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COMOTAL Nº 10 Abril de 2021 - Editora Religare

ZOROASTRISMO
QUE LÍNGUA FALAVAM OS ANTIGOS PEDREIROS?
OS TEMPLÁRIOS E O DESCOBRIMENTO DO BRASIL
MAÇONARIA: GENTE QUE CUIDA DE GENTE
Editora Religare Revista

Expediente
COMOTAL - REVISTA MAÇÔNICA DIGITAL

Publicação Mensal
N° 10 – ABRIL/2021

EDITOR
Cláudio Nogueira

DIAGRAMADOR
Rafael Vilela

ILUSTRADOR
Angeluz Corps

Revista gratuita. Publicidade gratuita. Finalidade e


circulação Maçônica. Textos de responsabilidade
única dos autores. Campanhas de solidariedade de
responsabilidade das entidades. Entre em contato para
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Editora Religare Revista

Sumário
EDITORIAL
Cláudio Nogueira 04
RELIGIÃO
ZOROASTRISMO 08
Cláudio Nogueira

CURIOSIDADES
QUE LÍNGUA FALAVAM OS ANTIGOS PEDREIROS? 19
Michael Winetzki

HISTÓRIA
OS TEMPLÁRIOSE E
OS TEMPLÁRIOS OO DESCOBRIMENTO
DESCOBRIMENTO 24
DO BRASIL
DO BRASIL
Alfério Di Giaimo Neto

FILOSOFIA
MAÇONARIA: GENTE QUE CUIDA DE GENTE 33
Rafael Gama

CAMPANHA DE SOLIDARIEDADE
CASA DE APOIO FILHOS DE HIRAM 40
EVENTO
LIVE DA GLESP 41
O que é a Maçonaria na perspectiva da Maçonaria
Editora Religare Revista

Editorial
À GL ∴ DO G∴A∴D∴U
Semana passada, no nosso podcast Papo de Bodes,
tive o privilégio de entrevistar o nosso Irmão
Alexandre Rampazzo e o tema do nosso podcast girou
em torno da questão da convivência entre gerações na
Maçonaria. Reitero aqui os meus agradecimentos,
pois de fato o papo profícuo resgatou da minha
memória várias vivências desses meus poucos anos
em nossa sublime instituição. Acredito sinceramente
que em outro ambiente não teria conhecido pessoas
tão interessantes e das mais diversas idades. Em geral,
no mundo profano nos relacionamos com indivíduos
da nossa faixa etária com pequenas variações de idade.
Claro que estou aqui excluindo os familiares e entes
mais próximos. De toda sorte, foi na Maçonaria que
pude conviver, no enlace espiritual da fraternidade,
com Irmãos dos dezoito aos cem anos e aprender um
pouquinho com todos eles. Lá, a construção da
irmandade parece que anulou de certa maneira as
diferenças de idade e o que ficou foi a experiência do
maduro e também a empolgação do novo; cada um doa
o que pode, cada um recebe o que se permite.
Mas sem dúvidas o nosso papo serviu para ir adiante
da questão da convivência entre gerações, pois além
da temática abordada pude refletir sobre os mais

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diversos aspectos das diferenças que convivem na


nossa Ordem. Veio-me à cabeça, sobretudo as
diferenças sociais. Estas, talvez a mais difíceis de se
misturar em nossa sociedade tão divididas por
estamentos. Fui nascido e criado na periferia de
Salvador, oriundo de família de classe baixa e
dificilmente teria acesso às pessoas dos mais variados
escalões da sociedade que tenho acesso hoje e, o mais
importante, que pude estreitar laços verdadeiros de
fraternidade. Acredito que essas barreiras de “clãs” tão
engessados em nossa nação raramente são quebradas.
A maçonaria encurta essas distâncias também.
São irmãos dos mais variados partidos, das mais
variadas religiões e que entenderam que conviver
entre as diferenças é talvez a maior lição que a nossa
Arte Real pode nos oferecer. Não tenho dúvidas
também que a chave ideológica que abre essa porta
tem o nome de tolerância e é do outro lado da porta que
mora a argamassa da nossa construção: a fraternidade.
Não estou aqui numa perspectiva romantizada
dizendo que todos da nossa Ordem pensam assim.
Infelizmente é perceptível que não. Contudo só me
inspiro em que vale a pena e dentro de mim mora a
certeza que embaixo de um pé de acácia repousa o
amor ágape.
Digo isso porque basta observar no mundo profano
que hoje, e a cada dia mais, a sociedade se organiza em
bolsões narcisistas. Ao que parece só é interessante o
que se parece consigo. As redes sociais, tão

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importantes nos mais diversos aspectos, possibilitou


também que as diferenças aparecessem e se
acentuassem. O dito “cada um em seu quadrado” está
em vigor. As divisões partidárias apodrecem em
politicagem, o racismo levanta bandeiras, as religiões
matam e roubam “em nome” de Deus e as diferenças
de classes constroem as muralhas de seus feudos. E a
cada dia é mais difícil encontrar homens que queiram
ter consigo o ideal da evolução através do
conhecimento.
Continuo aqui nessa difícil tarefa do autolapidar, mas
entendendo que a convivência fraternal entre Irmãos é
que nos dá o caminho para a tolerância e com ela a
evolução. É no coletivo e na diferença que se dá essa
lapidação. Somente juntos e em meio às diferenças
que poderemos ter a nossa Pedra no caminho da
polidez. Cada um lapida a sua Pedra, mas só se
constrói a Catedral se todas as Pedras estiverem
polidas igualmente.
Ir ∴ Cláudio Nogueira

