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Humanismo, Renascimento e Revolução Científica Moderna

1. Humanismo e Renascimento Atualmente, a interpretação de Bur-


ckhardt (e dos historiadores do séc. XIX)
1.1 Caracterís�cas gerais, primeiros foi contestada por diversos pensadores
pensadores, epicurismo, platonismo, contemporâneos, como Burdack. Bur-
aristotelismo e ce�cismo ckhardt usou expressões como “fazer
reviver”, “fazer renascer”, em contrapo-
1.1.1 Caracterís�cas gerais sição à era medieval, conhecida como a
era das trevas. A Idade Média, porém,
O termo Renascimento foi registrado foi uma época de grande civilização e
pela primeira vez por Giorgio Vasari no não foi uma longa noite de mil anos.
século XVI, mas a noção de Renasci-
mento como hoje a entendemos surgiu As duas mais significa�vas interpreta-
a par�r da publicação do livro de Jacob ções contemporâneas do Humanismo
Burckhardt, A cultura do Renascimento são as seguintes: i) P. O. Kristeller: o Hu-
na Itália (1867), onde ele definia o perí- manismo representaria apenas a litera-
odo como uma época de “descoberta tura e não a filosofia do período; ii)
do mundo e do homem”. Renascimen- Eugênio Garin: o humanismo indica ori-
to, para Burckhardt, designou um fenô- ginariamente a tarefa do literato, mas
meno caracterizado pelo individualismo possui também uma dimensão filológi-
prá�co e teórico, a par�r da exaltação ca e filosófica (busca do sen�do da his-
da vida mundana, do acentuado sensu- tória).
alismo, da mundanização da religião, da
tendência paganizante e da liberdade O Renascimento cultural manifestou-se
em relação às autoridades. Renascença primeiro na região italiana da Toscana,
seria, afinal, a síntese do novo espírito, tendo como principais centros as cida-
que se criou na Itália, com a an�guida- des de Florença e Siena, de onde se
de: o espírito que, rompendo defini�va- difundiu para o resto da península Itáli-
mente com o da era medieval, abre a ca e depois para pra�camente todos os
era moderna. Foi, portanto, um movi- países da Europa Ocidental, impulsiona-
mento cultural oposto a cultura clerical do pelo desenvolvimento da imprensa
com inspiração na An�guidade Clássica por Gutenberg. A Itália permaneceu
e nortearam as mudanças do período sempre como o local onde o movimen-
em direção a um ideal humanista. “O to apresentou maior expressão, porém
retorno como inovação”, não de repe�- manifestações renascen�stas de grande
ção, mas de recuperação da An�guida- importância também ocorreram na
de Clássica. Inglaterra, Alemanha, Países Baixos,
Portugal e Espanha.
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Humanismo, Renascimento e Revolução Científica Moderna

A ruptura com o sistema feudal não ficar ricos e melhorar de vida. Eles não
aconteceu da noite para o dia. Foi um aceitavam ter uma vida de penitências
processo lento e gradual de transforma- quando se poderia aproveitar os praze-
ções no mundo e no pensamento que res que a vida tem a oferecer. Eles não
aconteciam ainda na (baixa) Idade aceitavam que a busca pelo lucro fosse
Média. Se ainda hoje existem resquícios um pecado mortal, enquanto que esse
desse tempo, imagine durante essa pas- lucro lhes proporcionava mudar para
sagem. Enquanto os grandes reinos uma vida melhor, na medida de seu
estavam sendo criados, porque a situa- próprio esforço pessoal. Percebam que
ção estava um caos e precisava-se de nessas ricas cidades a visão de mundo
um poder forte para controlá-la, na feudal (teocêntrica) fundamentada pela
Península Itálica, onde se encontravam Igreja não �nha muito espaço. Não é
as principais rotas comerciais, cidades que todo mundo ficou ateu nas cidades,
muito ricas ficavam cada vez mais ricas mas é que a interpretação de mundo
devido ao intenso comércio com o passa a se dar a par�r do homem, já
oriente. As mais ricas cidades foram que ele, realmente era um pecador,
Gênova, Veneza e Florença, comanda- mas também fora feito à imagem e
das por ricas famílias de comerciantes e semelhança de Deus, do criador. E por
banqueiros, e onde um grande número ter algo de divino, a criatura mais per-
de pessoas de todos os lugares passa- feita criada por Deus, ele poderia
vam por lá e, além de comerciarem, tro- também criar maravilhas. O homem
cavam ideias e experiências de vida, passaria a olhar o mundo desde então,
ampliando os horizontes de seus habi- não mais a par�r de Deus, mas a par�r
tantes. Nessas cidades, uma nova de si mesmo. O centro das coisas agora
ordem social era criada. Lá os homens era o homem (antropocentrismo). Por
faziam seus des�nos por conta própria, isso que os pensadores desse tempo
eram senhores de si, construtores de ficaram conhecidos como humanistas.
seu novo mundo. Este era muito dife-
rente daquele existente no campo, Eles estavam no século XIII, onde pode-
onde imperavam as regras sociais feu- riam encontrar fundamentos para essas
dais sustentadas pela visão teocêntrica suas ideias? Isso mesmo, eles �veram
(Deus no centro de tudo) imposta pela que recuar mais de 1.000 anos para
Igreja. encontrar nos gregos an�gos algo pare-
cido com o que estava acontecendo
Esses homens não aceitavam a imobili- com eles. E não foi muito di�cil fazer
dade social, em que um servo morreria isso, já que eles estavam, onde mesmo?
servo, quando homens pobres podiam Exatamente, no centro do que fora o
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Humanismo, Renascimento e Revolução Científica Moderna

maior império do mundo, o mesmo que desde a polí�ca até as artes. Mas havia
conquistou os gregos e mesclou a cultu- algo que os impedia em progredir, e que
ra deles com a sua, preservando vários infelizmente também estava lá junto
de seus escritos. Os homens do renasci- deles na Península Itálica.
mento foram buscar nos gregos e roma-
nos an�gos inspiração para louvarem o Era a Igreja com seus ensinamentos
ser humano. Isso mesmo, “inspiração”. escolás�cos, principalmente Santo
Eles não estavam querendo simples- Tomás de Aquino e Aristóteles, que
mente copiá-los, prova disso é que dife- ensinavam um conhecimento baseado
rentemente dos an�gos que contem- na pura contemplação e que vinha
plavam a natureza, os renascen�stas sendo transmi�do às gerações pela tra-
queriam conhecê-la para dominá-la. dição, que era indiscu�vel. Para a Igreja,
Não bastava um pensamento contem- esses sujeitos que já haviam rompido
pla�vo, eles queriam um saber a�vo com a organização social que ela havia
que lhes permi�ssem criar coisas. O dito que era a única correta, pois reflexo
homem renascen�sta que rompeu com da vontade de Deus, agora querem des-
as imposições da sociedade feudal, cobrir os segredos do corpo humano,
agora queria romper também com as da natureza e do universo. Mas ela já
imposições que a natureza lhe impu- havia dito tudo que �nha para ser dito.
nha. Descobrir seus mistérios para usá- Essa vontade de conhecer era uma blas-
-los a seu favor era algo muito rentável fêmia tamanha que só poderia ser puri-
e promissor. ficada pelo fogo da Inquisição do Santo
O�cio. “Ousem ques�onar o que disse-
Pergunte aos navegadores que �- mos e sofrerão as consequências”, era o
nham que desbravar os mares, aos aviso que a Igreja havia dado. Mas as
mineradores que �nham que encontrar famílias ricas ousaram e, conhecidos
metais preciosos para cunhar moedas. como mecenas, financiaram vários
Pergunte aos estudantes de medicina ar�stas e cien�stas, que com sua arte e
que queriam conhecer melhor o corpo invenções iam firmando os valores bur-
humano para tratá-lo melhor, e aos gueses na nova sociedade.
engenheiros que queriam descobrir
novas formas de construir armas para 1.1.2 Primeiros pensadores humanis-
guerrear com mais facilidade. Essa von- tas: Francesco Petrarca
tade de obter um conhecimento que os
ajudassem em questões prá�cas (o em- Petrarca é considerado o iniciador do
brião do conhecimento cien�fico), se Humanismo. Pesquisador e filólogo,
refle�u em todos os ramos da cultura, divulgador e escritor, é �do como o
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Humanismo, Renascimento e Revolução Científica Moderna

“pai do Humanismo”. Mas esse grande O grande nome do neo-epirurismo do


la�nista deve sua fama principalmente período é Lourenzo Valla. Ele foi um
a seus poemas, redigidos em língua ita- filósofo de pres�gio e com seus conhe-
liana. Petrarca acreditava no imenso cimentos sobre linguís�ca, sendo
valor prá�co e na imensa moral do grande conhecedor do la�m e do grego,
estudo da História An�ga e da Literatu- expôs erros decorrentes de traduções
ra An�ga – isto é, o estudo do pensa- defeituosas de Aristóteles e da Bíblia.
mento e da ação humana. Embora o Se tornou um grande crí�co da lógica
Humanismo tenha mais tarde sido asso- escolás�ca aristotélica e do estoicismo,
ciado ao secularismo, Petrarca era um além de defensor de uma moral inspira-
devoto cristão e não via conflitos entre da no epicurismo. Na obra De Volupta-
a realização do potencial humano e a fé te, de 1431, Valla apresenta por meio
religiosa. Um homem muito introspec�- de um diálogo, os mo�vos pelo qual
vo, ele deu forma, em grande parte, ao não é de acordo com o conceito de
nascente movimento humanista por- “Verdadeiro bem” segundo a filosofia
que muitos de seus conflitos internos e estoica. Ao construir um debate entre
meditações expressadas em suas obras um epicurista, o poeta Antonio Becca-
foram sumamente recebidas pelos filó- delli e um estoico, o professor e chance-
sofos humanistas renascen�stas e ler Leonardo Bruni, na obra o autor
deba�das por muitos anos. Por exem- apresenta a visão filosófica de cada
plo, Petrarca lutou com a relação pró- escola para definir o conceito. Para o
pria entre a vida a�va e a vida contem- epicurismo, no qual Valla era adepto, o
pla�va e teve uma tendência a enfa�zar verdadeiro bem seria o “prazer”, pois
a importância da solidão e do estudo. O este seria desejável do homem, lhe
resultado foi que um surpreendente seria ú�l e agradável quando bem
número de líderes polí�cos, militares e entendesse. Para os estoicos, o verda-
religiosos durante a Renascença apon- deiro bem seria a “hones�dade” deriva-
taram a noção de que sua busca pela da da “virtude”, além de outras virtudes
glória pessoal deveria se basear no como a “coragem”, entretanto, isso
exemplo clássico e na contemplação. priva do prazer da dor e do sofrimento,
segundo Epicuro, e as possibilidades
Já os pensadores L. Bruni, P. Bracciolini que este prazer possa trazer. A crí�ca de
e L. B. Alber� são os primeiros nomes Lorenzo Valla se baseia nesta diferença
deste período que desenvolveram o de conceitos, no qual o estoicismo
debate sobre temá�cas é�co-polí�cas. limita o homem em alcançar o bem
devido as obrigações de suas virtudes,
1.1.3 Epicurismo: Lourenzo Valla que o impedem de experimentar as
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experiências e consequências das a hieróglifos universais, originários do


adversidades. mundo celeste.

1.1.4 Platonismo: Nicolau de Cusa, Pico dela Mirandola, na Oratio, jus�fica


Marsílio Ficino, Pico dela Mirandola e a importância da busca humana pelo
Francesco Patrizzi conhecimento numa perspec�va neo-
platônica. Ele afirma que Deus, tendo
Nicolau de Cusa tem como a sua princi- criado todas as criaturas, foi tomado
pal obra Da Douta Ignorância, publica- pelo desejo de gerar uma outra criatu-
da em 1440. Como filósofo, Nicolau ra, um ser consciente que pudesse
ficou conhecido por ideias que absorve- apreciar a criação, mas não havia
ra tanto da literatura an�ga quanto me- nenhum lugar disponível na cadeia dos
dieval, como por exemplo o neoplato- seres, desde os vermes até os anjos.
nismo e o neoplatonismo cristão. Seus Então Deus criou o homem, que ao con-
pensamentos giravam em torno do con- trário dos outros seres, não �nha um
ceito de cooperação: o obje�vo de lugar específico nessa cadeia. Em lugar
alcançar a mais ampla unidade possível, disso, o homem era capaz de aprender
segundo ele seria o meio para a huma- sobre si mesmo e sobre a natureza,
nidade se chegar a um sen�do mais ele- além de poder emular qualquer outra
vado. Também defendia que os efeitos criatura existente. Desta forma, quando
da mentalidade presente desenvolve- o homem filosofa, ele ascende a uma
riam algo em comum para um consenso condição angélica e comunga com a
de tolerância religiosa. Divindade, entretanto, quando ele falha
em u�lizar o seu intelecto, pode descer
Marsílio Ficino propõe uma visão do à categoria dos vegetais mais primi�-
homem com forte afinidade cósmica e vos. Pico, deste modo, afirma que os
mágica, no centro de uma machina filósofos estão entre as criaturas mais
mundi animada e altamente espirituali- dignificadas da criação. A ideia que o
zada, porque imbuída do spiritus homem pode ascender na cadeia dos
mundi. A função principal do pensa- seres pelo exercício de suas capacida-
mento humano seria a de a�ngir – atra- des intelectuais foi uma profunda
vés de uma iluminação racional (ratio), garan�a de dignidade da existência
intelectual (mens) e imagina�va (spiri- humana na vida terrestre. A raiz da dig-
tus e fantasia) – a autocosciência da nidade reside na sua afirmação que
própria imortalidade e a divinização do somente os seres humanos podem
homem, graças àqueles signa e symbola mudar a si mesmos pelo seu livre-arbí-
– signos cósmicos e astrais comparáveis trio. Ele observou na história humana
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que filosofias e ins�tuições estão tude, ela é sua própria recompensa,


