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A lb e rto A .

A n d e ry
A lfre d o N a ffa h N e to J o s é R. T . Reis
A n to n io d a C. C ia m p a M a rília G. d e M ira n d a
Iray C a ro n e S ilvia T . M . Lane (org.)
J o s é C. L ib ân eo W a n d e rle y C o d o (o rg .)

PSICOLOGIA SOCIAL
o h o m e m e m m o v im e n to

8?
e d iç ã o

editora brasiliense
C oleçào P rim eiros Passos

O Discurso da Homossexualidade O que é Loucura


Feminina Joio Frayzt" Pereira
Dcnise Portinari
O que é Psicanálise
Evas, Marias, Liliths... Fabio Herrmann
As voltes do fem in ino
Vera Paiva O que é Psicanálise
2 ? visão
Filosofia e Comportamento Oscar Cesarotto/ Márcio P .S . Leite
Bento Prado Jr.
O que é Psicologia
Freud, Pensador da.Cultura Maria Luiza S . Teles
Renato Mczan
O que é Psicologia Comunitária
O Mínimo Eu Eduardo M. Vasconcelos
Christopher Lasch
O que é Psicologia Social
Sigmund Freud e o Gabinete do Silvia T. Maurer Lane
Dr. Lacan
Peter Gay e outros O que é Psicodrama
Wilsçn Csutcljadc Almeida
Tempo do Desejo
S o ciologia e p sic a n á lise O que é Psico terapia
H eloísa F e rn a n d e s (org) leda Porchac

O que é Psiquiatria Alternativa


Alan índio Serrano
1

Parte 1
Introdução
A Psicologia Social
e uma nova concepção
do homem para
a Psicologia
S ilvia T a tia n a M a u rer L a n e

“Q u a se n e n h u m a ação h u m a n a te m p o r su je ito u m in d i­
víd u o isolado. 0 sujeito da ação é u m g r u p o , u m 'Nós',
m e s m o se a e str u tu r a a tu a i da s o c ie d a d e , p e lo fe n ô m e n o
d a reifiçaçao, te n d e a en co b rir esse ‘N ó s ’ e a tra n sfo rm á -lo
n u m a som a d e vã ria s in d iv id u a lid a d e s d is tin ta s e fe c h a d a s
u m a s às outras. ” L ucien G o ld m a n , 1947.

À relação en tre P sicologia e P sicologia Social deve ser e n te n ­


d id a em su a perspectiva h istó rica, quando^ n a d é c a d a de 50 se
iniciam sistem atizações em term os d e P sicologia Social, d e n tro de
d u a s te n d ên cias p re d o m in a n te s: u m a , n a tra d iç ã o p ra g m á tic a dos
E s ta d o s U nidos, visando a lte ra r e /o u c ria r a titu d e s , in te rfe rir nas
re la çõ es gru p ais p a ra h arm o n iz á -la s e assim g a ra n tir a p ro d u ti­
v id a d e d o g ru p o — é u m a a tu a ç ã o que se c a ra c te riz a p ela euforia d e
u m a in tervenção q u e m in im iz a ria conflitos, to rn a n d o os h om ens
“ felizes” recorstrutores d a h u m a n id a d e que acabava de sair da
d e s tru iç ã o de um a II G u e rra M u n d ia l. A o u tra te n d ên cia, que
ta m b é m p ro c u ra co n h ec im e n to s que evitem novas catástro fes
m u n d ia is , segue a tra d iç ã o filosófica e u ro p é ia , com raízes n a
fenom enologia, b u sc a n d o m odelos científicos to ta liz a n te s, com o
Lew in e su a teoria de C am p o .
A euforia deste ra m o científico d e n o m in a d o Psicologia Social
d u r a relativ am en te p o u co , pois su a eficácia com eça a ser q uestio­
n a d a em m eados d a d é c a d a d e 60, q u a n d o as análises criticas
a p o n ta v a m p a ra u m a “ c ris e '* do c o n h ec im e n to psicossocial q u e não
INTRODUÇÃO 11

