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apoio pastoral

Editorial

Mosaico
Apoio
“Cremos...” no amor de Deus ao mundo
Pastoral
quê mesmo? deve ser elemento norte-
ador de toda e qualquer

C omo tem sido rea- prática de quem se diz


seguidor/a deste Deus. Ano 16, no 41
lizado nos últimos Junho/Maio de 2007
anos, o Mosaico Se Deus ama o mundo
Apoio Pastoral dedica e o demonstrou de forma Publicação da Faculdade de Teologia
da Igreja Metodista/Universidade Me-
suas páginas do exemplar bem concreta, sempre, todista de São Paulo (UMESP).
de maio para contribuir ouvindo o clamor de seus Reitor da Faculdade de Teologia:
com as reflexões da tra- filhos e filhas, como a Rui de Souza Josgrilberg; Reitor da
dicional Semana Wes- Bíblia nos relata, por que
UMESP: Márcio de Moraes; Diretor
Administrativo da Faculdade de
leyana da FaTeo. Neste deixaria de fazê-lo? Não, Teologia: Otoniel Luciano Ribeiro;
... o amor de 2008, a semana celebra os Coordenador da Editeo: Ronaldo
certamente não deixaria, Sathler-Rosa; Editora do Mosaico:
Deus ao mundo 100 anos do Credo Social Magali do Nascimento Cunha; Coor-
(Igreja Metodista Episco- Ele é o mesmo de ontem e denador de Produção: Luiz Carlos

deve ser elemento pal dos Estados Unidos, será o de amanhã! Cremos! Ramos.

norteador de toda 1908). Se neste processo, tam- Conselho Editorial: Blanches de Pau-
la, Fábio N. Marchiori, José Carlos de
As questões sociais bém cremos, Deus sempre Souza, Luiz Carlos Ramos, Magali do
e qualquer práti- usou homens e mulheres Nascimento Cunha, Natália de Souza
estão no coração do me- Campos, Nelson Luiz Campos Leite,
ca de quem se diz todismo e de sua doutrina como instrumentos para Otoniel Luciano Ribeiro, Rui de Souza
Josgrilberg, Ronaldo Sathler-Rosa,
seguidor/a deste de santidade social: ser tornar concreto este amor Stanley da Silva Moraes e Tércio
Machado Siqueira
santos/separados para o ao mundo, o que ele espe-
Deus. serviço ao mundo. Nunca ra daqueles que se dizem Projeto gráfico: Luiz Carlos Ramos;
Secretaria da Edição: Glória Pratas;
é demais lembrar, princi- seus seguidores/as hoje? Editoração e Arte final: Marcos
palmente em tempos de Eis a grande questão!
Brescovici; Capa: Marcos Brescovici;
Edição e montagem de imagens:
individualismo e muita Esta edição do Mosai- Marcos Brescovici; Tiragem deste
competição, inclusive en- número: 2.000 exemplares. Distribui-
co busca contribuir com ção gratuita.
tre as igrejas, de que Deus
esta reflexão e chamar as *
criou o mundo, gostou do ***
que criou, e o ama tanto igrejas a uma atenção com *
que enviou seu único Fi- as causas sociais e com o
Mosaico Apoio Pastoral
lho para viver neste mun- clamor da Terra e seus ha- EDITEO

do e instaurar o modelo bitantes por misericórdia, Caixa Postal 5151, Rudge Ramos,
do governo de Deus e justiça, alimento, trabalho, São Bernardo do Campo, CEP
09731-970
seus valores. Portanto, o moradia, saúde...

Fone: (0__11) 4366-5983
Fax: (0__11) 4366-5962


editeo@metodista.br

Editorial

Ano 16, no 41, janeiro/maio de 2008


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apoio pastoral

O século do
Credo Social

Joyce Torres Plaça

O Credo Social ce-


lebra 100 anos
em 2008, entre-
tanto, suas origens re-
montam ao século XVIII,
do metodismo, e transpõe
o espaço institucional e
físico para ir ao encontro
do povo e em direção às
portas das fábricas, dando
a partir da repercussão sentido e dinamismo à
social da pregação de John missão.
Wesley (1703-1791) e dos A partir de 1729, o
leigos do metodismo pri- Clube Santo em Oxford
mitivo na Inglaterra. Wes- desenvolveu uma práxis
ley respondeu aos desafios significante. As visitas nas
de sua época articulando a prisões, o acompanha-
espiritualidade de forma mento dos condenados
holística, em termos de até a morte e o atendi-
atos de piedade e obras de mento de pessoas carentes
misericórdia, santidade de mediante a educação e o
coração e de vida, unidade fornecimento de alimen-
entre ciência e piedade tos e remédios conscien-
vital – elementos aparen- tizaram seus integrantes.
temente antagônicos e há Durante o tempo em que
tanto tempo separados, as sociedades serviram na
mas que, reunidos, cons- sociedade, o conceito de reino celestial mais tolerá- que preservem a tradição
tituem o equilíbrio ca- perfeição cristã era a fé vel, mas a participação na metodista. Enquanto as
racterístico da identidade atuando com amor. própria iniciativa reden- Regras Gerais abordam a
metodista. A vocação pública mar- tora de Deus, sua nova disciplina individual do
Em resposta às ne- ca o metodismo em sua criação. crente metodista, o Credo
cessidades concretas dos gênese. Wesley acreditava O esforço em relacio- Social formula uma dou-
trabalhadores, donas-de- que as transformações nar a fé cristã e a vida na trina sobre a responsabili-
casa e desempregados que sociais aconteceriam com sociedade resultou na ela- dade da Igreja Metodista.
aceitavam o Evangelho, a conversão das pessoas. boração das Regras Gerais O Credo Social nasceu
Wesley forma sociedades A santidade social na pers- – código de conduta cristã em 1908, no Concílio
a fim de atender aos pro- pectiva wesleyana implica formulado por John Wes- Geral da Igreja Metodista
blemas pastorais e sociais na participação dos cris- ley que se resume em “não Episcopal, nos Estados
por meio da aplicação in- tãos e cristãs nos projeto praticar o mal; zelosamen- Unidos. O documento,
tegral do Evangelho em de Deus de restauração de te, praticar o bem; atender inicialmente denominado
todos os aspectos da vida. sua Criação. Para Wesley, às ordenanças de Deus” “A Igreja e os Proble-
Wesley passa a considerar a religião não é um meio e que se desdobra em mas Sociais”, foi adapta-
os grupos pequenos como pelo qual a humanidade atitudes fundamentadas do pela Igreja Metodista
‘tendões de sustentação’ escapará para um nesses princípios Episcopal do Sul, nossa
Credo
Social

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“Igreja-mãe”, em 1918, cada indivíduo para com to Alegre, em 1934. E afir- estabelecido pelo ideal da
sendo posicionado na par- a sociedade, desde que ele ma: “Reconhecendo nossa “Igreja reformada, sempre
te constitucional a partir aceite os ensinamentos de responsabilidade na solução reformando”, é preciso
de 1922, e enfatizando o Jesus Cristo como Mestre dos enormes e graves pro- assumir o projeto integral
envolvimento leigo des- e Senhor. Tais ensinamen- blemas morais e espirituais proposto por John Wesley:
de 1934. Em 1930, ano tos estão claros nas decla- que defrontam a nação e o “Metodistas são aqueles
da autonomia da Igreja rações a seus discípulos: mundo, nós nos revestimos que buscam a santidade de
Metodista no Brasil, o vós sois a luz do mundo, vós de forças divinas para a exe- coração e de vida, confor-
documento da Igreja-mãe sois o sal da terra (...) e, na cução da tarefa a que nos midade interior e exterior
passou a integrar os Câno- sua aplicação devem ser propomos e, procurando em todas as coisas segun-
nes, editados desde 1934. dirigidos pela lei do amor manifestar as convicções do a vontade revelada de
Na Igreja Metodista fraternal: amarás o teu pró- que mantemos, esperamos Deus, são pessoas cuja
no Brasil, o Credo Social ximo como a ti mesmo. Este tornar mais clara a nossa religião reflete a imitação e
é uma tomada de consci- princípio deve finalmente própria visão”. adoração a Deus em todas
ência da responsabilidade transformar a socieda- O Credo Social é o tes- as suas perfeições imitá-
social no contexto brasi- de humana inteira. Este temunho da compreensão veis, em especial quanto à
leiro, à luz do Evangelho, princípio deveria ser apli- missionária e ministerial justiça, à misericórdia e à
visando o Reino de Deus cado em todas as relações assumida pela Igreja Me- verdade, ao amor universal
e sua justiça. Deste modo, industriais, internacionais todista, cujo espírito foi que enche o coração e go-
ocorreram as primeiras e sociais. transformado em ações verna a vida. Mantenham-
mudanças no documento, E ainda, o Bispo Can- concretas pelo Plano para se no caminho, sejam leais
com o objetivo de adequá- non concluiu destacando a Vida e a Missão da Igreja a seus princípios”.
lo à realidade do Brasil a importância de que, em (PVMI), em 1982. Como Embora o caminho da
em momentos históricos sua primeira reunião públi- palavra à ação seja longo e
parte da sua vocação wes-
relevantes. Em 1934, fo- ca na direção do Concílio apesar de sabermos muito
leyana, a missão inclui a
ram incluídos os temas Geral, a Igreja Metodista mais do que fazemos, um
responsabilidade para com
planejamento social no no Brasil demonstrasse novo comportamento
o mundo e a sociedade. pode ser aprendido, à luz
processo econômico, cor- enfaticamente a atitude As transfor mações da Palavra e do século do
reções no sistema penal, para com o Evangelho mundiais exigem novas Credo Social. Que se faça
desarmamento e direito social de Jesus, colocando- estratégias na tarefa da verdade a velha canção,
de liberdade de falar. se assim em linha de frente evangelização a partir da que diz venha o Teu Reino,
Na época, o Bispo Ja- com o Metodismo desde realidade das pessoas, e que Senhor, a festa da vida recria, a
mes Cannon discursou so- os dias de Wesley. acontece não somente pela nossa espera e a dor transforma
bre “A Igreja e o Evange- Igualmente, o presbí- pregação mas especial-
em plena alegria.
lho Social”, explicando os tero Hugh Clarence Tu- mente por meio dos grupos
princípios fundamentais cker declarou “A atitude da pequenos que se inserem como
das atividades da Igreja, Igreja Metodista do Brasil sal num corpo social plural Joyce Torres Plaça é teóloga meto-
dista, especialista em Estudos Wesleyanos,
expondo cuidadosamente perante o Mundo e a Na- e que carece da dinâmica mestranda em C iências da Religião e
a diferença entre apelo ção” – e o documento foi da graça e do Evangelho. colaboradora do Centro de Estudos Wes-
leyanos da FaTeo.
direto do Evangelho a aprovado no 2º Concílio Diante do leque multifa-
cada alma individualmente Geral da Igreja Metodista, cetado que nos rodeia, e
e a relação necessária de realizado em Por- dentro do padrão
Credo
Social

