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Como é feito o planejamento da oferta de transporte público e como

podemos melhorá-lo?

maio 27, 2020 Antonia Moreira 0 comentários pandemia, transporte público

Em meio à pandemia, aglomerações no transporte público não são


aceitáveis e afastam usuários. Planejamento da oferta, entretanto, ainda é
ineficaz.

Foto: WRI Brasil

Conforme endurecem as medidas de isolamento social no país, principalmente


em regiões bastante afetadas pela pandemia, como São Paulo, Rio de Janeiro,
Fortaleza e Manaus, aumenta a exposição dada à pauta transporte público
durante a crise.

Como meio fundamental de mobilidade, muitas cidades já descartaram a ideia


de interrompê-lo, seja total ou parcialmente. Com razão, pois essa medida
impossibilita o deslocamento de profissionais essenciais no momento, como
enfermeiros, médicos e trabalhadores da cadeia de suprimentos, o que agrava
o problema. Nenhum país fortemente atingido pela pandemia tomou tal medida
por mais de dois dias.

Entretanto, com o rodízio ostensivo promovido pela prefeitura de São Paulo,


que até a sexta-feira, 15 de maio, estipulou que a cada dia apenas placas
ímpares ou pares podem circular pela cidade, houve aumento no fluxo de
passageiros nos transportes coletivos maior do que a capacidade segura de
lotação para evitar o contágio, colocando em risco passageiros e profissionais
do transporte público.

Para termos uma ideia, no segundo dia de rodízio, dia 12 de maio, os trens da
CPTM andaram com 12% a mais de pessoas do que no resto da quarentena,
enquanto ônibus e metrô aumentaram 10%, chegando a 5.3 milhões de
viagens, em comparação aos 4.8 milhões de viagens em média durante a
quarentena e antes do rodízio.

A medida foi suspensa no domingo, 17 de maio, entretanto, a demanda


irregular por transporte público permanece, não só em São Paulo como outras
cidades, o que exige um planejamento prévio da oferta de transporte.

No artigo, você vai entender:

1. Como funciona o planejamento da oferta de transporte público hoje;


2. Quais alternativas existem para otimizar esse processo;
3. Dados enviados pelos próprios usuários como meio para planejamento.

Como planejar de forma inteligente a oferta e demanda do transporte


público
Da forma como o planejamento da frota é feito hoje, onde não é preditivo, é
difícil se preparar com antecedência para mudanças tão bruscas, como essas
vindas por meio de decretos da gestão municipal. Mas esse é possivelmente o
novo normal.

Com mais informações sobre a quarentena no Brasil alguns especialistas têm


tomado um tom crítico em relação ao isolamento social abrangente e brando,
ou seja, esse adotado pelo estado inteiro, mas ainda com bastante circulação
de pessoas, como temos visto na maior parte do Brasil.

Como mostra artigo da revista Piauí, cientistas têm defendido medidas mais
duras para lugares epicentro da doença, como a capital de São Paulo, e
medidas mais leves e intercaladas em outras regiões, ainda em São Paulo
como a região do ABC, Campinas ou demais centros densamente
urbanizados.

Dessa forma, teríamos uma quarentena na maior parte das cidades que ora
decreta a paralisação das escolas, ora de bares e restaurantes, comércio, etc.
Com toda essa instabilidade por meses, o gerenciamento inteligente da oferta e
demanda da frota de transporte público é essencial para garantir a segurança
de todos e a viabilidade econômica do serviço.

Em entrevista ao Agora é simples, Roberto Speicys, cofundador da


Scipopulis, empresa focada em cidades inteligentes e mobilidade urbana,
afirma que a principal fonte de informações para o planejamento do transporte
público em São Paulo é a pesquisa Origem e Destino, realizada pelo Metrô a
cada 10 anos “qualquer mudança que aconteça na cidade no intervalo de 10
anos é ignorada pela rede de transporte até a próxima pesquisa OD, então a
mais recente foi feita em 2017 a próxima vai ser 2027. É óbvio que são feitos
ajustes na rede ao longo do tempo, da operação, mas refletindo mudanças de
perfil de uso da linha. Por exemplo, quando a linha 5 do metrô foi inaugurada
em paralelo com a avenida Ibirapuera não foi preciso fazer uma outra
pesquisa OD para identificar uma queda na demanda das linhas de ônibus da
avenida Ibirapuera. Os próprios empresários acabaram detectando no caixa
deles, na quantidade de passageiros utilizando a linha, porque você tem uma
linha que normalmente tem 5 mil pessoas por dia e de repente ela passa para
800 pessoas. Dessa forma se faz um ajuste na oferta para se adequar essa
baixa de demanda. Então, ao longo dos 10 anos pequenos ajustes são feitos,
mas grandes mudanças estruturais nas origens-destinos de viagens só são
levados em conta na pesquisa OD seguinte em dez anos.”

