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Direito da Concorrência

Luísa Verdelho Alves


mlalves@iscap.ipp.pt

Regras aplicáveis às empresas


(artigos 101.º- 106.º TFUE)
A proibição das coligações restritivas da concorrência
(artigo 101.º TFUE)

Sumário:
1. Noção de empresa
entidades que exercem uma actividade social
2. Formas de coligações
i) acordos
ii) práticas concertadas
iii) decisões de associações de empresas
3. Afectação do comércio entre os Estados-membros
4. Restrição da concorrência
5. Justificação do comportamento restritivo da concorrência ao abrigo do artigo
103.º, n.º 3, TFUE
6. Consequências da violação do artigo 101.º, n.º1, TFUE

As coligações restritivas da concorrência

Importa começar pela leitura do artigo 101.º TFUE


O preceito divide-se em três partes:
O n.º 1 enuncia a proibição das coligações restritivas da concorrência
O n.º 2 determina a nulidade dos acordos abrangidos por esta proibição
O n.º 3 prevê uma derrogação à proibição das coligações restritivas da
concorrência

Em relação ao Direito português, v. a Lei n.º 19/2012


A proibição das coligações restritivas da concorrência (artigo 101.º TFUE)

Diz o artigo 101.º, n.º 1, TFUE:

todas as decisões de associações de empresas e todas as práticas concertadas que sejam


susceptíveis de afectar o comércio entre os Estados-Membros e que tenham por objectivo ou
efeito impedir, restringir ou falsear a concorrência no mercado interno, designadamente as
que consistam em:

a) Fixar, de forma directa ou indirecta, os preços de compra ou de venda, ou quaisquer outras


condições de transacção;
b) Limitar ou controlar a produção, a distribuição, o desenvolvimento técnico ou os
investimentos;
c) Repartir os mercados ou as fontes de abastecimento;
d) Aplicar, relativamente a parceiros comerciais, condições desiguais no caso de prestações
equivalentes colocando-os, por esse facto, em desvantagem na concorrência;
e) Subordinar a celebração de contratos à aceitação, por parte dos outros contraentes, de
prestações suplementares que, pela sua natureza ou de acordo com os usos comerciais, não

Conceito de empresa

O Direito da UE é um sistema jurídico autónomo em relação aos sistemas


jurídicos nacionais. O conceito de empresa tem sido desenvolvido pela
prática decisória da Comissão e pela jurisprudência do Tribunal de Justiça.
É hoje dado como assente:
No contexto do direito da concorrência da União, o conceito de empresa
abrange qualquer entidade que exerça uma actividade económica,
independentemente do estatuto jurídico dessa entidade e do seu modo de
financiamento.
V. Acórdão do Tribunal (Sexta Secção) de 23 de Abril de 1991. Klaus Höfner e Fritz Elser contra Macrotron
GmbH. Processo C-41/90, par. 21; Acórdão do Tribunal de 19 de Fevereiro de 2002, Wouters, J. Processo C-
309/99; Acórdão do Tribunal (Sexta Secção) de 24 de Outubro de 2002, Aéroports de Paris contra Comissão das
Comunidades Europeias. Processo C-82/01 P, par. 75 e 79.

Constitui uma actividade económica qualquer actividade consistente na


oferta de bens ou serviços num determinado mercado.
V. Acórdão do Tribunal de 16 de Novembro de 1995, Fédération française des sociétés d'assurance, Société
Paternelle-Vie, Union des assurances de Paris-Vie e Caisse d'assurance et de prévoyance mutuelle des
agriculteurs contra Ministério da Agricultura e da Pesca. Processo C-244/94. ECLI:EU:C:1995:392, par. 21 e 22
Conceito de empresa

Vejam-se os seguintes exemplos retirados da jurisprudência do Tribunal de


Justiça. Cabem na noção de empresa, para efeito de aplicação das regras
da concorrência:

Sociedades; Associações; Cooperativas


Ordens profissionais
Empresas públicas, se não actuarem no exercício de poderes públicos
Empresas que fazem parte do mesmo grupo (por ex., sociedade-mãe e
uma sua filial) podem ser consideradas uma única empresa. Será assim se
actuarem como uma unidade económica. O que obriga a demonstrar que a
filial não teve um comportamento economicamente autónomo.

Conceito de empresa Entidades sem fins lucrativos

O simples facto de uma entidade não ter fins lucrativos não retira à
actividade que exerce a natureza de actividade económica, e não impede a
sua qualificação como empresa na acepção dos artigos 101.º TFUE e ss.

V. Acórdão do Tribunal de 16 de Novembro de 1995, Fédération française des sociétés


d'assurance, Société Paternelle-Vie, Union des assurances de Paris-Vie e Caisse d'assurance et
de prévoyance mutuelle des agriculteurs contra Ministério da Agricultura e da Pesca. Processo C-
244/94. ECLI:EU:C:1995:392, par. 21 e 22
Conceito de empresa Entidades que exercem uma
actividade de natureza puramente social

Todavia, no acórdão FENIN o Tribunal declarou o seguinte:

em grande quantidade, não para oferecer bens ou serviços no âmbito de


uma actividade económica, mas para o usar no âmbito de outra actividade,
por exemplo, uma actividade de natureza puramente social, essa
entidade não actua como uma empresa pela sua simples qualidade de

V. Acórdão do Tribunal de Primeira Instância (Primeira Secção Alargada) de 4 de Março de 2003. Federación
Nacional de Empresas de Instrumentación Científica, Médica, Técnica y Dental (FENIN) contra Comissão das
Comunidades Europeias. Processo T-319/99. ECLI:EU:T:2003:50, Par. 36 e 37

Esta orientação já foi reafirmada, por diversas vezes

Noção de empresa, para efeito de aplicação


do Direito da Concorrência português

Nos termos do artigo 3.º da Lei n.º 19/2012:

1 Considera -se empresa, para efeitos da presente lei,


qualquer entidade que exerça uma atividade económica que
consista na oferta de bens ou serviços num determinado
mercado, independentemente do seu estatuto jurídico e do
seu modo de financiamento.
2 Considera -se como uma única empresa o conjunto
de empresas que, embora juridicamente distintas, constituem
uma unidade económica ou mantêm entre si laços de
interdependência decorrentes, nomeadamente:
a) De uma participação maioritária no capital;
b) Da detenção de mais de metade dos votos atribuídos
pela detenção de participações sociais;
c) Da possibilidade de designar mais de metade dos
membros do órgão de administração ou de fiscalização;
d) Do poder de gerir os respetivos negócios.
Formas de coligações

As noções de acordos, decisões e práticas concertadas são conceitos


autónomos do Direito da União Europeia
Abrangem a coordenação do comportamento das empresas no mercado
com o objectivo de produzir uma restrição da concorrência
Acordos
Segundo jurisprudência assente do Tribunal de Justiça da UE:

Não é, portanto, necessário que exista um acordo formal.


