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HARVEY, D. O tempo e o espaço do projeto do Iluminismo.

In: Condição Pós-Moderna:


uma pesquisa sobre as origens da mudança cultural. São Paulo: Edições Loyola, 2008
(1989), pp. 219-236.

O capítulo em questão, inserido no livro ``Condição Pós-moderna´´, foi escrito por David
Harvey, um acadêmico de geografia ainda vivo, e com sua primeira publicação em 1989. Com
um viés marxista, o autor se dedicou a trabalhar as transformações espaciais causadas pelo
capitalismo no espaço em geral, mas, que no livro em questão focaliza em tentar estudar essa
turbulenta fase do pós-modernismo, sendo o capítulo em questão uma análise quanto as
implicações históricas-sociais no conceito tempo-espaço

Quanto à época escrita, pode-se apontar diversos fatores para esclarecer esse refluxo ante os
acontecimentos no momento. Desde a retirada soviética do Afeganistão, passando por
movimentos sociais, como a primavera de praga, chegando até a queda do muro de Berlim,
1989 culminava o acúmulo de tensões criadas até aqui principalmente em decorrência da
guerra fria, que colocava o capitalismo também em foco.

David Harvey atua como um maestro ao, de certo modo, organizar seus conhecimentos de
forma a analisar como a pós-modernidade, ou contemporaneidade, passaria a interferir, com
seu modo capitalista, agora hegemônico, na construção, ou percepção, espacial. Assim sendo,
o geografo, que, no início da sua carreira adotava uma vertente mais quantitativa e passa para
algo mais crítico, é um dos maiores teóricos quando discutido a Ideia de espaço-tempo,
principalmente no cenário atual, com o avanço das tecnologias e a cristalização da
globalização, dinamizando cada vez mais as relações no cenário global.

Dessa maneira, aborda como a evolução social história, e consigo, as linhas de pensamento,
implicaram na construção da forma de ver e perceber o mundo. Pontuando mudanças enorme
nessa concepção espaço-temporais desde o imaginário feudal até o capitalismo predatório
pós-moderno, passando também por cenários renascentistas e modernistas, mas dando
ênfase na pavimentação da visão iluminista e no impacto causado por ela.

Quando ao texto, a priori, o autor pincela conceitos que serão consolidados com o seu
decorrer, como o modo no qual a percepção do espaço e do tempo interfere, de maneira
direta, nas vivencias pessoas. Ainda nisso, aponta a interferência que o capitalismo teve na
transformação dessa análise, principalmente por, pelo seu modo de produção, ditar um ritmo
cada vez mais veloz àquele previamente experimentado.

Não obstante, como a forma que sentimos o espaço e o tempo ao nosso redor interferem no
consolidado da sociedade em geral, a cristalização do fenômeno da globalização também
reverbera nas dinâmicas sociais, visto a redução de distancias e a sensação volátil do tempo.
Dito isso, o autor explica que sua argumentação terá uma base histórica, que tentara pontuar
o modo iluminista de enxergar esse conceito espaço-tempo.

Consequentemente, começa-se a interligar tais mudanças conceituais com o contexto


histórico, visando construir uma ponte entre as diferentes semânticas que esses símbolos
adquiriram com o passar do tempo, procurando contrastar com as transformações atuais, mas
sempre no recorte etnocentrista ocidental do processo.
Portanto, David Harvey começa sua escrita na alta idade média, no sistema feudal, precursor
do capitalismo na visão materialista de Marx. Nesse período, é descrito o espaço como a
região do próprio feudo, sendo, por tal, algo rígido e autônomo, enquanto seu exterior
carregava, de certa forma, um valor desconhecido. Além do mais, como era uma sociedade
que bebia muito da cosmologia misteriosa, seja ela religiosa ou não, a percepção de seu redor
era tão importante que acabou sendo traduzida nas representações gráficas, carregadas de
simbologias quanto sensações e concepções.

Entretanto, conforme a evolução histórica e as mudanças no feudalismo, destaca-se a


reativação econômica. Assim, o sistema feudal introvertido começa a se abrir e conectar-se,
correlacionando-se por meio dessas trocas comerciais, dando um preludio do que se tornaria o
capitalismo comercial, e mudando a concepção espaço-temporal consigo.

Em seguida, é demarcada a influência do período renascentista no âmbito conceitual, tendo,


como principal vetor, a racionalização implicando mais claramente nesse contraste. Contudo,
essa perceptível sistematização técnica também está ligada, de certa forma, a contornos
econômicos. Em resumo, a evolução do capitalismo comercial promoveu o fenômeno das
grandes navegações, longas jornadas a fim de descobrir novos lugares ou abrir diferentes rotas
de comércios. Sendo assim, o acúmulo do conhecimento geográfico e sua vinculação com a
procura de riquezas proporcionou uma gradativa mudança na forma da representação
espacial. Logo, técnicas gráficas para isso foram sendo aprimoradas, destacando-se o
desenvolvimento do perspectivismo, uma técnica que rompia com a época medieval e tornava
o espaço algo mais sistemático, frio, mas também harmonioso, como dito por Edgerton.