Roberto ainda nos diz que São Paulo é um caso à parte, pois muitas cidades
sequer têm uma pesquisa desse porte.

Para o executivo, com os deslocamentos na cidade instáveis devido à


pandemia, sistemas de transporte precisam lidar mais rapidamente com a
flutuação da demanda “Você tem a quarentena, diversos níveis de isolamento
social, diversos tipos de serviços funcionando e sendo fechados, e isso muda
de semana para outra, então a rede de transporte tem que dar conta de vários
perfis de demanda ao longo da epidemia que são desconhecidos”.
Além da demanda flutuante, outro fator de influência é o trânsito nas vias. Se
os ônibus podem ir mais rápido, porque mais pessoas estão em casa e existem
menos carros na rua, a quantidade de ônibus por linha também é passível de
diminuição “Quando começou a quarentena, linhas que trafegam em média 10
km por hora começam a trafegar a 21km. Dessa forma, na prática precisa de
menos ônibus para operar a linha. Essas mudanças acontecem muito rápido e
a programação da linha, a frota, tudo mais tem que também ser alterada
rapidamente para se adaptar a essa mudança de velocidade”.

Além disso, a diminuição de 70% no número de passageiros que a SPTrans,


administradora do Bilhete Único e ônibus em São Paulo, e que outras cidades
também sentiram em maior ou menor grau não significa que todas as linhas
perderam passageiros igualmente “Muitas linhas perderam mais do que isso, e
algumas perderam muito menos que isso. Você não pode fazer um corte de
frota uniforme em todas as linhas ou senão você tem o risco de gerar situações
de lotação e de acúmulo de pessoas, que estão justamente o que a gente quer
evitar ainda mais durante a pandemia.“

Como aumentar o alcance da geração de dados por meio das redes


sociais

Um planejamento preditivo, ou seja, antever as necessidades de


deslocamentos da população não é impossível. Com o conhecimento sobre
como e o porquê as pessoas se movimentam nas cidades, como é feito por
meio da pesquisa Origem e Destino, somada a velocidade média dos ônibus
podemos identificar melhor a necessidade de oferta da frota de transporte
público.

Ainda de acordo com Roberto da Scipopulis “Uma maneira de deixar mais


eficiente é você ter formas mais rápidas e dinâmicas de identificar demandas
que surgem e que somem da cidade a medida que a cidade se transforma.
Outra maneira é a gente também adaptar a programação das linhas a variação
de velocidade média.”

Uma iniciativa que busca tornar mais rápida a identificação da demanda é o


aplicativo ÔnibusGV, do sistema Transcol de Vitória (ES), por lá clientes do
transporte público poderão denunciar aglomerações e condutas indevidas,
como pessoas sem máscara. Os dados de denúncia servirão para auxiliar o
planejamento da operação.

Luiz Renato M. Mattos, CEO da ONBOARD, empresa que auxilia operadores


de transporte em sua transformação digital, alerta ao Agora é simples que
aplicativos concorrem não só com outros apps, como também com vídeos e
fotos, pois grande parte dos brasileiros possuem pouco armazenamento
disponível no celular, o que para ele “fazem os aplicativos de transporte
perderem espaço principalmente para aplicativos de redes sociais”.
Segundo o executivo uma alternativa são os chatbots em redes como
Facebook e WhatsApp, já usados no transporte público de cidades como Belo
Horizonte “Agora este canal de relacionamento foi potencializado com a
intensificação dos aplicativos de mensageria e a evolução dos chatbots – robôs
de respostas automáticas permitindo também que as marcas possam atender
e vender seus produtos e serviços através de uma infraestrutura e um canal já
consolidado.”

