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Segunda Guerra Mundial - Volume I

Em torno de Narvik, a neve ainda não derreteu. Estão em


curso grandes preparativos. Churchill conseguiu fazer com que o
tímido General Mackesey fique subordinado ao enérgico
Almirante Cork. O contigente francês, vigorosamente comandado
pelo jovem general Bethouart, vindo da França como coronel,
compreende meia brigada de caçadores alpinos, 4 batalhões
poloneses e 2 batalhões de infantaria da Legião Estrangeira,
chegados de Sidi-Bel-Abbes. Todos os legionários são voluntários
e, como alguns são alemães, deu-se a eles papéis em que constam
como naturais da Bretanha, de língua bretã, na cândida esperança
de que escaparão da morte se forem capturados por seus
compatriotas. O plano de ataque é organizado. O desembarque
será em Bjervik, ao fundo do fiorde Herjansk. Narvik será tomada,
transpondo-se o fiorde Rombaks. A data marcada para o inicio das
operações é 12 de maio.

Os alemães, por sua vez, esforçam-se para reforçar o grupo


Dietl. Hitler admite violar a neutralidade sueca, mas Goering,
alertado por uma mensagem pessoal de Gustavo V, consegue
dissuadi-lo. Os suecos pagam deixando passar munições e alguns
reforços camuflados. A Luftwaffe traz outros reforços,
pertencentes à 3ª Gebirgsdivision. Em terra, esforços sobre-
humanos são desenvolvidos para estabelecer ligação entre
Trondheim e Narvik. As tropas alpinas instalam uma cadeia de
postos de reabastecimento, mas, diz o comandante-chefe
Falkenhorst, trata-se mais de uma expedição em alta montanha do
que de uma operação militar. “O trabalho que nossos
destacamentos devem realizar é comparável à escalada no Nanga
Parbat”. Tudo está pronto para a batalha da rota do ferro. Na
França, Paul Reynauld proclama que ela está suspensa e, na
Inglaterra, Churchill afirma que a campanha da Noruega se saldará
por uma vitória, se os Aliados tomarem e conservarem Narvik.

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10 a 18 de Maio de 1940
O Drama de Sedan

Blitzkrieg

A primeira vítima de maio de 1940 é Chamberlain. No dia


7, abre-se, na Câmara dos Comuns, um debate sobre a derrota na
Noruega. A Câmara vibra de humilhação e cólera. Keyes, Amery,
Duff Cooper, Lloyd George e um deputado quase anônimo que
serve - e que perecerá - como metralhador de cauda num
bombardeiro, Arnold Wilson, arrasam o Primeiro-Ministro.

Ele, o velho homem de Munique, defende-se com


obstinação quase inconsistente. Mas seu apelo à solidariedade dos
tories soa mal na atmosfera de uma pátria em perigo. Através do
voto de moção de censura, 30 conservadores reúnem-se à
oposição e 60 abstêm-se. A maioria decai de 200 para 80 votos.
Leo Amery terminara seu ardente discurso com a apóstrofe de
Cromwell ao Longo Parlamento: “Ficastes aqui tempo demais pelo
bem que fizestes. Parti, eu vos digo! Pelo amor de Deus, ide
embora”. Chamberlain obedece a esse apelo dramático. Sai
tropeçando nos pés de seus ministros e, antes de deixar a sala,
volta-se para envolver a Assembléia com um último olhar
encolerizado e amargo.

Lá fora, ele se recobra e ainda se obstina. Impossível como


Primeiro-Ministro conservador, tenta sobreviver como Primeiro-
Ministro unionista, solicitando apoio aos trabalhistas. Estes o
recusam. Chamberlain procura então designar seu sucessor, a fim
de, uma vez mais, eliminar Churchill. Seu candidato favorito é
Halifax, mas Halifax é um lorde a quem a Constituição do Reino

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Unido proíbe o acesso à Câmara dos Comuns. A contragosto,


Chamberlain concorda que é impossível dirigir a guerra da Câmara
Alta. Terá de conformar-se com Churchill?

Muitos ainda se recusam a isso, continuando a ver em


Churchill o incorrigível franco-atirador, o impulsivo dos
Dardanelos, o desastroso ministro das Finanças de 1923 e, ainda
há pouco, verdadeiro responsável pelo desastre na Noruega. O
primeiro culpado é seu Almirantado, cuja negligência permitiu a
dez comboios alemães aparecerem simultaneamente em todos os
portos, de Oslo a Narvik. Churchill, durante o debate, reivindicara
essa responsabilidade, mas o velho Lloyd George ergueu sua
cabeça branca: “Este muito honrado gentleman não tem o direito
de se converter em abrigo antiaéreo para proteger dos estilhaços
os seus colegas...” Um grupo ardente lança o homem em quem a
opinião pública vê, cada vez mais, a energia de que necessita a
Inglaterra. Um outro grupo se esforça para impedir-lhe o acesso a
Downing Street. Ele, devorado pelo nervosismo, aguarda.

Em Paris, desenvolve-se uma crise paralela, mais grave


ainda, pois implica ao mesmo tempo o Governo e o Comando.
Paul Reynaud definitivamente não quer mais saber de Gamelin. É
estimulado a isso por uma carta ousada que o coronel De Gaulle,
passando por cima de uma cascata hierárquica, acabou de lhe
escrever. “O corpo militar, pelo conformismo inerente à sua
natureza não se reformará por si só... Sua reforma é obra de um
homem de Estado, que Vossa Excelência deve realizar. Não
ambiciono outra honra maior senão a de servi-lo nessa empresa
capital...” Mas Daladier continua solidário com o Generalíssimo a
quem nomeou e no qual ainda vê brilhar a calma centelha do
gênio. No Conselho do Gabinete do dia 9 de maio ele recusa a
retirar Gamelin de seu comando.

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Reynaud responde a essa recusa declarando demissionário


o Ministério. Só pede a seus colegas que guardem segredo dessa
decisão até o dia seguinte.

Até o dia seguinte, sexta-feira, 10 de maio de 1940...

A manobra da bigorna e do martelo

Absorvido pela sua campanha na Noruega, Hitler só


voltou a falar do Plano Amarelo em 27 de abril. Anunciou a Keitel
e Jodl que tinha a intenção de desencadear a ofensiva contra a
França entre 1 e 7 de maio.

Tudo está pronto. A ordem geral assinada em 24 de


fevereiro não mais foi modificada. Acabou por estabelecer-se uma
unidade de intenção e de idéias entre o OKW e o OKH, ente
Hitler e seus generais. Aliás, o documento é notável pela
sobriedade e clareza. O Grupo de Exércitos C (Von Leeb, 19
divisões) guardaria a frente passiva entre a Suiça e Luxemburgo.
Os outros dois grupos de exércitos, B (Von Bock) e A (Von
Rundstedt), dividiriam entre si o papel ativo.

Cabe ao grupo B aquilo que o Comando alemão


denominou ofensiva de fixação. “Ele deverá - diz a ordem -
ocupar rapidamente a Holanda, opor-se à junção das forças
holandesas e anglo-belgas, quebrar com ação rápida e violenta as
defesas da fronteira belga”. Vinte e nove divisões, dois exércitos, o
18° (Von Kuchler) e o 6° (Von Reichenau), são destinados a essa
missão. Relativamente pobres em grandes unidades blindadas, têm,
em compensação, à sua disposição, a maior novidade militar da
época, a infantaria aérea. Os pára-quedistas do General Student e
os planadores do General Conde Sponeck cairão do céu, pousarão
nos aeródromos e nas auto-estradas, apossar-se-ão das grandes

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pontes do Mosa e do Reno, atacarão as fortificações pelos


métodos revolucionários imaginados pelo Fuhrer. Espera-se que
essa ação inédita, que esses golpes retumbantes canalizem a
atenção do Comando inimigo para o norte da batalha e que
orientem para essa direção a maior parte de suas forças.

Posteriormente, o grupo de exércitos desembocará na


Bélgica e pressionará a frente aliada.

Bock é, portanto, a bigorna. Rundstedt, o martelo. A


ordem lhe confia a ofensiva principal. Consequentemente, esta o
favoreceu: 45 divisões, dentre as quais 7 blindadas. Sua missão
consiste em: forçar o mais rapidamente possível a passagem do
Mosa, entre Dinant e Sedan, e depois avançar com o máximo de
meios e de velocidade em direção à desembocadura do Somme, a
fim de tomar pela retaguarda a zona fortificada do Norte da
França. Três exércitos dividem entre si essa tarefa: o 4° (Von
Kluge), que atacará numa larga frente entre Eupen e o Norte de
Luxemburgo; o 12° (List), que atacará numa frente bem estreita
em direção a Sedan; enfim, o 16° (Busch), que bloqueará o avanço
contra qualquer reação francesa vinda do Sul.

Uma característica extraordinária do grupo Rundstedt é a


concentração dos meios de ruptura. Kluge conserva, sozinho, o
comando direto de seus carros blindados: a 5ª e a 7ª divisões
Panzer formando o 15° Corpo Blindado, sob o comando do
General Hoth. Todos os outros veículos rápidos do grupo de
exércitos ficariam reunidos num Panzerkeil, um “ponto blindado”
que, em três escalões, por causa da insuficiência das estradas, se
precipitará em direção a Sedan. Esse grupamento compõe-se do
19° Corpo, de Guderian (1ª, 2ª e 10ª Panzer), do 41° Corpo, de
Reinhardt (6ª e 8ª Panzer, 2ª Divisão de Infantaria motorizada) e
do 14° Corpo, de Wietersheim (13ª e 29ª divisões motorizadas). O

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comando dessa ponta de ferro foi confiado ao Coronel-General


Von Kleist. A tendência que se esboçou na Polônia, a divisão do
Exército alemão num exército rápido e num exército lento, entre
um exército revolucionário e um exército convencional, encontrou
sua expressão sistemática na manobra de Sedan

Em quatro meses, graças a uma excelente técnica do


estado-maior, a intuição de Hitler torna-se um plano de uma
magnífica simplicidade e de um grandioso desafio, uma das
combinações estratégicas mais magistrais de todos os tempos.

Mas Hitler tripudia. Os atrasos continuam acumulando-se.


A 3 de maio, as previsões meteorológicas são más: o ataque é
adiado para o dia 8. No dia 7 à noite, um último exame do mapa
do tempo acarreta, a pedido de Brauchitsch, novo adiamento...
“Cedo - disse Hitler - contra minha intuição e pela última vez. Não
haverá mais adiamento...”.

A ordem que saiu do OKW na manhã de 9 de maio é,


contudo, idêntica às quinze que a precederam, provocando ao final
a incredulidade e a troça. Mas, desta vez, não é a expressão
significando “ataque adiado” que será transmitido. Eis seu texto
literal: Berlim 9-5-40. O Fuhrer e Comandante Supremo decidiu:
Dia A: 10-5. Hora Z: 5h35 min. As palavras convencionais
“Dantzig” ou “Augsburg” serão dadas às diferentes frações da
Wehrmacht a 9-5 antes das 21h30 min. O Chefe do
Oberkommando da Wehrmacht: Keitel

No dia 9, às 16h48, o trem especial do Fuhrer deixa


Berlim-Finkenburg. Chega a Euskirchen antes do amanhecer. Há
escuridão, umidade e frio. Algumas colunas de infantaria
atravessam silenciosamente a pequena cidade. A subida ao
Felsennnest, perto de Munstereifel, um dos quatro postos de

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comando dispostos para o Senhor da Guerra, demorou uma meia


hora. Quando Hitler e seus 14 oficiais do OKW chegam ao grupo
de bunkers disseminados na floresta, o sol se levanta acima dos
bosques negros envoltos em bruma. Há alguns minutos que a
ofensiva do Oeste começou.

Invadida a Fortaleza Holanda e perdido o Canal Alberto


desde a primeira manhã

Surpresa na Holanda... Desde o alvorecer, os pára-


quedistas caem sobre Roterdã, Haia e a ilha de Dordrecht, perto
da ponte de Moerdijke. Vestring Holand, a Fortaleza Holanda, é
invadida desde o primeiro minuto de combate.

Por várias vezes durante o inverno tinham sido feitas


tentativas para organizar uma defesa comum da Bélgica e da
Holanda. Não tiveram êxito. Reduzidos a suas próprias forças, os
holandeses tiveram que renunciar a defender suas fronteiras.
Limitaram sua ambição à conservação do triângulo Amsterdã-
Haia-Roterdã, lançando mão de sua aliada histórica, a inundação.
A ilha artificial que contam fazer surgir diante do invasor poderá
ser socorrida pela Inglaterra e, eventualmente, ser ligada às
posições gerais da coligação feita por um exército francês que saia
de Antuérpia. Para provocar essa inundação é necessário um prazo
de 4 dias. Os holandeses dispõem suas 10 divisões para consegui-
lo. Ao norte, o 4° e o 2° CE girarão o mais lentamente possível em
torno de Arnhem. Ao leste, o 3° CE, e uma divisão especializada
disputarão passo a passo uma posição organizada ao longo dos
pântanos do Peel. O 1° CE, disposto do Reno ao Zuiderzee,
recolherá os elementos em retirada e assegurará a inviolabilidade
do redito nacional... Mas não se havia imaginado que os invasores
cairiam do céu.

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Os holandeses lutam energicamente. Mantêm-se no


Grebbe e no Peel. Mas não chegam a reconquistar seus
aeródromos nem a limpar o centro do país. São inúteis os gritos de
socorro que lançam à aviação inglesa e francesa. As esquadrilhas
de Kesselring dominam o céu. Depois de lançar 4.000 homens da
7ª Divisão de Flieger, elas os abastecem, reforçam-nos, apoiam-
nos, provocam a confusão entre o inimigo com bombardeios
ininterruptos. Por duas ou três vezes, os holandeses iriam assinalar
que se recobravam; algumas horas mais tarde, novas informações
revelariam que a mancha alemã se estendia...

Surpresa na Bélgica... A alguns quilômetros a oeste de


Maestricht, o canal Alberto é uma superfície de água de 60m de
largura entre as margens verticais. A melhor vala antitanque da
Europa. As duas pontes que o atravessam, a de Veldwezelt e a de
Vroenhoven, são cuidadosamente minadas. Dois blockhaus
defendem as pontes. Trinta quilômetros da Holanda interpõem-se
entre o território alemão e as defesas belgas. Quando é dado o
alarma, ao amanhecer de 10 de maio, o 18° RI está convencido de
que tem o tempo suficiente para se preparar para receber o
ataque... Quatro horas depois, os primeiros inimigos estão
atravessando o mais depressa possível as pontes intactas.

