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“A CASA
ERRADA”

Livremente inspirado no original de


Arthur de Azevedo
e
baseado na adaptação de Jackie Vellego para o
programa “Brava Gente” da TV Globo

TEXTO PARA USO ESCOLAR


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PERSONAGENS

FRANCELINA, a empregada
NONÔ, a velha ou o velho

ISABEL, a patroa
MARCOS, o patrão

ODETE, a vizinha
LAURA, a amiga

ENTREGADOR, que faz a entrega do mercado


MARLENE, a cabelereira
SOLANGE, a manicure

POLICIAL 1
POLICIAL 2
3

PRÓLOGO

Dois ambientes simultâneos; Francelina, a empregada está caminhando para


o apartamento que trabalha. Ela erra a porta e acaba entrando no apartamento
de Odete – que está batendo um bolo.

ODETE (Ao telefone) Sim, sim... Hoje é o meu aniversário.


Não vou fazer festa não... só um bolinho básico mesmo pra não passar em
branco. Inclusive, eu tô pra receber um familiar aqui em casa que eu não vejo
há um tempão... Pois é... mas me conte, como anda a Neuza?

FRANCELINA Ai, dona Isabel! A senhora precisava ver a


promoção mais irada que tava lá no mercado, viu.

ODETE (Grita) Ahhhhhhhhhh!!

(Odete leva um susto com uma mulher desconhecida que entra em sua
cozinha. Ambas dão um grito. Francelina percebe que entrou na casa errada
e sai correndo)

FRANCELINA Meu pai do céu! Eu errei! Eu entrei na casa errada!

CENA I

FRANCELINA Dona Isabel!!! Dona Isabel!!! Ainda bem que


encontrei a senhora! Oi, seu Marcos! Tudo bom? (Abraça Isabel)

ISABEL O que que é isso Francelina? Você tá desse jeito


por quê?

MARCOS Que afobação toda é essa, Francelina?


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FRANCELINA Ai, dona Isabel! Pelo amor de Deus! Uma pergunta


por vez! (Se joga no sofá)

ISABEL O que que é isso, Francelina? Tenha modos! Anda,


diga. O que houve?

FRANCELINA (Esbaforida) É que eu errei!

MARCOS Errou o quê? O caminho do mercado?

FRANCELINA Nada, seu Marcos! Eu errei foi de casa! Eu entrei


por engano na casa da vizinha!

ISABEL (Ri) Você tá brincando!

FRANCELINA Tô nada. Fui andando e fui parar lá na casa 13 ao


invés de entrar na 18. Tu acredita que eu fui parar lá dentro na casa da
mulher?

ISABEL (Rindo) Você foi parar lá na casa da Odete?

FRANCELINA Odete... aquela mulher levou um susto comigo na


cozinha dela. Ela grita que é uma beleza, viu... vocês nem precisavam gastar
grana com vigia noturno.

MARCOS (Dando bronca) Francelina! Você não vai me criar


com confusão com a vizinha, porque você acabou de chegar aqui, tá me
entendendo?

FRANCELINA Acontece que essas casas modernas são tudo igual.


Eu “se” confundi.
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ISABEL (Corrigindo Francelina) Eu me confundi.

FRANCELINHA A senhora também? Pra senhora ver, a senhora tá


aqui há um tempão! Eu não! Eu só tô aqui há “oitos dia”.

ISABEL Eu não vou conversar contigo agora não,


Francelina. (Pausa)

MARCOS Que isso, Isabel. Isso lá são modos de tratar a


Francelina?

ISABEL Cale a boca, Marcos. Só fale quando eu mandar!

MARCOS Tá bem, docinho.

ISABEL (Para Francelina) Olha, você vê se limpa essa


geladeira direito, que tá precisando... e eu e Marcos voltaremos às 5 horas.
Se você tiver que sair, você presta atenção no número da casa... pra você não
“se confundir” de novo. Entendeu?

FRANCELINA Pode deixar, dona Isabel! Eu não erro mais não!


Vai com Deus! Tchau, seu Marcos!
(Isabel e Marcos saem)
CENA 2

FRANCELINA Limpar essa casa vai dar um trabalhão. Olha o


tamanho dessa sala. Haja balde, vassoura e aspirador. Melhor começar logo
com a faxina antes que a dona Isabel e o seu Marcos voltem, viu. Aliás, pra
faxina ficar mais animada, é melhor botar um pancadão! (Ela liga o rádio
e/ou coloca os fones de ouvido. Começa a dançar e faxinar. A campainha
toca).
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FRANCELINA Visita? Agora? Será que os ‘patrão’ estava


esperando alguém?
(A campainha continua tocando)

FRANCELINA Já vai! Oxe... mas quem será que tá com tanta


pressa? (Vai até a porta) Quem é?

