134
ciente para gerar impacto nas AVD, sejam sociais e/ou labo-
Rastreio Cognitivo em Idosos
Ivan Aprahamian • Marina Maria Biella •
Alaise Silva Santos de Siqueira
Introdução
A avaliação cognitiva em idosos tem como função primor-
dial identificar se o envelhecimento cognitivo do in­di­ví­duo é
normal ou patológico. A cognição é uma habilidade fundamen-
tal para a manutenção da autonomia e da independência das
pessoas. Consequentemente, na avaliação dessa habilidade, é
preciso avaliar se o funcionamento do idoso encontra-se ínte-
gro ou comprometido, o que potencialmente agrega perda em
atividades da vida diá­ria (AVD), separando os transtornos cog-
nitivos em maiores (demências) ou menores (comprometimen-
to cognitivo leve [CCL], entre outros).
A queixa de perda subjetiva da cognição, principalmente
de memória, é muito frequente em ambientes ambulatoriais.
Paralelamente, em virtude de sua alta prevalência, é primordial
uma avaliação com rastreio inicial da condição cognitiva de
um paciente mesmo que assintomático, possibilitando a iden-
tificação de uma doen­ça neurodegenerativa e sua adequada in-
vestigação e planejamento. Um exemplo desta situação ocorre
durante a Avaliação Geriá­trica Ampla (AGA), na qual tradicio-
nalmente utilizam-se instrumentos de triagem cognitiva. Outro
ponto importante do rastreio cognitivo é a possibilidade de se
diagnosticar uma doen­ça já existente, mas não identificada ou
explorada adequadamente. O rastreio é o primeiro passo. A
avaliação deve ser rea­li­zada por profissional de saú­de que esteja
treinado e familiarizado com instrumentos de triagem breves
que oferecem um panorama global da cognição. A avaliação
cognitiva pode ser rea­li­zada no âmbito hospitalar, ambulatorial
e em estudos populacionais, contanto que se utilize uma técnica
adequada para dado ambiente.
Há algumas par­ticularidades deste assunto que demandam
maior discussão. O rastreio pode ser utilizado para a população
geral ou ser dirigido a grupos com maior risco para determi-
nado desfecho. O benefício para um ou outro grupo será dis-
cutido ao longo deste texto. Ainda, o rastreio cognitivo pode
ser rea­li­zado por uma gama de profissionais com formações
heterogêneas e com variados graus de conhecimento técnico
sobre o assunto. Em nossa opinião, o profissional que rea­li­
zará a avaliação cognitiva deve ter conhecimento teó­rico mais
aprofundado, associado à prática, para que o rastreio seja mais
efetivo e clinicamente mais preciso, possibilitando maior acu-
rácia diagnóstica. Apesar da simplicidade de diversos testes ou
instrumentos, va­riá­veis comuns em nossa população, como a
baixa escolaridade, podem ocasionar erros relevantes na inter-
pretação de resultados da avaliação.
Diversas podem ser as causas do declínio cognitivo não
atribuí­do ao processo natural do envelhecimento. As duas
causas principais na população e de maior interesse em saú­
de pública são a demência e o CCL, derivado de doen­ças
neuropsiquiá­tricas ou clínicas. A demência, segundo sua de-
finição, compreende um declínio significativo a partir de um
nível anterior de desempenho em pelo menos dois domínios
cognitivos (perda de memória, atenção, linguagem, função
1a prova Autor: Freitas e Py (21 x 28cm) Edição: 5a Revisor:
Revisão Capítulo 134 Págs.: 7 Operador: Edel
visuoespacial, função executiva ou cognição social), o sufi-
rais. As principais síndromes demenciais, também referidas
como transtornos neurocognitivos maiores na quinta edição
do Manual Diagnóstico e Estatístico dos Transtornos Mentais
(DSM-5), em idosos são: doen­ça de Alzheimer (60 a 70%),
demência mista Alzheimer e ­vascular (10 a 30%), demência
­vascular (20 a 30%), demência frontotemporal (12 a 25%), de-
mência com corpos de Lewy (5 a 10%) e demência da doen­ça de
Parkinson (Wu et al., 2017).
O CCL, também conhecido como transtorno neurocogni-
tivo menor pelo DSM-5, compreende déficits cognitivos em
um ou mais domínios, mas sem afetar significativamente (de
modo limitante) as AVD, culminando em comprometimento
na vida social e/ou laboral (Lyketsos et al., 2011). Observa-se
uma mudança cognitiva relatada pelo paciente ou informante
e/ou observada pelo médico. As alterações comportamentais
vistas neste contexto tendem a ter relação com a gravidade do
comprometimento da cognição e com o curso da doen­ça, além
de em muitos casos predizer a etiologia da síndrome demencial
nos in­di­ví­duos que convertem para demência. O quadro pode
ser heterogêneo em termos de apresentação clínica, etiológica e
prognóstico, assim como os possíveis domínios cognitivos afe-
tados (Petersen, 2016).
Este capítulo se propõe a abordar os principais testes de ras-
treio utilizados na população idosa, sejam estes para identifi-
car o comprometimento cognitivo de qualquer etiologia, ou até
mesmo para fornecer uma indicação quanto à etiologia mais
provável em um caso par­ticular.
Epidemiologia
Como já exposto, a maior razão que norteia a rea­li­zação do
rastreio cognitivo é o CCL e a demência. É importante que se
conheça minimamente sua epidemiologia para se estimar o ris-
co in­di­vi­dual dos idosos que rea­li­zarão uma avaliação cogni-
tiva. Segundo o United States Preventive Services Task Force
(USPSTF) (Owens et al., 2020), a estimativa da prevalência de
demência aumenta com a idade. Cerca de 3,2% das pessoas en-
tre 65 e 74 anos de idade, 9,9% daquelas com 75 a 84 anos de
idade e 29,3% nas maiores de 85 anos de idade são acometidas
pela síndrome demencial (Langa et al., 2017). Já as taxas para
CCL são mais difíceis de serem estimadas e variam amplamen-
te, em virtude de heterogeneidade diagnóstica, de 3 a 42% em
adultos com 65 anos ou mais (Owens et al., 2020).
