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EQUIPE ZÊNITE
INTRODUÇÃO
O presente artigo irá analisar a validade da exigência de que os orçamentos apresentados pelos
licitantes em certames de obras e serviços de engenharia sejam subscritos por engenheiro
devidamente registrado junto ao CREA.
Por meio de análise do regramento legal aplicável, bem como dos entendimentos do Tribunal de
Contas da União e do Superior Tribunal de Justiça, pretende-se traçar um panorama quanto à
legalidade da inclusão dessa exigência nos editais pela Administração Pública.
A Lei nº 8.666/93, ao tratar, em seu art. 30, da documentação a ser exigida para fins de habilitação
técnica, prescreve no seu inc. IV: “prova de atendimento de requisitos previstos em lei especial,
quando for o caso”.
Verifica-se, em face desse comando legal, que os documentos a serem apresentados quando da
habilitação técnica são os que os incisos do art. 30 expressamente exigem e as demais condições
impostas por lei especial, quando pertinentes à contratação. A propósito, Marçal Justen Filho (2012, p.
530) assevera que: “quando o objeto do contrato envolver bens ou atividades disciplinados por
legislação específica, o instrumento convocatório deverá reportar-se expressamente às regras
correspondentes”.
No que tange à assinatura dos orçamentos estimativos constantes das propostas referentes a
obras e serviços de engenharia, dispõe a Lei nº 5.194/66, que regula o exercício das profissões de
engenheiro, arquiteto e engenheiro-agrônomo:
Art. 14 Nos trabalhos gráficos, especificações, orçamentos, pareceres, laudos e atos judiciais ou
administrativos, é obrigatória além da assinatura, precedida do nome da emprêsa, sociedade,
instituição ou firma a que interessarem, a menção explícita do título do profissional que os
subscrever e do número da carteira referida no Ed. extra 56.
Art. 15 São nulos de pleno direito os contratos referentes a qualquer ramo da engenharia, arquitetura
ou da agronomia, inclusive a elaboração de projeto, direção ou execução de obras, quando firmados
por entidade pública ou particular com pessoa física ou jurídica não legalmente habilitada a praticar a
atividade nos têrmos desta lei.
(...)
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assinados.
A interpretação conjunta dos dispositivos acima autoriza concluir que a exigência de que os
orçamentos de obras e serviços de engenharia sejam assinados por engenheiro encontra fundamento
legal, mostrando-se, portanto, impositiva.
Afirma-se, ainda, que o engenheiro que subscreve os orçamentos poderá ou não ser o
responsável técnico indicado pela licitante, não havendo obrigatoriedade legal nesse sentido. O que
importa é que as propostas (orçamentos) sejam elaboradas por profissionais competentes, na forma
da Lei: engenheiros ou arquitetos, conforme o caso.
Não obstante isso, é válido destacar a existência de precedentes no sentido de que a falta de
assinatura do engenheiro na proposta deve ser considerada uma falha formal.
Sobre o tema, oportuno destacar precedente do Tribunal de Contas da União que entendeu
restritiva a exigência de assinatura dos orçamentos constantes da proposta por responsável técnico,
considerando também indevida a desclassificação de proposta pela ausência de assinatura do
engenheiro:
[Relatório]
Entretanto, faltava a assinatura dos responsáveis técnicos pela elaboração da planilha orçamentária,
em descumprimento ao item 7.7 do edital de Concorrência nº 09/2009:
'7.7. No orçamento em planilha de quantitativos, unidades, preços unitários, parciais e totais da obra,
alínea 'a' do subitem 7.5, deverá constar, obrigatoriamente a assinatura do técnico detentor dos
atestados referido na alínea 'f', do subitem 6.2 deste Edital, precedida do nome da empresa a que
interessarem, a menção explícita de seu título e o número de sua carteira profissional expedida pelo
CREA.'
(...)
Em primeiro lugar, não fica claro o propósito de se exigir a assinatura do engenheiro na planilha
orçamentária, responsabilizando-se pelos preços propostos pela empresa, uma vez que os
preços ofertados têm natureza comercial. Diferentemente é o preço de referência da Administração,
que deve ser atestado pelo engenheiro responsável pela elaboração do orçamento-base.
