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Resumo
Este artigo possui o intuito de analisar a forma pela qual o consumo e a mídia,
principalmente a social, são ferramentas de puro domínio do ser humano e grandes
causadores de impactos negativos em sua saúde mental. Para discutir essa problemática,
será abordada, aqui, de forma individual, a sociedade de consumo e o grande narciso
pós-moderno, que é visto como um reflexo comportamental que afeta a própria
pós-modernidade. Para tanto, será tomado como objeto de estudo o episódio “Queda
Livre”, da série Black Mirror (2011), e de como o consumo e a mídia social foram
capazes de proporcionar grandes desgastes mentais para a protagonista que, na verdade,
representa o indivíduo contemporâneo.
Palavras-chave: consumo; sociedade de consumo; narciso pós-moderno; mídia social;
black mirror.
Introdução
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Trabalho apresentado no IJ02 – Publicidade e Propaganda, da Intercom Júnior – XVII Jornada de
Iniciação Científica em Comunicação, evento componente do 44o Congresso Brasileiro de Ciências da
Comunicação.
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Estudante de graduação 4º semestre de Publicidade e Propaganda da UFPE. E-mail:
leticia.guedesf@ufpe.br
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Estudante de graduação 4º semestre de Publicidade e Propaganda da UFPE. E-mail:
pedro.taquino@ufpe.br
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Estudante de graduação 4º semestre de Publicidade e Propaganda da UFPE. E-mail:
walison.bruno@ufpe.br
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Orientador do trabalho. Professor do Curso de Publicidade e Propaganda da UFPE, E-mail:
rogerio@covaleski.com.br
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peso que ela causa dentro da esfera social. Ao abordar temáticas como a cultura e
sociedade de consumo, são levantadas questões que se referem à ascensão constante do
capitalismo, à formação de identidade dos indivíduos e a sua necessidade de inserção
social, assim como a aquisição de bens que enfatizam o processo de busca pelo
sentimento de satisfação e felicidade. Porém, com o aumento da popularização,
ascensão estrutural da mídia e, atrelado a isso, a idealização de um estilo de vida
“perfeito”, o consumo se torna um dos elementos principais para tentar tornar real tal
ideia.
A partir desse viés, o artigo busca compreender em como fenômeno do
consumo, estimulado pelas plataformas digitais, podem prejudicar a saúde mental da
sociedade, visto que, de acordo com os dados emitidos pela OMS, em 2017, o Brasil é
um dos primeiros países que mais sofrem com casos de ansiedade e depressão, e que
tais problemáticas relacionam-se com questões individualistas e consumistas (SILVA;
XAVIER, 2020).
Sociedade de Consumo
O ato de consumir, por mais que seja uma necessidade básica do ser humano,
passou por um processo de transformação imenso e, com isso, se tornou uma atividade
praticada por impulso e pela busca do prazer momentâneo. Para Bauman (2008), a
sociedade de consumo é representada por cidadãos que são transformados em
mercadorias, devido à exaltação do consumo como característica central do meio social,
o que ele irá chamar de consumismo. Na pós-modernidade, o consumismo circula
rotineiramente na vida humana e na sociedade. Com a mercantilização do indivíduo, a
manipulação de empresas acerca de seus produtos, tornam-se muito mais fortes, pois,
mais do que um produto e funcionalidade, nos é vendido: liberdade, felicidade,
identidade e reconhecimento social.
Para entender a sociedade de consumo com praticidade, é importante repassar
por alguns dos principais autores que têm como base de estudo a análise do consumo e
da sua influência dentro do meio social. Então, vale destacar, aqui, a visão dessa
sociedade através do olhar de Veblen (1889), Bauman (2008) e Campbell (2006).
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Inveja
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Forma de consumir apenas para demonstrar riqueza (VEBLEN, 1899).
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felicidade logo será substituída por outros bens que são agregados a poder, estilo e
prestígio, gerando, assim, a fomentação do capitalismo dentro da sociedade, a
persistência de desigualdades tanto sociais quanto econômicas e , principalmente, uma
mudança comportamental do indivíduo devido à sua necessidade de querer se sentir
pertencente ou aceito dentro de um grupo de prestígio, o que consequentemente afeta
seu processo de identidade (BAUMAN,2007). Pois, o indivíduo irá consumir por que
encontra parte de sua personalidade na marca ou por que, ao usar aquela marca, ele será
visto de forma diferente e positiva por outros?
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aceitação social. Sendo assim, o indivíduo para atingir essa necessidade de inserção,
pode começar a performar comportamentos ou até mesmo consumir aquilo que não
deseja, apenas para ser incluído em determinado grupo social. E a partir dessa
espetacularização, é preciso investigar as consequências individuais que irão afetá-lo.
