Você está na página 1de 2122

Giovanni Seabra

(organizador)

Fórum Internacional do Meio Ambiente

A Conferência da Terra
Questões Ambientais Globais e Soluções Locais

Editora Universitária da UFPB


João Pessoa - PB
2008
UNIVERSIDADE FEDERAL DA PARAÍBA
reitor
RÔMULO SOARES POLARI
vice-reitora
MARIA YARA CAMPOS MATOS

EDITORA UNIVERSITÁRIA
diretor
JOSÉ LUIZ DA SILVA
vice-diretor
JOSÉ AUGUSTO DOS SANTOS FILHO
supervisor de editoração
ALMIR CORREIA DE VASCONCELLOS JUNIOR
Capa: Eric Seabra
Editoração: Ivo Thadeu Lira Mendonça
E-mail: gs_consultoria@yahoo.com.br

C748 A Conferência da Terra: Fórum Internacional do Meio


Ambiente. Questões globais e solução locais./ Giovanni de
Farias Seabra (organizador).– João Pessoa : Editora
Universitária da UFPB, 2008.
2.122 p.: il.
ISBN: 978-85-7745-209-3

1. Meio ambiente. 2. Questões ambientais. 3. Terra.


4. Recursos naturais. I. Titulo. II. Seabra, Giovanni de
Farias

UFPB/BC
CDU : 504

As opiniões externadas nesta obra são de responsabilidade exclusiva dos seus autores.

Todos os direitos desta edição reservados à GS Consultoria Ambiental e Planejamento do Turismo Ltda.

Impresso no Brasil
Printed in Brazil
Foi feito depósito legal
APRESENTAÇÃO

A
Assembléia das Nações Unidas elegeu 2008, como o Ano Internacional do
Planeta Terra, com a finalidade de promover e incentivar o desenvolvimento de
programas sustentáveis e manutenção da vida. Visando ampliar as discussões
sobre os temas globais e as implicações locais, a Universidade Federal da Paraíba - UFPB, está
realizando o Fórum Internacional do Meio Ambiente - A Conferência da Terra, na cidade de João
Pessoa - PB, Brasil, no período de 21 a 24 de maio de 2008. A Conferência da Terra reunirá
cientistas renomados, cujos trabalhos apontam as alternativas para o futuro comum com melhor
qualidade ambiental. O evento teve o apoio de outras instituições de pesquisa, como a Universidade
Federal de Pernambuco - UFPE, Universidade Federal do Ceará - UFC, Universidade Federal da
Bahia - UFBA, e Universidade Estadual de São Paulo - UNESP.
O tema geral da Conferência da Terra - as questões ambientais globais e soluções locais -
proporcionou melhor compreensão dos fenômenos naturais, antrópicos e sociais, sugerindo
alternativas limpas para reduzir seus efeitos nas sociedades humanas e ecossistemas naturais. As
atividades programadas incluem conferências, palestras, debates, grupos de trabalhos, relatos de
experiências científicas e mini-cursos. O aquecimento do sistema climático é inequívoco e
evidenciado através da constatação das mudanças de temperatura na atmosfera e massas oceânicas,
derretimento das calotas polares, desaparecimento das geleiras no alto das montanhas e aumento do
nível do mar. Os ambientes urbanos tornam-se insuportáveis para a vida humana, sobretudo em
função do modelo econômico consumista. São agravantes para o ambiente urbano, os
congestionamentos de veículos, a poluição do ar, excesso de edifícios, expansão das áreas
periféricas e o nível elevado de ruídos.
No mundo atual está havendo incremento na mudança dos ventos e das correntes
marítimas, salinização das águas continentais, chuvas abundantes e furacões em determinadas áreas,
enquanto noutras observa-se o agravamento das secas e da desertificação. Extensas áreas agrícolas
estão sendo comprometidas pelo mau uso do solo, desperdício de água e uso indiscriminado de
defensivos químicos. Com o objetivo de mudar a conduta das sociedades humanas e os padrões de
consumo, cientistas de vários países apontam soluções, permitindo às nações criar as condições
necessárias para intervenções adequadas, impondo limites à emissões dos países industrializados,
incentivos à limitação no países em desenvolvimento e apoio à geração de energia limpa.
As mais respeitadas instituições científicas asseguram que estão acontecendo alterações
ambientais no Planeta com graves conseqüências para a manutenção da vida. Programas de
monitoramento e controle ambiental têm revertido o processo de degradação de alguns
ecossistemas. O somatório e ampliação dessas medidas, a partir de expressiva mobilização social e
esforço conjunto das nações, poderá impedir o esgotamento dos recursos naturais, essenciais à
permanência da vida na Terra.
O Brasil, por sua diversidade natural e socioeconômica, constitui um cenário ideal para a
reflexão das questões ambientais globais e apresentação das alternativas na solução dos problemas
locais. No Estado da Paraíba os efeitos das alterações ambientais globais são evidenciadas, numa
realidade constatada através dos elevados índices de acompanhamentos da natureza (ou naturais),
desertificação e o avanço regular das águas oceânicas sobre a zona costeira.

Giovanni Seabra
SUMÁRIO

I. ÉTICA, CIDADANIA E MEIO AMBIENTE ....................................................................... 20


ÉTICA E RESPONSABILIDADE AMBIENTAL: UMA ABORDAGEM DA RELAÇÃO ENTRE
A COMUNIDADE ACADÊMICA E O CAMPUS UNIVERSITÁRIO.................................. 20
A FORMAÇÃO CIDADÃ É FUNDAMENTAL PARA A EDUCAÇÃO AMBIENTAL .............. 28
ÉTICA E GESTÃO AMBIENTAL: ANÁLISE DO PROCESSO DE IMPLANTAÇÃO DO
PROJETO DE ESGOTAMENTO SANITÁRIO DAS PRAIAS DO MUNICÍPIO DE
PARNAMIRIM – RN ............................................................................................................... 34
UMA ÉTICA DA RESPONSABILIDADE ECOLOGICA .............................................................. 41
A AULA–CAMPO COMO EXERCÍCIO DA CIDADANIA: UM RECURSO PEDAGÓGICO NO
ENSINO DE GEOGRAFIA...................................................................................................... 47
PELA COMPLEXIDADE DA CIDADANIA, DA INFORMAÇÃO E DO MEIO AMBIENTE .... 56
EDUCAÇÃO BIOCÊNTRICA E ALTERIDADE COMO ÉTICA AMBIENTAL ......................... 64

II. MUDANÇAS CLIMÁTICAS E DESASTRES NATURAIS ............................................... 71


ESTUDO DE CASOS PARA AS VARIÁVEIS, RADIAÇÃO SOLAR GLOBAL ACUMULADA,
PRECIPITAÇÃO ACUMULADA, TEMPERATURAS DO AR E DO SOLO NO
MUNICÍPIO DE CAPIM – PB................................................................................................. 71
UMIDADE RELATIVA DO AR E VELOCIDADE DO VENTO NAS TÉCNICAS AGRÍCOLAS
E NO MEIO AMBIENTE......................................................................................................... 79
CORRELAÇÃO ENTRE AS TEMPERATURAS DE UM TERMO-HIGRÓGRAFO E DE
PRODUTO DE SENSORIAMENTO REMOTO TERMAL. .................................................. 85
COMPORTAMENTO DA PRODUÇÃO PESQUEIRA NORTE-RIO-GRANDENSE EM ANOS
DE EL NIÑO E LA NIÑA........................................................................................................ 93
EDUCAÇÃO AMBIENTAL E MUDANÇAS AMBIENTAIS GLOBAIS; UM RELATO DE
EXPERIÊNCIA COM O DOCUMENTÁRIO “UMA VERDADE INCONVENIENTE”
COMO ESTRATÉGIA NO ENSINO DE INGLÊS NUMA ESCOLA PÚBLICA. .............. 101
MUDANÇAS CLIMÁTICAS - GLOBAL WARNING: UM PROJETO DE CIÊNCIA E ARTE NA
ESCOLA PARQUE ................................................................................................................ 106
USO DE INTERPOLADORES NA ELABORAÇÃO DE MAPAS DE TEMPERATURA DE
SOLO NAS PRAIAS DO BESSA E INTERMARES - PB, VISANDO SUBSIDIAR
ESTUDOS SOBRE DESOVA DE TARTARUGAS MARINHAS ....................................... 112
MUDANÇAS CLIMÁTICAS E VARIAÇÃO SAZONAL DA INSOLAÇÃO NA CIDADE DO
NATAL/RN ............................................................................................................................ 118
AQUECIMENTO GLOBAL E AS CONSEQÜÊNCIAS NO SEMI-ÁRIDO: ÊNFASE EM FEIRA
DE SANTANA-BA. ............................................................................................................... 124
MUDANÇAS CLIMÁTICAS E CONEXÃO ALGAS-NUVENS ................................................. 133
ESTUDO CLIMATOLÓGICO DA EVOLUÇÃO TEMPORAL DA TEMPERATURA MÁXIMA
E MÍNIMA MENSAL PARA O MUNICÍPIO DE ARARIPINA – PE ................................. 142
RELAÇÃO DE TRANSMISSIVIDADE DA RADIAÇÃO ULTRAVIOLETA E OZÔNIO
ESTRATOSFÉRICO E SUAS IMPLICAÇÕES NA SAÚDE HUMANA ............................ 149
ANÁLISE CLIMÁTICA E RITMO DAS PRECIPITAÇÕES PLUVIOMÉTRICAS EM RECIFE -
PERNAMBUCO- PARA O ANO 2000 E SUAS CONSEQUÊNCIAS SOCIO-AMBIENTAIS
................................................................................................................................................. 159
PLUVIOMETRIA DA CIDADE DE JOÃO PESSOA – UMA OBSERVAÇÃO ELEMENTAR . 167
CONFORTO TÉRMICO EM NATAL/RN UTILIZANDO OS MÉTODOS DE ITU E WCI ....... 173
O PARQUE ESTADUAL DAS DUNAS NO PROCESSO DE AMENIZAÇÃO CLIMATICA DA
CIDADE DO NATAL-RN. .................................................................................................... 181

III. SOCIEDADE E NATUREZA .............................................................................................. 188


A CONSTRUÇÃO DE UM PLANO PARTICIPATIVO DE DESENVOLVIMENTO RURAL
COMO ESTRATÉGIA DE FORTALECIMENTO COMUNITÁRIO PARA A GESTÃO
SOCIOAMBIENTAL ............................................................................................................. 188
A CRIAÇÃO DA APA CABUÇU TANQUE – GRANDE COMO DEFESA DA RESERVA DA
BIOSFERA DO CINTURÃO VERDE DA CIDADE DE SÃO PAULO ............................. 195
A TERRA: O BERÇO DA HUMANIDADE SEUS FILHOS E FRUTOS .................................... 205
A COMUNIDADE QUILOMBOLA DE OLARIA: DA AUTO-SUSTENTABILIDADE À
DESTERRITORIALIZAÇÃO ................................................................................................ 213
DIREITO AMBIENTAL E DIREITOS HUMANOS NA SOCIEDADE DE RISCO .................... 221
PARÂMETROS DO ECODESIGN EM ARTEFATOS POPULARES ......................................... 227
REPRESENTAÇÕES SOCIAIS DO ACESSO À ÁGUA POTÁVEL E DAS PRÁTICAS DE USO
................................................................................................................................................. 236
SERRA DE MONTE ALTO - BA: PESQUISA E EXPERIÊNCIA DE GESTÃO DO
PATRIMÔNIO NATURAL E ARQUEOLÓGICO ............................................................... 243
CULTURA DO CONSUMO, SOCIEDADE INSATISFEITA E O FUTURO DO PLANETA .... 249
O ZONEAMENTO ECOLÓGICO-ECONÔMICO: INSTRUMENTO TÉCNICO E POLÍTICO
PARA A GESTÃO DO MEIO AMBIENTE .......................................................................... 258
PARTICIPAÇÃO COMUNITÁRIA NOS PROCESSOS DE GESTÃO DE RECURSOS
NATURAIS: ESTUDO DE CASO DE POVOADO DE NHAMBITA-MOÇAMBIQUE.... 267
SUSTENTABILIDADE E RELAÇÕES DE GÊNERO NO CAMPO: UMA PROPOSTA DE
PESQUISA NO SEMI-ÁRIDO BRASILEIRO ...................................................................... 273
MEIO AMBIENTE E QUALIDADE DE VIDA: APONTAMENTOS INICIAIS SOBRE
PERCEPÇÕES E PRÁTICAS NAS ÁREAS PRODUTORAS DE PETRÓLEO NO RIO
GRANDE DO NORTE ........................................................................................................... 280
ANÁLISE SOCIOAMBIENTAL DO POVOADO TUPIAÇU EM CABACEIRAS DO
PARAGUAÇU (BA): ANTES E DEPOIS DA BARRAGEM PEDRA DO CAVALO ........ 290
PERMACULTURA: UM EXEMPLO DE CONVIVÊNCIA HARMONIOSA COM O AMBIENTE
NATURAL DO SÍTIO NOVA CANAÃ, ÁREA RURAL DE OLINDA (PERNAMBUCO)
................................................................................................................................................. 298
APLICAÇÃO DO SISTEMA DE GESTÃO DO CONHECIMENTO PARA INDICADORES DE
SUSTENTABILIDADE NO SETOR DE ROCHAS ORNAMENTAIS ............................... 305
PROPOSTA DE RECONHECIMENTO DO IMPACTO AMBIENTAL “ESGOTAMENTO DOS
RESERVATÓRIOS DE PETRÓLEO E GÁS NATURAL” COMO DIRETRIZ PARA O
DESENVOLVIMENTO DE PLANO DIRETOR NACIONAL PARA A EXPLORAÇÃO
DOS RESERVATÓRIOS BRASILEIROS ............................................................................ 316
A ANÁLISE ESTRUTURAL DA COBERTURA PEDOLOGICA: A VISÃO HOLÍSTICA DO
SOLO ...................................................................................................................................... 324
REFLEXÕES SOBRE A COMPLEXA RELAÇÃO ENTRE PODER, IDENTIDADE E
SUSTENTABILIDADE. ........................................................................................................ 333
A INICIAÇÃO CIENTÍFICA NO ENSINO DE CIÊNCIAS: UMA EXPERIÊNCIA EM BELÉM
DO PARÁ ............................................................................................................................... 339
O FORTALECIMENTO DA CADEIA PRODUTIVA DE LEITE DE CABRA NO CONTEXTO
DO DESENVOLVIMENTO DO CARIRI PARAIBANO: UM ESTUDO DE CASO DO
MUNICÍPIO DE CABACEIRAS ........................................................................................... 345
GESTÃO PARTICIPATIVA PARA A ESTAÇÃO ECOLÓGICA DE CAETÉS, PAULISTA,
PERNAMBUCO, BRASIL ..................................................................................................... 353
EXPERIENCIA DEL PROGRAMA DE FORMACIÓN DE GRADO GESTIÓN AMBIENTAL DE
LA UNIVERSIDAD BOLIVARIANA DE VENEZUELA SEDE ZULIA EN LA
CONSTRUCCIÓN DE SABERES PARA LA GESTIÓN AMBIENTAL COMUNITARIA
EN EL ESTADO ZULIA, VENEZUELA. ............................................................................. 359
PRODUÇÃO DE VASSOURAS E SUSTENTABILIDADE EM ÁREA DE CARNAUBAL NO
PIAUÍ ...................................................................................................................................... 368
GLOBALIZAÇÃO, DESENVOLVIMENTO SUSTENTÁVEL E MODELOS DE INDICADORES
DE SUSTENTABILIDADE ................................................................................................... 375
RESGATE DA CIDADANIA E GERAÇÃO DE RENDA EM COMUNIDADES RURAIS
DA AMAZÔNIA .................................................................................................................... 383
POBREZA E DEVASTAÇÃO FLORESTAL NO BRASIL: UMA ABORDAGEM HISTÓRICA
................................................................................................................................................. 387
AGRICULTORES INOVADORES, SERVIÇOS AMBIENTAIS E EDUCAÇÃO BÁSICA:
PONTOS E CONTRAPONTOS. ............................................................................................ 395
A DEGRADAÇÃO AMBIENTAL E A PESCA ARTESANAL DA COMUNIDADE ILHA DE
DEUS - PE .............................................................................................................................. 400
EFETIVIDADE DAS RPPN NA CONSERVAÇÃO DA MATA ATLÂNTICA ......................... 405
A POSSIBILIDADE DE REESTRUTURAÇÃO MEDIANTE A DEGRADAÇÃO AMBIENTAL:
O CASO DO MANGUEZAL CHICO SCIENCE – OLINDA/PE ......................................... 414
ANÁLISE AMBIENTAL MULTITEMPORAL ACERCA DAS COMUNIDADES V8 E V9, DO
BAIRRO DO VARADOURO, OLINDA – PERNAMBUCO. .............................................. 420
A SOBREVIVÊNCIA DE COMUNIDADES VULNERÁVEIS E DE RISCO SOCIAL: O CASO
DA COMUNIDADE DO “S”. ................................................................................................ 426
A SOBREVIVÊNCIA PRECARIZADA DE COMUNIDADES EM SITUAÇÃO DE
VULNERABILIDADE SOCIAL: O CASO DO PORTO DO CAPIM. ................................ 435
DETERMINAÇÃO DE ÁREAS AMBIENTALMENTE DEGRADAS NA MESO REGIÃO
OESTE POTIGUAR ............................................................................................................... 441
PLANEJAMENTO AMBIENTAL: NOTAS E INDICAÇÕES DE PESQUISA NO SEMI-ÁRIDO
CEARENSE ............................................................................................................................ 450
DIAGNÓSTICO DA RESERVA LEGAL FLORESTAL DO ASSENTAMENTO NOVO
MUNDO, NO MUNICÍPIO DE CAMALAÚ - PB ................................................................ 458
PLANOS DE RECUPERAÇÃO DE ÁREAS DEGRADADAS (PRAD) NAS EMPRESAS
MINERADORAS DO MUNICÍPIO DE ITABUNA-BA ...................................................... 467
COMPENSAÇÃO AMBIENTAL A PARTIR DA CRIAÇÃO DE UMA APA E CORREDOR
ECOLÓGICO NO CCEN - UFPB .......................................................................................... 475
TABULEIRO DOS NEGROS OU A CULTURA NEGRA E SUA (DES)CONSTRUÇÃO NO
ESPAÇO ................................................................................................................................. 482

IV. CRESCIMENTO POPULACIONAL E A QUESTÃO AMBIENTAL ........................... 490


AGLOMERADO SUBNORMAL: CARACTERIZAÇÃO SOCIOAMBIENTAL DO BAIRRO
BANANEIRA NA CIDADE DE ITABUNA BA. ................................................................. 490
CRESCIMENTO POPULACIONAL E IMPLICAÇÕES AMBIENTAIS NA ILHA DO BISPO. 498
CRESCIMENTO POPULACIONAL E DEGRADAÇÃO AMBIENTAL: UMA VISÃO DOS
RECURSOS HÍDRICOS NO SUDOESTE DA AMAZÔNIA .............................................. 503
DINÂMICA METROPOLITANA DE GOIÂNIA .......................................................................... 510
REFLEXÕES SOBRE A QUESTÃO DA OCUPAÇÃO URBANA E A SITUAÇÃO DO
CRESCIMENTO OCUPACIONAL ....................................................................................... 519
MEIO AMBIENTE, O LOCAL E A CIDADE: CRIANÇAS E JOVENS DESENHANDO SEUS
LUGARES .............................................................................................................................. 528
ANÁLISE AMBIENTAL EM CIDADES DE PEQUENO PORTE: O CASO DAS LAGOAS DE
BOM JESUS - RN .................................................................................................................. 536
TERRITORIALIDADE GUARANI E IMPACTO AMBIENTAL................................................. 545

V. METROPOLIZAÇÃO E CIDADES SUSTENTÁVEIS .................................................... 554


A INSUSTENTABILIDADE DA EXPANSÃO URBANA ........................................................... 554
A SUBMISSÃO DO DESENVOLVIMENTO MUNICIPAL PERANTE A SUPREMACIA DO
CRESCIMENTO METROPOLITANO: DIRETRIZES PARA A GESTÃO SUSTENTÁVEL
DE PIRAQUARA, REGIÃO METROPOLITANA DE CURITIBA..................................... 562
CIDADES SUSTENTÁVEIS E PLANEJAMENTO AMBIENTAL ............................................. 569
INDICATIVOS METODOLÓGICOS PARA A PARTICIPAÇÃO SOCIAL NA CONSTRUÇÃO
DO PLANO DIRETOR MUNICIPAL ................................................................................... 577
PRINCIPAIS DESAFIOS PARA A SUSTENTABILIDADE DAS CIDADES ............................ 584
OS SINDICATOS COMO ATORES SOCIAIS NA BUSCA DE UMA MODERNIZAÇÃO
ECOLÓGICA.......................................................................................................................... 591
O VERDE NA CIDADE: ANÁLISE DA COBERTURA VEGETAL E QUALIDADE
AMBIENTAL NOS BAIRROS DO CENTRO EXPANDIDO DA CIDADE DO RECIFE - PE
................................................................................................................................................. 597
O PARQUE DAS DUNAS DE NATAL-RN E O CAMPUS CENTRAL DA UNIVERSIDADE
FEDERAL DO RIO GRANDE DO NORTE (UFRN): CONTROLANDO O GABARITO
PARA MANTER O EQUILÌBRIO AMBIENTAL DA CIDADE DO NATAL-RN............. 606
A PERMACULTURA EM UMA MOSTRA DE ARQUITETURA URBANA ............................ 613
ANÁLISE DA PERCEPÇÃO DE POLUIÇÃO VISUAL: ESTUDO DE CASO COM
TRANSEUNTES DA AVENIDA CONDE DA BOA VISTA, RECIFE-PE......................... 621
IDENTIFICAÇÃO DA COBERTURA VEGETAL EM ÀREAS URBANAS POR MEIO DE
SENSORIAMENTO REMOTO: UM CASO DE ESTUDO PARA O BAIRRO DE
PETROPOLIS – NATAL - RN. ............................................................................................. 628
POLUIÇÃO SONORA: A PROBLEMÁTICA DE UM DESEQUILÍBRIO AMBIENTAL NA
CIDADE DE CAMPINA GRANDE – PB ............................................................................. 635

VI. BIODIVERSIDADE, BIOCOMBUSTÍVEL E SEGURANÇA ALIMENTAR .............. 640


POLINIZAÇÃO, UM IMPORTANTE SERVIÇO PRESTADO AO MEIO AMBIENTE ............ 640
GESTÃO AMBIENTAL EM INDÚSTRIAS DE LATICÍNIOS - SOUSA/PARAÍBA ................. 647
FLORA ARBUSTIVA-ARBÓREA DE UMA ÁREA DE CAATINGA NO MUNICÍPIO DO
SENHOR DO BONFIM, BAHIA, BRASIL. ......................................................................... 655
LEVANTAMENTO FLORÍSTICO EM UMA ÁREA DE CAATINGA NO MUNICÍPIO DE
JACOBINA, BAHIA, BRASIL. ............................................................................................. 663
BIODIESEL E PRODUÇÃO DE ALIMENTO NO NORDESTE BRASILEIRO: REFLEXÃO
NECESSÁRIA ........................................................................................................................ 671
FAVORABILIDADE E POTENCIALIDADE BIOCLIMÁTICA DO Aedes aegypti: UMA
ABORDAGEM COM VISTAS À SUSTENTABILIDADE DA RELAÇÃO AMBIENTE-
SAÚDE NO ESTADO DO RIO GRANDE DO NORTE/BRASIL ....................................... 679
ALTERAÇÃO NA PAISAGEM VEGETAL EM DIFERENTES COMPARTIMENÇÕES
GEOMORFOLÓGICAS ......................................................................................................... 688
FACTIBILIDADE ECONÔMICA SOB CONDIÇÕES DE RISCOS: ANÁLISE DE UNIDADE
DE PRODUÇÃO CONTÍNUA DE BIODIESEL NA BAHIA .............................................. 698
ENSAIO PRELIMINAR SOBRE A ADAPTABILIDADE EM CATIVEIRO DO PEIXE ARIACÓ
(Lutjanus synagris) NA PRAIA DA PENHA/PB................................................................... 705
ALTERNATIVAS PARA A REDUÇÃO DOS DANOS AMBIENTAIS GERADOS NA
PRODUÇÃO CANA DE AÇÚCAR E ETANOL NO BRASIL ............................................ 712
PRODUÇÃO DE PEIXES DE ÁGUA DOCE NA ALDEIA INDÍGENA POTIGUARA DE
JARAGUÁ, RIO TINTO, PARAÍBA..................................................................................... 721
A CULTURA DO CAFÉ SOMBREADO NO MACIÇO DE BATURITÉ - CEARÁ .................. 727
IMPACTOS AMBIENTAIS EM ÁREA CANAVIEIRAS: A MORTE DO RIO UNA (PEDRAS
DE FOGO) .............................................................................................................................. 733
BIODIESEL: UM PRODUTO DA AGRICULTURA SUSTENTÁVEL A FAVOR DE UM
MUNDO MENOS POLUÍDO ................................................................................................ 740
CONSERVAÇÃO DOS RECURSOS VEGETAIS NO MUNICÍPIO DE CUSTÓDIA – PE ....... 746
DECLÍNIO DE POPULAÇÕES DE ANFÍBIOS E MUDANÇAS CLIMÁTICAS: REVISÃO .... 752
DIVERSIDADE DE MICROORGANISMOS EM SOLO CACAUEIRO ..................................... 759
EFEITO DE FONTES MINERAIS ORGÂNICAS NA CULTURA DA CENOURA (Daucus
carota L.) ............................................................................................................................... 765
FORMIGAS URBANAS: IMPORTÂNCIA NO ECOSSISTEMA TERRESTRE E NA
VEICULAÇÃO DE PATÓGENOS EM HOSPITAIS ........................................................... 770
STATUS CONSERVACIONISTA DA ANUROFAUNA E OS POSSÍVEIS EFEITOS DAS
MUDANÇAS CLIMÁTICAS NA RPPN FREI CANECA, JAQUEIRA, PERNAMBUCO 779
A CULTURA DO EUCALIPTO E AS TRANSFORMAÇÕES SÓCIO-AMBIENTAIS NO
EXTREMO SUL BAIANO. ................................................................................................... 788
AVALIAÇÃO DA EFETIVIDADE DE FUNGOS MICORRÍZICOS ARBUSCULARES
ORIUNDOS DE RAÍZES DE BATATA DOCE (Ipomoea batatas L.) PROVENIENTES DO
SOLO E DA AEROPONIA NO CRESCIMENTO DE MUDAS DE MAMOEIRO (Carica
papaya L.) ............................................................................................................................... 796
ENTEROBACTÉRIAS EM ÁGUAS DE POÇOS NO MUNICÍPIO DE PINDAMONHANGABA,
SP ............................................................................................................................................ 802
INFLUÊNCIA DA DENSIDADE DE FUNGOS MICORRÍZICOS ARBUSCULARES NA
PRODUÇÃO DE MUDAS DE MARACUJAZEIRO-DOCE (Passiflora alata CURTIS) ... 809
UMA PRÁTICA AGROECOLÓGICA NO ENSINO AGRICOLA , UTILIZANDO CONTROLE
BIOLÓGICO. .......................................................................................................................... 815

VII. PLANEJAMENTO E GESTÃO DOS RECURSOS HÍDRICOS .................................... 820


OCUPAÇÃO E IMPACTOS SÓCIO-AMBIENTAIS EM ÁREA DE MANANCIAL NA
AMAZÔNIA SUL-OCIDENTAL: ANÁLISE DA BACIA DO IGARAPÉ JUDIA (AC) .... 820
DINÂMICA FLUVIAL DO RIO ACRE: TRANSFORMAÇÕES DA PAISAGEM E IMPACTOS
A PARTIR DA MINERAÇÃO DE AREIA ........................................................................... 829
CARACTERIZAÇÃO DA VULNERABILIDADE DOS AQÜÍFEROS LIVRES NO MUNICÍPIO
DE JOÃO PESSOA - PB ........................................................................................................ 835
ANÁLISE DA BACIA HIDROGRÁFICA DO CÓRREGO BORORÓ NO MUNICÍPIO DE
POXORÉU, ESTADO DE MATO GROSSO, NUMA PERSPECTIVA
GEOLÓGICA/GEOMORFOLÓGICA E GEOAMBIENTAL .............................................. 844
RECURSOS HÍDRICOS NA ZONA RURAL DO SEMI-ÁRIDO BRASILEIRO:
DISPONIBILIDADE, DISTINTOS CENÁRIOS E MECANISMOS DE GESTÃO ............ 854
A APLICAÇÃO DO INSTRUMENTO DE COBRANÇA PELO USO DA ÁGUA SOB A ÓTICA
DOS CONSUMIDORES INDUSTRIAIS NA CIDADE DE ITABUNA-BA. ...................... 863
GESTÃO DE RECURSOS HÍDRICOS: UM ESTUDO DE CASO NA BACIA DO RIO
PIRAPAMA - PE .................................................................................................................... 870
LAGOAS E LAGOINHAS-ESTUDO DE CASO DOS MANANCIAIS LAGOA DA FEITICEIRA
E LAGOA FONTE DOS PADRES NO MUNICIPIO DE ALAGOINHAS – BA ................ 878
EXPLORAÇÃO DA ÁGUA SUBTERRÂNEA PELAS ATIVIDADES AGRÍCOLAS E
DEGRADAÇÃO AMBIENTAL NA REGIÃO DE IRECÊ NO SEMI-ÁRIDO BAIANO .. 885
ANÁLISE FISIOGRÁFICA COMO INDICADOR POTENCIAL DE PROTEÇÃO OU DE
DEGRADAÇÃO DOS RECURSOS NATURAIS DA BACIA HIDROGRÁFICA DO RIO
DA DONA - BAHIA .............................................................................................................. 892
CARACTERÍSTICAS HÍDRICAS DA MICROBACIA DE DRENAGEM DA BARRAGEM
VACA BRAVA – AREIA-PB, UM SUPORTE AO PLANEJAMENTO SUSTENTÁVEL
DOS RECURSOS HÍDRICOS ............................................................................................... 901
ECO-RESIDÊNCIA RURAL DE ADEQUADA GESTÃO HÍDRICA.......................................... 907
ANÁLISE DO DESPERDÍCIO DE ÁGUA TRATADA NO BAIRRO GERALDO SIMÕES NO
MUNICÍPIO DE ITABUNA-BA ........................................................................................... 917
ASPECTO CONSTRUTIVO DE TRÊS TÉCNICAS DE CAPTAÇÃO DE ÁGUA E SOLO
IMPLANTADAS NA REGIÃO DO CURIMATAÚ PARAIBANO ..................................... 924
POÇOS JORRANTES DO VALE DO RIO GURGUÉIA (PI): CARACTERIZAÇÃO DE UM
ESPAÇO MARCADO PELO DESPERDÍCIO HÍDRICO .................................................... 934
CARACTERIZAÇÃO DE OUTORGA DE RECURSOS HÍDRICOS SUPERFICIAIS NO
ESTADO DE GOIÁS ............................................................................................................. 942
ÁGUA COMO INSUMO OU MEIO DE VIDA? - RIBEIRINHOS NA REDE DE SABERES ... 950
REPRESENTAÇÕES SOCIAIS DO ACESSO À ÁGUA POTÁVEL E DAS PRÁTICAS DE USO
................................................................................................................................................. 959

VIII. TURISMO E MEIO AMBIENTE ....................................................................................... 966


AS UNIDADES DE CONSERVAÇÃO COMO ABRIGO ÀS ATIVIDADES DE TURISMO
SUSTENTÁVEL .................................................................................................................... 966
AS CATEGORIAS DE PERCEPÇÃO DO ECOTURISTA EM SUA RELAÇÃO COM A
NATUREZA COMO SUBSÍDIO PARA O DESENVOLVIMENTO DA EDUCAÇÃO
AMBIENTAL NO PARQUE ESTADUAL DA SERRA DE CALDAS NOVAS/GO.......... 973
TERRITORIALIDADES DO TURISMO: O IMPASSE ENTRE A CONSTRUÇÃO DE UMA
CIDADE TURÍSTICA E A DEMARCAÇÃO DA TERRA INDÍGENA TREMEMBÉ NO
LITORAL DO CEARÁ. ......................................................................................................... 983
GUIA DIGITAL ECOTURÍSTICO DO PARQUE ESTADUAL DA PEDRA BRANCA (RJ): UM
EXEMPLO DE MANEJO DE UNIDADE DE CONSERVAÇÃO VIA SIG-WEB.............. 992
TERRITÓRIOS, IDENTIDADE E MEIO AMBIENTE: IMPLICAÇÕES ÉTICAS DAS
POLÍTICAS PÚBLICAS DO TURISMO NO RN ............................................................... 1003
LAZER EM UNIDADE DE CONSERVAÇÃO ........................................................................... 1011
ECOTURÍSMO NOS CARIRIS VELHOS: UMA POSSIBLIDADE DE REESTRUTURAÇÃO
SOCIOECONÔMICA PARA O SEMI-ÁRIDO BRASILEIRO .......................................... 1017
SOCIEDADE, IDENTIDADE E MEIO AMBIENTE: UTILIZANDO A INTERPRETAÇÃO
TURÍSTICA PARA TRAZER UM NOVO OLHAR SOBRE O PARQUE “PAU POMBO”,
EM GARANHUNS – PE ...................................................................................................... 1025
O INSELBERGUE DE SERRA CAIADA: MAIS DO QUE O PRÉ-CAMBRIANO A SER
PRESERVADO .................................................................................................................... 1034
ECOTURISMO: ENTRE A DOMINAÇÃO E A SUSTENTABILIDADE ................................. 1039
GEOTURISMO NA CHAPADA DO ARARIPE CEARENSE .................................................... 1047
ANÁLISE DA PAISAGEM TURÍSTICA DA CHAPADA DO ARARIPE CEARENSE, COMO
PROPOSTA PARA O ENSINO DA GEOGRAFIA ............................................................ 1056
TURISMO, MEIO AMBIENTE E LAZER: RELAÇÕES E POSSIBILIDADES POSSÍVEIS EM
UM PARQUE NO CORAÇÃO DE UMA METRÓPOLE. ................................................. 1065
UMA CONTRIBUIÇÃO AO ESTUDO DOS IMPACTOS SÓCIO-AMBIENTAIS DA
ATIVIDADE TURÍSTICA EM COMUNIDADES RECEPTORAS................................... 1072
A PRESERVAÇÃO ATRAVÉS DE UM TURISMO SENSÍVEL À NATUREZA .................... 1079
ANÁLISE DA EFETIVAÇAO DA INFRA-ESTRUTURA TURISTICA ESTABELECIDA PELO
PROECOTUR PARA NOVO AIRAO ................................................................................. 1085
ANÁLISE DOS PROCESSOS GEOMORFOLÓGICOS A CAMINHO DE ANGRA DOS REIS/RJ
............................................................................................................................................... 1094
ECOTURISMO, UM MODELO DE GESTÃO: ALGUMAS REFLEXÕES .............................. 1103
IMPACTOS SÓCIO-AMBIENTAIS CAUSADOS PELO TURISMO NA REGIÃO DE BARRA
GRANDE – BA .................................................................................................................... 1110
EDUCAÇÃO AMBIENTAL E TURISMO ECOLÓGICO NO RIO CHORÃO MUNICIPIO DE
JUNCO DO SERIDO-PB ..................................................................................................... 1118
TURISMO, GEOGRAFIA E CIDADANIA ................................................................................. 1123
OS IMPACTOS AMBIENTAIS DO DESENVOLVIMENTO NA COMUNIDADE ................. 1128
PLANEJAMENTO EM TRILHAS ECOLÓGICAS: ANÁLISE SITUACIONAL E
ESTRATÉGIAS PARA UTILIZAÇÃO DE TRILHAS NO MUNICÍPIO DE RAPOSA-MA
............................................................................................................................................... 1137
RELAÇÕES AMBIENTAIS: UM ESTUDO DE CASO EM PITIMBU...................................... 1146
TURISMO E MEIO AMBIENTE: UM ESTUDO DA SAZONALIDADE NO MUNICÍPIO DA
BAÍA DA TRAIÇÃO – PB. ................................................................................................. 1151

IX. RESÍDUOS E SANEAMENTO AMBIENTAL ............................................................... 1158


GERENCIAMENTO DO LIXO ANTÁRTICO NO TERRITÓRIO NACIONAL: CONFLITO
AMBIENTAL? ..................................................................................................................... 1158
GESTÃO DA ÁGUA EM ABATEDOURO DE AVES NO SEMI-ÁRIDO DE PERNAMBUCO
............................................................................................................................................... 1163
A CRISE DO MEIO AMBIENTE ENTRE AS VÁRIAS AGENDAS CONTEMPORÂNEAS .. 1171
DIAGNÓSTICO DO IMPACTO AMBIENTAL OBSERVADO NA DESTINAÇÃO FINAL DE
EFLUENTES GERADOS NO CEFET CUIABÁ ................................................................ 1179
GESTÃO DE RESÍDUOS SÓLIDOS URBANOS: UMA ANÁLISE DO MUNICÍPIO DE
CAMPO VERDE - MATO GROSSO .................................................................................. 1186
OS AGROTÓXICOS NO COTIDIANO DA COMUNIDADE DE BASE FÍSICA, IPANGUAÇU-
RN ......................................................................................................................................... 1194
EXPERIÊNCIA DO PROJETO DE COLETA SELETIVA NA FACULDADE DE CIÊNCIAS DA
ADMINISTRAÇÃO DE PERNAMBUCO – FCAP/UPE ................................................... 1201
A RELAÇÃO ENTRE MORBIDADE POR DOENÇAS DIARRÉICAS E REDES DE
ABASTECIMENTO DE ÁGUA E ESGOTAMENTO SANITÁRIO NA CIDADE DE
PRATA, MINAS GERAIS, 2007. ........................................................................................ 1207
A COMPOSTAGEM COMO OPÇÃO DE GERIR RESÍDUOS BIODEGRADÁVEIS NA
ESCOLA AGROTÉCNICA FEDERAL DE UBERLÂNDIA ............................................. 1216
LIXÃO DE MOSSORÓ (RN): LAR E FONTE DE RENDA DOS EXCLUÍDOS. ..................... 1223
AVALIAÇÃO DOS EFEITOS SANITÁRIOS DO LIXO NA COMUNIDADE TEREZA RIBEIRO
– CRUZ DAS ALMAS – BAHIA ........................................................................................ 1230
AVALIAÇÃO PROTOZOOLÓGICA DA ÁGUA DA LAGOA DA PINDOBA – FEIRA DE
SANTANA – BA, E SUAS IMPLICAÇÕES NA QUALIDADE DE VIDA DA
COMUNIDADE CIRCUNVIZINHA................................................................................... 1235
COLETA SELETIVA SOLIDÁRIA NO MUNICÍPIO DE MARTINÓPOLIS – SP: UMA VISÃO
SÓCIO-AMBIENTAL .......................................................................................................... 1242
MAPEAMENTO TEMÁTICO APLICADO AO DIAGNÓSTICO DE SANEAMENTO BASICO
A PARTIR DE CENÁRIOS AMBIENTAIS........................................................................ 1250
UM ESTUDO DA PROBLEMÁTICA DA COLETA DO LIXO NA CIDADE DE ANÁPOLIS,
GOIÁS, SOB A PERSPECTIVA DOS CATADORES DE LIXO ...................................... 1260
CONDICIONANTES AMBIENTAIS E ESQUISTOSSOMOSE, NOS MUNICÍPIOS DE
APARECIDA E ROSEIRA, SP, BRASIL............................................................................ 1268
ASPECTOS POLÍTICOS-INSTITUCIONAIS NA GESTÃO DE RESÍDUOS URBANOS ...... 1277
COLETA SELETIVA E ORGANIZAÇÃO SOCIAL DOS CATADORES NO CABO DE SANTO
AGOSTINHO: UMA ABORDAGEM PRELIMINAR SOBRE AS RELAÇÕES DE
PRODUÇÃO NO SETOR DA RECICLAGEM .................................................................. 1286
TOXOCARÍASE E CARACTERIZAÇÃO SÓCIO-AMBIENTAL DE UMA POPULAÇÃO
RURAL DO MUNICÍPIO DE PINDAMONHANGABA, SÃO PAULO, BRASIL ........... 1295
À MARGEM DA GLOBALIZAÇÃO: TRABALHO INFANTIL NO “LIXÃO” DE CAMPINA
GRANDE, PB – UMA TRISTE REALIDADE ................................................................... 1301
RESÍDUOS URBANOS EM PATOS-PB: IMPACTOS AMBIENTAIS, POLÍTICAS PÚBLICAS
E REPRESENTAÇÕES SOCIAIS ....................................................................................... 1309
FUNGOS FITOPATOGÊNICOS EM CULTURA DE Passiflora alata, CURTIS EM NOVA
FLORESTA – PB.................................................................................................................. 1317
CATADORES DE RESÍDUOS SÓLIDOS: IMPORTÂNCIA DA ATIVIDADE LABORAL NUM
ASPECTO SOCIOAMBIENTAL ........................................................................................ 1322
DISTÚRBIOS MENTAIS EM AGRICULTORES EXPOSTOS AO USO DE AGROTÓXICOS:
UM DRAMA VIVÊNCIADO NO SILÊNCIO DA TERRA ............................................... 1328
LOGÍSTICA REVERSA E SUSTENTABILIDADE: UM ESTUDO DE CASO EM UMA
EMPRESA DE RECICLAGEM DE CARTUCHOS. .......................................................... 1335
RECICLAGEM PLÁSTICA: O CASO DOS FRASCOS PLÁSTICOS DE POSTOS DE
GASOLINA .......................................................................................................................... 1341
RESÍDUOS SÓLIDOS EM MARACANAÚ: PROPOSTAS DE GESTÃO INTEGRADA E
PARTICIPATIVA ................................................................................................................ 1349
GESTÃO AMBIENTAL: ESTUDO SOBRE O REUSO DA ÁGUA NO CURTUME DO CENTRO
DE TECNOLOGIA DO COURO E DO CALÇADO ALBANO FRANCO – SENAI/PB . 1357
CO-PROCESSAMENTO DE RESÍDUOS DE BORRACHA ESPONJOSA POR INCINERAÇÃO
............................................................................................................................................... 1366
DEPOSIÇÃO DOS RESÍDUOS SÓLIDOS NO MANANCIAL LAGOA DO MUCAMBINHO
............................................................................................................................................... 1372
ALTERNATIVAS PARA O CONTROLE DA POLUIÇÃO DO AR .......................................... 1380
A AÇÃO ANTRÓPICA NO PROCESSO DE DEGRADAÇÃO AMBIENTAL DOS
ECOSSISTEMAS DE MANGUEZAIS: UM ESTUDO DE CASO NOS MUNICÍPIOS DE
AREIA BRANCA-RN E GROSSOS – RN .......................................................................... 1387
A IMPORTÂNCIA DA COLETA DE RESÍDUOS SÓLIDOS PARA A GESTÃO AMBIENTAL:
O CASO DA EMPRESA COMÉRCIO DE METAIS NOSSA SENHORA DE LOURDES
NA CIDADE DE CAMPINA GRANDE – PB. ................................................................... 1393
A PROBLEMATIZAÇÃO DOS RESÍDUOS SÓLIDOS: UM ESTUDO DE CASO NO
MUNICÍPIO DE AREIA BRANCA/RN.............................................................................. 1402
ANÁLISE DAS PRESSÕES E AMEAÇAS NA APA DA LAGOA ENCANTADA E RIO
ALMADA, ILHÉUS - BA .................................................................................................... 1409
BIODIGESTORES: UMA ALTERNATIVA VIÁVEL PARA AMENIZAR A POLUIÇÃO
HÍDRICA CAUSADA PELOS DEJETOS PROVENIENTES DA CRIAÇÃO DE SUÍNOS
EM PROPRIEDADES RURAIS NA REGIÃO SUL DA BAHIA ...................................... 1417
DIAGNÓSTICO DA COLETA DO LIXO NO CAMPUS I DA UFPB ....................................... 1426
DISTRIBUIÇÃO DAS MICRO-LAGOAS NO CONJUNTO HABITACIONAL CIDADE VERDE
EM JOÃO PESSOA-PB ....................................................................................................... 1434
ESTUDO DE UM PROJETO SOCIOAMBIENTAL DESENVOLVIDO NO LIXÃO DE
ITACARÉ, BAHIA ............................................................................................................... 1442
ESTUDO DA EFICIÊNCIA DO SISTEMA DE TRATAMENTO DE ÁGUA DO SERVIÇO
AUTÔNOMO DE ÁGUA E ESGOTO DE ITAPETINGA-BA. ......................................... 1451
FABRICAÇÃO DE SABÃO SÓLIDO APARTIR DE ÓLEO COMESTÍVEL ........................... 1458
IMPACTOS DA AÇÃO ANTRÓPICA NO PARQUE DOS MANGUEZAIS, RECIFE – PE .... 1464
IMPACTOS SOCIOAMBIENTAIS: O CASO UMA MINERADO DE ITABUNA, BA ........... 1472
IMPACTOS SOCIOECONÔMICOS E AMBIENTAIS CAUSADOS PELOS EFLUENTES
INDUSTRIAIS NAS ÁREAS DE MANGUE EM PORTO JATOBÁ – ABREU E LIMA
(PE). ...................................................................................................................................... 1478
LIXO URBANO: ESTUDO DE CASO DO ATERRO SANITÁRIO DE TERESINA - PI ........ 1484
OS RESÍDUOS SÓLIDOS E O PAPEL DA SOCIEDADE ......................................................... 1491
PERCEPÇÃO E APLICABILIDADE DO DESCARTE ADEQUADO DE PILHAS E BATERIAS
DE CELULAR ...................................................................................................................... 1496
RESÍDUOS SÓLIDOS URBANOS E A QUESTÃO AMBIENTAL........................................... 1501
RESÍDUOS SÓLIDOS URBANOS NO MUNICÍPIO DO CABO DE SANTO AGOSTINHO – PE:
CONSIDERAÇÕES ACERCA DAS ALTERAÇÕES NA PAISAGEM E NO MEIO
AMBIENTE .......................................................................................................................... 1509
UTILIZAÇÃO DE RESÍDUO CERÂMICO DE INDÚSTRIA CERÂMICA E/OU OLEIRO
MISTURADOS OU NÃO PARA CORREÇÃO DE ARGILAS, FABRICAÇÃO DE
POZOLANA, CIMENTO CPII-Z E CPIV, PARA FINS COMERCIAIS. .......................... 1515

X. DESERTIFICAÇÃO E IMPLICAÇÕES SOCIOAMBIENTAIS .................................. 1528


A SUSCEPTIBILIDADE DO PROCESSO DE DESERTIFICAÇÃO NO SÍTIO MANDURI-PE
............................................................................................................................................... 1528
ALGUMAS CONSIDERAÇÕES TEÓRICAS SOBRE DESERTIFICAÇÃO E SECA NO
NORDESTE BRASILEIRO ................................................................................................. 1538
ANÁLISE DA DESERTIFICAÇÃO NOS SERTÕES DOS INHAMUNS – CEARÁ, NO
CONTEXTO DAS POLÍTICAS PÚBLICAS E O PAPEL DA MÍDIA .............................. 1545
ESTIMATIVA DE FATORES DA EQUAÇÃO UNIVERSAL DE PERDAS DE SOLO PARA
ANÁLISE DO POTENCIAL NATURAL À EROSÃO DAS TERRAS SUSCETÍVEIS A
DESERTIFICAÇÃO NO ESTADO DO PIAUÍ................................................................... 1552
ESTUDO AMBIENTAL SOBRE O CRESCIMENTO DA DESERTIFICAÇÃO NA
MICRORREGIÃO DO SERIDÓ ORIENTAL PARAIBANO ............................................ 1560
O SEMI-ÁRIDO BRASILEIRO: POLÍTICAS PÚBLICAS VERSUS AMPLIAÇÃO DAS
VULNERABILIDADES LOCAIS ....................................................................................... 1571
O PROCESSO DE DESERTIFICAÇÃO NA REGIÃO DE IRECÊ-BA E A RELAÇÃO COM A
AGRICULTURA. ................................................................................................................. 1579
DESERTIFICAÇÃO: UM PROBLEMA GLOBAL EM PROPORÇÕES LOCAIS. ................... 1586

XI. AGENDA AMBIENTAL DAS INDÚSTRIAS ................................................................. 1593


GOVERNANÇA GLOBAL, ISO 14000 E IMPLICAÇÕES LOCAIS PARA MICRO E
PEQUENAS EMPRESAS QUE ALMEJAM ADOÇÃO DE UM SISTEMA DE
GERENCIAMENTO AMBIENTAL.................................................................................... 1593
ESTUDO DA REUTILIZAÇÃO DE RESÍDUO DE CORTE DE MÁRMORES E GRANITOS NA
INDÚSTRIA CERÂMICA / CONSTRUÇÃO CIVIL. ........................................................ 1598
OTIMIZAÇÃO DAS ATIVIDADES EXTRATIVISTAS DA GIPSITA NO ARARIPE COM
ÊNFASE NA PRESERVAÇÃO AMBIENTAL .................................................................. 1603
MEIO AMBIENTE E GESTÃO AMBIENTAL NAS INDÚSTRIAS DO SUL DA BAHIA:
ESTUDOS PRELIMINARES SOBRE A ADOÇÃO DO SGA ........................................... 1609
RESPONSABILIDADE SOCIAL CORPORATIVA NAS INDÚSTRIAS: UMA PRÁTICA DE
INSERÇÃO SOCIAL JUNTO AOS COLABORADORES E À COMUNIDADE LOCAL
............................................................................................................................................... 1616
IMPACTOS E RISCOS AMBIENTAIS NA ÁREA DO POLO INDUSTRIAL DE CAMAÇARI
............................................................................................................................................... 1622

XII. DINÂMICA AMBIENTAL EM ZONAS COSTEIRAS ................................................. 1629


DINÂMICA DA PAISAGEM: UMA ANÁLISE INTEGRADA DA PLANÍCIE FLÚVIO
MARINHA - AREA DE PROTEÇÃO AMBIENTAL (APA) DELTA DO RIO PARNAÍBA,
PIAUÍ/MARANHÃO – BRASIL. ........................................................................................ 1629
GEOLOGIA E GEOMORFOLOGIA DA FAIXA COSTEIRA DO MUNICÍPIO DE JOÃO
PESSOA (PB) ....................................................................................................................... 1639
MONITORAMENTO DO NÍVEL DO OCEANO ATLÂNTICO TROPICAL NAS
PROXIMIDADES DA COSTA DO NORDESTE DO BRASIL ......................................... 1657
ORIENTAÇÕES A REALIZAÇÃO DO PLANO DE MANEJO E GESTÃO DA APA DA
BARRA DO RIO MAMANGUAPE –PB. ........................................................................... 1663
VARIAÇÕES DA LINHA DE COSTA DO MUNICÍPIO DE JOÃO PESSOA (PB) ................. 1668
ANÁLISE DA EVOLUÇÃO GEOAMBIENTAL E DO AVANÇO DO MAR NAS PRAIAS DE
CASA CAIADA E RIO DOCE-PE: EVOLUÇÃO DA PAISAGEM COSTEIRA ............. 1677
IMPACTOS AMBIENTAIS NO LITORAL DE CAMOCIM (CE) ............................................. 1686
TENDÊNCIA ATUAL DO COMPORTAMENTO DA LINHA DE COSTA NO ESTADO DA
PARAÍBA ............................................................................................................................. 1695
EROSÃO DO SOLO E VULNERABILIDADE À DESERTIFICAÇÃO NA MICROBACIA DO
RIACHO PASSAGEM ITAÚ/RN ........................................................................................ 1700
DINÂMICA DOS AMBIENTES CARACTERÍSTICOS DO POVOADO DE PONTA DO
MANGUE, LENCOÍS MARANHENSES, MUNICÍPIO DE BARREIRINHAS – MA ..... 1709
XIII. EDUCAÇÃO AMBIENTAL E DESAFIOS NO MODELO ECONÔMICO GLOBAL
1718
TINTIM POR TINTIM: A CIÊNCIA E A COMUNICAÇÃO APLICADAS À EDUCAÇÃO
AMBIENTAL ....................................................................................................................... 1718
AGUÇANDO OS SENTIDOS: TRILHA SENSORIAL, UM PROJETO DE EDUCAÇÃO
AMBIENTAL ....................................................................................................................... 1727
EDUCAÇÃO AMBIENTAL E GESTÃO AMBIENTAL: UM ESTUDO EXPLORATÓRIO EM
EMPRESAS .......................................................................................................................... 1733
CONCEPÇÕES DE DESENVOLVIMENTO SUSTENTÁVEL E EDUCAÇÃO AMBIENTAL
VEICULADAS NA PRODUÇÃO ORGÂNICA EM COOPERATIVAS ........................... 1743
EDUCAÇÃO AMBIENTAL: PERTENCER E CUIDAR DA TEIA DA VIDA ......................... 1752
EDUCAÇÃO AMBIENTAL ENQUANTO ESTRATÉGIA DE TRANSFORMAÇÃO SOCIAL
............................................................................................................................................... 1760
CONECTANDO A ESCOLA AOS PROBLEMAS AMBIENTAIS LOCAIS: RIO MORNO OU
RIO MORTO, EIS A QUESTÃO. ........................................................................................ 1767
TRABALHO DE CAMPO NAS PESQUISAS GEOGRÁFICAS ................................................ 1775
MEIO AMBIENTE, POLÍTICAS PÚBLICAS E AUDITORIA AMBIENTAL .......................... 1784
EDUCAÇÃO AMBIENTAL X MEIO AMBIENTE: CONCEITOS EM CONSTRUÇÃO?....... 1791
A COMUNIDADE DO CABOCÓ E A PERCEPÇÃO AMBIENTAL SOBRE O RIO
CAPIBARIBE ....................................................................................................................... 1799
FÓRUM PEDAGÓGICO DE EDUCAÇÃO AMBIENTAL: A UDESC-CEPLAN FAZENDO
EXTENSÃO.......................................................................................................................... 1806
O VALOR PEDAGÓGICO DA EXPOSIÇÃO E DO CONTAR HISTÓRIAS PARA A
EDUCAÇÃO AMBIENTAL ................................................................................................ 1815
LIMITES E PERSPECTIVAS DO ENSINO SUPERIOR NA FORMAÇÃO DE PROFESSORES
PARA A EDUCAÇÃO AMBIENTAL NO ENSINO FUNDAMENTAL .......................... 1821
CONHECER PARA PRESERVAR: A VISÃO DE ESTUDANTES DE ENSINO
FUNDAMENTAL SOBRE A MATA DO BURAQUINHO EM JOÃO PESSOA, PARAÍBA
............................................................................................................................................... 1830
PROJETO NUCODEMA: UMA PROPOSTA DE FORTALECIMENTO DA PARTICIPAÇÃO
SOCIAL NA GESTÃO AMBIENTAL ................................................................................ 1851
EDUCAÇÃO AMBIENTAL COM CRIATIVIDADE ................................................................. 1857
EDUCAÇÃO AMBIENTAL: A COLETA SELETIVA NA ESCOLA ........................................ 1866
EDUCAÇÃO AMBIENTAL E EXTENSÃO RURAL ................................................................. 1873
A EDUCAÇÃO AMBIENTAL EM UMA ESCOLA PÚBLICA DE BRAGANÇA-PARÁ COMO
UM INSTRUMENTO DE CIDADANIA............................................................................. 1888
A ECOPEDAGOGIA COMO FERRAMENTA PARA A EFETIVAÇÃO DO CONSUMO
SUSTENTÁVEL .................................................................................................................. 1894
EVOLUÇÃO HUMANA E DEGRADAÇÃO AMBIENTAL: O PAPEL DA EDUCAÇÃO
AMBIENTAL ....................................................................................................................... 1908
EDUCAÇÃO AMBIENTAL, ÉTICA E CIÊNCIA: A LUTA PELA GARANTIA DO PRINCÍPIO
DA DIGNIDADE HUMANA .............................................................................................. 1916
ANÁLISE DOS DIFERENTES TIPOS DE COMPREENSÃO E PERCEPÇÃO DE MEIO
AMBIENTE ENTRE ESTUDANTES DE ESCOLA PÚBLICA ........................................ 1923
PSICOLOGIA E MEIO AMBIENTE: POSSIBILIDADES DE INTERVENÇÃO ...................... 1931
PROGRAMA DE EDUCAÇÃO SANITÁRIA E AMBIENTAL DE CIDADE NOVA, NATAL-
RN, BRASIL ......................................................................................................................... 1939
EDUCAÇÃO AMBIENTAL PARA O TURISMO E O LAZER: UMA DISCUSSÃO
DIRECIONADA AOS AMBIENTES COSTEIROS DA REGIÃO NORDESTE DO BRASIL
............................................................................................................................................... 1946
EDUCAÇÃO AMBIENTAL EM CIDADES DO AGRESTE PERNAMBUCANO:
DIVERGÊNCIAS E ATITUDES ......................................................................................... 1955
ÍNDICE DE SUSTENTABILIDADE AMBIENTAL: UMA RESPOSTA AO PROBLEMA DA
INFORMAÇÃO AMBIENTAL COMO FATOR DE CONSOLIDAÇÃO NO PROCESSO
PARTICIPATIVO ................................................................................................................ 1959
GESTÃO AMBIENTAL MUNICIPAL: UM ELEMENTO A SERVIÇO DA POLÍTICA
PÚBLICA.............................................................................................................................. 1965
EDUCAÇÃO PARA A CONVIVÊNCIA COM O SEMI-ÁRIDO BRASILEIRO –REALIDADE
NA PRÁTICA PEDAGÓGICA ............................................................................................ 1971
A EDUCAÇÃO AMBIENTAL NO ENSINO INFANTIL: UM OLHAR SOBRE A PRÁTICA
DOCENTE ............................................................................................................................ 1980
AÇÕES AMBIENTAIS NA ESCOLA.......................................................................................... 1985
“CALÇADAS AMIGAS”: UMA ESTRATÉGIA DE INTERVENÇÃO COMUNITÁRIA EM
EDUCAÇÃO AMBIENTAL ................................................................................................ 1991
CAMINHOS METODOLÓGICOS PARA PRÁTICAS DE EDUCAÇÃO AMBIENTAL NO
ENSINO FUNDAMENTAL I .............................................................................................. 1998
CONVERSANDO SOBRE A LEI DE CRIMES AMBIENTAIS NA ESCOLA PÚBLICA: UM
RELATO DESSA EXPERIENCIA DE EDUCAÇÃO AMBIENTAL ................................ 2007
EDUCAÇÃO AMBIENTAL E TURISMO ECOLÓGICO NO RIO CHORÃO MUNICIPIO DE
JUNCO DO SERIDO-PB ..................................................................................................... 2013
EDUCAÇÃO AMBIENTAL NA ESCOLA: ESTUDO DE CASO NO CEFET-RN ................... 2018
EDUCAÇÃO AMBIENTAL NO CONTEXTO DA SALA DE AULA: EXPERÊNCIA
VIVENCIADA NA ESCOLA MARIA DAS GRAÇAS C. REZENDE, CABEDELO-PB 2023
ENSINO DE GEOGRAFIA: A COTIDIANIDADE O LUGAR E O DESESNVOLVIMENTO
CRÍTICO A CERCA DOS PROBLEMAS AMBIENTAIS ................................................. 2031
MÚLTIPLOS OLHARES SOBRE EDUCAÇÃO, SOCIEDADE E NATUREZA NO CONTEXTO
ESCOLAR ............................................................................................................................ 2037
EDUCAÇÃO AMBIENTAL NO BAIRRO DE JOSÉ PINHEIRO ATRAVÉS DO CICLO`S ... 2043
O TEATRO DO OPRIMIDO E DA CRUELDADE COMO EXPRESSÕES DE CRIAÇÃO
SOCIOPOÉTICA E DA EDUCAÇÃO AMBIENTAL. ....................................................... 2050
A CONCEPÇÃO DE NATUREZA E DE MEIO AMBIENTE ENTRE OS DISCENTES E
DOCENTES DOS COLÉGIOS GAMA E ABDIAS MENEZES – VITÓRIA DA
CONQUISTA – BA: UMA ANÁLISE A PARTIR DA PERSPECTIVA SÓCIO-
INTERACIONISTA ............................................................................................................. 2056
A FORMAÇÃO CIDADÃ É FUNDAMENTAL PARA A EDUCAÇÃO AMBIENTAL .......... 2064
EXTENSÃO UNIVERSITÁRIA E EDUCAÇÃO AMBIENTAL: A EXPERIÊNCIA DO CENTRO
DE CIÊNCIAS DA UNESP ................................................................................................. 2070
O BIOMA CERRADO NA CONCEPÇÃO DOS ALUNOS DO ENSINO MÉDIO EM
ANÁPOLIS, GOIÁS ............................................................................................................. 2077
APREENSÃO DA GEOGRAFIA HISTÓRICA LOCAL-GLOBAL: RESSIGNIFICAÇÕES NO
PROCESSO DE ENSINO-APRENDIZAGEM NA E PARA A CIDADE.......................... 2086
O ENSINO DA GEOMORFOLOGIA AMBIENTAL COMO FERRAMENTA NA PREVENÇÃO
DE DESLIZAMENTOS EM ÁREAS DE ENCOSTAS DA REGIÃO METROPOLITANA
DO RECIFE / PE .................................................................................................................. 2095
PROPOSTA METODOLÓGICA PARA CONTRIBUIR À CONCEPÇÃO CIENTÍFICA DE
MUNDO , MEDIANTE O ENSINO DE GEOGRAFIA ...................................................... 2103
DIAGNÓSTICO DAS ORGANIZAÇÕES NÃO GOVERNAMENTAIS AMBIENTALISTAS
QUE ATUAM EM GOIÂNIA .............................................................................................. 2110
PERCEPÇÃO DE ESTUDANTES DE MAGISTÉRIO DE ESCOLAS CEPES, NO MUNICÍPIO
DE ITAPORANGA / PB, SOBRE TEMÁTICAS AMBIENTAIS ...................................... 2115
GESTÃO AMBIENTAL PARTICIPATIVA NAS ESCOLAS CEPES NO MUNICÍPIO DE
ITAPORANGA NO ALTO SERTÃO PARAIBANO ......................................................... 2119
Fórum Internacional do Meio Ambiente - A conferência da Terra 20

I. Ética, cidadania e meio ambiente

ÉTICA E RESPONSABILIDADE AMBIENTAL: UMA ABORDAGEM DA RELAÇÃO


ENTRE A COMUNIDADE ACADÊMICA E O CAMPUS UNIVERSITÁRIO

Diego de Oliveira Cerqueira


Graduando do curso de Ciências Biológicas - Universidade Estadual de Feira de Santana, Bahia.
dcerqueira12@hotmail.com
Dalila Souza Santos
Graduanda do curso de Ciências Biológicas - Universidade Estadual de Feira de Santana, Bahia.
Jackeline Lisboa Araújo
Graduanda do curso de Ciências Biológicas da Universidade Estadual de Feira de Santana, Bahia.

RESUMO
O presente artigo aborda a maneira como o campus da Universidade Estadual de Feira de
Santana tem sido usado pela comunidade acadêmica, sendo inclusa nesta categoria os docentes e
discentes, bem como a comunidade local que também freqüenta o espaço, e se estes têm refletido
quanto as suas ações no ambiente da UEFS e na manutenção das áreas verdes.
PALAVRAS-CHAVE: ética, consciência ambiental, comunidade acadêmica.

ABSTRACT
This article discusses how the campus of the State University of Feira de Santana has been
used by the academic community, and included in this category the teachers and students as well as
the local community who also attends the space, and if they have reflected on the their actions on
the environment of UEFS and maintenance of green areas.

INTRODUÇÃO
A existência de qualquer ser vivo gera reflexos no meio circundante, por mais tênues que
sejam. No caso dos seres humanos, estes reflexos tomam uma dimensão ainda maior, pois nossas
capacidades de raciocinar, de planejar, nos permitem ampliar esta interação com o meio ambiente.
Assim é que atividade humana é, de forma diretamente ou indiretamente, responsável por
modificações na maior parte da cobertura vegetal do planeta, e está relacionada à extinção de várias
espécies animais.
Em poucos séculos, o homem conseguiu destruir grande parte da cobertura vegetal e por
em risco a existência de milhões de espécies. O desenvolvimento tecnológico e cientifico cresce de
forma acelerada e encontra na natureza um empecilho para o progresso rápido. O progresso quer
acontecer e de modo veloz, age-se então desconsiderando ações que agridem o meio ambiente. Esta
mentalidade de descaso se alastra nas mínimas relações cotidianas que mantemos com o ambiente,
nas nossas práticas diárias.
Muitas pessoas conseguem visualizar a questão da preservação ambiental (LAGO, 1986)
em âmbito global, e estabelece um discurso bonito em relação a essa questão, mas não conseguem
enxergar o ambiente local e estabelecer com este uma relação harmônica. A destinação correta do
lixo, o respeito pelos animais e suas formas de sobrevivência bem como a preservação da flora são
coisas que passam despercebidas no cotidiano agitado das pessoas. E estas questões merecem
atenção, pois são de pontos locais e de ações mínimas que conseguiremos grandes resultados.
É urgente, portanto, uma ação de responsabilidade para com o meio circundante, ou
estaremos comprometendo a existência saudável dos seres no planeta e a possibilidade de gerações
futuras. A responsabilidade torna-se eixo norteador principal ao tratarmos da relação homem-
natureza, esta responsabilidade implica numa mudança pragmática, ou seja, na elaboração de uma
nova ética (LOLAS, 2001) contempladora das mudanças em curso nos nossos dias.
Fórum Internacional do Meio Ambiente - A conferência da Terra 21

OBJETIVOS
Geral:
Identificar as relações sócio-ambientais entre a comunidade acadêmica e o campus
universitário.

Específicos:
Evidenciar o tratamento com relação ao lixo produzido;
Analisar a relação estabelecida com os animais presentes no campus;
Reconhecer a importância da flora no cotidiano das pessoas.

METODOLOGIA
Esta pesquisa foi realizada no campus da Universidade Estadual de Feira de Santana
(UEFS), na área que compreende o portão de entrada da universidade ao módulo VII, o que inclui
os PATs e as cantinas. Para atingir os objetivos propostos foram realizadas quatro observações
diretas no período de 26 de novembro à 21 de dezembro. Os espaços e tempos foram escolhidos
aleatoriamente, sem influência dos observadores. As informações foram registradas através de
fotografia, utilizando maquina digital, e em caderno de campo, para posterior análise.
Observaram-se os tipos de lixo mais comumente produzidos pela comunidade, o destino
dado a este material, os locais de descarte (lixeira, chão, vaso sanitário, etc..), se a coleta seletiva é
respeitada e quais os pontos onde ele é mais eficiente.
Levantamento das espécies de animais que freqüentam os espaços destinados aos humanos,
como cantinas e salas de aula. Observar de que forma a presença desses animais afetam as
atividades da comunidade (seja causando incomodo, constrangimento ou medo).
Em relação à flora, foi realizado um levantamento dos tipos de plantas encontradas no
campus que são úteis para as atividade das pessoas, e para que finalidade são aproveitadas.

RESULTADOS E DISCUSSÃO
Para compreender os resultados aqui apresentados, faz-se necessário uma descrição
detalhada do espaço físico observado. A área de trabalho compreende desde o pórtico, passando
pelos módulos do 1 até o último módulo (módulo 7). Sendo que os módulos mantêm uma
similaridade quanto à disposição das estruturas físicas divididas em: área de departamento e
colegiados, módulos teóricos, módulos práticos, pavilhão de aulas teóricas (PAT) e áreas abertas
que separam um módulo do outro. Encontram-se ainda nos módulos 1, 3, 5 e 7 espaços de
alimentação (cantina).
Cada observação foi realizada em horário aleatório, somente no período diurno. Os
seguintes dados e suas respectivas descrições e análises são descritos abaixo:

O tratamento dado ao lixo produzido no campus


Em relação ao lixo produzido, foi observado que o tipo orgânico é o mais comumente
encontrado, principalmente nas cantinas. Já o do tipo papel, plástico e metal são mais freqüentes nas
lixeiras distribuídas nas salas do PAT e nas áreas de departamentos. Todo o lixo é recolhido por
funcionários da limpeza que se encarregam de transportá-lo para uma lixeira central localizada no
final de cada módulo. Em seguida, esse lixo é recolhido por um carro coletor que passa por todos os
módulos.
Fórum Internacional do Meio Ambiente - A conferência da Terra 22

Figura 1: Lixeira central localizada no final de um dos módulos do campus da UEFS.

Apesar de todo o cuidado da prefeitura do campus em organizar o descarte do lixo,


encontra-se material espalhado pelo chão, em locais como fundo das cantinas, dos PATs e nas áreas
verde. Isso demonstra a falta de consciência ambiental das pessoas que utilizam esses espaços para
realizar suas atividades acadêmicas, não atentando para a manutenção dos espaços utilizados no seu
cotidiano.

Figura 2: Área do fundo da cantina do módulo 1.

Em relação à coleta seletiva, observa-se que ela é pouco eficiente. Algumas lixeiras estão
desativadas e outras não apresentam código de cores do tipo de lixo a ser descartado naquele
recinto. Devido a esta situação, o lixo não é devidamente descartado pela comunidade acadêmica.
Fórum Internacional do Meio Ambiente - A conferência da Terra 23

Figura 3: Lixeiras com o padrão de coleta seletiva, encontradas pelo campus da UEFS.

Relação entre comunidade acadêmica e os animais presentes no campus.


A fauna do campus é representada por indivíduos dos mais variados grupos de animais.
Sendo que os mais freqüentemente encontrados são do grupo dos mamíferos (Carnívora e Primates)
e insetos (Hexapoda). A relação das pessoas com estes animais é de certa forma harmoniosa, visto
que não há competição por espaço ou por alimento. Alguns funcionários alimentam os micos,
cachorros e gatos, e uma funcionária afirma que isto já se tornou um hábito.

Figura 4: Funcionária alimentando animal encontrado no campus.


Fórum Internacional do Meio Ambiente - A conferência da Terra 24

Os gatos são encontrados principalmente nas áreas das cantinas, devido à possibilidade de
obter alimento. Em outras áreas, os funcionários disponibilizam comida e água em pequenos
recipientes. Apesar de sinalizações do Comitê de Ética no Uso dos Animais – CEUA – em
conscientizar a comunidade acadêmica para não alimentar os animais do campus, as pessoas que
freqüentam a cantina e os funcionários citados anteriormente, não respeitam esta norma. O mesmo
ocorre com os micos e cães que são alimentados diariamente por uma funcionária, resultando numa
atração destes animais a freqüentar a área do campus e no aumento da população desses grupos.

Figura 5: Animais encontrados no campus.

Um fato desagradável é a presença de abelhas nas cantinas. Ao se dirigirem as lixeiras em


busca de alimento, elas permanecem nestes locais, gerando um incomodo nas pessoas que
freqüentam estes espaços.
Fórum Internacional do Meio Ambiente - A conferência da Terra 25

Figura 6: Abelhas encontradas nas lixeiras próxima a cantina do módulo 3.

Importância da flora no cotidiano das pessoas.


O campus apresenta uma grande diversidade de espécies de plantas características da
caatinga. Famílias como Leguminosae e Anacardiaceae, são comumente usadas pelas pessoas
devido à grande copa que apresentam. As práticas observadas nestas áreas são: reuniões em grupo,
descanso, proteger-se dos raios solares e até grupos de estudos. Além disso, as plantas frutíferas são
utilizadas como fonte de alimento. Projetos de identificação das plantas do campus e implantação
de placas de identificação foram relatados por um professor como projeto a ser desenvolvido no
campus, mas devido a algumas questões administrativas, não foi ainda implantado.

Figura 7: Utilização da flora pelos acadêmicos e funcionários da UEFS.


Fórum Internacional do Meio Ambiente - A conferência da Terra 26

Um espaço criado recentemente foi o bosque de pau-brasil. Localizado antes do primeiro


módulo, era um ambiente pouco freqüentado pelos discentes, mas devido à instalação de bancos e
limpeza do local com freqüência, tornou-se um espaço de estudo e confraternizações.

Figura 8: Área do Bosque de Pau Brasil.

Utilização da área do campus para desenvolver trabalhos das disciplinas acadêmicas.


Alguns professores desenvolvem atividades práticas nas áreas entre os módulos. Alunos da
área de engenharia civil são vistos frequentemente realizando mapeamento e levantamento dos
níveis de declividade do relevo, principalmente entre os módulos 3 e 4.
Fórum Internacional do Meio Ambiente - A conferência da Terra 27

Figura 9: Estudantes de Engenharia Civil utilizando o campus como instrumento de estudos


práticos.

É muito comum também, os professores da área de botânica utilizarem as plantas do


campus como material vivo para identificar os grupos das plantas e suas respectivas estruturas nas
suas aulas práticas.

Figura 10: Aula prática do curso de Ciências Biológicas no campus da UEFS.

CONSIDERAÇÕES FINAIS
Diante do trabalho realizado, conclui-se que a comunidade acadêmica possui um papel
crucial na manutenção do meio natural do campus universitário. Seus hábitos e práticas do
cotidiano são responsáveis tanto pelo equilíbrio, quanto pelo desequilíbrio das relações homem-
natureza.
Além disso, nota-se que apesar da grande utilidade de muitos recursos do campus, a
comunidade acadêmica muitas vezes se recusa a utilizá-los de maneira racional e sustentável. Esse
tipo de atitude reflete a falta de ética e responsabilidade ambiental que, infelizmente, ainda perdura
no meio acadêmico.
Desse modo, é mister uma mudança de comportamento e atitude por parte de todos os
setores que compõem a instituição. Desde a prefeitura do campus, com o elemento burocrático dos
métodos e equipamentos necessários à manutenção do espaço natural, até a comunidade usuária,
com o respeito e a prática adequados.

REFERÊNCIA BIBLIOGRÁFICA
LAGO, Paulo Fernando; Universidade para o Desenvolvimento do Estado de Santa Catarina. A
consciência ecológica : a luta pelo futuro. Florianópolis: Ed. da UFSC, UDESC, c1986.
LOLAS, Fernando. Bioética: o que e, como se faz. São Paulo: Loyola, c2001.
OLIVEIRA, Fátima. Bioética: uma face da cidadania. 2. ed. São Paulo: Moderna, 1997.
RODRIGUES, Rosicler Martins. Vida na Terra: conhecer para proteger. 16. ed. São Paulo:
Moderna, 1997.
Fórum Internacional do Meio Ambiente - A conferência da Terra 28

A FORMAÇÃO CIDADÃ É FUNDAMENTAL PARA A EDUCAÇÃO AMBIENTAL

Hélcia Macedo de Carvalho Diniz e Silva


Profª. Ms. DFE/CE/UFPB – SEDEC/JP. helciamacedo@hotmail.com

RESUMO
O presente estudo em filosofia tem como objetivo abordar a educação ambiental para a
formação da cidadania e como o ensino de filosofia se faz necessário para tal formação, para isso
apresentamos os fundamentos da filosofia. Esta temática é analisada para testar esta hipótese, não
podemos prescindir da oficina de conceitos filosóficos para a formação do cidadão.

ABSTRACT
The aim of this study in philosophy is to present an approach to the environmental
education, a person’s formation to citizenship and the how philosophy’s teach is necessary to this
formation, and then we present the philosophy’s foundations. Finally, we examine that possibility,
we cannot to form a person without workshop in philosophy.

INTRODUÇÃO
A educação é fundamental para o desenvolvimento do ser humano e toda a esfera global da
qual ele faz parte. Ela deveria ser tratada como um dos pilares da formação cidadã, isto é, deveria
ser prioridade nos investimentos e ações institucionais. Contudo, a realidade educacional brasileira
apresenta-se precária e desprestigiada. Os investimentos existentes, que ainda não atendem a
necessidade da população, muitas vezes têm uma aplicação deturpada e, por isso, ineficaz.
É diante dessa realidade que apresentamos nossa pesquisa, cujo objetivo é refletir sobre a
educação ambiental e, em seguida, acentuar que esta e outras conscientizações devem ter formação
voltada para a cidadania, a qual não prescinde de conhecimentos filosóficos, os seus fundamentos
perpassam áreas diversas. Eis uma reflexão sobre os problemas por que passa a educação brasileira.
Apresentamos, mesmo que timidamente, uma reflexão que analisa a realidade da educação
e aponta medidas, as quais possivelmente possibilitarão avanços e melhorias nos aspectos
pertinentes à postura cidadã do Ser, que está no mundo, enquanto agente transformador e
modificador da realidade.
Na medida em que o homem participa ativamente deste mundo, ele tem o poder de agir no
meio, tem o poder de beneficiar, melhorar o meio ambiente1, assim como pode destruí-lo. O
potencial positivo é pouco explorado até os dias atuais. A atuação das pessoas põe em iminência o
ambiente em que vivem. Ma maioria das vezes, elas são causadoras de desastrosas conseqüências
no meio ambiente, causando transtornos na rotina da humanidade. É incomensurável o impacto de
danos ambientais para as gerações atuais e futuras. Decorre disso a importância dessas reflexões, as
quais atravessam fronteiras. Importante é a forma como nossas reflexões incidem no mundo
globalizado, que no momento de crise busca entendê-la para superá-la.

Educação: o fundamento da ação humana


A ação do homem, leia-se humanidade, tem um fundamento que perpassa a educação
(Paidéia, afirma a filosofia grega). Dos gregos herdamos, por exemplo, o entendimento de que o
homem é um “animal racional” (Aristóteles) dotado de razão (logos). Ele, portanto, é capaz de
pensar e opinar (doxa) de forma lógica, muitas vezes coerente e outras tantas adequadas ao interesse
próprio. Na Paidéia grega a cultura era vista como algo natural, cotidiano. A preocupação maior da
época é o Homem, no sentido de humanidade, e sua capacidade de desenvolver habilidades
específicas adquiridas culturalmente. Dessa forma, lembramos ainda o entendimento da postura

1
Entende-se por meio ambiente "o conjunto de condições, leis, influências e interações de ordem física, química e
biológica, que permite, abriga e rege a vida em todas as suas formas". (Lei nº 6.938, de 31/08/1981, artigo 3º, inciso I).
Fórum Internacional do Meio Ambiente - A conferência da Terra 29

socrática e sua inquietação “conhece-te a ti mesmo”, frase que marca sua trajetória em busca de
conhecer. O método denominado de maiêutica socrática instigava o indivíduo a refletir sobre
determinado tema, provocando uma análise de suas “certezas” acerca do assunto discutido. Os
diálogos de Platão mostram Sócrates a dialogar com seus interlocutores, estes acabavam
reconhecendo a própria ignorância. Com o passar do debate e ao se deparar com questionamentos
filosóficos sobre a virtude, o amor e a justiça, por exemplo, os interlocutores reconheciam que não
tinham conhecimento profundo e bem justificado. A isso chamamos de tomada de consciência,
perceber-se que nada se sabe em sua totalidade, que o conhecimento é uma construção dialogada. O
legado socrático para a educação foi o método que leva a reflexão, não dando respostas prontas.
Com o advento da Idade Média, o surgimento da escolástica entra em evidência, a
educação para a formação religiosa do homem deve buscar conhecer a Deus. O fundamental neste
período de nossa história é analisar o homem como imagem e semelhança de Deus dentro de uma
perspectiva criacionista. Os ensinamentos obedeciam ao método catequético. Entendendo o homem
como criatura divina, que está de passagem pela terra e que deveria ter como principal preocupação
chegar à salvação, a vida eterna. Para isso, faz-se mister seguir o exemplo bíblico da encarnação de
Deus, Jesus. Nessa concepção é que se fundamentou a educação onde se recomendava a obediência
ao princípio da autoridade cristã. Isso exigia da criatura humildade, atuando de forma subordinada à
igreja, escutando-a e seguindo a máxima que “Deus é o princípio de todas as coisas”, inclusive da
ação pedagógica. Aos poucos os heróis gregos e mitológicos foram substituídos pelos bíblicos. Do
filósofo e teólogo Tomás de Aquino é possível destacar este feito, a conciliação da fé cristã com o
pensamento filosófico de Aristóteles. Tal conciliação ainda gera muitas discussões entre os
filósofos. É sabido que Aristóteles não concebia a idéia de Deus e de homem como a da igreja. Ele
via o homem como sendo formado de corpo e alma indissociáveis.
No período de transição para a idade moderna, a sociedade se depara com rompimentos,
um deles é a desconsideração dos dogmas antes respeitados de forma inquestionável. Mesmo
criticando a autoridade dogmática da igreja a sociedade continua sendo bastante hierarquizada. A
educação, com essa mudança de postura, baseia-se na redescoberta dos clássicos, leia-se a Grécia
em sua plenitude. Assim, a supremacia da igreja vai dando lugar à postura crítica e ao uso da razão.
O homem em processo de oposição das concepções peremptórias, dogmáticas e alienadoras.
Citamos Martin Lutero como ícone das críticas e da liberdade de pensamento do ser humano, capaz
de pensar e concluir suas próprias concepções ele é um março da ruptura da crença, sua atitude gera
atos que protestam com o que está posto.
A educação renascentista mudou muitos conceitos da educação medieval. A ruptura da
filosofia com a teologia da época, resgata valores da cultura grega. Propunha que a educação do
indivíduo deveria possibilitá-lo manifestar suas opiniões (doxas) fundamentadas e seus
questionamentos pertinentes usando a razão e não a fé. Erasmo de Roterdã, pensador renascentista
propões a busca da moralidade verdadeira do homem. Para ele a educação saudável era aquela em
que não houvesse controle do cristianismo e que o homem pudesse ser livre para pensar.
De modo introdutório destacamos o fundamento do pensamento kantiano. O qual analisava
a educação pelos seguintes elementos: disciplina, instrução (positiva), esclarecimento e cuidado. A
disciplina é vista por ele como algo negativo, porém ela é necessária para o homem, ela permite que
o homem seja dotado de civilização, o homem, através dela aprende a domar seus instintos. A
instrução positiva mostra, ao passo que conscientiza o indivíduo, tornando-o responsável por suas
ações. Decorre disso o esclarecimento, Kant apregoa o pensar por si mesmo ao mesmo tempo em
que se leva em conta o universo. Na medida em que o homem adquire a capacidade de ter as suas
próprias opiniões ele alcança a maioridade, saindo de sua menoridade, que é o pensamento
“infantil”, isto é, levado por outros. O ser humano, portanto, precisa de cuidado, precisa ser
higienizado, amado e guiado.
Com essas breves considerações, percebemos que o fundamento da educação perpassa a
condição humana, o homem dentro do mundo como ser atuante do meio. Ela vai conduzindo a ação
do homem dentro do contexto em que está inserido. Como iluminismo solidifica, então, a
valorização do raciocínio humano. Para Rousseau o homem é naturalmente bom fora do estado
Fórum Internacional do Meio Ambiente - A conferência da Terra 30

civil. Com isso ele está afirmando que é a sociedade que corrompe o ser humano e não o contrário.
O nosso foco, todavia, é a educação enquanto fundamento para a ação humana. Diante do exposto
identificamos o quanto, com o passar do tempo, muitos pensadores se preocuparam com isso.
Atualmente, estamos questionando a forma que fazemos educação no Brasil. Nossas pesquisas
sobre o ensino de filosofia, precisamente, mostra momentos da prática educacional onde há
períodos que o estudante tem contato com os ensinamentos filosóficos desde o nível básico
enquanto outros a referida disciplina é execrada do currículo, assunto que discutiremos no próximo
item.

A educação no Brasil e o ensino de filosofia


Considerando que um dos pilares no desenvolvimento de um país é a educação, uma vez
que através dela pode-se atingir melhores desempenhos na economia, por exemplo, iremos discutir
a educação no Brasil através da realidade do ensino de filosofia.
A tomada de consciência das ações do ser humano requer educação, pois devemos ser
educados para atuar no seio social nos mais variados espaços. Destacamos a educação ambiental,
como sólido exemplo do homem como ator determinante, livre, igual e solidário às questões
ambientais, esta tem recebido um olhar cuidadoso no processo educacional brasileiro. Isso ocorreu
por causa do ritmo acelerado de devastação, motivo de alerta. As gerações atuais sofrem os
impactos dos danos ambientais provocados por gerações anteriores, enquanto ecologistas de todo o
mundo pesquisam estratégias para mobilizar os órgãos competentes e movimentos sociais para
controlar o desflorestamento, a camada de ozônio e outros tipos de agressões ao meio ambiente. Os
reflexos desses danos podem afetar ainda mais as gerações futuras. Decorre disso o fato da questão
ambiental ser preocupante na dimensão global.
Em 1949 foi realizada em Lake Sucess, nos EUA, a Conferência Científica da ONU sobre a
Conservação e Utilização de Recursos (UNSCCUR). Carson (1962) em sua obra Silent Spring
relata os efeitos contrários da má utilização dos pesticidas e inseticidas químicos sintéticos estas são
tentativas de alertar as pessoas do iminente colapso ambiental devido ao crescimento populacional,
o desenvolvimento industrial e a corrida armamentista (testes nucleares) através da educação. Ela
inicia The Environmental Moviment in the United States.
No ano de 1992, no mês de junho, o Brasil foi o palco da Rio-92. No Rio de Janeiro a
conferência das Nações Unidas sobre o Meio Ambiente e Desenvolvimento (CNUMAD-92), foi um
mega evento que teve por objetivo examinar as estratégias de desenvolvimento de acordo com este
princípio, “os seres humanos constituem o centro das preocupações relacionadas com o
desenvolvimento sustentável. Têm o direito a uma vida saudável e produtiva em harmonia com o
meio ambiente” (MILARÉ, 1992, p. 83).
Entendendo-se a cidadania com o estabelecimento que enlaça o indivíduo e a organização
de poder na instância política, Barroso (1992) ensina que a Constituição Federal de 1988
estabeleceu abertura de canais para participação efetiva na vida social, através do cidadão ou da
coletividade. Milaré (1992, p. 83) observa que “reforçaram-se os canais de diálogo ante a convicção
de que os cidadãos, com amplos conhecimentos de sua realidade e com acesso à informação, teêm
melhores condições de atuar sobre a sociedade, de articular mais eficazmente desejos e idéias e de
tomar parte ativa nas decisões que lhe interessam diretamente”.
Com efeito, o homem se toma parte efetivamente de algo, quando ele adquire
conhecimentos sólidos, bem justificados e amplos sobre o assunto. As conferências e pesquisas que
citamos, assim como a grande produção intelectual que circula sobre a temática “meio ambiente”
ainda são insuficientes para que o cidadão assuma tal postura. Articular idéias e tomar parte ativa
nas decisões requer mudança de comportamento. Disto posto, a realidade evidencia homens e
mulheres que não assumiram o papel de agentes fiscalizadores em defesa do meio ambiente,
simplesmente porque mega eventos e produções intelectuais não são a base da formação
educacional. Miralé (1992) em sua observação deixa de ressaltar explicitamente a formação cidadã,
a esta estamos ressaltando a formação que prima pelo ensino de filosofia em todos os níveis da
educação, seja básica e/ou inicial.
Fórum Internacional do Meio Ambiente - A conferência da Terra 31

A convicção é uma postura advinda da tomada de consciência, a qual requer competência


intelectual para dialogar com as mais variadas concepções sobre determinados assuntos. Com isso,
acreditamos que é fundamental na formação do indivíduo o estudo dos fundamentos filosóficos que
tratamos no item um.
Na realidade a história do ensino de filosofia no Brasil é dramática, cheias de altos e
baixos. Em Uma Contribuição Didático-pedagógica do Ensino de Filosofia no Ensino Médio na
Paraíba, discutimos a LDB (Lei de Diretrizes e Bases), de nº. 9.394/96 numa dimensão nacional do
assunto e delimitamos em seguida a realidade da Paraíba.
A LDB exige uma formação cidadã, Silva (2003, p. 14) explica: “Ao exigir uma formação
cidadã do indivíduo a lei está remetendo-se ao ensino de filosofia, a pessoa deve apresentar
condições para enfrentar o mundo, entenda-se, mercado de trabalho, família e sociedade”. Sem
dúvida a contribuição da disciplina filosofia, nos níveis de formação básica e inicial, visando
atender a finalidade da lei é inquestionável. As especificidades da filosofia a serviço da educação
ressaltam que o ensino de filosofia e sua capacidade de trabalhar a formação da cidadania é algo
que não se encontra nas demais disciplinas. Sendo a importância desta tão sublime como as línguas,
artes e ciências.
Enquanto o Brasil caminha a passos largos no âmbito das tecnologias, avançando em
estudos científicos da medicina regenerativa com a promessa de cura através de células-tronco, há
um Brasil aquém a esta realidade inovadora, o Brasil da educação.
Com efeito, são muitas as instituições educacionais onde o aluno recebe uma formação
precária, com metodologia ultrapassada, sendo apenas um número na estatística do MEC. Este
estudante sofrerá ao se deparar com o mundo que está cada vez mais globalizado e competitivo.
Decorre disso a necessidade de se correr atrás do prejuízo. Uma das formas é a disciplina filosofia
com a especificidade que se baseia na criação de conceitos, porém estes conceitos segundo Savatter
(ano) devem ser encarados como problemas e propostos aos alunos através de temas como:
liberdade, morte, tempo, virtude e justiça nesse contexto Gallo (ano) recorre a Deleuze (ano), o qual
coloca o professor de filosofia como um eterno aprendiz e os conceitos como construção de
conhecimento não concluídos, pelo contrário, conceitos construídos diante de problemáticas que
persistem e sempre se renovam.
Entendemos que todo o legado filosófico e sua história são importantes para a construção
do conhecimento que coloca o aluno como protagonista. Sendo assim, pensar o que está posto desde
sempre é desvelar e desbanalizar a realidade que muitas vezes encontra-se velada na cotidianidade
do Ser. O ensino de filosofia tem por objetivo complementar a formação de estudantes no sentido
de proporcionar na sala de aula debates, questionamentos, discussões intelectuais e produção de
novos conceitos. Tudo isso, tem como ponto de partida o legado de mais de 2.500 anos de produção
filosófica existente na literatura ocidental.

CONSIDERAÇÕES FINAIS
À guisa de conclusão consideramos a educação o processo essencial para a formação da
cidadania da humanidade. Porque ele é o fundamento que fortalece e solidifica a atuação dos seres
humanos na sociedade e sem ela nada se constrói solidamente. Então, o estofo dos fundamentos está
na filosofia, por isso há que se estudar os fundamentos filosóficos, pois são estes que, desde sempre,
possibilitam a elaboração intelectual, trabalhando com conceitos. Conhecimento necessário para
atuar no seio social como seres éticos, políticos e cidadãos. Para isso a educação é transformação e
requer das pessoas articulação intelectual e raciocínio lógico para resolver problemas. Contudo, o
que acontece é uma educação voltada para a formação tecnicista. No Brasil, por exemplo, o
positivismo vem sendo aplicado no processo educacional desde o início do século XX. É sabido
que, até os tempos hodiernos ele se mostrou tecnicista e específico demais, segmentando os
conteúdos e dando destaque ao fazer tecnicamente. Decorre disso, a grande leva de profissionais
especialistas em algo, exímios conhecedores da parte que aprendeu, porém incapazes de ver o todo
da questão, na medicina por exemplo o médico a figura do clínico geral perdeu espaço para o os
especialistas no caso do oftalmologista, por exemplo, a sua função é examinar a vista do paciente e
Fórum Internacional do Meio Ambiente - A conferência da Terra 32

atestar se o mesmo precisará de óculos, ou não. Caso este paciente se queixe da dor na cabeça em
cima dos olhos ele o encaminha para um neurologista, porque cabeça é outra especialidade.
Voltando para a nossa discussão, a formação do profissional com a especificidade tecnicista
simplesmente, acarretou profissionais segregados, por isso a corrida pela humanização da saúde.
Tal necessidade se dá pela lacuna que ficou na formação inicial, a formação da postura crítica e a
tomada de consciência.
Com efeito, não traçamos todos os lados do prisma que forma a cidadania. Todavia
falamos sobre educação para a cidadania e sua atuação enquanto cidadão no meio ambiente. Nosso
objetivo foi refletir sobre a educação ambiental, não no sentido de pregar o que é certo ou errado
enquanto atuantes no meio ambiente, esse aspecto é muito trabalhado pelos ambientalista,
ecologistas etc., trouxemos uma discussão aprofundada da formação da cidadania, na qual é
imprescindível conhecimentos filosóficos, como bem colocou a LDB nº. 9.394/96 (Lei de Diretrizes
e Bases). Entendemos que esse processo de trabalho intelectual, uma oficina de conceitos, cujo
objetivo é trabalhar questões como ética, virtude, justiça etc., em médio prazo, irradiará para outras
áreas mudanças de comportamento. Os estudantes de filosofia desenvolvem as aptidões em
matemática, física, química e línguas porque aprendem a sistematizar o pensamento e pensar
logicamente. Esta é uma opção para se trabalhar a educação, ela não se pretende resolver todos os
problemas da humanidade, apenas chega como um ponto forte na colaboração da tomada de
consciência dos seres humanos. A proposta da educação para o pensar refletirá na mudança de
comportamento e, não com garantia total, conscientizará para a preservação do meio ambiente, por
exemplo. A educação que desencadeia a tomada de consciência é tão forte na concepção de homem
que acarreta a mudança de comportamento, algo almejado porque dessa forma haverá uma
transformação dos atos, os quais tenderão para o bem agir.
Louvamos as iniciativas de congressos, artigos e conferências que discutem determinados
temas. Contudo não acreditamos que os trabalhos acadêmicos por si só, como nos casos das
publicações e conferências, alcancem quem está longe da academia, isto é, o senso comum, a ponto
de trabalhar o esclarecimento e formação humana da grande massa. Esta formação, sem dúvida, não
se constrói com in-formações e sim com a formação sólida e gradativa. As aulas de filosofia, nos
diferentes níveis de ensino têm por objetivo suscitar a dúvida, delas vêm discussões pertinentes ao
tema sugerido, que por fim deve acarretar a construção de conceitos próprios, isto é, cada aluno
capaz de construir conceito, enquanto protagonista, este é um trabalho em médio prazo.
Será por isso, por dar resultado em médio prazo que a educação não evidencia o ensino de
filosofia? Os investimentos mostram que a gestão governamental não acredita no trabalho sólido e
consistente da formação intelectual, que requer tempo, ela quer respostas imediatas. De nada
adianta a Constituição Federal (CF) pregar que se deve possibilitar diálogos para melhorar a atuação
do cidadão na tomada de decisões, como ressaltou Milaré (1992), uma vez que nestas condições
eles devem ter amplo conhecimento sobre a realidade. Tais razões comprovam que não se
prescindir dos conceitos da filosofia para a formação do cidadão.
Conhecimentos sólidos com argumentos construídos de forma bem justificada,
característica dos que tiveram uma formação completa, isto é, com todas as disciplinas e mais a de
filosofia é o meio que possibilita ao cidadão a capacidade dessa tomada de consciência apregoada
pela CF. O paradoxo está no fato da falta de condições desse cidadão em torna-se capaz de obter
amplo conhecimento sobre a realidade, uma vez que sua realidade é precária e a política neoliberal
tem como meta diminuir em termos estatísticos e a qualquer custo o número de analfabetos.

REFERÊNCIAS BIBLIOGRAFICAS
CARSON, Raquel. Silent Spring. Boston: Houghton Mifflin Co.,1962.
MILARÉ, Édis. A participação comunitária na tutela do ambiente. In: Revista Forense, vol. 317.
Rio de Janeiro: Editora Forense, 1992.
BRASIL. Constituição de (1988).
Fórum Internacional do Meio Ambiente - A conferência da Terra 33

BARROSO, Luis Roberto. A Proteção do Meio Ambiente na Constituição Brasileira. In: Cadernos
de Direito Constitucional e Ciência Política 1. Ano 1. São Paulo: Ed. RT, Dezembro de 1992, pp.
115-140.
PLATÃO. A República. Os pensadores. São Paulo: Abril cultural, 1979.
GALLO, Silvio. A especificidade do ensino de filosofia: em torno dos conceitos. In: PIOSEVA,
Américo et al. Filosofia e ensino em debate. Ijuí: Unijuí, 2002.
ARISTÓTELES. Política. Os pensadores. São Paulo: Abril culrtural, 1979.
DESCARTES. Discurso do método. Os pensadores. São Paulo: Abril Cultural, 1979
AGOSTINHO, Santo. As cofissões. Os pensadores. São Paulo: Abril cultural, 1979.
ROUSSEAU, J-J. Emílio. São Paulo: Martins Fontes, 2004.
SILVA, Hélcia Macedo de Carvalho Diniz e Silva. Uma contribuição didático-pedagógica do
ensino de filosofia no ensino médio na Paraíba. Monografia (Bacharelado e Licenciatura em
Filosofia) – Universidade Federal da Paraíba. Biblioteca Central.
FERREIRA, Leila da Costa. A questão ambiental: sustentabilidade e políticas públicas no Brasil.
São Paulo: Boitempo, 1998.
FARIAS, Paulo José Leite. Competência Federativa e Proteção Ambiental. Porto Alegre: Sérgio
Antonio Fabris Editor, 1999.
McCORMICK, John. Rumo ao Paraíso. A História do Movimento Ambientalista. Rio de Janeiro:
Relume-Dumará, 1992.
VIEIRA, Liszt. Cidadania e Globalização. Rio de Janeiro: Record, 1998.
Fórum Internacional do Meio Ambiente - A conferência da Terra 34

ÉTICA E GESTÃO AMBIENTAL: ANÁLISE DO PROCESSO DE IMPLANTAÇÃO DO


PROJETO DE ESGOTAMENTO SANITÁRIO DAS PRAIAS DO MUNICÍPIO DE
PARNAMIRIM – RN

Karoline Rachel Teodosio de Melo


Graduanda do Curso de Tecnologia em Gestão Ambiental do CEFET – RN; Graduanda do curso de Biomedicina pela
UFRN. melo.krt@gmail.com.br
Profº. Ms. Samir Cristino de Souza
Professor do CEFET – RN; Doutorando do Programa de Pós-Graduação em Educação da UFRN; Pesquisador do Grupo
de Estudos da Complexidade (GRECOM); Coordenador do Grupo de Estudos da Transdisciplinaridade e da
Complexidade do CEFET-RN (GETC). samir@cefetrn.br
Centro Federal de Educação Tecnológica do Rio Grande do Norte – CEFET/RN, Av. Sen. Salgado Filho, 1559, Tirol,
Natal-RN, Fone/Fax: +55 (84) 4005-2600 / 4005-2694.

RESUMO
As medidas efetivadas pelos órgãos responsáveis pelo meio ambiente mostram que tais
órgãos ainda não compreendem que as questões ambientais não se referem apenas a problemas de
ordem técnica, política e econômica. O presente trabalho aborda a ética e gestão ambiental e tem
como objetivo analisar a conduta ética dos gestores públicos de Meio Ambiente do Rio Grande do
Norte, por meio do estudo de caso da instalação do Projeto de Esgotos Sanitários da Comunidade de
Pium, e das Praias das Praias de Cotovelo e Pirangi do Norte, no Município de Parnamirim-RN.
Com este propósito é feita uma explicação sucinta de aspectos teóricos da ética ambiental baseada
na responsabilidade, proposta por Hans Jonas. Em seguida, é avaliada a postura da CAERN,
IDEMA, Ministério Público e comunidade de Pium no processo de implantação da ETE em
comparação ao que é proposto pela referência apontada. Ficou evidente, ao longo da pesquisa, a
necessidade de uma mudança de comportamento com relação ao trato com as questões ambientais.
Portanto, espera-se, por meio do presente trabalho, formar uma nova consciência ética baseada na
responsabilidade ambiental.
Palavras-chave: Ética Ambiental, Gestão ambiental, Ética da responsabilidade.

ABSTRACT
The measures executed by the responsible organs by the environment show that such
organs still don't understand that the environmental subjects if they don't just refer to problems of
technical order, politics and economical. The present work approaches the ethics and environmental
administration and it has as objective analyzes the public managers' of Environment of Rio Grande
do Norte ethical conduct, through the study of case of the installation of the Project of Sanitary
Sewers of the Community of Pium, and of the Beaches of Cotovelo and Pirangi of the North, in the
Municipal district of Parnamirim-RN. With this purpose it is made a brief explanation of theoretical
aspects of the environmental ethics based in the responsibility, proposed by Hans Jonas. Soon
afterwards, the posture of CAERN, IDEMA, Public prosecution service and community of Pium in
the process of implantation of ETE is evaluated in comparison with the that is proposed by the
pointed reference. It was evident, along the research, the need of a change of behavior regarding the
treatment with the environmental subjects. Therefore, it is waited, through the present work, to form
a new ethical conscience based on the environmental responsibility.
Keywords: Environmental ethics, environmental Administration, Ethics of the responsibility.

INTRODUÇÃO
Constata-se que a os problemas ecológicos não dependem apenas de soluções técnicas para
sua resolução. Eles pedem uma resposta ética, requerem também uma mudança de paradigma na
vida pessoal, na convivência em sociedade, na produção de bens de consumo e, sobretudo, no
relacionamento com a natureza. Os problemas ambientais apontam para uma mudança de rota na
organização econômico-industrial e político-social e a conversão das atitudes de consumo e de
relacionamento com o meio ambiente. Trata-se, no fundo, de mudar a visão de mundo
contemporânea. (JUNGES, 2004).
Fórum Internacional do Meio Ambiente - A conferência da Terra 35

Assim, não se pode apenas assumir o encargo das conseqüências imediatas previsíveis de
nossos atos. Faz-se necessário elevar o olhar muito além, de maneira a manter na existência da
humanidade futura; a sobrevivência humana constitui o fruto desse olhar longínquo, seu autêntico
objetivo (RUSS, 1999, p. 45).
Mediante o exposto, observa-se que as instituições governamentais responsáveis pelo meio
ambiente ainda não compreenderam que as questões ambientais não se referem apenas a problemas
de ordem política e econômica, isto é, a preocupação ambiental é ainda estruturada no interior de
um quadro profundamente antropocêntrico. A preocupação com a gestão sustentável dos recursos
naturais ou com a preservação das espécies em vias de extinção depende não do valor intrínseco que
a natureza em seu todo possa ter, mas sim do interesse instrumental que possui para a qualidade de
vida dos humanos.
Diante disso, esse trabalho propõe-se a apresentar a problemática ética no que diz respeito
às atitudes procedimentais constantes do processo de instalação do Projeto de Esgotos Sanitários da
Comunidade de Pium, e das Praias de Cotovelo e Pirangi do Norte, no Município de Parnamirim-
RN.
Para execução do objetivo proposto, realizaram-se levantamentos de informações
bibliográficas e documentais com relação à ética e ao caso em foco. Dessa forma, esse estudo
busca, primeiramente, caracterizar as diferentes correntes da ética contemporânea. A partir disso,
apresentar os princípios da ética da responsabilidade proposta por Hans Jonas. Em seguida, realizar
uma análise crítica, a partir da ética da responsabilidade de Hans Jonas, dos fatos ocorridos no
processo de implantação do projeto de Esgotos Sanitários da Comunidade de Pium.

O PENSAMENTO ÉTICO CONTEMPORÂNEO


De uma ética tradicional a uma ética ambiental
A ética é uma parte da filosofia que busca refletir sobre o comportamento humano sob o
ponto de vista das noções de bem e de mal, de justo e de injusto. A ética tem duplo objetivo: a)
elaborar princípios de vida capazes de orientar o homem para uma ação moralmente correta; b)
refletir sobre os sistemas morais elaborados pelos homens.
Podemos dizer que pertencem ao vasto campo da ética a reflexão sobre perguntas
fundamentais tais como: O que devo fazer para ser justo? Quais valores devo escolher para guiar
minha vida? Há uma hierarquia de valores que deve ser seguida? Que tipo de ser humano devo ser
nas minhas relações comigo mesmo, com meus semelhantes e com a natureza? Que tipo de atitudes
devo praticar como pessoa e como cidadão?
As questões éticas, como podemos ver, abrangem largo campo da vida humana. Pois o
homem, além de sua dimensão individual, é também um ser social, o agir humano atinge a
sociedade e desdobra-se nas ações políticas. A ética e a política são instrumentos pelos quais os
homens fazem a sociedade.
Vemos, portanto, que as reflexões éticas não se restringem apenas à busca de
conhecimento teórico sobre os valores humanos, cuja origem e desenvolvimento levantam questões
de caráter sociológico, antropológico, religioso, entre outros. A ética tem preocupações práticas. Ela
orienta-se pelo desejo de unir o saber ao fazer.
Assim, como filosofia prática, a ética busca aplicar o conhecimento sobre o ser para
construir aquilo que deve ser. Trata-se, assim, de uma interação dialética entre reflexão interior e a
ação exterior.
Entretanto, as novas correntes de pensamento e o renascimento das discussões a respeito
do resgate de valores até então esquecidos pela humanidade anunciam, hoje, o retorno de uma
filosofia ética (RUSS, 1999). A princípio, o agir humano era regido por uma ética tradicional, dita
antropocêntrica, que não formava um domínio ético significativo com relação à natureza, haja vista
que, dizia respeito ao relacionamento direto de homem com homem, inclusive o de cada um
consigo mesmo. Dessa forma, ela delimitava estritamente o alcance da ação e da responsabilidade
humanas. (JONAS, 2006, p. 35).
Fórum Internacional do Meio Ambiente - A conferência da Terra 36

Desse modo, conforme Hans Jonas (2006), a ética antropocêntrica se preocupava com o
aqui e o agora das situações que o homem enfrentava, tanto públicas quanto privadas. Assim, o
homem era visto em sua condição como essência, como um ser presente no mundo e não como
objeto de uma “techne” transformadora. Dessa forma, tudo que atuasse em objetos não-humanos
não eram tidos como de relevância ética. Logo, os direitos ou dignidade dos animais nem sequer era
cogitada.
Atualmente, a técnica moderna introduziu elementos novos, os quais já não podem ser
abarcados pela ética tradicional. Todas essas mudanças impõem à ética uma dimensão nunca antes
sonhada, de responsabilidade. Assim, a ética da responsabilidade nasce de uma nova ótica, e
irrompe a partir de um mergulho profundo na experiência do ser, de uma nova percepção do todo
ligado, religado em suas partes e conectado com a fonte originária de onde provêm todos os entes.
(BOFF, 2003, p.17)
A partir daí, surge à necessidade de se discutir uma ética com relação ao meio ambiente,
partindo da preocupação e da sensibilidade ecológica como reação a uma mentalidade predatória da
natureza. A busca pelo progresso, induzida pela possibilidade de exploração descriteriosa dos
recursos naturais e originada no capitalismo, provoca injustiça social e destruição da natureza, e, ao
mesmo tempo, desperta reações no sentido de uma mudança de paradigma (JUNGES, 2004, p. 11-
12). Essa mudança deve partir da responsabilidade humana com relação à biosfera inteira em que
vivemos. É preciso mudar o modelo de desenvolvimento, os padrões de consumo, os meios de
produção, a atitude dos políticos, a administração pública.
Segundo Pelizzoli:
A consciência ecológica só surgirá, então, aliando-se o pensamento racional e uma
intuição não-linear da natureza – sabedoria com consciência altamente apurada do meio
ambiente. O crescimento de nossa civilização dicotomizou agudamente aspectos
culturais da natureza humana. Perdemos então o contato com nossa base ecológica e
biológica. Tal separação manifesta-se na grande disparidade entre o desenvolvimento
intelectual, conhecimento científico e qualificações tecnológicas por um lado, e o atraso
em termos de sabedoria, espiritualidade e ética do outro (PELIZZOLI, 2003, p.59).
Trata-se, pois, de tomar consciência da inter-relação tanto “espiritual” quanto biológica do
ser humano com os ecossistemas, dentro da biosfera em evolução, onde se necessita reequilibrar as
posturas e atitudes históricas que a humanidade tomou (PELIZZOLI, 2003, p.53).
Percebendo isso, o ser humano busca se preocupar com suas ações. Procura ter atos
coerentes em relação à Natureza. Mesmo as ações inter-sociais passam a ser direcionadas à causa da
preservação da vida global. Então, estará ele desenvolvendo uma visão "holística" do mundo, isto
é, uma visão global. Dessa forma, o ser humano formará uma nova interligação ética: homem-
natureza.
Assim, não se pode apenas assumir o encargo das conseqüências imediatas previsíveis de
nossos atos. Faz-se necessário elevar o olhar muito além, de maneira a manter na existência a
humanidade futura. A sobrevivência humana constitui o fruto desse olhar longíquo, seu autêntico
objetivo (RUSS, 1999, p. 45).

O princípio responsabilidade
O princípio de responsabilidade, proposto por Hans Jonas, baseia-se na gratuidade de
relações entre os seres humanos entre si e com a natureza. Nessa relação não prevaleceria os
direitos e deveres de uma ética antropocêntrica, mas o espontâneo desejo de contribuir com a
existência feliz de futuras gerações. É uma responsabilidade solidária, fraterna, de méritos naturais e
criacionais, e não unicamente de méritos pessoais.
Desse modo, a responsabilidade escuta o apelo da realidade ecoando em sua consciência.
Ela dá uma resposta a esse apelo, sempre de maneira qualificada, seja negativa, positiva ou qualquer
outra forma. Desta capacidade de resposta (responsum) nasce à responsabilidade, o dever de
responder e de atender aos apelos da realidade captados pela consciência. Essa responsabilidade
Fórum Internacional do Meio Ambiente - A conferência da Terra 37

pode ser formulada no seguinte imperativo: “age de tal maneira que as conseqüências de tuas ações
não sejam destrutivas da natureza, da vida e da terra.” (BOFF, 1995)
Dessa forma, Jonas propõe uma nova dimensão ética, levando em conta o seguinte:
Primeiro, a vulnerabilidade da natureza, acompanhada da complexidade e da consciência de que já
há efeitos atuais de causas antigas não previstas e que, agora, é toda a biosfera que está em jogo
(PELIZZOLI, 2003). Assim, têm-se responsabilidade pelo meio ambiente, que se traduz por um
pacto de cuidado, de benevolência de respeito para com a natureza, objetivando preservar os
recursos naturais e envolver as comunidades na gestão de seu ambiente. Entrelaçam-se aqui o
direito humano de conservar sua cultura e tradições, o direito de projetar o seu destino, a partir de
seus próprios valores e formas de significação do mundo, com os princípios da gestão participativa,
para o melhor manejo de seus recursos, de onde as comunidades extraem suas formas culturais de
bem estar e a satisfação de suas necessidades. Essa é uma condição para todos os demais pactos
(BOFF, 1995).
Segundo, não se trata apenas de defender a Natureza porque senão sofreremos de maneira
inevitável, mas também pensar em ética e direito próprio da natureza, que interage (PELIZZOLI,
2003). Desse modo, devemos ter responsabilidade pela qualidade de vida de todos os seres, pois
todos pertencem à comunidade biótica e terrena, são interdependentes e, por isso, tem direito de ser
e de viver junto conosco. É o novo pacto sócio-cósmico, fundado na combinação entre a justiça
social e justiça ecológica no espaço de uma democracia planetária na qual todos os seres, humanos
e não-humanos, fazem parte como sujeitos de direitos (BOFF, 1995).
Terceiro, levar em consideração o saber como uma nova concepção dos direitos e deveres.
Ele adquire novo peso, estando na mesma escala que a extensão causal de nossa ação. Esse saber
proporcionará um pacto com as gerações atuais em função das gerações futuras, que têm o direito
de herdar uma terra habitável, instituições político-sociais minimamente humanas e uma atmosfera
cultural e espiritual benéfica para com a vida nas suas múltiplas formas, com uma fina sensibilidade
para com todos os seres, presentes na Terra.
Para Jonas, a responsabilidade que temos para com nossos filhos é uma relação altruísta,
onde nos despojamos por inteiro de nosso ser em função da continuação de nossa espécie. Ser
altruísta é uma característica inata da natureza humana. Porém, devido ao afastamento individualista
da criação, houve uma espécie de “esquecimento” da mesma. Faz-se necessário resgatar o
altruísmo, entendido como parte de nossa identidade natural e que nos aproxima dos demais seres
da criação, pois nos revela nossa interdependência e semelhança de condição.
Nossa responsabilidade para com as gerações futuras não é tanto velar pelos seus direitos.
Devemos criar condições para que o direito à felicidade e uma vida harmonicamente equilibrada
aconteça. Nossa principal missão é criar condições para que as gerações futuras exerçam o seu
dever. Dever de gestar uma “autêntica humanidade”. Estes deveres poderiam acontecer sob a “ética
da solidariedade, da simpatia, da equidade, da compaixão inclusive” (JONAS, 2006, p. 87) Nós
devemos respeitar esses mesmos valores éticos hoje. Essa é a nossa responsabilidade.
Deve estar claro que falarmos em ética ambiental, ou em qualquer outro termo que
evoque a questão da natureza, é abordar diretamente a questão do sentido das relações
humanas, com o outro em vários e interconectados sentidos. Essas provêm de
concepções e práticas históricas que foram sendo formadas ao longo do encontro das
culturas, das sociedades, dos costumes e das idéias em jogo. Tudo isso remetido aos
modos de conhecimento, visões de mundo, paradigmas de compreensão, saberes e
ciências, tem implicações enormes em termos de ética. A vida humana, neste sentido, é
ou só pode ser ética, não no sentido da moral e normativamente apenas, mas na
qualidade das relações e na qualidade de vida que estabelecemos entre nós.
(PELIZZOLI, 2003, p.181)
Somos seres inteligentes e capazes de construir o novo. Nosso saber construiu ciência e
técnica. Nossa responsabilidade sapiencial não exclui estes conhecimentos, integra-os e os põe a
serviço para as gerações presentes e futuras numa construção harmônica com todo o universo.
Nosso saber deve ser orientado ao ser e a todas as suas necessidades. O progresso pode continuar a
Fórum Internacional do Meio Ambiente - A conferência da Terra 38

ser uma realidade, mas numa forma relacional, onde cada criatura seja levada em consideração e,
cada ação humana respeite a vida de todos os seres vivos.
Com o surgimento de um novo homem, surge uma nova ética, mais integral, menos
antropocêntrica e mais criacional. Uma ética da criação, voltada a todos os seres, entendidos como
dignos de respeito e de vida.

O PROCESSO DE IMPLANTAÇÃO DA ESTAÇÃO DE TRATAMENTO DE ESGOTO NA


COMUNIDADE DE PIUM: UMA ANÁLISE ÉTICA
A importância do saneamento básico
O grau de evolução de uma comunidade é identificado pela forma como ela trata seus
recursos hídricos e seu lixo. Da mesma forma, identifica-se a seriedade e competência de uma
administração pelos esforços em prol do saneamento. Não há saúde sem saneamento.
O saneamento básico é a medida de saúde pública mais eficiente no tocante de prevenir
doenças e reduzir gastos hospitalares. Sabe-se que para cada R$ 1,00 investido em saneamento
economiza-se R$ 4,00 em medicina curativa. Também é com o saneamento básico que se reduz
drasticamente a mortalidade infantil e se aumenta a expectativa de vida de uma comunidade, sendo
este um dos fatores componentes do Índice de Desenvolvimento Humano (IDH) de um país.
No entanto, intimamente ligada ao saneamento básico deve estar uma ética da
responsabilidade para com as gerações futuras. Antes de se realizar qualquer empreendimento, e
para que ele tenha perspectivas reais de sucesso, devem-se levar em conta todos os impactos sócio-
ambientais gerados no presente e os que poderão causar às próximas gerações. Para que, dessa
forma, cada ação humana respeite a vida de todos os seres vivos.

Descrição do processo de implantação da ETE na Comunidade de Pium


O Processo de Implantação do Projeto de Esgotos Sanitários da Comunidade de Pium e das
Praias de Cotovelo e Pirangi do Norte, no Município de Parnamirim – RN começou a ser executado
em maio de 2006. Na ocasião, os moradores do Núcleo Colonial de Pium só tomaram conhecimento
que a Estação de Tratamento de Esgotos (ETE) seria implantada na região, com a chegada da
tubulação ao local. O lugar escolhida para implantar a estação de tratamento de esgotos localizava-
se em uma área que compreendia um cemitério já construido e com sete corpos sepultados.
Preocupados com os possíveis impactos que tal lagoa poderia causar, os residentes da
comunidade rural de Pium se empenharam em cobrar respostas aos órgãos gestores. De acordo com
os moradores, eles não serão beneficiados com as obras de saneamento e ainda podem ser
prejudicados caso o lençol freático seja contaminado pelos efluentes da estação de tratamento.
As reclamações se intensificaram após modificações feitas no projeto original da obra.
Segundo os moradores, o projeto inicial previa o tratamento do esgoto e a reutilização da água para
irrigação de cana-de-açúcar, cultura que não existe na região. Agora, o destino final dos efluentes
será o rio Pirangi. Segundo, os representantes do conselho comunitário, a comunidade ficou
revoltada com a falta de informações e com a possibilidade de perder sua fonte de renda baseada na
agricultura familiar e no plantio de hortifrutigranjeiros que abastece a cidade de Natal.
O representante do IDEMA (Instituto de Desenvolvimento do Meio Ambiente) respondeu
as acusações afirmando que “o rio já é poluído e já é impróprio para banho. Não há risco das águas
poluírem o rio nem das águas da lagoa contaminar o lençol freático porque ela terá o fundo
impermeabilizado’’.
A promotoria do meio ambiente participou ativamente do processo, promovendo duas
audiências públicas de esclarecimento com a população local. Tais audiências contaram com a
participação de políticos, ONGs, representantes da CAERN (Companhia de Águas e Esgotos do Rio
Grande do Norte) e IDEMA.
Até o presente momento, o IDEMA não concedeu a nova licença provisória de construção
e a obra, portanto, está parada a fim de permitir estudos mais aprofundados.

Análise do caso à luz da Ética da Responsabilidade


Fórum Internacional do Meio Ambiente - A conferência da Terra 39

A implantação de um empreendimento como um projeto de esgotos sanitários não requer


apenas soluções técnicas. Também pede uma resposta ética que determina a postura das pessoas
envolvidas com o processo, sejam eles gestores públicos, empreendedores ou a própria população.
Muitas vezes, a omissão de impactos negativos é motivada por razões de ordem ética. No
caso de Pium, questiona-se porque a CAERN (Companhia de Águas e Esgotos do Rio Grande do
Norte) não convocou a comunidade para discutir a cerca da implantação da ETE antes da chegada
da tubulação e do início das obras. Avalia-se a postura do IDEMA concedendo um licenciamento
ambiental para um projeto que não continha nenhum relatório preciso dos impactos sócio-
econômicos e ambientais locais aprofundadamente. Nesse sentido, é questionada a ética presente na
gestão das políticas públicas de meio ambiente no Rio Grande do Norte.
Segundo Milaré:
[...] A moral que nos falta – pensando em termos de Ética do Bem Comum e Ética do
Meio Ambiente – é aquela outra menos conhecida e praticada: a moral de cunho e
alcance sociais. Mas não temos sido habituados a pensar e reagir impulsionados por este
tipo de moral, por esta espécie de cosmovisão que nos faz considerar e respeitar o
mundo como “nossa casa”. A moral tradicional não desenvolve a necessária
solidariedade com o Planeta vivo nem com os nossos semelhantes. Ao contrário, a
tendência que provém de instintos primitivos é tornarmo-nos senhores das coisas à
nossa moda pessoal e em função de interesses nem sempre justificáveis, embora
racionalizados inteligentemente (MILARÉ apud. SANTOS e JAPIASSÚ, 2006).

Assim, percebe-se que os agentes públicos agem em desacordo com a ética e a moral, por
meio de ações contra o meio ambiente e omissões que, em muitos casos, são banalizadas pela
própria constituição (SANTOS e JAPIASSÚ, 2006). De acordo com Milaré (2005) apud SANTOS
e JAPIASSÚ (2006) “[...] até que ponto se pode estar tranqüilo com a posição e as ações do Poder
Público em relação ao meio ambiente? Qual a ética que as preside? ”. Hans Jonas complementa essa
indagação afirmando que “O exercício do poder sem a observação do dever é, então,
‘irresponsável’, ou seja, representa uma quebra da relação de confiança presente na
responsabilidade” (JONAS, 2006, p. 168).
Outra preocupação com relação à ETE de Pium está na destinação final dos efluentes
tratados. Se assim se dá, a implantação de empreendimentos mesmo benéficos à população, como a
implantação da ETE em Pium, deve ser baseada num princípio de responsabilidade com as gerações
presentes e futuras. Deve levar em conta o princípio do cuidado com os possíveis impactos não só
ambientais como também sócio-econômicos que tal implantação pode causar. Quando se assume a
dimensão do cuidado leva-se em consideração a experiência do valor que não permite agir
utilitariamente ou egoisticamente.
Relacionando esse conceito ao processo de implantação da Estação de Tratamento de
Esgotos de Pium, percebe-se que tal princípio não foi respeitado, já que os empreendedores não
consideraram nem o impacto social, quando desapropriaram um cemitério já ativado sem a
comunicação prévia à população, nem o impacto econômico já que a renda da comunidade rural de
Pium é baseada na venda de hortifrutigranjeiros. O Ministério Público questiona ainda, junto ao
IDEMA e a CAERN, a respeito da manutenção adequada e da possível contaminação do lençol
freático, ficando a dever, dessa forma, o cuidado com o meio ambiente.
É nesse sentido que, acima da visão tecnicista da maioria dos gestores do meio ambiente,
deve estar à necessidade de se construir um pacto ético, fundado não tanto na razão ilustrada, mas
na sensibilidade humanitária e na inteligência emocional expressas pelo cuidado, pela
responsabilidade social e ecológica, pela solidariedade e pela compaixão, atitudes essas capazes de
comover as pessoas e de movê-las para uma nova pratica histórico-social libertadora.

CONSIDERAÇÕES FINAIS
Diante das considerações e fundamentos teóricos expostos nesse trabalho, conclui-se que à
frente da gestão do meio ambiente deve estar um imperativo ético baseado na responsabilidade.
Fórum Internacional do Meio Ambiente - A conferência da Terra 40

Esse se baseia na relação harmônica entre todos os seres vivos e impõe um dever da humanidade
para com as gerações presentes e futuras.
Tal ética não foi respeitada por parte dos gestores públicos do Rio Grande do Norte no
caso do Processo de Implantação do Projeto de Esgotos Sanitários da Comunidade de Pium, já que
tal processo se deu a revelia da comunidade e não levou em conta os impactos sócio-ambientais
para a população local e nem garantiu uma manutenção adequada do sistema que garante a boa
qualidade da água do rio para as próximas gerações.
Por fim, faz necessário aplicar a proposta de Hans Jonas para um princípio de
responsabilidade baseado na gratuidade de relações entre os seres humanos entre si e com a
natureza. Superando, dessa forma, os pontos de vista individuais e passando a prevalecer o ponto de
vista coletivo, contribuindo com a existência feliz de futuras gerações.

REFERÊNCIAS BIBLIOGRÁFICAS
BOFF, L. Ethos Mundial: um consenso mínimo entre os humanos. Rio de Janeiro – RJ: Sextante,
2003
______. Ecologia: grito da Terra, grito dos pobres. São Paulo: Ática, 1995.
______. Ética e eco-espiritualidade. Campinas-SP: Verus, 2003.
JONAS, H. O principio responsabilidade. São Paulo: Contraponto, 2006.
JUNGES, J. H. Ética ambiental. São Leopoldo – RS: Unisinos, 2004.
PELIZZOLI, M. L. Correntes da ética ambiental. Petrópolis-RJ: Vozes, 2002.
RUSS, J. Pensamento ético contemporâneo. São Paulo – SP: Paulus, 1999
BRÜSEKE, F. J. Ética e Técnica? Dialogando com Marx, Pengler, Jünger, Heidegger e Jonas.
Socitec e-prints - vol. 1 - nº 1. Disponível em: <http://www.socitec.pro.br/e-
prints_vol.1_n.1_etica_e_tecnica.pdf> Acesso em: 07/06/2007
FERRARI, A. R. A responsabilidade como princípio para uma ética da relação entre ser humano e
natureza. Revista Eletrônica do Mestrado em Educação Ambiental. Vol. 10, 2003. Disponível em:
fisica.furg.br/mea/remea/vol10/art8.pdf
AMARAL, Ana. Lagoa de Captação preocupa Pium. Diário de Natal, Natal. 7 de março de 2007.
Caderno Cidades, p. 5.
SANTOS, A. P. O. e JAPIASSÚ, M.C. Ética no Licenciamento Ambiental. In: Congresso de
Pesquisa e Inovação da Rede Norte Nordeste de Educação Tecnológica Natal-RN, 1, Anais..., 2006.
ARCO PROJETOS E CONSTRUÇÕES LTDA. Projeto de Esgotos Sanitários daComunidade de
Pium, e das Praias de Cotovelo e Pirangi do Norte, no Município de Parnamirim-RN. Vol. I.
Projeto executivo de engenharia. Janeiro de 2007.
Fórum Internacional do Meio Ambiente - A conferência da Terra 41

UMA ÉTICA DA RESPONSABILIDADE ECOLOGICA

Samir Cristino de Souza


Professor do Centro Federal de Educação Tecnológica do Rio Grande do Norte – CEFET/RN. Doutorando do Programa
de Pós-Graduação em Educação da UFRN. Pesquisador do Grupo de Estudos da Complexidade da UFRN (GRECOM)
e Coordenador do Grupo de Estudos da Transdisciplinaridade e da Complexidade do CEFET-RN (GETC).
Centro Federal de Educação Tecnológica do Rio Grande do Norte (CEFET-RN), Av. Senador Salgado Filho, 1559 –
Tirol, Natal-RN, 59015-000.
samir@cefetrn.br

RESUMO
O problema ecológico é um problema complexo, na exata medida em que assume muitas
faces concretas. No fundo a solução do problema ecológico pressupõe a construção de um mundo
novo em todos os seus aspectos. Por isso mesmo, seria ingenuidade pensar que haja solução mágica
e imediata. Há sempre uma série de desafios que permanecem, seja a nível ideológico-prático, seja a
nível puramente técnico. Não há dúvida de que a superação da crise ecológica requer do homem
uma mudança fundamental de atitude. Para preservar a vida ameaçada é preciso que o homem, com
sua tecnologia, se abra para uma série de valores que atualmente não entram nos seus esquemas.
Assim, o objetivo deste artigo é refletir acerca da necessidade de uma ética da responsabilidade
ecológica como instrumento de conversão à vida e a natureza, com vistas a construir uma sociedade
mais integrada ao mundo natural e social.
Palavras-chave: Ética da responsabilidade. Ecologia. Poluição. Demografia. Progresso.

ABSTRACT
The ecological problem is a complex problem, in the exact measure in that it assumes
many concrete faces. In the bottom the solution of the ecological problem presupposes the
construction of a new world in all their aspects. For that reason, it would be ingenuousness to think
that there is magic and immediate solution. There is always a series of challenges that you stay, be
at ideological-practical level, be at level purely technician. There is no doubt that the overcame of
the ecological crisis requests of the man a fundamental change of attitude. To preserve the
threatened life it is necessary that the man, with his technology, open up for a series of values that
now don't enter in their outlines. Like this, the objective of this article is to contemplate concerning
the need of an ethics of the ecological responsibility as conversion instrument to the life and the
nature, with views to build a society more integrated into the natural and social world.
Keywords: Ethics of the responsibility. Ecology. Pollution. Demography. Progress.

INTRODUÇÃO
Neste inicio de século, podemos ostentar uma certeza: este será um século marcado para
cair no ouvido das gerações futuras. Acontecimentos múltiplos imprimem marcas tão profundas que
a humanidade do futuro não se entenderá a si mesma se perder o referencial desse momento que
estamos vivendo.
O homem de hoje tem muitas razões para se orgulhar: suas conquistas são grandiosas e
incontáveis sob todos os prismas. Ele se locomove com desembaraço em todos os campos do saber.
Nunca se conseguiu acumular tanto saber num tão curto espaço de tempo. Todas as ciências foram
profundamente revolucionadas à luz de dados novos. E não só isso: todas estas revoluções no
campo do saber colocaram nas mãos do homem um poder tão grande que em fazes anteriores mal se
ousava atribuir aos deuses. O homem não só conhece profundamente toda a realidade do macro e do
microcosmo, como domina as tecnologias que o permite ir ao espaço e observar a Terra de forma
soberana.
O triunfo humano é tamanho que a Terra se tornou pequena para comportar tanta grandeza.
Astronaves cortam o céu com a mesma segurança que qualquer meio de transporte terrestre. Depois
da conquista da lua, a conquista de outros planetas é apenas questão de tempo. Engenhos
sofisticados secundam o homem neste e em outros empreendimentos sem precedentes.
Fórum Internacional do Meio Ambiente - A conferência da Terra 42

Ao domínio crescente sobre o universo, corresponde o surgimento de situações


preocupantes sobre a Terra. Problemas das mais diversas ordens começam a inquietar sempre um
maior numero de pessoas qualificadas. As mais diversas formas de poluição vão se estendendo
como um manto negro que cobre toda a Terra, ameaçando todas as formas de vida. O acelerado
crescimento demográfico, particularmente nos países mais pobres, põe em risco um equilíbrio
natural que se pensava regular automaticamente as populações. O próprio progresso, que tanto
fascina o homem, começa a apavorá-lo. Milhões de homens famintos rondam ameaçadoramente os
banquetes dos poucos ricos. E estes são apenas sintomas de uma grave enfermidade que ameaça a
vida humana sobre uma Terra doente. Com isto a ecologia deixou de ser preocupação de poetas e
profetas de mau agouro, para tornar-se uma questão de sobrevivência para a própria humanidade.
A consciência ecológica não nasce no vazio. Ela emerge antes de tudo de uma dura
realidade, que ameaça derrubar todo um sonho acalentado durante séculos, mas, sobretudo nos
últimos decênios: o sonho de o homem enfim tornar-se de fato o senhor de toda a criação.
A consciência ecológica emerge igualmente no contexto de uma nova consciência ética,
que supera o eternismo para preocupar-se com as realidades do homem; que sai do subjetivismo
privatista para lançar-se na macro-realidade; que abandona o progressismo para abraçar uma
contestação libertadora.
Testemunhando o emergir desta nova consciência ética, firma-se a convicção sempre mais
generalizada de que os problemas humanos já não podem ser resolvidos pelas armas; que o respeito
à natureza, as pessoas e aos povos é condição indispensável para a convivência humana.
É dentro deste contexto que certas questões de cunho ecológico assumem uma conotação
nitidamente ética. Qual é realmente a gravidade da ameaça que paira sobre o homem a partir dos
problemas ecológicos? Como chegamos ao atual estado de coisas? Será que os problemas
ecológicos não escondem problemas mais profundos, do relacionamento do homem com a natureza
e dos homens entre si? Como sair deste impasse? A ética não tem respostas prontas para este tipo de
questões, que vão se impondo, porém, de modo inarredável.
Assim, pretende-se refletir de forma introdutória e inacabada a relação entre ética e meio
ambiente com vistas a despertar para uma consciência ética do cuidado e da responsabilidade com o
meio ambiente.

ÉTICA E MEIO AMBIENTE


A primeira vista ecologia e ética são duas linhas paralelas que se perdem no horizonte
humano, sem jamais se cruzarem. Com efeito, a ecologia pode ser definida como a ciência do meio
ambiente. E como tal se detém de modo imediato, no estudo do equilíbrio ou desequilíbrio que se
instaura no ecossistema. A partir da interdependência, lei fundamental que rege todo universo, a
ecologia concebe todos os seres como vitalmente unidos entre si, de tal forma que o rompimento de
um elo desta cadeia repercute imediatamente sobre todos os outros (BOFF, 1995).
A ética, por sua vez, tradicionalmente se apresenta como a ciência categoricamente
normativa dos atos humanos, à luz da razão natural. Como ciência normativa, ela não apenas
descreve comportamentos humanos, mas traça imperativos para que o homem possa realizar-se na
sua humanidade.
A partir dessas duas definições, a ecologia se volta mais para o meio ambiente, enquanto a
ética se volta exclusivamente para o homem. Tudo isso leva a crer que a ética e a ecologia são duas
ciências que nada tem em comum. Contudo quando atentamos pras raízes mais profundas das duas
ciências, raízes conservadas pela própria etimologia, nos surpreendemos com um estranho
parentesco.
Ecologia remete para “oikos”, a casa do homem. A casa do homem não é constituída pelo
seu abrigo imediato, mas pelo universo inteiro. Todo o universo, em ultima instância, é o lugar onde
o homem fixa sua morada, e onde sobrevive numa interdependência quase total em relação ao seu
meio ambiente. Sua vida é, em grande parte, a vida do meio ambiente. Também a ética,
originalmente, designa “a morada do homem”. Ela só se encontra “em casa” quando em intima
Fórum Internacional do Meio Ambiente - A conferência da Terra 43

sintonia profunda com as tendências mais profundas do seu ser e quando com-vive
harmoniosamente com os outros e com tudo que o cerca (BOFF, 2003).
Esta aproximação etimológica nos leva a suspeitar que as ligações entre ecologia e ética
sejam bem mais fundamentais do que possam parecer inicialmente. Ambas as ciências voltam-se
em ultima análise para o homem, que tem o seu destino umbilicalmente ligado à sua casa, ao
universo. É por isto mesmo que os problemas do meio ambiente não apenas despertou uma
consciência ecológica, mas também uma consciência ética. É a vida do homem na terra que se
encontra ameaçada pela poluição crescente, pelo crescimento desordenado das populações, por um
progresso equívoco, pela miséria e pela fome. É, portanto através da vida ameaçada que a ecologia
e a ética encontram-se diante de um mesmo e gigantesco desafio: o que fazer para possibilitar a
continuidade da vida sobre a terra? Ecologia e ética encontram-se questionadas pela mais grave
ameaça que já pairou sobre o universo: a ameaça da sobrevivência do homem e de todas as formas
de vida.

A NOVA CONSCIÊNCIA ECOLÓGICA


A tomada de consciência sempre remete para fatos. Isto ocorre tanto no campo ético,
quanto no ecológico. Muitos são os fatos que estão por trás da tomada de consciência ecológica.
Como deixamos entrever anteriormente, os fatos mais notáveis parecem ser a poluição, o acelerado
desenvolvimento demográfico, as ameaças do progresso, a miséria e a fome no mundo. E tendo em
vista o choque do evidente desequilíbrio ecológico que o grito de alarme se faz ouvir nas mais
diversas instancias e nas mais diversas linguagens.

O problema da poluição
A poluição é sem dúvida um termo genérico para designar a quebra do ritmo vital em
muitas áreas. Ela é o primeiro e mais evidente sintoma: o ecossistema encontra-se profundamente
afetado, à beira da falência. A poluição atmosférica, a poluição das águas, a poluição sonora e a
poluição atômica não deixam dúvidas: a terra está doente.
A poluição atmosférica, oriunda, sobretudo das indústrias e dos veículos movidos na base
do petróleo, evidencia-se pelo fenômeno sempre mais freqüente da inversão atmosférica e do
“smog”. Toneladas de poluentes (tais como monóxido de carbono, óxidos, dióxidos de nitrogênio,
hidrocarbonetos, amianto) caem diariamente sobre grandes centros industriais, tornando, por vezes,
o ar irrespirável, e afetando diretamente a saúde da população. Segundo os cálculos de uma
autoridade em ecologia, a atmosfera terrestre seria anualmente envenenada por 200 milhões de
toneladas só de monóxido de carbono, sem falar de outros poluentes (MANO et al., 2005).
Este tipo de poluição, que de uma forma ou de outra chega por toda parte, curiosamente
não se localiza tanto nos países desenvolvidos, quanto nos pólos industriais dos países
subdesenvolvidos. Isso porque os países desenvolvidos a conscientização é bem maior e as medidas
saneadoras são mais acentuadas. É certamente a falta de vigilância dos países pobres que se
constitui num convite irresistível para os países industrializados transferirem as indústrias mais
poluidoras exatamente para o terceiro mundo (PORTILHO, 2005).
A poluição das águas, em sempre maior escala, é outro motivo de inquietação. Este tipo de
poluição é, basicamente, resultante de duas grandes fontes: os resíduos urbanos e os resíduos rurais.
Os resíduos industriais, os esgotos domésticos, os detergentes duros, constituem os principais
componentes do primeiro grupo. Os fertilizantes agrícolas e os inseticidas compõem o segundo
grupo. Tendo-se em vista a relativamente pequena parcela de água doce disponível e o fato de a
metade das fontes mundiais estarem poluídas, tendo-se ainda em vista que a água se constitui no
sustentáculo de todas as funções vitais, deduz-se que tudo o que se faz contra a água é crime contra
a vida. A ameaça a todas as formas de vida se torna mais patente quando os próprios oceanos,
primeiros responsáveis pela renovação do oxigênio, tidos como fonte de alimentação para o futuro,
também começam a ser poluídos. Se levarmos em conta apenas a poluição oriunda dos petroleiros,
que ordinariamente cruzam os oceanos, sem pensar no freqüentes acidentes que ocorrem com eles,
já teríamos motivos suficientes para ficarmos alarmados (LUZ, 2005).
Fórum Internacional do Meio Ambiente - A conferência da Terra 44

A poluição sonora, intimamente ligada à industrialização e ao progresso de um modo geral,


explode com maior evidencia os centros urbanos. Os habitantes das grandes cidades existentes no
mundo industrializado são dia e noite submetidos a ruídos cada vez mais insuportáveis e
ininterruptos.
Existe ainda outras formas de poluição que vamos apenas mencionar e que possui um
significado para ser aprofundado, como a poluição térmica, a poluição dos solos através do lixo
comum e resíduos não degradáveis.

O problema demográfico
Outro grande problema que enfrentamos nesse início de século é o problema demográfico
que não se depreende apenas dos números. Ele transparece também nos inúmeros problemas que a
explosão demográfica traz no seu bojo: problemas sociais, econômicos, políticos, habitacionais,
ideológicos, ocupacionais, educacionais, sanitários, urbanísticos, ambientais e ecológicos. Numa
palavra: traz consigo todos os outros problemas da humanidade e que são agravados nos momentos
de crise, particularmente nos países e regiões pobres. O que torna mais grave a consciência deste
problema e a constatação de que o equilíbrio natural parece definitivamente rompido. É por isso que
a humanidade anda a procura de um novo equilíbrio racional mediante uma planificação a
curtíssimo e em longo prazo (PORTILHO, 2005).

O fascínio e a ameaça do progresso


Relacionar desequilíbrio ecológico e população é um imperativo dos nosso dias.
Entretanto, não é forçosamente a explosão demográfica que mais pesa para desequilibrar a balança
ecológica. Bem mais do que o numero de habitantes pesa o modo como eles vivem ou são
obrigados a viver em vista de certas contingências. O desequilíbrio ecológico remete diretamente
para o processo desordenado da industrialização e para as conseqüentes aglomerações urbanas. Por
trás dos problemas ecológicos esconde-se o progresso, ao mesmo tempo um sonho e uma ameaça.
A revolução industrial não trouxe consigo apenas o progresso tecnológico. Ela implantou
também uma nova consciência no homem: a consciência de poder. O homem primitivo não só
dependia fundamentalmente das forças da natureza, como mantinha uma consciência submissa
diante desta situação. Seu único recurso efetivo consistia em impetrar clemência aos estranhos
deuses que dominavam o universo.
Com o advento da era da razão, já implantada em germe na renascença, impõe-se a fria
análise da realidade. Em vez de admirada, a Natureza deveria ser conhecida; em vez de cultivada,
dominada; em vez de companheira, deveria passar a ser escrava. A funcionalidade e a rentabilidade
passam a subjugar qualquer outro critério. O cosmo perde conseqüentemente seu mistério e sua
aureola sagrada, para tornar-se o mundo do que é experimentalmente cognoscível, objetivável,
tecnicamente utilizável.
Tais pressupostos, efetivamente acionados com a revolução industrial, provocam outra
revolução: a consciência de poder. O homem já não se compreende como um ser submetido a algo
maior do que ele, mas como soberano capaz de tudo transformar de acordo com seus desejos. E
claro que esta consciência de poder não se projeta no vazio. Ela surge simultanemante com o
aparecimento da técnica, num processo de reforço mutuo e simultâneo: a consciência de poder
desenvolve as ciências exatas e a técnica; estas alimentam a consciência de poder. De executor de
uma ordem cósmica, o homem moderno passa a artífice e construtor da sua própria história e do seu
próprio universo (PENNA, 1999).
O surgimento da tecnologia não apenas se constitui num salto quantitativo, mas qualitativo.
O homo sapiens passa a ser homo faber que analisa o mundo para transformá-lo. As ciências
experimentais, a invenção das máquinas, a automação, sempre novas formas de energia,
possibilitaram ao homem o sonho de tornar-se efetivamente senhor do seu próprio futuro terrestre.
É dentro deste contexto que surge o mito desenvolvimentista de um progresso irrefreável e
ilimitado. O progresso constatado nos países que lideram a revolução industrial iria transformar a
face de toda a terra. Os padrões de vida dos países altamente industrializados transbordariam para as
Fórum Internacional do Meio Ambiente - A conferência da Terra 45

grandes massas famintas dos países atrasados. O mundo todo não só resolveria seus problemas
básicos, como conheceria uma abundância nunca imaginada. As duas grandes ideologias que
dominam o mundo atual, por mais irreconciliáveis que pareçam, na realidade convergem neste
particular: um futuro feliz para todos. É o sonho de um mundo novo, criado pelo próprio homem, e
do qual não deverá dar satisfações a ninguém (MORIN, 2005).

O PROMETEU ACORRENTADO
Condenar o progresso, desprezar os engenhosos inventos com os quais o homem sonha
passar da sujeição para o domínio, não é somente o caminho neste momento. Chegamos a tal
desenvolvimento em todos os setores, que o recuo se tornou impossível.
Contudo, não perceber a ambigüidade fundamental do “progresso moderno” é fechar
ingenuamente os olhos diante da realidade. A contrapartida do progresso não tardou a aparecer
simultaneamente em duas direções, que no fundo se tocam: a da urbanização, com seus insolúveis
problemas, e a da Ecologia, com seus titânicos desafios.
O progresso surgido a partir da Revolução Industrial, e acentuado nas décadas do após-
guerra, cobra o seu tributo ao forçar as concentrações urbanas. Não é por acaso que as grandes
concentrações urbanas ocorreram com o advento da Revolução Industrial, e o fenômeno se repete
em todos os países e regiões que aceleram seu desenvolvimento industrial. O esquema industrial,
centrado no maior lucro e não nos maiores benefícios à população, faz a vida das pequenas cidades
e do entorno aparecer como atraso sob todos os pontos de vista. São os grandes centro que
funcionam como catalisadores das aspirações alimentadas com o progresso: maior chance de ganho;
de diversões; de instrução; de assistência no mais amplo sentido da palavra.
É assim que surgem as metrópoles e megalópoles como Nova Iorque, Tóquio, Calcutá,
Buenos Aires, México, São Paulo... É um símbolo perfeito das contradições do progresso: símbolos
ao mesmo tempo, do indomável poder criador do homem e da sua decadência. Símbolos da pujança
e da miséria. É assim que se prevê que, em torno do ano 2020, cerca de 80% da população dos
países industrializados estará vivendo em zonas urbanas. É assim que já no momento as grandes
metrópoles modernas, com seu ar irrespirável, crescente criminalidade, deterioração dos serviços
públicos, fuga da juventude na anticultura, surgiram como um pesadelo no sonho do progresso
linear em que se embalavam os teóricos do crescimento.
Ademais, o próprio sonho de atrelar todos os povos no carro da abundância dos países
ricos defronta-se com um impasse total. Se tal ocorresse, a pressão sobre os recursos não renováveis
e a poluição do meio ambiente seria de tal ordem (ou alternativamente, o custo do controle da
poluição seria tão elevado) que o sistema econômico mundial entraria necessariamente em colapso.
A evidência à qual não podemos escapar é que em nossa civilização a criação de valor econômico
provoca, na grande maioria dos casos, processos irreversíveis de degradação do mundo físico.
É diante destes impasses que se pode, com razão, afirmar que o homem, ao descobrir e
controlar as forças da natureza se tornou o verdadeiro Prometeu acorrentado. Se o progresso
fascina, ele também ameaça o presente e o futuro da humanidade. Como se pode constatar, o
problema não se prende nem à ciência, nem à tecnologia, mas a um sistema que traz no seu bojo
miséria, fome, destruição.
As ameaças que pesam sobre o ecossistema seriam bem mais dramáticas se não houvesse
uma providencial tomada de consciência, simultaneamente ecológica e ética, da necessidade de
mudar de direção. O próprio fato de sentir-se numa encruzilhada decisiva parece despertar no
homem uma clarividência maior e energias até então latentes. É neste contexto que vemos surgir
uma dupla revolução: na consciência ecológica e na consciência ética.

CONSIDERAÇÕES FINAIS
As colocações feitas ao longo de toda a nossa abordagem até aqui nos autorizam a ressaltar
ao menos dois pontos nevrálgicos. Primeiro: o problema ecológico se constitui num desafio
gigantesco e global para a humanidade; segundo: o problema ecológico não se reduz a uma
dimensão técnica, e portanto não pede apenas uma solução técnica. É antes de tudo um problema
Fórum Internacional do Meio Ambiente - A conferência da Terra 46

humano, que revela um modo de ser desumano. O mais trágico de tudo é que o homem já não trata
o meio ambiente com o carinho que requer sua casa (oikos – logos). E a ausência deste carinho, que
se patenteia no modo como ele se relaciona com as demais criaturas, revela uma desagregação
interna.
Em termos técnicos, a questão primordial que se coloca é a da possibilidade de se
conseguir uma reversão do processo, de tal forma que as mesmas ciências e técnicas empregadas na
devastação do meio ambiente sejam encaminhadas para a sua preservação. Isto só é possível
mediante uma acentuada consciência ao mesmo tempo ética e ecológica. Em termos éticos a
questão primordial consiste em saber se o homem, que está destruindo seu meio ambiente e,
conseqüentemente, lesando de modo profundo sua própria vida, está disposto a pagar o preço da
redenção, através da mudança de sua escala de valores, estilos de vida, objetivos políticos,
econômicos e sociais. Dramatizando um pouco se poderia dizer que o mundo vive como o Titanic
em seus últimos momentos, diante de um iceberg enorme, que esconde suas verdadeiras dimensões.
O desastre só poderia ser evitado com uma mudança rápida e total de rumo.
Em termos éticos tal mudança se denomina conversão. E aqui no contexto da ecologia fica
mais patente que a conversão não se constitui numa atitude intimista. A mudança de rumos deve
concretizar-se não apenas no coração, mas no relacionamento com os outros e com o meio
ambiente. Assim como o mal nasce no coração do homem, mas se instala nas engrenagens da
sociedade e afeta o próprio meio ambiente, a conversão deverá se manifestar num processo inverso.
Como o mal se manifesta por uma atitude de dominação sobre a Natureza, a conversão se
manifestará por uma volta à Natureza. Não por uma volta romântica, mas por uma volta guiada pela
redescoberta do sentido profundo das coisas.
São estas duas coordenadas que conduzirão nossas reflexões finais: ao mesmo tempo que
procuramos iluminar o caminho da volta sob o prisma ético, procuraremos iluminá-lo também sobre
o prisma técnico. Sob o prisma ético partiremos de dois modelos de atitude verdadeiramente
humana diante da natureza, para depois tematizarmos alguns pressupostos básicos desta volta. Sob
o prisma técnico assinalaremos as medidas concretas que brotam da consciência de uma
humanidade em perigo. É evidente que o prisma ético e técnico não serão conduzidos em termos de
oposição, mas de complementação, pois, como vimos ao início, tanto a Ética quanto a Ecologia
tratam do mesmo problema humano. Como também é evidente que não temos a pretensão de
resolver este problema gigantesco. Queremos oferecer subsídios, cônscios de que sempre sobrarão
muitas interrogações, seja de ordem ética, seja, sobretudo, de ordem técnica, mas, devemos sempre
promover a ética da responsabilidade ecológica como um propósito fundamental para a construção
de uma nova sociedade.

REFERENCIAS BIBLIOGRÁFICAS
BOFF, L. Ecologia: grito da Terra, grito dos pobres. São Paulo: Ática, 1995.
______. Ethos mundial: um consenso mínimo entre os humanos. Rio de Janeiro: Sextante, 2003.
LUZ, L. A. R. da. A reutilização da água: mais uma chance para nós. Rio de Janeiro: Qualitymark,
2005.
MANO, E. B.; PACHECO, É, B. A. V. BONELLI, C. M. C. Meio ambiente, poluição e reciclagem.
São Paulo: Edgard Blücher, 2005.
MORIN, E. O método 6: ética. Porto Alegre: Sulina, 2005.
PENNA, C. G. O estado do planeta: sociedade de consumo e degradação ambiental. Rio de Janeiro:
Record, 1999.
PORTILHO, F. Sustentabilidade ambiental, consumo e cidadania. São Paulo: Cortez, 2005.
Fórum Internacional do Meio Ambiente - A conferência da Terra 47

A AULA–CAMPO COMO EXERCÍCIO DA CIDADANIA: UM RECURSO


PEDAGÓGICO NO ENSINO DE GEOGRAFIA

Gisele da Silva GONÇALVES


Aluna de Iniciação Científica – Bolsista CNPq/PIBIC. geo_gisele@yahoo.com.br
Hamilton Cassiano DIAS
Aluno de Iniciação Científica- Bolsista Sala Verde CEFET-Campos. hamiltoncassiano@yahoo.com.br
Roberta de Sousa RAMALHO
Professora Orientadora - D.Sc. Ecologia e Recursos Naturais. roberta@cefetcampos.com.br

RESUMO
O presente artigo descreve a experiência de realizar um trabalho de campo no sentido de
contribuir à pesquisa geográfica a partir de discussões e reflexões realizadas na disciplina de Prática
Pedagógica, do curso de Licenciatura em Geografia do CEFET-Campos, no ano de 2007. Assim, foi
realizada uma aula-campo com a turma do 3º ano do Ensino Médio do Instituto de Educação
Professor Aldo Muylaert (ISEPAM), escola da rede Estadual. Essa proposta corrobora os conceitos
teóricos estabelecidos nos Parâmetros Curriculares Nacionais (PCN´s), de Geografia, que propõem
o estudo do meio como instrumento pedagógico que ultrapassa os muros da escola., como forma de
estimular habilidades e atitudes, que nesse caso, são despertadas através do próprio contato com o
espaço vivido dos alunos. Isto é, entender a relação crítica com a realidade cotidiana e os lugares de
vivência dos jovens, despertando uma maior sensibilização e reflexão de suas próprias vidas e
relações sociais. Autores como Freinet, Straforini e outros defendem o estudo do meio como forma
de atender as propostas de alguns temas transversais como Ética, Meio Ambiente e Pluralidade
Cultural. O objetivo do trabalho foi utilizar a aula-campo como um recurso pedagógico onde os
alunos pudessem perceber o meio em que vivem. Assim, a relevância dessa atividade está em tornar
mais compreensíveis os diversos assuntos que permeiam os conteúdos conceituais da Geografia.
Além disso, a atividade da aula ainda não havia sido utilizada como instrumento pedagógico no
ISEPAM e é pouco valorizada pelos professores. Dentre os processos metodológicos utilizados, o
principal fator foi a elaboração do projeto “Uma proposta de aula-campo na disciplina de geografia
do ensino médio”, que contou com embasamento teórico, roteiro do trajeto da aula, plano de aula e
um questionário aplicado aos jovens alunos. Os resultados demonstram que a aula campo os ajudou
a melhor compreender e interpretar o espaço que os cerca, concordando que essa proposta é
relevante para as escolas, pois é uma maneira diferente de aprender a geografia interagindo com o
ambiente, além de ser uma dinâmica motivadora que desperta curiosidade e interesse.
Palavra chave:Trabalho de Campo, Pesquisa Geográfica e Pedagógica, Percepção Ambiental,
Cidadania.

ABSTRACT
The present article describes the experience to accomplish a fieldwork, at the meaning to
contribute to the geographic research, from the results, discussions reflections and readings
accomplished at the pedagogic practice discipline, coursed at the 8° period of the geography
licentiature of CEFET – Campos on the year of 2007. This work had the intention to accomplish a
fieldwork on the school where the curricular training of pedagogic practice discipline has been
developed. With the 3° year of the medium instruction of the “Instituto de Educação Professor Aldo
Muylaert(ISEPAM)”, state system school. This proposal validate the theory conceptions
established at the “ Parâmetros Curriculares Nacionais(PCN´s) of geography, that propose the study
of the environment as pedagogic instrument that goes trough the school walls, like a way to
stimulate attitudes and abilities, that at this case are awakened trough the space contact itself lived
by the students , namely, the critic relationship with daily reality and places of living of the young,
awake a bigger sensibility and reflection to be from their own lives and social relationships.
Authors like Freinet, Straforini and others defends the study of the environment like a way to attend
the propose of some transversal theme like ethic, environment and cultural plurality. The work
objective was to utilize the fieldwork like a pedagogic resource where the students can notice the
Fórum Internacional do Meio Ambiente - A conferência da Terra 48

environment where they live. That way, that activity relevance is to make more comprehensible the
diverse topics that permeate the conceptual contents of the geography, trough this, the class activity
still don’t have been utilized as pedagogic instrument at ISEPAM. Amongst the methodological
process utilized, the main factor was the project elaboration “A Fieldwork Propose at the
Geography Discipline of the Medium Instruction” , that counted with the theoric support , class
trajectory script, class plans and a questionnaire applied to young students. The results shows that
the students noticed that the fieldwork helped to a better knowledge and interpretation of the
environment around then, agreeing that this propose is relevant for the schools, since this is a
different way to learn the geography interacting with the environment, further of being a dynamic
motivation that awakes curiosity and interests
Keywords: Fieldwork, Geographic and Pedagogic Research, Environmental Perception, Citizenship

INTRODUÇÃO
O presente artigo refere-se à realização prática de uma aula-campo como recurso
pedagógico a ser utilizado na disciplina de Geografia. Esta aula foi realizada com os alunos do
terceiro ano do ensino médio do Instituto Superior de Educação Professor Aldo
Muylaert(ISEPAM), escola da rede Estadual de ensino em Campos dos Goytacazes, Norte do
Estado do Rio de Janeiro(fig.1). O referido trabalho de campo foi proposto como atividade da
disciplina de Prática Pedagógica do curso de Licenciatura em Geografia do CEFET-Campos, sendo
realizado na escola campo de estágio(ISEPAM) durante o 8º período letivo(2007/2) .

Figura 1: Mapa de Localização da área de estudos – Município de Campos dos Goytacazes – Norte
do Estado do Rio de Janeiro

Assim, a relevância dessa atividade está em tornar mais compreensíveis os diversos


assuntos que permeiam os conteúdos conceituais da Geografia, além disso, a atividade da aula ainda
não havia sido utilizada como instrumento pedagógico no ISEPAM. Nesse sentido, o trabalho de
campo se destaca como uma prática que deve ser estimulada no ensino da Geografia. Porém, devem
ser destacadas as dificuldades em se desenvolver esta atividade, uma vez que envolve desde um
professor habilitado a escolher métodos para sua execução e aplicação como prática pedagógica
eficaz, até um programa pedagógico e orçamentário anual das escolas.
Consequentemente, o estudo do meio é de grande importância na disciplina de Geografia,
pois permite desenvolver conhecimentos, habilidades, atitudes e valores a partir do próprio espaço
vivido da realidade ao quais os jovens estão inseridos. Uma aula, então, pode ultrapassar as paredes
da sala de aula e os muros da escola, fazendo com que os alunos observem, sintam e interpretem
Fórum Internacional do Meio Ambiente - A conferência da Terra 49

todas as nuances do lugar ao qual pertencem e convivem no seu cotidiano. De acordo com os
PCN’s(1998), o trabalho de campo é importante para aproveitar os conhecimentos e experiências
dos alunos, como também despertar o seu interesse pela Geografia. Desta forma, a pesquisa, o
estudo do meio, a cartografia, e a leitura da paisagem, são algumas formas de aproximar o jovem
aluno da disciplina, e de fazer com que ela adquira significado. Logo, a aula campo vem possibilitar
aos discentes, que no confronto com a realidade registrada, formulem e reformulem conceitos a
partir da diversidade espacial da paisagem, compreendendo o Espaço Geográfico numa relação de
decomposição e recomposição da totalidade.
Dentre os temas transversais propostos pelos PCN’s(1998) que são:Ética, Pluralidade
Cultural, Orientação Sexual, Meio Ambiente, Saúde, Trabalho e Consumo. Contudo, priorizou-se
nesse trabalho, apenas, os que tratam a Ética, o Meio Ambiente e a Pluralidade Cultural, pois, foram
de extrema importância para o desenvolvimento da atividade da aula-campo. Nesse sentido, a Ética
trabalha conteúdos como: o respeito mútuo, a justiça, o diálogo, a solidariedade e a cidadania, que
aparecem traduzidos nos eixos propostos pela Geografia quando os lugares são valorizados como
expressão de uma identidade. A construção de uma visão solidária de relações humanas nas aulas
contribuirá para que os alunos superem o individualismo por meio do diálogo, da valorização, da
interação e da troca, percebendo que os lugares são produtos de ações coletivas.
Outro tema de suma importância é o Meio ambiente, onde as análises das questões
ambientais pressupõem um trabalho interdisciplinar, que envolve questões políticas, históricas,
culturais, econômicas, ecológicas, geográficas e sociais. Logo, o estudo da Geografia refere-se às
interações entre a sociedade e a natureza, pois um grande leque de temáticas de meio ambiente está
dentro do seu estudo, levando a compreensão das questões como poluição, desmatamento, limites
para uso dos recursos naturais, sustentabilidade e desperdício, que permitem o trabalho com a
espacialização dos fenômenos geográficos por meio da cartografia.
A Pluralidade Cultural refere-se a conteúdos que se relacionam aos da Geografia, que por
si mesmo apresentam um tratamento metodológico na linha proposta de pluralismo cultural, que são
comuns à disciplina, desde a caracterização dos espaços dos diferentes segmentos culturais que
marcam a população, até os estudos de como as paisagens, lugares e regiões onde se expressam
essas diferenças.
Nesse sentido, será de grande importância o conhecimento do espaço e suas dimensões
físicas, humanas e de como se dá sua apropriação a nível local e a reprodução sócio espacial, o que
leva a uma busca pela apreensão de uma visão processual do espaço geográfico, numa relação
teoria/prática e prática/teoria, no conjunto de seu “fazer geografia”. Assim, os trabalhos de campo,
tornam-se um instrumento fundamental para o processo de ensino / aprendizagem na apreensão do
empírico na Geografia.
Conforme Straforini (2004), o ensino de Geografia deve levar o aluno a compreender a sua
realidade sobre o ponto de vista de sua espacialidade, isto é, a Geografia na escola tem a função de
formação dos modos de pensar geográficos por parte dos alunos. E pensar na educação no sentido
transformador, evoca a idéia de totalidade, criando condições para que os alunos possam construir
sua cidadania.
Já a pedagogia proposta por Célestin Freinet (2001) estabelece uma forma de
aprendizagem natural, em que os jovens aprendem a partir de seu próprio mundo os fenômenos,
sejam naturais ou antrópicos, como também, objetos, pessoas, e impressões que as rodeiam, sem
que haja massificação e onde cada aluno se desenvolve a partir do seu próprio potencial e de suas
percepções, estimulados pelo professor. Quanto ao estudo do meio ele classifica como indutivo,
pois, procura guiar sequencialmente os processos de observação e interpretação para que os alunos
compreendam as transformações espaciais ocorridas na paisagem. Os alunos poderão observar
comparar, refletir sobre os diferentes estágios revelados na paisagem.
Portanto o estudo do meio trata-se de um procedimento que tem uma longa tradição nas
práticas de ensino em geral e em particular nos estudos geográficos na escola. Este não se refere
apenas ao natural, uma vez que nele se inter-relacionam natureza e sociedade. O objetivo do estudo
Fórum Internacional do Meio Ambiente - A conferência da Terra 50

do meio no ensino é o de sensações e percepções dos alunos no processo de conhecimento para em


seguida proceder-se à elaboração conceitual.

METODOLOGIA
O estudo do meio permite treinar os olhos para ver, como também, a mente para
generalizar os conhecimentos obtidos, além disso, permite fazer relações entre a escala global,
regional e a local, possibilitando uma melhor interpretação da realidade. Permite ao aluno ver de
perto, na escala real e na observação direta, a percepção por meio da paisagem e do lugar o que
acontece no espaço geográfico.
Percebeu-se um grande obstáculo em desenvolver o estudo do meio com os alunos através
de aulas de campo. Qual seria a dificuldade? Faltam profissionais capacitados? Faltam recursos?
Assim, foi ministrada uma aula campo para os alunos do 3º ano do ISEPAM, já que estes estariam
prestes a terminar o 2° grau sem ter a oportunidade de participar desse tipo de atividade.
A partir disso, houve a solicitação para que o projeto “Trabalho de Campo na disciplina de
Geografia no ensino médio” fosse desenvolvido na escola. Logo, o primeiro passo foi apresentar o
projeto para a direção do ISEPAM. Sendo então aceito, foi apresentado à professora da turma o
plano de aula do trabalho de campo que seguiu os seguintes passos:
1-Tema: O Espaço Geográfico: as paisagens naturais e culturais.
2-Delimitação do Tema: As paisagens da Baixada Campista
3-Objetivo Específico:
-Reconhecer as diferentes paisagens: antrópicas (urbana e rural) e naturais;
-Resgatar a consciência humana de preservação do patrimônio natural e cultural, tanto na
cidade como no campo;
-Reconhecer os fenômenos espaciais a partir da seleção, comparação e interpretação,
identificando as singularidades ou generalidades de cada lugar, paisagem ou território.
4-Habilidades e Competências:
-Observar, diferenciar e relacionar diferentes formas de relevo e suas implicações na
ocupação do espaço pelo homem;
-Identificar e compreender a diversidade e complexidade dos biomas terrestres
relacionando-os à ocupação humana e à apropriação dos recursos;
-Reconhecer a disponibilidade das águas como fonte de recursos múltiplos e valiosos;
-Sensibilizar quanto ao caráter esgotável das águas e da necessidade de preservação em
benefício de toda a humanidade;
-Interpretar e relacionar conceitos geográficos transferindo para situações concretas.
5-Estratégias de aula/ Metodologia:
- Reunião com a professora de geografia;
- Informar aos pais os objetivos propostos no trabalho de campo;
- Reunião e aula expositiva e dialogada para os alunos.
6-Normas e diretrizes das atividades pedagógicas externas:
-Comparecer 15 minutos antes da hora marcada para a saída;
-Responsabilizar-se pela conservação do transporte;
-Tratar com respeito todas as pessoas com quem mantiver contato, inclusive os colegas;
-Ter consciência de que o fato de não estar na sala de aula não significa que o trabalho de
campo não seja uma atividade pedagógica.
7-Recursos a serem utilizados no campo:
-Mapa;
-Máquina fotográfica;
-Filmadora;
-Material de primeiros socorros.
8-Material de uso pessoal (para os alunos)
-Máquina fotográfica (opcional);
-Bloco para anotações;
Fórum Internacional do Meio Ambiente - A conferência da Terra 51

-Repelente;
-Protetor solar e boné;
-lanche.
9-Atividades a serem realizadas durante a aula-campo:
-Fotografar as paisagens mais relevantes e que atendam ao tema proposto;
-Elaborar um pequeno roteiro de anotações sobre as diversas paisagens;
-Observar e interpretar o caminho percorrido desde a primeira parada até a última.
10-Estratégia de avaliação:
-Os alunos foram avaliados durante toda a aula;
- Foi aplicado um questionário para a turma contendo três perguntas, que são:
- Dentre as paisagens percebidas, quais foram as mais marcantes?
- A aula campo modificou a sua forma de interpretar a paisagem?
- Você acha a proposta da aula campo relevante para as escolas?
Também, foram feitas algumas visitas à turma, sendo que a primeira foi tanto para
informar a data da aula campo, como para induzir os alunos a pesquisarem sobre o tema da aula,
que foi “O Espaço Geográfico: as paisagens naturais e culturais”. Desta forma, uma lista dos alunos
que participariam da aula foi organizada pela escola, assim como a autorização dos pais e
solicitação o micro ônibus do CEFET-Campos para efetuar o trabalho.

RESULTADOS E DISCUSSÕES
Na semana do trabalho de campo, foi ministrada uma aula apresentando o tema “O Espaço
Geográfico: as paisagens naturais e culturais”. E distribuído para a turma um roteiro da aula campo
com os passos que seriam realizados na aula. É importante destacar que a proposta, foi também
mostrar que não é preciso se locomover a grandes distâncias para ministrar uma aula campo. Esta
pode ser feita até no pátio ou entorno da escola. O objetivo é justamente fazer o aluno observar e ter
um “olhar” crítico sobre a paisagem que está contemplando.
A aula campo foi realizada no dia 29 de novembro de 2007, com saída do CEFET-Campos
às 08h30min e retorno às 14h30min. Primeiramente, no pátio do CEFET foi feita uma
contextualização inicial, onde os professores induziam os alunos a terem um “novo” olhar para o
seu entorno, e que percebessem na paisagem o urbano e o rural, o dominante e o excluído, o natural
e o antrópico.
O percurso total da aula, desde a Sede do Município até o final no Distrito de Mussurepe,
foi de 50 km. Da Sede de Campos, os alunos seguiram para o Distrito de Tocos, onde está
localizado o “Solar do Colégio” um importante marco da ocupação da planície, em seguida ao
Distrito de São Sebastião, onde estão localizadas diversas cerâmicas. Também, para o Distrito de
Santo Amaro e o Distrito de Mussurepe, onde os alunos observaram a vegetação de restinga. Assim,
no percurso da aula-campo (fig.2), optou-se por fazer sete paradas nos locais mais significativos
para o estudo do tema proposto, que contemplaram as paisagens que marcam a natureza como
também todo o ciclo de ocupação econômica, política e social da Baixada Campista.

→ Saída do CEFET-Campos.
Fórum Internacional do Meio Ambiente - A conferência da Terra 52

Foto 2- Turma 3001 do ensino médio do


Foto 1- Saída da aula-campo com ISEPAM.
destino a Baixada Campista

Foto 3- Solar do Colégio século XVII. Foto 4- Alunos no Solar do Colégio.

→Primeira Parada-(Solar do Colégio)

Fundado pelos jesuítas, teve sua construção finalizada no final do século XVII, e tinha
como objetivo a catequese dos índios da colônia. É considerado um dos mais antigos conjuntos
arquitetônicos do país. Foi restaurado em 2002 e hoje abriga o Arquivo Público Municipal de
Campos dos Goytacazes.

→Segunda -Parada -Distrito de São Sebastião de Campos

Foto 6- Matriz de São Sebastião(1710)


Foto 5- Cinema de São Sebastião
(1929)

O acervo das paisagens construídas aponta algumas igrejas do período colonial como
a Matriz de São Sebastião e seu amplo pátio público, a igreja do Rosário e a igreja São Benedito
como também, a “Lira de São Sebastião”, além do cinema que data de 1929 a e sede da Usina Poço
Gordo de cana-de-açúcar.Todos bem conservados e destacando tempos perdidos atualmente
presentes na paisagem e não reconhecidos. Essas estruturas podem ser utilizadas para o
desenvolvimento de um roteiro turístico-histórico-religioso na região.
→Terceira Parada-cava de extração de argila e indústria ceramista
Fórum Internacional do Meio Ambiente - A conferência da Terra 53

Foto 7- Degradação do solo pelas cavas Foto 8- Indústria ceramista


de extração de argila

A localidade apresenta um uso tipicamente rural associado à extração mineral de argilas e a


produção de cana-de-açúcar, duas das mais importantes atividades do Município. Existem mais de
100 cerâmicas no Distrito que são a principal atividade econômica atualmente. Os solos da baixada
apresentam restrições de nível do lençol freático elevado, já que predominam os solos
hidromórficos e com presença marcante de pacotes argilosos e siltosos, essa abundância propicia
uma grande extração dos mesmos para a fabricação da cerâmica-vermelha. Porém, a intensa
extração de matéria-prima deixa vestígios de uma grande degradação ambiental dos solos. O
Distrito abriga também atividades de pecuária e monocultura canavieira.

→Quarta Parada -(Mosteiro de São Bento)

Foto 9 - Mosteiro de São Bento (1636) Foto 10- Alunos reunidos no Mosteiro de
São Bento.

Sua construção teve início na metade do século XVII, por volta de 1636, sendo concluída
somente em fins do século XVIII. Em 1965, um incêndio destruiu parte da igreja junto com seu
mobiliário. O conjunto é formado pelo convento, capela e cemitério. Hoje o Mosteiro, sede da
paróquia de Nossa Senhora do Rosário, administra 35 capelas, está sediado na Praça de São Bento
no Distrito de Mussurepe.

→Quinta Parada- Distrito de Santo Amaro

Foto 11- Igreja de Santo Amaro Foto 12- Alunos reunidos na praça de Santo
Amaro.
A construção da igreja de Santo Amaro teve início em 1735 e concluída em 1790, tendo
sofrido sucessivas reformas, responsáveis por sua descaracterização. Segundo a lenda, a capela foi
construída por desejo de Santo Amaro, uma vez que a imagem do santo, que estava no mosteiro,
desaparecia com freqüência, sendo encontrada sempre num monte onde foi erguida a igreja. O
patrimônio histórico que possui Igrejas seculares e agregam festas Religiosas como a de São
Sebastião e Santo Amaro que ainda preserva o folguedo da Cavalhada que devem ser aproveitados
Fórum Internacional do Meio Ambiente - A conferência da Terra 54

pelos professores como forma de divulgar e difundir os processos culturais, através dos diversos
setores do sistema educacional.
→Sexta Parada - praia do Farol de São Tomé

Foto 13- Farol de São Tomé Foto 14 - Orla da Praia do Farol.

Com 47 metros de altura, o Farol de São Tomé é uma construção francesa de 1882. É um
importante instrumento de navegação, orientação segura para os barcos de pescadores que voltam
para casa. Na região do cabo do Farol de São Tomé não é difícil a delimitação das duas planícies, a
sudeste do Distrito de Santo Amaro observa-se a planície argilosa, com baixíssimas altitudes,
cortada por pântanos e braços d’água, salpicada por manchas arenosas, está separada do mar por
uma faixa mais alongada e mais elevada de areia, na qual houve formação de dunas, hoje fixadas.
Neste ambiente de restinga mais elevado que a planície argilosa, localiza-se a praia do Farol de São
Tomé.

→Sétima parada-Restinga do Xexé(Distrito de Mussurepe)

Foto 15- Restinga do Xexé. Foto 16 - Lagoa da Maria da Rosa(Xexé)

Foto 17 - Alunos durante a aula na Foto 18-Toda a turma no fim da


restinga do Xexé. aula-campo.

Por fim, ao verificar a cobertura vegetal dessa região se observa um significativo e


considerável resquício da vegetação de restinga, como também, o único do Município. E se
analisarmos a nível regional e nacional, é um dos poucos locais que ainda mantém sua paisagem
natural de restinga praticamente intacta, sendo urgente uma proposta para definir essa área como de
proteção ambiental. Atualmente a restinga está seriamente ameaçada, e seu destino está nas “mãos”
da iniciativa privada, já que o complexo portuário de exportação da empresa MMX que vem sendo
construído no Açu, na borda norte da restinga, no limite do vizinho Município de São João da Barra
e o Distrito de Mussurepe de Campos.
Fórum Internacional do Meio Ambiente - A conferência da Terra 55

Os resultados das perguntas apontaram para um volume de respostas, em que, dos 25


alunos que participaram da aula, a grande maioria, 63% dos alunos elegeram a paisagem natural
como mais marcante, e os outros 37% reconheceram a paisagem urbana (gráfico 1).
Gráfico 1

Além disso, 100% dos alunos responderam que a aula campo modificou a sua forma de
interpretar a paisagem e que esta também os ajudou a compreender melhor o ambiente que os cerca.
Todos os alunos também concordaram que a aula campo é relevante para as escolas e a destacaram
como uma maneira diferente de aprender a Geografia, interagindo com o ambiente, além de ser uma
dinâmica muito motivadora que despertou curiosidade e interesse.

CONCLUSÃO
Um dos maiores objetivos da escola, e também da Geografia é formar valores de respeito
ao outro e das diferenças, sejam estas culturais, políticas, religiosas, econômicas entre outras.
Assim, é preciso formar uma “consciência espacial” para o estímulo ao exercício da cidadania, onde
é essencial perceber o espaço como um elemento importante da organização social. Proporcionando
uma autonomia intelectual e alicerçada numa ética solidária e democrática.
O trabalho de campo na disciplina de Geografia é de suma importância para desenvolver
conhecimentos, habilidades e atitudes nos jovens alunos, no sentido de compreender criticamente o
espaço vivido, assumindo valores éticos. Os resultados demonstraram que os alunos ao terminarem
a aula-campo se sensibilizaram com todo o patrimônio natural e cultural no qual estão inseridos,
que muitas vezes não são percebidos.
A experiência dos Licenciandos em Geografia de realizar um trabalho de campo prático,
com alunos de uma escola campo de estágio, foi única, o que demonstra a necessidade de se
valorizar esse tipo e atividade na escola. Logo, a educação está em todos os espaços, não somente
na sala de aula. Está também no pátio, na rua, no bairro, na família, isto é em toda a sociedade.
Aprende-se no dia a dia, nas relações com o outro e com a própria cultura local. A escola deve,
então, ser o instrumento para tornar o indivíduo um cidadão, com capacidade de interpretar
criticamente todos os aspectos que permeiam a sociedade.
Por fim, o que fica não são respostas em sim os dilemas que os educadores devem
enfrentar, e que são: O que ensinar? Como ensinar? Para que ensinar? Pois, a educação é troca de
conhecimentos entre professores e alunos. A educação não está somente na sala de aula, está no
pátio, nas ruas, nos meios de comunicação etc. Deve se priorizar o desenvolvimento da capacidade
intelectual dos estudantes dos princípios éticos, da compreensão e da solidariedade humana. A
educação visa preparar os alunos para lidar com as mudanças e diversidades tecnológicas,
econômicas e culturais, equipando-os com qualidades como: iniciativa, atitude e adaptabilidade. E a
aula-campo pode habilitar o aluno a ler o espaço geográfico em sua totalidade e “concretude” de
fatores e fenômenos.

REFERÊNCIAS BIBLIOGRÁFICAS
FREINET, Célestin. A educação do trabalho. São Paulo: Martins Fontes, 1998.
PARÂMETROS Curriculares Nacionais: Geografia, Secretaria de Educação, Brasília: MEC,1998.
STRAFORINI, Rafael. Ensinar a Geografia: O desafio da Totalidade – mundo nas séries iniciais.
São Paulo: Annablume, 2004.
Fórum Internacional do Meio Ambiente - A conferência da Terra 56

PELA COMPLEXIDADE DA CIDADANIA, DA INFORMAÇÃO E DO MEIO AMBIENTE

Alan Curcino Pedreira da SILVA


Ms. em Ciência da Informação pela UFPB, Professor da UFAL. alancurcino@hotmail.com
Elton Márcio Leite GOMES
Licenciado em História pela Fundação Educacional do Baixo São Francisco Dr. Raimundo Marinho, Aluno do Curso de
Graduação em Turismo da UFAL. elton.htur@hotmail.com

RESUMO
Discute a relação entre cidadania, informação e meio ambiente. Levanta o conceito de
cidadania por uma construção histórico-ambiental. Diante da cidadania e da problemática
socioambiental, caracteriza a sociedade contemporânea por diversas metáforas de sua compreensão,
sob o imperativo da informação e do conhecimento: Sociedade da Informação, Sociedade em Rede,
Sociedade da Aprendizagem e Sociedade do Conhecimento. Implica a informação e a informação
ambiental como possibilitadoras do desenvolvimento humano, da sustentabilidade e da cidadania
ambiental. Conclui com inferências acerca da complexidade ambiental e o poder da informação e
do conhecimento.
Palavras-chave: cidadania; informação; meio ambiente; desenvolvimento; complexidade.

ABSTRACT
It argues the relation between citizenship, information and environment. It raises the
concept of citizenship for a description-ambient construction. Ahead of the citizenship and the
socio-environmental problematic, it characterizes the society contemporary for diverse metaphors
of its understanding, under the imperative of the information and the knowledge: Information
Society, Net Society, Learning Society and Knowledge Society. It implies the information and the
ambient information that is makes possible of the human development, the sustainability and the
ambient citizenship. It concludes with inferences concerning the environmental complexity and the
power of the information and the knowledge.
Key-words: citizenship; information; environment; development; complexity.

(DES)CONSTRUÇÕES SÓCIO-AMBIENTAIS: O VIR-A-SER...2


(...) Que o nosso tempo seja lembrado pelo despertar de uma nova reverência à vida,
por um compromisso firme de restauração da integridade ecológica da Terra, pelo
avivamento da luta pela justiça e pelo outorgamento de poder aos povos, pelo
cumprimento dos compromissos de cooperação na resolução dos problemas globais,
pelo manejo pacífico da mudança e pela jubilosa celebração da vida. Teremos êxito
porque devemos fazê-lo.3

O planeta Terra existe há quase 5 bilhões de anos, enquanto que o homem surgiu há, no
máximo, 3 milhões de anos. Desde o aparecimento dos hominídeos na Terra, estes vêm tentando
compreendê-la, dominá-la, numa inter-relação nem sempre harmônica.
No processo de seleção natural do homem pré-histórico, baseando-se na teoria formulada
por Charles Darwin, pela mutação gradual descendente dos antropóides antigos, do período
Paleolítico (Idade da Pedra Lascada) ao Neolítico (Idade da Pedra Polida), somente neste último o
desenvolvimento de forças produtivas libertou o homem da dependência da Natureza, pelo menos
em parte, disseminando a Revolução Neolítica, conhecida também como Agrícola.
No princípio tudo era frio...
A transição entre os períodos Paleolítico e Neolítico, também reconhecida como um
período pré-histórico denominado de Mesolítico, coincide com o fim da era de glaciações da Terra.

2
O percurso humano-natural histórico desenvolvido nesta primeira parte do trabalho é baseado em GUGLIELMO
(1988). Tal percurso consiste num simples percurso descritivo, necessário aqui para a compreensão da relação homem
X natureza, culminando na questão ambiental da cidadania.
3
Último parágrafo da Minuta do Documento de Referência "Carta da Terra", datado de 11 de abril de 1999.
Fórum Internacional do Meio Ambiente - A conferência da Terra 57

Por volta de 15 e 10 mil anos a.C., na passagem do Mesolítico ao Neolítico, a Terra começava
adquirir suas características atuais. As regiões temperadas do planeta foram ficando mais quentes e
as mediterrâneas mais secas. Surgiram florestas e campos, além da formação de vales fluviais, com
regimes de cheias e vazantes - o meio ambiente tornava-se cada vez mais favorável à sobrevivência
humana.
O homo sapiens foi abandonando a vida de caçador e coletor e começou a cultivar
tubérculos, cereais e hortaliças, além de domesticar animais, para alimentação (carne e leite),
vestuário (peles) e para utilização como força de tração (ao arar a terra), especializando
progressivamente sua instrumentação técnica.
Nesse processo de sobrevivência o homem e seu grupo em evolução passaram do estado de
selvageria do período Paleolítico à barbárie no Neolítico, quando o homem deu mais um passo à
civilização, organizando-se em comitivas e cooperativas, como formas bárbaras de vida sociativo-
comunitária, sem distinguir socialmente os membros de seus grupos, contudo diferenciando
sexualmente o papel do trabalho. Com a necessidade de defesa os grupos sociais tornavam-se cada
vez mais complexos, culminando na formação de tribos.
Entre 5 mil e 4 mil anos a.C. começou a Idade dos Metais ao final do período Neolítico,
abandonando o homem seus instrumentos de madeira, osso e pedra, passando a utilizar metais
moles, aparecendo os primeiros registros escritos cuneiformes e hieroglíficos. A escrita toma corpo
ao passo que contribui ao desenvolvimento das civilizações.
Dos nomos egípcios, cidades-Estado mesopotâmicas e fenícias, tribos palestinas, às pólis
gregas e civitas romanas, todas as civilizações da Antiguidade originaram-se das primitivas tribos
pré-históricas. Diferente das antigas tribos, as novas formas sociativas impuseram estamentos e
classes sociais, subjugando povos outros, por vezes escravizando-os, bem como subjugando a
própria Natureza ao seu dispor. Os fenômenos naturais até então não compreendidos, portanto
muitas vezes não subjugados, davam margem às construções do imaginário social em busca de
respostas nessa relação homem-meio ambiente.
Por meio da religião, mitologia e filosofia, povos antigos, gregos e posteriormente os
romanos, buscavam todos respostas. Mas foi com Empédocles, natural da colônia dórica de
Agrigento, na Sicília, no século V a.C., que se estabeleceu a relação mais duradoura sobre a
constituição da natureza, do universo, do homem, perdurando tal relação por cerca de 2 mil anos,
até os questionamentos modernos da Ciência. Para Empédocles, os quatro elementos físicos que
constituíam todo o universo, seriam a água, o ar, a terra e o fogo, movidos pelas ações contrárias de
philía (= amor ou amizade) e neikos (= ódio ou inimizade) - sentimentos intrinsecamente humanos.
Ora, o verdadeiro pensamento de Empédocles é a unidade de tudo aquilo que se ama: há
em todas as coisas um elemento que as impele a se misturar e a se unir, mas também
uma força hostil que as separa bruscamente; esses dois instintos estão em luta. Essa luta
produz todo vir-a-ser e toda destruição. [grifo do autor] (NIETZCHE, 1978, p. 245).

Durante todo o período subsequente, denominado Idade Média, foi mais aproximada a
relação homem-meio ambiente através da cultura camponesa determinada pelo modo de produção
feudal. Posteriormente em detrimento dessa relação aproximada da Idade Média, pela formação de
uma cultura urbana, as cidades, originárias dos feudos e feiras medievais, tornaram-se a marca do
novo período histórico pautado no renascimento comercial e educativo-profissionalizante. Era a
Idade Moderna.
Na negação do teocentrismo e geocentrismo medievais germina o embrião da ciência.
Após o Renascimento Cultural surgem os métodos do conhecimento teórico, lastros da ciência
moderna: observação dos fatos, avaliação, experimentação, submissão ao rigor da matemática,
formulação de hipóteses, etc., criações reflexivas de homens como Galileu Galilei, Giordano Bruno,
Nicolau Copérnico, Kepler, dentre outros.
Talvez todos tivessem um único sonho, querer saber como o universo funcionaria sem o
poderio papal. Entretanto, foi em busca e em nome do progresso e desenvolvimento humano que
intelectuais racionalistas, denominados iluministas/ilustradores, aliados à face político-econômica
Fórum Internacional do Meio Ambiente - A conferência da Terra 58

européia, tendo como consequência a Revolução Industrial, desenvolveram as ciências como hoje
são conhecidas/estruturadas.
A Revolução Industrial determina nesse momento o mundo capitalista. Duas classes
sociais predominam: burguesia e proletariado. Mais e mais, com a utilização da Ciência e
tecnologia, a Natureza é dissecada e seres humanos são explorados por grupos dominantes, sendo
destituídos de direitos vitais, acrescentados de obrigações inumanas. Mesmo culminando na
Revolução Francesa para o ideal republicano do mundo Contemporâneo, sustentada na tríade de
liberdade, igualdade e fraternidade, males como exploração, miséria, criminalidade e
desigualdades sociais são multiplicados.
Por vezes, as mais legítimas bandeiras, como a da Revolução Francesa, podem reduzir-se
apenas a slogans, sendo transformado seu remédio proposto em veneno.
... liberdade, igualdade, fraternidade. Existe uma compreensão natural do significado de
cada um deles, além do qual torna-se necessária uma explicação/negociação dos limites
na compreensão dos mesmos. Consideramos que todos os homens nascem iguais no que
se refere aos direitos (...) Entretanto a plena liberdade no plano cultural não pode ser
transportada mimeticamente para o plano econômico, transformando-se, quando isso
ocorre, em uma corruptela do liberalismo. De modo similar, se é verdade que existe
uma carência crônica e crescente de solidariedade/fraternidade no plano econômico, no
plano político ou no cultural tais valores soem corromper-se em clientelismo ou
nepotismo. [grifo do autor] (MACHADO, 1997, p. 108)

Diante disso, Machado conclui que para a semeadura e negociação dos valores socialmente
acordados, como liberdade, igualdade e fraternidade, o espaço político preferencial seria o da
educação para a cidadania. E educar para a cidadania consiste em "prover os indivíduos de
instrumentos para a plena realização desta participação motivada e competente, desta simbiose entre
interesses pessoais e sociais, desta disposição para sentir em si as dores do mundo". (MACHADO,
1997, p. 106-107)
Instrumentar-se e ser instrumentado, participar, dispor-se a sentir as dores do mundo,
consistem, por sua vez, em práticas de cidadania. E no sentir as dores do mundo, ser cidadão
corresponderia a ouvir os gritos da Terra, pela degeneração insustentável das fronteiras ambientais e
pela degeneração da própria ecologia humana, corresponderia a ouvir os gritos, refletir e agir.
Desde o surgimento da Ciência como recurso/estratégia para alcance da verdade e progresso,
submetendo a Natureza e o homem comum, a questão ambiental foi dicotomizada, separando-se o
homem do próprio meio ambiente. Desse modo, no reatar desse elo, cidadania significaria promover
o vir-a-ser, anulando a destruição.

AQUARIUS: POR UMA NOVA SOCIEDADE... MAS QUE SOCIEDADE?


Num rápido balanço macro da situação mundial face às portas do atual milênio, seus dados
conduzem à reflexão acerca de que sociedade foi legada a humanidade e que sociedade está sendo
(des)construída:

• 5,77 bilhões de pessoas habitam a Terra.


• 1,15 bilhão vivem no hemisfério norte, nos países industrializados.
• 4,62 bilhões vivem no hemisfério sul, países pobres, 'em desenvolvimento'.
• 1,6 bilhão estão em situação pior do que há 15 anos.
• 1,44 bilhão vivem abaixo do nível de pobreza, quer dizer, 25% da população total.
• 1,3 bilhão de pessoas têm menos de um dólar por dia para viver, nos países do sul; 110
milhões na América; 220 milhões, na África; e 970 milhões, na Ásia.
• 1 bilhão de pessoas são analfabetas, das quais 600 milhões são mulheres.
• 1 bilhão de pessoas sobrevivem sem água potável.
• 800 milhões sofrem de desnutrição crônica.
• 500 milhões de mulheres de todo o mundo vivem na miséria.
Fórum Internacional do Meio Ambiente - A conferência da Terra 59

• 200 milhões de crianças menores de 5 anos são desnutridas.


• 100 milhões têm menos de 15 dólares por dia para viver. São pobres dos países do
hemisfério norte. Esse hemisfério tem 35 milhões de desempregados, que, porém, recebem ajuda
financeira dos Estados.
• 11 milhões de crianças morrem anualmente de desnutrição.
• 89 países estão em situação pior do que há dez anos.
• 70 países têm receita menor do que nas décadas de 60 e 70.
• Há um médico para cada 6 mil pessoas no hemisfério sul, enquanto no norte há um
médico para cada 350 pessoas.
• Entre 1980 e 1993, 82 % de todos os empregos novos na América Latina foram gerados
pela chamada economia informal.
• Cerca de 56% do total de empregos nos centros urbanos da América Latina estão no setor
informal, que não pára de crescer, segundo a Organização Mundial do Trabalho. De cada dez postos
de trabalho criados, só dois são do setor formal; os oito restantes são de trabalho sem contrato,
autônomo ou terceirizado.
• As posses de 349 multimilionários de todo o mundo são maiores que a renda anual de
45% da população mundial, ou seja, 349 pessoas recebem mais que 2,59 bilhões de pessoas.
• Nos últimos 30 anos, a participação na renda mundial dos 20% mais pobres do mundo
caiu de 2,3% para 1,4%, e os 20% mais ricos do mundo (230 milhões de pessoas) têm renda 60
vezes maior que a dos pobres - quer dizer, a renda de 4,62 bilhões de habitantes do hemisfério sul.
• Em 1998, a receita de 18 países da América Latina foi inferior à que tinha há dez anos.
• Segundo o Banco Mundial, um entre três latino-americanos é pobre, e 18% da população
da América Latina (86 milhões de pessoas) está na miséria, ou seja, sobrevive com uma renda
máxima de um dólar por dia.
• A continuar assim, o número de pobres da América Latina crescerá ao ritmo de um
milhão por ano. A cada minuto surgem mais dois pobres. (GADOTTI, 2000, p. 156-157)

Cada vez mais os fossos entre pobres e ricos, excluídos e incluídos, são aumentados.
Segundo Gutberlet (1999, p. 20), as desigualdades mundiais em geral são estruturais e determinadas
basicamente pela dimensão econômica, onde o nível de exploração de recursos naturais, o tipo de
desenvolvimento econômico dos países emergentes e as prioridades/escolhas das políticas nacionais
são influenciados pelo sistema econômico global capitalista.
Nesse processo excludente, "mulheres, crianças, idosos e grupos étnicos são, de forma
geral, os mais prejudicados" (GUTBERLET, 1999, p. 21). E esses prejuízos sociais demonstram
que há tempos os modelos de desenvolvimento, na sua maioria pautadamente baseados num
pretenso progresso da humanidade, mostram ser incapazes de alcançar ou estimular
verdadeiramente o equilíbrio sócio-econômico tão esperado, muitas e muitas vezes deixando
também de lado a questão ambiental e sua implicação em/para o próprio desenvolvimento.
Entretanto, diante dessa crise da sociedade, vozes críticas, a partir dos anos 70,
começaram a questionar o estilo de vida e de produção predominante. Foi o início do
empoderamento dos novos movimentos sociais, os movimentos ambientalistas e de
resistência cultural a todas as formas de dominação. (GUTBERLET, 1999, p. 23)

E a arte imita a vida... No fim dos anos sessenta o espetáculo Hair tornou-se o maior
sucesso da Broadway. De Ragni, Rado e MacDermot´s, a peça Hair suscitou uma das maiores
polêmicas do mundo do espetáculo ao levar pela primeira vez ao palco atores nus e discutir
abertamente temas como sexo, drogas, paz, exclusão social e amor livre. Hair anunciava uma nova
era, a era de Aquarius, era da comunicação e da celebração do amor e da vida, denominada desta
forma pela astrologia e pelo esoterismo, disseminada assim no senso comum.

Quando a lua no ponto aparecer


e Júpter e Marte chegar
Fórum Internacional do Meio Ambiente - A conferência da Terra 60

A paz o mundo guiará


e o amor há de brilhar

Há de nascer então a Era de Aquarius


Era de Aquarius
Aquarius 4

Se o senso comum sob uma perspectiva otimista já batizava essa nova era, pelas mudanças
paradigmáticas sentidas nos micro-espaços sociais a partir da crise da sociedade moderna, a ciência
também se propunha a caracterizá-la, esmiuçá-la, intitulando-a por muitos nomes, pelas suas muitas
compreensões.
Do "pós-industrialismo" de Daniel Bell, "terceira onda" de Alvin Toffler, "sociedade da
aprendizagem" de Van der Zee, à "sociedade em rede" de Manuel Castells, o novo paradigma
estabelecido é perpassado pela questão da informação e do conhecimento. Mesmo também no
debate do término ou não da sociedade moderna, rumo a um "presente" pós-modernismo, a
informação e o conhecimento tomam corpo e ganham relevância. E é dessa forma que se é proposta,
por outro lado, a Sociedade da Informação, ou para outros, a Sociedade do Conhecimento.
Com tudo isso, qualquer denominação do atual estado processual da sociedade
mundial não passa de um recorte da realidade, às vezes mais e às vezes menos aproximativo de um
todo complexo, como o caso da própria Sociedade da Informação:
A expressão 'sociedade da informação' deve ser entendida como abreviação (discutível!)
de um aspecto da sociedade: o da presença cada vez mais acentuada das novas
tecnologias da informação e da comunicação. Serve para chamar a atenção a este
aspecto importante. Não serve para caracterizar a sociedade em seus aspectos
relacionais mais fundamentais. Do conceito de sociedade da informação, passou-se, por
vezes sem as convenientes cautelas teóricas, ao de Knowledge Society (Sociedade do
Conhecimento) e Learning Society (Sociedade Aprendente). [grifo do autor]
(ASSMANN, 2000, p. 8)

O que ocorre é que a informação torna-se cada vez mais, nesta sociedade atual, um vetor
imperativo estratégico, condutor da vida (humano-natural).
A informação tornou-se uma noção que pretende imperar sobre todas as coisas físicas,
biológicas e humanas. Pretende agora reinar da entropia ao antropos, da matéria ao
espírito. (MORIN, 1977, p. 284)

Torna-se a informação imperial em dois modos, pela efetivação prática da máxima


"informação é poder", na manipulação social com fins de dominação ou na promoção de
desenvolvimento social, dito aqui social em observância ao elo indissolúvel homem-
meio(físico/biológico)-sociedade.
Pelo modo último imperial da informação, sendo imperial no sentido de promotor
necessário, para Barreto (1999, p. 1), a informação:
Ao atingir o público a que se destina deve promover uma alteração, aqueles que
recebem e podem elaborar a informação estão expostos a um processo de
desenvolvimento, que permite acessar um estágio qualitativamente superior, nas
diversas e diferentes gradações. Este é o objetivo da ciência da informação: criar
condições para a reunião da informação institucionalizada, sua distribuição adequada
para um público que ao julgar sua relevância a valorize para o uso com intuito de
semear o desenvolvimento do indivíduo e dos espaços que este habita.

4
Primeira estrofe e refrão traduzidos da canção antológica carro-chefe da trilha sonora do filme Hair (1979), dirigido
por Milos Forman.
Fórum Internacional do Meio Ambiente - A conferência da Terra 61

Assim, a informação torna-se um recurso de possibilidade de promoção de


desenvolvimento. Na promoção do desenvolvimento do indivíduo, a informação seria recurso para a
cidadania. Por sua vez, o desenvolvimento dos espaços que o indivíduo-cidadão habita implica no
primeiro desenvolvimento, num processo cíclico, democrático e libertador5.
Aspira, dessa maneira, a sociedade mundial, uma nova face de conscientização e
(r)evolução de si mesma, sob égide agora da sustentação da vida, pela democracia e liberdade,
tomando-se a informação como mola dessa sustentação.