A regra do art. 14 da Lei nº 5.194/1966 tem aplicabilidade para a elaboração do orçamento em si,
de responsabilidade da Administração. É ele (o orçamento-base) que demanda conhecimento
técnico. Afinal, resulta do levantamento dos serviços que serão condizentes com a execução do objeto
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contratado, em conformidade com o projeto básico que o subsidia. Assim, o engenheiro técnico
responsabiliza-se pelos serviços escolhidos, custos e quantidades que formam a planilha
orçamentária.
(...)
[Voto]
9. Também foram verificadas irregularidades no procedimento licitatório que culminou com a seleção
da empresa responsável pela construção da agência.
10. Algumas licitantes foram desclassificadas em decorrência de falhas meramente formais, que
poderiam ter sido sanadas durante o processo licitatório, a exemplo da falta de assinatura do
responsável técnico nas planilhas orçamentárias. Nesse caso, a ação equivocada por parte do
INSS decorreu de parecer da procuradoria da autarquia, que defendeu a exclusão das licitantes que
não tivessem cumprido a exigência, retirando da competição empresas que ofertaram preços inferiores
aos da proposta vencedora. O fato deve ser objeto de alerta à autarquia, evitando-se, assim, que
venha a se repetir futuramente.
[Acórdão]
De acordo com o entendimento adotado pelo TCU, a exigência de assinatura do orçamento por
engenheiro, emergente da Lei nº 5.194/66, dirige-se à Administração contratante, e não ao particular,
posicionamento que se assenta na premissa de que enquanto o orçamento elaborado pela
Administração demanda conhecimentos técnicos, servindo de baliza para a contratação, o orçamento
apresentado pelo particular é elaborado de acordo com condições de mercado.
Na mesma linha, parece ser o entendimento adotado pela AGU, conforme notícia extraída do site
do referido órgão:
Inicialmente, a 6ª Vara Federal de Goiás deferiu liminar entendendo que a proposta vencedora da
empresa Cabeceira Construtora e Incorporadora Ltda., assinada apenas pelo seu sócio-proprietário,
não seria válida. Segundo o juízo, a Lei nº 5.194/1966, que regula o exercício das profissões de
engenheiro, arquiteto, e engenheiro agrônomo, exigiria a assinatura e número do registro profissional
do responsável técnico credenciado perante o Conselho que autoriza o exercício das profissões
(Crea), requisito que deveria ser observado pela UFG, mesmo sem previsão no edital de licitação.
No recurso, os procuradores federais alegaram que a Lei nº 5.194/66 não torna obrigatória a
assinatura do engenheiro na planilha orçamentária para fins de participação em licitações,
quando a empresa deve responsabilizar-se pelos preços propostos, que têm caráter comercial
ou mercantil, diferente do valor de referência da Administração, que deve ser atestado pelo
engenheiro encarregado da elaboração do orçamento-base, que demanda conhecimento
técnico.
Segundo a AGU, o Tribunal de Contas da União tem entendimento de que “aspectos meramente
formais como a ausência de assinatura do engenheiro não devem ser motivos para desclassificação
das licitantes”. Dessa forma, não acarreta qualquer prejuízo à proposta da empresa, que se trata
apenas da valoração da obra, do quanto a empresa pretende cobrar para a prestação dos seus
serviços, sendo que em nada acrescentaria a posição da assinatura do engenheiro.
Além disso, os procuradores defenderam que a vencedora da licitação não descumpriu o edital, que
não fazia qualquer exigência de que seria necessária a assinatura do profissional técnico credenciado
perante o Crea na planilha orçamentária. Destacaram que deveria ser permitido que a UFG pudesse
dar continuidade ao certame com a contratação da empresa, em observância aos princípios da
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vinculação ao instrumento convocatório e da busca da proposta mais vantajosa para a Administração.
O Tribunal Regional Federal da 1ª Região concordou com a defesa da AGU e suspendeu a liminar da
primeira instância. A decisão reconheceu que a desclassificação da vencedora pela simples
ausência da assinatura do responsável técnico na planilha orçamentária “afigura-se excesso de
rigor formal”, além de patente o risco de lesão aos interesses da UFG, diante da
impossibilidade de concluir a licitação e executar a obra dentro do cronograma.
