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Educação do/no Campo:

qual é a importância para as


Ciências Agrárias?
Profº. Rafael Santos de Aquino
Zootecnista
I CIPAMEV - Ciclo de Palestras de Medicina Veterinária
Introdução
1. Os rurais do Brasil
2. Agricultura Familiar
3. Reflexões sobre a educação
4. Educação do/no Campo
5. Relação entre Ciências Agrárias e Educação do Campo
6. Projeto Rondon e a Extensão
7. Etnociência para a Educação do Campo
8. Compromisso das Ciências Agrárias com a Educação do Campo
Os rurais do Brasil
• 15,6% rural (IBGE, 2015)
• Estudos estimam que este número esteja subestimado (Agência Brasil, 2015).
https://agenciabrasil.ebc.com.br/geral/noticia/2015-03/pesquisa-diz-que-populacao-rural-do-brasil-e-maior-que-apurada-pelo-ibge

• Perfis rurais
• Agronegócio
• Agricultura familiar
• Agricultores tradicionais
• Indígenas
• Quilombolas
• Pescadores (ribeirinhos e litorâneos)
Agricultura Familiar

Produção Pecuária da Agricultura Produção Agrícola da Agricultura


Familiar Familiar

60% 80%
59%
69%
51%

48%
42%
30%

LEITE SUÍNO AVES BOVINOS CAFÉ MANDIOCA ABACAXI FEIJÃO

IBGE, 2017
Agricultura Familiar

Estabelecimentos Agropecuários Área Produtiva

23%; 23% 23%; 23%

Agricultura Familiar Agricultura Familiar


Agronegócio Agronegócio

77%; 77% 77%; 77%

IBGE, 2017
Agricultura Familiar: definição
Agricultura Familiar: definição
Módulo Rural
Cidade Módulo (ha) • Agricultura familiar pode atender ao
Recife/PE 7 agronegócio?
Caruaru/PE 20
Petrolina/PE 55
Ouricuri/PE 70 • Agricultor familiar é o mesmo que pequeno
Fortaleza/CE 5 agricultor?
Sobral/CE 50
Iguatu/CE 40
Crato/CE 26
https://www.embrapa.br/codigo-florestal/area-de-reserva-legal-arl/modulo-fiscal
Agricultura familiar sem módulo definido
• Extrativismo
• Povos tradicionais:
• Indígenas
• Quilombolas
• Seringueiros
• Catadores de castanha-do-pará
• Pescadores
• Marisqueiras
Porque distinguir a Educação?
• Qual é o objetivo educacional?

• A educação deve ter apenas um viés como meta?

• Toda atividade agropecuária brasileira é representada por um único tipo de


produção agropecuária?

• Então porque devemos focar em apenas um tipo produtivo?


Porque distinguir a Educação?
• Todos os agricultores familiares do Brasil têm acesso à educação básica, profissional e
superior?

• A educação científica/escolar pode ser ofertada no contexto do homem do campo?

• E a educação não-formal, como aquela representada pela extensão universitária, ela inclui ou
exclui o conhecimento tradicional (saber popular)?

• Todo saber popular é cientificamente errôneo?


Educação do/no Campo
• Diversos eventos ao longo de décadas de 1950 e 60 contribuíram:
• Movimento de Cultura Popular (MCP)
• Centros Populares de Cultura (CPCs)
• Campanha de Pé no Chão também se Aprende a Ler
• Movimento Educação de Base
• Movimento de Ação Católica
• Movimentos Sociais do Campo (MST)
Educação do/no Campo
• Na década de 1990 eventos importantes consolidaram o termo:
• I Encontro Nacional de Educadores e Educadoras da Reforma Agrária (I ENERA),
1997
• II Conferência Nacional de Educação do Campo em 2004
(MUNARIM e LOCKS, 2012)
Educação do/no Campo
• Pautaram a LDBEN 9.394/96
• Art. 1º - vida familiar, convivência humana, trabalho, movimentos sociais, organizações
civis e culturais;
• Art. 28 – se refere à população rural, provendo currículos e metodologias adequadas às
expectativas da população rural como calendário escolar ajustado às condições
climáticas, ciclo agrícola, organização escolar própria e adequação à natureza do
trabalho rural (agricultores, pescadores, ribeirinhos, extrativistas, etc.).
Educação do/no Campo
• Resolução CNE/CEB nº. 1 de 3/4/2002 instituiu as Diretrizes Operacionais
para Educação Básica nas Escolas do Campo reconhecendo as identidades
específicas.
• Resolução CNE/CEB nº. 2 de 2008 – art. 1º A Educação do Campo
compreende a Educação Básica e suas etapas de Educação Infantil, Ensino
Fundamental, Ensino Médio, Educação Profissional Técnica com Ensino
Médio.
Educação do/no Campo
• Decreto Presidencial nº. 7.352 de 4/11/2010 retoma os princípios d
educação do campo e os compromissos dos entes federados, dispondo sobre
a oferta, ampliação da inclusão social e define os critérios para identificação
da escola do campo.
• A Educação Rural não representava os interesses dos povos do campo, visto
que objetivava os interesses das empresas rurais em mão-de-obra,
distinguindo o trabalho manual do intelectual.
Santos (2010)
Educação do/no Campo
• É uma proposta baseada nos saberes dos povos do campo, na experiência, na
luta por políticas públicas.