Que se passara? O seguinte: um violento bombardeio


aéreo batera os defensores, e em seguida algumas seções
aerotransportadas, colocadas além do canal, atacaram as pontes
por trás. Mortos, capturados ou aterrorizados, os guarda-fronteira
não tinham posto em funcionamento os dispositivos de “abrir
fogo”. Os infantes aerotransportados tinham liquidado
rapidamente as resistências e mantido a posição até a chegada das
cabeças de colunas vindas de Maestricht.

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Para disputar as passagens do canal resta um recurso: o


canhão de Eben Emael. O forte, que cobre 65 ha, tem 8 peças de
75 e 2 peças de 120 em sua cúpula, podendo atirar em todas as
direções. No entanto, o Forte de Eben Emael se cala. Não foi
tomado, já que uma guarnição de 1.000 homens ainda resiste nas
casamatas. Não foi tomado, mas destruído. Desembarcados sobre
as superestruturas do forte, os sapadores pára-quedistas do
tenente-coronel Mikosch gastaram exatamente 16 minutos para
fazer explodir, por meio de cargas ocas, todos os órgãos de
observação e de tiro. O plano de ataque foi assinado por Hitler: foi
ele, esse amador, que o desejou, concebeu e montou.

Esses acontecimentos são testemunhos da visão alemã. O


que acaba de explodir em poucas horas é o ponto de articulação da
defesa belga. A vala antitanque onde esta queria manter-se por
uma semana é atravessada numa manhã.

O Exército belga conta 23 divisões. O traçado sobre o qual


ele pretende travar a sua primeira batalha seguia o Mosa, de Givet
a Liege, e depois o canal Alberto, de Liege ao Escalda. Balizam-no
três praças fortes: Namur, Liege e Antuérpia. A concentração é
feita principalmente em frente à Holanda, como se se visse o
perigo surgir de Triburg e de Breda, e não de Aachen (Aix-la-
Chapelle) e de Maestricht. Onze divisões são alinhadas no canal,
separado da fronteira por distancias que vão de 40 km até alguns
metros. O dispositivo expõe o flanco e, no entanto, é a leste que a
ocupação se revela menos densa. Enquanto as 10 outras divisões
defendem setores de uma dezena de quilômetros, a 7ª, a de
Vroenhoven e Veldwezelt, ocupa o dobro. Considera-se que ela
está coberta pela posição de Liége, flanqueada por Eben Emael,
precedida pelo Mosa, favorecida pela trincheira particularmente
escarpada do canal. Não se considera que é tentador, para um
inimigo inteligente, fazer explodir, de um só golpe, a articulação da

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frente adversária. A manobra de Sedan tem uma irmã gêmea em


Eben Emael. Todos os contra-ataques para livrar o forte
fracassam. Às 17h, embora atrasada de Maestricht, a 4ª DP, do
Major-General Stever, começa a atravessar a melhor vala
antitanque da Europa. Três intervenções aéreas - uma belga, uma
segunda francesa, a terceira inglesa - são inúteis. Eben Emael
capitula. A brecha alarga-se. Às 11h da manhã de 11 de maio,
numa morna casamata do velho Forte de Breendonck, entre
Antuérpia e Bruxelas, o comandante-chefe, Leopoldo III, seu
novo chefe do Estado-Maior, o General Michiels, e seu chefe de
gabinete, o General Van Overstraeten, verificam que a posição de
cobertura do canal Alberto está cercada. Nada mais resta senão
ordenar um recuo precipitado, na posição principal de resistência,
chamada linha KW. Conta-se fazê-lo numa semana; têm-se que
realizá-lo na manhã do segundo dia.

“K” quer dizer Koningshoyckt, pequena localidade no


Escalda inferior; “W” significa Wavre, célebre pela indecisão de
Grouchy. É lá, na frente de sua capital, que os belgas decidem
fazer a sua frente. Constróem alguns blockhaus e erguem um
obstáculo contínuo antitanque formado de elementos Cointet
justapostos. Os exércitos franco-britânicos devem vir alinhar-se ao
seu lado dessa grade. Chegarão a tempo?

Como os Exércitos franco-britânicos marcham para o


combate

Na Inglaterra, a ofensiva alemã resolve a crise


governamental. Na França, ela a detém. Churchill forma em
algumas horas, na manhã de 10 de maio, o Ministério histórico
que, com algumas modificações, será o da vitória: Attlee, Halifax,
Bevin, Eden, Beaverbrook, etc. Reynaud retira o pedido de
demissão que havia feito na véspera e troca com seu inimigo

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Gamelin algumas fases empoladas: “Daqui por diante, só importa


uma única coisa: vencer. - Só vejo uma resposta: a França”. A
derrocada começa com discursos enfáticos.

Às 7h30, as vanguardas francesas entram na Bélgica. A


manobra que se realiza é a “Dyle”. Os executantes ainda se sentem
tão pouco convencidos de sua adequação, que os dois principais;
Prioux, que comanda o Corpo de Cavalaria, e Blanchard, que
comanda o 1° Exército, pedem que se volte à manobra “Escalda”.
Billotte e Gamelin opõem-se a isso. É tarde demais!

O exército franco-britânico volteia. O ponto de junção é a


velha e pequena fortaleza de Givet-sur-Meuse. Uma rede de um
milhão de homens varre as planícies que já contam tantos nomes
de batalha em sua toponímia. Desde os rochedos das Ardenas até
os pôlderes da Zelândia, o exército franco-britânico marcha para o
seu destino.

A ala esquerda é o 7° Exército, que ficaria de reserva,


pronto para o contra-ataque, se Gamelin não se tivesse obstinado
a ir procurar longe sua batalha. Seus movimentos cuidadosamente
preparados pelo General Giraud cumprem-se com grande
celeridade. Desde o dia 10 à noite, a 1ª DLM e a 25ª DIM entram
na Holanda, atingem Berg-op-Zoom, aproximam-se de Breda. À
direita de Giraud, precipitam-se as 9 divisões de Lorde Gort. Elas
vão estabelecer-se de Louvain a Wavre, emoldurando os belgas,
cuja frente deve estender-se até Antuérpia. À direita dos ingleses
marcha o melhor exército francês, o 1°, 8 divisões de infantaria e 2
DIM. Estas últimas, que constituem o Corpo de Cavalaria,
batalham na região de Saint-Trond, enquanto o resto do exército
vai estabelecer-se de través na estrada clássica das invasões que é a
brecha de Gembloux. A prova de que o Comando espera aí o
choque principal reside na qualidade das tropas que escolheu e na

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estreiteza das frentes que designa. Bem provida de artilharia e de


armas antitanques, tendo diante de si as excelentes DLM e atrás de
si as poderosas DCR, cada divisão do 1° Exército deve defender
uma frente média de 5 a 6 km somente. O comandante do
exército, General Blanchard, é um oficial prudente e culto, em
quem certos críticos vêem o Lanrezac de 1940. “Inteligente, mas
pessimista”, pensa-se no GQG.

O vizinho de Blanchard é Corap. Ao general douto sucede


o general militar. O título de glória do soldado Corap é ter
capturado Abd el-Krim, encurralando-o passo a passo nas
montanhas do Rif. Mas o exército que ele comanda é, no inicio da
guerra, somente o destacamento do exército das Ardenas, e os
reforços que ele recebe continuam parcimoniosos. Suas 5 divisões
de primeira linha devem guardar o Mosa, de Namur às vizinhanças
de Sedan, duas delas resistindo no local, nas fortificações que
construíram, e as três outras estabelecendo-se no território belga.

Em relação a essas forças as frentes são enormes. Cada


divisão deve defender de 15 a 20 km em linha reta, e até mais, se
contarmos os meandros do Mosa. Nem mesmo o material está
completo. Exemplos: a 61ª DI, dispõe de 12 canhões de 25, em
vez de 48; a 102ª DIF, numa frente que atinge 45 km, deveria ter
72; faltam-lhe 29. É preciso fazer justiça a Corap: ele reclamou.
Por várias vezes assinalou a insuficiência e a mediocridade de suas
tropas. Queixas que quase lhe custaram o comando. Esse general
do Rif não parecia compreender que lhe fora confiada uma frente
passiva por destinação. Profundos cortes, falésias, florestas densas,
fracas redes de comunicações... Não é certamente impossível que
o inimigo tente alguma coisa naquele setor, especialmente em
direção de Dinant, onde ele passou em 1914, ou do lado de
Mézières, ponto de convergência de várias estradas. Mas toda a
operação importante deve ser precedida de uma concentração de

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meios, de uma acumulação de artilharia que não poderão ser feitas


em menos de 15 dias e passar despercebidas. Com duas divisões
reservadas e a cavalaria que ele iria recuperar, quando tivesse
cumprido sua missão retardadora, Corap tem como fazer frente a
um incidente local. O Comando fará o necessário, se, contra toda a
expectativa, uma ameaça séria se esboce nesse sentido.

Corap... Huntziger... o 3° Exército dá seqüência ao 9°. Sua


frente começa no canal das Ardenas e se estende até o Longuyon.
Em Sedan, esboça uma cabeça-de-ponte, “bem coberta - dizem os
documentos do Estado-Maior - pelo bosque de Marfée que a
domina”.

Os tanques inimigos vindos da floresta de Sedan só podem


descer para o vale pelos caminhos expostos aos fogos das alturas
da margem esquerda. Casas fortes, blockhaus e casamatas
asseguram a defesa próxima e o flanco do rio. É bem verdade que
uma missão parlamentar dirigida por um chefe de seção da outra
guerra, o tenente Pierre Taittinger, assinalou o estado “rudimentar,
para não dizer embrionário, das organizações defensivas em torno
de Sedan”, acrescentando que se conta talvez demais com os
obstáculos naturais que são as Ardenas e o Mosa. Mas o
comandante do 2° Exército determinou a seu estado-maior que
preparasse “um resposta de um modo ligeiramente irônico”. “Há -
dizia Taittinger - terras de infortúnio para nossas armas. Para
conjurar as tristes lembranças que a visita de Sedan faz reviver,
impõem-se medidas urgentes”. “Penso - respondeu Huntziger -
que não há qualquer medida urgente a tomar para reforçar o setor
de Sedan. Não esperamos Monsieur Taittinger para trabalhar”.

Huntziger está coberto: Gamelin inspecionou seu exército,


e declarou-se satisfeito. Huntziger está coberto também pela
repartição que fez de seus meios: o GQG a conhece a aprova. Sua

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instrução pessoal e secreta, breviário dos comandantes de exército,


prescreve-lhe como missão principal assegurar a inviolabilidade e
impedir o “envolvimento” da Linha Maginot. Assim, ele pôs à sua
ala direita, na cabeça-de-ponte de Montmédy, o que tinha de mais
sólido, suas 4 melhores divisões: a 4ª DI, 3ª DIC, 3ª DINA e, em
segunda linha, 1ª DIC. Restam-lhe apenas duas divisões, ambas da
série B, 55ª e 71ª DI - duas divisões compostas de velhos
reservistas, cujo armamento é incompleto e cujo treinamento e
espírito são de má qualidade. Colocou-as à sua esquerda, à saída de
Sedan.

Chega-se ao cúmulo do absurdo. A Linha Maginot eclipsa


a França. Já não é uma fortificação que economiza os efetivos; é
uma esponja que os absorve. Tirou do Exército francês seus
melhores elementos, para deles fazer divisões paralíticas. E fez
algo ainda pior: destruiu o sentido estratégico e mesmo o simples
bom censo. Deveria saltar aos olhos que a coisa primordial é ligar
solidamente os exércitos que vão marchar aos exércitos que
permanecem imóveis, a fim de que, justificado ou não, o
movimento na Bélgica tenha ao menos um sólido ponto de junção.
Mas a obsessão Maginot ofusca as inteligências. A atenção de
Huntziger deveria ter-se voltado para a esquerda, para a manobra
difícil e decisiva cujo flanco ele cobre. Mas ficou, ao contrário,
concentrada na sua direita. Ele desfalca seu exército em favor
deste lado, põe mais concreto no setor fortificado do Montmédy
do que no setor não fortificado de Sedan, só pensa em reforçar o
que está forte. E em Georges nem Gamelin intervêm para corrigir
sua disposições! Nem Georges nem Gamelin parecem lembrar-se
de que eles próprios haviam dirigido, alguns meses antes da guerra,
um Kriegspiel estabelecendo que a Ardena não é intransponível
aos carros blindados e que 8 divisões inimigas podem atingir o
Mosa em três dias.

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Segunda Guerra Mundial - Volume I

Georges e Gamelin parecem crer que haverá duas batalhas


distintas, uma nas planícies belgas, outra na Linha Maginot e, que
entre as duas, uma zona neutralizada que algumas divisões
medíocres e diluídas bastam para guardar.

E o absurdo continua. Na Lorena e na Alsácia, atrás do


escudo da Linha Maginot, a densidade das tropas aumenta. De
Longuyon até a Suiça alinham-se quatro exércitos, (3°, 5° e 8°), 40
divisões, uma artilharia formidável, centenas de carros. O
Comando francês não ignora que tem à sua frente somente uma
vintena de divisões alemãs, todas de segunda ordem, sem um
único carro blindado. Nem por isso deixa de conservar uma
superioridade numérica de dois e meio contra um - enquanto está
numa situação de inferioridade em todos os outros setores.

A chegada de Guderian diante de Sedan

O dia 12 de maio é um adorável domingo de Pentecostes.


Na França e na Alemanha, as cidades e as aldeias estão cheias de
comungantes de vestido de organdi. Na Holanda e na Bélgica, as
tochas da guerra enegrecem o céu.

Daí para frente um ponto é alcançado: a quebra do


bloqueio da Fortaleza Holanda é impossível. Giraud, depois de sua
arrancada fulminante, evita aventurar o grosso de suas tropas ao
norte do Escalda, contentando-se em avançar para Breda a 1ª
DLM e os grupos de reconhecimento de suas duas divisões
motorizadas. A aviação alemã deixou que as colunas francesas
subissem para o norte, sem intervir durante os dias 10 e 11; depois,
entra bruscamente em ação. Modificação à vista: na véspera, uma
marcha triunfal debaixo das flores; no dia seguinte, um ataque
cerrado, caminhões em chamas, riachos de sangue civil e militar
nas estradas crivadas de crateras.

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O 7° Exercito recebe na cabeça o batismo de fogo, mas a


inutilidade de seu destacamento avançado é por demais evidente: à
noite, é dada a ordem de atravessar de novo o Escalda.