(IN)FORM@ÇÃO: MOLA SUSTENTÁVEL


Acontece, porém, que a informação somente é significada e re-significada para
desenvolvimento ou ações de desenvolvimento quando contextualizada, sendo sua
contextualização, nesse caso, um processo de inter-relações sócio-ambientais, que determinam,
senão modelos, ao menos perspectivas de/para desenvolvimento, em sua própria busca.
Mas, se os antigos modelos de desenvolvimento não corresponderam a uma equidade
econômica e ao alcance de plenas democracia e cidadania, além do cuidado com a preservação e
utilização/manutenção da natureza de maneira otimizada, qual a forma de desenvolvimento a se
buscar?
Desde o surgimento das vozes críticas no mundo na aurora dessa nova era, as discussões
mundiais tenderam a um desenvolvimento que gradativamente incorporou as preocupações com os
limites da natureza, além das necessidades de estagnação das iniquidades sócio-econômicas e da
promoção de constante abertura social na particip(ação) política dos cidadãos.
Se por um lado foi iniciado tanto o empoderamento/ação de movimentos sociais quanto a
convergência das atenções científicas à relação homem-meio ambiente e desenvolvimento, por
outro lado, líderes/representantes mundiais iniciaram um processo de discussão para construção de
um pensamento planetário comum de desenvolvimento, para uma sociedade planetária em
(r)evolução. Para tanto, diversos encontros mundiais foram realizados desde a década de 70. No
entanto, foi somente com o Relatório Nosso Futuro Comum, publicado em 1987, resultado dos
trabalhos da Comissão Mundial (das Nações Unidas) sobre Meio Ambiente e Desenvolvimento
(UNCED), presidida pela primeira-ministra da Noruega, Gro Harlem Brundtland - motivo pelo qual
o relatório ficou também conhecido como Relatório de Brundtland - que foi lançada a idéia de um
desenvolvimento que atendesse os anseios mundiais. Era um desenvolvimento pautado em uma
nova noção, a sustentabilidade.
A noção de sustentabilidade, por sua vez, implica uma necessária inter-relação entre
justiça social, qualidade de vida, equilíbrio ambiental e a necessidade de
desenvolvimento com respeito à capacidade de suporte. (HOGAN apud JACOBI, 1999,
p. 384)

De forma concomitante a elaboração e publicação do Relatório de Brundtland, dão-se os


trabalhos da Assembléia Constituinte do Brasil para construção da Constituição Federal do país.
Após a promulgação da Constituição no ano de 1988, referindo-se ao seu Capítulo VI do Título
VIII – Da Ordem Social, Vieira (1992, p. 11), sobre a questão ambiental, comenta que:
(...) se sua própria inserção nominal no texto constitucional já representa um avanço,
tem-se considerado como ganhos concretos da sociedade os seguintes: o conceito de
ambiente como bem comum da população e o reconhecimento do direito do cidadão a
ter acesso à informação ambiental e a desfrutar uma qualidade sadia de vida.

Desse modo, na busca e efetivação do desenvolvimento sustentável, a informação,


enquanto ferramenta e meio, tem um papel de suma importância, no "informar os indivíduos sobre
os problemas e soluções viáveis sobre a questão, além de controlar e armazenar a documentação

5
Os estudos de SEN (2000) apresentam o desenvolvimento como um processo de expansão da liberdade humana e da
remoção das principais fontes de privação desta. Liberdade, democracia, ética, justiça e responsabilidade são referências
amarradas pelo autor na análise das políticas públicas e nas relações sócio-econômicas e políticas gerais.
Fórum Internacional do Meio Ambiente - A conferência da Terra 62

pertinente produzida sobre os assuntos ligados ao meio ambiente" (CARIBÉ, 1992, p. 41). O papel
da informação ainda é intensificado pelo poder das tecnologias da informação e comunicação, por
muitas vezes promotoras estratégicas de desenvolvimento e outras tantas alienantes, corruptoras
sociais.
No ir contrário à alienação das massas, a informação dita ambiental se evidencia como
informação estratégica, recurso para cidadania ambiental e desenvolvimento sustentável, quando
contextualizada, dada relevância e utilizada com fins sustentáveis. E se por um modo essa
informação é estratégica, só é estratégica pela formação da cidadania/ação cidadã, no seu uso
efetivo sócio-individualmente. Conforme Alícia Bárcena (in GUTIÉRREZ apud GADOTTI, 2000,
p. 159), "a formação de uma cidadania ambiental é um componente estratégico do processo de
construção da democracia".
Assim, a cidadania ambiental determina e é determinada por esse processo de construção
da democracia, de participação social, de atuação política civil, de exigência e questionamento
público, e de responsabilidade social, através dessa nova era que se estabelece, dessa sociedade em
transformação, por uma sociedade sustentável, uma sociedade consciente do meio ambiente e de
seu desenvolvimento.

CONSIDERAÇÕES... INICIAIS!
Tudo o que se traz neste texto só demonstra que o campo de discussão, análise e prática de
cidadania para uma sociedade que viva e pense acerca de si e do meio ambiente, quiçá na
perspectiva sustentável, está longe de seu esgotamento.
A era da informação disponibiliza recursos tecnológicos para diagnóstico e monitoramento
do meio técnico-científico-informacional, bem como incrementa os meios e o acesso à informação
para tomada de decisão, para formulação de políticas públicas e participação civil. A grande questão
ainda é sobre as disparidades da pretensa Sociedade da Informação no seu processo de inclusão (ou
exclusão) social.
Como uma sociedade eminentemente excludente poderá incluir excluídos?
Saberes ambientais tradicionais/populares se encontram nessa sociedade. É fato que ela
intensifica diálogos entre saberes ambientais. Educação ambiental, sistemas de informações
ambientais, movimentos ambientais, algo converge à possibilidade de efetivação de uma sociedade
sustentável, numa mudança coletiva de postura para com a vida e continuidade humano-natural.
Se existe um domínio onde estão bem salientes, simultaneamente, uma continuidade
evidente e uma formidável mudança entre o universo biológico e o universo
antropossocial, é precisamente o da comunicação e informação. (MORIN, 1977, p. 307)

Mas, há muito tempo a questão ambiental da cidadania fora rompida, na evidência do


conflito dos universos biológico e antropossocial, determinando práticas sociais "selvagens". Atá-la
novamente requer esforços pesados. Principalmente no que diz respeito ao homem comum,
destituído muitas vezes de meios de produção/sobrevivência.
Cidadania, democracia e desenvolvimento são três faces complexas do devir humano. Pelo
seu modo, a complexidade da questão ambiental tonifica e re-liga o ser humano no mundo, nesse
devir. E só na tentativa de compreensão dessa complexidade pelo poder da informação e do
conhecimento é que se poderá alcançar um futuro sustentável.
A complexidade ambiental abre o caminho infinito no qual se inscreve o ser num devir
complexificante. Um ser sendo, pensando e atuando no mundo. (LEFF, 2001, p. 222)

REFERÊNCIAS BIBLIOGRAFICAS
ASSMANN, Hugo. A metamorfose do aprender na sociedade da informação. Ciência da
Informação. v. 29, n. 2, Brasília: IBICT, 2000, p. 7-15.
BARRETO, Aldo. Mudança Estrutural no Fluxo do Conhecimento: a comunicação eletrônica.
Disponível em: http://www.alternex.com.br/~aldoibict/estrutura/estrutural.htm . Acessado em: 28
mai. 1999.
Fórum Internacional do Meio Ambiente - A conferência da Terra 63

BÍBLIA SAGRADA. Gênesis, 1:28.


CARIBÉ, Rita. Subsídios para um sistema de informação ambiental no Brasil. Ciência da
Informação. v. 21, n. 1, Brasília: IBICT, 1992, p. 40-45.
CASTELLS, Manuel. A era da Informação: economia, sociedade e cultura; v. 1. A sociedade em
rede. 3ª ed. São Paulo: Paz e Terra, 2000.
CONTEL, Fábio Betioli. Geografia, globalização e futuro. In: CARLOS, Ana Fani A. (Org.).
Ensaios de Geografia Contemporânea. Milton Santos: obra revisitada. São Carlos: Editora da USP,
HUDTEC, Imprensa Oficial do Estado, 2001, p. 248-255.
DREW, David. Processos interativos homem-meio ambiente. 4ª ed. Rio de Janeiro: Bertrand Brasil,
1998.
GADOTTI, Moacir. Pedagogia da Terra. São Paulo: Periópolis, 2000. (Série Brasil Cidadão).
GUGLIELMO, A. R. A Pré-História: uma abordagem ecológica. São Paulo: Brasiliense, 1988.
(Coleção Tudo é História).
GUTBERLET, Juta. Desenvolvimento desigual: impasses para a sustentabilidade. São Paulo:
Fundação Konrad Adenauer Stiftung, 1999. (Série Pesquisas, n. 14).
JACOBI, Pedro. Meio ambiente urbano e sustentabilidade: alguns elementos para a reflexão. In:
CAVALCANTI, C. (org.). Meio Ambiente, desenvolvimento sustentável e políticas públicas. 2ª ed.
São Paulo: Cortez: Recife: Fundação Joaquim Nabuco, 1999, p. 384-390.
JAPIASSÚ, Hilton; MARCONDES, Danilo. Dicionário básico de filosofia. Rio de Janeiro: Jorge
Zahar Editor, 1996.
JOLLIVET, M.; PAVÉ, A. O meio ambiente: questões e perspectivas para a pesquisa. In: VIEIRA,
Paulo Freire; WEBER, Jacques (Orgs.). Gestão de recursos naturais renováveis e desenvolvimento:
novos desafios para a pesquisa ambiental. São Paulo: Cortez, 1997, p. 53-112.
LEFF, Enrique. Epistemologia Ambiental. São Paulo: Cortez, 2001.
MACHADO, N. J. Cidadania e educação. São Paulo: Escrituras Editora, 1997. (Série Ensaios
Transversais - vol.1).
MORIN, Edgar. O Método. Tomo I: a natureza da natureza. Lisboa: Publicações Europa-América,
1977.
NIETZSCHE, F. Empédocles de Agrigento - crítica moderna: 2 [texto extraído do livro La
Philosophie à Époque de la Tragédie Grecque (tradução de R. R. Torres Filho)] . In: SOUZA, J. C.
(org.). Os Pré-Socráticos: fragmentos, doxografia e comentários. 2ª ed. São Paulo: Abril Cultural,
1978, p. 243-247.
OLIVEIRA, José Valberto; SOUTO, Francisco José Bezerra. Percepção ambiental de estudantes
secundaristas de uma escola estadual de Campina Grande, Paraíba. Campina Grande: UEPB,
1998.
REIGOTA, Marcos. Meio Ambiente e Representação Social. 3ª ed. São Paulo: Cortez, 1998.
(Questões de nossa época, v. 41)
SANTOS, Milton. Meio técnico-científico e urbanização: tendências e perspectivas. Revista
Resgate, n. 3, p. 76-86, 1991.
__________. Técnica espaço tempo - globalização e meio técnico-científico-informacional. São
Paulo: Hucitec, 1994.
__________. Território e sociedade. Entrevista com Milton Santos. 2ª ed. 1ª reimpressão. São
Paulo: Ed. Fund. Perseu Abramo, 2001.
SANTOS, Milton; SILVEIRA, María Laura. O Brasil: território e sociedade no século XXI. 3ª ed.
Rio de Janeiro, São Paulo: Ed. Record, 2001.
SEN, Amartya. K. Desenvolvimento como liberdade. São Paulo: Companhia das Letras, 2000.
SERPA, Luiz Felippe Perret. Perspectivas da ciência no próximo milênio. In: DIAS, André Luis
Mattedi; et al. (Orgs.). Perspectivas em epistemologia e história das ciências. Feira de Santana:
UFFS, 1997. p. 25-31.
VIEIRA, Ana. Meio ambiente e desenvolvimento sustentável: fontes para a compreensão do
discurso político ambiental do governo brasileiro. Ciência da Informação. v. 21, n. 1, Brasília:
IBICT, 1992, p. 7-13.
Fórum Internacional do Meio Ambiente - A conferência da Terra 64

EDUCAÇÃO BIOCÊNTRICA E ALTERIDADE COMO ÉTICA AMBIENTAL

Carla Jeane Helfemsteller Coelho


FACED/UFBA – e mail: ccfilos2@yahoo.com.br
Miguel Angel Garcia Bordas
FACED/UFBA – e mail: bordas@ufba.br

RESUMO
Em um contexto onde os problemas sociais e ambientais exigem soluções mais
expressivas, erguem-se propostas que situam a ética, como, alternativa a ser perseguida, na
esperança de provocar mudanças de estilo de vida no planeta. Este trabalho apresenta a perspectiva
de ética vista como Alteridade, categoria proposta pelo filosofo lituano Emmanuel Levinas, que por
propor formas de relações de pleno reconhecimento do outro, e por isso absoluta acolhida ao outro
individuo e ao outro meio ambiente como legítimos, poderiam resultar em formas de relações
sustentáveis. Reconhecendo que o estabelecimento de relações de alteridade, num contexto
paradigmático antropocêntrico constitui-se um tremendo desafio, a autora propõe a metodologia da
Educação Biocêntrica, proposta por Rolando Toro Araneda, como possibilidade, uma vez que esta
apresenta uma orientação epistemológica que possibilita o entrelaçamento entre razão e sentimento,
conscientização e sensibilidade. Sua metodologia inclui entre outras propostas a vivência de
Biodança, que possibilita o trabalho conjunto dos hemisférios cerebrais, proporcionando um
reequilíbrio orgânico, propiciando finalmente, no campo da educação, o desenvolvimento integral
do humano, condição para ética. Elemento perdido, nos processos educativos mecanicistas e
fragmentado, que tem gerado o descaso com o ser humano e com o planeta.
Palavras Chaves: Ética, Alteridade, Educação Biocêntrica

ABSTRACT
In a context where the social and environmental problems require solutions more
expressive, it is built new proposals that place the ethics, as alternative to be pursued in the hope of
provoking changes in the way of life on the planet. This work presents the perspective of seen ethics
as Alterity, category proposed by the Lithuanian Philosopher Emmanuel Levinas, who is proposing
ways of inter relations for full recognition of the other, and therefore the absolute upheld another
individual in another environment as legitimate, could result forms of relations sustainable.
Recognizing that the establishment of relations of otherness, in a paradigmatic anthropocentric itself
is a tremendous challenge, the author proposes a methodology for Biocentric Education, proposed
by Rolando Toro Araneda, as a possibility, since this provides an epistemological orientation that
allows the interlacement between reason and feeling, awareness and sensitivity. His methodology
includes among other proposals, the experience of Biodance allowing the joint work of the cerebral
hemispheres, providing a rebalancing organic, providing finally, in education, the integral
development of human, and condition for ethics. Lost element in the educational processes
mechanistic and fragmented, which has generated the neglect with human beings and the planet.
Keywords: Ethics, Alterity, Biocentric Education

Analisar a situação sócio-ambiental atual e verificar a necessidade urgente de mudanças de


estilo de vida é algo que já é do conhecimento da maioria das pessoas, embora ainda que
apresentando respostas lentas demais para a urgência da situação em que nos encontramos.
Temos presenciado iniciativas interdisciplinares, no sentido de buscar alternativas
sustentáveis buscando dar respostas aos problemas sócio-ambientais atuais.
O presente ensaio registra parte da investigação acadêmica realizada em torno da
problemática sócio-ambiental, no sentido de buscar alternativas a partir da dimensão ética no
contexto educativo formal e não formal.
Ética, neste contexto, é vista como Alteridade, (categoria que será mais bem explicitada ao
longo desta apresentação).
Fórum Internacional do Meio Ambiente - A conferência da Terra 65

Parte-se do pressuposto, que as relações de alteridade entre as pessoas e desta forma, delas
com o meio ambiente, possam resultar em uma das propostas de mudança que, somada a outras,
advindas das múltiplas iniciativas envolvidas nesta complexa rede, tecerão outra sociedade: uma
sociedade sustentável.
Reconhecendo que o estabelecimento de relações de alteridade, no entanto, constitui um
desafio, este estudo propõe a metodologia da Educação Biocêntrica, criada pelo chileno Rolando
Toro, como capaz de contribuir, ao estabelecimento de relações de alteridade entre as pessoas e
delas com o planeta.
As mudanças necessárias no contexto educativo formal e não formal, exigem
comprometimento político pedagógico e provém de um engajamento ético por parte dos sujeitos.
Da tomada de decisões, da realização de opções, muitas vezes exigindo coragem e ousadia, na
medida em que propostas que problematizam a ordem vigente solicitam muitas vezes
enfrentamentos. Isso desacomoda, desestabiliza e requer além de uma argumentação bem embasada
teoricamente, a vontade política de defender uma proposta. Atitude que corresponde a
compromisso. Não somente no cumprimento passivo dos papeis que representam (professores,
agentes comunitários, gestores de UC, governantes), que comparecem ao trabalho, na hora certa e
transmitem “conhecimentos” pré-estabelecidos, advindos de realidades diferentes, e sem
questionamento ou também sem envolvimento com os agentes sociais aos quais interagem.
Nesse sentido a formação do educador ambiental, constitui-se elemento importantíssimo
para alcançarmos o objetivo de educação e gestão participativas, que levem a práticas socialmente
justas, e ecológicas - éticas, portanto.
Consideramos que, fundamentações que sustentam formas de educação embasadas em
paradigmas científicos cartesianos e positivistas têm contribuído historicamente, a uma visão
antropocêntrica de mundo onde cada vez mais é alimentado o valor mercadológico em detrimento
de valores éticos e morais, trazendo prejuízos relacionados à forma como tem se desenvolvido a
consciência, postura e ações das pessoas nas sociedades atuais, desencadeando como
conseqüências, formas de viver que se revelam insustentáveis tanto do ponto de vista das relações
interpessoais como da relação com o meio ambiente: ambas as questões que afetam a vida no
planeta.
Situamos a concepção de Educação Biocêntrica, originada da proposta de Biodanza6,
como proposta que por suas características epistemológicas, pressupostos e metodologia poderiam
contribuir ao avanço da concretização de ações educativas éticas.
A Educação Biocêntrica visa à conexão com a Vida.
Nas palavras de FLORES (2006), propondo uma inversão paradigmática, a Educação
Biocêntrica objetiva a expressão da Identidade, que se dá na relação com o outro e com o mundo.
Ao ser reconhecido pelo outro e ao reconhecê-lo como semelhante, mas distinto, eu me identifico
como ser único e singular. Ao me inserir e integrar ao mundo, passo a fazer parte dele e do todo.
Como um holograma vivo, sou parte e todo no Universo.
Esta perspectiva educativa orienta-se a partir da compreensão de que, a uma educação que
contribua para tornar as pessoas mais humanas, resultando em uma transformação social
desencadeadora de uma mudança paradigmática, nos conceitos de ciência, educação, política,
economia e, portanto, sociedade, não depende somente de uma formação à base de um estudo
reflexivo, através de relações pautadas pela neutralidade, objetificadoras, ou desejantes de
resultados mensuráveis, imediatos, para produção de pessoas competentes para o mercado de
trabalho; nem tão pouco depende de uma formação técnica, privilegiadora de práticas educativas
espontaneístas, buscando receitas milagrosas para colocar em prática, na apropriação de modismos
sem embasamento, que levam a uma prática sem reflexão.

6
A biodança (do espanhol biodanza, neologismo do grego bio (vida) + dança, literalmente a dança da vida) é um
sistema de Integração humana, renovação orgânica, reeducação afetiva e reaprendizagem das funções originárias da
vida. Sua metodologia consiste em induzir vivências integradoras por meio da música, do canto, do movimento e de
situações de encontro em grupo.
Fórum Internacional do Meio Ambiente - A conferência da Terra 66

Compreendemos que a Educação Biocêntrica, proposta por Rolando Toro7, proporciona ao


indivíduo o desenvolvimento capaz de possibilitar posturas de alteridade – portanto de ética, na
medida em que esta proposta de educação apresenta uma orientação epistemológica que possibilita
o entrelaçamento entre razão e sentimento, conscientização e sensibilidade. Atributos necessários
para transformar as práticas e atitudes que correspondem, a ausência de compromisso, e atitudes
pautadas por uma razão procedurística.
Sua metodologia inclui entre outras propostas a vivência de Biodança, que possibilita o
trabalho conjunto dos hemisférios cerebrais, proporcionando um reequilíbrio orgânico, propiciando
finalmente, no campo da educação, o desenvolvimento integral do humano, condição para ética e
elemento perdido nos processos educativos que privilegiam um conhecimento, cuja orientação
epistemológica, desvincula razão, emoção e corporeidade.
Por esta razão, o conceito de vivência, constitui categoria fundamental ao entendimento da
proposta
Iniciamos com o conceito de vivência, empregado na teoria de Biodanza e Educação
Biocêntrica. Toro encontra na articulação realizada pelo filósofo W Dilthey, o emprego do termo
necessário para expressar o momento vivido, do aqui e agora da “vivência de biodança”.
Segundo AMARAL (2004) em substituição à experiência mutilada da realidade, oferecida
pelo sujeito cognoscente da filosofia tradicional do conhecimento, Dilthey oferece-nos o conceito
de vivência, símbolo verdadeiro da experiência “plena e não mutilada” da realidade igualmente
“plena e total”.8 Uma observação de Frithjof Rodi em relação ao conceito de vivência faz-se
oportuna: “Este conceito Erlebnis que deve expressar a totalidade da relação com a realidade
transformou-se, sob influência de Dilthey, em uma das palavras mais em voga dentro da filosofia
alemã do século XX”.9
Para Góis (1995), a vivência se dá quando entramos na Porta Antiga. Utiliza-se desta
metáfora para designar, uma porta de vai-e-vem entre as dimensões reflexivas e pré-reflexívas.
Sendo ultrapassada no sentido, Cultura-Natureza, Espírito-Animal, chega-se à inocência, ao instante
da intensificação espontânea da pulsação imanente-transcendente da identidade - momento de um
brilhar envolvendo o corpo expressivo. Quando o participante passa pela porta, (vivência de
biodança), a situação metodológica desaparece e surge o ontológico, principalmente como vivência
Biocêntrica, o instante onde a vida se faz plena no humano. O importante neste momento é
possibilitar a expressão maior da vida instintiva, a fim de criar ou refazer o seu entrelaçamento com
o cultural, construindo e fortalecendo valores significativos para a vida, valores baseados no amor.
Quando isso acontece, a porta de vai-e-vem move-se fluidamente nos dois sentidos: cultura-
natureza e natureza-cultura. A nova tessitura animal-espírito pode dar-se pelo circuito restaurador,
mas principalmente pelo circuito evolutivo.

7
O chileno Rolando Toro Araneda é o criador do Sistema Biodanza (a Biodança) e Presidente da
Fundação Internacional de Biodanza., A Fundação Biocêntrica Internacional (IBF) – International
Biocentric Foundation é o órgão que controla e administra o Sistema Biodança (Biodanza).
O objetivo desta fundação é unificar as teorias, os métodos e os critérios práticos da Biodanza em
todo o mundo.
A orientação do movimento é dirigida pelo professor Rolando Toro Araneda. A Fundação
Biocêntrica, através de seu presidente e Conselho Administrativo, é quem designa os Direitos das
Escolas, estabelece o Regulamento comum, e define o Programa de conteúdos. Estes conteúdos são
distribuídos exclusivamente por professores Didátas. A Fundação Biocêntrica cuida do
cumprimento uniforme das normas, dos direitos intelectuais e a utilização do nome e logotipo da
Biodanza. http//WWW.biodanza.org
8
Cf. “Grundgedanke meiner Philosophie”, Gesammelte Schriften, VIII, p. 171, apud, AMARAL,
2004
9
Frithjof Rodi. “W. Dilthey, Um Filósofo Desconhecido”, In: O Estado de S. Paulo, Suplemento
Cultura, 13/11/1983.apud, AMARAL, 2004.
Fórum Internacional do Meio Ambiente - A conferência da Terra 67

A vivência de biodança, instante vivido no aqui e agora, momento singular e irrepetível,


capacitam à pessoa a uma conexão com um estado íntimo genuíno, capaz de intensificar sua
identidade. Cabe ressaltar, que a metodologia de biodança propõe exercícios com a tríade: música,
movimento e consigna. Cada um no grupo é convidado à vivência. Mas a pessoa deve entregar-se
ao instante vivido, sem procurar controlar-se, realizando movimentos estereotipados. Desta forma,
uma pessoa poderá fazer inúmeros exercícios no grupo de biodança, sem necessariamente “entrar na
vivência” que significa passar pelo momento da vivência que a modifica. Que é restaurador. O
papel do facilitador é muito importante neste momento. Por esta razão, este profissional tem uma
formação específica, realizada nas escolas de biodança. Mas, a entrega de cada um na vivência, é
determinante para que ela viva esta experiência.
A proposta Biocêntrica de educação, em sua metodologia privilegia um desenvolvimento
que integra a corporeidade com seus movimentos, razão e emoções, avançando às proposições
educativas onde o conhecimento, é visto de forma fragmentada à luz das idéias cartesianas de razão
desconectada de emoção e corporeidade bem como das premissas de uma ontologia que privilegia
um conhecimento absoluto e objetificante do ente, prejudicando sua alteridade.
Por esta razão, a questão da supervalorização do conhecimento estabelecida pela lógica
moderna de ciência merece atenção, na medida em que, a lógica subjacente nos modos de
conhecimento empregados na tentativa de compreender a realidade, constitui-se um dos obstáculos
às relações éticas, segundo Emmanuel Lévinas, filósofo lituano que embasa a proposta de ética vista
como alteridade perseguida nesta exposição.
De acordo com Dal Pozzo (2000), Lévinas faz uma crítica à filosofia da autonomia da
razão, que torna a partir de si mesma a realidade objetivável. Essa filosofia tem suas raízes
primeiras na filosofia grega10. Sendo que as posições e conseqüências advindas desde aí podem ser
chamadas de determinação do Outro pelo Mesmo11. Para Lévinas, essa racionalidade é constituída
como ontologia e sua inteligibilidade contribui para a afirmação de uma totalidade lógica e
egológica, que não deixa uma brecha de abertura na identidade do Mesmo, para o acolhimento da
alteridade. Ou seja, é uma racionalidade que não pressupõe a anterioridade da justiça da alteridade
frente à liberdade do eu, não dissociando, portanto, saber e poder.
Tais obstáculos se tornam presentes, quando a atitude de voltar-se para a realidade, a fim
de conhecê-la no sentido de abarcá-la, está investida de uma forma de conhecer restrita que nega
diversos aspectos que constituem os fenômenos e a complexidade desta realidade, desta forma,
objetificando-a. O que representa uma das razões das atitudes que causam destruições no meio
ambiente.
É comum encontrarmos a afirmação de que cognição ou processos de conhecimento são
objetos do campo da educação, atribuindo-os a faculdades humanas (muitas vezes com
exclusividade). Quando, assume-se a abordagem em que educação é um processo especificamente
humano, e o conhecimento, uma prerrogativa “humana”, o conhecimento, ergue-se como a essência
do processo educativo.
Há uma estreita relação entre esta concepção de primazia do conhecimento nos processos
que visam conhecer a realidade e contribuir com o desenvolvimento do ser humano, com o
paradigma antropocêntrico, no qual há prevalência de uma centralidade da subjetividade, onde o

10 “A filosofia grega tornou-se como que a forma mentis comum da inteligência ocidental. Ora,
entre as teses básicas desta teorese constam: a autonomia do eu pela razão; a liberdade diante do
outro conflito; a consciência identificadora representativa que fixa o absoluto e o domestica na
integração sistêmica, não deixando margem nem espaço para o novo e o diferente e, sobretudo, para
o outro homem. Consequentemente, o outro homem, quando tomado em consideração, será, no
máximo, um outro eu, á semelhança do eu, portanto, objetivado” (PIVATTO, 1992, p. 326).
11 Para Lévinas, “a relação com o ser, que atua como ontologia, consiste em neutralizar o ente para
o compreender e o captar. Não é portanto, uma relação com o outro como tal, mas a redução do
outro ao Mesmo” (LÉVINAS,TI, 1980, p. 33).
Fórum Internacional do Meio Ambiente - A conferência da Terra 68

que se coloca no centro realmente é a razão deste homem moderno, no lugar do Deus do paradigma
anterior (teocêntrico). 12
O filósofo moderno René Descartes, importante influência à formulação do
antropocentrismo, e o mesmo que afirma que existe porque pensa, considera também que o corpo
atrapalha o homem de pensar. Logo, concluímos que ele refere-se a um pensamento desconectado
de uma corporeidade que sente. Segundo Volpe13, a subjetividade central do antropocentrismo,
reduz seu existir, em sua função do sujeito cognoscente que se constitui diante do ser que se
presentifica no conhecimento.
Aqui encontramos a forte relação entre a forma como lidamos com o conhecimento na
tentativa de compreensão da realidade com o paradigma antropocêntrico: o conhecimento como
essência do processo educativo – na tentativa de compreensão da realidade e contribuição para o
desenvolvimento dos seres humanos, sintetiza na verdade a subjetividade moderna. Trata-se de um
conhecimento que atribui poder aos sujeitos que conhecem. Daí a força da subjetividade na
modernidade.
Consideramos problemática esta relação com o conhecimento, justamente pelo fato do que
se atribui ao que conhece. Um poder do qual, consideramos perigoso, quando os pressupostos que
sustentam este conhecimento que atribui poder, estão desconectados da corporeidade do ser,
fragmentando-o em uma esquizofrênica dicotomia entre razão - sentimento, corpo – espírito.
Perigoso, por comprometer a possibilidade de que os conhecimentos produzidos nos
processos educativos se transformem em sabedoria, em ética. Pois é necessário que o ser humano
seja restituído de sua integralidade, visto não como um objeto, como uma peça a mais na
engrenagem de uma máquina. Ele precisa sentir-se parte de um todo. Precisa perceber a
interconexão e reciprocidade de suas ações com o todo para se responsabilizar. Já que a
responsabilidade é indispensável à ética.
A Negação do corpo e a fragmentação entre sentir e pensar, descompromete o ser. Se não
sente o corpo, como irá sentir-se parte do todo? Se não se vê em sua alteridade, como vai abrir-se e
responsabilizar-se pelo outro? O outro ser humano; o outro meio ambiente.
Segundo Leloup14, a concepção moderna que dissociou o corpo da alma e do espírito, nos
faz sofrer hoje conseqüências nos desviando da saúde integral. Para ele, “perdemos a coesão e a
congruência; mais do que isso, perdeu-se a transparência. A fragmentação epistemológica também
se refletiu no indivíduo e na sociedade, separando o organismo do meio ambiente, enfatizando as
fronteiras e os conflitos. O que Leloup considera como a alienação diabólica, já que diablos é o que
divide; o fator tanatológico básico”.
A visão de conhecimento, a relação sujeito e objeto e a questão da subjetividade, foram
vistas de diferentes formas ao longo da filosofia ocidental. Para Shemes(2005), na tradição clássica
ocidental, de Descartes a Husserl e Heidegger, a primeira relação do ser humano no mundo é de si
para si, é gozar a vida, é ser cego e surdo a outrem, egoísta e egocêntrico, é viver para si.
As estruturas psíquicas, centradas em si e preocupadas em defender-se do risco de
dissolver-se na totalidade, tornam-se egoísta. O conhecimento caracteriza-se semelhantemente,
colocando o objeto a ser conhecido, sob o domínio do sujeito que o conhece. O objeto é alterado de
seu ser, de suas características, de seu contexto, para ajustar-se às estruturas de encaixe de quem o
conhece. O objeto é sujeitado ao seu conhecedor, para poder ser conhecido. O que para Levinas,

12 A modernidade dos séculos XVIII e XIX tinha entre seus objetivos fundamentais o
esclarecimento e a emancipação dos homens, a partir da supervalorização da razão instaurando uma
supremacia pela autonomia do indivíduo – a subjetivação - a fim de contrapor-se ao legado
medieval da supervalorização da fé e à submissão e a hierarquia (clerical ou governamental). A
busca era da vitória da “luz da razão” sob as “trevas”, consideradas ignorância e preconceito.
13 VOLPE, Neusa. ANONIMATO E ROSTO NA EDUCAÇÃO www.prograd.ufpr.br/nesef/artigos/novo/Neusa.%20Levin%E1s.doc

14 LELOUP, Jean-Yves. O corpo e seus símbolos, p.9.


Fórum Internacional do Meio Ambiente - A conferência da Terra 69

trata-se de uma violência da qual ele traduz como a negação da independência dos entes que embora
existindo, são parcialmente negados.15
O conceito pensado, considerado como um terceiro termo é o que viabiliza e nega ao
conhecido a alteridade. Quando segundo Levinas, O indivíduo que existe abdica então a favor do
geral pensado.16
Esta redução realizada em torno do que é conhecido limita o olhar ao outro. Quando
olhamos o outro, não o vemos em sua epifania17. Vemos o que nossa idéia faz do outro.
Quando isso ocorre nos processos educativos, as pessoas, não são vistas. Suas realidades
ignoradas, em nome do que está colocado como necessário trabalhar nos currículos; suas
interpretações negadas em detrimento do que foi convencionado como “certo e errado”. E seus
estados psicológicos, traduzidos: no caso de crianças, muitas vezes como problemáticos.
Levinas, apesar de ser fortemente influenciado pelo pensamento ocidental, principalmente
de Husserl e Heidegger, não concordou com as idéias de seus precursores. O intuito de Lévinas em
sua filosofia é mostrar a precedência da ética à Ontologia, isto é, apresentar à ética como “Filosofia
Primeira.
A ética vem primeiro. A alteridade não pode ser negada no processo de conhecer. O que
significaria, no campo da educação, uma proposta que propicie o desenvolvimento integral do outro
(educadores e educandos).
Trabalhar com esta proposta requer uma postura ética pôr parte do educador, que estaria
comprometido com a vida do outro. Para educar a partir deste compromisso, este educador teria que
vivenciar experiências de relação de alteridade. O que significa, por exemplo, contemplar nas
relações intersubjetivas dos processos educativos, o encantamento com o outro, e com a natureza, o
reconhecimento do outro como legítimo outro; na sensibilidade, na percepção ampliada, no
sentimento de prazer com o que está fazendo, na capacidade de estabelecer vínculos, na capacidade
de diálogo, de escuta da realidade, no movimento que realiza e então possibilita a manifestação de
identidades capazes de abrir-se ao outro (outro, que também é o meio em que vive), em sua
alteridade.
Dimensões negadas ou difíceis de serem colocadas em prática, no modo de vida atual onde
tais valores foram descartados e substituídos pelo medo que se tem do contato físico, do olhar
penetrante do outro; pela exigência pragmática da pressa que faz com que na correria, a
contemplação, a admiração e o respeito, tornem-se atitudes raras ou inexistentes.
A reflexão acerca da educação como acontecimento ético, remete inevitavelmente à
reflexão paradigmática de sociedade e de ciência.
A intersubjetividade no processo educativo é imprescindível, na medida em que, a essência
do processo pedagógico, e da transformação social, encontra-se nas relações que se estabelecem.
GUSDORF apud ARANHA & MARTINS, (1995, p. 6), afirma que “o homem não é o que
é, mas o que não é”. O que nos parece, numa primeira impressão, como um jogo de palavras, é na
verdade a afirmação de que o homem não se define por um modelo que o antecede, por uma
essência que o caracteriza, nem é apenas o que as circunstâncias fizeram dele. Ele se define pelo
lançar-se no futuro, antecipando por meio de um projeto, a sua ação consciente sobre o mundo.
Portanto, os caminhos não estão prontos, mas a trilhar. Não há modelos de conduta, mas
um processo contínuo de estabelecimento de valores. Nada mais se apresenta como absolutamente
certo e inquestionável.
Esta condição, de certa forma, segundo Aranha e Martins, fragiliza o homem, na medida
em que ele perde a segurança característica da vida animal, em harmonia com a natureza. Mas, o
que parece ser sua fragilidade, é justamente a característica humana mais perfeita e mais nobre: a
capacidade do homem de produzir sua própria história.

15 LEVINAS, Emmanuel. Entre nós. Ensaios sobre a alteridade. RJ: Vozes, 1997.
16 Totalidade e Infinito, p.31
17 A palavra epifania (do Grego epiphaneia: apresentação, aparição)
Fórum Internacional do Meio Ambiente - A conferência da Terra 70

Desta forma, a proposta de Educação Biocêntrica, mediante seus pressupostos, sua


ancoragem epistemológica e através de sua metodologia que entre outras estratégias, propõe a
vivência de Biodança, situa-se como possibilidade de resgate destes valores que julgamos
necessários para que se estabeleçam relações de alteridade entre as pessoas e delas com o planeta.

REFERÊNCIAS BIBLIOGRAFICAS
AMARAL, Maria Nazaré de Camargo Pacheco. Dilthey – conceito de vivência e os limites da
compreensão nas ciências do espírito. Trans/Form/Ação, São Paulo, 27(2): 51-73, 2004
ARANHA, Maria Lúcia de Arruda; MARTINS, Maria Helena Pires. Filosofando: Introdução à
Filosofia. São Paulo: MODERNA, 1993.
Dal Pozzo, Ezequiel. Proposta de uma ética global como resposta a degradação do mundo. 2000.
Monografia (Graduação em Filosofia) – Faculdade de Filosofia Nossa Senhora da Imaculada
Conceição-FAFIMC, Rio Grande do Sul.
FLORES, Feliciano. (Org.) Educação Biocêntrica: aprendizagem visceral e integração afetiva. Porto
Alegre: Enangraf, 2006.
GÓIS, Cezar Wagner de Lima. Vivência: caminho à identidade. Fortaleza: Editora Viver, 1995.
LELOUP, Jean-Yves. O corpo e seus símbolos: uma antropologia essencial. Petrópolis, RJ: Vozes,
1998.
LEVINAS, Emmanuel. Totalidade e Infinito. Lisboa: EDIÇÕES 70, 1980.
_________. Humanismo do outro homem.Tradução: PIVATTO, Pergentino S. (coord).Petrópolis,
VOZES, 1993.
_____________________. Educação Biocêntrica – tecendo a vida. Ed. Própria. Porto Alegre, 1999.
PIVATTO, Pergentino Stéfano. A nova proposta Ética de Emmanuel Levinas. Cadernos da
FAFIMC, n.13, 1995, p.47-61.
TORO, Rolando. Biodanza- Integração existencial e desenvolvimento humano por meio da música,
do movimento e da expressão dos potenciais genéticos. São Paulo: Ed. Olavobrás/EPB, 2002.
WAISMANN, Carla Coelho. A vivência das Metáforas vivas no processo de Formação em nossos
Retiros Pedagógicos. Revista de Educação Popular, Canoas, Centro Universitário La Salle/NUPEP,
v.1, n.1, p80-84, 2001.
________.Entre Nós – Ensaios sobre alteridade. Coordenador de tradução Pergentino Stéfano
Pivatto. Petrópolis: VOZES, 1997.
Fórum Internacional do Meio Ambiente - A conferência da Terra 71

II. Mudanças climáticas e desastres naturais

ESTUDO DE CASOS PARA AS VARIÁVEIS, RADIAÇÃO SOLAR GLOBAL


ACUMULADA, PRECIPITAÇÃO ACUMULADA, TEMPERATURAS DO AR E DO SOLO
NO MUNICÍPIO DE CAPIM – PB

Ednaldo Araújo Mendonça


Mestrando em Meteorologia pela Universidade Federal de Campina Grande – UFCG. ednaldo@evl.com.br
Gabriel Moisés de Sousa Neto
Mestrando em Meteorologia pela Universidade Federal de Campina Grande – UFCG. gabrielgeografia@yahoo.com.br
Renilson Targino Dantas
Professor Doutor pela Universidade Federal de Campina Grande – UFCG. renilson@dca.ufcg.edu.br

RESUMO
As variáveis, radiação solar global, precipitação, temperaturas do ar e do solo são
importantes para as análises na agricultura como balanço hídrico, cálculos da evapotranspiração,
dentre outros. Por esse motivo este estudo tem como finalidade ser um demonstrativo das já citadas
variáveis dos anos de 2006 e 2007 no município de Capim – PB, região a qual desenvolve um
potencial para o cultivo da cana de açúcar e por esse motivo a irrigação é aplicada em escala
considerada. Portanto para uma irrigação feita de forma racional é de fundamental importância um
bom acervo de informações técnicas, dentre as quais podemos citar as meteorológicas. Para a
presente pesquisa foram usadas as acumuladas mensais de radiação solar global e precipitação, para
as temperaturas do ar e do solo, as médias mensais. Os resultados obtidos mostram que as maiores
dispersões em relação à radiação solar global acumulada ocorreram nos meses de agosto e
dezembro, já a precipitação acumulada nos meses de abril e junho e as temperaturas do ar e do solo
as dispersões foram relativamente pequenas.
Palavras-Chave: Radiação, Precipitação, Temperatura, Ar, Solo.

ABSTRACT
The variables, global solar radiation, precipitation, temperatures of air and the soil are
important for analyze them in agriculture as soil water balance, calculations of the
evapotranspiration, amongst others. For this reason this study it has as cited purpose to be a
demonstrative of already the changeable ones of the years of 2006 and 2007 in the city of Capim -
PB, region which develops a potential for the culture of the sugar cane and for this reason the
irrigation is applied in considered scale. Therefore for a done irrigation of rational form it is of basic
importance a good quantity of information techniques, amongst which we can cite the
meteorological ones. For the present research they had been used accumulated monthly of global
solar radiation and the precipitation, for the temperatures of air and the soil, the monthly averages.
The gotten results show that the biggest dispersions in relation to the accumulated global solar
radiation had occurred in the months of August and December, already to the precipitation
accumulated in the months of April and June and the temperatures of air and the soil the dispersions
had been relatively small.
Keywords: Radiation, Precipitation, Temperature, Air, Soil.

INTRODUÇÃO
A programação de irrigação pode ser feita através de diversos métodos, dos quais podemos
citar os que são baseados na cultura e no balanço hídrico no solo, como também, os que usam
evaporímetros ou informações meteorológicas (Hill, 1991). Portanto o método através de
informações meteorológicas não está ainda sendo usado em maior escala devido às dificuldades de
obtenção de dados meteorológicos e isto é prejudicial para o meio ambiente, pois uma boa
Fórum Internacional do Meio Ambiente - A conferência da Terra 72

eficiência de um sistema de irrigação está diretamente conectada a sua forma de utilização que sem
dúvida alguma deve considerar aspectos ecológicos, econômicos e sociais.
De acordo relatórios do Seminário sobre Mudanças Climáticas e seus Efeitos na
Agricultura (INMET – 2007) o Brasil tem 12% dos recursos hídricos do planeta, em particular, não
tem problemas de água, porém tem desequilíbrios regionais e o maior consumo de água se dá pela
irrigação, como também, um dos problemas atuais enfrentados pelo País está nos reservatórios do
nordeste, pois 80% da água armazenada se perdem por evaporação.
O aquecimento e resfriamento do ar e do solo são processos que utilizam troca de energia.
A propagação da água no estado de vapor para atmosfera, o conjunto dos fenômenos químicos e
físico-químicos mediante os quais se faz a assimilação e a desassimilação das substâncias
necessárias à vida das plantas e dos animais é proveniente da radiação solar. A liberação de água
proveniente da atmosfera sobre a superfície da Terra é considerada como precipitação, ou seja, de
acordo com (Tucci, 1997) a precipitação é entendida em Hidrologia como toda água proveniente do
meio atmosférico que atinge a superfície terrestre. Portanto o conhecimento dos valores
quantitativos das variáveis como: - radiação solar global, precipitação acumulada, temperaturas do
ar e do solo, são extremamente importantes para análises agrometeorologicas e ambientais.
Segundo (Monteith, 1977) a realização da conversão da radiação solar pode ser
predominada principalmente pela temperatura do ar e pelas condições de precipitação da região.
Apesar da importância do conhecimento dos valores das variáveis citadas nessa pesquisa
ainda existem vários obstáculos para adquirir os mesmos, de acordo (Thornton e Running, 1999)
como a medida da radiação solar é de grande valor para os estudos na agrometeorologia, o número
de estações que procedem ao seu registro diário na superfície terrestre é muito restrito, quando
comparado com o número daquelas que registram a temperatura e a precipitação.
Quantos os dados sobre temperatura do solo (Alfonsi et al., 1981) afirmam que, embora
medições de temperatura do solo a várias profundidades sejam comuns em postos meteorológicos,
poucos são os estudos que se tem usado de tais observações. Algumas vezes, a não utilização de tal
conjunto de dados se deve, principalmente, ao desconhecimento de sua existência e, em outras, por
se considerar esse fator como não limitante, dando-se maior ênfase ao fator hídrico. Entre os
trabalhos sobre o comportamento térmico do solo nas condições tropicais, a maioria utiliza a
variação da temperatura em períodos curtos e aplicação de análise harmônica na tentativa de
descrever tal variação (Decico, 1975; Decico et al., 1977; Alfonsi et al., 1984; Stathers et al., 1985;
Massman, 1992; Kustas & Daughtry, 1990).
No contexto geral a média anual de temperatura do solo conforme a profundidade é
praticamente constante, com desvios muito pequenos. A temperatura do solo é diretamente ligada à
radiação solar e a condução de calor no solo, pode-se considerar que a média anual de temperatura
do ar tenha uma referência constante com a temperatura do solo. (Ouellet, 1972), fez comparações
entre a temperatura do ar e do solo a várias profundidades, para 36 localidades do Canadá. A média
da temperatura anual do solo às profundidades superiores a 50 cm foi de 3,6 C mais elevada do
que o ar, apresentando, no entanto, uma amplitude térmica de 14,5 vezes inferior à do ar.
O conhecimento dos fatores climáticos é de fundamental importância para o manejo
racional da irrigação. Estes fatores permitem com uma aproximação bastante boa estimar a
evapotranspiração.
Então o objetivo desse trabalho é mostrar que quanto maior for o fornecimento de dados
meteorológicos para diversas regiões, maior será a possibilidade do uso correto das reservas
hídricas.

METODOLOGIA
A radiação solar global acumulada, a precipitação acumulada, a temperatura do ar e a
temperatura do solo a 10 cm de profundidade dos anos de 2006 e 2007, são os dados
meteorológicos considerados nessa pesquisa, onde foram feitas as acumuladas mensais referentes à
radiação solar global e precipitação, enquanto as temperaturas do ar e do solo, as médias mensais.
Fórum Internacional do Meio Ambiente - A conferência da Terra 73

Os dados foram obtidos junto ao Centro de Previsão de Tempo e Estudos Climáticos


(CPTEC), onde os mesmos foram coletados através da Plataforma de Coleta de Dados (PCD),
localizada na latitude 6,94o S, longitude 35,12o S e altitude 103 m, no município de Capim – PB.

O município de Capim está localizado na Microrregião do Litoral Norte e na Mesorregião


da Zona da Mata do Estado da Paraíba e está inserido na unidade Geoambiental dos Tabuleiros
Costeiros. Sua Área é 100 km² e conforme dados do Instituto Brasileiro de Geografia e Estatística –
IBGE (2007) a população consiste em 5207 habitantes com densidade demográfica de 52 hab/km2.
A sede do município distando 40,6 km da capital e o acesso é feito, a partir de João Pessoa, pela
rodovia BR 101, o mesmo encontra-se incluído nos domínios das bacias hidrográficas dos Rios
Mamanguape e Miriri. Os principais cursos d’água são os rios, Mamanguape e Miriri, além dos
riachos, Vargem Comprida, Cafundó, Moira, Ribeiro, Pindoba, Varjota e Cana Brava. Os principais
corpos de acumulação são as lagoas, da Telha, Carapucema e o Açude de Almecega. Os principais
cursos d’água têm regime de escoamento perene e o padrão de drenagem é o dendrítico (Ministério
de Minas e Energia - 2005).
Tanto o município de Capim como boa parte da região desenvolvem um potencial para o
cultivo da cana de açúcar, onde existem, produtores associados, usinas, destilarias e unidades mistas
que produzem tanto açúcar como álcool, como mostra a Figura 2.
Fórum Internacional do Meio Ambiente - A conferência da Terra 74

De acordo com a Superintendência do Desenvolvimento do Nordeste – SUDENE (2007), a


área canavieira da Paraíba ocupa aproximadamente 13% da área total do Estado, abrange um total
de trinta e cinco municípios, sendo distribuídos em duas Mesorregiões, Mata Paraibana e Agreste
Paraibano. A Mata Paraibana é composta de quatro microrregiões, que são João Pessoa, Litoral
Norte, Litoral Sul e Sapé, compondo um total de 19 municípios. O Agreste Paraibano concentra as
microrregiões do Brejo Paraibano, Guarabira e Itabaiana, somando um total de 16 municípios. Nas
regiões dos Tabuleiros Costeiros o cultivo da cana de açúcar atinge cerca de 95% de toda produção.

RESULTADOS E DISCUSSÃO
Radiação solar global acumulada
As acumuladas mensais da radiação solar global nos anos de 2006 e 2007 encontram-se
representadas na Figura 3.
Fórum Internacional do Meio Ambiente - A conferência da Terra 75

Na Figura 3 observa-se que as maiores dispersões ocorreram em agosto e dezembro sendo


de 14% e 16 % respectivamente. Já as mínimas foram em fevereiro com 1,2% e abril com 1,4%,
evidenciando que nos meses de fevereiro e abril as características de nebulosidade foram bastante
semelhantes nestes dois anos
Na presente pesquisa também foi constatado que o maior acumulo mensal da radiação
solar global foi no mês de janeiro de 2007 com 671,8 MJ/m2. Já o menor valor ocorrido entre os
dois anos foi de 423,9 MJ/m2 no mês de junho de 2006.
Através destes dados fica bem claro que está região tem uma disponibilidade energética
muito boa, que precisa ao longo do tempo ser utilizada como energia alternativa.

Precipitação acumulada
As precipitações acumuladas mensais nos anos de 2006 e 2007 encontram-se representadas
na Figura 4.

De acordo com esta figura, constata-se que o ano de 2007 foi bem mais chuvoso do que
2006 destacando-se os meses de abril e junho cujas diferenças foram 115 e 256 mm,
respectivamente.
Na mesma figura destaca-se que, o maior acumulo mensal ocorreu no mês de junho de
2007 com 362 mm. Já o menor valor ocorrido entre os dois anos foi no mês de outubro de 2006
com 1 mm.
A estação chuvosa deste município, de acordo com estes dados, embora não seja suficiente,
concentra-se nos meses de fevereiro a agosto, condição esta insuficiente, também pela precipitação
acumulada, para o cultivo da cana-de-açúcar e outras culturas exploradas na região.
Fórum Internacional do Meio Ambiente - A conferência da Terra 76

Temperatura do ar
As médias mensais da temperatura do ar nos anos de 2006 e 2007 encontram-se
representadas na Figura 5.

Para as médias mensais de temperatura do ar nos anos de 2006 e 2007 observa-se na figura
acima que as temperaturas não oscilaram muito apresentando uma média em torno de 25 oC. Onde
a média maior ocorreu no mês de março de 2006 com 27 oC e a menor em agosto de 2007 com
23.5oC.
De acordo com estes dados, fica bem evidenciado que neste local, assim como na região, a
amplitude térmica anual é muito pequena, caracterizando desta forma a inexistência de pelo menos
uma estação do ano, ou seja, o inverno.
Por outro lado, apesar da limitação com relação ao número de dados, percebe-se por meio
da figura, que as temperaturas médias mensais dos meses mais quentes, janeiro e dezembro, do ano
de 2007 foram superiores ao ano de 2006, também se observa que nos meses um pouco mais frios,
julho e agosto, as temperaturas médias mensais de 2007 foram inferiores em relação a 2006. Este
fato caracteriza em parte o aquecimento local e regional como forma de contribuir para o
aquecimento em uma escala maior.

Temperatura do solo a 10 cm
As médias mensais da temperatura do solo a 100 mm nos anos de 2006 e 2007 encontram-
se representadas na Figura 6.
Fórum Internacional do Meio Ambiente - A conferência da Terra 77

Analisando a Figura 6, verifica-se que nos meses de janeiro a março houve uma dispersão
de 3,3 em média para os mesmos, onde a maior média é constatada nos meses de janeiro e fevereiro
com 32,6 oC para ambos enquanto a menor em julho de 2006 com 25,5 oC. Ocorrendo desvios
muito pequenos nos demais meses.
Os dados meteorológicos já citados, que por sinal são poucos os disponíveis na região e o
demonstrativo do estudo de casos nos anos de 2006 e 2007 apresentados nessa pesquisa, possam
transmitir a percepção que, quanto mais informação neste aspecto, maior será a possibilidade de
estar contribuindo para melhor difusão do avanço de pesquisas nessa região, ou seja, é fundamental
colocar a meteorologia a serviço da agricultura para melhorar o uso da terra, para ajudar a produzir
o máximo de alimentos e evitar o abuso irreversível dos recursos naturais como a água e o solo.
O desperdício de água mundial na agricultura através da irrigação não planejada supera os
desperdícios no setor industrial e doméstico, juntos. (LEMOS, 2003).
O manejo ideal da água e do solo permite produzir mais e melhor; é fácil admitir a
possibilidade de produzir mais e com melhor qualidade, se houver atenção com a qualidade física
dos solos, investir na área de agrometeorologia que permite absorver cada vez mais informações
meteorológicas promovendo assim condições para um adequado manejo da água, já que ela é um
dos fatores importantes à produção de qualquer espécie vegetal.

CONCLUSÕES
ƒ A acumulada anual de radiação solar global para 2006 e 2007 variou entre 6400 a 6800
MJ/m2, comprovando um enorme potencial energético que pode ser convertido para o uso de
energias alternativas.
ƒ A distribuição de chuvas mensais foi mais homogênea no ano de 2006.
ƒ As oscilações de temperatura do ar para os anos de 2006 e 2007 foram bem semelhantes.
ƒ A temperatura do solo a 10 cm de profundidade se tornou maior nos meses de janeiro a
março principalmente no ano de 2006.
ƒ É necessária a maior atenção na agricultura em relação às reservas hídricas e isso se torna
mais fácil com o uso de técnicas agrometeorológicas.

REFERÊNCIAS BIBLIOGRÁFICAS
ALFONSI, R.R., PEDRO JÚNIOR, M.J., VILLA NOVA, N.A. et all. Estimativa da temperatura
média diária do solo, através de observações convencionais em posto meteorológico. Revista
Brasileira de Ciência do Solo, Campinas, v. 5, p. 150-152, 1981.
ALFONSI, R.R., PEDRO JÚNIOR, M.J., PEREIRA, A.R. Variação da difusividade térmica,
profundidade de amortecimento e camada de extinção da onda de calor para solo da região de
Campinas. Ecossistema, Espírito Santo do Pinhal, v. 9, p. 172-179, 1984.
ASPLAN - Associação de Plantadores de Cana da Paraíba, Zona Canavieira da Paraíba. 2007.
Disponível em: <http://www.asplanpb.com.br>.
DECICO, A. Velocidade de propagação e camada de extinção da onda de temperatura do solo. In:
Congresso Brasileiro de Ciência do Solo, 15, Campinas, SP, 1975. Anais..., Campinas: Sociedade
Brasileira de Ciência do Solo, 1975. p. 51-54.
DECICO, A., SANTOS, J.M., RIBEIRO, M.N. et al. Estudos climatológicos da reserva florestal
Ducke, Manuas - AM. I. Geotemperaturas. Acta Amazônica, Manaus, v. 7, p. 485-497, 1977.
HILL, R. W. Irrigation scheduling. Madison: American Society of Agronomy, 1991. p.491-509.
IBGE - Instituto Brasileiro de Geografia e Estatística, Contagem da População em 2007, publicado
no Diário Oficial da União de 05/10/2007. Disponível em:
<http://www.ibge.gov.br/home/estatistica/populacao/contagem2007/PB.pdf>.
INMET - Instituto Nacional de Meteorologia, Seminário sobre Mudanças Climáticas Globais e
seus Efeitos na Agricultura, Recursos Hídricos e Saúde Pública, Relatório, Impactos,
Vulnerabilidade e Oportunidades, 2007.
Fórum Internacional do Meio Ambiente - A conferência da Terra 78

KUSTAS, W.P., DAUGHTRY, C.S.T. Estimation of the soil heat flux / net radiation ratio from
spectral data. Agricultural and Forest Meteorology, Amsterdam, v. 49, p. 205-223, 1990.
LEMOS, H. M. Disponível em: < http://www.brasilpnuma.org.br/pordentro/artigos.htm>.
MASSMAN, N.J. Correcting error association with soil heat flux measurements and estimating
soil thermal properties from soil temperature and heat flux plate data. Agricultural and Forest
Meteorology, Amsterdam, v. 59, p. 249-266, 1992.
MINISTÉRIO DE MINAS E ENERGIA, Projeto: Cadastro de Fontes de abastecimento por água
Subterrânea no Estado da Paraíba, 2005.
MONTEITH, J. L. Climate and the efficiency of crop production en Britain. Phil. Trans. R. Soc.
Lond. B. 281, 277 – 294, 1977.
OUELLET, C.E. Analysis of the anual cycles of soil and air temperatures in Canada. Naturaliste
Can., Ottawa, v. 99, p. 621-634, 1972.
STATHERS, R.J., BLACK, T.A., NOVAK, M.D. Modelling soil temperature in forest clearcuts
using climate station data. Agricultural and Forest Meteorology, Amsterdam, v. 36, p. 157- 164,
1985.
SUDENE (Superintendência do Desenvolvimento do Nordeste), Nordeste em Números - Trabalho e
Rendimento. Revista Econômica do Nordeste, Fortaleza, v.38, nº2, abril/junho 2007.
THORNTON, P.E.; RUNNING, S.W. Improved algorithm for estimating incident daily solar
radiation from measurements of temperature, humidity and precipitation. Agric. Forest. Meteorol.,
v.93, p.211-228, 1999.
TUCCI, C. E. M. Plano Diretor de Drenagem Urbana: Princípios e Concepção. Revista Brasileira
de Recursos Hídricos, vol. 2, n. 2, jul./dez. 1997.
Fórum Internacional do Meio Ambiente - A conferência da Terra 79

UMIDADE RELATIVA DO AR E VELOCIDADE DO VENTO NAS TÉCNICAS


AGRÍCOLAS E NO MEIO AMBIENTE

Ednaldo Araújo Mendonça


Mestrando em Meteorologia pela Universidade Federal de Campina Grande – UFCG. ednaldo@evl.com.br
Renilson Targino Dantas
Professor Doutor pela Universidade Federal de Campina Grande – UFCG. renilson@dca.ufcg.edu.br
Carlos Henrique de Azevedo Farias
Doutor em Recursos Naturais pela Universidade Federal de Campina Grande. carlos.henrique@miriri.com.br

RESUMO
A presente pesquisa tem como finalidade fazer um demonstrativo dos anos de 2006 e 2007
no município de Capim – PB em relação à umidade relativa do ar e a velocidade do vento, pois as
mesmas têm grande influência no que diz respeito à irrigação e na aplicação de defensivos
agrícolas. A irrigação é um dos principais agravantes do consumo hídrico mundial e se seu manejo
não for feito de forma ideal poderá acarretar um grande prejuízo ambiental. A aplicação de
defensivos agrícolas sem levar em consideração, certos dados meteorológicos pode trazer situações
lesáveis para o meio ambiente. Na pesquisa foram utilizadas as médias mensais da umidade relativa
do ar e da velocidade do vento. Os resultados obtidos mostram que a umidade relativa do ar nos
anos de 2006 e 2007 não apresentaram oscilações significativas, enquanto que nos meses de
setembro e outubro ocorreram as maiores dispersões da velocidade do vento a 10 metros de altura.
Palavras – chave: Umidade, Velocidade, Irrigação, Defensivos Agrícolas.

ABSTRACT
The present research has as purpose to make a demonstrative of the years of the 2006 and
2007 in city of Capim - PB in relation to the relative humidity of air and speed of the wind,
therefore the same ones have great influence in that it says respect to the irrigation and in the
application of agricultural defensives. The irrigation is one of the main aggravations of world-wide
the hídrico consumption and if its handling will not be made of ideal form will be able to cause a
great ambient damage. The application of agricultural defensives without leading in consideration,
certain given meteorological can bring situations injured for the environment. In the research the
monthly averages of the relative humidity of the air and the speed of the wind had been used. The
gotten results show that the relative humidity of air in the years of 2006 and 2007 did not present
significant oscillations, while that in the months of September and October the 10 meters of height
had occurred the biggest dispersions of the speed of the wind.
Keywords: Humidity, Speed, Irrigation, Agricultural Defensives.

INTRODUÇÃO
Na agricultura deve-se levar em conta o quanto irrigar determinada cultura e para tanto se
necessita de técnicas aliadas, dentre as quais podemos citar os dados meteorológicos que são
possíveis através de estações meteorológicas automáticas onde os mesmos irão tornar perfectível a
irrigação. Por esse motivo o agricultor que não usa técnicas favoráveis pode estar tomando decisões
erradas no seu processo de irrigação, ou seja, irrigando a cultura depois de um estresse hídrico, ou
ainda tão pior como a anterior, estar oferecendo água a mais para cultura e com isso desperdiçando
os recursos hídricos da região e ainda promovendo possíveis surgimentos de doenças na cultura.
As variáveis, umidade relativa do ar e velocidade do vento realmente devem ser
consideradas na irrigação, pois a mesma, não é recomendada para locais de ventos fortes e
constantes. O vento afeta a uniformidade de distribuição de água e em regiões de baixa umidade
relativa do ar e de temperaturas altas, a perda de água por evaporação pode atingir valores altos,
favorecendo a incidência de doenças nas plantas (Silveira et al, 2004).
Portanto se o manejo de irrigação for orientado por processos agrometeorológicos, como
análises da evapotranspiração, balanço hídrico, coeficiente de cultura, dentre outros, pode se
determinar exatamente quanto e quando irrigar, assim sendo, ganhando uma economia nas reservas
Fórum Internacional do Meio Ambiente - A conferência da Terra 80

hídricas da região e ao mesmo tempo produzindo mais e melhor, sem déficit financeiro e ecológico.
A necessidade hídrica das culturas pode ser determinada através do coeficiente de cultura
(Kc) e com o mesmo, usar de forma correta o manejo da água de irrigação, como também usá-lo no
planejamento de sistemas hidroagrícolas exigido atualmente na análise de processos de concessão
de uso da água pelos departamentos e instituições de gestão das águas (Pereira et al, 2005). O
coeficiente de cultura (Kc) modifica com: - a altura e momento de desenvolvimento da cultura, a
velocidade do vento e umidade relativa do ar (Doorenbos & Pruitt, 1977; Doorenbos & Kassam,
1979).
Segundo (Bernardo, 2006) os aspectos ecológicos e as supervalorizações dos impactos
ambientais devem ser considerados para o desenvolvimento da irrigação, ou seja, devemos
empenhar esforços para granjear dados confiáveis que permitam quantificar, com precisão a
magnitude do impacto ambiental ocasionado pela irrigação.
De acordo (Furukawa et al, 1994) o manejo racional da irrigação requer, além do
conhecimento de parâmetros climáticos, de características das culturas, dos solos e dos recursos
hídricos, o conhecimento da distribuição e quantidade de água da região.
Estações meteorológicas instaladas em regiões rurais que usam irrigação irão garantir
informações necessárias sobre as variáveis hidrológicas como radiação solar global, precipitação
acumulada, temperaturas do ar e solo, e destacando-se as variáveis referenciadas nessa pesquisa: -
umidade relativa do ar e velocidade do vento.
Componentes do clima, como umidade relativa do ar, velocidade do vento e outros, podem
exercer influência no efeito desejado da irrigação de uma determinada cultura, promovendo desse
modo desperdícios no que diz respeito: - à energia elétrica nos componentes de bombeamento da
irrigação, os desvios das gotículas de água para parte externa da área irrigada e a água através da
evaporação (Frost & Schwalen , 1955), (Pereira et al, 1995) e (Azevedo 1998).
Além do bom manejo da irrigação o agricultor deve ter consciência do uso correto de
defensivos agrícolas. A opção por produtos adequados e o uso da técnica correta para a aplicação do
mesmo, devem ser fatores decisivos para obter medidas eficazes para evitar qualquer prejuízo para
o meio ambiente.
No momento de tomar à decisão da aplicação de defensivos agrícolas na cultura se deve
levar em consideração as variáveis climáticas como umidade relativa do ar, velocidade do vento e
temperatura do ar, pois os limites dessas variáveis são relativamente conhecidos para determinadas
regiões (ANDEF – 2003).
O uso de defensivos agrícolas é desaconselhável quando na presença de vento forte, pois o
mesmo é sem dúvida alguma, um fator que acoplado a dimensão e peso das gotas pulverizadas do
defensivo influenciara no local de deposição das mesmas, ou seja, podendo derivá-las a outros
lugares que não o alvo desejado (Christofoletti, 1992), como exemplo, as reservas hídricas locais.
A importância das informações meteorológicas como velocidade do vento e umidade
relativa do ar em cada região e época do ano são cruciais para os manejos racionais da irrigação e
aplicação de defensivos agrícolas e esses valores instantâneos podem ser obtidos através de
equipamentos meteorológicos, mas nem toda região rural dispõe dos mesmos. Sabendo disso foi
sugerido por (Saab, 2004) em seu trabalho científico a utilização de painéis de materiais plásticos
resistentes e flexíveis, hastes metálicas, canudos plásticos, adesivos coloridos e até mesmo
ventiladores usados, para um dimensionamento das faixas de indicação de velocidade, ou seja,
indicadores ou sinalizadores de velocidade do vento.
O comércio nacional de defensivos agrícolas movimenta mais de 2 bilhões de dólares
anuais. Pelo menos 30% dos defensivos agrícolas aplicados sofrem perda por desvio, ou seja, é
propagado fora da área para onde foi dirigido e isso acontece devido à velocidade do vento, se na
aplicação do mesmo fosse possível a diminuição de 10% do desvio seriam economizados em média
60 milhões de dólares, valendo salientar que, o fundamental não é só a economia financeira, mais
sim a extinção da contaminação do meio ambiente (Saab, 2004).

METODOLOGIA
Fórum Internacional do Meio Ambiente - A conferência da Terra 81

Os dados meteorológicos considerados nessa pesquisa foram, umidade relativa do ar e


velocidade do vento a 10 metros de altura dos anos de 2006 e 2007 onde se executou médias
mensais das mesmas.
A obtenção dos dados ocorreu através do Centro de Previsão de Tempo e Estudos
Climáticos (CPTEC) que tem instalado no município de Capim – PB uma Plataforma de Coleta de
Dados (PCD) com posição geográfica de latitude 6,94o S, longitude 35,12o S e altitude 103 m.
A Figura 1 mostra a localização do município de Capim – PB.

O município de Capim de acordo ao Instituto Brasileiro de Geografia e Estatística – IBGE


(2007) possui uma área de 100 km2, com 5207 habitantes, fica localizado a uma distância de
40,6km da capital João Pessoa, o mesmo está incluído na Microrregião do Litoral Norte e na
Mesorregião da Zona da Mata Paraibana na unidade Geoambiental dos Tabuleiros Costeiros.
Conforme o (Ministério de Minas e Energia – 2005) a região onde está incluído o
município de Capim possui um grande potencial para o cultivo da cana-de-açúcar por estar incluído
nos domínios das Bacias Hidrográficas dos Rios Mamanguape e Miriri, onde os principais cursos e
acumulações d’água são apresentados na tabela a seguir:
Fórum Internacional do Meio Ambiente - A conferência da Terra 82

A área canavieira paraibana ocupa cerca de aproximadamente 13% da área total do Estado
e as regiões dos Tabuleiros Costeiros atinge 95% de toda produção do cultivo da cana-de-açúcar de
acordo a Superintendência do Desenvolvimento do Nordeste – SUDENE (2007).
Baseado em informações da Associação de Plantadores de Cana da Paraíba – ASPLAN
(2007), a Figura 3 mostra o panorama do cultivo de cana no Estado.

Então em ser uma região de escala considerada do cultivo de cana, a irrigação e a aplicação
de produtos agrícolas são praticas constantes na mesma, portanto as informações de estudos de
casos das variáveis como a umidade relativa do ar e velocidade do vento são de boa importância.
Embora nessa pesquisa a velocidade do vento que estamos analisando é a 10 metros de
altura, no caso do manejo do cultivo da cana-de-açúcar o mais usual é a de 2 metros de altura, mas a
título de informação a conversão da velocidade média do vento a 10m (U10) para 2m (U2) foi
sugerida por (Allen et al, 1998) através da seguinte relação:
4,87
U 2 = U 10 .
ln(67,8.10 − 5,42)

RESULTADOS E DISCUSSÃO
Umidade relativa do ar
As médias mensais da umidade relativa do ar nos anos de 2006 e 2007 encontram-se
representadas na Figura 4.
Fórum Internacional do Meio Ambiente - A conferência da Terra 83

Observamos pela Figura 4 que as médias mensais de umidade relativa do ar nos anos de
2006 e 2007 não apresentaram oscilações significativas, apresentando uma média anual em torno de
79%. Onde as médias maiores ocorreram nos meses de abril de 2006 e junho de 2007 ambos com
85% e a menor em janeiro de 2006 com 73%.

Velocidade do vento a 10 metros de altura


As médias mensais da velocidade do vento a 10 metros de altura nos anos de 2006 e 2007
encontram-se representadas na Figura 5.

Analisando a figura 5, verifica-se que nos meses de setembro e outubro ocorreram as


maiores dispersões sendo de 12% e 14% respectivamente, enquanto as menores dispersões
ocorreram em janeiro com 3% e junho com 2%. Onde a maior média foi registrada no mês de
agosto de 2007 e as menores nos meses de fevereiro e novembro de 2006, como também no mês de
dezembro de 2007.
Observa-se que entre os meses de maio e setembro de cada ano praticamente a velocidade
do vento se apresenta com certa significância em relação aos demais meses, portanto observações
como essas podem se tornar importantes para o manejo de aplicação de defensivos agrícolas, no que
diz respeito à deriva, como também o manejo da irrigação no aspecto de possíveis perdas de água.
Fórum Internacional do Meio Ambiente - A conferência da Terra 84

CONCLUSÕES
ƒ Os meses de abril a julho dos anos referidos apresentaram os valores da umidade relativa do
ar um pouco maiores que os demais, evidenciando assim níveis maiores de precipitações
pluviais nessa época.
ƒ Os meses de fevereiro, abril, novembro e dezembro foram ou pelo menos deveriam ser os
melhores meses dos anos de 2006 e 2007 para a aplicação de defensivos agrícolas se acaso
fosse necessário seu devido uso, pelo fato que, os dados apresentaram nessa época os
menores valores de velocidades do vento, propiciando assim menor escoamento das gotas
pulverizadas para áreas não previstas e o oposto dessa situação seria entre os meses de maio
e setembro.

REFERÊNCIAS BIBLIOGRÁFICAS
ALLEN, R.G.; PEREIRA, L. S.; RAES, D.; SMITH, M. Crop evapotranspiration: Guidelines for
computing crop water requirements. Rome: FAO, 1998. 297p. FAO. Irrigation and Drainage Paper,
56.
ANDEF (Associação Nacional de Defesa Vegetal), Uso correto de produtos. 2003. Disponível em:
www.andef.com.br.
ASPLAN - Associação de Plantadores de Cana da Paraíba, Zona Canavieira da Paraíba. 2007.
Disponível em: <http://www.asplanpb.com.br>.
AZEVEDO, H.J. de. Influência de elementos do clima no desempenho de sistemas de irrigação por
aspersão na região Norte Fluminense. Viçosa MG: UFV. 1998. 145p. Tese Doutorado
BERNARDO, S. Manejo da Irrigação na Cana- de- açúcar. Universidade Estadual do Norte
Fluminense - CCTA/UENF, 2006.
CHRISTOFOLETTI, J. C. Manual shell de máquinas e técnicas de aplicação de defensivos
agrícolas. São Paulo.122 p, 1992.
DOORENBOS, J.; PRUITT, W.O. Crop water requirements. Rome : FAO, 1977. 144p. (FAO.
Irrigation and Drainage, 24).
DOORENBOS, J.; KASSAM, A.H. Efeito da água no rendimento das culturas. Roma : FAO,
1979. 306p. ( FAO. Irrigação e Drenagem, 33).
FROST, K.R.; SCHWALEN, H.C. Sprinkler evaporation losses. Agriculture Engineering, St
Joseph, Michigan v. 36, n. 8, p. 526-528, 1955.
FURUKAWA, M.C.; BERNARDO, S.; SOARES, A.A.; RAMOS, M.M. Avaliação da irrigação
por pivô central na região de Rio Verde - GO. Ceres, Viçosa, v.41, n.233, p.36-49, 1994.
IBGE - Instituto Brasileiro de Geografia e Estatística, Contagem da População em 2007, publicado
no Diário Oficial da União de 05/10/2007. Disponível em:
<http://www.ibge.gov.br/home/estatistica/populacao/contagem2007/PB.pdf>.
MINISTÉRIO DE MINAS E ENERGIA, Projeto: Cadastro de Fontes de abastecimento por água
Subterrânea no Estado da Paraíba, 2005.
PEREIRA, G.M.; SOARES, A.A.; ALVES, A.R.; RAMOS, M.M.; MARTINEZ, M.A. Modelo
computacional para simulação das perdas de água por evaporação por aspersão. In: Congresso
Brasileiro de Engenharia Agrícola, 24, 1995, Viçosa: Sociedade Brasileira de Engenharia Agrícola.
PEREIRA, A. S.; SANTOS, E. H. dos; EVANGELISTA, S. R. M.; ASSAD, E. D.; ROMANI, L.
A. S.; OTAVIN, A. F., Compilação de coeficientes de cultura (Kc) determinados em condições
brasileiras, Embrapa Informática Agropecuária, 2005.
SAAB, O. J. G. A. Indicador de velocidade do vento. Ciências Agrárias, Londrina, v. 25, n. 1, p.
21-26, jan./mar. 2004.
SILVEIRA, P. M. da.; STONE, L. F., Irrigação do feijoeiro, Embrapa Arroz e Feijão, 2004
SUDENE (Superintendência do Desenvolvimento do Nordeste), Nordeste em Números - Trabalho e
Rendimento. Revista Econômica do Nordeste, Fortaleza, v.38, nº2, abril/junho 2007.
Fórum Internacional do Meio Ambiente - A conferência da Terra 85

CORRELAÇÃO ENTRE AS TEMPERATURAS DE UM TERMO-HIGRÓGRAFO E DE


PRODUTO DE SENSORIAMENTO REMOTO TERMAL.

Ricardo Farias Amaral


Professor Dr. do Departamento de Geologia (UFRN)
Glauber Richard Sobreira de Carvalho
Técnico em Controle Ambiental (CEFET-RN)
Espedito Lima de Carvalho Segundo
Biólogo (UNP–Universidade Potiguar), e-mail: espedito_19@hotmail.com.

RESUMO
O objetivo deste estudo é correlacionar os produtos de sensoriamento remoto termal com
as temperaturas registradas por um Termo-Higrógrafo para a área urbana do município de Natal-
RN. Para isso recorremos às imagens de satélite para analise dos ambientes topos e microclimaticos,
foram usado o canal termal (TM6+) do sensor LANDSAT -7 de 04 de Agosto de 2001 e uma carta
de um Termo-Higrografo da mesma da data da imagem de satélite. Através de um perfil térmico
Norte-Sul da cidade a curva de temperatura encontrada no dia da imagem foi correlacionada com a
curva média das variações de temperaturas do ar obtidas na estação climatológica da
UFRN/INMET. O resultado da análise mostrou certa similaridade com certa tolerância +/- 1°C uma
vez que eles registram a temperatura com parâmetros diferentes, tornando possível assim uma
correlação que justifique o perfil térmico superficial possibilitando observações mais detalhada das
condições ambientais.
Palavras Chave: Microclimáticos. Sensoriamento Remoto Termal. Termo-higrógrafo.

ABSTRACT
The objective of this study is to correlate the products of thermal remote sensing with the
temperatures registered for Term-Hygrograph for the urban area of the city of Natal- RN. For this
we appeal to the images of satellite for analyzes of topos environments and microclimatic, they had
been used the thermal canal (TM6+) of sensor LANDSAT -7 of 04 of August of a 2001 and letter of
Term-Hygrograph of the same one of the date of the satellite image. Through a thermal profile
North-South highway of the city the curve of temperature found in the day of the image was
correlated with the average curve of the variations of gotten temperatures of air in the climatology
station of the UFRN/INMET. The result of the analysis showed certain similarity with certain
tolerance + 1°C a time that they register the temperature with different parameters, becoming
possible thus a correlation that justifies the superficial thermal profile more making possible
comments detailed of the ambient conditions.
Keywords: Microclimatic. Thermal Remote Sensing. Term-Hygrograph.

INTRODUÇÃO
As cidades vêm sendo consideradas como área de impacto máximo da ação humana. O
crescimento desordenado das áreas urbanizadas provoca degradação ambiental do meio natural,
com justaposição de um meio ambiente artificial que altera o equilíbrio natural, (...)em comparação
com a paisagem circunvizinha a cidade usualmente provoca um enrugamento, aquecimento, e talvez
ressecamento da condições da superfície. (OKE, 1978).
O processo de urbanização altera o balanço de radiação da superfície devido à substituição
dos materiais naturais, pelos materiais urbanos, que tem um alberdo mais baixo, e uma condução
maior de calor e conseqüentemente, possuem uma maior capacidade térmica mais elevada, do que
os materiais de áreas circunvizinhos assim, as propriedades radiativas dos materiais empregados na
elaboração do espaço urbano.
Influenciam no processo de absorção, difusão e reflexão da radiação sofrida pela
atmosfera, acarretando mudanças locais e regionais.
Fórum Internacional do Meio Ambiente - A conferência da Terra 86

O maior impacto do homem sobre o clima acontece nas áreas urbanas, que apresentam
condições climáticas particulares – “clima urbano” que e, portanto a influência do homem no meio
ambiente urbano, devido ao processo de urbanização e industrialização.
OKE (1982), a diferença primária entre os processos térmicos da área urbana e de seu
entorno natural ou rural está na repartição entre os fluxos turbulentos de calor sensível (trocas
térmicas secas) e de calor latente (trocas térmicas úmidas). As áreas naturais ou rurais adjacentes à
cidade perdem mais calor por meio do resfriamento evaporativo. Nas cidades, onde as superfícies
têm mais capacidade térmica e o grau de impermeabilização é muito maior, ao contrário, a maior
parte do fluxo térmico é de calor sensível – que, por sua natureza, é causa de desconforto térmico
humano (estresse bioclimático). As estruturas urbanas favorecem ainda o estoque de calor,
aumentando a importância desse termo no sistema, pois, durante a noite, a intensidade da perda
térmica é função da quantidade de calor armazenado e disponibilizado na superfície.
A analise do clima de uma cidade com as dimensões dos fatos urbanos existente no
município de Natal-RN exige à adoção de princípios, métodos e técnica adequados a compreensão
do fenômeno. O primeiro deles, e talvez o mais importante, seja considerar a realidade urbana como
uma totalidade. Os múltiplos e diversos aspectos, propriedades, grau de intensidade do fenômeno
redefine globalmente todo o conjunto de suas partes constituintes. Desta forma, o clima ou os
climas urbanos do município não podem ser tratados como um processo puramente físico, mas em
todas as suas interações com os fatos associados a produto do espaço, através de praticas sociais
vigentes no cotidiano desta sociedade urbana.
A ilha de calor urbana altera as características climáticas ambientais, resultante da elevação
da temperatura médias das zonas centrais em comparação com as zonas periféricas ou rurais,
estando relacionadas a diversos fatores, dentre os quais podem se destacar os materiais empregados
na construção civil, impermeabilização do solo, concentração de edifícios, ausência quase total de
cobertura vegetal, poluição atmosférica, crescimento populacional e produção de energia
antropogênica.
Nos últimos anos a cidade do Natal-RN vem passando por um intenso processo de
crescimento urbano caracterizado por estruturas horizontais e verticais, e a expansão da malha
urbana, em direção às cidades vizinhas, trazendo como conseqüências alterações nos espaços
microclimáticos.
De maneira geral os estudos do ambiente atmosférico urbano do Brasil, possuem uma
posição teórica e metodológica de significativa originalidade, seja pela multiplicidade de
experiências realizadas através de diferentes estudos de caso. As técnicas empregadas, neste campo
de conhecimento refletem tanto na manutenção de procedimentos tradicionais quanto ao avanço de
pesquisa.
A utilização de dados meteorológicos oficiais provenientes de pontos de estações de rede
publica de observação e o emprego de mini-abrigos termométricos móveis, pluviômetros, de
anemômetros e de equipamento para a coleta de material particulado, distribuição em rede e/ ou
transectos na zona urbana e/ ou parte dela, caracterizam procedimentos tradicionais para a
mensuração das características atmosfera da cidade. De maneira geral observa-se que o
levantamento de dados tem sido feito tanto de estações fixas quanto móveis distribuídas em pontos
pré - estabelecidos da mancha urbanas. As pesquisas modernas empregam o uso de mini-estações
meteorológicas automáticas, além de sensores eletrônicos e imagens de satélite, através do
sensoriamento remoto, sendo uma ferramenta pouco utilizada no Brasil, destacando os trabalhos em
São Paulo: Lombardo (1985), Atlas Ambiental (2002), Londrina: Mendonça (1994), Região
Metropolitana de Porto Alegre: Collishon (1998), Santa Maria – RS: Saydelles (2005), Piracicaba –
SP: Coltri (2006), Feira de Santana-BA: Mendes et al. (2006), Natal-RN: Carvalho et al (2006):
estudando o comportamento da temperatura aparente com recurso “3D”, na área piloto do campus
central da UFRN.
O objetivo deste estudo é correlacionar os produtos de sensoriamento remoto termal com
as temperaturas registradas por um Termo-Higrógrafo para a área urbana do município de Natal-
RN.
Fórum Internacional do Meio Ambiente - A conferência da Terra 87

MATERIAIS E MÉTODO
Localização da área de estudo
O Município do Natal, objeto de estudo, capital do Estado do Rio Grande do Norte, situa-
se na Zona Litorânea Oriental do Estado, na Subzona de Natal, a qual limita-se a Oeste com o
Município de São Gonçalo do Amarante; ao Norte, com Extremoz; ao Sul, com Parnamirim; e a
Leste, com Oceano Atlântico (Figura 1) , nas coordenadas geográficas aproximadas de 5º 44’ 50”
de latitude sul e 35º 12’ 34” longitude oeste.
Esta situada nas margens do Oceano Atlântico e banhada pelo Rio Potengi, possui uma
área verde de grande proporção – O Parque Estadual das Dunas. Constitui-se de fundamental
importância na amenização do clima da cidade de porte médio. A cidade do Natal-RN, que se
apresenta circundada pelas dunas, desde inicio de sua ocupação, com o passar dos anos a cidade foi
crescendo e a urbanização foi avançada sobre as dunas. Nós últimos anos a cidade do Natal-RN
vem passando por um intenso processo de crescimento urbano, caracterizado por estruturas
horizontais e verticais e a expansão da malha urbana em direção as cidades vizinhas.
Segundo ARAÚJO, MARTINS, ARAÚJO (1998), o clima da região de estudo caracteriza
por apresenta-se alta umidade relativa, radiação intensa, temperatura do ar elevadas, possuindo duas
épocas característica anuais: outubro a março e abril a setembro, com pequenas variação entre elas.
O primeiro período caracteriza-se por temperaturas do ar mais elevadas, umidades relativas mais
baixas, velocidade do vento relativamente menores em determinado horários e com predomínio a
sudeste, apresentando pequena variações na direção leste-nordeste. O segundo se caracteriza-se por
temperaturas mais amenas, umidade relativas mais altas (período chuvoso), velocidade dos ventos
mais elevadas e com predomínio também no quadrante sudeste, com variações sul – sudeste,
principalmente, nas primeiras horas do dia. A radiação solar global, em função da baixa latitude
apresenta ganho considerável durante todo o ano pelas superfícies horizontais e variações
características entre as superfícies verticais norte e sul, em função da época do ano. Entretanto, a
grande presença de nuvens (em média 6-10) ameniza a radiação solar direta intensa, mais impede a
reirradiação para o céu a noite, o que impede a queda de temperatura e provoca uma radiação solar
difusa e intensa.
Fórum Internacional do Meio Ambiente - A conferência da Terra 88

Figura 1. Região Administrativa do Município de Natal-RN

Metodologia
Para o trabalho foi utilizado as medias de temperaturas do ar registradas por um Termo-
Higrógrafo, obtidas na estação climatológica da UFRN/INMET.no dia 04.08.2001. É o mapa de
temperatura aparente da superfície, foi obtida através da técnica de processamento digital da banda
termal (TM 6+), das imagens captadas pelo sensor LANDSAT 7, no dia 0419.08.2001.
Transformaram-se as informações contidas na banda termal (6) do sensor Landsat-7
ETM+, em temperatura em graus Celsius, onde, as faixas de temperaturas foram reclassificadas.
O uso de produtos derivados da banda termal (TM 6+),é um recurso bastante usado hoje
em dia para mapear e visualizar o comportamento térmico das superfícies em grandes áreas
urbanas. A imagem termal é composta por uma matrix de pixels contendo um número digital (DN)
Fórum Internacional do Meio Ambiente - A conferência da Terra 89

associado a um intervalo da escala cromática de 255 tons de cinza que representam a superfície
terrestre e a cada pixel é associado uma temperatura a fim de possibilitar a leitura das temperaturas
encontradas na imagem assim como sua variação. O uso da imagem termal possibilitou fazer a
análise dos fatores que influenciam o aumento e a diminuição das temperaturas na cidade. Para a
obtenção da temperatura superficial foi necessário transformar o sinal digital do sensor do satélite
em radiância que é então convertida em temperatura de acordo com a formula descrita no manual
do satélite Landsat-7.
O valor de cada pixel da imagem foi transformado em radiância absoluta usando a seguinte
formula.(NASA, 2005):

(1) Lλ = ( Lmin - Lmax ) / 255 * DN + Lmin ,


onde Lλ é a radiância espectral, Lmin e Lmax [ mW cm 2 sr 1 µm1], são as radiâncias espectrais
para cada banda do numero digital de 0 a 255.
Para os sensores ETM+ 7, os valores da classe de radiância espectral foram:
(2) Low Gain: Lmin - 0.0 Lmax 17.4 watts/( meter squared * ster * µm )
High Gain: Lmin - 3.2 Lmax 12.65 watts/( meter squared * ster * µm )
A radiância spectral Lλ , foi convertida em temperatura efetiva do satélite,
(3) T = K 2 / lm ( K1/ Lλ + 1 )
Onde K1 e K2, são constantes de calibração para o Landsat 7 ETM+. (NASA.2005).
K1 = 666,09
K2 = 1282,71K

No sistema de visada Terra-Atmosfera do satélite Landsat 7, os valores obtidos na


temperatura efetiva do satélite, tem por base os valores de emissividade das superfícies. (Lillesand
and Kiffer1994)
O sensor Thematic Mapper do satélite landsat 7 recobre a faixa do espectro refletido ( 0,4 a
2,5 um ) com sete bandas e outra cobre o espectro emitido ou termal ( 10,4 a 12,5 um ), a qual foi
usada nesse trabalho.
Para transformação das informações contidas nas imagens, utilizou-se o módulo termal do
software Idrisi 3.2. Este módulo baseia-se nas funções de calibração dos detectores do sensor termal
do satélite e converte os níveis de cinza da imagem em valores de temperatura em graus
centígrados.
O passo seguinte foi reclassificar o resultado obtido em 10 faixas a saber <22°C, 23°C,
24°C, 25°C, 26°C, 27°C, 28°C, 29°C, 30°C, > 31°C.Após a classificação da imagem selecionou-se
as áreas que apresentaram variações significativas de temperatura.

RESULTADOS E DISCUSSÃO.
Considerando as dificuldades inerentes á complexidade dos espaços microclimaticos
urbanos foi necessário recorrer as imagem de satélite do sensor LANDSAT 7. As imagens
utilizadas para a analise e compreensão dos espaços topo e microclimaticas urbanas foram o canal
termal (TM6+) um excelente recurso para mapear o comportamento das temperaturas de superfície
aparente em grandes áreas, possibilitando fazer a análise dos fatores que influenciam o aumento e a
diminuição das temperaturas da na cidade.
A imagem processada conforme ilustra a (figura 2) mostra em vermelho as áreas de maior
temperatura aparente da superfície, em contraponto as áreas representadas de azul, nas quais a
temperatura é mais amena.
Fórum Internacional do Meio Ambiente - A conferência da Terra 90

Figura. 02 – Imagem Processada no Município de Natal-RN da banda termal do satélite LANDSAT


7 (ETM+), Órbita: 214 Ponto: 64, aproximadamente 11:30h da manhã

O perfil térmico
Na imagem termal foi traçado um perfil cortando a cidade de norte a sul para representar o
comportamento das temperaturas superficiais obtido às 11h30min hs, hora aproximada da passagem
do satélite no município de Natal-RN. Figura (3)

Figura 3 - Perfil Térmico Norte-Sul de Natal-RN.

O Perfil Meteorológico
s dados de um Termo-Higrógrafo, aparelho que registra as variações da temperatura e da
umidade relativa do ar da estação meteorológica do Campus da UFRN/INMET, 04.08.2001.
Fórum Internacional do Meio Ambiente - A conferência da Terra 91

Mostram que a temperatura média do ar se encontra na faixa dos 30°C a partir das 10hs da manhã e
se mantém até às 14Hs. Analisando a carta do Termo-Higrógrafo traçou-se um perfil representativo
da variação diária da temperatura do ar, a qual permitiu visualizar que o maior aquecimento do ar na
cidade acontece a partir das 9 hs da manhã, aumentando até as 16hs de onde começa a diminuir
gradativamente. Figura 4.

Figura 4 - Perfil meteorológico da temperatura do ar.

A uma correlação aproximada do Termo-Higrometrico e o Perfil Térmico entre os dois


registros para o dia 04 de Agosto de 2001, pois a temperatura do registrada na hora da passagem do
satélite LANDSAT-7, mostra certa similaridade com certa tolerância +/- 1°C (ambos situados
entorno dos 30°C) uma vez que eles registram a temperatura com parâmetros diferentes.
Os dados provenientes da imagem de satélite mostram a formação, no momento da tomada
da imagem, de um expressivo contraste entre a temperatura da superfície e a temperatura do ar (a
1,5 m). A observação da imagem deixa clara a formação de uma ilha de calor urbana, utilizada
como parâmetro temperaturas > 31°C.
A temperatura do ar de uma determinada localidade é resultante de uma combinação
momentânea de determinados fatores. No ambiente urbano, a escala espacial e temporal dos fatores
intervenientes na configuração climática apresenta particularidades derivadas tanto da maior
heterogeneidade relativa ao uso e ocupação do solo, quanto da maior velocidade e diversidade das
atividades humanas

CONCLUSÃO
A analise do Termo-Higrometrico do ambiente urbano, constitui uma aproximação pontual
(levantamento pontual) das condições climáticas, pois relata apenas o segmento linear. Entretanto á
medida que a mesma e empregada como complementar a outras técnicas, os resultados obtidos
auxiliam na identificação das condições ambientais.
O emprego das imagens de satélite, nos estudos climáticos, permite a elaboração de
documentos que retratam a distribuição espacial, possibilita observações mais detalhadas.
Desta forma, diante das constatações das diferentes respostas térmicas do Termo-
Higrometrico e dos dados dos sensores termal da banda (6) da imagem Landsat 7 (ETM+) na área
urbana do Municipio de Natal-RN, afirmar que o presente trabalho representa um estudo
preliminar e, portanto, longe de considerar seus resultados como conclusivos, pois se faz necessário
uma amostragem ainda maior, o que certamente poderá ser realizado em trabalhos futuros, na
tentativa de uma maior compreensão da realidade climática do Município de Natal-RN.
Fórum Internacional do Meio Ambiente - A conferência da Terra 92

REFERENCIA BIBLIOGRÁFICA
ARAÚJO, Henrique Silveira de; MARTINS, Themis Lima Fernandes; ARAÚJO, Virginia Maria
Dantas de. Dias climático típico pára o projeto térmico de edificações em Natal/RN. Natal:
EDUFRN, 1998.
CARVALHO, G. R. S. ; AMARAL, R. F. ; LUNA, J. B. . O Mapa termal do campus central da
UFRN por extensão 3D. In: Vll Simpósio Brasileiro de Climatologia Geográfica Rondonópolis, MT
, 2006.
LILLESSAND and KIEFER. Remote Sensering, Third edition 1994.
LOMBARDO, Magda Adelaide. Ilha de calor nas metrópoles. São Paulo: Hucitec,1985.
LUNA, James Barbosa, O Mapa Termal de Natal Baseado em Imagens Landsat-7 (ETM+) 1999-
2001. Monografia (graduação) do Departamento de Geografia da UFRN.
MONTEIRO, C. A. de F. Teoria e clima urbano. São Paulo: Instituto de Geografia da USP, 1976.
NASA. http://ltpwww.gsfc.nasa.gov/IAS/handbook/handbook_toc.html, acessado em 12.11.2005.
Saydelles, Alexandre Pistoia; Estudo do campo térmico e das ilhas de calor urbano em Santa
Maria – RS. Dissertação (Mestrado) Universidade Federal de Santa Maria, Rio Grande do Sul,
2005.
OKE, T. R. The energetic basis of the urban heat island. Quarterly Journal of the Royal
Meteorological Society, v. 108, p. 1-24, 1982.
OKE, T. R. Boundary layer climates. London: Methuen & Co. Ltd., 1978.
UFRN/INMET. Estação meteorológica principal do campus central UFRN. Natal 2006.
Fórum Internacional do Meio Ambiente - A conferência da Terra 93

COMPORTAMENTO DA PRODUÇÃO PESQUEIRA NORTE-RIO-GRANDENSE EM


ANOS DE EL NIÑO E LA NIÑA

Edseisy Silva BARBALHO


Mestranda do Programa de Pós-Graduação e Pesquisa em Geografia da UFRN. Email: seisybarbalho@yahoo.com.br
Fernando Moreira da SILVA
Professor Adjunto do Departamento de Geografia da UFRN e orientador da pesquisa. Email: fmoreyra@ufrnet.br.
Joseara Lima de PAULA
Mestranda do Programa de Pós-Graduação e Pesquisa em Geografia da UFRN. Email: josearageo@yahoo.com.br.

RESUMO
O desenvolvimento tecnológico e a crescente escassez nas atividades pesqueiras marítimas,
apontam para uma exploração nos moldes da sustentabilidade. As discussões a respeito da
exploração pesqueira no Rio Grande do Norte surgiram a partir da década de 1990, permeadas
concomitantemente pela relevância para com a economia Norte-Rio-Grandense, bem como pelo
declínio na sua produção. Assim, a pesquisa objetiva analisar o comportamento da produção
pesqueira no estado do Rio Grande do Norte e sua relação com os fenômenos climáticos El Niño e
La Niña. Os dados foram obtidos junto ao Instituto brasileiro do Meio Ambiente e dos Recursos
Naturais Renováveis – (IBAMA) e a Estação Climatológica da Universidade Federal do Rio Grande
do Norte para os anos de El Niño (1993, 1994) e La Niña (1996, 1998). A pesquisa foi desenvolvida
utilizando-se de técnicas da bioestatística, principalmente, análise de correlação entre a produção
pesqueira e as variáveis climáticas, bem como da estatística gráfica, curvas de regressão polinomial
e séries temporais. Resultados parciais mostraram que, considerando a produção pesqueira total, há
sensibilidade frente os eventos climáticos de ordem global, sendo maior em anos de La Niña e
menor em anos de El Niño, entretanto a produção por espécie apresenta relação direta e inversa, isto
é, cada espécie responde de forma diferenciada a esses desvios climáticos.
Palavras-chave: Produção Pesqueira, El Niño, La Niña, Correlação Ambiental.

ABSTRACT
Technological development and the growing shortage in the sea fishing activities, pointed
to a holding in the form of sustainability. Discussions regarding the farm fishery in Rio Grande do
Norte emerged from the decade of 1990, concurrently permeated by relevance to the economy
Norte-Rio-Grandense, as well as decline in its production. Thus, the research aims to analyse the
behavior of the fishery product in the state of Rio Grande do Norte and its relationship with the
weather phenomena El Niño and La Niña. Data were obtained from the Brazilian Institute of
Environment and Renewable Natural Resources (IBAMA), Climate Station and the Federal
University of Rio Grande do Norte for the years of El Niño (1993, 1994) and La Niña (1996, 1998).
The survey was developed using the techniques of biostatistics, mainly analysis of correlation
between production fishing and climate variables, as well as the statistical graphics, and polynomial
regression curves of time series. Partial results showed that, considering the total fishery production,
there is the sensitivity front of a global climatic events, and greater in La Niña years and lower in
years of El Niño, however the production by species presents direct and inverse, that is, each
species responds differently so these deviations weather.
Key words: Production fishing, El Niño, La Niña, Environmental Correlation.

INTRODUÇÃO
A pesca marítima ou de água salgada no Rio Grande do Norte, que faz parte da região
Nordeste do Brasil, é realizada ao longo da extensa faixa costeira de 399 Km, que engloba 25
municípios litorâneos indo de Baía Formosa (Sul – divisa com a Paraíba) a Tibau (Norte – fronteira
com o Ceará), conforme Figura 1.
Fórum Internacional do Meio Ambiente - A conferência da Terra 94

Figura 1 – Municípios Litorâneos do Rio Grande do Norte Fonte: Adaptado por Joseara Lima de
Paula

O Estado é privilegiado para o exercício da atividade pesqueira, “sendo encontradas


regiões piscosas (bancos e ilhas oceânicas) a uma distância nunca superior a 160 milhas náuticas,
onde são capturados cerca de uma centena de espécies peixes, crustáceos, moluscos, além da coleta
de algas marinhas” (IBAMA/CEPENE 2004, p. 14).
As discussões a respeito da pesca no Rio Grande do Norte surgiram a partir da década de
1990, permeadas concomitantemente pela relevância para com a economia norte-rio-grandense,
pela situação na queda da produção (principalmente a artesanal), pela pesca predatória, além da
falta de modernização das técnicas, fato que vem desmotivando a inserção dos jovens a profissão de
pescador.
As atividades humanas não podem ser negligenciadas enquanto influentes na diminuição
dos estoques pesqueiros e realização da pesca respectivamente, no entanto, é sabido que as causas
da diminuição dos estoques de peixes no mundo ainda não foram totalmente esclarecidas,
necessitando serem melhor estudadas, considerando que fenômenos naturais podem também está
influenciando na variabilidade dos estoques pesqueiros em várias partes do planeta (INPE, 2006).
A literatura mostra que existe uma relação entre a variabilidade dos estoques pesqueiros e
as condições naturais dos oceanos, como efeitos causados pelos ciclos naturais do planeta, por
fenômenos como El Niño e também por outros fatores de origem antrópica, desse modo, ficando
evidente que uma análise que busque compreender as causas da diminuição dos estoques pesqueiros
precisa ter conhecimento de fenômenos El Niño - La Niña, e de suas conseqüências.
O El Niño representa o aquecimento anormal das águas superficiais e sub-superficiais do
Oceano Pacífico Equatorial, anomalia do sistema climático que representa uma alteração do sistema
oceano-atmosfera no Oceano Pacífico tropical, e que tem conseqüências no tempo e no clima em
todo o planeta, correspondendo não somente a presença das águas quentes, mas também as
mudanças na atmosfera próxima à superfície do oceano, com o enfraquecimento dos ventos alísios
(que sopram de leste para oeste) na região equatorial, que mudam a circulação da atmosfera nos
Fórum Internacional do Meio Ambiente - A conferência da Terra 95

níveis baixos e altos, determinando mudanças nos padrões de transporte de umidade, e, portanto
variações na distribuição das chuvas em regiões tropicais e de latitudes médias e altas, ainda
podendo ser observados aumento ou declínio de temperatura em algumas regiões do globo (SILVA,
2000).
A La Niña é oposto ao El Niño, corresponde ao resfriamento anômalo das águas
superficiais do Oceano Pacífico Equatorial Central e Oriental formando uma “piscina de águas
frias” nesse oceano. Há semelhança com o El Niño, porém apresentando uma maior variabilidade
do que este, trata-se de um fenômeno natural que produz fortes mudanças na dinâmica geral da
atmosfera, alterando o comportamento climático. Nele, os ventos alísios mostram-se mais intensos
que o habitual (média climatológica) e as águas mais frias, que caracterizam o fenômeno, estendem-
se numa faixa de largura de cerca de 10 graus de latitude ao longo do equador desde a costa peruana
até aproximadamente 180 graus de longitude no Pacífico Central. Observa-se, ainda, uma
intensificação da pressão atmosférica no Pacífico Central e Oriental em relação à pressão no
Pacífico Ocidental.
Os impactos destes dois fenômenos se dão de formas diferenciadas no planeta, assim, na
Região Nordeste do Brasil, os impactos do El Niño são secas de diversas intensidades na região
norte do Nordeste brasileiro, durante a estação chuvosa de fevereiro a maio, sendo esta região
também muito influenciada pelas variações que ocorrem no Oceano Atlântico Tropical. O Sul e o
oeste da Região Nordeste não são significativamente afetados. Quanto aos impactos da La Niña na
Região Nordeste, estes se referem à chegada de frentes frias até a região, principalmente, no litoral
da Bahia, Sergipe e Alagoas, também existindo possibilidade de chuvas acima da média na região
semi-árida do Nordeste do Brasil. Essas chuvas só ocorrem se, simultaneamente, a La Niña, as
condições atmosféricas e oceânicas sobre o Oceano Atlântico mostrarem-se favoráveis, isto é, com
temperatura da superfície do mar (TSM) acima da média no Atlântico Tropical Sul e abaixo da
média no Atlântico Tropical Norte (PHILANDER, 1990; SILVA, 1999).
Nesta perspectiva o objetivo do trabalho é analisar o comportamento da produção
pesqueira do Rio Grande do Norte e sua relação com os fenômenos climáticos El Niño e La Niña.

MATERIAL E MÉTODOS
Os dados analisados na pesquisa foram extraídos do banco de dados do Instituto Brasileiro
do Meio Ambiente e dos Recursos Naturais Renováveis – IBAMA, além de dados coletados na
Estação Climatológica do Departamento de Geografia da Universidade Federal do Rio Grande do
Norte, tais como Pressão (hPa), Temperatura média compensada (ºC), Temperatura máxima (ºC),
Temperatura mínima (ºC), Vento (m/s), Precipitação (mm) e Insolação (horas), para os anos de El
Nino (1993, 1994) e anos de La Niña (1996, 1998).
A pesquisa foi desenvolvida utilizando-se de técnicas da bioestatística, principalmente,
análise de correlação entre a produção pesqueira e as variáveis climáticas. Fez-se uso, também, da
estatística gráfica, curvas de regressão polinomial e séries temporais (FONSECA et al, 1985;
COSTA et al, 2000) formuladas a seguir:
a) Coeficiente de Correlação de Pearson(r)

Onde: Y é a espécie pesqueira e X a variável climatológica


Interpretação Nebulosa de “r”
Fórum Internacional do Meio Ambiente - A conferência da Terra 96

r = 1 (diretamente proporcional)
Grau de associação máximo:
r = -1 (inversamente proporcional)

Com r ≠ 0, existência de correlação

Correlação fraca 0,25< r ≤ 0,50


Correlação grande 0,50< r ≤ 0,75
Correlação forte 0,75 < r ≤ 1

b) Regressão polinomial
Y = a + ΣbiXi com 1 < i < n
Onde: Y é a espécie pesqueira e X a variável climatológica

RESULTADOS E DISCUSSÃO
Os resultados obtidos mostraram que há fortes correlações, conforme tipos e espécies
pesqueiras, demonstrado na matriz de correlação (Tabela 01). Conforme podemos perceber, alguns
aspectos climáticos apresentam maior número de correlação forte com as 10 espécies de peixes
pescadas no litoral do Rio Grande do Norte, como é o caso da pressão com cinco espécies, e da
temperatura máxima e a velocidade dos ventos, ambas com quatro espécies. Outros aspectos
climáticos, que também observamos, apresentam forte correlação com as espécies pesqueiras, mas
em menor grau que os primeiros, foram as temperaturas média e mínima (três espécies cada uma).
A precipitação e a insolação, também, apresentam forte correlação em apenas uma espécie, Pargo e
Albacora, respectivamente.

Tabela 01 – Matriz de correlação


MATRIZ DE CORRELAÇÂO
Espécie Pres (mb) T(ºC) T máx (ºC) T mín (ºC) Vento (m/s) P (mm) Ins (h)
Agulha - - 0,96 - - - -
Albacora 0,75 0,98 - - 0,94 - 0,93
Cavala -0,98 - - -0,78 -0,76 - -
Cioba -0,99 -0,76 - -0,84 -0,88 - -
Dentão -0,87 -0,86 - - - - -
Dourado - - 0,99 - - - -
Pargo - - - - - -0,98 -
Pescada -1 - - -0,7 -0,77 - -
Sardinha - - -0,84 - - - -
Tainha - - 0,9 - - - -
Prod. Total -0,71 -0,43 0,68 -0,98 -0,83 0,56 -0,54

Desse modo, verifica-se que, cada uma das espécies observadas apresentam números e
graus de correlação variados, nos anos de El Niño (1993/1994) e La Niña (1996/1998), para com os
aspectos climáticos a estes relacionados, o que atribuímos aos padrões comportamentais e habitat
diferenciados dos peixes, que serão assim, mais ou menos afetados pelas mudanças climáticas
ocorridas em anos de El Niño e La Niña.
Nesta perspectiva, a forte correlação positiva (0,96) apresentada entre a produção da
espécie Agulha e a temperatura máxima, é conferida por serem peixes costeiros e oceânicos que
nadam próximo da superfície da água nos mares tropicais, subtropicais e temperados do mundo,
Fórum Internacional do Meio Ambiente - A conferência da Terra 97

desse modo, sendo altamente vulneráveis a influência da temperatura do ar, aumenta a produção à
proporção que esta se eleva, como é o caso dos anos de El Niño, e diminuindo a medida que a
mesma diminui, fato conferido aos anos de La Niña.
Situação semelhante a esta, ocorre com a Tainha e o Dourado, o primeiro ocorrendo em
águas tropicais do Atlântico ocidental e em todo Brasil, migrando conforme a época do ano,
tratando-se de peixes de águas costeiras, que nadam próximo da superfície em cardumes, e o
segundo em todos os mares tropicais e subtropicais do mundo, também comum em todo litoral
brasileiro, vivendo em mar aberto, e do mesmo modo, nadando próximo da superfície em pequenos
cardumes. A produção destas espécies apresentam, assim como a agulha, uma forte correlação
positiva com a temperatura máxima; Dourado (0,99) e Tainha (0,90), sendo, portanto a produção
influenciada de forma diretamente proporcional à temperatura, aumentando em anos de El Niño, e
diminuindo em anos de La Niña.
Do mesmo modo, que as espécies anteriormente citadas, o Albacora também apresenta
forte correlação positiva (0,98), com a temperatura média compensada (TMC). Como a TMC varia
de forma sazonal, associamos o alto grau de correlação ao fato de ser é uma espécie oceânica,
migradora e epipelágica (da superfície até 200 metros de profundidade). Esta espécie também
apresentou forte correlações positiva com a pressão (0,75), que está diretamente atrelada as células
de circulação atmosférica, bem como a TMC, que em anos de El Niño o campo barométrico no
Atlântico Sul é alterado para um valor maior que a média climatológica.
Com o vento, à medida que aumenta a velocidade e transporta água superficial (pobre em
nutrientes) e quente para longe da costa, faz ressurgir uma água sub-superficial (profunda) fria e
densa, que apresenta elevadas concentrações de nutrientes dissolvidos (fosfatos, nitratos e silicatos)
e abastecem as camadas de águas superficiais com componentes necessários à produtividade
biológica, promovendo o crescimento do plâncton que servirá de alimento para uma grande
população de peixes, que serão alimento para essa espécie, sendo a produção maior em anos de El
Niño e menor em anos de La Niña, já que em anos de El Niño os alísios tem intensidade mais
elevada que em anos normais, assim como a insolação, que com a turbidez da água interfere no
processo de fotossintético, e portanto, na alimentação dos peixes, que servirão, na cadeia alimentar,
para o albacora.
A produção da sardinha também apresentou forte correlação com a temperatura máxima,
mas neste caso a correlação foi negativa (-0,84), ou seja, inversamente proporcional, à medida que a
temperatura aumenta, como é o caso de anos de El Niño, a produção diminui, entretanto, com a
diminuição da temperatura favorecida pela atuação do fenômeno La Niña, a produção aumenta,
situação esclarecida pelo comportamento da distribuição da espécie na água, que com o esfriamento
da água, os peixes tendem a se concentrar, mantendo-se entre os 25 e os 30 metros de profundidade,
ao passo que, durante a noite, pelo fato da água apresentar-se mais quente eles tendem a se espalhar,
sendo encontrados entre os 15 e os 35 metros, o que dificulta a sua apreensão.
A pescada é um peixe carnívoro de água salgada, que vive em águas relativamente rasas, o
que justifica a forte correlação negativa com a pressão, a temperatura mínima e o vento,
considerando respectivamente que: a pressão está relacionada às mudanças de outros aspectos
climáticos, sendo aqui inversamente proporcional, aumentando a produção quando a pressão é
menor, fato conferido a anos de La Niña; estando em águas rasas são mais susceptíveis a influência
da alteração da temperatura, que neste caso é inversamente proporcional a produção, ou seja,
quando a temperatura aumenta em anos de El Niño, a produção diminui, ao passo que em anos de
La Niña, com a diminuição da temperatura do mar, a produção aumenta; e também por viver em
águas rasas, são profundamente afetado pela velocidade do vento, que a medida que aumenta é
responsável pela diminuição da produção, pois a velocidade do vento está associadas a promoção de
correntes, que quando aumentam mais que a média climática, acabam afugentando os peixes,
forçando um deslocamento para águas mais tranqüilas.
Assim, como a pescada, outros peixes também apresentaram forte correlação negativa
envolvendo os aspectos climáticos: pressão, temperatura do ar e vento, como foram os casos dos
peixes, Cavala, Cioba e Dentão. A Cavala apresentou forte correlação negativa com a pressão,
Fórum Internacional do Meio Ambiente - A conferência da Terra 98

temperatura mínima e vento. São espécies que dependem de um estuário, que em anos de La Niña
há uma forte coesão entre o desaguar dos rios no Oceano Atlântico Sul. É uma espécie que pode ser
encontrada até 300 metros de profundidade, ocorre nas águas tropicais do Atlântico, sendo comum
em todo litoral brasileiro e vive perto da costa, nadando próximo da superfície em pequenos
cardumes ou solitários, o que explica a significativa vulnerabilidade a estes aspectos.
O peixe Cioba apresentou forte correlação negativa com a pressão, a temperatura média e
mínima e o vento, o que do mesmo modo que a pescada, está relacionado ao seu ecossistema,
também de águas rasas, submetido em grande medida a influência destes aspectos climáticos,
considerando que são peixes presentes em águas tropicais do Atlântico ocidental, no litoral
brasileiro ocorrendo da região norte à sudeste e que vivem em águas costeiras rasas em fundos de
corais, rochas ou areia. Ainda, acrescenta-se a relação com as temperaturas média e mínima, o fato
de que em águas mais frias, como durante o dia ou pelas mesmas condições térmicas em anos de La
Niña, podem ser encontrados formando pequenos grupos próximos às pedras no fundo, sendo mais
fáceis de ser apreendidos em maior quantidade, ao passo que a noite, ou seja, em águas quentes,
como é o caso dos anos de El Niño, é comum encontrar indivíduos separados, dificultando a
pescaria. A mesma situação se dá com o Dentão, que pertence à mesma família da Cioba, tem as
mesmas características comportamentais, acima descritas, apresentando forte correlação negativa
com a pressão e a temperatura média do ar.
A única espécie que apresentou forte correlação inversa com a precipitação foi o peixe
Pargo. Essa forte correlação pode está atrelada ao seu habitat, é uma espécie encontrada em fundos
rochosos nas regiões costeiras dos 10 aos 300 m de profundidade, portanto, quando se encontram
em regiões estuarinas sujeitas a maior interferência de precipitação, diminue a produção à medida
que aumenta o fluxo do rio, fato reservado nos anos de La Niña, além disso, o aumento na produção
se dar com o aumento do teor de salinidade, que acontece quando o índice de precipitação diminue,
notadamente, ocorre em anos de El Niño.
Nesta alusão, cada espécies tem condições ideais para reprodução tanto em anos de El
Niño como em anos de La Niña, entretanto quando analisamos o total produzido por ano, vemos
que há uma forte correlação, em anos de El Niño a produção decresce, ao passo que em anos de La
Niña a produção aumenta, conforme podemos observar no Figura 2.

12000.0

10000.0

8000.0
Produção(ton)

6000.0

4000.0

2000.0

0.0
1993 1994 1996 1998
Anos

Figura 2: Comportamento da produção pesqueira no Rio grande do Norte, em anos de El niño e La


Niña.

Desta forma, é possível modelar a tendência da produção pesqueira no Rio Grande do


Norte, verificando o comportamento por espécie, e fazendo uso da análise de regressão.
Considerando a produção pesqueira total nos referidos anos de El Ninõ e La Niña, verificamos que
os aspectos climáticos que apresentaram forte correlação inversa, foram a temperatura mínima, o
Fórum Internacional do Meio Ambiente - A conferência da Terra 99

vento, e em menor escala a pressão, conforme podemos observar nas Figuras 3, 4 e 5, explicado por
uma análise de regressão polinomial de grau 3 com coeficiente de explicação igual a 1.

Produção(ton) versus Temperatura(ºC)


y = 31034x 3 - 2E+06x 2 + 5E+07x - 4E+08
R2 = 1
12000,0
Produção(ton)

10000,0
8000,0
6000,0
4000,0
2000,0
0,0
22,8 23,0 23,2 23,4 23,6 23,8 24,0
Temperatura Mínima (ºC)

Figura 3 – Produção (ton) versus Temperatura Mínima (ºC)

Produção(ton) versus Vento(m/s)


y = -56527x 3 + 776345x 2 - 4E+06x + 5E+06
R2 = 1
12000,0
Produção(ton)

10000,0
8000,0
6000,0
4000,0
2000,0
0,0
4,0 4,2 4,4 4,6 4,8 5,0 5,2
Vento (m/s)

Figura 4 – Produção (ton) versus Vento (m/s)

Produção(ton) versus Pressão Atmosférica(hPa)


y = -27430x 2 + 6E+07x - 3E+10
15000,0 R2 = 0,762
Produção(ton)

10000,0

5000,0

0,0
1006,6 1006,8 1007,0 1007,2 1007,4 1007,6
Pressão Atmosférica (hPa)

Figura 5 – Produção (ton) versus Pressão Atmosférica (hPa)

CONCLUSÕES
Podemos destacar algumas considerações relevantes: as correlações tanto ocorreram de
forma direta, como inversa, variando em função das características do peixe e do ecossistema ao
qual está imerso, de forma que influências na produção pesqueira pelos aspectos climáticos, se dão
Fórum Internacional do Meio Ambiente - A conferência da Terra 100

da seguinte forma: A variação do campo de temperatura afeta os peixes que vivem próximo à
superfície da água; a precipitação àqueles que vivem nos estuários; os ventos os que vivem em
ambientes sujeitos a ressurgência; a insolação pela relação com a turbidez da água que interfere no
processo de fotossíntese e desse modo, na cadeia alimentar dos peixes.
A pesquisa revela que, em anos de El Niño e La Niña, temos situações opostas no que se
refere a cada um desses eventos climáticos, revelando que embora as particularidades
comportamentais dos peixes estabeleçam diferenças entre a proporcionalidade direta e indireta
verificada entre a produção das espécies e os aspectos climáticos, temos majoritariamente que a
produção pesqueira é maior em anos de La Niña e menor em anos de El Nino. Por fim, é possível
modelar a produção pesqueira do Estado, com alto grau de certeza (≡0,95), a partir da técnica de
análise de regressão.

AGRADECIMENTOS
Agradecemos ao CNPq pelo apoio na pesquisa.

REFERÊNCIAS BIBLIOGRÁFICAS
COSTA, Ana Mônica de Britto; SILVA, Elisimar Lopes da; SILVA, Fernando Moreira da.
Modelos de quantificação do lixo para a cidade de Natal/RN. In.: Sociedade e Território.
UFRN/CCHLA – Departamento de Geografia. Natal/RM, v. 14, n. 2, jul/dez 2000.
FONSECA, Jairo Simon da; MARTINS, Gilberto de Andrade; TOLEDO, Geraldo Luciano.
Estatística Aplicada. São Paulo/SP: Editora Atlas S.A., 1985.
IBAMA/CEPENE. Boletim Estatístico da pesca marítima e estuarina do Nordeste do Brasil –
2004. Tamandaré, PE: CEPENE, 2004. Disponível em:
http://www.ibama.gov.br/cepene/download.php?id_download=316. Acesso em: 02 nov. 2007.
INPE. Brasil precisa de satélites para a gestão e conservação dos estoques pesqueiros –
29/09/2006. Disponível em: http://www.inpe.br/noticias/noticia.php?Cod_Noticia=812. Acesso em:
11 out. 2007.
PHILANDER, S. George. El Nino, La Nina, and the Sourthern Oscillation. San Diego, California:
Academic Press, Inc., 1989.
SILVA, Fernando Moreira da; COSTA, Ana Mônica de Britto; SOUZA, Bernardete de Lourdes
Quirino de; Circulação global e sua influência nos sistemas sinóticos no Nordeste do Brasil – Fase
1. In.: Sociedade e Território. UFRN/CCHLA – Departamento de Geografia. Natal/RM, v. 13, n. 1,
jan/jun 1999.
SILVA, Mario Adelmo Varejão. Meteorologia e Climatologia. Brasília: INMET, Gráfica e Editora
Stilo, 2000.
Fórum Internacional do Meio Ambiente - A conferência da Terra 101

EDUCAÇÃO AMBIENTAL E MUDANÇAS AMBIENTAIS GLOBAIS; UM RELATO DE


EXPERIÊNCIA COM O DOCUMENTÁRIO “UMA VERDADE INCONVENIENTE”
COMO ESTRATÉGIA NO ENSINO DE INGLÊS NUMA ESCOLA PÚBLICA.

A. Gusmão Pedrini
Laboratório de Ficologia e Educação Ambiental, Departamento de Biologia Vegetal, Instituto de Biologia Roberto
Alcântara Gomes, Universidade do Estado do Rio de Janeiro, Rua São Francisco Xavier, 524, Pavilhão Haroldo Lisboa
da Cunha, Sala 525/1, CEP 20550-013, Rio de Janeiro, RJ, Brasil; pedrini@uerj.br
M. Gusmão Saba

RESUMO
As mudanças globais vem aumentando no Planeta Terra, em particular, as mudanças
climáticas, sendo o Aquecimento Global a de caráter mais urgente a ser estudada. A
educomunicação tem colaborado para a compreensão desses fenômenos ambientais. O
documentário norte-americano premiado “Uma Verdade Inconveniente” mostrou ser uma estratégia
adequada e motivadora para a sensibilização e compreensão da questão ambiental através do ensino
de inglês. Possibilitou também uma prática interdisciplinar entre diferentes conteúdos disciplinares,
mesmo sem a participação de seus docentes. A língua inglesa, sendo a língua com maior penetração
internacional possibilita o ensino da EA de modo transversal como preconiza a Política Nacional de
Educação Ambiental.
Palavras-Chave: Ensino de Inglês, educomunicação ambiental, escola pública, educação ambiental,
estratégia didática.

ABSTRACTS
The global changes have been increasing on the planet Earth, particularly, the weather
changes, so as the global warming is the most urgent of all issues to be studied. The Educational
Communication has been helping to understand these environmental phenomena. The North
American awarded documentary “An Inconvenient Truth “ has showed to be an adequate and
motivating strategy to the sensitiveness and understanding of the environmental issue through the
English teaching. It has also allowed the practice among the different subjects , even without the
teachers’ participation. The English language, as it is a worldwide one, allows the Environmental
Education teaching in a transversal way as the National Politics for Environmental Education
argues.
Key-Words: English Teaching, Environmental Educational Communication, Public School,
Environmental Education, Didactic Strategies.

INTRODUÇÃO
As mudanças globais vêm sendo denunciadas há séculos, porém de modo constante nas
últimas décadas, especialmente pelos cientistas. Até hoje, os principais causadores das mudanças
globais negativas vêm tentando desacreditar os cientistas, acusando-os de serem apocalípticos,
pessimistas e exagerados.
Protestos contras as mudanças globais tem sido manifestados por cientistas de centenas de
universidades e de ativistas de Organizações Não Governamentais (ONG´s) e vem se multiplicando
assustadoramente. A questão ambiental deixou de ser assunto só de pesquisadores e ativistas
ambientais e sociais, passando a integrar pautas de setores antes refringentes a esse tema como os
econômicos e políticos. Percebeu-se que os cientistas não estavam brincando com o apocalipse e
que ele vem se mostrando inevitável tal como estava escrito nas previsões religiosas. Assim, a
busca pela solução dos efeitos negativos das mudanças ambientais globais é assunto urgente,
inevitável e de responsabilidade planetária e todos os meios, técnicas e recursos devem ser adotados
imediatamente com o fim de minimizar ou extinguir os efeitos previsíveis e imediatos de holocausto
da humanidade (PEDRINI, 2008).
A Educação Ambiental (EA) vem recebendo um grande apoio da Comunicação Ambiental
(CA) que tem não só divulgado amplamente as questões ambientais pelos seus instrumentos e
Fórum Internacional do Meio Ambiente - A conferência da Terra 102

variadas mídias como, contribuído para a construção e solidificação de uma nova especialização
comum a EA e a CA que se denomina Educomunicação Ambiental. TRAJBER (2005, p. 152)
afirma que:
“..a educomunicação pode ajudar a enfrentar o desafio de construir uma sociedade
brasileira educada e educomunicando ambientalmente para a sustentabilidade,
promovendo mudanças que permeiem o cotidiano de todas as pessoas. Para tal, trata-se
de ocupar espaços comunicativos que potencializem a voz de educadoras e educadores
ambientais, por intermédio do uso de veículos de mídia”

SCHMIDT (2004) reforça a importância da mídia não só para a discussão de temas


ambientais como para acelerar esse processo. Por exemplo, a televisão opera como um catalisador
entre as questões ambientais e o público, pois enquanto ela inclui na sua agenda de notícias as
questões ambientais, o público também o faz. Desse modo, o tema ambiental passa a fazer parte do
cotidiano das pessoas, fazendo com que o público tanto pense sobre o tema como também o que e
como pensar a questão.
A Educomunicação Ambiental tem sido considerada uma área tão importante pela
coletividade de educadores e comunicadores ambientais que foi criada a Rede Brasileira de
Educomunicação Ambiental (REBECA) que vem realizando eventos para debater os problemas do
tema. Alguns poucos autores vem estudando os fenômenos da educomunicação ambiental brasileira
como CAMPOS (2006) e MIRANDA (2006). CAVEDON et al. (2004) ao estudarem uma
comunidade escolar gaúcha determinaram que cerca de 65% dos alunos encontram informações
sobre ambiente na TV e não na sua escola, reforçando o argumento que a escola não cumpre seu
papel como difusora da questão ambiental.
AGUIAR (2003) afirma que a mídia é parte dinâmica do processo atual de expansão
capitalista, carregando uma contradição intrínseca, pois se apresenta como ator social idealista
comprometido com a verdade, pluralidade e interesse público, mas depende para sua sobrevivência
de publicidade que estimula o individualismo e consumismo desenfreado. O progresso
materializado consome toneladas de papel que custam milhares de árvores e estimulam modismos
que sustentam o consumismo cada vez mais veloz..
A Educação Ambiental (EA) vem sendo timidamente apoiada em todo o mundo,
principalmente nos mais expropriados onde seus recursos ambientais são dilacerados
irreversivelmente. O Brasil era um desses exemplos. Nos últimos governos federais nosso país criou
sua Política Nacional de EA (PNEA) e a regulamentou e mesmo com suas incoerências técnicas (cf.
PEDRINI, 2004) é um avanço inestimável.
A aprovação da PNEA ensejou a criação de políticas estaduais e municipais,
proporcionando um efeito de “bola de neve” no território brasileiro. Apesar disso, as restritas
avaliações que são feitas quanto a eficácia da EA no Brasil (PEDRINI e JUSTEN, 2006), sugerem
que ela apenas sensibiliza e informa o cidadão nos diferentes contextos que ele vive. Porém, a
EASS sendo um processo pedagógico, demora a dar resultados a curto prazo, mas continua sendo a
grande esperança para a mudança de hábitos, posturas e condutas humanas.
O Programa Nacional de EA (ProNEA) construído com múltiplas mãos da maioria dos
confins brasileiros trouxe grandes avanços. O ProNEA adotou a base conceitual do Tratado de
Educação Ambiental para Sociedades Sustentáveis e Responsabilidade Global (TEASS). Traçou
planos de ação e metas para variados atores sociais e contextos onde a Educação Ambiental para
Sociedades Sustentáveis e Responsabilidade Global (EASS) deve ser assumida e praticada.
DEBONI (2008) foi o primeiro no contexto brasileiro a fazer uma reflexão sobre a questão
das mudanças globais (também centrado no AG) e a EA. Ele apresenta uma série de conjecturas
sobre a EA e a mídia, propondo aos educadores ambientais: a) aprofundar o tema em termos
teórico-conceituais não se limitando a repetir o que é visto na TV ou em filmes como “Uma
Verdade Inconveniente”, que tem um caráter visivelmente de autopromoção do Al Gore, devendo
explorar profundamente a questão do AG; b) questionar urgentemente abordagens pragmáticas e
propor soluções mais pensadas e de longo prazo; c) buscar um pacto articulado em diferentes níveis
Fórum Internacional do Meio Ambiente - A conferência da Terra 103

espaço-temporais, potencializando a EA; d) avaliar se a EA brasileira está contribuindo para a


solução do AG; e) onde e como a questão das mudanças climáticas está sendo trabalhada no país; f)
identificar o montante de recursos financeiros aplicados pelo Brasil para a questão do AG; g) há
educadores ambientais capacitados para abordar com eficácia o AG?; h) o que os variados atores
sociais estão fazendo para enfrentar e solucionar essa questão no Brasil? Desse modo, Deboni
convida a todos para o aprofundamento desse seríssimo problema ambiental no contexto dos
educadores ambientais brasileiros.
A EASS já é uma realidade buscada por muitos educadores ambientais brasileiros em
particular professores de todos os níveis, sendo adotadas dezenas de estratégias de ensino
específicas para cada uma das disciplinas ministradas. No caso do ensino de línguas, como o Inglês,
pouco se conhece sobre experiências feitas na área da EASS. Desse modo, o presente trabalho
tenciona apresentar uma experiência em sala de aula no Ensino Médio público do estado do Rio de
Janeiro, adotando-se um filme documentário sobre os efeitos do aquecimento Global.

METODOLOGIA
O trabalho foi feito em três momentos em seis turmas de primeiro e segundo anos do
Ensino Médio. No primeiro momento foi comunicado aos alunos que seria exibido uma síntese de
cerca de 40 minutos do vídeo-documentário sobre os efeitos do Aquecimento Global (AG) da Terra.
Esse filme é intitulado “Uma Verdade Inconveniente (An Inconvenient Truth) apresentado pelo ex-
vice-presidente norte-americano Al Gore. Ao final do vídeo foi apresentada a música-tema
intitulada “ I need to wake up” cantada por Melissa Etheridge. Antes da exibição os alunos foram
orientados a: a) anotar palavras chave em inglês usadas no filme, como expressões idiomáticas e
palavras desconhecidas; b) pontuassem que assuntos os atingissem diretamente ou que fossem
temas que jamais eles tivessem ouvido falar.
Foi feita a projeção de uma parte do filme inserido após ele ter sido concluído
apresentando os seus efeitos nos EUA, visando sensibilizar o alunado para a questão ambiental e
informá-los sobre os efeitos do AG. Não foi exibido todo o filme, pois ele ultrapassaria o tempo
regular da aula de inglês. Essa parte do documentário aborda os seguintes temas: Furacões,
Temperatura Global, Acidificação dos Oceanos, Crescimento Populacional, Terremotos Glaciais,
Incêndios Florestais, Solo Desertificado e Derretimento do Solo Congelado.
Encerrada a projeção, os alunos foram orientados a formarem grupos de 6-7 componentes
para exporem e debaterem entre si suas opiniões sobre o filme. Além disso, relatassem as questões
ambientais que eles conheciam nas suas comunidades. Os temas acima expostos foram sorteados
entre os grupos. Durante o debate a problemática ambiental foi discutida intensamente e ao final,
um aluno-relator de cada grupo expôs as conclusões do seu grupo.
Encerradas as apresentações, o professor apresentou no quadro alguns sites (sítios)
relacionados com a questão ambiental (vide abaixo) para que os alunos, em casa ou no Laboratório
de Informática da escola aumentassem o seu conhecimento sobre a questão ambiental e sobre o
tema de seu grupo. O trabalho em casa foi o segundo momento da atividade.

Sítios:
www.avaaz.org.com
www.google.com
www.greenpeace.org.br
www.liveearth.com
www.wwf.org.br

O terceiro momento foi realizado cerca de 30 dias após o primeiro numa aula em que cada
grupo entregou um resumo do seu tema ao professor. Eles podiam escolher livremente se
entregavam o texto em português ou em inglês, mencionando as causas, conseqüências, locais onde
ocorrem os problemas ambientais e possíveis soluções. Após a entrega do texto apresentaram
cartazes confeccionados por eles próprios com fotos e legendas em inglês sobre o tema da pesquisa
Fórum Internacional do Meio Ambiente - A conferência da Terra 104

feita na Internet e na sua comunidade. Os cartazes foram afixados e expostos pelos corredores da
escola até o final do ano letivo.

RESULTADOS
A experiência permitiu mostrar que os alunos sentiram-se motivados e envolvidos pela
questão ambiental e receberam informações atualizadas sobre o AG e seus efeitos sobre o ambiente.
A mudança de postura frente aos problemas ambientais foi identificada na maioria dos alunos,
sendo que um deles teve uma mudança radical frente a essa questão. Após a atividade, ele se
mobilizou a difundir os problemas ambientais em sua comunidade, alertando as pessoas sobre os
efeitos iminentes do AG.
Percebeu-se também, em cada um, o respeito a todas as formas de vida do planeta. Foram
observadas conexões com outras disciplinas, integrando diferentes saberes, unindo as Ciências
através da Língua Inglesa. Por exemplo, no caso da Biologia verificou-se o impacto da poluição nos
organismos. Na Química, conhecendo os agentes químicos poluidores e suas respectivas fórmulas
moleculares. Na Geografia, identificando os locais onde ocorre maior incidência de desastres
ambientais e de variadas formas de degradação e poluição.
Esse trabalho também possibilitou o trabalho pedagógico com a própria Língua Inglesa,
através da identificação de vocábulos novos, do encontro de termos técnicos em Inglês e da
descoberta de expressões idiomáticas usadas em pesquisas na área ambiental. Integrando todo o
conhecimento acumulado foi possível formular os seus resumos e os cartazes usados na
apresentação do Seminário.
Os alunos conseguiram adquirir conhecimentos relativos aos graves problemas ambientais
pelos quais o nosso planeta vem passando, através da pesquisa em sites, leitura de revistas, jornais e
periódicos, onde eles puderam se inteirar de tais questões, refletir sobre suas causas e a gravidade e
extensão de suas conseqüências.Através de debates em sala de aula, tentaram chegar a possíveis
soluções,cada um participando de forma efetiva,colaborando com idéias, sugestões e mesmo
citando suas próprias experiências,vividas em suas comunidades. Considerando e respeitando as
diferentes formas de vida do planeta, analisaram, também, o impacto causado nelas pelo desrespeito
à mãe natureza, agredindo-a com a poluição de suas águas, seu solo e atmosfera. Então,
conseguiram promover em seu círculo comunitário o despertamento e a sensibilização para essas
questões e a conscientização de outros grupos afins, através de conversas informais com vizinhos,
amigos, colegas de outras turmas, familiares e conhecidos de lugares onde freqüentam.

CONSIDERAÇÕES FINAIS
A educomunicação através de suas diferentes formas de se expressar pode colaborar
efusivamente para a compreensão da questão ambiental. A adoção do vídeo Uma Verdade
Inconveniente, mostrou ser uma estratégia adequada e motivadora para a sensibilização e
compreensão da questão ambiental através do ensino de inglês. Possibilitou também uma prática
interdisciplinar entre diferentes conteúdos disciplinares, mesmo sem a participação de seus
docentes. A língua inglesa, sendo a língua com maior penetração internacional, possibilitou o
ensino da EA de modo transversal como preconiza a Política Nacional de EA.

BIBLIOGRAFIA CITADA
CAMPOS, P. C. Jornalismo e Meio Ambiente (O papel social da mídia na conscientização). Revista
Digital Comunicação em Agribusiness e Meio Ambiente, v. 3, n. 4,
2006(http://www.agricoma.com.br/rev4_artigoPedroCelsoCampos.htm; acesso em: 24.02.2008)
CAVEDON, C C.; ASMUS, G. F. ; VILAR, K. de S. P.; SANTOS, L. G. As múltiplas concepções
de EA em uma comunidade escolar. In: KINDEL, E. A. I.; SILVA, F. W da; SAMMARCO, Y. M.
(Org.) Educação Ambiental; vários olhares e várias práticas. Porto Alegre: Mediação, 2004, p. 65-
69.
Fórum Internacional do Meio Ambiente - A conferência da Terra 105

DEBONI, F. E a Educação Ambiental frente às mudanças climáticas: organizar ou desorganizar?


Notícias da América Latina e Caribe, 25 de fevereiro de 2008. (disponível em:
http://www.adital.com.br/site/noticia.asp?lang=PT&cod=26284; acesso em: 28.02.2008)
LOPES, S. A. Formação da cidadania: comunicação e informação da sociedade. In: LOUREIRO, C.
F. B. Cidadania e Meio Ambiente. Salvador: NEAMA, 2003, p. 132-163.
MIRANDA, A. S. de. O Jornal Escolar e a Educação Problematizadora: vislumbrando uma
aproximação. UNIrevista, v.l. 1, n. 3, p.1-9, 2006.
PEDRINI, A de G.; JUSTEN, L. Avaliação em EA no contexto ibero-americano; estudo
exploratório. In: CONGRESSO IBERO-AMERICANO DE EDUCAÇÃO AMBIENTAL, 5.,
Anais..., 2006.
PEDRINI, A. de G. Mudanças globais e a educação ambiental para a construção de sociedades
sustentáveis. In: CONFERÊNCIA DA TERRA, 1., Anais..., maio de 2008, 12 p.
PEDRINI, A. de G. As Políticas Públicas Nacionais com Educação Ambiental no Brasil: evolução
e perspectivas. (traduzido do inglês). In: AZEITEIRO, U., GONÇALVES, F, LEAL, W.,
MORGADO, F.; PEREIRA, M (Eds.) World Trends in Environmental Education. Inglaterra, Peter
Lang Ed, 2004.
SCHMIDT, L. Environmental Education – the Media and the fashion. In: AZEITEIRO, U.,
GONÇALVES, F, LEAL, W., MORGADO, F.; PEREIRA, M (Eds.) World Trends in
Environmental Education. Inglaterra, Peter Lang Ed, 2004, p. 195-224.
TRAJBER, R. Educomunicação para coletivos educadores. In: FERRARO JUNIOR, L. (Org.)
Encontros e caminhos: formação de educadoras (es) ambientais e coletivos educadores. Brasília:
MMA, 2005, p. 151-158.
Fórum Internacional do Meio Ambiente - A conferência da Terra 106

MUDANÇAS CLIMÁTICAS - GLOBAL WARNING: UM PROJETO DE CIÊNCIA E ARTE


NA ESCOLA PARQUE

Luciana SALLES
Pedagoga, Professora de Informática e Ciência e Arte – Escola Parque – Barra, Rio de Janeiro.
lucianasalles@escolaparque.g12.br
Giovanni SANTOS
Mestre em Educação. Professor de Física da Escola Parque – Gávea, Rio de Janeiro. giovanni@escolaparque.g12.br
Sância VELLOSO
Bióloga - Professora de Ciências – Escola Parque – Barra, Rio de Janeiro. sancia@escolaparque.g12.br
Rua Marquês de São Vicente, 355 – Gávea - Rio de Janeiro, RJ.
Rua Pedra de Itaúna, 111 – Barra da Tijuca - Rio de Janeiro, RJ.

RESUMO
O presente trabalho tem como objetivo apresentar o Projeto “Global Warning – Alerta
Global”, desenvolvido em conjunto pela Escola Parque, uma escola brasileira que atende alunos dos
dois aos 17 anos, junto com o Cape Farewell, uma ONG Britânica que desenvolve expedições ao
Ártico com o interesse de estudar as mudanças climáticas e com o British Council, órgão do
Governo Britânico que implementa em mais de cem países ações relacionadas com educação,
cultura e direitos humanos. O trabalho, que é uma oportunidade de aprender acerca da ciência da
mudança climática e comunicar a importância desse estudo através da arte, agrupa
aproximadamente 40 jovens da Escola Parque, dos quais dois irão ao Ártico para, in loco, visualizar
as mudanças climáticas, trocando com o grupo restante, de base, no Brasil, apoio para as suas
pesquisas. Após a viagem, a pesquisa será divulgada para toda a comunidade escolar, para compor,
de forma importante, a agenda ambiental da escola e, do mesmo modo, favorecer ações futuras cada
vez mais cotidianas.

ABSTRACT
This paper has the purpose to present the “Global Warning – Alerta Global” project, a
developed by Escola Parque with Cape Farewell and British Council. Escola Parque is a brazilian
school who attends children and youth from two to seventeen years, Cape Farewell is a british NGO
that develops expeditions to Arctic with the aim to study climate change and British Council, a UK
government organization with more than a hundred offices all over the world that develops actions
and studies about education, culture and human rights. The partnership, that becomes an
opportunity to learn about climate change science and shows its study by the art appeal, joins about
forty students of Escola Parque, and two of them will go to the Arctic to see, in loco, the climate
changes, doing the exchange with the remaining group the research support. After the expedition,
the research will be released to the school community, to make, at important point, the enviromental
agenda of the school and, as well, improve actions to the future.

A Escola Parque, em seus 37 anos de existência, se notabiliza como espaço de produção de


conhecimento, em que as Ciências Naturais têm papel de destaque. Em um universo no qual a
maior parte das escolas, públicas e privadas, fundamenta seus programas em livros didáticos que
pouco se modificaram nos últimos 50 anos, a Escola Parque é um espaço de reflexão sobre o ensino
de ciências, buscando a inovação e visando despertar no aluno um interesse cada vez maior pelo
conhecimento. O cotidiano escolar da instituição privilegia a discussão contínua de programas e
conteúdos pela equipe pedagógica e, especificamente no ensino de ciências, o uso de ferramentas de
experimentação e informática, junto aos alunos. E a partir deste mesmo cotidiano, ao longo de sua
história, a escola implementou uma série de projetos, os quais se tornaram atividades fixas em seu
calendário anual.
O Projeto Eco se realiza, anualmente, desde 1992 para alunos com idade entre 2 e 10 anos.
Tem como seu maior objetivo ressaltar a importância do cuidado com o ambiente. Os temas dos
Fórum Internacional do Meio Ambiente - A conferência da Terra 107

projetos a serem realizados são definidos pela equipe pedagógica e professores no início de cada
ano.

I- II -
Mural explicativo do Evento Ensino Fundamental I – estudo do som

III -
Ensino Fundamental I estudo do clima

A Semana de Cultura, Ciência e Cidadania, de realização anual, é voltada para alunos entre
11 e 17 anos, que possui, além do objetivo já manifestado pelo Projeto Eco, a apresentação de
resultado dos projetos desenvolvidos ao longo do ano em cada uma das diferentes áreas de
conhecimento. Este evento acontece desde 1995.

IV - V-
Ensino Médio – Línguas e Música Ensino Fundamental II – Casa Ecológica

Desde 2005, a escola participa de eventos de divulgação científica como Semana Nacional
de Ciência e Tecnologia, Mostras de Trabalho na Fundação Oswaldo Cruz e Congressos. Tais
iniciativas contam com a participação de professores e alunos na apresentação de trabalhos ligados
à área de ciências em espaço público e em escolas públicas de comunidades carentes próximas à
Escola.
Ao final de 2005, foi implantada uma disciplina chamada “Ciência e Arte”, fruto de
criação coletiva de professores e coordenação da Escola. É um projeto de caráter transdisciplinar,
que envolve áreas diversas como Física, Robótica, Artes, Biologia, Matemática, Teatro, Geografia,
Química, Redação, Fotografia, Literatura, Grafite e Pintura em discussões de conceitos científicos
reconhecendo e valorizando a importância da imaginação na descoberta científica e na reflexão dos
conceitos discutidos e, de forma análoga, na divulgação da Ciência. Apesar de ser um projeto
recente, em comparação com os vários anos de existência dos anteriormente citados, seu êxito como
iniciativa de busca pelo aumento do interesse pela área de Ciências Naturais e de sua utilização
Fórum Internacional do Meio Ambiente - A conferência da Terra 108

como ferramenta para interação dos mais variados ramos do conhecimento abriu espaço para
parcerias com Museu da Vida - Fiocruz e British Council.
Em 2007 foi iniciado o “Papo Científico”, uma série de palestras de cientistas e professores
da área de Ciências Naturais, apresentadas mensalmente, com o intuito de mostrar um pouco da
Ciência produzida pelos institutos de pesquisa, como também a inserção do objeto de estudo do
profissional no dia-a-dia, mesmo que isso, de acordo com o tema, pareça muito distante da
realidade. Nos últimos dois anos, as palestras do projeto “De Olho no Clima”, do British Council,
foram parte ativa do “Papo Científico”.
Em 2008, ampliamos o Projeto Ciência e Arte, inserindo novas ferramentas e linguagens.
Desenho, Animação, Cinema, Arte Sonora, Música, Teatro, Genética, Projetos Sustentáveis e
Mudanças Climáticas são novos elementos geradores para a integração dos dois ramos do
conhecimento. O objetivo é criar novas oportunidades e lançar novos desafios, fomentando
discussões acerca de temas atuais e tão necessários para esses jovens. Essa proposta tem como
resultado a criação de diversos produtos, que são expostos pelas áreas comuns da escola e
apresentados em eventos.

VI - VII
Projeto Ciência e Arte - Animação Projeto Ciência e Arte – Genética e
Evolução
Em janeiro deste ano, a Escola Parque recebeu um convite do British Council para
participar, do Projeto Cape Farewell, que traz como tema Mudanças Climáticas.
O projeto Cape Farewell, fruto da imaginação do artista britânico David Buckland,
conduziu quatro bem sucedidas expedições ao Ártico, sendo que a última, em setembro de 2007,
artistas e cientistas, membros do Cape Farewell Project, orientaram alunos de ensino médio em
seus projetos que relacionavam Ciência e Arte. Este projeto é desenvolvido em parceria com o
British Council e visa a divulgação de questões geradas pela discussão sobre o aquecimento global
e suas conseqüências no clima, com desenvolvimento de uma mentalidade planetária nos jovens
participantes, ou seja, que a concepção de deixarmos um planeta melhor do que aquele que
encontramos.
O Ártico é um dos locais do planeta no qual os impactos das mudanças no clima são mais
preocupantes e seus desdobramentos determinam modificações em todo o mundo. Esta expedição
será uma oportunidade para os jovens, matriculados em escolas de ensino médio, aprenderem um
pouco mais sobre as mudanças climáticas e para nós, brasileiros, comparar eventos relativos à
realidade brasileira a universo bastante distante de todos nós, com condições bastante
desconhecidas.
O trabalho com o Cape Farewell se tornou um gerador de ações cotidianas, no qual os
professores de cada escola participante obtiveram um incentivo a mais no estudo das Mudanças
Climáticas, em qualquer disciplina.
A próxima expedição,em setembro de 2008, contará com jovens do Canadá, do Brasil e do
México e a Escola Parque, única representante brasileira, participará enviando dois alunos. Assim,
desde janeiro de 2008, a escola está estruturando e implantando a discussão, de forma mais efetiva,
sobre Mudanças Climáticas em todos os seus segmentos, envolvendo alunos, professores,
funcionários, coordenação e direção. Deste modo, este novo projeto, desenvolvido pela escola, em
Fórum Internacional do Meio Ambiente - A conferência da Terra 109

parceria com o Cape Farewell e o British Council, recebeu o nome de Global Warning – Alerta
Global, nome democraticamente escolhido pelos alunos.
A Escola Parque, de forma análoga, está desenvolvendo o projeto Global Warning – Alerta
Global com o objetivo de integrar a temática de Mudanças Climáticas aos projetos pedagógicos e
sociais que a instituição desenvolve. O projeto, dentro do tema específico Mudanças Climáticas, irá
desenvolver pesquisas, no nível de alunos de ensino médio, nas áreas de oceanografia e
climatologia, sub-temas escolhidos pelos estudantes da Escola Parque. Do mesmo modo, uma ação
local, seja dentro da escola, como também na comunidade do Parque da Cidade, favela que está nas
cercanias da escola, será desenvolvida, neste último caso, junto aos moradores do local.

VIII - IX -
Divulgação do Projeto nas turmas de Divulgação do Projeto nas turmas de
Educação Fundamental I Educação Fundamental I - Discutindo sobre
Mudanças Climáticas
A fim de divulgar o projeto, no que ele tem de objetivo geral, ou seja, ressaltar a
conscientização sobre as mudanças climáticas que acontecem em nosso planeta, os alunos da Escola
Parque buscarão apresentar o projeto Global Warning e o trabalho gerado a partir dele em eventos
ligados ao jovem e à ciência, como por exemplo, a SBPC Jovem.
Contudo, a ferramenta mais importante para mostrar, de forma mais clara, tudo o que será
desenvolvido durante a atividade, é a arte. Conceitualmente, podemos dizer que é mais uma forma
de mostrar o quão lúdico pode ser o trabalho com a Ciência.
O projeto Global Warning está em plena ação. Para mostrar isto de forma mais clara,
seguem algumas informações desenvolvidas junto aos nossos alunos,

PLANEJAMENTO E AÇÕES DO PROJETO


Os alunos estão desenvolvendo estudos interdisciplinares, com temas que envolvem várias
áreas de conteúdo curricular.
O planejamento engloba ações locais e globais, que serão iniciadas em abril, seguindo o
cronograma do British Council
O planejamento tem como objetivo difundir os temas com jovens da escola pública mais
próxima, com a comunidade de moradores da favela do Parque da Cidade e com toda a comunidade
escolar.
Em fevereiro de 2008, três professores, os autores do presente trabalho, participaram de um
workshop no Canadá, que teve como objetivo a apresentação do projeto por parte do Cape Farewel
e do British Council do Canadá.
Em março de 2008, o projeto foi apresentado a todos os alunos do Ensino Médio. Um
quantitativo de quarenta alunos, número limite de alunos para participação, se inscreveram.
Os professores e alunos engajados no projeto contam com:
- sala ambiente / materiais específicos / mapas / livros, jornais e revistas / tecnologia
computacional / ferramentas de comunicação visual / vídeos e documentários/ palestras e
seminários / conferências / participação em outros projetos de meio ambiente e cidadania. Além da
estrutura física, contamos também com ambientes virtuais de aprendizagem e comunicação como o
Moodle e Multiply, que representam o espaço de decisões, discussões e reflexões via rede,
Fórum Internacional do Meio Ambiente - A conferência da Terra 110

complementando nossos encontros presenciais, além de promover brilhantemente o entrosamento


do grupo em atividades que inclui comentários e análises de fotos, vídeos e entrevistas.
7- os professores de todas as áreas de estudo lidam com os temas escolhidos.
8- a escolha dos dois jovens que irão ao Ártico, em setembro, em um navio de
pesquisas, junto com cientistas e artistas, será feita por integrantes do Cape Farewell, via vídeo
postado no YouTube, site na internet que permite que seus usuários carreguem, assistam e
compartilhem vídeos em formato digital e hospeda uma grande variedade de filmes, video-clipes e
materiais caseiros.
9- o grupo que fica no Brasil participa do preparo e apóia os selecionados. Continuam
como “equipe de terra”, desenvolvendo o trabalho com a comunidade local e em contato
permanente com os colegas ‘embarcados’.
10– na volta, todos ajudarão a difundir as preocupações e as ações necessárias para
lidar, no nosso pequeno universo, com o aquecimento global e as mudanças climáticas.

Organização dos alunos:


Durante os primeiros encontros com o grupo, levantamos temas e questões trazidas, pelo
grupo de alunos, se mostraram como primeiras possibilidades de pesquisa. São elas:

Climatologia
- O aquecimento global é resultado da ação humana?
- Existe possibilidade de reversão do quadro atual referente ao meio ambiente?
- Apesar da maior parte da pesquisas indicarem apenas fatores desfavoráveis frente às
mudanças climáticas, existem ecossistemas que seriam favorecidos por tais fenômenos?
- E, da mesma forma, que sociedades seriam beneficiadas?
- Quais são as influências do aumento do carbono nos fenômenos meteorológicos?
- Qual é a definição de deserto?
- Qual é a incidência de neve no Ártico?
- Como é o ciclo da chuva no Ártico? Ele existe?
- Que novas configurações geofísicas apareceram a partir do aquecimento global?
- Qual tempo levaria para o degelo total do Ártico?
- Quais são as conseqüências diretas do aquecimento global ao ecossistema?
- A partir dos fenômenos relativos ao aquecimento global, surgiram novas doenças?

Alguns tópicos sugeridos para discussão dentro deste tema:


- os povos habitantes da região
- as leis que regem a questão ambiental na região
- a capacidade de adaptação das espécies às mudanças na região
- Emissão de Carbono.

Oceanografia
- Como o aquecimento global vem influenciando as correntes marítimas?
- Que regiões foram afetadas pelo degelo do pólo norte?
- Houve aumento relativo do nível do mar?
- Quais são as influências da mudança de temperatura nas correntes marítimas?
- Alguns tópicos:
- Plâncton
- Magnetismo terrestre
- Comparação com o continente antártico.
- Qual é a relação entre salinidade e vida?
- Que espécies da flora estariam mais adaptadas? Que espécies se adaptam a tais condições
para se manterem vivas?
Fórum Internacional do Meio Ambiente - A conferência da Terra 111

X- XI -
Encontro do grupo Gobal Warning com Debate com o grupo Global Warning
filmagem

XII-
Primeira Logo proposta pelo grupo

O Global Warning se mostra como um projeto ainda mais interessante pela oportunidade
de montarmos projetos colaborativos com as equipes de professores e alunos do Canadá e do
México, Especificamente no caso deste último, o British Council Brasil sugeriu a possibilidade de
fazermos um projeto colaborativo, no qual teremos algum tema de pesquisa comum ou
complementar. Ao fim deste, produziremos um documento, em português, inglês e espanhol, sobre
o trabalho.
A oportunidade de enviar alunos em uma missão exploratória para uma região que pouco
conhecemos e ter a chance de comparar estudos sobre o nosso meio-ambiente com este lugar tão
distante de nossa realidade, é uma excelente oportunidade para desenvolver um projeto anual além
da possibilidade de trocar informações sobre educação, escola e os projetos de ensino de ciências.
Na verdade, o que se revela é um elemento essencial para uma mudança de paradigma diante da
questão ambiental.

REFERÊNCIAS BIBLIOGRÁFICAS
ARAÚJO-JORGE, Tânia C de (org.). Ciência e Arte – Encontros e Sintomas. Rio de Janeiro.
Senac-rio, 2004.
CIÊNCIA E ARTE 2006: Memórias do Simpósio. 2006, Rio de Janeiro. Museu da Vida/Casa de
Oswaldo Cruz/Fiocruz, 2007. Pág. 63.
DOW, Kirstin; DOWNING, Thomas – O atlas das Mudanças Climáticas, o mapeamento do maior
desafio do Planeta. Publifolha, São Paulo, 2007.
HISTÓRIA, CIÊNCIAS, SAÚDE: Diálogo entre Ciência e Arte: Manguinhos. – v.13. Fundação
Oswaldo Cruz/Casa de Oswaldo Cruz/Fiocruz, 2006.
TRIGUEIRO, André. Meio Ambiente no Século 21. Rio de Janeiro: Ed. Sextante, 2003.
___________, André. Mundo Sustentável: abrindo espaço na mídia para um planeta em
transformação. Globo, São Paulo, 2005.
Fórum Internacional do Meio Ambiente - A conferência da Terra 112

USO DE INTERPOLADORES NA ELABORAÇÃO DE MAPAS DE TEMPERATURA DE


SOLO NAS PRAIAS DO BESSA E INTERMARES - PB, VISANDO SUBSIDIAR ESTUDOS
SOBRE DESOVA DE TARTARUGAS MARINHAS

Sarah Golzio dos Santos


Curso Superior de Geoprocessamento – CEFET-PB. Av. 1º de Maio , 720, Jaguaribe, CEP 58015-430 João Pessoa-PB.
sarahgolzio@yahoo.com.br
Leonardo Figueiredo de Meneses
Geógrafo; Mestre em Engenharia Urbana - UFPB, Av. Francisco Moura, 167 – apt 103 – João Pessoa-PB – CEP:
58.025-650 – lfmeneses@hotmail.com
Rita Mascarenhas
Bióloga; Doutora em Biologia – UFPB, Cidade Universitária, s/n – Universidade Federal da Paraíba CAMPUS I –
Departamento de Sistemática e Ecologia – João Pessoa-PB – CEP: 58000-900 – rita.mascarenhas@gmail.com

RESUMO
A vida na Terra depende de um conjunto complexo de condições físicas, químicas e
biológicas. A ação humana tem influenciado alterações nas condições naturais do meio, afetando
diretamente a biodiversidade da fauna e flora. Neste sentido, o presente trabalho tem por objetivo
avaliar os métodos de interpolação espacial disponíveis no software SPRING para determinar
aquele que apresenta o melhor desempenho na elaboração de Modelos Numéricos de Elevação para
o tema temperatura do solo. Os MNE da temperatura do solo deverão subsidiar estudos
relacionados com a proteção e conservação das tartarugas marinhas no litoral da Paraíba – Brasil.
Palavras-Chave: Interpolação espacial, Modelo Digital de Elevação, tartarugas marinhas.

ABSTRACT
Life on Earth depends on a complex set of physical, chemical and biological conditions.
The human action has influenced changes in natural conditions of the medium, directly affecting the
animal and plant biodiversity. The present study aims to evaluate the methods of spatial
interpolation available in SPRING to determine who offers the best performance in the preparation
of Digital Elevation Model to the theme temperature of the soil. The DEM of temperature of the soil
should subsidize studies related to the protection and conservation of marine turtles on coast of
Paraíba – Brazil.
Keywords: Spatial interpolation, Digital Elevation Model, marine turtle

INTRODUÇÃO
Uma das características marcantes da nova conjuntura geopolítica global é a emergente
crise ambiental (BECKER, 1995 apud FERNANDES 2005). De acordo com SOARES (2001):
“a manutenção da qualidade ambiental está diretamente relacionada ao conhecimento e
controle das variáveis que interferem no problema, sejam elas resultantes das ações do
homem sobre o ambiente ou de suas transformações naturais. Este conhecimento sobre o
meio ambiente pode ser obtido através de monitoramento e, a eficácia do monitoramento
depende em especial de um projeto e operação adequados do sistema de informações,
que é constituído pela aquisição, manipulação, análise e utilização da informação
obtida”.

Neste sentido o Geoprocessamento vem experimentando rápida ascensão e grande


importância no contexto tecnológico, científico e comercial por conta da premissa de que a
informação organizada de forma correta, e disponível de forma ágil, é indispensável na realização
de análises, planejamento e tomada de decisões. Os ambientes de geoprocessamento disponibilizam
valiosas ferramentas para aplicações em atividades e processos que lidam com recursos
geograficamente distribuídos (CÂMARA et al, 2000).
O conjunto de tecnologias de coleta, tratamento, manipulação e apresentação de
informações espaciais envolvidos nos projetos de Geoprocessamento, permitem a investigação
detalhada de relacionamentos entre entidades pertencentes a um ambiente. No caso de estudos
Fórum Internacional do Meio Ambiente - A conferência da Terra 113

relacionados com monitoramento de fauna, tais tecnologias propiciam a realização de análises


espaciais entre a entidade e eventos biológicos, permitindo assim verificar possíveis correlações
entre o meio e a espécie.
Nesse contexto, o presente trabalho visa proporcionar a criação de um cenário prospectivo,
para subsidiar estudos relacionados à preservação das tartarugas marinhas, através da inferência de
oscilações da temperatura do solo nos locais de desova das mesmas. A importância de se estudar
esta variável reside no fato da mesma influenciar na determinação do sexo e desenvolvimento do
embrião das tartarugas-de-pente, espécie alvo desta pesquisa.
Os resultados da pesquisa servirão de base para os estudos que vêm sendo realizados pela
Organização Não-Governamental Guajiru, cuja sede encontra-se no município de Cabedelo – PB, e
que vem desenvolvendo, desde o ano de 2002, o monitoramento da espécie Eretmochelys imbricata
(tartaruga-de-pente), nas praias de Intermares e Bessa, situadas, respectivamente, nos municípios de
Cabedelo e João Pessoa – PB.

DESCRIÇÃO DA ÁREA DE ESTUDO


A área escolhida para o desenvolvimento da presente pesquisa situa-se no litoral
Paraibano, entre as praias de Intermares e do Bessa, localizadas respectivamente nas cidades de
Cabedelo e João Pessoa. Tal escolha se deve pelo fato da disponibilidade de dados sobre a variável
em estudo (temperatura do solo) para esta região.
As coordenadas UTM delimitadoras da área de estudo são as seguintes: 297008.3260 m E,
9218458.3970 m N; 297570.5960 m E, 9222211.9050 m N (Figura 1), todas no fuso 25. O clima da
região é do tipo intertropical, quente e úmido, com médias pluviométricas de cerca de 1.800 mm/
ano e com temperaturas médias de 28º C, tendo oscilações de 22º C a 30º C (SETUR 2008).

Figura 1- Localização da área de estudo

PROCEDIMENTOS PARA A ELABORAÇÃO DOS MAPAS TEMÁTICOS


Para a elaboração do trabalho foram cedidas pela ONG Guajiru as informações referentes
às amostras de temperaturas do solo dos anos de 2006 e 2007, com suas respectivas localizações e
caracterizações fisiográficas, além de dados sobre desovas e eclosão dos ninhos.
A fase inicial do trabalho foi composta pelo desenvolvimento de um banco de dados
geográfico, seguindo o modelo relacional, para o armazenamento e manipulação dos objetos
espaciais. Utilizou-se, para a criação deste banco de dados, o módulo PostGIS, do software
Postgres, tendo sido armazenadas as informações referentes à descrição dos pontos de amostragem
das temperaturas do solo e aos valores de temperaturas médias diárias do solo.
Fórum Internacional do Meio Ambiente - A conferência da Terra 114

A utilização de um banco de dados geográfico para o armazenamento das informações


possibilita a realização de consultas que facilitam o acesso aos dados, como no caso, por exemplo,
de querermos obter a média da temperatura do solo em um dado dia, com suas respectivas
descrições e localizações (Figura 2). Os resultados destas consultas podem ser exportados para um
Sistema de Informações Geográficas – SIG, de modo que nele sejam gerados mapas temáticos
diversos.

Figura 2 - Consulta para obtenção de dados específicos através do banco de dados

Após a criação do banco de dados, foram geradas algumas consultas relacionadas com
médias da temperatura do solo em épocas específicas, cujos resultados foram exportados para o
software SPRING, que é uma ferramenta de SIG com funções de processamento de imagens,
análise espacial, modelagem numérica de terreno e consulta a bancos de dados espaciais
(CÂMARA et al.,1996), desenvolvido pelo Instituto Nacional de Pesquisas – INPE, e de livre
distribuição e uso.
Após a importação dos dados das médias de temperaturas do solo para o SPRING,
utilizou-se de métodos de interpolação espacial para a geração de Modelos Numéricos de Elevação
– MNE. Um MNE é um tipo de dado matricial, que armazena dados que podem ser vistos como
elevação sobre uma superfície (MIRANDA, 2005). No SPRING, um MNE pode ser gerado a partir
de uma grade de pontos regulares ou irregulares.
Para a determinação de qual o melhor interpolador a ser utilizado, realizou-se um trabalho
de campo para coleta de amostras de temperaturas do solo que servissem de pontos de teste para os
modelos gerados. Estes pontos se localizam entre os pontos utilizados na amostragem sistemática
que a equipe da ONG Guajiru realiza diariamente.
A avaliação se deu sobre os seguintes interpoladores: Média ponderada, Média
ponderada/quadrante, Média ponderada/cota/quadrante, Vizinho mais próximo e Média simples.
Para cada um deles utilizaram-se duas grades, uma com 1 metro de resolução e outra com 50m.
Como critério para avaliação dos interpoladores, utilizou-se o Erro Quadrático Médio – EQM
(Equação 1), sendo tanto melhor o interpolador quanto menor o EQM, uma vez que, assim, teremos
uma melhor aproximação entre os valores estimados e os valores observados (PHILIP et al., 1992
apud LEITE et al, 2007).
EQM = Σ (XEST - XREAL)2 / N (1)

Onde: EQM = erro quadrático médio


XEST = valor interpolado da variável
Fórum Internacional do Meio Ambiente - A conferência da Terra 115

XREAL = valor real da variável


N= número de pontos considerados

Após a definição do melhor interpolador, realizou-se a elaboração do MNE para as


amostras diárias de temperatura. A definição da qualidade da interpolação se deu pela análise entre
os valores gerados pelo sistema em comparação com os valores observados em campo para pontos
de teste distribuídos na área de estudo.
A última etapa foi realizar o fatiamento da grade numérica das temperaturas de modo a
gerar uma imagem temática a partir do modelo. As fatias são definidas de acordo com intervalos de
cotas (ou outra variável que se esteja estudando) que são úteis para uma determinada aplicação
(CÂMARA e MEDEIROS, 1998). A efetivação da conversão de um dado numérico (MNE) para
um temático, no SPRING, deve levar em consideração que cada fatia deve ser associada a uma
classe temática previamente definida no Esquema Conceitual do Banco de Dados ativo.
A Figura 3 mostra um exemplo de uma operação de fatiamento em classes no SPRING.

Figura 3 – Fatiamento em classes no SPRING

No caso desta pesquisa, as classes foram definidas tendo como critérios as temperaturas do
solo que influenciam na determinação do sexo das tartarugas marinhas. O sexo das ninhadas é
influenciado pela temperatura de incubação dos ovos (Mrosovsky, 1980 apud Gomes et al 2006).
Temperaturas mais altas ocasionam maior proporção de fêmeas, enquanto temperaturas mais baixas
resultam em um maior número de machos (Mrosovsky, op cit; Mrosovsky e Provancha, 1992 apud
Gomes et al 2006).
Dentre a faixa transicional de temperatura (FTT), pequenas alterações em sua média no
terço médio de incubação são capazes de determinar a variação do sexo. Esta faixa varia de ninho
para ninho e de população para população entre as tartarugas, mas em média é de 1 a 3°C. Dentro
desta faixa, há um limite máximo que, se ultrapassado, haverá o nascimento de 100% de fêmeas e
um limite mínimo que, se também ultrapassado, haverá o nascimento de 100% de machos (Hamann
et al., 2003, apud GOMES et al 2006).
Segundo técnicos da ONG Guajiru, essas temperaturas variam da seguinte forma: menor
que 22.0º C - temperatura mínima letal; 22.1º C à 29.5ºC – probabilidade de nascer machos; 29.6ºC
à 30.0 ºC probabilidade de nascer machos e fêmeas; 30.1ºC à 34.0ºC probabilidade de nascer
fêmeas; maior que 34.0º C temperatura máxima letal. Assim sendo, foram definidas cinco classes
de acordo com as temperaturas de influência e geradas as imagens temáticas da temperatura do solo.
Fórum Internacional do Meio Ambiente - A conferência da Terra 116

RESULTADOS PRELIMINARES
Os procedimentos adotados e os dados geográficos utilizados permitiram a obtenção de um
MNE satisfatório para a representação espacial da temperatura do solo na área em estudo.
Apesar da necessidade de realização de estudos mais prolongados, alguns resultados já
podem ser observados a partir dos procedimentos desenvolvidos.
Em relação à seleção do interpolador mais adequado, observou-se, após a realização do
cálculo do EQM, que o interpolador Média Ponderada por Cota/ Quadrante foi o que apresentou o
melhor desempenho, uma vez que o EQM calculado para este interpolador apresentou o menor
valor dentre todos os testados (Tabela 1).

Tabela 1 - Resultado dos EQM dos interpoladores para Resolução de 1m


INTERPOLADOR EQM
media ponderada/quadrante 0.000000000037
media/ponderada/cota/quadrante 0.000000000033
media ponderada 0.000000000098
media simples 0.069734385186
vizinho mais próximo 0.000000000000

Uma vez gerado o MNE com base no interpolador selecionado, foi elaborado um mapa
temático das temperaturas do solo e com base neste mapa foi verificada a precisão do processo de
interpolação. Como dito anteriormente, esta verificação foi realizada com o apoio de pontos de
teste.
A comparação entre os valores medidos em campo e os valores calculados pelo
interpolador pode ser observada na Tabela 2.

Tabela 2 – Comparação entre valores observados para os pontos de teste e valores interpolados
Ponto Valor Interpolado Valor de Campo Erro observado
1 31.094091 31.1 0,005909
2 31.340746 31.1 0,240746
3 31.458492 31.6 0,141508
4 31.548496 31.8 0,251504
5 31.614563 31.5 0,114563

As estatísticas utilizadas, na forma do Erro Quadrático Médio, e por comparação para


análise e escolha do melhor MNE mostraram bons resultados. Os resultados apresentados na Tabela
3 indicam uma boa precisão da interpolação, uma vez que os erros ficarão próximos da precisão do
equipamento utilizado para a medição das temperaturas, que é de 0,2°C.
Como exemplo da geração dos mapas de temperaturas do solo, apresenta-se na Figura 4
um mapa temático para o dia 15 de março de 2008, onde se observou uma variação da temperatura
de 30,1ºC à 34,0ºC. A análise de uma seqüência temporal de mapas deste tipo pode auxiliar na
predição do sexo das tartarugas quando da eclosão dos ninhos. Caso as temperaturas se
mantivessem nestes intervalos durante o período de desenvolvimento embrionário, haveria grande
probabilidade de desenvolvimento de embriões fêmeas, uma vez que a temperatura é fator
determinante para a definição do sexo das tartarugas.
Assim, o presente trabalho tende a colaborar de forma eficaz para os estudos na proteção e
preservação das Tartarugas-de-pente pela ONG Guajiru.
As análises relativas à interpolação dos dados de amostragens de temperaturas do solo dos
anos de 2006 e 2007 serão realizadas em etapas futuras desse trabalho.
Fórum Internacional do Meio Ambiente - A conferência da Terra 117

Figura 4 – Mapa Temático da temperatura do solo por data

CONSIDERAÇÕES FINAIS
O trabalho, como projeto piloto da representação de temperatura do solo, adotando
ferramentas do geoprocessamento, proporciona um grande auxilio nos estudos relacionados às
tartarugas-de-pente, em especial aqueles voltados à proteção e preservação da espécie, contribuindo
para a customização de uma metodologia que propicie uma forma eficaz para realização de futuras
análises em relação ao sexo e desenvolvimento embrionário das tartarugas-de-pente.

REFERÊNCIAS BIBLIOGRÁFICAS
CÂMARA, G.; DAVIS, C. Introdução ao Geoprocessamento. in: CÂMARA, G.; Davis, C.;
Monteiro, A. M. V; Paiva, J. A.; D’Alge, J. C. L. (orgs.) Geoprocessamento: teoria e aplicações.
2000. Disponível em <http://www.dpi.inpe.br/gilberto/livro>. 5p.
CÂMARA, G.; MEDEIROS, J.S. Geoprocessamento para projetos ambientais. 2ª Edição -
Revisada e Ampliada, São José dos Campos, 1998.
CÂMARA, G.; SOUZA R.C.M.; FREITAS, U.M.; GARRIDO, J. SPRING: Integrating remote
sensing and GIS by object-oriented data modelling. Computers & Graphics, 20: (3) 395-403, May-
Jun 1996.
FERNANDES, M.C.; BRAGA, R.F.L. Disseminação de produtos do projeto sistematização de
informações de recursos naturais. Rio de Janeiro.IBGE. 2005.
GOMES, M.G.T.; SANTOS, M.R.D.; HENRY, M. Tartarugas marinhas de ocorrência no Brasil:
hábitos e aspectos da biologia da reprodução. Belo Horizonte, v.30, n.1/2, p.19-27, jan./jun. 2006.
Disponível em www.cbra.org.br.
LEITE, E.P.F.; SILVA, J.S.; GOMES, G.S. Obtenção de modelo numérico do terreno de alta
resolução utilizando o interpolador spline com tensão regularizada. Paraíba. 2007.
MIRANDA, J.I. Fundamentos de Sistemas de Informações Geográficas. Brasília, DF, EMBRAPA,
2005.
SETUR. Disponível em: http://www.joaopessoa.pb.gov.br/secretarias/setur/climaegeografia/ em
março de 2008.
SOARES, P.F. Projeto e avaliação de desempenho de redes de monitoramento de qualidade da
água utilizando o conceito de entropia. São Paulo. 2001.
Fórum Internacional do Meio Ambiente - A conferência da Terra 118

MUDANÇAS CLIMÁTICAS E VARIAÇÃO SAZONAL DA INSOLAÇÃO NA CIDADE DO


NATAL/RN

Bruno Claytton Oliveira da Silva


PRODEMA/UFRN. Brunoclaytton@yahoo.com.br
Fernando Moreira da Silva
UFRN. fmoreyra@ufrnet.br
Nivânia Ferreira Costa
UFRN. niva2006@hotmail.com

RESUMO
A presente pesquisa objetiva avaliar as mudanças climáticas e variação regional ocorridas
no município do Natal/RN pela série temporal da insolação. Os dados foram coletados por um
Heliógrafo Campbell Stokes junto a Estação Climatológica da Universidade federal do Rio Grande
do Norte para o período de 23 anos. Utilizou-se, para fins metodológicos, a estatística descritiva
(medidas de tendência central e de dispersão), distribuição Normalizada de Gauss, o intervalo de
confiança e reta dos mínimos quadrados. Os resultados parciais apontam, a partir da curva de
tendência, um aumento linear na insolação, partindo de um valor inicial de 2.695 horas no ano de
1984 a um valor final de 3.098 em 2007, ou seja, um aumento anual de 27 horas, que resulta em um
aumento diário médio de 9 minutos de insolação. Com isso, conclui-se que está havendo,
efetivamente, um decréscimo na cobertura de nuvens, propiciando um aumento no fluxo de
radiação solar global na superfície da cidade do Natal/RN.
Palavras-chave: Insolação, Mudança climática, Zona de Convergência Inter-Tropical, Anti-ciclone
Subtropical, Células de Walker.

ABSTRACT
This research aims to assess climate change and regional variation occurred in the city of
Natal/RN by the time series of sunshine. Data were collected by a Heliograph Campbel Stocks with
the Climatic Station University Federal do Rio Grande do Norte for the period of 23 years. It was
used, for methodological, descriptive statistics (measures of central tendency and dispersion),
distribution Normalized of Gauss, the confidence interval of least squares and straight. The partial
results indicate, from the curve of trend, a linear increase in the sunshine, from a baseline of 2,695
hours in the year of 1984 to a final value of 3,098 in 2007, an annual increase of 27 hours, which
results in an increase daily average of 9 minutes of sunshine. With that, it is concluded that there is,
effectively, a decrease in the coverage of clouds, providing an increase in the flow of global solar
radition on the surface of the city of Natal/RN.
Keywords: Insolation, Climate change, Zone Inter-Tropical Convergence, Anti-Subtropical
Cyclone, Walker Cells.

INTRODUÇÃO
A década de 1990 foi a mais quente desde que as primeiras medições, no fim do século
XIX, foram efetuadas. Este aumento nas décadas recentes corresponde ao aumento no uso de
combustível fóssil durante este período. Até finais do século XX, o ano de 1998 foi o mais quente
desde o início das observações meteorológicas em 1861, com +0.54ºC acima da média histórica de
1961-90. Os últimos 11 anos, 1995-2004 (com exceção de 1996) estão entre os mais quentes no
período instrumental (MMA, 2007).
Diante desse quadro, numerosos são os estudos que confirmam ter havido, nas últimas
décadas modificações nas características climáticas de várias porções do planeta. Especificamente,
na última década, em ambos os hemisférios observa-se exemplos desta afirmação: degelo e
elevação significativa do nível do mar, precipitações excepcionalmente intensas, estiagens severas
em regiões habitualmente úmidas, processos de desertificação e até ondas de calor. Tais fenômenos
têm sido interpretados com cautela pela comunidade científica como fenômenos associados,
principalmente, ao aquecimento global.
Fórum Internacional do Meio Ambiente - A conferência da Terra 119

Impactos do fenômeno El Niño e La Niña – que modulam conjuntamente uma grande parte
da variabilidade interanual do clima sobre a América do Sul – têm sido observados nas regiões do
país, mais intensamente nas regiões Norte, Nordeste (secas durante El Niño) e Sul do Brasil, que
apresenta secas durante a La Niña e excesso de chuva e enchentes durante o El Niño (MMA, 2007).
Sabe-se que a variação espacial e temporal do ângulo de incidência dos raios solares na
superfície influenciam nas suas resultantes quantitativas. No entanto, diariamente, devido à ação
antrópica, ocorrem transformações no meio através de substituição do ecossistema natural por
estruturas artificiais. Esse processo é contínuo e ocasiona impactos ambientais em vários níveis,
principalmente em relação à qualidade do ar e do clima, que representa uma diminuição na
qualidade de vida da população. Tal afirmação foi expressa Segundo o IPCC/TAR (MMA, 2007)
que considerou ser pouco provável que o aquecimento observado durante os últimos 100 anos seja
apenas conseqüência da variabilidade natural de clima, segundo as avaliações de modelos
climáticos. A principal evidência desse processo é o aumento da temperatura do ar nas cidades, que
tem atraído à atenção dos especialistas e da própria sociedade, a principal impactada pelas
conseqüências dessa mudança.
Sem dúvida alguma, como destaca Mendonça (2000), um dos mais importantes fenômenos
que contribuíram para a eclosão da questão ambiental na atualidade estão diretamente relacionados
ao clima, ou seja, à interação negativa estabelecida entre este e a sociedade.
Uma variável relevante na observação destas mudanças é a insolação, sendo designada
para representar o intervalo de tempo em que, num dado período, um ponto selecionado da
superfície terrestre permaneceu exposto à radiação solar direta, ou seja, representa o tempo – em
minutos, horas, dias, meses e/ou anos – que um local considerado no espaço esteve à descoberto.
Observa-se que, se a atmosfera terrestre fosse completamente isenta de impurezas e de água, esta
porção delimitada do espaço jamais seria ocultada por nuvens ou por certos fenômenos
meteorológicos (SUDENE, 1975). Consequentemente merece destaque a presença de compostos
químicos como a água e micro-partículas de naturezas químicas diversas e em quantidades
diferenciadas, como de impacto direto no comportamento da insolação.
A variável está diretamente associada ao saldo de radiação regional e global, influenciando
no clima e no tempo de uma determinada região, estando diretamente inserida nos processos
biológicos da superfície terrestre. Como destaca Mendonça (2000) a saúde humana é fortemente
influenciada pelo clima. As condições térmicas, de dispersão (ventos e poluição) e de umidade do ar
exercem destacada influência sobre a manifestação de muitas doenças, epidemias e endemias
humanas. Com isso, tem-se que a insolação pode ser uma relevante variável a ser estuda de modo a
se observar o grau de potencialidade e favorabilidade, por exemplo, de uma dada área à
disseminação de doenças, sejam estas vinculadas a partir de sua ação direta – incidência de raios
solares na superfície da pele humana; ou indireta – a partir da disseminação de vetores.
Finalmente, pretende-se ao final do presente trabalho analisar o comportamento mensal e
anual da insolação frente à variação temporal ocorrida nos últimos 23 anos na cidade do Natal-RN.

MATERIAL E MÉTODOS
Área de estudo
A área a ser estudado na presente pesquisa é o município do Natal, capital do estado do Rio
Grande do Norte. O mesmo localiza-se na mesorregião leste do estado, tendo como coordenadas
geográficas 5º 47’ 42’’ Sul e 35ª 12’ 34’’ Oeste. Sua área total é de 170,3 km² e a sede do município
está localizada a 30 metros de altitude. A cidade tem como limites: a norte, o município de
Extremoz; a sul, o município de Parnamirim; a leste, o Oceano Atlântico; a oeste os municípios de
São Gonçalo do Amarante, Macaíba e Parnamirim. A população total do município é de 712.317
pessoas, distribuindo-se, em se tratando de gênero, em 334.355 homens e 377.962 mulheres
(IDEMA, 2002).
Em se tratando dos aspectos físicos, merece destaque, no estudo, a configuração climática
da cidade. Natal caracteriza-se pela presença do Clima Tropical Chuvoso com verão seco. As
precipitações pluviométricas anuais observadas são de 1.523,6 mm, com distribuindo-se,
Fórum Internacional do Meio Ambiente - A conferência da Terra 120

principalmente, no período de fevereiro a setembro. As temperaturas médias anuais máximas são de


30,0º C, médias de 27,1º C e mínimas de 21,0º C. A média anual da umidade relativa do ar é de
76%. A insolação anual média é de 2.700 horas (IDEMA, 2002).

Metodologia
a) Coleta de dados:
Na pesquisa foram utilizadas as médias mensais de insolação, medida por um heliógrafo
tipo” Campbell Stokes” e obtidas junto a Estação Climatológica Principal da UFRN, no período
compreendido entre janeiro de 1984 e dezembro de 2007.

b) Estatística Descritiva:
A estatística descritiva foi utilizada durante todo o processamento e análise dos dados
coletados. Inseridos nesta metodologia, utilizou-se uma medida de tendência central, média
aritmética; e as medidas de dispersão; amplitude, variância, desvio padrão e coeficiente de variação,
conforme VIEIRA (1980). Além disso, fez-se uso da estatística gráfica.

c) Distribuição normaliza de Gauss:


“Denomina-se a distribuição normal ou Gaussiana, uma função que apresenta média zero e
variância 1” (VIEIRA, 1980). A distribuição foi utilizada nos cálculos da probabilidade da
insolação média mensal na cidade do Natal. A distribuição é expressa pela seguinte equação:
⎡ 1 ⎤ −
( z ²)
F (z) = ∫ ⎢ ( 2 π ) 0 ,5 ⎥ε
⎣ ⎦
2

x−x
Onde : Z =
σ

x = variável aleatória (insolação)


z = variável aleatória normalizada (insolação)
σ = desvio padrão da amostra.

d) Intervalo de Confiança:
“Se m é um estimador justo de um parâmetro populacional desconhecido M, com variância
σ² (m), poderemos construir com um nível de confiança de (1-α) % o intervalo de confiança para
M” (VIEIRA, 1980). Com isso, tem-se a seguinte equação:
⎛ α S α S ⎞
P = ⎜⎜ b − t ≤ β ≤b+t ⎟ = 1−α
⎝ 2 Sxx 2 Sxx ⎟⎠

e) Reta dos Mínimos quadrados:


Segundo Andriotti (2003), o Método dos Mínimos Quadrados é um método de ajuste de
pontos a uma reta e se baseia na premissa de que a reta resultante do ajuste seja tal que a soma dos
quadrados das distâncias verticais dos pontos à reta seja mínima. Ainda, o método fornece a reta
resultante com duas características, sendo estas: a soma dos desvios verticais dos pontos em relação
à reta é zero; e a soma dos quadrados desses desvios é mínima.

RESULTADOS E DISCUSSÃO
O gráfico 2 mostra a variação temporal da insolação média mensal (horas) na cidade do
Natal/RN para um período de 24 anos, coletados em horário sinótico.
A análise, por estatística descritiva, demonstra que Natal recebe por mês uma média
de 241,9 horas de insolação, com um desvio padrão de 32 horas e coeficiente de variação de 13,2
Fórum Internacional do Meio Ambiente - A conferência da Terra 121

%. Ou seja – devido a sua posição geográfica – Natal recebe um fluxo solar com pouca variação ao
longo do ano.

VARIAÇÃO TEMPORAL DA INSOLAÇÃO MÉDIA


MENSAL (HORAS) NA CIDADE DO NATAL/RN

350,0
300,0
Insolação média
mensal(horas)

250,0
200,0
150,0
100,0
50,0
0,0
JAN FEV MAR ABR MAI JUN JUL AGO SET OUT NOV DEZ
Meses

Gráfico 2: Variação temporal da insolação média mensal (horas) na cidade do Natal/RN.

O gráfico 3 mostra a probabilidade de ocorrência de insolação mensal, quanto à


freqüência de ocorrência. Os valores oscilaram entre 8,54% em junho a 95,1% em outubro. Esse
comportamento condiz com a climatologia e a atuação dos sistemas sinóticos na região em análise;
no período de fevereiro a julho a probabilidade de ocorrência de densidade no fluxo radiativo é
menores que 50%, enquanto que de agosto a janeiro as probabilidades ultrapassam os 50%, com
valor máximo absoluto de 95,11% no mês de outubro. Esses resultados atuam em harmonia com o
comportamento dos sistemas sinóticos operantes na cidade do Natal. Nos meses de fevereiro a maio
tem-se a predominância da Zona de Convergência Intertropical (ZCIT), com nuvens essencialmente
cumuliformes, o que caracteriza a precipitação em forma de pancadas de chuvas. De maio a julho
tem-se a atuação de Ondas de Leste e brisas marítimas, com nuvens estratiformes e chuvas
intermitentes. Nos meses de agosto a janeiro tem-se o Anticiclone subtropical do Atlântico Sul, que
condiciona a inibição de nuvens e favorece um alto índice de insolação nos meses de veraneio na
cidade do Natal.

PROBABILIDADE MENSAL DE OCORRÊNCIA


DA INSOLAÇÃO NA CIDADE DO NATAL/RN

100,00

80,00
Probabilidade(%)

60,00

40,00

20,00

0,00
JAN FEV MAR ABR MAI JUN JUL AGO SET OUT NOV DEZ
meses

Gráfico 3: Probabilidade mensal de ocorrência da insolação na cidade do Natal/RN.

O gráfico 4 mostra a variação da insolação média mensal em um intervalo de ocorrência no


nível de confiança de 95%. O mesmo apresentou valores mínimos no mês de junho, de 184,5 a
Fórum Internacional do Meio Ambiente - A conferência da Terra 122

211,7 horas, respectivamente. O máximo de acontece no mês de outubro com valor mínimo de
289,0 horas e um máximo de 300,8 horas. Verificou-se que no mês de outubro há convergência nos
valores em torno da média, justamente no mês de maior incidência da insolação.

ANÁLISE DO INTERVALO DE CONFIANÇA DA


INSOLAÇÃO MÉDIA NO MUNICÍPIO DE
NATAL/RN(1984-2007)
350,0

300,0

250,0
Insolação (horas)

200,0

150,0

100,0

50,0

0,0 µ<
JAN FEV MAR ABR MAI JUN JUL AGO SET OUT NOV DEZ Med
meses

Gráfico 4: Análise do intervalo de confiança da insolação média no município de Natal.

O gráfico 5 mostra o comportamento temporal da insolação anual na cidade do Natal


no período de 1984 a 2007, com registro de um valor máximo de 3.200 horas em 1997 e um
mínimo de 2.476 horas. Os valores máximos estão associados a eventos extremos globais, como é o
caso de 1993 e 1997 – que foram de El Niño – e em 1985 e 1994 – anos de La Niña – com
insolação mínima de 2.476 horas e 2.472.

COMPORTAMENTO TEMPORAL DA INSOLAÇÃO NO


PERÍODO DE 1984 a 2007 NA CIDADE DO NATAL/RN

y = 21,463x + 2644,8
2
R = 0,4713
3500,0

3000,0
Insolação anual (h)

2500,0
2000,0

1500,0
1000,0

500,0
0,0
84

85

86

87

88

89

90

91

92

93

94

95

96

97

98

99

00

01

03

04

05

06

07
19

19

19

19

19

19

19

19

19

19

19

19

19

19

19

19

20

20

20

20

20

20

20

Anos

Gráfico 5: Comportamento temporal da insolação no período de 1984 a 2007 na cidade do


Natal/RN

A curva de tendência da série temporal, gráfico 5, mostra que há um aumento linear na


insolação, partindo de um valor inicial de 2.695 horas no ano de 1984 a um valor final de 3.098 em
2007, ou seja, um aumento anual de 27 horas, que resulta em um aumento diário médio de 9
minutos de insolação.
Esses resultados demonstram que, efetivamente, está havendo um decréscimo na cobertura
de nuvens e um aumento no fluxo de radiação solar global na superfície da cidade do Natal/RN.
Esse aumento na insolação pode está associado à intensidade e atuação do Anticiclone Subtropical
Fórum Internacional do Meio Ambiente - A conferência da Terra 123

do Atlântico Sul devido à forçantes externas, tal como a dinâmica na circulação meridional, “Célula
de Walker”, que inibindo a formação de nuvens com grande desenvolvimento vertical, favorece a
incidência de raios solar em maior intensidade.
Uma outra explicação seria pelo aumento na freqüência e intensidade das erupções solares
que, se essa hipótese for verdadeira, necessariamente esse fato deverá ser observado em outras
estações meteorológicas espalhas no globo terrestre.

CONSIDERAÇÕES FINAIS
A curva de tendência da série temporal demonstra um aumento na insolação da cidade do
Natal/RN, ou seja, um aumento anual de 27 horas, que resulta num aumento médio diário de 9
minutos de insolação.
Esse aumento está associado a condições termodinâmicas do Anticiclone Subtropical do
Atlântico Sul, que inibindo a formação de nuvens, favorece um aumento no fluxo radiativo de
ondas curtas e aumento no fluxo do saldo de radiação, potencializando, assim, doenças a população
que, por meio de aquecendo da Camada Limite Atmosférica, implicará em pré-disposição desta área
a proliferação de vetores.
Os resultados merecem estudos mais aprofundados e específicos, inclusive de ordem
metodológica, tendo como objeto de estudo os balanços de radiação e energia, com abordagens na
influência desses fluxos em biomas.

AGRADECIMENTOS
A CAPES pelo apoio na pesquisa.

REFERÊNCIAS BIBLIOGRÁFICAS
ANDRIOTTI, José Leonardo Silva. Fundamentos de estatística e geoestatística. São Leopoldo:
Unisinos, 2004.
INSTITUTO DE DESENVOLVIMENTO ECONÔMICO E MEIO AMBIENTE (IDEMA-RN).
Perfil do estado do Rio Grande do Norte. Natal: IDEMA, 2002.
MENDONÇA, Francisco. Aspectos da interação clima-ambiente-saúde humana: da relação
sociedade-natureza à (in)sustentabilidade ambiental. RA’EGA, UFPR, n. 4, p. 85-99. 2000.
MINISTÉRIO DO MEIO AMBIENTE (MMA). Mudanças climáticas globais e seus efeitos sobre a
biodiversidade: caracterização do clima atual e definição das alterações climáticas para o território
brasileiro ao longo do século XXI/José A. Marengo. Brasília: MMA, 2007.
SUPERINTENDÊNCIA DO DESENVOLVIMENTO DO NORDESTE (SUDENE). Departamento
de Recursos Naturais. Instrumentos meteorológicos utilizados em superfície. DRN: Recife, 1975.
VIEIRA, Sonia. Introdução à Bioestatística. Rio de Janeiro: Editora Campus, 1980.
Fórum Internacional do Meio Ambiente - A conferência da Terra 124

AQUECIMENTO GLOBAL E AS CONSEQÜÊNCIAS NO SEMI-ÁRIDO: ÊNFASE EM


FEIRA DE SANTANA-BA.

Alany Santos Oliveira


Bióloga, UEFS, Mestrado em Engenharia Civil e Ambiental, Departamento de Tecnologia, Av.Universitária , Módulo 3,
Labotec II.E-mail: alanynha@uol.com.br
Carlos Ney N. de Oliveira
Geógrafo, UEFS, Mestrado em Engenharia Civil e Ambiental, Departamento de Tecnologia, Av.Universitária, Módulo
3, Labotec II. cnnogeo@yahoo.com.br
Elzita Ferreira Vidal
Engª. Civil, UEFS, Mestrado em Engenharia Civil e Ambiental, Departamento de Tecnologia, Av.Universitária Módulo
3,Labotec II. elzitavidal@uol.com.br

RESUMO
O último relatório do IPCC divulgado em fevereiro de 2007, evidenciou que as mudanças
climáticas decorrentes de atividades humanas já estão ocorrendo em uma escala global e que as
previsões para o século XXI são preocupantes. As mudanças impactam profundamente toda a Terra,
e estão associadas às secas e às enchentes. As ondas de calor afetam diretamente a pesca, a
agricultura, o meio ambiente e a saúde, a qualidade do ar, a oferta de energia e o aumenta de risco
de incêndios. Como o Brasil está situado em partes relativamente quentes do planeta e tem
dimensões continentais, os impactos serão consideráveis, inclusive na economia. O Brasil é um dos
países mais frágeis em termos de mudanças climáticas. Por possuir uma vasta extensão territorial,
apresenta áreas particularmente mais sensíveis, como o semi-árido nordestino, de ocupação já
limitada pela seca. E nesse contexto se insere o município de Feira de Santana-Ba.
Palavras-chave: mudanças climáticas, El nino, La nina, seca, agricultura.

ABSTRACT
The last IPCC report released in February 2007, showed that climate change resulting from
human activities are occurring on a global scale and that the forecast for the twenty-first century are
worrying. The changes profoundly impact the entire Earth, and are associated with droughts and
floods. The waves of heat directly affect the fishing, agriculture, the environment and health, air
quality, the supply of energy and increased risk of fires. As Brazil is located relatively warm in
parts of the planet and has continental dimensions, the impacts will be considerable, including in the
economy. Brazil is one of the weakest countries in terms of climate change. By having a wide
territorial extension, presents particularly more sensitive areas, such as the semi-arid northeast,
occupying already limited by the drought. And in this context falls the municipality of Feira de
Santana-Ba.
Keywords: climate change, el nino, la nina, drought, agriculture.

INTRODUCÃO
O estudo do tempo e do clima ocupa uma posição central e importante no amplo campo da
ciência ambiental. Os processos atmosféricos influenciam nas outras partes do ambiente,
principalmente na biosfera, hidrosfera e litosfera. Do mesmo modo, os processos e as outras partes
do ambiente não podem ser ignorados pelo pesquisador do tempo e do clima (AYOADE, 1996).
De forma sucinta, o clima está diretamente relacionado às condições meteorológicas do
tempo. Usualmente define-se clima como um conjunto de condições meteorológicas, tais como:
temperatura, pressão atmosférica, umidade do ar, velocidade do vento, precipitação de chuva e
características do estado médio da atmosfera, obtidas por um período de tempo suficientemente
longo, em um ponto da superfície terrestre.
O sistema climático é a atuação destes diversos elementos de forma interativa,
interdependente, dinâmica e reativa a mudanças. A atmosfera é fundamental para o equilíbrio deste
sistema. Ela envolve a Terra como um cobertor de gases contendo partículas sólidas e líquidas em
suspensão e, juntamente com a superfície terrestre, forma um sistema ambiental integrado. Esse
sistema é responsável por diversas funções que permitem que haja vida na Terra.
Fórum Internacional do Meio Ambiente - A conferência da Terra 125

A atmosfera provê e mantém o suprimento de oxigênio necessário para a vida. Ela controla
não só a quantidade de energia que “entra e sai” da Terra por meio de fenômenos como o efeito
estufa e a espessura da camada de ozônio, como também a quantidade de energia que circula
internamente, mantendo, por exemplo, o equilíbrio entre a temperatura durante o dia e a noite. A
atmosfera tem a capacidade de absorver os efluentes gasosos nela lançados em decorrência de
atividades naturais ou humanas (AYOADE, 1996).
Todavia essa capacidade de absorção é limitada, por isto à importância que tem para o
clima já que qualquer alteração na composição desta camada acarreta modificação na temperatura
média da superfície terrestre. O problema é que, nas últimas décadas, os climatologistas perceberam
que a temperatura média do planeta estava aumentando, ou seja, está acontecendo uma
intensificação do efeito estufa.
Desse modo diversos cientistas passaram a estudar as causas desse aquecimento, alertando
a comunidade internacional. Esse movimento deu origem à Convenção das Nações Unidas sobre as
Mudanças Climáticas, aprovada e iniciada na Conferência das Nações Unidas sobre Meio Ambiente
e Desenvolvimento, no Rio de Janeiro, em 1992, a Eco-92. A partir desses estudos surgiram
relatórios que ficaram conhecidos em todo o mundo, e os termos mudanças climáticas e
aquecimento global passaram a ser analisados e discutidos em diversas instâncias, passando a surgir
grupos de cientistas atuando em diversas frentes de trabalhos, uns buscando as conseqüências,
outros as causas, como funciona o processo, o histórico dentre outros.
Com o grande volume de produções que passaram a surgir, alguma exigindo drásticas
mudanças de comportamento ferindo o interesse econômico de certos países, o financiamento
econômico das pesquisas, lobys políticos e empresariais passaram a surgir, criando correntes
divergentes no debate sobre o clima do planeta. As duas principais teorias sobre as mudanças
climáticas são a teorias das causas antrópicas X teorias das causas naturais.
Independente de qual corrente está com a verdade, um fato dado é que a sociedade vem
sofrendo com os resultados do atual aquecimento a temperatura média do planeta já subiu 6ºC no
século XX e as projeções indicam que subirá entre 1,4ºC e 5,8ºC até o ano 2100, se nada for feito
para deter o processo, segundo o último relatório do IPCC (International Panel on Climate Change).
As mudanças climáticas decorrentes de atividades humanas já estão ocorrendo em uma
escala global e as previsões para o século XXI são preocupantes de acordo com último relatório do
IPCC divulgado em fevereiro de 2007. Essas mudanças impactam profundamente toda a Terra, e
estão associadas às secas e às enchentes. As ondas de calor afetam diretamente a pesca, a
agricultura, o meio ambiente e a saúde, a qualidade do ar, a oferta de energia e o aumenta de risco
de incêndios.
Partindo desses pressupostos o presente trabalho tem por objetivo geral analisar as
conseqüências do aquecimento global para a região do semi-árido nordestino, enfatizando o
município de Feira de Santana. E especificamente objetiva caracterizar a influência dos fenômenos
El niño e la niña no clima e na produção de milho, mandioca e feijão do município.
O município de Feira de Santana está localizado a 12º16'S e 58º58'W, no Estado da Bahia,
com área de 1.333 km² e altitude média de 257 m. Possui uma localização estratégica, sendo um
dos maiores entroncamentos rodoviários do interior do país, ligando o Nordeste ao Centro Sul, com
três rodovias federais (BR -101, BR-116 e BR-324) e quatro rodovias estaduais (BA-052, BA-502
BA-503 e BA-504) distando 100 km da capital Salvador.

