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DECLINAÇÕES: GÉNERO E NAÇÃO NAS LITERATURAS

E CULTURAS AFRICANAS DE LÍNGUA PORTUGUESA


organizadoras
Doris Wieser, Jessica Falconi
© Doris Wieser, Jessica Falconi, CES e Edições Almedina, 2022
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design de capa
EDIÇÕES ALMEDINA, S.A.
imagem da capa
«Tecido africano», Doris Wieser
paginação
João Jegundo
impressão e acabamento
Europress - Indústria Gráfica
1.ª edição: junho, 2022
depósito legal
500094/22

Este trabalho é financiado por fundos nacionais através da FCT – Fundação para a Ciência e a Tecnologia,
I.P., no âmbito do projeto Identidades Nacionais em Diálogo: Construções de Identidades Políticas e
Literárias em Portugal, Angola e Moçambique (1961–presente) (IF/00654/2015/CP1283/CT0004).
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do Editor, é ilícita e passível de procedimento judicial contra o infrator.

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biblioteca nacional de portugal – catalogação na publicação

DecliNações : género e nação nas literaturas e culturas africanas de língua portuguesa / org. Doris Wieser,
Jessica Falconi. – (CES)
ISBN 978-989-40-0466-0

I – WIESER, Doris
II – FALCONI, Jessica

CDU 821.134.3(6).09(042)
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mente desenvolvida no Centro de Estudos Sociais (CES) da Universidade de Coimbra.
Procura espelhar a atualidade e a interdisciplinaridade dos debates nas Ciências
Sociais e Humanas que marcam a investigação aqui realizada.
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A parceria que está na origem da Coleção procura potenciar as vantagens que resultam
do encontro entre a produção científica realizada no CES – enquanto unidade de investiga-
ção de excelência reconhecida internacionalmente – e o prestígio das Edições Almedina.
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Nunes, João Paulo Dias, José António Bandeirinha, Marta Araújo, Nancy Duxbury, Pedro
Hespanha.
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ÍNDICE

INTRODUÇÃO – O GÉNERO NAS NARRATIVAS DA NAÇÃO,


UMA CATEGORIA OBLITERADA? .............................................................. 11
Doris Wieser, Jessica Falconi

SECÇÃO 1
DECLINANDO TRADIÇÕES E MODERNIDADES

CAPÍTULO 1 – SÃO TOMÉ E PRÍNCIPE: A CONDIÇÃO FEMININA


E O DESAFIO AOS PAPÉIS «TRADICIONAIS» DA MULHER ..................... 23
Inocência Mata

CAPÍTULO 2 – NAÇÃO E GÉNERO NAS ESCRITAS DE ALDA


ESPÍRITO SANTO E CONCEIÇÃO LIMA ANTES E DEPOIS
DA INDEPENDÊNCIA SÃO-TOMENSE .......................................................... 41
Alexander Altevoigt

CAPÍTULO 3 – DECLINANDO NAUFRÁGIOS: MULHERES MILITARES


NO FILME MOÇAMBICANO ........................................................................... 63
Kathrin Sartingen

CAPÍTULO 4 – MULHER, VOZ E TRADIÇÃO EM MORTU NEGA


E NHA FALA DE FLORA GOMES...................................................................... 79
Mónica Ganhão

7
D ECLI N AÇÕES

SECÇÃO 2
DECLINANDO ESCRITAS EM CHAVE COMPARATISTA

CAPÍTULO 5 – ROMPENDO OS CORPUS DAS LITERATURAS


NACIONAIS AFRICANAS: CORPOS NUS DE MULHERES NEGRAS ........ 101
Catarina Martins

CAPÍTULO 6 – A GOTA QUE MOLDA A PEDRA: AS RESISTÊNCIAS


LITERÁRIAS DE AMA ATA AIDOO E PAULINA CHIZIANE
PARA REDESENHAR A NAÇÃO ...................................................................... 119
Marie Claire De Mattia

CAPÍTULO 7 – LITERATURAS AFRICANAS ENTRE A RECUSA


E A REIVINDICAÇÃO DA POLIGAMIA: MARIAMA BÂ, PAULINA
CHIZIANE, LOLA SHONEYIN E PEPETELA.................................................. 141
Doris Wieser, Paulo Geovane e Silva

CAPÍTULO 8 – DESVENDAR O PASSADO COLONIAL:


PERSPETIVA DAS MULHERES BRANCAS EM RAINHAS
DA NOITE DE JOÃO PAULO BORGES COELHO E IN THE
HEART OF THE COUNTRY DE J. M. COETZEE .............................................. 165
Marta Banasiak

SECÇÃO 3
DECLINANDO «RETORNOS», PERCURSOS E DIÁSPORAS

CAPÍTULO 9 – DECLINAÇÕES COLONIAIS: GÉNERO, NAÇÃO


E COLONIALISMO NA ESCRITA DE IRENE GIL .......................................... 185
Jessica Falconi

CAPÍTULO 10 – PERCURSOS (PÓS-)COLONIAIS E REPRESENTAÇÕES


DE MULHERES SOLTEIRAS NA OBRA DE MARIA ONDINA BRAGA...... 207
Gemma Nadal

8
ÍNDICE

CAPÍTULO 11 – ELAS AQUI: MULHERES ARTISTAS DE ANGOLA,


DE MOÇAMBIQUE E DAS DIÁSPORAS E OS CIRCUITOS DA ARTE
CONTEMPORÂNEA........................................................................................... 227
Ana Balona de Oliveira

SECÇÃO 4
DECLINANDO RESISTÊNCIAS: DO COLONIALISMO À ATUALIDADE

CAPÍTULO 12 – UMA RAINHA EM TRÊS CONTINENTES: GÊNERO


E SEXUALIDADE EM TORNO DE NZINGA MBANDI ................................. 249
Mário César Lugarinho, Helder Thiago Maia

CAPÍTULO 13 – DECLINAÇÕES FEMINISTAS E PÓS-COLONIAIS


EM MOÇAMBIQUE E TIMOR-LESTE ............................................................. 271
Teresa Cunha

CAPÍTULO 14 – «CINDERELAS DO NOSSO MOÇAMBIQUE»:


CONFRONTANDO DIÁLOGOS ENTRE JOVENS FEMINISTAS
E VETERANAS DA LUTA ARMADA ............................................................... 291
Isabel Maria Casimiro, Withney Osvalda M. Sabino

