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E SUAS TRADUÇÕES
Organização
IVO BARROSO
2' edição
aumentada
t'
© 2000. by Editora Nova Agullar S.A.
SumÁRio
Rua Dona Mariana. 205. casa } - Botafogo
cep: 22280.020 - Rio de Janeiro. RJ
Tel/fax: 537-7189 - 537-8275
e/mail: aguilar@iis.com.br
Traduções:
P798c
2' ed. Poe, EdgarAllan.1809-1849 CharlesBaudelaire(18531 61
'0 Corvo"e suas traduções/ organização: lvo Barroco.- Riode \
StéphaneMalíarmé(1888) 67
Janeiro: Lacerda
Ed..2000. DidierLamaison(1998) 73
Traduçãode: "TheRaven'
Machadode Assisjlaa3) 79
Textooriginal do poema. seguido de traduções precedidasde ensaio. Emíliode Menesesj19t71 87
ISBN8$7384409.9
FernandoPessoa(19241 101
Gondinda Fonseca(1928) 107
1. Poe.EsgarAlIaR.1809.1849. "0 Corvo" - traduções.2. Pwsb
norteameíicana. 1.Barrosã. lvo. It. Título. MiltonAmado(1943) 113
8É'
BeneditoLopeslt9561 119
98.0064 CDD 8]3
AlexeiBueno(1980) 135
CDU 820(73).3
Jorre Wanderleyli997) 141
?.
36 0 CORVO E SUAS TRAOUÇÕES
Charles Dickens, numa nota que agora está à minha frente. aludindo
A obra de Poe, inicialmente traduzida na França por Charles
Baudelaire, exerceu grande influência não só sobre a literatura daquele a uma análise. que fiz, certa vez, do mecanismo, de BarnabyRu(@e,diz:
De passagem. sabe que Godwín escreveu seu Ca/eb I'Uüams de trás
país, mas de todo o mundo. O detetive Dupin, de seu conto "0s Crimes
da Rua Morgue" serviu de modelo para o Sherlock Holmes, de Conan para diante? Envolveu primeiramente seu herói numa teia de dificulda-
Doyle. Autores como JuresVerne. Maupassant, Maeterlink. Dostoievski des, que formava o segundo volume, e depois. para fazer o primeiro,
ficou procurando um modo de explicar o que havia sido feito"
mostram fortes Influências de sua prosa. Sua poesia muito inspirou
seus tradutores Baudelaire e Mallarmé, e os poetas Verlaine, Rlmbaud Não posso pensar que esse seja o modo proa/se de proceder de
e Paul Valéry. Poe foi amplamente traduzido em língua portuguesa e Godwin, e. de fato. o que ele próprio confessa não está completamente
de acordo com a idéía do sr. Dickens. Mas o autor de Ca/eb l«#/ams
influenciou igualmente os nossos escritores.Sua obra completa, bem
como sua biografia em dois volumes. devida a HerveyAllen. foi vertida era muito bom artista para deixar de perceber a vantagem procedente
de um processo. pelo menos, um tanto semelhante. Nada é mais claro
por Oscar Mendes e Milton Amado, este último respondável pela ex-
do que deverem todas as intrigas, dignas desse nome. ser elaboradas
traordinária versão de "0 Como". anteriormente traduzido por nomes
da importância de Machado de Assime de Fernando Pessoa,e no qual em relação ao ep#bgo,antes que se tente qualquer coisa com a pena.
SÓtendo o ep/R290 constantementeem vista. poderemosdar a um
aparece a figura mítica de Lenora. Por algum tempo, julgou-seque
enredo seu aspecto indispensávelde consequência.ou causalidade.
essa imagem poética da "amada morta" fosse uma evocação de Vir-
fazendocom que os incidentese especialmente.o tom da obra ten.
gínia a mulher do poeta. No entanto como se verifica da cronologia ~
dam para o desenvolvimentode sua intenção.
acima. o poema foi escrito ainda em vida da esposa, achando-se hoje
mais provávelque a figura evocadatenha sido a da Sr.' Stanard. a Há um erro radical, acho, na maneira habitual de construir-se uma
ficção. Ou a história nos concede uma tese, ou uma é sugerida por um
mesma inspiradorade "To Helen", cuja morte tanto marcou o poeta.
incidente do dia, ou, no melhor caso, o autor senta.se para trabalhar
Elmseu estudo-"A Filosofia da Composição", Poe insiste no entanto em
na combinação de acontecimentos impressionantes. para formar sim-
afirmar que o poema foi escrito "a frio". obedecendo a critério rigorosa-
plesmente a base da narrativa, planejando, geralmente. encher de des-
mente técnico, longe de qualquer "inspiração".
ívo E3arroso crições, diálogos ou comentários autorais todas as lacunas do fato ou
da ação que se possam tornar aparentes, de página a página.