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O ZOROASTRISMO
Por Cláudio Nogueira

Alguns Rituais do Rito Escocês Antigo e Aceito fazem


alusão à figura de Zoroastro e, por conseguinte, do seu
Zoroastrismo, como referência e influência na
Maçonaria. A tradição fala das aberturas e fechamentos
dos trabalhos, do dualismo e do ágape fraternal. O fato
é que não se aprofunda mais do que isso. Mas vejamos
um pouco do que era essa religião no período da sua
criação e da principal figura que a criou.
O Zoroastrismo é uma religião que foi fundada na
antiga Pérsia, região que compreende nos dias atuais
parte do Irã e do Afeganistão, provavelmente a sua
criação data entre 1500 a 1 200 a.C. Ela também é
conhecida por Masdeísmo. Era uma religião
monoteísta e essencialmente dualista. Foi fundada
pelo profeta Zaratustra, também chamado de
Zoroastro. Os fundamentos eram essencialmente
passados oralmente. Esses conceitos teológicos
posteriormente foram escritos no livro Avestá, o qual
inclui-se os Gatas, hinos ao qual se atribuem a
composição ao próprio Zaratustra.
Os praticantes da fé masdeísta acreditam que existem
duas forças que representam a essência do Bem e do
Mal. Aúra-Masda (Senhor Sábio) é a entidade
suprema e único deus cultuado, apesar deste possuir
sete atributos divinos: Vohu-Mano (Espírito do Bem),

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Asa-Vahista (Retidão Suprema), Khsathra Varya


(Governo ideal), Spenta Armaiti (Piedade Sagrada),
Haurvatat (Perfeição), Ameretat (Imortalidade). O
Mal é representado pelo espírito (não é considerado
um deus) de nome Arimã ou Angra.
A essência do pensamento Zoroastrista está no conflito
entre essas entidades que é representado na própria
dualidade humana e na sua livre escolha de seguir o
bem ou mal, arcando com as suas devidas
consequências.
Dentre os traços fundamentais das doutrinas e crenças
pregadas por ela estão: a imortalidade da alma,
ressureição dos mortos, a vinda de um Messias e o
Juízo Final. Os seus adeptos acreditam no fundamento
de que o ser humano após a morte é recompensado ou
punido de acordo as suas obras na vida.
Os acadêmicos atestam que todas essas crenças são
anteriores a existência do povo Hebreu e, portanto, do
Judaísmo e por extensão do Cristianismo. É claro que
essas pesquisas levam somente em conta a
materialidade das provas e desconsideram a tradição
oral e mesmo bíblica que fala de povos anteriores aos
Hebreus que já acreditavam em um Deus único. O fato
é que cientificamente falando o Zoroastrismo é o
início do monoteísmo e da religião ética.
Os Zoroastristas não cultuavam imagens, se reuniam
em Templos e representavam a Deus através do fogo
ao qual oravam diante, mas não adoravam a chama,
esta era apenas um símbolo. Acreditavam no caráter

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sagrado da natureza e dos quatro elementos. O seu


ritual fúnebre distancia-se da maioria das práticas
ritualísticas conhecidas, pois consistia em colocar o
corpo em elevações, chamadas de torres do silêncio
(dakhma), para que ao apodrecer fossem devoradas
por aves de rapina, já que acreditavam que o corpo
morto era impuro e não podia nem enterrar, cremar ou
jogar no rio, como a maioria das culturas faziam, pois
iriam profanar os elementos.
A essência zoroastrista consiste no dualismo moral e
em um conceito chamado de Tríplice Bondade: boa
mente, boas palavras e boas ações.
Os principais mandamentos são: falar a verdade,
cumprir com a palavra e não contrair dívidas. A regra
de ouro é: "Age como gostarias que agissem contigo".
Condena-se a gula, o orgulho, a preguiça, a cobiça, a
ira, a luxúria, o adultério, o aborto, a calúnia e a
desonestidade. Juros e acúmulo de riquezas eram
altamente reprovados.
Valorizava-se a comunidade, o trabalho na terra e o
autoconhecimento como forma de manter o equilíbrio
entre o ser humano, a sociedade, a natureza e o ser. As
virtudes como justiça, retidão, cooperação, verdade e
bondade, surgem como o princípio organizador de
Deus, contudo estas só se manifestam através do
esforço individual, pois cada um é responsável por
seus atos. Os homens devem ser fiéis, amar e auxiliar
uns aos outros, amparar os desvalidos e serem
hospitaleiros. Eram contra penitências como o jejum

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ou sofrimento imposto a si mesmo, sendo a favor da


temperança, mas não da abstinência.
A base do pensamento zoroastrista consiste em evitar
o mal por meio de uma distinção rigorosa entre Bem e
Mal através do cultivo da sabedoria e das virtudes.
Era uma religião de Revelação e a sua principal
profecia é a de que na Batalha Final o Bem venceria e
extinguiria o Mal para sempre da face da Terra. Essas
profecias chegaram a humanidade através de uma
revelação ao profeta Zaratustra.

