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Significado do trabalho de parto: a perspectiva dos

acadêmicos de enfermagem
Resumo:

O artigo tem como objetivo entender o que o Trabalho de Parto (TP) significa para alunos de Enfermagem
que passaram pela disciplina "Enfermagem no Processo de Cuidar III - Saúde da Mulher". O estudo é de
abordagem qualitativa e usa o Interacionismo Simbólico como referencial teórico. Foram realizadas
observação participante e entrevistas abertas com 20 estudantes. Os resultados mostram que os símbolos
mais associados ao TP pelos alunos são dor, angústia, medo e ansiedade. O significado elaborado pelos
estudantes é que assistir a uma mulher no TP é presenciar seu sofrimento físico e emocional. A conclusão
indica que a experiência dos alunos na assistência ao TP enriquece o processo de ensino-aprendizagem,
trazendo novas perspectivas para o atendimento das necessidades da parturiente.

Introdução

A introdução do artigo traça uma linha do tempo da assistência ao trabalho de parto e parto, começando
com a prática milenar realizada por mulheres e parteiras, até a institucionalização e medicalização do parto
no século XX. A política de saúde brasileira tem, ao longo dos anos, incentivado o parto institucionalizado,
com programas e diretrizes específicas voltadas para a segurança da mãe e do bebê. No entanto, a
assistência institucionalizada tem seus desafios, como a falta de controle e familiaridade que a mulher sente
ao ser internada, o que gera angústia e solicitação de um atendimento mais humano por parte dos
profissionais de saúde, especialmente enfermeiros. O artigo coloca em foco a importância da formação de
enfermeiros capacitados para assistir a mulher durante esse processo, sendo este o motivo da realização do
estudo.

Métodos

A seção de métodos descreve a abordagem qualitativa da pesquisa, fundamentada na teoria do


Interacionismo Simbólico. Esta teoria foi escolhida como eixo norteador para compreender os significados do
trabalho de parto e parto para os alunos de enfermagem. O estudo foi realizado no Centro de Parto Normal
da Maternidade-Escola Assis Chateaubriand da Universidade Federal do Ceará.

A coleta de dados ocorreu em dois momentos: a primeira etapa envolveu a observação participante dos
alunos durante suas práticas de Enfermagem Obstétrica. A segunda etapa consistiu em entrevistas abertas
com 20 alunos, focadas em entender o significado que o trabalho de parto e parto têm para eles como
futuros profissionais de enfermagem.

Os dados coletados foram analisados seguindo a técnica de análise temática, que se divide em três fases:
pré-análise, exploração do material e tratamento dos resultados.

Quanto aos aspectos éticos, o estudo seguiu os princípios legais e éticos da Resolução n° 196/96 do Conselho
Nacional de Saúde e obteve consentimento livre e esclarecido de todos os participantes.

Resultados
O estudo envolveu 20 estudantes de enfermagem com idades entre 21 e 26 anos, sendo que 18 deles eram
mulheres. Entre essas mulheres, duas já eram mães, uma com experiência de parto normal e outra de
cesariana. Antes de cursarem a disciplina específica, a maioria dos alunos (18) já tinha algum conhecimento
sobre trabalho de parto e parto, adquirido principalmente por meio de documentários, filmes e relatos
pessoais de mães e amigas.

As experiências e conhecimentos prévios dos alunos influenciaram significativamente a forma como eles
percebiam e valorizavam o trabalho de parto em seu processo de ensino-aprendizagem. Muitos expressaram
surpresa e falta de compreensão sobre o processo fisiológico do parto, refletindo o impacto do significado
social e cultural que o trabalho de parto tem para eles. Por exemplo, o trabalho de parto é frequentemente
descrito pelos alunos como um processo doloroso e sofrido para a mulher, como evidenciado em
depoimentos.

Os alunos de enfermagem descrevem o trabalho de parto como uma experiência altamente dolorosa e
emocional para as mulheres, como ilustrado em vários depoimentos. Em sua percepção, a dor é um
fenômeno complexo e subjetivo, que engloba uma variedade de sensações e emoções. Estes significados são
formados a partir de suas interações sociais e experiências de vida, tornando o entendimento do trabalho de
parto um fenômeno dinâmico e em constante evolução no contexto da formação em enfermagem.

Os sentimentos expressos pelas parturientes, como angústia, medo, ansiedade e até felicidade, também
moldam o entendimento dos alunos sobre o que significa assistir a uma mulher durante o trabalho de parto.
Além disso, há uma desconstrução de preconceitos e mitos, já que o contato direto com a realidade do
trabalho de parto faz com que os alunos revejam suas concepções prévias, muitas vezes baseadas em
informações da televisão e relatos de terceiros.

