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AULA 2

ACESSIBILIDADE E
ERGONOMIA

Prof. Carlos Tietjen


CONVERSA INICIAL

Estudos referenciais sobre antropometria e escala humana acompanham


grandes nomes da história, como Vitruvius, Leonardo da Vinci e Le Corbusier.
Trata-se de contribuição não apenas métrica, mas técnica, associada à percepção
do “homem como medida de todas as coisas”, segundo preconizado por
Protágoras.
Reflexões conceituais sobre utilização, concepção formal, disposição e
organização de ambientes estabelecem fatores para se projetar e propor novas
soluções ergonômicas, em que tecnologias associadas à inteligência artificial
configuram novos modelos de interação universal.

TEMA 1 – ANTROPOMETRIA

A origem da antropometria remonta à Antiguidade. Egípcios e gregos já


observavam e estudavam as relações entre as diversas partes do corpo. O
reconhecimento dos biótipos remonta aos tempos bíblicos; o nome de muitas
unidades de medida, utilizadas hoje em dia, deriva de segmentos do corpo.

ANTROPOMETRIA

antropo - HOMEM

metria - MEDIDA

A antropometria é o estudo das medidas do corpo humano, que desperta


interesse ao longo da história. É um tema recorrente em grandes obras de
estudiosos de ciência, anatomia, antropologia, arquitetura e arte.
Os dados antropométricos estabelecem relações entre medidas de
tamanho, peso e proporção do corpo humano, aplicáveis a um correto
dimensionamento de projeto/produto, sem deixar de avaliar a fisiologia do
movimento, de acordo com:

• Antropometria Estática: referencial de medidas que toma como observação


o corpo parado, ou considerando poucos movimentos. “Definição por
excelência clássica no tema apresentado”. Ou o corpo está parado ou tem
pouco movimento.

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• Antropometria Dinâmica: as medidas se referem ao alcance dos
movimentos, ângulos e função de atividades exercidas.

Para Neufert (2013), o principal fundamento antropométrico estabelece que


o homem é base universal de escala e suas relações geométricas de medidas.

TEMA 2 – DESENVOLVENDO A ANTROPOMETRIA E FUNDAMENTOS E


RELAÇÃO DE ESCALA

Estudos sobre a proporção do corpo humano são comuns desde a


Antiguidade. O dimensionamento seguia princípios de escala e harmonia,
presentes principalmente em design e arquitetura em interface com ergonomia.
No Renascimento, as questões e os ideais da Antiguidade Clássica foram
postos novamente em foco, influenciando muitos artistas deste período, por novas
ideias e técnicas características. Entre eles, Leonardo da Vinci fez uma releitura
do Homem Vitruviano, modificando algumas relações de proporção.
No Tratado De Architectura Libri Decem, de Vitruvius, são descritos os
primeiros princípios de proporção do corpo humano, e a sua relação com
arquitetura.
Na Arquitetura Moderna, o arquiteto franco-suíço, Le Corbusier,
preocupou-se em valorizar a proporção em seus projetos. Elaborou um estudo
sobre o corpo humano, denominado de O Modulor, influenciando o modo de
projetar e pensar a arquitetura e a ergonomia.

2.1 O homem vitruviano

O engenheiro e arquiteto Marcus Vitruvius Pollio, que viveu no século I d.C.,


relacionou a razão áurea e as proporções humanas, em seu Tratado de
Arquitetura. O autor inicia a obra recomendando que os templos deveriam ser
construídos tendo por base o corpo humano, o que garantiria magnificência.
(Doczi, 2012).
O homem vitruviano, figura de estudo apresentada, tem seu
desenvolvimento inserido no princípio da “quadratura do círculo”, proposta pela
geometria grega, segundo a qual a construção do quadrado deriva da mesma área
do círculo em questão. Esse princípio era considerado perfeito na antiguidade
clássica.

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Figura 1 – Homo ad circulum e ad quadratum proposto por Cesariano

Crédito: Library of Congress.

O quadrado representa a estabilidade quádrupla da Terra (Doczi, 2012).


Essa combinação no corpo humano sugeria que, dentro de nosso corpo, uniam-
se pela mitologia as divindades do céu e da terra. O desenho mostra como as
partes do corpo humano se relacionam entre si a partir da Seção Áurea e do
Triângulo de Pitágoras.

2.2 Leonardo da Vinci e a releitura do homem vitruviano

Leonardo da Vinci, assim como outros mestres da Renascença, dedicou


parte de seu tempo ao estudo das proporções harmônicas, e chegou a ilustrar o
livro de Luca Paccioli, Divina Proportione. Neste livro, Leonardo diz que toda parte
tem em si a predisposição de unir-se ao Todo, para que assim possa escapar à
sua própria imperfeição (Marques; Siqueira; Sirilo, 2017).
Na interpretação de Leonardo, o corpo encontra-se ora inscrito no círculo,
ora inscrito no quadrado. Deste modo, temos dois centros diferentes, e as duas

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formas se tangenciam somente na base do quadrado, indicado em verde na figura
a seguir (Marques; Siqueira; Sirilo, 2017).