sempre evoluindo, fazendo da capaci- acrescentada a qualquer outra recom-
dade de auto-transformação do pensa ela diminuiria o valor da virtude,
homem a única constante. ela não é um meio para conseguir outra
coisa, a ideia da imortalidade é desloca-
Francesco Patrizzi foi um filósofo e hu- da pela ideia de progresso, assim a hu-
manista italiano. Ensinou nas cidades manidade inteira seria como um indiví-
de Ferrara e Roma. Nas obras Trattato duo, as leis morais não precisam susten-
della poetica em dois volumes (1582) e tar-se nem no medo, nem a esperança,
Della retorica (1562) concebe a arte mas sim nascem de nosso próprio ser,
como uma imitação da natureza. com o que se formula por primeira vez
o princípio da autonomia moral. Uma
1.1.5 Aristotelismo: Pietro Pomponazzi moral independente de todo critério
externo, portanto, o fim do homem não
Tratando agora do aristotelismo, o é o conhecimento, a não ser a felicidade
nome que se destaca é Pietro Pompo- moral.
nazzi. A imortalidade da alma é um ato
de fé e não é demonstrável pela razão; 1.1.6 Ce�cismo: Montaigne
nos argumentos do Aristóteles não é
possível demonstrar a imortalidade da E, por fim, citando o ce�cismo, o nome
alma. A relevância é�ca disto parece ser mais importante é Michel de Montaig-
que a vida moral perdesse seu centro, ne. Montaigne não tem um sistema.
pois a ideia da imortalidade da alma é o Não é um moralista, nem um doutrina-
instrumento de temor ou recompensa, dor. Mas não sendo moralista, não
portanto se deduz que ao não poder tendo um sistema de conduta, uma
jus�ficá-lo, o homem será o animal moral com princípios rígidos, é um pen-
mais desventurado (Ficino). Pomponaz- sador é�co. Procura indagar o que está
zi diz que o homem é capaz de encon- certo ou errado na conduta humana.
trar o sen�do de sua vida até sem exis�r Propõe-se mais estudar pelos seus
a imortalidade. No Aristóteles, o fim ensaios certos assuntos do que dar res-
úl�mo do homem é a vida contempla�- postas. No fundo, Montaigne está
va, que é a forma de vida do próprio naquele grupo de pensadores que
Deus. É verdade que há muitas pessoas estão a perguntar em vez de responder,
que prefeririam a desonra e o vício, se e é na sua incerteza em dar respostas,
com a morte termina tudo, isso prova que surge um certo cep�cismo em
unicamente que essas pessoas não Montaigne. Como não está interessado
entendem a verdadeira natureza da vir- em dar respostas apriorís�co tem uma
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certa reserva em relação a mis�cismos na razão, ele não põe a fé em causa,


e crenças. É de notar um certo alhea- pois esta situa-se num plano diferente,
mento em relação ao Cris�anismo e às sendo, portanto, estruturalmente inata-
lutas de religião que se viviam em cável pelo espirito cé�co. A “naturalida-
França na época. Embora não deixe de de” do conhecimento de Deus depende
refle�r em assuntos como a destruição inteira e exclusivamente da fé. O cé�co,
das Novas Índias pelos espanhóis, ou portanto, só pode ser fideísta. Mas o
seja, as suas reflexões visam os clássicos fideísmo de Montaigne não é o do mís-
e a sua própria contemporaneidade. �co. E o interesse de sua obra volta-se
predominantemente para o homem e
Tanto fala de um episódio de Cipião não para Deus. A an�ga exortação con-
como fala de algum acontecimento do �da na sentença inscrita no templo de
seu século como fala de um qualquer Delfos, “conhece-te a � mesmo”, da
seu episódio domés�co. O fato de ter qual Sócrates e grande parte do pensa-
introduzido uma outra forma de pensar mento an�go se apropriaram, torna-se
através de “ensaios”, fez com que o pró- para Montaigne o programa do autên�-
prio pensamento humano encontrasse co filosofar. Mas não só isso, os filósofos
uma forma mais legí�ma de abordar o an�gos visavam ao conhecimento do
real. A verdade absoluta deixa de estar homem com o obje�vo de alcançar a
ao alcance do homem, sendo doravan- felicidade e esse obje�vo também está
te, possível tão-somente uma verdade no centro da sua filosofia.
por aproximações. A filosofia de Mon-
taigne influenciou em grande medida A dimensão mais autên�ca da filosofia
uma das crises principais da história da é a da “sabedoria”, que ensina como
filosofia moderna: a questão da consis- devemos viver para sermos felizes. Mas
tência do homem e suas ações. Sua como a razão cé�ca, abraçada por Mon-
obra Ensaios desafia a crença no Eu taigne, pode alcançar esses obje�vos,
sólido e substancial para enfa�zar a aquela mesma razão cé�ca que propõe
inconsistência natural do homem, e acima de todas as coisas a pergunta de
assim traz uma mudança da valorização advertência “o que sei eu?”. Sexto Em-
da profundeza do homem para sua pírico (filósofo grego que viveu entre os
superficialidade. séculos II e III d.C.) escreveu que os cé�-
cos conseguiram resolver o problema
Com Montaigne, o ce�cismo convive da felicidade precisamente mediante a
com uma fé sincera. Isso surpreendeu renúncia ao conhecimento da verdade.
muitos historiadores. Na realidade, A este propósito, ele citava o conhecido
porém, sendo o ce�cismo desconfiança apólogo do pintor Apeles que, não con-
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Humanismo, Renascimento e Revolução Científica Moderna

seguindo pintar sa�sfatoriamente a bedoria a sua própria medida. Cada


espuma sobre a boca de um cavalo, qual só pode ser sábio de sua própria
tomado de raiva, lançou contra a pintu- sabedoria; o sábio deve saber dizer sim
ra a esponja embebida em �ntas. Então, a vida, em qualquer circunstância, e
a esponja deixou na tela uma mancha aprender a aceitá-la e amá-la assim
que parecia espuma. E da mesma ma- como é, sempre.
neira que, com a renúncia, Apeles
alcançou o seu obje�vo, os cé�cos, com Como cada ser humano apresenta múl-
a renúncia a encontrar o verdadeiro (ou �plos aspectos e cada um tem suas
seja, suspendendo o juízo), acabaram caracterís�cas próprias, não é possível
encontrando a tranquilidade. estabelecer regras para todos os
homens. Não podemos indicar algo que
A solução adotada por Montaigne inspi- seja comum a todos, cada indivíduo
ra-se nessa, mas é muito mais ar�cula- tem que elaborar seu próprio conheci-
da, rica em nuanças e sofis�cada, com a mento, sua sabedoria par�cular, que vai
inclusão, também, de sugestões epicu- ser a sua medida para conhecer a si
ristas e estoicas. O homem é mísero? mesmo. Conhecendo a si mesmo o
Pois bem, captemos o sen�do dessa homem também regressa a si, o que é
miséria. É limitado? Captemos o sen�- um dos princípios do renascimento.
do dessa limitação. É medíocre? Capte- Montaigne se preocupa também com a
mos o sen�do dessa mediocridade. condição existencial do ser humano. A
Mas, se compreendermos isso, compre- existência é um problema, uma pergun-
enderemos também que a grandeza do ta que nunca poderá ser respondida. A
homem está precisamente em sua me- nossa existência é uma experiência
diocridade. Então é claro que o “conhe- constante e constantemente também
ce-te a � mesmo” não pode desembo- deve explicar a si própria. Cada pessoa
car em uma resposta sobre a essência traz em si a condição existencial de toda
do homem, mas somente sobre as humanidade. Ele busca descrever o
caracterís�cas do homem singular, que homem descrevendo a si mesmo. Ele e
alcançamos vivendo e observando os o homem são um milagre em si mesmo.
outros viverem, bem como procurando Em seus escritos ele diz u�lizar a pró-
nos reconhecer a nós mesmos refle�- pria vida como filosofia. A sua filosofia é
dos na experiência dos outros. Os um relato autobiográfico, pois para ele
homens são notavelmente diversos cada indivíduo tem em si a capacidade
entre si e, não sendo possível estabele- máxima da situação humana. O homem
cer os mesmos preceitos para todos, é deve buscar ser somente o que ele é, ou
preciso que cada um construa uma sa- seja, um homem, e nada mais que isso.
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Humanismo, Renascimento e Revolução Científica Moderna

Não podemos fazer nada melhor do Para que esse renascimento e o retorno
que sermos humanos. De nada adianta aconteçam é necessário rejeitar tudo
criarmos fantasias de que seremos algo que foi criado pelo poder eclesiás�co, é
mais elevado do que humanos que preciso uma reforma religiosa, o cris�a-
somos. Aspirarmos ser algo além de nismo tem que voltar às suas origens,
homens é inú�l e pode nos causar ao entendimento das verdades simples
danos morais. Ele afirma ainda que a que os evangelhos mostram. O caminho
morte faz parte da nossa condição de da sabedoria e da salvação é simples e
humanos. Nós somos uma mescla de passa pela esperança, pela caridade e
vida e morte e ambas se confundem em pela fé sincera. Esses pontos dão liber-
nós. Aprender a viver é aprender a dade ao espírito e essa liberdade é o
morrer. Quando assumimos nossa con- verdadeiro ensinamento do evangelho.
dição mortal tendemos a es�mar mais a O espírito cristão não está nas roupas
vida que temos. A morte nos faz desejar eclesiás�cas ou em uma alimentação,
viver mais e melhor. mas na sensibilidade na emoção e na
compreensão. O cristão pode encontrar
1.2 A Renascença e a Religião tudo isso lendo e interpretando a Bíblia
e é da leitura das Sagradas Escrituras
1.2.1 Erasmo de Ro�erdam que vai renascer o verdadeiro cristão,
vai renascer a verdadeira natureza
Erasmo posiciona-se contra a constru- humana. A bíblia é a fonte do cris�anis-
ção da filosofia com base no aristotelis- mo e nela deve-se beber a água do
mo escolás�co. Ele acredita que o obje- renascimento.
�vo da filosofia é conhecer-se a si
mesmo, seguindo os passos de Sócra- Em seu livro Elogio da Loucura, ele u�li-
tes. Conhecer-se a si mesmo é a�ngir a za do sarcasmo e da sá�ra para
sabedoria que está ligada a uma vida demonstrar o declínio da moral religio-
religiosa cristã. Para ter sabedoria as sa da sua época. Para ele, a loucura é o
pessoas não precisam de grandes apro- que movimenta a vida, é a men�ra que
fundamentos filosóficos, basta a leitura dá sen�do à existência. Nossa socieda-
e o entendimento de poucos livros que de e nós mesmos temos por base a
para ele são os Evangelhos e as Epísto- men�ra e a ilusão e são elas que enco-
las de Paulo o apóstolo. Através do brem a dura realidade em que vivemos,
entendimento desses livros pode-se elas tornam a vida mais atraente. Nas
retornar à verdadeira natureza do cris- ideias de Erasmo estão as bases do pro-
�anismo, pode-se renascer. testan�smo de Lutero, mas sobre um
ponto Erasmo discorda de Lutero, no
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Humanismo, Renascimento e Revolução Científica Moderna

livre arbítrio. Para Erasmo na liberdade dem agos�niana em 1524 e, no ano


está a força da vontade humana e atra- seguinte, casa-se com uma ex-freira.
vés dela o homem pode buscar a salva- Morre em sua cidade natal.
ção por seu próprio mérito.
1.2.3 Ulrich Zwínglio
1.2.2 Mar�nho Lutero
A grande importância atribuída a João
Teólogo alemão, iniciador da Reforma Calvino, o mais destacado teólogo e
Protestante e fundador da Igreja Lute- organizador do movimento reformado,
rana, nasce em Eisleben e, a par�r de muitas vezes obscurece a figura do
1501, estuda na Universidade de Erfurt. reformador Zwínglio, o líder inicial
Torna-se mestre em filosofia em 1505 e desse movimento. Zwínglio nasceu no
ingressa na Ordem dos Agos�nianos. dia 1º de janeiro de 1484 (apenas dois
Em 1512 doutora-se em teologia. Cinco meses após o nascimento de Lutero) na
anos depois passa a cri�car a venda de vila de Wildhaus, no Cantão de St. Gall,
indulgências pela Igreja Católica e a nordeste da Suíça. Após frequentar
defender a tese de que o homem só se uma escola la�na em Berna, ingressou
salva pela fé. Acusado de herege, fixa na na Universidade de Viena, onde entrou
porta da igreja do Castelo de Wit- em contato com o humanismo. Em
tenberg as 95 teses que iniciam a refor- seguida, estudou na Universidade de
ma. Basiléia, na qual foi influenciado pelo
interesse bíblico de alguns mestres e
Não reconhece a autoridade papal, formou um círculo de amigos que mais
nega o culto aos santos e só aceita os tarde o puseram em contato com o
sacramentos do ba�smo e da eucaris- grande humanista holandês Erasmo de
�a. Convidado pelo papa Leão X a se Roterdã.
retratar, recusa-se e queima em praça
pública a bula pon�fical. Excomungado Após obter o grau de mestre em 1506,
em 1520, publica Manifesto à Nobreza foi ordenado ao sacerdócio e tornou-se
Alemã, Do Cativeiro Babilônico da pároco na cidade de Glarus. As influên-
Igreja e Da Liberdade do Cristão, os cias humanistas e as suas próprias expe-
grandes escritos reformistas. riências como capelão de mercenários
suíços na Itália o levaram a opor-se a
Em 1521 é banido da Alemanha pelo esse sistema. Tal fato contribuiu para a
imperador Carlos V. Apoiado por seto- sua transferência para Einsiedeln em
res da nobreza, traduz o Novo Testa- 1516 e dois anos mais tarde para Zuri-
mento para o alemão. Abandona a or- que, onde se tornou sacerdote da prin-
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Humanismo, Renascimento e Revolução Científica Moderna