ZOROASTRO

Esse era o nome dado pelos gregos a Zaratustra.


Significava "contemplador de astros". Pouco se sabe
do Zoroastro histórico. Há, inclusive, incerteza
material da sua existência e correntes defendem a
possibilidade de uma historização de um mito. O que
se sabe está nos textos sagrados creditados como de
sua autoria: os Gatas.
O que neles se relata e o que pesquisas podem
subentender, principalmente através da linguística
histórica, é que foi um profeta e poeta nascido na
Pérsia Antiga, provavelmente na parte oriental do
planalto iraniano. Falava avéstico e, justamente por
evidências linguísticas e socioculturais infere-se que
seu nascimento ocorrera em algum período do II
milênio a.C, apesar da tradição dizer que o seu
nascimento foi no século VI a. C. Foi o fundador do

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Masdeísmo que tornar-se-ia a religião oficial do


Império Aquemênida (558–330 a.C.).
Algumas correntes filosóficas o descrevem como o
primeiro filósofo, o pai da ética, o primeiro
racionalista, o primeiro monoteísta e principal
influenciador das religiões abraâmicas, do budismo,
da filosofia grega e do gnosticismo.
A tradição diz que recebeu a Revelação aos trinta anos
e pregou durante anos sem ninguém dar ouvido aos
seus ensinamentos, então decidiu abandonar a sua
região. Ao chegar na Báctria (Afeganistão) teria
entrado em contato com o rei Vishtaspa e sua esposa, a
rainha Hutosa. Segundo consta, a princípio ninguém
teria dado atenção a sua pregação, mas Zoroastro teria
curado o cavalo do rei através do conhecimento de
ervas e o monarca achou se tratar de um milagre, pois
ninguém no reino teria conseguido tal façanha.
Mas Zoroastro teria sido sincero e dito que se tratava
de um remédio utilizado por seus pais, criadores de
animais. O rei ficou impressionado por ele e pela sua
filosofia e acabou se convertendo. O Masdeísmo então
espalhou-se por todo o reino e foi declarado como
religião oficial.
Zoroastro é considerado um grande reformador que
acabou com o politeísmo da região e assim através dos
seus ensinamentos teria desafiado as tradições da
religião indo-iraniana criando um movimento que
acabou tornando-a religião dominante na antiga
Pérsia. Sua ideologia revoltou a classe sacerdotal e

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isso acabou resultando no seu assassinato aos setenta e


sete anos, o qual teria ocorrido no Templo durante as
suas orações.

ZARATUSTRA – O MITO

Conta-se que há muitos anos, em uma pequena vila,


situada entre montanhas próximo ao Mar de Aral,
havia uma pequena casa de adobe onde morava a
família Spitama formada pelo casal Pourushaspa e
Dugdav. Eles esperavam um bebê. Foi quando no sexto
dia da primavera um menino nasceu. E, para o horror
da comunidade, esse menino não chorou, mas sim, riu
às gargalhadas.
Chocado com a cena as parteiras chamaram o
sacerdote local que prontamente foi a casa e ao
perceber que a criança tinha algo de especial temeu ter
o seu poder ameaçado. Tomou providências! Procurou
o pai da criança e advertiu que ela era amaldiçoada por
um demônio, pois no mundo triste em que viviam o
riso era um agouro, um pressagio de trevas a dominar a
vila. O pai, um fanático pela seita do velho,
desesperado pergunta a ele o que deveria ser feito. O
velho sacerdote mandou então que fizesse uma
fogueira grande e jogasse o menino na manhã seguinte.
Choroso o pai foi cumprir o sacrifício. Preparou a
enorme fogueira e jogou o inocente menino no
fogaréu. Mas para o espanto de todos a criança

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acomodou-se no braseiro e começou a rir novamente.


Foi um espanto total!
O sacerdote estupefato constatou que de fato era o que
ele suspeitava. A criança era divina!
Mas determinada a dar cabo do menino risonho armou
nova penitência e advertiu que se os pais não dessem
conta setecentas e setenta e sete desgraças iam
acontecer com eles mandadas pelos deuses
enfurecidos.
Temeroso o pai segue o conselho do maquiavélico
sacerdote. A segunda tentativa consistia em deixar a
criança deitada na estrada e soltar uma boiada de mil
cabeças para que o menino fosse pisoteado até ser
esbagaçado.
O alienado pai assim cumpriu a determinação,
contudo assim que as porteiras foram abertas o
primeiro boi parou sobre ele e protegeu dos demais.
Passando assim a boiada e o menino permanecendo
incólume. O garoto gargalhava mais ainda.
Furioso o sacerdote resolveu ele mesmo dar conta do
garoto. Foi até a toca de uma loba recém-parida e
jogou a criança.
A loba ao notar o garoto o acolheu e cuidou dele
carinhosamente até que a sua mãe o viesse buscar. O
sacerdote envergonhado abandonou a vila. Preciso
dizer que o menino riu?
(...)
Zaratustra cresceu e tornou-se um rapaz muito

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coisas da vida: De onde vimos? Para aonde vamos?


