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LICENCIATURA EM GEOGRAFIA

TEORIA E MÉTODO DA GEOGRAFIA


DOCENTE: PROF. DR. PAULO BONFIM
ALUNO: DANIEL MADREGAL

A NATUREZA DO ESPAÇO - TÉCNICA E TEMPO, RAZÃO E EMOÇÃO


Uma Ontologia do Espaço, Milton Santos

SÃO PAULO
JUNHO, 2018
RESUMO

“Este, como todos os livros, tem uma história: a história de uma


pesquisa que durou muitos anos, a história da busca de urna forma
para exprimir os resultados alcançados. A pesquisa deveu muito aos
cursos, sobretudo de Pós-Graduação, que ministrei na Universidade
de São Paulo (USP), e que me obrigaram, cada ano, a enfrentar uma
questão nova e a encontrar uma ordem para as respectivas
exposições”.
Assim Milton Santos apresenta sua obra, resultado de inúmeras
horas em salas de aula e voltado às salas de aula. Pretende com
este trabalho completar ou complementar seu livro anterior, Por Uma
Geografia Nova (1978) e alguns dos temas nele abordados mas vai
além, discute aspectos que vão da sociologia à filosofia e, talvez,
seja esse seu verdadeiro viés. Nos dois primeiros capítulos discute
sobre as técnicas, ou sua ausência nas obras geográficas como se
nelas não se inserissem, a empiricização do tempo e a idade de um
lugar – uma forma de pensar o espaço e o próprio espaço, enquanto
sistema de objetos e sistema de ação.
Durante a leitura do texto procurei fontes externas que me ajudasse
a compreendê-lo, principalmente na abordagem ontológica do
espaço mas o que encontrei acabou desviando-se para criticas
semânticas sobre o uso do verbete ontologia e não epistemologia,
ou discussões que que fugiam à temática proposta por Santos.
Diante disso, a única maneira de entendê-lo é lendo e realizando um
exercício de por-se no lugar do outro, uma abstração que permita
ver a evolução das técnicas ao longo do tempo a ponto de
transforma-se em agente transformador do espaço e transformando
em algo novo, o espaço tecnocientífico, informacional, capaz de criar
tecnocracias e o próprio espaço, protagonista de si mesmo, o
crescimento das redes geográficas e o acirramento do processo de
globalização.
CAP. 1 – AS TÉCNICAS, O TEMPO E O ESPAÇO GEOGRÁFICO

“As técnicas são um conjunto de meios instrumentais e sociais, com os quais o homem
realiza sua vida, produz e, ao mesmo tempo, cria espaço.” (SANTOS, 2009, p. 29)

A NEGLIGÊNCIA COM AS TÉCNICAS

Por que os geógrafos se interessam por quase tudo, menos pelas técnicas?
Para explicar este conceito, o autor cita Maximilien Sorre, que sugeria que os estudos
geográficos levassem em conta, simultaneamente, as técnicas da vida social, as técnicas
da energia, as técnicas da conquista do espaço e da vida de relações e as técnicas de
produção e da transformação das matérias-primas. Entretanto, Sorre não foi seguido por
muitos de seu meio, o que causou, na opinião do autor, o tratamento errôneo desta
vertente no espaço geográfico. Santos considera incompleto o tratamento dado pelos
geógrafos às técnicas, já que estes tendem a considerar apenas as técnicas de produção,
as técnicas industriais ou outras técnicas específicas como meio de realizar algum
resultado especifico. De acordo com ele, somente “o fenômeno técnico alcançado em sua
total abrangência permite alcançar a noção de espaço geográfico”. Para resolver esta
questão, o autor propõe considerar a própria técnica como um meio, assim como o fez
Jacques Ellul, considerando o homem pertencente a um novo meio natural a partir da
ordem criada pelas técnicas.

A TÉCNICA, ELA PRÓPRIA, É UM MEIO

“De fato, dizemos nós, não há essa coisa de um meio geográfico de um lado e de um
meio técnico do outro. O que sempre se criou a partir da fusão é um meio geográfico, um
meio que viveu milênios como meio natural ou pré-técnico, um meio ao qual se chamou
de meio técnico ou maquínico durante dois a três séculos, e que hoje estamos propondo
considerar como meio técnico-científico informacional.” (SANTOS, 2009, p.41)

"a ordem criada pela técnica inclui o homem em um verdadeiro novo meio natural"
Jacques Ellul

O objeto técnico vive num "pisca-pisca" incessante entre o "interior" e o "exterior". Mas em
nenhum caso a difusão dos objetos técnicos se dá uniformemente ou de modo
homogêneo. Essa heterogeneidade vem da maneira como eles se inserem desigualmente
na história e no território, no tempo e no espaço. M. Akhrich (1987, p. 51)

É dessa forma que "a técnica adquire uma presença e esposa um meio". Nas redes
sociotécnicas, criadas a partir da introdução de objetos técnicos (no caso a eletricidade
em meio subdesenvolvido), M. Akhrich (1987) oferece-nos, também, uma chave para
entender, a partir do fenômeno técnico, a produção e a transformação de um meio
geográfico, assim como, por outro lado, as condições de organização social e geográfica,
necessárias à introdução de uma nova técnica. Ela estava trabalhando sobre a difusão da
rede elétrica na Costa do Marfim e avaliando o seu peso na produção de uma
solidariedade forçada entre os indivíduos. O objeto técnico define ao mesmo tempo os
atores e um espaço.