Uma possível explicação para taxas tão va­riá­veis baseia-se na
definição do que é CCL, a qual varia na literatura, assim como
os métodos utilizados para o diagnóstico clínico. O CCL pode
ser classificado em dois grandes grupos, definidos como am-
néstico e não amnéstico, conforme a memória é afetada ou não.
Ainda, dois subtipos estão presentes em cada grupo, denomina-
dos de único domínio ou múltiplos domínios, segundo o envol-
vimento de uma ou mais funções cognitivas. O diagnóstico de
CCL pode ser difícil, com número razoá­vel de falso-positivos
na prática clínica. A prevalência de queixas subjetivas envolven-
do a memória, varia ao redor de 40 a 50% em idosos (Virginia;
Moyer, 2014).
Um aspecto que suscita interesse é a taxa de conversão de
CCL para demência. Os valores variam nos estudos, sendo que
segundo a revisão sistemática do USPSTF (Owens et al., 2020)
ela ainda é incerta. Outra revisão sistemática constatou que 32%
das com pessoas com CCL desenvolvem demência ao longo de
5 anos (Ward et al., 2013). No entanto, estudos também mostra-
ram que entre 10 e 40% das pessoas com CCL podem retornar à
cognição normal em aproximadamente 4 a 5 anos.
Data:14/12/2021
2 PARTE 8  Aspectos Psicológicos do Envelhecimento e da Velhice

Hábitos: perguntar ativamente sobre tabagismo, alcoolismo,

Fatores de risco para o „„
uso abusivo de substâncias lícitas ou ilícitas e prática de ativi-
comprometimento cognitivo dade física
„„Sono: identificar possibilidades de distúrbios do sono, como,
A caracterização dos fatores de risco para declínio da cogni- por exemplo, insônia, apneia obstrutiva do sono e parassonias
ção deve ser identificada nos pacientes para melhor estimativa „„Prescrição medicamentosa: avaliar a lista de medicamentos em
do risco de um declínio anormal, portanto, sugerimos rastre- uso atual e seus efeitos adversos. Como exemplo podemos citar
ar os mesmos já durante a anam­ne­se. Na Tabela 134.1 estão os os fármacos anti-histamínicos, anticolinérgicos e benzodiazepí-
principais fatores implicados, lembrando que as síndromes de- nicos, que podem interferir no estado cognitivo e mental. Avaliar
menciais configuram um cenário heterogêneo, com causas po- a carga anticolinérgica da prescrição por meio de instrumentos
tencialmente reversíveis ou não, diferentes fatores de risco, as- validados como o Drug Burden Index (Hilmer et al., 2007)
sim como fisiopatologia, quadro clínico e tratamento distintos. „„Entrevista com familiar/cuidador: é i­deal e de grande valor
a presença de um informante que possua conhecimentos atu-
ais e anteriores sobre a condição pré-mórbida do paciente. A
Processo da avaliação cognitiva entrevista com o mesmo também nos permite adquirir infor-
A avaliação cognitiva é um processo extenso que deve abran- mações relevantes do funcionamento do idoso no seu contexto
ger a análise de variadas habilidades mentais do in­di­ví­duo. O biopsicossocial.
rastreio é apenas uma parte do processo. A seguir apresentamos
os passos que devem ser contemplados de modo prático.
Instrumentos de rastreio
„„ Entrevista clínica neurocognitivo
O cerne principal da avaliação de um in­di­ví­duo com sus-
peita de comprometimento cognitivo é a entrevista clínica. Os testes e escalas devem avaliar diferentes funções cogniti-
Seguem os componentes que devem ser avaliados: vas, comportamentais e funcionais. A disfunção cognitiva pode
estar alinhada à alteração comportamental e perda funcional,
„„ Aspectos do estado mental e cognitivo: podem ser observa- que, dependendo do grau, pode transformar um comprome-
dos durante a anam­ne­se como a apresentação do paciente, o timento cognitivo em algo clinicamente muito importante.
nível de consciên­cia, a orientação, a atenção e a concentração, o Preconiza-se uma combinação de instrumentos que avaliem
discurso e a fala (linguagem), o curso, a forma e o conteú­do do tais esferas, com o intuito de formar uma bateria de testes com
pensamento, a avaliação da sensopercepção, o juí­zo da realida- maior sensibilidade e especificidade para a avaliação cognitiva.
de, a memória, a volição, o humor, o afeto, a psicomotricidade, Seguem aspectos importantes na escolha dos instrumentos:
as alterações de personalidade, seu insight sobre sua condição
clínica, sua atitude para com o entrevistador, dentre outros „„ Os instrumentos devem, se possível, ser de aplicação fácil e
„„Comorbidades clínicas (doen­ ças orgânicas), neurológicas e ter uma acurácia diagnóstica satisfatória (de forma não oficial,
psiquiá­tricas: as principais condições psiquiá­tricas primárias algo em torno de 80%)
com in­fluên­cia na cognição são a depressão, os transtornos de „„Uma abordagem completa deve incluir a avaliação dos se-
ansiedade, o transtorno bipolar, os transtornos psicóticos e se- guintes aspectos: atenção e concentração, memória, linguagem,
cundariamente o delirium. Também é relevante questionar so- percepção visuoespacial, praxia, capacidade de fazer cálculos,
bre antecedentes familiares psiquiá­tricos funcionamento executivo e avaliação do estado do humor.
„„Características sociodemográficas: como suporte social, nível Concomitantemente devem-se avaliar sintomas neuropsiquiá­
de escolaridade, aspectos econômicos etc. tricos (antigamente denominados como transtornos compor-
tamentais e psicológicos da demência) e a funcionalidade do
in­di­ví­duo como já dito.
TABELA
„„ 134.1 Fatores de risco para declínio cognitivo.
