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UNIVERSIDADE DE BRASÍLIA

INSTITUTO DE CIÊNCIAS HUMANAS


DEPARTAMENTO DE FILOSOFIA

PAULO MAURICIO GOULART VALENTE

Ensaio Filosofia Marxista


1º Semestre 2023

Brasília – DF
2023
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UNIVERSIDADE DE BRASÍLIA
INSTITUTO DE CIÊNCIAS HUMANAS
DEPARTAMENTO DE FILOSOFIA

ENSAIO FILOSOFIA MARXISTA


A ESPERANÇA DESESPERADA

Autor: Paulo Mauricio Goulart Valente

Professor: Gilberto Tedeia

Brasília

2023

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Sumário

1 – Introdução e Apresentação 4
2 – Ensaio: A Esperança Desesperada 7
3 – Referências Bibliográficas 19

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Resumo: O presente texto tem por objetivo apresentar as percepções e
sentimentos do autor, no que se refere o contexto social e político
contemporâneo a partir de uma reflexão após a conclusão da disciplina
Filosofia Marxista ministrada pelo professor Gilberto Tedeia no 1º semestre de
2023, na Universidade de Brasília no curso de graduação em Filosofia.

Palavras-Chave: Marxismo, Lutas de Classes, Desesperança, Esperança,


Hedonismo, Transformação.

1 – Introdução e Apresentação

Durante as aulas e argumentações sempre contundentes e precisas do


estimado professor, foram despertadas várias reflexões individuais e com os
colegas de curso. Mas aquele que mais se destaca sem dúvidas, para esse
autor, é a realidade social na qual estamos inseridos no contexto brasileiro e
global. Diante das mudanças nos últimos anos ao redor do mundo, com o
desenvolvimento de tecnologias, conturbações políticas e sociais, as
transformações do mercado de trabalho e tantos outros fatores que impactaram
nossas vidas algo permanece: A insatisfação com a realidade material e social.
Insatisfação que não se resume as dificuldades materiais e barreiras sociais
que inviabilizam a realização pessoal e familiar. Mas que além disse parecem
determinar caminhos e escolhas, possibilidades e a própria felicidade.

O que parecia mais presente nos diálogos pós aulas e conversas por
mensagem, era a percepção de que mesmo após anos da elaboração dos
estudos sociais realizados por Marx e Engels e continuado por diversos
autores, o esclarecimento e a saída do conformismo e quebra da alienação não
se realizaram. E para piorar, o entendimento nessas discussões é de que ele
está distante de nossos tempos. A percepção é de que fomos engolidos pelo
tempo e condicionados a aceitar cada vez mais as condições impostas, como
bois caminhando para o abate, tensos, fatigados, mas dóceis.

Essa sensação e percepção vem acompanhado de um desesepero, mas


não de desesperança. Vale aqui ressaltar as diferenças entre as duas palavras.
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A desesperança se refere a falta ou perda de esperança, descrença na
mudança (DESESPERANÇA. In: Oxford Languages. Disponível em:
https://languages.oup.com/google-dictionary-pt/. Acesso em: 23/07/2023. Já o
desespero, se refere ao estado de consciência que julga uma situação sem
saída, estado de desânimo, de sofrimento a que se sujeita uma pessoa devido
a um excesso de dificuldades e de aflições; aflição, angústia, exasperação
(DESESPERO. In: Oxford Languages. Disponível em:
https://languages.oup.com/google-dictionary-pt/. Acesso em: 23/07/2023.).
Essa diferença que para o senso comum pode parecer sutil ou até mesmo
insignificante, faz todo sentido na forma como o presente ensaio aborda o
tema. Não se trata de uma visão puramente pessimista ou rancorosa com os
nossos tempos, mas sim uma tentativa de trazer a reflexão do contexto que
aflorou tal sentimento e percepção para, a partir daí, encontrar uma fresta de
luz em tempos de escuridão na realidade de inação na luta de classes e de
transformação real para uma sociedade justa e feliz.