NONÔ (Do lado de fora) Abre logo essa porta, menina. Ou


eu vou ter que ficar plantado aqui no Sol me enrugando mais ainda?

(Francelina abre a porta. Nonô entra).

FRANCELINA Pois não.

NONÔ Que?

FRANCELINA Pois sim.

NONÔ Hã?

FRANCELINA (Grita) POIS NÃOOOOOO!!!

NONÔ (Irritado) Não grita, que eu não sou surdo! Venha


me ajudar de uma vez. Não está vendo que eu tô cheio de mala, bengala,
chapéu...

FRANCELINA Me desculpe. Mas o senhor, quem é mesmo?


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NONÔ Não desculpo nada. Eu é que pergunto: que Diabo


é você? E fala alto! Eu não sou surdo... mas não escuto muito bem.

FRANCELINA (Grita) É Francelina! Eu sou a secretária do lar


dessa dona que mora aqui.

NONÔ (Ri) Secretária! Aquela lá muda de empregada


como eu mudo de doença!!! Cadê a Noêmia?

FRANCELINA Eu não conheço Noêmia não senhor.

NONÔ Ah, você também não perde nada. Noêmia não era
uma empregada boa. Ela era péssima. Enfim... eu sou o tio da sua patroa.

FRANCELINA Ahhhh! Que bonitinha o senhor!

NONÔ Bonitinho, eu?! Depois eu que não enxergo bem...


olha aqui, minha Inquilina... vai lá pra dentro chamar logo a minha sobrinha!

FRANCELINA Inquilina não! Meu nome é Francelina!

NONÔ Jovelina?

FRANCELINA (Grita) Francelina!!!

NONÔ Tá bom, eu já ouvi, Joventina!

FRANCELINA E sua sobrinha saiu... disse que só vai voltar no


final da tarde.
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NONÔ Saiu outra vez? Nossa senhora, continua uma bela


de uma sassariqueira. E eu vou ficar aqui, no Sol, em pé até ela chegar?

FRANCELINA O senhor quer entrar e esperar ela lá dentro ou o


senhor prefere voltar depois?

NONÔ Que depois? Tá maluca, menina? Depois na minha


idade significa nunca mais. É claro que eu quero entrar!

FRANCELINA Faça o favor!

NONÔ Faça o favor você! Não percebeu que eu mal


enxergo o portão? Anda, pegue minhas malas e coloca no quarto. Me leve
pra dentro.
(Eles entram).
CENA III

NONÔ (Apavorado) O que que isso? Jesus Cristo! Ela


mudou de móveis outra vez?

FRANCELINA Eu não sei não, senhor.

NONÔ Hein?! Falou comigo?

FRANCELINA (Gritando e gesticando) Eu disse que eu não sei se


a patroa mudou de móveis... porque eu tô aqui somente “oitos dia”.

NONÔ Por que você está tão saracoteando? Por que você
está tão agitada? Ah, senhor do céu... essa minha sobrinha é uma gastadeira.
Pra que trocar todos os móveis dessa casa? Ela pensa que dinheiro nasce nas
árvores. Onde que já se viu isso?
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FRANCELINA O senhor não quer sentar?

NONÔ Não! Quero ficar em pé. Aqui no meio da sala, até


criar um buraco no chão. (Pausa) Há quanto tempo você disse que está aqui?

FRANCELINA Hoje faz “oitos dia”.

NONÔ Ahhhhhh! Então é por isso que você não me


conhece. Eu não venho aqui há quase um mês.

FRANCELINA Deixa eu ajudar o senhor a sentar.

(Francelina o ajuda)

NONÔ (Rabujento) Sai daqui, sai, sai, sai. Não precisa me


ajudar. (Senta na poltrona de balanço). Ahhhhhhhhhhhh... que delícia!
Minha lombar. Até que enfim minha sobrinha comprou uma poltrona macia,
porque a outra... vou te contar! Deixava nosso traseiro inconsolável,
anestesiado! Ahhhhhh, que bom. Que conforto!

FRANCELINA O senhor quer um refresco?

NONÔ Hein?! Quem é que tá fresco aqui?

FRANCELINA Uma água?

NONÔ Quem é que tá na água?

FRANCELINA Um café!!!
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NONÔ Um café? Café pra mim? Ahhhh, por que você não
fala logo? Café é bem vindo. Mas olhe: quero um café bem forte! Não me
traga um café de beira de estrada não.

FRANCELINA Sim, senhor.

NONÔ Ei. Volte aqui! Tá surda?

FRANCELINA Quem, eu?

NONÔ Não. Minha avó. Olhe bem. Coloque um pouco de


conhaque, viu.

FRANCELINA (Apavorada) Conhaque? No café?

NONÔ É... conhaque no café. Nunca viu? Na Europa se


usa conhaque no café.

FRANCELINA Eu não sei se tem conhaque aqui em casa não.