cipal igreja da cidade. Tendo lido recen- pério alemão e também contra os can-
temente a tradução do Novo Testamen- tões católicos da Suíça. Buscando fazer
to feita por Erasmo, começou em 1519 uma aliança com os protestantes ale-
a pregar uma série de sermões bíblicos mães, encontrou-se com Lutero no
que causaram forte impacto. A par�r célebre Colóquio de Marburg, convoca-
dessa época, defendeu um grande pro- do pelo príncipe Filipe de Hesse em
grama de reformas em cooperação com 1529. Embora concordassem em quase
os magistrados civis. Suas ideias sobre o todos os pontos discu�dos, os dois
culto público e os sacramentos repre- reformadores não puderam chegar a
sentaram uma ruptura mais radical com um acordo com relação à Ceia do
as an�gas tradições do que fez o movi- Senhor. No dia 11 de outubro de 1531,
mento luterano. quando acompanhava as tropas protes-
tantes na segunda batalha de Kappel,
O ano de 1522 foi decisivo. Zwínglio Zuínglio foi morto em combate. Segun-
protestou contra o jejum da quaresma e do se afirma, suas úl�mas palavras
o celibato clerical, casou-se secreta- foram: “Eles podem matar o corpo, mas
mente com Ana Reinhart, escreveu não a alma”.
Apologeticus Archeteles (seu testemu-
nho de fé) e renunciou ao sacerdócio, 1.2.4 João Calvino
sendo contratado pelo concílio munici-
pal como pastor evangélico. Nos dois João Calvino, ba�zado Jean Cauvin,
anos seguintes, uma série de debates nasceu em Noyon (10/07/1509), filho
públicos levou à progressiva implanta- de Gérard Cauvin, oficial da Igreja cató-
ção da reforma em Zurique, culminan- lica na cidade, e de Jeanne de Lafranc,
do com a subs�tuição da missa pela filha de abastado hoteleiro de Cambrai
Ceia do Senhor em 1525. Infelizmente, e influente membro da sociedade de
alguns de seus primeiros colaborado- Noyon. Católicos pra�cantes, consagra-
res, tais como Conrado Grebel e Félix ram dois filhos ao sacerdócio, Charles e
Mantz, adotaram posturas radicais Jean. Com os rumores da Reforma,
quanto ao ba�smo, dando início ao mo- Gérard passou a ques�onar a validade
vimento anaba�sta, que gerou fortes de preparar Jean para o sacerdócio.
reações das autoridades. Obediente ao pai, Jean deixou Paris e
seguiu estudos em Orleans, depois em
Os úl�mos anos da vida de Zwínglio Bourges (Direito). Depois, Letras Clássi-
foram marcados por crescente a�vida- cas (Paris). Em 1532, Jean Cauvin publi-
de polí�ca. No interesse da causa refor- cou seu comentário da obra de Sêneca,
mada, ele defendeu a luta contra o im- De Clementia (sobre a clemência), con-
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Humanismo, Renascimento e Revolução Científica Moderna

clamando o rei Francisco I a usar de cle- elaborou uma cons�tuição religiosa


mência para com os reformadores, baseada nas “Ins�tuições”, par�cipou
posto que a Igreja francesa condenava de congressos, fez amigos reformado-
impiedosamente quaisquer novas res e se tornou impressionante teólogo
ideias que surgissem no campo do reli- e pastor de refugiados das persegui-
gioso. ções, até 1541, quando Genebra o
chamou de volta, para impedir a tenta-
A conversão de Cauvin ao protestan�s- �va do cardeal La Baume de restaurar o
mo ocorreu entre 1532 e 1533, quando catolicismo numa cidade que se tornara
residira na casa de E�enne de Laforge, reformada (Lux post Tenebras). Mais
adepto da Reforma, e tornou-se amigo experiente, Calvino faz uma segunda e
de outro novo adepto da Reforma, defini�va passagem por Genebra, onde
Nicolas Cop, professor de filosofia na veio a ser considerado o grande “refor-
Sorbonne. Foi a par�r de então que mador universal”. Par�cipou do Conse-
começou a ocorrer a metamorfose de lho da Cidade para assuntos eclesiás�-
Cauvin em Calvin, tornando-se militan- cos, sem poder decidir, pois era estran-
te nas disputas dos Placards contra a geiro, mas onde exerceu grande influ-
missa católica e após prefaciar a Bíblia ência a respeito de seu governo civil,
de Olivétan, traduzida para o francês ajudando a elaborar leis, fundando a
por este seu primo. Sua postura an�ca- Academia de Genebra que foi a escola
tólica o fez fugir de Paris para Angoulê- de grandes reformadores de toda a
me (onde iniciou as Ins�tutas) e depois Europa, tornando Genebra o principal
para Ferrara (Itália), onde mudou seu centro protestante da Europa. Calvino e
nome para Calvin, para fugir às perse- o Conselho de Genebra estabeleceram
guições. importantes reformas na Igreja na
cidade, onde trabalhou até a sua morte,
Calvino acabou passando por Genebra, em 27/05/1564, deixando um legado
onde encontrou Farel, líder protestante imenso, muitas obras publicadas e com
que começara ali a Reforma e obrigou seguidores do sistema presbiteriano
Calvino a ficar em Genebra. Sua primei- (governo cole�vo de presbíteros), mais
ra permanência ali durou de 1536 a tarde chamado de calvinismo, em toda
1538, mas fracassou na ajuda a Farel de Europa Ocidental onde foram chama-
impor uma reforma tão radical, mesmo dos de huguenotes (França), presbite-
tendo escrito “Ar�gos Sobre o Governo rianos (Escócia), puritanos (Inglaterra) e
Local” e “Confissões de Fé”, precisou ser protestantes (Holanda). Do século 16
expulso de Genebra. De lá para Estras- até hoje tem se espalhado por toda a
burgo, onde se casou, amadureceu, terra o cris�anismo de orientação
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Humanismo, Renascimento e Revolução Científica Moderna

calvinista. lições que a história havia dado e como


se comportavam os grandes polí�cos de
1.3 A Renascença e a Polí�ca sua época, ele escreveu um manual de
como construir um estado forte e como
1.3.1 Nicolau Maquiavel se manter no poder para governá-lo.

“Como é meu intento escrever coisa ú�l Durante a Idade Média, o poder do rei
para os que se interessarem, pareceu- era sempre confrontado com os pode-
-me mais conveniente procurar a verda- res da Igreja ou da nobreza. As monar-
de pelo efeito das coisas, do que pelo quias nacionais surgem com o fortaleci-
que delas se possa imaginar. E muita mento do rei e, portanto, com a centra-
gente imaginou repúblicas e principa- lização do poder, fenômeno este que se
dos que nunca se viram nem jamais desenvolve desde o final do século XIV
foram reconhecidos como verdadeiros.” (Portugal) e durante o século XV (Fran-
As transformações sofridas pelo poder ça, Espanha, Inglaterra). Dessa forma
polí�co não passaram despercebidas surge o Estado moderno, que apresenta
pelos renascen�stas, e a principal e caracterís�cas específicas, tais como o
mais significa�va personalidade nesse monopólio de fazer e aplicar as leis,
campo foi o floren�no Nicolau Maquia- recolher impostos, cunhar moeda, ter
vel. Ele assumiu um cargo importante um exército. A novidade é que tudo isso
no governo de Florença depois que a se torna prerroga�va do governo cen-
família Médici foi afastada do controle tral, o único que passa a ter o aparato
da cidade. Trabalhava como diplomata administra�vo para prestação dos servi-
fazendo várias viagens aos grandes ços públicos bem como o monopólio
reinos que haviam se unificado, e não legí�mo da força. É em função desse
se conformava com o estado de guerra contexto que se torna possível compre-
que se encontrava a Península Itálica. ender o pensamento de Maquiavel.

Maquiavel é considerado o pai da ciên- Na época de Maquiavel, as cidades mais


cia polí�ca moderna porque não escre- expressivas da Península Itálica eram: a
veu um tratado teórico de como deve- sua Florença, Milão, Nápoles e Veneza.
ria ser o governo ideal. Desde os gregos Apesar de seu forte comércio elas eram
até sua época, todos fizeram isso. Sua frágeis poli�camente e totalmente vul-
preocupação não era como deveria ser neráveis a ataques externos. Na época
a polí�ca, mas sim em como ela é real- dele era a coisa mais comum uma
mente pra�cada. Com isso em mente, cidade invadir e dominar outra, por isso
tendo como fundamento empírico as a sua preocupação. Além disso, Ma-
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Humanismo, Renascimento e Revolução Científica Moderna

quiavel acreditava que a região italiana desempenhar inúmeras missões diplo-


só teria a ganhar se fosse unificada. Mas má�cas na França, Alemanha e pelos
como fazer isso? Essa é a pergunta cen- diversos Estados italianos.
tral de O Príncipe, a sua grande obra
prima que iria mudar totalmente o Tem oportunidade de entrar em conta-
modo dos homens ocidentais enxerga- to direto com reis, papas e nobres, e
rem a polí�ca. Enquanto as demais também com o condo�ere César
nações europeias conseguem a centra- Bórgia, que estava empenhado na am-
lização do poder, a região onde futura- pliação dos Estados Pon��cios. Obser-
mente será a Alemanha e a Itália se vando a maneira de Bórgia agir, Ma-
acham fragmentadas em inúmeros quiavel o considera o modelo de prínci-
Estados sujeitos a disputas internas e a pe que a Itália precisava para ser unifi-
hos�lidades entre cidades vizinhas. No cada. Quando Soderini é deposto e os
caso da Itália, a ausência de unificação a Médicis voltam à cena polí�ca, Maquia-
expõe à ganância de outros países vel cai em desgraça e recolhe-se para
como Espanha e França, que reivindi- escrever as obras que o consagraram.
cam territórios e assolam a península Entre peças de teatro (como a famosa
com ocupações intermináveis. Mandrágora), poesia, ensaios diversos,
destacam-se O príncipe e Comentários
É nessa Itália dividida que vive Maquia- sobre a primeira década de Tito Lívio.
vel na república de Florença. Observa Destaco, a seguir, alguns pontos cen-
com apreensão a falta de estabilidade trais da obra O Príncipe.
polí�ca da Itália, dividida em principa-
dos e repúblicas onde cada um possui 1. Das formas de governo: repúblicas e
sua própria milícia, geralmente formada principados. “Não existe modo mais
por mercenários. Nem mesmo os Esta- seguro para conservar tais conquistas,
dos Pon��cios deixavam de formar os senão pela destruição. E quem se torne
seus exércitos. Maquiavel não foi senhor de uma cidade acostumada a
apenas um intelectual que refle�u a viver livre e não a destrua, espere ser
respeito de polí�ca, pois viveu intensa- destruído por ela...” (cap. V). Em vez de
mente a luta de poder no período em reproduzir a conhecida forma encontra-
que Florença, tradicionalmente sob a da na filosofia polí�ca dos an�gos, que
influência da família Médici, encontra- separava os regimes em Monarquia (go-
va-se por uma década governada pelo verno de um só), Oligarquia (o governo
republicano Soderini. Nessa época Ma- de um grupo) e Democracia (o governo
quiavel ocupa a Segunda Chancelaria de muitos), Maquiavel iden�fica apenas
do governo, função que o obriga a dois �pos de regime: as repúblicas (o
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Humanismo, Renascimento e Revolução Científica Moderna

governo em comum administrado por tudo desaba e a par�da está ganha.


um conselho, um senado ou consulado) Derrubando-se o príncipe absoluto, um
e os principados (o governo de um déspota oriental, por exemplo, tudo cai
homem só que pode exercê-lo por nas mãos do agressor. A an�ga criada-
herança, por indicação, ou pela força). gem simplesmente muda de senhor e
Há também os principados eclesiás�cos se põe às ordens do vitorioso, como
– aqueles dirigidos diretamente pela aconteceu com os sátrapas persas de
Igreja Católica por seus bispos –, pois a Dario (330 a.C.) em relação a Alexandre,
Santa Sé, naqueles tempos, também o Grande (323 a.C.); 2°) Autoridade
exercia poder temporal. A instabilidade mi�gada: o príncipe governa por meio
maior acomete o principado novo, de conselhos, parlamentos ou assem-
porque a chegada repen�na ao poder bleias de nobres, aparecendo como um
de um senhor desconhecido sempre presidente de uma confederação de
termina por desgostar os que antes barões e duques, tendo por vezes que
estavam no governo sem que ele ainda conviver com um parlamento. Neste
tenha a adesão do povo. Agrega-se a governo, pode ser mais fácil a vitória,
isso o fato da nova ordem ter redobra- mas é mais di�cil assegurar o controle
das dificuldades em se estabilizar do reino porque cada barão irá resis�r
quando implantada num território ao seu modo ao ocupante, independen-
estranho, com outras línguas e costu- te do rei estar aprisionado ou morto.
mes. A melhor e mais segura maneira Seja como for, a melhor maneira de
de dominar uma região conquistada – conservar um Estado dominado, sem
como haviam ensinados os romanos – é precisar destruí-lo inteiramente, é per-
ir habitá-la ou colonizá-la. mi�r que ele mantenha suas próprias
leis e costumes, preocupando-se
2. Da estrutura e essência dos gover- apenas em criar um núcleo colaboracio-
nos: autoridade absoluta ou mi�gada. nista que auxilie no domínio e na arre-
Os governos dividem-se em dois �pos: cadação dos tributos. Deste modo, o
1°) Autoridade absoluta (ou despó�ca): ódio e o rancor da população ocupada
o príncipe exerce o poder de modo são atenuados ou se voltam primeira-
direto. Ministros e funcionários, por mente contra o próprio conquistador.
exemplo, são seus servos. O príncipe é Maquiavel aponta que aqueles que
um chefe absoluto, sendo que os que o viveram em liberdade são os que
cercam são seus servidores, pra�ca- menos se conformam com a perda dela,
mente seus servos; o mecanismo é portanto a situação mais segura para o
semelhante ao de um jogo de xadrez: ocupante é destruí-los completamente.
basta dar um xeque-mate no rei que
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Humanismo, Renascimento e Revolução Científica Moderna