Um dia meditando apareceu-lhe Vohu Mano (a Boa
Mente) e disse-lhe que ele poderia encontrar todas as
respostas que ele buscava em si mesmo e que o deus
único Aúra-Masda que criou a todas as coisas o havia
escolhido para anunciar a mensagem libertadora a
todos. E ele duvidoso perguntou como, já que ele não
se sentia poderoso. A entidade respondeu que ele tinha
tudo que precisava dentro dele mesmo e que todos os
homens também o tinham. E recitou os ensinamentos
da Tríplice Bondade: Bons Pensamentos, Boas
Palavras e Boas Ações!

CONSIDERAÇÕES

O Zoroastrismo continua a ser praticado até os dias de


hoje, sobretudo no Irã e na Índia, contudo sofreu várias
modificações devido a conquistas ao longo de séculos
por diversas nações dentre elas a Macedônia, de
Alexandre (o Grande), os romanos e mais
recentemente pelo Islã.
Nesses 3 mil anos de cultura o Zoroastrismo
perpetuou-se das mais diversas formas. Esteve
presente na formação da cultura grega, na cultura
romana, sobreviveu nas sombras da Idade Média com
os Gnósticos, retornou através do interesse dos
Renascentistas e lá pelo final do século XVI e início do
século XVII foi moda entre o crescente interesse
europeu por alquimia, numerologia, misticismo e tudo
que fosse esotérico.
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Nesse período a Maçonaria, sobretudo a Latina


(França), recebeu influências das mais diversas
sociedades esotéricas que se tem notícia. Houve um
crescer de Ritos e um emaranhar de sincretismos que
só vão tomar um rumo quase um século depois. Mas é
importante que se diga que a Maçonaria não é uma
colcha de retalhos de misticismos dos mais variados e
que, apesar de que muitos quererem que sejamos uma
espécie de religião sincrética, a nossa Ordem não
utiliza nenhuma das espiritualidades dessas
civilizações para uso prático. Conserva-se a filosofia
por elas obtidas como metáfora, como alegoria, como
forma de dizer de diversas formas os mesmos
princípios fundamentais. Acreditamos no Criador,
acreditamos em uma vida espiritual após a matéria,
acreditamos que nos conhecendo podemos conhecer
as Grandes Verdades, que ao nos reconhecermos
falhos podemos evoluir através do conhecimento, com
ele nos tornarmos melhores e, com isso, contribuir
com a Humanidade.

Cláudio Nogueira é M ∴ M ∴, 1º Vigilante da A ∴ R ∴ L ∴ S ∴ 2 de


Julho nº 1421, GOB/BA, Grau 16 pelo R ∴ E ∴ A ∴ A ∴ É membro da
Academia Maçônica de Letras do GOB-BA, Cadeira 13, Patrono
Luiz Gonzaga. É professor, livreiro, editor e apresentador do podcast
Papo de Bodes.

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QUE LÍNGUA FALAVAM OS ANTIGOS PEDREIROS?
Por Michael Winetzki

A história nos conta que a primeira organização


documentada de pedreiros foram os Collegia
Fabrorum, criados pelo segundo rei de Roma, o sabino
Numa Pompílio, cerca de 700 anos antes de Cristo.
Também conhecemos o extraordinário legado do
Império Romano à civilização ocidental. Entre muitos
outros a religião cristã, o Corpus Juris Civilis do
Direito Romano, a gestão do Estado, a administração
das forças militares, a arte e ciência da construção, que
deu origem às magníficas obras espalhadas por toda a
Europa e a Ásia, e até os idiomas derivados do latim
como o italiano, o português, o francês, o espanhol e o
romeno.
Aqui surge uma curiosidade. Que língua falavam
aqueles primitivos pedreiros? Ainda não existia o
idioma italiano naquela época. O latim clássico de
Cícero e Júlio César não era conhecido pela maioria
dos cidadãos analfabetos do Império e só era utilizado
pelas classes letradas, na Igreja e na política. O
populacho falava uma língua simples que foi chamada
de latim vulgar ou latino popolare.
A partir do século XIV, na Toscana, os escritores e
poetas passaram a utilizar a língua vulgar florentina na
literatura. Assim foi com Dante, Petrarca, Boccacio e
outros em suas esplêndidas obras, mais tarde vertidas
para quase todos os idiomas do mundo.
O que hoje conhecemos como Itália era uma colcha
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de retalhos de pequenos reinos, cidades-estado,
ducados, condados e que só foi totalmente unificada
por Cavour e Garibaldi em 1861.Cada uma destas
cidades-estado tinha um regime de governo diferente,
falava idiomas diversos, bem como eram diversas suas
moedas e sistemas de medida. Conforme a região,
falava-se o idioma siciliano, o veneto, o romano, o
fiorentino, o napolitano, o piamontese e dezenas de
outros, que ainda hoje se mantém como dialetos.
Nessa época, Florença (Firenze), capital da
Toscana, era o centro cultural e econômico da Bota
Italiana. A língua florentina não era só a idioma da
literatura, mas também do comércio e da política. Os
poderosos políticos, os ricos homens de negócios e a
classe intelectual usavam esse idioma para se
comunicarem entre si. Dessa forma, a língua florentina
e o idioma italiano passaram a significar quase a
mesma coisa.
Mas quando houve a unificação, depois de anos de
violentos conflitos, criou-se um Estado, mas não havia
uma língua nacional, uma vez que grande parte dos
cidadãos não entendiam o florentino, ou não o falavam
com desembaraço. Mesmo hoje, apenas 75% da
população conhece a versão que se firmou como a
língua italiana, e milhões de pessoas ainda usam os
seus dialetos regionais.
Então podemos imaginar que os pedreiros oriundos
das diversas regiões da Bota, com dificuldades da
compreensão recíproca, se expressavam e se