Práticas concertadas
Será necessário demonstrar que o comportamento paralelo das empresas no mercado (por
exemplo, na fixação de preços) não encontra uma justificação económica plausível
Decisões de associações de empresas
Abrange: decisões de associações empresariais ou comerciais, associações não lucrativas,

Não é necessário que essas decisões sejam obrigatórias para os destinatários; basta que sejam
efectivamente seguidas. Cabe aqui, por exemplo, a recomendação, por parte de uma ordem
profissional, de um preço para a prestação de um determinado serviço

Afectação do comércio entre os Estados-membros

A verificação desta condição determina a aplicação do Direito da UE, e,


bem assim, a competência das autoridades administrativas (Comissão) e
jurisdicionais (Tribunal de Justiça) da UE
Segundo Jurisprudência assente:
Há afectação do comércio entre os EM quando o acordo permite antecipar

de troca entre os EM num sentido que possa prejudicar o objectivo da

V. acórdão LTM/MBU, processo 56/65


Não é necessário que as empresas actuem ou tenham a sua sede em mais
do que um Estado-membro.

restritivas que se estendem a todo o território de um EM têm por efeito,


pela sua própria natureza, consolidar uma compartimentação de mercados
a nível nacional, entravando assim a interpenetração económica permitida

V. Acórdão Bundeskartellamt c. Volkswagen, processo C-26/93


Afectação do comércio entre os Estados-membros

Pode haver afectação do comércio entre os EM mesmo se as empresas


tiverem a sua sede num país terceiro.
O que importa é a localização dos efeitos anti-concorrenciais no mercado
interno.
O isolamento do mercado interno preenche o requisito da afectação do
comércio entre os Estados-membros.

Afectação do comércio entre os Estados-membros

Para uma densificação do conceito, v. também:


A Comunicação da Comissão Orientações sobre o conceito de afectação
do comércio entre os Estados-Membros previsto nos artigos 81.° e 82.° do
Tratado (Texto relevante para efeitos do EEE)
https://eur-lex.europa.eu/legal-
content/PT/ALL/?uri=CELEX%3A52004XC0427%2806%29
Restrição da concorrência

O artigo 101.º, n.º 1, TFUE considera incompatíveis com o mercado interno, e


proibidos, todos os acordos entre empresas, todas as decisões de associações de
empresas e todas as práticas concertadas que sejam susceptíveis de afectar o
comércio entre os Estados-Membros e que tenham por objectivo ou efeito
impedir, restringir ou falsear a concorrência no mercado interno.

A restrição da Concorrência é um conceito económico.

Nessa análise, a Comissão e o Tribunal de Justiça recorrem, por vezes, a


uma ponderação dos efeitos positivos e negativos sobre a concorrência.

A análise deve incidir sobre todas as cláusulas do acordo; mas se a


restrição da concorrência resultar de uma cláusula acessória, isso não
implicará a nulidade de todo o acordo.

Ónus da Prova

Caberá à autoridade administrativa (Comissão ou autoridades nacionais de


defesa da concorrência), ou à parte que alegue em juízo ( por exemplo, em
apoio de um pedido indemnizatório, nos tribunais nacionais) uma violação
do n.º 1 do artigo 101.º (ou/e do artigo 102.º do TFUE), provar a referida
violação.
Derrogação à proibição dos acordos restritivos da concorrência
(artigo 101.º, n.º 3, TFUE)

Diz o artigo 101.º, n.º 3:

a qualquer acordo, ou categoria de acordos, entre empresas,


a qualquer decisão, ou categoria de decisões, de associações de empresas, e
a qualquer prática concertada, ou categoria de práticas concertadas,
que contribuam para melhorar a produção ou a distribuição dos produtos ou para promover o
progresso técnico ou económico, contanto que aos utilizadores se reserve uma parte
equitativa do lucro daí resultante, e que:
a) Não imponham às empresas em causa quaisquer restrições que não sejam indispensáveis à
consecução desses objectivos;
b) Nem dêem a essas empresas a possibilidade de eliminar a concorrência relativamente a uma

Derrogação à proibição dos acordos restritivos da concorrência


(artigo 101.º, n.º 3, TFUE)

Isenções individuais:

Os acordos, as decisões e as práticas concertadas referidos no n.º 1 do


artigo 101.º do Tratado que satisfaçam as condições previstas no n.º 3 do
mesmo artigo não são proibidos, não sendo necessária, para o efeito, uma
decisão prévia.
(Artigo 1.º, n.º 2, Regulamento 1/2003)

Ónus da prova
Incumbe à empresa ou associação de empresas que invoca o benefício do
disposto no n.º 3 do artigo 101.º do Tratado o ónus da prova do
preenchimento das condições nele previstas
(Artigo 2.º, Regulamento 1/2003)

V. Comunicação da Comissão Orientações relativas à aplicação do n.° 3 do artigo 81.° do Tratado


https://eur-lex.europa.eu/legal-content/PT/ALL/?uri=CELEX%3A52004XC0427%2807%29

.
Derrogação à proibição dos acordos restritivos da concorrência
(artigo 101.º, n.º 3, TFUE)

