até estar completamente
dentro de mim, com a palma da mã o grudada na carne do lado de fora.
Arquejei. Nã o havia mais nada a fazer a nã o ser chamá -lo de Deus, ou
gemer e implorar para ele fazer o que quisesse, desde que nã o fosse
parar. Do que eu sentia tanto medo? Alguém me diga, por favor. Parecia
que eu estava me afogando e nascendo ao mesmo tempo. Ele tirou o
dedo bem devagar, a linha entre suas sobrancelhas franzindo com o
movimento antes de ele deslizar de volta por completo enquanto
soltava um gemido rouco.
— Caralho — falou ele, em um tom arrastado, como se sentisse dor.
Aqueles olhos azuis brilhantes trilharam um caminho desde o meio do
meu corpo até o meu rosto, intenso e excitado. O peso do olhar de Dex
era esmagador. Sua pele geralmente suave estava corada. Dedos
massageavam o canal escorregadio em que eles se enterraram, e nã o
consegui prender o arquejo.
O lá bio inferior de Dex caiu um centímetro, e ele respirou com
dificuldade.
— Você gosta, linda?
Por algum milagre, consegui inclinar a cabeça para baixo uma vez,
concordando, e ganhei uma lambida na clavícula.
Seus dedos se retiraram bem devagar, a parte macia roçando algo
incrivelmente sensível e inacreditavelmente maravilhoso. Ele fez
movimentos circulares no mesmo lugar de novo, e eu posso ter soltado
um som meio que sufocado.
— Gostosa pra caralho. — O monstro incansável repetiu o gesto de
novo e de novo, enquanto eu me contorcia em sua mã o, alguma parte de
mim querendo e precisando de mais, mais e mais. Arqueei as costas e
movi os quadris em reaçã o. O que Dex fez? Ele gemeu, a respiraçã o cada
vez mais ofegante. — Continue fazendo isso e eu vou passar o dia com o
dedo dentro de você, flor.
Entã o ele começou a torcer os dedos enquanto a boca se mantinha
presa no meu pescoço, beijando, sugando, me respirando. Minhas
costas estavam arqueadas contra ele quando abri ainda mais as pernas.
Devagar, ele deslizou outro dedo para dentro bem naquele momento,
criando o mesmo padrã o de movimentos perigosos que faziam minhas
coxas tremerem de expectativa e minhas entranhas arderem com a
invasã o dos seus dedos.
Ele engoliu em seco ao enfiar os dedos quase até o limite antes de
voltar a tirá -los. Dex balançou a cabeça e lambeu o lá bio.
— Você está me arruinando, flor.
Empurrei os quadris com avidez, amando a forma como ele me
esticava. Qualquer desejo de ser recatada meio que voou pela janela.
— Dex.
Ele gemeu e inclinou a cabeça para me olhar dentro dos olhos
conforme a velocidade dos movimentos aumentava. Seus dedos se
cruzaram, a palma roçando no início da minha abertura a cada
estocada. Os olhos de Dex estavam escuros; e os ombros, tensos,
enquanto ele movia os dedos em mim.
— Você vai gozar na minha mã o, linda? — perguntou, com a voz mais
profunda. Seu corpo estava retesado e pesado sobre mim, e acho que
ele talvez tenha começado a suar, mas eu era egoísta demais para ter
certeza.
Engoli em seco e assenti, arrastando os olhos pelo declive colorido
do seu peito detalhado até pousar no volume sob sua cueca boxer que
parecia ter ficado maior em um piscar de olhos. Alguma parte profunda,
possessiva e sexual em mim queria tocá -lo. Minhas habilidades podiam
nã o ser motivo para eu me gabar, mas será que era difícil demais? Meu
namorado da época da escola tinha gozado na calça só de a gente se
esfregar um no outro.
Tudo bem, certo, era completamente diferente, mas ainda assim… eu
havia visto pornô suficiente, mesmo se minha habilidade de um-contra-
um nã o fosse digna de confiança. Minhas mã os tremiam por causa dos
nervos.
Entã o, mandei aquela parte do meu cérebro ir dormir por um
segundo, em seguida, estendi a mã o, afundei os dedos no có s da sua
cueca e puxei o elá stico para baixo, apenas o suficiente para que a
cabeça larga e redonda do pau espiasse de lá . A cabeça em formato de
ameixa e de um tom profundo de rosa que nã o tinha um piercing.
É , nã o me importei, e nã o estava exatamente decepcionada. Dex
terminou de descer a cueca por seus quadris e suas pernas longas,
observando meu rosto enquanto o seu… Santa-Mãe-de-todos-nós-é-
magnífico.
Ele tinha um piercing. Santo Deus, ele tinha um piercing pú bico.
Uma barra atravessada na junçã o do membro longo ao pú bis, com
duas bolinhas minú sculas de cada lado, como se fosse a joia mais
elegante e eró tica do mundo.
Quando vi aquilo, pude ouvir anjos tocando sinos na minha cabeça.
Havia a possibilidade de eu ter sussurrado um “uau”, mas esperava que
nã o tivesse sido o caso.
Porque, raios me partam, eu tinha visto a luz. E aquela luz tinha vinte
centímetros, um monte de veias e o tom mais fofo de rosa. Sabe, se um
pau rosado monstruoso pudesse ser chamado de fofo.
Alguma parte mais dissimulada do meu cérebro entoava: “Pegue!
Pegue!”. Já a outra metade, a ló gica, ficou em silêncio, me incitando, em
sua quietude, a envolver a mã o ao redor da grossa circunferência. Meus
dedos mal se fecharam ao redor dele, mas o pau saltou quando apertei-
o bem de leve. Ele era muito mais pesado e quente do que eu poderia
ter imaginado.
Eu deveria ter sabido, bem naquele momento, quando minha boca
começou a salivar com expectativa, que havia algo especial, algo
diferente com Dex. O que tinha dado em mim, caramba? Me sentia
despreparada para o que eu queria fazer, e nã o queria decepcioná -lo.
Mas qual era o problema? Eu poderia dar um jeito. Se eu fizesse algo
errado, ele nã o pensaria duas vezes antes de me corrigir, e eu nã o
estava planejando pedir permissã o. Na pior das hipó teses, já tinha
“virgem idiota” tatuado na minha testa…
Seus dedos deslizaram de mim enquanto eu tentava empurrá -lo de
costas. Ficando de quatro, na mesma posiçã o que ele estava antes,
arrisquei dar uma olhada para o rosto dele, angulando meu corpo
perpendicularmente ao dele. Sua expressã o era constrita, implacável e
tã o carregada de luxú ria que cheguei a engasgar. O impulso de lembrar
que eu era bastante inexperiente me agarrou, mas o espantei e respirei
fundo.
Eu conseguiria, caramba.
Eu conseguiria.
Foi com aquela motivaçã o em mente que caí de boca na ponta quente
e em forma de cogumelo, chupando a cabeça com toda a calma do
mundo. Igual a um pirulito, Ris.
Um pirulito grande e grosso. Bem, o pensamento me deixou excitada
até demais conforme eu arrastava a língua pela veia grossa. O gemido
retumbante que escapou do peito de Dex me fez lamber mais rá pido e
curvar os lá bios sobre a cabeça intumescida. Cuidado com os dentes,
cuidado com os dentes, e chupe.
— Caralho! — Ele rebolou. E, por instinto, empurrou-se mais fundo
na minha boca. Me engasguei por um segundo e recuei, em seguida,
pressionei a língua na veia saliente da parte de baixo da ponta bojuda,
como eu tinha lido que outras mulheres faziam. Ele parecia estar
gostando bastante, entã o nã o tinha como eu estar me saindo mal, né?
Senti o roçar da mã o dele naquele lugar entre minhas pernas
enquanto eu lhe dava uma lambida longa e explorató ria que fez seus
quadris terem outro espasmo.
Nã o havia como eu conseguir pensar, muito menos falar, quando os
dois dedos mergulharam em mim, pressionando ainda mais fundo que
antes. Foi violento, e só um pouquinho doloroso por um instante,
conforme ele entrava e saía, devagar de início, mas ganhando
velocidade a cada segundo. A sensaçã o desconfortável foi substituída
muito rá pido pelo prazer. Quanto mais brusco o movimento, mais dele
eu tentava engolir, sugando-o com força.
— Caralho! — gritou ele, movendo os dedos tã o rá pido que eu podia
ouvir o som da umidade dos seus movimentos.
Minha nossa, minha nossa. Um formigamento começou no meu
ventre, explodindo calor por cada centímetro da minha barriga e das
minhas pernas. A palma da sua mã o pressionou meu clitó ris antes de
seus dedos cruzados acelerarem. Um instante depois, a sensaçã o bem lá
no fundo do meu ventre estourou, e o orgasmo que eu jamais teria sido
capaz de esperar tomou o meu corpo. Minhas entranhas se contraíram,
minhas coxas tremeram e gemi o nome de Dex como um agradecimento
inadequado enquanto eu estava ali de quatro, com o pau dele batendo
em sua barriga chapada depois de escapulir da minha boca.
Sua mã o livre foi para a minha bochecha quando ele se sentou,
afagando de leve, beijando os cantos da minha boca enquanto eu
voltava para a Terra e ele começava a se inclinar. Os dedos de Dex ainda
estavam dentro de mim, o movimento lâ nguido e fluido conforme eu
tremia ao redor dele.
Parte de mim esperava que ele tivesse um sorrisinho no rosto, ou
algo igualmente arrogante, mas, quando finalmente tive forças para
olhar, sua expressã o era profunda e livre. Sorri para ele, ainda tonta por
causa do orgasmo, e mais saciada do que jamais esperei ser possível.
É , sem dú vida eu nã o dava a mínima para o recato nem para
esconder o que eu sentia por ele, e ele soube quando sorri, beijando a
lateral da sua boca bem antes de eu estender a mã o para o seu pau e
envolvê-lo com os dedos.
Ele afastou alguns fios do meu cabelo com dedos frouxos que
massagearam meu couro cabeludo. Bombeei a longa extensã o e
adicionei um aperto, de cima até a base. Dex soltou um tipo de barulho
choramingado, os quadris flexionando um centímetro quando ele se
inclinou para trá s, apoiando-se nas mã os.
— Você está indo bem pra caralho, linda… aperte… porra, aperte com
um pouco mais de força, flor. Bem assim… isso.
A boca de Dex se abriu, seus olhos encarando os meus dedos
envoltos nele. Mas eu estava ocupada demais olhando aqueles dois
pontinhos dourados na lateral da minha palma.
— Posso tocar? — pedi, ao olhar para o bastã o do piercing.
Dex gemeu, inclinou os quadris para cima e bufou um “por favor”.
