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7 de Junho a 31 de Julho de 1944

Hitler não está morto!


Tópicos do capítulo:

Ao amanhecer de 7 de junho, os Aliados consolidam suas posições


Ofensivas aliadas contra Caen e Carentan
13 de junho: as V1 caem sobre Londres
Cherburgo ameaçado
Rommel contra o massacre de Oradour
O mau tempo retarda os Aliados
Libera-se Cherburgo
Kluge substitui Rundstedt no Oeste
Os pântanos detêm a ofensiva de 3 de julho
9 de julho: tomada de Caen
Está pronta a bomba destinada a Hitler
O Coronel Von Stauffenberg prepara o atentado
A conjuração
Rommel ferido em Bernay
Saint Lô é libertada
20 de julho: a explosão poupa Hitler
Falha o complô: encontro Hitler-Mussolini
Recusa de Kluge. Suicídio de Stülpnagel. A repressão
No Cotentin, os bombardeiros aliados rompem o front
29-30 de julho: libertadas Coutances e Avranches

Fiasco

O sol se levanta. A batalha se reanima. Trata-se, para os Aliados, de consolidar e unir as cabeças-de-ponte e,
depois, atingir o mais rápido possível a linha que esperavam alcançar na véspera à noite.

Trata-se para os alemães, de repelir os invasores antes que estes tenham tempo de alargar a brecha que
acabam de fazer nas defesas do Continente. No Cotentin, novo esforço é dirigido contra Sainte-Mère-Eglise.
Mas os velhos reservistas do 1.058 o RI debandam, ao verem surgir uns 60 tanques americanos. O General
Von Schlieben precisa acorrer pessoalmente à frente para impedir a fuga. O 795 o Batalhão de Osttruppen, ao
sul de Sainte-Mère, ouve um ex-coronel do Czar que lhe promete um suave cativeiro e se entrega como um
só homem. Uma unidade de elite, um batalhão do 6 o Regimento de Fallschirmjäger (pára-quedistas), é
totalmente capturada, com exceção de 25 homens que conseguem alcançar Carentan. A má qualidade e o
baixo moral das tropas alemães que aparecem nestas fraquezas inquietam o Comando e suscitam a cólera e a
desconfiança de Hitler.

A resistência da 352a Divisão de Infantaria alemã, na praia de Omaha, diante do 5 o Corpo americano,
esgotou-se na noite do dia 6. O General Kraiss, desobedecendo as ordens de Hitler, envia para a retaguarda
os remanescentes da divisão, para evitar sua destruição total. O avanço aliado é mais rápido no próprio setor
onde os alemães acreditavam poder repelir a invasão. A junção com os ingleses é feita no dia 8, em Port-en-
Bessin. Isigny é tomada no mesmo dia e, no dia seguinte, uma vanguarda da 22 a DI americana, novamente
desembarcada, avança até a pequena estação de Lison, a 12 km de Saint-Lô. O PC do 84 o Corpo alemão
muda-se precipitadamente a e vai instalar-se em um velho seminário, na estrada de Coutances, pronto para
mudar outra vez de lugar.

Entretanto, o Comando americano está inquieto. Desde os primeiros passos, a invasão encontra um gargalo.
Somente quatro quintos dos 107.000 homens, apenas metade dos 14.000 veículos e unicamente um quarto
das 14.500 toneladas de provisões que deveriam estar desembarcadas nas praias o estão durante os dois
primeiros dias. O inimigo em nada contribui para esta falha, nas previsões logísticas. Alguns fracos reides
noturnos causaram poucos estragos; três pobres destróieres, que saíram corajosamente da Gironda para
atacar a frota de invasão, são despedaçados; os submarinos e as vedettes torpedeiras são mantidos à distância
respeitosa, mas a transformação de praias, que somente e sempre serviram para banhos de mar, em cais de
desembarque apresenta mais dificuldades ainda do que se tinha imaginado. Inicia-se precipitadamente a
construção dos portos Mullberry em Arromanches e em Omaha.

No dia 7, por ocasião de uma primeira visita às praias, Ike deu ordem para passar para primeiro lugar, como
objetivo principal e urgente, a junção dos corpos 7 o e 5o, o que significa a tomada de Carentan. Os alemães
não tiveram qualquer trabalho para imaginar o que a atividade americana anunciava nesta região: o
Ostbataillon n° 439 capturou, em Fontenay-sur-Mer, no corpo do Beachmaster (capitão comandante dos
serviços administrativos da praia) de Utah, morto na sua barcaça de desembarque, o plano de operações do 7 o
Corpo: isolamento do Cotetin e conquista de Cherburgo. Rommel decide, em conseqüência, lutar por
Carentan. Devidamente autorizado por Hitler, chama do Anjou e da Bretanha a 17 a Pz Gr SS, a 3a Divisão de
Pára-quedistas, as 77a e 365a DI, bem como um grupo misto das 375a . Estas tropas tomam posição ao leste de
Saint-Lô, reunidas ao 2o Corpo de Pára-quedistas.

No entanto, qualquer movimentação do 15 o Exército está - rigorosamente proibida. Hitler se opõe,


igualmente, ao retorno, para o continente, da guarnição das ilhas Anglo-Normandas, onde a 319 a DI, uma
brigada de DCA e um regimento de carros blindados, perfazendo um total de 35.000 homens, vivem em uma
tranqüilidade de férias. Cansado da insistência de Rommel, acaba proibi-lo de voltar a falar no assunto.

A aviação aliada tem o que dizer sobre o envio dos reforços alemães. Quinhentos bombardeiros colocam fora
de uso a rede ferroviária, destruindo os entroncamentos de Alençon, Mayenne, Rennes, Fougères,
Pontaubault, etc., e fecha, com a ajuda de bombas de 6 toneladas, o túnel de Saumur. A Resistência bretã
realiza, então, importantes sabotagens de um lado e outro de Rennes. Como exemplo, eis aqui a história do
Kampfgruppe Heintz, da 275a DI: embarca em Redon, no dia 6, em 14 comboios: 12 devem ser
descarregados entre Redon e Fougères, por causa da interrupção das linhas; o 13 o deverá sê-lo em Ponterson
e o 14o alcançará Folligny apenas para ser pulverizado por um ataque aéreo. Os reforços dirigem-se à
Normandia em marcha noturnas forçadas. Aparecem ali com atraso de muitos dias.

Quando o 2o Corpo de Pára-quedistas toma posição, é tarde demais para defender Carentan. A 101 a Airbone
tomou a cidade no dia 11 de junho. O Major Von der Heydte, tendo fracassado em cumprir a ordem de
defender a cidade até a morte, somente escapa da vingança de Hitler graças à glória de que se cobriu em
Cassino.

O General Erich Marcks, para retomar Carentan, decide comandar pessoalmente um contra-ataque. No
momento em que deixa o PC, o chefe de seu estado-maior, o Coronel von Criegern, respeitosamente o
censura por expor-se demais. Marcks lhe responde que, doravante, o único destino digno de inveja, na
situação em que a Alemanha se encontra, é uma morte de soldado. Minutos depois, Criegern e seus oficiais
ouvem o tiro característico de um Typhoon. Um dos generais alemães mais capazes e um daqueles a quem
Hitler honrava com um ódio especial, não mais existe. Seu sucessor, Fahrmbacher (substituído, dias depois,
por Von Choltitz), tenta, por sua vez, reconquistar Carentan. Fracassa.

Nos setores britânicos, os dias 7, 8 e 9 de junho, viram a fusão das cabeças-de-ponte, a redução das ilhotas de
resistência - com exceção da de Douvres-la-Délivrande, que ainda resiste - e a tomada de Bayeux,
miraculosamente intacta. Em compensação, em torno de Caen, chave estratégica da Normandia, os
progressos são extremamente difíceis. O setor compreendido entre o Dive e o Seulles, destacado do 8 o
Exército alemão, está a cargo do Grupamento Blindado West, sob o comando de Geyr von Schweppenburg.
Hitler lhe dá ordem de jogar os ingleses ao mar.

Mas Geyr começa mal. Seu QG é coberto por um tapete de bombas, no momento em que ele acaba de se
instalar no Castelo de Caine, a 30 km de Caen. Salva-se com uma forte comoção, mas o chefe de seu estado-
maior, Ritter und Edler von Dewans, é morto com todos os oficiais. Desorganizado na cabeça, o grupo
blindado é igualmente batido nos membros. As Panzer só chegam ao campo de batalha com um grande
atraso e pesadas perdas. Combatem por frações e, em lugar do grande contra-ataque ordenado por Hitler,
devem consagragar-se a ingratas missões defensivas contra um adversário que, no quinto dia de invasão,
superou a vulnerabilidade do primeiro instante.

Montgomery imaginou, para tomar Caen, uma manobra envolvedora. O 1 o Corpo avançará, pela margem
direita do Orne, até Cagny, a sudeste da cidade. O 30 o Corpo, com a 7a Divisão Blindada, partirá da região
de Bayeux, tomará Tilly-sur-Seulles, Villers e Noyers-Bocage e, descendo pela esquerda, conquistará as
alturas de Evrecy, ao sudoeste de Caen. O último ato do cerco consistirá em lançar no intervalo entre Cagny
e Evrecy a única divisão aerotransportada que não foi utilizada no dia 6 de junho, a First British Airbone. Ela
espera, na Inglaterra, inteiramente pronta. No dia 10, um ataque alemão e um ataque inglês são desfechados
ao mesmo tempo, ao sul de Bayeux. O ataque alemão fracassa. O ataque inglês é apoiado ainda pelos
canhões de 16 polegadas do Nelson, que, adernando para aumentar o alcance das peças, chega a atirar a cerca
de 30 km. O bocage - terreno coberto de bosques, característico da Normandia - é completamente estranho
para a 7a Armoured, os “Ratos do Deserto”, cuja experiência de guerra foi adquirida nas planícies rasas da
Líbia. Entretanto, a tropa progride rapidamente, a cavaleiro na estrada de Bayeux a Tilly, e, no primeiro dia,
perde apenas 4 carros blindados. No dia seguinte, muda o aspecto do combate. Toda a Pz Lehr, comandada
por Bayerlein, veterano da campanha da África, está escondida nos bosques, do leste de Tilly até o norte de
Villers. Os granadeiros se escondem nas sebes em torno de armas antitanques. Os carros blindados se
transformam em moitas e ficam à espreita, prontos para atirar e fugir. A melhor das divisões blindadas
alemães adotou uma tática de chounas, de guerrilhas, feita de paciência e de emboscadas. Os enxames de
Jabos, procuram alvos, encontram alguns, por vezes fazendo de um valado um lugar de morticínio. No
entanto, de um modo em geral, a espessa verdura normanda lhes esconde a caça.

Todo o dia 11 se escoa em combates parciais. A 7 a Armoured somente penetra em Tilly para ser repelida por
um contra-ataque. A situação é ainda mais desfavorável a leste do Orne. Os campos de batalha da grande
noite de 5 para 6, Breville, Amfreville, Ranville, tornam a ver soldados alemães rechaçando os ingleses para
o mar. O excelente tiro dos navios quebra estes retornos ofensivos.

Enquanto estas ações se desenrolam na zona britânica, os americanos da praia de Omaha tem diante de si
apenas os vencidos de 6 de junho. Comprimindo o flanco esquerdo para cobrir Saint-Lô, os destroços da 352 a
Divisão deixam, à direita, um vazio profundo. Rommel esperava preenchê-lo com os reforços vindos da
Bretanha, mas os acontecimentos de Carentan os monopolizaram no Cotentin. Só era preciso, para Gerow,
lançar-se na abertura e ultrapassar, ao mesmo tempo, Saint-Lô e Caen. Mas ainda não tinha soado a hora da
audácia americana.

O 5o Corpo contenta-se em ocupar a floresta de Cerisy e avançar prudentemente para Balleroy e Caumont-
L’Eventé.

Quem cuida de utilizar a brecha para contornar a oeste a porta de Tilly é o General Buchwall, comandante do
30o Corpo britânico. A 7a Armoured desloca-se para a direita, travessa o Aure e contorna o ferrolho defensivo
alemão. Surge, no dia 13, nas cristas de Villers-Bocage, entra na localidade e, tendo atravessado a cidade,
avança na estrada de Caen. Bayerlein está preso pela retaguarda!

É então que acontece uma reviravolta dramática da sorte. A vanguarda da 7 a Armoured, que consistia de uma
esquadrão londrino de Sharpshooters (atiradores peritos), pára no marco 213, na estrada de Caen, acima do
vale encaixado do Odon. Ninguém vê surgir um destacamento de 5 Tigres, que, desfilando ao longo da
coluna surpresa, como couraçados diante de uma linha de fragatas, incendeia todos os veículos: 25 tanques,
14 caminhões blindados, etc. Outros carros blindados alemães atacam a extremidade oriental de Villers-
Bocage e repelem o 8o e o 11o regimentos de Hussardos. Os intrusos que acabam de empanar o brilhante
sucesso dos “Ratos do Deserto” pertencem à 2 a Pz, colocada à disposição do Grupo Geyr por uma tardia
decisão de Hitler. Ela vinha da região de Beauvais, somente se deslocando de noite e tendo atravessado o
Sena nas pontes de Paris: assim, a divisão escapou da vigilância da aviação aliada. Devia, no dia 13 de junho,
reparar seu material, mas o Obersturmfuhrer Wittman e o Hauptsturmfuhrer Mödin descobriram os ingleses
onde eles não deveria estar e, espontaneamente, atacaram. O General Von Lüttwitz sustentou-os com todos
os elementos disponíveis de sua divisão.