38 0 CORVO E SUAS TRADUÇÕES
A FILOSOFIA
OACOMPOSIÇÃO 39
de permitir-se dispensar qt/a/qt/er co;sa que possa auxiliar seu intento, Meu pensamento seguinte referiu-se à escolha de uma impressão,
resta a ver se há, na extensão,qualquer vantagem que contrabalance a ou efeito. a ser obtidose aqui bem posso observarqúe. atravésde toda a
perda de unidade resultante. Digo logo que não há. O que denomina- elaboração. tive firmemente em vista o desejo de tornar a obra apreciável
mos um poema longo é, de fato, apenas a sucessão de alguns curtosl por lodos. Seria levado longe demais de meu assunto imediato. se fosse
isto é, de brevesefeitos poéticos. E desnecessário demonstrar que um demonstrar um ponto sobre o qual tenho repetidamente insistido e que.
poema só o é quando emociona. intensamente, elevando a almas e entre poetas, não tem a menor necessidade de demonstraçãol refiro-me
todas as emoções intensas, por uma necessidade psíquica, são bre- ao ponto de que a Belezaé a única províncialegítima do poema. Poucas
ves. Por essa razão. pelo menos metade do Para/bo Pera/do é essen- palavras,contudo. para elucidar meu verdadeiropensamentoque al-
cialmente prosa. pois uma sucessão de emoções poéticas se intercala, guns de meus amigos tiveram inclinação para interpretar mal. O prazer
/neüfave/mente,
de depressões
correspondentesl
e o conjuntosevê que sela ao mesmo tempo o mais intenso, o mais enlevante e o mais
privado, por sua extrema extensão, do vastamente importante elemen- puro õ, creio eu, encontrado na contemplação do belo. Quando. de fato.
to artístico. a totalidade, ou unidade de efeito. os homens falam de Beleza,querem exprimir, precisamente. não uma
qualidade,como se supõe.mas um efeitosreferem-se,em suma, preci-
\
um poema deve ser calculada, para conservar relação matemática alcançados pelos meios melhor adaptados para atingi-los. E ninguém
com seu méritos em outras palavras. com a emoção ou elevaçãol ou houve ainda bastante tolo. para negar que a elevação especial, a que
ainda em outros termos, com o grau, de verdadeiro efeito poético que aludi. é ma/s p/onfamen&e atingida num poema. Quanto ao objetivo Ver-
ele é capaz de produzir. Pois é claro que a brevidade deve estar na dade, ou à satisfação do intelecto, e ao objetivo Paixão, ou à excitação do
razão direta da intensidade do efeito pretendido, e isto com uma condi- coração, são eles multo mais prontamente atingíveis na prosa. embora
também, até certa extensão. na poesia. A Verdade, de fato. demanda
ção. a de que certo grau de duração é exigido. absolutamente, para a
produção de qualquer efeito. uma precisão. e a Paixão uma ÉamJ/lbddadelo verdadeiramente apaixo-
Tendo em vista essas considerações, assim como aquele grau de nando me compreenderás,que são inteiramente antagónicas daquela
excitação, que eu não colocava acima do gosto popular nem abaixo do Belezaque, asseguro,é a excitaçãoou a elevaçãoagradávelda alma. De
modo algum se segue, de qualquer coisa aqui dita, que a paixão e mes-
gosto critico, alcancei logo e que imaginei ser a extensão conveniente,
para meu pretendido poema: uma extensão de cerca de cem versos. mo a verdade não possam ser introduzidas, proveitosamente introdu-
De fato. ele tem cento e oito. zidas até, num poema. porque elas podem servir para elucidar ou auxiliar
\./ vVl\ V V 1- 'JVf\0 l I'tnt./\l\:lp\./Lx)
A FILOSOFIA
OACOMPOSIÇÃO 43
Compus essa estância. nesse ponto, primeiramente porque, esta- do é octâmetro acatalético,alternando-secom um heptâmetrocata.
belecendoo ponto culminante, melhor poderia variar e graduar, no lético, repetido no refrão do quinto verso e terminando com um teta.
que se refere à seriedade e importância, as perguntas precedentes do metro catalético. Falando menos pedantescamente, o pé empregado
amante e, em segundolugar. porque poderia definitivamente assentar no poema (troqueu) consiste em um sílaba longa, seguida por uma
o ritmo, o metro, a extensão e o arranjo geral da estância, assim como curral o primeiro verso da estânciacompõe-sede oito dessespésl o
graduar as estâncias que a deviam preceder, para que nenhuma delas segundo,de sete e meio (de fato. dois terços),o terceiro de oito. o
pudesse ultrapassa-laem seu efeito rítmico. Tivesseeu sido capaz, na cluartode sete e meio. o quinto idem, o sexto de três e meio. Ora. cada
composição subseqüente, de construir estâncias mais vigorosas, não um desses versos, tomado separadamente,tem sido empregadoan-
teria hesitações em enfraquecê-las propositadamente, para que não tes, mas a originalidade que "0 Corvo" tem .estáem sua coma)üaç;ão
interferissem com o efeito culminante. na esMncü. nada lá havendo sido tentado que mesmo remotamente
E aqui bem posso dizer algumas palavras sobre verslficação. Meu se aproximasse dessa combinação. 0 efeito dessa originalidade de
primeiro objetivo. como de costume. era a originalidade. A amplitude combinação é ajudado por outros efeitos Incomuns, alguns inteiramen-
com que esta tem sido negligenciada na versificação é uma das coisas te novos..oriundosde uma ampliaçãoda aplicaçãodos princípiosde
mais inexplicáveis do mundo. Admitindo-se que haja pequena possibli- rima e de aliteração.