A Comissão aprovou regulamentos de isenção por categoria, segundo os


quais declara que o n.º 1 do artigo 101.º do Tratado não é aplicável a
categorias de acordos, decisões ou práticas concertadas.
Contudo, em casos determinados, quando os acordos, decisões ou práticas
concertadas aos quais se aplicam tais regulamentos tiverem efeitos
incompatíveis com o n.º 3 do artigo 101.º do Tratado, tanto a Comissão
como as autoridades responsáveis em matéria de concorrência dos
Estados-Membros podem retirar o benefício do regulamento de isenção por
categoria
(v. artigo 29.º Regulamento 1/2003).
Para uma panorâmica geral dos regulamentos de isenção por categorias,
vide:
https://ec.europa.eu/competition-policy/antitrust/legislation/block-exemption-
regulations_en

Consequências da violação do artigo 101.º, n.º1, TFUE

Nulidade dos acordos restritivos da concorrência (artigo 102.º, n.º 2, TFUE)


Obrigação de indemnização dos danos decorrentes da violação das regras
da concorrência
V. Diretiva 2014/104/UE do Parlamento Europeu e do Conselho, de 26 de novembro de 2014 , relativa a certas regras que regem as
ações de indemnização no âmbito do direito nacional por infração às disposições do direito da concorrência dos Estados-Membros e da
União Europeia Texto relevante para efeitos do EEE. JO L 349 de 5.12.2014, p. 1 19 https://eur-lex.europa.eu/legal-
content/PT/ALL/?uri=CELEX%3A32014L0104
Comunicação da Comissão Orientações destinadas aos tribunais nacionais sobre a forma de calcular a parte dos custos adicionais
repercutida nos adquirentes indiretos C/2019/4899. JO C 267 de 9.8.2019, p. 4 43
https://eur-lex.europa.eu/legal-content/PT/TXT/?uri=CELEX%3A52019XC0809%2801%29 https://eur-lex.europa.eu/legal-
content/PT/TXT/?uri=CELEX%3A52019XC0809%2801%29
Lei n.º 23/2018 de 5 de Junho, DR, n.º 107 de 5 de Junho de 2018 https://dre.pt/dre/detalhe/lei/23-2018-115456103

Submissão ao poder sancionatório da Comissão e das autoridades


nacionais responsáveis pela aplicação das regras da concorrência
V. Orientações para o cálculo das coimas aplicadas por força do n. o 2, alínea a), do artigo 23. o do Regulamento (CE) n. o 1/2003
https://eur-lex.europa.eu/legal-content/PT/ALL/?uri=CELEX%3A52006XC0901%2801%29
Comunicação da Comissão Relativa à imunidade em matéria de coimas e à redução do seu montante nos processos relativos a cartéis
https://eur-lex.europa.eu/legal-content/PT/TXT/?uri=CELEX%3A02006XC1208%2804%29-20150805
Linhas de orientação da Autoridade da Concorrência sobre as prioridades no exercício dos poderes sancionatórios
https://www.concorrencia.pt/sites/default/files/documentos/linhasorientacao/Linhas%20de%20Orientac%CC%A7a%CC%83o%20sobre%
20Prioridades%20no%20exerci%CC%81cio%20dos%20poderes%20sancionato%CC%81rios.pdf
Nota informativa da Autoridade da Concorrência sobre o Programa de Clemência https://www.concorrencia.pt/sites/default/files/imported-
media/DR_NOTA%2520INFORMATIVA_CLEMENCIA_PosPublReguDR_03_01-2013.pdf
A proibição do abuso de posição dominante (artigo 102.º TFUE)

Sumário:

1. A razão de ser da proibição do abuso de posição dominante


2. Noção de empresa. Remissão
3. Afectação do comércio entre Estados. Remissão
4. Outras condições de que depende a aplicação do artigo 102.º TFUE
4.1. A existência de uma posição dominante
4.2 O abuso dessa posição dominante
A proibição do abuso de posição dominante (artigo 102.º TFUE)

Diz o artigo 102.º:

comércio entre os Estados-Membros, o facto de uma ou mais empresas explorarem de forma abusiva
uma posição dominante no mercado interno ou numa parte substancial deste.

Estas práticas abusivas podem, nomeadamente, consistir em:


a) Impor, de forma directa ou indirecta, preços de compra ou de venda ou outras condições de
transacção não equitativas;
b) Limitar a produção, a distribuição ou o desenvolvimento técnico em prejuízo dos consumidores;
c) Aplicar, relativamente a parceiros comerciais, condições desiguais no caso de prestações
equivalentes colocando-os, por esse facto, em desvantagem na concorrência;
d) Subordinar a celebração de contratos à aceitação, por parte dos outros contraentes, de prestações
suplementares que, pela sua natureza ou de acordo com os usos comerciais, não têm ligação com

A proibição do abuso de posição dominante no Direito português

V. Constituição da república Portuguesa


Artigo 81.º (Incumbências prioritárias do Estado)

f) Assegurar o funcionamento eficiente dos mercados, de modo a garantir a


equilibrada concorrência entre as empresas, a contrariar as formas de
organização monopolistas e a reprimir os abusos de posição dominante e

V. Lei da Concorrência (Lei 19/2012)


Artigo 12.º (Abuso de dependência económica)
A proibição do abuso de posição dominante. Ratio

A proibição do abuso de posição dominante é um instrumento de controlo


market power)
per se Proíbem-se os
comportamentos abusivos. As empresas são encorajadas a concorrer. Não
faria sentido penalizar as que alcançam bons resultados.
Mas, cabe perguntar: o foco deve estar na protecção dos concorrentes, ou
na protecção dos consumidores?
A prática decisória da Comissão tende a acentuar a protecção dos outros
concorrentes no mercado. Porém, alguns autores defendem que essa
abordagem dificulta a prova do abuso da posição dominante.

Artigos 101.º e 102.º TFUE - Comparação

Há elementos comuns nas hipóteses dos artigos 101.º e 102.º TFUE, a saber:
A noção de empresa
O comportamento censurável deve ser de natureza a afectar o comércio
entre os Estados-membros

A síntese que se segue centra-se nos outros elementos de que depende a


aplicação do artigo 102.º TFUE
A existência de uma posição dominante
Qual é o mercado relevante para aferir a posição dominante?