No entanto, antes de haver essa análise, é importante também entender o papel da mídia
na contemporaneidade para, enfim, elencar o porquê esses elementos - consumo e mídia
- influenciam negativamente na saúde mental do indivíduo.
Narciso Pós-Moderno
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(HAN, 2017, p. 86). Habowsk e Conte (2019), relacionam essa nova configuração do
sujeito pós-moderno, a corrosão da relação com o outro promovida pelos novos meios e
técnicas de comunicação e publicização, que estabelecem o homem como senhor de si
mesmo e detentor do seu próprio êxito. Disso resulta que, “o depressivo é uma pessoa
esgotada por sua soberania, que, portanto, já não tem mais força em ser senhor de si
mesmo. Está cansado de tanta exigência de ter iniciativa" (HAN, 2017, p. 94).
É importante destacar que o imperativo da expansão, transformação e
reinvenção individual no mundo contemporâneo, pressupõe a oferta e o consumo de
produtos e serviços ligados à identidade. Desse modo,“quanto mais se troca de
identidade, mais se impulsiona a produção. A sociedade disciplinar industrial dependia
de uma identidade firme e imutável, enquanto que a sociedade do desempenho não
industrial necessitava de uma pessoa flexível, para poder aumentar a produção” (HAN,
2017, p. 97).
A revolução clássica, desvenda a transformação corrente que apresentamos aqui,
quando pensamos que esta revolução tinha como meta a superação das relações de
alienação do trabalho, cujo sintoma era o trabalhador não reconhecer os frutos do
próprio trabalho, gerando segundo Marx um sentimento contínuo de auto desrealização
do trabalhador. Hoje, vivenciamos um momento histórico em que vige o neoliberalismo,
cujo regime explora a liberdade e auto realização como dimensões da auto alienação
servil” (HABOWSK; CONTE; 2019). Nesse sentido, a pessoa humana é reduzida ao
seu valor puramente mercantil, obsoleto e massificado, reincidindo num vazio
existencial. Ou seja, os detentores dos meios de produção já não são os únicos
exploradores do trabalhador e vilões por si só. “Ao contrário, eu próprio exploro a mim
mesmo de boa vontade na fé de que possa me realizar. E eu me realizo na direção para a
morte. Otimizo a mim mesmo para a morte” (HAN, 2017, p. 116).
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que o valor das pessoas é medido através de avaliações - que variam de uma a cinco
estrelas - realizadas e compartilhadas pelos usuários entre si. É nesse contexto que o
episódio introduz a personagem de Lacie Pound, (Bryce Dallas Howard) uma mulher
que planeja sistematicamente cada ação de sua vida para que esteja sempre com ótimas
avaliações no seu perfil (Anexo 1). Tendo que dividir o apartamento com seu irmão,
Ryan (James Norton), com quem mantém uma relação conturbada, ela enxerga na
oportunidade de ser madrinha de honra de sua amiga da infância, Naomi (Alice Eve), a
chance que precisa para chegar no ranking que a permitiria alugar uma casa e ir morar
sozinha.
ANEXO 1
ANEXO 2
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Além disso, fica claro como as pessoas, inseridas nesse contexto de avaliações e
julgamentos constantes, passam a ignorar o seu próprio gosto a fim de receberem
avaliações positivas dos outros usuários. Esse comportamento pode ser exemplificado
no momento em que Lacie compra um tipo de biscoito e o morde de forma
extremamente controlada para que o formato do alimento combine com a estética da
foto que ela pretende postar. Ou seja, nessa realidade, o consumo perde sua dimensão
individual - “compro porque gosto do que estou comprando” - e fica apenas com sua
dimensão coletiva - “compro porque preciso ganhar avaliações positivas das outras
pessoas”. De acordo com Covaleski e Vasconcelos (2020),“O totalitarismo da sociedade
posta em cena em Nosedive8 se dá por meio das exigências impostas aos cidadãos”.
Essas demandas, assim como na vida real, acabam afetando diretamente a saúde mental
dos usuários, os levando à manifestação de transtornos psicológicos, como ansiedade,
depressão, síndrome de burnout, dentre outros. Por meio de uma entrevista realizada
por Macieira (2017), com o psiquiatra Ernesto Venturini:
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Título original do episódio “Queda Livre”.