Villers-Bocage está perdida. Erskine, o comandante da 7 a Armoured, aproveita a noite e diminui os estragos,
retirando-se para as alturas de Tracy-Bocage. No dia seguinte, a atividade da aviação, o apoio da 1 a DI
americana e os ataques da 50 a DI britânica contra Tilly restabelecem um pouco a situação. Mas novos
indícios de concentrações alemães determinam que Montgomery retire a 7 a Armoured de uma posição muito
arriscada. Ela sai na noite de 14 para 15 e retira-se para Livry, com o barulho da retirada coberto pelo alarido
de 300 bombardeiros pesados. A ofensiva de Caen, tanto no oeste como no leste do Orne, é abandonada.
Bombas voadoras sobre Londres

No dia da refrega de Villers-Bocage, o início da ofensiva das V1 falhava na Alemanha. Os primeiros disparos
deveriam ocorrer no dia 12, 20 minutos antes da meia-noite, mas as inspeções feitas nos sítios de lançamento
acusaram dificuldades que o oficial responsável, o Coronel Watchel, modificou a hora H. Às 3h30 do dia 13
de junho, ele não ousou tomar a responsabilidade de retardar mais tempo a entrada na História da arma
impacientemente esperada pelo seu Fuhrer: 500 engenhos estavam nos lugares, perto de 54 rampas
terminadas; somente 10 puderam ser lançados, 5 explodiram na decolagem, um sexto caiu na Mancha e, dos
quatro que atravessaram a costa inglesa, somente um atingiu Londres, onde matou seis pessoas em Bethnal
Green. Watchel e seu superior, o General Heinemann, escaparam por pouco da decepção de Hitler.

A trégua dos londrinos é breve. O lançamento é retomando no dia 15 e, no dia 16, ao meio-dia, 244 mísseis
são lançados. Destes, 144 caem na Inglaterra, dos quais 73 na Grande Londres. O sistema de direção
automática é rudimentar, a impressão é muito grande, engenhos se perdem em Norfolk, mas a deflagração é
poderosa e os estragos são muito importantes. Londres, desde 1941, tinha saído praticamente da guerra
aérea: esta volta e é um choque doloroso. A alegria e o espírito de desafio que tinham, psicologicamente,
colocado em xeque a Blitzkrieg de 1940, não se observam nesta nova provocação. A Inglaterra está cansada
e, como nota Churchill, a natureza impessoal da nova arma produz um efeito deprimente.

O setor de Caen, na Normandia, se acalma, mas a ofensiva para Cherburgo se desenvolve. Toma duas
formas: uma ofensiva direta para norte e um movimento de leste para oeste, para cortar em dois a península
do Cotentin.

A ofensiva direta se choca com a posição de Montebourg, avançada da defesa terrestre de Cherburgo. A
bravura e a iniciativa de um simples soldado, Ralph Riley, permitem conquistar a bateria de Azeville, mas, as
baterias de Crisbecq e de Queneville resistem a assaltos repetidos. Os objetivos do dia 6 são alcançados
apenas a 13 de junho.

A ofensiva para oeste encontra primeiro as inundações do Merderet. O riacho insignificante está
transformado em uma barreira aquática e lamacenta de 2.000 a 3.000 m de largura. Restam somente três
pequenos encraves da tentativa da 82 a Airbone para estabelecer uma cabeça-de-ponte na noite de 5 para 6,
defendidas pelos coronéis Millet, Timmes e Shanley. Algumas centenas de pára-quedistas do 507 o e do 508o,
amontoados como ouriços, esperam que o grosso do 5 o Corpo, tendo limpado a região de Sainte-Mère-
Eglise, venha levantar o bloqueio a eles imposto.

No dia 8, à noite, dois soldados descobrem que é possível atravessar a inundação, utilizando um caminho
subterrâneo perto do povoado de La Fière. Por este itinerário precário, um batalhão do 325 o Regimento de
Planadores vai reunir-se ao Destacamento Timmes, mas, no momento em que este reforço toma posição, o
Destacamento Shanley se rende e a ação imaginada para conquistar a margem ocidental do Merderet termina
em um fracasso. Ridgway decide, então, forçar a passagem, atacando na Estrada Departamental n° 15, que se
eleva acima da inundação. Este campo de batalha com 5 metros de largura assiste a uma intensa ação de
carros blindados e de infantaria, conduzida pelo adjunto de Ridgway, o Brigadeiro-General James Gavin. O
povoado de Cauquigny, as aldeias de Motey, de Amfreville, de Gueutterville são conquistadas. O Marderet,
que associou seu nome a uma das batalhas decisivas da história, desaparece do relato das operações. O
objetivo seguinte é Saint-Sauveur-le-Vicomte, pequena cidade de 2.000 habitantes, na margem direita do
Douve. Collins dá ordem para tomar posição a uma divisão fresca, a 90 a, recrutada no Texas e no Oklahoma,
mas espera-o uma pungente decepção. A 90 a, “uma divisão problema”, como diz Bradley, não entra em
combate. O primeiro batalhão empregado foge e aqueles que se tenta fazer avançar em seu lugar se colam ao
solo. Collins substitui do comando o General MacKelvie e dois coronéis, mas estas sanções não são
suficientes para dar o menor valor combativo a uma grande unidade amedrontada. Deverá ser substituída
pela 9a DI ao preço de um grande atraso. No dia 12, o 7 o Corpo ainda não alcançou a linha que deveria ter
ocupado no dia 6.

No dia 13, em compensação, parte da resistência alemã se desmorona diante da 82 a Airbone, na ala esquerda
do ataque. Os pára-quedistas tomam Pont-L’Abbé, arrasada até o chão. No dia 16, entram em Saint-Sauveur,
da qual os alemães fogem desordenadamente. À direita, a 9 a DI progride rapidamente. Atravessa o Douve,
em Néhou, e, no dia 17, lança uma coluna na estrada de Carteret, que alcança a costa ocidental do Cotentin,
em Barneville-sur-Mer. Cherburgo está isolada.
Rommel tinha proposto a evacuação da península. Hitler proibiu-a, o 84 o AK deve dividir-se em dois. O
Grupamento Hellmich defenderá a base do Cotentin e o Grupamento Von Schlieben, compreendendo a 109 a,
a 91a, a 243a e a 77a divisões de infantaria, defenderá o vértice. Assim, quatro divisões são levadas à
destruição para retardar por uma semana a queda de Cherburgo.

Rundstedt e Rommel, nesta fase da batalha, são convocados bruscamente a Margival, perto de Soissons, com
os seus chefes de estado-maior. Em 1940, aí foi construído um PC cimentado, de onde o Fuhrer esperava
dirigir a invasão da Inglaterra. Pela primeira vez, ali está Hitler, para examinar com dois marechais os
problemas oferecidos pelos outros invasores. Rundstedt, Rommel, Blumentritt e Speidel encontram-no
macilento, envelhecido, divertindo-se morbidamente com uma quantidade de lápis de cor. Apenas ele se
senta, deixando os dois marechais em pé, como se fossem dois acusados. Declara-lhes que o exército do
Oeste se “deixou surpreender dormindo” e que o inimigo já estaria jogado ao mar se não fosse a moleza dos
chefes e a covardia das tropas. O que tem a dizer e a propor os dois marechais responsáveis?

Rundstedt cede a palavra a Rommel. Este defende suas tropas, sublinha a valentia de sua luta desigual, torna
a pedir a retirada do Cotentin e o abandono de Caen, declara-se convencido de que, doravante, o
desembarque normando constitui o principal esforço aliado, e propõe, como conseqüência, o reforço da
frente da Normandia com a maior parte do 15 o Exército. Hitler contradiz agressivamente. Exige que
Cherburgo seja defendida até a morte. Constata que 80 divisões inglesas e americanas (avaliação errônea do
Serviço da Abwehr (contra-espionagem) se encontram na Inglaterra; que apenas 20 desembarcaram na
Normandia; que é preciso cuidar da irrupção das outras na costa do Passo-de-Calais; que assim, é impossível
tocar no 15o Exército. As tropas que travam a batalha da cabeça-de-ponte devem sustentá-la com seus
próprios meios. Aproxima-se o momento em que a Inglaterra, apavorada pelos engenhos Vergeltung
(Vingança), implorará a paz. Uma crença fanática na vitória iminente deve animar os soldados da frente
ocidental.

Lá em cima, soa o alarma. Hitler desce para o abrigo. Ali se encontram somente os dois marechais e o
ajudante-de-campo, General Schmundt. Rommel aproveita a ocasião desta estranha intimidade. Protesta
contra o massacre da população de Orandur-sur-Glane, cinco dias antes, pela Divisão Das Reich: tais
excessos - diz ele - somente podem originar um furor de vingança e tornar impossível para sempre qualquer
cooperação com os franceses. Hitler corta-lhe a palavra: “Não se meta em política; ela me diz respeito.
Ocupe-se da frente da invasão!”.

A entrevista, completamente estéril, é seguida de um almoço, com o espetáculo comum de Hitler devorando
sem educação um enorme prato de arroz e legumes. Às 16 horas, Rommel e Rundstedt retornam a estrada.

Tudo o que obtiveram é que Hitler se aventure, dois dias depois, a ir até La Roche-Guyon. Contam colocá-lo
em contato com oficiais da frente, cujo testemunho, esperam, o esclarecerá sobre as condições reais da
batalha no Oeste.

No dia seguinte, de manhã, Blumentritt telefona para Margival para saber da organização da viagem do
Fuhrer. Ouve a resposta de que ele deixou a França de noite. Uma V1 fora da rota, caiu a 3 km do PC e Hitler
imaginou uma tentativa de atentado. Partiu logo, dizendo que não queria dar a criminosos “ocasião de feri-lo
pelas costas...”

O cerco de Cherburgo se estende. Von Schlieben recebeu ordens estritas: recuar somente passo a passo e
manter, de qualquer maneira, a linha Saintt-Vaast-la Houge-Vauville, apoiando-se na frente terrestre de
Cherburgo. Mas um lento combate, em retirada, é impossível, com unidades de tração animal atacadas pela
aviação inimiga, e uma defesa prolongada das linhas de Cherburgo é quimérica. O porto militar, como era
antigamente Cingapura, fortificado do lado do mar, está aberto pelo lado da terra. O General Marcks tinha
reclamado cimento para construir um cinturão de fortificações, mas o cimento foi monopolizado pelas
rampas das V1. As trincheiras, cavadas às pressas, não tem proteção de arame farpado e muitas posições de
combate são simples abrigos feitos de madeira. As tropas são deficientes, tanto pela qualidade como pela
quantidade. Das quatro divisões de Schlieben, três são esqueletos em torno dos quais se colocou um pouco
de carne de canhão, incorporando nos batalhões de infantaria os homens dos serviços auxiliares, os jovens da
Organização Todt, os velhos da Flak (artilharia antiaérea), etc. Schlieben diz, à outra divisão, a 77 a DI, que
ela somente enfraquecerá a defesa de Cherburgo, devido aos recursos limitados da praça. O General
Stegmann tenta, então, reunir o 84o Corpo, atravessando as linhas americanas entre os prados pantanosos e o
mar. A tentativa consegue êxito parcial. Parte da infantaria escapa ao longo da costa, mas a artilharia e os
comboios são destruídos. O próprio Stegmann é morto por um caça-bombardeiro. Como Hellmich teve a
mesma sorte na véspera, este é o quinto general alemão que, em 12 dias, cai na frente do Oeste.

Quando os americanos atacam, no dia 19, encontram apenas uma resistência simbólica, em Montebourg.
Além disso, em toda parte avançam em coluna na estrada, até ter contato com a frente de Cherburgo. Três
divisões, a 9a, à esquerda; a 79a, ao centro, e a 4 a, à direita, se preparam para o assalto. A 90 a é deixada na
retaguarda. O SHAEF (Supreme Headquarters of Allied European Forces) propôs dissolvê-la, mas Ike poupa
esta humilhação ao Texas, decidindo reorganizá-la.

O calendário da libertação é adiado

O mau tempo voltou. A eficiência da aviação diminui. Uma miraculosa divisão alemã, a 355 a DI, chega da
Bretanha, sem perder um único homem, dando uma coluna vertebral ao 84 o Corpo amputado para a defesa de
Cherburgo. Na noite do dias 18 para 19, levanta-se forte vento de noroeste, acompanhado de aguaceiro. Após
as dificuldades do início, o rendimento das praias estava-se tornando quase satisfatório e a construção dos
portos artificiais progredia rapidamente. Tudo se torna problemático por causa da tempestade, Centenas de
landing crafts (barcaças de desembarque) são destruídas pelas ondas, esmagadas nos rochedos e atiradas tão
longe, em terra firme, que será preciso esperar uma boa maré para que flutuem novamente. Na praia de
Omaha, o quebra-mar é lançado na costa, o dique inacabado parte-se, dez pesados caixões “Phoenix” para a
construção do porto, que estavam sendo rebocados, devem ser abandonados, o porto flutuante é torcido como
se fosse pela mão de um gigante. A calmaria sobrevem na manhã do dia 22, mas o Mullberry americano é um
espetáculo desolador. O Mullberry britânico, tendo recebido o assalto de um ângulo diferentes, sofreu menos.