No mesmo 12 de maio, realiza-se uma conferência anglo-


franco-belga no pequeno castelo de Casteau, perto de Mons. As
imagens concretas da guerra haviam escoltado os grandes chefes
que seguiam para o encontro. Tanto na Bélgica quanto na
Holanda, a entrada da aviação alemã transformara em tragédia a
florida ascensão ao fogo da véspera. Aldeias ardem, as estradas são
metralhadas, pânicos causados pelo medo aos pára-quedistas
provocavam fuzilamentos cruéis. A França está representada por
um Daladier de botas e pelos generais Georges, Billotte e
Champon; a Inglaterra, por um delegado de Lorde Gort; e a
Bélgica, pelo seu rei. As recriminações já pairam. Os franceses não
acharam a posição da Dyle preparada como gostariam e não
podem deixar de demonstrar uma surpresa polida diante da
rapidez com que os belgas abandonaram o canal Alberto. Eles
próprios, no entanto, estão impressionados com o poderio aéreo
alemão. No carro que o leva de volta a seu PC, Leopoldo diz a
Overstraeten: “A confiança no sucesso parece limitada...”O rei
aceita, todavia, a autoridade do General Billotte, encarregado de
coordenar a ação dos exércitos aliados na ala direita. A unidade de
comando está estabelecida; ela não resistirá aos reveses.

Marchando a toda velocidade, o corpo de cavalaria se


coloca na frente de Gembloux. A missão de suas duas DLM é de
conter o inimigo durante quatro dias. A tomada de contato é
difícil, mas as primeiras informações que chegam ao QG de La
Ferté-sous-Jouarre são satisfatórias. A batalha anuncia-se como o
Comando francês a vira: choque de vanguardas ao sul de Liege,
que certamente será seguido por uma estabilidade na posição
Antuérpia-Namur.

[ 139 [
Segunda Guerra Mundial - Volume I

Somente o ritmo está mais precipitado, mais brutal do que


se havia imaginado.

Todos os pensamentos estão orientados em direção de


Gembloux. Na Lorena e no Reno, a calma nem sequer se rompeu.
Nas Ardenas, as 5 divisões ligeiras de cavalaria conduzidas para a
frente do 9° e do 2° exércitos tinham sido violentamente impelidas
para trás, e algumas unidades blindadas alemães foram
identificadas no corte do Semois. Mas não se tiraram conclusões
alarmantes deste fato. Huntziger está firmemente estabelecido em
suas posições preparadas de antemão e a ala esquerda de Corap
atingiu o Mosa em Givet e Namur. A convicção sobre a qual o
dispositivo francês se fundou continua completa: não é na região
difícil das Ardenas que o inimigo fará seu principal esforço.

Acima de Bouillon, no dia 12 à noite, aparece uma


formação de aviões aliados. Chovem bombas. As janelas do Hotel
Panorama voam em estilhaços. O hotel domina soberbamente o
vale do Semois, encaixado entre suas falésias tortuosas. Algumas
gerações de caçadores o encheram com troféus que foram
arrancados pelo furioso deslocamento de ar provocado pelas
bombas. Os obuses explodem em cadeia e os ecos do estreito vale
amalgamam suas detonações num retumbante troar de tambor.

O general que quase foi morto por um defunto javali é


Guderian. Ele se sacode e ri. Há uma meia hora chegou ao Hotel
Panorama, onde seu chefe de estado-maior, o coronel Nehring,
instalou friamente o PC do corpo blindado, sem se preocupar com
a proximidade de uma ponte que atira bombas. “Afinal, Nehring -
diz Guderian - nós devíamos mudar-nos. Não é o dia de nos
fazermos matar...” Bouillon, última cidadezinha do território belga,
está somente a 5 km da fronteira francesa. Esta fora atravessada de
manhã, às 9h30 pelos elementos de frente da 1ª Divisão Panzer,

[ 140 [
Segunda Guerra Mundial - Volume I

carros leves tendo como insígnia uma folha de carvalho. Logo em


seguida penetraram na floresta de Sedan. Agora, chegam ao
famoso campo de batalha pelo calvário de Illy, de onde, a 1° de
setembro de 1870, o Rei Guilherme da Prússia assistira às missão
desesperada dos caçadores da África de Gallifett. De suas posições
da margem esquerda, a artilharia francesa atira com precisão, mas
Sedan, em chamas, não parece defendida. Os alemães chegam,
pois, ao Mosa, 60 horas depois de haverem abandonado seus
acantonamentos de Eifel.

Isso não foi fácil. Os belgas fizeram entrar em jogo


destruições que entravaram seriamente a progressão. A cavalaria
francesa bateu-se com vigor, embora, conformando-se à sua
simples missão retardadora, não se tenha em momento algum
prendido ao terreno sem o espírito de recuar. Essa tática teria
complicado seriamente a situação, uma vez que, nesse instante,
somente uma das três divisões blindadas do 19° Corpo, a 1ª, estava
plenamente dentro do horário. A 10ª chegaria com dificuldade a
Bazeilles durante a noite. A 2ª, francamente em atraso, estava ainda
no Semois.

Um Fieseler-Storch coloca-se ao lado do novo PC na


aldeia de Noirefontaine. O comandante do grupamento blindado,
o Coronel-General Von Kleist, manda chamar, para as ordens do
dia seguinte, o seu subordinado Guderian. Meia hora depois, este
o ouve, estupefato de ser pela primeira vez ultrapassado em
audácia. Às 16h do dia seguinte, 13 de maio de 1940, ele
atravessará o Mosa de ambos os lados de Sedan. Estabelecerá uma
cabeça-de-ponte, apoderando-se da cota 247, da aldeia de
Wadelincourt e do bosque de Marfée. Guderian brada que suas
forças não estão reunidas, que uma das suas divisões está na
retaguarda, que seu regimento de assalto Grossdeutschland ainda
não passou por Bouillon. Kleist nada pode fazer. A ordem não

[ 141 [
Segunda Guerra Mundial - Volume I

partiu dele. Não veio sequer do comandante de grupo de exércitos


Von Rundstedt, nem do comandante-chefe Von Brauchitsch. Veio
do supremo impaciente Adolf Hitler. Sua batalha se desenrola a
contento. As operações de detalhe que ele organizou pessoalmente
para a Holanda e a Bélgica tiveram sucesso admirável.

Além das vantagens propriamente militares, aqueles golpes


brilhantes realizaram um dos objetivos procurados pelo Fuhrer:
atrair a atenção para Liege e Roterdã, para desviá-la de Dinant e de
Sedan. Ele ordena que isso seja alardeado nos comunicados e, ao
contrário, que se faça silêncio da marcha dos blindados através da
Ardena. É preciso que os franceses continuem a concentrar suas
tropas na Bélgica o que, aliás, eles fazem como se também
obedecessem as ordens de Hitler. “O inimigo - verificou o Fuhrer
- ainda não alcançou a idéia fundamental de nossas operações: a
penetração do Corpo de Exércitos A. Continua deslocando
grandes efetivos para a linha Antuérpia-Namur e negligencia o
setor em frente do Grupo A...”. No entanto, no dia 12 à noite, as
condições razoáveis de uma penetração de ambos os lados de
Sedan não estão reunidas. Guderian pede que se espere um pouco,
mesmo que seja por algumas horas, para que lhe seja possível
reagrupar seu corpo de exército. Seus superiores imediatos lhe dão
razão, mas não podem assumir a responsabilidade de modificar o
horário de Hitler.

Depois do calor do dia, a noite de maio, de uma pureza de


diamante, parece glacial. O pequeno aparelho que conduz
Guderian de volta ao seu PC perde-se por um momento acima das
linhas francesas. A artilharia continua a atirar. Todos os balanços
do dia tinha frisado a sua precisão e eficiência. Forçar uma posição
como a de Sedan contra canhões tão hábeis exige que estes sejam
vigorosamente rebatidos. Não será a artilharia de que disporá
Guderian no dia seguinte às 16h que lho permitirá.

[ 142 [
Segunda Guerra Mundial - Volume I

Uma só coisa o tranqüiliza um pouco: o comandante da 3ª


Frota Aérea, Sperrle, assistiu à sua entrevista com Kleist, e
prometeu-lhe o maior apoio que um exército já recebeu.

A aviação conquista, a infantaria ocupa

A promessa de Sperrle começa a realizar-se às 11 horas.


Um pouco antes, o General Grandsard, comandante do 10°
Corpo, dizia ao General-de-Divisão Lafontaine, que comandava a
55ª DI: “Não me canso de repetir-lhe, Lafontaine, que os alemães
precisarão de semanas, senão de meses, para organizar um ataque.
Continuamos na fase de contato antes do inicio do combate. Pode
ficar tranqüilo pelo menos por oito dias”.

De fato, nada pode justificar o pessimismo de um


guerreiro da velha escola. É um pouco desconcertante, que os
alemães tenham atingido o Mosa tão rapidamente, mas a doutrina
francesa ensina que só se luta de verdade numa única posição,
chamada posição principal de resistência, e tudo aquilo que se
passou nos postos de vanguarda durante os três últimos dias não
foi mais do que hors-d’oeuvre. Os alemães chegaram com tanques,
mas os tanques não nadam e, depois das pontes de Bouillonnais,
de Fabert, de Torcy, da Praça Turenne, da Estação, a última ponte
do Mosa, a da Represa, explodiu como previsto, na véspera, às
21h. Aliás a marcha rápida do inimigo alertou o Comando, que
deu ordens para concentrar na direção de Sedan as unidades de
reserva geral. O 10° Corpo já recebera o 314° e o 369° regimentos
de artilharia. Duzentas bocas de canhão, cujos calibres vão do 75
ao 155 longo, guarnecem as partes altas a oeste de Sedan. É bem
verdade que uma certa desordem reina na zona do corpo do
exército. Para reforçar a defesa, o Comando toma a decisão de
fazer imediatamente formar a 71ª DI, em vez de conservá-la como
reserva. Ela veio de muito longe, sua instalação foi trabalhosa e a

[ 143 [
Segunda Guerra Mundial - Volume I

confusão propagou-se nas divisões vizinhas, que tiveram que


estreitar seu dispositivo para lhe abrir passagem. O movimento
não terminará antes da noite de 14 para 15, mas terá como
benefício a redução da frente que afeta à 55ª DI. Quanto a esta, ela
é o que é, com suas fraquezas evidentes das grandes unidades da
série B, mas urge que se bata tal qual é, e é uma vantagem receber
o choque num terreno que vem sendo organizado há meses. O PC
de combate da divisão se encontra em Font-Dagot, na estrada de
Bulson a Maisoncelles, a 10 km das primeiras linhas. Seu chefe, o
General-de-Brigada Henri Jean Lafontaine, é um velho gaulês de
densos bigodes, relativamente jovem para os eu posto: 58 anos.
Contrariamente a Grandsard, ele acredita que os alemães não
perderão tempo em atacar. Lafontaine conhece o General Musse,
antigo adido militar em Varsóvia, que lhe contara a campanha na
Polônia, e avalia que o Mosa não é obstáculo para um exército que
atravessou brincando o Bug e o Vístula. Ele dissera isso a
Huntziger, ao assumir o comando de sua divisão. Mas Huntziger
dera de ombros. A Polônia é a Polônia. Aqui, estamos na França,
general!...

Reforçada com um batalhão de metralhadoras e com


elementos de infantaria de fortaleza, porém amputada de uns e
seus regimentos, o 213°, que ficara de reserva de corpo de
exército, a 55ª DI guarda o Mosa desde o canal das Ardenas até
Pont-Maugis. À sua esquerda começa o 9° Exército, do General
Corap, e, à direita, a 71ª DI, comandada pelo General Baudet. O
rio corre num fundo de vale bastante largo, fluindo rente às alturas
de sua margem esquerda, sobre as quais a 55ª DI se entrincheirou.
De seus observatórios, ela vê a floresta ardendense, de onde o
inimigo desce, pelas estradas tortuosas, por Saint-Menges e
Givonne. Mais próximo, ela vê as grandes planícies pantanosas
que circundam Bazeilles e Donchery, assim como a longa
península de Iges, desenhada pelo Mosa depois que atravessa

[ 144 [
Segunda Guerra Mundial - Volume I

Sedan. Vê a cidade em chamas, abandonada sem combate. Com


mais razão fora abandonada a península de Iges, indefensável por
causa de seu contorno, transferindo-se a posição de resistência
para o canal, de 1.500 m de comprimento, que a corta em sua base.
Fora esta exceção, a instrução é defender o próprio curso do
Mosa, aplicando a este uma barragem de fogo contínuo. Mais de
50 blocos de concreto, armados com metralhadora, com um
canhão de 25 ou com um de 47, se haviam estabelecido de tal
forma que nem uma polegada de superfície da água não fosse
batida.

Em linhas gerais, o setor desenha um arco. O pequeno


maciço do bosque da Marfée forma a corda, entre o Mosa e o Bar.
Seu acesso era difícil e sua vertente norte fornece belos campos de
tiro no meandro de Sedan. A linha de limite está fixada ali. Alguns
lamentam que aí não se houvesse colocado a posição principal de
resistência, abandonando o meandro, mais dificilmente defensável
ainda do que a cidade a que se renunciara. Mas a doutrina exige
que a defesa se fixe às linhas de água, valas antitanques do Bom
Deus.

Este é o campo de batalha da desventurada 55ª DI (série


B). Dir-se-ia que a aviação alemã a escolhera entre todas as
divisões do Exército francês, para cortá-la inteiramente naquela
tarde de 13 de maio. A preparação aérea prometida por Sperrle
cobre exatamente seu setor. Esmaga as localidades das primeiras
linhas, Hannogne, Villiers-sur-Bar, Croix-Piot, Frenois, Claire-et-
Villette, o subúrbio de Torcy, Wadelincourt, Pont-Maugis, Noyers-
Pont-Maugis... Destroi as retaguardas, as encruzilhadas, as
posições de artilharia, as aldeias de Bolson, de Stonne, de
Raucourt-et-Flaba... Ataca as casamatas, dentre as quais umas
foram desventradas por bombas de mergulho e outras ficaram
cegas pelos géiseres de terra que obstruem as aberturas. As

[ 145 [
Segunda Guerra Mundial - Volume I

formações inimigas trabalham metodicamente, em grupos de uma


trintena de aparelhos, descrevendo uma grande roda de onde
jorram verticalmente as flechas uivantes dos Stukas. Até os
alemães, concentrando-se em direção ao Mosa, sob o vento de
suas próprias bombas, ficam impressionados, quase
compadecidos. “O efeito moral - anota o comandante Von
Kielmansegg no seu caderno de comando - deve ser apavorante. A
artilharia francesa calou-se...”E a aviação francesa? Nos dias 10 e
11 de maio, sua caça tinha conseguido algum êxito. Manifestou-se
ainda, abateu três aviões acima do Mosa, na manhã do dia 13.
Última oportunidade deixada ao artesanato contra a grande
indústria. Quando uma patrulha tripla do grupo Murtin reaparece
algumas horas depois, encontra diante de si 80 Messerschmitt
escoltando 50 bombardeiros. A patrulha perde um aparelho, e
abate dois. A intervenção da aviação francesa está terminada neste
dia.