NONÔ Bem, se não tiver conhaque... bote uísque. Ou rum.


Ou então, licor. Já sei! Coloca vodca!

FRANCELINA Já entendi. Qualquer birita. (Sai).

NONÔ (Resmunga) Garota chata. Ainda por cima é surda.

FRANCELINA (Resmunga) Velho chato, rabugento. Mas é tio da


patroa, né... fazer o quê? (Se apavora) E se ele for um assassino que mata de
montão? Ahhhh, não... ele não tem cara de assassino. Nem cara e nem saúde.
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Ai... Será que eu ligo pra dona Isabel? Não. Eu não vou ligar nada... pois
dona Isabel vai pensar que eu sou uma incapaz! Eu vou cuidar bem do velho!
Isso! Daí, a dona Isabel vai ver como eu sou uma boa empregada.

CENA IV

FRANCELINA Aqui está o seu café!

NONÔ O quê?

FRANCELINA (Grita) Seu café!

NONÔ (Rabujento) Não precisa gritar, garota. Eu não sou


surdo! (Toma o café) Delícia demais! Eu tô com um sono... acho que vou
tirar um cochilo depois do café. E não me acorde antes da minha sobrinha
chegar.

FRANCELINA (Gritando) Positivo. Entendido. Pode deixar.

NONÔ Pra que essa gritaria? Ande, vá. Traga-me


almofadas e a pantufa da minha sobrinha. Esses sapatos estão me matando.

FRANCELINA Ficou bom o café?

NONÔ Tem pouco conhaque... mas dá pro gasto. De


qualquer maneira, está melhor que o café da Noêmia.

(A campainha toca. Francelina abre a porta)

FRANCELINA Pois, não!


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ODETE (Grita) Ahhhhhh!!! Meu Deus! É a assassina que


invadiu a minha casa!

(Ambas gritam. Francelina entra em casa).

ODETE Polícia! Polícia! Uma bandida invadiu a minha


casa!

(Chegam Isabel e Marcos)

ODETE Não entrem na casa de vocês! Não entrem! Não


entrem!

MARCOS Dona Odete, o que houve?

ODETE Tem um bandido na casa de vocês! Pior! Tem uma


bandida!

ISABEL Na nossa casa? Tem certeza?

ODETE Certeza absoluta! A bandida tentou entrar na


minha! Mas eu a surpreendi! Eu gritei, pois sou de gritar... e a bandida saiu
correndo! E agora, entrou na casa de vocês!

ISABEL (Ri) Uma assassina, né?!

ODETE Mas eu já chamei a polícia!

MARCOS O quê? A polícia? Que história é essa?


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ODETE Eu tô falando pra vocês! Uma bandida


perigosíssima na casa de vocês!

ISABEL (Achando que é piada) Deixa eu te falar uma coisa:


eu vou entrar na minha casa, eu vou devagarinho e depois eu te falo se tem
ou não uma bandida na minha casa. Tá bom?

MARCOS Mas e se a bandida assaltar a gente?

ISABEL Cale a boca, Marcos. Você acreditar nessa maluca?

MARCOS Eu só não quero morrer!

ISABEL Cale a boca, Marcos! Só fale quando eu mandar!

MARCOS Tá, bem... meu docinho!

ISABEL Eu vou entrar com meu marido. Com licença,


Odete.

(Fecha a porta na cara de Odete)

CENA V
Francelina percebe que Nonô está dormindo.

FRANCELINA Ih, o velhinho pegou no sono mesmo. Até que ele


não é tão ruim... principalmente dormindo.

(Entram Marcos e Isabel)


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FRANCELINA Dona Isabel! Seu Marcos! Graças a Deus que vocês


chegaram! Dona Isabel, o seu tio tá lhe esperando há um tempão.

ISABEL Que tio, Francelina?

FRANCELINA Seu tio velhinho, meu surdo, capenguinho, meio


cego...

ISABEL Ô Francelina! O único tio que eu tive morreu há 5


anos. Eu nunca foi surdo, cego e muito menos capenguinho. Não, é não,
Marcos?

FRANCELINA Dona Isabel, então quem é aquele ‘véio’ que tá ali


no meio da sala?

ISABEL Francelina, quem é esse homem? Que história é


essa de tio?

MARCOS Quem é esse homem, Francelina?

FRANCELINA Calma, gente! Uma pergunta por vez!

ISABEL Quem é esse homem, Francelina?

FRANCELINA É seu tio!

ISABEL Que tio, Francelina? Eu não tenho tio. Esse homem


não é meu tio!
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FRANCELINA Mas ele veio! Disse que era sua tio! Conhecia a
casa. Sabia até que tinha conhaque na cozinha.

MARCOS Você deu conhaque pra um desconhecido na minha


casa?

FRANCELINA Foi com café!

ISABEL Eu nunca vi essa homem na minha vida! Vai ver é


um ladrão!