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Ainda há lugar

Ana Pinheiro Dos Santos

A Bíblia cultiva a es-


perança e fomen-
ta o olhar para
frente. O pão é um dos
elementos que a Bíblia ap-
mesa. A atitude de Jesus é
palavra profética que ex-
pressa a essência do Reino
e do cristianismo, presente
em nossas comunidades
vidados estão reclinados.
Nos evangelhos reclinar-
se sugere refeição ao ar
livre ou um banquete.
Nesse texto temos um
te messiânico.
O tema do banquete
está presente no AT no
Sl 23.5 e Is 25.6-8. No
período inter-testamen-
resenta como fomentador de sob a forma da eucaristia, banquete, os convidados tário, o tema do banquete
esperança. No AT o maná ou seja, temos comida são proprietários de terra estava relacionado com
formula um projeto em como metáfora do Reino e estão reclinados ao redor a vinda do Messias e os
torno do pão, quando não de Deus. O povo esteve da mesa ao estilo greco- gentios ficam de fora. Na
é acumulado, jamais falta. presente durante o mi- romano. Os camponeses comunidade de Qunram,
O NT acompanha esse nistério terreno de Jesus. reclinavam-se no chão. O o grande banquete tam-
projeto. O direito ao pão Eles são definidos como local é a casa de um go- bém estava ligado à vinda
é a fonte de todo direito do Messias. É estabelecida
e justiça. A ênfase no pão © David BarnetIllustration WorksCorbis uma hierarquia e somente
reaparece nos momentos os perfeitos participarão
em que Jesus ali-menta deste banquete. Com isto,
a multidão. Ele integra a perdeu-se a visão abran-
oração modelo, Mt 6.11. A gente do profeta Isaías.
Bíblia não celebra a digni- O convidado (v15)
dade do pão, mas enfatiza espera uma invocação
a partilha e deste modo piedosa de Jesus, mas ele
chegamos ao seu auge responde iniciando uma
na eucaristia. (Projetos de parábola. Certo homem
Esperança: Meditações sobre deu um grande banquete
Gênesis 1-1, p.14-15). e convidou a muitos. Este
No mundo que mos- primeiro convite é sério,
trava divisões sociais na o ato de aceitá-lo significa
refeição, Jesus procla- laos e ochlos. O laos é o povo vernante rico, Lc 14.1. A compromisso. O anfitrião
ma e instaura um mundo comum ou povo de Deus. parábola inicia no instante precisa providenciar a car-
novo em sua forma de O ochlos é a aglomeração em que um convidado diz: ne baseado no número de
comer. Esta é a lição que sem líder, sem impor- bem aventurado aquele que convidados/as. Após os
Ele deixa, apresentada no tância política e cultural. comer pão no reino de Deus. preparativos, é enviado
capítulo 14 de Lucas. As- Jesus estende ao ochlos a Comer pão na Palestina um servo dizendo: Vinde,
sim como na sociedade a compaixão, a cura e sua significa comer uma re- tudo está preparado, estamos
comida expressa a forma instrução, e os transforma feição. Desta maneira, o esperando por você. Aceitar
de os grupos sociais uni- em seus discípulos/as. convidado inicia o tema o convite inicial obriga o
rem-se, afirmarem e se No texto de Lc 14.15- de comer no reino. O convidado a responder ao
fecharem diante de outros 24 conta-se uma banquete é sím- chamado. E o movimento
grupos, Jesus expressa parábola num bolo da salvação, que Jesus dá à parábola
Credo
uma nova ordem social grande banquete que terá o seu surpreende, tomando ela
a partir da comunhão na Social
em que os con- auge no banque- uma direção inesperada.

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De repente, todos de uma vez Os mendigos são en- Ela traz a dimensão da não cessou de contraba-
começaram a desculpar-se. Isto contrados em aldeias e vivência comunitária e lanceá-la com o aspec-
na Palestina é considerado cidades onde vivem con- da responsabilidade so- to social, a vida externa,
uma afronta para o anfi- centrações humanas. Não cial. A sociedade exclui ações na vida prática do
trião. Quem ouvia a pa- pertencem à comunida- e a eucaristia denuncia as viver cristão (Passos para
rábola contada por Jesus de do senhor. Como de desigualdades e injustiças uma teologia wesleyana bra-
compreende, o banquete costume o servo toma o (Revista Caminhando, Ano sileira, p.15).
messiânico foi anunciado. convidado pelo braço e o VI, Nº 8, p.33-35, É mais do
Tudo está preparado e o puxa gentilmente. A graça que comer juntos/as, todos/as que Considerações
Reino de Deus está pró- é incrível. Em cada convi- comem são despertados/as a tra- Finais
ximo, na pessoa de Jesus. te e encontro haverá um balhar, orar pela igualdade, pelo
Quem quer comer pão choque e incredulidade fim da fome e a abraçar todos/as. Há uma sintonia fina
no reino de Deus, precisa dos convidados/as. Outro Pluralismo e a missão da Igreja na entre a ação de Jesus, a
comer pão com Ele. Mas costume era o de enviar atualidade, p. 99). E mais que frase de Wesley “reformar
os convidados se queixam porções do banquete aos comer juntos/as, todos/as a nação e espalhar a santi-
que o anfitrião come com amigos/as ausentes por que comem são des-per- dade bíblica sobre a terra”
os pecadores, as mulheres, motivos justos. Mas aqui, tados/as a trabalhar, orar e o Credo Social. Jesus
os pobres e não guarda o não há possibilidade de pela igualdade, pelo fim da assume a responsabilidade
sábado. participação à distância. fome e a abraçar todos/as. social de transformar os
Ao retornar o servo re- Quem não comparecer Há sempre o desafio após laos em ochlos. Convidar
latou tudo ao seu senhor, não provará do meu banquete.
cada celebração de servir alguém à mesa é sinal de
que fica irado. Mas sua Jesus declara o banquete ao Senhor na Igreja e no paz, de confiança, de fra-
reação é graça, e envia seu como sendo seu e estende mundo. Um convite para ternidade, solidariedade e
servo e o instrui a convi- o convite aos presentes. assumirmos a responsa- perdão. Quando as pes-
dar os proscritos da aldeia: A parábola não tem epí- bilidade social a favor do soas se reclinam no chão,
os pobres, cegos, aleija- logo. Os convidados não ser humano, a partir do encostam uma nas outras
dos. Estes fazem parte da estão todos reunidos/as. modelo deixado por Jesus. quebrando barreiras, não
cidade, embora isolados Jesus inaugura o banquete A eucaristia denuncia as desi- há lugares privilegiados
da vida comunitária. Os messiânico prometido gualdades e injustiças, propõe e nem posição de poder.
primeiros convidados se por Isaias 25.6-9, com a à igreja e ao mundo que sejam Sentar-se à mesa de gru-
recusam a atender as boas comunhão de mesa. E a um, momento em que buscamos pos com os quais não
noticias do banquete que eucaristia representa estaa Deus com nossa fraternidade, temos intimidade é um
foi preparado. E o servo comunhão contínua do amor e justiça, como prática desafio de compartilhar a
diz: Senhor o que mandaste Cristo Ressurreto. do ministério terreno de casa e a mesa comum. O
está feito, mas ainda há lugar. Cristo. Isto está expresso compromisso social de pessoas
Ele é instruído novamen- A eucaristia no Credo Social da Igreja não nasce de repente, é uma
te a sair e compeli-los a na Igreja Metodista, que completa planta que necessita ser regada
entrar. Um convite ines- Metodista 100 anos. O Evangelho e celebrada, para que possa
perado normalmente era wesleyano é, simultânea sobreviver e ser vivenciado.
recusado, por questão de Mas a eucaristia não e consistentemente, um
honra. Culturalmente os é apenas uma celebração, evangelho pessoal e pú-
Ana Pinheiro Dos Santos é leiga na Igreja
convidados são constran- ela relaciona-se com a blico. Deu ênfase à subje- Metodista no Ipiranga, teóloga e mestranda
vida e missão da tividade (religião na área de Novo Testamento na UMESP.
gidos a ficar, Lc 24.28-
29. Igreja Metodista. Credo do coração), mas
Social

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A dimensão social na identidade


metodista: O DNA metodista da
ação social

Welinton Pereira da Silva


http://founderypictures.com/pages/pages/why-foundery-pictures.php

Servos da ecemos, constrangidos pelo tava sendo influenciado, João Wesley e os meto-
amor de Jesus, a viver quais
humanidade servos da humanidade.
de maneira alarmante, distas que não formavam
pela apatia religiosa e pela uma igreja, mas eram gen-