O trabalho de parto é visto pelos alunos como um evento multicausal que envolve vários fatores. Apesar de
reconhecerem o sofrimento físico associado, principalmente devido à dilatação, os alunos também o veem
como um processo natural. No entanto, eles expressam preocupação com possíveis complicações que
podem surgir durante o trabalho de parto.

O fenômeno do parto também traz diversas preocupações relacionadas ao nascimento da criança. Os alunos
apontam que o processo é caracterizado por sua imprevisibilidade, podendo ser acompanhado de dores e
potenciais riscos tanto para a mãe quanto para o filho. Além disso, questões como se o parto será normal ou
cesárea e como será o estado de saúde do recém-nascido são aspectos que geram dúvidas e
questionamentos.

A complexidade e a incerteza do trabalho de parto e parto fazem com que os alunos enxerguem esse
momento como muito especial, repleto de dúvidas e questionamentos, tanto para a mãe quanto para eles
próprios como futuros profissionais de enfermagem.

Os alunos corroboram que o processo de trabalho de parto é emocionalmente desafiador tanto para as
parturientes quanto para eles próprios. Este desafio emocional é visto como uma resposta a uma ameaça à
integridade biológica, dada a vulnerabilidade intrínseca ao processo de nascimento. Mesmo possuindo
algum conhecimento teórico sobre o trabalho de parto, os alunos expressam sentimentos de medo e
ansiedade devido à incerteza dos resultados possíveis, como parto normal, fórceps ou cesárea.

As parturientes, seja em seu primeiro ou em subsequentes partos, também enfrentam ansiedade e medo. O
desconhecido e a imprevisibilidade do processo tornam este um momento de muita tensão, necessitando de
alta atenção e cuidado. A mulher se sente frágil e ansiosa, principalmente quando é o primeiro filho,
conforme apontam os depoimentos dos alunos.
Além dos aspectos já mencionados, o trabalho de parto é descrito pelos alunos como um processo natural,
embora nem sempre seja percebido dessa forma pelas parturientes, que frequentemente sentem medo e
ansiedade. Os alunos também expressam sentimentos semelhantes, com depoimentos revelando que,
apesar de considerarem a assistência ao trabalho de parto importante, muitas vezes sentem-se inseguros em
realizar procedimentos, demonstrando comportamento esquivo, apreensivo e calado.

O significado construído pelos alunos sobre o trabalho de parto e parto converge para uma visão onde dor,
angústia, medo e ansiedade são elementos predominantes. Assim, para os alunos de enfermagem, assistir a
uma mulher no trabalho de parto e parto é sinônimo de presenciar sofrimento físico e emocional vivenciado
pela parturiente.

Discussão

Os resultados mostram que a maioria dos alunos de enfermagem envolvidos no estudo é do sexo feminino e
pertence a uma faixa etária jovem. Essa característica é típica dos cursos de graduação em enfermagem.
Antes de cursarem a disciplina de Saúde da Mulher, o conhecimento dos alunos sobre o trabalho de parto e
parto era em grande parte influenciado pela mídia, como documentários e filmes, bem como por relatos de
pessoas próximas, como mães e amigas.

As pesquisadoras tiveram a oportunidade de interagir com os alunos no Centro de Parto Normal durante a
prática obstétrica. Essa interação teve como objetivo entender melhor os significados atribuídos pelos alunos
ao trabalho de parto e parto, permitindo um envolvimento mais profundo com os estudantes.

A discussão destaca a complexidade do processo que antecede o nascimento de uma criança, conhecido
como trabalho de parto. Este processo é caracterizado por três fases (latente, ativa e de transição). Ele se
inicia com a atividade uterina e prossegue de forma progressiva com a dilatação e apagamento do colo
uterino, etapas necessárias para a condução bem-sucedida do parto.

O trabalho de parto é descrito como uma fase extremamente significativa e dramática, tanto para a mulher
quanto para sua família. Ele é um conjunto de fenômenos fisiológicos que acontecem em um período
específico, tendo como objetivo principal a dilatação do colo uterino para preparar o canal de parto para a
passagem do feto. Este processo envolve várias etapas, como contrações uterinas de intensidade e
frequência crescentes, apagamento do colo uterino, dilatação progressiva da cérvice, descida e apresentação
fetal e, finalmente, a expulsão do feto.

O aluno de enfermagem se encontra em um paradoxo. Embora tenha grande interesse em presenciar o


parto, que é frequentemente descrito como o "milagre da vida", muitas vezes não demonstra o mesmo nível
de interesse em observar e compreender os fenômenos que ocorrem durante o trabalho de parto, que
também é um momento crucial e igualmente significativo.