Entrementes, os atacantes se amontoam. As estradas das


Ardenas despejam ondas de homens e de máquinas em direção à
bacia de Sedan. Reina um calor ardente, uma poeira causticante,
uma sede abrasadora. Ataque geral às 16 horas. Ordem do Fuhrer
- mas é preciso rastejar depressa para se conformar com aquela
precipitação impiedosa. O regimento Grossdeutschland, que devia
desempenhar o principal papel no ataque, está ainda, no início da
manhã, em território belga, a 40 km de seu local de assalto. Seus
caminhões o deixam na fronteira da floresta de Sedan, de onde
lhes restam 7 km a fazer a pé, transportando balsas pneumáticas e
enorme aparato. Conduz a companhia da testa o primeiro-tenente
Von Courbiere, que estaria ao lado dos franceses se Luís XIV não
houvesse revogado o edito de Nantes. Marcha inaudita, de fazer
correr suor - mas a artilharia francesa que, antes, matraqueava as
colinas expostas, já não atira. Floing está em chamas e é preciso
atravessá-lo debaixo das línguas de incêndio... Finalmente o Mosa

[ 146 [
Segunda Guerra Mundial - Volume I

está lá, correndo negro sob os muros de uma fábrica de tecidos em


ruínas. São 15 horas. Resta uma hora para preparar uma das
operações mais difíceis da arte militar: a travessia de um rio em
face de um inimigo entrincheirado.

“Nós, os velhos de 14-18 - diz o capitão Lothar


Gittermann - sabemos de que o espírito de sacrifício e de que a
habilidade tática o Exército francês é capaz. Só em parte estamos
tranqüilos. Mas nossos jovens oficiais e soldados têm uma
confiança cega na sua superioridade”.

O que eles vêem pode assegura-lhes essa convicção


orgulhosa. Guderian, tendo poucos recursos concentra-os ao
máximo. Sobre uma extensão de 2 km, desde as fronteiras de
Sedan até a península de Iges, comprimiu tudo o que atira contra a
1ª Divisão Panzer: a artilharia dos tanques, a artilharia motorizada,
a FLAK, ou artilharia de defesa contra avião, a PAK, ou artilharia
de defesa contra máquinas blindadas. As disposições tomadas ao
sul de Sedan, diante de Bazeilles, pela 10ª Panzer, são as mesmas.
O que importa é atirar. A tempestade aérea, o mergulho ressoante
dos Stukas, que parecem visar cada homem individualmente,
haviam atacado duramente os defensores. Acontece que estes não
encontravam o reflexo dos combatentes da primeira guerra, que
reerguiam as cabeças depois das mais violentas enxurada de
artilharia e reencontravam armas para quebrar o assalto...

Dizia-se em 1916: a artilharia conquista, a infantaria ocupa.


Agora, cabe ao avião conquistar.

O resto é quase detalhe. O ataque impossível parte na


hora. A travessia do Mosa dura alguns instantes. Nem todos os
defensores estão paralisados. Alguns resistem energicamente em
Frenois. Perto do Castelo Belleuve, uma casamata bem comandada

[ 147 [
Segunda Guerra Mundial - Volume I

detém os assaltantes. Estes se infiltram e envolvem a resistência, e


uma peça de 88 triunfa. Às 19h, o sol ainda está no céu. Sem que
um só blindado houvesse atravessado o Mosa, o Regimento
Grossdeutschland atinge a cota 247, seu objetivo do dia.
Ultrapassa-o e, infatigável, infiltra-se no bosque de Marfée.

Diante da 10ª Panzer, ao sul de Sedan, a resistência é a


princípio um pouco mais firme. Só depois das 5 horas, 40 minutos
após os soldados de elite do Grossdeutschland, é que o tenente
Hanbauer e o sargento Ruberth, do 86° Regimento de Fuzileiros,
chegaram à margem esquerda. De um observatório do 10° CE, os
homens que os seguem são contados: 40. Pelo milagre de uma
linha telefônica poupada, a informação sobe até os escalões
superiores: 40 alemães haviam conseguido cruzar o Mosa em
Wadelincourt...

Do lado alemão, o General Guderian atira-se a uma das


primeiras balsas pneumáticas. Atinge a margem esquerda, onde o
tenente-coronel Balck o acolhe gritando: “A navegação de recreio
está proibida no Mosa...” Do lado francês, o General Huntziger
transporta-se de seu PC de Senuc, a 50 km da frente, para o PC do
10° CE, na Berliére, distante 25 km; depois, volta a Senuc, onde
está de retorno às 19 horas, para se fazer servir por ordenanças de
luvas brancas... Um abismo separa os dois conceitos de comando.
Para os alemães, cuja doutrina de guerra foi refeita sob a influência
de Hitler, o chefe deve estar nos postos avançados; num avião,
quando é preciso observar; num caminhão de rádio, quando
precisa dar ordens; intervindo pessoalmente no combate, quando
vê necessidade disso. No conceito francês, herdado de 14-18, o
chefe dirige a distância uma guerra quase abstrata, com o recuo de
tempo e de espírito para que suas decisões não fiquem sujeitas à
emoção do combate.

[ 148 [
Segunda Guerra Mundial - Volume I

Em Senuc, a única informação chegada à noite - “40


alemães atravessaram o Mosa” - parece pintar um incidente local.
“isso vai nos dar 40 prisioneiros” - diz-se a Huntziger.

De uma surpresa, um pânico faz um desastre

Na mesma ocasião, toda a ala esquerda do 2° Exército


desmorona. A travessia do Mosa poderia não ter passado de um
incidente local, como todos os exércitos conhecem em todas as
guerras. Mas um pânico, nascido de um longo abatimento moral,
irá fazer dela um desastre irremediável, o começo da ruína de uma
nação.

Tanto quanto nos é possível julgar, é de Bulson que parte


este vento de derrota. Bulson, medíocre e pequena aldeia, no
bosque da Merfée. Uma centena de habitantes, uma igreja sem
padre, uma dezena de fazendas ardenenses de pórticos
arredondados e de montões de estrume transbordando nos
caminhos. Durante nove meses de espera, os artilheiros se haviam
instalado nos celeiros. A região estava lamacenta e sombria, o
clima úmido e frio. Malsão para os homens e ainda mais para os
cavalos que morriam em massa sem que se soubesse bem por quê.
O tédio e a preguiça roíam uma tropa na qual os oficiais não
tinham mais o gosto de comandar, nem os homens o hábito de
obedecer. As peças, alguns 105 longos, tinham suas instalações na
proximidade do acantonamento e suas bocas apontadas para as
clareiras da floresta de Sedan. Mas há muito tempo que aqueles
que serviam nesse grupo de artilharia pesada de corpo de exército
haviam deixado de acreditar que atirariam algum dia um obus
contra o inimigo.

[ 149 [
Segunda Guerra Mundial - Volume I

Essa inverosimilhança produz-se no dia 12 de maio. Os


artilheiros a acolhem quase como uma diversão para sua existência
monótona. O moral está bom e continua assim durante a manhã
do dia 13 - até o momento em que os Stukas se põem a mergulhar
sobre as baterias. As perdas são insignificantes, nenhum canhão é
posto fora de serviço, mas os soldados abandonam as armas e
dispersam-se nos bosques. É o momento em que os alemães
fazem pressão em direção ao Mosa; momento em que, de seu PC,
o General Lafontaine vê uma multidão de tanques atravessar a
larga colina que precede o rio. Alvo sonhado! Mas a artilharia
francesa já não tem braços para servi-la.

No entanto, a tempestade aérea decresce. Algumas baterias


se recuperam. Cinco tanques alemães, que se deixam ver nos
limites da Balan, são destruídos pelo 155 curto.

Talvez baste pouca coisa para que os homens dispersos e


amedrontados voltem para perto de seus canhões, sintam a
embriaguez do combate, reencontrem na oficina que é uma peça
de fogo a consciência profissional que está na base da bravura
legendária dos artilheiros. Afinal de contas, foram alguns
elementos de infantaria que atravessaram o Mosa, e nada mais.
Nenhum tanque passou e nenhum tanque passará antes do dia
seguinte. Se a artilharia se refizer, o punhado de infantes perdidos,
atirados de um lado ao outro do rio, poderia ser interceptado e
capturado.

Mas a artilharia não se refaz; foge! Enche a estrada de


Bulson a Maisoncelles e a estrada de Bulson a Chemery.
Artilheiros dos regimentos 45, 99, 110, 145, 310, arrastando
consigo os soldados das retaguardas, soldados rasos, enfermeiros,
telefonistas. Lá embaixo, no vale, ainda sem luta.

[ 150 [
Segunda Guerra Mundial - Volume I

Algumas casamatas resistem, alguns oficiais se defendem


em seu PC, mas o pânico se propaga como fogo em capim, no
meio de homens que nem sequer viram uma silhueta inimiga. “Os
tanques alemães em Bulson”- grito tolo que, no entanto, ganha os
estados-maiores, cujas últimas comunicações intactas servem para
propagá-lo. Alguns postos de comando se mudam
precipitadamente. Regimentos que não foram atingidos por uma
bomba sequer, como os da 71ª DI, abandonam suas posições e
retiram-se em desordem. Oficiais experimentados da última guerra,
coronéis - um deles iria suicidar-se de vergonha - assumem o
comando desse “salve-se quem puder”. Unidades disciplinadas,
como a artilharia da 5ª DLC, seguem a onda, levando o seu
material, convencidos de que obedecem a uma ordem de retirada.
O fim do dia é de uma serenidade mágica. Os Stukas
desapareceram. O ruído do combate, nas encostas do bosque da
Marfée, mal é ouvido. O Exército francês está intacto, com
centenas de batalhões, milhares de canhões e de tanques, uma
tradição de glória que atravessa os séculos e faz bater o coração de
um povo orgulhoso. Que importa! O Exército francês está batido.
Todos os esforços que ele fará daí por diante, durante seis
semanas, não serão mais que gestos convulsivos. Um único elo se
soltou e toda a cadeia se desfaz.

Na derrocada, algumas energias sobrenadam. Ao primeiro


boato de pânico, um homem fora de si, o coronel da gendarmaria
Serin, precipita-se pelas estradas. Ele mede o perigo. Durante a
última guerra, havia, no limite da retaguarda, barreiras de
gendarmes, piquetes de cavalaria, que teriam detido aquela turba
de fugitivos e que, à sombra do conselho de guerra, a teriam
trazido de volta à luta. Os tempos mudaram. O espectro do
conselho de guerra se dissipou, embora a necessidade nunca haja
sido maior nem o perigo mais iminente.

[ 151 [
Segunda Guerra Mundial - Volume I

Com a motorização do Exército, a estrada torna-se um


instrumento militar primordial. Deveria ser requisitada, cercada,
guardada, reservada à circulação militar, mantida aberta por todos
os meios, inclusive, em caso de necessidade, pelo terror e pela
crueldade. Ora, desde o dia 10 de maio, essa estrada da salvação
pública está entregue à fuga civil, às longas carroças ardenenses
puxadas por enormes cavalos de patas cobertas de pêlos, às vagas
de automóveis estofados com colchões, aos carrinhos de bebê e
aos carrinhos de mãos carregados de roupa velha e por vezes de
pessoas idosas, e até mesmo de rebanhos que os camponeses
inconscientes pretendem levar consigo em seu auxílio. Quando o
pânico militar, desencadeado de Sedan, se atirar nessa torrente
civil, aí então qualquer movimento de tropa, qualquer chegada de
reforço se tornará impossível. O Comando pode ser paralisado, o
Exército vencido, a França destruída, porque o sistema arterial das
estradas se encontrará obstruído por um coágulo humano.

Serin e seu punhado de gendarmes nada podem fazer. O


pânico virou avalanche. Nutre-se a si mesmo. Os homens e as
formações fogem nem sequer ouvem, ao longe, o rumor de uma
batalha. O 13 de maio é para eles um dia como qualquer outro,
ligeiramente modificado no seu ritmo por aquela ofensiva alemã
na qual ainda não se acredita muito...

Mais tarde, de uma só vez, um imenso clamor de desastre


enche a planície, adiantando-se ao desfalecimento secreto e
vergonhoso que enche os corações desde o início de uma guerra
cuja necessidade a nação não sente. O que se passou em Sedan
todo mundo ignora. Mas todo mundo sabe que a França foi
atacada pelas costas, que foi traída, que está perdida!

[ 152 [
Segunda Guerra Mundial - Volume I

Rommel em Dinant

Um homem foi mais rápido que Guderian: Rommel.


Desde as 16h, no dia 12, os veículos da frente de sua 7ª DP
haviam atingido o Mosa em Dinant. Abrigada numa abertura das
falésias da margem direita, a pequena cidade foi tomada sem
combate. A ponte, conquistada quase intacta, explodiu diante dos
primeiros blindados.

A 5 km a jusante de Dinant, no leito do Mosa, uma faixa


de terra arborizada - 1.100 m de comprimento por 50 m de largura
- a ilha de Houx, aproxima-se da margem esquerda. Desse lado, as
falésias se afastam, desenhando uma bacia ocupada em parte pela
grande localidade de Anhée. A margem oriental, ao contrário,
precipita-se em declives abruptos, escarpas cobertas de capim e
rochedos a pique. A represa n° 5 barra o rio. Não a fazem
explodir, a fim de não diminuir, com uma baixa das águas, o valor
defensivo do Mosa a montante. Mas tampouco foi fortificada.
Deixou-se mesmo de destruir o passadiço que o atravessa.
Algumas grades Cointet batidas por um FM foram dispostas para
impedir o acesso à passagem.