c o n se g u ia in te rv ir n em ex p licar, m u ito m e n o s prever c o m p o rta ­


m e n to s sociais. As rép licas de pesq u isas e e x p erim en to s n ão p e rm i­
tia m fo rm u la r leis, os estudos in te rc u ltu ra is a p o n ta v a m p a r a u m a
c o m p le x id a d e de variáveis q u e d esafiav am os p esq u isad o res e
esta tístic o s — é o re to rn o às análises fa to ria is e novas técnicas de
a n á lise d e m u ltiv a riâ n c ia , que afirm a m so b re relações ex istentes,
m a s n a d a em term os d e “ com o" e “ p o r q u ê ” ,
N a F ra n ç a , a tra d iç ã o p sican a lltica é re to m a d a com to d a a
v eem ên cia ap ó s o m ovim ento de 68, e sob sua ótica é feita u m a
c rític a à psicologia social n o rte -a m e ric a n a co m o um a ciência ideo­
ló g ica, re p ro d u to ra d o s interesses d a classe d o m in a n te , e p ro d u to de
c o n d içõ es históricas específicas, o que in v a lid a a tran sp o siçã o ta l e
q u a l d este co n h ecim en to p a ra o u tro s p aíses, em o u tra s condições
h istó rico -so ciais. E sse m ovim ento ta m b ém te m suas repercussões n a
In g la te rra , onde Israel e T àjfell a n a lisa m a “ crise1* sob o p o n to de
vista epistem ológico co m os d iferentes p ressu p o sto s que e m b a sa m o
c o n h e c im e n to científico — é a crítica ao positivism o, que em nom e
d a objetiv id ad e p erd e o se r h u m an o .
N a A m érica L a tin a , T erceiro M u n d o , d e p e n d e n te eco n ô m ica
e c u ltu ra lm e n te , a P sicologia Social o scila e n tre o p ra g m a tism o
n o rte -a m e ric a n o e a visão a b ra n g e n te de u m h o m em q u e só e r a
c o m p re e n d id o filosófica ou sociologicam ente — ou seja, u m h o m e m
a b s tra to . O s congressos in teram e rican o s d e Psicologia são exce­
le n te s term ô m etro s d e s s a oscilação e q u e cu lm in am em 1976
(M ia m i), com crític a s m ais siste m a tiz a d a s e novas p ro p o stas,
p rin c ip a lm e n te pelo g ru p o d a V enezuela, q u e se o rg an iza n u m a
A ssociação V en ezu elan a d e Psicologia Sovial (A V E PS O ) coexistindo
co m a A ssociação L atin o -A m erican a d e P sicologia Social (A L A P-
S O ). N essa ocasião, psicólogos b ra sile iro s ta m b é m faziam su a s
c rític a s, p ro c u ra n d o novos rum os p a r a u m a Psicologia Social q u e
a te n d e sse à nossa re a lid a d e , Esses m ovim entos cu lm in am em 1979
(S IP — L im a, P eru) co m p ro p o stas c o n c re ta s de u m a P sicologia
S ocial em bases m a te ria lista -h istó ric a s e v o lta d a s p a ra tra b a lh o s
co m u n itá rio s, a g o ra com a p a rtic ip a ç ã o d e psicólogos p e ru a n o s,
m e x ican o s e outros.
O p rim e iro p asso p a ra a su p eração d a crise foi c o n s ta ta r a
tra d iç ã o biológica d a Psicologia, em q u e o in d iv íd u o e ra co n sid era d o
u m o rg an ism o que in te ra g e no m eio físico, sen d o que os processos
psicológicos (o q u e o c o rre “ d e n tro " dele) são assum idos com o
c a u s a , ou u m a d as c a u s a s que ex plicam o seu co m p o rta m e n to . O u
seja, p a ra c o m p re e n d e r o indivíduo b a s ta r ia conhecer o q u e
12 SILVIA T . M . LANE