Esta abordagem auxilia o médico no curso da avaliação diag-
Efeito de massa Risco cardiovascular nóstica, do planejamento, da reabilitação e o acompanhamento
no sistema (p. ex., DM, síndrome
Progressivo da nervoso central metabólica, HAS, evolutivo e terapêutico do caso. É importante ressaltar que os
idade (p. ex., tumores, dislipidemia, obesidade, instrumentos apresentam limitações e devem ser interpretados
(principal) sangramentos) sedentarismo, tabagismo) em conjunto com outras informações clínicas, de neuroimagem
Baixo nível TCE Fragilidade física e de laboratório.
socioeconômico Um aspecto relevante dos instrumentos utilizados para o
Baixa História atual ou prévia Alelo e4 do gene da rastreio do declínio cognitivo é que pode haver diminuição da
escolaridade de transtornos mentais apolipoproteí­na E acurácia em determinadas condições, como nas fases iniciais
(p. ex., TAB, depressão, (doen­ça de Alzheimer) dos quadros demenciais, em idades avançadas, na baixa escola-
esquizofrenia e ridade, no desempenho sociocultural e escolar muito elevados,
transtorno Psicótico)
nos déficits sensoriais graves, e diante dos vários transtornos
Suporte social AVE Ocupacional mentais (Bustamante et al., 2003).
deficiente * Exposição a metais
pesados
Além disso, questões envolvidas na construção dos testes
* Repetidas concussões como confiabilidade, validade e sensibilidade dos procedimen-
cerebrais tos de avaliação têm impacto nas conclusões que podem ser ob-
História familiar Doenças infecciosas, Consumo (abusivo) de tidas durante sua administração.
de quadros autoimunes, ál­cool Algumas recomendações são relevantes na prática clínica:
demenciais inflamatórias e
metabólicas „„É importante que o procedimento seja rea­li­zado em um am-
AVE: acidente ­vascular encefálico; DM: diabetes melito; HAS: hipertensão arterial
biente sem distrações, calmo e que o paciente esteja munido
sistêmica; TAB: transtorno afetivo bipolar; TCE: traumatismo cranioencefálico. (Fonte: de órteses corretivas (tais como óculos e dispositivos auditivos)
Livingston et al., 2017.) caso faça uso

„„ No rastreio cognitivo devemos evitar processos demorados
por diversas razões. Primeiramente, não temos um tempo to-
talmente dedicado ao rastreio durante uma avaliação geral na
grande maioria dos casos. Segundo, procedimentos extensos,
podem causar fadiga e perda de desempenho dos pacientes.
E, finalmente, para facilitar um acompanhamento evolutivo e
replicável a outros profissionais, os testes utilizados devem ser
rápidos e de fácil execução
„„Alguns pontos devem ser observados a fim de se evitarem
falso-positivos durante a avaliação. O paciente pode apresentar
franco medo em falhar e de ter a possibilidade de receber um
diagnóstico cognitivo desfavorável, gerando ansiedade, perda
de atenção e pior desempenho de memória recente, o que pode
comprometer o desempenho final. Alguns idosos não dese-
nham ou mesmo escrevem há muitos anos, o que pode gerar
perda de rendimento em testes de linguagem escrita ou visuo-
construcionais. Cabe ao avaliador acolher tais anseios, observar
possíveis vieses e explicar o procedimento calma e detalhada-
mente, enfatizando que erros são esperados durante a avaliação
„„Finalmente, recomendamos que o paciente escolha livremen-
te se quer rea­li­zar a testagem na presença de um familiar ou
cuidador. Isto pode desencadear ansiedade para a rea­li­zação da
testagem por diversas razões como o medo de errar ou apresen-
tar pior desempenho.
Avaliação cognitiva
„„ Miniexame do Estado Mental
O Miniexame do Estado Mental (MEEM) é o instrumento
mais amplamente estudado, tendo sido publicado primeira-
mente por Folstein et al. (1975). Pontos relevantes:
„„ Domínios avaliados: orientação temporal e espacial, memó-
ria imediata, atenção e cálculo, memória de evocação, lingua-
gem, habilidades visuoespaciais e praxia construcional
„„Escore:
zzPode variar entre 0 e 30 pontos, sendo a pontuação mais
alta diretamente proporcional ao melhor rendimento cogni-
tivo. Muitos estudos brasileiros avaliaram a nota de corte para
um rastreio positivo para comprometimento cognitivo. O es-
tudo de Brucki et al. (2003) é o mais utilizado atualmente,
com maior número de citações na literatura. O estudo propõe
regras para uniformizar sua aplicação. A va­riá­vel educação
apresentou maior efeito sobre os escores do MEEM. Dessa
maneira, as seguintes notas de corte são propostas:
||Analfabetos < 20 pontos; escolaridade entre 1 e 4 anos –
25 pontos; 5 a 8 anos – 26,5 pontos (interpretado como 26,
uma vez que o instrumento somente possibilita números
inteiros); 9 a 11 anos – 28 pontos; > 11 anos – 29 pontos
(Brucki et al., 2003)
||Indivíduos com escores abaixo da nota de corte devem
ter uma investigação da função cognitiva mais detalhada
„„Vantagens:
zzO MEEM é considerado um bom teste de rastreio segundo
a literatura e os profissionais especializados
zzO instrumento apresenta boa aplicabilidade para ambien-
tes hospitalares e estudos populacionais, além do ambiente
ambulatorial
zzPode ser utilizado para rastreio, acompanhamento da
evolução do quadro cognitivo e estadiamento da doen­ça.
Importante frisar que a sua aplicação de maneira isolada, não
pode ser utilizada para dar diagnóstico de demência
„„Desvantagens:
zzOs extremos de anos investidos em escolaridade favorecem
um vié­s à acurácia do teste. Isto é especialmente verdadeiro
CAPÍTULO 134  Rastreio Cognitivo em Idosos 3
para pacientes com baixa escolaridade, que apresentam esco-
re falso-positivo com muita fre­quência
zzUm potencial falso-negativo é o declínio cognitivo em es-
tágio inicial visto no CCL e nas demências classificadas como
muito leves e leves (CDR; do inglês, clinical dementia rating,
0,5 a 1,0). O teste muitas vezes não é sensível o suficiente nes-
tes cenários
zzO MEEM é muito centrado na linguagem (8/30 pontos são
dependentes diretamente dessa função) e pouco avalia a fun-
ção executiva, tão importante nas demências
zzSua ampla reutilização de forma comparativa intrassujeito,
pode provocar um efeito de aprendizagem nos pacientes
„„Outros pontos relevantes a saber:
zzUm ponto importante na aplicação prática do MEEM é
avaliar qualitativamente o teste. Por exemplo, podemos in-
terpretar um resultado de 27 pontos em paciente com 8 anos
de escolaridade de duas maneiras: a primeira como normal,
afinal está acima de 26 pontos; a segunda como anormal, pois
os 3 pontos perdidos foram ao tentar relembrar as 3 palavras
na evocação, o que denota algo preocupante. Avaliar o teste
qualitativamente é um passo além de sua avaliação por meio
de escores brutos e notas de corte
zzO MEEM faz parte de importantes baterias cognitivas como
o CAMDEX (Cambridge Examination for Mental Disorders
of the Elderly), o CERAD (Consortium to Estabilish a
Registry for Alzheimer’s Disease) e a ACE-R
zzEntretanto, hoje o MEEM tem seus direitos autorais con-
trolados pela editora PAR, há cobrança de taxas pelo seu uso
e a incorporação do teste em outras baterias tem sido questio-
nado legalmente pela editora.