A NECESSIDADE DE UM ENFOQUE ABRANGENTE

“A técnica nos ajuda a historicizar, isto é, a considerar o espaço como fenômeno histórico
a geografizar, isto é, a produzir uma geografia como ciência histórica. Assim pode-se
também produzir uma epistemologia geográfica de cunho historicista e genético, e não
apenas historista e analítico.” (SANTOS, 2009, p. 49)
O autor preocupa-se também em definir o que é objeto técnico, chegando á conclusão
que a melhor maneira de conceituá-lo seria incluir até mesmo os objetos naturais entre os
objetos técnicos, levando-se em conta o critério do uso possível. Quanto á presença dos
objetos técnicos nas sociedades, Santos cita J-P Seris, que afirma que a adoção destes
passa por uma avaliação dos valores técnicos, em relação com o êxito ou fracasso
possíveis. É o espaço que determina os objetos, já que este é o conjunto de objetos
organizados segundo uma lógica e utilizados segundo uma lógica. Será o espaço o
definidor dos objetos técnicos,apesar de suas vocações originais, pois é este que os inclui
num conjunto coerente onde a contiguidade obriga a agir em conjunto e solidariedade.
Deve ser lembrado que as técnicas, na realidade, se distribuem de maneira desigual no
espaço, devido a fatores diversos, como aceitação e condições sociais do local. A falta de
homogeneidade, entretanto, não interfere no trabalho do geógrafo, que vai analisar o
substrato e verificar como as ações humanas se realizam neste espaço.

AS TÉCNICAS E A EMPIRICIZAÇÃO DO TEMPO

“Em qualquer momento, o ponto de partida é a sociedade humana em processo, isto é,


realizando-se. Essa realização se dá sobre uma base material: o espaço e seu uso; o
tempo e seu uso; a materialidade e suas diversas formas; as ações e suas diversas
feições.
Assim empiricizamos o tempo, tornando-o material, e desse modo o assimilamos ao
espaço, que não existe sem a materialidade.” (SANTOS, 2009, p. 54)

O convívio das diferentes técnicas pode auxiliar a geografia a definir a relação espaço-
tempo, conceito tão difícil de ser comprovado. É comum afirmar que espaço e tempo são
um único elemento, indissolúveis, mas afirma que esta relação nunca havia sido
comprovada com satisfação. Segundo ele, a melhor maneira utilizada para relacionar
estes dois fatores era a periodização histórica, entretanto, este artifício dá apenas o que
ele chama de tempo externo a cada subespaço, faltando resolver a questão do tempo
interno. A este problema, Santos vê como única alternativa a empiricização do tempo,
tomando-o uma medida recíproca ao espaço para que sejam compatíveis. Tempo, espaço
e mundo são realidades históricas, que devem ser mutuamente conversíveis, se a nossa
preocupação epistemológica é totalizadora. Em qualquer momento, o ponto de partida é a
sociedade humana em processo, isto é, realizando-se. Essa realização se dá sobre uma
base material: o espaço e seu uso; o tempo e seu uso; a materialidade e suas diversas
formas; as ações e suas diversas feições. A técnica surge, então, como um traço de
união, pois será ela, com suas datas precisas de criação e seus vestígios no espaço, que
vai permitir a empiricização do tempo e a possibilidade de qualificação do material
utilizados pelas sociedades em cada momento.

A IDADE DE UM LUGAR

As técnicas são um fenômeno histórico. Por isso, é possível identificar o momento de sua
origem. Essa datação é tanto possível à escala de um lugar, quanto a escala do mundo.
Ela é também possível à escala de um país, ao considerarmos o território nacional como
um conjunto de lugares.(SANTOS, 2009, p. 57)
É possível datar a idade de um lugar em parâmetros geográficos através da observação
da incidência dos processos naturais em cada local, entretanto, em se tratando de
materialidade artificial, o melhor recurso a ser utilizado neste sentido é a observação das
técnicas. Elas são documentos históricos, com datas de fabricação e local de nascimento,
mesmo que se tornem universais. As técnicas, no entanto, devem ser consideradas
existentes apenas a partir de sua introdução na sociedade. Será o lugar onde será
empregada e a integração de seu uso na sociedade que validará sua existência e dará
efetividade histórica.
CAPÍTULO 2
-
O ESPAÇO: SISTEMA DE OBJETOS E SISTEMA DE AÇÃO