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entendiam por símbolos, que significam a mesma
coisa para a maior parte das pessoas,
independentemente do idioma que falam. E nós na
Maçonaria, fazemos a mesma coisa. Em qualquer
local do planeta, em qualquer Loja,
independentemente da língua falada, conhecemos os
símbolos e as alegorias e nos sentimos em casa,

Michael Winetzki, MI, 33, escritor, palestrante e membro da ARLS


Tr í p l i c e A l i a n ç a 3 4 1 d e M o n g a g u á , S P d a G L E S P.
www.michaelwinetzki.com.br

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OS TEMPLÁRIOS E O DESCOBRIMENTO DO BRASIL
Por Alfério Di Giaimo Neto
O rei de França, Filipe IV, o Belo, na época do século
XIV, estava falido e devia muito dinheiro a Ordem dos
Templários, que era uma das organizações mais ricas e
mais poderosas da Europa. Seus membros eram
guerreiros, banqueiros e construtores e tinham sede
em Paris. Pelo fato de serem guerreiros, e bem
organizados, se apoderaram de imensas quantidades
de terras e bens materiais dos perdedores aos quais
punham ao seu julgo. Controlavam feudos e
construções no interior da França e em Paris.
Participaram de modo intenso das Cruzadas. As
mesmas eram "patrocinadas" pela Igreja Católica a
qual permitia, devido sua portentosa influência juntos
aos reis e governantes, que os Templários tivessem
muitas regalias e direitos. Entretanto, exigiam que as
Cruzadas saíssem vitoriosas em suas contendas. As
derrotas dessas no Médio Oriente alimentaram uma
onda de calúnias, produzida provavelmente por
pessoas ou entidades invejosas e sedentas do fracasso
dos Templários, dizendo que os mesmos teriam se
"vendido" aos muçulmanos, fazendo com que os
coitados dos cristãos sofressem as consequências de
tal atitude tomada.
Aproveitando o clima favorável, talvez produzido por
ele mesmo, em 13 de outubro de 1307, Filipe invadiu
de surpresa as sedes dos Templários por toda a França,
prendendo seus membros. Dois processos foram
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abertos contra a Ordem dos Templários: um dirigido


pelo rei contra os presos; o outro conduzido pelo papa
Clemente V, que foi forçado pelo rei Felipe a colocar a
sede do Papado em Avignon, França.
Muitos Cavaleiros foram mortos. A maioria
degolados. A Ordem era Iniciática e bastante discreta.
A sua própria discrição foi usada contra ela, fazendo-
se afirmações absurdas, típicas de antimaçonaria, que
ocorreria após alguns séculos. As etapas dos Rituais de
Iniciação foram convertidas em monstruosidades.
Devido a ramificada rede de informações da Ordem,
os sobreviventes trataram de salvar a maior
quantidade de bens e tesouros possíveis. Todos os seus
bens "disponíveis" foram confiscados. Esperava-se
uma fortuna, mas, como pouco foi efetivamente
recolhido, criou-se a suposição de que os tesouros
teriam sido transferidos em segurança para outro país.
Para muitos investigadores, esse país teria sido
Portugal. O rei Dom Dinis (1261-1325) decidiu
garantir a permanência da Ordem dos Templários em
terras portuguesas. Sugeriu uma doação formal dos
bens da Ordem à Coroa, mas, talvez por imposição dos
Templários, foi nomeado um administrador de
confiança da Ordem para cuidar deles.
Dom Dinis, numa atitude corajosa para a época, local e
condições, abriu as portas para todos os refugiados da
Europa. Nessa ocasião, por volta de 1317, o último
Grão-Mestre da Ordem dos Cavaleiros Templários,
Jacques (ou Thiago) de Molay, já havia sido executado

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na fogueira (1314). Nem o Papa, com toda sua


autoridade e com a "Santa" Inquisição a sua
disponibilidade, o intimidou: fundou a Ordem de
Cristo com, segundo afirmam os historiadores, o
patrimônio dos Templários. Todos os perseguidos da
Europa, se concentravam, trazendo seus segredos,
seus conhecimentos para o Convento de Tomar, sede
da Ordem de Cristo. Uma nova etapa, uma nova era,
estava acontecendo para os Cavaleiros Templários.
Dois anos depois, em 1319, um novo papa, João XXII,
reconheceu a Ordem de Cristo.
No início do século XV, Portugal era um reino pobre. A
riqueza estava na Itália, na Alemanha e na Flandres
(hoje parte da Bélgica e Holanda). Nesse caso, porque
é que foram os portugueses a encabeçar a expansão
europeia? Sem dúvida, a rica Ordem de Cristo foi o seu
trunfo decisivo, com seus tesouros, mas,
principalmente com os seus conhecimentos e
experiência adquiridos ao longo dos anos.
Quando o Infante Dom Henrique, terceiro filho de
Dom João I, se tornou Grão-Mestre da Ordem em
1416, a Organização encontrou apoio para colocar em
prática um antigo e ousado projeto: circum-navegar a
África e chegar à Índia, ligando o Ocidente ao Oriente
sem a intermediação dos muçulmanos, que então
controlavam os caminhos por terra. Dom Henrique
assumiu o cargo de governador do Algarve. Dividia
seu tempo entre a Ordem de Cristo e a Vila de Lagos.
Esta era a base naval e uma corte aberta, pois vinham