„„ Teste do Desenho do Relógio
O Teste do Desenho do Relógio (TDR) é um instrumento de
rápida aplicação e que necessita apenas de um pedaço de papel
e um lápis (Critchley, 1953). Pontos relevantes:
„„ Domínios avaliados: memória recente (lembrança da orien-
tação sobre o teste), memória semântica (conceito e figura do
relógio), função executiva (planejamento e execução do dese-
nho), linguagem (compreensão do comando), praxia e função
visuoespacial (manter a proporcionalidade do construto relógio
com seus itens)
„„Escore:
zzO teste pode ter uma avaliação qualitativa ou quantitati-
va também como o MEEM, sendo interpretado de maneira
livre ou com base em escalas de pontuação (inúmeras fo-
ram propostas; veja revisão em Aprahamian et al., 2009).
Diferentemente de outros testes, o TDR não apresenta um
consenso sobre sua melhor interpretação ou mesmo apli-
cação. A literatura descreve variadas escalas validadas para
diferentes doen­ças, em especial para síndromes demenciais.
Em linhas gerais, recomenda-se a utilização de alguma esca-
la para pontuação do teste, a fim de facilitar o seguimento e
a eventual resposta terapêutica do paciente. A escolha deve
basear-se no conhecimento e no treinamento com a mesma
zzDentre as escalas disponíveis, recomendamos a escala de
Shulman modificada em razão de sua simplicidade tanto na
administração quanto na avaliação (Shulman et al., 1993). É
uma das mais citadas na literatura. É solicitado ao paciente
que desenhe um relógio redondo (círculo), colocando todos
os números em seu interior e indicando os ponteiros em onze
e dez. Este horário parece muito interessante frente a tantas
outras opções, pois trabalha os ponteiros em ambos os he-
misférios do relógio (direito e esquerdo), assim como a tra-
dução automática (mecanismo inerente do lobo frontal) do
número 10 como sendo dez minutos, ou seja, posicionando
4 PARTE 8  Aspectos Psicológicos do Envelhecimento e da Velhice
o ponteiro maior sob o número dois. Segundo a escala de
Shulman modificada, a pontuação pode ser distribuí­da da
seguinte maneira:
||Zero é dado na impossibilidade da construção de um de-
senho que lembre um relógio; um ponto para uma figura
elementar que lembre um relógio; dois pontos quando não
há indicação de horário correto somado a inúmeros erros
visuoespaciais, incluindo adições, subtrações e aberrância
de elementos do desenho (p. ex., ausência do número 3, in-
serção de uma figura sorrindo); três pontos quando não há
indicação correta de horário com mínimos erros visuoes-
paciais (p. ex., espaçamento incorreto de números); quatro
pontos quando o desenho estiver correto com mínimos er-
ros estéticos (p. ex., tremido, tamanhos equivalentes de pon-
teiros); cinco pontos são dados para um desenho perfeito
||A nota de corte é três pontos, ou seja, pacientes com me-
nos de quatro pontos apresentam probabilidade de com-
prometimento cognitivo
„„Vantagens:
zzO teste tem boa acurácia (ao redor de 85%) para as demências
zzApresenta aplicação de curta duração, com média de
3,5 minutos, independentemente do método utilizado
zzÉ um teste de fácil aplicação, podendo-se utilizar apenas
uma folha de papel e de um lápis
„„Desvantagens:
zzSemelhante ao MEEM, de maneira equivalente, é afetado
pela escolaridade (Aprahamian et al., 2009)
zzO aspecto de maior desvantagem do TDR é sua interpre-
tação. Existem inúmeras escalas para avaliação do teste, sem
haver consenso sobre qual a melhor
zzOutros pontos relevantes a saber: o TDR é um bom ins-
trumento para detecção de alteração cognitiva, mas com um
rendimento insuficiente quando utilizado de maneira isolada.
Parece-nos ­ideal, assim como para a literatura, que utilizemos
o TDR juntamente com outro(s) teste(s) largamente valida­
do(s) e com altos índices de acerto (Aprahamian et al., 2010).
„„ Avaliação cognitiva de Montreal
O Montreal Cognitive Assessment (MoCA) (Nasreddine
et al., 2005) é um teste de rastreio desenvolvido para detecção
de déficits cognitivos leves, desenhado a partir de uma popula-
ção com escolaridade média entre 10 e 13 anos, dependendo do
grupo avaliado (doen­ça de Alzheimer, CCL e controles). Pontos
relevantes:
„„Domínios avaliados: atenção e concentração, funções execu-
tivas, memória recente, linguagem, habilidades visuoconstruti-
vas, conceituação abstrata, cálculo e orientação
„„Escore:
zzA pontuação total perfaz 30 pontos, sendo que a nota de
corte para a normalidade é 26 pontos. No entanto, em revisão
sistemática recente, foi proposto o corte em 23 pontos como
mais realístico mesmo em alta escolaridade, diminuindo a
taxa de falso-positivos (Carson; Leach; Murphy, 2018)
zzTambém é sugerido nota de corte de 25 pontos para pelo
menos 4 anos de escolaridade (Memória et al., 2012)
zzPara pacientes com escolaridade inferior a 12 anos, deve-se
adicionar 1 ponto ao escore total (Memória et al., 2012)
zzAinda no Brasil, publicamos previamente dados normati-
vos para o MoCA que facilitam o uso do teste e, potencial-
mente, em outras populações com proporções substanciais
de in­di­ví­duos com baixa escolaridade. Além disso, descre-
vemos uma abordagem sistemática para ajustar os efeitos da
idade e da educação usando polinômios fracionais e fornece-
mos sugestões sobre como explicar a relação não linear que é
frequentemente encontrada entre fatores sociodemográficos
e medidas de desempenho cognitivo (Apolinario et al., 2018)
„„ Vantagens:
zz No estudo original do instrumento, Nasreddine et al.
