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t~IUSTRAÇltr ALGUMA VEZ?

MPLEXO DE CULPA?
ANDO AVANTE LUTAS JA

ENTAR A LIBERTAÇÃO QUE


ECE?
precisa ler A Arte de Compreender-se a
o profundo, mas de linguagem
dos principais problemas que
emo enfrenta, mostrando
d Deus atua como força dinâmica
ração completa da personalidade.
fisicos que decorrem de
·ção.
o caminho da reintegração
e.
.• Osbome, fala da experiência
centenas de pessoas
ao participarem
compartilhamento onde o amor
",má~o real através das
a arte de
compreender-se
a si mesmo
CECIL OSBORNE

Tradução de João Barbosa Batista

3 ª edição
odos os direitos reservados.
JUERP para a língua portuguesa.
Copyright @ 1977 da APRESENTAÇÃO
radução autorizada do original Inglês, lhe Art 01 Unders-
tanding Yourself, publicado originalmente pela Zondervan Eis um convite autêntico ...
Publishing House. Copyright @ 1967.
. .. à perspicácia, ao crescimento, ao encontro da
identidade própria ... e à própria vida! Este livro
apresenta uma perspectiva completamente dife-
rente com relação aos problemas fundamentais
de homens e mulheres de todas as convicções
religiosas.

253.7 A Arte de Compreender-se a Si Mesmo tem uma


Osb-Art Osborne, Ceci I mensagem universal, porque trata de elementos
A arte de compreender-se a si mesmo. humanos universais:
Tradução de João Barbosa Batista. 3a edição.
Rio de Janeiro, JUERP, 1983. ansiedade
375p. culpa
Título original em I nglês: lhe Art of Unders- frustração
tandíng Yourself amor
1. Psicologia Pastoral. 2. Problemas Psico-
lógicos - Como Resolvê-Ios. 3. Aconselha- necessidade de melhor relacionamento.
mento Pastoral. 4. Complexos - Como Ven-
cê-Ias. I Título.
CDD - 253.7 o livrodeixa bem claro que há ALGUÉM que nos
ouve, compreende e perdoa. Quando o indivíduo
crê, abre o caminho para a plena realização de
Capa de sua personalidade, através da fé, e para uma
J. Nazareth nova e mais rica compreensão do seu próprio ser
Nº de Código para Pedidos: 25.201 e dos outros.
Junta de Educação Religiosa e Publicações da
Convenção Batista Brasileira
Caixa Postal 320
Departamento de Publicações Gerais
5.000/1983 20001 - Rio de Janeiro, RJ. Brasil

Impresso em gráficas próprias.

5
I

SUMÁRIO

Apresentação 5

1. Seu Ser Sol itário 9


2. União Redentora 33
3. Ansiedade.................... 55
4. A Cura da Ansiedade. . . . . . . . . .. 79

5. Alcançamos o Que Realmente De-

sejamos 99

6. Confissão 117

7. ACulpaeoCastigo 153

8. Culpa e Perdão 175

9. A Guerra Entre os Sexos 203


10. Levando Avante Lutas Já Venci-
das 237

11. A Sua Auto-imagem .......•... 255

12. Que Acontece num Grupo? 273


13. A Cura nos Grupos 303

14. Amor . . . . . . . . . . . . . . . . . . . . . . .. 333

Citações Documentadas 365


índice 371

7
I

1
SEU SER SOLITÃRIO

Se você quiser ser infeliz, deve pensar em si


mesmo, no que você deseja, no que você gosta, em
qual o respeito que os outros lhe devem dar, e então
para você nada será puro. Você estragará tudo que
tocar; você fará pecado e miséria com tudo que Deus
lhe enviar. Você pode ser tão desgraçado quanto
escolher.
Charles Kingsley

Talvez você nunca pensou que é solitário.


Você pode ter amigos, interesses vários e nume-
rosas atividades que ocupam seu tempo e pen-
samento. Mas a verdade é que ninguém co-
nhece você realmente. Um amigo pode saber
algumas coisas acerca de você, e pode ter cons-
ciência de algum dos desejos secretos do seu
coração, mas ninguém jamais sentiu precisa-

9
e esposas, aqueles que são mais caros a nós? Ouvem-nos
mente o que você sente, e, portanto, ninguém as estrelas, quando nos voltamos, desesperadamente, para
pode conhecê-Io inteiramente. longe do homem, ou os grandes ventos, ou os mares ou as
montanhas? A quem pode o homem dizer - Eis-me aqui!
Você sente que ninguém o ouve realmente. Contempla-me na minha nudez, com minhas feridas, meu
Enquanto você está tentando compartilhar al- mal secreto, meu desespero, minha traição, minha dor,
guns dos seus sentimentos mais profundos, minha lingua, que é incapaz de expressar meu pesar, meu
você tem a sensação de que a pessoa a quem terror, meu abandono? . .
você se dirige está esperando, com impaciência Ouça por um dia, uma hora! Um momento!
Silêncio solitário! Ó Deus, não há alguém que escuta?
mal contida, para dizer: "Sim, e isto me faz
Não háalguém que escuta? - você pergunta. Ah! Sim.
lembrar de algo que me aconteceu outro dia." Há Há um que ouve, que sempre ouvirá!
outra razão por que não somos real mente co-' Apressa-te a ele, meu amigo! Ele espera na montanha por
nhecidos por ninguém mais. A razão disto, como você.
aponta Paul Tournier, é que cada um de nós está Sêneca
num estado de tensão entre a necessidade de
nos revelarmos e a necessidade de nos enco-
brirmos. Temos o impulso de compartilhar Sim, há Um que ouve, e muitos têm aprendido
a derramar suas almas diante de Deus, em
nossos sentimentos verdadeiros, mas tememos
oração sincera e satisfatória. Mas milhões de
nos tornar vulneráveis e sermos rejeitados ou
outros - talvez a grande maioria - não têm
criticados. E, como resultado disto, nos limita-
mos às observações banais acerca da superfi- certeza de que ele ouve realmente, e assim não
cial idade da vida: procuram o ouvido daquele que ouve. Ele não
responde verbalmente, não há resposta simpá-
"Que coisa! Como o tempo tem mudado tica e imediata, e eles, afinal de contas, duvidam
ultimamente!" ou fazemos outro comentário que haja de fato alguém que ouça.
qualquer, igualmente banal. "Cada um de nós
faz o melhor que pode para se esconder atrás Taylor Caldwell, em The Listener (O Ouvinte),
de um escudo", diz Paul Tournier, no livro The diz:
Meaning of Persons (O Significado das Pes-
O homem não precisa ir à lua ou a outros sistemas
soas). "Para uns, pode ser um silêncio miste- solares. Ele não necessita de maiores e melhores bombas e
rioso que se constitui seu retiro impenetrável. mísseis. Ele não morrerá, se não conseguir melhor habita-
Para outros, é a conversinha fácil, que nunca ção ou mais vitaminas ... Suas necessidades básicas são
permite que nos aproximemos deles, ou às poucas, e custa pouco satisfazê-Ias, a despeito dos propa-
vezes são a erudição, citações, abstrações, teo- gandistas. Ele pode sobreviver com uma pequena quantia
de pão e no abrigo mais deplorável ...
rias ... trivialidades."l
Quem é que nos ouve no universo inteiro? Nosso amigo Sua necessidade real, sua mais terrível necessidade, é
alguém que o ouça, não só com paciência, mas como alma
ou professor, pai ou mãe, irmã ou vizinho, filho, rei ou
humana ...
servo? Escutam-nos, nosso advogado, ou nossos esposos

11
10
Nossos pastores ouviriam - se nós Ihes déssemos o nesta rua. Ela era uma pessoa muito confusa,
tempo para eles nos ouvirem - mas nós os sobrecarrega- mas de repente se endireitou, e a mudança é tão
mos com as tarefas que deviam ser nossas. Nós exigimos
notável, que resolvi descobrir como foi que isto
que eles não somente sejam nossos pastores, mas que
carreguem nossas trivialidades, nossas aspirações sociais,
aconteceu. Fiquei sabendo que ela participou de
os "divertimentos" de nossos filhos, em suas costas afadi- um grupo aqui na sua igreja. É tudo o que sei.
gadas. Exigimos que eles sejam peritos negociantes, políti- Preciso de ajuda de alguma forma. Talvez eu
cos, contadores, colegas de jogo, diretores da comunida- precise do que ela tem. Já fui a psiquiatras,
de, "bons amigos", juízes, advogados e apaziguadores de médicos, psicólogos, e não melhorei em nada.
brigas locais. Damos a eles pouco tempo para ouvir, e nós Corro aos médicos, com todos os tipos de sinto-
tampouco os ouvimos ... 2
mas, mas o que eles me dizem é que são meus
Este livro é, em parte, a história de gente, nervos. Eu acho que eles querem dizer que são
constituída a princípio de um pequeno grupo, minhas emoções. Dizem que nada há de errado
mas que agora chega aos milhares, que apren- fisicamente comigo, mas eu me sinto terrivel-
deu a ouvir; a história da cura da mente, do mente mal a maior parte do tempo.
espírito, do corpo e a circunstância em que foi
alcançada, porque estas pessoas aprenderam a "Além disso, eu tenho dificuldade de perma-
partilhar mais .orolunoamente" as suas experi- necer num emprego. Minha mulher é quem real-
ências e o o.arocesso , descobriram que o amor mente está sustentando a família. Eu não me
de Deus é mediado através de pessoas; é a sinto bem com isso, mas nem bem arranjo um
história de pessoas que chegaram a conhecer a emprego e já o perco. Brigo com o patrão ou, se
Deus, a si mesmas e aos outros de um modo estou indo bem, por algum motivo, arranjo uma
mais satisfatório do que jamais tinham pensado briga com um empregado, e pronto! Sou des-
ser possível. pedido de novo. Não consigo ficar num emprego
por mais que alguns meses. Não sei qual é o
Joe Dandini* era um homem muito solitário. meu problema. Será que esses grupos, sejam lá
Ele apareceu em meu estúdio uma tarde. Eu o que forem, podem ajudar um cara como eu?"
nunca o havia visto antes. Era um homem de
grande estatura, cordial, extrovertido, todo "Um grupo desses com o tempo poderá ajudá-
amabilidade. "Olhe", disse ele, "eu nem sei bem 10", respond i, "se você trabal har com ele. O
por que estou aqui. Eu sou católico romano, grupo oferece a oportunidade. O resto depende
entende? Mas eu tenho problemas, tenho-os há de você. Os resultados dependem de sua hones-
muito tempo. Bem, há uma mulher que mora tidade para consigo mesmo e de quão profunda-
mente você estiver motivado."
• Este nome, assim como outros usados através desta
obra, em casos típicos, são ficticios, embora as histórias "O que acontece nessas reuniões de grupo?"
sejam verdadeiras ou reais. Joe perguntou.

12 13
"É difícil de descrever. Você terá que experi-
mentar por si mesmo. Mas uma coisa é impor- estava trabalhando de novo, para um homem que
tante: sua esposa deve assistir também. Muitas o havia despedido. Ele permaneceu no emprego
vezes ajuda, se ambos, marido e mulher, assis- desta vez e começou a sentir auto-afirmação pela
primeira vez na vida. Depois de dois anos, ele foi
tirem juntos."
promovido a auxiliar de gerente. Isto não signi-
"Ela não viria", disse enfaticamente Joe. "Eu fica que seu crescimento emocional e espiritual
gastei dinheiro demais com psiquiatras e médi- estava completo. Crescimento espiritual é um
cos, no esforço de conseguir ajuda, e agora ela processo contínuo. Mas a experiência de grupo
não quer saber de nada com esta espécie de que Joe teve resultou em dividendos concretos
coisa. Além disso, eu não sei como ela se que incluíam a habilidade de ganhar a vida, u~
sentiria vindo a uma reunião numa igreja pro- novo sentido de auto-respeito, melhor comuni-
testante. " cação com sua família e uma profissão de fé que
a família toda fez quando pediram para serem
Sugeri-lhe que a convidasse, de qualquer
membros da igreja. Joe, esposa e filha devotam
modo, e insistisse para que ela assistisse pelo
agora uma grande parte de seu tempo a ativi-
menos por um mês. E, na primeira reunião, Joe
dades cristãs.
trouxe mesmo sua esposa, uma pessoa agra-
dável e tranqüilamente eficaz. Joe nos declarou A solidão de Joe, sua auto-rejeição e o senti-
durante a reunião: "Fui para casa e disse a ela mento de fracasso; sua alienação de Deus, de si
que eu ia me juntar a um grupo lá na Igreja mesmo ~ do próximo eram, em parte, o resul-
Batista de Burlingame. E acrescentei: Falei pra tado de. forças ambientais. Pode-se também
eles que v.ocê não assistiria. Ela respondeu: dizer que foi o pecado que produziu as dificul-
'Lá vem você, tomando decisões por mim outra dades dele. Pecado era a soma total das forças
vez. Claro que vou!'" que faziam com que ele tivesse uma personali-
dade distorcida. O pecado estava por detrás dos
Não houve nenhuma solução milagrosa ou
repentina para o problema de Joe. Ele comparti- fatores que fizeram seu pai austero e autoritário,
o que o tornava incapaz de se comunicar com o
lhou seus profundos sentimentos de rejeição
quando menino, o medo que sentia para com seu filho. Pecado, no caso de Joe, era uma combi-
nação de forças sociais, psicológicas e espiri-
pai autoritário, que era policial. Quando toma-
mos conhecimento de tudo sobre sua infância, tuais, que o deixava incompleto, incapaz de
entendemos por que ele reagia daquele modo. funcionar adequadamente como pessoa, pai e
Seu progresso foi lento, mas firme. Não há marido. A resposta, para Joe, foi o amor de
método conhecido pelo qual uma estrutura Cristo, mediado por um grupo de pessoas que
emocional imatura possa ser mudada da noite genuinamente se interessaram por ele. No seu
para o dia. Entretanto, dentro de um ano Joe grupo, Joe e sua esposa vieram a sentir-se
amados e aceitos. O grupo era a igreja em ação,

15
a família de Deus, através da qual o amor pode tem-se mais achegados a elas do que aos seus
ser canalizado, para abençoar, curar e orientar. parentes carnais.

É extremamente ingênuo pensar-se no pecado A idéia de grupo pequeno é uma das forças
simplesmente como um ato isolado, uma men- espirituais mais dinâmicas do século vinte.
tira, um roubo, imoralidade,desonestidade - Desde a Segunda Guerra Mundial temos redes-
porque pecado é tudo aquilo que fica aquém da coberto seu tremendo poder. Sob vários nomes,
perfeição. É rejeição de Deus - "destituir-se" pequenos grupos são formados, com grande
da perfeição que Deus nos preparou. Pecado é rapidez, em igrejas de muitas denominações.
ser distorcido, e não simplesmente praticar um Homens e mulheres estão descobrindo que os
ato mau. É ter relação e atitudes distorcidas. É serviços e atividades rotineiras da igreja local
ser menos que a integridade. É ter motivos não trazem motivação suficiente para um cresci-
confusos. Pecado é a racionalização inteligente, mento espiritual significativo.
pela qual procuramos escapar de nos encon-
trarmos com nós mesmos. Ele pode consistir de Uma hora por semana, gasta na igreja, nunca
um punhado de "obrigações" moralistas e rígi- teve o objetivo de providenciar respostas para
das, em vez de obediência ao Espírito de Deus, as nossas necessidades espirituais mais pro-
que habita em nós, em agir somente em resposta fundas. A igreja do primeiro século indubitavel-
a códigos legalistas (e sentir-se virtuoso em mente consistia de grupos pequenos, além das
assim fazer), em vez de aprender a agir esponta- reuniões semanais para adoração e instrução.
neamente, em resposta ao impulso divino.
Muitos, erroneamente, assumem que o cristia-
Muitos membros de grupo se tornam capazes nismo se preocupa somente com a verdade
de deixar de lado seu conceito limitado e infantil "bíblica" (que definem estreitamente), e que as
de pecado como alguma coisa confinada a "atos verdades psicológicas, de alguma forma, não
maus" ou "pensamentos maus" e descobrir que têm nada a ver com assuntos espirituais. Eles
pecado é o que nós somos, cheios de faltas, esquecem, naturalmente, que toda verdade é
distorcidos, não tendo suficiente maturidade divina em sua origem, quer seja uma lei cien-
espiritual. Eles descobrem uma nova qualidade tífica, um princípio filosófico ou uma verdade
de amor, porque, onde o repartir acontece num bíblica. A teologia em geral lida com a natureza
ambiente apropriado, as relações de amor geral- de Deus e sua vontade para com o homem. A
mente se seguem. Eles aprendem a orar por psicologia trata do homem e sua natureza inte-
uma outra pessoa diariamente e com interesse rior. Precisamos conhecer Deus. Precisamos
sincero. Para muitos, as pessoas dos seus conhecer tudo o que pudermos acerca de Deus, a
grupos tornam-se sua família, como alguns já o fonte de nosso ser, e tudo o que for possível
expressaram, porque eles freqüentemente sen- acerca do homem, criado à imagem divina.