O desespero percebido surge diante de um contexto em que as


conquistas sociais são ínfimas e pífias, não gerando resultados de
transformação social que possibilitem a realização e viabilização de planos e
desejos individuais e coletivos que façam da vida algo além de acordar, “bater
ponto” no trabalho, fazer uma refeição mediana, pagar as contas com
dificuldades e se adaptar as condições em que se seja útil para a máquina
social de produção e crescimento do PIB nacional. Isso não tem sido suficiente
para uma satisfação e realização de uma vida com sentido e significado nos
tempos em que a humanidade se julga tão desenvolvida.

Mesmo com dados que apresentam um crescimento da economia,


melhora na qualidade vida da população, queda na mortalidade infantil e
aumento da expectativa de vida, a percepção é de que tais mudanças não
geraram impacto significativo diante da realidade e das possibilidades que o
mundo material apresenta e vivenciamos (Relatório ISM – Indicadores Sociais
Mínimos. In: https://www.ibge.gov.br/estatisticas/sociais/populacao/17374-
indicadores-sociais-minimos.html. Acesso em 20/07/2023.).

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O contato com a filosofia marxiana durante o último semestre possibilitou
enriquecer o diálogo e sistematizar a análise desse contexto em que estamos
inseridos. Transformando o incômodo e desalento em uma visão sistematizada
e mais precisa dos vetores que causam e mantém o contexto do antagonismo
social entre as classes e as limitações materiais e sociais que nos cerceiam os
direitos de dignidade mínima. Mas não foi por si só, o suficiente para alimentar
uma esperança ou criar um alento para uma mudança presente nos tempos em
que vivemos. Mesmo que isso não tenha sido uma promessa ou compromisso
firmado, o contato com a filosofia de Marx traz um contexto de entendimento e
uma visão das possibilidades de transformação que tanto se espera e deseja.

Esse esclarecimento também carrega uma visão do atraso e da força


que os controles sociais e econômicos exercem sobre todos. Na forma como
toda ação de transformação é sufocada e pressionada a fim de inviabilizar a
tão desejada mudança. Permite também, entender que todo movimento de
consciência de classes e conhecimento da dinâmica do Capital são suprimidos
pela alienação e realização da sobrevivência material impostas pelas estruturas
de poder e política que se adaptam com rapidez as novas formas de
dominação e controle social. Conhecer essa lógica e forma em que estamos
inseridos, permite uma reflexão mais assertiva e uma visão realista do que
realmente nos leva ao desespero citado anteriormente.

Isso por si, é de grande valia. Pois, deixa claro quais são as causas do
descontentamento e insatisfação que carregamos e respiramos no dia a dia.
Permite entender que, diferente do que certas crenças e imposições sociais
apregoam, as causas e razões de tal frustração não estão no indivíduo ou
apenas nas “escolhas” que fazemos. Essas frustrações são frutos das próprias
condições impostas, herdadas de um sistema que transcende gerações e que
inviabilizam realizar algo fora do que é permitido e ou colocado como padrão
para a continuidade da “máquina” que mantém essa estrutura grotesca de
poder e supressão social. Velhas mentiras com novas roupagens são
disseminadas e aceitas pelo senso comum. Mas, é impossível que sejam
aceitas mansamente após o contato com o pensamento Marxiano apresentado
no último semestre.

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2 – A Esperança Desesperada

A juventude do século XXI enfrenta inúmeros desafios e incertezas


impostas pelo contexto gerado nas últimas décadas pela dinâmica social e
econômica determinadas pelo capitalismo no mundo todo. O que pode levar a
uma sensação de desespero em relação ao futuro. Diversos fatores têm
contribuído para esse sentimento, e é importante pontuá-los para entendermos
melhor essa realidade:

 Incerteza política: O cenário político mundial tem sido marcado por


polarizações, crises e mudanças inesperadas, o que pode gerar
descrença nas instituições políticas e nas perspectivas de mudanças
positivas;
 Crises econômicas recorrentes: A instabilidade econômica global, com
crises financeiras e recessões frequentes, torna difícil para os jovens
vislumbrarem uma trajetória de sucesso e prosperidade financeira;
 Desemprego e subemprego: O mercado de trabalho tornou-se altamente
competitivo, deixando muitos jovens desempregados ou trabalhando em
empregos precários que não oferecem perspectivas de crescimento
profissional;
 Desigualdade social: A desigualdade de oportunidades e a concentração
de riqueza podem levar a uma sensação de injustiça e desesperança
para os jovens menos privilegiados;
 Mudanças climáticas: A crise climática é uma preocupação crescente
entre os jovens, que temem os impactos devastadores que podem
enfrentar ao longo de suas vidas;
 Acesso limitado à moradia: Os altos preços dos imóveis e o aumento do
custo de vida em algumas áreas urbanas dificultam que os jovens
tenham acesso à moradia própria;
 Violência e insegurança: A violência urbana e a insegurança em
algumas áreas podem gerar medo e desesperança entre os jovens;