Consequentemente, cria-se a noção técnica tanto do espaço que deveria ser finito, quanto de
cronometrar o tempo, dois invólucros que tangenciam e, por serem limitados, contribuíram
para a consolidação da questão religiosa como conceito infinito divino. No entanto, destaca-se
o contraste entre as concepções finitas do espaço e do tempo, sendo esse último renegado
pela igreja quando discutido cientificamente, colaborando para o rompimento entre esses
conceitos na época renascentistas.

Ademais, o perspectivismo acabou promovendo o individualismo, já que dever-se-ia adotar


um referencial para a construção do espaço descrito, levando consigo trejeitos do agente na
ação, sendo, um deles, a crença dessa representação como demonstração do que seria o
´´real´´, colaborando, assim, para a quebra da cosmologia medieval. Ademais, essa
sistematização, que para alguns historiadores foi fruto da racionalização comercial, forneceu
parâmetros essencial para a consolidação iluminista futura.

Assim sendo, o autor toma a construção de mapas para demonstrar esses contornos técnicos
que foram adotados, e que, no período analisado, foram de importância ímpar na sociedade,
tanto na questão da viagem marítima quanto da consolidação da propriedade privada. Além
disso, destaca-se o mapa ptolemaico, que aglutinava todo o saber geográfico em um após
adotar um sistema de referência para mostras as ligações espaciais, transfonado o globo em
uma totalidade apreensível e favorecendo a racionalização ao utilizar da matemática para sua
confecção.

Por tal, assume-se, uma vez que o espaço pode ser reproduzido fielmente, ele também pode
ser conquistado e recortado, mudando toda a forma social para trejeitos técnicos de
apoderamento. Por conseguinte, David indica a ponte entre tais reverberações nas relações
sociais daquela época turbulenta, como na arquitetura e urbanismo, ou mais profundo, em
questão estatais, como a promoção da democracia parlamentar inglesa ou a centralização
francesa.

Ao adentrar no período iluminista, o autor pontua os reflexos renascentista nessa nova visão,
um preludio da construção moderna mais a frente. Nessa concepção, o espaço era visto como
algo passível de conquista e, a partir de sua transformação racional, seria a chave para a
emancipação do indivíduo, rompendo com a temática renascentista da conquista da natureza
com um viés divino. A partir desse domínio, o desenvolvimento do racionalismo em conjunto
com a modernização do capitalismo convergia para uma melhora na qualidade de vida social,
baseando-se no conceito espaço-tempo para tentar regular suas vidas, transformando mapas
e cronômetros em objetos indispensáveis.

A construção cartográfica se tornava cada vez mais técnica e fiel, utilizando de conceitos
matemáticos e racionais para se aprimorar, como foi feito na grade de Ptolomeu, que pôde
apresentar a representação de todos os lugares em um mesmo sistema, contribuindo para a
crença do uso da matemática como saída para a organização social. Contudo, percebendo-se
dentre diversos outros povos, acabou criando uma relação etnocentrista nessa relação, e,
como pontuado pelo autor, generalizante ante os demais, homogeneizando-os ante a
caracterização de ´´outro ´´.

Já a aplicação do cronometro como figuração do controle do tempo também teve tantos


reflexos quanto os da cartografia. De algum modo, esse paralelismo proporcionou aflorar
diversas correntes filosóficas quando relacionado o relógio à concepção passado-presente-
futuro. Outro espectro desse processo foi a promoção de uma raciocino sobre a previsibilidade
do futuro, bastasse entender as regras que compunham o tempo e aplicá-las para o futuro.
Não obstante, também tiveram recortes no sistema capitalista, contribuindo com seu
desenvolvimento. Todavia, tomando um distanciamento história para a análise, conclui-se que
naquele tempo houve uma totalização quanto esses conceitos e suas aplicações, o que, de
certa forma, contribuiu para a limitação nas formas de pensar.

David Harvey apresenta a entrada ao modernismo desses conceitos como uma ruptura
àquelas absoltas no iluminismo, mas discursa, pontuando, sobre as diferenças graduais entre
ambas as visões. Ele inicia apresentando a crítica quanto visão homogeneizadora que as
representações gráficas dos espaços acabavam tendo perante sua rigorosidade técnica de
produção, contrastando, por exemplo, mapa medieval e suas representações sensíveis. Ainda
nisso, o autor apresenta a também critica a esse sistema totalizador iluminista, que impelia o
livre fluxo racional com conceitos absolutos, fazendo uma breve relação a tese de Foucault
quanto a repressão imposta por esses modos racionais.

