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ISSN: 2525-8761
RESUMO
Nosso objetivo foi realizar uma análise sobre o direito à educação infantil voltado para as
crianças de zero a seis anos de idade nos termos do art. 205 da Constituição da República
Federativa do Brasil de 1988 (CRFB/88), que o institui como direito à personalidade,
corolário do direito à dignidade da pessoa humana. Previsto no texto constitucional entre
os direitos sociais, tem o Estado como garantista, a quem incumbe o dever de promover
o acesso aos serviços públicos e particulares que o envolve, seguindo as regras contidas
no Estatuto da Criança e do Adolescente, com especificações da Lei de Diretrizes
Escolares e Declarações Universais. Em virtude da notória precariedade da prestação do
serviço público, por meio da metodologia científica, da revisão teórica doutrinária, traça-
se um panorama sobre as políticas públicas, a possibilidade de escolha na consecução e
efetivação deste direito fundamental, que não compete, apenas, ao ente público, sua
influência na formação humana como instrumento de transformação da sociedade,
sobretudo, abordando aspectos favoráveis ou não, a fim de analisar se a realidade
brasileira atende à demanda e se há efetividade desta garantia fundamental.
ABSTRACT
The theme proposes an analysis of the right to early childhood education for children
from zero to six years old, under the terms of art. 205, of the 1988 Constitution of the
Federative Republic of Brazil (CRFB/88), which establishes it as a right to personality,
corollary to the right to human dignity. Provided for in the constitutional text among
social rights, the State is the guarantor, who is responsible for promoting access to the
public and private services that surround it, following the rules contained in the Statute
of Children and Adolescents, with specifications of the Law of School Guidelines and
Universal Declarations. Due to the notorious precariousness of public service provision,
through scientific methodology, theoretical doctrinal revision, an overview of public
policies is outlined, the possibility of choosing to achieve and implement this fundamental
right, which is not only a competence, to the public entity, its influence on human
formation as an instrument for transforming society, above all, addressing favorable
aspects or not, in order to know if the Brazilian reality meets the demand and if this
fundamental guarantee is effective.
1 INTRODUÇÃO
A Constituição da República Federativa do Brasil de 1988 (CRFB/88) estabelece
o direito à educação no rol de direitos fundamentais da pessoa humana, garantido a todo
brasileiro em desenvolvimento, ou seja, constitui direito subjetivo em favor das crianças,
direito fundamental na formação basilar para crianças de zero a seis anos de idade em
conformidade com a realidade brasileira.
inclusive para os adultos, como ocorre nos dias de hoje, em que o próprio sistema
educacional é desigual. A formação intelectual, social e cidadã, função primordial da
educação, deve voltar-se, sem nenhuma forma de exclusão. Somente assim poderemos
iniciar a busca por um efetivo Estado Democrático de Direito. Como dito anteriormente,
a educação é dever do Estado, que se faz presente em “inúmeros tratados, cartas de
princípios e acordos internacionais que buscam estabelecer a pauta de direitos
consagradores da dignidade da pessoa humana” (GARCIA, 2006, p.89).
A garantia de acesso à educação infantil pode ser exigida em decorrência do
insculpido em nossa Carta Magna, Estatuto da Criança e do Adolescente, Lei de Diretrizes
Escolares e Declarações Universais. Sob o aspecto do Estado social e democrático de
direito, a positivação jurídica de valores sociais passou a servir tanto à interpretação da
constituição, quanto à criação, direção e regulação de intervenções por meio de políticas
públicas (DUARTE, 2007, p. 694). Em conformidade com o art. 205, da CF88:
cobertos” (AMARAL, 2004, p. 111). Esta é uma escolha sujeita ao princípio da reserva
do possível, que legitima a escolha do Estado por optar por um determinado serviço e
considerar outros como menos importantes, de acordo com as possibilidades de momento.
Amaral (2004, p. 118) também mostra esse paradoxo constitucional, pois este
mesmo Estado está obrigado a cumprir prestações positivas: “mas pode escusar-se por
impossibilidades fáticas que deve demonstrar cabalmente”. Logo, o princípio da reserva
do possível não pode servir para mitigar o direito à educação, que é primordial, nem
chancelar o comodismo dos governos, impeditivos da realização de direitos inerentes à
dignidade humana, visto que é direito fundamental.
Entretanto, em descompasso desse ideal, a LDB corroborou a reserva do possível,
ao ressalvar que a educação é obrigatória, observando-se a seguinte escala: ensino
fundamental, infantil, médio e superior (art. 5º, § 2º)1. Significa que, diante da
impossibilidade de prover totalmente o serviço, privilegiar-se-á o ensino fundamental,
por força do art. 322, a partir de seis anos de idade, excluindo os de menos idade, inclusive
jovens e adultos, sem justificativa, em contrariedade às finalidades previstas nos arts. 29
e 30, I e II3, prejudicando o desenvolvimento pedagógico satisfatório da capacidade de
aprendizado, importantes na etapa básica da educação.