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 Pressão acadêmica e profissional: A competição acirrada por vagas nas
melhores instituições acadêmicas e empregos de alto prestígio pode
gerar ansiedade e estresse entre os jovens;
 Endividamento estudantil: O alto custo da educação superior tem levado
muitos jovens a acumularem dívidas substanciais, o que pode restringir
suas oportunidades futuras;
 Dificuldades de mobilidade social: A mobilidade social tem se tornado
mais difícil, com uma distribuição desigual de oportunidades e recursos;
 Falta de perspectiva para as gerações futuras: O medo do agravamento
dos problemas globais, como a crise climática e a escassez de recursos,
pode criar um sentimento de impotência em relação ao futuro das
próximas gerações;
 Alienação política: A falta de representatividade e a sensação de que as
vozes dos jovens não são ouvidas podem levar à alienação política e à
descrença nas instituições governamentais;
 Perda de valores culturais: A globalização e o avanço tecnológico
podem levar a uma sensação de perda de valores e tradições culturais,
gerando uma busca por identidade e pertencimento;
 Sobrecarga de informação: O acesso constante a informações pode ser
opressivo, tornando difícil para os jovens discernirem a verdade em meio
a um mar de desinformação e fake news;
 A crise de propósito: A busca por um propósito significativo na vida pode
ser um desafio, especialmente em um mundo que valoriza o sucesso
material e a realização imediata;
 Pressão social e padrões de perfeição: As redes sociais e a cultura do
"comparecimento" podem contribuir para a ansiedade e a sensação de
inadequação entre os jovens, que muitas vezes se sentem pressionados
a corresponder a padrões irrealistas de perfeição;
 Aumento das doenças mentais: A saúde mental tem se tornado uma
questão urgente entre os jovens, com um aumento significativo nos
casos de ansiedade, depressão e outras doenças mentais;

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 Dificuldades nas relações sociais: As mudanças na forma de
comunicação, com o uso predominante de tecnologias digitais, podem
dificultar a construção de conexões sociais significativas;
 Medo do futuro incerto: A incerteza sobre o futuro político, econômico e
social pode gerar ansiedade e desesperança sobre o que está por vir;
 Falta de perspectiva de mudança: A sensação de que os problemas
sociais e globais são grandes demais para serem resolvidos pode levar
à falta de esperança de que as coisas possam mudar para melhor.

Essa lista de fatores, que são de caráter coletivo e individual, percebidos


no convívio com colegas universitários, amigos, no ambiente de trabalho e no
círculo familiar, são corroborados por uma pesquisa do DataFolha realizada no
fim do ano de 2022 (Pesquisa Nacional. In:
https://media.folha.uol.com.br/datafolha/2023/01/03/23923q4qfjv0qwfj90q23-
avaliacao-do-brasil-e-orgulho.pdf. Acesso em 20/07/2023.). A pesquisa
demonstra que entre os jovens entre 16 e 29 anos, há uma sensação de
descontentamento e desesperança com o presente e futuro, desenhado de
maneira sutil e que podemos descrever como um apagamento do sonho de
futuro. Essa percepção descreve sintomas de um contexto social em que não
se tem as garantias de que se possa sonhar com uma vida equilibrada entre a
superação das necessidades materiais e a realização das perspectivas de
desenvolvimento intelectual e afetivo. Justamente por não ter no presente,
opções que permitam a realização e construção das bases de garantia mínima
do bem-estar, tais como, moradia, acesso à estudo e cultura, lazer e outros
fatores que contribuem para uma vida plena e de qualidade adequada aos
anseios da população jovem.