(2005) observaram 87% de especificidade para identificar
idosos comprometidos e 90% para detectar CCL em pessoas
normais. É fundamental avaliar o comprometimento funcio-
nal para delimitar os diagnósticos de CCL e demência
zzEsse teste é útil para detectar o déficit cognitivo em di-
versas doen­ças como nas demências de Alzheimer, ­vascular,
com corpos de Lewy, frontotemporal, Parkinson, no CCL, na
esclerose múltipla, na doen­ça de Huntington, nos tumores
cerebrais, na esclerose lateral amiotrófica, dentre outros
zzNo Brasil, o estudo de Memória et al. (2012) observou boas
características psicométricas e dados de acurácia diagnóstica
para esse teste em uma amostra da cidade de São Paulo
„„Outros pontos relevantes a saber: em linhas gerais, o MoCA é
um instrumento completo quando bem aplicado em virtude de
sua abrangente avaliação de domínios cognitivos, inclusão de
testes executivos como o TDR e parte da trilha B e maior núme-
ro de palavras para evocação de memória recente (5 palavras).
No entanto, mais uma vez, é preciso ter cuidado sobre como
interpretar seu escore total (Apolinario et al., 2018).
„„ Bateria breve de rastreio cognitivo
A bateria breve de rastreio cognitivo (BBRC), desenvolvida
por Nitrini et al. (1994; 2004), é um excelente instrumento que
combina o MEEM com outras tarefas cognitivas (Fichman-
Charcar et al., 2016; Yassuda et al., 2017). Pontos relevantes:
„„Domínios avaliados: é composto por subtestes com teste de
memória, prova de fluência verbal (FV) semântica (número de
animais por um minuto) que avalia linguagem, memória se-
mântica e funções executivas, e desenho do relógio, para fun-
ções executivas e habilidade visuoconstrutiva
„„Vantagens:
zzUm dado relevante é que o teste de memória de figuras
da bateria não sofre in­fluên­cia da escolaridade, podendo ser
aplicado inclusive em analfabetos e in­di­ví­duos de baixa esco-
laridade, o que configura uma vantagem em relação a outros
instrumentos, uma vez que o Brasil é um paí­s com escolari-
dade heterogênea
zzCurto tempo de aplicação, podendo ser rea­li­zado em me-
nos de 10 minutos
„„Outros pontos relevantes a saber:
zzA maior acurácia para o diagnóstico de demência leve
ou moderada podem ser obtidas pelas pontuações: teste de
Blessed (< 29 pontos), memória tardia (< 6 pontos) e FV
< 13 pontos (Nitrini et al., 1994).
„„ Fluência verbal
A FV (Benton, 1968) consiste em o paciente falar livremente
durante o intervalo de 60 segundos, o maior número de itens de
uma dada categoria. Esta categoria poderá abranger um grupo
semântico (p. ex., animais, frutas) ou fonêmico (p. ex., palavras
iniciadas pela letra F). Pontos relevantes:
„„Domínios avaliados: função executiva, abrangendo a capaci-
dade de busca, recupe­ração e organização de dados armazena-
dos na memória semântica, função de linguagem e as habilida-
des de autorregulação e de memória operacional
„„Escore:
zzO escore do teste para a população brasileira, de acordo
com a escolaridade, foi observado pelo estudo de Caramelli
et al. (2007), que determinaram as seguintes notas de corte:
||≥ 9 pontos (analfabetos), ≥ 12 pontos (1 a 7 anos de esco-
laridade) e ≥ 13 pontos (acima de 8 anos de escolaridade)
zzJá o estudo de Brucki e Rocha (2004) encontrou:
||≥ 9 pontos (analfabetos), ≥ 12 pontos (1 e 8 anos de esco-
laridade) e ≥ 13 pontos (acima de 9 anos de escolaridade)

„„Vantagens:
zzEste teste é muito interessante pelo curto tempo (1 min)
zzÉ de fácil aplicação
„„Outros pontos relevantes a saber: sua combinação com o
MEEM ou um teste funcional é interessante para o rastreio.
„„ 10-Point Cognitive Screener 10-CS
O 10-Point Cognitive Screener 10-CS (Apolinário et al.,
2015) é uma versão modificada do Six-Item Screener (SIS) e foi
desenvolvido no Brasil. Pontos relevantes:
„„Domínios avaliados: orientação temporal, fluência categórica
e memória
„„Escore:
zzO teste é pontuado de 0 a 10:
||Nota de corte: ≥ 8 pontos é considerado normal; 6 a
7 pontos, possível comprometimento cognitivo; e 0 a
5 pontos, provável comprometimento cognitivo
||Ajustes podem ser feitos para educação: para analfabetos
acrescentam-se mais 2 pontos (no máximo 10 pontos) e
para 1 a 3 anos de escolaridade soma-se mais 1 ponto (no
máximo 10 pontos)
„„Vantagens:
zzSua aplicação é extremamente ágil e rápida, cerca de 2 minutos
zzAlta correlação com MoCA e MEEM
zzNão necessita de materiais específicos
zzNão exige leitura, escrita e desenho, o que facilita sua apli-
cação em população de baixa escolaridade
zzNão inclui pistas visuais ou tarefas motoras, portanto, pode
ser rea­li­zado sem desvantagem considerável por in­di­ví­duos
com deficiên­cias motoras ou sensoriais comuns na terceira
idade
zzPode ser facilmente administrado por telefone
zzPossui uma estrutura fácil de ser lembrada e pontuada pelo
aplicador.