Esta tempestade de verão, por mais impressionante e desastrosa que seja, está longe de ser um ciclone. O
vento não ultrapassou cerca de 50 km por hora, correspondente à força 6, pela escala de Beaufort, como
“forte brisa”. As operações, nas praias, não foram interrompidas, embora a média diária de homens e
veículos desembarcados tenha caído, respectivamente, de 34.712 para 9.945 e de 5.624 para 2.426. Mas a
brilhante idéia de Churchill, dos portos sintéticos, exige condições absolutamente excepcionais e constitui,
mesmo no verão, uma aposta contra a meteorologia. Os ingleses começam a reparar Arromanches, mas, com
o relatório do Amirante Hall, os americanos decidem abandonar o seu Mulberry.

A tempestade adia a nova ofensiva britânica contra Caen. Dá, por outro lado, um grau suplementar de
urgência, na ofensiva contra Cherburgo. No dia 21, Collins intima, em alemão, russo, polonês e francês, a
guarnição a que se entregue. Não havendo resposta de Von Schlieben, o ataque começa, no dia seguinte, com
um violento bombardeio aéreo. As três divisões americanas avançam metodicamente em terreno acidentado
até a rendição apressada. No dia 24, Von Schlieben comunica a seus chefes que o valor combativo das tropas
diminui rapidamente e que duvida poder resistir a novo ataque. No dia 25, o 47 o RI americano toma de
assalto o velho Forte de Roule, a cujos pés se encontra Cherburgo. O rádio noturno de Von Schlieben
descreve a situação nos seguintes termos: “Tropas esgotadas e encurraladas... Perda inevitável da cidade em
breve prazo... 2.000 feridos sem meios de socorro. É ainda necessário o sacrifício dos sobreviventes?
Resposta urgente”. Rommel limita-se a responder: “Conforme a ordem do Fuhrer, deveis resistir até o último
cartucho...”

No dia 26, o 37o RI toma Octeville e cerca, no subúrbio de Saint-Sauver, o PC de Von Schlieben. Mil homens
desmoralizados encontram-se no abrigo, cujo sistema de ventilação não funciona mais e onde se espalha a
asfixia. Escutam-se as britadoras americanas cavando o solo, preparando a mina que fará explodir a praça de
armas subterrânea. Schlieben conforma-se, dá ordem de içar a bandeira branca, sai no meio de seus soldados,
contentes por se render. Pergunta-se a Bradley se ele quer convidar o chefe vencido à sua mesa. “Se o
bastardo tivesse capitulado quatro dias mais cedo - responde - eu o teria feito. Agora é muito tarde. Dêem-lhe
uma ração K”.

Mesmo porque Von Schlieben se recusou da dar ordem geral de baixar as armas. Os alemães retiram-se para
o arsenal, enquanto os sapadores acabam a destruição do porto, fazendo explodir a estação marítima, cujos
destroços enchem a baía dos transatlânticos. O arsenal capitula no dia 27. O Capitão-Tenente Witt,
comandante do porto, alcança o Forte do Oesfe, em um pequeno iate a vela, na extremidade do grande dique,
e ali se mantém, ainda, durante 48 horas. O último ninho de resistência, na península de La Hague, é
silenciado no dia 1o de julho.
Hitler não gosta dos prisioneiros. Confere, por uma raríssima exceção, a cruz de carvalho ao Almirante
Hennecke, que se rendeu ao mesmo tempo que Von Schlieben. “A destruição completa do porto de
Cherburgo - diz sua citação - é sem precedentes nos anais da defesa costeira”. Fundando-se no estado do
porto de Nápoles, os americanos acreditaram poder utilizar Cherburgo no fim de quatro dias. Serão
necessárias várias semanas para consegui-lo.

Não é somente por causa das condições do porto de Cherburgo que o calendário da libertação da Europa se
atrasa. A nova ofensiva britânica, a Operação Epsom, começa no dia 25 de junho, atravessa o Odon, alcança
as alturas a sudeste de Caen, mas ainda não chega a conquistar a cidade. A Operação Overlord previa que no
dia 1o de julho (D + 25) o perímetro da cabeça-de-ponte passaria por Trouville, Lisieux, Alençon, Rennes e o
Monte Saint-Michel. Apenas um quinto foi conquistado do território delimitado desta forma foi conquistado
pelos Aliados.

É claro, entretanto, que a tomada de Cherburgo finaliza a primeira fase da campanha da Europa. A invasão
não pode ser repelida como se fosse um ataque de Dieppe ampliado. A 1 o de julho os aliados desembarcaram
na Normandia 920.000 homens, 586.000 toneladas de material e 177.000 veículos. Bastante iguais, o
exército britânico e o exército americano colocam em linha, juntos, de 15 a 16 divisões, com 8 divisões
americanas e 6 divisões anglo-canadenses em fase de embarque na Inglaterra. Apesar da falta de espaço, 33
campos já estão em serviço na cabeça-de-ponte, aumentando ainda mais a eficácia de uma aviação que,
desde 6 de junho, totaliza o número fenomenal de 160.403 saídas. As perdas, 61.732, entre mortos, feridos e
desaparecidos, são inferiores às previsões e mais que compensadas pelas substituições, de maneira que as
unidades estão completas. A Alemanha, enfraquecida, é totalmente incapaz de repelir um bloco de poderio
tão sólido, tão denso e tão dispendioso. A estratégia de Hitler estava fundamentada na derrota rápida da
invasão; deve agarrar-se a outras esperanças.

No dia 20 de junho, os marechais Von Rundstedt e Rommel estão novamente a caminho. Convocação a
Berchstesgaden, com proibição de utilizar avião ou trem. Rodam 24 horas seguidas para chegar no tempo
marcado e esperam durante seis horas na antecâmara. O velho Rundstedt, furioso e exausto, declara ao
ordenança que morrerá como o comandante do 7 o Exército, o General Dollmann, fulminado na véspera por
uma crise cardíaca. A conferência não é mais que um longo discurso de Hitler diante de um numeroso
auditório condescendente. Declara que anula o plano de contra-ofensiva geral, estabelecido a 20 de junho, no
fim do qual três corpos blindados deviam atacar ao mesmo tempo os exércitos americano e inglês. O exército
do Oeste e seus chefes deixaram passar o momento de jogar a invasão ao mar. O que devem fazer agora é
confiná-la na sua cabeça-de-ponte no bocage, impedir-lhe o acesso às planícies abertas do Norte da França,
enquanto as V1, e em seguida as V2, atacarão a Inglaterra. Cada valado normando deve ser disputado como
se tratasse da última trincheira do Destschtum (espírito germânico)!

Ora, logo que Rommel volta a La Roche-Hguyon, em 30 de junho, à meia-noite, encontra em sua mesa duas
propostas concordantes. Geyr von Schweppenburg pede a evacuação da saliência de Caen. O sucessor de
Dollmann, Paul Hausser, primeiro general SS a chegar ao comando de um exército, pede o recuo da frente
até Villers-Bocage e Saint-Lô. Rommel, em seguida, toma como sua essas proposições e as transmite a
Rundstedt, que as endossa mais rapidamente. São transmitidas ao OKW a partir de 3h30 da manhã. Essa
manifestação de desafio é levada a Hitler com o seu almoço.

Às 17h30, Keitel chama Rundstedt para lhe dizer que suas propostas foram rejeitadas e que todo abandono
de terreno está proibido pelo Fuhrer. Rundstedt solicita sua substituição num comando no qual toda iniciativa
lhe é impedida. “Herr Generalfeldmarschall - pergunta cerimoniosamente o pesado Keitel - que deve ser
feito, na sua opinião? “. “A paz, idiota!” - responde Rundstedt, desligando bruscamente o telefone.

No dia seguinte, 2 de julho, o Tenente-Coronel Borgmann leva a Saint-Germain as folhas de carvalho para a
cruz de cavaleiro do Marechal Gerd von Rundstedt. O Fuhrer aceita o seu pedido de exoneração e o substitui
pelo Marechal Von Kluge. Schweppenburg, que, no seu pedido de retirada de Caen, criticou de uma maneira
total a estratégia de Hitler, foi substituído menos cerimoniosamente por Eberbach. Rommel, tendo
conhecimento desses fatos, dá de ombros: “O próximo, sou eu...”

Assim, Kluge entra em cena no teatro ocidental. Soldado capaz, destemido e ascético, de caráter estranho e
instável, sinuoso e timorato, brutal e flutuante. Ele diz que é preciso matar Hitler, “dieses Schwein!”, mas
“esse porco” o convidou para passar oito dias em Berchtesgaden e convenceu-o de que somente a
indisciplina e a moleza impedem os exércitos do Oeste de liquidar com os guerreiros amadores ingleses e
americanos. Cheio de duros preceitos da frente oriental, Von Kluge chegou com a resolução de redisciplinar
e de levar ao heroísmo os debilitados soldados do Oeste. O primeiro contato com Rommel é violento. Na
sala de guardas de La Roche-Guyon, na presença do chefe e do primeiro oficial do Estado-Maior do grupo
de exércitos, Kluge interpela o seu subordinado: “Marechal Rommel, a partir de hoje, o senhor mesmo deve
obedecer! Aconselho-o a não esquecer isto!”. Violenta discussão segue essas palavras; depois, por escrito,
Rommel coloca o novo comandante-chefe na obrigação de justificar suas críticas. Não obtém resposta.

Mas Kluge tem ao menos, uma qualidade: é excepcionalmente corajoso. Desde o dia seguinte ao da posse no
comando, ele visita os postos avançados e se decepciona com a característica da batalha do Oeste. Vista da
frente russa, é uma guerra com punhos de renda, para a qual todas as mãos se elevariam se se pedissem
voluntários. Mas Kluge descobre o calvário dos combatentes sob um céu que, a cada instante, lhe cai na
cabeça. Como todo mundo, deve mandar retirar as portas de seu carro, para poder atirar-se de cabeça na
trincheira quando ressoar o grito “Jabos!” O exército está desprovido de veículos, de equipamento, de
víveres, de material sanitário, de obuses e mesmo de cartuchos, diante de um adversário ao qual todas as
prodigalidades são permitidas. Registram-se, na verdade, falhas numa tropa ou muito velha ou muito jovem,
cheia de russos a quem se pede que se deixem matar na França, a fim de defenderem a Alemanha contra os
americanos! Mas, no conjunto, os soldados do Oeste combatem com valentia e abnegação. Kluge o constata
e, sem se desculpar, reconhece seus erros, juntando-se ao julgamento de Rommel: aproxima-se o momento
em que a frente da Normandia arrebentará como um elástico muito esticado.

Essa ruptura já se teria produzido não fosse a natureza do campo de batalha. “Nossa arma secreta - diz um
oficial do Estado-Maior do 84 o AK - são estas macieiras”. Exceto em torno de Caen, a progressão dos
Aliados não faz mais do que afundar-se na verdura, cuja espessura e dureza os surpreendem desde o dia D.
As sebes! Tirando Alan Brooke, que leu a história dos chouans - rebeldes realistas depois da revolução
francesa, no Norte e no Oeste da França - ninguém cuidou em prevenir a enorme máquina que é o SHAEF.
Ninguém foi avisado de que as sebes normandas não são simples arbustos, mas altas e sólidas elevações de
terra encimadas de árvores e ladeadas de caminhos fundos. Nenhum dos aliados deu importância suficiente
aos lodaçais que as dissimulam entre as colinas arborizadas. Quatro grandes zonas se estendem em torno da
baía de Carentan: os vales do Douve, do Taute, do Vire e, finalmente, uma vasta bacia praticamente ao nível
do mar, chamada Prados Pantanosos de Georges. Essas extensões porosas, essas turfeiras cheias de charcos e
cortadas por canais, só são acessíveis para os caminhantes que conhecem as raras veredas sólidas. Obrigam a
combater sobre istmos, favorecendo, assim, um adversário inferior em número e poderio. Os Estados Unidos
sonharam com uma guerra móvel na qual o número infinito de seus motores devia assegurar a vantagem;
encontra uma guerra disputada palmo a palmo.

O exército americano, em 3 e 4 de julho, parte para o ataque, de um lado e do outro dos prados pantanosos. A
finalidade da ofensiva é sair do Cotentin, contornar o canto da Bretanha, para trazer às dimensões previstas o
“alojamento” dos exércitos aliados. A vitória de Cherburgo fortificou o moral americano. As informações
sobre o inimigo autorizam o otimismo. As forças alemães de qualidade são retidas na região de Caen. O 1 o
Exército dos EUA só tem diante dele o 84o Corpo, apenas reconstituído, e, na margem esquerda do Vire, o
enfraquecido 2o Corpo de Pára-quedistas. Acreditava-se possível desbaratá-los desde o primeiro dia.