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viajantes de todo o Mundo, com todo tipo de


informações importantes daquela época. Afirma-se
hoje que do Porto de Lagos, liderada pelo Infante, foi
que se comandou a expansão marítima do século XV.
Tinham passado cem anos da condenação dos
Templários nos processos de Paris e o Vaticano estava
preocupado com a pressão muçulmana sobre a Europa
que aumentara muito no século XIV. Com isso, em
1418, o Infante consegue o aval do papa ao projeto
expansionista. Em um século, os papas emitiram onze
bulas privilegiando a Ordem com monopólios da
navegação para a África, posses de terras, isenção de
impostos eclesiásticos e autonomia para organizar a
ação da Igreja nos locais a descobrir.
No momento em que o Infante, à frente da Ordem de
Cristo, resolveu dar a volta ao continente Africano, a
ideia parecia uma loucura. Havia pouca tecnologia
para navegar em oceano aberto e nenhum
conhecimento sobre como se orientar no Hemisfério
Sul, porque só o céu do Norte estava cartografado.
Mais ainda, acreditava-se que, ao Sul, os mares
estavam cheios de monstros terríveis. De onde teria
vindo então a informação de que era possível
encontrar um novo caminho para o Oriente?
Possivelmente dos Templários, que durante as
Cruzadas, além de se especializarem no transporte
marítimo de peregrinos para a Terra Santa,
mantiveram imensos contatos com viajantes oriundos
de toda a Ásia.

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Quando o navegador da Ordem de Cristo Gil Eanes


passou o Cabo Bojador, um pouco ao sul das Ilhas
Canárias, em 1434, mais do que realizar um avanço
náutico, estava a desmontar uma mitologia secular.
Acreditava-se que depois do Cabo, localizado no que é
hoje o Saara Ocidental, começava o Mar Tenebroso,
onde tudo de mal aconteceria aos navegadores.
Quando finalmente reuniu coragem e viu que do outro
lado não haveria nada de especial, Eanes abriu
caminho para o Sul.
Morto em 1460, o Infante Dom Henrique não assistiu
o triunfo de sua empreitada, mas sentiu que Portugal
estava para se tornar uma das maiores potências
marítima, na época.
Nas primeiras décadas da existência da Ordem de
Cristo, os ex-Templários estabeleceram estaleiros em
Lisboa, fizeram contratos de manutenção de navios e
dedicaram-se à tecnologia náutica, aproveitando o
conhecimento adquirido no transporte de peregrinos
entre a Europa e o Médio Oriente durante as Cruzadas.
O rei Dom João II, que governou entre 1481 e 1495,
estimulou a atividade mercantil e a colonização dos
territórios africanos. A Ordem de Cristo controlou o
conhecimento das rotas e o acesso às tecnologias de
navegação enquanto pode. Mas com o ouro
descoberto na Guiné em 1461 o monopólio da
pilotagem passou a ser cada vez mais desafiado. A
partir de então, multiplicaram-se os contratos com
comerciantes e as cessões de domínios do rei para a

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exploração das regiões descobertas. Aos poucos, a


sabedoria secreta guardada em Tomar foi sendo
passada para mercadores de Lisboa, da Flandres e de
Espanha. Naquela época, Portugal fervilhava de
espiões, especialmente espanhóis e italianos, que
procuravam os preciosos mapas ocultados pelos
Templários.
Enquanto o tesouro de dados marítimos esteve sob a
sua guarda, a estrutura secreta da Ordem garantiu a
exclusividade aos portugueses. Em Tomar e em
Lagos, os navegadores só progrediam na hierarquia
depois de sua lealdade ter sido comprovada, se
possível em batalha. Só então podia ler os relatórios
reservados de pilotos que já tinham percorrido regiões
desconhecidas e ver preciosidades como as tábuas de
declinação magnética, que permitiam calcular a
diferença entre o Polo Norte verdadeiro e o magnético.
E, à medida que as conquistas avançavam no
Atlântico, eram feitos novos mapas de navegação
astronômica, que forneciam orientação pelas estrelas
do Hemisfério Sul, a que também só os iniciados
tinham acesso.
Mas o sucesso atraía a competição. A Espanha,
tradicional adversária, também fazia política no
Vaticano para minar os monopólios da Ordem, numa
ação combinada com seu crescente poderio militar.
Em 1480, depois de vencer Portugal numa guerra de
fronteiras que durou dois anos, os reis Fernando de
Leão e Isabel de Castela, começaram a interessar-se

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pelas terras de além-mar. Com a viagem de Colombo à