dade de variedade no ritmo, permanece claro, porém. que as varieda- 0 ponto seguinte, a ser considerado, era o modo de juntar.o aman-
des possíveis do metro e da estância são absolutamente infinitas, e te e o Corvo: e o primeiro ramo dessa consideração era o /ocâi( Para
conluio, durante séculos, nenhum homem. em verso. jamais fez ou isso, a sugestão mais natural seria a de uma floresta, ou a dos cam-
jamais pareceu pensar em fazer uma coisa original. A veTàaàeé que a posl mas sempre me pareceu que uma c/rct//7scdção fechada do espa-
originalidade (a não ser em espíritos de força muito comuml de modo ço é absolutamente necessária para o efeito do incidente insulado e
algum é uma questão, como muitos supõem, de impulso ou de intui- tem a força de uma moldura para um quadro. Tem indiscutívelforça
ção. Para ser encontrada.ela. em geral, tem de ser procurada traba- moral, para conservar concentrada a atenção e, naturalmente. não
Ihosamente. e embora seja um mérito positivo da mais alta classe, seu deve ser confundida com a mera unidade de lugar
alcance requer menos inven.ção que negação. Determinei, então, colocar o amante em seu quarto -- num quarto
Sem dúvida, não pretendo que haja qualquer originalidade. quer para ele sagrado, pela recordação daquela que o freqtlentara. O quarto
no ritmo. quer no metro de "0 Corvo".zO primeiro é trocaico, o segun- é apresentado como ricamente mobilíado, isso na simples continua-
ção das idéias, que eu lá tinha explanado, a respeito da Beleza como a
?
únicaverdadeiratesepoética,
A explicação da forma utilizada refere-se. é evidente. ao original inglês. Na tradu-
Tendosido assim determinadoo /ocastinha agorade introduzira
ção portuguesa, de que nos estamos valendo, por motivos óbvios. o metro e o
ritmo são outros. embora com a preocupação de se aproximar o máximo possível ave e o pensamento de fazê-lo pela janela era inevitável. A Idéla de
do original.(N. do T.). fazer o amante supor. em primeiro lugar, que o tatalar j"flapping"l das
48 0 CORVO E SUAS TRADUÇÕES 49
A FtLOSOf:IA DA COMPOSIÇÃO
asasda ave contra o postigoé um "batido" j"tapping") à porta,origi- Maravilhou-me que falasse uma ave rude dessa classe.
nou-se dum desejo de aumentar, pela prolongação, a curiosidade do misteriosa esfinge negra. a retorquir-me em termos tais.
leitor, e dum desejo de admitir o efeito casual. surgindo do fato de o pois nunca soube de vivente algum, outrora ou no presente.
que igual surpresa experimente: a de encontrar, em sua porta
amante abrir a porta. achar tudo escuro e depois aceitar a
uma ave lou fera, pouco importa) empa/e/fada. em sua poda.
semifantasia de que fora o espírito de sua amada que batera. e que sechama"lxluncamais
Fiz a noite tempestuosa, primeiro para explicar por que o Corvo
procurava entrar e, em segundo lugar. para efeito de contraste com a
Sendo assim assegurado o efeito do desenvolvimento, imediata-
serenidade (físicas que reinava dentro do quarto.
mente troquei o fantástico por um tom da mais profunda seriedade.
Fiz o pássaro pousar no busto de Minewa ("Pallas"), também para
começando esse tom na estância imediatamente seguinte à última
efeito de contraste entre o mármore e a plumagem -- sendo entendido que citada, com o verso:
o busto foi absolutamente sugando pelo pássaro -- e escolhido o busto de
/W/ne/va,primeiro, para combinar mais com a erudição do amante e, em Diversa coisa não dizia, alí pousada. a ave sombria etc
segundo lugar, pela sonoridade da própria palavra Minewa.
Pelo meio do poema, também, aproveitei-me da força do contraste, Daí para a frente, o amante não mais zomba. não mais vê qualquer
tendo em vista aprofundar a impressão derradeira. Por exemplo, um ar coisa de fantástico na conduta do Como. Fala dele como "horrendo.
do fantástico -- aproximando-seo mais possíveldo burlesco -- é dado lavo. om\Rosae anhgo" 1."grim, ungainly, ghastly. gaunt and ominous
à entrada do Corvo. Ele entra "em tumulto. a esvoaçar" ("w/fh maná a ó/rd ofyore"), sentindo "da ave. incandescente, o olhar" j"#e/y aves"l
flirt and flutter''l. queima-lo"fixamente" l"óosom's core"). Essa revoluçãodo pensa-
mento. ou da Imaginação, da parte do leitor, levar o espírito a uma
Como um fidalgo passa, augusto, e sem notar sequer meu susto.
disposição própria para o desen/ace.que é agora completado tão rápi-
a(ida e pousa sobre o busto -- uma escultura de Minerva. da e diretamente quanto possível.
Com o desenlace conveniente, com a resposta do Corvo. "Nunca
Nas duas estânciasque se seguem,esse desígnioé ainda mais mais", à pergunta final do amante, sobre se ele encontraria sua amada
evidentemente solicitado:
em um outro mundo, o poema,em sua fase evidente.que é a da
simples narrativa, pode ser considerado como completo. Até aí, tudo
P.ave{ da ave austera e escura a soleníssima figura,
está dentro dos limites do explicável,do real. Um corvo, tendo aprendi
desperta em mim um leve riso. a distrair-me de meus ais.