A oeste dos Prados, o 8 o Corpo, do General Troy Middleton, põe em posição 3 divisões: 79 a, 82a e 90a. A
chuva coincide com o início da ofensiva. Chove sem cessar, durante uma semana, ampliando os pantanais,
inundando os valados, encharcando as sebes, reduzindo o apoio aéreo e quebrando o moral dos soldados.
Tendo sido colocada em posição, a leste do corpo de exército, a 90 a DI, encarregada de conquistar o pequeno
maciço do monte Castre, não se reabilita dos fracassos que a inutilizaram durante a batalha do Merderet. Na
outra ala, diante das alturas de Montgardon, a 79 a fica parada da mesma maneira. Os pára-quedistas e os
infantes aerotransportados são de um energia melhor, mas a divisão é substituída desde o início da batalha,
para ser reenviada à Inglaterra, onde deverá ser reconstituída. O relato oficial dos combates é um filme de
unidades frouxas, penosamente reconduzidas à linha de fogo, retidas por um punhado de inimigos dias
inteiros, povoando os postos de socorros com a neurose de guerra, eufemismo para “covardia”. Os soldados
que desembarcaram no começo de julho pertencem, na maior parte, às divisões de formação recente, que não
tem nem espírito combativo nem disciplina suficiente para substituí-lo. O monte Castre não caiu, após uma
semana de ofensiva. A pequena cidade de La Haye-du-Puits, a seus pés, continua em poder do inimigo. O
avanço médio é igual aos das piores ofensivas da Primeira Guerra: 500 metros por dia.

A história se repete no leste dos Prados Pantanosos. O 7 o Corpo, comandado por Lawton Collins e composto
da 83a, da 4a e da 9a DI americanas, esperava tomar a aldeia de Sainteny no primeiro dia, a pequena cidade de
Périers no segundo e, em seguida, cortar a estrada Coutances-Saint Lô. Mas Collins pode empregar apenas
uma única divisão no istmo de 3 km de largura que se estende entre os Prados e os pântanos de La Taute. A
83a, designada por ele, recebe o batismo de fogo debaixo de uma forte chuva e toda a energia de soldado de
Collins não consegue empurrá-la para a frente. Périers, no dia 7 de julho, ainda pertence à 17 a Pz Gr SS.

No mesmo dia 7 de julho, a ofensiva se estende aos dois corpos da ala esquerda, o 19 o e o 5o do 1o Exército
americano, entre Vire e Caumont. É intensificada sobretudo em torno de Caen.

Montgomery nunca deixou de apresentar uma fisionomia filosoficamente calma contra aqueles que o
criticavam por ser tão lento em tomar uma cidade incluída entre os objetivos do primeiro dia, e não cessará
de sustentar que sua idéia de manobra, incompreendida por Eisenhower, consistiu sempre em ocupar as
forças alemães na ala esquerda da frente de invasão, para permitir aos americanos avançar na outra ala, para
a bacia do Loire. Caen, em si mesma, não tinha qualquer valor particular. Sofreu um martírio. A artilharia
naval, a artilharia terrestre e a artilharia aérea bombardearam-na cada qual uma vez. A Kommandantur
(Comando Militar) tinha dado ordem à população para fugir, mas o prefeito de Calvados, Cacaud, esquivou-
se dessa ordem. Considerando que seus administrados corriam menos perigo nos abrigos do que nas estradas
bombardeadas e metralhadas. Os Aliados se esforçaram em poupar uma “ilhota sanitária”, traçada em redor
da Basílica de Sasint-Etienne, chamada “Abadia dos Homens”, mas as bombas são cegas e o número de
vítimas inocentes foi elevado. Caen esperava ser libertada no desalento, e aterrorizada - mas Montgomery
considerava que a obstinação dos alemães em se manter ali servia ao seu projeto. Vendo em Caen a porta de
Paris, e em Paris a chave da França, Hitler deixava usar na cabeça-de-ponte do Orne a flor do exército do
Oeste.

A nova ofensiva começa em 4 de julho, com a tomada do aeroporto de Carpiquet. No começo da noite do dia
7, a preparação aérea começa por um bombardeio que pulveriza as extremidades ao norte de Caen, cortando
de sua retaguarda as tropas em posição. Às 4h30, toda a artilharia começa a atirar, compreendendo os
canhões de 16 polegadas do Rodney, atirando cerca de 31 km. Às 7 horas, em uma manhã fresca e
ligeiramente enevoada, os bombardeiros da 9 a US Air Force executam a tarefa de neutralizar as pontes,
encruzilhadas, QGs, etc. Às 7h30, começa o ataque. É conduzido pelo 1 o Corpo, cujas três divisões, 3 a e 59 a
britânicas e 3a canadense, apertam concêntricamente a 12 a Pz SS.

Todas as aldeias da região noroeste, Buron, Ardenne, Couvre-Chef, Epron, Lebisey, foram transformadas em
centros de resistência que os ingleses e canadenses devem esmagar um por um. Após dois dias de luta, o
Oberpruppenfurher Heinz Meyer, apelidado “Panzermeyer”, faz aquilo que os chefes SS ousam fazer mais
freqüentemente do que os chefes do Exército: recusam-se a sacrificar sua divisão. Faz com que ela retorne
para a margem direita do Orne, com a infantaria reduzida ao efetivo de um batalhão.

Caen é, assim, libertada - em parte, pois os quarteirões do leste continuam em poder dos alemães. Mais de
um mês de combates, uma formidável aviação, o desembarque de um milhão de homens, conseguiram a
conquista de meia prefeitura e a libertação de um centésimo do território francês.

A guerra se atenua e, como foi o caso das ofensivas de 1914-1918, os adversários retomam forças para novas
matanças. Não é se admirar, de forma alguma, que críticas violentas apareçam na imprensa anglo-americana
e que Montgomery seja criticado pelos americanos como Eisenhower o é pelos ingleses. Inversamente, a
lentidão dos progressos da invasão deveria provocar um certo júbilo nos estados-maiores alemães: mas isto
não acontece. A importância da luta é muito grande para autorizar o menor renascimento de otimismo. Todos
os oficiais informados sabem que a frente Oeste está condenada, que todas as vitórias defensivas somente
podem retardar um pouco a derrocada. Para os membros da conspiração anti-hitlerista, esta fatalidade vem
acrescentar um grau de urgência em matar Hitler. É preciso que o tirano seja abatido e que o nazismo seja
derrubado, enquanto o exército do Oeste ainda está de pé.

O tempo é curto. No dia 9 de julho, dia da tomada de Caen, um dos agentes de ligação da conspiração, o
tenente-coronel da reserva Cäsar von Hofacker, apresentou-se em La Roche-Guyon para perguntar a
Rommel quanto tempo acreditava que fosse possível ainda conter a invasão. Resposta do marechal: “Quinze
dias a três semanas no máximo”.

Mas a bomba que deve matar Hitler já está confeccionada. E o homem encarregado de colocá-la nos pés do
Fuhrer é um dos corações mais puros e mais intrépidos que jamais bateram.
A bomba é idêntica à que Fabian com Schlabrendorff colocou no avião de Hitler no dia 13 de março de 1943.
É idêntica à que os conspiradores quiseram fazer explodir, alguns dias depois, no Zeughaus (Museu Militar)
de Berlim, em uma festa de caridade em benefício dos soldados da frente - mas Hitler encurtou a visita. É
idêntica, ainda, àquela que o Tenente Ewald Heinrich von Keist, descendente de uma família ilustre da
Pomerânia, tinha pedido para levar ao novo uniforme que devia apresentar ao Fuhrer em 11 de fevereiro de
1944, oferecendo-se em holocausto pela reabilitação da Alemanha - mas um bombardeio inesperado destruiu
os modelos e a apresentação não se realizou. O explosivo é sempre de plástico inglês, fornecido pelo Barão
Von Freytag-Lothringen e obtido em suas funções na contra-espionagem. Assegurou-se da sensibilidade da
cápsula, para não correr o risco de uma decepção como a de 13 de março.

O executor é o Coronel Claus Shenk von Stauffenberg. Ele tinha deixado, no começo de 1943, suas funções
no OKH para servir na Tunísia. Uma mina arrancou-lhe o braço direito, o olho esquerdo e dois dedos da mão
esquerda. No leito do hospital, em uma cegueira temporária, meditou sobre o dever de um nobre e de um
cristão. Muitos de seus camaradas anti-hitleristas tinham escrúpulos por causa do juramento fatal que tinham
prestado: “Juro perante a Deus fidelidade incondicional ao Fuhrer... e estarei a qualquer momento pronto a
dar a minha vida por este juramento sagrado”. Outros receiam que Hitler se transforme em um mártir e
outros hesitam ainda em dar uma punhalada nas costas da Alemanha, diante de uma adversário que não
admite outra solução para a guerra que não seja a rendição incondicional. Como Beck, Tresckow e Oster,
Stauffenberg afasta estes escrúpulos pesados e falaciosos. É preciso matar Hitler, não somente porque seu
desaparecimento representa a única chance de evitar inteiramente o desastre, como também porque o
extermínio do monstro que a Alemanha produziu é uma obrigação de consciência para um alemão. A
Alemanha, exangue, recupera os destroços dos campos de batalha. Entretanto, hesita-se em aceitar o pedido
do Conde Stauffenberg, solicitando para continuar no Exército, apesar de suas diversas mutilações. Faz ver
que sua visão está parcialmente restabelecida, que aprendeu a escrever com os três dedos que lhe restam, e
que com isso mais um oficial irá para a frente em seu lugar. Tendo obtido satisfação de seu pedido, ele
manobra para obter um posto que lhe dê acesso junto ao Fuhrer. O que consegue, em dezembro de 1943, é,
deste ponto de vista, razoavelmente satisfatório. Chefe do Estado-Maior do Exército do Interior, o
Ersatzheer, sob as ordens do Coronel-General Fromm, Stauffenberg só excepcional e irregularmente será
convocado ao Legebesprechung (Centro de Decisões) do OKW.

Mas, em compensação, o Ersatzheer, agrupando os comandos territoriais, fornece um instrumento para a


tomada do poder após o assassinato de Hitler. Assim, Stauffenberg propõe matar-se também, para estar
seguro de não falhar em sua tentativa. Demonstra-se-lhe que ele é indispensável; assim, deve sobreviver ao
atentado. O esquema combinado consiste em utilizar o plano de alerta geral estabelecido na hipótese de
tumultos interiores e, especialmente, para o caso de uma revolta dos milhões de prisioneiros e de
trabalhadores estrangeiros. Com a palavra chave Walküre, os comandantes regionais devem assumir todos os
poderes. A sede do Ersatzheer, no Ministério da Guerra, na Bendlerstrasse, torna-se o centro de toda a
autoridade. Fromm é cúmplice apenas por assentimento tácito, e é do chefe de seu estado-maior que
dependem as horas decisivas que seguirão a este grito retumbado no mundo: “Hitler está morto!”. O
Ersatzheer desarmará as SS, dissolverá as organizações nazistas e prenderá seus dirigentes. Tarefa pesada e
complexa, da qual Stauffenberg é o principal encarregado. Não tem, pois, o direito de se sacrificar. Deve sair
vivo do lugar aonde for levar a morte. Os chefes da conspiração acrescentam, a esta condição já difícil, uma
outra: a bomba que matará Hitler deve matar, ao mesmo tempo, Goering e Himmler. Um é o duque da
Luftwaffe, o outro o príncipe das Waffen SS, dois poderosos exércitos privados, em face dos quais o
Ersatzheer é somente um amontoado de recrutas e mutilados. Mas nem Goering nem Himmler assistem
regularmente às audiências de Hitler e a conjunção de suas presenças esporádicas com as convocações
irregulares de Stauffenberg representa uma fraca probabilidade.

No dia 11 de junho, Stauffenberg é convocado a Berchtesgaden. Parte com um de seus adjuntos, o capitão
Kalusing, cada um levando um quilo de plástico explosivo. Stauffenberg repetiu cem vezes os gestos
vingativos. Destravará a bomba com a ajuda de uma pinça que maneja dificilmente com os três dedos, irá
depositá-la na sala de conferências, sairá sob qualquer pretexto, para reunir-se a Klausing, que permanece ao
volante do carro, e correrá para o aeródromo de Freilessing, a fim de voltar a Berlim e colocar em ação o
mecanismo para a tomada do poder.

Chegando a Berchtesgaden, Stauffenberg toma conhecimento de que Himmler não estará ao lado do Fuhrer.
Assume o risco de telefonar para o General Friedrich Olbricht, chefe do 1 o Escritório do Estado-Maior Geral
(Allgemeins Heeresamt) e um dos principais conspiradores, para perguntar-lhe se deve, assim mesmo,
perpetrar o atentado. Resposta negativa. O explosivo fica no carro com Klausing.
À noite mesmo, em Berlim, Beck e Olbricht reconhecem que foi cometido um erro. Decidem que doravante
a presença de Himmler ou Goering não mais será condição necessária para matar Hitler. Mas uma ocasião
rara e preciosa foi desperdiçada.