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(Cherry Jones), uma mulher mais velha que, antes uma viciada no mundo virtual tal
qual Lacie, nos dias atuais dirige seu caminhão sem se preocupar com as suas
avaliações virtuais. Ora, em uma realidade em que motoristas de aplicativo, com risco
de perder o emprego, têm que lutar para conseguir boas avaliações dos seus clientes,
Nosedive não precisa se esforçar muito para demonstrar as situações paralelas entre a
sociedade em que Lacie vive e a nossa. Somado a isso, em congruência com a definição
do narcisismo secundário citada anteriormente, fica claro que as pessoas dentro da
realidade de Nosedive perderam a capacidade de apreciar tudo que há de externo ao seu
redor, se contentando apenas em registrar uma ou outra situação do dia a dia, não por
um desejo genuíno, mas por uma satisfação narcísica que será gerada a partir dos
elogios feitos nas postagens. Por fim, depois de aprender algumas lições com Susan e
realizar seu discurso catártico no casamento da amiga (Anexo 3), Lacie é presa e, em
mais um momento de catarse, já com sua pontuação completamente zerada, troca
xingamentos com o prisioneiro que está na cela em frente à sua. Inclusive, a cena é
montada e encenada quase como se ambos estivessem em um crescente estado de prazer
que atinge seu “momento orgásmico” quando os personagens gritam o palavrão final.
ANEXO 3
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colegas de trabalho, como se não tivesse escolha a não ser se envolver em uma profecia
autorrealizável de classificação pobre e servidão.
ANEXO 4
Sendo o tema que une todos os episódios de Black Mirror, a relação entre os
seres humanos e a tecnologia é representada em Nosedive de uma forma tão crítica e
ácida que chega a ser irônico o fato da sua plataforma de distribuição ser justamente o
maior serviço de streaming do mundo com um dos algoritmos mais sofisticados do
mercado. No passado, essa obra seria considerada uma ficção-científica. Hoje, no
entanto, o melhor gênero para encaixá-la seria uma espécie de “realismo-profético”. O
maior plot twist, no final das contas, é como a vida real ainda não se tornou idêntica à
de Nosedive.
Considerações Finais
Através da análise do episódio Queda Livre, da série Black Mirror, e das
discussões apresentadas relacionando conceitos como a sociedade de consumo e o
narciso pós-moderno, fica claro como a realidade fictícia do seriado se assemelha cada
vez mais à contemporaneidade. Atualmente, é flagrante o uso contínuo das redes sociais
pela maioria da população, o que não só aumenta a tendência consumista dos usuários,
como também pode gerar diversos problemas psicológicos quando o uso se torna
exagerado. Assim como na série, as pessoas estão se tornando reféns de dois principais
sentimentos: a pulsão consumista e a carência por atenção.
Nesse sentido, a busca por um status superior dentro da sociedade se torna o
principal objetivo dos indivíduos, que vão perdendo seus desejos genuínos e passam a
viver apenas de acordo com o padrão imposto pelos mais ricos e poderosos. Além disso,
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as redes sociais - e a internet como um todo - que, no começo, surgiram como uma
ferramenta nova da socialização, prometendo um maior dinamismo nas interações
sociais, tendem a criar bolhas virtuais regidas por algoritmos que restringem o que os
usuários têm ou não têm acesso.
Diante desse contexto, percebe-se que a busca do indivíduo contemporâneo por
uma auto realização se mantém ancorada, na maioria das vezes, em como sua
performance virtual está sendo avaliada. Ou seja, a felicidade passa a ser inerente ao
status social que a pessoa ocupa tanto na sociedade quanto dentro do seu círculo social.
Somado a isso, o consumismo se torna um elemento central da vida cotidiana, pois
apenas através dele é possível atingir os maiores status e, por consequência, ter uma
vida supostamente melhor.
REFERÊNCIAS
Black Mirror’s 'Nosedive’ isn’t just about social media, it’s about race. Splinter, 24 out.
2016. Disponível em:
<https://splinternews.com/black-mirror-s-nosedive-isn-t-just-about-social-media-179386311
3> . Acesso em: 18 nov. 2021
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LEMOS, André. Isso (não) é muito Black Mirror: passado, presente e futuro das
tecnologias de comunicação e informação. Salvador: EDUFBA, 2018.
MACIEIRA, Luana. 'As pessoas não tentam mais resolver suas frustrações', afirma Ernesto
Venturini. UFMG. 09 out. 2017. Disponível em:
<https://ufmg.br/comunicacao/noticias/a-saude-mental-e-uma-questao-social-afirma-psiquit
ra-italiano> Acesso em: 21 nov 2020
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SILVA, Adriele Eunice da; XAVIER, Ana Augusta Odorissi. O QUE ESTÁ
ACONTECENDO COM NOSSA SAÚDE MENTAL?, Com Ciência, 2020. Disponível
em: <https://www.comciencia.br/o-que-estaacontecendo-com-nossa-saude-mental/> Acesso
em: 18 ago. 2021
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