Para Luiz, usar chatbots como canal para contato de clientes do transporte
público, denúncias de aglomeração e dados para predição de demanda e
otimização de oferta é uma iniciativa eficaz que facilita a comunicação
“Incorporar chatbots em campanhas já nos provaram que os resultados são
atingidos de forma mais rápida e o engajamento é muito maior que nos
aplicativos. Os chatbots permitem não só uma comunicação direta com os
clientes que já estão na nossa base como também os que não estão e se
relacionam esporadicamente, assim como potenciais clientes que podem ser
impactados por uma campanha de divulgação ou até mesmo uma indicação
podendo interagir de forma direta e imediata sem precisar fazer nada além de
trocar simples mensagens como eles já estão habituados a fazer”.

A ONBOARD, de Luiz Renato, lançou durante a pandemia a contagem


automática de passageiros por câmeras de segurança, que permite a análise
de demanda do transporte público sem a necessidade de uma pesquisa longa
de Origem e Destino. Com a solução, operadores de transporte têm em mãos
informações valiosas sobre o número de passageiros transportados por linha,
principais trechos, fluxos por regiões, etc.

 Com necessidade de distanciamento, solução criativa surge para


contagem de passageiros no transporte público

De qualquer forma, a necessidade de atender às demandas da população é


urgente, em meio à pandemia o transporte público já perdeu milhões de
clientes e sua recuperação no longo prazo depende, dentre outras coisas, de
uma percepção positiva e de segurança durante as viagens. Lotações e espera
só contribuem para uma migração massiva a outros modais, o que pode se
tornar permanente e prejudicial a nossas cidades.

Citada, a Assessoria de Imprensa da SPTrans ao ser procurada pela


redação respondeu:

A SPTrans informa que a programação da oferta do transporte público


considera a demanda de passageiros transportados por linha, faixa horária e
sentido de operação, o sobe e desce de passageiros, o intervalo médio entre
partidas e as condições de capacidade dos veículos e frequência das partidas
para atender a demanda.
Nos tempos de pandemia, a oferta do transporte tem tido como premissa a não
aglomeração de passageiros nos ônibus e nos terminais. Prova disso, é que a
demanda de passageiros atual está em de 33% e a quantidade de veículos em
operação está na ordem de 65,51% comparado a um dia útil antes da
quarentena.

A SPTrans realiza a associação dos dados de bilhetagem com os de GPS, que


possibilita identificar as origens e destinos dos passageiros, avaliar o índice de
ocupação das linhas, mapear os embarques e desembarques dos usuários,
entre outros aspectos. Em alguns casos, são realizadas pesquisas
operacionais para validar a precisão das informações geradas.

Além disso, a SPTrans monitora constantemente a operação através dos


técnicos em campo, agentes de monitoramento e pelas manifestações dos
usuários nas redes sociais e central 156, o que possibilita ao planejamento
melhor adequar a oferta de transporte às necessidades dos passageiros.

Durante esta quarentena, o monitoramento da movimentação de passageiros


possibilita a SPTrans fazer ajustes nas linhas quanto aos horários e à frota,
quando constatada a necessidade. As equipes de fiscalização são enviadas
para determinar as medidas que podem ser adotadas para cada uma.

Esse acompanhamento serviu de base para a adequação da oferta de ônibus à


demanda de passageiros em diversos momentos da pandemia, que foram
definidas após uma análise realizada pelos técnicos da SPTrans.

A Secretaria de Mobilidade e Transportes, por meio da SPTrans, está


empenhada na modernização da gestão do sistema de transporte coletivo na
cidade de São Paulo e decidiu renovar a plataforma para viabilização dos
novos sistemas embarcados, de monitoramento e gestão da frota de ônibus. A
nova ferramenta irá possibilitar a SPTrans aprimorar a capacidade de planejar,
controlar, fiscalizar, medir e realizar intervenções sobre a operação, dar
informações aos usuários do transporte, gerir crises de todo o Sistema de
Transporte, concentrando todos os dados em uma única plataforma.

As funcionalidades desenvolvidas nos sistemas computacionais deverão


permitir flexibilidade para o trabalho ser realizado em diferentes configurações,
oferecendo a SMT e a SPTrans uma poderosa ferramenta para a gestão do
Serviço de Transporte Coletivo Urbano da capital paulista.

Vale ressaltar que os projetos previstos na parceria com o Governo Britânico


estão em fase de elaboração.

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https://agoraesimples.com.br/negocios/projecao-demanda-transporte-publico/

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