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Contrato de Transporte

Por contrato de transporte entende-se aquele em que uma pessoa ou empresa


(transportadora) se obriga a transportar pessoa ou coisa (contratante do serviço), em
segurança, de um local para outro, mediante o pagamento de um preço.

Quando o contratante do serviço é empresário e o objeto do contrato corresponde a seu


insumo — como nos casos de transporte de cargas, de empregados etc. —, o estudo é feito
pelo direito comercial.

Entre o transportador e o contratante há sempre relação de consumo, se o contrato de


transporte é do interesse do direito civil.

➮ REQUISITOS

I) Empresarialidade — Art. 739. O transportador não pode recusar passageiros, salvo os casos
previstos nos regulamentos, ou se as condições de higiene ou de saúde do interessado o
justificarem.

Para Fábio Ulhoa Coelho, essa proibição só alcança quem explora o transporte como
atividade econômica.

Art. 734. O transportador responde pelos danos causados às pessoas transportadas e suas
bagagens, salvo motivo de força maior, sendo nula qualquer cláusula excludente da
responsabilidade.

Parágrafo único. É lícito ao transportador exigir a declaração do valor da bagagem a fim de


fixar o limite da indenização

II) Onerosidade

Art. 730. Pelo contrato de transporte alguém se obriga, mediante retribuição, a transportar, de
um lugar para outro, pessoas ou coisas.

Art. 736. Não se subordina às normas do contrato de transporte o feito gratuitamente, por
amizade ou cortesia.

Parágrafo único. Não se considera gratuito o transporte quando, embora feito sem
remuneração, o transportador auferir vantagens indiretas.

Súmula 145, STJ


No transporte desinteressado, de simples cortesia, o transportador só será civilmente
responsável por danos causados ao transportado quando incorrer em dolo ou culpa grave.

Espécies de transporte

➮ TRANSPORTE DE PESSOAS

Quando o serviço de transporte consiste em levar uma ou mais pessoas físicas de um lugar
para outro.

❐ Obrigações da transportadora

a) Levar a pessoa ao destino. Em qualquer contrato de transporte de pessoas, a principal


obrigação do empresário transportador é a de recolher no ponto de origem e levar ao ponto de
destino a pessoa a ser transportada.

b) Oferecer o serviço a qualquer interessado. Ao transportador é, em geral, proibido


recusar-se a transportar qualquer pessoa que tiver interesse no serviço e se dispuser a pagar a
remuneração cobrada pelo trajeto. A lei admite apenas duas exceções: os casos previstos no
regulamento e a falta de higiene ou saúde do interessado.

c) Observar horários, itinerários e demais condições do contrato. No ato da contratação do


transporte, definem as partes as condições da execução do contrato.

A inobservância dos horários, itinerários ou demais condições do transporte gera a obrigação


para o transportador de indenizar as perdas e danos sofridos pelo contratante do transporte,
salvo motivo de força maior.

d) Arcar com os custos de interrupção da viagem. Se a viagem interromper-se por qualquer


razão, mesmo que alheio à vontade do transportador ou derivado de fato imprevisível, é
obrigação dele providenciar a continuidade do transporte em outro veículo da mesma
categoria.

E, em qualquer caso, todas as despesas com alimentação e estada do passageiro durante a


interrupção do transporte são da responsabilidade do empresário transportador (CC, art. 741;
Lei n. 11.975/2009, art. 5º).

e) Restituir o valor da passagem ao passageiro desistente. É direito do passageiro resilir


unilateralmente o contrato de transporte a qualquer tempo.

Se a resilição do contrato de transporte feita por declaração unilateral do passageiro dá-se


antes de iniciada a viagem, cabe distinguir duas hipóteses. Primeira, a resilição é feita a
tempo de ser renegociada a passagem. Aqui, o transportador fica obrigado a restituir ao
passageiro o valor pago (CC, art. 740).

Segunda, a resilição do contrato é feita por declaração unilateral do passageiro antes de


iniciar-se a viagem, quando não há mais tempo suficiente para a renegociação da passagem.
Agora, a restituição só será devida se alguém for transportado no lugar do passageiro.