Nesta segunda semana de julho, grandes batalhas, desastrosas para a Wehrmacht, desenrolam-se na frente
oriental. Na frente normanda, o 19 o e o 5o corpos avançam lentamente para Saint-Lô. Reconciliado com
Kluge, Rommel amadurece sua resolução. No dia 16, redige um relatório que, hierarquicamente dirigido ao
Oberbefehlshaber West (Supremo Comando do Oeste), tem, na realidade, o Fuhrer como destinatário.
Descreve a deterioração implacável do exército do Oeste. Perdeu 97.000 homens e 358 chefes de corpos e
recebeu como substituição apenas 6.000 homens. Perdeu 225 carros blindados e recebeu 17. Combate
heroicamente, mas uma crise insuperável é iminente. “O inimigo está prestes a quebrar nossa delgada frente
e penetrar profundamente no interior da França. A luta desigual aproxima-se do fim”. Na minuta
datilografada, Rommel acrescenta à mão: “Acredito ser necessário pedir-vos deduzir as conseqüências
políticas desta situação. Rommel. Feldmarschall”. Refletindo, elimina a palavra “políticas” diante da qual
Hitler ficaria vermelho de raiva. O texto, pensa ele, está bastante claro. Diz, sem equívocos, que a guerra está
perdida e que é necessário tratar ao menos com os ocidentais.

Tem ilusões? Acredita que Hitler, vendo a partida perdida, poderia sacrificar-se para poupar a Alemanha? É o
problema que o Almirante Ruge coloca perante ele. “Cometerá o suicídio?” - “Não - responde Rommel, -
conheço o homem. Continuará a guerra sem a menor piedade pelo povo alemão, até o momento em que não
mais existir uma só casa na Alemanha”. Porém, com uma certa inconseqüência, persiste em recusar sua
adesão ao assassinato. “Dou-lhe - diz a Speidel - a última chance. Se não fizer nada, agirei...”. Ele considera
a possibilidade de examinar um armistício com o Alto-Comando Aliado. A composição da delegação que
espera enviar a Eisenhower está formada em seu espírito.

Mas ele será seguido? As viagens que multiplica constituem sondagens. Muitos generais não hesitam em se
colocar adiante. O Conde Schwerin, comandante da 116 a Panzer, ousa assinar um memorando no qual,
declarando falar em nome de sua tropa, pede o fim da guerra e a derrubada do regime. O Barão Von Lüttwitz,
comandante da 2a Panzer, ratifica a linguagem de seu colega. Aqueles a quem Hitler chama, com ódio,
“nobreza de almanaque”, se levantam contra um aventureiro meio eslavo, sem dúvida bastardo, que arrasta a
Alemanha para um maëlstrom, para um maremoto, para uma catástrofe. Um sobrinho-neto de Bismarck, um
sobrinho-neto de Moltke, os descendentes do grande Yorck de Wartemburg, do grande Seidlitz, de inúmeros
nomes associados à glória da Prússia-Alemanha repudiam Adolf Hitler.

Há outros, especialmente os generais das SS. Também eles perderam a confiança. No dia 17 de julho,
Rommel inspeciona o 1o Corpo SS. Seu chefe, Joseph, apelidado Sepp Dietrich, é o antigo chofer, o antigo
guarda pessoal, o antigo confidente de Hitler. Declara, encolerizado, que a situação é insustentável; que
caminha para o absurdo; que não é mais possível continuar a guerra sem abastecimentos, sem substituições e,
sobretudo, sem aviação; que, de uma maneira ou de outra, é preciso acabar com ela. Os comandantes de
divisão Bittrich e Meyer exprimem-se com a mesma veemência. Os próprios pretorianos perderam o
fanatismo, duvidam do Fuhrer!

Por volta das 16 horas, Rommel põe-se a caminho para La Roche-Guyon. Faz calor e o dia está claro: tempo
mortífero. O carro é conduzido pelo chofer Daniels, tendo a seu lado o Sargento Holke, vigiando o céu.
Atrás, com Rommel, o Major Neuhaus e o Capitão Lang. Contorna Livarot, por um caminho secundário,
com aviões inimigos em cima, mas saindo na Estrada Nacional n° 179, entre Livarot e Virmoutiers, perto da
aldeia de Montgomery, Holke grita: “Jabos!”. Daniels tenta jogar o veículo a um valado, mas, atirando com
todas as armas, os dois caças-bombardeiros, surgem com terrível rapidez. Daniels é mortalmente ferido. O
carro dá uma guinada para a esquerda, salta, atravessa a estrada e arrebenta-se na vala da direita. Rommel jaz
a vinte passos, inanimado, com uma fratura dupla no crânio. Só recuperará a consciência no hospital de
Bernay, onde os médicos não respondem por sua vida.

No dia seguinte ao desastre com Rommel, o exército britânico ataca a leste do Orne, para completar a
conquista de Caen e quebrar a saliência da frente alemã. No dia seguinte, 19 de julho, uma segunda
prefeitura francesa, Saint-Lô, é libertada. Foi bombardeada com uma intensidade extraordinária e suas
ruínas, sob as quais estão enterradas 1.200 vítimas civis, fornecem clichês dramáticos aos jornais hitleristas
de Paris (“Como eles libertam a França!”). Os americanos entram na cidade levando o corpo do Major
Thomas Howie, morto durante o último assalto, e o expõe nos escombros da catedral, dizendo que os mortos
devem assistir à vitória com os vivos. Vitória prorrogada, pois se está no 44 o dia da batalha da Normandia;
Saint-Lô devia cair no sexto dia.

20 de julho: Hitler está salvo, o “putsch” fracassa

O 20 de julho começa com um ria radioso em toda a Europa. Berlim, excepcionalmente, não foi
bombardeada durante a noite. As 7 horas, um avião de ligação decola do aeródromo de Rangsdorff. O
Coronel Von Stauffenberg e seu adjunto, o Tenente Werner von Haeften, estão a bordo. Cada um leva uma
pesada pasta. Cada pasta contém uma bomba. Estas bombas são as mesmas que, no dia 11, fizeram a viagem
de ida e volta a Berchtesgaden. Quatro dias depois, fizeram a viagem de ida e volta a Rastenburgo, para onde
Hitler acabava de voltar - mas a conferência do Fuhrer foi cancelada à última hora. Pela terceira vez em dez
dias, Stauffenberg voa para matar Hitler.

Sabe que é a última tentativa. O laço se aperta. Um dos conspiradores mais importantes, Julius Leber, antigo
deputado socialista no Reichstag, acaba de ser preso. A miraculosa impunidade que cobriu uma conspiração
tão extensa e tão indiscreta já não pode prolongar-se por muito tempo.

Em Berlim, o governo provisório está formado. Presidente: Beck. Chanceler: Gördeler. Negócios
Estrangeiros: Von Hassell. Comandante-Chefe: Marechal Von Witzleben, etc. Stauffenberg deve, após ter
executado a missão, de tarde, vir tomar lugar entre eles como Secretário de Estado da Guerra. O comandante
militar da Grande Berlim, o General Von Hase, e o chefe de polícia, Conde Helldorf - um conspirador de
1938 - estão com eles. Hase conta com a Escola de Infantaria de Döbenitz, com a Escola de Unidades
Blindadas de Krampnitz e com o batalhão blindado da Divisão Grossdeutschland, à qual, por causa de um
rodízio, tem a honra de defender a cidade de Berlim. Não se duvida a adesão de Fromm - que, apesar disso,
não suspeita com que intenções o chefe de seu estado-maior voa para a Prússia Oriental. No caso de sua
fuga, será substituído na chefia do Exército do Interior por uma das vítimas ilustres de Hitler, o Coronel-
General Hoeppner.

Três horas de vôo, em um dia ensolarado, acima do Brandenburgo e da Prússia... A primeira visita de
Stauffenberg, depois da aterragem, é o General Erich Fellgiebel, chefe de comunicações do OKW, elo
importante da cadeia da conspiração, pois deve, depois do atentado, isolar o QG do Fuhrer morto. Através de
diversos postos de controle, que verificam as identidades mas não se preocupam com a carga, o carro
enviado ao aeródromo deixa Stauffenberg, diante do alojamento de Keitel. Ele desce, carregando
penosamente a pasta com os três últimos dedos de sua única mão. A outra bomba fica no carro, com Haeften.
Constitui uma duplicata inútil, pois Stauffenberg está, fisicamente, impossibilitado de entrar na sala de Hitler
com duas pastas. Mesmo porque os artífices da conspiração se sentem garantidos de que somente um
engenho, explodindo em um espaço fechado, bastará para não deixar sobrevivente. Com Keitel, Stauffenberg
esboça o assunto que o traz a Rastenburgo: as novas divisões formadas pelo Ersatzheer, levantadas com uma
terceira proclamação e às quais Hitler deu o nome pomposo de Volksgrenadieredivisionen (Divisões de
Granadeiros do Povo). Quando Keitel apanha o quepe para sair, Stauffenber vai ao vestiário, tranca-se e, com
a ajuda de uma pinça, quebra a cápsula contendo o ácido que deve libertar a espoleta. Nada pode impedir a
explosão da bomba dez minutos depois.

Do lado de fora, o marechal-de-campo se impacienta. O horário está sobrecarregado por causa de uma visita
de Mussolini, que, depois de ter inspecionado quatro divisões italianas em formação na Alemanha, deve
chegar à estação de Rastenburgo, no começo da tarde. Stauffenberg sai, desculpando-se. Keitel se oferece
para carregar a pasta. Ele recusa com um sorriso afável. Amor-próprio de mutilado.

A conferência realizou-se no Lagebaracke (Quartel), como acontecia todas as vezes que a região não estava
em estado de alarma aéreo. Uma casa de madeira, protegida por uma escassa camada de cimento, iluminada
por dez janelas, tendo, na frente, uma central telefônica, diante da qual um suboficial vigia. Stauffenberg,
com voz bastante clara, diz-lhe que espera uma comunicação urgente de Berlim e, depois, atrás de Keitel e
do General Buhle, entra na sala de conferências. Já são mais de 12h30, a sessão foi aberta há alguns minutos
e o General Heusinger expõe os últimos acontecimentos da frente oriental. Keitel interrompe para explicar a
presença de Stauffenberg. Somente Hitler está sentado, no meio de vinte pessoas em pé; dirige uma pequena
saudação ao coronel mutilado; depois, pede a Heusinger que termine sua exposição. Stauffenberg coloca sua
pasta junto a um dos pés de madeira que sustentam a mesa do lado de dentro, ou seja, em direção ao Fuhrer.
Recua um passo, espera alguns segundos e sai.
Keitel não viu a saída, mas constata a ausência. Sai por sua vez, com a intenção de dizer a Stauffenberg que
sua vez de falar está próxima e que ele deve estar preparado. O coronel não está na antecâmara. Keitel
perplexo, volta.

Neste instante, às 12h42, há a explosão da bomba. Stauffenberg e Haeften já tinham deixado o Sperrkreis 1
(Círculo de Controle 1), ou seja, o recinto do Fuhrer. Esperavam, fumando um cigarro, no segundo círculo,
diante do escritório de Fellgiebel. A detonação que ouvem é comparável a de um obus 150. Vêem chamas e
ouvem gritos de dor. O trabalho está feito.

Conduzido por Haeften, o carro dirige-se para o campo de aviação. O zelo de um chefe de posto, intrigado
com a explosão que acabou de ouvir, o retém um instante na barreira exterior, mas Stauffenberg
desembaraça-se, telefonando para o Capitão Möllendorff, adjunto do comando do GQG. Alguns minutos
depois, voa para Berlim.

Pousa em Rangsdorff às 15h41 e telefona ao General Olbricht, para dar a boa nova: Hitler está morto!

Olbricht corre para Fromm, informa-o do grande acontecimento e apresenta-lhe, para assinar, a ordem de
execução do Plano Walküre (Valquírias). Fromm, um homem enorme, de 2.04 m de altura, a maior entre os
generais alemães, reclama confirmação dos fato. Olbricht liga o telefone e chama Keitel com urgente
prioridade - convencido de que Rastenburgo não responderá, pois Fellgiebel devia bloquear as centrais. Mas,
em segundos, Keitel está na linha. Fromm, que tomou o aparelho, diz-lhe que correm rumores, em Berlim, de
um atentado contra o Fuhrer. Keitel confirma. O Fuhrer, diz, não foi seriamente ferido, graças a Deus! Foi
esperar Mussolini na estação de Rastenburgo. Não! Não é preciso tomar medidas particulares e executar o
Plano Walküre. Mas, saberia Fromm onde estaria o Coronel Von Stauffenberg, chefe de seu estado-maior?
Ele se encontrava no Lagebaracke alguns instantes antes da explosão. Desapareceu. Fromm responde de boa-
fé, que não sabe de coisa alguma.