ocorre "dentro dele” , quando ele se defronta com estím ulos do


m eio.
Porém o hom em fala, pensa, aprende e en sina, transform a a
natureza; o hom em é cultura, é história. E ste hom em biológico não
sobrevive por si e n em é u m a espécie que se reproduz tal e qual, com
variações decorrentes de clim a, alim entação, etc. O seu organism o é
um a infra-estrutura que perm ite o desenvolvim ento de um a superes­
trutura que é social e , portanto, histórica. E sta desconsideração da
Psicologia em geral, do ser hum ano com o produto histórico-
social, é que a torna, se não inócua, um a ciência que reproduziu a
id eologia dom inante de um a sociedade, qu and o descreve com por­
tam en to e baseada em freqüências tira conclusões sobre relações
causais pela descrição pura e sim ples de com portam entos ocorrendo
em situações dadas. N ão discutim os a validade das leis de aprendi­
zagem ; é indiscutível que o reforço aum enta a probabilidade da
ocorrência do com portam ento, assim com o a punição extingue
com portam entos, porém a questão que se coloca é por que se
apreende certas coisas e outras são extintas, por que objetos são
considerados reforçadores e outros punidores? Em outras palavras,
em que condições sociais ocorre a aprendizagem e o que ela significa
n o conjunto das relações sociais que defin em concretam ente o
indivíduo na sociedade em que ele vive.
O ser hum ano traz consigo um a dim ensão que não pode ser
descartada, que é a su a condição social e histórica, sob o risco de
term os um a visão distorcida (ideológica) de seu com portam ento.
U m outro ponto de desafio para a P sicologia Social se colocava
d ian te dos conhecim entos desenvolvidos — sabíam os das deter­
m inações sociais e culturais de seu com portam ento, porém onde a
criatividade, o poder d e transform ação da sociedade por ele
construída. O s determ inantes só nos ensinavam a reproduzir, com
p equenas variações, as condições sociais n as quais o indivíduo vive.

A ideologia nas ciências humanas

A afirmativa de que o positivism o, na procura da objetividade


dos fatos, perdera o ser hum ano decorreu d e u m a análise crítica de
um conhecim ento m inucioso enquanto descrição de com porta­
m entos que, no entanto, não dava conta d o ser hum ano agente de
m udança, sujeito da história. O hom em ou era socialm ente deter­
m inado ou era causa de si m esmo: sociologism o vs biologism o? Se
INTRODUÇÃO m

por um lado a psicanálise enfatizava a história do individiM^


a sociologia recuperava, através do m aterialism o histórico, a espe­
cificid ad e de um a totalidade histórica concreta n a análise de cadà
sociedade. Portanto, caberia à Psicologia Social recuperar o indi-
víduo na intersecção de sua história com a h istória de sua sociedade
— apenas este conhecim ento nos perm itiria com preender o hom em
en q u anto produtor da história.
N a m edida em que o conhecim ento positivista descrevia
com portam entos restritos no espaço e no tem po, sem considerar a
inter-relaçào infra e superestrutural, estes com portam entos, m e­
diados pelas instituições sociais, reproduziam a ideologia dom i­
nan te, em termos de freqüência observada, levando a considerá-los
com o “ naturais” e, m uitas rezes, "universais” . A ideologia, com o
produto histórico que se cristaliza nas in stitu ições, traz consigo um a
concepção de hom em necessária para reproduzir relações sociais,
que por sua vez são fundam entais para a m anutenção das relações
de produção da vida m aterial da sociedade com o tal. N a m edida
em que a história se produz dialeticam ente, cada sociedade, n a
organização da produção de sua vida m aterial, gera um a contra­
dição fundam ental, que ao ser superada produz um a nova socie­
dade, qualitativam ente diferente da anterior. Porém , para que esta
contradição não negue a todo m om ento a socied ad e que se produz, é
necessária a m ediação ideológica, ou seja, valores, explicações tidas
com o verdadeiras que reproduzam as relações sociais necessárias
para a m anutenção das relações de produção.
D este m odo, quando as ciências hum anas se atêm apenas na
descrição, seja m acro o u m icrossocial, das relações entre os hom ens
e das instituições sociais, sem considerar a sociedade com o produto
histórico-dialético, elas não conseguem captar a m ediação id eo­
lógica e a reproduzem com o fatos inerentes à “natureza” do
h om em . E a Psicologia n ão foi exceção, principalm ente, dada a sua
origem biológica naturalista, onde o com portam ento hum ano
decorre de um organism o fisiológico que responde a estím ulos.
Lem bram os aqui W undt e seu laboratório, que, objetivando
construir um a psicologia científica, que se diferenciasse da esp ecu ­
lação filosófica, se preocupa em descrever processos psicofisiológicos
em term os de estím ulos e respostas, de causas-e-efeitos.
N esta tradição e no entusiasm o d e descrever o hom em
en q u anto um sistem a nervoso com plexo que o perm itia dom inar e
transform ar a natureza, criando condições s u i-g e n e r is para a
SILVIA T. M . LANE