METODOLOGIA
Foi realizada pesquisa bibliográfica, estudo dos relatórios do IPCC e de eventos científicos
sobre aquecimento global e pesquisa em web sites especializados na temática. Relativo à Feira de
Santana realizou-se análise estatística dos dados de precipitação, temperaturas, umidade,
evaporação e insolação coletados diariamente na Estação Climatológica da UEFS durante 1993-
2006, e os dados da normal climatológica (média do período: 1945-1983) fornecidos pela
SUDENE.
Fórum Internacional do Meio Ambiente - A conferência da Terra 126

Os dados foram tabulados em planilhas eletrônicas do Excel, correspondentes aos mapas


utilizados pelo INMET-Instituto Nacional de Meteorologia, através das médias mensais de cada ano
elaborou-se um resumo climático mensal, plotando-se também as linhas de tendência. A partir
desses procedimentos foi realizado um estudo minucioso do clima do município através das médias
históricas de pluviosidade, temperaturas, insolação, umidade do ar, e balanços hídricos. Foram
cluculados os desvios em relação à normal climatológica, o Índice de Variabilidade Temporal de
Precipitação, o SPI (Índice de Precipitação Padronizada), Índice de seca anual para estação chuvosa,
e a variabilidade de precipitação do período chuvoso principal. Calculou-se a evapotranspiração
diária, mensal e anual segundo o método de Thorntwaite (1962), foram elaborados balanços
hídricos mensais, e anuais segundo Thorthwaite e Matther (1958) e determinados os períodos
úmidos, sub úmidos, sub secos e secos e caracterizados os períodos de deficiência e excedentes
hídricos e análise do período “chuvoso” principal.
Analisou-se as massas de ar, tipos de ventos e a circulação atmosférica da área através de
mapas e imagens de satélite na banda do visível e infravermelho fornecidas pelo INPE - Instituto
Nacional de Pesquisas Espaciais e INMET. Estudou-se os fenômenos El Niño e La Niña, conceitos,
características e possíveis efeitos no clima do município, e as características e especificidades
bioclimáticas dos cultivares milho, feijão e mandioca. Foram analisados dados e informações sobre
as áreas plantadas, colhidas e as previsões de safra para cada ano (IBGE). Após foi feita a
correlação das análises anteriores com a produção agrícola das culturas selecionadas através da
média de produtividade (quantidade produzida em kg dividido pela área plantada em hectares)
encontrada nos Censos Agrícolas do IBGE, 1975-2006.

RESULTADOS
Segundo o primeiro volume do Terceiro Relatório do Painel Intergovernamental sobre
Mudança Climática (IPCC, 2001), as mudanças climáticas observadas no planeta são graves, e vão
modificar aspectos de todo sistema ambiental gerando variações nas temperaturas, precipitações, no
sistema hidrológico, dentre outros como pode ser visto na seqüência:
A temperatura média global superficial (média da temperatura próxima ao ar sobre a terra e
a temperatura da superfície do mar) vem aumentando desde 1861. Durante o século XX, a
temperatura aumentou 0,6 ± 0,2o C. Este valor foi cerca de 0,15ºC maior que o estimado no
Segundo Relatório de Avaliação do IPCC para o período pós-1994, devido às temperaturas
relativamente altas ocorridas de 1995 a 2000; De 1950 a 1993, houve um aumento da temperatura
mínima do ar sobre a terra de 0,2ºC por década.
A temperatura aumentou durante as quatro décadas passadas nos primeiros 8 km mais
baixos da troposfera. Os primeiros 8 km da troposfera são influenciados diretamente por fatores
como diminuição do ozônio estratosférico, aerossóis atmosféricos e o fenômeno El Nino.
A extensão da cobertura de neve e gelo diminuiu em torno de 10% desde 1950; o gelo
ártico perdeu 40% de seu volume nas últimas cinco décadas; e o nível global médio do mar subiu de
0,1 a 0,2 m e o conteúdo de calor (heat content) do oceano aumentou.
Todavia a temperatura não será a única mudança, em muitos lugares, haverá alterações no
ciclo hidrológico, a circulação de água entre o mar, a atmosfera e a superfície da Terra e, portanto,
nos padrões de chuva, enchentes e seca, no fluxo dos rios e na vegetação. Mesmo uma pequena
elevação da temperatura faz-se acompanhar por mudanças climáticas nas camadas de nuvens, nas
chuvas, padrões dos ventos e duração das estações do ano.
Outras tendências no planeta, muitas já evidentes, apontam aquecimento maior à noite
durante o inverno. Isso sugere menos neve e mais chuva, além de estações de cultivo sem geadas
prolongadas nas latitudes medianas. A precipitação pluviométrica aumentou de 0,5.º a 1% por
década em latitudes altas e médias dos continentes do Hemisfério Norte, e de 0,2 a 0,3% por década
nas áreas tropicais. (GREENPEACE, 2006)
Aumento da temperatura leva a evaporação mais rápida, o que proporciona aumento da
umidade no ar. O calor extra e a umidade irão gerar tempestades tropicais mais intensas. Haverá
mais chuva nas regiões costeiras, particularmente, e ao longo das rotas das tempestades. O resultado
Fórum Internacional do Meio Ambiente - A conferência da Terra 127

do aumento na evaporação, é que hoje a umidade relativa do ar está acima das observadas
historicamente. Esse aumento da temperatura e da umidade explica as tendências observadas em
fenômenos mais dinâmicos da atmosfera, que resultam na ampliação da freqüência e da intensidade
de eventos extremos, como furacões, tempestades, ondas de calor, secas, etc. (GREENPEACE,
2006).
Com maior quantidade de calor na atmosfera tropical e no oceano, o El Niño tem
condições de se tornar um evento quase permanente. E por outro lado em várias regiões do planeta a
água irá desaparecer de lugares onde é esperada e necessária e reaparecerá onde é inesperada, ou
simplesmente se tornar imprevisível. Como o aquecimento torna a atmosfera mais energética, as
taxas de evaporação e formação de nuvens e tempestades deverão aumentar embora os efeitos
dessas mudanças possam variar conforme a localização.
O agravamento das secas, as restrições hídricas e o fogo em florestas constituíram matéria
para muitos artigos científicos durante anos recentes. De mais a mais, isto serve para lembrar à
sociedade que sua vulnerabilidade frente às alterações do ciclo hidrológico é grande. Globalmente,
a área afetada pela seca aumentou mais de 50% durante o século XX, enquanto as mudanças sobre
as áreas úmidas permaneceram relativamente inalteradas. É importante ressaltar que enchentes e
secas andam lado a lado (IPCC, 2007).

COMO AS MUDANÇAS CLIMÁTICAS AFETAM O SEMI-ÁRIDO?


O Semi-Árido Brasileiro se estende por uma área que abrange a maior parte dos Estados da
Região Nordeste (86,48%), a região setentrional do Estado de Minas Gerais (11,01%) e o norte do
Espírito Santo (2,51%), ocupando uma área total de 974.752 Km2.
É conhecido que as chuvas, do semi-árido da região Nordeste, apresentam enorme
variabilidade espacial e temporal. Anos de secas e chuvas abundantes se alternam de formas
erráticas. A região Nordeste caracteriza-se naturalmente como de alto potencial para evaporação da
água em função da enorme disponibilidade de energia solar e altas temperaturas (BRAGA 2007).
Os principais resultados e conclusões do Workshop do IPCC realizado em Tucson, em
2001, a respeito da seca, mostraram que as áreas mais afetadas pelas secas estão localizadas no
Nordeste brasileiro, correspondendo àquelas cuja ocorrência depende da ação da Zona de
Convergência Intertropical-ZCIT, quer se trate de secas anuais (parciais ou totais) ou plurianuais.
As evidências empíricas disponíveis indicam que a variabilidade climática decorrente da ação da
ZCIT é combinada com os fatores que determinam o regime pluviométrico na Zona da Mata e no
Nordeste meridional. Quando essa conjunção de fatores se articula é que ocorrem as secas de
amplas proporções − anuais (como as de 1951, 1958 e 1970) e plurianuais (como a de 1979-1983)
(SOUZA FILHO, 2003).
Aumentos de temperatura associados à mudança de clima decorrente do aquecimento
global, independente do que possa vir a ocorrer com as chuvas, já seriam suficientes para causar
maior evaporação dos lagos, açudes e reservatórios e maior demanda evaporativa das plantas. Uma
mudança de clima devido ao aquecimento global ocasionará maior evaporação dos lagos, das
represas e dos açudes, o Rio São Francisco reduzirá a sua vazão de até 15-20% (MARENGO,
2003).
As projeções de clima do (IPCC AR4), têm mostrado cenários de secas e eventos extremos
de chuva em grandes áreas do planeta. Reduções de chuva aparecem na maioria dos modelos
globais do IPCC AR4, assim como um aquecimento que pode chegar até 3-4ºC para a segunda
metade do século XXI.
O Relatório do Clima do Brasil, produzido recentemente pelo INPE, tem estudado as
mudanças de clima no Brasil, e para o Nordeste, para finais do século XXI. Este relatório tem usado
modelos regionais de até 50 km de resolução animados no modelo global de HadAM3 do Centro
Climático do Reino Unido (Hadley Centre). Segundo o relatório do INPE, estes seriam os possíveis
impactos da mudança de clima, considerando os cenários otimistas e pessimistas propostos pelo
IPCC:
Fórum Internacional do Meio Ambiente - A conferência da Terra 128

No cenário climático pessimista, as temperaturas aumentariam de 2 ºC a 4 ºC e as chuvas


de reduziriam entre 15-20% no Nordeste até o final do século XXI. No cenário otimista, o
aquecimento seria entre 1-3 ºC e as chuvas ficariam entre 10-15% menor que no presente.
Essas mudanças no clima do Nordeste no futuro podem ter os seguintes impactos:
- A caatinga pode dar lugar a uma vegetação mais típica de zonas áridas, com predominância de
cactáceas. O desmatamento da Amazônia também afetará a região.
- Um aumento de 3ºC ou mais na temperatura média deixaria ainda mais secos os locais que hoje
têm maior déficit hídrico no semi-árido.
- A produção agrícola de subsistência de grandes áreas pode se tornar inviável, colocando a própria
sobrevivência do homem em risco.
- O alto potencial para evaporação do Nordeste, combinado com o aumento de temperatura,
causaria diminuição da água de lagos, açudes e reservatórios.
- O semi-árido nordestino ficará vulnerável a chuvas torrenciais e concentradas em curto espaço de
tempo, resultando em enchentes e graves impactos sócio-ambientais. Porém, e mais importante,
espera-se uma maior freqüência de dias secos consecutivos e de ondas de calor decorrente do
aumento na freqüência de veranicos.
- Com a degradação do solo, aumentará a migração para as cidades costeiras, agravando ainda mais
os problemas urbanos.

As projeções apresentadas no Relatório do Clima do INPE foram geradas usando modelos


climáticos globais e regionais, e o fato de todos os modelos convergirem numa situação de clima
mais quente e seco pode fazer com que consideremos essas projeções como tendo um grau de
certeza grande. Considerando um modelo em particular (o modelo do Centro Climático britânico -
Hadley Centre) e o cenário pessimista, apresenta uma tendência de extensão da deficiência hídrica
por praticamente todo o ano para o Nordeste, isto é, tendência a “aridização” da região semi-árida
até final do século XXI (SOUZA FILHO, 2003).
Define-se “aridização” como sendo uma situação na qual o déficit hídrico que atualmente
apresenta-se no semi-árido durante 6-7 meses do ano seja estendido para todo o ano, conseqüência
de um aumento na temperatura e redução das chuvas. Em resumo, grande parte do semi-árido
nordestino, onde a agricultura não irrigada já é atividade marginal, tornar-se-ia ainda mais marginal
para a prática da agricultura de subsistência (SOUZA FILHO, 2003).
A população mais pobre é a que sofrerá mais e a região mais afetada seria um quadrilátero
no Nordeste, compreendendo desde o oeste do Piauí, o sul do Ceará, o norte da Bahia e oeste de
Pernambuco, onde estão as cidades com menor desenvolvimento humano. As projeções de clima
para o futuro indicam riscos de secas de 10 anos ou mais.

INFLUÊNCIA DO AQUECIMENTO EM FEIRA DE SANTANA


Segundo a classificação climática de Koppen (1948) o município possui clima tipo quente
e úmido (Cw), já para Thorntwaite (1955) o clima do município de Feira de Santana-BA é sub-
úmido a seco. O clima tende a semi-árido à medida que avançamos na direção oeste, mas a área do
município está totalmente inserida no polígono das secas.
A média anual de pluviosidade é 848 mm, com período chuvoso correspondendo aos
meses de abril a junho. A temperatura média anual é de 24º C, podendo no verão atingir médias
mensais de 27ºC e, no inverno de 21ºC. A umidade relativa do ar possui média anual de 75%. A
evapotranspiração potencial média anual é de 1.250 mm, a evapotranspiração real média anual é de
848 mm e déficit hídrico médio anual é de 402 mm. Não apresenta excedente hídrico , o índice de
aridez (%) 32 e o índice hídrico (mm) é – 19.0.Os ventos dominantes são de SE .
Observou-se que o período chuvoso “principal” da Normal Climatológica (a media do
período 1945 – 1983) corresponde a 5 meses, indo de Março a Julho, nos últimos 10 anos
restringiu-se a 3 meses, Abril a Julho devido aos menores índices de precipitação anual, 11%
menores que a Normal Climatológica, porém representa em média 34,4% do total anual. Também
Fórum Internacional do Meio Ambiente - A conferência da Terra 129

nos últimos 10 anos a freqüência do período “chuvoso” principal ser realmente o de maior índice
pluviométrico foi de 70%.
Por outro lado pelo calculo do SPI o período apresentou 1 (uma) seca severa, 2 secas
moderadas, 3 secas suaves, 3 vezes foi chuvoso moderado e 1 muito chuvoso; freqüência de 60%
para qualquer tipo de seca. Diante disso, verifica-se que o período chuvoso é regular, porém o total
de precipitação é irregular confirmado pelo índice de variabilidade igual a 0,35 considerado alto; o
que é muito prejudicial para a agricultura.
Foi verificado que a média de precipitação do período (769,3 mm) foi 11% menor que a
normal climatológica (869,9 mm) demonstrando pequena tendência da diminuição dos excedentes
hídricos, e logicamente aumento da deficiência hídrica anual, a qual passou de 380,7 mm, na média
histórica a 562,3 no período 1993-2003. Para a média dos 10 anos, o balanço hídrico demonstrou
deficiência hídrica em 11 meses, com uma leve reposição em junho, enquanto que na normal
climatológica há 4 meses com excedente (abril, maio, junho e julho) 1 (um) com reposição (março)
e 1 com retirada (agosto) e 6 com deficiência. Em relação a freqüência, para 1993-2003, janeiro,
fevereiro e setembro apresentaram 100% de déficit, e maio e junho apresentaram 60% e 50% de
excedentes. Diante disso se observa que os meses mais regulares em deficiência são os de
primavera/verão, e os de excedente os meses de outono/inverno.

INFLUÊNCIA DOS FENÔMENOS EL NIÑO E LA NIÑA


Um dos principais aspectos das mudanças climáticas que tem influência em Feira diz
respeito aos fenômenos El Niño e La Niña. Sobre esses eventos foram observadas muitas mudanças
segundo o IPCC como as referidas na seqüência abaixo.
Episódios quentes do fenômeno El Niño Oscilação Sul- ENSO (que afetaram
consistentemente as variações regionais de precipitação e temperatura em muitas partes dos
trópicos, subtrópicos e áreas de latitudes médias) foram mais freqüentes, persistentes e intensos
desde a metade de 1970, comparada com os 100 anos anteriores; e em muitas regiões, como partes
da Ásia e da África, a freqüência e intensidade das secas aumentaram nas décadas recentes(IPCC ,
2006).
Mudanças associadas com o fenômeno ENSO produzem grandes variações no clima e
tempo em torno do mundo, ano a ano. Essas mudanças têm profundos impactos sobre a humanidade
porque estão associadas à secas, enchentes, ondas de calor e outras mudanças, que podem
interromper severamente a agricultura e a pesca, causar danos ao meio ambiente e a saúde, diminuir
a demanda de energia e qualidade do ar, bem como aumentar o risco de incêndios. (IPCC, 2001.)
Durante o El Niño, as águas quentes do Oeste do Pacífico tropical migram em direção a
Leste, mudando o padrão das tempestades tropicais; além disso, enfraquecem os trade winds,
reforçando as mudanças de temperatura do mar. O nível do mar baixa no Oeste, mas aumenta no
Leste, em cerca de 0,24 m. Essas mudanças na circulação atmosférica não estão confinadas aos
trópicos, mas se estendem globalmente. O padrão inverso ocorre durante a fase La Niña, constituída
de um esfriamento do Pacífico Tropical, dentro de um período de cerca de 3 a 6 anos(IPCC,200)
Recentes comportamentos do ENSO parecem ter sido incomuns, comparados a décadas
recentes. Existem evidências de que episódios El Niño, desde a metade de 1970, têm sido
relativamente mais freqüentes do que os episódios La Niña opostos.
Outra importante característica da circulação que afeta o clima em regiões extensas do
globo é a Oscilação do Atlântico Norte- NAO (North Atlantic Oscillation). A NAO é o padrão
dominante da variabilidade da circulação atmosférica no inverno da Região Norte e é estritamente
relacionada com a Oscilação do Ártico (AO). As flutuações de temperaturas da superfície do mar no
Atlântico (SST) são fortemente relacionadas com a NAO.
Os cientistas atribuem alguma relação entre a seca e o fenômeno El Niño. Durante os
eventos de El Niño, a seca é endêmica na Austrália, Indonésia, Sudeste da Ásia, Nordeste do Brasil
e partes da África. Mas durante o evento La Niña, as localizações preferenciais de seca mudam para
outras partes do mundo, incluindo a América do Norte e a América do Sul. (MARENGO e
SOARES, 2003.)
Fórum Internacional do Meio Ambiente - A conferência da Terra 130

Durante a ocorrência desses fenômenos as interações oceano-atmosfera de grande escala


que se processam na Bacia do Pacífico Tropical, provocam modificações na circulação geral da
atmosfera, isto é, na Célula de Walker e, consequentemente, desencadeiam adversidades climáticas
em diversas regiões continentais ao redor do globo e entre elas na região do município de Feira de
Santana.
No intervalo de tempo (1970-2003) houve em Feira de Santana a ocorrência de 15 anos
com El Niño (variando entre fraco, moderado e forte), 8 com La Niña e 10 sem anomalias. Com a
ocorrência do El Niño, um sistema subsidência com ar quente e seco, instala-se sobre a região
Nordeste, inclusive Feira de Santana, não permitindo o desenvolvimento vertical da nebulosidade,
gerando alto índice de aridez; La Niña, não há a corrente de ar descendente sobre a região,
facilitando a entrada da zona de baixa pressão, o que gera chuvas um pouco acima do normal. A
influência de cada fenômeno nas média de pluviosidade podem ser verificadas no quadro 1.

Quadro 1- Comparativo das médias de pluviosidade do período de 1970-2003, por meses, em Feira
de Santana.
Meses Média histórica Média do El Niño Média La Niña
JANEIRO 53,6 13,1 53,7
FEVEREIRO 39,6 21,2 47,3
MARÇO 95 18,6 103,4
ABRIL 95,3 28,8 140
MAIO 116,4 79,3 113,3
JUNHO 88,5 56,5 96,6
JULHO 82,2 59,4 79
AGOSTO 66,7 35,5 70,1
SETEMBRO 29,3 22,3 47,8
OUTUBRO 28,9 6,5 33,3
NOVEMBRO 109,5 41 131,6
DEZEMBRO 64,2 40,3 119
Fontes: Sudene, 1970-88; Estação Climatológica Nº 83.221 - UEFS, 1993-2003.

Em anos de ocorrência dos fenômenos observou-se modificações em todos os aspectos dos


elementos climáticos do município. Quando há El niño tem-se um desvio negativo médio de 20%,
chegando até a 50%, na media pluviométrica e desvios positivos nas medias de temperatura do ar
em torno de 4°c e de insolação 20%, que será maior quanto mais intenso é o fenômeno, o que
acarreta em produtividade abaixo da media de anos normais (quadro 2). Quando há La niña ocorre o
contrário, aumento da pluviosidade cerca de 25% em média, chegando a 80%, e meses que
aumentou 10 vezes além da média histórica, ocorrem desvios negativos das médias de temperatura
e insolação. Há declínio da produtividade causado principalmente pela alta pluviosidade. Assim a
produtividade media do feijão diminuiu em todos anos de La niña (caiu 81% em 1989) bem como, a
de mandioca que apresentou a mesma queda em 1995/96, e o milho teve a média de anos normais
em 2 fenômenos (1985 e 89), porém nos outros decaiu.
Quadro 2-Média da produção agrícola de feijão, milho e mandioca em anos de El Nino e La Niña
em Feira de Santana.
Produtos Média de anos normais Média de El Niño Média de La Niña
Feijão 834 622 594
Milho 640 621 577
Mandioca 15.897 12.821 14.018
Fonte: IBGE-1975-2003.

CONCLUSÕES
Diante do exposto, verificou-se as causas e conseqüências da considerável influência dos
fenômenos El Niño e La Niña na agricultura de Feira de Santana, principalmente, através dos
Fórum Internacional do Meio Ambiente - A conferência da Terra 131

desvios das médias históricas de precipitação e temperatura, pode-se observar modificações nos
fatores vitais ao bom desenvolvimento dos cultivos de feijão, milho e mandioca, produtos principais
dos pequenos agricultores do município. E estes devem ficar cientes da interferência desses
fenômenos na agricultura a fim de realizarem melhores planejamentos das atividades e usarem
manejos adequados prevenindo-se e até aproveitando-se das características de cada anomalia.
Os estudos divulgados mostram que os impactos do aquecimento global, sendo por causas
humanas ou naturais, podem ser dramáticos. Ainda não se pode ter certeza sobre as conseqüências
de longo prazo, pois o período de observação ainda é muito curto, mas os efeitos serão múltiplos,
pois tudo está relacionado à temperatura, chuva, nível do mar, biodiversidade e outros elementos
que serão diretamente afetados pelas mudanças climáticas.

REFERÊNCIAS
AYOADE, J. O. Introdução à climatologia para os trópicos. São Paulo: Difel, 1996.
BRAGA, M.P. Implicações da variabilidade e mudança climática nos recursos hídricos, INPE,
2007
CENSOS AGROPECUÁRIOS 1975-1996. Rio de Janeiro: IBGE, 1998, Nºs3 a 15.
GREENPEACE. Mudanças de clima, mudanças de vida: como o aquecimento global já afeta o
Brasil. 64 pp. Preparado pelo Greenpeace-Brasil, São Paulo. www.greenpeace.org.br. 2006.
IBGE. Produção Agrícola Municipal. Disponível via Word Wide Web
http://www.sidra.ibge.gov.br/bda/acervo/acervo2.asp. Acessos desde 2 de setembro de 2003.
INSTITUTO NACIONAL DE PESQUISAS ESPACIAIS (INPE). Mudanças climáticas globais e
seus efeitos sobre a biodiversidade: caracterização do clima atual e definição das alterações
climáticas para o território brasileiro ao longo do século XXI.
http://www.dge.inpe.br/coletadadosambientais/relatorios.htm. Acesso em Agosto de 2007.
IPCC - Intergovernmental Panel on Climate Change; WMO - World Meteorological Organization;
United Nations Environment Program. Climate Change: The IPCC Scientific Assessment.
Cambridge, U.K: Cambridge University Press, 1991.
INTERGOVERNAMENTAL PANEL CLIMATIC CHANGE (IPCC). Cambio Climático 2001:
Informe de síntesis. 2001. Disponível em www.ipcc.ch. Acesso maio 2007.
INTERGOVERNAMENTAL PANEL CLIMATIC CHANGE (IPCC). La captación y el
almacenamiento de dióxido de carbono. 2005. Grupo Intergubernamental de Expertos sobre el
Cambio Climático. Disponível em www.ipcc.ch. Acesso em setembro de 2007. ISBN 92-9169-319-
7
INTERGOVERNAMENTAL PANEL CLIMATIC CHANGE (IPCC). La protección de la capa de
ozono y el sistema climático mundial: Cuestiones relativas a los hidrofluorocarbonos y a los
perfluorocarbonos. PNUMA OMM, Grupo Intergubernamental de Expertos sobre el Cambio
Climático y Grupo de Evaluación Tecnológica y Econômica. 2007. disponível em www.ipcc.ch.
Acesso em março de 2008.
MARENGO, J. Mudanças climáticas globais e regionais: Avaliação do clima atual do Brasil e
projeções de cenários climáticos do futuro. Revista Brasileira de Meteorologia, 16, 1-18. Rio de
Janeiro-RJ-2002
MARENGO, J. Condições climáticas e recursos hídricos no Nordeste Brasileiro. In: Tucci, C. E.;
Braga, B. Clima e Recursos Hídricos no Brasil, Associação Brasileira de Recursos Hídricos
FBMC/ANA. Porto Alegre, Brasil, v. 9, p. 117-161. 2003:
MARENGO, J. A., SOARES, W.: Impacto das modificações da mudança climática. Síntese do
Terceiro Relatório do IPCC. Condições climáticas e recursos hídricos no Norte do Brasil. Clima e
Recursos Hídricos. Associação Brasileira de Recursos Hídricos, FBMC-ANA. Porto Alegre, 2003
NOBRE, C.A. Um novo índice de anomalia de precipitação para o Nordeste do Brasil. In:
Congresso Brasileiro de Agrometeorologia, 7, 1991, Viçosa. Anais... Viçosa: SBAGRO, 1991.
p.21-25.
SOUZA FILHO, F. A. Variabilidade e mudanças de cima no semi-árido. Clima e Recursos
Hídricos. Editores. C. Tucci e B. Braga. Coleção ABRH Vol. 9, Porto Alegre, RS, 2003. pp. 77-11.
Fórum Internacional do Meio Ambiente - A conferência da Terra 132

SUDENE/SEI-SUPERINTENDÊNCIA DE ESTUDOS ECONÔMICOS E SOCIAIS DA BAHIA.


Análise dos Atributos climáticos do Estado da Bahia. SEI: Salvador, 1998.
THORNTHWAITE, C.W. An approach toward a rational classification of climate. Geogr. Rev,
v.38, p.55-94, 1948.
THORNTHWAITE, C.W.; MATHER, J.R. The water balance. Publications in Climatology. New
Jersey: Drexel Institute of Technology, 104p. 1955.
Fórum Internacional do Meio Ambiente - A conferência da Terra 133

MUDANÇAS CLIMÁTICAS E CONEXÃO ALGAS-NUVENS

Nei Freitas Nunes-Neto


Grupo de Pesquisa em História, Filosofia e Ensino de Ciências Biológicas, Universidade Federal da Bahia. Endereço
para correspondência: Rua Barão de Jeremoabo, 147, Campus Universitário de Ondina, Instituto de Biologia,
Departamento de Biologia Geral. CEP: 40170-290. Salvador, BA, Brasil. Telefone: (71) 3283-6568. E-mail do autor
correspondente: nunesneto@gmail.com.
Ricardo Santos Do Carmo
Charbel Niño El-Hani

RESUMO
Neste trabalho, abordamos o surgimento e o desenvolvimento de uma hipótese científica
sobre a conexão entre algas e nuvens, de grande relevância para a compreensão das mudanças
climáticas, tecendo algumas considerações epistemológicas. Foram importantes para o surgimento
da hipótese investigações empreendidas por Lovelock e colaboradores, no início da década de 1970,
em busca de um intermediário estável do ciclo do enxofre, que seria responsável pelo transporte
deste elemento dos oceanos para a terra. A partir de estudos sobre a liberação de sulfeto de dimetila
(DMS) por espécies do fitoplâncton marinho e sobre processos de formação de nuvens e sua relação
com o albedo planetário, Charlson e colaboradores propuseram que a rápida oxidação do DMS
levaria à formação de um aerossol (NSS-SO42-), que, ao ser oxidado, formaria núcleos necessários
para a condensação de vapor d’água e conseqüente formação de nuvens sobre os oceanos. Como as
nuvens refletem parte da radiação solar que chega ao planeta, elas contribuem para o resfriamento
da superfície planetária. Por esta razão, o DMS tem sido apontado como um importante gás estufa
negativo, que poderia contrabalançar os efeitos de aquecimento de gases estufa como CO2 e CH4.
Deve-se apontar, contudo, que o grau em que o DMS pode contribuir para o resfriamento da
superfície planetária ainda é uma questão aberta na comunidade científica. A hipótese proposta por
Charlson e colaboradores tem exercido, ainda assim, grande impacto nas pesquisas sobre mudanças
climáticas, tendo dado origem a toda uma nova área de pesquisas científicas interdisciplinares,
conhecida como ‘conexão algas-nuvens’. Aqui, buscaremos mostrar as implicações desta hipótese e
da nova área de pesquisas por ela gerada, para os estudos sobre mudanças climáticas, bem como
sobre as relações entre a biota e seu ambiente físico-químico.
Palavras-Chave: Hipótese CLAW, Conexão algas-nuvens, Sulfeto de dimetila, Biogeoquímica do
enxofre, Mudanças climáticas.

ABSTRACT
In this work, we address the origin and development of a scientific hypothesis about the
connection between algae and clouds that is greatly relevant to the understanding of climate change,
advancing some epistemological remarks. Studies carried out by Lovelock and colleagues in the
beginning of the 1970s were important to the construction of this hypothesis. Those studies
searched for a stable intermediary in the sulphur cycle, which would be responsible for transferring
this element from oceans to land. Based on studies about the release of dimethyl sulphide (DMS) by
marine phytoplankton species and the process of cloud formation and its relationship with planetary
albedo, Charlson and colleagues proposed that the rapid oxidation of DMS would lead to the
formation of an aerosol (NSS–SO42-), which, when oxidized, would constitute nuclei required for
the condensation of water vapor, and, thus, to cloud formation over the oceans. Since clouds reflect
part of the solar radiation that reaches the planet, they contribute to cool the planetary surface.
Therefore, DMS has been pointed out as a negative greenhouse gas, which could counterbalance the
heating effects of greenhouse gases such as CO2 and CH4. We should stress, however, that the
degree in which DMS can contribute to cool the Earth surface is still an open issue in the scientific
community. Charlson and colleagues’ hypothesis has nonetheless exerted a great impact on
researches about climate change, giving rise to a whole new area of interdisciplinary scientific
research, known as the ‘cloud-algae link’. Here, we intend to show how this hypothesis and the new
Fórum Internacional do Meio Ambiente - A conferência da Terra 134

research area resulting from it have an impact on studies about climate change, and, also, about the
relationships between the biota and its physicochemical environment.
Keywords: CLAW hypothesis, cloud-algae link, Dimethyl sulphide, Sulphur
biogeochemistry, Climate change.

“Até mesmo se CLAW vier a ser totalmente irrelevante em termos climáticos, ela deixará
um legado rico e fundamentalmente importante quanto às nossas percepções de como o mundo
funciona e ao modo como precisamos fazer nossa ciência para entendê-lo” (árbitro anônimo, citado
em Liss & Lovelock, 2007, p. 378).

INTRODUÇÃO
A epígrafe deste breve artigo traz à tona o argumento central que pretendemos defender
aqui, ainda mais por ser uma citação ipsis litteris de um árbitro protegido pelo anonimato. Neste
trabalho, abordaremos o desenvolvimento de uma hipótese científica que, com pouco mais de duas
décadas de existência, exerceu e vem exercendo grande impacto sobre as pesquisas relacionadas à
compreensão da dinâmica planetária do enxofre e das mudanças climáticas. A hipótese em questão
ficou conhecida na literatura como “hipótese CLAW”, um acrônimo dos nomes dos quatro
cientistas proponentes (Charlson, Lovelock, Andreae e Warren). A hipótese CLAW foi proposta em
1987 e enuncia, em linhas gerais, que a síntese e a liberação, pelas algas marinhas, de um composto
de enxofre, que dá origem aos núcleos de condensação de nuvens, atuariam na redução da
temperatura da superfície planetária. Esta hipótese foi bem recebida pela comunidade científica de
então, e tem repercutido nas investigações de diversas ciências dedicadas ao clima, bem como
contribuído para uma melhor compreensão das relações entre os seres vivos e seu ambiente físico-
químico. Ela levou, entre o final da década de 1980 e o início dos anos 1990, ao surgimento de uma
nova e interessante área de pesquisas interdisciplinares, conhecida como ‘conexão algas-nuvens’
(algae-cloud link)18. A hipótese CLAW e a área interdisciplinar à qual deu origem continuam a
despertar o interesse de diversos pesquisadores, destacando-se sua contribuição para o avanço
teórico e empírico do entendimento sobre a interação biosfera-atmosfera. Vale notar ainda, que os
estudos a este respeito consistem num excelente resultado de esforços conjuntos de pesquisadores
provenientes de diversas áreas do conhecimento.
A estrutura deste artigo é a seguinte. Na próxima seção, situaremos historicamente a
hipótese CLAW e explicaremos o que ela afirma, passando, então, a fazer algumas considerações
de natureza epistemológica. Nossa discussão na seção 2 se iniciará em torno de uma questão
científica importante na década de 1970, a saber, qual o composto que transporta o enxofre dos
oceanos para a terra e, assim, completa uma lacuna então existente no ciclo do enxofre? A partir do
exposto na seção 2, apresentaremos na seção 3 o que entendemos ser as principais implicações da
hipótese CLAW para o entendimento das relações dinâmicas entre os seres vivos e o ambiente
físico-químico, assim como da dinâmica planetária. Por fim, na seção 4, a partir dos argumentos
expostos, faremos nossas considerações finais.

DE UMA LACUNA NO CICLO DO ENXOFRE A UMA NOVA ÁREA DE PESQUISAS


INTERDISCIPLINARES
Até o início da década de 1970, havia muitas dúvidas acerca da dinâmica do ciclo do
enxofre. De fato, nosso conhecimento sobre o ciclo deste elemento apresentava lacunas
importantes. Uma dessas lacunas dizia respeito a qual seria o composto químico estável que atuaria
18
Aqui, usaremos a expressão “cloud-algae link”, mais freqüente na literatura, para nos referir à área de pesquisas em
questão. Uma expressão similar, “algae-cloud connection”, foi proposta por Andrew Bell em 1986 (ver Bell, 1986, p.
9), portanto, um ano antes da publicação do artigo de Charlson et al., no qual é apresentada a hipótese CLAW.
Entretanto, mesmo tendo proposto uma expressão similar à que nomearia a área de pesquisas, nem a publicação de Bell
nem os trabalhos científicos que ele relata fazem referência a um elo fechado ligando as algas, o DMS e as nuvens ao
clima planetário. De fato, esta ligação é feita, pela primeira vez, por Charlson et al., em 1987. Apesar de ter
desempenhado um papel central na criação da nova área de pesquisas, é provável que os trabalhos de Bell e dos
cientistas citados por ele também tenham contribuído para o surgimento da área conexão algas-nuvens.
Fórum Internacional do Meio Ambiente - A conferência da Terra 135

como transportador do enxofre dos oceanos para a terra. A ação mecânica da água ao longo dos rios
provoca a lixiviação dos solos e a intemperização das rochas, resultando numa água cada vez mais
rica em enxofre (na forma de íons sulfato). Esta é uma explicação para o fato de o enxofre ser mais
abundante nos oceanos do que nos continentes, apesar de ser um elemento essencial para todos os
organismos vivos. Desse modo, caso não existisse algum mecanismo que retornasse o enxofre de
volta para as massas de terra, os organismos terrestres não poderiam sobreviver, por estarem
privados de um elemento essencial. Nós sabemos, contudo, que o enxofre está acessível tanto aos
animais quanto às plantas, ou seja, eles não estão privados deste elemento. Mas, então, qual seria o
mecanismo de reposição do enxofre aos ecossistemas terrestres? A resposta a esta questão era, no
começo dos anos 1970, objeto de estudo de vários cientistas interessados na dinâmica do enxofre.
A visão convencional daquela época atribuía ao sulfeto de hidrogênio (H2S) o papel de
composto químico responsável pela transferência do enxofre dos oceanos para a terra. Um requisito
necessário para esta proposta é que grandes quantidades de H2S sejam liberadas dos oceanos, para
compensar a perda de enxofre do ambiente terrestre. Entretanto, como notou o químico inglês
James Lovelock, a água do mar é muito oxidante para permitir a existência de concentrações de
H2S que sejam suficientes para realizar a transferência do enxofre para a terra (Lovelock,
[1991]2000). Além disso, o H2S possui um odor muito forte e característico, o que o tornaria
facilmente detectável. No entanto, tal composto não fora encontrado, o que abriu espaço para novas
investigações. Em 1972, apoiando-se num trabalho de Fred Challenger, no qual o autor observara
que muitos organismos marinhos emitem sulfeto de dimetila (doravante, DMS), Lovelock e
colaboradores colocaram em xeque a visão tradicional e propuseram que o “DMS é o composto
natural de enxofre que cumpre o papel originalmente atribuído ao H2S; aquele de transferir o
enxofre dos mares através do ar para as superfícies de terra.” (Lovelock et al., 1972, p. 452)
É importante notar que a sugestão de que o DMS seria o intermediário envolvido na
dinâmica planetária do enxofre foi baseada numa das teses centrais da teoria Gaia, desenvolvida por
Lovelock e outros cientistas, como a microbióloga norte-americana Lynn Margulis, desde a década
de 1960. De acordo com a teoria Gaia, todos os seres vivos estão profunda e sistematicamente
envolvidos em mecanismos de regulação das variáveis físico-químicas do sistema Terra,
freqüentemente atuando como fontes de compostos químicos que podem ser detectados, por
exemplo, na atmosfera. Esta idéia também pode ser encontrada nas obras do grande pensador russo
das primeiras décadas do século XX, Vladimir Vernadsky ([1926]2007), como evidencia sua
conhecida máxima: “a vida é uma força geológica”. Entretanto, foi apenas entre as décadas de 1960
e 1970, com aportes teóricos advindo da cibernética e de estudos sobre detecção de vida
extraterrestre (Lovelock, [1991]2000), que esta idéia pôde ser articulada num sistema teórico com
grande poder explicativo, como fizeram Lovelock, Margulis e outros cientistas (Kump et al., 1999;
Jacobson et al., 2000). Após a divulgação do artigo de Lovelock e colaboradores, em 1972, novos
trabalhos mostraram que várias espécies de algas marinhas liberam DMS para a atmosfera
(Lovelock, [1991]2000; Gabric et al., 2001), e que o DMS, assim como outros compostos químicos,
pode estar envolvido no processo de nucleação de nuvens (Para mais detalhes, ver Ayers & Cainey,
2007; Liss & Lovelock, 2007). Seja como for, sabemos hoje que um conjunto de evidências
empíricas tem revelado que o DMS cumpre um importante papel no processo de indução à
formação de nuvens, razão pela qual a proposta de Lovelock e colaboradores foi incorporada à
Ciência do Sistema Terra e à biogeoquímica, figurando hoje como parte do conhecimento científico
convencional sobre a Terra (Kump et al., 1999; Jacobson et al., 2000).
Aqui, cabe sublinhar que a relação entre a refletividade das nuvens e o clima já havia sido
imaginada por Twomey em 1977 (citado em Ayers & Cainey, 2007, p. 367) e que, quatro anos
antes da proposta de Charlson e colaboradores, Shaw (1983, citado em Charlson et al., 1987) já
havia proposto que aerossóis atmosféricos de enxofre provenientes da biota poderiam participar do
balanço radiativo do planeta, afetando significativamente o clima. Contudo, nenhuma destas
propostas explicou de modo satisfatório a ligação entre as algas, as nuvens, o ciclo do enxofre e o
clima global, como fizeram Charlson et al. (1987). Neste artigo, tomando como base uma série de
trabalhos prévios sobre a dinâmica do enxofre e a formação de nuvens, e apoiando-se numa visão
Fórum Internacional do Meio Ambiente - A conferência da Terra 136

sistêmica da Terra, Lovelock e colaboradores propuseram que a rápida oxidação do DMS no ar


sobre os oceanos leva à formação de um aerossol (NSS-SO42-), que, ao ser oxidado, forma núcleos
necessários para a condensação de vapor d’água e conseqüente formação de nuvens sobre os
oceanos. Estes núcleos são denominados ‘núcleos de condensação de nuvens’ (abreviados CCN, do
inglês ‘cloud condensation nuclei’). A partir da análise cuidadosa destes fenômenos, os autores
enunciaram o que ficaria conhecido na literatura como hipótese CLAW.
De modo muito breve e esquemático, a hipótese CLAW afirma que há uma alça de
retroalimentação negativa ligando as algas, o DMS e as nuvens. Segundo os autores, quanto mais
quente, mais salina e mais intensamente iluminada a região do oceano, maior a taxa de volatilização
de DMS para a atmosfera. As porções de água nos oceanos que não estão cobertas por nuvens
tendem a ser mais iluminadas e se aquecer mais, já que recebem a radiação solar diretamente. O
aumento da temperatura deve levar a um aumento da produção de DMS pelas algas19,
contribuindo, assim, para a maior formação de nuvens sobre os oceanos. Estas nuvens reduzem,
então, a temperatura e a luminosidade da superfície, porque refletem boa parte da radiação solar. A
diminuição da temperatura na superfície da água leva, então, a uma menor produção de DMS, o que
reduz a produção de nuvens, levando novamente a um aumento da incidência de raios solares sobre
a superfície da água (Figura 1).

Figura 1 - Representação simplificada e esquemática da hipótese CLAW (retirado de Ayers &


Cainey, 2007, p. 367). Os sinais de + ou – indicam, respectivamente, feedback positivo ou negativo.
As interrogações indicam as relações entre os componentes do sistema que ainda não estão claras
no estado atual do conhecimento, como discutido no corpo do texto.

Algumas dúvidas acerca das relações entre as algas, a biota marinha, os compostos de
enxofre, as nuvens e o clima em geral ainda permanecem na comunidade científica, tendo já sido
apontadas, inclusive, em Charlson et al. (1987). O conjunto dos resultados empíricos gerados desde
a proposição de Charlson et al. (1987) não apontam todos numa mesma direção, a favor ou contra o
mecanismo proposto pela hipótese CLAW. Por exemplo, ainda é uma questão em aberto se o sinal
do feedback é positivo ou negativo. Também permanecem dúvidas acerca do modo como a ecologia
marinha influencia a abundância e a especiação do fitoplâncton, e também como estas variáveis se

19
A rigor, as algas não sintetizam DMS, mas sim o seu precursor, um composto conhecido como
dimetilsulfoniopropionato (DMSP). A demetilação enzimaticamente mediada do DMSP origina o DMS, que é liberado
para a água do mar quando as algas morrem. Portanto, assim como em muitos trabalhos de revisão sobre o assunto,
estamos fazendo uma simplificação, quando escrevemos apenas DMS.
Fórum Internacional do Meio Ambiente - A conferência da Terra 137

ligam à liberação de DMS (ver Figura 1). Tais lacunas não devem, contudo, surpreender-nos, na
medida em que a área de pesquisas na qual se insere a hipótese é muito recente. Além disso, é
importante notar que dúvidas são parte natural do processo de produção do conhecimento científico.
A hipótese CLAW tem suscitado uma intensa discussão desde que foi proposta,
particularmente devido às suas implicações para o problema do aquecimento global (Ayers &
Cainey, 2007; Vallina et al., 2007; van Rijssel e Gieskes, 2002; Gabric et al., 2001; Andreae &
Crutzen, 1997; Schwartz, 1988). Após a publicação do artigo de Charlson e colaboradores em 1987,
mais de 1500 publicações foram feitas sobre a hipótese CLAW (Ayers & Cainey, 2007). Charlson,
Lovelock, Andreae e Warren receberam, em 1988, o prêmio Norbert Gerbier-Mumm, uma honraria
importante concedida pela Organização Meteorológica Mundial (World Meteorological
Organization), vinculada à ONU, como reconhecimento por suas descobertas e pela elaboração de
um mecanismo para o ciclo do enxofre (WMO, 2007). Recentemente, o periódico Environmental
Chemistry publicou um número quase exclusivamente dedicado à hipótese CLAW, tratando de sua
história, de controvérsias a seu respeito, avanços teóricos e empíricos, além de implicações para a
compreensão da dinâmica climática no planeta (Cainey, 2007).
É importante observar, contudo, que a produção de DMS pelo fitoplâncton não deve ser
interpretada como um ato de altruísmo global, com o suposto objetivo de manter a temperatura da
Terra em valores adequados para a sobrevivência de toda a biota. A síntese do precursor do DMS
tem custos metabólicos para as algas e, portanto, estes custos devem ser compensados com
benefícios próprios. Com efeito, há evidências de que o precursor do DMS cumpre, no mínimo,
quatro papéis: (1) é um soluto que contribui para o equilíbrio osmótico celular (Stefels, 2000; Kirst,
1996); (2) um antioxidante (Sunda et al., 2002); (3) um inibidor da cisteína e da metionina (através
de um mecanismo de superabundância [overflow mechanism], cf. Stefels, 2000, p. 192); e (4) um
mediador de informação química em interações contra predadores (Steinke et al., 2002; Stefels,
2000; Wolfe et al., 1997;). Estas quatro funções fisiológicas parecem ser importantes para o sucesso
reprodutivo das algas e, por isso, trata-se de um comportamento que pode ter sido selecionado
evolutivamente. Hamilton & Lenton (1998) apresentam um interessante tratamento evolutivo deste
aspecto.
Apesar de sua aceitação pela comunidade científica e de seu papel potencial na
compreensão do sistema Terra, a hipótese CLAW ainda não pôde ser adequadamente testada, na
medida em que os mecanismos de retroalimentação envolvendo processos atmosféricos e oceânicos
são bastante complexos e vários aspectos da oxidação do DMS na atmosfera não são ainda bem
compreendidos (Ayers & Cainey, 2007; Vallina et al., 2007; Malin, 2006; Andreae & Crutzen,
1997). Contudo, se a hipótese CLAW será mantida ou refutada é uma questão secundária para o
nosso argumento. Esta é uma questão empírica que será resolvida, ao seu próprio tempo, pela
comunidade científica. O que nos interessa aqui é a capacidade das propostas de Lovelock et al.
(1972) e Charlson et al. (1987) de gerar novas previsões e novas questões de pesquisa. Os estudos
pioneiros destes autores deram origem a uma nova área de pesquisas, com caráter fortemente
interdisciplinar, no qual pesquisadores de disciplinas como a geoquímica, a geofísica, a
biogeoquímica, a climatologia, a meteorologia, a taxonomia, a oceanografia e a biologia evolutiva
vêm atuando em colaboração estreita. Além disso, é importante sublinhar que, de acordo com a
hipótese CLAW, fazendo ou não parte de um mecanismo de controle do clima, “micro- e macro-
algas têm um importante papel no sistema climático, porque provêem os gases precursores [...] para
a formação de novas partículas e fornecem uma fonte de CCN, sem os quais nós não teríamos
quaisquer nuvens” (Ayers & Cainey, 2007, p. 370). Está claro que as partículas de aerossóis
cumprem papel crucial tanto na condensação quanto na formação de nuvens. Christner et al. (2008)
destacam que os aerossóis produzidos biologicamente (principalmente por microorganismos) são
ubíquos e constituem as principais fontes de partículas ativas para induzir a formação de nuvens,
particularmente sob condições de alta temperatura.
Usando a terminologia da teoria da ciência do filósofo Imre Lakatos ([1970]1995),
podemos dizer que houve, nos termos de Lakatos (pp. 31-37), uma alteração progressiva do
problema que se buscava resolver dentro do programa de pesquisa Gaia. Um esforço de pesquisa
Fórum Internacional do Meio Ambiente - A conferência da Terra 138

que se iniciou buscando um intermediário para o ciclo do enxofre não apenas indicou com sucesso
qual seria este composto, mas acabou por levar à descoberta de uma relação nova entre o
metabolismo das algas e a cobertura de nuvens sobre os oceanos, com implicações importantes para
a compreensão do clima da Terra. É necessário ter em mente que a visão convencional anterior
afirmava que uma fonte puramente físico-química poderia produzir o intermediário desconhecido
do ciclo do enxofre, no caso, o H2S. Porém, diferentemente das fontes não-biológicas, os seres
vivos produzem compostos de enxofre e os liberam continuamente20 (Charlson et al., 1987;
Lovelock, [1991]2000, Lovelock et al., 1972).
A descoberta do DMS foi possível devido à adoção de certos pressupostos teórico-
metodológicos, como a asserção de que os organismos vivos são fontes de muitos compostos
importantes nos ciclos de compostos químicos. Esta descoberta foi uma conseqüência da idéia de
que os processos biológicos são fundamentais para a existência da combinação bastante improvável
de gases na atmosfera terrestre (incluindo O2, N2, CH4 e CO2), a qual não pode ser explicada
recorrendo apenas a processos físico-químicos. Não podemos perder de vista ainda que a hipótese
CLAW não apenas representa um novo mecanismo para a biogeoquímica do enxofre, mas sugere
fortemente inovações teórico-metodológicas para o estudo integrado dos ciclos biogeoquímicos,
dando-se particular atenção para as interações entre os organismos e seu meio material. Por
exemplo, o DMS é um composto que une o ciclo da água (na medida em que o vapor d’água se
agrega aos CCN de modo a formar nuvens) ao ciclo do enxofre, por participar simultaneamente
destes dois ciclos. Além disso, como o DMS atua na formação de nuvens e na conseqüente redução
da temperatura da superfície planetária, ele se apresenta como um elemento potencialmente
importante para a compreensão do clima global, sobretudo, quando existe uma tendência de
aquecimento provocada pelo acúmulo e pela constante liberação de gases de efeito estufa. Uma
abordagem que busque integrar os ciclos biogeoquímicos numa grande rede dinâmica global se
mostra, assim, crítica para o entendimento do complexo processo de mudança climática em curso.
A regulação da temperatura planetária (a qual é vista freqüentemente como a principal variável
alterada no processo de mudanças climáticas) é uma propriedade sistêmica, e não apenas de partes
do sistema Terra. Esta é, em nosso entendimento, uma importante lição metodológica a ser extraída
da história da hipótese CLAW.

IMPLICAÇÕES DA HIPÓTESE CLAW PARA A COMPREENSÃO DA DINÂMICA GLOBAL


Lovelock & Rapley (2007) propuseram recentemente, em carta à Nature, um mecanismo
de geoengenharia visando mitigar os efeitos do aquecimento global. Este mecanismo está
fundamentado na contribuição das algas para a liberação de DMS e para a captura de CO2
atmosférico. Os autores propõem a instalação nos oceanos de tubos ou canos verticais, flutuantes ou
amarrados, com o objetivo de “aumentar a mistura de águas ricas em nutrientes abaixo da
termoclina[21] com as águas relativamente estéreis da superfície oceânica” (Lovelock & Rapley,
2007, p. 403). Estes canos deveriam ter de 100 a 200 metros de comprimento e 10 metros de
diâmetro e bombeariam água do fundo para a superfície, fornecendo, assim, nutrientes para as algas
acima da termoclina. Esta oferta extra de nutrientes aumentaria a taxa de crescimento das algas e,
em conseqüência, a taxa fotossintética, a qual está relacionada à taxa de captura de CO2 da
atmosfera. Além disso, as algas aumentariam sua emissão de DMS, o que, em última instância,
resfriaria o planeta, devido à sua contribuição para a formação de nuvens. De fato, conforme
sugeriram Jones & Gabric (2006, p. 28), o DMS pode ser tratado, se a hipótese CLAW estiver
correta, como um “gás estufa negativo” e a duplicação de sua quantidade na atmosfera poderia levar

20
As principais fontes não-biológicas de enxofre, excluindo as atividades industriais humanas, são os vulcões e as
fumarolas que liberam H2S e SO2. Estes processos são responsáveis apenas por cerca de 10 a 20% do fluxo natural de
compostos de enxofre para a atmosfera. Além disso, a liberação de gases por estas fontes não-biológicas é altamente
variável no espaço e no tempo, sendo que pequenas erupções vulcânicas geralmente são de importância apenas local.
Por sua vez, grandes erupções vulcânicas, que tendem a influenciar áreas maiores, são eventos muito raros (Charlson, et
al., 1987).
21
Trata-se da região de transição de temperatura entre a superfície oceânica e o oceano profundo.
Fórum Internacional do Meio Ambiente - A conferência da Terra 139

a um resfriamento da superfície planetária em até 1,3 ºC 22. De acordo com Lovelock e Rapley
(2007), apesar dos riscos envolvidos na instalação deste mecanismo, precisaríamos – com urgência
– induzir fortemente o sistema a regenerar-se. Em suas palavras, “a remoção de 500 gigatoneladas
de dióxido de carbono do ar através do esforço humano está além da nossa atual capacidade
tecnológica. Se nós não podemos ‘curar o planeta’ diretamente, nós podemos ser capazes de ajudar
o planeta a curar a si mesmo” (Lovelock & Rapley, 2007, p. 403).
A proposta de Lovelock e Rapley foi comentada por Shepherd, Iglesias-Rodriguez e Yool
(2007), em carta publicada na edição seguinte da Nature. Estes autores advertem que o mecanismo
de geoengenharia proposto por Lovelock e Rapley poderia “causar problemas, em vez de curá-los”
(p. 781). Estes autores recorrem a estudos anteriores que mostraram que, apesar do aumento da
biomassa dos produtores, não ocorre seqüestro de carbono no oceano profundo, porque as partículas
que carregam o carbono fixado são rapidamente degradadas pela respiração dos organismos
marinhos e remineralizadas dentro dos limites das águas oceânicas superiores. Assim, é provável,
de acordo com estes autores, que quase todo o CO2 capturado pelas microalgas seja devolvido à
atmosfera no período de um ano. Além disso, o fato de interferir-se num ecossistema ainda pouco
conhecido poderia gerar danos, por exemplo, alterando-se sua estrutura trófica, de tal modo que os
problemas resultantes poderiam superar os possíveis benefícios da geoengenharia defendida por
Lovelock e Rapley.
Entretanto, intervenções no sistema Terra como a proposta por Lovelock e Rapley não são
a única maneira pela qual os estudos na área da conexão algas-nuvens podem contribuir para
mitigar os efeitos das mudanças climáticas. Há outra implicação destes estudos – de fato mais
interessante – que deve ser mais explorada pelos cientistas que constroem modelos climáticos. A
hipótese CLAW e os estudos que vêm sendo desenvolvidos a partir da teoria Gaia desde a década
de 1990 apontam para a enorme complexidade dos ciclos biogeoquímicos, bem como para o fato de
que os seres vivos não devem figurar como personagens secundários nos modelos climáticos, mas
sim como elementos críticos para o entendimento da dinâmica global dos elementos. As algas, por
exemplo, são sorvedouros de CO2 e fontes de DMS e O2 – substâncias importantes para a dinâmica
climática no planeta. Modelos que não levam em conta o papel das algas na dinâmica global, apenas
para usar um exemplo, não são apenas representações muito simplificadas do sistema de interação
entre estes organismos e o seu ambiente físico-químico em escala global23, mas sim representações
irrelevantes de tal sistema. Estamos cientes de que os trabalhos de modelagem climática têm
apontado na direção de incorporar adequadamente o papel dos organismos vivos, porém ainda o
fazem de modo incipiente. A importância deste ponto não pode ser subestimada. Como apontam
Ayers & Cainey (2007, p. 370), o relatório do Grupo de Trabalho 1 do Painel Intergovernamental
sobre Mudanças Climáticas (IPCC), publicado em fevereiro de 2007, não dá a devida atenção à
hipótese CLAW (ver IPCC, 2007). Entretanto, como apontam estes autores:
“[...] A menos que nós compreendamos completamente as conexões biológicas-físicas-químicas-
dinâmicas-microfísicas inerentes à hipótese CLAW, nós seremos incapazes de avaliar
adequadamente os riscos da mudança climática para os sistemas marinhos, ou considerar estratégias
apropriadas de mitigação ou adaptação” (Ayers & Cainey, 2007, p. 370).

22
Ainda de acordo com estes autores (p. 28), o DMS preso em bolhas de ar no gelo seria liberado para a atmosfera com
o derretimento da calota Antártica, o que constitui uma interessante hipótese a ser testada sobre os efeitos do DMS no
clima antártico. Note-se ainda que este é um mecanismo similar ao proposto pela hipótese da arma dos clatratos (ou
hidratos) de metano (ver Chakoumakos, 2004). Entretanto, diferentemente do metano que, uma vez liberado, aceleraria
o derretimento do gelo nos pólos e, em conseqüência aumentaria a temperatura planetária, o DMS, por ser um gás
estufa negativo, seria parte de um processo de retroalimentação negativa e atuaria no equilíbrio da temperatura
planetária, contrabalançando o efeito aquecedor dos gases estufa.
23
Em medidas variáveis, todos os modelos são, de fato, representações simplificadas de algum sistema. Porém, o ponto
aqui diz respeito ao grau em que são incorporados certos elementos no modelo e em conseqüência toca na questão da
relevância dos modelos para a geração de conhecimento e para as tomadas de decisões (com uma grande dimensão
ética).
Fórum Internacional do Meio Ambiente - A conferência da Terra 140

CONSIDERAÇÕES FINAIS
Esperamos com este trabalho ter mostrado a importância dos estudos das conexões entre
algas e nuvens para a compreensão da dinâmica global. A hipótese CLAW e a área de pesquisas por
ela gerada apontam para lições importantes a respeito do modo como se faz ciência atualmente,
quando se estudam as mudanças climáticas. Esta hipótese oferece uma abordagem global dos
fenômenos. Diante da crise ambiental contemporânea, uma abordagem desta natureza é
imprescindível, uma vez que fenômenos de mudanças climáticas não são espacialmente localizados,
mas afetam todo o sistema Terra.
Muitas das ações sociopolíticas relativas à questão climática têm sido baseadas em
evidências produzidas a partir de modelos do clima ou da dinâmica e das inter-relações entre a
biosfera e a atmosfera. Julgamos que tão mais acertadas serão estas ações ou decisões, quanto
melhor se apoiarem em modelos que consideram o papel dos seres vivos, algo já reconhecido no
estudo dos ciclos biogeoquímicos. Em nossa visão, caminharemos a passos largos nesta direção se
incorporarmos seriamente no trabalho de modelagem princípios teóricos formulados na área da
conexão algas-nuvens que se têm mostrado heuristicamente poderosos.

REFERÊNCIAS BIBLIOGRÁFICAS
ANDREAE, M.O.; CRUTZEN, P.J. Atmospheric aerosols: Biogeochemical sources and role in
atmospheric chemistry. Science, vol. 276, p. 1052–1058, 1997.
AYERS, G.P.; CAINEY, J.M. The CLAW hypothesis: a review of the major developments.
Environmental Chemistry, vol. 4, n. 6, 366–374, 2007.
BELL, A. The algae-cloud connection. ECOS Magazine, n. 47, pp. 9–11, 1986.
CAINEY, J.M. Investigating the current thinking on the CLAW Hypothesis. Environmental
Chemistry, vol. 6, n. 4, p. 365, 2007.
CHAKOUMAKOS, B. Preface to the Clathrate Hydrates special issue. American Mineralogist,
vol. 89, 1153–1154, 2004.
CHARLSON, R.J.; LOVELOCK, J.E.; ANDREAE, M.O.; WARREN, S.G. Oceanic
Phytoplancton, Atmospheric Sulphur, Cloud Albedo and Climate. Nature, vol. 326, n. 6114, pp.
655–661, 1987.
CHRISTNER, B.C.; MORRIS, C.E.; FOREMAN, C.M.; CAI, R.; SANDS, D.C. Ubiquity of
Biological Ice Nucleators in Snowfall. Science, vol. 319, p. 1214, 2008.
GABRIC, A.; GREGG, W.; NAJJAR, R.G.; ERICKSON, D. J. III.; MATRAI, P. Modeling the
Biogeochemical Cycle of Dymethylsulfide in the Upper Ocean: a Review. Chemosphere – Global
Change Science, vol 3, n. 4, pp. 377–392, 2001.
HAMILTON, W.D.; LENTON, T.M. Spora and Gaia: How Microbes Fly with Their Clouds.
Ethology, Ecology & Evolution, vol. 10, n. 1, pp. 1–16, 1998.
IPCC, 2007: Climate Change, 2007: The Physical Science Basis. Contribution of Working Group I
to the Fourth Assessment Report of the Intergovernamental Panel on Climate Change. SOLOMON,
S.; QIN, D.; MANNING, M.; CHEN, Z.; MARQUIS, M.; AVERYT, K.B.; TIGNOR, M.;
MILLER, H.L. (Eds.). Cambridge University Press: Cambridge, United Kingdom and New York,
NY, USA, 996 pp. Disponível em: <www.ipcc.ch>. Acesso em: 20 out. 2007.
JACOBSON, M.C.; CHARLSON, R.J.; RODHE, H.; ORIANS, G.H. Earth System Science: From
Biogeochemical Cycles to Global Changes, Elsevier: San Diego, CA, 2000.
JONES, G.; GABRIC, A. Sulphur aerosols released from melting sea ice may influence Antarctic
climate. Australian Antarctic Magazine, n. 10, pp. 28–29, 2006.
KIRST, G.O. Osmotic adjustment in phytoplankton and macroalgae: the use of
dimethylsulfoniopropionate (DMSP). In: KIENE, R.P.; VISSCHER, P.T.; KELLER, M.D.; KIRST,
G.O. (Eds.). Biological and Environmental Chemistry of DMSP and Related Sulfonium
Compounds, Plenum Press: New York, pp. 121–129, 1996.
KUMP, L.R.; KASTING, J.F.; CRANE, R.G. The Earth System. Prentice Hall: New Jersey, 1999.
LAKATOS, I. Falsification and the methodology of scientific research programmes [1970]. Vol. 1,
pp. 8-101. In: WORRAL, J.; CURRIE, G. (Eds.). The methodology of scientific research
Fórum Internacional do Meio Ambiente - A conferência da Terra 141

programmes, Philosophical Papers, vol. 1. Cambridge: Cambridge University Press, 1995.


LISS, P.; LOVELOCK, J. Climate change: the effect of DMS emissions. Environmental Chemistry,
vol. 6, n. 4, 377–378, 2007.
LOVELOCK, J.E. Gaia: the Practical Science of Planetary Medicine. Oxford: Oxford University
Press. [1991]2000.
LOVELOCK, J.E.; MAGGS, R.J.; RASMUSSEN, R.A. Atmospheric Dimethyl Sulphide and the
Natural Sulphur Cycle. Nature, vol. 237, pp. 452–453, 1972.
LOVELOCK, J.E.; RAPLEY, C. Ocean pipes could help the Earth to cure itself. Nature, vol. 449,
p. 403, 2007.
SCHWARTZ, S.E. Are global cloud albedo and climate controlled by marine phytoplankton?
Nature, vol. 336, pp. 441–445, 1988.
SHEPHERD, J.; IGLESIAS-RODRIGUEZ, D.; YOOL, A. Geo-engineering might cause, not cure,
problems. Nature, vol. 449, n. 18, p. 781, 2007.
STEFELS, J. Physiological aspects of the production and conversion of DMSP in marine algae and
higher plants. Journal of Sea Research, vol. 43, pp. 183–197, 2000.
STEINKE, M.; MALIN, G.; LISS, P.S. Trophic interactions in the sea: an ecological role for
climate relevant volatiles? Journal of Phycology, vol. 38, n. 4, pp. 630–638, 2002.
SUNDA, W; KIEBER, D.J.; KIENE, R.P.; HUNTSMAN, S. An antioxidant function for DMSP
and DMS in marine algae. Nature, vol. 418, pp. 317–320, 2002.
VALLINA, S.M.; SIMÓ, R.; GASSÓ, S.; BOYER-MONTÉGUT, C.; DEL RÍO, E.; JURADO, E.;
DACHS, J. Analysis of a potential ‘‘solar radiation dose–dimethylsulfide–cloud condensation
nuclei’’ link from globally mapped seasonal correlations. Global Biogeochemical Cycles, vol. 21,
pp. 1–16, 2007.
VAN RIJSSEL, M.; GIESKES, W. Temperature, Light, and the Dimethylsulfoniopropionate
(DMSP) Content of Emiliania huxleyi (Prymnesiophyceae). Journal of Sea Research, vol. 48, n. 1,
pp. 17–27, 2002.
VERNADSKY, V.I. Geochemistry and The Biosphere. Essays by Vladimir I. Vernadsky,
Synergetic Press: Santa Fé, New Mexico, [1926] 2007.
WMO. World Meteorological Organization. Winners of the Norbert Gerbier-Mumm International
Award. Disponível em: <http://www.wmo.ch/pages/about/awards/winners_mumm.html>. Acesso
em: 20 out. 2007.
WOLFE, G.V.; STEINKE, M.; KIRST, G.O. Grazing-activated chemical defence in a unicellular
marine alga. Nature, vol. 387, pp. 894–897, 1997.
Fórum Internacional do Meio Ambiente - A conferência da Terra 142

ESTUDO CLIMATOLÓGICO DA EVOLUÇÃO TEMPORAL DA TEMPERATURA


MÁXIMA E MÍNIMA MENSAL PARA O MUNICÍPIO DE ARARIPINA – PE

Janaina Assis
Departamento de Geografia, UFPE e Laboratório de Meteorologia de Pernambuco – LAMEPE/ITEP Av. Prof Luiz
Freire, 700. Cidade Universitária. Cep: 50.740-540. Recife – PE. janaina.assis@itep.br
Janduy Araújo
Laboratório de Meteorologia de Pernambuco – LAMEPE/ITEP Av. Prof Luiz Freire, 700. Cidade Universitária. Cep:
50.740-540. Recife – PE
Ricardo Irmão
Departamento de Eng. Cartográfica, UFPE e Laboratório de Meteorologia de Pernambuco – LAMEPE/ITEP Av. Prof
Luiz Freire, 700. Cidade Universitária. Cep: 50.740-540. Recife – PE

RESUMO
O objetivo deste trabalho é estudar a evolução temporal das temperaturas máximas e
mínimas sobre o Município de Araripina, situado no sertão do Estado de Pernambuco, para o
período compreendido entre 1952 a 2005 e relacionar os resultados à degradação ambiental sofrida
por tal região nos últimos anos. Os resultados obtidos mostraram que houve uma acentuada
tendência para a elevação da temperatura máxima em escala climatológica. Quando se compara a
climatologia de (1979 a 2005) com a climatologia de (1952 a 1978), encontra-se valores tão altos
como 4.4C, o que em parte, pode ser atribuída à localização espacial do instrumento de coleta de
dados, o qual transferiu-se de um local provido de árvores de grande porte para um local
descampado, e em parte, pode estar relacionada à degradação ambiental, sofrida pela região. A
análise da temperatura mínima mostrou que não houve do ponto de vista climatológico, uma
tendência tão significativa quanto a encontrada na temperatura máxima.
Palavras-chave: temperaturas, degradação, climatologia.

ABSTRACT
The goal of this work is to study the temporal evolution of the maximum and minimum
temperatures on the Municipal district of Araripina, placed in the interior of the state of
Pernambuco, for the period among 1952 to 2005 and to relate the results to the environmental
degradation suffered by such an area in the last years. The obtained results showed that there was an
accentuated tendency for the elevation of the maximum temperature in climatological scale. When
the climatology is compared of (1979 to 2005) with the climatology of (1952 to 1978), he/she meets
as high as 4.4C values, which partly, the space location of the instrument of collection of data can
be attributed, which was transferred of a local one provided of trees high for a local countryside,
and partly, the environmental degradation can be related, suffered by the area. Analyse it of the
minimum temperature, it showed that there was not of the climatological point of view, such a
significant tendency with found relationship her in the maximum temperature.
Keywords: temperatures, degradation, climatological.

INTRODUÇÃO
O Aquecimento global é um fenômeno climático de larga extensão - um aumento da
temperatura média superficial global que vem acontecendo nos últimos 150 anos. Entretanto, o
significado deste aumento de temperatura ainda é objeto de muitos debates entre os cientistas.
Causas naturais ou antropogênicas (provocadas pelo homem) têm sido propostas para explicar o
fenômeno.
Os dados de temperatura obtidos de diversas fontes em todo o mundo mostram que nos
últimos 100 anos a temperatura da superfície terrestre, a qual inclui a baixa atmosfera e a superfície
do oceano, tem aumentado significativamente no século passado. O IPCC (Intergovernamental
Panel on Climate Change) estima que a elevação da temperatura esteja entre 0.4C e 0.8C. Segundo
Kalnay & Cai (2003), a temperatura poderá subir em até 0,088C por década, chegando próximo da
situação mais otimista indicada no relatório do IPCC. Em conseqüência disso, as medidas do nível
do mar em escala global apresentam uma elevação de 0.1 a 0.2m para esse mesmo período de
Fórum Internacional do Meio Ambiente - A conferência da Terra 143

tempo (The Earth Science Enterprise Series). Com o aquecimento global, em um futuro próximo,
espera-se cenário de clima mais extremo, com secas, inundações e ondas de calor mais freqüentes
(Salati et al., 2004).
Segundo Accioly et al. (2006), a vegetação da caatinga da área foco deste trabalho sofreu,
para um período de 28 anos (1973-2001) uma redução de 82.81%. O levantamento, com base em
imagens de satélites, mostra que, dos 93.001.27 ha existentes em 1973, restavam apenas 50.872.47
em 2001. No mesmo período a extração de gipsita na região passou de 200 mil toneladas para 1.4
milhões de toneladas ao ano. Partindo-se desse pressuposto e sabendo-se que o aquecimento global
é condicionado pela mudança climática de origem natural e àquela causada pelo homem objetiva-se
neste trabalho estudar a correlação entre a degradação ambiental sofrida pelo município de
Araripina com as temperaturas máximas e mínimas para um período em escala climatológica.

ÁREA DE ESTUDO
A área de estudo compreende o município de Araripina – PE, localizado entre as
coordenadas geográficas 07º29’00” latitude sul e 40°36’00” longitude oeste, está localizado na
mesorregião Sertão e na Microrregião Araripina do Estado de Pernambuco (ver fig. 1), limita-se ao
norte com o Estado do Ceará e a oeste com o Estado do Piauí. Está inserido na unidade
geoambiental da Depressão Sertaneja, que representa a paisagem típica do semi-árido nordestino,
caracterizada por uma superfície de pediplanação bastante monótona, abrangendo uma área de
aproximadamente 1.900 km2.

Fig. 1 Mapa das microrregiões do Estado de Pernambuco com destaque para o Município de
Araripina (região hachurada) Fonte: SRH - Secretaria de Recursos Hídricos.

MÉTODOS E PROCEDIMENTOS TÉCNICOS


Os dados obtidos neste trabalho (temperatura máxima e mínima) são oriundos da estação
convencional de coleta de dados (1952-1997) e da plataforma de coleta dados – PCD (1980-2005)
do Município de Araripina-Pe, fornecidos pelo banco de dados do Laboratório de Meteorologia de
Pernambuco – LAMEPE.
Ressalta-se que a partir de 1980 foi mudado também o local da obtenção da coleta de
dados, que passou a situar-se a aproximadamente 300m do local anterior, mantendo-se a mesma a
altitude, porém o novo local tem como característica está desprovida de árvores de grande porte, o
que era evidente no antigo local.
Fórum Internacional do Meio Ambiente - A conferência da Terra 144

O software utilizado neste estudo é uma ferramenta muito utilizada nos grandes Centros
Meteorológicos que possibilita a visualização dos dados obtidos através dos Modelos Numéricos,
Sondagens Via Satélite, Radiossondagens, entre outros, conhecido como GrADS ( Grid Analysis
and Display System). O GrADS trabalha com modelos de dados em quatro dimensões, onde as
dimensões normalmente são latitude, longitude, nível e tempo. Cada conjunto de dados está
localizado dentro de um espaço de quatro dimensões através do uso de um arquivo descritor de
dados. O software foi utilizado neste trabalho para o processamento dos dados de temperatura.
Foram feitas séries temporais em escala climatológica da temperatura máxima e mínima desde 1952
até 2005 para cada mês e comparou-se com a média aritmética climatológica para todo o período.
Adicionalmente, obteve-se a diferença entre a climatologia das temperaturas máximas e mínimas de
(1979 a 2005) e (1952 a 1978) e apresentou-se os resultados em forma gráfica.

RESULTADOS E DISCUSSÃO
As Fig. 2 e 3 mostram a evolução temporal da temperatura máxima para o primeiro e
segundo semestre do município de Araripina, desde 1952 a 2005. Nota-se que há uma acentuada
lacuna de dados nas décadas de 50 e 60, o que pode ser atribuído a eventuais problemas na estação
convencional. Em ambas as figuras evidencia-se que, a partir da década de 80, houve uma inversão
em torno da média climatológica, da temperatura máxima. Até a década de 80 as temperaturas
máximas encontram-se predominantemente abaixo da média e a partir de 1980 predominantemente
acima da média climatológica. De um modo geral, entretanto, pode-se observar que existe uma
tendência de crescimento da temperatura máxima para todo o período em estudo.

Fig. 2 Evolução Temporal da Temperatura Máxima Mensal do primeiro semestre do período (1952
– 2005), para o Município de Araripina. Fonte: LAMEPE/ITEP.
Fórum Internacional do Meio Ambiente - A conferência da Terra 145

Fig. 3 Evolução Temporal da Temperatura Máxima Mensal do segundo semestre do período (1952
– 2005), para o Município de Araripina. Fonte: LAMEPE/ITEP.

Acredita-se que esta inversão da temperatura máxima em torno da média climatológica


pode ser atribuída, em sua maior amplitude, ao fato de que em 1980, houve uma mudança espacial
da ordem de 300m, no local de coleta de dados, o qual se encontrava em uma área cercada por
árvores de grande porte e deslocou-se para uma área livre. Deve-se, contudo evidenciar, que a
região de Araripina, vem passando por um elevado grau de degradação ambiental a partir de 1973
(tabela1), o que pode interferir significativamente no clima local, de modo a diminuir a
evapotranspiração, afetar o albedo local e, por conseguinte interferir na temperatura do ar.
Fórum Internacional do Meio Ambiente - A conferência da Terra 146

Tabela 1 - Variação temporal da área ocupada por cada classe de cobertura. Fonte: Accioly et. al.
(2006).

Na Figura 4 é exibida a diferença entre a temperatura máxima para o período de (1979 a


2005) e o período de (1952 a 1978), na qual se pode observar que concomitantemente com os
resultados apresentados nas Figuras 2 e 3 há um aumento da temperatura mensal máxima no
período de 1979 a 2005 se comparado com o período de 1952 a 1978, com valores tão elevados
quanto 4.4C para o mês de junho. Observa-se ainda, de conformidade com a figura 4, que os meses
de maio, junho e julho apresentam uma elevação maior que nos outros meses. Note-se ainda que a
temperatura aumentou em todos os meses. É importante relembrar, que dois fatores podem ter
contribuído enormemente para elevação da temperatura: A mudança do local de captação de dados,
a partir de 1980 e a degradação ambiental.
Fórum Internacional do Meio Ambiente - A conferência da Terra 147

Figura 4. Diferença entre a temperatura máxima para o período de (1979 a 2005) e o período de
(1952 a 1978). Fonte: LAMEPE/ITEP.

A figura 5 aplica a mesma metodologia que na Figura 4, só que para a temperatura mínima
mensal. Nela, observa-se que houve uma elevação na temperatura mínima entre os junho, julho e
agosto, de 0.6C, enquanto que os meses de outubro, novembro e dezembro apresentam uma
diminuição na temperatura. Tal resultado indica que a temperatura mínima se mostra menos
sensível a uma perturbação do meio.

Figura 5. Diferença entre a temperatura mínima para o período de (1979 a 2005) e o período de
(1952 a 1978). Fonte: LAMEPE/ITEP.

CONCLUSÃO
Os resultados obtidos neste trabalho sugerem que:
Fórum Internacional do Meio Ambiente - A conferência da Terra 148

A temperatura máxima de um determinado local é mais sensível a uma mudança no


ambiente do que a temperatura mínima;

Há uma tendência climatológica da elevação da temperatura máxima para o Município de


Araripina, o que pode estar associado em parte à degradação ambiental do local;

Não se pode afirmar que aumentos nas temperaturas máximas tão expressivas como os
obtidos neste trabalho estão exclusivamente associados a efeitos antropogênicos, como a
degradação de um determinado ambiente, leva-se em consideração o histórico climático da região,
que encontra-se em ambiente semi-árido e apresenta um clima predominante quente e seco.

REFERÊNCIAS BIBLIOGRAFICAS
ACCIOLY, J. O. et al: Avaliação das mudanças na cobertura do solo entre os anos de 1973 e 2001 e
suas implicações no potencial lenheiro do município de Araripina – PE. Anais – III Simpósio
Regional de Geoprocessamento e Sensoriamento Remoto. Aracaju/SE, outubro/2006.
CALADO, M., “Apontamento sobre Instrumentos Meteorológicos de Observação de Superfície”,
INPE, 1979
KALNAY, E. et al: Impact of urbanization and land-use change on climate. Nature, v.423, p.528-
531, 2003.
NOBRE, Carlos A. Aquecimento global e o papel do Brasil. Ciência hoje. Rio de Janeiro, v. 36, n.
211. p. 38-40. dez 2004.
PINTO, H.S. et al: Estimativa das temperaturas médias mensais do Estado de São Paulo em função
da altitude e latitude. São Paulo: USP, 1972. 20p. (Caderno Ciências da Terra, 23).
SALATI, E. et al: As mudanças climáticas globais e seus efeitos nos ecossistemas brasileiros.
Disponível em: <http://www.comciencia.br/reportagens/clima/clima14.htm > Acesso em: 04 março,
2004.
SOUZA, M. M. et al: Comparação entre os Perfis de Temperatura Obtidos a partir do Modelo
Numérico, Sondagens Via Satélite e Radiossondagem. Anais – Terceira Conferência Científica do
LBA. Brasília/DF, julho/2004.
Fórum Internacional do Meio Ambiente - A conferência da Terra 149

RELAÇÃO DE TRANSMISSIVIDADE DA RADIAÇÃO ULTRAVIOLETA E OZÔNIO


ESTRATOSFÉRICO E SUAS IMPLICAÇÕES NA SAÚDE HUMANA

Angela Cristina Silva


Geógrafa e Mestre em Geografia – FATEC Presidente Prudente
Membro do GAIA – Grupo de Pesquisa Interações na Superfície Terrestre, Água e Atmosfera
E-mail: angela_zanelato@yahoo.com.br

RESUMO
Estudos prospectivos apontam que a redução do ozônio estratosférico (O3) em decorrência
da ação antropogênica, pode acarretar um aumento no fluxo de radiação ultravioleta (RUV) na
superfície terrestre. A RUV é considerada o principal agente etiológico de diversas enfermidades e,
entre elas, o câncer de pele. As estimativas indicam uma tendência de aumento no número de casos
novos de câncer cutâneo no âmbito mundial. Como forma de orientação para uma exposição segura
ao sol, a comunidade científica desenvolveu o Índice UV, parâmetro de medida dos níveis diários
de RUV relevante à sensibilidade da pele humana dentro de um espectro de ação eritêmica. O
objetivo do presente trabalho foi analisar a relação de transmissividade da RUV e O3 sob condições
de céu claro e presença de nuvens, a partir de dados coletados pelo sensor TOMS e dados
observacionais de superfície da Estação Meteorológica da FCT/UNESP. Outro objetivo do trabalho
foi a elaboração de uma banco de dados de câncer de pele para a região Oeste do Estado de São
Paulo e identificação do perfil epidemiológico da população acometida por essa patologia.
Palavras-chave: câncer de pele, radiação ultravioleta, ozônio estratosférico.

ABSTRACT
Prospective studies appear that the reduction of the stratospheric ozone (O3) due to the
antropogenic action, it can cart an increase in the flow of ultraviolet radiation (UVR) in the
terrestrial surface. UVR is considered the main etiological agent of several illnesses and, among
them, the skin cancer. The estimates indicate an increase tendency in the number of new cases of
cutaneous cancer in the world extent. As orientation form for a safe exhibition in the sun, the
scientific community developed the UV Index, parameter of measure of the daily levels of relevant
UVR inside to the sensibility of the human skin of a spectrum of erythemal action. The objective of
the present work was to analyze the relationship of transmissividade of UVR and O3 under
conditions of clear sky and presence of clouds, starting from data collected by sensor TOMS and
data observing of surface of the Meteorological Station of FCT/UNESP. Other objective of the
work was the elaboration of a database of skin cancer for the West region of the State of São Paulo
and identification of the epidemic profile of the population attacked by that pathology.
Keywords: skin cancer, ultraviolet radiation, stratospheric ozone.

INTRODUCAO
A degradação do ozônio estratosférico (O3), gás com concentração variável e diminuta na
atmosfera terrestre, representa um dos maiores problemas ambientais no século XXI.
A variabilidade do O3 é essencialmente gerada por processos físico-químicos e transporte
meridional (DOBSON, 1968). Todavia a ação antropogênica intensificada a partir da Revolução
Industrial tem contribuído para a aceleração dos processos de destruição desse gás. Apesar de
representar menos de 1% da massa atmosférica, o O3 é essencial para a vida e balanço energético na
Terra (SALBY, 1995), em decorrência de ser um eficiente agente absorvedor da radiação solar
ultravioleta (RUV), compreendida na faixa espectral de 100 a 400 nm, e fonte de liberação de
energia na forma de calor (LONDON, 1985).
Segundo Krzýscin (1996, apud KIRCHHOFF et al., 2000), estima-se que a redução de
1% no conteúdo total de ozônio estratosférico poderia causar um aumento de 1,2% na RUV
biologicamente ativa.
A RUV, enquanto elemento ambiental, também é influenciada por diversos fatores de ordem
geográfica, astronômica e atmosférica. Por isso, para se determinar a irradiância espectral da RUV, é
Fórum Internacional do Meio Ambiente - A conferência da Terra 150

imprescindível a observância dos seguintes elementos: elevação solar, altitude da superfície, albedo
da superfície e cobertura nebulosa (VANICEK; et al. 2000).
A exposição excessiva à RUV pode causar efeitos fotobiológicos e fotoquímicos danosos
ao organismo humano. A pele, os olhos e o sistema imunológico são os órgãos mais lesados
(DIFFEY, 1991).
Segundo a WHO (2001), a incidência do câncer de pele vem crescendo nas últimas
décadas, superando até mesmo o câncer de mama, próstata e pulmão. A RUV é considerada o
principal agente etiológico dessa enfermidade, principalmente se a exposição inadvertida a radiação
solar ocorrer durante a infância e adolescência.
No Brasil, de acordo com o Instituto Nacional do Câncer (2006), o câncer cutâneo detém o
primeiro lugar no ranking de incidência e apresenta tendência de aumento no número de casos
novos em todo território nacional, conforme mostra o Quadro 1.
O resultado de estudos prospectivos sobre a epidemiologia do câncer de pele no âmbito
mundial, fez com que a comunidade científica desenvolvesse um parâmetro de medida da RUV,
com o objetivo de informar a população leiga sobre os níveis diários da radiação solar, como forma
de orientação e prevenção do câncer cutâneo e diversas outras enfermidades relacionadas à
exposição ao sol.
O Índice UV (IUV) é uma escala de determinação da intensidade da RUV na superfície
terrestre, relevante a sensibilidade biológica da pele humana, descrita por um espectro de ação
eritêmica formulado por McKinlay e Diffey (1987) e adotado pela CIE - Commission on
Ilumination (CORRÊA, 2003).
Segundo WHO (2002), o IUV é uma grandeza adimensional apresentada nos seguintes
intervalos de intensidade de radiação: baixo (1 – 2); moderado (3 – 5); alto (6 – 7), muito alto (8 –
10) e extremo ( ≥ 11).

Quadro 1 – Estimativa da incidência de câncer de pele no Brasil.

Fonte: Instituto Nacional de Câncer


* CPNM – Câncer de Pele Não Melanoma
** MM – Melanoma Maligno
Fórum Internacional do Meio Ambiente - A conferência da Terra 151

O objetivo do presente trabalho foi analisar a relação de transmissividade da RUV,


padronizada na forma de Índice UV, e o conteúdo vertical de ozônio estratosférico, na região Oeste
do Estado de São Paulo - Brasil, dentro do segmento temporal (jan/1999 a dez/2004). Também
buscou-se elaborar um banco de dados de incidência de câncer de pele dentro da área de estudo,
através da identificação do perfil epidemiológico dos indivíduos acometidos por essa patologia.

MATERIAL E METODOS
A análise da variabilidade têmporo-espacial do conteúdo vertical de ozônio estratosférico
(O3) foi realizada a partir dos dados coletados pelo sensor TOMS (Total Ozone Mapping
Spectrometer), que monitora a Terra a bordo do satélite EarthProbe, da NASA, disponibilizados no
site (www.jwochy.gsfc.nasa.gov).
A partir dos valores médios diários de O3, foram realizados cálculos do Índice UV (IUV)
para o segmento temporal jan/1999 a dez/2004. Os cálculos do IUV foram efetuados com o auxílio
do código UVGAME (Ultraviolet Global Atmospheric Model).
Como a RUV é atenuada pela nebulosidade, através de processos de absorção e
espalhamento, utilizou-se dados dessa variável para se determinar o impacto da cobertura nebulosa
no cálculo do IUV. O levantamento dos dados de nebulosidade foi realizado junto a Estação
Meteorológica da FCT/UNESP, campus de Presidente Prudente, onde são realizadas observações de
superfície.
Todavia, diante do grau de subjetividade e percepção de cada observador meteorológico, a
fim de se determinar a altura e o tipo de nuvem, fez-se uma relação entre os valores aproximados de
transmitância propostos pela EPA (Environmental Protection Agency) e a nebulosidade observada
na Estação Meteorológica da FCT/UNESP, o que permitiu a seguinte classificação, conforme
mostra a Tabela 1.

Tabela 1 – Fatores de modificação das nuvens.


TRANSMITÂNCI COBERTUR
COBERTURA GLOBAL
A A
Céu claro 100 % 0–2
Nuvens esparsas 89 % 3–5
Céu parcialmente encoberto 73 % 6–8
Céu totalmente encoberto 31 % 9 – 10
Fonte: EPA, 2005.

As simulações do IUV foram obtidas sob duas condições: a primeira, para céu claro, com
ausência total de nuvens e; a segunda, com a presença de nuvens. Também optou-se em trabalhar
com três horários específicos: 11h, 14h e ao meio dia solar, para representar a máxima elevação do
Sol.
A proposta de formação de um banco de dados de incidência de câncer de pele para área de
estudo, bem como a identificação do perfil epidemiológico dessa enfermidade, ocorreu através da
coleta direta periódica de dados, disponibilizados em três laboratórios situados no município de
Presidente Prudente-SP, que realizam análises de biópsias citopatológicas e anatomopatológicas de
48 municípios localizados no Oeste Paulista.
Nos laudos de biópsias foram coletadas informações sobre o câncer de pele, de acordo com
a sua tipologia e grau de letalidade, conforme segue: Carcinoma Basocelular (CBC) e Carcinoma
Espinocelular (CEC), ambos denominados Câncer de Pele Não-Melanoma (CPNM), e o Melanoma
Maligno (MM).
Também foram coletadas informações sobre a região cutânea de prevalência do câncer de
pele, sexo e idade. Embora a variável cor da pele seja um elemento importante, nos estudos de
câncer cutâneo, infelizmente não foi possível incluí-la na análise, em virtude de irregularidades na
Fórum Internacional do Meio Ambiente - A conferência da Terra 152

qualidade e fornecimento dessa informação. Na revisão dos laudos de biópsias anatomopatológicas,


foram computados apenas os casos novos de câncer de pele, excluindo-se as recidivas.
O agrupamento dos dados e a análise estatística foi realizada com o auxílio do programa
Microsoft Excel e do pacote estatístico Origin.

ANÁLISE E DISCUSSÃO DOS RESULTADOS


Variabilidade do IUV e Ozônio Estratosférico
A série temporal de O3 para o Oeste Paulista, dentro do recorte temporal proposto,
apresentou valor médio em torno de 264 UD, com máximo de 286 UD e mínimo de 237 UD, o que
vem a corroborar com as afirmações de Baird (2002), para quem, em climas tropicais, o conteúdo
médio de ozônio estratosférico encontra-se em torno de 250 UD (Figura 1).

Figura 1 - Ângulo solar zenital, IUV sem a presença de nuvens e conteúdo de ozônio estratosférico,
ao meio dia solar, na região Oeste do Estado de São Paulo (jan/1999 a dez/2004).

O ozônio estratosférico apresentou um comportamento cíclico em função da estação do


ano, com maiores níveis de concentração ocorrendo em setembro, início da primavera, e menores
valores em abril, no outono.
Pode-se verificar que o IUVo com ausência total de nuvens apresentou variabilidade
temporal de acordo com as estações do ano, com valores máximos mensais (IVU ≥ 10), nos meses
de janeiro e dezembro, causados principalmente pela variação anual do ângulo solar, que, nesse
período do ano, encontra-se próximo ao zênite. Os valores mínimos e máximos ficaram,
respectivamente, em torno de 4,6, no inverno, e 14,9, no verão, ao passo que a média obtida foi de
9,8. Isso ocorre porque cerca de 25% da quantidade de RUV, recebida no verão, chega à superfície
terrestre em torno do meio dia, entre as 11 e 13 horas, e cerca de 75% entre as 9 e 15 horas (WHO,
2002).
Observa-se que, mesmo durante o inverno, existe a necessidade de utilizar medidas
adequadas de proteção ao sol, pois o IUV > 5, de acordo com a OMS, pode causar queimaduras
e/ou diversas outras enfermidades relacionadas à radiação solar. Nos meses de inverno, quando a
temperatura está mais baixa, invariavelmente as pessoas tendem a se expor ao sol como forma de se
aquecer, aumentando o risco de desenvolver um câncer cutâneo.
Podemos concluir a partir da análise da Figura 1 que, a sazonalidade do conteúdo de
ozônio no Oeste paulista não tem nenhuma influência na variabilidade do IUV, em decorrência da
Fórum Internacional do Meio Ambiente - A conferência da Terra 153

localização geográfica. A sazonalidade do ozônio estratosférico ora verificado decorre do processo


de produção e perda de ozônio na atmosfera. Porém, a variabilidade do IUV para a latitude
geográfica, na qual se insere o Oeste Paulista, está intimamente relacionada com a declinação solar,
ao longo do ano.
Para as simulações do IUV, O3 e ângulo solar zenital, para as 11 e 14 horas, com a
presença de nuvens (Figuras 2 e 3), verifica-se que o IUV mesmo em condições de presença de
nuvens apresentou valores considerados extremos pela OMS, em torno de 13,9 no verão. O IUV
médio sazonal foi de 7,7 e 8,6, respectivamente na primavera e verão, com valores mínimos em
torno de 1,4 e 4,5 no inverno.
Contudo em condições de céu totalmente encoberto, ou seja, fração da abóbada celeste
10/10, o IUV sofreu atenuação em torno de 80%. Isto ocorre porque a atenuação do IUV depende
da espessura óptica da nuvem. Nuvens mais espessas como a cumulus-nimbus, popularmente
conhecidas como nuvens de chuva, possui maior capacidade de atenuação. Em contrapartida, as
nuvens menos espessas como a cirrus, por exemplo, tendem a não exercer muita influencia na
irradiância espectral.
Nas duas simulações, a atenuação do IUV exercida pelos diferentes tipos nuvens e posição
do sol em relação ao zênite decorre da diminuição da irradiância global, pois a atenuação da
radiação direta é mais eficiente que a produção de radiação difusa descendente, conforme afirma
Corrêa (2003). Assim, considerando o sol no zênite, quanto maior a espessura óptica, maior será a
atenuação do IUV.

Figura 2 - Ângulo solar zenital, IUV com presença de nuvens e conteúdo de ozônio estratosférico,
às 11 horas, na região Oeste do Estado de São Paulo (jan/1999 a dez/2004).
Fórum Internacional do Meio Ambiente - A conferência da Terra 154

Figura 3 - Ângulo solar zenital, IUV com presença de nuvens e conteúdo de ozônio estratosférico,
às 14 horas, na região Oeste do Estado de São Paulo (jan/1999 a dez/2004).

Epidemiologia do Câncer de Pele no Oeste Paulista


No período de seis anos abrangidos pela pesquisa (jan/1999 a dez/2004), foram
diagnosticados 8.063 casos novos de câncer de pele. A distribuição dos casos novos, segundo o tipo
de câncer cutâneo, foi: 5.888 casos de CBC, correspondendo a 73% do total; 1.976 casos de CEC
(24,5%) e 199 casos de MM (2,5%), conforme se pode ver na Figura 4.

Figura 4 - Casos novos de câncer de pele, de acordo com a sua tipologia, registrados na região
Oeste do Estado de São Paulo (jan/1999 a dez/2004).

Na Figura 5, temos a distribuição percentual anual do câncer de pele, de acordo com o


gênero e sua tipologia. Dos casos novos de CBC registrados, aproximadamente 51,4%
desenvolveram-se em indivíduos do sexo feminino e 48,6%, no sexo masculino. Já para o CEC, a
predominância foi no sexo masculino (52,3%), enquanto o sexo feminino deteve 47,7% dos casos.
Dos casos registrados de MM, há uma predominância significativa dessa enfermidade em
indivíduos do sexo feminino (60,8% dos casos). No ano de 1999, 45,7% dos casos de MM foram
Fórum Internacional do Meio Ambiente - A conferência da Terra 155

diagnosticados em indivíduos do sexo feminino, chegando a atingir percentuais em torno de 73%,


nos anos de 2001 e 2002, e, em 2004, cerca de 58,6% dos casos novos registrados.

Figura 5 - Predominância do câncer de pele (%), de acordo com o gênero e tipologia da


enfermidade maligna cutânea, diagnosticados na região Oeste do Estado de São Paulo (jan/1999 a
dez/2004).

Observa-se, na Figura 6, que os casos de câncer cutâneo registrados em indivíduos do sexo


feminino ocorreram com maior freqüência na sexta e sétima década de idade, ao passo que, nos
indivíduos do sexo masculino, a predominância foi na sexta década de idade (Figura 7).
Todavia, os grupos etários acometidos por essa enfermidade também se mostraram bem
amplos, apresentando casos novos diagnosticados entre os 20 e 100 anos de idade, para ambos os
sexos.

Figura 7 - Predominância do câncer de pele em indivíduos do sexo masculino, de acordo com a


idade, diagnosticados na região Oeste do Estado de São Paulo (jan/1999 a dez/2004).
Fórum Internacional do Meio Ambiente - A conferência da Terra 156

Figura 6 - Predominância do câncer de pele em indivíduos do sexo feminino, de acordo com a


idade, diagnosticados na região Oeste do Estado de São Paulo (jan/1999 a dez/2004).

Na Figura 8, temos a predominância do câncer de pele de acordo com a região cutânea.


Vê-se que mais de 65% dos casos registrados ocorrem na cabeça. Provavelmente isso se explica
porque, quando expostos ao sol, recebemos a radiação direta em um ângulo em torno de 90º. A
região do tronco deteve 13,5% dos casos, seguida dos membros superiores (11,4%) e membros
inferiores (3,2%). Cerca de 6% dos casos diagnosticados encontram-se na categoria “não
declarado”, em decorrência da falta de notificação do local anatômico de retirada do fragmento
cirúrgico, no laudo de biópsia anatomopatológica.
Há que se ressaltar que as áreas de maior ocorrência do câncer cutâneo são aquelas que
invariavelmente ficam expostas à radiação solar. Os percentuais registrados podem ser atribuídos às
significativas mudanças nos padrões culturais da população.
Seguindo as tendências da moda nacional e internacional, a população, de um modo geral,
está usando roupas mais curtas e decotadas, deixando partes do corpo à mostra.

Figura 8 - Predominância do câncer de pele (%), de acordo com a região cutânea, diagnosticados na
região Oeste do Estado de São Paulo (jan/1999 a dez/2004).

Até a década de 1960, era inadmissível uma pessoa expor determinadas partes do seu
corpo, pois tal ato era considerado imoral e desrespeitoso. Todavia, com a criação do biquíni, das
mini-saias, bermudas e camisetas regatas, a população foi incorporando no seu dia-a-dia esse tipo
de vestimenta, que antes era relegado às regiões praianas, vindo a perder a proteção física que a
roupa mais “recatada” oferecia. A abolição do uso de chapéus e sombrinhas, acessórios não mais
presentes na moda atual, também causou um impacto negativo no que diz respeito à proteção da
radiação solar.

De modo geral, as hipóteses mais aceitas para os resultados obtidos estão relacionadas:
a) Às mudanças nos padrões culturais e sociais de exposição individual ao sol (DIFFEY, 2000).
No Brasil, de modo geral, pele bronzeada é sinônimo de beleza. A busca desse padrão de beleza,
através do bronzeamento natural ou artificial, como as câmaras de bronzeamento, pode trazer
prejuízos irreparáveis à saúde humana;
b) À melhoria nos sistemas de saúde e diagnósticos clínicos (SOUZA, 2001). Com a ampliação do
atendimento nos setores de saúde pública, mais pessoas tiveram acesso a esse serviço, o que
proporcionou o diagnóstico clínico e tratamento de diversas enfermidades, entre as quais o
câncer cutâneo;
c) Ao aumento considerável de atividades realizadas a céu aberto, sejam por lazer, sejam laborais
(CORRÊA, 2003). No passado, entre as décadas de 1950 e 1970, a população rural era maior
que a população urbana, na região Oeste do Estado de São Paulo. As atividades realizadas no
Fórum Internacional do Meio Ambiente - A conferência da Terra 157

campo obrigavam os trabalhadores a ficar várias horas do dia expostos ao sol, com risco
potencial de desenvolver o câncer de pele. Nos dias atuais, apesar de ocorrer uma reversão, isto
é, a população urbana é maior que a população rural, ocorrem diversas atividades em que os
trabalhadores também ficam várias horas do dia expostos à radiação solar, como, por exemplo:
vendedores ambulantes, carteiros, garis etc.;
d) Ao aumento da expectativa de vida da população brasileira (JUCHEM et al., 2002). Como o
câncer de pele decorre da ação cumulativa da RUV, ao longo da vida, com o aumento da
expectativa de vida há igualmente um aumento no número de casos de câncer de pele.

Segundo Diffey (2000) e Okuno & Vilela (2005), estudos recentes sugerem, também, um
aumento nos casos de morbidade por câncer de pele em decorrência do uso inadequado de protetor
solar e maior tempo de exposição ao sol. Ao utilizar o protetor solar, os indivíduos acabam
aumentando ainda mais seu tempo de exposição solar, uma vez que se sentem seguros e protegidos
da RUV. Essa falsa segurança, associada ao uso incorreto do protetor solar, aumenta a
probabilidade de desenvolvimento de uma série de doenças relacionadas à exposição solar, entre as
quais o câncer de pele.

CONCLUSÕES
Os resultados obtidos mostraram que não há nenhuma relação dos valores medidos de
ozônio estratosférico (O3) no Oeste Paulista e os episódios do “buraco na camada de ozônio”,
quando o O3 atinge níveis inferiores a 220 UD, no continente antártico.
As análises realizadas apontaram também que não há nenhuma relação direta entre os
valores mínimos de O3 e valores máximos do Índice UV (IUV). A variabilidade do IUV, nessa
região, está relacionada a fatores de ordem astronômica, como o ângulo solar zenital em
determinadas estações do ano, que acaba influenciando o fluxo de RUV que atinge a superfície
terrestre, e de ordem geográfica, em decorrência do posicionamento latitudinal do recorte espacial
estudado, em torno de 22º S da linha do Equador.
As simulações do IUV para condições de céu claro e sob a presença de nuvens resultaram
em valores considerados altos e extremos (IVU > 10), durante boa parte do ano. Somente entre os
meses de maio a julho ocorreu uma redução do IUV, em torno de 5 a 7, valores estes que já
requerem cuidados para uma exposição segura, segundo Vanicek et al. (2004).
Quanto à influência das nuvens no fluxo de RUV, pode-se verificar atenuação da mesma
em cerca de 80%, quando o céu se encontrava totalmente encoberto. O IUV calculado sob a
presença de nuvens, com céu totalmente encoberto, apresentou valores em torno de 1,4 a 4,3, ou
seja, de baixo a moderado. Portanto, a cobertura nebulosa é um eficiente mecanismo de atenuação
da RUV.
No que tange aos casos de câncer de pele na região Oeste do Estado de São Paulo, a
pesquisa permitiu a verificação de que não há um elemento unicausal para a sua deflagração.
Fatores como fototipo cutâneo, histórico de queimaduras solares, uso de medidas de proteção e
hábitos de exposição ao sol, são elementos imprescindíveis para análise da incidência do câncer
cutâneo.
Todavia os resultados alcançados sugerem um cuidado maior da população que se expõe
ao sol, voluntariamente ou por necessidade, visto que os altos índices de RUV podem causar efeitos
deletérios irreversíveis à saúde humana interferindo na qualidade de vida dos indivíduos acometidos
por essa patologia.

REFERÊNCIAS BIBLIOGRÁFICAS
BRASIL. Ministério da Saúde. Instituto Nacional de Câncer. Estimativa de câncer 2006.
Disponível em: <http://www.inca.gov.br/estimativa/2006/>. Acesso em: 03 fev. 2006.
CORRÊA, M. P. Índice ultravioleta: avaliações e aplicações. 2003, 216 f. Tese (Doutorado em
Ciências) – Instituto de Astronomia, Geofísica e Ciências Atmosféricas, Universidade de São Paulo,
São Paulo.
Fórum Internacional do Meio Ambiente - A conferência da Terra 158

DIFFEY, B. L. Luz solar, câncer de pele e redução do ozônio. Tradução: José Tadeu Garcia
Tommaselli. In: DIFFEY, B. L. Causes and environmental implications of increased UV-B
radiation. Cambrige, GBR: The Royal Society of Chemistry, 2000. Disponível em:
<http://site.ebrary.com /lib/unesp/Doc?id=10015647&ppg=12 1>. Acesso em: 30 set. 2005.
DIFFEY, B. L. Solar ultraviolet radiation effects on biological systems. Physics in Medicine and
Biology, 36(3), p. 299-328, 1991. Disponível em: <http://www.ciesin. org/docs/001-
503/001503.html>. Acesso em: 25 out. 2005.
DOBSON, G.M.B. Ozone in the Atmosphere, In: DOBSON, G.M.B. Exploring the Atmosphere.
Oxford: University Press, 1968, p. 111-136.
JUCHEM, P. P.; et al. Riscos à saúde da radiação ultravioleta. Revista Boa Saúde [on line] 2001.
Disponível em:<http://boasaude. uol.com.br/lib/showDoc.cfm?LibDocID=3801&ReturnCatID=
1773>. Acesso em: 02 abr. 2004.
KIRCHHOFF, V. W. J. H.; et al. Variação sazonal da radiação ultravioleta solar biologicamente
ativa. Revista Brasileira de Geofísica, vol. 18, n.1, p. 63-74, 2000. Disponível em:
<http://www.scielo.br/scielo.php?pid=S0102-261X20000001 00006& script =sci_arttext>. Acesso
em: 10 abr. 2005.
KRZÝSCIN, J. UV controlling factors and trends derived from the ground-based measurements
taken at Belsk, Poland, 1976-1994. Journal Geophysics. Res., 101(D11):16797-16805, 1996.
LONDON, J. Observed distribution of atmospheric ozone and its variations. In: WHITTEN RC &
PRASAD SS (Ed.). Ozone in the free atmosphere. New York: Van Nostrand Reinhold, 1985, cap.
1, p. 11–80.
McKINLAY, A. F.; DIFFEY, B. L. A reference action spectrum for ultraviolet-induced erythema in
human skin. Journal CIE, v. 6, n. 1, p. 17-22, 1987.
OKUNO, E.; VILELA, M. A. C. Radiação ultravioleta: características e efeitos. São Paulo: Editora
Livraria da Física / Sociedade Brasileira de Física, 2005 (Temas Atuais de Física).
SALBY, M.L. Fundamentals of atmospheric physics. International Geophysics Series, vol. 61, ed.
Academic Press, California, 1985, cap. 1, p. 1–54.
SOUZA, S. R. P. Tendência temporal da mortalidade por melanoma cutâneo no Estado de São
Paulo. 2001, 211 f. Tese (Doutorado em Saúde Ambiental) – Faculdade de Saúde Pública,
Universidade de São Paulo, São Paulo.
VANICEK, K., et al. Índice UV para o público. Tradução: Fernanda do Rosário da Silva Carvalho.
Ação COST-713. Lisboa, 2000. Disponível em: <http://www.arsalgarve.min-saude.pt/docs/pub_
indiceuv.pdf>. Acesso em: 28 abr. 2004.
WORLD HEALTH ORGANIZATION. Fact sheet nº 261: protecting children from ultraviolet.
Genebra, 2001. Disponível em: <http://www.who.int /mediacentre/factsheets/ fs261/en/print.html>.
Acesso em: 30 out. 2004.
WORLD HEALTH ORGANIZATION. Global Solar UV Index: a practical guide. Genebra, 2002.
Disponível em: <http://www.who.int/uv/publications/en/ GlobalUVI.pdf>. Acesso em: 25 set. 2004.
Fórum Internacional do Meio Ambiente - A conferência da Terra 159

ANÁLISE CLIMÁTICA E RITMO DAS PRECIPITAÇÕES PLUVIOMÉTRICAS EM


RECIFE -PERNAMBUCO- PARA O ANO 2000 E SUAS CONSEQUÊNCIAS SOCIO-
AMBIENTAIS

Thaís Sousa Menezes Teixeira


Aluna de graduação; Centro de Ciências Biológicas; Universidade Federal de Pernambuco. thayba17@hotmail.com
Marcos Tavares de Arruda Filho
Aluna de graduação; Centro de Ciências Biológicas; Universidade Federal de Pernambuco.
marcostavares30@hotmail.com
Manuela Souza Correia de Araújo
Aluna de graduação; Centro de Ciências Biológicas; Universidade Federal de Pernambuco. manusckrela@hotmail.com
Professor orientador: Cristiano Aprigio dos Santos.

RESUMO
A análise rítmica das chuvas em Recife no ano 2000 se dá pelo levantamento dia a dia dos
picos de chuvas, o qual é necessário para obter resultados de análise e identificação do clima, além
de observar seu reflexo na cidade e alertar para possíveis problemas e soluções dos já existentes.
Esse artigo tem por objetivo mostrar e comparar os meses mais chuvosos com os problemas de
alagamento, proliferação desordenada de habitações e desabamento de encostas e aparecimento de
epidemias. O objetivo principal é mostrar como o meio ambiente humano é conturbado e vulnerável
ao aumento das chuvas e como pode haver soluções para tais problemas envolvendo população e os
órgãos públicos competentes. Para essa realização utilizamos dados disponíveis nos sites do ITEP
(Instituto de Tecnologia de Pernambuco), INPE (Instituto Nacional de Pesquisas Espaciais), e dos
jornais impressos Diário de Pernambuco e Jornal do Commércio levantando dados pluviométricos e
térmicos além de ocorrências conseqüentes como mortes, contaminações e alagamentos. Após esse
levantamento se constatou que o número de casos de mortes por desabamentos, casas desmoronadas
com as barreiras, aumento do número de doenças de veiculação hídrica como leptospirose, dengue
entre outras, tendem a aumentar em determinados meses ditos chuvosos como Julho e Agosto. Não
só a população carente sofre com as chuvas, mas a sociedade como um todo, além disso, diversas
ruas alagadas obstruem o trânsito e dificultam o fluxo de carros e pedestres em avenidas de grande
circulação no Recife.
Palavras-Chaves: análise rítmica, precipitações, desabamentos, contaminações, alagamentos

ABSTRACT
The analysis of the rhythmic rains in Recife in 2000 is done by the inventory of the daily
peak rainfall, which is needed for results of analysis and identification of climate, besides its
reflection in the city and alert for possible problems and the existing solutions. This article aims to
show and compare the rainy months with the problems of flooding, disorderly proliferation of
housing, collapse of hillsides and emergence of epidemics. The main goal is to show how the
human environment is disturbed and vulnerable to the increase in rainfall how can solutions be
provided to problems involving population and the responsible public agencies. For this
achievement, data on rainfall and temperature and consequential events as deaths, contamination
and floods available on the websites of ITEP (Instituto de Tecnologia de Pernambuco), INPE
(National Institute of Space Research), and the newspapers Diário de Pernambuco and Jornal do
Commércio were used. After this survey it was found that the number of deaths collapsed houses
with barriers, increasing the number of diseases of running water as leptospiroses, dengue among
others, tend to increase in rainy months such as July and August. Not only the poor people suffer
with the rain, but the society as a whole, as several flooded streets obstruct the traffic and hamper
the flow of cars and pedestrians on streets of higher movement in Recife.
Key-words: analysis rhythmic, rain, collapsed, contamination, floods

INTRODUÇÃO
A análise dos diferentes climas se dá pelo levantamento rítmico do tempo e, no caso desse
relatório, pelo levantamento dos picos de chuvas. A quantidade de chuvas que assolam e Recife a
Fórum Internacional do Meio Ambiente - A conferência da Terra 160

cada ano é um fator preocupante para a sociedade. Analisar ritmicamente as chuvas, ver seus
impactos na cidade e propor soluções para tais efeitos é o objetivo deste artigo.
Recife possui clima Tropical chuvoso tipo As’ a Ams’ (Koppen) está localizada na porção
oriental do Nordeste, a 8° 04’ 03’’ de latitude Sul e 34° 55’ 00’’de longitude Oeste. A Região
Metropolitana do Recife configura uma faixa alongada no sentido norte-sul situado no litoral
pernambucano, nele encontrando-se localizada, em sua porção central, a cidade do Recife. (Alheiros
et al, 2002).
Representa cerca de 3% da área do território pernambucano onde se insere, concentrando
42% da população e mais da metade do PIB estadual e mesmo com as maiores potencialidades e
condições efetivas de crescimento do Estado de Pernambuco, apresenta um dos maiores índices de
vulnerabilidade socioeconômica (0,73). Este resultado explica-se, pois Recife tem a maior
densidade demográfica dentre as capitais brasileiras junto à maior percentagem de domicílios com
mais de duas pessoas por cômodo, maior taxa de pobreza e de mortalidade infantil,e ao mesmo
tempo tem as menores porcentagens de domicílios com abastecimento de água, serviço de esgoto e
destino de lixo.
Parte do território da Região Metropolitana do Recife é constituído por relevos
movimentados, genericamente denominados morros, ocupam cerca de ¾ de sua área, onde habitam
cerca de 600 mil habitantes. Os municípios costeiros (Recife, Olinda, Jaboatão, Cabo, Paulista e
Ipojuca) têm mais problemas com a ocupação de suas encostas, devidas às maiores precipitações
pluviométricas e a maior argilização dos minerais constituintes dos sedimentos e solos.
Atualmente encontram-se identificados cerca de 10.000 pontos de risco nas áreas de
morros da cidade do Recife e 3.000 em Olinda. Estima-se que a existência de aproximadamente
20.000 pontos de risco no território urbanizado da Região Metropolitana do Recife. São definidos
como pontos de risco os locais em morros que apresentam problemas de estabilidade ou de erosão
de encostas. (Andrade, 2002).
A despeito desta caracterização como condicionante, tais elementos ambientais,
correntemente ao longo da história sofreram agressões do processo de urbanização, reduzindo e
descaracterizando suas feições originais que hoje resultam em graves situações de risco para uma
população pobre que foi impelida à ocupação de áreas menos valorizadas nas encostas e alagados.
(Marinho, 2002).
O crescimento populacional interage diretamente com o meio, alterando as condições
naturais, trazendo para o ambiente construído – seja nas áreas de planície, seja nas áreas de morros
– a expressão da desigualdade social. Em um processo de periferização característico da expansão
das grandes cidades brasileiras, a população pobre, também, se desloca na busca de condições de
acesso à terra e à moradia, e não tendo muitas escolhas, avança para as bordas da malha urbana
ocupando os terrenos impróprios – as encostas dos morros – intensificando as ocorrências de
acidentes.
A chegada dos meses chuvosos também causa imensos transtornos em várias vias urbanas,
causados por um sistema de drenagem falho que não dá escoamento às águas superficiais. Há
também grande incidência de casos de doenças causadas por vetores que se dissipam pela água, por
exemplo a leptospirose que é originária de roedores (ex. ratos urbanos) que ocorre sob a forma
epidêmica associada à extremos de precipitação seguidos de enchentes urbanas, durante o verão, em
grandes cidades litorâneas como Recife. (Confalonieri, 2003), a dengue também se destaca por seu
vetor se reproduzir principalmente em água limpa, que no período chuvoso é abundante. Por esses e
outros fatores, o levantamento das chuvas é de grande importância na detecção e solução desses
problemas.

MATERIAL E MÉTODOS
Foram utilizados para o desenvolvimento deste artigo climogramas e tabelas produzidos
pelo programa de informática Excel, tendo como embasamento teórico trabalhos de outros autores,
tais como Conti, 2000 e Sant’anna Neto, os dados pluviométricos foram obtidos dos sites: Lamepe,
consultado no dia 26 de fevereiro de 2007, às 14hs, que foram cedidos do posto Recife-PCD ( posto
Fórum Internacional do Meio Ambiente - A conferência da Terra 161

de coleta de dados ) , código 480 do ano 2000; CPTEC (Centro de Previsão de Tempo e Estudos
Climáticos) consultado no dia 05 de março de 2007, às 16hs, de onde foram retiradas informações
sobre as massas de ar que atuaram no ano 2000 e CNPM (Centro Nacional de Pesquisa de
Monitoramento por Satélite) consultado no dia 06 de março de 2007, às 17hs30 sobre os dados da
temperatura.
Dos dados citados acima, foram utilizados os picos de chuva acima da média de cada mês
para a construção dos gráficos. Foram retirados ainda, dados do Jornal do Commércio e do Jornal
Diário de Pernambuco da cidade do Recife para análise dos acontecimentos ligados às chuvas,
como sua ação ao meio ambiente e suas conseqüências na sociedade.
Foram considerados nos gráficos apenas os dias que em cada mês superou a média normal
registrada e a partir daí construiu-se os gráficos e interligaram-se aos fenômenos noticiados pelos
jornais impressos locais.

RESULTADOS E DISCUSSÃO
Ao longo de todo ano 2000 o Recife, como todos os outros anos, foi bastante castigado
pela chuva e pelas suas conseqüências (Quadro 01.). No mês de janeiro houve três deslizamentos de
barreiras, vários barrancos ameaçados, e várias casas e muros rachados. A CODECIR registrou 390
ocorrências, a grande maioria 80% foi deslizamento de barreiras. Neste mês choveu 130% a mais
que a media do mês. (Quadro 02.)

Quadro 01. Ano 2000

25 26
25
20
24
15 Prec (mm)
23
Temp
Prec

Temp (°C)
10 22
21
5
20
0 19
Fev

Nov
Mai
Mar

Dez
Jan

Ago
Set
Jun
Jul

Out
Abr

mês

Quadro 02. Janeiro.

60 28,5

50 28
27,5
40
27 Prec (mm)
Temp
Prec

30
26,5 Temp (°C)
20
26
10 25,5
0 25
2 4 5 7 8 9 15 18

No mês de fevereiro, várias vias da cidade do Recife foram interditadas devido a


alagamentos, como Avenida Recife, Caxangá, entre outras, (Quadro 03.). No mês de março não
houve ocorrências relevantes (Quadro 04.). Já no mês de abril, grandes alagamentos ocorreram nas
principais vias, além de duas mortes no dia 10/04/2000 e quedas de muro no Cordeiro, Morro da
Conceição e na Bomba do Hemetério; dezessete deslizamentos de barreiras, várias ruas alagadas
fecharam o mês (Quadro 05.).
Fórum Internacional do Meio Ambiente - A conferência da Terra 162

Quadro 03. Fevereiro.

35 29,5
29
30
28,5
25 28
20 27,5

Temp
Prec

27
15 26,5
10 26
25,5
5 Prec (mm)
25
Temp (°C)
0 24,5
1 2 8 14 16 17 24 27

Quadro 04. Março.

35 30
30 29
25
28
20

Temp
Prec

27
15
26
10
5 25

0 24 Prec (mm)
8 20 24 25 26 30 31
Temp (°C)

Quadro 05. Abril.

140 31

120 30
29
100
28
80 27
Temp
Prec

60 26
25
40
24
20 23
Prec (mm)
0 22
Temp (°C)
1 2 4 8 9 11 12 17 26 29

A leptospirose aumenta os casos em maio e as alagações continuam. O medo de


deslizamento de barreiras e o volume das chuvas são crescentes. No dia 16 de maio foram
registradas vinte ocorrências de deslizamentos (Quadro 06.). Em junho um muro caiu em Olinda e
matou 1 pedreiro, em Jaboatão também houve a queda do muro de arrimo destruindo parte de uma
casa que soterrou quatro pessoas. A barragem Tapacurá quase dobrou o seu volume e o fluxo de
veículos no centro se tornou caótico (Quadro 07.). No mês de julho, deslizamento de barreiras e
ruas alagadas (Quadro 08.). Agosto começa com dezessete mortos, seis pessoas desaparecidas e três
feridas; só na primeira semana, por conta dos deslizamentos de barreiras e ruas alagadas (Quadro
09.).
Fórum Internacional do Meio Ambiente - A conferência da Terra 163

Quadro 06. Maio.

60 29,5
29
50 28,5
40 28
27,5

Temp
Prec

30 27
26,5
20 26
10 25,5 Prec (mm)
25
Temp (°C)
0 24,5
3 4 6 7 14 17 24

Quadro 07. Junho.

120 29

100 28
27
80
26

Temp
Prec

60
25
40
24
20 23 Prec (mm)
Temp (°C)
0 22
1 7 8 9 14 16 26 29 30

Quadro 08. Julho.

140 27

120 26
100 25

80 24
Temp
Prec

60 23

40 22

20 21 Prec (mm)
0 20 Temp (°C)
1 2 4 7 12 15 20 27 30 31
Fórum Internacional do Meio Ambiente - A conferência da Terra 164

Quadro 09. Agosto.

180 27
160 26
140
25
120
100 24

Temp
Prec

80 23
60
22
40
Prec (mm)
20 21
Temp (°C)
0 20
1 2 3 7 9 18 19 24

Em setembro seis pessoas desaparecidas, duas morreram, três ficaram feridas na região
metropolitana do Recife e mata Sul; o rio Jaboatão transbordou e inundou alguns bairros de Moreno
(Quadro 10.). Outubro não houve ocorrências (Quadro 11.) assim como novembro (Quadro 12.).
Em dezembro Recife foi surpreendido por uma frente fria vinda da Bahia, causando transtornos nas
principais ruas e avenidas da região metropolitana do Recife. Várias crianças ficaram feridas; um
muro desabou e três barreiras atingiram imóveis em Olinda e Recife, fechando o ano (Quadro 13.).
Em seqüência segue o detalhamento da análise rítmica observada.

Quadro 10. Setembro.

120 26,5

100 26

25,5
80
25
Temp
Prec

60
24,5
40
24 Prec (mm)
20 23,5 Temp (°C)

0 23
5 10 11 16 17 19 23 25

Quadro 11. Outubro.

14 27,2
27
12
26,8
10 26,6
26,4
8 26,2
Temp
Prec

6 26
25,8
4 25,6
25,4 Prec (mm)
2
25,2 Temp (°C)
0 25
8 9 11 13 27
Fórum Internacional do Meio Ambiente - A conferência da Terra 165

Quadro 12. Novembro.

6 28

5
27,5
4
27

Temp
Prec
3
26,5
2

26
1 Prec (mm)
Temp (°C)
0 25,5
10 18 19 28 29

Quadro 13. Dezembro.

120 26,5
26
100 25,5
80 25
24,5

Temp
Prec

60 24
23,5
40 23
20 22,5 Prec (mm)
22 Temp (°C)
0 21,5
13 15 16 17

No mês de janeiro do ano 2000 a atuação dos Vórtices Ciclônicos em altos níveis
favoreceu as chuvas no centro-oeste do estado de Pernambuco, havendo inclusive algumas
pancadas de chuvas no semi-árido. Em fevereiro a ZCIT (Zona de Convergência Inter-Tropical)
atuou no norte do estado ocorrendo chuvas dentro da normal climatológica. Em março não há
disponibilidade de informações.
Já em abril houve um déficit hídrico não só em Recife como em toda a região Nordeste
devido a uma posição anômala da ZCIT. Maio se caracterizou por uma leve carência de chuvas o
mesmo ocorrendo em junho, pois nessa época a ZCIT se situa mais ao Norte do país, diminuindo as
precipitações no estado.
Iniciando o segundo semestre o Recife apresentou chuvas abundantes causadas por nuvens
oriundas do Oceano Atlântico, que foram favorecidas pela presença de águas superficiais mais
quentes próximas ao litoral da região.Em agosto a cidade foi assolada pelos distúrbios de leste, as
primeiras Frentes frias fracas do oceano e a TSM (Temperatura Superficial do Mar) nas primeiras
semanas houve chuvas fortes no leste do estado .
Na primeira quinzena de setembro um sistema frontal no litoral do estado de Pernambuco
causou um forte aumento nas precipitações. Em outubro do decorrente ano, sistemas frontais e
cavados aumentaram a quantidade de chuvas e adiou o fim da estação chuvosa prevista para agosto.
Em novembro houve algumas instabilidades em Recife em virtude de sistemas frontais e em
dezembro perturbações na camada superior da atmosfera promoveram algumas chuvas dentro das
normais climatológicas.

CONCLUSÃO
A análise rítmica das chuvas é de grande importância para detectar problemas de cunho
social como o desabamento de casas, soterramento de pessoas, alagamentos de ruas e avenidas além
de proliferação de doenças como leptospirose e dengue. Com essa análise se obtém, por exemplo,
os meses em que mais chove e, conseqüentemente, o aumento de acidentes em virtude da chuva,
Fórum Internacional do Meio Ambiente - A conferência da Terra 166

mostrando assim também os meses em que se devia haver mais ações mitigadoras sob forma de
obras.
Percebe-se que para que se haja a contenção de barreiras contra o desabamento, deve-se
nos meses de Janeiro e Fevereiro realizar obras como paredões de rocha e muros de arrimo, uma
outra forma de solucionar estes problemas, é o plantio de plantas monocotiledôneas nessas encostas,
como gramas e coqueiros, as quais contêm raízes fasciculadas que prendem melhor o solo, dando
maior solidez e sustentabilidade.
Para o problema de drenagem do solo se torna necessária à obstrução de “bocas-de-lobo” e
bueiros que irão escoar a água, além de uma coleta de lixo periódica para todos os bairros e um
melhor saneamento para haver menor lançamento de dejetos nos rios, córregos e canais no intuito
de não haver transbordamento, e conseqüentemente, alagamento das chuvas.
Analisar ritmicamente as precipitações ocorridas no Recife e região metropolitana, dia a
dia, no ano de 2000 torna-se importante para um melhor planejamento urbano e uma vida melhor
para a população.

REFERÊNCIAS BIBLIOGRAFICAS
www.lamepe.itep.br; dia 26 de fevereiro de 2007, às 14hs.
Ricardo@itep.br
www.cpetec.inep.br; dia 05 de março de 2007, às 16hs.
www.cnpm.embrapa.br, dia 06 de março de 2007, às 17hs30.
www.jornaldocommercio.com.br
www.diariodepernambuco.com.br
ALHEIROS, Margareth et. Al., (2002). Diagnóstico Ambiental, Urbanístico e Social dos
ANDRADE, Maurício, (2002). Serviços Urbanos na Região Metropolitana do Recife.
AYOADE; J.O., Introdução Á Climatologia Para Os Trópicos. Editora Bertrand Brasil; 4ª Edição –
Rio de Janeiro, 05 de março de 2007.
CONFALONIERI, U.E.C., Variabilidade climática, vulnerabilidade social e saúde no Brasil. Terra
CONTI; José Bueno. Resgatando A “Fisiologia da Paisagem”. Revista do Departamento de
Geografia, Universidade de São Paulo, n.14, p. 59-68. 2001.
FIDEM.
Livre, S. Paulo, 19-1(20):193-204. 2003.
MARINHO, Geraldo, (2002). Considerações Sobre o Uso e Ocupação do Solo na
Morros da Região Metropolitana do Recife. Relatório – Programa Viva o Morro. Recife,
Projeto Metrópole Estratégica. Recife, FIDEM.
Região Metropolitana do Recife. Projeto Metrópole Estratégica. Recife, FIDEM.
SANT’ ANNA NETO; João Lima. Por Uma Geografia do Clima. Terra Livre, São Paulo. N.17,
p.49-62. 2001.
Fórum Internacional do Meio Ambiente - A conferência da Terra 167

PLUVIOMETRIA DA CIDADE DE JOÃO PESSOA – UMA OBSERVAÇÃO ELEMENTAR

Liése Carneiro Sobreira


lica1704@yahoo.com.br
Conrad Rodrigues Rosa
crodriguesrosa@yahoo.com.br
Paulo Roberto de Oliveira Rosa
prrosa@hotmail.com

RESUMO
A cidade de João Pessoa nas ultimas décadas vem passando por um ritmo de crescimento
acelerado, de modo que em 1970 a população residente era de 221.052 habitantes, estando
atualmente, segundo dados do IBGE, com um contingente populacional de 674.762 habitantes. O
adensamento dos equipamentos urbanos tanto na forma horizontal como também na forma vertical,
haja vista, as edificações mais elevadas, verdadeiros espigões, já começam a ser estabelecidos
recriando novas condições urbanas. Essas condições se pautam na dinâmica dos conjuntos
geográficos que formam a paisagem, a implantação desses novos elementos no cenário acaba por
recriar o ambiente. Tomemos que a observação adequada sobre o clima e a drenagem são agentes
fundamentais para que a qualidade de vida não seja negligenciada. Assim, neste trabalho busca-se
entender o comportamento do regime pluviométrico da cidade, utilizando como parâmetro dados
referentes às últimas 3 décadas, a fim de observá-la e assim inferir possíveis alterações no regime
de chuvas ao acelerado crescimento da cidade que ocorreu no mesmo intervalo de tempo.
Palavras-Chaves: Crescimento urbano, pluviometria e precipitação concentrada.

ABSTRACT
The city of Joao Pessoa in the last decades is undergoing a pace of growth accelerated, so
that in 1970 the resident population was 221,052 inhabitants and is currently, according to the
IBGE, with a population quota of 674,762 inhabitants. The density of the equipment in both the
urban form as well as horizontal as vertical, it is seen, the highest buildings, real spikes, begin to be
established recreating new urban conditions. These conditions are guided in the dynamics of the
sets that form the geographical landscape, the deployment of these new elements in the scenario
ultimately recreate the environment. Take that comment on the climate and adequate drainage are
key actors so that the quality of life is not neglected. Thus, this work is finding understand the
behavior of the regime. Precipitation of the city, using as parameter data for the last 3 decades, to
see it and thus infer possible changes in the system of rain accelerated growth of the city that
occurred in the same period of time.
Keys Word: Urban growth, rainfall

INTRODUÇÃO
A cidade de João Pessoa no Estado da Paraíba é uma mancha urbana que está
assentada sobre a estrutura geomorfológica denominada de Baixos Planaltos Costeiros, relevo esse
suavemente ondulado e que conta com vales dos rios encravados nesse Planalto.
O crescimento da cidade tanto pelo quesito relativo aos equipamentos urbanos como
também no contingente populacional deu-se de forma rápida, e nessa última variável inferimos que
foi proporcionalmente bem maior do que o Estado da Paraíba e nas últimas três décadas a cidade
quase triplicou o número de seu contingente populacional. Tomando que em 1970 a população
residente era de 221.052 habitantes, estando atualmente, segundo dados do IBGE, com um
contingente populacional de 674.762 habitantes.
O adensamento dos equipamentos urbanos tanto na forma horizontal como também na
forma vertical, haja vista, as edificações mais elevadas, verdadeiros espigões, já começam a ser
estabelecidos recriando novas condições urbanas. Essas condições se pautam na dinâmica dos
conjuntos geográficos que formam a paisagem, a implantação desses novos elementos no cenário
Fórum Internacional do Meio Ambiente - A conferência da Terra 168

acaba por recriar o ambiente. Tomemos que a observação adequada sobre o clima e a drenagem são
agentes fundamentais para que a qualidade de vida não seja negligenciada.
Isto posto, busca-se entender o comportamento do regime pluviométrico da cidade
utilizando como parâmetro dados referentes às últimas 3 décadas, a fim de observá-la e assim inferir
possíveis alterações no regime de chuvas ao acelerado crescimento da cidade que ocorreu no
mesmo intervalo de tempo.

PROCEDIMENTOS METODOLÓGICOS
Para análise da pluviometria foram utilizados dados de precipitação referentes ao período
de 1976 a 2005 fornecidos pela Estação Convencional do Laboratório de Energia Solar da
Universidade Federal da Paraíba.
Primeiramente foi criada uma base de dados em planilha Excel, onde posteriormente
iniciou-se o tratamento e análise. Assim, foi feito o somatório e médias das totais anuais e geração
de gráfico a fim de perceber o comportamento do volume de precipitação ao longo dos anos
observados.
Foram utilizadas médias mensais da precipitação de temperatura do ar durante o período de
1990 a 2005 para a elaboração do climograma, onde depois dos dados serem trabalhados em
planilha Excel o climograma foi confeccionado em sistema CAD e posteriormente para uma melhor
visualização gráfica foi trabalhado em programa Gráfico Core lDraw.
Para observação de possíveis alterações no regime pluviométrico diário, tomou-se
como referência o mês de junho, já que este é com freqüência o mais chuvoso do ano, onde foi
observado o comportamento da densidade e intensidade das chuvas.

RESULTADOS E DISCUSSÕES
No que se refere ao regime climático, a cidade, como toda faixa litorânea do Estado, está
sob o domínio do Clima Tropical quente-úmido (As’, segundo classificação de Köppen-Geiger),
onde se caracteriza por uma média anual de 1.800 mm, com uma maior concentração de chuvas no
final da estação do outono e inicio do inverno, nos meses de abril, maio e junho, sendo este último o
mês de maior concentração pluviométrica.
A concentração das chuvas nos meses de abril, maio e junho, decorre da influência da
Massa tropical Atlântica (mTa), que se forma no Atlântico Sul e atual nas regiões Nordeste, Sudeste
e Sul nesse período, resultando em eventos de precipitação de alta magnitude. Na figura abaixo se
pode observar as massas de ar no Brasil, podendo assim verificar no terceiro quadro a atuação da
Massa de ar Atlântica (mTc) exercendo influência nas regiões litorâneas do Brasil.

Fig. 1-Massas de ar atuantes no Brasil. NETO,2005.


Fórum Internacional do Meio Ambiente - A conferência da Terra 169

Outro fator importante levantado é de que este trimestre (abril-maio-junho) de


concentração pluvial representa um percentual de 50,33% de M.P.C. (Máximo Porcentual de
contribuição de três meses consecutivos), sendo um valor relativamente alto, tomando como
referência que o valor da M.P.C. “teoricamente é tanto melhor distribuído quanto mais se aproxima
de 25% e tanto mais concentrado quanto mais se afasta desse volume”. (NIMER, 1979).
Isto posto, é relevante observar que precipitação na cidade de João Pessoa, no que se refere
a sua distribuição anual, apresenta um alto grau de intensidade, em que esta é entendida como o
“grau de força, de atividade ou de potência de um fenômeno ou de um processo que se exprime por
unidade de tempo e de superfície”. (DOLFUSS, 1973), como poder ser o verificado no climograma
da cidade referente ao período de 1990 a 2005.

Fig.2- Climograma da cidade de João Pessoa (1990-2005)

No se refere à análise específica dos períodos mais chuvosos, além do fator


intensidade consideramos também a densidade, ou seja, a carga de um evento por unidade de
superfície. Assim, observando as totais mensais do mês de junho do período de 1976 a 2005,
percebe-se que quanto ao volume total acumulado durante o mês não há uma alteração aparente,
pois ao longo dos anos há uma oscilação dos valores acumulados, onde períodos de alta e baixa
densidade pluviométrica.
No gráfico 1 pode-se verificar esse comportamento, em que nos anos de 1977, 1986, 1992,
2000 e 2005 as totais mensais referentes ao mês de junho possuem valores pluviométricos
semelhantes, apresentando um ritmo de oscilações em que se verifica uma precipitação mensal ora
de alta magnitude, ora menos elevada.
Fórum Internacional do Meio Ambiente - A conferência da Terra 170

Gráfico 1- Total mensal do mês de junho (1976-2005)

Com o resultado da observação das totais mensais de junho, seguiu-se para a


observação de valores diários deste mesmo mês, a fim de verificar possíveis alterações na
intensidade da precipitação, analisando agora a o comportamento mensal a partir de dados diários
de precipitação.
Os anos de 1976 a 1979 caracterizaram-se por um período de precipitação moderada,
estando o valor mais elevado em 1977 com total mensal de 515 mm e o mais baixo em 1976 com
total de 192,7 mm. No entanto a distribuição da precipitação ao longo do mês se dá de forma
irregular em todos os anos, onde em 1977 352,9 mm de chuva se deu em apenas 5 dias, do mesmo
modo que em 1976 choveu 77,1 mm em apenas um dia, como pode ser observado no gráfico 2 e3.

Gráfico 2 – Precipitação diária junho de 1976


Fórum Internacional do Meio Ambiente - A conferência da Terra 171

Gráfico 3 – Precipitação diária junho de 1977

O mesmo fenômeno ocorre nos anos conseguintes. No mês de junho do ano de 1985
nos dias 16 e 17 verificou uma precipitação diária de 101 e 165,7 mm respectivamente, num total de
266,7mm em apenas dois dias, onde o total mensal registrado foi de 443,3 mm.
Nos anos de 2000 a 2005 também se pode observar ocorrências de precipitação de grande
intensidade, estando grande do valor do total mensal em apenas poucos dias do mês, como em 2000
dos 431,4 dos 495,6 do mês de junho ocorreu em 7 dias.

Gráfico 4 – Precipitação diária junho de 1985


Fórum Internacional do Meio Ambiente - A conferência da Terra 172

Gráfico 5 – Precipitação diária junho de 2000

CONSIDERAÇÕES FINAIS
A partir da observação do volume e intensidade de precipitação mensal do mês mais
chuvoso do ano, podemos inferir que o processo de urbanização não alterou o microclima no que
diz respeito à variável precipitação pluvial. Todavia, prosseguir-se-á com estudos mais acurados
sobre a interferência da expansão urbana no microclima da cidade de João Pessoa, inclusive na
variável precipitação.

REFERÊNCIAS BIBLIOGRÁFICAS
Atlas geográfica do Estado da Paraíba. João Pessoa, Grafisset, 1985.
DOLFUSS, Olivier. A análise geográfica. Trad. Heloysa de L. Dantas.Coleção Saber Atual. DIFEL,
1973.
NETO, João Lima Sant’Anna, & NERY, Jonas Teixeira. Variabilidade e mudanças climáticas no
Brasil e seus impactos regionais. In.:SOUZA, Célia R. de Gouveia (Ed.). Quaternário do Brasil.
Ribeirão Preto: Holos Editora, 2005.
NIMER, Edimon. Pluviometria e recursos hídricos de Pernambuco e Paraíba. Rio de Janeiro: IBGE,
1979.
Fórum Internacional do Meio Ambiente - A conferência da Terra 173

CONFORTO TÉRMICO EM NATAL/RN UTILIZANDO OS MÉTODOS DE ITU E WCI

Juliana Rayssa Silva Costa


Discente em Geografia na Universidade Federal do Rio Grande do Norte. rayssa480@hotmail.com
Fernando Moreira da Silva
Prof. Dr. DGE/UFRN. fmoreyra@ufrnet

RESUMO
Com a oscilação do comportamento homem-ambiente em função da atuação antrópica e
consequentemente nas mudanças dos elementos climáticos, tais como; a temperatura, a umidade, o
vento e principalmente alterações no balanço de radiação, se faz importante estudar o conforto
térmico em cidades. Nesse contexto, o objetivo da pesquisa é avaliar o conforto térmico da cidade
de Natal-RN. Os dados foram obtidos junto à estação climatológica da Universidade Federal do Rio
Grande do Norte, no período de 1984 a 2007 em horários sinóticos. Os métodos utilizados foram os
modelos de Tom, Índice de Temperatura e Umidade – ITU e o de Chill – WCI. Os resultados
parciais indicaram que o método de Tom – ITU se mostrou mais adequado, por se tratar de trocas
de calor por convecção livre, com avaliações de conforto térmico oscilando em frio, confortável,
pouco desconforto e morno, entretanto sua predominância foi pouco desconforto a confortável.
Palavras-chave: Conforto térmico em Natal, Índice de Temperatura e Umidade, Índice de Wind
Chill.

ABSTRACT
With the oscillation of the human-environment behavior depending on performance
manmade and therefore changes in the climatic elements such as, the temperature, humidity, wind
and especially changes in the balance of radiation, it is important to study the thermal comfort in
cities. In this context, the objective of the research is to evaluate the thermal comfort of the city of
Natal-RN. Data were obtained from the station climatológic the Federal University of rizer big of
North, in the period from 1984 to 2007 at times sinótics. The methods used were the models for
Tom, Index of temperature and humidity - ITU and the Chill - WCI. The partial results indicated
that the method of Tom - ITU was more appropriate, because it is in trading of heat by convection
free, with ratings ranging from thermal comfort in cold, comfortable, little discomfort and warm,
though its dominance has been a little discomfort comfortable.
Keywords: Thermal Comfort in Natal, Index of Temperature and Humidity, Wind Chill Index.

INTRODUÇÃO
Trabalhar com a temática inter-relação pessoa-cidade-conforto térmico, por assim dizer, é
uma área de transito interdisciplinar, no qual implica em reconhecer que há complexidade do tema.
Complexidade porque, este assunto nos transporta para uma serie de interesses, os quais muitas
vezes se apresentam divergentes, tanto em âmbito teórico-acadêmico, social, político e
principalmente econômico, pois principalmente esses dois últimos interessados, intervêm nesses
espaços.
Como a geografia, de modo diferente, dentro de suas características essenciais de localizar,
descrever e analisar os fenômenos e processos acontecidos e produzidos pelas relações humanas em
espaços, busca nos oferecer a possibilidade de entendimento do que ocorre no ambiente vivenciado,
que no caso desse estudo encontra-se em um clima tropical e “proveniente” deste, muitas belezas
naturais, mas também há urbanização, em decorrência da ação humana.
Com a oscilação do comportamento homem-ambiente em função das mudanças nos
elementos climáticos, tais como a temperatura, a umidade, o vento e principalmente no balanço de
radiação, se faz importante estudar o conforto térmico em cidades. O município de Natal-RN foi a
cidade escolhida para esse tipo de estudo, devido ao fato de que este lugar e suas paisagens são de
convivência cotidiana (como a maioria das cidades), mas o que lhe diferencia de muitas é a grande
relação com o capital, pois este lugar é famoso por ser atrativo turístico e consequentemente
Fórum Internacional do Meio Ambiente - A conferência da Terra 174

imobiliário por causa do seu clima, pois traz condições de bem estar e conforto para com as
pessoas que as residem e para as que as usam.
Em relação as condições de bem estar e conforto para com as pessoas, Oliveira et al.
estudaram a inter-relação pessoa-ambiente em Praças publicas na cidade de Natal-RN. A pesquisa
abordou um estudo descritivo, exploratório e quantitativo o que possibilitou uma analise de conforto
ambiental e térmico sobre esses espaços geográficos. O comportamento do conforto térmico em
duas praças foi avaliado dos índices termodinâmicos ITU e Wind Chill. Os autores mostraram que
há condições de desconforto térmico nas praças, precisando assim de políticas publicas para
melhorar essa “forma” de lazer.
Natal-RN é considerado um dos melhores climas do Brasil, pois o clima é tropical, com
temperatura media de 26ºC, devido estar próximo ao Equador e encontra-se localizada em faixa
litorânea (figura 1), fazendo com que o ambiente seja quente úmido. Esse fato pode ser explicado
devido ás brisas dos oceanos, que geralmente advém do Sudeste, que ao acumular e precipitar-se na
atmosfera gera chuvas rápidas e moderadas. Segundo MOTTA (2003), este fato ocorre devido à
ação das zonas de leste, que ocorrem entre os meses de abril e julho, sendo predominante em junho,
com duração de 48 horas e intervalos de 18 a 24 horas.
Nesse contexto, a pesquisa objetiva diagnosticar o comportamento do conforto
térmico em Natal/RN, bem como avaliar métodos que exprimam com mais acuridade as condições
de trocas de calor entre o homem-ambiente.

Figura 1- Localização da cidade de Natal, no Rio Grande do Norte

METODOLOGIA
Coleta de dados
A realização da pesquisa envolveu etapas de levantamento, tratamento e análise e
interpretação dos dados. Ressalta-se que os dados meteorológicos foram coletados no período de
1984 a 2007 na Estação Climatológica da Universidade Federal do Rio grande do Norte, por um
psicrômetro ordinário. Esse material foi tabulado e sistematizados em um “Arquivo de Dados”.Foi
feito, também, um levantamento bibliográfico e coleta de material fotográfico.
Fórum Internacional do Meio Ambiente - A conferência da Terra 175

Figura 2 – Abrigo meteorológico da Estação Climatológica de Natal-RN

Fundamentação física do conforto térmico


Fez-se o uso de dois modelos de conforto térmico para podermos ter uma melhor
compreensão dos resultados de conforto térmico e conseqüentemente aplicarmos o método
considerado mais preciso para a pesquisa.
Primeiro utilizamos o método proposto por TOM (1959), denominado Índice de
Temperatura e Umidade (ITU). Este índice é um avaliador do conforto térmico em humano para o
verão, baseado em condições de temperatura e umidade, considerando o vento com velocidade
menor que 0,3 m/s, sendo dado pela equação:

ITU = T – 0.55 (1- UR) (T - 14)

Onde: T e a temperatura dada em graus Célsius e UR e a umidade relativa dada em fração


decimal. Segundo Tom os valores encontrados acima de 25, são considerados pela maioria como
desconfortável, enquanto que os valores entre 15 e 20 são aceitos pela maioria como confortáveis.
Na tabela abaixo são mostrados os ITU, calculados com temperatura em graus Célsius.
Tabela 1- Índice de Temperatura-Umidade (ITU)
Temperatura Umidade Relativa (%)
ºC
10 20 30 40 50 60 70 80 90 100
21,1 64 64 65 66 66 67 68 68 69 70
23,9 66 67 68 69 70 71 72 73 74 75
26,7 69 70 71 72 73 75 76 77 78 80
29,4 71 73 74 76 77 79 80 82 83 85
32,2 74 75 77 79 81 82 84 86 88 90
35,0 76 78 80 82 84 86 88 90 92 95
37,8 79 81 83 86 88 90 93 95 97 100
40,6 82 84 87 89 92 95 97 100 102 105
Legenda
Sensação de frio
Confortável
Pequeno desconforto
Desconforto considerável
Grande desconforto
Máximo desconforto
Fórum Internacional do Meio Ambiente - A conferência da Terra 176

Em seguida utilizamos um segundo modelo de conforto térmico, Wind Chill Index (WCI)
(MUNN, 1970 apud ARAUJO 2001), que trata as trocas de calor pelo processo de convecção
forçada, dado pela equação:

WCI = hc.(33-t)
⎡ 0,5

hc = 1,16.⎢10,45 − v + (100.v ) ⎥
⎣ ⎦
⎛ −1

Onde: hc => coeficiente de convecção forçada ⎜ wm −2 °C ⎟
⎝ ⎠
T = > temperatura do ar (°C )
V => vento na superfície (m.s −1 )

Tabela 2 - Interpretação Nebulosa de WCI

Wind Chill Index - WCI (wm-2 ) Sensação térmica


≤ 60 Quente
60 => 120 Morno
120 => 230 Conforto
230 => 460 Fresco
460 => 700 Quase frio
700 => 930 Frio
930 => 1200 Muito frio
1200 => 1400 Severamente frio
≥1400 Congelamento da região exposta

RESULTADOS
Ao analisar os dados de Natal através do método de ITU, de acordo com a temperatura e
umidade média, respectivamente, foi verificado que, no período de janeiro a abril as temperaturas
variam entre 23,9ºC a 26ºC, que segundo o modelo de Tom é avaliado como desconfortável, pois os
valores encontrados foram acima de 25, enquanto que os valores entre 15 e 20 são aceitos como
confortáveis.
Para reforçar tal interpretação pode-se verificar, no mesmo gráfico, onde nos meses de
maio a agosto há um declínio de temperatura, sendo no mês de julho com valor mínimo de 23,9ºC.
Avaliando situação descrita acima, tendo como base a tabela de qualificação nebulosa do ITU,
conforme gráficos 1 e 2, cujos estes expõem a quantificação e qualificação do conforto térmico
médio. No mês de abril a Julho possuem um desconforto considerável, que neste caso esta
associada á estação de inverno, que embora apareça com pequena amplitude térmica, sua condição
no modelo é de desconforto considerável.

27,0
26,0
IT U (m éd ia)

25,0
24,0
23,0
22,0
Jan Fev Mar Abr Mai Jun Jul Ago Set Out Nov Dez

Meses

Gráfico 1 – Índices do ITU (médio)


Fórum Internacional do Meio Ambiente - A conferência da Terra 177

Qualificação do Conforto térmico do


3

ITU(média)
1

0
Jan Fev Mar Abr Mai Jun Jul Ago Set Out Nov Dez
Meses

1 - Pouco desconfortavél
2 - Desconforto considerável

Gráfico 2 – Qualificação do conforto térmico pelo ITU (médio)

Já o modelo de Wind Chill, que depende da temperatura, umidade e vento médio,


respectivamente mostra que, de acordo com os gráficos 3 e 4 (dados e lógica nebulosa), o clima de
Natal foi diagnosticado de confortável a refrescante, sendo que, em meados do mês de junho á
agosto há um pequeno desconforto (fresco) sendo confortável nos demais meses.
Índice de Wind Chill (média)

300,0
250,0
200,0
150,0
100,0
50,0
0,0
Jan Fev Mar Abr Mai Jun Jul Ago Set Out Nov Dez

Meses

Gráfico 3 – Índices do WCI (médio)


Qualificação do Conforto térmico

3
do WCI (média)

0
Jan Fev Mar Abr Mai Jun Jul Ago Set Out Nov Dez
Meses

1 - Confortável
2- Fresco
Gráfico 4 – Qualificação do Conforto térmico do WCI (médio)

Para entender e saber qual dos dois modelos responde melhor as condições
climáticas de Natal, houve a necessidade de avaliar separadamente o comportamento da ITU e do
WCI de acordo com a temperatura e umidade máxima e a mínima.
Conforme o modelo de ITU máxima, o gráfico 5 nos mostra que, as temperaturas
máximas oscilam de 26,8º a 28,7º, sendo as mais altas consideradas no mês de janeiro á meados de
abril, sendo o seu ápice em fevereiro. Em relação à qualificação, o gráfico 5, expõe um desconforto
considerado durante todo ano, pois a temperatura extrapola os 25ºC.
Fórum Internacional do Meio Ambiente - A conferência da Terra 178

29,0
28,5
28,0

ITU (max)
27,5
27,0
26,5
26,0
25,5
Jan Fev Mar Abr Mai Jun Jul Ago Set Out Nov Dez

Meses

Gráfico 5 – Índices do ITU (máximo)

Em relação ao modelo de WCI, o gráfico 6 mostrado abaixo, no mês de junho ate meados
de setembro são constatados os maiores índices qualificados como confortável, enquanto que, nos
meses restantes os valores encontram-se abaixo de 120 w/m2 , são considerados mornos. O gráfico
7 mostra e ratifica esses resultados, que nos meses de outubro a maio o conforto térmico é
diagnosticado como morno, e a partir de junho a setembro o índice apresenta como confortável.
Ìndice de Wind Chill

160,0
140,0
(m ax.)

120,0
100,0
80,0
60,0
Jan Fev Mar Abr Mai Jun Jul Ago Set Out Nov Dez
Meses

Gráfico 6 – Índices do WCI (máximo)


3
Conforto por WCI
Qualificação do

2
(max.)

0
Jan Fev Mar Abr Mai Jun Jul Ago Set Out Nov Dez
Meses
1 - Morno
2 - Confortável
Gráfico 7 – Qualificação do Conforto térmico pelo ITU (máximo)

Analisando os dados a partir da media das temperaturas mínimas, que de acordo com o
modelo ITU, os meses com menores temperaturas são de julho a setembro, oscilando de 20,1ºC á
22ºC, como mostra o gráfico 8, abaixo. Mas vale salientar que, as temperaturas começam a descer
consideravelmente a partir do mês março e a menor dessa no mês de julho, com 20,1º C.
Fórum Internacional do Meio Ambiente - A conferência da Terra 179

24,0
23,0

ITU (min.)
22,0
21,0
20,0
19,0
18,0
Jan Fev Mar Abr Mai Jun Jul Ago Set Out Nov Dez
Meses

Gráfico 8 – Índices do ITU (mínimo)

Em relação á qualificação desse modelo (figura 9), percebe-se que, os meses considerados
confortáveis encontram-se em abril á meados de julho e os demais meses são considerados frios,
como mostra o gráfico a seguir:
Conforto por ITU (min.)

3
Qualificação do

0
Jan Fev Mar Abr Mai Jun Jul Ago Set Out Nov Dez

1- Frio Meses
2 - Confortavel

Gráfico 9 – Qualificação do conforto térmico do ITU (mínimo)

Conforme o modelo WCI para temperatura mínima verificou-se que, no mês de julho,
agosto e setembro, são verificados os índices mais baixos durante o ano, como mostra o gráfico 10.
Quanto à qualificação, segundo a lógica nebulosa por WCI, foi diagnosticado como refrescante,
pois os índices variaram de 272,42 wm-2 á 389,64 wm-2.
Índice de Wind Chill

390
370
350
(min.)

330
310
290
270
Jan Fev Mar Abr Mai Jun Jul Ago Set Out Nov Dez
Meses

Gráfico 10 – Índices do WCI (mínimo)

CONSIDERAÇÕES FINAIS
De acordo com os resultados dos dois modelos verificados, constatou-se que o método
TOM, índice de temperatura e umidade – ITU, foi o que mais se adequou ao clima de Natal-RN.
Esse fato pode ser explicado devido esse método ser um avaliador do conforto térmico em humano
para o verão e se basear em condições de trocas de calor por convecção livre. Aliado a isso, a
Fórum Internacional do Meio Ambiente - A conferência da Terra 180

cidade de Natal possuindo clima tropical por se localizar próximo ao Equador e em faixa litorânea,
há presença constate das brisas marítimas, que geralmente advém do sudeste, fazendo com que
umedeça a cidade.
Quanto ao método de Chill - WCI, este não condiz com a realidade da cidade de Natal,
pois este método foi desenvolvido para as regiões subtropicais, depende da convecção forçada.
Como em Natal os ventos predominantes são os alísios com uma média de 5m/s, bem diferente dos
ventos das regiões subtropicais que têm velocidades superiores aos alísios, além de serem frios, há
trocas de calor devido ao escoamento gerado pelo vento. Dessa forma constata-se que, este método
não retrata um procedimento a ser utilizado para se verificar o conforto térmico em relação às
condições climáticas da cidade de Natal-RN.
Segundo a avaliação por ITU, as condições de conforto térmico oscilaram entre o frio,
confortável, pouco desconforto e morno. Diagnosticou-se que há diferença consideráveis na
sensação térmica de acordo com sua sazonalidade e no decorrer do dia. Um fato interessante
verificado é que no inverno, por ser úmido, há uma sensação de conforto no período noturno
(madrugada), enquanto no verão (seco) pela madrugada há uma perda de calor por radiação, o que
das uma sensação de frio.

REFERÊNCIAS BIBLIOGRAFICAS
ADAUTO, Gouveia Motta. O clima de Natal. Natal: Ed. Foco, 2003.
BAÊTA, Fernando C. e SOUZA, Cecília F. Ambiência em edificações rurais conforto animal.
Editora UFV. 1997.
MUNN, R. E. Biometeorological Methods. New York and London. 1970
NAAS, Iroliza de Alencar. Princípios de conforto térmico na produção animal. São Paulo ícone
da Editora, 1989.
OLIVEIRA et al. Conforto térmico em praças de Natal/RN: um diagnóstico psicofísico usando
modelos ITU e WCI. Interface. Porto Nacional/TO, v.3, p. 77- 88, maio 2006.
Fórum Internacional do Meio Ambiente - A conferência da Terra 181

O PARQUE ESTADUAL DAS DUNAS NO PROCESSO DE AMENIZAÇÃO CLIMATICA


DA CIDADE DO NATAL-RN.

Glauber Richard Sobreira de Carvalho


Técnico em Controle Ambiental (CEFET-RN)
Ricardo Farias do Amaral
Professor Dr. do Departamento de Geologia da Universidade Federal do Rio Grande do Norte (UFRN). e-mail:
glauberrichard@rn.gov.br

RESUMO
O presente estudo trata sobre a relação existente entre vegetação e clima urbano. Analisa-
se o processo pelo qual o Parque das Dunas, uma área verde com 1.172 hectares, localizada na
cidade do Natal, no Estado do Rio Grande do Norte, exerce influências na amenização climática da
cidade. A metodologia utilizada e fundamentada no processamento digital da banda termal (6) do
sensor Landsat 7 (ETM+), dentro da área do Parque das Dunas e fora dos seus limites. Os
resultados desta pesquisa, confirma o importante papel desempenhado pelo Parque das Dunas na
cidade do Natal-RN no processo de amenização climática no meio ambiente urbano e para a criação
de microclimas agradáveis, para a melhoria da qualidade de vida da população.
Palavra – chaves: Clima urbano e Vegetação, Parque das Dunas e Sensoriamento Remoto.

ABSTRACT
The present study deals with the relationship between urban vegetation and climate. The
process whereby the Parque das Dunas – a 1,172 ha green area in the city of Natal, State of Rio
Grande do Norte – exerts influence on the climate of the city. The used methodology and based in
the digital processing of the thermal band (6) of sensor Landsat 7 (ETM+), inside of the area of the
Park of the Dunes and out of your limits. he results of this research, it confirms the important paper
carried out by the of the one of Parque Dunas in the city they do Natal-RN any process of climatic
any urban of middle atmosphere for of and a creation of pleasant microclimates. for the
improvement of the quality of life of the population.
Key words: Urban climate and vegetation, Park of the Dunes and Remote Sensing

INTRODUÇÃO
A rápida urbanização e o crescimento das cidades no ultimo meio século, mudou a
fisionomia da Terra mais do que provavelmente, qualquer atividade humana em toda a historia
(ODUM, 1988).
Dentre essas alterações, as cidades uma das maiores criações do ser humano, tem
causado modificações profundas na paisagem naturais, e gerando um adensamento de consumo e a
capacidade de produzir crise ambiental. Os problemas relacionados ao meio ambiente urbano são os
mais variados: excesso de ruído, emissão de poluentes no ar e efluentes a escassez de recursos
energéticos e de água, falta de tratamento adequado de resíduos, alterações no regime de chuvas e
de ventos, formação de ilhas de calor, ilhas frias e o aumento do consumo de energia para o
condicionamento artificial, etc.
A presença de vegetação nas cidades tem sido considerada sinônima de qualidade de vida.
A existência de áreas verdes junto aos centros urbanos, tais como parques, praças, e ruas
arborizadas proporcionam uma sensação de bem estar aos usuários destes espaços.
O Parque das Dunas cenário natural ocupa discursões sobre a preservação do patrimônio
ambiental e paisagístico do Município de Natal-RN, não serão necessários muitos esforços para
perceber a função do Parque, nesse contexto, serve de proteção e recarga para os lençóis freáticos
dunar, de desempenhar um papel de contendor das areias dunares e contribuir para a amenização
climática da cidade do Natal-RN. Com diversificados elementos floristicos, faunisticos, geológicos,
geomorfologicos e cênico-paisagisticos.
Trata-se de uma área rica em recursos naturais, onde são propícios atividade de cunho
científico - educacional turístico e de lazer.
Fórum Internacional do Meio Ambiente - A conferência da Terra 182

Quando se trata da função da vegetação nas cidades varias abordagens são feitas, mais para
efeito desse estudo aqui realizado, da se mais enfoque a função ecológica, e mais especificamente a
função reguladora clima – vegetação.
De acordo com BACH apud ASSIS (1990). As áreas verdes provocam alterações no clima
urbano. O quadro 1 apresenta o efeito de um parque urbano de pequenas dimensões localizado na
cidade de Cincinnati, Estados Unidos, no verão, em 1969.
ASSIS (1990) também comenta os estudos realizados na cidade de St. Louis, nos Estados
Unidos, onde detectou que as maiores diferenças de temperatura na ilha de calor são encontradas no
inverno e que a diferença de temperatura entre o centro urbano é um parque da cidade localizado a 8
km de distância, aproximadamente, foi de 5 ºC, em junho (verão), e de 7,3 º C, no mês de dezembro
(inverno).
ASSIS (1990) comenta, ainda, que Bach analisou um parque urbano de Cincinnati, com
dimensões aproximadas de 3.400 m2, com o propósito de conhecer qual era o tamanho de uma área
verde ou um parque urbano que provocasse diferenças de umidade, temperatura e conforto, quando
comparada com a área de entorno, numa situação de calmaria, e chegou a resultados que
apresentaram diferenças significativas entre as medições realizadas. Com base na análise e
interpretação dos resultados desse estudo, Bach recomenda a distribuição na cidade, de áreas verdes
com características semelhantes às do parque estudado e a incorporação desse instrumento de
projeto inserido ao planejamento integrado.

Quadro 1 – Efeito de um parque urbano de pequenas dimensões localizado no centro de Cincinnati,


nos Estados Unidos. Fonte: BACH apud ASSIS, 1990.

À TARDE (14:30-15:00 - Hora Local) À NOITE (20:30-22:00 - Hora Local)


ELEMENTOS
METEORO- PARQUE ENTORNO DIFEREN- PARQUE ENTORNO DIFEREN-
LÓGICOS URBANO CONSTRUÍDO ÇA URBANO CONSTRUÍ- ÇA
DO
TBS (C º) 29,7 31,2 1,5 26,9 26,9 0,0
TG (C º) 37,1 43,0 5,9 26,9 27,8 0,9
TRM (C º) 49,4 60,9 11,5 28,1 29,1 1,0
UR (%) 40,6 38,5 2,1 53,3 50,5 2,7
TGBU (C º) 24,4 26,2 1,8 22,2 22,4 0,2
ID 24,7 25,6 0,9 23,6 23,7 0,1
R (W) 137,8 255,00 117,2 -73,6 -54,2 -19,4
C (W) 47,5 32,8 14,7 46,3 52,5 0,2

DEFINIÇÃO DOS SÍMBOLOS:


TBS - Temperatura de bulbo seco ou do ar seco;
TG - Temperatura de globo (termômetro de globo)
TRM - Temperatura radiante média do ambiente, calculada a partir da temperatura de globo, velocidade
do vento (u) e temperatura de bulbo seco (TBS), usando TRM= [(TG:460)4+ 1,03x108u0,5 (TG-TBS)]0,25-
460, em unidades inglesas (u.i.), segundo HERTIGH & BELDING (1967);
UR - umidade relativa;
TGBU - Temperatura de globo de bulbo úmido, índice de conforto desenvolvido para a marinha
americana (é calculado por: TGBU= 0,7 TBU + 0,2TG + 0,1 TBS, onde TBU é a temperatura de bulbo
úmido);
ID - Índice de desconforto desenvolvido por Thom (1969); ID=0,4 (TBS + TBU) +15, em u.i.
R (W) - Troca de calor por radiação; R= 17,5 (TRM - 95), em u.i. (HERTIG & BELDING, 1983);
C (W) - Troca de calor por convecção; C = 0,756 u 0,6 (TBS - 95), em u.i. (HERTIG & BELDING,
1963).

CARVALHO (2001) chama atenção, afirmar O Parque das Dunas exerce uma influência
climática numa área de entorno de 3,51 km2, aproximadamente, o equivalente a 30% da superfície
urbana de Natal, contribuindo para a redução da temperatura do ar, devido à interferência, na
incidência solar, da dispersão da luz e da radiação solar, pela absorção da radiação solar e pela
Fórum Internacional do Meio Ambiente - A conferência da Terra 183

evapotranspiração, processo pelo quais as plantas lançam água na atmosfera, integrando, dessa
forma, o ciclo hidrólogico. Tomando-se como referência um cálculo realizado por IZARD &
GUYOT (1980), conclui-se que o Parque das Dunas coloca aproximadamente no ar atmosférico,
por ano, a quantidade de 5.860 000 (cinco milhões oitocentos e sessenta mil) toneladas de água,
fornecida pelo processo de evapotranspiração.
Objetivo deste trabalho e analisar a influência do Parque das Dunas no processo de
amenização climática no meio ambiente urbano da cidade do Natal-RN.

MATERIAIS E MÉTODOS
localização e Caracterização da área de estudo
A cidade do Natal-RN capital do Rio Grande do Norte, esta situada nas margens do
Oceano Atlântico e banhada pelo Rio Potengi, é possui uma área verde de grande proporção: O
Parque Estadual das Dunas. Constitui-se de fundamental importância na amenização do clima da
cidade de porte médio. O município do Natal-RN, que se apresenta circundada pelas dunas, desde
inicio de sua ocupação, com o passar dos anos a cidade foi crescendo e a urbanização foi avançada
sobre as dunas. Nós últimos anos a cidade do Natal – RN, vem passando por um intenso processo
de crescimento urbano, caracterizado por estruturas horizontais e verticais e a expansão da malha
urbana em direção as cidades vizinhas, trazendo como conseqüência, entre outros aspectos,
alterações no comportamento térmico dos espaços microclimaticos do ambiente urbano.
O Parque Estadual das Dunas do Natal, primeira Unidade de Conservação implantada no
Rio Grande do Norte, criada através do decreto Estadual n.º 7.237, de 22 de novembro de 1977.
Situado na área oriental do Estado, na faixa costeira da Cidade do Natal-RN é possui uma área de
1.172 hectares, que representa 6,89% da área urbana. Esta limitada pela Via Costeira, pelos bairros
de Ponta Negra, Capim Macio, Nova Descoberta, Tirol, Petrópolis e Mãe Luiza.
Área de estudo com ocorrência de contas que variam de 17,52 mts até 122,26 mts, sua
posição geográfica com baixa latitude e proximidade da linha do Equador, a disposição dos
cinturões dunares obedece a direção SE-NW em decorrência dos alísios predominantes do SE.
(conforme ilustra a figura 01).
Fórum Internacional do Meio Ambiente - A conferência da Terra 184

Fig. 01 – Localização do Parque das Dunas, obedecendo à direção SE-NW. Imagem Landsat 7
(ETM +) Órbita: 214 Ponto 64.

MATERIAIS E MÉTODOS
O mapa de temperatura aparente da superfície, foi obtida através da técnica de
processamento digital da banda termal (TM6), das imagens captadas pelo sensor LANDSAT 7
ETM +, no dia 04.08.2001, as 11:30h.
Transformaram-se as informações contidas na banda 6 (termal) do satélite Landsat-7
ETM+, em temperatura em graus Celsius, onde, as faixas de temperaturas foram reclassificadas.
O valor de cada pixel da imagem foi transformado em radiância absoluta usando a seguinte
formula.(NASA, 2005):

(1) Lλ = ( Lmin - Lmax ) / 255 * DN + Lmin ,


Onde Lλ é a radiância espectral, Lmin e Lmax [ mW cm 2 sr 1 µm1], são as radiâncias espectrais
para cada banda do numero digital de 0 a 255.
Para os sensores ETM+ 7, os valores da classe de radiância espectral foram:
(2) Low Gain: Lmin - 0.0 Lmax 17.4 watts/( meter squared * ster * µm )
High Gain: Lmin - 3.2 Lmax 12.65 watts/( meter squared * ster * µm A radiância
spectral Lλ , foi convertida em temperatura efetiva do satélite,
(3) T = K 2 / lm ( K1/ Lλ + 1 )
Onde K1 e K2 , são constantes de calibração para o Landsat 7 ETM+. (NASA.2005).
K1 = 666,09
K2 = 1282,71K
Fórum Internacional do Meio Ambiente - A conferência da Terra 185

No sistema de visada Terra-Atmosfera do satélite Landsat 7, os valores obtidos na


temperatura efetiva do satélite, tem por base os valores de emissividade das superfícies. (Lillesand
and Kiffer1994)
O sensor Thematic Mapper do satélite landsat 7 recobre a faixa do espectro refletido ( 0,4 a
2,5 um ) com sete bandas e outra cobre o espectro emitido ou termal
( 10,4 a 12,5 um ), a qual foi usada nesse trabalho.
Para transformação das informações contidas nas imagens, utilizou-se o módulo termal do
software Idrisi 3.2. Este módulo baseia-se nas funções de calibração dos detectores do sensor termal
do satélite e converte os níveis de cinza da imagem em valores de temperatura em graus
centígrados.
O passo seguinte foi reclassificar o resultado obtido em 10 faixas a saber <22°C, 23°C,
24°C, 25°C, 26°C, 27°C, 28°C, 29°C, 30°C, > 31°C.Após a classificação da imagem selecionou-se
as áreas que apresentaram variações significativas de temperatura.

RESULTADO
Figura. 02 – Imagem Processada no Município de Natal-RN da banda termal do satélite LANDSAT
7 (ETM+), destacando a Região do Parque Estadual das Dunas.

O Processamento da banda termal (6) do sensor LANDSAT 7 (ETM +), permitiu uma
analise térmica horizontal no dia 04/08/2001, observando que O Parque das Dunas e o Estuário do
Rio Potengi, são pontos relativamente mais frio dentro da ilha de calor urbana. No Parque do
Estado, varia de 23-24 ° C, salientando o efeito da altitude e da presença de vegetação, no próprio
Fórum Internacional do Meio Ambiente - A conferência da Terra 186

parque as desprovida de vegetação, 27-28 ° C, e no seu entorno apresentam temperatura mais


elevadas superior a 31 ° C, devido o grande numero de edifícios, que serve de barreira , bloqueado o
fluxo de vento e aquecendo a cidade a sotavento.

CONCLUSÃO
O Presente trabalho mostrou a importância da interação dos estudos de dados dos sensores
termais, para a compreensão da dinâmica térmica e nos seus arredores. Verificou-se nesta pesquisa
que o Parque das Dunas do Natal-RN, cria microclima agradáveis, trazendo benefícios relevantes
no processo de amenizarão climática no meio urbano.
Considera-se de fundamental importância, o controle da quantidade de edifícios e seus
respectivos gabaritos, pois o complexo dunar do Parque das Dunas (barreira natural), pois o fluxo
de vento que consegue ultrapassar o Parque corre o risco de ficar bloqueado, pelas barreiras
formadas pelos edifícios, aquecendo a cidade, a sotavento.
Observa-se que dentro do processo de urbanização existente, vários vetores e o Parque das
Dunas, encontra-se pressionado por 2 (dois) deles de um lado a população de baixa renda do bairro
de Mãe Luiza e a Industria do Turismo que procuram áreas com característica de conforto. Devido
ao grande retorno financeiro que essa atividade proporciona, e ela corre o risco de gerar uma
banalização de fatores importantes, a relação do Parque com a qualidade de vida.
Com base nas análises realizadas nestas pesquisas visou conhecer um pouco mais da
realidade da camada limite superficial, ou seja, da climatologia da cidade utilizando como indicador
o fator térmico da cidade utilizando dados mesoclimaticos para se conhecer o processo pelo qual o
Parque das Dunas provocar na diminuição da temperatura no microclima urbano, o estudo ressalta
a importância das áreas verdes e sua influência na amenização climática da cidade para contribuir
para uma melhorar da qualidade ambiental urbana e consequentemente qualidade de vida da
população a interpretação dos resultados deste estudo, recomenda a divisão de áreas verdes em
maior número de pequenos parques espalhado por toda a cidade.

REFERÊNCIA BIBLIOGRÁFICA
ASSIS, Eleonora Sad de. Mecanismos de desenho urbano apropriados à atenuação da ilha de calor:
análise de desempenho de áreas verdes urbanas em clima tropical. 1990. 164 f. Dissertação
(Mestrado) – Faculdade de Arquitetura e urbanismo, Universidade Federal do Rio de Janeiro, Rio
de Janeiro, 1990.
CARVALHO, Glauber Richard Sobreira de. Educação Ambiental no contexto de Ecologia Urbana
e as conseqüências das nossas ações: Estudo para o município de Natal/RN. Monografia
(Graduação), UnP, 2006.
CARVALHO, G. R. S. ; AMARAL, R. F. ; LUNA, J. B. . O Mapa termal do campus central da
UFRN por extensão 3D. In: Vll Simpósio Brasileiro de Climatologia Geográfica Rondonópolis, MT
, 2006.
CARVALHO, G. R. S. Mapeamento do uso do uso urbano do Município de Natal-RN. In: XI
Congresso Nordestino de Ecologia, 2006, Recife, PE , 2006.
CARVALHO, Márcia Monteiro. Clima Urbano e vegetação estudo analítico e prospectivo do
Parque das Dunas em Natal. Dissertação (Mestrado). UFRN, Departamento de Arquitetura, Natal,
2001.
LILLESSAND and KIEFER. Remote Sensering, Third edition 1994.
LOMBARDO, Magda Adelaide. Ilha de calor nas metrópoles. São Paulo: Hucitec, 1985.
MONTEIRO, C. A. de F. Teoria e clima urbano. São Paulo: Instituto de Geografia da USP, 1976.
NASA. http://ltpwww.gsfc.nasa.gov/IAS/handbook/handbook_toc.html, acessado em 12.11.2005.
ODUM, E.P. Ecologia. Rio de Janeiro: Guanabara Koogam. 1988.
OKE, T. R. Boundary layer climates. London: Methuen & Co. Ltd., 1978.
RIO GRANDE DO NORTE. Decreto n.º 7.237, de 22 de novembro de 1977. Declara de utilidade
pública, para fins de desapropriação, bens situados na área das dunas, adjacente ao Oceano
Fórum Internacional do Meio Ambiente - A conferência da Terra 187

Atlântico, no município de Natal. Diário Oficial [do] Estado do Rio Grande do Norte, Natal, ano 80,
n. 4177, p. 2, 23. nov. 1977.
SANTAMOURIS, M..Energy and indoor climate in urban environments : recent trends. In:
ENCONTRO NACIONAL DE CONFORTO NO AMBIENTE CONSTRUÍDO, 4., 1997, Salvador.
Anais... Salvador: FAUBAM/LACAM/ANTAC, 1997. p. 15-24.
VIDAL, Roseane Dias de Medeiros. Influência da morfologia urbana nas alterações da temperatura
do ar na cidade do Natal. 1991. 139 f . Dissertação (Mestrado) – Universidade de Brasília, Brasília,
1991.
Fórum Internacional do Meio Ambiente - A conferência da Terra 188

III. Sociedade e natureza

A CONSTRUÇÃO DE UM PLANO PARTICIPATIVO DE DESENVOLVIMENTO RURAL


COMO ESTRATÉGIA DE FORTALECIMENTO COMUNITÁRIO PARA A GESTÃO
SOCIOAMBIENTAL

RODRIGUES, H. C.
Instituto Centro de Vida, Av. Ariosto da Riva, 2367, Centro. Alta Floresta – MT. camila@icv.org.br

RESUMO
Um assentamento rural é constituído por um agregado de pessoas oriundas de
diferentes localidades que se estabelecem em determinado espaço, no qual , uma nova
organização social, política, econômica e ambiental deve ser construída. A organização das
pessoas no assentamento se torna fundamental para que seu desenvolvimento ocorra de fato.
A gestão socioambiental da área, feita pela comunidade organizada, pode ser um fator chave
para o desenvolvimento local sustentável. Isso se torna ainda mais necessário em
assentamentos localizados na Amazônia Legal, devido a comum situação encontrada, como
a riqueza de recursos naturais somados a falta de estrutura, assistência e a distancia dos
mesmos. O apoio metodológico para essa mobilização e organização é necessária, para isso
a construção de um plano participativo de gestão socioambiental se apresenta como
importante estratégia. Esse trabalho apresenta a experiência de construção desse plano
participativo no assentamento ENA, localizado no município de Feliz Natal, MT. A
experiência demostra que este processo contribui para fortalecer as relações de confiança,
compromisso mútuo e organização comunitária, além de estabelecer ações de maneira clara
e eficiente rumo ao desenvolvimento alemejado pela comunidade.

ABSTRACT
A rural settlement is a catch of people from different parts of Brazil who was
established in a determinable land, and at this time, a new social, political, economic and
environmental organization have to be built by this group. People’s organization in the
settlement is fundamental in order to have a real development. The social and environmental
management in this area, doing by the organized community can be a key to achieve a
sustainable local development. It is more than necessary in settlements located in the
Amazon , because there we can see a common situation: wealth of natural resources plus
basic structure missing and no assistance. Help and methodology support to mobilization
and organization is necessary, for it building a participative plan to social and environmental
management show us a very important strategy. This article shows us efforts to building a
participatory plan at settlement ENA, located in Feliz Natal city, Mato Grosso. The
experience demonstrate that this process to encourage the truth relationship with each other,
the exchange compromise and community organization, there more the community
according a clear organizationand efficient actions going to a development looking forward
by the community.

INTRODUÇÃO
Ao conjunto de famílias de trabalhadores rurais vivendo e produzindo num
determinado imóvel rural, desapropriado ou adquirido pelo governo federal (no caso de
aquisição, também, pelos governos estaduais) com o fim de cumprir as disposições
constitucionais e legais relativas à reforma agrária dá-se o nome de assentamento rural. A
expressão assentamento é utilizada para identificar não apenas uma área de terra, no âmbito
dos processos de reforma agrária, destinada à produção agropecuária e ou extrativista, mas,
Fórum Internacional do Meio Ambiente - A conferência da Terra 189

também, um agregado heterogêneo de grupos sociais constituídos por famílias de


trabalhadores rurais (Martins, 1998).
Essa nova comunidade em processo de estabelecimento, que agrega diferentes
grupos com identidades sociais distintas, forma um pequeno sistema social que demanda
uma nova organização social, econômica, política e ambiental a ser construída.
A reconstrução desse espaço gera insegurança, exige decisões continuadas sobre
temas novos, adaptações e a construção do novo, formando uma nova identidade social para
o grupo. Essas dificuldades e a falta de experiência faz com que muitas vezes se reproduza
neste pequeno sistema social as problemáticas sócio-ambientais e político-econômicas que
este modelo vigente traz. A degradação ambiental, a desconexão com os sistemas naturais e
seus ciclos, a adoção do monocultivo, o uso dos insumos industrializados, a competição
entre as pessoas, o individualismo e a falta de organização são alguns fatores comuns que
podem ser citados, acarretando em graves problemas sociais e ambientais. Capacitação e
educação ambiental podem ser estratégias importantes, mas não são suficientes para
transformar as práticas dos agricultores. Para esta mobilização, os incentivos econômicos se
mostram também fundamentais. Ressalta-se que a comunidade deve ser capaz de analisar
seus problemas criticamente levantando suas necessidades com clareza para, a partir daí,
traçar as estratégias de ação.
Esforços visando a organização efetiva da comunidade se tornam imprescindíveis
para viabilização dos assentamentos da reforma agrária. A falta de orientação e de
planejamento para que isso de fato aconteça pode prolongar por muito tempo o
desenvolvimento de um assentamento. Assim, geralmente podemos constatar a existência de
diversos assentamentos precários com alta transitoriedade dos beneficiários.
Tendo em vista esses fatores, o presente trabalho tem por objetivo relatar a
experiência de construção de um plano participativo de desenvolvimento rural no Projeto de
Assentamento ENA, localizado no município de Feliz Natal, Mato Grosso, como estratégia
de organização comunitária visando a transformação da realidade local e a capacitação para
gestão socioambiental do assentamento.

CONTEXTUALIZAÇÃO DA ÁREA DO PROJETO


Feliz Natal, município localizado no estado do Mato Grosso, território da bacia
hidrográfica do Rio Xingu, possui uma população de 10.313 (dez mil, trezentos e treze)
habitantes, na qual a principal corrente migratória que povoou este município veio dos
estados do Sul, porém, hoje imigrantes de outras áreas do País juntaram-se aos primeiros
habitantes. É um município extremamente recente, sua fundação da colonização ocorreu em
1.989 e sua emancipação Política em 1.995. O município possui 1.109.900 (um milhão cento
e nove mil e novecentos) de hectares tendo aproximadamente 32% de área indígenas e
aproximadamente 4,5% (cinqüenta mil hectares) áreas de manejo florestal e reflorestamento,
ficando ainda mais de 63% (setecentos mil hectares) de terras a serem cultivadas (mas que
não necessariamente estão abertas). É bem servido de rios, sendo os mais importantes o
Xingu, Von Den Steinen, Ronuro, Arraias, Tartaruga e Rio Ferro. A base da economia esta
na exploração madeireira que vem sendo substituída aos poucos pela produção agrícola
como soja e arroz.
O Projeto de Assentamento ENA foi criado em 1997 em uma área da antiga
Fazenda da Cônsul à 90 km do município. Um fator que torna o PA ENA especial para o
estado está no fato de ser o único assentamento que possui a LAU (licença ambiental única)
no Mato Grosso, possuindo 15.000 ha de reserva legal, essa situação lhe confere diversos
conflitos uma vez que não somente os assentados têm interesses na exploração madeireira da
área, mas também existe interesse de atores de fora do assentamento. Não somente da
reserva legal se faz as riquezas do PA ENA. Rios, represas, e lotes ainda não desmatados
conferem uma beleza particular ao local. Porém, apesar de não ser um assentamento recente,
as condições de infra-estrutura são precárias e os sistemas de gestão ambiental e social são
Fórum Internacional do Meio Ambiente - A conferência da Terra 190

inexistentes, isso leva ao mau uso dos recursos naturais, na falta de renda permanente e nas
relações de desconfiança e conflitos constantes. O assentamento, formado por agricultores
originários de diferentes regiões do Brasil (principalmente do sul), apresenta sistemas
produtivos culturalmente adotados nestas regiões de origem, que, na maior parte das vezes,
não se adequam à realidade ambiental (como as freqüentes queimadas).
Áreas bem preservadas destinadas para reforma agrária nos colocam um grande
desafio para o desenvolvimento e a gestão ambiental dos assentamentos, que consiste em
criar, nestes espaços, ambientes onde se busca uma qualidade de vida e uma produção
economicamente viável. Quando a conservação ambiental é levada em consideração, soma-
se a este desfio mais um ingrediente, que pode tornar-se um aliado da produção e da
qualidade de vida, em vez de um empecilho (Carvalho, 2006).

Contextualização do projeto: governança florestal nas cabeceiras do xingu


O projeto Governança Florestal nas Cabeceiras do Xingu é um consórcio de 5
instituições que atuam no estado do MT e visam diversas ações no âmbito da bacia
hidrográfica do rio Xingu. Essas ações visam proteger a bacia hidrográfica do Xingu através
de 5 eixos estratégicos principais: a) Processos de planejamento territorial e gestão
ambiental no nível da bacia, sub-bacias, municípios desenvolvidos na região das cabeceiras
do Xingu, b) Intervenções demonstrativas e articulações da rede de atores sociais para a
proteção e recuperação das nascentes e matas ciliares, c) Organização de base e movimentos
sociais empoderados para a participação nos processos de Governança Florestal, d)
Monitoramento e controle social do desmatamento em grandes propriedades, e)
Mobilização, comunicação e disseminação de informações no âmbito regional e nacional.
Uma das ações no eixo c propõe o trabalho no assentamento ENA: “Projeto piloto
de desenvolvimento sócio-econômico e gestão ambiental em um assentamento prioritário na
bacia do Xingu”. O piloto tem como enfoque central a organização e mobilização dos atores
sociais, e construção e fortalecimento das relações de confiança, que servem como base ao
trabalho no campo social, econômico e ambiental. Trabalha-se, através de técnicas
educativas e de comunicação, na construção de uma leitura da realidade atual e na
provocação de propostas de transformação dessa realidade. As propostas, oriundas do grupo,
recebem apoio técnico para a sua realização. A construção participativa de um plano de
gestão ambiental e social do assentamento deve ser pactuado entre os membros da
comunidade e monitorado ao longo do projeto.
O projeto prevê quatro anos de trabalho no PA ENA, sendo este texto uma reflexão
das ações desenvolvidas no primeiro ano.

PARTICIPAÇÃO PARA TRANSFORMAÇÃO


Os métodos utilizados para a difusão e adoção das tecnologias da agricultura
moderna, nos anos 60, fundamentalmente se orientavam num processo de cima para baixo.
O conhecimento era do técnico e o produtor tendia a ser colocado como ignorante, receptor
final das tecnologias e práticas agrícolas. Frente a estes métodos, e a partir de influencias da
antropologia, da pedagogia de Paulo Freire, e outras fontes, foram propostos métodos
alternativos, participativos, dando-se a voz ao produtor. Porém havia um pouco de
ingenuidade e romantismo nesta proposta, pois as relações de poder entre técnicos e
agricultores não se evaporam por vontade ou decreto. Passou-se a assumir um outro conceito
de poder nas relações sociais. O poder é parte de negociações permanentes, é intrínseco às
relações sociais, e permeia desde as estruturas macro às microsociais. Novos desafios para
os métodos participativos colocam-se com esta perspectiva.
Participar significa viver e relacionar-se de maneira diferente. Implica na
recuperação da liberdade interior própria, aprender a escutar e compartilhar, livre de
qualquer medo ou conclusão, crença ou julgamentos pré-definidos. Possibilita a pessoa a
adquirir um tremendo poder para o fortalecimento de sua própria vida, para assim contribuir
Fórum Internacional do Meio Ambiente - A conferência da Terra 191

de maneira significativa, na luta pela melhoria de vida de todos os demais. Mas a


participação pode se tornar um processo de manipulação quando os indivíduos estão
alienados e atuam apenas como robôs programados. Existe uma confusão a respeito de
participação com quantidade de pessoas presentes e em alguns casos usa-se de seu poder
para levar as pessoas a assumirem a sua proposta, muitas vezes usando instrumentos
metodológicos participativos. Acredita-se, ainda, que o mais importante é chegar ao
resultado final e não construir o processo.
Podemos distinguir formas manipuladas de participação e formas espontâneas. Na
primeira, os participantes não se sentem pressionados para fazer algo, mas na realidade estão
guiados a realizar ações que são inspiradas ou dirigidas por centros fora de seu controle.
A participação, que é também uma forma de intervenção, é algo demasiado sério
para ser reduzido a uma palavra de um significado preciso, ou a um lema publicitário, um
fetiche, um instrumento ou uma metodologia. Se usada no reducionismo pode se tornar uma
ferramenta perigosa de manipulação.
Quando a comunidade reflete sobre casos concretos da problemática organizativa e
produtiva de seu dia-a-dia, ela achará, de forma gestionada, as melhores e mais adequadas
soluções para estes problemas. Esta participação conduz à gestão, pelos próprios
interessados, tanto do processo produtivo como no processo organizacional. O grupo tendo
em suas mãos a capacidade de decidir sobre o que fazer e o como fazer, os rumos a serem
tomados a serem alcançados e a divisão de recursos financeiros, materiais e humanos
disponíveis entre estas prioridades, quem serão os favorecidos e quem serão os prejudicados,
somente então este grupo tem o poder de decidir.
Participar significa ter consciência do poder de transformação que todos tem sobre
sua própria realidade. Significa engajar-se na luta de um sonho comum, construído em cada
local onde se está inserido. Mais do que isso participação significa distribuição de poder, e
isso leva ao enfrentamento daqueles que buscam o empoderamento e daqueles que
historicamente concentram o poder.

METODOLOGIA
O planejamento participativo parte de uma leitura do nosso mundo na qual a idéia
de que nossa realidade é injusta e de que essa injustiça se deve a falta de participação em
todos os níveis e aspectos da atividade humana (Gandin, 1994). A função do planejamento
como ferramenta de participação é tornar a ação clara, precisa, eficiente, direcionada e
transformadora. Planejar não é fazer algo antes de agir, é agir de determinado modo
buscando construir a realidade com as características que se deseja para a mesma. É
interferir na realidade para transformá-la numa direção claramente indicada.
Em um processo de planejamento participativo, todos, com seu saber próprio, com
sua consciência, organizam seus problemas, seus ideais, seu conhecimento da realidade, suas
propostas e suas ações.
A experiência do PA ENA na construção do planejamento participativo foi baseado
nas seguintes etapas:

I - Planejamento político-social
Preparação (sensibilização e animação da comunidade): esta etapa tem como
objetivo conhecer e analisar conceitos sobre planejamento, participação e comunicação.
Buscou-se nivelar alguns conceitos com o grupo e também trabalhar a motivação da
comunidade para a necessidade da discussão de suas potencialidades e problemas. É
fundamental a construção de uma relação de confiança entre os atores sociais envolvidos
com vistas ao planejamento participativo e para que a eficiência das etapas seguintes
obtenham sucesso. Neste passo é desejável que todos os participantes passem a ter uma
visão global do processo e que compreendam, a cada momento, o que será realizado, de
forma que a tomada de decisão seja compartilhada.
Fórum Internacional do Meio Ambiente - A conferência da Terra 192

Compreender a situação: utilização de técnicas e ferramentas (com base no


diagnostico rural participativo – DRP) que permitam que as comunidades façam o seu
próprio diagnóstico e a partir daí comecem a auto-gerenciar o seu planejamento e
desenvolvimento. Seu objetivo, mais que a perfeição científica, foi a complementaridade de
informação recebida pelas diferentes fontes, mantendo, assim, um cruzamento de dados que
incrementa a precisão crítica de análise.
Estabelecer um rumo: só tem sentido saber onde se está para relacionar este
conhecimento com o resultado que se pretende alcançar. O objetivo dessa fase foi construir
uma “visão de futuro” da comunidade, ou seja, chegar a um consenso sobre a situação ideal
que o grupo enxerga para o assentamento.
Verificar a distancia entre o desejado e o que se tem no momento, definição dos
objetivos: nesta fase o objetivo foi verificar a distancia em que se está, de que meios se
dispõe e que dificuldades estão presentes e vão surgir. Feita a partir do diagnóstico, a
definição dos objetivos ocorre de forma a expressar o caminho que vai da realidade existente
à realidade desejada, ou seja, partindo de “como está” para o “como se deseja”, com isso
levantam-se as necessidades do grupo que serão os objetivos prioritários para a construção
do plano de ações.
Ao final dessas etapas tem-se um marco referencial, ou seja, o grupo se vê como
parte integrante de uma realidade mais ampla, tem uma proposta sócio-política de
transformação da realidade existente e se propõe como realizadora das ações especificas
previstas, rumo a realidade desejada.

II – Planejamento Operacional
O planejamento operacional tem como objetivo definir um caminho
para um tempo: a proposta de ação é uma interferência na realidade (na prática), a fim de
transformá-la (aproximar o real do ideal) ou de construir uma nova realidade (aquela que foi
proposta como ideal, que vai sendo construída aos poucos e através dos tempos). Para cada
ponto almejado no planejamento político-social devem ser traçadas ações necessárias,
responsáveis e o tempo de concretização desta ação.
Plano de ações: é importante a compreensão do que é necessário e do que é possível,
bem como a priorização das ações, considerando recursos disponíveis, prazos estabelecidos
e responsáveis. É preciso ainda estabelecer estratégias que assegurem a organização das
ações e possibilitem benefícios permanentes. O Plano operacional é um documento flexível,
que pode sofrer mudanças ao longo do tempo se for isso for avaliado necessário pelo grupo.
Execução e gestão do plano: é o momento em que as ações programadas são
colocadas em prática, coletivamente. As responsabilidades são assumidas, de forma
integrada, de acordo com os interesses coletivos. A execução e a gestão do plano deve estar
sob a responsabilidade dos atores envolvidos no processo. O presente trabalho se encontra
nesta fase de desenvolvimento.
Acompanhamento contínuo, avaliação e socialização com a comunidade: a
necessidade de fazer um acompanhamento contínuo do plano, avaliar e socializar sucessos e
insucessos faz com que as pessoas que participam deste processo de planejamento
participativo se apropriem daquilo que construíram coletivamente. Esse ponto deve ser
contemplado em todas as etapas do planejamento identificando os impactos sociais,
econômicos, ambientais e outros de todo o processo de aprendizagem que a metodologia de
trabalho possibilita. Os sucessos devem servir como base de um processo de
aperfeiçoamento das ações e os insucessos devem ser encarados como desafios e fator
motivador para novas ações na busca de novos caminhos.

RESULTADOS
A presença de do “animador”, de um técnico local facilitador, com sensibilidade para
escutar as pessoas da comunidade e vivenciá-la permite que o processo ocorra de maneira
Fórum Internacional do Meio Ambiente - A conferência da Terra 193

mais eficiente. A presença constante do agente externo traz segurança para pessoas no
trabalho desenvolvido, fortalece a auto-estima do grupo e contribui metodologicamente para
que esteja sempre em evidencia as aprendizagens que o processo possibilita. Isso mantém a
“chama acesa”. A participação popular é uma forma de luta e reivindicação de melhoria da
qualidade de vida e o grupo deve refletir sobre isso ao longo do tempo.
O ato de planejar permite a avaliação da situação como um todo, dando a possibilidade
de prever as dificuldades e os modos para superá-las. O planejamento aumenta a
compreensão sobre trabalho a ser realizado, permite ver sua complexidade e suas
dependências. Também gera compromissos e responsabilidades mútuas. Porém devemos ter
clareza que não é um processo que se constrói da noite para o dia. Os técnicos, angustiados
por quererem ver resultados mais imediatos, costumam atropelar o processo, tomando
decisões em nome dos grupos, não lhes permitindo descobrir os caminhos por si mesmos,
por meio de um diálogo construtivo. Costumam, também, achar que as pessoas não estão
preparadas para assumir este processo. Se alguém quer que as pessoas participem, deve,
antes de mais nada, levá-las a sério (Gandin, 1994).
Através do planejamento participativo foi possível a organização de um grupo de
trabalho, que, trouxe novamente à tona o espírito de esperança de transformação que a
comunidade havia perdido, como relatado por muitas pessoas durante o diagnóstico. Isso foi
muito importante visto que para a construção de um planejamento, além de problemas, é
necessário que haja a esperança de que a realidade pode ser mudada. A construção de um
plano político-social, de uma realidade ideal que se pretende alcançar trouxe ânimo para a
elaboração de um plano operacional consistente, que foi sistematizado em um documento,
junto com os dados do diagnóstico, e que foi distribuído para toda a comunidade. A
transparência das ações tornam-nas mais efetivas e consolidam as relações de confiança que
o processo vem gerando.

CONCLUSÕES PARCIAIS
Os resultados do trabalho mostram que o planejamento participativo é uma
ferramenta eficiente para trabalhar a participação espontânea e o envolvimento comunitário,
bem como potencializar as relações de confiança e comprometimento entre as pessoas. O
plano de desenvolvimento auxilia a comunidade a seguir um caminho comum, de forma
organizada, clara e eficiente, possibilitando traçar estratégias de ação concretas rumo ao
sonhado desenvolvimento almejado por eles.