CAPÍTULO 15 – DEPOIS DO «SILÊNCIO PORTUGUÊS»: RELATOS


SOBRE VISIBILIDADE E VIOLAÇÃO DOS DIREITOS SEXUAIS
EM MOÇAMBIQUE ........................................................................................... 319
Maria Judite Chipenembe

COLABORARAM NESTA OBRA...................................................................... 341

9
CAPÍTULO 11
ELAS AQUI: MULHERES ARTISTAS DE ANGOLA,
DE MOÇAMBIQUE E DAS DIÁSPORAS
E OS CIRCUITOS DA ARTE CONTEMPORÂNEA*

Ana Balona de Oliveira


Instituto de História de Arte, Universidade Nova de Lisboa

Resumo: Este capítulo examina a obra de artistas angolanas, moçambicanas e


da diáspora, de diferentes gerações e com trajectos migratórios: Keyezua, Ana
Silva, Alida Rodrigues, Alice Marcelino, Grada Kilomba, Mónica de Miranda
(Angola); Eurídice Kala, Maimuna Adam, Camila de Sousa, Ângela Ferreira
(Moçambique). Analisa as condições estruturais que têm determinado que os
contextos angolano, moçambicano e diaspórico sejam marcados pela predomi-
nância da subjectividade artística masculina. Examina a forma como o sexismo,
o classismo e, em particular na diáspora, o racismo tendem a excluir as mulheres
negras da educação superior e da carreira artísticas, e como a migração, apesar
de frequentemente reservada a uma elite, tem contribuído para a emergência de
uma nova geração de mulheres artistas. Analisa a exposição Being Her(e)
(Luanda, 2017–2018) como sintomática de mudanças positivas.

Palavras-chave: Angola, Moçambique e diásporas; arte contemporânea;


colonialidade patriarcal, racial e de classe; exposição Being Her(e); mulheres
artistas.

*
Por vontade da autora, este texto não segue as regras do Acordo Ortográfico de 1990.

227
D ECLI N AÇÕES

1. Notas introdutórias

Este capítulo centrar-se-á no trabalho de mulheres artistas angolanas,


moçambicanas e das diásporas, de diferentes gerações e com trajectos
marcados por vários tipos de experiências migratórias: Ana Silva (Angola,
1979), Alice Marcelino (Angola, 1980), Alida Rodrigues (Angola, 1983),
Keyezua (Angola, 1988), Mónica de Miranda (Portugal, 1976) e Grada
Kilomba (Portugal, 1968) nos contextos angolano e diaspórico; e Eurídice
Kala aka Zaituna Kala (Moçambique, 1987), Ângela Ferreira (Moçambique,
1958), Maimuna Adam (Moçambique, 1984) e Camila Maissune de Sousa
(Moçambique, 1985) nos contextos moçambicano e diaspórico. Contudo,
mais do que uma análise demorada das obras em si, a reflexão focar-se-á
nas suas condições alargadas de produção e recepção, no sentido de indagar
que condições estruturais e sistémicas têm determinado que os contextos
artísticos angolano, moçambicano e português, entre outros africanos e
diaspóricos, sejam marcados pela predominância da subjectividade artís-
tica masculina, e que condições mais ou menos recentes têm determinado
a alteração deste estado de coisas.
Tendo em conta as especificidades de cada um destes contextos através
de uma perspectiva comparativa, argumentar-se-á no sentido de mostrar
como várias formas de sexismo, classismo e, em particular nos contextos
diaspóricos, racismo tendem a excluir as mulheres negras — africanas,
portuguesas de ascendência africana e outras — da educação superior e
da carreira artísticas; e como as experiências diaspóricas, apesar de fre-
quentemente reservadas a uma elite, têm tido um papel importante para a
emergência de uma nova geração de mulheres artistas.
Ao introduzir a expressão «elas aqui» no título deste capítulo, recupero
uma parte do título de uma recensão que escrevi sobre a exposição colectiva
Being Her(e), um projecto itinerante da plataforma !KAURU — Contempo-
rary Art from Africa (África do Sul), em parceria com a galeria angolana This
Is Not a White Cube (TINAWC) e com Beyond Entropy Africa (Angola),
que foi comissariado por Paula Nascimento (Angola) e Violet Nantume
(Uganda) na Galeria do Banco Económico, em Luanda, entre o final de 2017
e o início de 2018 (Balona de Oliveira, 2018a). «Elas Aqui» foi a forma que
encontrei de traduzir o being her (sendo ela) e o being here (estando aqui)

228
MULHERES ARTISTAS: ANGOLA, MOÇAMBIQUE E DIÁSPORAS

que a exposição pretendeu examinar através de um conjunto de obras de


14 mulheres artistas oriundas de sete países africanos a trabalhar no conti-
nente e/ou na diáspora, incluindo Kala, Miranda, Keyezua e Silva. Como
explicitarei adiante, tomo esta exposição como indiciadora de uma maior
visibilidade das mulheres artistas, apesar dos enormes desafios estruturais
que continuam a exigir resistência e mobilização, não só em Angola, como
em Moçambique e nas múltiplas diásporas de ambos os países, nomeada-
mente em Portugal e na África do Sul.

2. Mulheres artistas de Angola e suas diásporas

Contar histórias de arte contemporânea de Angola e das suas diásporas


já não implica escrever somente no e sobre o masculino, apesar de se estar
ainda muito longe de um real equilíbrio em termos da presença de artis-
tas angolanas em exposições, colecções, recepção crítica e historiografia.
Durante demasiado tempo, escrever tais histórias e investigar as práticas
tanto das gerações mais velhas como das mais novas significava encontrar
apenas as obras de artistas homens, com poucas excepções (e apesar de as
duas curadoras angolanas mais relevantes hoje em dia — Paula Nascimento e
Suzana Sousa — serem mulheres). Tal deve-se a vários factores de natureza
sistémica, nomeadamente a um mais fácil acesso a uma educação artística
por parte dos homens. Dado que o ensino superior artístico é recente no país
e que só alguns tiveram a possibilidade de se formar no estrangeiro,1 a edu-
cação artística tem sido maioritariamente de nível secundário, autodidacta
e/ou baseada num modelo informal de relação entre mestre e discípulo. Por
sua vez, tal acesso tem sido facilitado por uma percepção geral de que um
certo tipo de vivência social menos ortodoxa, frequentemente associada à
subjectividade criativa dos artistas, e mais independente, propiciando uma
maior capacidade de circular e viajar, seria mais apropriada a homens do

1
O Instituto Superior de Artes (ISART) foi fundado em Luanda em 2014 e teve os seus
primeiros alunos licenciados em 2019. A educação artística anteriormente disponível era
de nível secundário no Instituto Nacional de Formação Artística (INFA). Em 2015, o INFA
passou para a zona de Camama, na periferia de Luanda, integrando o Complexo das Es-
colas de Arte (CEARTE).

