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da ação.
Paulo Freire
Torna-se cabível uma aproximação aos estudos do pedagogo Paulo Freire, que é conhecido
por sua abordagem crítica à educação e seu foco na conscientização e na libertação através da
educação.
Em um texto menos conhecido que foi escrito a partir de uma alocução sua na Universidade
de Dar‑Es‑Salaam, Tanzânia, em 1971. Foi publicado uma década depois, integrando a obra
coletiva Investigação Participante (Brandão, 1981). Falando a estudantes, professores e
cientistas sociais da Tanzânia, Paulo Freire sugere caminhos e direções de pensamento sobre
questões de estratégias e práticas de trabalhos de investigação da realidade social, como base
para um trabalho imediato de educação. No texto, ele discute a importância de entender o que
realmente constitui a realidade concreta quando nos esforçamos para conhecê-la.
Ele argumenta que, para muitas pessoas, a realidade concreta de uma determinada área é vista
apenas como um conjunto de fatos ou dados materiais cuja existência ou ausência pode ser
simplesmente constatada. No entanto, Freire acredita que a realidade concreta vai além desses
fatos e dados. Ela também inclui a percepção que as pessoas envolvidas têm desses fatos e
dados.
Além disso, Freire destaca a importância de considerar as pessoas como sujeitos ativos no
processo de conhecimento da realidade. Ele argumenta que não podemos realmente conhecer
a realidade em que as pessoas estão envolvidas a menos que as incluamos como sujeitos desse
conhecimento. Isso implica reconhecer que o conhecimento não é algo que é simplesmente
transmitido de fora para dentro, mas é construído coletivamente e envolve a experiência
cotidiana das pessoas.
“Na perspectiva libertadora em que me situo, pelo contrário, a pesquisa, como ato de
conhecimento, tem como sujeitos cognoscentes, de um lado, os pesquisadores profissionais;
de outro, os grupos populares e, como objeto a ser desvelado, a realidade concreta.”
Freire defende uma abordagem libertadora que envolve os grupos populares como sujeitos
ativos na pesquisa e na educação. Ele destaca que a pesquisa, como ato de conhecimento,
deve envolver os pesquisadores profissionais e os grupos populares como sujeitos
cognoscentes, com o objetivo de tratar a realidade concreta.
“Deste modo, fazendo pesquisa, educo e estou me educando com os grupos populares.
Voltando à área para pôr em prática os resultados da pesquisa não estou somente educando ou
sendo educado: estou pesquisando outra vez.” Nessa perspectiva, a pesquisa não é uma
atividade isolada dos grupos populares, mas sim uma forma de educação mútua, na qual os
pesquisadores profissionais e os grupos populares aprendem juntos.
Freire enfatiza a importância de se questionar a quem serve a ciência e a pesquisa. Ele
argumenta que é fundamental considerar o caráter político da atividade científica e estar
ciente de como o conhecimento científico pode ser usado para servir os interesses da classe
dominante.
Na sociedade capitalista, ele aponta que a classe dominante muitas vezes busca manter o
controle sobre o conhecimento e a formação, de modo a perpetuar seu poder e influência. Isso
pode resultar na instrumentalização da educação e da pesquisa, transformando a formação em
"treinamento da mão-de-obra" e limitando o desenvolvimento crítico das pessoas. Freire
argumenta que é essencial resistir a essa abordagem e trabalhar para envolver o povo como
sujeito participante do seu próprio desenvolvimento, promovendo uma compreensão crítica da
realidade e das estruturas de poder.
Ele ainda faz uma crítica a certos cientistas sociais do "Primeiro Mundo" que argumentam que
a participação popular na pesquisa pode prejudicar a "pureza" dos achados. A ideia por trás
dessa crítica é que a presença popular pode introduzir subjetividade e viés nos resultados da
pesquisa. Mas Freire argumenta que mesmo os cientistas sociais que fazem essas afirmações
não podem escapar completamente da subjetividade no processo de pesquisa e interpretação.
Eles próprios são influenciados por suas perspectivas e visões de mundo, o que afeta a "forma
pura" de seus achados.