E diante de um cenário de decadência das perspectivas, assistimos os


ditos, “movimentos sociais” se embrenharem em lutas que não visam a
resolução das causas dos problemas. Percebemos frentes de luta
disseminadas por causas isoladas, que visam resultados tímidos de
transformação social e enfraquecidas por resistências focadas nos valores
morais de uma sociedade conservadora e sem a devida consciência de classe.
Esses fatores inviabilizam uma organização centrada nas transformações

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sistematizadas e que ataquem as verdadeiras causas dos problemas, tirando o
foco dos problemas reais que resistem há anos e inviabilizam qualquer
transformação mais profunda na sociedade.

Os movimentos sociais têm se concentrado nas próprias lutas, com foco


nos seus problemas íntimos, não se organizando para uma transformação
sistêmica e colhendo resultados ínfimos que não tem impacto duradouro. Os
vários movimentos de luta, como os das causas feministas, ou LGBTQIA+,
moradia urbana, reforma agrária, movimento estudantil e tantos outros, tem se
concentrado em problemas particulares, levantado suas bandeiras, se dizendo
muitas vezes apolíticos. O que não faz nenhum sentido, pois, as próprias
causas, são causas políticas a priori. Não há luta por direito que seja fora do
âmbito político, não há transformação social apolítica. E tal comportamento
atende principalmente aos interesses das classes dominantes, que
predominantemente dominam as discussões políticas e estruturas de poder,
seja este poder político e econômico. Mantendo sobre sua guarda, o controle
da pauta de discussões e a forma como essas são resolvidas. Sempre
garantindo seus interesses. Ou seja, temos um cenário de lutas enfraquecidos
pelos próprios movimentos ditos, “sociais”. Estes movimentos adotam um
comportamento focado nas próprias bandeiras em detrimento de um contexto
de real transformação. Se afastam do debate e do confronto real e garantem
sua influência dentro do próprio contexto, se afastando da organização ampla e
enfraquecendo as bases de luta, com suas massas fragmentadas e
organizadas em nichos. Tornando-se presas fáceis para os detentores do
poder que se organizam e mantêm o controle através de poucas migalhas
distribuídas que não surtem efeito a longo prazo para a solução dos reais
problemas que afetam as diversas categorias e são a origem de todas as
mazelas sociais de que todos compartilham.

O que muitos chamam de universalidade de pautas na verdade parecem


ser um amontoado de grupos atordoados e perdidos diante de um cenário de
conquistas que geram resultados inócuos no que se refere a transformação
social. Pelo simples fato de que essas poucas conquistas não têm a
capacidade de perdurar no tempo, e invariavelmente são superadas por
imposições do poder do capital e a consequente retirada de direitos, logo que
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uma nova estrutura mais reacionária e reformista chega ao poder. Vide o que
ocorreu particularmente no Brasil na década passada, onde um governo
composto por representantes desavergonhados da elite econômica do país,
implantou inúmeras medidas de contenção dos pequenos avanços sociais
implementados na primeira década dos anos 2000. Conseguindo, assim,
realizar um retrocesso sem enfrentar nenhuma resistência consistente das
bases e grupos de lutas sociais em um curto período de tempo.

A mensagem que fica para a juventude que aflora nesse cenário é de


que a luta é inútil, não gera resultados e não há uma organização ou plano a se
seguir. Cria-se um cenário de desconfiança ampla, tanto ante ao opressor,
quanto daqueles que se dizem defensores dos interesses populares. Aqui sim,
vemos o efeito do comportamento apolítico alertado anteriormente. Criando um
sentimento de repulsa ampla, contra qualquer movimento ou organização
política, generalizando a antipatia e descrença nas intenções dos movimentos
de luta. Agravado é claro, pelo caráter identitário que cada grupo carrega
quando estes estão focados em suas causas próprias e lutas particulares. Não
se faz aqui uma crítica rasa às causas ou identidade dos grupos de luta. Esses,
têm sim seu caráter legítimo e urgente. Mas é necessário que haja uma
convergência de forças para fortalecer a capacidade de reivindicar suas causas
particulares dentro de um contexto amplo e geral de bem-estar social. E o
primeiro passo é rever as táticas empregadas em suas organizações, lutas e
ações.