Não se suspeitou imediatamente de Stauffenberg. A explosão foi de uma violência terrível. Quatro homens
foram mortos imediatamente: o ajudante-de-campo, General Schmundt, o General Korten, da Luftwaffe, um
Coronel Brandt, que, mudando de lugar a pasta de Stauffenberg, na qual tropeçara, salvou, talvez, a vida de
Hitler, e, finalmente o estenógrafo Berger. Os sobreviventes saíram cobertos de sangue, as fardas em
farrapos, negros como breu, gritando de dor, mas o primeiro pensamento foi o de que um avião isolado
acabava de lançar uma bomba no alvo. O Lagebaracke fora reconstruído recentemente e imaginou-se, em
seguida, que trabalhadores estrangeiros da Organização Todt tinham colocado uma máquina infernal sob o
chão. Depois, Keitel - o único que não recebera qualquer arranhão - lembrou-se de Stauffenberg...

Hitler foi o mais calmo no momento. Quando o trem de Mussolini entrou na estação - após uma longa
demora, que fez com que os passageiros suspeitassem de um acontecimento fora do comum - ele estava na
plataforma, coberto de uma grande capa preta, diante de Goering, Himmler, Ribbentrop, Bormann, etc., que
haviam acorrido dos QGs vizinhos. A saudação com o braço esquerdo, a mão esfolada, uma tampa de
algodão enterrada na orelha direita com o tímpano arrebentado, eram os únicos sinais visíveis do atentado.
“Duce - diz - uma máquina infernal acaba de explodir contra mim. A Providência protegeu-me”. Chegado ao
Wolfsschanze, desculpa-se e fecha-se com Himmler e, durante este tempo, os italianos assombrados vêem os
outros grandes chefes nazistas discutirem e Goering ameaçar Ribbentrop com seu bastão de marechal.
“Sente-se Judas no ar...” - dirá o Marechal Graziani.

O retorno do Fuhrer traz de volta a compostura. Himmler parte para Berlim com a nomeação de comandante-
chefe do Exército do Interior, após o que Hitler dá ao outro ditador - desta vez ligeiramente condescendente -
a vigésima demonstração de sua certeza na vitória. Somente na hora do chá é que a raiva contida se
manifesta. Hitler entra em crise de histeria vingativa, promete aos traidores, às suas famílias, à sua classe
social, os mais horrorosos castigos...

Uma outra cena se desenrola na Bendlerstrasse. Stauffenberg, chegado de Rangsdorf, jura a Fromm que
Keitel mente, que Hitler está morto, que viu seu corpo sair do Lagebaracke despedaçado. Fromm recusa-se a
acreditar. Hoeppner, que Hitler excluíra do Exército em 1941, chegou, trazendo seu uniforme em uma valise,
e, no vestiário, vestiu-se, novamente, como coronel-general. Quer expulsar Fromm do escritório. Fromm
resiste. Os dois homens se esmurram. Sacam dos revólveres - mas não atiram. Fromm, desarmado, é preso. A
guarda do Ministério obedece a Olbricht, bloqueia as saídas, patrulha os corredores. Centenas de oficiais
trabalham nos escritórios sem suspeitar do drama que se desenrola ao lado deles.
Aliás, tudo se desenrola frouxamente. Atravessando Berlim, Stauffenberg teve a decepção de não constatar
qualquer movimentação de tropas. Quando chega a Bendlerstrasse, irrita-se em saber que a palavra de ordem
Walküre tinha sido lançada há pouco e, ainda, somente graças à energia do Coronel von Quirheim, que se
substituiu aos seus superiores hesitantes. Beck, doente, quase morrendo, somente chegou ao Ministério às
16h30. Witzleben foi para Zossen, a 40 km de Berlim para conferenciar com o primeiro-general intendente
Wagner. A Escola de Infantaria de Doberitz não está alertada. Os generais, que, segundo o exemplo de
Fromm, se pronunciam contra o putsch, como Kortzfleisch, comandante da Wherkreis 3 a (Terceira Região
Militar), são presos, em vez de serem abatidos na hora. Os conspiradores tiveram, diante dos olhos, os
métodos implacáveis do nacional-socialismo; sabem que, se fracassarem, somente tem a esperar uma morte
horrível. Apesar disso, exercem sua tarefa com considerações de homens educados e lentidão de velhos.

O batalhão da guarda de Berlim é comandado pelo Major Otto Ernst Remer, de 32 anos, oficial da frente,
ferido nove vezes, recentemente condecorado com a cruz de cavalheiro pelas mãos do próprio Fuhrer.
Helldorf advertiu Beck e Witzleben que seria melhor afastá-lo de Berlim, em virtude de seus sentimentos
políticos serem duvidosos, mas os dois velhos gentlemen não prestaram atenção a esta observação.
Raciocinavam com um silogismo: um soldado obedece; Remer é um soldado; portanto, Remer obedecerá.
Convocado por Von Hase à Kommandantur da Unter den Linden (uma das principais avenidas de Berlim), é
informado da morte do Fuhrer e ouve a enumeração das trinta missões confiadas ao seu batalhão, para
manter a ordem: ocupação das estações de rádio, defesa do quarteirão dos Ministérios, ocupação da sede da
Gestapo, prisão do Doutor Goebbels, etc. Não levanta objeções, nas faz perguntas; volta a Döberitz, dá as
ordens e parte, ele próprio, com alguns blindados, para prender Goebbels. O negócio, dirá após o golpe, lhe
pareceu suspeito. Apesar disso, Witzleben e Beck, até aqui, tem razão: o soldado Remer obedece.

Mas Goebbels foi advertido. Um certo Hagens, tenente da reserva e oficial de doutrinação política do
batalhão, preveniu-o. Quando por sua vez, entra Remer, com o revólver na mão, encontra um Goebbels cheio
de sangue-frio. Que quer o Herr Major? Prendê-lo. Por que? Porque o Fuhrer está morto. Levanta os ombros.
O Herr Major é vítima de uma mistificação. Mas traz no pescoço a cruz de cavalheiro. Ela não lhe foi dada
pelo Fuhrer? É certo. Então conhece a voz do Fuhrer? Muito bem, escute.

São necessários trinta segundos para que Goebbels consiga a ligação com o Wolfsschanze. Dá o telefone a
Remer. Hitler diz ao jovem comandante que traidores da pátria alemã tentaram, é verdade, assassiná-lo, mas
que ele próprio não está ferido e o castigo está a caminho. Encarrega-o de, pessoalmente, prender os
conspiradores e, esperando a chegada do Reichfuhrer Himmler, pede-lhe que obedeça somente ao Doutor
Goebbels. Conta com seu zelo, fidelidade e honra.

Nesse momento, aproxima-se as 18 horas. Embora doravante duvidem da morte de Hitler, os conspiradores
imaginam que estão prestes a ganhar a partida, pois são senhores do Ministério da Guerra e da sede do
Estado-Maior. De Zossen, Witzleben proclama-se, finalmente, comandante-chefe da Wehrmacht. Da
Bendlerstrasse, Stauffenberg, usurpando o nome de Fromm, lança aos comandantes das Wehrkreise (Regiões
Militares) ordens para a prisão dos Gauleiter (chefes de distritos), Statthalter (governadores), chefes da
Gestapo, da SD (Sicherheitsdienst, Serviço de Segurança), dos campos de concentração, etc. O contato é
estabelecido com Paris, onde Stülpnagel põe-se de acordo com o entusiasmo. Kluge está na frente de batalha,
mas espera-se a qualquer momento sua volta a La Roche-Guyon. Ninguém duvida da sua adesão ao
movimento. Ele disse cem vezes que era preciso matar “esse porco do Hitler” e liquidar uma guerra perdida.

O dia foi terrível para Kluge. Volta coberto de suor e de terra, por ter-se jogado dez vezes às valas. Depois do
desastre com Rommel, reuniu em sua pessoa o supremo comando do Oeste e o comando do Grupo B.
Percorrendo diariamente a Normandia, conhece agora a experiência da inferioridade esmagadora sob a qual
combatem as tropas que ele acreditava serem fracas e covardes. A conferência que acaba de presidir,
reunindo os generais do Panzergruppe West, realizou-se em um bosque perto de Saint-Pierre-sur-Dives, pois
qualquer movimento em torno de uma habitação constitui suicídio. O dia está magnífico, o que significa
grande ação da aviação inimiga. O céu é uma colméia barulhenta e todos os aviões que cortam o azul levam
a estrela branca. A conferência foi sinistra. A ofensiva britânica a leste de Caen prossegue há 48 horas. O
tapete de bombas, lançado no primeiro dia por 2.000 aviões aniquilou as tropas alemães de primeira linha e
foi necessário apelar imediatamente para as reservas. Todos os Panzer combatem em uma delgada frente
pressionada incessantemente, de Troarn a Bourguebus. Será rompida? Aborrecidos e extenuados, todos os
generais o predizem.
Speidel, continuando como chefe do Estado-Maior do grupo de exércitos, narra a Kluge os acontecimentos
do dia. Acrescenta, como se tratasse de um detalhe do serviço, que foi perpetrado um atentado contra a vida
do Fuhrer e que parece ter tido êxito. Kluge não se sobressalta, não pisca, não comenta. Apenas uma
pergunta: “Nada mais?” E uma única palavra: “Obrigado”.

Estranho Kluge! O acontecimento em que, talvez, tanto tenha pensado, o assassinato de Hitler, acaba de
acontecer sem causar nele uma reação perceptível. Toma banho e muda a roupa branca. Para recuperar as
forças e ter tempo de ver com clareza.

Às 19 horas, Berlim chama. Ludwig Beck no outro lado da linha. “Kluge, o Fuhrer está morto. Reúna-se
imediatamente ao nosso movimento... Lembro-lhe nossas conversas e a posição que você tomou. Não, a
situação não está ainda absolutamente clara. A morte de Hitler é provável; mas não é bem certa... Pouco
importa, nossa ação esta desencadeada e irá até o objetivo final. Tudo repousa no Exército do Oeste, em
você! Exijo uma resposta sem equívocos”. Kluge deixa passar o fluxo de palavras nervosas do velho homem
que foi seu comandante. “Devo - diz - consultar meu estado-maior. Chamarei dentro de meia hora”.

Um pouco mais tarde, Stülpnagel se apresenta, trazendo com ele o Dr. Horst, cunhado de Speidel, e o mais
entusiasta, o mais persuasivo dos conspiradores, Cäsar von Hofacker. Fecham-se com Kluge - que não
cumpriu ainda e nem cumprirá jamais a promessa de chamar Beck. Hofacker, simples tenente-coronel da
reserva, toma a palavra: “A guerra está perdida... Ponham um paradeiro no massacre... impeçam que a mais
terrível das catástrofes se abata sobre o povo alemão...” Esta eloqüência jorra sobre um icebergue. Kluge
levanta-se. “Senhores - diz - o atentado fracassou...” - “Mas - atalha - Stülpnagel - pensei que o senhor
soubesse” - “Acabo de sabê-lo diretamente de Rastenburgo...” Qualquer outra palavra seria inútil. Stülpnagel
e Hofacker compreenderam. Stülpnagel e Hofacker - e tantos outros, milhares de outros - acabam de receber
a sentença de morte. O Marechal Günther von Kluge assim decidiu.

Acabou? Nem tudo. Kluge é o anfitrião. Os visitantes de Paris são convidados para jantar. Toma-se lugar,
segundo a ordem hierárquica, na sala nobre de refeições do velho solar. O longo crepúsculo de julho morre e,
tendo sido a eletricidade cortada pelos bombardeios, são trazidos candelabros. Candelabros fúnebres.
Ninguém come, a não ser Kluge. Ninguém fala, a não ser Kluge. Conta lembranças das campanhas da
Rússia, anedotas da vida de caserna. Ri. De repente, Stülpnagel baixa o guardanapo. “Senhor Marechal-de-
Campo, posso dizer-lhe algumas palavras em particular?”. Kluge hesita, concorda, dirige-se com seu
subordinado para uma sala vizinha. Na sala de jantar, o silêncio volta a ser total. Repentinamente, a porta de
abre. As roucas explosões de voz próprias de uma decompostura militar ressoam como se fosse na escada de
serviço de um quartel. O Feldmarshall Von Kluge pragueja como um Feldwebel (sargento). “É incrível! É
insensato! É um ato de insubordinação! O Senhor General Von Stüpnagel deu ordem para prender o General
Oberg, os SS e os SD de Paris! Blumenritt, telefone, revogue-me esta ordem imbecil! Sofort!
Imediatamente!”

Em Paris, tudo se passa às mil maravilhas. Os soldados executavam com entusiasmo a ordem de encarcerar
os suportes do regime. Estes não opunham nenhuma resistência. Colunas de caminhões da Wehrmacht
transportavam para a prisão de Fresnes e para o Forte de Saint-Denis cerca de 1.200 indivíduos que, há
quatro anos, faziam imperar a lei nazista na capital francesa. No Hotel Raphael, os oficiais de Stülpnagel
bebiam champanha, esperando a volta de seu chefe. A rádio tinha anunciado que o Fuhrer tinha escapado de
um atentado, mas todos estavam convencidos de que o Marechal Von Kluge se tinha reunido ao putsch e que
iria tratar com os Aliados.

