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OPINIÃO
Deste modo, o que urge discutir em primeiro lugar não são pessoas
isoladamente (como se tem estado a fazer), e sim o MPLA e a corrupção que
grassa nas suas entranhas. O MPLA é, por si, o rosto da corrupção, o
epicentro de todas as crateras que abalam o Estado angolano. Todos os
problemas de Angola desde o alvorecer da independência nacional se
confundem e estão intrinsecamente associados aos governos desta
organização política. No entanto, os narcisos do palácio presidencial e da
Justiça desdobram-se em passes de mágica para tentar dissolver a dimensão
real da crise com retóricas enganadoras e fazerem as pessoas acreditar nas
narrativas do general.
Não, João Lourenço não estava distraído. Ele sabia (e sabe) de tudo, da
mesma forma que Nikita Khrushchov, sucessor de Stalin, sabia da história
completa dos assassinatos em massa e da colectivização violenta levada a cabo
pelo Grande Líder, aos quais deu o seu apoio e aprovação. Entretanto, ao
ascender ao patamar de novo ditador, entendeu que só poderia poupar-se de
ser responsabilizado pelas monstruosidades que ele próprio cometera, se
inculpasse de tudo o monstro que o antecedera. O propósito foi claro:
consolidar a sua posição na luta pelo poder dentro do Kremlin. Tanto que a 24
de Fevereiro de 1956, na qualidade de presidente do Comité Central,
apresentou um “Relatório Secreto” ao XX Congresso do PCUS (em sessão
nocturna realizada a portas fechadas) a denunciar os delitos de Stalin. Antes
disso, teve o cuidado de ordenar a liquidação de Lavrenti Beria, outro
monstro na hierarquia do Partido, chefe dos serviços secretos que conduziu o
Grande Expurgo na década de 1930 e que conhecia bem os sulcos mais
sórdidos da biografia de Khrushchov.
João Lourenço faz parte desta mesma linhagem ideológica, bebeu toda a sua
formação política nas escolas do absolutismo e da discricionariedade. Logo,
nada de inovador se espera dele. Ele cultiva as mesmas narrativas de
antagonismo cénico pelas quais forja vilões e culpados de todas as desgraças
nacionais. Submete-os a julgamento e faz cumprir as leis a seu arbítrio, sem
que nada ou ninguém se lhe oponha. No regime do MPLA não existem
mecanismos institucionais de controlo, então o primeiro homem do país faz o
que quer e fortalece o seu poder igual a um deus salvacionista.
A terminar, direi que a percepção cada vez mais forte em mim é que nada irá
mudará no carácter da ditadura lourencista. Inclusive arrisco afirmar,
contrariando inúmeras expectativas, que a etapa histórica presente não
augura nada de bom em termos de avanços políticos. Inclino-me a defini-la
como uma etapa de regressão, de retorno a uma situação em que a autoridade
do líder se fará mais unipessoal, mais dura. Ou seja, mais vincada e logo mais
forte do que a protagonizada por Eduardo dos Santos. Basta observar as
atitudes de arrogância em João Lourenço, a sua complacência e agrado com
os aduladores que pululam à sua volta.
Diante de tudo isto, é possível ter uma ideia clara do rumo que as coisas estão
a tomar. João Lourenço dá mostras inequívocas de inépcia ou impotência
para combater a corrupção até às últimas consequências e evitar o colapso
que se avizinha. O gosto doentio pelo poder (só o poder), fá-lo igualar-se ao
grande ditador da I República. É patente a obsessão de esconder as suas
carências com gestos simbólicos. A incapacidade de reconhecer os erros e as
debilidades do Partido e do aparelho de Estado com os seus velhos troncos
carcomidos, e as péssimas lições que estes exemplos projectam sobre os actos
da governação, constituem, a meu ver, uma característica bastante negativa
da sua liderança.
Historiador angolano
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