Você está na página 1de 68

janeiro-fevereiro de 2024 – ano 65 – número 355

CF-2024
FRATERNIDADE
E AMIZADE SOCIAL
“VÓS SOIS TODOS IRMÃOS E IRMÃS” (Mt 23,8)
COLEÇÃO

COMUNIDADE
E MISSÃO

Em meio às diversas realidades, é também no contexto das cidades


que Deus se manifesta, por meio das pessoas e das relações. A coleção
discute aspectos teológicos de uma evangelização urbana que nos
convida a descobrir e valorizar as reais presenças de Deus como
habitante das cidades e das megacidades.

loja.paulus.com.br Aponte a
(11) 3789-4000 | 0800-0164011 câmera do
vendas@paulus.com.br seu celular e
@editorapaulus saiba mais!
Prezadas irmãs,
prezados irmãos, graça e paz!
Diz o verso da canção popular que nosso país dos anônimos. De homens e mulheres, de uma
é “abençoado por Deus e bonito por natureza”. ponta a outra do país, que insistem em remar
Contudo, há outro dado que não é abençoado contra a corrente do egoísmo, da intolerância,
nem bonito: o pão e a beleza ainda estão con- da violência, do crime... e acreditam em um
centrados em poucas mesas. mundo melhor.
O pão, aqui, quer dizer o pão de comer mes- A esperança na luz dos que plantam a semente
mo. O arroz e o feijão nossos de cada dia. Quer da justiça, lá aonde quase ninguém quer ir: nos
dizer o acesso aos bens básicos e necessários para becos, nos morros, nas favelas, nos acampamen-
uma vida saudável e de qualidade. A beleza se tos, nos quilombos, nas ocupações, nas roças,
refere à cultura, à educação, à religião, à festa, a nas ribeiras...
tudo o que nos humaniza e nos faz olhar para A esperança na luz das mulheres margari-
a existência com grandeza de alma. das, que gritam contra o feminicídio. Nenhu-
Ocorre que este país,“abençoado e bonito”, é ma mulher a menos. Ir. Dorothy, presente! Mãe
explorado muito mais do que amado e cuidado. Bernadete, presente! Iranir, mana querida, pre-
Desde a chegada do colonizador, construíram-se, sente! Todas as mulheres ceifadas, tanto sangue
ao longo do tempo, abismos entre pobres e ricos, derramado pelo machismo, pelo patriarcalismo.
sem falar na ferida aberta pela escravização dos Mulheres, presente! O corpo de mulher é sa-
irmãos negros e no preconceito e indiferença grado. Maldita toda violência.
em relação aos povos originários, vítimas de A esperança na luz dos jovens e seus olhos
tantos sofrimentos. que brilham, que rimam a vida com palavras e
Apesar de nosso país ainda deixar tantos ir- ritmos, com a ginga, com seus modos de andar,
mãos e irmãs à beira do caminho, eles mesmos vestir e encarar a vida, nas rodas de capoeira e
nos inspiram a luz da esperança. Todos precisa- dança de rua espalhadas por nosso país, cantando
mos de esperança.Aquela esperança que é verbo: o misto de memória, alegria e resistência de um
esperançar. Ela é a centelha que nos impele no povo marcado pela dor, por marcas no corpo.
presente e nos aponta o horizonte. Jesus nos Poucos sabem traduzir o texto de uma ruga.
ensinou que somos chamados a ser “sal da terra Nossos idosos, rugas do tempo impostas pelas
e luz do mundo” (Mt 5,13-14). horas a fio de trabalho árduo e salário miserável.
Esta edição de Vida Pastoral, à luz do tema A esperança na luz das mãos que sabem mis-
da Campanha da Fraternidade deste ano: “Fra- turar tantos ingredientes para a feijoada, o vatapá,
ternidade e amizade social” e do lema:“Vós sois o acarajé, o caruru, com o sabor do azeite de
todos irmãos e irmãs” (Mt 23,8), quer olhar dendê. O mungunzá, o pirão, o tutu, o arroz
para a realidade e vislumbrar a possibilidade de carreteiro e o feijão tropeiro, a moqueca, o cus-
“novos céus e nova terra” (Ap 21), porque esse cuz, a pamonha, o tucupi, o arroz com jambu,
é o sonho de Deus. O papa Francisco tem in- pequi, baião de dois.
sistido para que a Igreja não perca de vista o Esses sabores, que nos dão “água na boca”,
compromisso do cuidado com a “casa comum”, nos tornem firmes na caminhada “neste mundo
onde todos possam viver fraternalmente, com rumo ao céu”.A memória da refeição do Senhor
dignidade. Enquanto houver um irmão nosso que fazemos em cada Eucaristia compromete-
passando fome, jogado nas calçadas, sendo tratado -nos na missão de trabalhar pela partilha do pão
com indiferença, todos somos atingidos. da mesa e da beleza e para que a amizade social
A amizade social não faz acepção de pessoas, aconteça, feito olhar de criança, iluminando a
de credo, gênero ou etnia. Temos um caminho vida qual aurora de um novo dia.
de desafios para superar a intolerância que causa Somos todos irmãos e irmãs! O Espírito
tantos males e cria tanta inimizade entre os seres Santo nos fortaleça.
humanos. Por isso, olhando para o Brasil e para Boa leitura!
nosso povo, tão bonito e plural, queremos exaltar Pe. Antonio Iraildo Alves de Brito, ssp
a esperança na luz da organização dos simples, Editor

vidapastoral.com.br • ano 65 • n o 355 1


Sumário
CAMPANHA DA FRATERNIDADE 2024:
FRATERNIDADE E AMIZADE SOCIAL
PARA CURAR UMA SOCIEDADE ADOECIDA....................... 4
Revista bimestral para sacerdotes
e agentes de pastoral Jean Poul Hansen
Ano 65 - No 355
janeiro-fevereiro de 2024
FRATERNIDADE E AMIZADE SOCIAL
EM FRAGMENTOS.................................................................................. 12
Joaquim Mol

“MAS O QUE SERIA ISSO PARA TANTA GENTE?”


© PAULUS – 2024
Pia Sociedade de São Paulo O SINAL DA COMENSALIDADE...................................................... 22
Rua Francisco Cruz, 199
04117-091 – São Paulo - SP
José Pascoal Mantovani
paulus.com.br
ISSN – 0507-7184
PARÓQUIAS À LUZ DO DOCUMENTO “A CONVERSÃO
Direção editorial PASTORAL DA COMUNIDADE PAROQUIAL A SERVIÇO
Darlei Zanon, ssp (mtb 0094255/SP)
DA MISSÃO EVANGELIZADORA DA IGREJA”........................ 30
Editor Edson Oriolo
Antonio Iraildo Alves de Brito, ssp

Redação ROTEIROS HOMILÉTICOS.................................................................. 38


vidapastoral@paulus.com.br
Junior Vasconcelos do Amaral
Conselho editorial
Antonio Iraildo Alves de Brito, ssp
Danilo Alves Lima, ssp
Darcir Luiz Marin, ssp
Darlei Zanon, ssp
Paulo Sérgio Bazaglia, ssp Assinaturas
Imagens
• Distribuição gratuita nas Livrarias PAULUS (1 exemplar por pessoa);
Romolo Picoli Ronchetti
• Envio gratuito para as paróquias que fizerem o cadastro, a ser renovado
Imagem da capa anualmente (1 exemplar de cada edição por paróquia);
Romolo Picoli Ronchetti
• Para receber em casa, basta fazer uma contribuição de 20 reais.
Diagramação • O acesso ao site continua inteiramente gratuito: www.vidapastoral.com.br
Philipe Silva Ribeiro dos Santos

Revisão
Alexandre S. Santana
Tiago José Risi Leme
Para contato:
Impressão - PAULUS
paulus.com.br/loja
Versão digital V (11) 3789-4000 | 0800 016 40 11
vidapastoral.com.br
w (11) 99974-1840
assinaturas@paulus.com.br
f l t @editorapaulus

Aponte a
Periódico de divulgação científica. câmera do
Área: seu celular e
Humanidades e artes.
Curso: Teologia. saiba mais!

2 vidapastoral.com.br • ano 65 • n o 355


Livrarias Paulus
APARECIDA – SP CUIABÁ – MT RECIFE – PE
Centro de Apoio aos Romeiros Rua Antônio Maria Coelho, 180 Av. Dantas Barreto, 1000 B
Lojas 44, 45, 78, 79 (65) 3623-0207 (81) 3224-9637
(12) 3104-1145 cuiaba@paulus.com.br recife@paulus.com.br
aparecida@paulus.com.br
CURITIBA – PR RIBEIRÃO PRETO – SP
Pça. Rui Barbosa, 599 Rua São Sebastião, 621
ARACAJU – SE
(41) 3223-6652 (16) 3610-9203
Rua Laranjeiras, 319
curitiba@paulus.com.br ribeiraopreto@paulus.com.br
(79) 3211-2927
aracaju@paulus.com.br
FLORIANÓPOLIS – SC RIO DE JANEIRO – RJ
Rua Jerônimo Coelho, 119 Rua México, 111–B
BELÉM – PA
(48) 3223-6567 (21) 2240-1303
Rua 28 de Setembro, 61 – Campina (91)
florianopolis@paulus.com.br riodejaneiro@paulus.com.br
3212-1195
belem@paulus.com.br
FORTALEZA – CE SALVADOR – BA
Rua Floriano Peixoto, 523 Rua Direita da Piedade, 75 – Barris
BELO HORIZONTE – MG (85) 3252-4201 (71) 3321-4446
Rua da Bahia, 1136 fortaleza@paulus.com.br salvador@paulus.com.br
Ed. Arcângelo Maleta
(31) 3274-3299 GOIÂNIA – GO SANTO ANDRÉ – SP
bh@paulus.com.br Rua Seis, 201 – Centro Rua Campos Sales, 255
(62) 3223-6860 (11) 4992-0623
BOA VISTA – RR goiania@paulus.com.br stoandre@paulus.com.br
Avenida Ville Roy, 5011 – sala 01
Centro GUARAPUAVA – PR SÃO JOSÉ DO RIO PRETO – SP
(95) 3212-5340 / 98122-0040 Rua XV de Novembro, 7466 - Lj. 1 Rua XV de Novembro, 2826
boavista@paulus.com.br (42) 9926-0224 (17) 3233-5188
guarapuava@paulus.com.br riopreto@paulus.com.br
BRASÍLIA – DF
SCS – Q.1 – Bloco I JOÃO PESSOA – PB SÃO LUÍS – MA
Edifício Central – Loja 15 – Asa Sul Rua Peregrino de Rua do Passeio, 229 – Centro
(61) 3225-9847 Carvalho, 134 – Centro (98) 3231-2665
brasilia@paulus.com.br (83) 3221-5108 saoluis@paulus.com.br
joaopessoa@paulus.com.br
CAMPINA GRANDE – PB SÃO PAULO – PRAÇA DA SÉ
Rua Afonso Campos, 233 – Centro JUIZ DE FORA – MG
Praça da Sé, 180
(83) 3182-0659 / 99956-0020 Av. Barão do Rio Branco, 2590
(11) 3105-0030
campinagrande@paulus.com.br (32) 3215-2160
pracase@paulus.com.br
juizdefora@paulus.com.br
CAMPINAS – SP SÃO PAULO – VILA MARIANA
MACEIÓ – AL
Rua Barão de Jaguara, 1163 Rua Dr. Pinto Ferraz, 207
Rua Barão de Alagoas, 32 – Centro
(19) 3231-5866 Metrô Vila Mariana
(82) 3142-0544
campinas@paulus.com.br (11) 5549-1582
maceio@paulus.com.br
vilamariana@paulus.com.br
CAMPO GRANDE – MS MANAUS – AM
Av. Calógeras, 2405 – Centro Rua Itamaracá, 21 – Centro SOROCABA – SP
(67) 3382-3251 (92) 3622-7110 Rua Cesário Mota, 72 – Centro
campogrande@paulus.com.br manaus@paulus.com.br (15) 3442-4300 / 3442-3008
sorocaba@paulus.com.br
CAXIAS DO SUL – RS NATAL – RN
Av. Júlio de Castilhos, 2029 Rua Cel. Cascudo, 333 TERESINA – PI
(54) 3221-8266 Cidade Alta – (84) 3211-7514 Rua Rui Barbosa, 45 – Centro
caxias@paulus.com.br natal@paulus.com.br teresina@paulus.com.br

COTIA – RAPOSO TAVARES PORTO ALEGRE – RS VITÓRIA – ES


Av. das Acácias, 58 – Jd. da Glória Rua Dr. José Montaury, 155 Rua Duque de Caxias, 121
(11) 3789-4005 Centro – (51) 3227-7313 (27) 3323-0116
raposotavares@paulus.com.br portoalegre@paulus.com.br vitoria@paulus.com.br

vidapastoral.com.br • ano 65 • n o 355 3


Jean Poul Hansen*

Campanha da
Fraternidade 2024
Fraternidade e amizade social
para curar uma sociedade
adoecida
*Pe. Jean Poul Hansen pertence ao
clero da diocese da Campanha –
MG, onde já foi pároco, assessor
diocesano da catequese, professor
nos seminários e coordenador
diocesano de pastoral. É mestre
em Teologia Dogmática pela
Universidad Pontificia de Salamanca
e especialista em Origens do
Cristianismo pelo Instituto
Agostiniano de Valladolid, ambos na
Espanha. Atualmente é o secretário
executivo de Campanhas na CNBB.
E-mail: hpj76@hotmail.com

4 vidapastoral.com.br • ano 65 • n o 355


vidapastoral.com.br • ano 65 • n o 355 5
Ao completar 60 anos em âmbito nacional, a
Campanha da Fraternidade faz um diagnóstico da
nossa sociedade enferma e, à luz da Palavra de Deus e
do magistério eclesial, constata que sofremos de grave
“alterofobia”, causada por um “hiperindividualismo”.
Para o tratamento, o papa Francisco já nos indicou o
remédio: “fraternidade e amizade social”. O presente
artigo é um guia de leitura para o Texto-base da CF-2024.

INTRODUÇÃO fundamental, uma vez que,“dotados de alma


Em 2024, quando completa 60 anos em racional e criados à imagem de Deus, todos
âmbito nacional (1964-2024), a Campanha da temos a mesma natureza e origem; e, remidos
Fraternidade (CF) – inspirada na Carta Encí- por Cristo, todos temos a mesma vocação e
clica Fratelli Tutti, do papa Francisco, publicada destino” (GS 29).
em 3 de outubro de 2020 – traz como tema No entanto, move-nos a consciência de que
“Fraternidade e amizade social” e como lema estamos socialmente enfermos e é nossa missão
“Vós sois todos irmãos e irmãs” (Mt 23,8). ver, compadecer e cuidar (CF-2020). Por isso, a
Neste ano, a CF se empenha em fazer CF-2024 quer acompanhar nossa sociedade ao
um diagnóstico da enfermidade que nossa médico para que, com base nos sintomas que
sociedade atual sofre, com base nos sinto- apresentamos, seja diagnosticada e medicada
mas que experimentamos cotidianamente no nossa doença mediante um processo de ver-
nosso convívio social e na literatura bíblica dadeira conversão pessoal, comunitária e social.
e do magistério sobre o assunto, para, enfim,
oferecer ou reoferecer o remédio indicado 1. OS SINTOMAS
pelo papa Francisco ao mundo hodierno. Em toda consulta, começamos a conversa
apresentando ao médico os sintomas que
A Campanha da Fraternidade é o modo identificamos em nós mesmos e que nos
brasileiro de celebrar a Quaresma. Ela não levaram a procurá-lo.
esgota a Quaresma. Dá-lhe, porém, o tom, Nossa adoecida sociedade apresenta inú-
mostrando, a partir de uma situação bem es- meros sintomas:
pecífica, o que o pecado pode fazer quando • Estamos transformando o diferente, o di-
não o enfrentamos. Por isso, a cada ano, re- vergente e o oponente em inimigos para po-
cebemos um convite para viver a Quaresma dermos dar azo ao nosso desejo de eliminá-los;
à luz da Campanha da Fraternidade e viver • Impera entre nós a intolerância;
a Campanha da Fraternidade em espírito • Nas redes sociais, temos divulgado
de conversão pessoal, comunitária e social mensagens discriminatórias e intolerantes
(Texto-base da CF-2023, Apresentação). e praticado o cancelamento;
• Na vida real (não digital), aumenta a
Partimos de um princípio muito basilar violência, o ódio, o homicídio e as guerras;
e seguro, expresso no lema desta CF: somos • O diálogo é cada vez mais raro e escasso;
todos irmãos e irmãs, possuímos a mes- • As famílias se dividiram, romperam re-
ma dignidade, que nos dá uma igualdade lações por razões ideológicas;

6 vidapastoral.com.br • ano 65 • n o 355


• As comunidades estão em conflito, defen-
dendo opostos em nome do mesmo Evangelho;
• O rancor, a inimizade, o afastamento Formação integral –
das pessoas crescem vertiginosamente; Por uma cultura
• Por razões etnorraciais, pratica-se o racismo; do cuidado
• Por razões sociais, a aporofobia;
• Por razões sexuais, o feminicídio e Ronaldo Zacharias (org.)
a eliminação das pessoas que vivem uma
orientação sexual diversa da nossa;
• Por motivos políticos, abandona-se o
bem comum (do todo) e prioriza-se a parte,
minha parte, a parte com a qual me identifico
sem consciência crítica;
• Por motivos religiosos, difama-se, per-
segue-se, calunia-se, destrói-se, mata-se;
• Os interesses valem mais que os valores;
• O outro se tornou mercadoria;

Imagens meramente ilustrativas.


• Julgamentos precipitados, rejeição gra-
tuita, ódio desmedido, combate a pessoas por
causa de suas ideias e propostas e banalização
248 págs.

da morte tornam-se corriqueiros;


• Falta compromisso com a verdade, em
nome de interesses individuais ou de grupo
(fake news);
• Creches e escolas são atacadas por pes- A obra apresenta elementos para
soas armadas; ajudar não apenas no processo
• A violência é normalizada, como a posse de amadurecimento
de armas e o incentivo ao armamento; dos vocacionados, mas também
• Além de assédio moral e sexual, cons- no caminho de cura e libertação
tata-se aberta defesa do aborto, devastação de tudo aquilo que
contradiz o que os ministros
ambiental, bullying, intolerância religiosa, trá-
consagrados são chamados a ser
fico de drogas, tráfico de pessoas, apologia ao na Igreja e no mundo.
armamentismo, situações análogas ao trabalho
escravo, discurso de ódio, corrupção e fome;
• Há uma “globalização da indiferença”
(EG 54); Aponte a câmera do
• Há uma crise de pertencimento que seu celular e confira!
gera o fenômeno do identitarismo;
• Nossa sociedade está dividida, é desigual
e excludente.
Vendas: (11) 3789-4000
2. AS CAUSAS E O DIAGNÓSTICO 08000-0164011
O que nos tem levado a esse tipo de
comportamento são a destruição da coletivi- paulus.com.br
dade e a construção do indivíduo solitário e

vidapastoral.com.br • ano 65 • n o 355 7


“MOVE-NOS A CONSCIÊNCIA DE QUE ESTAMOS
SOCIALMENTE ENFERMOS E É NOSSA MISSÃO
VER, COMPADECER E CUIDAR.”

autossuficiente – ou, como diz o papa Fran- mas absolutamente distantes, num império
cisco, autorreferencial –; a construção de um das individualidades, e aquilo que é comum
inimigo comum, como o único elemento parece ter caído em desuso.
aglutinador, na sociedade, capaz de retirar as A questão é tão grave, que o papa Francis-
pessoas do seu subjetivismo individualista; co já alertou: “Neste mundo que corre sem
a mentalidade de que o conflito e a guerra um rumo comum, respira-se uma atmosfera
são geradores de vida e desenvolvimento; em que a distância entre a obsessão pelo pró-
a ideologia da invisibilização da inimizade prio bem-estar e a felicidade da humanidade
social e a normalização da competição e da partilhada parece aumentar: até fazer pensar
meritocracia, dando assim permissão para que entre o indivíduo e a comunidade hu-
eliminar o outro. mana já esteja em curso um cisma” (FT 31).
O triste diagnóstico que fazemos é que
nós, na nossa sociedade atual, sofremos de 3. HÁ, PORÉM, ESPERANÇA!
grave alterofobia, ou seja, medo, rejeição e Embora esteja indubitavelmente adoecida,
aversão a tudo aquilo que é outro, tudo o nossa sociedade apresenta sinais de esperan-
que não sou eu mesmo. ça. Nem tudo está perdido. Há pessoas e
A palavra é estranha, mas a situação que organizações verdadeiramente empenhadas
ela indica é real, presente e incisiva dia após na construção de um mundo fraterno e em
dia, alimentando mentalidades e gerando ati- iniciativas de amizade social que gerem vida,
tudes. A outra pessoa, a outra causa, o outro e vida em abundância:
sonho, o outro esforço, tudo, enfim, que não • Na nossa própria natureza, gerada no
seja eu mesmo acaba por se tornar desne- amor da Trindade, está inscrito o ímpeto
cessário, ameaçador, destinado à rejeição e de comunhão, de fraternidade, de diálogo
até mesmo à eliminação e extinção. e amizade social;
Resumindo, sofremos de alterofobia, cau- • O grande desenvolvimento das tecnolo-
sada pelo hiperindividualismo. Esse é o diag- gias da comunicação nos possibilita enormes
nóstico. É isso que precisamos atacar. possibilidades de diálogo e conexão;
Sofremos de um agudo processo de sub- • Nosso povo cultiva permanente dis-
jetivação, isto é, a única ótica que importa é posição à solidariedade, especialmente nas
a minha. Rejeitamos tudo que é diferente grandes tragédias;
de nós mesmos porque deixamos crescer • A sadia e complementar pluralidade
demasiadamente, num processo de inchaço, existente entre todos os seres humanos,
nosso próprio eu, desencadeando, assim, um imagem e semelhança do Criador, é para a
processo de fechamento ao outro. Não há comunhão, e não para a divisão;
dúvidas de quanto é positiva a individuali- • Os movimentos sociais e as organiza-
dade; isso não se põe em pauta. No entanto, ções comunitárias, com suas lutas pelo bem
aquilo que conquistamos como um grande comum, são uma proclamação de esperança;
valor passou a ser como um dos nossos maio- • Também o é a vida cotidiana das nos-
res limites. Vivemos fisicamente próximos, sas comunidades eclesiais verdadeiramente

8 vidapastoral.com.br • ano 65 • n o 355


comprometidas com o Evangelho da liber-
tação integral do ser humano;
• Por fim, mas sem esgotar, o Pacto Edu-
cativo Global, a Economia de Francisco e
Como ler o Evangelho
Clara e o Sínodo sobre a sinodalidade e seu
e não perder a fé
amplo processo de escuta das bases são sinais
eloquentes de esperança. Alberto Maggi

4. A CONSULTA À LITERATURA
REFERENCIAL
Todo médico, ao ouvir os sintomas do
paciente, consulta mentalmente todo o ar-
cabouço teórico construído ao longo da sua
formação.Assim também nós, neste diagnós-
tico da sociedade atual, recorremos à vasta
literatura bíblica, capaz de iluminar a reali-
dade, para chegarmos a nossas conclusões.

Imagens meramente ilustrativas.


Partimos do fratricídio original, na narrativa
de Caim e Abel (Gn 4,1-9), passamos pela
história de José do Egito e seus irmãos (Gn
192 págs.