17
vidas dos homens e assim santificou a vida toda.
Portanto, através de todo o livro, não faço
Ele curou seus corpos e fez da cura uma função
distinção entre verdade sagrada e verdade se- sagrada para sempre. Ele falou da natureza de
cular, porque todo aspecto da vida é sagrado.
Deus e das relações cotidianas entre os homens
O homem, criado à imagem de Deus, é sagrado; ao mesmo tempo. No Sermão do Monte, ele
e seu corpo físico, nos diz a Bíblia, é o templo do
ensinou princípios espirituais, filosóficos, psi-
Espíríto Santo. O mesmo Deus que criou o
cológicos e sociológicos; discutiu proces-
homem projetou o universo, com intenção santa. sos, oração, divórcio, ansiedade; amor, perdão,
Cada árvore e cada folha de grama, cada átomo reconciliação, raiva, e um punhado de outras
e molécula, todo fragmento de verdade são
coisas que pertencem à vida de cada dia. Jesus
sagrados. Cada lei cientificamente descoberta
estava i nteressado em todas as coisas concer-
pelo homem originou-se em Deus, e é sagrada.
nentes aos homens, e seu interesse amoroso
Não há distinção entre "sagrado" e "profano",
nos diz que esta é a natureza de Deus - que ele
"santo" e "comum".
está interessado em cada detalhe de nossas
A ordem de Deus a Moisés, no Monte Sinai - vidas. Com Deus, não há categorias, tais como
"Tira as sandálias , porque o lugar onde pisas é ciência e religião, o sagrado e o profano.
terra santa" 3 - não significava que só aquele
No livro de Marc Connelly, The Green Pastures
determinado pedaço de terra sobre o qual Moi-
sés estava era santo. A implicação é que Moisés (Os Pastos Verdejantes), quando "o Senhor'" se
tinha procurado encontrar Deus em algum lugar prepara para deixar o céu e descer à terra, para
"sagrado" especial. Deus estava dizendo a ele ver como seus filhos estão passando, ele dá
que, onde quer que ele se encontrasse, ali era algumas instruções finais a Gabriel: "Gabriel,
um lugar santo, e Deus o podia encontrar lá. não te esqueças daquela estrela que não tem
funcionado direito. Toma conta disto." Gabriel
Muitos têm a tendência de pensar que o concorda. "E, Gabriel, lembras-te daquele pe-
trabalho de um ministro é um tanto sagrado queno pardal de asa quebrada? Toma conta disto
porque ele deve estar interessado principalmente também, sim?" Neste drama deleitoso, o autor,
em assuntos espirituais, enquanto de um mé- muito corretamente, retrata Deus como estando
dico, que trata de corpos físicos, raramente igualmente interessado no cosmos e nos par-
se diz que está engajado num trabalho santo. dais. Aquele que já compreendeu a bela harmo-
Toda pessoa, qualquer que seja sua vocação, nia que existe em toda a natureza, que já teve um
pode ter o sentimento de realizar uma missão vislumbre da unidade peculiar do universo todo,
divina, se ela estiver cônscia do amoroso inte- e sentiu que Deus está em nós e nós nele, e que
resse de Deus por todos os aspectos da vida. todas as coisas, em nosso universo, são uma
Jesus não fez distinções artificiais entre sa-
• No original, "o Sinhô".
grado e profano. Ele tratou de cada aspecto das

19
18
parte de Deus - esse nunca mais poderá fazer que ensinou o caminho, que ele mesmo é o
distinção entre sagrado e profano. Porque "toda caminho, o caminho para viver e ter vida abun-
a terra está cheia da glória de Deus", e todas as dante e eterna.
coisas nela são santas, exceto quando tocadas
Se pudéssemos ver, de uma vez por todas,
pelo pecado e despojadas de sua perfeição que o cristianismo é um modo de vida, não só
divina. para o domingo e emergências, e não só um
Os místicos, que adentraram o véu da cons- conjunto de princípios morais; se pudéssemos
ciência humana e tiveram um vislumbre do infi- nos despojar da crença de que Deus se interessa
nito, confirmam que há uma unidade em todas principalmente em que sejamos bons, teríamos
as coisas, muito além do poder de compreensão dado um grande passo para frente. Deus não
da mente humana no seu estado comum. Mui- está interessado só na necessidade de seus
tos, que têm explorado algumas drogas que filhos serem decentes, morais e honestos, em-
expandem o consciente, tais como o LSD-25, bora sejam desejáveis esses traços. Ele está
embora suas experiências variem largamente em interessado, Jesus ensinou, em que nossas
muitos aspectos, relatam uma percepção mís- vidas sejam ricas, cheias e criativas; em que
tica: a lucidez repentina, mais sentida que descubramos nosso potencial mais alto; em que
percebida pela mente, de que o universo é um de tenhamos amor, alegria, paz, felicidade, uma
um modo impossível de ser descrito por pala- vida abundante, a vida eterna. Jesus falou disso
vras. Todos eles contam de eles mesmos expe- tudo várias vezes, durante seu ministério. No
rimentarem ser uma parte do todo, de ser um só Evangelho de João, por exemplo, estão registra-
com Deus e a natureza, e ainda assim estarem das estas palavras:
separados e serem autônomos. "Um novo mandamento vos dou: que vos
Muita gente tem descoberto, em graus varia- ameis uns aos outros, como eu vos amei."
dos, que para o cristão não há linha divisória "Pedi, e recebereis, para que a vossa alegria
entre religião e vida, que toda vida é sagrada, e seja completa."
que o cristianismo deve ser aplicado a todos os
aspectos da vida. Jesus nunca usou a palavra "A minha paz vos dou ... "
"religião" (que aparece somente duas vezes no "Se sabeis estas coisas, felizes sereis se as
Novo Testamento). Parece que ele nunca pensou cumprirdes."
na relação da pessoa com Deus como se ela
envolvesse "um dever religioso" ou mesmo um "Eu vim para que tenhais vida, e a tenhais em
ato religioso no sentido em que muita gente usa abundância."
tais termos. Ele não separou a vida em sagrada e "E a vida eterna é esta: que te conheçam a
profana. Os cristãos eram chamados de "os ti, o único Deus verdadeiro, e a Jesus Cristo, a
seguidores do Caminho," e Cristo era Aquele quem enviaste.,,4

20 21
Ele ofereceu isto e muito mais. A maioria de Elizabeth O'Conner reconta uma experiência
nós se contentaria com uma ou duas destas seis de Gordon e Mary Cosby. Gordon é pastor duma
grandes bênçãos que ele ofereceu aos seus igreja mais conhecida como Igreja do Salvador,
seguidores. Ao fazer do cristianismo outra reli- em Washington, D.C. "Ele tinha pregado numa
gião, em vez de o Caminho da Vida, perdemos o igreja onde a atmosfera não era nada vibrante.
centro da mensagem dele. Conforme nos conta Miss O'Conner:
Parece que falta alguma coisa na igreja orga- Gordon disse: "Enquanto eu olhava para aquelas figuras
nizada de hoje, algo que estava muito em evi- de granito, tive que reprimir o impulso de rasgar minhas
dência entre os cristãos do Novo Testamento. vestes e sair da igreja para dentro da noite, onde o ar fosse
límpido e eu pudesse me sentir purificado. Eles tinham-se
A Igreja Cristã é a maior força do bem que temos
juntado, como tudo indicava, para comemorar uma data
na terra, e, embora fraca, não deve ser desacre- significativa da igreja, mas a única evidência de vida era o
ditada. Mas nós, que amamos a Igreja, podemos tilintar de moedas caindo na bandeja de ofertas."
avaliar suas fraquezas. Pois são, na realidade, as Quando o culto terminou, naquela noite, ele e Mary foram
nossas próprias fraquezas. de carro bem longe. Finalmente pararam num pequeno
hotel, onde o último quarto vago ficava acima de uma
Na igreja média, dez por-cento dos membros taverna. Vozes barulhentas e melodias alegres de vitrola
fazem noventa por-cento do trabalho. Trinta por- entravam em seu quarto e não os deixavam dorm ir. Refle-
cento sustentam noventa por-cento do orçamen- tindo sobre os sons que vinham de baixo e a igreja de que
haviam saído, Gordon ponderou: "Compreendi que havia
to. Quarenta por-cento assistem à igreja aos
mais calor e comunhão naquela taverna do que na igreja.
domingos de manhã. Isto está muito aquém da Se Jesus de Nazaré tivesse que fazer sua escolha, ele
Igreja Vitoriosa. provavelmente teria ido à taverna, e não à igreja que
visitamos. "
O amor entre os membros de uma igreja média
é pouco maior do que entre os rotarianos ou No dia seguinte eles tomaram o café da manhã num bar
do outro lado da rua do hotel. As pessoas que entravam e
Kiwanos. De fato, há uma espécie de comunhão
saiam cumprimentavam umas às outras, liam seus jornais
mais aberta entre membros de clubes de serviço e comentavam sobre as notícias do dia. "Pensamos outra
do que a encontrada em algumas igrejas. Na vez" disse Gordon "que Cristo se sentiria muito mais em
igreja média de cem ou mil membros, a maioria cas; no bar." 5 '
deles não conhece uns aos outros, a não ser de \. Muitos membros de igreja, se pensassem
uma maneira muito casual. Não podemos amar as seriamente,· teriam que admitir que eles estão
pessoas sem antes as conhecermos, e é impos- solitários e que não se sentem particularmente
sível conhecer cem ou mil pessoas, a não ser em amados por um número apreciável de pessoas na
um nível muito superficial. Mesmo assim, o igreja. Ninguém tem culpa; acontece que a igreja
amor é que devia ser o distintivo do crente. simplesmente se tornou gradativamente uma
"Nisto conhecerão todos que sois meus dis- instituição, em vez de uma comunhão amorosa.
cípulos, se vos amardes uns aos outros." Mas não é impossível mudar isto. Nos últimos

22 23
anos esta situação tem sido mudada para milha- do que fazia, ou da razão de fazê-Ia, ela con-
res de pessoas. seguia sentir-se ferida em seus sentimentos
ou inventar maneiras pelas quais podia ser rejei-
Quando uma pessoa visita uma igreja pela
tada. Acabou vendo, pelo menos intelectual-
primeira vez, 'ela participa dum culto de ado-
mente, que era ela que estava trazendo a maior
ração, e o que é dito no sermão pode ou não ser
parte de seu sofrimento sobre si mesma.
aplicado às suas necessidades particulares.
Ela pode ser cumprimentada e convidada a Na sessão de aconselhamento com ela, li-
voltar, mas nada além disso, nada de impor- mitei-me a ouvir, e, no final da nossa conversa
tãncia real ocorre para levá-Ia a acreditar que sugeri que ela participasse de uma de nossa~
aquele é um grupo de pessoas que têm profundo sessões de grupo. Ela tornara-se membro de
interesse por ela. As manifestações de amor são grupo por vários anos, e gradativamente revelou
geralmente limitadas a uma saudação amistosa, as recordações de sua infância. Seu pai tinha
e a gente pode conseguir isto quase que em sido uma pessoa de moral elevada, rígido e
toda parte.
autoritário. Ela nunca fora capaz de se relacio-
Em certa época, se alguém tivesse pergunta- nar com ele, ou de sentir a mínima afeição por
do a Margarida qual era seu problema, ela teria ele. De fato, todo sentimento de que tinha cons-
dito: "Todo o problema é o meu marido. Ele é ciência era de hostilidade e rejeição, emoções
alcoólatra." Não me lembro da primeira vez que que havia parcialmente escondido. Ela sempre
ela apareceu na igreja ou o que a levou a vir se sentiu vagamente culpada quando criança,
ver-me. Ela revelou parte de sua necessidade em parte por causa dos padrões de conduta não
e disse-me que estivera consultando um psi- alcançáveis que lhe foram impostos, em parte
quiatra. Como resultado do seu aconselhamento, porque se sentia rejeitada. A criança rejeitada
ela veio a compreender que nem tudo era falta de sempre se sente culpada. Embora uma criança
seu marido. É verdade que ele bebia em excesso não ordene seu pensamento desta forma, o
e as dificuldades resultantes eram suficientes sentimento resultante é: "Sou rejeitada, e não
para causar depressão em qualquer pessoa. Mas amada. Se eu fosse uma criança boa, eles me
Margarida tinha encarado o fato de que no íntimo amariam. Não sou amada porque devo ser má."
ela era o que o psiquiatra chamava de "colecio- O resultado é um sentimento profundo de culpa
nadora de injustiças". Mesmo quando as coisas e inutilidade. A criança simplesmente não se
iam razoavelmente bem em casa, ela sempre sente digna de ser amada. Por tais razões,
encontrava razão para reclamar e aborrecer seu Margaret "mergulhou nos sentimentos de auto-
marido, e por causa disso ele bebia até ficar comiseração e auto-rejeição", como ela mesma
embriagado. Ela era uma masoquista psíquica, disse. Mas, sabendo da rejeição por ela expe-
com uma necessidade profunda, mas incons- rimentada em sua infância, a gente só podia
ciente, de ser punida. Inteiramente inconsciente sentir compreensão e compaixão, particular-

2S
mente porque ela estava fazendo um esforço
por muitos anos sem serem capazes de resolver
heróico para tornar-se um adulto maduro.
seus problemas pessoais.
A transformação de Margaret foi tão notável,
Nem todos os que participam dessas sessões
que seu irmão decidiu juntar-se ao grupo. Na de grupo têm dificuldades pessoais sérias. Mui-
primeira sessão, Jeff, uma pessoa agradável e tos se reúnem a fim de aprender a orar, ou ser
amistosa, contou sua história. Tinha gasto cerca crentes mais efetivos, e, conquanto estas sejam
de $ 30,000 com psiquiatras, sabia tudo o que
necessidades significativas, elas não constitu-
estava errado com ele mesmo e jorrava termos em, para a maioria das pessoas, uma crise real.
psiquiátricos á menor provocação. Estava
sofrendo de uma "paralisia de análise". Contou Ocasionalmente, alguém diz: "Eu não preciso
que, depois de ter passado por nove anos de desse tipo de grupo, pois não tenho problemas
tratamento psiquiátrico Freudiano, ainda era reais." O que tais pessoas querem dizer, natural-
uma pessoa muito confusa. Sua esposa uma vez mente, é que não experimentam nenhuma crise
lhe dissera pessoalmente: "Jeff, por que você pessoal grande. Elas são capazes de cuidar dos
não faz um seguro bem grande e dá cabo de si, a problemas menores da vida, sem muita dificul-
seguir, com um tiro?" Ele contou isto sem dade. Mas têm problemas realmente. Toda pes-
nenhum rancor, e acrescentou: "Na realidade, ela soa tem conflitos íntimos, porque a dificuldade
tinha dado uma boa sugestão. Eu não prestava de se alcançar estado mais elevado de nosso ser
nem para mim mesmo nem para minha família." constitui-se em um grande problema. Dr. Leon J.
Saul, professor de psiquiatria da Escola de Me-
Seis meses mais tarde, Jeff havia feito pro- dicina da Universidade da Pensilvânia, diz: "Nin-
gresso significativo, tanto assim que disse: "Te- guém é totalmente maduro emocionalmente, ou
nho feito mais progresso espiritual e emocional está em perfeita harmonia com seus desejos,
nestes seis meses do que em nove anos de sua consciência e o mundo exterior ao seu redor.
tratamento psiquiátrico. Aprendi a orar e a me Esta discrepância entre o desejo e a realização é
relacionar com Deus como um Pai Celestial expressa por infelicidade, tensão emocional e
amoroso, e me comunico com ele freqüente- neurose, que todos carregam. 6
mente durante o dia." Seu progresso continua e
Como Fritz Kunkel apontou, ninguém faz uma
ele está descobrindo que não há limite para o
crescimento espiritual. mudança significativa de sua personalidade ou
situação de vida enquanto não for motivado por
uma dor de alguma espécie. Rollo May diz: "As
Ao relatar a experiência de Jeff, não tenho
pessoas, então, deviam regozijar-se no sofri-
nenhuma intenção de desacreditar os psiquia-
mento, por mais estranho que isto pareça, por-
tras. Muitos que descobriram que a psiquiatria
que isto é um sinal dadisponibiJidade de energia
não os ajudaria também assistiram em igrejas
para transformar seus caracteres. O sofrimento é

26
27
o meio de a natureza mostrar uma atitude enga- çarem maior crescimento espiritual. Depois de
nosa ou um modo de comportamento, e... para a alquns meses de discussão, baseada num livro
pessoa não egocêntrica, todo momento de so- devocional, o grupo votou fazer um dos inven-
frimento é oportunidade para crescimento." 7 tários de crescimento espiritual. Estes são basi-
camente inventários psicológicos, aos quais foi
Aqueles, para os quais a vida corre mais ou
adicionado um sistema de folhas de avaliação,
menos numa paz serena, que não se sentem
que os membros do grupo recebem semanal-
ameaçados por doenças físicas, tensão conjugal
mente ou de duas em duas semanas. Uma folha
ou sofri mento mental, geral mente estão conten-
recebida por Chuck revelou que havia nele muita
tes em manter o status quo. Eles não são
hostilidade enterrada, da qual ele estava, na
motivados a uma entrega espiritual significativa
maior parte, inconsciente. Ele havia partilhado
ou a um crescimento além do seu nível atual.
com o grupo seus terríveis ataques de asma e
Entretanto, além da facada aguda de uma crise febre de feno, e começou a imaginar se sua hos-
como força motivadora para a procura do alívio, tilidade reprimida e sentimentos de dependência
há também a sombria pulsação da frustração. não tinham alguma ligação com seus problemas
Muitas pessoas, aos seus trinta ou quarenta respiratórios, que mais ou menos o incapacita-
anos, começam a descobrir, pela primeira vez, vam por uma parte do ano.
que a vida é consideravelmente mais frustradora Eles deixaram o grupo depois de mais ou
do que jamais sonharam possível, aos seus vinte menos um ano, e algum tempo mais tarde per-
anos. Pelo menos três quartos de todos os ca- guntei-lhe de sua asma e febre de feno. Ele
sais experimentam tensão e lutas ocasionais ou disse, surpreso: "Oh! você não sabia?! Eu me
contínuas. Eles, na maioria das vezes, só pro- livrei disto assim que descobri tudo sobre minha
curam um conselheiro matrimonial depois de hostilidade enterrada. Quando aprendi a lidar
haver tantas cicatrizes e recordações dolorosas com a hostilidade, minha asma desapareceu."
que tornam difícil, se não impossível, conseguir Ele não tinha se juntado ao grupo por causa da
uma reconciliação. asma, mas quando resolveu alguns de seus
Em nossos grupos, no Oeste, temos centenas problemas emocionais, através de uma forma de
de casais que não têm dificuldade mais séria do oração mais madura, seus sintomas físicos de-
que a de aprender a se comunicar melhor, de sapareceram. Em tempo algum ele orou por sua
selecionar seus sentimentos e aumentar o nível asma. Em vez disso, tratou da causa subjacente,
de sua tolerância para com a frustração, através sua hostilidade enterrada e não reconhecida.
da aplicação de leis espirituais. Duas mulheres, membros de grupos diferen-
Ninguém podia imaginar que houvesse um tes estavam procurando crescimento espiritual
casal mais feliz do que Chuck e Henrietta. Eles e u'm grau maior de paz interior. Eu não tinha
se juntaram a um grupo, na esperança de alcan-