3. O príncipe e as novas conquistas: nar é a arte de se fazer amar ou temer


virtù e fortuna. “Não haver coisa mais pelo povo, “de vencer pela força ou pela
di�cil para cuidar, nem mais duvidosa a fraude”, de manter-se no poder a qual-
conseguir, nem mais perigosa a mane- quer custo.
jar, que se tornar chefe e introduzir
novas ordens” (cap. VI). Quando se 4. O príncipe e o crime: mal bom e ruim.
trata da fundação de um novo principa- Há ainda uma terceira via, além da virtù
do, a situação de sucesso depende de e fortuna, para chegar ao poder em um
dois fatores: virtù e fortuna. A implanta- Estado: o crime. A vilania e o crime, por
ção do novo regime deve muito à oca- vezes, são degraus para se chegar ao
sião, ao príncipe saber aproveitar bem topo, mas depois de nele instalado
as oportunidades que surgem à sua recomenda-se ao príncipe que se desfa-
frente, saber navegar quando as corren- ça da escada suja de sangue que ele
tes estão a seu favor. O maior desafio usou para subir. As “maldades nega�-
que um príncipe se depara na fundação vas”, ou maldades verdadeiramente
de uma nova ordem das coisas deriva ruins são aquelas que não cessam
do fato que ele tem contra si todos nunca, “que aumentam ao invés de se
aqueles que eram beneficiados na situ- ex�nguir”. É sempre melhor, aconse-
ação anterior, tendo ao seu lado apenas lhou, “pra�car a ofensa de uma só vez,
os simpa�zantes ainda �midos, que não de imediato, enquanto que os bene�-
sabe ou não puderam ainda sen�r-se cios devem ser feitos aos poucos”. O
beneficiados pela nova situação. Os que mal, tal como um purgante, deve ser
são contra ele são muito fortes ainda e aplicado instantaneamente, todo de
os que lhe acompanham não têm certe- uma só vez goela abaixo, enquanto que
za do sucesso do empreendimento e o bem deve ser ministrado aos poucos,
tendem facilmente a desis�r. “Somente como se fosse uma iguaria, apreciada
os profetas armados venceram enquan- colher a colher. O mesmo se dá com a
to que o des�no dos profetas desarma- injúrias. Para ele, o mal – inerente ao
dos é o fracasso” (cap. VI). Profetas homem – é um instrumento da polí�ca
desarmados: é historicamente derrota- que somente deve ser condenado se
do visto que a par�r do momento em aplicado de modo exagerado ou fora de
que perdem o crédito – o povo é volúvel propósito, prejudicando o bom anda-
– ele não tem meios para manter no mento do governo, trazendo-lhe insta-
poder; profeta armado: é o que vence, bilidade. Sobre a guerra, não se pode
pois quando o desencanto ocorre, o evitar uma batalha, pois ela é inevitável.
povo se desilude, ele consegue mantê- Apenas se consegue postergá-la.
-lo na crença pela força da arma. Gover- Enquanto exis�r a humanidade haverá
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Humanismo, Renascimento e Revolução Científica Moderna

guerras. A questão é �rar o melhor pro- aparência e o resultado final da sua po-
veito possível dela. Este �po de disposi- lí�ca e não os pecados em que incorreu
ção, indiferente ao apelo pacifista do ou os métodos que u�lizou para mantê-
cris�anismo, é que levou seus crí�cos a -la. Deve, sim, cul�var a ferocidade de
dizerem que o Maquiavel estava a servi- um leão e a astúcia de uma raposa.
ço de Lúcifer. Há dois �pos de males: 1)
mal bom (posi�vo): quando aplicado de Quando estava no ostracismo polí�co,
uma só vez; quando impõe a ordem; 2) Maquiavel se ocupa com a elaboração
mal ruim (nega�vo): quando se estende dos Comentários sobre a primeira
por muito tempo; quando gera desor- década de Tito Lívio, interrompendo
dem. esse trabalho por alguns meses para
escrever O príncipe. À medida que
5. O príncipe e seus dilemas. 1) Deve ser escreve os Comentários, lê trechos nas
liberal ou con�do? É perigoso ser libe- reuniões realizadas por jovens republi-
ral. Ser gastador significa aumentar os canos, a quem dedica a obra. Aí desen-
impostos do povo, o que gera descon- volve ideias democrá�cas, admi�ndo
tentamento. Melhor a fama de sovina que o conflito é inerente à a�vidade po-
do que a de pródigo; “os homens lí�ca e que esta se faz a par�r da conci-
esquecem mais rapidamente a morte liação de interesses divergentes. Defen-
do pai do que a perda do patrimônio”; de a proposta do governo misto: “Se o
2) Ser amado ou temido? Na impossibi- príncipe, os aristocratas e o povo gover-
lidade de conquistar ambas as coisas, é nam em conjunto o Estado, podem com
melhor ser temido, pois é o método do facilidade controlar-se mutuamente”.
cas�go que mantém o povo quieto; 3) Considera importante que as monar-
Deve ou não sustentar a palavra dada? quias ou repúblicas sejam governadas
Se uma promessa resulta em algo incô- pelas leis e acusa aqueles que, no uso
modo aos interesses do Estado é da violência, abusaram da crueldade,
melhor esquecer o que jurou cumprir; ou a usaram para interesses menores.
4) Deve ou não temer uma conspira-
ção? Somente se for odiado pelo povo e Maquiavel era um republicano e não
cair em desgraça junto aos poderosos escreveu uma obra para um governante
da cidade. A obrigação maior dele é que quisesse se perpetuar no poder de
vencer e manter o Estado, não impor- forma absoluta e despó�ca. Ele �nha
tando os meios u�lizados para alcançar um sonho, mas não era um ingênuo.
tal fim. Se ele �ver sucesso em sua em- Sabia que teria de haver derramamento
preitada sempre será louvado e honra- de sangue para que um grande Estado
do por todos, porque o que importa é a fosse criado, e que isso teria de ocorrer
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Humanismo, Renascimento e Revolução Científica Moderna

sob a liderança de um único homem. cem ser de um homem que defenda um


No entanto, alcançada a estabilidade, governo absolu�sta, que deseja ver um
um regime republicano deveria ser ins- rei governar por toda a eternidade.
talado para que o interesse cole�vo pu- Parecem mais o alerta de alguém que
desse guiar o des�no de todos, e os sabe a importância da liberdade para a
rumos do Estado. É claro que não grandeza e prosperidade de um povo.
encontramos isso em O Príncipe, que é
um manual de como conseguir o poder 1.3.2 Tomás Morus
e se manter nele. Esse perfil republica-
no de Maquiavel é percebido em outra O termo Utopia foi criado pelo inglês
obra sua, qual seja, Comentários sobre Tomás Morus para in�tular um roman-
a primeira década de Tito Lívio. Veja- ce filosófico em 1516. Para compor a
mos um trecho dessa obra em que isso palavra, Morus juntou duas palavras
fica bem evidente: “Percebe-se facil- gregas: "ου" (não) e "τοπος" (lugar), ou
mente de onde nasce o amor à liberda- seja, se formos interpretar a palavra
de dos povos; a experiência nos mostra seguindo sua e�mologia, Utopia signifi-
que as cidades crescem em poder e em ca um lugar que não existe na realidade.
riqueza enquanto são livres. É maravi- No entanto, a obra tornou-se tão céle-
lhoso, por exemplo, como cresceu a bre que o termo foi considerado uma
grandeza de Atenas durante os cem espécie de gênero de escrita caracteri-
anos que sucederam à ditadura de Pisís- zado por conter como principal tema
trato. Contudo, mais admirável ainda é uma organização polí�ca e/ou social
a grandeza alcançada pela república ideais, geralmente em contraponto a
romana depois que foi liberta dos seus uma organização polí�ca e/ou social
reis. Compreende-se a razão disto: não atuais. Uma das marcas que indicam,
é o interesse par�cular que faz a gran- em uma obra filosófica, a diferença
deza dos Estados, mas o interesse cole- entre uma utopia e uma Filosofia Moral
�vo. E é evidente que o interesse ou Polí�ca é a exposição do pensamen-
comum só é respeitado nas repúblicas: to: em vez de o autor de uma utopia tra-
tudo que pode trazer vantagem geral é balhar com conceitos e argumentos, ele
nelas conseguido sem obstáculos. Se expõe os conceitos aplicados a uma
uma certa medida prejudica um ou situação concreta. Por exemplo, Morus
outro indivíduo, são tantos o que ela cria uma ilha-reino, com a geografia
favorece, que se chega sempre a fazê-la descrita provavelmente a par�r de nar-
prevalecer, a despeito das resistências, ra�vas sobre a América, em que
devido ao pequeno número de pessoas demonstra como seria aplicável uma
prejudicadas”. Essas palavras não pare- sociedade sem propriedade privada e
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Humanismo, Renascimento e Revolução Científica Moderna

sem intolerância religiosa, na qual a mônio em caso da morte do cônjuge.


razão é o critério para estabelecer con-
dutas sociais e não o autoritarismo do Apesar de ter se oposto tão firmemente
Rei ou da Igreja – que, em seu contexto à Igreja Anglicana criada pelo rei, em
histórico, a Inglaterra do século XVI, Utopia todos têm liberdade religiosa e
estavam reunidos na figura de Henrique apenas deveriam ser vistos com des-
VIII, chefe de Estado e da Igreja Anglica- confiança aqueles que não professavam
na, criada por ele como forma de rever- nenhuma fé. Isso porque, na obra de
ter a proibição da Igreja Católica ao seu Morus, a fé é consequência da razão e
novo matrimônio com Ana Bolena. instrumento para exercício da jus�ça:
os utopianos acreditam em Deus
Morus foi um homem bastante influen- porque, pela razão, reconhecem que
te na sua época, ocupando inclusive o sua existência depende dele; a crença
cargo de Chanceler de Henrique VIII da em um julgamento futuro faz com que
Inglaterra. Estudou em Oxford, onde todos se apliquem a exercer a jus�ça e a
conheceu outro pensador importante não se entregarem a prazeres de forma
do período, Erasmo de Ro�erdam que desregrada. Ou seja, aos utopianos é
dedicou a ele sua principal obra, Elogio recomendada a fé em Deus, mas
da loucura, e com quem estabeleceu podem discordar a respeito de sua
correspondência. Ambos, humanistas e iden�dade. A religião de Utopia é for-
leitores dos filósofos clássicos, com mada a par�r de preceitos do cris�anis-
grande simpa�a por aquilo que diziam mo e, também, de escolas filosóficas
os estoicos e epicuristas, contestavam a como o estoicismo e o epicurismo. Tem
tradição escolás�ca e queriam promo- três verdades básicas: 1) A fé na exis-
ver uma educação polí�ca que permi�s- tência de um ser supremo, como já foi
se que as pessoas �vessem liberdade dito; 2) A providência de Deus em rela-
de pensamento. Essa base lançada por ção aos homens é amável; 3) A fé na
eles foi um terreno fru�fero para a dis- providência e na retribuição futura para
cussão filosófica posterior. Justamente a alma, que é imortal.
por prezar a liberdade de pensamento,
Morus foi condenado à prisão por trai- Um dos pontos principais de Utopia é a
ção e, depois, à morte por manter-se preocupação com o bem comum ao
firme em sua recusa ao novo matrimô- qual se submete o bem individual. Para
nio de Henrique VIII que contrariava um tanto, os utopianos preferem a divisão
dos dogmas da Igreja Católica, a qual dos bens entre todos, pois acreditam
pertencia, e segundo o qual diz-se que que isso garan�ria a abundância para
só é possível contrair um novo matri- todos e não a concentração de riquezas
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Humanismo, Renascimento e Revolução Científica Moderna

nas mãos de um grupo pequeno. Diz estrutura familiar. Na capital, há trinta


Morus: “É minha convicção firme que famílias, cada uma dirigida por um filar-
uma distribuição segundo critérios de ca, o mais idoso e, em tradução literal,
equidade ou uma planificação justa das “aquele que a ama”. O principal papel
coisas humanas não é possível sem do filarca é mediar a par�cipação da po-
eliminar totalmente a propriedade pri- pulação nas decisões polí�cas, mas sua
vada. Enquanto ela subsis�r, estou con- função é supervisionar o trabalho e
vencido de que há de con�nuar sempre evitar a preguiça. Pra�ca-se a monoga-
a haver, entre grandíssima parte da hu- mia e todos sabem quem são seus
manidade e entre a melhor parte dela, filhos. No entanto, cada família nuclear
o fardo angus�ante e inelutável da po- é integrada às outras famílias com
breza e da miséria”. quem tenha laços de sangue. Cada
família, entendida nesse contexto mais
Por meio da divisão do trabalho, todos amplo, contém entre dez e dezesseis
trabalhariam apenas o necessário para adultos na cidade e até quarenta no
garan�r o bem geral, pois do mesmo campo.
modo que ninguém trabalharia para
outra pessoa, ninguém poderia se 1.3.3 Jean Bodin
esquivar da sua responsabilidade. Até
os viajantes deveriam trabalhar antes Jean Bodin foi um jurista francês que
de serem alimentados. Em caso de contribuiu bastante para que o absolu-
haver produção além da necessidade �smo ganhasse suas mais importantes
de consumo, as horas de trabalho jus�fica�vas intelectuais. Além de preo-
seriam reduzidas. A esse respeito, diz cupar-se com questões de ordem polí�-
Morus: “Se todos trabalhassem, a carga ca, Bodin também era um famoso per-
horária diminui para todos. Havendo seguidor das manifestações heré�cas
seis horas apenas para trabalhar, [...] de sua época. Sua ação contra valores
esse tempo é suficiente para produzir religiosos considerados an�cristãos
bens abundantes que bastem para as acabou deixando-o conhecido como
necessidades e que cheguem não “procurador do Diabo”. Convivendo
apenas para remediar, mas até com os intensos conflitos religiosos que
sobrem”. tomaram conta da França do século XVI,
Bodin vai dedicar boa parte de sua
No segundo livro, descreve-se a ilha reflexão polí�ca à questão da sobera-
como um semicírculo de quinhentas nia. Nesse sen�do, um dos mais mar-
milhas de arco onde existem cinquenta cantes valores pregados pelo seu pen-
e quatro cidades organizadas a par�r da samento consiste em defender a indivi-
21
Humanismo, Renascimento e Revolução Científica Moderna