37-50), de Rute e sua sogra, Noemi (Rt), de


Paulo, Filêmon e Onésimo (Fm), para chegar
aos dois filhos do pai misericordioso (Lc 15,11-
32) e às marcantes expressões de Jesus:“já não Espiritualidade e bom senso
vos chamo servos, mas amigos” (Jo 15,15) e podem andar juntos? Fé exigida
“vós sois todos irmãos e irmãs” (Mt 23,8). ou necessária? O Evangelho
Também o testemunho dos santos nos suscita a fé ou a põe em risco?
ajudou. Quantos santos fizeram da amizade O livro busca responder a essas
o caminho para a santidade! Gregório Na- e outras questões de forma crítica,
zianzeno e Basílio de Cesareia, São João Cri- com uma série de reflexões
sóstomo e a diaconisa Olímpia, São Bento e voltadas aos cristãos e àqueles
que buscam uma primeira
Santa Escolástica, São Francisco e sua gama
aproximação aos Evangelhos.
de irmãos e amigos: Clara, Leão, Ângelo,
Rufino, Masseo e Jacoba.
Os papas atuais também nos ajudam no
diagnóstico: São João Paulo II, ao nos con- Aponte a câmera do
seu celular e confira a
vidar, no início do terceiro milênio (NMI degustação do livro!
43), a uma espiritualidade de comunhão e
descrevê-la em detalhes; Bento XVI, na sua
mensagem para o 43º Dia Mundial das Co-
municações Sociais (24/5/2009), esclarecen-
Vendas: (11) 3789-4000
do o conceito de amizade e promovendo-a, 08000-0164011
especialmente entre os jovens; e Francisco,
ao nos mostrar como a fraternidade está no paulus.com.br
coração do Evangelho (EG 177-179).

vidapastoral.com.br • ano 65 • n o 355 9


“O TRISTE DIAGNÓSTICO QUE FAZEMOS É QUE NÓS,
NA NOSSA SOCIEDADE ATUAL, SOFREMOS DE GRAVE
ALTEROFOBIA, OU SEJA, MEDO, REJEIÇÃO E AVERSÃO A TUDO
AQUILO QUE É OUTRO, TUDO O QUE NÃO SOU EU MESMO.”

5. ENFIM, A RECEITA E O REMÉDIO As ações derivam de uma união que propende


A SER ADMINISTRADO cada vez mais para o outro, considerando-o
O que todos esperamos, ao fim de uma precioso, digno, aprazível e bom, independente-
consulta, é o prognóstico. Apresentamos os mente das aparências físicas ou morais.Amor ao
sintomas. O médico ajudou-nos, com base outro por ser quem é impele-nos a procurar o
em suas fontes, a fazer um diagnóstico pre- melhor para sua vida. Só cultivando essa forma
ciso. Agora, queremos saber como será o de nos relacionarmos é que tornaremos possível
tratamento, qual será o remédio a ser ad- aquela amizade social que não exclui ninguém
ministrado e como fazê-lo. e a fraternidade aberta a todos” (FT 94).
O remédio para nossa alterofobia, causada Agora, pois, é preciso aplicar esse remé-
pelo hiperindividualismo, é a amizade social. dio diariamente em nossa vida pessoal e em
Mas o que é amizade social? Do que se trata? nossa convivência comunitária e social, com
Deixemos que o próprio papa Francisco atitudes concretas, iniciativas reais e empenho
nos responda: amizade social é “amor que ul- comprometido com o fim da indiferença, do
trapassa as barreiras da geografia e do espaço” ódio, das divisões e guerras, superando resolu-
(FT 1);“uma fraternidade aberta, que permite tamente esse sistema que incha o indivíduo e
reconhecer, valorizar e amar todas as pessoas, anula as grandes causas sociais e comunitárias.
independentemente da sua proximidade física” Que tal começar indo visitar um vizinho
(FT 1); “um amor desejoso de abraçar a todos” ainda desconhecido? Que tal tomar a ini-
(FT 3); “comunicar com a vida o amor de ciativa da reconciliação com um familiar de
Deus, recusando impor doutrinas por meio quem nos afastamos? Que tal celebrar e viver
de uma guerra dialética” (FT 4); “é viver li- a reconciliação em nossas comunidades? Que
vre do desejo de domínio sobre os outros” tal vencer a omissão e denunciar toda forma
(FT 4); “o amor que se estende para além das de racismo e tantos outros males presentes
fronteiras” (FT 99),“a todo ser vivo” (FT 59); na nossa sociedade? Que tal conscientizar
“o amor que rompe as cadeias que nos isolam sobre a coleta nacional da solidariedade, que
e separam, lançando pontes; o amor que nos se realizará no próximo domingo de Ramos,
permite construir uma grande família na qual e promovê-la, já que ela socorre centenas de
todos nós podemos nos sentir em casa; amor projetos sociais por todo o Brasil?
que sabe de compaixão e dignidade” (FT 62);
nossa “vocação para formar uma comunidade CONCLUSÃO
feita de irmãos que se acolhem mutuamente e Com este artigo, você, caro(a) leitor(a),
cuidam uns dos outros” (FT 96);“a capacidade tem um mapa para aprofundar sua reflexão
diária de alargar meu círculo, chegar àqueles em torno do Texto-base da CF-2024. Aqui
que espontaneamente não sinto como parte do indicamos os caminhos nele percorridos.
meu mundo de interesses, embora se encontrem A organização e preparação dos anima-
perto de mim” (FT 97); “amor que implica dores da CF nos seus vários níveis – co-
algo mais do que uma série de ações benéficas. munitário, paroquial, diocesano, regional e

10 vidapastoral.com.br • ano 65 • n o 355


nacional – é muito importante, bem como
sua divulgação nos mais diversos meios e
veículos de comunicação, para que a cam- Mulheres que
panha alcance seu objetivo. Sem verdadeiro conquistaram espaço e voz
na Bíblia – Resistências ao
envolvimento de todos os atores eclesiais na
patriarcalismo
organização, formação e divulgação, não há
CF. Para tanto, todos(as) os(as) batizados(as) Joel Antônio Ferreira
– animadores(as) fundamentais da CF –
devem unir-se nesse serviço à comunhão
da Igreja no Brasil. Todos nós, caminhando
juntos, motivaremos nossas comunidades a
assumir suas responsabilidades ante a situação
de divisão que persiste no nosso país.
É importante encontrar e criar oportunidades
para propor a reflexão da CF-2024 nas cele-
brações comunitárias, nas catequeses, nos con-
selhos diocesanos, paroquiais e comunitários,

Imagens meramente ilustrativas.


nos encontros e reuniões de grupos pastorais e
movimentos eclesiais, nas escolas e nas câmaras
legislativas. O que importa é insistir no que é a
224 págs.

CF em si mesma – um instrumento de comu-


nhão eclesial, de formação das consciências e CONFIRA
do comportamento cristão e de edificação de VERSÃO
verdadeira fraternidade cristã e amizade social E-BOOK
entre os brasileiros.

REFERÊNCIAS BIBLIOGRÁFICAS O livro reúne diferentes


narrativas de mulheres de fé e
CONCÍLIO VATICANO II. Gaudium et Spes coragem que elevaram o
(GS): Constituição Pastoral sobre a Igreja protagonismo feminino na
no mundo de hoje. In: CONCÍLIO VATI- Bíblia. Mulheres que resistiram
CANO II. Documentos do Concílio Ecumênico ao sistema de patriarcalismo
Vaticano II. Petrópolis:Vozes, 2001. reinante na época em que
viveram, conquistando, assim,
CONFERÊNCIA NACIONAL DOS BISPOS
espaço e voz na Bíblia.
DO BRASIL. Texto-base da CF-2023. Brasília,
DF: Edições CNBB, 2022.
FRANCISCO, Papa. Evangelii Gaudium (EG): Aponte a câmera do
Exortação Apostólica sobre o anúncio do Evan- seu celular e confira a
degustação do livro!
gelho no mundo atual. São Paulo: Paulus, 2013.
FRANCISCO, Papa. Fratelli Tutti (FT): Carta
Encíclica sobre a fraternidade e a amizade
social. Brasília, DF: Edições CNBB, 2020. Vendas: (11) 3789-4000
08000-0164011
JOÃO PAULO II, Papa. Novo Millennio Ineunte
(NMI): Carta Apostólica no termo do grande paulus.com.br
jubileu do ano 2000. São Paulo: Paulus, 2001.

vidapastoral.com.br • ano 65 • n o 355 11


Joaquim Mol*

*Dom Joaquim Giovani Mol Guimarães, catequista


e servidor da teologia e da pastoral, educador, ani-
mador de comunidades eclesiais de base, membro
do Observatório Eclesial Brasil, do Observatório da
Comunicação Religiosa Brasil, do Grupo de Reflexão
sobre Juventudes da Comissão para as Juventudes da
CNBB, coordenador da Comissão de Comunicação do
Leste II, bispo auxiliar da Igreja local de Belo Horizonte,
esperançoso e dedicado a colaborar com a reforma da
Igreja liderada pelo papa Francisco. E-mail:
jmol@pucminas.br

FRA
TER
NI
DA
DE
E AMIZADE
SOCIAL EM
FRAGMENTOS
12 vidapastoral.com.br • ano 65 • n o 355
vidapastoral.com.br • ano 65 • n o 355 13
A Campanha da Fraternidade existe há muitos anos e enfrenta
grandes desafios internos e externos à Igreja, na sociedade e no
planeta, pondo em foco realidades específicas e incentivando
grandes saltos na vivência da fé cristã e na melhoria de vida por
meio de incontáveis projetos de cuidado das pessoas, da sociedade,
do meio ambiente, todos vulneráveis.

1. CAMPANHA... somente alguns esforços especiais, aplicados na


São muitos os tipos de campanha que conhe- abordagem de problemas ou no fortalecimento
cemos, nos tocam e capturam – ou não – cada de instituições. Quando planejamos e execu-
dia. Há campanhas comerciais, promocionais, tamos uma campanha, ela fala de nós mesmos,
institucionais; campanhas de lançamentos, de diz o que queremos e o que propomos, envolve
sustentabilidade, de arrecadações; conhecemos, pessoas que passam a fazer parte de uma grande
além disso, campanhas de difamação, destrui- rede, definida no escopo da campanha.
ção e violência; campanhas políticas para eleger Consideramos a campanha uma forma efe-
pessoas e para destituir ditadores; também há tiva de ajudar a realizar mudanças, por isso ela
campanhas de conscientização, sensibilização, precisa ter objetivos específicos claros, assimi-
mobilização, que são mais nobres; e ainda existe lados na mente e no coração de quem a anima,
certa campanha, que chamamos, no âmbito da evitando dispersar energia com ações que dela
Igreja católica e, de vez em quando, no âmbito destoam e com discussões que esvaziam o que
de algumas Igrejas ecumênicas, de Campanha foi proposto. Para alcançar a meta, ela precisa
da Fraternidade, a qual importa muito. deixar claro o alvo escolhido, as pessoas que
Embora essa campanha tenha um significa- podem colaborar, gerando grande movimento
do próprio em relação àquelas, situando-se no envolvente e participativo, unindo a todos.
contexto da vivência cristã, ela utiliza alguns Faz muito bem a uma campanha lembrar
elementos do que é ensinado pelas ciências resultados de campanhas anteriores, para que
gerenciais. Para que ela seja eficiente (funcione as pessoas percebam os avanços, os bons re-
como planejado) e eficaz (mude a realidade sultados, e se alegrem por, mais uma vez, in-
que é chamada a mudar) – ainda mais hoje, em tegrarem-se ao movimento. Essa é a melhor
meio a tantas dificuldades e a tantas campanhas forma de manter o envolvimento de todos
concomitantes, muitas extremamente agressi- ao longo do tempo.As campanhas produzem
vas, também no meio religioso –, é necessário, excelente efeito colateral, ou seja, à margem do
objetivamente, lembrar alguns pontos, para que seu objetivo principal e favorável a ele: geram
a Campanha da Fraternidade não se identifique líderes e coordenadores, que tomam a frente e
com campanhas estranhas e, ao mesmo tempo, atuam com convicção, e não por mera tática.
aplique conhecimentos de diversas áreas. Campanhas necessitam do fator “tempo”:
Campanha é um conjunto de ações e re- a preparação, as expectativas, a conscienti-
cursos mobilizados para alcançar determinado zação, a mobilização, as ações específicas, o
objetivo, determinada finalidade.As campanhas próprio investimento nessas ações. Planejar a
são poderosas e estratégicas para melhorar a vida campanha implica entrar no âmago da causa
dos beneficiados por ela.Além disso, a depen- que ela assumiu, de modo que os envolvidos
der da campanha, ela é fator importante para tenham o rosto da campanha, por se iden-
a prática da justiça social. Campanhas não são tificarem com ela.

14 vidapastoral.com.br • ano 65 • n o 355


“A FRATERNIDADE É EXIGENTE, PORQUE ELA
DESCE ATÉ A ÚLTIMA RAIZ DAQUELE QUE
DESEJA SER DISCÍPULO DE JESUS CRISTO.”

2. ...DA FRATERNIDADE... uma arte, porque a convivência


A Campanha da Fraternidade (CF) existe passa a ser prazerosa, respeitosa,
há muitos anos e enfrenta grandes desafios amigável.
internos e externos à Igreja, na sociedade e no A fraternidade, contudo, não
planeta, pondo em foco realidades específicas comporta desigualdades, que são
e incentivando grandes saltos na vivência da diferenças artificiais, planejadas (não
fé cristã e na melhoria de vida por meio de sem perversidade) para obter status, lu-
incontáveis projetos de cuidado das pessoas, cro, vantagem sobre o sofrimento alheio –
da sociedade, do meio ambiente, todos vul- não só de algumas, mas de muitos milhões
neráveis. A grande artífice dessa beleza é a de pessoas, se pensarmos planetariamente.
solidariedade humana e cristã em ato. Mesmo As desigualdades são resultado das injustiças
assim, a CF sofre desgastes, é desafiada a rein- sociais, políticas, econômicas; das violências
ventar-se a cada ano, sobretudo neste tempo cometidas contra vários segmentos da
em que o “inimigo” – por meio de “inimi- sociedade; do roubo sob ameaça de ataques
gos”, daqueles que semeiam o joio venenoso sub-reptícios ou explícitos, intimidações
no meio do trigo – trabalha para destruir a morais e agressões físicas, até a morte.
fraternidade. Uma vez que o semeador é o A fraternidade comporta diferenças, não
Senhor e a Campanha é da Fraternidade, ela desigualdades. Estas precisam ser superadas e
segue seu caminho altiva, fazendo o bem. aquelas valorizadas. Não há fraternidade, do
No dia 3 de maio de 2023, o papa Francisco ponto de vista humano, quando, separados
canonizou São Charles de Foucauld, uma das por uma avenida, de um lado se encontra
suas motivações para escrever a encíclica Fratelli um dos maiores Índices de Desenvolvimento
Tutti (FT), sobre a fraternidade e a amizade Humano (IDH) e, do outro, um dos menores.
social, assim como o foram São Francisco de Como a riqueza é concentração de renda para
Assis, Martin Luther King, Desmond Tutu e alguns, em detrimento da carência de renda
Mahatma Mohandas Gandhi. Charles de Fou- para outros, é necessário afirmar que nessa
cauld foi aquele que perseguiu o caminho de situação não há fraternidade, muito menos
sua transformação pessoal até o clímax de tor- do ponto de vista cristão, do Evangelho de
nar-se “irmão de todos”, porque queria ser “o Jesus.Tudo isso fica ainda mais grave porque,
irmão universal” (FT 286-287). A fraternidade de um lado e do outro, todos os domingos,
é exigente, porque ela desce até a última raiz celebra-se a Eucaristia sem efeito algum so-
daquele que deseja ser discípulo de Jesus Cristo. bre a vida concreta, sem incidência alguma
Essa postura deixa claro que a fraterni- sobre as relações sociais, sem fraternidade
dade comporta, com largueza, as diferenças alguma, sem amor social algum, porque as
entre as pessoas, grupos e culturas, religiões desigualdades e suas causas são camufladas,
e sociedades. São diferenças que chegam a até naturalizadas e justificadas religiosamente.
alto nível de diversidade, já que todos são es- Ultimamente se têm ouvido discursos so-
sencialmente diferentes, mesmo aqueles que bre processos de reconciliação nas sociedades,
possuem elementos aparentemente de difícil como resposta às grandes polarizações em vários
aceitação.Viver e reconhecer as diferenças é campos da vida humana, familiar, social, política,

vidapastoral.com.br • ano 65 • n o 355 15


“NÃO HÁ FRATERNIDADE, DO PONTO DE
VISTA HUMANO, QUANDO, SEPARADOS
POR UMA AVENIDA, DE UM LADO SE
ENCONTRA UM DOS MAIORES ÍNDICES
DE DESENVOLVIMENTO HUMANO (IDH)
E, DO OUTRO, UM DOS MENORES.”

econômica, religiosa e cultural. Concordamos direitos e os da sua família, precisamente


que a reconciliação é uma necessidade. Entre- porque deve guardar a dignidade que lhes
tanto, ela jamais pode legitimar desigualdades foi dada, uma dignidade que Deus ama.
e posturas completamente díspares e contra- [...] O perdão não só não anula essa ne-
ditórias com relação às pessoas e aos valores da cessidade, mas reclama-a (FT 241).
humanidade, do Evangelho. Essa legitimação O importante é não o fazer para alimentar
é a prova da inautenticidade da reconciliação, um ódio que faz mal à alma da pessoa e à
porque não há conciliação entre democracia alma do nosso povo, ou por uma necessi-
e ditadura, entre fascismo e humanismo, entre dade doentia de destruir o outro (FT 242).
fundamentalismo e liberdade, entre violên-
cia e pacifismo. A reconciliação só pode ser O perdão e a reconciliação não são e
celebrada quando acompanhada de sincero nunca serão um ardil ludibriante para aliviar
processo de conversão, em que, efetivamente, falsamente as consciências e fazer de conta
haja uma mudança de mentalidade, de cora- que está tudo bem. Perdão e reconciliação
ção e de postura existencial e social. transformam a vida.
Nesse sentido, a dimensão práxica, pessoal,
comunitária e coletiva da reconciliação não 3. ...NA QUARESMA DE 2024...
pode prescindir do magistério do papa Fran- A Campanha da Fraternidade deixa-se,
cisco sobre o perdão, para que ela mesma não a cada ano, banhar na espiritualidade da
se torne um engodo espiritual. Ao tratar das Quaresma, tempo litúrgico que incentiva
“lutas legítimas e o perdão”, Francisco ensina: todos os cristãos e cristãs, na viva fé em Jesus
Cristo, à conversão, a qual deve revelar-se
Não se trata de propor um perdão re- pela mudança de visão, sentimentos, atitudes
nunciando aos próprios direitos perante e práticas. Fazer Campanha da Fraternida-
um poderoso corrupto, um criminoso de na Quaresma não é um arranjo nem,
ou alguém que degrada nossa dignidade. muito menos, uma espécie de invasão do
Somos chamados a amar todos, sem exce- território litúrgico, mas, harmonicamente,
ção, mas amar um opressor não significa considerando não só a liturgia, mas também
consentir que continue a oprimir, nem os aspectos da vivência da fé, constitui uma
levá-lo a pensar que é aceitável o que faz. oportunidade, um tempo kairológico, expres-
Pelo contrário, amá-lo corretamente é são de que todos precisamos nos converter
procurar, de várias maneiras, que deixe de ao amor ao próximo, que vemos, como prova
oprimir, tirar-lhe o poder que não sabe de amor a Deus, que não vemos, a fim de
usar e que o desfigura como ser humano. não passarmos por mentirosos (1Jo 4,20-21).
Perdoar não significa permitir que con- A oração eucarística chamada “Jesus que
tinuem a pisotear a própria dignidade e passa fazendo o bem”, entre outras, faz essa
a do outro, ou deixar que um criminoso síntese entre a liturgia e todos os esforços pela
continue a fazer o mal. Quem sofre injus- fraternidade e por um mundo melhor.A nova
tiça tem que defender vigorosamente seus tradução do Missal Romano sugere que essa

16 vidapastoral.com.br • ano 65 • n o 355


oração seja feita pelos refugiados e exilados,
pelos que passam fome, pelos cativos, prisio-
neiros, enfermos, agonizantes e em qualquer
Comunicar para humanizar –
necessidade (MISSAL ROMANO, 2023), na
A comunicação a partir do
qual se inclui a de fazermos Campanhas da
papa Francisco
Fraternidade. Em seu prefácio próprio, rezamos:
Marcus Tullius (org.)
“Ele sempre se mostrou cheio de misericórdia
para com os pequenos e os pobres, os doentes
e os pecadores, e se fez próximo dos aflitos e
oprimidos. Por sua palavra e ação anunciou ao
mundo que sois Pai e cuidais de todos os vossos
filhos e filhas” (MISSAL ROMANO, 2023).
Fazemos Campanha da Fraternidade na
Quaresma porque somos chamados, na ale-
gria do Evangelho, a sermos misericordiosos
como Jesus, atentos e operantes em relação

Imagens meramente ilustrativas.


aos pobres, doentes, pecadores, aos que vivem
na miséria e com fome, aos que esperam de
nós fraternidade e amizade social. O critério
144 págs.

fundamental e aferidor da autenticidade do CONFIRA


processo de conversão é a consciência, que VERSÃO
precisa ser crescente, de que ou nos salvamos E-BOOK
todos, ou ninguém se salva.
Mais adiante, depois de pedirmos que o
O livro retoma as profundas e
Espírito Santo nos una num só corpo, o cor-
necessárias reflexões do papa
po eclesial, rezamos, tocados profundamente: Francisco para o tempo presente,
revisitando suas mensagens para
Abri nossos olhos para perceber as neces- o Dia Mundial das Comunicações
sidades dos irmãos e irmãs; inspirai-nos Sociais. Além das mensagens,
palavras e ações para confortar os cansados a obra traz comentários escritos
e oprimidos; fazei que os sirvamos de por profissionais cristãos que, da
coração sincero, seguindo o exemplo e o pastoral à academia, atuam de
mandamento de Cristo.Vossa Igreja seja forma comprometida na área
da comunicação.
testemunha viva da verdade e da liber-
dade, da justiça e da paz, para que toda a
humanidade se reanime com uma nova Aponte a câmera do
seu celular e confira a
esperança (MISSAL ROMANO, 2023). degustação do livro!