Por volta de 23 horas, o chefe do Estado-Maior, Coronel Von Linstow, recebe uma chamada telefônica de La
Roche-Guyon, ordenando suspender a caça aos nazistas; responde que é muito tarde, que a operação está no
final. Meia hora depois, Berlim, chama. Linstow, cardíaco, afunda-se na cadeira, vitimado por uma síncope.
Stauffenberg, pessoalmente - muito calmo, sem um estremecimento na voz - informa aos cúmplices de Paris
que o putsch fracassou e que devem cuidar apenas de sua segurança pessoal. O Batalhão Grossdeutschland
mudou de campo. Em vez de proteger o Ministério da Guerra, cerca-o e invade-o. Os SS, membros da
Gestapo, marcham com os soldados. “Estão à porta de meu escritório... Estão chegando...”

Em La Roche-Guyon, Kluge voltou à mesa. Insistiu para que Stülpnagel retomasse o lugar à sua direita.
Depois do conhaque, conduz o general até o carro e, voltando a ser bom camarada, sopra-lhe um conselho no
ouvido: “Em seu lugar, eu me vestiria como civil e tentaria desaparecer”. Stülpnagel não ouve e, quando o
marechal lhe estende a mão, ele não vê.
Chegou a hora da decisão em Berlim, Fromm, libertado, é tomado de fúria vingativa, superexcitado pela
pressa em ver desaparecerem homens dos quais foi cúmplice por assentimento tácito. Witzleben, que fez
apenas breve aparição na Bendlerstrasse, volta para esperar a prisão. Gördeler, que não apareceu durante o
dia, foge. O general-intendente Wagner se suicida, Hoeppner, a quem Fromm oferece o mesmo tipo de saída,
em nome da velha camaradagem, responde que espera poder justificar-se e deixa-se conduzir para a prisão
militar de Moabit. Alguns conseguem fugir. Outros, entre os quais Yorck, Schwerin e Berthold von
Stauffenberg, irmão de Claus, são conduzidos à Gestapo, na Prinzregenstrasse. Beck dá um tiro na cabeça,
arranha a testa, desmaia, volta a si e recomeça o mesmo insucesso. Fromm pede a um suboficial que “ajude o
velho cavalheiro”; o suboficial leva o antigo chefe do Estado-Maior-Geral nos braços e vai acabar de matá-lo
em uma sala vizinha.

Restam quatro prisioneiros, que, em escalões diferentes, eram todos colaboradores do Coronel-General
Friedrich Fromm. Bastam a este algumas palavras cochichadas com Remer e Skorzeny, para declarar que
uma corte marcial condena à morte o General Olbricht, o Coronel Mertz, o Tenente Haeften e “este coronel
cujo nome não quero pronunciar” (Stauffenberg). Eles são levados ao pátio principal e executados à luz de
faróis de um automóvel - enquanto ressoa o bombardeio efetuado por uma esquadrilha aérea que esmaga um
quarteirão do norte de Berlim.

2.246 aviões rompem a frente do Cotentin

O estranho e terrível acontecimento de 20 de julho foi, sistematicamente, minimizado entre os Aliados. Os


governos conheciam, através dos próprios conspiradores, a antigüidade e extensão da conspiração, mas
constantemente se recusavam a dar o menor encorajamento a esta forma alemã de resistência. Ela contradizia
a idéia-força de uma identidade absoluta da Alemanha com o seu Fuhrer. Chocava-se com o postulado de
uma cumplicidade automática, entre o nacional-socialismo e o militarismo prussiano, simbolizado pela
classe dos Junkers. Ainda hoje, poucas pessoas tem o cuidado de observar que, entre os grandes chefes
nazistas, não houve praticamente prussianos e, ainda menos, aristocratas, mas quase unicamente alemães do
Oeste e do Sul, geralmente de origem católica e sempre de origem social humilde ou modesta: Hitler,
Goering, Himmler, Goebbels, Bormann, Ley, Sauckel, etc. A revelação de que uma elite social e espiritual
reconhecia os crimes do regime e concretizava o patriotismo no castigo dos criminosos, trazia um golpe no
princípio da rendição sem condições. A Alemanha deveria permanecer, integralmente, como o gênio do mal.
As guerras são conduzidas com princípios simples e imperativos curtos.

Assim, Hitler e os Aliados concorreram para apresentar o 20 de julho como um episódio de menor
significado. Quando o Fuhrer falou pelo rádio, por volta da meia-noite, para narrar o atentado que o
transformara em protegido da Providência, sublinhou que os conspiradores eram “uma súcia muito pequena,
uma súcia extremamente reduzida” de oficiais criminosos e estúpidos, perseguindo sórdidas ambições
pessoais. Churchill, embora conhecesse de maneira bem particular os antecedentes da conspiração, limitou-
se a declarar que o atentado contra “o velho bastardo”, provava, muito simplesmente, que o Estado-Maior
alemão reconhecia que a guerra estava perdida. Antes de suicidar-se, com uma granada, entre as linhas
alemães e russas, Von Tresckow escreveu: “Deus prometera poupar Sodoma se ali encontrasse dez justos.
Espero que Ele não consentirá em destruir a Alemanha, por causa do que tentamos fazer. Nenhum de nós
pode queixar-se da sorte. Todo aquele que aderiu ao movimento de resistência vestiu a túnica de Nesso...”
Mas seriam necessários anos de pacificação para que fosse reconhecido no 20 de julho aquilo que o
historiador Maurice Beaumont chama de “o esforço heróico de alguns para quebrar as cadeias em que todos
se puseram voluntariamente”.

Uma terrível repressão começa a 21 de julho. Hitler jura apagar o nome de Stauffenberg e os puros nazistas
prometem aniquilar totalmente a aristocracia. Detentos são assassinados na prisão, entre os quais o Conde
Sponek, condenado à morte por desobediência, mas cuja pena fôra comutada por Hitler. Foram constituídos,
para conduzir o inquérito e julgar os acusados, respectivamente, uma comissão especial, Sonderkommission
20 Juli, e um Tribunal do Povo, Volksgerichthof. Vários milhares de prisões são ordenados. A cabeça de
Gördeler é colocada a prêmio por um milhão de marcos. Os corpos de Stauffenberg, de Olbricht, de Mertz e
de Haeften são desenterrados, queimados e as cinzas lançadas ao vento, “não em terras cultivadas - precisa
Himmler - mas em campos incultos”. Um Tribunal de Honra, Ehrenhof, é constituído no Exército para
designar os oficiais que devem ser entregues à Justiça nazista, e o Marechal Rundstedt se desonra, aceitando
a sua presidência. Hitler, aliás, não espera suas decisões para castigar. Fromm, transformado em suspeito pela
pronta execução de Stauffenberg, é preso. O chefe do Estado-Maior Geral, General Kurt Zeitzler, não foi
cúmplice dos conspiradores, mas manteve relações de amizade com muitos deles: Hitler expulsou-o do
Exército, com a proibição de usar uniforme. Guderian aceita sucedê-lo.

Em Paris, os SS e os SD tem o bom-senso de preferir a repressão à exposição ridícula e perigosa de sua


prisão sem glória. Hofacker, Linstow e um outro coronel chamado Finckh puderam ter, durante alguns dias, a
ilusão de que haviam escapado do cerco, mas a Gestapo os despista e os envia para a Alemanha, para a
tortura e a morte. A sorte de Stülpnagel é ainda mais trágica: convocado a Berlim, para se explicar, dá ao
chofer ordem de fazer um desvio pelo campo de batalha de Verdun. Perto de Vachereauville, onde combatera
em 1916, dá um tiro na cabeça, mas consegue acertar apenas os dois olhos e, no hospital, sob o efeito do
anestésico, pronuncia o nome de Rommel...

O ardor da luta, na frente da Normandia, não deixa aos combatentes, de forma alguma, tempo para se
interessar pelo atentado de Rastenburgo. Montgomery, bruscamente, toma a decisão de suspender a Operação
Goodwood. Os britânicos avançaram 10 km e fizeram 2.000 prisioneiros - resultado medíocre dos meios
desenvolvidos e das esperanças suscitadas. Vivas críticas abrem caminho na imprensa inglesa e americana.
Eisenhower está inquieto. Um precedente pesa nos espíritos: a expedição dos Dardanelos. Como em 1915,
estabeleceu-se e consolidou-se uma cabeça-de-ponte, mas não se consegue sair dali e a campanha se
condensa em uma guerra de assédio... Enquanto isso, no Leste, a frente alemã desmorona e o Exército
Vermelho, vindo do Volga, atinge o Niemen...

Para quebrar o impasse, o SHAEF estudou outros desembarques, examinou a Alta Normandia, o Norte da
Bretanha, Quiberon, etc. Tudo bem considerado, pronuncia-se a favor de uma nova tentativa no Cotentin. As
horríveis sebes e os abomináveis caminhos esburacados desanimam os soldados americanos, mas, a custa de
estudar os mapas, Bradley acredita ter encontrado uma zona de ataque, relativamente favorável, logo a oeste
de Saint-Lô, entre as aldeias de Hébécrevon e de Montreuil. O terreno é acidentado, mas firme e
relativamente pouco arborizado. Os corredores de penetração estão orientados para sudoeste, entre cristas de
pequena altura. Chega-se, em seguida, a uma parte do bocage normando onde os campos são mais vastos, as
sebes menos espessas, a lama menos pegajosa, os caminhos menos esburacados. Esta direção do ataque
conduz a Avranches, na base da Bretanha, e permite avançar para o Loire e, assim, empreender o grande
movimento envolvente que constitui a idéia estratégica do Plano Overlord. Aliás, um rasgo de engenhosidade
melhorou as condições da luta no bocage. Um sargento, Curtiss Culin Jr, do 102 o Esquadrão de
Reconhecimento, imaginou um dispositivo que permite ao tanques Sherman atravessar as sebes. O
comandante de Corpo Gerow e o próprio Bradley vieram conhecê-lo. Com as ferragens apanhadas na praias
e um maçarico encontrado nas ruínas de uma garagem, Culin efetivamente construiu uma espécie de escudo
prolongado por quatro pontas de aço. Dá ao tanque um meio de abrir caminho e, ao mesmo tempo, o
dispensa de abrir o ventre vulnerável aos tiros da defesa antitanque. O Sherman escava na base da sebe,
rugindo como um javali, e força a passagem no meio de uma erupção de terra e verdura esmagada. Fez-se vir
da Inglaterra o material necessário e logo se promove a multiplicação da invenção do Sargento Culin. Mas
Bradley proíbe que os tanques modificados sejam usados nas operações rotineiras. Devem constituir uma
surpresa para o dia do ataque.

Bradley hesita um pouco sobre o modo deste ataque. Os comandantes de corpos, generais clássicos,
pronunciam-se por uma penetração prévia de artilharia. “Eu seria desta opinião - diz Bradley - se tivesse dez
vezes mais canhões”. Com aqueles de que dispõe, seria necessário um bombardeio de vários dias, e assim o
inimigo estaria alerta e faltaria a surpresa. O avião não tem a precisão do canhão, mas tem a seu favor a
rapidez, o efeito opressivo, a capacidade de desorientar os defensores. Todo o problema é alcançar um grau
satisfatório de saturação, aplicando assim uma tonelagem de bombas adequada sobre uma zona
correspondente ao objetivo tático visado.

Para formar a artilharia aérea, Bradley volta à Inglaterra. Os resultados da procura a que se entrega
ultrapassam a expectativa. São colocados à sua disposição 1.500 bombardeiros pesados, 396 bombardeiros
médios e 350 caças-bombardeiros. Poderiam ainda ser mais numerosos, mas os Lancaster da RAF estão
preparados apenas para lançar bombas de grande calibre e, receando as falhas que entravaram o avanço
britânico na região de Caen, Bradley os elimina.

A zona na qual será aplicada a preparação aérea é um retângulo de 7 km de comprimento por 3 km de


largura, com um dos lados coincidindo com a Estrada Périers-Saint-Lô. Serão revolvidos 20 km² de terra
normanda por 2.246 aviões, ou seja, um aparelho por hectare. Três divisões de infantaria, a 9 a, a 4a e a 30a,
penetrarão na brecha aberta pela massa aérea. Serão ultrapassadas pelas divisões blindadas 2 a e 3a que,
orientando-se para sudoeste, correrão para Coutances, Granville e Avranches e cercarão as forças inimigas
em posição entre Périers e Lessay. Conta-se fazer cair com um único golpe toda a defesa do Cotentin.

Do lado alemão, recuou-se passo a passo das alturas de La Haye-du-Puits até o desaguadouro dos Prados
Pantanosos de Gorges, terminando por um largo estuário. Alguns dias antes, a Panzer Lehr e a 12 a Pz SS
foram empregadas a oeste de Saint-Lô, em vã tentativa de salvar a cidade. Agora, Kluge pensa que a ofensiva
inglesa vai prosseguir e quer recuperar as duas divisões blindadas para levá-las até a região de Caen. A 2 a Pz
SS já foi substituída. A Panzer Lehr deveria sê-lo, pois Hitler consentiu, afinal, em retirar algumas divisões
do Passo de Calais. Mas o comando local tem de tal forma consciência da fragilidade de suas linhas, que
retém os carros blindados e os homens de Bayerlein. São eles a elite do Exército do Oeste, que mantém a
frente entre Montreuil e Hébécrevon, com alguns grupos de pára-quedistas e os destroços da 275 a DI.