Ri só um pouquinho da sua educaçã o. Sorri para ele ao mesmo
tempo em que baixava a cabeça e lambia as duas bolinhas metá licas
aninhadas nos pelos escuros e muito bem aparados, o comprimento
imponente da sua ereçã o bem no meu rosto. Aproveitei para explorar o
piercing, com timidez.
— Nã o dó i?
Os olhos de Dex brilharam com algo que poderia ter sido diversã o,
mas que acabou sendo algo mais gentil que isso. Ele segurou minha
bochecha de novo, o polegar afagando meu lá bio inferior.
— Nã o, linda, a sensaçã o é ó tima. — Lambi seu polegar, e ele revirou
os olhos. Aqueles cílios grossos se abaixaram enquanto ele gemia.
Dei um beijo nas linhas entre o polegar e o indicador dele, e em
seguida voltei para o seu colo, deixando a ansiedade do que eu estava
fazendo se esvair, minha boca se enchendo dele. Para minha surpresa,
ele nã o moveu demais os quadris, em vez disso, me deixou fazer o que
eu quisesse e optou por ranger os dentes e agarrar os lençó is quando
caiu sobre os cotovelos.
Comecei a chupar em um ritmo constante, bombeando com as mã os
a metade do pau que eu nã o conseguia abocanhar. Os gemidos de Dex
ficaram mais altos, até ele estar arquejando e movendo os quadris,
fazendo seu piercing bater na lateral dos meus dedos.
— Eu vou gozar — gemeu. — Linda, aperte com bastante força. Ah,
isso… puta que pariu… linda, me deixe gozar nesses peitinhos lindos…
por favor…
Ah, caramba. Quem era eu para dizer nã o? Eu o agarrei com mais
força e o tirei da boca com uma chupada desleixada, bombeando o
mú sculo duro e a pele sedosa até ele gemer e longos fios brancos
dispararem para o meu peito.
Dex se deitou na cama, arfando, a boca entreaberta enquanto eu me
ajoelhava diante dele e tentava recuperar o fô lego.
— Puta merda — rosnou, e se sentou depois de um momento.
Ele estendeu os dedos para tocar o líquido viscoso nos meus seios.
Foi gentil e cauteloso com o anelar e o dedo do meio, espalhando o
líquido quente e grudento em movimentos circulares sobre os meus
mamilos.
— Meu Deus, linda, você é a coisa mais gostosa que eu já vi —
murmurou, ao me olhar através daqueles longos cílios quando
finalmente afastou a mã o do meu peito. Ele sorriu quase que com
timidez, passando a mã o limpa pelo meu cabelo antes de inclinar a boca
para a minha. Ele me beijou e me beijou, a língua afagando a minha, os
meus dentes, todos os lugares.
Dex se afastou a contragosto depois de um bom tempo e respirou
fundo. Sentou-se sobre os calcanhares e pegou a cueca que havia jogado
na beira da cama, usando-a para limpar meu peito, e puxou a bainha da
minha blusa para baixo depois que acabou. Aqueles brilhantes olhos
azuis capturaram os meus, e Dex sorriu de novo, aquele sorrisinho
satisfeito e despreocupado que fazia o meio do meu peito doer. Ele
estendeu a mã o e passou um braço ao redor da minha cintura para unir
minha barriga na sua.
Ele estava nu, sua pele quente e ú mida quando me puxou para o seu
peito. A mã o livre de Dex afastou meu cabelo do rosto antes de ele
beijar minha têmpora e minha testa com um murmuro e uma promessa
de familiaridade.
— Você está bem?
A timidez tomou conta de mim, e eu assenti.
— Estou, sim. — Eu nã o ia entrar em pâ nico. — Você está ?
— Acho que descarreguei uns três jatos em você, linda, estou mais
do que bem — disse, ao beijar minha bochecha e soltar uma risadinha.
— Muito mais do que bem.
Eu estaria mentindo se dissesse que aquela confissã o nã o me fez
sorrir.
— Eu…
Ele moveu a mã o para cima de forma tã o fluida que quase nã o vi as
manchas vermelhas nos seus dedos. Eu nã o era idiota a ponto de nã o
saber que aquele vermelho era sangue. Meu sangue. E entã o corei, me
sentindo incrivelmente mortificada.
— Hum… talvez você queira ir lavar as mã os — sussurrei.
Dex franziu a testa e olhou para a mã o a que eu nã o me referira, e
logo ergueu a outra para dar uma olhada. Sua sobrancelhas se
ergueram lentamente quando ele a moveu de um lado para o outro para
dar uma olhada no que havia lá . Seu lá bio inferior caiu aberto.
— Ah, Ritz, eu… — Ele fechou a boca, e as narinas dilataram quando
ele engoliu em seco com um som alto. — Linda, eu tirei sua virgindade?
Foi a minha vez de engolir em seco.
— Eu te disse que nunca tinha dormido com um cara. — Deus, que
vergonha. Eu nã o deveria ter dito nada e só o deixado pensar que era
minha menstruaçã o ou algo assim. — Você tem dedos bem longos.
Ah, Senhor. Que chacota.
Ele piscou uma, duas, três vezes.
— Acho que… porra, flor. Eu nã o estava pensando nisso, acho. —
Seus olhos voltaram para os dedos sujos de sangue. — Tirei mesmo a
sua virgindade?
Que forma de me fazer me sentir um fracasso. O que um hímen
deveria ser? Indestrutível?
— Nã o é a minha menstruaçã o.
Dex soltou um longo gemido baixo. Ele moveu os dedos por instante
antes de juntar o corpo com o meu, e entã o deu um beijo na minha
mandíbula.
— E você está de boa com isso?
Seu cheiro era muito bom. Assenti, deixando a sensaçã o á spera da
sua barba por fazer arranhar minha bochecha. Eu nã o ia voltar atrá s.
Aceitaria tudo de braços bem abertos.
— Estou.
O ronco contente que fluiu do seu peito me fez sorrir.
— Que bom.
— Tio! Tio! TIO! — Dean gritou a plenos pulmõ es, debatendo-se com
cuidado para nã o me chutar. Bem, me chutar de novo. Ele já tinha me
atingido na barriga pelo menos três vezes, mas esse era o risco que
você corria quando fazia cosquinha em uma criança. Era impossível nã o
acabar levando uns tapas ou que nã o fizessem xixi em você. Eu
preferiria mil vezes levar uns tapas.
Cutuquei suas costelas com mais força.
— O que você disse?
— RIS! A Ris é quem manda! — arquejou ele.
— Quem é que manda? — Eu ri, fazendo ainda mais có cegas nele.
Dean jogou a cabeça para trá s, o cabelo loiro voando para toda parte.
— Você! Você!
— Tem certeza?
— Tenho! — gritou ele.
— Tudo bem. — Eu ri, e soltei suas costelas.
O rosto do pobrezinho estava todo vermelho quando ele conseguiu
recuperar o fô lego, e ele me lançou um sorriso enorme e pateta. Depois
de correr atrá s dele por alguns minutos, finalmente o peguei e passei a
hora seguinte brincando com ele na piscina. Fiquei sabendo, depois de
encharcá -lo uma vez, que, ao que parecia, ele era obcecado por
bumbuns em geral.
E o que a gente dizia ao se deparar com algo assim?
Nada. Pronto.
Passamos um tempo brincando de caça ao tesouro no raso; depois
de Marco Polo com duas meninas mais ou menos da idade dele, e aí
começamos com as có cegas.
— De novo? — perguntou ele, arfando.
— Garoto, sua mã e já falou que você tem que sair. — Eu nã o fazia
ideia de quem era o pai dele. Nem sequer reconheci a mã e, mas a
mulher nã o parava de articular um “obrigada” para mim todas as vezes
que ela passava para ver como ele estava.
Ele soltou um barulho de pum.
— Tudo bem.
Apertei as costelas dele antes de levá -lo até os degraus. Dean parou
no mais baixo e deu uma olhada rá pida ao redor. Ainda havia umas dez
pessoas na piscina, mas ele nã o encontrou o que estava procurando
porque, um segundo depois, jogou os braços ao redor do meu pescoço e
me abraçou.
— A gente pode brincar de novo qualquer dia desses? — perguntou,
baixinho.
Ah, caramba, ele ia me fazer chorar.
— Sempre que você quiser, carinha.
Dean me apertou por um milésimo de segundo antes de soltar os
braços.
— Tudo bem. — Ele olhou ao redor de novo e deu um passo para
trá s ao sussurrar: — Tchau, moça do bumbum. — E entã o saiu da
piscina e seguiu em direçã o à mã e, enquanto eu ficava na á gua, que
chegava à altura do meu peito quando estava ajoelhada, sorrindo para
ele.
Eu precisava descobrir quem era o pai. Tinha certeza de que
explicaria muita coisa.
Sozinha pela primeira vez depois de uma hora, nadei cachorrinho em
direçã o ao fundo, onde havia menos pessoas. Mas havia alguém lá ,
sentado na beirada da piscina, de pernas cruzadas e uma expressã o que
era o filho da diversã o e do afeto.
Ah, caramba.
Como eu poderia ficar com raiva dele por coisas que tinham
acontecido antes de mim? Ok, bem, eu poderia, se fosse superbabaca,
mas eu nã o era. Meu coraçã o e cérebro sabiam que as coisas entre nó s
eram diferentes e assustadoras. Ainda assim, ali estava ele, esperando
por mim. Corajoso e seguro como sempre quando acontecia de eu fugir
dele.
— Oi.
— Oi, linda — ele me cumprimentou, plantando as mã os na beirada
da piscina.
Me agarrei lá , mantendo só a cabeça à tona.
— Você comeu?
Ele assentiu, sério, tocando minha bochecha com a ponta do dedo.
— Você parecia estar se divertindo.
— Eu estava. Dean é engraçado.
— Eu vi o moleque bater na sua bunda. — Seu dedo desceu para
delinear minha mandíbula. — Acho que todos nó s vimos você correndo
atrá s dele, flor. — A trilha de Dex seguiu caminho pelo meu pescoço. —
Todo mundo ouviu vocês dois morrendo de rir.
Engoli em seco.
— Essa coisa chega a ser um biquíni?
Assenti.
Ele nã o estava com cara de quem acreditava.
— Gostei bastante, mas talvez nã o tanto na frente desse bando de
pervertidos. — Dex fechou a cara por um instante. — E a porra da Amy
saindo por aí dizendo à s pessoas que você deveria estar procurando um
sugar daddy. Pensei que eu fosse ter que dar uma surra no Wheels
quando ele a ouviu.
— Deixe o pobre do homem em paz. Por que você está sempre
caçando briga com ele?