Em frente da 7ª Panzer, chega a ala esquerda do exército


de Corap: 5ª DIM e 18ª DI. A primeira, motorizada, está mais ou
menos colocada ao sul de Namur. A segunda, de infantes, geme
pelos caminhos. Os homens, Angevisn, Tourangeaux, Berrichon,
estão longe de ser maus soldados. Desprovidos de entusiasmo por
essa guerra incompreensível, são descritos, no entanto, por um
relatório oficial, como “polidos e disciplinados”. Mas a abominável
mochila, de que todos os motores do século XX não conseguiram
livrar a infantaria, os estafa, esmaga, sufoca. Tendo partido da
região de Hirson, eles percorrem 100 km para alcançar os seus
locais de combate - isto é, tanto quanto Rommel, que não tinha

[ 153 [
Segunda Guerra Mundial - Volume I

um só infante em sua divisão. Além disso, Rommel entrou na


Bélgica ao amanhecer. A 18ª DI, cujas unidades blindadas tinham
sido dispersadas por necessidade de instrução, só começou a
atravessar a fronteira ao fim da tarde. Vinte por cento dos homens
faltam nas fileiras, pois a cadência das licenças foi acelerada para
compensar o atraso corrido durante os falsos alarmes do inverno.
O próprio general, chamado Duffet, está em casa, em Besançon.
Ele se reunirá à tropa no dia seguinte.

Na verdade, o contraste é trágico. O Exército francês


marcha para um combate a respeito do qual tudo o que se sabe do
inimigo promete que será rápido e brutal. No GQG, o chefe do
Estado-Maior, Doumenc, é o oficial que, durante a guerra
precedente, improvisou o abastecimento de Verdun com os
caminhões da Via Sacra. No entanto, não parece que, durante o
longo inverno, isso se houvesse refletido sobre os meios pelos
quais se poderia dar a essa temerária expedição da Bélgica uma
rapidez menos desproporcional à sua época. “A 18ª DI fará seu
deslocamento por via terrestre...” Fórmula de Estado-maior. O
que queria dizer que, marchando sobre as bolhas dos pés, a razão
de 30 a 40 km por dia, ela precisará de três dias para alcançar seu
campo de honra.

A aviação entra em jogo. Abalou pouco as colunas, mas


destruiu a estação de abastecimento de Hirson. As munições não
mais chegarão. Os trens de víveres voltavam vazios, obrigando a
tropa a mendigar ou a pilhar para comer. Descobre-se
bruscamente que já não se concebe uma marcha em campo raso
sem cobertura aérea e uma DCA apropriada. Descobre-se isso no
momento em que se acaba de lançar numa guerra de movimento
um exército organizado para a guerra estacionária - no momento
em que é tarde demais.

[ 154 [
Segunda Guerra Mundial - Volume I

Como no 2° Exército, duas divisões ligeiras de cavalaria,


unidades complexas e frágeis, tinham sido deslocadas para frente
para disputar ao inimigo o tempo necessário para a instalação da
infantaria no Mosa. Atrás delas, dois batalhões, um do 66°, outro
do 77° RI, tinham sido transportados em caminhões, para
estabelecer um escalão de cobertura. O General Duffet chega atrás
deles e convence-se da extrema dificuldade de sua missão. Se ele se
instalasse a meia colina, o fundo muito encaixado do vale escaparia
às vistas de seus observatórios e o tiro tenso de suas armas
automáticas não lhes permitiria bater o plano da água. Foi-lhe,
portanto, necessário descer até às margens, isto é, aceitar ser
dominado pelo inimigo. Na realidade, para conservar o setor, para
atacar os deslocamentos da margem direita e, ao mesmo tempo,
para engastar com uma faixa de fogo contínuo os inúmeros
meandros, seriam precisos meios muito mais consideráveis do que
os de uma simples divisão de infantaria. No mapa, o barranco do
Mosa parecia uma posição defensiva formidável. No local, as
coisas mudam de aspecto. Aquelas florestas profundas e aquelas
escarpas favorecem mais ao atacante do que ao defensor.

Além disso, o inimigo está ali! Chegam adiantado quatro


dias em relação ao calendário francês. O comandante da 18ª DI
acredita que terá tempo de fazer repousar a sua gente e estabelecer
seus planos de fogo. Entendera-se que as destruições belgas, o
combate em retirada dos caçadores ardenenses, a ação retardadora
das 1ª e 4ª divisões ligeiras de cavalaria proporcionariam o atraso.

Subentendera-se, principalmente, que a ação inimiga seria


pouco incisiva naquela região difícil, naquela região não estratégica.
Mas as destruições belgas não foram efetivas, os caçadores
ardenenses estavam em outros locais, e as divisões leves se
retiraram precipitadamente. Com seus dois batalhões incompletos,
o pobre General Duffet vê-se na necessidade de manter 20 km de

[ 155 [
Segunda Guerra Mundial - Volume I

frente, até o momento em que seus 7 outros batalhões,


extenuados, atinjam por sua vez o Mosa. Duffet pede auxílio.
Consegue. Em vez de ir recompor-se na retaguarda, a 1ª DLC,
atravessando o Mosa, cooperará com a defesa do setor. A 5ª DIM
emprestará um batalhão à sua vizinha. Na noite do dia 12, atrás
das pontes destruídas, um arremedo de organização se esboça no
papel. Ao sul, em ligação com a 22ª DI, alguns esquadrões de
dragões e caçadores. No centro, em frente a Dinant, os dois
batalhões do 77° e do 66°. Ao norte, o batalhão cedido pela 5ª
DIM, o 2° do 39° RI. Em seu PC de Falaem, a 15 km das linhas, o
General-de-Divisão Duffet pode adormecer dizendo para si
mesmo que providenciou o mais urgente.

Quanto a Rommel, fechou os olhos aos postos avançados.


Às 4h da manhã, no dia 13 de maio, desce à pé um atalho
escarpado e, com um núcleo oficial, atocaia-se num pequeno
bosque, para assistir aos esforços dos fuzileiros do 7° Regimento
tentando atravessar o Mosa em balsas pneumáticas. O fogo
francês está bem ajustado. Algumas balsas naufragam. Um ferido
alemão pedindo socorro passa dentro do rio e afoga-se sob as
vistas de seu general. Rommel dá ordem de incendiar algumas
casas, para tentar erguer uma cortina de fumaça e, depois, subindo
num Pz Kw 4, circula pela margem, para apressar o ataque. Em
Leffe, atulhada de feridos, uma companhia conseguiu manter-se na
margem esquerda, mas está pregada ao chão, com pesadas baixas.
O dia começaria bastante mal se não existisse a ilha de Houx. Mas
existe a ilha de Houx. A posição francesa já não está mais
estanque; o dique faz água e a infiltração cresce.

O que se passou foi simples: a barragem n° 5 não estava


guardada e o batalhão do 39° RI não ocupara suas posições de
combate. Ninguém percebera aquela brecha, exceto o 7° batalhão
alemão de motociclistas. Desde o cair da noite, seus homens

[ 156 [
Segunda Guerra Mundial - Volume I

começaram, um a um, a atravessar o Mosa, por cima da crista da


barragem. Alguém deve ter percebido isso (os relatos são muito
confusos), uma vez que um tiro de alto foi pedido e a artilharia
gastou 1.200 obuses no sul da ilha. Os atacantes não pareceram
emocionar-se com o fato. Ao amanhecer, subiram as encostas
arborizadas da bacia, dispersaram algumas seções isoladas,
tomaram a aldeia de Grange, penetraram no bosque de Surinvaux.
Estávamos longe de uma reedição da caldeira de Sedan: a ação
aérea era fraca e os motociclistas eram poucos. No entanto, a
resistência que lhes opôs foi quase nula. Reforçados por alguns
grupos de fuzileiros, eles ganharam terreno em direção ao
oeste. Para limpar a margem esquerda, o General Duffet ordena
três ataques, um depois do outro. Os elementos dos dois primeiros
não chegam a se agrupar. O terceiro parte muito tarde, às 20 horas.
Fortalecido por um batalhão do 39° RI, precedido de uma
companhia de tanques, apoiado por três grupos de artilharia, ele
deverá ser decisivo contra um adversário que ainda não tem
blindados nem peças antitanques. Rommel, que, por sua vez,
passou a barragem de Houx, está lá no meio de seus atiradores.
Manda aplicar sobre os tanques um fogo de artifício de todas as
suas peças, inclusive seus foguetes de sinalização. Os tanques
continuam a avançar, atingem o Mosa, mas por uma razão
inexplicável os soldados não os seguem. Os tanques retrocedem.
O contra-ataque fracassa. A cabeça-de-ponte de Houx permanece
com o inimigo.

Simultaneamente, a terceira cabeça-de-ponte foi feita em


Monthermé, entre Givet e Mézières, pela 6ª DP, do Corpo
Reinhardt. Em nenhuma parte o Mosa é mais selvagem, o vale
mais encaixado, os bosques mais densos. Os motociclistas alemães
seguidos de alguns carros com metralhadoras, chegam pela grande
estrada de Givet. Sofrem fogos de artilharia longínquos ao
atravessar a clareira das Hautes-Buttes, e depois, descendo o vale,

[ 157 [
Segunda Guerra Mundial - Volume I

ocupam a pequena cidade industrial de Monthermé. Do outro lado


do rio, um escudo de 7 km de contorno está ocupado por uma
única companhia, meio malgaxe, meio francesa, da 42ª
Semibrigada de Metralhadores Coloniais. Violento
bombardeamento aéreo a neutraliza. Ao atravessar o rio sobre a
ponte mal destruída, os soldados alemães apoderam-se do escudo
cujos defensores haviam aniquilado.... Até chegarem aos QGs
serenos e longínquos, as notícias desastrosas do dia atenuam-se.
Em Vervins, no comando de Corap, há indignação porque o
contra-ataque de Houx não foi executado. Em Senuc, na chefia de
Huntziger, não há “exagerada inquietação”. Em Ferté, no
comando de Georges, é preciso esperar até 23h45 para se ter
confirmação “de um acidente bastante sério do lado de Sedan”. A
informação é transmitida de Vincennes, PC de Gamelin, nesta
forma ingênua, com um acréscimo lenitivo: “Aqui, estamos
calmos...”. Há um pouco menos de tranqüilidade, um momento
mais tarde, quando parece que algumas tropas debandaram e que a
posição de defesa foi rompida em alguns pontos. Georges, para
aliviar a tarefa de Billotte, decide por Huntziger sob seu comando
direto. A inquietação que ele manifesta não é pelo 1° Grupo de
Exércitos, que vê surgir uma ameaça a suas comunicações; é pela
querida Linha Maginot. Ordena a Huntziger que impeça, a
qualquer preço, a sua tomada pela retaguarda, o “enrolamento”,
constituindo um gancho defensivo e detendo o inimigo, custe o
que custar, na correia Inor-Montmédy. “A sorte da guerra - diz ele
- depende disso”.

Obsessão de um perigo inexistente. O “enrolamento” viria


certamente, porém num outro momento e de outra maneira. No
momento, a Linha Maginot interessa tão pouco ao Comando
alemão quanto Ruanda-Urundi. A única ação possível do
comandante-chefe reside na manobra das reservas. Estas são
fracas, pois o movimento para a Dyle absorveu o 7° Exército e a

[ 158 [
Segunda Guerra Mundial - Volume I

maioria das divisões rápidas. Restam à disposição de Georges 17


divisões de infantaria e as 3 divisões couraçadas. É com tais
recursos insuficientes que ele tem que tentar uma reparação contra
uma tripla surpresa, tática, técnica e estratégica. Nenhum general
poderia consegui-lo.

Falta, pelo menos, que as medidas tomadas na noite de 13


para 14 sejam adaptadas à natureza do perigo. O incidente de
Sedan afigura-se grave e a ameaça que parece provocar na Linha
Maginot causa viva emoção. Em compensação, a fragilidade do 9°
Exército e o poderio das forças que se concentram contra ela
ainda não causam alarme sério. Em conseqüência, é para
Huntziger que se dirigem todas as grandes unidades - 21ª CE, 6ª
DI, 3ª DIM, 3ª DCR - acionadas pelo Alto-Comando. Corap,
observa-se só foi fracamente atacado e ainda possui em reserva
duas divisões, a 53ª DI e a 4ª DINA, uma das melhores do
Exército francês. “Não estou inquieto pelo senhor - diz-lhe
Billotte -, estou inquieto por Huntziger...”.

O núcleo de aço das reservas gerais foi constituído pelas


três divisões couraçadas, cuja razão de ser, segundo a doutrina
francesa, é o restabelecimento da continuidade das frentes. As
duas primeiras já estão à disposição do 1° Exército, a fim de
assegurar a impenetrabilidade da brecha de Gembloux, Uma, a 1ª
DCR, em marcha desde a véspera, atinge sua zona de reunião, a
região de Charleroi. A outra, a 2ª DCR, começa a deslocar-se na
região de Châlons. Mas os singulares princípios de transporte em
vigor a dissociam antes que ela se ponha em movimento. Os
veículos sobre esteiras locomovem-se por via férrea. As viaturas de
rodas - inclusive os caminhões-cisterna - deslocam-se por estrada
de rodagem. Quem imaginou essa dualidade revive 14-18, época
em que a aviação de bombardeio estava embrionária e em que as
frentes contínuas e a lentidão das ofensivas garantiam a segurança

[ 159 [
Segunda Guerra Mundial - Volume I

das retaguardas. Enquanto que em 1940 cada linha de vagões


lançada numa via férrea, cada comboio posto numa estrada é um
desafio para a Luftwaffe...

No dia 13 à noite, nada ainda mudou quanto à afetação das


1ª e 2ª DCR. a 3ª, que não tem 50 dias de existência, recebe ordem
de contra-atacar para fechar a brecha de Sedan.

Estão completas, preparadas, essas grandes unidades


blindadas criadas tão dolorosamente e tão recentemente? Cada
uma compreende dois batalhões de B. 1 e B. 1 bis (66 tanques) e
dois batalhões de H 39 (120 tanques). Não é exato dizer-se que
elas só se eqüivalem a um terço de uma Panzer, cujo, efetivo em
tanques, geralmente mais leves, vão de 324 a 218. Por outro lado, é
verdade que muitos H 39 só tem canhões da última guerra, sendo
que as armas de grande poder de perfuração que devem permitir-
lhes lutar tanque contra tanque não foram entregues pela indústria.
É verdade que os aparelhos de transmissão estão defeituosos e que
a estúpida proibição de comunicar-se por fonia torna o rádio quase
inutilizável. É verdade que a DCA é insuficiente, e o sistema de
reabastecimento, execrável. É verdade que nenhuma cooperação
foi organizada entre as DCR e a aviação. É verdade que elas estão
servilmente subordinadas a chefes que não têm a menor idéia da
batalha dos blindados e que seus próprios generais, Bruneau,
Bruché, Brocard, não têm a visão, a experiência, o ardor, a sã
disciplina de um Rommel ou de um Guderian. Quando Estienne,
Hering e De Gaulle reclamam um corpo couraçado, entendem por
isso uma força autônoma de ação maciça, com velocidade própria,
sob um comando particular. As DCR francesas não tem tais
características. Depois do erro que se cometeu repelindo essa
reivindicação, comete-se provavelmente um segundo erro, criando
esse corpo couraçado tão tarde e tão mal.

