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Medicina cria usuários de drogas como doentes, logo como usar um veneno para
Desde que o mundo é mundo o ser humano quer ficar expandir a consciência (Grof,
1997). Assim sendo, essa é uma marca de todas épocas e culturas, a busca dos sujeitos pela
expansão da consciência, sendo uma condição inerente ao ser humano (Carneiro, 2005).
Dessa forma, a utilização de determinadas substancias, definidas hoje como drogas, tem sua
base ancestral em inúmeras culturas, porém apenas a sociedade ocidental criou um combate
Quanto a história de estudo sobre essas substâncias é relatado por Carneiro (2005),
como a partir dos últimos 150 anos iniciou-se uma jornada (maior do que havia antes) de
pesquisa cientifica a respeito das plantas e substancias psicoativas. Uma das primeiras
classificações feitas sobre isso foi de Ludwig Lewin que classificou essas substancias em uma
categoria referidas como fantásticas. Essa classificação depois passará a ser conhecida como
características químicas e fisiológicas observadas são toxicidade baixa e dose muito pequena
necessária para o efeito. Outra característica observada é a de impacto psíquico, nivel a qual
essas produzem efeito significativo. Essa forte ação psíquica é o que fez essas plantas serem
Desse modo, as pesquisas sobre essas substâncias enfocaram seus usos tradicionais
como o contemporâneo, onde essas práticas vão ganhando novos significados. Os estudos
possuindo um longo registro bibliográfico. Após um início onde houveram pesquisas com a
mescalina realizadas por Arthur Heffter, em 1897, e Ernst Spath, em 1919, com enfoque mais
peyote (cujo um dos princípios ativos é a mescalina) feitos por Rouhier e La Barre . Logo
após aparecem as pesquisas com o LSD, substancia descoberta em laboratório e que chegou a
pesquisado depois por Aldous Huxley, Gordon Wasson, Richard Evans-Schultes e uma
explosão política e social nos anos 60 com estudos realizados por Timothy Leary, Richard
Alpert, Ralph Metzner. Nos anos 70 e 80, após o início das políticas proibicionistas, vem trabalhos, como
os de Escohotado e Jonathan Ott, com visões críticas sobre as funções culturais, sociais e
econômicas das drogas e como foi regulamentado durante a história (Carneiro, 2005).
total dos estudos oficiais sobre essas substancias, que denotavam potenciais promissores de
uso. No lugar disso, surge uma imensa perseguição sobre essas substancias, igualando-as a
qualquer outras em uma relação de drogas proibidas, classificadas como sem potencial para
uso terapêutico, gerando um empecilho para o seguimento das pesquisas. Uma crítica a como
as políticas de guerra as drogas são conduzidas reside em como isso se realizou, coibindo a
Assim, o trabalho de Escohotado nos informa acerca das lógicas de controle e regulação dos usos dos
fármacos e plantas. Ali se expõe como um dos pilares desse movimento proibicionista reside
em uma ‘inquisição farmacrática’, em uma guerra travada em além dos níveis de saúde, mas
2005).
Nesse sentido, é preciso buscar a precisão dos termos ao se referir a essas
vem dos termos utilizados entre as décadas de 30 e 50 e se configurou como a forma cientifica
de se referir. Apesar do uso mais vigente, essa expressão denota um preconceito, pois
direciona a existência de alucinações, como fato mais definidor da experiencia, que é si muito
mais ampla. O termo alucinógenos, que inclusive ainda descreve essa sub área de tematica no
Decs, se mostra não condizente pois não descreve de fato as experiencias e nem estão
O termo psicodélico, bastante utilizado dentro das pesquisas dessas substâncias e nos
movimentos políticos e culturais, é escolhido entre outras opções justamente por atingir a
o term o p sico d élico (q u e d eriv a d a ju n ção d as p alav ras g reg as p sy ch é, m en te, alm a e d elo u n ,
revelar, tornar visível) nos Anais da Academia de Ciências de Nova York ressaltando:
ferm en tad o r d a m en te, co m efeito é ap ro p riad o . P sico réx ica, ex p lo so r d o esp írito ,
ap esar d e d ifícil, é m em o ráv el. P sico lítico , lib ertad o r d a m en te, é satisfató rio . M as
Assim, segundo sua etimologia, psicodélico é aquilo que manifesta a mente, e apesar de ser
considerado não contaminado na época temhoje outras conexões (Carneiro, 2005; Rodrigues, 2016).
A expressão enteógeno, (do grego em - dentro, teo - d eu s, gen – origem) que significa
conectar com a origem do deus interior, foi proposta por Gordon Wasson em 1978 visando
dizer sobre plantas utilizadas como ferramentas sagradas de conexão e êxtase . Assim se torna
identifica componentes ‘religiosos’, como podemos perceber com a lente de nossa sociedade .