— Sempre foi assim com a gente. — Uma linha profunda se formou
entre sua sobrancelhas. — Por que você está defendendo o cara? Se
visse o jeito como ele olha para você, nã o estaria pensando que ele
merece qualquer consideraçã o.
Nã o consegui evitar o revirar de olhos e o resmungo. Que exagero.
— Ah, por favor. Nã o achei que você já tivesse chegado à idade de ter
que fazer exame de vista.
As sobrancelhas de Dex se ergueram em ultraje. Que suscetível!
Como sempre, ele optou por se agarrar à parte menos relevante.
— Caralho, você nã o faz a mínima ideia, nã o é? — Dex lambeu o lá bio
inferior. — Porra, você me deixa duro pra caralho, linda. Ainda mais
depois que fiquei te observando tanto tempo com aquelas crianças —
ele sussurrou. — Eu nã o conseguia parar de olhar para você, nem ele.
Ah, droga. Inclinei a cabeça para Dex, sentindo seus dedos se
esticarem para alcançar a lateral do meu pescoço em um aperto
possessivo.
— Está pronta para dar o fora daqui?
Hã , é claro.
— Me deixe sair pelas escadas — pedi, inclinando a cabeça na
direçã o de onde eu tinha vindo.
Dex franziu a testa.
— É só sair daí.
— Na verdade, nã o posso… — Suspirei, pensando nas centenas de
vezes que tinha saído da á gua na academia. — Por causa do meu braço.
A careta que tinha se formado em seu rosto desapareceu. Dex se
agachou e passou os braços por debaixo das minhas axilas.
— Deixe comigo, flor.
Ele me içou e me tirou da á gua antes que eu pudesse falar qualquer
coisa, e nó s dois ficamos de joelhos por um instante antes de ele me
ajudar a ficar de pé. Dex me pegou pela mã o e nos guiou em direçã o ao
lugar em que ele estava sentado antes. Havia menos gente do clube no
círculo à quela altura, uns poucos estavam vagando pelo quintal
acompanhados da família ou comendo.
Ele devia ter pegado minha bolsa enquanto eu estava com Dean,
porque se abaixou e tirou minha toalha de lá .
— Melhor se secar antes de acabar resfriada — disse Dex, com um
tom enganosamente suave.
Olhei para o céu.
— Está sol.
Ele se levantou, segurando a toalha cinza já aberta.
— Me faça um agrado, flor.
Como nã o estava mesmo pensando em voltar para a á gua, assenti e
permiti que ele envolvesse a toalha ao redor dos meus ombros com
tanta força que me senti um burrito humano.
Em um piscar de olhos, ele já tinha me pegado e se acomodado na
cadeira em que estivera sentado. Dex me aninhou de lado em seu colo,
com os braços me envolvendo com força. Os lá bios pressionaram minha
testa. Parecia normal o bastante para quem nos olhasse, mas nã o para
mim. Eu conhecia Dex bem demais. Reconhecia a possessividade do seu
gesto e estaria mentindo se dissesse que nã o tinha ficado animada com
aquilo.
Luther estava sentado na sua cadeira, olhando ao redor do jardim.
Sozinho.
Deixei a cabeça descansar no ombro de Dex.
— Desculpe por mais cedo.
Ele murmurou e os braços fortes me apertaram.
— Eu entendo.
— Entende?
— Ah, entendo — falou ele, no que soou como um rosnado. Era um
rosnado? Eu meio que esperava que fosse o caso. Rawr.
— É melhor aqueles garotos rezarem para que eu nunca os veja em
carne e osso.
— Nã o precisa ficar todo nervosinho — impliquei. — Nã o dormi com
nenhum deles, Dex.
Seu fô lego ficou mais ofegante ao mesmo tempo em que o aperto
vacilou.
— Pensar em você… você com… puta merda, nã o consigo. Nã o
consigo nem dizer.
Dex estava com ciú me? Ciú me? Ah, caramba, acho que meus ová rios
começaram a se descontrolar quando ele gaguejou.
— Pensar em você… — ele pigarreou com força. — Nã o precisa se
preocupar. Nã o gosto de comer a carne onde ganho o pã o.
O olhar inexpressivo que lancei para ele deve ter sido o suficiente
para ele entender que eu nã o tinha entendido exatamente o que queria
dizer.
— Becky foi um erro, Ritz.
Eu o olhei pelo canto do olho.
— Claro.
Ele suspirou, o aperto ficando um pouco mais possessivo.
— Você estava lá naquela manhã , flor. Eu tinha bebido demais na
noite anterior.
Eu tinha estado lá no dia seguinte. As palavras pareciam ter
escapado do alcance antes de eu conseguir apanhá -las.
— É , e você bateu na bunda dela como se nã o tivesse sido um erro
tã o grande assim.
Dex teve a decência de estremecer.
— Nã o posso afirmar que nã o gostaria de voltar no tempo. O que
está feito está feito, Ritz. Existe um motivo para eu nã o encher a cara,
flor. Aprendi a liçã o com o meu pai.
Uhum. Eu sabia que ele tinha razã o. Nesse tempo todo desde que eu
o conhecia, e todas as noites que havíamos passado juntos, ele
raramente tinha bebido mais do que umas poucas cervejas. Com
certeza nã o era o suficiente para que eu duvidasse, por um segundo que
fosse, que ele nã o estivesse no controle total de si mesmo. Ele
geralmente era mais só brio que eu.
E ele estava certo quanto ao pai. Pelo que eu havia descoberto, o
Locke mais velho era alcoó latra, e se Dex sabia disso… bem, ele nã o ia
querer seguir pelo mesmo caminho. De jeito nenhum. Para um homem
que parecia valorizar o controle, seria difícil engolir se ele caísse numa
armadilha dessas.
— E aquela ruiva? Sky?
Ele gemeu, balançando as pernas debaixo de mim. Dex mordiscou o
ló bulo da minha orelha.
— Naquela noite nã o aconteceu com ela nada do que você está
pensando, flor. Ou em qualquer outra noite desde que você entrou no
meu estú dio com suas roupas de patricinha.
A pergunta que escapou da minha boca nã o foi intencional. Juro, mas
todos esses temores que espreitavam nos recô nditos do meu cérebro
nã o sumiriam da noite para o dia. Uma parte de mim ainda precisava da
proteçã o deles, eu acho.
— Entã o por que ela levou seu colete para o estú dio e disse que você
deixou com ela?
— Vai saber. Meu melhor palpite é que ela estava tentando ser uma
cretina e queria uma desculpa para dar uma olhada em você, já que
você estava ficando na minha casa.
Uma sensaçã o sorrateira e esquisita inundou meu estô mago com
algo parecido com pavor…
— Você é a ú nica garota que já levei para casa, Ritz. Acho que ela
ficou com inveja porque a dispensei todas as vezes que ela abordou o
assunto.
Eu ia vomitar, e o rosto do Dex era o meu alvo.
É isso? Era isso que eu ia conseguir? Uma confirmaçã o nauseantes
das vezes em que ela quisera que ele a levasse para casa e ele nã o tinha
levado?
Creio que isso, na verdade, era tudo o que eu queria e precisava. Eu
queria os detalhes? De jeito nenhum.
De. Jeito. Nenhum.
Tudo bem, talvez uma partezinha minú scula e sá dica de mim
quisesse, mas era burrice. O que eu ficasse sabendo nã o poderia ser
esquecido. Melhor nã o.
Eu era forte o bastante para aceitar o papel que Dex tinha criado
para mim. Ele havia me dito o que sentia mais do que umas poucas
vezes de um jeito que, mesmo vago, era poderoso. Eu precisava deixar
de ser infantil e aceitar. Aceitar que eu o conhecia melhor do que
qualquer pessoa. Isso bastaria para mim?
Teria que bastar.
Ele me apertou com força.
— Mas nã o precisa esquentar com nada disso. Há muito poucas
coisas para as quais já dei alguma importâ ncia. Todo o resto… é sazonal,
como minha mã e diria. — Ele pressionou a boca na minha têmpora, e
sussurrou: — E aí você apareceu.
Engula, Iris. Respire, Iris.
Fui completamente engolida pela emoçã o. Por essa coisa
aterrorizante que tinha que ser amor, porque doía tanto quanto
consolava.
Erguendo os joelhos mais alto, me movi no seu colo até poder olhá -lo
melhor. Sua expressã o estava tensa. Cheia de cautela. Talvez até mesmo
um pouco preocupada? Entã o, ele nã o era virgem. Nem de longe, mas
isso era normal. Dex era quem era e eu tinha uma partezinha dele só
para mim. Nã o arruinaria tudo por me agarrar ao passado. Nã o queria
que isso ganhasse.
Apostava que nenhuma outra pessoa já tinha visto o quarto de
hó spedes dele, cheio de colecionáveis relacionados a quadrinhos. Iris 1,
Vagabundas Pré-Iris 0.
Bati o dedo na ponta do seu nariz.
— Tudo bem.
Ele piscou aqueles olhos que mais pareciam uma pedra preciosa de
cor escura.
— Tudo bem?
— Sim.
O sorriso que se arrastou pela sua boca era melhor do que uma
manhã de Natal, e o beijo que ele me deu depois disso, de alguma
forma, foi ainda melhor.
— Acho que eu deveria agradecer por você nã o ter três ex-mulheres
à solta por aí, tentando te reconquistar, né?
Ele revirou os olhos, as rugas nos cantos ficando ainda mais
pronunciadas quando o sorriso ficou mais largo.
— Você acha?
— Acho, eu nã o sei lutar. Se chegasse a esse ponto, teria que usar
minha chave na cara delas ou arrancar um pedaço da orelha delas com
os dentes — disse, fazendo careta.
A risada que escapou dele fez os outros homens do MC se virarem
para olhar para nó s, como se ver Dex rindo alto assim se equivalesse a
avistar um OVNI. Juro que um dos mais novos, um aspirante, expressava
uma combinaçã o esquisita de pavor e perplexidade. Mas eu estava tã o
entretida com a resposta de Dex que simplesmente fiquei sentada ali
observando-o com um sorriso imenso e bobo. Para onde mais eu ia
querer olhar?
Assim que finalmente se controlou, Dex me puxou para trá s o
suficiente para passar o olhar pelo meu rosto. Eu deveria estar igual a
um rato molhado, mas nã o me importava quando vi sua expressã o
calma e focada. E quando o canto da sua boca se ergueu daquele jeito
sorrateiro…
— Você é a coisa mais fofa que eu já vi na vida, sabia?
— Ei, namoradinho, quer um cigarro?
Um dos homens do clube mais velhos sentados na nossa frente
soltou uma risadinha e ergueu um maço de cigarros na mã o
envelhecida.