[ 160 [
Segunda Guerra Mundial - Volume I

Seus batalhões de tanques não teriam pior rendimento


permanecendo no quadro da infantaria, como em 1918.

Transcorre a noite de 13 para 14 de maio. Do lado alemão


longas colunas motorizadas atravessam a Ardena, com todos os
faróis acesos. À margem do Mosa, os infatigáveis generais
Guderian, Rommel, Stever, Schaal, supervisionam pessoalmente a
construção das pontes que, ao amanhecer, colocarão seus tanques
na outra margem. No campo francês, o medo e a confusão
começam a fazer estragos. Na Bélgica, a 4ª DINA, subindo para a
batalha, realiza uma marcha forçada em meio a uma multidão de
fugitivos. Em direção a Reims, o pânico de Sedan corre como uma
torrente dentro da noite. As equipagens da 3ª DCR, constituídas
por soldados a toda prova, abrem caminho com grande esforço.

Na Ponte Montgon, no canal das Ardenas, a polícia militar


da divisão organiza de revólver em punho, uma barreira para deter
os soldados debandados. Abre-a diante de uma formação de
artilharia que avança em boa ordem, os oficiais à frente, e verifica
que os cavalos não puxam canhões e que os tirantes dos jogos
dianteiros foram cortados... Durante muito tempo a França terá
vergonha daquela noite.

No escalão do GQG, a síntese do dia 13 estabelece-se


assim: “De Namur a Mézières (9° Exército), o inimigo conseguiu
estabelecer duas pequenas cabeças-de-ponte, uma em Houx, ao
norte de Dinant, outra em Monthermé. Instalou uma terceira, mais
importante, no bosque da Marfée, perto de Sedan (2° Exército).
Foram ordenados contra-ataques, para atirá-las ao Mosa...”

[ 161 [
Segunda Guerra Mundial - Volume I

Os tanques tornam-se guarda-estradas

Na manhã de 14 de maio, finda a luta na Holanda: o


exército holandês deporá as armas no dia seguinte, depois de um
cruel bombardeio de Roterdã, por Kesselring. Procura-se salvar
Antuérpia, mas o General Georges já tomou a decisão de
requisitar divisões rápidas do 7° Exército. Diante dos belgas e dos
ingleses, a luta não está muito intensa. Está mais encarniçada na
brecha de Gembloux, onde as DLM, duramente açoitadas, passam
de novo aquém da frente do 1° Exército. Mas a posição de
resistência se organiza e, em linhas gerais, a situação é satisfatória
naquele setor.

Na outra extremidade da frente, a esquisita guerra


continua. O 8°, o 5° e o 4° exércitos permanecem completamente
inertes, abstêm-se até de atirar sobre o território inimigo, pelo
menos para fazer conhecer a alguns habitantes de Baden a sorte
das populações belgas e holandesas. O 3° Exército resiste sem
esforço a um fraco ataque, mas nem por isso retira maior número
de atacantes de Longwy para encurtar sua frente. Poderosamente
coberta pela cabeça-de-ponte de Montmédy, a ala esquerda do 2°
Exército conhece horas sem emoção. O drama só se desenrola no
Mosa, de um riacho chamado Emmenance, ao pé das velhas
muralhas de Namur.

Diante de Sedan - ou melhor, atrás da cidade - as medidas


ordenadas pelo Comando francês são três. Primeira: constituir-se-á
uma frente defensiva, voltada para leste, no canal das Ardenas e
sobre o rio Bar; segunda: far-se-á um contra-ataque, em direção ao
norte, partindo-se de um pequeno maciço chamado bosque do
Mont-Dieu; terceira: destruir-se-ão com violentos bombardeios
aéreos as passagens que o inimigo se esforça por estabelecer no
Mosa. As três medidas formam um todo. Como a primeira,

[ 162 [
Segunda Guerra Mundial - Volume I

contém-se o avanço inimigo. Com a segunda, fecha-se a brecha


aberta na véspera. Com a terceira, impede-se que os alemães se
fortaleçam na margem esquerda, e condena-se ao aniquilamento os
veículos que atravessaram o rio. A manobra é incensurável. Resta
executá-la.

Quanto a Guderian, ele sabe que seu sucesso ainda é frágil.


Agora, seu problema consiste em desdobrar-se rapidamente além-
Mosa, para quebrar a reação dos franceses e empreender sem mais
demora sua marcha sobre Amiens. É por isso que pressiona ao
extremo a passagem da 1ª Panzer, ordenando a seu chefe, o
General Kirchner, que ataque imediatamente, de verdade e em
linha reta na direção oeste. A 10ª DP, cujos blindados atravessam
o rio a montante de Sedan, tem que se orientar para sul, em face
do Mont-Dieu e de Stonne, para cobrir o flanco de sua vizinha.
Resta a 2ª DP, que na véspera, permaneceu para trás no Semois.
Ela chega, por sua vez e se apresenta para atravessar o Mosa em
Donchery. Guderian se desloca para lá. Ele ainda não sabe que
missão reservará para sua terceira grande unidade.

Heroicamente a aviação franco-britânica ataca as pontes.


As formações sucedem-se em ondas obstinadas, mas a FLAK do
coronel Von Hippel conhece seu dia de glória: abate 100
aparelhos, impede qualquer bombardeio preciso. Em meio de uma
formidável tempestade de aço, um velho homem, o comandante
do Grupo de Exércitos Rundstedt, que viera respirar o cheiro de
pólvora, alcança Guderian na entrada da ponte de Donchery.
“Como é, Guderian, é assim todos os dias?”.

Depois da partida do grande chefe, Guderian ainda hesita.


Ao seu lado, o comandante da 2ª DP, Veiel, aguarda ordens.
Como empregar sua divisão blindada? Na direção oeste, para
acelerar o sucesso da 1ª DP que acaba de tomar Chemery e que

[ 163 [
Segunda Guerra Mundial - Volume I

ataca o canal? Ou para sul, reforçar a 10ª DP contra as fortes


concentrações de tanques franceses assinalados perto de Mont-
Dieu? Vacilante entre a astúcia e a prudência. Guderian consulta
seus oficiais. O major Wenck, que este relato encontrará na agonia
de Berlim, responde-lhe rindo com a sua própria divisa: “Ataque
com rigidez, não dê “pancadinhas”. Esta frase vence a causa da
astúcia. É para oeste que Veiel faz orientarem-se seus tanques.

No entanto, por um golpe de sorte, a 3ª DCR chegou


desde as 6h da manhã, e sem ter perdido um só veículo, na sua
zona de intervenção. Suas viaturas de reconhecimento deslocam-se
até as fronteiras do Mont-Dieu. Diante deles se estende uma bacia
algo pantanosa, cortada por um riacho, e, mais à frente, um
movimento de terreno que esconde a aldeia de Chemery, a que 1ª
Panzer ataca dando as costas à 3ª DCR. O inimigo não é
numeroso e sua atividade é fraca. Qualquer general que tenha o
mínimo de visão de homem de guerra aproveitará, diante desse
quadro, a oportunidade que se lhe oferece para cair sobre o
adversário ainda esparso enquanto, na sua retaguarda, as unidades
descansadas da 3ª DIM, chegam em auxílio. Mas os generais
franceses não estão na frente, como os generais alemães, para
tomar inspiração do momento e do terreno. O da 3ª DCR,
Brocard, está nas Petites Armoises, a 12 km do Mont-Dieu, a
discutir com o superior hierárquico que lhe deram, o General
Flavigny, comandante do 21° CE. Flavigny pede a Brocard que
ataque imediatamente. Brocard responde que precisa de 10 horas
para organizar a manobra e reabastecer seus tanques. As ordens e
as ameaças não o abalam. São quase 14 horas quando ele inicia a
marcha de aproximação. Há muito tempo que os blindados
alemães passam o Mosa em grandes ondas.

[ 164 [
Segunda Guerra Mundial - Volume I

Perde-se a ocasião. Flavigny, com razão ou sem ela, detém


o movimento da dianteira da 3ª DCR e estabelece-se em cordão
defensivo, sobre extensão de 20 km, do lago de Bairon a Stonne.
Fracionada em seções mistas, dois H e um B, a divisão barra os
caminhos da floresta. As soberbas máquinas feitas para a guerra
épica, as retiradas em massa, as grandes evoluções renovadas da
cavalaria de outrora, acabam sua breve carreira no papel dos
territoriais de 1914: GVC - guardas de vias de vias de
comunicação.

Ao mesmo tempo, o papel do 2° Exército na batalha do


Mosa está terminado. Estando a pressão dos tanques inimigos a
exercer-se numa outra direção, ele poderia sem muita dificuldade
continuar até junho em sua missão de dar cobertura à Linha
Maginot. Por pouco, diante de uma comissão de inquérito de pós-
guerra, seu chefe de estado-maior não reivindicou para ele a palma
dos vencedores. “Se não tivesse havido o nome de Sedan - disse
esse inconsciente - estou convencido de que o recuo do 2°
Exército teria parecido algo de insignificante...”.

“No rio Bar, a luta é mais séria. Procura-se


desesperadamente erguer uma linha de limite de lado a lado da
brecha aberta pela volatilização da 55ª e da 71ª DI. Estirado numa
frente absurda, o 148° RIF mantém o angulo formado pelo Mosa
e o Bar. Os cavaleiros da 5ª DLC, da 3ª BC e da 3ª Brigada do
Corpo de Spahis encarregam-se da defesa do canal e tentam
restabelecer, para o lado da aldeia de la Cassine, a ligação com o 2°
Exército. Tendo chegado a pé do campo de Sissone, onde ela está
em instrução, a última reserva do 9° Exército, a 53ª DI, do
General Etcheberrigaray, é atirada como reforço na zona
arborizada que se estende entre o Bar e um pequeno rio paralelo, o
Vence. Grande unidade de série B, irmã gêmea da 55ª, ela chega
extenuada e logo se vê enrolada num turbilhão de ordens e contra-

[ 165 [
Segunda Guerra Mundial - Volume I

ordens que refletem a ignorância e a precipitação dos escalões


superiores. Finalmente, os batalhões se deixam cair lá onde estão,
numa zona de 400 m², em plena noite, no meio dos bosques.
Alguns lutarão até certo ponto. Outros se dissociarão ao primeiro
embate.

Durante todo o dia 14, uma poeira de unidades enfrenta a


1ª e a 2ª Panzer. A defesa escalona-se em profundidade, nas
clareiras e nos corredores do maciço florestal, no planalto Carlos
Magno, nas aldeias de Malmy, de Vendresse, de Omicourt. À
noite, nova linha de resistência se constitui no rio Vence. A estrada
de Amiens ainda não está completamente aberta para Guderian!

Mas é preciso poder auxiliar aquela frente frágil sobre a


qual agora pesa o ataque frontal vindo de Sedan. Ora, as unidades
de reserva geral foram orientadas para outras direções, e o 6°
Exército Touchon, encarregado de restabelecer a ligação ente o 9°
e o 2°, ainda é apenas um organismo de comando. Sozinha, vindo
por Rethel, a 14ª DI, comandada pelo enérgico De Lattre de
Tassigny, leva um batalhão do 152° RI até o Vence. Mas é uma
gota no oceano.

Um reforço mais importante, um poderoso elemento de


manobra, foi a 2ª DCR. Uma ordem do GQG, transmitida em 14
de maio às 9 horas, retira-a do 1° Exército para colocá-la à
disposição do 9°. Uma segunda ordem dirige-a para Signy-
l’Abbaye. Ela fica, portanto, no papel, com a possibilidade de
surgir no meio das Panzer de Guderian, para uma daquelas
disputas de tanques em função das quais foram construídas as
divisões couraçadas.

[ 166 [
Segunda Guerra Mundial - Volume I

O mínimo que se pode esperar dela é que dê um golpe de


parada ao avanço alemão, que ela proporcione ao Comando uma
demora que lhe permita recolocar em ordem uma batalha mal
conduzida. Em outras palavras: que ela se sacrifique até o último
ataque.

Mas o absurdo sistema de transporte tudo sabota. Por falta


de estações ferroviárias, os tanques são desembarcados em Hirson,
a 60 km da zona de reunião prescrita para a divisão. Os veículos de
rodas, compreendendo especialmente o reabastecimento e o
conserto, perdem-se no mundo de estradas e, tendo chegado, bem
ou mal, a Signy, encontra-se mais perto do inimigo do que das
formações combatentes a que deviam servir. Onde há gasolina,
não há tanques. Onde há tanques, não há gasolina. “No dia 14 ao
meio dia - reconhece o comandante da DCR, Bruché -, podemos
dizer que não existe mais divisão couraçada, mas unicamente
veículos dispersos que os comandantes locais disputam entre si...”.
Um outro fator quase dá tempo aos franceses: o inimigo. Kleist,
comandante do grupamento blindado, ordena a Guderian que pare
na cabeça-de-ponte de Sedan e se entrincheire, para permitir que
as divisões de infantaria se unam às Panzer. Guderian voa ao PC
de seu chefe, protesta, demonstra que os frutos da surpresa vão
perder-se, mas Kleist responde-lhe dogmaticamente que ele irá
correr para um desastre e que suas divisões blindadas arriscadas
nas planícies do Norte da França serão assaltadas pela retaguarda,
decepadas e feitas em pedaços. Tendo voltado ao seu corpo de
exército, Guderian desobedece e prossegue sua marcha para
frente. Kleist o afasta do comando.

Imediatamente prevenido por Rundstedt, Hitler o


readmite. Não foram necessárias três horas para decidir o conflito.

[ 167 [
Segunda Guerra Mundial - Volume I

Abandonados a si mesmos, os defensores do Vence lutam


ainda durante todo o dia 15. As Panzer devem entregar-se
completamente à luta, pedindo incessantemente o apoio dos
Stukas para quebrar os ninhos de resistência. O Horgne é
defendido até as 17h pelo 2° Corpo de Cavalaria argelino e pelo 2°
Corpo de Cavalaria marroquino, que não tem mais que um único
canhão de 25. Chagny, inteiramente em chamas, é defendida até as
19h pelo 8° Corpo de Caçadores. Baalons e Bouvellemont
resistem até a meia-noite; depois, os restos do 152° RI furam o
círculo inimigo e vão alcançar o 11° Corpo de Couraceiros, que
ainda luta em Jouvel. Contraste extraordinário: tanto heroísmo no
Vence, depois de tanta covardia no Mosa. Mas são, por uma justa
severidade, as imagens da covardia que subsistirão.