FRANCELINA Ô dona Isabel, que calúnia. O velhinho não fez


nada. Ele só dorme.

MARCOS E tá dormindo há quanto tempo?

FRANCELINA Um tantão de horas! Acho que eu caprichei demais


no conhaque!

MARCOS Então vamos acordar ele. Senhor, senhor! Ei,


acorde!

FRANCELINA Pode falar alto, seu Marcos. Ele é surdo que nem
uma porta!

ISABEL (Grita) Moço! Moço! Senhor!

MARCOS Bora, amigão... Acorda!!!


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FRANCELINA (Gritando) Dona! Acorda que a sua sobrinha


chegou!

ISABEL Esse homem não é o meu tio!

MARCOS Amor, você tem certeza mesmo que ele não é seu
tio?

ISABEL Cala a boca, Marcos!

MARCOS Mas amor...

ISABEL Cale a boca, Marcos! Eu já disse! Só fale quando


eu mandar!

MARCOS Tá bem, docinho.

FRANCELINA Eu tô com o seu Marcos1 Olha bem pro velho, dona


Isabel... as vezes a gente esquece das pessoas! Se bem que eu tô até achando
você parecida com ele.

ISABEL Ei, moço! Moço!! Acorde!! Ai, meu Deus!


(Apavorada)

MARCOS O que houve?

ISABEL O velhinho tá frio demais, Francelina!

FRANCELINA E olha que ele chegou aqui cheio de calor!


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ISABEL Francelina, ai Francelina... eu acho que... eu acho


que... ESSA HOMEM TÁ MORTO!

(Ambas gritam)

TODOS Ahhhhhhhhhhhhhhhhhhh!!!

ISABEL Alguém me belisca e diz que eu tô sonhando! Eu tô


sonhando, não tô?! Ai meu deus, tem um morto na minha sala e eu não sei
quem é.

FRANCELINA O que que a gente faz?

MARCOS Será que a gente vai ter que chamar a polícia?

ISABEL É óbvio que a gente vai ter que chamar a polícia...


mas antes eu preciso pensar no que eu vou dizer pra polícia. (Repara na
pantufa em Nonô) Nossa... ele tem a pantufa igual a minha.

FRANCELINA (Ri) É! São as suas pantufas!

ISABEL (Indignada) Francelina! Você colocou meus


chinelos num morto?!

FRANCELINA Não senhora! Quando eu coloquei, ele tava bem


vivinho.

(Marcos puxa Francelina pelo braço e a coloca no sofá)

MARCOS Francelina! Me conta essa história direito!


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FRANCELINA Foi assim: ele tocou a campainha e eu atendi. Ele


mandou eu ajudar ele com as malas. Ele perguntou por uma Noêmia.

MARCOS Quem é Noêmia?

FRANCELINA Uma empregada péssima que faz um café


horroroso. Eu disse que você não estava e ele preferiu esperar.

ISABEL Mas ele disse o meu nome? Ela disse Isabel?

FRANCELINA Falou! (Pausa) Ihhhhhh, não me lembro. Eu ‘se’


confundo.

ISABEL Eu me confundo!

FRANCELINA A senhora também, é?!

ISABEL Ah, não....

FRANCELINA Eu entendo! É muito chato a pessoa chegar em casa


e encontrar um velho morto na sala.

MARCOS Chato não, Francelina! Isso é uma tragédia grega!

FRANCELINA Vixe, o velhinho era da Grécia?

ISABEL Nãoooooooo!
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FRANCELINA Vou continuar: ele pediu café com conhaque e


dormiu um pouco. E pediu que eu só o acordasse quando a senhora chegasse.
Daí a senhora chegou, e o velho esticou as canelas.

ISABEL Vamos revistar o velho pra saber quem ele é?


Algum documento...

MARCOS O quê? Mexer no morto?

FRANCELINA Meus me livre e guarde!

ISABEL (Estressada) Se pedir a identidade é óbvio que ele


não vai dar!

FRANCELINA Verdade, o velho é surdo.

ISABEL Ela é surdo e tá morto!

MARCOS Olha, eu não sei mexer em morto não. Eu aprendi


no catecismo que não se deve ficar chacoalhando corpo.

FRANCELINA Eu não vou encostar um dedinho no defunto.

ISABEL Acontece que quem colocou a morta aqui foi você,


Francelina! Então você vai me ajudar pra saber quem é a morta.

FRANCELINA (Se ajoelha) Senhor, me perdoa por mexer numa


morta!
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CENA VI

(A campainha toca)

ISABEL Meu Deus! Chegou alguém!

MARCOS O que faremos com esse morto na sala?

FRANCELINA Calma, deixa eu ir lá ver quem é!

(Francelina vai até a porta e vê quem surge. É o Entregador).

FRANCELINA Calma, dona Isabel! Calma, seu Marcos! É o


menino que veio trazer o resto das compras do mercado. Deixa comigo!