Dex balançou a cabeça, e sua expressã o de “como assim?” foi
impagável.
— Nã o? — perguntou o integrante do clube, incrédulo.
— Ela nã o precisa ficar cheirando a essa merda.
O homem fechou a cara, os olhos indo dele para mim.
— Você é alérgica ou algo assim, Rissy?
Rissy. Ha.
Balancei a cabeça e sorri para ele.
— Nã o. Você pode fumar aqui, eu vou procurar Dean ou algo do tipo.
As pernas debaixo de mim balançaram de novo.
— Ela teve câ ncer, Lee. Nã o precisa de nada desse negó cio de
fumante, de ser fumante passiva e essas merdas para piorar tudo.
Como é que é?
Me virei bem devagar para encarar Dex. Mas ele estava esperando.
Parecia que estava pronto para que eu o desafiasse, que ficasse
chateada por ele sair por aí contando algo que tinha acabado de
descobrir.
E nã o era como se eu nã o o tivesse flagrado olhando para o meu
braço a toda oportunidade, rangendo os dentes e tudo o mais.
— O quê? É verdade. Todo mundo vê esses comerciais que dizem a
quantidade de pessoas que morrem todos os anos por causa do fumo
passivo. Você nã o vai se colocar em risco — declarou, firme. Dex
inclinou o rosto para mais perto do meu e sussurrou: — Isso é uma
família, Ritz. Você nã o precisa esconder essas merdas de ninguém.
Lee, o homem mais velho, se engasgou antes que eu tivesse a
oportunidade de processar o comentá rio de Dex.
— Você teve câ ncer? — Ele se recostou na cadeira e abriu as pernas
finas. — Puta merda. Você ainda é a porra de uma criança.
— Já faz um tempo — esclareci, olhando feio para Dex.
Meu comentá rio nã o ajudou Lee em nada a processar o que estava se
passando na sua cabeça. Ele acabou passando as mã os pelo cabelo e
soltou um bufo.
— Bem, caramba. — Com uma olhada rá pida para mim, ele enfiou o
maço de cigarro no bolso da frente do colete. — Ninguém fuma perto de
você. Você me ouviu, Dexter? Nada de fumar perto da Rissy.
Essa era a minha família? Esse motoqueiro bem mais velho com
quem eu tinha falado talvez duas vezes na vida estava fazendo
exigências em meu nome?
Tive que curvar os lá bios atrá s dos dentes para me impedir de sorrir
como uma boba.
Dex soltou uma risada alta.
— Entendido, velho.
— Velho é o meu rabo — disparou ele, sem nem pensar. Lee passou
as mã os pelo cabelo de novo e gemeu. — Caralho. Câncer? Minha irmã
morreu de câ ncer no cu. Essa merda ronda a minha família. — Ele virou
o foco para mim, com olhos arregalados. — Dá para fazer teste para
saber se tem ou algo assim?
Pelo canto do olho, flagrei Dex me encarando com os olhos
arregalados e achando graça.
— Bem…
Trinta minutos depois, Lee havia saído da cadeira parecendo
esgotado demais. Acho que eu o tinha assustado. Mas quando ele
prometeu visitar o médico pela primeira vez em cinco anos, nã o me
senti tã o mal. Prevençã o, prevençã o, prevençã o.
— Pronta para ir para casa daqui a pouco? — perguntou Dex.
Assenti.
— Sim. Vou só me vestir, e quero me despedir do Luther.
Ele apertou meu ombro e me deixou me levantar, entã o me entregou
o short e a blusa que eu estava vestindo mais cedo.
Me despedi das poucas pessoas que estavam por perto,
especialmente Lee, mas nã o vi Dean causando confusã o em lugar
nenhum. Droga. Eu tinha gostado do moleque.
Luther estava na cozinha com alguns dos outros quando estávamos
de saída. Eu nã o era muito efusiva com pessoas que nã o conhecia muito
bem, e Luther era uma delas. Mas nã o pude deixar de dar um abraço de
lado nele quando estávamos perto o bastante.
— Só queria agradecer pela sua ajuda na busca pelo meu pai —
disse, com discriçã o, e dei um passo de volta para perto de Dex.
Ele nã o parecia o tipo que ria com frequência. As linhas marcadas do
seu rosto contavam a histó ria de um homem que fazia parte de um
clube de motoqueiros desde antes de ele se legalizar. Um homem que
havia perdido alguém a quem amava por causa de uma infinidade de
erros.
Mas esse homem também era o pai de Trip. Ele tinha que ter um
pouco do coraçã o daquele idiota.
A ruguinha em seus olhos confirmou o fato.
— Coraçã o, fiz melhor que isso por você. Um camarada meu o
localizou ontem.
— Acho que nã o vai encaixar.
Ofeguei, afoita demais por ter precisado me controlar na casa do
Luther dois dias antes.
— Isso foi o que ela disse!
— Porra, Ris. — Magrã o balançou a cabeça e riu, quase derrubando o
termotransfer que tínhamos montado um minuto antes. — Esses braços
nã o foram feitos para trabalho pesado, você nã o pode me fazer rir
quando estou carregando as coisas.
Olhando-o pelo canto do olho, agarrei o outro lado do aparelho.
— Isso nã o pesa só uns cinco quilos?
— Nã o esquente. — Ele bufou. — Mova aquele kit ali um pouquinho
para lá e vai caber.
Empurrei pelo balcã o as tintas sobre as quais ele se referia e o
observei deslizando o termotransfer no lugar. Devia ser um saco ir e vir
da copa sempre que precisavam de um estêncil, entã o eu talvez tivesse
ficado um pouco animada demais quando o velho pifou e encomendei
um novo com a intençã o de colocá -lo lá na frente.
— Você quer estrear a má quina nova? — perguntou Magrã o, de
costas para mim.
— Ainda nã o sei o que quero — expliquei, ao me referir à tatuagem.
Ele olhou para trá s, tremulando aqueles cílios loiro-avermelhados.
— O dragã o estará esperando quando você estiver pronta.
Ele se referia ao dragã o que cuspia arco-íris.
— Vai doer? — perguntei, igual a uma chorona, e me sentei na
cadeira mais pró xima.
Magrã o mordeu o lá bio e fez uma careta que dizia é, vai doer pra
caramba.
— Bem, vai. Um pouquinho. — Cará coles. — Mas você é forte. Vai
aguentar.
A histó ria da minha vida. Merda.
Encontrei minha voz.
— Ainda estou pensando, Michelangelo.
Ele soltou um suspiro resignado.
— Tudo bem, vó .
A cabeça de Blake apareceu por cima da divisó ria entre a recepçã o e
a estaçã o dele. Nã o havia nada marcado para a hora seguinte e, no
ú ltimo segundo, eu havia pedido a Blake para cuidar da recepçã o
enquanto montávamos o aparelho novo. Ele franziu a testa quando
estreitou os olhos para o que a gente estava fazendo.
— Dex sabe que você quer fazer uma tatuagem? — perguntou, com
tato.
— Ele ouviu a gente falando disso naquele dia — respondi, distraída.
No dia que eles ficaram sabendo sobre o meu braço.
Blake soltou uma risada. Talvez tenha sido a primeira risada que eu
ouvia dele na ú ltima semana. Ele ainda estava enlouquecido por causa
do Seth, mas agora que nos contara, parecia ter tirado um pouco do
peso dos ombros.
— Nã o sei por que está se esforçando desse jeito, Magrã o. Você sabe
que ele nã o vai deixar nenhum de nó s tirar a virgindade dela.
Eu quase, quase me engasguei ao ouvir o comentá rio espontâ neo,
retomando a lembrança da noite anterior com tudo ― Dex havia tirado
minha roupa, se deitado de costas e me puxado para cavalgar o rosto
dele. Aqueles deviam ter sido os melhores quinze minutos da minha
vida. E os quinze ou trinta minutos que vieram logo depois, quando ele
me virou e me fez apreciar muito um determinado nú mero formado por
um seis e um nove… bem, digamos apenas que eu estava acumulando
experiências novas e divertidas com uma velocidade surpreendente.
Aleluia!
— Foda-se — falou Magrã o, devagar. — Talvez ele me deixe fazer
essa nele, entã o. Você sabe que eu o venho amolando para ele me deixar
terminar o outro lado do corpo dele.
— O outro lado do peito? — perguntei.
Os dois ergueram as sobrancelhas em diversã o fingida, mas foi a
droga do ruivo quem abriu um sorriso.
— Ah, você conhece as tatuagens dele todinhas, nã o é?
Qualquer coisa que lembrasse um sorriso desapareceu do meu rosto.
— Cale a boca.
— O que aconteceu com a srta. Nã o-Vai-Acontecer-Nada?
— Tomara que você se esqueça de passar protetor solar da pró xima
vez que ficar ao ar livre — disparei.
Magrã o balançou a cabeça e riu.
— Uhum. Aposto que você também está super por dentro dos
piercings dele, nã o é, Ris?
Fiz careta.
— Pode continuar.
— Quando der por si, vai estar com um “Propriedade do Dex”
tatuado nas costas — ele pensou alto.
Mas de jeito nenhum eu tatuaria o nome de um homem em mim.
— Vai sonhando, otá rio.
Blake ergueu as mã os, rendendo-se.
— Eu nã o ficaria nada surpreso se ele fizesse isso.
É , eu também nã o, depois que parei para pensar. Aquele imbecil
sorrateiro a faria em mim em segredo na primeira oportunidade que
tivesse.
E ainda assim…
Por mais estranho que parecesse, eu era apenas cerca de noventa
por cento contra.
Nã o que isso fosse acontecer algum dia, ainda mais quando eu nem
sequer conseguia decidir quanto a fazer uma tatuagem pequena
primeiro.
O movimento da porta abrindo nã o me alarmou. Blake estava livre e
atenderia a pessoa que havia entrado. Por ser noite de terça-feira, o
movimento estava bem tranquilo. Era por esse motivo que Dex tinha
saído, depois de terminar uma sessã o de três horas, para ir falar com a
mã e sobre o possível divó rcio.
No entanto, a primeira coisa que saiu da boca de Blake foi um alto e
alarmado “mas que porra?”, seguido por um som agudo de algo muito
pesado batendo em algo igualmente tã o pesado, mas um pouco mais
frá gil. E entã o o som inconfundível de um corpo caindo no chã o fez nó s
dois nos erguermos e olharmos na direçã o de Blake.
Mas nã o era o meu amigo careca que estava lá . Havia três homens
usando má scara de ski parados bem onde Blake tinha que estar.
Homens de estatura mediana, com corpo mediano, com um esgar
raivoso na boca que mal era visível.
E um segurava uma arma. E aquela arma estava apontada para mim.