Chove, porém. O ataque americano, com o nome convencionado de “Cobra”, no princípio marcado para o
dia 18, é adiado por duas vezes. Decide-se pelo dia 24. As formações aéreas levantam vôo, mas o céu
escurece tão rapidamente que lhes é dada a ordem de voltar. Muitas formações não a ouvem, executam suas
missões, atiram 800 toneladas de bombas, matam e ferem alemães, mas também 157 americanos,
provocando pânico e uma retirada. Os veteranos da Panzer Lehr alegram-se em ver o inimigo fugir das
próprias bombas, apesar de suas perdas.

No dia seguinte, 25 de julho, um relatório espantoso parte das primeiras linhas para os QG alemães:
“Retirada geral do inimigo...” A artilharia aérea se aproxima, desta vez inteira, e as cenas da véspera
impressionaram tanto os americanos, que, recebendo ordem ou espontaneamente, regimentos inteiros
recuam. Mas a satisfação alemã é curta. O furacão que se abate no retângulo desenhado por Bradley
ultrapassa tudo o que se vira no correr da guerra em todas as frentes. As posições alemães são destroçadas.
As munições explodiram. As armas e os carros blindados são destruídos. As sebes são revolvidas. Os homens
são despedaçados ou só sobrevivem em estado de bestas amedrontadas. Soldados que acabavam de travessar
cinco anos de guerra tremem e soluçam. Muitos ficaram loucos. A terra estremece. Em Saint-Lô, muito perto,
e infelizmente sofrendo o efeito da guerra, a população civil grita que é o fim do mundo e outros pensam que
um dos beligerantes inventou uma nova e terrível arma. Finalmente, iluminada pelo napalm atirado pelos
caças-bombardeiros, uma onda de chamas cobre a zona atacada. Parece impossível que um homem possa
sobreviver nesse inferno.

Os americanos também pagam. Como na véspera, rosários de bombas caem ao norte da Estrada Périers-
Saint-Lô. Muitas centenas de homens são mortos ou feridos. O General Lesley McNair, vindo como
espectador, é pulverizado em seu jipe: ele comandava na Inglaterra, um grupo de exércitos fictício, destinado
a entreter o inimigo no receio de um novo desembarque, e é preciso guardar segredo de sua morte para não
ser descoberto o ardil.

Às 11 horas, enquanto os canadenses atacam em volta de Caen, para fixar as reservas alemães, os americanos
atravessam a Estrada Saint-Lô-Périers. Foi-lhes dito muitas vezes que o bombardeio aéreo arrasaria todos os
defensores. Em Lozon, La Chapelle-en-Juger, Hébécrevon, os sobreviventes levantam a cabeça, encontram
algumas armas e combatem. Ainda intimidados, os coronéis e os generais-de-divisão contêm os batalhões
que avançam sem encontrar resistência, e o General Collins, considerando que a brecha aberta pela infantaria
não é suficiente, atrasa o emprego de suas divisões blindadas. De noite, o avanço não ultrapassa 2 km e nem
Marigny, nem Saint-Gilles, objetivos do primeiro dia, são alcançados. A decepção é profunda. Traduz-se por
uma acerba crítica à aviação. “Até aqui - diz o General Hobbs - não vimos traços de bombardeio”.

Julgamento injusto. A fraqueza do avanço decorre principalmente da falta de audácia do ataque da infantaria.
O bombardeio aéreo virtualmente destruiu a Panzer Lehr, e realmente fez uma brecha nas linhas inimigas.
Nos dias 26 e 27, as resistências locais desmoronam. No dia 28, duas poderosas colunas blindadas lançam-se
às estradas de Coutances e de Avranches. O exercício do comando alemão torna-se impossível, as linhas
telefônicas estão cortadas, as emissoras de rádio atraem a aviação e os oficiais de ligação são bombardeados
nas estradas pelos Jabos. O General Von Choltitz, surpreendido em Térence, em chamas pela súbita aparição
dos carros blindados americanos, escapa através dos campos e só retoma contato com seu estado-maior para
saber que foi substituído à frente do seu 84 o Corpo pelo General Elfeldt. O chefe do Estado-Maior do 7 o
Exército, Pemsel, é igualmente substituído, pagando por seu chefe, o General SS Hausser, que, contrariando
as intenções de Kluge, recuou sua ala esquerda para sudeste, perdendo contato com a costa do Cotentin. O
mar já não cobre o flanco do exército alemão. No dia 29 de julho, os americanos entram em Coutances. A 30,
tomam Avranches. A 31, conquistam Pontaubault, última localidade normanda na estrada da Bretanha.
Eles deveriam estar lá a D + 20. E estão a D + 54. Mas estão lá.

Vercors, onde a Resistência deixou cair a máscara

A luta dos combatentes do Vercors constitui um dos mais nobres episódios da Resistência interior francesa.

Fortaleza natural de mais de 200 km, isolado pelos vales do Drac, do Isère, do Drôme e do Ródano, situado
nas proximidades de Grenoble, o maciço do Vercors, considerado inexpugnável, foi escolhido para uma
importante missão pelo Alto-Comando Aliado. Devia servir como fortaleza interior, com a finalidade de
reunir as forças vivas da região e servir de abrigo aos grupos autônomos. Lá, seriam recebidos os
lançamentos de homens e material em pára-quedas. Vercors seria uma cabeça-de-ponte após o desembarque
no Sul da França.

O maquis (nome dado para designar os grupos de guerrilheiros franceses da Resistência, durante a guerra) do
Vercors, em março de 1944, contava apenas com 300 a 400 homens: soldados do exército do armistício
dissolvido pelos alemães, refratários do STO (Serviço de Trabalho Obrigatório), voluntários, prisioneiros
evadidos, etc. A organização militar estava assegurada por antigos oficiais e suboficiais de unidades diversas,
notadamente do 6o Batalhão de Caçadores a Pé, do 11 o Regimento de Cavaleiros Couraçados e do 159 o
Regimento de Infantaria Alpina.

Dependia da autoridade do coronel Zeller (Joseph), comandante das regiões militares R-1 e R-2, indo da
Provença ao Jura. O chefe da R-1, onde se encontrava Vercors, era o Coronel Descours (Bayard). O maquis
propriamente dito foi comandado inicialmente pelo Capitão Geyer (Thivollet) e depois pelo comandante
Huet (Hervieux). O chefe da resistência civil era Eugène Chavant (Clément).

Desde o inverno de 1942-1943, foram organizados, no maciço, campos para abrigar os maquisards (membros
do maquis), mas depois de uma série de choques com os alemães, seguidos de prisões, os campos deram
lugar a uma organização mais flexível por “trintenas”. Isto durou até o desembarque aliado na Normandia.
As unidades formadas secretamente se agruparam, os voluntários foram prevenidos com antecedência,
muitos se apresentaram à última hora e Vercors contava com mais de 4.000 combatentes. Os Aliados
lançaram de pára-quedas várias missões, entre as quais o “comando” americano do Capitão Tuppers.

A primeira batalha foi travada na região de Saint-Nizier, em 13 de junho. Nos dias seguintes, combates
encarniçados opuseram os maquisards às forças da Wehrmacht. Dois lançamentos de armas e de víveres em
pára-quedas, em 25 de junho e 14 de julho, ajudaram um pouco aos combatentes da Resistência a manter a
luta. Mas, quando a 157 a Divisão de Infantaria de Montanha alemã, colocada sob as ordens do General
Pflaum, apoiada por 20 planadores, pousando no planalto de Vassieux, passou ao ataque, os franceses
tiveram que se retirar diante da superioridade do inimigo. A repressão alemã foi cruel: não somente foram
passados pelas armas os maquisards mas também civis foram assassinados, enforcados - como em Vassieux
-, ou fuzilados. No dia 27 de julho, a gruta de La Luire, transformada em hospital, foi invadida, os feridos
foram mortos e o pessoal médico, fuzilado ou deportado para a Alemanha.

A ordem de dispersão tinha sido dada pelo comandante Huet desde o dia 23 de junho. A missão do Vercors
estava terminada em parte. Se não pôde ser, pela falta de homens e material, a cabeça-de-ponte interior
prevista nos planos primitivos, foi um ponto de fixação extremamente importante, que permitiu a
imobilização de forças alemães que retardariam o avanço das forças americanas e francesas vindas da
Provença.

É guerra em plena França de Vichy

Setecentas tumbas de combatentes ou civis assassinados perpetuam a lembrança dos combates do maquis de
Vercors.

Os relatórios contraditórios chegados ao estado-maior do General Eisenhower levaram-no a considerar a


ação da Resistência interior francesa como um bônus, um complemento do trabalho das tropas aliadas
desembarcadas na Normandia e na Provença.
As previsões foram, talvez, ultrapassadas. A sabotagem de vias férreas, de pontes e de estradas, os ataques
aos comboios revelaram-se eficazes e retardaram o encaminhamento dos reforços alemães para a Normandia,
assim como a retirada das forças da Wehrmacht.

No que diz respeito aos maquis, sua ação foi desigual, no conjunto do território. Alguns tiveram êxito, antes
da chegada das tropas aliadas, conseguindo realizar operações espetaculares, como a libertação de cidades ou
aldeias. A escassez de armamento e de efetivos somente permitiu aos outros golpes de mão, limitados contra
as colunas alemães em retirada. Os excessos cometidos por alguns, antes, durante e depois da Libertação,
responderam, talvez, aos do ocupante, não se podendo esquecer o sacrifício de numerosos franceses,
notadamente os do maquis de Glières, na Alta Sabóia.

Como seus camaradas do Vercors, os soldados de Glières estavam organizados por oficiais e graduados do
exército ativo, vindos, na maior parte, do 27 o Batalhão de Caçadores Alpinos. Desde o fim de janeiro de
1944, estavam eles instalados em um planalto de 1.500 m de altitude. As operações começaram em 5 de
fevereiro, com uma destruição na milícia de Thônes. Prosseguiram durante os meses de fevereiro e março,
com combates muito violentos entre maquisards, milicianos e GMR de Vichy. A Luftwaffe entrou em ação
no começo de março e depois, em 24 desse mês, a Wehrmacht, com forte apoio de artilharia e a ajuda da
aviação. A operação realizou-se sob a direção dos generais Niehoff e Pflaum, assistidos pelo Dr. Knab,
comandante da Sicherheitsdienst - Serviço de Segurança - de Lyon. Esmagados, os maquisards tiveram que
retirar-se de todas as posições. A repressão foi severa: fuzilamentos e deportações (de 500 foragidos, 200
foram capturados). Os que puderam escapar reuniram-se a outros agrupamentos da região, entre os quais
puderam participar dos combates da Libertação.

Um dia de massacre: Oradour-sur-Glane

A origem da tragédia de Oradour-sur-Glane foi a captura por maquisards, na Estrada Nacional 741, perto de
Saint-Léonard (Haute-Vienne), do tenente-coronel SS (Oberststurmbannfuhrer) Kämpfe. No dia seguinte,
sábado, 10 de junho de 1944, a 3 a Companhia de Regimento Der Fuhrer, conduzida pelo
Oberststurmbannfuhrer Diekmann, chegava a Oradour, acreditando em uma falsa informação de que Kämpfe
tinha sido preso e devia ser executado publicamente. Tomada de sinistra agitação, Diekmann deu ordem de
fuzilar todos os homens e de queimar todas as casas. Fechadas na igreja, as mulheres e as crianças foram
carbonizadas ou abatidas. O massacre fez 642 vítimas, com idade de 18 dias até 85 anos. Únicos
sobreviventes: uma mulher, cinco homens e uma criança.

Diekmann foi morto alguns dias depois na Normandia. O chefe de seu Corpo, o Standatenfuhrer Stadler,
tinha aberto contra ele um processo judicial. O prefeito da Haute-Vienne, Freund-Valade, o general alemão
comandante de Limoges, Glleiniger, o governo de Vichy e o Marechal Rommel protestaram contra o caso -
mas a morte de Diekmann, a semidestruição da 3 a Companhia, o veto de Hitler e a derrota alemã na França
interromperam as diligências.

O affaire de Oradour devia provocar na frança, quase 10 anos depois, profundo abalo. Um terço dos soldados
do Regimento Der Fuhrer eram jovens alsacianos alistados compulsoriamente - como, aliás, muitos alemães
- nas Waffen SS. Doze deles, entre vinte acusados, se reencontraram diante do Conselho de Guerra de
Bordéus, onde foram julgados em virtude de uma lei momentânea sobre culpabilidade coletiva. Em 12 de
março de 1953, após seis semanas de debates que indignaram a Alsácia, o Conselho de Guerra pronunciou
duas condenações à morte, uma delas de um alsaciano, e doze condenações à prisão ou trabalhos forçados.
As penas de morte foram comutadas e todos os condenados rapidamente libertados.

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