Tendo em vista esse viés da especificidade, acaba não sendo útil pra descrever experiências do
uso laico e contemporâneo. Ainda assim surgem inúmeras outras formas de definir algumas
(Carneiro, 2005).
componentes dessa trama. O contexto geral aonde se percebe a cisão entre pesquisas
promissoras e proibição e perseguição, pode ser representado pela década de 60, periodo
efervescente com mudança profundas advindas do pós guerra e corrente guerra fria. Esse
período tem como um dos marcos os movimentos contraculturais, que demandavam por
consciencial, não desejando a gestão do Estado sobre o que se faz se si mesmo, um manifesto
pela autonomia e fuga do controle dos corpos. Dessa forma, foi observado como possivel um
resp o sta o cid en tal a isso tem sid o m u ito n eg ativ a e tem seu s em b asam en to s q u e b u scarem o s
Dessa forma é preciso olhar mais a fundo esse complexo fator que muda de um aceno
para uso social e terapêutico dos psicodélicos para uma situação de drogas . Acredito que a
análise do componente histórico social pode ser de fundamental importância para compreender
esse processo. Esse aceno buscava se inserir na arena pública como opções de tratamento de
Assim é necessário analisar quais fatores podem ter influenciado impedimento de algo
que se demonstrava tão bom a princípio. Essa questão vem à tona justamente nesse momento
em que se disputa o local público de utilização como tratamento de saúde, em uma época de
me objetivo a pesquisar em que nível possa existir uma relação entre a proibição dos
época que de fato se realizou a proibição, o uso de algumas substancias já estava um tanto
para entender o que de fato foi o crescimento da autoridade medica nas sociedades europeias .
Logo é importante olhar qual modelo fora utilizado pela instituição médica e também até que
ponto pode ser transformado, visto a sua utilização em contextos que não os europeus, que não
Foucault (1979/2023), se desenvolveu dessa forma tendo o corpo como primeiro objeto, em
seu sentido de potência produtiva, referencial de relevância para época capitalista do século
XVIII. O controle das pessoas não começa pela ideologia ou pela consciência, mas pelo corpo .
144) delineia que “o corpo é uma realidade biopolítica. A medicina é uma estratégia
biopolítica”. Porém não se trata de um corpo proletariado que se aborda nesse momento, visto
este vir à tona mais à frente no século posterior. Ainda assim é preciso buscar mais
do próprio Estado.
fortalece uma ação médica realmente voltada para melhorar a saúde da população . Com essa
relevância obtido, tanto o médico como a medicina, serão os primeiros objetos a serem
normalizados. Ou seja, antes que isso seja feito com os pacientes, o próprio profissional é
submetido a essa aplicação. Assim, há a submissão da medicina a uma organização acima . O
centraliza, e passar a ser o braço do Estado, fatores que consagram para formar o que se
de influência e poder gerou certamente inúmeros avanços para toda sociedade. Porém, convém
questionar: de que forma ocorreu esse desenvolvimento? e se esse modelo apresenta falhas ou
crises, é possivel ser corrigido? Esse modelo cabe para todas as sociedades, mesmo as sem
Dessa forma, percebemos como o saber médico tem imposição normatizadora sobre os
que se investe emadministrar os corpos e realizar uma gestão calculista da vida. Cria se assimumprojeto
adestrador de corpo humano, direcionado para seu aperfeiçoamento de aptidões, ampliados em
suas forças, crescendo de forma devidamente disciplinada, como um corpo que se torna uma
máquina (Vargas, 1998). Assim a autoridade e poderio da medicina geram munição para uma
médico-social sobre a vida humana. Assim é possivel ver como esse controle biomédico viria
a suceder outras maneiras de gestão da sociedade. Esse poder do controle social da medicina
viria de uma capacidade de ter lugar para determinar e reajustar o que são alguns
demonstra um caráter controlador do saber médico sobre as formas de cura, sendo seu
julgamento um delimitador se algo presta ou não como cuidado de saúde. Com isso, se
percebe como a medicina através do seu viés de controle social pode expandir seus horizontes
d e ação , co n seg u in d o ab arcar situ açõ es e d itar v erd ad es so b re isto (C o n rad , 2007; V arg as,
1998).