sob ftvivên cia da esp écie, os psicólogos se esqueceram de que este


h om em , ju n to com outros, ao transform ar a natureza, se trans­
form ava ao longo da história.
C om o exem plo, podem os citar Skinner, que, sem dúvida,
causou um a revolução na Psicologia, m a s as condições histórico-
sociais que o cercam , im pediram -no de dar um outro salto q u ali­
tativo. A o superar o esquem a S-R , ch am ando a atenção para a
relação hom em -am biente, para o c o n tr o le que este am biente exerce
sobre o com portam ento; criticando o reducionism o biológico,
perm itiu a Skinner ver o hom em com o produto das suas relações
sociais, porém não chega a ver estas relações com o produzidas a
partir da condição histórica de um a sociedade. Q uando Skinner,
através da análise experim ental do com portam ento, detecta os
controles sutis que, através das instituições, os hom ens exercem uns
sobre os outros, e define leis de aprendizagem — e não podem os
negar que reforços e p unições d e f a t o controlam com portam entos —
tem os u m a descrição perfeita de um organism o que se transform a
em função das conseqüências de sua ação, tam bém a análise do
a u to c o n tr o le se aproxim a do que consideram os consciência de si e o
c o n tr a c o n tr o le descreve ações de um indivíduo em processo de
conscientização social. Skinner aponta para a com plexidade das
relações sociais e as im plicações para a análise dos com portam entos
envolvidos, desafiando os psicólogos para a elaboração de um a
tecnologia de análise que dê conta desta com plexidade, enquanto
con tin gên cias, presentes em com unidades. A história individual é
considerada enquanto história social q u e antecede e sucede à
história do Indivíduo. N esta linha de raciocínio caberia questionar
por que alguns com portam entos são reforçados e outros punidos
dentro de um m esm o grupo social. Sem responder a estas questões,
passam os a descrever o s ta tu s q u o com o im utável e, m esm o que­
rendo transform ar o hom em , com o o próprio Skinner propõe,
jam ais o conseguirem os num a dim ensão histórico-social.
Im passe sem elhante podem os observar em Lewin, que procura
detectar os “casos puros" à m aneira galileica e assim precisar leis
psicológicas. Tam bém para ele Indivíduo e M eio são indissociáveis,
e na m ed id a em que o m eio é social e se caracteriza p ela
com plexidade de regiões e sub-regiões e seu s respectivos sistem as de
forças, se vê num im passe para a com provação e previsão de
com portam entos. Este im passe surge, entre outros, na descrição de
processos grupais sob lideranças autocráticas, democráticas e
la is s e z -fa ir e , quando, entendendo ser o p rocesso dem ocrático o m ais
INTROD UÇ ÃO íê