REFERÊNCIAS BIBLIOGRÁFICAS
ANTONIO, F. (coord.). Projeto Inovar. EMATER - Minas Gerais. 2004.
BEZERRA, R.; Santos, H.S.;Silva, N.D. Utilização do diagnóstico participativo e
organização social dos artesãos do distrito de Caraibeiras/ Tacaratu-PE: Relato de
experiência do programa Universidade Solidária/ Xingo e UFRPE – 2000. Anais do IV
SEMPE – Seminário de Metodologia para Projetos de Extensão, São Carlos. 2001.
CARVALHO, I. S. H. Desenvolvimento e Gestão Ambiental para Assentamentos Rurais no
Cerrado. III Encontro da ANPPAS. Brasília. 2006.
GANDIN, D. A Prática do Planejamento Participativo: na educação e em outras
instituições, grupos e movimentos dos campos cultural, social, político, religioso e
governamental. Petrópolis. 1994.
GUIVANT, J. Métodos Participativos. In: Métodos Participativos em Desenvolvimento
Rural Sustentável – REDCAPA. 2007.
MARTINS, C. H. Interação social e as possibilidades de coesão e de identidade sociais no
cotidiano da vida social dos trabalhadores rurais nas áreas oficiais de reforma agrária no
Brasil. Ministério extraordinário de política fundiária – MPF, Núcleo de estudos agrários e
de desenvolvimento – NEAD, Instituto Interamericano de Cooperação para a Agricultura –
IICA. Curitiba. 1999.
Fórum Internacional do Meio Ambiente - A conferência da Terra 194

SACHS, W. (editor). Diccionario del desarrollo. Una guía del conocimiento como poder.
PRATEC, Perú. 1996
VERDEJO, E. M. Diagnóstico Rural Participativo: Um guia prático. Secretaria da
agricultura Familiar – SAF/ MDA. Emater/ RS. Brasília. 2006.
Fórum Internacional do Meio Ambiente - A conferência da Terra 195

A CRIAÇÃO DA APA CABUÇU TANQUE – GRANDE COMO DEFESA DA RESERVA


DA BIOSFERA DO CINTURÃO VERDE DA CIDADE DE SÃO PAULO (+)

Antonio Manoel dos Santos OLIVEIRA


Universidade Guarulhos. Laboratório de Geoprocessamento. aoliveira@prof.ung.br
Edson José de BARROS
Prefeitura de Guarulhos. Secretaria do Meio Ambiente
Rodrigo VICTOR
Instituto Florestal. Coordenação da RBCV

RESUMO
A criação da Área de Proteção Ambiental - APA Cabuçu – Tanque Grande está em processo
no município de Guarulhos. Como área protegida de uso sustentável, possui os principais requisitos
necessários à valorização dos serviços ambientais da biosfera, ou seja, o Zoneamento Ecológico-
Econômico, correspondente ao diagnóstico sócio – ambiental da região, e o Conselho Gestor que
contempla um sistema de gestão ambiental participativa. Este processo de criação resultou da
realização, de 2002 a 2005, de projeto de pesquisa da Universidade Guarulhos - UnG, com o apoio
da Fundação de Amparo à Pesquisa do Estado de São Paulo - FAPESP, com várias instituições
parceiras, destacando-se a participação de órgãos da Prefeitura de Guarulhos. A área da futura APA,
com cerca de 32 km2, compreende o entorno do Parque Estadual da Cantareira (PEC), no município
de Guarulhos, com o papel de harmonizar a sua expansão urbana com a floresta da Cantareira e com
a perspectiva de valorizar os serviços ambientais da Reserva da Biosfera do Cinturão Verde da
Cidade de São Paulo e de contribuir para a redução das vulnerabilidades locais frente às mudanças
climáticas globais.
Palavras-chave: Área de Proteção Ambiental; Cabuçu – Tanque Grande; Guarulhos; Reserva da
Biosfera do Cinturão Verde da Cidade de São Paulo.

ABSTRACT
The creation of the Environmental Protection Area – APA Cabuçu – Tanque is in progress at
Guarulhos, São Paulo, Brazil. As a protected area of sustainable use, the APA possess the main
necessary requirements to valorization of the biosphere services, that is the ecological – economic
zoning, and the Managing Advice to implant a system of participative environmental management.
This process is the result of a research project developed by Guarulhos University, approved in the
FAPESP Public Policies Research Program, carried in the years 2002 to 2005 with the participation
of several partners’ institutions as Guarulhos City Hall and the Forest Institute of São Paulo. With
an area of 32,2 km2, surrounding the State Park of Cantareira, Guarulhos county, São Paulo state,
the APA aim the harmony between cities and urban forests in the perspective of valorization of
biosphere services of Green Belt Biosphere Reserve of São Paulo City and to contribute to mitigate
local vulnerability against global climatic changes.
Key - words: Environmental Protection Area; Cabuçu – Tanque; Guarulhos; Green Belt Biosphere
Reserve of São Paulo City.

INTRODUÇÃO
Levantamento recente da situação das florestas urbanas do Brasil, realizado pelo Ministério
do Meio Ambiente (SERRANO, 2005) concluiu que, embora não haja dúvidas quanto a sua
importância como serviços da biosfera para o bem estar humano, de uma população brasileira quase
totalmente urbana, suas condições, nas principais capitais do país, vem sofrendo degradação.
Na Região Metropolitana de São Paulo – RMSP, a expansão urbana vem reduzindo
sistematicamente as áreas verdes do entorno, tendo atingido, no município de São Paulo, os limites
do Parque Estadual da Cantareira, eliminando assim qualquer possibilidade de se implantar, nesse
município, uma zona de amortecimento (SNUC, 2000). Como agravante, a expansão urbana vem se
(+)
Este artigo contou com a colaboração de Marcio Roberto Magalhães de Andrade, Sandra Emi Sato e William de
Queiroz do Laboratório de Geoprocessamento da Universidade Guarulhos.
Fórum Internacional do Meio Ambiente - A conferência da Terra 196

desenvolvendo sobre terrenos menos aptos à ocupação, devido ao relevo de maiores amplitudes e
declividades, em terrenos cristalinos, mais suscetíveis à erosão e a áreas de risco, à produção de
sedimentos e intensificação de enchentes (EMPLASA, 2003). Além disso, vem atingindo áreas com
maiores restrições da legislação ambiental, especialmente as APPs do Código Florestal e as Áreas
de Proteção de Mananciais, eliminando radicalmente os serviços ambientais proporcionados pela
cobertura vegetal e, ainda, impactando os mananciais que hoje se destinam ao abastecimento e
outros, menores, ainda não aproveitados, mas que, em função do esgotamento qualitativo e
quantitativo dos recursos hídricos, vem sendo procurados, como é o caso do Cabuçu, um exemplo
paradigmático da reativação do aproveitamento que era realizado no século XIX (HERLING,
2002).
O duplo impacto da expansão urbana inadequada – perda de serviços da biosfera e geração
de desequilíbrios geoambientais – com conseqüências nefastas sobre o bem estar humano, indica a
necessidade de se orientar o processo de uso do solo de forma mais harmoniosa com as florestas
urbanas e outras áreas verdes da RMSP.
Este propósito foi plenamente confirmado pela UNESCO ao declarar, em 9 de junho de
1994, a constituição da Reserva da Biosfera do Cinturão Verde da Cidade de São Paulo – RBCV,
como uma das mais de 500 criadas em todo o planeta. As reservas da biosfera despontam
atualmente como uma linha de defesa contra os efeitos indesejáveis das mudanças climáticas
globais tanto como fontes de serviços ambientais quanto como oportunidades de praticar e ensaiar
tecnologias para o desenvolvimento sustentável, reduzindo as vulnerabilidades locais a estas
mudanças.

RESERVA DA BIOSFERA DO CINTURÃO VERDE DA CIDADE DE SÃO PAULO -


RBCV
A RBCV, apresentada na Figura 1, com cerca de 15.000 km2, abrange 73 municípios,
incluindo as regiões metropolitanas de São Paulo e da Baixada Santista, onde vivem cerca de 23
milhões de pessoas, mais de 10% da população nacional, numa área equivalente a 0,2 % do
território brasileiro.

Figura 1. Reserva da Biosfera do Cinturão Verde da Cidade de São Paulo – RBCV


Fórum Internacional do Meio Ambiente - A conferência da Terra 197

As Reservas da Biosfera foram criadas em 1976 no âmbito do Programa “O Homem e a


Biosfera” (MaB: Man and Biosphere) da UNESCO como “áreas que inovam e demonstram
abordagens para a conservação e o desenvolvimento sustentável” (UNESCO, MAB, 2006 apud IF,
2007). Suas funções básicas são 3: de conservação de paisagens e ecossistemas; de
desenvolvimento sustentável e de estímulo à pesquisa; educação e monitoramento. Estas funções
estão cada vez mais destacadas pela importância crescente dos serviços ambientais da biosfera para
o bem estar humano na RMSP, frente ao forte stress dos problemas do crescimento urbano que não
tem valorizado suficientemente esses serviços. Os serviços ambientais da biosfera são os serviços
de provisão, como a água para o abastecimento urbano; os serviços de regulação, como a atenuação
da ilha de calor urbano; os de sustentação, como os processos ecológicos e, finalmente, os serviços
culturais, como os da paisagem para o lazer e a contemplação (ALCAMO et al. 2003). A
conservação destes serviços destaca-se como uma das medidas de prevenção das conseqüências das
mudanças climáticas globais.

CRIAÇÃO DA APA COMO FRUTO DE PROJETO DE PESQUISA DA FAPESP

A proposta da criação da APA Cabuçu – Tanque Grande resultou do desenvolvimento de


pesquisa da Universidade Guarulhos – UnG, com apoio da FAPESP – Fundação de Amparo à
Pesquisa do estado de São Paulo, com o título “Diagnóstico Ambiental para o Manejo Sustentável
do Núcleo Cabuçu do Parque Estadual da Cantareira e Áreas Vizinhas do Município de Guarulhos”
(Processo FAPESP 01/02767-0). Este projeto foi desenvolvido na área de entorno (32,2 km2) do
Parque Estadual da Cantareira - PEC, denominada, pelo Projeto, Zona de Defesa do Núcleo Cabuçu
- ZD, como uma área de amortecimento do PEC (UnG, 2005). Esta área situa-se nas bacias do rio
Cabuçu de Cima e do Baquirivu - Guaçu, afluentes do rio Tietê. A Figura 2 apresenta sua
localização no município de Guarulhos, na RMSP e na RBCV.

Figura 2. Zona de Defesa do Núcleo Cabuçu,correspondente à APA Cabuçu – Tanque Grande, no


município de Guarulhos, na RMSP e na RBCV.

Aprovado no Programa de Pesquisa em Políticas Públicas – PPPP – da FAPESP, o projeto


foi realizado de 2002 a 2005, com a participação de instituições parceiras (PMG - Prefeitura
Municipal de Guarulhos: SDU - Secretaria de Desenvolvimento Urbano e SEMA - Secretaria de
Meio Ambiente; IF – Instituto Florestal: PEC – Parque Estadual da Cantareira; RBCV – Reserva da
Biosfera do Cinturão Verde da Cidade de São Paulo e Seção de Geociências da Divisão de
Dasonomia; SAAE – Serviço Autônomo de Água e Esgoto de Guarulhos; PROGUARU –
Progresso e Desenvolvimento de Guarulhos S/A) e colaboradoras (UNICAMP – Departamento de
Educação em Geociências; IPT – Laboratório de Geofísica Aplicada). Além destas instituições, o
Projeto teve o apoio da OnG Projeto Cabuçu de Desenvolvimento Local, com importante papel na
Fórum Internacional do Meio Ambiente - A conferência da Terra 198

sua interação com a comunidade. A região, com 32,2 km2, foi criteriosamente delimitada no
entorno do Parque Estadual da Cantareira (PEC), envolvendo 3 regiões do município de Guarulhos,
conforme a Figura 3, visando a harmonia da sua expansão urbana com a floresta da Cantareira. Para
este objetivo ser alcançado, o projeto tinha como perspectiva a definição de um sistema de gestão
ambiental participativa na área – objeto, como política pública a ser implantada em Guarulhos, para
evitar os problemas advindos do uso do solo inadequado e a valorização dos serviços ambientais da
biosfera da região, destacados pela Reserva da Biosfera do Cinturão Verde da Cidade de São Paulo
– RBCV, conforme diagnóstico de Avaliação Subglobal Ecossistêmica do Milênio realizado por sua
coordenação (SMA, 2003).

Figura 3. As 3 regiões da ZD / APA: Cabuçu, Invernada e Tanque Grande.

DIAGNÓSTICO AMBIENTAL DA REGIÃO

O diagnóstico ambiental ZD/APA foi realizado por meio de um levantamento do meio físico
tendo como bases conceituais e metodológicas a definição de microbacias hidrográficas, a aplicação
dos métodos da Geologia de Engenharia (como em OLIVEIRA; BRITO, 1998), da Hidrologia
(como em TUCCI, 2002) e da Geomorfologia (como em CHRISTOFOLETTI, 1980), conforme
apresentado em UnG (2005).
Predomina na ZD/APA relevo de morros e montanhas, com elevadas declividades, acima de
30%, esculpidos em rochas cristalinas, pré-cambrianas, indicando áreas menos favoráveis à
ocupação mas, por outro lado, ricas em mananciais sugerindo a sua preservação.
No mapa de restrições ambientais legais, apresentado na Figura 4, verifica-se a densa malha
de Áreas de Preservação Permanente – APPs, de fundo de vale, determinada pela rica rede de
drenagem dos mananciais da região e suas nascentes. Destacam-se também as APPs dos topos dos
morros, marcando o limite da ZD/APA na região do Cabuçu, e a elevada densidade de Mata
Atlântica que ainda subsiste, especialmente na região do Tanque Grande, região sujeita à Lei de
Proteção dos Mananciais.
Fórum Internacional do Meio Ambiente - A conferência da Terra 199

Figura 4. Mapa de restrições legais da ZD/APA.

Balanço hídrico realizado na bacia do Cabuçu de Cima (LACAVA, 2007), contribuinte do


reservatório do Cabuçu, correspondente à maior parte do Núcleo homônimo do PEC, com completa
cobertura de vegetação natural, mostrou baixa capacidade de armazenamento na bacia. Este
comportamento resulta da constituição dos terrenos de solos rasos, substrato pouco permeável e
relevo muito acidentado, o que se reflete em baixa infiltração e rico escoamento superficial. Sendo
estas as condições do meio físico, desfavoráveis para a regulação anual do escoamento de água,
entre os períodos de estiagem e chuvosos, compreende-se a grande depleção do reservatório nos
meses de inverno (Figura 5), quando faltam chuvas para repor as vazões destinadas ao
abastecimento de Guarulhos. Conclui-se que é a cobertura vegetal que nesta bacia cumpre o papel
de serviço ambiental de regulação dos escoamentos superficiais e de contribuição à provisão do
recurso hídrico, auxiliando no armazenamento da água na bacia.
Depreende-se que o desmatamento, excluindo este importante componente ambiental,
eliminaria esse armazenamento, potencializando escoamentos superficiais torrenciais e provocando
processos erosivos intensos, produção de sedimentos, assoreamentos, intensificação e maior
freqüência de cheias a jusante. Este comportamento indesejável é o que tem sido verificado nas
áreas ocupadas vizinhas, onde se observam sulcos e ravinas nas ruas de terra e nos terrenos baldios
descobertos e, o que é mais preocupante, a formação de áreas de risco a escorregamentos nas
encostas de alta declividade que, durante os períodos de chuva intensa, deflagram movimentos de
terra, provocando acidentes que atingem as edificações locais.
Fórum Internacional do Meio Ambiente - A conferência da Terra 200

Figura 5. A evolução do nível do reservatório do Cabuçu de 2004 a 2006 mostra forte depleção na
estiagem, de maio a outubro.

Estes resultados indicaram a necessidade de se orientar uma ocupação criteriosa e adequada


às condições do meio ambiente da área da ZD/APA, não só para conservar o máximo possível dos
serviços ambientais dos ecossistemas locais, delimitados pelas microbacias, como para evitar
processos geológicos indesejáveis, especialmente a formação de áreas de risco. Neste sentido foi
elaborado um modelo de ocupação “Habitação Saudável – Água Boa – Mata Viva” (Figura 6) que
considera a microbacia como unidade de planejamento e encontra, na região, condições favoráveis à
sua implantação: as cabeceiras de várias microbacias ainda possuem cobertura vegetal natural e há
microbacias com aproveitamento de águas de superfície nos fundos dos vales como é o caso de
pesqueiros.

PROPOSTA DA CRIAÇÃO DA APA


A implementação da política pública decorrente do projeto do PPPP da FAPESP, ou seja, a
proposta de criação da APA Cabuçu – Tanque Grande no território da ZD, considerada como fase
III do Programa da FAPESP, passou a ser trabalhada nas Secretarias do Meio Ambiente e
Desenvolvimento Urbano durante a elaboração do Plano Diretor de Guarulhos, no decorrer do ano
de 2004.
Em 25 de maio de 2007, o Prefeito de Guarulhos sancionou e promulgou a nova Lei de
Zoneamento, cujo artigo 42 determina a criação da Área de Proteção Ambiental do Cabuçu –
Tanque Grande em lei específica (D.O. 039 de 25/05/07).
Em 19 de julho de 2007, o Prefeito instituiu Grupo Executivo, vinculado à Secretaria do
Meio Ambiente, com a atribuição de propor a minuta dessa lei, composto pelos secretários do Meio
Ambiente e do Desenvolvimento Urbano, técnicos de ambas secretarias, representante do Instituto
Florestal, da OnG Projeto Cabuçu Desenvolvimento Local e, da Universidade Guarulhos. O Grupo
concluiu a minuta que será objeto de audiências públicas, seguidas de encaminhamento da lei pelo
Executivo para a Câmara de Vereadores de Guarulhos para aprovação.
Fórum Internacional do Meio Ambiente - A conferência da Terra 201

Figura 6. Proposta de modelo de ocupação adequada à ZD/APA, em planta e na seção AA.

PROPOSTA DA APA CABUÇU – TANQUE GRANDE


A APA Cabuçu – Tanque Grande deverá propiciar a conservação dos recursos naturais, o
cuidado com a capacidade de sustentação dos ecossistemas, a preservação da biodiversidade e a
manutenção do corredor ecológico Cantareira – Mantiqueira. Especialmente quanto aos recursos
hídricos, a APA deverá garantir a conservação dos dois únicos mananciais de superfície do
município que atualmente abastecem Guarulhos, correspondentes aos reservatórios do Cabuçu e do
Tanque Grande.
Para a elaboração do Zoneamento Ecológico – Econômico da região da APA, apresentado
na Figura 7, o reconhecimento de atributos sócio-ambientais permitiu que as cotas altimétricas de
800 e 900 metros fossem tomadas como níveis de referência, pois permitem com facilidade a
distinção de porções do território com características específicas, que foram denominadas de Zona
de Vida Silvestre (ZVS), Zona de Uso Conservacionista (ZUC) e Zona de Uso Sustentável (ZUS).
Fórum Internacional do Meio Ambiente - A conferência da Terra 202

Figura 7. Zoneamento Ecológico – Econômico da região da APA Cabuçu – Tanque Grande.

ZONA DE VIDA SILVESTRE - Áreas situadas acima da cota 900.


Esta zona corresponde aos topos de morros e linhas de cumeada mais elevados onde os
solos e remanescentes de Mata Atlântica são extremamente frágeis, correspondendo a locais
apropriados à infiltração e dispersão das águas pluviais, ao abrigo da fauna e à articulação de
corredores ecológicos entre o Parque Estadual da Cantareira e a Serra da Mantiqueira.

ZONA DE USO CONSERVACIONISTA - Áreas localizadas acima da cota 800 e abaixo da 900.
Esta zona corresponde ao conjunto de terrenos formados por outros topos de morros e
linhas de cumeada menos elevados, incluindo encostas muito íngremes, contendo a maior parte das
nascentes d’água e onde ocorrem expressivos remanescentes de Mata Atlântica. A ZUC juntamente
com a ZVS, constituem assim a porção do território onde as condições geoambientais são de
elevada fragilidade natural, menos favoráveis à ocupação, destinadas portanto ao predomínio dos
serviços ambientais da biosfera. Além disso, são terrenos que apresentam mais restrição legal à
ocupação em relação às áreas de preservação permanente de topo de morro (Código Florestal) e de
Mata Atlântica (Lei Municipal 4566/94) e às encostas com declividades excessivas (a lei de
zoneamento de Guarulhos estabelece um limite de 45% de declividade). Além disso a ZUC se
localiza na Área de Proteção aos Mananciais do Tanque Grande.

ZONA DE USO SUSTENTÁVEL - Áreas localizadas abaixo da cota 800.


Esta zona corresponde ao conjunto de terrenos onde predominam declividades inferiores
aos da ZUC, menor número de nascentes e remanescentes de Mata Atlântica, havendo maior infra-
estrutura viária que articula espaços urbanos mais ocupados ou com tendência à ocupação, embora
ainda apresentem remanescentes de Mata Atlântica e condições geoambientais que exigem cuidados
no uso e ocupação do solo. A ZUS tem por objetivo conciliar atividades de baixo impacto ambiental
com a manutenção das condições ambientais da região, prestando-se a atividades compatíveis com a
mínima impermeabilização do solo e a menor alteração possível da paisagem.
Fórum Internacional do Meio Ambiente - A conferência da Terra 203

DEMAIS ZONAS
Além das ZVS, ZUC e ZUS, fundamentais na definição da identidade da APA Cabuçu –
Tanque Grande, destacam-se no seu território algumas áreas atualmente ocupadas e que foram
previstas na Lei de Zoneamento de Guarulhos: a Zona de Uso Misto (ZM); a Zona de Extração de
Minérios e Disposição de Resíduos Sólidos (ZEMR), onde se encontra o aterro sanitário que atende
a cidade de Guarulhos, e a Zona de Uso Sustentável e Recuperação Ambiental (ZUSRA), que
correspondem à assentamentos urbanos que necessitam de planos de recuperação urbano-ambiental.

CONCLUSÕES
A criação da APA, por força da nova Lei de Zoneamento de Guarulhos e da lei específica,
contribuirá para a requalificação urbana e decorrente regularização fundiária, assim como para a
educação ambiental nas ZUSRAs, com seus dois pilares: o Zoneamento Ecológico – Econômico –
ZEE e o Conselho Gestor. Este Conselho deverá constituir fórum adequado ao fortalecimento da
gestão local, envolvendo representantes de bairros, de ONGs, de Escolas, de Clube de Mães, enfim
de toda a comunidade, juntamente com representantes do poder público. O Conselho Gestor tem
portanto o potencial de fortalecer a cidadania da sociedade local, em sua maior parte de baixa renda,
no quadro político e institucional do município, para conquistas no sentido de uma melhor
qualidade de vida.
Os resultados obtidos com o diagnóstico ambiental, que fundamenta o ZEE, aplicados na
APA, promoverão preventivamente o uso adequado do solo reduzindo a dilapidação dos recursos
públicos correspondente às ações de defesa civil e outras, além das obras corretivas que vem sendo
demandadas pelas ocupações ambientalmente irregulares das ZURAs. Para os moradores, a APA
reforça as atividades não poluidoras hoje existentes e abre perspectivas para um turismo ecológico
na região da Cantareira, cujas atividades já se iniciam com o I Seminário de Construção do Plano de
Turismo de Base Local Comunitário da Região do Cabuçu, realizado em 24 de novembro de 2007
no Núcleo Cabuçu do PEC, Instituto Florestal.
Além disso, a região, tendo o status de APA, poderá atrair recursos e constituir poder
compensatório de obras regionais de impactos ambientais significativos.
A APA tem como pressuposto a conservação ambiental com uso adequado do solo, o que
reflete uma preocupação com uma distribuição demográfica mais equilibrada da região e com as
florestas hoje ainda presentes. Esta condição deverá propiciar um melhor equilíbrio geográfico do
que a situação atual na RMSP e na RBCV em que as áreas mais densamente ocupadas atingiram os
limites do PEC e de outras unidades de conservação, por força do processo de expansão urbana
inadequado.
A APA, ao frear a expansão urbana veloz e inadequada, criará condições favoráveis à defesa
da cultura local que vinha sendo alimentada pela estabilidade histórica das ocupações que datam da
época em que foi criado o Parque Estadual da Cantareira com a construção da primeira barragem
arco de concreto do Brasil, no início dos anos de 1900, e com expressões locais reconhecidas pela
população, como a Igreja do Bom Jesus das Cabeças e o Sítio da Candinha.
De um ângulo mais geral, entende-se que as experiências adquiridas a partir da criação e
gestão da APA Cabuçu-Tanque Grande, especialmente em face de suas peculiaridades
socioambientais e de seu contexto socioeconômico, deverão iluminar e inspirar iniciativas
semelhantes, seja localmente, no âmbito do Parque Estadual da Cantareira, cujas regiões de entorno
carecem de instrumentos e marcos mais integradores de gestão ambiental participativa, seja na
própria Reserva da Biosfera do Cinturão Verde da Cidade de São Paulo como um todo, cujos
exemplos exitosos de criação e gestão de APAs periurbanas seguramente contribuirão de forma
relevante para o robustecimento de sua governança ambiental.
Por fim a criação da APA Cabuçu – Tanque Grande pode ser considerada um exemplo de
solução local para as questões socioambientais, cuja potencialização pelas mudanças climáticas
globais, pode assim ser localmente atenuada.
Fórum Internacional do Meio Ambiente - A conferência da Terra 204

AGRADECIMENTOS
Os autores agradecem à FAPESP pelo apoio ao projeto (Processo 01/02767-0) e aos técnicos
da Prefeitura de Guarulhos e do Instituto Florestal, assim como à direção da ONG Projeto Cabuçu
Desenvolvimento Local.

REFERÊNCIAS
ALCAMO, J. et al. Ecosystems and human well–being. A report of the conceptual framework
Working Group of the Millennium Ecosystem Assessment. Island Press. 245 p. 2003.
CHRISTOFOLETTI, A. Geomorfologia. São Paulo. E. Blucher. 188 p. 1980.
EMPLASA – Empresa Paulista de Desenvolvimento Metropolitano S.A. Mapa de uso do solo da
Região Metropolitana de São Paulo. CD. 2003.
HERLING, T. A floresta em São Paulo, a cidade na Cantareira: fronteiras em transformação. 2002.
222 p. Tese (Doutorado em Arquitetura e Urbanismo) – Faculdade de Arquitetura e Urbanismo,
Universidade de São Paulo, São Paulo, 2002.
LACAVA, M. A. et al. Análise do comportamento hídrico do Rio Cabuçu de Cima – Parque
Estadual da Cantareira, Guarulhos (SP), pelo método SCS com dados do radar meteorológico de
São Paulo. In: Congresso Brasileiro de Meteorologia, 14 nov., Florianópolis. Anais... 1 CD ROM.
2006.
OLIVEIRA, A.M.S.; BRITO, S.N.A. Geologia de Engenharia. São Paulo. ABGE. 516 p. 1998.
SERRANO, O. Florestas Urbanas: conceitos, manejo e açõies governamentais. Brasília. Ministério
do meio Ambiente (TCP/BRA/2902). Versão Final. 122 p. 2005.
SMA – SECRETARIA DE ESTADO DO MEIO AMBIENTE. Avaliação Subglobal da Reserva da
Biosfera do Cinturão Verde da Cidade de São Paulo. Submissão de Proposta para a avaliação
Ecossistêmica do Milênio. São Paulo: Coordenação da Reserva da Biosfera. Instituto Florestal.
Relatório Interno. 111 p. Anexos. 2003.
SNUC – Sistema Nacional de Unidades de Conservação. Lei 9.985 de julho de 2.000.
http://www.seia.ba.gov.br/gerconovo/arquivos/SNUC.PDF. 2000. Acessado em 21 de novembro de
2007.
TUCCI, C.E.M. Hidrologia. Ciência e Aplicação. Torto Alegre. Editora da UFRGS / ABRH. 943 p.
2002.
UnG – Universidade Guarulhos. Diagnóstico Ambiental para o Manejo Sustentável do Núcleo
Cabuçu do Parque Estadual da Cantareira e Áreas Vizinhas do Município de Guarulhos. Relatório
Final à FAPESP. 108 p. 2005.
Fórum Internacional do Meio Ambiente - A conferência da Terra 205

A TERRA: O BERÇO DA HUMANIDADE SEUS FILHOS E FRUTOS24

Rômulo Luiz Silva Panta


Graduado em Geografia (UEPB), Aluno do Bacharelado em Ciências Econômicas (UFPB)-
romulolspanta@yahoo.com.br

RESUMO
A terra é um elemento essencial à sobrevivência da maioria dos seres vivos. Através da sua
função a terra consegue adquirir um status de geradora de vida, patrocinadora de esperanças e de
possibilidades a realização de sonhos. A importância que têm a terra é evidenciada e reconhecida por
gerações passadas. No entanto sua funcionalidade muda, conforme ocorrem as mudanças sociais, que
direcionam e reconfiguram toda sua funcionalidade. Na perspectiva metodologia para construção
deste artigo, onde inicialmente foi efetuada o levantamento bibliográfico para melhor se fundamentar
e criar um aporte intelectual necessário à construção do trabalho. Para tanto destacamos alguns
autores que subsidiaram de forma valorosa a construção deste artigo: CASTRO (1996), HUNT
(2000), LEPSCH (2001), MOREIRA; WATANABE, (2006), entre outros. A terra no entendimento
do sistema capitalista é reafirmada sob um conceito materializado, é elemento de disputa, conflito. A
forma de sua apropriação há séculos vem se efetivando de maneira, inadequada. Quando vista como
material de consumo ou objeto que agrega valor comercial, a terra é apropriada e degradada. Esta
situação é responsável por inúmeras injustiças às quais são impostas às sociedades vigentes.
Entretanto qualquer maneira de rompimento com esta forma de dominação e degradação social e
ambiental só será conseguida com uma consciência crítica, fundamentada na igualdade, solidariedade,
entendendo que a terra é o elemento mais próximo e mais concreto para cumprimento estes objetivos.
Palavras Chave: Terra; Necessidades; Consciência.

ABSTRACT
The land that's a element basic at the survival from the majority of the living beings. Via the
your feature the land affords acquire um status as of generator as of life, backer as of hopes and as of
chances the achievement as of dreams. The amount than it is to they have the land is evidence and
acknowledges by generations drawframe. All the same your functionality he shifts, as per occurred
the changes sociais, than it is to direction and reconfigure the whole your functionality. At the
perspective methodology for construction of this article, where initially he went effectuated the lifting
bibliographical for the better in case that basal and breed um contend highbrow required at the
construction of the work. About to so much stands out from the crowd a few authors than it is to
subsidies as of he forms brave the construction of this article: CASTRO (1996), HUNT (2000),
LEPSCH (2001), MOREIRA; WATANABE, (2006), among others. The land at the perception from
the system capitalist is reaffirmed under um concept materialize, is element as of altercation, conflict.
The figure as of your appropriation there are centuries he comes in case that effective as of manner
inadequate. As you eyesight as a hardware as of expenditure or object than it is to aggregated going
value, the land is apt and abase. This situation is responsible for numerals injustices to the what they
are assessment to the associations vignettes. In the mean time any manner as of disruption along this
figure as of dominated and abasement social and environmental all by oneself it shall I managed to
along a consciousness criticism, basal at the equality, solidarity, understanding than it is to the land is
the element nearer and more concrete about to greeting these objectives.
Key Words: Land; Necessities; Conscience.

INTRODUÇÃO
Compreender o sentido e os sentimentos que estão agregados ao elemento -“terra”, é
efetuar uma análise temporal da existência humanidade em deferentes momentos da construção da

24
Artigo produzido como requisito curricular para cumprimento do Trabalho Acadêmico Orientado, em face de
conclusão do curso de Licenciatura em Geografia da Universidade Estadual da Paraíba-UEPB, sob orientação do
Professor Doutor em Sociologia (UFCG/UFPB) Belarmino Mariano Neto.
Fórum Internacional do Meio Ambiente - A conferência da Terra 206

teia social a qual estamos inseridos e continuamos a tecê-la. As condições as quais está subjugada a
terra, que durantes séculos foi apropriada, degradada, mantida como unidade geradora de valor
circunstancial, dado os interesses políticos, econômicos e sociais da humanidade no transcorrer da
sua composição.
A importância ambiental, histórica e social que têm a terra, são os alicerces que motivam a
busca do conhecimento científico, para assim construir o embasamento teórico necessário que
favoreça a compreensão da função que têm a terra no âmbito ambiental, social, político e
econômico para construção de uma nova humanidade. Terra esta que foi castigada, usada,
apropriada e usurpada, devido à cobiça descontrolada, e aos fins econômicos que foram atribuídos a
este elemento. Fins estes que ofuscaram as reais necessidades e importância que têm a terra para o
ser humano. Visto que foi interpretada como um mero objeto capitalizado, que vale o quanto
produz, ou quanto se consegue acumular em cifras monetárias. Escamoteando assim a importância
utópica, filosófica e natural que têm o elemento terra, para fomentar a eqüidade, social e ambiental
tão esperada para a humanidade. (Figura 1).

Figura 1 - Um reflexo humano na face da terra. Fonte: Rômulo Panta, 2007.

Para arquitetar o embasamento necessário à construção deste artigo, foi efetuada uma
pesquisa nos Assentados Rurais da cidade de Sapé, localizada na zona da mata paraibana, visto sua
história de lutas camponesas por terra, e o valor social que têm este elemento para os habitantes
daquela região. Destaca como objeto de pesquisa o Assentamento Santa Helena- I. Pesquisa esta
que partiu dos elementos históricos, de cunho empírico, social e filosófico do grupo pesquisado.
Estes elementos fôramos alicerces a construção do entendimento conceitual e da importância que
têm a terra para este grupo social, bem como para a humanidade.
No que concerne ao processo metodológico à pesquisa foi é orientada “metodologicamente
pela história oral no sentido de valorizar o conhecimento popular e as experiências de vida”
(MARIANO NETO, 2001, p. 26). Assim, o saber científico é extraído do saber popular e
transformar a experiência de vida em razão é organizar esta experiência em objeto de
conhecimento, utilizando os aportes empíricos, culturais e aparentes que ressaltam a percepção
intelectual e permitem uma compreensão mais total do estudo que resultará na construção formal e
contextual da temática analisada.
A terra é um dos quatro elementos da natureza, assim como água, ar e fogo, que são vitais
a sobrevivência da maioria dos seres vivos. No livro de Gênesis “As origens”, constante na Bíblia
Sagrada Cristã, a terra é apresentada com um dos primeiros elementos da criação divina que é
fomentador de vida. Ou seja, meio pelo qual Deus criou a vida, a compartilhou, e deu meios para
que se desenvolvesse.
Fórum Internacional do Meio Ambiente - A conferência da Terra 207

“No principio, Deus criou os céus e a terra”. Deus disse: “Produza a terra plantas, ervas
que contenham sementes e árvores frutíferas que dêem fruto segundo sua espécie, e o
fruto contenha a sua semente.” E assim foi feito. A terra produziu plantas, ervas que
contêm semente segundo a sua espécie, e árvores que produzem fruto segundo a sua
espécie, contendo o fruto a sua semente (...) Deus disse: “Produza a terra seres vivos
segundo sua espécie. E assim foi feito. Deus disse: “Eis que eu vos dou toda a erva que
dá semente sobre a terra, e todas as árvores frutíferas que contêm em si mesmas a sua
semente, para que sirvam de alimentos (Gên: 1: 1-29)

A importância que têm e que representa a terra para a continuidade da humanidade, face
ser geradora de alimentos, motivo de produção e fixação é evidenciada a milhares de anos.
A cerca de 10.000 anos atrás, a maior parte dos homens começou a fixar-se em
determinados territórios e iniciou o cultivo de plantas para obter mais facilmente parte de seus
alimentos, passou a se firmar e defender determinada porção de terra, cujo tornou-se algo onde ele
colocava sementes que, em condições favoráveis, germinava, cresciam e produziam alimentos ou
outras utilidades (LEPSCH, 2002, p. 3).
Na Grécia antiga acerca de 2.500 anos, os trabalhos de Hipócrates, que foi um dos
primeiros grandes médicos da antiguidade, encontra-se a afirmação que “as terras estão
relacionadas com as plantas tal como os estômagos com os animais”. Conceito
interpretado sob o entendimento que, o estomago transforma os alimentos para o
crescimento e a manutenção do corpo, da mesma maneira, que a terra transforma e cede
nutrientes às plantas, permitindo-as crescer e frutificar e assim servir de alimentos para
os homens de animais. Mostrando assim a dependência humana face a terra como
promotora de alimentos (LEPSCH, 2002, p. 4).
No entanto esta concepção da importância da terra para a sobrevivência da humanidade
não foi contemplada por todas as civilizações. Com o processo de reorganização
política, econômica e social por qual passou a humanidade, principalmente após o século
XVIII, quando a vida econômica das sociedades deixou de ser submetida a preceitos
éticos e religiosos, e passou a ser guiada sobre as estratégias individuais e capitalizadas,
fundamentadas em variáveis como preço, salários, lucros e juros, que levaram a
maximização dos resultados em relação aos investimentos. A terra passou a ter outro
sentido, dado seu valor produtivo, tornando-se um dos principais objetivos econômicos
da época (FEIJÓ, 2001, p. 13-14).
Para Hunt (2001), a terra cultivável passou a ser incorporada ao cenário de abrangência do
capital, portanto era considerada um elemento produtivo sem função social. Sua função era restrita e
calculada devido sua capacidade de gerar rendimentos. Estes conceitos pseudo-feudais,
mercantilistas e materialistas foram percebidos durante o processo histórico da humanidade, que
congregou e fomentou a forma de apropriação e utilização deste bem, vigente até nos dias de hoje.
Na obra Principles of Political Economy and Taxation (1817)25, do fisiocrata, David
Ricardo. O autor definiu a terra como um produto, do qual eram extraídos os
lucros/renda face sua capacidade de produção criando a “teoria da terra”. Para Ricardo a
terra era dividida em três classes, conforme sua produtividade, e grau de investimento. A
teoria da renda da terra era uma elaboração que definia a renda como “a parte do produto
que é pago ao seu proprietário pelo uso dos poderes originais e indestrutíveis”. Portanto
elemento capaz de gerar riquezas monetárias para quem posse tivesse (HUNT, 2001, p.
110-111).
A visão de Ricardo (1817) sobre a terra é um elemento concreto e evidente dos interesses
capitalistas, sobre a função econômica, que se limitava em produzir. Aliás, sua importância era dada
pelo grau de produção. Visão esta limitada e capitalizada, devido não compreender a riqueza, social,
biológica, econômica e ambiental que possui a terra para a sociedade em geral.
25
Esta obra é a principal obra de RICARDO, David sobre teoria econômica. Foi publicada, pela primeira vez, em 1817
em Londres.
Fórum Internacional do Meio Ambiente - A conferência da Terra 208

Entretanto a terra para o homem do campo e para uma parcela de estudiosos e


interessados pela temática adquire outra importância, tem um outro sentido, se apresenta
como um elemento sagrado, um organismo vivo, capaz de gerar e alimentar diversas
formas de vida. Através do acesso a terra, e da sua capacidade produtiva/geradora; os
camponeses, lavradores, agricultores, protudores, assentados rurais não importando a
nomenclatura usada para designar o homem do campo, desenvolvem sua “teleonomia” -
que é a propriedade que têm todos os sistemas vivos de desempenharem as suas funções
num ritmo e dinâmica que favoreçam ao máximo a sobrevivência do individuo
(CASTRO, 1996, p. 37).
A terra é o material palpável a qual tudo se consolida, transforma, e tornando-se elemento
sustentador de uma teia onde estão envolvidos homem e natureza. E é nesta interface que se “realiza
o contado humano com o seio natural, que se reconhece a importância e grandeza que têm este
elemento”, não só sob o conceito de objeto materializado, nem como chão no sentido de lugar fixo,
mas sim como parte integrante e imprescindível à sustentação da vida (MARIANO NETO, 2001).
Contudo o acesso a terra para o homem do campo, representa uma nova forma de liberdade
e dignidade, face a sua capacidade de gerar e manter a vida. Não somente a vida que é fecundada e
que brota nas sementes, mais as vidas de milhares de seres humanos que dependem da terra para
viver, morar e produzir alimentos para si e para seus semelhantes, proporcionando assim eqüidade
social e amenizando a problemática da fome.
Estes ideais, transforma-se em alternativas para concretizar o direito à vida digna na terra,
aos homens e mulheres do campo que trabalharam, construíram, lutaram e alimentaram a população
brasileira e significativa parcela da população mundial. Terra que é cultiva, fecundada e manejada
com mãos humanas, sofridas, vividas e desgastadas. Mãos que trabalham de sol - a - sol cultivando,
semeando e tirando dela sua sobrevivência. É neste semear, onde resistem e semeiam-se sonhos,
vontades e aspirações de uma mesa farta e de um mundo melhor (Figura 2):

Figura 02: Mãos trabalhadas de um trabalhador. Fonte: Rômulo Panta, 2007.

No entanto a questão do acesso e a compreensão da função/importância e necessidade que


têm a terra, ainda não foi resolvida/compreendida. Os paradigmas da inacessibilidade a terra, ou das
limitações impostas aos que dela dependem para viver, são fatores que favorecem a presença feroz
da fome e da pobreza, e se fazem presentes e latentes na contemporaneidade.
O aumento da condição de pobreza (...), é observado quando se verifica a origem dos
pedintes na cidade de Sapé. A sua grande maioria é constituída de ex-assalariados da
cana, residentes de vilarejos e pontas de rua, que foram excluídos do mercado de
trabalho e não encontraram outra alternativa de emprego na região. Regra geral, essa
Fórum Internacional do Meio Ambiente - A conferência da Terra 209

população é constituída de homens com mais de 45 anos (MOREIRA; WATANABE,


2006, p. 142).
Milhares são os filhos dos homens que expulsos do campo se amontoam nas periferias
cidades sobrevivendo da mendicância, passando por todas as formas de privações, provações e
submissões, muitas vezes esquecendo-se de suas humanidades, dado ao grau desprezo e repúdio
como são tratados pela sociedade vigente, que visa o lucro, a vida moderna, o prático, e o
visivelmente bonito.
As imagens da fome e da pobreza marcam e destroem qualquer apego visual pré-
convencional. As imagens da fome dada sua tonicidade, têm voz própria, tem sentimentos e
concretude face seu reflexo e projeção social. Estas imagens são extraídas de uma sociedade injusta,
onde muitos se refestelam sob a pobreza dos que mendigam, dos que são obrigados a deixar a terra
e viver em sub-condições humanas nas cidades, vitimados por males, sociais, fisiológicos e
econômicos (Figura 3).

Figura 3 - A imagem da fome - Pedinte na feira-livre em Sapé/PB. Fonte: Rômulo Panta, 2007.

Hoje estas imagens juntam-se a outras de maior atualidade, imagens dos campos e das
cidades, devastados pela tirania. Imagens de homens, mulheres e crianças
“perambulando como fantasmas num mundo perdido, flutuando fora das órbitas e com
os molambos de vestuários balançando grotescamente sobre a armação dos esqueletos
saltando à flor da pele, consumidos pela pobreza e pela fome” (CASTRO, 1996, p. 133).
Pode-se dizer que a pobreza é resultante da exploração de um sistema econômico
impessoal, e das classes dominantes gananciosas, que sempre e cada vez mais, fazem
questão de manter esta relação de exploradores e explorados. “A mensuração da pobreza
equivaleria à mensuração dos níveis de iniqüidade e injustiça existentes em uma
sociedade, a serem reduzidos pelo arrependimento dos ricos e a mobilização dos pobres”
(SCHWARTZMAN, 1997, p.7-18).
De acordo como Sampaio citado por Pereira (2005, p. 56), a classe dominante atual
sustenta que esta forma de globalização é irreversível, e “o país que não conseguir se
acomodar nela está condenado ao atraso econômico e à barbárie social”, fenômeno este
visto nas periferias das cidades, que são áreas de absorção de ex-camponeses que
abandonaram o campo na tentativa de recomeçar uma vida melhor e mais digna. No
entanto ficam rastejando sob o modelo social degradante e excludente, passando a
sobreviverem castigados, andando sem rumo e sem direção, já que lhe foram tirado o seu
único pedaço de chão. (Figura 4):
Fórum Internacional do Meio Ambiente - A conferência da Terra 210

Fotografia 04. Pés castigados (adaptado). Sebastião Salgado. Fonte:http//www.mst.org.br/. Acesso


em 10 de março. 2008.

O camponês quando se afastam do espaço rural onde vivem em direção a cidade perdem
sua identidade, perdem seu oficio sendo lançados a sua própria sorte, já que na cidade não há
oportunidades para os que só têm sua força de trabalho a oferecer. Passando assim da condição de
sem terra a condição de sem teto, onde estão desprovidos de tudo e de qualquer subsidio que
garanta a vida.
Ao analisar a vida do humano na cidade, do cidadão no espaço urbano da
contemporaneidade, percebe-se que as figuras mudaram de posição, tudo passa a ser
visto sob a ótica do comércio/mercado, juros, investimentos, circulação de dinheiro,
mercadoria, bem destacando que: “em lugar do cidadão, formou-se um consumidor, que
a aceita ser chamado de usuário dos serviços urbanos” (CARLOS, 2001, p. 96).
Desta maneira ratificam-se as necessidade e importância que têm a terra para que todas as
esferas da sociedade possam viver em eqüidade. Um pedacinho de terra transformou-se em sinal de
solução para o problema da exclusão social e da fome que afeta milhões de brasileiros e que foi
desencadeado por um sistema capitalista que inventou a aberração da miséria na fartura (FREIRE,
1997 apud PEREIRA, 2005).
A terra ocupada torna-se elemento desencadeador de humanidade. O reencontro com a
terra inaugura para o sem terra “jogado” nas periferias, de um novo tempo, a
possibilidade concreta de se encontrar com a sua ontológica vocação de ser mais e
desenvolver-se como sujeito de uma história de solidariedade. Têm atualmente a
garantia mínima de sobrevivência com o plantio de gêneros alimentícios (PEREIRA,
2005, p.104).
Para esta gama camponeses e ex-camponeses, sobreviventes dos infortúnios sociais da
contemporaneidade, à volta a terra se apresenta como um elo onde está enraizada sua história, sua
cultura, sua perspectiva de vida. Pois é na terra que se reencontram os sonhos e os desejos de uma
sociedade dolorida, que precisa se redescobrir.
A terra para os camponeses assentados tem sentido laico, é considerada instrumento de
dignidade coletiva. A posse da terra é importante, mas a propriedade e forma como se apropriam
dos seus benefícios é o revés que prejudica e dificulta o manejo deste elemento. E esta compreensão
é percebida pelos assentados. Entretanto este entendimento sobre a terra adquire nova importância
como pode se percebido no depoimento da assentada Maria das Graças:
Pra mim a terra significa tudo. (...) É sonhar com um dia melhor e ter oportunidade de
conseguir. A terra é vida. Eu sempre digo. A terra não é minha, eu estou passando por ela, e tenho
Fórum Internacional do Meio Ambiente - A conferência da Terra 211

que fazer de tudo para os que vierem depois possam, sobreviver e ver como ela é importante e
necessária26.

Dada à importância e reconhecimento que têm a terra, seus frutos não só limitam-se aos
gêneros alimentícios produzidos. O reconhecimento da importância da terra, bem como os
movimentos sociais de luta por acesso e democratização, são os “frutos” em que os camponeses
assentados depositaram todas as esperanças de continuidade de um futuro melhor e mais justo.
Frutos estes que se fundamentam “na práxis camponesa, que é percebida como mudança
da realidade” que acontece quando os oprimidos incorporam a capacidade de refletir os
acontecimentos e atuar sobre eles de forma consciente, objetiva, ou seja, “é a reflexão e
ação dos homens sobre o mundo para transformá-lo” (PEREIRA, 2005, p. 41-42).
Esta conscientização de classe juntamente com a percepção da importância ambiental, se
materializa, quando acontece o milagre da geração de alimentos através terra. Constituindo assim os
motivos e objetivos de luta e de resistência do campenisato brasileiro, que compreende que
fecundar a terra significa germinar sonhos e produzir esperanças (Figura 5):

Figura 5 - Os frutos da terra - Feira-livre - Sapé -PB. Fonte: Rômulo Panta, 2007

O acesso a terra, a um “pedaço de chão” 27 e nele poder produzir, criar seus filhos vê-los
crescer e frutificar no mesmo chão onde um dia seus pais lutaram com sangue, suor e vontade, é
uma das maneiras encontradas pelos camponeses assentados de promover a justiça, a dignidade e a
paz.
Da forma que é possível obter água cavando chão, da forma que é possível enfeitar uma
casa, da forma que é possível desviar leitos dos rios, e se é possível mudar o mundo da natureza,
porque não mudar o mundo que fazemos (FREIRE, 2000 apud PEREIRA, 2005, p. 47).
Mudar, renascer, recriar, reinventar, florescer e se libertar é preciso e necessário. Ver a
vida seguir, ver os sorrisos das crianças, e ter a certeza de um amanhã melhor, mais justo são os
alicerces fundamentais destes homens e mulheres, filhos da terra, que lutaram, sofreram, gritaram,
morreram e venceram a luta desigual e a cultura do oprimido.
E é neste caminhar que mãos, pés e corpos se entrelaçam na construção de uma rede social
essencial a construção de um território28 concreto e efetivo. Sendo rede, fundamentada no conceito
de Claude Raffestin29 (1986), que inscreve-a como um segundo ciclo de relações territoriais, que
compreende três fazes: inovação, difusão e obsolescência. Que conduz posteriormente a uma
reterritorialização (CASTRO, CORRÊA, GOMES, 2005, p. 172-173).
Estas redes de reterritorialização social são fundamentadas em utopias, ideologias e
fenomenologia, que contribuem na edificação de um novo conteúdo social que almeja corrigir as
26
Depoimento da assentada Maria das Graças de Souza em ocasião da aplicação do questionário em fev. de 2007
27
Inspirado em Moreira 1997, no livro “Por um Pedaço de Chão”.
28
O território surge, na tradicional Geografia Política, como o espaço concreto em si, com seus atributos naturais e
socialmente construídos, que é apropriado, ocupado por um grupo social.
29
Vide, obra Écogénèse terriroriale et terrororialité de CLAUDE RAFFESTIN (1986).
Fórum Internacional do Meio Ambiente - A conferência da Terra 212

desigualdades sócio-econômicas, as quais a humanidade foi segregada veladamente sob um modelo


explorador do aglomerado natural, cultural e social em favor de uma minoria aristocrática, alheia e
omissa.
Deste modo, vencer o abismo social existente entre as elites e a grande massa de excluídos
que habitam os campos e as periferias das cidades, é romper com a organização social e econômica
vigente. Rompimento este que só será conseguido com uma consciência crítica, fundamentada na
igualdade, solidariedade entendendo que a terra é o elemento natural mais próximo e mais concreto
para cumprimento destes objetivos.

REFERÊNCIAS BIBLIOGRÁFICAS
CARLOS, Ana Fani Alessandri. (org). Ensaios de Geografia Contemporânea. São Paulo: Editora
Hucitec, 2001.
CASTRO, Josué de. Fome, um tema proibido: Os últimos escritos de Josué de Castro; CASTRO,
Anna Maria de (Org). Recife: Companhia Editora de Pernambuco, 1996.
CASTRO; CORRÊA e GOMES, Iná Elias de, Roberto Lobato e Paulo César da Costa. Geografia:
Conceitos e Temas. Rio de Janeiro: Bertrand Brasil, 2005
FEIJÓ, Ricardo. História do pensamento econômico. São Paulo: Editora Atlas, 2001.
GÊNESIS, Bíblia Sagrada. São Paulo: Editora Ave Maria 55ª edição, 2005.
HUNT, E. K. História do pensamento econômico. Rio de Janeiro: Editora Campus, 2000
LEPSCH, I. F. Formação e Conservação dos Solos. São Paulo: Oficina de Textos, 2002.
MARINO NETO, Belarmino. Ecologia e Imaginário. Memória Cultural, Natureza e
Submundialização. João Pessoa: Editora Universitária, 2001.
MOREIRA, Emília. Por um pedaço de chão. João Pessoa: Editora Universitária, 1997.
MOREIRA, Emília: WATANABE, Takako. Ambiente, trabalho e Saúde. João Pessoa: Editora
Universitária, 2006.
PEREIRA, Antonio Alberto. Além das Cercas. Um olhar educativo sobre a reforma agrária. João
Pessoa: Editora Idéia, 2005.
SALGADO, Sebastião. Pés castigados. 2002. 1 fotografia. Disponível em: <http://www.mst.org.br>.
Acesso em 10 de març. de 2008.
SCHAWARTZMAN, Simon. Estatísticas da Pobreza. Disponível em:
<www.schwartzman.org.br/siom/statpob.htm>. Acesso em 21.02.2007.
Fórum Internacional do Meio Ambiente - A conferência da Terra 213

A COMUNIDADE QUILOMBOLA DE OLARIA: DA AUTO-SUSTENTABILIDADE À


DESTERRITORIALIZAÇÃO

Janeide Bispo dos Santos


Estudante do Mestrado em geografia da UFBA, vinculada ao Projeto GeografAR. projanebs@bol.com.br
Guiomar Inez Germani
Professora do Programa de Mestrado em Geografia e pesquisadora do CNPq, Universidade Federal da Bahia. Projeto
GeogrfAR30. guiomar@ufba.com.br

RESUMO
O presente trabalho propõe uma reflexão e uma análise da situação sócio-ambiental da
comunidade quilombola de Olaria, localizada na zona rural do município de Irará (BA). A
trajetória histórica deste grupo social é marcada por dois momentos: o período que dominavam o
território e o controle sobre a posse das terras, quando elas eram usadas como recurso natural
indispensável para a sobrevivência do grupo, e, a expropriação das terras por fazendeiros,
transformando-o em sem terra, sem água, sem comida, sem emprego, ou seja, totalmente excluídos.
Assim, compreende-se que a expropriação das terras reforçou a marginalização histórica na qual o
grupo social foi submetido ao longo de suas diversas territorialidades: negros, escravos,
quilombolas e sem terras. O fato da história daquelas terras ser a representação sócio-cultural e o
meio de sobrevivência daquele grupo étnico implica uma territorialidade e esta, por sua vez, a
representação identitária e a sustentabilidade do referido grupo. Nesse sentido, eles mantinham uma
economia de subsistência, baseada no trabalho coletivo, referenciado na produção agrícola de
milho, feijão e mandioca e na fabricação artesanal de objetos de cerâmica e palha, porém, nos anos
50, do século passado, a partir da abertura de uma estrada cortando as terras desta comunidade, tal
território começou a ser cobiçado pela elite local e a história do grupo passou a ser alterada, fato
que repercute na estruturação na da sua organização social atual, isto porque, com a expropriação de
suas terras, os quilombolas perderam as reservas de matéria-prima, as roças e toda a cultura secular
que era transmitida de geração em geração, bem como o espaço de sobrevivência. Hoje, lutam para
que o artigo 68 do Ato das Disposições Constitucionais Transitórias, inserido na Constituição de
1988, seja exeqüível e, dessa forma, possam ter suas terras restituídas e voltem a viver em uma
comunidade economicamente sustentável.
Palavras-Chave: terra; quilombola; sustentabilidade; olaria

ABSTRACT
The present work considers a reflection and an analysis of the socio-environmental
situation of the quilombola pottery community, located in the agricultural zone of Irará town (BA).
The historic trajectory of this social group is marked by two moments: the period in which they
dominated the territory and had the control on the ownership of lands, when they were used as
indispensable natural resources for the survival of the group and, the expropriation of lands by
farmers who made them landless people, deprived from water, food, job, in a total exclusion. Thus,
it is understood that the expropriation of lands strengthened the historical isolation of those
communities, in which, the social group was submitted throughout its diverse territorialities: blacks,
slaves, quilombolas and landless. The fact of the history of those lands a cultural representation and
the way of survival of that ethnic group implies in a territoriality and, this, in its turn, implies in the
identity representation and the sustainability of that group. In this direction, they kept an economy
of subsistence, based on the collective work, referred in the agricultural production of maize, beans
and cassava, and in the artcraft manufacture of ceramics and straw. However, in the 50s, of last
century, from the opening of a road cutting the lands of that community, such territory started to be
coveted by the local elite, and the history of the group started to be modified, this fact has its effects
in the current social organization. Therefore, with the expropriation of its lands, quilombolas has

30
A Geografia dos Assentamentos na Área Rural - Projeto de Pesquisa vinculada ao Programa de Mestrado em
Geografia da UFBA.
Fórum Internacional do Meio Ambiente - A conferência da Terra 214

lost the raw material reserves, little planting farms and all the secular culture that was transmitted
from generation to generation, as well as the survival space. Today they fight so that article 68 of
the Dispositional Constitutional Transitory Act, inserted in the Constitution of 1988 be executed
and thus they can have their lands back and may return to live in an economically sustainable
community.
Key Words: land; quilombola; sustainability; pottery

INTRODUÇÃO
A proposta deste trabalho é apresentar parte do resultado de uma pesquisa do Programa de
Mestrado em Geografia da Universidade Federal da Bahia que tem como objeto de estudo três
comunidades quilombolas, situadas no município de Irará, estado da Bahia, a partir da questão da
terra e do território, na perspectiva geográfica das dinâmicas históricas que possibilitaram
desencadear um processo de segregação espacial, racial e resistência territorial, tendo a
territorialidade como base consolidada para referida resistência, o que implicou uma relação intensa
entre os moradores, e destes, com a terra entendida pelo grupo como instrumento de sobrevivência.
Este artigo visa analisar um pequeno recorte do referido estudo: a trajetória da comunidade de
Olaria (conforme localização na fig. 01), antes e depois da expropriação das terras. Expropriação
esta que provocou alterações no modo de vida do grupo social, tornando-se um divisor entre dois
momentos: de auto-sustentável à desterritorialização. Nesse sentido, a terra é entendida como
recurso natural, base física para a sobrevivência do grupo.
Portanto, seguiu-se rigorosamente alguns procedimentos considerados imprescindíveis
para se atingir o objetivo proposto. Partiu-se de uma pesquisa bibliográfica, consultas a fontes
secundárias, sendo estas escritas por autores que discutem os eixos temáticos que sucedem: a
história dos negros e dos quilombos no processo de construção do espaço brasileiro, a estrutura
fundiári, resultante do referido processo, a situação das comunidades oriundas de antigos quilombos
na contemporaneidade e a formação territorial do município de Irará. A partir daí, seqüenciou-se
com observações assistemáticas e generalistas sobre a comunidade, seguida de um processo
metódico de escuta ativa, através da história oral, onde o diálogo interage entre o pesquisador e os
atores sociais do quilombo, focando nesses atores a forma dialética de se buscar a memória da
comunidade ao longo dos anos, o processo de expropriação da terra e do território, a idéia de
território e territorialidade para se compreender a atual estruturação territorial, diante de uma
evidente segregação sócio-espacial e desterritorialização.
Fórum Internacional do Meio Ambiente - A conferência da Terra 215

Fig. 01 – Localização da área de estudo

TRAJETÓRIAS DA COMUNIDADE DE OLARIA: DO QUILOMBO À EXPROPRIAÇÃO DAS


TERRAS
A dinâmica que opera sobre o espaço geográfico e que, conseqüentemente, caracteriza o
uso do território no presente deve ser entendida como fruto de um processo histórico que, como tal,
possui determinantes cuja gênese, inevitavelmente, deve-se buscar compreender a partir de
dinâmicas e processos inscritos nos tempos passados.
Sabe-se que, a tarefa de compreender a terra como recurso natural indispensável para a
sustentabilidade da comunidade quilombola de Olaria é necessário conhecer um pouco da sua
história, pois a mesma revela o processo de construção e estruturação do espaço geográfico ao
longo do tempo, o que poderá dar subsídios para entender-se a situação na qual eles vivem na
contemporaneidade.
Neste aspecto, observa-se que a formação de quilombos no município de Irará, foi algo
comum a todo o processo de dominação e exploração colonial, afinal, alguns documentos oficiais
do século XVIII destacam que a formação de núcleos de negros fugidos era constante na sesmaria, a
qual, na época, pertencia a João Peixoto Veigas. Esse desbravador enfrentou algumas lutas no
processo de perseguição aos quilombos e aos povos indígenas, denominados de “gentio-bravo”. No
entanto, esse contigente de afro-descendentes foi engossado no final do século XIX porque, as
imediações do município de Irará recebeu um número elevado de ex-escravos que fugiam da crise
da região açucareira, a fim de ocupar as terras da região do sertão. Somado a este fato, destacam-se
também as consequências do decreto da abolição ((NOGUEIRA 1988).
Fórum Internacional do Meio Ambiente - A conferência da Terra 216

De acordo com os documentos existentes e os depoimentos de alguns moradores,


considera-se que a comunidade quilombola iraraense se formou em meados do século XIX,
especificamente, na década de 1840. Isso em vista dos registros de títulos de terras, concedidos no
município, tendo, também como referência, o regime das posses que vigorou de 1822 a 1850,
pois,com a abolição da Lei das Sesmarias, o acesso à terra deixou de ser um privilégio de classe e,
ao menos do ponto de vista legal, tornou-se livre até 1850, quando a Lei de Terras foi implantada e
a terra foi transformada em mercadoria (GERMANI 2006). No entanto, para a comunidade
quilombola de Olaria, a terra sempre foi a base física, sustentáculo para a sobrevivência do grupo.
Dessa forma, a formação da comunidade de Olaria se insere no contexto dos movimentos
abolicionistas e da recessão da lavoura canavieira do Nordeste, período marcado pela saída de
muitos negros das áreas produtoras de açúcar. Assim, os quilombos se constituíam, geralmente, em
terras sem título de propriedade.
A localização de qualquer quilombo, segundo Moura (1987), privilegiava, principalmente,
os lugares cujo acesso não fosse facilitado às forças da ordem imperial. A intenção era fazer a
defesa do território ou efetuar a fuga em condições vantajosas frente ao adversário. Para tanto, os
aquilombados, utilizavam estratégias que impediam o fim da instituição dos quilombos. Por esta
razão, ocupavam os charcos, as encostas e topo dos morros, sobretudo os que apresentavam
coberturas florestais (ANJOS 1999).
Assim, a comunidade de Olaria se instalou no topo da Serra do Periquito, lugar de muitos
rios e nascentes e matas, onde viveu, durante anos, num isolamento geográfico estratégico, tendo
como fonte de subsistência o artesanato, a caça, a pesca e a agricultura familiar.
Dessa forma, eles desenvolviam as atividades pensando na conservação dos recursos
naturais numa perspectiva futura, conforme depoimentos do Senhor João dos Santos, nascido em
oito de setembro de 1927.

Fig.02 Fotografia do Senhor João Santos, nasceu em (08/10/1927), faleceu em (02/02/2008). Fonte:
a autora, em 27/11/2007

Olhe minha sinhá, o cuidado com a terra, vem desde o meu bisavô, Manoel Ramos, que foi
cativo e fundador da Olaria. Quando a gente tirava um cipó pra fazer um cesto, só tirava a
quantidade certa, pra mode não perder nada.Quando tirava o barro, tanto pra fazer louça como pra
trabaiá na olaria, tirava na quantidade certa. Aqui nunca fartou água, nunca fartou comida, nunca
fartou trabaio, isso começou com essa estrada mardita quem fez os home tomar nossa terra e gente
ficar na misera que tamos (JOÃO SANTOS, entrevista concedida em 27/11/07).
O equilíbrio se dava na relação entre as atividades de subsistência e a natureza, pois toda a
terra era entendida como sustentáculo do grupo e não mercadoria. Por esta razão, o trabalho era
desenvolvido na coletividade. Dessa forma, o cotidiano da comunidade era permeado por um total
equilíbrio entre sociedade e natureza. A divisão social do trabalho era (e é), estabelecido mediante
uma questão de gênero. Assim, cabia aos homens a tarefa de entrar na mata e retirar a lenha (usada
para aquecer os fornos das casas de farinha e da olaria), o cipó, e depois, confeccionavam os cestos
e caçuás que eram comercializados na feira livre da cidade de Irará. Também cabia aos homens
preparar o barro e fazer as telhas e tijolos na olaria.
Fórum Internacional do Meio Ambiente - A conferência da Terra 217

As mulheres desenvolviam as mesmas funções dos homens, entretanto, o produto era


diferente. Então, cabia a elas extrair a palha, matéria-prima utilizada para fabricar as esteiras,
sacolas, chapéus, vassouras, peneiras, dentre outros; caçar a lenha (usadas no aquecimento dos
fornos e nas cozinhas); confeccionar as peças de cerâmica utilizadas na cozinha, tais como: pratos,
panelas, fogareiros, potes. Já o trabalho nas roças era realizado por toda a comunidade,
independente do gênero. Toda a produção artesanal, exceto os tijolos e telhas, era comercializada
aos sábados, na feira livre da cidade de Irará. O lucro obtido na venda das mercadorias era dividido
entre os chefes de família.
Ao longo de mais de um século, eles conseguiram manter uma verdadeira comunidade.
Dessa forma, formaram um território diferente dos outros à sua volta, pois o modo de vida, a
identidade e a história dos grupos eram diferentes, dando ao território uma identidade própria. Por
este motivo, do topo da serra, eles observavam a cidade e seus principais movimentos, entendiam
tudo que estava em volta, mas o contato com a cidade se limitava aos dias de feira, sempre gostaram
de ser diferentes. Por isto, sempre tiveram uma vida reservada, sem muito contato com as outras
comunidades, mesmo as rurais, até porque tinham culturas totalmente antagônicas. A invisibilidade
fazia parte de uma estratégia de resistência.
Porém, no início da década de 1940, surgiu o boato na cidade que um referido senhor,
morador da cidade, foi conhecer a serra, onde encontrou uma pedra de ouro e ficou muito rico,
transformando-se no maior comerciante do município. Assim, constantemente, os moradores de
Olaria eram incomodados com a presença de estranhos.
O marco principal para a consolidação da situação nas quais eles vivem atualmente foi
deliberada em 1949, pelo então prefeito Elísio Santana, quando abriu uma estrada, atual BA 504,
ligando a sede do município ao distrito de Santanópolis31. Esta estrada, construída nas proximidades
das terras quilombolas, possibilitou a valorização da área, acessibilidade e, conseqüentemente, a
cobiça, pois as terras eram férteis, localizadas em áreas de nascentes e drenadas por muitos riachos.
A partir daí, todos da elite local passaram a ter conhecimento e a desejar uma parte das mesmas. E
assim, ao logo desses, quase 50 anos elas foram gradativamente griladas e mais tarde, legalizadas
pela estratégia do usucapião. Inserida neste contexto, a população quilombola de Olaria sobreviveu
e sobrevive até hoje nessas terras, onde a progressiva valorização, associada a uma Lei de Terras
que tende à perpetuação das grandes propriedades e a atender aos interesses dos detentores do
poder, passaram a ser disputadas por especuladores, grandes proprietários, produtores e extratores
de bens naturais, que na maioria das vezes, não reconhecem o direito desta população que vive a
gerações nessas terras, fato que transformou os quilombolas em prisioneiros de seus expropriadores.
Por conta disso, algumas famílias remanescentes de quilombos se dispersaram pelo meio
rural e urbano, ou seja, migraram, gerando o fenômeno da desterritorialização, conforme Haesbaert
(2004). Tanto as famílias já deslocadas, quanto as que resistem e as que estão ameaçadas de
deslocamento forçado se defrontam cotidianamente à tensão, coação, insegurança, restrição de
circulação e de acesso aos recursos naturais da região. Com a configuração da propriedade privada
na região, os remanescentes de quilombos deixaram de ter acesso ao barro e a lenha, matérias-prima
fundamentais para a fabricação da cerâmica. Dessa maneira, o trabalho do artesão na Serra de Irará
representa hoje um processo de resistência e de luta, travada entre a exclusão e a sobrevivência.
Dessa forma, comunga-se com Haesbaert (2004), observando que os sujeitos desterritorializado
não são só o que saem, mas também os que ficam, pois
[...] a mobilidade espacial não é, por si só, um indicador de desterritorialização. Muitos
grupos sociais podem estar “desterritorializados” sem deslocamento físico [...] bastando
para isso que vivenciem uma precarização das suas condições básicas de vida e/ou a
negação de sua expressão simbólico-cultural (HAESBAERT, 2004 p. 251)
Esta realidade de ocupação tanto gera os conflitos com invasores quanto aumenta as
tensões internas às comunidades, causadas pelo confinamento que transformou o ambiente de
moradia dos quilombolas em espaços minúsculos. Muitos dos que resistem continuar no território

31
Este distrito emancipou-se de Irará em 17/07/1972
Fórum Internacional do Meio Ambiente - A conferência da Terra 218

foram forçados a saírem do topo da serra. Construíram amontoados de barracos nas margens da BA
504, constituindo um verdadeiro aglomerado de exclusão (HAESBAERT 2004), o que colaborou
para que a comunidade de Olaria ficasse conhecida, entre os moradores do município de Irará como
uma favela rural. Esse novo perfil de moradia, associado à desterritorialização, promoveu a
restrição de acesso aos recursos naturais, o que vem contribuindo com a destruição progressiva e
acelerada da estrutura produtiva comunal, coletiva associada, que, mediante o rodízio e as trocas,
permitiam o manejo sustentável da região e a vivência em suas tradições culturais.

OS DILEMAS DA COMUNIDADE DE OLARIA NA CONTEMPORANEIDADE


Atualmente, a organização do espaço da comunidade de Olaria se configura da seguinte
maneira: o aglomerado de exclusão nas margens da BA 504 e os prisioneiros dos grandes
fazendeiros. Neste caso, os últimos correspondem a um grupo de quilombolas que, mesmo
perdendo a terra, não abandonaram as suas casas. Elas ficam situadas em meio aos pastos e, para
chegar até elas, ainda hoje, precisam passar por baixo de cercas com até 10 fios de arame farpado,
sendo que a distância entre o entorno das casas e as cercas não chega a cinco metros. Tal condição
levou muitos moradores, principalmente os mais jovens, a construírem suas casas nas margens da
BA 504, pois o acesso se tornou mais fácil e menos doloroso. No entanto, é preciso refletir sobre o
modo de vida que esta comunidade leva na atualidade. Busca-se, então, compreender a partir dos
pontos mais caóticos que assola a população: trabalho e acesso aos recursos naturais.

Desemprego e fome
Sabe-se que a terra foi a base da sobrevivência do grupo, pois era nela que eles extraíam
todos os recursos que se transformavam em mercadoria, as quais eram comercializadas e revertidas
em bens de consumo, utilizados na sobrevivência grupal. A expropriação das terras destruiu toda a
história de vida comunal, pois eles ficaram sem ter onde plantar, onde tirar o barro, a palha, todos os
seus instrumentos de trabalho. Os expropriadores, hoje, contrataram capataz para vigiar as terras e
impedirem que um quilombola entre, mesmo que seja pra pegar um mísero pedaço de lenha para
cozinhar seus alimentos.
Dessa forma, toda a cultura secular, do artesanato foi praticamente destruída. Só uma
família ainda trabalha com a cerâmica. Para tanto, precisa andar sete quilômetros para extrair o
barro, do mesmo que se encontra nos fundos da casa, revestido por uma cerca. Além disso, precisa
comprar a lenha que é utilizada no cozimento das peças.

Fig. 03 A transformação do barro em Objetos Fig. 04 O processo queima da cerâmica


Fonte: a autora, em 26/01/2006 Fonte: a autora, em 01/07/2006

A olaria que ficou inserida na propriedade de um dos expropriadores é utilizada apenas


para atender aos interesses do fazendeiro e está em situação de extremo abandono.
Fórum Internacional do Meio Ambiente - A conferência da Terra 219

Diante desse quadro, cabe aos que resistem na comunidade, sobreviver à custa da venda da
mão-de-obra pra estes fazendeiros, o que não é freqüente. Na maioria das vezes eles preferem
contratar trabalhadores de outras localidades. Quando conseguem encontrar uma fazenda para
prestarem os serviços, recebem diárias que variam de R$ 8,00 para os homens, R$ 6,00 para as
mulheres e R$ 4,00 para as crianças.
Muitas famílias sobrevivem, exclusivamente, com o auxílio pago pelo Governo Federal,
através do Programa Bolsa Família, o que implica afirmar que a fome, associada a um quadro de
extrema miséria que reflete em criminalidade, gravidez na adolescência, alcoolismo, falta de
saneamento básico e péssimas condições de moradia, marcam o cotidiano da comunidade de Olaria.
Mediante tal situação, o espaço ocupado por este grupo social funciona como se fosse uma
“ilha” isolada na zona rural do município de Irará. Essa área – o território quilombola - está bem
demarcada pelo preconceito, imposto pela população das localidades circunvizinhas. Tal atitude
resulta do fato de não quererem ser confundidos com um quilombola, por trazerem além das marcas
da escravidão presente na história e na memória, a condição de serem negros, pobres, analfabetos e
desempregados.

A falta de água
O povo que habita na região pesquisada sobrevive em áreas onde a escassez de água coloca
à prova a capacidade da resistência humana que, na atualidade, chegou ao seu ponto mais crítico
com as dificuldades provenientes da exclusão das terras e a conseqüente privatização dos aqüíferos.
As pessoas apontam que é complicado viver praticamente sem água. De acordo com a trabalhadora
rural Joana Joventina de Souza, 74 anos, que durante muito tempo conviveu com a abundância de
água, a estratégia que os moradores recorrem para ter água nas proximidades da casa é construir um
buraco para acumular a água das chuvas que, vez por outra, cai nas terras da região. No entanto,
logo que as chuvas suspendem, começa o grande dilema da comunidade.
Antes da expropriação das terras, todo o abastecimento de água era proveniente dos rios e
nascentes. A expropriação foi acompanhada pelas cercas e a vigilância dos fazendeiros, assim, os
grandes aqüíferos que pertenciam à comunidade passou a pertencer aos grandes fazendeiros que não
permitem o uso coletivo. Diante disso, a falta de água é, para a comunidade, um dilema com efeitos
semelhantes ao da falta de alimentos, pois são recursos indispensáveis para a vida. Na tentativa de
amenizar a problemática, a Prefeitura Municipal de Irará construiu um pequeno reservatório, em um
determinado ponto, nas margens da rodovia. E, o caminhão pipa, uma vez por semana o abastece.
No entanto, antes do caminhão terminar de colocar a água, o referido reservatório já está
vazio, pois cada litro d’água que cada morador consegue levar pra casa é disputado a tapa.
Nesse contexto, vale a lei do mais forte, e geralmente os idosos e as crianças saem
perdendo, conforme depoimento da senhora Rosa Justina de Souza, 67 anos, “não tenho mais força
pra lutar com esse povo novo, assim tenho que pegar o que sobra”. Essa senhora coloca o filho
dentro do reservatório pra sugar os últimos milímetros da água suja que restou, a qual será usada
para todos os fins, principalmente beber e cozinhar.
Durante os outros dias, eles recorrem a uma pequena minação situada em uma das
propriedades, hoje privada, que abre durante dois períodos diários: das 05:00 às 07:00 e das 16:00
às 17:00. Todavia, a água é também utilizada pelos animais, tem uma coloração esverdeada e muito
suja, por isto usam, exclusivamente, para tomar banho, lavar roupas e limpeza do domicílio.
Fórum Internacional do Meio Ambiente - A conferência da Terra 220

Fig. 05 Porteira limitando a água e a população Fig. 06 Água utilizada pela população
Fonte: a autora, em 17/02/2008 Fonte: a autora, em 17/02/2008

Por isso, recorrem a locais distantes um busca de água para beber e cozinhar os alimentos.
Famílias inteiras enfrentam um drama de carregar latas d’água na cabeça. Crianças, jovens, adultos
e mesmo os idosos enfrentam essa rotina todos os dias. As pessoas enfrentam o calor escaldante em
busca de água em locais distantes. É uma tarefa difícil, porém, comum para quem vive na
comunidade.

CONCLUSÃO
Diante dos fatos mencionados, observa-se que a perda de territórios por comunidades
tradicionais é, muitas vezes, irreversível, pois altera culturas, modos de vida, e tradições que são,
como pensava o geógrafo alemão Ratzel, a liga entre o homem e o solo. Faz-se necessário que estas
famílias reivindiquem os direitos humanos e democráticos conquistados e instituídos, pois o avanço
e o desenvolvimento da sociedade devem, no mínimo, garantir a manutenção da subsistência dos
indivíduos. Desse modo, deve-se ainda, além de lhes reconhecer as propriedades destas terras,
fornecer-lhes recursos indispensáveis a qualquer cidadão, tais como saneamento básico, educação,
materiais para que possam melhorar suas habitações, estímulo a agricultura familiar, dentre outros.
É preciso desprender esforços a fim de contribuir com a superação das condições
subumanas que boa parte dessa população está submetida e não lhes tomar as terras, que constituem
mais do que propriedade material, pois compõem também o vínculo cultural do grupo com a terra e
suas tradições, ou seja, sua própria identidade. Certamente não devem correr o risco de incorrer aos
mesmos erros do passado, como o holocausto das tribos indígenas que viviam no Brasil, onde
populações inteiras foram dizimadas. Atualmente, os moradores da comunidade lutam para que o
artigo 68 do Ato das Disposições Constitucionais Transitórias, inserido na Constituição de 1988
seja exeqüível e, dessa forma, possam ter suas terras restituídas e voltem a viver em uma
comunidade de forma sustentável como em autrora, diante de uma possível reterritorialização.

REFERÊNCIAS BIBLIOGRÁFICAS
ANJOS, Rafael Sanzio Araújo dos. Territórios das Comunidades Remanescentes de Antigos no
Brasil: primeira configuração espacial, edição do autor: Brasília, 1999.
GERMANI,Guiomar Inez Germani. Condições históricas e sociais que regulam o acesso a terra no
espaço agrário brasileiro. Geotextos: Revista da Pós-graduação em Geografia da Universidade
Federal da Bahia. Salvador, vol. 2, n° 2, p. 115-147, 2006.
HAESBAERT, Rogério. O Mito da Desterritorialização: do “Fim dos Territórios” à
Multiterritorialidade. Rio de Janeiro: Bertrand Brasil, 2004.
MOURA, C. Quilombo: resistência ao escravismo. São Paulo: Ática, 1987.
NOGUEIRA, Aristeu. Irará 88. Irará: Prefeitura Municipal de Irará, 1988.
Fórum Internacional do Meio Ambiente - A conferência da Terra 221

DIREITO AMBIENTAL E DIREITOS HUMANOS NA SOCIEDADE DE RISCO

Anaisa Moreira Firmino


Universidade de Uberaba – anaisa_moreira@yahoo.com.br
Boris Mark Tomelic Rivero
Universidade de Uberaba – thor_geo@yahoo.com.br

RESUMO
Um dos aspectos fundamentais abordados neste trabalho é a discussão da importância dos
Direitos Humanos da terceira geração e o Direito Ambiental na sociedade de riso. Diante da
deflagração de uma crise civilizatória sem procedente na história da humanidade, tem-se pensado
em mecanismos de sustentação aos novos desafios apresentados pela crise ambiental frente aos
problemas de injustiça e desigualdades socioambientais. Neste contexto, o Direito Ambiental, nos
apresenta como um das alternativas a dignidade humana e a qualidade de vida assim como o direito
ao ambiente sadio.
Palavras chaves: direitos humanos; direito ambiental; sociedade de risco

ABSTRACT
One of the main aspects approached in this work is the discussion of the importance of the
Human Rights of the third generation and the Environmental Rights in the Risk Society. With the
deflagration of a civilization crisis with no precedent in the humanity history, people have been
thinking in maintenance ways for new challenges presented by the environmental crisis facing the
injustice and social-environmental problems. In this context the Environmental Rights present us as
one of the alternatives for a human dignity and life quality as for a healthy environment.

SOCIEDADE DE RISCO E JUSTIÇA AMBIENTAL


Nunca os temas ambientais ocuparam lugar de destaque na mídia internacional e nacional
como agora. Se há uns trinta anos, as discussões acerca da problemática ambiental ainda estavam
restritas ao âmbito acadêmico e científico, hoje eles ocupam um espaço, sem procedente na
sociedade. Isto se deve ao fato, principalmente, da inserção desta discussão na mídia. Não é mais
segredo que se continuarmos com este modelo de crescimento, o planeta entrará em colapso. Se
antes, se tinha alguma dúvida ou tentava-se encobrir a crise ambiental32, hoje a sociedade, já
conhece quais são estes problemas ambientais e as conseqüências para as espécies que habitam a
Terra.
Diante do quadro alarmante, apresentado em relatórios, estudos, documento, etc., das
alterações ambientais – degelo, contaminação da água, assoreamento, perda de solo, entre outros -,
tem-se pensado, urgentemente, em recursos e/ou medidas que possam minimizar os impactos
exercidos sobre o ambiente, ocasionado, principalmente, pela maneira, como nós, seres humanos,
nos relacionamos com a natureza. O uso indiscriminado dos recursos naturais, impulsionado pelo
modelo econômico insustentável de produção e consumo desenfreado – tira-se da terra mais do que
a capacidade que ela tem de renovar esses recursos -, tem-nos levado a uma sociedade mais injusta
e desigual.
A sociedade capitalista e o modelo de exploração capitalista dos recursos economicamente
apreciáveis se organizam em torno das práticas e comportamentos potencialmente produtores de
situações de risco. Esse modelo de organização econômica, política e social submete e expõem o
ambiente, progressiva e constantemente, ao risco (LEITE; AYALA, 2002, p. 103).
Ou ainda, como destaca Leff (2001, p. 59):
a problemática ambiental – a poluição e a degradação do meio ambiente, a crise de
recursos naturais, energéticos e de alimentos – surgiu nas últimas décadas do século XX
como uma crise de civilização, questionando a racionalidade tecnológica dominante.

32
Entende-se por crise ambiental a escassez de recursos naturais e as diversas catástrofes em nível planetário, surgidas a
partir das ações degradadoras do ser humano na natureza (LEITE e AYALA, 2002, p. 1)
Fórum Internacional do Meio Ambiente - A conferência da Terra 222

Segundo Genebaldo Dias (2004), o modelo de desenvolvimento socioambiental, ao passo


que produz consumismo produz também exclusão social. Tanto um quanto o outro contribuem para
o processo de degradação. O primeiro, porque estimula o consumo desnecessário e desenfreado,
impulsionado pelo bombardeio da mídia – especialista em criar necessidades que não são reais –,
exercendo, assim, uma pressão maior sobre os recursos naturais. O segundo, porque a exclusão
social favorece, a degradação ambiental refletida na perda da qualidade de vida, por condições
inadequadas de moradia, poluição em todas as suas expressões, destruição de habitas naturais, entre
outros. Corrobora com Sato (2004) quando afirma que:
a preparação para mudanças necessárias depende da compreensão coletiva da natureza
sistêmica das crises que ameaçam o futuro do planeta. As causas primárias de problemas
como o aumento da pobreza, da degradação humana e ambiental e da violência podem
ser identificadas no modelo de civilização dominante, que se baseia em superprodução e
superconsumo para uns e em subconsumos e falta de condições para produzir para a
maioria (SATO, 2004, p. 17).

O fluxograma 2 apresentado por Dias (2004) representa muito bem este modelo

Modelo de “desenvolvimento”

Produz Produz

EXCLUSÃO SOCIAL
CONSUMISMO

Miséria – fome Opulência-desperdício

DEGRADAÇÃO AMBIENTAL

PERDA DA QUALIDADE DA
EXPERIÊNCIA HUMANA
Perda da qualidade
de vida
Fluxograma 2: Esquema da análise sistêmica do contexto socioambiental. Fonte: DIAS, G.F, 2004,
p. 95.

Dessa maneira, como afirma Navarro e Cardoso (2008), vivemos em uma sociedade de
risco; “designando um estágio da modernidade em que começam a tomar corpo as ameaças
produzidas até então no caminho da sociedade industrial”. O conceito de sociedade de risco, foi um
Fórum Internacional do Meio Ambiente - A conferência da Terra 223

termo desenvolvido pelo sociólogo alemão Ulrich Beck, referindo-se a atual sociedade em que
vivemos, “onde a poluição ambiental não respeita fronteiras e onde os riscos nos submetem a todos”
(HERCULANO, 2008).
Assim, a teoria da sociedade de risco, se dá em função, principalmente, do contínuo
crescimento econômico e do esgotamento dos recursos naturais. Espera-se, diante disso, a qualquer
tempo, as conseqüências de uma catástrofe ambiental. A deteriorização e perda da qualidade de vida
têm anunciado uma crise ambiental sem precedentes na história da humanidade.
Neste sentido, a superação da crise ambiental implica numa mudança de comportamento,
na aquisição de novos hábitos e na ética. Em resposta aos problemas ambientais, deve-se iniciar um
processo de sensibilização, mudança de atitude e participação na resolução da crise ambiental.
Trata-se, portanto, da adoção de novas posturas e atitudes pessoais e coletivas.
A crise ambiental que assola o planeta: escassez de água, poluição, mudanças climáticas,
perda da biodiversidade entre outros, tem relação estreita com as injustiças sociais. Segundo
Acselrad (2004), “a destruição sistêmica do meio ambiente acontece, de modo predominantemente,
em locais onde vivem populações negras, indígenas ou sem recursos econômicos”.
A direito a vida e a qualidade desta tem relação intrínseca com a qualidade ambiental. A
ingestão de água contaminada e à falta de saneamento básico, é responsável pela morte de mais de
10 milhões de pessoas por ano em todo o mundo (WWF). A poluição do ar nas grandes cidades tem
agravado ou mesmo provocado diversas doenças respiratórias - asma, bronquite crônica, infecções
pulmonares, enfisema pulmonar, entre outras -, principalmente em crianças e idosos.
Assim, os problemas ambientais, como por exemplo, poluição e escassez de água, são
problemas que geralmente estão associados a populações mais pobres e marginalizadas no planeta.
Se nos anos de 1960 essas questões eram tratadas “apenas em termos de preservação,
preocupados com as conseqüências da escassez associados à exploração predatória dos recursos
planetários”, hoje, ela está muito mais associada à desigualdade social.
Neste sentido, um novo enfoque dos problemas das questões ambientais nos apresenta. A
preocupação com a proteção ambiental é recente. Data do início dos anos de 1960 com os
movimentos ambientalistas dos Estados Unidos. Neste período, a preocupação com a natureza,
estava associada, principalmente, com a deterioração e esgotamento dos recursos naturais. Isto quer
dizer que, o centro da questão ambiental se encontrava “a preocupação com a sobrevivência da
espécie humana, numa visão de viés puramente econômico”. Nos anos de 1980, esta preocupação
tomou novos rumos. Essa nova roupagem, de análise dos problemas ambientais, surgiu na década
de 1980 nos EUA, também com os movimentos sociais, e passou a denominar-se de Justiça
Ambiental.
Por Justiça Ambiental, entende-se pelo “conjunto de princípios que asseguram que nenhum
grupo de pessoas, sejam grupos étnicos, raciais ou de classe, suporte uma parcela desproporcional
das conseqüências ambientais negativas de operações econômicas, de políticas e programas
federais, estaduais e locais, bem como resultantes da ausência ou omissão de tais políticas. Dito de
outra forma, trata-se da “espacialização da justiça distributiva, uma vez que diz respeito à
distribuição do meio ambiente para os seres humanos”. (LOW & GLEESON, apud LYNCH, 2001).
Complementarmente, entende-se por Injustiça Ambiental o mecanismo pelo qual
sociedades desiguais destinam a maior carga dos danos ambientais do desenvolvimento a grupos
sociais de trabalhadores, populações de baixa renda, grupos raciais discriminados, populações
marginalizadas e mais vulneráveis. Assim, como destaca (LYNCH, apud HERCULANDO, 2008):
O conceito de Justiça Ambiental vem da experiência inicial dos movimentos sociais dos
Estados Unidos e do clamor dos seus cidadãos pobres e etnias socialmente discriminadas
e vulnerabilizadas, quanto à sua maior exposição a riscos ambientais por habitarem nas
vizinhanças de depósitos de lixos químicos e radioativos ou de indústrias com efluentes
poluentes. É um paradigma tributário da luta dos negros norte-americanos por direitos
civis (LYNCH, 2001: 60).
Fórum Internacional do Meio Ambiente - A conferência da Terra 224

Como definiu Robert Bullard, apud Herculando (2008), Justiça Ambiental é “a busca do
tratamento justo e do envolvimento significativo de todas as pessoas, independentemente de sua
raça, cor, origem ou renda no que diz respeito à elaboração, desenvolvimento, implementação e
reforço de políticas, leis e regulações ambientais”.
Por tratamento justo entenda-se que nenhum grupo de pessoas, incluindo-se aí grupos
étnicos, raciais ou de classe, deva suportar uma parcela desproporcional das conseqüências
ambientais negativas resultantes de operações industriais, comerciais e municipais, da execução de
políticas e programas federais, estaduais, locais ou tribais, bem como das conseqüências resultantes
da ausência ou omissão destas políticas.

DIREITOS HUMANOS E DIREITO AMBIENTAL


Como sabemos os direitos humanos apareceram concretamente no cenário mundial com a
Revolução Francesa em 1789, tendo sido uma conquista alicerçada nos movimentos de preservação
das garantias individuais.
Os direitos humanos possuem o propósito de proteger os seres humanos, respeitando sua
dignidade e garantindo os seus direitos fundamentais.
Atualmente existe uma corrente doutrinaria mundial, que classifica os direitos em primeira,
segunda e terceira geração.
A primeira geração dos direitos humanos, surgiram durante revolução francesa, em 1789, e
desde então foram preservados os direitos individuais do ser humano, os direitos políticos e civis.
A segunda geração dos direitos humanos, surgiram com a revolução industrial, e seu
principal objetivo foi aperfeiçoar o papel do Estado, no que diz respeito as problemas coletivos,
visando políticas de desenvolvimento econômico e social.
E mais recentes, os direitos humanos de terceira geração tratam de forma específica dos
direitos difusos. Eles começam a manifestar-se depois da segunda guerra mundial e foram se
desenvolvendo nas convenções internacionais.
Os direitos humanos de terceira geração incluem um ambiente digno e saudável, de tal
forma que quando são violados os direitos ambientais também são violados os direitos humanos.
Atualmente a sociedade de consumo globalizada, instrumentalizada pelo intenso
desenvolvimento tecnológico, agrava e amplia os impactos ambientais na escala global. Nesse
sentido quando a biosfera entra em desequilíbrio, compromete a qualidade dos elementos naturais
(água, solo, ar, etc.) que influenciam diretamente no gozo dos direitos humanos.
Assim, o Direito Ambiental surge como “representante” desse “novo” direito humano. O
direito a um ambiente ecologicamente equilibrado e sadio.

DIREITO AMBIENTAL NA SOCIEDADE DE RISCO


Frente as desafios impostos pela devastação do meio ambiente originado uma crise
ambiental e social em níveis planetários – aquecimento global, “destruição da camada de ozônio,
perda da biodiversidade, entre outros – tem-se pensado em mecanismos que possam minimizar a
ameaça não só o bem-estar, mas a qualidade de vida humana.
Neste contexto, faz-se necessário, o surgimento de um novo estado e de uma nova
cidadania, “que têm plena consciência da devastação ambiental, planetária e indiscriminada,
provocada pelo desenvolvimento, aspirando assim a novos valores como a ética pela vida, o uso
racional e solidário dos recursos naturais, o equilíbrio ecológico” (NUNES, 2008).
Dessa maneira, o Direito Ambiental, considerado como um conjunto de normas jurídicas
relacionadas à proteção do meio ambiente, e entendido como um direito fundamental, visto que os
direitos ambientais dependem do exercício dos direitos humanos para se efetivarem, pois, “através
do direito à informação, à liberdade de expressão, à tutela jurídica, à participação política no Estado
em que vivem, emfim, no exercício da cidadania, poder-se á reivindicar direitos relativos ao meio
ambiente” (SCHWENCK, 2008) poderá atuar como um remédio à delicada situação ambiental que
tomou magnitude tão serias em nível mundial.
Fórum Internacional do Meio Ambiente - A conferência da Terra 225

O reconhecimento do direito ao meio ambiente como um direito humano fundamental já


está presente em vários ordenamentos jurídicos. Na Constituição Federal do Brasil, no art. 225,
caput, impõem que “todos têm direito ao meio ambiente ecologicamente equilibrado, bem de uso
comum do povo e essencial à sadia qualidade de vida, impondo-se ao Poder Público e à
coletividade o dever de defendê-lo e preservá- lo para as presentes e futuras gerações”. Neste
sentido, corrobora Schwenck, (2008) quando destaca que:
a interligação existente entre esses direitos, formando o que se pode chamar de direitos
humanos ambientais, é evidente e já foi declarada em normas positivadas de muitos
países, ratificando ser direito da pessoa humana e das coletividades o de viver em
ambiente sadio e equilibrado. Por outro lado, o desenvolvimento sócio-econômico e
cultural dos povos deve ocorrer tendo em vista o paradigma da utilização racional dos
elementos naturais, sob pena de se estar privando as populações do direito humano a
uma vida digna.

Neste sentido, como foi estabelecido e exposto no citado caput do art. 225 da Constituição
Federal, cabe a todos, não apenas ao poder Público cuidar do meio ambiente. Torna-se, portanto,
uma tarefa coletiva que terá efetividade somente com a colaboração de todos e em todos os níveis
da sociedade.
Como se vê nos dispositivos legais referidos, hoje em dia podemos incluir o meio ambiente
saudável e equilibrado como um dos direitos fundamentais humanos, pois viver bem e em lugar
saudável é um direito de todos; erradicar a pobreza e suas conseqüências ambientais também
constitui-se em um direito humano, bem como o bem estar social que implica em um bem estar
ambientalmente equilibrado é outro direito humano, assim como para se ter uma justiça social é
necessário que todos os requisitos quanto ao meio ambiente sadio sejam observados. A dignidade
humana está, ligada direta ou indiretamente à qualidade de vida e do ambiente sadio.
Entretanto, para que qualquer destes direitos sejam efetivamente observados e respeitados
deve haver muita vontade política em âmbito internacional, regional e local
Não podemos esquecer ainda que proteção dos direitos humanos é fundamental, sem o que
estaremos fadados a viver na obscuridade de nossos instintos, com rompantes de egoísmo, violência
e desrespeito aos mais fracos e ao meio ambiente.
Assim, como assinala Milaré (2002, p.44) a finalidade do Direito Ambiental é, “conservar
a vitalidade, a diversidade e a capacidade de suporte do planeta Terra, para usufruto das presentes e
futuras gerações”.

CONCLUSÃO
Ao longo dos últimos anos, os esforços relacionados a preservação e/ou recuperação de
ambientes degradados tem somado esforços nos âmbitos nacionais e internacionais.
Desde a Conferência das Nações Unidas de 1972, em Estocolmo, inúmeros chefes de
Estados vêem discutindo a preservação do Planeta, tendo em vista a crescente pressão das
sociedades humanas sobre os múltiplos ecossistemas e fatores ambientais que o compõem.
Entretanto, apesar dos esforços e da crescente mobilização popular sobre a crise ambiental
do planeta, os resultados ainda são tímidos e incipientes.
Dessa maneira, tem-se pensado, em mecanismos mais eficazes que possam minimizar os
impactos exercidos sobre a maneira como nós seres humanos agimos no planeta. Assim, um desses
mecanismos, entre tantos, está relacionada ao Direito Ambiental como um Direito Humano
fundamental de se viver em um ambiente ecologicamente equilibrado e sadio e na Justiça
Ambienta; pois nenhum grupo, seja ele de raça, classe ou de etnia deva suportar uma parcela
desproporcional das conseqüências ambientais negativas.

REFERÊNCIAS BIBLIOGRÁFICAS
Fórum Internacional do Meio Ambiente - A conferência da Terra 226

BRASIL. Constituição (1988). Constituição da República Federativa do Brasil de 1988, com as


alterações adotadas pelas Emendas Constitucionais de nºs 1, de 1992, a 31, de 2001, e pelas
Emendas Constitucionais de Revisão de nºs 1 a 6, de 1994. São Paulo: Atlas, 2000.
DIAS, G.F. Educação Ambiental: princípios e práticas. 9. ed. São Paulo: Gaia, 2004.
HERCULANO, S. Riscos e desigualdade social: a temática da Justiça Ambiental e sua construção
no Brasil. Disponível em:
<http://www.anppas.org.br/encontro_anual/encontro1/gt/teoria_meio_ambiente/Selene%20Hercula
no.pdf>. Acesso em: 20 dez. 2007
LEFF, E. Epistemologia Ambiental. Tradução de Sandra Valenzuela São Paulo: Cortez, 2001.
LEITE, J.R; AYALA, P.A. Direito Ambiental na sociedade de risco. Rio de janeiro: Forense
Universitária, 2002.
LYNCH, B.D. Instituições Internacionais para a Proteção Ambiental: suas implicações para a
justiça ambiental em cidades latino-americanas. In: A Duração das Cidades: sustentabilidade e risco
nas políticas urbanas. Henri Acselrad (org.) Rio de Janeiro: De Paulo Editora, 2001, pp. 57 – 82.
MILARÉ, Édis. Direito do ambiente: doutrina, prática, jurisprudência, glossário. São Paulo: Editora
dos Tribunais, 2000.
NUNES JR , A T. O Estado ambiental de Direito. Disponível em:
<http://jus2.uol.com.br/doutrina/texto.asp?id=6340&p=2>. Acesso em : 14 out. 2007
SATO, M. Educação Ambiental. São Carlos: RiMa, 2004.
SCHWENCK, T. Direitos humanos ambientais. Disónívem em:
<http://www.jurid.com.br/new/jengine.exe/cpag?p=jornaldetalhedoutrina&ID=33743>. Acesso em:
02 mai. 2006.
Fórum Internacional do Meio Ambiente - A conferência da Terra 227

PARÂMETROS DO ECODESIGN EM ARTEFATOS POPULARES

Marília Riul
Universidade Federal da Paraíba - UFPB, Cidade Universitária s/n - Campus I, João Pessoa-PB, mriul@yahoo.com.br
Danielly Araújo Martins
Centro Federal de Educação Tecnológica da Paraíba – CEFET-PB, Av. 1° de Maio, nº 720. Jaguaribe, João Pessoa-PB,
daniellymartins@hotmail.com
José Nivaldo Ribeiro Filho
Centro Federal de Educação Tecnológica da Paraíba – CEFET-PB, Av. 1° de Maio, nº 720. Jaguaribe, João Pessoa-PB,
jnivaldo-ribeiro@uol.com.br

RESUMO
Algumas implicações do design como força produtiva atingem a sociedade, a exemplo do
modo como ela consome os produtos e, portanto, como ela faz uso dos recursos naturais. Diante da
crise ambiental, faz-se necessária uma mudança nos valores éticos e morais e na percepção dos
indivíduos em relação ao meio ambiente. Assim, novas estratégias surgem em favor da
sustentabilidade ambiental, a exemplo do conjunto de práticas estabelecidas no ecodesign, que
compreendem desde a redução dos impactos da produção ao aumento da vida útil dos produtos e
materiais. O presente estudo teve como objetivo identificar práticas do ecodesign na produção
popular de artefatos. A metodologia utilizada foi a pesquisa bibliográfica e exploratória. Os
resultados mostraram que grande parte da produção do “design popular”, além de atender às
necessidades dos indivíduos quanto aos seus objetos de uso, atendem a vários requisitos do
ecodesign, contribuindo assim para a sustentabilidade ambiental.
Palavras-chave: ecodesign, artefatos populares, sustentabilidade

ABSTRACT
Design as creative and productive force affects society and its consumption habits and, in
consequence, influences the use of natural resources and residues generation. In face of the
environment crisis, it is urgent to make a change in society ethical and moral values as well in
individual perception about nature. Thus, new sustainable strategies emerge, like ecodesign
practices for reduce impacts of the industrial production and the increase of products and materials
useful life. This paper had the objective of identify ecodesign parameters in popular production of
devices. The methodology was bibliographical and exploratory research. The results had shown that
the majority of products of “design popular” provides the domestic devices for individual use and
also attends some requirements of ecodesign and contribute for the environment sustainability.
Keywords: ecodesign, devices, sustainability.

INTRODUÇÃO
As conquistas tecnológicas do homem proporcionaram um grande aumento no seu poder
de interferência sobre o meio ambiente nos últimos séculos. A expansão da industrialização
possibilitou, por um lado, o aumento da qualidade de vida no mundo “civilizado” através da
produção e da popularização de produtos e de serviços que visam ao conforto e ao bem estar. Por
outro lado, em função desse sistema de produção e de consumo, surgem as ameaças à vida no
planeta, na forma de impactos sobre o meio ambiente, a exemplo da extinção de recursos naturais e
do aumento na geração de resíduos que contribuem para a degradação do ar, do solo e da água
(RAMOS, 2001).
O contexto social contemporâneo é marcado pelo processo de globalização e por outros
processos que exercem influência sobre os hábitos de consumo dos indivíduos. O design é uma
atividade projetual que está diretamente interligada a esses costumes, já que se caracteriza pela
mediação entre as necessidades humanas e a concepção de artefatos para atenderem a essas
necessidades, isto é, consumo e produção (MALDONADO, 1991).
Por outro lado, a produção de bens materiais também é realizada em nível popular. Objetos
são concebidos e produzidos de forma artesanal e com os materiais disponíveis de modo a
satisfazerem as necessidades funcionais do cotidiano de quem os produziu e de outras pessoas que
Fórum Internacional do Meio Ambiente - A conferência da Terra 228

tiverem acesso a essas criações. Muitas vezes, nos artefatos da produção popular podem ser
enxergadas soluções com caráter ambientalmente sustentável (RIUL, 2007).
Há um diálogo que pode ser estabelecido entre a produção do design denominado
tecnológico e a produção popular de artefatos, de forma que sejam equacionados conhecimentos
oriundos dessas duas atividades no intuito de que ambas dêem origem a soluções sustentáveis para
as necessidades materiais humanas.
Diante da crise ambiental, faz-se necessária uma mudança nos valores éticos e morais e na
percepção dos indivíduos em relação ao meio ambiente. Assim, novas estratégias surgem em favor
da sustentabilidade ambiental, a exemplo do conjunto de práticas estabelecidas no ecodesign, que
compreendem desde a redução dos impactos da produção ao aumento da vida útil dos produtos e
materiais.
O presente estudo teve como objetivo identificar estratégias do ecodesign a partir de três
exemplos de artefatos populares, e a metodologia utilizada foi a pesquisa bibliográfica e
exploratória.

DESIGN: HISTÓRIA E CONCEITOS


A história aponta para o indivíduo que detinha as informações necessárias para o
planejamento e a construção de um artefato - o artesão - como o sujeito que deu origem ao designer.
Na Idade Média, a principal característica da produção de objetos de uso era a ausência de divisão
entre o trabalho intelectual e o trabalho manual. Ou seja, os artesãos planejavam e produziam os
produtos, desde a escolha do material até a fase de acabamento final. O trabalho manual era
realizado com maestria e competência e assim eram satisfeitas as necessidades de uso em relação
aos artefatos do cotidiano do homem (BONFIM, 1998).
Já a partir da Revolução Industrial, que foi precedida de uma série de fatores sociais,
econômicos e políticos, dentre os quais merece destaque o crescimento da sociedade de consumo
(LEITÃO, 1997), observa-se o surgimento dos primeiros designers – sob essa denominação. Houve
uma tendência à promoção de operários que se destacavam pela sua experiência ou habilidade para
o controle e a concepção no processo produtivo. Assim, afirmar que o design e os designers são
produtos de escolas, de movimentos ou mesmo de uma época bem delimitada é uma visão que entra
em confronto com as fontes históricas disponíveis (CARDOSO, 2004).
No decorrer do tempo, o design recebeu conceitos e definições diversificados. Segundo
Cardoso (2004), o termo design origina-se do latim “designare”, verbo que abrange níveis abstratos,
como conceber, projetar e atribuir, e também concretos, como registrar, configurar e formar. Na
língua inglesa, o substantivo design refere-se à idéia de plano, desígnio e intenção, além de
apresentar os sentidos de configuração, arranjo e estrutura. Para a atividade do design, defende-se a
junção desses dois níveis (abstrato e concreto), a fim de que seja atribuída forma material a
conceitos intelectuais.
De acordo com Löbach (2001), o processo do design é tanto um processo criativo como
um processo de solução de problemas. Para esse autor, o processo do design pode ser
metodologicamente dividido em quatro etapas distintas. São elas:
a) Análise do problema de design: envolve as análises da necessidade, da relação social
(homem produto), da relação com o ambiente (produto-ambiente), o desenvolvimento histórico, as
análises do mercado, da função (funções práticas), estrutural (estrutura de construção), da
configuração (funções estéticas), de materiais e processo de fabricação, as patentes, a legislação e as
normas, a análise de sistema de produtos (produto-produto), a distribuição, montagem, serviço ao
cliente, manutenção, a descrição de características do novo produto e as exigências para com o novo
produto;
b) Alternativas de design: abrange os conceitos de design, as gerações de alternativas de
solução, os esboços de idéias e os modelos;
c) Avaliação das alternativas de design: consiste na escolha da melhor solução e na
incorporação das características ao novo produto; e
Fórum Internacional do Meio Ambiente - A conferência da Terra 229

d) Solução de design: projeto mecânico, projeto estrutural, configuração dos detalhes,


desenvolvimento de modelos, desenhos técnicos e de representação, documentação do projeto e
relatórios.
De acordo com Stephan (2002), o design é uma área que produz projetos e está
intimamente ligada a outros campos de conhecimento, no intuito de estabelecer relações múltiplas
para a solução de problemas de concepção e produção de imagens e objetos que têm por alvo
atender às necessidades do homem e da comunidade, considerando os impactos negativos dos
processos industriais no meio ambiente.
Algumas visões acerca do design recentemente levam em consideração a produção e o
saber popular. Segundo Miranda (2002), todos nós usamos, vestimos, lemos, descansamos, nos
protegemos, nos movimentamos e realizamos uma gama de ações relacionadas a objetos e coisas
concebidas pelo design, seja ele popular, seja ele industrial.
Já para Papanek (1995), os Inuit33 são “os melhores designers do mundo”, considerando
que são obrigados a superarem a si mesmos em função do clima e do meio que habitam. Nas
condições de seu habitat, os Inuit possuem a mesmas necessidades dos habitantes de áreas mais
amenas no planeta: eles precisam de alimentação, roupa, abrigo contra os elementos da natureza,
utensílios para pescar, caçar, armas para se defender e ainda objetos e artefatos com significado
ritualista e para adorno pessoal.
O mesmo autor reflete sobre a idéia de que o designer apenas se adapta ao longo dos
tempos, sempre buscando a melhor forma de desenvolver as atividades humanas a fim de melhorar
a qualidade de vida:
Quer esteja, há cerca de três milhões de anos, a transformar uma pedra em ponta de lança
para caçar, quer trabalhar como oleiro na China durante a dinastia Sung, quer ainda construir a proa
de um barco viking, ou desenhar cartas celestes para navegar no longínquo Pacífico, a construir uma
igreja barroca na Áustria ou a conceber um programa informático de diagnóstico médico
(PAPANEK, 1995).

CONCEITOS DE SUSTENTABILIDADE, ECODESIGN E ALGUNS PARÂMETROS


Em 1996, Wackernagel e Rees (apud VAN BELLEN, 2OO4) afirmou que o conceito de
sustentabilidade se baseia na utilização dos serviços da natureza seguindo a lógica da manutenção
do capital natural, ou seja, no aproveitamento dos recursos naturais realizado dentro da capacidade
de carga do sistema.
Para Chambers (2001, apud VAN BELLEN, 2004), em decorrência de fatores éticos e
culturais, o meio ambiente é considerado parte externa às pessoas e ao mundo de trabalho. Porém,
para que a sociedade viva de maneira sustentável, devemos partir da idéia de que o mundo natural
não deve estar externo à realidade da vida humana. Assim, deve-se observar que, em termos de
fluxo de matéria e energia, simplesmente não existe o termo externo, sendo que a economia humana
nada mais é do que mais um subsistema da ecosfera. Um modo de vida sustentável decorre da
gestão da humanidade e não apenas dos recursos naturais utilizados por ela. Apesar de vivenciar os
problemas graves gerados pelos impactos ambientais que decorrem de seu sistema de produção e de
consumo, a sociedade age como se a gestão ambiental fosse apenas uma parte da economia. Se a
meta é atingir uma maneira sustentável de vida, deve-se assegurar que os produtos e processos da
natureza sejam utilizados numa velocidade que permita sua regeneração.
De acordo com Ramos (2001), “design para o Meio Ambiente ou Ecodesign são as
principais denominações da atividade de projeto que busca a redução dos impactos ambientais dos
produtos”. Considerando de maneira preventiva a relação do produto com o meio ambiente, durante
todo o seu ciclo de vida.
O conceito de ecodesign dado por Fiksel em 1996 (apud VENZKE, 2002) diz que:

33
Povos habitantes de localidades com climas extremamente frios, como o norte do Alasca e a costa da baía de Hudson,
no Canadá (PAPANEK, 1995).
Fórum Internacional do Meio Ambiente - A conferência da Terra 230

Projeto para o meio ambiente é a consideração sistemática do desempenho do projeto, com


respeito aos objetivos ambientais, de saúde e segurança, ao longo de todo ciclo de vida de um
produto ou processo, tornando-os ecoeficientes.
Levando em consideração que o design como atividade projetual estabelece um diálogo
entre necessidades e objetos, entre produção e consumo (MALDONADO, 1991) e, sabendo que as
mudanças ambientais são conseqüências do que fazemos e dos meios que são utilizados, é
imperativo que profissionais como os designers, arquitetos e engenheiros dêem a sua contribuição
em forma de soluções para os problemas gerados pelas mudanças significativas e ameaçadoras que
afetam o meio ambiente (PAPANEK, 1995).
O objetivo maior do ecodesign é o desenvolvimento de produtos ecoeficientes34 e que, ao
mesmo tempo, nas empresas não sejam comprometidos os custos, a qualidade e o tempo para a
fabricação desses artefatos. Para que esses objetivos sejam alcançados, algumas práticas podem ser
adotadas durante o projeto dos produtos (VENZKE, 2002). A seguir, serão apresentadas alguns
parâmetros estabelecidos por FIKSEL (1996), para a implementação dos conceitos de ecodesign nas
empresas.
a) Recuperação de material: uso de materiais no estado mais próximo possível de seu
estado natural, para que sejam facilmente recuperados.
b) Recuperação de componentes: prática que defende que os componentes do produto
sejam retirados e reutilizados em outros produtos ou enviados para o fabricante para serem
recuperados.
c) Facilidade de acesso aos componentes: com componente com fácil acesso, otimiza-se o
custo e o esforço para que um produto possa ser desmontado. Isso facilita a recuperação das peças
no fim da vida útil do produto e também que elas sejam recuperadas e usadas novamente. Além de
facilitar a reciclagem das partes que serão descartadas.
d) Projetos voltados à simplicidade: com formas simples, o custo da produção é menor, já
que uma quantidade menor de matéria será utilizada, além de serem simplificadas a montagem e a
desmontagem.
e) Não utilização de materiais contaminantes: esta estratégia condena o uso de materiais
que dificilmente serão separados dos produtos ou das embalagens (ex. colas, tintas, pigmentos,
grampos e rótulos). Estes materiais contaminam as demais partes, muitas vezes impossibilitando a
reciclagem.
f) Recuperação e reutilização de resíduos: além dos resíduos gerados com o descarte de um
produto, há os resíduos produzidos com a sua fabricação e uso. Assim, é importante a adoção de
tecnologias que recuperem estes resíduos, aproveitando o máximo da matéria-prima, obtendo
ganhos ambientais e econômicos. Considerar que se torna ecoeficiente a produção que gere a menor
quantidade de resíduo possível.
g) Redução do uso de energia na produção: os programas de redução do consumo
energético se destacam entre as práticas em prol do meio ambiente, pois são geralmente fáceis de
implementar e afetam diretamente a redução dos custos operacionais.
h) Produtos multifuncionais: com a criação de produtos multifuncionais utiliza-se uma
mesma quantidade de material e energia na produção de equipamentos que atendam diferentes
demandas.
i) Utilização específica de materiais reciclados: em consonância com o desenvolvimento
sustentável devemos também praticar a conservação dos recursos não renováveis. Uma das práticas
do Ecodesign prevê a troca de materiais novos por matéria-prima reciclada, desde que o grau de
pureza não comprometa a qualidade do produto final.

34
Todo artigo - artesanal, manufaturado ou industrializado, de uso pessoal, alimentar, residencial, comercial, agrícola e
industrial - que seja não-poluente, não tóxico, reciclável, notadamente benéfico ao meio ambiente e à saúde,
contribuindo para o desenvolvimento de um modelo econômico e social sustentável (MINISTÉRIO DO MEIO
AMBIENTE DO BRASIL, Pesquisa sobre produtos e empresas ecoeficientes).
Fórum Internacional do Meio Ambiente - A conferência da Terra 231

j) Utilização de materiais renováveis: em função do conceito de desenvolvimento


sustentável, pode-se optar pela utilização de materiais renováveis como substitutos de materiais não
renováveis.
l) Não utilização de substâncias perigosas: eliminação de todas as substâncias que possam
causar danos à saúde dos funcionários e dos consumidores e também ao meio ambiente.
m) Utilização de produtos biodegradáveis: a disposição final dos produtos pode ser
facilitada quando seus componentes forem biodegradáveis.
n) Prevenção de acidentes: defende-se que durante o projeto do produto sejam aplicadas
práticas de prevenção de acidentes, além da análise de riscos na produção.

PARÂMETROS DO ECODESIGN, UMA ANÁLISE EM ARTEFATOS POPULARES


A partir do referencial teórico levantado, foram escolhidos três artefatos populares, os
quais serão analisados quanto ao atendimento das práticas do ecodesign apresentadas por Fiksel
(1996). Na medida em que os métodos e processos produtivos referentes aos produtos escolhidos
diferem dos de design industrial para os quais as práticas do ecodesign foram elaboradas, neste
trabalho considerou-se apenas as práticas que podem ser observadas na elaboração de um produto
artesanal. Para verificação do cumprimento das estratégias adotadas, é necessário analisar todo o
processo de produção do artefato; saber quais os materiais utilizados, como são agregados, além de
conhecer a forma de energia utilizada, sua distribuição, entre outros. No presente trabalho, a análise
foi realizada considerando-se somente aquelas estratégias que pudessem ser verificadas a partir da
observação direta, ou seja, foi realizada uma análise visual.
Os artefatos estudados foram: um candeeiro, um carro de sorvete e um armário para
banheiro. O primeiro artefato em análise, o candeeiro, fora catalogado na Feira de São Joaquim, em
Salvador, além de ter sido exposto na “Mostra de Design Popular da Bahia” (PENIDO, 2004).
Trata-se de um objeto que tem a iluminação como funcionalidade, e que foi concebido por
pescadores com a intenção de que sua atividade de trabalho fosse facilitada à noite. Podemos
observar na figura mostrada no Quadro 1, que o candeeiro foi produzido por meios artesanais e com
a adoção de materiais reutilizados, como latas e outras peças metálicas.

Quadro 1 – Análise do candeeiro


Artefato Parâmetros do ecodesign Atendidas Não atendidas
Recuperação de material X
Recuperação de componentes X
Facilidade de acesso aos componentes X
Projetos voltados a simplicidade X
Não utilização de materiais
X
contaminantes
Recuperação e reutilização de resíduos X
Redução do uso de energia na produção X
Produtos multifuncionais X
Utilização específica de materiais
X
reciclados
Utilização de materiais renováveis X
Não utilização de substâncias perigosas X
Utilização de produtos biodegradáveis X
Prevenção de acidentes X

O Quadro 1 apresenta as práticas atendidas e não atendidas pelo candeeiro. Assim,


observou-se o atendimento de um percentual de 46% do total das práticas adotadas para este tipo de
produto. Em relação às práticas atendidas, vê-se que a maioria se associa à prática de reutilização de
materiais, questão cada vez mais relevante, considerando-se o acúmulo de resíduos sólidos
provenientes da produção industrial em massa, associada intimamente ao estilo de vida e de
Fórum Internacional do Meio Ambiente - A conferência da Terra 232

consumo da sociedade. Algumas práticas não atendidas, como utilização de materiais renováveis,
não utilização de materiais contaminantes, não utilização de substâncias perigosas e prevenção de
acidentes são de fácil atendimento na concepção dos produtos, desde que haja uma orientação
específica quanto ao uso dos materiais. Isto elevaria o atendimento para 70% das práticas de
ecodesign, conferindo ao produto características significativas quanto à ecoeficiência.
No Quadro 2, temos o segundo artefato estudado, um carrinho para o comércio de sorvetes,
que também foi encontrado na Feira de São Joaquim, em Salvador, e exposto na “Mostra de Design
Popular da Bahia”. Ele foi concebido por um comerciante de sorvetes a partir da junção de um
cilindro de isopor, na parte interna, com um cilindro metálico, para a proteção externa, resultando
num sistema que conserva a temperatura dos sorvetes, ainda com o auxílio do gelo e do sal. Foram
também utilizadas hastes metálicas, para o apoio, e rodas provenientes de um artefato anterior
(PENIDO, 2004).

Quadro 2 – Análise do carro de sorvetes


Artefato Parâmetros do ecodesign Atendidas Não atendidas
Recuperação de material X
Recuperação de componentes X
Facilidade de acesso aos componentes X
Projetos voltados a simplicidade X
Não utilização de materiais
X
contaminantes
Recuperação e reutilização de resíduos X
Redução do uso de energia na produção X
Produtos multifuncionais X
Utilização específica de materiais
X
reciclados
Utilização de materiais renováveis X
Não utilização de substâncias perigosas X
Utilização de produtos biodegradáveis X
Prevenção de acidentes X

Notamos que o artefato atende a 61% das práticas do ecodesign adotadas, dentre elas,
foram enumeradas práticas essenciais para o desenvolvimento sustentável, no contexto atual
caracterizado pelo acúmulo descontrolado de resíduos sólidos no meio ambiente, como é o caso da
recuperação de componentes e da recuperação e reutilização de resíduos. Verifica-se que na
produção deste artefato teve-se a preocupação com a não utilização de materiais contaminantes e
substâncias perigosas em sua concepção, uma vez que se destina ao transporte, distribuição e venda
de produto alimentício.
O último objeto analisado foi catalogado na pesquisa “O papel social do design nas regiões
de baixa renda: descobrindo soluções criativas para o dia-a-dia, valorizando a cultura regional”
(RIUL et. al, 2006), realizada na cidade de Cabaceiras, Paraíba. Trata-se de um armário idealizado
para a guarda de acessórios de higiene pessoal no ambiente do banheiro. Os materiais utilizados na
sua construção foram: pedaços de madeira e de espelho e tinta, no acabamento final. O Quadro 3
mostra a análise acerca desse artefato e de seu atendimento às práticas do ecodesign.
Fórum Internacional do Meio Ambiente - A conferência da Terra 233

Quadro 3 – Análise do armário para banheiro


Artefato Parâmetros do ecodesign Atendidas Não
Recuperação de material X did
Recuperação de componentes X
Facilidade de acesso aos componentes X
Projetos voltados a simplicidade X
Não utilização de materiais
X
contaminantes
Recuperação e reutilização de resíduos X
Redução do uso de energia na produção X
Produtos multifuncionais X
Utilização específica de materiais
X
reciclados
Utilização de materiais renováveis X
Não utilização de substâncias perigosas X
Utilização de produtos biodegradáveis X
Prevenção de acidentes X

O artefato do Quadro 3 atende a 69% das práticas de ecodesign adotadas para este estudo.
Nota-se uma taxa satisfatória, considerando que se trata de um produto artesanal e que este atende a
duas práticas importantes para sustentabilidade ambiental: utilização de materiais renováveis e de
materiais biodegradáveis (a madeira). Novamente, as práticas não atendidas foram: não utilização
de materiais contaminantes e de substâncias perigosas e prevenção de acidentes, as quais requerem
conhecimento específico das características dos materiais.

CONSIDERAÇÕES FINAIS
Sabe-se que uma grande maioria da população brasileira vive em condições sócio-
econômicas adversas. Apesar disso, a escassez de recursos e a falta de oportunidades, muitas vezes,
dá origem a soluções criativas para problemas cotidianos.
Por outro lado, há o agravamento da problemática ambiental, caracterizada pela
degradação do meio natural, com a poluição do ar, das águas e dos solos, o esgotamento dos
recursos, bem como pelo acúmulo de resíduos provenientes do estilo de vida da sociedade de
consumo.
Tendo em vista a problemática socioambiental, esse trabalho reuniu artefatos originários da
classe de baixa renda com características funcionais e sustentáveis na sua concepção. Observou-se
que esses artefatos foram concebidos para substituírem os objetos industrializados e
comercializados aos quais os seus produtores não tinham fácil acesso. Os referidos artefatos
passaram a suprir a necessidade de utensílios domésticos e de trabalho de seus produtores, com a
possibilidade de serem produzidos e usados por outros indivíduos, já que foram construídos
artesanalmente e com matéria-prima reutilizada. Vale enfatizar que a prática de reutilização de
materiais aparentemente sem valor ou utilidade é fundamental no contexto atual da crise sócio-
ambiental.
A contribuição do design em relação aos emergentes riscos ambientais pode ser
exemplificada pelas estratégias elaboradas no intuito de aumentar a sustentabilidade dos projetos da
área e pela sua interface com a atividade industrial.
Este trabalho apresentou análises acerca do caráter sustentável de artefatos do “design
popular”, levando em consideração as práticas do ecodesign expostas por Fiksel (1996). Verificou-
se que a produção dos objetos estudados atendeu à maioria das práticas do ecodesign apresentadas,
Fórum Internacional do Meio Ambiente - A conferência da Terra 234

sendo importante destacar que essas estratégias foram estabelecidas para o design industrial, uma
atividade de caráter técnico e especializado.
Consideramos relevante para o desenvolvimento sustentável a troca de conhecimentos e
experiências entre os designers por formação acadêmica e os “designers populares”, observando-se
a importância da produção de soluções e de artefatos de forma inovadora, funcional, sustentável e
acessível à maioria da população.

REFERÊNCIAS BIBLIOGRAFICAS
BONFIM, Gustavo Amarante. Idéias e formas na história do design: uma investigação estética. João
Pessoa: UFPB, 1998.
CARDOSO, Rafael. Uma introdução à história do design. Edgard Blücher. São Paulo, 2ª edição,
2004.
COVAS, Mário. Nosso design: tradição e tecnologia (2000, p.25), In: LEAL, Joyce Jopert. Um
olhar sobre o design brasileiro. Objeto Brasil; Instituto Uniemp; Imprensa Oficial do Estado. São
Paulo. 2002.
FIKSEL, Joseph. Design for environment: creating eco-efficient products and processes. New York
: McGraw-Hill, 1996.
GILL, Kristina, Estudio Campana: Absolute Charm. Three Layer Cake. Jul. 2006. Disponível em:
<http://threelayercake.com/content/view/287/45/>. Acesso em: 02 maio 2007.
INTERNATIONAL COUNCIL OF SOCIETIES OF INDUSTRIAL DESIGN. Definition of design.
Disponível em: <http://www.icsid.org/about/about/articles31.htm>. Acesso em: 01 maio 2007.
LEITÃO, Juarez. História geral. Lowes. Ceará. 1º edição, 1997.
LÖBACH, Bernd. Design Industrial: bases para a configuração dos produtos industrial. Edgard
Blücher. São Paulo. 1º edição, 2001.
MALDONADO, Tomás. Design Industrial. Edições 70. Lisboa, 1991.
MINISTÉRIO DO MEIO AMBIENTE DO BRASIL. Pesquisa sobre produtos e empresas
ecoeficientes. Disponível em: <http://www.mma.gov.br/port/sds/pesquisa.html>. Acesso em: 23 jun
2007.
MIRANDA, Danilo Santos. A cultura do design. In: LEAL, Joyce Jopert. Um olhar sobre o design
brasileiro. Objeto Brasil; Instituto Uniemp; Imprensa Oficial do Estado. São Paulo. 2002.
PAPANEK, Victor. Arquitectura e Design. Edições 70. Lisboa. 1995.
PENIDO, Ana.Mostra Design Popular da Bahia. Rede Design Brasil, Almanaque. Brasília, dez.
2004. Disponível em:
<http://www.designbrasil.org.br/portal/almanaque/conteudo_exibir.jhtml?idLayout=14&id=1076>.
Acesso em: 10 mar. 2006.
RAMOS, Jaime. Alternativas para o projeto ecológico de produtos. Florianópolis, 2001. Disponível
em: < http://teses.eps.ufsc.br/defesa/pdf/1167.pdf>. Acesso em: 09 maio 2007.
RIUL, Marília. Diálogo entre o design e a produção material popular./Marília Riul. Monografia de
conclusão do curso de Tecnologia em Design de Interiores. João Pessoa: CEFET/PB, 2007.
RIUL, Marília; MARTINS, Danielly A.; MEDEIROS, Carine H. M. F. de. O papel social do design
nas regiões de baixa renda: descobrindo soluções criativas para o dia-a-dia, valorizando a cultura
regional. PIBICT – CEFET-PB. Paraíba, 2006.
SAKAMOTO, C.K. A Criatividade sob a luz da Experiência: A busca de uma visão integradora do
fenômeno criativo. São Paulo, 1999. 296p. Tese (Doutorado) – Instituto de Psicologia,
Universidade de São Paulo. Disponível em:
<http://www.mackenzie.com.br/universidade/psico2/p3.htm>. Acesso em: 20 jul 2007.
STEPHAN, Auresmede, Eddy Pires. Design em formação. In: LEAL, Joyce Jopert. Um olhar sobre
o design brasileiro. Objeto Brasil; Instituto Uniemp; Imprensa Oficial do Estado. São Paulo. 2002.
VAN BELLEN, Hans Michael. Sustainable development: presenting the main measurement
methods. Ambient. soc., Campinas, v. 7, n. 1, 2004. Disponível em:
<http://www.scielo.br/scielo.php?script=sci_arttext&pid=S1414-
753X2004000100005&lng=en&nrm=iso>. Acesso em: 01 maio 2007. Pré-publicação.
Fórum Internacional do Meio Ambiente - A conferência da Terra 235

VENZKE, Cláudio Senna. A situação do Ecodesign em empresas moveleiras da região de Bento


Gonçalves, RS: análise da postura e das práticas ambientais. Porto Alegre: Escola de Administração
da UFRGS, 2002 (Dissertação de Mestrado em Administração). Disponível em:
<http://volpi.ea.ufrgs.br/teses_e_dissertacoes/td/000721.pdf>. Acesso em: 05 abr 2007.
Fórum Internacional do Meio Ambiente - A conferência da Terra 236

REPRESENTAÇÕES SOCIAIS DO ACESSO À ÁGUA POTÁVEL E DAS PRÁTICAS DE


USO

José Rocha Filho CAVALCANTI


UNIARA - Centro Universitário de Araraquara, Rua Carlos Gomes, 1338 Centro Araraquara-SP CEP 14801-340, (16)
3301 7100 (Geral) 0800 556588. rocha-cp@uol.com.br

RESUMO
A cidade de Cabaceiras, localizada no semi-árido paraibano, é o município onde menos
chove no país. Apresenta temperatura média de 30o e menos de 200mm de chuva durante o ano
todo, com precipitações em apenas 2 meses anuais, alcançando períodos secos de até 10 meses. É
uma região habitada por populações pobres e de extrema carência, cuja fonte de sustentabilidade
encontra-se na agricultura familiar. Os Projetos Sociais desenvolvidos têm o caráter de atender
apenas as necessidades imediatas, socorrendo estas populações com o abastecimento de água
através de carros-pipa, a distribuição de cestas básicas e o trabalho realizado pelas frentes de
emergência. A água é elemento vital no desenvolvimento sustentável e a seca ou as enchentes
constituem-se em um fato social agravado pelo comportamento humano. Sendo a região carente de
chuvas, percebe-se nas minorias religiosas a acomodação para este fator climático, levando-as a
perceber a água como um dom de Deus. Para entender melhor este simbolismo, a Teoria das
Representações Sociais fundamenta a análise dessa condição específica de construção do
conhecimento e de práticas sobre a água (acesso, uso e manejo) por esta população profundamente
influenciada por sua formação religiosa.
Palavras-chaves: Manejo da água – Estudo sociológico – Grupos de cristianismo popular – Semi-
árido nordestino – Município de Cabaceiras (Pb)

ABSTRACT
The city of Cabaceiras, located in the semi-arid paraibano, is the municipal district with the
smallest index of rains in the country. It presents medium temperature of 30o and less than 200mm
of rain during the whole year, just raining for 2 months, reaching dry periods of up to 10 months.
Area inhabited by poor populations and of extreme lack where the maintainability source can be
found in the family agriculture. The developed Social Projects has the character of just assisting the
immediate needs, helping these populations with the provisioning of water through tanks cars, the
distribution of basic baskets and the work accomplished by the emergency fronts. The water is vital
element in the maintainable development and the drought or the floods they are constituted in a
social fact worsened by the human behavior. Being the lacking area of rains, it is noticed in the
religious minorities the accommodation for this climatic factor taking them to notice the water as a
talent of God. To understand better that symbolism, the Theory of the Social Representations is
grounded on analysis of that specific condition of the knowledge’s construction and practices about
the water (the access, use and handling of the water) for this population deeply influenced by its
religious formation.
Keywords: Handling of the water – Sociologic study – Popular Groups of Christianity – Semi-arid
of northeast – City of Cabaceiras (Pb).

INTRODUÇÃO
O presente artigo propõe um estudo sociológico sobre o acesso e uso da água potável por
grupos minoritários entendidos como vulneráveis, segundo o Programa Nacional de Direitos
Humanos. O grupo de estudo será composto pelas minorias religiosas (grupos de cristianismo
popular) no semi-árido nordestino, tendo sido escolhida a região de Cabaceiras – PB para realizar o
estudo.
Essa região do semi-árido nordestino apresenta altos níveis de degradação, os quais,
segundo Souza et al (2007) são resultantes da extrema carência das camadas mais pobres da
população e somente um manejo racional adequado dos recursos naturais, com a recuperação das
Fórum Internacional do Meio Ambiente - A conferência da Terra 237

áreas degradadas e desertificadas, pode vir a garantir a sustentabilidade à agricultura familiar e


reduzir as vulnerabilidades a níveis aceitáveis.
Segundo Lima (1994), os projetos sociais que têm o objetivo de desenvolver as áreas
carentes do semi-árido em geral são ineficientes, por não atenderem às necessidades e não se
adequarem à realidade da população que vive nestas regiões. A grande maioria dos projetos visa
apenas prestar assistência imediata, como o abastecimento temporário de água por carros pipas,
doações de cestas básicas e frentes de emergência.
A partir dessas considerações, propõe-se um estudo sobre o manejo do recurso natural da
água pelas populações menos favorecidas da região de Cabaceiras (representando outras populações
carentes do semi-árido) e sobre como sua condição social e religiosa influencia suas práticas.
Com base nos dados levantados e levando-se em conta as considerações de Valencio et al
(2001a), a respeito de que um processo acadêmico passível de reverter a degradação sócio-
ambiental é o de colocar as temáticas ambiental e dos direitos humanos em contato, o objetivo deste
trabalho é contribuir com um estudo sociológico sobre os grupos minoritários religiosos seguidores
de um cristianismo popular em Cabaceiras e suas práticas de uso e manejo da água, a fim de
formular diretrizes para as políticas públicas de regulamentação do setor hídrico na região, com
enfoque na questão dos direitos humanos.

RELIGIÃO E SUAS REPRESENTAÇÕES SOCIAIS


A religião é uma forma de construção simbólica da realidade. Sendo assim, a forma como
os recursos naturais são explorados está diretamente vinculada à construção religiosa existente em
alguns grupos sociais do semi-árido nordestino. Dentre os recursos naturais mais fundamentais,
numa região que sofre com sua escassez, está a água, que possui uma função central tanto na
subsistência dessa população quanto nas suas práticas religiosas. A água, por esse ponto de vista, é
um elemento central sobre o qual a cultura do sertanejo no semi-árido nordestino se estrutura. As
práticas religiosas, por sua vez, fazem a mediação entre as esferas do sagrado (ou seja, o que é
divino) e o profano, sobre as quais se constroem as representações sociais que estão na base da
identidade do sertanejo, entre as quais, as que estão relacionadas aos recursos naturais e aos
fenômenos hidrometereológicos como a seca e a chuva.
Este artigo fundamenta-se na psicologia social. Pretende-se analisar a problemática do
manejo e acesso à água potável na região de Cabaceiras, pelas minorias religiosas rurais, com base
na forma como estas minorias constroem suas práticas de manejo deste recurso natural, tomando
como arcabouço teórico a Teoria das Representações Sociais de Moscovici (2003). O estudo de
como o aspecto religioso influi na relação desses indivíduos com a situação de escassez de água
será feito a partir da abordagem fenomenológica dos significados conferidos à água nas formas em
que se apresenta no ambiente e no imaginário social, a partir do estudo desenvolvido por Bachelard
(1989) em A água e os sonhos.
Uma vez fundamentado o problema, tentar-se-á identificar conflitos pelo uso e manejo da
água entre as minorias religiosas de Cabaceiras e os grupos radicados em práticas hegemônicas. As
bases teóricas para a análise desses conflitos serão buscadas nos conceitos apresentados por Elias
(2000) em Os estabelecidos e os outsiders: sociologia das relações de poder a partir de uma
pequena comunidade, e por Bourdieu (2005), em O poder simbólico. A seguir, apresenta-se uma
breve descrição da interface entre a problemática abordada neste artigo e os estudos elaborados
pelos autores de referência.

Grupo investigado: As minorias religiosas (grupos de cristianismo popular) no município de


Cabaceiras
A região de Cabaceiras, na porção central no estado da Paraíba, está localizada no polígono
das secas no semi-árido nordestino e possui um dos menores índices pluviométricos do Brasil. A
pluviometria média na região de Cabaceiras é de 280 mm anuais, distribuídos entre os meses de
janeiro a maio. Em virtude de a região apresentar solos muito expostos sem uma significativa
cobertura vegetal, ocorre degradação acelerada e erosão, propiciando o aparecimento de ravinas,
Fórum Internacional do Meio Ambiente - A conferência da Terra 238

voçorocas e o escoamento superficial dos nutrientes do solo por meio das chuvas. Atualmente, a
região encontra-se em processo de desertificação devido às práticas não-sustentáveis de manejo dos
recursos naturais.
A população local é de aproximadamente 5000 habitantes, concentrados
predominantemente na área rural. Essa população é predominantemente cristã, em sua maioria,
seguidora de um catolicismo popular. As suas práticas de uso e manejo da água são profundamente
afetadas por sua fé religiosa e, por este motivo, o grupo é investigado principalmente sob o aspecto
religioso. Pretende-se investigar como as condições religiosa, cultural e social influenciam nas
práticas de manejo da água por parte desses indivíduos e a sua relação com a condição de seca.
Segundo Souza et al (2007), os altos índices de degradação dos recursos naturais
registrados na região de Cabaceiras são resultantes da extrema carência das camadas mais pobres da
população e somente um manejo racional adequado dos recursos naturais, com a recuperação das
áreas degradadas e desertificadas, pode vir a garantir a sustentabilidade à agricultura familiar e
reduzir as vulnerabilidades a níveis aceitáveis.
No entanto, conforme salienta Lima (1994), os projetos sociais desenvolvidos com as
populações carentes do semi-árido são de natureza fundamentalmente assistencialista (p.ex.
abastecimento temporário de água por carros pipas, doações de cestas básicas e frentes de
emergência) e não promovem, de fato, o desenvolvimento sustentável da região.

As representações sociais
Moscovici, em seu estudo “Representações sociais: investigação em psicologia social”
(2003), reflete sobre a teoria psico-sociológica das representações sociais, que tem raízes na
sociologia e profunda interface com a psicologia social, com aplicações em diversas áreas das
ciências humanas. Este estudo será de grande auxílio para uma interpretação mais aprofundada
sobre a fundamentação das práticas de manejo da água pelo grupo social investigado e,
principalmente, acerca de sua relação com a condição de escassez de água e a constante ameaça de
seca.
O conceito de representação social tem seu início com o sociólogo Durkheim, mas é na
psicologia social que esse conceito ganha uma teorização mais aprofundada por Moscovici, que
reflete sobre as interações entre indivíduo e sociedade. Ela reflete sobre como os indivíduos
constroem o seu conhecimento a partir de sua inscrição social e cultural e, em outra via, como a
sociedade se dá a conhecer e constrói este conhecimento com os indivíduos. Em suma, trata das
interações entre sujeito e sociedade para a construção da realidade, ou das diversas realidades
possíveis acerca de uma mesma situação construídas pelos diferentes grupos culturais e sociais.
Água e escuridão formaram a matéria prima da criação, na compreensão judaico-cristã. No
sertão do Nordeste a tradição religiosa, de origem predominantemente judaico-cristã, foi transmitida
ao longo das gerações principalmente via linguagem oral, uma vez que se tratava de populações
extremamente carentes, a grande maioria não alfabetizada. Ou seja, é um povo de cultura mais oral
que escrita.

O aspecto psicológico, o imaginário social e a simbologia da água


Bachelard (1989) discorre sobre a imaginação que surge da materialidade do mundo em
um poema sobre a psicologia das águas. Segundo o autor, há duas formas de imaginação: a formal,
ligada ao aspecto sentimental, e a material, surgida do mundo físico. Ambas somente existem
interligadas, uma a partir da outra. O ensaio de Bachelard trabalha este aspecto a partir do estudo
psicológico sobre a água em suas diversas formas de ocorrência no ambiente: as águas calmas e
amorosas de um riacho límpido, as águas obscuras e dormentes das profundezas da terra, as águas
violentas do oceano e a água pura de beber. O sentido do imaginário sobre a água potável é o de
pureza, de fonte de vida, de alimento.
Cada elemento no mundo material é cercado de um universo de significados
correlacionados que lhe são atribuídos. A água traz um universo muito vasto de simbologias e
significados, a ela inerente, os quais, por sua vez, são intimamente ligados à condição do
Fórum Internacional do Meio Ambiente - A conferência da Terra 239

observador e aos sentimentos que lhe são atribuídos. A água tem, conforme salienta Bachelard
(1989), a peculiar característica de ser foco, lente e espelho. Ela se deixa ver, permite ver através de
si e reflete o observador. Neste sentido, as metáforas que lhe são permitidas são inúmeras, e ainda
mais abundante o universo de sentimentos a ela associados.
Também na tradição judaico-cristã, Deus constrói o mundo a partir da condição inicial em
que apenas existiam água e escuridão e a ação do criador sobre esses elementos é de separar as
várias águas em oceanos, rios, lagos, mares e águas subterrâneas. Essa tradição é uma das
importantes bases do povo do nordeste brasileiro que tem, portanto, profundas raízes de diferentes
significados para as várias formas em que a água se apresenta no ambiente.
Com o auxílio do estudo de Bachelard (1989) será possível extrapolar para a interpretação
da ausência de água no psicológico social, para o significado da escassez real ou iminente, ou seja, a
convivência do indivíduo com a constante possibilidade da falta de água; de qualquer indivíduo,
mais especificamente do sertanejo, com sua raiz cultural e religiosa. Como citaram Brandão et al
(2005), “o sertão e a água estão indissociáveis: mesmo quando não há a presença de água por perto,
ela aparece na imaginação dos personagens”. E essa imaginação se dá sob influência do aspecto
moral e religioso ligado à água.

O aspecto religioso e a compreensão sobre a água pelo grupo investigado


O sertão nordestino é uma região extremamente castigada pela seca. Este fator traz grandes
complicações à vida do Homem nordestino, que é extremamente religioso na sua formação e cujas
práticas e manejo da água são profundamente influenciadas por suas tradições religiosas, quase
sempre vindas de um catolicismo popular.
A religiosidade no Nordeste teve origem na formação das irmandades, confrarias,
associações religiosas formadas nos primeiros séculos da colonização européia. A chegada do
cristianismo foi vivida por duas correntes que terminaram por ser sufocadas: as religiões de origem
africana, trazidas pelas populações que viriam a ser escravizadas na “Terra de Santa Cruz” e as de
origem indígena, dos que eram batizados e catequizados na religião cristã e obrigados a deixar suas
práticas religiosas, para então serem também escravizados. Esses povos mantinham, ainda que na
clandestinidade, suas práticas religiosas de origem.
Com as fusões entre essas três religiões, nasceu a primeira religião essencialmente
brasileira, a Umbanda, bem como uma nova forma de catolicismo, o catolicismo popular. No sertão
do Nordeste, este catolicismo popular foi a forma de religião que mais se desenvolveu e permanece
nos dias de hoje.
Nas várias formas de religião existentes desde o início da colonização no nordeste do
Brasil, o elemento água sempre foi de grande importância e especial significado. As religiões
africanas tinham seus orixás, que eram deuses e deusas que representavam elementos da natureza.
Iemanjá era considerada a deusa do mar; Ogum, a deusa das águas doces, que morava nas
cachoeiras; Iansã representava os ventos e tempestades.
Também nas religiões indígenas, a água tinha importante papel ligado ao ritual e ao
sagrado. O batismo cristão utiliza a água como elemento de purificação, de imersão e nascimento
para a iniciação e pertença do indivíduo na comunidade cristã, como condição fundamental para a
vivência neste grupo. No catolicismo popular há santos ligados especificamente à água, como São
Pedro, que é responsável pelas chuvas, e São José, responsável pelo plantio e pela colheita.
Segundo a crença popular, se houver chuva no dia de São José – 19 de março – significa que haverá
naquele ano chuva e uma boa colheita. A colheita é feita no dia de São João Batista – 24 de junho.
Assim, a água, além se ser essencial à vida, faz também parte do imaginário religioso e da formação
religiosa do povo do semi-árido.

Dimensões sócio-culturais do acesso e uso da água


A principal diferenciação que se faz das águas na realidade do semi-árido é entre a água
que pode ser bebida e a que não pode. A água que pode ser bebida é aquela encontrada nas fontes,
nas cisternas, tanques de pedras e poços, ou trazida por carros-pipa. As águas superficiais,
Fórum Internacional do Meio Ambiente - A conferência da Terra 240

encontradas em açudes, são em geral impróprias para beber. Como a água potável é pouca, os
usuários têm de estabelecer prioridades de uso: consumo humano, preparo de alimentos, consumo
animal, irrigação das lavouras, higiene pessoal e doméstica.
Além disso, não raro ocorrem conflitos entre os diversos usuários pela água, os quais
devem ser claramente identificados, bem como as razões desses processos conflitivos. Segundo
Valencio et al (2001b), a unidade compreendida pelo meio natural e pelo meio sócio-cultural de
uma região entra em risco quando não são reconhecidos esses conflitos como elementos de escolha
que fragilizam ainda mais os grupos sociais e ecossistemas naturais já fragilizados.
Nos processos conflitivos, tende-se a estabelecer prioridades entre os grupos no acesso à
água. Esta prioridade pode se dar pela condição social, econômica, política e cultural, ou mesmo
pode não haver a condição de diferença e, ainda assim, existirem relações de poder entre os grupos,
como mostra Elias (2000) em “Os estabelecidos e os outsiders”.
Neste trabalho, o autor realizou um estudo empírico sobre as relações de poder existentes
em uma pequena comunidade industrial inglesa nos anos 50 do século XX, com base no qual
validou seu modelo teórico sobre o poder e as relações entre indivíduo e sociedade – o modelo das
configurações. Segundo este modelo, a sociedade é uma teia flexível de relações entre indivíduos
interdependentes temporal e espacialmente. Esta visão rompe com o conceito clássico de
polarização que avalia indivíduo e sociedade de forma separada.
Uma característica importante do grupo investigado por Elias (2000) é o fato da relação de
poder claramente identificada entre dois grupos daquela comunidade não ser baseada em diferenças
de raça, condição financeira e cultural, educação, credo, cor ou gênero – mas ao tempo de
residência no lugar. Identificou-se que a população estabelecida na comunidade investigada possuía
elevado grau de coesão e identidade social, ao passo que a comunidade imigrante era desarticulada.
Elias (2000) estuda os aspetos diferenciais de poder devidos a diferenciais no grau de organização
dos diversos grupos.
Elias estudou o poder relacionado a um determinado atributo daquele que o detém. No
projeto ora proposto, as relações sociais de poder serão avaliadas a partir da condição do acesso à
água, dos grupos que detêm a prerrogativa de uso e manejo deste raro recurso natural no semi-árido.
Porém, há contornos diversos que permeiam a relação do Homem com a água e que
estabelecem relações conflitivas de acesso a ela não apenas entre os grupos usuários, mas entre um
determinado grupo de elite que detém os meios de produção da água e os grupos usuários, e que
fazem da seca um grande negócio.
A água no semi-árido é vista como um dom de Deus. Existe, no mundo religioso do
Homem do semi-árido, uma certa explicação para a ausência de chuvas. A grande maioria da
população atribui a escassez de chuvas e ausência de água potável não a uma condição climática,
geográfica e histórica, mas com interpretação no campo religioso: trata-se da “vontade de Deus”. O
sofrimento, a desertificação, o processo migratório, a desidratação e a desnutrição decorrentes da
seca são fortemente associados a essa mitificação.
A parcela da sociedade que detém o poder de influência (ou poder do discurso) sobre o
restante da sociedade toma proveito dessa compreensão religiosa, e passa a compor o processo
conhecido como “indústria da seca”, o qual tem fundamento principalmente econômico e político
naquela região.
A erradicação real da seca, em lugar de políticas assistencialistas que somente reforçam as
relações de dependência entre os grupos sociais no semi-árido, de fato não acontece. A cada ano vê-
se fortalecer uma elite política e latifundiária que se beneficia da condição de extrema miséria
provocada pela seca.
Neste sentido, a análise de Bourdieu (2005) permite uma compreensão do processo de
poder identificado no discurso. Segundo o autor, o poder do discurso é proporcional à sua
hegemonia e o que ele descreve como “poder simbólico” é “esse poder invisível que só pode ser
exercido com a cumplicidade daqueles que não querem saber que lhe estão sujeitos ou mesmo que
o exercem”. (p.322). Aqueles que falam em nome da ciência ou de Deus são concebidos como
agentes privilegiados, atuantes na produção e reprodução do discurso.
Fórum Internacional do Meio Ambiente - A conferência da Terra 241

Bourdieu (2005) faz um estudo sobre o poder simbólico e interpreta o discurso como
mecanismo de constituição da realidade, função que vai muito além da simples representação da
realidade. O autor apresenta uma análise de discursos como prática social de hegemonia. Esta
análise de Bourdieu (2005) será utilizada no trabalho ora proposto como ferramenta de
interpretação das relações de poder exercidas pelas elites no semi-árido a partir da condição de
acesso à água e do discurso religioso que se faz em torno da situação de seca.

METODOLOGIA
Caracterização da área de estudo e do grupo vulnerável investigado
A partir de estudos baseados na bibliografia disponível, em índices sociais e visitas a
campo, a região do município de Cabaceiras será caracterizada de modo a possibilitar uma
investigação qualitativa das práticas de uso e manejo da água pelos seus habitantes.
Por se tratar de uma região com baixa densidade populacional (apenas 5000 habitantes no
município), cujos hábitos de manejo da água e práticas de convivência com a situação de extrema
seca são influenciados por sua fé religiosa, advinda de um modelo popular de cristianismo
(predominantemente católico), o grupo investigado pode ser considerado como minoria religiosa,
sendo, portanto, um grupo social vulnerável, conforme o Programa Nacional dos Direitos Humanos
(PDNH II).
Nesta etapa da metodologia, serão registradas todas as informações acerca da região e da
população investigada no que se refere ao manejo da água e à convivência com a seca.

Análise das dimensões sócio-culturais do acesso à água pelas minorias religiosas em Cabaceiras
A partir das entrevistas e observações de campo, será possível identificar se ocorrem
disputas pela água por diferentes grupos sociais e se existem práticas hegemônicas que favoreçam
especialmente algum desses grupos. Feita esta pesquisa qualitativa, com base na bibliografia de
apoio, poderão ser analisadas as situações de conflito e as suas principais características, tomando
como base o modelo das configurações sociais em que a comunidade é vista como uma teia de
indivíduos interdependentes que ocupam diversas funções. Nesta etapa do estudo, os autores de
referência serão Bourdieu (2005) “o poder simbólico” e Elias (2000) “Os estabelecidos e os
outsiders”.

Levantamento de projetos e ações sociais já desenvolvidos ou em desenvolvimento no local


Muitos projetos sociais foram e são desenvolvidos no sertão nordestino, p.ex. Pastoral da
Seca (sertão do Ceará), ASA (Paraíba), Pastoral da Terra (em todo o sertão do Nordeste), projeto
SECCA (Pernambuco), projeto Cisternas e outros. Esses projetos serão estudados e serão analisadas
sua metodologia e sua adequação à região de estudo, visando a dimensão humana do problema do
acesso à água potável no semi-árido, sua abrangência e possíveis causas de seu sucesso ou
insucesso. O estudo será feito com foco na dimensão humana da população atendida pelos projetos
e se esta está incorporada em seus métodos.

REFERÊNCIAS BIBLIOGRAFICAS
BACHELARD, G. (1989) A água e os sonhos – ensaio sobre a imaginação da matéria. São Paulo:
Martins Fontes, 202p.
BORDIEU, P. (2005) O poder simbólico. Rio de Janeiro: Bertrand Brasil, 322p.
BRANDÃO, C. R. et al. (2005). Um estudo sobre as águas em Gaston Bachelard. III Simpósio
Nacional de Geografia Agrária – II Simpósio Internacional de Geografia Agrária, Presidente
Prudente – SP. < http://www.geograficas.cfh.ufsc.br/geoeventos/geoagraria.pdf> acesso em 21 de
setembro de 2007.
ELIAS, N. & SCOTSON, J. (2000) Os estabelecidos e os outsiders: sociologia das relações de
poder a partir de uma pequena comunidade. Rio de Janeiro: Zahar, 213p.
Fórum Internacional do Meio Ambiente - A conferência da Terra 242

LIMA, R. F.; FERRO, F. F. & SILVA, A. DE M. (1994). Projeto SECCA: Os impactos ambientais
e o desenvolvimento sustentável na região árida de Cabaceiras – PB. Departamento de Ciências
Geográficas, Universidade Federal de Pernambuco.
MOSCOVICI, S. (2003) Representações sociais: investigação em psicologia social. Petrópolis:
Vozes, 404p.
SOUZA, R. F. et al (2007) Estudo do processo de desertificação e das vulnerabilidades do
município de Cabaceiras – PB. Engenharia Ambiental – Espírito Santo do Pinhal, V.4, n.1, p. 89-
102.
VALENCIO, N. F. L. da S.; MARTINS, R. C. & LEME, A. A. (2001a). A água como valor social:
considerações acerca de uma prática acadêmica em torno do tema. In VALENCIO, N.F. (org).
Caminhos da cidadania; um percurso universitário em prol dos direitos humanos. São Carlos:
EdufSCar, capítulo 15.
VALENCIO, N. F. L. da S.; VARGAS, M. C. & MIRANDA, C. O. (2001b). O processo de
interiorização do desenvolvimento e suas implicações ao acesso e uso da água pelo cidadão:
desafios econômicos, sociais e político-institucionais do Caso Paulista. In VALENCIO, N.F.;
MARTINS, R.C. & LEME, A.A. (orgs). Uso e gestão dos recursos hídricos no Brasil. São Carlos:
Rima, capítulo 13.
Fórum Internacional do Meio Ambiente - A conferência da Terra 243

SERRA DE MONTE ALTO - BA: PESQUISA E EXPERIÊNCIA DE GESTÃO DO


PATRIMÔNIO NATURAL E ARQUEOLÓGICO

Joaquim P. da Silva
DFCH - Departamento de Filosofia e Ciências Humanas. Universidade Estadual do Sudoeste da Bahia. jsilva@uesb.br
Eduardo S. Bernardes
Departamento de Ciências Naturais - Universidade Estadual do Sudoeste da Bahia - edusbstein@gmail.com.
Edvaldo Oliveira
Departamento de Geografia. UESB - Universidade Estadual do Sudoeste da Bahia, Estrada do Bem Querer, km 4 –
Vitória da Conquista – Bahia. CEP 45100-000. edvaldocartografia@gmail.com

RESUMO
A Serra de Monte Alto na região sudoeste da Bahia, cercada por 17 pequenas comunidades
de tradição rural de cinco municípios (Candiba, Guanambi, Palmas de Monte Alto, Pindaí e
Sebastião Laranjeiras) encontra-se sob forte pressão de atividades extrativistas como a produção de
carvão, que ameaçam seus 70.000 hectares de recursos naturais. Os arenitos que sustentam a Serra
representam importante aqüífero que mantém as nascentes correndo para as planícies ao seu redor.
Uma série de estudos interdisciplinares realizados durante dois anos na Serra reuniu um grupo de
pesquisadores da Universidade Estadual do Sudoeste da Bahia, para atender a solicitação de pessoas
que lutam pela sua preservação. Esses estudos resultaram no reconhecimento de nove nascentes
perenes de água de boa qualidade, cachoeiras, trilhas e sítios arqueológicos numa área de 9.000
hectares. O trabalho de gestão dos diferentes interesses, realizado através de encontros, reuniões e
seminários, com expressiva participação das comunidades, culminou na sinalização do Governo do
Estado em criar uma Unidade de Conservação na área. A iniciativa das Câmaras de Vereadores e
Prefeituras dos Municípios envolvidos foi decretar o tombamento das respectivas áreas
administrativas na Serra. Os estudos revelam ainda que a capacidade de suporte ambiental dos
locais de interesse turístico só pode ser avaliada em pesquisas mais detalhadas, previstas para
acontecer nos próximos meses. A implantação de infra-estrutura adequada nos acessos e no entorno
dos pontos de atividades recreativas deve ser motivo de referendos populares, para consolidar a
criação da reserva. Um mapa com os principais atrativos da serra foi gerado pelo cruzamento dos
dados de campo com imagens de satélite através de técnicas de geoprocessamento.
Palavras-chaves: Serra de Monte Alto, turismo, desenvolvimento sustentável, patrimônio natural,
geoprocessamento.

ABSTRACT
Charcoal production threatens Serra de Monte Alto, a 70,000 ha local geomorphic unit of a
widely distributed orographic system named Planalto do Espinhaço in southwestern State of Bahia.
The sandstones on the top of the steep-sided plateau represent an important water supply that
sustains life in the semi arid plains around it. The region is populated by 54,000 people of many
small rural communities of five cities (Palmas de Monte Alto, Sebastião Laranjeiras, Candiba,
Pindaí e Guanambi). Interdisciplinary studies carried out since 2005 by a group of researchers from
University Southwest Bahia State answer the claim of those people involved with environment
preservation in the region. Research works evaluated nine springs of quality water, the waterfalls,
paths for tracking and archaeological sites of rock art within a 9,000 ha area that can be an attractive
sustainable tourism based development. Local labor management meetings with expressive
participation of communities resulted in a compromise of Bahia Government to establish a
Conservation Unity at the area. Councilors of legislative power and Mayors from the five cities
have had the initiative of legal preservation on each administration area of the plateau. Studies
revealed also that the evaluation of environment support capacity of places with tourism interest
will depend on more detailed researches which must happen in the following months. The
implementation of appropriate infrastructure and accesses to recreation activity points must be issue
of popular referendum to the conservation unity consolidation. The map with main plateau
Fórum Internacional do Meio Ambiente - A conferência da Terra 244

attractions was generated by integrating field collected data and satellite images using
geoprocessing techniques.
Key-words: Serra de Monte Alto, tourism, sustainable development, natural heritage,
geoprocessing.

INTRODUÇÃO
Nos pequenos povoados e comunidades rurais onde o turismo ainda é uma alternativa
pouco freqüente, essa atividade deve se desenvolver de forma equilibrada com o meio ambiente,
onde o maior desafio é se antecipar nos impactos. A Unidade de Conservação da Serra de Monte
Alto no sudoeste da Bahia deve ser criada com base na sua importância como patrimônio natural e
arqueológico.
O projeto possui alguns objetivos que orientam os trabalhos de preparação do Plano de
Manejo da Serra, tais como: garantia de preservação de nascentes, desenvolvimento do turismo
sustentável, conservação de sítios arqueológicos. Nesse sentido um grupo de pesquisadores
trabalhou na coleta de dados para subsidiar a implantação de trilhas temáticas e infra-estrutura
adequada de suporte ao turismo.
A pesquisa científica possui caráter essencial nesta etapa, para que o material coletado em
campo (arqueológico, geológico e biológico) possa ser analisado em laboratório e transformado em
produto turístico e de educação ambiental e patrimonial. O presente trabalho é o resultado de
levantamentos e diagnósticos realizados para atender a solicitação das comunidades e autoridades
locais dos cinco municípios (Tabela 1), interessadas na criação da Unidade de Conservação.

Tabela 1 – IDH_M e população rural nas cidades da área de estudo.

Fonte: 2002, IBGE.

As informações são importantes e serão utilizadas em oficinas de formação de


empreendedores e na capacitação de gestores. O suporte técnico para a produção de material
didático e o arcabouço para a elaboração do Plano de Manejo da Unidade de Conservação também
devem ser fundamentados nas pesquisas.
Esse planejamento deve prever um turismo que possa gerar renda e desenvolvimento para
a região, na medida em que a informação se torne vetor de inspiração para o artesanato e produtos
regionais (bebidas, comidas, música, poesia, fotografia) e na delimitação de roteiros para se
contemplar a paisagem e o patrimônio arqueológico da Serra.
Estão previstas audiências públicas com o fim de consolidar o processo de gestão desse
importante monumento do patrimônio natural do Estado da Bahia e de levantar questões ainda não
ouvidas.

ASPECTOS GEOLÓGICOS
Pela divisão do território baiano em domínios geoambientais elaborada a partir do
Levantamento de Recursos Naturais (CAR, 2007) a unidade da Serra se enquadra entre os domínios
do Vão do São Francisco, do Pediplano Sertanejo e dos Patamares do Espinhaço, numa unidade
designada Serras Centrais.
A Unidade Serras Centrais faz parte do grande Planalto do Espinhaço, compondo três
serras descontínuas em Minas Gerais e na Bahia, onde é representado pela Serra de Monte Alto.
Fórum Internacional do Meio Ambiente - A conferência da Terra 245

Destaca-se, na paisagem plana das unidades mencionadas atuando como limite municipal entre
Sebastião Laranjeiras, Guanambi, Candiba, Pindaí e Palmas de Monte Alto. A Serra se alinha no
sentido noroeste-sudeste com topo plano de pequena inclinação para o sudoeste. A sua outra
vertente apresenta uma escarpa abrupta, com altitude entre 950m e 1.260 m. Várias nascentes como
a do Rio Casa Velha e as dos Riachos Mandiroba, Cotandiba e Aguapé se originam nesta Unidade.
No domínio do Vão do São Francisco a oeste da Serra, predominam altitudes de 450
metros, com um sistema hídrico intermitente, onde o Riacho de Mandiroba se destaca, formando o
Rio Verde Pequeno, que atua como limite interestadual entre Bahia e Minas Gerais que se dirige
por sua vez ao Rio Verde Grande afluente do Rio São Francisco (Figura 1).

Figura 1: Mapa gerado com base nas informações de campo, dados de cartas topográficas e de
imagens de satélite. Do centro para o canto inferior esquerdo do mapa observa-se o Riacho
Mandiroba formador do Rio Verde Pequeno.

Geologicamente a Serra de Monte Alto apresenta rochas sedimentares que estão dispostas
numa estrutura monoclinal, com mergulhos de 10 a 15º para oeste; são arenitos finos, médios
localmente arcozianos, ferruginosos, com intercalações pelíticas e abundantes estruturas
sedimentares, tais como estratificações cruzadas acanaladas, tangenciais e ripples assimétricas
(Bertoldo, 1993). Essa configuração das camadas de arenitos com elevada porosidade proporciona
as condições necessárias para a infiltração das chuvas torrenciais nas areias que recobrem tais
rochas, vindo a percolar o substrato para formar os aqüíferos num imenso manancial, sem riscos de
implantação de processos de erosão violenta.
Ao longo do perfil das encostas da Serra observam-se metassedimentos arenosos com
intercalações pelíticas de aspecto ferruginoso formando marcantes exposições de laterita. Nesses
Fórum Internacional do Meio Ambiente - A conferência da Terra 246

locais a ausência de vegetação pode ser erroneamente interpretada como área sujeita à erosão. No
entanto atestamos a estabilidade de tais encostas e foram descartadas ações de reposição da
cobertura vegetal pois tratam-se de locais naturalmente impróprios para tais fins.
No seu interior encontram-se rochas básicas concordantes, como é o caso nas
proximidades do topo da serra, no trajeto da estrada que liga as cidades de Sebastião Laranjeiras e
Candiba. Nessas rochas encontram-se falhas formando cachoeiras próximas à estrada que são
pontos de atividades recreativas em boas condições.
Essas e outras observações de campo são importantes na interpretação de imagens de
satélite no desenho final do Plano de Manejo da Serra em mapa a ser elaborado numa escala
adequada.
A compreensão desses aspectos pode contribuir para direcionar as ações de proteção do
meio ambiente e de avaliação de impactos futuros associados com a atividade turística. Buscando
esse equilíbrio necessário na avaliação dos impactos ambientais foram preparados relatórios
utilizando o método Visitor Impacto Management – VIM (Grafe et al., 1990), que representa uma
metodologia de gerenciamento projetada para identificar e controlar o impacto previsto de visitantes
em um dado ambiente.

PATRIMÔNIO ARQUEOLÓGICO
O patrimônio arqueológico brasileiro não raramente tem sido destruído face à especulação
econômica não racional de interesses diversos ou á falta de uma educação patrimonial. Possati
(2006) assinala que a grande maioria das pessoas desconhece a importância do patrimônio que
possui em seus municípios, principalmente pela falta dos meios que permitam que a comunidade
tenha acesso a essas informações.
A educação patrimonial tem a missão de criar condições para o bem estar da comunidade,
não apenas para que se torne um lugar viável ao turismo, mas também para que desperte o
sentimento de pertencimento ao lugar. A pesquisa então fornece os elementos necessários para que
se construa essa relação identidade e desenvolvimento, que fortalecem a tomada de decisões e o
planejamento estratégico.
A criação de unidades de conservação em áreas de especial interesse ambiental e cultural
tem sido no momento a única alternativa de salvaguardar esse patrimônio e preencher a lacuna da
“Educação Patrimonial”. Tais unidades não só possuem sistemas de vigilância, como também
permitem a visitação e a informação científica que contribuem para a consciência pela preservação
da memória e da natureza, vetores fundamentais de discussão na contemporaneidade para a reflexão
de cultura e bem estar das sociedades.
A paisagem e as evidências culturais pré-históricas da Serra são importantes elementos que
podem ser aproveitados para o turismo, a exemplo de tantas outras regiões no Brasil e no mundo. O
turismo é sem dúvida um grande propulsor para o desenvolvimento local, é uma ferramenta para a
preservação do patrimônio, seja natural ou cultural. Para Cuellar (1977, p. 224) a contribuição do
patrimônio cultural para a promoção do turismo tem se tornado latente, e o patrimônio que tem
fornecido forças para o turismo se tornam um bem a serviço do desenvolvimento regional.
O sentido prático da gestão do patrimônio arqueológico da Unidade de Conservação deverá
alcançar objetivos que estão entre arqueologia, a cultura e a sociedade. Guzmán (1989, p. 194) ao
analisar o “Parque Arqueológico” pela ótica social e projetar o “Parque” como serviço público
enumera: O endomuseu é um modelo que se distingue do museu tradicional não só pelo seu
conteúdo material, mas pela sua concepção funcional, onde a experiência cultural é capaz de
provocar no visitante um estado de recreação.
A criação da Unidade de Conservação da Serra de Monte Alto se baseia em todas as idéias
expostas acima com o objetivo de que o intercâmbio entre os “visitados” e “visitantes” seja
frutuoso. A pesquisa científica é crucial nesse processo empreendedor, pois as trocas serão
permanentes e positivas na medida em que ganhos são simultâneos e se configuram numa
interessante forma de aprendizagem através do ir e vir de conhecimentos e experiências,
subsidiando e estimulando a adoção de mecanismos e estratégias de uso racional e sustentável.
Fórum Internacional do Meio Ambiente - A conferência da Terra 247

No levantamento realizado na área, constatou-se a existência de inúmeros sítios de “arte


rupestre” localizados em abrigos e grutas de arenito nos pontos mais altos da Serra. Foram também
identificados sítios a “céu aberto” em cuja superfície se observou diversos tipos de ferramentas
líticas (ferramentas confeccionadas a partir de pedras lascadas e polidas), cerâmica e artefatos sobre
ossos e conchas.
Foram localizados dois sítios arqueoastronômicos, um “alinhamento de menires
retilíneos”, descrito pela primeira vez pelo engenheiro Teodoro Sampaio em 1879, e outro
alinhamento circular, denominado “cromlech”, ainda não descrito na bibliografia arqueológica
brasileira.
Próximos a esses alinhamentos foram localizadas três estruturas de pedras cuidadosamente
construídas em forma de muros com portais voltados para o leste, de alturas entre um e três metros,
que a comunidade local denomina de “Currais de Pedra” Outra estrutura com características de
habitação, denominada de “Casa de Pedra”, também foi reconhecida e deverá ser estudada em
detalhe

HISTÓRICO DA GESTÃO
Algumas avaliações preliminares apontam a necessidade de infra-estrutura de acesso aos
sítios arqueológicos e às cachoeiras, atrativos localizados em pontos que podem colocar em risco o
visitante pela falta de trilhas adequadas. Algumas cachoeiras que já recebem turistas apresentam
escadas de forma satisfatória e são tomados cuidados com a coleta de lixo, em função de sua
exploração por moradores da região.
É importante ressaltar que a Serra de Monte Alto está localizada em um vazio de unidades
de conservação do território baiano na área da Bacia do Rio São Francisco; isso vem somar à
necessidade de se adequar ao SNUC – Sistema Nacional de Unidades de Conservação (2003) que
prevê um mínimo de áreas de preservação e conservação que o Estado deve ter, ao Projeto de
Revitalização do Rio São Francisco. A CODEVASF vem trabalhando por meio de ações de
promoção do uso sustentável dos recursos naturais e a melhoria das condições sócio ambientais da
bacia. Garantir o crescimento de regiões com baixo Índice de Desenvolvimento Humano (IDH) é
meta da agenda social do Governo, em sintonia com a redução das desigualdades no país.
O Projeto da Unidade de Conservação da Serra de Monte Alto, sob a denominação de
Parque Arqueológico e Natural da Serra de Monte Alto vem cumprindo algumas etapas de
exigências legais para sua efetiva criação junto aos órgãos do Estado.
Foi realizado um levantamento e diagnóstico do potencial arqueológico e natural e sua
relevância como justificativa para a preservação e conservação da Serra (Silva et al., 2007). Este
relatório foi encaminhado à Secretaria do Meio Ambiente e Recursos Hídricos do Estado da Bahia
(SEMARH), e gerou uma reunião convocada pelo Secretário do Meio Ambiente, com a
participação dos prefeitos dos municípios da Serra, do Secretário de Recursos Hídricos, do
Superintendente de Florestas, Recursos Hídricos e Unidade de Conservação, de representantes da
Agência Nacional de Águas, do Comitê da Bacia do Rio Verde Grande, de Organizações da
sociedade Civil que atuam na região e da equipe de pesquisa.
No cumprimento dos encaminhamentos foram realizados seminários nos municípios do
entorno da Serra com a participação efetiva de aproximadamente 1.200 pessoas da comunidade, que
contou com apoio da PRISMA – Preservação da Serra de Monte Alto, organização com sede em
Guanambi e associados nas cinco cidades. Nesses seminários ficou clara a preocupação da
comunidade com a Serra de Monte Alto que se manifestou em prol da preservação dos mananciais
de águas e dos empreendimentos de turismo ecológico e cultural como fonte de geração de renda.
Fórum Internacional do Meio Ambiente - A conferência da Terra 248

Figura 1. Pontos de interesse da Serra. A: Pinturas rupestres; B: Cachoeira do Ribeirão São


Domingos; C: Casa de Pedra. D: Cachoeira do Brucunum.

No desdobramento desses seminários, vereadores dos cinco municípios articularam


projetos de lei com fins de tombamento do patrimônio natural e cultural da Serra. No momento já
foram aprovados os projetos dos municípios de Palmas de Monte Alto e de Guanambi. Nos demais
municípios os projetos tramitam em discussão nas Câmaras.
O projeto da Unidade de Conservação também foi apresentado na 8ª Reunião do Comitê da
Bacia Hidrográfica do Rio Verde Grande – CBH Verde Grande, ocorrida no dia 9 de outubro de
2007. Nessa ocasião obteve aprovação da Moção de Apoio à criação do Parque, documento que foi
encaminhado ao Governador do Estado da Bahia.
Finalmente na atual etapa dos trabalhos serão realizadas audiências públicas nos cinco municípios
que devem reunir as entidades da sociedade civil e o Ministério Público. Espera-se que resultem na
criação de Conselhos Municipais como garantia da gestão compartilhada da Unidade de
Conservação.

REFERENCIAS BIBLIOGRAFICAS
BERTOLDO, A. L. Comportamento estrutural dos Supergrupos São Francisco e Espinhaço e do
embasamento, entre as serras do Espinhaço Setentrional e as serras de Monte Alto (BA) e Central
(MG). Rio de Janeiro, 1993, Dissertação (Mestrado) – IG/UFRJ. 99p.
CAR – COMPANHIA DE DESENVOLVIMENTO E AÇÃO REGIONAL (BA). Perfil regional:
Serra Geral. Programa de desenvolvimento Regional sustentável – PDRS/Companhia de
Desenvolvimento e Ação Regional – Salvador, 2007.
CUELLAR, J. P. Nossa diversidade criadora. Brasília, UNESCO/MEC/Papirus. 1997.
GRAEFE, A. R.; KUSS, F. R.; VASKE, J. J. Visitor impact management – the planning framework.
Washington (DC): National Parks and Conservation Association, 1990.
POSSATI, J. A. Turismo e educação patrimonial. Disponível em:
http://www.educacaopatrimonial.com.br/turismo.htm Acesso em: 14/11/2006.
SNUC – Sistema Nacional de Unidades de Conservação da Natureza. Ministério do Meio
Ambiente. Lei n° 9.958, de 18 de julho de 2002; decreto n° 4.340, de 22 de agosto de 2002.
Brasília: MMA/SBF, 2003. 52p.
Fórum Internacional do Meio Ambiente - A conferência da Terra 249

CULTURA DO CONSUMO, SOCIEDADE INSATISFEITA E O FUTURO DO PLANETA

Altamir da Silva Souza


Professor do DCEAC e pesquisador do CEEMA, Fundação Universidade Federal do Rio Grande – RS.
asouza@vetorial.net

O presente ensaio é um recorde de idéias que constituem meu trabalho de tese e tem por
objetivo desvendar significados, interpretações e contribuir com a discussão de idéias para mitigar
os problemas que o consumo ávido tem ajudado a deflagrar, já que esse pode ser visto como “[...]
um grande avanço da civilização humana, quanto como o começo do fim” (SLATER, 2002, p. 36).
Segundo Meszáros (2003), na atual fase do capitalismo não se trata de ampliar o círculo
do consumo em função das necessidades humanas, mas de um processo de reprodução
ampliada do capital em que consumo e destruição são equivalentes funcionais.
Entretanto, como refere George (2002), o sistema econômico é um subsistema do mundo
natural e não o contrário, e no século XXI teremos de encontrar um equilíbrio entre a
preservação da liberdade de mercado e o controle do efeito social colateral que essa
liberdade não apóia, mas engendra. Caso contrário os custos pesarão mais que os
benefícios. Em outras palavras, a transformação da natureza num artefato global nos leva
a conclusão de que a natureza é a segunda natureza da sociedade (Santos, 2000c); e “[...]
a conversão do progresso em acumulação capitalista transformou a natureza em mera
condição de produção. Os limites desta transformação começam hoje a ser evidentes e os
riscos e perversidades que acarreta, alarmantes, bem demonstrados nos perigos cada vez
mais iminentes de catástrofe ecológica [...]” (SANTOS, 2000a, p. 34-35).
Para tanto, faço, inicialmente, uma narrativa histórica das origens e acontecimentos da
cultura do consumo, procurando apontar fatos e acontecimentos, que começam na modernidade até
chegar no período contemporâneo. Posteriormente, apresento algumas idéias sobre as necessidades
insaciáveis da sociedade insatisfeita, bem como de alguns mecanismos de produção de sentido e
criação de realidades em torno desse contexto. Finalmente, apresento os argumentos finais do
ensaio e relativos ao futuro do planeta.

UM RESGATE HISTÓRICO SOBRE ACONTECIMENTOS QUE MARCAM O SURGIMENTO


DA CULTURA DO CONSUMO
Em uma concepção moderna, o consumo pode ser definido como a criação, a compra e o
uso de produtos e serviços (McCRACKEN, 1986), podendo ser classificado em três grupos: bens e
serviços básicos (alimentação, vestuário e moradia; saúde, educação, transporte público, diversão
popular); bens e serviços correspondentes a um padrão intermediário de bem-estar
(eletrodomésticos, automóveis); e os bens e serviços conspícuos (automóveis de luxo, alimentos
requintados, turismo externo, vestuário sofisticado) (SODRÉ, 1984). Slater (2002, p. 16) explica:
O consumo é sempre e em todo lugar um processo cultural, mas “cultura do consumo” é
singular e específica: é o modo dominante de reprodução cultural desenvolvido no
Ocidente durante a modernidade [...] crucial, certamente, para a prática significativa da
vida cotidiana no mundo moderno; e, num sentido mais genérico, está ligada a valores,
práticas e instituições fundamentais que definem a modernidade ocidental, como a
opção, o individualismo e as relações de mercado. [...] A cultura do consumo não foi o
único modo de reprodução cultural operante nos últimos trezentos anos, nem é o único
que existe agora. [...] não é a única maneira de realizar o consumo e reproduzir a vida
cotidiana; mas é, com certeza, o modo dominante [...].
Com base nos estudos de vários autores, Slater (2002) descreve que até o século XVIII a
palavra consumo significava desperdício, esgotamento, consumição, esbanjamento, gasto (sem
ganho), uma perda (e não uma reprodução ou expansão) para os fluxos econômicos, morais e
políticos de valor. O consumo excessivo por parte das camadas inferiores era rotulado de luxúria e
considerado mais um problema de “ordem cósmica” (pecado contra a hierarquia natural) que de
estabilidade econômica, embora o consumo extravagante da elite pudesse representar poder. A
Fórum Internacional do Meio Ambiente - A conferência da Terra 250

demanda era entendida como algo que está dentro da economia, um aspecto chave dentro de um
circuito de recursos materiais à medida em que flui através de um corpo político. A riqueza do país
era identificada pela quantidade de ouro guardado pelo monarca, já o consumo de mercadorias
importadas tenderia a esgotar essa riqueza.
Alguns autores vêem a modernidade e o capitalismo como conseqüências da Revolução
Industrial; sendo assim, a produção seria o motor e a essência da modernização e a cultura do
consumo uma conseqüência da industrialização. Outros autores contestam essa posição, chamada de
“tendência produtivista”, e afirmam que houve uma Revolução do Consumidor, que antecedeu a
Revolução Industrial ou foi pelo menos um fator fundamental para o começo da modernização
ocidental. Se não fosse assim, a industrialização provavelmente não teria prosseguido numa base
capitalista sem a existência anterior de uma demanda efetiva para sua produção. Em contrapartida,
os defensores de uma visão econométrica entendem que simplesmente as pessoas já desejavam mais
coisas, por acreditarem na existência de uma demanda insaciável. Slater (2002), tendo o suporte dos
trabalhos de historiadores que revisaram a “tendência produtivista”, faz uma descrição dos
processos ocorridos a partir do século XVI, período que marca a primeira fase da era moderna, e
que podem ser divididos de acordo com três características principais: na Europa do século XVII,
como resposta à mercantilização, o surgimento de um novo “mundo de mercadorias” que
penetravam no cotidiano de mais classes sociais; o desenvolvimento e a disseminação da cultura do
consumo, motivada pela moda (destinada a um público consumidor ampliado) que afetou os desejos
ambiciosos ou invejosos dos consumidores; e o desenvolvimento de infra-estruturas, organizações e
práticas que tinham como alvo os novos tipos de mercados, o surgimento do varejo, da publicidade
e do marketing.
Slater (2002, p. 29) reconhece limitações nos trabalhos de autores que consideram a
Revolução do Consumidor precedente à Revolução Industrial e propõe uma posição
alternativa de que ambas são decorrentes de uma revolução comercial, “onde os
conceitos de troca, dinheiro, novos instrumentos financeiros e propriedade de bens
móveis, contratos e orientação para a exploração comercial de mercados cada vez
maiores e mais impessoais geraram um vasto leque de novas idéias e atividades
chamadas modernas”. Dessa forma, “é a negociação e o comércio (e não a produção ou
o consumo) que começam a tomar vulto no início da era moderna [...].”
É no século XVIII que a cultura do consumo se manifesta de forma reconhecível no ocidente
e diferenciada do resto do mundo, como uma cultura moderna, progressista, livre, racional, pois são
muitas as evidências de algum tipo de revolução do consumo tendo em vista o mundo abundante de
novas mercadorias derivadas dos descobrimentos e da exploração colonial.
O movimento iluminista influenciou fortemente o pensamento moderno. O iluminismo
baniu a tradição e a fé, valorizou a racionalidade e apostou na autonomia do sujeito. Ao mesmo
tempo, os ideais da Revolução Francesa, de 1789, – “Liberdade, Igualdade e Fraternidade” – foram
influenciados pelo pensamento iluminista. A Revolução Francesa marcou a chegada da segunda
fase da modernidade (BERMAN, 1987).
Slater (2002) refere que o consumidor e o consumismo são típicos do novo mundo e parte
integrante de sua construção, pois surge uma visão de mundo que não é mais governado pela
tradição, e sim pela abundância, produzido pela organização racional e pelo saber científico, e que
valoriza um indivíduo que é supostamente livre e racional, Os conceitos modernos de
individualismo, baseados nas práticas modernas da troca no mercado, varreram a possibilidade e a
conveniência de uma ordem de status fixa. O comércio configurava-se na oportunidade de o homem
exercer sua liberdade individual pela negociação de bens e troca de idéias. É através dele que o
consumo começa a ser redefinido ao final do século XVIII, passando a palavra consumo a designar
uma parte natural dos fluxos econômicos e a venda de mercadorias, como sendo necessárias e
importantes.
De acordo com Santos (2000a) a modernidade ocidental e o capitalismo são dois processos
diferentes e autônomos que tiveram sua dinâmica de desenvolvimento separadamente e
relativamente autônomas, mas que convergiram e se cruzaram.
Fórum Internacional do Meio Ambiente - A conferência da Terra 251

Na Grã-Bretanha, entre 1760 e 1860, acontece a primeira Revolução Industrial que alterou
profundamente a economia e a sociedade inglesa. E no início do século XIX a cultura do consumo
existia como um problema para os críticos sociais, uma ideologia para a população e uma realidade
para a burguesia. Esse século marca a expansão da industrialização para países como França,
Bélgica, Alemanha e Estados Unidos. As transformações econômicas e sociais da Revolução
Industrial norte-americana, entre 1860 e1870, são especialmente significativas para as histórias da
cultura do consumo e do marketing. Weber (1983) demonstra que o “espírito do capitalismo” tem
relação com a ética protestante, cujos valores propiciam a acumulação da riqueza. Para o autor, os
capitalistas de outras épocas também procuravam o lucro, mas eram aventureiros e desenvolviam
atividades de caráter irracional e especulativo. Foram determinadas atitudes da religião protestante,
somadas a outros fatores (como a ciência), que impulsionaram o desenvolvimento de uma busca
racional para a acumulação econômica.
Por outro lado, Campbell (2001) atribui ao movimento romântico papel fundamental ao
facilitar o desenvolvimento da Revolução Industrial e, mais do que isso, ao despertar o consumismo
e o caráter da economia moderna. O autor desafia a concepção defendida por outros cientistas
sociais de que foram os anunciantes que escolheram fazer uso do material “romântico” nas
propagandas para estimular o consumo. Foi o romantismo que sob o impacto de uma sociedade
materialista, promoveu idéias de autenticidade pessoal como resultado do emocional, do irracional,
do sensual, da imaginação e do natural, fazendo com que a cultura do consumo se tornasse
extremamente lúdica e séria. Tal situação ocorreu mesmo que, desde a metade do século XVIII até
meados do século XIX, o romantismo e seu conceito de cultura apresentassem reações contra a
sociedade industrial e comercial, no sentido de terem tornado a modernidade materialista, carente
de valores e verdades coletivas e autênticas.
Ao final do século XIX, a industrialização chega a países como Suécia e Japão. Quanto à
cultura do consumo, Slater (2002) diz que nesse período essa tomou duas direções contraditórias,
mas interligadas: de um lado, ela parece surgir da produção do espetáculo público e, de outro, o
consumismo aparece ligado à construção da domesticidade privada burguesa. Ainda, que até o
início do século XX, na história econômica a modernização aparece como um processo de
poupança, investimento e acumulação em escala social, apoiado numa ética puritana voltada para o
trabalho e no adiamento da gratificação do consumo, de um plano de poupança para a família
nacional. No entanto, como registra o autor, Marx afirmava que o capitalista exige que seus
operários poupem, somente seu próprio dinheiro, porque os vê como operários, mas o resto dos
operários ele os vê como consumidores.
Cabe enfatizar que é no início da modernidade que surge a cultura do consumo e aparecem
as primeiras manifestações de marketing, porém, conforme Bartels (1978), é somente no século XX
que esse passa a existir como uma área do conhecimento. Nesse século, também há o surgimento e
desenvolvimento tecnológicos no campo da comunicação que passaram a disseminar informações e
padrões de comportamento, encurtaram distâncias entre pessoas e invadiram países e lares
(HARVEY, 1992).
A cultura do consumo do início do século XX é convencionalmente descrita como o
consumo em massa, em contrapartida da produção em massa. O sistema fordista – com sua
industrialização pesada, sua rígida linha de montagem industrial e seu processo de trabalho com
operários taylorizados – começa a representar o padrão de acumulação capitalista dessa fase da
modernidade. Harvey (1992), por sua vez, atribui ao modo de acumulação fordista a criação de
expectativas que não podiam ser atendidas por todos aqueles que não conseguiam acesso ao
trabalho privilegiado. De acordo com Slater (2002), a produção em massa e a participação em
massa no consumo assinalam o verdadeiro nascimento da cultura do consumo, e a década de 1920
foi provavelmente a primeira a proclamar uma ideologia generalizada de riqueza, uma ligação
fortíssima entre o consumo cotidiano e a modernização.
Porém, Slater (2002), sintetizando as posições de economistas e sociólogos, demonstra que
nesta época a cultura do consumo era estimulada a absorver o excedente de produção, uma vez que
a quantidade de valor produzida era maior do que a demanda efetiva disponível para absorvê-lo. O
Fórum Internacional do Meio Ambiente - A conferência da Terra 252

desequilíbrio gerado requeria níveis extraordinários de desperdício (o chamado “consumo


improdutivo”). Assim, as mudanças no design, nas embalagens e nas propagandas serviam para
acrescentar custos improdutivos e extraordinários à produção, como forma de valorizar a forma em
detrimento ao valor de uso dos produtos e, ao mesmo tempo, promover a demanda efetiva e
eliminar a concorrência de mercado – controlando o teor cultural dessa demanda.
No que diz respeito à cultura do consumo nas décadas de 1950 e 1960, Slater (2002, p. 20)
lembra que “a prosperidade e uma vida boa significavam a capacidade de não ficar atrás dos
vizinhos, [...] [mas ao mesmo tempo havia o sentimento] do consumo perturbadoramente explosivo
e hedonista entre os novos grupos sociais”. A prosperidade econômica criou necessidades
insaciáveis e moralmente duvidosas, uma crise de valores a respeito da ética do trabalho, uma
bifurcação do desejo entre o consumo respeitável familiar e o consumo hedonista, amoral, não
familiar.
A superprodução de produtos e, conseqüentemente, o consumismo passam a ser questões
preocupantes na década de 1960 nos EUA. Packard (1960) descreve esse período como sendo da
“estratégia do desperdício”, faz severas críticas às estratégias usadas pelas empresas para estimular
o crescimento, e manifesta sua preocupação com relação aos problemas que essa forma de fazer
negócios traria ao meio ambiente.
A partir dos anos de 1970 o modelo de acumulação fordista começa a dar sinais de
esgotamento e revela-se incapaz de continuar promovendo o crescimento econômico capitalista.
Fatores políticos, culturais e econômicos explicam o esgotamento desse modelo. A crise do
petróleo, de 1973, dá início a um período de tensão na economia mundial, caracterizado por:
inflação, desemprego, dívidas públicas, capacidade ociosa no setor produtivo, queda na
produtividade, aumento da competição internacional. A sociedade de consumo, que até então era
vista como parte de um sistema capaz de superar crises econômicas, entra também em colapso. Esse
momento é chamado de pós-fordismo ou modelo de acumulação flexível. Outros entendem que é o
começo de um novo tipo de sociedade que recebe generalizações como: sociedade pós-industrial,
sociedade do conhecimento, sociedade da informação, economia globalizada, capitalismo tardio.
O capitalismo tardio que em Jameson (1996) é uma expressão que funciona como espécie de
signo, que traz uma carga de intenções e conseqüências que é usada como sinônimos adequados de
capitalismo multinacional, sociedade do espetáculo ou da imagem, capitalismo da mídia, ou o pós-
modernismo. Como, também, tem a ver com as empresas transnacionais, a nova dinâmica
vertiginosa de transações bancárias internacionais e das bolsas de valores, as novas formas de
mídia, computadores e automação, a fuga da produção para áreas desenvolvidas do Terceiro
Mundo, além das conseqüências sociais mais conhecidas (incluindo a crise do trabalho). Esse
estágio do sistema capitalista [...] não assumiu as formas mais antigas e brutais de exploração
geográfica e reivindicações territoriais, mas, sim, a saturação por mercadorias e a extraordinária
simultaneidade informacional pós-geográfica e pós-espacial [...] (JAMESON, 2004, p. 81).
A produção flexível além de ser rápida e barata, possibilitou que o preço unitário da
produção personalizada de pequenas quantidades não fosse maior do que as quantidades muito
grandes de artigos padronizados. Com isso, a cultura do consumo passa a ter relação com a
fragmentação e a diversificação, tanto no consumo quanto na produção (SLATER, 2002). A
fragmentação tem afetado o mercado e o marketing contemporâneo e é um aspecto significativo
para definir o consumidor na pós-modernidade, pois a cada nova idéia, mensagem, símbolo,
imagem, conceito que o marketing propaga é uma nova oportunidade para que o “eu” seja alterado
e novos hábitos e comportamentos sejam estabelecidos (FIRAT e DHOLAKIA, 1998).
A década de 1980, como afirma Santos (2000a) é a década do pós-marxismo, que dentre
outras tantas características, é momento do sistema econômico neoliberal, do Estado mínimo, das
privatizações, da luta pela competitividade internacional e da globalização, da mercantilização das
relações sociais; o fortalecimento sem precedentes da cultura de massas e a celebração nela de
estilos de vida e de imaginários sociais individualistas, privatistas e consumistas. Complementando
tal caracterização, Slater (2002) registra que a cultura do consumo dessa década é marcada pela
exploração visual e verbal dos objetos, e afinada com os signos, imagens e com a propaganda. É o
Fórum Internacional do Meio Ambiente - A conferência da Terra 253

auge da estetização das mercadorias e de seu ambiente (propagandas, embalagens, vitrines, designs
de produto). Fato esse, que de acordo com o autor, também não representava nada de novo, uma vez
que essas manifestações já apareciam desde os tempos do capitalismo comercial, mas eram motivo
de reflexão na década de 1980. Era o anúncio, também, da subordinação da produção ao consumo
sob a forma de marketing, e da cultura do consumo orgulhosamente superficial e profundamente
voltadas às aparências. Nesse contexto, Slater (2002, p. 19) descreve que “O consumidor era o herói
do momento, não apenas como provedor do poder aquisitivo que serviria de combustível para o
crescimento econômico [...]”. Como cidadão moderno, sua identidade é forjada de forma plural,
maleável, lúdica, em um processo governado pelo jogo da imagem, do estilo, do desejo e dos
signos. Até mesmo no Brasil da “década perdida”, da indústria obsoleta, de produtos sem
competitividade internacional e da hiperinflação, o consumidor recebeu o status de herói. Em 1986,
o presidente José Sarney, em defesa do Plano Cruzado, convocou a população para que ajudassem a
fiscalizar os preços que haviam sido congelados (TASCHNER, 2000).
A comunicação esteve presente em todos os países, sociedades, culturas e civilizações, mas
na sociedade pós-moderna a comunicação é mais intensa e torna o mundo mais próximo e universal.
(LYOTARD, 1998). De maneira particular, a televisão é uma ótima oportunidade de “personalizar o
impessoal,”, revelar tendências e criações dos “produtores de conceitos” (SLATER, 2002) e dos
“manipuladores de signos” (BAUDRILLARD, 1995). Harvey (1992) refere que a televisão, como
um produto do capitalismo avançado, tem de ser vista no contexto da promoção de uma cultura do
consumismo. Pois “[...] a mídia não é apenas um meio poderoso de criar e fazer circular conteúdos
simbólicos, mas possui um poder transformador ainda pouco estudado – e, talvez, ainda
subestimado – de reestruturação de espaços de interação propiciando novas configurações aos
esforços de produção dos sentidos” (SPINK e MEDRADO, 2004, p. 58). O que é especialmente
significativo em um país como o Brasil de “teledependentes” (ERAUSQUIN, MATILLA e
VAZQUEZ, 1983).
Na década de 1990 o processo de globalização econômica adquire maior intensidade. No
Brasil, o Governo Collor deflagra o processo de privatização. Começam as negociações para a
consolidação do Mercosul, o câmbio e as importações são liberadas e uma série de produtos
importados invade o País. O consumidor brasileiro pode, assim, na diversidade de mercadorias
globais produzidas, com o objetivo de estimular o consumo efêmero e volátil, suprir e satisfazer
necessidades reais e imaginárias múltiplas, que podem ser descartadas com um piscar de olhos
(ARAÚJO, 2000).
A exacerbação capitalista é mantida com a chegada do século XX e os sinais da hiper-
competição passam a ser mais evidentes. O presente é cada vez mais efêmero e cercado de rápidas
transformações, especialmente pelo frenesi da inovação tecnológica. A expectativa futura é a do
próximo evento, e quando este chega já é hora de uma nova expectativa. A descrição de Jameson
(1996, p. 30-31).sobre a década passada continua atual para o momento: “O que ocorreu é que a
produção estética hoje está integrada à produção das mercadorias em geral: a urgência desvairada
da economia em produzir novas séries de produtos que cada vez mais pareçam novidades (de
roupas a aviões), com um ritmo de turn over cada vez maior [...]. (JAMESON, 1996, p. 30-31).
Uma outra marca distintiva e significativa do novo século, que também é fruto do
desenvolvimento tecnológico, é o excesso de informação que está a disposição de humanos e
organizações. Nesse sentido, em muitas instâncias da vida, o que se tem são apenas dados que 9pelo
excesso) não se transformam em informações (SOUZA, 2005).
2 As necessidades insaciáveis na sociedade insatisfeita
Segundo Heller (1998), Karl Marx, em sua teoria das necessidades, descreve a satisfação da
necessidade como condição sine qua non para qualquer troca, e o valor de troca se dá pelo
significado de seu valor de uso. O capitalista valoriza suas mercadorias (bem como a força-de-
trabalho) não por suas qualidades específicas (valor de uso), mas pelo valor econômico abstrato
(valor de troca). Mas, para que esse valor econômico se configure, as mercadorias precisam ter
valor de uso para alguém e esse precisa ter dinheiro para comprá-la. O valor de uso precisa
satisfazer necessidades: as necessidades da produção da mais-valia e, por conseguinte, do capital.
Fórum Internacional do Meio Ambiente - A conferência da Terra 254

De modo que tais necessidades de crescimento sejam atendidas o sistema capitalista precisa
produzir mais do que o suficiente.
Na análise de Campbell (2001), a tendência generalizada de considerar normal, natural ou
racional o fato do ser humano contemporâneo ter uma fome ilimitada, incessante e ininterrupta por
bens é produto da etnocentricidade e da ausência de uma investigação histórica e merece reflexão.
Uma vez que tal condição não recebe qualquer apoio da história ou da antropologia.
Contrariamente, o que pode ser identificado, nas sociedades não-alfabetizadas e pré-industriais, é o
consumo amplamente orientado pelo costume e pela tradição, e um conjunto tradicional de
necessidades familiares, estáveis e limitadas. Assim, como refere Marx, as necessidades dependem
da historicidade, da tradição e da cultura.
A busca interminável de necessidades do consumidor contemporâneo é, segundo Campbell
(2001), um enigma a ser desvendado. Conforme o autor, a insaciabilidade não se limita à sociedade
atual, uma vez que há indícios de que os seres humanos, em todas as culturas, são capazes de
desenvolver inclinações. O autor refere que causa admiração o fato de que raramente é possível a
um habitante de sociedade moderna, não importa quão privilegiado ou opulento seja, declarar que
não esteja querendo nada. “Como é possível as necessidades aparecerem com tamanha constância, e
de uma forma tão inexaurível, especialmente quando se referem, tipicamente, a novos produtos e
serviços?” (ibid, 2001, p. 59). Tal propensão, descrita por alguns observadores como uma
“revolução de frustrações ascendentes”, leva o consumidor a nunca fechar o hiato entre necessitar e
alcançar. O autor diz que pode haver a objeção de que a origem do consumismo moderno esteja na
inventividade do homem moderno que faz com que surjam invenções e produções sem fim de
novos produtos e serviços. Essa possível verdade esbarra no fato que nem todas as novas invenções
são destinadas a atender as necessidades existentes, mas sim em atender novas necessidades. Ainda
segundo Campbell, da mesma forma que a criação de necessidades constitui-se em um enigma, a
extinção contínua das necessidades é quase um outro enigma, “pois um corolário natural de
necessitar incessantemente é a alta taxa de obsolescência (e, por conseguinte, da necessidade) do
produto. Como é que as necessidades partem tão subitamente, e tão facilmente, quanto chegam?”
(ibid, 2001, p. 60).
Conforme Slater (2002, p. 36) “a idéia de necessidade insaciável está intimamente ligada às
noções de modernização cultural”. Para o autor nessa condição os desejos das pessoas se tornam
cada vez mais sofisticados, refinados, imaginativos e pessoais, assim como à aspiração de ascender
social e economicamente. O consumo insaciável também pode ser explicado pela idéia de Heller e
Fehér (1998) da “sociedade insatisfeita”. Ou seja, essa condição sugere que a forma moderna de
criação, percepção e distribuição de necessidades reforça a insatisfação, independente de alguma
necessidade concreta ser ou não de fato satisfeita. Também sugere que uma insatisfação geral atua
como uma vigorosa força motivacional na reprodução das sociedades modernas, pois “[...] se as
pessoas deixassem de se sentir insatisfeitas com sua sorte – sua riqueza material, posição social,
relações pessoais, conhecimento e desempenho, de um lado, e, do outro, suas instituições,
organizações sociais e políticas, e a condição geral de tudo no mínimo – a sociedade moderna não
mais poderia reproduzir-se” (HELLER e FEHÉR, 1998, p. 29).
Segundo Baudrillard (1995, p 59) a “análise da lógica social do consumo [...] não é a da
apropriação individual do valor de uso dos bens e dos serviços – lógica de produção desigual, em
que uns têm direito ao milagre e outros apenas às migalhas do milagre –; também não é a lógica da
satisfação, mas a lógica da produção e da manipulação dos significantes sociais”. Baudrillard vê o
consumo como um processo de diferenciação social e descreve que o mesmo organizado em torno
de um sistema de signos formata o mundo moderno como “sociedade de consumo”. O autor entende
que é através da lógica da diferenciação que podemos entender o consumo ilimitado e a insatisfação
definitiva a ele associada nos dias de hoje. Diferenciação essa que é perversa, pois os indivíduos ao
procurarem se diferenciar uns dos outros (de forma inconsciente), restauram a diferença.
No Brasil, onde nem mesmo o acesso aos bens e serviços básicos é uma realidade de toda a
população, quanto mais àqueles relativos a um padrão de consumo de bem-estar intermediário, o
Fórum Internacional do Meio Ambiente - A conferência da Terra 255

estímulo ao consumo e, naturalmente, a diferenciação estão à disposição, se não de todos, pelo


menos da esmagadora maioria da população (SOUZA, 2005).
Baudrillard (1991) entende que a mentalidade individualista e consumista do ser humano é
formada pela manipulação e a grande variedade dos objetos que implicam a “livre” possibilidade de
escolha, mas “livre” no sentido de não ser possível deixar de escolher. Nesse mesmo sentido, Santos
(2000c) diz que a ênfase em assegurar materialmente o aumento de escolhas determina que,
paralelamente a esse, seja observada a diminuição da capacidade de escolher.
Como o ser humano não existe além da linguagem (WITTGENSTEIN, 1996) e só possui
força e expressão na coletividade, sendo reduzido a um componente social (FOUCAULT, 2004),
acaba por ficar preso aos constantes e renovados condicionantes criados pelas estratégias de
marketing das empresas e projetam nelas seus sonhos, esperanças, angústias e frustrações. Além
disso, o consumidor contemporâneo, sem possibilidade de construir sua identidade seja através do
passado, ou com base em uma perspectiva futura, constrói a sua “identidade do momento” baseado
na linguagem daquilo que é moda, do consumo de luxo, da marca, do efêmero da vida local e
global, até mesmo porque as posições políticas ou religiosas não são mais determinantes
(LIPOVETSKY, 1989).
Nesse contexto, o consumidor contemporâneo passa a ser vulnerável e se encontra à mercê
do discurso do marketing e, asssim, “a idéia do consumidor exigente só é parcialmente aceitável e
nas condições de produção de sentidos estabelecidas pelo marketing e pela cultura do consumo
vigente [...]” (SOUZA, 2005, p. 162). Porém, é a força conjunta e inter-relacionada da linguagem
do marketing e de outras áreas da gestão (produção, finanças, gestão de pessoas, sistemas de
informação e etc) que são produzidos sentidos e realidades que moldam a cultura do consumo atual
(ibid, 2005).
Penso que, na sociedade do “ter” (FROMM, 1976) que também é do “parecer” (DEBORD,
1997), é compreensível que os “turistas” (ricos) e os “vagabundos” (pobres), de Bauman (1999),
busquem sua formas de consumir e participar do jogo.
3 E o futuro...
A idéia de expansão permanente do sistema capitalista dá sinais de esgotamento. Mas, o
capitalismo “não é simplesmente uma doutrina econômica e uma realização intelectual, mas um
poder revolucionário e milenar, além de uma força de esperança, assim como foi o comunismo”
(GEORGE, 2002, p. 26). E, como refere Slater (2002), a soberania do consumidor é uma imagem
extremamente sedutora, e o consumo, um campo privilegiado de autonomia, de significado, de
subjetividade, de privacidade e de liberdade humana. Assim, hoje, o direito de o ser humano
consumir livremente é inquestionável, no entanto essa é uma condição levanta dúvidas e
manifestações críticas. O autor refere que
[...] a privacidade da escolha individual parece contradizer a solidariedade, a autoridade
e a ordem social. Se os indivíduos definem seus próprios interesses, como a sociedade
pode se manter coesa? Se a escolha é governada por preferências individuais privadas, o
que acontece aos valores culturais duradouros? Em muitos aspectos, essa é a maior
preocupação dos críticos da cultura do consumo, tanto os conservadores quanto os
radicais: se não podemos julgar ou regular os desejos dos indivíduos, como podem eles
trabalhar para constituir uma vida coletiva boa, progressista ou autêntica? (ibid, 2002, p.
36)
No futuro será possível aceitar o consumo livre e ilimitado?.Seremos obrigados a romper
com a atual cultura do consumo e a mudar o discurso e as práticas a respeito de como os seres
humanos podem/devem atender às suas necessidades?
A atual cultura do consumo tem intima relação com os problemas de exclusão, violência,
infelicidade, stress, depressão, poluição, transporte, catástrofes ambientais, redução das reservas de
água doce da terra, diminuição da camada de ozônio, mudanças climáticas, entre outros. Entendo
que a busca de caminhos alternativos deva ser pensada mediante a articulação ético-política
(ecosofia), de Guattari (1990), entre três registros ecológicos (o do meio ambiente, o das relações
Fórum Internacional do Meio Ambiente - A conferência da Terra 256

sociais e o da subjetividade humana). Pois, conforme o autor, precisamos pensar em outras formas
de poluição, como a poluição da subjetividade, que atualmente é exercida pela indústria cultural.
Wittgenstein (1996) explica que não existe significação e conhecimento anteriores ao uso de
linguagem, essa é um fenômeno social e a vida social se dá em termos de “jogos de linguagem”, por
isso a exatidão da linguagem é um mito filosófico. Usamos a linguagem – composta por sinais,
discursos, signos e imagens – para compor uma narrativa, produzir uma histórica, dar sentido à
vida, construir a realidade social, fundamentar a fala, e fornecer as bases e as regras para o
comportamento das pessoas. Nesse contexto, considero que é importante buscar novas linguagens,
novas formas de pensamento relacionadas a outras visões de mundo que possam (re)construir a
sociedade, pois “por mais que o discurso seja aparentemente bem pouca coisa, as interdições que o
atingem revelam logo, rapidamente, sua ligação com o desejo e com o poder”. (FOUCAULT, 2000,
p. 10). As práticas discursivas condicionam, controlam e delimitam a forma de ver os fatos, de
conceituar as coisas e as práticas sociais. Uma prática discursiva “é um conjunto de regras
anônimas, históricas, sempre determinadas no tempo e no espaço, que definiram, numa dada época,
e para uma determinada área social, econômica, geográfica ou lingüística, as condições de exercício
da função enunciativa” (FOUCAULT, 2004, p. 147-148).
A busca de caminhos alternativos, em tempos de globalização, exige encontrar alternativas
para tudo aquilo que não é global, e sim, local. (SANTOS, 2000b), assim como, é uma tarefa no
sentido de identificar e conciliar diferentes interesses (sociais, econômicos, políticos, ambientais)
que muitas vezes são incompatíveis entre si. Além disso, é preciso considerar que “é a condição
presente quem impõe condições ao pensamento pensado do presente e o impele a despensar-se e a
repensar-se” (SANTOS 2000a, p. 33).
Diante da complexidade da situação, como recomenda Santos (2003), precisamos de uma
produção científica mais multicultural, e resultante dos esforços e saberes de acadêmicos de
diferentes áreas (e partes do mundo) misturados aos saberes do senso comum, para que as soluções
viabilizem o futuro do planeta.