Quanto mais abrangente for o mercado, mais fácil é demonstrar a posição


dominante. Daí que um dos principais argumentos esgrimidos pelas
empresas sancionadas por abuso de posição dominante seja o de que as
autoridades administrativas (Comissão, Autoridade da Concorrência)
adoptaram uma definição do mercado muito limitada.
Na delimitação do mercado, pode atender-se ao mercado geográfico e/ou
ao mercado do produto. E até ao elemento temporal.
Na delimitação do mercado do produto, o critério geral é o da facilidade
com que alguns produtos podem ser substituídos por outros.
Do ponto de vista da procura, isso obriga a avaliar a elasticidade cruzada: a
existência de um alto grau de elasticidade cruzada na procura sugere que se trata do
mesmo mercado. Pode também atender-se às características do produto.
Do ponto de vista da oferta, isso obriga a indagar da facilidade de a empresa adaptar
a produção a um produto produzido pelos concorrentes.
Na delimitação do mercado geográfico, por vezes a Comissão considera
todo o território da UE; noutras vezes, considera um mercado mais restrito.
A definição do mercado geográfico pode ser condicionada por factores como os
custos de transporte.

A existência de uma posição dominante


Qual é o mercado relevante para aferir a posição dominante?

Para saber mais sobre os critérios adoptados pela Comissão na definição


do mercado, vide:
Comunicação da Comissão relativa à definição de mercado relevante para
efeitos do direito comunitário da concorrência
https://eur-lex.europa.eu/legal-
content/PT/ALL/?uri=CELEX%3A31997Y1209%2801%29
A existência de uma posição dominante
Em que consiste uma posição dominante para efeito de aplicação do artigo
102.º TFUE?

No acórdão United Brands, o Tribunal de Justiça respondeu:

posição de poder económico detida por uma empresa que lhe permite
afastar a manutenção de uma concorrência efectiva no mercado em causa
e lhe possibilita comportar-se, em medida apreciável, de modo
independente em relação aos seus concorrentes, aos seus clientes e,
finalmente, aos consumidores.
A existência de uma posição dominante resulta, em geral, da reunião de
vários factores, que, tomados isoladamente, não seriam necessariamente

Acórdão do Tribunal de 14 de Fevereiro de 1978. United Brands Company e United Brands


Continentaal BV contra Comissão das Comunidades Europeias. Bananas Chiquita.Processo
27/76. ECLI:EU:C:1978:22, par. 65 e 66.

A existência de uma posição dominante


Em que consiste uma posição dominante?

Para apurar a existência de uma posição importa indagar:

Existe um monopólio legal?


É que a atribuição de um monopólio a uma empresa pelo Direito nacional
não lhe confere imunidade às regras da concorrência (v. artigo 106.º, n.º 2,
TFUE)
Existe um monopólio de facto (100% da quota de mercado)?
Existe uma alta quota de mercado? Por um largo período de tempo?
Outros critérios: a facilidade, ou não, do acesso ao mercado por parte de
outros operadores
O abuso da posição dominante

Como é que se distingue um comportamento abusivo de uma estratégia


comercial normal?
O artigo 102.º vem acompanhado de uma lista de comportamentos
abusivos. Note-se, porém, que não se trata de uma lista exaustiva.

Impor, de forma directa ou indirecta, preços de compra ou de venda ou outras condições de


transacção não equitativas;
Limitar a produção, a distribuição ou o desenvolvimento técnico em prejuízo dos consumidores;
Aplicar, relativamente a parceiros comerciais, condições desiguais no caso de prestações
equivalentes colocando-os, por esse facto, em desvantagem na concorrência;
Subordinar a celebração de contratos à aceitação, por parte dos outros contraentes, de
prestações suplementares que, pela sua natureza ou de acordo com os usos comerciais, não têm
ligação com o objecto desses contratos

Importa observar:
O comportamento abusivo não tem de ser necessariamente prejudicial para
os consumidores; pode ser prejudicial para os concorrentes.
Os efeitos do comportamento abusivo podem produzir-se num mercado
diferente daquele em que a empresa tem posição dominante

Para saber mais, vide:


Comunicação da Comissão Orientação sobre as prioridades da
Comissão na aplicação do artigo 82. º do Tratado CE a comportamentos de
exclusão abusivos por parte de empresas em posição dominante
https://eur-lex.europa.eu/legal-
content/PT/ALL/?uri=CELEX%3A52009XC0224%2801%29
Direito da Concorrência

Da aplicação do Direito da Concorrência


Luísa Verdelho Alves
mlalves@iscap.ipp.pt

Relação entre os artigos 101.º e


102.º e as legislações nacionais
em matéria de concorrência
O que diz o Regulamento 1/2003?

Nos termos do artigo 3.º do Regulamento /2003:

1. Sempre que as autoridades dos Estados-Membros responsáveis em matéria de


concorrência ou os tribunais nacionais apliquem a legislação nacional em matéria de
concorrência a acordos, decisões de associação ou práticas concertadas na acepção do n.º 1
do artigo 81.º do Tratado (actual artigo 101.º TFUE), susceptíveis de afectar o comércio entre
os Estados-Membros, na acepção desta disposição, devem aplicar igualmente o artigo 81.º
do Tratado a tais acordos, decisões ou práticas concertadas. Sempre que as autoridades dos
Estados-Membros responsáveis em matéria de concorrência ou os tribunais nacionais
apliquem a legislação nacional em matéria de concorrência a qualquer abuso proibido pelo
artigo 82.º do Tratado, devem aplicar igualmente o artigo 82.º do Tratado (actual artigo 102.º
TFUE).
2. A aplicação da legislação nacional em matéria de concorrência não pode levar à proibição
de acordos, decisões de associação ou práticas concertadas susceptíveis de afectar o
comércio entre os Estados-Membros mas que não restrinjam a concorrência na acepção do
n.º 3 do artigo 81.o do Tratado, ou que reúnam as condições do n.º 3 do artigo 81.º do
Tratado ou se encontrem abrangidos por um regulamento de aplicação do n.º 3 do artigo
81.º do Tratado. Nos termos do presente regulamento, os Estados-Membros não estão
impedidos de aprovar e aplicar no seu território uma legislação nacional mais restritiva que
proíba actos unilaterais de empresas ou que imponha sanções por esses actos.