29
ramos nossas máscaras, descobrimos que so-
conhecimento, então, de que ambas sofriam de mos aceitos num nível novo.
enxaquecas, uma delas por vinte e cinco anos, e
a outra por um período de tempo mais curto. Numa sessão de um grupo principiante, en-
Embora elas não orassem pelo alívio de seus quanto várias pessoas partilhavam seus senti-
sintomas físicos, ambas foram curadas como mentos, um homem disse: "Acabei de experi-
resultado do novo crescimento espiritual que mentar uma inversão completa de meus senti-
alcançaram. À medida que se relacionaram em mentos para com AI. Eu o conheço por muito
amor e confiança com o Deus de paz, seus tempo numa base muito superficial. Sempre
sintomas físicos simplesmente desapareceram. pensei que ele agia como se fosse superior,
Ao invés de orar por seus sintomas físicos, elas sendo, talvez, um pouco esnobe. Agora mesmo,
focalizavam-se em Deus, na sua meditação diá- quando ele partilhou alguns dos seus sentimen-
ria. No grupo encontravam uma oportunidade de tos de inadequação, eu gostei dele realmente
partilhar seus sentimentos. Embora fossem bem porque tenho os mesmos sentimentos em rela-
pessoais nas suas revelações, não compartilha- ção a mim. Eu não sinto mais rejeição da parte
ram nenhum detalhe íntimo de suas vidas.A cura dele. Somos iguais. Talvez eu também encubra
se efetuou quando obedeceram literalmente ao alguns de meus sentimentos de inadequação
mandamento de Jesus: "Buscai primeiro o reino com a pretensão de superioridade, que realmen-
de Deus e a sua justiça, e todas estas coisas vos te não sinto. De qualquer modo, AI, eu o tenho,
serão acrescentadas." por assim dizer, suportado até este instante.
Agora eu ... bem, acho que posso dizer que o
Uma das descobertas gratificantes feita du- amo."
rante os primeiros oito anos em que estes gru-
pos de compartilhamento estiveram em opera- Você pode nunca ter pensado ser solitário,
ção no Oeste é a maneira pela qual as barreiras mas o sentimento está lá da mesma maneira, a
entre as pessoas são quebradas fácil e natural- menos que você tenha quebrado a barreira do
mente. Estas barreiras invisíveis fazem com que seu medo de rejeição. E quando você conseguir
nós não conheçamos nem amemos uns aos revelar seu ser verdadeiro, mesmo em pequena
outros e trazem a solidão ou o sentimento de parte, você se encontrará aceito e amado em
isolamento, experimentados pela relutância em novo nível. E, além disso, você virá a se conhe-
nos revelarmos aos outros, por medo de rejei- cer, à proporção que se revelar aos outros,
ção. Dentro do grupo, barreiras são desfeitas e porque nosso medo de sermos conhecidos por
nos descobrimos amando pessoas de que antes outros não é maior do que o medo de conhecer-
nem mesmo gostávamos. Descobrimos que, mos a nós mesmos.
quanto mais os outros aprendem de nós, mais Não é "por força nem por poder", nem por
fácil se torna para eles nos aceitarem e amarem. organização, cruzada ou campanha que o Reino
Ninguém pode amar uma máscara. Quando ti-

31
30
de Deus virá à terra ou a qualquer ser humano.
Ele só vem pelo amor - amor a Deus e aos
outros - que constrói uma ponte no nosso iso-
lamento e desfaz nossa solidão.

UNIÃO REDENTORA

Jesus indica que não há absolutamente nenhum


substituto para a Ei(1uena sociedade redentora. Se
esta falhar, ele dá a entender, tudo será fracasso; não
existe outro rnelo.!
- Elton Trueblood

Cristina, uma jovem senhora, .casada, com


seus trinta anos, tinha três anos de idade quan-
do seu pai foi preso. Por toda a vida ela tem
suportado um sentimento de vergonha por seu
pai ter sido condenado. Enquanto ele estava na
cadeia, Cristina e sua mãe viveram com seus
avós. Ela se recorda de que eles eram muito
pobres e que seu avô era um homem durão,
autoritário e sem amor, que expressava hosti-
lidade.

32 33
Quando seu pai voltou para casa, solto por
refeitório, e, de repente, ela se desabafou: "Es-
fiança, ela ficou com muito medo dele. Ele tinha
tou doente e cansada de carregar a culpa de meu
explosões de raiva terríveis, e ela não se lembra pai!" Encorajei-a a contar-me o seu problema, e
de ele tê-Ia alguma vez elogiado ou expressado vagarosa e dolorosamente, ela me expôs, com
amor de alguma maneira. Ele repetidamente lhe detalhes consideráveis, os acontecimentos que
dizia que ela era estúpida. Quando ela se tornou já relatei. Antes de terminar o retiro, ela come-
adolescente, ele a avisou duramente que ela çou, pela primeira vez, a sentir a extensão da sua
nunca devia "arranjar complicações com rapa- violenta hostilidade para com o pai. Ela nunca
zes". Isto foi toda a educação sexual que teve de havia se permitido sentir isto antes. A maior
seus pais; mas, quando tinha cerca de 15 anos, parte da coisa estava enterrada logo abaixo da
seu pai tentou molestá-Ia sexualmente. Ela ficou superficie. Vergonha, culpa, ódio, inferioridade,
chocada e desgostosa. tudo isto se misturava num sentimento violento
de raiva. Eu lhe assegurei que não havia proble-
Cristina se casou com vinte anos de idade.
mas em sentir qualquer das emoções que ela
Seu marido queria filhos, mas ela opôs-se for-
experimentava então, e eventualmente ela pôde
temente à idéia de criar uma família. Quando
admitir no consciente toda a hostilidade repri-
veio o primeiro filho, ela experimentou um
mida, dores e frustrações que nunca havia par-
sentimento profundo de prazer no primeiro mês',
tilhado com ninguém nem totalmente admitido
depois começou a perder o interesse pela cri~n-
a si mesma. Cristina sentiu um alívio conside-
ça. Seu médico a ajudou neste pont? .Ele havia: rável, ao contar sua história, que envolvia a
lhe dito: "Os pensamentos são um habito, e voce
aceitação de que ela tinha sentimentos que nunca
pode mudar o seu padrão de pensamentos p~n-
havia ousado confrontar antes. No processo, ela
sando de outra maneira." Ela se esforçou muito
pôde perdoar seu pai, e isto foi uma experiência
neste sentido e eventualmente teve sucesso e curadora. Mas, inexplicavelmente, sua relação
aceitou seu primeiro filho. Posteriormente ela com o esposo se tornou pior. Às vezes ela mal
conseguiu manter uma relação maravilhosa com podia suportar ficar no mesmo aposento com
ele. Quando o segundo filho nasceu, a mesma ele. Ela experimentava um antagonismo violento
coisa começou a manifestar-se, mas ela desco- e desarrazoável para com ele, o que o deixava
briu, desta vez, que era muito mais fácil amar a intrigado e magoado.
criança.
Na igreja a que Cristina pertencia, alguns
Cristina era uma pessoa muito pacata e tími- grupos se reuniam semanalmente; cada um con-
da. Num retiro, onde a encontrei pela primeira sistia de oito a uma dúzia de pessoas. Alguns
vez, percebi que ela estava lutando com algum grupos estudavam um livro e partilhavam seus
conflito interior profundo. Depois de uma das sentimentos acerca do mesmo. Outros estavam
sessões, aconteceu de eu ir com ela para o fazendo um inventário de crescimento espiritual

34 35
e recebiam folhas de avaliação semanais. O que sou muito mais tolerante com os outros, e
propósito dos grupos era o crescimento espiri- procuro não me apropriar de sua confusão. Gos-
tual, 'o que significava não somente a aquisição to de ajudar onde posso, ao passo que antes eu
de conhecimento bíblico, como requeria maturi- tinha medo das pessoas - medo demais para
dade emocional. Alguns procuravam resolver ajudá-Ias. É maravilhoso ser capaz de amar, ser
problemas pessoais; outros queriam simples- capaz de amar tanto os homens como as mulhe-
mente tornar-se mais maduros na sua entrega e res, e não me sentir culpada. Hostilidade, medo
experiência cristã. e culpa foram substituídos por amor."

Cristina havia-se juntado a um dos grupos Cristina está ativa em sua igreja e tem dirigido
antes que eu a encontrasse, e sua experiência foi grupos efetivamente. Ela quer que sua vida seja
o passo inicial, que resultou em seu interesse tão útil quanto possível. A vontade de Deus é seu
em revelar algumas de suas emoções profun- mais alto ideal na vida.
damente enterradas. Depois de voltar para casa, Comparativamente, poucas pessoas experi-
após o retiro, profundamente perturbada por mentam os problemas que marcaram a vida
causa de sua hostilidade para com seu marido, pregressa de Cristina, mas a história dela revela
ela partilhou alguma coisa a respeito disto com vividamente a maneira pela qual uma comunhão
seu grupo. Ela não sentia necessidade de contar amorosa pode prover discernimento e o clima no
toda a dolorosa história de sua vida anterior. qual a pessoa fica livre para crescer espiritual-
Eles ajudaram-na a ver que ela simplesmente ha- mente. Não é preciso identificar-se com Cristina
via transferido a hosti Iidade que sentia em relação para sentir-se a dificuldade que aprender a amar
ao seu pai para seu esposo. Até onde podia ver, e perdoar envolve. A maioria de nós teme sua
ela havia perdoado seu pai, -rnas a dor do pas- hostilidade, qualquer que seja sua origem, e
sado não lhe permitia abandonar seu ódio intei- sente-se culpada por ela.
ramente. Ao descobrir o que estava fazendo, deu
um passo novo e significativo, entregando toda a Durante os últimos anos, mais de doze mil
pessoas participaram dos nossos grupos de
sua hostilidade a Deus.
çompanheirismo* - na costa oeste. Nosso
Como mais tarde ela me descreveu: "Deus propósito é ajG"'dar as pessoas a tornarem o
se tornou uma realidade para mim pela primeira cristianismo relevante a todos os problemas da
vez. O Deus que eu conhecia antes estava 'Ia em vida e ajudar os crentes no sentido de uma
cima', em algum lugar. Agora encontrei o Deus entrega maior. Usando várias centenas de gru-
que estava aqui dentro de mim e que era uma pos como experiência, começamos a descobrir
parte de mim. Foi a maior descoberta da minha alguns fatos importantes:
vida. Fiquei exultante. Quase não consigo lem-
brar-me do meu 'velho ser' do passado. Descobri • No original, "Yokefellow groups".

36 37
r
Primeiro, que uma pessoa só pode entregar a algum aspecto da personalidade e freqüente-
Deus a parte de si mesma que ela compreende mente apontam para uma emoção ou atitude não
e aceita; segundo, que uma pessoa não pode percebida que constitui uma séria barreira para o
orar eficazmente enquanto não dominar suas crescimento espiritual.
barreiras emocionais; terceiro, que, em grande
parte, não se tem consciência da maioria destas Num grupo de ministros, um dos membros
barreiras; quarto, que os crentes, de modo recebeu uma folha indicando que ele experimen-
geral, não estão mais bem integrados como tava medo intenso de suas emoções, o que o
personalidades do qUB os não-crentes; quinto, impedia de poder dar e receber amor. Ele teve um
que não faz diferença se uma pessoa é metodis- pouco de dificuldade, a princípio, em aceitar
ta,' luterana, pentecostal, batista, episcopal, o que afirmava a folha, pelo que disse: "Eu não
liberal ou conservadora em sua teologia - todos tenho consciência de nenhum medo intenso,
têm as mesmas necessidades espirituais e emo- como diz a folha. É verdade que sou um rouco
cionais. Os membros dos grupos perdem de reservado, e mantenho minhas emoções bem
imediato todo o sentido de pertencer a denomi- controladas, mas sempre considerei que isto
nações diferentes. Quase que logo de início eles fosse uma virtude, não um defeito." Disseram-
sentem que trabalham num nivel mais profundo lhe que lesse sua folha de vez em quando, por-
do que o oferecido pelas bonitas distinções teo- que às vezes leva semanas ou meses, e mesmo
lógicas. Sem negar nenhuma de suas doutrinas, mais tempo, para a pessoa aceitar uma emoção
eles simplesmente passam a um outro terreno, que enterrou bem abaixo do nível do consciente.
onde a realidade de Deus e do amor transcende
O ministro disse a seu grupo, alguns meses
às insignificantes diferenças teológicas.
mais tarde: "Vocês se lembram daquela folha
Outro aspecto da experiência é o uso de que recebi acerca do 'medo das emoções'? Ela
inventários espirituais, que são feitos por, apro- dizia que eu não tinha nenhuma consciência de
ximadamente, três mil pessoas por ano, só na minhas emoções, e, francamente, fiquei um
costa oeste. Esta idéia originou-se da experi- pouco embaraçado, porque não podia ver ne-
ência do Dr. William R. Parker. Ele chamou isto nhum valor nisso. Eu pensei que o psicólogo que
de "terapia da oração". Os inventários são basi- verificara meu teste havia cometido um erro.
camente testes psicológicos feitos para ajudar o "Bem, na semana passada, fui pego de sur-
crescimento espiritual e emocional pelo uso de presa e sem preparo para falar extemporanea-
um sistema de "feedback", ou realimentação, mente, coisa que já tinha feito algumas vezes.
com folhas de avaliação semanais, entregues Pela primeira vez na minha vida tive consciência
aos membros dos grupos. As folhas, distribuí- da emoção do pânico. Verdadeiro pânico. Devo
das regularmente por um período de quinze a ter experimentado isto. freqüentem ente, repri-
vinte e duas semanas, colocam em destaque mindo-o. De fato, dessa vez quase me surpreendi

38 39
subjugando a emoção. No entanto, em vez dis- O alcoolismo dela, naturalmente, era simples-
so, permiti-me sentir o pânico, ou medo, ou o mente uma manifestação exterior de seus senti-
que quer que fosse. Admiti, a mim mesmo, que me~tos de auto-rejeição. Ela era incapaz de
era capaz de sentir medo intenso, e, em conse- acelt~r am_ar a si mesma adequadamente, e
qüência, de alguma forma sinto-me liberto. Não tambem nao podia dar nem receber amor.
tenho mais que me esconder disso. Depois de seis meses de crescimento espiritual
e e~ocional firme, ela fez este comentário por
"Quando menino, me ensinaram a nunca de- escnto acerca das folhas de avaliação que havia
monstrar temor. Não era coisa de homem; de recebido:
modo que suponho ter mentido a mim mesmo No dia que fiz o teste, sentia-me mais otimista do que
todos estes anos. No processo de subjugar o de~rimida. Entretanto, sete das onze folhas que recebi
medo, acho que reprimi com ele outras emo- Indicavam mais necessidades emocionais do que tinham os
ções. Talvez seja por isso que eu sou tão reser- outros_do grupo. Eu sabia disso há muito tempo, penso,
mas .nao queria admitir estes "fracassos" - que é o que eu
vado. Algumas pessoas me consideram inibido.
sentia que eram - diante de ninguém mais nem de Deus
Talvez eu tenha tido medo todos estes anos de nemde mim mesma. Tenho sempre tentado'fugir dos meu~
que as pessoas descobrissem quão apavorado sentlment?S, tranqüilizando-me com álcool ou com pílulas.
realmente me sinto. Acho que só enganei a mim HOJeadmito e aceito estas emoções como parte de mim
mesmo." mesma. Pedi a Deus para aceitá-Ias e ajudar-me, e sinto
que ele o fez. Sei que o grupo as aceitará e me aceitará
No decorrer dos meses seguintes, observa- também. E agora faço um plano de ação para o dia-a-dia.
mos que ele começou a perder um pouco de sua C0!11a ajuda de Deus e a compreensão do grupo e meus
propnos esforços, espero continuar meu progresso cres-
tensão. Ele estava muito mais descontraído e
cente. O teste descreveu-me com precisão. Embora eu
mais comunicativo. Alguém disse-lhe: "Você tenha levado seis meses para admitir essas verdades acerca
está muito mais humano." Ele sorriu e disse: de mim mesma, é sempre melhor seis meses do que nunca.
"Os membros de minha igreja me dizem que
prego melhor também. Sinto-me bem mais livre C?s seis meses seguintes foram seu maior
agora, e menos inibido." penodo de crescimento. Ela havia aceito a si
mesma _como era. Aceitação não implica em
aprovaçao. Ela estava admitindo, diante de si
Neli tinha problema com o álcool e estava
mesma, de Deus e dos outros, o tipo de pessoa
assistindo às reuniões dos Alcoólatras Anôni-
mos, quando, pela primeira vez, se juntou ao que era. Depois de quatorze meses no grupo,
Neli revelou uma maturidade emocional admirá-
nosso grupo, a fim de apressar sua cura. Ela,
vel, bem como um equilíbrio espiritual admirá-
sem querer, veio, uma noite, à reunião, um
vel. Ela havia-se tornado "uma nova pessoa em
pouco embriagada. O grupo aceitou-a amorosa-
Cristo" - através de sua decisão.
mente, não tendo um sentimento de nem expri-
mindo a menor crítica. Jung disse, a um grupo de ministros, em 1932:

40 41
Não podemos mudar nada, a menos que o aceitemos. A
condenação não liberta, oprime. A aceitação de si mesmo é que viria com a mudança." 2 A dor ou o sofri-
a essência do problema moral e a prova de fogo de toda mento a que ele se refere pode ser sentida por
uma maneira de ver a vida. Alimentar um mendigo, perdoar um golpe repentino de uma crise ou pelo lento
um insulto, amar o inimigo em nome de Cristo - todas pulsar de uma frustração; e a frustração pode vir
estas são indubitavelmente grandes virtudes ... Mas, se eu de uma conscientização crescente da insignifi-
descobrir que o menor deles, o mais pobre de todos os
c~ncia da vida. da pessoa, ou como conseqüên-
mendigos, o mais mal-educado de todos os ofensores, sim,
cia de um sentimento de chateação.
o próprio demônio - que estes estão em mim, e eu mesmo
tenho necessidade das esmolas de minha própria bondade, Antes de começar a procurar, por todos os
que eu mesmo sou o inimigo que deve ser amado - que
lados, maneiras de ajudar alguma causa digna, é
fazer então?
melh?r procurar saber primeiro quem você é.
Aceitar e amar a mim mesmo adequadamente Depois de sua conversão, o apóstolo Paulo não
- aí está a dificuldade. Podemos desafiar um ~e ap.ressou a voltar para Jerusalém e se ocupar
crente a uma entrega mais profunda a Cristo, Imediatamente de um ministério intensivo de
mas se, no íntimo de seu coração, ele não pode evang~lismo. Aparentemente, primeiro ele pas-
suportar a si mesmo, não pode amar a si mesmo, sou tres anos na Arábia, e só alguns anos mais
ele não será capaz de amar alguém mais ade- tarde conseguiu fazer alguma coisa significativa.
quadamente. Embora possamos fazer com que Os doze que Jesus escolheu gastaram três anos
se envolva ardorosamente no serviço do Reino de preparação intensiva antes de serem consi-
de Deus, ele trará consigo sua própria auto- derados suficientemente maduros para conti-
rejeição, seus próprios padrões neuróticos de nuar o trabalho que Jesus começou. Mesmo
comportamento, e envenenará, em certo grau, depois de três anos, absorvendo o espírito e os
tudo o que tocar. ~nsinamentos de Jesus, na última ceia, eles se
Incomodavam sobre quem teria os lugares de
Um dos milagres de pequena monta que ve-
mos acontecer repetidamente nos grupos é a honra - pouca evidência de maturidade espi-
ritual.
força transformadora do amor divino, mediado
pelos membros dos grupos, possibilitando a .Laurel se u.niu a u~ grupo somente para enco-
pessoa aceitar a si mesma. É neste ponto que o rajar seu mando, cujo problema pressionante era
verdadeiro crescimento espiritual começa. a perda do emprego de engenheiro por causa de
doença emocional. Ela escreveu sua mãe al-
à

Rollo May diz que "O ser humano não mudará guns meses depois de ter-se juntado ao grupo e
seu padrão de personalidade, apesar de todo mostrou-me a carta. Parte desta dizia assim:
esforço, enquanto não for forçado a fazê-Io pelo
seu próprio sofrimento ... De fato, muitos indi- Primeiramente, quero contar-lhe que coisas estão acon-
víduos neuróticos preferem agüentar a miséria tecendo comigo neste grupo de companheirismo. Fui com
o Rob porque ~ensava que ele precisava do meu encoraja-
de sua situação atual, a arriscar a incerteza do
mento. Agora Sinto que estou sob o bisturi do cirurgião e,

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43
até que se complete a operação, eu não sou nem o meu esforço razoavelmente consistente para manter
velho ser nem o novo ser que, espero, emergirá. uma hora devocional, apesar da depressão, que
Este momento diário de devoção a que nos submetemos, praticamente o imobilizava. Mas, antes que o
de cerca de trinta minutos diários de meditação e oração, grupo comemorasse o seu primeiro aniversário,
alguns dias se torna dificil. Dr. Osborne diz que, quando Rob estava de volta ao trabalho, com apenas
resistimos hora de meditação é porque estam os Incons-
à

alguns traços de sua velha doença emocional.


cientemente com medo do que Deus está tentando nos
Igualmente importante foi o novo sentimento de
revelar. Eu tenho resistido freqüentemente ao meu mo-
mento de devoção. Tanto tem sido revelado a mim até aqui, paz interior que ele manifestou.
que ás vezes não posso agüentar mais alguma coisa por A cura espiritual, emocional e física que se
alguns dias. Descubro que as desculpas que tenho Inven-
operou nas vidas dos membros do grupo foi o
tado para as coisas, a vida inteira, não são desculpas de
modo nenhum; são só mentiras que preguei a mim mesma
resultado de uma série de coisas:
para tentar explicar os meus problemas.
Primeiro, um sentimento de amor genuíno
Um perfeito exemplo, mamãe, é esta autodecepção que permeava o ambiente. Os membros oravam uns
você e eu mantemos pelo fato de sermos gordas. Estou pelos outros diariamente.
trabalhando para a aceitação de eu ser gorda. Quando
finalmente aceitar isto, poderei perder peso simplesmente Segundo, seu amor uns pelos outros era in-
por não recusar a enfrentar mais o problema; mas perder condicional e sincero. Eles aceitavam uns aos
peso não é o objetivo principal. outros justamente como eram. Não davam con-
Só depois de seis meses é que Laur:1 fez selhos, mas diziam "a verdade em amor", como
algum esforço para diminuir o peso: Tres ou o Novo Testamento ordena.
quatro meses depois ela perdeu mais de dez Terceiro, eles fizeram dois inventários espi-
quilos, sem ou quase nenhuma dificuldade. Isto rituais durante seu primeiro ano. Algumas das
fbi uma simples manifestação externa do seu folhas de avaliação não foram aceitas imedia-
crescimento espiritual interior. Começou quan- tamente. Em outras ocasiões, levou tempo para
do ela "cortou o cordão umbilical", como ela eles aceitarem emocionalmente as coisas que
disse e parou de depender emocionalmente de Ihes foram reveladas.
sua ~ãe e seu marido. Outras evidências d~ ~eu
crescimento foram reveladas pelo seu admirável Quarto, eles lembravam uns aos outros sema-
novo senso de auto-aceitação, perda do medo nalmente o período devocional diário. Todos
das pessoas e o abandono do complexo de liam, durante o período devocional, o mesmo
mártir que havia estragado sua vida caseira e sua material geral recomendado e obtinham, fre-
felicidade. Agora ela gasta voluntariamente qüentemente, grandes discernimentos de suas
várias horas diariamente no serviço cristão. necessidades básicas. Mais importante, desco-
O crescimento de Rob por alguns meses não briam dentro de si mesmos as barreiras ao seu
próprio crescimento espiritual. No seu período
foi significativo, embora ele tenha feito um

44 45
devocional, eles, então, apresentavam a Deus supervisão pessoal da operação geral dos
essas barreiras recém-descobertas. grupos.
O jovem pastor de uma igreja metodista es- Os dividendos de encontrar "Deus como
creveu acerca de sua experiência com grupos uma realidade viva", em vez de "como uma
pequenos: Divindade distante", teve resultados impressio-
nantes para muitos membros daquela igreja, e a
Quase que a metade dos nossos membros adultos esteve
experiência foi curadora e espiritualmente esti-
em grupos, porque agora exigimos que todos aqueles que
se juntam à igreja devem passar por um ~rupo ?e Aventura mulante para virtualmente todos os que partici-
Espiritual de oito semanas. Esta ~edlda fOI posta em param.
prática nos dois últimos anos, e ass!m todos os membros
que entraram para a igreja nesse período passaram por um Uma das tragédias da Igreja hoje é que temos
grupo destes. Muitos deles continuaram em nosso progra- a tendência de medir nosso sucesso em termos
ma dos grupos de companheirismo. de tamanho. E nisto temos sido vítimas do que
O Grupo de Aventura Espiritual é basicamente uma intro- Jung chama de "a mentalidade da massa".
dução aos grupos pequenos, e possibilita, ao indivíduo que
O indivíduo que não está firmado em Deus não pode
esteja algo hesitante em se entregar a um grupo de longo oferecer nenhuma resistência, por meio de seus próprios
período, experimentar a significação e valor desse grupo recursos, às atrações que o mundo oferece nos sentidos
num periodo mais curto. físíco e moral. Para isso ele precisa da evidência da
Em todos os casos, quando um indivíduo participou de experiência interior transcendente, Que é a única coisa
um grupo e desistiu, por uma razão ou outra, ou o g~upo que pode protegê-I o contra a inevitável imersão na massa.3
deixou de funcionar, estes indivíduos acabaram pedindo
para se unirem a outro grupo. Eles reconheceram que as
Ao falar das "atrações do mundo", Jung não
necessidades genuinas estavam sendo tratadas enquanto se refere primariamente a uma forma de compor-
estavam no grupo e que o grupo é uma parte essencial de tamento escandalosa e espalhafatosa. Ele tem
sua experiência cristã. em mente algo muito mais sério do que um lapso
Temos tido inúmeros casos de vidas serem espantosa- moral. E antes o terrível perigo de sermos en-
mente tocadas pelo poder do Espírito Santo trabalhando golfados pela mentalidade da massa, a ponto de
através do grupo. Os seus componentes têm encontrado pensarmos o que a massa pensa, sentirmos o
sentido e propósito em suas próprias vidas, e casais têm que ela sente e sermos levados pelos mesmos
achado uma nova esperança. Estou convencido de que o
objetivos materialistas que compelem a massa
verdadeiro reavivamento dos membros de nossas igrejas
quanto ao que significa ser "a Igreja" pode ser atribuído à humana.
experiência inicial que cada pessoa teve com grupos pe- A esta mentalidade da massa, sua principal
quenos. disposição, seus objetivos, deve-se opor resis-
É importante acrescentar que resultados tência tão zelosamente quanto à ameaça à moral
como estes podem ser melhor alcançados quan- pessoal. Podemos estar muito mais conscientes
do o próprio pastor é um participante ativo e faz da tentação do pecado moral óbvio - roubo,

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46
adultério, cobiça e coisas assim - do que da Não havia um só líder para dirigir a ação, mas
tentação insidiosa de ser igual aos outros: com- parecia como se gradualmente emergisse, não
prar o que eles compram, procurar o que eles um milhar de mentes individuais capazes de
procuram, louvar o que eles louvam e desculpar pensamento racional, mas uma única mente
o que eles desculpam. movendo toda a turba.
Jung comenta acerca das tentações que a Podíamos ouvir vozes da multidão gritando:
Igreja experimenta, deste modo: "Vamos pegá-Io na cadeia!" Outros aderiram ao
grito, e, ainda sem líder, a multidão avançou em
Por mais estranho que pareça, as igrejas também querem
se apropriar da ação das massas... as próprias igrejas, cuja
direção à cadeia, que ficava a alguns quarteirões
função é a salvação da alma Individual. Elas, também, de distância. Fomos juntos. Aqueles que iam
parecem não ter ouvido nada do axioma elementar da na frente não estavam liderando mais do que
psicologia das massas, de que o indivíduo se torna moral e sendo empurrados por aqueles que estavam
espiritualmente inferior nas massas, e por esta razão não se atrás. Os gritos mais raivosos vinham dos ho-
preocupa muito com a sua real tarefa de ajudar o indivíduo a mens que estavam seguramente imersos no
alcançar uma metánoia ou renascimento do espírito ...
centro da turba. Eram eles que impeliam a turba
Infelizmente, é demasiadamente claro que, se o indivíduo
não for verdadeiramente regenerado no espírito, a socieda- para frente. Eles avançaram em direção aos
de também não o pode ser, porque esta é a soma total de degraus da cadeia, porém de repente uma figura
indivíduos carentes de redenção. Posso, portanto, perceber calma emergiu da porta e ali parou, com a mão
que é só ilusão quando as igrejas tentam, como aparente- erguida.
mente o fazem, amarrar o indivíduo numa organização
social e reduzi-Io a uma condição de responsabilidade Era um homem de tamanho médio, que não
diminuída, em vez de erguê-Io da massa torpe e sem tinha atitude de domínio nem inspirava terror;
consciência e tornar claro para ele que o fator importante é
mas havia algo terrivelmente autoritário em sua
ele e que a salvação do mundo consiste na salvação da alma
individual. 4 voz: "Parem onde estão! Não se movam, ou
alguém poderá se ferir."
Quando eu estava na universidade, pude uma
vez observar a mental idade da massa em ação. A turba parou de imediato. Ouvia-se alguns
Um homem havia sido preso por algum crime resmungos irados, mas eles se detiveram, para
sórdido e a cidade estava consideravelmente ver o que o xerife tinha para dizer.Ele começou
excitada pelo incidente. E me disseram que uma a falar em tom comedido e calmo. O mais
multidão estava se formando no centro da cida- notável nele era que parecia não ter medo. A
de, e, como eu estudava psicologia nesse tem- turba não lhe impunha ameaça alguma, porque
po, fiquei ansioso para ver de perto a ação da ele estava certo, e sabia disso. Falou a eles em
multidão. Um colega e eu corremos para o local termos simples sobre os tribunais, o sistema
da cena, e, de um ponto vantajoso e seguro, americano de justiça que cada homem quer para
observamos a mentalidade da massa funcionar. si mesmo e deve querer para os outros.

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Ele fez uma pausa e depois disse: "Agora, demonstrou, com zelo demoníaco e genialidade
todos vocês irão para casa, e nossos tribunais insana, é muito mais fácil atirar a mentalidade da
tomarão conta deste réu." E, voltando-se calma- massa para o ódio do que para o amor.
mente, entrou no edifício. Jesus dava grande importância à conversão do
Um homenzinho bem atrás gritou: "Vamos indivíduo. Ele não conduziu nenhuma marcha de
pegá-Io de qualquer maneira!" Mas a multidão protesto a Roma ou a Jerusalém, advogando
estava. se desfazendo, e o homenzinho desapa- reforma social. As injustiças sociais dos seus
receu no meio da turba. Uma pessoa que sabia dias devem tê-Io angustiado. A pobreza e miséria
que estava certa, sem amparo de meios visíveis das massas oprimidas contrastavam com os
quaisquer para manter a lei" havia parado uma prazeres dos ricos. A doença e a enfermidade, os
turba raivosa de homens que estavam tempora- arrendatários de fazendas sobrecarregados de
riamente insanos. impostos, a injustiça gritante em todos os lados,
o pesado jugo de Roma - tudo isto deve ter sido
Coisas como esta têm acontecido em todas uma fonte da mais profunda dor pessoal para ele.
as épocas, onde quer que os homens se reúnam. Mesmo assim, ele resistiu à tentação de fazer
Alguém grita: "Hosana ao Filho de Davi", e a uma exigência dramática por justiça social. Ele
multidão acena com ramos de palmeira para não mandou que seus seguidores se preocupas-
saudar o Messias. Mais tarde alguns homens sem primariamente com esses males óbvios.
começam a bradar: "Crucifica-o!" e a turba Pelo contrário, logo antes de sua ascensão, ele
entra em coro. Ou, em nossos dias, os propagan- disse ao pequeno grupo: "Esperai aqui na cidade
distas clamam: "Comprem isto!" ou: "É novo e até que sejais revestidos do poder do alto.">
audacioso!" ou apontam para esta ou aquela Nenhuma outra instrução Ihes foi dada, a não ser
suposta panacéia como indicada para o bem- que esperassem em oração até que o Espírito
estar físico e mental. Santo de Deus os houvesse unido, purificado e
Ihes dado poder. Ele os julgou incapazes da
Se uma voz é ouvida mais persuasivamente e
tarefa de levar as boas-novas do Reino enquanto
com mais treqüêncla que outras, pela televisão,
algo vital não tivesse acontecido a eles pessoal-
rádio ou imprensa, uma multidão invisível é
mente!
formada: a mental idade de massa começa a
funcionar. Logo, milhares, talvez milhões, jun- Vemos injustiça e sofrimento ao nosso redor.
tam-se ao canto do refrão, quer seja de louvores As pessoas dotadas de compaixão sentem-se
a um líder, a condenação de uma causa que constrangidas a se apressarem em organizar,
antes fora popular ou a exigência desta ou angariar fundos e lançar novos movimentos para
daquela mudança social. Algumas das causas erradicar a pobreza, a doença ou os muitos tipos
promovidas são louváveis porque a mentalidade de sofrimento que afligem a humanidade. Este
de massa não é de todo má. Mas, como Hitler zelo é louvável. Eu gastei tantos anos como um