REFERÊNCIAS BIBLIOGRÁFICAS
ARAÚJO, C. M. Globalização consumo e cidadania o papel do movimento consumidor na era
globalizada, In: XXIV Enanpad. Anais... Administração Pública. Florianópolis: ANPAD, 2000. em
CD-ROM.
BARTELS, R. El desarrollo del pensamiento en mercadotecnia. México: Compañia Continental,
1978.
BAUDRILLARD, J. Da sedução. São Paulo: Papirus, 1991.
BAUDRILLARD, J. A sociedade de consumo. Lisboa: Edições 70, 1995.
BAUMAN, Z. Globalização: as conseqüências humanas. Rio de Janeiro: Jorge Zahar Editora
Ltda., 1999.
BERMAN, M. Tudo que é sólido desmancha no ar: a aventura da modernidade. São Paulo: Cia das
Letras, 1987.
CAMPBELL, C. A ética romântica e o espírito do consumismo moderno. Rio de Janeiro: Rocco,
2001.
DEBORD, G. A sociedade do espetáculo. Petrópolis: Cultrix, 1997.
ERAUSQUIN, M. A.; MATILLA, L.; VASQUEZ, M. Os teledependentes. São Paulo: Summus,
1984.
FIRAT, A. F., DHOLAKIA. N. Consuming people: from political economy to theaters of
consumption. London: Routledge, 1998.
FOUCAULT, M. A Ordem do Discurso. 7ª ed., São Paulo: Loyola, 2000.
FOUCAULT, M. A arqueologia do saber. 7ª. ed., Rio de Janeiro: Forense Universitária, 2004.
FROMM, E. Ter ou ser? 4ª ed., Rio de Janeiro: Guanabara Koogan, 1976.
GEORGE, S. O Relatório Lugano. São Paulo: Boitempo, 2002.
GUATTARI, F. As três ecologias. Campinas: São Paulo, 1990.
HARVEY, D. Condição pós-moderna: uma pesquisa sobre as origens da mudança cultural. 7ª ed.,
Fórum Internacional do Meio Ambiente - A conferência da Terra 257

São Paulo: Edições Loyola, 1992.


HELLER, A. Teoria de las necessidades em Marx. 3ª ed., Barcelona: Ediciones Peninsula, 1998.
HELLER, A.; FEHÉR, F. A condição política pós-moderna. Rio de Janeiro: Civilização Brasileira,
1998.
JAMESON, F. Pós-modernismo: a lógica cultural do capitalismo tardio. São Paulo: Ática, 1996.
JAMESON, F. Espaço e imagem. 3ª ed., Rio de Janeiro: Editora UFRJ, 2004.
LIPOVETSKY, G. O império do efêmero. São Paulo: Companhia das Letras, 1989.
LYOTARD, J. F. A condição pós-moderna. 5ª ed. Rio de Janeiro: José Olympio, 1998.
MANDEL, E. O capitalismo tardio. São Paulo: Abril Cultural, 1982.
MATTOS, P. C. L. Teoria administrativa e pragmática da linguagem perspectivas para problemas
que afligem as relações entre acadêmicos e consultores, educadores e educandos. In: XXV
Enanpad.. Anais ... Ensino e Pesquisa em Administração, Campinas: ANPAD, 2001. em CD-ROM.
McCRACKEN, G. D. Culture and consumption: a theoretical account of the structure and
movement of the cultural meaning of consumer goods. Journal of Consumer Research. v. 13, Jun.,
1986.
MÉSZAROS, E. O século XXI: socialismo ou barbárie. Campinas: Boitempo Editorial. 2003.
PACKARD, V. Estratégia do Desperdício. São Paulo: IBRASA, 1965.
SANTOS, B. S. Pela Mão de Alice: O Social e o Político na Pós-modernidade. 7ª ed., São Paulo:
Cortez, 2000a.
SANTOS, B. S. Introdução a uma ciência pós-moderna. 3ª ed., Rio de Janeiro: Gral, 2000b.
SANTOS, B. S. A crítica da razão indolente: contra o desperdício da experiência. 2ª ed., São Paulo:
Cortez, 2000c.
SANTOS, B. S. Dilemas do nosso tempo: globalização, multiculturalismo e conhecimento
entrevista concedida a GANDIN, L A. e a HYPOLITO, M., Currículo sem Fronteiras, v.3, n.2, pp.
5-23, Jul./Dez., 2003b. Disponível em: http://www.curriculosemfronteiras.org 5. Acesso em 22 de
mar. 2004.
SLATER, D. Cultura do consumo & modernidade. São Paulo: Nobel, 2002.
SODRÉ, M. O monopólio da fala; função e linguagem da televisão no Brasil. 4ª ed. Petrópolis:
Vozes, 1984.
SOUZA, A. S. Sobre a construção da insatisfação: reflexões críticas sobre o discurso do marketing.
Tese de Doutorado. Apresentada ao Programa de Pós-Graduação em Engenharia de Produção,
UFSC, 2005.
SPINK, M. J.; MEDRADO, B. Produção de sentidos no cotidiano: uma abordagem teórico-
metodológica para análise de práticas discursivas, p. 41-61; In: SPINK, M. J. (org.) Práticas
discursivas e produção de sentidos no cotidiano: apresentações teóricas e metodológicas, 3ª ed.,
São Paulo: Cortez, 2000.
WEBER, M. A ética protestante e o espírito do capitalismo. 3ª ed., São Paulo: Pioneira, 1983.
WITTGENSTEIN, L J. J. Investigações filosóficas. São Paulo: Nova Cultura, 1996.
Fórum Internacional do Meio Ambiente - A conferência da Terra 258

O ZONEAMENTO ECOLÓGICO-ECONÔMICO: INSTRUMENTO TÉCNICO E


POLÍTICO PARA A GESTÃO DO MEIO AMBIENTE

Sergio Fernandes Alonso


Universidade Federal da Paraíba, CCEN, Departamento de Geociências. salonsoufpb@yahoo.com.br

O objetivo deste texto é discutir o ZEE como instrumento técnico e político para a gestão
do meio ambiente. O ZEE surge num contexto paradigmático novo denominado de
“Desenvolvimento Sustentável” que preconiza uma relação sociedade-natureza fundamentada numa
integração harmônica entre o desenvolvimento sócio-econômico e a conservação da natureza. A
efetivação desse modelo enquanto prática já é uma realidade, uma vez que na atualidade, os
próprios avanços tecnológicos potencializam a utilização do zoneamento como instrumentos
técnicos de informação sobre o território. Para a conceituação de zoneamento exige um conjunto de
entendimentos prévios, já que sua aplicação em relação a um determinado espaço geográfico exige
método, reflexão e estratégia própria. Os princípios do zoneamento, quando aplicável a uma
determinada área, necessitam de uma multidisciplinaridade plena, devido à pretensão de identificar
as potencialidades específicas ou preferenciais de cada um dos sub-espaços ou sub-áreas do
território em estudo. Para que sejam estabelecidas as bases desse processo, dentro de uma
conjuntura, é necessário realizar uma pesquisa que apreenda a vocação de todos os sub-espaços que
compõem um certo território e efetue o levantamento de suas potencialidades econômicas a partir
de um enfoque ecodesenvolvimentista. Em essência, o objetivo do processo de zoneamento, numa
primeira instância, é realizar classificações do espaço, baseadas em fatores ecológicos, econômicos
e sociais e, através do cruzamento dessas duas ordens de fatores, identificar diferentes zonas em
regiões, com sua problemática específica, que serão objeto de propostas e diretrizes. Numa segunda
instância, o processo de zoneamento, deve ocorrer com uma escala de maior detalhamento, e visa à
organização do espaço no interior de cada unidade, com indicação de áreas de preservação e das
áreas deliberadas à ocupação, obedecendo aos princípios de uma política ambiental voltada para
assegurar a eficiência produtiva dos espaços e preservar os fluxos vivos da natureza.
Palavras-Chaves: Zoneamento Ecológico-Econômico, Instrumento Técnico e Político, Gestão do
Meio Ambiente

The purpose of this text is to discuss the EEZ as a technical and political instrument for the
management of the environment. The EEZ appears in a new paradigmatic context called
"Sustainable Development" that praises a relationship society & nature based on the harmonic
integration between socio-economic development and conservation of the nature. The
accomplishment of this model as a practice is already a reality, because, nowadays, the
technological advances strengths the use of the zoning as instrument of technical information on the
territory. The zoning conceptualization demands a set of previous agreements, since its application
to a determined geographic space demands method, reflection and a proper strategy. The principles
of zoning, when applicable to a determined area, need a full multidisciplinary approach, due to the
aim of identifying the specific or preferential potentialities of each one of the sub-spaces or sub-
areas of the territory. For establishing the bases of this process, inside of a conjuncture, it is
necessary to carry through a research that apprehends the vocation of all the sub-spaces that
compose a certain territory and to survey its economic potentialities from an ecodevelopment
approach. In essence, the objective of the zoning process, in a first approach, is to accomplish
classifications of the space, based in ecological, economic and social factors, through the crossing
of these two orders of factors, to identify different zones in regions, with its specific problems, that
will be object of proposals and lines of action. In a second moment, the zoning process, must occur
with a scale of bigger detailing, and aims the organization of the space in the interior of each unit,
with indication of preservation areas and of the areas consigned to the occupation, obeying the
principles of an environmental politics to assure the productive efficiency of the spaces and to
preserve the living flows of the nature.
Fórum Internacional do Meio Ambiente - A conferência da Terra 259

Key-Words: Ecologic-Economic Zoning, Technical and Political Instrument, Management of the


Environment

Nas últimas décadas o Brasil conheceu a implementação, - pela atuação governamental


centralizada, em forma de programas e projetos - de modelos de desenvolvimento que buscavam
otimizar uma relação custo benefício favorável aos lucros em curto prazo, sem se preocupar com os
efeitos prejudiciais, a médio e longo prazo, à sociedade e ao ambiente. A inadequação do modelo
ancorado em bases técnicas centralizadas ficou patente uma vez que apresentava crescentemente
dificuldades em controlar as variáveis econômicas políticas e ambientais do território. Em razão das
mudanças de rumo ao nível internacional, foi necessária uma reorientação na forma de
planejamento.
Trata-se de recomendações internacionais cuja orientação tem por base o “novo padrão de
desenvolvimento sustentável, decorrente da revolução científico-tecnológica e da crise ambiental,
que transforma a natureza em um bem escasso”. (Becker, 1988, p 3). O modelo de desenvolvimento
denominado de “Desenvolvimento Sustentável” preconiza uma relação sociedade-natureza
fundamentada numa integração harmônica entre o desenvolvimento sócio-econômico e a
conservação da natureza. A efetivação desse modelo enquanto prática já é uma realidade, uma vez
que na atualidade, os próprios avanços tecnológicos potencializam a utilização do zoneamento
como instrumentos técnicos de informação sobre o território.
Antes de prosseguir, considera-se relevante compreender em maior profundidade,
expressões do tipo “desenvolvimento sustentável”, “zoneamento”, “ecológico-econômico”, uma vez
que, até certo ponto, a sua utilização, em vários segmentos da sociedade atual, generaliza o seu
verdadeiro sentido, assim como deixa superficial o seu conteúdo.
“Desenvolvimento Sustentável é um conceito surgido em 1987 de um relatório produzido
por uma comissão composta de 21 países membros da ONU e presidida pela Senhora Gro Harlem
Brundtland (Primeira-Ministra da Noruega), que pesquisou a situação de degradação ambiental e
econômica do planeta. Este relatório ficou conhecido como Relatório Brundtland ou ”Nosso Futuro
Comum”.
As propostas e análises desse relatório partem do pressuposto de que seria possível e
desejável conciliar crescimento econômico com conservação ambiental, algo até então tido como
incompatível. Em suma, o “desenvolvimento sustentável” pressupõe o crescimento para todos e
cogita dos direitos das gerações futuras de ter acesso aos recursos da natureza para sua
sobrevivência. Corresponde, enfim, da determinação de novas prioridades pela sociedade, uma nova
ética do comportamento humano e uma recuperação do primado dos interesses sociais coletivos. Ou
seja, de um conjunto de mudanças-chave na estrutura da produção e consumo, invertendo o quadro
de degradação ambiental e miséria social a partir de suas causas.
O desenvolvimento sustentável enquanto modelo propõe uma regulação no uso do
território segundo três princípios básicos: a eficácia, referente à nova racionalidade de poupança de
recursos, e a incorporação de informação e tecnologia nos produtos e processos; a valorização da
diferença referente à identificação e potencialização das vantagens competitivas de cada território; a
descentralização, constituindo uma nova forma de governo em parceria, expressão de uma nova
relação entre público-privado.
Quanto ao “zoneamento”, o conceito exige um conjunto de entendimentos prévios, já que
sua aplicação em relação a um determinado espaço geográfico exige método, reflexão e estratégia
própria. Os princípios do zoneamento, quando aplicável a uma determinada área, necessitam de
uma multidisciplinaridade plena, devido à pretensão de identificar as potencialidades específicas ou
preferenciais de cada um dos sub-espaços ou sub-áreas do território em estudo. Para que sejam
estabelecidas as bases desse processo, dentro de uma conjuntura, é necessário realizar uma pesquisa
que apreenda a vocação de todos os sub-espaços que compõem um certo território e efetue o
levantamento de suas potencialidades econômicas a partir de um enfoque ecodesenvolvimentista.
O principal objetivo do processo de zoneamento, numa primeira instância, é realizar
classificações do espaço, baseadas em fatores ecológicos, econômicos e sociais e, através do
Fórum Internacional do Meio Ambiente - A conferência da Terra 260

cruzamento dessas duas ordens de fatores, identificar diferentes zonas em regiões, com sua
problemática específica, que serão objeto de propostas e diretrizes. Numa segunda instância, o
processo de zoneamento, deve ocorrer com uma escala de maior detalhamento, e visa à organização
do espaço no interior de cada unidade, com indicação de áreas de preservação e das áreas
deliberadas à ocupação, obedecendo aos princípios de uma política ambiental voltada para
assegurar a eficiência produtiva dos espaços e preservar os fluxos vivos da natureza. IBGE (1986)
apud Crepani et al (1996).
O conceito de zona “ecológico-econômica” sintetiza duas dimensões básicas: a ecológica,
que reflete as limitações e potencialidade de uso sustentado dos recursos naturais e a econômica,
que manifesta as aspirações de desenvolvimento humano das comunidades que habitam e retiram
seu sustento do território. Usualmente utilizada como sinônimo de região, a zona ecológico-
econômica possui alguns atributos que lhe são próprios:
• Exprime o conceito geográfico de zonalidade, isto é, uma certa uniformidade
ecológica em função da distribuição de energia na superfície da terrestre;
• Possui um perímetro bem definido no território, onde as normas de regulação do seu
uso devem ser socialmente aceitas e cumpridas.

Com base no exposto acima, acredita-se ser possível aprofundar nossa discussão em torno
do zoneamento ecológico-econômico.
Quanto sua elaboração, Becker e Egler afirmam que:

“o zoneamento ecológico-econômico, pressupõe uma abordagem transdisciplinar, que


considera, segundo uma hierarquia de escalas espaciais e temporais, a dinâmica do
sistema ambiental e da formação sócio-econômica, estabelecendo interações e
articulações entre seus componentes ... a definição de zonas ecológico-econômicas deve
ser resultante de uma metodologia integradora, de atualização permanente ... o que só é
possível hoje com o desenvolvimento de técnicas de coleta, tratamento e análise de
informações das quais devemos destacar os Sistemas de Informações Geográficas que
permitem o estabelecimento de relações espaciais entre informações temáticas
georreferenciadas”. (Becker e Egler, 1997, p. 18-19).

Neste sentido, a realização do zoneamento, em qualquer território ou parte dele, depende


do levantamento de informações geográficas as quais vão constituir um banco de dados geográficos
sobre o referido território e que deve ser continuamente atualizado. Num processo de levantamento
e atualização permanente dessas informações, a cada dia que passa, maior será a quantidade e o
detalhamento delas. Cabe frisar, que quando se fala em informação geográfica no contexto do
zoneamento, considera-se o todo, ou seja, o ambiente natural e o sócio-econômico, mesmo porque
não poderia ser diferente, já que as premissas que orientam o zoneamento é a identificação,
constatação, e avaliação da realidade territorial; processo dinâmico; enfoque holístico-sistêmico;
critérios de sustentabilidade e temporalidade.
Valendo-se da modelagem dos dados contidos no banco de dados geográficos e da
combinação adequada das informações geradas, são produzidas análises, diagnósticos e se permite
montar cenários que servirão de base para o zoneamento e fornecerão os subsídios à gestão do
território. Tais produtos caracterizam-se por conterem informações integradas do território na forma
de mapas e relatórios, segundo critérios de vulnerabilidade e potencialidade.
No âmbito de uma discussão mais política, não há duvidas de que cabe ao Estado-nação
viabilizar um plano para efetivar um programa de zoneamento ecológico-econômico. Mencionamos
isto porque se considera o ZEE como um dos instrumentos para a racionalização e ocupação dos
espaços e redirecionamento das atividades, cuja finalidade é dotar o Governo das bases técnicas
para a espacialização das políticas públicas, visando a Ordenação do Território. Para tanto, o ZEE
deve ser: 1) resultante da identificação, constatação e avaliação da realidade territorial; 2)
conduzido como processo dinâmico e contínuo, exigindo detalhamentos de acordo com as
Fórum Internacional do Meio Ambiente - A conferência da Terra 261

prioridades nacionais, regionais e locais e atualizações proporcionadas pela ampliação e


aprofundamento do conhecimento técnico-científico; 3) fundamentado no enfoque holístico-
sistêmico de modo a proporcionar a integração dos fatores físico-bióticos e sócio-econômicos.
Portanto o ZEE não se caracteriza como um fim, não tem por objetivo efetivar uma mera
divisão física, e nem tampouco visa criar zonas homogêneas e estáticas cristalizadas em mapas.
Constitui-se um instrumento técnico e político do planejamento das diferenças espaciais, segundo
critérios de sustentabilidade, de absorção de conflitos e de temporalidade, configurando um
processo dinâmico que deve ser revisto e atualizado periodicamente.
Conforme Becker e Egler, 1997, o ZEE deve ser capaz de fornecer subsídios para agilizar a
transição para um novo padrão de desenvolvimento, o desenvolvimento sustentável, além de ser
entendido como instrumento estimulador do desenvolvimento e não somente corretivo das
distorções sócio-ambientais detectadas.
Reforça-se que a proposta do ZEE supera os modelos reducionistas que caracterizaram os
zoneamentos específicos - agrícolas, hidrológicos, florestais - ao contrário, esta nova visão de
zoneamento busca compreender a organização e funcionalidade do espaço geográfico, além de
projetar o seu comportamento futuro.
Considerando as premissas que orientam a sua concepção, o ZEE exige um embasamento
teórico-metodológico capaz de integrar os diversos elementos, objetos e fenômenos naturais ou
antropogênicos do espaço geográfico, Ou seja, o ZEE exige que as técnicas e procedimentos que
definem as zonas ecológico-econômicas sejam baseados na interdependência entre os objetos do
espaço geográfico. Tais técnicas e procedimentos são comumente denominados de pesquisa
ambiental e pesquisa sócio-econômica.

REFLEXÕES QUANTO AO DESENVOLVIMENTO DA METODOLOGIA PARA EXECUÇÃO


DO ZONEAMENTO ECOLÓGICO-ECONÔMICO
No contexto do trabalho, procurou-se aqui tecer reflexões sobre a proposta metodológica
formulada para a execução do ZEE, sugerida por Becker e Egler, ao tratar do detalhamento da
metodologia do Programa Zoneamento Ecológico-Econômico da Amazônia Legal - MMA/SAE/PR
– 1997. Os autores, respeitando a integridade dos procedimentos para a avaliação da
vulnerabilidade da paisagem natural, desenvolvidos pelo Instituto Nacional de Pesquisas Espaciais
(INPE), consideraram a potencialidade social como complemento indispensável para obter-se a
integração ecológico-econômica necessária ao zoneamento.
No conjunto, a proposta apresenta a consecução de três cartas: uma de vulnerabilidade
natural, baseada em informações sobre o meio-físico, e avaliada segundo as unidades de paisagem
natural; outra de potencialidade sociais e econômicas, baseadas em informações sócio-econômicas e
avaliadas segundo unidades territoriais político-administrativas; por fim uma carta-síntese - com
base na sobreposição das duas anteriores - de subsídio à gestão do território baseada nos níveis de
sustentabilidade e legislação vigente.
Foge aos objetivos deste trabalho a transcrição do procedimento metodológico, suas etapas
estão resumidas na figura 1 que se segue. O que se propõe é uma análise das suas etapas, nas quais
são incorporadas sugestões feitas à luz de reflexões amadurecidas na atividade prática.
Tomando-se os dados do meio físico e considerando os procedimentos do INPE com base
em Crepani et al. (1996), para obtenção da carta de vulnerabilidade natural, são realizadas as
seguintes operações de análise:

• Inicialmente a interpretação visual dos geo-campos através de imagens de satélites,


nos quais são definidas áreas homogêneas sob uma visão integrada do clima, geologia,
geomorfologia, solos, vegetação e uso da terra. Os geo-campos correspondem à distribuição dos
dados continuamente sobre a superfície da terra. Por exemplo: um mapa de vegetação descreve uma
distribuição espacial, a cada ponto do mapa um tipo específico de cobertura vegetal Nos geo-
campos, os elementos da terra interpenetram entre si, horizontal e verticalmente;
Fórum Internacional do Meio Ambiente - A conferência da Terra 262

Figura 1. Detalhamento da Metodologia do PZEEAL


Elaborado com base em Becker e Egler (1997) e Crepani et. al. (1996).

• Considera-se cada área homogênea como um geo-objeto, ou seja, que representa o espaço
geográfico como uma coleção de entidades distintas e identificáveis, que por sua vez, herda todos
os atributos relativos às classes temáticas, tais como geologia, geomorfologia, pedologia, e
cobertura vegetal, e que são denominadas de Unidades de Paisagens ou Unidades Territorial
Básica - UTB, sendo materializadas num mapa de geo-objetos. Importa reforçar que o modelo de
geo-objetos vê o mundo como conjuntos de objetos individualizáveis. Este modelo é mais
conveniente às abordagens humanas, por exemplo: um cadastro espacial dos lotes de um
município identifica cada lote como um dado individual, ou poder-se-ia pensar como os rios de
uma bacia hidrográfica.
• Para cada uma das classes de cada um dos geo-campos temáticos (climatologia, geologia,
geomorfologia, pedologia, uso da terra e cobertura vegetal) que permitem caracterizar as UTB’s
atribui-se um valor numérico relativo à vulnerabilidade natural, tomando-se por base os dados
disponíveis, usando os conceitos de Tricart (1977) e uma escala de valores (Tabela 1), sugerida
por Crepani et al. (1996), obtendo-se, através de operações de transformação, no caso,
ponderações, geo-campo numéricos - associação de cada ponto do espaço, a um valor real - a
vulnerabilidade dos respectivos temas.
• Na seqüência, com os respectivos valores de cada tema, gera-se um geo-campo numérico que
representa a média aritmética das vulnerabilidades de todos os temas. Feito isso, associa-se aos
valores médios e classes de estabilidade ecodinâmicas a uma tabela de cores, assim, a carta de
vulnerabilidade será produzida através de um sistema de geração de documentos cartográficos -
procurando-se relacionar os valores médios de estabilidade de cada unidade com uma
determinada cor pré-estabelecida.
Fórum Internacional do Meio Ambiente - A conferência da Terra 263

Tabela 1 - Avaliação da Ecodinâmica


Unidade Relação pedogênese/morfogênese Valor
Estável Prevalece a pedogênese 1,0
Intermediária Equilíbrio entre pedogênese e morfogênese 2,0
Instável Prevalece a morfogênese 3,0
Fonte: Crepani et al. (1996) adaptado de tricart (1977)

Com relação ao conjunto dos dados relativos a sócio-economia, os procedimentos são


realizados sobre as unidades territoriais básicas político-administrativas, ou seja, municípios,
distritos e setores - que são selecionadas em razão do detalhamento da pesquisa.
Sua operacionalização segue o princípio racional. Utilizam-se as informações e o material
preparado para a carta de vulnerabilidade natural, efetiva-se o levantamento de dados e preparação
dos planos de informações complementares e banco de dados sócio-econômicos. Estabelece a
unidade territorial básica, por exemplo, os municípios que são materializados em um mapa de geo-
objetos, ou seja, um suporte que agrupa um conjunto de geo-objetos mantendo suas relações
topológicas. A Preparação da carta de potencialidade social segue os seguintes procedimentos:
• Estabelece-se o relacionamento lógico entre as unidades territoriais básicas e variáveis
retiradas do banco de dados. Em outros termos: relacionamento entre geo-objetos “municípios” e
objetos não-espaciais, ou seja, objetos que não possui localizações espaciais associadas, exemplo:
informações da Receita Federal, Secretaria da Saúde.
• Considerando a relação entre os fatores dinâmicos e restritivos, utiliza-se uma escala arbitrária
de valores análoga à tabela 1, na qual os valores próximos a 1,0 correspondem um alto potencial
de desenvolvimento, os valores próximos a 3,0, correspondem um baixo potencial e os valores em
torno de 2,0, indicam situações intermediárias. Isto, evidentemente tomando-se quatro grupos de
parâmetros: potencial natural, potencial humano, potencial produtivo e potencial institucional.
• Por fim, a carta de potencialidade social é o resultado do cruzamento dos grupos de
parâmetros e sua representação leva em conta a classificação das unidades territoriais em cinco
classes de potencial para o desenvolvimento humano: alto, moderadamente alto, médio,
moderadamente baixo e baixo, representados por gama de cores.
• Finalmente, a Carta de Sustentabilidade do Território ou carta síntese final é alcançada
valendo-se, grosso modo, da sobreposição das cartas de vulnerabilidade das UTB’s e
potencialidade social e econômica das UTB’s, na qual as classes referem-se a todas as
intersecções possíveis.

CONSIDERAÇÕES PERTINENTES
Quanto à carta de vulnerabilidade natural, parece acertado mencionar que se procura
estabelecer uma relação ecodinâmica que leve em conta a biodiversidade, uma carta de
vulnerabilidade que se restringe a erodibilidade empobrece o processo e limita a análise.
Informações relativas à biologia (pelo menos dados quanto à fauna) e à hidrologia, com dados
relativos aos cursos d’água deveriam estar contidas, uma vez que são tão importantes, e às vezes
podem corresponder ao mais importante atributo numa unidade territorial. Assim, uma carta de
vulnerabilidade natural, cujo plano atinge uma área com densos recursos hidrológicos e/ou
composição faunística, ao não incorporar estas informações, sua composição final não
corresponderá aos propósitos desejados.
Admitimos a preocupação com o acesso aos dados, que neste caso, como não existem
informações secundárias, devem ser coletados e tabulados, o que leva tempo e consome recursos;
porém a composição de banco de dados é um processo contínuo, o que pode ser facultado às escalas
necessárias.
Quanto à carta de potencialidade social e econômica, parece acertado refletir sobre a
ponderação do potencial natural, já que se torna contraditória a relação alta porcentagem alto/baixo
potencial. Dependendo do indicador uma alta percentagem corresponde a um fator restritivo e o
contrario também é verdadeiro.
Fórum Internacional do Meio Ambiente - A conferência da Terra 264

Parece acertado que em face da importância da tecnologia, poder-se-ia pensar em


acrescentar variáveis que pudessem expressar o grau de incorporação tecnológica às unidade
territoriais, como terminais eletrônicos (pessoal, coletivo, institucional) já que a utilização de
computadores enquanto ferramenta é crescente, e provoca modificações importantes em todo tecido
social; telefonia, telemática; incorporação tecnológica nos diversos produtos. Enfim, que se pudesse
perceber a velocidade das transformações que se processam em virtude de incorporações
tecnológicas.
Quanto à carta síntese ou de sustentabilidade do território, a sobreposição das cartas
temáticas de vulnerabilidade natural e potencialidade social e econômica, nos permitem admitir:
primeiro a importância do papel do analista, segundo a importância do trabalho de campo, portanto
do conhecimento sobre o território e por último, a certeza da inexistência de um sistema de
informação geográfica que produza uma carta final sem que o analista, portanto o conhecedor da
área de estudo intervenha no processo.
O trabalho prático nos leva refletir sobre a pertinência das unidades territoriais, enquanto
áreas de coletas. A utilização de setores censitários se mostrou contraproducente, uma vez que
muitas variáveis somente são encontradas ao nível de municípios e outras, que mesmo sendo
obtidas ao nível setorial, por força de lei, não podem ser fornecidas, caracterizando quebra de sigilo:
por exemplo, dados agropecuários em municípios de grande extensão e pouco adensáveis, que
muitas vezes o informante é o único residente do setor censitário.
Esta não uniformidade em termos de informações em diferentes unidades territoriais faz
com que se utilize, como recurso técnico, a pulverização dos dados pelos setores, o que mascara a
realidade. Por exemplo: tendo informações por setores e uma outra no nível de município que se
queira incorporar por sua importância, utiliza-se a repetição da informação do município em cada
setor, como se todos os setores fossem homogêneos. Além disso, há uma necessidade, também
enquanto recurso técnico, de individualizar os dados entre o sítio urbano e à área rural. Ou seja,
informações ao nível do município na maioria das vezes se diluem, isto é, estão generalizadas,
quando, na verdade, o grande peso da informação esta concentrada no sítio urbano.
O mesmo recurso deve ser feito ao longo dos objetos geográficos (hidrovias, rodovias,
ferrovias, enfim), que dependendo de sua importância e sua dinâmica, agregam e concentram maior
volume de informação ao espaço, sendo que estas áreas não correspondem às unidades de
informação. Exemplo: uma rodovia geralmente incorpora informações ao longo de sua margem, ela
é um importante fator de atração (de pessoas, comércio, etc.) e estas informações correspondem a
uma dinâmica seletiva e não diluída numa UTB’s .
Por fim, é lícito supor que se o zoneamento ecológico-econômico deve ser capaz de
manifestar a resultante de dois processos dinâmicos que interagem no território - de um lado os
processos naturais, cuja lógica pode ser sintetizada nos princípios da ecodinâmica e, de outro, os
processos sociais, que correspondem à dinâmica econômica e a objetivos políticos - e se seu
objetivo último é subsidiar a gestão do território, o que consiste em uma ampla negociação social,
sugere-se que isto pode ser alcançado e de forma realista, tomando-se por base o poder local,
enquanto escala de manifestação da cidadania.

O ZEE COMO INSTRUMENTO DE GESTÃO DO TERRITÓRIO TOMANDO-SE POR BASE O


ESPAÇO LOCAL
Pensar na implementação do ZEE enquanto realidade requer uma ampla representação
social e política. Sua viabilidade reforça nossa argumentação em torno do espaço local, ao qual a
importância para um reforço generalizado da gestão política, representa uma importante evolução
da democracia representativa. Uma forma mais avançada de organização política só se efetiva
quando a própria sociedade local e, de forma participativa, coloca em prática o processo de gestão
do território. Portanto o ZEE enquanto uma função da gestão do território pode perfeitamente ser
iniciado valendo-se do espaço local enquanto lócus de negociação
Ou seja, a negociação é essencial. O ZEE como instrumento capaz de romper as posições
polarizadas e oferecer oportunidades de crescimento econômico, respeitando-se o ambiente através
Fórum Internacional do Meio Ambiente - A conferência da Terra 265

do uso racional dos recursos, requer uma ampla negociação. Portanto, nada mais factível de se
iniciar um processo como o ZEE pelo espaço local, já que sua implementação visa a espacialização
democrática de políticas públicas. Ou seja, o ZEE é um instrumento técnico e político que viabiliza
a produção do espaço.
Não se trata de uma proposição irreal e poética, uma vez que as zonas ecológico-
econômicas compreendem um conjunto de escalas que superam a escala do espaço local e que sua
efetivação, portanto, cabe aos estados e à nação. O que aqui se propõe corresponde a um processo
democrático, cuja compreensão do todo parta da participação dos atores do município enquanto
escala de vivência dos atores sociais.
Sua pertinência implica mudanças institucionais é bem verdade, mas estamos vivendo um
momento de profundas mudanças na sociedade e no espaço e é nesse bojo que o processo se inicia.
Já podemos perceber - ao nível de alguns municípios - a formação de fóruns de desenvolvimento,
com a participação de empresários, sindicatos, universidades e assim por diante.
É preciso termos em mente na realidade contemporânea às profundas transformações que
se enveredam na sociedade. O processo produtivo é profundamente transformado em conseqüência
do desenvolvimento da técnica. As mudanças nos meios de comunicação ligando os espaços em
redes de fluxos cada vez mais densas ultrapassam fronteiras e deixam o espaço mais contínuo
eliminando-se o tempo. As comunicações diminuem as distâncias e com isso o local cada vez mais
se constitui na sua relação com o mundial.
O processo de reprodução das relações sociais que estão ocorrendo, hoje, não invalida o
fato do município aparecer como um fragmento do espaço mundial, mesmo porque o mundial não
suprime o local. O local é a representação da materialidade, é o espaço concreto.
Cumpre reforçar que o espaço local enquanto espaço concreto, produz-se e revela-se no
plano da vida e do cotidiano. As relações que os indivíduos mantêm com os espaços habitados se
exprimem todos os dias nos modos de uso, nas condições mais banais. O espaço do concreto é o
espaço possível de ser sentido, pensado, apropriado e vivido.
E o local como espaço concreto, como lócus onde se exerce a cidadania que se pode, de
fato, levar a efeito uma gestão democrática do território, o que só se realiza em virtude das formas
diretas de articulação dos atores sociais.
A proposição do ZEE a partir do município, portanto, leva em conta que não existem mais
espaços desarticulados daí a busca da reconstituição do tecido social e da efetivação de políticas
públicas a partir do município. Afinal, a sociedade moderna é constituída por um tecido complexo e
extremamente diferenciada de atores sociais. Assim, é preciso compreender que políticas globais
tornam-se desajustadas, reduzindo-se a competência das decisões centralizadas. Este argumento é
reforçado ainda mais, porque hoje, constituímos dominantemente sociedades urbanizadas, daí o
espaço local expressar um tecido social organizado que pode assumir, como ponto de partida, o
processo de implementação do ZEE enquanto instrumento que viabilize a gestão do território.
Em essência, o espaço contemporâneo passa por um processo de reordenamento, assim
como se efetiva uma rearticulação dos espaços locais emergindo o espaço compartilhado. Espaço
onde se tem a visão das partes e do todo, é sim um espaço democrático e de pertinência a
instrumentos como o ZEE. É claro que esta rearticulação dos espaços locais passa por uma
redefinição da cidadania, em particular por uma definição das instituições para que os espaços
participativos coincidam com as instâncias de decisões.

REFERÊNCIAS BIBLIOGRÁFICAS
AB’SABER, A. Zoneamento Ecológico da Amazônia: Questões de Escala e Método. Brasília.
CEPAL/IPEA. 1987.
BECKER, K. B. “Globalização: O Novo Espaço Mundial e a América Latina”. Seminário “A
América Latina na Nova Ordem Mundial: Integração Regional e Internacional”: LAGET/UFRJ
(mimeo). 1998.
BECKER, K. B. EGLER, C.A.G. Detalhamento da Metodologia para Execução do Zoneamento
Ecológico-Econômico Pelos Estados da Amazônia Legal. Brasílis. SAE/MMA. 1987.
Fórum Internacional do Meio Ambiente - A conferência da Terra 266

CREPANI. et al. Curso de Sensoriamento Remoto Aplicado ao Zoneamento Ecológico-Econômico.


São José dos Campos INPE. 1996.
IBGE. Termos de Referência para uma Proposta de Zoneamento Ecológico-Econômico do Brasil.
Rio de Janeiro. Diretoria de Geociências DGEO_=-IBGE. 1986.
SANTOS, M. Técnica, Espaço, Tempo: Globalização e Meio Técnico-Científico- Informacional.
São Paulo: HUCITEC, 1994.
________ A Natureza do Espaço: técnica e tempo, razão e emoção. São Paulo: HUCITEC, 1996.
TRICART, J. Ecodinâmica. Rio de Janeiro. IBGE-SUPREN. 1977.
Fórum Internacional do Meio Ambiente - A conferência da Terra 267

PARTICIPAÇÃO COMUNITÁRIA NOS PROCESSOS DE GESTÃO DE RECURSOS


NATURAIS: ESTUDO DE CASO DE POVOADO DE NHAMBITA-MOÇAMBIQUE

André Camanguira Nguiraze – UECE


Mestrando em Geografia pela Universidade Estadual do Ceará. Endereço Profissional: Mestrado Acadêmico em
Geografia, Av.Paranjana, n.1700, CEP: 60.740-000, Fortaleza, Ceará, Brasil. acamaguira@yahoo.com.br

RESUMO
Assiste-se, nas últimas décadas, a uma maior preocupação do homem com as questões
ambientais, com a preservação do planeta e a garantia de continuidade da biodiversidade. A
participação consciente da comunidade local na gestão dos recursos naturais deve ser um processo
de expansão das possibilidades de escolha para os indivíduos.
A preocupação particular com o tema, participação comunitária na gestão participativa dos
recursos, origina-se da vivência na comunidade de Nhambita-Moçambique, que apresenta uma
postura de tomar iniciativas e aposta nas competências que a comunidade possui na gestão dos seus
recursos promovendo o desenvolvimento local almejado.
Na pesquisa ficou evidente que ações desenhadas para a promoção do desenvolvimento
devem não apenas se dar de forma descentralizada, mas devem estar focadas, essencialmente, no
local onde se dá a vida cotidiana concreta. Neste sentido, percebemos que a gestão participativa se
torna mais sustentável, na medida em que ela não se restringe aos processos de consulta. Torna-se
fundamente a visão estratégica de tomar as experiências pilotos em gestão dos recursos em políticas
públicas.
Palavras-chave: gestão participativa, recursos naturais, desenvolvimento local, comunidade.

ABSTRACT
There is, in recent decades, a major concern of the man white environment issues, with the
preservation of the planet and the guarantee of continuity of biodiversity. A conscious participation
of the local community in natural resource management should be a process of expansion of choice
for individuals.
A particular concern with the issue, community participation in the participatory
management of resources, originates from the experience of the community – Nhambita –
Mozambique, which has a position to take initiatives and emphasis on skill that community has in
the management of their resources promoting the development Local desired.
In search was clear that actions designed to promote the development should not only be
given in a decentralized manner, but should be focused, essentially, on the spot where he gives
concrete daily life. In this sense, we realize that the participatory management becomes more
sustainable, in that it does not restrict the processes of consultation. It is based the strategic vision to
take the experiences pilots in resource management in public policy.
Keywords: participative management, natural resources, local development, community.

INTRODUÇÃO
Durante a década de 1960, quando as antigas colônias africanas alcançaram paulatinamente
suas independências políticas, Moçambique e as demais colônias portuguesas sofreram um processo
de exacerbação colonial, na medida em que o Portugal de Salazar recusou cede às pressões
internacionais e insistira na suas especificidades “luso-tropicais”, renomeando as “províncias”
ultramarinas. As resistências a essa situação de domínio não tardou a se manifestar e, de 1964 em
diante, um conjunto de partidos nacionalistas, como a Frente de Libertação de Moçambique –
FRELIMO lutou contra o colonialismo numa guerra prolongada e sangrenta. Coincidente com a
escala da Guerra Fria, a luta entre o Portugal e a FRELIMO foi a luta entre o ocidente que apoiava o
Governo Português e o bloco soviético que dava apoio militar e ideológico a FRELIMO.Com a
Revolução dos Cravos, em Abril de 1974, provocada em grande parte pela tragédia das guerras de
independência, Portugal mudou radicalmente de rumo e negociou a independência de Moçambique.
Fórum Internacional do Meio Ambiente - A conferência da Terra 268

Apreensivo com o seu futuro sob um governo de tendências marxistas, um grupo de


colonos iniciou uma revolta em Maputo, antes Lourenço Marques, e em conseqüência a maioria dos
portugueses fugiram do País. Em 1975, Moçambique viu-se politicamente livre, mas dependente de
apoio financeiro e de mão-de-obra especializada estrangeira, sobretudo oriunda dos países do bloco
soviético, então socialistas.
Em seguida, Moçambique sofreu mais uma vez uma mudança política e econômica
bastante radical, marcando a sua singularidade em relação ao colonialismo e ao “Apartheid” do seu
poderoso vizinho da África de Sul. Declarando-se “marxista-leninista” e anunciando uma série de
medidas para garantir a soberania nacional e a sua saída do subdesenvolvimento num espaço de dez
anos.
Para tanto, o movimento da FRELIMO evidenciou as seguintes palavras de ordem:
“abaixo o colonialismo”, “Abaixo o tribalismo”, “Abaixo o obscurantismo”, sinalizavam o fim do
passado colonial e tradicional e o nascimento do “homem novo” socialista. O feudalismo o, ou seja,
o sistema de governo das populações rurais através dos lideres escolhidos por seus parentes e
antepassados e confirmados pela administração colonial como regulo (pequenos reis), foi
substituído pelas “estruturas” do partido FRELIMO: secretários e “grupos dinamizadores35”, essa
realidade foi evidenciada por “Isto significava à eliminação das diferencias culturais, os valores, as
atitudes, as crenças e as antigas animosidades entre indivíduos, grupo e outro. Como pronunciou o
então Presidente de Moçambique, Samora36 (é preciso matar a tribo para construir a nação)” (FRY,
2001:14).
E assim punha-se em causa a sustentabilidade cultural, que é a dimensão capaz de respeitar
e estimular as diferenças, os valores, à confiança mútua e os saberes locais de cada população para
uma ação comunitária. Por meio desta estratégia era impossível intensificar o diálogo franco entre
as partes da dimensão territorial, da diversidade de atividades, de atores econômicos, políticos,
sociais e a partir destes, elaborar e operacionalizar as possíveis políticas de desenvolvimento. E
realizar o paradigma “desde baixo”. Nessa perspectiva, Bourdieu (1968:10) afirmou: “Quase
sempre a construção de nação é em grande parte moldada por um determinado grupo que, em
virtude dessa identidade de propósitos, constitui uma classe diferente de massas”.
Essa idéia é comungada por Fry (2001), ao afirmar que “... o capitalismo foi substituído
pela socialização dos meios de produção, as indústrias e o comércio foram nacionalizados, e as
populações rurais saíram das suas casas rumo às “aldeias comunais” e as antigas fazendas coloniais,
agora estatais” (FRY, 2001:13).
Em nome de Marxismo proporcionou se uma linguagem universal a das “classes”, dos
“camponeses” e dos “operários”, capaz de ao mesmo tempo, negar a diversidade social e cultural do
território.
A existência de um ator central capaz de coordenar a resolução dos problemas estruturais e
de maior compromisso dos atores externos com o sucesso das reformas implicou que o
“obscurantismo”, (cosmologia tradicional, cristãs e islâmicas), fosse reprimido e substituído pelo
“socialismo científico”.
Em Moçambique, apos a saída dos paises do bloco socialista, o desenvolvimento endógeno
se associa estreitamente às questões da superação da pobreza, onde 80% da população rural vivem
da agricultura de subsistência (Censo de 2007) e da saturação de mercado de trabalho. Esse quadro
se relacionou estreitamente com a introdução de Programa de Reabilitação Econômico e social
(PRES37), introduzido pelo Banco Mundial e Fundo Internacional Monetário, políticas
caracterizadas pelas privatizações de todos os sectores de produção com a racionalização de mão de
obra e a criação de exercito de desempregados.

35
Órgão de base que tinha como função sensibilizar a massa popular sobre a ideologia Marxista-Leninista em
Moçambique.
36
Primeiro Presidente de Moçambique.
37
Programa introduzido nos finais da década 80 para reverter a crise socioeconômica que havia abalado o país.
Fórum Internacional do Meio Ambiente - A conferência da Terra 269

Os mecanismos de participação são fracos por conta de más experiências das cooperativas
organizados, designadas “machambas de Povo” e “Lojas do povo” na época da pós independência.
A questão de poder social então se converte em algo chave tanto para a democracia formal
como para a governabilidade nacional e local para reconstrução de relações entre o estado e a
sociedade civil.
Falar de desenvolvimento endógeno é falar de construção democrática da participação de
base e, portanto, da construção do poder da sociedade em às suas relação com o estado.

CONSTRUINDO O ENVOLVIMENTO CÍVICO


A partir do final de década 1990, especialmente na região sul de Moçambique, surge uma
visão diferente de desenvolvimento que se vem traduzindo em iniciativas de planejamento voltado à
valorização do potencial endógeno das regiões. Trata-se de um novo horizonte, em Moçambique,
para as políticas de desenvolvimento, em que o objetivo de crescimento econômico necessariamente
se associa à mobilização cívica, à cooperação e comprometimento, à valorização das identidades
locais e a regionais e a inclusão participativa de amplos setores de sociedades.

O vinculo entre desenvolvimento sustentável e protagonismo local significa, antes de tudo,


partir da descoberta, do reconhecimento e da valorização das competências locais, isto é, das
potencialidades e dos vínculos que podem ser ativados a partir de cada território. Considerando que
o “local” não é um dado, e sim uma construção, trata-se de um processo de auto-instituição
territorial, o que significa fazer das necessidades uma rede, um encontro entre lugar e fluxos, um
território.
Em outras palavras, são as relações intersubjetivas e comunicacionais que constituem o
local, na qualidade de forças instituintes do território. Também nesse sentido que o
desenvolvimento local é entendido como processo construído de “baixo para cima” e de “fora para
dentro”.
A despeito disto, os títulos de uso de recursos naturais disponíveis nas comunidades e no
país em geral é em grande parte da terra, direito de posse ao invés de direito de propriedade o que
periga a capacidade de suporte do ambiente.
Nas políticas públicas traçadas havia uma grande desvinculação entre meio ambiente e a
economia em processos de decisórias e uma ausência de responsabilidade de decisões tomadas.
Aqui, ganham destaque, sobretudo as comunidades locais, cujas experiências deveriam ser
aproveitadas para a gestão de recursos locais. Para Küst (2004, p.23), “um desenvolvimento
sustentável exige uma modificação dos marcos jurídicos e institucionais, cuja base é constituída
pelo direito a um meio ambiente saudável. Além de leis que permitem fazer prevalecer os interesses
comuns, considerarem-se necessária possibilidade a participação da sociedade em processos
decisórios”.
Podemos afirmar, a partir da análise pioneira de Putnam (1996), que é agora amplamente
aceito que uma sociedade civil fortalecida e engajada - especialmente em termos das suas “normas
de reciprocidades e redes de envolvimento cívica” e encarada em formas diversas de instituições
democráticas. A interpretação de Putnam sobre a contribuição da vida associativa no
aprofundamento da democracia e na gestão participativa é, no entanto, inspirada em uma
interpretação essencialista que entende o comportamento cívico sendo fortemente enraizado na
cultura e na história local. Os críticos dizem que também que as formas de vidas cívicas é que
contribuem para assegurar bens de desenvolvimento como o caso de capital social. Hauff (1989)
observou que o uso dos recursos naturais poderia alcançar o maior êxito, se houvesse uma
descentralização de gestão dos recursos naturais dos quais dependem as comunidades locais, e se
estas comunidades tivessem algo a dizer quanto á utilização desses recursos. Ainda para este autor,
“a necessidade de fomentar iniciativas cidadãs, empoderando organizações emergente
espontaneamente e fortalecer a democracia local”.
Fórum Internacional do Meio Ambiente - A conferência da Terra 270

O RESGATE DA DIMENSÃO COMUNITÁRIA NA GESTÃO DE RECURSOS NATURAIS EM


NHAMBITA
O próprio resgate dos valores, do sentido de pertencimento, da integração social,
comprometimento cidadão e a reconstituição da dimensão ética do desenvolvimento sustentável
exigem que o ser humano torne-se ele próprio um individuo. Este processo de reconhecimento do
outro não se dá no anonimato, mas sim na comunidade. Na linha dos aportes de John Friedmann
(1992), o “empowerment”, ou a recuperação da cidadania, é essencial, caminhando para a
reconstituição das comunidades, em outros níveis, incorporando e capitalizando as próprias
tecnologias hoje desagregadoras.
Na excelente formulação de Milton Santos, “o que globaliza separa; é o local que permite a
união”. Uma dimensão extremamente pratica deste processo nos é dada pelo exemplo cotidiano do
dilema de solidariedade. Neste contexto, esta rearticulação passa por uma redefinição da cidadania,
e em particular por uma definição das instituições para que os espaços participativos coincidam com
as instâncias de decisões significativas. As hierarquizações tradicionais dos espaços já não são
suficientes, ou inadequados. Precisa-se mais de uma construção de redes sociais horizontais de
modo que compartilhem os valores e objetivos.
Apesar de grande esforço da comunidade de Nhambita em procurar demonstrar a sua
autodeterminação no exercício da cidadania e na gestão participativa dos recursos como forma de
alavancar o desenvolvimento local, existe, por de trás, um movimento integrado com as discussões
estratégicas da macroeconomia. Uma vez que as decisões que afetam a vida da comunidade estão
fora do âmbito local. Sendo assim, surge a necessidade de criar mecanismos de participação onde o
local tenha voz na formulação de políticas públicas. Caso contrário, este processo servirá apenas
como espaço de legitimação dos fóruns que estabelecem “consensos não negociados” como é o caso
mais freqüente em paises Africanos, os chamados “Consensos de Washington”. Tânia Fischer
elenca vários fatores que podem impactar, negativamente, os processos de “desenvolvimento
local+integrado+sustentável” (Tânia, 2002 p. 24-25) são eles:
9 Desgaste dos métodos participativos e dos chamados “consensos vazios”, que não estruturam
planos de ação e não alcançam resultados;
9 A articulação das comunidades de interesses esbarra em limites concretos de poder, nas falácias
da despolitização das iniciativas e na exacerbação das potencialidades e virtualidades locais, tais
como os consensos sobre os temas da geração de empregos e renda;
9 A Construção “externa” das estratégias de desenvolvimento local, o que pode ocorrer tantos nos
modelos competitivos quanto nas perspectivas corporativistas, seja por ação dos governos, das
ONGs ou de outros autores institucionais, como as agências internacionais.
9 Fragilidades metodológicas dos tipos de intervenção em desenvolvimento local, modismos e
mimetismos, havendo muita semelhança entre os modos de fazer, que atuam na superfície dos
problemas e acreditam à mobilização bem mais do que é possível obter.
9 Descontinuidade política que aniquila muitas iniciativas ao fim do mandato do gestor que as
criou, soma-se às interferências político-partidárias locais, regionais e nacionais.
9 Superposição de programas e projetos de diferentes instituições, que, por sua vez, superpõem
agendas, dispersam e fragmentam esforços, para não perder oportunidades de financiamento; e
9 Avaliação inexistente ou inadequadas de processos, resultados e impactos, o que reforça e
impedem e limita a reconstrução de curso de ação.

Como pode se depreender a partir da década de 1990 devido ao Consenso de Washington,


se atribuiu o sistema de cotas e a uma gestão descentralizada de recursos naturais de forma a
corrigir as graves falhas na eficiência e na sustentabilidades dos mesmos na época da colonização
dos países do bloco socialista soviético.
Neste período da ascensão social, a comunidade local, tornou proprietária de recursos com
direito de propriedade bem definida, tendo como forma de estímulo, o beneficio de 20% resultante
do uso dos recursos. Essa foi à forma encontrada para estimular a comunidade na conservação e
preservação dos recursos naturais, no qual, direitos de caças são severamente limitados e garantidos
Fórum Internacional do Meio Ambiente - A conferência da Terra 271

às comunidades locais indígenas. Como exemplo, podemos citar a prática do turismo e a venda dos
direitos de caça e produtos dos animais abatidos como forma de obtenção de renda para a
comunidade. A percentagem é invertida para a construção de infra-estrutura como beneficio liquido
de comunidade local.

Foto 01. Membros da comunidade Nhambita – Moçambique.Fonte: Foto 02. Membros da comunidade Nhambita no plantio dos viveiros de
Autor 09/01/08 fruticultura e florestamento.Fonte: Autor 09/01/08

AS ARTICULAÇÕES PARA O DESENVOLVIMENTO DA COMUNIDADE LOCAL


As ligações estreitas entre pensamento, crenças e valores podem ser vistas como mudanças
de auto-afirmação para a integração da componente ambiental. A observância dessas simples regras
e a percepção da necessidade de normas que visem à proteção e a consciência ambiental garantem
as estratégias de obtenção do desenvolvimento local.
Uma das características interessantes e essenciais de desenvolvimento introduzida na
comunidade é a da rede social. A rede social é uma ferramenta na qual a relação de conectividade
entre a população, a Organização Não-Govremantal, denominada Envirotrade38, o governo e setor
privado promovem a troca de conhecimentos e o fortalecimento da organização produtiva para
autonomia social e econômica da comunidade.
A Envirotrade, sendo uma organização vocacionada para o reflorestamento com a
finalidade de seqüestro de carbono, financiada pela União Européia e a GTZ-Agência de
cooperação Alemã.
A comunidade de Nhambita situa-se numa região com um potencial econômico da flora e
fauna imensurável, tanto do ponto de vista madeira e da abundância de variedade de espécies
produtivas de frutos para a alimentação e uso, quanto da existência de plantas medicinas e
ornamentais.
Com a aglutinação das iniciativas locais pelos arranjos institucionais da Agência Alemã de
Cooperação, da Envirotrade e do governo local, Estadual e Federal, a partir de 2000, a comunidade
fora estimulada a participar nos processos de tomada de decisão no processo de desenvolvimento
endógeno e também na geração de renda pelas atividades nos processos de gestão da produção de
colméia, criação de viveiros para o reflorestamento e fruticultura. A iniciativa consiste em
transformar parte dos membros das comunidades em criadores de abelhas. Uma vez que aqueles
insetos são “inimigos” do fumo, a comunidade faria grandes esforços para eliminar qualquer foco
de incêndio. A estratégia visa conscientizar as comunidades no sentido de combater as queimadas
descontroladas sem esperarem a intervenção das estruturas administrativas locais.
A mudança de paradigma, agregando novos sistemas de produção, que integradas às
atividades tradicionais, podem contribuir para mudar o perfil produtivo local, gerando novos postos
de trabalhos, agregando rendas aos membros das comunidades. Para isso, nota se a auto-estima dos
produtores locais. Segundo entrevista de campo com Nhandolo,integrante da associação
comunitária - diz que:

38
ENVIROTRADE, Uma Organização Não Governamental da União Européia com finalidade de reflorestamento e
seqüestro de carbono, que inicio a sua atividade na comunidade no ano 2000.
Fórum Internacional do Meio Ambiente - A conferência da Terra 272

“... a minha vida mudou com a apicultura e pelo beneficiamento de madeira pela
associação de carpintaria. Estou conseguindo melhorar não só a minha vida como
também a vida de minha família, isso é muito bom, o projeto é muito importante para
nós, ele trouxe uma nova oportunidade para o novo de Nhambite” (NHANDOLO,
2008).

A mensuração dos benefícios é uma atividade que se realiza em vários níveis. Daí que as
pessoas devem desenvolver uma boa idéia do valor que elas colocam para articular a gestão
participativa do meio em que vivem.
O grande desafio agora para a comunidade é estabelecer um modelo de desenvolvimento
de atividades que íntegra a sustentabilidades da produção rural, o beneficiamento, o armazenamento
e a comercialização que requer agregar valor para tornar competitivo no mercado local e regional.

Projetos em destaque na comunidade de Nhambita:


9 Associação de carpintaria – beneficia se da madeira para quem encontrar um toro seco na
floresta. Como forma de desestimula o desmatamento.
9 Atribuir colméias para os membros das comunidades para fortalecer as atividades de Apicultura
e evitar a queimada descontrolada.
9 desenvolvimento sustentável de Apicultura;
9 desenvolvimento sustentável da fruticultura;
9 Reflorestamento das áreas, onde o membro da comunidade beneficia se de uma taxa de
recompensa em cada ano de acordo com os hectares.
9 proteção e conservação de fauna.

CONSIDERAÇÕES FINAIS
Na gestão de novas interações sociais e políticas, emerge a questão da aprendizagem dos
atores locais e institucionais para a gestão compartilhada e socialmente participativa. Mais do que
instrumentalizar os agentes, é requerida uma capacitação envolvendo valores, símbolos, atitudes
relacionais, capacidades dialógicas e de protagonistas cooperativos. Todo o processo político de
desenvolvimento territorial parece complicar-se caso não tenha como componente intrínseco a
aprendizagem entendida também como desconstrução-construação de padrões culturais na gestão
dos recursos.

REFERÊNCIA BIBLIOGRÁFICA
BOURDIEU, P. The forms of capital. In: Handbook of Theory and Research for the Sociology of
Education. Ed. J. Richardson. N.Y., Greenwood. 1986.
FISCHER, Tânia. Poderes locais, desenvolvimento e gestão. Introdução a uma Agenda. In: Gestão
de desenvolvimento e poderes locais: marcos teóricos e avaliação. Salvador: casa da qualidade,
2002.
FRIEDMANN, John. Empowerment: the politics of alternative Development. Blackwell:
Cambridge, 1992.
FRY, Peter. Moçambique: ensaios, 2ª Edição, Rio de janeiro, Editora UFJR, 340.p, 2001.
HAUFF, Volker. Combinar a democracia representativa: Desafio do governo Local, Grever, 1987.
KÜSTER, Ângela. Democracia e sustentabilidade: Experiências no Ceará, Nordeste do Brasil,
Fortaleza, Expressão Gráfica e Editora, 2003.
PUTNAM, Robert. Comunidade e Democracia: Experiências da Itália Moderna. Rio de Janeiro:
FGV, 1996.
SANTOS, Milton. Por uma outra globalização: do pensamento único à consciência universal. Rio
de janeiro: Record. 2000.
ZAPATA, Tânia et al. Desenvolvimento local e participação social: Gestão Ambiental e
Participação., 2ª Edição, Recife: Instituto de Associação para o Desenvolvimento Humano, 2007.
Fórum Internacional do Meio Ambiente - A conferência da Terra 273

SUSTENTABILIDADE E RELAÇÕES DE GÊNERO NO CAMPO: UMA PROPOSTA DE


PESQUISA NO SEMI-ÁRIDO BRASILEIRO

Rakuel Costa
Assistente Social e Mestranda do Programa de Pós-graduação em Desenvolvimento e Meio Ambiente- PRODEMA da
Universidade Federal do Pernambuco- UFPE. E-mail: rakuel.piaui@gmail.com
Vitória Gehlen
Professora do Departamento de Serviço Social/UFPE. E-mail:vicgehlem@yahoo.com.br

RESUMO
O desafio de se trabalhar sustentabilidade e relações de gênero está vinculado à existência de
desigualdades de gênero construídas socialmente, que negam e subvalorizam o papel reprodutivo e
produtivo da mulher. Além disso, a complexidade da crise ambiental evidenciada a partir de 1960,
que pautou o imperativo debate sobre a conservação da biodiversidade, exige, enquanto estratégia
para sua compreensão e superação, a construção de um novo saber com a interação entre
conhecimentos, incluindo os saberes das populações rurais, e em especial, os saberes construídos e
acumulados pelas mulheres.
Estudos recentes têm enfatizado a importância do trabalho desempenhado pelas mulheres na
sustentabilidade e manutenção da biodiversidade, partindo da construção e transmissão de saberes
sobre as variedades de plantas e sementes e sua utilização, e da importância de suas práticas para a
aclimatação de espécies.
Nesse sentido, com o objetivo de estudar as práticas, experiências e saberes das mulheres
agricultoras familiares no semi-árido e sua relação com a conservação da biodiversidade, encontra-
se em andamento uma pesquisa realizada junto às famílias agricultoras município de Triunfo-
Pernambuco, na microrregião Vale do Pajeú, sertão pernambucano, a 411 km de Recife.
Espera-se com o estudo, evidenciar a importância das mulheres no manejo e conservação da
biodiversidade, na perspectiva da valorização de seus saberes e práticas tradicionais na direção da
construção de relações de gênero mais justas, de forma a perceber a relação entre esses aspectos e
os processos de auto-afirmação das mulheres enquanto sujeito político, proporcionando a reflexão
sobre sustentabilidade e relações de gênero.
Palavras-chave: Relações de gênero, sustentabilidade, agricultura familiar, semi-árido.

ABSTRACT
The challenge of working sustainability and relations of gender is tied with the existence of
inequalities of gender constructed socially, that deny and give little value to the reproductive and
productive role of the woman. Moreover, the complexity of the evidenced ambient crisis from 1960,
that directed the imperative discussion on the conservation of biodiversity, demands, while strategy
for its understanding and overcoming, the construction of a new acquirement with the interaction
between knowledges, including the acquirements of the rural populations and, in special, the
acquirements constructed and accumulated for the women.
Recent studies have emphasized the importance of the work played for the women in the
sustainability and maintenance of biodiversity, leaving of the construction and transmission of the
acquirements on the varieties of plants and seeds and its use, and the importance of their pratices for
the species acclimatization.
In this direction, with the objective to study the practical ones, experiences and acquirements
of the small-scale farmers women in the semiarid region and their relation with the conservation of
biodiversity, a research meets in progress with the agriculturists families in the City of Triunfo
(State of Pernambuco), in the microregion Pajeú Valley, inland of Pernambucano, distant 411 Km
from Recife.
One expects with the study, to evidence the importance of the women in the handling and
conservation of biodiversity, in the perspective of the valuation of their acquirements and traditional
pratices in the direction of the construction of relations of gender more rightness, with the intention
Fórum Internacional do Meio Ambiente - A conferência da Terra 274

to perceive the relation between these aspects and the processes of self-affirmation of the women
while politician subject, providing the reflection on sustainability and relations of gender.
Key words: Relations of gender, sustainability, small-scale agriculture, semiarid.

Não é noticioso pautar, nos debates atuais, o questionamento do termo “desenvolvimento


sustentável”. Há alguns anos o mesmo vem conquistando peso nos espaços de discussão sobre
questões ambientais e estratégias de sustentabilidade. Ainda assim, considera-se forçoso insistir em
iniciar este artigo a partir de um posicionamento aberto acerca do tema, visto que falar em
“desenvolvimento” sustentável pressupõe partir de um lugar, definir de que tipo de
“desenvolvimento” se está tratando.
A corrente econômica dominante, de forma geral, trabalha com o termo desenvolvimento
associado à noção de “progresso” e crescimento econômico, ancorada no estilo e padrão de vida e
de consumo das sociedades ocidentais industrializadas.
Sob essa ótica do “progresso” e do “desenvolvimento”, o final do século XX foi marcado
por inúmeras transformações na agricultura, especialmente no Pós-Segunda Guerra Mundial. À luz
da “modernização tecnológica”, emerge a conhecida “Revolução Verde”, sob a égide de combater
a fome e a miséria do mundo. A partir da imposição de um conjunto de técnicas, implementos e
práticas agrícolas, como a utilização de insumos industriais, máquinas sofisticadas, agrotóxicos,
adubos químicos e sementes modificadas, dentre outros, a “Revolução Verde” modificou a estrutura
da agricultura brasileira, visando a produção em larga escala para a exportação, e isso trouxe
inúmeros prejuízos relacionados à degradação ambiental e sócio-cultural das famílias agricultoras,
sem, no entanto solucionar o problema da fome e da miséria:
Essa nova lógica de produção, aumentou os custos, principalmente, com insumos e
máquinas, sendo que a rentabilidade quase sempre significou perdas para as famílias
rurais (...) com o passar do tempo e a intensificação do processo de modernização, os
problemas foram aumentando, principalmente devido aos seus impactos ambientais,
sociais e econômicos, principalmente nos países subdesenvolvidos, relacionados ao
aumento da pobreza no campo e o conseqüente êxodo rural. (Pastore: 2005, p. 4)

Caporal e Costabeber (2007), referindo-se a estudos da EMBRAPA, salientam que num


intervalo de 15 anos, entre 1964 e 1979, a produtividade dos 15 principais cultivos do Brasil cresceu
apenas 16,8%, enquanto que o consumo de fertilizantes químicos cresceu 124,3%, de inseticidas
233,6%, de fungicidas quase 600%, de tratores mais de 389,1% e de herbicidas mais de 5.414%.
A partir do final dos anos 1960 e inicio de 1970, o mundo começa a perceber que os
resultados da difusão de tais tecnologias e técnicas produtivas seriam insuficientes para resolver os
problemas da oferta de alimentos e das desigualdades, além de provocar efeitos catastróficos sobre
a natureza de forma acelerada.
A crise ambiental evidenciada, pautou a discussão sobre o modelo de desenvolvimento
econômico mundial e a questão da finitude dos recursos naturais, incitou a preocupação com a
biodiversidade e sustentabilidade dos ecossistemas como elemento de destaque.
Estudos recentes sobre a perda da diversidade biológica da Terra, demonstram que
diariamente são extintos cerca de 150 tipos únicos de organismos vivos, numa velocidade entre 100
a 1000 vezes maior do que antes da existência humana na Terra, sendo que para cada 10.000
espécies extintas, apenas uma consegue evoluir39.
Shiva (2003) enfatiza que os trópicos são o berço da diversidade biológica do planeta, com
uma multiplicidade de ecossistemas, estando a maior parte dos países do Terceiro Mundo
localizados aí, sendo dotados de uma imensa riqueza em diversidade biológica. As duas principais
causas da deterioração da biodiversidade, enfatiza a autora, são a destruição dos habitats
provocados por megaprojetos como barragens, minas, e aqüiculturas, e a pressão tecnológica e

39
Jansson, 2007
Fórum Internacional do Meio Ambiente - A conferência da Terra 275

econômica para substituir a diversidade por homogeneidade na silvicultura, na agricultura, na


piscicultura e na criação de animais.
No Brasil como um todo a situação não é diferente, tão pouco na região Semi-Árida. A
mesma conta com uma área de mais de 980 mil quilômetros quadrados, a população que
corresponde a aproximadamente 13% da população do país, e 45% da Nordestina40. O bioma
predominante na região é a Caatinga, que ocupa uma área equivalente a 70% da área do Nordeste e
13% do Brasil. É, no entanto, um dos biomas mais alterados pelas atividades humanas; ainda entre
1970 e 1980 o IBGE registrou que cerca de 68% da área estava antropizada em algum grau, sendo
que 35,3% encontravam-se extremamente antropizadas (mais de 60% da área alterada); 13,7%
estavam muito antropizadas (entre 30 e 60% da área alterada); 19,4% pouco antropizadas (menos de
30%); e 31,6% estavam não antropizadas (com nenhuma área alterada identificada), estas últimas
estavam distribuídas na forma de ilhas no interior do bioma, formando os brejos de altitude.
Fruto principalmente da disseminação do modelo agrícola químico-mecanizado e de práticas
agrícolas inapropriadas para obtenção de produtos agrícolas, madeiras e pastoril, Almeida et al
(2001) apresenta que atualmente mais de 80% da vegetação da caatinga são sucessionais,
aproximadamente 40% mantidos em estágio pioneiro de sucessão secundária, e cerca de 15% da
caatinga encontra-se em processo de desertificação.
Isso sem contar que é o único “bioma” exclusivamente brasileiro, considerado patrimônio
biológico, e é encontrado exclusivamente no Nordeste. Foi reconhecido como uma da 37 grandes
regiões naturais do planeta, pelo estudo coordenado pela Conservation International.
Esse bioma tem sua vegetação constituída, principalmente, de espécies lenhosas, cactáceas,
bromeliáceas e pequenas herbáceas, geralmente com espinhos, e caducifólias, ou seja, perdem suas
folhas no início da estação seca, daí o nome “catinga” de origem Tupi-Gurani, que significa floresta
branca. Uma das principais características é sua heterogeneidade, pois inclui pelo menos uma
centena de diferentes tipos de paisagens únicas, além disso, é rico em espécies. Até o momento
foram registradas 932 espécies de plantas vasculares, sendo 380 endêmicas, e 20 gêneros,
pertencentes a 42 famílias; além disso registra-se a existência de 185 espécies de peixes (57% de
endemismo), 154 de répteis e anfíbios, 348 de aves (4,3% de endemismo), e 148 espécies de
mamíferos41.
O Semi-Árido, compreendido aqui para além de suas características climáticas ou naturais, é
uma região marcada por especificidades culturais, simbólicas, históricas e políticas. Isso implica
considerar, em sua caracterização, as varias estratégias de convivência construídas pelas famílias
agricultoras no Semi-Árido brasileiro ao longo da história.
Além disso, o questionamento desse modelo “desenvolvimento” tratado acima, passa pela
perspectiva da valorização de alternativas sustentáveis, na relação que homens e mulheres
estabelecem entre si e com a natureza nos diferentes contextos e regiões.
Em se tratando da produção agrícola e pecuária, a agricultura familiar ou tradicional42 é
compreendida aqui como uma forma mais vantajosa de produção em relação ao modelo químico
mecanizado de monoculturas em larga escala, por suas características inerentes, como a diversidade
de cultivos, as relações sociais e de produção estabelecidas e o manejo dos agroecossistemas.
Na perspectiva de valorização dessas alternativas, aos poucos foram sendo construídas
algumas estratégias no campo da agroecologia chamadas de “conversão ecológica da agricultura”
ou “transição agroecológica”43, com o intuito de fortalecer experiências de manejo sustentável dos
recursos naturais na produção agrícola em unidades da agricultura familiar.
Enquanto alternativa para a sustentabilidade da agricultura, a agroecologia é adotada na
perspectiva de uma melhor relação no manejo dos recursos naturais que conta com a realização de
atividades compatíveis com a preservação do meio-ambiente, a produção de alimentos saudáveis e a
partir de relações sociais justas. Ou, Conforme Weid:

40
Ministério da Integração Nacional, 2005.
41
UFPE, 2003.
42
Almeida et al, 2001.
43
Ibdem.
Fórum Internacional do Meio Ambiente - A conferência da Terra 276

Agroecologia se define como uma abordagem que procura utilizar os bens e serviços da
natureza da melhor forma possível como instrumentos funcionais (...) se constrói
mobilizando os conhecimentos e habilidades dos agricultores e incorporando os
conhecimentos científicos mais avançados trazidos pela ecologia, biologia, etc. (Weid:
2001, p. 6)

Assim, a Agroecologia, enquanto ciência e modo de vida, pressupõe mudanças de valores e


no manejo dos agroecossistemas, a partir da diversificação dos sistemas agrícolas, autonomia e
interdependência entre os subsistemas que compõem as unidades produtivas, o que resulta, na
prática, em menor dependência de insumos externos, mais qualidade de vida, menor degradação
ambiental, produção de alimentos saudáveis, relações sociais justas, ampliação da biodiversidade,
dentre outros.
Contudo, não obstante ao crescimento, nas últimas duas décadas, das estratégias e
experiências agroecológicas, muitas dessas abordagens ainda não conseguiram contemplar a
sustentabilidade em suas múltiplas dimensões. Em especial, o enfrentamento das questões de gênero
ainda não conseguiu tornar-se uma prioridade em grande parte dessas abordagens.
Pastore (2005), retrata que apesar de sugerirem um novo sistema de produção, apresentando
bons resultados, principalmente nos aspectos ambientais e econômicos, essas abordagens têm
permanecido, em grande parte, “imersas num ambiente patriarcal reproduzindo-se as desigualdades
entre homens e mulheres” (Pastore, 2005, p. 4).
Partindo do princípio que a idéia de sustentabilidade emerge enquanto alternativa em meio
ao debate sobre “crescimento” versus “desenvolvimento”, considera-se, pois, que a mesma deva
estar ancorada numa abordagem multidimensional, isto pressupõe considerar a complexidade dos
elementos que compõem a realidade, envolvendo os aspectos econômicos, ecológicos, políticos,
sociais, culturais e éticos.
Nessa linha, consideramos que tanto os debates sobre a sustentabilidade, como sobre as
relações sociais de gênero, configuram-se como contraposição às concepções produtivistas e
economicistas que são norteadas pela lógica do capital e do mercado.
Reconhecer que as práticas de desigualdades econômicas, ambientais e sociais também se
configuram nas relações injustas entre os sexos é pressuposto básico para a inserção das discussões
sobre gênero no debate sobre as estratégias de sustentabilidade.
Ao falar em relações sociais de gênero, faz-se referência a um conceito usado para explicar a
construção social do ser mulher e do ser homem na sociedade, que, conforme Nobre (1998), possui
não apenas uma base ideológica, mas também uma base material que se expressa na divisão sexual
do trabalho, e, como toda construção, se refere a algo mutável. Assim, as análises acerca das
relações sociais de gênero devem estar associadas a um contexto histórico e sócio-cultural, e estão
interligadas a outras relações sociais como classe, etnia e geração.
É diante dessa leitura da realidade que propusemos a elaboração de uma pesquisa que
envolve o debate sobre sustentabilidade e relações de gênero. Enquanto parte do Programa de Pós-
graduação em Desenvolvimento e Meio Ambiente - PRODEMA da Universidade Federal de
Pernambuco- UFPE, tendo como foco, o estudo sobre o manejo e conservação da biodiversidade a
partir das práticas, experiências e saberes das mulheres agricultoras no Semi-Árido.
A pesquisa em curso, está sendo realizada junto à famílias agricultoras do município de
Triunfo - PE, localizado na microrregião Vale do Pajeú, sertão pernambucano, a 411 km de Recife.
Almeja-se, com o desenvolvimento desse estudo, evidenciar a importância das mulheres no manejo
e conservação da biodiversidade, na perspectiva da valorização de seus saberes e práticas
tradicionais na direção da construção de relações de gênero mais justas, de forma aperceber a
relação entre esses aspectos e os processos de auto-afirmação das mulheres enquanto sujeito
político.
A necessidade do enfrentamento da questão de gênero, representa nessa proposta um
desafio, tendo em vista as mulheres terem historicamente seu papel produtivo e reprodutivo negado
Fórum Internacional do Meio Ambiente - A conferência da Terra 277

e subvalorizado socialmente. Essa negação do papel produtivo da mulher tem raízes históricas e
sociais, e estão imbricadas no processo de construção de uma sociedade marcada por desigualdades
de gênero expressas na divisão sexual do trabalho44. Embora as mulheres constituam mais de 45%
da população rural45, elas representam 80,76% das ocupações não remuneradas no setor
agropecuário, exercendo 77,3% do trabalho não remunerado na agricultura, e 72,8% na pecuária46.
A condição de “membro não remunerado da família”, conforme Pacheco (2002) mascara o
significado da inserção produtiva das mulheres, expressando uma desigualdade de gênero.
A própria trajetória da política de Assistencia Técnica e Extensão Rural- ATER voltada às
famílias agricultoras aponta nessa perspectiva de negação do papel da mulher enquanto agricultora
e gestora dos agroecossitemas, tendo sua ação, durante muito tempo, voltada à práticas de
reafirmação e reprodução da divisão sexual do trabalho.
Siliprandi (2002) resgata o processo de constituição das organizações de ATER no Brasil, e
o remonta ao final da década de 40 até o início da década de 60, onde as famílias e as comunidades
eram o foco das ações extensionistas, sendo estas desenvolvidas por um técnico em Ciências
Agrárias e uma mulher capacitada a atuar no campo da economia doméstica.
Conforme a autora, às agricultoras era possibilitada a organização em grupos com o
acompanhamento das extencionistas, que orientavam os trabalhos para temas considerados
“femininos”, excluindo-as dos espaços de discussão que pautavam as questões tecnológicas e o
acesso a financiamentos para as atividades agrícolas, embora sempre tenham participado ativamente
dessas atividades.
Essas ações contribuíram para o processo de reafirmação e naturalização da divisão sexual
do trabalho, negando o papel das mulheres enquanto produtoras e gestoras ambientais. Além das
agricultoras, as mulheres técnicas extencionistas também sofriam restrições, além de serem
subordinadas aos técnicos, até a década de 70, eram impedidas de casar, e, até a década de 80, eram
proibidas de dirigir os automóveis da empresa47.
Nesse percurso, em conseqüência das lutas dos movimentos de mulheres, aos poucos foi
sendo inserida a discussão sobre o papel da mulher na agricultura. A própria Eco-92 já apresenta
propostas de uma “ação mundial pela mulher, com vistas a um desenvolvimento sustentável e
eqüitativo”48, resgatando, inclusive, as estratégias de Nairóbi para o progresso da mulher,
especialmente no que se refere à sua participação no manejo dos ecossistemas e controle da
degradação ambiental.
Pacheco (2002) resgata as principais contribuições do debate sobre as relações sociais de
gênero, no sentido de enfatizar as identidades e papéis masculinos e femininos como uma
construção histórica e social, sujeita, por tanto, a mudanças; além de contribuir para a
desnaturalização da divisão sexual do trabalho, para a superação das dicotomias entre espaços
público e privado, produtivo e reprodutivo, evidenciando que homens e mulheres ocupam
simultaneamente todas essas esferas.
É mister, pois, reconhecer o papel que as mulheres desempenharam historicamente a partir
da observação da natureza, desde o período neolítico, com a descoberta da agricultura e da pecuária,
até os dias atuais, ressaltando que esse processo não deve ser analisado sob uma ótica essencialista,
mas enquanto processo sócio-cultural construído historicamente.
Essa relação estabelecida pelas mulheres com o meio-ambiente, em muitos lugares, é de
grande importância para a manutenção da biodiversidade, pelo desenvolvimento de práticas, no
cultivo de hortas, lavouras e pequenos animais, como a seleção e o armazenamento de sementes,

44
Nobre,1998.
45
IBGE. Censo demográfico 2000.
46
IBGE: Pesquisa Nacional de Amostra Domiciliar – PNAD, 1998.
47
Siliprandi, 2002.
48
Agenda 21, capítulo 24: Ação mundial pela mulher, com vistas a um desenvolvimento sustentável e eqüitativo. Rio
de Janeiro 1992.
Fórum Internacional do Meio Ambiente - A conferência da Terra 278

aclimatação de novas espécies, construção e transmissão de saberes sobre a utilização de


determinados produtos, contribuindo para que esses materiais e saberes não se percam49.
Em pesquisa sobre a mulher na agricultura orgânica realizada pela UFSC, Karam (2004)
demonstra que, apesar de os homens serem, na maioria dos estabelecimentos, responsáveis pelos
sistemas de produção na agricultura orgânica, em 50% dos casos, a conversão do sistema
convencional ao orgânico foi assumido pelas mulheres. Outro aspecto de destaque da pesquisa foi
em relação aos saberes tradicionais, onde em mais de 70% das famílias, os conhecimentos
transmitidos pelas mulheres de geração em geração foi considerado muito importante, havendo
predominância do papel da mulher em relação aos cuidados com saúde.
Responsáveis, em grande parte, pela segurança alimentar das famílias, as mulheres acabam
por desempenhar múltiplas atividades, sendo uma delas o cuidado com a área do quintal, espaço ao
redor de casa, caracterizado pela diversidade, consistindo também em espaço de geração de renda,
segurança alimentar e saúde, além de campo de experimentação e aclimatação de espécies para
posterior utilização em maiores escalas. Segundo a OIT (2005), em um quintal de 0,4 ha na
Amazônia, identificou-se a existência de 68 espécies, destas, 55 haviam sido plantadas.
Isso corrobora para destacar o papel das mulheres na construção e transmissão de saberes
sobre as variedades de plantas e sementes, sua utilização, e a importância de suas práticas e
experiências para a aclimatação de espécies e a conservação da biodiversidade:
Em muitos lugares o trabalho que as mulheres realizam tem uma importância muito
grande para a manutenção da biodiversidade, pois ao fazerem a horta, os pequenos
cultivos, ao cuidarem dos animais domésticos, das plantas medicinais, elas estão
contribuindo para que esses produtos não se percam (porque guardam sementes,
aclimatam novas espécies, transmitem os conhecimentos sobre como utilizar cada
produto). (Siliprandi: 2005, 16p.)
Espera-se, com a realização da referida pesquisa, além do resgate e valorização das ações
das mulheres no Semi-árido para a conservação da biodiversidade, possibilitar a discussão sobre
gênero e sustentabilidade, fomentando possíveis debates sobre políticas públicas para o
desenvolvimento sustentável no Semi-Árido focados na valorização dos saberes e das experiências
das mulheres no manejo e conservação da biodiversidade.
Discutir uma proposta de sustentabilidade e de convivência com o semi-árido, a partir das
estratégias de manejo e conservação da biodiversidade que trabalhe as relações sociais de gênero
numa perspectiva mais justa passa, conforme Pacheco (2002), pelo empoderamento das mulheres e
valorização de seu papel enquanto gestoras da biodiversidade e produtoras de bens e saberes.

REFERÊNCIAS BIBLIOGRÁFICAS
AGENDA 21- Câmara dos Deputados – Comissão de Defesa do Consumidor. Meio Ambiente e
Minorias. Centro de Documentação. Rio de janeiro, 1992.
ALMEIDA, Silvio Gomes de; PETERSON, Paulo; CORDEIRO, Ângela. Crise socioambiental e
conversão ecológica da agricultura brasileira: subsídios à formulação de diretrizes ambientais
para o desenvolvimento agrícola. Rio de Janeiro: AS-PTA, 2001.
BROWN, Lester R. Eco-economia: construindo uma economia para a terra. Salvador: UMA,
2003.
CAPORAL, F. R. e COSTABEBER, J. A. Agroecologia e Extensão Rural: Contribuições para a
Promoção do Desenvolvimento Rural Sustentável. Brasília: MDA/SAF/DATER, 2007.
JONSSON, Micael. Perda de biodiversidade e funcionamento dos ecossistemas. In: Ecologia. INFO
30: Ecology Online Sweden, 2007.
KARAM, Karen Follador. A mulher na agricultura orgânica e em novas ruralidades. In. : Estudos
Feministas. Forianópolis, 12(1): 360, jan-abril, 2004.
LEFF, Enrique. Saber ambiental. Petrópolis: Vozes, 2004.

49
Siliprandi, 2005.
Fórum Internacional do Meio Ambiente - A conferência da Terra 279

MINISTÉRIO DA INTEGRAÇÃO NACIONAL-MI. Relatório final do Grupo de Trabalho


Interministerial para redelimitação do SemiÁrido Nordestino e do polígono das secas. Brasília,
março, 2005.
NOBRE, Miriam. Relações de gênero e agricultura familiar. In.: Gênero e agricultura. Cadernos
sempreviva. São Paulo: SOF, 1998.
OIT, Organização Internacional do Trabalho. Manual de capacitação e informação sobre gênero,
raça, pobreza e emprego: guia para o leitor/OIT. Brasília: OIT, 2005.
PACHECO. Maria Emília Lisboa. Agricultura Familiar: sustentabilidade ambiental e equidade de
gênero. In.:Perspectivas de Gênero: Debates e questões para ONGs. Recife: GTGênero -
Plataforma de Contrapartes Novib/ SOS CORPO Gênero e Cidadania, 2002.
PASTORE, Elenice. Relação de Gênero na Agricultura Ecológica. Texto para discussão n. 06,
Universidade de Passo Fundo: Rio Grande de Sul, 2005.
SHIVA, Vandana. Monoculturas da Mente: perspectivas da biodiversidade e da biotecnologia. São
Paulo: Gaia, 2003.
SILIPRANDI, Emma. Segurança alimentar, nutricional e gênero. In.: Gênero, Agroecologia e
Segurança Alimentar: Interfaces temáticas na prática das organizações sociais. Grupo de Trabalho
em Gênero e Agroecologia. Belo Horizonte: Rede de Intercâmbio de Tecnologias Alternativas,
Rede Economia e Feminismo – SOF – 2005.
___________. (coordenadora). Desafios para a extensão rural: o “social” na transição
agroecológica. In.: Agroecologia e Desenvolvimento Rural Sustentável. Porto Alegre, v.3, n. 3,
jul/set 2002.
UFPE. Ecologia e Conservação da Caatinga. Recife: Ed. Universitária da UFPE, 2003. Disponível
em : http://www.cepan.org.br. Acesso em 10/02/07.
WEID, Jean Marc von der. Qual Estratégia para o Desenvolvimento Rural? Rio de Janeiro: As-pta,
2001.
Fórum Internacional do Meio Ambiente - A conferência da Terra 280

MEIO AMBIENTE E QUALIDADE DE VIDA: APONTAMENTOS INICIAIS SOBRE


PERCEPÇÕES E PRÁTICAS NAS ÁREAS PRODUTORAS DE PETRÓLEO NO RIO
GRANDE DO NORTE50

Anieres Barbosa da Silva


(DGE/UFRN) – anieres@uol.com.br
Rita de Cássia da Conceição Gomes
(DGE/UFRN) – ricassia@ufrnet.br
Valdenildo Pedro da Silva
(CEFET/RN) – valdenildo@cefetrn.br

RESUMO
O presente trabalho tem por finalidade discutir a percepção ambiental que as populações,
residentes nos municípios produtores de petróleo no estado do Rio Grande do Norte têm sobre os
problemas ambientais por elas vivenciados, no nível domiciliar. As áreas produtoras de petróleo,
embora apresentem processos de geração de emprego e renda, são marcadas por permanentes
degradações do meio ambiente construído. Isso tem desafiado a implementação de ações que
possibilitem tanto a melhoria das condições de vida - ancoradas numa base técnica e socialmente
eficiente -, quanto à redução da degradação do meio natural provocada pela atividade petrolífera. O
estudo em tela baseia-se, neste momento, numa abordagem teórica centrada num enfoque
descritivo-reflexivo, como referencial para a análise do meio ambiente da área produtora de
petróleo no Rio Grande do Norte, que constituem como parte e totalidade do mundo real. Trata-se
de um tema geográfico pouco estudado no âmbito local, cujo conhecimento possibilita uma abertura
para reflexões sobre a temática em contextos sociais caracterizados pela desigualdade de acesso aos
bens e a renda gerada pela atividade petrolífera.
Palavras-chaves: Meio Ambiente; Petróleo; Percepção Ambiental.

ABSTRACT
This paper aims to discuss the environmental perception that the people, living in the
municipalities in the oil-producing state of Rio Grande do Norte have on the environmental
problems they experienced in the household level. The oil-producing areas, although present
procedures for generation of employment and income, are marked by permanent deterioration of the
environment built. This has challenged the implementation of actions enabling both the
improvement of living conditions - anchored on a technical basis and socially efficient - as to the
reduction of the degradation of the natural environment caused by the oil activity. The study is
based on screen at the moment, in a theoretical approach focused on a descriptive approach
reflexive, as reference for the analysis of the environment of the area producing oil in Rio Grande
do Norte, which are in full as part of the real world. It is a theme geographic little studied within
that state, whose knowledge allows an opening for thoughts on the subject in social contexts
characterized by unequal access to assets and income generated by oil activity.
Keywords: Environment; Oil; Environmental perception.

INTRODUÇÃO
Mais do que em qualquer outra época de vivência da humanidade, tem-se nesta
contemporaneidade uma multiplicidade de problemas ambientais: esgotamento de recursos naturais,
proliferação de resíduos sólidos, insalubridade residencial, contaminação de mananciais, de solos e
da água, dentre outros. Assim considerando, o presente estudo tem como objeto de reflexão a
percepção ambiental que as populações residentes nos municípios produtores de petróleo no estado
do Rio Grande do Norte têm dos problemas ambientais por elas vivenciados, no nível domiciliar e

50
Pesquisa que está sendo desenvolvida na Base de Pesquisa em Estudos Urbanos e Regionais (BPEUR) do
Departamento de Geografia da Universidade Federal do Rio Grande do Norte. Conta com apoio financeiro do Conselho
Nacional de Desenvolvimento Científico e Tecnológico (CNPq).
Fórum Internacional do Meio Ambiente - A conferência da Terra 281

no seu entorno, vez que tais problemas têm sido praticamente ignorados ou recebem pouca atenção,
tanto dos órgãos públicos quanto das empresas que estão relacionadas diretamente com essa
importante atividade econômica. Entendemos que a percepção ambiental é de importância cabal
para a explicação das dimensões geográficas. Esta é entendida, por nós, como a maneira pela qual o
ser humano se informa dos objetos e transformações que se manifestam ao seu redor, sendo
estudada com o objetivo de se compreender a relação homem-ambiente, suporte importante para o
desenvolvimento de outros estudos que considerem essa relação. Conduzido por essa concepção, o
estudo descartará qualquer visão simplificadora da realidade geográfica, detendo-se numa análise
integrada e interdisciplinar das questões ambientais.
Metodologicamente, optamos pela realização de entrevistas, sendo estas centradas nas
donas de casa. Esta opção se deve ao fato de que elas estão, na grande maioria, participando
ativamente da formação e orientação familiar, e, portanto, vivem mais cotidianamente os problemas
ambientais. A amostra da pesquisa não utiliza um critério numérico ou quantitativo, mas
procedimentos qualitativos, dando prioridade à percepção ambiental. Na entrevista estruturada com
esses informantes serão inquiridos dados sobre: condições de infra-estrutura, moradias, segurança,
água, esgoto, lixo, poluição, renda etc.
À vista do acima exposto e dos objetivos a que se propõe, a pesquisa segue alguns
procedimentos metodológicos, dentre os quais destacamos: sistematização de estudos de grupo
voltados para a temática em pauta; levantamento, coleta e análise de dados secundários, além de
pesquisa de campo nos municípios produtores de petróleo do Estado, todos localizados nos terrenos
sedimentares da bacia Potiguar. Dessa Bacia fazem parte os municípios de Açu, Alto do Rodrigues,
Apodi, Areia Branca, Caraúbas, Carnaubais, Felipe Guerra, Governador Dix-sept Rosado,
Guamaré, Macau, Mossoró, Pendências, Porto do Mangue, Serra do Mel e Upanema (Figura 1), e
também os municípios cearenses de Aracati e Icapuí.

Figura 1 – Municípios produtores de petróleo no estado do Rio Grande do Norte.

De um modo geral, as áreas produtoras de petróleo são marcadas por processos de geração
de emprego e renda, que simultaneamente convivem com permanentes degradações do meio
ambiente construído. Isso tem desafiado a implementação de ações que possibilitam tanto a
melhoria das condições de vida, ancoradas numa base técnica e socialmente eficiente, quanto ao
impacto da degradação do meio ecológico. Nesse sentido, questões inerentes à análise dos
Fórum Internacional do Meio Ambiente - A conferência da Terra 282

determinantes do processo, os atores envolvidos e as formas de organização social que contribuem


para novos desdobramentos e alternativas de ação numa perspectiva de sustentabilidade devem estar
contidos em estudos volvidos com a temática em foco.

A EXPLORAÇÃO DO PETRÓLEO NO RIO GRANDE DO NORTE: BREVES NOTAS


A indústria do Petróleo é, na atualidade, um dos mais importantes setores econômicos da
sociedade moderna e, de modo, particular do Rio Grande do Norte, que é considerado como um dos
maiores produtoras de óleo e gás natural do território brasileiro. Nesse aspecto, cabe ressaltar que o
campo de exploração do petróleo do Canto do Amaro, localizado entre os municípios de Mossoró e
Areia Branca, é um dos maiores produtores de petróleo em terra do Brasil, extraindo 47 mil barris
por dia em, aproximadamente, 3,5 mil poços perfurados. Essa produção corresponde a 50,5% da
produção total do Estado que é, em média, de 93 mil barris/dia. O gráfico 01 expressa a evolução da
produção do petróleo no Rio Grande do Norte, desde o ano de 2000.

Gráfico 01 – Produção de petróleo no Rio Grande do Norte. Fonte: Agência Nacional do Petróleo,
2007.

Para se ter uma idéia da importância do petróleo para a economia potiguar, e


particularmente para a área de estudo, o pagamento de royalties efetuado aos municípios produtores
de petróleo no Estado, no ano de 2006, foi de R$ 113.072.372,40 (tabela 01), constituindo-se em
uma importante fonte de recursos financeiros para aplicação em investimentos nos municípios.
Entretanto, os dados contidos na tabela apontam para uma aplicação dos royalties de forma não
integral, instigando-nos a questionar sobre a sua real aplicação pelos gestores municipais.
Fórum Internacional do Meio Ambiente - A conferência da Terra 283

Tabela 01 – Repasse de royalties da Petrobrás para municípios produtores de petróleo no Rio


Grande do Norte (2006).
Despesas de Aplicação em
Receita de Royalties
Municípios Investimentos Investimentos
(valores em R$)
(valores em R$) (valores em %)
Açu 3.381.246,78 2.452.750,00 72,5
Alto do Rodrigues 3.861.633,48 1.285.716,00 33,3
Apodi 3.068.003,39 2.536.714,00 82,7
Areia Branca 10.789.404,56 3.048.065,00 28,3
Caraúbas 2.005.872,16 1.164.498,00 58,1
Carnaubais 1.973.903,55 148.843,00 7,5
Felipe Guerra 3.561.519,52 1.639.874,00 46,0
Gov. Dix-sept Rosado 3.551.886,63 2.290.536,00 64,5
Guamaré 22.318.391,10 9.996.438,00 44,8
Macau 22.377.562,99 4.751.369,00 21,2
Mossoró 24.834.159,54 24.617.004,00 99,1
Pendência 3.009.687,41 2.039.484,00 67,8
Porto do Mangue 4.657.637,93 778.311,00 16,7
Serra do Mel 1.680.534,14 844.706,00 50,3
Upanema 2.000.929,22 1.707.674,00 85,3
TOTAL 113.072.372,40 59.301.982,00 52,4
Fonte: Base de pesquisa Royalties do Petróleo da Ucam-Campos, 2007.

Apesar da elevada produção e da renda gerada pela exploração do petróleo, as áreas rurais
dos municípios produtores, mesmo recebendo royalties pagos pela Petrobrás, convivem com
diversos problemas de ordem socioambiental, haja vista os suportes econômicos dessas áreas ainda
estão basicamente pautados numa economia decadente, ou melhor, em processo de declínio, como é
o caso do complexo gado-algodão-agricultura de subsistência. Além disso, a maior parcela desses
municípios praticamente sobrevive dos recursos oriundos do Fundo de Participação dos Municípios
(FPM) e de assinatura de convênios com os governos estadual e federal.
Um outro componente do quadro econômico dos municípios contemplados pela pesquisa
diz respeito às aposentadorias dos idosos e às transferências de renda, por meio de Programas
Assistencialistas, como o Programa Bolsa Família, os quais têm se constituído numa importante
fonte de renda para as famílias de menor poder aquisitivo. Mesmo assim, as sedes municipais têm
apresentado dificuldades em suas gestões e, sobretudo, no atendimento aos anseios e necessidades
das populações, principalmente no que se refere às condições ambientais.
Aliando-se aos considerandos acima, acrescenta-se que a análise da literatura pertinente
evidencia que até recentemente os problemas ambientais que afetam o cotidiano da população, no
nível domiciliar, seja da área rural ou urbana têm permanecido praticamente ignorados ou recebem
pouca atenção tanto dos ambientalistas quanto dos órgãos públicos, em diversos níveis de atuação.
As discussões têm se concentrado, geralmente, em fenômenos globais como: o efeito estufa, o
buraco da camada de ozônio, a destruição da floresta amazônica, dentre outros. Esses ameaçam o
Planeta e os Grandes Ecossistemas, deixando de lado, ou em segundo plano, os agravos da
degradação ambiental, particularmente nas relações entre a vida cotidiana das famílias e o seu
espaço vivencial, ou seja, no cotidiano socioambiental das populações em seus domicílios.
Fórum Internacional do Meio Ambiente - A conferência da Terra 284

Geralmente, essas discussões têm ficado restritas aos espaços ocupados pelas médias e
grandes cidades do Brasil, já que não se têm contemplado estudos sobre os problemas ambientais
das áreas rurais, principalmente, lançados questionamentos sobre as qualidades ambientais e de vida
das populações que vivem nas áreas mais pobres do País.
Matizada por esse contexto, a pesquisa em tela se propõe a estudar, a partir de uma análise
de natureza qualitativa, um aspecto importante dessa problemática: os problemas ambientais das
populações residentes na área de produção de petróleo do Rio Grande do Norte, tendo como
referência as percepções e priorizações dos moradores dos domicílios locais. Trata-se de um
contexto geográfico pouco estudado no âmbito desse Estado, cujo conhecimento possibilita uma
abertura para reflexões sobre a temática em contextos sociais caracterizados pela desigualdade de
acesso aos bens e a renda gerada pela atividade petrolífera.
Como foi salientado anteriormente, constituem-se como espaços de análise dessa pesquisa
os quinze municípios produtores de petróleo no território potiguar. Pesquisas preliminares
revelaram que esses espaços são realidades caracterizadas tanto por uma dinâmica econômica e por
avançados padrões tecnológicos quanto por problemas de ordem socioeconômica dos mais diversos,
o que, certamente, contribui também para os problemas socioambientais vivenciados principalmente
no meio rural. Nessa dialética ficam expressas realidades sociais diversas, resultantes, de um lado,
da concentração de renda e, de outro, da disseminação da pobreza e de agressões ao meio natural.
Nas formas espaciais essa dialética ainda é mais perceptível. Os edifícios imponentes,
como os que ocupam o espaço urbano em Mossoró, se contrapõem às casas das favelas e,
principalmente aos casebres ainda existentes na zona rural pertencente àqueles que, mesmo sabendo
de suas adversidades, primam pela sua identidade.

EM BUSCA DE UMA ABORDAGEM TEÓRICO-CONCEITUAL


Inicialmente, entendemos que o processo perceptivo ocorre pelo o ato do perceber e isso
significa ter um conhecimento por meio dos sentidos, objetos e situações, organizando
interiormente os elementos levados pelos sentidos a partir da realidade social exterior. Para nós, o
ser humano percebe o mundo simultaneamente por todos os seus sentidos, e a informação
disponível é imensa. Sabemos que as pessoas percebem de acordo com sua visão individual, ou
seja, em sintonia com sua personalidade, refletindo sua natureza, anseios, sonhos, experiências e
desejos. Além do mais, a percepção é diferente de acordo com o gênero, classe social, idade,
profissão, escolaridade, local de moradia e ambiente cultural, sendo, portanto, altamente
exploratória e seletiva. Para que se possa analisar a percepção da população que habita nos
municípios produtores de petróleo no estado do Rio Grande do Norte, entende-se ser importante a
explicitação do entendimento sobre os conceitos de meio ambiente, questão ambiental e percepção.
Tem-se conhecimento que na literatura disponível existem várias acepções desses
conceitos. Renunciando ao tratamento analítico das diversas concepções sobre meio ambiente, tem-
se a compreensão que esse conceito designa não apenas um aspecto específico, como paisagens,
assentamentos ou espaços naturais, mas também uma relação de interdependência, o que implica
pensar o meio ambiente como um ambiente socialmente produzido e configurado enquanto um
meio natural modificado pela ação humana.
Segundo Godard citado por Vieira (1998, p. 73),
o conjunto de objetos designados sob a categoria de meio ambiente define-se somente
em referência a um sujeito principal (um ator, um agente, um sistema) e mais
particularmente em referência às percepções, aos interesses, às funções e à sensibilidade
deste sujeito; os objetos e processos que compõem o meio ambiente não se encontram
reunidos num mundo único senão através do tipo de interesse e dos modos de ação do
sujeito. [...] O meio ambiente constitui assim o produto ideal do sujeito, ou, mais
precisamente, a categoria cognitiva que designa os objetos especificados por sua relação
a um sujeito de referência.
Fórum Internacional do Meio Ambiente - A conferência da Terra 285

Ainda nessa mesma linha de raciocínio, ressaltamos o pensamento de Casseti (1996) que
procura entender o meio ambiente a partir da relação homem versus meio. Assim para esse autor,
A relação homem meio contém em si duplo aspecto, ou seja, é relação ecológica e
relação histórica social, tem-se que a questão ambiental encontra-se fundamentada na
relação de propriedade das forças produtivas, determinada pela relação homem-homem
(CASSETI, 1996, p.25).

Desse modo, para que se compreenda o significado de meio ambiente é importante


considerar, também, as relações de propriedades das forças produtivas. Isto porque os problemas
ambientais são, em suma, decorrentes das formas de apropriação e transformação da natureza, cuja
origem encontra-se nas relações sociais.
A problemática ambiental, mesmo que não fosse esse o termo utilizado, tornou-se uma
velha e conhecida questão que vem perpassando toda construção do conhecimento humano, desde
os seus primórdios na Antigüidade Clássica no âmago do povo grego até os dias atuais. No entanto,
a realidade tem nos mostrado que a separação natureza-sociedade parece não ter desaparecido na
sua plenitude, no correr dos tempos, tornando-se, por conseguinte, num dos mais velhos e
irresolvidos problemas das ciências nesta contemporaneidade.
Neste limiar de século, os problemas ambientais atingiram grande magnitude que
representam um verdadeiro desafio à sobrevivência da humanidade. Em qualquer área territorial –
urbana ou rural – a degradação ambiental (natural-social) já atingiu tal nível que a qualidade de vida
se encontra com o futuro ameaçado.
Como disse Comune (1994, p. 46),
Se no passado a economia condicionou a utilização do meio ambiente, sem se preocupar
com a degradação e exaustão dos seus recursos, atualmente parece ser o meio ambiente
que deve condicionar a economia.

O meio ambiente vem sendo destruído e no território de produção do petróleo no Rio


Grande do Norte, em particular, os problemas resultantes desta destruição tornam-se perceptíveis
por toda à parte. Esses, dizem respeito não apenas a problemas relacionados à natureza, mas às
problemáticas decorrentes das relações sociais. Nas palavras de Rodrigues (1998, p. 14),
Os problemas ecológicos parecem, à primeira vista, referir-se apenas às relações
homem/natureza e não às relações dos homens entre si. É preciso, assim, ter cuidado
para não ocultar a existência e as contradições de classes sociais para compreender a
problemática ambiental em sua complexidade, pois os problemas ambientais dizem
respeito a formas como o homem em sociedade se apropria da natureza.

Nesse sentido, procuramos entender, por meio da percepção, a problemática


socioambiental que vem se descortinando na área de produção do petróleo no Rio Grande do Norte.
A produção de petróleo tem posto em evidência uma territorialidade bastante perversa. Aí a
territorialidade de cada indivíduo-trabalhador e da sociedade como um todo se fragmenta em função
da expropriação do território e de cada um dos indivíduos locais em suas condições tradicionais de
vida.
Ao se referir ao processo produtivo, Paixão (1982, p. 216) fez uma importante colocação:
A história da produção social traduz-se na manutenção secular da contradição existente
entre o desenvolvimento das forças produtivas e a qualidade de vida social dos homens.
Negar, pois a existência de uma questão ambiental implica em primeiro lugar no não-
reconhecimento de que a relação natureza-sociedade tal qual ela se realiza hoje produz
efeitos drásticos em ambas as partes. Em segundo lugar, implica em negar valor à
própria condição concreta de existência desta mesma sociedade: a natureza.

O estudo em pauta tem, ainda, como suporte o pensamento de Corrêa (1997). Esse autor
entende que o meio ambiente, na atualidade, se confunde com o de meio geográfico, em virtude de
Fórum Internacional do Meio Ambiente - A conferência da Terra 286

que aquele está além dos limites das ciências da natureza. Para ele, o meio ambiente só é entendido
a partir de três dimensões que se encontram articuladas. Primeiramente, como resultado material da
ação humana, tratando-se da segunda natureza, da natureza transformada pelo trabalho social, em
seguida, o autor em tela expressou que o meio ambiente agrega os fixos e os fluxos e, em terceiro
lugar, ressaltou que um homem qualificado pelas suas relações sociais, na cultura, seu ideário,
mitos, símbolos, utopias e conflitos, [...] é produtor e usuário do meio ambiente, mas também, por
meio dele, algoz e vítima (CORRÊA, 1997, p. 154).
Esse entendimento permite pensar o meio ambiente da área definida para a realização da
pesquisa a partir do entorno e do domicílio, tendo como referencias indicadores de acesso e uso de
infra-estrutura e vivencia de agravos ambientais, dentre os quais se destaca os seguintes aspectos:
condições de moradia, de escolaridade, de saúde e de renda; identificação de problemas
domiciliares referentes às condições de abastecimento d’água e de seu armazenamento; disposição
de resíduos sólidos e exposição aos possíveis danos ambientais causados pela atividade petrolífera,
por meio de referenciais quantitativos e qualitativos.
Mesmo tendo a compreensão de que os dados qualitativos possam estar eventualmente
prenhes de subjetividade e por pontos de vista estritamente pessoais, entende-se que a obtenção
destes possibilita um entendimento mais abrangente das percepções e, ao mesmo tempo, pode
contribuir na construção de um (re) pensar sobre a inserção de determinantes qualitativos na
formulação de políticas públicas, tendo como referência a classificação dos temas pela ótica dos
moradores e sua disponibilidade para intervenções (JACOBI, 2006, p.184). Tal procedimento
implica uma análise das práticas sociais, sob a ótica da convivência/conflito com a dinâmica que
orienta as práticas econômicas e as políticas públicas.
Ainda de acordo com o pensamento desse autor:
a convivência com os agravos ambientais está relacionada com um conjunto de
interações que incluem fatores socioeconômicos, político-administrativos,
informacionais e socioculturais, sejam estes obstáculos ou benefícios. Dentro desta
perspectiva os resultados da pesquisa domiciliar possibilitam uma análise das práticas
sociais numa perspectiva de convivência com a dinâmica que rege as políticas públicas,
no sentido de verificar as expectativas, avaliar a qualidade dos serviços prestados e o
conhecimento que os moradores têm a respeito dos custos e impactos destes problemas
e seus fatores geradores. (JACOBI, 2006, p.182).

Com base nisso, entende-se ainda que a realidade geográfica contida neste estudo não é
vivenciada e nem percebida do mesmo modo pelos diferentes grupos sociais, uma vez que a
percepção ambiental tem uma base eminentemente cultural. Por isso, a percepção da questão
ambiental, como qualquer outra em geral, é uma resultante não somente do impacto objetivo das
condições reais sobre os indivíduos, mas também da maneira como sua interveniência social e
valores culturais agem na vivência dos mesmos impactos.
Cabe acrescentar que no estudo em questão, a percepção será entendida como a
“visão/compreensão” que as pessoas têm sobre os problemas ambientais que afetam a sua condição
de vida. A partir de fatores qualitativos, a percepção dos moradores (representados pelas donas de
casa) sobre as práticas sociais vinculadas à questão ambiental será analisada a partir da convivência
cotidiana dessas e sua vinculação com as condições de salubridade ambiental. Também fará parte
da análise o nível de engajamento ou relação com a formulação de demandas políticas e as formas
de ação frente aos problemas ambientais e o seu impacto na transformação das suas condições de
vida (JACOBI, 1997).
Ao utilizarmos a percepção dos moradores como um meio de elucidação dessa realidade
socioespacial, estaremos valorizando a experiência vivida (FRÉMOND, 1976) de cada um dos que
habitam os municípios produtores de petróleo do Rio Grande do Norte, para externarem suas
observações, sentimentos, utopias e sonhos. Lançando mão da percepção conseguiremos que esses
indivíduos, por meio de depoimentos e opiniões, expressem as relações entre a natureza em que
Fórum Internacional do Meio Ambiente - A conferência da Terra 287

vivem e se reproduzem, uma vez que cada grupo social dispõe de estruturas específicas para ler o
seu mundo real. Ou melhor, dizendo:
Cada um interpreta o mundo segundo perspectivas que tanto quanto as demais merecem
ser consideradas. As certezas de um mundo que acreditava-se, se impunha a todos da
mesma maneira, opõe-se as dúvidas de uma percepção doravante dividida,
impressionista, evanescente às vezes. (CLAVAL, 2002).

Nesse sentido, considera-se a percepção como a exteriorização de pensamentos,


sentimentos e pontos de vista interiores aos humanos. Acredita-se, ainda, que percepção e cognição
possuam relações recíprocas (PIAGET e INHELDER, 1993) e estão ligadas às vivências humanas
que se externam por meio da cotidianidade (TUAN, 1983).
Pode-se dizer que percepção é a resposta dos sentidos aos estímulos externos (TUAN,
1980, p. 04). Sendo assim, não é difícil compreender que as percepções decorrem da subjetividade,
sendo egocêntricas. Nesse sentido, pode-se dizer que a subjetividade [...] é um dos traços mais
marcantes do humanismo e deriva diretamente [...] da concepção antropocêntrica (GOMES, 1996,
p. 310).
Ao se realizar estudos geográficos que demandem análises e compreensões das relações
entre o homem e o seu meio é fundamental que se apreenda as percepções elaboradas pelos sujeitos
viventes, uma vez que são marcadas por subjetividades e informações da realidade socioespacial. É
por isso que se considera no trabalho em tela as percepções, em função destas revelarem
informações do cotidiano, isto é, das vivências humanas, o que só tem a contribuir para o
enriquecimento das discussões aqui traçadas.
Quando se trabalha com percepções, deve-se ter uma abordagem em que o ponto de partida
é o conhecimento revelado pelos pontos de vista populares. Esse conhecimento é resultado da
apreensão da realidade contida em um objeto (SANTOS, 2004, p. 92) não do ponto de vista
externo, mas, principalmente, pelas relações sociohistóricas que esse objeto contém, ou seja, o seu
sentido simbólico.
Para esse autor, os objetos carregados de significação transmitem esta significação a seus
observadores. (SANTOS, 2004, p. 94). Sendo assim, é fundamental que em estudos que considerem
os sentidos simbólicos dos objetos não se perca de vista a significação atribuída a cada objeto
espacial.
As percepções podem ser consideradas numa dimensão de complexidade que se
considerem, principalmente, aquelas marcadas por cognições, emoções, sentimentos, histórias e
simbolismos sobre as realidades socioespaciais, como é o caso das realidades construídas
simbolicamente pelos moradores da área do estudo em questão. Segundo Tuan (1983) é de suma
importância que se contemplem as vivências humanas, ou as experiências vividas, por intermédio
de percepções, pois estão relacionadas às vivências de cada indivíduo, mesmo que coletivamente,
em seu habitat, ou seja, as pessoas possuem diferentes percepções em função de possuírem
diferentes cotidianos (TUAN, 1983).
Trata-se, portanto, de uma cadeia de relações existente entre o que a população identifica
como problemas relativos ao meio ambiente no cotidiano domiciliar e o que detecta como causa
desses problemas. Nesse contexto, a análise das práticas e percepções no cotidiano permitirá uma
análise das diferenças existentes entre as práticas sociais e as atitudes das famílias dos diversos
estratos sociais nas áreas produtoras de petróleo no território potiguar. Nesse aspecto, faz-se
necessário esclarecer que:
Embora o cotidiano de cada família e seus condicionantes e estratégias assumam
características específicas, a percepção e a adoção de determinadas práticas, face à
existência de problemas ambientais e do seu impacto, decorre do conjunto de relações
sociais, no qual se inscreve as famílias e, notadamente, aquelas que são parte
componente de um universo de exclusão e de parcos rendimentos (JACOBI, 1996).
Fórum Internacional do Meio Ambiente - A conferência da Terra 288

Portanto, a relação entre meio ambiente e qualidade de vida será pensada durante a
pesquisa levando-se em consideração aspectos estreitamente relacionados a uma abordagem
intersetorial. Quando da análise entre ambiente (urbano e rural) e qualidade de vida tem-se como
pressuposto estabelecer mediações entre as práticas do cotidiano vinculadas a vivência domiciliar,
ao acesso a serviços, as condições de habitabilidade da moradia e as formas de interação e
participação dos moradores (McGRANAHAN, 1993).

PARA NÃO CONCLUIR


Esta pesquisa se encontra em andamento, por isso não trazemos a baila os resultados da
pesquisa de campo. No entanto, apresentamos essa abordagem teórica para a discussão, dada a
importância do estudo das questões ambientais, aqui considerando a percepção que as donas de casa
têm sobre os problemas ambientais de seus espaços vivenciais. Face à complexidade da temática
que estamos desenvolvendo fazem-se mister que sejam consideradas as interações humanas com o
sistema natural que se desenvolvem através das formas de apropriação dos recursos naturais e da
ocupação do território. Isto porque as relações entre o homem e o meio natural ocorrem a partir das
diversas formas de ocupação do território, da apropriação dos recursos naturais e da organização
social com vistas ao atendimento das suas necessidades socioeconômicas, culturais e ambientais.
Para o estudo da percepção ambiental e da qualidade de vida das donas de casas que vivem
nas áreas produtoras de petróleo do Rio Grande do Norte, tem-se como suporte de que a percepção
em geral, e a ambiental em especial, vêm exigindo da sociedade reflexões mais profundas e um
equacionamento teórico, prático e fatual. Nesse sentido, é interessante ressaltar que a percepção
ambiental perpassa por uma questão dialética, pois a dinâmica do mundo atual tem contribuído para
separar ou distanciar as pessoas de seu meio vivencial, muitas vezes impossibilitando o
conhecimento desigual e contraditório que o mesmo enceta.

REFERÊNCIAS BIBLIOGRÁFICAS
BRASIL. Agência Nacional do Petróleo. Disponível em: http://www.anp.gov.br. Acesso em: 19
set. 2007.
BRESSAN, Delmar. Gestão racional da natureza. São Paulo: Hucitec, 1996.
CASSETI, Valter. Ambiente e apropriação do relevo. São Paulo: Contexto, 1991.
CLAVAL, Paul. A revolução pós-funcionalista e as concepções atuais da geografia. In:
MENDONÇA, Francisco; KOZEL, Salete (Orgs.). Elementos da epistemologia da geografia
contemporânea. Curitiba: Ed. da UFPR, 2002.
COMUNE, Antônio Evaldo. Meio ambiente, economia e economistas: uma breve discussão. In:
MAY, Peter Herman; MOTTA, Ronaldo Serôa da (org.). Valorando a natureza: análise econômica
para o desenvolvimento sustentável. Rio de Janeiro: Campus, 1994.
CORRÊA, Roberto Lobato. Trajetórias geográficas. Rio de Janeiro: Bertand Brasil, 1997.
FEMURN. Federação dos Municípios do Estado do Rio Grande do Norte. Disponível em:
<http://www.femurn.org.br/idh/melhoresindices.xls>. Acesso em: 15 mar. 2006.
FRÉMOND, A. La région, espace vécu. Paris: PUF, 1999.
GIL, Izabel Castanha; MORANDI, Sonia. Tecnologia e ambiente. São Paulo: Copiart, 2000.
GOMES, Paulo César da Costa. Geografia e modernidade. Rio de Janeiro: Bertrand Brasil, 1996.
GUSMÃO, Marcos. O sertão virou pó. Revista Veja, São Paulo, 1 set. 1999.
HOGAN, Daniel Joseph. A qualidade ambiental urbana: oportunidades para um novo salto. São
Paulo em Perspectiva, v. 9, n.3, jul./set. 1995.
HOGAN, Daniel; VIEIRA, Paulo (Org.). Dilemas socioambientais e desenvolvimento sustentável.
Campinas-SP: Ed. da Unicamp, 1995.
JACOBI, Pedro. A percepção dos problemas ambientais urbanos em São Paulo. In: FERREIRA,
Leila da Costa; VIOLA, Eduardo (orgs.) Incertezas de sustentabilidade na globalização. Campinas
(SP): Editora da Unicamp,1996.
Fórum Internacional do Meio Ambiente - A conferência da Terra 289

______. Meio ambiente urbano e sustentabilidade: alguns elementos para a reflexão. In: Cavalcanti,
C. Meio ambiente, desenvolvimento sustentável e políticas públicas. São Paulo: Editora Cortez,
1997.
______.Cidade e meio ambiente: percepções e práticas em São Paulo. São Paulo: ANNABLUME,
2ª edição, 2006.
MAGALHÃES, Antônio R. Um estudo de desenvolvimento sustentável do Nordeste Semi-árido.
In: CAVALCANTI, Clovis (Org.). Desenvolvimento e natureza. São Paulo: Cortez, 1995.
McGRANAHAN, G. Household environmental problems in low income cities: An overview of
problems and propects for improvement. Habitat International, v. 17, n. 2, Londres, 1993.
MORAES, Antonio Carlos Robert. Meio ambiente e ciências humanas. São Paulo: Hucitec, 1994.
PAIXÃO, Ricardo Antônio da. Geografia e meio ambiente. In: MOREIRA, Ruy (Org.). Geografia:
teoria e crítica. Petrópolis: Vozes, 1982.
PIAGET, J.; INHELDER, B. A representação do espaço na criança. Tradução de Bernardina
Machado de Albuquerque. Porto Alegre: Artes Médicas, 1993.
ROCHA, Aristotelina Pereira Barreto. Expansão urbana de Mossoró: período de 1980 a 2004.
Natal: EDUFRN, 2005.
RODRIGUES, Arlete Moysés. Produção e consumo do e no espaço: problemática urbana. São
Paulo. Hucitec, 1998.
SACHS, Ignacy. Caminhos para o desenvolvimento sustentável. Rio de Janeiro: Garamond, 2000.
SACK, Robert David. Human territorility: it's teory and history. Cambridge: Cambridge University,
1986.
SANTOS, Milton. Por uma Geografia Nova: da crítica da Geografia a uma Geografia Crítica. São
Paulo: Editora da Universidade de São Paulo, 2004.
TUAN, Yi-Fu. Espaço e lugar: a perspectiva da experiência. São Paulo: Difel, 1983.
VIEIRA, Paulo Freire. Meio ambiente, desenvolvimento e planejamento. In: VIOLA, Eduardo J. et
al. Meio ambiente, desenvolvimento e cidadania: desafios para as Ciências Sociais. São Paulo:
Cortez; Florianópolis; Universidade Federal de Santa Catarina, 1998.
Fórum Internacional do Meio Ambiente - A conferência da Terra 290

ANÁLISE SOCIOAMBIENTAL DO POVOADO TUPIAÇU EM CABACEIRAS DO


PARAGUAÇU (BA): ANTES E DEPOIS DA BARRAGEM PEDRA DO CAVALO

Constança Pereira dos Santos


Graduanda em Geografia pela Faculdade Maria Milza (Cruz das Almas (BA).
constançacruz@hotmail.com
Janeide Bispo dos Santos
Orientadora e professora da disciplina Metodologia da Pesquisa Aplicada à Geografia, Faculdade
Maria Milza. projanebs@bol.com.br

RESUMO
Este artigo é fruto de um estudo sobre a trajetória dos moradores do povoado de Tupiaçu,
situado no município de Cabaceiras do Paraguaçu - BA, a partir da construção da Barragem Pedra
do Cavalo. A pesquisa teve como objetivo avaliar as implicações da barragem na organização
sócio-territorial, e utilizou em suas análises os referenciais que discutem a questão da terra e do
território enquanto categoria analítica da Geografia. A trajetória metodológica, na perspectiva
dialética, buscou compreender a realidade em foco, considerando o sujeito como ser social e
historicamente construído. Neste sentido, adotou-se a abordagem qualitativa, através do Estudo de
Caso, pois as representações, os conflitos, os determinantes históricos, culturais, políticos e sociais
não seguem graus de linearidade, mas aparecem inter-relacionados e caracterizados pelas
especificidades dos diferentes contextos. Foram utilizadas como técnicas de coleta de dados a
entrevista semi-estruturada e o grupo focal. Para complementar as informações, utilizou-se também
da análise documental. Os sujeitos do estudo foram 30 pessoas, distribuídas de acordo com a sua
representação. A análise dos dados foi orientada pela técnica de análise de conteúdo que, por meio
da identificação dos núcleos de sentido encontrados nos conteúdos das entrevistas, permitiu definir
as categorias de análise. Os resultados revelam que a implantação da barragem provocou a
fragmentação da identidade do grupo pela perda das terras, do território e toda uma dinâmica sócio-
ambiental que estava inserida no espaço.
Palavras-chave: Barragem Pedra do Cavalo; Território; Tupiaçu.

ABSTRACT
This article is a result of a study about trajectory of the inhabitants of Tupiaçu village,
situated in the Cabaceiras do Paraguaçu town (BA) starting from building of Pedra do Cavalo
Barrage. The research had as objective to evaluate the implications of barrage in territorial
organization. This work used in its analysis the references which discuss the question about land
and territory while Geography analytic category. The methodological trajectory, in dialect
perspective, looked for comprehend the reality in focus, considering the subject like social being
and built historically. In this direction , it was adopted an qualitative approach as Case Study
because representations, conflicts, historical, cultural, politic and social determinant don’t follow
lineally degree, but they appear interrelated and characterized by peculiarity of different contexts.
Data collection techniques were used equally to half-structured interview and the focal group. In
order to complement the information , it was used a documental analysis too. The subjects of study
were thirty (30) people distributed according to their representation. Data analysis was oriented by
Content Analysis technique that through sense nucleus identification found in contents of the
interviews it permitted to define analysis categories. The results reveal that implantation of the
barrage provoked the fragmentation of the group identity, because of loss of lands, territory and all
socio-environmental dynamics that was inserted in space.
Key Words: Pedra do Cavalo Barrage; Territory; Tupiaçu.

INTRODUÇÃO
Este estudo é resultado de um trabalho desenvolvido pela disciplina Metodologia da
Pesquisa Aplicada à Geografia, do quinto semestre do curso de Geografia da Faculdade Maria
Fórum Internacional do Meio Ambiente - A conferência da Terra 291

Milza situada na cidade de Cruz das Almas, no Recôncavo Baiano. Já a pesquisa foi realizada no
Povoado Tupiaçu, pertencente ao município de Cabaceiras do Paraguaçu – BA, povoado este
composto por famílias que se unem por laços de parentesco, do que se compreende que a história de
vida está associada também ao modo de vida; uma vez que este fora totalmente alterado após a
implantação da Barragem de Pedra do Cavalo, quando todos os moradores tiveram parte das suas
terras inundadas com a formação do lago decorrente da construção da barragem, no período de 1979
a 1985. A pesquisa teve como objetivo avaliar as implicações da construção da mesma na
organização sócio-territorial da comunidade. Observa-se que esta população, ao contrário de muitas,
não foi reassentada, mas foi “indenizada”, pois, de início, não havia perdido a totalidade das terras.
Os moradores residiam nos próprios terrenos, dos quais tiravam o sustento e ainda usufruíam da
água do rio para consumo humano, dos animais e da pesca. Além disso, essa comunidade era
atração turística na região, posto que o rio Paraguaçu, nas proximidades do povoado, possuía
inúmeras cachoeiras, o que possibilitava o complemento da renda familiar na alta estação com
venda de bebidas e comida para os turistas. Com a construção da barragem, as concheiras foram
inundadas.
Atualmente, a área que restou é extremamente pequena e o dinheiro obtido pela suposta
“indenização” não foi suficiente pra comprar praticamente nenhuma tarefa na mesma área, até
porque não tinha terra à venda nas proximidades da comunidade, e as que apareceram tinham preço
superfaturado, muito distante da “indenização” efetivada pelo Estado. Outro problema que atingiu a
comunidade foi a especulação imobiliária, em que muitas pessoas de posses, ofereceram muito
dinheiro na compra das poucas terras que restaram nas margens do lago. Dessa forma, as regiões
marginais e, conseqüentemente, o próprio rio deixaram de fazer parte do território da comunidade e
se transformaram com a construção de verdadeiras fortalezas rodeadas por cercas que chegam a ter
20 linhas de arame farpado. Este fato que contribuiu para a destruição de um modo de vida
permeado pela relação intensa entre comunidade e rio Paraguaçu, o que garantia a sobrevivência de
toda a comunidade; além da perda de identidade cultural.
Nesse sentido, essa população precisa encontrar outras formas de driblar as condições
impostas pelo novo contexto de “sem-terra”, “sem-rio”, “sem-comida” e “sem-identidade cultural”.
Desta forma, questiona-se: até que ponto o processo de exclusão da terra, provocou
alterações na dinâmica socioambiental e no contexto comunitário, politicamente organizado e
socialmente sustentável, dos sujeitos deste povoado?

METODOLOGIA DO ESTUDO
Tendo as questões da pesquisa e os objetivos como referência, optou-se por uma
abordagem qualitativa, através do Estudo de Caso, por acreditar que as representações, os conflitos,
os determinantes históricos, culturais, políticos e sociais não seguem graus de linearidade, mas
aparecem inter-relacionados e caracterizados pelas especificidades dos diferentes contextos. Foram
utilizadas como técnicas de coleta de dados a entrevista semi-estruturada, a aplicação de
questionários e a realização de uma oficina de memória oral, procedimentos considerados
imprescindíveis para se atingir o objetivo proposto. Partiu-se de uma pesquisa bibliográfica através
de consultas a fontes secundárias. Depois, iniciaram-se observações assistemáticas e generalistas
sobre a comunidade, seguidas de um processo metódico de escuta ativa, no qual o diálogo interage
entre o pesquisador e os atores sociais da comunidade de forma dialética, na tentativa de
compreender a memória da comunidade ao longo dos anos, o processo de exclusão da terra e do
território, e a idéia de território e territorialidade, para entender a atual estruturação sócio-territorial
diante da evidente segregação sócio-espacial.

TRAJETÓRIA HISTÓRICA QUE ANTECEDEU A CONSTRUÇÃO DA BARRAGEM


As barragens são implantadas no Brasil a partir do processo de expansão do capitalismo,
visando a preparar as bases para satisfazer aos interesses da indústria emergente. O processo de
industrialização é acompanhado pelo processo de urbanização, em que surge a necessidade, ainda
mais urgente, de água potável. Visando atender a estas necessidades, associadas aos interesses do
Fórum Internacional do Meio Ambiente - A conferência da Terra 292

capital nacional e internacional, os governos brasileiros, em especial os militares, lançam planos


com caráter eminentemente desenvolvimentista, numa perspectiva de ampliação do capital e de suas
forças produtivas. Assim, parte significativa dos planos governamentais direcionou-se para a
construção de barragens, as quais, pelo fornecimento de água potável e energia elétrica, iriam
satisfazer a industrialização do país (SANTOS et al., 1986).
Diante deste contexto, a Barragem de Pedra do Cavalo, construída no estado da Bahia, teve
suas obras iniciadas em 1979, e as comportas fechadas em 1985. Durante o processo de construção,
por algumas vezes, a obra foi interrompida, não por conta dos protestos populares, mas sim por
conta de divergências entre os políticos, numa disputa entre o governador Roberto Santos e o então
ministro das comunicações Antonio Carlos Magalhães.
Desse modo, os planos governamentais visavam a ampliação do capital, atendo-se à lógica
desigual do Modo de Produção Capitalista, o que provocou nas margens do Lago de Pedra do
Cavalo inúmeros impactos sociais, pois a proposta do plano político neoliberal não atendia, e não
atende, em nenhum momento, aos interesses da população ribeirinha que depende da terra e que,
mesmo numa luta política, não conseguiu vencer a força brutal do capital reforçada pelo Estado.
A Barragem Pedra do Cavalo foi construída, inicialmente, com o objetivo de abastecer a
região metropolitana de Salvador e outras cidades do Recôncavo Baiano. Logo, passou a controlar
também o nível de água do rio Paraguaçu, evitando inundações das cidades ribeirinhas que ficam a
jusante, com destaque para Cachoeira e São Félix. Visava também proporcionar o lazer e o
embelezamento da região. Mas que tipo de embelezamento? Para quem? Haja vista que, por trás
daquela obra, muitas territorialidades e organizações sócio-ambientais foram destruídas.
Compreende-se que esta idéia tinha como plano de fundo uma estratégia de manipulação de massas,
o que poderia reduzir as resistências e as repercussões sentimentais e ambientais.
A obra resultou de uma parceria entre a Secretaria de Saneamento e Recursos Hídricos, a
Superintendência de Desenvolvimento do Nordeste (Sudene) e foi empreendida pela DESENVALE
(Companhia de Desenvolvimento do Vale do Paraguaçu), que tinha o objetivo de promover o
desenvolvimento do Vale do Paraguaçu.
Muitas entidades de classe e da sociedade civil organizada contestaram a construção da
barragem, entre elas destacaram-se o Sindicato de Engenheiros e o Grupo Ambientalista da Bahia
(GAMBA). No entanto, a atuação mais marcante foi a do Cardeal D. Avelar, quando se recusou a
visitar a área, alegando que só o faria quando os atingidos estivessem reassentados (SANTOS et al.,
1986). Segundo Germani 1993, a construção da Barragem de Pedra do Cavalo traz algumas
particularidades:
[...] a Barragem de Pedra do Cavalo foi construída pelo Governo do Estado da Bahia,
fora do sistema da Eletrobrás. Sua construção fazia parte do Plano de Valorização dos
Recursos Hídricos da Bacia do Vale do Paraguaçu que propunha o aproveitamento dos
recursos hídricos e naturais da bacia em benefício do desenvolvimento regional, com o
objetivo de fixar o homem na região e diminuir o êxodo para Salvador (GERMANI
1993, p. 596)

No entanto, na contramão do projeto, milhares de pessoas foram desalojadas, dentre elas


inúmeras famílias de pequenos produtores rurais atingindo, diretamente, cerca de cinco mil pessoas
que residiam e trabalhavam, originalmente, em terras que foram inundadas com a formação do
reservatório pertencentes aos municípios de Feira de Santana, Santo Estevão, Antônio Cardoso, São
Gonçalo dos Campos e Cabaceiras do Paraguaçu, então território do município de Muritiba
(CARMO, 2002).
Segundo a professora Germani (1993, p. 599),
[...] os dados com relação à obra davam conta da grandiosidade da represa, a terceira
maior da América Latina, mesclando as utilidades oferecidas. A propaganda
mencionava os aspectos positivos, porém em nenhum momento fazia referência ao
número de pessoas afetadas nem para o seu destino.
Fórum Internacional do Meio Ambiente - A conferência da Terra 293

Compreende-se que não havia, por parte dos sujeitos envolvidos no processo de construção
da barragem, nenhuma preocupação com os impactos sócio-ambientais, pois se previa só o
pagamento de “indenizações”, sem levantamento real do número de famílias ou do tamanho das
propriedades, e sem analisar os impactos sócio-econômicos que iriam causar.
Foi diante deste contexto que o Sindicato dos Trabalhadores Rurais (STR) de Feira de
Santana, em parceria com o Movimento de Ação Comunitária (MOC), iniciou um processo de
reivindicações junto à Desenvale, no qual se exigia um plano de reassentamento para a população
atingida (SANTOS et al., 1986).
Esta luta foi significativa; no entanto, segmentos sociais com apoio da imprensa se
organizaram com discursos em defesa da obra – fato que contribuiu para o enfraquecimento da luta
política do Sindicato.
Contudo, verificou-se que o processo de desapropriação apresentava muitas falhas, dentre
elas: favorecimento dos grandes proprietários, distanciamento entre o que se previa no projeto e as
indenizações, e exploração da ignorância do pequeno trabalhador rural com indenização injusta.
Carmo (2007) destaca que a Companhia de Desenvolvimento do Vale do Paraguaçu, em seu
relatório final, descreve uma série de equívocos cometidos no processo de desapropriação.
Na área de construção da adutora de água bruta, em alguns casos, percebeu-se o
favorecimento político, uma vez que o valor da indenização foi 30 vezes superior ao de avaliação,
sem considerar os valores das casas construídas, que a maioria dos expropriados indenizados pelos
bens demolidos, recebeu casas novas e não teve esse valor deduzido da avaliação final; dessa forma,
houve duplicidade de indenização (CARMO 2007, p. 08).
Dessa forma, a luta não era mais contra a obra, que já era um fato consumado: os
questionamentos foram direcionados para o futuro incerto da população atingida. Assim, acirraram-
se os ânimos, e as reivindicações básicas das populações atingidas eram: a garantia de posse da
terra, construção de casas pela empresa responsável e indenizações justas. Foi neste contexto que se
percebeu a dimensão dos impactos sócio-ambientais que a obra traria para a população ribeirinha.
Por conta deste movimento, segundo Germani (1993), no começo de 1983 “a Desenvale realizou
uma pesquisa para identificar a quantidade de famílias afetadas. Então se estabeleceu uma nova fase
de relação da empresa com a população afetada frente à prática anterior de singelo pagamento de
indenização, passando a se falar em reassentamento para as famílias mais necessitadas (GERMANI,
1993, p, 600).” Foi aí que se consolidaram dois segmentos dentre os atingidos pela Barragem de
Pedra do Cavalo: os assentados e os “indenizados”.
Nesse sentido, a situação dos moradores de Tupiaçu se enveredou no contexto dos que
seriam “indenizados”, pois, as casas ficaram situadas numa altitude acima do nível do lago, e as
terras foram parcialmente inundadas, não a totalidade; por este motivo foram submetidos ao
fracassado projeto de “indenização”.

TUPIAÇU: ANTES E DEPOIS DA BARRAGEM PEDRA DO CAVALO


O povoado de Tupiaçu se consolidou no contexto da ocupação do território brasileiro. O
início do processo de ocupação e configuração territorial das terras deste povoado remonta ao
período colonial, pois tem sua gênese inscrita na dinâmica de desenvolvimento tanto da atividade
pecuária, como também da cultura fumageira do nordeste e, mais especificamente, do Recôncavo
Baiano. O início da penetração da área do atual povoado ocorreu exatamente a partir do século
XVII, quando as bandeiras que penetraram os sertões da Bahia demarcaram terras estabelecendo
plantações e currais no local. Assim, o povoado surgiu de uma fazenda de propriedade de uma
família de origem portuguesa que se instalou naquele lugar no início do século XIX. Naquela
fazenda foi construída uma casa, no ponto mais alto, que tinha vista para o rio Paraguaçu que
meandrava no seu entorno. Mais tarde, construíram uma igreja, as casas dos filhos do casal e, ao
longo dos anos, através de uma cadeia sucessória, as terras foram sendo divididas entre os
descendentes do primeiro casal de fazendeiros que continuaram seguindo a estratégia de construir
as casas umas próximas às outras já existentes, dando ao povoado a caracterização de um núcleo
Fórum Internacional do Meio Ambiente - A conferência da Terra 294

urbano. No entanto, todas as atividades econômicas desenvolvidas estavam associadas à agricultura,


pecuária, pesca e turismo.

Modo de vida em Tupiaçu antes da Barragem Pedra do Cavalo


A organização social de Tupiaçú sempre esteve associada às sucessivas gerações de
parentesco; dessa forma, as famílias se entrelaçavam. As residências, por outro lado, abrigavam os
grupos domésticos, compostos no seu limite mínimo por duas gerações (pai e filhos) – e, no limite
máximo, por quatro (avô, pai, filhos e netos). Do ponto de vista técnico, o grupo doméstico era
constituído por uma família nuclear (composta pelo casal e seus filhos solteiros) ou por uma família
extensa pais e filho(s) e nora(s), ou filha(s) e genro(s); ou ainda por dois irmãos e suas esposas ou
duas irmãs e seus maridos. As pessoas que moram nesse lugar promovem trocas e compartilham
produções associadas aos vínculos consangüíneos, os quais davam uma unidade socioeconômica e
cultural.
Num passado não tão distante, essas pessoas viviam através do uso comum das terras, em
que praticavam a agricultura baseada na mão-de-obra familiar. As localidades eram herdadas em
linha agnática, assegurando aos parentes lineares o "controle" sobre um território. As residências se
estabeleciam a partir das parentelas agnáticas de parentes mais próximos, os quais se constituíam na
unidade social de maior densidade, a comunidade em si. A principal característica do trabalho era
da vivência solidária entre seus membros que, mesmo tendo suas propriedades demarcadas,
realizavam trabalhos coletivos nas chamadas “trocas de dias”51. Dessa forma, deixavam em
evidência que a luta pela sobrevivência só tinha força quando era feita coletivamente. Nessa
coletividade, cuidavam da produção da farinha de mandioca e seus derivados, além de milho, feijão
e a plantação de fumo, que davam à comunidade a configuração de unidade familiar.
Pode-se concluir que o passado desse povoado foi demarcado por uma dinâmica de vida
diferente da dos dias atuais. Assim, viviam dos recursos naturais de forma harmônica, consumiam,
produziam e comercializam o excedente adquirido na própria terra. As terras eram de origem
comum e, por conseguinte, ocupadas por pessoas também de origem comum, fato que possibilitava
o uso equilibrado dos recursos naturais (solo, hídricos e florestais), e que consolidava um equilíbrio
ecológico sustentável.
Vale salientar que esse sentido de pertencimento ao território vem da ascendência, do
convívio e da parentela que se unificam sobre uma terra em que todos, em maior e menor grau,
conservam certos direitos comuns. Nessa situação, todos podiam coletar lenha e frutos com
liberalidade, ter acesso ao rio e usar a mata ciliar, o que configurava uma possibilidade de
sobrevivência no território, determinando o usufruto de bens, recursos e oportunidades comuns.
Neste contexto, os moradores do território em questão, a partir de uma relação intensa
entre si e com o espaço geográfico, estabeleceram uma territorialidade consolidada no mesmo perfil
de relações culturais e de história coletiva. Situação que se enquadra no pensamento de Raffestin
(1993), ao abordar a questão do poder e do espaço, que define território como uma produção social
a partir do espaço, conduzida por um ou mais atores (agentes) no processo de realização do
trabalho, cuja efetivação é operada na produção de um campo de poder que envolve a interação
entre sociedade, espaço e tempo. Neste sentido, o território constitui um campo de poder
engendrado a partir das relações sociais de produção materializadas sobre o espaço, temporalmente
contextualizadas e em constantes transformações. Ainda se enquadra também nas concepções de
Corrêa (1994) e Haesbaert (2004), pois ambos destacam o aspecto afetivo no qual o território inclui
uma dinâmica centrada nas relações de apropriação simbólica do espaço. Ressalta-se, porém, que
esse aspecto não se encontra desvinculado de nenhum outro que compõe a dimensão territorial das
práticas sociais. Neste aspecto, a territorialidade não é construída num território ideologizado com
um poder centralizador como o Estado-Nação, mas em um território autônomo, onde as pessoas têm
a liberdade de manifestar suas escolhas e potencialidades, gerando um espaço socialmente

51
Cada dia da semana os moradores trabalhavam na roça de um chefe de família, dessa forma todos ficavam com as
roças prontas.
Fórum Internacional do Meio Ambiente - A conferência da Terra 295

eqüitativo. Vale salientar que a referida territorialidade era consolidada numa relação intensa entre a
população, a terra e o rio.
O rio, ao meandrar nos arredores do povoado, por conta do relevo do local, formava
inúmeras cachoeiras, o que permitia a Tupiaçu ter umas das paisagens mais belas da região
(conforme fig. 01).

Fig. 01 Cachoeiras de Tupiaçu antes da Barragem Fig. 02 Área do caminho da cachoeira


depois da Barragem

Fonte: Constança Pereira dos Santos, 1977. Fonte: Constança Pereira dos Santos, 2008.

Em virtude da beleza rara, muitas pessoas, dos mais diversos locais da região, visitavam
Tupiaçu tendo em vista, usufruir da sua beleza natural, o que colocou o povoado na rota do turismo
do recôncavo. Por esta razão, era comum, em quase todos os meses do ano, o povoado receber
muitos turistas para apreciarem e usufruírem dos banhos de cachoeira que, na região, só eram
possíveis em Tupiaçu. Diante desse quadro, os moradores da comunidade, passaram a investir na
construção de bares, barracas, lanchonetes, pousadas e restaurantes para atenderem à crescente
demanda turística. Muitos dos investidores no novo ramo que despontava, recorreram a
empréstimos junto aos agentes financeiros, custeando os novos empreendimentos e apostando tudo
o que tinham. A certeza do potencial turístico do lugar já estava consolidada, o que levou algumas
pessoas nascidas no povoado, mas que tinham migrado para São Paulo, a desfazerem-se de tudo que
tinham lá conquistado, como casas, carros, eletros, dentre outros, e voltarem a viver em Tupiaçu,
essencialmente do turismo e da exploração do comércio.
No entanto, todos foram surpreendidos, no final da década de 1970, com o anúncio das
obras da barragem, fato que causou muita angústia e revolta para toda a população do povoado.
Foram muitas incertezas durante esse processo, as quais só se tornaram evidentes quando a
Desenvale chegou a Tupiaçu pra destruir toda a mata ciliar e medir as terras que seriam atingidas
pelo lago. Inicialmente, verificou-se que a sede do povoado, em virtude da altitude, não seria
inundada; todavia, 80% das propriedades seriam atingidas e todo o complexo de cachoeiras
também. Logo começou o processo de remoção da floresta tropical que cobria o intervalo entre o
povoado e o rio, e também boa parte das plantações. Diante deste quadro, a situação daquela
população foi enquadrada no rol dos que seriam “indenizados”.

O processo das “indenizações”


O processo ao qual o Estado, através da Desenvale, chamou de “indenização” se processou
de forma muito complicada em Tupiaçu. Sabe-se que o ato de indenizar é algo muito complexo,
haja vista que muitas perdas não são compradas por nenhum valor mercantilista, pois tratam de
questões subjetivas, essencialmente de valor simbólico. Do mesmo modo, após a contabilidade dos
bens materiais atingidos, na maioria das vezes, os cálculos projetados ficaram extremamente
distantes do valor de mercado. Outro ponto importante foi a falha da Desenvale na demarcação das
terras que seriam alagadas, visto que, quando o lago se formou, cobriu muito mais terras do que o
projetado. Dessa forma, ainda existem pessoas brigando na justiça pela indenização das terras não
incluídas pela Desenvale na área de alagamento. Por essa razão, optou-se por usar a expressão
“indenização” sempre entre aspas.
Fórum Internacional do Meio Ambiente - A conferência da Terra 296

Em vista desses fatos, o referido processo foi permeado por muita angústia e incertezas
acerca do futuro dos moradores e, por conseguinte, do povoado eminentemente territorializado e,
diante do contexto, em vias de desterritorialização.
As “indenizações” saíram gradativamente, porém muito descompassadas da realidade das
famílias. Dessa forma, os recursos financeiros que receberam não foram suficientes para comprarem
um quarto das terras em nenhum lugar das proximidades, uma vez que as terras foram
supervalorizadas. Então ficou o dilema: o que fazer com o dinheiro? E como continuar
sobrevivendo num lugar com territorialidade ameaçada, sem a posse dos instrumentos básicos de
sobrevivência: a terra e os recursos naturais? Com o fim das cachoeiras, quem iria manter a
estrutura montada pra atender aos turistas? Assim sendo, a população se enquadrava no velho
ditado popular, de estar “sem eira nem beira”. A posse das terras associada ao uso dos recursos
naturais representava a sustentabilidade de todos, ou seja, a garantia de vida pelas condições
materiais.
Em virtude desses fatos, intensificou-se um processo de migração em massa, com destino
aos grandes centros urbanos, principalmente Salvador e São Paulo, constituindo-se uma verdadeira
desterritorialização.
Nesse sentido, conforme sugere Haesbaert (2004), observa-se que os sujeitos
desterritorializados não são só os que saem, mas também os que ficam, pois
[...] a mobilidade espacial não é, por si só, um indicador de desterritorialização. Muitos
grupos sociais podem estar “desterritorializados” sem deslocamento físico [...] bastando
para isso que vivenciem uma precarização das suas condições básicas de vida e/ou a
negação de sua expressão simbólico-cultural (HAESBAERT, 2004 p. 251)

As implicações da barragem na organização do grupo social atual: revelações da pesquisa


A Barragem de Pedra do Cavalo implicou uma série de conseqüências que estão
impregnadas no espaço, na memória e no modo de vida dos moradores de Tupiaçu. O fim das
cachoeiras associado ao alagamento das terras criou toda uma estrutura de desterritorialização. O
sofrimento foi tanto, que muitas pessoas resolveram sair do povoado. Famílias inteiras compraram
casas e mudaram pra Salvador e São Paulo, enquanto outras foram para as cidades da região: Feira
de Santana, Cruz das Almas, Governador Mangabeira, Santo Antônio de Jesus e Muritiba. Dois
senhores tiveram ataque cardíaco e morreram logo que viram o Lago se formando sobre as suas
terras. Nesse sentido, o valor de mercado das casas na sede do povoado ficou muito desvalorizado,
o que contribuiu para que elas fossem abandonadas pelos seus moradores.
De modo geral, os moradores, ao saírem do povoado, venderam as poucas terras que
sobraram exclusivamente para três empresários de Salvador que já tinham projetos para investir na
área do lago. A partir daí, as cercas se estenderam e a população que optou por continuar vivendo
no povoado transformou-se de proprietária e auto-sustentável em sem-terra e desterritorializados.
Foi desta forma que a vida próspera e articulada por laços de extrema coesão entre os
moradores foi substituída por uma vida muito dura e extremamente individualista, que consolidou o
fim de uma vida gerida pela coletividade. O depoimento de Dona Raimunda Bernardina da Silva,
88 anos, numa entrevista cedida em 10 de março do ano corrente, afirma:
Vou morrer e não vou esquecer o sofrimento da perda das terras que há várias gerações
pertenciam a nós. Nós deixou de ter o único recurso de trabaio. Agente sempre foi trabaiador da
roça e o rio, nosso pai, dava peixe pra todo mundo, rico ou pobre. Ninguém nunca passou fome em
Tupiaçu, era só jogar o anzol no rio e voltar pra casa com alimento pra toda família. E agora a gente
se encontra nessa condição, sem trabaio, sem comida e sem terra. (MARIA RAIMUNDA DOS
SANTOS, MARÇO DE 2008)

O Senhor Argemiro Rodrigues afirmou:


Sabe, moça, o que mais dá saudade é baruio das cachoeira, a gente sentava na porta de
casa e ouvia água caindo, trabaiva na roça ouvindo a água cair. Aquela zuada fazia
parte do nosso dia-a-dia. Eu não tive coragem de ir ver a água subir, senti que ela tava
Fórum Internacional do Meio Ambiente - A conferência da Terra 297

subindo quando vi as cachoeiras silenciar. Chorei e choro muito, meu fi morreu em São
Paulo, (choros) por causa dessa mardita barragem. Se não fosse ela, ele não tinha ido
pra lá. (ARGEMIRO RODRIGUES, MARÇO DE 2008)

Tupiaçu hoje se encontra em um total ostracismo. Teve sua população consideravelmente


reduzida e, ao mesmo tempo, o fim de uma territorialidade consolidada ao longo de
aproximadamente dois séculos. A partir da barragem, observam-se migrações constantes,
principalmente de jovens, fato que contribui para a população ter, em sua composição, um grande
número de idosos que sobrevivem de pensão do INSS.
Lembrar de Tupiaçu é viver de memórias, pois era uma vez um lugar, consolidado em um
território, quando homens pensaram em uma barragem que destruiu toda a harmonia consolidada
no equilíbrio homem e natureza.

CONSIDERAÇÕES FINAIS
Analisando o processo de desterritorialização por que passaram as famílias atingidas pela
construção da Barragem de Pedra do Cavalo, considera-se que, além do aproveitamento dos
recursos hídricos e naturais da bacia do rio Paraguaçu, o objetivo de fixar o homem no campo,
diminuindo o êxodo rural para Salvador, teve efeito contrário. As famílias que foram indiretamente
retiradas de suas terras e destinadas aos centros urbanos vivem em situação inferior à que possuíam
antes de serem desterritorializadas. Portanto, famílias foram separadas e deslocadas, de forma
indireta, para outros municípios. Resta ao grupo que ficou em Tupiaçu, gradativamente, assumir a
nova identidade social, a de diaristas das fazendas vizinhas. Nos depoimentos, destacaram que
gostar e ter sentimento de pertença local tem se tornado cada vez mais difícil, pois as carências
sociais impedem que isso aconteça: hoje vivem somente de saudades. Observa-se que a população
de Tupiaçu necessita, urgentemente, de ações por parte do poder público e até mesmo da sociedade
civil, na tentativa de intervir no processo de exclusão a que foram submetidos, na conscientização
dos jovens para a formação do ator social, e que possam ser estimulados na luta pela construção de
um novo contexto politicamente organizado e socialmente sustentável.

REFERÊNCIAS BIBLIOGRÁFICAS
CARMO, Edinaldo Medeiros. Agenda 21 no Assentamento Fazenda Nova: uma construção
participativa. 2002, 101 f. Monografia (Especialização em Educação Ambiental para a
Sustentabilidade) – Universidade Estadual de Feira de Santana, Feira de Santana, BA.
CARMO, Edinaldo Medeiros. De ribeirinhos a sertanejos do semi-árido: a trajetória dos atingidos
da barragem Pedra do Cavalo, Bahia, Brasil. In: I Encuentro Latinoamericano Ciencias Socils y
Represas. II Encontro Brasileiro de Ciências Sociais e Barragens, Anais..., CD Rom. Salvador:
Universidade Federal da Bahia, 2007. V. 01.
CORRÊA, Roberto Lobato. Territorialidade e Corporação: um exemplo. In: SANTOS et al (orgs.).
Território Globalização e Fragmentação. São Paulo: Hucitec e ANPUR, 1994.
GERMANI, Guiomar Inez. Cuestión agraria y asentamiento de población em El área rural: la
noueva cara de la lucha por la tierra. Bahia, Brasil (1964-1990). 1993. Tese (Doutorado em
Geografia) – Facultat de Geografia e Historia, Universidad de Barcelona, Barcelona.
GERMANI, Guiomar Inez. Expropriados terra e água: o conflito de Itaipu. Salvador: EDUFBA,
2003.
HAESBAERT, Rogério. O Mito da Desterritorialização: do “Fim dos Territórios” à
Multiterritorialidade. Rio de Janeiro: Bertrand Brasil, 2004.
RAFFESTIN, C. Por Uma Geografia do Poder. São Paulo: Ática, 1993
SANTOS, José Geraldo Reis et al. Pedra do Cavalo: organização sindical e protesto popular em
áreas de barragem. 1986. 50 f. Relatório (Prática de Pesquisa em Sociologia). Faculdade de
Filosofia e Ciências Humanas, Universidade Federal da Bahia, Salvador.
Fórum Internacional do Meio Ambiente - A conferência da Terra 298

PERMACULTURA: UM EXEMPLO DE CONVIVÊNCIA HARMONIOSA COM O


AMBIENTE NATURAL DO SÍTIO NOVA CANAÃ, ÁREA RURAL DE OLINDA
(PERNAMBUCO)

J.A.G.A. César
Bolsista CNPq, Laboratório de Etnobotânica e Botânica Aplicada (LEBA), Departamento de Botânica, Centro de
Ciências Biológicas Av. Professor Moraes Rego Barros s/nº Cidade Universitária UFPE.
joseantoniocesar@gmail.com.br;
L.H.C. Andrade
Orientador, Laboratório de Etnobotânica e Botânica Aplicada (LEBA), Departamento de Botânica, Centro de Ciências
Biológicas Av. Professor Moraes Rego s/nº Cidade Universitária UFPE. lhcandrade@gmail.com

RESUMO
O novo paradigma ambiental se refere à maneira como o homem precisa reconhecer e
conviver com a natureza. Devido à emergência desta relação, portanto, é oportuna a re-inserção de
princípios e práticas responsáveis para ocupação de áreas, que possibilitam minimizar os impactos
ambientais. A Permacultura, que se baseia em observar os sistemas naturais, a sabedoria dos
sistemas produtivos tradicionais e o conhecimento moderno, científico e tecnológico, destina-se a
harmonizar a interação entre pessoas e seu entorno, provendo nossas necessidades de forma
sustentável. No presente trabalho visou-se estudar a Permacultura a partir da identificação de
ecotécnicas e tecnologias alternativas do Sítio Nova Canaã (Olinda-PE), para posterior aplicação na
Área Verde (Camaragibe-PE), a partir das necessidades e conhecimentos desta comunidade. O Sítio
Nova Canaã apresenta técnicas de construção ecológica, sistemas agroflorestais e hortas orgânicas,
além de ser auto-suficiente em água. Ainda ocorrem tecnologias de reciclagem da água utilizada e
nutrientes, bem como a sistema de aquecimento de água para banho através da energia solar. O sítio
serve como exemplo de sistemas bio-intensivos de produção e uso do espaço, não sendo o único, e
possibilita o encorajamento das práticas alternativas de interação com a natureza.
Palavras-chave: Permacultura, novo paradigma, ecotécnicas, sistemas bio-intensvos.

ABSTRACT
The new environmental paradigm tells to itself the way as the man needs to recognize and
to coexist with the nature, due to emergence of this relation, so there is opportune the re-insertion of
beginnings and responsible practices for occupation of areas, which makes possible us to minimize
the environmental impacts. For so much, there is the Permaculture, which is based in observing the
natural systems, the wisdom of the productive traditional systems and the modern, scientific and
technological knowledge, to harmonize the interaction between persons and his environment,
providing our necessities of sustainable form. The general objective of the inquiry consists in
studying the Permaculture from the identification of eco-techinques and alternative technologies of
the Sítio Nova Canaã (Olinda-PE), for subsequent application in the Área Verde (Camaragibe-PE),
from the necessities and knowledges of this community. The Sítio Nova Canaã presents techniques
of ecological construction, agroforestry sistems and organic vegetable gardens, besides being water
self-sufficient. Still there take place technologies of recycling of the used water and nutritious, as
well as to system of heating of water for bath through the solar energy. The siege serves like
example of bio-intensive systems of production and use of the space, but is not the only one, and
makes possible the encouragement of the alternative practices of interaction with nature.
Keywords: Permaculture, new paradgim, ecothecnics, bio-intensive sistems.

INTRODUÇÃO
O fim do Século XX provocou um aumento das preocupações acerca do meio ambiente
natural, e por esta razão adquiriu importância elevada em relação aos parâmetros de qualidade
ambiental. A partir daí, percebeu-se uma gama de problemas globais que causam danos alarmantes
à biosfera, incluindo a espécie humana, podendo ser irreversíveis (CAPRA, 1995). O uso de
Fórum Internacional do Meio Ambiente - A conferência da Terra 299

alternativas que minimizem tais impactos é necessário, favorecendo ao homem a re-inserção em


maneiras mais intuitivas de envolvimento com o meio natural que o cerca.
O homem tem vivido como um parasita que se sustenta do planeta, vivendo em seu
hospedeiro e o enfraquecendo, promovendo sua própria destruição, pois encontra abundância na
natureza e, em muitos casos, devasta completamente o que encontrou. Ele mudou as faces do
planeta algumas vezes para melhor, mas demasiadas vezes para pior (HUXLEY, 1959).
As intervenções do homem em qualquer local da terra resultam sempre em alteração
temporária ou permanente dos ambientes de acordo com a magnitude dos impactos causados a
natureza, que sofre com a crescente geração de resíduos provenientes das necessidades supérfluas
dos seres humanos. Contudo, alguns povos considerados primitivos permanecem em relação
amistosa com a natureza, sendo gratos pelos benefícios auferidos, respeitando a sua complexidade e
exuberância, bem como temendo e respeitando as manifestações do poder destruidor, transformador
ou criador dos fenômenos naturais. Estes povos desenvolveram conhecimentos sobre o meio natural
que permitiram sua sobrevivência por milhares de anos em ambientes generosos ou inóspitos
(KRZYZANOWSKI, 2005).
Esta, segundo Mollison & Slay (1991), é a base da Permacultura, que compreende a
sabedoria que existe em comunidades tradicionais (índios, aborígenes, quilombolas), pois estes
povos podem deter e aplicar uma experiente observação dos padrões e princípios da natureza, a
partir de uma convivência contínua.
O termo Permacultura foi cunhado na década de 70 pela parceria estabelecida entre Bill
Mollison e David Holmgren, desenvolvendo a estrutura de trabalho que criasse um sistema
agricultural sustentável, baseando-se inicialmente na policultura de árvores, arbustos, ervas,
tubérculos e fungos.
Não é apenas a junção das palavras permanente e agricultura, mas corresponde às bases
para uma cultura permanente, com preceitos na ética de uso da terra. Também consiste no
planejamento para a criação de sistemas ecologicamente corretos e economicamente viáveis,
adotando três princípios básicos (MOLLISON & SLAY, 1991)
Os três princípios básicos para a Permacultura são o cuidado com o planeta Terra, o
cuidado com as pessoas e o cuidado com a repartição do excesso de renda, tempo e materiais, a fim
de atingir a sustentabilidade ambiental e sócio-econômica (MOLLISON & SLAY, 1991),
caracterizando-se, potanto, pela re-introdução do homem no meio natural e sendo uma alternativa
para o manejo adequado dos serviços ambientais.
Os princípios permaculturais permitem implementar tecnologias e práticas alternativas às
atividades humanas, possibilitando relação menos danosa com o mundo natural por ajudar a
estabelecer sistemas sustentáveis, a partir de habitats permanentes no tempo (BERNAL et al, 2003).
Com isso, promove garantia dos serviços ambientais, como a manutenção da biodiversidade, o
armazenamento de carbono e a ciclagem da água, para as gerações futuras (FEARNSIDE 1997
apud CAVALCANTI, 1997).
Os ciclos energéticos exsistentes no planeta Terra precisam ser respeitados pelos processos
de produção aos quais a civilização contemporânea está fortemente relacionada. Mollison & Slay
(1991) afirmam que os sistemas de suprimento alimentar da sociedade contemporânea precisam de
uma rede mundial de transporte, armazenamento e publicidade que demandam muito mais energia
do que uma diversidade agricultural local. A energia pode ser transferida de uma forma a outra, mas
não pode desaparecer, ser criada ou destruída. Então, tem-se escolhas dos tipos de energia que se
vai permitir fluir pelos sistemas, podendo definir qual será estocada e qual será deixada passar
naturalmente (MOLLISON, 1981).
A veiculação dos conhecimentos acerca da Permacultura pode estimular novas maneiras de
cooperação no uso da natureza, sendo este o objetivo do trabalho, que iniciou com o estudo de
técnicas alternativas de ocupação do espaço que ocorre no Sítio Nova Canaã, localizado na Área
Rural do município de Olinda, e em centros de referência do Brasil, tendo como exemplo, a
Fazenda Marizá (Bahia) e o SERTA-Serviços de Tecnologia Alternativa (Pernambuco).
Fórum Internacional do Meio Ambiente - A conferência da Terra 300

Técnicas permaculturais de otimização do espaço já foram e continuarão sendo


implementadas na comunidade Área Verde, que se localiza em Aldeia (Camaragibe–PE), a partir da
escolha dos moradores locais.

MATERIAIS E MÉTODOS
O local de estudo de técnicas alternativas é o Sítio Nova Canaã, Área Rural de Olinda,
pertencente à Mesorregião Metropolitana do Recife, que abrange uma área de 2.761 Km² do estado
de Pernambuco, com um número total de 14 municípios e corresponde a uma densidade
demográfica de 1.208,9 hab/Km² (ANDRADE, 2003).
O sítio Nova Canaã é uma propriedade particular que tem como moradores o agrônomo
Flávio Duarte e sua companheira, a permacultora Chivi Maríncola, além de seus dois filhos em
idade escolar. Eles são responsáveis por desenvolver trabalhos com Permacultura, hortas orgânicas
e Sistemas Agroflorestais desde 2002 e oferecem cursos de Sistemas Agroflorestais (SAF’s),
Introdução à Permacultura e Construções com Terra Crua. Desta forma, o sítio é um centro de
obtenção de informações acerca de técnicas permaculturais.
A coleta de dados para o presente trabalho foi realizada a partir de Albuquerque e Lucena
(2004), com aplicação de formulário semi-estruturado, em entrevistas com moradores do Sítio Nova
Canaã para reconhecimento das técnicas permaculturais nas categorias bioconstrução, cultivos
orgânicos e reciclagem de nutrientes e energia do sítio. A técnica da observação direta, a partir do
uso de diário de campo facilitou o entendimento para posterior aplicação em Aldeia.
A comunidade Área Verde se localiza em Aldeia, no município de Camaragibe,
Pernambuco, e foi criada a partir de uma invasão que ocorreu há 20 anos, em uma área de mata
atlântica a 12 Km da capital Recife. Começou com poucos moradores, mas logo foram agregando
parentes ao local, atingindo uma comunidade que possui cerca de 300 famílias assentadas usando
dos recursos naturais. No local há um rio, denominado pelos moradores como rio da Mina, que é
afluente do rio Beberibe.
A primeira implementação de técnicas alternativas na Área Verde ocorreu no anexo da
Escola Rita Neiva de Oliveira, onde as crianças da comunidade estudam até o Ensino Fundamental,
além de funcionar como creche.
Também foi realizada a comparação entre centros de estudo de agricultura alternativa
SERTA (Serviços de Tecnologia Alternativa), localizado no município de Glória do Goitá,
Pernambuco, e a Fazenda Marizá no município de Tucano, Bahia, que utilizam estes métodos no
uso e ocupação do espaço, e o Sítio Nova Canaã, com o intuito de avaliar as semelhanças na
presença das técnicas e tecnologias alternativas.

RESULTADOS E DISCUSSÃO
A partir da aplicação do formulário semi estruturado foi possível a obtenção de dados
sobre a dinâmica dos hábitos de consumo de energia, água e alimentação do Sítio Nova Canaã, no
que concerne a sua necessidade de abastecimento externo à propriedade. O sítio tem como base a
energia hidrelétrica, com alguns exemplos de energia alternativa implementados. Apresenta
ecotécnicas que, segundo Lengen (2004), são aquelas que não promovem a contaminação do
ambiente circundante, nem a extinção de materiais e são de simples aplicação, contando apenas com
a criatividade das pessoas envolvidas na implementação.
O sítio é independente de água fornecida pela Companhia de Água e Esgotos de
Pernambuco (COMPESA), pois com o manejo da vegetação existente possibilitou o aumento do
estrato arbóreo em torno de um charco, e a formação de pequenas represas no curso d’água
transformaram o charco inicial em um córrego. Atualmente, o córrego apresenta uma mata ciliar em
toda a sua extensão. No inverno aparecem várzeas e vários olhos d’água que serão potencializados
no ciclo hidrológico da propriedade.
Há reutilização de água de chuveiro, pias de banheiro e cozinha em áreas próximas à casa,
entretanto não existem sistemas de captação e armazenamento de água. O planejamento destas
tecnologias está sendo realizado para sua implementação em 2008 com calhas de direcionamento da
Fórum Internacional do Meio Ambiente - A conferência da Terra 301

água captada em tonéis de plástico de 250 litros, para uso doméstico e a formação de barreiros
(açudes) ligados por canais de divergência, em área inclinada da propriedade, que possibilitarão
armazenar água no período das chuvas, priorizando sistemas de irrigação.
O sistema de filtração de água funciona pelo direcionamento da água negra (bacias
sanitárias) e água cinza (banho, pia de banheiro) para uma caixa de 1 m de raio com brita,
promovendo a retenção de resíduos sólidos e segue para um tanque onde ocorre aerobiose. Logo
após, um círculo de bananeiras (Musa sp.), que preferem solos ricos em matéria orgânica, traram de
purificar a água, aproveitando a os nutrientes disponíveis.
A alimentação da família do Sítio Nova Canaã é baseada no consumo das culturas
orgânicas produzidas pelas árvores dos pomares e por hortas orgânicas existentes na propriedade,
complementada com o consumo de alimentos externos. A horta orgânica apóia o orçamento
familiar, por conta da comercialização dos produtos excedentes em feira orgânica semanal que
ocorre em Olinda, além da venda de tortas, bolos, sanduíches integrais produzidos no sítio.
No sítio existem técnicas de construção ecológica do tipo pau-a-pique, taipa de pilão e
Adobe, ecotécnicas (LENGEN, 2004) que utilizam recursos locais, desde materiais e mão-de-obra,
pois as ripas e o barro para a construção são extraídos na propriedade.
O pau-a-pique, também denominado em outras regiões de taipa de mão, ou de sopapo, foi
uma das mais tradicionais técnicas de construção que ocorreu e que ocorre em terras brasileiras,
depois das técnicas dos indígenas no Brasil (SECCO et al 2004). Encontrada nas diversas regiões
em construções urbanas e rurais, consiste em criar uma malha de aproximadamente 15x15 cm com
bambu ou madeira bem amarrados entre si e com os esteios, que servem de pilares de suporte.
O Adobe é uma técnica tradicional executada em terra crua, que o processo de fabricação
do tijolo de adobe consiste em amassar a mistura de terra e argila, deixá-lo descansar por alguns
dias e, ainda úmido, colocá-lo em fôrmas de madeira retangulares, deixando-o secar ao sol
(OLIVEIRA, 2005).
Além das técnicas de terra crua, foi observada a utilização de lonas de outdoors, para a
cobertura de locais que servem como depósito. Esse exemplo foi considerado uma maneira
alternativa de se construir por se usar pilares de madeira local e reutilizar material.
A reutilização dos resíduos humanos também é promovida através dos banheiros secos,
que são constituídos de duas construções lado-a-lado de madeira. Cada um possui 1m2 de área e
contém um vaso, onde são depositadas as fezes e, logo em seguida, coloca-se cinza contida num
balde com uma garrafa PET de dois litro cortada ao meio. A cinza é retirada do forno a lenha do
sítio e serve para impedir a proliferação de microrganismos e odores indesejados. Após quatro
meses essa mistura de cinzas e matéria orgânica decomposta será utilizada como adubo nas hortas.
Um setor com nove composteiras formadas por material seco, material úmido e esterco de
cabra, gado e galinha é mantido para adubação orgânica das hortaliças que são encaminhadas para a
feira orgânica de Olinda.
O diagnóstico das técnicas e tecnologias presentes no sítio possibilitaram a montagem de
um gráfico que demonstra a divisão em três categorias para as tecnologias alternativas
implementadas na propriedade. São elas: bioconstruções, cultivo orgânico e reciclagem de
nutrientes e energia, que foram constatadas por observação e aplicação do formulário semi-
estruturado (Fig.1).

Figura 1- Tecnologias alternativas implementadas no Sítio Nova Canaã (Olinda, Pernambuco).


Fórum Internacional do Meio Ambiente - A conferência da Terra 302

A implementação das hortas verticais no anexo da Escola Rita Neiva de Oliveira partiu da
intenção de despertar o interesse no uso eficiente do espaço do estabelecimento, além de servir para
um processo inicial de educação vivenciada.As atividades ocorreram através de oficinas e com
efetiva participação de alunos e professoras. Hortas de dois tipos foram montadas: um com garrafas
PET presas à parede e o outro com pneus, sustentados por uma estrutura de madeira (Figura 2).

Figura 2- modelo de horta vertical com reutilização de pneus montado na extensão da Escola Rita
Neiva de Oliveira. Acervo pessoal.

Os canteiros montados com garrafas PET de dois litros foram criados a partir da junção de
duas ou três unidades, presas por fios de Nylon, também utilizados para sustentá-las na parede.
Estas hortas têm a capacidade de suportar pequenas plantas, como coentro (Coriandrum sativum) e
cebolinho (Allium schoenoprasum), além de ervas medicinais, como, manjericão (Ocimum
basilicum) e alecrim (Rosmarinus officinalis), que podem ser utilizados na merenda escolar.
Para a montagem do segundo tipo de hortaforam utilizados pneus de diferentes tamanhos,
preenchidos com terra e estruturados da seguinte maneira: pneu de caminhão (maior) fica em baixo,
o de automóvel de passeio de no meio e o de moto acima, suportados por uma estrutura de madeira.
Nesta posição, existe a re-utilização de água de um pneu para outro.
A partir das visitas ao SERTA foi diagnosticado que este centro tem um trabalho de
desenvolvimento de tecnologias alternativas, desde o ponto de vista de cultivo, em policultura e
consórcio, hortas verticais que têm a função de otimizar a utilização de espaços, até as formas de
irrigação que economizam água e reutilizam materiais, como no caso do sistema “porco-espinho”,
engenhadas por seus responsáveis.
As hortas contam com cultivo orgânico, sem necessidade de insumos agrícolas alheios ao
SERTA, além de servir para alimentação durante os dias de semana que os alunos estão no local. Os
alunos desenvolvem funções na instituição a partir de um processo de capacitação de jovens que o
proposto principalmente quando se trata de comunidades que vivem no sertão.
A instituição não desenvolve construções, pois têm problema com a questão fundiária, não
são donos do terreno que ocupam, mas tem grande desejo de aplicar técnicas de bioconstrução no
local.
Fórum Internacional do Meio Ambiente - A conferência da Terra 303

Existem algumas áreas determinadas para serem trabalhados Sistemas Agroflorestais


(SAF’s) de cultivo, onde alunos e integrantes do SERTA trabalham em forma de mutirão.

Quadro comparativo das tecnologias alternativas observadas nos centros de estudo de Permacultura
visitados entre agosto de 2007 e janeiro de 2008.

A presença na Fazenda Marizá, localizada ao município de Tucano-BA e coordenada pela


permacultora Marsha Hanzi, co-fundadora do Instituto de Permacultura da Bahia (IPB),referência
nacional no desenvolvimento de técnicas e tecnologias permaculturais no Semi-árido Nordestino,
concebeu dados acerca das diferenças que ocorrem entre os locais que desenvolvem técnicas e
tecnologias permaculturais a partir de suas necessidades por conta das variáveis ambientais, clima e
relevo, por exemplo. Possibilitou a comparação entre o encontrado no Sítio Nova Canaã, o SERTA
e o próprio epicentro Marizá. O quadro comparativo abaixo pode mostrar as diferentes técnicas nos
três locais citados.
A localização da Fazenda Marizá justifica a construção de cisternas de armazenamento de
água, com capacidade para 20.000 l de água cada, com a captação realizada pelos tetos das
habitações construídas no local, direcionadas às caixas d’água por calhas. São duas caixas no total,
uma localizada entre a cozinha e o alojamento da Marsha, distantes entre si em aproximadamente
15 m, e outra a 3 m do alojamento utilizado para receber os visitantes.
O estudo das técnicas e tecnologias do Sítio Nova Canaã possibilitou a quantificação das
categorias de bioconstrução, cultivo orgânico e reciclagem de nutrientes e energia. De acordo com o
formulário semi-estruturado, a categoria bioconstrução foi apresentou o maior número das técnicas
aplicadas ao local, sendo 37%, seguida de tecnologias de reciclagem, com 36% e cultivos orgânicos
apresentou 27%. Entretanto, esta relação não diz respeito ao uso das tecnologias, mas apenas a sua
presença, pois existem intensos trabalhos de manejo dos sistemas agroflorestais e das hortas do
sítio, que precisam de manejo contínuo para andamento dos processos de sucessão nas culturas de
curto, médio e longo prazo.
O Sítio Nova Canaã apresenta exemplos de construção ecológica, sistemas
agroflorestais e modos orgânicos de plantio, bem como tecnologias de refluxo de energia, diga-se
nutrientes. Por esta razão, serve de caso local para estudos envolvendo práticas de sustentabilidade e
qualidade de vida envolvendo os proprietários, pois estes consomem alimentos com qualidade.
A reciclagem de materiais, provenientes ou não do sítio, mostra-se como uma
alternativa a transformação das energias que fluem no sistema. Materiais que estariam no lixo, ou
seriam desperdiçados, como no caso das fezes no banheiro seco, passam a ser úteis para a realidade
do local. Desta maneira, promove-se o fechamento de ciclos que poderiam ser negligenciados,
rompendo a seqüência no fluxo de energia.
O sítio Nova Canaã foi considerado semelhante a Fazenda Marizá, em detrimento do
SERTA mesmo a primeira sendo localizada em região do Semi-árido nordestino, diferenciou
apenas no fator captação e armazenamento de água, por conta da escassez deste recurso no local,
Fórum Internacional do Meio Ambiente - A conferência da Terra 304

seguida da necessidade de estocagem hídrica, pois no sítio existe água em abundância sempre
disponível.

REFERÊNCIAS BIBLIOGRÁFICAS
ALBUQUERQUE, U. P.; LUCENA, R. F. P. Métodos e Técnicas na Pesquisa Etnobotânica.
Recife: Livro Rápido/NUPEEA, 2004.
ANDRADE, M. C. O. Atlas escolar de Pernambuco. João Pessoa: GRAFSET, 2003.
BERNAL, B. A.; MADUANE, C.; GIRALDO L. F. Permacultura: hacia una cultura permanente
en la Tierra. Revista Tierra, Agroecología – Medio Ambiente – Desarollo Rural, N 2, 2003
CAPRA, F. A teia da vida: uma nova compreensão científica dos sistemas vivos. São Paulo Editora
Cultrix. Tradução: Newton Roberval Eichenberg
CAVALCANTI, C. Meio ambiente, desenvolvimento sustentável e políticas públicas. Organizador:
CLÓVIS CAVALCANTI. São Paulo Editora Cortez/Recife Fundação Joaquim Nabuco, 1997 Pág
314-344
HUXLEY, A. L. A situação humana. Editora Globo. Tradutor: Lya Luft. 1959
KRZYZANOWSKI, R. F. Novas tecnologas em assentamentos humanos: a Permacultura como
proposta para o planejamento de unidades unifamiliares em Florianópolis. Dissertação (Mestrado
em Engenharia de Produção) Programa de Pós Graduação em Engenharia de Produção,
UFSC,Florianópolis. 2005.
LENGEN, J. Manual do Arquiteto Descalço, Editora Livraria do Arquiteto. 2004
MOLLISON, B. Introduction to Permaculture. Edited from de transcript of the Permaculture
Design Course at the Rural Education Center, Wilton–EUA. 1981
MOLLISON, B.; Slay, R. Introdução a Permacultura. Tyalgum, Australia. Editora Tagary
OLIVEIRA, L. B. Introdução ao estudo de ADOBE: Construção de Alvenaria. Periódico Paranoá
UNB Volume 7 2005
Publicações. Tradução: André Luis Jaeger Soares. 1991.
SECCO, C. et al. Estudo preliminar de tipos de solos mais adequados para construções de taipa de
mão em microrregiões do estado do Pará. In: Encontro Latino Americano de Iniciação Científica,
11, Encontro Latino Americano de Pós-Graduação, Anais…, Universidade do Vale do Paraíba,
2007.
Fórum Internacional do Meio Ambiente - A conferência da Terra 305

APLICAÇÃO DO SISTEMA DE GESTÃO DO CONHECIMENTO PARA INDICADORES


DE SUSTENTABILIDADE NO SETOR DE ROCHAS ORNAMENTAIS

Waleska Silveira Lira


UEPB - waleska.silveira@oi.com.br
Gesinaldo Ataíde Cândido
UFCG- gacandido@uol.com.br
Edvan Cruz Aguiar
UEPB- edvan.ed@gmail.com

RESUMO
Este artigo tem como objetivo aplicar o modelo de Gestão do Conhecimento para o uso dos
indicadores de sustentabilidade no setor de rochas ornamentais a partir da análise das diferentes
abordagens da gestão do conhecimento e de sistemas de indicadores de sustentabilidade. O modelo
proposto apresenta cinco estágios: o reconhecimento do problema; o diagnóstico da
sustentabilidade, a busca de soluções a partir da gestão do conhecimento, a avaliação das práticas de
gestão do conhecimento e a implantação de novas ações de desenvolvimento sustentável. Os
resultados indicam que o setor de rochas ornamentais atua com uma visão predominantemente
econômica, havendo um desequilíbrio entre as dimensões social, ambiental, cultural e Institucional.
Conclui-se que a partir da utilização de práticas de gestão do conhecimento, as empresas podem
contribuir para elevar o índice de sustentabilidade do Município de Campina Grande e
conseqüentemente do setor de Rochas Ornamentais.
Palavras-chave: Indicadores, conhecimento, gestão do conhecimento, indicadores de
sustentabilidade, modelo.

ABSTRACT
The aim of this work is to test the knowledge management to use the Sustainable
Development Indicators model in the sector of ornamental stone, through the analysis of different
views of knowledge management and sustainable indicators system. The research used seeked to
identify the training stage of knowledge management for use of the sustainable indicators and to
promote the new action for sustainable development. The methodology has five stages: The
information needs, sustainable diagnostic, the search of solutions from knowledge management, the
knowledge management practices evaluation and the implantation of new actions for the sustainable
development. The results indicate that the ornamental stone sector act with a predominantly
economic vision, having an unbalance between the social, environmental, cultural and institutional
dimensions’. It concludes that by using the knowledge management practices, the companies
contribute to the elevation of the sustainable index of the city of Campina Grande and in
consequence the ornamental stone sector.

INTRODUÇÃO
Os paradigmas da relação meio ambiente versus desenvolvimento econômico mudaram
nos últimos anos e de forma particular em relação às atividades do setor Rochas Ornamentais.
Considerando que a nova ordem é o desenvolvimento sustentável, o setor de Rochas Ornamentais
tem, obrigatoriamente, que alinhar o desenvolvimento econômico com as questões sociais e
ambientais. Conflitos sociais pontuais e, principalmente, o conflito com o meio ambiente têm
colocado esse setor, em lugar às vezes bastante desconfortável em relação à opinião pública.
Por outro lado, o setor de Rochas Ornamentais é um dos setores básicos da economia do
país, contribuindo de forma decisiva para o bem estar e a melhoria da qualidade de vida das
presentes e futuras gerações, sendo fundamental para o desenvolvimento de uma sociedade
equânime, desde que seja operada com responsabilidade social, estando sempre presentes os
preceitos do desenvolvimento sustentável.
Fórum Internacional do Meio Ambiente - A conferência da Terra 306

A produção de Rochas Ornamentais no Brasil é favorecida pelo elevado potencial


geológico, principalmente em relação à abundância e diversidade em rochas. O Brasil já é um
importante produtor mundial de mármores e granitos, com produção do primeiro semestre de 2005
alcançando mais de 1 bilhão de toneladas de produtos diversos de rochas ornamentais. Uma das
rochas mais exigidas no mercado é o granito e este é responsável por 60% dessa mesma produção
nacional (BNDES, 2007).
Um dos principais desafios para os agentes sociais é saber transformar a informação obtida
através dos sistemas de indicadores de sustentabilidade, transformá-la em conhecimento e
conhecimentos em ações que visem a melhoria da qualidade de vida da população.
Considerando que obter informações não é o suficiente para tomar decisões confiáveis em
busca do desenvolvimento sustentável, torna-se importante saber reunir informações relevantes no
ambiente interno e externo, transformá-la em conhecimento de forma que se trabalhe uma gestão do
processo de transformação de informações em conhecimento, uma vez que o excesso de
informações é cada vez maior, e os sistemas de indicadores apenas indicam situações e não
soluções.
Neste sentido, torna-se oportuno entender o processo de gerenciamento do conhecimento
no uso dos sistemas de indicadores de sustentabilidade, visto que, na prática, as organizações não
dispõem de métodos sistemáticos de utilização de transformação das informações em conhecimento
contidas nos sistemas de indicadores de sustentabilidade para o desenvolvimento de políticas
sustentáveis.
Este estudo parte do princípio de que a Gestão do Conhecimento pode contribuir para uma
utilização mais sistemática dos Sistemas de Indicadores de Sustentabilidade por parte das empresas
de Rochas Ornamentais e que a utilização mais adequada dos Sistemas de Indicadores de
Sustentabilidade contribui para a geração do Desenvolvimento Sustentável.

MODELO DE GESTÃO DO CONHECIMENTO PARA INDICADORES DE


SUSTENTABILIDADE
O modelo tem o objetivo de proporcionar a criação do conhecimento a partir das
informações contidas nos sistemas de indicadores de sustentabilidade que forneça condição
necessária para o desenvolvimento de ações sustentáveis. O modelo considera que a geração, a
exploração e a difusão do conhecimento são fundamentais para o crescimento econômico, o
desenvolvimento e o bem estar das nações. O modelo proposto contempla cinco fases: o
reconhecimento do problema; o diagnóstico da sustentabilidade; a busca de soluções através
do gerenciamento do conhecimento, a avaliação das práticas de gestão do conhecimento e a
implantação de novas ações de desenvolvimento sustentável. A figura 1, a seguir ilustra de
forma mais didática os estágios que compõe o modelo.
Fórum Internacional do Meio Ambiente - A conferência da Terra 307

Figura 1. Modelo de gestão do conhecimento para indicadores de sustentabilidade. Fonte: Lira,


2008.

1º Estágio- Reconhecimento do Problema- O primeiro estágio no processo de gestão do


conhecimento no uso dos sistemas de indicadores de sustentabilidade é o reconhecimento da
necessidade de usar informações contidas nos sistemas de indicadores de sustentabilidade, que pode
ser entendido como a percepção da necessidade de desenvolver ações de desenvolvimento
sustentável a partir do índice de sustentabilidade que possibilite a melhoria da qualidade de vida da
região onde a organização está inserida.

2° Estágio: Diagnóstico da Sustentabilidade- Uma vez que se reconhece a necessidade de


utilizar as informações contidas nos sistemas de indicadores de sustentabilidade para desenvolver
ações em prol do desenvolvimento sustentável, pode-se então, ocupar-se do diagnóstico das
dimensões ambiental, econômica, social, instituicional, cultural e demográfica para identificar em
que nível de sustentabilidade se encontra a região onde a organização está inserida, para então
delinear ações que minimize os danos causados pela atividade econômica, no caso específico as
indústrias do setor de rochas ornamentais. O modelo utiliza a metodologia criada por Martins e
Cândido (2008), a qual utiliza as Dimensões e os indicadores propostos por Sepúlveda at. al.
(2005), assim como , indicadores do Desenvolvimento Sustentável – IDS Brasil (2004).

3° Estágio: Busca de Soluções através da Gestão do Conhecimento- No modelo proposto a


busca de soluções se dar através das práticas de gestão do conhecimento, que pode ser definida
como ferramentas de gestão que contribui para a criação, disseminação, compartilhamento e
aplicação do conhecimento interno a organização e sua relação com o ambiente externo a partir do
uso dos indicadores de sustentabilidade. Como soluções o modelo proposto considera as seguintes
práticas de gestão do conhecimento: Aprendizagem Organizacional, Coaching, Comunicação
Institucional, Educação Ambiental Corporativa ,Portais Corporativos, Inteligência Competitiva,
Benchmarking Sócio-Ambiental

4º. Estágio - Avaliação das Práticas de Gestão do Conhecimento e Ações Corretivas- Esta
etapa do modelo refere-se a avaliação das práticas de gestão do conhecimento que podem servir
como base para elaboração de políticas de desenvolvimento sustentável. As ações corretivas
servirão para adequação das práticas avaliadas as necessidades locais. Concluindo esta fase, a
Fórum Internacional do Meio Ambiente - A conferência da Terra 308

organização pode então ocupa-se da implantação de ações diferenciadas de desenvolvimento


sustentável. A avaliação das práticas de gestão do conhecimento deverão servir como guia para a
implantação de novas ações que será o próxima fase do modelo.

5º. Estágio – Implantação de Novas Ações de Desenvolvimento Sustentável- Nesta fase a


organização deve está voltada para os objetivos definidos garantindo sua execução. A execução das
ações será norteada pelos resultados alcançados na fase anterior que determinará quais sistemas do
processo de práticas de gestão do conhecimento necessitam de ações efetivas e quais estratégias
serão utilizadas para o seu efetivo uso. O acompanhamento e análise dos resultados permitem que
sejam redefinida os pontos críticos de sucesso de forma que possam ser atualizadas e corrigidas.
Deve-se, no entanto, acompanhar todo o processo no sentido de identificar e solucionar os
problemas bem como conscientizar os participantes da importância da prática de desenvolvimento
sustentável.

CARACTERIZAÇÃO DAS EMPRESAS


Empresa “A” – é uma empresa especializada em extração e beneficiamento de rochas
ornamentais , localizada no município de Campina Grande Estado da Paraíba. Tem como principais
produtos o granito em blocos, chapas e ladrilhos. Nos últimos anos tem investido na compra de
equipamento de alta tecnologia a exemplo do Tear a fio diamantado, que segundo o gestor otimiza a
produção, diminui o impacto ambiental e reduz os desperdício de matéria-prima. Os produtos são
comercializado na própria fábrica em Atacado. A empresa exporta para Europa e Estados Unidos os
blocos e chapas de granito e mármore com diferencial em relação ao mercado interno na textura,
cor e espessuras.
Empresa “B” – é uma empresa de beneficiamento de rochas ornamentais fundada no ano
de 1993 e está localizada no município de Campina Grande Estado da Paraíba. Participa do
mercado de rochas ornamentais, desde a extração até a comercialização, fornecendo granito em
blocos, chapas e ladrilhos. O principal problema vivenciado pela empresa no processo produtivo é
a perda de matéria-prima que segundo o gestor está sendo minimizado através de inovações
tecnológica junto a Instituições de ensino e centro de pesquisa. O produto final, geralmente blocos,
chapas e ladrilhos, é negociado interna e externamente, sendo que 91% da mercadoria são
exportados. Dos 85 empregados da empresa, 16 estão envolvidos em pesquisa e desenvolvimento
de inovações, como os granitos Bordeaux, Exotic, Macambira, Marrom Madeira, Mororó, Pereiro,
Umburana, Jabitacá, Cabernet e Verde Brasil.

APLICAÇÃO DO MODELO PROPOSTO


A aplicação do modelo contempla os seguintes estágios: reconhecimento do problema, o
diagnóstico da sustentabilidade, a busca de soluções, avaliação de práticas de gestão do
conhecimento nas empresas de rochas ornamentais da cidade de Campina Grande.

Reconhecimento do problema
A partir dos resultados da pesquisa foi possível perceber que as empresas pesquisadas têm
consciência da importância de melhorar os indicadores de sustentabilidade do município de
Campina Grande através do desenvolvimento de ações sustentável. Observou-se que apesar de
reconhecer esta necessidade, ainda utilizam de forma incipiente ações de melhoria. Desenvolvem
projetos em parcerias com instituições de ensino bem como capacita os funcionários em áreas que
possam de alguma forma atuar com pesquisas para minimizar o impacto ao meio ambiente, a
exemplo de projetos que utilizam os resíduos oriundos do processo de produção como matéria-
prima para o desenvolvimento de novos produtos.

Diagnóstico da sustentabilidade
Fórum Internacional do Meio Ambiente - A conferência da Terra 309

Uma vez que as empresas reconheceram a necessidade de desenvolver ações sustentáveis,


é preciso identificar o índice de sustentabilidade do município de Campina Grande para então
delinear as ações a serem desenvolvidas.
Para a realização do diagnóstico da sustentabilidade do município onde as empresas de
rochas ornamentais está inserida utilizou-se as dimensões e os cálculos desenvolvidos por Martins e
Cândido ( 2008). Com base nos resultados da pesquisa, verificou-se que índice de Desenvolvimento
Sustentável do município de Campina Grande é de 0,5649, índice este considerado moderado.
A tabela 1 mostra a pontuação e a performance obtidas em cada dimensão. Como pode ser
observado, quatro dimensões da cidade de Campina Grande obtiveram performance moderada ,
uma obtive performace alta e uma obteve desempenho baixo . Pela pontuação obtida, a dimensão
ambiental, demográfica, econômica e cultural obtiveram performance moderada, a dimensão social
obteve a melhor performance e a dimensão político-instituicional obteve a pior desempenho.

DIMENSÃO ÍNDICE MÉDIO - PB ÍNDICE MÉDIO - CG


Social 0,4768 0,7076
Demográfica 0,3382 0,4781
Institucional 0,3422 0,3310
Econômica 0,2417 0,5884
Ambiental 0,4686 0,6481
Cultural 0,1145 0,6363
IDS 0,3303 0,5649
Tabela 1: Índice de Desenvolvimento Sustentável da Paraíba e de Campina Grande. Fonte: Martins
e Cândido, 2008.

O bom desempenho obtido na dimensão social não foi suficiente para modificar a
tendência das outras dimensões. Assim sendo, o IDS de Campina Grande aponta para
sustentabilidade baixa. No próximo item será analisada cada dimensão isoladamente.