Tática essa, que deve buscar sempre o princípio da unidade do


interesse das classes exploradas e expostas ao massacre social. Unindo
forças, seja em número, seja no próprio discurso. Os problemas enfrentados
têm seu caráter particular de cada grupo, mas tem mais em comum do que é
dito nos discursos difusos e isolados. Pois, os opressores são sempre os
mesmos, os atores da barbárie social, são os mesmos. Mas a resistência é
difusa e confusa, não encontrando respaldo popular, apenas dentro dos
próprios grupos. E em alguns casos, até rivalizando entre si.

Nos poucos momentos de mobilização minimamente organizada entre


os diversos movimentos sociais, a causa não era de real interesse de

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transformação. Mas sim, um temor por algo ainda pior, como vimos na
organização da tal “frente ampla” nas eleições de 2022. Frente ampla essa,
que não apresentou nenhuma proposta de transformação social significativa,
verdadeira e real. Apenas a manutenção da mínima civilidade e do Estado
vigente com toda a sua estrutura de manutenção do sistema opressor.

Não é de se surpreender que diante desse cenário não se enxergue


perspectivas de mudanças para o futuro para a juventude. Essa categoria de
cidadãos não consegue se identificar e nem crer que encontra representantes
que possam guiá-los para uma transformação de fato, que gere resultados no
presente ou no futuro. Tornando a desesperança um fato invariável de sua
realidade. E nesse contexto, apoiado pelas novas estruturas de alienação,
vemos um crescente sentimento de realização cada vez mais individualista.
Onde se busca a satisfação dos desejos íntimos em primeiro plano, em
detrimento das transformações sociais que os possibilitariam ser realizados de
forma consistente e duradoura. Chegamos a era do hedonismo exacerbado de
toda uma geração que busca as realizações imediatas, desprovidas de sentido
real e transformador da pessoa e sociedade. Onde correlacionam a
oportunidade de imposição de suas identidades e particularidades aos modelos
incorporados e apropriados pelas redes de influência global.

Essa transição se apresenta e pode ser observada, quando se tem em


larga escala a valorização cada vez mais preponderante da identidade
individual, com a máxima corrente do “seja você mesmo”, “se aceite como você
é”, mas que não passa de um impulso para a alocação em massa de indivíduos
em “caixinhas” e modelos controlados e especificados por aqueles que de fato
determinam os padrões de consumo e controle das massas. O que é
propagado como uma fonte de oportunidades de liberdades individuais, não
passa de uma falácia que controla cada um dentro de seu papel, induzindo
comportamentos e padrões culturais cada vez mais planificados mundo à fora.
O que se esperava no início dos anos 2000 com a evolução das
telecomunicações e trocas culturais através da internet para as massas, se
transformou, ou se revelou, numa forma de controle cada vez maior dos
detentores do capital, na forma como nos relacionamos, nos comunicamos,

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consumimos e produzimos. A tal liberdade aventada não passava de uma
grande armadilha para aprisionar à todos.

Essa liberdade que é propagada, principalmente pelas grandes


organizações e Estados que controlam as redes sociais na internet e demais
meios de comunicação de massa, proporciona esse caráter hedonista no
comportamento da juventude. Esse comportamento hedonista, que enfatiza a
busca pelo prazer e satisfação pessoal como objetivo central da vida, tem se
tornado uma característica marcante no século XXI. Vários fatores contribuíram
para o aumento desse comportamento, moldando a cultura contemporânea de
diversas formas. Podemos citar alguns desses fatores, tais como:

 Estresse e pressão no trabalho: O estresse e a pressão no ambiente de


trabalho podem levar as pessoas a buscarem o alívio imediato do prazer
através de comportamentos hedonistas;
 Avanços tecnológicos: A facilidade de acesso à tecnologia e aos
dispositivos móveis tornou possível a satisfação instantânea de desejos
e necessidades, alimentando o comportamento hedonista;
 Excesso de informação: O acesso constante a informações e estímulos
pode levar as pessoas a buscarem prazeres rápidos e intensos para
lidar com a sobrecarga de informações;
 Redes sociais: As redes sociais criam uma cultura de comparação e
exposição constante, levando as pessoas a buscarem a aprovação e
validação através dos likes e comentários, o que pode gerar uma busca
por experiências hedonistas para serem compartilhadas;
 Publicidade: A publicidade incessante promove a ideia de que a
felicidade está associada a produtos e serviços, incentivando a busca
constante pelo prazer material;
 Influência da cultura de celebridades: A cultura de celebridades e
influenciadores digitais pode inspirar a busca por estilos de vida
luxuosos e hedonistas, reforçando a ideia de que o prazer e a felicidade
estão associados ao sucesso material;