50 51
ativista, mergulhado em boas obras, para aliviar crítico - doença física, pecado, cegueira.
a necessidade humana, que só posso encontràr Quando os discípulos discutiram sobre qual
simpatia em meu coração pelo autor zeloso de deles seria o maior, ele aproveitou a ocasião não
boas obras. para apaziguar uma briga, mas para dar-Ihes uma
É com dificuldade que consigo controlar o lição sobre humildade, que seria lembrada por
impulso de participar em toda causa digna. muito tempo.
Entretanto, aqui, como em todo lugar, o bom E.ltgn Trueblood, fundador do movimento
pode se tornar inimigo do melhor. O bem óbvio VÔkefellow, expressou isto muito bem:
e*" >

de levar comida ao faminto ou conforto ao aflito


pode ser inimigo do melhor - que pode ser o mundo precisava de uma fé salvadora, e a fórmula para
uma fé assim vem através de um tipo particular de comu-
simplesmente fazer o que Jesus mandou. De nhão. Jesus tinha um profundo interesse pela continuação
fato, ele disse: "Não se apressem a espalhar as de seu trabalho redentor após sua existência terrena, e seu
boas-novas da ressurreição ou a mudar o mun- método escolhido foi a formação de uma sociedade reden-
do, até que vocês tenham um tipo especial de tora. Ele não ai istou nenhum exército, não estabeleceu
poder do céu." Ele não descreveu o efeito que nenhum quartel-general, nem sequer escreveu um livro.
Tudo o que ele fez foi ajuntar alguns homens de futuro não
este poder teria sobre eles. Ele simplesmente
muito promissor, inspirar neles o sentido da sua vocação e
Ihes disse para esperarem. Eles saberiam quan- da vocação deles, e construir a vida deles numa comunhão
do o poder chegasse. E eles esperaram horas e intensiva de afeição, adoração e trabalho.
dias, em obediência perfeita, até o poder chegar. Uma das passagens realmente chooantes do Evangelho é
a em que Jesus mostra que não há absolutamente nenhum
Tendo orado juntos em calma receptividade,
substituto para a pequena sociedade redentora. Se isto
eles estavam prontos para serem purificados de falhar, ele sugere, tudo será fracasso; não há outra manei-
interesse pessoal, mesquinharias, ciúmes, ego- ra. Ele disse, para a pequena comunidade enlameada, que
centrismo e outra centenas de pecados que eles, na realidade, eram o sal da terra e que, se este sal
estragam a eficácia de um povo zeloso. Jesus, falhasse, não haveria preservação adequada, de modo
nenhum. Ele estava colocando tudo numa só jogada. 6
evidentemente, dedicou uma parte considerável
de seu ministério à lida com indivíduos e ao
preparo dos doze para sua missão. Embora ele
tenha pregado várias vezes à multidão, os
seus resultados mais efetivos vieram do tra-
balho com indivíduos e com o pequeno grupo de
discípulos.
Com os indivíduos, ele começava no ponto
da necessidade: "Que queres que te faça?" Ele
era solícito em perguntar. Começava no ponto

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r-------------------r----~--~----~---

ANSIEDADE

o coração puro é livre, sem preocupação, não está


comprometido e não deseja a sua própria vontade em
coisa alguma, antes se encontra imerso na vontade
amorosa de Deus. Não pode haver inquietação, a não
ser aquela resultante da vontade própria.
- Meister Eckhart

Um psiquiatra de renome afirma, categori-


camente, que todos estão gastando pelo menos
cinqüenta por-cento de sua energia psíquica,
conservando recordações reprimidas sob o
consciente. Pelo menos, pode-se dizer segura-
mente que cada um de nós gasta uma quanti-
dade enorme de energia psíquica tentando evitar
a ansiedade. Se essa energia fosse aplicada para
um viver criativo, poderíamos mudar as nossas
vidas e nossos destinos.

55
Por detrás de cada atividade, cada decisão,
cada plano, a longo ou curto prazo, há um es- queria ficar em casa, assistindo á televisão ou
forço inconsciente de evitar a ansiedade. Por ouvindo uma boa música; as pessoas, via de
ser a ansiedade uma experiência dolorosa, regra, eram enfadonhas; as suas conversações
tomamos todas as precauções para evitarmos fúteis eram cansativas; havia poucas pessoas
situações que poderão produzi-Ia. Planejamos, inteligentes com quem alguém podia verdadei-
racionalizamos, trabalhamos, até mentimos a ramente se comunicar, e assim por diante.
nós mesmos e aos outros, no esforço de evitá-Ia. Havia, de fato, alguma verdade em cada uma das
suas alegações, mas nenhuma delas era o real
Os pstcóloqos, em geral, concordam que cada motivo, conforme chegou a descobrir no grupo.
ação é um esforço para evitar a ansiedade. De início, resistiu á possibilidade de que sim-
O homem que trabalha diariamente em uma plesmente estivesse fugindo da ansiedade do
tarefa de que não gosta e que cria ansiedade está contato pessoal mais achegado com as pessoas.
fugindo da ansiedade maior de enfrentar o Resistiu de forma ainda mais forte à idéia de que
desemprego e a miséria financeira. A mulher que isso poderia ter começado nos primeiros anos da
não gosta de limpara casa, mas mesmo assim o sua vida. Depois de algum tempo, entretanto,
faz, deseja evitar a ansiedade ainda maior que chegou ao ponto de ver que a verdadeira razão de
seria produzida por morar em uma casa suja. evitar o contato pessoal com outros, em ambi-
Há dados momentos, sejam quais forem, em que entes sociais, prendia-se ao fato de que eles
fazemos a coisa que preferimos. despertavam nele sentimentos de inferioridade
e insegurança. Simplesmente encontrava razões
A maneira como racionalizamos a nossa para fugir da situação que provocava a ansie-
conduta a fim de evitar a ansiedade é ilustrada dade.
por um homem que não gostava de aconteci-
mentos sociais. Fora tímido °e retraído quando O ajuntador, seja de dinheiro, barbante ou
criança, sem amigos achegados com quem sortimentos esquisitos de coisas consideradas
pudesse se relacionar. Lembrava-se de um sen- desnecessárias por sua família, está atendendo
timento de alienação do seu pai e dos irmãos a um sentimento de ansiedade enterrada pro-
mais velhos. Agora, já cinqüentão, experimen- fundamente no subconsciente. Ele poderá ra-
tava um desgosto intenso por todos os aconte- cionalizar facilmente o seu hábito. A gente pode
cimentos sociais. Até em assistir aos cultos se precisar de barbante; sempre há necessidade
sentia mal. de dinheiro; e não é economizar uma grande vir-
Sua esposa fazia a sugestão de assistirem a tude? É claro que é, e, possivelmente, um dia
algum acontecimento social, mas ele resistia haverá alguma necessidade de todos esses res-
com qualquer desculpa entre uma dúzia de tinhos que ele tem guardado, mas a verdadeira
racionalizações muito usadas: estava cansado e razão é mais profunda. Ele é motivado por um
sentimento de ansiedade que tem a sua origem

56
57
i fância. Pode ser o resultado de ter sido tolo, ou simplesmente irracional; mas para a
. ado de amor quando muito pequeno. A inse- pessoa em questão, sendo quem é e o que é,
rança, o medo de não ser amado e bem parece ser a melhor escolha possível. Ela está
idado, experimentados quando criança, agora agindo na base de certas necessidades emocio-
ornam a forma do medo de não possuir sufici- nais, certas suposições e respostas. Para ela, o
e e dinheiro para cuidar de si nos anos vindou- agir de outra forma lhe traria ansiedade e tensão
ros. A insegurança financeira no lar de uma consideráveis.
riança, criadora de uma ansiedade generali-
zada. pode manifestar-se na forma de ajuntar Isto não quer dizer, entretanto, que toda ansie-
dade seja destrutiva. Há uma forma de ansieda-
oisas, ser mesquinho ou ter medo de dar ou
a ar - e tudo isso são manifestações de ansie- de criadora, que faz com que um homem saía
da cama de manhã para ir ao trabalho. A mãe
ade.
atende ao choro de seu filho em resposta a uma
Pode-se afirmar, com segurança, que todo ansiedade interna, que também é criadora. Nos-
omportamento caracterizado por sobrecarga de sa reação a um perigo repentino, que requer
a siedade não é o resultado de um processo todos os nossos recursos internos, estimula a
bem pensado e racional, mas de fatores emo- secreção de adrenalina adicional na corrente
cionais, cujas raízes geralmente se estendem sanguínea e nos prepara para "fuga ou luta".
ao passado, à infância da pessoa. Esta é uma resposta instintiva ao medo, dada
Se agíssemos de outra maneira do que agi- por Deus. Só quando o medo se torna uma
mos, isto criaria ainda maior ansiedade. Se ansiedade dominante e impede nossa eficácia é
mudarmos nosso padrão de comportamento de que ele cessa de ser criador e se torna des-
orma significativa, sem compreendermos nossa trutivo.
atureza básica, haverá a tendência de criarmos
O alcoólatra, ou o que tem problemas com a
ansiedade adicional, e por isso nossa propensão
bebida, sofre ansiedade profunda. Seu problema
é de nos agarrarmos a um modo de agir bem
básico não é beber demais; o beber em excesso
conhecido.
é sintoma externo de uma ansiedade ou neces-
O alpinista é· tão motivado pela ansiedade sidade muito forte. Ele quase não tolera as
quanto a pessoa que não consegue olhar a borda situações que produzem ansiedade e, quando se
de um precipício sem entrar em pânico. O alpi- sente ameaçado por alguma situação, só pode
nista tem, simplesmente, um tipo diferente de suportar a ansiedade com a ajuda do álcool, que
ansiedade, que o leva a alcançar os picos das complica o problema, fazendo-o sentir culpa e
montanhas. inferioridade. O álcool tende a paralisar o centro
O modo de agir tomado por alguém pode nos superior do cérebro, onde a faculdade de juízo
dar a impressão de ser precipitado, temerário, reside. O que tem problema com a bebida não é

S8 S9
ais capaz de resolver a situação antes de ter Sabemos que o sentimento existe e estam os
ornado seus vários drinques; de fato, sua atua- cônscios dele, mas o suprimimos. O procedi-
ção geralmente se processa num nível mais mento mais perigoso e que é muito usado in-
baixo do que antes, mas, desde que seu juízo conscientemente, é o de reprimi-Ia; isto é, fin-
está prejudicado, ele se sente um pouco mais gimos que não sentimos hostilidade. Por exem-
efetivo. plo, uma criança pode sentir hostilidade contra
Sermões por parentes, ameaças, condena- seus pais, mas ela aprende a enterrar ou reprimir
ções, criticismo e importunação só servem para esse sentimento. Afinal, "não devíamos odiar
tornar as coisas piores. Ele já se sente culpado nossos pais". A expressão da hostilidade fre-
e fora de lugar. A crítica simplesmente inten- qüenternente não é aceita em casa, e a criança
sifica esses sentimentos, e ele sente uma ne- pode aprender a enterrá-Ia profundamente no
cessidade mais forte de beber, a fim de apazi- inconsciente.
guar temporariamente seus sentimentos de
Ângela é um caso desses. Ela era um desses
culpa. O método de ação dos Alcoólatras Anô-
modelos de virtude que é caro ao coração
nimos providencia uma solução criadora para um
paterno: uma criança inteiramente obediente.
grande número de alcoólatras. O programa é
Nunca lhe ocorreu rebelar-se abertamente,
psicológica e espiritualmente saudável. Infeliz-
mesmo na adolescência. Após se formar, deu
mente, muitos alcoólatras não podem admitir
aulas por vários anos, depois se tornou secre-
que são bêbados problemáticos e que não
tária particular.
podem ser ajudados enquanto não admitirem,
com toda a humildade, que não são capazes Seu pai, por quem ela sentia um misto de
de se ajudar se não estiverem prontos a pedir amor e ódio, dominava sua vida. Ele nunca fora
ajuda a um Poder Maior. A própria aceitação muito bem-sucedido nos negócios. Ângela, o
deste fato é o passo absolutamente essencial a epítome da generosidade, contribuiu, com uma
Ser tomado, antes de mais nada. boa parcela do seu salário, para o sustento da
família, por muitos anos. Ela morava em casa a
Muita ansiedade é produzida por hostilidade
maior parte do tempo, freqüentemente com um
reprimida. Há várias maneiras de se lidar com
guarda-roupa bem limitado e uma vida social
a hostilidade ou com outra emoção negativa
muito restrita, por causa do seu sentimento de
qualquer: Pode-se exprimi-Ia, suprimi-Ia, repri-
que devia ajudar a família.
mi-Ia ou entregá-Ia a Deus, em completa sub-
missão. Há situações em que a hostilidade pode Ela recebeu várias propostas de casamento,
ser expressa para o bem de todos os envolvidos. mas não ousou aceitar nenhuma até perto dos
E, em outras situações, exprimir profundo res- quarenta anos. Depois de se casar com um
sentimento seria insensato e destrutivo. Em tais homem de boa paz, continuou a ajudar seus pais
casos, aprendemos a suprimir o sentimento. ainda por muitos anos. Sua generosidade não

60 61
grande para acarretar um desequilíbrio endó-
o ecia limites. Mas agora que ela tinha uma
crino, que era a principal fonte de todas as suas
. a separada dos pais, a ansiedade começou a moléstias.
se mostrar. Houve várias idas ao hospital, tra-
amento freqüente com vários médicos e compli- Ângela havia sido um membro de igreja ativo e
cações repetidas com leves infecções, das quais fiel por toda a .sua vida. Cria firmemente em
e a não podia se livrar. Deus, em Cristo e na oração. Não é que não
Para cúmulo, seus pais foram morar com possuísse fé religiosa na qual confiar. Mas,
ela. intensificando seu conflito interior. Ela tinha sim, que o padrão de vida religiosa nada tinha
ois empregos e ainda cuidava da casa. Final- para oferecer a uma pessoa cercada por pro-
ente, tendo sido os pais colocados num asilo fundas ansiedades. Se ela orava, era pela molés-
de velhos, onde eram bem cuidados a vida de tia física; mas esta forma de oração provou ser
- gela, julgaríamos, deve ter-se t~rnado um inútil, porque sua doença era somente um sin-
uco mais plácida. Mas, pelo contrário, a an- toma do problema básico: hostilidade reprimida,
siedade de toda a sua vida começou a piorar; que criava ansiedade insuportável.
ois não era, na realidade, a presença de seus Ela podia discutir suas emoções confusas
ais. ou suas exigências, que a produziam; era o para com seus pais, mas só de modo superficial.
seu próprio sentimento de auto-rejeição e de E!a recusava procurar aconselhamento ou tera-
c Ipa que ela experimentava por causa das suas pia de grupo de qualquer espécie. Era óbvio que
emoções confusas de amor e ódio para com as dores que suas moléstias freqüentes provo-
seus pais que a produzia. cavam eram mais suportáveis que o sofrimento
Suas doenças físicas não eram imaginárias. que se apresentaria se encarasse seus senti-
Eram doenças orgânicas e que lhe proporcio- mentos verdadeiros. Ela sirnplesrnente escolheu
avam considerável sofrimento. Ela suportava o modo de agir que inconscientemente achava
odas com um misto de jovialidade, sabedoria e que produziria o mínimo de ansiedade possível;
es oicismo. Estava vagamente consciente de mas a mente tem a tendência de transmitir sua
que. de algum modo, seu amor e hostilidade própria dor - sentimento de culpa e ansiedade
ara com seus pais - especialmente para com - ao corpo. No caso de Ângela, parecia prefe-
seu pai - fazia parte disto tudo, mas a coisa rível suportar a doença física por muitos anos
oda era dolorosa demais para que ela pudesse do que encarar a fonte de sua ansiedade profun-
orná-Ia criativa. Ela só aceitava o aconselha- damente enraizada. Infelizmente, o seu caso não
mento de uma maneira transitória e superficial. é um casoincomum; é altamente típico.
Os sentimentos de culpa de Ângela por "ter
desertado" de seus pais por causa do casamento Uma das coisas mais difíceis para muitas
produziram nela ansiedade, e ansiedade é con- pessoas aceitarem é que, embora consciente-
lito. Este conflito interno foi suficientemente mente elas queiram se libertar de seus sintomas