O aluno de enfermagem age de acordo com o significado que o trabalho de parto tem para ele. Este
significado é formado a partir das diversas interações sociais e experiências de vida que o aluno teve,
incluindo informações de familiares, meios de comunicação, entre outros. Para a maioria dos alunos, o
trabalho de parto é visto como um processo doloroso que causa sofrimento à mulher. Essa percepção é
influenciada pelos diversos sentimentos que as parturientes expressam, como angústia, medo, dor,
ansiedade e até felicidade.

A dor associada ao trabalho de parto é um fenômeno complexo que não deve ser simplificado. Ela resulta de
uma série de interações de naturezas variadas, incluindo obstétricas, neurofisiológicas, psicológicas e
sociológicas. Essa complexidade exige uma compreensão aprofundada e holística por parte dos futuros
profissionais de enfermagem.

A percepção da dor no trabalho de parto é altamente subjetiva e influenciada por uma série de fatores
sociais e culturais. Desde a infância, muitas mulheres são condicionadas a associar o parto com dor e perigo,
criando um reflexo condicionado que impacta a experiência do trabalho de parto. Apesar de ser um processo
natural e fisiológico, o trabalho de parto é frequentemente visto como um momento de preocupação e
dificuldade, tanto para a mulher quanto para aqueles que estão ao seu lado.

A forma como a mulher e seus familiares veem o trabalho de parto está diretamente relacionada à
socialização que tiveram em relação ao processo de parto. Este é um aspecto crucial que os futuros
profissionais de enfermagem devem compreender para fornecer uma assistência mais eficaz e empática.

A experiência de dor durante o trabalho de parto é complexa e multifacetada, envolvendo aspectos


emocionais, cognitivos e socioculturais. O desconforto resultante pode influenciar negativamente a
percepção da mulher sobre o processo de nascimento, o que torna ainda mais importante o papel dos
profissionais de saúde em fornecer assistência empática e eficaz.

Fisiologicamente, o trabalho de parto é desencadeado por um conjunto de fatores interconectados. A


liberação de ocitocina pela neurohipófise é estimulada pelo estrogênio e é influenciada por outros fatores
como a supressão da secreção de progesterona, o aumento dos níveis de prostaglandinas, a liberação de
cálcio pelo retículo sacroplasmático, e a compressão da cérvice e do segmento uterino inferior pela parte
fetal. Todos esses elementos trabalham em conjunto para criar condições ideais para o bem-estar tanto da
mãe quanto do feto.

Essa compreensão fisiológica e psicológica do trabalho de parto é crucial para os alunos de enfermagem, pois
os prepara para prestar cuidados mais holísticos e sensíveis às necessidades da parturiente.

As contrações durante o trabalho de parto são frequentemente acompanhadas de emoções intensas, como
temor, medo e dor, contribuindo para um estado de ansiedade que afeta tanto o bem-estar físico quanto
emocional da mulher. Este conjunto de fatores desencadeia uma série de respostas fisiológicas que
amplificam a sensação de desconforto e sofrimento.

A ativação do sistema nervoso, provocada pelo medo, resulta em uma tensão excessiva no útero, que por sua
vez intensifica a sensação de dor. Além disso, o medo também tem um impacto negativo na circulação
sanguínea uterina, exacerbando ainda mais o desconforto e o sofrimento físico e emocional.

É importante notar que a dor durante o trabalho de parto tem uma dimensão que vai além do aspecto físico,
afetando também o contexto sociocultural e psicoafetivo da mulher. Portanto, a assistência de enfermagem
durante esse período crucial deve ser holística, abordando não apenas as necessidades fisiológicas, mas
também as emocionais e psicológicas da parturiente.

Esse entendimento integral do processo de trabalho de parto e parto é vital para o aluno de enfermagem,
capacitando-o a fornecer um atendimento mais completo e empático às necessidades da mulher em um dos
momentos mais significativos de sua vida.

O sofrimento emocional durante o trabalho de parto é uma realidade tanto para a mulher em trabalho de
parto quanto para o aluno de enfermagem que assiste ao processo. Esse sofrimento é frequentemente
exacerbado pelos altos níveis de ansiedade que podem ser experimentados por ambos os participantes. A
ansiedade é uma emoção complexa e multifacetada que pode ter efeitos tanto construtivos quanto
destrutivos no processo de parturição.
Esta ansiedade não é apenas um subproduto do momento, mas está intrinsicamente ligada à natureza
humana e à nossa concepção de futuro. Ela é ambivalente, podendo manifestar-se como angústia e
preocupação com perigos iminentes, e pode afetar de forma significativa a percepção da dor e o bem-estar
emocional da parturiente.