O que diz o Regulamento 1/2003?

Duas conclusões principais:

A aplicação das legislações nacionais em matéria de concorrência a acordos,


decisões e práticas concertadas, na acepção do n.º 1 do artigo 101.º do Tratado, não
pode conduzir à proibição destes acordos, decisões e práticas concertadas se estes
não forem também proibidos pelo Direito da União Europeia.

O regulamento não impede os Estados-membros de aprovarem e aplicarem no seu


território uma legislação nacional em matéria de concorrência mais restritiva que
proíba actos unilaterais de empresas ou que imponha sanções por esses actos.
O que diz a Lei da Concorrência (Lei n.º 19/2012
que aprova o regime jurídico da concorrência)?

São considerados justificados os acordos entre empresas, as práticas concertadas


entre empresas e as decisões de associações de empresas proibidos pelo artigo
anterior que, embora não afetando o comércio entre os Estados membros,
preencham os restantes requisitos de aplicação de um regulamento adotado nos
termos do disposto no n.º 3 do artigo 101.º do Tratado sobre o Funcionamento da
União Europeia.

Da leitura combinada destes preceitos pode concluir-se:


O Direito nacional não proíbe comportamentos considerados compatíveis com o
Direito da União Europeia. Cabem aqui:
- Comportamentos que caem no âmbito de aplicação do Direito da União, na medida
em que afectam sensivelmente o comércio entre os Estados-membros, mas não são
considerados restritivos da concorrência.
- Comportamentos que afectam sensivelmente o comércio entre os Estados-
membros, e restringem a concorrência, mas reúnem as condições de uma isenção
individual, ao abrigo do artigo 101.º, n.º 3
- Comportamentos que afectam sensivelmente o comércio entre os Estados-
membros, e restringem a concorrência, mas são abrangidos por um regulamento de
isenção por categorias
Sistema orgânico de aplicação
do
Direito da Concorrência

Quadro normativo

Regulamento (CE) n.° 1/2003 do Conselho, de 16 de Dezembro de 2002, relativo à execução das
regras de concorrência estabelecidas nos artigos 81.° e 82.° do Tratado
https://eur-lex.europa.eu/legal-
content/PT/TXT/?uri=CELEX%3A32003R0001&qid=1648420741248
Diretiva (UE) 2019/1 do Parlamento Europeu e do Conselho, de 11 de dezembro de 2018, que
visa atribuir às autoridades da concorrência dos Estados-Membros competência para aplicarem a
lei de forma mais eficaz e garantir o bom funcionamento do mercado interno
https://eur-lex.europa.eu/legal-
content/PT/TXT/?uri=CELEX%3A32019L0001&qid=1648420825142
Comunicação da Comissão sobre a cooperação no âmbito da rede de autoridades de
concorrência
https://eur-lex.europa.eu/legal-content/PT/ALL/?uri=CELEX%3A52004XC0427%2802%29
Comunicação da Comissão sobre a cooperação entre a Comissão e os tribunais dos Estados-
Membros da UE na aplicação dos artigos 81.° e 82.° do Tratado CE
https://eur-lex.europa.eu/legal-content/PT/ALL/?uri=CELEX%3A52004XC0427%2803%29
A aplicação do Direito da Concorrência

O sistema orgânico de aplicação do Direito da Concorrência


assenta nos seguintes pilares:

Controlo administrativo
Comissão
Autoridades responsáveis em matéria de concorrência dos Estados-
membros

Controlo jurisdicional
Tribunal de Justiça
Tribunais nacionais

A importância da reforma iniciada com o Livro Branco


sobre a Modernização do Direito da Concorrência, 1999

O modelo anterior: traços mais salientes


As intervenções do legislador da União deram corpo a um regime centralizado de
aplicação do Direito da Concorrência
Salvo algumas excepções, os acordos que entravam no âmbito de aplicação do
artigo 101.º, n.º 1, tinham de ser notificados à Comissão
A Comissão tinha o monopólio de aplicação do artigo 101.º, n.º 3

O novo regime instituído pelo Regulamento 1/2003


Reconhece-se aos tribunais nacionais e às autoridades administrativas nacionais de
defesa da concorrência uma competência plena para a aplicação dos artigos 101.º e
102.º
Definem-se os termos da relação de cooperação entre a Comissão, as autoridades
nacionais de defesa da concorrência e os tribunais nacionais, de modo a assegurar:
- uma aplicação uniforme e coerente do Direito da União;
- uma distribuição optimizada dos processos.
Criam-se mecanismos de informação e de consulta
A instituição de um sistema em rede

A modelação das relações de cooperação entre a Comissão e as


autoridades nacionais de defesa da concorrência (ANC)
As ANC devem informar a Comissão da abertura de uma investigação relativa à aplicação dos
artigos 101.º e 102.º. E devem ainda informar a Comissão, antecipadamente, da adopção de uma
decisão em que se exige o termo da infracção, ou se retira o benefício de uma isenção categorial
(v. artigo 11, n.º 3 e 4)
O início por parte da Comissão da tramitação conducente à aprovação de uma decisão priva as
ANC da competência para aplicarem os artigos 101.º e 102.º do Tratado.
As ANC, quando se pronunciarem comportamento anticoncorrencais, ao abrigo dos artigos 101.º
e 102.º, não podem contrariar decisões da Comissão (artigo 16.º, n.º 2)
A modelação das relações de cooperação entre as autoridades nacionais
de diferentes países
Caso as ANC de dois ou mais Estados-membros tenham recebido uma denúncia ou tenham
oficiosamente dado início a um processo nos termos dos artigos 101.º e 102.º contra o mesmo
acordo, decisão de associação ou prática, a instrução do processo por parte de uma autoridade
constitui, para as restantes autoridades, motivo suficiente para suspenderem a respectiva
tramitação ou rejeitarem a denúncia (artigo 13.º, n.º 1).
A modelação das relações de cooperação entre as autoridades
administrativas (comissão e autoridades nacionais) e os tribunais nacionais

