Você está na página 1de 6

Constituição Federal de 1988, uma análise da

Seção I – Da educação: arts. 205 a 214.

1 INTRODUÇÃO

Muito se fala sobre o direito á educação e como isso é algo impreterível para a sociedade
humana, porém pouco se ouvi dizer sobre como nós conseguimos chegar a tal consenso e assim obter e
assegurar por meio da Constituição Federal de 1988 o direito a educação como algo incontestável e
universal, entretanto conseguirmos alcançar tal alvo perseverando em meio a várias ‘batalhas’.

A primeira aparição da educação como direito se tem com a Constituição Imperial de 1824,
onde o art. 179, nos apresenta, “a inviolabilidade dos direitos individuais, civis e políticos dos cidadãos
brasileiros, tendo por base ‘a liberdade, a segurança individual, e a propriedade”. Enquanto a
Constituição de 1891 trouxe a laicidade para o ensino público, porém não reiterou a educação como
obrigatória.

No que diz respeito a educação no contexto dos anos 30, temos o Manifesto dos Pioneiros da
Educação Nova, divulgado em 1932 em disposição a Assembleia Nacional Constituinte de 1933, ante o
título “A reconstrução educacional no Brasil: ao povo e ao governo”, considerado marco inicial a
respeito de um projeto nacional de educação. A Constituição de 1934 contempla algumas das
necessidades apontadas pelo Manifesto, trazendo no Art. 149 – “A educação é direito de todos e deve ser
ministrada, pela família e pelos Poderes Públicos, cumprindo a estes proporcioná-la a brasileiros e a
estrangeiros domiciliados no País ...”. colocando assim a educação como um direito de todos, e assegura
no art. 150 as competências da União quanto a concepção de normas gerais e do Plano Nacional de
Educação.

Decretada após o golpe de Getúlio Vargas a Constituição de 1937 nos diz no Art. 125 – “A
educação integral da prole é o primeiro dever e o direito natural dos pais. O Estado não será estranho a
esse dever, colaborando, de maneira principal ou subsidiária, para facilitar a sua execução ou suprir as
deficiências e lacunas da educação particular.”, priorizando assim o ensino particular e relegando o
ensino público a uma “... educação adequada às suas faculdades, aptidões e tendências vocacionais.”
Descrito pelo art. 129 e reforçado no art. 132.
Em 1945 os ideais do Manifesto de 1932 retornam com a realização do IX Congresso Brasileiro
de Educação. No ano seguinte é derrubada a Constituição ditatorial de 1937 e entra em vigor a
Constituição de 1946, que se manteve por muitos anos e retomou temas educacionais da constituição de
1934, declarando, que a educação é um direito de todos e será dada no lar e na escola, em seu art. 166.
Contudo nos traz o seguinte em seu Art. 168. “A legislação do ensino adotará os seguintes princípios: I -
o ensino primário é obrigatório e só será dado na língua nacional; II- o ensino primário oficial é gratuito
para todos; o ensino oficial ulterior ao primário sê-lo-á para quantos provarem falta ou insuficiência de
recursos”, nos deixando somente com o ensino primário com sua gratuidade assegurada.

Em 1961 temos um marco importante para a educação nacional, em 20 de novembro se dá a


aprovação da Leis de Diretrizes e Bases da Educação Nacional (LDB). Seu projeto final sancionado
disponha sobre a gratuidade, a obrigatoriedade, a vinculação orçamentária dentre outros pontos.
Também retomou a necessidade de um Plano Nacional de Educação, função atribuída ao Conselho
Federal de Educação.

A LDB começou a ser desconjuntada após o golpe de 1964, dado ao pensamento tecnocrático e
reformas desencadeadas nos governos militares. Durante esse período ditatorial, mantido inicialmente as
margens da constituição de 1946, com as recorrentes medidas de exceção, concede-se a Constituição de
1967, que declara a educação como responsabilidade do Estado, e assegura sua obrigatoriedade e
gratuidade estendendo seu período dos 07 (sete) aos 14 (quatorze) anos.

Com o fim da ditadura e a redemocratização da nossa sociedade a Constituição Federal de 1988,


resultou de um abrangente processo constituinte, trazendo avanços consideráveis.