"Sem cdsfa embora, ó Corvo antigo e singular" - então Ihe digo -- do rotineiramente a dizer apenas "Nunca mais" e tendo escapado à
"não tens pavorl fala comigo. alma da noite. espectro vigilância de seu dono, é levado à meia-noite, em meio à violência de
torvo qual é o teu nome. ó nobre Corvo, o nome teu no inferno torvos' uma tempestade, a buscar entrada numa janela, pela qual se vê ainda
E o Corvo disse: "l~lunca mais'
a luz brilhar: a janela do quarto de um estudante, ocupado entre folhe-
OU \J bVKVV L ÕUaõ l KAUU9UCÕ
A FILOSOFIA
DA COMPOSIÇÃO 51
sejam, por mais vivasriquezas de incidentes que possuam. há sempre e a luz da lâmpada. disforme, atira ao chão a sua sombra.
Nela. que ondula sobre a alfombra. está müóa a/ma e. presa ã sombra.
ceda dureza ou nudez que repele o olhar artístico. Duas coisas são
Nâo l)á de erguer-se.ail nunca maisl
invariavelmente requeridasprimeiramente. certa soma de complexida-
de, ou mais propriamente. de adaptaçãol e, em segundo lugar, certa
soma de sugestividade,certa subcorrente embora indefinida de senti-
do. Esta última. afinal, é que dá a uma obra de arte tanto daquela
riqueza aparatirar da conversação cotidiana um termo eficaz) que gos-
tamos demais de confundir com o idem/.E o excessodo sentido suge-
rido, é torna-io a corrente superior, em vez da subcorrente do tema.
que transforma em prosa je prosa da mais chata espéciesa assim
chamada poesia dos assim chamados transcendentalistas.
Mantendo essasopiniões, ajuntei duas estâncias que concluem o
poema. sendo sua sugestividade destinada a penetrar toda a narrativa
"0 CORVO" E SUAS TRADUÇÕES
$
THE RAVEN EOGAR ALLAN POE
1'845
. '
oor-
56 0 CORVO E SUAS TRAOUÇÕES
ESGARALLANPOE 57
Deep into that darkness peeríng, long l stood there, wondering. fearing,
Doubting, dreaming dreams no mortais ever dared to dream beforel Much l marvelled this ungaínly fowl to hear discourse se plainly.
But the silence was unbroken, and the stillness cave no token Though its answer little meaning, little relevancy borel
And the only word there spoken was the whispered word, "Lenorel" For we cannot help agreeingthat no living human being
This l whispered. and an echo murmured back the word, "Lenorel" Everyet was blessed with seeingbird abovehis chamber door -
Merelythis and nothing more. Bird or beast upon the sculptured bust above his charnber doar
With such nome as "Nevermore"
Open here l flung the shutter, when. with many a flirt and flutter,
Startled at the stillness broken by reply se aptly spoken,
In there stepped a stately Ravenof the saintly days of yore. "Doubtless", raid l. "what it utters is its only stock and store.
Not the least obeisancemade he. not a minute stopped or stayed he, Caught from some unhappy master whom unmerciful Disaster
But, with mien of lord or lady perched above my chamber door --
followed fast and followed faster till his sonos one burden bole
Perched upon a bust of Pallas lusa above my chamber doou --
Till the dirges of his Hope that melancholy burden bore
Perchedand sat. and nothing more. Of 'Never -- nevermore'."
Then, this ebony bird beguiling my sad fancy indosmiling, But the Raven still beguiling all my sad soul untosmiling,
By the grave and stern decorum of the countenance it wore, Straight l wheeled a cushioned seat ín front of bird and bust and door
"Thoughthy crest be shorn and shaven,thou", l raid, "art fure Then, upon the velvet sinl<ing,l betook myself to linking
Ino craven. fancy unto fancy, thinking what this ominous bird of yore.
Ghastly.grim, and ancient Raven,wanderingfrom the nightly shore: What this grim. ungainly. ghastly, gaunt. and omínous bird of yore
Teíl rne what thy lordly nome is on the Night's Plutonían shorel" Meant in croaking "Nevermore"
Quoth the Raven. "Nevermore"
Tais l sat engagedin guessing,but no syllabeexpresslng
To the fowl, whose fiery eyes now burned untomy "bosom's core
58 0 CORVO E SUAS TRAOUÇÕES EDGAR
ALLAN POE 59
This and more l sat divining, with my head at ease reclining Leave no black plume as a token of that lie thy soul hath spokenl
On the cushion's velvet lining that the lamplight gloated o'.er, Leavemy lonelinessunbrokenl qult the bust above my doorl
But whose velvet violet lining with the lamplight gloating o'er, Take thy beak from out my heart. and take thy form frorn off my doorl
She shall press, ah, nevermorel Quoth the Raven. "Nevermore"
Then, methought, the air grew denser, perfumed from an unseen And the R-aven.never fiitting. still is sitting, still is sitting
jcenser On the pallid bust of Palhaslust above my chamber doar:
Swung by seraphim whose foot-falastinkled on the tufted floor.