No dia 16 de manhã, Guderian está de novo nas estradas.


A abertura está feita. Cessou toda resistência organizada. Os
homens alcançam, a 80 km por hora, longas colunas de fugitivos.
Manda-se que eles atirem à estrada as armas que lhes restam; os
tanques as esmagam. Indica-se aos homens o local da prisão para
onde devem seguir. Depois, o turismo militar recomeça, com os
homens de boina preta, peito nu, em cima das superestruturas dos
tanques, bronzeando-se ao sol, tocando gaita, anestesiando sua
fadiga com a embriaguez da vitória. Um quarto de século mais
tarde, restarão inúmeros alemães grisalhos para dizer que jamais
conheceram plenitude de vida comparável àquela de maio de
1940... Ma eles pagarão caro por isso.

O desmoronamento do 9° Exército

No Mosa, ao norte de Sedan, a situação não deixa de ser


estranha durante todo o dia. As colunas blindadas lançadas em
todas as estradas das Ardenas atingem o rio em momentos
variáveis, segundo a importância dos obstáculos que encontram.

[ 168 [
Segunda Guerra Mundial - Volume I

Como Rommel vigia, cada divisão ataca ao chegar, onde pode,


como pode, atirando seus homens à água, em balsas pneumáticas,
em tábuas, em feixes de palha, e mesmo a nado. Várias zonas
ainda estão calmas, especialmente o setor da 6ª DI francesa, em
posição recíproca com Fumay. Em outros lugares, os ataques
alemães são brutais incursões em faixas estreitas, passagens de
ardente energia sucedendo a preparações aéreas ensurdecedoras.
No setor da 5ª DIM o Mosa é atravessado na altura de Yvoir, pela
5ª Panzer; no setor da 22ª DI, na altura de Chooz, perto de Givet,
pela 6ª Panzer. O Comando francês imaginara uma tentativa de
investida sob a forma de uma grande operação “organizada”. Mas
o inimigo não respeita os precedentes de 1918. A frente
desmorona debaixo de uma sucessão de golpes improvisados. Na
sua cabeça-de-ponte, Rommel recomeça o combate desde o
amanhecer. Mas não consegue fazer passar para a margem
esquerda mais que uma quinzena de tanques e o máximo que pode
realizar logo de início é manter escaramuças na bacia de Houx,
esperando a lenta chegada dos reforços. Para a sua felicidade, as
reações francesas são fracas e desordenadas. Chegando ao campo
de batalha depois de fatigante marcha noturna, várias unidades se
deixam dispersar sem resistência. Enviadas para executar o contra-
ataque cuja ordem fora reiterada na véspera, duas companhias de
H 35 não encontram, mais uma vez, a infantaria a quem deveriam
acompanhar. Os tanques retrocedem, e ainda GVC são dispostos
em cordão defensivo ao longo da estrada de Philippeville a Dinant.

A pressão de Rommel acentua-se à medida que novos


meios lhe chegam. O coronel Von Bismarck, comandante do 7°
Regimento de Fuzileiros, toma Onhaye. O coronel Rothenburg,
comandante do 25° Regimento de Panzer, chega em auxílio.
Rommel está montado num Pz K3 quando um golpe direto, vindo
de um ângulo do bosque fê-lo precipitar-se num barranco. E ele
sai “de quatro” do seu tanque, com o rosto lacerado por uma

[ 169 [
Segunda Guerra Mundial - Volume I

explosão, como um general do Império livrando-se de um cavalo


morto sob seu corpo. No mesmo instante, uma carga da aviação
alemã varre a estrada de Dinant a Philippeville, atravancada de
parelhas de artilharia: os cavalos atrelados rompem as trelas e,
misturados aos cavalos de montaria, de um regimento de cavalaria,
galopam em todas as direções, loucos de pavor. E, no entanto,
contra o arrojado Rommel, forma-se uma ameaça: a 1ª Divisão
Couraçada acudiu... À noite, uma ordem preparatória a alertou:
considerar uma transformação de missão e uma intervenção em
favor do 9° Exército. Ao meio dia, a ordem preparatória torna-se
ordem de execução. Ponto de direção: Florennes, com a
determinação de atirar ao Mosa os blindados que o atravessaram.
A distância não é grande: 30 km. Se Brineau fosse um verdadeiro
general de tanques, subiria num de seus B1 e atiraria sua divisão
diretamente na contenda. A batalha ainda está em equilíbrio
instável. Quem sabe a reviravolta material e psicológica que poderá
provocar o aparecimento súbito de 200 mastondontes de aço?

Mas Brineau não é Rommel. Brineau é um general da


escola francesa, para quem um contra-ataque “se organiza” num
quadro de comando claro e rígido. Bruneau procura o General
Martin, que comanda o 11° Corpo, para se opor às suas ordens;
depois, busca um telefone, para pedir ao General Corap que
modifique as ordens do General Martin; em seguida, volta a
procurar o General Martin, que, tendo escapado de seu PC de
Florennes, continua desaparecido. Nesse meio-tempo, seus
batalhões de tanques chegam à base de partida, em perfeito estado
material e moral. Mas a gasolina é escassa nos reservatórios e
ninguém sabe onde se encontravam os caminhões-tanque. Jamais
alguém chegará a descobri-los, apesar dos inquéritos que serão
feitos depois da guerra. Jamais alguém chegará a explicar como a
melhor divisão blindada do Exército francês se lançou para frente
sem que seu chefe se tivesse preocupado com a idéia de fazer

[ 170 [
Segunda Guerra Mundial - Volume I

seguir seu combustível. Para compreender isso, é preciso penetrar


nas idéias que quatro dias de Blitzkrieg não bastaram para dissipar:
frente contínua, retaguardas organizadas, circulação livre, margem
de tempo...

A noite chegou. Brineau procura de novo Martin ainda


desaparecido. As equipagens, sempre confiantes, vigiam ou
dormem junto de seus tanques bem camuflados nos bosques.
Flavion, Corenne, Florennes são grandes auréolas rutilantes.
Cessou o ruído da batalha. Alguns comandantes de unidades
conseguem encher o tanque de seus veículos desencavando
gasolina comum em desafio às regras sagradas para as quais os
tanques só andem com gasolina de aviação. Mas os oficiais
enviados em busca dos caminhões-tanque voltam, desesperados -
ou não voltam... E no entanto, às 5h da manhã, vem-se dizer ainda
uma vez ao general que sua divisão está completamente intacta,
com um tanque apenas fora de serviço, devido a um enguiço.
Rommel atacou, Rommel venceu apresentando o flanco a 7.000
homens de elite e a 5.000 toneladas de aço. É agradável ser um
general alemão em 1940!

Enquanto a 1ª DCR espera, o 9° Exército se desmorona. A


batalha do Mosa atinge o fim.

Às 19h, os nervos do comandante do 11° Corpo baqueiam.


As notícias que lhe chegaram são terríveis. Por toda parte as
brechas estão alargadas. A 18ª DI desagrega-se. A 22ª põe-se em
fuga, precedida por seu chefe. As retaguardas assumem aspecto de
derrota: carretas de artilharia, ambulâncias, veículos de parque
isolados, voltando às costas para o leste.

[ 171 [
Segunda Guerra Mundial - Volume I

O General Martin só vê um único meio de salvar o Corpo


de Exército: fazer um recuo estratégico. Ordena um retrocesso na
linha Florennes-Philippeville-Marienbourg. E, enquanto outras
ordens não chegam nunca aos seus destinatários, aquela voa.

Erro fatal. A única oportunidade de salvar alguma coisa do


11° Corpo é fixar as tropas dentre as quais algumas lutavam com
coragem. a ordem de retirada desfaz todos os nós que ainda se
mantêm. Como a 55ª e a 71ª DI em Sedam, na véspera, a 18ª e a
22ª deixam de existir. Nenhum elemento se deteria na posição de
recuo, uma simples estrada, prescrita por Martin. O comandante
da 18ª DI procurará em vão um retalho de sua divisão, e depois
prosseguirá sua inútil busca em todas as estradas da derrocada e,
finalmente, tomará a decisão de retornar a Paris, para informar ao
Ministro que, tendo partido com 15.000 homens para a guerra,
ficou sozinho.

Outros generais julgarão mais honrado fazer-se matar:


Bouffet, que comanda o 2° CE, Thierry d’Argenlieu, irmão do
futuro monge-almirante, Augereau, chefe das forças aéreas do
Exército. Destruído seu último avião, ele irá reunir-se aos
combatentes e morrerá, com o fuzil na mão, defendendo a
Prefeitura do Catelet.

Em Vervins, QG do 9° Exército, a ordem de retirada do


11° CE provoca viva surpresa e violenta cólera. Cólera e surpresa
sobem de tom ao se elevarem até o escalão do Grupo de
Exércitos. Corap mantém com Billotte uma estridente conversa
telefônica, em que responde de maneira soldadesca à reprimenda
por ter perdido a linha do Mosa. No dia seguinte, ele será
substituído na chefia de seu exército pelo General Giraud. Depois,
com uma injustiça que as circunstâncias desculpam em parte, Paul
Reynaud o considerará o bode expiatório do desastre.

[ 172 [
Segunda Guerra Mundial - Volume I

Depois de terem censurado Martin, Corap e Billotte o


imitam. No dia 15, às 2 h da manhã, todo o 9° Exército recebe
ordem de se movimentar, para instalar-se na linha Marcinelle (nos
arredores de Charleroi), Clerfontaine, Marienbourg, Rocroi, Signy-
l’Abbye. Ali irá bater-se com derradeira determinação, sem espírito
de recuo.

Vãs palavras sonoras! Para as tropas tão enfraquecidas, é


muito mais difícil retirar-se em ordem do que morrer no mesmo
lugar. Tudo se desarticula, tudo desmorona. A 5ª DIM, toma seus
caminhões e volta para a França. A 1ª DCR, pregada ao chão pela
falta de gasolina, é totalmente destruída.

A 61ª DI pulveriza-se. A 4ª DINA refaz em sentido


inverso a marcha forçada da véspera e desaba de fadiga.
Philippeville e Clerfontaine não fazem mais que um simulacro de
resistência. Rommel ataca as duas localidades e apodera-se delas
ele próprio. Em Philippeville, manda reunir alguns oficiais
franceses que acabam de render-se, mas lhes dá as costas quando
eles lhe pedem permissão para conservar suas ordenanças e
recuperar suas cantinas. Às vezes, trava-se um combate contra
tanques ou carros antitanques, mas termina rapidamente com o
aniquilamento dos focos de resistência.

Postos pela primeira vez à disposição da 7ª Panzer, os


Stukas caem do céu sobre o inimigo, depois tornam a subir,
uivantes, seguidos pela detonação ininterrupta de suas bombas.
Imensas colunas de poeira materializam a marcha dos
destacamentos blindados que desenvolvem velocidade de 60
km/hora no meio de um inimigo em debandada. A batalha torna-
se uma caçada.

[ 173 [
Segunda Guerra Mundial - Volume I

O mais estranho é que aquele 15 de maio de derrota é um


dia de otimismo nos QGs franceses. Do gabinete de Georges, um
telefonema ao gabinete de Gamelin faz balanço cor-de-rosa:
“Nada de importante... Pequena infiltrações em Mézières-
Charleville... Obstrução em Sedan... O ataque parece bloqueado...
Todos os prisioneiros assinalam a fadiga das tropas alemães...”.
Em Vervins, no gabinete de Corap, as notícias da frente ainda são
consideradas “bastante tranquilizadoras”: o 2° e o 11° CE retiram-
se “em boa ordem” e se instalam na linha de resistência. Uma
síntese feita durante a noite em La Ferté-sous-Jouarre deixa
transparecer a confiança: “O dia 15 parece marcar uma calmaria.
Nossa frente abalada se restabelece pouco a pouco...”. Para os
espíritos militares franceses, um esforço como o que o inimigo fez
desde o dia 10, um avanço como o que ele realizou são
necessariamente seguidos de um tempo de interrupção para
reorganizar as unidades, restabelecer as comunicações, fazer seguir
a artilharia, etc. Os analistas dos QG descreveram a batalha como
Corneille descrevia os homens: como ela deveria ser, e não como
é.

Na verdade, os sublimes escalões do Comando não sabem


de nada. Todos os testemunhos o atestam. “Nós sofríamos - diz o
subchefe do Estado-Maior do 9° Exército - de uma falta total de
informações. O diário de marcha do Exército nada menciona na
data de 15 de maio”. “Dia vazio...”, relata um dos oficiais de
Gamelin em Vincennes. O rompimento definitivo da frente só
será conhecido, nesse Alto-Comando da França militar, em 16 de
maio às 11 horas, 24 horas depois do acontecido - e, ainda assim,
graças a um oficial da 2ª Região que toma a iniciativa insólita de
telefonar para GQG dizendo que o inimigo está de todos os lados.
Outro informe vindo de Vincennes atribui o enorme refluxo do
Exército francês a uma ordem proveniente de um capitão
Foulonge, que é procurado para ser fuzilado - e que não existe.

[ 174 [
Segunda Guerra Mundial - Volume I

Os grandes chefes e seus assistentes não tem uma idéia


concreta da batalha nem os elementos de informação necessários
para conduzi-la. As decisões se aplicam regularmente a situações
ultrapassadas. O fracasso do Comando é total. Foi preparado para
uma guerra de trincheiras. E não tem sequer a destreza e a rapidez
das duas extremidades móveis da guerra precedente: 14 e 18.

Em Vervins, na tarde de 15, Giraud substitui Corap. Suas


primeiras ordens são draconianas: resistir em toda a parte sem se
mover, inclusive nos postos de comando dos generais, que não
devem ser evacuados sob nenhum pretexto. Ele próprio, general-
de-exército, conta transportar-se ao nível dos chefes de batalhão,
onde, diz, “uma batalha como essa que se trava deve ser dirigida”.
Ele o fará, de quepe bordado, com sua bandeira esvoaçante no
carro, até o momento em que, com o revólver no peito, deverá se
render como um soldado de linha.