Em uma primeira hipótese de trabalho (no livro Por Uma Geografia Nova), Milton Santos
defendeu que o espaço era constituído por elementos fixos e fluxos, sendo os elementos
fixos aqueles fixados em locais, permitindo as ações modificadoras do próprio local e os
fluxos aqueles que resultam direta ou indiretamente das ações, ou seja, as modificadoras
do primeiro elemento. Neste novo trabalho, Santos propõem uma mudança no tratamento,
desejando, então, lidar com estes dois fatores (os sistemas de objeto e os sistemas de
ação) como um único componente do espaço. Segundo ele, o espaço é formado por um
conjunto indissociável, solidário e também contraditório, de sistemas de objetos e
sistemas de ações, não considerados isoladamente, mas como um quadro único no qual
a história se dá. Esse novo paradigma se faz possível devido à dependência destes dois
elementos. Os sistemas de objetos condicionam a forma como as ações vão ocorrer. As
ações, por sua vez, são as criadoras de novos objetos ou se realizam sobre objetos
existentes.

SISTEMAS DE OBJETOS

Costuma-se dizer que as coisas são obras da natureza, enquanto os objetos são obras do
homem. Santos nos lembra que, cada vez mais, os objetos tomam o lugar das coisas. No
princípio, tudo eram coisas, enquanto hoje tudo tende a ser objeto, já que as coisas,
quando utilizadas pelo homem a partir de um conjunto de interações sociais, passam,
também a ser objetos. Assim a natureza passa a ser um verdadeiro sistema de objetos.
Mesmo incidindo de forma universalizada, todo objeto surge para responder a
necessidades sociais e técnicas de um dado momento histórico, que podem ser concretas
ou simbólicas. A relação direta com os hábitos da sociedade faz com que a partir das
populações de objetos sejam construídas as respectivas demografias, tarefa
interdisciplinar que conduziria ao reconhecimento de uma verdadeira ecologia dos
objetos. O conceito de população de objetos se deve ao fato de poucos deles serem
oferecidos separadamente, por necessitarem de complementações, como a geladeira e o
freezer doméstico, o caminhão refrigerado, os refrigeradores dos estabelecimentos
comerciais e os frigoríficos.

UM OBJETO GEOGRÁFICO?

Na geografia, tudo aquilo que existe na superfície terrestre é considerado um objeto,


sendo ele pertencente á história natural ou á ação humana. Estes objetos são contínuos e
compõem a população que constitui o espaço. Com esta definição, entretanto, corre-se o
risco de confusão entre o objeto de estudo da geografia e da arqueologia, pois, para
ambas as disciplinas, o objeto material permite a construção de uma realidade. A proposta
de considerar o espaço geográfico a união dos sistemas de objetos e de sistemas de
ação vem ajudar na definição do papal do geógrafo e distingui-lo dos de outras
disciplinas. Esses objetos e essas ações são reunidos numa lógica que é, ao mesmo
tempo, a lógica da história passada e a lógica da atualidade. Trata-se de reconhecer o
valor social dos objetos, mediante um enfoque geográfico.

SISTEMAS DE AÇÕES

A ação é o trabalho que o homem exerce sobre a natureza, isto é, sobre o meio, mudando
a si mesmo, sua natureza íntima, ao mesmo tempo em que modifica a natureza externa.
O autor concebe o espaço como um conjunto indissociável de sistemas de objetos e de
ações. Além disto, considera o espaço geográfico como um misto, um híbrido da condição
social e física, mesclando relações sociais e materialidades. Para ele, os sistemas de
objetos representam o conjunto das forças produtivas, enquanto os sistemas de ações
englobam o conjunto das relações sociais de produção. Afirma que o espaço sem a ação
humana, seria paisagem, pois é o homem quem anima as formas espaciais, conferindo-
lhes conteúdo. Avalia a paisagem como mais morfológica e enxerga o espaço vinculado à
funcionalidade. Embora as ações se tornem gradativamente mais técnicas, estas são
também emotivas, simbólicas. Deste modo, toda ação é dotada de intencionalidade. As
relações entre os sistemas de objetos e os de ações são mediadas pelas leis e normas.

"o homem, esse fazedor de paisagens, somente existe porque ele é membro de um
grupo que em si mesmo é um tecido de técnicas".
REFERÊNCIA BIBLIOGRÁFICA:

SANTOS, M. A Natureza do Espaço: Técnica e Tempo, Razão e Emoção. 4. ed. São


Paulo: Editora da Universidade de São Paulo, 2009. p. 29 – 59.

OBSERVATORIUM: Revista Eletrônica de Geografia, v.8, n.21, p. 150-155, set/2017.

Caminhos de Geografia Uberlândia v. 9, n. 26 Jun/2008 p. 215 - 226 Página 218

Revista geo-paisagem (on line), Ano 12, nº 23, Janeiro/Junho de 2013, ISSN Nº 1677-650

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