(Entra o Entregador)

ENTREGADOR Coé, Francelina! Tranquilona?

FRANCELINA E aí, ném. Pode deixar que eu mesmo levo as


compras lá pra dentro.

ENTREGADOR Ih, qual foi, glamurosa? Tu sempre paga pra eu


trazer as compras até o teu serviço. Já sou de casa. Pode deixar que vou
descarregar as paradas lá na cozinha. Confia no pai! Fala aí, donos...
firmeza?

ISABEL (Imitando o jeito do Entregador) Tudo firmeza!


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MARCOS Tudo suave, pai.

(Marcos e Isabel ficam dançando na frente de Nonô – a fim que o Entregador


não veja o morto na sala)

ISABEL Francelina!!! Quem mandou o menino entrar?

FRANCELINA Eu não deixei! Ele entrou sem licença!

MARCOS Que intimidade toda é essa com o menino do


mercado?

FRANCELINA Ah, é que ele mora lá perto de casa... a gente pega


o trem junto lá em Saracuruna!

ISABEL Onde fica Saracuruna?

FRANCELINA Ih, a senhora nem queira saber! Vamos abafar esse


caso!

(O Entregador volta)

ENTREGADOR Ih, quem é esse dono aí?

FRANCELINA É o tio dela!

ISABEL Cala a boca, Francelina!

ENTREGADOR Ele tá...


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MARCOS ... dormindo! Não tá vendo que ele tá dormindo?

ENTREGADOR Pô, na boa... mas esse tio dorme esquisitão, hein...

FRANCELINA É que ele bebe!

ISABEL Ele bebe muito!

ENTREGADOR Ihhh, esquisito isso hein...

(Marcos puxa Isabel e Francelina para um canto)

MARCOS Pronto! Agora o entregador viu o morto!

FRANCELINA Mas ele não sabe que o morto tá morto. Ele acha
que o morto tá vivo.

ISABEL Eu tenho medo dele sair contando o que viu por aí,
pros outros vizinhos!

FRANCELINA Pior que ele conta mesmo! Outro dia ele tava me
contando, que foi fazer uma entrega na casa da vizinha do 35, e viu ela
enxugando o suor do sovaco com o pano de prato!

MARCOS Vamos inventar uma desculpa!

(A campainha toca).
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CENA VII

MARCOS Meu Deus!

FRANCELINA A campainha!

ISABEL Quem será que é?

LAURA Isabel, amiga! Abre aí! Sou eu, Laura!

FRANCELINA Quem é Laura?

ISABEL Minha melhor amiga!

LAURA Oi, amiga! (Cumprimenta) Olha o que eu trouxe


pra gente comer nesta tarde: um maravilhoso pavê de frutas vermelhas!

ISABEL Um pavê?!

LAURA De frutas vermelhas! Olha só! Tá lindo, né?! Você


acredita que eu aprendi essa receita no TikTok? Tá deixando a Ana Maria
Braga no chinelo, menina.

FRANCELINA Acho melhor colocar na geladeira pra não ficar


mole!

MARCOS Francelina!

LAURA Ah, querida! Leva pra mim?


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FRANCELINA Pode, deixar!!!

ISABEL (Empurrando a amiga pra fora de casa) Sabe o que


que é, amiga?! É que eu tô de dieta, sabia? Tá difícil de perder alguns
quilinhos.

LAURA Ah, mas não se preocupe! Fiz tudo com ingrediente


diet!

ISABEL (Empurrando com mais força) Não vai dar, amiga.


Meu colesterol tá alto, a glicose, triglicerídeos... até fiquei intolerante a
lactose. Acredita que virei vegana hoje de manhã?

LAURA (Extremamente dramática) Pera aí! Você não quer


comer o meu pavê que eu fiz com tanto carinho pra você? Eu faço uma
gentileza, venho na sua casa e sou tratada dessa forma?

ISABEL Não, amiga... não é isso. É que...

LAURA (Se joga no chão aos prantos) Meu Deus! Que


castigo é esse? Estou sendo humilhada pela minha melhor amiga! O que foi
que eu fiz, senhor?

MARCOS (Sem graça, tentando resolver a situação) De


repente a gente come só um pedacinho, né, amor... um pedacinho só, Isabel
não vai passar mal.

ISABEL Cala a boca, Marcos!

MARCOS Mas meu amor!


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ISABEL Cala a boca, já disse!

MARCOS Tá bem, docinho.

LAURA (Muda de humor rapidamente, se recompõe)


Ahhhhh, vocês são o melhor casal do mundo!

FRANCELINA Eu vou pegar os pratinhos! (Para o Entregador) Vai


querer pavê também?

ENTREGADOR É pavê ou pá comê?

(Francelina sai)

ISABEL Meu Deus! O entregador ainda está aqui!