Figura 2 – Releitura do homem vitruviano

Crédito: Wikimedia Commons.

Analisando o círculo, temos que o homem inscrito tem pernas afastadas


uma em relação à outra; os braços não se encontram perpendiculares ao tronco.
O centro é o seu umbigo, como indicado pela cor laranja na figura. Já no quadrado,
os braços estão horizontais e perpendiculares ao tronco, e as pernas unidas. O
centro do quadrado se localiza, no homem, na base da pelve, como demonstrado
em cor azul (Pedro, 2011).
Na representação do Homem Vitruviano feita por Leonardo da Vinci, torna-
se interessante destacar que a altura do homem equivale à largura de seus braços
estendidos.

2.3 O Modulor de Le Corbusier

O Modulor consiste em um sistema de medidas do corpo humano


desenvolvido pelo arquiteto Le Corbusier, com base em dois sistemas métricos: o
anglo-saxônico (pés e polegadas) e o métrico-decimal (metro e centímetro).

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Conforme Marques, Siqueira e Sirilo (2017), trata-se de uma fórmula gráfica
com base no quadrado duplo, na série de Fibonacci e no retângulo de ouro, a
partir da qual seria possível gerar duas séries de medidas em harmonia com o
corpo humano e entre si.

Figura 3 – O Modulor

Crédito: FLC-ADAGP.

TEMA 3 – PROJETO E DIMENSIONAMENTO DAS EDIFICAÇÕES

Para projetar e dimensionar espaços de uma edificação, ou de um espaço


externo, é preciso considerar a delimitação do “espaço atividade” e sua área
mínima de uso. Espaço Atividade é a superfície necessária suficiente para que
uma pessoa possa desenvolver qualquer atividade sem interferência ou restrição
de mobiliário, equipamentos e/ou componentes da edificação. Boueri Filho (2008)
define área mínima “como espaços de atividades arranjados espacialmente, de
modo que as condições de uso, acesso e articulação entre mobiliários,
equipamentos e componentes do edifício, sejam adequadas às funções que
possam ser executadas naquele ambiente”.
Com essa delimitação, é possível considerar:

• a menor área do ambiente para um mesmo número de funções contribuindo


para otimização funcional;
• a redução de circulações desnecessárias;
• o aumento das condições de segurança das atividades;
• a frequência de usos dos equipamentos (hora, diário, semanal...);
• o agrupamento de funções dos equipamentos;
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• a interação entre equipamentos e mobiliários (sequência de uso,
proximidade e acessibilidade).

Para que haja um processo organizado e sistematizado, Boueri Filho (2008)


propõe uma metodologia para o dimensionamento dos espaços atividade, nas
seguintes etapas:

• Etapa 01 – Inventário das Atividades


• Etapa 02 – Definição do Objeto e suas Dimensões
• Etapa 03 – Registro das Posturas do Corpo Humano
• Etapa 04 – Análise de Registros
• Etapa 05 – Medidas e Padrões Antropométricos
• Etapa 06 – Determinação do Espaço Atividade

Seguem abaixo alguns exemplos decorrentes dessa metodologia:

Figura 4 – Exemplo de diagramação de áreas mínimas para utilização de um


conjunto mesa/cadeira

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Figura 5 – Exemplo de diagramação de áreas mínimas para utilização em
circulação

TEMA 4 – ASPECTOS DO ESPAÇO INTERNO: REFLEXÕES CONCEITUAIS PARA


ELABORAÇÃO DE PROJETOS

Para elaborar projetos considerando a acessibilidade e a ergonomia como


fatores primordiais, é preciso analisar os aspectos conceituais de utilização do
espaço e do artefato, a concepção formal, além da disposição e organização de
ambientes, estabelecendo uma relação objetiva e direcional de fatores que
influenciam a forma de projetar e de propor novos espaços.
Tais propostas visam o sistema funcional dos ambientes e sua
consequente melhoria ergonômica.
Além disso, considera-se importante adequar a usabilidade dos
equipamentos, pois favorecem a dinâmica de uso em sua diversidade de tarefas,
seja na residência ou em qualquer função a que se destina.
Outros aspectos também são fundamentais no processo de elaboração de
projeto no que tange à acessibilidade e ergonomia:

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• fluxogramas: estabelecidos para confrontar inadequações de atividades e
estabelecer ordens prioritárias na concepção da volumetria e no status
visual;
• territorialidade e posicionamento geográfico como delineadores de conforto
ambiental;
• meio ambiente e ecologia urbana como pilares da sustentabilidade;
• mobiliário e design, que devem garantir a modularidade ou a
adaptabilidade;
• afetividade como reflexo da apropriação do espaço;
• cultura e estilos de vida, de modo a entender o modo de vida na sociedade
contemporânea.