229
D ECLI N AÇÕES

que a mulheres, consideradas cuidadoras da casa e da família. Esta tendência


aplica-se, inclusivamente, ao período revolucionário da pós-independência,
apesar de a igualdade entre homens e mulheres ter sido um dos supostos
pilares da revolução.2
Contudo, o statu quo está em processo de transformação, dando lugar
a uma presença mais visível, embora ainda não igualitária, das mulheres
na cena artística angolana. As dinâmicas diaspóricas têm tido um impacto
fundamental nessa abertura (sem a determinar exclusivamente). Ao focar-
-me numa geração de artistas nascidas depois da independência em 1975,
nas especificidades dos seus trajectos diaspóricos e nas particularidades das
suas preocupações materiais, formais e conceptuais — que têm implicado
o uso de certos meios em detrimento de outros, e a análise de temas seme-
lhantes, ainda que simultaneamente variados —, deixo necessariamente
de fora várias práticas que um levantamento exaustivo incluiria. Ou seja,
apresento apenas uma selecção das práticas mais relevantes desta geração
em particular, que é também a mais profícua.3
A partida de Angola para estudar e/ou trabalhar fora do país foi forte-
mente motivada pela guerra civil (1975–2002),4 apesar de Luanda, onde
nasceram muitas das artistas em questão, ter sido um campo de batalha

2
A União Nacional dos Artistas Plásticos (UNAP), fundada em 1977, desempenhou um
importante papel dinamizador das artes visuais na pós-independência. Sobre a concep-
ção socialista do «homem novo» e o conceito nacionalista de «angolanidade» na política
cultural e na produção artística da pós-independência, nomeadamente no que concerne à
UNAP, conferir Collier (2013) e Siegert (2014).
3
À excepção do critério geracional, a mesma lógica centrada no uso de certos meios e na
investigação de certos temas preside à selecção das artistas moçambicanas.
4
A guerra civil foi combatida pelos três movimentos de libertação — MPLA (Movimento
Popular de Libertação de Angola, liderado por Agostinho Neto), FNLA (Frente Nacional
de Libertação de Angola, liderada por Holden Roberto) e UNITA (União Nacional para
a Independência Total de Angola, liderada por Jonas Savimbi) — imediatamente após a
independência em 1975, com o apoio da União Soviética e de Cuba ao MPLA, do Zaire
à FNLA (que perdeu progressivamente relevância durante a guerra) e da África do Sul do
apartheid e dos Estados Unidos à UNITA. A guerra civil fez parte das dinâmicas alargadas
da Guerra Fria, ainda que não exclusivamente (Pearce, 2017a, 2017b), e terminou com a
morte de Jonas Savimbi em 2002. Líder do MPLA entre 1962 e 1979, Neto foi o primeiro
presidente da Angola independente. Sucedeu-lhe José Eduardo dos Santos (1979–2017),
que, por sua vez, foi sucedido por João Lourenço (2017–). O MPLA está no poder desde
a independência.

230
MULHERES ARTISTAS: ANGOLA, MOÇAMBIQUE E DIÁSPORAS

apenas de forma muito intermitente durante os 27 anos do conflito. A neces-


sidade, normalmente não acompanhada pela possibilidade, de abandonar
o país para evitar o recrutamento foi enfrentada por homens, e a maioria
não escapou à guerra. Mas, obviamente, os seus efeitos foram sentidos de
múltiplas formas por todas as camadas da sociedade angolana, e as famílias
com conexões diaspóricas e com a capacidade económica para enviar os
seus filhos e filhas para o estrangeiro não hesitaram em fazê-lo. Estas eram
maioritariamente, embora não exclusivamente, famílias urbanas, de Luanda,
e que mantinham laços com o partido no poder, o MPLA.
Os trajectos diaspóricos da maioria das mulheres artistas nascidas em
Angola depois de 1975 — para Portugal, Reino Unido e Holanda — e
as múltiplas formas pelas quais tais trajectos necessariamente tiveram um
impacto no seu trabalho perturbam noções fixas, estáveis e essencialistas de
africanidade. Ao mesmo tempo, porém, a sua prática sugere que o continente
africano, em geral, e Angola, em particular, constituem um lugar central,
ainda que não exclusivo, a partir do qual, sobre o qual e com o qual dialogam.
Com efeito, desde o final da guerra civil, algumas das artistas que viviam
na diáspora regressaram a Angola (Keyezua e Ana Silva), enquanto outras
permanecem bastante conectadas ao país a partir do estrangeiro (Mónica
de Miranda), e outras não expuseram ainda as suas obras no país (Alice
Marcelino).
Incluo aqui artistas de ascendência angolana, que, embora não tenham
nascido no país, herdaram as memórias e experiências das suas famílias.
As histórias familiares e pessoais de Grada Kilomba e Mónica de Miranda
são exemplares das formas pelas quais os cruzamentos políticos, econó-
micos, sociais e culturais entre Portugal, Angola e São Tomé e Príncipe
(além de Cabo Verde, Guiné-Bissau e Moçambique)5 — surgidos a partir
da progressiva ocupação colonial portuguesa destes territórios africanos
ao longo de cinco séculos — produziram rotas migratórias coloniais e pós-
-coloniais na direcção da antiga metrópole, assim como múltiplas formações
diaspóricas culturais, étnicas e raciais. Ao mesmo tempo que estas artistas
são, obviamente, portuguesas, as suas identidades culturais entre Europa e
África, Portugal e Angola, reflectem uma condição europeia pós-colonial,