No entanto, é possível que intervenções educacionais específicas possam ajudar a mitigar alguns desses
efeitos emocionais negativos. Por exemplo, a preparação adequada e o suporte emocional podem ajudar a
"descondicionar" o medo e a ansiedade associados às contrações uterinas, permitindo que a mulher
participe de forma mais ativa e positiva em seu próprio trabalho de parto.

A dor é uma experiência subjetiva e sua percepção pode ser significativamente influenciada por fatores
emocionais e psicológicos. Portanto, a abordagem de enfermagem ao cuidado da mulher em trabalho de
parto deve ser holística, levando em consideração não apenas as necessidades fisiológicas, mas também as
necessidades emocionais e psicológicas da mulher.

A dor durante o trabalho de parto é complexamente influenciada por aspectos emocionais, como a
ansiedade e o medo. A liberação excessiva de catecolaminas, induzida por estados elevados de ansiedade e
medo, pode levar a uma série de respostas fisiológicas que aumentam a percepção da dor. Este aumento na
dor pode criar um ciclo de retroalimentação, onde o aumento da dor leva a mais medo e ansiedade, que por
sua vez aumentam ainda mais a dor.

O papel do aluno de enfermagem nesse cenário é crucial. O significado atribuído ao processo de trabalho de
parto e parto converge para uma série de emoções complexas, incluindo dor, angústia, medo e ansiedade. O
entendimento e a empatia do aluno de enfermagem podem desempenhar um papel significativo na quebra
deste ciclo de retroalimentação emocional negativa.

O sofrimento físico e emocional da mulher em trabalho de parto é inegável, e o aluno de enfermagem, ao


presenciar esse processo, também vivencia uma série de emoções e percepções que podem impactar a
qualidade do cuidado prestado.

Dessa forma, é imperativo que a formação em enfermagem prepare os alunos não só para os aspectos
técnicos do cuidado em saúde, mas também para a complexidade emocional e psicológica envolvida no
processo de trabalho de parto e parto.

Considerações Finais

O estudo baseado no Interacionismo Simbólico permitiu uma compreensão mais profunda do significado do
trabalho de parto e parto para o aluno de enfermagem. A interação com a parturiente durante esse processo
complexo e emocionalmente carregado, muitas vezes, reformula as percepções e significados que o aluno
tem sobre o trabalho de parto e parto.

O aluno de enfermagem, inicialmente sobrecarregado com as emoções de presenciar o sofrimento físico e


emocional da parturiente, começa a perceber a importância de estar presente e ativo durante todo o
processo de parturição. Mesmo diante da dor intensa e das emoções complexas envolvidas, o aluno entende
que sua presença e cuidado podem ser fundamentais para uma boa condução do parto.

Este entendimento não apenas beneficia a parturiente, mas também contribui para o desenvolvimento
profissional e pessoal do aluno. A experiência em si torna-se uma oportunidade de aprendizado valiosa, que
vai além dos aspectos técnicos e clínicos, entrando no domínio emocional e humano do cuidado em saúde.
O estudo conclui que a experiência prática no Centro de Parto Normal é crucial para a formação do aluno de
enfermagem, pois amplia significativamente a compreensão deste sobre o trabalho de parto e o parto em si.
A situação de ensino-aprendizagem é enriquecida por essas vivências, que vão além da teoria e permitem ao
aluno confrontar e reformular seus próprios significados e entendimentos sobre o processo.

Ao ter a oportunidade de assistir tanto o trabalho de parto quanto o parto, o aluno muda sua perspectiva
sobre o que realmente significa fornecer cuidados durante esses momentos cruciais. Esta mudança de
perspectiva não afeta apenas o entendimento clínico do aluno, mas também o emocional e o humano,
permitindo uma abordagem mais holística e humanizada do cuidado.

A partilha de emoções e experiências entre os alunos indica um ambiente de aprendizagem rico e


diversificado, onde cada um pode aprender não apenas com as experiências clínicas, mas também com as
experiências emocionais e humanas uns dos outros.

O estudo reforça a necessidade de estratégias educacionais que preparem os alunos para fornecer um
cuidado integral e humanizado, abordando tanto as necessidades físicas quanto emocionais das parturientes.
Portanto, para efetivamente "conhecer, ver e assistir" e fornecer o cuidado necessário, a formação em
enfermagem deve ser abrangente e profundamente enraizada na prática clínica e emocional.

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