4. ...SOBRE FRATERNIDADE
E AMIZADE SOCIAL
A fraternidade e a amizade social se ins-
Vendas: (11) 3789-4000
crevem no âmbito maior do humanismo 08000-0164011
cristão, mais precisamente do novo humanis-
mo cristão (GUIMARÃES, 2022), sustentado paulus.com.br
pela Palavra de Deus e pelo ensino social da

vidapastoral.com.br • ano 65 • n o 355 17


Igreja, agora retomado, vigorosamente, pelo aos homens e mulheres um humanismo
papa Francisco, não só na Fratelli Tutti, mas à altura do desígnio do amor de Deus
também na Laudato Si’, na Querida Amazô- sobre a história, um humanismo integral
nia, nos projetos da Economia de Francisco e solidário, capaz de animar uma nova
e Clara e do Pacto Educativo Global, bem ordem social, econômica e política, fun-
como em vários de seus pronunciamentos e dada na dignidade e na liberdade de toda
homilias, com linguagens diversas, explícita a pessoa humana, a se realizar na paz, na
ou implicitamente, como ocorre na bela e justiça e na solidariedade [...] de forma
densa Carta Apostólica Misericordia et Misera, que, assim, aparecerão, com o necessário
no encerramento do Jubileu Extraordinário auxílio da graça divina, homens realmente
da Misericórdia, e na construção de banhei- construtores de uma humanidade nova
ros para pessoas com trajetória de rua, no (PONTIFÍCIO CONSELHO JUSTIÇA
Vaticano, com tudo de que necessitam: ba- E PAZ, 2005, n. 17-19).
nho, sabonete, toalhas, roupas limpas e pas-
sadas. É o humanismo cristão “miudinho”, Ser humano! Essa é a questão para definir
em pequenos gestos, também no de abraçar a amizade social no prisma da fraternidade.
fortemente os pobres, os enfermos, sem sinal A amizade social ultrapassa os limites de
algum de aporofobia, antes a combatendo ações benéficas, porque, estando na raiz das
dura e bravamente. ações, estabelece conexão entre a unidade
O livro da Sabedoria fala da moderação e a coletividade, de modo a fazer querer
de Deus em relação a Canaã, ensinando a o melhor para a vida da sociedade, para
virtude de permanecer na exata medida, todos e cada um. A amizade social eleva
na medida do Deus que cuida de todos e a amizade e o social. Quando lançamos a
de tudo, porque atua com o princípio da luz do Evangelho sobre a amizade social,
justiça, da clemência, oferece confortadora encontramos o ensinamento de Jesus Cristo
esperança e concede arrependimento, aplica sobre o amor aos amigos: “Ninguém tem
correções com misericórdia, para que, assim maior amor do que aquele que dá a vida
procedendo, ensine ao povo que o justo deve por seus amigos” (Jo 15,13), “o que não
ser humano (Sb 12,13-22). restringe o amor universal, pois o amor gera
O próprio Jesus entrou na história e, nela, amigos” (BÍBLIA SAGRADA, 2018, nota
dialogou com a humanidade para lhe revelar de Jo 15,13).
o desígnio divino de salvação, justiça e frater- O vital testemunho de Jesus, ao dar sua
nidade. Por isso a Igreja, com sua Doutrina vida, obriga-nos a entender o Reino de Deus
Social, propõe como algo não restrito a uma organização
sociopolítica definitiva, porque o Reino de
Deus
“FAZEMOS CAMPANHA
DA FRATERNIDADE NA é, antes, testemunhado pelo progresso de
QUARESMA PORQUE uma sociabilidade humana que é para os
homens fermento de realização integral,
SOMOS CHAMADOS, NA de justiça e de solidariedade, na abertura
ALEGRIA DO EVANGELHO, A ao Transcendente, como termo referencial
SERMOS MISERICORDIOSOS para a própria, definitiva e plena realização
COMO JESUS.” pessoal (PONTIFÍCIO CONSELHO
JUSTIÇA E PAZ, 2005, n. 51).

18 vidapastoral.com.br • ano 65 • n o 355


A fraternidade e a amizade social são, ao
mesmo tempo, em si mesmas, um modo de
viver e resultado de constante exercício de soli- Infopastoral – O agir
dariedade. Observe-se, contudo, que os nomes pastoral numa sociedade
desses componentes são múltiplos para abran- em transformação
ger tudo, como aparece nitidamente abaixo:
Andréia Gripp

O princípio que hoje designamos de so-


lidariedade [...] várias vezes Leão XIII o
enuncia, com o nome de “amizade” [...];
desde Pio XI é designado pela expressão
mais significativa “caridade social”, enquanto
PauloVI, ampliando o conceito na linha das
múltiplas dimensões atuais da questão social,
falava de “civilização do amor”. João Paulo II
realça como o ensinamento social da Igreja
corre ao longo do eixo da reciprocidade
entre Deus e o homem: reconhecer Deus

Imagens meramente ilustrativas.


em cada homem e cada homem em Deus é
a condição de um autêntico desenvolvimen-
to humano (PONTIFÍCIO CONSELHO
128 págs.

CONFIRA
JUSTIÇA E PAZ, 2005, n. 103). VERSÃO
E-BOOK
O núcleo central e articulador de toda a
Fratelli Tutti é a fraternidade e a amizade social.
Pode-se começar a leitura da encíclica pelo A autora oferece aos
comunicadores católicos
capítulo VI, “Diálogo e amizade social”, para
uma nova proposta de
melhor compreender os demais capítulos e evangelização e de presença
notar o esforço de Francisco em retirar esse da Igreja no ambiente digital:
assunto do campo emocional, privado ou me- a infopastoral ou infopráxis,
ramente racional, a fim de situá-lo no campo da que nasce da convicção de
vivência, na contemporaneidade (FT 198-199). que o povo de Deus precisa
O ponto de partida é o diálogo, entendido integrar a mensagem do
como centro gravitacional da aproximação, es- Evangelho à cultura digital.
cuta, conhecimento e troca, para explicitar que
a fraternidade começa com o diálogo e poderá Aponte a câmera do
seu celular e confira a
conduzir à amizade social, com o objetivo de degustação do livro!
ajudar o mundo a ser melhor, pondo em diá-
logo as diversas culturas, também a dos meios
de comunicação, que importam muito, porque
eles podem facilitar ou dificultar decisivamen-
Vendas: (11) 3789-4000
te o processo dialógico. Por um lado, quando 08000-0164011
comprometidos com a fraternidade e a amizade
social, os meios de comunicação ajudam a nos paulus.com.br
sentirmos mais próximos uns dos outros, a nos

vidapastoral.com.br • ano 65 • n o 355 19


fazermos mais família humana, impelem-nos do “outro” e da prostração diante dele para
a buscar vida digna para todos, a tecer redes lavar-lhe os pés, já que toda a humanidade,
de comunicação humana e de encontro; por mais do que ter os pés lavados, necessariamen-
outro, há meios de comunicação capturados por te precisa fazer a experiência de abaixar-se e
pessoas de mentalidade fundamentalista, fascista, lavar os pés dos escorraçados da vida, como
excludente e violenta, produtoras de notícias fal- gesto de redescoberta da amabilidade, que
sas, cultivadoras de ódio contra a família, contra jamais permitirá que a lei seja a do “salve-se
a comunidade, contra a encarnação dos ensina- quem puder”, porque só nos salvamos juntos.
mentos de Jesus na realidade, contra o diálogo
(FT 205). A ausência do diálogo despreocupa 5. PORQUE VÓS SOIS TODOS
e desocupa a todos do bem comum (FT 202). IRMÃOS E IRMÃS (Mt 23,8)
Sabemos que o eixo fundamental da con- Chegamos ao umbral desta reflexão sobre
vivência, em qualquer sociedade, é a dignidade a Campanha da Fraternidade de 2024, evento
da pessoa humana. Diz Francisco que todo que nos colocará diante do grande desafio da
ser humano possui uma dignidade inviolável, fraternidade e da amizade social, no tempo
inalienável, em qualquer situação, que corres- da Quaresma. Sim, até aqui quisemos abrir as
ponde à natureza humana (FT 213-214). O portas para iniciar um caminho, como cris-
bem viver tem uma “gramática ética”, com tãos e cristãs, de edificação da fraternidade na
alcance e aceitação universais, e pauta o com- perspectiva da amizade social, inspirados no
promisso social, até que se estabeleça a amizade papa Francisco, porque somos todos irmãos
social – como fundamento do urgente novo e irmãs, nas palavras de Jesus:
humanismo – na sociedade que globalizou a
indiferença e agora, por uma questão de vida Quanto a vós, não permitais que vos
ou morte, precisa globalizar a fraternidade. Os chamem “Rabi”, pois um só é o vosso
princípios gramaticais desse trabalho esforçado, Mestre e todos vós sois irmãos (grifo nosso).
próprio de todo e qualquer discípulo de Jesus, A ninguém na terra chameis “Pai”, pois
são os do personalismo, da solidariedade e do só tendes o Pai celeste. Não permitais
bem comum (SORGE, 2018, p. 23). que vos chamem “Guias”, pois um só é o
A implementação desses princípios não se vosso guia, Cristo. Antes, o maior dentre
dá sem tensões, as quais, quando aproveitadas, vós será aquele que vos serve. Aquele que
geram o progresso da humanidade (FT 203). se exaltar será humilhado, e aquele que
Mais uma vez, é necessário afirmar que a se humilhar será exaltado (Mt 23,8-12,
amizade social, fruto maduro do exercício da BÍBLIA DE JERUSALÉM, 2003).
fraternidade, não é um programa romântico,
mas um programa de esforços. Embora ela seja Forte sinal é aquele dado pelo papa Fran-
laboriosa e meticulosa como a feitura de um cisco e pelo grande imã Ahmed Al-Tayyeb,
artesanato, no “manual de instrução” de sua quando se encontraram em Abu Dhabi, nos
implementação estão alguns itens facilitadores: Emirados Árabes Unidos, em 4 de fevereiro
a cultura do encontro, que o próprio papa de 2019, e assinaram juntos o Documento sobre
Francisco chama de “encontro feito cultura”, a fraternidade humana em prol da paz mundial e
encontro como cultura fraterna, que penetra da convivência comum, selando a convicção de
a alma do povo; a consciência de que a paz na que o destino da humanidade é a fraterni-
sociedade se conquista concomitantemente à dade, que galopeia para gerar a amizade so-
amizade social, pois ambas são irmãs; a alegria cial, fragmento a fragmento, até que se con-
prazerosa da alteridade, do reconhecimento solide o Reino de Deus, dom e missão.

20 vidapastoral.com.br • ano 65 • n o 355


REFERÊNCIAS BIBLIOGRÁFICAS

BÍBLIA de Jerusalém. São Paulo: Paulus, 2003. Jesus, hebreu por parte
de mãe – O Cristo
BÍBLIA Sagrada. Brasília, DF: Edições CNBB,
2018.
de Mateus
BIGO, Pierre; ÁVILA, Fernando Bastos de. Fé Alberto Maggi
cristã e compromisso social: elementos para uma
reflexão sobre a América Latina à luz da Dou-
trina Social da Igreja. São Paulo: Paulus, 1982.
CONCÍLIO VATICANO II. Documentos do
Concílio Vaticano II. São Paulo: Paulus, 1997.
DUSSEL, Enrique. Ética comunitária. Petrópolis:
Vozes, 1986.
FORTE, Bruno. Um pelo outro: por uma ética
da transcendência. São Paulo: Paulinas, 2006.
FRANCISCO, Papa. Fratelli Tutti: Carta Encí-
clica sobre a fraternidade e a amizade social.

Imagens meramente ilustrativas.


Brasília, DF: Edições CNBB, 2020.
GUIMARÃES, Joaquim Giovani Mol et al. O
288 págs.

novo humanismo: paradigmas civilizatórios para


o século XXI, a partir do papa Francisco. São
Paulo: Paulus, 2022.
JOÃO PAULO II, Papa. Centesimus Annus: Carta
Encíclica no centenário da “Rerum Nova- Um estudo sobre a figura e
os principais ensinamentos de
rum”. Disponível em: https://vatican.va/
Jesus, conforme a leitura
content/john-paul-ii/pt/encyclicals/docu-
dos textos bíblicos de São
ments/hf_ip-ii_enc_01051991_centesimus- Mateus. O livro é indicado
-annus.html. Acesso em: 8 ago. 2023. para todos os que desejam
MISSAL Romano. 3. ed. típica. Brasília, DF: aprofundar os textos bíblicos e
Edições CNBB, 2023. No prelo. suas mensagens proféticas
de salvação.
NODARI, Paulo César. Fraternidade e amizade
social: uma introdução à leitura da encíclica
“Fratelli Tutti” do papa Francisco. São Paulo:
Aponte a câmera do
Paulinas, 2022. seu celular e confira a
degustação do livro!
OLIVEIRA, Manfredo Araújo de. Desafios éticos
da globalização. São Paulo: Paulinas, 2001.
PONTIFÍCIO CONSELHO JUSTIÇA E PAZ.
Compêndio da Doutrina Social da Igreja. São Vendas: (11) 3789-4000
Paulo: Paulinas, 2005. 08000-0164011

SORGE, Bartolomeo. Breve curso de Doutrina paulus.com.br


Social. São Paulo: Paulinas, 2018.

vidapastoral.com.br • ano 65 • n o 355 21


José Pascoal Mantovani*

*Prof. José Pascoal Mantovani


é clérigo metodista, teólogo,
filósofo e pedagogo. Mestre em
Ciências da Religião e doutor em
Educação. Atualmente é professor
e coordenador do curso de
Filosofia da Faculdade Paulus de
Comunicação (Fapcom). E-mail:
prof.pascoalmantovani@gmail.com

“MAS O QUE
SERIA ISSO
PARA TANTA
GENTE?”
O sinal da
comensalidade
22 vidapastoral.com.br • ano 65 • n o 355
vidapastoral.com.br • ano 65 • n o 355 23
O tema da comensalidade marca a história das primeiras
comunidades cristãs. Assim, com base no Evangelho de João
6,1-15, apresentaremos o impacto transformador que o ato da
doação e da generosidade pode gerar – afinal de contas,
a entrega diminuta do generoso ultrapassa as sobras do faustoso.

INTRODUÇÃO de Mateus, Marcos e Lucas seguem um es-


“Tenho tão pouco para ofertar”; “Isso é quema bastante parecido, que trata do nas-
praticamente nada diante da necessidade”; cimento, do ministério e da paixão de Jesus,
“Quem sou eu para fazer alguma coisa?” o texto joanino segue outro caminho, que
Essas são algumas das expressões ouvidas poderíamos, de modo sintético, afirmar ser
diante de situações graves e intimidadoras o das questões descendentes e ascendentes
que levam os fiéis, concentrados em suas (BROWN, 1999).
fragilidades e limitações, a escolher enalte- Para explicitar a ação amorosa de Deus em
cer o problema, em vez de ser instrumentos direção à humanidade, São João evidencia o
do milagre. Em um contexto marcado pela esvaziamento do “Verbo que se fez carne e
competitividade, pela ânsia predadora pre- habitou entre nós, cheio de graça e de verdade”
sente no individualismo e pela indiferença (COMBLIN, 2009). Esse aspecto é notório
como marca cultural, é fundamental buscar entre os capítulos 1 e 11, conhecido como
caminhos para enfatizar a fraternidade e a Livro dos Sinais, em que o evangelista eviden-
amizade social. Para vencer tais correntes, cia que o Pai amou o mundo de tal maneira,
precisamos de fiéis que aceitem ser instru- que não poupou nada, nem a si mesmo. Essa
mentos nas mãos do Senhor.Afinal de contas, abordagem se inicia no prólogo (cap. 1) e se
é por meio das mãos humanas que a mão encerra na ressurreição de Lázaro (cap. 11). Já a
divina, em muitos casos, aponta seus sinais. questão ascendente está presente nos capítulos
Para desenvolver nossa reflexão, partire- 12 a 21, trecho que enfatiza a concretização do
mos do trecho do Evangelho de São João ministério de Jesus e conduz para a consumação
que narra a multiplicação dos pães e dos do projeto da paixão. Essa parte do Evange-
peixes. A ideia é apresentar a estrutura geral lho é marcada por embates com os religiosos,
do Evangelho joanino e, mais do que isso, instrução para os seus, entrega incondicional.
explicitar a importância dessa narrativa para O segundo aspecto que diferencia o texto
evidenciar a vocação da Igreja em seu caris- joanino dos sinóticos está em seu estilo litúrgico
ma do cuidado, da partilha e da fraternidade. (KONINGS, 2005). Há elementos mnemôni-
cos nos versos, ou seja, as palavras estão conec-
1. A ESTRUTURA DO tadas por linha poética, em que ideias conectam
QUARTO EVANGELHO ideias, palavras aproximam outras palavras. Esse
O Evangelho de São João, também co- elemento é típico da cultura oral que marcou a
nhecido como Quarto Evangelho, tem ca- formação desse Evangelho (KOESTER, 2005).
racterísticas bastante peculiares em relação Ainda nesse ponto, é importante destacar que
aos Evangelhos sinóticos (SILVA, 2009). Em o texto do discípulo amado faz escolha por
primeiro lugar, existe a questão da estrutura alguns termos que recebem ênfase significa-
das narrativas, pois, enquanto os Evangelhos tiva – por exemplo, a palavra “amor” aparece

24 vidapastoral.com.br • ano 65 • n o 355


44 vezes, “verdade” 46 vezes, “conhecer” 57
vezes, “mundo” 67 vezes, “testemunha” 47
vezes, “crer” 102 vezes –, em contraste com a Lendo o Evangelho segundo
ausência do termo “arrependimento” ou das 5 Mateus – O caminho do
vezes, apenas, em que a palavra “reino” aparece discipulado do Reino
(KOESTER, 2005, p. 206).
O terceiro aspecto se refere às fontes cons- Jaldemir Vitório SJ
titutivas do Quarto Evangelho. Se é possível
identificar uma fonte comum que perpassa os
Evangelhos de Mateus, Marcos e Lucas, o texto
joanino, nesse sentido, possui independência.
A escrita, a estruturação, o modo de organizar
os imbróglios e defeitos são peculiares na nar-
rativa do discípulo amado (MARGUERAT,
2009).As similitudes entre os textos joaninos e
os demais Evangelhos se devem à tradição oral
que perpassa todos os textos bíblicos – afinal de

Imagens meramente ilustrativas.


contas,“o mais fascinante ao estudar as origens
cristãs é que, apesar de serem tão diferentes e, em
alguns pontos, até divergentes, as comunidades
320 págs.

se empenham em manter a comunicação entre


elas” (NOGUEIRA, 2003, p. 125). CONFIRA
VERSÃO
De modo geral, o Quarto Evangelho E-BOOK
carrega, em sua estrutura textual, o mesmo
extrato, a mesma memória dos Evangelhos
O Evangelho segundo Mateus
sinóticos, todavia não há dependência literária
testemunha o esforço da Igreja
entre os escritos (JEREMIAS, 1991).Trata-se primitiva de manter-se fiel a Jesus
de textos que trazem marcas da cultura oral de Nazaré e ao Reino de Deus
do primeiro século, sem, contudo, enclausurar por ele anunciado. A obra oferece
os estilos, abordagens e/ou ênfases de cada pistas valiosas a quem, em meio
Evangelho. Destacaremos, assim, o papel da aos muitos desafios da fé, se
comensalidade no texto do discípulo amado. dispõe a caminhar nos passos
daquele que, até o fim, foi “manso
2. A CENTRALIDADE DA PARTILHA DO PÃO e humilde de coração”.
Destacaremos, nesta seção, a centralidade
da comensalidade no texto joanino (BULT- Aponte a câmera do
MANN, 2004). Entendemos a ideia de co- seu celular e confira!
mensalidade como hábito de partilhar refeições
à mesma mesa. Como, porém, perceber esse
ponto no texto joanino? Como dito ante-
riormente, a estrutura do Livro dos Sinais do
Vendas: (11) 3789-4000
Quarto Evangelho é marcada por sete sinais, isto 08000-0164011
é, não existem narrativas de milagres no texto
joanino (DODD, 2003). Para o evangelista, toda paulus.com.br
ação de Jesus que rompe com a lógica humana

vidapastoral.com.br • ano 65 • n o 355 25


é identificada como sinal.A ausência do termo relações humanas. Mais do que esperar milagres
“milagre” deve ser vista como elemento inten- divinos ou respostas mirabolantes, a comunida-
cional por parte do evangelista, haja vista que, de é chamada a ser vaso de barro nas mãos do
se a ação miraculosa é um fim em si mesma, oleiro, com o intuito de revelar a graça divina
o sinal, por sua vez, não está encerrado em si, em meio ao ordinário. Demonstrar a solida-
mas, em vez disso, aponta para algo maior do riedade no cotidiano. Fazer das contingências
que ele mesmo, uma vez que é apenas um sinal. do dia a dia as possibilidades da ação dos céus.
Os sinais aparecem no texto joanino em A narrativa joanina revela o nome do dis-
forma de quiasmo, ou seja, há aproximação cípulo que ficou assustado com o desafio que
e diálogo entre eles: o casamento de Caná tinha diante de si e do discípulo que trouxe a
(Jo 2) contrapõe-se ao ofício fúnebre de Lá- oferta da criança, entretanto o texto não traz
zaro (Jo 11); a cura do filho de um oficial o nome desse menino. De modo paradoxal,
(Jo 5) vincula-se à cura de um cego de nascen- quem conhece a narrativa bíblica costuma lem-
ça (Jo 9); a cura do paralítico (Jo 5) contrasta brar a existência de um menino que ofertou
com o andar sobre as águas (Jo 6). O único pães e peixes, mas, com raras exceções, lembra
sinal que fica isolado é a multiplicação dos os nomes dos discípulos presentes no episódio.
pães e peixes. A estrutura do quiasmo tem a Muitos fiéis têm a preocupação de ter seus
finalidade de potencializar essa narrativa, que nomes citados ou lembrados, mas o que o tex-
é central em relação às demais (WEGNER, to joanino nos ensina é que o ato da partilha,
2007). Desse modo, a ênfase joanina está na da entrega, é mais significativo, pois é essa ação
multiplicação dos pães e peixes. Como, porém, que fará a diferença na história das pessoas.
essa narrativa é apresentada pelo autor? É interessante notar que a singela doação da
criança foi suficiente para mobilizar o coração
2.1. A multiplicação dos pães de Jesus. Em vez de esperar que coisas gran-
A narrativa da multiplicação dos pães e diosas aconteçam, vale mais a pena a entrega
peixes, no texto joanino, carrega singularida- do que se tem. Aliás, essa postura da criança
des. São João relata que Jesus se deslocou para tensiona a lógica dominante na atualidade.
o outro lado do mar de Tiberíades e grande Qual a possibilidade de receber algo em troca,
multidão o seguiu. Jesus vai ao monte, junto algum benefício, à medida que entrega seu
com seus discípulos, próximo do período pascal. alimento? Em meio àquela multidão, não havia
Aquela grande multidão havia seguido Jesus e nada diante do menino que poderia gerar nele
seus discípulos.A pergunta que o Mestre faz a a convicção de que teria alguma retribuição
Filipe é: “Onde comprar pão para tanta gente?” pela doação. Esse ponto é significativo, uma
A resposta de Filipe é factual, concreta: seria vez que explicita a distinção entre doação e
preciso o equivalente a duzentos dias de traba-
lho para conseguir comprar comida para todas
as pessoas – afinal, segundo a narrativa, só os “EM UM CONTEXTO MARCADO
homens eram cinco mil. Diante desse cenário PELA COMPETITIVIDADE, PELA
caótico, o inusitado acontece. Quase em estilo ÂNSIA PREDADORA PRESENTE
satírico,André, outro discípulo, diz que havia um
menino, mais especificamente uma criança, que NO INDIVIDUALISMO E PELA
carregava consigo cinco pães e dois peixinhos, INDIFERENÇA COMO MARCA
“mas o que seria isso para tanta gente?” CULTURAL, É FUNDAMENTAL
Esse ponto é significativo, tendo em vista
que a experiência com Deus é mediada pelas
BUSCAR CAMINHOS PARA
ENFATIZAR A FRATERNIDADE
26 vidapastoral.com.br • ano 65 • n o 355 E A AMIZADE SOCIAL.”
investimento. Na lógica do investimento, há
expectativa do retorno, da retribuição; já na
lógica da doação, o que está em pauta é o A loucura de Deus –
desprendimento, o altruísmo, a abnegação. O Cristo de João
Continuando a narrativa da perícope, Jesus
pede que a multidão se sente na grama e, com Alberto Maggi
isso, faz um tipo de ato litúrgico inesperado:
“Jesus tomou os pães e, tendo dado graças
(eucaristes), distribuiu às pessoas” (Jo 6,11). O
que acontece nesse momento, no Evangelho
do discípulo amado, é um ato eucarístico, ou
seja, de celebração, de inclusão, de doação. Mais
do que a sobra abundante dos pães e peixes
em doze cestos, o texto joanino nos chama a
perceber que a fraternidade e a amizade social
não têm distinção religiosa, étnica, racial, po-
lítica ou quaisquer outras. Não há no trecho
nenhuma inquisição sobre o passado daquelas

Imagens meramente ilustrativas.


pessoas; aliás, mesmo após desfrutarem e viven-
ciarem a multiplicação dos pães, muitas delas
se sentiram incomodadas com as palavras de
192 págs.