5
Além de angolana, Kilomba também tem ascendência são-tomense.

231
D ECLI N AÇÕES

em que as vidas culturais necessariamente impossibilitam qualquer con-


ceito homogéneo de identidade e de nação. Para complicar ainda mais — e
positivamente — este estado de coisas, ambas as artistas tiveram outras
experiências migratórias: Miranda em Londres (actualmente vive em Lisboa)
e Kilomba em Berlim (onde ainda vive).
Nos contextos diaspóricos como o português, onde os sujeitos racia-
lizados (incluindo migrantes, nacionais e aqueles que, apesar de nascidos
em Portugal, não são considerados Portugueses devido à primazia do ius
sanguinis em detrimento do ius soli na lei da nacionalidade;6 e em particular
as mulheres, tanto cis quanto transgénero, devido às intersecções entre raça,
género e classe)7 permanecem estrutural e institucionalmente impedidos de
aceder a uma cidadania política, económica, social e cultural plena, estas
artistas — juntamente com as artistas nascidas em Angola, que, não tanto
como os seus pares masculinos, têm exibido algum trabalho em Portugal
(Ana Silva, Alice Marcelino e Keyezua) — disseminam as lições ainda
inestimáveis de uma política da identidade que, noutros contextos, pode
ser considerada como já algo datada ou excessivamente divisiva. A última
das nações europeias a abandonar as suas colónias africanas, e tendo-o feito
apenas porque uma guerra sangrenta e impossível de ganhar — travada em
Angola, na Guiné-Bissau e em Moçambique (1961–1974) — culminou no
derrube do regime ditatorial do Estado Novo (1926–1974) pela Revolução
dos Cravos, Portugal tem, desde então, cultivado tanto a amnésia das verda-
des inconvenientes da violência e da exploração coloniais, como a nostalgia

6
Várias organizações activistas negras têm lutado contra a lei da nacionalidade e as for-
mas pelas quais ela contribui para a exclusão dos filhos nascidos em Portugal de migrantes
africanos vindos das antigas colónias portuguesas. Muitos desses migrantes mudaram-se
para Portugal antes da independência dos seus países em 1973–1975, ou seja, num mo-
mento em que a legislação pós-Segunda Guerra Mundial do Estado Novo considerava
(apenas em teoria) que todos eram portugueses. Os governos revolucionários de 1974–
–1975 em Portugal nunca resolveram completamente a questão da nacionalidade, e os
pós-revolucionários chegaram a inscrever o ius sanguinis na lei, pois não era mais do inte-
resse do país que todos continuassem portugueses. Mais recentemente, algumas alterações
legislativas foram introduzidas para melhorar a situação, sem resolvê-la completamente.
7
Sobre estas intersecções e os feminismos negro, interseccional e descolonial, conferir,
entre outras, hooks (2015), Davis (1983), Hill Collins (2009), Crenshaw (1989), Vergès
(2017 e 2019).

232
MULHERES ARTISTAS: ANGOLA, MOÇAMBIQUE E DIÁSPORAS

pela glória perdida das suas supostas «descobertas» e do seu império. Tais
amnésia e nostalgia foram reembaladas sob a forma da benevolente e fra-
terna influência portuguesa no mundo, nomeadamente nos países africanos
anteriormente colonizados, através do projecto de diplomacia política, eco-
nómica e cultural da lusofonia. Se a descolonização política teve lugar em
1974, as descolonizações epistémicas, psíquicas e institucionais continuam
por fazer. Por isso, sem confundir um sujeito diaspórico privilegiado com
um nacional, migrante ou refugiado racializado e destituído, e sem cair nas
armadilhas perigosas do essencialismo, uma política e uma ética da diáspora
e da migração em Portugal têm de estar profundamente sintonizadas com
a urgência da luta interseccional anti-racista, feminista e anticapitalista.8
Apesar da especificidade dos contextos, tais lutas permanecem igualmente
urgentes em Angola, em particular a feminista e a anticapitalista.
Trabalhando a partir de uma variedade de percursos pessoais contra
todas as formas de absolutismo étnico (ethnic absolutism) e outras formas
de essencialismo — para citar a proposta de Gilroy de uma dupla consci-
ência atlântica, inspirada, por sua vez, na obra de Du Bois (Gilroy, 1993)
—, as artistas aqui em discussão examinam as complexidades da pertença
nacional, continental e cultural. Uma actividade ético-política orientada para
mundos e futuros partilhados poderá, em última instância, surgir a partir
das próprias ambiguidades e ambivalências da migração e da diáspora.
O sujeito diaspórico negoceia necessariamente uma profusão de experiên-
cias díspares, e até contraditórias, de pertença, incluindo as herdadas, das
quais pode emergir um habitar partilhado e comunal do mundo; um habitar

8
Apesar de elaboradas a partir do contexto britânico, as ideias de Gilroy (1992 e 2004)
sobre melancolia pós-colonial, raça, racismo e multiculturalismo poderiam aplicar-se a
Portugal e a outros países europeus. As comunidades racializadas e segregadas, que vi-
vem maioritariamente nas periferias de Lisboa, têm um acesso estruturalmente dificultado
ao ensino superior e a empregos qualificados, nomeadamente nas artes. A sua situação
contrasta com a de muitas das artistas abordadas neste ensaio. Os sectores culturais e ar-
tísticos, nomeadamente da arte contemporânea, tendem a manter-se reservados às elites,
seja na Europa ou em África, em Portugal ou Angola. Assim, apesar da invisibilização
comparativa em relação aos seus pares brancos na cena artística portuguesa, a maioria des-
tas artistas é, no entanto, privilegiada — o que não significa que não enfrentem racismo,
sexismo e a precariedade económica de uma carreira artística.