62 63
físicos, possuem uma necessidade inconsciente É um dos objetivos reconhecidos da educação lidar com
de sentir esses mesmos sintomas. Nós escolhe- a agressividade existente em a natureza da criança, isto é,
mos nossos sintomas inconscientemente e com no decorrer dos primeiros quatro ou cinco anos, mudar a
uma finalidade inexorável. Os especialistas no atitude própria da criança para com este impulso nela
Inerente. A vontade de machucar as pessoas, e mais tarde o
campo da medicina psicossomática acreditam
desejo de destruir os objetos sofre todas as forr ias de
que cinqüenta a oitenta por-cento de todas as mudanças. Ela é primeiro, geralmente, restringid , então
moléstias físicas têm sua origem em nossas suprimida por mandamentos e proibições; um po. co mais
emoções. De fato, todas as emoções têm algum tarde, é reprimida, o que significa que desa rrece do
efeito sobre o organismo físico, de maneira cria- consciente da criança. A criança não ousa r ris tomar
tiva ou destrutiva. Sintomas fabricados emocio- conhecimento destas vontad.es. Há sempre o pe .. go de que
elas possam voltar do inconsciente; portanto, toda medida
nalmente podem, com o tempo, se desenvolver
de proteção é tomada contra elas. A criança cruel desen-
em moléstias orgânicas reais. volve a capacidade de ter dó, a criança destruidora se torna
hesitante e cuidadosa demais. Se a educação for dirigida
Já há muito tempo atrás a Bíblia reconheceu inteligentemente, o principal destes impulsos destruldores
isto. Ela nos admoesta que "uma mente tran- será dirigido para longe do seu propósito primitivo de
qüila é saúde para o corpo". J O apóstolo Paulo prejudicar alguém ou alguma coisa, e será usado para
escreve aos crentes de Filipos: "Não andeis combater as dificuldades do mundo exterior: sealizar tare-
ansiosos por coisa alguma; antes em tudo sejam fas de toda espécie no sentido de __ "fazer o bem", em vez
de "ser mau", como o impulso original exigia.
os vossos pedidos conhecidos diante de Deus pe-
la oração e súplica, com ações de graças; e a paz
de Deus, que excede todo o entendimento, guar- A paz e a harmonia interior, a ausência de
ansiedade destrutiva providenciam o clima emo-
dará os vossos corações e os vossos pensa-
cional em que os nossos corpos podem funcio-
mentos em Cristo Jesus." 2 A paz de Deus só po-
nar melhor e as nossas vidas se desenvolver de
de ser nossa quando lhe entregamos nossa an-
forma mais criadora. A Bíblia afirma esse fato e
siedade e medo.
é confirmado pela ciência moderna. Nem sempre
A maneira em que o amor misturado com ódio é possível descobrir a causa da ansiedade.
opera na vida diária é ilustrada pela jovem que Alguém poderá afirmar que não tem preocupa-
escreve a seu namorado: "Querido George: ção alguma, e pode ser que de fato não tenha,
Odeio-te! Com amor, Alice." Estas emoções entretanto, experimenta um sentimento de ansi-
confusas, sempre presentes conosco, têm papel edade difusa. Talvez esta tenha começado na
importante não somente em nossas relações infância, como resultado de um pai autoritário,
humanas, mas têm muito a ver com nosso ou de padrões não realistas, ou de sentimentos
bem-estar ou falta dele. de rejeição. A criança de quatro anos pode
enfrentar a exigência de se comportar como se
Karl Menninger descreve o processo pelo qual tivesse seis anos; a criança de dez, como de
nossos impulsos agressivos são reprimidos: doze. Se o boletim escolar traz a nota 4, pelos

64 65
verificar as notas de seus pais. Eram bem mais
padrões dos pais deveria ser pelo menos 6 ou 7. baixas do que as dele!
Se for mais de 7, então deveria ser 9 ou 10. Se
todas as notas não forem 10, a conclusão é que Uma mãe, que não teve sucesso como canto-
poderiam ser, houvesse mais diligência por parte ra, forçava sua filha a tentar a carreira artística.
do menino. A família toda trabalhava para este fim e sacri-
Uma criança em tal situação aprende que ficou-se para assegurar à jovem cantora em
nunca poderá alcançar a plena aprovação dos formação um treinamento vocal. A menina pos-
seus pais, por mais que se esforce. Jamais o que suía uma voz bonita, mas não notável. Por vinte
fizer será o suficiente. Nunca se sentirá aceita, e anos ela lutou por um objetivo totalmente irreal,
nunca poderá aprender a se aceitar, enquanto e acabou doente física e emocionalmente, desi-
não conseguir um trabalho perfeito. Então pode- ludida da vida e como pessoa completamente
rá passar a vida inteira sem nunca ser capaz de frustrada.
atingir coisa alguma que satisfaça à sua própria
exigência implacável de perfeição. Não criou Uma ansiedade toda dominante na vida de
esse perfeccionismo com sua filosofia de vida. uma pessoa adulta freqüentemente provém de
Foi-lhe incutido quando criança. Pode ser que acontecimentos que tiveram lugar cedo na vida
ninguém lhe tenha ensinado isto, mas ela o da criança e desde então enterrados profunda-
adquiriu por uma espécie de "osmose ambi- mente no inconsciente. Na idade de quatro anos,
ental" . uma criança um pouco rebelde, mas muito ativa,
foi taxada de "teimosa" por sua mãe e forçada à
O padrão demasiadamente alto de ação pode submissão. A partir daí não lhe deu mais tra-
ser adquirido de um dos pais que realmente balho. Tornara-se um "bom menino", nunca
nunca exige demais de crianças. As crianças abertamente desobediente, mas os seus pais
aprendem não somente do que se Ihes diz, mas não conseguiram entender por que ele não gos-
também imitando as atitudes dos pais. A criança tava de ser mimado, nem por que mantinha
tem a tendência de desenvolver sua "tonalidade quase que constantemente uma expressão de
emocional" simplesmente por estar com seus hostilidade, à qual nunca dava vazão verbal-
pais. mente ou de qualquer outra forma. Exterior-
Há pais que tentam inconscientemente fazer mente era submisso. Interiormente fervia nele a
com que seus filhos alcancem certos objetivos hostilidade reprimida. Rebelar-se significaria ser
para compensar seus próprios sentimentos de privado de amor, ou abandono, o que para a
fracasso ou de inadequação. Um estudante de criança representa aniquilamento total. As
faculdade, cujos pais expressaram insatisfação poucas vezes que mostrou alguns sinais de
com suas notas, estava na mesma universidade rebelião, foi surrado por seu pai, até que desis-
em que seus pais haviam estudado. Ele pediu a tiu e de novo se tornou "um bom menino"!
um colega que trabalhava na secretaria para

67
66
agressão reprimida do menino podia ter
A mudança se processou principalmente
omado várias direções, dependendo isto de
pela participação em um grupo de comunhão,
muitos fatores. No seu caso, no primeiro dia de
onde a honestidade para com os sentimentos
aula, ele ameaçou uma meninazinha no recreio
dos outros era um dos requisitos básicos. Antes
e foi castigado na escola e em casa. Daí, ele d~
de a mudança ocorrer, ele nunca havia podido en-
novo aprendeu a futilidade de mostrar agressão.
tender por que não sentia afeição especial por
o ginásio, se envolveu em vários tipos de com- seus pais. Sentia um leve laço familiar, preo-
portamento anti-sociais, tais como furto, mas
cupação e compaixão, mas sem a mínima
nunca foi apanhado.
afeição.
Ele estava agora muito mais cônscio de uma
ansiedade sem nome, para a qual não havia
A esta altura, algo de "positivo" aconteceu.
causa aparente. Essa ansiedade teve o seu qui-
Sua família o havia sempre levado à Escola
nhão de nervosismo, ataques ocasionais de
Bíblica Dominical e à igreja. Lá ele entrava em
colite, artrite e uma sucessão de outros sinto-
contato com uma espécie de religião moralista.
mas vagos, mas desconfortáveis. Ao fazer as
na qual havia pouco amor, mas que dava uma
pazes com seus sentimentos - alguns deles
forte ênfase a se "fazer o que é direito". Sua
enterrados de há muito - a maioria dos sinto-
agressão reprimida e as exigências rígidas de
mas desapareceu.
retidão sustentadas por um Deus vingador
Ele começou a ver como um relacionamento
entraram em luta, em sua alma, e Deus - o Deus
familiar rígido, autoritário e punitivo havia feito
que ele havia aprendido a conhecer - foi o
com que sentisse a hostilidade, que havia en-
vitorioso. O jovem entrou para o ministério e
terrado em sua mente inconsciente. Lá ele lutava
procedeu segundo os padrões adotados. Mas
contra o amor e a obediência. Uma parte dele
seu evangelho foi moralista e destituído de amor
por muitos anos, até que ele veio a compreender queria amar e ser amada, mas a outra parte de
sua natureza sentia rejeição e hostilidade. A
a causa de sua hostilidade reprimida. Então
agressão resultante, tendo sido transformada e
desenterrou seus sentimentos, admitiu-os
então permeada com amor e compaixão, tornou-
diante de sua consciência e os entregou a um Pai
se criadora.
Celeste amoroso, que não era mais um Deus
moralista, exigente e vingativo. Ele começou a A agressão pode manifestar-se de duas ma-
sentir e exprimir amor num grau muito maior. neiras: pode ser abertamente hostil e possivel-
Sua pregação moralista foi substituída por uma mente destruidora, ou pode ser criadora -
ênfase ao amor redentor e perdoador de Deus, sendo um impulso que muda as circunstâncias
revelado em Jesus Cristo. Ele sempre havia crido constrói e cria. '
nisto intelectualmente. Havia sido uma parte de Às vezes as forças antagônicas criadoras de
sua teologia. Agora se tornara parte de sua vida. ansiedade podem ser parcialmente reconheci

68 69
as. Se sentimos, ao mesmo tempo, o desejo de
assís ir a um concerto e jogar boliche na mesma Suas duas irmãs reagiram à atmosfera carre-
oi e, um certo grau de ansiedade se apresenta, gada do lar de maneiras diversas. Uma delas
a é que o problema seja solucionado. A neces- tomou a determinação de ser bem-sucedida num
sidade de tomar uma decisão é criada, em parte, campo altamente competitivo e arruinou sua
a necessidade de aliviar a ansiedade, que saúde, destruiu seu casamento e não alcançou
persiste numa forma leve até que uma decisão nem sucesso nem felicidade. Seu impulso para
seja tomada. A ansiedade é confl ito interior. Se, realizações era tão grande, que ela não podia ter
em dada ocasião, o marido quer jogar boliche e a outra coisa em vista senão obter um grande
esposa quer assistir a um concerto, a ansiedade sucesso. Quando este lhe foi negado, ela ficou
ode tornar-se um conflito conjugal, a menos doente e assim permaneceu por toda a vida,
que o caso seja resolvido de modo que satisfaça embora os médicos, uns após outros, nada
a ambos. pudessem encontrar de errado com ela. A outra
Se a pessoa desiste com dificuldade e apenas irmã trabalhava durante horas, incrivelmente
inge uma pronta aquiescência, surge nela uma longas, e economizava seu dinheiro, para gastá-
ansiedade interior. A necessidade de amar e a 10 generosamente com os outros, e trabalhava
compulsoriamente em empregos diferentes, em
necessidade de agir à sua própria maneira estão
em conflito. Só a autocompreensão madura e o sucessão, e ainda cuidava da casa, acabando por
perdão e amor cristão genuínos podem expulsar ficar prostrada, em pura exaustão física e emo-
o demônio da hostilidade neste sentido. cional.

A ansiedade pode tomar formas mil. Um ami- Não há aqui nenhuma intenção de pôr a culpa
go meu poucas vezes pôde brincar na infância. nos pais. Eles eram produtos de seu próprio
Ele tinha de estar sempre ocupado. Seus pais ambiente, e usaram do melhor critério que
estavam em aperto e cheios de dívidas. A ansie- possuíam. Atribuir nossas doenças pessoais às
dade deles foi transmitida aos seus três filhos, suas origens de modo algum lança a culpa sobre
cada um dos quais reagindo de um modo dife- nossos pais. Se formos culpar alguma coisa,
rente. Meu amigo tornou-se um trabalhador que sejam os males da sociedade, ou o pecado
compulsório, raramente permitindo-se um des- original, ou um inconsciente coletivo inseguro e
canso, e sentindo-se culpado se tirasse um dia perturbado - e tudo isto vai dar na mesma
de folga. Às vezes ele se recusava a tirar férias, coisa.
sob a alegação de que havia coisas demais para
Muitas pessoas que sofrem forte ansiedade
fazer. Seus pais, do mesmo modo, raramente
prefeririam submeter-se a uma operação ou
haviam tirado férias, mas ele não conseguia ver
serem hospitalizadas, ou sofrerem tratamento
nenhuma ligação entre o seu procedimento e o
deles. doloroso, a encararem o fato de que o problema
é de origem emocional ou espiritual. Inconsci-

70
71
nindo-os dos resultados de tais decisões. Este
en emente, sem qualquer conscientização do é, naturalmente, um mecanismo totalmente in-
mecanismo envolvido, elas escolhem suportar a conscierfte, pelo qual o eu se pune por culpa real
dor física ao conflito emocional. O Dr. Alvarez, ou imaginária.
da Clínica Mayo, disse que a grande maioria dos A culpa, quer real ou falsa, só pode ser tratada
pacientes que reclamam de sintomas digestivos de duas maneiras. Deve ser punida ou perdoada.
não tem doença orgânica que seja responsável Se não pudermos estar seguros do perdão, en-
por seus sintomas. A maioria prefere uma ope- contraremos um modo de nos punirmos física,
ração ou um tratamento dispendioso a saber que mental ou circunstancialmente - isto parece
suas "doenças" são causadas por suas emo- ser uma lei cósmica inexorável. Mas então não é
ções. Não que essas moléstias sejam inteira- Deus quem está punindo, mas o próprio eu
mente imaginárias; pelo contrário, geralmente condenador.
há dor genuína envolvida, ou pelo menos des-
conforto. Mas o paciente insiste: "A dor é aqui, Isto nos leva pergunta, feita durante séculos,
à

doutor; nada mais há de errado comigo." A dor do porquê do sofrimento do justo. Nenhuma
está lá, mas freqüentemente sua origem é a resposta completamente satisfatória jamais pô-
ansiedade, que é simplesmente outra maneira de ser oferecida, embora volumes e volumes
de dizer que o problema é basicamente espiri- tenham sido escritos sobre o assunto, desde o
tual. livro de Jó até o último trabalho teológico sobre
o problema do bem e do mal. O justo sofre real-
Quer o chamemos de problema de saúde men- mente. Jesusdisse: "No mundo tereis aflições." 4
tal, problema espiritual ou desajustamento emo- Sofremos não só os males organizados da socie-
cional, estaremos falando da mesma coisa. O dade (guerra, fome, doença, catástrofe), mas
homem é corpo, mente e espírito, e o que afeta a também sofremos, tanto quanto o "injusto", por
um, afeta a todos. Se há conflitos e tensões causa dos nossos conflitos internos, se não
internas, ansiedade e sentimento de culpa em tivermos alcançado a maturidade emocional e
algum ponto em sua vida, o indivíduo tende a espiritual. O mero conhecimento dos fatos bí-
manifestar este mal-estar espiritual por meio de blicos e da moralidade cristã não nos garantirá
algum sintoma físico. Se não o fizer, seu mal- isenção do conflito interior, e muito menos de
estar pode assumir a forma de masoquismo desastres naturais.
psíquico - uma necessidade inconsciente de
punir-se a si mesmo. Ele pode tornar-se dado a Uma idosa e boa senhora ficou aleijada por
acidentes, a dificuldades, a desastres ou a mau uma artrite reumatóide. Suas mãos ficaram de-
juizo. Sabe-se de homens que tomam uma série formadas, e a espinha, torcida. Vive em dor
de decisões incrivelmente más e que resultam constante. Seus amigos não podem entender por
em fracasso inevitável, apesar de todos os seus que esta querida velhinha, que gastou tanto de
amigos e parentes unidos os avisarem, preve-
73
72
sua vida a serviço de outros, que nunca faltou
sentimento de que era quase uma bênção estar
à igreja, cuja vida moral tem sido sempr~ livre de
na presença dela. Ela nunca reclamava.
qualquer suspeita, possa sofrer tanto. E um es-
pírito meigo e gentil. Por quê? - perguntamos Ela foi criada numa atmosfera religiosa rígida.
- por quê? Quando bem jovem, aprendeu que exprimir o
ressentimento era pecado, e assim se tornou
Embora os médicos não estejam de acordo uma criança complacente, respeitosa e obedi-
quanto à causa real da artrite reumatóide, há ente. A rebeldia normal do adolescente nunca foi
evidências clínicas suficientes para confirmar expressa por ela. Cresceu acreditando que não
que a hostilidade reprimida freqüentemente pro- sentia hostilidade. "Um crente nunca odeia",
duz artrite, desde leves a severas. Muitos dos dizia. "Nunca responde mal. Devemos vencer o
pacientes que sofrem de artrite são plácidos e mal com o bem." Suas citações eram boas, seu
gentis externamente. Raramente têm consci- conhecimento de teologia extenso, mas a cons-
ência de que abaixo do nível do consciente cientização de suas emoções era quase inexis-
sempre tem havido hostilidade, que aprenderam tente. Ela havia aprendido a reprimir (negar e
a reprimir cedo na vida. olvidar) toda consciência de hostilidade; mas o
conflito interior prosseguiu nas câmaras sub-
Loring T. Swaim, ex-professor de artrite, na
terrâneas de sua alma, criando ansiedade, dese-
Escola de Medicina de Harvard, e que tem sido
quilíbrio metabólico e, com o tempo, uma do-
um especialista no campo da ortopedia por
ença que lhe produziu aleijamento.
cinqüenta anos, é autor de um livro notável,
Arthritis, Medicine, and the Spiritual Laws (Ar- A Sra. Blandon jamais sonharia em contar
trite, Medicina e as Leis Espirituais), no qual cita uma mentira a alguém, mas foi ensinada, quan-
um grande número de casos que foram curados do criança, a mentir a si mesma acerca de seus
só depois que ele levou os indivíduos a lidarem verdadeiros sentimentos. É igualmente errado,
com seus ressentimentos reprimidos, ou com quer mintamos a Deus, aos outros ou a nós
outras emoções negativas, à luz dos ensina- mesmos. Uma mentira é simplesmente a nega-
mentos de Cristo. ção, repressão ou distorção da verdade. O uni-
verso de Deus depende de leis espirituais de
A Sra. Blandon, uma excelente professora de amor e verdade. Não é o simples conhecimento
Escola Bíblica Dominical, tinha um conhecimen- da verdade que nos liberta, mas o desejo de
to notável da Bíblia. Ela falava de assuntos encarar a verdade acerca de nós mesmos.
espirituais com calma e autoridade e sempre Não só a artrite, que usamos simplesmente
expressava uma doce paciência em suas manei- como ilustração, mas centenas de outras pertur-
ras. Ela se tornou quase que totalmente incapa-
bações físicas resultam da ansiedade nascida da
citada pela artrite nos seus últimos anos, e nossa recusa em sermos honestos para com
aqueles que a visitavam sempre saíam com o
nossas emoções. Dependendo de coisas tais