Busca de Soluções através da Gestão do Conhecimento


A partir da identificação do problema e do diagnóstico do índice de sustentabilidade da
região, o próximo passo é buscar soluções viáveis para melhorar os indicadores e aumentar o nível
de sustentabilidade através das práticas de gestão do conhecimento. Através dos resultados da
pesquisa junto às empresas pesquisadas, observa-se, que as mesmas despontam na concordância
sobre a existência das práticas formais de gestão do conhecimento como Benchmarking, Educação
Corporativa e Inteligência Empresarial e não formal em Aprendizagem Organizacional. e Coaching.
Com base no diagnóstico da sustentabilidade do município de Campina Grande, bem como
na prática de gestão do conhecimento, as empresas pesquisadas podem promover ações sustentáveis
que contribuam para aumentar os índices de sustentabilidade das seguintes dimensões e seus
respectivos indicadores abaixo relacionados:

Dimensão Social
Taxa de Escolarização população acima de 25 anos

Dimensão institucional
Despesas com Ciência e Tecnologia
Despesas com educação
Despesas com desporte e lazer
Despesas com urbanismo
Despesas com habitação urbana
Despesas com gestão ambiental
Comparecimento nas eleições
Fórum Internacional do Meio Ambiente - A conferência da Terra 310

Dimensão Econômica
Balança Comercial (US$)
Produto interno bruto per capita
Índice de Gini

Dimensão Ambiental
Qualidade das águas (%)

Dimensão Cultural
Cinemas
Ginásios de esportes e estádios
Unidades de ensino superior

Avaliação das Práticas de Gestão do Conhecimento e Ações Corretivas


A empresa B apresentou o maior percentual de indicações de práticas de Gestão do
Conhecimento formais, dando indícios de se encontrar em um estágio mais avançado em relação a
empresa A nas práticas referentes ao Benchmarking ,Educação corporativa e Inteligência
Empresarial. Tanto a empresa A como a empresa B praticam informalmente o Coaching , a
Comunicação Institucional, e a aprendizagem organizacional.
No que se refere a prática do benchmarking, o gestor da empresa B relata que:
“foi feito um estudo juntamente com o IEL para avaliar o desempenho do setor
comparado com a realidade do Espírito Santo, alguns itens estão próximo a realidade de
ES, a maioria realmente estamos abaixo em termos de desempenho.”

Isto mostra que apesar de não existir um programa formal, a empresa tem incentivado os
funcionários a expor as forças e identificar as fraquezas da empresa.
Esta realidade também é percebida na fala do gestor da empresa B, quando diz que:
Não temos programa formal, isso não quer dizer, que todas as pessoas devido a
informalidade que a gente faz na hierarquia da empresa, as critica e sugestões são
escutadas, não posso tiver efetivamente que todas são atendidas por não temos um
sistema de registro, mas a forma como a gente administra, em termos de conversar com
os encarregados e os colaboradores, existe uma interação. Gerente da Empresa B.

No que se refere à educação corporativa como pratica de gestão do conhecimento, na


empresa A foi observado práticas formais de educação ambiental apenas no que se refere a
separação do lixo. Por outro lado, A empresa B tem mostrado maior grau de maturidade nesta
prática, isto pode ser percebido quando o gestor relata que:
Em 2004 fizemos juntamente com o SESI o programa de alfabetização de adultos, foram
10 funcionários alfabetizados, hoje temos 6 na empresa e 4 se desligaram, então essa foi
uma das campanhas que foi feita na empresa. Temos incentivado os funcionários a fazer
cursos de especialização em parceria com a UEPB e o IEL. Atualmente temos 4
funcionários fazendo o curso de gestão ambiental e o gerente de produção fazendo o
curso de mestrado profissionalizante na UFPE.

Apesar da empresa A demonstrar a existência de um compromisso com a responsabilidade


social, não apresentam um programa de formação contínua e treinamento dos trabalhadores, bem
como não dispõem de estudo sobre a repercussão da sua atividade na população. Não foi constatado
um ambiente capacitante considerado como alavancador do processo.
Apenas a empresa B elabora projetos construindo a prática profissional do ator social,
utilizando estudos de caso e laboratório. Esta educação corporativa pode ser identificada na empresa
a partir da construção de um laboratório para a produção de tijolos que segundo o gestor da empresa
é um projeto que beneficiará os funcionários com a melhoria das condições de moradia.
Fórum Internacional do Meio Ambiente - A conferência da Terra 311

No que se refere a Inteligência empresarial, ambas as empresas participam de feiras


nacional e internacional, conforme descreve o gestor da empresa B:
Participamos de feiras nacionais e internacionais, fazemos visita ao setor produtivo, o
Brasil é um país altamente competitivo, lá no Espírito Santo, a gente tem contato. O
setor é muito competitivo em Verona na Itália, a gente tem acompanhado a concorrência
e têm buscado informações junto aos fornecedores. Os fornecedores por ser uma
atividade que os insumos são poucos e são poucos os fabricantes destes insumos, então
existe uma troca de informação muito grande entre as fabricas e os fornecedores de
insumos e seus clientes.

Com base nos resultados, infere-se que, progressivamente, as empresas devem observar as
práticas que produzem resultados excelentes em outra situação e que possam ser adaptadas para a
empresa, levando mais rápido aos resultados pretendidos. Observar-se também que as empresas se
encontram em um estágio que requer uma crescente transformação das práticas de gestão do
conhecimento informais e inexistentes em práticas formais que elevem a capacidade dessas
empresas, para melhor responderem às mudanças demandadas em seus ambientes.
Ressaltar-se que as práticas Coaching, Comunicação Institucional, Comunidades de
Práticas, Portal Corporativo e Aprendizagem Organizacional têm baixa utilização formal nas
empresas e em função deste grau de utilização, justificam-se como práticas pouco consolidadas.
Por outro lado, as práticas Benchmarking e Educação Corporativa têm alta utilização
formal nas empresas e em função deste grau de utilização, justificam-se como práticas
consolidadas.

Identificação e Implantação das ações de Desenvolvimento sustentável.


Nesta fase as empresas pesquisadas deverão traçar objetivos definidos garantindo a
execução das ações de desenvolvimento sustentável. A identificação de novas ações sustentáveis e
sua execução foi norteada pelos resultados alcançados das fases anteriores que determinou quais os
indicadores de sustentabilidade necessitam ser melhorados através das práticas de gestão do
conhecimento e quais estratégias serão utilizadas para o seu efetivo uso.
Verificou-se que os gestores reconhecem a necessidade de elevar os indicadores de
sustentabilidade, mais este reconhecimento está relacionado a competitividade e sustentabilidade da
empresa, conforme pode-se observar nas falas dos gestores:
Já está em andamento um projeto de cooperação entre o SENAI, FIEP, IEL, UFCG,
UEPB, IEL e as empresas de rochas ornamentais, para que a gente elabore um termo de
cooperação buscando o destino final dos seus resíduos, isso está em andamento, a gente
tem feito algumas reuniões junto com as universidades e centro de pesquisa.

As questões relacionada à dimensão institucional, no que se refere a investimento em


Ciência e Tecnologia, verificou-se que a empresa B desenvolve projetos que visam o
reaproveitamento dos rejeitos oriundo do processo produtivo em parceria com as Universidades e
Centro de Pesquisa.
Com relação ao indicador “Despesas com Ciência e Tecnologia”, o gestor da empresa B
mostra que :
Há uma abertura muito grande para se fazer investimento em tecnologia e
desenvolvimento de processo e produtos, infelizmente agente está no ano muito
complicado para o setor. Por serem empresas voltadas para exportação, o setor tem
sofrido muito com a questão de investimento, investimos em maquina agora, mais a
parte de mercado tem preocupado um pouco, inclusive são empresas que diminuíram o
seu nível de competitividade em termos de resultados, mais é uma sazonalidade do setor
e com certeza as empresas vão passar por esta dificuldade e voltam a investir.
Fórum Internacional do Meio Ambiente - A conferência da Terra 312

O indicador “Despesas com Gestão Ambiental”, segundo o gestor da empresa B poderá ser
elevado a partir dos:
Resultados dos estudos feitos pelos funcionários no curso de especialização em gestão
ambiental. Todos estão fazendo trabalho na gestão ambiental dentro da empresa. Temos
um funcionário desenvolvendo um estudo da reutilização dos resíduos sólidos
incorporando aos tijolos. O gerente de produção está fazendo o gerenciamento e o
monitoramento dos resíduos nas indústrias de beneficiamento de rochas ornamentais e a
gerente administrativa, que é assistente social está fazendo um diagnostico do para
identificar o perfil dos colaboradores das industria de beneficiamento, tanto para
conscientizá-lo com as questões ambientais como detectar e prospectar a realidade sócio
econômica e cultural destes colaboradores. Tem outro funcionário que está fazendo o
mestrado profissionalizante, estudando a viabilidade econômica para implantação de
britadores de pequena escala para utilizar os resíduos nas pedreiras.

O indicador Despesas com esporte e lazer, a empresa A diz que:


Tem uma quadra e um campo onde eles praticam esporte toda quarta-feira, no São João
e no final do ano é feito torneio entre os colaboradores de fabricas, de jazidas e clientes (
marmorarias), e temos 2 atletas bem conceituados, um de Xadrez que todo ano participa
da competição do SESI, inclusive competições internacionais e dentro do Estado temos
um atleta que pratica salto de vara em altura que todo ano funcionário nosso que todo
ano ganha a competição estadual, então estes dois tem incentivo, os demais pratica por
lazer.

Com relação ao Indicador Despesas com habitação urbana, a empresa B está com um
programa que visa elevar o número de moradia para os seus funcionários mais carentes bem como
para comunidade, isso pode ser constatado quando o gestor da empresa B diz que :
A gente tem 20.000 de tijolos confeccionados para fazer analise e protótipo, e
juntamente com os resultados da pesquisa do diagnóstico do perfil sócio econômico e
cultural ver realmente se há demanda e tentar viabilizar uma possível moradia para os
funcionários de baixa renda e por ventura possa mostrar interesse de ter esta alternativa,
mais é estudo mais com possibilidade de vim a ser posto em prática.

Ambas as empresas não tem biblioteca, por outro lado, no indicador qualidade da água as
empresas tem um sistema produtivo fechado, e o tratamento da água é feito através do decantador e
do filtro prensa , ou seja, a água é toda reciclada.
O indicador Comparecimento as eleições, ambas as empresas relataram que não misturam
a questão de eleições na empresa. O gestor da empresa B mostra que:
Se discute a questão de cidadania, a gente tem feito a semana interna de prevenção , que
é obrigado por Lei, mais a gente tem ampliado com palestras com o pessoal do SESI que
tem dado um suporte neste sentido.

O gestor da empresa A diz ser possível uma empresa contribuir para o desenvolvimento
sustentável e acredita que a empresa pode melhorar os indicadores da cidade de Campina Grande,
quando diz que:
Se você consegue dentro das indústrias criarem cidadãos com consciência, com
educação e disciplinas eles automaticamente vão levar para dentro das suas casas e vão
dá valores que muitas vezes eles não tiveram oportunidades e se eles, por exemplo,
conseguem ter escolaridade dentro do ambiente de trabalho, é um excelente exemplo
para as crianças, você pegar adultos depois de uma jornada de trabalho, fazer com que
eles estudem, e eles retornam pra casa e possam evoluir junto com seus filhos é um
incentivo extremamente saudável.
Fórum Internacional do Meio Ambiente - A conferência da Terra 313

Observa-se que a cultura dos gestores limita-se as questões econômicas e ambientais. A


redução do impacto ambiental é feita por existir um rigoroso controle por parte dos órgãos
fiscalizadores.
Veja bem, a questão das empresas estarem contribuindo para a sustentabilidade da
região onde estão inseridas bem como buscando a sua sustentabilidade é uma
necessidade que as empresas têm, até por elas estarem inseridas na comunidade, e se
beneficiando daquela comunidade, por outro lado, o Brasil já é extremamente punitivo
para com as empresas, quando a sua carga tributária , na geração do numero de emprego
até a sua responsabilidade de tributação é extremamente penoso e começa a faltar
muitas vezes recursos para desenvolver e ampliar ações sociais, porque ações desde tipo
tem de ter recursos, não adianta só você querer fazer com voluntariedade , porque chega
um determinado momento que precisa de recursos e ai se desestimula aquele que estão
sendo voluntários.

A identificação e implantação destas ações contribuirão para elevar o índice de


desenvolvimento sustentável do município de Campina Grande e, por conseguinte a
sustentabilidade da empresas.

Considerações
O modelo de gestão do conhecimento no uso dos indicadores de sustentabilidade dá ênfase
especial ao trabalho desenvolvido pelas redes humanas dos agentes sociais, considerando sua
importância na criação do conhecimento como fator de mudanças para promoção do
desenvolvimento sustentável.
A partir da revisão bibliográfica foram identificados cinco estágios do processo de gestão
do conhecimento no uso dos sistemas de indicadores de sustentabilidade: o reconhecimento do
problema, o diagnóstico da Sustentabilidade, a busca de solução através da gestão do conhecimento,
a avaliação das práticas de gestão do conhecimento e ações corretivas e a identificação e a
implantação de novas ações de desenvolvimento sustentável. Embora cada um deles possua
natureza diferenciada, eles se complementam.
Quanto ao estágio de busca de solução através da gestão do conhecimento, em função dos
resultados obtidos, pode-se concluir que as empresas despontam na concordância sobre a existência
das práticas formais de gestão do conhecimento como Benchmarking, Educação Corporativa e
Inteligência Empresarial e não formal em Aprendizagem Organizacional. e Coaching.
No estágio de avaliação das práticas de gestão do conhecimento e ações corretivas as
empresas se encontram em um estágio que requer uma crescente transformação das práticas de
gestão do conhecimento informais e inexistentes em práticas formais. Com base nos resultados da
pesquisa pode concluir que as práticas de gestão do conhecimento pouco consolidadas nas empresas
pesquisadas foram: Comunidades de Práticas, Comunicação Institucional, Portal Corporativo e
Aprendizagem Organizacional, Coaching. Por outro lado, as práticas de gestão do conhecimento já
consolidadas foram: Benchmarking, Educação Corporativa, e Inteligência Competitiva.
No estágio de identificação e implantação de novas ações de desenvolvimento sustentável,
as empresas deverão implementar ações visando a melhoria dos conhecimentos técnicos e
científicos e a difusão de novas tecnologias para auxiliar a gestão sustentável dos recursos naturais,
bem como, programas de educação ambiental, investimento em um tecnologia de informação
através do desenvolvimento de um Portal Corporativo, criando uma cultura organizacional que
possibilite a prática de ações de desenvolvimento sustentável e estruturas coletivas que favoreça a
produção e disseminação do conhecimento através da consolidação das práticas de gestão do
conhecimento voltada para a sustentabilidade.
Os resultados permitem direcionar o foco para o desenvolvimento e/ou aprimoramento da
gestão do conhecimento no contexto do desenvolvimento sustentável, objetivando ganhos de
sustentabilidade no gerenciamento do conhecimento no segmento estudado.
Fórum Internacional do Meio Ambiente - A conferência da Terra 314

Por fim, vale ressaltar que no cenário atual de economia globalizada e de reconfiguração
das empresas na busca da eco-eficiência, o entendimento das práticas de gestão do conhecimento é
o caminho almejado para aumentar a sustentabilidade da região e por conseguinte a sustentabilidade
das organizações.

REFERÊNCIAS BIBLIOGRAFIA
ACIESP - ACADEMIA DE CIÊNCIAS DO ESTADO DE SÃO PAULO. Glossário de ecologia.
São Paulo: ACIESP/CNPq/FAPESP/SCT, 1987. 271p. (Publicação ACIESP, 57).
BAKKES, J.A. ET AL. An Overview of Environmental Indicators: State of the Art and
Perspectives. RIVM, Bilthoven-The Netherlands. 1994
BARBIERI, José Carlos. Desenvolvimento e meio ambiente: as estratégias de mudanças da Agenda
21. Petrópolis: Vozes, 1997.
BARTELMUS, P. Indicators of sustainable Growth and Development – Linkage Integration and
Policy Use. Background Paper of Scientific Workshop on Indicators of Sustainable Development,
Wuppetal, 1995.
BOISIER, Sérgio. En busca del esquivo desarollo regional: entre la caja negra y el proyecto
politico. Santiago: ILPES, 1995. (Serie Ensaios, Documento 95/30).
BOSSEL,H.Indicators for sustainable development:Theory, Method, Aplications:A report to the
balaton group. Winnipeg:IISD, 1999.
BUKOWITZ, Wendi R.; WILLIAMS, Ruth L. Manual de Gesta o do Conhecimento: ferramentas e
tôcnicas que criam valor para a empresa. Porto Alegre: Bookman, 2002.
CAVALCANTI, Clóvis. Desenvolvimento e natureza: estudos para uma sociedade sustentável. São
Paulo: Cortez, 2001.
_______. Desenvolvimento e natureza: estudos para uma sociedade sustentável. São Paulo: Cortez,
1998b. p.153-174: Sustentabilidade da economia: paradigmas alternativos de realização econômica.
CAPRA. F., A Teia da Vida. São Paulo, Cultrix, 1996.
CHOO, W. C. A organização do conhecimento.Como as organizações usam a informação para criar
significado. Senac editora, São Paulo 2003.
DNPM. Departamento Nacional de Pesquisa Mineral. www.dnpm.org.br. Acesso em janeiro de
2005.
FREY, K. Desenvolvimento sustentável local na sociedade em rede: o potencial das novas
tecnologias de informação e comunicação. In: Revista de Sociologia e Política. Curitiba, n.21, p.
165-185, nov., 2003.
GALLOPIN.G.C. Enviromental and sustainability indicators and the concept of situacional
Indicators.1996
GODOY, C.K; SILVA, A.B.da. Desenvolvimento de competências e os processos subjacentes da
aprendizagem em uma empresa pública do setor elétrico. In: Anais do I Encontro de Estudos em
Estratégica. Curitiba: 3Es, 2003.
GOLDSMITH , E.; ALLEN,R;ALLABY,M. Blueprint for Survival..Boston, Penguin, 1972
GÜELL, J. M. F. El diseño de escenarios en el ámbito empresarial. Madrid: Ediciones Pirâmide,
2004
HAMMOND, A.; ADRIAANSE, A.; RODENBURG, E. et al. Environmental Indicators: a
Systematic Approach to Measuring and Reporting on Environmental Policy Performance in the
Context of Sustainable Development. Washington: WRI, 1995.
HARDI, P., BARG, S. Assessing sustainable development: principles in practice. Draft paper,
Winnipeg: IISD, 1997
LIRA.Waleska Silveira. Sustentabilidade :Um enfoque sistêmico. EDUEP.2007
_________________ Sistema de Gestão do Conhecimento para Indicadores de
Sustentabilidade.Tese de Doutorado em Recursos Naturais.UFCG., 2007.
NONAKA I; TAKEUCHI, H.. Criação de conhecimento na empresa. Rio de Janeiro, Editora
Campus, 1997.
Fórum Internacional do Meio Ambiente - A conferência da Terra 315

O’DELL, C.; GRAYSON JR., C.J. Ah… se soubéssemos antes o que sabemos agora – as melhores
práticas gerenciais ao alcance de todos. São Paulo: Futura, 2000.
OCDE (1993), Draft Synthesis Report, Group on State of Environment workshops on Indicators for
Use in Environmental Performance reviews. Doc ENV/EPOC/SE, Paris, OCDE.
OECD. Economic Outlook. Paris: OECD, 2000.
OLIVEIRA, J.H.R., Desenvolvimento sustentado: meio ambiente e biodiversidade. UNISC. 1998.
PASSET, R. (1992) Desenvolvimento durável e biosfera: abertura multidimensional ou novos
reducionismos? Revista Tempo Brasileiro, 1999.
RESENDE, M; KER, J. C.; BAHIA FILHO, A. F. C. Desenvolvimento sustentado do cerrado. In:
ALVAREZ V., H. V.; FONTES, L. E. F.; FONTES, M. P. F. O solo nos grandes domínios
morfológicos do Brasil e o desenvolvimento sustentável. Viçosa, MG: SBCS; UFV, DPS, 1996.
SACHS, I. Ecodesenvolvimento: crescer sem destruir. São Paulo: Vértice,1986.
SCHWARTZMAN, S., CASTRO, C. M. (org). Pesquisa universitária em questão. SãoPaulo:
Unicamp/Ícone/CNPq, 1986.
SILVA, M. (Org). Educação online. São Paulo: Edições Loyola, 2003.
STOLLENWERK, M. F. L. Gestão do conhecimento, inteligência competitiva e estratégia
empresarial: em busca de uma abordagem integrada. Anais do Workshop Brasileiro de Inteligência
Competitiva. Rio de Janeiro 1999.
SACHS, I. Ecodesenvolvimento: crescer sem destruir. São Paulo: Vértice,1986.
VIEIRA, P.F. et al. (Orgs.) Desenvolvimento e meio ambiente no Brasil. A contribuição de Ignacy
Sachs. Porto Alegre: Pallotti e APED. 1998.
UNCED- United Nations Conference on Environment and Development, Rio de Janeiro, 3-14 June
1992
UNITED NATIONS DEVELOPMENT PROGRAM. Agenda 21: Chapter 40. Disponível on-line
em http://rolac.unep.mx/agenda21/ing/ag21an40.htm.1992.
UNITED NATIONS Agenda 21 - (Conference on Environment and Development). Genebra:
United Nations, 1992.
WACKERNAGEL, M.; REES, W.(1996). WALL R.; OSTERTAG, K.; BLOCK, N. Synposis of
select indicators __Further development of indicator systems for reporting on the environment of
the Federal Ministry of the Environment. Karlsruhe: Frauenhofer Institute for Systems and
Innovation Research, 1995.
WAGNER, A. et. alli. A eleição presidencial e a mineração. Gazeta Mercantil 20 de setembro de
2002.
WATSON-BOONE, R.. The information needs and habits of humanities scholars. Reference
Quarterly, Chicago, v. 34, n. 2, p.203-216, 1994.
WORLD RESOURCES INSTITUTE, 2000, Tomorrow’s Markets. Global Trends and Their
Implications for Business WIIG, Karl M. Knowledge management in public administration. Journal
of Knowledge Management, v. 6, n. 3, 2002, p. 224-239.
WORLD Commission on Environment and Development. Our Common Future. Oxford and New
York: Oxford University Press, 1987.
Fórum Internacional do Meio Ambiente - A conferência da Terra 316

PROPOSTA DE RECONHECIMENTO DO IMPACTO AMBIENTAL “ESGOTAMENTO


DOS RESERVATÓRIOS DE PETRÓLEO E GÁS NATURAL” COMO DIRETRIZ PARA O
DESENVOLVIMENTO DE PLANO DIRETOR NACIONAL PARA A EXPLORAÇÃO DOS
RESERVATÓRIOS BRASILEIROS

Rodrigo Machado Vilani


Doutorando do Programa de Pós-Graduação em Meio Ambiente da UERJ. Bolsista da Fundação Carlos Chagas Filho
de Amparo à Pesquisa do Estado do Rio de Janeiro / FAPERJ. r_vilani@yahoo.com.br
Carlos Saldanha Machado
Pesquisador da Fundação Oswaldo Cruz/ICICT/LabCiTIeS. Professor do Programa de Pós-Graduação em Meio
Ambiente da UERJ. saldanha@fiocruz.br; carlos.saldanha@pesquisador.cnpq.br

Resumo
O objetivo deste trabalho é, a partir da análise dos impactos ambientais de atividades de
exploração e produção de petróleo e gás natural (E&P) apresentados em estudos ambientais (RAA e
EIA) de empreendimentos localizados da Bacia de Campos - RJ, ressaltar o esgotamento dos
reservatórios como impacto ambiental negativo destas atividades. Para mitigar este impacto,
propõe-se a elaboração de um plano diretor nacional, de caráter participativo, para o planejamento
intertemporal da exploração dos campos petrolíferos conhecidos no Brasil. A proposta visa, ainda,
fortalecer a implementação de políticas públicas de incentivo ao uso de fontes alternativas de
energia e de controle do consumo.
Palavras-chave: desenvolvimento sustentável; petróleo e gás natural; impacto ambiental; política
pública; plano diretor nacional.

Abstract
The aim of this article is to emphasize exhaustion of oil and gas reservoirs as a negative
environmental impact. We analysed the environmental impact of oil and gas exploitation and
production activities presented in environmental assessments (RAA and EIA) of enterprises located
in Bacia de Campos – RJ. In order to mitigate the effects of this impact we propose a national
master plan for intertemporal planning of the exploitation of Brazilian oil fields. The proposal aims
to strengthen the implementation of public policies of alternative energy sources and consumption
control.
Key-words: sustainable development; oil and gas; environmental impact; public policy; national
master plan.

INTRODUÇÃO
O trabalho procura delinear um novo instrumento jurídico-político, no sentido de fortalecer
os demais instrumentos legais existentes para a garantia do desenvolvimento sustentável, como a
avaliação de impactos ambientais e o Estudo de Impacto Ambiental / Relatório de Impacto
Ambiental (EIA / RIMA).
Partindo-se da identificação de impactos ambientais integrante de estudos ambientais (EIA
e Relatório de Avaliação Ambiental – RAA) de procedimentos de licenciamento ambiental
protocolados no CGPEG/IBAMA, foi possível conhecer os impactos ambientais das atividades de
exploração e produção de petróleo e gás natural.
Na análise proposta reconhecemos dois conceitos fundamentais para a delimitação da
exploração de petróleo e gás natural como impacto ambiental (LIMA-E-SILVA, 1999):
a) Impacto ambiental: qualquer alteração no ambiente causada por atividades antrópicas; 52
b) Recurso não renovável: qualquer recurso finito que, em escala de tempo humana, uma vez
consumido não possa ser renovado.53

52
IMPACTO AMBIENTAL. In: LIMA-E-SILVA, P. P.; et al. Dicionário brasileiro de ciências ambientais. Rio de
Janeiro: Thex, 1999. p. 130.
53
RECURSO. In: LIMA-E-SILVA, P. P. op. cit. p. 195.
Fórum Internacional do Meio Ambiente - A conferência da Terra 317

A proposta de inserção do esgotamento dos reservatórios entre os impactos ambientais das


atividades de exploração e produção de petróleo e gás (E&P) parte da análise dos impactos
reconhecidos ao longo do caminho percorrido pelo licenciamento ambiental, baseada na legislação
ambiental, especificamente, nas Leis Federais no 6.938/81 e no Lei 9.478/97 e na Resolução
CONAMA 001/86, sob o enfoque da sustentabilidade encerrado na Constituição Federal de 1988
(CF/88).
Através desta discussão buscamos trazer contribuição para: a) elaboração de instrumento
intertemporal de planejamento das atividades de exploração e produção de petróleo e gás natural; b)
estímulo ao incremento de políticas públicas voltadas para fontes alternativas e consumo de energia.

DESENVOLVIMENTO SUSTENTÁVEL
Conceituado como alternativa à lógica hegemônica de produção de mercadorias através da
degradação ambiental e exploração do trabalho humano, desenvolvimento sustentável encerra um
ideal de racionalização na apropriação dos recursos naturais, inserindo uma variável temporal e uma
exigência ética (responsabilidade intergeracional) no desenvolvimento econômico.54
Analisando de forma sistêmica55 a Constituição Federal, entendemos ter sido adotado
como modelo para o desenvolvimento nacional aquele definido para o desenvolvimento sustentável.
O desenvolvimento no Brasil está, portanto, fundado sobre os seguintes pilares:
desenvolvimento nacional (art. 3º, II);
redução das desigualdades regionais e sociais (art. 3º, III);
ordem econômica tem por fim assegurar a todos existência digna (art. 170, caput);
meio ambiente ecologicamente equilibrado (art. 225, caput);
responsabilidade intergeracional (art. 225, caput).

Sob essa perspectiva:


Desenvolvimento econômico no Estado Brasileiro, subentende um aquecimento da
atividade econômica dentro de uma política de uso sustentável dos recursos naturais
objetivando um aumentado de qualidade de vida que não se reduz a um aumento do
poder de consumo.56

Logo, ao se afirmar o caráter sustentável do desenvolvimento nacional brasileiro, não se


busca criar óbices ao aproveitamento dos recursos naturais, mas, outrossim, construir um modelo de
desenvolvimento, com base nos princípios constitucionais, orientado pela “exploração equilibrada
dos recursos naturais, nos limites da satisfação das necessidades e do bem-estar da presente geração,
assim como de sua conservação no interesse das gerações futuras.” Podemos, por exclusão, ainda
seguir o entendimento de que se o “desenvolvimento não elimina a pobreza absoluta, não propicia
um nível de vida que satisfaça às necessidades essenciais da população em geral, ele não pode ser
qualificado de sustentável.”57
Entre a literatura especializada destaque-se o ensinamento do Profo José Afonso da Silva:
O objeto de tutela jurídica não é tanto o meio ambiente considerados nos seus elementos
constitutivos. O que o direito visa proteger é a qualidade do meio ambiente em função da
qualidade de vida. Pode-se dizer que há dois objetos de tutela, no caso: um imediato, que

54
“DESENVOLVIMENTO SUSTENTÁVEL – Econ. Forma de desenvolvimento econômico que não tem como
paradigma o crescimento, mas a melhoria da qualidade de vida; que não caminha em direção ao esgotamento dos
recursos naturais” In: LIMA-E-SILVA, P. P. op. cit. p. 76.
55
Seguindo a orientação adotada por Eros Roberto Grau, ao salientar que “não se interpretam textos normativos
constitucionais, isoladamente, mas sim a Constituição, no seu todo” (A ordem econômica na Constituição de 1988. 8
ed. rev. atual. São Paulo: Malheiros, 2003. p. 145), resume o caráter de integração entre os princípios, dentro de um
contexto sistêmico (Ensaio e discurso sobre a interpretação/aplicação do direito. 2 ed. São Paulo: Malheiros, 2003. p.
194).
56
DERANI, C. Direito ambiental econômico. 2 ed. rev. SP: Max Limonad, 2001. p. 242.
57
SILVA, J. A. Direito ambiental constitucional. SP: Malheiros, 1994. pp. 7-8.
Fórum Internacional do Meio Ambiente - A conferência da Terra 318

é a qualidade do meio ambiente, e outro mediato, que é a saúde, o bem-estar e a


segurança da população, que se vêm sintetizando na expressão qualidade de vida.58

O Fluxograma 1 apresenta de forma esquemática o entendimento extraído da Constituição


Federal, culminando como objetivo maior da proposta de sustentabilidade a existência digna, de
presentes e futuras gerações:

Fluxograma 1 - Constituição Federal: sustentabilidade e dignidade da pessoa humana


redução das desigualdades regionais e ordem econômica (art. 170, caput)
sociais (art. 3º, III)

meio ambiente ecologicamente responsabilidade intergeracional (art.


equilibrado (art. 225, caput) 225, caput)

desenvolvimento nacional (art. 3º, II)

desenvolvimento sustentável

dignidade da pessoa humana (art. 1º, III)

Desta forma, o cotidiano cenário de exploração exclusivamente e econômica dos recursos


naturais, de pobreza generalizada e de desigualdades sociais, traços destacados do atual quadro de
injustiça ambiental59, está em patente dissonância com os objetivos constitucionais da República
Federativa do Brasil.
É preciso, portanto, que se faça uma revisão destas limitações, de forma solidária, tomando
como eixo de análise as necessidades vitais para uma existência digna:
A vida em sociedade gera necessidades coletivas que, com os processos de civilização,
se tornam mais e mais complexas e exigentes. A satisfação destas necessidades tem
conduzido a humanidade a uma exploração predatória dos recursos naturais
caracterizada pela irracionalidade e pela irresponsabilidade.60

Na busca por uma conduta racional e responsável frente à existência perene de vida no
planeta, importa reconhecer o papel desempenhado pelo ser humano como propõe PORTO-
GONÇALVES, no auxílio ao desafio quantitativo imposto pelo uso crescente dos recursos naturais:
Nenhuma sociedade produz o carvão, o petróleo, o ferro, o chumbo, a água e outros
minerais, assim como o homem não produz os dias e as noites, a radiação solar, sem o
que não vivemos. Somos, como espécie, em grande parte, extratores de petróleo, carvão,
ferro, manganês, água e outros minerais, e não seus produtores. Observemos que dizer

58
Idem. p. 54.
59
Entendida como “a condição de existência coletiva própria a sociedades desiguais onde operam mecanismos
sóciopolíticos que destinam a maior carga dos danos ambientais do desenvolvimento a grupos sociais de trabalhadores,
populações de baixa renda, segmentos raciais discriminados, parcelas marginalizadas e mais vulneráveis da cidadania.”
(ACSELRAD, H.; HERCULANO, S.; PÁDUA, J. A. A justiça ambiental e a dinâmica das lutas sócioambientais no
Brasil – uma introdução. In: _____ (orgs.). Justiça ambiental e cidadania. Rio de Janeiro: Relume-Dumará, 2004. p.
10)
60
MOREIRA NETO, D. F. Introdução ao direito ecológico e ao direito urbanístico. 2 ed. rev. aum. Rio de Janeiro:
Forense, 1977. p. 18.
Fórum Internacional do Meio Ambiente - A conferência da Terra 319

que somos produtores significa que depende de nossa capacidade criativa a existência do
que é produzido. Dizer que somos extratores sinaliza que extraímos algo que não
fazemos, o que significa manter prudência no seu uso.61

A distância existente entre o ideal constitucional e a realidade brasileira e mesmo global no


dias atuais, nos leva a concordar com a afirmação de SACHS: a “História nos pregou uma peça
cruel. O desenvolvimento sustentável é, evidentemente, incompatível com o jogo sem restrições das
forças do mercado”62.
E, justamente, no sentido de estabelecimento de regras sustentáveis no vale-tudo da
globalização, capazes de combater o paradigma econômico vigente, que seu busca a instauração de
diretrizes assecuratórias de existência digna à população excluída dos benefícios monopolizados
pela minoria dominante.
Frente ao atual fortalecimento de interesses hegemônicos, sobretudo em tempos de valores
recordes do barril de petróleo, cumpre ressaltar o pressuposto intertemporal de distributividade
encerrado no conceito de sustentabilidade:
A idéia de desenvolvimento sustentado também está relacionada à de riqueza constante,
no sentido de que cada geração deve deixar para a próxima pelo menos o mesmo nível
de riqueza, considerada como a disponibilidade de recursos naturais, de meio ambiente e
de ativos produtivos.63

Para garantir a herança das futuras gerações devem ser inseridos aspectos intertemporais,
distributivos e solidários no jogo econômico do mercado global. Acompanhamos o entendimento de
que a “sustentabilidade sai do campo estritamente econômico e pode ser entendida como o processo
pelo qual as sociedades administram as condições materiais da sua reprodução, redefinindo os
princípios éticos e sociopolíticos que orientam a distribuição de seus recursos ambientais”64.
Discutiremos a instituição de limites para as apostas com recursos naturais, sobretudo os
não-renováveis, no âmbito do licenciamento ambiental das atividades de E&P.

ASPECTOS LEGAIS: PELA CONCRETIZAÇÃO DO DESENVOLVIMENTO SUSTENTÁVEL


A Política Nacional do Meio Ambiente – PNMA (Lei 6938/81), recepcionada pela
Constituição Federal e, portanto, em consonância com o modelo constitucional de desenvolvimento
sustentável, elenca entre os princípios para assegurar “a preservação, melhoria e recuperação da
qualidade ambiental propícia à vida” (art. 2º, caput) o “planejamento e fiscalização do uso dos
recursos ambientais” (art. 2º, III).
Seguindo o texto constitucional, este planejamento deve abarcar o aspecto temporal na
exploração dos recursos ambientais. Esta responsabilidade intergeracional está prevista, também, na
finalidade de preservação e restauração dos recursos ambientais com vistas à sua utilização racional
e disponibilidade permanente (art. 4º, VI, da PNMA – grifos nossos).
A avaliação de impactos ambientais e o licenciamento estão entre os instrumentos da
PNMA (art. 9º, III e IV). São regulados pela Resolução CONAMA nº 001/86, que exige a
elaboração de EIA/RIMA para o “licenciamento de atividades modificadoras do meio ambiente”,
dentre as quais a extração de combustível fóssil (art. 4º, VIII).
Urge destacar, que o EIA deve “atender à legislação, em especial os princípios e objetivos
expressos na Lei de Política Nacional do Meio Ambiente” e diretrizes como a identificação e
avaliação sistemática dos impactos ambientais gerados nas fases de implantação e operação da
61
PORTO-GONÇALVES, C. W. O desafio ambiental. Rio de Janeiro: Record, 2004. (Os porquês da desordem
mundial. Mestres explicam a globalização). p. 61.
62
SACHS, I. Caminhos para o desenvolvimento sustentável. 3 ed. Rio de Janeiro: Garamond, 2002. p. 55.
63
GOMES, H. M. As relações sociedade/natureza e a valoração econômica da natureza: o caso da mata do Estado.
Disponível em: <http://www.biblioteca.sebrae.com.br/bds/BDS.nsf/95BB814DC390446A03256FC4004F20BC/$File/
NT000A50E6.pdf>. Acesso em 30 mar. 2008. p. 44.
64
LEROY, J. et al. Tudo ao mesmo tempo agora: desenvolvimento, sustentabilidade, democracia: o que isso tem a ver
com você? 3 ed. Petrópolis: Vozes, 2002. p. 18. (grifos no original)
Fórum Internacional do Meio Ambiente - A conferência da Terra 320

atividade e considerar os planos e programas governamentais, propostos e em implantação na área


de influência do projeto, e sua compatibilidade (art. 5º, II e IV).
Item obrigatório do EIA, a “Análise dos impactos ambientais” se dá “através de
identificação, previsão da magnitude e interpretação da importância dos prováveis impactos
relevantes, discriminando: os impactos positivos e negativos (benéficos e adversos), [...]
temporários e permanentes; seu grau de reversibilidade [...]” (art. 6º, II).
O esgotamento de um reservatório de petróleo e gás, dentro do contexto legal vigente,
configura impacto ambiental negativo, permanente e irreversível. Escamotear este fato constitui
flagrante opção pela manutenção de orientação exclusivamente econômica na exploração destes
recursos em patente descompasso com o desenvolvimento sustentável constitucionalmente definido.
A Lei 9.478/97 – Lei do Petróleo – determina, por sua vez, dentre os objetivos das
“políticas nacionais para o aproveitamento racional das fontes de energia” a proteção ao meio
ambiente e a utilização de fontes alternativas de energia (art. 1º, IV e VIII), corroborando o
entendimento aqui exposto.
Impende promover o ideal de sustentabilidade transversalmente às políticas públicas
setoriais, como de energia e de infra-estrutura, para a criação de uma unidade harmônica. A
existência de múltiplos interesses, diferentes e divergentes (ALVES, 1996), sem uma agenda
nacional comum, favorece à manutenção de interesses econômicos, desapropriando a maioria da
população da possibilidade de viver dignamente em um ambiente ecologicamente equilibrado.

EXPLORAÇAO DE PETRÓLEO E GÁS NATURAL


Os estudos ambientais exigidos no início das atividades de licenciamento ambiental de
petróleo e gás natural, da década de 90, eram os Relatórios de Avaliação Ambiental – RAA.
Posteriormente, já nos anos 2000, passou a ser obrigatória a elaboração dos Estudos de Impacto
Ambiental (EIA).
No RAA elaborado para a operação da unidade marítima PETROBRAS 34 (P-34)65 foram
discriminados os seguintes impactos ambientais:
1. Aumento da carga orgânica;
2. Aumento da temperatura da água superficial e subsuperficial;
4. Contaminação da biota marinha por hidrocarbonetos;
5. Desenvolvimento de comunidades biológicas;
6. Efeito antrópico.

Estão indicados abaixo, os impactos ambientais identificados no RAA66 da unidade


PETROBRAS 35 (P-35):
1. Aumento da carga orgânica;
2. Aumento da temperatura da água superficial e subsuperficial;
3. Alteração na qualidade da água;
4. Possibilidade de contaminação da biota marinha por hidrocarbonetos;
5. Desenvolvimento de comunidades biológicas;
6. Aumento na receita dos municípios da área de influência;
7. Aumento na produção nacional de petróleo.

Note-se que, com o aumento de conhecimento acerca dos impactos ambientais, reais e
potenciais, das atividades de exploração e produção de petróleo e gás natural, também os estudos
ambientais passaram a apresentar maior detalhamento, de acordo com o aprofundamento das
exigências pelo órgão ambiental.

65
PETROBRAS. Relatório de avaliação ambiental: Petrobras 34. Processo IBAMA/MMA no 02001.004540/92-98.
66
Dados retirados da Matriz de Impactos Ambientais do RAA da P-35 (PETROBRAS. Relatório de avaliação
ambiental: Petrobras 35. Processo IBAMA/MMA no 02001.001975/96-78).
Fórum Internacional do Meio Ambiente - A conferência da Terra 321

Desta forma, encontramos no Relatório de Impacto Ambiental (RIMA), documento que


apresenta os resultados do Estudo de Impacto Ambiental (EIA), de empreendimentos do começo
desta década, com considerável ampliação nos impactos diagnosticados (Quadro 1).

Quadro 1 Aspectos e Impactos Reais das Atividades de E&P


ASPECTOS IMPACTOS
Ressuspensão de sedimentos Alteração da qualidade da água; Alteração da comunidade bentônica
Transporte da P-53 para a locação Introdução de espécies exóticas
Presença física da plataforma Alteração da biota marinha (plantas e animais marinhos)
Descarte ao mar dos efluentes Alteração dos níveis de nutrientes e de turbidez na coluna d’água; Alteração
da biota marinha
Descarte ao mar de água produzida Alteração da qualidade da água; Alteração da biota marinha
Descarte no mar de fluido de preenchimento Alteração da qualidade da água; Alteração da biota marinha
Emissões gasosas Alteração da qualidade do ar
Desativação da atividade de produção Alteração da comunidade pelágica; Alteração da comunidade bentônica
Criação da zona de segurança no entorno da P-53 Geração de conflitos entre atividades de produção e escoamento de óleo e
gás e a pesca
Demanda de mão-de-obra Geração de emprego
Demanda de aquisição de bens e serviços Aumento da demanda sobre as atividades de comércio e serviços; Geração
de tributos e crescimento das economias local, estadual e nacional; Pressão
sobre o tráfego marítimo; Pressão sobre o tráfego aéreo; Pressão sobre o
tráfego aéreo; Pressão sobre o tráfego rodoviário; Pressão sobre a infra-
estrutura de transporte marítimo e aumento da demanda da indústria naval;
Aumento das atividades do setor de transporte aéreo; Pressão sobre a infra-
estrutura de transporte rodoviário; Pressão sobre a infra-estrutura portuária
Produção de óleo e gás Aumento da produção de hidrocarbonetos; Geração de royalties,
participações governamentais e aumento das atividades econômicas;
Aumento do conhecimento técnicocientífico e fortalecimento da indústria
petrolífera; Geração de expectativas
Geração de resíduos sólidos e oleosos Pressão sobre a infra-estrutura de disposição final de resíduos sólidos e
oleosos

Fonte: PETROBRAS. Relatório de Impacto Ambiental: atividade de produção e escoamento de óleo


e gás do Campo de Marlim Leste, Bacia de Campos, através da Plataforma P-53. Disponível em:
<http://www.ibama.gov.br>. Acesso em: 15 out 07. (grifos nossos)

Na fase de “Elaboração do plano de desenvolvimento”, para exploração de um campo de


petróleo, “são determinados: custo da operação; nível de produção; pressão de produção;
características gerais de viabilidade econômica”67.
Assim como no “plano de desenvolvimento”, os estudos ambientais que vêm sendo
elaborados e protocolados junto ao IBAMA, para a obtenção de licenças de operação, ainda que
apresentando alguma evolução na identificação dos impactos ambientais, conforme mostrado
acima, não fazem referência ao impacto do esgotamento dos reservatórios de petróleo e gás natural.
Ao se escamotear tal impacto impede-se uma análise integrada da reserva nacional de
petróleo pelos órgãos ambientais e sociedade (dificultando sua discussão nas audiências públicas de
cada empreendimento), por exemplo, impossibilitando qualquer forma de planejamento que vise
prolongar sua exploração no tempo, ou seja, assegurar a sustentabilidade no uso destes recursos.
Enfim, a proposta encerra a revisão dos impactos ambientais atualmente aceitos nos
procedimentos de licenciamento ambiental das atividades de exploração de petróleo e gás que, para
alcançar os objetivos almejados, requer o acompanhamento de políticas públicas e de
institucionalização de um instrumento de planejamento para exploração sustentável dos
reservatórios no tempo (plano diretor nacional das reservas de petróleo e gás).

CONSIDERAÇÕES FINAIS

67
FRANÇA, R. É só teste... mas dá para comemorar. Revista Veja, São Paulo, n. 45, 14 nov. 2007. p. 83.
Fórum Internacional do Meio Ambiente - A conferência da Terra 322

Podemos resumir as considerações em quatro propostas para a concretização de um real


desenvolvimento sustentável:
Reconhecer a depleção dos reservatórios de petróleo e gás como impacto ambiental
irreversível: a inserção desta variável nos Estudos Ambientais obrigará a adoção de critérios
intertemporais no planejamento do desenvolvimento dos campos de petróleo e gás a serem
licenciados;
Incremento nas ações de incentivo ao uso de fontes alternativas de energia: pressuposto
lógico para a implantação de instrumentos voltados para o controle da exploração dos reservatórios
de petróleo e gás;
Desenvolvimento de políticas para o controle no consumo de energia: a partir dos
principais centros consumidores, estabelecer parâmetros para redução no consumo, que pode
ocorrer, por exemplo: a) pela implementação de fontes alternativas (item 2); b) pela utilização de
máquinas e equipamentos de menor demanda energética; c) pela revisão dos sistemas produtivos; d)
através da conscientização e disseminação de princípios básicos para a redução do consumo
(industrial, comercial e doméstico).
Elaborar plano diretor nacional das reservas de petróleo e gás: para a utilização
intertemporal das reservas nacionais o planejamento intertemporal visa, tomando por base o
zoneamento nacional das reservas, definir marcos temporais para a exploração dos campos de
petróleo em cada região do país, atendendo a níveis de consumo que deverão ser conduzidos pelo
poder público federal, através de suas agências (ANP e ANEEL) e do órgão ambiental (IBAMA),
com participação da comunidade científica e da população.
A proposta, portanto, convoca para a discussão acerca desta revisão sobre os impactos
ambientais das atividades de E&P, para o fortalecimento de uma política nacional integradora, sem
submissão ou omissão a interesses exclusivamente econômicos, criando uma unidade transversal
entre as diversas políticas setoriais (energia, meio ambiente, infra-estrutura etc.) e a elaboração de
um instrumento intertemporal de planejamento (plano diretor nacional das reservas de petróleo e
gás).
Apenas através de um discurso econômico, social, político e ambiental nacional, voltado
para um projeto de sociedade justa e solidária poderemos assegurar às presentes e futuras gerações
o direito ao meio ambiente ecologicamente equilibrado e, conseqüentemente, o direito à existência
digna.

REFERÊNCIAS BIBLIOGRÁFICAS
ACSELRAD, H.; HERCULANO, S.; PÁDUA, J. A. A justiça ambiental e a dinâmica das lutas
sócioambientais no Brasil – uma introdução. In: _____ (orgs.). Justiça ambiental e cidadania. Rio
de Janeiro: Relume-Dumará, 2004. p. 9-20.
ALVES, A. C. Meio ambiente, realidade dos interesses e ruptura da razão jurídica tradicional,
Revista da Fundação do Desenvolvimento Administrativo – FUNDAP, 20: 27:34, 1996.
DERANI, C. Direito ambiental econômico. 2 ed. rev. SP: Max Limonad, 2001.
FRANÇA, R. É só teste... mas dá para comemorar. Revista Veja, ano 40, n. 45, ed. 2034.
GOMES, H. M. As relações sociedade/natureza e a valoração econômica da natureza: o caso da
mata do Estado. Disponível em: <http://www.biblioteca.sebrae.com.br/bds/BDS.nsf/
95BB814DC390446A03256FC4004F20BC/$File/ NT000A50E6.pdf>. Acesso em 30 mar. 2008.
GRAU, E. R. A ordem econômica na Constituição de 1988. 8 ed. rev. atual. São Paulo: Malheiros,
2003.
_____. Ensaio e discurso sobre a interpretação/aplicação do direito. 2 ed. São Paulo: Malheiros,
2003.
LEROY, J. et al. Tudo ao mesmo tempo agora: desenvolvimento, sustentabilidade, democracia: o
que isso tem a ver com você? 3 ed. Petrópolis: Vozes, 2002.
LIMA-E-SILVA, P. P. et al. Dicionário brasileiro de ciências ambientais. Rio de Janeiro: Thex,
1999.
Fórum Internacional do Meio Ambiente - A conferência da Terra 323

MOREIRA NETO, D. F. Introdução ao direito ecológico e ao direito urbanístico. 2 ed. rev. aum.
Rio de Janeiro: Forense, 1977.
PETROBRAS. Relatório de avaliação ambiental: Petrobras 34. Processo IBAMA/MMA no
02001.004540/92-98.
_____. Relatório de avaliação ambiental: Petrobras 35. Processo IBAMA/MMA no
02001.001975/96-78.
_____. Relatório de impacto ambiental: atividade de produção e escoamento de óleo e gás do
Campo de Marlim Leste, Bacia de Campos, através da Plataforma P-53. Disponível em:
<http://www.ibama.gov.br>. Acesso em: 15 nov. 2007.
PORTO-GONÇALVES, C. W. O desafio ambiental. Rio de Janeiro: Record, 2004. (Os porquês da
desordem mundial. Mestres explicam a globalização).
SACHS, I. Caminhos para o desenvolvimento sustentável. 3 ed. Rio de Janeiro: Garamond, 2002.
SILVA, J. A. Direito ambiental constitucional. SP: Malheiros, 1994.
Fórum Internacional do Meio Ambiente - A conferência da Terra 324

A ANÁLISE ESTRUTURAL DA COBERTURA PEDOLOGICA: A VISÃO HOLÍSTICA


DO SOLO

Cleire Lima da Costa Falcão


Universidade Estadual Vale do Acaraú – UVA. cfalcao@sobral.org

RESUMO
O presente artigo baseia-se na concepção do estudo do solo. Fundamenta-se na análise
estrutural da cobertura pedológica, como encaminhamento metodológico que permite interagir o
solo com os demais elementos da natureza. Tem o solo não apenas como um perfil, e sim,
abrangendo-se espacialmente e interagindo com os demais elementos da natureza.
Palavras-chave: solo, cobertura pedológica, analise estrutural.

ABSTRACT
This article is based on the design of the soil of the study. Fundamenta in the structural
analysis of the coverage pedological as routing methodological allowing the soil interact with the
other elements of nature. Is the soil not only as a profile, and yes, covering up spatially and
interacting with other elements of nature.
Words keys: Soil, pedological coverage, review structural.

A CIÊNCIA GEOGRÁFICA E O ESTUDO DO SOLO


A análise da natureza por parte da Ciência Geográfica constitui, desde a sua base, uma
ciência interdisciplinar, enfatizando o conhecimento do solo, do relevo, da rocha, dos recursos
hídricos, entre outros, tornando cada vez mais pertinente, ainda, o estudo do homem no contexto da
formação da paisagem. Entretanto o estudo do solo esteve voltado apenas para o perfil vertical, seja
realizado em cortes de estradas ou abertura de trincheiras. Nesse momento, objetiva-se inserir o
conhecimento do solo e evidenciar o uso da abordagem metodológica da Análise Estrutural da
Cobertura Pedológica como de fundamental contribuição para uma melhor compreensão do solo no
contexto da paisagem em suas múltiplas complexidades integradora com os demais componentes da
natureza.

A consolidação do conhecimento do estudo do solo


Segundo Queiroz Neto (2002) e Marcos (1979), poucos estudiosos têm pensado sobre os
solos, e esta preocupação se enquadra em nossos interesses. Existem duas publicações: a primeira é
um texto em francês Une epistemologie de la science du sol autor Ivon Chatellin, publicada na
revista PEDOLOGIE, da O.R.S.T.O.M., Paris, datada de 1979 e a segunda publicada na mesma
revista e no mesmo ano Ensaio sobre Epistemologia Pedológica de Zilmar Ziller Marcos.
Buscamos na tese de Marcos (1979), o resgate referente a epistemologia do solo, ele busca
de início, o entendimento conceitual quanto ao uso da expressão “Ciência do Solo”, registrada pelo
cientista considerado o pai desta ciência, Dokuchaev. Este termo, em russo “Potchava-vedzenie”,
foneticamente gravado, significa “Conhecimento do Solo”, e não Ciência do Solo. Para a autora,
ocorreu uma impropriedade da expressão “Ciência do Solo”, devido a um erro de lingüística
cometido no ato de tradução para o português.
Nesta perspectiva histórica, recorremos a Marcos (1979) ao refletir o estudo do solo, revela
três enfoques distintos: (a) o enfoque Edafológico, (b) o enfoque Geológico e (c) o enfoque
Pedológico.
Segundo o autor, o primeiro enfoque data da Pré-História, e recebeu o nome de enfoque
Edafológico, caracterizado pela concepção de que o solo é o meio natural para o crescimento e
desenvolvimento das plantas. Seu objetivo é estudar o solo, quanto à sua natureza e comportamento,
de modo a desenvolver princípios que permitam formular previsões sobre os resultados de sua
utilização e indicações quanto à necessidade de correlação dos aspectos considerados indesejáveis.
Fórum Internacional do Meio Ambiente - A conferência da Terra 325

Segundo Young e Smith (1966), há cerca de 9.000 anos passados, na região da Ásia
Menor, o homem começou a cultivar a terra. Deixou de apenas colher o alimento que encontrava e
dedicou-se a plantar. Na América Central, o plantio de milho deve ter tido seu início há pouco
menos 6.500 anos. Registros históricos indicam que, no antigo Egito, a cultura de trigo era
conhecida há 4.000 anos, segundo Harlan (1976). Os registros históricos sobre a civilização grega
revelam que filósofos e naturalistas reconheciam as relações do solo com a planta.
No antigo Egito e na antiga Pérsia, segundo Klett (1999), existiu uma linha evolutiva
dentro da própria Humanidade, em que as pessoas viviam perto espiritualmente de suas origens.
Inicialmente, era formada pelos pastores, pessoas que começavam a domesticar e a criar animais;
em seguida, surgiu uma outra linha, seguida por Zaratrusta, na qual tinham a habilidade de
transformar as plantas em alimentos - eram chamados de plantadores ou cultivadores; a terceira
linha era dos jardineiros que cultivavam as plantas anuais e as verduras; a última linha era formada
por pessoas que tinham as suas habilidades voltadas para o cultivo das árvores.
O segundo enfoque para o estudo do solo surgiu juntamente com o aparecimento da
Geologia, no final do século XVIII e início do século XIX. O interesse existente dos geólogos era
relacionado com a observação de que os solos resultam da ação de agentes naturais como o clima e
os organismos, sobre a rocha. Marcos (1979) relembra que na literatura, existem diversas
publicações relatando o desenvolvimento desse enfoque como (JENNY, 1941; GLINKA, 1963;
CLINE, 1961; SMITH, 1965; TIURIN, 1965; AVERY, 1969; CRUICKSHANK, 1972; BUOL, et.
al.,1973; VIEIRA, 1975; CLINE, 1977).
O terceiro enfoque, o Pedológico, referente ao estudo do solo, surgiu, segundo Marcos
(1979), como uma resposta mais direta e particular à indagação sobre a natureza e origem do solo
como uma classe de corpos de ocorrência natural, com uma organização peculiar. O autor relembra
que esses estudos ficaram evidenciados nos trabalhos de (DOKUCHAEV, 1983; MULLER, 1887 e
SIBERTZEV, 1900, citados por GLINKA, 1931 e 1963 e CRUICKSHANK, 1972), como resultado
de novas descobertas, ou de um modo de agregar verdades já conhecidas.
Dentre estes, não poderíamos deixar de explanar resumidamente os primeiros estudos de
solo do cientista Dokuchaev (1895), cuja paternidade lhe foi atribuída, a título de reconhecimento
pelas suas descobertas a respeito do solo, sendo considerado o iniciador da divisão da ciência do
solo. Ao estudar os solos da Rússia, consagrou o nascimento da moderna Ciência dos Solos.

EVOLUÇÃO DAS PESQUISAS DO SOLO


Segundo Ab’Saber (1997), a história da Ciência do Solo deve estar sempre presente, pois,
É a nossa capacidade de retraçar alguma coisa que vai servir para a educação, que vai
servir para a transmissão de conhecimento, que vai servir para a informação sobre métodos de
trabalho, vai servir para informação sobre a organização ideal dos espaços, vai servir para a nossa
profissão en termos de ciência do solo (p.8).
Pescrutando um pouco o passado, podemos evidenciar que as pesquisas desenvolvidas no
Brasil não ocorrerão de forma sistemática. Contudo, podemos mencionar as primeiras observações
de Queiroz Neto (1964 e 1968) a respeito da classificação de solos brasileiros; as discussões de
alguns aspectos dos solos do estado de São Paulo, por meio do Prof. F.W. Dafert, nos relatórios de
1888 e 1893, quando atuava como primeiro diretor do Instituto Agronômico de Campinas, e, por
fim, em 1935, quando foram lançadas as primeiras pesquisas com verdadeiro sentido pedológico,
com P. Vageler.
Os estudos posteriores foram de Setzer (1941), e Paiva Neto et al., (1961). Suas pesquisas
basearam-se na gênese e distribuição de solos no estado de São Paulo, com subdivisões baseadas
em propriedades físicas e químicas.
As pesquisas foram dando continuidade, ao evidenciar apenas o cadastramento dos solos,
definidos a partir da concepção de linearidade dos fenômenos de alteração entre o substrato rochoso
e o perfil de solo. Foram excluídas do contexto teórico as observações de Milne (1935 e 1936), em
que buscava explicações sobre os processos pedogenéticos que careciam de maior sustentação,
Fórum Internacional do Meio Ambiente - A conferência da Terra 326

principalmente quando se passava da escala zonal para a local, e, sobretudo, quando se


consideravam os processos relativos à dinâmica das vertentes e sua relação com a pedogênese.
Na década de 1960, foi introduzida a noção de pedon, pelo Soil Survey Staff, dos EUA. O
solo passava a ser encarado como um corpo tridimensional, cujas unidades eram ainda
representadas por horizontes verticalmente dispostos, ocupando certo volume do espaço. Contudo,
segundo Queiroz Neto (1987), o espaço pedológico era ainda constituído pela justaposição de perfis
de solo verticais. O autor relata ainda, que, somente a partir daquela década, a conjunção de fatores
constituiu-se no fato mais estimulante para a evolução na compreensão do fenômeno pedológico
são eles: a) os trabalhos de pesquisa (cartografia, gênese, evolução e comportamento dinâmico)
realizados em zona tropical, em grande parte da África; e b) os avanços realizados pela
Geoquímica, Petrografia e Mineralogia, graças ao desenvolvimento das técnicas de micro-análise.
Daí, formaram-se, então, as bases das pesquisas para a interpretação dos solos como
resultantes de processos pedogenéticos e geomorfológicos, fazendo intervir as relações existentes
entre perfis. Surgiram, por conseguintes, trabalhos procurando interpretar os perfis dos solos
baseados não só em processos pedogenéticos lineares, mas também em ações de erosão e deposição,
variadas no tempo e no espaço (QUEIROZ NETO et al.,1973; PENTEADO E RANZANI,1973;
QUEIROZ NETO, 1975; CARVALHO, 1976).
Foi com Delvigne em (1965) que ocorreu a comprovação dos mecanismos de perda,
transferências e acumulações de material poderiam ocorrer lateralmente, do topo à base das
vertentes, sobre um mesmo material de origem. Ele mostra, trabalhando com alteração de granitos e
formação de minerais, e neoformação de argila, de forma muito clara, que, ao longo das vertentes,
existe uma zona de exportação, uma de passagem e uma de acumulação de elementos. A principal
delas é a sílica, mas existe migração de ferro, de alumínio e, evidentemente, as bases alcalinas e
alcalino-terrosas que se perdem. O sopé da vertente pode ser a zona de acumulação com formação
preferencial de argilas. Nessa translação sílica, de alumínio etc., são os íons que se deslocam, mas a
parte terminal da vertente pode funcionar como uma espécie de armadilha, permitindo, então, a
formação de argilas a partir destas soluções.
Para Queiroz Neto (2004, p. 77) esta pesquisa é “o germe da análise estrutural”. Depois,
vieram os trabalhos dos pedólogos franceses realizados na África, nos anos de 1970 e 1980, em
especial pelos pedológos franceses, (BOUQUIER, 1973; BOULET, 1974; CHAUVEL, 1977;
HUMBEL, 1978; RUELLAN, 1985), e entre outros do ex-O.R.T.O.M. (Institut Français de
Recherche Scientifique pour lê Développement em Coopération). Formaram as primeiras pesquisas
realizadas no estudo da organização do solo, por meio de sua morfologia, espacialidade, integração
na paisagem e de laboratório.
Paralelamente, em outro caminho completamente diferente, em condições também
completamente diferentes, Ruellan trabalhou nas bordas do Saara voltadas ao Mediterrâneo,
exclusivamente dedicado à caracterização de processos de alteração e pedogênese de rochas
calcárias em ambientes quase áridos, semi-áridos, bem como Boulet e Bouquier.

A Análise Estrutural da Cobertura Pedológica


A expressão cobertura pedológica foi utilizada no sentido de representar melhor a
realidade, em uma extensão geográfica de continuidade espacial; o adjetivo “pedológico” define
bem o objeto estudado.
O marco da análise estrutural foi expresso em uma revista francesa “Science du Soil”, onde
René Boulet publicou sua pesquisa realizada na Guiana Francesa e em Cuba, em 1980. Segundo
Ruellan (2004), existia também um capítulo de um Atlas sobre a Guiana, que era de autoria de
Boulet, trazido ao Brasil por Ruellan, cujo acesso era difícil.
Esses estudos (BOULET et al., 1982a,b,c) sistematizaram e apresentaram, em um contexto
macromorfológico, os procedimentos para o estudo das estruturas pedológicas em sua lateralidade,
ou seja, do continuum da cobertura pedológica, que ficou conhecida como “Análise Estrutural da
Cobertura Pedológica”, correspondendo a uma abordagem morfológica, das estruturas do solo.
Visava estudar a organização dos solos através de sua morfologia, espacialidade e integração na
Fórum Internacional do Meio Ambiente - A conferência da Terra 327

paisagem, para, só então, recorrer à medida de laboratório. Desta forma, os estudos deveriam
abranger desde a morfologia de campo até estudos mais detalhados de microscopia ótica,
microscopia eletrônica de varredura, microssonda entre outros.
Para Ruellan (2004), esses trabalhos foram uma espécie de descoberta das morfologias da
cobertura pedológica no nível das vertentes. Foram realizados no sentido de compreender as
variações verticais das estruturas em função das vertentes e em função do tempo, estudando a
organização do solo através de sua morfologia, espacialidade e integração na paisagem, para, só
então, recorrer às medidas de laboratório.
Esta concepção de análise estrutural origina-se no conceito de catena de Milne (1934),
segundo Queiroz Neto (2004), catena significa, para Milne,
Uma unidade prática de mapeamento [...] que agrupa solos que, a despeito de estarem
colocados em pontos diferentes de um sistema natural de classificação, tendo em vista suas
diferenças morfológicas e fundamentais, estão, no entanto, relacionadas na sua ocorrência por
condições topográficas e se repetem nas mesmas posições uns em relação aos outros, sempre que
aquelas condições estão presentes (QUEIROZ NETO, 2004, p. 77).
A idéia de catena teve um grande sucesso no mapeamento dos solos, pois era de grande
valia como um instrumento para mapear solos. Foi muito aplicada, sendo adotada também por
geomorfológos e biólogos. Segundo Queiroz Neto (2004, p.77), “surgiu como uma palavra mágica
que foi aplicada mais a ‘torto’ do que a ‘direito’. Se fosse só a direito tudo bem, mas entortaram a
idéia de catena”.
Este longo posicionamento de Queiroz Neto demonstra a postura conclusiva de um dos
pontos em que Ruellan (2004) se posiciona a respeito dos estudos de catena propostos por Milne.
Ele explica que a análise estrutural não pode se limitar aos estudos de catena, pois a distribuição
lateral das organizações pedológicas e das suas estruturas é apenas um dos aspectos da análise
estrutural. Acentua ainda, para entendermos a distribuição dos tipos de solos em função do relevo,
que é necessário entender os aspectos da morfologia, que, apesar de ser muito importante, é
somente, um de seus aspectos.
O estudo de Milne, em 1936, considerava a erosão como a principal responsável pela
disposição de catena ao longo das vertentes. Somente após dez anos, Greene (1945) veio a afirmar
que essas seqüências são comuns nos trópicos, e o que se observa equivaleria a horizontes de
lixiviação e acumulação; contudo, suas observações não tiveram seqüência. Em 1965, vinte anos
depois, a tese de doutorado de Delvigne, um estudo sobre a distribuição de alteração de granitos ao
longo das vertentes, constatou que as posições do topo das vertentes são de exportações e, nos
sopés, podem ser zonas de acumulação, mas isto não foi suficiente.
Foi somente em 1973, com a tese de Bouquier, que surgiu a contribuição fundamental ao
estudo da Pedogênese, ao constatar que essas estruturas pedológicas dinâmicas testemunham, ao
mesmo tempo, os processos que lhe deram origem. As diferenciações pedológicas e geoquímicas
resultam de autodesenvolvimento, em sistemas condicionados pelos agentes climáticos; as
acumulações de matéria a jusante podem bloquear a saída dos elementos, promovendo
modificações estruturais e neoformações mineralógicas remontantes ao longo das encostas, a partir
dos sopés.
Foi especificamente com base nesses resultados e com as pesquisas adquiridas no
continente africano que Boquier et al. (1974) realizaram suas observações em outras condições
ambientais e puderam concluir que o zoneamento e o conceito de zonalidade dependem do
condicionamento topográfico e da circulação das soluções; e estas das condições de umidade do
clima. Boulet havia utilizado em sua tese uma abordagem similar à de Bouquier (1973), então ele
propôs que esse procedimento fosse lançado com o intuito de permitir a reconstituição da
distribuição espacial das organizações pedológicas ao longo das encostas. Logo depois, as bases da
Análise Estrutural da Cobertura Pedológica foram formalizadas e os seus fundamentos consolidados
- o artigo de (BOULET et al., 1982 a,b,c), marcou a sua formalização.
Este artigo apresentou o solo como um meio organizado, estruturado, que existe em todas
as escalas, desde a microscópica até a da paisagem, possuindo quatro dimensões: três espaciais e
Fórum Internacional do Meio Ambiente - A conferência da Terra 328

uma temporal. Além disso, demonstra-se que, independentemente do objetivo de um estudo do solo,
é vital a compreensão das estruturas do solo, das suas propriedades, do seu funcionamento, da sua
história e o seu comportamento em relação ao meio Ruellan (1985).
A importância da utilização desse procedimento foi ressaltada por Boulet (1982), por
permitir mostrar a participação dos processos superficiais na diferenciação lateral da cobertura
pedológica, bem como por possibilitar perceber o papel e a importância dos processos geoquímicos
e pedológicos na evolução do relevo.
Estas idéias foram sistematizadas para ressaltar o fato de a cobertura pedológica encontrar-
se organizada e hierarquizada em vários níveis, que vão desde as organizações elementares
(microestruturas) até os sistemas pedológicos (paisagem). Estudá-la é observar sistematicamente
esses vários níveis de sua organização, cujos recursos vão desde imagens de satélite e fotos aéreas
até o microscópio, como havia exposto Chauvel (1977).
Segundo Ruellan et al. (1985), esses níveis correspondem a quatro escalas diferentes de
organização da cobertura pedológica. São eles: (a) As organizações elementares, que se expressam
sob forma de constituintes do solo, tais como a fração argila (plasma), a fração silte e areia
(esqueleto) e os poros que juntos, constituem o fundo matricial; (b) As assembléias, que se
caracterizam por um certo número ou conjunto de organizações elementares; (c) Os horizontes, que
são descritos pela presença de um ou vários tipos de assembléias e, (d) Os sistemas pedológicos,
que representam na escala da unidade do relevo, os horizontes e sua relação entre horizontes, ou
seja, como eles se superpõem verticalmente e se sucedem lateralmente ao topo à base das vertentes.

PROCEDIMENTO METODOLÓGICO DA ANÁLISE ESTRUTURAL DA COBERTURA


PEDOLÓGICA
Para esta seção, importarão o texto de Silva (1999), e uma entrevista com Ruellan e
Queiroz Neto a Lobato em 2004, revisada e complementada. No relatório final da pesquisa,
trabalharemos mais profundamente a morfologia do solo, segundo as informações contidas no livro
“Regard sur le Sol” de Ruellan e Doss (1993).
Partindo da constatação e confirmação da necessidade inicial de abordamos a importância
do estudo da interpretação e das características morfológicas do solo, uma vez que sua história, sua
situação atual e suas tendências estão traduzidas na sua morfologia, abordaremos alguns requisitos
que obedecem ao método da análise estrutural, no sentido de auxiliar a compreensão do
comportamento e funcionamento do solo. Ruellan (2004), sistematiza as informações necessárias:
Adotar-se-ão os seguintes procedimentos: a) análise da paisagem e escolha da vertente
representativa; b) passos de descrição do perfil; c) levantamento feito com trado; d) representação
cartográfica da estrutura pedológica; e) interpretação dos resultados.

Análise da paisagem e escolha da vertente representativa


Observação da paisagem, análise de mapas e cartas, percurso em campo e escolha das
áreas onde se farão os estudos detalhados. 2- Escolha dos locais para a abertura de trincheiras. 3 -
Abertura de trincheiras e descrição dos perfis e 4 - Realização de um transecto do topo à base de
uma vertente, construindo um perfil topográfico, de forma que as rupturas de declive e outras
alterações na vertente estejam contempladas no perfil topográfico.
Para a identificação da organização da cobertura pedológica será necessário, ainda
observar a paisagem, andar por ela e, assim, começar a entender quais as relações entre o que é
visto na superfície do solo e no relevo.
No segundo momento, escolhe-se uma vertente típica, que se estima ser representativa da
paisagem vista, e trabalha-se sobre esse nível em detalhes nesta vertente. Deve-se realizar um
transecto do topo à base de uma vertente, construindo um perfil topográfico, de forma que as
rupturas de declive e outras alterações na vertente estejam contempladas no perfil topográfico. Para
tal, será necessário o uso de equipamentos básicos, tais como clinômetro, trena e mira graduada. A
primeira escala é a vertente, ou planalto, vale, a unidade de relevo. Mas, depois, deve-se trabalhar o
Fórum Internacional do Meio Ambiente - A conferência da Terra 329

perfil e o horizonte. Em seguida, após entender tudo o que for possível no campo, a amostra é
levada ao laboratório.

Descrições morfológicas do perfil de solo


Alguns parâmetros morfológicos podem ser destacados como de maior importância
durante a descrição do perfil. Esta observação mais geral sobre o perfil antecede a etapa de
descrição mais detalhada de cada horizonte. A descrição de cada horizonte deve ser a mais rica
possível, de modo a permitir que o leitor seja capaz de ‘ver’ o perfil a partir de sua descrição.
Estas descrições ocorrem a partir da escolha dos locais para a abertura de trincheiras, no
sentido de obter o reconhecimento das principais variações verticais em alguns perfis ao longo de
uma encosta e, posteriormente, por meio de sondagens sucessivas, reconhecer as variações laterais
existentes entre estes perfis na topossequência. A escolha da vertente e da abertura da trincheira
não corresponde a uma fragmentação e sim à possibilidade de desvendar as variáveis.
Deve ficar claro que o estudo efetuado por aberturas de trincheiras em intervalos regulares
é mais vantajoso, pois permitirá uma descrição morfológica mais precisa da topossequência, já que
as características morfológicas estarão presentes sem nenhuma mistura, como freqüentemente
ocorre com as amostras coletadas por trado.
É oportuno lembrar que a descrição morfológica efetuada nas trincheiras é a responsável
pela caracterização dos horizontes ou volumes da toposseqüência. A descrição executada nas
amostras coletadas com o trado auxilia no acompanhamento das variações laterais e verticais ao
longo da vertente. Após o corte vertical do perfil de solo, deve-se realizar a delimitação dos
principais horizontes, descrevendo seus limites e anotando duas profundidades. Para cada horizonte,
devem-se descrever as organizações elementares:

1-Reconhecer as principais variações verticais em termos de: Cores, agregados, texturas,


porosidade, feições pedológicas, atividade biológica, umidade. Concluir com uma primeira
delimitação dos principais horizontes. Descrever limites que separam os horizontes.
2- Para cada horizonte, devem-se descrever as organizações elementares:
Cor: descrever e medir as cores dos horizontes e das feições pedológicas; (b) Agregação:
forma, tamanho, nitidez e as relações entre os diversos tipos de agregados de um mesmo horizonte;
(c) Constituintes: textura e morfologia; (d) Porosidade: abundância, morfologia e orientação; (e)
Feições pedológicas: tipos, forma, tamanho, localização e relações com agregados, porosidade e
constituintes; (f) Solidez dos agregados: estimar; (g) Enraizamento e atividade biológica: descrever
a distribuição em relação às estruturas; (h) Umidade: estimar; (i) Descrever as transições entre os
horizontes; (j) Coletar amostras para o pedocomparador de cada horizonte; (l) Coletar amostras
indeformadas para o estudo micromorfológico (conforme os objetivos do estudo); (m) Coletar
amostras para análise laboratorial (física e química); (n) Desenhar em escala o perfil (horizonte,
transições, feições, etc); (o) Fotografar; e, (p) Localizar o perfil em carta planialtimétrica (1:10.000;
1:5.000; 1:1.000).
È importante salientar que, com uma primeira delimitação dos principais horizontes,
destacam-se as transições entre os horizontes. Esta transição morfológica será fundamental na
compreensão da transformação do solo e da pedogênese.

Levantamento feito com trado


Sua seqüência obedece a um método sistemático de observação, de forma que todas as
transições sejam localizadas precisamente.
1- Escolher a demarcação no mapa dos locais, onde serão feitas as tradagens.
2- Coletar amostras a cada 10 centímetros, guardá-las no pedocomparador e descrever: Cor
(descrever e medir), textura, umidade, feições pedológicas possíveis de se observar na amostra
obtida com o trado, localizar o perfil em carta planialtimétrica
De início, deve-se escolher a demarcação no mapa dos locais onde serão feitas as tradagens
sucessivas e eqüidistantes ao longo da vertente, seguidas da abertura de trincheiras a intervalos
Fórum Internacional do Meio Ambiente - A conferência da Terra 330

regulares, e, posteriormente, utilizar o trado para acompanhar as transições laterais existentes entre
estes perfis na topossequência da cobertura pedológica.
As amostras coletadas devem ser acondicionadas em caixas de papelão (4cmx4cm), o
número da topossequência e o número da tradagem, devem ser anotados bem como a profundidade
de coleta. Essas caixas deverão ser armazenadas no pedocomparador, que é uma maleta de madeira,
com capacidade para 100 caixinhas de papelão, sua função é armazenar organizadamente as
amostras retidas nas sondagens, de maneira que o pesquisador tenha uma rápida e fácil visualização
das tradagens, permitido, assim, reconstruir todos os horizontes dos solos presentes na
topossequência.
Uma vez que o pesquisador opte por iniciar pela abertura de trincheiras, as amostras para o
pedocomparador podem ser coletadas de uma das paredes da trincheira, sempre obedecendo ao
intervalo de 10 centímetros de profundidade entre uma coleta e outra. Com as amostras do topo e da
base da vertente acondicionadas no pedocomparador, verifica-se se estas são iguais. Caso a primeira
seja diferente da segunda, realiza-se uma terceira sondagem entre elas. Se a terceira sondagem for
igual à primeira, porém diferente da segunda, procede-se, então, à abertura de uma quarta
sondagem, desta vez entre a terceira e a segunda, e assim sucessivamente, até que todas as
transições sejam encontradas.
O objetivo maior do uso do pedocomparador e as anotações de campo, é auxiliar no
desenho da toposseqüência, bem como na localização posterior de trincheiras para a coleta de
amostras dos horizontes e das principais transições.
A coleta de amostras durante as sondagens ocorre, primeiramente, com o auxílio de faca na
parte superficial (0cm) e, a seguir, com o trado, coleta-se uma amostra a 20 cm de profundidade. A
partir deste momento, realizam-se tradagens sucessivas com intervalos de 10cm até a profundidade
de um metro, pois, em geral as variações verticais mais rápidas acontecem até esta profundidade.
Após 1 metro de profundidade, coletam-se amostras com o intervalo de 10 centímetros. As amostras
que farão parte da coleção do pedocomparador serão apenas aquelas com 50 cm de intervalo, ou
quando ocorrer alguma mudança nas características do material que está sendo coletado.

Representação cartográfica da estrutura pedológica


Na representação gráfica da toposseqüência reproduz-se tudo o que foi visto, anotado e
caracterizado em campo. Os dados são inicialmente plotados em papel milimetrado, de forma que
os detalhes da encosta sejam percebidos, e sua morfologia seja o mais representativa possível, para
que represente a realidade encontrada na área. Pode-se receber ajuda também de softwares gráficos
de grande resolução, conforme (SILVA, 1999): (a) Desenho em escala do perfil (horizontes,
transições, feições etc.) de distribuição dos horizontes pedológicos e das frentes de transformação;
(b) 2- Representação bidimensional; (c) Representação tridimensional e (d) Carta politemática para
orientação do manejo do solo.

Interpretação dos resultados


O procedimento da análise estrutural do solo responde a diversas interpretações do solo,
como já mencionado anteriormente, como os impactos ambientais (erosões, assoreamentos,
desertificação); os temas relativos ao equilíbrio ecológico (diversidade biológica, fitossanidade); a
capacidade produtiva (situação das culturas, fertilidade potencial; manejo necessário, como também
auxilia na compreensão do comportamento e funcionamento do solo).

REFERENCIAS BIBLIOGRÁFICAS
AB-SABER, A. Z. Análise da conjuntura da educação no Brasil. In: A FRAGMENTAÇÃO DO
CONHECIMENTO E SUA SUPERAÇÃO EPISTEMOLÓGICA. Simpósio Brasileiro Sobre
Ensino De Solos, 3, Anais..., SBCS: CEFET-PR, Unidade de Ensino de Pato Branco, Curso de
agronomia, editor: João Alfredo Braida. 1997. 332 p.
BOULET, R.; CHAUVEL, A.; HUMBEL. F.X.; LUCAS, Y. – 1982a – ‘Analyse structurale et
carographie em pédologie. I - Prise en compte de l’organisation bidimensionnelle de la couverture
Fórum Internacional do Meio Ambiente - A conferência da Terra 331

pédologique: les études de toposéquencess et leurs principaux apports à la connaissance des sol’.
Cah. ORSTOM, sér. Pédol., no 4: 309-321.
BOULET, R.; HUMBEL, F.X.; LUCAS, Y. – 1982b – ‘Analyse structurale et cartographie en
pédologie: II - Une méthode d’analyse prenant en compte l’organisation tridimensionnelle des
couvertures pédologiques’. Cah. ORSTOM. sér. Pédol., no 4: 323-339.
-------------------------- - 1982c – ‘Analyse structurale et carographie em pédologie. III – Passage de
la phase analytique à une cartographie génerale synthétique’. Cah ORSTOM, sér. Pédol., no 4,
4:341-351.
CHAUVEL, A. Recherches sur la transformation des sois ferralitiques dans la zone tropicale à
saisons contrástes. Paris, 1977. 532 p. Thèse Sci. Strasbourg et Tra. Et Doc. ORSTOM., no 62,
1977.532p. .
CARVALHO, A. Solos da região de Marília: relações entre a pedologia e a evolução do relevo. SP
Dept. de Geografia/FFLCH/USP- SP, 1976 (Tese) 163p.
DELVIGNE, J. Pedogenese en zone tropicale: la formation des mineraux secondaires en milleu
ferrallitique. Memóires OR.S.T.OM. no 13, Paris. 177p. 1965
GREENE Classification and use of tropical sils. Soil Science Society of American Proceedings, v.
10, p. 392-396.
HARLAN, J.R. TAHE. Plants and animals that mourish men. Scientific American. New York,
235(3): 88-97, 1976.
KLETT, M. O impulso da agricultura biodinâmica a partir da Antroposofia. Parte I e II. In: Miklós,
A. A. W. (org.) A AGROECOLOGIA EM PERSPECTIVA. Conferência Brasileira De Agricultura
Biodinâmica. Secretária Do Meio Ambiente, 3, Anais..., Governo do Estado de São Paulo.
Documentos Ambientais. SMA/ CED. São Paulo, 1999, pp. 28-40.
MARCOS, Z. Z. Ensaio sobre epistemologia pedológica. São Paulo. Tese. USP/FFLCH/DG, 1979.
MILNE, G. Some suggested units of classification and mapping, particulary for east african soiis.
supplements to the proceedings of the international Society of Solls Science, v.4, n.3, p. 183-198,
1935
PAIVA NETO, J.E. , NASCIMENTO, A.C., KÜPPER, A.; VERDADE, F.C.; MEDINA, H.P.;
GROHMANN, F. Solos da bacia Paraná-Uruguai. Comissão interestadual da bacia Paraná-
Uruguay, São Paulo. 1961, 168p.
QUEIROZ NETO, J. P. Observações preliminares sobre perfis de solo com bandas onduladas no
estado de São Paulo. IGEOG-USP. Sedimentologia e Pedologia 7.1975. 34p.
---------------------- Análise estrutural da cobertura pedológica no Brasil. In: CONGRESSO
BRASILEIRO DE CIÊNCIA DO SOLO, 21., Sociedade Brasileira de Ciência do Solo. Campinas,
1987. Anais. Campinas, CBCS, p. 415-430.
---------------------- Análise estrutural da cobertura pedológica: uma experiência de ensino e
pesquisa. revista do departamento de geografia, 15 (2002) 77-90.
QUEIROZ NETO, J, P. JOSÉ QUEIROZ NETO; depoimento [ABR. 2004], Entrevistador J. A.
Lobato. São Paulo, 2004. 1 fita k7 MC-60 (32min) ¾ pps mono.
QUEIROZ NETO, J. P.; CARVALHO, A ; JOURNAUX, A & PELLERIN, J. Cronologia dos
solos da região de Marília, São Paulo. Sedimentologia e Pedologia no 5, IGUSP, 1973. São Paulo,
p.55
QUEIROZ NETO, J. P., CASTRO, S. S. FDERMENDES, O. N., MANFREDINI, S., PELLERIN,
J., RUELLAN, A., TOLEDO, G. S. Estudo de dinâmica e solo; formação e transformação de perfis
com horizonte b textural. In: XVIII CONG. BRAS. DE CIÊNCIA DO SOLO. Salvador, Ba: 1981.
RUELLAN, A. Les apports de la connaissance des sols intertropicaux au développement de la
pédologie: La contribution des pédologues Français. Science du sol, 2:141- 148, Catena. 1985.
RUELLAN, A.; QUEIROZ NETO, J. P.; PELLERIN, J. Analyse structurale de la couverture
pédologique: Une expérience structurale d’ enseigment et de recherche au Bresil. Cah. ORSTOM.,
ser. Péd., vol XXI, n. 4: 1984-1985. p. 253-256.
RUELLAN, A.; DOSSO, M. Regards sur le sol. Les Éditions Foucher. Paris, 1993.
Fórum Internacional do Meio Ambiente - A conferência da Terra 332

SILVA, A. S. Análise morfológica dos solos e erosão. In: Erosão e Conservação dos Solos:
conceitos, temas e aplicações. Orgs.: A.J.T. Guerra; A. S. Silva, R.G.M. Botelho. Bertrand Brasil,
Rio de janeiro, 101-126. 1999.
YOUNG, T.C.; SMITH, P.E.L. Reserch in the prehistory of central western Iran. Science,
Washington D.C., 153:386-91, 1966.
Fórum Internacional do Meio Ambiente - A conferência da Terra 333

REFLEXÕES SOBRE A COMPLEXA RELAÇÃO ENTRE PODER, IDENTIDADE E


SUSTENTABILIDADE.

Márcia C. Dornelas Braga


Doutoranda em Geografia-UFPE. E-mail: mbraga2007@gmail.com
Vanice S. Fragoso Selva
Professora Adjunta-UFPE. E-mail: Vanice.selva@gmail.com

RESUMO
O presente artigo pretende tecer algumas reflexões sobre questões envolvendo poder e
identidade no tocante às comunidades costeiras, notadamente no Nordeste brasileiro, que vem sendo
alvo de diferentes interesses econômicos alterando os ambientes e as formas de relações de poder e
identidade refletindo na sustentabilidade dessas comunidades. A ênfase que foi dada no texto às
comunidades formadas por pescadores, artesãos e pequenos produtores não foi aleatória e teve por
objetivo abordar um viés cada vez mais atual que seria para alguns o inevitável confronto entre o
global e o local. Neste sentido no texto procurou-se destacar elementos, idéias e reflexões
encontradas em uma literatura que enfatiza a preocupação com um possível processo que levaria a
absorção de práticas globais no interior de comunidades litorâneas, urbanas e rurais em detrimento
de suas próprias práticas tradicionais identificadas com a chamada escala local.
Palavras-chaves: sustentabilidade - poder- identidade

ABSTRACT
The present article intends to make some reflections on questions involving power and
identity on coastal communities, in the Brazilian Northeast, that have being target of different
economic interests modifying environments and forms of relations of power and identity reflecting
in the sustainability of these communities. The emphasis that was given in the text to the
communities formed by fishermen, craftsmen and small producers has not been random and had for
objective to approach a bias each time more current that would be for some the inevitable
confrontation between global and local. In this direction we tried to give distinction to some
elements in the text, ideas and reflections found in a literature that emphasizes the concern with a
possible process that would take the absorption of global practices into the interior of littoral
communities, urban and rural to the detriment of its proper traditional practices identified with what
we call local scales.
Key-words: sustainability - power - identity

INTRODUÇÃO
A chamada crise ambiental converteu-se em um sintoma que desencadeou a formulação de
um discurso em que, no cerne da questão, estaria o colapso ecológico, o resgate de uma natureza
que dava sinais de exaustão e que já em meados da década de 1960 entrou na pauta de discussões
ambientalistas. Nesse contexto é que passam a ser difundidas as estratégias de poder que
apresentariam novas soluções para a chamada crise, um conjunto de novas alternativas para
problemas que passou a extrapolar as esferas biológicas e naturais passando também a ser alvo de
interesse das áreas política, econômica e social tendo em vista as mudanças desencadeadas
alterando inclusive identidades locais.
Uma forte dependência por recursos naturais entre comunidades tradicionais, notadamente
aquelas situadas em áreas litorâneas do Nordeste brasileiro, onde se expande à atividade turística
vem evidenciando tanto custos ambientais como sociais; a substituição da jangada, considerada uma
herança indígena, por botes motorizados configura-se um típico exemplo desse quadro; a ausência
da matéria-prima para fabricação de instrumentos de trabalho e habitação originalmente retirada da
mata, a perda do saber empírico utilizado por pescadores artesanais na sua construção e repassado
por laços familiares, são exemplos de mudanças desencadeadas pelo processo de expansão
econômica e da globalização que demandam a chamada sustentabilidade local.
Fórum Internacional do Meio Ambiente - A conferência da Terra 334

A noção de desenvolvimento sustentável, uma das estratégias postulada para o


enfrentamento da crise ambiental, foi amplamente difundida e mesmo oficializada nos idos dos anos
90 como afirma Leff (2006 p.135), “na raiz da Conferência das Nações Unidas sobre o Meio
Ambiente e Desenvolvimento, celebrada no Rio de Janeiro, em 1992.” No entanto, a crise já era
evidente nos anos 60 e 70, exposta de forma contundente pelo modelo econômico capitalista que
desencadeava todo um processo de degradação ambiental, no sentido mais amplo de ambiente,
considerando as relações múltiplas estabelecidas entre os elementos naturais, sócias, econômicos
políticos culturais. É esta trajetória que irá proporcionar o surgimento das propostas de um
“Ecodesenvolvimento” centradas em idéias de um modelo de desenvolvimento econômico com
base em três premissas: eficiência econômica, justiça social e prudência ecológica.
Este novo discurso, no entanto, não consegue alterar o processo produtivo e nem a lógica
do mercado que permanece sob o domínio do lucro. Nesse sentido as ações que visam proteger o
meio ambiente passam a ser consideradas como um custo adicional dentro do processo econômico.
As respostas a crescente crise ambiental que defendiam modificações nas formas de produção,
revisão nos estilos de vida aproximando a sociedade do potencial ecológico de cada região, também
irá exigir das diferentes comunidades locais capacidade para gerir seus próprios recursos. Os
entraves para que efetivamente o ideário contido nos princípios de ecodesenvolvimento fosse
transformado em realidade dependia de uma ruptura com a linha economicista que necessariamente
teria que permitir que a ênfase agora fosse à dimensão ambiental e seu atrelamento ao
desenvolvimento econômico que permaneceu sob o comando do capital internacional num amplo
processo de globalização com visíveis mudanças locais de poder e de identidades.
A idéia de que a globalização invade diferentes sociedades impondo um padrão
homogêneo, uniformizador, ou novos costumes eliminando os hábitos e comportamentos locais não
é nova, no entanto, hoje já é possível encontrar leituras mais aprofundadas deste fenômeno
permitindo uma maior clareza da questão. Na verdade, o entendimento que a globalização nada
mais é que uma fase do processo de internacionalização do capital vem sendo posto de uma forma
enfática por uma diversidade de autores e acredita-se que um dos pioneiros, seja o economista
francês François Chesnais que em meados da década de 1990 já assim o definia como um
movimento de longo prazo.
De acordo com Bacelar (1996), Chesnais em seu livro Mundialização do Capital deixa
muito claro que o reconhecimento de que a uniformização é uma conseqüência, uma marca dentro
do quadro da globalização, porém as singularidades do local também são elementos que se
transformam em uma força atrativa para o mercado global e seus agentes interessados em
consolidar alianças econômicas. Fica fácil perceber este movimento em busca do singular quando se
observa o interesse do capital ora nacional, ora estrangeiro, por exemplo, pelas praias em regiões
como o Nordeste brasileiro, especialmente aquelas detentoras de um perfil exótico para o
desenvolvimento da atividade turística ou pelas possibilidades de expansão de produtos econômicos
mais rentáveis a exemplo da exploração de camarão. Nesse sentido percebe-se a alteração de
antigas relações sociais e econômicas, que são relações de poder, agora com novas práticas
estabelecidas, como também o surgimento de diferentes estratégias que buscam na adaptação de
comportamentos a sobrevivência econômica e também cultural, ou seja, a tentativa de
sustentabilidade das comunidades locais.
A dinâmica dessas relações de poder e as dificuldades enfrentadas quando se evidencia a
questão da sobrevivência econômica, tomando como exemplo atividades ligadas à agricultura
familiar, a pesca artesanal, ao artesanato encontrado em pequenas localidades todas aqui encaradas
como sinônimo de pequena produção fica claro que vai muito além das necessidades dos seus
membros no presente. Expõe na verdade os riscos que ameaçam a manutenção de suas práticas e as
gerações futuras de agricultores, artesãos e pescadores. Atropelados pela globalização, nem sempre
encontram brechas dentro da economia capitalista que permitam uma sobrevivência justa e ficam os
mesmos na eminência de perder, entre outras coisas, todo um saber tradicional que se fosse
adequadamente instrumentalizado, garantiria além da sua sobrevivência econômica o pleno
exercício de seu poder.
Fórum Internacional do Meio Ambiente - A conferência da Terra 335

No caso brasileiro o que se observa é um Estado que não tem colaborado com a
consolidação das relações de poder entre grupos de pequenos produtores dificultando dessa forma o
exercício do poder constituído pelos grupos sociais e a sustentabilidade dos mesmos.
As permanentes fragilidades e lacunas identificadas no âmbito destas relações desperta-se
para ter cautela na análise dos bons resultados que muitas vezes escondem o grande número de
pequenos produtores ligados a comunidades tradicionais, não contemplados com os benefícios
disponibilizados por vários tipos de programas bancados pelo Estado.

O DIFÍCIL ENTENDIMENTO DO PODER


O poder sugere uma ambigüidade destacada por Raffestin (1993); esta seria a confusão
entre os termos Estado e Poder que levaria uma valorização do poder exercido pelo Estado
minimizando a importância do termo que na afirmação de Lefébvre (1972), ”nasceu muito cedo,
junto com a história que contribuiu a fazer”. A verdade é que geralmente o que se vê é um
bombardeio constante que pressiona o indivíduo, seja urbano ou rural, a acreditar que suas decisões,
mesmo que pessoais, irão depender naturalmente de uma esfera superior o Estado, fazendo-o crer
que seus interesses convergem para objetivos comuns, um pensamento que não se concretiza na
realidade.
No Nordeste brasileiro, em função da precariedade que envolve atividades tradicionais
como, por exemplo, a pesca artesanal, não é raro observar um comportamento de caráter submisso e
de acomodação frente às políticas implementadas pelo Estado. Desta forma linhas de crédito para
aquisição de barcos ou atitudes assistencialistas ainda são vistas com bons olhos por grupos de
comunidades locais, mesmo que no final isto resulte em um endividamento individual e na
permanência de um quadro desfavorável que esses grupos no fundo desejariam superar. Assim
sendo, mesmo percebendo que fazem parte desta complicada dinâmica não se reconhecem um elo
atuante nessa relação de poder.
Enfatiza Raffestin (1993, p. 58) “O poder visa o controle e a dominação sobre os homens e
sobre as coisas. Pode-se retomar aqui a divisão tripartite em uso na Geografia Política: a população,
o território e os recursos.”. Defende o autor, que a população viria em primeiro lugar, pois nela
estaria à origem de todo o poder. Teria ela capacidade de transformar a relação existente entre o
território e os recursos existentes constituindo-se no elo dinâmico que precederia a ação. Ao
território caberia ser reconhecido como lugar onde as relações se dariam, mas faz uma ressalva
admitindo que sem a população o território pudesse apenas se converter em um dado estatístico
passível de ser organizado. Por último os recursos se comportariam como elementos potenciais que
condicionariam o alcance da ação.
Em áreas costeiras território, população e recursos revelam uma complexidade presente no
caráter vasto do mar, este território, mas do que um elemento físico se reverte em um fornecedor
direto dos meios de subsistência, de trabalho e produção. A população, neste caso as comunidades
tradicionais, lutam, muitas vezes de forma inglória, por uma sustentabilidade econômica que
depende de ações do Estado e do poder por ele exercido, como também dos recursos naturais que
devem estar em condições de serem explorados. Pode-se até concordar que a população ainda pode
ser considerada a origem do poder, mas ela é um elo que necessita urgentemente ser fortalecido de
forma que se reconheça pronta para intervir na dinâmica destas relações.
A visão utilizada por Raffestin (1993), toma por base diferentes aspectos sobre o que se
entende por poder, centralizando seus argumentos na premissa de que não existe uma assimetria no
cerne das relações que se configurariam como o poder. Para fundamentar sua interpretação,
Raffestin (1993) destaca o pensamento de Foucault (1976, p.123 - 127) cuja obra aborda diferentes
faces do poder, relacionando suas proposições:
“1. O poder não se adquire; é exercido a partir de inumeráveis pontos;
2. As relações de poder não estão em posição de exterioridade no que diz respeito a outros
tipos de relações(econômicas, sociais etc.), mas são imanentes a elas;
3. O poder vem de baixo; não há uma oposição binária e global entre dominador e
dominados;
Fórum Internacional do Meio Ambiente - A conferência da Terra 336

4. As relações de poder são, concomitantemente, intencionais e não subjetivas;


5. Onde há poder há resistência e no entanto, ou por isso mesmo, esta jamais está em
posição de exterioridade em relação ao poder.”
Embora reconhecendo que as proposições de Foucault não definem o que vem a ser o
poder o autor afirma que elas são mais importantes que uma simples definição; elas permitiriam o
entendimento da natureza do poder.
Assim como Raffestin (1993), Iná Castro (2005) também recorre a Foucault para trabalhar
a questão do Poder, considerando o caráter assimétrico e relacional constante na teoria do Poder do
filósofo e aprofunda a sua abordagem colocando o poder no universo dos valores sociais, tudo seria
socialmente valorizado. Por conta disso elege o tempo e o espaço como dois principais marcos das
sociedades, de onde não poderia se excluir o poder. A vontade comum, fundamentaria todo o
exercício de poder e nela residiria a impotência do Poder. E exemplifica, se o indivíduo oprimido
(escravo) escolhe morrer ele tira o poder do opressor (senhor) expondo claramente toda a
impotência do poder que no final sempre dependerá da vontade do outro. (p.99-100). Haveria desta
forma, mesmo em uma situação irreversível, a morte, espaço para possibilitar uma reação, que
reforçaria a idéia do Poder como fruto de um permanente confronto dentro das sociedades.
Desta maneira, grupos como os pequenos produtores rurais, artesãos ou pescadores
artesanais inseridos na dinâmica relacional que envolve o Poder, poderiam ter uma resposta
comportamental, mas contundente com relação as possíveis estratégias para viabilizar sua
sustentabilidade seja ela econômica, social e mesmo cultural. Neste caso, a resistência de alguns
grupos locais em aderir estratégias impostas por elementos externos a seu cotidiano (governo,
empresários) talvez possa levá-los a expor claramente sua vontade eliminando sua impotência e
abrindo espaço para uma reação. Comunidades litorâneas que rejeitam a instalação de grandes
hotéis se configuram em um exemplo claro desse tipo de resistência, demonstrando haver uma
tomada de consciência sobre a discussão em torno do que seria vantajoso para o local.
Prossegue Castro (2005) ao distinguir o Poder de (capacidade de fazer) do Poder sobre
(encontrada no campo das vontades) esclarecendo que:
Neste sentido, o Poder de põe em ação uma força que é condição de possibilidade
concreta e está sempre em relação com outra coisa que é frágil, dependente e variável... O Poder
sobre é a força de propagação de uma vontade comum e à possibilidade de aplicar sanções
socialmente aceitas, ou seja, sob o fundo dessa vontade comum, o poder pode dispor das outras
vontades em limites variáveis.(p.101)
Comenta Arruda, (2000) que o poder sobre (encontrado no campo das vontades) se apóia
nas idéias do filósofo Thomas Hobbes que coloca o Estado como aquele que possui um poder
superior ao indivíduo, sendo este o principal fundamento da dominação. Esta noção de poder
concebida por Hobbes seria construída a partir de três instâncias isoladas: o poder, o rei e os
súditos; se teria desta forma como resultado o poder soberano. Essa concepção agiganta o papel do
Estado, que toma a forma do monstro Leviatã, o que levaria ao domínio deliberado de uma das três
instâncias envolvidas. Nesse sentido “A liberdade do indivíduo justifica a dominação do Estado,
isto é, o Estado tem sua origem na aceitação consensual dos indivíduos livres.” (p.24).
Essa visão do Estado é naturalmente assimilada por parte da sociedade brasileira que
encara o Estado brasileiro como um monstro cheio de tentáculos, centralizador de poder e decisões.
Partindo-se desta visão é comum e até mesmo justo, aceitar as críticas a esse comportamento do
Estado conduzido por governantes embriagados pelo Poder. No entanto, os vícios decorrentes desta
relação, se distanciam da idéia original de Hobbes que enxergava no domínio do Estado algo
necessário para proteger os direitos do indivíduo, algo que permitisse o atendimento de suas
necessidades básicas de maneira igualitária, algo que garantisse no final de tudo o bem comum.
Referindo-se ao Leviatã afirma Hobbes:
Graças à autoridade que lhe é dada por cada indivíduo no Estado, é-lhe atribuído o uso
de gigantesco poder e força [...] é nele que consiste a essência do Estado, que pode ser assim
definida: uma grande multidão institui a uma pessoa, mediante pactos recíprocos uns com os
outros, para em nome de cada um como autora, poder usar a força e os recursos de todos, da
Fórum Internacional do Meio Ambiente - A conferência da Terra 337

maneira que considerar conveniente, para assegurar a paz e a defesa comum. (Hobbes, 2006
p.131)
Considerando-se grupos de pequenos produtores rurais, artesãos, de pescadores artesanais,
como os indivíduos a quem Hobbes se referiu em sua teoria, ter-se-ia que aceitar a idéia que o
monstro brasileiro é devedor de ações que viabilizem a permanência e sobrevivência destes
indivíduos, garantindo-lhes o chamado tratamento igualitário, isso independente da execução de
suas próprias estratégias pessoais e dessa forma se teria o caminho para a sustentabilidade de
comunidades e povos.
Para Castro (2005), que baseia seu discurso em autores como, Weber, Bertrand Russel,
Lasswell, como também Foucault e Hobbes, o Poder se apresentaria diferenciado em três formas
básicas: o despótico quando o medo fosse o instrumento de coerção pela força; a forma baseada na
autoridade exercida como concessão e reconhecimento dos que a ele são submetidos; e o último o
político que faria uso tanto da coerção como da autoridade pressupondo sempre que seu objetivo
seja o bem comum.
Todas as três formas relacionadas pela autora, podem ser facilmente associadas ao papel
desempenhado pelo Estado e ao poder por ele exercido em diferentes situações. Este entendimento,
porém se diferencia das idéias propostas por Foucault. Este ao não colocar o Estado no centro da
questão do Poder enfatiza o que considera mais importante, o papel determinante das relações de
poder. O foco seria o indivíduo que tornaria visível a complexidade destas diferentes relações e o
Estado perderia o privilégio de ser a instância onde essas relações seriam constituídas. No entanto
não se estaria ignorando ou negando o papel do Estado, mas se revendo a dimensão de sua atuação
no efetivo exercício do poder respeitando a percepção da realidade de outros atores.
Enfim, há a necessidade de uma reflexão clara sobre qual o papel destinado aos atores
sociais que compõem o elo relacional criado entre o poder do Estado e o poder dos pequenos
produtores, dos artesãos e pescadores, e se no fim é possível comprovar-se que o bem comum e a
sustentabilidade enquanto uma meta, um objetivo, realmente prevalece para todos ou somente para
poucos.

IDENTIDADE: UM INSTRUMENTO DE RESISTÊNCIA LOCAL


A escala local permite uma investigação que se leva a reconhecer o papel de pequenos
grupos, atores locais, que em suas comunidades, ligados pelo desempenho de atividades
tradicionais, possuem mecanismos conscientes ou não de resistência a sua eliminação. O local pode
exprimir uma idéia de proximidade e a partir daí também expressar as especificidades sociais e
culturais que individualmente os atores locais compartilham no seu dia a dia.
Conforme Bourdin (2001), o vínculo social apresenta três grandes dimensões: a primeira
seria a de complementaridade e a troca; a segunda o sentimento de pertença à humanidade que
reforça os vínculos com os outros seres humanos e por fim a terceira corresponderia ao fato de viver
junto partilhando do mesmo cotidiano. O local e sua identidade é para o autor um lugar privilegiado
onde se teria um conjunto de representações e códigos repassados pela prática que refletiriam as
chamadas estruturas antropológicas e estas seriam colocadas em perigo em função da mobilidade,
pelo cruzamento, pela mistura dos povos.
Este debate em torno do local e da identidade remete a uma reflexão de Castells (1999, p.
84) que afirma:
As comunidades locais, construídas por meio da ação coletiva e preservadas pela
memória coletiva, constituem fontes específicas de identidade. Essas identidades, no entanto,
consistem em reações defensivas contra as condições impostas pela desordem global e pela
transformação incontroláveis e em ritmo acelerado. Elas constroem abrigos, mas não paraísos.
As palavras do autor espanhol induzem a reconhecer nos grupos locais,
especialmente àqueles em que já é possível identificar um mínimo de organização como o caso dos
pescadores artesanais, pequenos agricultores e artesãos, a possibilidade de uma efetiva resistência a
formas de exploração econômica que os levariam a uma total ruptura com a noção de
sustentabilidade.
Fórum Internacional do Meio Ambiente - A conferência da Terra 338

As ações destes grupos locais ainda estão longe de ser encaradas como um
movimento forte, com grande distribuição espacial, pelo contrário, casos pontuais servem de
exemplo para uma grande maioria que ainda não consegue efetivamente atingir resultados
satisfatórios em termos econômicos. O pensamento de Castells (1999) quando faz uso do termo
abrigo pode ser bem colocado nos casos de comunidades litorâneas onde se conjugam práticas de
pesca, artesanato, pequena agricultura e turismo, onde o sentido da palavra se encaixa, expressando
também um sentimento de refúgio, remetendo a reflexão sobre a relação do visitante em busca do
paraíso a ser consumido e os nativos, atores locais que buscando a sobrevivência econômica, mas
também a permanência de sua identidade, de seus valores culturais constrói verdadeiros
abrigos/refúgios que os protegem da massificação da globalização. Praias exóticas, espaços ainda
fora do circuito comercial são consideradas não contaminadas pelos vícios da globalização e mesmo
que inconscientemente, esses grupos locais, ao lutar pela sua sobrevivência econômica, protegem
seus recursos naturais, ao mesmo tempo em que também reforçam sua identidade com o local.

CONSIDERAÇÕES FINAIS
Conclui-se, portanto que seria uma visão simplista reduzir o debate do poder, da identidade
local e da sustentabilidade a um possível enfrentamento entre o local e o global. A sustentabilidade
econômica versus conservação ambiental – processos dos costumes e da cultura de utilização dos
recursos existentes - envolve uma complexidade de ações e reações que exige um aprofundamento
da leitura de um processo que acarreta conseqüências tanto para o homem como para a natureza.
É notório que o modelo econômico capitalista ao ditar regras para o preservacionismo
exige um alto custo social, pois agrega diretrizes autoritárias que minimiza a participação das
comunidades tradicionais locais, que em geral não são consultadas sobre temas que afetarão não
somente seu futuro, mas comprometerão seu presente afastando-as do poder de decisão que define
como se dará sua sustentabilidade econômica, cultural, social e política.
As comunidades litorâneas, em função do grande apelo estético de seu território,
apresentam uma vulnerabilidade maior diante de uma avalanche de intervenções propostas com a
intenção de explorá-las economicamente. Fica cada vez mais claro que os elementos ligados à
identidade destas comunidades (cultura, religião, etnia) estão se firmando como objetos de
resistência a uma padronização que grassa pelo mundo afora. Este parece ser o meio que através do
dia a dia, dos laços familiares existentes, vem permitindo a resistência de marcas locais e
principalmente da possibilidade de se implantar um conceito de sustentabilidade que garanta um
atendimento justo as aspirações e a própria existência dessas comunidades.

REFERÊNCIAS BIBLIOGRAFIA
ARRUDA, José Nilton Conserva. Um Não ao Triunfo do Leviatã: A Questão do Poder em Michel
Foucault. Dissertação de Mestrado. UFPB, João Pessoa, 2000.
BACELAR, Tânia. Ação Local e Desenvolvimento Sustentável. IN Seminário Sustentabilidade e
Fortalecimento Local. Foundation Kornand Stiftung Adenauer. Debates. Nº 11, junho de 1996.
Acesso em: 07/03/2008.
BOURDIN, Alain. A questão Local. Tradução de Orlando dos Reis. Rio de janeiro: DP&A, 2001.
CASTELLS, Manuel. O Poder da Identidade. V. 2 Tradução Klauss Brandini Gerhardt. São Paulo:
Paz e Terra, 1999.
CASTRO, Iná Elias de. Geografia e Política: território, escalas de ação e Instituições. Rio de
Janeiro: Bertrand Brasil, 2005.
FOUCAULT, Michel. Histoire de la sexualité, 1. La volonté de savoir. Paris, Gallimard, 1976.
HOBBES, T. Leviatã, ou Matéria, Forma e Poder de Um Estado Eclesiástico e Civil. Tradução Alex
Martins. São Paulo: Martin Claret, 2006.
LEFÈBVRE, Henri. Le droit à la ville, de Espace et politique. Paris, Anthoropos, 1972.
LEFF, Enrique. Racionalidade Ambiental: A reapropriação social da natureza. Tradução Luis
Carlos Cabral. Rio de Janeiro: Civilização Brasileira, 2006.
RAFFESTIN, Claude. Por uma geografia do Poder. São Paulo: Ática, 1993.
Fórum Internacional do Meio Ambiente - A conferência da Terra 339

A INICIAÇÃO CIENTÍFICA NO ENSINO DE CIÊNCIAS: UMA EXPERIÊNCIA EM


BELÉM DO PARÁ

Ângela Maria Melo Pantoja


Secretaria Estadual de Educação do Pará – SEDUC/PA. Belém – PA – Brasil.
angelamariapantoja@yahoo.com.br

Resumo
Este estudo trata do relato de uma experiência de iniciação científica realizada por alunos
de Belém do Pará. Buscou identificar os saberes dos moradores da comunidade sobre o valor
nutricional do açaí, que é um fruto regional. A partir dos resultados foram desenvolvidas campanhas
educativas de orientação e esclarecimento da comunidade.
Palavras-Chave: ensino de ciências, iniciação científica, ressignificação da prática docente.

Abstract
This study relates an experience of scientific initiation carried through by students from
Belém-Pará. It searched to identify the knowledge of the school community about the nutritional
value of açaí that is a regional fruit. From the results educative campaigns of orientation and
clarification of the community had been developed.
Key Words: education of sciences, scientific initiation, renovation of the practical teacher.

INTRODUÇÃO
Ensinar Ciências atualmente, em virtude da baixa qualidade educativa, exige a renovação
das práticas docentes nessa área, possibilitando a compreensão pelos estudantes da realidade
vivenciada por eles. Considerando a importância de realizar atividades que fujam ao modelo
tradicional de dar aulas de Ciências e ao mesmo tempo, romper com o formalismo do processo
habitual nas escolas, favorecendo a participação de diferentes segmentos da comunidade e, das
diversas formas de comunicação oral, escrita e visual, justifica-se a importância da experiência aqui
relatada.
Outros aspectos também justificaram a realização desse trabalho, dentre eles destaco a
necessidade de intercâmbio com a comunidade educacional de experiências que avaliam ou
sugerem atividades de iniciação científica, dentro das escolas e nas comunidades; a necessidade de
buscarmos o significado da pesquisa, principalmente pelo que interferem e qualificam a formação
dos professores; o caráter cada vez mais inter e multidisciplinar; a integração escola-comunidade e
centros de pesquisa; a aquisição de informações novas, a disseminação dos conhecimentos
produzidos nas etapas anteriores da pesquisa, a oportunidade de gerar desacomodação no professor
e a busca de novas alternativas para o processo de ensino e aprendizagem.
Usualmente, as práticas docentes no ensino de Ciências, se limitam à apresentação dos
resultados do processo de construção do conhecimento científico. Nesse sentido, essas práticas,
poucas vezes desenvolvem nos estudantes, a compreensão sobre o processo de produção desse
conhecimento. É claro que a informação é imprescindível para a construção do conhecimento
científico, mas ela, por si só, não é Ciência.
Nesse sentido, busco relatar uma experiência de iniciação científica realizada por
estudantes do ensino fundamental de uma escola pública em Belém do Pará. Considero que o
presente relato tem como objetivo enfatizar o valor formativo das atividades de iniciação científica
para a ressignificação da prática no ensino de ciências.
Constituindo-se como uma estratégia relevante para a construção do conhecimento
significativo, as atividades de iniciação científica, em função da preocupação com a formação
integral, motivam os estudantes a vivenciarem processos cognitivos que resultam na produção e/ou
reconstrução de conhecimentos. A experiência aqui relatada possibilitou aos estudantes o exercício
da capacidade de comunicação, da criatividade, a compreensão e a construção de novas concepções
sobre o conhecimento de Ciências em uma visão mais integrada ao ambiente.
Fórum Internacional do Meio Ambiente - A conferência da Terra 340

A motivação para o estudo surgiu da percepção de que apesar do açaí se constituir em um


alimento de relevante valor cultural para a população belenense, sobretudo daquela de baixa renda,
são poucas as informações que essas pessoas têm a respeito do valor nutritivo desse alimento.
Diante disso, houve a preocupação e o interesse em proporcionar especialmente, às pessoas da
comunidade próxima à escola onde se originou a pesquisa, uma orientação que as capacitasse a
compreender a constituição nutritiva do açaí, contribuindo para a maior valorização desse fruto
regional.
Fruto de uma palmeira conhecida como açaizeiro, cujo nome científico é Euterpe oleracea,
o açaí é uma espécie nativa das várzeas da Região Amazônica, especialmente dos seguintes países:
Venezuela, Colômbia, Equador, Guianas e Brasil. No Brasil, nos estados do Amazonas, Amapá,
Pará, Maranhão e Acre. É habitante de terrenos pantanosos e da margem dos rios. Cresce em
touceiras de 3 a 25 estipes (troncos de palmeira). Da palmeira, tudo se aproveita: frutos (alimento e
artesanato), folhas (coberturas de casas, trançados), estipe (ripas de telhado), raízes (vermífugo),
palmito (alimento e remédio anti-hemorrágico). Em razão de sua importância alimentar,
especialmente entre as classes média e baixa, vem sendo disseminado por toda a região amazônica,
pelo Brasil inteiro e até em outros países. É consumido na forma de bebidas, doces, geléias e
sorvetes.

Figura 1. Açaizeiros em uma área ribeirinha de Belém

A frutificação do açaizeiro pode ocorrer durante o ano inteiro, mas o período de maior
abundância é a estação menos chuvosa, que acontece no período de julho a dezembro na região
norte. Nessa época, o fruto se encontra em melhor qualidade, ou seja, na sua maturação ideal, que
fornece o vinho de melhor qualidade. O vinho conhecido simplesmente por açaí, é um complemento
básico na alimentação das classes populares, na maioria das vezes se constitui a principal refeição.
Devido ao consumo do fruto, muitos pesquisadores fazem estudos sobre seu valor nutricional.
O estudo aqui relatado oportunizou aos jovens nele envolvidos, além de ampliarem seus
conhecimentos sobre temática tão relevante, contribuírem para o processo de orientação das pessoas
da comunidade onde moram, fortalecendo assim a relação escola-comunidade. O objetivo geral
desse estudo foi valorizar o açaí como um alimento de alto valor nutritivo.
A primeira etapa consistiu em verificar o grau de conhecimento da comunidade próxima à
escola sobre o valor nutritivo do açaí, norteando-se pela seguinte questão: A comunidade que
consome o açaí conhece seu valor nutricional?
Baseada nos resultados obtidos foi realizada a segunda etapa da atividade que se constituiu
de atividades de pesquisas bibliográficas e entrevistas com especialistas, como: nutricionistas,
médicos e coordenadores da merenda escolar sobre a temática. O objetivo nesse momento foi à
apropriação pelos alunos do conhecimento a respeito do valor nutritivo do fruto.
Fórum Internacional do Meio Ambiente - A conferência da Terra 341

A terceira etapa constou do desenvolvimento de campanhas educativas de orientação e


esclarecimento para a comunidade, socializando as aprendizagens feitas pelos estudantes, tendo,
pois como objetivo, socializar com a comunidade, informações sobre o valor nutricional do açaí e
criar campanhas educativas na escola e na comunidade para informar sobre o valor nutricional do
açaí.
Todas as atividades realizadas, além de fortalecer a relação escola-comunidade, ampliaram
o conhecimento por parte dos alunos e da comunidade sobre o açaí, no sentido de reconhecê-lo
como importante recurso cultural, econômico e alimentar, evidenciando a importância de atividades
de iniciação científica para a construção de conhecimentos significativos e para a ressignificação da
prática docente.

METODOLOGIA
O trabalho baseou-se em atividades de pesquisa realizada pelos alunos sob a minha
orientação, que foi dividido em três etapas, a saber:
Na primeira etapa, a fim de traçar um perfil dos moradores do bairro e de levantar as
informações da comunidade relativas ao valor nutricional do açaí, isto é, o grau de conhecimento
sobre a temática em questão, foram aplicados 20 questionários aos moradores da comunidade do
Pantanal, no bairro do Benguí, contendo questões abertas e fechadas.

Figura 2. Aluna realizando a pesquisa na comunidade

A análise dos dados levantados nessa etapa foi feita com base nas seguintes categorias:
caracterização dos consumidores, perfil sócio-econômico, hábito alimentar e o nível de
entendimento sobre o valor nutricional do fruto.
Com base nos resultado dessa análise foi realizada a segunda etapa da pesquisa que tinha
como objetivo o levantamento de informações científicas sobre o valor nutritivo do açaí.
As atividades da segunda etapa foram realizadas através de pesquisas bibliográficas e
entrevistas com especialistas que trabalham na comunidade tais como: nutricionistas, trabalhadores
do centro de saúde e coordenadores da merenda escolar. As entrevistas tratavam do valor
nutricional do açaí. Foram feitas 10 entrevistas com retorno de 100%. Os resultados obtidos
evidenciaram o alto valor nutritivo do açaí. As substâncias nutritivas mais freqüentes no fruto são:
carboidratos, proteínas, fibras, gorduras, cálcio, além das vitaminas, que são substâncias de grande
influência na saúde das pessoas.
A terceira etapa da pesquisa foi a socialização dos saberes adquiridos pelos alunos com a
comunidade. Os procedimentos utilizados pelos alunos para a realização de campanhas educativas
constaram de palestras, seminários e exposições para a comunidade na escola e em feiras regionais
de Ciências bem como em fóruns de Educação Ambiental.
Fórum Internacional do Meio Ambiente - A conferência da Terra 342

RESULTADOS E DISCUSSÕES
Os resultados evidenciaram que a comunidade pesquisada faz do fruto seu alimento básico,
principalmente porque atende sua necessidade alimentar e devido ao baixo custo, isto é, o consumo
do açaí faz parte dos hábitos populares da comunidade. É importante destacar que o açaí tem um
sabor bastante apreciável, o que atrai a comercialização. O desconhecimento do valor nutritivo do
açaí, no entanto, é quase que geral entre as pessoas entrevistadas.
Os resultados a serem destacados na primeira etapa, demostram que apesar do fruto ter seu
valor nutricional comprovado cientificamente, as pessoas dessa comunidade desconhecem suas
substâncias nutritivas e o poder do açaí como fonte energética. Consomem o alimento, porque é
acessível a seu poder aquisitivo e de sabor bastante agradável, sendo complemento da alimentação e
muitas vezes a principal e única refeição.
Dos 20 consumidores da comunidade, 95% conhecem o fruto e 5% dizem não conhecer.
Em relação ao perfil sócio-econômico desses consumidores, a grande maioria (80%), não tem renda
fixa, são trabalhadores informais, cuja renda familiar não chega a um salário mínimo. Os (20%)
restantes trabalham com renda fixa de um salário mínimo. O hábito de tomar açaí dessas pessoas é
muito freqüente, tal que (35%), tomam açaí todos os dias em vários horários. Os que se alimentam
de açaí uma vez por dia e o representam como principal refeição são 55%. Os que têm o açaí como
complemento da alimentação, chegam a 10% dos entrevistados. Esses dados justificam a
importância do fruto no hábito alimentar dessas pessoas. É importante destacar que em 80% dos
casos as pessoas responderam que tomam o açaí porque é gostoso. Por ser um alimento barato na
área, 10% consomem o fruto e apenas 5% dizem que tomam o açaí por ser saudável e nutritivo, mas
não conseguem nomear as substâncias que compõem o fruto. Sobre o conhecimento do valor
nutricional, os resultados apontam que 70% dos entrevistados não têm esse conhecimento. Os 30%
restantes dizem saber que é nutritivo, não sabendo, portanto, quais são os nutrientes.
Na segunda etapa, as pesquisas bibliográficas e as entrevistas com os nutricionistas
demonstraram a importância do açaí, enquanto um alimento de alto potencial nutritivo, com estudos
que comprovam na sua composição diversas substâncias nutritivas, tais como: carboidratos,
proteínas, fibras, gorduras, cálcio, além de possuir vitaminas, que são substâncias de grande
influência na saúde das pessoas. É importante destacar que os nutricionistas entrevistados, mesmo
conhecendo o poder nutritivo do produto e dos benefícios que pode fazer à saúde do corpo não o
recomendam a seus pacientes. Atualmente, o açaí constitui-se assim em uma alimentação
alternativa, onde hoje é servida na merenda escolar em escolas públicas, cuja opção do governo, põe
em destaque o valor nutritivo da fruta. A regionalização da merenda escolar atende aos hábitos
alimentares do povo, o custo é baixo e gera emprego. O vinho conhecido simplesmente por açaí, é
um complemento básico na alimentação das classes populares, na maioria das vezes se constitui a
principal refeição.

Figura 3. Comunidade tomando o açaí durante a pesquisa

Nas pesquisas bibliográficas os alunos destacaram diversos estudos já realizados no


sentido de ressaltar o valor nutricional do açaí, tais como os de Chaves e Pechnik (1945): “a
interpretação dos dados analíticos permitem-nos observar ser o açaí, um alimento essencialmente
Fórum Internacional do Meio Ambiente - A conferência da Terra 343

energético, com um valor calórico superior ao leite e um teor de lipídios duplo deste. O teor de
minerais, cálcio, fósforo e ferro apresentam interesse”. Outro estudo feito por Dante Costa (1959),
empregando o ensaio biológico em ratos, o método curativo, evidenciou no açaí a presença da
vitamina A. Também Calzavara (1972), realizou um amplo estudo no qual aborda todos os aspectos
do açaí no estuário amazônico, notadamente sua importância econômica, ecológica, aspectos
fitotécnicos e métodos de cultura. Quanto à composição química do fruto, o autor transcreveu cerca
de uma dezena de resultados a que chegaram vários pesquisadores. Sem dúvida alguma, o açaí
reúne qualidades que o colocam como fonte de alimento nutritivo da população, exigindo maior
divulgação para a comunidade dos estudos das pesquisas já realizadas.

Figura 4. Alunos fazendo a pesquisa bibliográfica na Sala de Leitura da Escola

Considerando os resultados obtidos na segunda etapa deste estudo, parecendo evidenciar


que existe pouca divulgação sobre as substâncias nutritivas do alimento e do seu potencial
alimentar, o que contribui para a falta de informação da comunidade, procedeu-se à realização de
campanhas educativas de valorização e conhecimento de tão importante produto regional.
Constou essa terceira etapa, da culminância das investigações, resultando em campanhas
educativas na escola, criadas pelos alunos, intencionando a valorização deste importante recurso
natural. Entre os mecanismos propostos foram realizados: fóruns de discussões na escola, debates,
seminários e campanhas educativas através de folder, cartazes e da criação pelos alunos de histórias
em quadrinhos.
Considero que seja de extrema importância que as escolas se responsabilizem pela
valorização da cultura dos estudantes, favorecendo sua ampliação e a divulgação de conhecimentos
significativos para os estudantes e para a comunidade que a rodeiam. Atualmente, embora o açaí
seja servido como parte da merenda escolar, os alunos não recebem qualquer orientação sobre seus
constituintes nutritivos.
Os resultados dessa experiência ressaltam a relevância das atividades de investigação
científica para a produção científica juvenil, propiciando condições para publicações e disseminação
da produção científica dos envolvidos, caracterizando uma oportuna troca de experiência e
conhecimentos, além de despertar para a continuidade e aprofundamento teórico prático dos
trabalhos. Apontam para a melhoria da aprendizagem dos alunos, pois eles se apropriaram do
conhecimento de forma mais significativa, demonstrando interesse no decorrer de todo o trabalho,
ao participarem ativamente em todas as etapas da investigação, demonstraram a capacidade de
autonomia e criatividade.
Como docente e orientadora do estudo aqui relatado, ressalto o valor dessa experiência tão
significativa para a minha prática educativa. Ao partir do conhecimento vivenciado pelos alunos e
pela comunidade , o trabalho de educação ambiental constitui-se em excelente instrumento para a
formação de cidadãos participativos e atuantes na realidade em que estão inseridos.

CONCLUSÕES
A realização desse trabalho investigativo permitiu que os alunos adquirissem a visão de um
mundo mais integrado e menos compartimentalizado. Considerou e reavivou a cultura dos
Fórum Internacional do Meio Ambiente - A conferência da Terra 344

indivíduos nela envolvidos, incluindo aí os alunos, a comunidade e os professores, fazendo com que
a bagagem cultural de cada um, fosse respeitada e estivesse presente no decorrer de todo o trabalho,
“procurando não somente valorizar a realidade de cada um, mas, indo além, fazendo com que essa
realidade perpassasse todas as atividades” (SIMSON, 2001, p.11).
Considerei relevante a capacidade que os alunos adquiriram em planejar, executar e relatar
criticamente suas investigações científicas, o que por si só representa o alcance de um dos
pressupostos para uma adequada Iniciação à Educação Científica, bem como à compreensão dos
fenômenos científicos, filosóficos e epistemológico. O trabalho com atividades de iniciação
científica contextualizado no cotidiano dos estudantes, ao possibilitar que os mesmos sejam sujeitos
do próprio conhecimento, apostando na criatividade, na participação e na autonomia constitui-se em
relevante estratégia metodológica de renovação da prática do ensino de Ciências. Nesse sentido, o
trabalho com a iniciação científica, pode ser a possibilidade de melhoria da qualidade do ensino
nessa área, contribuindo para a formação de sujeitos criativos, participativos, autônomos. Um dos
fatores que contribui para a falta de informação é a ausência de campanhas educativas de
valorização e conhecimento dos produtos regionais, principalmente em se tratando em alimentação
do povo. É de extrema importância que os órgãos públicos, principalmente as escolas, estejam em
sintonia com as necessidades da comunidade. É necessário a proposições de ações que venham a
contribuir para esse conhecimento.

REFERÊNCIAS BIBLIOGRÁFICAS
CALZAVARA, B.B.G. As possibilidades do açaiceiro no estuário amazônico. FCAP, Pará, 1972.
CAVALCANTE, P.B. Frutas Comestíveis da Amazônia. 6ª ed. Belém: CNPQ/Museu Paraense
Emilio Goeldi., 1996.
CHAVES, J.M; PECHNIK, E. O açaí, um dos alimentos básicos da Amazônia. T.F. Amapá, 1945.
COSTA, D. Presença de vitamina A no açaí. Boletim Agrícola do Pará. Belém, 1953.
SIMSON, Olga e Org. Educação Não-Formal. Cenários da Criação. Campinas: UNICAMP, 2001.
Fórum Internacional do Meio Ambiente - A conferência da Terra 345

O FORTALECIMENTO DA CADEIA PRODUTIVA DE LEITE DE CABRA NO


CONTEXTO DO DESENVOLVIMENTO DO CARIRI PARAIBANO: UM ESTUDO DE
CASO DO MUNICÍPIO DE CABACEIRAS

Sérgio Alves Oliveira


Mestrando do PRODEMA/UFPB. E-mail: sergio.ao@bol.com.br

RESUMO
Nos últimos anos a região do Cariri paraibano tem recebido importantes investimentos
financeiros oriundos de instituições governamentais e de fomento, direcionados para a cadeia
produtiva da caprinocultura leiteira, que tem sido considerada como uma atividade estratégica para
o desenvolvimento do território. No entanto, ainda é escassa a quantidade de informações
disponíveis sobre as particularidades dessa atividade produtiva. A presente pesquisa teve como
objetivo principal caracterizar e analisar a cadeia produtiva de leite de cabra, tomando como estudo
de caso o município de Cabaceiras. Após a realização de entrevistas com 28 produtores de leite de
cabra, observou-se que os mesmos têm a produção de leite como uma alternativa de geração de
renda, melhoria do padrão racial dos rebanhos e também melhoria da infra-estrutura das
propriedades pesquisadas, que na sua maioria caracterizam-se como pequenas e médias
propriedades, administradas por produtores jovens. Constatou-se também que a agroindústria tem
um importante impacto econômico e social na região recebendo leite de produtores de cinco
municípios, gerando postos de trabalho e disponibilizando serviços aos produtores de leite. As
principais dificuldades detectadas, segundo os produtores, foram falta de forragem no período de
estiagem, atraso no pagamento do leite e o alto custo de produção. Ainda como fator limitante à
manutenção do sistema agroindustrial, tem-se à relação de venda exclusiva da produção para o
programa governamental de compra de leite, o que pode colocar em risco a sustentabilidade do
negócio.
Palavras-chave: Cadeia produtiva; Caprinocultura leiteira; Cariri.

ABSTRACT
In recent years the region of the Cariri paraibano has received significant financial
investment from government institutions and promotion, directed to the productive chain of
caprinocultura milk, which has been seen as a strategic activity for the development of the territory.
However, it is still low, the amount of information available on the particularities of this productive
activity. This study aimed to characterize and analyze the main productive chain of goats' milk,
taking as a case study of the council Cabaceiras. Therefore, after carrying out research in the field
of which 28 were interviewed producers of goats' milk, it was observed that they have the
production of milk as an alternative for generating income, improving the standard of racial herds
and also improving infrastructure of the properties surveyed, most characterize themselves as small
and medium-sized properties, administered by young producers. It was also the agribusiness has an
important economic and social impact in the region receiving milk from producers of five
municipalities, generating jobs and providing services to producers of milk. The main difficulties
identified, according to the producers, were lack of forage in the period of drought, delay in
payment of milk and the high cost of production. Even as a limiting factor to system maintenance
agribusiness, has been selling exclusively to the relationship of production to the government
programme for the purchase of milk, which can endanger the sustainability of the business.
Keywords: Goat producction; Cariri; Paraíba.

INTRODUÇÃO
Nos últimos anos a região do Cariri paraibano tem recebido importantes investimentos
financeiros oriundos de instituições governamentais e de fomento, direcionados principalmente para
a cadeia produtiva da caprinocultura. Esta região concentra 48% do rebanho caprino do estado e
38% do volume de leite de cabra produzido (IBGE, 2002), sendo a criação de caprinos uma
atividade tradicional, historicamente adaptada às condições ambientais locais que faz parte da
Fórum Internacional do Meio Ambiente - A conferência da Terra 346

estratégia produtiva da grande maioria das famílias de pequenos e médios produtores rurais. Por
este motivo, esta atividade tem sido considerada uma importante estratégia para o desenvolvimento
do Cariri (SEBRAE, 2001). Para Caniello (2004), a caprinocultura é uma alternativa perfeitamente
viável para a região do Cariri sendo adequada às condições ambientais e com características de
sustentabilidade no aspecto social, pois é uma atividade própria dos produtores familiares;
econômico, visto que o fluxo de produção e comercialização dos produtos da caprinocultura gera
ganhos aos diversos agentes econômicos; ecológico, considerando-se que é uma atividade
adequada e pouco impactante no ambiente semi-árido; cultural, uma vez que faz parte da identidade
do povo da região; e espacial, pois contribui para a fixação dos produtores no meio rural através da
melhoria nas suas condições de vida.
Por outro lado, há um questionamento quanto à viabilidade da caprinocultura na região
tendo em vista a possibilidade de degradação dos recursos naturais em virtude do aumento da
população animal e sua relação com o ecossistema caatinga. Nesse sentido, Pereira (2007) afirma
que a pecuarização e a agriculturização representam um risco de degradação para a região do Cariri
paraibano, comprometendo a sustentabilidade ambiental deste território. Alerta o autor para o
crescente aumento do rebanho caprino sem que seja observada a capacidade de suporte das áreas
naturais, destacando também a ocorrência de processos de desertificação em diversos municípios do
território.
Apesar destas concepções, são significativos os exemplos de investimentos públicos feitos
na caprinocultura leiteira do Cariri paraibano, nos últimos anos. Tem-se como exemplo o
“Programa da Caprinocultura” que em 1999 promoveu a instalação de usinas de pasteurização de
leite em cinco municípios da região: Zabelê, São Sebastião do Umbuzeiro, Monteiro, Cabaceiras e
Prata (RODRIGUES & QUINTANS, 2003). Outro exemplo desse investimento foi o “Pacto do
Novo Cariri”, uma rede de gestão compartilhada resultado da articulação de diversas instâncias,
agentes e programas de desenvolvimento tendo como ação principal investir na cadeia produtiva da
caprinocultura através do Programa do Leite (GALVÃO et al, 2006).
Por outro lado, embora a caprinocultura leiteira seja considerada por órgãos públicos,
associações de produtores e governos, como uma atividade estratégica para o desenvolvimento do
território do Cariri paraibano, é escassa a quantidade de informações disponíveis sobre as
particularidades dessa atividade produtiva. Diante dos incentivos e investimentos para a produção
de leite de cabra, promovidos por órgãos governamentais e instituições públicas, se faz necessário
realizar pesquisas que sistematizem informações sobre essa cadeia produtiva, analisando os
sistemas produtivos (dificuldades e entraves tecnológicos, uso dos recursos naturais etc.); a forma
de organização e gerência da cadeia produtiva e o ambiente institucional que a envolve.
Sendo assim, o objetivo deste trabalho foi caracterizar e analisar a cadeia produtiva de leite
de cabra no Cariri paraibano, tomando como estudo de caso o município de Cabaceiras. Buscou-se
também, identificar os principais componentes da cadeia produtiva de leite de cabra; caracterizar os
diferentes produtores de leite de cabra; identificar o quadro institucional e organizacional da cadeia
produtiva; identificar e analisar a forma de organização da cadeia produtiva.

CARACTERIZAÇÃO DA ÁREA DE PESQUISA


O Cariri da Paraíba possui 31 municípios, com uma população de 190.367 habitantes
(100.337 na zona urbana; 90.030 no meio rural) e uma área territorial de 12.316,6 km2, o que
corresponde a 21,7% da área total do Estado (PTDRS, 2007).
A região do Cariri é marcada por uma crise do sistema agrário que se baseava no trinômio
gado-algodão e culturas de subsistência. A crise desse sistema começou na década de 60 com a
decadência do cultivo do algodão. Nesse quadro, a agricultura familiar também entra em crise,
passando a depender apenas da agricultura de sequeiro, o que reduziu drasticamente sua capacidade
de investimento nos sistemas produtivos. Atualmente, o território do Cariri se depara com dois
grandes desafios decorrentes da crise do sistema agrário: a falta de atividades que gerem ocupação e
renda para a população, sobretudo para o segmento jovem; e a degradação acelerada dos recursos
naturais (BAZIN & CARDIM, 2003).
Fórum Internacional do Meio Ambiente - A conferência da Terra 347

No contexto da pecuária, a microrregião do Cariri Paraibano, possui cerca de 47,0% de


todo o rebanho caprino do estado da Paraíba, que possui cerca de 657.824 cabeças. O município de
Cabaceiras está localizado na região do Cariri Oriental, abrangendo uma área total de 405 km2 e
com uma população de 4.907 habitantes. O clima do município é do tipo Bsh (Clima semi-árido
quente e seco), com distribuição irregular das chuvas em curtos períodos e estação seca prolongada,
caracterizando-se por apresentar temperaturas médias anuais em torno de 24,5 ºC e uma média
pluviométrica de 400 mm/ano. A vegetação predominante é do tipo caatinga hiperxerófila (MELO,
1980).

PROCEDIMENTO METODOLÓGICO
O levantamento das informações referentes aos segmentos da cadeia produtiva foi
realizado através de aplicação de questionários específicos para cada componente da cadeia
(produtores, agroindústria e instituições de apoio). As entrevistas com os produtores foram
realizadas por meio de visitas às unidades produtivas. A realização das entrevistas e aplicação dos
questionários ocorreu durante os meses de setembro e outubro de 2007 e a análise das informações,
no mês de novembro do mesmo ano.
No segmento da produção, foram realizadas 28 (vinte e oito) entrevistas com produtores de
leite de cabra, localizados em diferentes regiões do município; no segmento agroindustrial, foi
entrevistado o administrador da agroindústria de leite de cabra; além disso, foram entrevistados os
agentes de assessoria técnica (ADR´s); o técnico da instituição governamental de assistência técnica
(EMATER) e o representante da prefeitura municipal, ligado à secretaria de agricultura.

RESULTADOS E DISCUSSÕES
Caracterização e análise dos sistemas de produção de leite de Cabra
No aspecto idade dos produtores, contatou-se que dos 28 entrevistados, 14 produtores
(50%) tiveram idade variando entre 19 e 35 anos; 06 produtores (21,4%) tiveram idade entre 35 e
45 anos; e 08 produtores (28,6%) com idade entre 45 e 70 anos. Esses dados demonstram uma
adesão dos produtores mais jovens à produção de leite de cabra (70% dos produtores entrevistados).
Esses dados evidenciam a afirmação feita pelos produtores de que a oportunidade de aumentar a
renda foi o principal motivo para começar a criar cabras leiteiras. Por outro lado, a adesão dos
produtores mais jovens à criação de cabras leiteiras, possivelmente se deva ao fato de esta atividade
se apresentar como uma alternativa de renda, num cenário de poucas oportunidades de emprego.
Estes resultados também podem confirmar outras análises segundo as quais, no cenário atual de
desenvolvimento econômico do Nordeste, a caprinocultura leiteira se apresenta como atividade
promissora tendo em vista que, devido à agricultura instável, esta atividade tende a desempenhar
um importante papel socioeconômico por proporcionar renda direta e uma excelente fonte alimentar
para os agricultores (CORDEIRO, 1998; LIMA, 2000; RODRIGUES, 1998; SILVA, 1998).
Quanto ao tamanho das propriedades (área em hectare), constatou-se que do total de 28
produtores entrevistados, 20 deles (71,4%) possuíam propriedades com área inferior a 70 hectares.
Esta informação confirma as conclusões de outros estudos que também verificaram a
predominância da criação de cabras entre os pequenos e médios agricultores. Segundo dados do
DESER (2006), a caprinocultura está fortemente presente entre as pequenas e médias propriedades,
tendo em vista que grande parte dos estabelecimentos ocupados com a criação de caprinos no Brasil
(78% das propriedades), não ultrapassou a faixa dos 200 hectares, sendo o estrato com a maior
participação, o de 20 a 50 hectares.
Ao analisar o tema da lucratividade dos produtores, os dados das entrevistas permitiram
constatar que 50% dos produtores (14 dos 28 entrevistados) alegaram que a criação de cabras
leiteiras tem resultado no aumento da sua renda pessoal. Fato este também verificado por outros
pesquisadores, segundo os quais a caprinocultura leiteira desempenha um importante papel na
geração de renda e melhoria de vida dos agricultores da região semi-árida (QUEIROGA et all,
2003; SEBRAE, 2000).
Fórum Internacional do Meio Ambiente - A conferência da Terra 348

Com relação aos aspectos técnicos dos sistemas produtivos, no tema da caracterização dos
rebanhos leiteiros, foi constatado que 26 dos 28 produtores pesquisados (93%), tinham rebanhos
formados por raças de aptidão leiteira, tais como Saanem, Parda Alpina, Toggenburg e Murciana, e
apenas dois produtores tinham rebanhos compostos por cabras SRD (sem raça definida) , mestiças
de cabras leiteiras. Este fato reflete a opinião da maioria (57%) dos produtores entrevistados (16 dos
28 entrevistados), segundo os quais um dos benefícios da produção de leite de cabra foi o
melhoramento genético do rebanho. Este tipo de melhoria também foi percebido por outras
pesquisas que afirmaram que a instalação de agroindústrias de leite na região semi-árida da Paraíba,
representa um incentivo importante para os produtores no que concerne ao melhoramento de seus
rebanhos (SEBRAE, 2000; RODRIGUES,1998; COUTO, 2003).
Outro benefício decorrente da criação de cabras leiteiras, bastante citado pelos produtores
(11 dos 28 entrevistados, ou seja, 39%), se refere à melhoria nas instalações da propriedade com a
construção da sala de ordenha, currais e cercas. No tema da infra-estrutura, das 28 propriedades
visitadas, 26 propriedades (93%) possuíam energia elétrica, apenas 01 propriedade não tinha sala de
ordenha e 19 possuíam máquina forrageira (68%), o que pode indicar uma boa base para o incentivo
a um processo de tecnificação da produção e melhoria da produtividade. Fato que pode se diferencia
da realidade constatada por outras pesquisas realizadas no Nordeste semi-árido, onde prevalecem
sistemas produtivos direcionados para a subsistência, com baixa adoção de tecnologia e pouco
incremento na renda dos produtores (PEDROSA et all, 2003; PINHEIRO et all, 2000; SOUZA
NETO, 1987; CALDAS, 1989). Muito embora, os resultados sobre produtividade encontrados na
pesquisa confirmam algumas conclusões encontradas em outros trabalhos segundo os quais, apesar
de a caprinocultura leiteira ter passado pela introdução progressiva de raças melhoradas, os níveis
de produtividade, em termos médios, ainda são baixos (CORDEIRO, 1998).
Quanto ao tema das dificuldades relatadas pelos produtores entrevistados, a grande maioria
(15 produtores, o que representa 53% da amostra) destacou o problema da falta de forragem para os
animais na época da seca. Nessa temática, foi constatado que dos 28 produtores pesquisados, um
total de 24 produtores (85,7%) afirmou não produzir reserva de forragem, na forma de feno ou
silagem, para alimentar os rebanhos nos períodos de estiagem, enquanto apenas 04 produtores
(14,3%) afirmaram produzir feno e silagem. Certamente, é possível que este fato contribua para
aumentar os custos de produção, diminuir a produtividade e colocar os rebanhos em risco durante a
estiagem além de provocar uma sazonalidade na oferta de leite, prejudicando todo a cadeia
produtiva.
As outras dificuldades relatadas pelos produtores se referem ao atraso no pagamento do
leite vendido à agroindústria (8 produtores, dos 28 entrevistados ou 28,6%) e o alto custo de
produção, se referindo ao custo da ração concentrada utilizada na alimentação das cabras (9
produtores, citaram esta dificuldade, o que significa 32% dos entrevistados).

Análise do segmento de processamento do leite de cabra


Segundo o administrador, a agroindústria de processamento de leite de cabra do município
de cabaceiras foi construída em 1999, através de recursos do Governo Estadual e do Banco Mundial
através do Projeto Cooperar. Segundo o entrevistado, atualmente a agroindústria tem capacidade
para pasteurizar 4.000 litros de leite por dia, através do processo de pasteurização rápida. No
entanto, processa apenas 1.800 litros de leite por dia, embora sua cota de participação no Programa
do Leite, seja ainda menor (1.780 litros por dia). Este dado revela a ociosidade da capacidade
produtiva da usina bem como a limitação da política de compra do leite que não permite a
ampliação da capacidade de compra da usina, o que poderia resultar em um impacto econômico e
social muito maior do que aquele alcançado nas condições atuais.
A agroindústria de pasteurização de leite também recebe leite oriundo de produtores de
outros municípios da região como Boa Vista (14 produtores), Boqueirão (27 produtores), Caturité
(07 produtores), São Domingos do Cariri (07 produtores) e Riacho de Santo Antônio (04
produtores). Em Cabaceiras, a agroindústria recebe leite de 72 produtores, recebendo no total, a
produção de leite de 131 produtores, de seis municípios diferentes.
Fórum Internacional do Meio Ambiente - A conferência da Terra 349

Todo o leite pasteurizado pela agroindústria de Cabaceiras é destinado ao Programa do


Leite, um programa do governo Federal em parceria com o governo do estado da Paraíba, que
compra a produção de leite de produtores familiares para a distribuição a famílias carentes. Não
havendo, até a data da entrevista, a produção de sub-produtos do leite in natura (iogurte, queijo,
doce), destinados ao mercado. Embora seja este um plano de expansão futura para a usina, segundo
o administrador.
As informações citadas acima, evidenciaram uma questão importante da cadeia produtiva
de leite de cabra, no caso em estudo, que diz respeito ao direcionamento do sistema agroindustrial
para um único comprador, no caso, o programa governamental de compra do leite. Diante de tal
fato, infere-se que essa relação de dependência de um único comprador, pode comprometer a
sustentabilidade da cadeia produtiva, tendo em vista que qualquer medida política que venha a
interromper o referido programa pode colocar em risco a sustentação de toda a cadeia produtiva.
Observa-se que se faz necessário ampliar o leque de produtos derivados do leite processado pela
agroindústria, com a produção de queijos, doces, iogurte, licor, assim como promover a inserção
destes produtos no mercado local, estadual e regional, pois se acredita que a região Nordeste
apresenta um grande potencial para o aproveitamento do leite de cabra e seus derivados
(CORDEIRO, 2006).
Por fim, é necessário mencionar os benefícios econômicos e sociais da atuação da
agroindústria de leite, localizada em Cabaceiras. Sendo um dos impactos positivos, a geração direta
de seis postos de trabalho em funções relacionadas ao funcionamento da agroindústria (recepção,
pasteurização do leite e administração). Outros impactos positivos se referem a benefícios e
facilidades destinados aos produtores, por parte da usina, tais como: pequenos financiamentos para
a construção de salas de ordenha, que os produtores podem pagar com a produção de leite; a compra
de ração no atacado para repasse para os produtores que também pagam com o leite; e a
manutenção de um serviço de assistência técnica com a disponibilização de dois técnicos mantidos
pela agroindústria.

Análise do ambiente organizacional e institucional da cadeia produtiva


No município de Cabaceiras, os produtores de leite de cabra são representados por uma
associação, chamada de ASCOMCAB (Associação dos Criadores de Caprinos e Ovinos do
Município de Cabaceiras), que defende seus interesses perante os outros componentes da cadeia
produtiva como comerciantes, órgãos de estado e gestores de políticas públicas para o setor. A
associação também é responsável pela administração da agroindústria e pela intermediação entre o
programa governamental de compra do leite e os produtores. No caso em estudo, a associação de
produtores tem demonstrado boa capacidade de articulação e empreendendorismo, a exemplo da
implementação de benefícios destinados aos produtores, citados anteriormente (crédito, insumos e
assistência técnica).
Todavia, percebe-se haver ainda pouca articulação com outras associações de produtores
de leite de cabra da região, no que tange à defesa conjunta de interesses e na formulação de políticas
específicas para esta atividade produtiva nos espaços de participação, como o Conselho Municipal
de Desenvolvimento Rural. Fato este que merece atenção tendo em vista o ambiente de incentivo a
caprinocultura leiteira, seja no âmbito da sociedade civil ou na esfera governamental e na base
produtiva da atividade, representada pelos produtores. Destaca-se nesse contexto, a necessidade de
haver maior articulação entre os componentes da cadeia produtiva como requisito para garantir a
sustentabilidade do sistema agroindustrial como um todo (NOGUEIRA FILHO, 2003;
MEDEIROS, 2003).
A partir da análise dos aspectos organizacionais da cadeia produtiva de leite de cabra no
caso em estudo, apresenta-se na Figura 01 a seguir, a estrutura atual da cadeia produtiva e na Figura
02, uma proposição de estrutura organizacional ideal para a cadeia produtiva.
Fórum Internacional do Meio Ambiente - A conferência da Terra 350

CONSIDERAÇÕES FINAIS
A caracterização da cadeia produtiva de leite de cabra, a partir do estudo de caso do
município de Cabaceiras (PB), indica que entre os produtores, há uma predominância de produtores
jovens, com a prevalência de pequenas e médias propriedades. Percebeu-se também que a criação
de cabras leiteiras proporcionou uma melhoria no padrão genético dos rebanhos assim como na
infra-estrutura das propriedades analisadas, além de representar uma importante fonte de renda para
os produtores. No aspecto organizacional, a agroindústria assume um papel central tanto na
comercialização do leite como no fornecimento de produtos e serviços aos produtores associados. O
sistema agroindustrial apresenta alguns pontos de fragilidade representados principalmente pela
venda de toda a produção de leite exclusivamente para um único comprador, no caso, o programa
governamental; e a vulnerabilidade dos sistemas produtivos na época seca do ano, devido a pouca
Fórum Internacional do Meio Ambiente - A conferência da Terra 351

produção de reserva forrageira para este período e à dependência da compra de insumos externos
(ração) para a alimentação dos rebanhos.

REFERÊNCIAS BIBLIOGRÁFICAS
BAZIN, Frédéric & CARDIM, Sílvia. Plano de Desenvolvimento Sustentável do Cariri Paraibano.
Projeto de Cooperação Técnica MDA/FAO, 2003
CALDAS, E.M. Estudo da ovinocaprinocultura na região nordeste do Estado da Bahia. Arquivos da
Escola de Medicina Veterinária da UFBA, Salvador, 12:1-98. 1989.
CANIELLO, M. Quando a sustentabilidade falha: o caso do programa da caprinovinocultura no
Cariri paraibano. In: Globalização e desenvolvimento sustentável: dinâmicas sociais rurais no
Nordeste brasileiro / Maria de Nazareth Baudel Wanderley (Org.). São Paulo: Pólis, 2004.
CORDEIRO, P. R. C. O desenvolvimento econômico da caprinocultura leiteira. Revista do
Conselho Federal de Medicina Veterinária. Brasília, v. 4, n.13, p.28-30, 1998.
CORDEIRO, P. R. C. Mercado de leite de cabra e seus derivados. Revista do Conselho Federal de
Medicina Veterinária. Brasília, v. 6, n.39, p.21-24, 2006.
DESER. Monitoramento da Conjuntura de Mercado das Principais Cadeias Produtivas
Brasileiras: cadeia produtiva da caprinocultura. DESER (Estudo Exploratório, 15), 2006. 23p.
GALVÃO, P. F. M; LIMA, D. do N.; ALBUQUERQUE, A. C. de A.; ATAÍDE, C. A.
Desenvolvimento sustentável da caprinovinocultura no Cariri Paraibano. In: MOREIRA, E. (Org.)
Agricultura Familiar e Desertificação. João Pessoa: Editora Universitária / UFPB, 2006. 300p.
LIMA, L. A de A. Ovinocaprinocultura na Agricultura familiar. Informativo do Centro Nacional de
Caprinos CNPC/EMBRAPA. Sobral, n.11, jun-jul., 2000.
MELO, M. L. de. Áreas de exceção da Paraíba e dos sertões de Pernambuco. Série estudos
regionais, SUDENE, 3: 205-234, 1980.
MEDEIROS, J. X. Governança no agronegócio da carne, leite e produtos derivados da
ovinocaprinocultura na Região Nordeste do Brasil. IN: Anais do II SINCORTE. João Pessoa-PB.
2003. p. 35-41.
NOGUEIRA FILHO, A. Sistemas agroindustriais e potencialidades da ovino-caprinocultura.
Revista O BERRO. Uberaba-MG: Ed. Agropecuária Tropical, 2003,. n º 55, p. 52-59.
PEDROSA, K.Y.F.; BARRÊTO JR., R.A.; COSTA, E. S.; LEITE, A.Í.; DE PAULA, V.V.
Aspectos epidemiológicos e sanitários das criações de caprinos do RN. Revista Caatinga, Mossoró-
RN, 16(1/2):17-21, dez. 2003
PEREIRA, D. D. Quando as políticas públicas auxiliam o processo de desertificação: O caso do
Cariri paraibano. In: MOREIRA, E. (Org.) Agricultura Familiar e Desertificação. João Pessoa:
Editora Universitária / UFPB, 2006. 300p.
PINHEIRO, R. R.; GOUVEIA, A. M. G.; ALVES, F. S. F.; HADDAD, J. P. A. (2000). Aspectos
epidemiológicos da caprinocultura cearense. Arquivo Brasileiro de Medicina Veterinária e
Zootecnia, Belo Horizonte, 52 (5):534-543.
PTDRS / Plano Territorial de Desenvolvimento Rural Sustentável. FÓRUM DE
DESENVOLVIMENTO SUSTENTÁVEL DO TERRITÓRIO DO CARIRI (FDSTC). MDA/SDT,
2007.
QUEIROGA, R.C.R.E.; GUERRA, N.B.; BISCONTINI, T.M.B.; COSTA, R.G. A Caprinocultura
leiteira no contexto da segurança alimentar. Revista Conceitos, jan./jun. 2003, p. 89-94.
RODRIGUES, A. & QUINTANS, L. J. Produção e Beneficiamento do Leite de Cabra na Paraíba.
In: I Simpósio Internacional sobre o Agronegócio da Caprinocultura Leiteira (II SINCORTE -
Simpósio Internacional de Caprinos e Ovinos de Corte). Anais... João Pessoa, 2003
RODRIGUES, A. A importância dos caprinos de leite para o Nordeste. In: Simpósio O
Agronegócio de leite no Nordeste: Alternativas tecnológicas e perspectivas de mercado. Anais...
Natal, 1998, 211p.
SEBRAE. Procariri – Programa de desenvolvimento regional integrado e sustentável do Cariri
paraibano. João Pessoa, 2001.
Fórum Internacional do Meio Ambiente - A conferência da Terra 352

SEBRAE. Agronegócio da caprinovinocultura nos cariris paraibanos. João Pessoa: SEBRAE,


2000. 23 p
SILVA, R. R. Agribussiness do leite de cabra. Salvador: SEBRAE, 1998. 63p.
SOUZA NETO, J. de, et al. Características gerais da produção de caprinos leiteiros no Nordeste do
Brasil. Revista da Sociedade Brasileira de Zootecnia, v.3, n. 5 p.481-491, 1987.
Fórum Internacional do Meio Ambiente - A conferência da Terra 353

GESTÃO PARTICIPATIVA PARA A ESTAÇÃO ECOLÓGICA DE CAETÉS, PAULISTA,


PERNAMBUCO, BRASIL

Gileno Antonio Araújo Xavier


UFRPE, gileno@dmfa.ufrpe.br
Sandra Maria de Almeida Cavalcanti
CPRH, eseccaetes@cprh.pe.gov.br

RESUMO
A gestão participativa é a administração na qual cada representante pode manifestar e
negociar seus interesses de forma igualitária, com sentimento de responsabilidade e pertencimento a
um grupo, participando efetivamente na construção em conjunto das decisões a serem tomadas para
a definição de um destino coletivo. A Estação Ecológica de Caetés – ESEC-Caetés localiza-se na
Região Metropolitana do Recife, na porção Norte do Município do Paulista-PE, no Nordeste do
Brasil. Possui 157ha, correspondendo a 1,54% da área do município. Apesar da ESEC-Caetés
localizar-se em Paulista, é a população do Município de Abreu e Lima que mais se beneficia direta
e indiretamente da área. Este estudo visou avaliar as etapas preliminares à formação do Conselho
Gestor, como espaço de gestão participativa sociedade-poder público, da ESEC-Caetés. Durante a
oficina de gestão participativa em Unidades de Conservação, que ocorreu na Estação em julho de
2007, foram trabalhados temas como: experiências com gestão participativa em Unidades de
Conservação, apresentação do Plano de Manejo e do quadro de avanços, necessidades e
oportunidades e a elaboração do plano de ação para a ESEC-Caetés. As reuniões, palestras, cursos,
e outros, com a presença de atores de representatividade diversificada – moradores do entorno,
líderes comunitários, pesquisadores, etc. – são consideradas como os primeiro passos para o
desenvolvimento do processo de implantação de uma gestão compartilhada na ESEC-Caetés; O
Curso de Capacitação em Gestão Participativa de Unidades de Conservação na Mata Atlântica do
Nordeste oportunizou um elenco de informações técnicas atualizadas, interações interpessoais,
permuta de experiências e, principalmente, integrações entre UC’s, que deu início à formação de
uma Rede de Unidades de Conservação do Nordeste. A análise dos resultados da oficina indica que
o planejamento e a gestão participativa, inclusive da criação do Conselho Gestor, são instrumentos
fundamentais para a gestão da Unidade de conservação e o alcance de seus objetivos.
Palavras-chaves: Gestão Participativa, Unidade de Conservação, Estação Ecológica.

INTRODUÇÃO
O Brasil possui o título de país megadiverso, sendo um dos mais ricos em diversidade
biológica – fauna, flora e microorganismos – do planeta. Detém seis biomas de grande relevância
(Mata Atlântica, Cerrado, Amazônia, Caatinga, Pantanal e Campos Sulinos), além do maior sistema
fluvial do mundo. Uma grande parte desta rica biodiversidade encontra-se em perigo, devido à
intensa exploração e pressões geradas pelo atual modelo socioeconômico de desenvolvimento.
Mesmo com esse panorama, desde a década de 1930, unidades de conservação têm sido criadas em
todo o país, com categorias e objetivos distintos, nas três esferas de poder – federal, estadual e
municipal (SIMÕES, 2008).
No ano de 2000 foi aprovada a Lei 9985 que instituiu o Sistema Nacional de Unidades de
Conservação, conhecido como SNUC. Esta Lei define em seu Art. 2°, Unidade de Conservação,
como sendo o “espaço territorial e seus recursos ambientais, incluindo as águas jurisdicionais, com
características naturais relevantes, legalmente instituído pelo Poder Público, com objetivos de
conservação e limites definidos, sob regime especial de administração, ao qual se aplicam garantias
adequadas de proteção” (BRASIL, 2000).
A conservação da biodiversidade in situ, por meio da criação e implementação de
Unidades de Conservação (UC), é uma ferramenta indispensável para que o país consiga cumprir os
compromissos constitucionais internos e os diversos acordos internacionais firmados. Além do
mais, é primordial para a preservação dos bens naturais, minimização dos problemas oriundos da
'crise ambiental', e promoção da qualidade de vida da sociedade (SIMÕES, 2008).
Fórum Internacional do Meio Ambiente - A conferência da Terra 354

Silva et al. (2008) consideraram que a criação de UC’s se faz importante, pois ao se definir
uma área a ser protegida, são observadas suas características naturais e estabelecidos os principais
objetivos de conservação e grau de restrição à intervenção antrópica. Estratégia importante para
conservação e bem-estar das espécies silvestres.
A gestão participativa é a administração na qual cada representante pode manifestar e
negociar seus interesses de forma igualitária, com sentimento de responsabilidade e pertencimento a
um grupo, participando efetivamente na construção em conjunto das decisões a serem tomadas para
a definição de um destino coletivo (MUSSI, 2007).
Para a implementação do Sistema Nacional de Unidades de Conservação da Natureza
(SNUC), o desafio central é efetivar o controle e a participação da sociedade civil no processo de
planejamento e apoio à gestão das unidades de conservação (IBASE, 2006).
Para Loureiro et al. (2005), a concepção, os critérios e as normas que instituem as UC’s,
quando as definem como “espaço territorial e seus recursos ambientais [...] com características
naturais relevantes”, negam a interação entre grupos sociais no espaço protegido. Por isso, as
comunidades localizadas no entorno das UC, ou mesmo no seu interior, foram historicamente
excluídas de sua gestão e ainda são direta ou indiretamente atingidas pelas restrições de uso que são
impostas (situação mais evidente ainda naquelas de proteção integral).
A participação é a promoção da cidadania, a realização do sujeito histórico, o instrumento
por excelência para a construção do sentido de responsabilidade e de pertencimento a um grupo,
classe, comunidade e local (BAUMAN, 2000). Em um certo sentido rousseauniano, a participação é
o cerne do processo educativo, pois desenvolve a capacidade do indivíduo ser “senhor de si mesmo”
(LOUREIRO et al., 2005).
A Estação Ecológica de Caetés tem um importante papel a desempenhar na formação e
multiplicação de uma consciência ecológica de toda a comunidade da Região Metropolitana do
Recife, pois ainda hoje se constitui na única unidade de conservação efetivamente implantada,
voltada aos objetivos conservacionistas que fundamentaram sua criação, no final da década de 80,
no século passado.
Dentro deste contexto, o presente estudo tem como objetivo avaliar as etapas preliminares
à formação do Conselho Gestor da Estação Ecológica de Caetés, como espaço de gestão
participativa sociedade-poder público.

MATERIAL E MÉTODOS
Caracterização da Estação
A Estação Ecológica de Caetés, inaugurada em 18 de fevereiro de 1991 e administrada
pela Agência Estadual de Meio Ambiente e Recursos Hídricos – CPRH, localiza-se na Região
Metropolitana do Recife, na porção Norte do Município do Paulista, Estado de Pernambuco, na
região Nordeste do Brasil. Situa-se entre 7º55’15” e 7º56’30” de latitude Sul e 34º55’15” e
34º56’30” de longitude Oeste de Greenwich. Ocupa uma área de 157ha, correspondendo a 1,54% da
área do município. O acesso se dá pela BR-101/Norte, alcançando a PE-18, no Distrito Industrial do
Paulista, distando cerca de 30 km do centro do Recife.

Caracterização da População Local


Apesar da Estação Ecológica de Caetés localizar-se no Município do Paulista, é a
população do Município de Abreu e Lima que mais se beneficia direta e indiretamente da área.
Conforme o senso demográfico do IBGE de 1991, o Município de Abreu e Lima apresenta uma
população de 77.035 habitantes, com uma densidade demográfica de 558,2 hab/km2. Ainda de
acordo com o IBGE, há uma projeção do crescimento populacional até o ano de 2010 para a área.
Esta estimativa, quando colocada ao lado da realidade sócio-econômica atual da população e das
condições físicas desse Município, indicam um crescimento acelerado, que levará a uma ocupação
desordenada do espaço, ocasionando forte pressão antrópica no entorno da Estação. Os fatores mais
preocupantes estão relacionados à produção de lixo, ao esgotamento sanitário e à utilização
indevida dos recursos naturais.
Fórum Internacional do Meio Ambiente - A conferência da Terra 355

A administração da ESEC-Caetés mantém, a muitos anos, uma atividade de caráter


participativo, que são as reuniões mensais, palestras, exposições, oficinas, campanhas com a
presença da comunidade do entorno e instituições envolvidas com suas atividades. Tal
procedimento tem relação direta com o Sub-programa de Divulgação do seu Plano de Manejo, o
qual visa esclarecer ao público sobre os objetivos, os programas, as atividades e os benefícios da
Estação, além de divulgar o conhecimento sobre a utilização sustentada dos recursos naturais,
promovendo a compreensão do meio ambiente. Uma das atividades previstas por este sub-programa
é a necessidade de integração com a população do entorno, a fim de melhorar a imagem da Unidade
e divulgar as atividades que nela são desenvolvidas.

Da Oficina de Gestão Participativa em Unidades de Conservação


A oficina fez parte de uma das atividades propostas pelo Projeto Educação Ambiental e
Mobilização Social como Instrumento de Gestão Ambiental da Estação Ecológica de Caetés,
executada pela Sociedade Nordestina de Ecologia – SNE, em parceira com a Agência Estadual de
Meio Ambiente e Recursos Hídricos – CPRH e financiado pelo Fundo Estadual de Meio Ambiente
– FEMA da Secretaria de Ciência Tecnologia e Meio Ambiente de Pernambuco – SECTMA.
Teve como objetivo estimular o envolvimento e a participação de setores representativos
da sociedade em ações que possam contribuir com a gestão compartilhada da UC. Os temas e
conteúdos trabalhados foram sobre Experiências com Gestão Participativa em Unidades de
Conservação, o Plano de Manejo da ESEC-Caetés, Apresentação do Quadro de Avanços,
Necessidades e Oportunidades (Tabela 1) e a Elaboração do Plano de Ação.

Tabela 1 - Alguns exemplos dos itens encontrados no Quadro de Avanços, Necessidades e


Oportunidades apresentado durante a Oficina de Gestão Participativa em Unidades de Conservação.
AVANÇOS NECESSIDADES OPORTUNIDADES
Aquisição de alguns Equipar a ESEC para atuar de Recursos de compensação
equipamentos para maneira mais eficiente na ambiental e parcerias.
administração e fiscalização fiscalização e administração.
Realização de parcerias com Ampliação e manutenção de Recursos de compensação
ONG’s e instituições de parcerias com instituições de ambiental e parcerias para
pesquisa. pesquisas e ONGs para implantação do Plano de
viabilizar as atividades Manejo. Elaboração de projeto
previstas no Plano de Manejo para captação de recursos do
FEMA e outras fontes
Articulação com as prefeituras Fortalecimento das articulações Sensibilização das prefeituras.
e parcerias com as Prefeituras Potencialização dos recursos do
locais. ICMS socioambiental
Reforma do prédio de eventos Ampliação das obras de Recursos de compensação
reforma e adequação dos ambiental.
demais prédios da UC.
Ambientação das salas do
Centro Interativo Ecólogo
Vasconcelos Sobrinho.
Capacitação e sensibilização da Estruturação da administração e Motivação da comunidade e
comunidade. Reuniões mensais, gestão participativa da ESEC. técnicos.
realização de oficinas, cursos e
palestras.
Divulgação da ESEC através de Tornar a ESEC conhecida bem Rádio comunitária e jornais
mídias locais como os serviços oferecidos. locais. Site da CPRH e da SNE.

A oficina ocorreu no auditório da ESEC-Caetés, no ano de 2007, tendo registrado o


número total de 75 instituições, com a participação de diversas entidades da sociedade civil e de
Fórum Internacional do Meio Ambiente - A conferência da Terra 356

instituições públicas e privadas, tais como: Associação de Moradores de Caetés I, da SECTMA, das
UCs APA de Guadalupe, Reserva Ecológica de Gurjaú e Estação Ecológica de Tapacurá,
Prefeituras do Paulista, de Abreu e Lima e Jaboatão dos Guararapes, Associação das Indústrias do
Paulista – ASSEDIPE, Secretaria de Educação do Município do Paulista, da CPRH, Companhia
Independente de Policiamento do Meio Ambiente – CIPOMA e Universidade Federal e Federal
Rural de Pernambuco – UFPE e UFRPE.
Durante a oficina foi proposta a construção da visão do futuro da ESEC, segundo os
sentimentos e intenções previstos pelos participantes. A atividade foi desenvolvida de forma
participativa e foi baseada em duas questões: O que queremos no futuro para a ESEC? Onde
queremos chegar?
Outra atividade realizada foi a elaboração do Plano de Ação da ESEC-Caetés. Foram
utilizados técnicas e instrumentos de enfoques participativos. Para cada ação decidida e considerada
pelos participantes como importante para acontecer, foram definidas as necessidades, os prazos e os
possíveis parceiros.
Em 2008, alguns gestores da Estação participaram do Curso de Capacitação em Gestão
Participativa de Unidades de Conservação na Mata Atlântica do Nordeste, realizado pela
Associação para a Proteção da Mata Atlântica do Nordeste – AMANE, cujo objetivo foi colaborar
com a ampliação das capacidades dos gestores de UC’s, contribuir para a gestão participativa das
unidades e influenciar políticas públicas para a conservação e o uso sustentável do bioma Mata
Atlântica na região.
Os temas abordados foram: Conservação da Biodiversidade, Desenvolvimento Sustentável,
Ética e Educação Ambiental, Direito Ambiental, Planejamento e Gestão Participativa, Espécies
Invasoras, Gestão da Informação e Ecoturismo. O público alvo do curso foi composto por atores
envolvidos direta ou indiretamente com a gestão de Unidades de Conservação da Paraíba e de
Pernambuco: gerentes de unidades, membros dos seus conselhos gestores, representantes de
entidades de ensino e pesquisa, de órgãos do governo e da sociedade civil organizada, líderes
comunitários, empresários locais, moradores do entorno de unidades e populações tradicionais.

RESULTADOS E DISCUSÃO
Da Oficina
Quanto à visão do futuro da ESEC, as idéias/desejos foram estruturadas desta forma: “A
Unidade de Conservação, ESEC Caetés, é reconhecida em Pernambuco como centro de referência
em educação ambiental e pesquisa científica no bioma Mata Atlântica, envolvendo a comunidade
local, comunidade acadêmica, setor empresarial, entes federados e movimentos de caráter
socioambiental”.
Todos os itens incluídos no Plano de Ação (Tabela 2) foram identificados a partir da leitura
e análise do Quadro de Avanços, Necessidades e Oportunidades, tornando-se um instrumento de
referência para a execução das atividades nos próximos dois anos.
A participação é um processo social que gera a interação entre diferentes atores sociais na
definição do espaço comum e do destino coletivo (LOUREIRO, 2005). Observou-se que o
planejamento e gestão participativa já é rotina na ESEC, pois todos os oficineiros puderam
manifestar ativamente, opinando, criando comprometimentos e expondo suas aspirações de forma
comunitária.
A participação da ESEC-Caetés no curso de capacitação em gestão teve determinado
destaque, não só pelo número de participantes, como também pela representatividade diversificada
(um representante da administração, um dos pesquisadores, um dos policiais ambiental, um dos
líderes comunitário e um representante dos escoteiros do entorno) e por ter sido escolhida com
palco para realização da visita de campo.
Fórum Internacional do Meio Ambiente - A conferência da Terra 357

Tabela 2 - Alguns exemplos dos itens encontrados no Plano de Ação elaborado durante a Oficina de
Gestão participativa em Unidades de Conservação
QDO/ATÉ
AÇÃO NECESSIDADES PARCEIROS
QUANDO
Definição de quadro Definir as atividades Setembro 2007
funcional para atender básicas da ESEC
as necessidades da Definir perfil da
ESEC equipe
Elaboração de um Identificar as áreas Outubro 2007 Corpo de Bombeiros,
Plano de Manutenção vulneráveis / riscos e Prefeituras, CELPE,
Preventiva das periodicidade de Empresas Privadas e
Instalações vistorias e Universidade (Escolas
intervenções. de Engenharia).
Elaboração de um Definir as atividades Dezembro 2007
Plano de Aquisição de básicas; Dimensionar
Equipamentos / a necessidade de
Material equipamentos /
material
Criação e implantação Articulação para Março de 2008
do Conselho Gestor da discutir a implantação
ESEC do Conselho
Revisão e atualização Realização de reuniões Junho de 2009
do Zoneamento e do e oficinas de trabalho.
Plano de Manejo

Durante o curso, com relação ao intercâmbio entre UC’s, observou-se uma forte integração
coletiva, que resultou na elaboração de um documento, assinado por todos, que pretende iniciar um
longo processo de formação de uma rede, que venha confluir as UC’s da Região Nordeste. Com
isso, foi possível por em prática uma das atividades do Sub-programa de Administração e
Manutenção, que é a possibilidade de intercâmbio técnico-científico com outras Unidades.
A capacitação dos conselheiros e das conselheiras (atuais e potenciais) e da equipe técnica
da UC precisa ser garantida simultaneamente ao processo de estruturação ou reestruturação do
conselho e após sua consolidação, envolvendo temas internos e externos ao seu funcionamento
(LOUREIRO, 2007).

CONCLUSÕES
As reuniões, palestras, cursos, e outros, com a presença de atores de representatividade
diversificada – moradores do entorno, líderes comunitários, pesquisadores, etc. – são consideradas
como os primeiro passos para o desenvolvimento do processo de implantação de uma gestão
compartilhada na ESEC-Caetés;
Na Oficina de Gestão Participativa em Unidades de Conservação, o exercício da
participação sociedade-poder público na gerência da UC foi registrada no Plano de Ação elaborado
coletivamente para a ESEC-Caetés. Plano este que se encontra em vigor até o momento;
O Curso de Capacitação em Gestão Participativa de Unidades de Conservação na Mata
Atlântica do Nordeste oportunizou um elenco de informações técnicas atualizadas, interações
interpessoais, permuta de experiências e, principalmente, integrações entre UC’s, que deu início à
formação de uma Rede de Unidades de Conservação do Nordeste.
A análise dos resultados da oficina indica que o planejamento e a gestão participativa,
inclusive da criação do Conselho Gestor, são instrumentos fundamentais para a gestão da Unidade
de conservação e o alcance de seus objetivos.
Fórum Internacional do Meio Ambiente - A conferência da Terra 358

REFERÊNCIAS BIBLIOGRÁFICAS
BAUMAN, Z. Em busca da política. Rio de Janeiro: Zahar, 2000. 216p.
BRASIL. Sistema Nacional de Unidades de Conservação da Natureza: Lei no. 9.985 de 18 de julho
de 2000. Brasília: MMA/SBF, 2000.
LOUREIRO, C. F. B. AZAZIEL, M.; FRANCA, N. Educação ambiental e conselho em unidades
de conservação: aspectos teóricos e metodológicos. Rio de Janeiro: IBASE, 2007. 88 p.
LOUREIRO, C. F. B.; AZAZIEL, M.; FRANCA, N. Educação ambiental e gestão participativa em
unidades de conservação. 2. ed. Rio de Janeiro: IBASE, 2005. 44p.
LOUREIRO, C. F. B. Gestão participativa em unidades de conservação. Rio de Janeiro: IBASE,
2006. 30p.
MUSSI, S. M. Gestão participativa em Unidades de Conservação – guia do conselheiro. Rio de
Janeiro: IBAMA/NEA, 2007. 13p.
SILVA, J. C. R.; SIQUEIRA, D. B.; MARVULO, M. F. V. Unidades de Conservação. In:
CONGRESSO BRASILEIRO DE BIOÉTICA E BEM-ESTAR ANIMAL, 1., 2008, Recife. Anais...
Recife: Conselho Federal de Medicina Veterinária, 2008.
SIMÕES, L. L. Unidades de conservação: conservando a vida, os bens e os serviços ambientais.
São Paulo: Acqua, 2008. 23p.
Fórum Internacional do Meio Ambiente - A conferência da Terra 359

EXPERIENCIA DEL PROGRAMA DE FORMACIÓN DE GRADO GESTIÓN


AMBIENTAL DE LA UNIVERSIDAD BOLIVARIANA DE VENEZUELA SEDE ZULIA
EN LA CONSTRUCCIÓN DE SABERES PARA LA GESTIÓN AMBIENTAL
COMUNITARIA EN EL ESTADO ZULIA, VENEZUELA.

Lenin Parra
lparra69@yahoo.es
Polly Urribarri
Deinys León
Universidad Bolivariana de Venezuela, Sede Zulia, Sector La Retirada.

El PFG Gestión Ambiental de la Universidad Bolivariana de Venezuela nace como una


institución comprometida con la formación de ciudadanos profesionales para la transformación
integral de la sociedad, especialmente en la solución colectiva de los problemas ambientales de las
comunidades, el país, de la región y del planeta. La sede Zulia se ubica en uno de los estados mas
biodiversos y con mayor presión antrópica, la UBV se ha insertado dentro de 23 comunidades
urbanas y rurales en oportunidad de desarrollar Diagnósticos Socio – Ambientales comunitarios,
utilizando la metodología de la investigación acción participativa. A partir de estos diagnósticos se
desarrollaron actividades de educación ambiental y evaluaciones ambientales. En la actualidad se
trabaja en el desarrollo de proyectos comunitarios para la solución de los principales problemas de
las mismas y en la cooperación para la organización comunitaria a través de los Consejos
Comunales. Como resultado se tiene un total 262 egresados Técnicos Superiores Universitarios en
Evaluación Ambiental, fueron presentadas 132 Tesinas de Investigación sobre realidades
ambientales, en temas tales como desechos sólidos, aguas residuales, educación ambiental,
ecoturismo, salud, deforestación, entre otros. A través de la Municipalización de la Educación
Superior se tiene presencia en 61 Aldeas Universitarias en los Estados Zulia, Mérida y Trujillo. En
conclusión tenemos un número significativos de ciudadanos en proceso de formación, y constituyen
un puente de acción entre las instituciones públicas y sus comunidades, además de fortalecer las
capacidades de organización interna e introducir la variable ambiental dentro las discusiones
cotidianas de estas comunidades.
Palabras Claves: Gestión Ambiental, Zulia, Educación Ambiental, Diagnósticos Socio –
ambientales.

INTRODUCCIÓN:
La universidad Bolivariana de Venezuela fue creada en junio de 2003 como un proyecto
educativo y social vinculado a las demandas del desarrollo integral de la Nación que plantea entre
sus condiciones fundamentales la elevación del nivel cultural y educativo del pueblo venezolano, la
creación permanente de una cultura democrática y la formación integral de profesionales con
profundo sentido de país y al servicio de los intereses nacionales.
La UBV nace con la finalidad de brindar oportunidades a los ciudadanos y ciudadanas
históricamente excluidos de los sistemas de educación públicos y privados de la república. En el
primer caso debido a que la educación pública universitaria posee fuertes mecanismos de admisión,
que no representa el ingreso selectivo de jóvenes según sus aptitudes académicas ni promedio de
notas, se ha demostrado que hay una fuerte exclusión de estudiantes de bajos recursos económicos,
egresados de instituciones públicas de educación media. Por otra parte las universidades privadas
poseen matriculación y mensualidades con elevados costos, lo cual disminuye aun más las
posibilidades de ingreso a la gran mayoría de los nuevos bachilleres.
Esta situación a provocado la acumulación histórica, año tras año, de una población de
bachilleres, que por no tener oportunidades de estudiar, se dedica a otras actividades, en un país con
amplias posibilidades de desarrollo. Por tanto se hace necesario la formación de ciudadanos
capacitados académica, moral y éticamente para fortalecer esas capacidades de desarrollo y lograr
un mejoramiento sustancial en la calidad de vida de nuestras comunidades.
Fórum Internacional do Meio Ambiente - A conferência da Terra 360

El gran numero de problemas generados por los modelos de desarrollo humanos a través de
la historia, a nivel global, regional y local, en el contexto descrito anteriormente, favorecen el
desarrollo de áreas de formación académicas, para la formación profesionales de alto nivel de
compromiso, y una concreción de conocimientos técnicos y sociales, que permita enfrentar a
diversos niveles estos problemas, es por ello que se hace necesario abordarlos las situaciones
ambientales a nivel educativo, técnico y ético.
La visión integral de la sociedad y la naturaleza, como subsistemas de un gran sistema
holístico, que están interrelacionados directamente y en el cual históricamente, la cultura occidental
dominante se ha desarrollado bajo la premisa de dominio total de la naturaleza, considerándola más
como un objeto, disponible para ser utilizada a total beneficio de las élites político – económicas de
las culturas dominantes, con excepción de una buena parte de los pueblos indígenas. Bajo esta
premisa, estos grupos han confiado excesivamente en el desarrollo de la ciencia y la tecnología,
como entes salvadores de la humanidad frente a los desastres derivados del desequilibrio ambiental
global, tales como el calentamiento global, escasez de alimentos, escasez de agua potable, pérdida
de la biodiversidad, entre otros.
En este contexto político y cultural, surge la necesidad de un programa académico
universitario que forme profesionales capaces de enfrentar los retos de solucionar los problemas
ambientales a nivel local, participar en la conversión hacia la sustentabilidad de los procesos
productivos de nuestras empresas, sean capaces de realizar estudios y evaluaciones de impacto
ambiental, desarrollar actividades de educación ambiental a nivel formal y no formal, promover
proyectos de recuperación de ecosistemas degradados, recuperación de poblaciones de especies
amenazadas y de la biodiversidad en general. Profesionales preparados, con un profundo respeto a
los conocimientos ancestrales y tradicionales de nuestros pobladores, campesinos, indígenas,
ancianos, capaz de construir conocimientos a partir de ese diálogo de saberes. Trabajando desde y
para las comunidades, resolviendo problemas locales de impacto global.
El Plan de estudios concentra unidades curriculares de formación ética, técnica, política
que intentan formar a los estudiantes desde una visión transdiciplinaria de la realidad. Esta
transdiciplinareidad está apoyada por las diferentes disciplinas y experiencias de vida de los
docentes. La sede Zulia tiene 35 docentes, egresados de licenciatura en biología, licenciatura en
educación, ingenieros, veterinarios, abogado y economistas, con más del 70% cursando estudios de
Maestría en áreas como la Ecología Aplicada, Intervención Social, Ingeniería Ambiental, Gerencia
en Ciencia y Tecnología, Filosofía, entre otras áreas. Mientras que el 11,4% de los docentes se
encuentra realizando estudios de doctorado. Las actividades académicas del PFG se iniciaron con
una primera cohorte que inició el 26 de febrero del 2004. En ese momento se contaba con un
número de 547 estudiantes. De esta primera cohorte en la actualidad quedan 366 estudiantes. La
segunda cohorte ingresó el 27 de Septiembre del 2004 con total de estudiantes de 89, de los cuales
permanecen 52. La tercera cohorte ingresó el 22 de abril del 2005 con un número de 42 estudiantes.
En nuestro caso, existe una unión entre los estudiantes, el o la docente y la comunidad,
junto a su realidad socio – ambiental. Esto mediante la perspectiva de la investigación – acción –
participativa, donde la comunidad se convierte en investigadora de su propia realidad, mientras que
los estudiantes y docentes se involucran dentro del “objeto” de estudio. Como se señalo
anteriormente, los problemas socio – ambientales se enfocan desde una perspectiva holística,
reconociendo la relación entre impactos seres humanos – ambiente – seres humanos, es decir, que
como señala el Jefe indígena Seattle, “lo que le suceda a la tierra, le sucederá a los hijos de la
tierra”.
Fórum Internacional do Meio Ambiente - A conferência da Terra 361

Cuadro 1. Proyecto, con sus objetivos básicos y las Unidades curriculares que concurren en la UC.
Proyecto.
Proyecto / Año Enunciado rector Unidades Curriculares
Globalización, Comunicación y cultura
Ética
Proyecto I
Análisis del Dato Estadístico I
Fase I
Bases Ecológicas de sistemas ambientales de Venezuela
Diagnostico de situaciones
Bases del Conocimiento
socio – ambientales en las
comunidades abordadas Biodiversidad y sociodiversidad

Proyecto I Análisis del Dato Estadístico II

Fase II Técnicas de Análisis Espacial

Pensamiento político latinoamericano y venezolano

Proyecto / Año Enunciado rector Unidades Curriculares


Economía ecológica
Proyecto II
Legislación y políticas públicas
Fase I
Educación Ambiental, Evaluación Ciclos biogeoquímicos
Ambiental Evaluación de sistemas naturales
Proyecto II
Ambiente, desarrollo y salud
Fase II
Calidad ambiental I
Grado como Técnico Superior Universitario en Evaluación Ambiental
Calidad Ambiental II
Proyecto III Rehabilitación de ecosistemas Y Aspectos ambientales de la industria
Fase I desarrollo sustentable Ordenamiento territorial
(Desarrollo de proyectos) Electiva (bioindicadores)
Proyecto III Formas de racionalidad y producción de conocimientos
Fase II Electiva 2
Derecho Ambiental y marco legal en el manejo integral de
recursos naturales
Proyecto IV
Fase I Desarrollo e integración de América Latina
Gestión Ambiental, participación
comunitaria y calidad de vida Arte y Ecología
(Desarrollo y consolidación de Redes sociales, planificación y gestión
proyectos)
Proyecto IV Escenarios energéticos

Fase II Ética de la sustentabilidad

Electiva

Grado como Licenciado en Gestión Ambiental

OBJETIVOS, MÉTODOS Y ALCANCES DE PROYECTO I Y II


Proyecto I
En esta etapa, se aborda criterios teóricos y procedimientos metodológicos básicos para la
identificación participativa e integral de problemas socioambientales a partir de una pedagogía
crítica y una estrategia flexible de investigación, con ajustes periódicos. Contempla la descripción,
el análisis crítico y la formulación sistémica de los componentes básicos del sistema socioambiental
que incluyen a una comunidad y un área ecogeográfica, y culmina con la inducción de sinergias con
actores claves para la definición de líneas de acción que puedan orientar la resolución de problemas
identificados.
En primer lugar, en asamblea con los estudiantes designan las posibles comunidades donde
se desarrollaran la UC Proyecto. Las condiciones ideales para esta escogencia se basan en que
Fórum Internacional do Meio Ambiente - A conferência da Terra 362

buena parte de los estudiantes vivan en la comunidad o cerca de esta y que la comunidad posea
características ambientales atractivas, donde se puedan desarrollar con mayor amplitud los
conocimientos técnicos adquiridos.
Posteriormente se hace contacto inicial con los líderes comunitarios, tratando de desarrollar
lazos fuertes de amistad a largo plazo con estas personas. Siempre se recalca, que la presencia de
los estudiantes en una comunidad, es para el análisis y aporte de posibles soluciones a los
problemas presentes, se trata de no levantar falsas esperanzas, pues no se quiere levantar
expectativas que no puedan ser cumplidas posteriormente.

Cuadro 2. Comunidades abordadas en la 1ra cohorte


Comunidad seleccionada Municipio/ Parroquia Tipo de comunidad
Puerto Caballo, Salina Rica Maracaibo / Idelfonso Vásquez Urbana / pescadores
B/ Mi Chinita (El Marite) Maracaibo / Venancio Pulgar Urbana
Parcelamiento Lomas de
Maracaibo / Raul Leoni Urbana
Maracaibo I
Bello Monte 2 Maracaibo / Manuel Dagnino Urbana
Maracaibo./ Cecilio Acosta, Cristo de
Ricardo A. Urbana
Aranza, Bolivar
El Samide Maracaibo / Antonio Borjas Romero Urbana
San Isidro Maracaibo / San Isidro Urbana / agrícola
Urbana / Palafítica,
Santa Rosa de Agua Maracaibo/ Coquivacoa
pescadores
Maracaibo / Francisco Eugenio
14 de Julio Urbana
Bustamante
Maracaibo / Francisco Eugenio
Villa Eclipse Urbana
Bustamante
Rural indígena Agrícola,
El Orchila (Cachirí) Mara /Mons. Marcos Sergio Godoy
Wayuu en zona montañosa
Urbana / Palafítica,
Nazareth Mara /San Rafael
pescadores
El Arrollo Páez / Elias Sánchez Rúbio Rural, pescadores
El Marite La Concepción/ Jesús Enrique Lossada Rural, agricultores
Rural indígena agrícola,
Toromo Machiques / Libertad
Yuckpa en zona montañosa
El Paraíso San Francisco/El Bajo Urbana
Manzanillo. Zona de riesgo
San Francisco/Francisco Ochoa Urbana
II
Total 17 comunidades

Cuadro 3. Comunidades abordadas por la 2da cohorte


Comunidades Municipio/Parroquias Tipo de comunidad
Barrio Bicentenario Maracaibo/Venancio Pulgar Urbana
Barrio Rafael Hernández Maracaibo/Francisco Eugenio Bustamante Urbana
Ricardo Aguirre Maracaibo/Cristo de Aranza Urbana
Teotiste de Gallegos Maracaibo/Coquivacoa Urbana
Campo Palmarejo Municipio Mara/Ricaurter Urbana
Dios es amor Mcbo. / San Isidro Urbana / Agrícola
Juan de Dios Mcbo. / San Isidro Urbana / Agrícola

Continuando, se desarrolla un instrumento (encuesta) desarrollado para censar la población


de la comunidad (esto depende también del tamaño poblacional de la comunidad y del número de
Fórum Internacional do Meio Ambiente - A conferência da Terra 363

estudiantes que tenga el grupo), y recoger datos de interés social, económico, de organización
comunitaria y ambiental, para tener un panorama amplio de las realidades presentes. Finalmente,
una vez acumulada un número considerable de encuestas, los estudiantes, aplicando los
conocimientos adquiridos en Análisis del Dato Estadístico I y II, utilizando el Programa
computarizado SPSS 12.0, se encargan del análisis e interpretación de los resultados. Estos
resultados fueron llevados hasta las comunidades, y presentados a los habitantes en asambleas
comunitarias. En muchos casos se fortalecieron estos resultados mediante el desarrollo de un
análisis de fortalezas, oportunidades, debilidades y amenazas (FODA), y la jerarquización de los
problemas por orden de importancia según la valoración de la misma comunidad.
Nuestra experiencia de sede concluyó con la presentación pública de los resultados de
todos los grupos de proyecto, que en nuestro caso inicial fue 23 comunidades abordadas por igual
número de grupos, en una feria expositiva que se desarrollo en nuestra sede y a la cual se invitaron
habitantes de la comunidad, instituciones públicas, entre otros.
Proyecto II:
El componente Proyecto II, tiene como propósito el diseño, planificación, implementación
y cogestión de proyectos participativos para el abordaje de situaciones socioambientales
diagnosticadas con la participación de las comunidades, tomando en cuenta todos los procesos que
determinan la dinámica de la vida cotidiana, las potencialidades, amenazas, problemáticas,
necesidades y oportunidades, así como, el reconocimiento a las diferencias y experiencias
particulares y colectivas dentro de un espacio que propicie articulaciones dialécticas en pro de
generar acciones concretas de transformación social a favor de las mayorías contribuyendo en su
desarrollo endógeno.
En este caso se desarrollan actividades de educación ambiental, cuya planificación se
centra en los problemas socio – ambientales identificados en Proyecto I. Se toman como sitios
pilotos, las escuelas ubicadas dentro de la comunidad, o en su defecto la(s) más cercana(s), que en
nuestra primera experiencia se visitaron periódicamente 39 escuelas dentro de los Municipios
Maracaibo, Mara, San Francisco y Jesús Enrique Lossada.
La planificación de educación ambiental incluyó en muchos casos programas de charlas
sobre uno o varios temas, carteleras, murales, obras de teatros con títeres, juegos ecológicos. Los
temas de las charlas se distribuyeron entre la contaminación del agua, el Lago de Maracaibo, La
Laguna de las Peonías, Los desechos sólidos, la capa de ozono, el efecto invernadero, educación
para la salud, la Lemna, entre otros
En la segunda fase de Proyecto II el esfuerzo se dirigió hacia la elaboración de
evaluaciones ambientales, en base a los problemas detectados, que en su mayor grado es desechos
sólidos, aguas residuales, deforestación, entre otros. En esta fase, los estudiantes tienen la salida
intermedia que les permite egresar como Técnico Superior Universitario (TSU) en Evaluación
Ambiental. Pero previo a esto, ellos deben desarrollar una pequeña experiencia de investigación,
sobre algún tema socio ambiental en la comunidad, denominada Tesina y en la cual deben conjugar
la búsqueda de bibliografía especializada (antecedentes, bases teóricas), y la generación de
conocimientos a partir de una intervención en la comunidad, específicamente sobre el tema sobre el
cual desea obtener conocimientos
Para tal fin, los estudiantes se reunieron en parejas o tríos y con la asesoría del docente y
sus inquietudes particulares, escogieron el tema. De todos los grupos se desarrollaron 127 tesinas de
investigación. De estas 127 investigaciones sobre temas ambientales desarrollados a partir de la
realidad de la comunidad se observa lo siguiente:
Fórum Internacional do Meio Ambiente - A conferência da Terra 364

Gráfico 1. Áreas de estudio desarrolladas en las Tesinas de Gestión Ambiental, UBV - Zulia.
1era Cohorte de TSU
Enfermedades Fauna
Respiratorias 4%
6%
Prácticas higiénicas Desechos sólidos
6% 26%

Enfermedades Dérmicas
6%
Deforestación
6%

Cañadas
7%
Ed. Ambiental
Aguas residuales 15%
10%
Enf Gastrointestinales
14%

Otros temas escogidos fueron:

Cuadro 4. Temas escogidos para la realización de las tesinas de investigación


Temas Nº de tesinas
Estudios de impacto ambiental 3
Estudios de diversidad: Flora 3
Sustancias químicas, pesticidas 3
Descripción de actividades económicas 2
Infraestructuras educativas, hogares 2
Lombricultura 2
Manglares 2
Reciclaje 2
Efectos de la superfloración de la Lemna sp. Sobre la
2
Salud
Turismo 2
Agricultura 1
Áreas verdes 1
Deslizamiento de terreno 1
Desplazamientos de comunidades por explotación del
1
carbón
Propuesta de Ecoturismo 1
Temas Nº de tesinas
Historia Ambiental 1
Lagunas 1
Legislación Ambiental 1
Pesquerías 1
Planta de Tratamiento 1
Efectos del polvillo del carbón 1
Pago de servicios ambientales 1
Reforestación 1
Salud preventiva 1
Fórum Internacional do Meio Ambiente - A conferência da Terra 365

Un alto porcentaje de los temas de investigación son netamente descriptivos, y muchos se


basan en opiniones de la comunidad, por tanto, estos constituyen una experiencia básica de
investigación dentro de nuestro PFG.
Proyecto III: Este proyecto capacitará a los estudiantes para la caracterización, análisis y
rehabilitación de situaciones ambientales de ecosistemas intervenidos. Ello supone: el manejo del
enfoque de teoría de sistemas, compartimientos y procesos; el análisis del papel de las interacciones
bióticas en los procesos de rehabilitación; el dominio y aplicación de medidas de manejo y
rehabilitación de ecosistemas intervenidos; evolución secuencial: descontaminación, medidas de
comando y control; producción a través de tecnologías cero emisiones. Igualmente Proyecto III, se
presenta como agente articulador entre las comunidades, sus organizaciones comunitarias y grupos
sociales que hacen vida en dicha comunidad, para llevar a la práctica proyectos orientados a
resolver problemas ambientales presentes en las mismas.
Las actividades de esta fase se encuentran en la actualidad en proceso de ejecución, por lo
que no se tienen resultados evaluables.

EXPERIENCIA EN LAS ALDEAS UNIVERSITARIAS, MUNICIPALIZACIÓN DE LA


EDUCACIÓN SUPERIOR
La municipalización de la educación universitaria se diseño, a través de Misión Sucre
como una estrategia para poder dar respuesta al gran número de población de bachilleres, enfocado
en que estudien en su propio Municipio donde residen. Esto, disminuye la migración de estos
estudiantes hacia lugares (en nuestro caso la ciudad de Maracaibo) con una alta densidad de
habitantes y de estudiantes, al mismo tiempo permite el desarrollo de esos municipios, que en la
gran mayoría son económicamente deprimidos, con muchas necesidades y con escasas
oportunidades de desarrollo. El generar ciudadanos profesionales, capacitados para el diseño y
realización de proyectos en las diversas áreas del conocimiento, atendiendo las realidades
particulares de cada región, forma parte de la estrategia nacional de desarrollo. En el cuadro Nº 5
observamos la información del número de estudiantes y docentes hasta el mes de marzo de 2007,
sin embargo, en la actualidad la población estudiantil y docente ha aumentado en cerca de un 20%
aproximadamente.

Cuadro 5. Número de estudiantes y docentes en las aldeas universitarias que dependen de la Sede
Zulia para el mes de marzo de 2007.
TOTAL
Estado MUNICIPIO Nº Docentes
ESTUDIANTES
Maracaibo 105 16
Mara 62 5
Machiques 6 5
Rosario de Perijá 10 3
Jesús Enrique Lossada 9 6
Colón 12 3
Cabimas 21 6
Simón Bolívar 31 8
ZULIA

Lagunillas 30 4
San Francisco 31 4
Total Zulia (14 aldeas) 317 60
Total Trujillo (13 aldeas) 169 S/I
Total Mérida (33 aldeas) 244
Total 730 60
Fórum Internacional do Meio Ambiente - A conferência da Terra 366

Relación con instituciones gubernamentales, participación en eventos.

Dentro de las actividades que deben cumplir los estudiantes para optar al título de TSU, se
debe realizar una Pasantía o Práctica Profesional dentro de instituciones públicas o privadas que
tengan entre sus responsabilidades cotidianas, actividades relativas al medio ambiente. Las
pasantías permite la generación de un puente entre la institución y la comunidad donde el estudiante
desarrolla sus actividades de Proyecto.