233
D ECLI N AÇÕES

despertencido (unbelonged),9 cosmopolita e, neste caso, também afropoli-


tano (afropolitain) (Mbembe, 2010); um habitar móvel e orientado para o
futuro, de passagens e rotas (routes) através de geografias, histórias e cul-
turas, ao invés de ansioso para delinear origens e raízes (roots), fronteiras e
divisões (Clifford, 1997). De forma algo semelhante, Glissant (1990 e 1997)
elaborou uma poética da relação fundada numa ética do todo-mundo (tout-
-monde; totalité-monde) e, recentemente, Mbembe (2016) também escreveu,
de forma bastante estética, sobre a ética do passante (passant). É claro que
tal cosmopolitismo ético-político e crítico, potencialmente nascido a par-
tir da perda diaspórica da casa, só pode verdadeiramente ocorrer quando
experienciado por mais do que apenas uns quantos sujeitos privilegiados.
Esta situação requer a nossa análise incansável dos limites sistémicos que
o capitalismo neoliberal — tanto ocidental quanto oriental — impõe a uma
política e a uma ética da migração e da diáspora: não só no continente afri-
cano, assolado como tem sido, historicamente, pela opressão, predação e
extracção coloniais e neocoloniais da Europa para benefício, actualmente,
das corporações ocidentais e orientais e das elites africanas; mas também
na Europa, convenientemente esquecida das suas conquistas coloniais pas-
sadas, e erguendo-se cada vez mais sob a forma de uma fortaleza, contra o
perigo delirante de uma invasão aniquiladora por parte de corpos negros,
rapidamente transformados em cadáveres afogados à sua porta.
Quando a subjectividade diaspórica é artística (i.e., quando o sujeito
diaspórico é um ou uma artista), a política e a ética propostas constituem
também, obviamente, uma estética. Sem dúvida, este ensaio reúne práticas
extremamente diversas. Contudo, elas partilham uma propensão para os
meios conceptuais da fotografia, do vídeo, da instalação e da performance,
na linha quer das tendências internacionais disseminadas através das escolas
de artes que estas artistas frequentaram no estrangeiro, quer dos circuitos
artísticos cada vez mais globais onde expõem o seu trabalho. Artistas como
Miranda examinam histórias e memórias coloniais, anti e pós-coloniais,
incluindo a luta de libertação, a guerra civil, a Guerra Fria e o impacto da

9
A noção de (un)belonging, que tenho elaborado em vários textos (por exemplo, Balona
de Oliveira, 2015, 2017, 2018b, 2018c e 2018d) e que traduzi por (des)pertença (Balona de
Oliveira, 2015 e 2019), é também usada por Rogoff (2000) e aproxima-se da unhomeliness
de Bhabha (1994).

234
MULHERES ARTISTAS: ANGOLA, MOÇAMBIQUE E DIÁSPORAS

globalização em Angola e no continente. Fazem-no através de investigações


arquivísticas e de análises visuais e materiais das muitas camadas arquitec-
tónicas e dos velhos e novos símbolos da paisagem urbana de Luanda (e
para além dela). O olhar atento e investigativo sobre a realidade angolana é
possibilitado precisamente pelo estranhamento produzido pela experiência
diaspórica: dificilmente reconhecendo o lugar deixado para trás (pela artista
ou pela sua família), observar, documentar criativamente e, dessa maneira,
reinventar a cidade e o país também se tornaram formas de voltar a casa
(Miranda, Hotel Globo, 2014–2015; Panorama, 2017–2018).
Outra linha relevante de pesquisa artística, desenvolvida por Kilomba,
Keyezua, Miranda, Marcelino e Silva, desenrola-se em torno do corpo,
nomeadamente, embora não exclusivamente, do corpo negro feminino,
representado de forma a contrariar múltiplas narrativas estereotipificado-
ras de negritude, de angolanidade, de africanidade, assim como de femi-
nilidade e de maternidade. Por vezes, estas artistas inspiram-se nas ricas e
diversas tradições africanas da fotografia de estúdio e do retrato (Marcelino,
Kindumba, 2015), assim como da fotografia de paisagem (Keyezua, Fortia,
2017). Apropriam, subvertem e recriam vários tipos de arquivos fotográficos,
como, por exemplo, os etnográficos e botânicos criados pelo ex-colonizador
na sua ânsia exoticista de catalogação (Rodrigues, Wild Flowers, 2018), e
os documentais e militantes produzidos pelas lutas anticoloniais (Miranda,
Tales of Lisbon, 2020), entre outros.
Outra linha importante de investigação artística baseia-se em usos varia-
dos da performatividade e da oralidade (Kilomba, Plantation Memories,
2015), assim como do som e da musicalidade (Kilomba, The Desire Project,
2015–2016), como estratégias contemporâneas, atentas às tradições culturais
do continente e das suas diásporas (Gilroy, 1993 e 2010),10 para descons-
truir a fixidez violenta dos estereótipos raciais, de género e sexualidade
(Bhabha, 1994: 94–120). Artistas como Kilomba articulam explicitamente
a sua prática em termos da ética e da política do feminismo interseccional:

10
Gilroy escreve sobre a dimensão performativa e a dimensão discursiva da cultura
atlântica negra em termos de uma política (performativa) de transfiguração (politics of
transfiguration) e de uma política (discursiva) de realização (politics of fulfilment), con-
siderando-as como dimensões irmãs da sensibilidade negra (sibling dimensions of black
sensibility) (1993: 37–38).

235
D ECLI N AÇÕES

um feminismo que não concebe o género e a sexualidade sem considerar


as suas intersecções históricas e contemporâneas com a raça e a classe
(Kilomba, 2008; hooks, 2015; Davis, 1983; Hill Collins, 2009; Crenshaw,
1989; Vergès, 2017 e 2019).

3. Mulheres artistas de Moçambique e suas diásporas

Em Moçambique, apesar da força das suas tradições de fotografia


documental desde o período da luta de libertação (1964–1975)11 e da forte
influência da vizinha África do Sul não só em termos económicos, mas
também culturais (com Joanesburgo e outras cidades sul-africanas consti-
tuindo importantes destinos migratórios e diaspóricos para jovens artistas
em busca de formação, galerias e museus), a verdade é que o panorama
tem sido quase exclusivamente masculino, com raras excepções. As artistas
moçambicanas que mencionei — Kala, Ferreira, Adam e Sousa — nasceram
em Maputo em períodos distintos, mas todas partilham uma trajectória mar-
cada pela experiência diaspórica na África do Sul e/ou na Europa. Ferreira
é uma artista branca e filha de ex-colonos, que, nascida em Maputo antes da
independência, se politiza no contexto da luta anti-apartheid na Cidade do
Cabo, onde foi estudante de escultura no início dos anos 80. Vive em Lis-
boa desde os anos 90, com um breve regresso ao Cabo, e nova partida para
Lisboa nos anos 2000, em cuja Faculdade de Belas Artes lecciona. Adam
é uma artista moçambicana com ascendência indiana e norueguesa, que
passou a infância em Gotemburgo, na Suécia, e cresceu em Maputo. Estu-

11
A luta de libertação foi levada a cabo pela FRELIMO (Frente de Libertação de
Moçambique) a partir de 1964. O movimento foi liderado por Eduardo Mondlane até
seu assassinato a 3 de Fevereiro de 1969, e por Samora Machel, o primeiro presidente de
Moçambique independente, até à sua morte num acidente de avião a 19 de Outubro de 1986.
O avião no qual Machel viajava da Zâmbia para Moçambique caiu numa área montanhosa
da África do Sul. Houve suspeitas, nunca confirmadas, de que o governo sul-africano
estaria envolvido no acidente. A guerra civil (1977–1992) opôs a FRELIMO à RENAMO
(Resistência Nacional Moçambicana). A Rodésia patrocinou a fundação da RENAMO em
1975 para combater o apoio da FRELIMO aos movimentos de libertação do que viria a
ser o Zimbabwe. Ao contrário do que aconteceu em Angola, a África do Sul não invadiu
Moçambique, mas interveio na guerra apoiando a RENAMO contra o governo da FRELIMO.