América em 1492, o papa Alexandre VI, um espanhol
de Valência, reconheceu em duas bulas, as Inter
Caetera, o direito de posse dos espanhóis sobre o que o
navegante genovês tinha descoberto, e rejeitou as
reclamações de Dom João II de que as novas terras
pertenciam a Portugal. O rei não se conformou e
ameaçou com outra guerra. A controvérsia induziu os
dois países a negociarem, frente a frente, em Espanha,
no ano de 1494, um tratado para dividir o vasto Novo
Mundo que todos pressentiam: o Tratado de
Tordesilhas.
Portugal acabou por ser obrigado a enviar os melhores
cartógrafos e navegadores da Ordem de Cristo,
liderado pelo experiente Duarte Pacheco Pereira, à
Tordesilhas em Espanha, para tentar um tratado
definitivo com os espanhóis, mediado pelo Vaticano,
Apesar de toda contestação, a Santa Sé era o único
poder transnacional na Europa do século XV. Só ela
podia mediar e legitimar negociações entre países.
Portugal saiu-se bem no acordo. Era a vantagem dada
pela estrutura secreta da Ordem de Cristo, que devido
a sua política de sigilo, os portugueses já sabiam da
existência das terras onde hoje está o Brasil sete anos
antes da viagem de Pedro Álvares Cabral.
Lisboa, 08 de março de 1500, um domingo. Terminada
a missa campal, o rei Dom Manuel I sobe ao altar,
montado no cais da Torre de Belém, toma a bandeira
da Ordem de Cristo e a entrega a Pedro Álvares
Cabral. O capitão vai içá-la na principal nave da frota
que partirá daí a pouco para a Índia. Era uma esquadra

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respeitável, a maior já montada em Portugal, com


treze navios e 1500 homens. Além do tamanho, tinha
outro detalhe incomum. O comandante não possuía a
menor experiência como navegador. Cabral só estava
no comando da esquadra porque era Cavaleiro da
Ordem de Cristo e, como tal, tinha duas missões: criar
uma feitoria na Índia e, no caminho, tomar posse de
uma terra já conhecida, o Brasil. Em 22 de abril de
1500, naus com a cruz da Ordem de Cristo chegaram
onde hoje é a Bahia. Foi o espírito dos cruzados que
guiou a aventura das grandes navegações portuguesas.
A presença de Cabral à frente do empreendimento era
indispensável, porque só a Ordem de Cristo, uma
companhia religiosa-militar autónoma do Estado e
herdeira da misteriosa Ordem dos Templários, tinha
autorização Papal para ocupar, tal como nas Cruzadas,
os territórios tomados aos infiéis. No dia 26 de abril de
1500, quatro dias depois de avistar a costa brasileira, o
Cavaleiro Pedro Álvares Cabral cumpriu a primeira
parte da sua tarefa. Levantou, onde é hoje Porto
Seguro, a bandeira da Ordem e mandou rezar a
primeira missa no novo território. O Escrivão Pero Vaz
de Caminha escreveu ao rei sobre a solenidade: " Ali
estava com o capitão a bandeira da Ordem de Cristo,
com a qual saíra de Belém, e que sempre esteve alta. "

Alfério de Giaimo Neto é Mestre Instalado, membro da Loja


LÁquima Romana, GOB- SP. Grau 9 pelo Rito Moderno. Foi Grande
Representante da Grande Loja da Nova Zelândia junto ao GOB.
Escritor com publicações em várias revistas maçônicas e autor do
Pílulas Maçônicas.

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MAÇONARIA: GENTE QUE CUIDA DE GENTE
Por Rafael Gama
Perguntou certa vez o escritor mineiro João
Guimarães Rosa “se todo animal inspira ternura, o que
houve, então, com os homens? ” É perturbadora a
realidade apresentada por essa frase, dita por um dos
maiores escritores brasileiros. Não por nos lembrar de
nossa condição animal, mas por tornar evidente a
camada de insensibilidade que a muitos de nós ainda
reveste.
Tanto as grandes tradições religiosas quanto as Ordens
e movimentos esotéricos/espiritualistas ou ainda em
grande parte das culturas tribais, o cuidado é visto
como manifestação plena do amor. Cuidando saímos
do eu, autocentrado, em direção ao tu, num
movimento de alteridade e empatia, que é também
construção identitária da vivência coletiva.
Correntes do pensamento antropológico defendem
que fatos determinantes para a nossa transição
enquanto espécie, dos primatas menos evoluídos ao
homo sapiens, são os inferidos a partir dos achados de
ossos de fêmur que apresentavam recomposição/
cicatrização, o que indica que, a certa altura da sua
jornada evolutiva o homem foi capaz de perceber que
o cuidado para com o seu semelhante (ao não deixá-lo
para morrer porque não conseguiria acompanhar o
bando em razão das limitações impostas pela fratura)
seria decisivo tanto para a manutenção dos laços no
interior do grupos, quanto para a sobrevivência de
todos.
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Editora Religare Revista