O
Em seu pequeno livre- degeneração moral. te religiosa de todo tipo
Metodismo não
to intitulado “Aspectos do e de qualquer confissão
foi, segundo o
metodismo histórico” o Movimento religiosa, reuniam-se em
bispo argentino
referido bispo nos recorda subversivo qualquer lugar que fosse
Sante Uberto Barbieri,
uma nova forma eclesiás- que este desejo de servir a ou não consagrado. Por
humanidade surgiu na In- Ainda segundo nosso esta razão, afirma nosso
tica. Foi um movimento
glaterra do século XVIII, bispo argentino, era proi- bispo, até o princípio do
de renovação espiritual,
quando o cristianismo, bido por lei pregar fora século XIX, os metodistas
ao que cita uma estrofe da
em todas as suas deno- dos lugares consagrados tiveram sérios problemas
poesia de Carlos Wesley:
minações, definhava por para essa finalidade, mes- com a justiça. Muitos fo-
Não anelamos morar em
túmulos, nem nas escuras esterilidade e estava impo- mo no interior das casas, ram parar nas cadeias por
celas monásticas, relegados tente diante da sociedade. os ofícios religiosos deve- não poderem pagar as
por votos e barrotes. A multas.
todos, livremente, nos ofer-
Ao invés de influenciar, riam ser feitos na Igreja
o cristianismo es- Credo Anglicana, mas
Social

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Decoro o autor, nas Regras Gerais geração de riqueza, nossas dos, mais por curiosidade,
Humano das Sociedades Unidas, já cidades têm cada vez mais mas nenhuma manifes-
se nota claramente a preo- pobres nas ruas. Continu- tação é vista contra os
Seguindo o pensamen- cupação social prática que amos a nos deparar com milhares de crianças que
to de nosso bispo, Wesley os seus integrantes deviam crianças muito pequenas estão sofrendo violência
viveu antes da revolução alimentar. nos sinais vendendo balas todos os anos.
industrial, quando ainda e fazendo “malabarismos” Na revista Carta Ca-
não se tinha consciên- A questão para ganhar uns trocados e pital de fevereiro deste
cia de respeito humano, social no sobreviver. São comuns e ano, saiu uma reportagem
de maneira que deve-se Brasil constantes os pedidos de sobre a “Balada Canina”,
creditar aos primeiros oração para empregos em isto mesmo! Um pet shop
metodistas a semente da Nesta segunda parte nossas igrejas. A violência
com uma danceteria e
idéia do decoro humano, da reflexão pretendemos contra a criança nunca
salão de festas para os
mas também o interesse expor um panorama da esteve tão em evidência
cachorros. O ingresso sai
pelo sofrimento humano, questão social no Brasil e a destruição dos recur-
por 60 reais com direito a
a insistência numa religião de hoje e propor desafios sos naturais da mesma
comes e bebes e música
de socorro aos indigen- para um agir pastoral na maneira.
eletrônica.
tes, aos enfermos e aos perspectiva da identidade Na área da educação
desgraçados. Segundo o chegamos ao cúmulo de
metodista.
mantermos as crianças
Desafios
autor, este interesse não Apesar das noticias do
era panacéia passageira, nas escolas, mas sem ne- para o tempo
grande desenvolvimento
mas sim dever de cada dia, econômico que o Brasil cessariamente terem que presente
cada hora, uma inquieta- tem tido nos últimos anos, aprender a ler e escrever.
ção incessante para com o O estado de São Paulo, Como nos tempos de
até o FMI – Fundo Mone-
bem estar do próximo. o mais rico da federação, Wesley e do surgimento
tário Internacional, nosso
grande “demônio”, nos tem péssimos índices de do movimento metodis-
Economia e anos 2000 já não assusta aproveitamento escolar de ta, os desafios sociais são
finanças mais, pelo contrario, a suas crianças. muitos, a questão econô-
dívida com este órgão foi Nossa sociedade che- mica continua sobrepon-
No campo das finan- paga para surpresa de to- gou ao cúmulo de aprisio- do a questão humana,
ças, Wesley recomenda: dos. Segundo as estatísti- nar e matar suas crianças, mas temos uma grande
“De toda a maneira que te cas divulgadas nos jornais como tem sido noticiado diferença em nosso tem-
seja dada, emprega tudo o temos ficado mais ricos a recentemente. No Brasil po: os caminhos já estão
que Deus te confiou para cada dia, porém não é o mata-se uma criança por dados, não precisamos
fazer o bem aos da família que se vê na realidade das motivo de violência a cada inventar a roda. Sabemos
da fé e a todos os homens. regiões mais pobres do os meios para erradicar
10 horas, um verdadeiro
De tudo o que tens e tudo Brasil como o semi-árido e vários dos problemas que
extermínio de seres ino-
quanto és, oferece. Qual regiões metropolitanas das centes que estão tendo afligem nossa sociedade.
sacrifício vivo ao Senhor capitais e grandes cidades. suas vidas ceifadas pre- Sabemos por exemplo
que não deixou de te dar Alguma coisa parece estar
no Seu filho, o Seu único cocemente. Infelizmente que a pobreza de muitos
errada, pois apesar das não é por causa da pre-
filho” (do sermão sobre o a revolta da sociedade se
noticias do grande desen- guiça, e sim por causa
uso do dinheiro). Segundo volta contra casos isola-
volvimento e da
Credo
Social

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do acumulo da riqueza • Reduzir a mortalidade que os envolvem, por xão retomando o texto
por alguns. Sabemos que infantil; que e como ocorrem de nosso bispo Barbieri:
muitos passam fome, não • Melhorar a saúde mater- e suas conseqüências. “João Wesley e os meto-
por que não tem comida na; Isto inclui conhecer distas de sua época eram,
suficiente para todos, e • Combater o HIV/ a maneira como as ao mesmo tempo, de um
sim por causa da ganância AIDS, a malária e outras pessoas vivem e se certo misticismo prático e
das grandes corporações doenças; organizam, são gov- de uma ação social ativa.
• Garantir a sustentabili- ernadas e participam Dependiam muito, tanto
transnacionais que visam
dade ambiental; politicamente, e como
acima de tudo o lucro. na ordem pessoal como
• Estabelecer uma par- isto pode ajudar ou at-
Sabemos que muitos mor- na congregacional, da
ceria mundial para o rapalhar a mani-
rem de doenças facilmente desenvolvimento. festação da vida

casteloseosseuslacos.blogs.sapo.pt
evitáveis, mas os medica- A preocupação e res- abundante.
mentos não estão aces- ponsabilidade do meto- 3. Há necessidade
síveis a todos. Estes são dista para com a questão de apoiar todas
alguns dos muitos desafios social não é uma opção, as iniciativas que
postos para a pastoral de e sim algo inerente ao ser preservem e val-
nossas igrejas no tempo metodista. orizem a vida
de hoje. A Igreja Local: lugar humana.
Vale citar o grande privilegiado da missão/ As metas do mi-
esforço que organizações social lênio apresentadas
governamentais e não O Plano para a Vida e acima nos dão um
governamentais estão fa- Missão da Igreja é muito panorama dos prin-
zendo com vistas a um atual quando afirma: Na cipais problemas
mundo melhor, e creio realização do trabalho de que nossa sociedade preci- assistência e orientação
Deus, a Igreja Metodista sa enfrentar neste tempo, e do Espírito Santo, do
que estas metas poderiam
reconhece grandes neces- qual sentiam-se agentes e
ser de nossas igrejas tam- nosso plano para a vida e
sidades que são também responsáveis ao darem o
bém, como forma de ser- missão nos dão a estraté-
desafios da missão:
mos fiéis à nossa herança e gia para a ação, ou seja, o seu testemunho. Do céu
1. Há necessidade de
identidade metodista. local e em parceria com a pediam a direção para
conhecer a Igreja, es-
comunidade e instituições. atuar acertadamente na
pecialmente a Igreja
As metas de local, descobrir suas O sociólogo Betinho, ide- terra. Que Deus em sua
desenvolvimento possibilidades e seus alizador da campanha infinita sabedoria nos guie
do milênio dons, e valorizar seus contra a fome dizia: “Agir no tempo de hoje para
ministérios para a par- localmente e pensar glo- irmos na direção certa
• Erradicar a extrema ticipação total do povo balmente”. Como Igreja em nossa ação missionária
pobreza e a fome; na missão de Deus. temos a oportunidade de e social na realidade de
• Atingir o ensino básico 2. Há necessidade de con- praticarmos esta ação nos nosso país.
universal; hecer o bairro, a ci- diversos bairros e cidades
• Promover a igualdade dade, o campo, o país, onde estamos inseridos e Welinton Pereira da Silva é pastor meto-
entre os sexos e a auto- o continente, o mundo fazer diferença. dista e assessor de Relações Cristãs da
Visão Mundial
nomia das mulheres; e os acontecimentos Termino esta refle-
Credo
Social

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A dimensão social no
serviço cristão