Jesus e, ainda no capítulo 6, afastam-se da sua


mensagem. O que Jesus faz é incluir as pessoas
de modo incondicional; afinal de contas, CONFIRA
VERSÃO
E-BOOK
no cristianismo primitivo, sentar-se à mesa
com alguém, partilhar uma refeição cate-
A obra apresenta Jesus à luz
gorizava o indivíduo, era sinal de pertença. do Evangelho de João. O
A sacralidade na refeição não era exclusi- evangelista nos convida a
vidade cristã. O tema da comensalidade desfazer qualquer imagem
fazia parte da cultura e, consequentemen- ou concepção de Deus que
te, da religiosidade dos diversos povos que não encontre eco na figura de
estabeleciam fronteira com os judeus e, Jesus, na sua vida e no seu
posteriormente, com os primeiros cristãos ensinamento.
(MANTOVANI, 2013, p. 92).
Aponte a câmera do
A ruptura que Jesus estabelece com a pro- seu celular e confira a
degustação do livro!
moção da comensalidade é expandir as fron-
teiras do Reino de Deus. É ato de inclusão, de
amor, de acolhimento. Esse ato de Jesus ligado
à comensalidade revela seu interesse apriorís-
Vendas: (11) 3789-4000
tico em relação à pessoa humana. Sentar-se
08000-0164011
no mesmo espaço e partilhar do mesmo pão
foi o modo que Jesus escolheu para tipificar paulus.com.br
a dimensão inclusiva da casa do Pai.

vidapastoral.com.br • ano 65 • n o 355 27


“A FRATERNIDADE E A
AMIZADE SOCIAL NÃO
TÊM DISTINÇÃO RELIGIOSA,
ÉTNICA, RACIAL, POLÍTICA
OU QUAISQUER OUTRAS.”

3. MARCAS DA COMENSALIDADE (MANTOVANI, 2013, p. 93). Portanto, o


CRISTÃ princípio bíblico não está pautado na re-
É possível mensurar algumas marcas tribuição, na cooptação ou no proselitismo
na comensalidade proposta por Jesus. Em religioso, e sim, ao invés, no desprendimento
primeiro lugar, não há pré-requisito para a e na gratuidade típica da graça e do amor
participação na mesa. A mesa acolhe pes- presente no Evangelho.
soas indistintamente, sem se ater a classe so-
cial, confissão religiosa ou quaisquer outros CONCLUSÃO
predicados. É preciso considerar que a ideia preda-
Em segundo lugar, a experiência da tória do individualismo, do egoísmo e do
sacralidade, da partilha, só ocorre se hou- desprezo ao próximo só será suplantada se
ver pessoas disponíveis para doar, entregar houver mudança de mentalidade.A transfor-
indistintamente. mação no modo de pensar é o ponto inicial
Com isso, em terceiro lugar, o espaço para ações sintonizadas com o projeto do
da celebração é ampliado, pois a experiên- Reino dos Céus. O sinal da comensalidade
cia com Deus transcende quaisquer limites não tem origem no exagero ou no excesso,
geográficos. e sim na disposição em entregar.
Em quarto lugar, a mesa é ampliada, ou Se, por um lado, os olhos dos discípulos
seja, não há limite, sempre há espaço para estavam cativos aos fatos e evidências e ques-
mais uma pessoa à mesa. tionavam, de modo categórico,“o que seria
Em quinto lugar, Jesus, ao dar graças pe- isso para tanta gente?”, por outro, a entrega
los cinco pães e dois peixinhos, ensina um dos cinco pães e dos dois peixinhos rompe
coração de gratidão e contentamento. Em com esse ceticismo pragmático e expande
vez de reclamar do que faltava, sua postura a percepção do alcance dos céus. Assim,
é dar graças pelo que se tem em mãos – ou o Quarto Evangelho põe ênfase na noção
seja, a gratidão antecede a provisão. de que os sinais apontam para algo muito
Por fim, em sexto lugar, algumas pes- maior, de modo que a partilha, a doação, a
soas irão ver e desfrutar a provisão dos céus, generosidade são marcas indispensáveis para
mas, tal como na narrativa bíblica, quando aquelas pessoas que buscam ser instrumentos
se sentirem incomodadas com a mensagem nas mãos do Pai.
do Evangelho, irão abandonar o barco. Não Em tempos em que enfatizamos a fra-
é esperando a retribuição que se divide o ternidade e a amizade social, o discípulo
pão, ao contrário: é na entrega incondicional amado nos faz pensar sobre quem temos
típica da doação que se sustenta toda a sido: o discípulo que olha para o problema
ação de Jesus; afinal de contas, “partilhar da e esquece todo o resto ou o menino que
mesma refeição não harmonizou o proje- entrega, confia e descansa, sendo, dessa forma,
to de Jesus com os projetos da multidão” o que o apóstolo Paulo classifica como “vaso

28 vidapastoral.com.br • ano 65 • n o 355


de barro que carrega grande tesouro” (2Cor
4,7). Disponhamo-nos a doar, não só os bens,
mas o tempo, a atenção, os afetos, os abraços, Comentário ao
a empatia, a solidariedade. Enfim, doemos, Evangelho segundo João
ainda que seja algo aparentemente peque- Vol. 1 e 2
no e sem muito valor; entreguemos, pois,
como resposta à dilatação dos afetos, veremos Raymond Brown
grandes multiplicações acontecerem.

REFERÊNCIAS BIBLIOGRÁFICAS

BROWN, Raymond E. A comunidade do discípulo


amado. São Paulo: Paulus, 1999.
BULTMANN, Rudolf. Teologia do Novo Testa-
mento. São Paulo: Paulus, 2004.
COMBLIN, José. Jesus, enviado do Pai. São Paulo:
Paulus, 2009.
DODD, Charles. A interpretação do Quarto Evan-
gelho. São Paulo: Paulus, 2003.

Imagens meramente ilustrativas.


JEREMIAS, Joachim. Teologia do Novo Testamento.
São Paulo: Paulinas, 1991.
1736 págs.

KOESTER, Helmut. Introdução ao Novo Testa-


mento: história e literatura do cristianismo
primitivo. São Paulo: Paulus, 2005. v. 2.
KONINGS, Johan. Evangelho segundo João: amor
e fidelidade. São Paulo: Loyola, 2005. A obra contém os dois volumes
MANTOVANI, José Pascoal. Os sinais do Evan- da obra: o volume 1, intitulado
“O livro dos sinais”, aborda os
gelho de João. 2013. Dissertação (Mestrado em
capítulos 1 a 12 do Quarto
Ciências da Religião) – Faculdade de Huma-
Evangelho; o volume 2, intitulado
nidades e Direito, Universidade Metodista de “O livro da glória”, explora os
São Paulo, São Bernardo do Campo, 2013. capítulos 13 a 21.
MARGUERAT, Daniel. Para ler as narrativas bí-
blicas: iniciação à análise narrativa. São Paulo:
Loyola, 2009.
Aponte a câmera do
NOGUEIRA, Paulo Augusto de Souza. Ex- seu celular e confira!
periência religiosa e crítica social no cristianismo
primitivo. São Paulo: Paulinas, 2003.
SILVA, Cássio Murilo Dias da. Metodologia de
exegese bíblica. São Paulo: Paulinas, 2009. Vendas: (11) 3789-4000
08000-0164011
WEGNER, Uwe. Exegese do Novo Testamen-
to: manual metodológico. 5. ed. São Paulo: paulus.com.br
Paulus, 2007.

vidapastoral.com.br • ano 65 • n o 355 29


Edson Oriolo*

*Dom Edson José Oriolo, bispo da Igreja particular de Leopoldina-MG, escreve para diversas revistas e periódicos sobre gestão eclesial,
pastoral urbana e paróquias. E-mail: edsonoriolo@uol.com.br

PARÓQUIAS
À LUZ DO
DOCUMENTO
“A CONVERSÃO PASTORAL DA
COMUNIDADE PAROQUIAL A SERVIÇO DA
MISSÃO EVANGELIZADORA DA IGREJA”
O artigo apresenta pistas canônicas, teológicas e pastorais,
na perspectiva de uma “Igreja em saída”, que visam
reestruturar, reorganizar, reajustar, renovar, reorientar e
revitalizar nossas paróquias, para serem mais missionárias.
A missionariedade acontece na vida paroquial quando se supera
a pastoral da conservação.

INTRODUÇÃO que demonstra em valorizar teologicamente


No dia 27 de julho de 2020, a Congregação a missão do padre. Apontou, no entanto,
para o Clero divulgou a instrução intitulada a carência de uma linguagem mais posi-
A Conversão Pastoral da Comunidade Paroquial tiva, encorajadora e sensível, já que foca
a Serviço da Missão Evangelizadora da Igreja. O o ministério sacerdotal na perspectiva do
verdadeiro sentido da iniciativa é revelar que Código de Direito Canônico. Lembrou,
“na Igreja há lugar para todos e todos podem ainda, que os presidentes das conferências
encontrar seu lugar, respeitando a vocação de episcopais deveriam ter sido ouvidos antes
cada um”. Embora não tenha causado alarme da publicação.
na Igreja da América Latina, o documento re- O cardeal Marx, arcebispo de Munique,
percutiu na Europa, a ponto de suscitar posicio- mencionou que uma escuta mais atenta
namentos adversos entre alguns bispos alemães. entre os diferentes níveis da Igreja deveria
Os prelados alemães manifestaram suas ter acontecido. O arcebispo de Bamberg,
opiniões: o cardeal Walter Kasper fez elo- Ludwig Schick, comentou que o documento
gios ao documento, falando da preocupação nunca deveria ter sido publicado: “Trata-se

30 vidapastoral.com.br • ano 65 • n o 355


de uma instrução que faz mais mal do que são apresentadas as repartições das paróquias
bem”. O cardeal de Colônia, Rainer Woelki, nas diferentes modalidades de aplicação das
por sua vez, elogiou a instrução, pelo fato normas canônicas.
de lembrar as verdades fundamentais da fé. Fica evidente que o documento é uma sín-
Diante de tais dissensos, perguntamo-nos: tese de dois outros documentos, de quase vinte
afinal, que documento é esse? É formado anos atrás. O primeiro é resultado da ativida-
por 124 parágrafos, 183 notas de referências de de vários dicastérios da Cúria romana, ou
e 11 capítulos. Nos primeiros seis capítulos, seja, consiste em uma instrução interdicasterial,
temos uma reflexão sobre conversão pastoral, denominada Ecclesiae de Mysterio,“acerca de al-
sem qualquer citação dos textos conclusi- gumas questões sobre a colaboração dos fiéis
vos das Conferências de Santo Domingo leigos no ministério dos sacerdotes”, de 15 de
e Aparecida, nas quais o conceito foi in- agosto de 1997. Como fonte de pesquisa, foi
troduzido e desenvolvido. Fala do sentido usada também a instrução da Congregação para
missionário e do valor da paróquia na con- o Clero denominada O Presbítero, Pastor e Guia
temporaneidade.A partir do sétimo capítulo, da Comunidade Paroquial, de 4 de agosto de 2002.

vidapastoral.com.br • ano 65 • n o 355 31


“Hoje, mais do que nunca,
o território paroquial supera missionárias, numa “Igreja em saída” com
todos os limites possíveis. acento eclesiológico da missionariedade;
Nada de fronteiras, saírem da própria comodidade e terem a
nada de interdições, coragem de alcançar todas as periferias que
precisam da luz do Evangelho (cf. EG 20);
nada de limites.” irem ao encontro daqueles que são a carne de
Cristo, tocarem e assumirem seus problemas.
O estar em atitude de “saída” é pista, é diretriz,
abertura de horizonte para a vida paroquial
na dimensão da visibilidade da Igreja.
Considero como principal lacuna do
texto a ausência do significado conceitual 1. PISTAS CANÔNICAS
de “conversão pastoral” (SD 30). Sobre tal A Conversão Pastoral da Comunidade Pa-
conceito, podemos nos reportar às conclu- roquial a Serviço da Missão Evangelizadora da
sões da Conferência de Aparecida, que o Igreja é, considerando suas fontes, um do-
põe em destaque com relevância semântica. cumento acentuadamente técnico, embo-
Nessa importante conferência, encon- ra, nesse aspecto, não apresente nenhuma
tramos as seguintes considerações sobre novidade legislativa em relação à paróquia.
a conversão pastoral: “abandonar as ultra- A estrutura paroquial foi ganhando força
passadas estruturas que já não favoreçam no decorrer da história. O Concílio Vati-
a transmissão da fé” (DAp 365), realizar cano II deu ênfase ao seu papel na missão
“reformas espirituais, pastorais e também evangelizadora. Os padres conciliares anali-
institucionais” (DAp 367), “requer que as saram a evolução do sistema paroquial como
comunidades eclesiais sejam comunidades uma condição histórica do cumprimento
de discípulos missionários ao redor de Je- do mandato de Jesus. Basta percorrer os
sus Cristo Mestre e Pastor” (DAp 368); “vá documentos conciliares, o Código de Direito
além de uma pastoral de mera conservação Canônico e o Catecismo da Igreja Católica (SC
para uma pastoral decididamente missioná- 24 e 42; LG 20 e 26; CD 28-32,35 e 44; OT
ria” (DAp 370) e, finalmente, “atender às 2 e 22; AA 10,26 e 30; AG 37; PO 19-22;
exigências do mundo de hoje com indicações CDC cânones 374 §1, 515-552, 1740-1752
programáticas concretas, objetivos e métodos e ainda 89, 107, 233, 510 §2, 757, 776, 800,
de trabalho, formação e valorização dos 833, 877, 911, 958, 986, 1079, 1110 e 1272;
agentes e a procura dos meios necessários CIC 2579 e 2226).
que permitam que o anúncio de Cristo Segundo o Código de Direito Canônico,
chegue às pessoas, modele as comunidades “a paróquia é uma determinada comunida-
e incida profundamente na sociedade e na de de fiéis, constituída de modo estável na
cultura mediante o testemunho dos valores Igreja particular, cujo cuidado pastoral, sob
evangélicos” (DAp 371). a autoridade do bispo diocesano, é entregue
O novo documento, de que tratamos neste a um pároco, como pastor próprio” (CDC
artigo, apresenta três pistas para que as paró- 515, §1). Esse Código determina que “toda
quias entrem na perspectiva de uma “Igreja diocese ou Igreja particular seja dividida em
em saída”, em três eixos: canônico, teológico partes distintas ou paróquias” (CDC 374, §1)
e pastoral. Tais pistas objetivam reestruturar, e que “a paróquia seja territorial, isto é, seja
reorganizar, reajustar, renovar, reorientar e tal que compreenda todos os fiéis de um
revitalizar nossas paróquias para serem mais determinado território” (CDC 518).

32 vidapastoral.com.br • ano 65 • n o 355


Ao mencionar a questão do território, a
instrução em pauta apresenta que ele não
é apenas um espaço geográfico delimitado, Família e sexualidade –
mas também o contexto no qual cada um Desafios e novas
exprime a própria vida, feita de relações, perspectivas
de serviço recíproco e de tradições antigas.
A paróquia tem uma ligação particular Pe. Márcio José Costa Teixeira
com o território em que está situada. É um
lugar demarcado, dotado de estruturas espe-
cíficas, impregnado de significados, símbo-
los e imagens. Essa estrutura específica visa
favorecer o exercício da fé e a identidade
religiosa. Evocada como território, é um
exemplo notável de organização da vida social
e pessoal dos habitantes, pontuando o tempo
cotidiano da comunidade. Ela é o lugar para
onde confluem as tradições, as expectativas,
os problemas culturais, sociais e políticos de

Imagens meramente ilustrativas.


seus habitantes (ORIOLO, 2017, p. 23).
Há vários séculos, notam-se mudanças
nos territórios paroquiais, quer por criação
208 págs.

de novas paróquias, quer por fragmentação


de dioceses. Hoje, mais do que nunca, o
território paroquial supera todos os limites O autor ajuda o leitor a repensar
possíveis. Nada de fronteiras, nada de inter- a sexualidade humana, o
dições, nada de limites. As paróquias estão se matrimônio e a família à luz
tornando completamente difusas no novo dos desafios dos tempos atuais.
cenário do mundo urbano. Coloca-se e nos coloca no
O aspecto territorial da paróquia é um gume da espada, pois somos
fator importantíssimo, bem como a perten- chamados a, por um lado, não
rejeitar ou fragilizar a moral cristã
ça a determinada diocese, mesmo sabendo
católica e, por outro, perceber
que muito subestimam o aspecto territorial a necessidade de novos
com o surgimento das comunidades. Como discernimentos e
mantê-los? avanços pastorais.
O princípio da territorialidade da paró-
quia está sendo posto em discussão e, para Aponte a câmera do
mantê-lo nas cidades com vários territórios seu celular e confira a
paroquiais, é preciso que haja um plano de degustação do livro!
pastoral orgânico.
Hoje, também, são necessárias propostas
de solução já previstas pelo Código de Di-
Vendas: (11) 3789-4000
reito Canônico, como as “paróquias pessoais” 08000-0164011
e outras instâncias pastorais especializadas
que ultrapassam o território, mas valorizam paulus.com.br
a paróquia como “comunidade de fiéis”.

vidapastoral.com.br • ano 65 • n o 355 33


“A essência da paróquia como fonte
de vivência cristã só vai ser entendida
quando o mistério eucarístico for
o alimento para nosso caminhar
peregrino neste mundo.”

O aspecto territorial das paróquias é impor- A missão do pároco consiste em fazer que
tante para dar a concretude que o modelo da a celebração eucarística se torne o elemento
encarnação pede à Igreja. A paróquia, assim central da vida eclesial dos fiéis (CDC 528),
como a Igreja, precisa ser concreta. de sorte que tenham energia para irradiar
seu sentido de ação de graças em todos os
2. PISTAS TEOLÓGICAS momentos da vida. Pois, como o antigo Ite,
O documento apresenta a paróquia tam- missa est, do rito extraordinário, apenas insinua,
bém na perspectiva teológica. Para tal, per- nós podemos dizer claramente: “Ide, a missa
corre a história da Igreja desde o século IV, continua”, ou seja, agora é missão (ORIOLO,
fundamentando sua natureza, finalidade e 2017, p. 72). A Eucaristia aponta horizontes
missão nas mesas da Palavra de Deus e da novos para que a paróquia não fique restrita
Eucaristia, que são alicerces para motivar a ao aspecto canônico-territorial, mas vivencie
visibilidade da Igreja. A Eucaristia, celebrada seu autêntico caráter de assembleia eucarística.
e vivenciada na comunidade paroquial, deve- De acordo com o documento conciliar
rá motivar a leitura e a meditação da Palavra Christus Dominus – que considero a “carta
de Deus, para que o fiel possa participar de magna” dos responsáveis pelas paróquias –,
tantas outras mesas no mundo urbano. os párocos devem “pregar a Palavra de Deus
A paróquia, à luz da teologia eucarística, a todos os fiéis, a fim de que, fundados na fé,
faz da celebração eucarística fonte e referência esperança e caridade, cresçam em Cristo, e a
de todas as atividades sacramentais, pastorais e comunidade cristã dê aquele testemunho de
caritativas. O próprio Código de Direito Canô- caridade que o Senhor recomendou” (CD 30).
nico nos ajuda a entender que “pela Eucaristia A paróquia dispõe de meios especiais,
continuamente cresce a Igreja e, por ela, “é sobretudo a homilia, que ilumina os acon-
significada e se realiza a unidade do povo de tecimentos de cada dia, a catequese em todas
Deus e se completa a construção do corpo as idades, o contato pessoal e a pregação,
de Cristo” (CDC 897). Portanto,“o sacrifício que suscitam entre os fiéis a vocação evan-
eucarístico, memorial da morte e ressurreição gelizadora. A homilia e a catequese são os
do Senhor, em que se perpetua pelos séculos instrumentos mais adequados para obter a
o sacrifício da cruz, é ápice e a fonte de todo conversão pessoal e o testemunho da vida
o culto e da vida cristã” (CDC 897). (ORIOLO, 2017, p. 111-123).
A essência da paróquia como fonte de Os párocos devem cuidar para que a ce-
vivência cristã só vai ser entendida quando o lebração do sacrifício eucarístico seja centro
mistério eucarístico for o alimento para nosso e cume de toda a vida da comunidade cristã.
caminhar peregrino neste mundo.A paróquia, Do mesmo modo, devem empenhar-se muito
nesse sentido, é uma realidade dinâmica e viva, para que os fiéis se nutram do alimento espi-
cuja transformação visa ser realmente o espaço ritual pela piedosa e frequente recepção dos
onde o fiel possa alimentar-se do mistério de sacramentos e pela consciente e afetuosa par-
Jesus Cristo celebrado eclesialmente. ticipação na liturgia (CD 30). Celebrar bem os

34 vidapastoral.com.br • ano 65 • n o 355


sacramentos, com piedade e digna simplicidade,
é uma forma sublime de servir e amar o povo
de Deus (cf. Mc 9,29). O programa paroquial
deverá prescrever tempos fortes de oração e de Desafios atuais para
contemplação, pessoais e comunitários. a teologia
3. PISTAS PASTORAIS Urbano Zilles
Entre as prioridades pastorais na paróquia,
que certamente são muitas, a missionariedade
é a mais urgente! Continuar a missão de
Jesus não é só celebrar o culto e desenvolver
atividades pastorais, mas também abraçar um
estilo de vida que testemunhe concretamente
o amor. Caso não nos amemos entre nós,
como podemos ser ministros do amor? Na
Igreja particular, a missionariedade equivale
a “ter os mesmos sentimentos de Cristo” (Fl
2,5), no exercício da comunhão, do perdão,

Imagens meramente ilustrativas.


do acolhimento, da valorização e da abertura
ao outro.
A missionariedade só tem sentido na
216 págs.

dinâmica da verdadeira comunhão presbiteral,


para superarmos a pastoral de mera conser-
vação, que repete as mesmas fórmulas e se CONFIRA
VERSÃO
conforma com os mesmos resultados. O do-
E-BOOK
cumento ressalta que a Cúria e os organismos
de comunhão carecem de novos paradigmas
de comunhão e participação. Nossas paró- O livro aponta novos
horizontes para a teologia e,
quias precisam crescer como referencial para
consequentemente, para a Igreja
nossos fiéis, como sinais da “Igreja que vive no mundo de hoje. Reúne ensaios
entre as casas de seus filhos e filhas” (CL 26). escritos em diferentes ocasiões,
A instrução valoriza a importância dos sobre diferentes temas, com o
fiéis leigos, com a riqueza de carismas e mi- objetivo pastoral de construir uma
nistérios a serviço da paróquia, de acordo Igreja viva para um mundo novo.
com a índole própria e a formação específica.
Os fiéis leigos devem estar nos organismos
de corresponsabilidade eclesial, como os Aponte a câmera do
seu celular e confira!
conselhos para assuntos econômicos e de
pastoral paroquial, ajudando seus párocos.
Na dinâmica da missionariedade, o docu-
mento ressalta ser preciso valorizar os caris-
Vendas: (11) 3789-4000
mas, sem clericalizar os leigos nem laicizar 08000-0164011
os clérigos. Cabe-nos trabalhar para uma
reforma missionária pastoral, a fim de não paulus.com.br
cair na excessiva e burocrática organização

vidapastoral.com.br • ano 65 • n o 355 35


de eventos e numa oferta de serviços que a casa do povo de Deus, a casa onde se vive a
não exprimem a dinâmica da evangelização, fé. O problema está no modo como organizo
mas critérios de autopreservação. a paróquia. Há paróquias com secretárias pa-
Entre os imperativos diocesano e paroquial, roquiais que parecem “discípulas de satanás”:
há uma instituição fundamental e importantíssi- assustam as pessoas. Paróquias com as portas
ma para o exercício da missionariedade: a forania fechadas. Mas existem também paróquias com
(região, setor, decanato, comarca) (cf. Diretório as portas abertas, paróquias onde, quando chega
para o Ministério Pastoral dos Bispos, n. 217). O alguém com uma questão, lhe dizem:“Sim, sim...
futuro da ação pastoral das paróquias tem como Sente-se. Qual é o problema?” E escuta-se com
chave a forania. Reorganizar, posicionar, articular, paciência... porque cuidar do povo de Deus é
conscientizar, implementar, valorizar as foranias, cansativo, é cansativo!
com toda sua estrutura, é condição indispensável A paróquia é cansativa, quando está bem or-
para introduzir a renovação eclesial na diocese. ganizada. A renovação da paróquia é uma das
A palavra forania, derivada de “fórum”, coisas que os bispos devem ter sempre sob os olhos:
designa a instância apropriada para a partilha, Como está esta paróquia? Que faz? Como está
a discussão e o desenvolvimento de ações a catequese? Como é ensinada? É aberta?
evangelizadoras comuns que sejam propostas, Nas paróquias – não digo naquelas que estão
dialogadas, animadas, coordenadas e avaliadas em bairros pequenos, mas nas paróquias que estão
de modo colegiado, na consciência da mútua no centro, nas grandes avenidas –, se houver um
corresponsabilidade, em vista de uma pastoral confessionário com a luz acesa, há sempre pessoas
contextualizada, relevante e orgânica. que vão. Sempre! Uma paróquia acolhedora. E
A forania ambienta e aperfeiçoa o relacio- nós, bispos, devemos interpelar os padres sobre isto:
namento entre as diversificadas expressões do “Como está a tua paróquia? E tu sais? Visitas
“ser Igreja” para uma vivência eclesial sólida: os presos, os doentes, as velhinhas? E com as
fortalece a fraternidade presbiteral; vivencia crianças, que fazes?”
a caridade pastoral; favorece as relações entre A paróquia é importante. Alguns dizem que
o laicato e os ministros ordenados; estimula a a paróquia está ultrapassada; agora é o tem-
integração das expressões de vida consagrada po dos movimentos. Isso não é verdade! Os
à pastoral da Igreja particular; potencializa movimentos ajudam, mas não devem colocar-se
a troca de experiências entre paróquias e como alternativa à paróquia: devem ajudar na
o enfrentamento conjunto de dificuldades paróquia, fazer caminhar a paróquia, como faz
similares (ORIOLO, 2022, p. 82-84). a Congregação Mariana, como faz a Ação Ca-
tólica e muitas outras realidades. Correr atrás
CONCLUSÃO de novidades, pôr de lado a estrutura paroquial?
Como conclusão, desejo fazer memória Aquilo que vos digo talvez possa parecer uma
das palavras visionárias do papa Francisco heresia, mas é assim como eu a vivo: creio que
no encontro com os bispos poloneses em é uma realidade análoga à estrutura episcopal;
27 de julho de 2016, em que há a síntese da diferente, mas análoga.
“paróquia em saída” sonhada pelo pontífice, Na paróquia não se toca: deve permanecer
a qual se apresenta como paradigma para a como um local de criatividade, referência, mater-
conversão pastoral de nossas paróquias. nidade e o mais que seja; e, dentro disso, exercitar
a capacidade inventiva. E quando uma paróquia
A paróquia é sempre válida! A paróquia deve procede assim, realiza-se aquilo a que chamei –
permanecer: é uma estrutura que não devemos isso a propósito dos discípulos missionários – a
jogar fora pela janela. A paróquia é precisamente “paróquia em saída”.