2 Educação e a Constituição de 1988

A educação brasileira adentrou a década de 80 com a presença de entidades de suma


importância sendo elas a ANDE (Associação Nacional de Educação) constituída em 1977, a ANPEd
(Associação de Pós-Graduação e Pesquisa em Educação) constituída em 1977 e a CEDES (Centro de
Estudos Educação e Sociedade) articulada em 1978, entretanto fundada em 1979, unindo-se para a
realização das I, II, III, IV, V, VI CBE (Conferência Brasileira de Educação), ocorridas a partir de 1980
de forma bienal. Da IV CBE, que tinha como tema “A educação e a Constituinte” surgiu a “Carta de
Goiânia” que segundo os educadores continham pontos a ser integrados ao capítulo sobre educação da
Constituição Federal. Toda essa mobilização educacional culminou no “Fórum de Educação na
Constituinte em Defesa do Ensino Público e Gratuito” que atuou na Constituinte.
Nossa atual Constituição traz em seu art. 22 como privativa a competência da União de legislar
sobre diretrizes e bases da educação nacional, além de também ter uma seção especifica a educação, qual
explícita o direito a educação expresso no art. 6 da Constituição, por meio dos arts. 205 a 214,
estabelecendo os objetivos e as diretrizes para o sistema educacional do país.

O art. 205 nos diz que a educação é um direito de todos e dever do Estado e da família,
estabelecendo a educação como meio de desenvolvimento para que os cidadãos exerçam sua cidadania
de forma mais eficiente e consciente, bem como obter qualificação para o trabalho. Tal direito deve ser
compreendido como instrumento de inclusão social.

Já o art. 206 estabelece a forma como a educação brasileira deve ser concebida, sempre se
pautando nos princípios da “igualdade de condições para o acesso e permanência na escola”; “liberdade
de aprender, ensinar, pesquisar e divulgar o pensamento, a arte e o saber”; “pluralismo de ideias e de
concepções pedagógicas e coexistência de instituições públicas e privadas de ensino”; “gratuidade do
ensino público em estabelecimentos oficiais”; “valorização dos profissionais do ensino, garantido, na
forma da lei, planos de carreira para o magistério público, com piso salarial profissional e ingresso
exclusivamente por concurso público de provas e títulos, assegurado regime jurídico único para todas as
instituições mantidas pela União”; “gestão democrática do ensino público, na forma da lei”; e “garantia
de padrão de qualidade” (Art. 206, Incisos I a VII. In: VITA, 1989, p. 182). Tais princípios vinculam tato
entidades públicas quanto privadas, de maneira a garantir uma prestação do serviço educacional de
forma isonômica.

Como Nunes da Silva nos traz sabemos que as instituições de ensino privadas e públicas no
Brasil sofrem uma desigualdade no ensino básico e fundamental, trazendo consigo uma realidade
empírica de alunos advindos de escolas privadas adentrando de forma abrangente em universidade de
ensino gratuito, enquanto os alunos das escolas públicas acabam se relegando a adentrar em
universidade particulares, ou mesmo negados de adentrar em tal devido a condições econômicas.

No art. 207 se estatui a autonomia universitária perante a didática-cientifica, administrativa e de


gestão financeira e patrimonial.

O art. 208 nos diz que o direito á educação é um dever do Estado, e tem por sua obrigação
efetivá-lo, conferindo a todos (isonomia) o direito de acesso ao ensino gratuito e obrigatório, mesmo que
limitado ao ensino fundamental. Assim colocando tal direito atrelado ao próprio direito à vida,
constituindo assim um direito fundamental, indispensável ao pleno desenvolvimento da pessoa humana.
Perante o art. 209 a Constituição nos diz que o ensino é livre a iniciativa privada desde que
atenda a certas condições, como: “cumprimento das normas gerais da educação nacional”, “autorização
e avaliação de qualidade pelo Poder Público.”

No art. 210 temos fixados os conteúdos mínimos do ensino fundamental que tem por objetivo
assegurar uma formação básica comum qual respeite valores culturais e artísticos, nacionais ou
regionais. Deixando especifico que o ensino religioso é de matricula facultativa, e o ensino será
ministrado em língua portuguesa salvo as comunidades indígenas que podem utilizar-se de sua língua
materna e processos de ensino próprios.

Art. 211 nos apresenta que os sistemas de ensino são organizados em regime de colaboração da
União, Estados, Distrito Federal e os Municípios, cabendo a cada qual uma parte de atuação prioritária,
cabendo a União organizar o sistema federal e o dos Territórios, ao Municípios cabem o ensino infantil e
fundamental, e aos Estados o ensino fundamental e médio. De modo a assegurar a universalização do
ensino obrigatório ambos definirão formas de colaboração.

No art. 212 é definido a porcentagem da receita que a União, Estados, Distrito Federal e
Municípios irão aplicar na manutenção e desenvolvimento do ensino sendo de dezoito por cento para
União e vinte e cinco por cento para os demais.