O impulso de perguntar o que era aquilo estava bem na ponta da
minha língua, mas me contive, me lembrando do que tinha acontecido
com Blake havia apenas um segundo.
— Pegue o que estiver na mesa, cara — Magrã o assumiu, agarrando
o encosto da cadeira com uma das mã os até as juntas ficarem brancas.
Respirei fundo e assenti, concordando com o que ele estava
sugerindo, as palavras no meu cérebro perdendo a vez para o tremor
nas minhas mã os. Onde é que estava o meu celular?
O homem com a arma soltou um risinho alto e dissimulado.
— Tu. — Ele apontou para mim. O sotaque forte parecia russo, eu
acho. — E tu ris?
Eu? De onde ele tirou que eu estava rindo?
Eu estava prestes a abrir a boca quando o outro mascarado logo à
direita do que segurava a arma assentiu.
— É ela. Rá pido, Fyo.
Puta merda! Puta merda! Puta merda!
Olhei para Magrã o, achando que íamos morrer. Esse cara ia atirar na
gente. Acho que meu coraçã o chegou a um milhã o de batidas por
segundo, fazendo tremer nã o só meus dedos, mas os antebraços e até
mesmo meus bíceps com a possibilidade do que estava prestes a
acontecer. Era por causa do meu pai? Tinha que ser. Tinha que ser,
caralho.
Os Ceifadores? Ai, meu Deus. Eles eram membros? Dex tinha dito que
havia cuidado de tudo, mas… merda!
— Por favor, deixe meus amigos em paz. Seja o que for, é culpa só
minha. — Eu me vi gaguejando quando dois dos três homens
avançaram ao redor da divisó ria.
Mas nenhum deles disse nada quando um dos homens armados
estendeu a mã o e agarrou meu rabo de cavalo em um puxã o rá pido tã o
forte que minha cabeça estalou com a brutalidade. Ele puxou com mais
força ainda da segunda vez, arrastando meu corpo sobre a cadeira antes
de dar outro puxã o. Eu gritei alto, e caí no chã o, batendo o quadril com
força no piso quando o mascarado deu um solavanco.
O homem puxou meu cabelo uma ú ltima vez, e se agachou com a
Glock na mã o. Os lá bios se abriram quando ele levou o rosto para perto
do meu.
— Diga ao seu pai que se ele nã o nos pagar até a meia-noite de
amanhã , vamos terminar o trabalho que começamos esta noite —
ameaçou o homem, um momento antes de sua mã o livre avançar e me
dar um tapa tã o forte na cara que minha visã o explodiu em estrelas
multicoloridas. — Diga isso. Entendeu? — perguntou o homem.
Eu estava piscando, incapaz de ver onde ele estava porque parecia
que meu rosto havia sido atingido por um caleidoscó pio de tijolo.
O homem me deu outro tapa tã o forte quanto o outro, se nã o mais.
— Você entendeu, sua vagabunda? — O cano frio da arma
pressionou o meio da minha testa, e fiz de tudo para reprimir o
choramingo. — Responda!
A ú nica coisa que eu entendia com clareza era que eu ia matar o meu
pai. Ia cortá -lo em pedacinhos, estilo um assassino em série, e o jogaria
no oceano, onde seus restos mortais jamais seriam encontrados.
De alguma forma, enquanto planejava rapidamente um homicídio,
respondi um “sim”. Consegui nã o chorar enquanto meu rosto latejava
no ritmo do meu coraçã o, à medida que os homens saíam do estú dio
tã o rá pido quanto tinham entrado.
A batida da porta me fez olhar para cima. Ignorando as fisgadas
desconfortáveis irradiando das minhas costelas, foquei nos olhos de
Magrã o.
— Você está bem? — ele me perguntou, com os olhos arregalados.
Fiz que sim, mas nã o estava, na verdade. Minha cabeça latejava e
minhas costelas doíam pra caramba. Mas, naquele momento, nã o
importava. Estava viva e…
— Blake! — gritamos nó s dois, ao mesmo tempo.
Magrã o saltou sobre a cadeira enquanto eu lutava para me ajoelhar,
minhas mã os e meu corpo doendo em protesto. Blake estava deitado no
chã o, com sangue empoçando ao redor da cabeça.
Não perca o controle, Iris!
Magrã o se ajoelhou ao lado de Blake e o sacudiu. O homem nã o tinha
atirado nele, disso eu sabia, mas provavelmente lhe deram uma
coronhada ou algo assim.
Me ajoelhei do outro lado do seu corpo imó vel, balançando seu
ombro de leve. Olhos escuros piscaram até entrarem em foco enquanto
suas mã os se estendiam fracas para começar a bater para afastar as
persistentes de Magrã o.
— Pare com isso, babaca — murmurou ele, levando a mã o à cabeça.
Afastando-se, Magrã o arrancou o celular do bolso e discou tã o rá pido
que nã o tive nem a chance de me perguntar se ele ligaria primeiro para
a polícia ou para Dex.
— Dex, alguns homens estiveram aqui — ele falou um minuto
depois. O que respondeu a minha pergunta.
Me inclinei sobre Blake, observando enquanto ele recobrava os
sentidos, contorcendo o rosto de dor.
— Porra — gemeu ele.
— Nã o foram eles. A gente vai te esperar no bar. Blake precisa de
pontos — disse Magrã o no aparelho, os olhos se desviando para mim.
Eu conseguia ouvir Dex falando do outro lado. — Ela… ela… eles
deixaram uma mensagem para o pai dela. — Um segundo depois,
Magrã o afastou o telefone do rosto e olhou para a tela. A preocupaçã o
estava gravada em suas feiçõ es. Com grande relutâ ncia, ele olhou para
Blake e para mim e suspirou:
— Vamos lá para o Mayhem, cara — ele instruiu, estendendo as
mã os para o cotovelo dele para ajudá -lo a ficar de pé.
Me levantei e fiz o meu melhor para ajudar Blake também. Meus
olhos se desviaram para Magrã o.
— Você vai ligar para a polícia?
Seus olhos se arregalaram quando ele pressionou na cabeça de Blake
alguns guardanapos que havia pegado na sua estaçã o.
— Nã o.
— Prefere que eu ligue? — perguntei, ao cruzarmos a rua com
cuidado, com Blake entre nó s.
Ele balançou a cabeça.
— A gente nã o precisa da polícia, Iris.
Blake nem olhou para qualquer um de nó s dois nesse meio-tempo,
concentrando-se apenas em segurar os guardanapos logo acima da
sobrancelha.
— A gente nã o precisa da polícia? — A má fia devia estar envolvida.
Coisa que acontecia na televisã o, nã o na droga da vida real.
— Você acha mesmo uma boa ideia ligar para a polícia quando uma
gangue croata está querendo te matar? — indagou, sem fazer rodeios.
Dei uma olhada para Blake, ainda completamente alheio à nossa
conversa, e engoli em seco. Se tinham tido coragem de ir até o estú dio
armados… nã o queria nem pensar do que mais eram capazes.
— Certo. — Mas nã o estava nada certo. Meu rosto doía pra caramba
e meu coraçã o ia explodir para fora do peito por causa do medo que eu
estava sentindo. Mas o comentá rio de Magrã o me pegou em cheio. —
Eles eram croatas?
Ele assentiu, cansado.
— Reconheci a tatuagem nas mã os deles. Há um tempo, atendi um
cliente que me pediu para cobrir o símbolo da gangue.
Aquilo era um pesadelo.
E isso era exatamente o que Sonny quis dizer quando falou que nã o
queria saber a quem nosso pai devia dinheiro além dos Ceifadores.
No momento em que atravessamos o segundo quarteirã o para
chegarmos ao Mayhem, três homens já nos esperavam lá fora. Um era
aquele cara um pouco mais velho que Dex e que era muito atraente, e os
outros dois eu nunca tinha visto antes. Um dos caras foi direto na
direçã o de Blake, só me olhando rapidamente de canto de olho antes de
puxar o homem ensanguentado para dentro do prédio.
— Ah, porra — murmurou o homem bonito, chamado Wheels,
quando parou bem na minha frente. Seus olhos estavam em uma
missã o de busca. — Foram eles que fizeram isso?
Magrã o fez o favor de repetir o que os homens tinham dito a mim,
mas com uma voz muito mais equilibrada do que a minha teria
conseguido em qualquer ocasiã o.
Wheels rosnou em resposta ao balançar a cabeça.
— Sinto muito, boneca.
Eu também.
— Está tudo bem. Poderia ter sido pior — tentei dizer, mas minha
voz vacilou e basicamente gaguejei. Fraca, fraca, fraca. Eu estava bem.
Superbem. Precisava me recompor, Blake estava sangrando sem parar e
eu corria o risco de me mijar de medo. Quando olhei para o chã o, tive
um vislumbre de um metal preto e achatado enfiado no có s do jeans de
Wheels.
Uma arma. Puta merda. Ele estava armado. Por que eu estava
surpresa?
— Vamos lá pegar um pouco de gelo para você — ele conseguiu
sugerir entre dentes, de alguma forma.
Nó s três seguimos para a escada, enquanto Blake e os outros homens
foram em direçã o à cozinha, no primeiro andar. Wheels e Magrã o
pareciam estar tendo uma conversa telepá tica acima da minha cabeça.
Nã o consegui reunir forças para me dar ao trabalho de prestar atençã o
ao que estava sendo comunicado. O latejar no meu rosto multiplicava
dez vezes a cada contraçã o muscular.
Com um saquinho ziplock pressionado na bochecha e uma garrafa de
á gua entre minhas coxas enquanto eu estava sentada no sofá , Wheels se
plantou ao meu lado e Magrã o ficou do outro. Nenhum de nó s disse
nada. O que havia a dizer? Wheels nã o perguntou o que havia
acontecido nem se eu estava bem. Ele simplesmente ficou sentado lá ,
puxando o ar pelo nariz e o liberando pela boca.
— Blake está bem? — indaguei, enfim, depois de pegar outro maço
de papel-toalha para cobrir o saco de gelo.
— Jesse deve estar dando os pontos nele agora. Ele está bem —
respondeu Wheels.
Respirei com dificuldade, olhando ao redor da sala mal iluminada
com suas mesas de sinuca e o bar. Aquela confusã o estava me
devorando aos pouquinhos. Eles nã o queriam envolver a polícia. Meu
pai devia uma boa quantia para aqueles filhos da mã e terem vindo de
Austin só para fazer ameaças, e eu tinha sido arrastada para o meio
dessa bagunça causada por um homem que nem me amava. E eles
simplesmente haviam encostado uma arma na minha testa depois de
machucar Blake. Uma coisa era lidar com Liam, outra completamente
diferente era ser abordada por uma gangue.