Saulo Baptista

A igreja foi cria-


da para atender
necessidades hu-
manas. O ser humano se
desenvolveu como um
se pode admitir que haja
prioridade de umas em re-
lação às outras, pois o cris-
tianismo não é uma teoria
para alimentar discursos e
ser social ou seja, desde diletantismos intelectuais,
tempos que se perdem na como também não é ape-
origem de suas existências nas um ativismo, ainda
na terra, homens e mulhe- que este venha inspirado
res formaram sociedades, pelas melhores intenções.
organizadas de modos Em resumo, a sociedade
simples ou complexos. jamais reconhecerá a for-
Nesses contextos, a igreja ça do cristianismo se ela ridade” – quando somos Wesley sugere que ele
não é apenas mais uma não for evidenciada pelas convocados a aliviar a priorizava a ação huma-
instituição social como obras nos dois sentidos aflição do nosso próximo, nitária, em detrimento
as outras, tais como cen- mencionados, ou seja, o seja no corpo ou na alma. da piedade. Não é este o
tros comunitários, clubes, serviço e a piedade. E estes [...] Seguis vós o exemplo entendimento, se conside-
sindicatos, partidos etc. A deverão ser sempre pra- do Nosso Senhor, prefe- rarmos que, para Wesley, a
igreja está aí e existe para ticados em comunidade. rindo a misericórdia ao fé cristã era a nova forma
praticar os ensinamentos Neste sentido, mesmo a sacrifício? Usais de toda da existência humana, res-
de Jesus Cristo e estabele- devoção individual que diligência ao alimentar o taurada como verdadeira
cer os propósitos do Cria- João Wesley tanto valori- faminto, vestir o nu, visitar imagem de Deus. Para
dor em toda a obra de Sua zava era um reflexo, uma os enfermos e os que es- ele, a vida do cristão era
criação, ou seja, em toda avaliação consciente, da tão presos? [...] Sede mais sempre uma existência em
a natureza e humanidade; ação do cristão como ser zelosos com as obras de sociedade, para servir aos
sendo esta, evidentemen- social. E aqui vale a pena misericórdia, [...] aquelas seus semelhantes, como
te, uma parte daquela. lembrar um pequeno tre- marcas pelas quais o Pas- conseqüência natural de
No metodismo há duas cho de suas exortações: tor de Israel identificará ser uma nova criatura em
formas de compreender a “Deus quer misericór- suas ovelhas no último Cristo. Dizia Wesley: “O
realização desses propósi- dia, e não sacrifício” – isto dia. (RUNYON, T. A nova cristianismo é essencial-
criação: a teologia de João mente uma religião social
tos divinos em sociedade. é, prefere-a ao sacrifício.
Wesley hoje. São Bernardo- e torná-lo uma religião
De modo bem sumário, Sempre, portanto, que
SP: Editeo, 2002, p. 138). solitária é destruí-lo. [...]
a vida cristã pode ser en- um interferir no outro, as
Parece haver uma Quero não só afirmar que
tendida como a prática de obras de misericórdia são
contradição entre essas ela [a religião] não pode
“obras de misericórdia” e preferíveis. Mesmo o ler,
palavras de Wesley e o subsistir normalmente,
“obras de piedade”, sendo o ouvir e o orar devem
que foi afirmado no pará- mas que não pode sub-
que ambos os tipos de prá- ser omitidos, ou adiados,
ticas são essenciais e in- “ante o poderoso grafo anterior. A citação sistir de modo nenhum à
dissociáveis. Também não chamado da ca- do argumento de margem da sociedade, sem
Credo
Social

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viver e tratar com outros tração de renda, através da e o sucateamento da esco-


homens” (idem, p. 277). agiotagem legalizada, de la pública.
forma tão escandalosa que A dimensão social no
Jesus: a soma dos investimentos serviço cristão deve ser
exemplo e do governo federal em um testemunho eloqüente
inspiração programas sociais, para de que o evangelho faz
atender 11 milhões de novas todas as coisas, na
A fonte de inspiração famílias em 2006, ficou medida em que partici-
de Wesley sempre foi o abaixo dos lucros dos pamos, como cristãos
exemplo de Jesus Cristo, metodistas, em organiza-
cinco maiores bancos pri-
que doou sua vida em ser- ções de ação social que
vados brasileiros, no 1º
viço a todos os oprimidos: promovem o bem-estar
semestre de 2007. Jesus
desde os ricos obcecados humano, tais como, con-
certamente derrubaria as selhos municipais, centros
por suas ganâncias, como bancas desse capitalismo comunitários, sindicatos
o cobrador de impos- selvagem. Não obstante, e partidos políticos, cujo
tos e entreguista Zaqueu, como sua igreja, estamos compromisso esteja loca-
convertendo-o a ser um fazendo o quê? lizado nos empobrecidos
homem misericordioso,
e não nas classes privile-
até aqueles que tinham Visualizando giadas. Um exemplo de
necessidades básicas de
ações testemunho é abrirmos
saúde e re-integração ao
convívio social, como concretas hoje nossos templos para pro-
mover a auto-organização
leprosos, epiléticos, pros-
A dimensão social no popular, tornando-nos
titutas, hemorrágicas, do-
entes mentais e tantos serviço cristão é, também, protagonistas, junto com
outros. a presença e a participação outros parceiros sociais,
Jesus enfrentou o cer- de nossas igrejas em muti- de transformações, a par-
tir do bairro onde está
ne do sistema de opres- rões pela paz e ações que Cristo, visto que basta esta
inserida nossa igreja local.
são, quando provocou neutralizem a violência e motivação, embora outras
Assim estaremos sendo
os sumo-sacerdotes, sa- denunciem a corrupção. “luz do mundo” e “sal da inspirações até possam
duceus e herodianos, no Corresponde, de igual terra”. ser importantes, como o
templo de Jerusalém, ao modo, à elaboração e exe- caráter humanitário de
Diante do que foi
derrubar as mesas dos cução de pequenos proje- escrito, é nossa missão, uma ação responsável na
cambistas, denunciando, tos de educação ambiental como igreja local ou em sociedade. Em síntese,
assim, a transformação da precisamos ser a presença
e engajamento em ações qualquer outra dimensão,
casa de oração em covil de Cristo em cada situação
de desenvolvimento sus- agir a partir da realidade,
de salteadores. Uma ação concreta que aflige nossos
tentável. A igreja presente ou seja, captar e sentir as semelhantes. É para isto
política dessa envergadura na educação secular, atra- necessidades das pessoas que somos uma parte da
seria, no tempo presente, vés de escolas paroquiais, do bairro, cidade, país e, sociedade, chamada para
as igrejas se unirem e ou da rede de escolas quiçá, do mundo intei- agir como povo metodista,
organizarem manifesta- ro, para, a partir dessa
confessionais maiores, a fim de espalhar a santi-
ções contra o Congres- percepção e desses desa-
tem condições de praticar dade bíblica e a perfeição
so Nacional e o Banco fios, estabelecer o tipo de
uma educação de quali- serviço cristão a ser exe- cristã em toda a terra.
Central, para provocarem
dade e assim denunciar cutado, com inspiração,
mudanças nas políticas Saulo Baptista é leigo metodista da Região

financeiras e monetárias, a mercantilização exclusivamente, Missionária da Amazônia, doutor em Ciên-


cias da Religião, integrante do Movimento
promotoras de concen- do ensino privado no amor de Jesus Evangélico Progressista.
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Social

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Desafios do século XXI para o


credo social

Nicanor Lopes

O Credo Social
promulgado
em 1908 pelo
Conselho Federal de Igre-
jas, agora Conselho Na-
mações sobre seminários,
palestras, livros, e outros,
com promessas de pros-
peridade pessoal, louvores
proféticos e outros afins.
desafio maior da Igreja.
A crise de alimentos,
na atual conjuntura do pla-
neta, tem uma complexi-
dade própria. Anualmente
Como pastoralista
não sou um especialista
no tema da produção de
alimentos. Porém, busca-
mos ações pastorais para
cional de Igrejas Cristãs Pretendo neste exercício os meios de comunica- os conflitos do mundo
dos EUA, revela as preo- pastoral focar, dentro da ção de massa anunciam contemporâneo. Entendo
cupações sociais da Igreja dimensão profética da o crescimento das safras que um dos maiores de-
Cristã da época. Por um Igreja, a primeira meta agrícolas. Países, como o safios para o século XXI,
lado, a Igreja da época para o milênio: “Acabar Brasil, ano após ano ba- na perspectiva do Credo
colocava em sua pauta com a fome e a miséria”. tem recordes de produção Social, é o compromisso
as preocupações sociais agrícola. Isso não significa da Igreja na expressão so-
da humanidade face aos Sobre a crise que a fome do mundo está lidária para com as pessoas
desafios que se apresen- de alimentos diminuindo. Estima-se que passam fome.
tavam no novo século, o que os alimentos estão em
XX, e procurava com o Há um sentimento de crescente alta de preços, Credo é
Credo Social despertar, impotência dentro das cerca de 40% em 2007, confissão de fé
na fé cristã, uma postura igrejas que têm em suas e seus desdobramentos
ética, solidária, ecumênica pautas a preocupação so- estão nos conflitos sociais Credo Social é, tam-
e socialmente responsável. cial, e uma insensibilidade em países com baixa pro- bém, uma afirmação de
Por outro lado, neste iní- naquelas que excluem os dução de grãos e econo- fé, e por isso, deve ser vi-
cio do século XXI a Igreja problemas sociais de sua mias frágeis. Países como venciado na vida liturgica
de agora, em sua maioria, preocupação espiritual. República dos Camarões, e eclesial da comunidade
não se sensibiliza para Quando fui encorajado Moçambique, Haiti, Costa de fé, no século XXI ele
uma pauta humanitária, a escrever sobre os desa- do Marfim, Bolívia, Indo- precisa ser professado,
como por exemplo, as fios do século XXI para o nésia, Egito, India, Sene- não somente, nas cele-
metas para o milênio. Credo Social, a primeira gal e outros já enfrentam breções liturgicas da Ceia
É provável que quem coisa que me veio à mente revoltas populares pela do Senhor, quando do
lê este artigo já tenha visto foi de que precisamos re- alta dos preços e escassez partir do pão. Não creio
em sacolas de supermer- tomá-lo em nossa prática dos alimentos. Alguns que a visão dicotômica
cados, capas de cadernos, de fé. Suas declarações do especialistas no tema afir- do pietismo do século
outdoors e sites da Internet início do século XX ainda mam que uma das causas XVIII, que se encarregou
as figuras do programa: As são contemporâneas para é a produção agrícola para de divulgar uma fé cristã
metas para o milênio [veja a o século XXI. Mas, ao biocombustíveis. Porém, separada da vida cotidiana,
figura]. Assim como eu, mesmo tempo, dentre os os países que produzem como se fosse possivel
creio que poucos devem muitos problemas sociais grãos para a fabricação de celebrar uma fé celes-
tê-las visto em boletins de que desafiam a fé cristã, biocombustíveis afirmam tial num mundo cheio de
igrejas ou em seus quadros em nossos dias, o que que essa atitude é uma conflitos, talvez, pior que
de avisos. Certamente, mais me chama a aten- saída para a crise do petró- a dicotomia pietista seja a
nesses mesmos espaços de ção é a crise de leo e uma forma insensibilidade contempo-
Credo
comunicação eclesial sem- alimentos. É isto de produção de rânea da Igreja pelos que
pre encontramos infor- Social energia limpa.
que entendo ser o passam fome.

