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Universidade Federal do Rio Grande do Norte - UFRN

Faculdade de Ciências da Saúde do Trairi - FACISA


Programa de Pós-graduação em Saúde Coletiva - PPgSaCol
Disciplina: Ciências Sociais em Saúde

Discente: Pablo Matheus da Silva Lopes

TAREFA

O texto "A saúde-doença como processo social", da Asa Cristina Laurell, aborda,
desde o final da década de 1960, a polêmica em torna da origem das doenças. Para isso, de
início, a autora problematiza e questiona a referência puramente biológica e individual do
paradigma biomédico da doença e, ao mesmo tempo, introduz o caráter social de vida dos
sujeitos como fator importante para o surgimento e desenvolvimento das enfermidades. Além
disso, Laurell procura explicações para esse processo para além da medicina, ao evidenciar as
crises políticas e sociais, bem como os movimentos de luta das massas de classe trabalhadora
que se entrelaçam e evidenciam, ainda mais, as limitações da perspectiva dominante sobre os
processos do adoecer e das práticas de cuidado à saúde.
Diante disso, para comprovar o caráter social e histórico da doença, é colocada a
necessidade de olhar não apenas para as características de doenças de indivíduos isolados,
mas sim, observar como as doenças afetam as populações em seu conjunto, ou seja, como as
pessoas em seus grupos sociais adoecem e morrem.
Ainda, para compreensão do caráter social da doença, a autora menciona, como
exemplo, a história natural da tuberculose, ao longo do tempo ou em um mesmo momento
histórico, e de como a doença afeta diversas comunidades e populações de diferentes formas.
Para evidenciar a importância da comparação das condições distintas de saúde que cada grupo
pode demonstrar, Laurell discute as formas em que cada “perfil patológico” pode se
apresentar numa mesma sociedade ou em sociedades diferentes.
Ou seja, em contrapartida ao modelo médico-biológico, o estudo das condições
coletivas de saúde permite verificar empiricamente o caráter social do processo saúde-doença.
Não como determinante das patologias, mas coloca em tela condicionantes de saúde e doença
que, geralmente, não são evidenciados em estudo com foco no biológico do indivíduo, que
enxerga, sobretudo, como alteração do desequilíbrio biológico (em alguns casos, causado por
um agente) manifesto no corpo.
Contudo, é preciso explicitar que, quanto Laurell coloca os coletivos/grupos adoecidos
como manifestações de perfis patológicos de possibilidade para o claro entendimento do
surgimento e reprodução das doenças, em comparação a investigações de nível do indivíduo,
são exclusos estudos com populações selecionadas “a dedo”. Como exemplo, a autora cita as
pessoas hospitalizadas e de zonas habitacionais específicas, geralmente estudadas por médicos
e epidemiologistas.
Nesse sentido, o interesse é entender como os processos biológicos de adoecimento
(que seria o foco médico) surgem, se espalham e se apresentam em uma comunidade ou
sociedade, em dado momento histórico. Em outras palavras, seria não olhar para o surgimento
de doença apenas por meio de estatísticas e medidas que indicam o estado geral de saúde da
população, e que deve ser eliminado pela técnica médica, reduzindo dados de morbidades ou
mortalidade. Mas, ao contrário, olhar para a anormalidade biológica das pessoas através de
determinantes sociais e do momento histórico. Nas palavras da autora, “descrever as
condições de saúde de um grupo, articuladas com as condições sociais deste” (pág. 12).
Para exemplificar as questões expostas até aqui, se faz possível mencionar o
documentário “Herança Social”, de Christian Jafas, que traz imagem de moradores de
Manguinhos, uma das favelas do Rio de Janeiro, onde as condições de vida precária provoca o
surgimento da tuberculose, que atinge toda a comunidade. Nas cenas, podemos enxergas
condições de saneamento precárias e habitação extremamente deterioradas, além dos
problemas de mobilidade e densidade urbana. Todos os problemas destacados, podem ser
vistos como um conjunto de determinantes sociais para os casos de tuberculose que
acometeram a população e segue sendo persistente até hoje. Durante as cenas, observamos
que há uma percepção dos moradores de que os casos são atribuídos a uma condição genética,
passada pela hereditariedade. Contrária a essa percepção biológica, José Araújo, pesquisador
da FIOCRUZ, opõe-se ao dizer que “de fato o que é hereditário é a situação social. A pobreza
é hereditária”.
Essa percepção nos faz compreender que cada formação ou circunstâncias sociais de
modo específico podem provocar nos grupos, ou sociedades, processos biológicos de
desgastes e reprodução, que interferem no funcionamento das atividades cotidianas também
de modo específico. Como exemplo, é possível citar os casos dos moradores de Manguinhos,
que ao voltar para sua moradia após realizar o tratamento para tuberculose e receber alta, é
novamente contaminado pela doença devido às condições prejudiciais de habitação e
saneamento em que suas casas se encontra.
Diante disso, podemos perceber que os processos biológicos de saúde-doença dos
sujeitos são influenciados pelo social, sobretudo na forma como se manifestam na sociedade,
adquirindo, também, historicidade diante da evolução das condições de saúde ao longo do
tempo. Isso significa que a normalidade biológica de uma pessoa não pode ser separada do
momento histórico e do ambiente social em que ela vive.
Nesse sentido, Laurell chama a atenção para o fato de que, ao examinar o objeto de
estudo (saúde-doença) de maneira empírica, implica não considerar apenas aspectos
biológicos, mas também fatores sociais que influenciam o processo de saúde e doença. Além
de reconhecer o alcance das observações que podem ser feitas a partir desse objeto e da
perspectiva pela qual ele é estudado. Ou seja, ao olhar os fenômenos presentes no processo
saúde-doença coletiva pelas lentes do social, significa que esta abordagem permite não apenas
descrever as condições de saúde, mas também explicar as razões por trás dessas condições,
incluindo como fatores (sociais) que afetam a saúde e a doença.

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