• Munarim (2008) nomeou a luta por uma educação do e no campo nascida


dos e nos movimentos sociais do campo como o Movimento Nacional de
Educação do Campo.
Educação do/no Campo
• Ela rompe com a educação bancária, da cidade para o campo (OLIVEIRA,
2013).

• A preposição “do” indica o direito dessa educação ser pensada do lugar e a


preposição “no” ao direito que o povo tem de ser educado no lugar onde
vive (CALDART, 2008).
Educação do Campo e Ciências Agrárias
• Há uma dicotomia entre o saber tradicional e o saber científico (tradição x
tecnologia, campo x cidade, atraso x desenvolvimento, etc.) que pauta a
relação entre a educação do campo e as ciências agrárias.

• Essa dicotomia revela relações de poder em que um saber ou uma cultura se


sobrepõe a outra.
Educação do Campo e Ciências Agrárias
• Isso pauta as relações profissionais e as fragilizam, assim como fragilizam-se
as populações do campo.

• Desvalorização dos conhecimentos práticos/teóricos que trazem os sujeitos


do campo, construídos a partir de experiências, relações sociais, de tradições
históricas e principalmente, de visões de mundo tem sido recorrente de quem
atua nesses territórios (MOLINA, 2006, p. 12).
Educação do Campo e Ciências Agrárias
• A Espanha investiu no desenvolvimento urbano na década de 1960 e na
década de 1990 se viu desabastecida devido ao êxodo rural e precisou
repensar as políticas rurais incluindo a educação rural (MUNARIM e
LOCKS, 2012).
Educação do Campo e Ciências Agrárias
• Os meios de se fazer a educação do campo são:
1. Educação formal
• Políticas públicas de fomento à educação do/no campo nas esferas educacionais.
2. Extensão rural
• Políticas de assistência técnica e extensão rural
Educação do Campo e Ciências Agrárias
• A extensão rural é um elo entre a educação do campo e as ciências agrárias.
• Atualmente é assumida por instituições de ensino e pesquisa após o desmonte das
EMATERs.
• O Projeto Rondon tem início em 1967 com 30 universitários da Guanabara e dois
professores em Rondônia.
• Recebe o nome em homenagem ao Marechal Cândido Mariano da Silva Rondon e
foi institucionalizado como política pública extensionista universitária para o
desenvolvimento social e econômico.
• Em 1989 foi extinto pelo governo e relançado em 2004.
Educação do Campo e Ciências Agrárias
• A extensão não contempla a educação do campo quando:
a. Objetiva a instrução exclusiva do conhecimento prático;
b. Não considera o conhecimento tradicional;
c. Promove educação colonizadora.
Educação do Campo e Ciências Agrárias
• Como atender a essas demandas
sem a extensão?

• Como democratizar o acesso às


informações às populações
pobres e excluídas?

• Que tipo de educação utilizar


senão a do Campo?
Etnociência para a Educação do Campo
• Etnociência é o estudo científico com base na cultura em que se aborda o
“conhecimento local” (ALVES, PIRES e RIBEIRO, 2010).

• Se ocupa de um estudo complexo em que se considera o histórico, os aspectos


socioeconômicos, culturais, ecológicos e políticos (MONTEIRO, BEVILAQUIA e
CAMURÇA-VASCONCELOS, 2011).

• Etnomatemática, etnobiologia, etnoecologia, etnobotânica, etnozoologia,


etnofarmacologia, etnopedologia, etnozootecnia e etnoveterinária.
Etnociência para a Educação do Campo
• Etnoveterinária é um termo dado por Mc Corckle em 1986 (MONTEIRO,
BEVILAQUIA e CAMURÇA-VASCONCELOS, 2011).