MARCOS E vai comer pavê!

LAURA (Contente) De frutas vermelhas!!! Receitinha nova


que aprendi no TikTok!

ENTREGADOR Só um pedacinho, que eu ainda tô de serviço!

CENA VIII

(A campainha toca. Marlene e Solange surgem)

ENTREGADOR Pode deixar que eu atendo!


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MARLENE Olá, darlings!

SOLANGE Oi, Isabel! Tudo bem?

ISABEL (Cai no sofá) Meu Deus do céu!

MARLENE Isabel, querida! Desculpe o atraso, viu. O trânsito


na Linha Amarela estava um verdadeiro caos! Da Ilha do Governador pra cá
pra Curicica é um chão!

SOLANGE Eu falei que era melhor ter vindo de BRT. Agora


que reformaram tá um luxo só... mas não! Marlene é teimosa! Disse que tava
com medo de se assaltada. Imagina se o bandido ia querer roubar uma
cabelereira e uma manicure! Na bolsa só ia encontrar secador e alicate!

MARLENE Onde você vai fazer o cabelo, aqui na sala mesmo?

SOLANGE Inclusive, o valor da manutenção da unha de


acrigel subiu, hein...

ISABEL Olha, meninas... eu não sei se hoje eu tô com clima


de fazer o cabelo e a unha.

MARLENE Ah, meu bem! Você tá com uma carinha de abatida


mesmo. Mas pode ficar tranquila! Senta aí que a gente cuida de você.
Inclusive, vou utilizar os produtos da linha Linda de Bonita em você! Vai
ficar maravilhosa, toda poderosa! Uma mulher fina é uma mulher bem
cuidada! E mulher bem cuidada tem que usar os produtos Linda de Bonita!

MARCOS Olha, eu adoraria receber todos vocês em minha


casa... mas hoje está sendo um dia complicado!
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LAURA Ah, Marcos! Não precisa expulsar as meninas não,


bobo! O pavê vai dar pra todo mundo comer e repetir!

SOLANGE Ih, menina! Tem pavê?!

LAURA Tem!!! De frutas vermelhas!!!

SOLANGE Ih, mentira!

LAURA Aham! Aprendi no TikTok, cê acredita?

SOLANGE Babado!

MARLENE Eu quero! (Repara no Nonô) E esse aí que tá


dormindo? Quem é?

MARCOS É o tio da Isabel!

ISABEL Cala a boca, Marcos!

MARLENE Se quiser eu faço o cabelo dele também! Trouxe


maquininha... fiz um curso na FAETEC e agora sei até fazer um disfarçado!

CENA IX

(Surge Francelina com uma bandeja e vários pedaços de pavê servidos em


pratinhos. Ela serve todos, inclusive o morto).

ENTREGADOR Pô, o pavê tá bonzão. Esquece!!


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SOLANGE O sabor das frutas vermelhas explode na boca! Que


delícia!

MARLENE Depois me passa a receita!

(Marcos puxa Isabel e Francelina para o canto)

MARCOS E agora? O que que a gente faz? Esse povo não vai
sair da nossa casa?

ISABEL Eu tenho medo deles estarem desconfiados de que


o velhinho tá morto!

FRANCELINA Mas até agora tá tranquilo, dona Isabel! Acho que


ninguém percebeu nada...

LAURA Isabel, amiga! O seu tio não gosta de pavê?

ISABEL Gosta, gosta, gosta muito de pavê. Não é, senhor...


digo, tio?!

(O corpo do tio começa a ficar rígido. Nonô tomba pra frente e cai com a
cara no pratinho do pavê).

SOLANGE Tá tudo bem?

FRANCELINA É que ele come pavê de uma forma diferente,


sabe... ele não gosta de comer de colherzinha não.
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LAURA E que tio é esse que você nunca me apresentou,


amiga?

ISABEL É que ele veio de outra cidade.

LAURA Que estranho, amiga. O único tio que você teve


morreu há 5 anos.

(O corpo do Nonô quase não consegue ficar na postura ereta)

ENTREGADOR Queria dizer nada não... mas tô achando que o tio


da senhora não tá nada bem não.

MARCOS Ele tá doentinho mesmo. Não enxerga, não fala,


não anda...

ENTREGADOR Olha, gente... eu não queria dizer nada não. Eu sei


que essa família aqui é de muito respeito... mas desde que cheguei nessa casa
eu não vi esse senhor respirar!
(Silêncio)

MARLENE Isabel, querida...

SOLANGE ... você tem certeza que seu tio...

LAURA Gente, ele tá morto!

(Pânicos e gritaria. O Entregador desmaia e é aparado. Vozes e gritos).


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VOZES Ele tá morto sim! Meu Deus! O que que a gente


faz? Eu quero ir embora! Eu tenho medo! (Os visitantes vão em direção à
porta)

MARCOS (Em tom alto) Atenção! Ninguém sai dessa casa!