Competência da Comissão. Quadro geral

Para garantir a aplicação das disposições do Tratado, a Comissão pode aprovar decisões que
tenham por destinatários empresas e associações de empresas:
Obrigando-as a porem termo à infracção aos artigos 101.º e 102.º
A Comissão tem competência para impor uma solução, quer de conduta, quer de carácter estrutural.
Quando exista um interesse legítimo, a Comissão pode também declarar verificada a existência de uma infracção
que já tenha cessado.
Ordenando medidas provisórias
Em caso de urgência devida ao risco de um prejuízo grave e irreparável para a concorrência, a Comissão pode,
actuando oficiosamente, com base no apuramento prima facie de uma infracção, ordenar, mediante decisão,
medidas provisórias.
Aceitando compromissos
Quando a Comissão tencione aprovar uma decisão que exija a cessação de uma infracção e as empresas em
causa assumirem compromissos susceptíveis de dar resposta às objecções expressas pela Comissão na sua
apreciação preliminar, esta pode, mediante decisão, tornar estes compromissos obrigatórios para as empresas.
Emitindo uma Declaração de não aplicabilidade
Em casos excepcionais, quando o interesse público assim o exija (por exemplo, por estarem em causa novos
tipos de acordos, não visados na prática decisória anterior), a Comissão, pode, através de decisão, declarar
oficiosamente que o artigo 101.º do Tratado não se aplica a um acordo, decisão de associação de empresas ou
prática concertada, quer por não estarem preenchidas as condições do n.º 1 do artigo 101.º do Tratado, quer por
estarem preenchidas as condições do n.º 3 do artigo 101.º do Tratado.
A Comissão pode fazer declaração semelhante relativamente ao artigo 102.º.o do Tratado.
Competência da Comissão. Aplicação de coimas

O cumprimento das obrigações impostas às empresas e às associações de


empresas em aplicação podem ser garantidos através de coimas e
sanções pecuniárias compulsórias (V. artigo 23.º)
A Comissão pode, mediante decisão, aplicar às empresas e associações de
empresas coimas até 1 % do volume de negócios total realizado durante o exercício
precedente, sempre que, deliberadamente ou por negligência:

incompleta os livros ou outros registos relativos à empresa, aquando das inspecções

A Comissão pode, mediante decisão, aplicar coimas às empresas e associações de


empresas sempre que, deliberadamente ou por negligência:
a) Cometam uma infracção ao disposto nos artigos 101.º ou 102.º; ou

A coima aplicada a cada uma das empresas ou associações de empresas que tenha
participado na infracção não deve exceder 10 % do respectivo volume de negócios
total realizado durante o exercício precedente.

Poderes da Comissão

A Comissão dispõe de poderes para exigir as informações necessárias


para detectar eventuais acordos, decisões ou práticas concertadas
proibidas pelo artigo 101.º do Tratado, ou eventuais abusos de posição
dominante proibidos pelo artigo 102.º do Tratado.
As empresas são obrigadas a responder a perguntas de natureza factual e
a exibir documentos, mesmo que essas informações possam ser utilizadas
para determinar que elas próprias ou quaisquer outras empresas
cometeram uma infracção.

A Comissão dispõe de poderes para realizar as inspecções necessárias


para detectar os acordos, decisões e práticas concertadas proibidas pelo
artigo 101.º do Tratado, bem como a exploração abusiva de uma posição
dominante proibida pelo artigo 102.º do Tratado.
As autoridades dos Estados-Membros responsáveis em matéria de
concorrência deverão colaborar de forma activa no exercício destes
poderes.
Competência das autoridades responsáveis em matéria de
concorrência dos Estados-membros

Competência para aplicar, em processos individuais, os artigos 101.º e


102.º do Tratado. Para o efeito, podem, actuando oficiosamente ou na
sequência de denúncia, tomar as seguintes decisões (artigo 5.º):

exigir que seja posto termo à infracção,


ordenar medidas provisórias,
aceitar compromissos,
aplicar coimas, sanções pecuniárias compulsórias ou qualquer outra
sanção prevista pelo respectivo direito nacional.

Entre nós, vide:


O artigo 5.º da Lei da Concorrência (Lein.º 19/2012) que consagra a competência da Autoridade
da Concorrência para aplicar os artigos 101.º e 102.º do Tratado.
O Decreto-lei 125/2014 que aprova os estatutos da Autoridade da Concorrência

Competência dos tribunais nacionais

Os tribunais nacionais têm competência para aplicar os artigos 101.º e


102.º do Tratado, integralmente (artigo 6.º)

Nos processos relativos à aplicação dos artigos 101.º e 102.º do Tratado,


os tribunais dos Estados-membros podem solicitar à Comissão que lhes
sejam enviadas informações na posse desta ou que dê parecer sobre
questões relativas à aplicação das regras comunitárias de concorrência
(artigo 15.º, n.º 1)

Os Estados-membros devem transmitir à Comissão cópia de todas as


sentenças pronunciadas por tribunais nacionais em matéria de aplicação
dos artigos 101.º e 102.º do Tratado (artigo 15.º, n.º 2)

Quando se pronunciarem sobre acordos, decisões ou práticas ao abrigo


dos artigos 101.º e 102.º que já tenham sido objecto de decisão da
Comissão, os tribunais nacionais não podem tomar decisões que sejam
contrárias à decisão aprovada pela Comissão (artigo 16.º, n.º 1)
Competência do Tribunal de Justiça

O Tribunal de Justiça pode ser chamado a apreciar:

Em sede de recurso, as decisões da Comissão


O Tribunal de Justiça tem competência de plena jurisdição no que se refere às
decisões pelas quais a Comissão aplica comas ou sanções pecuniárias
compulsórias.

Em sede prejudicial, as questões colocadas pelos tribunais nacionais.