36 vidapastoral.com.br • ano 65 • n o 355


congregations/cbishops/documents/rc_con_
É preciso inventar, procurar, sair; procurar as cbishops_doc_20040222_apostolorum-suc-
pessoas, penetrar nas dificuldades das pessoas. cessores_po.html. Acesso em: 9 ago. 2023.
Hoje, uma paróquia-escritório não serve, porque
CONSELHO EPISCOPAL LATINO-AME-
as pessoas não são disciplinadas. Vós tendes um
RICANO. Conclusões da IV Conferência do
povo disciplinado, e isso é uma graça de Deus. Episcopado Latino-americano: Santo Domingo
(SD). São Paulo: Paulinas, 1992.
REFERÊNCIAS BIBLIOGRÁFICAS
CONSELHO EPISCOPAL LATINO-AME-
RICANO E CARIBENHO. Documento de
CATECISMO da Igreja Católica. 8. ed. Petró- Aparecida (DAp). 2. ed. Brasília, DF: CNBB;
polis:Vozes, 1998. São Paulo: Paulus: Paulinas, 2007.
COCCOPALMERIO, Francesco Cardeal. A FRANCISCO, Papa. Encontro com os bispos
paróquia: entre o Concílio Vaticano II e o poloneses: diálogo. 27 jul. 2016. Disponível
Código de Direito Canônico. Brasília, DF: em: https://www.vatican.va/content/fran-
Edições CNBB, 2013. cesco/pt/speeches/2016/july/documents/
CÓDIGO de Direito Canônico.Tradução oficial papa-francesco_20160727_polonia-vescovi.
da CNBB, com notas e comentários de Jesus html. Acesso em: 9 ago. 2023.
Hortal, sj. São Paulo: Loyola, 1983. FRANCISCO, Papa. Evangelii Gaudium: Exorta-
ção Apostólica sobre o anúncio do Evange-
CONCÍLIO ECUMÊNICO VATICANO II.
lho no mundo atual (EG). São Paulo: Paulus:
Compêndio do Vaticano II: documentos, decre-
Loyola, 2013.
tos, declarações. 6. ed. Petrópolis:Vozes, 1968.
JOÃO PAULO II, Papa. Christifidelis Laici:
CONGREGAÇÃO PARA O CLERO. A Exortação Apostólica Pós-sinodal sobre a
Conversão Pastoral da Comunidade Paroquial vocação e missão dos leigos na Igreja e no
a Serviço da Missão Evangelizadora da Igreja. mundo (CL). 1988. Disponível em: https://
29 jun. 2020. Disponível em: https://www. www.vatican.va/content/john-paul-ii/
clerus.va/content/clerus/pt/notizie/new14. pt/apost_exhortations/documents/hf_jp-
html. Acesso em: 9 ago. 2023. -ii_exh_30121988_christifideles-laici.html.
CONGREGAÇÃO PARA O CLERO. O Pres- Acesso em: 9 ago. 2023.
bítero, Pastor e Guia da Comunidade Paroquial. 4 ORIOLO, Dom Edson. A revitalização da paró-
ago. 2002. Disponível em: https://www.vati- quia. Vida Pastoral, São Paulo, n. 278, p. 5-7,
can.va/roman_curia/congregations/cclergy/ maio-jun. 2011.
documents/rc_con_cclergy_doc_20020804_ ORIOLO, Dom Edson. Evangelização nas cidades.
istruzione-presbitero_po.html. Acesso em: 9 São Paulo: Paulus, 2019.
ago. 2023.
ORIOLO, Dom Edson. Francisco, bispo de Roma,
CONGREGAÇÃO PARA O CLERO et al. e a Igreja particular. São Paulo: Paulus, 2022.
Ecclesiae de Mysterio: instrução acerca de al-
ORIOLO, Dom Edson. Gestão paroquial para
gumas questões sobre a colaboração dos fiéis
uma Igreja em saída. São Paulo: Paulus, 2018.
leigos no sagrado ministério dos sacerdotes. 15
ago. 1997. Disponível em: https://www.vati- ORIOLO, Dom Edson. Paróquia e nova evange-
can.va/roman_curia/congregations/cclergy/ lização. Revista Eclesiástica Brasileira, Petrópolis,
documents/rc_con_interdic_doc_15081997_ n. 291, p. 688-697, jul. 2013.
po.html. Acesso em: 9 ago. 2023. ORIOLO, Dom Edson. Paróquia: lugar de trans-
CONGREGAÇÃO PARA OS BISPOS. Dire- missão da fé. Revista Eclesiástica Brasileira, Pe-
tório para o Ministério Pastoral dos Bispos “Apos- trópolis, n. 289, p. 181-200, jan. 2013.
tolorum Successores”. 22 fev. 2004. Disponível ORIOLO, Dom Edson. Paróquia renovada, sinal
em: https://www.vatican.va/roman_curia/ de esperança. São Paulo: Paulus, 2017.

vidapastoral.com.br • ano 65 • n o 355 37


ROTEIROS HOMILÉTICOS
Junior Vasconcelos do Amaral*
Acesse também o programa
Palavra Viva pelo QR code
ao lado.

Cada um dos roteiros está acompanhado de códigos QR que remetem para as plataformas digitais de
músicas     e       e trazem sugestões de cantos para a respectiva celebração. Ouça os álbuns
Paulus, de forma gratuita, nas principais plataformas de streaming.

SANTA MARIA, MÃE DE DEUS II. COMENTÁRIO DOS TEXTOS BÍBLICOS


1º de janeiro 1. I leitura (Nm 6,22-27)
A primeira leitura está inserida no fim
do capítulo 6 do livro dos Números, cuja
temática central é o nazireato, o voto realiza-
do por um homem ou mulher em sua con-
sagração a Deus. Nm 6,22-27 corresponde
ao ritual de bênção sacerdotal. Grosso modo,
Maria, Mãe de Jesus e nossa o livro dos Números pertence à tradição
que conhecemos como Código Sacerdo-
I. INTRODUÇÃO GERAL tal, Priestercodex. Esse ritual de bênção se
O mês de janeiro é sempre tempo de associa ao múnus santificante do povo de
recomeçar. Desejamos a todos e todas que Deus rumo à Terra Prometida, aludindo ao
nos leem um feliz ano de 2024, repleto nosso múnus santificador da Igreja hoje,
de paz, saúde e amor. Que o Bom Deus, rumo à Páscoa definitiva em Cristo. Tam-
nascido em Belém, nos acompanhe pelos bém nós somos convidados à mesma prece
caminhos do mundo.Todas as leituras deste neste primeiro dia do ano. A fórmula da
primeiro dia do ano nos levam a consi- bênção remonta a Lv 9,22-23: o ato mesmo
derar Maria como a Mãe de Deus, Jesus de Aarão, o sacerdote e irmão de Moisés,
Cristo, e também nossa Mãe – pela fé em que levanta as mãos e abençoa o povo. Esse
seu Filho. Na primeira leitura, ouvimos o rito sacerdotal é também conhecido como
relato da bênção sacerdotal, que faz brilhar cheirotonia (“ch” tem som de “r”), usado em
sobre nossa face a luz de Deus, constituin- nossas liturgias cristãs na epiclese sobre os
do-nos homens e mulheres de paz (shalom). dons do pão e vinho, pelo presbítero ou
O Evangelho nos convida a olhar, neste epíscopo que presidem a celebração euca-
tempo do Natal, para a manjedoura e ver lá rística, e, no fim, para a bênção de envio
o Amor encarnado. É com esse Amor que do povo à missão. Nm 6,22-27 reflete a
a segunda leitura nos chama a nos relacio- resposta de Deus, Adonai, à manutenção da
narmos, não como escravos, mas livres, em pureza e à generosa dedicação voluntária
Cristo Jesus, o Filho de Deus. em prol da comunidade. O texto hebraico

*Pe. Junior Vasconcelos do Amaral é presbítero da arquidiocese de Belo Horizonte-MG e vigário episcopal da Região Episcopal Nossa Senhora da
Esperança. Doutor em Teologia Bíblica pela Faculdade Jesuíta de Filosofia e Teologia (Faje – BH), realizou parte de seus estudo de doutorado na
modalidade “sanduíche”, cursando Narratologia Bíblica na Université Catholique de Louvain (Louvain-la-Neuve, Bélgica). Atualmente, é professor
na PUC-Minas, em BH, e pesquisa sobre psicanálise e Bíblia. E-mail: jvsamaral@yahoo.com.br

38 vidapastoral.com.br • ano 65 • n o 355


preserva a tradição oral do pré-exílio e mos-
tra um estilo poético como nos Salmos (cf.
Sl 67,1). O direito de invocar o nome santo Dor e prazer – O desafio
do Senhor está reservado a Aarão e aos seus da vida
filhos sacerdotes. Os conceitos de guardião
de Israel (v. 24), de resplandecimento do Antônio Bonifácio Rodrigues de Sousa
rosto de Deus ou sua presença mesma (v.
25) e de sua benignidade, face divina e paz
(v. 26, o shalom) estão aqui arquitetados e
arrematados em uma bênção, que deverá ser
pronunciada sobre os israelitas, e o Senhor
os abençoará (v. 27) de modo confirma-
tivo e afirmativo. Essa bênção tem como
elemento-chave a ideia de que o Senhor,
em tempos de angústia, teria “escondido
sua face” e abandonado seu povo (cf. Dt

Imagens meramente ilustrativas.


31,18; Sl 30,8; 44,25; 104,29). O shalom,
nessa bênção, tem sentido mais amplo, re-
fletindo a “inteireza” e o “bem-estar”.
84 págs.

2. II leitura (Gl 4,4-7) CONFIRA


A carta aos Gálatas envolve polêmica, uma VERSÃO
vez que Paulo escreve aos irmãos da Galácia E-BOOK
a fim de evitarem os erros dos judaizantes
e, assim, não se apegarem veementemente
à Lei, pois foi para a liberdade que Cristo O livro reflete sobre a temática
nos libertou (Gl 5,1). A passagem deste dia, existencial da dor e do prazer.
Gl 4,4-7, está inserida na temática sobre A busca do prazer é uma
luta cheia de desafios, que
a filiação divina do Filho de Deus, nosso
nos obrigam à superação
Senhor Jesus Cristo, “nascido de mulher, das barreiras formadas pelas
nascido sob a Lei” (v. 4), para resgatar os inúmeras circunstâncias de
que estavam sob a Lei, com a finalidade de desprazeres, sofrimentos
que recebessem a adoção filial (v. 5). É pelo e dores.
Espírito de Cristo, que clama em nós, que
dizemos Abbá, o que se traduz por “Pai” (v.
6). Nessa passagem, como em outras, Paulo Aponte a câmera do
resgata o caráter pneumatológico da carta: é seu celular e confira a
o Espírito Santo que vem em nosso socorro degustação do livro!

e nos ajuda a viver como filhos e filhas de


Deus; foi dessa mesma forma que o Filho,
Jesus, viveu, em toda a sua condição huma-
Vendas: (11) 3789-4000
na, exceto no pecado – que, infelizmente, 08000-164011
habita em nós pela liberdade que temos de
escolher, pois às vezes escolhemos errado. paulus.com.br
Paulo assim conclui: “porque sois filhos...

vidapastoral.com.br • ano 65 • n o 355 39


sois também herdeiros” da salvação de Deus o amor. Os pastores voltaram glorificando e
(v. 7). Nesse sentido, a carta aos Gálatas se louvando a Deus por tudo o que viram e ou-
define como uma espécie de “rascunho” viram, conforme lhes tinha sido dito (v. 20). O
da carta aos Romanos, pois somos todos texto conclui com o cumprimento ritual da
justificados, no Espírito que habita em nós, Lei no oitavo dia, a circuncisão do menino e
por Cristo, junto ao Pai, perfazendo assim a purificação da mãe. Foi dado ao menino o
o mistério trinitário em nossa fé batismal. nome Jesus, que significa “Deus salva”, con-
forme o anjo indicara anteriormente (v. 21).
3. Evangelho (Lc 2,16-21) Lucas assim entretece, no relato do nasci-
O Evangelho da infância, no qual o texto mento de Jesus, a tradição sobre os pastores,
desta solenidade está inserido, constitui um a visitação do anjo, a alegria típica de seu
midrash, uma forma rabínica de interpretar e Evangelho, dentro de uma colcha de retalhos
escarafunchar, na história do povo, o sentido na qual se destaca a maternidade de Maria,
do nascimento de Jesus. Belém – do hebraico, Mãe de Jesus e nossa Mãe.
Bet Helem – é a “Casa do Pão” onde nasce o
menino Jesus, numa manjedoura. Os pasto- III. PISTAS PARA REFLEXÃO
res (Lc 2,15) vão até lá para ver o Senhor. O Mostrar a relação entre as três leituras, des-
verbo utilizado por Lucas é ídomen, derivado tacando que a bênção do passado, dada pelos
de eidén, e traduz um sentido de “identificar”, sacerdotes, agora se traduz no nascimento de
“conhecer”.Trata-se de verbo frequentemente Jesus, tanto para a vida de Maria e José quanto
utilizado nos Evangelhos para traduzir essa rela- para a de todos nós, que ainda celebramos
ção estrita entre as pessoas que se conhecem, se o tempo do Natal. Enfatizar que Cristo nos
identificam umas com as outras e estabelecem libertou para vivermos não um conglome-
amizade. É interessante notar que esse verbo rado de leis e rituais, mas o verdadeiro amor
é o mesmo utilizado por Jesus quando olha a Deus e aos irmãos e irmãs. Perceber que
tanto para seus discípulos quanto para o povo a maternidade de Maria foi primeiramente
que estava como ovelhas sem pastor (Mc 6,34). vivida na fé, pois ela acolheu a Palavra de
Os pastores chegam às pressas, a exemplo Deus pelo ouvido, e agora essa Palavra nasce
de Maria, que também saiu apressadamente entre nós, renovando nossa alegria, como
para visitar sua prima Isabel (Lc 1,39).Trata-se outrora renovou a alegria dos pastores.
da expectativa feliz por se encontrarem com
o Messias. Lá eles encontram Maria, José e o EPIFANIA DO SENHOR
menino recém-nascido deitado na manjedoura 7 de janeiro
(v. 16). O verbo ver aparece novamente no v.
17: ao verem o menino, contaram o que já ha-
viam ouvido sobre ele, desde os tempos antigos.
Trata-se aqui de uma interpretação, um derash,
retirando do passado as melhores recordações,
aquilo que ficou na memória do povo. Os
pastores deixavam todos maravilhados com o Jesus é o Filho de Deus
que diziam (v. 18). Maria conservava todas as
coisas, misteriosamente, em seu coração e nelas I. INTRODUÇÃO GERAL
meditava (v. 19). O coração – em hebraico, Na solenidade da Epifania do Se-
lev –, para os judeus, é lugar das decisões mais nhor, somos chamados a contemplar Je-
importantes, lugar onde se assentam a Lei e sus como “o Senhor” que vem nos salvar.

40 vidapastoral.com.br • ano 65 • n o 355


Na primeira leitura, ouvimos Isaías, que
busca recuperar a esperança dos exilados
para reconstruírem juntos Jerusalém: a
Reflexões acerca do
luz chegou para seu povo que vivia na sentido da vida – A partir
escuridão. O Evangelho nos faz voltar o do pensamento de
olhar para a manjedoura de Jesus e, em Viktor Frankl
seu Natal, contemplar o amor de Deus Thiago Antonio Avellar de Aquino
por nossa humanidade. Com os magos,
somos animados a oferecer a Cristo ouro,
incenso e mirra, bem como ofertar aos que
sofrem a esperança, o amor e a paz. Na
segunda leitura, Paulo convida os irmãos
da comunidade de Éfeso a admitir a to-
dos “no corpo de Cristo”, que é a Igreja.
Todos são chamados a crer na pessoa de
Jesus Cristo e a ver nele a salvação.

II. COMENTÁRIO DOS TEXTOS BÍBLICOS

Imagens meramente ilustrativas.


1. I leitura (Is 60,1-6)
Isaías, em seu terceiro livro, convida
todos os ouvintes e leitores a contemplar
144 págs.

a glória de Jerusalém. Essa passagem está


ligada a um contexto de pós-exílio, no qual
o profeta, como porta-voz de Deus, repe- CONFIRA
te a mensagem consoladora do Senhor à VERSÃO
comunidade que retornou da Babilônia, E-BOOK
cuja fé e esperança devem ser sustentadas.
A princípio, no v. 1, o profeta convida a
cidade de Jerusalém a pôr-se de pé – que é o A obra tem por objetivo
sentido de prontidão para servir –, “porque servir como guia de leitura
e aprofundamento para a
tua luz é chegada, a glória do Senhor raia
compreensão da condição
sobre ti”. A terra, contudo, está coberta de humana.
trevas, alerta o profeta, e a escuridão envolve
as nações. Sobre Israel, levanta-se o Senhor,
Adonai (v. 2). Sob sua luz, caminharão as
nações e os reis no clarão do sol nascente Aponte a câmera do
(v. 3). seu celular e confira a
O profeta, no v. 4, pede que Jerusalém degustação do livro!
erga os olhos e veja que todos se reúnem
e vêm até ela. A imagem é dos filhos que
vêm de longe, e as filhas carregadas em suas
Vendas: (11) 3789-4000
ancas (v. 4). Tal imagem mostra Jerusalém 08000-0164011
como mãe que cuida, que dá de si para a
vida dos filhos, que os ensina a caminhar. paulus.com.br
É um tempo novo, como atesta o v. 5, pois

vidapastoral.com.br • ano 65 • n o 355 41


as riquezas virão de além-mar, virão para ocorreu o nascimento de Jesus. Belém era
ela os tesouros das nações. Uma horda de a cidade da bisavó de Davi, Rute (Rt 1,1-
camelos inundará a cidade, os camelinhos 4), e de sua família (1Sm 16; 17,12). Uma
de Madiã e Efa, todos os de Sabá: trarão citação de Miqueias (Mq 5,1) foi mudada
ouro e incenso, proclamando os louvores por Mateus, que trocou “clãs de Judá” por
do Senhor (v. 6). Tais ofertas aludem à vi- “regentes de Judá”, a fim de realçar o as-
sita ao Rei-Messias, imagem que prefigura pecto messiânico, acrescentando o trecho
aqueles que visitam Jesus, como atestará Mt “apascentará Israel, o meu povo”, tirado de
2,11. Esse tempo messiânico, que inspira o 2Sm 5,2. A narrativa de Mateus afirma que,
profeta, faz lembrar a glória de Jerusalém, no tempo do rei Herodes, tendo nascido
cidade santa e bem edificada, morada do Jesus em Belém, vieram magos do Oriente
grande Rei. A shequinah do Senhor lá está, a Jerusalém, perguntando: “Onde está o
e a ela as pessoas se dirigem para oferecer rei dos judeus recém-nascido?” (v. 2). Tal
incenso e ouro, oblatas que indicam a di- questão alerta a Herodes e, com ele, toda
vindade e a realeza do Senhor de Israel. a Cidade Santa. Para Herodes, não poderia
existir outro rei, pois assim seu trono seria
2. II leitura (Ef 3,2-3a.5-6) posto em xeque, e seu poder em disputa.
Paulo, na carta aos Efésios, trata sobre Herodes, o Grande, era um rex socius de
o mistério de Deus revelado em Cristo. Roma – rei vassalo do Império – que go-
Por dom de Deus e pura gratuidade, o vernou entre 37 e 4 a.C., uma figura forte
apóstolo é capaz de acolher esse mistério, e igualmente citada em Lc 1,5 como “o
assim como nós também o acolhemos em rei da Judeia”.
sua epifania, manifestação-doação. Deus Os magos, por sua vez, seguiram a es-
se revela na história da humanidade por trela, desde seu surgimento, no Oriente, e
meio de uma pessoa, Jesus Cristo. Assim, vieram para homenagear o Senhor. Podem
temos hoje o encontro com uma pessoa ser entendidos como uma casta de sábios
– não com uma doutrina, um dogma ou astrólogos ou intérpretes de sonhos, liga-
uma verdade, mas com uma pessoa – que dos também ao zoroastrismo, religião persa
pode nos levar à salvação. que definia o mundo entre bem e mal. Os
O que Deus revelou outrora, ele agora magos são apenas citados por Mateus. Na
nos revela por seus profetas e santos após- tradição cristã, posteriormente, tornaram-
tolos. Dessa maneira, Paulo está convicto -se reis, à luz da interpretação de Sl 72,10:
de que todos os pagãos estão admitidos à “Os reis de Társis e das ilhas trarão presen-
mesma salvação oferecida aos primeiros tes; os reis de Sabá e de Seba oferecerão
aos quais Deus se revelou em Jesus Cristo. dons” e de textos de Isaías (Is 49,7; 60,10).
Todos somos membros do corpo de Cristo, Uma espécie de midrash fez que essas figuras
que é a Igreja; ela tem hoje uma missão do passado dessem sentido à presença dos
especial de anunciar Jesus Cristo ao mundo, magos que visitam o Filho de Deus com
revelando-o a todos e todas, em vista da presentes. Por fim, foram nomeados como
salvação. Gaspar, Baltasar e Melquior, representando
os gentios.
3. Evangelho (Mt 2,1-12) Ao chegarem ao lugar, os magos viram
Belém, a “Casa do Pão”, é um lugar o menino, deitado na manjedoura, e sua
especial para a fé judaica e também cristã. mãe. Então fizeram, tal como na primeira
Lá nasceu o rei Davi e, segundo a tradição, leitura, suas ofertas ao Rei-Messias: ouro,

42 vidapastoral.com.br • ano 65 • n o 355


incenso e mirra. O ouro é símbolo da rea-
leza de Jesus. Já o incenso simboliza sua
divindade. Por último, a mirra é sinal de Papa Francisco –
sua humanidade, que será, no fim do Evan- As bem-aventuranças
gelho, usada para a unção do sepulcro, em e a cura do mundo
vista de sua ressurreição. O v. 12 conclui
o relato, dizendo que os magos tomaram Papa Francisco
outra direção e retornaram para casa sem
terem voltado a Herodes, que certamente
esperava informações precisas sobre onde
o menino teria nascido.