Não se pode esquecer que o direito à educação infantil é inalienável, pois a
matrícula é obrigatória, por previsão legal e a disponibilidade de vagas é obrigação do
Estado, que deve ser compelido, pelas vias administrativas e jurídicas, a garantir a todos
quanto delas necessitarem, porque faz parte do mínimo existencial, segundo a máxima,
já citada, do art. 205, da CRFB/88, Em reforço, o art. 4º, do ECA4, determina que seja
1
Art.5º, § 2º. Em todas as esferas administrativas, o Poder Público assegurará em primeiro lugar o
acesso ao ensino obrigatório, nos termos deste artigo, contemplando em seguida os demais níveis e
modalidades de ensino, conforme as prioridades constitucionais e legais. (g.n.).
2
Art. 32. O ensino fundamental obrigatório, com duração de 9 (nove) anos, gratuito na escola pública,
iniciando-se aos 6 (seis) anos de idade, terá por objetivo a formação básica do cidadão, mediante: (g.n.).
3
Art. 29. A educação infantil, primeira etapa da educação básica, tem como finalidade o desenvolvimento
integral da criança de até 5 (cinco) anos, em seus aspectos físico, psicológico, intelectual e social,
complementando a ação da família e da comunidade
Art. 30. A educação infantil será oferecida em:
I - creches, ou entidades equivalentes, para crianças de até três anos de idade;
II - pré-escolas, para as crianças de 4 (quatro) a 5 (cinco) anos de idade.
4
Art. 4º É dever da família, da comunidade, da sociedade em geral e do poder público assegurar, com
absoluta prioridade, a efetivação dos direitos referentes à vida, à saúde, à alimentação, à educação, ao
esporte, ao lazer, à profissionalização, à cultura, à dignidade, ao respeito, à liberdade e à convivência
familiar e comunitária.
Parágrafo único. A garantia de prioridade compreende:
a) primazia de receber proteção e socorro em quaisquer circunstâncias;
b) precedência de atendimento nos serviços públicos ou de relevância pública;
assegurada como primazia das políticas públicas, a todos os infantes de zero a cinco anos.
Para tanto, é crucial promover políticas públicas destinadas à aplicação de receitas anuais,
para manter e desenvolver o ensino, para cumprimento do art. 2125 da Lei Augusta de
1988. Sarlet (2007) esclarece que a ordem jurídica brasileira consagrou o princípio da
proibição de retrocesso, ainda que sem nominar, nas garantias aos direitos adquiridos e a
ato jurídico perfeito, que se compreende como limitação de atuação do poder constituinte
derivado, do legislador infraconstitucional ou dos governantes, de deixar de priorizar a
educação, com espeque na reserva do possível.
Torna-se cada vez mais evidente a relação entre a situação econômica, social
e educacional que distingue a situação dos diferentes municípios nos estados
das regiões mais desenvolvidas e daqueles que estão em regiões menos
desenvolvidas (2003, p. 67).
O campo da educação infantil tem sido farto em pressões sociais com vistas à
ampliação da rede física por parte das famílias de classes populares. Isso faz
supor também o aumento da consciência da importância dessa etapa de ensino
não só como direito dos pais ao trabalho como também um direito da própria
infância como um momento significativo de construção da personalidade.
Atribui-se, também, a essa procura, o fato de que a criança não dispõe mais de
tempo para vivenciar suas brincadeiras e fantasias, tão benéficas ao desenvolvimento
mental e emocional. Por outro lado, a respeito de serem os pais os agentes socializadores
e os educadores mais importantes para seus filhos (na teoria), grande parte deles - os pais
- não exercem suas funções por diversos fatores (sociais, econômicos, culturais, e etc.),
muitos até desconhecem que sua criança deve realizar atividades dentro do que lhe é
próprio para o desenvolvimento numa certa idade. Desconhecem, simultaneamente, que
o brincar é importante na construção do desenvolvimento e aprendizado infantil. À
exemplo, destaca-se o texto, em parte, do Plano Nacional de Educação, aprovado pela Lei
de nº 10.172/2001 – que em suas diretrizes explica a importância da educação infantil
como primeira etapa básica,
mais recente sobre a Lei nº 10.172/2001, que aprova o Plano Nacional de Educação e dá
outras providências, chama atenção para estes espaços, acima citados e enfatiza que “A
maioria dos ambientes não conta com profissionais qualificados, não desenvolve
programa educacional, não dispõe de mobiliário, brinquedos e outros materiais
pedagógicos adequados”. Por isso, o maior desafio, hoje, para garantir um atendimento
voltado para essa especificidade de ensino, a educação infantil, está no da formação dos
sujeitos que a ela estarão diretamente envolvidos.