„„ Addenbrooke’s Cognitive Examination
Outro teste de fácil e rápida aplicação é o Addenbrooke’s
Cognitive Examination (ACE) (Mathuranath et al., 2000;
Mioshi et al., 2006).
„„Domínios avaliados: orientação, atenção, memória, FV, lin-
guagem e capacidade visuoespacial
„„Escore: o estudo brasileiro da versão revisada (ACE-R)
(Carvalho; Barbosa; Caramelli, 2010) sugeriu uma nota de
corte < 78 para separar controles de pacientes com demência.
Também há o estudo de Cesar et al. (2017), que diferenciou
controles de comprometimento cognitivo sem demência, atra-
vés da nota de corte de 69 pontos. E utilizou a nota de corte de
64 pontos, para distinguir a pontuação entre in­di­ví­duos nor-
mais e com demência. A versão revisada possui ainda uma ver-
são reduzida, chamada de M-ACE. O ponto de corte sugerido é
de 20 para DA e 27 para CCL (Miranda et al., 2018)
„„Vantagens: pode ser administrado em 15 a 20 minutos.
„„ Cognitive Abilities Screening Instrument
O Cognitive Abilities Screening Instrument (CASI) em sua
forma abreviada (CASI-S) (Teng et al., 1994) abrange a capaci-
dade de repetir (registrar) as palavras e, posteriormente, recu-
perá-las após um intervalo durante o qual são rea­li­zados testes
de orientação temporal e FV. O CASI foi validado no Brasil por
Damasceno et al. (2005).
„„Escore:
zzPara as questões de orientação temporal, a pontuação é
dada a partir do quão grosseiro foi o erro – por exemplo, se
o paciente errou a data por 1 dia de diferença, menos pontos
CAPÍTULO 134  Rastreio Cognitivo em Idosos 5
são descontados em comparação ao paciente que errou o mês
e o ano
zzO estudo brasileiro de Oliveira et al. (2016) encontrou nota
de corte 22/23 para demência em população idosa da atenção
primária
„„Vantagens:
zzAplicação muito fácil e rápida
zzInteressante para população de baixa escolaridade.
„„ General Practitioners Assessment of
Cognition
O General Practitioners Assessment of Cognition (GPCOG)
(Brodaty et al., 2002; Yokomizo et al., 2018) foi desenvolvido
para atender às demandas de clínicos gerais, com o objetivo de
ser rápido, fácil de se utilizar e eficaz. Pontos relevantes:
„„ Domínicos avaliados: o instrumento é dividido em duas par-
tes, a avaliação cognitiva do paciente e questões de funcionali-
dade dirigidas ao informante
„„Vantagens:
zzO tempo de aplicação é curto, com duração de 4 a 5 minutos
zzAborda tanto a cognição quanto a funcionalidade, o que é
par­ticular­mente vantajoso nos casos de pacientes com baixo
nível educacional
zzO GPCOG mostrou boa performance na população brasilei-
ra na atenção primária, desde que ajustadas as notas de corte.
Avaliação funcional
O comprometimento da capacidade para rea­li­zar as AVD
(incapacidade funcional) é um ponto imprescindível da avalia-
ção. O grau de dependência e a perda da autonomia estão im-
plicados no diagnóstico diferencial de demência e CCL. Além
disso, é uma ferramenta importante para avaliar a perda pro-
gressiva das AVD, durante a evolução de uma doen­ça que afeta
a cognição. Tais informações contribuem para melhor orien-
tação de pacientes e seus familiares, para avaliar o efeito das
intervenções farmacológicas e comportamentais e por fim para
avaliar a progressão da doen­ça. Os instrumentos mais utiliza-
dos serão discriminados a seguir.
É válido salientar que o avaliador deve ficar atento quando os
dados são obtidos com uma terceira pessoa, pois ela pode for-
necer uma informação superestimada ou subestimada, uma vez
que esses dados relatados dependem de alguns fatores como:
tipo de relação com o cuidador, grau de estresse do cuidador,
dificuldade em saber a real capacidade do idoso para rea­li­zar
uma tarefa e até mesmo a não percepção de um déficit. Por fim,
vale reforçar que uma avaliação cognitiva adequada passa por
uma breve avaliação funcional do paciente.
„„ Índice de Katz
Mensura a capacidade do in­di­ví­duo em rea­li­zar as ativida-
des básicas da vida diá­ria (ABVD) (Katz et al., 1963). A escala
possui adaptação transcultural para o Brasil (Lino et al., 2008).
Pontos relevantes:
„„ Itens avaliados: aborda a capacidade para se vestir, se banhar,
utilizar o banheiro, o controle esfincteriano, se alimentar e a
transferência, por exemplo, da cama para uma cadeira
„„Escore: pode ser considerado para cada item da escala as op-
ções: sem ajuda, com ajuda parcial e com ajuda total.
„„ Escala Lawton e Brody
Mensura a capacidade do in­di­ví­duo em rea­li­zar as atividades
instrumentais da vida diá­ria (AIVD) (Lawton; Brody, 1969).
6 PARTE 8  Aspectos Psicológicos do Envelhecimento e da Velhice
Foi validada no Brasil por Santos e Virtuoso (2008). Pontos
relevantes:
„„ Itens avaliados: abordam atividades mais complexas, como
utilizar o telefone, a capacidade de locomoção em meios de
transporte, a habilidade para fazer compras, preparar refeições,
rea­li­zar trabalhos domésticos, cuidado com finanças, uso e ad-
ministração de medicamentos
„„Escore: pode ser considerado para cada item da escala as op-
ções: sem ajuda, com ajuda parcial e com ajuda total.
