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ORLANDI, E. P. (2005). Discurso e Texto: formulação e circulação dos sentidos (2ª ed.).

Campinas, SP: Pontes.


Resenhado por Daniel Fernandes de Paula Pereira (LETRAS-UFMS/CPTL)
Em seu percurso intelectual, Eni P. Orlandi, é uma figura proeminente no campo da
análise do discurso, possui doutorado em Linguística pela Universidade de São Paulo e
pela Universidade de Paris/Vincennes (1976). Nesta resenha, examino seu notável trabalho
intitulado “Discurso e Texto” com 218 páginas onde Eni Orlandi (2005) mergulha
profundamente na análise do discurso.
No prefácio de nome “Corpo do Texto, Vida da Linguagem", Orlandi (2005)
constrói um alicerce para a compreensão dos processos de produção do discurso;
destacando três momentos cruciais na produção do discurso: constituição, formulação e
circulação. Ela enfoca especialmente a formulação e sua relação com as emoções e sentido
na linguagem.
Iniciando os capítulos, o intitulado "A Escrita Da Análise De Discurso" tem como
estrutura argumentativa autores como Michel Pêcheux. Através de suas teorias, Orlandi
(2005) dispõe sobre a relação entre linguagem e realidade, argumentando que a linguagem
não apenas expressa, mas também constrói a realidade. Isso destaca a importância da
linguagem na geração de significados e explora conexões entre análise de discurso e
pragmática, por exemplo. Trazendo a compreensão de que o discurso são efeitos de
sentidos que o enunciado estabelece entre locutores.
No capítulo "Real Sujeito À Interpretação", Orlandi (2005) evidencia a importância
da memória discursiva na análise de discurso, enfatizando como os sentidos são
construídos através da afiliação a redes de memória de ditos. Assim, coloca a questão da
memória discursiva (interdiscurso) como o conjunto de dizeres já ditos que influencia o
que dizemos, buscando compreender o sujeito à interpretação que ocorre na interseção
entre língua e história.
Em conseguinte, o capítulo "O Estatuto Do Texto Na História Da Reflexão Sobre A
Linguagem" denota uma compreensão do texto como uma unidade significativa em relação
à situação discursiva. Destaca, ao longo do capítulo, a importância de considerar a
materialidade do discurso em sua manifestação concreta. Em outras palavras, compreende-
se que uma determinada palavra só possui um sentido próprio porque está inserida em um
discurso (ideologia) que a envolve. Neste ponto, podemos fazer um hiperlink com as teses
de BAKHTIN (2006) assegurando que "A língua não é o reflexo das hesitações subjetivo-
psicológicas, mas das relações sociais estáveis dos falantes. Conforme a língua, conforme a
época ou os grupos sociais, conforme o contexto apresente tal ou qual objetivo específico".
Portanto, a construção de sentidos ocorre através da textualidade, no sentido de
discursividade, da relação entre texto e texto, história, sujeito e ideologia, que permeiam a
produção do discurso
No âmago da leitura, em "Do Sujeito Na História E No Simbólico," encontra-se
uma explanação sobre a formação do sujeito na história e no domínio simbólico, o que me
faz pensar em DURKHEIM (2011), o qual assegura que "o homem idealizado em nós não
é o homem tal como a natureza o criou, mas sim como a sociedade o idealizou." Isso está
em conformidade com o argumento da autora, que afirma que o sujeito está
inevitavelmente ligado ao simbólico e à ideologia. Além disso, há uma discussão sobre a
possibilidade de resistência e deslocamento por parte do sujeito em relação às formas de
individualização impostas pelo Estado. Esse ponto pode ser relacionado com o capítulo
"Ponto Final: Interdiscurso, Incompletude, Textualização," no qual há discussões sobre a
relação entre incompletude e acréscimo na linguagem, a influência do imaginário na língua
e sua relação com o acréscimo. Ou seja, os movimentos de expansão e inserção de
acréscimos linguísticos, movimentos desenvolvidos e idealizados pelo homem, tendo a
linguagem como uso.
