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ALBERTO CAEIRO

Análise dos poemas

"Poema Segundo" O Mundo não se fez para pensarmos nele


(Pensar é estar doente dos olhos)
O meu olhar é nítido como um girassol. Mas para olharmos para ele e estarmos de
Tenho o costume de andar pelas estradas acordo...
Olhando para a direita e para a esquerda,
E de, vez em quando olhando para trás... Eu não tenho filosofia: tenho sentidos...

E o que vejo a cada momento Se falo na Natureza não é porque saiba o

É aquilo que nunca antes eu tinha visto, que ela é,

E eu sei dar por isso muito bem... Mas porque a amo, e amo-a por isso,

Sei ter o pasmo essencial Porque quem ama nunca sabe o que ama

Que tem uma criança se, ao nascer, Nem sabe por que ama, nem o que é amar

Reparasse que nascera deveras... ...

Sinto-me nascido a cada momento Amar é a eterna inocência,


Para a eterna novidade do Mundo... E a única inocência não pensar...

Creio no mundo como num malmequer,


Porque o vejo. Mas não penso nele
Porque pensar é não compreender...

 Este poema é a materialização do sensacionalismo. Nele, o sujeito poético expõe a sua


tese sobre como ser feliz, como obter conhecimento e sobre o amor.
Assim, o poema começa com uma comparação “O meu olhar é nítido como um
girassol”, pois o girassol, para além de ser um elemento da natureza (e o “eu”
comparando-se com ele, aproxima-se da sua realidade, afirmando que também ele faz
parte da natureza), é um se irracional que, mesmo sem pensar, consegue seguir o sol.
Depois, num tom coloquial, muito próximo da prosa e da oralidade, enaltece a sua visão e
a importância que esta tem para a compreensão do mundo, usando palavras do campo
lexical da mesma, como “olhando”, “vejo” e “visto”. De seguida, propõe-nos uma
permanente atitude de ingenuidade face à natureza “Sei ter o pasmo comigo/Quem tem
uma criança se, ao nascer/ Reparasse que nascera deveras…”. Na 2ª estrofe expõe-nos a
sua teoria sobre o que é pensar “… pensar é não compreender…” e demonstra que recusa
o pensamento para viver em comunhão com a natureza. Considera que a única forma de
de conhecer o mundo é através dos sentidos e que não existe um sentido oculto nas
coisas, devemos apenas sentir o que nos rodeia e assimilá-lo, sem refletir: “O mundo não
se fez para pensarmos nele/…/Mas para olharmos para ele e estarmos de acordo”. Por fim,
apresenta-nos a sua definição de amor que pressupõe ingenuidade.
Em suma, o “eu” privilegia os sentidos (sobretudo o olhar) em detrimento do
pensamento para melhor viver em paz com a natureza e consigo.
"Poema Nono"

Sou um guardador de rebanhos.


O rebanho é os meus pensamentos
E os meus pensamentos são todos sensações.
Penso com os olhos e com os ouvidos
E com as mãos e os pés
E com o nariz e a boca.

Pensar uma flor é vê-la e cheirá-la


E comer um fruto é saber-lhe o sentido.

Por isso quando num dia de calor


Me sinto triste de gozá-lo tanto.
E me deito ao comprido na erva,
E fecho os olhos quentes,

Sinto todo o meu corpo deitado na realidade,


Sei a verdade e sou feliz.

 Neste poema, ao comparar-se com um pastor, o sujeito poético fala-nos da sua relação
com a natureza, que lhe é permitida através dos sentidos.
Deste modo, inicia apresentando a sua tese ao longo dos dois primeiros versos. O
primeiro, através de uma metáfora “Sou um guardador de rebanhos”, compara-se a um
pastor que deambula num contato privilegiado com a natureza. No segundo verso, diz-nos
“O rebanho são os meus pensamentos”, e podemos entender que ele guarda os seus
pensamentos, pois não precisa deles. A partir daí vai desenvolver a sua ideia inicial,
enquanto recorre ao polissindeto (repetição da conjunção coordenativa copulativa “e”) e
da estrutura anafórica, explica-nos que conhece a realidade através da sua apreensão
pelos sentidos. Na verdade, desde as necessidades básicas, “…comer um fruto”, até às
estéticas, “…vê-la e cheirá-la” são satisfeitas pelos sentidos,
Por fim, conclui que é o contato com a realidade “Sinto todo o meu corpo deitado na
realidade” é a única coisa que o permite conhecer a realidade e ser feliz “Sei a verdade e
sou feliz”.

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