236
MULHERES ARTISTAS: ANGOLA, MOÇAMBIQUE E DIÁSPORAS

dou em Mbabane, na Swazilândia/Eswatini, e formou-se na Faculdade de


Belas Artes de Pretória, na África do Sul. Leccionou no Instituto Superior
de Artes e Cultura (ISArC), na Machava, em Maputo, e hoje em dia vive
entre o Reino Unido e Moçambique. Camila de Sousa estudou ciências
sociais, com enfoque em antropologia visual, na Universidade Federal de
Santa Catarina, assim como arte e cultura visual na Universidade Federal
de Goiás, no Brasil, e actualmente vive em Lisboa. Já Kala, a mais jovem,
viveu durante vários anos em Joanesburgo, onde estudou fotografia — mais
precisamente, na Market Photo Workshop — e se politizou. Hoje reside
em Paris. De forma mais ou menos intensa, todas mantêm ligações artísti-
cas e profissionais a Moçambique, onde têm exposto o seu trabalho. Kala
desenvolveu também algumas actividades de curadoria e produção cultural
em Joanesburgo e Pretória, nomeadamente com a Visual Arts Network of
South Africa (VANSA) e a !KAURU.12 Embora Ferreira não tenha voltado a
residir em Moçambique desde a saída da sua família em 1973, tem visitado
o país com frequência crescente a convite de várias instituições culturais
para expor o seu trabalho, apresentar palestras e dar formação em workshops
destinados a gerações mais novas de artistas.13
Tal como as suas pares angolanas e as artistas contemporâneas em geral,
estas artistas moçambicanas recorrem a vários meios de natureza conceptual,
tais como a fotografia, o vídeo, a instalação e a performance, os quais se
têm disseminado através das escolas de artes e dos circuitos de exibição do
Norte e do Sul globais. Os motivos sistémicos para uma ainda incipiente
presença feminina na cena artística moçambicana são idênticos aos referidos
anteriormente, mas agravados pelo facto de este contexto ser comparativa-
mente menos dinâmico do que o angolano, nomeadamente no que concerne

12
Kala foi co-curadora, com Melissa Goba, da exposição colectiva Cultural Brokerage:
Africa Imagined (Act 1), o segundo projecto da !KAURU, que teve lugar no Pretoria Art
Museum entre Maio e Junho de 2013 e que incluiu o trabalho de Adam. Com a VANSA,
Kala trabalhou nomeadamente no programa PAN!C — Pan African Network of Indepen-
dent Contemporaneity, uma plataforma para espaços independentes de arte contemporânea
no continente africano.
13
Ferreira e Adam foram as duas formadoras convidadas para a primeira edição do
Upcycles em 2019, um programa de residências artísticas em Maputo, organizado pela
Associação dos Amigos do Museu do Cinema em Moçambique (AAMCM) e destinado a
artistas emergentes dos países africanos de língua oficial portuguesa.

237
D ECLI N AÇÕES

aos circuitos galerístico e curatorial e ao coleccionismo. Apesar de a edu-


cação artística superior existir no país desde a pós-independência (a Escola
Nacional de Artes Visuais [ENAV] foi fundada em 1983 e, actualmente,
não é a única);14 da existência do Núcleo de Arte, uma instituição historica-
mente relevante que antecede em muito a independência e que reabriu em
1994; de, ao contrário de Luanda, Maputo possuir um Museu Nacional de
Arte, o MUSART, fundado em 1989; e da criação do Movimento de Arte
Contemporânea de Moçambique (MUVART) em 2002 (Costa, 2013; Díaz
Rivas, 2014), o circuito galerístico é mais parco e a dinâmica curatorial
permanece muito circunscrita às galerias dos centros culturais português
e francês (além do brasileiro e do alemão).15 A África do Sul, mais do que
Portugal, constitui frequente porta de entrada nos circuitos internacionais
da arte contemporânea e tem tido também um papel determinante na politi-
zação do discurso artístico de algumas moçambicanas, como sucedeu com
Ferreira, durante o apartheid, e com Kala, décadas mais tarde.
Do ponto de vista das temáticas examinadas, e apesar das inúmeras
especificidades, destacam-se questões não muito dissemelhantes das que
preocupam as artistas angolanas já mencionadas. Todas elas, de uma forma
ou de outra, trabalham em torno de uma política da história e de uma ética da
memória a partir de investigações arquivísticas, sendo que os arquivos em

14
A Escola de Comunicação e Artes (ECA) da Universidade Eduardo Mondlane (UEM)
foi criada em 2002. O Instituto Superior de Artes e Cultura (ISArC) iniciou as suas activi-
dades lectivas na Machava, em Maputo, em 2010.
15
Em Luanda, destacam-se as galerias Jahmek, Movart, This Is Not a White Cube (TI-
NAWC), Espaço Luanda Arte (ELA), Tamar Golan e Hall de Lima Pimentel. Em Maputo,
a única galeria comercial com participação em feiras de arte internacionais é a Arte de
Gema (ainda que a venda de obras de arte ocorra igualmente em espaços não comerciais).
Espaços expositivos relevantes são o MUSART, o Núcleo de Arte, a galeria da Associação
Kulungwana na Estação Central dos Caminhos de Ferro de Moçambique, a Fortaleza, a
Casa de Ferro e as galerias da Fundação Fernando Leite Couto e da Direcção de Cultura
da Universidade Eduardo Mondlane (UEM). A forte presença dos centros culturais por-
tuguês, francês, brasileiro e alemão também se faz sentir em Luanda, em particular a do
português no que a exposições diz respeito. Outros espaços expositivos relevantes são a
galeria do Banco Económico, a UNAP, o Memorial Dr. António Agostinho Neto (MAAN),
o Museu de História Natural, o Palácio de Ferro, a Fundação Arte e Cultura, a Fábrica
de Sabão, a Academia BAI e o Hotel Globo, onde existiu a galeria Soso e a sede da Trienal de
Luanda e onde vários artistas têm organizado as edições do Fuckin’Globo desde 2015.
No passado, também o Teatro Elinga foi um importante espaço expositivo.