III. PISTAS PARA REFLEXÃO


Compreender que, unidas, as três lei-
turas almejam que todos sejam acolhidos
na comunidade dos fiéis e sejam luz para
o mundo, sobretudo para os desanimados.
Perceber que o Natal do Senhor renova

Imagens meramente ilustrativas.


nossa esperança de um mundo mais jus-
to e solidário. Propor que a comunidade
litúrgica se sinta chamada nesta liturgia a
unir-se sempre mais como corpo de Cris-
88 págs.

to, convidada à salvação em Jesus. Por fim,


despertar em cada fiel o ímpeto de ofer- CONFIRA
tar-se ao Senhor tal qual os magos fizeram VERSÃO
outrora, quando lhe ofereceram ouro, in- E-BOOK
censo e mirra.
Este livro contém a série de
2º DOMINGO DO TEMPO COMUM catequeses do papa Francisco
14 de janeiro sobre “as bem-aventuranças
no Evangelho de Mateus” e “a
cura do mundo”, em tempos de
pandemia da Covid-19.

Aponte a câmera do
“Encontramos o Messias, seu celular e confira a
o Cristo” degustação do livro!

I. INTRODUÇÃO GERAL
Neste 2º domingo do Tempo Comum,
Vendas: (11) 3789-4000
a Igreja nos oferece na liturgia textos vo- 08000-0164011
cacionais. Todos somos vocacionados por
Deus à vida, à santidade e a uma missão paulus.com.br
específica. A primeira leitura nos põe em

vidapastoral.com.br • ano 65 • n o 355 43


sintonia com Samuel, chamado pelo Se- A vocação de Samuel é um apelo que
nhor a servir como profeta. A segunda Deus faz não apenas ao profeta, mas tam-
leitura nos convida a compreender que bém a toda sua Igreja, incluindo a nós,
nossa vida e nosso corpo devem estar a hoje. Somos interpelados pela Palavra de
serviço de Deus e que tudo começa a partir Deus, a qual nos convida ao profetismo
do nosso encontro com Cristo – nosso – que consiste em anunciar a esperança
enamoramento por ele. No Evangelho, divina e sua consolação e, também, de-
somos conduzidos por André, irmão de nunciar as injustiças que corrompem a
Simão Pedro, a encontrar o Messias – o humanidade e a impedem de prosseguir
Cristo – e a permanecer a seu lado. Desse no caminho salvífico indicado por Deus:
modo, seremos transformados pelo Senhor a paz em busca da fraternidade universal.
em pedras vivas para a construção da Igreja, Deus acompanha aqueles que ele mesmo
sacramento universal de salvação (Lumen chamou, além de capacitá-los no caminho
Gentium, n. 48). e no projeto que devem cumprir.

II. COMENTÁRIO DOS TEXTOS BÍBLICOS 2. II leitura (1Cor 6,13c-15a.17-20)


1. I leitura (1Sm 3,3b-10.19) A chave de leitura para compreender
Estamos diante de um clássico texto esta passagem paulina sobre a dignidade
vocacional, que nos permite perceber do corpo é o v. 17, que afirma: “Quem
o agir de Deus no meio de seu povo, adere ao Senhor torna-se com ele um só
chamando seus servidores para as mais espírito”. Paulo sabe que a cidade de Co-
diversas missões. O chamado é feito a rinto tinha como lema “viver à coríntia”,
Samuel – nome que, em hebraico, pode denotando uma atitude de licenciosidade
ser traduzido por “aquele a quem Deus e laxismo, práticas que não correspondiam
escuta”. Samuel estava dormindo no tem- à dignidade com a qual o Evangelho de
plo, junto à arca da Aliança. Por três vezes, Jesus Cristo convidava seus ouvintes a viver.
o Senhor chamou-o: “Samuel, Samuel!” Viver de modo licencioso, na concupis-
O jovem vocacionado ao profetismo, não cência, não era o teor do convite feito por
percebendo que era Deus aquele que o Paulo: “O corpo não é para a imoralidade,
chamava, “pois não conhecia o Senhor” mas para o Senhor, e o Senhor é para o
(v. 7), dirigiu-se a Eli, o sacerdote do tem- corpo” (v. 13c).
plo. Por duas vezes essa cena acontece; na O apóstolo entendeu que a comuni-
terceira vez, Eli entendeu ser Deus aquele dade de Corinto estava dividida entre os
que estava chamando o jovem (v. 8), então costumes consuetudinários (comuns àquela
o instruiu, dizendo: “Volta a deitar-te e, se região) e os valores que o Evangelho lhes
alguém te chamar, responderás: ‘Senhor, procurava incutir. O supracitado v. 17 ser-
fala, que teu servo escuta!’” Pela quarta ve para compreender que quem faz uma
vez, Deus, em pé ao lado dele, chamou-o: aliança, após o convite de Jesus Cristo, tor-
“Samuel, Samuel!” E o jovem lhe res- na-se unido a ele pelo Espírito. Essa união
pondeu: “Fala, que teu servo te escuta” pneumatológica fortalece a consciência do
(v. 10). Ao final, o v. 19, que foi incluído cristão, que, conquanto viva em meio a
no texto deste domingo, diz que Samuel imoralidades – àquilo que o torna menos
crescia, que o Senhor estava com ele e digno, em razão da força pecaminosa –, é
que não deixava cair por terra nenhuma chamado à santidade de vida, unido com
de suas palavras. o Senhor.

44 vidapastoral.com.br • ano 65 • n o 355


3. Evangelho (Jo 1,35-42)
O prólogo de João – além da teologia do
Logos, a Palavra que se fez carne (Jo 1,14)
– apresenta, em sua continuação, a tradição Celebrando a vida
de João Batista. Nos Evangelhos sinóticos, em família
João é o personagem que apresenta Jesus,
preparando os caminhos para que o Senhor Dom Edson Oriolo
possa passar. É o precursor do Messias, aquele
que vem antes, apontando quem é o Filho
de Deus. João é também o Batista, pois ba-
tiza as pessoas de seu tempo, admoestan-
do-as à metanoia, que em grego significa
“arrependimento”.
No Evangelho de João, o Batista é um
mestre que ensina seus discípulos. Ao ver
Jesus passar, o profeta afirma:“Eis o Cordeiro
de Deus”. Tal afirmação quer dizer que Jesus
é, de um lado, para a comunidade joanina,

Imagens meramente ilustrativas.


símbolo da paz e, de outro, na esteira do
judaísmo, símbolo da passagem, remetendo
ao sangue do cordeiro, no contexto pascal
do livro do Êxodo. A imagem do cordeiro
48 págs.

também aparece, na tradição joanina, no livro


do Apocalipse (Ap 5,6). Nele, o Cordeiro CONFIRA
VERSÃO
está de pé no meio do trono, com aparência
E-BOOK
de morto; recebe o louvor dos seres vivos,
que aparecem juntamente com os 24 anciãos
que se prostram diante dele.
No v. 37 do Evangelho, ao ouvirem as A obra ajudará as famílias
a perceber quanto somos
palavras do Batista, os discípulos passaram
abençoados por Deus e como é
a seguir Jesus. Vendo que o seguiam, este importante louvá-lo pelas coisas
pergunta: “O que estais procurando?” Eles boas que fazem parte do
dizem: “Rabi, onde moras?” E Jesus fala-lhes: nosso dia a dia.
“Vinde ver!” Então eles foram ver onde Jesus
morava e, nesse dia, permaneceram (verbo
que se repete no Evangelho joanino) em sua
Aponte a câmera do
companhia (v. 39). Um dos que ouviram o seu celular e confira a
Batista e seguiram a Jesus era André, irmão degustação do livro!
de Simão Pedro. Ele foi até seu irmão e lhe
disse: “Encontramos o Messias”, que João
explica: “que quer dizer Cristo”.
Vendas: (11) 3789-4000
André conduziu Simão a Jesus. O Senhor 08000-0164011
viu (do verbo grego ídon – traduzido por
“ver”, no sentido de “identificar”) Simão paulus.com.br
com profundidade e disse-lhe: “Tu és Simão,

vidapastoral.com.br • ano 65 • n o 355 45


filho de João; serás chamado Cefas (que se I. INTRODUÇÃO GERAL
traduz por Pedra)” (v. 41-42). Desse modo, Jesus nos convida hoje ao seu segui-
“encontramos o Messias” é a expressão-chave mento. Tornamo-nos seus discípulos e
da celebração deste domingo. Também ne- pescadores de homens e mulheres: essa é
cessitamos descobrir em nossa existência a missão da Igreja. Na primeira leitura, o
cristã o Messias que nos chama e nos con- profeta Jonas é símbolo de resistência a
vida a permanecer com ele. Deus, mas, seduzido e conduzido por ele,
Essa narrativa vocacional, assim como a chega a Nínive com a mensagem divina e
primeira leitura, convoca-nos para seguir os o apelo à conversão. No Evangelho, Jesus
passos de Jesus Cristo e permanecer com ele. convida ao arrependimento e, anunciando a
Sermos olhados – identificados – por Jesus Boa-nova, chama seus primeiros discípulos
é, para nós, condição de possibilidade para o – e também a nós – para segui-lo. Paulo,
encantamento necessário, com base no qual na segunda leitura, faz-nos perceber que
ele conta conosco para edificar sua Igreja o tempo está abreviado, que tudo passa
como pedras vivas desse edifício espiritual rapidamente e precisamos dar sentido à
(1Pd 2,5), cujo fundamento é a fé apostólica nossa existência, cooperando com o Reino
de Pedro. Assim, formaremos uma casa espi- de Deus.
ritual – como lembra o apóstolo Pedro em
sua primeira epístola –, um sacerdócio santo. II. COMENTÁRIO DOS TEXTOS BÍBLICOS
1. I leitura (Jn 3,1-5.10)
III. PISTAS PARA REFLEXÃO Da mesma maneira que chamou Sa-
Ajudar a comunidade cristã a perceber muel, no domingo passado, Deus chama
sua vocação à vida, à santidade e à ministe- Jonas, o profeta, na liturgia deste dia. Jo-
rialidade, no contexto da sinodalidade: to- nas, do hebraico Yonáh, significa “pom-
dos “juntos-unidos” no mesmo caminho de ba” ou “mensageiro”. A pomba é um dos
Cristo Jesus. Compreender que nosso corpo, símbolos do judaísmo. O profeta Jonas é
bem como toda nossa vida física, psíquica e convidado a levar aos ninivitas a seguinte
espiritual, formam, integralmente, um lugar mensagem: “Ainda quarenta dias, e Nínive
salvífico de Deus. Ele nos quer salvos na será destruída” (v. 5). Nínive era a capital
nossa integridade. Despertar na Igreja a mis- da Assíria e havia se corrompido por seus
são de ir ao encontro de Cristo nos pobres: inúmeros pecados e idolatrias. O profeta
onde eles moram – nos asilos, nas prisões... é relutante contra Deus e não quer ir
–, também Cristo ali se encontra. Lá estão até lá; contudo, é vomitado no litoral de
nossos “Cristos abandonados”. Nínive e percorre a pé toda a cidade, até
chegar ao rei e dizer sua mensagem. O
3º DOMINGO DO TEMPO COMUM povo todo se converteu a Deus por meio
21 de janeiro do anúncio do profeta: “Vendo Deus as
suas obras de conversão e que os ninivitas
se afastavam do mau caminho, compa-
deceu-se e suspendeu o mal que tinha
ameaçado fazer-lhes, e não o fez” (v. 10).
A índole da atividade profética de Jo-
nas provoca uma comparação: um povo
“Segui-me e eu farei de vós estrangeiro (no caso, os ninivitas) é mais
pescadores de homens” temente a Deus que o próprio Israel,

46 vidapastoral.com.br • ano 65 • n o 355


a nação escolhida. Eis a grande ironia com
a qual Jonas é incapaz de conviver: o povo
judeu, ao qual ele pertence, convive natu- Evangelização nas
ralmente com o pecado, com corrupções, cidades – Raízes na
e nem sempre é capaz de ouvir a men-
teologia do povo
sagem profética da conversão, da crítica
às injustiças sociais e religiosas cometidas Dom Edson Oriolo
pela monarquia e seus súditos. Jonas gosta-
ria que Deus promovesse uma destruição,
conforme havia prometido. Contudo, o
Senhor é infinitamente misericordioso e
perdoa os pecados de seu povo. Já Jonas
se mostra um profeta duro de coração e
apenas no final da narrativa vai entender
a infinita bondade e o amor de Deus.
Jonas, mensageiro de Deus, tinha sido
levado de Jope, litoral de Israel, para a
Assíria, usando uma embarcação e sendo

Imagens meramente ilustrativas.


engolido por um peixe grande. Chegou ao
destino de sua missão, convidando todos
à conversão. Ele é imagem que antecipa
120 págs.

Cristo, pelo qual todos nós somos convi-


dados ao arrependimento e à conversão.
CONFIRA
2. II leitura (1Cor 7,29-31) VERSÃO
A chave de interpretação para a perí- E-BOOK
cope paulina de 1Cor 7,29-31 é o ver-
sículo 31b: “pois a figura deste mundo O texto apresenta perspectivas
para os que atuam na
passa”. A figura do mundo é sua imagem,
evangelização nas cidades e
eikon, que, de acordo com Paulo, é cons- se interessam por um caminho
tituída pela provisoriedade. Tudo, dessa de fidelidade à eclesiologia do
maneira, é provisório e passageiro, como Concílio Vaticano II. Constitui um
a vida humana sobre a terra. Por isso, o recurso para as pesquisas sobre
desapego desta vida terrena faz que o ser teologia pastoral e, certamente,
humano não sofra exageradamente por será apresentado e estudado nos
sua provisoriedade. cursos de Teologia.
Estamos neste mundo e vivemos as vi-
cissitudes próprias da história, entremeadas Aponte a câmera do
às nossas virtudes, forças que nos capaci- seu celular e confira!
tam para a salvação. A salvação é sempre
um dom de Deus, e não uma conquista
Vendas: (11) 3789-4000
humana, para que o ser humano não se 08000-0164011
glorie de sua salvação nem seja juiz de seu
irmão. Por isso, Paulo, no v. 29, diz que o paulus.com.br
tempo está abreviado.

vidapastoral.com.br • ano 65 • n o 355 47


3. Evangelho (Mc 1,14-20) que eles “imediatamente deixaram tudo e
O Evangelho deste domingo reúne duas seguiram Jesus” (ekoloúthesan). O verbo ako-
tradições importantes: a primeira delas, nos louthia, em grego, traduz-se por “acompa-
v. 14-15, relativa à prisão de João Batista, nhar”, “estar junto de”. O mesmo se passa
ao início do ministério de Jesus na Gali- com Tiago e João, os filhos de Zebedeu.
leia e ao anúncio do Reino de Deus; em Tornar-se pescadores de homens é
seguida, a segunda tradição, nos v. 16-20, expressão que ressignifica a função da pesca.
cuja cena se situa junto ao mar da Galileia e Pescar homens é sinônimo de salvar vidas
envolve dois relatos vocacionais, dos quatro humanas com o auxílio das redes do Evan-
primeiros discípulos chamados por Jesus gelho, que envolverá a muitos, retirando-os
(Simão e André; Tiago e João, os filhos de do mar da vida – o mar é sempre símbolo
Zebedeu). da instabilidade e do medo. A mensagem do
Na primeira seção, a prisão de João é Evangelho salva os que estão no mundo e
causa para o início do ministério de Je- sofrem com suas vicissitudes e instabilidades.
sus. Ele se dirige para a Galileia e anuncia
(kerysson) o Evangelho de Deus. O tempo, III. PISTAS PARA REFLEXÃO
kairós, abreviou-se, e o Reino de Deus está Perceber a correlação entre as leituras:
próximo. Jesus ainda acrescenta: “Conver- Jonas é um profeta que convida Nínive à
tei-vos (metanoeite, no modo imperativo) conversão e ao arrependimento, enquanto
e crede (pisteúete) no Evangelho”. Jesus Jesus é o grande profeta de Deus, que inicia
está dizendo que o tempo se abrevia e seu ministério na Galileia e também con-
é preciso, por isso, haver conversão e fé. vida seu povo ao arrependimento. Levar a
O Evangelho é o conteúdo do anúncio comunidade a perceber sua vocação à vida, à
de Jesus, cuja centralidade está no Reino santidade e ao amor ao próximo, na pesca de
(basiléia toú Theoú). homens e mulheres para Deus. Compreen-
Na segunda seção, existem dois relatos der que a Galileia é símbolo da exclusão
vocacionais, ambientados à beira do mar e da pobreza e que os pobres constituem
da Galileia. Destacamos o verbo “ver”, a opção preferencial de Jesus em sua ação
quatro vezes presente no texto de Marcos profético-missionária.
(em 1,16 e 1,19, bem como em 2,14 e
6,34). Esse mesmo verbo aparece 42 vezes 4º DOMINGO DO TEMPO COMUM
ao longo do Novo Testamento e pode ser 28 de janeiro
entendido no sentido de “identificar-se”.
Ele é processual; ou seja, não se trata de
“ver” como um simples “olhar”, e sim de
“perceber” o que está presente no outro.
Por isso, nesse processo, há uma relação
profunda. Esse verbo aparece também na
cena da multiplicação dos pães (em Mc 6) “Que queres de nós,
e no v. 34: após ver a grande multidão, Jesus Jesus Nazareno?”
sentiu compaixão (splachinizomai), pois o
povo era como ovelhas sem pastor. I. INTRODUÇÃO GERAL
Ao ver Simão e André, Jesus os convida: Deus nos chama a ser profetas. A pri-
“Vinde após mim (deúte ópiso mou), e eu vos meira leitura é um convite a refletir sobre
farei pescadores de homens”. O v. 18 afirma a missão que o Senhor concede a Josué,

48 vidapastoral.com.br • ano 65 • n o 355


que sucederá a Moisés na difícil emprei-
tada de instruir o povo, conduzindo-o à
Terra da Promessa. Na segunda leitura,
Paulo convida os homens e mulheres de Gestão paroquial –
Corinto, solteiros e casados, a não viver Para uma Igreja em saída
agoniados em meio a preocupações des-
necessárias, mas fecundar, com a própria Dom Edson Oriolo
vida e com as próprias condições, a co-
munidade cristã. No Evangelho, o profeta
Jesus de Nazaré expulsa para longe todo
espírito mau incapaz de ouvir a Boa-nova
do Evangelho que ele está anunciando.
Precisamos, antes de ser profetas, escutar
com atenção a Palavra de Deus que ire-
mos proclamar com nossas palavras, mas
sobretudo com nossa vida.

II. COMENTÁRIO DOS TEXTOS BÍBLICOS

Imagens meramente ilustrativas.


1. I leitura (Dt 18,15-20)
Deus é bom e compassivo; por isso,
suscita no meio do povo profetas que
152 págs.

proclamem sua Palavra e sua vontade. O


profeta é seu porta-voz, e o Senhor há
de prover seu povo com um profeta aos CONFIRA
moldes de Moisés. Este está próximo do VERSÃO
fim e sabe que, envelhecendo, não poderá E-BOOK
continuar a missão que Deus lhe con-
Neste livro, dom Edson Oriolo
fiou. Por ser o intercessor por excelência,
trata da gestão paroquial
Moisés clama ao Senhor que envie, em como meio que pode ajudar
seu lugar, outro que, à frente do povo, o a comunidade paroquial. A
conduza à realização do projeto divino: a paróquia representa a Igreja visível
tomada de posse da Terra Prometida. Isso espalhada por toda uma região
acontecerá, posteriormente, com a ajuda (cf. SC 42), conduzindo à unidade
e a intercessão de Josué, grande líder da as diversidades de dons que
nação. nela se encontra.
A perícope desta primeira leitura pode
ser considerada uma oração tanto de in- Aponte a câmera do
seu celular e confira
tercessão quanto testamentária, na qual
Moisés diz a seu povo: “O Senhor teu
Deus fará surgir para ti, da tua nação e do
meio de teus irmãos, um profeta como
Vendas: (11) 3789-4000
eu: a ele deverás escutar” (v. 15). Moisés é 08000-0164011
líder que tem consciência de seus limites
e, consequentemente, de seu fim. Ele não paulus.com.br
se vê insubstituível, embora seja único e

vidapastoral.com.br • ano 65 • n o 355 49


irrepetível na história salvífica de Deus. sim a completa absorção da atenção exis-
Essa seria excelente chave de interpreta- tente entre os recém-casados. O homem
ção para pensarmos nossa atuação pastoral, casado é membro de uma comunidade
no nível ou instância em que estamos na de amor; sua esposa tem o primeiro lugar
vida da Igreja. Existem pessoas em nossas (primazia), mas não o exclusivo direito à
comunidades cristãs, até líderes impor- sua afeição. A mulher não casada e a vir-
tantes, que se iludem, acreditando que, gem (em grego, parthernos) têm o mesmo
se forem tirados de suas atividades, nada dever do homem. Para Paulo, homens e
mais seguirá adiante. mulheres têm o mesmo direito e também
Essa perícope denuncia ainda a incre- os mesmos deveres. Ambos são chamados,
dulidade do povo, que diz: “Não quero igualmente, a servir a Deus com a própria
mais escutar a voz do Senhor meu Deus, vida, louvando o Criador também com a
nem ver este grande fogo, para não acabar fecundidade de suas histórias, que não se
morrendo” (v. 16). Deus, de sua parte, reduzem ao matrimônio, mas envolvem
insiste: “Está bem o que disseram. Farei uma vida de serviço à comunidade.
surgir para eles, do meio de seus irmãos,
um profeta semelhante a ti. Porei em sua 3. Evangelho (Mc 1,21-28)
boca as minhas palavras e ele lhes comuni- O Evangelho, sequência daquele do do-
cará tudo o que eu lhe mandar” (v. 17-18). mingo anterior, situa-nos ao lado de Jesus,
Deus se mostra ainda mais exigente o profeta de Deus, em Cafarnaum, na sina-
com o próximo profeta, substituto de goga, em um dia de sábado. Jesus é senhor
Moisés. Cobrará dele tudo o que for dito, também do sábado, vale recordar, como nos
não podendo tal profeta dizer nada além diz o evangelista Marcos (Mc 2,28).
do revelado por Deus. Ele deve ser fiel ao Os primeiros versículos, 21 e 22, apre-
Senhor, e não refém das próprias vontades. sentam o contexto da cena, indicando os
personagens (Jesus e algumas pessoas), a
2. II leitura (1Cor 7,32-35) atividade do Senhor – que é ensinar (em
Paulo fala à comunidade de Corinto grego, didaskalia) – e o resultado do ensino
acerca de condições sociais: dos casados, de Jesus: a admiração por causa de seu po-
que vivem o matrimônio, a comunidade der autorizado, expresso pelo termo grego
de amor; e dos solteiros, que estão livres exousian. Ele ensinava com exousia, e não
para servir a Deus. Os que vivem o enla- como os mestres da Lei, baseados em seus
ce matrimonial cuidem de agradar a seus próprios adjetivos.
cônjuges, vivendo de forma fiel e digna a O primeiro enfrentamento de Jesus no
vocação e o estado de vida. Já os soltei- Evangelho de Marcos é este: um espírito
ros e solteiras possam servir ao Senhor, endemoninhado que está no interior da
consagrando-lhe sua vida, suas atitudes e sinagoga, um homem possuído por um es-
tudo o que realizam, em prol do Reino pírito mau (v. 23). Ele grita contra Jesus:
de Deus. “Que queres de nós, Jesus Nazareno? Vieste
O apóstolo dos gentios inicia a períco- para nos destruir? Eu sei quem tu és: tu és o
pe falando da isenção de preocupações, daque- Santo de Deus” (v. 24). Seu grito constitui a
la preocupação ansiosa, que é uma carac- forma solene de reprimir a ação messiânica
terística da existência humana ainda não de Jesus, que adentra na sinagoga. Ele sabe
redimida. Paulo não tem em mente o amor de onde vem Jesus, o que veio realizar e
entre marido e mulher (Gl 5,13-14), mas também quem o enviou: o próprio Deus.