Se, por outro lado, a resilição se opera depois de iniciada a viagem, o direito à restituição de
valor proporcional ao trecho não utilizado fica condicionada à prova de que outra pessoa
continuou a viagem no lugar do passageiro desistente (CC, art. 740, § 1º).

Em qualquer hipótese de restituição, total ou parcial, do valor da passagem em razão da


resilição por declaração unilateral do passageiro, o transportador pode reter até 5% do valor a
restituir, para compensar-se de suas despesas com a quebra do contrato.

❐ Obrigação do contratante do transporte

O contratante do transporte tem uma única obrigação, a de pagar o preço da passagem.


Trata-se de obrigação pecuniária, sujeita às consequências próprias do inadimplemento
contratual, como a imposição de juros moratórios, correção monetária, multa etc.

❐ Dever do passageiro

Passageiro é a pessoa transportada. Mesmo não sendo ele o contratante do serviço,


cumpre-lhe o atendimento a um dever estabelecido por lei no interesse dos demais usuários
do mesmo transporte.

Trata-se da observância do regulamento do serviço. Preceitua a lei que “a pessoa transportada


deve sujeitar-se às normas estabelecidas pelo transportador, constantes no bilhete ou afixadas
à vista dos usuários, abstendo-se de quaisquer atos que causem incômodo ou prejuízo aos
passageiros, danifiquem o veículo, ou dificultem ou impeçam a execução normal do serviço”
(CC, art. 738).

Por fim, a derradeira implicação da inobservância do dever imposto ao passageiro é a


proporcionalização da indenização a que ele faria jus por força de acidente de transporte para
o qual sua conduta ilícita tenha contribuído (CC, art. 738, parágrafo único).

➮ TRANSPORTE DE COISA

No transporte de coisas, o objeto do contrato são bens corpóreos confiados pelo contratante
(também chamado, nessa espécie de transporte, de remetente) ao transportador, para que os
entregue incólumes, no ponto de destino, ao destinatário (ou consignatário).

❐ Obrigações do transportador:
a) Levar a coisa ao destino.
A principal obrigação do transportador é a de levar a coisa objeto de contrato do lugar em que
se encontra para o destino indicado pelo contratante do serviço.

O transportador tem a obrigação de manter a coisa transportada no mesmo estado em que a


recebeu. Ele é responsável por indenizar o remetente caso o bem se perca ou sofra
deterioração.

Além disso, deve observar os prazos contratados, fazendo chegar a coisa transportada no seu
destino no termo estipulado com o contratante (CC, art. 749).

A responsabilidade do transportador tem início no


momento em que recebe a coisa, diretamente ou por seus prepostos, e termina no da entrega
ao destinatário ou depósito judicial (art. 750).

Se, durante o transporte, o transportador recebe instruções do remetente mudando o


destinatário ou determinando o retorno à origem, deve observá-las. Nesse caso, terá direito de
cobrar do remetente remuneração acrescida que pelo menos cubra seus custos com a
contraordem (CC, art. 748).

Em determinados modos de transporte, como o marítimo, ferroviário e aéreo, a entrega ocorre


necessariamente numa estação à qual deve se dirigir o destinatário para receber a coisa
transportada. Nesse caso, o transportador não está obrigado a comunicar-lhe o desembarque
do bem transportado, se não existir expressa cláusula contratual nesse sentido (CC, art. 752).

b) Emitir o conhecimento de transporte. O instrumento que documenta as obrigações do


transportador derivadas do contrato de transporte de coisas é o conhecimento de transporte
(também denominado frete).

Sua emissão pelo transportador, no ato do recebimento da coisa a transportar, é obrigatória


(CC, art. 744).

Trata-se de título de crédito impróprio, da espécie “representativo”, que permite a


transferência, mediante endosso, da titularidade da coisa objeto do contrato de transporte.
Quem exibe o conhecimento de transporte endossado está legitimado para receber a coisa do
transportador no ponto de destino (CC, art. 754).

c) Adotar os procedimentos legais em caso de frustração do transporte.