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Um Credo Social para cação do planeta, como A verdadeira Senhor está posta, para
o século XXI deve confes- as utilizadas nos asfaltos Mesa do saciar a fome do espírito,
sar que a terra ao ser cul- que determinam as pistas como sacramento. E, por
tivada deva priorizar o ali- de uma rodovia. Do lado
Senhor outro lado, esquecer-se
mento para a humanidade. direito do quadro com O maior desafio do sé- da mesa cotidiana das
“Pois comerás do trabalho o dizer “hemisfério sul” culo XXI certamente será pessoas que não têm o
das tuas mãos; feliz serás, e está uma pessoa com uma a fome. O planeta possui que comer.
te irá bem” [Salmo 128.2]. criança no colo chorando uma população com cerca O gesto solidário do
Quando da grande explo- de fome, olhando assus- de 6,8 bilhões de habitan- evangelho nos propõe,
são urbana os operários da tada para um homem que tes, uma crise ecológica de em sua centralidade, ele-
cidade lamentavam que as abastece seu carro. Do desmatamento, e começa mentos suficientes para
casas que construiam não outro lado com o dizer a dividir o espaço da terra a nossa responsabilidade
eram por eles habitadas. “hemisfério norte” que para a plantação de grãos cristã. Isso não sendo su-
Chegamos no tempo que apresenta um homem para sustentar os bio- ficiente para nos sensibili-
os grãos produzidos nos
campos não são mais para
alimento da humanidade,
mas sim para alimentar
máquinas e automóveis.
“Dai-lhes vós mesmos
de comer” [Lucas 9.13]
esse espírito de partilha
e solidariedade é o pon-
to forte no evangelho
de Jesus, me parece, ser
uma oposição ao que se
propala no mundo evan-
gélico sobre prosperidade
pessoal e exclusividade
de acessos aos bens de
consumo.
O Credo Social do sé- muito bem nutrido (obe- combustívies dos países zar, certamente as palavras
culo XXI deve denunciar so) abastecendo um carro ricos e agravar a crise de de Jesus servem de base
que assim como as casas enorme. A forte carac- alimentos para os países bíblica–teológica–pasto-
das cidades não são habi- teristica da charge está na
empobrecidos. ral: “Dai-lhes vós mesmos
tadas pelos trabalhadores voracidade de consumo Se falamos de um Cre- de comer” [Lucas 9.13];
da construção, assim tam- deste carro, que tem uma do Social para o século “Tive fome e me deste de
bém não são os alimentos boca enorme, e, a pessoa XXI, certamente os apon- comer...” [Mateus 25.35].
hoje para a humanidade. do norte despeja combus- tamentos do credo do sé- Creio que este é o maior
Há pouco tempo vi tível na boca desse carro culo passado (1908) ainda desafio social da Igreja
uma charge que descrevia e pergunta para a pessoa se fazem atuais. Mas, uma para o século XXI.
o seguinte: no centro do do sul: “Sua criança está atenção especial deverá ser
quadro uma bomba de com fome? Meu carro dada à questão da mesa. Nicanor Lopes é pastor metodista e
combustível sendo alimen- está esfomeado”. [http:// Por um lado, não bas- professor de Missão e Evangelização na
tada por uma quantidade marcelinopena.wordpress. FaTeo, onde também coordena o Curso de
com/2008/04/22/ ta, como Igreja, Teologia em EAD.
enorme de alimentos, com afirmar (algumas
empire-notes-capi-
os dizeres “alimento do talism-the-global- Credo mensalmente)
mundo”; do centro desta food-crisis/]. Social que a Mesa do
bomba sai uma demar-
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Pensamentos sobre a
falta atual de alimentos

John Wesleiy

Recentemente muitos uma refeição um dia sim, terem nada para comer é de que todo o imposto é
artigos têm sido publica- outro não. Conheço outra a falta de emprego. pago sobre o milho que
dos sobre a atual falta de pessoa que, embora há 1.2. Mas, por que não é destilado? E que dizer
alimentos, com suas cau- poucos anos tivesse todas têm emprego? Porque os do grande número de
sas apontadas por homens as conveniências da vida, ex-patrões não podem alambiques particulares,
de experiência e reflexão. hoje cata do esterco larvas mais mantê-los. (...) Não que não pagam qualquer
Mas, será que não falta fedorentas e as leva para podem empregá-los por- imposto? Eu mesmo já
algo nessas publicações? casa para repartir com os que não têm mercado ouvi um empregado de
(...) Voluntariamente, ofe- filhos. para seus produtos; os um eminente destilador,
reço a homens abertos (...) De uma terceira, alimentos são tão caros ocasionalmente declarar
que a maioria do povo que para cada litro, sobre
não pode comprar quase o qual pagou o imposto,
42-18794345 RF © moodboardCorbis

mais nada. ele destilou seis sobre os


1.3. Mas, por que os quais não pagou nada.
alimentos são tão caros? Sim, já ouvi destiladores
Particularmente, por que afirmarem: “Temos que
a farinha está tão cara? fazer isto para sobrevi-
Deixando de lado razões ver”. Logicamente, então,
parciais, a causa é que não podemos julgar pelo
enormes quantidades de imposto pago, quanto mi-
milho são usadas para lho é usado na fabricação
fabricar bebida. Juntando de bebida.
todos os fabricantes da In- “Entretanto o imposto
glaterra, temos razão para traz grandes reservas para
crer que um pouco menos o Reino”. Isto vale, Majes-
da metade do trigo produ- tade, pela vida de seus sú-
e benevolentes, algumas ouvi a inocente declara- zido no Reino, cada ano, é ditos? Sua majestade ven-
idéias sobre esse impor- ção: “De fato estava quase consumido na fabricação deria cada ano, à Argélia,
tante assunto, propondo desmaiando e tão fraca, desse perigoso veneno, cem mil dos seus súditos
algumas questões e acres- que quase não podia na- veneno que naturalmente por 400 mil libras? Certa-
centando a cada uma delas dar, até que o meu cachor- destrói, não somente a mente não. Os venderia
o que parece ser a resposta ro, não achando nada em força física e a vida, mas por aquela quantia então,
óbvia e direta. casa, saiu e trouxe de volta também os valores morais para serem abatidos pelos
1.1. Primeiro pergun- um osso em estado relati- de nossos compatriotas. seus compatriotas? Ah,
to: por que milhares de vamente bom, o qual tirei Esse fato pode ser não diga a Constantinopla
pessoas estão morrendo de sua boca e fiz um bom rejeitado: “Isto não é que os ingleses aumentam
em toda a nação? Que é jantar”. (...) Por que tantos possível. Sabemos pelo seus impostos vendendo a
um fato eu sei, pois tenho não têm nada para comer? imposto pago quanto ao própria carne e o sangue
visto com meus próprios Por que muitos milho é destila- de seus compatriotas!
olhos por todo canto da não encontram Credo do”. Sabemos 1.4. Mas, e a aveia, por
terra. Conheço pesso- nada para fazer? Social mesmo? Não que é tão cara? Porque o
as que só podem comer A razão de não haverá dúvida número de cavalos para
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carruagem e charretes desperdício, não mais se 2.1. Qual o remédio arrendando terras a preço
particulares é quatro vezes admirará da escassez, e para curar esta úlcera superior a 100 libras por
maior do que era qua- do resultante alto custo maligna para as milhares ano; b) diminuindo o luxo,
tro anos atrás. Se não se daquilo que eles com tanta de pessoas morrendo de por lei, por exemplo, ou
produz quatro vezes mais agilidade destróem. fome? Arranjar emprego por ambos.
aveia do que se produzia 1.7. Mas, por que a para elas, e elas acharão o 2.7. Como reduzir
há quatro anos, o preço terra está tão cara? Por- seu sustento. o preço das terras? Por
não pode ser o mesmo. que, pelas razões acima, a 2.2. Mas como a aris- todos os modos acima
Se apenas duas vezes da aristocracia não pode viver tocracia pode arranjar-lhes mencionados, visto que
quantia é produzida, ob- da forma que está acostu- emprego sem se arruinar? cada um contribui para
viamente o preço dobrará. mada, sem aumentar sua Procure um mercado para diminuir as despesas de
(...) renda, o que a maioria só o seu produto e os patrões capital; especialmente o
1.5. Por que a carne pode fazer aumentando os lhe darão emprego de último, restrição de luxo,
de boi e de carneiro são aluguéis. Assim, o possei- sobra. E isto se faz dimi- que é a maior e a principal
tão caras? Porque muitos ro, pagando mais aluguel nuindo os preços dos ali- fonte de necessidade.
fazendeiros que criavam pela terra, precisa ganhar mentos, pois assim o povo 2.8. Como diminuir
grandes rebanhos de ove- mais pelos produtos. Isto, também terá dinheiro para os impostos? a) acabando
lhas e de gado, ou ambos, por sua vez, aumenta o outros produtos. com a metade da dívida
agora não criam nada. Eles preço da terra e assim a 2.3. Mas como redu- nacional, economizando
podem melhor aproveitar roda gira. zir o preço do trigo e da desta maneira uns dois
da terra criando cavalos 1.8. Mas por que não cevada? Proibindo, para milhões de libras por ano;
para exportação. somente os alimentos sempre, acabando com- b) acabando com todas as
1.6. Mas, por que o e a terra, mas quase to- pletamente com aquela pensões ridículas dadas as
porco, as aves domésticas das as outras coisas são praga à saúde, (...) que é a centenas de pessoas à toa,
e os ovos são tão caros? tão caras? Por causa dos fabricação da bebida! (...) tais como as de gover-
Por causa da monopoli- enormes impostos que O preço do milho abaixa- nadores de fortaleza ou
são cobrados sobre quase ria pelo menos um terço. castelos, que nestes 100
zação das fazendas; talvez
tudo. 2.4. Como reduzir o anos só abrigaram gralhas
o monopólio mais diabó-
1.9. Mas por que os preço da aveia? Reduzin- e corvos.
lico jamais introduzido
impostos são tão altos? do o número de cavalos. Mas isso será feito?
neste Reino. A terra, que
Por causa da dívida na- E seria possível fazer isto Receio que não. Pelo me-
há alguns anos atrás era
cional. Eles tem que ser (sem prejudicar no seu nos não temos razão de
dividida entre dez ou 20
mantidos altos, enquanto trabalho): a) colocando esperar que sim, pois qual
pequenos posseiros e que
a dívida existir. (...) Resu- um imposto de dez libras o bem que podemos es-
lhes permitia sustentar
mindo, então: milhares de sobre cada cavalo exporta- perar, sendo as Escrituras
suas famílias confortavel-
pessoas em toda a terra do à França; b) colocando verdadeiras, de uma nação
mente, é agora englobada
estão morrendo por falta um imposto sobre as car- tal como esta, onde há
por um grande fazendei- tão profundo, declarado e
ro. (...) Cada uma dessas de alimentos. Isto é devido ruagens da aristocracia.
completo desprezo a toda
famílias tinha porcos e a diversas causas; mas, aci- 2.5 Como reduzir o
religião e não há temor a
aves domésticas que vo- ma de tudo, à fabricação preço da carne de boi e
Deus? Parece que resta
luntariamente enviavam de bebida, aos impostos de carneiro? Aumentando
apenas Deus atuando por
ao mercado. Os mercados, e ao luxo. os rebanhos de ovelhas
sua causa. E assim, sendo,
portanto, eram abastados Aí está o mal e as ine- e gado. E isto acontece-
que caiamos nas mãos de
e a abundância mantinha gáveis causas dele. Mas ria sete vezes mais, se o
Deus e não dos homens.
os preços ao alcance do onde está o remédio? Tal- preço dos cavalos fosse
Lewisham, 20 de feve-
povo. (...) É só examinar vez exceda à sabedoria hu- diminuído.
reiro de 1773
a cozinha dos poderosos, mana dizer. Mas, não seria 2.6. Como reduzir o
dos nobres e da corte, um erro oferecer preço do porco
Credo
quase sem exceção, é ob- algumas suges- e das aves do- Texto extraído de The Works of John
tões no assunto. Social mésticas? a) não Wesley, Vol XI, 53-59. Tradução de Donald
servado surpreendente Raffan.