sibilidade da soberania. Segundo o experiências onde a soberania é assu-


autor, um sistema polí�co em que a mida pela grande maioria da popula-
delegação de poderes se ins�tui ção, acredita o pensador que o estado é
enquanto prá�ca comum promove a popular. Por fim, caso haja um grupo
diluição da soberania necessária a um minoritário controlando as ins�tuições
governo estável. polí�cas, haveria a formação de um
regime aristocrá�co. Além disso, Bodin
Além disso, Bodin acredita que a ideia também vai admi�r que cada �po de
de um governo misto gera uma falsa estado assuma diferentes formas de
impressão de que não há a ação de um governo. Em uma monarquia, por
setor poli�camente soberano. Para con- exemplo, ele pode admi�r que o rei
firmar essa ideia ele toma como exem- tenha uma forma de governo democrá-
plo as prá�cas polí�cas ins�tuídas no �ca ao permi�r que diferentes grupos
interior da República romana. De sociais par�cipem da administração pú-
acordo com sua interpretação, o fato da blica. Ao mesmo tempo, quando a mo-
população romana ter o direito de indi- narquia restringe a par�cipação popu-
car quais pessoas ocupariam os cargos lar ou concentra as decisões nas mãos
de magistratura, não limita os diversos do rei, o governo passa a ganhar traços
poderes concedidos a esses mesmos claramente despó�cos. Dessa maneira,
representantes polí�cos. Dessa manei- Bodin oferece meios para analisar de
ra, Jean Bodin não aceita a possibilida- forma diversa os mais diferentes esta-
de de uma forma de governo pautada dos. Por fim, sua obra se sustenta vee-
na ausência de soberania. Caso não mentemente na ideia de que seria
haja um setor poli�camente soberano, impossível conceber um governo pau-
seja minoritário ou majoritário, qual- tado em grupos igualitariamente favo-
quer governo acaba se transformando recidos. Ao naturalizar as desigualda-
em um verdadeiro regime de natureza des, Bodin começa a levantar argumen-
anárquica. Por isso esse pensador fran- tos onde indica que a desigualdade e a
cês vai pensar no “estado” que a sobe- presença de um indivíduo soberano não
rania assume em diferentes contextos se tratam de um costume socialmente
polí�cos, para assim, julgar qual a clas- cons�tuído, mas uma forma claramente
sificação mais adequada ao seu �po de percep�vel em diferentes manifesta-
governo. ções de ordenação da natureza.

No momento em que a hegemonia é Dessa forma, Jean Bodin também u�liza


assumida pela figura do príncipe, temos uma argumentação de traço fortemen-
a instalação de uma monarquia. Em te religioso para defender o regime mo-
22
Humanismo, Renascimento e Revolução Científica Moderna

nárquico. Segundo o próprio autor, Diferente do direito natural é o “direito


“todas as leis da natureza nos guiam civil” (direito posi�vo), que depende
para a monarquia; seja observando das decisões dos homens e que é pro-
esse pequeno mundo que é nosso mulgado pelo poder civil. Este tem
corpo, seja observando esse grande como obje�vo a u�lidade e é sustenta-
mundo, que tem um soberano Deus; do pelo consen�mento dos cidadãos. A
seja observando o céu, que tem um só vida, a dignidade da pessoa e a proprie-
Sol”. Por isso, esse teórico absolu�sta dade pertencem ao âmbito dos direitos
será considerado um dos defensores do naturais. O direito internacional baseia-
“direito divino dos reis”. -se na iden�dade de natureza entre os
homens. Portanto, os tratados interna-
1.3.4 Hugo Gro�us cionais têm valor mesmo quando es�-
pulados por homens de confissões dife-
Entre os séculos XVI e XVII formou-se e rentes, já que o fato de pertencer a fés
se consolidou a teoria do direito natu- diversas não modifica a natureza
ral, sobretudo, por obra do holandês humana. O obje�vo da punição para as
Hugo Gro�us no escrito O direito da infrações aos direitos deve ser corre�-
guerra e da paz, de 1625. Ainda se vo: não se pune quem errou porque
podem sen�r as raízes humanistas de errou, mas para que não erre mais (no
Gro�us, mas ele já está encaminhado futuro). E a punição deve ser, ao mesmo
na estrada que levará ao moderno tempo, proporcional tanto à natureza
racionalismo, ainda que só a tenha per- do erro como à conveniência e à u�lida-
corrido em parte. Os fundamentos da de que se pretende �rar da própria pu-
convivência dos homens são a razão e a nição.
natureza, que coincidem entre si. O “di-
reito natural”, que regula a convivência 1.4 Vér�ces e resultados conclusivos
humana, possui esse fundamento racio- do pensamento renascen�sta
nal-natural. Todavia, notemos a consis-
tência ontológica que Gro�us dá ao 1.4.1 Leonardo da Vinci
direito natural, este se revela tão está-
vel e alicerçado que o próprio Deus não Leonardo da Vinci fez por merecer o
poderia mudá-lo. Isso significa que o �tulo de mais versá�l ar�sta de que se
direito natural reflete a racionalidade, tem no�cia. Pintor, desenhista, escultor,
que é o próprio critério com que Deus arquiteto, astrônomo, além de enge-
criou o mundo e que, como tal, Deus nheiro de guerra e engenheiro hidráuli-
não poderia alterar, a não ser se contra- co entre outros o�cios, cuja mente será
dizendo, o que é impensável. sempre objeto de admiração. Junta-
23
Humanismo, Renascimento e Revolução Científica Moderna

mente com Rafael e Michelangelo preparar quadros e esculturas; apren-


deram base ao Renascimento. Nascido deu a desenhar animais e plantas, bem
no vilarejo de Vinci, na região de Floren- como, teve uma base sólida no aprendi-
ça, Itália, em 15 de abril de 1452, era zado na perspec�va e no uso das cores.
filho ilegí�mo de Ser Piero um proprie- Da Vinci foi um ar�sta cuja genialidade
tário rural e Catarine uma camponesa. despertou a curiosidade por quase tudo
Numa referência a cidade natal, adotou na natureza. Foi um dos primeiros a
o sobrenome Da Vinci. sondar os segredos do corpo humano e
o desenvolvimento dos fetos no útero,
Desde criança suas habilidades ar�s�- dissecando cadáveres. Observou o voo
cas já eram notadas pelo pai que reuniu dos pássaros e insetos, o crescimento
alguns de seus trabalhos e encaminhou das plantas, as formas, sons e cores da
a oficina de Andrea del Verrocchio natureza, que por sua vez, dariam base
(1435-1488), figura de grande impor- a sua arte. Além disso, dedicou-se a
tância no âmbito das artes e oficio da escrever da direita para esquerda de
região. Leonardo com 14 anos de idade maneira que suas anotações só pode-
foi aceito na oficina de Verrocchio, pas- riam ser lidas refle�das no espelho e foi
sando a ser seu aprendiz. Logo, aos 20 o inventor de uma técnica que os italia-
anos, passou a compor a Corporação nos chamaram de “sfumato”, que con-
dos Pintores de Florença, nessa época sis�a em fazer com que uma forma se
já era admirado e aceito por outros misturasse a outra por meio de contor-
ar�stas e intelectuais. Morou em Milão, nos embaçados e cores suaves. Leonar-
Veneza e Roma até ser convidado em do da Vinci recusava-se a entregar uma
1516 pelo soberano francês Francisco I, encomenda de um quadro enquanto
para morar no Castelo de Clous na não �vesse sa�sfeito com ela.
França. Aos 67 anos, já aba�do e com a
mão direita paralisada, morreu em 02 Como inventor criou centenas de proje-
de maio de 1519. Antes de morrer Da tos de hidráulica, cosmologia, geologia,
Vinci que era canhoto, deixou vários mecânica, música e audaciosos projetos
manuscritos que mais tarde seriam reu- de engenharia. Na década de 1960 em
nidos no Tratado sobre a pintura. Madri, descobriu-se mais de 700 pági-
nas de desenhos sobre aviação, arquite-
Na oficina de Verrocchio, Leonardo teve tura e engenharia mecânica, datadas
o aprendizado que levaria para toda entre 1491 e 1495. Muito embora a
vida. Aprendeu as técnicas da fundição maioria de seus projetos nunca tenha
e seus segredos; a par�r de modelos saído do papel é inegável sua contribui-
nus e vestes drapeadas, aprendeu a ção para as ciências. Entre suas obras
24
Humanismo, Renascimento e Revolução Científica Moderna

mais famosas estão Mona Lisa ou Gio- mesma inerte. A força anima, penetra,
conda (1503-1505) na qual fez uso da move, transforma con�nuamente toda
técnica do esfumado que havia criado, a matéria.”
encontra-se atualmente no Museu do
Louvre em Paris; e A úl�ma ceia (1495- O intelecto é reduzido aos sen�dos,
-1497), um mural representando Cristo bem como o conceito universal é redu-
e seus apóstolos encomendado pela zido à sensação. Como é naturalizado o
Igreja de Santa Maria dele Grazie, em pensamento, é também naturalizada a
Milão. O fato de não ter assinado suas vontade, no sen�do materialista e
obras, faz com que muitos de seus tra- hedonista. Entretanto, haveria no
balhos ainda estejam perdidos, além homem também uma alma que trans-
disso, ganhou fama por deixar grande cende a natureza e o mundo material,
parte de suas obras inacabadas. O Papa criada e infundida por Deus. Por conse-
Leão X ao se referir a essa caracterís�ca quência, o homem pode pensar e
proferiu: “Da Vinci gosta mais do cami- querer o supersensível, o eterno, e do-
nho que da chegada, mais do processo minar com a vontade livre as tendências
que do resultado”. naturais. Desse modo, acima da ciência
é posta e jus�ficada a fé e a revelação.
1.4.2 Bernardino Telésio
1.4.3 Giordano Bruno
Na Renascença houve um grande pen-
sador Bernardino Telésio. Nasceu em Nascido em Nola em 1548, Giordano
1509 em Cosenza (Itália), estudou espe- Bruno entrou muito jovem no convento
cialmente em Pádua (Itália) e faleceu de São Domingos em Nápoles, onde foi
em 1588. A sua obra fundamental é “De ordenado sacerdote em 1572. Acusado
rerum natura iuxta propria principia” em 1576 de heresia e de homicídio,
que significa “A nova naturalidade se deixou o sacerdócio e iniciou uma fase
ajusta aos próprios princípios”. O pen- de peregrinações pela Europa, até que
samento de Telésio representa uma em 1591 voltou para a Itália, aceitando
sistema�zação do naturalismo da o convite do nobre veneziano João Mo-
Renascença, a saber, uma tenta�va para cenigo, que desejava dele aprender
explicar a natureza mediante os princí- uma arte an�ga de memorização,
pios universais imanentes à mesma porém, denunciou-o ao Santo O�cio.
natureza. “O mundo natural é cons�tuí- Começou então o processo por heresia
do de matéria e de força. A matéria é que se concluiu com a condenação à
homogênea, preenche o espaço (que morte na fogueira, executada em Roma
existe antes da matéria) e é por si dia 7 de fevereiro de 1600. Até o fim,
25
Humanismo, Renascimento e Revolução Científica Moderna