50 vidapastoral.com.br • ano 65 • n o 355


Jesus, em contrapartida, sabendo o
que o espírito maligno deseja, repreen-
de-o: “Cala-te e sai dele!” (v. 25). A ação
transformadora está explícita no v. 26: o Espiritualidade conjugal
espírito mau sacudiu o homem, deu forte e familiar
grito e, com violência, o deixou. Já o v.
27 explicita a admiração de todos os que Humberto Robson de Carvalho /
Caio Henrique Esponton
testemunham a ação salvífico-messiânica
de Jesus: ele age com exousia, com um
poder autorizado pelo Pai, que o enviou.
Os espíritos maus obedecem a Jesus: esse
é o clímax da narrativa. Jesus é um novo
didáskalo, um mestre com autoridade, capaz
de deter a resistência e a incredulidade da-
quele movimento que ocupava o interior
da comunidade de Cafarnaum, sobretudo
na sinagoga, lugar da reunião para o culto
e louvor a Deus.

Imagens meramente ilustrativas.


Em outras palavras, o espírito mau resis-
te à mensagem de Jesus, quer detê-lo, pois
conhece seu nome, sua missão e quem o
enviou. Jesus, porém, não se deixa reprimir
96 págs.

com as palavras do endemoninhado. O


Senhor traz um ensino novo, proveniente CONFIRA
de Deus, e não do rigorismo dos mestres VERSÃO
da Lei. Ao expulsar da sinagoga o espírito E-BOOK
mau, Jesus está expulsando da religião seu As reflexões propostas neste
rigorismo, que impede de ouvir o dife- livro contribuem para que a
rente em sua interpretação libertadora. Às espiritualidade cristã se torne o
vezes, os religiosos estão cheios de certezas meio pelo qual a ação pastoral
e dogmas, mas são incapazes de ouvir a paroquial seja eficaz, chegando
voz divina. O poder autorizado de Jesus às famílias atuais com o mesmo
é capaz de nos libertar do rigorismo re- amor que Cristo dispensou
ligioso e nos tornar abertos à mensagem àquelas encontradas por ele ao
longo de seu ministério.
salvífica de Deus.
Aponte a câmera do
III. PISTAS PARA REFLEXÃO seu celular e confira a
Conduzir a comunidade cristã a com- degustação do livro!
preender sua missão profética, derivada
do batismo. Somos todos profetas e pro-
fetisas de Deus, em busca de um mundo
Vendas: (11) 3789-4000
mais justo e fraterno. Compreender que 08000-0164011
a mensagem de Jesus na sinagoga consiste
em nos libertar da autossuficiência, atitude paulus.com.br
própria do espírito mau, que já parece

vidapastoral.com.br • ano 65 • n o 355 51


conhecer quem é Jesus, desejando domi- está ligado à tradição sapiencial, que traz
ná-lo. Perceber que, na comunidade cris- à tona questões sobre a finitude, a vida, o
tã, independentemente de nossa condição, sentido da existência humana e, sobretudo,
solteiros ou casados, todos podemos servir a oferta de bom senso, que seria o estado
a Deus, mas primeiramente cuidando de de sabedoria (em hebraico, shokmah), com
nossas prioridades. as quais o ser humano deve lidar. Essa sa-
bedoria é o bom direcionamento de suas
5º DOMINGO DO TEMPO COMUM ações em relação a Deus, ao próximo e a
4 de fevereiro si mesmo.
“Se me deito, penso: quando virá o
dia?”; e quando chega o dia, o ser humano
já pensa na noite. Jó está falando sobre o
sentimento que perpassa seu ser e também
o da humanidade: a insatisfação, fruto da
finitude, entremeada à angústia. Além de a
“Jesus, todos estão vida passar rapidamente, ela pode ser com-
te procurando!” parada a um sopro, a um hebel, fumaça. Essa
palavra é a mesma utilizada por Qohélet,
I. INTRODUÇÃO GERAL o autor do livro do Eclesiastes, para dizer
A liturgia deste domingo nos coloca vaidade – do latim vanitas. Aparentemente
diante das fragilidades humanas e, ao mes- pessimista, na verdade Jó é um realista que
mo tempo, diante da potencialidade divina vê sua vida passar, como a vida do povo
revelada em Jesus, o Filho de Deus. Se Jó que passa por altos e baixos, por liberdade
representa a humanidade limitada e sofre- e exílio. É preciso, contudo, dar sentido
dora, por conta da triste realidade em que à vida, às pequenas e boas experiências
está inserida, o Evangelho descortina a face que somos capazes de viver, entre ciclos
de Deus em Jesus, aquele que todos nós e estações.
estamos procurando. Jesus é o taumaturgo
do Pai, que passa por Cafarnaum, e também 2. II leitura (1Cor 9,16-19.22-23)
por nossa vida, fazendo o bem. É preciso, A primeira carta aos Coríntios é fruto
porém, que o busquemos de coração. Na da maturidade de Paulo, de sua experiência
segunda leitura, Paulo nos lembra da impe- narrativa de evangelizador. Por isso, ele diz
riosa necessidade de evangelizar, sobretudo (v. 16): “Evangelizar para mim não é um
com nossa vida e, se preciso for, com nossa motivo de glória, de ensimesmamento ou
pregação. vaidade, mas uma necessidade imperati-
va”, a qual lhe foi imposta pelo Senhor,
II. COMENTÁRIO DOS TEXTOS BÍBLICOS desde o caminho para Damasco, quando
1. I leitura (Jó 7,1-4.6-7) se converteu a Jesus, a quem perseguia.
Inserido no primeiro ciclo dos discursos Paulo conclui ainda nesse versículo: “Ai de
alternados entre Jó e seus amigos, o texto mim se eu não evangelizar”. Constitui uma
da primeira leitura corresponde a um tre- necessidade vital anunciar o Evangelho, a
cho existencial, no qual o autor questiona boa novidade de Cristo, seu amor salvífico
sobre a finitude e o sofrimento humano: pela humanidade. Paulo acredita que isso
“Não é a vida de um homem trabalho e é para ele um cargo, uma missão que lhe
luta sobre a terra?” (v. 1). O texto de Jó foi confiada (v. 17). Seu salário consiste

52 vidapastoral.com.br • ano 65 • n o 355


em anunciar o Evangelho, pois, por ele,
o apóstolo também adquirirá a graça sal-
vífica (v. 18). O Evangelho é, para Paulo,
O novo humanismo –
Paradigmas civilizatórios
trabalho e sustento, caminho de salvação para o século XXI a partir
e possibilidade para muitos outros serem do papa Francisco
conduzidos a Cristo.
Dom Joaquim Giovani Mol Guimarães, Clau-
Em uma realidade que contrapõe, de demir Francisco Alves, Robson Savio Reis Souza,
forma clara, liberdade e escravidão, o após- Adriana Maria Brandão Penzim (orgs.)
tolo se vê livre para ser escravo de todos, a
fim de comunicar o Evangelho de Cristo,
levando outros à mesma libertação pro-
pugnada pela Boa-nova de Cristo. Paulo
assumiu a fraqueza para ajudar os fracos a
ganhar a fortaleza (v. 22). O apóstolo dos
gentios se faz tudo pelo Evangelho, para
ganhar, pelo mesmo Evangelho, a salva-
ção. Ter parte na Boa-nova de Jesus é, para
Paulo, uma necessidade, pois o Evangelho

Imagens meramente ilustrativas.


de Cristo é o próprio Cristo que vem sal-
var o mundo (v. 23).Tudo pelo Evangelho
é o desafio para nós, evangelizadores do
640 págs.

presente. Tomar parte nesse Evangelho é


vivê-lo com nossa vida e, se for preciso,
pregá-lo por palavras, como nos lembra CONFIRA
São Francisco de Assis. VERSÃO
E-BOOK
3. Evangelho (Mc 1,29-39)
A passagem do Evangelho de Marcos
proclamada neste domingo apresenta um A obra reflete sobre a urgência
momento especial para Jesus: o dia de Ca- de um novo humanismo. A
publicação reúne diversos artigos
farnaum. Trata-se de um dia que serve de
de estudiosos sobre o tema,
paradigma narrativo e teológico para todos além de pensamentos
os demais dias da evangelização de Jesus. do papa Francisco.
Após ter chamado seus quatro primeiros
discípulos, o Mestre vai com eles para a casa
de Simão, a quem posteriormente chamará
Aponte a câmera do
Pedro, e seu irmão André. A casa é o se- seu celular e confira a
gundo cenário para a ação taumatúrgica de degustação do livro!
Jesus em Marcos: primeiro foi a sinagoga –
conforme o episódio do domingo passado –,
no interior da qual Jesus fez calar um es-
Vendas: (11) 3789-4000
pírito imundo que estava em um homem. 08000-0164011
Agora, os discípulos comentam com Jesus
que a sogra de Simão, aquele discípulo que paulus.com.br
os recebia em casa, estava de cama e com

vidapastoral.com.br • ano 65 • n o 355 53


febre. Jesus tocou-a com a mão, levantou-a o Evangelho apresenta.Ajudar a comunidade
e a curou. Em seguida, a mulher curada a orar como Jesus, em meio às dificuldades
pôs-se a servi-los (diekonein é o verbo grego do dia a dia, e convidar a todos para juntos
utilizado por Marcos). evangelizarmos, sobretudo os fracos e pe-
À tarde (v. 32), levaram a Jesus todos cadores, os vulnerabilizados.
os doentes, e ele expulsou os demônios
que possuíam aquelas pessoas. Os demônios 6º DOMINGO DO TEMPO COMUM
eram a melhor explicação para as doenças 11 de fevereiro
que não tinham diagnóstico confirmado
pela ciência da época. Sem condições de
obter um diagnóstico seguro, muitos eram
considerados possuídos ou simplesmente
amaldiçoados, por causa de seus pecados
ou dos pecados de seus antepassados.
Na madrugada (v. 35), Jesus se dirigiu “Eu quero: fica curado!”
a um lugar deserto para orar. Orar era es-
sencial para ele, a fim de continuar inti- I. INTRODUÇÃO GERAL
mamente relacionado com aquele que o Se, por um lado, a liturgia nos põe diante
tinha enviado ao mundo, o Pai. Simão e os da exclusão e do mal causados pela doença
discípulos o procuraram a fim de que con- então conhecida como lepra, por outro,
tinuasse suas curas e milagres. Jesus, porém, apresenta-nos a inclusão e o bem protago-
respondeu: “Vamos para as outras aldeias e nizados por Jesus, que diz: “Eu quero: fica
povoados da redondeza”. E acrescentou: curado!” As palavras de Jesus têm poder
“Pois foi para isso que vim”. Jesus passou de incluir e salvar: essa é a mensagem do
por toda a Galileia, e sua fama se espalhou. Evangelho do dia. A primeira leitura lem-
Ele pregava nas sinagogas e expulsava os bra-nos o que aconteceu com Naamã, o
demônios (v. 39). sírio, purificado de sua doença ao realizar
Para Marcos, o dia de Cafarnaum é indis- o que o profeta Eliseu lhe havia pedido.
pensável para marcar a popularidade de Jesus. Na segunda leitura, Paulo nos convida a
Trata-se de um dia revelatório da exousia ser seus imitadores, assim como ele imita
de Jesus, do seu poder autorizado por Deus. a Cristo, buscando em tudo o bem dos
Jesus é o taumaturgo do Pai, aquele que vem irmãos.
realizar a plenitude da criação. É o Messias
por palavras e por obras. Ele ensina, cura e, II. COMENTÁRIO DOS TEXTOS BÍBLICOS
gradativamente, vai aproximando cada vez 1. I leitura (2Rs 5,9-14)
mais as pessoas de Deus. Naamã, o sírio, está com uma doença
de pele e vai até Eliseu – um homem
III. PISTAS PARA REFLEXÃO reconhecido como poderoso em razão
Mostrar a relação entre as três leituras, de seus milagres –, na esperança de que
destacando a primazia do amor de Deus o profeta o toque. Contudo, Eliseu diz,
revelado em Jesus, o Filho, que vem salvar por meio de um mensageiro, que Naamã
o que está decaído e submerso no pecado. deverá lavar-se sete vezes no rio Jordão
Evidenciar que a vida, embora seja difícil de para ser curado. O general sírio, reticente,
ser vivida, como retrata a primeira leitura, questiona a atitude do profeta de mandar-
deve ser tomada com a esperança e a fé que -lhe um servo dizer tais palavras (v. 11).

54 vidapastoral.com.br • ano 65 • n o 355


Na verdade, esperava que Eliseu saísse para
recebê-lo de pé, que invocasse sobre ele
o nome do Senhor e o tocasse com sua
A comunicação da Igreja
católica na América Latina –
mão. Naamã também questiona o fato de O que nos ensinam os
ter de banhar-se no rio Jordão, uma vez documentos do Celam
que, em sua terra, há outros dois rios mais
caudalosos e importantes – o Abana e o Ricardo Alvarenga
Farfar –, que ele julga serem melhores do
que todas as águas de Israel (v. 12). Indig-
nado, Naamã dá meia-volta.
Na Antiguidade, a doença então deno-
minada lepra sujeitava as pessoas a viver nas
saídas das cidades e a não se relacionarem
fisicamente com os outros. Constituía uma
doença excludente, que retirava da pessoa
a possibilidade de conviver e de tocar em
outras por causa do risco de transmissão,
situação que perdurou até pouco tempo

Imagens meramente ilustrativas.


atrás, a ponto de muitos doentes serem
levados a leprosários.
Contudo, na cena do relato, os servos
168 págs.

de Naamã o convencem a mudar de ideia:


“Senhor, se o profeta te mandasse fazer
uma coisa difícil, não a terias feito? Quan- CONFIRA
to mais agora que ele te disse: ‘lava-te e VERSÃO
ficarás limpo’”. Na verdade, eles tocam E-BOOK
a consciência do seu senhor, que fez um
esforço para vir a Israel e agora deve ouvir A obra é fruto do esforço
a mensagem do profeta Eliseu. O v. 14 compreensivo de entender como
descreve que ele desceu e mergulhou sete o catolicismo, nesta parte do
globo, tratou a temática da
vezes no Jordão, conforme a orientação do
comunicação e de que forma
profeta. Depois disso, sua carne se tornou os meios comunicativos foram
semelhante à de uma criança, pois ele ficou utilizados e interpretados pela
purificado. Naamã, antes incrédulo, con- Igreja ao longo dos anos.
verte-se à mensagem profética de Eliseu.
Tudo isso por intercessão de seus servos,
Aponte a câmera do
que são, para nós, neste trecho, símbolos seu celular e confira a
de fé. degustação do livro!

2. II leitura (1Cor 10,31-11,1)


Paulo, nesta altura de sua carta, convi-
Vendas: (11) 3789-4000
da a comunidade de Corinto a imitá-lo, 08000-0164011
ele que é imitador de Cristo e vive sua
vida iluminada pela ressurreição do Se- paulus.com.br
nhor (v. 1). “Quer comais, quer bebais”

vidapastoral.com.br • ano 65 • n o 355 55


corresponde às atitudes basilares da pessoa puro” ou “purificar” (v. 40). A fé do doente
humana, às suas necessidades vitais. Isso o faz burlar a lei do distanciamento; sua fé
e tudo o mais devem ser realizados para o aproxima de Jesus. Sua iniciativa se dá,
a glória de Deus, e não como efeito das exclusivamente, pela fé. Por sua vez, no v.
idiossincrasias e misérias humanas. No en- 41, Jesus, cheio de compaixão (em grego,
tendimento de Paulo, o importante para splanchinistheis), comovido interiormente,
o cristão é não ser pedra de tropeço e de estendeu a mão, tocou nele e disse: “Eu
escândalo para o próximo. Ser motivo de quero: fica curado!” As palavras de Jesus
tropeço para o outro, seja judeu, seja grego, levam o doente à cura, à sua purificação.
seja ainda um cristão da Igreja de Deus (v. No v. 42, o evangelista Marcos afirma que
32), não é honroso. o homem ficou puro.
A comunidade eclesial deve ser lugar Jesus o mandou embora para cumprir
de fraternidade, no qual deve imperar o o ritual de apresentar-se ao sacerdote, que
amor, e não a busca de vantagens pessoais. o declararia puro, de acordo com a lei de
A Igreja deve ser lugar em que se almeja Lv 14. “Não contes nada disso a ninguém”
a salvação para todos, e não o privilégio (v. 44) corresponde ao segredo messiâni-
de alguns, em detrimento do sofrimento co, comum ao Evangelho de Marcos e,
e exploração de muitos. A essência da co- por isso, comum também aos Evangelhos
munidade cristã é o amor fraterno. sinóticos. No entanto, assim que ele par-
tiu, começou a proclamar e divulgar o
3. Evangelho (Mc 1,40-45) fato (v. 45). Esse que conta e divulga os
Jesus é o taumaturgo por excelência, fatos, supostamente, é o homem curado.
capaz de recriar o decaído. Para o Evan- Há, contudo, quem sugira que o pronome
gelho de Marcos, Cristo tem poder sobre “ele” possa ser atribuído também a Jesus.
as doenças, incluindo aquela que acometia Dessa maneira, diluiria o efeito do segredo
o homem da perícope em análise, do qual, messiânico, pois Jesus mesmo teria contado
diferentemente de Naamã, não sabemos o que fez, a cura praticada. O fim do v.
o nome, mas reconhecemos a fé. A lepra 45 afirma que, em razão de tal divulgação,
bíblica – em hebraico, sara‘at, no Antigo Jesus já não podia entrar publicamente nos
Testamento, e lepra no Novo Testamen- lugares e de toda parte as pessoas vinham
to – era um termo geral para designar para que ele pudesse curá-las.
qualquer doença repulsiva relacionada à Jesus é o taumaturgo do Pai que segue,
escamação da pele, como psoríase e der- em sua vida itinerante, curando e purifi-
matite seborreica. Por exemplo, o livro do cando as pessoas de suas misérias e pecados.
Levítico, mais especificamente o capítulo Que ele continue a agir por meio de nos-
13, descreve os vários tipos de enfermi- sas atitudes no interior das comunidades
dade e sua detecção pelo sacerdote, que cristãs! Que sejamos casa de clemência e
declarava, no final do tratamento, a pessoa misericórdia, na acolhida aos nossos irmãos
pura ou impura. e irmãs, como exorta o papa Francisco em
O homem leproso (do grego, lepros) sua ação pastoral.
aproxima-se de Jesus e, ajoelhado, suplica-
-lhe: “Se queres, tens o poder de curar-me” III. PISTAS PARA REFLEXÃO
(ou, no grego marcano, “purificar-me”). O Mostrar a sintonia existente entre as
verbo encontrado no texto grego é katha- leituras e como elas nos convidam à fé em
risai, que pode ser traduzido por “declarar Deus, que age em Jesus, purificando-nos

56 vidapastoral.com.br • ano 65 • n o 355


de nossas impurezas, sobretudo a incre-
dulidade. Propor à comunidade cristã a
vivência da fé em Cristo, sobretudo o
amor e a compaixão. Refletir sobre as ex-
clusões que podemos promover na Igreja,
nas situações em que julgamos as pessoas.
Evidenciar o Deus da inclusão revelado
na face de Jesus, que sente compaixão
por todos nós.

QUARTA-FEIRA DE CINZAS
14 de fevereiro

Conheça as
belíssimas
“Ficai atentos!” canções que
I. INTRODUÇÃO GERAL preparamos para
A Quarta-feira de Cinzas é marco de
um tempo novo, repleto de significados você meditar
e símbolos que nos preparam para a Pás-
coa do Senhor Jesus. Iniciamos tanto o
durante a
tempo quaresmal quanto a Campanha
da Fraternidade de 2024. Nesta, medi-
Quaresma.
tamos o tema: “Fraternidade e amizade
social”, convidados pelo lema bíblico de
Mateus (Mt 23,8): “Vós sois todos irmãos
e irmãs”. Na primeira leitura, o profeta
Joel nos convida ao arrependimento. Já na
segunda leitura, Paulo nos convida a ser
embaixadores da ação salvífica de Cristo,
unindo as pessoas a Deus. No Evangelho,
Jesus nos ensina novas práticas de piedade: Ouça agora!
a verdadeira esmola, a oração sincera e o
agradável jejum.