• Nos tratamentos veterinários são empregados produtos de origem vegetal


(fitoterápicos), animal (zooterápicos) e minerais (BARBOSA-JÚNIOR et al.
2020).
Etnociência para a Educação do Campo
• A etnozootecnia abrange temas diversos como:
• a produção de leite e derivados, a conservação de raças ameaçadas, os cruzamentos
interespecíficos, aspectos bioacústicos da domesticação, a alimentação animal e as
preferências dos produtores relativas a cruzamentos e seleção artificial.
(ALVES, PIRES e RIBEIRO, 2010)
Etnociência para a Educação do Campo
• Apropriações e assimilações tecnológicas e culturais proporcionam
discriminação e subjugação de povos minoritários.

• A ciência ocidental valida o conhecimento popular


e se apropria dele

• A biopirataria é um exemplo disso!


O compromisso das Ciências Agrárias com a
Educação do Campo
• Todo profissional das ciências agrárias deve se compromissar com as diversas formas de
conhecimento e produção agropecuária.

• Quando o público for carente social, econômica e educacionalmente devemos estar tão bem
preparados quanto somos formados a estarmos preparados para o agronegócio.

• Considerar que existem outros conhecimentos e que podem ser validados cientificamente
para benefício das populações tradicionais deve ser uma preocupação do veterinário,
zootecnista ou agrônomo.
O compromisso das Ciências Agrárias com a
Educação do Campo
• Nem sempre o uso da tecnologia de ponta que aprendemos na universidade
pode ser utilizada para o desenvolvimento social e econômico de uma
população tradicional, pois a tecnologia lhe é inacessível.
• O profissional das ciências agrárias deve se pautar no conhecimento
científico que tem para validar ou aprimorar as tecnologias locais conforme a
ciência ocidental. (Ex.: uso de cinzas para desinfecção, mel para cicatrização,
fitoterápicos para tratamentos patológicos, etc.).
• Com base na ciência o profissional saberá validar ou não uma menzinha.
Referências
• ALVES, AG.C.; PIRES, D.A.F.; RIBEIRO, M.N. Conhecimento local e produção animal: uma
perspectiva baseada na etnozootecnia. Archivos de Zootecnia, v. 59(R), p. 45-56, 2010.
• BARBOSA-JÚNIOR, S.A.; ALBUQUERQUE, C.A.; BATISTA-NETO, M.A.; FERREIRA, J.S.;
FRITAS, A.A.; RIZZO, H. Um diálogo entre a etnoveterinária e a agroecologia: análise da relação de
camponeses(as) com a criação de bovinos em assentamentos rurais no estado de Pernambuco. Revista
Agricultura Familiar – RAF, v. 14, n. 1, p. 142-164, 2020.
• BRASIL, Lei nº 9.394, de 20 de dezembro de 1996. Lei de Diretrizes e Bases da Educação Nacional.
Disponível em: <http://www.planalto.gov.br/ccivil_03/Leis/L9394.htm>. Acesso em 08 Jan. 2015.
• CALDART, R. S. Por Uma Educação do Campo: traços de uma identidade em construção. In:
ARROYO, M. G; CALDART, R. S.; MOLINA, M. C. (Org.). Por uma educação do campo. 3ª edição.
Petrópolis – RJ: Vozes, 2008. p. 147-158.
• MOLINA, M. C. (org.). Educação do Campo e Pesquisa. Brasília: Ministério do Desenvolvimento
Agrário, 2006.
Referências
• MONTEIRO, M.V.B.; BEVILAQUIA, C.M.L.; CAMURÇA-VASCONCELOS, A.L.F. Metodologia
aplicada a levantamentos etnoveterinários. Veterinária em Foco, v. 9, n. 1, p. 76-87, 2011.
• MUNARIM, A. Trajetória do movimento nacional de educação do campo no Brasil. Revista Educação,
Santa Maria, v.33, n.1, p.57-72, jan./abr. 2008.
• MUNARIM, A.; LOCKS, G.A. Educação do campo: contexto e desafios desta política pública. Olhar de
professor, Ponta Grossa-PR, v. 15, n. 1, p. 77-89, 2012.
• OLIVEIRA, M.C.P. Educação do campo: concepção, contribuições e contradições. Revista Espaço
Acadêmico, n. 140, 2013. ISSN: 1519-6186.
• PEIXOTO, M. Extensão rural no Brasil – uma abordagem histórica da legislação. Textos para Discussão
48. Consultoria Legislativa do Senado Federal – Coordenação de Estudos, Brasília, outubro / 2008. 50p.
ISSN: 1983-0645.
• SANTOS, J.R. Da educação rural à educação do campo: um enfoque sobre as classes multisseriadas. In:
IV Colóquio Internacional Educação e Contemporaneidade, Laranjeiras-SE, Brasil, 22 a 24 de setembro
de 2010. ISSN: 1982-3657.
Muito obrigado!
• Contato: rafael.aquino@ifsertao-pe.edu.br

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