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apoio pastoral

As obras principais de Walter


Rauschenbusch na internet

Helmut Renders

O pastor batista
norte americano
com descendên-
cia alemã Walter Raus-
chenbusch (1861-1918) é
reconhecimento pontual,
por exemplo, de Rubem
Alves, que prefaciou o
livro Orações por um mundo
melhor, editado pela Pau-
fase da industrialização e
urbanização acelerada e
selvagem. Ele conhecia
seus efeitos de perto du-
rante a sua primeira nome-
perigo é que ela pode isolar. [...]
Eu acredito na oração e na me-
ditação na presença de Deus.
Quando a alma fica perceptiva
por Deus perdem-se o medo, a
considerado um dos mais lus, e posterioremente, ação pastoral entre 1886 a vontade de acumular riquezas
importantes representan- gravou uma seleção dessas 1897. A sua comunidade e qualquer ambições egoístas
tes do Evangelho Social. orações num audiolivro, vivia no Westend de Nova [...]. Quando o homem tem
Sua obra inicial “A cris- Rauschenbusch não é lido Iorque, designada por seus que enfrentar trabalho duro
tandade e a crise Social” no Brasil. Teólogos de ou- habitantes como “cozinha ele necessita receber dessa fonte
do diabo”. O filme Gan- silenciosa. Mas que ele recebeu
gues de Nova Iorque (1863) dessa fonte, deve ser investido.
e o musical West-Side-Story A santificação pessoal deve
(1957) descrevem o am- servir o Reino de Deus.
biente bem. A dedicatória Para chegar a esta mís-
do seu primeiro livro ex- tica, Rauschenbusch pas-
plica a sua motivação: sou também por muitas
Escrevo este livro para decepções, inclusive com
pagar uma dívida. Fui onze a sua amada Igreja Batista,
anos pastor entre os trabalha-
especialmente a do ramo
dores da West Side de Nova
Iorque. [...] nunca perdi a alemão mas conseguiu
sensação de que devo dar um manter proximidade com
retorno a esta gente simples, a igreja e não cansou em
que era minha amiga. Caso lutar durante toda a sua
este livro, no sentido mais vida para a sua reforma
amplo, possa contribuir para e a transformação da so-
diminuir a pressão sobre eles, ciedade.
levantando-os e fortalecendo-
os, vou ter meu encontro com
o Senhor da minha vida com
mais certeza.
A sua mística lembra
deu o impulso final para a tros países como Dietrich de John Wesley:
criação do Credo Social da Bonhoeffer, H. Richard Em quase todas as formas
Igreja Meto-dista Episco- Niebuhr, Martin Lu-ther do cristianismo se avalia a ex-
pal em 1908, e tornou-se, King, jr., Visser’t Hooft, periência mística como a forma
ainda no mesmo ano, o Harvey Cox e Gustavo mais alta da santificação. [...]
Credo do Conselho Nacio- Gutiérrez, reconheceram Sem dúvida nasceram dela
nal das I-grejas Cristãs dos a sua importância. sobre condições favoráveis, um
Estados Unidos da América W. Rauschenbusch espírito de serviço, humildade
do Norte. Apesar de um escreveu numa e coragem. O seu

Credo
Social

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A ordem dos livros


Helmut Renders é missionário da Igreja 1. The Righteousness of the Kingdom [A justiça do
indicada no quadro é cro- Evangélica Metodista na Alemanha, doutor
nológica. A justiça do Reino em Ciências da Religião e professor da Reino]. Max L. Stackhouse (Ed.). Nash-ville, New York: Abingdon
foi publicado postuma- FaTeo, onde é também secretário-executivo Press, 1968. Cf. <http://books.google.de/books?id=YEwcAAAAMAAJ
do Centro de Estudos Wesleyanos.
mente, 50 anos depois da &q=Rauschenbusch&dq =Rauschenbusch&hl=pt-BR&pgis=1>.
sua morte, em 1918. 2. Christianity and The Social Crisis [A Cristandade e
a crise social]. New York, Londres: The Macmillan Company,
1908 [1ª edição 1907]. Cf. <http://www.archive.org/details/socialcri-
sis00rausuoft>.
3. For God and the People: Prayers of the Social Awakening
[Por Deus e o povo: orações de despertamento social]. Boston,
New York, Chicago: The Pilgrim Press, 1910. Cf. <http://www.
archive.org/details/forgodandthepeop00rausuoft>.
4. Christianizing the Social Order [Cristianizando a or-
dem social]. New York, London: The Macmillan Company, 1912.
Cf. <http://www.archive.org/details/christianizingth00rausuoft>.
5. Dare we be Christians [Que sejamos cristãos] . Boston,
New York, Chicago: The Pilgrim Press, 1914. Cf. <http://www.
archive.org/details/darewebechristia00rausuoft>.
6. The Social Principles of Jesus [Os princípios sociais
de Jesus]. Henry H. Meyer (Ed.). New York, Cincinnati: The
Methodist Book Concern, 1916. Cf. <http://www.archive.org/de-
tails/thesocialprincip00rausuoft>.
7. A Theology of the Social Gospel [A Teologia do Evangelho
Social]. New York, London: The Macmillan Company, 1918. Cf.

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Superando os limites na
caminhada missionária,
numa leitura de Atos 1.8
Sueslhey José Ferreira

Leitura Bíblica: nados e despreparados, e a expansão da Igreja Km do mar Morto,


Atos 1.6-9. pois deviam dar prosse- entre os judeus e gentios, e a uma altitude de
guimento ao ministério ou seja, de Jerusalém a 765m. Segundo Atos

L embro-me de uma de Jesus... Roma. Analisando o texto dos Apóstolos, Jesus


experiência em que ... porém, assim como lido, percebemos que se antes de subir ao céu,
havia uma senhora eles tiveram, nós também trata do “acontecimento disse aos discípulos
em minha comunidade de temos o Espírito Santo, da ascensão”, e é nessa para permanecerem
fé que era considerada o como o nosso grande mo- perspectiva que se relata em Jerusalém até que
exemplo de serva de Deus. tivador missionário. No o começo da atividade eles fossem revesti-
Todos olhavam para ela decorrer do livro de Atos, do Espírito Santo sobre a dos de poder, ordem
como uma ótima referên- vamos notar a importância Igreja, daí, notamos na ex- essa obedecida, pois
cia (inclusive eu), pois ela do Espírito Santo para a pressão de Jesus: “e sereis os discípulos ficaram
fez parte do meu chamado Igreja Primitiva. Este livro, minhas testemunhas” que em Jerusalém até o
para o ministério pastoral. segundo estudiosos, foi se trata de um seguimento, Pentecostes (At.2.1-
Em um certo dia, aqui na escrito por volta de 80/90 de uma continuidade da 4). Jerusalém é o
Faculdade, recebi uma d.C, e tradicionalmente, o missão iniciada por ele, e centro dos aconte-
mensagem dizendo que autor deste livro é Lucas, que passou a ter a partici- cimentos salvíficos,
esta irmã havia falecido. um conhecedor da gramá- pação “ativa” do Espírito e é lá que a Igreja foi
Ao retornar à minha cida- tica e dos recursos lingüís- Santo... impulsionada pela
de, um irmão me disse que ticos. A expansão da Igreja ... desta maneira, cha- obra de Jesus. Ser
agora não tinha mais jeito, em Atos acompanha a mados e chamadas a pas- testemunha em Je-
ninguém mais iria fazer o predição de Cristo: Jerusa- torear, somos desafiados rusalém! Será que en-
que aquela senhora fazia. lém é evangelizada (1.12); a superar os limites e bar- tendemos realmente
Eu lhe disse que quem Judéia e Samaria são atin- reiras territoriais da nossa o que é testemunhar
iria dar prosseguimento a gidas (8.1-40); o Evange- vida pastoral, e acima de Jesus e os seus feitos?
essa missã, seríamos nós: lho avança sem parar pelas tudo, chamados/as para Jesus disse aos discí-
eu, ele e todos da comuni- terras gentias até Roma testemunhar Jesus por pulos, que era para
dade. Essa experiência me (9.1-28). É interessante toda a parte. A dimensão eles testemunhá-lo,
leva ao relato em que Jesus notar que o mesmo Lucas geográfica da expansão começando por Je-
subiu aos céus e deixou relata, em seu evangelho missionária da Igreja de rusalém. A “nossa
os discípulos para con- no capítulo 24. 47-49, Atos dos Apóstolos ini- Jerusalém” está situ-
tinuarem a sua missão... que essa missão confiada cia-se a partir de alguns ada muito próxima
irmãos/as, o nosso grande aos discípulos deveria ter limites. a nós. Ela é o nosso
desafio enquanto igreja a participação do Espírito primeiro limite, ou
(discípulos/as), ainda é Santo. Por localização e Desenvolvimento seja, a nossa igreja
ser testemunha de Jesus. ênfase, o verso oito do local, o nosso bairro;
primeiro capítulo de Atos, O primeiro limite é ser o local de trabalho;
Precisamos superar os
limites nesta caminhada parece designar claramen- testemunha em: a ‘faculdade de te-
missionária. Assim como te o propósito deste livro, I. Jerusalém: Jerusalém – ologia’. São nesses
pois aqui trata-se de uma [Lugar de Paz], uma lugares, que as pes-
aconteceu em “minha”
história especial, cidade situada soas nos conhecem
comunidade, os discípulos
que narra o es- a uns 50 Km bem, podendo assim
de Atos também devem Sermão
tabelecimento do mar Medi- conferir nossas vi-
ter se sentidos abando-
terrâneo e 22
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apoio pastoral