And his eyes have all the seeming of a demon's that is dreaming,
"Wretch",l cried,"thyGodhathlentthee- bytheseangelshe hath 4 And the lamplight o'er him streaming throws his shadow on the floor=
jsentthee And my soul from out that shadow that nes floating on the foor
Respite-- respite and nepenthe from thy rnemories of Lenorel Shall be lifted -- nevermorel
Quaff, oh quaff this kind nepenthe, and forget this postLenorel"
Quoth the Raven, "Nevermore"
/-
Vendoqueo pássaroentendia
SÓIhe ficou, na amarga e última cantiga
A perguntaque Iheeu fazia.
Esse estribilho: "Nunca mais."
Fico atónito, embora a resposta que dera g
Dificilmente Iha entendera. a
Segunda vez. nesse momento.
Na verdade, jamais homem há visto
Sorriu-me o triste pensamentos
Coisa na terra semelhante a isto:
Vou sentar-me defronte ao Corvo magro e rudo
Umaave negra,friamenteposta, !
EImergulhando no veludo
Num busto,acima dosportais. Da poltrona que eu mesmo all trouxera
Ouvir uma pergunta e dizer em resposta
Achar procuro a lúgubre quimera.
Que este é o seu nome: "Nunca mais.
A alma. o sentido, o pávido segredo
Daquelas sílabasfatais,
No entanto. o Corvo solitário
Entender o que quis dizer a ave do medo
Não teve outro vocabulário.
'i
Oinexcedidae inexcedível
tradutordo genial
poema de Edgar Poe. consagra esta pálida
paráfrase que em nada $e aproxima e jamais
pretendeuaproximar.se
da imorredouratra-
dução feita pelo Mestre dos Mestres.
Porque jamais se esquece, alma consoladora "Como nesta ocasião o sono me prendia
Como essa que nos céus é chamada Eleonora. E a pancada foi tal. tão leve e tão ligeira,
Nome que nunca mais ouvirei. nunca maisl Que presto não carril perdoai-me esta ousadia
Dama ou senhor que estais da minha porta à ombreira
V
Fujamos. pois, do medo ao tenebroso impérios
Cravo os olhos na treva e longamente a escruto. Animo, coraçãol sondemos o mistério,
E a treva é muda e é muda a própria ventania. Se bem que a noite esteja uivando aos vendavais
E longo tempo assim com o próprio medo luto.
De dúvida e terror povoando a fantasia. E continuando fui: Nada mais foi que o vento,
Não foi mais que o feroz, não foi mais que o violento
Sonhos que outro mortal, como eu nunca ousaria Sopro do furacãol Foi isso e nada maísl...
Sonhar, me vêm num bando esmagador e bruto.
Profunda calma aquieta a quieta calmaria. Vlf
Imóvel é o silêncio e só o silêncio escutou...
Abro a janela e vejo entrar, ruidosamente
A única voz humana, o único som ouvido. Amplas asas batendo e ares de fidalguia,
E este nome, em surdina e a medo proferido: Um majestoso corvo a:tivo e irreverente
E este nome que encerra os meus mortos ideais. Como arauto ferasda noite erma e bravia
Sou eu quem o profere, eu que o trago na mente. Sem fazer o menor sinal de cortesia.
E um eco a repercutir, repete-o vagamente: Sem um gesto sequer dehesitação prudente
-- "Eleonoral Eleonoral" É isto e nada maisl Como entraria um nobre, alta dama entraria
Entrou e se alojou despreocupadamente.
VI
Vagaroso e solene, ar indolente e farto.
Entrei de novo em ânsia e ardendo a estranho fogo, Exatamentesobre a entrada de meu quarto
Senti que. dentro em mim, todo o meu ser ardia. Seguroabrigoachouacimadosportais.
Ouvi distintamente outra pancada e, logo,
Deoutra pancadao som maisclaropercutir. Esta recordação até agora me enerva:
Sobreum pálido busto antigo de Minerva,
A essa nova impressão, volto-me e monólogo: Rígidoe senhorial, portou-se e nada maisl
Talvezcousaqualquer me bata à gelosia.
Certamente que sim, pois que ludíbrlo e jogo
Do pavor de mim mesmo, eu. certo, não serial
v vv'--v ç-'?vnÜ IKaUUÇUES
EMÍLIO DE MENESES 93
Vlll
Ninguém verá. como eu, a ave negra num busto.
A este Pássaro audaz, de ébano a cor das penas. Sem que a mova o receio e sem que a mova o susto.
Grave na compostura e na fisionomia. Tranquila espreguiçando as asas triunfais.
;'''
Que ao cérebro me dava idéias mais serenas.
Que me acalmava o peito, e a sorrir me induzia. Ouvir a minha voz a Ihe indagar o nome
E ante a curiosidade atroz que me consome.
Voltando-me disse eu: "Tu que te não encenas Dizerme simplesmente a frase: Nunca maisl
De altas cristas ou Poupa à negra frontaria.
Velho corvo foral que te mostras apenas. X
Certo, não és o víl núncio da covardia.
XI
Procuro compreender qual o escondido gozo
Todo o assombro em meu ser por tremor se anuncia. Dessevil e sinistro arauto tenebroso
Ouvindo a ave auguramsem o menor estorvo. Que em dois termos resume os seus vis cabedais
Tal resposta me dar. com tanta analogia
Que inda agora, a lembra-la, eco por eco a sorvo. Que os seus vis cabedais de ciênciae de linguagem
Resume ao exibir-me a tétrica plumagem
Certo a frase aprendeu na triste companhia Crocitando e grasnando a frase: Nunca maisl...