Mas um boato se propaga no QG consternado. É o


subchefe do Estado-Maior, Véron, quem o traz ao novo
comandante do 9° Exército: os blindados alemães estão em
Montcornet (Aisne), a 20 km de Vervins, a meio caminho entre o
Mosa e o Oise, na estrada de Laon e Paris! Giraud se aborrece. É
absurdo! É impossível! É um boato de quinta-coluna! Proíbe que
lhe falem isso. Manda acabar com essas mentiras derrotistas. Luta-
se no Bar, a 15 km de Sedan, onde, sob as ordens do General
Touchon, um novo exército, o 6°, acaba de entrar em linha. E vem
dizer-se que os blindados alemães estão em Montcornet...

Infelizmente, estão... Contida por um instante numa região


de Monthermé, a 6ª Panzer abriu finalmente uma brecha e avança
até a pequena cidade cuja tomada marca a derrocada definitiva da
frente do Mosa.

[ 175 [
Segunda Guerra Mundial - Volume I

Vindo de Sedan, Guderian chega lá um pouco mais tarde,


sendo acolhido na praça principal pelo General Kempf, que se
adiantou a ele. Das casas vizinhas saem centenas de prisioneiros
estupefatos.

A decisão que se toma a 16 de Maio

O dia 15 de maio é decisivo. Marca a primeira grande


virada da guerra. Condiciona o que será, por muitos anos, o drama
francês.

Não se permite nenhuma ilusão. Fica demonstrado aquilo


que alguns espíritos suspeitavam, a diferença da natureza entre o
Exército alemão e o Exército francês. Quando dois exércitos são
de natureza idêntica, a inspiração do Comando, a energia da tropa
e até a sorte podem decidir sobre o desfecho de uma batalha.
Quando dois exércitos são de natureza diferente, já é difícil
modificar-se o desenrolar dos combates; bem mais ainda, o seu
resultado. Em 1940, nada podia salvar o Exército francês. Se
Gamelin não houvesse entrado na Bélgica, se Georges tivesse
defendido melhor as Ardenas, as condições e a duração da luta
teriam sido diferentes, a dificuldade e as perdas alemãs teriam sido
mais pesadas, mas o resultado teria sido o mesmo. Se Bruneau e
Brocard houvessem sido chefes inspirados, as ocasiões perdidas de
Sedan e Dinant ter-se-iam tornado brilhantes episódios da história
militar, mas está fora de dúvida que a capacidade de manobra das
Panzer e a superioridade da Luftwaffe teriam restabelecido a
situação em favor da Wehrmacht.

Esta poderia ser atropelada, perturbada, forçada a entregar-


se completamente à luta; mas não poderia deixar de vencer.

[ 176 [
Segunda Guerra Mundial - Volume I

Na noite de 15 de maio, depois de seis dias de batalha, fica


decidido que o Exército francês não pode resistir numa frente
contínua nem replicar bastante rapidamente para contrapor-se à
prodigiosa mobilidade alemã. Em outras palavras, sua destruição é
inevitável e fatal a invasão da totalidade do território nacional.

Contra tal evidência, insurge-se o romantismo de 1914. Os


alemães chegaram a Luzarches. Os lanceiros viram o Sacré-Coeur.
O 15° Corpo fraqueja em Morhange, como o 10° Corpo acabara
de fazê-lo em Sedan. Os combatentes de calça vermelha foram
surpreendidos pela artilharia pesada, como os soldados de 1940
acabavam de sê-lo pelos Stukas. Joffre dispensou dezenas de
generais, como dispensados foram Corap, Martin, Brocard, etc.
Nem com isso a França se reergueu. Os alemães chegaram a Laon?
Ficaram lá durante quatro anos. Atingiram o Somme? Lá eles
encontrarão os campos de batalha da tenacidade francesa. A
França não desesperou no Marne. Por que se desesperará quando
seus exércitos ainda estão no Escalda?

Sentimentalmente, as razões são fortes. Militarmente, são


nulas. O Exército francês e o Exército alemão de 1914 estavam
conforme a velha expressão militar, no mesmo pé de igualdade.
Joffre, em dificuldades, tinha atrás de si o espaço necessário para
livrar-se e recobrar-se. Mas o motor reduziu as dimensões dos
campos de batalha, assim como o resto. A estratégia defensiva
consiste sempre em trocar espaço por tempo, mas o espaço está
enfaticamente desvalorizado. É preciso ser a Rússia para poder
alcançar total revide em seu próprio território. Um país de
pequena dimensão, feito sob medida para a guerra dos blindados,
como a França, não pode pensar nisso.

[ 177 [
Segunda Guerra Mundial - Volume I

A conclusão que se tirava, dessas evidências era a


impossibilidade de prosseguir no território metropolitano outra
coisa senão uma luta de duração estritamente limitada.

O único dilema realista era o seguinte: tentar chegar a um


acordo, enquanto se estava com as armas; ou decidir que não se
discutiria nunca - e, consequentemente, sem perder um minuto,
tomar todas as medidas concebíveis para prolongar a guerra além
mar. A batalha da França assumia então uma significação como
um combate de retaguarda permitindo evacuar para a Inglaterra e
para a África do Norte o máximo de homens de meios.

Talvez não fosse possível. Talvez um povo apegado à terra


não pudesse fazer o que fizeram os atenienses atacados por Xerxes
e o que teriam feito com toda certeza os ingleses se Hitler
houvesse conseguido invadir a sua ilha. Talvez a idéia de começar
a evacuação da França enquanto seus exércitos estavam ainda de
pé fosse impraticável, inadmissível ou mesmo um sacrilégio. Se é
assim, a fatalidade do armistício de junho foi crida em maio, ou,
falando de modo mais geral, resultou da natureza de um povo que
não foi feito para transportar seus altares em barcos.

Os alemães se encontravam em Montcornet. A estrada de


Paris está aberta. O GQG não tem sequer uma divisão para atirar
de través na estrada de invasão. O Governo foi prevenido de que
em algumas horas os blindados alemães podem estar à porta da
Villette. A partida dos ministros é ordenada para o dia 16, à meia-
noite. Grandes fogueiras acesas no pátio do Quai d’Orsay fazem
chover na Avenida Saint-Germain segredos diplomáticos mal
consumidos... Entretanto, nem o General Nogués, ditador militar
da África do Norte, nem qualquer dos procônsules coloniais são
informados da gravidade da situação, da possibilidade que surge
para eles de estar no dia seguinte na primeira linha. Os grandes

[ 178 [
Segunda Guerra Mundial - Volume I

chefes do Exército não são melhor preparados, como o atestará o


General Georges dizendo que só na segunda quinzena de junho
ouviu falar de uma continuação da luta na África do Norte.

No dia 16 à noite, o 41° Corpo Blindado está em


Aubenton, entre Mézières e Guisa e o 19° em Marle, a 20 km de
Lens. Rommel dá um prodigioso salto noturno, atravessa a
posição fronteiriça sob o luar, perto de Soldre-le-Château, circunda
Maubeuge, precipita-se nas estradas fantasticamente atravancada,
desperta e captura regimentos que se acreditavam a vinte léguas do
inimigo, toma Avesnes, Landrecies, Le Cateau, provoca mortal
confusão nas retaguardas do 1° Exército francês. Quando se
detém, na manhã de 17, sua divisão fez 120 km, perdeu 35 mortos
e 59 feridos, capturou 10.000 prisioneiros e 100 tanques.

Nessa mesma ocasião, Guderian atravessa o Oise e chega a


Saint-Quentin. Do lado francês, o dia 16 deve ser a grande
manobra montada pessoalmente pelo estrategista Georges. Trata-
se de fechar uma pinça mecânica atrás das Panzer. Ao norte,
Giraud assume o comando das 1ª e da 2ª DCR, reforçadas por
esquadrões de carros Somua, e atacará em direção ao sul. No sul, a
4ª DCR atacará em direção ao norte. O comandante-chefe da
frente nordeste ignora que a 1ª DCR está completamente
destruída, que a 2ª se encontra completamente desmembrada e que
o comandante de exército Giraud já não comandava coisa alguma.

Quanto à 4ª DCR, esta existe. Parcialmente e há pouco.


Seu ato constitutivo data apenas de 11 de maio. Quando seu chefe,
o coronel De Gaulle, chega ao seu PC, de Laon, no dia 15, ele está
sozinho. A primeira tropa que encontra é um grupo químico que
só tem como armamento alguns mosquetes. Ele o anexa, dispõe-
no em linha de segurança atrás do canal de Sissone e, durante o dia
16, procura e organiza os elementos postos à sua disposição para

[ 179 [
Segunda Guerra Mundial - Volume I

constituir sua divisão. O Plano Georges não lhe foi comunicado, a


vaga missão que recebeu é de ordem defensiva e, em seu lugar,
qualquer outro militar francês esperaria para esboçar uma ação de
reunião de seus meios. Mas De Gaulle “arde com seu furor sem
limites” desde que ouviu contar que os alemães estão quebrando
as armas dos soldados franceses e prosseguem sua marcha
gritando que não têm tempo para fazê-los prisioneiros. À noite, ele
faz seu discurso: “Se eu viver, bater-me-ei onde for necessário,
quanto for necessário, até que o inimigo esteja derrotado e a
mancha nacional lavada”. Portanto, ele atacará ao amanhecer, com
as forças, sejam quais forem, que lhe tenham chegado. Aliás, seu
instinto militar lhe diz que o inimigo se reforça mais depressa do
que ele e que, esperando-o, perderá.

Ao amanhecer, a 4ª DCR, ainda nada mais é que um


batalhão de carros B, dois batalhões de R 35 e um grupo de
artilharia, sem tropa de infantaria, sem uma só peça antitanque
nem uma metralhadora antiaérea. De Gaulle dirige este embrião
até Montcornet, incursão de 30 km nas retaguardas inimigas, limpa
a localidade, destrói os comboios e volta à noite com 120
prisioneiros, no meio de um carrossel de Stukas. No dia seguinte,
recomeça em direção de Marle, e, dois dias depois, na região de
Fismes, de onde Georges o chamará para, confiar-lhe outra
missão. Esses ataques, fracos demais, não detém o avanço dos
Panzer nem perturbam gravemente a manobra inimiga. Mas
mostram qual teria sido o efeito de um corpo blindado vindo no
flanco do avanço alemão e mesmo que resultados parciais teriam
alcançado as divisões couraçadas sob o comando de chefes
vitoriosos.

Nos dias 17 e 18, Paris tranqüiliza-se: a investida blindada


não se dirige para lá. A transferência do Governo é contra-
ordenada. Ouve-se falar de falso alerta e dizer que Hitler perdeu a

[ 180 [
Segunda Guerra Mundial - Volume I

oportunidade. Paul Reynaud assume a pasta da Guerra. Chama o


Marechal Pétain de sua embaixada de Madri e o General Weygand
de seu comando no Levante, um para reforçar seu gabinete como
vice-presidente do Conselho e o outro para assumir o Comando
Supremo. Em La Ferté, o General Georges estabelece uma frente
no Aisne e no canal Crozat; prolonga o 6° Exército Touchon,
ainda embrionário, por um 7° Exército Frère, ainda fictício; dá ao
9° Exército - que ele ainda acredita existir! - ordem de manter o
Sambre canalizado e o canal do Sambre em Oise; esboça uma
posição Sambre-Oise-Aisne diante da qual os blindados sem
fôlego iriam necessariamente parar. O mapa de guerra que resulta
desse plano é mais satisfatório do que o de 1914. A direita francesa
fica apoiada no Reno e algumas frações mais importantes da
Bélgica e do Norte da França são subtraídas à invasão. Mas
Georges ignora que o Sambre já foi abandonado e que o Oise já
foi atravessado.

No dia 19, o 19° Corpo Blindado alemão toma Peronne. O


41° captura Busigny. O 15° apodera-se de Cambrai. Na agreste
casa de campo dos Bondons, encantadora residência do General
Georges, surge um fantasma: Gamelin. Com a mesma mão que
escreveu a ordem do dia do Marne, ele redige num canto de mesa
uma instrução pela qual recomenda (não ordena, pois é Georges
quem comanda o Nordeste) uma ofensiva nas retaguardas dos
Panzer. Poderia também mandar tomar Berlim, a manobra que ele
indica como aquela que se esforça em vão para organizar há três
dias. Gamelin sustentará até a morte que a França teria sido salva
se Georges se tivesse conformado à sua ordem do dia 19. No dia
seguinte, 20 de maio, é Weygand que aparece em Vincennes,
alerta, apesar de seus 73 anos e de uma viagem movimentada de
dois dias. Respondendo à convocação de Reynaud, ele deixara
Beirute na antevéspera, a bordo de um bombardeio Glen Martin,
mas teve que fazer meia-volta acima de Tripolitânia, perder a noite

[ 181 [
Segunda Guerra Mundial - Volume I

em Túnis, sobrevoar o Morvan a baixa altura. Finalmente, ao


chegar a Etampes, o trem de aterragem de seu avião se quebrou e
os passageiros ficaram por um momento prisioneiros na carlinga.
À noite mesmo, depois de breve visita a Georges, Weygand aceita
o comando. Gamelin, informado de sua desgraça quando se põe à
mesa, não esconde sua surpresa. Depois de uma noite em claro, e
com uma dignidade de circunstância, ele transmite seus poderes ao
sucessor.

O General-de-Exército Máximo Weygand está em pleno


vigor físico e intelectual. Sua lealdade, sua energia, seu caráter, sua
maneira pessoal de agir, sua autoridade, seu ardente patriotismo
são indiscutíveis. Todavia, coronel dos Hussardos em 1914, chefe
do Estado-Maior de Foch durante toda a Primeira Guerra, ele
pertence a uma outra época. Antes da guerra, em dois artigos na
“Revue des Deux Mondes”, ele condenara as teses degaullistas a
respeito do corpo couraçado, e, falando num concurso hípico,
algumas semanas antes das hostilidades, ele assegurara à França
que seu Exército nunca estivera mais bem equipado e melhor
comandado.

Está consciente de que o chamaram para enfrentar uma


grave crise, para reerguer uma situação perigosamente
comprometida, e aceita nobremente, sem discussões e sem
condições, a responsabilidade que se coloca sobre os seus velhos
ombros. Mas ele está longe de ter medido o caráter desesperado
que a batalha assumiu. E mais longe está ainda de imaginar - e Paul
Reynaud não lhe fala disso - que seja possível transportar para um
quadro extra-europeu uma guerra perdida na França. Para esta
tarefa, para esta visão, não é Weygand, mas De Gaulle que é
preciso. Exatamente no momento em que Weygand assume o
comando, levam a Hitler a notícia decisiva: Abbeville foi tomada, a
Mancha atingida, 45 divisões foram cercadas nas Flandres. “O

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