74
75
como sensibilidade orqaruca, fatores ambien- Discrepâncias entre o nível de real ízação de um indivíduo
tais, ou a necessidade inconsciente de a pessoa e as metas e prêmios que uma sociedade diz serem dese-
escolher algum sintoma particular, a ansiedade jáveis. Assim, um indivíduo que é membro de uma socieda-
de que enfatiza a riqueza materíal e a posição social pode se
pode manifestar-se de centenas de modos dife-
tornar ansioso, preocupado e desalentado, se ele falhar em
rentes. conseguir muito dinheiro e em melhorar sua posição social.
Por exemplo, muitos dos que sofrem de úlcera Isto será verdade especialmente se seus amigos íntimos e
gástrica são pessoas dependentes e hostis. Elas associados esperam que ele alcance estes objetivos ... A
necessidade de expressar a agressividade ou hostilidade
geralmente não parecem dependentes. Pelo
pode ser também uma fonte de ansiedade quando tal
contrário, com freqüência mostram evidência de expressão é afogada por restrições culturais ou conseqüên-
serem duronas, de terem personalidade cheia de cias ameaçadoras ... Deveras, qualquer exigência que o
recursos. Interiormente estão divididas. Uma indivíduo sente que não pode preencher ou que está em
parte de sua personalidade se tornou compla- conflito com suas necessidades pode ser fonte de ansieda-
cente e dependente, geralmente por causa de de. 5
"
dominação materna forte, e a outra parte da
personalidade está buscando liberdade. O con- Lehner e Kube sugerem que a ansiedade é o
flito inteiro cria ansiedade, que pode ser devas- centro comum, do qual todo comportamento
tadora. Alguns pacientes que sofrem de úlcera neurótico surge. Eles mencionam moléstias tí-
não podem jamais aceitar o fato de que eles picas, como úlceras, dores de cabeça e alergias,
sentiram tanto amor quanto ódio para com um como sintomas de ansiedade.
ou ambos os pais; e seu complexo de culpa
reprimido pelos seus sentimentos hostis para Karl Menninger cita Ali ibn Hazm, que viveu de
com um dos pais cria tensão e ansiedade inte- 994 a 1064: "Ninguém é levado a agir ou resolve
rior. dizer sequer uma única palavra se não esperar,
O simples reconhecimento deste conflito in- por meio desta ação ou palavra, liberar a ansie-
terior não é sempre suficiente para se conseguir dade de seu espírito."6 Há novecentos anos
a cura. Muitos descobrem que precisam, pri- atrás este antigo escritor antecipou a descober-
meiro, de conscientização da causa básica; se- ta, que a psicologia moderna faria, de que evitar
gundo, de aceitação dessas emoções como vá- a ansiedade é a motivação primária da ação
lidas e reais, e, terceiro, de ação. Isto é, elas humana.
precisam "ventilar" seus sentimentos num lugar O. Hobart Mowrer salienta que o sentimento
apropriado. de culpa não solucionado é a maior fonte de
É claro que algumas ansiedades têm outras ansiedade destrutiva e conseqüente neurose. Diz
causas. Em lhe Dynamics of Personal Adjust- ele:
ment (A Dinâmica do Ajuste Pessoal), Lehner e Manifestamente nem todos os erros ou "pecados" levam
Kube dizem que a ansiedade pode provir de: a dificuldades neuróticas. Algumas pessoas "fícam presas"

76 77
ao mesmos, e algumas voluntariamente os confessam e
arcam com as suas conseqüências. Outras simplesmente
não têm consciência suficiente para serem incomodadas.
Mas as pessoas de bom caráter, que não são nem afortu-
nadas o suficiente para se superarem e nem sábias o
suficiente para confessarem, desenvolvem uma disposição
crescente, com o correr do tempo, de experimentarem as
emoções e cometer ações que chamamos de "sintomas" ...
Por um pouco de tempo a neurose pode permanecer
dormente, latente - "o Senhor é tardio em irar-se". Mas,
eventualmente, o período da "graça" expira, "a paciência"
se acaba e o indivíduo descobre que a consciência não é
mais um amigo confortador, mas, ao contrário, um crítico
severo e inimigo. O indivíduo, por assim dizer, vira-se
contra si mesmo, e, quando isto acontece, ele está na
espécie de "dificuldade" que chamamos de psicopatolo-
gia.7
4
Quer o chamemos de pecado, complexo de
culpa, neurose da ansiedade, ou "uma ilusão da A CURA DA ANSIEDADE
mente mortal", estaremos falando exatamente
da mesma coisa. Estaremos descrevendo um
indivíduo que está fora da harmonia das leis Todas as doenças do corpo procedem ou da mente
divinas e, assim, alienado de Deus, do seu ou da alma. - Piatão
próximo e de si mesmo. Ele pode libertar-se de
sua alienação e de seus sintomas se restabelecer A psiquiatra Karen Horney apresenta quatro
uma relação amorosa com Deus e os homens. maneiras principais de escapar à ansiedade:
Ele poderá vir a sentir-se perdoado e aceito. ~á-Ia, ~itar .9 pensamento ou o sentimento
Seu autodesprezo, consciente ou inconsciente, que a desperta, racional izá-Ia e "narcotizé - a". 1
pode ser substituído por uma auto-aceitação. A estas quatro acrescentarei uma quinta, que me
Milhares descobriram que um grupo pequeno; parece a única maneira criativa de lidar com a
sob condições adequadas, pode criar o ambiente ansiedade de um modo definitivo.
no qual esta transformação espiritual pode efe-
O primeiro método, que consiste em negar a
tuar-se. Aqui pode-se aprender a confiar em suas
existência da ansiedade, é geralmente um pro-
emoções, em seu próximo e em Deus. No pro-
cesso inconsciente. O indivíduo pode ter cons-
cesso dá-se um grande passo na direção da
ciência de certos sintomas depressivos ou dolo-
obediência suprema lei do amor; porque, no
à
rosos, que podem ser físicos ou emocionais, e
seu ãmago, a ansiedade é ausência de amor.

79
78
estar desapercebido do verdadeiro motivo da mente no consciente, ela o afastava e negava
ansiedade. que o tivesse tido. "A gente não deve ter tais
pensamentos!" ela dizia, excitada. "Eu não sou,
Uma mulher certa vez me pediu que orasse por
de modo nenhum, desse tipo de pessoas que
ela porque tinha medo de um ataque cardíaco.
os admitem. Eu amava minha mãe!" Eventual-
A.ntes de orar, perguntei-lhe quais eram seus
mente, entretanto, ela aceitou o fato de que
Sintomas. Ela contou-me que sofria de forte
tinha tido emoções confusas acerca da morte de
palpitação do coração, que o seu médico havia
sua mãe, querendo-a e temendo-a. E como
dito que a causa era emocional, e não orgânica.
havia reprimido o desejo de que sua mãe mor-
Ela estava certa, entretanto, de que as batidas
resse, não podia obter o sentimento de perdão.
violentas do coração, que surgiam quando me-
Nunca poderemos nos sentir perdoados por uma
nos esperava, eram o indício de que estava
emoção que não admitimos ter. É impossível
prestes a sofrer um ataque cardíaco.
confessar a Deus o que não confessamos a nós
Perguntei-lhe quando o problema havia come- mesmos.
ç~do. Ela replicou que tinha notado as palpita-
çoes pela primeira vez em março do ano anterior. Outra causa de sua ansiedade era o medo não
Então se lembrou de que sua mãe, já idosa reconhecido de que ela também devia morrer.
havia falecido nesse mês. Até o momento d~ Era assaltada por certos sentimentos de culpa.
falarmos, não notara nenhuma ligação entre os Ela sentia-se culpada como se tivesse culpa
dois acontecimentos. Então agora começamos o genuína perante Deus. Sabia intelectualmente
demorado processo de tentar descobrir o que, que Deus a havia perdoado, mas não aceitava
acerca da morté de sua mãe, havia provocado isto emocionalmente. Em seu inconsciente, ela
começara a temer a morte como um castigo para
esta tremenda ansiedade. Ela assegurou-me que
apenas sentia imensamente a morte da mãe. seus pecados. O inconsciente não funciona nu-
ma base lógica. Ele atua em relação aos senti-
Aparentemente, não havia medo da morte e
mentos primitivos e freqüentemente infantis.
nenhuma conscientização de outra causa qual-
Ela conscientemente não pensava todas estas
quer de ansiedade indevida.
coisas, mas as sentia. "Sabia" melhor com seu
Quando procuramos o que se ocultava sob o consciente, mas, não conhecendo o funciona-
consciente, encontramos a fonte do problema mento do inconsciente, pensava que o que "sa-
dela. E aconteceu que eram duas coisas rela- bia" intelectualmente era precisamente o que
cionadas, e não apenas uma. Ela pôde ver que sentia. Pensava que estava dizendo a verdade
havia conscientemente temido a morte de sua quando dizia que não tinha razão para a ansie-
mãe, mas inconscientemente a tinha desejado. dade.
Havia escondido este sentimento da sua mente
consciente. Ninguém deseja a morte de sua Então ela pôde entender que possuía uma
mãe! Quando este pensamento surgia perigosa- ansiedade profunda acerca da morte de sua mãe,

80 81
a Qual em parte tinha desejado, e, em parte,
emido; era um sentimento profundamente re- permanentemente. A ansiedade básica ainda
primido de que devia ser punida, por seus mal- persiste.
feitos e "maus" pensamentos, e a morte podia
ser a forma de punição. A morte de sua mãe Algumas de nossas ansiedades são normais.
havia feito aflorar um dilúvio de memórias É somente Quando a ansiedade - medo difuso
parcialmente esquecidas de sua infância: amea- - permeia a vida e destrói nossa paz mental que
ças tremendas do que lhe aconteceria se ela precisamos procurar a causa subjacente.
desobedecesse ou fizesse algo mau. Pela pri- É normal que uma jovem mãe fique um pouco
meira vez compreendeu o motivo pelo qual devia apreensiva quanto ao seu novo papel. Uma des-
orar. Não era um funcionamento cardíaco erra- sas mães, grandemente angustiada, revelou-me
do, ou ameaça de um ataque, mas sentimento de seu medo terrível de Que pudesse fazer alguma
culpa, medo e ansiedade. Quando ela pôde coisa prejudicial ao seu filho. Medo e sentimen-
encarar seu verdadeiro sentimento com honesti- to de culpa haviam feito com que ela ficasse
dade e humildade, conseguiu alívio para seus quase que emocionalmente doente. Ela amava
sintomas físicos. Mais importante ainda, foi seu bebê. Como é possível que tivesse esses
aliviada de grande parte da ansiedade que havia pensamentos terríveis de prejudicá-Io?
estragado sua vida até este ponto, porque com-
preendeu que a oração não é um modo mágico Na primeira sessão de aconselhamento, foi
de obter a ajuda de Deus numa crise, mas que levada a ver que não era a criança que ela odiava,
envolve completa honestidade para com Deus, mas as responsabilidades novas, das quais sen-
para com os outros e para com nós mesmos. tia-se incapaz de se desincumbir. Esta desco-
Evitar é a segunda maneira de lidar com a berta minorou seus sentimentos de culpa, e a
ansiedade. Quando usamos este artifício, pro- ansiedade anormal decresceu, sem necessidade
curamos evitar os sentimentos, situações ou de mais ajuda. Ela pôde, então, prosseguir ade-
pensamentos que despertam ansiedade. Não quadamente como mãe.
surte mais efeito do que negar a ansiedade. Ela havia estado em choque com os pensa-
Uma pessoa excessivamente tímida pode mentos de prejudicar seu filho, e primeiro tinha
achar que as relações sociais causam ansiedade, procurado negar o sentimento e depois evitá-Io;
de modo que ela faz todo esforço para evitar as mas não havia maneira de evitá-Io. Ele devia ser
pessoas; o individuo que tem medo das alturas enfrentado e solucionado.
evita pontes e edifícios altos; a pessoa que
experimenta ansiedade indevida ao dirigir em A pessoa Que adia as coisas está lidando com
lugares montanhosos, estar entre a multidão, a ansiedade pela evitação, embora não esteja
falar em público, pode simplesmente evitar estas consciente disto. Não é a preguiça que faz com
situações. Mas com isto nada é solucionado que as pessoas adiem indevidamente o escrever
uma carta, ir ao médico, ou fazer uma chamada

82
83
elefônica. Nós chamamos isto de procrastina-
ção, o que realmente é, mas a procrastinação importarei com ele, nem me séntirei culpado por
aparece basicamente por causa de ansiedade. causa dele. É um hóspede não convidado, por-
o: tanto, darei atenção a outra coisa qualquer, sem
Por
.. alguma razão, qeralrneate.-:
encontrada no
tnconscrente, nos encontramos com a ansiedade um sentimento de culpa ou autocondenação."
de fazer outra coisa, em vez de escrever a carta, Com o tempo, este processo de deixar de lado
telefonar ou ir ao médico. Portanto, "soluciona- tem muito mais poder sobre os pensamentos
mos" o problema temporariamente, evitando-o. sem objetivo e não desejados do que todo o
A dificuldade é que o problema não é resolvido poder da vontade poderia exercer.
de verdade.
A dificuldade em usar a evasão como solução
Algumas pessoas têm grande dificuldade com é que a pessoa tende a evitar somente o sintoma,
o que chamam de "maus" pensamentos. Estes o que deixa o verdadeiro problema escondido e
pensamentos, com freqüência relacionados com não resolvido; ele então persiste e se manifesta
sexo ou hostilidade, vêm às suas mentes espon- de outro modo.
taneamente. Estas pessoas sentem-se embara- Um homem, certa vez, contou seu medo para-
çadas e envergonhadas por abrigarem tais pen- lisador de ir além de determinada distância em
samentos. Tentam expulsà-Ios de suas mentes, suas atividades diárias. Ele estava limitado a
mas quanto mais se esforçam para expulsá-Ios, uma área de uns dez quarteirões. Passar a fron-
tanto mais eles se arraigam, e, nessa luta entre teira de sua "prisão" ocasionava-lhe medo muito
a vontade e a imaginação, esta geralmente ven- forte - batidas do coração, agitação extrema e
ce. outros sintomas tão severos, que ele simples-
mente não se podia forçar a ir além de seus
Em primeiro lugar, não existe uma tal coisa limites auto-impostos. Em algumas ocasiões,
como um "mau" pensamento. Há pensamentos sem aviso, seu mundo inteiro o restringia tanto,
destrutivos, pensamentos sem objetivo e pensa- que ele sentia dificuldade em sair de casa.
mentos absurdos. Se, em vez de colocar todos Quando, finalmente, se forçava a sair, um
os pensamentos em duas categorias, de "bons" sintoma secundário, como dor de cabeça severa,
e "maus", a pessoa puder dizer pensamentos aparecia.
"criativos" e "destrutivos", terá tomado o pri- A origem de seu problema estava em fortes
meiro passo para a solução.
sentimentos de culpa, que ele tinha cuidado-
Quando muitos pensamentos sem objetivo samente negado e escondidO de si mesmo. Seu
assaltam a mente, a gente pode dizer: "Este não sentimento de culpa não resolvido pedia perdão
é um 'mau' pensamento. É um pensamento ou autopunição de alguma forma. Assim, seu
destrutivo, porque destrói minha paz mental. primeiro passo foi negar e reprimir seus senti-
Não sei a sua origem, não o convidei, não me mentos de culpa, empurrando-os para o incons-

84 85
Provavelmente, não há esperança de aliviar tal
ciente, e foi então que seus numerosos sintomas situação enquanto a pessoa não encontrar o
apareceram. Embora negasse o fato, ele achava problema verdadeiro. A Bíbl ia o chama .de peca-
que sua limitação de espaço era menos amea- do. Os psicólogos o chamam de ansiedade e
çadora do que encarar o verdadeiro problema, conflito. O nome pouco importa. Não obstante,
que era o seu sentimento de culpa. . independente de como o chamemos, para ficar
livre, todo ser humano precisa encarar e confes-
A segunda tentativa que ele fez para solucio-
sar o que quer que seja que o separa de seu ser
nar seu problema foi evitar a situação que pro-
verdadeiro, de Deus e de seu próximo.
vocava a ansiedade. Quando ir além de um ponto
determinado causava medo intenso, ele sim- Um terceiro método de lidar com a ansiedade é
plesmente parava. Evitando o sintoma, ele sentia racionalizá-Ia. Todas as racionalizações são, em
alívio da ansiedade por uns momentos, mas isto grande parte, processos inconscientes. O que
não resolvia o problema básico. Nessas ocasi- dizemos através da racionalização pode ser ver-
ões em que achava difícil mesmo sair de casa, se dadeiro, total ou parcialmente,mas não será uma
ele se forçava a fazer isto (não evitando mais a explicação do modo de agir.
situação), respondia inconscientemente com
Ouvi dois homens discutindo os méritos de
outro sintoma - dor de cabeça.
seus carros novos e dispendiosos. Um deles deu
Todos os esforços no sentido de fazê-Io pro- uma explicação por que comprou um carro tão
. curar a causa real falharam, quer no grupo, quer caro. O motor novo, recém-lançado pelo fabri-
no aconselhamento particular. Ele queria remo- cante, dava quilometragem surpreendentemente
ver o sintoma, mas recusava-se obstinadamente boa. Ele dirigia muito e precisava do conforto
a encarar a causa real - o sentimento de culpa que o carro proporcionava. A direção hidráuli.ca
- ou mesmo admitir a possibilidade de que esta fazia com que as viagens longas fossem rnuito
podia ser a fonte de seu problema. Era como se menos fatigantes, e assim por diante. Seu amigo
ele dissesse, na profundeza do seu inconscien- ouviu atentamente toda a lista de racionaliza-
te: "Prefiro antes sofrer a dor e o embaraço de ções, sorriu e disse: "Comprei o meu, em parte,
meus sintomas do que a dor maior de olhar para porque é um símbolo de posição s.?cial !". O ~utro
dentro e encarar meu sentimento de oulpa." negou evidentemente que a posiçao social tives-
se qualquer coisa a ver com sua escolha do
É fácil ter um espírito crítico neste ponto e
difícil entender o conflito real travado em sua carro.
mente. Ele realmente não podia suportar a dor e Séries constantes de interrupções, como uma
examinar a culpa que sentia, qualquer que fosse. sucessão de chamadas telefõnicas, criam mais
Em vez de encará-Ia e confessá-Ia, ele simples- tensão em mim do que em muitas pessoas que
mente a negava e então tentava evitar as situa- conheço. A tensão cria ansiedade e a ansiedade
ções que despertavam todos os seus sintomas.