De algum mestre infeliz cujo destino torvo.
Da dor o escravizou à fera tirania.
XIEI
E a sabe assim de cor. o foragido corvos
Deixo-me após ficar como quem se extasia
Tantas vezes a ouviu. Tão repetidamente Entre a alucinação e a funda conjetura.
0 seu mestreinfelizIhafez vibrar na mente. Ante a luz da razão e a névoa da utopia,
Que hoje a profere a rir, como a profere em aisl Sem nada a me apoiar a mente mal segura
De proáun(#s/ cruel de uma morta esperança, Nada mais pronunciei. nem um som se me ouvia
Tão tristonhos canções deixaram na lembrança, E como a um ferro em brasa, a uma horríveltortura
Do como este estribilho, este só: Nunca maisl.. Da ave ao olhar hostil e à pérfida ironia
N'alma entrou-me o terror que as almas transfigura.
Xll
Mas a um torpor de quem vagamente ressona
Como apesar de tudo a calma conseguia Recosto-me ao espladar dessa velha poltrona
Fazer-med'alma vír, do lábio, um riso. à tona.
Que eu para alí trouxera em ânsias infernais,
Chegando-me ao portal, do corvo hospedaria,
Sentei-me e recortei-me a uma antiga poltrona. E vejo a luz brilhar sobre o roxo veludo
Em que por tanta vez d'Ela o semblante mudo
Frente à frente do corvo, a alma já me sorria
Brilhou, mas nunca mais brilharál Nunca maisl
E toda entregue a mim, como quem se abandona.
Busco ansioso indagar que novas me traria
0 fúnebre viajouque inda hoje me emocional
yb . O CORVO E SUAS TRAOUÇÕES
EMÍLIO DE MENESES 97
Xlv
Dize-me.por quem és, se neste mundo triste
Sinto assim a envolver-me uma nuvem de incenso. Existealgum reposuso, algum consolo existe
Solta de um Incensóriooculto que pendia Paraestesmeuscruéissofrimentosmortaísl
Das invisíveis mãos de anjos que em coro extenso.
Revoavam roçagando a ampla tapeçaria. Existeesse mendaz bálsamo da Judéia
\ Que,da saudade,a dor nos arrancada idéia?
Hauríndo o ar aromado e, de bálsamo, denso. E o corvo, inda outra vez. repetiu: Nunca malsl
De mim para mim mesmo exclamo em gritaria:
Infelizl Infelizl Um Deus piedoso e Imenso XVI
Pelos anjos te manda o repouso e a alegrias
Profeta ou Satanás, negro ser da desgraçar
Do nepentes é o sumos Ei-lo, bebe-ol Ei-lo, esquecem Profeta sempre atroz de negra profecia.
Ele é a seara do bem, do esquecimento a messes Pelo azul deste céu que sobre nós se espaço.
Nele ouvirás a voz dos gozos celestiaisl PeloDeus.todo luz. que em ambos nós radia
E o nepentesidealque Deuste mandaagoral Dizea esta alma sem luz e de dúvidas baça,
Bebe-ol Bebe o olvidando a tua morta Eleonoral Baça de incertidão e de melancolia:
E o como crocítou de novo: -- Nunca maísl
Ser:lhe-ádado abraçar o anjo que entre anjos passa
E de cujo esplendor hoje o céu se atavia?
xv
Ser-lhe-ádado abraçar a virgem pura e santa.
Pássaroou Satanás, ave de profecia.
Virgem casta e piedosa e que os anjos encanta
Sejas ave ou Satã. sempre hás de ser profetas
Com seus gestos de encanto e encantos virginais?
Venhas do teu inferno ou da brava invernia
Que náufrago te fez, acalma esta alma inquieta. Ser-lhe-ádado abraçar. ohl dize-o sem demora
A rútlla. a radiosa, a radiante Eleonora?
Já que a noite exigiu, no võo que te guia,
E o coiro rouquejou, roufenho: Nunca malsl
Que caíssemaqui. onde a angústia secreta.
Onde o secreto horror tem teta ou moradia
Do pouco que disseste o sentido completam
98 O CORVO E SUAS TRAOUÇÕES
EXÍLIO DE MENESES 99
wll
Essa sombra que a luz da lâmpada suspensa
"Que esta palavra, enfim! de negra profecia faz refletirno chão. qualabranuvemdensa,
Do teu regresso o início ambicionado sejam No mesmo chão negreja em linhas sepulcrais
Regressaao reino teu, à noite que te envia.
A noite plutoniana, essa que em ti negrejal E desse âmbito negro. esse âmbito de sombra,
Minha alma que da dor da saudade se assombra
VolvemCala essa voz que me fere e angustíal Nunca mais sairás Nunca maisl Nunca maisl
Reentrano temporal, volve à tua peleja
De lá fora e não fique uma só pluma esguia
Neste chão, de tua vil plumagem malfazejal
xv l l l
Abri então a vidraça, e eis que, com muita negaça. A alma súbito movida por frase tão bem cabida.
Elntrougrave e nobre um Corvo dos bons tempos ancestrais. "Por certo", disse eu. "são estas suas vozes usuais.
Não fez nenhum cumprimento. não parou nenhum momento. Aprendeu-asde algum dono, que a desgraça e o abandono
Mas com ar sereno e lento pousou sobre os meus umbrais. Seguiram até que o entono da alma se quebrou em ais.