Bruno não renegou seu credo filosófico- uma parte ora de outra, eram apenas
-religioso. apoios tá�cos para realizar a própria
reforma. E precisamente por isso é que
Para entender a mensagem de um filó- ele provocou violentas reações em
sofo é preciso captar a essência do seu todos os ambientes nos quais ensinou.
pensamento, a fonte dos seus conceitos Bruno não podia seguir nenhuma seita,
e o espirito que lhe dá vida. No caso de porque seu obje�vo era o de fundar ele
Giordano Bruno, onde estão esse fulcro, próprio uma nova religião. E, no entan-
essa fonte e essa alma? A marca que to, estava cheio de Deus e o infinito foi
dis�ngue o seu pensamento é de cará- o seu princípio e o seu fim. Mas trata-se
ter mágico-hermé�co. Bruno se coloca de um “divino” e de um “infinito” de
na trilha dos magos-filósofos renascen- caráter neopagão, que o aparato con-
�stas, procurando manter-se dentro ceitual do neoplatonismo prestava-se a
dos limites da ortodoxia cristã, mas que expressar de modo quase perfeito.
ele tratou de levar às úl�mas consequ-
ências. E mais, o seu pensamento pode Depois do período na França, a etapa
ser entendido como uma espécie de mais significa�va da carreira de Bruno
gnose renascen�sta, uma mensagem foi sua estada na Inglaterra, onde elabo-
de salvação moldada no �po de religio- rou e publicou os “Diálogos Italianos”,
sidade “egípcia”, como precisamente que cons�tuem suas obras-primas.
pretendia ser a mensagem dos escritos Antes de falar do seu conteúdo, é bom
hermé�cos. Ele adequa o neoplatonis- iden�ficar como Bruno se apresentou
mo para servir de base e de moldura aos ingleses, par�cularmente aos
conceitual para essa sua visão religiosa. doutos da Universidade de Oxford. Ele
expôs uma visão copernicana do uni-
A filosofia de Bruno é fundamentalmen- verso, centrada na concepção heliocên-
te hermé�ca, ele era um mago hermé�- trica e na infinitude do cosmo, vinculan-
co do �po mais radical, com uma espé- do-o à magia astral e ao culto solar.
cie de missão mágico-religiosa. Conse- Criou-se um escândalo que obrigou
quentemente, é claro que Bruno não Bruno a despedir-se rapidamente dos
podia estar de acordo com os católicos “pedantes gramá�cos” de Oxford, que
nem com os protestantes (em úl�ma nada haviam entendido de sua mensa-
instância, não pode ser considerado gem. A imagem que ele queria transmi-
sequer cristão, pois acabou pondo em �r de si mesmo, portanto, era a do
dúvida a divindade de Cristo e os mago renascen�sta, de alguém que
dogmas fundamentais do cris�anismo) propunha a nova religião “egípcia” da
e que os apoios que buscava, ora de revelação hermé�ca, o culto do deus
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Humanismo, Renascimento e Revolução Científica Moderna

que está presente nas coisas. qual brotam todas as formas que são
imanentes à matéria, cons�tuindo com
No seu pensamento, o “egipcianismo” é ela um todo indissolúvel. As formas são
apresentado até mesmo como temá�- a estrutura dinâmica da matéria, “que
ca, ao passo que Hermes Trismegisto é vão e vêm, cessam e se renovam”, pre-
apresentado como fonte de sabedoria. cisamente porque tudo é animado,
E essa visão do “deus nas coisas” esta tudo está vivo. A alma do mundo está
expressamente ligada à magia, entendi- em cada coisa. E na alma está presente
da como sabedoria proveniente do “sol o intelecto universal, fonte perene de
inteligível”, que é revelada ao mundo formas que con�nuamente se renovam.
ora em menor ora em maior medida. O Por isso, é compreensível que, nesse
“egipcianismo” de Bruno é uma forma contexto, Deus e natureza, forma e ma-
de religião paganizante, com base na téria, ato e potência acabem por coinci-
qual ele pretendia fundar a reforma dir, a ponto de Bruno escrever: “Daí,
moral universal. Mas quais são seus não é di�cil ou grave, em úl�ma instân-
fundamentos filosóficos? Acima de cia, aceitar que, segundo a substância,
tudo, Bruno admite uma “causa” ou um tudo é uno, como talvez tenha entendi-
“princípio supremo”, ao qual ele chama do Parmênides, tratado ignobilmente
também de “mente sobre as coisas”, da por Aristóteles”.
qual deriva todo o restante, mas que
permanece incognoscível para nós. O infinito se torna a marca emblemá�-
ca da sua filosofia. Com efeito, para
Todo o universo é efeito desse primeiro Bruno, se a Causa ou o Princípio primei-
princípio; mas não se pode remontar do ro é infinito, também o efeito deve ser
conhecimento dos efeitos ao conheci- infinito. Com base nisso, Bruno sustenta
mento da causa, como não se pode não apenas a infinitude do mundo em
remontar da visão de uma estátua à geral, mas também (retomando a ideia
visão do escultor que a fez. Esse princí- de Epicuro) a infinitude no sen�do da
pio outra coisa não é do que o Uno de existência de mundos infinitos seme-
Plo�no adaptado por um renascen�sta. lhantes ao nosso, com outros planetas e
Assim como em Plo�no, o Intelecto outras estrelas, “e isso se chama univer-
deriva do Supremo Princípio, analoga- so infinito, no qual há inumeráveis
mente, Bruno também fala de um Inte- mundos”. Infinita também é a vida,
lecto universal, mas o entende, de porque infinitos indivíduos vivem em
modo mais marcadamente imanen�sta, nós, assim como em todas as coisas
como mente nas coisas e precisamente compostas. O morrer não é morrer,
como faculdade da Alma universal, da porque “nada se aniquila”. Assim, o
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Humanismo, Renascimento e Revolução Científica Moderna

morrer é apenas uma mudança aciden- tudo em todas as partes). Estamos


tal, ao passo que aquilo que muda per- agora em condições de entender as
manece eterno. razões da entusiás�ca aceitação da
revolução copernicana por Giordano
Mas, então, por que existe essa muta- Bruno. Com efeito, o heliocentrismo: a)
ção? Por que a matéria par�cular pro- harmonizava-se perfeitamente com seu
cura sempre outra forma? Será que pro- herme�smo, que atribuía ao sol (símbo-
cura outro ser? De modo bastante lo do intelecto) um significado inteira-
engenhoso, Bruno responde que a mu- mente par�cular, e b) permi�a-lhe
tação não procura “outro ser” (pois romper a visão estreita dos aristotéli-
tudo já existe desde sempre), e sim cos, que sustentava a finitude do uni-
“outro modo de ser”. E nisso reside pre- verso, e assim fazia desvanecer todas as
cisamente a diferença entre o universo “fantás�cas muralhas” dos céus, tor-
e as coisas singulares do universo: nando-os sem limites rumo ao infinito.
“aquele abrange todo o ser e todos os
modos de ser; estas, cada qual tem Bruno é certamente um dos filósofos
todo o ser, mas não todos os modos de mais di�ceis de entender. E, no âmbito
ser”. Assim, Bruno pode dizer que o uni- da filosofia renascen�sta, certamente é
verso é “esferiforme” e, ao mesmo o mais complexo. Daí as exegeses tão
tempo, “infinito”. O conceito de Deus diversas que sobre ele foram propostas.
como “esfera que tem o centro em toda No estado atual dos estudos, porém,
parte e a circunferência em nenhum muitas conclusões a que se chegara no
lugar”, que apareceu pela primeira vez passado devem ser revistas. Não parece
em tratado hermé�co, serve admiravel- possível fazer dele um precursor da
mente a Bruno; é precisamente com revolução do pensamento moderno, no
essa base que ele opera a conciliação já sen�do em que operara a revolução
referida. cien�fica, porque seus interesses eram
de natureza completamente diferente,
Deus é todo infinito e totalmente infini- ou seja, mágico-religiosos e meta�sicos.
to, porque é todo em tudo e totalmente A defesa que ele fez da revolução
também em toda parte do todo. Como copernicana fundamenta-se em bases
efeito derivado de Deus, o universo é totalmente diferentes daquelas em que
todo infinito, mas não totalmente infini- se baseara Copérnico, tanto que alguns
to, porque é todo em tudo, mas não chegaram até a levantar dúvidas de que
totalmente em todas as suas partes (ou, Bruno realmente tenha entendido o
de todo modo, não pode ser infinito no sen�do cien�fico daquela doutrina. Em
modo como Deus é, sendo causa de seu conjunto, a obra de Bruno marca
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Humanismo, Renascimento e Revolução Científica Moderna

um dos pontos culminantes da Renas- sive as materiais como as pedras, tem a


cença e, ao mesmo tempo, um dos capacidade de sen�r, pois todas tem em
resultados conclusivos mais significa�- si um espírito que também é material.
vos desse período irrepe�vel do pensa- O homem se dis�ngue do restante das
mento ocidental. coisas materiais por ter, além da alma
material, também uma alma espiritual
1.4.4 Tomás Campanella que nos é dada por Deus.

A filosofia para Campanella é interpre- As coisas no mundo tem basicamente


tar a natureza, que é onde Deus colocou três caracterís�cas: potência, que é a
sua expressão. Além de nós mesmos capacidade de ser e ter qualidades que
devemos conhecer a natureza, mas ainda não é ou tem; sapiência, que é a
conhecer a si mesmo não é uma obriga- habilidade de saber que existe e é algo;
ção para conhecer a natureza, pois toda e o amor, que é o querer e gostar de ser
natureza sabe que existe e sente em si o que é. Essas três caracterís�cas
mesma a sua existência. Esse saber-se encontram-se mescladas umas nas
existente é uma caracterís�ca inata das outras, e o contrário delas é a impotên-
coisas naturais. Além do saber inato da cia, a insapiência e o ódio. Todas as
própria existência, as coisas sabem coisas finitas têm em si as caracterís�-
também que existem outras coisas dife- cas e o contrário delas. Em Deus, não
rentes de si e esse conhecimento da existem as caracterís�cas nega�vas,
existência de outras coisas vem do con- pois ele é a máxima potência, a máxima
tato. As pessoas não sentem o calor ou sapiência e o máximo amor.
o frio, sentem a modificação que
sofrem em si mesmas causadas pelo O filósofo Campanella presta atenção
contato com o calor ou com o frio. especial à teologia polí�ca, ou à polí�ca
ordenada e comandada pela religião
Quando conhecemos algo somos católica. Ele busca unificar todas as reli-
também modificados por esse algo, giões em uma só, a católica, que ele
esse algo nos transforma e deixamos de considera a verdadeira, natural e que
ser o que éramos. A coisa que conhece- segue a razão. Teoriza também a unifi-
mos transfere para nós algo que não cação de todos os estados em um só.
�nhamos, nós ganhamos conhecimen- Este estado único deveria ser direciona-
to, mas ao mesmo tempo perdemos, do pela religião. Acreditava que a reli-
pois morreu em nós algo e no local gião católica �nha que retornar nova-
desse algo foi colocada parte da coisa mente o seu caminho natural e isso só
que conhecemos. Todas as coisas, inclu- se daria através de uma renovação, pro-
29
Humanismo, Renascimento e Revolução Científica Moderna

movida pela filosofia. úl�ma, essa pode parecer milagre.

Em seu livro A Cidade do Sol, ele exem- 2. Revolução Cien�fica Moderna


plifica muito bem qual é sua ideia de
sociedade ideal. O Estado perfeito era 2.1 Nicolau Copérnico
liderado por um príncipe sacerdote cha-
mado de Sol. Esse príncipe �nha outros Nas ciências como a biologia, a �sica, a
três príncipes ajudantes, Pon, Sin e Mor, matemá�ca e a astronomia �vemos
que são a Potência, a Sapiência e o grandes nomes que enfrentaram os
Amor. Em seu Estado perfeito tudo e dogmas (verdades indiscu�veis) da
detalhadamente organizado e os mora- Igreja. Nicolau Copérnico desafiou a
dores desse estado u�lizam a razão teoria geocênctrica (terra no centro do
para organizar suas vidas. Segundo universo) defendida por Aristóteles e
Campanella, eles sabem que a proprie- pela Igreja, e propôs o modelo helio-
dade privada cria o egoísmo no homem centrico (sol no centro).
e os incen�va a lutar pela propriedade,
por isso todos os bens são comuns. Na teoria de Copérnico, a Terra move-se
Todos tem que trabalhar e até os meno- em torno do Sol. Mas, seus dados foram
res atos são feitos em comunidade. A corrigidos pelas observações de Tycho
Cidade do Sol é comunista e liderada Brahe. Com base nelas e em seus pró-
pelos sacerdotes e sábios. prios cálculos, Johannes Kepler refor-
mou radicalmente o modelo copernica-
Campanella colocou como obje�vo de no e chegou a uma descrição realista do
sua existência destruir os governos �râ- sistema solar. Esse fenômeno já havia
nicos, os argumentos falsos e a hipocri- sido estudado e defendido pelo bispo
sia. A filosofia é o que vai impulsionar a de Lisieux, Nicole d'Oresme, no século
renovação da polí�ca e da religião e XIV. O movimento da Terra era negado
destruir todas as desgraças humanas. pelos par�dários de Aristóteles e Ptolo-
Através da filosofia, o homem vai alcan- meu. Eles acreditavam que, caso a Terra
çar paz e jus�ça. Dedica também estu- se movesse, as nuvens, os pássaros no
dos à magia, que ele divide em divina, ar ou os objetos em queda livre seriam
como os milagres; magia natural como deixados para trás. Galileu combateu
as curas feitas pela medicina ou o movi- essa ideia, afirmando que, se uma
mento das estrelas e, por úl�mo, a pedra fosse abandonada do alto do
magia diabólica que são feitas pelo mastro de um navio, um observador a
demônio e que se não conhecermos as bordo sempre a veria cair em linha reta,
diferenças entre as duas primeiras e a na ver�cal. E, baseado nisso, nunca po-
30
Humanismo, Renascimento e Revolução Científica Moderna

deria dizer se a embarcação estava em massas diferentes: uma bala de mos-


movimento ou não. Caso o barco se mo- quete e outra de canhão. Contra as
vesse, porém, um observador situado expecta�vas dos acadêmicos aristotéli-
na margem veria a pedra descrever cos, que apostavam na vitória da bala
uma curva descendente – porque, de canhão e na derrota do cien�sta, os
enquanto cai, ela acompanha o deslo- corpos chegaram rigorosamente juntos
camento horizontal do navio. Tanto um ao chão.
observador quanto o outro constataria
que a pedra chega ao convés exatamen- O historiador da ciência Alexandre
te no mesmo lugar: o pé do mastro. Pois Koyré demonstrou que, assim como
ela não é deixada para trás quando o muitos outros mitos que enfeitam os
barco se desloca. Da mesma forma, se relatos sobre a vida de Galileu, a famosa
fosse abandonada do alto de uma torre, experiência de Pisa jamais ocorreu. Ela
a pedra cairia sempre ao pé da mesma – foi, na verdade, uma experiência ideali-
quer a Terra se mova ou não. zada, que o cien�sta realizou no recesso
da sua consciência, e não um ruidoso
O cardeal S. Roberto Francisco Belarmi- espetáculo público. Sabia-se, desde o
no presidiu o tribunal que proibiu a final da Idade Média, que a velocidade
teoria copernicana. Culto e moderado, dos corpos aumentava à medida que
ele conseguiu poupar Galileu. Es�mula- eles caíam. E também se conhecia a lei
do pelo novo papa Urbano VIII, seu matemá�ca que descreve os movimen-
grande admirador, o cien�sta voltou à tos uniformemente acelerados. O
carga. Mas o Papa sen�u-se ridiculariza- mérito de Galileu foi juntar as duas
do num livro de Galileu. E isso mo�vou coisas e mostrar que, descartada a
sua condenação. O percurso das balas resistência do ar, todos os objetos caem
de canhão e a queda dos corpos com a mesma aceleração.
também foram estudadas por Galileu.
Ele demonstrou que a curva descrita Os filósofos do século XV aceitavam o
pelos projéteis é um arco de parábola e geocentrismo como fora estruturado
que os corpos caem em movimento uni- por Aristóteles e Ptolomeu. Esse siste-
formemente acelerado. Segundo as ma cosmológico afirmava (corretamen-
biografias romanceadas do cien�sta, te) que a Terra era esférica, mas
ele teria realizado um experimento que também afirmava (erradamente) que a
desmoralizou defini�vamente a �sica Terra estaria parada no centro do Uni-
aristotélica. Subindo ao alto da torre de verso enquanto os corpos celestes orbi-
Pisa, deixou cair, no mesmo instante, tavam em círculos concêntricos ao seu
dois corpos esféricos de volumes e redor. Essa visão geocêntrica tradicional
31
Humanismo, Renascimento e Revolução Científica Moderna