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86
cria tensão. Por muitos anos a minha racionali-
zação era que eu tinha trabalho para fazer e não Então percebi que estava racionalizando minha
teria tempo para fazê-Io se fosse interrompido ansiedade. Eu a havia atribuído ao meu zelo de
tantas vezes. Minha racionalização era verda- terminar a tarefa, e a um conseqüente senti-
deira até onde se podia perceber, mas eu sem- mento de fracasso, por não ter sido capaz de
pre evitara o problema básico. fazer tudo o que havia proposto a mim mesmo.
O problema real, depois pude ver, era que eu A verdade, como depois percebi, consistia em
ficava com um sentimento de culpa e autocrítica uma série de coisas. Quando era menino, sen-
se não conseguisse dar conta de certo trabalho tia-me aceíto por meus pais somente quando
proposto. Por exemplo, uma manhã, incumbi- fazia bem meus deveres e a tempo. Na infância,
me da tarefa de ditar um certo número de cartas. eu ficava possuído de sentimento de culpa se
Houve uma série de interrupções inesperadas: não estivesse em constante ação. A ansiedade
a campainha parecia tocar ti cada segundo; o paterna foi transmitida a mim. Já como adulto,
telefone tilintava a cada instante, até que pedi descobri que só poderia me aceitar se terminasse
para não ser interrompido; membros da diretoria a tempo minhas tarefas auto-impostas. Eu
entravam, e em cada caso parecia que a inter- sentia-me vagamente culpado e incapaz quando
rupção envolvia algo importante que não podia nào as terminava. Não havia pai para criticar,
esperar. Minha irritação ia aumentando. Eu tinha a não ser o pai "interno" que mora em cada
completado só uma fração do trabalho de que um de nós. Meus sentimentos de culpa não se
me incumbira, quando a secretária anunciou que constituíam, em sentido algum, de "culpa real";
uma mulher estava à minha espera. Embora eram de "culpa falsa". Eu era culpado só perante
tivesse marcado uma consulta para ela, eu havia- a consciência acusadora, que fora assim condi-
me esquecido. Enquanto olhava para o trabalho cionada em minha infância. Por uma série de
não terminado, mandei que a senhora entrasse. inteligentes racionalizações, eu tinha quase
Sob minha cordialidade havia uma subcorrente conseguido fazer virtude do que era uma reação
de irritação por não ter terminado o trabalho levemente neurótica, baseada em condiciona-
planejado. Estou certo de que a visitante notou mentos da infância. O trabalho, então, que me
minha frustração, porque vi isto refletido em seu propus foi de insistir que "o adulto de agora"
modo de agir. tomasse as decisões, e não mais a "criança
Examinando meus sentimentos mais tarde, interior do passado".
senti-me um pouco culpado por não ter sido Um quarto método de lidar com a ansiedade é
capaz de completar meu trabalho, que agora teria "narcotizá-la". Isto pode ser feito pelo uso de
que ser feito á noite; culpado por não ter conse- drogas, álcool, super-ocupação e de vários outros
guido dar conta, ao mesmo tempo, da diretoria, modos. Bilhões de dólares são gastos anual-
visitas, chamadas telefônicas e interrupções. mente em álcool e drogas num esforço para
escapar da ansiedade. Pode ser a ansiedade
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sentar. Há coisas demais para serem feitas.
roduzida pela solidão, pelos sentimentos de
O trabalho da mulher nunca termina."
n erioridade, de culpa ou de frustração, ou pela
a eaça de fracasso. O álcool paralisa os centros Acontecia que o problema dela era uma mistura
cerebrais superiores, onde o juízo é produzido, e de racionalização e narcotização. Quando cri-
ende a minorar a ansiedade temporariamente. ança, ela nunca tivera permissão para ficar à
A pessoa não tem mais coragem do que antes; toa ou lendo um livro. Seu pai insistia em que
sua capacidade de tolerância para com a ansie- as crianças deviam estar sempre ocupadas,
dade não foi aumentada. Nada, de fato, acon- mesmo quando não havia trabalho para ser feito.
eceu. a não ser que ela se narcotizou. Alguns Além disso, como jovem esposa, ela estava
dos tranqüilizantes funcionam da mesma ma- tendo dificuldades consideráveis no casamento.
neira. A pessoa não se torna mais capaz de A comunicação teria sido interrompida. A
enfrentar a vida, talvez, mas a vida parece-lhe ocupação constante com a casa, acrescida de
menos ameaçadora no momento. Ninguém muita atividade social, constituía um escape,
duvida do valor de certas drogas como soluções para ela, da ansiedade de contato mais íntimo
temporárias para o problema da ansiedade, mas com seu marido. Ele, por sua vez, começou a
elas não proporcionam cura para o mal-estar devotar mais e mais tempo ao seu escritório, o
básico, que é o problema da ansiedade não que também era um esforço inconsciente para
aliviada. evitar a ansiedade gerada em casa.

Um processo menos consciente, e muito res- Há também pessoas que procuram minorar a
peitado socialmente, é o de narcotizar a ansie- ansiedade envolvendo-se em atividades sociais.
dade pela super-ocupação. A maioria dos traba- Tais pessoas não estão sendo sociais de verdade;
lhadores compulsivos pertence a esta categoria. estão é procurando escapar de ansiedade pro-
Quer seja a devoção compulsiva da pessoa ao duzida pela solidão, procurando resposta para
seu trabalho, a atenção exagerada da mãe para sua própria auto-alienação. Seus esforços podem
com detalhes inumeráveis do trabalho domés- consistir em constante ida a festas, visitação,
tico, ou a fadiga de quem trabalha na igreja, divertimento; ou podem tomar a forma de "boas
cujo trabalho nunca termina, sendo compulsão obras" na comunidade ou na igreja local. Todos
orientada para Deus, tudo deve ser reexaminado. ou alguns destes podem ser ou esforços criativos
ou esforço inconsciente de silenciar a pequena
Uma jovem esposa e mãe reclamou que não voz que nos encoraja a avaliar nossa vida íntima e
podia entender como seu marido, muito des- nossas metas.
cansado, mas altamente competente, podia
Um sábio escreveu: "precavenha-se da este-
"ficar sentado, olhando pela janela". Exaspe-
rilidade da ocupação excessiva"; e um provérbio,
radamente ela disse: "Ele pode ficar sentado sem
muito repetido, diz: "Quando se está ocupado
fazer nada. Eu não posso simplesmente me

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Alguém disse: - E fugir do universo, de você
demais para orar, então se está ocupado de-
mesma e dos seus problemas interiores?
mais." Super-ocupação é uma característica da
nossa sociedade e é muito claro que, por melhor - Sim, talvez seja isso. Eu simplesmente
que nos possam parecer muitas de nossas ativi- fico tão cansada!
dades frenéticas, muito do que passa por ativi-
Discussão posterior revelou que ela estava
dade digna é simplesmente um esforço para
frenética e neuroticamente ocupada com uma
aliviaraansiedade. O bom pode tornar-se inimigo dúzia ou mais de atividades na igreja e na
do melhor. comunidade. Ela era amável e prestativa, a
Certa senhora, membro de um grupo, em uma própria compaixão e compreensão personifi-
sessão inicial, fez um inventário pessoal simples cadas. Mas sua fadiga, que não era tanto física
(o teste de desenhar uma pessoa), o qual foi como psicogênica, procedia de sua ansiedade
interpretado na hora. O líder disse, depois de interior. Ela não sabia de outra maneira de solu-
examinar a figura: - Parece que você está cionar essa ansiedade a não ser narcotizando-a
tentanto fugir do universo, por quê? com excesso de ocupação. Ajudava muita
gente e muitas causas boas; mas sentia-se
Ela replicou: - Bem, na verdade eu sou uma frustrada e internamente desligada da vida.
das pessoas mais ocupadas que se possa imagi- Estava resolvendo os problemas dos outros,
nar. Longe de fugir, estou ocupada o dia inteiro, mas sua própria ansiedade ficava sem sotucào.
todos os dias da semana, tentando socorrer
as pessoas necessitadas à minha volta. Há Quando chegou o dia de verificar se o grupo
tanto que precisa ser feito, tantas pessoas que deveria continuar, ela foi a primeira a objetar
necessitam deajuda. Háalgo de errado nisto? se seu horário tão cheio lhe permitiria continuar.
Estava tentando evitar a necessidade dolorosa de
O líder respondeu: - Claro que não há nada de examinar a verdadeira fonte de sua ansiedade,
errado em ser útil. Este teste simples não revela o que estava baseada num profundo sentimento de
que você está fazendo, mas nos revela que você inaptidão.
está insatisfeita com sua vida ou com aigum ~de e a única solução
aspecto dela, que você gostaria de se retirar e criativa é procurar e remover a causa da ansie-
desistir de tudo. Por quê? dade. Outra vez pode ser enfatizado que não
Então ela disse, pensativamente: - Bem há nada de errado com a ansiedade em si mesma.
realmente eu fico terrivelmente fatigada. Estou É somente quando nossa ansiedade adquire
sempre cansada das minhas muitas atividades. tão grandes proporções, de modo a limitar a
Às vezes me pergunto como é que eu poderia eficácia do que fazemos, que precisamos
sair disso tudo e simplesmente ir embora para procurar a sua origem. Isto é mais fácil de
sugerir do que realizar, porque freqüentemente
algum lugare ... - ela fez uma pausa.

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a s as raizes estão profundamente enterradas
nconsciente. A pessoa pode estar total-
Sentimento de vergonha e medo, de inferio-
en e inconsciente dos acontecimentos que
ridade e rejeição estavam todos misturados.
e criaram um grau indevido de ansiedade.
Quando ela terminou, eu disse: - Não acho
eqüentemente, entretanto, é possível procurar
que você tenha pecado tanto, mas que tantos
e dar com a causa dessa ansiedade anormal.
pecaram contra você. Sair-se de tudo isto e
Uma jovem senhora que pôde descobrir, em tornar-se a pessoa maravilhosa que você é,
reuniões de grupo, a causa de sua ansiedade, para mim, é um feito extraordinário. Eu sempre
ão estava nem mesmo cônscia de que a ansie- pensei bem de você. Agora que conheço a sua
ade era um problema em sua vida. Ela estava vida anterior, sinto uma admiração muito maior, e
e ando uma vida normal e criativa sob todos amor tam bém.
os pontos de vista. Era benquista, altamente
competente no seu trabalho e um fiel membro Ela, surpresa, perguntou: - Como é que
de igreja. Era, para todos os efeitos, uma jovem alguém pode me respeitar e amar sabendo tudo
senhora total mente normal. isto a meu respeito?
Num retiro, onde os presentes participavam Ao que eu disse: - Eu posso. E qualquer
de sessões de grupo, ela parecia estar enfren- outra pessoa também.
tando algum problema interior, cuja natureza Da próxima vez que a vi, percebi uma mu-
não sabia. Depois da sessão, veio a mim para dança radical. Havia franqueza nela, uma nova
discutir certas ansiedades que a incomodavam. alegria e vivacidade. Ela era uma personalidade
Sugeri a possibil idade de que tais ansiedades
aliviada, e ainda permanece assim. A ansie-
geralmente se originavam de sentimento de dade causada pelo sentimento de culpa tinha
culpa e pedi-lhe que trouxesse para nossa pró- mantido uma grande porção de sua personali-
xima sessão uma lista em relação a que ela sentia dade sob disfarce; ou melhor, uma grande
o tormento do complexo de inferioridade, quantia de sua energia psíquica estava sendo
vergonha, rejeição ou culpa. Expliquei-lhe gasta em dissimular. Agora ela não tinha nada
que tudo isto tende a ser registrado na natu- para esconder. Não precisava mais gastar gran-
reza interior como sentimento de culpa. Ela de parte dos recursos espirituais combatendo a
trouxe a lista, e bem grande, na semana se- ansiedade. Essa energia agora estava à dispo-
guinte. Demonstrava angústia considerável, sição para a vida criativa.
ao revelar sua lista. Seu sofrimento era causado
pelo fato de ter escondido estas coisas por Dr. Mowrer diz que as pessoas necessitam
muito tempo. Ela não podia acreditar que alguém de outras pessoas; e "quando esta necessidade
pudesse jamais respeitá-Ia, muito menos amá-Ia, é frustrada - como acontece, pela decepçao
se conhecesse todas as coisas a seu respeito e negação da identidade continua - há em
BI i cont idas. cada pessoa socialmente ajustada um desejo
poderoso de voltar às relações humanas satis-

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3. A ansiedade insuportável, que excede nos-
a orlas e confortadoras". Ele chama a aten-
so nível de tolerância, tenderá sempre a
ção para o conflito entre o nosso medo de sermos
produzir ou sintomas físicos, ou depressão
descobertos e o forte desejo interior de jogar
emocional, ou ambos.
nossas máscaras fora e procurar relações cria-
tivas com os outros. "Como resultado de uma 4. As causas de nossa ansiedade serão encon-
politica de duplicidade, os seres humanos têm tradas em uma ou mais destas áreas:
evitado detenção e castigo; e ... a condição que
(a) Tentativa de alcançar alvos incompa-
chamamos de doença mental é o mal-estar que
tíveis.
vem de uma consciência intranqüila e ... senti-
mento de cu Ipa não resolvido!" 2 (b) Sentimento de culpa, recente ou de mui-
O tempo não diminui nossos sentimentos de to tempo, real ou falso (muito sentímen-
culpa. A passagem do tempo pode embaçar to de culpa está centralizado em sexo e
a memória da culpa, ou ela pode mesmo ser hostilidade).
"esquecida" enterrada no inconsciente. (c) Condicionamento da infância.
Mas ainda está lá, criando seu fardo de ansie- (d) Fracasso em alcançar algum ideal.
dade desnecessária. Mesmo que o sentimento
Em média, a pessoa que experimenta ansie-
de culpa não seja, de modo algum, a única
dade indevida encontrará a causa de sua difi-
causa da ansiedade, ele contribui grandemente
culdade em uma ou mais destas áreas. Isto
para a criação da ansiedade destrutiva. Por cu Ipa,
requer, entretanto, um desejo de se abrir e não
queremos dizer, não somente pensamentos,
ser defensivo; de correr o risco de se expor,
atitudes e atos culposos, mas o sentimento
com conseqüente rejeição (que quase nunca
geral de "inadequação".
acontece); e ser cruelmente honesto para consigo
As generalizações são perigosas, como des- mesmo e para com os outros.
cobriu o estatista que começou a atravessar
um rio cuja média de profundidade seriam dois O processo não é fáci I, e raramente pode ser
pés, e adentrou-se em água de doze pés de levado a cabo sozinho. Nossa capacidade para
profundidade! Assim, tendo em mente os riscos, autodecepção é enorme. Outros, em um grupo
façamos as seguintes generalizações: pequeno, podem ajudar-nos, gentil e amorosa-
mente, a encarar nossa tendência de raciona-
1. A ansiedade até certo ponto é necessária e
lizar. Nós não só precisamos de discernimento
criativa. Além desse ponto é destrutiva.
psicológico, mas também da presença curadora
2. Se a tolerância do indivíduo para com as de Alguém, que disse: "Porque onde dois ou três
situações normais que produzem ansíedade estiverem reunidos em meu nome, ali estarei no
é pequena. ela pode ser aumentada com o meio deles." 3 De alguma maneira mística, a
tempo pelo processo de amadurecimento presença e o poder de Cristo são experimenta-
emocional.

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dos quando um pequeno grupo de pessoas se
reúne em Seu nome a fim de serem honestas
para com ele, para consigo mesmas e umas para
com as outras. Seu poder então é ajuntado ao
nosso discernimento humano, e não estam os sós
em nossa procura. Somos fortalecidos e sus-
tentados por Seu espírito e pelos outros enga-
jados na mesma busca.

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