das, vendo em nós trabalho metodista todista está presente são lugares ainda mais dis-
verdadeira mudança (precisamos, digo, em todos os estados tantes que bairros, cidades
que o evangelho traz necessitamos estar brasileiros, porém, e estados. Este representa
para a vida humana. presentes em muitos precisamos nestes lugares fora do nosso país.
O segundo limite é ser outros municípios). mesmos estados, Hoje a missionários me-
testemunha em toda Superando a caminha- chegar em muitos todistas espalhados pelo
a: da, além da Judéia, o municípios. Para mundo (Estados Unidos,
II. Judéia: Judéia – Parte terceiro limite é ser isso, a Igreja conta Suíça, dentre outros), mas
sul das três regiões testemunhar em: com a minha e a sua não poderíamos deixar de
em que a província III. Samaria: Samaria aptidão missionária. dizer que ainda há muitos
romana da Palesti- – [Torre de Guarda], Além de Jerusalém (nos- outros países esperando
na se dividia. Media um estado vizinho so bairro, lugar mais a chegada do evangelho
aproximadamente da Judéia, a oeste do próximo de nós), através de nós.
90 km, estendendo- mar Mediterrâneo, Judéia (cidades vi-
se do mar Morto ao uma região central da zinhas) e Samaria Concluindo...
Mediterrâneo. Em “Terra Santa”, que (estados vizinhos),
alguns casos, como compreendia as tri- temos, como Igreja, Quando o evangelho,
em Lc. 1.5, Judéia se bos de Efraim e Ma- de superar os limites através de Paulo, chega
referia a toda a Pa- nassés. Conforme o e ser testemunhas... a Roma, o autor de Atos
lestina (um estado). capítulo oito de Atos, IV. “... até aos confins da encerra seu relato. Fim da
Certamente, os discí- essa região, conside- terra”: para a Igreja história? NÃO! Muitas
pulos não poderiam, rada um território Primitiva, significou igrejas estão ainda olhan-
e nem deveriam se quase proibido para a chegada do evan- do para as alturas, espe-
contentar apenas em os judeus religiosos, gelho à Síria, Grécia rando Jesus voltar; mas há
testemunhar a Jesus foi evangelizada pela e Roma. Até che- muito que fazer. Devemos
somente em Jerusa- pregação dos após- gar “aos confins da sim, olhar para o campo,
lém, pois o Evange- tolos Filipe, Pedro terra”, o evangelho para o lugar onde a missão
lho deveria se espa- e João. Samaria era foi pregado em Je- vai ser realizada. E se me
lhar e ser anunciado uma área (estado) de rusalém, em seguida perguntarem quem deve
ao seu redor, ou seja, direto conflito com a se espalhou pela Pa- fazer a missão, sem medo
ser anunciado em Judéia, sendo assim, lestina e Samaria. A eu respondo que todos
toda a Judéia. a expansão missio- próxima fase relata nós, pois temos o Espírito
Trazendo para os nos- nária era mais que a difusão do evange- Santo. Não só no verso
sos dias, onde se um seguimento, era lho através da Ásia 8 do capítulo 1, mas em
encontra a nossa Ju- um desafio histórico Menor e da Europa, todo o livro de Atos, o
déia? Percebemos no a ser superado. A para enfim chegar Espírito Santo é o verda-
relato de Atos, que “nossa Samaria” são a Roma, como rela- deiro iniciador da missão
através do Espírito os estados vizinhos ta Atos 19.21. Para apostólica, por isso, para
Santo, o evangelho aonde não chegou entendermos essa o desenvolvimento mis-
se espalhou por toda o Evangelho. Talvez expansão, temos de sionário, é indispensável
a Judéia, por todo lugares mais distan- perceber que em Je- sua participação.
o estado e cidades tes de nosso local de rusalém, os apóstolos Parafraseando John
vizinhas. “Nossa origem. Se realmente eram testemunhas Wesley, posso dizer que:
Judéia” são aquelas somos “parceiros” apenas diante dos “O melhor de tudo é
cidades e lugarejos de Jesus na missão, judeus, e não poderia que o ‘Espírito Santo’ está
aonde o evangelho precisamos como permanecer assim, conosco”. Amém! Deus
ainda não chegou, e membros da Igre- por isso, o evangelho nos abençoe!
“levantando a nossa ja de Cristo, enviar vai se espalhando Sueslhey José Ferreira é estudante
bandeira”, são aque- e sermos enviados para então chegar formando da fateo (7º semestre do curso
les lugares em que para o vasto campo a Roma, e cumprir de teologia), vinculado à 5ª região ecle-
siastica da igreja metodista. Sermão
mesmo havendo a missionário que nos o que fora dito em apresentado à disciplina homilética da fateo
com aprovação.
presença do pro- está propos- Atos 1.8.
testantismo, ainda to. Hoje, a Sermão O “nosso
não existe nenhum Igreja Me- confins da terra”,

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Luzes, câmera, pregação!

Princípios meios e fins da homilética espetacular

Luiz Carlos Ramos

Introdução texto bíblico em busca de sua história e do seu sentido


primeiro, a homilética espetacular prefere a eisegese, que

A prática homilética contemporânea é moldada é o processo pelo qual o intérprete projeta sobre o texto
pela sociedade do espetáculo. A base principal as suas próprias idéias. Isso porque a história como
dessa sociedade espetacular é a economia de memória significativa de um povo não interessa para
mercado globalizada aliada aos meios eletrônicos de o mundo do espetáculo. Este, ao contrário se alimenta
comunicação de massa e à tecnologia da informação, do novidoso. A história só interessa enquanto servir
de onde surge o seu principal produto: a indústria do para os propósitos da indústria do entretenimento. Por
entretenimento. Nessa sociedade, dá-se, sistematica- exemplo: a história do Dia Internacional da Mulher,
mente, o processo de degradação do ser para o ter e do não interessa à mídia como história da conscientização
ter para o parecer (por exemplo: já não basta ser rico e de pessoas a partir de uma tragédia que vitimou 129
ter dinheiro, é preciso parecer rico e parecer ter muito mulheres operárias, na cidade de Nova Iorque, no dia
dinheiro). 8 de março de 1857. Por isso, sem pudor, a publicidade
Os meios eletrônicos, tais como o rádio, a TV e a aproveita a ocasião para vender lingerie, cosméticos e
Internet são, basicamente, instâncias recreativas, instru- outros artigos de moda. O espetáculo refaz a história
mentos de diversão, parques de entretenimento. Como segundo os seus próprios interesses, num procedimento
meios espetaculares, representam (encenam) a realidade. eisegético sistemático.
Não são a realidade, mas imagens do real, como espe- Em segundo lugar, enquanto a homilética con-
lhos (specculum). A fruição dessa não-realidade, implica vencional, mediante o procedimento hermenêutico,
na alienação da vida, ainda que por alguns instantes, procura atualizar a mensagem do texto bíblico à luz da
pela contemplação da representação do real que se vê tradição e do testemunho acumulado historicamente
nas telas e monitores, ou que se ouve nos receptores pela Igreja, a homilética espetacular opta pela “pesquisa
de rádio. Essa suspensão da existência é precisamente de opinião”. A homilética, para subsistir no mundo do
o sentido da palavra entretenimento: ter+entre. Abre-se espetáculo, precisa agradar às massas. Deve, portanto,
um parênteses na vida real, para que se possa assistir
oferecer não o que a massa precisa, mas o que ela
a vida representada. Por que isso acontece, isto é, por
quer. Se, em outros tempos havia um compromisso
que as pessoas abrem esses parênteses em suas vidas
de coerência com o que os pregadores supunham ser
com freqüência cada vez maior não cabe aqui discutir.
O fato é que assim é. a verdade, no mundo da mídia, a verdade é a opinião
pública, o Ibope. Como se trata de um empreendimento
Princípios homiléticos demasiadamente oneroso, a homilética da mídia não
pode se dar ao luxo de dispensar audiência. Para tanto,
espetaculares
procede à constante monitoração desta, e reformula
Os princípios espetaculares regem a homilética sua proposta de acordo com a adesão conquistada.
espetacular. Enquanto, na homilética convencional, as Em uma palavra, a hermenêutica da mídia é o Ibope.
bases da prédica são as teologias bíblica, sistemática e Daí a necessidade dessa homilética de trabalhar com
pastoral, por meio dos processos exegéticos, hermenêu- os mesmos mecanismos de sedução da mídia: o apelo
ticos e retóricos, na homilética espetacular, essas bases ao narcisismo, os estereótipos, o mecanismo de trans-
são outras. Primeiramente, em lugar da exegese, que ferência de valores e o fascínio das estrelas, para men-
seria o processo pelo qual o intérprete visita o cionarmos apenas alguns.