238
MULHERES ARTISTAS: ANGOLA, MOÇAMBIQUE E DIÁSPORAS

questão são tanto públicos, como privados, nomeadamente familiares; tanto


fílmicos e fotográficos, quanto sonoros, textuais, objectuais e performativos;
tanto físicos, quanto psíquicos, incluindo as suas próprias memórias e as das
suas famílias, arquivos vivenciais e orais registados pelo e no próprio corpo,
sempre psíquico e social, pessoal e político (Butler, 1997 e 1999). Ferreira
e Kala, em particular, têm examinado histórias e memórias coloniais, anti e
pós-coloniais, incluindo as utopias revolucionárias da pós-independência,
os seus legados emancipatórios e o que ficou por cumprir, através de obras
que inserem o contexto moçambicano nas dinâmicas regionais e globais
do apartheid, da Guerra Fria e da globalização neoliberal. Ferreira fê-lo
nomeadamente em For Mozambique (2008), entre inúmeras outras, e Kala,
em Will See You in December... Tomorrow (2015), onde abordou igualmente
os trânsitos pré-coloniais no Índico através de um olhar sobre a capulana.
Em obras como The Travelling Dress (2008), Home (2010) e Pack Your
Bags (2011), entre outras, Adam recorre aos arquivos pessoais e familiares
com o intuito de examinar a condição migratória e diaspórica, subvertendo
qualquer possibilidade de conceber as posicionalidades identitárias (nomea-
damente, as culturais e nacionais) como fixas e homogéneas, sem, contudo,
deixar de afirmar o lugar específico e concreto, histórico e corpóreo, ou,
ainda, situado, a partir do qual os sujeitos falam e se deslocam (Hall, 1990;
Bhabha, 1994; Haraway, 1988). Tal como as suas pares angolanas, de forma
mais ou menos assumidamente feminista, e através de diferentes estratégias,
estas artistas moçambicanas examinam igualmente as questões de género,
questionando estereótipos de feminilidade e afirmando a multiplicidade
das experiências e vivências de género e sexualidade (quer cis, quer trans-
género; tanto hetero, como homossexuais). Kala, em particular, não deixa
de abordar as limitações históricas e contemporâneas do feminismo branco
e burguês e a necessidade de perspectivas descoloniais com enfoque na
realidade das mulheres racializadas (Vergès, 2017 e 2019) (Entre-de-Lado,
2012–2017; Measuring Blackness and a Guide to Many Other Industries,
2016). Recorrendo a metodologias da etnografia e da antropologia visual,
Sousa desenvolveu pesquisas importantes com comunidades de mulheres
negras encarceradas em Moçambique, que fotografou (3x4, 2011). Kala,
Sousa e Ferreira têm também evidenciado os valiosos contributos das mulhe-
res para a luta de libertação, relembrando e enunciando de múltiplas formas

239
D ECLI N AÇÕES

alguns dos seus nomes, como Josina Machel e Janet Mondlane (uma mulher
branca norte-americana), evocadas por Kala, e a poeta Noémia de Sousa
(tia-avó de Sousa e por si homenageada, entre outros, em Mafalala Blues,
2010, e celebrada por Ferreira em Súplica, 2018). Numa perspectiva pan-
-africanista, Kala expandiu esta lista com os nomes das inúmeras mulheres
que se destacaram nas várias lutas de libertação do continente (Imagine If
Truth Was a Woman... And Why Not?, 2016); e Ferreira prestou homenagem,
nomeadamente, à sul-africana Miriam Makeba, a partir de um olhar arqui-
tectónico sobre a sua casa no exílio na Guiné-Conakry (Pan African Unity
Mural, 2018; Dalaba: Sol d’Exil, 2019). Kala lembrou ainda as anónimas
mulheres moçambicanas que, envergando as suas capulanas, migram para
a vizinha África do Sul em busca de melhores condições de vida para se
depararem com a frequente realidade da xenofobia (Will See You in Decem-
ber... Tomorrow, 2015).

4. Being Her(e) ou Elas Aqui

Estas mesmas preocupações com questões de género, centradas nas


realidades do continente africano e das suas diásporas, presidiu à concepção
curatorial da exposição Being Her(e) em Luanda. A exposição reuniu obras
de 14 mulheres artistas oriundas de sete países africanos a trabalhar no
continente e/ou na diáspora: Stacey Gillian Abe (Uganda), Phoebe Boswell
(Quénia), Mimi Cherono Ng’Ok (Quénia), Eurídice Kala aka Zaituna Kala
(Moçambique), Lebohang Kganye (África do Sul), Keyezua (Angola),
Immaculate Mali (Uganda), Mónica de Miranda (Angola/Portugal), Nandipha
Mntambo (África do Sul), Zanele Muholi (África do Sul), Aida Muluneh
(Etiópia), Zohra Opoku (Gana), Jessica Atieno Ounga (Quénia) e Ana Silva
(Angola). O projecto teve início em 2016 com a exposição colectiva Being
and Becoming: Complexities of the African Identity, comissariada por Paula
Nascimento e Rafael Chikukua (Zimbabwe) na galeria UNISA em Pretória.
Continuou em 2017 com Being Her(e): Meditations on African Feminities,
comissariada por Refilwe Nkomo (África do Sul) e Thato Mogotsi (África
do Sul), sob orientação de Paula Nascimento e Violet Nantume, no Consti-
tution Hill em Joanesburgo. A sua presença em Luanda, sob a forma desta