Os tribunais nacionais desempenham uma função essencial na aplicação das regras
de concorrência. Ao deliberarem sobre os litígios entre particulares, salvaguardam os
direitos subjectivos decorrentes do Direito da União, nomeadamente através da
concessão de indemnizações às vítimas das infracções.

Direito da Concorrência

Controlo das concentrações de Empresas

Luísa Verdelho Alves


mlalves@iscap.ipp.pt
Controlo das concentrações de empresas Quadro normativo

Regulamento (CE) n.° 139/2004 do Conselho, de 20 de Janeiro de 2004, relativo ao


controlo das concentrações de empresas. JO L 24 de 29.1.2004, p. 1-22
Regulamento de Execução (UE) n. ° 1269/2013 da Comissão, de 5 de dezembro de
2013 , que altera o Regulamento (CE) n. ° 802/2004, de execução do Regulamento
(CE) n. ° 139/2004 do Conselho relativo ao controlo das concentrações de
empresas. JO L 336 de 14.12.2013, p. 1-36
Orientações para a apreciação das concentrações horizontais nos termos do
regulamento do Conselho relativo ao controlo das concentrações de empresas. JO C
31 de 5.2.2004, p. 5-18

Lei n.º 19/2012 de 8 de Maio. Diário da República, n.º 89, 8 de maio de 2012, artigos
36.º e ss.

Ratio do sistema de controlo da concentração de empresas

As operações de concentração de empresas (especialmente, as concentrações


horizontais) podem criar entraves à concorrência no mercado em que operam as
empresas. Por exemplo, através do reforço da posição de uma empresa dominante,
que lhe permita definir uma política de preços, independente do jogo do mercado,
com prejuízo para os consumidores.
E podem ainda entrar em conflito com os objectivos da política regional: um maior
equilíbrio na distribuição da riqueza e no acesso ao emprego num determinado
território.
Mas as operações de concentração de empresas também podem trazer benefícios.
Por exemplo, a diminuição dos custos de produção ou de distribuição, o

O Regulamento das Concentrações reconhece que estas operações podem

condições do crescimento e para elevar o nível de vida na Comunidade (par. 4 do


Preâmbulo).
O objectivo do sistema de controlo de concentrações de empresas não é impedir a
reestruturação das empresas através de operações de concentração é impedir que
daí resultem efeitos nefastos para a estrutura da concorrência.
O problema do controlo das concentrações de empresas no Direito da UE.
Evolução

Inicialmente, o Direito da UE não previa instrumentos que permitissem um controlo


prévio das concentrações de empresas
Em face do silêncio do legislador da União, a Comissão e o Tribunal de Justiça
adoptaram uma interpretação larga dos artigos 85.º e 86 TCEE (hoje, 101.º e 102.º
TFUE) de modo a abranger as operações de concentração de empresas
V. acórdão Continental Can (6/72), em relação às fusões por uma empresa em posição dominante; e acórdão
BAT (142 e 156/84, em relação aos acordos para aquisição de controlo
A solução estava longe de ser satisfatória. Cabe destacar: o modo de actuação a
posteriori dos meios previstos nos artigos 101.º e 102.º; o tipo de sanções previstas
O primeiro Regulamento sobre o controlo das concentrações de empresas foi
adoptado em Dezembro de 1989 (Regulamento 4064/89). O regime actual está
fixado no Regulamento 139/2004. O Regulamento 1269/2013 regula alguns aspectos
processuais do regime do controlo das concentrações de empresas
Não obstante a adopção do regulamento, não se pode excluir a aplicação dos artigos
101.º e 102 às operações de concentrações de empresas. Até porque estes artigos
têm efeito directo. Assim, mesmo se uma determinada operação não entrar no

invocar estes preceitos nos tribunais nacionais.

Noção de empresa. Remissão

Segundo jurisprudência bem consolidada, constitui uma empresa:


actividade económica,

Ou, noutra formulação:


qualquer actividade consistente na oferta de bens ou serviços num
determinado mercado

Como conclui Gorjão-Henriques:


direito da concorrência, a realidade económica prevalece sobre a forma
Definição de concentração
(artigo 3.º do Regulamento 139/2004 e artigo 36.º da Lei 19/2012)

Fusão
Fusão de duas ou mais empresas ou partes de empresas anteriormente independentes
Na sequência de uma fusão, apenas subsiste uma empresa
Aquisição de controlo
Aquisição por uma ou mais pessoas, que já detêm o controlo de pelo menos uma empresa, ou
por uma ou mais empresas por compra de partes de capital ou de elementos do activo, por via
contratual ou por qualquer outro meio, do controlo directo ou indirecto do conjunto ou de partes
de uma ou de várias outras empresas
Na sequência de um negócio jurídico, ocorre uma alteração da estrutura de controlo de uma
empresa, susceptível de influenciar ou coordenar o comportamento das empresas em causa.
Exemplos:
i) aquisição da totalidade ou de parte do capital social
ii) aquisição de direitos de propriedade, de uso ou de fruição sobre a totalidade ou parte dos
activos da empresa
Criação de uma Empresa Comum de Pleno Exercício (full- function joint-
venture)
A criação de uma empresa comum que desempenhe de forma duradoura todas as funções de
uma entidade económica autónoma

Articulação do sistema europeu e dos sistemas nacionais


de controlo das concentrações de empresas

As concentrações de empresas que operam em vários Estados-Membros,


e que atingem determinados limiares de volume de negócios são
apreciadas a nível europeu pela Comissão Europeia. Isso permite:
- que as empresas que operam em diferentes Estados-Membros da UE
one stop shop
- que o impacto da operação de concentração seja avaliado em relação a
toda a UE
Abaixo desses limiares, as autoridades nacionais da concorrência nos
Estados-Membros da UE podem, em princípio, apreciar a operação de
concentração ao abrigo das regras nacionais.
Âmbito de aplicação do Regulamento da UE

Nos termos do artigo 1.º, nº 2 e 3 do Regulamento,

Uma concentração tem dimensão comunitária quando:


a) O volume de negócios total realizado à escala mundial pelo conjunto das empresas em causa for superior
a 5 000 milhões de euros; e
b) O volume de negócios total realizado individualmente na Comunidade por pelo menos duas das empresas
em causa for superior a 250 milhões de euros, a menos que cada uma das empresas em causa realize
mais de dois terços do seu volume de negócios total na Comunidade num único Estado-Membro.

