Você está na página 1de 7

UNIVERSIDADE ESTADUAL DO RIO DE JANEIRO

FACULDADE DE EDUCAÇÃO

Disciplina: Avaliação em Educação


Docente: Virgínia Louzada
Aluna: Juliana Gonçalves Tavares de Sousa

Antigo Enem (1998 - 2008)

Ainda no governo do ex-presidente Fernando Henrique Cardoso, com a liderança de


Paulo Renato Souza no Ministério da Educação, se tornou necessário avaliar a qualidade de
ensino do país. Nessa época, a prova ainda não trazia a proposta de inserção de alunos no
ensino superior e podemos compará-la com o que hoje é a Prova Brasil, tendo como objetivo
avaliar a educação do país para avaliar métricas educacionais e referências negativas e
positivas do ensino nacional durante os anos. No site oficial do Inep, é informado que o
primeiro Enem aconteceu no dia 20 de agosto de 1998, que caiu em uma quinta-feira. A partir
disso, é possível investigar sobre os primórdios do exame e suas características. A avaliação
era feita em um dia comum escolar do aluno? Como era organizado o dia letivo dentro dessa
aplicação? O currículo sofreu mudanças?

A informação divulgada pelo Inep


está errada. De acordo com a capa do Jornal
Globo, a prova foi realizada no dia
30/08/1998. A primeira versão do Exame
Nacional do Ensino Médio propôs a
avaliação das habilidades dos estudantes, ou
seja, a prova era ainda mais conteudista do
que a atual, com ênfase nos assuntos e tópicos abordados durante o ano. Com 63 questões e
4h de prova, o exame foi disponibilizado para os alunos sem finalidade de ingresso para o
ensino superior, apenas como um teste de nivelamento educacional, e tinha uma taxa de R$20
para a inscrição. Nessa época, o valor de R$20 já era considerado elevado, e por seguirmos
um padrão utilitarista (fazer em troca de algo) na sociedade, a adesão da avaliação foi baixa.
Incentivos pelo governo foram feitos, 157 mil alunos se inscreveram, mas 40% faltaram. Em
muitos estados, inclusive no Rio de Janeiro, a taxa foi paga integralmente pela Secretaria de
Educação, o que poderia ser um motivo para explicar o índice de abstenção. O padrão
utilitarista da sociedade, portanto, já está enraizado nas avaliações da terceira geração, que de
acordo com Valença (2009), são aquelas que referenciam políticas de responsabilização,
contemplando sanções ou recompensas de acordo com o resultado dos alunos. Em outras
palavras, a adesão do exame só começou a ser realmente efetiva quando, a partir dos
resultados, os alunos recebiam como recompensa o ingresso no ensino superior.

Naquela época, a prova já não se importava com o método que o aluno usou para ter
conhecimento dos assuntos abordados, o que explicita a desconsideração com a aprendizagem
efetiva e duradoura. Se o aluno decorou temporariamente os tópicos, mas consegue resolver o
problema apresentado, ele será bem avaliado, independente de levar ou não o conhecimento
para sua vida. O Enem, de acordo com a ex-presidente do Inep, Maria Helena Guimarães de
Castro, em 1998, foi considerado um exame inteligente que fez uso de uma abordagem nova
de avaliação prevista na Lei de Diretrizes e Bases, recebendo grandes expectativas para seu
desenvolvimento no futuro.

De acordo com Machado e Lima (2014, p. 364)

O Enem pretende provocar transformações na educação brasileira, não apenas através de


políticas centrais, no nível dos sistemas de ensino, mas provocar discussões sobre a qualidade
da educação no interior das próprias escolas, entre educadores e alunos, repensando não só os
currículos, mas também a metodologia aplicada em relação àquela preconizada pela reforma
do EM. No Parecer nº 15/98 (BRASIL, 1998b), que trata das diretrizes curriculares para o EM
o trabalho e a cidadania são mencionados como os principais contextos nos quais a
capacidade de aprender (e continuar aprendendo) deve ser aplicada, para que o educando
possa se adaptar às condições em mudança na sociedade.
A partir de 1999, o número de instituições adeptas ao exame para ingresso às
universidades aumentou para 98. Já em 2000, o Exame Nacional do Ensino Médio garantiu o
atendimento especializado para 376 pessoas com deficiência. Apesar de ser um número muito
baixo comparado ao número populacional do país, e até mesmo comparado ao número de
inscritos no exame, que foram 390 mil, era o início de uma movimentação de inclusão, que foi
fortificado ainda mais após a Lei 10.098, sancionada no mesmo ano, que estabelece normas
gerais e critérios básicos para a promoção da acessibilidade das pessoas portadoras de deficiência
ou com mobilidade reduzida, e dá outras providências (BRASIL. Decreto nº 10.098, de 19 de
dezembro de 2000). Se estabelecemos uma avaliação em escala nacional, precisamos garantir
o acesso para todos os estudantes com o desejo de realizá-la.