Num alvo busto de Atena que há por sobre os meus umbrais. E o bordão de desesp'rança de seu canto cheio de ais
foi. pousou,e nada mais. Era este "Nunca mais"
E esta ave estranha e escura fez sorrir minha amargura Mas, fazendo inda a ave escura sorrir a minha amargura,
Com o solene decoro de seus ares rituais. Sentei-medefronte dela. do alvo busto e meus umbrais:
' Tens o aspecto tosquiado", disse eu, "mas de nobre e ousado. E, enterrado na cadeira. pensei de multa maneira
0 velho Como emigrado lá das trevas infernaisl Que qu'ria esta ave agoureira dos maus tempos ancestrais
Dize-mequal o teu nome lá nas trevas infernais." Esta ave negra e agoureira dos maus tempos ancestrais.
Disseo Corvo,"Nunca mais". \
Com aquele "Nunca mais''
Isto e mais ia cismando, a cabeça recllnando Tira o vulto de meu peito e a sombra de meus umbraisl
No veludo onde a luz punha vagas sombras desiguais Disseo Corvo."Nunca mais"
Naquele veludo onde e/a, entre as.sombras desiguais.
Recllnar-se-á nunca maisl E o Como, na noite infinda, está ainda, está ainda,
No alvo busto de Atena que há por sobre os meus umbrais
Fez-seentão o ar mais denso. como cheio dum incenso Seu olhar tem a medonha dor de um demónio que sonha,
Que anjos dessem, cujos leves passos soam musicais. E a luz lança-lhe a tristonha sombra no chão mais e mais.
"Maldito", a mim disse. "deu-te Deus, por anjos concedeu-te E a minh'alma dessa sombra que no chão há mais e mais.
O esquecimentos valeu-te. Toma-o, esquece, com teus ais. Libertar-se-á...
nuncamaisl
0 nome da que não esqueces,e que faz essesteus aisl"
Disse o Corvo, "Nunca mais"
Perqulro a treva longamente, estarrecido. amedrontado. e creio bem, que em tempo algum. em noite alguma, entes mortais
sonhando sonhos que, talvez, nenhum mortal haja sonhado. viram um pássaro adejar, voando por cima de uma porta.
Silêncio fúnebres Ninguém. De visitante nem sinais. e declarar (do alto de um busto, erguido acima de uma portal
Uma palavra apenas corta a noite plácida: -- "Lenora". quesechamava"Nuncamais"
Digcbaem segredo,e num murmúrio, o eco repete-me-- "Lenoral'
Isto, somente -- e nada mais. Porém o Corvo. solitário, essas palavras só murmura.
como que nelas refletindo uma alma cheia de amargura.
Para o meu quarto eu volto enfim -- sentindo n'alma estranho ardor. Depois concentra-se e nem move -- inerte sobre os meus umbrais
e novamente ouço bater. ouço bater com mais vigor. uma só pena. Exclamo então: "Muitos amigos me fugiram...
"Vêmda janela", presumi,"estesrumoresanormais. Tu fugirás pela manhã. como os meus sonhos me fugiram..."
Mas eu depressa vou saber donde procede tal mistério. Respondeo Corvo:"Ohl Nuncamaisl"
Fica tranqililo, coraçãol Perscruta, calmo. este mistério.
E o vento. o vento e nada malsl" Pasmo. ao varar o atroz silêncio uma resposta assim tão justa,
e digo: "Certo, ele só sabe essa expressãocom que me assusta
Eis, de repente, abro a janela, e esvoaçaentão, vindo de fora. Ouviu-a, acaso, de algum dono. a quem desgraças infernais
um Como grande, ave ancestral, dos tempos bíblicos. -- d'outroral hajam seguido, e perseguido, até cair nesse estribilho,
Sem cortesias, sem parar. batendo as asas noturnais. até chorar as ilusões com esse lúgubre estribilho
ele, com ar de grão-senhor.foi, sobre a porta do meu quarto, de -- "nunca maisl ohl nunca maisl"
pousar num busto de Minerva, -- e sobre a porta do meu quarto
quedou. sombrio. e nada mais. De novo. foram-se mudando as minhas mágoas num sorriso.
Então, rodei uma poltrona. olhei o Como. de improviso.
Eu estava tristes mas sorri. vendo o meu hóspede noturno e nos estofos mergulhei. formando hipóteses mentais i
tão gravemente repousado. hirto, solene e taciturno. sobre a$ secretas intenções que essa medonha ave agoureira
"Sem crista, embora"-- ponderei--, "embora ancião dos teus iguais. -- rude. sinistra. repulsiva e macilenta ave agoureira. --
não és medroso, ó Corvo hediondo, ó filho errante de Plutãol tinha, grasnando"Nuncamais"
Que nobre nome é acaso o teu. no escuro império de Plutão?"
E o Corvo disse: "Nunca maisl" Mil coisas vagas pressupus... Não Ihe falava. mas sentia
que me abrasava o coração o duro olhar da ave sombria.