Gangue. Cristo. Dois meses atrá s, meu maior temor era como eu
pagaria a conta do celular.
— Isso é normal? — com a voz fraca, perguntei ao homem.
Wheels me olhou de canto de olho e suspirou.
— Nã o é totalmente incomum.
Nã o sei como me senti com aquela resposta.
— Você acha que eles vã o voltar se nã o forem pagos?
A porta se abriu com um estrondo, batendo na parede com um estalo
alto do gesso da parede rachando, o que sinalizou a chegada de Dex. Seu
corpo alto e musculoso preencheu a porta. Ele esquadrinhou o salã o
antes de pousar os olhos em nó s três amontados no sofá .
E eu senti. Todo mundo sentiu.
O estalo do seu humor despencando foi como uma camada de gelo;
poderia muito bem ter sido o inferno congelando por causa da potência
fria e poderosa da sua raiva. Indicava a chegada da segunda Era do Gelo.
Entã o seus olhos se estreitaram no saquinho que eu pressionava na
bochecha. E, como se fosse possível, a linha tensa de controle no ar se
esticou a ponto de arrebentar fio a fio.
No espaço de dois segundos, Dex havia avançado e caído de joelhos
diante de mim, uma das mã os se enterrando no meu cabelo, a outra
espalmando a almofada logo ao lado da minha coxa.
— Iris. — O tom era baixo e descontrolado.
Pisquei para ele.
— Está tudo bem.
A mã o no sofá se moveu para pegar a bolsa do gelo que eu segurava.
Dex fechou a cara. Algo indescritível cintilou em seus brilhantes olhos
azuis, algo que se relacionava à fú ria e que era algum primo distante do
assassinato.
Isso, aliado ao seu tom de voz, me fez sentir medo.
— Me conte.
— Aqueles caras entraram e atacaram o Blake. E aí me disseram que
se meu pai nã o os pagasse até amanhã , eles voltariam. — E
terminariam o trabalho, fosse qual fosse: minha morte ou algo
igualmente violento. De jeito nenhum eu diria isso.
A cabeça de Dex se afundou para a minha, os olhos nã o perdendo um
grama da emoçã o sombria que nadava no fundo deles.
— O que eles fizeram? — perguntou ele, aos sussurros.
Eu estava dividida entre contar a versã o resumida ou a verdade.
Concluí que ambas acabariam voltando para me assombrar. A
expressã o que fiz deve ter indicado a Dex que eu estava escondendo
alguma coisa, porque ele estendeu a mã o para traçar minha mandíbula,
seus olhos se fixando no que supus ser a marca vermelha inchada na
minha bochecha.
Eu nã o queria preocupá -lo, mas sabia que, se nã o contasse o que
tinha acontecido, ele ficaria ainda mais puto depois.
— Ele me agarrou pelo cabelo quando eu estava na cadeira e me
arrancou de lá — contei, com toda sinceridade. Pude ver pelo mover do
seu pomo de adã o que ele havia engolido em seco. — E aí ele me deu
um tapa. — Respirei fundo, deixando o medo irracional rastejar pelos
meus ombros. Ele pressionou uma arma na minha testa, eu quis dizer,
mas nã o consegui me convencer a dizer as palavras em voz alta.
O humor de Dex disparou pelo salã o como uma corrente poderosa.
Sua expressã o ficou séria; a postura, tensa, e eu juro que ele até mesmo
parou de respirar. As moléculas no ar pausaram em deferência.
Mas, em vez de dizer ou fazer qualquer coisa, ele levou a boca à
minha e pressionou um beijo suave. Um beijo demorado que me fez
esquecer de que minha cabeça doía porque ele deixara tudo melhor.
— Vou pedir a um dos caras para te arranjar um analgésico —
sussurrou Dex, beijando minha mandíbula com um carinho que ele
raramente demonstrava.
Foi naquele momento que notei que sua mã o tremia… bastante. Ele
me beijou mais uma vez logo ao lado do olho, tendo o cuidado de nã o
apertar o que estava dolorido.
Sem pressa, Dex ficou de pé, o movimento estável e equilibrado, mas
havia algo de estranho nele.
— Aonde você vai? — perguntei, esquadrinhando sua expressã o.
Aquele olhar nã o estava certo. Era selvagem e descontrolado, e fez meu
coraçã o se apertar ainda mais.
— Vou cuidar do assunto — disse ele, ao desviar o olhar para o teto.
Ah, droga. Fui tomada pelo pâ nico, preocupada com o que Dex
pudesse fazer se saísse de lá . Naquele milésimo de segundo, eu nã o
estava nem aí para o que tinha acontecido no estú dio. Nã o se isso fosse
levar Dex a fazer alguma idiotice.
— Charlie.
— Flor — rosnou ele. — Preciso que você melhore. Sente-se.
Estendi a mã o e peguei a dele, entrelacei nossos dedos e apertei com
força.
— Nã o faça nada. — Puxei sua mã o. — Está tudo bem. Eu estou bem.
Sério. Vou pensar em alguma coisa para que eles nã o me encontrem.
— Você nã o vai a lugar nenhum — disse ele, uma declaraçã o. Uma
ordem. O pomo de adã o se moveu com força com as engolidas, os
mú sculos se retesando e relaxando duas vezes.
— Dex, por favor — implorei. — Por favor. Se você se encrencar com
a polícia de novo… — Um soluço estava abrigado no fundo da minha
garganta. — Nã o vá . — Meu coraçã o estava prestes a se estilhaçar.
Estava sendo picadinho por causa de todos os “e se”.
Dex rangeu os dentes, e a veia em seu pescoço ficou mais
protuberante.
— Nã o me peça para nã o fazer nada, Ritz. — Ele inclinou o pescoço
para cima com a raiva mal contida. — Você espera que eu fique sentado
e deixe esse pessoal se safar dessa merda?
— Dex…
— Olhe o que fizeram com você! — explodiu. Seus olhos
resplandeciam. — Eles machucaram você. Colocaram as mã os em você.
Nã o posso ficar sentado aqui e olhar para você com a consciência
tranquila. Eu jamais deveria ter deixado isso acontecer.
Ai, meu Deus. Meu coraçã o tamborilou feito um idiota em reaçã o à s
suas palavras, à sua convicçã o, sua lealdade… tudo. Eu estava mesmo
apaixonada por esse homem. Era aterrorizante e maravilhoso. Apertei
os dedos ao redor dos dele.
— Nã o é culpa sua, Dex.
Ele estreitou os olhos e soltou um suspiro que fez seus lá bios
tremerem. Estalando o pescoço de um lado e do outro, ele girou os
ombros.
— Você é responsabilidade minha. Você é minha. E nã o vou ficar
parado aqui feito um inú til. Acho que eu faria qualquer coisa por você,
pode acreditar. Mas isso, nã o. — Ele pressionou os lá bios na minha
testa, o fô lego quente. — Tenho que fazer isso.
Eu poderia ter deixado Dex ir. Eu poderia ter simplesmente ficado
sentada ali e o deixado ir se vingar em meu nome, mas nã o faria nada
disso. Nã o naquele dia, nem no pró ximo, nem no mês seguinte, nem no
ano que vem. Porque a situaçã o nã o valia a possibilidade de perdê-lo, e
eu nã o me achava boa demais para apelar. Para dizer o que fosse
necessá rio. Fazer o que fosse necessá rio.
— Por favor. Nã o me deixe também — sussurrei.
A declaraçã o deve ter ido direto para aquela cabeça dura e teimosa.
Ele piscou aqueles brilhantes olhos azuis repetidas vezes antes de
finalmente assentir devagar, como se o ato lhe causasse dor. Ele ergueu
a mã o e a apoiou no meu braço ruim, pressionou os lá bios na minha
testa e soltou um suspiro trêmulo. Era golpe baixo dizer aquelas
palavras para ele, mas nã o me importei quando, enfim, ele falou:
— Vou pegar um analgésico para você.
Olhei para ele ao me sentar. Os olhos de Dex estavam ferozes ao
mirar os de Wheels, a boca dele se curvando com crueldade. Aquela
tensã o brutal pulsava por suas veias a cada segundo que ele se
comunicava com Wheels sem dizer uma ú nica palavra antes de sair dali.
Foi só quando ele saiu que a está tica que parecia irradiar dele se
expandiu, triplicou e quadriplicou.
Quando demos por nó s, ele tinha agarrado um dos bancos do bar e o
atirado do outro lado do salã o, onde o objeto encontrou uma morte alta
e bagunçada ao atingir a parede. Dex rugiu. Entã o rugiu um som
primitivo e gutural que poderia ter causado terremotos. Ele inclinou o
rosto para cima e cerrou as mã os ao lado do corpo.
— Puta que pariu! — gritou ele, ao passar as mã os pelo cabelo.
Minha nossa.
Ele pegou outro banco pelas pernas e o lançou na mesma direçã o.
— Caralho! — Explodiu de seus pulmõ es.
Com uma explosã o final, ele sumiu pela porta. Num piscar de olhos.
E por alguma razã o nã o tã o estranha assim, confiei nele o bastante
para concluir que nã o tinha mentido para mim.
— Foi melhor do que eu esperava. — Suspirou Magrã o.
Voltei a pressionar o saco de gelo no rosto e estendi a outra mã o para
agarrar os dedos dele.
— Sinto muito por tudo isso.
E eu sentia. Mas mais que tudo, naquele instante, eu estava era
muito, muito puta.
Que droga havia de errado com o meu pai? Que tipo de babaca
egoísta colocaria outras pessoas em perigo por causa dos rolos que ele
mesmo arranjava? E por que, caramba, eu tinha que ter parentesco com
ele? Sabia que era injusto e que talvez fosse um pouco de maldade, mas
suas açõ es eclipsaram todos os meus pensamentos. Nã o havia como ele
nã o saber do que a droga dos russos ou dos romenos ou dos croatas
eram capazes de fazer. Essa merda de gangue e de má fia era algo
reservado para os livros que eu lia e para os filmes a que assistia.
Estava possessa. E agora que ainda mais pessoas de quem eu gostava
acabaram se envolvendo, aquilo se parecia ainda mais com uma batalha
pessoal. Minha pró pria bagunça para consertar. É claro que nã o havia
como esses otá rios receberem o dinheiro no dia seguinte, mas se eu
fosse embora, nada aconteceria, nã o é?
Era um tiro no escuro, mas era a ú nica esperança que eu tinha.
Magrã o puxou minha mã o e apertou os dedos que ele segurava.
— Nã o é culpa sua.
— É , sim — respondi, e suspirei. Eu me sentia péssima.
Precisava dar um jeito nisso.