O título desse texto de imediato nos traz à mente a


lembrança de um dos sagrados atributos do homem-
maçom, saber cuidar. Cuidar de si, cuidar do outro,
cuidar da sociedade, cuidar do ambiente, cuidar.
Queremos aprofundar essa compreensão e perceber
esse título como um chamado, ao qual temos o dever
de responder. O chamado a cuidarmos uns dos outros,
num mútuo esforço por deixarmos que exalem de nós
a gentileza, o afeto e a verdadeira fraternidade.
Ainda recorrendo à sabedoria do autor de Grande
Sertões: Veredas, percebemos que para nos tornarmos
gente que cuida de gente é necessário entender que “o
mais importante e bonito, do mundo, é isto: que as
pessoas não estão sempre iguais, ainda não
foram terminadas – mas que elas vão sempre
mudando. Afinam ou desafinam, verdade maior”.
Quando mencionamos a fraternidade, no seu sentido
mais estrito, podemos recorrer à simplicidade do
exposto: “gente que cuida de gente”. Irmãos, família,
Cadeia de União, lealdade e serviço, abnegação e
entrega aos compromissos que firmamos uns para com
os outros.
Recordemos, meus Irmãos, que os nossos juramentos
são feitos, não a uma entidade intangível chamada
Maçonaria, mas aos Irmãos que dão corpo a essa
Ordem, que tem como cabeça o Supremo Arquiteto do
Universo.
Gente que cuida de gente meus Irmãos!
Eis o chamado reiteradas vezes feito ao homem-
maçom.
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Sigamos os exemplos dos sábios e recorramos à poesia


para que, a partir de sua sensibilidade, possamos
compreender melhor o sentido desta exortação. Quem
nos falará é a poetisa goiana Cora Coralina:

"Não sei... se a vida é curta


ou longa demais para nós,
mas, sei que nada
do que vivemos tem sentido,
se não tocamos o coração das pessoas.
Muitas vezes basta ser:
o colo que acolhe,
o braço que envolve,
a palavra que conforta,
o silêncio que respeita,
a alegria que contagia,
a lágrima que corre,
o olhar que acaricia,
o desejo que sacia,
o amor que promove.

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E isso não é coisa de outro mundo,


é o que dá sentido à vida.
É o que faz com que ela não
seja nem curta, nem longa demais,
mas que seja intensa, verdadeira,

Meus Irmãos, dedicar um olhar especial ao cuidado


com o outro está longe de nos levar a cair no
sentimentalismo ou numa afetividade piegas. Tal
postura, faz o inverso, reforça o nosso sentimento de
unidade, os nossos compromissos sociais, uma vez
que cuidar do outro significa também zelar pela
harmonia no convívio coletivo, pelo bem-estar social,
pela efetivação de políticas de promoção de
oportunidades e redução de desigualdades, enfim,
cuidar do outro, para além de ser um ato de afeto, é,
com ele, um ato político, no sentido mais nobre do
termo.
O intelectual baiano, geógrafo Milton Santos, há
muito já nos alertava quando asseverou que "a força da
alienação vem dessa fragilidade dos indivíduos,
quando apenas conseguem identificar o que os separa
e não o que os une".
Tal assertiva nos impõe alguns questionamentos,
quais sejam: temos permitido que as nossas
discordâncias superem aquilo que temos em comum?
O que temos feito dos laços indissolúveis que a Ordem
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nos oportunizou criar? Temos cuidado dos nossos


Irmãos? Temos sido entre nós amparo, aconchego,
solidariedade, comprometimento, fraternidade?
Quando nos tratamos por Irmãos, temos buscado viver
o que esta alcunha representa? Ou o fazemos apenas
para exibir o privilégio de ser Maçom? Ao
dialogarmos com nossos Irmãos, temos elevado a
nossa voz ou procurado melhorar os nossos
argumentos? Temos sido escuta fraterna e sensível ou
ouvintes ávidos por responder e impor aquilo que já
temos em nossas consciências cristalizado? Temos
recorrido à sabedoria dos milenares ensinamentos da
Maçonaria ou à violência do nosso ego, que não
permite a possibilidade de que haja razão e coerência
no pensamento de alguém que não seja em nós
mesmos?
Urge que reflitamos acerca dessas questões. É
imprescindível que o homem-maçom seja,
verdadeiramente, diferente do homem profano. Um
valioso caminho que nos colocará nessa direção é o
exercício do cuidado para com os nossos irmãos de
ideal Maçônico. Como levar aos "de fora" aquilo que
não oferecemos aos "de dentro"?
A dureza da vida, a urgência dos compromissos, a
velocidade da passagem do tempo, meus Irmãos, tudo
isso concorre para que, sutilmente, nos esqueçamos
dos pequenos gestos que fazem toda a diferença, nos
momentos em que um dos nossos esteja travando
verdadeiras batalhas, contra a tristeza, a solidão, a

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perda de um ente querido, as doenças físicas e/ou


espirituais, as dificuldades financeiras, enfim, contra
toda a sorte de males aos quais estão suscetíveis os que
caminham sobre a terra.
Mais uma vez, recorremos à sensibilidade poética,
para com ela atestar que ao cuidar muito mais
recebemos do que pensamos doar. Uma vez que, o
cuidado nos ensina muito sobre nossas fragilidades,
nossas limitações, enfim, sobre a finitude e
efemeridade da vida.

Pensemos que "se a gente cresce com os golpes duros


da vida, também podemos crescer com os toques
suaves na alma".

Rafael Gama Moreira é o atual Venerável Mestre da Loja Maçônica


28 de Julho nº 1840, do GOB, Oriente de Itabuna, Rito Brasileiro.
Membro da Academia Maçônica de Letras do GOB-BA, cadeira nº 6,
Patrono Elias Ocke.

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http://bit.ly/FilhosDeHiram

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