SOLANGE Saio sim! Ora, que audácia!

ENTREGADOR Ih, qual foi chefe?! Eu tenho que voltar pro serviço.
Tenho que voltar pro mercado.

MARCOS Já disse, ninguém sai! Temos um problema aqui e


vamos juntos resolver!

MARLENE Eu vou chamar a polícia!

LAURA Isabel, você matou o seu tio?

ISABEL Ele não é o meu tio!

LAURA Então quem é?!

ENTREGADOR Mas você disse que era o seu tio!

FRANCELINA Esse senhor entrou aqui em casa procurando a


sobrinha dele...

ISABEL ... que não sou eu!


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FRANCELINA Só que ele entrou na casa errada! Ele não é tio da


dona Isabel. Daí, ele bebeu café com conhaque e depois bateu as botas!

MARLENE E quem deu café com conhaque pra ele?

MARC/ISABEL (Juntos) Francelina!

LAURA E por que raios você deu café com conhaque pra
ele?

FRANCELINA Porque ele pediu!

ENTREGADOR Então a assassina é você, Francelina!

FRANCELINA (Cai no sofá) Ai, não! Tudo menos a cadeia! Eu ‘se


demito’, gente!

ISABEL (Corrigindo) Eu me demito!

FRANCELINA Ah, a senhora também?!

MARCOS A questão é a seguinte: se a gente chamar a polícia,


todos nós seremos incriminados. Francelina não matou ninguém. O velhinho
bateu na porta errada, Francelina achou que ele era sobrinho da Isabel...

FRANCELINA ... até porque eu trabalho aqui há ‘oitos’ dia!

MARCOS ... daí o senhor empacotou do nada! Morreu


dormindo! Ninguém tem nada a ver com a morta dele! Ninguém é culpado
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de nada. A questão é se a polícia vai acreditar na gente. Precisamos pensar


juntos em como daremos o desfecho nessa história.

FRANCELINA Vamos ter que dar um jeito no presunto!

ISABEL Isso aí!

LAURA Eu só vim trazer um pavê, gente...

ENTREGADOR Que você aprendeu no TikTok...

SOLANGE Gente, vamos rezar pro defunto?

CENA X

ODETE Opa, polícia! Graças à Deus que vocês chegaram!

POLICIAL 1 Em que posso ser útil?

ODETE Temos uma assassina na vizinhança.

POLICIAL 2 Assassina?

ODETE Ela inclusive entrou na minha casa, pela cozinha!


Eu tava batendo um bolo – que é meu aniversário - quando eu a vi eu gritei
assim: “Ahhhhhhhhhhh”. E depois ela gritou de volta assim;
“Ahhhhhhhhhh”.

POLICIAL 1 Já podemos pular essa parte.


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ODETE Aí ela saiu correndo e foi embora! Fui na casa dos


vizinhos, contar pro casal o que tinha acontecido. Quando eu bati lá, sabe
quem eu encontrei?

POLICIAL 2 O casal?

ODETE Não!!! A elementa! Aí, eu gritei assim:


“Ahhhhhhh”.

(O Policial tampa a boca de Odete)

ODETE Bom, aí depois chegou o casal. E eu disse: “Não


entre na sua casa! Tem uma ladra aí”... mas aquele casal lá não queriam
saber, já viram, né?! Dois metidos! A mulher é a pior de todas, ainda mais
agora que ela pintou o cabelo e tá se achando. Ela disse que ia entrar na casa
assim mesmo e que não tinha perigo. Aquela lá, vou te falar, eu não gosto
dela! Ela vive gritando com o marido – que é um tolo também. Não sei como
eles são casados se...

POLICIAL 1 (Interrompe) É... eu acho melhor ir até a casa do


casal.

ODETE Eles podem estar mortos! Estripados, com pedaços


espalhados pela casa. Você desmaia com sangue?

POLICIAL 2 Que isso, dona?

ODETE Se você desmaia com sangue, vai você que é mais


alto, mais forte!

(O Policial toca a campainha)


34

ODETE Tá demorando pra atender. Eu falei, eu falei...


Agora é tarde! A carnificina já está feita!

MARCOS (Vai até o lado de fora) Pois, não. Em que posso ser
útil.

ODETE Ué, você tá inteiro? Cadê a assassina?

POLICIAL 1 Desculpe, senhor. Mas nós recebemos uma


denúncia de que uma possível assaltante possa ter entrado na sua casa.

MARCOS Assaltante? Deve ser algum engano. Não há nada


de anormal na minha casa. De qualquer maneira, muito obrigado, viu.

POLICIAL 2 Mesmo assim gostaríamos de dar uma olhada. O


senhor sabe como é que é, né?! Apenas pra garantir que não há nenhum risco.

MARCOS Mas eu garanto. Tá tudo certo. Não há risco


nenhum.