foi abalada por Copérnico em 1537, ciência acolheram com ce�cismo as


quando este começou a divulgar um suas ideias. Apesar disso, o trabalho de
modelo cosmológico em que os corpos Copérnico marcou o início de duas
celestes giravam ao redor do Sol, e não grandes mudanças de perspec�va. A
da Terra. Essa era uma teoria de tal primeira, diz respeito à escala de gran-
forma revolucionária que Copérnico deza do Universo: avanços subsequen-
escreveu no seu De revolutionibus tes na astronomia demonstraram que o
orbium coelestium: “quando dediquei universo era muito mais vasto do que
algum tempo à ideia, o meu receio de supunham quer a cosmologia aristotéli-
ser desprezado pela sua novidade e o ca quer o próprio modelo copernicano;
aparente contra-senso quase me fez a segunda diz respeito à queda dos
largar a obra feita”. graves. A explicação aristotélica dizia
que a Terra era o centro do universo e,
Naquele tempo a Igreja Católica aceita- portanto, o lugar natural de todas as
va essencialmente o geocentrismo aris- coisas. Na teoria heliocêntrica, contu-
totélico, embora a esfericidade da Terra do, a Terra perdia esse estatuto, o que
es�vesse em aparente contradição com exigiu uma revisão das leis que gover-
interpretações literais de algumas pas- navam a queda dos corpos, e mais
sagens bíblicas. Ao contrário do que se tarde, conduziu Isaac Newton a formu-
poderia imaginar, durante a vida de Co- lar a lei da gravitação universal.
pérnico não se encontram crí�cas siste-
má�cas ao modelo heliocêntrico por 2.2 Tycho Brahe
parte do clero católico. De fato, mem-
bros importantes da cúpula da Igreja Tycho Brahe é um dos personagens
ficaram posi�vamente impressionados mais fascinantes na história da Astrono-
pela nova proposta e insis�ram para mia. Nascido em 1546, de uma família
que essas ideias fossem mais desenvol- nobre dinamarquesa, esteve em Rosto-
vidas. Contudo a defesa, quase um ck (Alemanha) onde se envolveu num
século depois, por Galileu Galilei, da duelo com outro estudante, que lhe
teoria heliocêntrica vai deparar-se com cortou parte do nariz. Nada abalado,
grandes resistências no seio da mesma construiu para si mesmo um nariz de
Igreja Católica. ouro, prata e cera, que segundo as más
línguas, não lhe ficava melhor que o ori-
Como Copérnico �nha por base apenas ginal. Em 1572 estava de regresso à
suas observações dos astros a olho nu e Dinamarca, de onde observou uma
não �nha possibilidade de demonstra- estrela brilhante na constelação de Cas-
ção da sua hipótese, muitos homens de siopeia, ficando conhecida como a
32
Humanismo, Renascimento e Revolução Científica Moderna

“nova de Tycho”. Tycho observou o seu planetas. Este modelo preservava a ele-
brilho a diminuir nos meses seguintes e gância do modelo geocêntrico grego,
decidiu que a Astronomia �nha de ser a retendo a �sica de Aristóteles, explican-
sua carreira. Teve a sorte de em 1576 o do porque é que os objetos caíam de
Rei Frederico da Dinamarca lhe ter pro- volta para a Terra, ganhando as vanta-
porcionado o local para a instalação de gens da simplicidade de explicação das
um observatório na ilha bál�ca de retrogradações do modelo heliocêntri-
Hven, conjuntamente com fundos para co. Tycho também observou um cometa
a sua manutenção. brilhante em 1577 e provou que, con-
trariamente ao defendido pelos geo-
Tycho considerou sempre que para se centristas (que pretendiam tratar-se de
poder �rar conclusões corretas dos um corpo terrestre), este se encontrava
fenômenos naturais, era necessário muito para além da Lua, o que cons�-
dispor de medidas o mais precisas pos- tuiu um argumento contra o geocentris-
sível. Tendo em vista esse obje�vo, mo, pois desta forma ficou provado que
construiu instrumentos de proporções o Universo celeste não era imutável.
gigantescas, de modo a minorar os
erros de precisão, como é o caso do Viria a falecer em 1601, não sem antes
grande quadrante mural do observató- fornecer a Kepler todos os dados das
rio. Além das dimensões, Tycho preocu- suas observações, pedindo-lhe que pu-
pou-se em colocar os seus instrumen- blicasse o seu úl�mo trabalho, as Tabe-
tos sob fundações sólidas de modo a las Rudolfinas, dedicadas ao imperador.
que man�vessem a sua estabilidade. Neste livro, foram compilados os dados
Entre 1576 e 1598, Tycho produziu as observacionais de Tycho, embora a
maiores tabelas que alguma vez haviam visão teórica patente no livro seja a de
sido realizadas até à época. No entanto, Kepler, que era um heliocentrista.
não conseguiu verificar qualquer para-
laxe estelar ou qualquer outro movi- 2.3 Johannes Kepler
mento anual que indicasse que a Terra
se deslocasse ao redor do Sol. Johannes Kepler foi um astrônomo,
astrólogo e matemá�co alemão, sendo
Tycho viu claramente as vantagens de conhecido por suas leis chamadas de
ter um sistema centrado no Sol e, por “Leis de Kepler”. Elas descrevem os mo-
isso, em 1586, propôs o seu modelo vimentos dos planetas do sistema solar
híbrido em que o Sol gira em torno da a par�r de modelos heliocêntricos.
Terra ao longo de um ano mas leva orbi- Kepler foi uma das principais figuras do
tando à sua volta os restantes Renascimento Cien�fico, ao lado de Co-
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Humanismo, Renascimento e Revolução Científica Moderna

pérnico, Galileu, Newton, Descartes, torno do sol. Isso tudo baseado no


Francis Bacon, Leonardo da Vinci, heliocentrismo de Copérnico, onde o
dentre outros. Johannes Kepler nasceu sol é o centro do universo. Além da
no dia 27 de dezembro de 1571 na astronomia, Kepler foi um astrólogo no-
cidade de Weil der Stadt, no sul da Ale- tável e chegou a escrever diversos
manha. Desde pequeno, Kepler demos- almanaques astronômicos. Nas pala-
trou interesse pela área da astronomia. vras do cien�sta: “Deus provê a cada
Isso porque fora incen�vado por seu animal seu meio de sustentação. Para o
pai. Ainda com 5 anos de idade viu um astrônomo, ele proveu a astrologia”.
cometa e com 10 anos, um eclipse Escreveu ainda sobre ó�ca e a geome-
lunar. Esses eventos foram essenciais tria euclidiana. Segundo ele: “A Geome-
para o transformar num dos maiores tria exis�u antes da criação. Ela forne-
cien�stas do renascimento. ceu a Deus um modelo de criação. A
geometria é Deus”.
Formou-se na Universidade de Tübin-
gen. Foi professor de matemá�ca na As chamadas “Leis de Kepler” são três
Universidade de Graz, na Áustria. Por leis que regem os movimentos celestes.
conta da perseguição protestante, Foram propostas no século XVII nas
Kepler foi para a cidade de Linz, e lá obras in�tuladas “Astronomia Nova”
também lecionou matemá�ca. Em (1609) e “Sobre a Harmonia do Mundo”
1597, Kepler casou-se com Barbara (1619). Primeira Lei de Kepler: chamada
Müller. No entanto, casou-se novamen- de “Lei das Órbitas” onde os planetas
te em 1613 com Susanna Reu�nger. descrevem órbitas elíp�cas em torno
Com ela, teve seis filhos, embora três do Sol, ao invés de circulares. Segunda
deles morreram ainda bebês. Por ser Lei de Kepler: chamada de “Lei das
um visionário em sua época, Kepler foi Áreas”, os segmentos (raio vetor) que
perseguido pela igreja católica durante unem o sol aos planetas correspondem
a contra-reforma. Esse fato fez com que a áreas e intervalos de tempo iguais.
ele fosse viver na Alemanha. Faleceu na Terceira Lei de Kepler: chamada de “Lei
cidade alemã de Ra�sbona, dia 15 de dos Períodos”, onde ele aponta a exis-
novembro de 1630, com 58 anos. Os tência da relação entre a distância de
estudos de Kepler foram essenciais para cada planeta e seu período de Transla-
o desenvolvimento da astronomia e da ção.
matemá�ca.
2.4 Galileu Galilei
Em relação à astronomia, Kepler provou
o movimento elíp�co dos planetas em Na Itália, Galileu Galilei conseguiu se
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Humanismo, Renascimento e Revolução Científica Moderna

impor como um grande matemá�co e experiências na torre de Pisa, ele


inventor. Ele era estudante de medicina também provou que as esferas celestes
e abandonou o curso, para desgosto da não eram perfeitas como o filósofo
família, no intuito de se aprofundar nos grego sustentava. Esse foi o grande
estudos de matemá�ca, que era sua passo para o conhecimento experimen-
grande paixão. Galileu, contrariando os tal. Veja que um indivíduo, por meios
ensinamentos formais da Igreja predo- dos sen�dos, pôde sozinho desafiar os
minantes nas escolas e universidades conhecimentos contempla�vos susten-
de seu tempo, acreditava que era possí- tados por todo o clero da Igreja. Ele viu
vel explicar o universo através da mate- com seu telescópio as crateras lunares,
má�ca, e dedicou sua vida a provar que e o extraordinário era que não se trata-
estava certo. va apenas de uma disputa de opiniões,
a palavra de Galileu contra a de Aristó-
Na primavera de 1609, Galileu vem a teles. Qualquer pessoa poderia ver isso
saber que um certo flamengo havia pelo telescópio e atestar que Galileu
fabricado uma lente mediante a qual os estava com a razão.
objetos visíveis, por mais distantes que
es�vessem dos olhos do observador, Mediante a luneta, se podem ver, além
eram vistos dis�ntamente como se es�- das estrelas fixas, “outras inumeráveis
vessem próximos. A mesma no�cia lhe estrelas jamais divisadas antes de
é confirmada por seu ex-discípulo Jac- agora”; o universo, em suma, torna-se
ques Badouere. Justamente com base maior; constata-se que a lua não é um
nestas no�cias Galileu construiu a corpo perfeitamente esférico, como até
luneta. E a coisa realmente interessante então se acreditava, mas é escabrosa e
é que ele a tenha levado para dentro da desigual como a terra (este é um resul-
ciência, como instrumento cien�fico a tado que destrói uma coluna da cosmo-
ser u�lizado como potencialização de logia aristotélico-ptolomaica, isto é, a
nossos sen�dos. Esse foi o grande passo ideia da clara dis�nção entre a terra e
para o conhecimento experimental. os outros corpos celestes); vê-se que a
Veja que um indivíduo, por meios dos Galáxia não é “nada mais que um
sen�dos, pôde sozinho desafiar os monte de inumeráveis estrelas, disse-
conhecimentos contempla�vos susten- minadas em amontoados”; observa-se
tados por todo o clero da Igreja. que as nebulosas são “rebanhos de
pequenas estrelas”; veem-se os satéli-
Além de desbancar Aristóteles com tes de Júpiter (e esta descoberta ofere-
relação à queda dos corpos, por meio cia a Galileu a inesperada visão no céu
de seus cálculos matemá�cos e suas de um modelo menor do que o modelo
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Humanismo, Renascimento e Revolução Científica Moderna