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 Padrões de beleza e aparência: A busca por padrões de beleza e
aparência idealizados pode levar as pessoas a buscarem prazer através
de procedimentos estéticos e outras práticas hedonistas;
 Pressão social: A pressão social para se encaixar em determinados
padrões de comportamento e estilo de vida pode levar as pessoas a
adotarem comportamentos hedonistas para se sentirem aceitas e
integradas;
 Relações superficiais: A prevalência de relações superficiais e
descartáveis pode levar as pessoas a buscarem prazeres efêmeros,
uma vez que não veem valor nas conexões mais profundas e
significativas;
 Cultura do consumo: O consumismo desenfreado incentiva as pessoas a
buscarem constantemente novas experiências e bens materiais para
alcançarem o prazer imediato;
 Cultura do entretenimento: A cultura do entretenimento, com filmes,
séries, jogos e outras formas de lazer disponíveis a qualquer hora, pode
incentivar a busca pelo prazer imediato em detrimento de outras
atividades mais construtivas;
 Instantaneidade: A cultura da instantaneidade no século XXI, onde tudo
está ao alcance das mãos em questão de segundos, promove a busca
por prazeres rápidos e imediatos;
 Fuga da realidade: O hedonismo pode ser uma forma de escapismo,
onde as pessoas buscam prazer para fugir dos desafios e problemas da
vida cotidiana;
 Individualismo: A ênfase no individualismo leva as pessoas a priorizarem
suas próprias necessidades e desejos, muitas vezes em detrimento do
bem-estar coletivo;
 Crise de valores: O enfraquecimento de valores éticos e morais pode
levar as pessoas a priorizarem a busca pelo prazer imediato, sem
considerar as consequências a longo prazo;
 Vazio existencial: A busca constante pelo prazer pode criar um
sentimento de vazio existencial, uma vez que a felicidade e a realização
pessoal não estão diretamente ligadas ao acúmulo de prazeres;
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 Fuga do tédio: O hedonismo pode ser uma forma de escapar do tédio e
da rotina monótona do dia a dia, buscando experiências emocionantes e
prazerosas para preencher o vazio existencial;
 Ansiedade e depressão: O aumento dos casos de ansiedade e
depressão pode levar as pessoas a buscarem o prazer como uma forma
de aliviar o sofrimento emocional;
 Experiências vazias: O hedonismo pode levar as pessoas a buscarem
experiências vazias e superficiais, sem propósito ou significado, apenas
para satisfazer desejos momentâneos;
 Medo da morte: O hedonismo pode ser uma resposta ao medo da morte,
onde as pessoas buscam aproveitar o máximo possível a vida atual,
sem se preocupar com as consequências futuras.

Temos assim, a formação de um cenário catastrófico onde um problema


leva à outro. A falta de perspectiva que gera uma busca cada vez mais
exacerbada dos desejos individuais e desencadeia esse hedonismo
generalizado. Um contexto que explica o sentimento de desespero do início
desse texto e que parece desanimador e pessimista. Contudo, ainda há
esperança. Não pela transformação por meio das forças que aí estão, mas por
uma que ainda está por vir e que deve ser fomentada no agora. Transformação
essa, que virá pela força dos que hoje estão desesperados, mas que ainda
acreditam que podem e devem trazer um feixe de luz para esclarecer os
nossos problemas sociais e suas causas. Esse esclarecimento deve se dar por
meio das mesmas formas e armas pelas quais somos afligidos e atacados.

Nas redes sociais, o aprendizado e propagação do socialismo e as lutas de


classes têm encontrado um espaço significativo para a disseminação de ideias
e debates acalorados. O ambiente digital proporciona uma base para que os
defensores dos ideais socialistas expressem suas opiniões, compartilhem
informações e se organizem. Além disso, a internet também amplia a
visibilidade das lutas de classes e das questões sociais, tornando-as mais
acessíveis ao público em geral.