O transportador deve comunicar o empecilho ao remetente, não podendo tomar nenhuma


providência por conta deste. Enquanto aguarda as instruções, continua com a mesma
obrigação de zelar pela coisa transportada (CC, art. 753).
Após o decurso de prazo razoável para o recebimento da instrução, o transportador pode
ingressar com processo judicial de depósito, com o objetivo de liberar-se da obrigação de
manutenção do animal (CC, art. 753, § 1º).

Se o impedimento deve-se a fato não imputável ao transportador (exigência da vigilância


sanitária, por exemplo), tem ele também a opção de vender a coisa transportada, pelo preço
de mercado e observado o regulamento do transporte, para depositar em juízo o saldo do
valor obtido na venda (§ 1º, in fine).

Caso a coisa se encontre em armazém do transportador, poderá cobrar do remetente


remuneração acrescida (§ 4º). Mas quando o impedimento ocorre por fato imputável ao
transportador (defeito no veículo, por exemplo), a opção pela venda da coisa transportada só
existe se ela for perecível (§ 2º). Num ou noutro caso, o transportador deve comunicar o
remetente o depósito ou a venda (§3º).

A dúvida acerca da identidade do destinatário pode também frustrar a execução do contrato


de transporte. Nesse caso, as providências são similares. Se o remetente não desfizer a
dúvida, o transportador deve depositar a coisa em juízo ou, se houver perigo de deterioração,
deve vendê-la e promover o depósito judicial do saldo do valor recebido por ela (CC, art.
755).

d) Recusar transporte de coisa ilícita ou irregular. A lei impõe ao transportador a obrigação de


recusar o transporte de coisa quando houver proibição legal (ilicitude da coisa) ou
regulamentar (irregularidade). A obrigação de recusar o transporte ilícito ou irregular é do
transportador (CC, art. 747) e pode dar ensejo a sanções administrativas ou penais.

❐ Obrigações do remetente

a) Pagar a remuneração. Remunerar o empresário transportador pelo serviço que recebe é a


principal obrigação do remetente. O valor, prazo e condições do pagamento encontram-se
descritas no conhecimento. Quando o transporte é de coisas, o preço devido à transportadora
chama-se frete. Não pago o frete contratado, tem o transportador direito aos consectários
(juros, correção monetária, honorários de advogado etc.).

b) Prestar informações verídicas sobre a coisa. O remetente deve prestar ao transportador


certas informações sobre a coisa a transportar. Ao entregá-la, ele deve informar a natureza,
valor, peso e quantidade.

Outra informação que o remetente é obrigado a prestar diz respeito ao nome e endereço do
destinatário (CC, art. 743).

Aliás, a empresa de transporte pode exigir que o remetente lhe entregue em duas vias a
relação discriminada das coisas objeto do contrato, uma das quais assinada pelas partes
integrará o conhecimento (art. 744, parágrafo único).
O transportador tem, por exemplo, o direito de recusar o transporte de coisas que possam pôr
em risco a saúde das pessoas ou danificar o veículo e outros bens (CC, art. 746).

De qualquer forma, o remetente tem a obrigação de indenizar a transportadora por todos os


prejuízos que suas declarações inexatas ou falsas ocasionarem. O direito dela às perdas e
danos decai, nesse caso, em cento e vinte dias contados da prestação da informação inverídica
(CC, art. 745).

c) Embalar adequadamente a coisa. A coisa deve ser apropriadamente embalada pelo


remetente, caso contrário o transportador poderá legitimamente recusar o transporte (CC, art.
746). Essa é a regra geral que pode ser afastada por cláusula do contrato.

Inexistindo cláusula expressa no conhecimento ou


em qualquer outro instrumento contratual, imputando ao transportador a obrigação de
embalar a coisa objeto de transporte, cabe ao remetente providenciar a embalagem e
custeá-la.

➮ RESPONSABILIDADE DO TRANSPORTADOR

1ª) O transportador tem responsabilidade objetiva pelos danos que a execução do contrato de
transporte causar à pessoa ou coisa transportada (CC, arts. 734, 749 e 927, parágrafo único;
CDC, art. 14).