criativo e produtivo, propõe um a “liderança dem ocrática fefttt**


com o form a de se chegar a esta relação gru p ai...
Tam bém a psicanálise, em suas várias tendências, enfrenta
e ste problem a, desde as criticas de Politzer a Freud até as análises
atuais dos franceses, que procuram fazer u m a releitura da obra de
Freud num a perspectiva histórico-social do ser hum ano.
N ão negam os a psicobiologia nem as grandes contribuições da
psiconeurologia. A final, elas descrevem a m aterialidade do orga­
nism o hum ano que se transform a através de sua própria atividade,
m as elas pouco contribuem para entenderm os o pensam ento h u ­
m an o e que se desenvolve através das relações entre os hom ens, para
com preenderm os o hom em criativo, transform ador — sujeito da
história social do seu grupo.
Se a Psicologia apenas descrever o que -é observado ou enfocar
o Indivíduo com o causa e efeito de sua individualidade, ela terá um a
ação conservadora, estatizante — ideológica — quaisquer que sejam
as práticas decorrentes. Se o hom em não for visto com o produto e
produtor, não só de sua história pessoal m as da história de sua
sociedade, a Psicologia estará apenas reproduzindo as condições
necessárias para im pedir a em ergência das contradições e a trans­
form ação social.

Á psicologia social e o materialismo histórico

Se o positivism o, ao enfrentar a contradição entre objetividade


e subjetividade, perdeu o ser hum ano, produto e produtor da
H istória, se tornou necessário recuperar o s u b je tiv is m o enquanto
m a te r ia lid a d e p s ic o ló g ic a . A dualidade físico X psíquico im plica
um a concepção idealista do ser hum ano, n a velha tradição animíp-
tica da psicologia, ou en tão caím os num organicism o onde hom em e
com putador são im agem e sem elhança um do outro. N enhum a das
duas tendências dá conta de explicar o h om em criativo e trans­
form ador. T om ou -se necessária um a nova dim ensão espaço-tem -
poral para se apreender o Indivíduo com o um ser concreto,
m anifestação de um a totalidade histórico-social — daí a procura de
um a psicologia social que partisse da m aterialidade histórica
produzida por e produtora de hom ens.
Ê dentro do m aterialism o histórico e da lógica dialética que
vam os encontrar os pressupostos epistem ológicos para a recons­
16 SILVIA T . M . LANE

trução dç um conhecim ento que atenda à realidade social e ao


cotidiano de cada indivíduo e que perm ita um a intervenção efetiva
na rede de relações sociais que define ca d a indivíduo — objeto da
Psicologia Social.
D a s críticas feitas detectam os que definições, conceitos cons-
tructos que geram teorias abstratas em n ad a contribuíram para um a
prática psicossocial. Se n ossa m eta é atingir o indivíduo concreto,
m anifestação de u m a totalidade histórico-social, tem os de partir do
em pírico (que o positivism o tão bem n os ensinou a descrever) e,
através de análises sucessivas nos aprofundarm os, além do apa­
rente, em direção a esse concreto, e para tanto necessitam os de
c a te g o r ia s que a partir do em pírico (im obilizado pela descrição) nos
levem ao processo subjacente e à real com preensão do Indivíduo
estudado.
T am bém a partir de críticas à p sicologia social “tradicional"
pudem os perceber dois fatos fundam entais para o conhecim ento do
Indivíduo: 1) o hom em não sobrevive a n ão ser em relação com
outros hom ens, portanto a d ic o to m ia Indivíduo X Grupo é falsa —
desde o seu nascim ento (m esm o antes) o h om em está inserido num
grupo social — ; 2) a sua participação, as suas ações, por estar em
grupo, dependem fundam entalm ente da aquisição da lin g u a g e m
que preexiste ao indivíduo com o código produzido historicam ente
pela sua sociedade ( la n g u e ) , m as que ele apreende na sua relação
específica com outros indivíduos (p a r o le ) , Se a língua traz em seu
código significados, para o indivíduo as palavras terão um sentido
pessoal decorrente da relação entre p ensam ento e ação, m ediadas
p elos outros significativos.
O resgate destes dois fatos em píricos perm ite ao psicólogo
social se aprofundar n a análise do Indivíduo concreto, considerando
a im bricação entre relações grupais, linguagem , pensam ento e ações
na defin ição de características fundam entais para a análise psicos­
social.
A ssim , a a tiv id a d e im plica ações encadeadas, ju n to com outros
indivíduos, para a satisfação de um a necessid ade com um . Para
haver este encadeam ento é necessária a com unicação (linguagem )
assim com o um plano de ação (pensam ento), que por sua vez
decorre de atividades anteriorm ente desenvolvidas.
R efletir sobre u m a atividade realizada im plica repensar suas
ações, ter consciência de si m esm o e dos outros envolvidos, refletir
sobre os sentidos pessoais atribuídos às palavras, confrontá-las com
as conseqüências geradas pela atividade desenvolvida pelo grupo
INTR ODU ÇÃO 17