Fiquei surpreso -- pois que nunca imaginei fosse possível E assim fiquei, num devaneio, em deduções conjecturais
ouvir de um Corvo tal resposta, embora incerta. incompreensível. minha cabeça declinando -- à luz da lâmpada fulgente
110 0 CORVO E SUAS TRAOUÇÕES
GONDIN DA FONSECA 111
nessa almofada de veludo. em que ela, agora - à luz fulgente E não saíul e não saiul Ainda agora se conserva
naomais descansa-- ahl nuncamais pousado, trágico e fatal. no busto branco de MinerVa
Negro demónio sonhador, seus olhos são como punhaísl
Subitamente o ar se adensou, qual se em meu quarto solitário, Por cima, a luz. jorrando, espalha a sombra dele, que flutua..
anjos pousassem,balançando um invisívelincensário.
E a alma infeliz, que me tombou dentro da sombra que flutua
"Ente infeliz"-- eu exclamei. -- "Deus apiedou-se dos teus aisl não há de erguer-se."Nunca mais"
Calma-tel calma-te e domina essas saudades de Lenoral
Bebe o nepente benfazejosOlvida a imagem de Lenoral"
E o Corvo disse: "Nunca mais.';
Sondei a noite erma e tranqüila, olhei-a fundo, a perquiri-la. pois nunca soube de vivente algum. outrora ou no l)rebente.
sonhando sonhos que ninguém, ninguém ousou sonhar iguais. que igual surpresaexperimente: a de encontrar, em sua porta
Elstarrecidode ânsia e medo. ante o negror imoto e quedo. uma ave (ou fera. pouco importa), empoleirada em sua porta
só um nome ouvi(quase em segredoeu o dizia) e foi: "Lenoral" e que se chame "Nunca mais"
E o eco, em voz evocadora, o repetiu também: "Lenoral"
Depois. silêncio e nada mais.
Diversa coisa não dizia. ali pousada, a ave sombria.
com a alma inteira a se espelhar naquelas sílabas fatais.
Com a alma em febre, eu novamente entrei no quarto e, de repente, Murmuro. então. vendo-aserena e sem mover uma só pena,
mais forte, o ruído recomeça e repercute nos vitrais. enquanto a mágoa me envenena: "Amigos... sempre vão-seembora.
"E na janela"-- penso então. -- "Por que agitar-me de aflição? Como a esperança, ao vir a aurora, ELE também há de ir-se embora."
Conserva a calma. coraçãol É na janela. onde, agourento. EIdisseo Como:"Nuncamais."
o vento sopra. E só do vento esse rumor surdo e agourento.
E o vento só e nada mais.
Vara o silêncio, com tal nexo. essa resposta que, perplexo,
julgo: "É só isso o que ele dizeduas palavras sempre iguais.
Abro a janela e eis que, em tumulto, a esvoaçar, penetra um vulto: Soube-asde um dono a quem tortura uma implacável desventura
-- é um Corvo hierático e soberbo, egresso de eras ancestrais. e a quem, repleto de amargura, apenas resta um ritornelo
Como um fidalgo passa, augusto e, sem notar sequer meu susto. de seu cantarádo morto ando, um epitáfio: -- o ritornelo
adeja e pousa sobre o busto -- uma escultura de Minewa. de "Nunca,nunca.nuncamais"
bem sobre a portal e se consema ali, no busto de Mínerva.
empoleirado
e nadamais. Como ainda o Corvo me mudasse em um sorriso a triste face.
gereientão numa poltrona, em frente ao busto, à ave, aos umbrais
Ao ver da ave austera e escura a soleníssima figura, e, mergulhado no coxim. pus-me a inquirir (pois, para mim.
desperta em mim um leve riso, a distrair-me de meus ais. visava a algum secreto fiml que pretendia o antigo Corvo.
"Sem crista embora. ó Corvo antigo e singular"-- então Ihe digo com que intenções. horrendo, torvo, esse ominoso e antigo Corvo
"não tens pavor. Fala comigo, alma da noite, espectro torvo. grasnava
sempre:"Nuncamais."
qual é teu nome, ó nobre Corvo, o nome teu no inferno towol"
E o Corvodisse:"Nuncamais." Sentindo da ave. incandescente,o olhar queimar-me fixamente.
eu me abismava, absorto e mudo, em deduções conjeturais.
Maravilhou-me que falasse uma ave rude dessa classe. Cismava, a fronte reclinada. a descansar, sobre a almofada
misteriosa esfinge negra. a retorquir-me em termos tais; dessa poltrona aveludadaem que a luz cai suavemente.
in U t;ORVO E SUAS TRADUÇões
MILTON AMADO 117
dessa poltrona em que ELA,ausente, à luz que cai suavemente. E lá ficoul Hirto, sombrio, ainda hoje o vejo, horas a fio,
lá nãorepousa.ahl nuncamais...
sobre o alvo busto de Minerva, inerte, sempre em meus umbrais.
No seu olhar Medonho e enorme o anjo do mal, em sonhos, dorme.
0 ar pareceu-meentão mais denso e perfumado. qual se incenso e a luz da lâmpada, disforme. atira ao chão a sua sombra.
ali descessema espanir turíbulários celestiais.
lxlela,que ondula sobre a alfombra. está minha almas e, presa à sombra
"Míseros,exclamo. Enfim teu Deus te dá, mandando os anjos seus. não há de erguer-se,ail nunca maisl
esquecimento, lá dos céus, para as saudades de Lenora.
So.rveo nepentes.Sorveo, agoral Esquece,olvida essa Lenoral"
E o Como disse: "Nunca mais."