Cuadro Nº 6. Instituciones donde se desarrollaron las pasantías


Numero de
Nº Institución
estudiantes
1 Petroquímica de Venezuela, El Tablazo. 1
2 Comité de Transición de Empresas 2
3 Instituto Nacional de Canalizaciones, Maracaibo 1
4 Ministerio del Poder Popular para el Ambiente 57
5 Alcaldía de San Francisco 27
6 Hidrológica del Lago de Maracaibo 20
7 Instituto para la Conservación del Lago de Maracaibo. 27
8 Asesoria de proyectos, consultaría ambiental y representaciones ACRE. C.A. 2
10 Museo de Biología de la Universidad del Zulia 7
11 FRIDLUZ Desarrollo 2
12 Petróleos de Venezuela 22
13 Alcaldía Bolivariana de Mara. Instituto Municipal del Ambiente 17
14 Alcaldía de Maracaibo. Instituto Municipal del Ambiente 12
15 Instituto Municipal del Aseo Urbano y Domiciliario 15
16 Instituto Nacional de Parques 24
17 Instituto Nacional de los Espaciosa Acuáticos e Insulares 4
18 Grupo Ambiental de Servicios Tecnológicos 2
19 Carbones del Guasares 2
20 Policía del Municipio Maracaibo, Brigada Ambiental 20

ACTIVISMO AMBIENTAL.
Dentro del PFG, se observa la participación de nuestros estudiantes y profesores, en
actividades relacionadas con los movimientos ambientalistas desarrolladas en la región zuliana.
Como es el caso de la lucha en contra del aumento de la explotación del carbón mineral en la
vertiente norte de la serranía de Perijá y el compromiso en participar por la delimitación de las
tierras indígenas de los Barí, Yuckpa, Japreria, Añú, y Wayuu.
En este sentido existe un movimiento estudiantil ecologista, los cuales se denominan
Jeyuuchön (la Hormiguita en el idioma Wayunaiki). Los mismos tienen un programa radial de
difusión ambientalista en una emisora comunitaria en el norte de la ciudad de Maracaibo y trabajan
en la comunidad de Juyacirrain, principalmente los problemas de deforestación y su impacto en las
nacientes del Riecito Maché.
De igual manera, los docentes participan en los eventos, charlas, congresos, video foros de
divulgación ambiental. Además en unión a otras instituciones, estudiantes y docentes han
participado y participan en curso de formación ambiental, Juegos Ecológicos, Manejo y aplicación
de la información sociodemográfica para el desarrollo local, Formación Socio Política.
En la actualidad se esta conformando entre estudiantes y profesores de los PFG Gestión
Ambiental, Agroecología y Gestión Social para la Salud el Comité Conservacionista Universitario
UBV, que busca desarrollar experiencias para mejorar el ambiente de la Sede y que puedan
extrapolarse a las comunidades vecinas y en donde nuestros estudiantes y profesores adelantan las
actividades de Proyecto. Entre estas propuestas se encuentra:
Fórum Internacional do Meio Ambiente - A conferência da Terra 367

Los Hombres de Barro: Consiste en retomar experiencias de construcción tradicional


utilizando el barro como elemento constructivo. Procurando la popularización de estas prácticas
para resolver necesidades de mejoramiento de viviendas de gran parte de nuestra población.
El conuco agroecológico: Espacio para la docencia y la práctica de experiencias agrícolas
sutentables, sin el uso de agroquímicos y favorecer la producción y consumo de plantas autóctonas.
Laboratorio de Etnoecología: Valoración de los saberes tradicionales de nuestros pueblos
indígenas y campesinos.
Huerto de plantas medicinales.
Compostero: Generación de abono orgánico a partir de la hojarasca de los árboles
presentes en la sede y de los desechos del comedor, de manera que se pueda desarrollar como una
actividad socio productiva.
Brigada ambiental: Formación de jóvenes voluntarios como vigilantes ambientales.
Alfabetización Ecológica: Talleres destinados a comunidades, docentes, líderes
comunitarios, funcionarios públicos, que contribuyan con la educación ambiental, el
reconocimiento de las amenazas ambientales globales y locales y el nivel de responsabilidad que
tenemos a nivel individual y colectivo.

RESULTADOS HASTA EL PRESENTE:


En cuanto al 3er motor Moral y Luces, participamos impulsando actividades de educación
ambiental, formación técnica y socio política a nuestros estudiantes, docentes, y a los miembros de
las comunidades donde desarrollamos vida activa. El trabajo desplegado en los Proyectos tiende a
fortalecer la capacidad organizativa de las comunidades, bajo la figura de los Consejos Comunales,
siendo este el objetivo del 5to Motor: Explosión del Poder Popular. Durante el desarrollo de
nuestras actividades, hemos verificado que no existe una gestión ambiental comunitaria, pues en
muchas casos nos hemos topado con personas, líderes y funcionarios públicos que no consideran el
tema ambiental como prioritario dentro de las agendas de acción, ocasionándose incluso
enfrentamientos. Sin embargo, consideramos que la presencia de más de 400 estudiantes y 35
docentes, actuando y conviviendo de manera cotidiana dentro de las comunidades, influyen en el
cambio de visión del resto de los habitantes, de sus familiares, compañeros de trabajo y vecinos y
esa es una forma no formal y poco evidente de transformación de la conciencia colectiva y
generación de valores frente a la degradación ambiental.

AGRADECIMIENTOS:
Este trabajo fue posible gracias a la participación de todos nuestros estudiantes y
profesores. Especial agradecimiento a todas las comunidades que nos han acogido y apoyado desde
nuestros inicios y que en el presente continúan trabajando junto a nuestros estudiantes y docentes. A
todas las instituciones que han recibido a nuestros estudiantes como pasantes y beca empleo. A
HIDROLAGO por permitirnos usar sus laboratorios para la realización de prácticas de Calidad
Ambiental. A Petróleos de Venezuela, que se encuentra en estos momentos comprometido con el
acondicionamiento del espacio físico y la construcción y dotación de los laboratorios. El Ministerio
del Ambiente y el Instituto para la Conservación del Lago de Maracaibo quienes nos han prestado
su apoyo para la actualización de nuestros docentes y estudiantes. De igual manera los Institutos
Municipales del Ambiente de las Alcaldías de Maracaibo, Mara y San Francisco. La Fundación
Centro Nacional para el Mejoramiento de la Enseñanza de la Ciencia por brindarnos la posibilidad
de adquirir experiencias en estrategias de educación ambiental, juegos ecológicos y por la donación
de libros ambientalistas a nuestra biblioteca.
Fórum Internacional do Meio Ambiente - A conferência da Terra 368

PRODUÇÃO DE VASSOURAS E SUSTENTABILIDADE EM ÁREA DE CARNAUBAL NO


PIAUÍ

Maria do Socorro B. A. dos Santos


Mestranda em Desenvolvimento e Meio Ambiente-Prodema
José Luis Lopes Araújo
Prof. Dr. do Depto de Geografia e História da Universidade Federal do Piauí

RESUMO
Este trabalho trata da importância socioeconômica da produção de vassouras
comercializadas na feira de Altos - Piauí. Tem como objetivos conhecer o processo de fabricação
das vassouras; identificar os municípios de procedência e destino das vassouras comercializadas na
feira de Altos; e, caracterizar as formas de comercialização. Para levar a cabo estes objetivos
recorreu-se a pesquisa bibliográfica e de campo com aplicação de questionários, entrevistas e
registros fotográficos. O estudo revelou a importância desta atividade para os lugares onde são
produzidas. Os dados da pesquisa indicam que 92,3% dos produtores arrendam carnaubal para
adquirirem a matéria prima de fabricação de vassouras e somente 7,7% dos produtores detém seu
próprio carnaubal. Quanto aos municípios que a fabricam destacam-se Coivaras e Altos por
apresentarem, 50% e 30% da produção, respectivamente; outro dado relevante da pesquisa é o
grande índice de participação dos membros das famílias no processo de fabricação das vassouras. A
Pesquisa também revelou que as vassouras são vendidas na feira pelo próprio produtor ou são
repassadas para atravessadores, da própria feira ou de outras cidades. A produção é escoada da feira
para Teresina, e outras cidades do Maranhão e Pará.
Palavras-Chave: Desenvolvimento local. Produção artesanal. Cadeia produtiva.

ABSTRACT
This work of the importance socioeconomic of the production of brooms commercialized
in the fair of Altos-Piauí. Have with objectives to know the process of fabrication of the brooms;
indicate the district of origin and draining of the brooms commercialized in the fair of Altos;
identify the forms of commercialization, well with characterize with if gives this commercialization.
For to go the handle this objectives it was appealed the research bibliographic and of camp with
applications of questionnaires, interview and photographic registers. The study reveled the
importance these activity for the places where they are produced. Data of the research indicate that
92,3% of the producers lease carnaubal for acquire the substance cousin of fabrication of brooms
and only 7,7% of the producers withholds its proper carnaubal. How much to the districts that the
manufacture they had been distinguished coivaras for presenting 50% of the production and Alto
Longá with high 3%. The district of Altos too it distinguished for presenting 30% of the production;
another side excellent of the research is the bid indice of participation of the family’s members in
the processes of fabrication of the brooms. Research too reveled that the brooms is for sailed in the
fair for proper producer or they are repassed for profiteers that the it resells them. Production is
flowed off the fair for Teresina, Maranhão and Pará.
Key word: Local development, Artisan production. Productive chain.

INTRODUÇÃO

A busca pelo desenvolvimento sustentável é um dos caminhos a serem trilhados pelas


sociedades contemporâneas. Neste sentido, o desenvolvimento local se dá a partir de atividades
econômicas baseadas em matérias-primas renováveis exploradas localmente.
O extrativismo é designado atividade de coleta de produtos naturais seja estes de origem
animal, vegetal ou mineral. Até o início do século XIX, estava ligada a idéias de naturalistas,
influenciadas pelas grandes expedições à África, Ásia e América Latina e ao sucesso da Botânica e
da Zoologia, através das descobertas científicas.
Fórum Internacional do Meio Ambiente - A conferência da Terra 369

No Brasil a atividade extrativista tem sido uma constante desde o período colonial quando
se praticava o extrativismo da madeira e de minérios, tendo atravessado ciclos econômicos
encontrando épocas que se constituía a principal atividade econômica de regiões do país.
Segundo Queiroz (1998), o extrativismo piauiense destacou-se no mercado internacional
durante a primeira metade do século XX pela exportação de produtos extrativistas como: borracha
de maniçoba, cera de carnaúba e babaçu.
No contexto do desenvolvimento socioeconômico piauiense, o extrativismo se apresenta
como atividade fomentadora da economia. Destacando-se no Estado o extrativismo vegetal que
possui uma diversidade de produtos advindos desta que tem sido, desde o início do século XX, setor
importante das exportações extrativistas do Estado.
Neste contexto, desde a primeira metade do século XX, a cera de carnaúba, extraída da
carnaúba (Copernicia prunifera (Mill.) H.E. Moore) vem se configurando como um dos dos
principais produtos de exportação do Estado (ARAÚJO, 1985; QUEIROZ, 1998). A carnaúba é
uma palmeira nativa do Nordeste do Brasil com ocorrência nos estados do Maranhão, Piauí, Ceará,
Rio Grande do Norte e Paraíba. Contudo, somente na área que compreende porções do leste do
Maranhão, os territórios dos estados do Piauí e Ceará e o oeste do Rio Grande do Norte, a extração
de sua palha é de grande relevância econômica.
A carnaúba fornece matérias-primas que estão na composição de diversos produtos. Dela
se aproveita o pó cerífero, a partir do qual se extai a cera de carnaúba. Essa tem grande aplicação
industrial, uma vez que entra na composição de uma elevada gama de produtos nas indústrias de
cosméticos, farmacêutica, tinta automotivas, informática, filmes plásticos e fotográficos,
revestimentos, impermeabilizantes, lubrificantes, vernizes, na confecção de chips, tonners, códigos
de barras e na indústria alimentícia. Ressalte-se, ainda, que de suas folhas são fabricados chapéus,
esteiras, capachos, sandálias, surrões, cestas, cofos e vassouras, confeccionadas artesanalmente em
diferentes municípios do Estado.
Segundo Araújo (2006, p. 125),
Da carnaúba, além do pó extraído de suas palhas, ainda são aproveitados os caules como
madeira de construção. Após a retirada do pó das palhas, estas são utilizadas como
cobertura para casas, elaboração de produtos artesanais ou, quando na forma de bagana,
como adubo na agricultura.

Dos produtos de exploração econômica da carnaúba, a confecção artesanal de vassouras se


traduz em fonte de renda para algumas famílias, e, quando a produção diminui cultivam roças e ao
mesmo fabricam vassouras. Assim, a produção artesanal de vassouras, destaca-se pelas suas
características peculiares demonstrando a relevância de um estudo dos impactos sócio-econômicos
e ambientais da produção de vassouras oriundas da palha de carnaúba a partir do conhecimento de
sua cadeia produtiva.
Tomando como parâmetro o desenvolvimento sustentável foi feito levantamento de
informações sobre a cadeia produtiva das vassouras demonstrando como a carnaúba é utilizada para
sua fabricação, e principalmente todo o processo de confecção deste produto indicando a sua
importância para o desenvolvimento local nas áreas onde se desenvolve essa atividade.
Neste sentido, a produção artesanal de vassouras comercializadas na feira-livre de Altos
/PI, se traduz em atividade que envolve mão-de-obra familiar. A renda advinda desta atividade além
de ser mais uma fonte de recursos para as famílias que a praticam, se traduz numa atividade que
incrementa o fluxo do comércio local.
Mesmo com o advento da globalização a atividade artesanal tenta sobreviver e, na maioria
das vezes, resiste como atividade complementar de renda nas mais diversas regiões do País. As
feiras-livres semanais são espaços para onde converge o comércio dos pequenos produtores
principalmente no Nordeste brasileiro.
No Brasil, as feiras-livres semanais são marcas fortes para a economia de cada região.
Nelas estão presentes trabalhadores que comercializam as mais diversificadas mercadorias que vão
desde produtos agrícolas, utensílios domésticos, ervas, animais de pequeno porte, etc., e representa
Fórum Internacional do Meio Ambiente - A conferência da Terra 370

melhor todo conceito de circulação de produtos e de pessoas, e demonstra a importância desse


espaço para grande parcela da população brasileira que não se inseriu no mercado formal da
economia.
Sobre as feiras-livres o geógrafo Roberto Lobato Corrêa comenta que:
A existência dos mercados periódicos parece residir, de um lado, no fato de o alcance
espacial mínimo ser superior ao alcance espacial máximo. Em outras palavras, o limite
da área que engloba o número de pessoas necessárias para que os comerciantes se fixem
encontra-se, em razão do muito baixo nível da demanda, e da pequena mobilidade
espacial, além do limite até onde os consumidores conseguem deslocar-se. Em situações
como estas, argumenta Stine comentado por Corrêa, a alternativa para os comerciantes é
tornarem-se móveis, percorrendo sistematicamente os núcleos de povoamento e
estabelecendo-se em cada um deles periodicamente (CORRÊA, 1989, p.36).

No Nordeste brasileiro as feiras-livres se constituem espaços econômicos culturais e


tradicionais e contribuem para a dinamização da economia local. Sua periodicidade depende da
organização de cada localidade em que as comunidades mais distantes se deslocam para
comercializarem o fruto de sua produção bem como para adquirirem produtos de suas necessidades.
No Piauí, as feiras-livres se destacam pelo grau de influência que exercem junto às
comunidades onde estão localizadas; para elas converge semanalmente grande fluxo de pessoas e
mercadorias. Destaca-se no cenário piauiense a feira-livre semanal do município piauiense de Altos,
tendo como características espaços delimitados para comercialização de produtos diversificados: a
área para comercialização de animais, hortifrutigranjeiros, utensílios domésticos e das vassouras
produzidas a partir da palha da carnaúba.
Para o espaço de comercialização das vassouras da palha de carnaúba semanalmente se
deslocam produtores de diversos municípios piauienses. Desta maneira a venda deste produto na
feira-livre se torna um atrativo para compradores de várias regiões. Assim, esta área se torna um
ponto de encontro das diferentes comunidades, com diferentes traços culturais.

MUNICÍPIO DE ALTOS /PIAUÍ


Segundo IBGE (1959) o atual município de Altos já foi denominado de São José dos Altos
e Altos de João de Paiva. Essa por pertencer inicialmente ao casal João de Paiva Oliveira e sua
esposa, D. Raimunda Maria de Jesus, que ali fixaram residência, vindos do Ceará no ano de 1800.
Contudo, foi em 18 de julho de 1920 que o governador do estado, Dr. João Luís Ferreira elevou o
povoado Altos João de Paiva à categoria de Vila, tendo sua instalação como município em 12 de
outubro de 1922.
De acordo Araújo (2006), Altos está situado na Mesorregião do Centro-Norte Piauiense, e
na Microrregião de Teresina. Altos apresenta altitude de 115 metros em sua sede municipal. O
Clima do município é aw´ Tropical com máximos pluviométricos no verão, com temperatura média
anual de 29°C e isoietas média anual de 1400mm a 1600mm.
Pode-se destacar entre os recursos naturais de Altos uma hidrografia representada pelo rio
Surubim, considerado um dos principais do município, com uma extensão aproximada de 60 km.
Notam-se ainda os riachos Raposa, Nova Olinda e Cipó. O último nasce no lugar denominado
Maravilha, subúrbio da sede municipal. Além dos rios citados existem outros, como o Tamanduá,
de menor importância, e diversos riachos, olhos d’água e lagoas (IBGE, 1959).
Geomorfologicamente contam-se algumas pequenas serras, sendo reconhecida como uma
das maiores a “Serra das Correntes” com 36 km de extensão. Os aspectos geográficos do município
de Altos propiciarem à extração de riquezas naturais como a cera de carnaúba que é o principal
produto extrativo vegetal do município. Há outras riquezas de menor importância como a extração
mineral do barro (argila) para fabricação de telhas e tijolos.
Conforme Araújo (2006), no município estão presentes as formações vegetais Floresta
mista subcaducifólia e Campos inundáveis/cerrado arbustivo, destacando essa última como propícia
para o habtat da carnaúba.
Fórum Internacional do Meio Ambiente - A conferência da Terra 371

A fauna do município é representativa pela presença de animais silvestres como: gato


maracajá (Leopardus wiedi), caititu (Tayassu pecari), veado mateiro (Mazama tetradectyla) ,
tamanduá (Tamanduá tetradectyla) , e jibóia (Allamenda cathartica).
As atividades econômicas fundamentais para o município de Altos são agricultura e a
pecuária, sobressaindo ainda, se bem que em menor volume que aquelas, a extração da carnaúba,
tanto para a produção de pó cerífero, como para a atividade artesanal na produção vassouras e
outros utensílios.

A PRODUÇÃO ARTESENAL DE VASSOURAS DE PALHA DE CARNAÚBA


A importância da carnaúba se dá em vários cenários da atividade extrativista piauiense.
Sua utilização é integral, daí ser de fundamental importância sua utilização e manejo adejado. Neste
contexto, a confecção de vassouras é uma atividade que não traz danos ao meio ambiente, tendo em
vista que a extração das palhas não compromete a sobrevivências das plantas.
A cadeia produtiva das vassouras tem inicio a partir da retirada da palha da carnaúba. A
confecção das vassouras se dá de maneira artesanal como relata o senhor Raimundo Soares Gomes:
A gente vai no carnaubal, derruba lá com a foice a paia e aí traz pra casa num jumento. Aí
risca ela, bota no sol no correr do dia, bota das sete as três da tarde. A gente tira três horas, aí bota lá
dentro de casa, aí quando for dia de quinta-feira a gente bate e faz a vassoura até a hora de parar. Aí
sábado traz pra vender na feira (GOMES, 2006).
Este depoimento relata as etapas da produção de vassouras da palha de carnaúba,
demonstrando que esta é uma atividade artesanal que não traz impacto negativo ao meio ambiente.
Quanto à importância socioeconômica desta atividade o senhor Antônio Leopoldino da
Silva, produtor na localidade Bom Nome, município de Altos pronuncia:
A vassoura é um trabalho muito sofrido porque as pessoas que trabalham em vassouras é
porque não tem outro trabalho né. Então a gente faz só pra ajudar o consumo mesmo das despesas
né diariamente, mas não é que dê lucro, é porque você ficar parado... e aí tem que fazer esse serviço
pra dar continuidade com a vida mesmo (SILVA, 2006).
A produção artesanal de vassouras varia quantitativamente por município. Havendo recuo
da produção em função do período chuvoso. Em contrapartida há um incremento acentuado da
produção no período da estiagem que vai de maio a dezembro. Essa variação climática influencia do
preço do produto, pois o mesmo fica com preço elevado no período chuvoso.
O escoamento das vassouras se dá, na feira semanal de Altos/Pi, por meio da venda direta
do produtor ou de atravessadores a intermediários que revendem em mercados consumidores. O
trabalho dos atravessadores começa sexta-feira pela manhã sendo que no sábado é que se
intensificam as vendas, quando há um incremento do fluxo de caminhões, carros baú e outros tipos
de meio de transporte no espaço delimitado para a comercialização de vassouras.
Em relação ao deslocamento da produção para a feira os produtores ainda têm um custo
adicional que é o frete de pequenos caminhões e alguns utilizam carroça para deslocamento,
variando de acordo com a distância da área de produção.
Quanto ao apoio do poder público o senhor Juvêncio Silva,comprador de vassouras
residente em Santa Inês / Ma, explana:
Lá em Santa Inês (MA), se fosse lá em Santa Inês o prefeito fazia um galpão... sempre ele
faz pros agricultores que vem lá do interior... tudo ele manda pegar no interior. O prefeito de Santa
Inês tem um carro pra pegar no interior os povos e traz "tudim" sem pagar nada. Tinha que fazer era
um galpão grande pra eles colocarem as vassouras no inverno pra não molhar porque as vassouras
dá renda muito boa pra Altos. E o pessoal que produz e vem vender aqui se aperreia no período do
inverno (SILVA, 2006).
A presente pesquisa entrevistou 26 produtores de vassouras, dos quais 69,2% pertencem ao
sexo masculino e 30,8% são representados pelo sexo feminino. Considerando o tempo de trabalho
na produção de vassouras, 61,6% informou que já está com mais de dez anos; 34,6% de dois a dez e
3,8% com apenas um ano. Quanto a freqüência a feira para vender vassouras, 38,5% dos produtores
Fórum Internacional do Meio Ambiente - A conferência da Terra 372

disseram freqüentá-la todo fim de semana; 46,2% dois fins de semana por mês,11,5% em fins de
semana variados, e 3,8% freqüentam três fins de semana por mês.

Tabela 1 – Municípios de origem dos produtores de vassouras comercializadas na feira de Altos-


Piaui
Município de residência Número de produtores %
Altos 8 30,8
Alto Longá 1 3,8
Campo Maior 3 11,6
Coivaras 13 50,0
Beneditinos 1 3,8
Total 26 100,0
FONTE: Pesquisa direta, março/ 2006.

Na Tabela 1 indica dados sobre os municípios de origem dos produtores de vassouras


comercializadas na feira de Altos. Demonstrando o intercâmbio entre os diversos municípios
produtores, pois estes se deslocam de suas comunidades locais para comercializar sua produção em
Altos. Da amostra pesquisada se destaca Coivaras por apresentar 50% dos produtores presentes na
feira enquanto os menores índices 3,8% ficaram com Alto Longá e Beneditinos.
A pesquisa detectou que 69,0% dos produtores revendem suas produção para os
atravessadores que escoam a produção para o Piauí, particularmente para a capital, Teresina, e para
os estados do Maranhão e Pará.

Tabela 2 - Forma de acesso às matérias-primas para fabricação de vassouras.


Local de acesso Número de produtores %
Carnaubal próprio 2 7,7
Carnaubal arrendado 24 92,3
Total 26 100,0
FONTE: Pesquisa direta, março/ 2006.

Pelos dados obtidos na Tabela 2 percebe-se quase todos os produtores não possuem
carnaubal para obter matéria-prima. Tendo em vista que a vassoura é produzida por pequenos
produtores, esses são dependentes dos grandes proprietários de terra, tendo que se submeter a
arrendar carnaubal para adquirirem matéria-prima.

COMERCIALIZAÇÃO DAS VASSOURAS NA FEIRA DE ALTOS-PI


Os atravessadores são pessoas que compram diretamente dos produtores, logo que esses
chegam à feira. Destes, 58,4% residem em Altos e 25,0% em Teresina. Segundo relato destes
trabalhadores 68,7% faz estoque de vassouras e apenas 31,3% não o fazem. E questionados sobre o
período de maiores vendas, 83,3% declararam que ela ocorre de maio a dezembro e 16,7% afirmam
ser estáveis às vendas de vassouras, durante o ano.
Na cadeia produtiva das vassouras são diversas as etapas que a compõe. Neste contexto os
atravessadores são cidadãos que encontraram nesta atividade uma fonte de incremento de sua renda.
Semanalmente exercem a função de pedreiro, vendedor, lavrador, funcionário público, carpinteiro,
funções que na economia de mercado são mal remunerados necessitando assim de atividade
econômica complementar para o sustento de suas famílias.
Fórum Internacional do Meio Ambiente - A conferência da Terra 373

Tabela 03 – Renda média por atravessador na atividade de comercialização de vassouras.


Renda (em salários mínimos) Número de produtores %
Menos de 1 5 41,7
1 a menos de 2 5 41,7
2 a menos de 3 1 8,3
3 e mais 1 8,3
Total 12 100,0
FONTE: Pesquisa direta, março/ 2006.

Segundo dados da Tabela 3 a atividade de atravessadores de vassouras é pouco rentável


para grande maioria tendo em vista que dos 12 atravessadores entrevistados 83,4% consegue até
dois salários mínimos.

CONSIDERAÇÕES FINAIS
No presente estudo demonstrou a importância que o desenvolvimento local sustentável
denota a partir de atividades econômicas baseadas em matéria primas renováveis locais.
Neste contexto, se insere a atividade extrativista piauiense, destacando-se a atividade
extrativa da carnaúba que se apresenta com diversas potencialidades para exploração econômica,
em face da cera que produz ter largo emprego na indústria, fazendo parte da composição de
inúmeros produtos e da utilização da palha para a confecção de produtos utilizados como utilitários,
decoração e outros fins. As vassouras de palha de carnaúba, expostas à venda na feira semanal de
Altos eram procedentes dos municípios de Altos Beneditinos, Pau D’Arco, Coivaras e Campo
Maior, sendo estas revendidas para outros municípios do Piauí, particularmente para a capital,
Teresina, e ainda para os estados do Maranhão e Tocantins.
Quanto à questão ambiental detectou-se ser esta atividade não degradante ao meio
ambiente, tento em vista que a extração das palhas não compromete a sobrevivência dos carnaubais.
O presente estudo também indicou que há dificuldades quanto ao acesso a matérias-prima por parte
dos pequenos produtores, pois os mesmos não são detentores dos carnaubais. E que na confecção
das vassouras a mão-de-obra é familiar. Outro fator importante encontrado é que há recuo de
produção no período chuvoso. Contudo, durante todo o ano há produção de vassouras. Quando a
integração dos produtores de vassouras percebe-se que há necessidade de uma organização local a
partir de implementação de cooperativas para melhor facilitar o desenvolvimento desta atividade,
vislumbrando sua ampliação, melhores condições de produção, ransporte até a área de
comercialização e valorização do produto.
Assim, cabe ao poder público implementar políticas públicas direcionadas ao pequeno
produtor no sentido de capacitá-lo naquilo que ele produz, indicando as diretrizes da
sustentabilidade local.

REFERÊNCIAS BIBLIOGRÁFICAS
ARAÚJO, José Luís Lopes (Coord). Atlas Escolar do Piauí – Geo-Histórico e Cultural. João
Pessoa, PB: Editora Grafset, 2006.
______.O rastro da carnaúba no Piauí. In.: Almanaque da Parnaíba, 1985. Parnaíba, 1985. p. 100-
104.
AZEVEDO, Beatriz Regina Zago de. Setor informal e forma de participação na produção. In:
Ensaios FEE, Porto Alegre, v. 4, n. 1, p 185 1994, 1984.
CARVALHO, Francisco Prancacio Araújo de. Eco-eficiência na Produção de Pó e Cera de
Carnaúba no município de Campo Maior-PI. Dissertação. (Mestrado em Desenvolvimento e Meio
Ambiente) – Universidade Federal do Piauí. Teresina, 2005.
CORRÊA, Roberto Lobato. A rede urbana. Editora Ática S. A. 1989.
DUARTE, Lucicleide. Feira livre de Altos na década de 70. Ano 1995.
GOMES, Jaíra Maria Alcobaça; SANTOS, Karla Brito dos; SILVA, Marcos Soares da. Cadeia
produtiva da cera de carnaúba: diagnóstico e cenários. Teresina: EDUFPI, 2006.
Fórum Internacional do Meio Ambiente - A conferência da Terra 374

História das feiras. Disponível em: http://www.eumed.net./cursecon/lidreria/2004/lgs-mem/_ ftn3#


_ftn3. set. 2006.
IBGE-Instituto Brasileiro de Geografia e Estatística. Enciclopédia dos municípios brasileiros. Piauí.
1959. p.413 a 417.
os, Piauí: mar. 2006.
QUEIROZ, Teresinha de J. M. Economia piauiense: da pecuária ao extrativismo. 2. ed. Teresina:
EDUFPI, 1998.
Fórum Internacional do Meio Ambiente - A conferência da Terra 375

GLOBALIZAÇÃO, DESENVOLVIMENTO SUSTENTÁVEL E MODELOS DE


INDICADORES DE SUSTENTABILIDADE

Waleska Silveira LIRA


UEPB- waleska.silveira@oi.com.br
Gesinaldo Ataíde CÂNDIDO
UFCG- gacandido@uol.com.br
Ronaldo Nóbrega TAVARES
UEPB - ronaldonobregatavares@hotmail.com

RESUMO
Este artigo investiga a relação entre o processo de globalização, o desenvolvimento
sustentável e os modelos de indicadores de sustentabilidade, levando em consideração a
necessidade urgente de uma mudança de comportamento por parte da sociedade e de uma mudança
de paradigma que envolva uma visão econômica, social, e ambiental. De forma abrangente descreve
os principais modelos de indicadores de sustentabilidade dentre eles pode-se citar OECD (1998);
DPCSD (1999); Hardi (1999), IBGE (2002). Esta reflexão é de grande relevância para a sociedade
na medida em que fornecem subsídios para o delineamento do processo de desenvolvimento de
ações de sustentáveis.

ABSTRACT
This article investigates the relationship between globalization process, the sustainable
development and the sustainable indicators models, taking in consideration the urgent necessity of a
change in the social behavior and a change of paradigm that include the economic, social and
ecological vision. Describes the principal models of sustainable indicators models, such as, OCDE
(1998), DPCSD (1999), HARDI (1999) and IBGE (2002). This reflection is of great relevance
because give subsidies for sustainable development process.

INTRODUÇÃO
Um dos grandes desafios que o mundo enfrenta atualmente é chegar a um consenso sobre o
crescimento econômico e a preservação ambiental e a melhoria das condições de vida da população.
Ao longo de sua existência, o homem sempre utilizou os recursos naturais do planeta e gerou
resíduos com pouca ou nenhuma preocupação, já que os recursos eram abundantes e a natureza
aceitava passivamente os despejos realizados. A partir do século XVIII, com a revolução industrial,
o modelo ou estratégia de desenvolvimento das nações consolidou suas bases técnicas e sociais. O
objetivo principal era o crescimento econômico em curto prazo, mediante a utilização de novos
processos produtivos e a exploração intensiva de energia e matérias-primas, cujas fontes eram
consideradas ilimitadas. Esse modelo gerou impressionantes excedentes de riqueza econômica, mas
trouxe consigo grandes problemas sociais e ambientais.
Este artigo faz uma reflexão sobre o processo de globalização, do desenvolvimento
sustentável, levando em consideração a necessidade urgente de uma mudança de comportamento
por parte da sociedade e de uma mudança de paradigma no que se refere à visão econômica,
empresarial, social e ecológica. Trata de forma abrangente os principais modelos de indicadores de
sustentabilidade. Procurando alcançar este desafio, o artigo proposto está estruturado da seguinte
forma: inicia-se com uma reflexão sobre o processo de globalização e conceitos de
desenvolvimento sustentável, focando as diferentes concepções sobre o tema. Em seguida, será trata
dos diferentes modelos de indicadores de sustentabilidade e finaliza destacando algumas
considerações sobre o atual modelo de desenvolvimento e suas implicações para o desenvolvimento
sustentável.

GLOBALIZAÇÃO E DESENVOLVIMENTO SUSTENTÁVEL


O século XX testemunhou uma exploração dos recursos naturais mundiais sem
precedentes, com o objetivo de alimentar a atividade econômica, o que repercutiu sobre a
Fórum Internacional do Meio Ambiente - A conferência da Terra 376

deterioração física dos grandes componentes da biosfera - a atmosfera, os oceanos, a cobertura dos
solos, o sistema climático e as espécies animais e vegetais. As pressões sobre o meio ambiente do
planeta foram ampliadas a partir da expansão econômica que sucedeu o pós-guerra.
Leff (2006) define economia como um mecanismo sócio-democrático responsável pela
geração e distribuição da riqueza. Essa função, a ela atribuída, teria como finalidade a redução da
pobreza e o estabelecimento do equilíbrio socioambiental. Ainda segundo, o autor o modelo de
crescimento e desenvolvimento econômico atual gerou enormes desequilíbrios; se, por um lado,
nunca houve tanta riqueza e fartura no mundo, por outro lado, a miséria, a degradação ambiental e a
poluição tendem a uma escalada que nos dá uma sensação de infinidade.
A partir dessa percepção, surge a idéia do desenvolvimento sustentável, buscando conciliar
o desenvolvimento econômico à preservação ambiental e, ainda, ao fim da pobreza no mundo. É
fortalecida a percepção de que é preciso desenvolver com consciência das limitações ecológicas,
para que as gerações futuras tenham condições de existir e viver bem, de acordo com as suas
necessidades.
É neste contexto que a informação torna-se um fator preponderante para se promover o
desenvolvimento de forma sustentável através do uso eficiente dos sistemas de indicadores de
sustentabilidade, tópico que será abordado no próximo item.

MODELOS DE INDICADORES DE SUSTENTABILIDADE


A sociedade passa a conhecer as ações sustentáveis de um determinado espaço geográfico
através da divulgação externa da informação ambiental oportuna em relatórios ambientais, balanço
social e indicadores de sustentabilidade. Diante da preocupação com o meio ambiente e a
sustentabilidade estão sendo estruturadas e testadas formas para medição e mensuração do
desenvolvimento sustentável, de países, empresas e sistemas de gestão em várias partes do mundo.
Diversos estudos foram realizados com o intuito de avaliar a sustentabilidade, dentre eles podemos
citar : OECD (1998); DPCSD (1999); Hardi (1999), IBGE (2002).

Modelo - Pressão –Estado-Resposta


O modelo Pressão-Estado-Resposta desenvolvido pela OECD (1998), para o estudo de
indicadores ambientais globais vem sendo aceito e adotado internacionalmente. Basea-se no
conceito de causalidade: as atividades humanas exercem pressão sobre o ambiente alterando a
qualidade e a quantidade de recursos naturais, ou seja, alterando o seu estado. A sociedade responde
a essas mudanças mediante políticas ambientais, econômicas ou setoriais. Embora esse modelo
possa sugerir uma interação linear entre atividades e ambiente, deve-se considerar que tais relações
são complexas. A partir dele são especificados três tipos de indicadores ambientais:
• indicadores da pressão ambiental - descrevem as pressões das atividades humanas sobre o
ambiente, incluindo a quantidade e qualidade dos recursos naturais;
• indicadores das condições ambientais ou de estado – referem-se à qualidade do ambiente
e à qualidade e quantidade dos recursos naturais. Eles devem fornecer uma visão da situação do
ambiente e sua evolução no tempo, não das pressões sobre ele;
• indicadores das respostas sociais - são medidas que mostram a resposta da sociedade às
mudanças ambientais, podendo estar relacionadas à prevenção dos efeitos negativos da ação do
homem sobre o ambiente, à paralisação ou reversão de danos causados ao meio, e à preservação e
conservação da natureza e dos recursos naturais.
Fórum Internacional do Meio Ambiente - A conferência da Terra 377

I n fo r m a ç ã o

P R E SSÕ E S E ST A D O RESPOSTAS
R e c u rs o s In fo rm a ç ã o
A tiv id a d e s A m b ie n te A g e n te s
H u m an as E c o n ô m ic o s e
A m b ie n ta is
Ar
E n e rg ia Á gua A d m in is tra ç õ e s
T ra n s p o rte s S o lo R e s p o s ta s E m p re s a s
P o lu iç ã o
In d u s tria R e c u rs o s a m b ie n ta is O rg .In te rn a c io -
A g ric u ltu ra V iv o s n a is
O u tro s C id a d ã o s

R e s p o s ta s s e to r ia is

Figura 12 - Modelo - Pressão –Estado-Resposta. Fonte: OECD(1998,p.11).

Nesse modelo as pressões sobre o ambiente são reduzidas àquelas causadas pela ação do
homem, desconsiderando as provenientes da ação da natureza. Com objetivo de melhor integrar os
aspectos ambientais às políticas setoriais, a OECD (1998) procurou agrupar os indicadores por
temas e por setores. A classificação por temas é dividida em: mudança climática, diminuição da
camada de ozônio, eutrofização, acidificação, contaminação tóxica, qualidade ambiental urbana,
biodiversidade, paisagens culturais, resíduos, recursos hídricos, recursos florestais, recursos
pesqueiros, degradação do solo (desertificação e erosão) e indicadores gerais. Os setores são
classificados em transportes, energia e agricultura.

Modelo Força Motriz-Estado-Resposta


Em uma proposta de desenvolvimento de indicadores para o monitoramento do
desenvolvimento sustentável de países mediante a implementação da Agenda 21, o Departamento
de Coordenação Política e Desenvolvimento Sustentável (Department for Policy Coordination and
Sustainable Development - DPCSD) da Divisão das Nações Unidas para o Desenvolvimento
Sustentável propõe a classificação dos indicadores segundo o modelo Força Motriz-Estado-
Resposta, adaptado do modelo Pressão-Estado-Resposta. O termo força motriz, na visão do DPCSD
seria mais apropriado para reunir indicadores econômicos, sociais e institucionais. Nesse caso, os
indicadores das forças motrizes descrevem as atividades humanas, processos e padrões de impacto
sobre o desenvolvimento sustentável. Como resultado desse trabalho é proposto 58 indicadores de
desenvolvimento sustentável, cuja descrição e métodos são fornecidos em um relatório da Divisão
para o Desenvolvimento Sustentável das Nações Unidas (United Nations, 2001).
Atividades Humanas, Processo e
Costumes
Impacto no Desenvolvimento
Sustentável

FORÇA MOTRIZ
Ações Políticas e outras
Estado de respostas de alterações
Desenvolvimento SITUAÇÃO RESPOSTA
do Desenvolvimento
sustentável Sustentável

Figura 13. Modelo Força Motriz-Estado-Resposta. Fonte: Departamento de Coordenação Política e


Desenvolvimento Sustentável (DPCSD,1999)

Partindo do modelo Pressão-Estado-Resposta, Gouzee et al. (1995) e Hammond et al.


(1995), sugerem o agrupamento dos indicadores ambientais em quatro categorias e propõem o uso
de índices para cada uma delas:
Fórum Internacional do Meio Ambiente - A conferência da Terra 378

a) medidas do uso dos recursos renováveis e não renováveis, que potencialmente causam a
redução dos recursos e a degradação dos sistemas biológicos; refletem o que retiramos do ambiente
(source indicators);
b) medidas de poluição e resíduos liberados no ambiente; refletem o que introduzimos no
ambiente (sink-indicators);
c) medidas da situação e risco do ambiente, o qual mantém a biodiversidade e fornece
outros benefícios que vão da retenção de água à reciclagem de nutrientes; refletem a redução da
habilidade do ambiente em fornecer tais benefícios à medida que ele é degradado pela expansão das
atividades humanas (life support indicators); e
d) medidas do impacto das condições do ambiente sobre a saúde e o bem-estar humano;
refletem as ameaças ao bem-estar da população por fatores como a poluição do ar e da água, entre
outros (human impact/exposure indicators).
Embora o modelo proposto possa ser aplicado para descrever as pressões das atividades
humanas sobre o ambiente, o estado do ambiente e as respostas da sociedade, Gouzee et al. (1995) e
Hammond et al. (1995) se restringiram aos indicadores de pressão justificando que melhor
satisfazem os critérios estabelecidos no trabalho, possibilitando o uso por diversos países e
fornecendo as bases para avaliar o desempenho de políticas ambientais.

Método do Painel de Sustentabilidade


O Painel de Sustentabilidade constitui uma ferramenta de auxilio aos tomadores de decisão
na formulação de estratégias de desenvolvimento sustentável. Segundo o IISD (1999), o
agrupamento dos indicadores dentro de cada um dos grupos fornece o índice relativo a cada
dimensão. Os agrupamentos mais discutidos das dimensões da sustentabilidade são, segundo Hardi
(2000):
2 dimensões: considera o bem-estar humano e ecológico;
3 dimensões: considera o bem-estar humano, ecológico e econômico;
4 dimensões: considera a riqueza material e desenvolvimento econômico, eqüidade e
aspectos sociais, meio ambiente e natureza, democracia e direitos humanos.
As dimensões devem abranger as questões relacionada ao Meio Ambiente como por
exemplo, qualidade da água, ar e solo, níveis de lixo tóxico. A Economia com variáveis como
emprego, investimentos, produtividade, distribuição de receitas, competitividade, inflação e
utilização eficiente de materiais e energia e a Sociedade no que se refere ao crime, saúde, pobreza,
educação, governância, gastos militares e cooperação internacional. Os estoques ambientais podem
ser representados pela capacidade ambiental, uma medida incluindo estoque de recursos naturais e
tipos de ecossistema por área e qualidade.
Uma das limitações deste modelo é considerar, para cada dimensão, peso igual devendo
gerar um índice geral de sustentabilidade agregado (Sustainable Development Index), visto que nem
todas as variavéis consideradas nas dimensões são igualmente importantes, mas, considerando a
atual fase do modelo não existem alternativas para uma média simples e as distorções causadas por
este aspecto não devem produzir efeitos significativos no índice geral. (HARDI,2000)
A performance dos 4 mostradores, que representam as dimensões de sustentabilidade
adotadas no modelo, é resultado da agregação de diversos indicadores; a saber:
Dimensão Natureza: emissão de gases estufa; consumo de substâncias destruidoras da
camada de ozônio; Concentração de poluentes atmosféricos; terras aráveis; uso de fertilizantes, uso
de agrotóxicos; área florestal; intensidade de corte de madeira; desertificação; moradias urbanas
informais; aqüicultura; uso de fontes de água renovável; demanda bioquímica de oxigênio dos
corpos d’água; concentração de coliformes fecais em água potável; área de ecossistemas nativos;
porcentagem de área protegida; presença de mamíferos e pássaros.
Dimensão Social: população que vive abaixo da linha de pobreza; taxa de desemprego;
relação do rendimento médio mensal por sexo; prevalência de desnutrição infantil; taxa de
mortalidade infantil; esperança de vida; tratamento adequado de esgoto; acesso ao sistema de
abastecimento de água; acesso à saúde; imunização contra doenças infecciosas infantis; taxa de uso
Fórum Internacional do Meio Ambiente - A conferência da Terra 379

de métodos contraceptivos; crianças que alcançam a 5ª série do ensino fundamental; adultos que
concluíram o ensino médio; taxa de alfabetização; área construída (per capita); coeficiente de
mortalidade por homicídios; taxa de crescimento populacional; urbanização.
Dimensão Econômica: Produto Interno Bruto (per capita); investimento; balança
comercial; dívida externa; empréstimos; intensidade de uso de matéria-prima; consumo comercial
de energia; fontes renováveis de energia; uso de energia; disposição adequada de resíduos sólidos;
geração de resíduos perigosos; geração de resíduos nucleares; reciclagem; meios de transporte
particulares.
Dimensão Institucional: implementação de estratégias para o desenvolvimento sustentável;
relações intergovernamentais ambientais; acesso à internet; linhas telefônicas; despesas com
pesquisa e desenvolvimento; perdas humanas devido a desastres naturais; danos econômicos devido
a desastres naturais; indicadores utilizados.
O Método do Painel de Sustentabilidade possui o cálculo do IDS de 230 países e algumas
regiões do mundo, em diferentes anos ou épocas, sendo considerado pela Nações Unidas o
principal indicador de performance de sustentabilidade .

Indíce de Desenvolvimento Sustentável –IDS Brasil


A metodologia desenvolvida pelo IBGE apresenta abrangência regional e está baseada no
documento desenvolvido pela Comissão de Desenvolvimento Sustentavel (1996) das Nações
Unidas (ONU) intitulado Indicators of sustainable development: framework and methodologies.
Este documento, apresentou um conjunto de 134 indicadores que segundo o IBGE (2004)
foi reduzido em uma lista de 57 indicadores. O conteúdo apresentado foi adaptado às
particularidades do Brasil, tendo como suporte o modelo proposto pressão-estado-resposta (PER)
adotado pela ONU, denominado DSR (Driving force-State-Response).
O conceito de desenvolvimento sustentável adotado pelo IBGE (2004) segue a mesma
linha de pensamento da Comissão de Desenvolvimento Sustentável (CDS) da ONU (CSD, 2001),
que considera o desenvolvimento sustentável como um processo de transformação no qual a
exploração dos recursos, a direção dos investimentos, a orientação do desenvolvimento tecnológico
e a mudança institucional se harmonizam e reforça o potencial presente e futuro, a fim de atender às
necessidades e aspirações futuras... é aquele que atende às necessidades do presente sem
comprometer a possibilidade das gerações futuras atenderem as suas próprias necessidades.
Este modelo contempla as quatro diretrizes sugeridas pela Agenda 21 (NATIONS, 2001):
eqüidade, eficiência, adaptabilidade, e atenção a gerações futuras, bem como trabalha quatro
dimensões : Ambiental; Social; Econômico; e Institucional.
A dimensão ambiental, refere-se ao uso dos recursos naturais e à degradação ambiental, e
está relacionada aos objetivos de preservação e conservação do meio ambiente, considerados
fundamentais ao benefício das gerações futuras. Estas questões aparecem organizadas nos temas:
atmosfera; terra; água doce; oceanos, marés e áreas costeiras; biodiversidade; e saneamento (IBGE,
2004). A dimensão social corresponde à satisfação das necessidades humanas, à melhoria da
qualidade de vida e à justiça social. Os indicadores incluídos nesta dimensão abrangem os temas:
população; trabalho e rendimento; saúde; educação; habitação; segurança. Os mesmos procuram
retratar a situação social, a distribuição da renda e as condições de vida da população, apontando o
sentido de sua evolução recente. Na dimensão econômica, é discutido desempenho
macroeconômico e financeiro e dos impactos no consumo de recursos materiais e uso de energia
primária. Esta dimensão tem como objetivos avaliar a eficiência dos processos produtivos, e suas
alterações nas estruturas de consumo a partir de uma reprodução econômica sustentável de longo
prazo. Segundo o IBGE (2004), os diferentes aspectos da dimensão econômica do desenvolvimento
sustentável são organizados nos temas: quadro econômico e padrões de produção e consumo.
Finalizando, a dimensão institucional refere-se à orientação política, capacidade e esforço
despendido para as mudanças requeridas a fim de uma efetiva implementação do desenvolvimento
sustentável. O IBGE (2004) diz que esta dimensão aborda temas de difícil medição, necessitando
Fórum Internacional do Meio Ambiente - A conferência da Terra 380

assim, de mais estudos para o seu aprimoramento. A dimensão é trata dos temas, quadro
institucional e capacidade institucional, e apresenta cinco indicadores conforme descrito abaixo:

Dimensão Ambiental
Qualidade das águas
Volume de águas tratada (1000m3/ano)
Consumo médio per capita de água L/(hab*dia)
Acesso ao sistema de abastecimento de água (%)
Acesso a esgotamento sanitário (%)
Acesso a serviço de coleta de lixo doméstico (%)

Dimensão Social:
Esperança de vida ao nascer (anos)
Taxa de mortalidade infantil (por 1000 nascidos vivos)
Prevalência de desnutrição total
Imunização contra doenças infecciosas infantis (%)
Oferta de serviços básicos de saúde
Taxa de escolarização (%)
Taxa de alfabetizaçao (%)
Escolaridade
Taxa de analfabetismo funcional (%)
Famílias atendidas por transferência de benefícios sociais
Adequação de moradia (%)
Densidade inadequada de moradores por dormitório (%)
Coeficiente de mortalidade por homicídios
Coeficiente de mortalidade por acidentes de transporte

Dimensão Econômica:
Produto interno bruto per capita
Participação da indústria no Produto Interno Bruto
Índice de Gine da distribuição do rendimento
Renda per capita
Renda proveniente de rendimentos do trabalho (%)
Renda familiar per capita (%)
Balança Comercial (US$)

Dimensão Institucional:
Despesas com Ciência e Tecnologia
Despesas com educação
Despesas com cultura
Despesas com Assistência Social
Despesas com desporte e lazer
Despesas com urbanismo
Despesas com habitação urbana
Despesas com saneamento urbano
Despesas com gestão ambiental
Despesa total com saúde por habitante (R$)
Acesso a serviços de Telefonia Fixa
Comparecimento nas eleições
Número de Conselhos Municipais
Acesso à justiça
Transferências intergovernamentais da União
Fórum Internacional do Meio Ambiente - A conferência da Terra 381

A partir dos modelos de indicadores de sustentabilidade citados, o quadro 3 mostra a


síntese dos modelos abordando as dimensões , pontos fortes e pontos fracos.
MODELOS PER DPCSD DPSIR PAINEL DE IDS Brasil
SUSTENTABILIDADE
AUTORES OECD Gouzee e Smeets e Hardi e Zdan, 2000 IBGE, 2002 2
(1998) Hammond Weterings 2004
(1995) (1999)
DIMENSÕES Ecologica Ambiental Ambiental Natureza Ambiental
Social Social Social Social;
Econômica Econômica Econômica Econômico
Institucional Institucional
PONTOS Impacto Impacto Impacto Utiliza no mínimo Adaptado as
FORTES maior maior maior quatro particularidades
sobre o sobre o sobre o dimensões do Brasil,
público- público- público- Representação visual
alvo alvo alvo Influência maior sobre
Simples Simples Simples os tomadores de decisão
aplicação aplicação aplicação

PONTOS Ênfase no Ênfase no Ênfase no Excesso de dimensões Não contempla


FRACOS meio meio meio mascara a dependência a diferenciação
ambiente ambiente ambiente dos recursos naturais de peso às
Utiliza Utiliza Utiliza Impacto menor sobre o variáveis para
apenas apenas três apenas 3 público-alvo cada dimensão
três dimensões dimensões
dimensões Pouca Pouca
Pouca Influência Influência
Influência sobre os sobre os
sobre os tomadores tomadores
tomadores de decisão de decisão
de decisão

Quadro 3 : Síntese dos modelos de Indicadores de Sustentabilidade. Fonte: a autora.

Os modelos de sistema de indicadores de sustentabilidade são abordados sob uma


perspectiva limitada e estática por apenas indicar situações em que uma sociedade se encontra não
dando soluções viáveis de melhoria. Porém, ainda sim, a contribuição da reflexão sobre os modelos
de sistema de indicadores é de grande relevância para este estudo na medida em que fornecem
subsídios para o delineamento do processo de criação do conhecimento para o desenvolvimento de
ações de sustentáveis.

CONSIDERAÇÕES FINAIS
As questões relacionadas ao meio ambiente e ao desenvolvimento econômico estão
necessariamente vinculadas às questões de ordem social. O atual modelo de desenvolvimento
econômico traz como conseqüência, um processo exógeno de enfraquecimento das sociedades do
Terceiro Mundo, da sua cultura, submetendo-as a um modelo socioeconômico colonial criado pelos
países desenvolvidos que usa o pragmatismo tecnológico, cultural e econômico como estratégia
para impor a sua hegemonia.
Os modelos de sistema de indicadores de sustentabilidade disponibilizam informações
importantes que servirão de base para construção e criação do conhecimento acerca do uso desses
Fórum Internacional do Meio Ambiente - A conferência da Terra 382

indicadores por parte das organizações, principalmente as que têm atividade econômica que
apresentam riscos ambientais.
Os modelos de sistema de indicadores de sustentabilidade apenas indicam situações não
contemplando as formas de criação do conhecimento que subsidiam o desenvolvimento de
soluções. Nesse sentido, os indicadores de sustentabilidade são abordados sob uma perspectiva
limitada e estática. Porém, ainda sim, a contribuição da reflexão sobre os modelos de sistema de
indicadores é de grande relevância para este estudo na medida em que fornecem subsídios para o
delineamento do processo de criação do conhecimento para o desenvolvimento de ações de
sustentáveis.
O que significa que o debate sobre o desenvolvimento sustentável continua aberto aos
fóruns nacionais e internacionais, colocando para a sociedade um grande desafio: descobrir novos
produtos, manter e expandir a produção e realizar as atividades de exploração e tratamento dos
recursos naturais em perfeita harmonia com o meio ambiente, contribuindo para a equidade social e
para uma constante melhoria da qualidade de vida da população.

REFERÊNCIAS BIBLIOGRÁFICAS
ACIESP - ACADEMIA DE CIÊNCIAS DO ESTADO DE SÃO PAULO. Glossário de ecologia.
São Paulo: ACIESP/CNPq/FAPESP/SCT, 1987. 271p. (Publicação ACIESP, 57).
BANERJEE, Subhabrata Bobby. Quem sustenta o desenvolvimento de quem? O desenvolvimento
sustentável e a reinvenção da natureza. In: Contra-Discurso do desenvolvimento sustentável. Belém,
Associação de Universidades Amazônicas, 2003. p. 75-130.
BARTELMUS, P. Indicators of sustainable Growth and Development – Linkage Integration and
Policy Use. Background Paper of Scientific Workshop on Indicators of Sustainable Development,
Wuppetal, 1995.
CAIDEN, Gerald e CARAVANTES, Gerald. Reconsideração do conceito de desenvolvimento
sustentável. Caxias do Sul, EDUCS, 1988, 680 P.
CAPRA. F., A Teia da Vida. São Paulo, Cultrix, 1996.
GALLOPIN.G.C. Enviromental and sustainability indicators and the concept of situacional
Indicators.1996
GOLDSMITH , E.; ALLEN,R;ALLABY,M. Blueprint for Survival..Boston, Penguin, 1972
HARDI, P., BARG, S. Assessing sustainable development: principles in practice. Draft paper,
Winnipeg: IISD, 1997
HAWKEN, P.; LOVINS, A.; LOVINS, L. H. Capitalismo natural. São Paulo, SP: Cultrix, 1999.
HERCULANO, Selene C. Do desenvolvimento (in) suportável à sociedade feliz. In:
GOLDEMBERG, MIRIAN (Coord.). Ecologia, ciência e política. Coletânea. Rio de Janeiro:
REVAN, 1982.
LEFF. E. Saber Ambiental. Sustentabilidade, Racionalidade, Complexidade e Poder.Ed.Vozes.5
edição.2007.
LIRA, Waleska Silveira. Sistema de Gestão do Conhecimento para indicadores de
sustentabilidade.Exame qualificação de Doutorado.Programa de Pós-Graduação em Recursos
Naturais.UCG.2007.
MARTINEZ ALIER, Juan "Economia y ecologia: cuestiones fundamentales", Pensamiento
Iberoamericano, 1987
PRONK, J.; HAQ, M. Desarrollo sustenible: del concepto a la accion. Haya: edit, 1992.
REDCLIFT, Michael. Sustainable Development, Exploring the contradictions, London: Methuen,
1987.
SACHS, I. Ecodesenvolvimento: crescer sem destruir. São Paulo: Vértice,1986.
SÁNCHEZ, L.E. Projetos de recuperação: usos futuros e a relação com a comunidade. In: I
Encontro de Mineração no Município de São Paulo. Anais... São Paulo: Secretaria das
Administrações Regionais da Prefeitura do Municipal de São Paulo, 1994. p. 53-73.
Fórum Internacional do Meio Ambiente - A conferência da Terra 383

RESGATE DA CIDADANIA E GERAÇÃO DE RENDA EM COMUNIDADES RURAIS


DA AMAZÔNIA

Antonio Zacarias Paes


azp.pesca@hotmail.com

RESUMO
O presente artigo discute uma nova perspectiva de desenvolvimento sustentável para a
Amazônia, uma vez que os tantos projetos e programas elaborados pelos governos, em nível
municipal, estadual e federal acentuaram na região uma série de aspectos negativos, entre eles:
violência por disputas de terras, empobrecimento do povo amazônico e desmatamento da floresta. E
hoje, é lançado o desafio de se propor novas visões sobre esses aspectos, a fim de se construir
projetos aplicados à sustentabilidade da região amazônica, com objetivos de viabilidade técnica,
ecologicamente correto, economicamente viável e socialmente justo.
Palavra Chaves: Sustentabilidade, Amazônia, meio ambiente, socioeconômico.

ABSTRACT
This article discusses a new perspective of sustainable development for Amazônia, since so
many projects and programs are developed by governments, at the municipal, state and federal level
accentuated in the region a number of negative aspects, including: violence on land dispute,
Amazon impoverishment of the people, and deforestation of the forest, among many others. And
today, it launched the challenge to propror new visions on these aspects in order to build projects
applied the sustainability of the Amazon region, objectives of technical ecologically correct,
economically viable and socially just.
Fórum Internacional do Meio Ambiente - A conferência da Terra 384

A Amazônia tem sido discutida pelos governantes, ONGs, entidades ligadas a preservação
do meio ambiente, em fim por todos os setores sociais, porém ao longo do tempo pouco ficou, de
fato para o povo amazônico em relação a preservação da floresta, uso racional dos recursos
renováveis, o combate as queimadas,desenvolvimento sustentável do homem e do meio ambiente.
Dentro desta ótica a região amazônica vem sendo dilapidada por projetos incoerentes e
irresponsáveis tanto com o homem quanto com o meio ambiente, hoje a região é o centro de
notícias tanto a níveis locais, regionais, nacionais e internacionais, como uma região marcada pela
violência no campo, pela disputa da terra, pelo desmatamento da floresta, pelos projetos de
mineração, pecuária, monocultivos de soja e cana-de-açúcar, e assoreamento dos rios e por o fim a
desertificação da Região amazônica.
Diante desses desafios nos colocamos a repensar sobre as novas práticas para a região
amazônica, uma vez que as ondas de invasões promovidas pelos movimentos sociais, e do outro
lado os “pseudo fazendeiros” armados para protegerem suas “Terras” na verdade estão protegendo a
madeira que tem na área, e que por sua vez já foi negociada e precisa ser cortada, e as autoridades
governamentais assistem passivamente a tudo isso. Sem proporem políticas publicas capazes de
reverter tal quadro.
Este cenário é em que a Região Amazônica agoniza e pede por socorro, neste contexto o
tema pesquisado nos oferece uma visão global do estudo realizado, esclarecendo as delimitações
estabelecidas na abordagem do assunto, os objetivos e justificativas que nos levaram a um trabalho
relacionado a problema, para, em seguida, apontarmos as respostas.
Foi elaborado projeto de pesquisa com enfoque de um estudo de caso, ao desafio do
contexto amazônico baseados nesses princípios, fizemos uma pesquisa de campo junto as
comunidades rurais no Município de Bragança Estado do Pará , os resultados obtidos refletem a
realidade das famílias que vivem na zonas rurais da região. Os resultados obtidos foram: não
possuem conhecimento sobre novas práticas para cultivo da terra para o seu sustento e de suas
famílias, cultivam em várias áreas utilizando práticas de destoca e queima para o plantio,
desmatamento da mata ciliar para o plantio de várzea, derrubada da floresta para a venda da
madeira para setor madeiro enfim o próprio amazônida ajudando a destruir a sua floresta.
A pesquisa foi desenvolvida em Bragança, também conhecida como Pérola do Caeté, está
a 215 Km de Belém. O acesso se dá percorrendo a BR-316 por 165 Km até Capanema, já na Pará-
Maranhão. Após, segue-se viagem pela PA-242, num percurso adicional de 50 Km chegando-se a
Bragança. A ligação da sede do município com as vilas e distritos é realizada por estradas asfaltadas
ou em revestimento primário.
Fórum Internacional do Meio Ambiente - A conferência da Terra 385

O Município de Bragança pertence a Messoregião do Nordeste Paraense e a Região


Amazônica Oriental . A sede Municipal tem as seguintes coordenadas: 01º 03’15’’ de latitude Sul e
46º 46’ 10 “ de longitude a Oeste de Greenwich.

O clima do Município de Bragança, conforme dados obtidos junto ao IBGE e, localmente,


na Estação Meteorológica de Tracuateua, é similar ao da média da Região Bragantina: equatorial
superúmido, com temperatura máxima de 33º C e mínima de 18º C, sendo a média de 27º C. O
índice pluviométrico se situa em torno de 2.501 mm/ano, com período chuvoso nos primeiros seis
meses do ano e forte estiagem entre os meses de agosto e novembro.
No Município, estão presentes os solos de terra firme representados pelo Podzóico
Vermelho-Amarelo, textura média e o Latossolo Amarelo cascalhento. Nas várzeas, estão presentes
os Solos Hidromórficos Indiscriminados Aluviais e Solos Indiscriminados de Mangue.
Começamos a construir um projeto de sustentabilidade e geração de renda junto as
Associações de agricultores, pescadores artesanais, sindicatos com parceria da UFRA (Universidade
Federal Rural da Amazônia) um trabalho de coletas de dados, junto a 120(cento e vinte), famílias as
quais apresentaram os seguintes dados: 62%(sessenta e dois por cento) das famílias vivem abaixo
dos índices de sustentabilidade, 22% com renda de até 01(um) salário mínimo 16% (desesseis por
cento) com mais de 01(um) salário mínimo, apesar de estarem em uma região com vários recursos
naturais renováveis, porém com agravantes históricos de práticas insustentáveis já citadas
anteriormente. Começar-se então a elaboração do projeto de Resgate da Cidadania e Geração de
Renda nas Comunidades da Amazônia, com objetivos de desenvolvermos novas práticas com
velhos conhecimentos.
A metodologia adotada foi a partir do perfil das famílias de estarem abertas ao novo perfil
de cultivos para alcançar os objetivos do projeto, tais como: o envolvimento dos membros da
família e abertura a compreender e praticar o associativismo. O processo produtivo em um conceito
da permacultura, em círculos concêntricos compreendidos em, uma área de 50X50 metros
quadrados ou ¼ de hectare, desenvolverá o cultivo integrado em círculos de várias culturas, sendo
que no centro um tanque para a criação de peixes, no primeiro círculo os pequenos animais como,
por exemplo, patos,galinhas que farão adubação e aeração da água, e nos demais círculos serão
cultivados 54(cinqüenta e quatro) culturas diversificadas, nos três primeiros círculos será para o
sustento da família e demais serão para a comercialização.
Os prováveis resultados obtidos com esse projeto poderão historicamente
desencadear ações que promovam a justiça social, o resgate da cidadania, geração de renda as
Fórum Internacional do Meio Ambiente - A conferência da Terra 386

famílias que hoje vivem com rendas abaixo da linha da miséria ou de rendas dos aposentados, o
equilíbrio ambiental, a segurança alimentar de milhares de famílias, estanque do êxodo rural, a
educação para o consumo dos produtos oriundos dessas práticas, e uma renda capaz de suprir as
necessidades do homem e de sua família.
Com esses objetivos propostos no projeto, que o Governo do Estado do Pará aprovou e
disponibilizou recursos na ordem de R$ 100.000,00(cem mil reais), para a sua implantação, que
conta com parceria da SEPAQ(Secretaria de Estado de Pesca e Aqüicultura), Agência
Mandalla,UFRA,Sindicato dos Produtores Rurais de Bragança ,Emater-Pará, SAGRI( Secretaria
Estadual de Agricultura) e há um direcionamento por parte do Governo do Estado em transformar o
projeto em políticas públicas de combate a destruição da floresta amazônica, justiça social,
segurança alimentar e preservação do meio ambiente.
O projeto surgiu a partir de trabalhos que venho desenvolvido junto às comunidades rurais
e demais categorias ligadas ao setor produtivo primário do Estado do Pará e principalmente no
Município de Bragança que são: os Pescadores Artesanais, Agricultores Familiares, Quilombolas,
Assentados e Índios, ao percebermos a escassez alimentar que passam essas famílias e devido a
práticas extrativistas herdadas de seus antepassados, como por exemplo: a destoca e queima da área
para o plantio, a destruição da mata ciliar o desequilíbrio ambiental que levaram ao longo do tempo
ao empobrecimento do solo e ao desmatamento das florestas na Região Amazônica, bem como o
assoreamento dos rios, lagos e mares, e que ao longo do tempo o que restou aos povos da Amazônia
foram os impactos drásticos ao meio ambiente e a Floresta Amazônica e ao homem, aliado a estes
fatos, está o desmatamento promovidos pelos os "pseudos fazendeiros", que com o discurso de
progresso desmatam a floresta, promovem a matança de pessoas que não curvam as suas ganâncias
financeiras e não aceitam a destruição da floresta, para criação de gado e para grandes plantações de
monoculturas de soja e cana-de-açúcar. Ocasionando com isso empobrecimento do solo o
assoreamento dos rios, que por sua vez não descarregam mais nutrientes nos mares, causando com
isso o desequilíbrio nos manguezais da região, como conseqüência a fome, a miséria é o que
resultam para as famílias que estão na Região Amazônica.
Essa nova Abordagem em relação a outros tantos projetos já elaborados para a Amazônia,
e que ao longo do tempo não conseguiram alcançar os seus objetivos propostos, que me vez buscar
uma idéia verdadeiramente inovadora para frear a destruição da região amazônica, diante do
exposto o projeto resgate da cidadania e geração de renda em comunidades rurais de Bragança-Pará,
que tem com sub-projetos para o desenvolvimento, o Mandalla e a Roça sem Fogo, que têm por
objetivos a agricultura familiar, a integração de diversas culturas cultivadas organicamente e
tecnologias sociais caracterizadas pela simplicidade e inovação criativa, onde é possível alimentar
todo o núcleo familiar envolvido e gerar excedentes que podem atingir uma renda mensal de até R$
2.000,00(dois mil reais),por família, como o projeto trabalha com aspectos de equilíbrio ambiental e
sistêmico, logo não precisará mais das queimadas a nossa floresta, logo, a nossa mata ciliar que
estava sendo destruída, voltará a defender os nossos rios e conseqüentemente voltará a depositar os
nutrientes nos mares, necessários para a nossa fauna e flora marinha, possa restabelecer o equilíbrio
nos nossos manguezais. .

REFERENCIAS BIBLIOGRAFICAS
BARRETO, G E RAIOL. Unidades de Conservação Estaduais do Pará na Região da Calha Norte do
Rio Amazonas. 2007.
SOUZA JR. C, VERÍSMO, A, COSTA, A, SALOMÃO, R; BALIEIRO, C, RIBEIRO, J. 2006.
Belém: Imazon.
Fórum Internacional do Meio Ambiente - A conferência da Terra 387

POBREZA E DEVASTAÇÃO FLORESTAL NO BRASIL: UMA ABORDAGEM


HISTÓRICA

Diogo de Carvalho Cabral


Núcleo de Pesquisas em Geografia Histórica (NPGH), Departamento de Geografia – IGEO. Centro
de Ciências Matemáticas e da Natureza, Universidade Federal do Rio de Janeiro. Prédio do CCMN
Bloco I sala: 20 - Cidade Universitária – Ilha do Fundão, Rio de Janeiro, RJ, – CEP. 21941-972.
diogocabral@superig.com.br

RESUMO
O artigo procura historicizar a questão da retro-alimentação positiva entre pobreza e
devastação florestal (tributária da chamada “tese do círculo vicioso”), no Brasil. Para isso, remonta-
se até a época colonial, a fim de se analisar como a economia de então se imbricava com a
ecorregião da Mata Atlântica. Verifica-se que a desigualdade sócio-econômica ‘originária’
proveniente tanto do sistema sesmarial quanto do regime escravista eram guiados por uma lógica
cultural aristocratizante. O advento do capitalismo, nos anos 1930, não transformou, em nenhum
sentido fundamental, essa dinâmica de exclusão; ele apenas submeteu o “ideal de enobrecimento”
às regras de acumulação próprias de um sistema globalizado de produção e consumo, como
podemos observar no cenário da Amazônia pós-1970.
Palavras-chave: pobreza, devastação florestal, história, Mata Atlântica, Amazônia.

ABSTRACT
The article attempts to historicize the positive feedback between poverty and forest
devastation (derivative from the so-called “vicious circle thesis”) in Brazil. In order to do that, it
reconstructs the colonial period to analyze how the colonial economy overlapped with Atlantic
Forest’s ecoregion. It’s found that the ‘original’ socioeconomic inequality proceeding from the
allotment system as well as from slavery were guided by an aristocrating cultural logic. The advent
of capitalism back in the 1930’s didn’t transform, in any sense, this dynamics of exclusion; it’s just
submitted the “ennoblement ideal” to the rules of accumulation pertaining to a global system of
production and consumption, as we can observe in the Amazon post-1970’s scenery.
Key words: poverty, forest devastation, history, Atlantic Forest, Amazon.

INTRODUÇÃO
A busca de um “desenvolvimento sustentável”, no plano político-institucional, supõe,
necessariamente, que sejam conhecidas as redes de causalidades por trás da crise ambiental
contemporânea. Após a publicação do famoso “Relatório Brundtland” (WCDE, 1987), as pesquisas
acerca desses fenômenos foram dominadas por uma concepção generalizada de que os países em
desenvolvimento exercem um papel crucial na exaustão dos recursos naturais do planeta – um
papel, com efeito, mais importante do que aquele jogado pelas nações ditas desenvolvidas.
Subjacente a esta visão jaz a premissa de que o grau de pobreza da população (e, especialmente da
população assentada em áreas rurais) é, a um só tempo, a maior causa e o maior efeito da
degradação ecológica. Dessa concatenação, surgiu uma extensa literatura que procurou avançar
teórica e empiricamente essa hipótese, a qual acabou desembocando na chamada “tese do círculo
vicioso” (Finco e Waquil, 2004).
Esta corrente de pensamento, notadamente desenvolvida por economistas de formação
neoclássica, sustenta que as comunidades rurais dos países periféricos e semi-periféricos dependem
mais diretamente da exploração dos recursos naturais do que quaisquer outras. Contudo, esses
recursos possuem, em geral, a características de bens públicos, ou seja, são de comum acesso e não
contam com direitos de propriedade definidos, o que faz com que sejam utilizados sob o conceito de
use as vou please. Deste modo, num claro raciocínio à la “tragédia dos comuns” (Hardin, 1968),
como nenhum indivíduo tem responsabilidade sobre a conservação dos serviços ambientais
oferecidos por aqueles espaços – pois “o que é de todos não é de ninguém” –, a tendência é o uso
Fórum Internacional do Meio Ambiente - A conferência da Terra 388

não-sustentável dos mesmos. Nesta visão, portanto, a condição de pobreza rural, atuando como
maior causa da degradação, cai numa espécie de espiral decrescente e passa a criar as condições da
sua própria perpetuação.
Enquanto elaboração formal – embora demasiadamente simplista –, a tese do círculo
vicioso é pertinente e, com efeito, o autor destas linhas concorda com ela. Contudo, “o formalmente
possível não é o empiricamente provável” e, neste sentido, se é teoria científica o que realmente
queremos desenvolver, “o primeiro só é útil na medida em que nos leva ao segundo” (Kaplan,
1968:247). O problema, portanto, está no modo como se vem tentando demonstrar a dita
formulação. A pobreza não pode ser tratada como um fenômeno atomizado, unidimensional e a-
histórico, isto é, de uma maneira que a isole da dinâmica sócio-espacial mais ampla. Como
visualizar a pobreza sem a riqueza, o rural sem o urbano, o presente sem o passado? Trazendo,
então, o problema para o campo da economia política, o fenômeno da pobreza é re-equacionado
como uma questão de desigualdade – desigualdade social e regional.
Assim como ao economista cabe, no que tange à explicação das disparidades sócio-
econômicas do país, “assumir o risco de ir além dos limites que circundam o seu terreno
profissional [...] mediante a introdução de considerações histórico-contextuais” (Barros et al.,
1997:40, grifo meu), também o problema da relação entre desigualdade e degradação ambiental
deve ser encarado sob essa perspectiva. Deste modo, mostra-se bastante instrutivo o exame das
dinâmicas geo-históricas que regeram a devastação da Mata Atlântica brasileira. A matéria de nosso
estudo reside, então, no modo como os mecanismos mais básicos de reprodução social do país
foram modelados na convivência histórica com o complexo de florestas costeiras, ao longo dos
séculos XVI, XVII e XVIII. Embora obviamente alterados por processos mais recentes, estes
mecanismos ressoam até hoje e respondem, em grande parte, pelas dificuldades que encontramos
em mitigar a degradação do nosso território e da nossa gente.

A formação do sistema capitalista global, a ‘ecologia-mundo’ e o Brasil


O mundo em que vivemos e seus problemas são uma manifestação contemporânea da
economia-mundo capitalista. Esta pode ser caracterizada como uma forma hierárquica e integrada
de divisão do trabalho que começou a se desenvolver há cerca de meio milênio na Europa ocidental
e se expandiu, chegando a abarcar todo o globo, no começo do século passado (Taylor, 1997). Esse
sistema pressupunha intensos fluxos de bens e pessoas, tendo como corolário um fantástico
intercâmbio de plantas, animais e micro-organismos (na maioria das vezes patogênicos) por todo o
planeta, algo que Moore (2003) chamou de “ecologia-mundo”.
Em uma primeira aproximação, portanto, o Brasil precisa ser pensado como um ponto de
encruzilhada nesse processo que conectou todos os seres e saberes do planeta, na aurora do século
XVI. A civilização brasileira nasceu da adaptação de interesses coloniais a ecossistemas estranhos
ao âmbito europeu, foi construída a partir do entrelaçamento de matérias-primas, mão-de-obra,
sistemas de cultivo e modos de vida da Europa ocidental, da América pré-colombiana e da África
negra. Na base da combinação destes elementos formadores, a posição dominante dos colonizadores
foi decisiva para estabelecer uma desequilibrada correlação de forças (Cardoso e Brignoli, 1979).
Com total desconhecimento das particularidades daquela paisagem, os colonizadores
portugueses trouxeram para a Mata Atlântica todo um complexo ecológico que incluiu o cavalo e o
boi, animais domesticados inexistentes nos trópicos, mas também doenças contras as quais os
ameríndios não tinham defesas imunológicas, como o sarampo e a varíola. O ambiente inóspito para
os europeus permitiu, contudo, a resistência de certos grupos indígenas e a sobrevivência de muitos
de seus traços culturais, o mais notável deles sendo a agricultura de derrubada-e-queimada. Os
africanos entraram em cena um pouco mais tarde, essencialmente como força de trabalho para a
submissão de toda aquela densa mata, mas também com seus conhecimentos agrícolas (o cultivo do
arroz, por exemplo) e religiosidades.
Este processo através do qual homens, plantas, animais e micro-organismos de três
continentes se encontraram e, sob a égide dos europeus, criaram uma nova geografia neste rincão
tropical do planeta pode ser parcialmente compreendido através do conceito de “neo-Europas” de
Fórum Internacional do Meio Ambiente - A conferência da Terra 389

Crosby (1993). Elas são definidas como tentativas de replicar o modo de vida europeu no além-mar,
em espaços similares ao Velho Mundo do ponto de vista climático – notadamente as porções
temperadas e subtropicais da América e da Oceania. Seu esquema, contudo, embora útil em muitos
aspectos, precisa ser adaptado para as “neo-Europas mestiças”, ou seja, a Ibero-América tropical.
No caso do Brasil, é preciso levar em consideração todas as especificidades das formações sócio-
econômico-culturais tipicamente ibéricas.
Morse (1988) argumenta que a Ibéria seria uma outra vertente do Ocidente e encerraria
uma possibilidade civilizatória mais flexível e incorporadora que a matriz anglo-saxã. A este quadro
devem ser adicionados os achados da historiografia portuguesa mais recente, achados estes que
mostram que o Antigo Regime luso destacava-se, no cenário europeu e mesmo ibérico, pela
estrutura social radicalmente arcaica. No que importa mais diretamente para nós aqui, isto significa
que a colonização do Brasil e sua conseqüente incorporação na economia-mundo não foi, como por
décadas se sustentou, baseada na exploração por parte do capital mercantil metropolitano. De fato,
não havia, no reino, uma classe propriamente burguesa estabelecida, de modo que era a Coroa o
veículo primordial do comércio ultramarino, desde o século XV até meados do XVII (Thomaz,
1994).
Quando falamos em “Coroa” – ou mesmo “Estado” –, leia-a se as relações quase
simbióticas entre o rei e a aristocracia, relações estas baseadas numa extensa rede de clientelismo.
Tratava-se de uma elite cortesã que monopolizava os principais cargos e ofícios no paço, no
exército e nas colônias (Monteiro, 1998). É neste sentido que a figura dos fidalgos-mercadores
ganha toda a sua importância: eram membros da aristocracia que enriqueciam no Ultramar através
da arrematação de direitos sobre arrecadação de impostos comerciais com o objetivo de ampliar
e/ou manter terras, rendas e prestígio na metrópole. Em face de um projeto colonizador que
prescindia de uma burguesia metropolitana forte, foi possível à economia colonial brasileira
adquirir certo grau de autonomia (Fragoso e Florentino, 2001).

A Mata Atlântica e a economia colonial


A Mata Atlântica foi o principal baluarte físico-geográfico da formação colonial,
fornecendo, ao longo de mais de três séculos, a maior parte da matéria-bruta utilizada no
empreendimento ultramarino português. E essa matéria-bruta não se restringiu ao solo usurpado a
ferro e fogo da floresta. Como toda apropriação é multiforme, como toda paisagem natural pode ser
recursalizada, simultaneamente, de diversas formas, a floresta foi derrubada e queimada, sim –
afinal, para morar na floresta, o homem necessariamente a remove –, mas também cultivada,
drenada, caçada, estradada, madeirada.
A análise desse processo econômico-ecológico de conversão de floresta em tecnosfera
social deve incorporar, contudo, um importante componente cultural. Mesmo que os processos de
recursalização da floresta sejam conduzidos por agentes que operam dentro de uma racionalidade
econômica instrumental, não devemos nos deixar seduzir pela forma, posto que seja o conteúdo,
isto é, a motivação, que nos interessa. Se a existência da floresta, enquanto entidade fisionômico-
paisagística, materialidade geográfico-natural, não deve ser desvinculada dos significados que as
diversas sociedades lhes conferem, por quê a sua transformação deveria? Enquanto ação ambiental,
esse processo deve ser estudado de um ponto de vista substantivo, atento às lógicas cognitivas
historicamente circunscritas dos atores que a peformatizam.
O que a nova historiografia econômica brasileira mostra é que, para os agentes coevos, o
agenciamento econômico era um meio, e não um fim em si mesmo; não havia uma esfera de
motivação econômica individualizada. Considerando os efeitos da circularidade cultural,
observamos que o chamado “ideal aristocratizante” herdado do reino permeava a ideologia de toda
a sociedade colonial. A alta disseminação da propriedade de cativos pelo tecido social mostra como
esse ideal alinhava-se pari passu ao escravismo, enquanto a alta concentração dessa mesma
propriedade nos aponta para uma sociedade na qual o principal objetivo da renda extraída ao
escravo não é a reprodução ampliada do capital, mas a reiteração da diferença socioeconômica entre
Fórum Internacional do Meio Ambiente - A conferência da Terra 390

a elite escravocrata e todos os outros homens livres, isto é, a reiteração do mecanismo produtor do
poder (Fragoso e Florentino, 2001).
O mais importante, aqui, contudo, é perceber as derivações desse fato no que tange ao
grupo que controlava a reprodução da economia, isto é, os grandes comerciantes. Para estes, o
desejo de afastar-se do mundo trabalho e, mais ainda, o desejo de controlar terras e homens
conduzia a um investimento em status, e não em produção material. E é exatamente neste ponto que
encontramos o maior empecilho à aplicação tout court do conceito de capitalismo à realidade
colonial brasileira. Recorramos ao pensamento clarividente de Wallerstein. Segundo ele, do ponto
de vista histórico, a existência de capital (isto é, o estoque de bens consumíveis, maquinário, e/ou
demandas reconhecidas de coisas materiais que se expressam sob a forma de dinheiro), por si só,
não define um sistema social capitalista. É preciso que essa acumulação dos resultados do trabalho
passado seja usada (investida) de maneira especial, tendo como intenção primordial a auto-
expansão. “Nesse sistema, o que se acumulou no passado só é ‘capital’ na medida em que seja
usado para acumular mais da mesma coisa” (Wallerstein, 2001:13).
Não era esse o caso dos agentes econômicos coloniais – pelo menos não majoritariamente
– e também não surpreende, neste contexto, que a esterilização do excedente e a escravidão
constituíssem traços estruturais dessa economia. Sabe-se que, por si mesma, uma economia
marcada pela hegemonia do capital mercantil esteriliza enorme parcela do excedente produzido. E o
que, em termos ecológicos, significa a esterilização do excedente, senão um fluxo unilateral de
matéria (elementos químicos) e energia para fora dos ecossistemas domesticados, um déficit
permanente que impõe uma renovação dos estoques de nutrientes baseada num avanço sem-fim
sobre novas terras e novas matas?
Não obstante, isso não significa, em absoluto, que algum tipo de “riqueza social” não fosse
produzida a partir da “riqueza florestal”, no Brasil-Colônia. Quando menciona os “escritórios
governamentais, os fortes, as igrejas e conventos do Rio de Janeiro, a zona de mineração e uma
única estrada não pavimentada que os conectava” como as únicas expressões de conversão do
capital in natura contido na floresta em capital social, Dean (1996:132) considera apenas o valor
agregado ao solo (capital fixo) e esquece, imperdoavelmente, de contabilizar a principal forma de
riqueza de giro encontrada na economia colonial: os escravos africanos.68 Embalado pela crítica
apaixonada a um sistema de trabalho no qual “a conservação da vida humana era irrelevante”
(Idem:75-6), o historiador norte-americano inevitavelmente acaba por identificar a escravidão
também a uma completa irrelevância atribuída à conservação dos recursos ambientais.
Mas o escravo, em si mesmo, não era uma riqueza? Se não o fosse, como poderia trabalhar
para destruir algo? Independentemente da validade empírica de sua hipótese mais polêmica – a de
que os negros africanos foram originalmente introduzidos, no Brasil, como meio de liquidação
monetária –, é inevitável concordar com Caldeira (1999) em sua afirmação de que os escravos
eram, juntamente com a terra, os principais ativos da economia, ao mesmo tempo fonte de formação
e aprisionamento de todas as fortunas rústicas. Como as opções de investimento, devido à falta
crônica de numerário, eram restritíssimas, o destino do sobretrabalho escravo era sempre o de
realimentar o sistema extensivo, requisitando e/ou ocupando mais terras, donde eram necessários
mais cativos.
Neste quadro, a posse de escravos – malgrado todos os riscos relativos à alta mortalidade
negra – constituía-se num importante signo de reserva de valores (Idem:72). Argumentando nessa
direção, Cardoso (1962) propôs um equivalente para a expressão típica de toda a documentação
colonial e imperial brasileira, qual seja, a “deficiência de braços”. “Esta ‘deficiência de braços’ era,
realmente, uma deficiência de capitais”, diz ele. Ter escravos, portanto, significava não somente ter
trabalhadores à disposição; significava também ter capital, excedente acumulado ou, em outras
palavras, “reinvestir, sob a forma de mão-de-obra escrava, o excedente gerado por seu trabalho”
(Cardoso, 1962:58-9).

68
Vale lembrar que é somente a partir do último quartel do século XIX que a terra começa a substituir, de forma mais
significativa, o escravo como equivalente de capital. Cf. Martins (1986:23-34).
Fórum Internacional do Meio Ambiente - A conferência da Terra 391

Conforme o próprio Dean (1996:133) comentou, “as colônias não estão necessariamente
condenadas a níveis de formação de capital inferiores aos de suas metrópoles”. De fato, é o que a
nova historiografia econômica tem mostrado para o caso brasileiro, principalmente a partir do
século XVIII. O Brasil produzia muita riqueza e – o que é mais importante –, retinha uma parte
bastante significativa dela. A principal forma na qual se consubstanciava essa grande quantidade de
valor retido era exatamente a mercadoria humana. Para se ter uma idéia, no início do século XIX,
quase 40% da população brasileira era composta por escravos negros e mulatos (Marcílio, 1999), o
que equivale a dizer, em última análise, que 2/5 do contingente demográfico colonial era composto
de homens e mulheres que, em si mesmos, representavam repositários de valor mobilizável e
reproduzível, tanto biológica quanto economicamente.
Parece-me que a questão não é, absolutamente, se a economia colonial brasileira produziu
capital internamente ou não, mas sim como esse capital era produzido ou, em outras palavras, como
os meios de produção e a renda eram apropriados pela sociedade. Os principais meios de produção
eram, naturalmente, a terra e os escravos. O regime de grandes propriedades viabilizado pelo
sistema sesmarial dificultava bastante a emergência de uma classe camponesa com um vínculo mais
orgânico e sedentário com o ambiente. Como requisito à doação de sesmarias, a Coroa exigia que o
pretendente demonstrasse ter recursos suficientes (principalmente escravos) para cultivar a terra.
Assim é que muitos colonos portugueses e mestiços acabaram não tendo acesso à terra. Os mais
abastados podiam adquirir ou aforar pequenas porções de sesmarias de outrem. Grande parte,
entretanto, transformou-se em meeiros, rendeiros ou simples “agregados” dos latifundiários,
formando toda uma classe de pobres livres que habitava o campo, mas que não possuía bens de raiz
(Abreu, 1997).
Esse contingente de homens livres e pobres (que cresceu exponencialmente no século
XVIII) desempenhou papel fundamental na dinâmica de crescimento da economia de exportação.
Os latifundiários nunca empregavam seus próprios meios de produção – os escravos – na tarefa de
“limpar” a mata o plantio de cana, algodão, tabaco, etc. Além da óbvia facilidade propiciada para a
fuga, os negros podiam ser feridos ou mortos por picadas de insetos ou cobras, galhos ou árvores
que tombavam, fogos descontrolados ou quaisquer outros tipos de acidentes. Assim, na maioria das
vezes, a empreitada era confiada a trabalhadores livres de alguma forma ligados à extensa família
patriarcal, em troca do direito de usar temporariamente as áreas desmatadas para a agricultura de
subsistência e/ou comercialização das madeiras retiráveis. Este era o principal mecanismo através
do qual se gerava pobreza e devastação florestal a um só tempo.

MODERNIZAÇÃO CAPITALISTA PÓS-1930: RUPTURAS E CONTINUIDADES (O CASO


DA AMAZÔNIA)
Pode-se afirmar que a generalização de relações sociais propriamente capitalistas, no
Brasil, ocorre somente a partir da década de 1930, quando o Estado autoritário chama para si a
responsabilidade de promover o desenvolvimento econômico e acabar com o “atraso”. O
pensamento desenvolvimentista relacionava a modernização com o crescimento econômico e a
“ocidentalização”, propiciando o nascimento de grandes disparidades sociais e regionais. Neste
caso, a modernização via industrialização urbana se fazia precípua para alavancar o país. Para que o
desenvolvimento via industrialização se processasse, o Estado deveria intervir para controlar e
precipitar esta industrialização.
Mas, conforme observou Fernandes (apud Szmrecsányi, 1986:173), a modernização
industrial “(...) não é em si mesma um fator de mudanças da situação ou de superação efetiva das
iniqüidades sócio-econômicas, culturais e políticas.” É neste sentido que se fala, comumente, de
uma modernização “dolorosa”, desigual e conservadora. O Brasil, segundo Oliveira (1981:12, 36),
não pode ser visualizado sob o prisma do dualismo/antagonismo arcaico-moderno, mas sim como
uma verdadeira simbiose, “uma unidade de contrários, em que o chamado ‘moderno’ cresce e se
alimenta da existência do ‘atrasado’”. Nisto reside a originalidade da expansão do capitalismo no
Brasil: a introdução de relações novas no “arcaico” e na reprodução de relações “arcaicas” no novo,
nesta compatibilização da acumulação global “em que a introdução das relações novas no arcaico
Fórum Internacional do Meio Ambiente - A conferência da Terra 392

libera força de trabalho que suporta a acumulação industrial-urbana e em que a reprodução de


relações arcaicas no novo preserva o potencial de acumulação liberado exclusivamente para os fins
de expansão do próprio novo”.
Neste contexto, defendo que a conformação de uma “economia capitalista”, no Brasil, não
transformou, em nenhum sentido fundamental, as dinâmicas ancestrais que ligam a pobreza rural e a
degradação do meio ambiente. A economia colonial era modelada na tensão entre um sistema de
repressão da força de trabalho, que tendia a reproduzir a economia agro-exportadora através da
rígida estratificação senhor-escravo, e uma demanda por alimentos e outros insumos criada por essa
própria economia, aliada à existência de terras livres. No movimento concreto da sociedade
colonial, a interdependência entre plantation e pequena produção de alimentos podia ser observada
no processo de alargamento da fronteira econômica: era comum suceder à fase de sertão de floresta
tropical a apropriação da terra pelos grandes fazendeiros vinculados à lavoura de exportação,
aproveitando-se da “domesticação” do ambiente (a “limpeza” parcial da mata, a construção de vias
de acesso) já executada pelos ocupantes precedentes. Disto resultava que, no Brasil colonial, salvo
raras exceções, ao pequeno produtor rural não era possível estabelecer um vínculo de cooperação
com o ambiente:
Não havia tempo para isso, ele não podia perder sequer uma única oportunidade de extrair
da natureza qualquer mercadoria que lhe proporcionasse bons rendimentos no momento da troca;
afinal de contas, nunca se sabia quando o senhor de engenho ao lado iria expulsá-lo de suas terras e
deixá-lo à deriva pelo sertão. Em outras palavras, a extrema instabilidade e precariedade de seu
relacionamento com a terra parece ter produzido um vínculo de saque entre o pequeno produtor de
subsistência e o ambiente [...] (Cabral, 2004:138, grifo no original).
Esta dinâmica não me parece muito diferente daquela protagonizada pelas “frentes
pioneiras” e “frentes de expansão” no Brasil contemporâneo, notadamente na Amazônia, a partir de
1970. As “frentes pioneiras” eram constituídas por enormes contingentes de população pobre
provenientes principalmente das regiões nordeste e sul do país. Esses migrantes em busca de terra e
trabalho foram “direcionados” pelo Estado autoritário de forma a mitigar os conflitos sociais no
agro brasileiro, valendo-se de propaganda político-ideológica e da construção de grandes vias
rodoviárias que possibilitaram o acesso à última grande fronteira florestal do território. Muitos
foram os projetos oficiais de colonização empreendidos pelo poder público, assentando milhares de
famílias de agricultores na porção sul dos estados de Mato Grosso, Rondônia e Pará, porém com
pouca ou nenhuma assistência técnica. Essas famílias faziam o que podiam: desbastavam a floresta,
implantavam precárias vias de comunicação, tentavam plantar; mas deixados à própria sorte (leia-se
sem conhecimento adequado dos processos ecológicos da região e, principalmente, sem nenhuma
política governamental que os protegesse dos mecanismos perversos do mercado), logo se viam
completamente depauperados. Era inevitável que, mais cedo ou mais tarde, fossem obrigados a
vender seu lote de terra para os grandes agentes capitalistas69 e voltar para seu solo natal ou, então,
se proletarizar.
Os grupos econômicos nacionais ou estrangeiros – a “frente de expansão” (do capital) –
procuravam terras de boa qualidade para pastagens ou lavouras. A preferência obviamente era por
terras já desmatadas pelos antigos “colonizadores” ou simples posseiros (Picoli, 2006). Afinal de
contas, isso diminuía consideravelmente os custos de implantação dos projetos agro-pecuários.
Mesmo que o desmatamento não fosse tão caro quanto na época colonial, a racionalidade capitalista
sempre orienta a diminuição dos custos e, apesar dos avanços tecnológicos (tratores, serras elétricas,
etc.), desalojar uma densa floresta tropical não era propriamente “barato”. O valor agregado ao solo
pelos pequenos produtores era usurpado pelos agentes capitalistas, que o reproduziam, então, de
maneira ampliada, na forma de grandes latifúndios voltados para o comércio externo. De fato, a
maior parte do desmatamento na Amazônia, no período 1970-2000, deveu-se à implantação de
fazendas e projetos agropecuários empresariais (Sawyer, 1993). Deste modo, Estado e capital
instrumentalizavam uma herança geo-histórica produtora de desigualdade sócio-econômica (a

69
Isso, claro, sem mencionar a grilagem, um instrumento extra-econômico fundamental nesse processo.
Fórum Internacional do Meio Ambiente - A conferência da Terra 393

concentração “originária” de terras advinda do sistema colonial de apropriação do território, o


sesmarialismo) para reiterar historicamente esta mesma desigualdade. Os maiores impactos, em
termos de devastação florestal, eram, portanto, resultado da instabilidade da ocupação por parte dos
agricultores familiares (Sawyer, 2001).

CONCLUSÕES
Atualmente, o Brasil goza de enorme destaque no cenário internacional através de dois
grandes highlights: (1) como um Bric que encontra no abismo social um dos entraves para o pleno
desenvolvimento econômico e (2) como a maior reserva de floresta tropical do planeta – e que, com
efeito, vem desaparecendo de forma acelerada. Embora, entre 1989 e 2004, o índice de Gini tenha
retornado ao patamar em que se encontrava em 1981, re-posicionando o país da segunda para a
décima posição no ranking mundial (Ferreira et al., 2006), o quadro da desigualdade sócio-
econômica nacional ainda é deveras alarmante. Neste mesmo Estado-nação, a maior “fronteira
florestal” do globo (a Amazônia brasileira, com algo em torno de 3,6 milhões de km2) contrai-se a
taxas anuais que oscilam entre 11 e 12 mil km2 (INPE, 2008).
Essa coincidência midiática aponta para uma constatação mais profunda, qual seja, a de
que desigualdade social e degradação ambiental estão intimamente associadas. Mais ainda: essa
ligação tem um profundo lastro histórico que aponta na direção de um mecanismo de retro-
alimentação positiva. A introdução de relações capitalistas nos sistemas agrários brasileiros foi feita
de “cima para baixo”, de forma autoritária, reproduzindo, em outra matriz, uma “dinâmica
arcaizante” que interdita à grande massa o estabelecimento de relações sólidas e estáveis com a
terra. O legado de uma estrutura social estamental, produtora de riqueza concentrada, ainda se faz
presente em nosso país. A diferença em relação ao passado reside exclusivamente no fato de que a
conversão de patrimônio florestal em riqueza social é, hoje, ditada pelas regras de acumulação
propriamente capitalista.
Isto muda um pouco o estado das coisas, mas não muito. Sobre os despossuídos, continua a
recair a tarefa de desbravar o “sertão”, sendo lhes privada, contudo, a possibilidade de usufruírem
sua “conquista”. Como corolário, são ainda eles que mais sofrem com as conseqüências de “suas”
ações: no campo, restam-lhe os solos impróprios e/ou degradados, imprestáveis para a produção
capitalista; ao migrarem para a cidade, são condenados ao subemprego (quando há) e à habitação de
áreas insalubres, freqüentemente assoladas por desastres ambientais. O Brasil continua extraindo
muita riqueza de suas florestas, embora a retenha em um grau bem menor do que antes, devido à
crescente globalização da economia. De qualquer modo, produção de pobreza e produção de terras
arrasadas ainda constituem facetas de um mesmo problema estrutural.

REFERÊNCIAS BIBLIOGRÁFICAS
ABREU, M.A. (1997) “A apropriação do território no Brasil colonial” In: CASTRO, I.E. et al.
(orgs.) Explorações geográficas. Rio de Janeiro, Bertrand Brasil.
BARROS, R.P. et al. (1997) Bem-estar, pobreza e desigualdade de renda: uma avaliação da
evolução histórica e das disparidades regionais. Rio de Janeiro, IPEA (texto para discussão # 454).
CABRAL, D.C. (2004) “Produtores rurais e indústria madeireira no Rio de Janeiro do final do
século XVIII”. Ambiente & Sociedade, v.7 (2).
CALDEIRA, J. (1999) A nação mercantilista. São Paulo, Ed. 34.
CARDOSO, C.F.; BRIGNOLI, H.P. (1979) História econômica da América Latina: vol. I.
Barcelona, Editorial Critica.
CARDOSO, F.H. (1962) Capitalismo e escravidão no Brasil meridional. São Paulo, Difel.
CROSBY, A.W. (1993) Imperialismo ecológico: a expansão biológica da Europa, 900-1900. São
Paulo, Companhia das Letras.
DEAN, W. (1996) A ferro e fogo: a história e a devastação da Mata Atlântica brasileira. São Paulo,
Companhia das Letras.
FERREIRA, F.H.G. et al. (2006) The rise and fall of Brazilian inequality: 1981-2004. Washington,
D.C, World Bank Policy Research Working Paper 3867.
Fórum Internacional do Meio Ambiente - A conferência da Terra 394

FINCO, M.V.A.; WAQUIL, P.D. (2004) “Pobreza rural, degradação ambiental e desenvolvimento
sustentável: uma revisão de literatura sobre a hipótese do círculo vicioso”. Redes, v.9 (2).
FRAGOSO, J.; FLORENTINO, M. (2001) O arcaísmo como projeto: mercado atlântico, sociedade
agrária e elite mercantil em uma economia colonial tardia: Rio de Janeiro, c.1790-c.1840. 4ª ed. Rio
de Janeiro, Civilização Brasileira.
HARDIN, G. (1968) “The tragedy of the commons”. Science, v.162, Dec.: 1.243-48.
INPE. (2008) http://www.obt.inpe.br/prodes/prodes_1988_2007.htm. Acessado em 09/04.
KAPLAN, D. (1968) “The formal-substantive controversy in economic anthropology”.
Southwestern Journal of Anthropology, v.24, 1968.
MARCÍLIO, M.L. (1999) “A população do Brasil colonial”. In: BETHELL, L. (org.) História da
América Latina: vol. 2. São Paulo, Edusp/Funag.
MARTINS, J.S. (1986) O cativeiro da terra. 3ª ed. São Paulo, Hucitec.
MONTEIRO, N.G. (1998) O crepúsculo dos grandes (1750-1832). Lisboa, Imprensa Nacional da
Casa da Moeda.
MOORE, J.W. (2003) “Capitalism as world-ecology: Braudel and Marx on environmental history”.
Organization and Environment, v.16 (4).
MORSE, R. (1988) O espelho de Próspero: cultura e idéias nas Américas. São Paulo, Companhia
das Letras.
OLIVEIRA, F. (1981) A economia brasileira: crítica à razão dualista. Petrópolis, Vozes.
PICOLI, F. (2006) O capital e a devastação da Amazônia. São Paulo, Expressão Popular.
SAWYER, D. (1993) “População e meio ambiente na Amazônia brasileira”. In: MARTINE, G.
(org.) População, meio ambiente e desenvolvimento: verdades e contradições. Campinas, Ed.
Unicamp.
_______. (2001) “Evolução demográfica, qualidade de vida e desmatamento na Amazônia”. In:
BRASIL – MINISTÉRIO DO MEIO AMBIENTE. Causas e dinâmica do desmatamento na
Amazônia. Brasília-DF, MMA.
SZMERECSÁNYI, T. (1986) “O desevolvimento da produção agropecuária (1930-1970)”. In:
FAUSTO, B. (org.) História Geral da Civilização Brasileira: O Brasil Republicano, Tomo III, vol.
IV. São Paulo, Difel.
TAYLOR, P.J. (1997) “As raízes geoistóricas do desafio da sustentabilidade e uma alternativa
política pós-moderna”. In: BECKER, B.K.; MIRANDA, M. (orgs.). A geografia política do
desenvolvimento sustentável. Rio de Janeiro, Ed. UFRJ.
THOMAZ, L. (1994) De Ceuta a Timor. Lisboa, Difel.
WALLERSTEIN, I. (2001) Capitalismo histórico e civilização capitalista. Rio de Janeiro,
Contraponto.
WCDE. World Commission on Environment and Development. (1987) Our common future.
Oxford and New York: Oxford University Press.
Fórum Internacional do Meio Ambiente - A conferência da Terra 395

AGRICULTORES INOVADORES, SERVIÇOS AMBIENTAIS E EDUCAÇÃO BÁSICA:


PONTOS E CONTRAPONTOS70.

José S. Romano de Oliveira


Geógrafo Doutorando em Ciências Agrárias Universidade Federal Rural da Amazônia. Av. Pte Tancredo Neves, 2501.
Terra firme. 66077-530 Cx postal 917. Belém Pará. romanoirituia@yahoo.com.br
Osvaldo R. Kato
Agrônomo Doutor Pesquisador da EMBRAPA-CPATU Amazônia Oriental. Trav. Dr Enéas Pinheiro s/n Cx Postal 48.
Belém Pará. Okato@cpatu.embrapa.br
Joana Almeida Leão
Geógrafa Especialista Educadora da Secretaria Estadual de Educação do Pará. Rodovia Augusto Montenegro km 10, s/n
icoaraci - Belém/pa - cep: 66.820-000. joanaalmeidaleao@yahoo.com.br

RESUMO
O trabalho ressalta experiências inovadoras realizadas por 78 agricultores familiares do
qual expandiram seus tradicionais sítios ou quintais para outras parcelas produtivas das suas
Unidades de Produção Familiar – UPFs na forma de Sistemas Agroflorestais – SAFs, localizados no
Nordeste Paraense Amazônia Oriental, nos municípios de Irituia, Mãe do Rio, São Domingos do
Capim e Concórdia do Pará, área territorial do programa PROAMBIENTE71. Os referidos sistemas
têm garantido diversidade produtiva ao longo do ano, segurança alimentar, inserção no mercado
consumidor, menor penosidade do trabalho e serviços ambientais auxiliando na solução dos
problemas relacionados ao meio ambiente local. Estes agricultores não tiveram inicialmente
intervenções do aporte científico da pesquisa e extensão e nem a contribuição direta da educação
básica.
Palavras-chaves: SAFs, experiências, serviços ambientais, educação

ABSTRACT
The work emphasizes innovative experiments performed by 78 family farmers from which
expanded its traditional sites or backyards for other parts of its productive units Production Familiar
- UPFs as Agroflorestais Systems - SAFs, located in the Northeast Paraense eastern Amazon, in the
municipalities of Irituia, Mãe do Rio, Sao Domingos do Capim and Concordia of Para, the land area
of the program PROAMBIENTE. These systems have guaranteed diversity productive throughout
the year, food security, integration into the consumer market, lower penosidade labour and
environmental services assisting in solving problems related to the local environment. These
farmers have not had initially interventions of the contribution of scientific research and extension
and not a direct contribution of basic education.
Keywords: SAFs, experience, environmental services, education

INTRODUÇÃO
O processo de desenvolvimento na Amazônia tem sido à custa do uso indiscriminado dos
seus recursos naturais. Os programas governamentais de ocupação da Amazônia planejados e
aplicados, sem levar em conta os conhecimentos e as características regionais, trouxeram
conseqüências quase irreparáveis, com mudanças na paisagem principalmente, em função do
avanço da ação antrópica resultando em perdas da biodiversidade, além de não promover um
desenvolvimento equânime das populações locais (Oliveira 1992).

70
Parte do texto retirado da Dissertação de Mestrado de José Sebastião Romano de Oliveira, defendida em 2006 na
Universidade Federal do Pará – UFPA no Núcleo de Agricultura Familiar e Desenvolvimento Sustentável – NEAF.
71
PROAMBIENTE. Programa de atividades de ordenamento territorial por meio da formação de Pólos, crédito rural,
estabelecimento de sistemas sustentáveis de produção rural, fortalecimento de organizações sociais, assessoria técnica e
extensão rural, certificação e remuneração dos serviços ambientais como política pública nacional incorpora novos
conceitos e abordagens como a organização territorial, assistência técnica diferenciada, remuneração de serviços
ambientais, organização e planejamento da cadeia produtiva e mudança do uso da terra.
Fórum Internacional do Meio Ambiente - A conferência da Terra 396

Na maior parte da Amazônia brasileira, especificamente, a agricultura familiar pratica


principalmente o sistema de agricultura migratória ou itinerante, alternando períodos de cultivo
(principalmente de milho e mandioca) com os de pousio, ocasião em que a vegetação secundária se
desenvolve, para após algum tempo, ser transformada em fertilizante para o próximo período de
cultivo, adotando a técnica de derruba-e-queima, que vem sendo questionada, pelas perdas em
nutrientes, emissões nocivas à atmosfera, e riscos de incêndio que a prática da queima representa
(Moran 1990, Hölscher et al. 1997a; Nepstad et al. 1999).
Para Costa (1997) a ausência de políticas direcionadas ao setor agrícola familiar que se
identifiquem com a realidade local tem sido um dos fatores que contribuem para que na região
Amazônica predomine a roça de subsistência – slash and burn system ou shifiting cultivation - que
gera poucos resultados não só econômicos como também sociais e ambientais, interferindo na
qualidade de vida dos agricultores.
Ademais, na Amazônia, o processo de derruba e queima a floresta primária é convertida
em áreas agrícolas e/ou pasto (figura 1 e 2), do qual o conteúdo de nutrientes e carbono do solo é
vulneráveis a perdas através de vários mecanismos, incluindo combustão durante o fogo, mais
rápida decomposição da matéria orgânica do solo, mudanças químicas e microclimáticas do solo, e
alterações na qualidade e quantidade do ciclo dos nutrientes através do sistema que substitui a
floresta (Juo e Manu 1996).
Perdas de elem entos pela queim a de uma capoeira de 7 anos
de idade (m atéria seca de 31 t/ha)
Perdas em kg/ha e
em % da biomassa
biom assa
Carbono 14378 (98% )
Nitrogênio 205 (96% )
Potássio 39 (48% )
Fósforo 4 (47% )
Cálcio 107 (35% )
M agnésio 18 (40% )
Enxôfre 14 (76% )
Sódio 6 (30% )

Fonte Hölscher 1995

Figura 1 e 2 – Processo de derruba e queima e formação de pasto.

Na messoregião Nordeste Paraense- NEPA, uma das mais antigas áreas de colonização da
Amazônia oriental brasileira, prevalece o sistema produtivo de corte e queima para o preparo do
solo para plantio de roças e prática do pousio baseado nos nutrientes acumulados na biomassa da
vegetação natural. Segundo Sommer (2000) na queima de uma capoeira de sete anos de idade na
referida região, estimou-se uma perda de 21,5 Mg C e 372,0 kg N ha-1.
Ainda para o autor op. cit 45 a 70% dos, geralmente, cátions menos voláteis, como K, Ca
e Mg, foram perdidos. A maioria da perda é pelo vôo de partículas com a fumaça do fogo, sendo
que o mais preocupante é a exportação de 63% do estoque de fósforo, o qual corresponde a 11,0 kg
ha-1 (Sommer, 2000).
Ou seja, o sistema de corte e queima contribui para degradação dos solos resultando na
perda de fertilidade dos lugares onde vigora, além disso, se torna predatório quando a pressão
demográfica sobre o território leva à utilização em módulos inferiores ao limite da viabilidade
(Hébette, 2004).
No entanto, vale ressaltar que o sistema de roças considerado insustentável, tem garantido
a permanência de grande parte do contingente populacional na região permitindo a reprodução
familiar e a produção agrícola por centenas de anos (Oliveira, 2006).
Porém, alguns agricultores, muitos excluídos das políticas públicas governamentais, com
raras perspectivas de serem atendidos pelas referidas políticas resolveram inovar expandindo os
tradicionais sítios ou quintais para outras parcelas de suas unidades produtivas em forma de
sistemas agroflorestais – SAFs.
Fórum Internacional do Meio Ambiente - A conferência da Terra 397

A característica marcante destes Safs é a diversificação de espécies regionais,


principalmente de frutíferas. Os sistemas, inicialmente, foram planejados para garantir a
subsistência da família mas tomou outras configurações,não só espaciais, pois, ao possibilitar
produtividade ao longo do ano, estes agricultores já se inserem no mercado consumidor local e
regional (figura 3).

Figura 3- Produtos oriundos dos SAFs

Outra relevância, é a produção dos serviços ambientais: eliminação do uso do fogo,


reflorestamento (figura 4), proteção de mananciais (figura 5), proteção do solo contra erosão,
recuperação de áreas degradadas, aumento da biodiversidade.

Figura 4 e 5 Reflorestamento e proteção de fontes hídricas proporcionado pelos SAFs

Desta feita, o que inicialmente era a garantia de sobrevivência familiar, os SAFs tornaram-
se espaços produtivos alterando paisagens e resultaram em vantagens sociais, econômicas, culturais
e principalmente ambientais.
Apesar das inúmeras vantagens que os SAFs apresentam, esses agricultores não tiveram
intervenção do aporte cientifico normativo por parte da pesquisa e extensão, bem como ainda a
“negligencia” da educação formal local que desconsidera a construção de conhecimentos
acumulados das populações tradicionais que seriam importantes no processo ensino-aprendizagem,
não contribuindo, dessa forma, no desenvolvimento das experiências inovadoras.
A tarefa do ensino segundo Cavalcanti (2006) é a de tornar os conteúdos veiculados
objetos de conhecimentos para o aluno, o que requer constante diálogo do sujeito do conhecimento,
portador de uma cultura determinada, com esses outros objetos culturais, no sentido de atribuir-lhes
significados próprios, o que é necessário para um processo de aprendizagem siginificativa. O que
não ocorre nesta parte do território amazônico.
Para Teixeira (1998) a ausência de aporte científico referente a pesquisas sobre o
conhecimento tradicional de agricultores, não chega a ser surpresa, pois, é decorrente da dificuldade
Fórum Internacional do Meio Ambiente - A conferência da Terra 398

do mapeamento e sistematização das informações sobre os saberes e usos desenvolvidos pelas


populações locais.

AS EXPERIÊNCIAS INOVADORAS
Os Sistemas Agroflorestais, SAFs, são sistemas tradicionais surgidos no decorrer de
séculos de evolução biológica e cultural (Altieri, 2000). No Nordeste Paraense as experiências
inovadoras são praticadas ao longo dos séculos na forma dos tradicionais sítios em torno das
moradias (Oliveira, 2006). Situação similar ocorre no Mato Grosso onde os quintais se prolongam
por meio das roças (Brito&Coelho, 2000).
Na compreensão relativa à inovação realizada pelos agricultores, refere-se as estratégias de
conduta correspondem aos seus objetivos quanto, a maior segurança alimentar, economia de custos,
cautela quanto aos riscos e como dividir seu tempo e da família ao longo do ano, ou seja, um
projeto familiar.
O projeto familiar definido por Reynal et al. (1997) é um conjunto complexo de objetivos
mais ou menos hierarquizados, não desprovidos de contradições e suscetível a evolução. O projeto
familiar é, a priori, uma operação abstrata, mas que por meio das práticas torna-se concreto.
Os agricultores inovadores fizeram o que Levi-Strauss (1997) chama de Bricolage. Isto é,
um artista que faz acontecer com que o possui em mãos criando e adaptando a ponto de inovarem,
por exemplo, em fertilizantes naturais, defensivos naturais, arranjos ou consórcios arbóreos
diferenciados, plantas mantenedoras de umidade adaptadas as condições diversas, manejos entre
outros.

MATERIAL E MÉTODOS
A pesquisa foi realizada no Nordeste Paraense Amazônia Oriental, nos municípios de
Irituia, Mãe do Rio, São Domingos do Capim e Concórdia do Pará, área territorial do programa
PROAMBIENTE1. Foram localizadas, mapeadas e georreferenciadas 78 unidades produtivas
consideradas inovadoras, com uso de GPS e com registro fotográfico.

RESULTADOS
As experiências inovadoras têm contribuído na diminuição de áreas na formação de novas
roças, melhoria do miclo-clima local, conforto térmico, menor penosidade nos trabalhos, inserção
no mercado consumidor local, serviços ambientais.
Dentre os 78 agricultores entrevistados 72% dos agricultores, inicialmente não tiveram
acesso às políticas creditícias; intervenção do aporte científico normativo fosse da pesquisa ou
extensão, publico ou privado.
Referente ao nível de escolaridade 85,9% não possui o ensino fundamental, sendo que
apenas 8,97% concluíram a 8ª série e somente 5,13% concluíram o ensino médio.
Nas palavras dos próprios agricultores “a educação é uma coisa muito boa e hoje dia só
não estuda quem não quer a cada 5km tem uma escola....”, “o problema é que nem sempre se
ensina o que nos precisa, pros nossos filhos...”;

PONTOS E CONTRAPONTOS - ALGUMAS CONCLUSÕES


Os benefícios gerados pelos SAFs são possibilidades de alternativas de melhoria de
qualidade de vida a agricultura familiar no Nordeste Paraense, principalmente a geração de serviços
ambientais. Possibilitando soluções ao meio ambiente local.
Porém, a ausência de políticas de assistência técnica, creditícias e comercialização são
fatores imprescindíveis, bem como rever e começar adaptar a educação formal nas escolas para que
estas se voltem para a realidade e o cotidiano desses atores sociais e geração futura. Pois, a
localização desses agricultores são municípios eminentemente agrícolas mas não existe uma única
disciplina sequer, tanto no quadro curricular estadual ou municipal, que esteja direcionado ao
cotidiano dos agricultores inovadores e de seus descendentes, ou seja, imensa contradição de
princípios escolares que desconsideram a realidade do lócus amazônico.
Fórum Internacional do Meio Ambiente - A conferência da Terra 399

A partir dos depoimentos dos agricultores constata-se a necessidade de fazer as escolas e o


currículo mais sensíveis e adaptáveis aos contextos e necessidades locais. Contreras (2000) as
reformas educativas deveriam desviar o interesse do conteúdo do currículo nacional para sua
adaptabilidade, e apresentar a desigualdade social, que pode ser observada nas desigualdades
dentro do sistema escolar, como uma questão de pluridade e diversidade social.
Essa realidade leva a necessidade de inserir, como conteúdo escolar a reflexão sobre a área
do conhecimento, seus propósitos no tange a um campo científico, sua história; a reflexão sobre a
prática geográfica e suas relações com as necessidades e saberes dessas populações. Essas reflexões
são fundamentais para mediar o processo de atribuir significados aos conteúdos apresentados para
os alunos.

REFERENCIAS BIBLIOGRÁFICAS
ALTIERI, Miguel. Agroecologia: a dinâmica produtiva da agricultura sustentável. 2ª edição, Porto
Alegre/UFRGS, 2000.
BRITO, Marcia Aparecida & COELHO, Maria de Fatima Barbosa. Os quintais agroflorestais em
tegiões tropicais – Unidades auto-sustentáveis. Revista Agricultura Tropical. Cuiabá, 2002.
CAVALCANTI, Lana de Souza. Ensino de Geografia e diversidade. Construção de conhecimentos
geográficos escolares e atribuição de significados pelos diversos sujeitos do processo de ensino. In:
CASTELLAR, Sônia (org). educação geográfica: teorias e práticas docentes. 2ª edição. Editora
Contexto. São Paulo, 2006.
CONTRERA, José. Currículo democrático e autonomia do magistério. In: SILVA, Luiz Heron.
(org). Século XXI: Qual conhecimento? Qual currículo? 2ª edição. Editora Vozes. Rio de Janeiro,
2000.
COSTA, F. de A. A diversidade estrutural e desenvolvimento sustentável: novas de política de
planejamento agrícola para Amazônia. In: Perspectivas do desenvolvimento sustentável (uma
contribuição para Amazônia 21) Tereza Ximenes (org.) Belém: UFPA/NAEA; Associação de
Universidades Amazônicas, 1997.
HÉBETTE, Jean. Cruzando a fronteira: 30 anos de estudo do campesinato na Amazônia. Vol. 1 –
EDUFPA / UFPA. Belém,2004.
HÖLSCHER, D.; SÁ, T. D. de A .; BASTOS, T. X.; DENICH, M.; FÖLSTER, H. Evaporation
from young secondary vegetation in eastern Amazonia. Journal of Hydrology, 193: 293-305. 1997b.
JUO, A. S. R.; MANU, A. Chemical dynamics in slash-and-burn agriculture. Agric. Eosyst.
Environ. 58: 49-60. 1996
LEVI-STRAUSS, Claude. O pensamento Selvagem. Papirus. Campinas, 1987.
MORAN, E. F. A ecologia humana das populações da Amazônia. Petrópolis: Vozes, 1990. 368p.
NEPSTAD, D. C.; MOREIRA, A . G.; ALENCAR, A. A. Flames in the rain forest: origins, impacts
and alternatives to Amazonian fire. The Pilot Program to Conserve the Brazilian Rain Forest,
Brasília, 1999.
OLIVEIRA, A. E. Ocupação humana na Amazônia. IN: SALATI, E. Amazônia: integração,
desenvolvimento e ecologia. Brasília: CNPq, 1992. p. 144-327.
OLIVEIRA, J. S. Romano. Uso do território, experiências inovadoras e sustentabilidade: um estudo
em unidades de produção familiares de agricultores na área de abrangência do programa
PROAMBIENTE, Nordeste Paraense. Dissertação de Mestrado. NEAF/UFPA/EMBRAPA. Belém,
2006. 116p.
Fórum Internacional do Meio Ambiente - A conferência da Terra 400

A DEGRADAÇÃO AMBIENTAL E A PESCA ARTESANAL DA COMUNIDADE ILHA DE


DEUS - PE

Maria Magaly Colares de Moura Alencar


Graduanda em Serviço Social. Membro do Grupo de Estudos e pesquisa em Gênero, Raça, Meio Ambiente e
Planejamento de Políticas Públicas (GRAPP/UFPE). Endereço Institucional: Universidade Federal de Pernambuco,
Centro de Ciências Sociais Aplicadas, Departamento de Serviço Social. Avenida Professor Moraes Rego, 1235 Cidade
Universitária 50670-901 - Recife, PE – Brasil. E-mail: magalycolares@gmail.com.
Vitoria Régia Fernandes Gehlen
Professora do Departamento de Serviço Social, Coordenadora do Grupo de Estudos e Pesquisa em Gênero, Raça, Meio
Ambiente e Planejamento de Políticas Públicas (GRAPP/UFPE). Endereço Institucional: Universidade Federal de
Pernambuco, Centro de Ciências Sociais Aplicadas. Avenida Professor Moraes Rego, 1235 Cidade Universitária 50670-
901 - Recife, PE – Brasil. E-mail: vicgehlen@yahoo.com.br
Amanda Roberta Souza da Silva
Graduanda em Serviço Social, Membro do Grupo de Estudos e pesquisa em Gênero, Raça, Meio Ambiente e
Planejamento de Políticas Públicas (GRAPP/UFPE). Endereço Institucional: Universidade Federal de Pernambuco,
Centro de Ciências Sociais Aplicadas, Departamento de Serviço Social. Avenida Professor Moraes Rego, 1235 Cidade
Universitária 50670-901- Recife, PE – Brasil. E-mail: amanda_roberta84@yahoo.com.br.

RESUMO
Este trabalho é resultante de uma pesquisa desenvolvida em parceria com o Programa de
Pós-Graduação em Extensão Rural e Desenvolvimento Local (POSMEX) da UFRPE e o Programa
de Pós-Graduação em Serviço Social da UFPE, com o apoio do CNPq. Propõe-se investigar a
realidade e as dificuldades que assolam a comunidade de Ilha de Deus, localizada na cidade do
Recife-PE. Considerada uma das maiores áreas de mangue situadas dentro de um centro urbano
brasileiro, a comunidade faz parte da Zona especial de Preservação Ambiental (ZEPA). Sua
população é formada em média por 450 famílias pobres, que estão direta ou indiretamente ligadas à
atividade da pesca artesanal de captura de moluscos, crustáceos e peixes. Devido ao uso abusivo da
pesca, a falta de infra-estrutura de saneamento básico no entorno, e das edificações que vem
degradando os manguezais, como também a proliferação da carcinocultura (criação em tanques
redes de camarão), vem-se promovendo a escassez na pesca da Comunidade, o que compromete a
subsistência dos moradores, tanto pelo esgotamento do pescado, dos caranguejos e dos mariscos,
quanto pela ausência de preservação dos rios que cercam a ilha. Essa situação demonstra a
necessidade de políticas públicas para o desenvolvimento local da pesca artesanal dentro do quadro
geral de transformações socioeconômicas globalizadas.
Palavras-chaves: Degradação ambiental, pesca e políticas públicas.

ABSTRACT
It is proposed to investigate the reality and difficulties that assolam the community of Ilha
de Deus, located in the city of Recife, PE. Considered one of the largest areas of mangroves located
winthin an urban centre brazilian, the community is part of the Special Zone of Environmental
Conservation (ZEPA). Its population is made on average per 450 poor families, who are directly or
indirectky linked to the actvity of fishig for catching molluscs, crustaceans and fishes. Due to abuse
fisheries, a lanck of infrastructure for sanitation in the environment, and the buildings that came
degrading the mangroves as, weel as the proliferation of carcinocultura (cration in tanks networks
of shrimp), has been promoting itself in the shortage community fishing, which undermines the
livelihood of the residents, both the depletion of fish, crabs and shellfhish, as the lack of
preservation of rivers that surround the island. This demonstrates the need for public policies for
development of the local fishing within the general framework socioeconomic trnasformations
together.
Keyword: Environmental degradation, fishing, public policy.

Este trabalho faz parte do projeto de pesquisa desenvolvida em parceria com o Programa
de Pós-Graduação em Extensão Rural e Desenvolvimento Local (POSMEX) da UFRPE e o
Programa de Pós-Graduação em Serviço Social da UFPE, com o apoio do CNPq. Propõe-se
Fórum Internacional do Meio Ambiente - A conferência da Terra 401

investigar o trabalho de homens e mulheres na pesca artesanal na comunidade da Ilha de Deus


localizada na Cidade do Recife-PE .
A comunidade faz parte da Zona especial de Preservação Ambiental (ZEPA), e caracteriza-
se pela presença de manguezal e dos cursos d’água que o recortam. É considerada uma das maiores
áreas de mangue situadas dentro de um centro urbano brasileiro. Sua população é formada em
média por 450 famílias pobres, que estão direta ou indiretamente ligadas à atividade da pesca
artesanal de captura de moluscos, crustáceos e peixes.
A distribuição por renda familiar indica a situação de pobreza da área. A maior parte das
famílias tem renda de até dois salários mínimos e, individualmente, 51,9% ganham menos de um
salário mínimo (LIMA, 2003). A renda insuficiente da população influi diretamente na qualidade
das habitações e nas condições sanitárias do local. Atualmente ainda existem na Ilha as palafitas,
porém em menor quantidade se comparada às casas de alvenaria que existem na localidade.
A lógica que permeia as áreas pobres da cidade do Recife não é diferente das grandes
metrópoles brasileiras, no que diz respeito ao processo de urbanização, normalmente marcada pelas
desigualdades sociais geradas pelo modo de produção capitalista. Neste contexto, a população pobre
geralmente excluída do acesso legal a terra urbanizada, encontra como alternativa morar em áreas
de fragilidade ambiental, ou seja, áreas ambientalmente degradadas.
A exclusão no acesso legal a terra configura-se como segregação espacial ou ambiental.
Caracterizada por várias dificuldades para a população com respeito ao acesso aos serviços e infra-
estrutura urbanos, a oportunidade de emprego, profissionalização, maior exposição à violência, à
discriminação racial, de gênero, e etc. Desta forma, se impõe outra cidade, uma gigantesca,
denominada de cidade ilegal.
A questão ambiental é hoje central em debates e discussões. A relação antagônica entre o
modelo de desenvolvimento e meio ambiente é constantemente questionada. As mudanças,
constituídas nos diferentes espaços urbanos e rurais, direcionam-se para a formação das sociedades
modernas, mercadologizadas tanto em escala regional quanto em escalas nacional e global,
impulsionadas por um modelo desenvolvimentista, com características inerentes de degradação
ambiental. O modelo em questão prima pelos interesses privados (econômicos) frente aos bens
coletivos (meio ambiente), consubstanciando-se em uma visão antropocêntrica de mundo, gerador
de fortes impactos socioambientais (GUIMARÃES, 2003).
Vale ressaltar que esse modelo de desenvolvimento produz também uma crescente
desigualdade social, expressa na qualidade de vida dos moradores da área em estudo. Além da
defesa do consumo, “os problemas ecológicos e ambientais revelam disfunções que são próprias de
um determinado estilo de desenvolvimento desigual para as sociedades humanas e nocivo para os
sistemas naturais”. (GUIMARÃES, R.P, 1997 apud GUIMARÃES, 2003). Como afirma Leff
(2001):
“A racionalidade capitalista se construiu em torno de uma doutrina econômica que aspira
a sua cientificidade fundada numa racionalidade formal e em sua eficácia técnica, cada
vez mais afastadas da subjetividade e dos valores, o que levou à superexploração de
recursos e ao desequilíbrio dos ecossistemas naturais”.

Para Maria Coelho (2001) é preciso metamorfosear a problemática dos impactos


ambientais urbanos, despindo-a da questão exclusivamente natural, mostrando sua face social e
política. A autora ressalta que os problemas ambientais (ecológicos e sociais) atingem de forma
diferenciada o espaço urbano, atingindo muito mais os espaços físicos de ocupação das classes
sociais menos favorecidas do que os das classes mais elevadas. Revela, portanto, a desigualdade
entre as classes, a exclusão e a segregação social.
É neste contexto que se insere a comunidade de Ilha de Deus. Rica produtora de fauna
aquática, mas com a biodiversidade ameaçada pelas condições de pobreza dos seus habitantes e da
ineficiência na aplicação das políticas públicas ambientais e sociais. Existe um impacto negativo da
questão social sobre o meio ambiente. O descaso dos órgãos governamentais com a população
vulnerável, maiores vítimas desse sistema excludente, possui grandes dimensões.
Fórum Internacional do Meio Ambiente - A conferência da Terra 402

A pesca, principal atividade da maioria dos moradores da ilha tem se tornado cada vez
mais escassa, comprometendo a subsistência, tanto pelo esgotamento do pescado, dos caranguejos e
dos mariscos, quanto pela ausência de preservação dos rios que cercam a ilha.
A poluição dos rios que formam a área estuarina da Ilha de Deus, agravada pelas condições
precárias e improvisadas de habitação de seus moradores implicam em risco à saúde e vida dos
mesmos. Mas, apesar disso, a vida do mangue vem a ser uma alternativa de sobrevivência e
trabalho. A Ilha de Deus é cercada por viveiros, cuja construção foi financiada, em sua maioria, por
proprietários que não são moradores da comunidade e que alocam a mão de obra da população local
para a manutenção dos viveiros (LIMA, 2003).
A construção de viveiros na Ilha, segundo DA MATA, FERRAZ E CALLOU (2007), têm
inicio em meados da década 70. Estes eram destinados à estocagem de peixes nativos, que
engordavam naturalmente até atingir um porte que contribuísse para o aumento da renda do
pescador. O cultivo de camarões na comunidade teve seu começo nos anos 90, depois da empresa
Netuno (pioneira em produção e beneficiamento de pescados) visitar os seus viveiros e sugerir o
cultivo de camarões, oferecendo pós-larva para engorda. Existem 64 viveiros de engorda de
camarão cujas áreas são irregulares variando de 200 a 10.000 m², e suas estruturas como diques e
comportas são bastante precárias. Não possuem canais destinados ao abastecimento e drenagem dos
viveiros: cada viveiro possui apenas uma comporta reservada a esta finalidade, obedecendo as
variações das marés (baixamar e preamar).
Desprovidos de políticas públicas que contribuam para o desenvolvimento da atividade
pesqueira local os pescadores sofrem com a falta de investimento por parte do Poder Público.
As principais dificuldades enfrentadas pelos pescadores, não só da comunidade, mas todo o
estado de Pernambuco são os fatos de não possuir equipamentos, e quando estes existem estão
sobrecarregados, causando a perda da qualidade do produto; o caráter rudimentar das embarcações,
a inexistência de fábrica de gelo nas colônias/associações e o baixo nível de capacitação do
pescador para processamento do pescado são alguns dos fatores que contribuem para o baixo
rendimento da pesca em Pernambuco (CPRH, 2003).
Dentre os problemas enfrentados pela população da comunidade que tem a pesca como
atividade de subsistência, destacamos um problema grave que se encontra na poluição das águas em
seu entorno, na qual despejam-se desejos de esgotos, resíduos sólidos, contribuindo para a
mortandade dos animais aquáticos.
A toda esta problemática socioeconômica dos pescadores da Ilha de Deus, que reflete o
problema de todos os pescadores artesanais do Estado de Pernambuco, somam-se outros fatores de
degradação dos ecossistemas costeiros, como a quebra de corais, projetos desordenados de
carcinicultura, aterros e desmatamento dos manguezais, poluição dos rios e estuários, fatores estes
que contribuem para a depleção dos estoques (SECTMA, 2003; GERCO, 2004).
Nesse cenário, emerge, de um lado, a perspectiva do desenvolvimento local, que visa,
através de atores locais, desenvolver potencialidades econômicas endógenas como estratégia de
democratização política e de justiça social (Jara, 2001); e, de outro, surgem novas interpretações
teóricas sobre o território agrário, ampliando a noção do rural para outras atividades econômicas
não agrícolas a exemplo do turismo rural, artesanato, indústrias e serviços (Campanhola & Graziano
da Silva, 2001).
No campo específico das comunidades pesqueiras, viabilizar políticas públicas para o
desenvolvimento local da pesca artesanal dentro desse quadro geral de transformações
socioeconômicas globalizadas é quase um salto no escuro. Depois de mais de vinte anos de serviço
de extensão na pesca, também pautado na modernização tecnológica e sem atingir o
desenvolvimento pretendido (Callou; Tauk Santos, 2001), o setor pesqueiro atravessou os anos de
1990 praticamente sem qualquer política pública para o desenvolvimento dessa atividade, com a
extinção da Superintendência do Desenvolvimento da Pesca (SUDEPE), no final dos anos 80.
Esses aspectos, reunidos às fracassadas tentativas históricas de desenvolver a pesca
nacional, trouxeram repercussões sociopolíticas negativas sobre a vida das populações pesqueiras
(Callou, 1994). São frágeis, ainda hoje, as formas associativas dos pescadores – as colônias, criadas
Fórum Internacional do Meio Ambiente - A conferência da Terra 403

pela Marinha de Guerra -, às quais as mulheres foram impedidas por décadas de participar dessas
entidades. Somem-se a isso, os problemas ambientais decorridos da poluição aquática e do esforço
de pesca, além da especulação imobiliária nas praias e da expansão do turismo no litoral
(Schnuetgen, 1973; Diegues, 1979). Aspectos que têm modificado sobremaneira as relações sociais
nas comunidades de pesca, em especial no Nordeste onde a pesca é majoritariamente artesanal.
Pensar em políticas públicas para enfrentar os desafios contemporâneos das
comunidades pesqueiras na perspectiva do desenvolvimento local sustentável é algo que parece
atualmente emergir das organizações governamentais. Em 2003, por exemplo, foi criada a
Secretaria Especial de Aqüicultura e Pesca (SEAP). Trata-se de uma iniciativa importante, pois
reconhecem que a pesca ficou “relegada aos escalões inferiores da política e da economia...”(Brasil,
2003:2). Aspecto considerado grave pelo atual governo, na medida em que o setor pesqueiro no
Brasil é “responsável hoje por 834 mil empregos diretos, 2,5 milhões indiretos e por uma renda
anual de 4 bilhões de reais.” (Brasil, 2003:2).
Embora a intenção do governo, com a criação da SEAP, seja a de alcançar um
crescimento superior a 20% ao ano nas atividades de aqüicultura e pesca e transforma-se em indutor
desse processo de desenvolvimento através de investimentos na modernização da aqüicultura e da
pesca, a partir do estabelecimento de parcerias com os estados e municípios e do incremento ao
associativismo e cooperativismo (Brasil, 2003:2), o que ocorre é que em comunidades de pesca
artesanal as ações do governo não se fazem presentes, o que pode ser evidenciado ao se estudar
uma comunidade como Ilha de Deus, onde as ações governamentais são inexistentes
Com o Plano Estratégico de Desenvolvimento Sustentado da Aqüicultura e
Pesca, o governo pretende, também, marcar diferença com as políticas de desenvolvimento do setor
pesqueiro do passado, uma vez que incorpora “uma visão de gerenciamento por projetos que
articula a tradicional cultura vertical, até então predominante no serviço público, com os modernos
conceitos de gerenciamento horizontal.” (Brasil, 2003:4).
Ao se confrontar as Diretrizes do Plano Estratégico de Desenvolvimento Sustentado da
Aqüicultura e Pesca com os princípios do Desenvolvimento Local, observa-se que essas diretrizes
parecem coincidir com os vetores fundamentais para construção do Desenvolvimento Local
contemporâneo. O Estado se propõem a assumir um papel de indutor do processo através do
estabelecimento de parcerias com organizações governamentais e não-governamentais; estimular a
organização e a participação popular, a exemplo do associativismo e cooperativismo; articular os
diversos setores produtivos numa perspectiva local; valorizar os recursos endógenos; demonstrando
preocupação com a sustentabilidade dos recursos naturais; entre outros vetores. No entanto,
nenhuma dessas propostas vem sendo executada na comunidade estudada, o que demonstra a
ineficácia das ações estatais bem como a falta de compromisso para com as comunidades cuja
principal atividade é a pesca artesanal.
Concluindo, percebe-se que o desenvolvimento local da pesca artesanal na Ilha de Deus
tem um potencial latente, no entanto pela carência de políticas publicas, sociais e econômicas o
desenvolvimento dos pescadores locais tem a sua produção de peixes prejudicadas, impedindo que
os moradores tenham garantida a sua dignidade através do seu próprio trabalho.

REFERÊNCIAS BIBLIOGRAFICAS
ANDRADE, Maria do Rosário. Trabalho, gênero e desemprego em Lagoa do Carro. Bogotá,
Revista Territórios N° 13. Universidad de los Andes, 2005.
BRASIL, Ministério do Meio Ambiente. Agenda 21 Brasileira. Brasília, 2000.
BRASIL, Presidência da República, Secretaria Especial de Aqüicultura e Pesca. Projeto político
estrutural. Brasília, 2003.
CALLOU, Angelo Brás Fernandes. A Voz do Mar: Construção simbólica da realidade dos
pescadores brasileiros pela missão do cruzador “José Bonifácio” (1919-1924). Tese (doutorado
em Comunicação) apresentada à Escola de Comunicações e Artes da Universidade de São Paulo.
São Paulo, 1994, 319 p.
Fórum Internacional do Meio Ambiente - A conferência da Terra 404

CALLOU, Angelo Brás Fernandes; BRAGA, Brenda. Estratégias de comunicação para o


desenvolvimento local: uma experiência governamental em Pernambuco, Brasil. Revista
UNIRCOOP, vol. 3, nº 1, 2005, Université de Sherbrooke, Sherbrooke, Canadá, p. 177-191.
CAMPANHOLA Clayton; GRAZIANO DA SILVA, José (Editores). O novo rural brasileiro:
políticas públicas. Jaguariuna, SP: EMBRAPA, Meio Ambiente, Volume 4, 2000.
COELHO, MARIA Célia Nunes. Impactos Ambientais em Áreas Urbanas - Teorias, Conceitos e
Métodos de Pesquisa. In: Impactos Ambientais Urbanos no Brasil. Rio de Janeiro: Bertrand Brasil,
2001.
DA MOTA, Artur Delmiro Sodré; CALLOU, Angelo Brás Fernandes . Extensão Pesqueira e
Carcinicultura na Ilha de Deus: Engorda e Comercialização do Camarão Cinza, Litopenaeus
vennamei (Boone, 1931). In: XV Congresso Brasileiro de Engenharia de Pesca, 2007, Manaus. XV
Congresso Brasileiro de Engenharia de Pesca - Recursos Pesqueiros e Desenvolvimento
Sustentável. Manaus: UFAM, 2007. p. 29-29.
GUIMARÃES, MAURO. Sustentabilidade e Educação Ambiental. In: CUNHA, S.B. GUERRA,
A.J.T. (Orgs.) A Questão Ambiental: diferentes abordagens. Rio de Janeiro: Bertrand Brasil, 2003.
LEFF, Enrique. Saber Ambiental: sustentabilidade, racionalidade, complexidade, poder. Petrópolis,
Rio de Janeiro: Vozes, 2001.
LIMA, Carolina da Silva; SOUSA, Ana Carolina Lemos de. A Atuação da Assessoria para
Assuntos Sócio-Ambientais ASSA/EMLURB – Na Comunidade Ilha de Deus. Trabalho de
Conclusão do Curso, Serviço Social – UFPE, 2003.
SCHNUETGEN, Alfredo. Experiência pastoral dos pescadores do Nordeste. Documentos da
Pastoral dos Pescadores, nov. 1968/dez. 1973. (mimeografado).
SEPLAN. Atlas Ambiental da Cidade do Recife. Recife, 2000
TAUK-SANTOS, Maria Salett. Comunicação rural: do difusionismo tecnológico ao
desenvolvimento local. In: Coletânea de Palestras. Recife: Prorenda, 2003.
Fórum Internacional do Meio Ambiente - A conferência da Terra 405

EFETIVIDADE DAS RPPN NA CONSERVAÇÃO DA MATA ATLÂNTICA

Aracelle Moreira Almeida


Faculdade de Tecnologia e Ciências de Itabuna (Graduando em Engenharia Ambiental)
Dayse Gomes Azevedo
Faculdade de Tecnologia e Ciências de Itabuna (Graduando em Engenharia Ambiental)
Fábio dos Santos Massena
Faculdade de Tecnologia e Ciências de Itabuna (Docente Engenharia Ambiental) – fabiomassena@gmail.com

RESUMO
Este trabalho apresenta uma discussão sobre a eficiência das Reservas Particulares do
Patrimônio Natural – RPPN na conservação do Bioma Mata Atlântica, considerando os seus
aspectos histórico, político-institucional e ainda o estágio em que se encontram as RPPNs criadas na
porção baiana do Corredor Central da Mata Atlântica. O potencial das reservas na conservação da
natureza poderia melhorar com a criação de uma rede de incentivos e parcerias para suprir as
demandas de apoio e manejo adequado das reservas.
Palavras-chave: RPPN, eficiência, estágio.

ABSTRACT
This work presents a discussion on the efficiency of the Particular Reservations of the
Natural Patrimony. RPPN in Bioma Atlantic forest's conservation, considering their historical,
political-institutional aspects and still the stage in that the RPPNs are in the portion from Bahia of
the Central Corridor of the Atlantic Forest. The potential of the reservations in the conservation of
the nature could get better with the creation of a net of incentives and partnerships to supply the
support demands and appropriate handling of the reservations.
Word-key: RPPN, efficiency, apprenticeship.

INTRODUÇÃO
O Brasil possui a maior cobertura de florestas tropicais do mundo, aliada ao fato de sua
extensão territorial e diversidade geográfica e climática, o país abriga uma imensa diversidade
biológica, o que faz dele o principal entre os países detentores de mega diversidade do planeta,
possuindo entre 15% e 20% das 1,5 milhões de espécies descritas na Terra (MMA, 2002).
Apesar desta posição de destaque, apenas 2,14% da porção continental do território
brasileiro encontram-se protegidos em Unidades de Conservação Federais do grupo de proteção
integral (IBAMA, 2006); média muito inferior ao padrão internacional de 6% (MMA, 2002).
Devido às limitações do sistema público de unidades de conservação, tem aumentado a importância
da participação do setor privado na estratégia de conservação in situ da diversidade biológica
brasileira.
As Reservas Particulares do Patrimônio Natural (RPPN) têm servido como um instrumento
adicional para o fortalecimento do sistema de unidades de conservação existente, permitindo o
aumento de áreas sob proteção legal, promovendo a proteção e o apoio à pesquisa sobre
biodiversidade, possibilitando o aumento da conectividade da paisagem natural e a proteção de
áreas chave ao longo dos biomas brasileiros (PINTO, et al., 2004).
As RPPN podem atuar como zonas tampão de unidades de conservação pública de uso
indireto; como formação de zonas de vida silvestre em unidades de uso sustentável além de
contribuir com o estabelecimento de corredores ecológicos. Entretanto, para apresentar melhores
resultados para a conservação da biodiversidade, as RPPN necessitam de planejamento regional
para a sua instituição, além de políticas publicas de incentivo e apoio.
Este artigo tem como objetivo demonstrar a eficiência das RPPN na conservação do Bioma
Mata Atlântica, considerando seus aspectos histórico e político-institucional, além de identificar e
averiguar o estágio em que se encontram as RPPN já criadas na porção baiana do Corredor Central
da Mata Atlântica.
Fórum Internacional do Meio Ambiente - A conferência da Terra 406

RESPONSABILIDADE SOCIAL E AMBIENTAL


Segundo Chiavenato (1994), a teoria da administração começou com uma abordagem de
sistema fechado, preocupada inicialmente com alguns aspectos e variáveis situados dentro da
organização e foi paulatinamente ampliando-se. Tal expansão foi acontecendo de forma variada, de
acordo com as escolas e teorias administrativas e de acordo com os aspectos e variáveis que cada
uma delas considerou relevantes na sua época para fundamentar as suas conclusões ou para
solucionar os problemas mais importantes com que se defrontavam.
De acordo com Chiavenato (1994), a Teoria da Burocracia nasceu com Max Weber (1864-
1920), que considerava a burocracia como sendo um termo técnico que identificava certas
características da organização formal voltada exclusivamente para a racionalidade e eficiência.
Consoante Bowditch e Buono (1992), Max Weber descobriu empiricamente os aspectos básicos que
caracterizavam o tipo ideal de organização.
A visão fechada das organizações foi tomando novas perspectivas a partir de
acontecimentos históricos, como a Revolução Industrial. Os países ocidentais, por exemplo, têm
características industriais advindas desse processo. Segundo Tachizawa (2002, p.42):
O desenvolvimento industrial nos finais do século XIX nos Estados Unidos e na Europa
Continental levou à necessidade de aperfeiçoamento dos princípios tradicionais da
organização, bem como deu continuidade ao desenvolvimento do capitalismo nas
primeiras décadas do século XX, o qual resultou no surto industrial que vem até os
nossos dias. É exatamente após esse surto industrial e os positivos avanços científicos
que se esboçam os primeiros trabalhos sobre os efeitos da poluição gerada por minas e
fábricas, tratados basicamente sob o enfoque da saúde dos trabalhadores.

A Teoria dos Sistemas ocorreu à medida que os pesquisadores começaram a perceber a


interação entre as dimensões estruturais e humanas das organizações e a influência das forças
ambientais externas. Sob esta perspectiva, “uma organização é um sistema composto de
subunidades ou subsistemas que interagem continuamente e que dependem mutuamente uns dos
outros” (Bowditch e Buono, 1992, p. 15)
Percebe-se, então, que no decorrer dos anos, o estudo apenas das variáveis internas não
proporcionava uma compreensão mais ampla da estrutura e comportamento organizacionais,
surgindo a necessidade de entender as variáveis externas e que influenciavam profundamente seus
aspectos estruturais e comportamentais.
Bowditch e Buono (1992) explicam que uma das decorrências da perspectiva dos sistemas
é o conceito de Teoria da Contingência, segundo a qual não existe uma única “melhor maneira” (the
one best way) de organizar as empresas.

A tese central da teoria da Contingência é que não há princípios universais de


administração que possam ser aplicados indiscriminadamente a todas as situações. As abordagens à
organização e à administração precisam variar de uma firma para outra porque dependem de
condições ambientais exclusivas e fatores internos inerentes a cada organização. Assim, é
necessária uma abordagem situacional às decisões sobre a estrutura organizacional e o
comportamento administrativo apropriado. Bowditch e Buono (1992, p. 17)

Os autores afirmam que o macroambiente empresarial assume muitas formas diferentes:


embora alguns ambientes ainda possam ser simples e estáveis, outros tendem a ser muito mais
complexos por natureza. Tais organizações vistas como partes de um ambiente maior podem afetar
o ambiente ou serem afetadas por ele, ao menos levemente.
O modelo dos interessados na organização (stakeholders), descrito por Bowditch e Buono
(1997, p. 144), sugere que as incorporações estejam a serviço de uma sociedade maior,
reconhecendo que as exigências sobre as organizações empresariais crescem continuamente e,
ampliando a variedade de grupos que não eram tradicionalmente definidos como parte do interesse
imediato da organização.
Fórum Internacional do Meio Ambiente - A conferência da Terra 407

Segundo os autores “interessado é qualquer grupo ou indivíduo que possa afetar ou ser
afetado pelo desempenho da organização em termos de seus produtos, políticas e processos
operacionais” (Bowditch e Buono,1997, p. 145) .
Obviamente a ampliação das fronteiras organizacionais não vem ocorrendo por acaso; as
pressões no ambiente estão levando a um repensar organizacional. O crescimento das organizações
não-lucrativas, a conscientização dos indivíduos perante o papel das organizações no contexto
econômico, a insuficiência do poder do Estado no desenvolvimento, a disseminação rápida das
informações na atual era da economia digital, entre outros aspectos cruciais, vêm mudando a
natureza do capitalismo.
Levando em conta as diversificadas e crescentes expectativas de clientes, fornecedores,
colaboradores, gestores e outras entidades que influenciam ou são influenciadas pelas organizações,
as empresas têm como grande desafio agir de forma responsável em seus relacionamentos internos e
externos.
Cada vez mais a conscientização do indivíduo como cidadão, conhecedor de seus direitos e
deveres na sociedade, tem exigido por parte das organizações uma postura ética, boa imagem
institucional no mercado e que atuem de forma ecologicamente correta.
Nesse contexto, os gestores precisam ter um novo senso de responsabilidade em relação
aos interessados internos, no que toca às expectativas de receberem um tratamento justo, ter
participação no processo decisório, local e instrumentos de trabalho apropriados ao desempenho de
suas funções e a possibilidade de trabalharem em equipe.

A responsabilidade social e ambiental pode ser resumida no conceito de efetividade, como


alcance de objetivos do desenvolvimento econômico-social. Portanto, uma organização é efetiva
quando mantém uma postura socialmente responsável. A efetividade está relacionada à satisfação
da sociedade, ao atendimento de seus requisitos sociais, econômicos e culturais. Tachizawa (2002,
p.73)

A cidadania corporativa, termo usado por McIntosh (2001), não se trata de filantropia, ou
de anexar um lustroso relatório sobre assuntos comunitários ao relatório financeiro anual. Segundo
o Serviço Social da Indústria – SESI, “responsabilidade social não é filantropia, não é uma
ferramenta de marketing, nem o simples cumprimento de leis e regulamentos”. O novo modelo de
cidadania corporativa descrito por McIntosh (2001) pode representar uma mudança de paradigma,
uma evolução dentro da empresa, ou seja, a inclusão das preocupações sociais e ambientais no
centro de suas estratégias corporativas. Segundo McIntosh (2001, p.42):

Não importa se estamos falando de uma grande empresa fabril, uma escola local, uma
instituição de caridade nacional ou uma pequena loja de família, todas as organizações possuem
responsabilidades sociais que as tornam cidadãs corporativas, responsáveis ou não.

Uma gestão socialmente responsável ocorre, a partir do momento em que a empresa, além
de cumprir seu papel na geração de riquezas pela produção de bens e serviços para a comunidade,
com o objetivo de criar valor aos acionistas, pagar impostos, salários e outros benefícios aos seus
colaboradores e, ainda reinvestir em sua estrutura e seus negócios, passar a desenvolver todas essas
ações primando sempre pela ética, a transparência, respeitando as leis, o meio ambiente e o bem-
estar da comunidade. Essas ações têm como base valores sociais e por objetivo a qualidade e
eficiência, tanto dos produtos quanto das relações entre as partes envolvidas.
McIntosh (2001) enumera as responsabilidades em econômicas, legais, sociais e
ambientais, conforme descrito: (a) responsabilidade econômica - todas as organizações devem se
manter viáveis e operar dentro de seu contrato social, bem como, divulgar prestações de contas
certificadas, regidas por critérios acordados; (b) responsabilidade legal – todas as organizações
devem trabalhar dentro da lei e estar conscientes de suas restrições legais; (c) responsabilidade
social e ambiental – as organizações não podem trabalhar apenas com bases em suas obrigações
Fórum Internacional do Meio Ambiente - A conferência da Terra 408

financeiras e legais, mas compreender que operam em um ambiente social no qual considerações
éticas e filantrópicas são essenciais à sua capacidade de operar.
As certificações são maneiras utilizadas para atestar as organizações. Assim como a
ISO9000, de qualidade e a ISO14000, para meio ambiente, outras surgiram com o intuito de
verificar as ações no que tange à ética organizacional.

A EVOLUÇÃO DAS RPPNS


As Reservas Particulares do Patrimônio Natural surgiram através do Decreto 98.914, de 31
de janeiro de 1990, tendo sido estabelecidos seu caráter perpétuo e o incentivo à sua criação
mediante isenção de impostos.
O Decreto Federal 1.922 de 5 de junho de 1996 ampliou as vantagens para os proprietários,
oferecendo a possibilidade de financiamento para implantação da RPPN junto ao Fundo Nacional
de Meio Ambiente (FNMA) e dando preferência na análise e concessão de créditos agrícolas. Outra
inovação foi estabelecer a possibilidade de RPPNs serem reconhecidas pelos órgãos estaduais e
municipais de meio ambiente.
Com a aprovação da Lei 9.985 de 2000, que institui o Sistema Nacional de Unidades de
Conservação (SNUC), as RPPNs passaram a ser consideradas Unidades de Conservação (UCs),
fazendo do Brasil o único país da América Latina a incluir as reservas particulares no seu sistema
de áreas protegidas oficial. Segundo a Lei do SNUC, as RPPNs integram o grupo das Unidades de
Conservação de Uso Sustentável, que permite uso direto dos recursos naturais. No entanto, o art. 21
da referida Lei estabelece que as únicas atividades permitidas são a pesquisa científica e a visitação
com fins recreativos, turísticos e educacionais, tornando-as, na prática, UCs de proteção integral
(BRASIL, 2000).
O artigo 46 do Decreto nº 4.340/2002, que regulamentou o SNUC, prevê que cada
categoria de unidade de conservação terá regulamentação específica. Visando atender este
instrumento legal, foi apresentada, em março de 2003, a primeira minuta de decreto regulamentando
as RPPNs, elaborado pelo IBAMA, em parceria com a Confederação Nacional de RPPNs e
associações estaduais de proprietários. Após três anos de discussões, em abril de 2006, foi aprovado
o Decreto nº 5.746 que regulamenta as RPPNs, sendo esta a primeira categoria de Unidade de
Conservação a ter regulamentação própria baseada na Lei do SNUC.
O novo decreto sobre RPPN, além das vantagens já consolidadas, como a isenção do ITR,
prioridade na análise de projetos do FNMA e a possibilidade de cooperação com entidades públicas
e privadas; traz uma definição mais precisa dos critérios para o proprietário obter concessões de
crédito agrícola e também define a RPPN diretamente afetada por empreendimentos de dano
ambiental como passível de benefício financeiro por compensação ambiental (BRASIL, 2006).
Quanto às exigências para a criação de RPPN, o novo decreto requere o Certificado de
Cadastro de Imóvel Rural – CCIR, certidão trintenária na matrícula do imóvel e o
georreferenciamento obrigatório no levantamento da planta do imóvel, da área a ser reconhecida e
da localização da propriedade na região ou município da RPPN, efetuado e assinado por
profissional habilitado.
O Decreto nº 5.746/06 trata somente de RPPNs criadas a partir da data de sua publicação e
ignora mecanismos financeiros desburocratizados, como o ICMS ecológico na questão das
oportunidades de apoio e compensações para as RPPNs. Apesar dessas críticas ao novo Decreto
sobre RPPN, trata-se de um avanço na regulamentação da conservação da biodiversidade em terras
privadas no Brasil.
Desde sua regulamentação em 1990, já foram criadas cerca de 694 RPPNs no Brasil, que
somam mais de 540.000 ha de área protegida, sendo 420 reservas criadas em nível federal e 274
reservas criadas nos estados com programas próprios de RPPN. Martins (2003) comenta que a
legislação referente às RPPNs é um exemplo de instrumento de política moderno e eficiente devido
ao fato de consolidar o conceito de propriedade vinculado ao paradigma da função social da
propriedade, atendendo ao conceito definido na Constituição Federal de 1988.
Fórum Internacional do Meio Ambiente - A conferência da Terra 409

Para Wiedmann (2001), este foi o encerramento de um capítulo na história ambiental


brasileira, onde somente o Estado tinha essas obrigações. Com a nova Carta Constitucional, esse
dever foi estendido aos cidadãos, devendo o Estado prover os meios necessários. Esta trajetória
revela o fortalecimento e consagração da figura jurídica das RPPNs no cenário ambientalista no
Brasil.
O sucesso no processo de criação de RPPNs está vinculado ao fato de existirem
proprietários dispostos a implantá-las. Para estimular essa pré-disposição e transformá-la em
solicitação para criar reservas, é necessário desenvolver um cenário favorável. Segundo Martins
(2003), a disponibilidade de políticas públicas federais e estaduais objetivas, desburocratizadas e
complementares; instrumentos econômicos atraentes; sociedade civil organizada e atuante
localmente e governo local mobilizado e preparado para agir, compõem este cenário.
Estudando a influência das políticas públicas na criação de RPPNs, Martins (2003)
observou uma clara resposta dos proprietários rurais às políticas de incentivo às reservas privadas.
Em 1990, quando o Decreto Federal 98.914/90 instituiu a RPPN, foram criadas 11 reservas. Após a
edição do Decreto 1.992/96, que reformulou a figura das RPPNs, foram criadas 45 reservas em
1997, 50 em 1998 e 59 em 1999. Com o início da vigência da Lei 9.985 de 2000, que instituiu o
Sistema Nacional de Unidades de Conservação, no ano de 2001 foram criadas mais de 59 unidades.
No entanto, a partir de 2003, houve um decréscimo no número de reservas particulares
criadas pelo IBAMA. Até 2002, a média anual de reservas criadas foi de 31, em 2003 somente 2
reservas foram criadas e nos anos seguintes, a média de reservas instituídas não passou de 10. Hoje
existem 151 processos de criação de RPPN paralisados no Ibama, devido à burocracia e à maior
exigência dos órgãos ambientais quanto à documentação necessária para a criação de RPPN (O
Estado de São Paulo, 2006).
Segundo Martins (2003), os instrumentos econômicos têm sido amplamente utilizados no
mundo como um mecanismo de aprimoramento da gestão ambiental visando o desenvolvimento
sustentável. No caso das RPPNs no Brasil, os instrumentos econômicos utilizados para fomentar a
criação de reservas privadas são a isenção do Imposto Territorial Rural – ITR, que funciona como
renúncia fiscal e a criação da modalidade do Imposto de Circulação de Mercadorias – ICMS
Ecológico, instituído em dez estados da federação.

A LIGAÇÃO ENTRE A CRIAÇÃO E CONSOLIDAÇÃO DAS RPPN E OS LINKS COM


OUTROS ASPECTOS IMPORTANTES
Sendo assim fazendo uma relação com a Responsabilidade Social e Ambiental e a criação
e consolidação das RPPN’s percebe-se a forte ligação que ambas apresentam, pois assim como a
Responsabilidade Social e Ambiental pode ser resumida em efetividade as RPPN’s podem ser vistas
como efetivas a partir do ponto em que são criadas com o objetivo de preservar e manter o ambiente
de forma sustentável, atendendo os seus requisitos sociais, econômicos e culturais.
Alguns links podem ser feitos com relação às RPPN’s, como por exemplo, a parte da
Hidrobiologia para estar verificando a qualidade dos mananciais envolvidos nessas RPPNS. Na
parte da Hidrologia, para reconhecer economicamente os serviços ambientais hidrológicos
desempenhados por determinadas propriedades, que é apenas um setor da paisagem, vasta literatura
aponta que existe um “gargalo” quanto à questão da relação causa/efeito (Porras, 2003; Pagiola e
Platais, 2003; Faurès; 2003), isto é, uma determinada ação de manejo.
A complexidade da ciência hidrológica sugere que para se chegar a esse tipo de resultado é
preciso desencadear estudos científicos focados na questão dos Pagamentos por Serviços
Ambientais (PSA), com a concepção de gerar um marco teórico para o mesmo. Pó outro lado,
defende-se que não há tempo hábil para isso, pois os infortúnios da biodiversidade são cada vez
maiores e mais intensos e a demanda por pagamentos de serviços ambientais crescentes. No caso
das RPPN, os artigos 47 e 48 do SNUC já sinalizam para isso.
Com relação ao Manejo de Unidades de Conservação está envolvido uma série de fatores
ligados ás RPPN’s inclusive o plano de manejo que é um documento técnico de planejamento que
Fórum Internacional do Meio Ambiente - A conferência da Terra 410

estabelece sistematicamente o conjunto de ações a serem desenvolvidas para que os objetivos sejam
alcançados.
Na recuperação de áreas degradadas deve-se estar atento, pois existe um link interessante
no que diz respeito á criação das RPPN’s que estas só poderão ser criadas abrangendo até trinta por
cento de áreas para recuperação ambiental, com o limite máximo de mil hectares. Na agricultura e
Irrigação o desenvolvimento rural sustentável, com recuperação de matas ciliares, controle de
erosão do solo e aumento da produtividade, pode ser de muita importância no plano de manejo de
uma RPPN.

RESULTADOS E DISCUSSÃO
A região do Corredor Central da Mata Atlântica é composta por um conjunto de Unidades
de Conservação, gerenciadas de forma integrada com terras indígenas, extrativistas e áreas
particulares que vem funcionando como um projeto piloto do governo federal para testar as
condições de implementação desse conceito, baseado num mosaico de uso de terra.
A área de estudo encontra-se inserida na porção baiana do Corredor Central da Mata
Atlântica e o presente estudo abrange quinze RPPN, distribuídas em 10 municípios no litoral sul da
Bahia (Figura 01). A maior parte dessas RPPN foi criada com o intuito de conservar a natureza, o
que é condizente com a principal meta proposta pela Lei 9.985 que institui o Sistema Nacional de
Unidades de Conservação - SNUC (BRASIL, 2000).
O segundo principal motivo para criação das áreas protegidas foi a isenção de impostos,
resultado também encontrado por Cegana (2005). Este parece ser o principal e, muitas vezes, o
único incentivo concreto para a criação de RPPN oferecido aos proprietários e, embora sua
eficiência como estimulador na criação de reservas seja questionada (MORSELLO, 2001), de certa
forma vem contribuindo para que novas áreas sejam gravadas como RPPN.
Muitas atividades relacionadas com o uso dos recursos naturais tais como turismo e
aproveitamento florestal, têm melhorado sua gestão após ter identificado, através de processos de
avaliação, critérios de medição e padrões de qualidade (IZURIETA et al., 1999). O mesmo se aplica
para o caso da gestão de áreas naturais protegidas, as quais, ao contarem com um sistema de
avaliação testado e validado, têm à sua disposição uma valiosa ferramenta, que pode levar à
melhoria de suas condições de manejo e cumprimento dos seus objetivos.

1 Mãe da Mata
2 Ararauna
3 Ecoparque
4 Água Branca
5 Rio Capitão
6 Pedra do Sabiá
7 Capitão
8 Paraíso
9 Nova Angélica
10 São José II
11 2 de Julho
12 Baixão
13 Castelino
14 Serra do Teimoso
15 Serra Bonita

Figura 01 – Localização da RPPNs


Fórum Internacional do Meio Ambiente - A conferência da Terra 411

Segundo CIFUENTES (1998), o manejo de uma área protegida pode ser definido como “o
conjunto de ações que resultam em um melhor aproveitamento e permanência de uma área
protegida, permitindo que os objetivos para os quais foi estabelecida se cumpram.” IZURIETA
(1997) define efetividade de manejo como “o conjunto de características, ações, atitudes,
capacidades e competências particulares que permitam à uma área protegida cumprir
satisfatoriamente a função e os objetivos para os quais foi criada.”
No caso das reservas naturais privadas, ALDERMAN (1994) e LANGHOLZ (1999),
expressaram a necessidade de se estabelecer sistemas de avaliação do manejo dessas reservas.
Entretanto, é importante ressaltar que a avaliação do manejo de uma reserva não deve ser vista
como um fim em si mesmo, mas como um importante passo para determinar suas fortalezas e
debilidades, com vistas ao monitoramento contínuo e ao aprimoramento da sua gestão.
Os principais objetivos de manejo apontados pelas RPPNs foram o de proteger espécies
ameaçadas de extinção, proteger recursos hídricos, conservar paisagem natural, disponibilizar área
para realização de pesquisas e proteger a terra de ocupações e invasões.
Com relação ao plano de manejo 90% das reservas não possuem plano de manejo e tal
tendência é decorrente do alto custo de sua execução, da exigência de uma equipe multidisciplinar e
da falta de assistência técnica e apoio dados aos proprietários. Entretanto, espera-se que o
lançamento do Roteiro Metodológico para a Elaboração de Plano de Manejo para Reservas
Particulares do Patrimônio Natural (FERREIRA et al., 2004) possa reverter este quadro ao se
consolidar como ferramenta norteadora para a elaboração do plano de manejo para as RPPNs,
apesar de que instituições de pesquisa estão sempre buscando se inteirar em pesquisas científicas.
Quanto ao apoio dado às reservas todas recebe apoio de órgãos e instituições de pesquisa, o que
garante por outro lado o manejo efetivo das mesmas.
FUNATURA & CNRPPN (2004) observaram que 45,3% dos proprietários consideram
muito importante ou importante a função das RPPNs na proteção das terras contra invasões e
ocupações. Embora, na América Latina, a proteção legal contra a desapropriação seja também
considerada um incentivo à criação de reservas privadas; a preocupação em proteger a terra contra
ocupações e invasões é vista com ressalvas entre os conservacionistas, que temem que a criação de
RPPNs passe a ser uma estratégia para escapar à Reforma Agrária ou assegurar a posse da terra,
deixando de lado os propósitos de conservação (MORSELLO & MANTOVANI, 1997).
No entanto, Wiedmann (2001) explica que uma das exigências para que o proprietário
possa criar uma RPPN é o título de domínio da propriedade registrado no Cartório de Registro de
Imóveis e a averbação de RPPN à margem da inscrição no Registro Público de Imóveis. Com essas
exigências, ficam excluídas as posses e os aforamentos de imóveis da União, pois não permitem a
averbação ad perpetum.
Vários autores ressaltam a importância das associações de proprietários para o
fortalecimento institucional das RPPNs por meio da criação de novos espaços de articulação e
negociação com os órgãos ambientais (MESQUITA & VIEIRA, 2004), na capacitação dos
proprietários (MESQUITA, 2002) e na formação de parcerias e desenvolvimento de projetos
(MELO, 2004).

CONSIDERAÇÕES FINAIS
O fortalecimento das RPPN como ferramenta na conservação biológica depende de
políticas públicas de apoio aos proprietários mais eficazes, com regras simples, objetivas e
desburocratizadas, e de um incremento aos instrumentos econômicos de incentivo à criação e gestão
das reservas. A Confederação Nacional de RPPN, juntamente com as associações estaduais de
proprietários têm papel fundamental na construção de políticas de apoio às reservas, bem como na
formação de parcerias com órgãos públicos, entidades ambientalistas e instituições de pesquisa.
Os programas de incentivo às RPPN têm importante função na ampliação da rede de
reservas no Brasil, assim como na melhoria da gestão das reservas, através das ações de capacitação
dos proprietários e da construção de modelos eficazes de gestão. A inserção de critérios ecológicos
Fórum Internacional do Meio Ambiente - A conferência da Terra 412

e de representatividade biológica nas políticas voltadas à instituição das reservas é essencial para
melhorar o potencial das Unidades na conservação da biodiversidade.

REFERÊNCIAS
ALDERMAN, C. L. The economics and the role of privately-owned lands used for nature tourism,
education and conservation. In Munasinghe, M; McNeely, J. eds. Protected areas, economic and
policy: linking conservation and sustainable development. World Bank / IUCN. 1994. p.273-317.
Brasil 2006. Decreto nº 5.746 de 5 de abril de 2006. Regulamenta o art. 21 da Lei no 9.985, de 18
de julho de 2000, que dispõe sobre o Sistema Nacional de Unidades de Conservação da Natureza.
Brasília
Brasil. 2000. Lei nº 9.885 de 18 de julho de 2000. Institui o Sistema Nacional de Unidades de
Conservação. Brasília.
CEGANA, A. C. V. 2005. Reservas Particulares do Patrimônio Natural do Estado Paraná: situação
atual e perspectivas. Dissertação de Mestrado, Programa de Pós-graduação em Agronomia.
Universidade Estadual de Maringá.
CIFUENTES, M. Curso Manejo de Áreas Naturales Protegidas. Apuntes de clase.Turrialba, Costa
Rica, CATIE, Programa de Maestría en Manejo y Conservación de Bosques Tropicales y
Biodiversidad. 1998.
FERREIRA, L.V.; SÁ, R. L.; BUSCHBACHER, R.; BATMANIAN, G.; BENSUSAN, N.R.;
COSTA, K.L. Áreas protegidas ou espaços ameaçados. Informe sobre o grau de implementação e
vulnerabilidade das unidades de conservação brasileiras. Brasília, DF, WWF. 1999.15p.
FUNATURA; CNRPPN. 2004. Levantamento do perfil atual das RPPN do Brasil. Não publicado.
IBAMA. Contexto federal das unidades de conservação Disponível em
http://www.ibama.gov.br/siucweb/unidades/encarte_federal.pdf. Acesso 26/01/2006.
IZURIETA, A. Evaluación de la eficiencia del manejo de áreas protegidas: validación de una
metodología aplicada a un subsistema de áreas protegidas y sus zonas de influencia, en el Área de
Conservación de Osa, Costa Rica. Tesis Mag. Sc. Turrialba, Costa Rica, CATIE. 1997.126p.
IZURIETA, A.; CIFUENTES, M.; FARIA, H.H. Medición de la efectividad del manejo de áreas
protegidas. WWF-Centroamérica. Turrialba, Costa Rica. 1999. 89p.
LANGHOLZ, J.A. Conservation cowboys: privately-owned parks and the protection of biodiversity
in Costa Rica. PhD. Dissertation. Cornell University. 1999. 269p.
MARTINS, I. D. M. 2003. A influencia das políticas publicas na criação das Reservas Particulares
do Patrimônio Natural no Brasil. Dissertação de Mestrado, Centro de Desenvolvimento Sustentável
da Universidade de Brasília.
MELO, A. L. 2004. Reservas particulares do patrimônio natural (RPPN) em Silva Jardim, Rio de
Janeiro: perfil e características de manejo. Monografia, Instituto de Florestas, Universidade Federal
Rural do Rio de Janeiro.
MESQUITA, C. A. B ; Vieira, M. C. W. 2004. RPPN Reservas Particulares de Patrimônio Natural
da Mata Atlântica. Conselho Nacional da Reserva da Biosfera da Mata Atlântica. 2004. São Paulo.
MESQUITA, C. A. B. 2002. Capacitação como meio para conservar terras privadas. In. III
Congresso Brasileiro de Unidades de Conservação, Anais, V. I, Trabalhos Técnicos e Seminários.
Pp. 873-4. Rede Pró-Unidades de Conservação: Fundação O Boticário de Proteção à Natureza:
Associação Caatinga. Fortaleza.
MMA – Ministério do Meio Ambiente. 2002. Biodiversidade brasileira: avaliação e identificação de
áreas e ações prioritárias para conservação, utilização sustentável e repartição dos benefícios da
biodiversidade nos biomas brasileiros. MMA/SBF. Brasília.
MORSELLO, C. 2001. Áreas naturais protegidas públicas e privadas: seleção e manejo.
Annablume/FAPESP. São Paulo.
MORSELLO, C.; MANTOVANI, W. 1997. Mecanismo de seleção de RPPN: uma critica. In.
Congresso Brasileiro de Unidades de Conservação, Anais, V. II, Trabalhos Técnicos. Pp.15-30.
IAP/Unilivre/Rede Pró-Unidades de Conservação. Curitiba.
Fórum Internacional do Meio Ambiente - A conferência da Terra 413

PINTO, L. P. et al. 2004. O papel das reservas privadas na conservação da natureza. In. Castro, r.;
Borges, M. (org.) RPPN: Conservação em terras privadas – desafios para a sustentabilidade. Pp. 5-
16. Edições CNRPPN. Planaltina do Paraná.
WIEDMANN, S. M. P. 2001. Reserva Particular do Patrimônio Natural – RPPN – na Lei nº
9.985/2000 que instituiu o Sistema Nacional de Unidades de Conservação – SNUC. 2001. In.
Benjamin, A. H. (org.) Direito Ambiental das áreas protegidas: o regime jurídico das unidades de
conservação. Forense Universitária. Rio de Janeiro.
Fórum Internacional do Meio Ambiente - A conferência da Terra 414

A POSSIBILIDADE DE REESTRUTURAÇÃO MEDIANTE A DEGRADAÇÃO


AMBIENTAL: O CASO DO MANGUEZAL CHICO SCIENCE – OLINDA/PE

Ludmilla Calado
Departamento de Geografia, UFPE e Gerência de Revitalização de Bacias Hidrográficas da Secretaria de Recursos
Hídricos de Pernambuco – SRH. Avenida Cruz Cabugá, 1111 - Santo Amaro - Recife-PE - CEP: 50.040.000 E-mail:
ludmillacalado@gmail.com
Janaina Assis
Departamento de Geografia, UFPE e Laboratório de Meteorologia de Pernambuco – LAMEPE/ITEP Av. Prof Luiz
Freire, 700. Cidade Universitária. Cep: 50.740-540. Recife – PE

RESUMO
Apesar da importância ecológica do manguezal, este é um ecossistema que tem sido alvo
constante de graves ações. O Manguezal Chico Science (MCS) é um ambiente aquático artificial,
produto de aterros realizados sobre o complexo estuarino dos rios Beberibe e Capibaribe, localizado
na área externa do Espaço Ciência. A intenção de trabalhar no estudo da reestruturação
biogeográfica do Manguezal partiu do interesse pelas áreas verdes em meios urbanos que sofrem
com a forte atuação antrópica do ambiente urbano nos diferentes tipos de ecossistemas. O caso do
MCS, que após longos anos de severas degradações (poluição e abandono, por exemplo), recebeu
um plano de reconstituição e preservação, advindo com a implantação do Espaço Ciência, utilizado
como laboratório didático para atividades de pesquisa e conscientização ambiental. A descrição do
panorama evolutivo e do seu nível de antropização são os enfoques do presente trabalho, fazendo
referência aos fatos presentes ao quadro atual.
Palavras-chave: Manguezal, Impactos ambientais, reestruturação.

ABSTRACT
Although the ecological importance of the mangrove, this is an ecosystem that has been
target constant of serious actions. The Mangrove Chico Science (MCS) is artificial an aquatic
environment, product of embankment carried through on the estuary complex of the rivers Beberibe
and Capibaribe, located in the external area of the Space Science. The intention to work in the study
of the biogeographic reorganization of the Mangrove Chico Science came from the interest for the
green areas in urban ways, which suffer with the strong antropic performance of the urban
environment in the different types of ecosystems. The case of the MCS, that after long years of
severe debasement (pollution and abandonment, for example), received a plan from reconstitution
and preservation, happened with the implantation of the Space Science, used as didactic laboratory
for activities of research and ambient awareness. The description of the evolutionary panorama of
the Mangrove Chico Science and its level of antropization is the approaches of the present work,
making reference to the facts gifts to the current picture.
Keywords: Mangrove forests, environmental impacts, reestructuring

INTRODUÇÃO
O manguezal é um ecossistema costeiro de transição entre os ambientes terrestre e
marinho, característico de regiões tropicais e subtropicais e sujeito ao regime das marés. (Schaeffer-
Novelli 1995). Constitui um dos ecossistemas mais produtivos do mundo, cuja importância para a
humanidade como fonte de alimentos, remédios, material de construção (barro e madeira),
combustível, e outros, é de longo tempo reconhecida (Vanucci, 1999).
Se não bastasse esta importância para o ser humano, é digno de ênfase o papel dos
manguezais como estabilizadores ambientais, funcionando como barreiras naturais contra impactos
permanentes de inundações catastróficas além da erosão eólica, por furacões e ciclones, e hídricos,
pela ação das ondas (Vanucci 1999). Além disso, os manguezais podem funcionar como
despoluidores através do acúmulo seletivo de metais pesados por algumas espécies. Apesar de toda
importância desse ecossistema para o equilíbrio ecológico e conseqüentemente para o homem, ele
continua sofrendo destruição total ou parcial por meio de processos urbano-industriais de ocupação
Fórum Internacional do Meio Ambiente - A conferência da Terra 415

do litoral, com a exploração predatória de sua fauna e flora, poluição de suas águas, além de sua
transformação em aterros e depósitos de lixo (LIRA et al., 1992; OLIVEIRA, 2004). Os manguezais
mais afetados são aqueles que se encontram nas áreas mais urbanizadas, pois dentre os trechos mais
concorridos para o estabelecimento do homem em busca de sua sobrevivência, estão aqueles que
margeiam os estuários (SILVA, 1992).
O estudo da área do Manguezal Chico Science (MCS) elucida a questão da atuação
humana versus ambiente, demonstrando como o ecossistema pode sobreviver mediante as
intempéries enfrentadas durante cerca de 35 anos e o atual estado de conservação apresentado. De
início, o aterramento ocorrido durante longos anos na área dos atuais: Parque Memorial Arcoverde,
Fábrica Tacaruna e Centro de Convenções, compreendidos entre os municípios de Olinda e Recife,
ocasionou o represamento do manguezal, que permaneceu durante anos em estado de abandono,
sem drenagem e recebimento de água salobra e doce. Só a partir da total implantação do Parque
Memorial Arcoverde e da instalação do Espaço Ciência, na década de 90, o manguezal iniciou seu
processo de revitalização.

MATERIAL E MÉTODOS
ÁREA DE ESTUDO
A delimitação da área de estudo foi baseada na fotografia de 1971, local onde se
apresentavam as primeiras habitações e aterramento no entorno do Manguezal, tem localização
aproximada 8°02'01''S e 34°52'05''W, apresentando uma área total de aproximadamente 82.500 m².
O manguezal está inserido nesta área ocupando cerca de 25.024 m². A área de estudo fica localizada
no Complexo de Salgadinho, em Olinda, Pernambuco (Ver Figura 1).

Figura 1: Mapa de localização da área de estudo. Fonte: Autor.


Fórum Internacional do Meio Ambiente - A conferência da Terra 416

O manguezal surgiu a partir de aterros realizados sobre o complexo estuarino dos Rios
Beberibe e Capibaribe. A bacia hidrográfica do Rio Beberibe está situada em pleno centro da
Região Metropolitana entre os núcleos de Recife e Olinda, onde se originou a urbanização do
Estado. O Rio Capibaribe nasce da divisa dos Municípios de Jataúba e Poção no Agreste
pernambucano, percolando por vários centros urbanos recebendo resíduos industriais e domésticos
até sua foz na cidade do Recife.
Durante as décadas de 1980 e 1990, a região foi alvo de mais aterros e destruição de
manguezais, ocasionado pela instalação de complexos de lazer e comércio. Em 1980 foi construído
o Centro de Convenções de Pernambuco, em 1993 inaugurou-se o empreendimento Parque
Memorial Arcoverde e em 1997 foi construído o Shoping Center Tacaruna. Em função destas
construções ocorreram aterramentos projetados sem levar em consideração o impacto sobre a
drenagem, provocando um represamento do Manguezal.

METODOLOGIA
O estudo enfoca a análise de dados multitemporais referentes aos anos de 1971 e 2006.
Através de técnicas de geoprocessamento desenvolveram-se diagnósticos de análise de expansão ou
redução da área total, vegetação e situação do entorno para os anos citados anteriormente.
Inicialmente, a base cartográfica utilizada foram as fotografias aéreas verticais,
pancromáticas P&B, com dimensão 23cm x 23cm, na escala de 1:6.000, dos anos de 1971, 1981 e
1997 e a imagem do satélite QuickBird do ano de 2006, adquiridas por meio da CONDEPE /
FIDEM. As fotografias foram escaneadas e, utilizando o software ArcGIS 9.2, georreferenciadas ao
sistema de coordenadas UTM no fuso 25, tendo como fonte a UNIBASE (Plantas Topográficas
Cadastrais) com escala 1:1.000, da Região Metropolitana do Recife, possibilitando desta forma o
uso espacial e analítico das informações. Uma vez digitalizados e georreferenciados, os dados
foram analisados, estimados e calculados através do ArcGIS 9.2 tornando possível a vetorização da
área, em m², referentes a cada ano.

RESULTADOS E DISCUSSÕES
Ao longo de trinta e cinco anos, o MCS atravessou diversas fases, incluindo etapas de
desestruturação e posterior reestruturação, apresentando diferentes causas da sua variação espaço-
temporal como a ação antrópica que levou, entre os anos de 1971 e 1981, a máxima deteriorização
do ambiente. Observa-se que, atrelado à ação antrópica, a degradação ambiental no local alcançou
também, na época citada acima, os seus maiores picos. Nota-se ainda mudanças ocorridas tanto no
ambiente mangue quanto na sua área de entorno, elementos destacados nas Figuras 2, 3, 4 e 5, desta
forma permitindo melhor visualização das mudanças espaciais ocorridas ao longo do período
determinado.

Figura 2: Fotografia Aérea de 1971. Figura 3: Fotografia Aérea de 1981.


Fonte: CONDEPE / FIDEM Fonte: CONDEPE / FIDEM
Fórum Internacional do Meio Ambiente - A conferência da Terra 417

Figura 4: Fotografia Aérea de 1996.


Figura 4: Imagem QuickBird de 2006.
Fonte: CONDEPE / FIDEM
Fonte: CONDEPE / FIDEM

As alterações foram calculadas, apontando as diferenças espaciais entre os anos de


1971 a 2006. A Tabela 1 apresenta o resultado da medição feita:

Tabela 1: Área de mangue e entorno referente aos anos de 1971 a 2006.

Em 1971, a área começava a ser modificada indicando os primeiros sinais de impacto


urbano como os aterramentos e as primeiras habitações.
Em 1981, a área reduziu drasticamente para 45.2% como aponta a tabela 2. Esta foi a pior
fase encontrada na análise. A falta de vegetação, suporte e drenagem dificultaram a sobrevivência
do ecossistema. A implantação do Parque Memorial Arcoverde estava iniciada, ocorrendo obras de
aterramento e aplainamento, interrompendo a ligação com fontes hídricas.

Tabela 2: Variação temporal da área de mangue, apontando seu acréscimo ou decréscimo.

Em 1996, a estrutura física do manguezal indica o início de sua recuperação. O progresso


deve-se à implantação do Espaço Ciência (Museu interativo de divulgação científica) que teve
como um dos objetivos a preservação e melhoria do Manguezal Chico Science. A primeira atuação
realizada foi a ligação do Manguezal ao Canal Derby-Tacaruna através de um duto subterrâneo. O
Canal começa na Escola de Aprendizes de Marinheiro, em Santo Amaro – Recife, desaguando no
manguezal da Ilha do Leite. Ele corta o Espaço Ciência entre as cidades de Recife e Olinda. Além
de ser um caminho de entrada para o mar, o canal recebe água salobra vinda do rio Capibaribe e
Beberibe. Em todo seu percurso, o Derby/Tacaruna recebe grandes quantidades de despejos de
Fórum Internacional do Meio Ambiente - A conferência da Terra 418

esgotos, resíduos sólidos entre outros materiais, provenientes da área urbana local. Com a ligação
feita entre o Canal e o mangue, o acesso da água ao manguezal permitiu que a área, que já estava
gravemente debilitada, tivesse uma chance de sobrevivência e reestruturação, possibilitando que a
vegetação fosse tomando seu antigo aspecto naturalmente. Entretanto, a poluição determinou
limites ao processo de conservação desse ecossistema. Entre as espécies, são encontradas por ordem
de incidência: Mangue vermelho (Rhizophora mangle), Mangue branco (Laguncularia racemosa) e
Mangue Preto (Avicennia schauriana). Por conta da acentuada poluição vinda na água, a fauna
encontra-se severamente diminuída apresentando apenas algumas espécies de peixes, aves, répteis,
insetos e crustáceos.
Em 2006, o MCS apresentou uma crescente melhora, observada através do grande porte da
vegetação. Entretanto, a poluição continua a dificultar o desenvolvimento da fauna, apresentando
quadro semelhante ao encontrado em 1996. O baixo crescimento da área de apenas 3.1%, de acordo
com a Tabela 2, deve-se ao fato do seu entorno, o Espaço Ciência, ter limitado sua área de expansão
lateral sendo apenas possibilitado seu crescimento vertical. As Figuras 6 e 7 apontam a diferença
entre os anos de 1996 e 2006, confirmando o aumento da vegetação em grandes proporções. O
Espaço Ciência colabora com seu avanço desenvolvendo pesquisas ambientais como
monitoramento do controle da qualidade de água e educação ambiental.

Figura 6: Visão Lateral do Manguezal Chico Figura 7: Visão Lateral do Manguezal Chico
Science em 1996. Fonte: Espaço Ciência. Science em 2006. Fonte: Autor.

CONCLUSÕES
A expansão urbana acarreta sérias modificações ao meio ambiente. A intensidade das
mudanças pode provocar graves danos aos mais variados sistemas, podendo alcançar níveis de
difícil recuperação ou mesmo extinção.
O longo período no qual o Manguezal ficou exposto aos mais variados aspectos de
influência antrópica ocasionou grande desestruturação à área. A partir da conexão do MCS com o
canal foi possibilitada a reativação das atividades do mangue. Esse fato comprova que o frágil
ecossistema depende essencialmente da alimentação através da água salobra para sobrevivência.
A poluição vinda dos rios Beberibe e Capibaribe, somadas aos resíduos do Canal Derby /
Tacaruna, ainda interfere na reabilitação completa da área devido à antropização exercida sobre o
trajeto, porém os esforços feitos para a mudança do quadro ainda são poucos em relação ao sensível
sistema mangue.

REFERÊNCIAS BIBLIOGRAFICAS
Agência Estadual de Planejamento e Pesquisas de Pernambuco – CONDEPE/FIDEM. Disponível
em: http://www.condepefidem.pe.gov.br/. Acesso em: 16 de janeiro de 2008.
CALADO, L.O., CALADO, T.O. VIANNA, M.C. Uso de Técnicas do Geoprocessamento para
Análise Ambiental: um panorama multitemporal acerca das comunidades V8 e V9, do Bairro do
Fórum Internacional do Meio Ambiente - A conferência da Terra 419

Varadouro, Olinda – Pernambuco. In: Anais do II Encontro Intercontinental Sobre a Natureza.


Instituto Hidroambiental Águas do Brasil. Fortaleza.
CAMPOS, H.L. A Bacia Hidrográfica do Beberibe: um enfoque ambiental. Dissertação de
Mestrado. Departamento de Ciências Geográficas. Universidade Federal de Pernambuco, Recife,
1991. 85p.
ESPAÇO CIÊNCIA. Disponível em: www.espacociencia.pe.gov.br. Acesso em: 20 de novembro de
2007.
KRUG, L.A., LEÃO, C., AMARAL, S. Dinâmica Espaço - Temporal de Manguezais no Complexo
Estuarino de Paranaguá e Relação entre Decréscimo de Áreas de Manguezal e Dados Sócio-
Econômicos da Região Urbana do Município de Paranaguá – Paraná. In. Anais XIII Simpósio
Brasileiro de Sensoriamento Remoto. Florianópolis, Brasil. 21-26 abril 2007, INPE, p. 2753-2760.
LIRA, A. et al. Manguezais, importância de sua preservação. Recife: Secretaria de Educação
Cultura e Esportes, 87 p., 1992.
MENGHINI, R.P. et al. Análise Temporal dos Impactos Antrópicos e da Regeneração Natural em
Manguezais da Ilha Barnabé (Baixada Santista, SP, Brasil) Obtida Através de Fotografias Aéreas.
In: Anais XIII Simpósio Brasileiro de Sensoriamento Remoto. Florianópolis, Brasil. 21-26 abril
2007, INPE, p. 4037-4040.
OLIVEIRA, J.A. Percepção Ambiental sobre o Manguezal por Alunos e Professores de uma
Unidade Escolar Pública no Bairro de Bebedouro, Maceió – Alagoas. 36 f., 2004. Monografia
(Especialização em Biologia de Ecossistemas Costeiros) - Universidade Federal de Alagoas,
Maceió, 2004.
SCHAEFFER – NOVELLI, Y. & CINTRÓN – MOLERO, G. 1994. Manguezais Brasileiros: uma
síntese sobre aspectos históricos (séculos XVI a XIX), zonação, estrutura e impactos ambientais.
Pp. 333-341. In: Anais do Simpósio de Ecossistemas da Costa Brasileira. Subsídio a um
gerenciamento ambiental. São Paulo, ACIESP, v. 1.
SECTMA/PE. Atlas de bacias hidrográficas de Pernambuco. Coordenação técnica de Simone Rosa
da Silva. – Recife; A Secretaria, 2006.
SILVA, J.R. Ecologia da paisagem: um estudo de caso – Complexo de Salgadinho, Olinda – PE. 37
f. 1992. Monografia (Graduação em Bacharelado em Ciências Biológicas) - Universidade Federal
Rural de Pernambuco, Recife, 1992.
SILVA, M.A.B., BERNINI, E., CARMO, T.M.S., Características Estruturais de Bosques de
Mangue do Estuário do Rio São Mateus, ES, Brasil. In: Acta bot. Brás. 19(3): 465-471.2005.
VANNUCCI, Marta. Os Manguezais e Nós: Uma Síntese de Percepções. 2º ed. – São Paulo; Ed. da
Universidade de São Paulo, 2002.
Fórum Internacional do Meio Ambiente - A conferência da Terra 420

ANÁLISE AMBIENTAL MULTITEMPORAL ACERCA DAS COMUNIDADES V8 E V9,


DO BAIRRO DO VARADOURO, OLINDA – PERNAMBUCO.

Ludmilla de Oliveira Calado


Departamento de Geografia, UFPE e Gerência de Revitalização de Bacias Hidrográficas da Secretaria de Recursos
Hídricos de Pernambuco – SRH. Avenida Cruz Cabugá, 1111 - Santo Amaro - Recife-PE - CEP: 50.040.000. E-mail:
ludmillacalado@gmail.com
Tatiana de Oliveira Calado
Departamento de Ciências Ambientais, UFPE. Avenida Prof. Moraes Rego, 1235 - Cidade Universitária, Recife - PE -
CEP: 50670-901

RESUMO
O município de Olinda, localizado na região metropolitana do Recife – Pernambuco possui
uma grande desordem ambiental ocasionada pela ocupação irregular. O estudo focaliza
especificamente nas comunidades V8 e V9, ribeirinhas ao Canal da Malária, no Bairro do
Varadouro em Olinda, no qual uma contínua destruição da paisagem vem ocorrendo resultante do
processo de pressão populacional. Utilizando o Sistema de Georreferenciamento e Cartografia
Digital, foi possível a interpretação espacial da área de estudo através de fotografias aéreas
multitemporais, possibilitando uma visualização total da região e, também, estimar a área onde a
vegetação foi substituída pelo avanço da ocupação humana em cada período, desde 1974 até 1997.
Como resultados, foram detectadas alterações provocadas pelo processo de crescimento urbano
desordenado das comunidades V8 e V9 ao longo das margens e zona de alagamento do Canal da
Malária.
Palavras-Chave: análise ambiental, ocupação urbana, geoprocessamento.

ABSTRACT
The city of Olinda, located in the region metropolitan of Recife - Pernambuco possesss a
great environmental clutter caused by the irregular occupation. The study it focuses specifically in
the communities V8 and V9, creeks to the Canal of the Malaria, in the quarter of the Varadouro in
Olinda, in which a continuous destruction of the landscape have been occurring resultant of the
process of population pressure. Using the System of Georreferenciamento and Digital Cartography,
the spacial interpretation of the area of study through multisecular aerial photographs was possible,
making possible a total visualization of the e region, also, esteem the area where the vegetation was
substituted by the advance of the occupation human being in each period, since 1974 up to 1997. As
results, alterations provoked for the process of disordered urban growth of the communities V8 and
V9 throughout the edges and zone of overflow of the Canal of the Malaria had been detected.
Keywords: environmental analysis, urban occupation, geoprocessing.

INTRODUÇÃO
O município de Olinda, localizado na região metropolitana do Recife – Pernambuco,
situado na parte oriental do Nordeste brasileiro, com coordenadas geográficas 08º 01’ 42´´ Sul e 34º
51` 42`` Oeste, apresenta relevo constituído por duas unidades: os tabuleiros da Formação
Barreiras, com terreno plano a ondulado e cotas variando em torno de 80 a 150 metros, e as áreas
baixas da Planície Flúvio-Marinha Costeira, com cotas inferiores a 10 metros e relevo plano
ocorrendo em faixa estreita ao longo da costa. As áreas baixas coincidem com as planícies de
inundações dos vales de antigos rios (SRH/PE, 2002).
A região divide-se em dois tipos pedológicos influenciados pela morfologia, nas cotas altas
ocorre o solo arenoso com a vegetação nativa rala e herbácea enquanto nas cotas baixas,
influenciadas pelas marés, ocorre uma vegetação típica de solos orgânicos, vadosos e limosos, os
mangues. Atualmente existem apenas pequenas áreas de manguezais, localizadas na planície
costeira junto aos estuários dos rios que deságuam no Oceano Atlântico, além de poucos fragmentos
de Mata Atlântica. Sua rede de drenagem é constituída pelas bacias dos rios Beberibe e Fragoso,
cujos pequenos afluentes recebem o escoamento da drenagem urbana.
Fórum Internacional do Meio Ambiente - A conferência da Terra 421

O rio Beberibe possui uma bacia hidrográfica de 5ª ordem, com cerca de 79Km². Possui
rede de drenagem tomada pela expansão urbana desordenada (loteamentos populares, conjuntos
residenciais, favelas, entre outras edificações) de modo que, em um futuro próximo, as suas águas
estarão reduzidas e/ou poluídas por despejos urbanos (lixo, esgoto, etc.), comprometendo seu uso
para abastecimento de água potável. O Canal da Malária encontra-se inserido na bacia do rio
Beberibe, possuindo cerca de 43km² tendo maior parte incluída em zona estuarina.
Uma das maiores causas de impacto ambiental existente no município é, sem dúvida, a sua
ocupação desordenada. O intenso processo de pressão populacional é resultado do parcelamento
urbano para fins de moradia, lazer, atividades turísticas e comerciais, refletindo diretamente em uma
contínua destruição do meio ambiente e da paisagem, através de desmatamento e da destruição de
manguezais, estuários, entre outros.
Dentro do município de Olinda, localiza-se o bairro do Varadouro onde encontram-se as
comunidades V8 e V9, caracterizadas por uma ocupação populacional às margens do canal da
Malária abrangendo resquícios de manguezais em suas margens e proximidades. A densidade de
ocupação média é de aproximadamente 125 hab/ha, com uso do solo predominantemente
residencial. Historicamente a ocupação urbana dessa localidade foi acompanhada pela degradação
do espaço físico-natural, sendo seu núcleo edificado em área alagável, com sérios riscos de
inundação e caracterizando-se como um ambiente de extrema insalubridade, quer seja por aterros,
desmatamentos do mangue e pelo indiscriminado despejo de lixo, contribuindo para agravar o risco
de contaminação de doenças para as comunidades locais, e para o desequilíbrio do ecossistema.
Nesse contexto, o presente trabalho tem como objetivo a análise da ocupação urbana
irregular das Comunidades V8 e V9 em áreas ribeirinhas do Canal da Malária utilizando técnicas de
geoprocessamento como a análise de fotografias aéreas através de diferentes décadas, estimando e
comprovando que a área onde existia a vegetação foi substituída pelo avanço da ocupação humana.

ÁREA DE ESTUDO
A área de estudo abrange as comunidades V8 e V9 localizadas no bairro do Varadouro, no
município de Olinda, Pernambuco, estando limitada pelas avenidas Pan Nordestina, Presidente
Kennedy e Joaquim Nabuco ocupando cerca de 381,237 m² (ver Figura 1). A região pertence à
Bacia do Rio Beberibe sendo cortada por um de seus afluentes, o Canal da Malária. Neste local, o
canal apresenta um leito indefinido que desaparece com a subida da maré tendo grande parte do
manguezal situado nesse trecho, desaparecido após a expansão urbana. A área possui estuários
afogados, o que impede a formação de calhas de drenagem mais expressivas. Possui topografia de
cotas baixas e solos saturados de água com lençóis freáticos muito próximos a superfície,
propiciando alagamentos. São encontradas pequenas lagoas resultadas de antigas escavações
produzidas pela exploração de fosfatos.
Fórum Internacional do Meio Ambiente - A conferência da Terra 422

Figura.1: Localização da Área de Estudo.

METODOLOGIA
Com o intuito de apontar o crescimento urbano através de fotografias aéreas das
comunidades V8 e V9, pertencentes ao município de Olinda, foram utilizados dados multitemporais
referentes aos anos de 1974 e 1997. Através de técnicas de geoprocessamento desenvolveram-se
diagnósticos para análise da expansão urbana das comunidades para os anos citados anteriormente.
Inicialmente, foram utilizadas como base cartográfica as fotografias aéreas verticais,
pancromáticas P&B, com dimensão 23cm x 23cm, na escala de 1:6.000, dos anos de 1974 e 1997,
adquiridas por meio da CONDEPE / FIDEM. As fotografias foram escaneadas e, utilizando o
software ArcGIS 9.2, georreferenciadas ao sistema de coordenadas UTM no fuso 25, tendo como
fonte a carta de nucleação da Região Metropolitana do Recife (CONDEPE / FIDEM),
possibilitando desta forma o uso espacial e sintético das informações. Uma vez digitalizados e
georreferenciados, os dados foram analisados, avaliados e calculados através do ArcGIS 9.2
tornando possível a vetorização das manchas urbanas, da hidrografia e da vegetação, em m²,
referentes a cada ano.