2ª) A culpa exclusiva da vítima, no transporte de pessoa, não é sempre excludente de


responsabilidade (CDC, art. 14, § 3º, II), porque sendo esta caracterizada pela inobservância
do regulamento, verifica-se a proporcionalização da indenização (CC, art. 738, parágrafo
único).

3ª) A culpa de terceiro, no transporte de pessoa, não exclui a responsabilidade do


transportador. Se o acidente de trânsito em que morreram passageiros do ônibus interestadual
derivou de imprudência do motorista de outro veículo, isso não exonera o transportador da
responsabilidade.

O dispositivo do CDC que elege a culpa de terceiro como excludente (art. 14, § 3º, II) não se
aplica aos serviços de transporte de pessoas fornecidos no mercado, em vista de disposição
específica sobre o tema no CC (art. 735: “a responsabilidade contratual do transportador por
acidente com o passageiro não é elidida por culpa de terceiro, contra o qual tem ação
regressiva”).

A responsabilidade do transportador por ato de terceiro existe quando é este interno à


atividade de transporte; se é externo (como na hipótese de roubo no interior do veículo), o ato
de terceiros importa a exclusão de responsabilidade do transportador.
4ª) A força maior, no transporte de pessoa, exclui a responsabilidade do transportador
somente se o contratante do serviço for pessoa jurídica. Se é ele pessoa física, aplica-se a
regra geral do Código de Defesa do Consumidor, que imputa ao fornecedor responsabilidade
objetiva mesmo diante de fortuito (art.14).

5ª) A cláusula de não indenizar — isto é, a que libera o transportador de obrigação a ele
legalmente imputada — é inválida em qualquer contrato de transporte de pessoas (CC, art.
734). Mas se a obrigação de indenizar não é imputada por lei ao transportador, a cláusula de
não indenizar vale sempre que o contratante do serviço for pessoa jurídica, mesmo que
caracterizada a relação de consumo (CDC, art. 51, I, in fine).

6ª) A indenização pode ser limitada em três hipóteses. Primeira, no transporte de pessoas,
quando há disposição legal tarifando o seu valor.

Segunda, sendo o contratante do transporte uma pessoa jurídica e não representando o objeto
do contrato insumo de sua atividade, a responsabilidade do transportador pode ser limitada ao
valor declarado da bagagem ou ao da coisa transportada (CC, arts. 734, parágrafo único, e
750; CDC, art. 51, I, in fine).

Terceira, no contrato interempresarial, em que o contratante do serviço é empresário e o


transporte corresponde a seu insumo, as partes são livres para contratar qualquer limitação à
responsabilidade do transportador. Em caso de omissão, ela é limitada ao valor declarado da
bagagem ou ao constante do conhecimento de frete (CC, arts. 764, parágrafo único, e 750).

7ª) No transporte cumulativo (também chamado de combinado), como tal definido aquele em
que o serviço é prestado por dois ou mais transportadores, encarregado cada um de parte do
percurso, há solidariedade entre todos perante o remetente (CC, art 756).

➮ CLASSIFICAÇÃO

a) bilateral, uma vez que cria obrigação para o transportador de remover a coisa ou pessoa de
um lugar para outro, e obrigação para o remetente ou, no transporte de pessoas, passageiro,
de efetuar o pagamento do preço convencionado;

b) comutativo, já que as prestações de ambas as partes são certas, não ficando a depender de
evento incerto e futuro;

c) oneroso, por haver interesse e utilidade para ambas as partes. Ao tratar do transporte de
pessoas, especificamente, o Código Civil dispõe que não se subordina às normas do contrato
de transporte o feito gratuitamente, por amizade ou cortesia; e acrescenta que não se
considera gratuito o transporte quando, embora feito sem remuneração, o transportador
auferir vantagens indiretas (Código Civil, art. 736).

d) consensual, por se aperfeiçoar pelo simples acordo de vontade dos contratantes.

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