240
MULHERES ARTISTAS: ANGOLA, MOÇAMBIQUE E DIÁSPORAS

nova exposição, constituiu a primeira instância de uma dinâmica de itine-


rância através da qual a !KAURU pretende fortalecer redes de colaboração
artística a nível regional e continental. Ao contrário da exposição de 2016
em Pretória, as iniciativas em Joanesburgo e Luanda em 2017 e 2018 foram
compostas exclusivamente por obras de mulheres artistas, com o intuito de
examinar as complexidades das identidades africanas no feminino e de o
fazer a partir da noção fundamental de corpo, ou seja, de uma subjectividade
que se assume como simultaneamente corpórea, psíquica, social, política e
historicamente inscrita. Falar de identidade africana e de identidade feminina
— de qualquer tipo de identidade — implica uma conjugação no plural e
no gerúndio, ou seja, o reconhecimento da forma como cada sujeito, tanto
individual quanto colectivo, é constituído por uma multiplicidade de posi-
cionalidades identitárias, cuja concretude e especificidade (being), como
afirmei anteriormente, não comprometem o seu potencial de transformação
e abertura (becoming) (Hall, 1990).
Esta exposição assumiu uma relevância particular por três razões essen-
ciais. A primeira, de pendor feminista, diz respeito ao facto de a exposição
ter aberto um espaço decisivo de visibilidade para vozes femininas não só
curatoriais e galerísticas, mas acima de tudo artísticas — algumas das quais
já mais do que estabelecidas no panorama artístico internacional, e outras
emergentes — num contexto que, tal como muitos outros, tem sido caracteri-
zado por uma predominância da presença e das vozes masculinas. A segunda
razão, de inspiração pan-africanista, concerne ao facto de a exposição ter
concedido essa visibilidade a obras que, muito embora valham por si, indi-
vidualmente consideradas, foram curatorialmente colocadas num diálogo
regional, continental e diaspórico. Este gesto foi tanto mais significativo
quanto certos legados históricos e certas realidades económicas têm impli-
cado demasiadas vezes o privilegiar de ligações à Europa e a consequente
falta de comunicação, de circulação e de conhecimento mútuo entre os agen-
tes culturais do continente. Em terceiro lugar, notou-se uma preponderância
da fotografia, do vídeo, da instalação e da performance, o que, neste con-
texto artístico, adquire especial relevo, já que contrasta com uma frequente
ênfase local na pintura e na escultura. A arte contemporânea angolana que
se internacionalizou tem sido profícua no que aos lens-based media diz
respeito, mas isso nem sempre se traduz numa presença suficientemente

241
D ECLI N AÇÕES

forte destes meios quando se olha para lá do que uma geração e um circuito
artísticos mais internacionalizados têm produzido. Apesar desta preponde-
rância, a exposição não abdicou de uma interessante diversidade de meios.
Às obras fotográficas e videográficas de Abe, Boswell, Cherono Ng’Ok,
Kala, Keyezua, Kganye, Miranda, Mntambo, Muholi e Muluneh (muitas
delas de qualidade fortemente performativa pela forma como as câmaras
retratam ou auto-retratam os corpos em vários tipos de paisagem ou no
estúdio), acrescentaram-se interessantes exemplos de trabalho pictórico e
de colagem em tela, como o de Silva; serigráfico, material e espacial, como
o de Opoku; e mais explicitamente tridimensional, como os de Abe, Kala
(ambas conjugando fotografia e instalação), Mali e Ounga.
A exposição constituiu uma proposta discursiva de pendor tanto poético
quanto assumidamente ético-político, reflectindo sobre questões tão diversas
— ainda que intimamente relacionáveis — como as memórias pessoais e
familiares e as histórias colectivas; o habitar e ocupar dos espaços domés-
ticos e públicos, interiores e exteriores, das arquitecturas e das paisagens;
a política da representação e da auto-representação do corpo feminino;
o casamento, a maternidade e a religião; a desconstrução de estereótipos
patriarcais, cis e heteronormativos, racistas e eurocêntricos, nomeadamente
aqueles inscritos nas narrativas da história da arte ocidental; a agência do
olhar, da pose e do movimento; a materialidade corpórea do sujeito, o seu
poder político de transfiguração e de subversão de normatividades social-
mente impostas e naturalizadas, e as suas múltiplas manifestações virtuais.
Por tudo isto, e apesar de Being Her(e) ter ocupado a galeria do Banco
Económico (i.e., um espaço não propriamente dedicado a formas mais expe-
rimentais, horizontais e não-comerciais de produção artística e curatorial),
a exposição tornou-se de visita obrigatória.
Com efeito, um feminismo interseccional verdadeiramente descolonial
está longe de envolver apenas a questão da presença igual de mulheres e
homens em todas as arenas da vida pública e cívica, pois exige uma luta mais
ampla contra o capitalismo, o racismo, o sexismo, a homofobia e a transfobia
em vista de mudanças estruturais e sistémicas e um real compromisso com
meios de produção verdadeiramente democráticos e horizontais, incluindo
na produção cultural, artística, curatorial e historiográfica. No entanto, tal
presença constitui uma parte inestimável da luta — a da visibilidade e da

242
MULHERES ARTISTAS: ANGOLA, MOÇAMBIQUE E DIÁSPORAS

representatividade. Formas não-tokenísticas de inclusão e visibilização das


e pelas mulheres — em particular, das e pelas mulheres negras, indígenas e
outras racializadas (cis e transgénero; heterossexuais e lésbicas) —, que
contrariam séculos de silenciamento e invisibilização patriarcal, racista e
capitalista, são da maior importância para uma maior justiça epistémica na
produção e na reprodução do conhecimento, assim como na afirmação e
mesmo na sobrevivência de epistemologias e de ontologias não-ocidentais
e não-ocidentalizadas, constantemente ameaçadas de epistemicídio, genocí-
dio e extinção. Apesar de a luta feminista mudar consideravelmente de um
contexto para o outro (tanto na passagem entre o Norte e o Sul globais, como
no âmbito quer do Norte, quer do Sul) e apesar de a prática artística não
poder ser simplesmente equiparada ao activismo, a presença e a visibilidade
de artistas (assim como de curadoras, críticas, historiadoras de arte, etc.)
ético-politicamente activas, ao lado dos seus pares masculinos, em Angola,
em Moçambique, no continente e nas suas diásporas (nomeadamente, na
portuguesa), contribuem decisivamente para o debate urgente sobre as con-
dições locais e globais necessárias para uma democracia verdadeiramente
interseccional. Pois, embora tal democracia permaneça um objectivo a atin-
gir, aquilo que dela foi, de facto, alcançado está hoje em perigo em várias
partes do mundo, em detrimento dos pobres, dos negros, dos ciganos, dos
indígenas e de outras comunidades racializadas, das mulheres, das pessoas
LGBTQI e das formas de vida não humana.

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