POLICIAL 1 Por favor, senhor. Se realmente houver alguém


pelas redondezas, não é só o senhor que corre perigo... mas toda a
vizinhança! Vamos ter de entrar!

MARCOS Já que insistem... por favor!

(Os policiais entram. Odete tenta entrar).

MARCOS Você não!


35

(Bate a porta na cara de Odete)

MARCOS Então, vamos começar lá por cima? Os quartos


ficam lá em cima!

POLICIAL 1 Sim, senhor.

POLICIAL 2 Você verifica lá em cima, enquanto eu fico aqui


embaixo. Vocês sabem me informar se essa saída dos fundos dá pro
corredor... e

(Policial 1 sai. Policial 2 se assusta com Nonô revirado na poltrona).

POLICIAL 2 Meu Deus! O que é isso?

FRANCELINA Não mexe e não anda, coitado.

POLICIAL 2 Ah, mas eu ajudo a senhora!

TODOS Não! Não! Não precisa!!!

POLICIAL 2 Ah... mas eu faço questão! (Fala para Nonô) O


senhor quer mudar de posição?

FRANCELINA Ele não vai responder não porque ele tá mort...


mudo, coitado!

POLICIAL 2 Mas ele é mudo também? Mas ele tem um olhar


muito estranho, muito parado.
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ISABEL Ele tá cego de tudo... ele não vê nada.

POLICIAL 2 Coitado, é cego também?! Olha, que pra acabar


com a vida assim, eu preferia estar morto!!!

FRANCELINA Mas ele tá mort... digo!!! Não fala uma coisa


dessas, não!!! Esse senhor aí é cheio de vontade de viver!

(Volta Policial 1 com Marcos)

POLICIAL 2 Bom, Sargento. Aqui por baixo tá tudo limpo.

POLICIAL 1 Lá em cima também. Tudo normal! (Repara no


morto) O senhor tá bem?

POLICIAL 2 Ele tá complicado, Sargento. É cego, surdo, mudo


e paraplégico!

POLICIAL 1 Coitado, por isso que ele tem essa cara!

LAURA Aceitam um pedacinho de pavê? É de frutas


vermelhas!

TODOS Cala a boca, chata!

POLICIAL 2 Até mais ver, pessoal!

POLICIAL 1 Qualquer suspeita ou novidade, chamem a polícia!


37

CENA XI

(Os policiais saem. Francelina pega um lençol e joga por cima de Nonô)

LAURA Melhor cobrir o defunto né... pegando uma friagem


dessa.

FRANCELINA Eu vou passar um café pra gente.

(Francelina sai. Odete entra na casa)

ODETE Ué, não tinha ninguém? Cadê a assassina?

ISABEL Não, minha senhora. Não tinha ninguém.

ODETE Mas é melhor prevenir! Numa cidade tão violenta


quanto a nossa! Eu vivo preocupada... aliás, eu tô MUITO preocupada. O
meu tio ligou, disse que vinha... até agora não apareceu. Seu tio?

MARCOS Você disse...

TODOS Seu tio?

ODETE É! Meu titio, tão velhinho... meio surdo, ceguinho


e capenguinho.

(Isabel tem uma crise de riso. Todos caem na gargalhada em seguida)


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ODETE Mas vocês não valem nada mesmo! Rindo de um


pobre velhinho surdo e cego! Como é que pode? Deus que me perdoe de um
negócio desse! (Sai da casa)

FRANCELINA (Volta com o café) Gente, então o velhinho...

ISABEL Só pode ser!

MARCOS ... o tio da vizinha!

ISABEL Ele não enxergava direito, fez igual a você,


Francelina. Entrou na casa errada!

FRANCELINA Então, agora é fácil. É só a gente devolver o tio pra


dona!

ISABEL A vizinha já me odeia. Vou chegar com o tio dela


morto, a vizinha vai adorar... né, Francelina?

FRANCELINA É... meio chato mesmo. (Pausa) Pessoal, tive uma


ideia!

TODOS O que?

FRANCELINA Hoje é aniversário da vizinha! Quem sabe alguém


especial não entrega um bolo pra ela? Eu tenho um plano! A gente vai fazer
o seguinte... vamos esperar anoitecer e a gente pega o velhinho... (Vai
falando o plano até a música de fundo surgir).
39

CENA XII
(Porta da casa da vizinha. Todos os personagens – exceto Odete e policiais)
pegam o Nonô e colocam ele na porta da casa de Odete segurando um bolo
de aniversário. Francelina toca a campainha de Odete.

FRANCELINA (Sussurando) Pessoal! Se prepara! Um, dois, três


e...

(Todos se escondem. Odete abre a porta e encontra seu tio morto segurando
um bolo)

TODOS Surpresa!!!

ODETE (Berra) Titiooooooooooooooooo!!!

FIM

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