„„ Questionário de atividades funcionais de
Pfeffer (PFAQ)
Pontos relevantes:
„„Itens avaliados: constituí­do por 10 itens relacionados com a
capacidade do in­di­ví­duo para rea­li­zar as AIVD e funções cog-
nitivas/sociais. Este instrumento foi formalmente adaptado
para o contexto brasileiro em um estudo rea­li­zado por Sanchez
et al. (2011). Seguem alguns exemplos:
zzCapacidade de manusear o próprio dinheiro e medica-
mentos; preparar uma comida; esquentar água para o café e
apagar o fogo; manter se atualizado com os compromissos;
caminhar pela vizinhança e voltar para casa; ser deixado em
casa de maneira segura; dentre outros
„„Escore:
zzSua pontuação possui um escore mínimo de zero e máxi-
mo de 30 pontos
zzEspecialmente desenhado para pacientes com comprome-
timento cognitivo
zzQuanto menor a pontuação obtida pelo in­di­ví­duo, maior a
sua independência e autonomia
zzPontuações acima de cinco já indicam comprometimento
funcional
„„Vantagens: não sofre in­fluên­cia da escolaridade (Pfeffer et al.,
1982).
„„ Disability Assessment for Dementia
A escala Disability Assessment for Dementia (DAD) é co-
nhecida por ser um instrumento breve (Gauthier et al.,1994).
Pontos relevantes:
„„ Itens avaliados: consiste em 40 itens:
zz17 relacionados com as AVD, como autocuidado, mobili-
dade, alimentação, higiene pessoal e atos de se vestir, despir
e calçar
zz23 itens relacionados com as AIVD, como ir às compras,
gerir o dinheiro, utilizar o telefone, limpar, cozinhar e utilizar
transportes
zzCada item é avaliado para iniciativa, planejamento, organi-
zação e desempenho efetivo
zzEspecialmente desenhado para pacientes com comprome-
timento cognitivo
„„Vantagens: o estudo brasileiro de validação da DAD (DAD-
Br) (Carthery-Goulart, 2007) apresentou boa consistência in-
terna e boa correlação com o MEEM.
„„ Questionário do informante sobre
declínio cognitivo do idoso
O questionário do informante sobre declínio cognitivo
(IQCODE) (Jorm; Korten, 1988) se baseia nas informações de
familiares e cuidadores sobre um possível declínio cognitivo.
Pontos relevantes:
„„Itens avaliados: contempla perguntas sobre o funcionamento
cognitivo e o desempenho funcional do idoso
„„Vantagens:
zz Possui boa sensibilidade para casos com suspeita de demên-
cia, mas ainda com um menor número de estudos sobre suas
propriedades diagnósticas em CCL (Sanchez; Lourenço, 2009)
zzNo Brasil foi traduzido e validado, incluindo uma versão
mais curta e ágil (Perroco et al., 2009).
„„ Questionário das atividades da
vida diá­ria
O questionário das atividades da vida diá­ria (ADL-Q) é divi-
dido em 6 seções direcionadas para avaliar diferentes á­ reas das
atividades cotidianas, como cuidados pessoais, cuidados em
casa/família, trabalho/lazer, compras/dinheiro, viagem e comu-
nicação, tendo cada seção de três a seis itens (Johnson et al.,
2004).
Avaliação do humor
Atenção especial será dada à depressão devido a sua maior
importância clínica e epidemiológica. É mandatório investigar
sua relação com o déficit cognitivo. Um dos motivos é a apresen-
tação da depressão com sintomas de comprometimento cogniti-
vo, a síndrome demencial da depressão, antigamente conhecida
como pseudodemência. Outro fator é uma possível correlação,
em especial da depressão de início tardio (> 60 anos de idade),
com desfechos desfavoráveis, em detrimento da sua maior asso-
ciação com evolução para síndromes demenciais. Além disso, a
depressão também pode ser a manifestação precoce de prejuí­zos
cognitivos. Estudos de coorte mostraram que o humor depri-
mido e/ou ansiedade estão associados a aumento do risco para
CCL em pacientes com cognição normal, e com a progressão
para demência em pacientes com CCL (Goveas et al., 2011).
„„ Escala de Depressão Geriá­trica
A Escala de Depressão Geriá­trica (GDS) é o instrumen-
to para investigação de sintomas depressivos mais utilizado
em idosos. Sua primeira versão com trinta itens, descrita por
Yesavage et al. (1983), teve sua versão reduzida para quinze
questões por Sheikh et al. (1986). Pontos relevantes:
„„Escore: um estudo rea­li­zado por Paradela et al. (2005) sugeriu
para a população brasileira ponto de corte 5/6 como mais ade-
quado, com sensibilidade de 81,1% e especificidade de 63,3%,
para a versão de quinze itens
„„Vantagens:
zzInstrumento adaptado para sintomatologia observada na
população idosa
zzAborda o domínio cognitivo da depressão e qualidade de
vida
zzPode ser utilizada em diversos ambientes de cuidado:
rede básica, ambulatórios, hospitais e instituições de longa
permanência
zzPossui propriedades de confiabilidade e validade satisfató-
rias para rastreamento de depressão
„„Desvantagens:
zzMenos confiá­vel para casos mais graves
zzAborda poucos sintomas somáticos
„„Outros pontos relevantes a saber: no Brasil tanto o GDS-30
(Almeida; Almeida, 1999) como a sua versão reduzida, o GDS-
15 (Stoppe et al., 1994), são validadas para o português.
Os pacientes com transtorno afetivo bipolar também mere-
cem atenção, pois possuem alto risco para CCL e demência. É
interessante avaliar um perfil cognitivo ao menos por meio de
rastreio no seguimento inicial destes pacientes. Dificilmente, na
prática clínica, iremos confirmar um declínio cognitivo nestes
pacientes sem uma avaliação detalhada de sua apresentação

clínica, quanto do seu humor e de uma observação longitudinal
de seu desempenho cognitivo segundo testes cotidianos ou ava-
liações mais complexas.
Exame físico
Um minucioso exame físico deve ser rea­li­zado, incluindo a
propedêutica do exame neurológico e a semiologia psiquiá­trica
básica.
Exames subsidiá­rios
É indicado solicitar:
„„ Exames laboratoriais: incluindo as possíveis causas reversí-
veis de déficit cognitivo como: função tireoidiana (hormônio
tireoestimulante [TSH] e tiroxina livre [T4L]), sorologias para
vírus da imunodeficiên­cia humana/sífilis (HIV/VDRL), avalia-
ção da inflamação (velocidade de hemossedimentação (VHS),
proteí­na C reativa), deficiên­cias nutricionais (ácido fólico, vita-
mina B12), alterações eletrolíticas, assim como uma avaliação
da parte metabólica para checar possível risco ­vascular
„„Neuroimagem: pois auxilia nas hipóteses diagnósticas, sendo
útil na investigação da etiologia do déficit cognitivo e na exclu-
são de diagnósticos diferenciais como hematoma subdural, hi-
drocefalia de pressão normal ou lesão expansiva, por exemplo.