Segue um esquema de modo a resumir o espectro observacional.

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Quadro 1 – Espectro observacional

USO

•Convivência
•Manutenção individual corporal
•Manutenção da edificação
•Trabalho temporário
•Armazenagem

PRIVACIDADE

•Espaço privado
•Espaço semiprivado
•Espaço semipúblico

ADEQUAÇÃO

•Conforto
•Mobilidade
•Acessibilidade
•Segurança

FLEXIBILIDADE

•Delimitação dos espaços


•Mobiliário solto x Mobiliário planejado

APROPRIAÇÃO

•Objetos
•Decoração
•Afetividade

ERGONOMIA

•Saúde
•Bem estar

TEMA 5 – FACILITADORES E TECNOLOGIA APLICADA À ERGONOMIA

5.1 Dispositivos e Conectividade

A conectividade retrata a realidade que se vive, e já não cabe mais um


questionamento dissociado entre “real e virtual”. Novas conexões se apresentam

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e os smartphones adquirem status pessoais entre as dinâmicas de trabalho e a
vida social.
São esses os primeiros produtos que passam a incorporar e alterar a
funcionalidade de mobiliários e ambientes. Extremamente versáteis, há os
carregadores para celular por indução e os dispositivos powerplugs, que são
facilmente embutidos em projetos de mobiliários.
Sistemas integrados de som ao mobiliário já são uma realidade comum, em
que a aparente estática do móvel no espaço passa a interagir com os usuários em
suas maiores sensibilidades e afetividades.

5.1 Automação inclusiva

As tecnologias e interações promovidas entre todos os setores de estudos


aplicados ao projeto/produto ergonômico, nos setores de arquitetura e meio
ambiente, estão relacionadas, na atualidade, com a pluralidade do termo Internet
das Coisas.
Entre tantos outros atributos e funcionalidades espaciais, a automação de
ambientes reveste-se de valores perceptuais muito mais relevantes do que
simplesmente tornar automática uma tarefa habitual.
Nesse sentido, o conceito de automação inclusiva passa a ser um conjunto
integrante de inteligência artificial, dotado de memória, noção temporal,
interatividade, capacidade de integrar vários sistemas de um ambiente, atuar em
diversas condições, com reprogramação e capacidade autocorretiva. Em tese,
destina-se aos usuários com necessidades especiais, mobilidade reduzida e
idosos, visando melhoria da qualidade de vida.
Alguns dispositivos presentes no mercado:

• leitores biométricos;
• acionamentos por comando por voz;
• dispositivos de presença;
• controle de iluminação;
• controle de acessos e aberturas;
• funcionalidades de equipamentos;
• climatização.

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REFERÊNCIAS

BALBINOTTI, G. C. Ergonomia como Princípio e Prática nas Empresas.


Curitiba: Genesis; 2003.

BOUERI FILHO, J. J. Antropometria Aplicada à Arquitetura, Urbanismo e


Desenho Industrial. 1 ed. São Paulo: Estação das Letras e Cores Editora, 2008.

COHEN, J. L. Le Corbusier. 3. ed. São Paulo: Taschen; 2010.

COOPER, J. M. Plato’s Theaetetus. 2. ed. New York: Routledge: 2015.

DOCZI, G. O poder dos limites: harmonias e proporções na natureza. 6 ed. São


Paulo: Publicações Mercuryo Novo Tempo, 2012.

DUL, J. Ergonomia Prática. São Paulo: Edgard Blucher, 2004.

GOMES FILHO, J. Gestalt do Objeto, Sistema de Leitura Visual da Forma. 9.


ed. São Paulo: Escrituras Editora, 2009.

GURGEL, M. Guia de Arquitetura de Interiores para Áreas Comerciais. São


Paulo: Editora SENAC São Paulo, 2005

GURGEL, M. Projetando Espaço. São Paulo: Editora SENAC São Paulo; 2007.

MARQUES, J.; SIQUEIRA, V.; SIRILO, G. A Proporção no Corpo Humano e Sua


Influência na Arquitetura. Artigo Graphica, 2017. Disponível em:
<https://even3storage.blob.core.windows.net/anais/49748.pdf>. Acesso em: 18
jun. 2019.

NEUFERT, E. Neufert, Arte de Projetar em Arquitetura. 18 ed. São Paulo:


Gustavo Gili, 2013.

PANERO, J.; ZELNIK, M. Dimensionamento Humano Para Espaços


Interiores. São Paulo, Gustavo Gili, 2015.

PEDRO, A.P.G. A Ideia de Ordem: Symmetria e Decor nos Tratados de Filarete,


Francesco di Giorgio e Cesare Cesariano. São Paulo: Universidade de São Paulo:
FAU, 2011.

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