Assim se faz necessário observar a que se destina essa mítica de onipotência do saber
efeito h istó rico d essas tecn o lo g ias d e sab er/p o d er d a m ed icin a é o d e u m a so cied ad e
n o rm alizad o ra, q u e cria m o d elo s id eais d e su jeito s (V arg as, 1998). D essa fo rm a é p reciso
verificar a existência de uma dissonância entre o poder cientifico da medicina e os seus efeitos
positivos (Foucault, 1976). Assim, é importante olhar para uma influência excessiva em
ser considerada como algo que não seja de cara um problema médico, mas que precisa ser
quanto que a entrada do corpo e da saúde em uma lógica consumista e mercadológica não
aumentou de fato o nível de saúde das pessoas. Logo se verifica como médicos e a indústria
que a responsabilizações e apontamentos recaiam sobre a classe dos médicos, que as reais
desse ramo são mantidas por um subsidio coletivo das condições de saúde e doença. Os
sujeitos que consomem as medicações não concebem essa dimensão, porém outros
profissionais envolvidos podem estar bem cientes disso. Nesse sentido, é cada vez mais
factível para os médicos são apenas a ponte entre as medicações e os sujeitos, como meros
Mas ainda assim é necessário ressaltar o quanto que essas afirmações sobre o saber
médico não são uma condenação sobre si, mas uma contextualização de que a medicina
invasivo e demasiadamente controlador das práticas de vida das pessoas. Essa prática pode, na
sujeitos, sendo apenas a que contempla sua visão biologicista a que detém a verdade. Desse
jeito se demonstra um caráter controlador do saber médico sobre as formas de cura, sendo seu julgamento um
médica, se caracteriza como um dos fatores mais influentes nas transformações do ocidente no
final do século passado (Conrad, 2007).Nesse sentido, se torna relevante demonstrar o quanto
a medicina e suas práticas estabelecem influência sobre a questão das drogas, sendo justamente
os crivos enunciados pelo saber biomédico que legitimarão a visão sobre a validade do uso das
substancias. Esse discurso médico garante legitimidade à guerra as drogas como forma de
Quanto ao assunto das drogas se constata haver umjulgamento moralista sobre quemas utiliza, sendo
essa questão atravessada por diversos fatores políticos, jurídicos, médicos, econômicos e
às drogas, gerando uma guerra de imensidão nunca antes observada na história (Vargas,
1998).
se faz a classificação de medicações alopáticas como positivas e das drogas como somente
negativas, demonizadas (Vargas, 1998). O preconceito sobre essas substâncias gerou, pelo
menos um impedimento, de conseguir compreender suas possibilidades terapêuticas . Conforme
descrito de forma bem profunda por Leary (1960), que foi o primeiro manual de instrução
sobre como utilizar essas substancias, se escapa o potencial da percepção integral dessas
substancias, cujo foco não está nelas, mas onde o principal está em quem e como utiliza-las, o
processo set-setting. Assim, é preciso salientar o quanto que não apenas substancia que define
vivenciado. Criar um ambiente confiável, ter uma pessoa experiente como guia na situação são
Assim é preciso buscar uma percepção não dualísticas sobre o uso das substancias que
não sejam tão opostas, ou algo imensamente prazeroso ou extremamente danoso . Assim, a
pelas restrições legais, torna-se também demonizada devido a ilicitude moral sobre essas
alguma forma, se inserir em uma epistemologia que converse com o universo dessas
mente, por vezes caótica, dos psicodélicos foram mal vistas pela mentalidade militarizada
presente na época do início da guerra fria. Essas mudanças e modulações da mente, sem um
viés controlador mas oposto a isso, são classificadas como ameaçadoras à ordem desejada pelo
sistema vigente. Assim deixar que a mente manifeste seus conteúdos de forma irrestrita pode
de fato permitir que venham muitos conteúdos complexos à tona, difíceis de serem alocados
somente em bons ou ruins, podendo haver situações paradoxais que questionam algumas
Nesse sentido, um movimento que acontece em um cenário binário posto como bom
ou mal, remedio ou veneno, medicação ou droga, mocinho ou bandido, gera, através também
direito de controlar e punir os que fogem a regra se faz mais presente do que o direito de gerir
Metodologia
Embuído dessas concepções pretendo pesquisar as relações da proibição/legalização
contextos. Através de revisão bibliográfica extensa sobre a temática e suas áreas de influência,
desde suas produções anteriores a sua proibição de pesquisa até os estudos realizados neste
saúde coletiva, utilizarei os referenciais foucaultianos para retratar a dinâmica de controle dos
corpos e daí discorre sobreem medida que isso aparece nas situações analisadas.
Justificativa
objeto, onde de um lado reside uma percepção negativada das drogas e de outro um
dizem os documentos, entendendo suas limitações. Com essa direção de transpor o dito é
necessário observar o que está silenciado e resiste à margem, esperando o momento para
através das medicações, mas em conceitos que possam se unir junto a estes dois processos .
Nessa direção, busco com meu estudo traçar novas fronteiras e conexões entre os
perspectiva sobre os termos pode mudar a correlação e ótica entre eles (Geertz, 1989).
Assim considero relevante pesquisar essa temática, por em algum nível representar
uma ótica nova de perspectiva (Knauth, 2014). Apesar de demonstrarmos que esse campo de
pesquisa não é recente, podemos coloca-la assim devido seu hiato de produção. Isso se dá
justamente devido seu apagamento por razões inúmeras que buscaremos explicitar nesse estudo, como as
um modelo que em diversos pontos se diferencie dos moldes que recebemos. Espero com essa
pesquisa contribuir para o avanço de perspectivas de saúde que de fato elevem o nível de
Referências
GEERTZ, C.. Uma descrição densa: por uma teoria interpretativa da cultura. In:
A Interpretação das Culturas. Rio de Janeiro: LTC, 1989.
HART, C.. Doing a literature review: releasing the social Science research
imagination. London: Sage, 1998
LEITE, M.. O que você sabe sobre a ciência psicodélica no Brasil?. Chacruna
Latinoamerica, 22 fev. 2023. Disponível em: https://chacruna-la.org/a-ciencia-
psicodelica-no-brasil/ . Acesso em: 19 jul. 2023.