Reflexão

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Finalmente, em lugar da retórica sagrada, que se (e, por conseguinte, de exclusão) não está imune às
encarrega de traduzir em acontecimento a intenção do ideologias, antes se prestam muito a servi-la. A imagem
pregador ou pregadora, na forma de desafios concretos metonímica, ao contrário da metáfora, faz o caminho
para a transformação ou confirmação de valores com do coração para o cérebro, isto é, primeiramente a gente
vistas a um futuro melhor, na homilética espetacular, “sente” uma imagem, depois (às vezes muito depois) a
essa escatologia é substituída pela ansiedade imediatista gente pensa sobre ela.
do aqui e agora. Assim como não interessa ao espetá- Como o papel da mídia, numa sociedade espetacular
culo o passado, tampouco interessa o futuro. Para a comandada pelo mercado, é vender produtos, a meto-
sociedade do espetáculo, tudo é um eterno presente. nímia imagética torna-se muito útil, pois uma pessoa
Assim, alimenta-se de uma vertiginosa enxurrada de é convertida em consumidor não pela razão, mas pela
eventos (por exemplo: as Olimpíadas devem dar lugar emoção. Se o indivíduo pensar muito ele não compra,
à Copa do mundo, que deve dar lugar às eleições
presidenciais, que devem dar lugar às comemorações
natalinas, etc., etc.). Não se deve esperar para consumir
amanhã o que se pode consumir hoje. A expectativa do
celeste porvir, das antigas tradições cristãs, dá lugar ao
imediato labor pela satisfação iminente das aspirações
de prosperidade e sucesso.

Meios homiléticos
espetaculares
Além dos princípios, deve-se pensar a respeito dos
meios homiléticos espetaculares. Ora, o meio privilegia-
do pela homilética convencional é o da alocução, isto
é, o processo oral-verbal pelo qual a palavra se torna
acontecimento. No caso da homilética espetacular, a
palavra deve dar lugar à imagem, e o processo oral-
verbal, ao imagético-visual. No primeiro caso, a prin-
cipal ferramenta persuasiva é a recorrência à metáfora, principalmente os produtos supérfluos. Mas, como já
que, dentre as figuras de linguagem, é a que mais tem a foi dito alhures: a propaganda é a arte de fazer você
capacidade de sensibilizar o corpo, mas sempre a partir comprar o que você não precisa, com o dinheiro que
de um disparo intelectual, de um estimulo racional. No você não tem. E isso só acontece por impulso. Depois
caso do espetáculo, o principal elemento de sedução é da compra é que o consumidor parará para pensar (e
a metonímia, processo pelo qual se pode tomar a parte amargar) a sua impulsividade.
pelo todo. Assim se dá o processo de enquadramento Dessa forma, enquanto a homilética convencional
das câmeras (de TV, de cinema, da Web...): elas selecio- se ocupa, principalmente do significado (conteúdo),
nam o assunto, deixando, propositalmente, de fora o a homilética espetacular se concentra no significante
que não interessa. Esse processo gestáltico de seleção (forma). O conteúdo espetacular se constitui de mera

Reflexão

Ano 16, no 41, janeiro/maio de 2008


22 mosaico
apoio pastoral

desculpa para a elaboração de um invólucro atrativo, Pelo riso, o desgraçado alivia suas penas, e pelo choro
sedutor, irresistível, capaz de valorizar (atribuir valor) o abastado se penitencia de suas injustiças.
e precificar o seu produto. Da combinação da tragédia e da comédia nasceu o
drama. Nessas categorias, joga um papel particularmen-
Fins homiléticos espetaculares te importante a música. Não somente como prelúdio
e poslúdio, mas como trilha sonora e parte integrante
Também é preciso que se analisem os fins da homi- da cena.
lética espetacular. Segundo Gui Debord, o fim do espe- Portanto, a homilética que melhor se adequa ao
táculo é o próprio espetáculo. Ele deve constantemente meios eletrônicos de massa é aquela carregada de forte
se retroalimentar, pois ele se consome a si mesmo. O teor emocional, que tem a capacidade de provocar na
espetáculo vive de si mesmo. Note-se a freqüência sua audiência, alternadamente, o riso e, principalmente
com que programas da mídia são montados em cima com o concurso da música, produzir o choro. Há uma
de suas próprias personagens (estrelas). A mídia, cons- dependência crescente da música, no processo discur-
tantemente noticia a própria mídia, entrevista a própria sivo contemporâneo.
mídia, elabora documentários sobre a própria mídia,
num verdadeiro círculo vicioso de auto-promoção. Daí Conclusão
a freqüência dos apelos dos telepregadores para que
seus telespectadores contribuam para a manutenção do Concluindo, a prédica espetacular desafia a homilé-
programa. O objetivo é manter o programa no ar, e é tica convencional, à medida em que se apresenta como
por isso que ele vai ao ar: para ficar no ar. fenômeno aliado à ideologia hegemônica do espetácu-
Ora, a homilética convencional, enquadrava suas lo-mercado. É a pregação da massificação e do lucro
prédicas nas categorias discursivas aristotélicas, a saber: sobrepujando a prédica da resistência e da graça.
o discurso judiciário, pelo qual interpreta-se e julga-se Os protestantes vivem hoje, o que a Igreja cristã
sobre o passado (procedimento exegético); o discurso experimentou no século IV, sob Constantino: uma
demonstrativo, pelo qual se expõe sobre a relevância religião outrora minoritária e de proscritos, de repente
ou não de certa questão (procedimento hermenêutico), se torna religião oficial e hegemônica. Em lugar de
pelo qual algo deve ser louvado ou criticado no pre- perseguição, passou a ser vantajoso ser cristão. Assim
sente; e, finalmente, o discurso deliberativo, pelo qual também os evangélicos brasileiros vivem um processo
se decide a respeito do futuro (processo retórico), se de constantinização espetacular: outrora proscritos e
algo deve ou não ser implementado, deve ou não ser minoritários, começam a experimentar a notoriedade
realizado, e de como isso se dará. e a celebridade.
Por sua vez, para alcançar seus fins, a homilética Aonde isso nos levará são cenas dos próximos
capítulos...
espetacular adota outras categorias, oriundas do teatro:
a comédia e a tragédia (e suas derivações). Nesses gêne-
ros teatrais, as emoções são preponderantes. O riso e Luiz Carlos Ramos é pastor metodista, doutor em Ciências da Religião e professor de
Liturgia e Homilética na FaTeo.
o choro purgam o indivíduo de suas próprias misérias.

Reflexão

Ano 16, no 41, janeiro/maio de 2008


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Jürgen Moltmann em
diálogo no Brasil

C om muita honra, a Universidade Metodista de


São Paulo realizará em conjunto duas de suas
tradicionais e destacadas Semanas de Estudos:
a Semana de Estudos Teológicos da FaTeo e a Semana
de Estudos da Religião do Programa de Pós-Graduação
pelo valor, pública e incontestavelmente afirmado, do
conjunto de sua obra para o cristianismo e a sociedade
contemporânea.
A vinda de Moltmann ao Brasil é uma iniciativa do
Instituto Mysterium (Rio de Janeiro) realizada em con-
em Ciências da Religião, para, especialmente, acolher junto com a Universidade Metodista de São Paulo.
um diálogo com o destacado teólogo alemão Jürgen As instituições interessadas em participar como
Moltmann (27 a 31 de outubro de 2008). parceiras deste diálogo histórico devem contatar o prof.
O teólogo oferecerá conferências com um balanço Claudio de Oliveira Ribeiro, um dos responsáveis pela
das principais questões presentes em sua produção
coordenação do evento: claudio.ribeiro@metodista.
teológica, conhecida como Teologia da Esperança, desen-
br.
volvida ao longo dos anos, com destaque para aquelas
que se inserem mais fortemente no Século XXI. Quem tiver interesse em participar do evento deve
Durante o evento, a Universidade Metodista de São acompanhar detalhes sobre as inscrições no site da
Paulo concederá a Jürgen Moltmanno título Doutor FaTeo, http://www.metodista.br/fateo e pode, desde
Honoris Causa, em cerimônia especial na noite de 30 de já, se cadastrar pelo e-mail comfateo@metodista.br para
outubro, como expressão de gratidão e reconhecimento receber informações, diretamente, sobre o evento.

A contribuição de Jürgen Moltmann


José Carlos de Souza, professor da FaTeo
A contribuição inestimável do Dr. Moltmann para a reflexão te-
ológica, tanto quanto para a presença e ação pública das Igrejas
na sociedade contemporânea, transcende as fronteiras da Europa
e é universalmente reconhecida. Suas obras, traduzidas para di-
versas línguas, estão entre as mais influentes e o projetam entre os
mais importantes teólogos dos séculos XX e XXI. A seriedade de sua
interpretação da mensagem cristã, a sua profundidade filosófica, a sua
permanente abertura para as angustiantes questões contemporâneas,
a sua aguçada sensibilidade social e política, o seu compromisso
com as causas dos Direitos Humanos, da justiça e da paz, da
ecologia e do ecumenismo, entre outras, aliada à sua fecunda
produção intelectual justificam, sem dúvida, a outorga do título
de Doutor Honoris Causa.
Vale lembrar que, no ano de 1977, o Dr. Jürgen Moltmann, já
mundialmente célebre em vista da publicação de sua Teologia da
Esperança, esteve, a convite da Fateo, com o apoio da ASTE (As-
sociação de Seminários Teológicos Evangélicos), no Brasil quando
proferiu diversas conferências em distintas regiões do país, pub-
licadas posteriormente sob o título Paixão pela Vida (São Paulo:
ASTE, 1978). Nessa oportunidade, houve um diálogo tenso,
porém fecundo, com a teologia da libertação latino-americana.
Hoje, o Dr. Moltmann é professor emérito
de Teologia Sistemática da Universidade de
Tübingen, na Alemanha.

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