Por um lado, as redes sociais têm possibilitado a conexão de pessoas de


diferentes partes do mundo que compartilham ideais socialistas, criando uma

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comunidade virtual de ativistas e intelectuais. Isso fortalece a disseminação de
teorias e análises críticas sobre as desigualdades econômicas e sociais, bem
como sobre a exploração capitalista.

Por outro lado, as redes sociais também se tornaram um espaço para


debates acalorados e polarizados sobre o socialismo e as lutas de classes. As
discussões muitas vezes se tornam emocionais e levam a conflitos entre os
defensores do socialismo e os seus opositores, incluindo defensores do
liberalismo e do capitalismo. A desinformação e a disseminação de fake news
também tem distorcido esses debates e dificultado a compreensão mais
precisa das ideias socialistas e das questões relacionadas às lutas de classes.

As redes sociais também têm sido usadas como uma ferramenta para
organizar protestos e manifestações em prol das lutas de classes e causas
socialistas. Movimentos sociais e grupos ativistas utilizam plataformas digitais
para mobilizar apoiadores, compartilhar informações e coordenar ações em
busca de mudanças sociais e econômicas.

Por outro lado, algumas redes sociais podem censurar ou reprimir


conteúdos relacionados ao socialismo e às lutas de classes, alegando violação
de diretrizes ou práticas de combate à disseminação de informações "falsas"
ou prejudiciais. Isso pode gerar debates sobre liberdade de expressão e
acesso igualitário à informação.

Em resumo, as redes sociais têm sido um espaço tanto para o


fortalecimento do comunismo e do socialismo, quanto para o embate e a
polarização de ideias. É fundamental que as discussões e os debates sejam
conduzidos de forma embasada em informações precisas, a fim de promover
uma compreensão mais profunda e construtiva dessas questões sociais e
políticas. Ou seja, utilizar das mesmas táticas das redes que se fazem
dominantes para trazer o debate das ideias a partir de uma ótica socialista com
grande alcance das massas e na linguagem das massas.

Mas isso por si só não basta. Não há revolução no sofá. É preciso fortalecer
o debate em todos os campos e espaços. É preciso retomar o caráter
humanista do discurso socialista já que, por anos o mesmo vem sendo atacado

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e difamado de forma sistemática e contundente. Principalmente com a
disseminação de discursos e retóricas vazias que tornam o debate raso e vazio
de sentido e verdade.

Para que isso ocorra, se faz necessário traduzir o que é discutido nas
universidades e grupos socialistas numa linguagem menos tecnicista e
acadêmica. É preciso transpor os muros que isolam os pensadores socialistas
das massas e transformar a retórica em prática. Mobilizar por meio da
persuasão e da prática. Reformar as bases de luta e as estruturas das classes
exploradas para um movimento mais dinâmico e assertivo. Já que toda a
estrutura do capital tem demonstrado uma capacidade de se adaptar e
apropriar dos discursos e pautas progressistas, cabe aos socialistas adotarem
a mesma prática. Desconstruindo as falácias do capital e de suas estruturas
arraigadas dentro o Estado, por meio da conscientização das massas.
Demonstrando para essas não só a face do opressor, mas as formas e táticas
que esse adota para concentrar o poder e manter sua dominação.

