68 Crônicas Sociais
Amazônas: o povo arquiteto
Quando se fala em sociedade, pensa-se
sempre, sem saber porque, num cocktail
ou numa daquelas festas onde as
mulheres vão com as costas despidas e
os homens com os sapatos laqueados.
Mas a sociedade é outra coisa: é o
conjunto dos cidadãos, e compreende
todas as classes sem distinções. É
verdade que, para fazer confissão, a
sociedade das soirées se faz chamar de
“sociedade”; mas esta denominação é
errônea: parece-me jamais ter visto,
nestas reuniões, figuras de excepcional
importância física ou intelectual. Estas
distinções, medidas com a escala da
solidariedade humana, vão sendo aos
poucos reduzidas, e os últimos
saudosistas que desejam conservar estas
divisões, e a assim chamada “esfera
aristocrática”, baseados em argumentos
históricos fragilíssimos e tão absurdos
hoje em dia - mais parecem pessoas
senis já vividas, do que sêres realmente
vivos.
Sociedade, então, significa todos os
cidadãos, de Einstein ao fazendeiro do
Arizona, de Cocteau ao carteiro de Albi,
de Mac Arthur a um soldado raso
coreano, enfim, o homem com suas
características ideológicas ou nacionais
ou municipais. (O conceito verdadeiro
do Brasil trabalhador, país de cimento,
espaços e riquezas, sua atividade
generosa - esse conceito, dizia, deveria
ser baseado inicialmente nas camadas
sociais do interior, ao longo dos rios
fabulosos, nos cafezais, nas fazendas de
algodão, e nos seringais, nas pontes e
oficinas. O milagre de uma sociedade
que fala uma só língua há séculos, que
se criou numa amalgama de elementos
históricos provindos de continentes tão
diversos - o Brasil, deve ser
compreendido através de imagens reais e
não através dos falsos instantâneos das
boites).
É por isso que reproduzimos aqui o
habitat de nossa gente no Amazônas,
com sua casa de uma arquitetura
extremamente funcional e muito
estética, agradável, com cenas da vida
cotidiana, que se manifestam através das
alegrias do homem simples.
De vez em quando aparece na cidade um
filósofo, por vezes verdadeiro, outras
apenas filósofo da universidade - que
mesmo sem ser iniciado e Sartre, dá sua
conferência sobre o existencialismo,
pois esta palavra é mágica. Quando se
trata dum existencialista oficial, tudo é
visto através dum rima de pessimismo
desesperado de mundo, de “não vale a
pena”, etc., quando ao contrário, o
criador não é existencialista, limita-se a
expor teorias, comentá-las, traduzi-las
em docinhos digeríveis pelas senhoras
presentes. Disse !senhores”, porquê são
êstas ao que parece, as mais interessadas
pela filosofia, não pela filosofia em si,
como pela moda. As conferências
sucedem-se em orem de importância - :
filosofia, estética, crítica de arte… A
senhora condenada a isto não quer que,
no dia seguinte à conferência, a prima
lhe telefone pedindo o que pensa sobre
Sartre, sem saber qual é o chapéu mais
bonitinho da assistência. Precisa-se,
afinal de contas, estar ao par daquilo que
acontece no campo das modistas!