Foi Wheels quem me disse exatamente o que eu precisava fazer.
— Você ainda nã o sabe onde Curt está ? — perguntou ele.
Eu sabia, agora, pelo menos. O amigo de Luther o encontrara a
poucos quarteirõ es da casa onde a gente morava na época… na época
antes de tudo ir para o inferno, quando eu era criança.
E eu sabia o que precisava fazer, independentemente de ter dito ou
nã o tanto a Dex quanto a Luther que os deixaria cuidar do assunto. Que
os deixaria trazê-lo para cá , quer dizer. No momento que aqueles filhos
da mã e haviam entrado na Pins, isso se tornava problema meu. Nã o de
outra pessoa.
Nem mesmo do Sonny.
Sonny. Droga. Meus dedos flexionaram de nervosismo quando levei a
mã o ao bolso para pegar meu celular. Mais tarde, eu nem sequer me
lembraria de ter pressionado tã o rá pido a discagem rá pida do nú mero
dele. Naquele momento, só estava ciente de que tinha que ser eu a ligar
para o meu irmã o e contar para ele. Isso nã o resolveria os problemas de
confiança entre nó s, mas seria um começo, tomara.
Nem sequer permiti que ele me cumprimentasse antes de o
interromper. O acontecido e minha decisã o recente assumiram meus
pensamentos como uma tempestade. Ele precisava saber.
— Son, preciso voltar para casa.
1 Na má fia americana, significa um membro completamente iniciado, apó s feito o juramento. (N.E.)
Entrelaçamos nossos dedos, e Dex me conduziu em direçã o aos
elevadores naquela noite. Em questã o de horas, havíamos cometido
pelo menos quatro crimes. Agressã o, lesã o corporal, arrombamento e
invasã o, roubo e sabe-se mais lá o quê.
Quem teria pensado que eu me consideraria uma criminosa?
Geralmente, eu suava quando dirigia dez quilô metros acima da
velocidade permitida.
Envolvi as mã os em torno das dele e descansei a testa em seu ombro
enquanto nos deslocávamos em silêncio. O que havia a ser dito?
Havíamos pegado quinze mil no respiradouro onde meu pai tinha
escondido o dinheiro, e nã o perguntei como Dex sabia onde procurar, e
levamos a moto dele para o amigo de Luther, que nos assegurou de que
encontraria um comprador para uma Harley Davidson Classic. Em troca
de uma taxa, é claro.
Documentaçã o? Impostos, título de propriedade e licenciamento?
Não se preocupe com isso, ele tinha dito. Entã o eu nã o me
preocuparia.
A ú nica coisa com que me preocuparia era com o resto do dinheiro
que meu pai ainda deveria se conseguíssemos o que eu esperava pela
moto. O dinheiro dos Ceifadores.
— Entã o… há algo mais que você deseja me contar?
Os dedos dele folgaram ao redor dos meus, e suas unhas roçaram
minha palma.
— Eu te conto tudo, flor.
— Nã o exatamente — cantarolei ao irmos em direçã o ao quarto. Ele
deslizou o cartã o na porta. — Dex, você pagou aos Ceifadores?
Ele grunhiu e segurou a porta para que eu passasse primeiro.
Parei no meio do quarto e o esperei entrar e passar a correntinha na
porta. Deus, como ele era lindo. O corpo esguio, os braços fantá sticos na
camiseta branca. Bem, branca com umas manchinhas vermelhas no
peito. O sangue do meu doador de esperma. Dex parou a poucos passos
de mim e deslizou as mã os no bolso da frente.
— Paguei. — Tã o simples. Tã o sincero.
— Por quê? — Diminuí a distâ ncia entre nó s, parando perto o
suficiente para deslizar os dedos por debaixo do có s do seu jeans. Pele
quente cumprimentou as costas dos meus dedos.
Dex estendeu a mã o e puxou o elá stico que prendia meu coque
bagunçado.
— Porque… — Ele torceu meu cabelo ao redor dos dedos, sem me
olhar nos olhos. — Eu nã o queria ninguém te perturbando.
Como era possível eu ainda estar de pé?
— Você acha que quero aquele otá rio indo atrá s de você quando seu
pai nã o pagasse? Aquele filho da puta nem sequer pretendia pagar a
dívida com eles, flor.
Acho que estava menos para ele nã o se lembrar e mais para ele optar
por nã o se lembrar. Otá rio.
Os dedos de Dex foram até minha testa, e as pontas desceram para
baixo, para baixo, para baixo, passaram por trá s das minhas orelhas e
foram para o meu pescoço.
— Nã o gostei nada de pensar nele querendo você.
Ele… Liam.
Ah, caramba.
Tudo dentro de mim que havia sido esmagado e pisoteado pelas
palavras despreocupadas e as atitudes idiotas do meu pai se regenerou
com o toque e as palavras de Dex. Tirei os dedos da calça dele e os levei
para a bainha da sua camiseta e a puxei o bastante para desnudar a
parte inferior da sua barriga.
— Vou te pagar o resto — prometi, deslizando a mã o por sua
camiseta acima, para espalmar o espaço entre seu peitoral. — Vai me
levar um tempo, mas…
As mã os de Dex seguraram o alto da minha cabeça, me afagando com
carinho.
— Nã o.
— Estou falando sério. Prometo te pagar…
— Nã o — repetiu. — Você nã o vai me pagar nem um centavo.
O desconforto formigou na minha nuca. Eu estava devendo por
muitas coisas, mas quase dez mil era demais. A ú ltima coisa que eu
queria era que ele pensasse que eu queria tirar vantagem dele.
— Eu vou.
— Nã o. Nã o vai. Ritz, olhe para mim. — Direcionei os olhos para
cima para encontrar os azuis dele. — Nã o dou a mínima para o
dinheiro. Vou ganhar mais.
Um rosnado vibrou na minha garganta.
— É demais.
Os lá bios dele se repuxaram em uma linha severa, os olhos buscando
os meus. Ele queria discutir comigo, dava para perceber. Mas nã o iria.
Aquele rosto bonito se comprimiu.
— Quer me pagar? Matricule-se na faculdade e assuma a
contabilidade do clube e do estú dio, ok?
Meu queixo caiu.
— Nã o é a mesma coisa.
— Nã o estou dizendo por alguns meses, linda. Mas de agora em
diante — esclareceu.
De agora em diante.
Ai, meu Deus.
— Pegar ou largar — murmurou, e sua boca perdeu um pouco do
esgar. — Nã o me importo nem com um nem com o outro.
Esse homem.
— É dinheiro demais. Dinheiro demais mesmo, Charlie. Nã o quero
tirar vantagem de você.
— Nã o está tirando, flor. Eu conheço você e você me conhece. Pode
aceitar ou recusar a oferta, mas nã o vou pegar dinheiro seu. Você tem o
resto da vida para me pagar fazendo merdas de que nã o gosto.
Minhas costelas apertaram todos os ó rgã os lá dentro. Tudo pulsou,
cheio de vida, calor, jujuba e purpurina. Isso era… nã o sei como
explicar… era manhã de Natal quando a gente é criança. De certa forma,
era tudo o que eu quis desde que meu pai tinha ido embora da primeira
vez.
E nã o havia nada melhor que isso.
— Feito — concordei, com um sussurro ofegante. Cada um dos seus
polegares se curvou sobre a volta das minhas orelhas.
— Essa é a minha garota.
A garota dele.
Depois de toda porcaria pela qual eu havia passado naquele dia, nã o
podia haver palavras melhores de se ouvir.
Bem, havia outras palavras, três, principalmente, que eu gostaria de
ouvir, mas aceitaria essas. Isso nã o significava que ele era o ú nico que
sabia como dar. Ele já tinha me dado o suficiente. Meus ossos e coraçã o
sabiam que nã o havia nada a temer. Eu o amava e à s vezes isso gerava
consequências assustadoras, mas isso, a emoçã o em si, nã o era. Eu
sabia agora.
Que tipo de vida eu teria se deixasse meus medos assumirem? Esse
era um presente que eu havia me esquecido de apreciar ultimamente.
Havia passado tempo demais sendo feliz por apenas estar viva, mas
agora… agora eu tinha Dex. Eu tinha toda a minha vida pela frente, e
precisava parar de ser covarde, agarrar a vida pelos chifres. Nesse caso,
eu agarraria os piercings de mamilo dele.
— No que você está pensando, Ritz?
Estendi as mã os para ele ver o quanto estavam tremendo.
— Estou pensando que te amo tanto que me dá medo. Viu?
Os polegares de Dex inclinaram meu queixo para cima para que eu
pudesse olhar seu rosto… seu rosto lindo e desalinhado.
— Iris. — Ele disse meu nome como se fosse um ronronar que
alcançou as vértebras da minha coluna.
Curvei os lá bios por detrá s dos dentes e respirei fundo, massacrada
pelas coisas boas que mordiscavam meu sistema nervoso.
— E mesmo que isso me assuste pra caralho, eu amo você, e quero
que saiba disso. Tudo o que você tem feito por mim… — Ah, caramba.
Soltei um longo suspiro. — Obrigada. Você é a melhor pessoa que já
gritou comigo.
Ele murmurou meu nome de novo, baixo e suave. Os dedos cravaram
um pouco mais fundo na pele macia da parte de baixo da minha
mandíbula.
— Se todas as merdas que faço por você, e toda merda que estou
disposto a fazer nã o te disserem o quanto você se esgueirou para
dentro de mim, flor, entã o eu vou te dizer. — Ele baixou a boca para
bem perto do meu ouvido, os dentes mordiscando o ló bulo antes de ele
sussurrar: — Te amo.
A sensaçã o que se afundou em mim era indescritível.
Ele me deu esperança. Esse ex-presidiá rio enorme e de pavio curto
me lembrava do quanto eu era forte e, para melhorar tudo, me fazia ser
mais forte ainda.
— Dex — suspirei seu nome.
Ele mordiscou minha orelha de novo.
— Eu amo você, Ritz. — A barba por fazer roçou minha mandíbula
antes de ele morder de leve. — Amo a porra da sua cara, suas piadas de
isso foi o que ela disse, seus “toca aqui” idiotas e seu braço, mas eu amo
pra caralho o quanto você é idiota. Seus culhõ es sã o maiores do que os
do seu irmã o, linda.
Soltei uma risada engasgada.
Dex inclinou minha cabeça ainda mais para trá s, segurando o peso
em seus dedos longos ao morder a curva do meu queixo.
— E eles vã o ser os meus culhõ es, sua fodonazinha.
Fogo disparou pelo meu peito.
— É ? — arquejei.
— É . — Ele assentiu e mordeu meu queixo com mais força. — Já te
disse que eu cuido do que é meu.