Transformar o socialismo acadêmico em socialismo prático requer uma


abordagem cuidadosa, inteligente e até mesmo, pragmática. Algumas medidas
importantes podem ser tomadas, como a participação mais efetiva nas
comunidades, onde os acadêmicos socialistas devem se engajar ativamente
em suas comunidades, compreendendo os problemas cotidianos enfrentados
pelas pessoas e propondo soluções concretas. Efetivar a aproximação com
movimentos sociais para estabelecer parcerias com movimentos sociais e
sindicatos, unindo teoria e ação. Apoiar a criação de cooperativas que
coloquem em prática os princípios de propriedade coletiva e tomada de
decisões com a participação da comunidade. Promover a educação popular
levando o conhecimento e as ideias socialistas para além do ambiente
acadêmico, para conscientizar a população sobre as questões sociais e
econômicas. Lutar e promover políticas públicas que viabilizem a igualdade
social e econômica, como a garantia de saúde e educação de qualidade para
todos. Construir uma solidariedade internacional unindo-se a movimentos e
organizações internacionais em defesa da justiça social e dos direitos
humanos. Ter atenção às necessidades locais e adaptar as ideias socialistas
às necessidades específicas de cada comunidade, reconhecendo que as
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soluções não são universais. Promover o uso responsável das redes sociais e
utilizá-las como ferramenta para disseminar informações sobre o socialismo de
forma efetiva e embasada, evitando a propagação de desinformação. Dialogar
e buscar pontos de convergência com outros grupos políticos e sociais no
espectro progressista, estabelecendo diálogos construtivos em busca de
soluções comuns.

Isso posto, é possível retomar o título desse ensaio e dizer que sim, temos
uma Esperança Desesperada. Já estamos nos tempos da barbárie, já estamos
no limite pós limite. O que se faz necessário e urgente, é utilizar o sentimento
de frustração e desânimo para se criar um sentimento de revolta. Uma revolta
onde os atores devem ser os que mais se sentem desamparados, sem
perspectiva, os mesmos jovens que não acreditam no futuro. Entregar em suas
mãos o poder de transformar não pelo individualismo, mas pelo senso de
coletividade que foi abandonado e está preso nas grades impostas pelo
opressor, o capital e sues algozes. Deixar claro que se não há nada a perder,
tem-se tudo para ganhar. Mas que, para isso, se faz necessário olhar para
frente, diferente da forma como se olhou até ontem. Desenvolver uma visão
coletiva e cooperativa da própria luta. E a partir das conquistas coletivas,
usufruir e realizar as individualidades.

Há esperança enquanto houver luta. Mas é urgente redefinir a luta,


redesenhar as formas como nos vemos de maneira coletiva e individual. Mudar
a concepção que temos tanto das nossas agruras como de nossas conquistas.
Reforçar a capacidade que temos de transformar e mudar a realidade, desde
que aceitemos que somos um todo. Buscar a esperança ante tantos motivos
que temos para abandoná-la. Não mais se conformar com desconforto. Refletir
e agir. Revoltar-se e mais ainda, rebelar-se.

Jogados no mundo Chego a parar de querer, mas nunca de fazer

Ao amanhecer sinto o impulso de viver Faço por fazer, mas não quero mais querer

Mesmo não sabendo o porquê ou pra quê Esse mundo, cheio de vazios

Sigo, dou passos em direção a lugar nenhum Perdido e jogado

Vivendo numa rotina vazia, cheia de coisa nenhuma Jogando o jogo que me foi dado

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Como que jogando dados Aquilo que não me tomaram

Numa aleatoriedade certeira Aquilo que não me tomarão

Onde a dor é certa A certeza de que um dia

A justiça é cega Sob o olhar dos céus

E a morte o fim Veremos o mundo como deve ser

Mas sigo, teimoso que sou Sendo eu, nós e todos

Não há o que entregar O mundo onde o homem

Pois tudo me foi tirado Não é mais do que é

Procuro na esperança Apenas homem.

Minha única posso Paulo MG Valente

3 – Referências Bibliográficas

Para elaboração desse ensaio, foram realizadas leituras dos seguintes textos:

GALLO, Sílvio. CARVALHO, Alexandre Filordi de. Lutas Democráticas Contra


o URSTAAT: O que pode fazer a Educação?. ETD- Educação Temática
Digital Campinas, SP v.21 n.3 p.549-567 jul./set. 2019. Acesso em 20/07/2023
https://periodicos.sbu.unicamp.br/ojs/index.php/etd/article/view/8654644

SILVA, Segislane Moésia Pereira da. MACIEL, Valnise Verás. FRANÇA,


Marlene Helena de Oliveira. Conservadorismo como instrumento capitalista
em tempos de barbárie.
https://www.scielo.br/j/rk/a/85M8JfffpDjxny99VGGJrLc/?lang=pt# Acesso em
20/07/2023 https://doi.org/10.1590/1982-02592020v23n2p256.

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