Dito isso, apresenta-se o paralelo com a crítica do pós-modernismo à totalização espacial


iluminista e à técnica perspectiva do renascimento. Dessa forma, a principal questão se dá em
torno da incongruência entre apoiar a racionalização no sentindo de organização social, mas
inibir o uso desses elementos absolutos de representação espacial ou temporal para
coordenar a produção. Além da problemática individualista que o perspectivismo leva à tona,
sendo, agora, a principal questão ser de qual agente idealizar a construção de um espaço, uma
vez que, até então, cada indivíduo reagiria de uma forma àquela ambientação.

A abordagem social feita pelo autor quanto sendo reflexo da disposição espacial é discorrida
no fim de sua argumentação, quase como um preludio da conclusão. Portanto, o autor aponta
a dominação espacial somente sendo possível se o tornar subjetivo, algo realizado pelo
perspectivismo ao abstrair o espaço em prol de seu recorte. Então, usa-se da linguagem
matemática como intercambio entre os mundos real e representativo, ou vice e versa, como
feito por construtores ao realizar uma obra. Logo, utiliza-se desse caminho racional para
coordenar o espaço, como o capitalismo dobra o espaço a fim de produzir lucro, ou o Estado
na procura de consolidar um território. Contudo, foi somente na ascensão da prática de
propriedades privadas que o espaço realmente se tornou algo homogêneo e abrangente.

Desastre, essa universalização espacial também se torna a raiz da questão quanto os


programas de reformulado espacial com princípios sociais. Lefebvre argumentava que
somente com a fragmentação espacial haveria, de fato, sua homogeneização. Contudo,
também cria atritos entre essa privatização fragmentaria excessiva e a dominação social
publica, resultando em 5 problemas apontador por Lefebvre.

Sendo o primeiro já referente à forma que essa pulverização ocorreria, já que, como
sustentado por Foucault, a disposição espacial tem reflexos diretos na organização social, o
que exige ao menos regras para essas divisões antes os diversos propósitos a parti delas, coo
exemplificado pelo autor ao citar o mapeamento da França, embora um tenha sentido de
promover uma descentralização do poder enquanto o outro o contrário. O segundo dilema é a
ligação entre o espaço e questões econômicas, quanto a lucratividade abstraída, e políticas,
referente a democratização social. A próxima questão sustenta a inviabilidade de uma política
social desacoplada de um viés também social, que sustente seu objetivo e não o deixe cair em
uma relação social capitalizada. A quarta problemática é o atrito entre a homogeneização do
espaço, sistematizando-o, e a inviabilidade de abstrair um reconhecimento pessoal nele,
torná-lo um lugar a si. E, por fim, a última questão liga-se a necessidade de se produzir um
espaço para, somente assim, conquistá-lo, deixando, portanto, à mercê das ferozes
intervenções do capitalismo na paisagem.

Logo, esse apoderamento espacial capitalista se baseia em um paradoxo contraditório entre


conquistar e fixar-se no espaço a fim de atemporaliza-lo, mas utilizar ele de forma a garantir
uma maior produção em menor tempo. Isso posto, o iluminismo procurava uma sociedade
melhor quando constatou a necessidade na dominação do espaço e do tempo de modo
racional, e, por isso, difundiu-se relógios e mapas a fim de popularizar essa conquista.
Contudo, enquanto na época iluminista tinha-se um objetivo econômico em comum, a atual
voracidade do capitalismo e dos estados tanto em âmbito interno quando externo, contribui
para a virada nessas concepções o iluminismo ao modernismo.

Destarte, o texto oferece um recorte histórico das transformações na percepção do espaço-


tempo frente sua gradual dominação pelos indivíduos, principalmente em relação à evolução
do capitalismo em si. Ou seja, em outras palavras e de forma resumida, o nascimento do
capitalismo contribui para a promoção da racionalização social, proporcionando o rompimento
com a época medieval ao sistematizar o reconhecimento espacial, como visto na perspectiva, e
desenvolver conceitos temporais. Dessa forma, também serve de base para a concepção
iluminista de dominação espaço-temporal como forma de melhora a qualidade de vida se
baseando nesses conceitos absolutos.

Já ao adentrar o modernismo, mesmo que esse sirva de continuidade ao iluminismo, alguns


vértices de incongruência são apontados, como a crítica à expansiva homogeneização espacial,
que sublinhava as diferenças, e a concepção total e fechadas nesses conceitos como absolutos.
Desse modo, ao pontuar sobre o pós-modernismo, figura entre o uso dos conceitos espaço-
temporais para organizar a vida, mas não a produção, além de questionar sobre o
individualismo perspectivo quanto a construção dos espaços, ou seja, sob qual visão eles
seriam planejados? Ademais, conecta-se, assim, a concepção social como um reflexo do
programa espacial, seja ele em razão de seu entendimento, ou de uma organização. Por fim,
argumenta, de forma geral, como a dominação capitalista se dá de uma forma esquizofrênica
no sentindo de tentar controlar o espaço no tempo, mas em virtude de sua produção
acelerada, tanta transpassar esses próprios conceitos, criando um cenário instável que reflete
na sociedade pós-moderna caótica.

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