Trazendo títulos chamativos e estimulantes para nossa imaginação textual, os
capítulos "Boatos E Silêncios: Os Trajetos Dos Sentidos, Os Percursos Do Dizer" e
"Palavras Ao Vento Ou Poder Ao Vento" estabelecem uma excelente relação entre
linguagem, poder e história. Eles destacam o papel do silêncio na produção de sentidos e
exploram como o boato influencia a política e a sociedade. A autora enfatiza a ideia da
não-transparência da linguagem e a necessidade de interpretar informações não
confirmadas. Afinal, o boato busca a verdade e pode ser uma arma de dominação ou
resistência, já que é um jogo de sentidos. Esse jogo explora o que é dito e não dito,
mostrando que, na construção de enunciados na prática da enunciação, ocorre uma
manipulação dos signos, dos sentidos e dos silêncios. Assim sendo, o capítulo conclui que
a palavra é política e tem poder, como costumavam dizer nossas avós.
Já em “Divulgação Científica e Efeito Leitor: Uma Política Social Urbana” diria
que é uma parte destinada a leitores que compreendam as mudanças tecnológicas em um
sentido amplo, pois a autora aborda a interação entre a divulgação científica e a sociedade,
com ênfase nas mudanças introduzidas pelas novas tecnologias de linguagem e como essas
mudanças impactam a disseminação do conhecimento, transformando a forma de
comunicar e a maneira como as pessoas se relacionam com o conhecimento.
Por conseguinte, o texto “A textualização Política Do Discurso sobre a Terra”
analisa e discute como o Discurso Ecológico vem desempenhar um papel semelhante ao da
Catequese na colonização, impondo ideologias dominantes dos países de primeiro mundo
sobre os países de terceiro mundo, compilando uma generalização.
Já em “Televisão e memória” há a elucidação sobre a generalização do conteúdo, o
que a autora chama de memória metálica, isto é, a TV cria uma memória horizontal, não
permitindo a interpretação profunda, consequentemente, isso afeta a relação do homem
com a linguagem, substituindo a memória histórica por uma memória metálica, o que entre
linhas também me faz compreender que a mídia consegue moldar assim como os jesuítas
na catequização. Apesar dos capítulos formarem uma temática diferente, uma reflexão
simples nos faz pensar justamente sobre o discurso como marcador e dominador cultural.
Em faces finais, o penúltimo capítulo “A cidade como Espaço Político-Simbólico:
textualização e Sentido Público” Orlandi (2005) enfatiza que a cidade é como um espaço
material com profundas raízes históricas, sociais e significativas. Este espaço é onde
símbolos e políticas se entrelaçam, criando memória e expressões de diversas narrativas
que podem ou não se materializar, com convergências e divergências entre suas unidades:
sujeito, expressão (poder e materialidade histórica) e ação.
No capítulo final, intitulado “Retomando a Palavra: Um Corpo Textual?” a autora
explora algumas retomadas, citando os exemplos dispostos de análises que abordam a
formulação, a textualização e a circulação dos sentidos como modos de significação. Em
suma, o capítulo retoma as informações anteriores, onde é possível observar uma análise
profunda sobre como a linguagem molda nossa compreensão do mundo e explora tópicos
como a relação entre linguagem e realidade, memória discursiva, poder da linguagem e sua
influência na política e na sociedade.
Para o público acadêmico, estudantes e pesquisadores da área, este livro é um
norteador central para se obter um alicerce fidedigno da análise do discurso, pois oferece
uma visão abrangente e crítica dentro desse eixo. No entanto, também requer
conhecimentos linguísticos para melhor compreensão, bem como leitura e releitura.

Referências:
BAKHTIN, Mikhail. 12ª Edição – 2006 - HUCITEC. Capítulo 9. O “Discurso de Outrem”
p. 144-154.
DURKHEIM, Emile, 1858-1917. Educação e Sociologia / Tradução de Stephania
Matousek.– Petropolis, RJ: Vozes, 2011 – (Coleção Textos Fundantes de Educação).

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