copernicano). católicos e protestantes – pois pensa-


vam que a Bíblia em sua versão literal
Dia 12 de março de 1610, Galileu publi- não podia errar. No Eclesiastes (1, 4-5)
ca em Veneza o Sidereus Nuncius, obra lemos que “a terra permanece sempre
que inicia com estas palavras: “Grandes em seu lugar” e que “o sol surge e se
na verdade são as coisas que neste põe voltando ao lugar de onde surgiu”;
breve tratado proponho a visão e con- e por Josué (10,13) somos informados
templação dos estudiosos da natureza. de que Josué ordena ao sol que pare.
Grandes, digo, tanto pela excelência da Com base nestas passagens da Escritu-
matéria em si mesma, como pela novi- ra, Lutero e Calvino se opuseram ferre-
dade delas jamais ouvida em todos os nhamente à teoria copernicana. Nesse
tempos passados, como também pelo ano, também, obtém da parte do grão-
instrumento em virtude do qual as pró- -duque Cosme II o rendoso posto de
prias coisas se tornaram manifestas a “matemá�co extraordinário do estúdio
nosso sen�do”. Nessa obra, ele corro- de Pisa”. Era como se fosse o �tulo de
bora o sistema copernicano e desmente “o” filósofo-cien�sta da sua época, o
o sistema defendido pela Igreja, que era pensador mais notável e respeitado da
o geocentrismo. Através de seus estu- Europa e, por conseguinte, do mundo.
dos de astronomia ele chegou às
mesmas conclusões de Copérnico sobre Entre 1613 e 1615, Galileu escreve as
a posição da terra no sistema solar, sus- famosas quatro cartas copernicanas
tentando um sistema heliocêntrico (sol sobre as relações entre ciência e fé.
no centro), contrariando a posição geo- Uma a seu discípulo, o benedi�no Be-
cêntrica (terra no centro) da Igreja. nede�o Castelli, duas a dom Piero Dini;
e uma a senhora Cris�na de Lorena, grã-
Daqui as raízes do desencontro entre -duquesa de Toscana. Galileu teoriza a
Galileu e a Igreja. Copérnico afirmara incomensurabilidade entre saber cien�-
que “todas as esferas giram em torno fico e fé religiosa, os conhecimentos
do sol como seu ponto central e, por- cien�ficos são autônomos em relação à
tanto, o centro do universo está dentro fé, pois pretendem descrever o mundo;
do sol”. E ele pensava que sua própria os dogmas da fé, as proposições religio-
teoria fosse uma representação verda- sas, de sua parte, não são e não querem
deira do pressuposto universo. Deste ser um tratado de astronomia, mas uma
parecer era também Galileu. Para ele, a mensagem de salvação. Galileu fixa o
teoria copernicana descreve o sistema princípio da dis�nção entre ciência e fé,
do mundo. Tal tese realista devia neces- segundo o qual “a intenção do Espirito
sariamente aparecer perigosa a todos – Santo seria ensinar-nos como se vai ao
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Humanismo, Renascimento e Revolução Científica Moderna

céu e não como vai o céu”. sob pena de prisão, “não ensiná-la e
não defendê-la de nenhum modo, nem
Para Galileu, portanto, ciência e fé são com as palavras nem com os escritos”.
compa�veis porque incomensuráveis, Galileu concordou e prometeu obede-
não se trata de um “ou-ou”, e sim de um cer. Em 1623 sobe ao trono pon��cio,
“e-e”; o discurso cien�fico é um discur- com o nome de Urbano VIII, o cardeal
so factualmente controlável, des�nado Maffeo Barberini, amigo e admirador
a fazer-nos ver como funciona o de Galileu. Encorajado por este evento,
mundo; o discurso religioso é um dis- Galileu retoma sua batalha cultural; e
curso de “salvação” que não se ocupa em 1632 publica a obra Diálogo de Gali-
de descrever o mundo, e sim do “sen�- leu Galilei Linceu, onde se discorre
do” do universo, da vida dos indivíduos sobre os dois máximos sistemas do
e de toda a humanidade. Denunciado mundo ptolomaico e copernicano,
ao Santo Oficio, Galileu é processado fazendo uma defesa cerrada do sistema
em Roma em 1616, ele é proibido de copernicano. O Diálogo sobre os dois
ensinar ou defender com palavra ou máximos sistemas do mundo aparece
com os escritos a teoria copernicana. em 1632.

No dia 19 de fevereiro de 1616, o Santo Urbano VIII foi convencido pelos adver-
O�cio passou a seus teólogos as duas sários de Galileu de que o Diálogo cons-
proposições não aceitas pela Igreja e �tuía um descrédito da autoridade e
que resumiam o núcleo da questão: a) talvez também do pres�gio do papa, o
“Que o sol esteja no centro do mundo e, qual estaria sendo ridicularizado. Foi
por conseguinte, imóvel de movimento assim que iniciou o segundo processo
local”; b) “Que a terra não está no contra Galileu em 1633, que o conde-
centro do mundo nem imóvel, mas se nou a negar o que havia dito. A prisão
move segundo si mesma inteira, perpétua lhe é logo comutada em confi-
também com movimento diurno”. namento, em sua casa. Na prisão domi-
Cinco dias depois, dia 24 de fevereiro, ciliar escreve os Discursos e demonstra-
todos os teólogos do Santo O�cio con- ções matemáticas sobre duas novas
denaram as duas proposições. A sen- ciências, que aparecerão em 1638.
tença do Santo O�cio é transmi�da à Essas ciências são a está�ca e a dinâmi-
Congregação do Índex, que no dia 3 de ca. Tais discursos são propostos em
março de 1616 emana a condenação do forma de diálogo onde discute-se sobre
copernicanismo. No dia 26 de fevereiro, a resistência dos materiais, sobre siste-
o papa �nha alertado Galileu a abando- mas de alavanca, e está presente a cele-
nar a ideia copernicana e lhe ordenava, bre experiência sobre planos inclina-
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Humanismo, Renascimento e Revolução Científica Moderna

dos. Nesta obra, apresenta-se a contri- as teorias cien�ficas alcancem e descre-


buição mais original de Galileu à histó- vam a realidade; a ciência e descrição
ria das ideias cien�ficas. Assis�do por verdadeira da realidade, e nos diz
seus discípulos Vicente Viviani e Evan- “como vai o céu”; e é obje�va porque
gelista Torricelli, Galileu morre no dia 8 descreve as qualidades obje�vas e
de janeiro de 1642. mensuráveis (qualidades primarias) e
não as qualidades subje�vas (qualida-
Explicitando mais detalhadamente a des secundarias) dos corpos. E esta
imagem galileana da ciência é preciso ciência, descri�va de realidades obje�-
salientar que, para Galileu, a ciência vas e mensuráveis, é possível porque é
não é mais um saber a serviço da fé, o próprio livro da natureza que “está
não depende da fé e tem um escopo escrito em linguagem matemá�ca”. A
diferente do da fé, aceita-se e encontra ciência, portanto, é obje�va porque não
fundamentos diferentes dos da fé. Au- se embrenha nas qualidades subje�vas
tônoma em relação à fé, a ciência está e secundarias nem se propõe à busca
desvinculada também do autoritarismo das “essências”.
da tradição aristotélica que bloqueia a
pesquisa cien�fica. E contra os aristoté- Do que foi dito segue-se que a pesquisa
licos dogmá�cos e livrescos, Galileu qualita�va é suplantada pela quan�ta�-
recorre justamente a Aristóteles, o qual va, e são eliminadas as causas finais em
“antepõe [...] as experiências sensatas a favor total das mecânicas. O universo
todos os discursos”; de modo que “não de Galileu é um universo determinista e
duvido nada de que se Aristóteles vive- mecanicista; não é mais o universo
-se em nosso tempo, mudaria de opi- antropocêntrico de Aristóteles e da tra-
nião”. Com isso Galileu faz “o funeral dição, não é mais hierarquizado, orde-
[...] da pseudofilosofia”, mas não o nado e finalizado em função do
funeral da tradição enquanto tal. homem. E perdem todo valor os discur-
sos vazios e os ensinamentos de certa
Com as devidas cautelas se pode dizer tradição filosófica privada de contato
que Galileu é platônico em filosofia (o com a experiência. Enquanto sobre o
livro da natureza está escrito em lingua- mundo nos dão informações as teorias
gem matemá�ca) e aristotélico no construídas sobre “sensatas experiên-
método (Aristóteles “teria [...] antepos- cias” e “necessárias demonstrações”. A
to, como convém, a sensata experiência experiência cien�fica de Galileu e o
ao discurso natural”). A ciência de Gali- experimento, que se faz para ver se
leu é a ciência de um realista, ou seja, a uma suposição corresponde ou não à
ciência de um cien�sta convicto de que realidade. Óbvio que a Igreja não ficou
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Humanismo, Renascimento e Revolução Científica Moderna

parada de braços cruzados. A inquisição reis feudais, esses novos Reis teriam
caiu em cima de Galileu e ele teve de tanto poder que alguns deles desafia-
dizer que suas teorias eram apenas ram até o representante de deus na
suposições (hipóteses). Apesar de tudo, terra, o Papa.
a Igreja não conseguiu conter a Revolu-
ção Cien�fica que Galileu havia come- 2.5 Isaac Newton
çado, e muitos foram os estudiosos que
deram prosseguimento a seus estudos, O grande cien�sta que completou a
sendo Isaac Newton quem aperfeiçou o revolução cien�fica do século XVII foi
sistema. Isaac Newton. Ele também era fascina-
do pelos inventos mecânicos de sua
E o movimento renascen�sta não ficou época, quando criança construiu pipas,
só na Península Itálica, ele se espalhou moinhos, e até um relógio d’agua. Na
por toda a Europa. Na França �vemos universidade ele conheceu a filosofia
também Rabelais (1490-1553), na Ingla- mecânica de Descartes e seus trabalhos
terra, Willian Sheakespeare (1564 de geometria, a explicação matemá�ca
-1616), na Espanha, Miguel de Cervan- de Galileu para o universo, e as leis de
tes (1547-1616), nos Países Baixos, Kepler sobre os movimentos planetá-
Erasmo de Ro�erdam (1466-1536). É rios. Quando estudou a luz usou o
importante destacar que talvez a princi- método de observação e experimenta-
pal invenção dessa época, sem a qual ção de Francis Bacon, e descobriu que
nada disso poderia ter acontecido, as cores são uma propriedade da luz e
tenha sido a imprensa (1454) do não dos objetos.
alemão Gutemberg. Ela possibilitou a
reprodução rápida e barata dos livros já Newton se vale das duas grandes con-
produzidos e dos que estavam sendo cepções de ciência de seu tempo, a ma-
escritos. Ela foi também um importante tema�zação e a experiência. Mas ele
instrumento contra a centralização do não é apenas um seguidor dessas dife-
saber com o clero, já que antes dela os rentes concepções, ele as unifica e as
livros eram copiados pelos monges de supera, na síntese que faz do empiris-
capa a capa. Imagine quanto tempo mo de Francis Bacon e do racionalismo
levaria para copiar a quan�dade de de Descartes. Apesar de se u�lizar da
livros que circulou pela Europa nesse filosofia mecânica, Newton não gostava
tempo. Essas foram grandes realizações do materialismo que estava por trás
dos homens, que ainda con�nuaram no dela, do fato desta filosofia ter �rado
campo da polí�ca com a criação dos Deus da explicação do funcionamento
Estados Nacionais. Diferentemente dos do mundo. Na base de todo o pensa-
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Humanismo, Renascimento e Revolução Científica Moderna

mento de Newton estava a crença em conceitos medievais como a magia. Mas


um Deus racional que havia criado um essas crí�cas em nada abalaram a gran-
universo racional que poderia ser des- diosidade de sua obra. Para ele, espaço
coberto pela análise e pela matemá�ca. e tempo são absolutos, tendo conheci-
mento do que acontecia num determi-
Em 1687, chegara o tempo dele descre- nado momento era possível calcular o
ver racionalmente a grande obra divina que iria acontecer em outro. Os even-
que era o universo, na sua grande obra tos/movimentos eram determináveis,
Os princípios matemáticos da filosofia como em uma máquina, um grande
natural, popularmente conhecido como relógio para ser mais preciso. Desco-
Principia. Kepler já havia dito que as brindo-se a causa de um efeito, poder-
órbitas planetárias eram elíp�cas, mas -se-ia prever os efeitos seguintes, como
não explicou o mo�vo. No Principia, uma grande engrenagem de causas e
Newton explica tudo com a sua teoria efeitos. Inaugurava-se então uma
da gravitação universal. Perceba a gran- grande era de inovações, onde os
diosidade de sua obra, ela não explica homens fariam uso das leis da natureza
apenas os fenômenos terrestres, mas para controlar seus des�nos. A revolu-
todo o universo. Ele diz até como calcu- ção industrial muito dificilmente teria
lar a quan�dade de massa de cada pla- acontecido sem as ideias de Newton.
neta. Explica o mo�vo da terra ser acha-
tada nos polos e porque há uma saliên-
cia na região do equador. Ele descreve
as leis de funcionamento do universo. É
algo extraordinário.

O Principia foi a primeira obra cien�fica


a apresentar um trabalho quan�ta�vo,
exato, de um sistema matemá�co,
baseado em experimentação e observa-
ção crí�ca. Ele concluiu o processo de
explicação matemá�ca do universo,
desde o cair de uma maçã, ao movi-
mento dos planetas. Apesar da grandio-
sidade do sistema newtoniano, ele pró-
prio admi�a que não sabia o que era a
gravidade, apenas como ela atua. Por
isso, foi acusado de usar em sua teoria
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Humanismo, Renascimento e Revolução Científica Moderna

Indicações de Leituras

1. Cancioneiro, de Petrarca
2. A Douta Ignorância, de Nicolau de Cusa
3. Discurso Sobre a Dignidade do Homem, de Giovanni Pico Della Mirandola
4. Humanismo y renacimiento, de Lorenzo Valla e outros
5. Os ensaios, de Montaigne
6. Elogio da Loucura, de Erasmo de Ro�erdam
7. As 95 Teses e a Essência da Igreja, de Mar�nho Lutero
8. Institutas da Religião Cristã, de João Calvino
9. O Príncipe e Discursos Sobre a Primeira Década de Tito Lívio, de Maquiavel
10. A Utopia, de Tomás Morus
11. Os Seis Livros da República, de Jean Bodin
12. O Direito da Guerra e da paz, de Hugo Gro�us
13. Leonardo da Vinci, de Walter Isaacson e André Czarnobai
14. A Causa, o Princípio e o uno, de Giordano Bruno
15. A Cidade Do Sol, de Tommaso Campanella
16. Commentariolus, de Nicolau Copérnico
17. Kepler o Legislador dos Céus, de Paulo Roberto Mar�ns Contador
18. Kepler: a descoberta das leis do movimento planetário, de Ronaldo Rogé-
rio de Freitas Mourão
19. Diálogo sobre os dois máximos sistemas do mundo ptolomaico e coperni-
cano, de Galileu Galilei
20. Principia. Princípios Matemáticos de Filosofia Natural, de Isaac Newton

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