O art. 213 informa para quais instituições os recursos públicos serão destinados podendo ser elas
públicas, comunitárias, confessionais ou filantrópicas, definidas em lei. Perante comprovação de
finalidade não-lucrativa e aplicação de excedentes financeiros na educação, assegurando a destinação a
outra instituição em casa de encerrar suas atividades. Ele também nos diz que tais recursos podem ser
direcionados para projetos de pesquisa, extensão e de estímulo e fomento a inovação.

No art. 214 se concebe o plano nacional de educação, de duração decenal visando articular o
sistema nacional de educação em regime de colaboração, afim de assegurar a manutenção e
desenvolvimento do ensino em seus diversos níveis, etapas e modalidade conduzindo a “erradicação do
analfabetismo”, “universalização do atendimento escolar”, “melhoria da qualidade do ensino”,
“formação para o trabalho”, “promoção humanística, cientifica e tecnóloga do País”, “estabelecimento
de meta de aplicação de recursos públicos em educação como proporção do produto interno bruto”.

Tendo sido tudo apresentado podemos distinguir que os art. 206, 207 e 209 nos trazem de forma
abrangente o que a Constituição defini por liberdade do ensino não prendendo o professor a ideais
políticos ou religioso dando autonomia para ensinar, trazendo também como livre a forma de instituição
a ensinar desde que seguindo as bases da Constituição, não monopolizando assim o ensino para si
próprio.

A Constituição também nos mostra melhorias quanto a manter e até mesmo ampliar os direitos
em respeito a educação em comparação as outras constituições que a antecederam, com respeito a
abrangência de gratuidade e obrigatoriedade, a atual constituição amplia a mesma até os 17 anos como
disposto no art. 208, também temos um aumento no quesito orçamentário implementado no art. 212.

Por meio de tudo que foi exposto podemos constatar que a Constituição Federal de 1988 nos
trouxe inúmeros avanços para consagrar a educação como um direito fundamental do cidadão brasileiro,
atrelando-se com todo o movimento educacional que abrangeu a década de 80. No entanto ainda se
mantém limitações, permanecendo a marca que atravessa toda a história da educação brasileira: a
precariedade, de infraestrutura, de equipamentos, na formação dos professores, nos salários, nas
condições de exercício docente. Isso nos mostra o desleixo das autoridades em assumir na prática a
prioridade dada a educação pela Constituição.

3 CONCLUSÃO

Conclui-se então que a educação conseguiu se fazer perceber de suma importância para a
formação do cidadão e da sociedade perante a Constituição do país, porém quando vamos assumir isso
na prática ainda é relegada e menosprezada, muitas das vezes pela própria sociedade, isso acontece
quando vemos que no papel da Constituição a educação é assegurada como direito e dever, já no dia a
dia da sociedade ela é deslocada do dever para como cidadão comum e realocada como um dever
somente da instituição de ensino e de seus funcionários.

Vemos mais desse ‘descaso’ quando a família se abstém da participação da educação do jovem,
alegando que esse papel recai sobre a escola como única redentora de tal responsabilidade,
complementada muitas vezes pelo abandono de recursos pelo Estado, que prioriza mais a educação de
forma técnica e profissionalizante, pensando somente em gerar mão de obra para o mercado de trabalho
e não em formar cidadãos críticos perante a sociedade, uma boa apresentação atual desse pensamento é
o Novo Ensino Médio.

Enfim, se, seguíssemos a risca os preceitos constitucionais, precisaríamos levar aos tribunais a
maioria das autoridades para que pudéssemos nos aproximar do objetivo de efetivar de modo universal,
o direito a educação no Brasil.
REFERENCIAS BIBLIOGRAFICAS

SAVIANI, Dermeval A educação na Constituição Federal de 1988: avanços no texto e sua neutralização
no contexto dos 25 anos de vigência. - RBPAE - v. 29, n.2, p. 207-221, mai/ago. 2013

OLIVEIRA, Marli dos Santos de; SANTELLI, Igor Henrique da Silva O direito à educação na
ordem constitucional brasileira: texto e contexto . Pol. Educ-s vol.14 Curitiba 2020 Epub 01-Dez-
202

SILVA, Fábio de S. Nunes da; Análise crítica quanto efetivação do direito fundamental à

educação no Brasil Rede de Ensino Luiz Flávio Gomes


RODRIGUES, Horácio Wanderlei; MAROCCO, Andréa de Almeida Leite. Liberdade de cátedra e a
Constituição Federal de 1988: alcance e limites da autonomia docentes. In: CAÚLA, Bleine Queiroz et
al. Diálogo ambiental, constitucional e internacional. Fortaleza: Premius, 2014. v. 2. p. 213-238.

Você também pode gostar