II. COMENTÁRIO DOS TEXTOS BÍBLICOS


1. I leitura (Jl 2,12-18)
A situação denunciada pelo profeta Joel
é alarmante, por isso é necessário arre-
pendimento e conversão. “Voltai para mim
com todo o vosso coração, com jejuns,

vidapastoral.com.br • ano 65 • n o 355 57


lágrimas e gemidos” (v. 12). Jejuar, chorar e imperativo. Paulo exorta a comunidade
gemer são atos de arrependimento, expres- de Corinto à reconciliação com Deus. A
sões de quem está arrependido pelo mal comunidade é chamada a superar as bar-
cometido. O v. 13a diz: “rasgai o coração, e reiras, intrigas e divisões; deve tornar-se
não as vestes; e voltai para o Senhor, vosso ponte entre os irmãos e Deus.
Deus”. Esse é um gesto profético de ira, O v. 21 expande o sentido do papel de
de não contentamento com as próprias Cristo na reconciliação: “Aquele que não
atitudes. Em seguida, o v. 13b apresenta os conhecera o pecado, Deus o fez pecado”.
atributos de Deus: “benigno, compassivo, Cristo é reconhecido em Hebreus (Hb
paciente, cheio de misericórdia e inclinado 4,15) como aquele que não tem pecado
a perdoar o castigo”. (cf. 1Pd 2,22; Jo 8,46; 1Jo 3,5). Entretanto,
Em momento algum Joel desaprova o por opção de Deus (Rm 8,3), ele passou
culto, mas este deve estar acompanhado a estar naquela relação com o Pai que
de uma convocação à interioridade: “de normalmente é resultado do pecado. Ele
todo vosso coração” (v. 12). O resultado tornou-se parte da humanidade pecadora
esperado do arrependimento é que tal- (Gl 3,23), a fim de que, por ele, nos tor-
vez Adonai, o Senhor, agirá de acordo nássemos justiça de Deus.
com os atributos listados anteriormente Já em 6,1, somos chamados a cola-
(v. 13b). O povo é chamado, por duas borar com Paulo, Timóteo e Apolo na
vezes, a arrepender-se (v. 12-13). Assim, missão que eles receberam de Cristo, por
Adonai voltará a ter misericórdia. Cabe comunhão. Paulo estimula os líderes da
tocar a trombeta em Sião (v. 15-17), não comunidade de Corinto a colaborar com
apenas em ocasiões militares (Os 8,1), mas a obra salvífica de Cristo. O dia da sal-
também para o culto (Sl 81,4; 150,3), por vação se aproxima, o tempo da graça de
ocasião da Pessach (Páscoa) e do Sukkot Deus, o kairós.
(Tabernáculos). Há um detalhe acerca dos
convidados ao jejum: fala-se em anciãos 3. Evangelho (Mt 6,1-6.16.18)
e infantes, noivo e noiva, mas faltam o Mateus convida sua comunidade à prá-
rei e os governantes. Isso nos sugere que tica da atenção (em grego, proséxete), que é
essa profecia seja do tempo pós-exílico. a mesma atenção com a qual este tempo da
Também os ministros sagrados choram Quaresma merece ser vivido: “Ficai atentos
em lamentos: “Onde seu Deus está?”, fa- para não praticar a vossa justiça na frente dos
zendo-nos recordar o livro dos Salmos homens só para serdes vistos por eles” (v. 1).
(Sl 42,4.11) e os dos profetas Miqueias Grosso modo, a ética cristã, o modus vivendi ao
(Mq 7,10) e Malaquias (Ml 2,17). O v. qual Jesus exorta seus seguidores, neste pri-
18 conclui, esperançosamente, dizendo: meiro discurso de Mateus, deve ser superior
“o Senhor encheu-se de zelo por sua terra à forma de viver dos seguidores da Lei. Jesus
e perdoou o seu povo”. chama os discípulos e seus ouvintes a seguir
a ele, a nova Lei. Por isso, Jesus está como
2. II leitura (2Cor 5,20-6,2) um novo Moisés, sentado sobre a montanha
Exercer a função de embaixadores signi- e ensinando (Mt 5,1). Sentar-se é o modo
fica prolongar a missão salvífica de Cris- como o mestre, didáskalo, ensina.
to. “Deus mesmo vos exorta” significa o O Evangelho deste dia está inserido no
respeito de Deus mesmo pela liberdade “Discurso da montanha” (Mt 5-7). Do pon-
de suas criaturas. “Reconciliai-vos” é um to de vista bíblico, poderíamos considerá-lo

58 vidapastoral.com.br • ano 65 • n o 355


como uma sabedoria escatológica, ética ou
também como lei – percebida como instru-
ção (Torá) –, com vistas ao Reino vindouro,
que não se impõe de maneira coercitiva, mas O discernimento
escatológica e misteriosamente.
Mateus oferece a seus ouvintes-leitores
uma reforma nas obras de piedade: a esmola Papa Francisco
(v. 1-4), a oração (v. 5-15) e o jejum (v. 16-
18). Jesus, portanto, é o novo Moisés que
reformula os sistemas legais antigos com nova
concepção, nova forma de viver, como se
fosse vinho novo colocado em odres novos
(Mt 9,17) para os novos seguidores.
A esmola é uma forma de relacionar-se
com o outro que nada tem. No entanto,
não pode ser realizada da mesma maneira
que os outros agiam: “quando deres esmola,
não toques a trombeta diante de ti, como

Imagens meramente ilustrativas.


fazem os hipócritas nas sinagogas e nas ruas,
para serem elogiados pelos homens”. Jesus
afirma: “Em verdade vos digo: eles já rece-
beram a sua recompensa. Ao contrário, que
72 págs.

a tua mão esquerda não saiba o que faz a tua


direita” (v. 2-3). Jesus os convida a uma nova
forma, gratuita e não retributiva, de viver a
tsedaqah (termo aramaico para “justiça”, que O livro é um conjunto de
quer dizer “esmola”). Viver a nova justiça palestras de catequese do papa
(dikaiosyne) proposta por Jesus é viver com Francisco com a temática do
retidão e de forma justa, não hipócrita. discernimento, que consiste na
Hypókrites era um termo do teatro para capacidade de reflexão do ser
significar “ator”. Ele também é usado em humano, junto à Palavra de Deus,
para saber como levar a vida de
Mt 23 para designar os falsos intérpretes das
maneira livre e agradável.
Escrituras, os mestres religiosos que falham
em sua missão. Ser hipócrita significa fazer
tudo para aparecer, para tirar proveito da
esmola dada. O cristão, pelo contrário, deve
Aponte a câmera do
fazer tudo em silêncio e de forma modesta. seu celular e confira a
A oração é uma forma de relacionar-se degustação do livro!
com Deus, pelo diálogo sincero e fiel (v. 5-6).
Deve ser espontânea comunhão pessoal com
Deus, para nosso benefício. Ele sabe daqui-
Vendas: (11) 3789-4000
lo de que necessitamos. A oração alimenta 08000-0164011
nossa fé e nos insere na missão. Em Mateus,
Jesus ensina, na sequência do texto, a oração paulus.com.br
espontânea do pai-nosso (v. 7-15).

vidapastoral.com.br • ano 65 • n o 355 59


O jejum é a forma de nos relacionar- Santo, que o impulsiona a ir pela Galileia
mos com nós mesmos, controlando nossos proclamando o Evangelho e salvando a
desejos e paixões (v. 16-18). Novamente, todos. Na segunda leitura, Pedro recorda
Mateus utiliza o termo hipócritas, referin- que o dilúvio é o “batismo antecipado”
do-se aos atores que se desfiguram histe- por Deus, uma forma de Ele abrir a cons-
ricamente, quando estão jejuando, só para ciência dos homens e mulheres para a
se mostrarem piedosos. Essa falsa piedade salvação.
não agrada a Deus nem faz bem àquele
que a pratica. Pelo contrário, quando jejuar, II. COMENTÁRIO DOS TEXTOS BÍBLICOS
o discípulo de Jesus deve lavar o rosto e 1. I leitura (Gn 9,8-15)
perfumar a cabeça, retratando a alegria. A primeira leitura propõe à Igreja me-
Todas essas práticas de piedade, agora na ditar a recriação da parte de Deus. Em
perspectiva teológica do Senhor, terão sua infinita bondade e compaixão, ele es-
sentido novo e serão recompensadas por tabelece uma aliança (em hebraico, berit),
Deus, o Pai. um pacto com Noé. Este é chamado por
Deus a construir uma arca e, por meio
III. PISTAS PARA REFLEXÃO dela, salvar das águas sua família e todas as
Perceber a relação teológica existente criaturas. Assim, Noé é obediente a Deus e
entre as três leituras, que convidam à pe- faz tudo o que ele ordena. Se em Gênesis,
nitência, ao arrependimento e à prática do por um lado, vemos a criação e o pecado
amor cristão. Levar a comunidade cristã às que entra no mundo, por outro, vemos a
verdadeiras práticas de piedade: esmola, ora- recriação e a aliança sendo cumprida por
ção e jejum. Propor a leitura e meditação da parte de Deus, por causa da obediência
Campanha da Fraternidade, que visa à vida humana.
fraterna na comunidade de fé. O v. 9 trata exatamente da berit, o pacto
ou aliança, estabelecida por Deus com Noé
1º DOMINGO DA QUARESMA e sua descendência. De Adão e Eva até Noé
18 de fevereiro e sua família, a humanidade é descenden-
te. Se nessa descendência encontramos as
imperfeições humanas, há também nela a
capacidade de abrir-se à aliança com Deus.
Assim, o teólogo jesuíta Pe. Karl Rahner
diz que o ser humano é capax Dei, ou seja,
“capaz de Deus”, aberto à transcendência
“Convertei-vos e crede e ao transcendental, que é Deus mesmo.
no Evangelho” Deus se revela ao ser humano e se comu-
nica com ele (Dei Verbum, n. 2).
I. INTRODUÇÃO GERAL Os v. 9-11 estabelecem os acordos, pro-
A Quaresma é um tempo propício para messas e cláusulas da aliança: nenhuma
nossa conversão. Na primeira leitura, o criatura será exterminada, não haverá outro
narrador bíblico nos faz recordar o dilúvio dilúvio. Há ainda, nos v. 13-14, um sinal
como oportunidade para Deus transformar estabelecido pelo Criador: um arco nas
a humanidade com sua Aliança. No Evan- nuvens. E, no v. 15, o Criador reafirma
gelho, Jesus vence as tentações: o Filho sua aliança, ratificando que já não haverá
de Deus está acompanhado pelo Espírito dilúvio.

60 vidapastoral.com.br • ano 65 • n o 355


2. II leitura (1Pd 3,18-22)
Em leitura e exegese tipológicas (em gre-
go, typós), Pedro alude à arca de Noé, en- Igreja em saída sinodal para
as periferias – Reflexões sobre
tendendo-a à luz do sacramento do batismo.
a I Assembleia Eclesial da
“À arca corresponde o batismo, que hoje é a América Latina e do Caribe
vossa salvação” (v. 21). Pelo batismo, somos
mergulhados em Cristo, morremos para o Geraldo Luiz de Mori / Francisco de Aquino
pecado e ressurgimos para uma vida nova. Júnior (orgs.)
Pedro lembra que Cristo morreu por nossos
pecados, o justo pelos injustos (v. 18). Ele é
nosso justificador. Essa teologia de Pedro é
encontrada também na carta de Paulo aos
Romanos (Rm 5,1).
Nesse trecho (v. 21), há um sentido novo
para compreender o batismo, não como mero
rito de passagem, e sim como realidade que
abre a consciência humana, a fim de que esta
seja recriada e deixe a condição de pecado:

Imagens meramente ilustrativas.


“mas é um pedido a Deus para obter uma
boa consciência, em virtude da ressurreição
de Jesus Cristo”. O v. 22 lembra-nos que
216 págs.

Cristo está à direita do Pai. De certa maneira,


essa leitura nos ajuda a compreender a teo-
logia da primeira leitura, na qual o dilúvio CONFIRA
não é apenas sinal de morte e condenação, VERSÃO
mas também de recriação, de recomeço para E-BOOK
a nova humanidade que estabelece com Deus
uma nova aliança. Oferece a agentes de pastoral
uma compreensão aprofundada
3. Evangelho (Mc 1,12-15) do significado e do alcance
O Evangelho deste domingo pode ser da Assembleia Eclesial da
América Latina e do Caribe nos
dividido em duas partes principais. Os v.
processos de reforma da Igreja
12-13 apresentam Jesus sendo levado para implementados pelo
o deserto a fim de ser tentado por satanás papa Francisco.
durante quarenta dias; já os v. 14-15 mostram
que, após a prisão de João, Jesus inicia sua
Aponte a câmera do
missão na Galileia: anunciar o Evangelho seu celular e confira a
de Deus. degustação do livro!
O número quarenta é símbolo de trans-
formação, de uma geração, de uma vida. Por
isso dizem que “a vida começa aos 40”. A
Vendas: (11) 3789-4000
quarentena é necessária para que uma doen- 08000-0164011
ça viral possa deixar o organismo humano.
Sobre isso, tivemos triste experiência global paulus.com.br
com a pandemia da Covid-19. Quarenta foi

vidapastoral.com.br • ano 65 • n o 355 61


a quantidade de anos que o povo de Deus pecaminoso de sempre e voltar o coração
peregrinou pelo deserto até chegar à Terra para Deus. É isso que Jesus deseja a todos
da Promessa. A Quaresma é tempo, assim, nós neste tempo quaresmal.
de acompanharmos os passos de Jesus, que
vence as tentações e assume sua consciência, III. PISTAS PARA REFLEXÃO
sempre crescente, de Filho de Deus. Levar a comunidade cristã a perceber
É o Espírito que conduz Jesus (do grego, a aliança que Deus estabelece com a hu-
ekballein – literalmente,“jogado”), para dizer manidade e também com todos nós, hoje,
que o Filho de Deus não tinha outra opção em Jesus. Evidenciar que somos chamados
senão assumir o projeto querido por seu Pai. à salvação em Cristo. Propor um itinerário
É o Espírito que o conduz nesse tempo; por quaresmal pelo qual chegaremos à Páscoa
isso, mesmo em um deserto, Jesus não está só, transformados em novas criaturas, sobretu-
mas, pela oração, conecta-se a Deus e vive do agindo com amor para com os irmãos
em profunda comunhão com ele. Jesus, em e irmãs.
Marcos, não sofre três tentações, como em
Mateus e Lucas. Isso significa que as ten- 2º DOMINGO DA QUARESMA
tações, para a tradição marcana, serão para 25 de fevereiro
toda a vida do Filho de Deus, e, por isso,
ele deverá vencê-las. Os anjos o serviam
(v. 13), embora convivesse entre os animais
selvagens, símbolo das forças malignas que
o tentavam. O anjo, entendido como men-
sageiro, é, nas Escrituras, sempre sinal do
próprio Deus. “Este é meu Filho amado.
Os v. 14-15 informam que, após a prisão Escutai o que ele diz!”
de João, o Batista, Jesus foi para a Galileia. Lá,
começa sua missão salvífica como novo Mes- I. INTRODUÇÃO GERAL
sias. A missão de Jesus é uma Nova Aliança, A Quaresma é tempo de revelação e de
definitiva e plena. Por isso, ele vai, paulatina encontro com a Palavra de Jesus, o Filho de
e progressivamente, salvando as pessoas todas Deus. Na primeira leitura, ouvimos a narra-
que encontra ao longo do caminho e com as tiva de Gênesis acerca do sacrifício de Isaac,
quais se relaciona. Jesus tem compaixão das não consumado em virtude da providente
pessoas, toca-as, conversa e alimenta-se com intervenção de Deus. Abraão é ouvinte fiel
elas, vive seu cotidiano e as salva, liberta-as da Palavra do Criador. O Evangelho nos
de seus pecados, cura suas limitações físicas convida a ouvir a Palavra de Jesus Cristo,
e espirituais. o Evangelho do amor. Na segunda leitura,
Ir pela Galileia “pregando o Evangelho de Paulo convida a comunidade romana a crer
Deus” significa, para Jesus, viver a Boa-nova que Cristo morreu por nossos pecados como
da salvação e anunciá-la para todos, sem vítima de expiação.
excluir ninguém, sobretudo os pecadores.
Por isso, Jesus diz:“Convertei-vos (em grego, II. COMENTÁRIO DOS TEXTOS BÍBLICOS
metanoiete) e crede (em grego, pisteúete) no 1. I leitura (Gn 22,1-2.9a.10-13.15-18)
Evangelho”. O verbo metanoeite vem de me- A primeira leitura, relacionada quase sem-
tanoia, que significa mudar a direção do pen- pre ao Evangelho do dia, convida-nos a com-
samento, ultrapassar o mesmo pensamento preender a fidelidade de Abraão, chamado

62 vidapastoral.com.br • ano 65 • n o 355


a sacrificar seu filho Isaac no monte Moriá
(v. 1-2). Jesus, no Evangelho, também sobe
ao monte da transfiguração e é por Deus Santo Agostinho – Um
confirmado como seu Filho amado. pensador eternamente
No Oriente Médio Próximo, sabe-se que contemporâneo
havia a prática de sacrifícios humanos, sobre-
tudo de crianças, a fim de “aplacar a ira dos Pedro Calixto / Cristiane N. A. Ayoub (orgs.)
deuses”. Deus, Adonai, porém, não deseja
que tal prática continue, providenciando, no
lugar do menino Isaac, um carneiro, que,
imolado, é servido em holocausto (palavra
que significa “queimar por inteiro”). Não
obstante, é admissível perceber também
nesse relato que a fidelidade e a obediência
de Abraão são testadas. Este, de sua parte,
atende ao pedido de Deus (v. 9-10), que não
leva adiante o sacrifício, mas fica contente
com a fidelidade daquele que ele chamou

Imagens meramente ilustrativas.


em Gn 12,1.
Os v. 11-12 evidenciam, pela voz do anjo
celestial, a intervenção do Senhor, que in-
216 págs.

terdita tal prática, observando também que


Abraão é um homem temente a Deus. O v.
13 apresenta o sinal da Providência divina CONFIRA
VERSÃO
em favor de Abraão, que vê um carneiro
E-BOOK
preso pelo chifre e o oferece em sacrifício.
Deus, por meio do anjo, confirma sua Esta coletânea de textos sobre
bênção a Abraão, alicerçada em sua fidelidade Santo Agostinho traz valiosas
e temor a Adonai. Os v. 16-18 testemunham traduções – realizadas pelos
que Deus confia naquele que primeiramente organizadores do livro – de
confiou em sua palavra e agiu conforme sua artigos escritos por estudiosos
ordem; por isso, tornará seu povo numeroso renomados que se dedicam
e forte para conquistar tudo o que desejar aos temas tratados pelo Doutor
de Hipona, com prefácio do
sobre a terra.
professor Moacyr Novaes.

2. II leitura (Rm 8,31b-34)


Aponte a câmera do
Na cristologia da carta aos Romanos, seu celular e confira a
Deus não poupa seu Filho, mas o entrega degustação do livro!
como vítima de expiação por nós (v. 32).
Essa certeza teológica responde à inquieta-
ção paulina: “Se Deus é por nós, quem será
Vendas: (11) 3789-4000
contra nós?” (v. 31b).Tal pergunta explicita, 08000-0164011
na linguagem de Paulo, a imagem de um
tribunal de justiça, uma vez que a tese fun- paulus.com.br
damental de Romanos é a justiça de Deus

vidapastoral.com.br • ano 65 • n o 355 63


em Cristo. O plano salvífico de Deus atesta a natureza gloriosa da experiência, a qual
aos cristãos que Deus está do seu lado – essa Pedro parece querer prolongar. A tenda é
é a certeza que fecunda o solo do coração lugar da habitação, porém o Transfigurado
de Paulo. não necessita se fixar. Ele é luz que não
O trecho “não poupou seu filho” (v. 32) pode ser apreendida. O narrador diz que
talvez seja uma alusão a Gn 22,16, no qual Pedro não sabia o que estava dizendo (v. 6).
se diz que Abraão não poupou seu filho A sugestão de Pedro é construir três tendas
Isaac. Portanto, Deus, o juiz, já pronunciou a para prolongar esse momento, provavelmente
sentença em nosso favor: ele nos salvou por uma alusão ao êxodo, com a festa dos Ta-
seu Filho. Assim, poupou o filho de Abraão, bernáculos (Lv 23,39-43).
substituindo-o por um cordeiro, em alusão Outro símbolo fenomênico do Antigo
tipológica ao Cordeiro de Deus que tira o Testamento é a nuvem (v. 7), que acompa-
pecado do mundo (Jo 1,29). nhava o povo pelo deserto (Ex 16,10; 19,9;
24,15-16; 33,9), durante a peregrinação até a
3. Evangelho (Mc 9,2-10) Terra Prometida. Nessa nuvem e nas palavras
A narrativa do Evangelho deste domin- que dela ecoam está o clímax da narrativa
go é conhecida como a cena da transfigu- desse Evangelho, quando o Pai enuncia: “Este
ração. Segundo Marcos, Jesus subiu a uma é o meu Filho amado. Escutai o que ele diz!”
alta montanha e se transfigurou diante de A ordem de ouvir Jesus talvez aponte para
seus discípulos: mudou de figura, eviden- as predições de sua paixão (Mc 8,31; 9,31;
ciando a ressurreição. O que se pode dizer 10,33-34). Nas predições, aparece o verbo
é que a transfiguração antecipa aquilo que “ressuscitar”.
está para acontecer com Jesus no fim; em O fim da teofania indica, no v. 8, a centra-
sentido literário e narrativo, tratar-se-ia de lidade de Jesus: “não viram mais ninguém”.
uma narrativa proléptica, que antecipa algo Jesus é o centro do Evangelho. No desfecho,
que acontece no final de uma obra. o Filho de Deus ordenou o “segredo messiâ-
Jesus leva consigo Pedro, Tiago e João e, nico” – que não contassem nada a ninguém –,
diante deles, numa alta montanha, transfi- e seus discípulos conversavam sobre o que
gura-se. O termo grego usado por Marcos é significava “ressuscitar dos mortos”.A dúvida
metemorphóte, que significa “mudou de figu- dos discípulos era sobre como Jesus poderia
ra”. O v. 3 destaca a brancura das roupas de ressuscitar dos mortos antes e à parte da res-
Jesus. Roupa branca, nas Escrituras, é símbolo surreição universal, que ocorreria na vinda
da divindade. O v. 4 apresenta Moisés e Elias, do Reino de Deus.
a Lei e os Profetas, que autorizam a teofa-
nia na montanha. São a síntese do Antigo III. PISTAS PARA REFLEXÃO
Testamento: a Lei em Moisés e a profecia Buscar perceber a relação entre o filho
em Elias antecipam a chegada messiânica Isaac, levado ao sacrifício não realizado, e
de Jesus. A Lei e os Profetas são promessas; Jesus, o Filho de Deus, que revela em si
Jesus é a consolidação. o sacrifício perfeito e pleno. Confirmar a
Em meio a essa teofania, Pedro deseja comunidade de fé na certeza de que Jesus
levantar três tendas (v. 5), como os antigos morre para nos salvar por amor, não ape-
no deserto. O título cristológico encontrado nas para cumprir uma lei. Perceber que o
nesse versículo é Rabbi, que quer dizer “Mes- Pai hoje deseja nos revelar seu Filho e nos
tre”. Em Mt 17,1, encontramos “Senhor”, chama a ouvi-lo em seu Evangelho, que nos
e em Lc 9,33, “Mestre”. O que é bom é convida ao amor.

64 vidapastoral.com.br • ano 65 • n o 355


Dividida em cinco volumes,
volumes, a coleção apresenta, com base nos
ensinamentos da Palavra de Deus e da Igreja, um itinerário dinâmico e
pedagógico de estudo e preparação para a iniciação à vida cristã. São
subsídios pensados para a concretização da missão da Igreja de conduzir
o ser humano para “a alegria do encontro vivo e pessoal com Cristo”.
CONFIRA!

loja.paulus.com.br Aponte a
(11) 3789-4000 | 08000-164011 câmera do
vendas@paulus.com.br seu celular e
saiba mais!
@editorapaulus
UM JEITO JOVEM DE
APRENDER SOBRE A FÉ!

A coleção YOUCAT conta com vários volumes e oferece conteúdos que vão enriquecer
Neste livro,dedoestudos
sua rotina renomado artista
de forma leveplástico brasileiro
e dinâmica. Cláudio
Catecismo, Pastro,
doutrina é possível
da Igreja eo
conhecer os mais belos trabalhos de arte sacra, presentes em uma cuidadosa
Evangelho de Cristo são exemplos dos temas abordados nessa coleção incrível. Confira!
compilação do autor. A obra possui uma introdução e 16 capítulos que
harmonizam textos e ilustrações. Ao todo são cerca de 600 imagens coloridas,
entre fotos, reproduções
• YOUCAT deConfi
– Update! pinturas
ssão! •conceituadas, em mais
Bíblia jovem – Youcat de 300
• DOCAT: comopáginas.
agir? O livro
também oferece outros
• Youcat: cursorecursos
sobre a fé •como
Youcata–caracterização
catecismo jovem estética da arte cristã em
da Igreja católica
cada período
• Youcat parada história.
crianças Umaorações
• Youcat: obra impecável,
para jovens •que motiva
Youcat uma reflpara
– preparação exão sobre o
a Crisma
espaço sagrado, a partir da arte e da beleza presentes na iconografia cristã.

Aponte a
loja.paulus.com.br
paulus.com.br/loja câmera do
11 3789-4000 | 0800-0164011 seu celular e
vendas@paulus.com.br saiba mais!
@editorapaulus

Você também pode gostar