Em 2001, tivemos pela primeira vez a possibilidade de isenção de taxa para aqueles
que cursaram o ensino médio em escolas públicas ou que foram bolsistas em escolas
particulares. Por esse motivo, tivemos um salto nas inscrições do Enem, que atingiu o número
de 1.624.131 alunos, sendo 82% deles
beneficiados com a isenção da taxa de inscrição.
Analisando o aumento das inscrições, é
perceptível a tentativa anual do governo de levar
mais estudantes à realização do exame para
aumentar a relevância e aderência em âmbito nacional. O Enem passa a ser uma referência e
influencia diretamente no currículo escolar, dando a partir do exame uma base de conteúdos
essenciais que devem ser aplicados para os estudantes do Ensino Médio a fim que tenham um
bom rendimento na prova.

Em 2003, o Enem adicionou o questionário socioeconômico no ato de inscrição.


Dentro desse questionário, encontramos perguntas sobre renda familiar, escolarização e
profissão dos responsáveis e o ano de conclusão do Ensino Médio. Em 2004, o ingresso no
ensino superior se torna mais acessível com o Programa Universidade para Todos (PROUNI),
e em 2005, por conta da adesão ao PROUNI, o número de inscritos com o objetivo de
ingresso à universidade aumentou, batendo recorde histórico na Educação e dobrando o
número de participantes. Enquanto em 2004 tínhamos um milhão e meio de alunos inscritos,
em 2005 foram registrados três milhões. Ao longo dos anos, a prova do Enem passou a ser
cada vez mais acessível. Em 2006, por exemplo, pela primeira vez o número de participantes
com renda familiar de até 2 salários mínimos ultrapassou 50%. Dentro dessa perspectiva, é
visível que a realidade era de pessoas que consideravam o ingresso à faculdade utópico, visto
que seus próprios familiares e pessoas do seu convívio também não tiveram acesso, e
conforme o exame encontrava meios de inclusão, o ensino se via cada vez democrático e
público. Em 2007, o Exame Nacional do Ensino Médio buscou crescer pelo país, atingindo o
número de 1.324 municípios envolvidos e, em 2008, ano que o Enem completava 10 anos, os
inscritos também tinham a possibilidade de emitir a certificação do Ensino Médio. 70% dos
estudantes afirmaram terem feito a prova para receber a certificação. Desde 2017, a avaliação
responsável por essa emissão é o ENCCEJA.

Considerando que o Enem tinha se tornado a maior prova de cunho avaliativo da


educação, grandes responsabilidades foram inseridas no processo. O perfil da prova para
avaliar o Ensino Médio tem o mesmo perfil da prova que tem como objetivo inserir estudantes
na instituição pública dentro de uma concorrência de vagas? Trazendo esse questionamento,
um novo Enem nasce com intenção de selecionar os candidatos para todas as universidades
federais do país com um modelo de prova mais
direcionado, conteudista e principalmente focado
nas habilidades e competências dos estudantes.
Uma mudança perceptível, por exemplo, é a
anulação de questões no estilo ‘’verdadeiro ou
falso’’ do Antigo Enem para o Novo Enem.

Novo Enem (2009 – momento atual)


Com a reformulação da prova, focando em produzir um exame específico para a
seleção de estudantes para instituições públicas e privadas de nível superior, o Enem passa a
ter 180 questões, dividido em 4 áreas de conhecimento (Linguagens, Matemática, Ciências da
Natureza e suas Tecnologias e Ciências Humanas e suas Tecnologias). A prova era aplicada
em dois dias consecutivos, sendo sábado e domingo, tendo como tempo de realização 4h30
para o primeiro dia e 5h30 para o segundo dia. As questões eram corrigidas a partir do TRI,
Teoria de Resposta ao Item, que despadroniza a correção a partir de respostas fáceis, médias e
difíceis, fazendo com pretendendo que ‘’chutes’’ sejam identificados nas respostas e que o
processo comportamental e o grau de conhecimento do aluno também sejam considerados.
Junto com o novo Enem, o Sistema de Seleção Unificada (SISU) entrou em vigor. O Sisu
passou a ser o único meio de acesso para as universidades federais do país. Além disso, novo
conhecimento foi adotado pelo Enem: língua estrangeira. No antigo Enem, conseguimos
enxergar uma tentativa de incentivo grande do governo para a avaliação ter cada vez mais
aderência e inscrições de estudantes. Já no novo Enem, encontramos um formato muito mais
robusto e desafiador para o estudante. O FIES, Programa de Financiamento Estudantil, passou
a integrar o sistema do novo exame e a utilizar as notas dos estudantes. Dentro dessa
perspectiva inclusiva, em 2012, foi proposta a isenção de taxa para estudantes que integram
famílias de baixa renda, independente se estudaram em uma escola pública ou privada. O que
conseguimos analisar neste ponto é a tentativa do Exame de inclusão ao mesmo tempo que
refina seu conteúdo. Apesar de ser uma situação contraditória, a isenção foi muito bem aceita
e, dentro de um total de 6 milhões de inscritos, 70% estavam isentos do valor de inscrição.