social, e nesta reflexão se processa a c o n s c iê n c ia do indivíduo, que é


indissociável enquanto de si e social.
Leontiev inclui ain d a a p e r s o n a lid a d e com o categoria, decor­
rente do princípio de que o hom em , ao agir, transform ando o seu
m eio se transform a, criando características próprias que se tornam
esperadas pelo seu grupo no desenvolver de su as atividades e de suas
relações com outros indivíduos.
C aberia ainda, n a especificidade psicossocial, um a análise das
r e la ç õ e s g r u p a is en q u anto m ediadas p elas in s titu iç õ e s s o c ia is e
com o tal exercendo u m a m ediação id eológica na atribuição de
p ap éis sociais e representações decorrentes d e atividades e relações
sociais tidas com o “ adequadas, corretas, esp erad as” , etc.
A consciência da reprodução id eológica inerente aos papéis
socialm ente definidos p e r m i t e aos indivíduos no grupo superarem
suas individualidades e se conscientizarem das condições históricas
com uns aos m em bros do grupo, levando-os a um processo de
identificação e de atividades conjuntas que caracterizam o grupo
com o unidade. Este processo pode ocorrer individualm ente e cons­
tataríam os o desenvolvim ento de um a consciência de si idêntica à
consciência social. N a m edid a em que o processo é grupai, ou seja,
ocorre com todos os m em bros, ele tende a caracterizar o desen­
volvim ento de um a consciência de classe, q uando o grupo se percebe
inserido no processo de produção m aterial de sua vida e percebe as
contradições geradas historicam ente, levando-o a atividades que
visam à superação das contradições presentes no seu cotidiano,
to m a -se um grupo-sujeito da transform ação histórico-social.
D esta forma, a análise do processo grupai nos perm ite captar a
d ialética indivíduo-grupo, onde a dupla negação caracteriza a
superação da contradição existente e quando o indivíduo e grupo se
tornam agentes da história social, m em bros indissociáveis da
totalidade histórica que os produziu e a qual eles transform am pôr
suas atividades tam bém indissociáveis.
E sta análise das categorias fundam entais para a com preensão
d o ser hum ano nos leva à constatação d a im possibilidade de
delim itarm os conhecim entos em áreas estan qu es que com poriam o
conjunto das Ciências H um anas. Psicologia, Sociologia, A ntropo­
logia, Econom ia, H istória, Pedagogia, L ingüística são enfoques a
partir dos quais todas as áreas contribuem para o conhecim ento
profundo e concreto do ser hum ano. Suas fronteiras devem ser
necessariam ente perm eáveis, am pliando o conhecim ento, seja do
18 SILVIA T . M . LANE

in d iv íd u o , d o g ru p o , d a so cied ad e e d a p ro d u ç ã o d e s u a ex istên cia


m a te ria l e c o n c re ta .