Uma concentração que não atinja esses limiares tem dimensão comunitária quando:
a) O volume de negócios total realizado à escala mundial pelo conjunto das empresas em causa for
superior a 2 500 milhões de euros;
b) Em cada um de pelo menos três Estados-Membros, o volume de negócios total realizado pelo
conjunto das empresas em causa for superior a 100 milhões de euros;
c) Em cada um de pelo menos três Estados-Membros considerados para efeitos do disposto na
alínea b), o volume de negócios total realizado individualmente por pelo menos duas das
empresas em causa for superior a 25 milhões de euros; e
d) O volume de negócios total realizado individualmente na Comunidade por pelo menos duas das
empresas em causa for superior a 100 milhões de euros, a menos que cada uma das empresas
em causa realize mais de dois terços do seu volume de negócios total na Comunidade num
único Estado-Membro

Âmbito de aplicação do Regulamento da UE Outros factores que determinam


a competência da jurisdição da EU e dos Estados-membros

A Comissão Europeia pode examinar operações de concentração que lhe


sejam submetidas pelas autoridades nacionais (artigo 22.º), ou a pedido
das pessoas ou empresas (artigo 4.º, n.º 5)

A Comissão Europeia pode remeter um caso para a autoridade nacional da


concorrência de um Estado-membro da UE (artigo 4.º, n.º 4 e artigo 9.º)

Estados-Membros podem tomar as medidas apropriadas para garantir a protecção


de interesses legítimos, desde que esses interesses sejam compatíveis com o
Direito da UE. São considerados interesses legítimos, por exemplo, a segurança
pública, a pluralidade dos meios de comunicação social e as regras prudenciais
(artigo 21.º, n.º 4)
O controlo nacional das operações de concentração

Nos termos do artigo 37.º da Lei 19/2012:

As operações de concentração de empresas estão sujeitas a notificação prévia


quando preencham uma das seguintes condições:

a) Em consequência da sua realização se adquira, crie ou reforce uma quota igual ou


superior a 50 % no mercado nacional de determinado bem ou serviço, ou numa parte
substancial deste;
b) Em consequência da sua realização se adquira, crie ou reforce uma quota igual ou
superior a 30 % e inferior a 50 % no mercado nacional de determinado bem ou
serviço, ou numa parte substancial deste, desde que o volume de negócios realizado
individualmente em Portugal, no último exercício, por pelo menos duas das
empresas que participam na operação de concentração seja superior a cinco milhões
de euros, líquidos dos impostos com estes diretamente relacionados;
c) O conjunto das empresas que participam na concentração tenha realizado em
Portugal, no último exercício, um volume de negócios superior a 100 milhões de
euros, líquidos dos impostos com este diretamente relacionados, desde que o
volume de negócios realizado individualmente em Portugal por pelo menos duas
dessas empresas seja superior a cinco milhões de euros.

Alguns aspectos do regime do controlo da concentração de empresas

Da obrigação de notificação
Em relação às concentrações de dimensão comunitária
Devem ser notificadas à Comissão antes da sua realização e após a conclusão do acordo, o anúncio da oferta
pública de aquisição ou a aquisição de uma participação de controlo (artigo 4.º, n.º 1)
A operação não pode ter lugar nem antes de ser notificada nem antes de ter sido declarada compatível com o
mercado comum (artigo 7.º)
A Comissão pode, por via de decisão, aplicar coimas até 10 % do volume de negócios total realizado pela
empresa em causa (artigo 14.º, n.º 2)

Em relação às concentrações abrangidas pela legislação nacional


Devem ser notificadas à Autoridade da Concorrência após a conclusão do acordo e antes de realizadas, sendo caso disso, após
a data da divulgação do anúncio preliminar de uma oferta pública de aquisição ou de troca, ou da divulgação de anúncio de
aquisição de uma participação de controlo em sociedade emitente de ações admitidas à negociação em mercado
regulamentado, ou ainda, no caso de uma operação de concentração que resulte de procedimento para a formação de contrato
público, após a adjudicação definitiva e antes de realizada (artigo 37.º, n.º 2)
É proibida a realização de uma operação de concentração sujeita a notificação prévia antes de notificada ou, tendo -o sido,
antes de decisão da Autoridade da Concorrência, expressa ou tácita, de não oposição (artigo 40., n.º 1).
O não cumprimento destas disposições pode dar origem a um processo sancionatório (artigo 58.º)
Alguns aspectos do regime do controlo da concentração de empresas

Da apreciação das operações de concentração


Em relação às operações de concentração de dimensão comunitária, a
Comissão deve ter em conta:
a) A necessidade de preservar e desenvolver uma concorrência efectiva no mercado comum, atendendo,
nomeadamente, à estrutura de todos os mercados em causa e à concorrência real ou potencial de empresas
situadas no interior ou no exterior da Comunidade;
b) A posição que as empresas em causa ocupam no mercado e o seu poder económico e financeiro, as
possibilidades de escolha de fornecedores e utilizadores, o seu acesso às fontes de abastecimento e aos
mercados de escoamento, a existência, de direito ou de facto, de barreiras à entrada no mercado, a evolução da
oferta e da procura dos produtos e serviços em questão, os interesses dos consumidores intermédios e finais,
bem como a evolução do progresso técnico e económico, desde que tal evolução seja vantajosa para os
consumidores e não constitua um obstáculo à concorrência
(V. artigo 2.º do Regulamento das Concentrações e as Orientações para a apreciação das concentrações
horizontais nos termos do regulamento do Conselho relativo ao controlo das concentrações de empresas. JO C
31 de 5.2.2004, p. 5-18)

Em relação às operações que entram no âmbito da legislação nacional,


v. artigo 41.º

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