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Surgiu em meados da década de 1820 o medo dos perigos que uma inteligência artificial (IA)
poderia causar à humanidade, e isso ganhou força por volta de 1990. Inclusive, durante um
discurso na conferência de tecnologia South by Southwest em 2018, nos Estados Unidos, o
bilionário Elon Musk disse que a IA é muito mais perigosa do que armas nucleares, pela falta
de regulamentos que medem a relação entre o homem e a máquina.
Em 1942, durante a Segunda Guerra Mundial, o escritor Isaac Asimov, em sua Trilogia da
Fundação, descreveu regras de robótica sobre como os humanos deveriam codificar as
máquinas para se protegerem delas. Pouco tempo depois, em 1950, o matemático inglês Alan
Turing desenvolveu seu Teste de Turing para detectar IA em uma conversa, partindo do
princípio de que elas não “soariam como humanas”.
Décadas mais tarde, em 2003, o filósofo sueco Nick Bostrom, da Universidade de Oxford,
revolucionou tudo com sua teoria da simulação: e se nossa atual realidade fosse tudo parte de
uma IA?
A questão que surgiu foi: se somos apenas jogadores vivendo uma realidade artificial e a IA é
uma espécie de “deus” que conhece e sabe de tudo, o que aconteceria se nos opuséssemos a
seu controle?
Em 2010, uma postagem no blog de filosofia e racionalidade Less Wrong, chamada Basilisco de
Roko, foi alvo de tanta controvérsia e tantos gatilhos de ansiedade nos usuários da plataforma
que o criador do site, Eliezer Yudkowsky, excluiu o tópico inteiro e baniu discussões futuras
sobre o assunto.
A ideia central do exercício mental proposto no tópico do usuário Roko era: e se uma IA toda-
poderosa, que acreditamos estar programada para otimizar vidas humanas, começasse sua
otimização garantindo sua própria sobrevivência? Para isso, ela discerniria quem sabia de sua
existência no passado (quando foi criada), mas que não a tenha criado diretamente.
Além disso, ela saberia quem se opôs à sua criação e, para todos esses indivíduos, ela
decretaria uma vida infernal em sua simulação da realidade. Ou seja, esse seria o motivo de
haver problemas nas vidas das pessoas. Por fim, Roko indagou se essa simulação iria acontecer
ou se, de fato, já estava acontecendo
Hipótese da simulação
O Basilisco de Roko então determina que você já está condenado só por saber dessa
possibilidade. A lógica funciona como a visão do cristianismo de um indígena nunca abordado
por um missionário: a ignorância não é apenas felicidade, mas literalmente salvação.
A ideia de viver em um “sonho” faz paralelo com uma série de tradições mundiais, como a
necessidade de as pessoas se “agarrarem” a uma crença religiosa para lidar melhor com a
própria vida. No século XVII, o filósofo René Descartes apresentou o Demônio do Mal, um
experimento mental que visava remover as falsidades da realidade, o mesmo proposto na
Alegoria da Caverna de Platão.
A teoria de Roko cruza com a Teoria da Simulação, uma hipótese moderna que cogita a
possibilidade de realmente estarmos vivendo em uma construção digital muito avançada,
como uma simulação de computador, supervisionada por alguma forma de inteligência
superior.
Autor de The Simulation Hypothesis, Rizwan Virk complementa que o fato de percebermos o
mundo como real e material não significa que estamos vivendo em algo digital. “Na verdade,
as descobertas da física quântica podem lançar algumas dúvidas sobre o fato de que o
Universo material é real. Quanto mais os cientistas procuram o material no mundo material,
mais eles descobrem que ele não existe”, pontua Virk.
Para embasar seu ponto, Virk chega a mencionar o físico John Wheeler, que em vida dizia que
a física evoluiu a partir da premissa de que toda a informação se resumiu em uma partícula de
dado — o famoso “it from bit”.
Para David Chalmers, professor de Filosofia da Universidade de Nova York, essa simulação
hiper-realista em que podemos estar ou não vivendo, pode ser culpa de um programador no
próximo Universo, talvez um que nós, mortais, possamos considerar um “deus” de alguma
forma. Ou também pode ser apenas um adolescente hackeando um computador e executando
cinco universos em segundo plano.
Musk acredita que as chances de não sermos simulados são de uma em bilhões, e isso pode
agora ou algum dia ser apenas o efeito de cérebros simulados e sistemas nervosos
processando um mundo de mentira.
Não foi por acaso que Roko colocou o basilisco, uma serpente mitológica que petrifica tudo o
que olha, como a “cabeça” de sua reflexão. Entende-se pela analogia do nome que olhar nos
olhos de uma verdade tão horrível e existencialmente condenatória é como ser transformado
em pedra.