Kramer (2001, p.109) afirma que “[...] o grande desafio que enfrentamos no que
diz respeito à educação das crianças de 0 a 6 anos, se constitui no desafio de construir –
hoje - a cidadania”. Esse desafio rompe com os modelos estereotipados de criança e a
define como pessoa, gente, cidadã, dotada de direitos e capacidades que a legitime como
um sujeito histórico, em detrimento da visão de séculos atrás, em que a criança era sujeito
de direitos. Ela era, simplesmente, um sujeito à margem da família, considerada como um
vir a ser. Só era considerado sujeito de direitos quando chegava à idade da razão.
Faria (2000, p.74) afirma que “a organização do espaço físico das instituições de
educação infantil deve levar em consideração todas as dimensões humanas
potencializadas nas crianças: o imaginário, o lúdico, o artístico, o afetivo e o cognitivo”.
A insuficiência e inadequação de espaços físicos, equipamentos e materiais pedagógicos
(especialmente brinquedos e livros); a não incorporação da dimensão educativa nos
objetivos da creche; a separação entre as funções de cuidar e educar, a inexistência de
currículos ou propostas pedagógicas voltadas para infância e sua cultura, ou o seu não
cumprimento e/ou pouca efetividade na orientação do cotidiano das instituições de
educação infantil são alguns dos desafios a serem enfrentados pelas políticas educacionais
para garantir qualidade no atendimento à demanda da educação infantil.
A LDB estabelece os objetivos de cada nível e modalidade de ensino a se adequar
às diferentes características do desenvolvimento do educando. Portanto, admitir-se-á
apenas, como exigência mínima, profissional formado em nível médio, modalidade
normal, caracterizada como formação inicial. Assim é definido:
cotidiano da sala de aula. Neste passo, legitimar a educação infantil enquanto segmento
de ensino exige, das políticas públicas educacionais, investimentos no atendimento à
criança até seis anos, e na redefinição dos objetivos para desenvolvê-la sem deixar de
evidenciar a concepção de infância e que tipo de criança se pretende formar.
A problemática da promoção de políticas públicas pelo poder estatal é que as
ideias são válidas, mas não são eficazes em razão da ineficácia, seja na elaboração, dos
procedimentos ou na fiscalização. Meninos e meninas em situação de rua e jovens à deriva
são o resultado também da pobreza em que vivem os pais e, em especial, as mães, do
abandono, da violência doméstica e do descaso do Estado. Nesta toada, imprescindível
colacionar o entendimento de Fachin (2003, p. 3) ao dispor que “em todo campo do saber
(daí a pertinência quiçá especial com a instância jurídica), há o desafio de conhecer para
transformar, pois a educação que tão-só reproduz não liberta”. Para Chauí (2004, 74),
A teoria de Freire (1999, p.42) elucida: “a educação é um ato de amor, por isso,
um ato de coragem. Não pode temer o debate. A análise da realidade. Não pode fugir à
discussão criadora, sob pena de ser uma farsa”. Assim tem decidido o Poder Judiciário,
quando provocado a dizer o direito, exemplo do tratamento jurisprudencial tangente à
hipótese do direito em questão:
4 CONCLUSÃO
O direito à educação infantil com ênfase ao atendimento da criança de zero a seis
anos de idade é uma realidade jurídica viável, exigível, constitui o rol de direitos
fundamentais que compõem o mínimo existencial que o Estado deve garantir, como
corolário do direito à dignidade humana. Portanto, o Estado, assim como, mais
especificamente, os municípios devem arcar com os meios necessários para
perfectibilizar o acesso de infantes, menores de cinco anos, ao início da formação
educacional formal, sem olvidar do dever colaborativo e conjunto, da família.
Todavia, o que se deseja é um espaço ideal, sadio, com as possibilidades de
influenciar positivamente no desenvolvimento físico e mental do menor, a fim de
contribuir na formação de um cidadão e não apenas prédios inóspitos de profissionais
capacitados e falta de estrutura para acolhimento desses pequenos seres humanos. Esta é
a realidade brasileira atual, a qual está aquém do ideal do Estado de Direito Democrático,
em virtude das circunstâncias que emperram a elaboração de políticas econômicas sérias
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CURY, Carlos Roberto Jamil. Legislação educacional brasileira. 2ª ed. Rio de Janeiro:
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SILVA, J.A. Curso de Direito Constitucional Positivo. 32ª ed., São Paulo: Malheiros,
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