Preferencialmente recomendamos a ressonância magnética que
agrega maiores informação estruturais
„„Outros: ainda pouco utilizado para fins assistenciais, o teste ge-
nético do alelo e4 da apolipoproteí­na E não é recomendado como
maneira de prever a probabilidade de progressão de CCL para
demência, nem para estabelecer risco para demência ou mesmo
para complementar o rastreio cognitivo ou avaliação inicial. Sua
maior utilidade é para fins de pesquisa. Paralelamente, biomarca-
dores liquó­ricos (p. ex., biomarcadores da doen­ça de Alzheimer)
ainda requerem maior confiabilidade entre provedores para que
os testes tenham maior abrangência na prática clínica.
Ao discutir todos esses aspectos, é possível ter uma visão
multidimensional do paciente e desenvolver um bom conheci-
mento sobre o grau de comprometimento cognitivo do mesmo.
Evidências para rastreio
Segundo a USPSTF (Owens et al., 2020), o rastreio de uma
doen­ça, quando é clinicamente indetectável ou em seus está-
gios mais precoces, deve ser levado em consideração quando
intervenções possam prevenir ou retardar as conse­quências da
doen­ça. Para idosos da comunidade maiores de 65 anos de ida-
de, sem sinal e/ou sintoma de comprometimento cognitivo, o
rastreio não é recomendado (nível I: não houve evidência sufi-
ciente para se determinar o claro benefício ou malefício do ras-
treio cognitivo). Contudo, para aqueles pacientes que apresen-
tam queixas cognitivas, é fundamental e indicada a avaliação
pormenorizada das suas funções cognitivas, seja de maneira
livre ou com base em instrumentos (Virginia; Moyer, 2014).
Um ponto que deve ser valorizado na decisão de rea­li­zar ou
não o rastreio são os potenciais benefícios e malefícios.
„„ Pontos positivos
Sabe-se que o fato de o paciente ter a detecção precoce de
uma disfunção cognitiva permite algumas medidas, tais como
a discussão com o paciente e familiares sobre o diagnóstico,
possíveis tratamentos, prognóstico e abordagem de medidas
preventivas e de fatores de risco (como o melhor controle das
comorbidades, interrupção do tabagismo e etilismo, prática de
CAPÍTULO 134  Rastreio Cognitivo em Idosos 7
atividade física, exercícios de estimulação cognitiva e melhora
da qualidade de vida). Com isso permite-se a participação do
paciente nas tomadas de decisões e de planejamentos já no iní-
cio do diagnóstico. É válido lembrar que quando o diagnóstico
é feito, a instituição do tratamento precoce pode influenciar o
curso natural da doen­ça. Além disso, em alguns casos pode ser
feito o diagnóstico de causas potencialmente reversíveis de de-
mência e o paciente ter melhora ou resolução do quadro (Lin
et al., 2013).
„„ Pontos negativos
Por outro lado, não há evidência suficiente na literatura so-
bre os danos diretos ou indiretos de resultados falso-positivos
ou falso-negativos e danos psicológicos em se rea­li­zar o rastreio
(Virginia; Moyer, 2014). Mas na prática sabemos da existência
do potencial risco de se causar depressão, ansiedade e até mes-
mo uma possível estigmatização do paciente com o diagnósti-
co precoce, além de o processo exigir tempo e acarretar custos
(Aprahamian et al., 2008).
Considerações finais
O rastreio cognitivo apresenta mais vantagens do que desvan-
tagens segundo nossa experiência. O alto custo no tratamento
das demências ocorre principalmente nas fases moderada e gra-
ve, as quais podem ser bem planejadas tanto terapeuticamente
com equipes multiprofissionais como pela própria família en-
volvida no caso. O passo fundamental para isto é o diagnóstico
precoce. O tratamento não curativo permite um alentecimento
sintomatológico que apresenta sua melhor ação quanto mais
precoce sua instituição. Dessa maneira, levando tais pontos em
reflexão, podemos concluir a favor da detecção inicial de trans-
tornos cognitivos.
„„ Como fazer o rastreio com tantas opções?
Apesar de não haver consenso, podemos resumir as evidên-
cias práticas e científicas, tentando traduzir a ideia principal
para um amplo acesso:
„„ Recomendamos que se utilize ao menos um instrumento
com domínio de sua técnica. Para escolaridades abaixo de 13
anos, recomendamos o MEEM, enquanto para aqueles com es-
colaridade mais alta, o MoCA
„„A combinação de instrumentos cognitivos eleva a acurácia
diagnóstica, recomendando-se as combinações MEEM e FV ou
MEEM e TDR (Aprahamian et al., 2010)
„„Caso seu tempo seja limitado para a avaliação, a associação
entre o MEEM e um instrumento funcional como o PFAQ é
uma boa opção, especialmente para baixa escolaridade e analfa-
betos (Aprahamian et al., 2011 c)
„„Naqueles pacientes muito diferenciados por sua vida escolar
ou desenvolvimento pessoal e que apresentam déficits cogniti-
vos mais sutis, a utilização do MoCA inicialmente e juntamente
a um instrumento funcional é imperativa
„„Instrumentos compostos por baterias mais extensas (ao redor
de 30 minutos) não constituem um rastreio e sim uma avalia-
ção mais dedicada tanto para transtornos cognitivos menores
(p. ex., CCL) quanto maiores (p. ex., demências) (Aprahamian
et al., 2011a; Aprahamian et al., 2011b). Tais instrumentos
(p. ex., CAMCOG, CERAD, ADAS-Cog) seriam a etapa seguin-
te à identificação de um paciente com alteração cognitiva.
Por fim, após a identificação de um transtorno cognitivo, o
paciente deve ser encaminhado a um serviço com habilidade no
diagnóstico diferencial, acompanhamento clínico e tratamento
destas doen­ças.