Decorrências metodológicas:
a pesqufea-ação enquanto práxis
A p a r tir d e u m en fo q u e fu n d a m e n ta lm e n te interdisciplinary
o p e s q u is a d o r-p ro d u to -h istó ric o p a r te de u m a v isão d e m u n d o e do
h o m e m n e c e ssa ria m e n te c o m p ro m e tid a e n e s te se n tid o n ã o h á
p o ssib ilid a d e de se g e ra r u m c o n h e c im e n to “ n e u tro ” , n e m u m
c o n h e c im e n to d o o u tro q u e n ã o in te rfira n a s u a ex istên cia. P e sq u i­
s a d o r e p e s q u is a d o se d efin e m p o r rela çõ es so ciais q u e ta n to p o d em
ser re p ro d u to ra s com o p o d e m se r tra n s fo rm a d o ra s d a s condições
sociais o n d e am b o s se in serem ; d e sta fo rm a , co n sc ie n te s o u n ã o ,
sem p re a p e s q u is a im p lic a in terv en ção , a ç ã o de u n s so b re outros* A
p e s q u is a em si é u m a p rá tic a social o n d e p e s q u is a d o r e p e sq u isa d o
se a p re s e n ta m e n q u a n to su b je tiv id a d e s q u e se m a te ria liz a m n as
relaçõ es desenvolvidas, e o n d e os p ap éis se c o n fu n d em e se
a lte rn a m , a m b o s o bjetos de an álises e p o r ta n to d escrito s e m p iri­
c a m e n te . E s ta re la ç ã o — o b je to d e an á lise — é c a p ta d a em seu
m o v im en to , o q u e im p lic a, n e c e ssa ria m e n te , p e sq u isa -a ç ã o .
P o r o u tro la d o , as condições h istó ric as so ciais d o p esq u isa d o r
e d e p e s q u is a d o s q u e re sp o n d e m p elas relaçõ es sociais q u e os
id e n tific a m co m o in d iv íd u o s p e rm ite m a a c u m u la ç ã o de co n h ec i­
m e n to s n a m e d id a em q u e as condições sã o a s m e sm a s, o n d e as
esp ecificid ad es in d iv id u a is a p o n ta m p a ra o c o m u m g ru p a i e social,
ou seja, p a r a o p ro cesso h istó rico , q u e, c a p ta d o , nos p ro p ic ia a
c o m p re e n s ã o do in d iv íd u o com o m a n ife sta ç ã o d a to ta lid a d e social,
ou seja, 0 In d iv íd u o c o n cre to .
E s te c a r á te r ac u m u la tiv o d a p e sq u isa faz d o c o n h e c im e n to
u m a p rá x is , o n d e c a d a m o m e n to em p íric o é re p e n s a d o n o co n fro n to
com o u tro s m o m en to s e a p a r tir d a refle x ão c ritic a novos c am in h o s
d e in v e stig açã o são tra ç a d o s, q u e p o r su a vez levam a o reex am e de
to d o s os e m p írico s e an álises feitas, a m p lia n d o se m p re a co m ­
p re e n sã o e o âm b ito d o co n h ecid o . P e s q u is a -a ç â o é p o r excelência a
p rá x is cien tífica.
IN TR OD U Ç ÃO 19

Toda a psicologia é social

E s ta a firm ação n ã o significa re d u z ir as á re a s específicas d a


P sic o lo g ia à P sicologia S ocial, m as sim c a d a u m a a ssu m ir d e n tro d a
su a esp ecificid ad e a n a tu re z a h istórico-social d o ser h u m a n o . D esde
o d esenvolvim ento in fa n til a té as p a to lo g ia s e as técnicas de
in te rv e n ç ã o , cara c te rístic a s do psicólogo, devem ser a n a lisa d a s
c ritic a m e n te à luz d e sta c o n ce p ção d o ser h u m a n o — é a c lareza de
q u e n ã o se p ode c o n h ec er q u a lq u e r c o m p o rta m e n to h u m a n o is o ­
la n d o -o o u fra g m e n ta n d o -o , com o se este existisse em st e p o r si.
T a m b é m com e s ta a firm a tiv a n ã o n e g a m o s a especificidade d a
P sic o lo g ia Social — ela c o n tin u a te n d o p o r objetivo co n h ecer o
In d iv íd u o n o c o n ju n to d e s u a s rela çõ es sociais, ta n to n aq u ilo q u e lhe
é específico com o n a q u ilo e m que ele é m a n ife sta ç ã o g ru p ai e social.
P o ré m , a g o ra a P sicologia S ocial p o d e rá re sp o n d e r à q u e stão de co m o
o h o m e m é sujeito d a H istó ria e tra n s fo rm a d o r d e sua p ró p ria v id a e
d a s u a sociedade, assim co m o q u a lq u e r o u tr a á re a d a P sicologia.

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