Borda, discute alguns fundamentos teóricos relacionados à ciência, sua natureza e seu papel
na sociedade.
Ciência como Produto Cultural: Destaca que a ciência não deve ser vista como uma entidade
autônoma e soberana, mas como um produto cultural criado pelo intelecto humano. Ela é
moldada pela cultura, pelas necessidades coletivas, por elementos artísticos, sobrenaturais e
extracientíficos, bem como pelos interesses das classes sociais dominantes em períodos
históricos específicos. Enfatizando que, por esse motivo, a ciência não é absoluta em seus
valores e conhecimentos. Em vez disso, os valores e conhecimentos científicos variam de
acordo com os interesses objetivos das classes sociais envolvidas em sua produção. Isso
sugere que a ciência não é puramente objetiva, mas influenciada por fatores sociais, culturais
e políticos. Destaca ainda, a importância de examinar o processo de produção do
conhecimento científico, em oposição ao foco apenas nos produtos finais, como objetos, leis,
teses, entre outros. Isso sugere que compreender como o conhecimento científico é construído
e as influências envolvidas é fundamental para uma análise crítica da ciência.
Tudo isso enfatiza que a ciência não é uma entidade desprovida de contexto e influências, mas
é moldada por fatores culturais, sociais e políticos. Ele destaca a importância de considerar a
natureza relativa da ciência e o processo de sua produção ao discutir seu papel na sociedade.
Explora a distinção entre a ciência dominante, muitas vezes associada ao sistema capitalista, e
a ciência emergente ou subversiva. Aponta para a tendência de a comunidade científica
ocidental monopolizar a definição do que é considerado científico. Isso é percebido como
uma influência que mantém o status quo político e econômico do sistema industrial e
capitalista dominante. Os cientistas dentro desse sistema são propensos a lidar apenas com
objetos, dados e fatos que se alinham com os objetivos do sistema capitalista, ignorando ou
suprimindo aqueles que poderiam apresentar alternativas contraditórias, inconsistências e
fraquezas inerentes ao sistema. Então ele traz o conceito de ciência emergente ou subversiva,
que reconhece uma dimensão alternativa e válida da atividade científica e cultural. Esta
ciência, muitas vezes desenvolvida fora dos canais acadêmicos e institucionais estabelecidos,
é descrita como um fator estimulante de criatividade e inovação, mesmo desafiando as
instituições estabelecidas.
Isso tudo sugere que a ciência dominante muitas vezes serve aos interesses do sistema
capitalista, enquanto a ciência emergente ou subversiva procura questionar e explorar
alternativas ao status, incentivando a criatividade e a inovação. A distinção entre esses dois
tipos de ciência reflete a complexa interação entre interesses políticos, econômicos e culturais
no campo científico.
O texto aponta que o sucesso atual da ciência tem exposto a falta de neutralidade que
costumava ser associada aos acadêmicos e à objetividade que se pretendia impressionar no
público em geral. A ciência não pode escapar das influências da política e do poder, e o
conceito de verdade torna-se relativo e condicionado pelas visões políticas da sociedade e seu
desenvolvimento. Ser um cientista hoje implica estar comprometido com questões que afetam
o presente e o futuro da humanidade. Isso significa que a ciência tem uma dimensão
qualitativa e cultural, não se limitando apenas à quantificação estatística, mas envolvendo a
compreensão das realidades. O verdadeiro cientista hoje se questiona sobre o tipo de
conhecimento que a sociedade precisa e para quem esse conhecimento será benéfico. Há um
chamado para reorganizar a atuação científica a fim de torná-la mais útil para a sociedade
como um todo. O autor, observa que, devido à ameaça que representam para o sistema
dominante, as necessidades das massas trabalhadoras que sofrem a exploração capitalista
estão recebendo maior atenção. É necessário se aproximar das bases da sociedade para
entender sua própria ciência prática e expressão cultural, buscando incorporá-las às
necessidades coletivas sem que isso resulte na perda de sua identidade e especificidade.
A pesquisa participante se baseia nesses princípios, com o apoio necessário das ciências
emergentes e subversivas, para construir uma abordagem eficaz que respeita e valoriza a
diversidade cultural e o conhecimento das comunidades locais.