Atuaram no caso a Procuradoria Federal em Goiás e a Procuradoria Federal junto à UFG, que são
unidades da Procuradoria-Geral Federal, órgão da AGU.
O Superior Tribunal de Justiça também afastou o rigor formal da exigência em comento, conforme
o julgamento do Recurso Ordinário em Mandado de Segurança nº 18254/RS:
1. Mandado de segurança com pedido de liminar impetrado por Encop Engenharia Ltda. contra ato do
Secretário da Administração e dos Recursos Humanos do Governo do Estado do Rio Grande do Sul.
Aduz a impetrante que foi declarada vencedora da licitação, em razão de ter a SD Consultoria e
Engenharia Ltda. apresentado orçamento e cronograma financeiro sem a assinatura do responsável
técnico legalmente habilitado. Posteriormente, retificando-se o ato de desclassificação a SD
Consultoria foi declarada vencedora. Informações da autoridade coatora relatando que seria rigor
formal excessivo a manutenção da desclassificação de licitante pela troca de assinatura por rubrica.
Contestação da SD Engenharia, defendendo a validade da rubrica aposta no documento, posto que a
desclassificação por tal motivo resultaria no prosseguimento de apenas uma licitante, a impetrante,
significando prejuízo muito maior ao objetivo da licitação, que é a obtenção da condição mais
vantajosa ao erário. Acórdão do TJRS denegando a segurança, por entender que o orçamento e o
cronograma financeiro não sofrem qualquer questionamento quanto a sua fidedignidade, ferindo o
objetivo do certame a desclassificação de licitante por mera aposição de rubrica no lugar de
assinatura. Recurso ordinário da Encop Engenharia, sustentando que as rubricas do responsável
técnico não foram reconhecidas em cartório, que o processo licitatório deve obedecer à forma estreita
e rigorosa traçada pelo edital e que a Lei Federal nº 5.194/66, que regula o exercício das profissões de
engenheiro, arquiteto e engenheiro-agrônomo, prevê a assinatura e o número do registro do
profissional, nos orçamentos que este apresentar. Contra-razões do Estado do Rio Grande do Sul e da
SD Consultoria pugnando pelo improvimento do recurso. Pareceres do Ministérios Públicos Estadual e
Federal pelo improvimento do recurso ordinário.
4. Recurso ordinário em mandado de segurança desprovido. (STJ, ROMS nº 18254/RS Rel. Min. José
Delgado, j. em 19.05.2005.) (Grifamos.)
Diante dos precedentes citados, tanto o TCU quanto o STJ têm posicionamento mais flexível
quanto à necessidade de assinatura de engenheiro na proposta de orçamento, podendo tal omissão
ser considerada mera falha formal. E a falha, quando meramente formal, não enseja a desclassificação
da proposta, como decidiu o STF:
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Licitação: irregularidade formal na proposta vencedora que, por sua irrelevância, não gera nulidade.
(...) Verifica-se, pois, que o vício reconhecidamente praticado pela ora recorrida, embora reflita
desobediência ao edital, consubstancia tão-somente irregularidade formal, incapaz de conduzir à
desclassificação de sua proposta. Desta forma, se a irregularidade praticada pela licitante vencedora a
ela não trouxe vantagem, nem implicou desvantagem para as demais participantes, não resultando
assim em ofensa à igualdade; se o vício apontado não interfere no julgamento objetivo da proposta, e
se não se vislumbra ofensa aos demais princípios exigíveis na atuação da Administração Pública,
correta é a adjudicação do objeto da licitação à licitante que ofereceu a proposta mais vantajosa, em
prestígio do interesse público, escopo da atividade administrativa. (STF, ROMS nº 23.714-1/DF, Rel.
Min. Sepúlveda Pertence, j. em 05.09.2000.)
CONSIDERAÇÕES FINAIS
Diante do exposto, conclui-se que, à luz da legislação do CREA, os editais de licitação para
contratação de obras e serviços de engenharia devem exigir que os orçamentos constantes das
propostas dos licitantes sejam assinados por profissional competente, na forma da Lei nº 5.194/66, o
qual poderá ou não ser o responsável técnico indicado pela proponente.
REFERÊNCIA
JUSTEN FILHO, Marçal. Comentários à lei de licitações e contratos administrativos. 15. ed. São Paulo:
Dialética, 2012.
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