Eu ia vomitar.
Sério.
— Você vai ter que encostar.
Sonny se virou para me olhar por cima do ombro, olhos arregalados
em exasperaçã o.
— De novo?
Essa era só a terceira vez.
Bem, a terceira vez na ú ltima hora.
O movimento de cabeça entusiasmado demais que fiz para ele deve
ter sido o bastante para ele puxar o carro alugado para o acostamento.
O pavimento desigual fez meu estô mago revirar ainda mais. A gente mal
havia parado quando abri a porta de trá s e saí, vomitando coisas que
nem deveriam estar no meu estô mago depois de ter colocado tudo para
fora duas vezes.
E pensar que a mã e de Dex havia me falado que eu sofreria com isso
pelos pró ximos dois meses.
Dois meses. Se eu tivesse sorte.
Por quê? Por quê?
Nã o era mais tã o frequente eu sentir saudade da minha mã e, mas
quando o enjoo matinal por fim deu as caras, semanas depois daquela
droga de teste ter dado positivo, me atingiu como uma bola de
demoliçã o. A quem eu procuraria para pedir conselhos? Eu nã o sabia
um nada sobre isso. Entã o mesmo apesar eu ter ficado animada, e
tendo morrido de medo, sentir saudade dela, precisar dela, havia
amortecido tudo nos primeiros poucos dias.
Até que fui ao médico e soube com certeza que minha vida mudaria
para sempre.
Mas, bem, acho que seria só questã o de tempo. Juro pela minha vida
que Dex vinha fazendo de tudo para atingir esse objetivo desde o
momento… Bem, conhecendo aquele babaca presunçoso,
provavelmente desde o momento em que ele decidira mandar seus dois
melhores amigos, nas palavras dele, “irem se foder”.
— Você está bem, flor? — Duas mã os pousaram nos meus ombros,
massageando-os enquanto eu estava curvada sobre o mato crescido.
Era bem capaz de que eu tivesse vô mito nos cantos da boca. Ó timo.
Assentindo, me endireitei e peguei um dos muitos papéis-toalha que
havia enfiado no bolso de trá s para limpar a boca.
— Estou bem.
O riso de Dex preencheu meus ouvidos quando ele envolveu os
braços ao redor do meu peito, por detrá s, e descansou o queixo no alto
da minha cabeça.
— Só bem?
Ele estava me provocando, eu sabia.
Eu ainda nã o havia contado a novidade para ele, mas, da mesma
forma sobrenatural que ele sempre sabia o que eu estava sentindo ou
pensando, ele podia farejar minhas mentiras a quilô metros de
distâ ncia. Ele só estava me dando tempo para revelar a ele.
Para contar que estaria carregando o filho dele no ventre pelos
pró ximos sete meses e meio.
Eu só queria que a loucura dessas duas ú ltimas semanas acabasse.
As provas finais do semestre haviam acabado fazia três dias, Dex
estivera mais ocupado do que nunca com a abertura do novo bar do MC,
e aí havia essa viagem. A viagem que, de início, havia sido planejada
para Sonny, Will e eu.
No entanto, surpreendendo a ninguém, Will havia desmarcado havia
duas semanas, e Dex do nada “decidiu” que queria vir junto. Só calhou
de eu ter feito o teste de gravidez no dia anterior a ele comprar uma
passagem de aviã o para si.
Certo.
Esse homem nunca fazia nada sem um bom motivo. E o motivo atual
o fez parecer uma mamã e ursa. Uma mamã e ursa muito agressiva e
possessiva. O que era alarmante, pois Dex normalmente já era assim. Eu
nã o podia nem me sentar no Mayhem sem ele ou Sonny estarem a três
metros de mim.
Inclinei a cabeça para trá s em seu peito e ri.
— É , só bem.
Ele soltou um murmú rio que veio do fundo da garganta.
— Ritz — falou, arrastado, naquela voz rouca que atingia as partes
mais sombrias dos meus ó rgã os. — Você está me matando, linda.
Ah, caramba.
Eu queria mesmo dar oficialmente a notícia ali no acostamento da
estrada com vô mito provavelmente ainda espalhado pelo meu rosto?
Nã o. Entã o optei pela verdade.
— Eu tinha tudo planejado na minha cabeça. Já encomendei a
motinha de brinquedo mais fofa do mundo para poder te contar, entã o
nã o estrague tudo.
Uma risada baixa explodiu do seu peito, tã o forte que balançou meu
corpo junto com o dele. Eu amava esse cara pra caramba. Cada vez que
ele ria, eu juro que o sentimento se multiplicava. A esse ritmo, eu o
amaria mais do que a minha pró pria vida ao cubo, e ao cubo de novo.
— Certo — murmurou, entre aquelas risadas baixas logo que ele se
acalmou um pouco. Os dedos trilharam a pele das costas da minha mã o
até pararem no meu anelar, e ele apertou o osso esguio. — Posso ser
paciente.
Aquilo lhe rendeu uma risada da minha parte. Paciente? Dex? Mesmo
depois de mais de três anos, aquele ainda seria um termo que eu jamais
usaria para descrevê-lo. E talvez nunca usaria. Ele havia começado a
perder a cabeça durante a viagem, quando Trip ligou para perguntar
como armava o alarme do bar novo.
— Dex, Ris e bebê Locke, vocês já acabaram? — gritou Sonny,
espiando por cima da porta do carro.
— Você está de brincadeira comigo? — gritei para ele. Todo mundo
já sabia?
Os olhos arregalados do meu meio-irmã o para mim nã o estavam
nem um pouco arrependidos. Eu nã o ia nem me dar ao trabalho de
perguntar como ele sabia. Esses dois otá rios me conheciam melhor do
que ninguém, incluindo o idiota que eu chamava de irmã o mais novo. O
mesmo irmã o mais novo que eu havia visto apenas duas vezes. O
covarde que estava com medo demais de vir conhecer o mais novo de
nó s.
Nã o que isso significasse muito, já que eu tinha levado três anos para
finalmente ir ao Colorado. Mas Carson, nosso meio-irmã o de treze anos,
tinha estado mais do que receptivo com nossa progressã o gradual de
conhecer um ao outro. Tínhamos evoluído de eu enviando um presente
de aniversá rio para ele, para uma ú nica ligaçã o de agradecimento.
Depois ligaçõ es mensais para conversarmos, o que durou um ano,
evoluindo para e-mails semanais e, enfim, videochamadas via Skype.
Mesmo entã o, eu tinha levado alguns meses para ligar para ele
depois que a vida voltou ao normal, apó s a confusã o com o homem que
nunca será nominado.
Tinha levado ainda mais uma semana e meia para a moto do meu pai
conseguir ser vendida. O dinheiro havia sido o bastante para cobrir o
resto da dívida que ele tinha com os croatas. Em seguida, entregar o
dinheiro para eles havia sido um processo tedioso para garantir que o
assunto houvesse se encerrado e que estaríamos seguros depois disso.
E com facilidade, depois que aqueles babacas receberam, nunca
houve outro problema.
Nem com a má fia, nem com os Ceifadores, nem com o meu pai.
O mesmo pai que nunca havia feito outra apariçã o na minha vida,
nem na dos meus irmã os.
E eu podia dizer, com toda tranquilidade, que nã o sentia um grama
de culpa por causa do que tínhamos feito naquela viagem, nem mesmo
três anos depois. Também ajudou nunca termos descoberto para que o
dinheiro era. Quando tudo acabou, nã o me importei. Nem um pouco.
— Prontos? — gritou Sonny de novo, batendo no teto do carro com a
palma da mã o.
— Sossegue o facho, porra — gritou Dex em resposta. Bem, a
amizade deles levou alguns meses para voltar aos trilhos, mas estavam
bem agora.
Sabe, depois que eles trocaram socos lá no Mayhem. E depois teve
uma segunda briga no quintal do Luther. Pois é. Nã o consegui
testemunhar nenhuma delas, mas nã o deixei de notar o nariz inchado,
os olhos roxos e os lá bios partidos depois. Ainda assim, eu nã o podia
deixar de sentir uma sensaçã o de completude por esses dois homens
das cavernas idiotas serem meus. Meus otá rios orgulhosos e leais.
Me afastei dele e, devagar, me virei e inclinei a cabeça para olhar o
seu rosto. Deus, ele era tã o bonito. Tã o incrivelmente perfeito. Eu
conseguia ver a ponta do tentá culo de Uriel em um lado do seu pescoço
e a explosã o multicolorida de um arco-íris do outro lado. O arco-íris era
a minha tatuagem. O dragã o azul que Magrã o tinha passado semanas
me rodeando para fazer.
Só que foi Dex quem me convenceu, tecendo meu nome em violeta,
de um jeito que só Magrã o seria capaz de fazer.
Meu pró prio dragã ozinho azul, uma fraçã o do tamanho do dele,
enfim havia encontrado seu lar na parte interna do meu pulso logo
depois.
Fiquei na ponta dos pés e beijei a parte de baixo da barba bem-
aparada que ele vinha cultivando nos ú ltimos meses.
— Te amo.
Aquele sorriso lento e sedutor rastejou por suas feiçõ es. Brilhante e
mais carinhoso do que era possível para eu conseguir lidar, e que
roubou todo o meu fô lego. Quando ele espalmou minhas bochechas e
beijou cada uma delas e meu nariz e minha testa, devagar, como se
estivesse saboreando os estalinhos e o contato, absorvi tudo. Como
sempre, e como eu sempre faria.
— Te amo pra caralho. — Ele suspirou no meu ouvido, um braço
deslizando pela minha lombar para nos aproximar ainda mais. — Mais
que tudo.
A droga da buzina do carro soou, longa e baixa. Droga de Sonny.
Sorri para Dex e entrelacei os dedos com os dele.
— Pronto? — perguntei. Um questionamento amplo que abarcava
uma dú zia de direçõ es distintas.
E ele respondeu do jeito que eu sabia que responderia todas as vezes
que eu perguntasse a partir de entã o, do jeito que me dizia que ele
jamais me decepcionaria. Que ele era um objeto imutável. Que ele
sempre estaria presente para mim para lutar com os demô nios que
podíamos ver e com os que nã o podíamos.
— Iris.
Meus amados leitores, obrigada por todo o seu apoio nessa
incrível jornada. Este livro começou uma vida totalmente nova
para mim, e sou grata pra caramba a todos vocês. Obrigada por
tudo.
Como sempre, um obrigada especial para a minha família,
Chris, Dorian e Kai, que me colocam para cima quando estou
para baixo… mas que também me dã o alguns pontapés para ter
certeza se ainda estou viva e disposta a batalhar quando nã o
me levanto sozinha, hahaha. Amo vocês, galera.
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