Analisando o Enem como uma avaliação externa, encontramos uma dualidade intensa
e uma contradição inegável: da mesma forma que se diz uma prova robusta e composta por
habilidades e competências que precisam ser treinadas, também permite ano após ano que
alunos menos favorecidos socialmente e economicamente tenham mais acessos e
possibilidades. Quando deixa de ser uma avaliação focada apenas em entender o nível e o
andamento da educação básica para se tornar uma referência de prova para entrada em
instituições de ensino superior, esta conversa com o sentido de trazer um conteúdo mais
aprofundado, mas deixa de dialogar com aqueles que não possuem um ensino qualificado e
faz com que a prova se torne, mais uma vez, um medidor do bom e do ruim, do pobre e do
rico, do que tem mérito e do que não tem. Permanece o questionamento intrigante: o Enem
2021 teve o menor número de inscritos em mais de uma década. Segundo a Unicef, havia
cerca de 1,5 milhão de jovens de 15 a 17 anos sem qualquer tipo de acesso à educação no
Brasil. Apesar de todas as reais tentativas, o Enem é mesmo um exame inclusivo, visto que
enxerga seus inscritos com homogeneidade e sem relacionamento com questões externas?

Por ser uma avaliação em larga escala, o Enem propõe mudanças em currículos
inapropriados e desenvolve no estudante o desafio do melhor resultado, como Bauer, Alavarse
e Oliveira (2015) traziam em seus estudos. Visualizando o exame de maneira
pedagogicamente crítica, a avaliação enxuga totalmente quaisquer possibilidades de
metodologias diversas, focando apenas no mecânico e no tradicional, ou seja, independente da
teoria de desenvolvimento da aprendizagem em larga escala ou da defasagem do currículo, o
Enem ainda será um exame tradicionalista que incentiva o foco no resultado e promove a
desigualdade social e cultural.
REFERÊNCIAS:

Jornal O Globo, disponível em <https://acervo.oglobo.globo.com/consulta-ao-acervo/?


navegacaoPorData=199019980830>. Acesso em 17/09/2022.

Bauer, A., Alavarse, O. M., & Oliveira, R. P. de. (2015). Avaliações em larga escala:
uma sistematização do debate. Educação E Pesquisa, 41(spe), 1367-1384.

Jornal O Globo, disponível em <https://acervo.oglobo.globo.com/em-destaque/criado-


em-98-enem-chega-ufrj-como-unico-acesso-graduacao-13-anos-depois-19602286>.
Acesso em 17/09/2022.

Jornal O Globo, disponível em


<https://acervo.oglobo.globo.com/em-destaque/redacoes-do-enem-abordam-temas-
que-vao-de-direitos-sociais-futuro-digital-22039010>. Acesso em 17/09/2022.

Alves Machado, P. H., & Lima, E. G. dos S. (2014). O ENEM no contexto das
políticas para o Ensino Médio. Perspectiva, 32(1), 355–373.

Wikipedia, disponível em
<https://pt.wikipedia.org/wiki/Exame_Nacional_do_Ensino_M%C3%A9dio>. Acesso
em 17/09/2022.

Governo Federal, disponível em


<http://www.planalto.gov.br/ccivil_03/leis/l10098.htm#:~:text=LEI%20No
%2010.098%2C%20DE%2019%20DE%20DEZEMBRO%20DE
%202000.&text=Estabelece%20normas%20gerais%20e%20crit
%C3%A9rios,reduzida%2C%20e%20d%C3%A1%20outras%20provid
%C3%AAncias.&text=Art>. Acesso em 17/09/2022.

Bonamino, A., & Sousa, S. Z. (2012). Três gerações de avaliação da educação básica
no Brasil: interfaces com o currículo da/na escola. Educação E Pesquisa, 38(2), 373-
388.

BBC, disponível em <https://www.bbc.com/portuguese/brasil-58021267>. Acesso em


17/09/2022.

Você também pode gostar