RESULTADOS E DISCUSSÕES
A urbanização resulta de transformações relevantes e irreversíveis que afetam a sociedade
em aspectos sociais, econômicos, políticos, ambientais, entre outros. O processo de Urbanização
evoluiu nas últimas décadas para uma concentração populacional em cidades grande e média,
fazendo com que o Brasil chegasse ao ano 2000 possuindo 13 municípios com mais de 1 milhão de
habitantes, IBGE (2000). Com início no período entre 1940 a 1950, a urbanização no
Brasil caracteriza-se por uma intensa progressão da população urbana, tendo nesta época inicial
36,16% dos habitantes residentes em áreas urbanas, saltando, ao ano de 1980, para 68,86%. Em
Pernambuco, com a criação da SUDENE em 1950, o incentivo econômico as indústrias gerou
grandes empreendimentos, atraindo uma grande demanda de mão de obra de diversos lugares.
Entretanto, esse período trouxe consigo um acelerado crescimento populacional nas grandes cidades
do Estado levando ao aumento de moradias irregulares e ocupação de áreas inapropriadas. Olinda
foi um dos municípios que mais sofreu com o aumento populacional, especialmente pela ocupação
irregular (Fig.2) tendo boa parte de sua área habitacional desenvolvida de forma inadequada. As
comunidades V8 e V9 se enquadram neste perfil histórico de povoamento obtendo seu apogeu de
crescimento da década de 1980.
Fórum Internacional do Meio Ambiente - A conferência da Terra 423

Fig.2 Gráfico representativo do crescimento populacional total de Olinda. IBGE(2000)

Além da problemática da ocupação irregular, a destruição do ecossistema existente


acarretou problemas à qualidade de vida da população. A falta de condições para aquisição da casa
própria e o alto custo dos aluguéis levou a população a invadir e aterrar as áreas de manguezais
tornando rápida a concentração habitacional das comunidades V8 e V9. A supressão da vegetação
de mangue existente substituindo-a por aterros para moradias irregulares, gerou bloqueios ao
permeio da drenagem provocando diretamente as enchentes. A destruição dos manguezais pode
provocar sérios problemas à região. Segundo Vannucci (2002):
Os manguezais são especialmente vulneráveis por serem, na verdade, ecossistemas
marginais vivenciando uma existência precária no limite entre outros sistemas; foram gerenciados
para se tornarem altamente produtivos por que desenvolveram adaptações morfológicas e
fisiológicas ao ambiente físico e químico que lhes permite crescer e se reproduzir livres de
competidores, mas estão sob estresse como indivíduos, como espécies e como ecossistemas.
Portanto os manguezais como um todo são frágeis e requerem um tratamento cuidadoso a fim de
que não se percam a riqueza e os benefícios que representam.
Através da observação da fotografia aérea de 1974, foi calculado que a área pertencente à
vegetação ocupava 276.613 m² , cerca de 72% da extensão total, enquanto que a mancha urbana
correspondia a 94.589 m² , cerca de 26%. Ao analisar a fotografia aérea relativa ao ano de 1997, foi
registrado para a área pertencente à vegetação de 99.667 m² ocupando 26% enquanto que a mancha
urbana apresentou 277.655 m² , cerca de 72% da extensão total. Vale ressaltar que a contagem
realizada excluiu os pontos sem aproveitamento habitacional e/ou sem cobertura vegetal.

Fig.3 Fotografia Aérea de 1974. Fonte: CONDEPE/FIDEM


Fórum Internacional do Meio Ambiente - A conferência da Terra 424

Fig.4 Fotografia Aérea de 1997. Fonte: CONDEPE/FIDEM

Foram notadas que determinadas alterações durante o período analisado obtiveram


evidência. A percepção mais evidente foi a modificação do curso do Canal da Malária agregada à
perda da cobertura vegetal. Em 1974, o Canal apresentava meandros, extensa distância entre as
margens e ampla rede de drenagem possibilitando a ocorrência do ecossistema mangue. Em 1997,
tanto o Canal da Malária quanto o Manguezal foram transformados. O Canal passa a apresentar-se
retificado em função da pressão das moradias irregulares, em muitos casos palafitas, perdendo
claramente a extensa dimensão que antes existia. Com isso, a rede de drenagem perde poder de
escoamento e penetração dificultando e incapacitando o desenvolvimento do Manguezal. Com
relação à vegetação ainda existente, foi evidenciado que por conta da grande quantidade de despejo
de esgoto e resíduos sólidos advindo das próprias Comunidades para o Canal da Malária, a extinção
do ecossistema na área vem crescendo vertiginosamente. Com o desaparecimento gradativo do
mangue substituído pelas moradias, o percentual de alagamentos em períodos chuvosos no local
cresce, pois com o aumento do volume de água no Canal e com a área de alagamento suprimida por
aterros, a água não encontra acesso para seu percolamento tendo como via o escoamento superficial
prejudicando as habitações ribeirinhas.
Com a concretização dos dados antes previstos, foi possível determinar que o crescimento
da ocupação urbana irregular na área em questão modificou não só a paisagem como a qualidade
ambiental. O alastramento habitacional de cerca de 48% (183.066 m²) e o decréscimo de cobertura
vegetal de 46% (178.846 m²) ao longo dos vinte e três anos apontam que a falta de planejamento
urbano e consciência ambiental são os principais agentes causadores do cenário de precariedade ao
qual os moradores da comunidade estão sujeitos.

REFERÊNCIAS BIBLIOGRAFICAS
BELTRÃO, Adelma de Lima et al. Diagnóstico ambiental do município de Olinda. Recife: CPRH,
1995. 145p. il. [577.4 D536 ]
CAMPOS, H.L. A Bacia Hidrográfica do Beberibe: um enfoque ambiental. Dissertação de
Mestrado. Departamento de Ciências Geográficas. Universidade Federal de Pernambuco, Recife,
1991. 85p.
Instituto Brasileiro de Geografia e Estatísticas – IBGE. Disponível em: http://www.ibge.gov.br.
Acesso em: 02 de junho de 2007.
PERNAMBUCO EM DADOS: ano 2002. Recife: Instituto de Planejamento de Pernambuco, 2000 -
Anual. 68p. Disponível em: http://www.condepefidem.pe.gov.br/. Acesso em: 15 de junho de 2007.
Fórum Internacional do Meio Ambiente - A conferência da Terra 425

SECTMA/PE. Atlas de bacias hidrográficas de Pernambuco. Coordenação técnica de Simone Rosa


da Silva. – Recife; A Secretaria, 2006.
SRH/PE. Estudo Hidrogeológico de Recife – Olinda – Camaragibe – Jaboatão. Hidrorec II.
Relatório final – Tomo I. Recife, Junho de 2002.
VANNUCCI, Marta. Os Manguezais e Nós: Uma Síntese de Percepções. 2º ed. – São Paulo; Ed. da
Universidade de São Paulo, 2002
Fórum Internacional do Meio Ambiente - A conferência da Terra 426

A SOBREVIVÊNCIA DE COMUNIDADES VULNERÁVEIS E DE RISCO SOCIAL: O


CASO DA COMUNIDADE DO “S”.

Maria de Lourdes Soares


Profª Drª. UFPB/Brasil-marialsc@click21.com.br
Flavio Nery da Nóbrega Júnior
UFPB/Brasil–flavionery.ss@hotmail.com
Suellen Regina F. de Oliveira
UFPB/Brasil- suellenfagundes7@hotmail.com

RESUMO
O trabalho busca conhecer a realidade de comunidades em situação de vulnerabilidade e
risco social e ambiental, neste caso a Comunidade do “S”, situada numa área de mangue,
clandestina, no baixo Roger, na cidade de João Pessoa, constituída de 377 famílias, em sua maioria
constituída de pessoas pobres que vivem basicamente do convívio e do trabalho com lixo, pois
moram numa área que foi o antigo lixão e hoje é uma usina de reciclagem de lixo. Vivem
basicamente da ”cata” do lixo e hoje são os “desempregados” ou subempregados do lixo, em
situação de precariedade e exclusão social, expressas nas péssimas condições de vida, no tocante a
alimentação, moradia, saúde, educação, higiene e saneamento básico. Nosso objetivo é conhecer
mais profundamente a realidade sócio-econômica e ambiental dessa população, assim como seu
potencial para, dessa forma, propor um projeto de desenvolvimento social e sustentável que
dinamize as potencialidades dos moradores de forma a introduzir ações positivas e propositivas, que
possibilitem a melhoria da qualidade de vida dessas famílias. Pois o que vem se observando é que
as ações, por parte do poder público, não tiveram repercussões positivas nessa comunidade uma vez
que não resultaram em mudanças positivas em termos ambientais e sócio-econômicos e a cada dia a
situação vem se agravando, pois as famílias vão aumentando e a precariedade também.
Palavras-chave: comunidade, risco, desenvolvimento, social.

ABSTRACT
The work seeks to know the reality of communities in a situation of vulnerability and social
and environmental risk, in this case the Community of the "S", located in an area of mangroves,
illegal, in the low Roger, in the city of Joao Pessoa, consisting of 377 families, mostly formed of
poor people who live mainly of coexistence and work with garbage, because living in an area that
was the old deposit of garbage and today is a plant for recycling of waste. They live mainly of the
"collection" of garbage and today are the “unemployed” or underemployed of garbage, in a
situation of precariousness and social exclusion, expressed in bad living conditions, with regard to
food, housing, health, education, hygiene and sanitation . Our goal is to learn more deeply the real
socio-economic and environmental this population, as well as its potential to thus propose a project
of social development and sustainable develop that the potential of the residents to introduce
positive actions and proposals, which allow the improvement of the quality of life of these families.
So what has been observed is that the actions on the part of government, did not have positive
repercussions in that community since not resulted in positive changes in environmental and socio-
economic and each day the situation is becoming worse because the families and insecurity will
increase too.
Keywords: community, risk, development, social.

HISTÓRICO DA COMUNIDADE DO “S”


Fórum Internacional do Meio Ambiente - A conferência da Terra 427

Considerando que no Brasil, após a revolução de 30, vivenciamos um crescimento


industrial e urbano de forma intensa e desordenada e que a combinação de tal processo vem
ocasionando uma enorme concentração econômica com exclusão sócio-espacial da maior parte da
população, particularmente nas cidades de porte médio e grande com grande fluxo de pessoas, que
vem engrossando as correntes migratórias internas em busca de trabalho e sobrevivência, gerando
uma enorme demanda por habitação, emprego e renda no meio urbano, problemáticas que ainda
está longe de ser solucionada pelas vias convencionais, do mercado e das limitas e ineficientes
políticas governamentais.
Desta feita não assistimos a estruturação de um plano eficaz, particularmente utilizando um
arsenal de tecnologias alternativas disponíveis que poderiam contribuir para sanar estes problemas a
baixo custo e sustentável. Enquanto isso a população vem buscando formas alternativas de
sobrevivência no meio urbano, ocupando áreas de risco situadas na periferia, com salubridade
precária, ambientes miseráveis e com tensões sociais, onde edificam suas moradias feitas de
material de baixo custo, geralmente colhido do lixo, como restos de madeiras, papelão, plásticos,
espumas, eletrodomésticos, metais e de material de construção. Para sobreviverem nessa
precariedade vêm explorando o máximo do meio para garantir sua sobrevivência dentro dos
mínimos possíveis, muitas vezes de forma insalubre para eles e predatória para a natureza.
Esta é a situação da Comunidade do “S”, localizadas no baixo Roger, na cidade de João
Pessoa, constituída de 377 famílias que, em sua maioria, é constituída de pessoas que viviam da
”cata” do lixo e hoje são os “desempregados” ou subempregados do lixo, em situação de
precariedade e exclusão social, expressas nas péssimas condições de vida, no tocante a alimentação,
moradia, saúde, educação, higiene e saneamento básico.
A Comunidade do “S”, localizado no Baixo Roger, no berço histórico de João Pessoa, a 6
km do centro da cidade, numa das áreas mais nobres da cidade, na margem direita do Rio Sanhauá,
num denso manguezal, situada ao norte com o mangue, ao sul com a linha de trem e o baixo Roger
a Leste com a mata e a rede de esgotos e a oeste com o lixão e a comunidade Silva Ramos.
Principal via de acesso é um aterro que forma uma estrada de rodagem, encontrar-se
situada composta pelos detritos da rede de esgoto e o lixão, em área de risco social em virtude da
falta de infra-estrutura (água, esgoto, drenagem fluvial, pavimentação) e de estar entre uma zona de
manque e um aterro sanitário, é desprovida de serviços urbanos (educação, saúde, transporte, coleta
de lixo), mas, de certa forma, goza do privilégio da proximidade do centro da cidade (6 km), onde
ficam os escritórios e o comercio, com facilidade de locomoção a pé, pela via férrea que margeia a
área.

As Casas
A ocupação do espaço se deu com a chegada de alguns moradores (60% do interior do
estado) e até de outros estados, que ocuparam o terreno, de área do manguezal, onde foram
erguendo as primeiras casas construídas de tijolos aparentes, taipa, palha, blocos de cimento, e
outros materiais colhidos do lixo (resto de moveis, de madeira, de papelão, de zinco, etc, que
desmoronavam a cada período chuvoso, para resistir estão sendo substituídas por alvenaria).
Instaladas na miséria, cercada de poluição, excrementos e deterioradas, não possibilitam
privacidade.
No decorrer dos 30 anos, aproximadamente, de existência a comunidade passou por
algumas tentativas de remoção para condomínios populares, denominados peles comunitários de
Fórum Internacional do Meio Ambiente - A conferência da Terra 428

gaiolas, realizados pela prefeitura, atendendo particularmente as pessoas que moram dentro do
lixão. Após esta foram realizadas reuniões na tentativa de novas remoções recusadas pelos
moradores, justificada por distância do lixão e do centro, local de trabalho, da colheita e da venda
de lixo pela estrutura inadequada das residências (pequenas, sem espaço livre e de primeiro andar),
o que dificulta a acomodação da família e do trabalho com o lixo e outros, como a criação de
animais e guarda dos instrumentos de trabalho (carroça, cavalo, etc).

[...] queriam botar agente ali numas casas de condomínio, que não cabia nem a cama no
quarto. [...] Já houveram muitas reuniões e alguns foram porque moravam dentro do lixão mesmo.
Os que tinham uma casinha não queriam sair daqui pra um lugar pequeno, quem tinha família
grande não ia.

Ainda hoje a maioria das habitações ainda é construída de materiais do lixo, como: pau do
mangue, resto de moveis de madeira e compensado (guarda-roupa, mesas) papelões, espumas,
plásticos, cortinas, entre outros.
O crescimento da comunidade se deu de forma propiciada por migrantes que não tendo
onde morar acabavam se estabelecendo no local.
Eu vim para cá por causa do meu pai e de minha mãe que aqui, na comunidade... (J.S.
moradora).
No decorrer dos 30 anos a comunidade passou por tentativas de remoção, realizadas pela
prefeitura de João Pessoa, para Condomínios Populares.
Com a urbanização desordenada, dado significativo da Comunidade é o grande contingente
populacional constituído particularmente por crianças, jovens e mulheres que assumem o papel de
chefe de família o que corrobora os dados oficiais de feminização da pobreza.
Muitos dos moradores mantêm relações de compadrio e de vizinhança, além de uma
identidade comum, embasada na origem, no analfabetismo, no desemprego e na permanente
condição de pobreza e, consequentemente, na luta cotidiana pela sobrevivência.
Além destes problemas a população tem uma péssima qualidade de vida, em razão da
deteriorização ambiental e as condições sócio-econômica que os coloca em uma situação de vida
sub-humana, vivendo do lixo e com o lixo, desempregados e subempregados. Numa disputa diária
pela sobrevivência viviam no “lixão”, formado desde 1959, local onde eram depositados 10 milhões
de toneladas por dia do lixo da cidade de João Pessoa, hoje com a criação do projeto de reciclagem
de lixo foi absorvida parte da população ativa que alterna jornadas diurnas e noturnas de trabalho na
reciclagem, enquanto outra parcela ainda continua sobrevivendo do lixo colhido nas diversas zonas
da cidade, de maneira autônoma.
Para ganhar mais espaço e secar mais o solo os moradores vão adquirido restos de
materiais de construção e outros para aterrar o mangue. Acrescidos aos problemas ambientais são
evidenciados conflitos sociais na disputa pelo lixão, pois os territórios são geralmente demarcados e
o acesso a eles depende da permissão dos que estão ocupando a área a mais tempo. Assim os lixos
de maiores valores (papel, papelão e lata) pertencem aos de maior poder e mais fortes enquanto os
de menores valores, as sobras, ficam com os mais inferiorizados e mais fracos.
Em 2001, atendendo a uma reivindicação dos Catadores de lixo, foi apresentado pela
Empresa Municipal de Limpeza Urbana (EMLUR) um projeto para remediar os problemas do
Lixão do Roger que preconizava uma transformação radical da área, incluindo a construção de um
parque ecológico, um centro de educação ambiental e área de lazer. Da proposta inicial pouco foi
efetivado. Inicialmente foram retiradas algumas pessoas, posteriormente alojadas em apartamentos,
construídos pelo ”Projeto é Prá-Morar” bem distantes do local, e construídos dois galpões adaptados
com esteira para a separação do lixo. Havendo uma seleção de pessoal em que apenas alguns
catadores foram cadastrados, gerando, assim, uma insatisfação dos moradores por não serem
absorvidos todos os trabalhadores que tinham atividades relacionadas ¨a cata do lixo¨., ficando
poucos empregados como horistas, com salários muito baixo e a maioria desempregada.
Fórum Internacional do Meio Ambiente - A conferência da Terra 429

Com o Projeto de “Coleta Seletiva e Aterro Sanitário” do Governo Estadual, além dos
inevitáveis impactos ambientais não houve um avanço em termos de melhoria da qualidade de vida
da população local, pois houve mais uma seleção de pessoal, questionável dada à falta de
transparência nos critérios adotados e por provocar exclusão de alguns trabalhadores da cata do lixo
e uma limitação nos horários de trabalho, piorando assim, ainda mais, a situação sócio-econômica
do pessoal, o que levou os mesmos sentirem desejosos de retornar ao estágio anterior.
A associação dos Trabalhadores em Material Reciclável (ASTRAMARE) criada pela
prefeitura Municipal de João Pessoa.
Os catadores, em diversas partes da América Latina, estão se organizando para melhorar
suas condições de trabalho e for fim a seu status de cidadãos de segunda classe, se reunindo em
cooperativas que lhes permitam coordenar suas atividades com os órgãos sanitários municipais e
negociar preços melhores, além das condições de higiene no ato da reciclagem e da valorização da
atividade.
Como se vê todas essas ações, por parte do poder público, não teve repercussões positivas
uma vez que não resultaram em mudanças positivas em termos ambientais e sócio-econômicos e a
cada dia a situação vem se agravando, pois as famílias vão aumentando e a precariedade também.
Mesmo com todos estes problemas os moradores dizem gostarem de morar no local, por ser calmo,
perto e não violento, mas reconhecem as precariedades e a necessidade de melhorar a infra-
estrutura, particularmente das ruas.
[...] “é tão bomzinho aqui, é calmo não tem violência”[...] (J.S. Moradora).
[...] “eu to bem satisfeita, gosto daqui” (M.R. Moradora).

Infra-estrutura
A comunidade dispõe e iluminação da rede pública, porém de forma irregular. As ruas não
são pavimentadas, os esgotos são laçados na rua ou no mangue, apesar da comunidade contar com
carros que fazem à coleta urbana, os moradores continuam jogando o lixo de suas casas no mangue.
Com relação ao transporte, a maioria da população faz uso de transporte público no Baixo
Roger e um número reduzido de moradores possui automóveis.
À luta pela sobrevivência dessa comunidade é possível perceber que grande parte dos
moradores da comunidade do S, retira seu sustento da coleta de lixo nas ruas e no Parque Ecológico
construído pela prefeitura municipal de João Pessoa para substituir o antigo lixo de Roger. Contudo,
apesar desse trabalho ser realizado numa cooperativa, ainda não possui condições para os
trabalhadores que recebem quinzenalmente, de acordo com a produção. Por outro lado muitos
moradores preferem exercer de forma autônoma, coletando materiais recicláveis nas ruas do centro
da cidade a nas praias, pois afirmam ser mais lucrativo para eles, na medida em que envolve todos
os familiares na atividade.
Algumas mulheres trabalham como empregadas domésticas na cidade de João Pessoa e
percebem um salário que não chega ao mínimo.
É notável ao baixo nível de escolaridade da maioria dos moradores e a falta de
planejamento familiar. Não existem formas de expressão cultural na comunidade. Os moradores
passam a maior parte do tempo livre dispersos nas calçadas das casas, conversando ou jogando. Os
grupos formais existentes são os já citados: ONG, Casa Pequeno Davi, Pastoral da Criança e a
Arquidiocese e os informais são os times de futebol e os usuários de drogas (lícitas e ilícitas).
A fala dos moradores revela diferentes trajetórias de vida que têm como traço em comum a
marca da pobreza. São homens, mulheres e, até mesmo crianças que limitam no espaço do lixo a
possibilidade de seu cotidiano. A necessidade de ajudar a família fez com que essas pessoas
ingressassem desde cedo no mundo do trabalho, tal fator contribui para uma passagem rápida pela
escola.
A sobrevivência sempre foi à meta principal dessas famílias que, num horizonte limitado,
passou dos biscates e atividades auxiliares na construção civil ou do trabalho doméstico, no caso
das mulheres, para o ingresso na atividade de coleta de lixo, que se tornou uma atividade fixa.
Fórum Internacional do Meio Ambiente - A conferência da Terra 430

Poucos, ou quase nenhum, dos moradores vivenciaram uma relação diferenciada


prevalecido é o vínculo informal e a faixa de rendimentos com muito esforço chega a um salário
mínimo.
Na fala dessas pessoas, é possível registrar que a “coleta de lixo é um trabalho como outro
qualquer”, ou seja, apresenta o sentido moral descrito por Sarti (1996), pois mesmo estando
inseridas em uma atividade socialmente desqualificada elas têm saúde e disposição para o trabalho.

A Reciclagem enquanto expressão informal


O cenário da pesquisa é de inúmeras carências, porém um dos aspectos mais visíveis dessa
comunidade diz respeito à precária infra-estrutura, e se encontra diretamente relacionado à
problemática do lixo. Desde a fundação da cidade, tanto lixo residencial quanto os detritos
hospitalares da cidade de João Pessoa eram jogados no Roger, ocasionando grandes problemas tanto
para o meio ambiente, quanto para a sociedade, pois a cada dia crescia o número de pessoas
vivendo em condições sob humanas dentro do próprio lixão, fazendo desse lugar sua moradia e seu
local de trabalho.
Alguns governantes tentaram mudar essa situação, e a partir de 1997, na gestão do Prefeito
Cícero Lucena, surgem alternativas para a destinação adequada dos resíduos sólidos tomando como
princípios reduzir, reutilizar e reciclar, fomentando educação ambiental e, concomitantemente,
organizando a cooperativa de catadores com objetivo de integrar os trabalhadores que atuam no
principal vazadouro da cidade, o “Lixão do Roger”. Somente em 1º de maio de 1997, com a
inauguração desse programa de gerenciamento de resíduos sólidos, o Estado passou a intervir no
sistema de coleta, disciplinando essa atividade.
Em 2003, ano em que a cidade completou 418 anos de fundação, o prefeito Cícero Lucena
desativou o Lixão do Roger e inaugurou o Aterro Sanitário. A partir do dia cinco de agosto desse
mesmo ano os resíduos sólidos produzidos pelos sete municípios da Região Metropolitana de João
Pessoa (Santa Rita, Bayeux, Cabedelo, Lucena, Conde, Cruz do Espírito Santo e João Pessoa)
passaram a ser tratados no Aterro Sanitário, instalado no engenho Mussuré, localizado no Distrito
Industrial de João Pessoa a cinco quilômetros da BR-101.
O Aterro Sanitário em João Pessoa surgiu com a proposta não só de qualidade ambiental,
mas, também, de promover geração de empregos na coleta seletiva. A iniciativa se deu face à
necessidade de diminuir a quantidade de resíduos dispostos nos vazadouros e aterros, bem como de
redirecionar a população marginalizada ligada à catação de material nesses locais.
Em 2004, o Centro de Triagem para a reciclagem de lixo da Empresa Municipal de
limpeza Urbana (EMLUR) contava com 122 agentes ambientais e se encarregava de dar uniformes,
transporte, alimentos para os agentes que trabalham diariamente, oito horas por turno, separando o
lixo orgânico do inorgânico, no Aterro Sanitário, no antigo Lixão do Roger unidades de recepção
dos bairros Cabo Branco e Bessa. Apesar dos recursos oferecidos aos trabalhadores essa atividade
ainda é realizada sem as mínimas condições de higiene e segurança. Todo material recolhido é
vendido as empresas que trabalham com recicláveis, aproximadamente de 10 a12 toneladas, e o
valor apurado é repassado para os agentes que integram a Associação dos Trabalhadores de
Material Reciclável (ASTRAMARE).
Não obstante os esforços por parte do poder público em sanar os problemas vividos pela
comunidade do S, alguns moradores não conseguiram integrar no quadro de trabalhadores formais
no Aterro Sanitário, nem nos centros de Coleta Seletiva, continuando a exercer suas atividades de
forma autônoma, coletando materiais recicláveis nas ruas do centro da cidade e nas praias.
Segundo depoimento dos próprios moradores,quando as atividades no lixão eram
realizadas individualmente, ou seja, cada pessoa era responsável por sua produção e horário de
trabalho, era possível escolher quem compraria o material coletado, ou seja, quem seria o chamado
“atravessador”. Havia um retorno maior, segundo depoimentos dos próprios moradores:
Enfim, o cotidiano dos moradores da comunidade do “S” é marcado pela trajetória da
pobreza e exclusão, e apesar de todas as dificuldades – falta de condições dignas de sobrevivências
Fórum Internacional do Meio Ambiente - A conferência da Terra 431

e acesso aos bens e serviços – muitos não querem sair da comunidade, apenas desejam melhorias
nas condições de vida, de trabalho e de infra-estrutura local.
O trabalho informal da reciclagem começou há 5000 anos atrás, quando na metarlúgica
começou-se a perceber que as sobras do processo podiam ser fundidas, dando origem a novos
objetos. Com o aumento do desemprego estrutural e a nova ideologia do mercado a atividade se
consolida pela necessidade de reduzir o tempo útil dos produtos para aumentar a velocidade do
circuito produtivo, devendo os produtos durararem pouco e terem reposição rápida. A reciclagem
converte o lixo descartado em produto inicial ou em outro, economizando energia e poupando
recursos naturais, dessa forma contribui para diminuir a poluição do solo, da água e do ar, contribui
na limpeza da cidade e consequentemente na qualidade de vida das populações, prolonga a vida útil
dos aterros sanitários, aumenta a produção de compostos orgânicos, gera emprego para a população
não qualificada e, ainda, gera receita com a comercialização, barateia produtos gerados a partir da
reciclagem em relação aos originados de mataria-primas virgens. Medina (2005) acredita que esse
fenômeno não é novo é que ao longo dos anos vem mudando a magnitude e a visibilidade dessas
atividades de recuperação do lixo, influenciados pelo crescimento inexorável das cidades da região,
pela expansão do uso de embalagens de papel, plástico e vidro no setor de produtos alimentícios e
outros bens de consumo, o crescimento paralelo de indústrias que reciclam esse material, além do
desemprego provocado pela crise econômica, que tem elevado milhares de pessoas a se dedicarem á
coleta de lixo em tempo integral ou parcial.

Perfil das Famílias


Hoje a comunidade do “S” é constituída de 377 famílias, constituídas em média de 5 a 6
filhos, com arranjos bem particularizados, quanto a composição e organização: 60% do modelo pai,
mãe e filho, 13.35 pela mãe e seus filhos, decorrente de divórcios, separações, mãe solteiras e
13.3% pela avó e filho, estas quando as filhas deixam os filhos com avó, geralmente que tem um
benefício social, e mãe vai viver com um homem o restante por mãe, filho, neto e genro, um
processo de ampliação do núcleo familiar via integração de parentes ou não ou incremento das
famílias convivendo via associação entre núcleos familiares devido a fatores concretos de condições
de vida. São uniões livres (66%) e com reduzido índice de uniões estáveis, vivem maritalmente e
por pouco tempo, sendo comum a troca de parceiros e a existência de filhos com pais diferentes.
È comum à gravidez entre adolescentes, com vínculos precários que não possibilitam
segurança o que os fazem permanecerem dentro de casa, ampliando os núcleos familiares via
integração de parentes ou não ou ao incremento das famílias convivendo via associação entre
núcleos. Todos estes arranjos deixam as mulheres com a responsabilidade sobre a família, que
agrega idosos, filhos, netos, etc, e\ou idosos como um dos responsáveis pelo sustento, com o uso de
seus benefícios sociais (aponsentadorias, pensões). A precariedade em que vivem essas famílias
possibilita sua extensão, quando os filhos vão permanecendo na mesma casa mesmo quando
formam novas famílias.
Sempre sobrecarregando as mulheres, que 86% da constituição das famílias e na faixa
etária entre 18 e 70 anos, destas 46% são de 18 a 31 e 20 % de 57 a 70 anos. 53% das famílias se
dizem mantidas pelos companheiros, 26% pelos filhos, muitos menores, com a mulher senso
responsável pelo cuidar da educação dos filhos, do trabalho doméstico e do trabalho fora de casa,
Como as mulheres, mesmo nas situações de ter um chefe provedor da família, se responsabilizam
pelas principais atividades das famílias, o que contribui para a caracterização das famílias em
situação de risco social, constituídas de Idosos, mulheres, homens, adolescentes e crianças.
Todos trabalhadores do lixo, que vivem em situação sub-humana, insalubre, baixo nível
sócio-econômico e desestruturadas.
Do ponto de vista econômico e sócio-demográfico das famílias da comunidade, estas são
constituídas principalmente por famílias chefiadas por mulheres, já que os homens têm passagem
transitória. São geralmente muito numerosas, de cinco a oito filhos e de pais variados, que assumem
pouco ou nada o cuidado com os filhos, desde ajudas financeiras até a educação e o afeto. Tanto que
elogiam muito a mãe, mas falam mal do pai. Constatamos um grande número de crianças soltas na
Fórum Internacional do Meio Ambiente - A conferência da Terra 432

rua sem alternativas de lazer, expostos a riscos constantes, demandando ações recreativas que
favoreçam a sociabilidade e viabilize ações sócio-culturais. Pois as crianças, quando não estão
fechadas em suas pequenas casas ou na escola, ou ainda nas poucas atividades de esporte e lazer,
desenvolvidas por uma ONG, ¨O Pequeno Daví¨ que fica próximo da comunidade.

Serviços
Assim famílias inteiras (homens, mulheres e crianças) vivem no cortiço ao lado ou no
aterro sanitário, espaço extremamente limitado, com risco de deslizamentos, desabamento e
alagamento, em caso de chuvas fortes. E insalubre, sem esgotamento sanitário, convivendo
diretamente com lixo, de onde retiram uma renda mínima para a subsistência com a venda do
material (papel, papelão, garrafas, vidros, borrachas, latinhas de alumínio, cobre, etc), considerando
que maior lucro fica com os atravessadores. Também do lixo retiram alimentação, geralmente restos
de comidas deterioradas, e materiais para construir e mobiliar suas casas.
Na própria comunidade não existe unidades de saúde apenas de uma agente de saúde, os
moradores tem acesso ao Programa de Saúde da Família (PSF), no baixo Roger.
Dispõe de uma Escola Virgem dos Pobres, na própria comunidade funcionando desde
1990, com alfabetização para 52 crianças, mantida por religiosos com parcerias internacionais.
Neste mesmo espaço é realizado, nos finais de semana. Também é realizado na escola o trabalho da
Pastoral da Criança, com reuniões bíblicas, orientações sobre educação da criança e programa do
leite, que a mãe paga dois saquinhos e recebem oito que atende 50 crianças de até 03 anos de idade.
Também usam escolas do Baixo Roger, como a escola Frei Afonso e João Coutinho.
A Comunidade usa a ONG o Pequeno Davi, localizada no Baixo Roger, com atividades de
arte-educação e música. Quanto ao fator escolaridade 60% dos informantes não concluíram o
Ensino Fundamental e 33% são analfabetos.
A Comunidade dispõe de água canalizada e iluminação pública, mas geralmente feita de
forma irregular. As ruas não são pavimentadas, são esburacadas e alagadas que nos períodos de
chuva fica quase que impossibilitada a passagem. Os esgotos são lançados no mangue ou nas vias
públicas. Apesar de ter uma coleta de lixo este é geralmente despejado no mangue ou em suas
proximidades.
As pessoas da comunidade se deslocam a pé, quando para mais perto, ou de ônibus, já que
apenas uns 4 moradores possuem automóvel próprio. Possuem ainda um telefone público, 40 no
total, e poucos fixos ou moveis (celular). A comunidade existe pequenas vendas de produtos
alimentícios, de bebidas alcoólicas, refrigerantes e lanches. Para recreação as crianças e também os
adultos utilizam um espaço livre gramado na comunidade como campo de futebol e uma lagoa
barreada pela CAGEPA72 e um pequeno campo gramado, que é utilizado pelas crianças para
jogarem futebol. Os adultos, homens, nas suas folgas conversam nas ruas e calçadas ou jogam
damas e dominó ou mesmo sinucas. O comércio local se caracteriza pela existência de pequenas
vendas de produtos alimentícios e bebidas alcoólicas.

Atividades econômicas e sobrevivência


A catação do lixo se inclui entre as ocupações mais perigosas, trabalham sem contratos
trabalhistas e benefícios médicos ou previdenciários. É uma atividade marginal porque se
desenvolve a margem da sociedade, mas desempenham papel fundamental no suprimento de
mataria-primas para a indústria, alguns são especializados e chegam a utilizar a divisão do trabalho.

72
Companhia de Água de Esgotos da Paraíba.
Fórum Internacional do Meio Ambiente - A conferência da Terra 433

Nas ruas estabelecem divisões de territoriais e fazem acordos com os moradores locais, mercearias
e empresas para venderem ou repassarem materiais específicos, selecionados. Estão submetidos
cotidianamente a altos riscos de acidentes e doenças, devido a sua constante exposição a materiais
perigosos e fumaças tóxicas nos aterros. Acredita-se também que a pobreza em que os catadores
vivem tende a ser provocada pela exploração de intermediários e líderes corruptos. Quando não são
explorados, os catadores podem ganhar mais de um salário mínimo, o possibilita melhores
condições de subsistência.
Dado o baixo nível de escolaridade, a falta de qualificação profissional e hábitos de
trabalho adequado ao trabalho formal, estes trabalhadores dificilmente são absorvidos pelo mercado
formal, mas pelo informal, que vem crescendo como estratégia de sobrevivência quanto como uma
opção de vida para os trabalhadores que preferem desenvolver seu próprio negócio, marcado pela
instabilidade e precarização, baixo nível de produtividade e remuneração, marcado pela dupla
jornada, particularmente quando adicionado ao trabalho doméstico. A Organização Internacional do
Trabalho (OIT) considera trabalhadores informais aqueles que exercem atividades econômicas a
margem da lei e desprovidas de proteção ou regulamentação pública, regulamentação contratual, e
cuja produção acontece em pequena escala.
Com 60% das mulheres como do lar e não tendo qualificação profissional e 20% delas
como aposentadas e pencionistas, consequentemente, o desemprego, a maioria das famílias da
comunidade retiram seus sustentos da coleta de lixo, uma parte ligada a coleta seletiva, realizada no
Parque Ecológico, administrado pela prefeitura de João Pessoa e outra colhendo diretamente na rua
e comercializando.
O funcionamento do Parque Ecológico passou por um processo longo e desgastante, do
qual foram selecionados alguns moradores para trabalharem como ¨Agente Ecológico¨,
denominação para um trabalho precarizado sem as mínimas condições de higiene e segurança e com
baixa remuneração, recebendo quinzenalmente R$ 40,00, o que exige a continuação da cata de lixo
e outras atividades ligadas ao mercado informal. Os moradores que não foram contemplados com a
participação da coleta seletiva continuam a atividade de catar lixo pelas ruas da cidade e vender aos
atravessadores. Os coletores são os que estão nas ruas, caçadas e parques, junto a aglomerados de
pessoas, supermercados e festas, separando sacos de papel e papelão, lata e ferro, vidro e comida e
conduzem nos braços, na cabeça ou em carroças puxadas a mão ou animal (burro ou cavalo).
[...] ¨quando não existia a coleta seletiva não faltava nada dentro de casa, ganhava mais de
um salário, prefiro trabalhar por conta própria¨ (M. R. morador).
Os que vivem no lixo e do lixo enfrentam grandes problemas, sem qualificação,
desempregados e subempregados, em condições precárias de trabalho, tendo que recorrer a
informalidade ao mercado informal para sobreviverem 40% recebem 1\2(meio) salário mínimo,
33% um salário mínimo e 13% declararam não possuir renda fixa, Por viverem do trabalho
informal, principalmente da cata e da reciclagem de lixo e outros bicos. 80% são usuárias de
programas do governo federal, como o Programa Bolsa Família e o Programa de Erradicação do
Trabalho Infantil (PETI).

CONCLUSÃO
As comunidades em situação de risco social, como a comunidade do S, denunciam o
modelo de desenvolvimento adotado, concentrador, voltado para o lucro fácil e farto, sem
compromisso com o social e a sustentabilidade. Uma urbanização desordenada e desenfreada que
vem gerando um déficit habitacional que se eleva uma falta de saneamento básico e fornecimento
de água potável limitado, além de uma deficiente política de educacional e de saúde e de criação de
emprego e renda.
Dessa forma vem gerando uma cadeia de problemas que vai agravando a situação, como é
o caso da Comunidade do S, que é a denuncia de nosso modelo de desenvolvimento e da ineficácia
das políticas sociais, e ao mesmo tempo de chamado urgente de um enfrentamento eficaz, que deve
envolver o conjunto da sociedade e medidas multifacetadas.
Fórum Internacional do Meio Ambiente - A conferência da Terra 434

REFERÊNCIAS BIBLIOGRAFICAS
CABALLERO, Araceli. Um triângulo muy viciado: consumo, pobreza, y deterioro ambiental.
Manos Unidas, Madrd, 1997.
CARNEIRO, Cládia de Medeiros. Sistema construtivo para construção habitacional em lugares
escalas. São Paulo, FAUUSP, 1984.
DIAZ, Carlo. Hacia La Humanidad Nueva. Conjería de Educáción y Cultura de la junta de castilla
Y León, Ayuntamiento de Valladolid, 1996.
MASSENA, Rosa M. R. O Tema habitacional. na Pesquisa Nacional por Amostra de domicílios
(PNAD). (Texto para disccussão nº. 895 Brasília: Publicações PEA, 2002
Revista Perspectivas: notas sobre intervención. Revista de trabalho Social. Caderno 02, Santiago do
Chile: Universidede Católica Blas Cañas, 1995.
RIBEIRO, Luiz Cesar de Queiroz. Dos Cortiços aos condomínios.Rio de Janeiro: Civilização
Brasileira,1997.
SANTOS, Cládio H.M; CRUZ, Bruno O. A Dinâmica dos mercados habitacionais Metropolitanos:
aspectos Teóricos e uma aplicação para a grande São Paulo, . (Texto para discussão nº. 713),
Brasília: Publicações PEA, 2000.
TASCHENER, Susana P. Habitação da pobreza: alternativa de moradia popular em São Paulo:
FAUUSP,1982.
Fórum Internacional do Meio Ambiente - A conferência da Terra 435

A SOBREVIVÊNCIA PRECARIZADA DE COMUNIDADES EM SITUAÇÃO DE


VULNERABILIDADE SOCIAL: O CASO DO PORTO DO CAPIM.

Flavio Nery da Nóbrega Júnior


UFPB/Brasil–flavionery.ss@hotmail.com
Ana Karolynne de Lima Freitas
UFPB/Brasil-anakarol100@hotmail.com
Dalliana Ferreira Brito
UFPB/Brasil-dallianagrisi@hotmail.com

RESUMO
O trabalho trata do desenvolvimento sustentável da Comunidade Porto do Capim, que faz
parte das ações do Programa de Preservação do Patrimônio Cultural de Ibero-América, mantido
pela agencia espanhola de Cooperação Internacional que inclui a revitalização da área tradicional da
cidade de João Pessoa, com a reconstrução do harmonioso conjunto arquitetônico e paisagístico
com reaproveitamento de espaços de incomparável beleza para tornar-lo de utilidade para
moradores e trabalhadores deste privilegiado espaço, além dos turistas. O Projeto tenta privilegiar
antigos moradores para melhorar sua condição de moradia, com ações que vão desde a restauração
dos prédios semi-destruídos através da Oficina Escola73, com geração de emprego e
profissionalização (eletricistas, bombeiros, pintores, jardineiros, etc) de jovens e adultos, até o
assentamento e relocação de famílias das margens do rio para local mais adequado, especialmente
considerando as condições dos jovens e dos adolescentes. O objetivo de nosso trabalho é conhecer a
comunidade e sua população nos seus aspetos físicos e sócio-econômicos para, assim possibilitar
com o desenvolvimento integral e sustentável destas comunidades, considerando os progressos
científicos e tecnológicos e o potencial da própria comunidade, já que há uma expectativa nos
idealizadores do projeto e na população residente.
Palavras-chaves: desenvolvimento sustentável, comunidade, revitalização, restauração.

ABSTRACT
The work treats of the maintainable development of the Comunidade Porto of the Grass,
that is part of the actions of the Program of Preservation of the Cultural Patrimony of Ibero-
America, maintained for the it negotiates Spanish of International Cooperation that it includes the
revitalização of the traditional area of the city of João Pessoa, with the reconstruction of the
harmonious architectural group and paisagístico with reaproveitamento of spaces of incomparable
beauty that can become of usefulness for residents and workers of this privileged space, besides the
tourists. The Project tries to privilege old residents to improve your home condition, with actions
that are going from the restoration of the buildings semi-destroyed through the Oficina Escola, with
employment generation and professionalization (electricians, firemen, painters, gardeners, etc) of
youths and adults, until the establishment and reallocation of families of the margins of the river for
more appropriate place, especially considering the youths' conditions and of the adolescents.
Word-keys: maintainable development, community, revitalização, restoration.

INTRODUÇÃO

73 Criada em 1991, como Programa pioneiro no Brasil para profissionalizar jovens restauradores provenientes de
famílias pobres, vem sendo referência nacional
Fórum Internacional do Meio Ambiente - A conferência da Terra 436

Visão Panorâmica da Comunidade Porto do Capim/ João Pessoa - PB

Rua principal de acesso à comunidade Porto do Capim/ João Pessoa - PB

A revitalização do Porto do Capim faz parte de um Projeto grandioso e ousado, o Programa


de Preservação do Patrimônio Cultural de Ibero-América, mantido pela Agencia Espanhola de
Cooperação Internacional, entre o governo Espanhol e o Brasil, que contempla o revigoramento de
todo Centro Histórico de João Pessoa, com a reconstrução do harmonioso conjunto arquitetônico e
paisagístico com reaproveitamento de espaços de incomparável beleza e utilidade para moradores e
trabalhadores deste privilegiado espaço, além dos turistas.
O projeto iniciou em 1987, com o planejamento das ações de preservação e revitalização
da área tradicional da cidade, abrangendo uma área de 117 he para recuperar e valorizar as raízes
culturais e patrimônio natural, construído, por uma Comissão Permanente de Desenvolvimento do
Centro Histórico de João Pessoa, que funciona até hoje como um órgão gestor da área, em sintonia
com a Prefeitura Municipal de João Pessoa e o IPHAEP, da Secretaria de Educação e Cultura do
Governo do Estado da Paraíba.
O Projeto tenta privilegiar antigos moradores para melhorar sua condição de moradia, com
ações que vão desde a restauração dos prédios semi-destruidos através da Oficina Escola74, com
geração de emprego e profissionalização (eletricistas, bombeiros, pintores, jardineiros, etc) de
jovens e adultos, até o assentamento e relocação de famílias das margens do rio para local mais
adequado, especialmente considerando as condições dos jovens e dos adolescentes.

74 Criada em 1991, como Programa pioneiro no Brasil para profissionalizar jovens restauradores provenientes de
famílias pobres, vem sendo referência nacional
Fórum Internacional do Meio Ambiente - A conferência da Terra 437

DESENVOLVIMENTO

Casarão Antigo da Comunidade Porto do Capim/ João Pessoa - PB

Prédio Antigo da Comunidade Porto do Capim/ João Pessoa - PB

Prédio Restaurado da Comunidade Porto do Capim/ João Pessoa - PB

Com suas 26 ações do Plano Estratégico do Centro Histórico o Projeto já recuperou o


Hotel Globo, a Igreja São Pedro Gonçalves e São Bento, as Praças Antenor Navarro, São Francisco
Fórum Internacional do Meio Ambiente - A conferência da Terra 438

e Dom Adalto, o Correto da Praça Venâncio Neiva, a Casa de Rodrigues de Arquito e tantos outros,
e assim vem mudando a feição da área e a vida dos moradores e trabalhadores da localidade.
O Projeto vai além da recuperação de antigos imóveis e se preocupa especialmente com a
recuperação de vida natural e social da Comunidade Porto do Capim, que é uma localidade situada
às margens do Rio Sanhauá, estuário do Rio Paraíba, local onde se originou a cidade, localizada às
margens do Rio Sanhauá, que tem essa nominação por ter sido lá que era descarregada boa parte das
mercadorias que abasteciam a cidade através de embarcações que navegavam no curso do rio
transportando capim e bambus (ração) para alimentar animais, geralmente burros (de carga e tração
dos bondes urbanos e do quartel do exercito) que com a fundação da cidade de Filipéia de Nossa
Senhora das Neves, em 1585, se localizava o antigo e único porto do Estado da Paraíba e entreposto
da região, que fazia a conexão do interior com outros estados, quando eram inexistentes ou
precárias as estradas e predominava o transporte por embarcação, até o início do século XX. A
partir da década de 30 foi desativado.
Inicialmente foi construído um pequeno ancoradouro - o Varadouro - para pequenas
embarcações e hoje abriga a Vila Nassau e o Aglomerado Porto do Capim, localizada no
Varadouro, zona urbana, centro Histórico de João pessoa, PB, com área de 117 há, próximo a
estação de Trem e do terminal de Integração. Região de Mangue com vegetação própria deste
habitat, área de preservação permanente, próximo ao Rio Sanhauá. As ruas que dão acesso a
Comunidade, apesar de estreitas, estão precariamente calçadas, possibilitando apenas o tráfego de
veiculo de pequeno e médio porte por, o uso de transporte é feito por ônibus ou trem que passam
próximo.
Constituída de 170 famílias que habitam em casas claramente observáveis de alvenaria, em
sua maioria conjugadas e muito pequenas, com uns pequenos jardins murados ou cercados de varas
e esgotos a céu aberto. As habitações ribeirinhas se defendem dos riscos das águas improvisando
aterros e instalando alpendres até as margens do rio como extensão de seus quintais, que funcionam
com espaço de lazer, trabalho, reuniões de amigos e familiares. Também são encontrados galpões
desativados, como o antigo curtume e a fábrica de gelo e outros, em funcionamento como
residências, mercearias, oficinas, reciclagens de papel e marmorarias.
Hoje na comunidade existe uma igreja Batista e uma Escola de Ensino fundamental Padre
João Félix, funcionando precariamente pela manhã e tarde, da alfabetização a segunda série, com
um total 53 alunos, com merenda escolar, e a noite alfabetização para 30 adultos. Água canalizada,
energia elétrica, coleta de lixo, entrega de gás e energia elétrica Não existe esgotamento sanitário.
Funciona também no local um prédio de arquivo e almoxarifado da secretaria da receita do Estado,
fundado em 1993 e passou por reforma recentemente.
A comunidade utiliza os serviços de Saúde de Posto do Programa de Saúde da Família
(PSF) que funciona próximo, no décimo andar, uma creche Petrilina Maria de Jesus (programa Vida
Criança),que inaugurada em Dezembro de 1994, atende 60 crianças 2 a 6 anos de 07 às 17 horas,
constituída de cozinha, duas salas de aula, banheiro, sala de coordenação, área recreativa, oferece
quatro refeições, dormitório e vestuários para 22 crianças e funcionários e orientação aos pais sobre
violência., do Porto do Capim, do Roger e do Centro.
Há na Comunidade uma Associação de moradores e um grupo de Pescadores e pequenos
comércios (mercearias), bares, madeireiras, casas de material de Construção, além de um dotado e
expressivo acervo arquitetônico, artístico, histórico, cultural e paisagístico, mesmo que ocupado por
armazéns, depósitos, oficinas com estrutura edificada bastante depredada e 180 famílias de baixa
renda, tem como reflexo o uso irracional do espaço público que faz parte da relíquia do patrimônio
cultural brasileiro.
Como maior núcleo residencial do Centro histórico da cidade merece atenção especial e
urgente, pois apesar de vir passando por um acentuado processo de depredação dos prédios
residenciais e comerciais e de evasão de seus moradores, os residentes vem sobrevivendo de
maneira precária, entre a pobreza, a exclusão, o abandono, a violência e a depredação ambiental,
embora o meio ofereça um grande potencial para a pesca, o artesanato, a gastronomia típica, o
turismo, de forma sustentável.
Fórum Internacional do Meio Ambiente - A conferência da Terra 439

Nossas atividades se integram ao grande Projeto de Revitalização da Comunidade Porto do


Capim mas centra as ações em três vertentes: levantamento sócio-econômico para maior
conhecimento das famílias e assim melhor contribuir e agir nos trabalho da relocação dos
moradores e construções e restauração de casas; da capacitação da comunidade para geração de
emprego e renda, assumindo importância fundamental as ações que promovam a inserção da
população Porto do Capim no processo de revitalização da área, assegurando as condições de
habitabilidade aliada aos componentes sustentável de desenvolvimento social, cultural e econômico.
Desse modo o projeto envolve ações de ensino, pesquisa e extensão, a medida que suas
ações serão utilizados os conhecimentos acumulados na academia e nas experiências das pessoas
envolvidas sobre a complexa realidade dessas comunidades e mais particularmente da realidade
local, o que exige muito mais do que a inteligência dos mais inteligentes dos homens, exige uma
“inteligência” de dimensões planetária, associada a uma verdadeira prática humanitária, que
concilie o homem interior e exterior, o indivíduo com a sociedade, a experiência com a teoria, o
sujeito com o verbo.
Desse modo o desenvolvimento sustentável da Comunidade Porto do Capim, através do
levantamento sócio-econômico para conhecer a realidade as diversidades regionais, culturais e
naturais da comunidade para assim descobrir formas de revitalização das funções econômicas da
localidade através do comercio e dos serviços, reforçando antigos e buscando hábitos novos, mas
não danosos ao ambiente e as pessoas para buscar transformar a comunidade em núcleo turístico da
cidade, com a criação de infra-estrutura necessária ao turismo histórico-cultural e do ecoturismo,
buscando formas de transformar a área em importante ponto de habitação e lazer para a população
local e para de toda cidade, com utilização dos espaços para eventos, concentração e contemplação;
As ações consistem em revitalizar as funções habitacionais da comunidade, construindo
prédios, fixando famílias na localidade e relocando outras das margens do rio para novas áreas de
fixação, estimulando as atividades culturais locais com resgate histórico e divulgação de sua cultura
para transformar o rio, o antigo porto e varadouro em local de habitação e de trabalho buscando
medidas que transforme as áreas do mangue do estuário do rio Paraíba em parque ecológico, com
utilização do trecho remanescente da área do Centro Histórico para atividades didáticas, de pesquisa
e de lazer competitivo, gerando em prego e renda através da capacitação e profissionalização de
mão-de-obra voltada para a restauração e preservação de patrimônio, com curso de eletricistas,
pedreiros, pintores, jardineiros para jovens e adultos.
As atividades do projeto iniciaram com visitas a localidade para conhecer melhor tantos os
aspectos físicos quanto humanos, com uma exaustiva pesquisa para levantamento cadastral da
ocupação total da área para auxiliar na proposição de um zoneamento de uso e ocupação do solo e
identificação das áreas de interesse ambiental. Associadas a essas atividades serão desenvolvidas
reuniões com a população local e com os técnicos\instituições envolvidos para discussão e
planejamento das ações de relocação de moradores que estão em situação de risco e próximas das
margens do rio Sanhauá e revitalização e preservação da área;
Também será discutido e decidido com a comunidade e a Oficina Escola o calendário de
Cursos e os jovens da comunidade que serão beneficiários da formação para a capacitação de
restauradores e recuperadores de acervo cultural para a criação de emprego e renda.
Todas essas atividades serão desenvolvidas com a participação direta dos alunos não
somente no planejamento das ações, mas particularmente na execução e avaliação das atividades.
Para a capacitação e planejamento das ações estão sendo desenvolvidas atividades com a equipe de
serviço social (professores, assistentes sociais e estudantes). Todas as segundas-feiras, à tarde, no
ambiente 19 e as quintas feiras a tarde, mensalmente em locais variados, como: Hotel Globo ou
comunidade, com o grupo ampliado de técnicos e instituições envolvidas para a integralização das
ações.

REFERÊNCIAS BIBLIOGRAFICAS
CABALLERO, Araceli. Um triângulo muy viciado: consumo, pobreza, y deterioro ambiental.
Manos Unidas, Madrd, 1997.
Fórum Internacional do Meio Ambiente - A conferência da Terra 440

CARNEIRO, Cládia de Medeiros. Sistema construtivo para construção habitácional em lugares


escalas. São Paulo, FAUUSP, 1984.
DIAZ, Carlo. Hacia La Humanidad Nueva. Conjería de Educáción y Cultura de la junta de castilla
Y León, Ayuntamiento de Valladolid, 1996.MASSENA, Rosa M. R. O Tema habitacional. na
Pesquisa Nacional por Amostra de domicílias (PNAD). (Texto para disccussão nº. 895 Brasília:
Publicações PEA, 2002.
RIBEIRO, Luiz Cesar de Queiroz. Dos Cortiços aos condomínios..Rio de Janeiro: Cicvilização
Brasileira,1997.
SANTOS, Cládio H.M; CRUZ, Bruno O. A Dinâmica dos mercados habitacionais Metropolitanos:
aspectos Teóricos e uma aplicação para a grande São Paulo, . (Texto para discussão nº. 713),
Brasíia: Publicações PEA, 2000.
TASCHENER, Susana P. Habitação da pobresa: alternativa de moradia popular em São
Paulo:FAUUSP,1982.
Fórum Internacional do Meio Ambiente - A conferência da Terra 441

DETERMINAÇÃO DE ÁREAS AMBIENTALMENTE DEGRADAS NA MESO REGIÃO


OESTE POTIGUAR

Gabriella Cynara Minora da Silva


Aluna de Graduação do Curso de Gestão Ambiental, Núcleo Avançado de Areia Branca - NAESAB /UERN e Bolsista
de Iniciação Científica do Cnpq. gabriella_cynara@yahoo.com.br
Paulo César moura da Silva
Dr. em Recursos Naturais Prof. Adjunto na disciplina de Geoprocessamanto da UFERSA. paulo.moura@oi.com.br.
Wendson Medeiros de Araújo
Ms.c em Geografia Prof. Assistente de Avaliaçõa de Impactos Ambientais da UERN. wendosnmedeiros@uern.br

RESUMO
O atual modelo de desenvolvimento baseado na produção e consumo desenfreados
preconizado pelo capitalismo tem agredido fortemente o meio ambiente, retirando dele recursos
naturais de forma impensada, sem se preocupar com as limitações que o mesmo impunha. Dessa
forma, o que percebemos hoje são áreas completamente modificadas pela ação antrópica e
ambientalmente degradadas. A Meso Região Oeste Potiguar caracteriza-se pelas ótimas condições
climáticas para o desenvolvimento da atividade salineira, além de possuir um grande campo de
exploração petrolífera, atividades estas altamente impactantes para o meio ambiente.
Palavras-Chaves: Áreas de Proteção Permanente; Sistema de Informação Geográfica e Zoneamento
Ambiental.

ABSTRACT
The current development model based on the production and consumption unbridled
extolled by the capitalism has been attackink the environment strongly, removing of him natural
resources in a thoughtless way, without worrying with the limitations that it imposed. In that way,
what noticed today they are areas completely modified by the action antropic and degraded
ambiently. The Meso Region Potiguar West is characterized by the good climatic conditions for the
development of the activity producer of salt, besides possesseing a wide field of exploraction of the
activity producer of salt, besides possessing a wide field of exploration of petroleo, activities these
highly crashing for the environment.
Key-Words: Areas of Permanent Protection; System of Geographical Information and
Environmental Zoning.

INTRODUÇÃO
A busca pelo meio ambiente equilibrado deve ser interesse de toda a sociedade, visto que,
a boa qualidade do ar, da água e do solo é fundamental para a existência do homem.
Fogliatti, Filippo e Goudard (2004), consideram o meio ambiente como sendo o conjunto
de elementos formados pelas águas interiores ou costeiras, superficiais ou subterrâneas, subsolo, ar,
flora, fauna e comunidades humanas e seus inter-relacionamentos.
A Constituição brasileira de 1998, em seu artigo 225 declara que todos têm direito ao meio
ambiente ecologicamente equilibrado, bem de uso comum do povo e essencial à sadia qualidade de
vida, impondo-se ao poder público e à coletividade o dever de defendê-lo e preservá-lo para as
vpresentes e futuras gerações.
As atividades antrópicas têm causado poluição e desmatamento em áreas de estuário,
prejudicando os ecossistemas desse ambiente e levando à escassez inúmeras espécies da fauna e
flora, visto que, nesses locais encontram-se remanescentes de manguezais e caatinga nativa.
Os manguezais, segundo ABNT (1988), são sistemas litorâneos de transição entre os
ambientes terrestres e aquáticos, característicos de áreas tropicais e subtropicais (ocupando
geralmente áreas no interior de baías e estuários), estando submetidos ao regime de maré. São
constituídos de espécies vegetais típicas, adaptadas à flutuação de salinidade e a um tipo de
sedimento predominantemente lodoso, com baixos teores de oxigênio.
Fórum Internacional do Meio Ambiente - A conferência da Terra 442

Devido a sua vulnerabilidade ambiental, esses ecossistemas vêm despertando interesse e


preocupação. A partir daí percebeu-se a necessidade de destacar áreas não destinadas para a
alteração de uso da terra, devendo sempre estar coberta com a vegetação original. O Código
Florestal em seu art. 2º, Lei nº 7.803, de 1993, define Área de Proteção Permanente como sendo os
locais onde devem ser mantidas todas as florestas e demais formas de vegetação natural. A
cobertura original da vegetação evita inúmeros transtornos ambientais, como é o caso da erosão e o
assoreamento de leitos de rios que acabam afetando negativamente algumas espécies animais.
Para minimizar a deterioração ambiental é necessário um planejamento adequado do uso
do solo, que seria a busca por uma ocupação ordenada e sustentável do meio físico de modo que o
mesmo não sofra alterações negativas ou pelo menos que sejam minimizadas. Este planejamento
precisa comportar as necessidades humanas, da fauna e da flora para que todos possam viver em
harmonia.
Com a finalidade de zonear o espaço ocupado, (MATA, 1981) considera que o zoneamento
ambiental procura ordenar o território de acordo com suas características bióticas e abióticas, com
diferentes níveis de usos e atividades. Sua utilização é necessária para evidenciar os problemas
ambientais e sem dúvida, é uma ferramenta importante no planejamento ambiental.
Segundo (ROCHA, 1997), os recursos naturais são componentes próprios ou vinculados
aos parâmetros: ar, água, solo/rocha, vegetação e fauna silvestre, que o homem utiliza para
sobreviver. A ação antrópica tem utilizado os recursos de maneira insustentável, podendo chegar
ao extremo de extingui-los. O autor coloca ainda que qualquer recurso natural renovável, se
deteriorado a mais de 10% da sua unidade básica, não se recompõe naturalmente. Fica nítida a
importância da conscientização do homem com relação à questão ambiental, visto que se não mudar
seu comportamento estará contribuindo para sua própria extinção.
Conforme (MELLO FILHO, 1999), a deterioração da terra como sendo o resultado de
ações antrópicas, pode ser definida como toda e qualquer mudança permanente ou irreversível na
estrutura e funções dos recursos naturais da terra ou sua perda. Mudanças que são causadas por
alterações de natureza física, química e biológica ou tensões antrópicas induzidas por seres
humanos que excedem a capacidade de uso destes recursos naturais.
A deterioração da terra causada por atividades antrópicas que o autor cita é o resultado do
padrão de desenvolvimento estabelecido pelo atual modelo econômico, o capitalismo. Como
sabemos o único objetivo deste é o lucro imediato, entretanto se pensarmos bem, o modo predatório
como o capitalismo caminha acarretará na exaustão dos recursos naturais, e consequentemente na
sua própria derrocada como modelo de desenvolvimento econômico.
Para (MILANO, 1993), o zoneamento ambiental proporciona as seguintes vantagens: a)
permite que se determine limite de possíveis irreversibilidades, devido a conflitos ambientais e
pontos de fragilidade biológica, antes que se tomem decisões sobre o uso de cada área, que de outra
forma poderiam causar danos irreversíveis; tendo portanto, caráter preventivo; b) permite a
identificação de atividades antrópicas para cada setor da unidade ambiental e seu respectivo manejo,
possibilitando a descentralização de comando e decisão; c) pelo fato da metodologia do zoneamento
ambiental ser flexível, permite que se adapte a definição e manejo de uma zona, conforme
necessidade.
Em virtude das modificações e degradações decorrentes das ações antrópicas e seus
efeitos, não se pode pensar no desenvolvimento sem condicioná-lo a um adequado planejamento
ambiental, de modo que se possam minimizar os impactos ambientais negativos, estabelecendo o
manejo adequado dos recursos naturais. O zoneamento ambiental apresenta-se como uma
importante ferramenta no auxílio ao planejamento, pois ajuda a identificar as deficiências e as
virtudes ambientais da área zoneada, indicando se a mesma pode ou não comportar determinada
atividade.
Dentro deste contexto, objetiva-se com este estudo quantificar e determinar, com base na
lei vigente no Brasil as áreas de proteção permanente de rios e córregos da Meso Região Oeste
Potiguar no estado do Rio Grande do Norte utilizando técnicas de geoprocessamneto.
Fórum Internacional do Meio Ambiente - A conferência da Terra 443

MATERIAIS E MÉTODOS
Área de Estudo

Área de estudo está localizada no Oeste Potiguar, trata-se da Meso Região Oeste Potiguar e
conta com 6 (seis) municípios que são: Areia Branca, Baraúna, Grossos, Mossoró, Serra do Mel e
Tibau. Ocupa uma área total de 427.178 ha. De acordo com o IBGE 2007, a população total é de
304.322 mil habitantes, o município mais populoso é Mossoró, seguido de Areia Branca, Baraúna,
Grossos, Serra do Mel e por fim Tibau, de acordo com a tabela abaixo.

Tabela 1 – Municípios da área de estudo com suas respectivas populações e áreas.


Municípios Áreas (ha) População Total (Hab.)
Areia Branca 37.258 24.398
Baraúna 88.913 23.098
Grossos 13.821 9.451
Mossoró 209.979 234.392
Serra do Mel 60.188 9.216
Tibau 17.018,62 3.767

A Meso Região Oeste Potiguar é uma das quatro do Estado do Rio Grande do Norte, sendo
formada por 62 municípios agrupados em sete microrregiões. A região de estudos é uma das mais
importantes do nordeste, pois nela estão concentrados 45% da produção de sal marinho do Brasil e
o maior campo terrestre de exploração petrolífera do país, causando um crescente aumento nas
tensões ambientais nos municípios que a compõem.
A seguir tem-se o mapa da Meso Região Oeste Potiguar com seus respectivos
municípios.

Figura 1 – Mapa dos municípios da Meso Região Oeste Potiguar

A classificação climática da região baseada em Thornthowaite, apresenta clima semi-árido


com pequeno ou nenhum excesso de água. A vegetação predominante é a de caatinga hiperxerófila,
na mata ciliar encontra-se a presença de carnaubais, além de manguezais nas áreas de foz. A Meso
Região Oeste Potiguar encontra-se na Bacia do rio Apodi-Mossoró, sendo que a mesma ainda
contém duas Bacias de Fluxo Difuso, uma na região que compreende os municípios de Tibau e
Grossos, e outra na área leste do município de Areia Branca.
Toda essa malha hídrica é composta por rios perenes e intermitentes que são considerados
afluentes do Rio Apodi-Mossoró que nasce na Serra de Luiz Gomes e desemboca no município de
Fórum Internacional do Meio Ambiente - A conferência da Terra 444

Areia Branca. Geologicamente encontram-se como grupos presentes o calcário jandaíra, arenito açu
e grupo barreiras como principais unidades geológicas da região.
O relevo vai de plano a ligeiramente inclinado, porém com declividades inferiores a 5%,
encontra-se ainda a presença do vale do Rio Apodi-Mossoró e a foz do mesmo como pontos de
relevo mais baixos na região.
Como método aplicado utilizou-se um sistema de informações geográficas (SIG) como
ferramenta de análise espacial, para demarcar a área e a localização das APP’s, usou-se como base
as cartas digitalizadas da SEMARH-RN (2003) baseadas nas cartas da SUDENE de 1:100.000
convertidas de córrego alegre para UTM-SAD 69, foram feitas nestas cartas correções através de
deslocamento em campo usando GPS de navegação, realizou-se o sincronismo do datum
planimétrico do receptor GPS e do SIG, para reduzir os erros de leitura dos dados. Foram gerados
bufers (áreas) a partir das linhas dos rios perenes e intermitentes, depois foram calculadas as áreas
de proteção permanente em hectares, e logo em seguida foram realizados cálculos pontuais em toda
área de estudo relacionando esta com a área de proteção permanente. A partir destes dados foram
elaborados os mapas das APPs, da hidrografia, do solo, e das áreas inundadas temporariamente ou
permanentemente e as áreas ocupadas por salinas. Utilizou-se ainda para análise, tabelas, gráficos e
os mapas elaborados, bem como material fotográfico para verificação das áreas.
O SGI foi alimentado com as informações legais do Código Florestal (Lei no 4.771, de
15/09/65, alterada pela Lei no 7.803, de 8/08/93). A Resolução N° 303 do CONAMA, de 20 de
março de 2002, regulamenta e estabelece parâmetros, definições e limites das APP’s. destacaremos
a seguir as APP’s objeto deste estudo:
APP ao longo de rios ou de qualquer curso d’água.
APP ao de nascentes ou olhos d’água.
APP em topo de morros, montes, montanhas e serras.
APP ao longo das linhas de cumeada.

RESULTADOS E DISCUSSÃO
O mapa a seguir apresenta a hidrografia da região com seus rios e córregos:

Figura 2 – Mapa dos Rios e Córregos da Meso Região Oeste Potiguar

Verifica-se que a Meso Região Oeste Potiguar situa-se na bacia do Rio Apodi-Mossoró,
que é a mais extensa do Rio Grande do Norte, ocupando cerca de 14.276 km2, o que corresponde a
26,8% da superfície do Estado (SERHID, 1998)
A figura seguinte identifica as APP’s dos Rios intermitentes e de trechos perenizados:
Fórum Internacional do Meio Ambiente - A conferência da Terra 445

Figura 3 – Mapa das APP’s da Meso Região Oeste Potiguar

A região alvo deste estudo se caracteriza por seu relevo plano, o que explica a presença de
APP’s somente as margens de curso d’água, visto que a área não possui superfície de topografia
elevada, o que impossibilita a existência de morros e montanhas.
A próximo figura revela o detalhamento da APP’s identificadas neste estudo:

Figura 4 – Mapa do detalhe das APP’s da meso Região Oeste Potiguar

Esta figura apresenta em detalhe as APP’s dos rios perenes onde podemos observar o curso
do Rio Apodi Mossoró; e as APP’s dos rios intermitentes, estes são caracterizados pelo fato de não
apresentarem água parcial ou completamente no período de seca, que costuma ser muito intensivo
nesta região do semi-árido.
Os resultados obtidos através dos mapas demonstraram que as APP´s dos rios intermitentes
têm uma área total de 6.841,8 ha e os trechos perenizados de 4.113,0 ha totalizando 10.954,8 ha, o
que representa 2,56% da área total da região estudada.
Observando-se a figura a seguir verifica-se a percentagem relacionada às áreas de proteção
permanente de rios perenes e intermitentes com relação às áreas totais.
Fórum Internacional do Meio Ambiente - A conferência da Terra 446

38% Rios Perenes

Rios Intermentes
62%

Figura 5 – Percentagem das APP’s de Rios perenes e intermitentes na área de estudo.

A região alvo deste estudo é sedimentar, muito entrecortada por drenagens, por isso não
possui muitos rios e córregos, o que explica a pouca quantidade de APP’s. Trata-se de uma região
plana com relevo levemente ondulado, não havendo condições de correr rios ou córregos.
A seguir verifica-se a figura das áreas alagadas do local de estudo.

Figura 6 – Mapa das áreas alagadas da Meso Região Oeste Potiguar

Essas áreas podem ser alagadas naturalmente, em decorrência do período de chuvas ou


cheias do Rio Apodi Mossoró, ou podem ser alagados em decorrência da ação antrópica, visto que a
área é cercada por salinas que muitas vezes acabam despejando a água utilizada no processo de
produção do sal nestes locais, provocando desequilíbrio ambiental e grave impacto a fauna e flora
local.

A próxima figura revela as áreas ocupadas por salinas na área avaliada.


Fórum Internacional do Meio Ambiente - A conferência da Terra 447

Figura 7 – Mapa das áreas ocupadas por salinas na Meso Região Oeste Potiguar

A atividade salineira no município encontra-se em sua maioria às margens do Rio Apodi-


Mossoró, provocando o desmatamento da mata ciliar original e de manguezais (área de proteção
permanente) que atuam como berçários para a reprodução de crustáceos e peixes. Dessa forma,
estes ecossistemas desmatados ficam fragmentados e desprotegidos, causando a perda da
biodiversidade, bem como provocando o assoreamento do leito do rio.
Além disso, a atividade impacta também o próprio curso d’água com a deposição das
águas-mães com elevado teor salino, e provoca a inutilização do solo e a redução ou substituição da
vegetação nativa por vegetação exótica, inviabilizando práticas agrícolas sustentáveis no território
dos municípios
Logo a segui é apresentada a figura que revela as áreas alagadas e ocupadas por salinas em
cada município da área de estudo

Figura 8 – Carta das áreas alagadas e de salinas na Meso Região Oeste Potiguar

Nesta figura podemos identificar a forma como as salinas influenciam a origem de


alagados de águas salobras. Esta interferência acaba por salinizar este solo, causando infertilidade e
perda das condições naturais do mesmo, tornando impacto registrado extremamente forte.
Fórum Internacional do Meio Ambiente - A conferência da Terra 448

Já as áreas de solo alagado apresentaram uma superfície total de 5.475,7 ha e a ocupação


por salina é de 13.077,01 ha, totalizando 18.552,71 ha, o que representa 4,34% da área total da
região. Na figura seguinte verifica-se a percentagem relacionada às áreas de solo alagado e ocupada
por salinas com relação às áreas totais.

30%
Solo Alagado

Salinas
70%

Figura 9 – Percentagem dos solos alagados e de salinas na área de estudo.

As condições climáticas da região favorecem a produção de sal marinho por evaporação,


esta facilidade desencadeou a invasão da atividade salineira sem a preocupação de se fazer um
planejamento de uso e ocupação do solo, e hoje identificamos os resultados negativos desse ato.

CONCLUSÕES
Nas APPs encontram-se os mangues na foz e mata ciliar no interior, que estão sendo
progressivamente desmatados de forma ilegal e sem sustentabilidade.
Os desmatamentos ilegais têm causado a fragmentação dos ecossistemas florestais,
deixando-os isolados e desprotegidos, causando a perda da biodiversidade, além disso a falta de
controle da erosão pode provocar o assoreamento do leito do rio. Some-se a isso a pressão exercida
pela exploração petrolífera, o que aumenta o desmatamento das sub-bacias hidrográficas e os riscos
de poluição, que antes da exploração inexistiam.
Como medidas, os órgãos governamentais responsáveis pela fiscalização devem atuar de
forma mais incisiva, juntamente com a sociedade no sentido de detectar o mau uso das áreas de
proteção permanente, aqui definidas, além da aplicação da lei federal.
São, ainda, indicadas como medidas compensatórias, a recuperação das áreas degradadas, a
fim de reduzir os impactos da exploração econômica das margens dos córregos e rios da região.
Por fim verifica-se que o geoprocessamento se mostrou um importante suporte em estudos
desta natureza, pois tratar-se de uma ferramenta de análise espacial de fácil interpretação e muito
importante para o planejamento e tomada de decisão relativa às questões ambientais.

REFERÊNCIAS BOBLIOGRÁFICAS
Associação Brasileira de Normas técnicas (ABNT). Manguezal, metodologia para estudo do
ecossistema: padronização. Rio de Janeiro, 1988. 8 p.
Brasil, Código Florestal Brasileiro. Lei Federal Nº 4.771. 15 de Outubro de 1965
Brasil, Conselho Nacional de Meio Ambiente. Resolução Normativa N° 303, 20 de Março de 2002.
Brasil, Constituição da República Federativa do Brasil. Artigo Nº 225. 1988.
FOGLIATTI, M. C.; FILIPPO, S.; GOUDARD, B. Avaliação de Impactos Ambientais – Aplicação
aos sistemas de transporte. Rio de Janeiro. 2004.
MATA, S. Planejamento urbano e preservação ambiental. Fortaleza: UFC, 1981. 242 p.
MELLO FILHO, J. A. - Estudo das microbacias hidrográficas, delimitadas por compartimentos
geomorfológicos, para o diagnostico físico - conservacionista. Dissertação de Mestrado. Santa
Maria-RS. Brasil. 1999.
Fórum Internacional do Meio Ambiente - A conferência da Terra 449

MILANO, M. S. Unidades de conservação: conceitos básicos e princípios gerais de planejamento,


manejo administração. Curitiba: [s.n.], 1993. 63 p.
ROCHA, J. S. M. da. Manual de Projetos Ambientais. Santa Maria: UFSM, 1997. 423p.
Secretaria Estadual de Recursos Hídricos – SERHID. Plano Estadual de Recursos Hídricos.
Novembro de 1998. 254 p.
Fórum Internacional do Meio Ambiente - A conferência da Terra 450

PLANEJAMENTO AMBIENTAL: NOTAS E INDICAÇÕES DE PESQUISA NO SEMI-


ÁRIDO CEARENSE

Maria Rita Vidal


Departamento de Geografia (UFC)
mritavidal@yahoo.com.br
Abraão Levi dos Santos Mascarenhas
Av. John Stanford – Centro de Ciências Humanas – Casa da Geografia (UVA)
abraaolevi@hotmail.com

RESUMO
Planejamento tem sido a palavra de ordem na sociedade moderna, os avanços científicos e
tecnológicos abrem um leque de oportunidades de intervenção sobre os sistemas naturais. Com o
passar dos anos fazer planejamento não é tarefa apenas dos burocratas, mas envolve técnicos
especializados, instituições de ensino e pesquisa e a própria sociedade civil. As mudanças na forma
de agir e pensar a natureza são os elementos norteadores da metamorfose do planejamento. O
objetivo central da presente seção é fazer um resgate histórico do desenvolvimento dos marcos
teóricos do planejamento sobre os seus adjetivos econômicos, estratégicos, ambiental e etc. Na
segunda parte do trabalho, optou-se em torna exeqüível a teorização do planejamento ambiental
focalizando a região norte do estado do Ceará, com ênfase em um município da Serra da Ibiapaba
(Tianguá) e no município da Bacia Hidrográfica do Rio Acaraú, destacando os Municípios de
Sobral pelas suas características socioespaciais diferentes. O caminho metodológico se escreveu a
luz da teoria sistêmica e geossistêmica dos elementos naturais e sociais, bem como nos estados dos
ambientes a partir da dinâmica física e socioespacial, destacando as atividades econômicas,
turísticas, análise e gestão ambiental. Ao final propõem-se, em linhas gerais, temas para execução
de metodologia voltada ao planejamento ambiental.
Palavras-Chave: Planejamento, Política Pública, Sistemas Naturais

ABSTRACT
Planning has been the watchword in modern society, the scientific and technological
advances open up a range of opportunities for intervention on the natural systems. Over the years
doing planning wasn’t a task just of the bureaucrats, but involves technical expertise, educational
institutions and research and the civil society. The changes in the way of acting and thinking the
nature elements guiding the metamorphosis of planning. The central objective of this work is to
make a historical rescue of the development of theoretical major points of planning about their
adjectives economic, strategic, environmental and so on. In the second part has chosen to carry out
the theorizing of environmental planning with a focus on the northern region of the state of Ceara,
with emphasis on municipality of Ibiapaba mountain (Tianguá) and the municipality of
hydrographic basin from Acaraú River, highlighting the city of Sobral by their different socio-space
characteristics. The way methodological was written the light of the systemic theory and geo-
systemic of natural and social elements, as well in the states of environments from the physical and
socio dynamic, highlighting the economic activities, tourism, analysis and environmental
management. At the end propose is, in general, theme for implementation of methodology dedicated
to environmental planning.
Keywords: Planning, Public Policy, Natural Systems

INTRODUÇÃO
Ao passo que cresce a demanda por planejamento, nasce dúvidas sobre qual seria a melhor
forma de administrar os recursos naturais via cálculo custo-benefício das intervenções humanas nos
sistemas naturais. O planejamento, via de regra, tem se mostrado bastante metamorfoseado no que
se refere ao tipo de planejamento a ser implementado. A necessidade de se estabelecer parâmetros e
metodologias que visem maximizar as atividades sócio-espaciais é a tônica das políticas públicas
para a preservação/conservação dos sistemas naturais.
Fórum Internacional do Meio Ambiente - A conferência da Terra 451

As novas formas de apropriação dos materiais disponíveis na Natureza são incorporadas


pelo trabalho humano, conseqüentemente, surgem novas formas de apreensão do homem e da
própria natureza. Essa dimensão de permanente mudança, qualitativa/ quantitativa, tem sido
percebida pela sociedade de forma geral como um desajuste nos sistemas naturais, carecendo de
uma análise mais profunda das atuais mudanças.
Hoje mais do que nunca se fala de uma relação homem/natureza dialeticamente
contraditória, com efeitos danosos, provocados pela ação impressa pelo homem para com a
natureza. Dentro da visão humana os fatores ambientais (Clima, relevo, pedologia, vegetação,
minerais, recursos hídricos), sobre interconexões e inter-relações dos fatores humanos, tendem a
utilizar técnicas/tecnologias (adequadas ou não) para a ocupação do uso da terra, desse processo,
resulta mudança no uso do solo, e essas inconstâncias acarretam alterações significativas nos
sistemas ambientais. (DREW, 2005).
A gestão dos recursos naturais precisa ser implementada de forma integrada pelos
dirigentes políticos das três esferas de poder, ou seja, União, Estado e Município, sem a qual se
tornará inviável em sua totalidade. A princípio, a busca por uma sustentabilidade socioambiental
transpassa por todas as áreas de conhecimento. Por isso o objetivo do presente artigo e fazer uma
pequena retrospectiva do que foi o planejamento governamental, nas décadas que se antecederam as
“novas” políticas para o meio ambiente, bem como dar indicativos de análises ambientais na região
norte do estado do Ceará, focalizando a micro-região de Ibiapaba, com destaque ao município de
Tianguá, e também partes da Bacia hidrográfica do Rio Acaraú, com destaque para o município de
Sobral.

Planejamento Avanços na Temática Ambiental


Desde o aparecimento da humanidade a ação de planejar (ato reflexivo) tem acompanhado
o comportamento dos homens, isso se dar pelas suas características psicomotoras, para além das
discussões entre a diferença do homem em relação aos outros animais, a realidade de calcular certa
ação tem sido fato e ato da sociedade, Gonçalves (1989) já nos alertava de que o homem é um ser
que produz cultura e nesse produzir cultura modifica a si e, o seu entorno.
A idéia de que o homem era “senhor” da natureza ocasionou alguns problemas de ordem
ecológica e social, visto que a degradação dos sistemas naturais provocou mudanças no
comportamento da própria sociedade, pois os impactos ficaram mais visíveis e os riscos mais
proeminentes. Desde a primeira revolução industrial a sociedade humana tem acelerado a
degradação ambiental, chegando a seu ápice com a segunda Grande Guerra. Esse recorte histórico
visa mostrar o acentuado nível de desestruturação, não só nos sistema econômicos, mas sócio-
espacial e ecológico, era mister que as políticas públicas fossem tangenciadas para a proteção,
acima de tudo, da vida na Terra, coisa que somente a partir dos anos de 1970 viria a acontecer.
Os planejamentos sempre tiveram, em geral, um caráter eminentemente econômico-
estratégico, pois seu objetivo maior era a maximização dos lucros, sem, contudo levar em
consideração as conseqüências socioambientais. O fator “desenvolvimento econômico” era a matriz
dos planejamentos – esses planejamentos assumiam esse caráter desenvolvimentista.
Entre esses planejamentos podemos citar o Plano de saúde, alimentação e transporte
(SALTE) do governo Dutra que foi desenvolvido entre os anos de 1946 a 1950, o Plano de Metas
do governo de Juscelino Kubitscheck com vigências entre os anos de 1956-1960 além dos vários
planos dos governos dos anos de 1964 a 1982, quanto em fim são substituídos pelo Plano Real.
(ALMEIDA, 2004).
As características dos planejamentos estavam tendencialmente a adotar uma postura
desenvolvimentista com caráter econômico, sem se quer, pensar nas questões físico-naturais, das
quais, toda a sociedade se fixa – quer dizer, o aporte territorial e sócioespacial foram negligenciados
em nome de um desenvolvimento urbano-industrial. Essa postura se estabelece basicamente por se
trata de um planejamento com raízes no conceito de natureza, essa por sua vez já foi vista como
recurso infinito de exploração, como uma natureza hostil e hoje como fonte de recurso a ser
explorado racionalmente. A noção de um mundo destinado ao beneficio do homem foi igualmente
Fórum Internacional do Meio Ambiente - A conferência da Terra 452

enunciada pelos gregos da antiguidade. Aristóteles, Política, 350 a.C já falava que as plantas foram
criadas por causa dos animais e os animais por causa do homem. (DREW, 2005).
Nesse ínterim, as políticas ambientais vinham ganhando força nos mais variados níveis,
sem contundo atingir as macro-políticas governamentais, essa realidade se configurava em situações
pontuais como as políticas de proteção a uma dada espécie vegetal ou animal, bem como de
imprimir uma política de caráter de justiça ambiental75 como as que deram origem a esse tipo de
movimento nos bairros periféricos da sociedade norte-americana. (ACSELRAD, 2005). De acordo
com Ribeiro (2005) as conversões que resultaram em políticas públicas que envolvem o caráter
ambiental exercem grande influência para, os futuros, planejamentos governamentais, baseados na
matriz do desenvolvimento sustentável76.

Planejamento, Análise e Gerenciamento Ambiental


Conforme se tem modificado a concepção de natureza o planejamento também sofre
metamorfoses que vem acompanhado de uma certa adjetivação, ou seja, o planejamento passa de
econômico, estratégico, setorizado, etc., para um planejamento ambiental, ou ainda planejamento
territorial, que visa a gestão do território. Para Moreira (2000, 2006) a concepção de um homem
fora da natureza tem raízes na cultura judaico-cristã, isto quer dizer que a acepção de uma relação
homem-natureza nunca foi homogênea, onde pode-se encontrar o embrião de um homem
desnaturalizado na idéia de uma expulsão edênica, tem o significado de exclusão do mundo
puramente natural da criação divina, exigindo que o homem modifique a natureza.
No segundo momento Moreira (Op. cit. p. 344) vai se reporta ao desenvolvimento das
ciências fisico-matemática que é o rompimento radical e definitivo da desnaturalização humana,
isso acontece lá pelo período do renascimento. Em um terceiro momento lembrado pelo autor
supracitado é a desterreação, referindo à fase inicial do sistema de produção capitalista, quando os
camponeses são desapropriados de suas terras.
Essa realidade epistemológica é essencial para o entendimento das mudanças relativas ao
planejamento atrelado a uma visão cosmológica, essa visão de mundo é fato primordial para se
buscar o real sentido de um planejamento que passa por transformações na sua matriz de
pensamento e conseqüentemente em seu arranjo técnico-estrutural e político. A realidade brasileira
acompanha a tendência nacional sobre a temática ambiental, apesar de que o Brasil tem uma das
mais modernas legislações nesse setor, isso demonstra o fortalecimento institucional em estratégias
de conservação/preservação dos sistemas naturais. Ainda existe muita confusão no estabelecimento
de critério técnico-científico para a adoção dos estudos relativos a todos os tipos de sistemas
(antrópico, ecológico, sócioespacial, etc.), na escala da análise e do planejamento.
Cabe ao Planejamento implementar a administração (gerenciamentos) tanto dos recursos
financeiros como dos recursos humanos e ambientais, o planejamento se insere em um modo de dar
as diretrizes que antecederá e presidirá as ações dos agentes envolvidos com a gestão dos sistemas
naturais, seja em bacias hidrográficas seja nos enclaves úmidos ou em qualquer ambiente terrestre.
A análise ambiental se refere ao ato de executar o levantamento de todas as potencialidades
e fragilidades dos sistemas físico-naturais, sistemas antropo-ecológicos e geoecológicos, esse
último, tem grande aplicabilidade para os possíveis, zoneamentos e gerenciamentos dos Sistemas
Naturais.
Para Santos (2004) o planejamento é um processo contínuo que envolve a coleta,
organização e análise sistematizadas das informações, por meio de procedimentos e métodos, para
chegar a decisões ou a escolhas acerca das melhores alternativas para o aproveitamento dos
75
De acordo com Henri Acselrad (2005, p. 223-224), a justiça ambiental é uma noção emergente que integra o processo
histórico de construção subjetiva da cultura dos direitos no bojo de um movimento de expansão semântica dos direitos
humanos, sociais, econômicos, culturais e ambientais. Entre os conjuntos e práticas da justiça ambiental pode-se
destacar a que se assegure o amplo acesso às informações relevantes sobre o uso dos recursos ambientais e a destinação
de rejeitos e localização de fontes de risco ambientais, bem como assegurar processos democráticos e participativos na
definição de políticas, planos, programas e projetos que lhes dizem respeitos.
76
Ver obra organizada por Becker e Miranda (1997) – a discussão travada tem como eixo central da ciência geográfica,
no seu ramo Geopolítico, e o desenvolvimento sustentável.
Fórum Internacional do Meio Ambiente - A conferência da Terra 453

recursos disponíveis. Acrescentamos ainda que [...] o planejamento seria um meio sistemático de
determinar o estágio em que você está, onde deseja chegar e qual o melhor caminho para chega lá.
(SANTOS, 2004, p. 23).
Para Rodriguez (1997) o planejamento em sua adjetivação ambiental é
[...] Um instrumento dirigido a planejar e programar o uso do território, as atividades
produtivas, o ordenamento dos assentamentos humanos e o desenvolvimento da
sociedade, em congruência com a vocação e qualidade do meio ambiente.
(RODRIGUEZ, 1997, p. 37).

Em linhas gerais o planejamento seria o cálculo junto a ação (re) flexiva com o objetivo de
maximizar recursos (naturais, financeiros, econômicos e humanos) em virtude das políticas
norteadoras vislumbradas com o desenvolvimento sustentável, apesar dessa categoria ser alvo de
severas críticas por ser uma utopia dentro do sistema econômico dominante (capitalismo) e da
difícil mudança de hábitos e atitudes. Para as questões que envolvem as diretrizes e marcos teóricos
e metodológicos da Análise ambiental é necessário investigar seus fundamentos teóricos, seus
procedimentos e técnicas, bem como seu conjunto de diretrizes, de acordo com IBAMA (1997) a
análise ambiental se apóia nesses três elementos supracitados, valendo a pena especificá-lo.
Fundamentos Teóricos: Sem dúvida a concepção sistêmica passar a ser o fundamento geral
das análises ambientais, levando em considerações o conceito de ecodinâmica de Tricart (1976) e
das (inter) conexões de Sotchava, (1977), buscando identificar potencialidades e limitações das
paisagens naturais; b) Procedimentos e técnicas capazes de identificar, analisar e interpretar os
processos e os fatores que intervêm de forma direta ou indireta na configuração de problemas
socioambientais, para a avaliação de riscos e impactos, nesse sentido as concepções geoecológicas
são ferramentas fundamentais para a identificação, análise e espacialização das questões que
envolvem os estudos das paisagens. c) Um conjunto de diretrizes baseado em normas da Política
Nacional do Meio Ambiente que possibilita a avaliação da legalidade dos usos atuantes, as
inadequações desses usos e, a recomendação de ações futuras no sentido do ordenamento do
território.
Dentro da definição de planejamento ambiental, Santos (2004) nos chama atenção para o
fato de que é necessário a compreensão dos processos de síntese da apresentação das disciplinas que
levem em consideração os possíveis temas, esses temas se referem a uma determinada matéria que
contém conceitos e métodos particulares. Na ciência Geográfica os temas mais utilizados para a
realização da análise ambiental são a Climatologia, Geomorfologia, Hidrogeologia e o Uso e
Ocupação, justamente porque revela a face metodológica da própria ciência – quer dizer; a
discussão metodológica que envolve a relação homem-natureza dentro de um processo de conexão
e interconexão dos fatores ecológicos e fatores antrópicos, sobressaindo à análise geossistêmica e
Ecodinâmica que tornam a ciência eficaz para a realização de tais estudos. Os princípios do
planejamento estão atrelados sempre à questão espacial, pois incide na execução de determinada
implementação de atividade no território, sendo constituída de processos que refletem nas
características, funcionamento e dinâmica das organizações espaciais. (CHRISTOFOLETTI, 2003,
p. 417-418).
Após o planejamento ambiental tem-se início a realização da Análise ambiental, nessa fase
o pressuposto básico consiste na identificação, classificação e espacialização das paisagens, sempre
atrelada ao conceito de geossistemas, pode-se então organizar os geossistemas em quatro categoria
à saber: Geossistema Natural, Sistema Sócio-cultural, Sistema Sócio-cultural Natural e Sistema
Antropoecológico (CAVALCANTI, RODRIGUEZ, 1997, p. 21-26). Partindo da integração entre
teoria ecológica e a própria análise ambiental, Fowler e Aguiar (1995) demonstram, que é
necessário partir da inclusão dos atributos de ecossistema (função), comunidades (estrutura e
organização), população (dinâmica e estrutura) e indivíduos (saúde) para se alcançar a eficiência da
análise ambiental. Uma das maiores dificuldades de se estabelecer uma “ideal” análise ambiental é
a disponibilidade de recursos técnicos e operacionais para a realização de tal empreitada, visto que,
muito das vezes, isso esbarra no aporte de capital financeiro, pois os custos financeiros de uma
Fórum Internacional do Meio Ambiente - A conferência da Terra 454

imagens de satélite de alta resolução requer elevada soma de capital, além de que torna-se
necessário conhecer as principais técnicas (Software) de composição e interpretação dessas imagens
e a adoção da escala cartográfica.
O importante é levar em conta os objetivos da análise ambiental, bem como respeitar as
limitações metodológica dos membros da equipe, já que a análise ambiental assim como o
planejamento ambiental requer uma equipe interdisciplinar, juntamente com os objetivos bem
delimitados será possível se chegar a uma visão integrada de todos os elementos constituidores do
sistema natural que se quer analisar. Outro ponto chave dentro do planejamento e da análise
ambiental é a gestão ambiental, muito se fala em gestão racional dos recursos naturais, mas pouco
se sabe sobre o real significado de uma gestão, a começar pelo a acepção do termo Gestão, essa
perspectiva é de suma importância para o entendimento das políticas públicas executadas pelo
Estado.
O Estado é sem dúvida o maior e o mais importante elemento social responsável em
ordenar o território, o gerenciamento ambiental tem a característica de ser uma atividade voltada a
formular os princípios e as diretrizes, além da estruturação de sistemas gerenciais e tomadas de
decisões com o objetivo de promover, de forma coordenada, o uso, proteção, conservação e
monitoramentos dos recursos naturais e sócioeconômicos em um determinado espaço geográfico.
(IBAMA, 1995). O gerenciamento se torna bastante complexo no instante que envolve conceitos de
gestão, território, ordenamento e espaço construído pelo homem, esses conceitos estão sempre
conjugados com as políticas públicas, da qual dão suporte as diversas políticas estatais.
No caso brasileiro, e em especial nas regiões Amazônica e Nordeste, as políticas públicas,
de acordo com (Cunha; Coelho, 2003), foram divididas em políticas estruturadoras, políticas
indutoras, levando em consideração o contexto nacional e internacional, bem como os principais
atores e escala de atuação profissional.
A observação do quadro abaixo é a maior prova de que o planejamento no Brasil vem se
modificando com o passar dos anos, isso não acontece de forma gratuita, já que as políticas
ambientais internacionais constituem-se em uma ordem ambiental, bem orquestrada pelos países
desenvolvidos, de outra maneira o Brasil, país signatários em vários acordos multinacionais,
procurou se adequar nessa nova forma de conduzir as políticas estatais. Isso reflete de forma
significativa na forma de como se fez e, agora, se faz planejamento, nessa perspectiva o
planejamento se metamorfoseia a partir de sua adjetivação, respondendo as análises econômicas,
estratégicas, setoriais, sistêmicas e atualmente se reveste de ambiental, onde a maior expressão do
planejamento ambiental se materializa nos estudos de impactos ambientais (IEA) e nos relatórios de
impactos ambientais (RIMA).

Planejamento Ambiental na Região Norte: apontamentos para uma análise Geossistêmica no


Município Serrano de Tianguá (MST) e o Município do Vale do Acaraú (MVA) Sobral no estado
do Ceará.
Em relação ao Município de Tianguá, podemos destacar que esse município nos seus
primórdios já despontava como entreposto comercial e fornecedor de produtos agrícolas, os estudos
do IBGE (1959) apontavam como uma área de diversos brejos e de população numerosa, da qual se
conhece registros de 1877, período de flagelo na superfície sertaneja. Nos anos de 1959 a principal
atividade econômica é a agricultura, cultivando-se em grande escala a cana-de-açúcar, que era
transformada em rapadura e aguardente, seguida de café, batata-inglesa, milho, banana, manga,
abacate, mandioca. Sendo que atualmente a atividade de hortifrutigranjeira é a que vem se
destacando.
Tianguá é o principal município exportador desse produto para os estados do Piauí e Pará,
bem como é responsável pelo abastecimento local, pode-se dizer que atualmente o MST é auto-
suficiente em hortaliça. As principais interferências humanas no sistema natural do MST referem-se
às práticas de desfloresta no topo da serra, esse ambiente se caracteriza por uma região erosiva,
visto que a retira de grandes parcelas da vegetação prova uma disfunção nesse sistema, ou seja, é
Fórum Internacional do Meio Ambiente - A conferência da Terra 455

causador de grandes formações de voçorocas, ocasionando perda de solos férteis, bem como a
fragmentação, descaracterização e diminuição da biodiversidade.
As conseqüências da ação predatória, da sociedade humana, sobre as áreas de vertentes,
têm repercussões nos micro e meso-clima, bem como na configuração topográfica e geomorfológica
da área – é provável que as diminuições, correntes, dos índices de precipitações que vem sendo
registradas pela Fundação Cearense de Meteorologia (FUNCEME – Médias Históricas de
Pluviometria de 1974 à 2007), sejam conseqüências do processo contínuo de desflorestamento
dessa área. Nos sistemas naturais das planícies fluviais e aluviais encontramos “novas” perturbações
antrópicas provocados pelo uso e ocupação intenso, conseqüência do adensamento populacional que
é um dos mais expressivos do estado do Ceará, levando em considerações essas características, por
exemplo, temos Fortaleza e Caucaia na região metropolitana, Juazeiro e Crato no sul do estado e
especificamente na bacia hidrográfica do Rio Acaraú temos Sobral com um contingente
populacional de 155, 276 e Acaraú 48, 968. Podemos concluir de forma geral que a pressão
ecológica exercida nesses ambientes tendem a ultrapassar a capacidade de suporte dos mesmos.
Dentre os municípios do Vale do Rio Acaraú (MVRA) encontramos o Município de
Sobral, dotado de um mosaico paisagístico de inestimável valor cênico e científico. Caracterizado
em sua grande extensão pela superfície sertaneja, seguido por ambientes fluviais e lacustres, as
variações altimétricas ficam entre 200 a 700 metros, ainda, caracteriza-se por um clima Tropical
Quente Semi-Árido e Tropical Quente Semi-Árido Brando, com médias pluviométricas anuais de
821 milímetros, a temperatura oscila entre 260 C à 280 C. Esses sistemas ambientais se configuram
bastante modificados, guardando, em pequenos pontos, algumas características pretéritas. O
Município de Sobral localiza-se na mesoregião administrativa do noroeste do estado do Ceará,
fazendo limites ao norte com os municípios de Miraíma, Santana do Acaraú, Massapê, Meruoca,
Alcântaras e Acaraú, ao norte faz fronteira com os municípios de Cariré, Groaíras, Forquilha, Santa
Quitéria e Canindé, a leste e a oeste têm-se respectivamente municípios limítrofes, Canindé,
Irauçuba, Miraíma, Coreaú e Mucambo. O fato de alguns municípios se repetirem nos limites
municipais decorre do traço geográfico do qual Sobral se encontra, formando a figura de duas asas
horizontalmente dispostos. A economia sobralense se assenta no tripé indústria, serviço,
agropecuária. A indústria nesse município sempre teve características grandiosas, relato histórico
(IBGE, 1959), mostra que no fim dos anos de 1950 a indústria possuía admirável desenvolvimento
industrial. A história econômica do município vem se metamorfoseando, justamente porque no
século XVIII se caracterizava pela produção de carne-de-sol, exportação de tecidos, louças,
ferragens, bebidas, farinha de trigo, manteiga, arroz, farinha de mandioca, fósforos, couros, pele,
medicamentos, madeira beneficiada, peças e acessórios para automóveis, lâmpadas e outros tipos de
material elétrico, máquinas, artigos de armarinho e de adorno, calçados, combustíveis, etc. e nos
dias atuais os principais produtos exportados de Sobral, são os Calçados produzidos pela Grendene,
refrigerante e cimento. (IBGE, 1959, CPRM, 1998). Destaca-se como um dos maiores impactos
ambientais registrados no MVRA de Sobral o aterramento da Lagoa da Fazenda (Planície
Flúviolacustre), a fragmentação/ diminuição da biodiversidade é conseqüência das sucessivas
retiradas da mata ciliar que bordeja a franga fluviolacustre dessa unidade geoambiental.
As obras de urbanização do bairro Betânia, onde encontra-se localizada parte da Lagoa da
Fazenda sofreu processo de terraplanagem, esse impacto “positivo” provocou mudanças no regime
hidro-sedimentológico dos sistemas fluviolacustres, como conseqüência tem-se a
impermeabilização do solo, bem como a fragmentação da biodiversidade.
De posse dos dados referentes ao índice de desenvolvimento humano (IDH) e instalação de
esgotamento sanitário pode-se ter uma visão, parcial, do estado do sistema antroecológico. De
acordo com IPECE (2004, 2006) Sobral tem um IDH de 0, 698 que, caracteriza-se como um
município de médio índice de desenvolvimento humano, ocupando a 7ª posição no ranking
estadual, em relação ao dados de esgotamentos sanitário o IPECE (2006), tratou de forma global
esses dados, Sobral aparece com um percentual de 20% à 40% de área coberta, dentro de um
panorama geral, pode-se concluir que o município precisa com urgência reestruturar sua malha-
técnica urbana.
Fórum Internacional do Meio Ambiente - A conferência da Terra 456

Dentro das potencialidades de Sobral pode-se destacar na área de maior adensamento


populacional o Corredor Cultural77, ponta de lança de expansão da atividade turística, no ramo de
turismo cultural e religioso. Hoje o município mostra-se estruturado para receber eventos de
pequeno e médio porte, podendo se consolidar como município que desenvolve turismo científico e
de eventos. Os distritos que compõe o MVRA de Sobral, Aprazível, Aracatiaçu, Bonfim, Caioca,
Caracará, Jaibaras, Jordão, Rafael Arruda, Patos, Patriarca, São José do Torto, Taperuaba, guardam
incríveis “laboratórios à céu aberto”, pois encontram-se em sistemas naturais do tipo superfície
sertaneja, maciços residuais, planícies fluviais, lacustre e áreas aluvionares, com grande
potencialidade de estudos biogeográficos, paleogeográficos, históricos, biológicos,
geomorfológicos, enfim, uma variedade de áreas propicias ao desenvolvimento da metodologia do
planejamento ambiental, visando a melhoria das condições socioespaciais. (entende-se ambiente e
sociedade).

CONSIDERAÇÕES FINAIS
Como proposta de futuras pesquisas indica-se os seguintes temas gerais, eles devem ser
executados à luz da teoria e da metodologia dos estudos da paisagem, visto que se adaptam com
grande facilidade aos sistemas naturais, com características de paisagem furta-cor, da qual a região
norte apresenta.
A compartimentação geoambiental dos municípios aqui destacados, levando em conta as
questões zonais e azonais; 02) Estudos hidrogeomorfológicos, reparando os estudos de balanço
hídrico a fim de identifica as normais e as médias termopluviométricas; O levantamento
pedofitológico – focalizando os estudos biogeográficos e a dinâmicas dos solos e sua influência na
agricultura; 03) Os estudos tectogênicos no setor urbanos – pontuando os aterramentos das lagoas e
pequenas faixas das planícies fluviais; 04) Potencialidades e limitações nas unidades geoambientais
encontradas nos municípios.
Diante de todo o exposto, uma filigrana de outras ações precisa ser realizada dentro da
Universidade Estadual Vale do Acaraú, com objetivo de estruturar melhor, principalmente,
laboratórios de solo e de análise de água, bem como de adoção de computadores com capacidade de
processamento de imagens e software de sistemas de informações geográficas, os famosos SIG. A
construção de bases climatológicas de forma mais efetivas seria um passo importante para o
conhecimento rumo a caracterização dos micros climas locais, bem como execução de
monitoramento das mudanças meso e micro climáticas com objetivo de subsidiar as atividades
agrícolas entre outras atividades. Podemos afirmar que os estudos de caráter geoambientais ainda
caminham para a sua consolidação, visto que a carência de material cartográfico e de um maior
número de bolsas em instituições de pesquisa se configura como fatores negativos que em médio
prazo podem trazer grandes avanços nos estudos das análises ambientais, o resultado será uma base
técnico-científica à tomada de decisões políticas rumo a uma efetiva gestão dos recursos naturais.

REFERÊNCIAS BIBLIOGRÁFICAS
ACSELRAD. H. Justiça Ambiental: narrativas de resistência ao risco social ampliado. In: (org.)
FERRARO Jr. Luiz Antonio. Encontro e Caminhos: Formação de Educadoras(es) Ambientais e
Coletivos educadores. MMA, Brasília, Diretoria de Educação Ambiental, 2005.
ALMEIDA. P. R. A experiência brasileira em planejamento econômico: uma síntese histórica, s/l,
2004
BECKER. B. K.; MIRANDA. M. (Org’s). A Geografia Política do Desenvolvimento Sustentável.
Rio de Janeiro, Editora da UFRJ, 1997.
CAVALCANTI. A. P. B., J. M. M RODRIGUEZ. O meio ambiente: histórico e contextualização.
In: Desenvolvimento Sustentável e Planejamento. (Org.). CAVALCANTI. A. P. B. Fortaleza,
Impressa Universitária, 1997.

77
Área urbana que concentra os prédios tombados pelo instituto de patrimônio arquitetônico (IPHAN), nessa área têm-
se a Casa de Cultura de Sobral, Museu Dom José, a Casa do Capitão-Mor, o prédio da Assembléia Legislativa (antiga
casa penitenciária), Igreja da Sé, Teatro São José, etc.
Fórum Internacional do Meio Ambiente - A conferência da Terra 457

CHRISTOFOLETTI. A. Aplicabilidade do conhecimento geomorfológico nos projetos de


planejamento. In: Geomorfologia: uma atualização de bases e conceitos. (Orgs) GUERRA. A. J. T.
e CUNHA. S. B. 5ª. Ed. Rio de Janeiro. Bertrand Brasil, 2003.
CUNHA. L. H., COELHO. M. C. Política e Gestão Ambiental. In: GUERRA. A. J. T.; CUNHA. S.
B. (Org’s). A Questão Ambiental: Diferentes Abordagens. Rio de Janeiro, Bertrand Brasil, 2003.
CPRM. Atlas dos Recursos Hídricos Subterrâneos do Ceará. Ministério de Minas e Energia,
Diretoria de Hidrologia e Gestão Territorial, CD Room, Fortaleza, 2000.
DREW. D. Processos interativos homem-meio ambiente, 6ª. Ed., Bertrand Brasil, Rio de Janeiro de
2005.
FOWLER. H. G., AGUIAR. A. M. D. A integração da Teoria Ecológica na análise ambiental. In:
Análise Ambiental: uma visão multidisciplinar. (Org) TAUK-TORNISIELO. S. M., Gobbi,
FOWLER. H. G. 2ª. Ed., São Paulo, Editora da Universidade Estadual Paulista, 1995.
GONÇALVES. C. W. P. Os (des) caminhos do meio ambiente, São Paulo, Contexto, 1989.
______. Demanda de instrumento de gestão ambiental: zoneamento ambiental. Brasília,
MMA/IBAMA, 1997.
______. Gerenciamento de Bacias Hidrográficas: Aspectos conceituais e metodológicos. Brasília,
MMA/IBAMA, 1995.
IBGE. Enciclopédia dos Municípios Brasileiros. (Org.) Jurandyr Pires Ferreira. S/L, 1959.
______. Censo Demográfico de 2000: resultados preliminares. IBGE, Rio de Janeiro, 2000.
IPECE. Perfil Básico Municipal. Governo do Estado do Ceará - Secretaria de Planejamento e
Coordenação, Fortaleza, 2004.
______. Ceará em números. Instituto de Pesquisa e estratégia Econômica do Ceará, Fortaleza,
2006.
MOREIRA. R. Realidade e metafísica nas estruturas geográficas contemporânea. In:
Redescobrindo o Brasil: 500 anos depois. (Orgs). CASTRO. I. E, MIRANDA. M., EGLER. C. A.
G. 2ª. Ed., Rio de Janeiro, Bertrand Brasil. FAPERJ, 2000.
______. A insensível natureza sensível. In: MOREIRA. R. Para onde Vai o pensamento
geográfico?: Por uma epistemologia crítica. São Paulo, Contexto, 2006.
RIBEIRO. W. C. A ordem ambiental internacional, São Paulo, Contexto, 2005.
RODRIGUEZ. J. M. M. Planejamento Ambiental: bases conceituais, níveis e métodos. In:
Desenvolvimento Sustentável e Planejamento. (Org.). CAVALCANTI. A. P. B. Fortaleza, Impressa
Universitária, 1997.
SANTOS. R. F. Planejamento ambiental: teoria e prática. São Paulo, Oficina de Texto, 2004.
SOTCHAVA. V. B. The study geosystems. In: Reports of Institute of Geography of Siberia and the
fay Eeast, special issue for the. XXIII Internacional Geographical Congress, n 51, p. 3-40, Irkutsk
(trad. De Carlos A. F. Monteiro e Dora de A. Romariz). Texto Básico, distribuição interna, USP-
FFLCH-DEGEO-PPGEO, São Paulo, 1977.
TRICART. J. Ecodinâmica. IBGE, Diretoria Técnica, SUPREN, Rio de Janeiro, 1977.
Fórum Internacional do Meio Ambiente - A conferência da Terra 458

DIAGNÓSTICO DA RESERVA LEGAL FLORESTAL DO ASSENTAMENTO NOVO


MUNDO, NO MUNICÍPIO DE CAMALAÚ - PB

Sílvio de Miranda Galvão Velôso


UFPB - velosojpa@gmail.com
Paulo Roberto de Oliveira Rosa
UFPB – paulorosa_ufpb@hotmail.com
Maria Barros José Vicente de Barros
COPAM – laecogeo@yahoo.com.br

RESUMO
As florestas brasileiras vêm sendo devastadas de forma intensa desde o início da
colonização. Um meio de diminuir essa degradação se faz através da legislação, dentre as quais
destaca-se a lei nº 4.771 de 15.09.1965 que institui o Código Florestal Brasileiro que entre outras
ações prevê a manutenção de áreas de reserva legal em propriedades. O objetivo desse trabalho foi
diagnosticar as áreas de reserva legal do assentamento Novo Mundo no município de Camalaú-PB.
Para tanto foram realizadas visitas ao assentamento quando pode-se observar as áreas de reserva
legal definidas para a área. Na oportunidade foram feitas coletas de pontos com o GPS onde
detectou-se situações interessantes de serem registradas com a máquina fotográfica. Verificou-se
que apesar do assentamento estar em conformidade com o Código Florestal, ações antrópicas tem
provocado o desflorestamento irregular das reservas, afetando o equilíbrio dinâmico da paisagem do
município, pondo em risco a preservação da biodiversidade do ecossistema local. Sugere-se, por
fim, a utilização dos recursos econômicos florísticos da reserva legal, através de plano de manejo
sustentável da caatinga, além de cultivo da espécie florestal Jurema Preta nos lotes individuais dos
assentados.
Palavras-chave: reserva legal, fragmento, degradação, manejo.

ABSTRACT
The Brazilian forests are being devastated so intense from the beginning of colonization.
One way to reduce this degradation is through legislation, among which there is a law No. 4,771,
15.09.1965 establishing the Brazilian Forest Code which among other actions provides for the
continuation of areas of legal reserve in properties. The objective of this work was diagnosing the
areas of legal reserve of the New World settlement in the municipality of Camalaú-PB. For both
visits were made to the settlement we could see the areas of legal reserve established for the area.
On the occasion were collections of points with GPS where it was detected interesting situations to
be registered with the camera. It was found that despite the settlement comply with the Forestry
Code, human actions have caused the deforestation of irregular reserves, affecting the dynamic
balance of the landscape of the municipality, putting at risk the conservation of biodiversity of the
local ecosystem. It is suggested, finally, the use of economic resources floristic the legal reserve,
through sustainable management plan for the caatinga, and cultivation of the species forest Jurema
Preta in lots of individual settlers.
Keywords: legal reserve, fragment, degradation, management.

INTRODUÇÃO
Desde o início da colonização das Américas, os recursos florestais destes continentes têm
sido extraídos continuamente de forma degradante. O litoral brasileiro teve sua cobertura vegetal,
praticamente, toda suprimida, restando, hoje, alguns resquícios de Mata Atlântica. O interior do país
também tornou-se alvo das ações de desmatamento.O Estado da Paraíba que tem,
aproximadamente, 70% de seu território constituído pela área do semi-árido, onde predomina a
vegetação de caatinga também não fugiu às ações de desmatamentos. Para entender-se os
fenômenos que modificam a configuração de uma paisagem é necessário levar-se em conta as inter-
relações dos seus vários elementos componentes, portanto, a ação que a atmosfera impõe aos
Fórum Internacional do Meio Ambiente - A conferência da Terra 459

elementos geológicos, conjugados com os demais elementos de natureza abiótica, da fauna, da flora
e intervenções humanas contribuem, de forma significativa, para a sua formação.
A preocupação mundial com a necessidade de uso sustentável dos recursos naturais tem
mobilizado a comunidade internacional no sentido de criar acordos que viabilizem o
desenvolvimento econômico e social sustentável nos vários países. Nesse sentido, a legislação
brasileira, para assegurar a sobrevivência da biodiversidade da fauna e da flora, além de proteger
locais históricos, culturais e de beleza cênica, determinou a criação de áreas protegidas. As áreas
protegidas públicas são regidas pela Lei 9.985, de 18 de agosto de 2000 que trata do Sistema
Nacional de Unidades de Conservação – SNUC.
As áreas privadas são regidas pela Lei nº 4.771, de 15/09/1965 que estabelece o Código
Florestal Brasileiro, o qual define que florestas e demais formas de vegetação sobre o território
nacional são bens de interesse comum dos habitantes do país, ressalvando limites sobre o direito de
propriedade. É comum no Brasil, em grandes propriedades, o não atendimento à legislação
ambiental, no que concerne às áreas de preservação permanente e reserva legal, sendo comum o
argumento dado pelos proprietários de pequenos imóveis rurais, de que suas terras são insuficientes
para terem que “deixar de usar alguma parcela das mesmas”. Fato semelhante ocorre em
assentamentos humanos de reforma agrária. O objetivo desse trabalho foi diagnosticar a área de
reserva legal do assentamento Novo Mundo no município de Camalaú-PB.
O município de Camalaú, localizado na Microrregião do Cariri Ocidental paraibano,
Mesorregião da Borborema, com população de 5.516 pessoas (IBGE, 2000), está a 331 quilômetros
da Capital João Pessoa, com área territorial de 60.300 hectares, representando 1,0685 % do
território do Estado da Paraíba, com altitude de 521 metros, temperatura média anual de 25º C,
precipitação pluviométrica média anual de 665 m.
O Assentamento foi criado a partir de reivindicação de trabalhadores rurais do município
de Camalaú, em uma área, antes denominada fazenda Floresta, parte integrante da empresa Tamoio
Frigorífico Reunidos S/A, então propriedade de José Inácio da Silva, que inicialmente foi instituída
para a produção de farelo de Algaroba e pecuária, nos idos dos anos de 1972.
Com uma área de 1.722 hectares, o assentamento Novo Mundo teve 464 hectares
destinados para compor a área florestada de reserva legal, em atendimento ao que prevê o artigo 16
do Código Florestal, Lei nº 4.771 de 15 de setembro de 1965. A área de reserva legal corresponde a
25,8% do total do imóvel.

METODOLOGIA
Inicialmente foi realizado um levantamento bibliográfico, consulta aos arquivos da
Superintendência do Instituto Nacional de Colonização e Reforma Agrária – INCRA, no Estado da
Paraíba e verificações em campo.
A partir do levantamento de informações preliminares colhidas no Incra e em gabinete,
foram realizadas duas expedições ao assentamento Novo Mundo. Na oportunidade contatou-se o
presidente da associação que abriga os assentados, o qual nos acompanhou na visita às áreas de
reserva legal do assentamento.
As estradas que levam às áreas da reserva estão em bom estado, o que nos permitiu ir até o
seu interior, depois seguimos por trilhas para chegar aos locais onde estavam os indícios mais fortes
de degradação. Foram visitados dois fragmentos florestais constituintes da reserva legal, onde foram
identificadas em seu interior algumas situações merecedoras de registros. Para tanto utilizou-se
aparelho de GPS de navegação, modelo Garmim III e máquina fotográfica digital, tendo em vista a
coleta das coordenadas geográficas dos pontos e o registro fotográfico dos indícios de degradação.

RESULTADOS E DISCUSSÕES
A reserva legal do assentamento Novo Mundo, está estabelecida em três grandes áreas, no
entanto nos preocupamos em fazer uma excursão a apenas duas das três áreas, haja vista não apenas
o custo, mas também a disponibilidade de tempo para trabalhos desse gênero.
Fórum Internacional do Meio Ambiente - A conferência da Terra 460

No primeiro fragmento averiguou-se as condições em que se encontra a reserva legal, no


que diz respeito à degradação ambiental e logo foi possível localizar-se os primeiros sinais que
caracterizam o uso indevido e ilegal, decorrentes de ações antrópicas degradadoras no local.
Localizou-se um indivíduo arbóreo conhecido regionalmente com Umburana, o qual não estava
totalmente cortado, porém com marcas de instrumento cortante no caule (machado ou foice) há,
aproximadamente, 30 cm do solo (FIG 01). Não foi possível saber-se o motivo pelo qual o
indivíduo degradador deixou de finalizar o corte total da árvore, porém esse ato demonstra a falta de
preocupação e responsabilidade com que está sendo feita a retirada da cobertura vegetal da reserva
legal, pelos infratores.
Embora a existência de estradas em áreas de reserva legal não seja permitida verificou-se a
existência de uma estrada carroçável cortando a reserva legal a qual já existia anteriormente na
então fazenda Floresta. . Na margem da estrada, adentrando-se até a mesma, há ocorrência de
processo erosivo em estágio bem avançado, com formação de ravinamentos. A degradação ali
existente é decorrente da denudação do solo, o qual, ao ficar exposto, sem sua cobertura vegetal
original, que servia de proteção natural, passou a sofrer processo de erosão regressiva, com
formação de ravinas (FIG 02). Estando o solo exposto, quando a carga de águas pluviais ocorre com
muita intensidade há formação de enxurradas onde, em conseqüência das torrentes favorecidas pela
inclinação do relevo, a erodibilidade é maior.

Figura 01 – Umburana com ferimento Figura 02 – Estrada com erosão formando


provocado por machado. Foto: Sílvio Velôso, ravinamento dentro da reserva legal. Foto:
Data: 29/08/2007 Maria Barros, Data: 29/08/2007

No interior da reserva legal algumas clareiras provenientes de ações antrópicas,


evidenciam os danos ambientais que vêm sendo causados no local. As clareiras apresentam vários
tocos de indivíduos arbóreos e arbustivos que foram suprimidos com a possível finalidade de
produção de estacas, lenha e carvão (FIG 03 e 04). Identificou-se entre os restos dos indivíduos
florestais suprimidos, as espécies conhecidas popularmente como algaroba, jurema, marmeleiro,
faveleira, angico, umburana, entre outras.
Fórum Internacional do Meio Ambiente - A conferência da Terra 461

Figura 03 – Material abandonado após retirada Figura 04 – Clareira aberta pela retirada da
de estaca. Foto: Maria Barros, Data: vegetação. Foto: Maria Barros. Data:
29/08/2007. 29/08/2007.

O segundo fragmento de reserva legal está localizado à margem esquerda do açude do


Estado, em posição intercalar entre este e o assentamento Beira Rio. Seu modelado topográfico é
um serrote com vertentes íngremes nas duas faces. O solo é coberto por fragmentos de rochas
graníticas e gnáissicas, apresentando também afloramentos rochosos espaçados. A cobertura vegetal
é composta por populações de indivíduos da flora local, de espécies conhecidas como catingueira,
jurema de imbiras, pereiro, pau-ferro, marmeleiro, aroeira, angico, umburana, umbuzeiro, feijão-
bravo, facheiro, imbiratanha, coroa-de-frade, palmatória, xique-xique, maniçoba, urtiga, entre
outros. Neste local foram encontrados vários indícios de degradação recentes (FIG 05 e 06) e por
isso resolveu-se fazer um levantamento censitário da vegetação suprimida. Em uma poligonal de
aproximadamente 100 metros quadrados, contou-se 24 indivíduos de espécies arbóreo-arbustivas
suprimidos, o que nos permite um cálculo de densidade vegetacional de 1 indivíduo arbóreo-
arbustivo por 4,16 metros quadrados.

Figura 05 – Estacas cortadas e deixadas no Figura 06 – Resquício da supressão.


local. Foto – Maria Barros. Data 24/09/2007.
Foto – Maria Barros. Data 24/09/2007.

No limite da reserva legal com o assentamento Beira Rio, há uma cerca recém construída,
tendo em sua margem na reserva legal, vários resquícios de indivíduos arbustivos suprimidos, o que
nos leva a crer que as estacas foram retiradas daquele local (FIG 07). Aparentemente, a madeira
retirada das áreas de reserva legal, a partir da supressão da vegetação nativa, é transformada em
estacas para construção de cercas ou lenha comercializada para alimentar os fornos de indústrias de
cerâmicas, padarias e indústrias de calcário instaladas pela região. Parte da vegetação suprimida é
Fórum Internacional do Meio Ambiente - A conferência da Terra 462

também transformada em carvão, produzidos em caieiras, tipos de fornos escavados no chão ou


tipos “rabo quente” (FIG 08), construídos no próprio local onde ocorre o desmatamento clandestino.
A supressão da vegetação de Caatinga tem ocorrido com intuito de comercializar estacas
para cercas, lenha ou carvão, assim como cultivar os solos agricultáveis. Nesse sentido ao desnudar
o solo, eleva-se o albedo e a carga de energia solar sobre o mesmo, aumentando sua temperatura,
contribuindo para a alteração de sua umidade, favorecendo a permanência de uma fauna mais
resistente à seca. Uma leve carga de pressão, exercida sobre um determinado ponto de um sistema,
pode provocar alterações em todo sistema, devido a esse ponto significar um elo mais frágil na
corrente de causa e efeito.

Figura 07 –Cerca construída com estacas de Figura 08 – Forno tipo rabo quente.
reserva Foto: Sílvio Velôso Data: 29/08/2007
Foto: Sílvio Velôso. Data: 29/08/2007

Segundo dados do IBGE, entre os anos de 1990 e 1992, o município de Camalaú obteve
produção rural extrativista média de 125 toneladas/ano de carvão vegetal. Entre 1993 e 1995, a
média baixou para 98 toneladas/ano. Já os anos de 1995 e 1996, houve um elevado acréscimo na
produção de carvão, atingindo a média de 177 toneladas/ano. Nos quatro anos seguintes, de 1997 a
2001, a média foi de 36 toneladas/ano. No entanto, de 2002 a 2005, a produção de carvão atingiu
seus níveis mais baixos, desde 1990, apresentando uma média anual de 17 toneladas (Quadro 01).
Essa oscilação que pode ser visualizada na figura 09, ocorreu nos quinze anos pesquisados pelo
IBGE, com uma queda bem acentuada, a partir do ano de 1998, o pode indicar os resultados da
atuação fiscalizadora ou educadora dos órgãos ambientais. No entanto, é possível que tenha havido
uma diminuição da oferta dos recursos florestais, decorrentes da carga de pressão das ações
antrópicas, as quais podem ter sido superiores à capacidade de reposição natural da caatinga.
Fórum Internacional do Meio Ambiente - A conferência da Terra 463

Quadro 01 - com dados da produção de carvão vegetal no município de Camalaú entre os anos de
1990 e 2005

Ano Toneladas
1990 122
1991 128
1992 125
1993 113
1994 90
1995 92
1996 175
1997 179
1998 40
1999 37
2000 34
2001 33
2002 17
2003 17
2004 18
2005 17
Fonte: IBGE

Produção de Carvão
180

160

140

120
Toneladas

100
Toneladas
80

60

40

20

0
1990 1991 1992 1993 1994 1995 1996 1997 1998 1999 2000 2001 2002 2003 2004 2005

Ano

Figura 09 – Gráfico demonstrando a oscilação da produção de carvão.

A extração de lenha, em Camalaú apresenta evolução semelhante à de carvão vegetal,


atingindo quantidades maiores nos anos de 1996 e 1997, com 5405 metros cúbicos/ano,no entanto,
apesar de diminuir nos anos seguintes, os dados apontam para um crescimento da produção dessa
matriz energética (quadro 02, figura 10).
Fórum Internacional do Meio Ambiente - A conferência da Terra 464

Quadro 02 - Dados da produção de lenha no município de Camalaú entre os anos de 1990 e 2005.
Ano Metro cúbico
1990 264
1991 257
1992 248
1993 224
1994 150
1995 180
1996 5342
1997 5468
1998 1240
1999 1123
2000 1100
2001 1050
2002 892
2003 900
2004 1950
2005 2000
Fonte: IBGE

Produção de Lenha
5500
5000
4500
4000
M e tro c ú b ic o

3500
3000
2500 Metro cúbico

2000
1500
1000
500
0
1990 1991 1992 1993 1994 1995 1996 1997 1998 1999 2000 2001 2002 2003 2004 2005

Ano

A falta da adoção de critérios técnicos ambientalmente sustentáveis, no processo de


desmatamento para a comercialização ilegal dos produtos dele oriundos é a primeira etapa do
processo de degradação. O solo, após a retirada de sua cobertura vegetal nativa, passa a ser usado
com o cultivo de lavouras temporárias, normalmente sem serem observadas práticas
conservacionistas, como plantio em curvas de nível. A denudação do solo aumenta o albedo,
proporcionando a elevação da temperatura do solo e, conseqüentemente, a diminuição da umidade
relativa do ar, podendo alterar o mesoclima local e, conseqüentemente, desequilibrar o ecossistema,
ameaçando a sobrevivência e preservação da biodiversidade local do bioma Caatinga.
É comum ouvirmos de indivíduos, entre as comunidades assentadas no município, que há
desmatamento e comercialização irregular de estacas, lenha e carvão, por não terem alternativas
Fórum Internacional do Meio Ambiente - A conferência da Terra 465

econômicas de sobrevivência, principalmente no período de estiagem. A supressão de indivíduos


florestais arbóreos/arbustivos foi constatada no interior de um dos fragmentos florestais da reserva
legal, conforme registros fotográficos. Com a carga de pressão exercida pelas ações antrópicas
degradadoras, sobretudo o desmatamento irregular, há um risco de comprometimento da auto-
sustentabilidade da vegetação. Desta forma, as gerações futuras, descendentes das comunidades dos
assentados, poderão herdar um ambiente degradado, com grandes possibilidades de
irreversibilidade.
Em uma área desnudada, após a supressão da cobertura vegetal, o processo de
transferência de nutrientes minerais do solo para a fitomassa é reduzido, como também diminui o
volume de biomassa. A água que antes era utilizada pela cobertura vegetal, com o solo desnudo,
aumenta o potencial de lixiviação dos nutrientes no solo e o poder de erodibilidade superficial.
O desmatamento em uma área, ao favorecer um processo erosivo de alta intensidade, pode
desencadear um processo de alteração na geomorfologia, na hidrologia, nas características do solo
e, possivelmente, do clima do lugar. De acordo com o grau de fragilidade ou resistência de
determinado sistema, a intensidade da pressão exercida sobre ele, atinge o seu limiar de equilíbrio
dinâmico. Quando esse limiar é ultrapassado, se a intensidade da carga de pressão for muito grande,
não é permitido o restabelecimento do equilíbrio anterior, o sistema passa a ter um novo equilíbrio,
portanto é estabelecido um novo sistema.
O Código Florestal sendo aplicado possibilita a implantação, manutenção ou recuperação
das áreas de preservação permanente e reservas legais podendo viabilizar a implantação de um
planejamento da paisagem por microbacia ou por município, mantendo todos os fragmentos
interligados. Um planejamento assim, para um município, pode ser previsto na elaboração do plano
diretor do Município de Camalaú, com a participação de proprietários de terras, autoridades
públicas e Sociedade Civil Organizada.
Quaisquer alterações que possam ocorrer em um sistema, ou mesmo reações em cadeia,
podem ser conseqüência de uma ação de desflorestamento ou queimada que, isolada,
aparentemente, não apresenta risco. A tensão exercida pelo homem sobre as áreas de assentamento,
especificamente sobre as áreas de reserva legal, e o grau de sensibilidade desta, influenciam na
intensidade das mudanças sobre todo o ecossistema local. O sistema natural do Bioma Caatinga,
para aqueles pouco observadores, pode parecer estático, quando leva-se em consideração a escala
temporal humana, no entanto os sistemas alteram-se ao longo do tempo, e mantêm-se em equilíbrio
dinâmico.

CONSIDERAÇÕES FINAIS
A partir do estudo foi possível verificar que as áreas de reserva legal do assentamento
Novo Mundo estão sendo degradadas devido à retirada de madeira para várias finalidades. No
interior dos fragmentos de reserva legal está havendo desflorestamento irregular para consecução de
estacas, lenha e carvão, tendo em vista que o município de Camalaú e municípios da região
possuem uma forte demanda por estacas de cercas, carvão e lenha para as indústrias de panificação,
cerâmicas e cal.
A supressão indiscriminada da vegetação, elo mais frágil do ecossistema da reserva legal,
pode provocar a alteração do seu equilíbrio dinâmico, já estando ocorrendo processos de
ravinamento em áreas desnudadas, logo, as intervenções antrópicas feitas nos fragmentos estão
comprometendo a dinâmica da paisagem, pondo em risco o equilíbrio daqueles ecossistemas e
ameaçando a biodiversidade ali existente.
É possível o manejo racional, prevendo o futuro, ou seja, de acordo com a legislação,
utilizar-se a reserva legal em regime de manejo florestal sustentável. Sugere-se então, como
alternativa de aproveitamento econômico dos recursos florestais existentes na reserva legal do
assentamento Novo Mundo, que a comunidade de assentados, busque orientação junto à Emater,
Ibama, Sudema e outras entidades públicas ou não governamentais competentes, para viabilizar a
elaboração de um plano de manejo florestal sustentável da caatinga, bem como que criem parcerias
com esses órgãos e o município no intuito de que a utilização dos recursos econômicos naturais
Fórum Internacional do Meio Ambiente - A conferência da Terra 466

existentes nos fragmentos de reserva legal no assentamento Novo Mundo, possam fazer parte das
discussões sobre o planejamento econômico municipal.
Uma outra alternativa de exploração econômica que sugere-se é que sejam implantados
manejos florestais individuais com Jurema-preta (Mimosa tenuiflora), nos lotes individuais, que têm
seus territórios limítrofes com os dos fragmentos florestais da reserva legal no assentamento Novo
Mundo, tendo em vista que essa espécie de leguminosa lenhosa além de servir para produção de
estacas e mourões para cercas e na forma de carvão ou lenha para produção energética, suas folhas e
vagens são forrageiras e suas flores são melíferas.

REFERENCIAS BIBLIOGRAFICAS
AB´SÁBER, Aziz Nacib. O domínio morfoclimático semi-árido das caatingas brasileiras. 43,
Geomorfologia. USP, Instituto de Geografia. São Paulo, 1974.
BRASIL. Lei 4.771 de 15 de setembro de 1965. Estabelece o Código Florestal. Brasília, 1965.
BRASIL. Lei No 9.985, de 18 de julho de 2000. SNUC – Sistema Nacional de Unidades de
Conservação. Brasília, 2000.
BRASIL. Medida Provisória nº 2.166-67, de 24 de agosto de 2001. Altera Código Florestal.
Brasília, 2001.
COLE. J. P. Geografia Quantitativa. Ministério do Planejamento e Coordenação Geral. Rio de
Janeiro: Fundação IBGE, 1972.
DOLFUSS, Olivier. A análise geográfica. Coleção “Saber Atual”. Ed. Difusão Européia do Livro.
1973.
DOLFUSS, Olivier. O Espaço Geográfico. Coleção “Saber Atual”. Ed. DIFEL, 1975.
DREW, David. Processos Interativos Homem-Meio Ambiente. Tradução de SANTOS, João Alves
dos. Revisão de BASTOS, Suely. Coordenação editorial de CHRISTOFOLETTI Antonio. Difel,
1983.
GUERRA, Antônio José Teixeira. CUNHA, Sandra Baptista da. Organizadores. Avaliação e
Perícia Ambiental. Rio de Janeiro: Bertand Brasil, 1999.
GRIGG, David. Regiões, Modelos e Classes in CHORLEY/HAGGET. Modelos Integrados em
Geografia. Rio de Janeiro: Livros Técnicos e Científicos Editora S.A., 1974.
INCRA-PB. Instituto Nacional de Colonização e Reforma Agrária. Processo administrativo de
desapropriação da Fazenda Floresta. João Pessoa, 1998.
STRAHLER, Arthur N. STRAHLER, Alan H. Geografia Física. Tercera edición. Barcelona:
Ediciones Omega, S.A, 1989
TRICART, Jean. Paisagem e Ecologia. Inter-facies, Escritos e documentos. IBILCE, 1982.
VIANA, Virgílio M, PINHEIRO, Leandro A. F. Conservação da biodiversidade em fragmentos
florestais. ESALQ/SP. Série Técnica IPEF, v. 12, n. 32, p. 25-42, dez. 1998.
http://www.biosferadacaatinga.org.br/o_bioma_caatinga.htm. Acesso em 10/07/2007.
http://www.ibge.gov.br. Acesso em 05/07/2007
Fórum Internacional do Meio Ambiente - A conferência da Terra 467

PLANOS DE RECUPERAÇÃO DE ÁREAS DEGRADADAS (PRAD) NAS EMPRESAS


MINERADORAS DO MUNICÍPIO DE ITABUNA-BA

Kátia Guedes de AZEVEDO


Faculdade de Tecnologia e Ciências de Itabuna (Graduando em Engenharia Ambiental)
Marcus Vinicius Andrade RIBEIRO
Faculdade de Tecnologia e Ciências de Itabuna (Graduando em Engenharia Ambiental)
Fábio dos Santos MASSENA
Faculdade de Tecnologia e Ciências de Itabuna (Docente Engenharia Ambiental) – fabiomassena@gmail.com

RESUMO
A mineração é um dos setores básicos para a economia nacional, sendo indispensável para
o bem estar e a melhoria da qualidade de vida das presentes e futuras gerações, devendo fazer uso
da responsabilidade social e ambiental para o desenvolvimento de uma sociedade igualitária.
Segundo Farias (2002), o perfil do setor mineral brasileiro se caracteriza por 95% de pequenas e
médias empresas. Entretanto, a identificação de empreendimentos de pequeno porte é uma atividade
complexa devido ao grande número de empresas que produzem na informalidade, aliada a
paralisações freqüentes das atividades que distorcem as estatísticas. Os impactos causados pela
mineração, associados à competição pelo uso e ocupação do solo, geram conflitos sócio-ambientais
pela falta de metodologias de intervenção, que reconheçam a pluralidade dos interesses envolvidos.
Os conflitos gerados pela mineração, inclusive em várias regiões metropolitanas no Brasil, devido à
expansão desordenada e sem controle dos loteamentos nas áreas limítrofes, exigem uma constante
evolução na condução dessa atividade para evitar situações de impasse. O Plano de aproveitamento
econômico (PAE), o Plano de recuperação de áreas degradadas (PRAD) e o EIA/RIMA são
documentos técnicos exigidos para a obtenção da licença prévia, cuja tramitação é concomitante ao
do pedido de concessão de lavra. O PRAD discrimina de antemão as obras de recuperação da área
minerada a serem implementadas pelo empreendedor após o esgotamento do recurso mineral.
Palavras-chave: Mineração; PRAD; Gestão Ambiental

ABSTRACT
The mining is one of the basic sections for the national economy, being indispensable for
the health and the improvement of the quality of life of the presents and future generations, should
make use of the social and environmental responsibility for the development of an equalitarian
society. According to Farias (2002), the profile of the Brazilian mineral section it is characterized
by 95% of small and middle companies. However, the identification of companies of small size is a
complex activity due to the great number of companies that produce in the informality, allied to
frequent stoppages of the activities that distort the statistics. The impacts caused by the mining,
associated to the competition for the use and occupation of the soil, generate partner-environmental
conflicts for the lack of intervention methodologies that recognize the plurality of the involved
interests. The conflicts generated by the mining, besides in several metropolitan areas in Brazil, due
to the disordered expansion and without control of the divisions into lots in the bordering areas,
they demand a constant evolution in the transport of that activity to avoid impasse situations. The
Plan of Economical Use (PEU), the Plan of Recovery of Degraded Areas (PRDA) and EIA/RIMA
are technical documents demanded for the obtaining of the previous license, whose development is
concomitant to the of the request of plowing concession. PRAD discriminates the recovery works
beforehand the mined area to be implemented by the entrepreneur after the exhaustion of the
mineral resource.
Key words: Mining; PRAD; Environmental administration

INTRODUÇÃO
As atividades mineradoras se caracterizam como uma das maiores atividades degradadoras
do meio ambiente, chegando a transformar completamente a paisagem, e consequentemente,
provocando a perda da biodiversidade. Desde 1989, após a publicação do decreto 97.632, os
Fórum Internacional do Meio Ambiente - A conferência da Terra 468

empreendimentos que se destinam à exploração de recursos minerais deverão submeter à aprovação


do órgão ambiental competente, o plano de recuperação de área degradada.
O presente artigo visa apresentar a situação ambiental das indústrias mineradoras do
município de Itabuna, discutindo os meios pelos quais as mesmas elaboram planos de recuperação
de áreas degradadas (PRAD) para atender ao conceito de sustentabilidade e garantir as mesmas
oportunidades de uso às gerações futuras. Sendo assim, o artigo se propõe a suprir uma necessidade
de ampliar as informações já existentes sobre a situação atual das mineradoras e demonstrar a
necessidade da elaboração de planos de recuperação de áreas degradadas para as mineradoras.
O trabalho se justifica pela falta de estudos sobre a elaboração de PRAD pelas empresas
mineradoras que desenvolvem atividades de impacto na Mata Atlântica no entorno do município de
Itabuna. A análise será realizada partindo do global para o local, utilização de dados coletados na
internet, livros, manuais, pesquisa no site da Companhia Baiana de Produção Mineral (CBPM) e no
Departamento Nacional de Produção Mineral (DNPM), além de visitas às empresas mineradoras
Pedreira União e J. Macedo para entrevistas com os proprietários em busca de informações sobre
seu desempenho perante a responsabilidade ambiental e social.

ANÁLISE SOBRE RESPONSABILIDADE AMBIENTAL


Hoje em dia, não se pode ignorar que a discussão dos aspectos legais e éticos envolvidos
na relação do ser humano com o ambiente é de fundamental importância, mesmo porque o saber
ecológico é um saber de relações e de interações. É importante termos consciência sobre a
capacidade de carga do planeta Terra e da necessidade de refletirmos sobre nossas ações e
responsabilidades com o mundo natural.
A luta pela convivência equilibrada com o ambiente, não é somente responsabilidade de
alguns grupos preservacionistas, mas missão política, ética, e jurídica de todos os cidadãos que
tenham consciência da destruição que o ser humano está realizando, em nome da produtividade e do
progresso. Sendo assim, é necessária uma mudança de paradigma, de comportamento, uma
mudança ética. Não podemos desconsiderar os malefícios causados pelo atual modo de vida do ser
humano.
Conforme José Carlos Barbieri, o meio ambiente não existe como uma esfera desvinculada
das ações, ambições e necessidades humanas, e tentar defendê-lo sem levar em conta os problemas
humanos geraram à própria expressão meio ambiente uma conotação de ingenuidade em certos
círculos políticos. A preocupação com a proteção do meio ambiente e, por conseqüência, dos
recursos naturais, é recente na história da humanidade. A efetividade da tutela ambiental depende,
de início, da percepção da amplitude dos problemas ambientais.
A responsabilidade passou por diversos estágios, variando o critério para justificar o dever
de reparar: ora a culpa, ora o risco. A legislação especial consagra, a responsabilidade ambiental
como sendo objetiva. Com efeito, a Lei de Política Nacional do Meio Ambiente (Lei 6.938/81)
consagra a responsabilidade objetiva por danos ambientais. A respeito da expressão
responsabilidade, Sérgio Cavalieri Filho, traduz: em seu sentido etimológico, responsabilidade
exprime a idéia de obrigação, encargo, contraprestação. Em sentido jurídico, o vocábulo não foge
dessa idéia. Designa o dever que alguém tem de reparar o prejuízo decorrente da violação de um
outro dever jurídico. Em apertada síntese, a responsabilidade civil é um dever jurídico sucessivo
que surge para recompor o dano decorrente da violação de um dever jurídico originário.
Responsabilidade ex ante - O processo de autorização de uma atividade deve levar à
fixação de obrigações que garantam uma utilização lícita do ambiente e uma proporcional
compensação. Tem importante função preventiva, pois obriga, incentiva o poluidor a não produzir
danos. Deve-se condicionar a obtenção de ato autorizativo (licença) de uma atividade à observância
de determinadas obrigações dirigidas à reconstituição ou compensação. È de suma importância,
para essa responsabilização, o EIA e o RIMA. Deve ser suscitada a possibilidade de se falar em
responsabilidade penal pelo não atendimento das condições impostas durante o licenciamento, em
face do que dispõe o art. 68, Lei nº 9.605/98. Atende ao princípio da prevenção e da precaução.
Fórum Internacional do Meio Ambiente - A conferência da Terra 469

Responsabilidade ex post – é a tradicional, fundada na idéia da reparação de um dano já


concretizado, tem como fundamento principal os princípios do poluidor-pagador e do usuário-
pagador.

Atividade mineradora
De acordo com Paulo Nunes (2006), um dos princípios que regem a ordem econômica
brasileira é a defesa do meio ambiente (CF/88, art. 170, VI). O direito ambiental é o “conjunto de
normas que regem as relações do homem com o meio ambiente” William Freire (2000); o direito
minerário, ou direito mineiro, é o ramo da ciência jurídica destinado a regulamentar a atividade
mineradora. Levando–se em conta que a mineração é uma forma de atividade econômica, nada mais
natural do que condicionar sua prática à conservação do meio ambiente. Por conseguinte, os dois
ramos do direito - ambiental e minerário – na prática, é imprescindível que haja uma relação de
subordinação do segundo para com o primeiro.
Outro fator que merece ser observado na relação entre a mineração e o meio ambiente são
os impactos produzidos por essa atividade econômica. Dentre as definições apresentadas pela Lei
6.938/81, há duas que interessam: a degradação da qualidade ambiental e a poluição, previstas nos
incs. II e III do art. 3º, respectivamente.
A Lei da Política Nacional do Meio Ambiente (PNMA) considera a degradação da
qualidade ambiental “a alteração adversa das características do meio ambiente” e define a poluição
como uma forma específica de degradação da qualidade ambiental. A mineração é uma atividade
que pode provocar muitas formas de degradação ambiental, isolada ou conjuntamente. Tendo em
vista os danos provocados pela atividade mineradora, a CF/88, incluiu, no capítulo dedicado ao
meio ambiente, um dispositivo que prevê a obrigação daquele que explora recursos minerais de
recuperar o meio degradado (art.225, § 2º).
Segundo Nunes (2006), a mineração pode ser considerada, genericamente, a atividade de
extração de minerais que possuam valor econômico. Essa atividade foi vital para o desenvolvimento
da humanidade e ainda não perdeu sua importância, visto que a produção é totalmente dependente
da utilização de recursos minerais. Embora a mineração, em um primeiro momento tenha
contribuído para a evolução humana, pois propiciou a fabricação de utensílios e ferramentas
indispensáveis à sobrevivência do homem e ao desenvolvimento técnico-científico, posteriormente
se tornou uma atividade essencialmente exploracionista.
Sobre a regulamentação da mineração destaca-se o Departamento Nacional de Produção
Mineral (DNPM), autarquia vinculada ao Ministério de Minas e Energia (MME), cabendo a
promoção, planejamento, fomento, controle e fiscalização da atividade mineradora. As Normas
Regulamentadoras de Mineração (NRM) foram aprovadas pela Portaria 237 de 18.11.2001, do
DNPM. A recuperação total do meio ambiente é impossível e isto faz da mineração um mal
necessário, uma vez que somos totalmente dependentes de bens minerais. Portanto, cabe aos órgãos
de fiscalização ambiental e mineral adotar medidas que assegurem a reabilitação das áreas
degradadas.

Direito Ambiental
A proteção do meio ambiente interessa a quase todo o direito, a começar pelo Direito
Constitucional, que estabelece para a hipótese de lesão ao meio ambiente a sujeição a
conseqüências de ordem civil, penal e administrativa, conforme determina o art. 225, § 3º da
Constituição Federal: “As condutas e atividades consideradas lesivas ao meio ambiente sujeitarão
os infratores, pessoas físicas ou jurídicas a sanções penais e administrativas, independentemente da
obrigação de reparar os danos causados.”
Uma grande divisão do ambiente pode separar componentes naturais dos artificiais.
Quando o dano recai sobre os componentes naturais, muitos autores falam em “dano ao patrimônio
natural” ou “dano ecológico”. Conceito Sendim (2002), “dano ecológico seria a alteração causada
pelo homem das qualidades físicas, químicas ou biológicas dos elementos constitutivos do ambiente
ou das relações recíprocas entre eles”. No Brasil, são adotadas algumas técnicas de prevenção do
Fórum Internacional do Meio Ambiente - A conferência da Terra 470

dano ambiental, merecendo destaque a exigência constitucional de licenciamento ambiental para as


atividades potencialmente lesivas ao meio ambiente, bem como a exigência, também de ordem
constitucional, da realização de Estudo Prévio de Impacto Ambiental (EPIA). Sendo o dano
ambiental provocado pela mineração, irreversível, é fundamental uma atuação preventiva e
reparadora.
Os princípios da prevenção e da precaução estão relacionados ao princípio do poluidor
pagador, que impõe o dever do causador do dano ambiental de reparar esses danos. O princípio está
previsto na Constituição Federal, nos §§ 2º e 3º do art. 225. Sendo acolhido também na Lei de
Política Nacional do Meio Ambiente (Lei 6.938/81) conforme o art. 4º, inciso VII, e o art. 14.
Nesses termos não se pode deixar de mencionar que o princípio poluidor–pagador tem aspectos
repressivos e preventivos. O aspecto repressivo decorre da obrigação daquele que causa danos ao
meio ambiente em repará-los. Porém, a função preventiva deve ser visualizada, pois a obrigação de
reparar o dano não deixa de ser uma ameaça àquele que está inclinado a essa prática.
A responsabilização objetiva decorre do art. 14, § 1º, da Lei nº 6.938/81: Sem prejuízo das
penas administrativas previstas nos incisos do artigo, o poluidor é obrigado, independentemente da
culpa, a indenizar ou reparar os danos causados ao meio ambiental e a terceiro, afetados por sua
atividade. A constitucionalização é importante para que sejam evitadas tentativas de minimizar a
responsabilidade dos degradadores. O princípio usuário–pagador é o princípio central do direito
ambiental, o qual orienta e estrutura todo o sistema de prevenção e reparação dos danos ambientais.
Nesse princípio, o poluidor é obrigado a suportar todos os custos ambientais resultantes de sua
atividade econômica.
Sendim (2002) afirma que só uma perturbação significativa e duradoura dos sistemas
ecológicos expressa uma afetação da capacidade de auto-regulação dos sistemas. Sendo assim, o
dano ecológico, para ser imputável, pressupõe que sejam ultrapassados os chamados “limites da
tolerância”. Quando se pensa a reparação do dano ambiental, deve-se lembrar a primeira grande
regra: a reparação do dano ambiental deve ser integral. Trata-se do princípio da plena reparação do
dano ambiental.
A reparação do dano ambiental deve propiciar a restauração do meio ambiente impactado,
sem esquecer sua finalidade preventiva em relação ao dano ecológico. Prevalente é o ambiente
ecologicamente equilibrado através da recomposição da situação anterior, não é um interesse
substancialmente subjetivado, mas, um interesse público na conservação de um ambiente sadio e
ecologicamente equilibrado. O princípio da reparação previsto na Declaração de Estocolmo, nº 7,
expressa que todos, de maneira justa, têm o dever de reparar os danos que venham a ser causados ao
meio ambiente e a terceiros.
Nem sempre na avaliação do dano ambiental não basta considerar a capacidade de uso do
bem pelo ser humano, devendo-se considerar a sua função ecológica. A localização, construção e
operação de empreendimento que se utilize de recursos ambientais e que possa causar impacto
significativo, não pode desconsiderar as questões ambientais. A licença ambiental somente deveria
ser emitida após a avaliação do prévio Estudo de Impacto Ambiental e respectivo Relatório de
Impacto sobre o Meio Ambiente (EIA/RIMA) e do Estudo de Impacto de Vizinhança. (diagnóstico
ambiental e urbanístico da área; a descrição, identificação, análise e previsão dos impactos
significativos, positivos e negativos; a definição das medidas mitigadoras dos impactos negativos; o
adensamento populacional; a geração de tráfego e demanda por transporte público; a paisagem
urbana e patrimônio natural e cultural).
A licença ambiental não pode ser um mero instrumento para atender apenas os interesses
patrimoniais e egoísticos dos proprietários do empreendimento. A política ambiental em áreas
degradadas deve se orientar pelo seguinte binômio: melhoria das áreas afetadas e preservação das
áreas não afetadas.
Para se começar a solucionar grande parte dos problemas ambientais causados pelas
empresas, começou a surgir uma concepção de que com a preservação do meio ambiente, ganha
ambos os lados, a sociedade por ter um ambiente equilibrado e os empresários por melhorarem a
Fórum Internacional do Meio Ambiente - A conferência da Terra 471

imagem de suas empresas uma vez que deixaram de ser autuadas e de terem seu conseqüente
fechamento causando sérios prejuízos.
Entende-se que as agressões causadas pelas pessoas Jurídicas na maioria das vezes são por
falta de informações, mas muitas vezes por ganância de dinheiro e poder. Os recursos naturais são
utilizados de maneira irracional, os solos são destruídos, grandes áreas de florestas desmatadas, as
águas e o ar são poluídos, tudo em busca de progresso e desenvolvimento. O desenvolvimento deve
ocorrer com certeza, mas um desenvolvimento sustentável, na busca de crescimento econômico e
industrial do país.

Princípios do direito ambiental – gerais e aplicáveis à atividade mineradora


princípio do direito fundamental a um meio ambiente ecologicamente equilibrado - surge
pela gradual inter-relação entre a proteção do meio ambiente e a proteção dos direitos humanos.
Uma vez considerado imprescindível à qualidade de vida.
princípio da participação – a proteção ambiental, inicialmente, é de natureza pública,
cabendo assegurar a efetividade do direito ao meio ambiente ecologicamente equilibrado através de
obrigações previstas expressamente. Todavia, a tarefa de proteger o ambiente diz respeito à
coletividade como um todo, tanto os entes públicos quanto os entes privados – pessoas físicas e
jurídicas – têm o dever de velar pela manutenção e melhoria da qualidade do ambiente.
princípio do poluidor–pagador (usuário-pagador) – tem como fundamento a internalização
dos custos sociais da atividade produtiva. Diz respeito a todo aquele que se beneficia da utilização
dos recursos naturais.
princípio da prevenção e da precaução – é um dos fundamentos da proteção ambiental,
uma vez que procura evitar o acontecimento ou a ocorrência do dano ambiental.
princípio da cooperação – leva implícita a idéia de que a proteção ambiental é um tema de
preocupação comum de toda a humanidade. A cooperação é o elemento chave para a
implementação efetiva de políticas ambientais.
princípio da recuperação , ou restauração , do meio degradado – a obrigação de recuperar o
ambiente degradado decorre da natureza da atividade mineradora, pois , trata-se da extração de
recursos não renováveis. O § 2º do art. 225 da CF/88 determina que “todo aquele que explorar
recursos minerais ficará obrigado a recuperar o meio ambiente degradado, de acordo com a solução
técnica exigida pelo órgão público competente, na forma da lei”.
O órgão competente mencionado no dispositivo constitucional é o DNPM, cuja norma
principal é a NRM-21(anexo I da Portaria 237, de 18.10.2001)

São considerados como degradação os processos resultantes dos danos ao meio ambiente,
pelos quais se perdem ou se reduzem algumas de suas propriedades, tais como a qualidade ou
capacidade produtiva dos recursos ambientais. A recuperação terá por objetivo o retorno do sítio
degradado a uma forma de utilização de acordo com um plano preestabelecido para uso do solo,
visando a obtenção de uma estabilidade do meio ambiente (FREIRE, 2000).

princípio do desenvolvimento sustentável - compatibilização entre as atividades


mineradoras e a proteção ambiental.

MINERAÇÃO EM ITABUNA
O Plano de Recuperação de Áreas Degradadas (PRAD) é o complemento necessário à
atividade mineradora, pois não é possível a extração de recursos minerais, ou, pelo menos, grande
parte dos recursos minerais, sem a produção da modificação do meio. Significa dizer que na
mineração o PRAD é uma exigência para a liberação da licença ambiental.
As áreas de pesquisa requeridas para mineração no município de Itabuna, conforme
listagem do DNPM atualizada até abril de 2000, foram plotadas no mapa municipal dos direitos
minerários. De 25 requerimentos, onze são de granito (42%) e seis de sodalita (24%). Os 32%
restantes se distribuem entre gnaisse, gabro, monzonito e quartzito. Esta distribuição pode não
Fórum Internacional do Meio Ambiente - A conferência da Terra 472

refletir o verdadeiro potencial do município, uma vez que nem sempre o material requerido
corresponde à substância mineral constatada.

Das dez ocorrências minerais visitadas pelo DNPM no município de Itabuna, duas são
pedreiras de granulito, de onde se extrai material para utilização como brita, três são de argila,
utilizadas em pequenas cerâmicas, e cinco de areia aluvial, para construção civil.
A rocha granulítica não é utilizada para pavimentação, nem como material de uso
ornamental. Dentre as ocorrências passíveis de utilização futura, destacam-se as rochas sieníticas
que ocorrem na parte norte do município, possivelmente aplicáveis como rocha ornamental.
Observou-se que o município em estudo apresenta o granulito como fonte de recurso mineral
utilizado pelas duas pedreiras para a produção de britas. A atual produção de britas provém de duas
pedreiras: União e J. Macedo.

Características das Pedreiras


A) Pedreira União
• Localização: situada na BR-415, a 10 quilômetros a SE de Itabuna, na divisa com Itapé,
nas coordenadas UTM (m) 458.940E-8.358.468N. É de propriedade do Dr. Paulo Jatobá.
• Exposição da rocha: na frente de lavra. A rocha é pouco alterada e extremamente
fraturada. O manto de intemperismo varia de três a seis metros de espessura.
• Caracteres macroscópicos: trata-se de um granulito que varia de cinza-escuro a
avermelhado, granulação fina, pouco alterado e fraturado a brechado.
• Caracteres microscópicos: a composição varia de charnoenderbito a enderbito, com
textura granoblástica, cataclástica, e a seguinte composição mineralógica dominante nas amostras
ITB-6A e ITB-6B (apêndice 2b): plagioclásio (55 a 59%), mesopertita (0 a 18%) e quartzo (20 a
28%). Hiperstênio e/ou piroxênio alterado: 5%.
• Unidade de britagem: é bem dimensionada.
Fórum Internacional do Meio Ambiente - A conferência da Terra 473

– alimentador vibratório com circuito de expurgo do material terroso;


– britador primário Faço 8050C;
– pulmão, peneiramento primário;
– rebritador giratório Nordberg;
– peneiramento 3 decks para produção de britas 1, gravilhão ½”, brita 2 e pó de pedra.
• Produção e comercialização: situação atual: capacidade instalada: 6.000 m³/mês;
produção atual: 3.500 a 3.800 m³/mês;

B) Pedreira J. Macedo
• Localização: situada na periferia NW da cidade, com entrada pela BR-101, nas
coordenadas UTM 469.323-8.366.104.
• Exposição da rocha; na frente de lavra a rocha é pouco alterada, extremamente fraturada,
sob um manto de intemperismo de três a seis metros de espessura.
• Caracteres macroscópicos: granulito cinza-escuro, foliado, com segregações de minerais
máficos.
• Caracteres microscópicos: trata-se de um enderbito, com textura granoblástica, e os
seguintes minerais essenciais na amostra ITB-1A: plagioclásio (61%), quartzo (20%) e hiperstênio
(12%).
• Unidade de britagem: dois rebritadores giratórios e conjunto de peneiras para produção
de britas nº 1 e 2 e pó de pedra.

Características comparativas entre os materiais das duas pedreiras


Os resultados dos ensaios efetuados pelo Ceped em amostras coletadas nas duas pedreiras
são apresentados no quadro 1. Os resultados desses ensaios mostram que a rocha utilizada para brita
é um granulito com elevada resistência à compressão, classificado como rocha dura (faixa de 100 a
200 MPa). O índice de forma (cúbica) é adequado para britas. Para uso em concreto, o valor
levemente superior a 3 indica uma tendência à lamelaridade, mas com possibilidade de correção. O
percentual de desgaste à abrasão é excelente, assegurando, junto com os outros parâmetros
examinados, a boa qualidade das britas produzidas no município de Itabuna.

De acordo com as informações obtidas no site da CBPM, as duas pedreiras em atividade no


município, uma na divisa Itabuna-Itapé (pedreira União) e outra na periferia NW de Itabuna
(pedreira J. Macedo), produzem britas de boa qualidade, a partir de um granulito de alta resistência
mecânica e um baixo grau de abrasividade de alvenaria.
Fórum Internacional do Meio Ambiente - A conferência da Terra 474

SITUAÇÃO DAS MINERADORAS


O Plano de Recuperação de Áreas degradadas é elaborado contendo informações gerais
sobre a empresa, como localização e acesso, além de equipe técnica, metodologia, caracterização da
área, do meio físico e biótico, análise dos prováveis impactos ambientais, recuperação ambiental
das áreas degradadas contendo as atividades operacionais e monitoramento do processo,
cronograma e custos de implantação. Fazendo uma análise da documentação existente no DPA,
verifica-se que o PRAD da pedreira União segue a recomendação, cabendo aos órgãos ambientais
uma fiscalização periódica para sua implantação efetiva.
Após a análise dos dados coletados no órgão ambiental responsável pela liberação da
licença ambiental simplificada, consta que das duas mineradoras da região, apenas uma delas,
encontra-se com a documentação regulamentada e sua licença ambiental para funcionamento
renovada, tendo sido entregue no departamento toda a documentação necessária. Observou-se que
uma delas encontrava-se com as atividades paralisadas e buscando atualmente, o processo de
regularização.
A Pedreira J. Macedo encontra-se em busca de regulamentação perante o órgão ambiental,
requerendo análise prévia do processo de licenciamento para o retorno ao funcionamento das suas
atividades. A Pedreira União mantém suas atividades em constante ação, permanecendo em
conformidade com a documentação exigida. As duas empresas demonstraram preocupação perante
as normas exigidas e com o meio ambiente. Em geral, as empresas de mineração já vêem a
necessidade de serem internalizados os custos de recuperação ambiental e, já reconhecem como
legítimas as reivindicações das comunidades, incorporando em suas práticas a responsabilidade
social e ambiental.

REFERÊNCIAS
ALMEIDA D. S. Recuperação ambiental da mata atlântica. Ilhéus: Editus, 2000.
CATANHO G.; VASCONCELOS E. C. A. Crimes Ambientais: A responsabilidade penal das
pessoas jurídicas. São Paulo: Imperium, 2007.
Decreto 97632, de 10/04/1989. Publicado no D.O.U de 12.04.89, Seção I, pág. 5.517.
DESTEFENNI M. A responsabilidade civil ambiental e as formas de reparação do dano ambiental
(aspectos teóricos e práticos). São Paulo: Campinas – SP, Book Seller 2005.
DIAS, M. C. O. (coordenadora) Manual de impactos ambientais: orientações básicas sobre aspectos
ambientais de atividades produtivas. Banco do Nordeste, 1999, p297.
GALLI, L. F.; GONÇALVES, J. C.; NOFFS, P. D. S. Recuperação de áreas degradadas da Mata
Atlântica. Uma experiência da CESP – Companhia Energética de São Paulo , 2000. Caderno 03, 2ª
ed. 48p.
HAMMES V. S. Julgar: percepção do impacto ambiental, educação ambiental para o
desenvolvimento sustentável, vol4 , Embrapa, ed globo2004.
IBAMA. Manual de recuperação de áreas degradadas pela mineração: técnicas de revegetação.
Brasília: IBAMA, 1990, 96p.
NUNES, P. H. F. Meio Ambiente e Mineração: O desenvolvimento sustentável. Curitiba: Juruá,
2006.
SENDIM, J. S. C. Responsabilidade Civil por Danos Ecológicos. Editora Almeida, 2002.
Fórum Internacional do Meio Ambiente - A conferência da Terra 475

COMPENSAÇÃO AMBIENTAL A PARTIR DA CRIAÇÃO DE UMA APA E CORREDOR


ECOLÓGICO NO CCEN - UFPB

Elis Silva de Almeida Jácome


elis.jacome@hotmai
Liése Carneiro Sobreira
lica1704@yahoo.com.br
Paulo Roberto de Oliveira Rosa
prrosa@hotmail.com

RESUMO
Atualmente a Universidade Federal da Paraíba vem passando por um processo de
ampliação de suas edificações. Isso se deve ao Programa de Apoio de Reestruturação e Expansão
das Universidades Federais. Em decorrência desse plano de expansão, indivíduos vegetais exógenos
e endógenos da Mata Atlântica estão sendo suprimidos, incluindo indivíduos que se encontram os
núcleos de reserva legal de Remanescentes de Mata Atlântica. Isto posto, neste trabalho, buscamos
estabelecer uma compensação ambiental, tomando como referência duas Áreas de Proteção
Ambiental (APAs) e o antigo bosque situado entre essas duas APAs localizado no Centro de
Ciências Exatas e da Natureza, a fim de propor a transformação do referido bosque em uma nova
APA e a criação de um corredor ecológico que interligue estes núcleos de Mata Atlântica para que
ocorra o fluxo de espécies que habitam esses fragmentos florestais.
Palavras-chave: Compensação Ambiental, UFPB, Corredor Ecológico.

ABSTRACT
Currently the Federal University of Paraíba is undergoing a process of expansion of their
buildings. This is due to the Program of Support for Restructuring and expansion of federal
universities. As a result of this plan of expansion, individuals exogenous and endogenous plant of
the Atlantic Forest are being abolished, including individuals who are the nuclei of legal reserve of
Remanescentes de Mata. That said, this work, we sought to establish a compensation environment,
taking as reference two Areas of Environmental Protection (APAs) and former forest located
between these two APAs located in the Center of Exact Sciences and Nature, in order to propose the
transformation of that forest in a new APA and the creation of an ecological corridor that interligue
these nuclei of Atlantic that occurs to the flow of species that inhabit the forest fragments.
Keywords: Environmental Compensation, UFPB, Ecological Corridor.

INTRODUÇÃO
O Campus I da Universidade Federal da Paraíba foi criado em 1955 pelo Governo da
Paraíba, sendo federalizado em 1960. Está localizada na cidade de João Pessoa no bairro Castelo
Branco. De acordo com a proposta de Plano Diretor do Campus I da UFPB, o seu território está
compartimentado em 3 unidades territoriais, onde estas foram definidas com base nas diretrizes do
Estatuto da UFPB. Assim, têm-se definidas as unidades, constituídas por centros acadêmicos,
Florestas e Jardins (Região Funcional) e Órgãos Suplementares (Região Nodal). As áreas de
florestas são divididas em 12 Áreas de Proteção Ambiental – APA (FIG 01), em que são
constituídas por núcleos remanescentes de Mata Atlântica, “que pelas características de sua
paisagem e de suas condições geográficas, apresenta restrição à implantação de atividades urbanas,
necessitando de normas específicas de uso e ocupação, com o objetivo precípuo da proteção
ambiental” (Proposta Plano Diretor, 2007).
Atualmente a universidade vem passando por um processo de ampliação de suas
edificações, em decorrência do Programa de Apoio a Planos de Reestruturação e Expansão das
Universidades Federais – REUNI, do Governo Federal, onde este visa aumentar o número de
estudantes do terceiro grau através do aumento do número de vagas e criação de novos cursos de
graduação. Como resultado desse plano de expansão, indivíduos vegetais exógenos e endógenos da
Fórum Internacional do Meio Ambiente - A conferência da Terra 476

Mata Atlântica estão sendo suprimidos, incluindo indivíduos que se encontram nos núcleos de
reserva legal de Remanescentes de Mata Atlântica.
Posto que essa expansão vem gerando Passivos Ambientais, buscamos propor áreas para
geração de Ativos Ambientais dentro do território do campus I da UFPB, para assim estabelecer um
processo de Compensação Ambiental e conseqüentemente minimizar os impactos causados pela
supressão dos indivíduos vegetais. Assim, neste trabalho tomaremos como referência núcleos de
bosques e remanescentes de Mata Atlântica, especificadamente as Áreas de Proteção Ambiental
Remanescente I e II e o antigo bosque situado entre essas duas APAs, localizados no Centro de
Ciências Exatas e da Natureza (CCEN), onde se propôs a geração de um ativo ambiental a partir da
criação de um corredor ecológico que interligue os ecossistemas dos referidos núcleos, como
também a transformação da referida área de bosque em uma nova APA.
Fórum Internacional do Meio Ambiente - A conferência da Terra 477

Figura 01 - Áreas de Proteção Ambiental – APAs (UFPB)

REFERENCIAL TEÓRICO
Posto que o trabalho tem como objeto de estudo unidades de vegetais da Mata Atlântica,
buscamos definir alguns conceitos fundamentais a sua elaboração.
Aqui entenderemos como áreas protegidas como “áreas reservadas primariamente para a
conservação de comunidades bióticas naturais e características fisiográficas associadas, dentro das
quais somente são permitidas aquelas atividades que não interferem com a proteção dos recursos
naturais a longo prazo”. (DASMANN, 1973 apud MILANO, 1993).
Assim, embasado nesse conceito, buscamos propor a criação de uma área de proteção
ambiental a partir de uma área de bosque, em que neste pode ser verificado interferências antrópicas
em seu ecossistema. Para elucidar o tipo das alterações observadas, buscamos em ALMEIDA,
2000, as seguintes definições:
Impacto Ambiental: Alteração das propriedades físicas, químicas e biológicas do meio
ambiente, causada por qualquer forma de matéria ou energia, resultante das atividades humanas que
direta ou indiretamente afetam a saúde, a segurança e o bem estar da população interessada.
Degradação: Termo que define a remoção da vegetação, fauna e camada superficial do
solo, e alteração da qualidade e regime de vazão do sistema hídrico A degradação ocorre quando há
perdas referentes às características químicas, físicas e biológicas da área em questão.
Área degrada: Aquela que, após distúrbios, tem eliminado juntamente com a vegetação, os
seus meios de regeneração bióticos, como banco de sementes, banco de plântulas (mudas, chuva de
sementes e rebrota. Apresenta, portanto, baixa resiliência, isto é, seu retorno ao estado anterior pode
não ocorrer ou ser extremamente lento, sendo a ação antrópica necessária.
Fórum Internacional do Meio Ambiente - A conferência da Terra 478

Área Perturbada: Aquela que sofreu distúrbios, mas manteve seus meio bióticos de
regeneração. A ação humana não é obrigatória, somente auxilia na sua regeneração, pois a natureza
pode ser encarregar da tarefa.

METODOLOGIA
Iniciamos o trabalho com a medição das áreas desprovidas de indivíduos vegetais do
Bosque que serviam como vias de acesso aos transeuntes, visando estabelecer a quantidade de
indivíduos para o repovoamento dessas áreas. Essa medição foi feita a partir da medição das laterais
dos polígonos utilizando uma trena (FIG 02), para posterior cálculo de área aplicando a fórmula
adequada para cada tipo de polígono.

Figura 02 – Medição das áreas sem indivíduos vegetais


Juntamente a essa medida foi elaborado um croqui manual em papel milimetrado do
bosque e posteriormente uma confecção gráfica em sistema CAD, delimitando seus núcleos de mata
Atlântica, as vias de acesso e o ambiente de convivência, o que possibilitou a definição dos limites
para a transformação do Bosque em uma nova Área de Proteção Ambiental Remanescente.
Por fim, através da observação de fotografias aéreas referentes à área de estudo, como
também de observações feitas in loco, pudemos definir uma proposta de corredor ecológico que
interliga os núcleos de proteção ambiental que se encontram no CCEN da UFPB.

RESULTADOS E DISCUSSÃO
A partir das medições das áreas sem indivíduos vegetais do bosque localizado entre os
entre as edificações da Biologia (CCEN) e do Núcleo de Tecnologia da Informação (NTI),
verificamos que pode ser gerado um ativo ambiental em torno de 200 indivíduos exógenos da Mata
Atlântica. Essa quantidade de indivíduos necessários para a compensação de um passivo ambiental
de aproximadamente 67 indivíduos, considerando que foi estabelecido que na UFPB que para cada
indivíduo da Flora endógena seria replanto outros 3 indivíduos também endógenos.
No referido bosque pode ser verificado algumas perturbações em seu sistema decorrentes
da ação antrópica. Essa área possui caminhos e por isso tem sido utilizada como via de acesso para
transeuntes, interligando o CCEN ao CCS (Centro de Ciências da Saúde). No entanto alguns desses
caminhos foram abandonados e se encontram em processo regeneração. Também se verifica a
deposição de resíduos sólidos, principalmente plásticos, vidros e até mesmos preservativos. (FIG 03
e 04)
Fórum Internacional do Meio Ambiente - A conferência da Terra 479

Figura 03 – Passagem de transeuntes na área do Figura 04 – Deposição de resíduos dentro do


Bosque bosque
Em decorrências desses impactos, propõe-se a transformação do bosque em uma nova
Área de Proteção Ambiental de remanescentes de Mata Atlântica. A partir das observações
realizadas in loco, pode-se afirmar que a área do bosque possui características necessárias para se
tornar um núcleo de floresta, uma vez que áreas que estão prontas para se tornarem florestas são
aquelas que já apresentam uma forte população de indivíduos endógenos, e quando olhadas mais de
perto essas pequenas populações ainda contam com elementos endógenos de grande porte, ou seja,
com indivíduos com mais de dez metros de altura.
Para que essas áreas que ainda estão sem vegetação sejam incorporadas à Floresta se fez
necessário uma delimitação para quando possível, permitir que as copas das árvores se juntem as de
outra área já delimitada para formar os corredores de vegetação nativa para facilitar o trânsito de
animais silvestres entre os fragmentos. Assim, preocupamo-nos em dimensionar a área que poderá
vir a ser considerada mais um membro dos fragmentos da Mata Atlântica na responsabilidade
patrimonial da UFPB.
Para isso, foi elaborado um croqui da área referente ao bosque constando os núcleos de
indivíduos vegetais, as áreas edificadas a sua adjacência, formada pelos edifícios do CCEN, Núcleo
de Tecnologia da Informação - NTI e a praça de convivência que se encontra inserida na área do
bosque, como também a elaboraração da proposta para delimitação do novo núcleo florestal. (FIG
05)

Figura 05- Croqui da área do Bosque.


Fórum Internacional do Meio Ambiente - A conferência da Terra 480

A demarcação do novo núcleo de floresta está sendo realizada pela Prefeitura Universitária
da UFPB (FIG 06), seguindo a delimitação estabelecida no croqui. O replantio será realizado a
partir da concessão de mudas de espécies endógenas da Mata Atlântica pela Prefeitura Municipal de
João Pessoa, posto que a UFPB e a prefeitura de João Pessoa assinaram um convênio a fim de
estabelecer um Plano de crédito florestal, de modo que a prefeitura cederia à universidade 2100
mudas para o desenvolvimento desse plano (FIG 07).

Figura 06- Demarcação da nova APA em Figura 07- Banco de mudas da Pref. de João
andamento Pessoa

Definida a criação da nova APA, buscou-se propor a criação de um corredor ecológico que
interligue 3 núcleos remanescentes de Mata Atlântica, que referem-se a APA I, II e a nova APA
criada a partir do bosque. O objetivo da criação desse corredor é de permitir a circulação de
indivíduos da fauna entre esses núcleos.
Os núcleos florestais do campus I da UFPB possuem um considerável número de espécies
nativas, tais como sagüis (designação geral das várias espécies pertencentes à família
Callitrichidae), bicho-preguiça (Bradypus infuscatus Riquelmis), entre outros. No entanto pode-se
verificar que muitas espécies da fauna local não podem locomover-se livremente entres núcleos
florestais da universidade, uma vez que muitos destes não se encontram interligados. (FIG 08, 09 e
10).

Fig. 08– Bicho-preguiça e Fig. 09 – Bicho-Preguiça Fig. 10- Desencontro de


desencontro de copa de deslocando-se do núcleo de copas de árvores
árvores, o que impede a Floresta para o bosque.
passagem de sagüis

Posto a importância dessas espécies na dinâmica dos ecossistemas em observação, busca-


se a partir do replantio de indivíduos nativos da mata Atlântica a criação de um corredor ecológico
que permita que algumas espécies da fauna local perpassem por entre os núcleos de florestas
remanescentes, como pode ser observado na figura 11.
Fórum Internacional do Meio Ambiente - A conferência da Terra 481

Figura 11 – Proposta da criação de corredor ecológico

CONSIDERAÇÕES FINAIS
Com o trabalho foi possível relacionar o custo-benefício da compensação ambiental para a
UFPB, tendo em vista que, da forma como está sendo feita, a compensação irá minimizar os
impactos ocasionados pelo corte dos indivíduos necessários à ampliação das instalações prediais.
Em longo prazo, o bosque beneficiado com as mudas alcançará um novo patamar ecológico,
passando a ter uma maior densidade vegetal por onde poderá circular diversos indivíduos da fauna
silvestre, locomovendo-se para outros fragmentos sem precisar correr riscos, passando assustados
pelos corredores das edificações.

REFERÊNCIAS BIBLIOGRÁFICAS
ALMEIDA, Danilo Sette de. Recuperação ambiental da mata atlântica. Ilhéus: Editus, 2002.
MILANO, Miguel Serediuk.[et al]. Possibilidades alternativas para o manejo e o gerenciamento das
unidades de conservação. PNMA – IBAMA, Brasília, 1993.
Fórum Internacional do Meio Ambiente - A conferência da Terra 482

TABULEIRO DOS NEGROS OU A CULTURA NEGRA E SUA (DES)CONSTRUÇÃO NO


ESPAÇO

Elton Márcio Leite Gomes


Licenciado em História pela Fundação Educacional do Baixo São Francisco Dr. Raimundo Marinho, Aluno do Curso de
Graduação em Turismo da UFAL. elton.htur@hotmail.com
Alan Curcino Pedreira da Silva
Ms. em Ciência da Informação pela UFPB, Professor da UFAL. alancurcino@hotmail.com

RESUMO
A presente pesquisa buscou diagnosticar a existência de comunidade negra remanescente
do período colonial brasileiro (de engenho de cana-de-açúcar e/ou quilombola) no município de
Penedo no estado de Alagoas e sua atual condição de vida socioeconômica na relação com o meio
ambiente. Discute o aspecto cultural da comunidade encontrada e sua importância na contribuição
no processo de formação da identidade da sociedade Penedense na sua relação com o espaço rural.
Tem-se como espaço-objeto da pesquisa o povoado do Tabuleiro dos Negros, localizado na zona
rural de Penedo, há 13 km do seu centro urbano.
Palavras-chave: cultura; comunidade negra; meio ambiente; Tabuleiro dos Negros; Penedo-AL.

ABSTRACT
The present research searched to diagnosis the existence of remaining black community of
the brazilian colonial period (of device of sugar-cane and/or quilombola) in the city of Penedo in the
state of Alagoas and its current condition of socioeconomics life in the relation with the
environment. It argues the cultural aspect of the joined community and its importance in the
contribution in the process of formation of the identity of the Penedo society in its relation with the
agricultural space. It is had as space-object of the research the town of the Tabuleiro dos Negros,
located in the agricultural zone of Penedo, has 13 km of its urban center.
Key-words: culture; black community; environment; Tabuleiro dos Negros; Penedo-AL.

POR UMA INTRODUÇÃO: AS ALAGOAS E AS SOCIEDADES MUCAMBEIRAS

O núcleo colonial alagoano surgiu como resultado da conquista e da expansão das


atividades mercantilistas. As Alagoas, no seu início, são conhecidas como parte sul de Pernambuco,
onde tiveram como seus primeiros núcleos de povoamento Penedo e Porto Calvo. Esses dois
núcleos ocuparam posições estratégicas importantíssimas, pois além de contribuírem com a
produção açucareira havia uma extrema facilidade de escoamento de seus produtos graças as
grandes porções de água hidrográfica, sendo Penedo o rio São Francisco e Porto Calvo o
Manguaba. Ora a parte sul de Pernambuco, hoje Alagoas, era conhecida pela sua riqueza, sua
participação na economia da capitania era bem maior do que a própria sede da capitania a que hoje
chamamos de Pernambuco e toda essa participação advinda da produção açucareira, portanto o
núcleo de Penedo não ficou tanto tempo adormecido como uma sociedade primitiva como diz
Lindoso:
O pólo penedense conheceu, num período de três séculos, um lento processo formativo,
em que se incluíam o assentamento dos currais de gado e a conversão dos campos de
caça dos índios em pastagem para a criação de gado. A constituição da sociedade são-
franciscana permaneceu, por séculos num estágio primitivo , quase sem estruturação
social, adida à vida nômade dos rebanhos. (2000, p. 42)

Além disso, ainda acrescenta que Penedo tem sua formação montada no pastoreio,
atividade que dispensa a existência do escravizado. Acredita-se que Penedo não permaneceu muito
tempo sem atividade escravista, pois ao contrário de Dirceu Lindoso, o historiador Ernani Méro
mostra um fato que nos permite afirmar que a formação cultural e econômica de Penedo teve a
contribuição dos africanos e afro-descendentes, diz historiador:
Fórum Internacional do Meio Ambiente - A conferência da Terra 483

Os sobradões, com um ou mais andares, alojavam os senhores da nobreza, ricos


comerciante. Na parte assobrada vivia a família. Nos baixos, ou serviam de casa comercial ou
alojamento para escravos. Na zona rural, nas grandes fazendas, a casa grande, símbolo do poder, da
dominação. (1994, p. 49)
O texto citado evidencia a existência da Casa Grande, que simbolizava o poder, que era
portanto, o espaço formador de uma sociedade patriarcal, consequentemente machista; escravista,
assim sendo preconceituosa, racista e branca e católica, portanto, de forte dominação religiosa e
cultura européia. A presente sociedade tinha como componentes principais a Casa Grande, a
Senzala, a Capela, o engenho e o canavial. Ainda o negro e o branco procuravam se misturar no
interior da Casa Grande e daí alteravam-se as relações sociais e culturais de ambos os lados, sem
deixar de destacar a rotina diária que lhe era imposta pelo domínio do senhor de engenho, cuja
riqueza da sociedade patriarcal somente estaria apoiada no açúcar e no escravo negro.
Com esse fato pode-se dizer que Alagoas e as sociedades mucambeiras nasceram
praticamente juntas, já que no núcleo de Porto Calvo essa presença é inegável. Penedo não fugiu da
atividade açucareira, os engenhos de açúcar eram as grandes fontes de renda associados ao tráfico
de africanos para a escravização. A cidade, já no século XVII, contava com o engenho do Saco do
Dâmaso, localizado no conhecido Bairro de Oiteiro, atualmente Senhor do Bonfim.
Não devemos acreditar que os negros africanos ou afro-descendentes que habitavam no
centro urbano de Penedo, como escravo de ganho ou os da zona rural no eito da cana,
permaneceram por muito tempo inertes, sem lutar por sua liberdade. A luta contra o regime de
escravidão foi uma constante, como já dissemos anteriormente, em todo povoado onde houve
trabalho escravo, ali perto havia uma comunidade quilombola. Referente a Penedo, vejamos o que
diz Méro:
"Tabuleiro dos Negros" conta-se que origem data da época da escravidão. Afirmam
alguns que vários negros fugitivos das senzalas, ali se localizaram, dando origem ao
povoamento. Pois sabemos que muitos Quilombos foram instalados em nossa região.
(1989, p.19)

Os espaços em busca de liberdade sempre foi o objetivo principal dos escravizados,


principalmente dos escravizados do campo, formando lugares de fácil convívio social em áreas
rurais de vários aglomerados quase sempre em sua maioria negra.
Desse modo, a presença do negro ficaria bem explícita pelas condições mesmas de
organização e evolução político-administrativa, econômica e social do meio. Desde muito cedo,
ficou dito em linhas passadas, por Abelardo Duarte que:
(...) a corrente negra foi encaminhada para o “sul” da donataria de Duarte Coelho. O três
núcleos fundamentais do povoamento das Alagoas - PENEDO, ALAGOAS (atualmente
MARECHAL DEODORO) e PÔRTO CALVO - contaram com o contingente afro-
negro... a sorte desses núcleos dependeu em grande parte da presença do escravo. Ainda
numa fase indecisa da formação econômica alagoana, sem rumo definido para esta ou
aquela cultura, e mais tarde quando se estabelecia de modo racional o predomínio da
atividade agrícola ou pastoril neste ou naquele ponto, o elemento negro desempenhou
papel importante no desenvolvimento desses núcleos.
Os engenhos de açúcar, as engenhocas retiveram, principalmente, o negro. (1955, p. 22)

O NEGRO E A IGREJA
Na História religiosa brasileira o período barroco foi marcado pela construção de várias
igrejas, em Penedo não foi diferente. Podem-se destacar inúmeros templos neste estilo: o Convento
de Nossa Senhora dos Anjos, a Igreja de Nossa Senhora do Rosário dos Pretos, a de São Gonçalo
Garcia dos homens Pardos e de Nossa Senhora das Correntes. Assim esses templos tiveram
importantes contribuições para sociedade penedense e domínio da Igreja Católica nessa região.
É importante lembramos que a evangelização expandiu-se na região penedense e nas áreas
circunvizinhas, tendo assim, iniciado desde o começo do século XVI, grandiosos trabalhos
Fórum Internacional do Meio Ambiente - A conferência da Terra 484

apostólicos feito pelos frades Capuchinhos franceses, seguidos dos jesuítas. Os Franciscanos,
somente no século XVII procuraram a sua fixação em Penedo.
A Igreja Católica tinha como principal objetivo evangelizar os povos de quaisquer que
fossem a etnia, esta instituição encontrava-se representada em Penedo pelos franciscanos. Houve
também momentos da história que entraram em contra-senso com a etnia negra e com outras etnias,
podendo ser averiguado quando Méro nos diz:
No local onde se encontra o templo dedicado a Nossa Senhora do Rosário dos Pretos,
havia uma capela em honra de Santa Efigênia, que fora construída pelos escravos, nos
primórdios do século XVII, aliás a devoção a essa santa, como São Benedito, era muito
caras aos negros! (1991, p. 261)

Como a Igreja Católica já havia desenvolvido alguns planos ambiciosos, tornou-se difícil
para a classe negra à entrada no convívio social do branco em Penedo, fazendo com que as
construções dos templos tornassem caras para o negro, por não deter o poder, que estava restrito a
plutocracia. A entrada do negro no espaço religioso católico sempre foi um problema, mesmo os
negros convertidos ao catolicismo, quando iam levar seus senhores ou senhoras, no caso das
mucamas, para assistirem as missas, a esses não era permitido entrar, posteriormente foi lhes
destinado o espaço da entrada da igreja, onde deveriam permanecer todo tempo em pé. Assim
sendo, percebemos que a igreja, mesmo tendo como principal objetivo conquistar novos fiéis,
movida pelo espírito social da época, não deixa de ser um espaço racista, preconceituoso e de
exclusão.
Um problema importante para uma outra pesquisa é como se deu a construção de Igrejas
como as de São Benedito e Nossa Senhora do Rosário dos Pretos no seio de uma comunidade
racista e preconceituosa. Os jesuítas, em Penedo, também contribuíram para a condenação da
religião do negro e dos seus ancestrais, espalhando, ao mesmo tempo, essa mentalidade para outras
etnias. Desde a escravidão que o Catolicismo repudiava o negro, tendo o mesmo como mau
exemplo para o restante da sociedade.
Apesar de toda perseguição o negro nunca deixou a sua religiosidade, de cultuar seus
deuses, mesmo que para isso incorporasse elementos encontrados na nova terra, o que
posteriormente, receberia o nome de sincretismo religioso. Na obra de Abelardo Duarte, Negro
Muçulmanos nas Alagoas (os Malês), encontramos o seguinte relato:
(...) um dos meus principais informantes, pessoa de idade avançada ex-proprietário e
comerciante no Penedo, (*) lembra-se de que ouvira falar em candomblé (note-se a
influência baiana desta denominação, pois, em Maceió, as casas-de-culto afro-negro e
afro-brasileiro recebeu a denominação de xangôs) no Penedo só freqüentados por
negros africanos legítimos, puros ou descendentes diretos destes. Segundo se dizia êstes
mesmo negros se reuniam, em caráter privado, tôdas as sextas-feiras para celebrações
religiosas. (1958, p. 39)

Acrescenta ainda que não fossem apenas essa atividade que evidenciava a prática religiosa
afro na comunidade de Penedo, outros ritos eram praticados, a exemplo das festas. Mas, só teremos
a presença de afro-brasileiros no seio da religião católica, quando eles, efetivamente conseguiram
criar algumas irmandades, objeto de muita discussão e disputa entre mulatos, negros e brancos no
seio da Igreja.
Quanto as Irmandades e Ordens Terceiras existentes no Penedo Antigo, diz Méro:
(...) as Irmandades em Alagoas tem a sua história e vamos encontrar em Penedo:
Irmandade de Nossa Senhora do Rosário dos Pretos, Irmandade de São Gonçalo Garcia
dos homens Pardos, Irmandade de brancos do Santíssimo Sacramento, das Almas e
Ordem Terceira de São Francisco. (1983, p. 33-34)

(*)
Senhor Francisco de Góes, casado com a Sra. Blandina Malta de Góes, falecido em Maceió, há anos.
Fórum Internacional do Meio Ambiente - A conferência da Terra 485

No período da colonização, Penedo sempre esteve inserida nos grandes feitos históricos
das Alagoas e do Brasil. Podendo ser demonstrado em um fato relevante para a história do negro no
século XIX, com o movimento da Abolição dos escravos no Brasil, em Penedo não foi diferente.
Logo, visto que a mesma houve uma sociedade protetora dos negros, conhecida como:
"SOCIEDADE HUMANITÁRIA EMANCIPADORA PENEDENSE", em 1869, primeira das
Alagoas.
Vale a pena ser enfocada, ainda, a presença dos “Malês”, negros escravos islamizados do
Sudão, especialmente Haussás e Mandingas. No território alagoano, Penedo foi o único ponto onde
houve culto negro-maometano perfeitamente organizado, conforme Abelardo Duarte.
As tradições dos negros escravos em Penedo foram seguidas através de práticas religiosas.
"Os Malês destacavam-se dos outros negros da sociedade penedense, por uma espécie de
segregação social, religiosa ou de vida pautada por hábitos de absoluta austeridade, sendo por isso
respeitados. Viveram na Rocheira e no Bairro Vermelho"1, conforme a mesma publicação destacou
ainda no "ano de 1828, havia em Penedo 4.468 pretos. Libertos ou livres 2.043 e escravos 2.425"2.
Aliás temos aí uma pequena noção da fixação dos negros na área penedense no século XIX.
Portanto, é inegável a presença dos negros nessa região, bem como suas contribuições sociais e
culturais, enraizadas, até então, no contexto histórico da sociedade penedense.

ESPAÇO DE (DES)CONSTRUÇÃO: TABULEIRO DOS NEGROS


A comunidade Tabuleiro dos Negros está localizada na parte rural do município de
Penedo, fazendo limite com o município de Igreja Nova, estando há distância de 13 km desse
município.
Dona Marina3, diz: "... que o povoamento teve início onde hoje está localizado o clube de
Mães (foto acima) com os seus primeiros moradores, os índios da tribo caetés, onde os líderes
eram duas mulheres índias, a Bebe e a Águia, que administravam a família". Essa área dada à
lavoura de café ali existente ficou conhecida como "Moitiço do café", depois "Lagoa do café", para
posteriormente, com a entrada do negro na comunidade, ser conhecida por Tabuleiro dos Negros.
Acrescenta ainda: "... que os negros, apesar de todos os castigos, quando chegaram se
sentiram maravilhados, longe dos castigos dançavam a dança do coco e montaram um terreiro ...".
Este terreno teria sido a morada da família "Cabral" de etnia branca, conhecido hoje pela
comunidade como Fábrica de blocos. Ainda destacamos o informe de Dona Marina: ”... que a
família do Medeiros implantou um engenho na Palmeira-3, que já era documentada pela família
"Cabral", que era uma família civilizada, que havia documentado também a Palmeira-1 e 2 mais
acima". Dona Marina enfatiza ainda "...que na Palmeira-3, despertou o interesse do Coronel
Medeiros, porque ficaria próximo a vertente que não secava".
A Igreja São Pedro é a primeira da comunidade construída pelos negros, com o passar dos
anos o templo caiu, sendo mais uma vez reerguido. De acordo com seu José Matias4, "a Igreja de
São Pedro foi à primeira Igreja do povoado do Tabuleiro dos Negros". Acrescenta ainda: "... que o
nome Tabuleiro dos Negros foi porque existiu negro valente, próximo à casa dos Vital, que vivia
em uma aldeia de casas chamada de Tabuleiro".
Uma moradora da comunidade, Dona Marina, diz: "... conheci muitas das casas de capim,
onde era morada de negros, vindos de Atalaia, à frente da Igreja de São Pedro”.
Este templo construído no início do século XX, nessa comunidade teve fatos curiosos em
sua história: um deles foi o nome de Igreja do Basílio, por pertencer a Basílio Néris dos Santos, que
foi construída com o punho dos brancos. Tanto as igrejas como, as casas da comunidade,
antigamente eram de taipa.

1
JORNAL DA CASA DO PENEDO, Ano I - Nº05, setembro de 1994, p.06.
2
Idem.
3
Dona Marina da Silva, agricultora e professora, residente na rua: Santo Antônio n° 301 Tabuleiro dos Negros, 61 anos
de idade, casada com o Sr. Manoel Vital, morada da comunidade, desde o seu nascimento.
4
José Matias, agricultor, residente na rua: da rodagem nº 94 Tabuleiro dos Negros, 62 anos de idade, casado com a
Senhora Maria de Lourdes Evangelista Matias, morador da comunidade, desde o seu nascimento.
Fórum Internacional do Meio Ambiente - A conferência da Terra 486

Esse templo foi erguido em 1928, teve como primeiro nome Igreja de Nossa Senhora da
Conceição, que foi construída com o punho de descendentes de negros. “Também era chamada de
Igreja de “Luiz Vó”, devido à área antigamente ter sido pertencente ao senhor” Luiz “,
posteriormente, em 1917, passou por uma restauração e daí então Frei Boa Ventura renomeou para
Igreja de Santo Antônio.
“Na época dos negros” existiam duas religiões na comunidade: a Católica e o Candomblé,
Dona Marina, diz: "... que esses escravos saiam do Candomblé e iam se benzer com água benta na
Igreja de São Pedro". Acrescenta ainda: "... que o Candomblé só existiu enquanto havia
escravidão, eles usavam como forma para defender-se dos castigos. Depois, com término da
escravidão, essa religião afro sumiria, pelo menos ao público".
No povoado do Tabuleiro dos Negros atualmente encontra-se um terreiro de Candomblé,
cujo espaço de culto religioso é da Maria Lima Santos, espírita que desde os seus 12 anos realiza
curas e se alojou neste povoado em 15 de dezembro de 2002, natural de São Miguel dos Campos.
Nestes três anos que reside no povoado sempre realizava o culto afro (dança), na data dos santos
Cosme e Damião em setembro e no mês de outubro no dia das crianças. Segundo Maria Lima
quando “vinha a mestra e outras pessoas que realizavam os cultos em dois turnos: à tarde, para as
crianças e à noite para os adultos, sempre aberto ao público, mas a partir, deste ano não haverá
dança no terreiro por falta de componentes para exercer as funções que exige a religião, o terreiro
estará aberto apenas para consultas ".
Na comunidade existem igrejas protestantes. Segundo os moradores, a Assembléia de Deus
é a igreja que a cada dia tem atraído mais fiéis. A comunidade tem sido constantemente visitada por
outras congregações protestantes.

A POPULAÇÃO DO TABULEIRO DOS NEGROS


Na década de 1980, o Núcleo de Estudos afro-brasileiras (NEAB/UFAL) identificou 35
comunidades remanescentes de quilombos em Alagoas, quando apresentou a população da
comunidade do Tabuleiro em número de famílias, conforme tabela que segue.

Tabela 01 - Comunidades Remanescentes de Quilombos

COMUNIDADES REMANESCENTES DE QUILOMBOS


Nº DE FAMÍLIAS
COMUNIDADE MUNICÍPIO
(APROXIMADO)
OITEIRO PENEDO 149
TABULEIRO DOS
PENEDO 120
NEGROS
Fonte: Adaptado de SCHUMAHER (2004, p. 37).

A implantação do Engenho das Moças trouxe desenvolvimento para comunidade do


Tabuleiro dos Negros, fazendo com que surgisse a entrada do primeiro barracão (o comércio). Com
a chegada do engenho, segundo Dona Marina: "... como havia muitas terras no Tabuleiro ninguém
se encomodava, a comunidade só gostava de trabalhar no baixio, porque, tinha terra fértil que
produzia grande escala do produto. Depois que a comunidade foi trabalhar nas terras de cima".
O coronel Medeiros era da família vinda de Atalaia. O mesmo fez o percurso igual ao do
negro, segundo Dona Marina: "... o Medeiros ao chegar encontrou a negra pisada a Tumâsia5, que
já era alforriada, trabalhou para o Coronel em sua casa". O importante é perceber o ato de
reescravização sofrida pela negra.

5
A expressão” negra pisada a Tumâsia”, é uma mistura de realidade, lenda contada pelos moradores que: "à noite o
Coronel Medeiros teria se transformado em bicho, indo à casa da negra, ao chegar derrubaria a porta por cima dela".
Fórum Internacional do Meio Ambiente - A conferência da Terra 487

Alto das Boiadas, em Penedo, foi o local para onde foram levados os negros reescravizados
e vitimados de varíola (bixiga), por determinação do Coronel Medeiros, para não contaminar a
comunidade. Pois, nas frases do seu João Ferreira Pereira6, que nos diz: "... ninguém passava
próximo ao morro porque a peste pegava em qualquer um. Ainda alguns deles eram enterrados na
baixada. Nesse ano já existia cemitério, mas o coronel não aceitava que levassem o negro, porque
apesar de mortos, a doença ainda poderia passar pra a comunidade".
Dona Eurotildes, uma das remanescentes dos negros que fixou morada no Tabuleiro dos
Negros, diz: "... alcancei o tempo da epidemia da bixiga e não fui contaminada". Hoje com 97 anos
tem dificuldades para contar sua história de vida, pois volta-e-meia troca, esquece ou mistura
determinados fatos. O que é compreensível, e por essa razão não foi mais explorada nesta pesquisa.
Estes pedaços de cerâmicas foram encontrados no antigo Engenho das Moças, que é de
propriedade da família de Dona Marina Silva, mas ainda existe materiais nessa área de grande valia
para o esclarecimento de existência de outros artefatos.

CONCLUSÕES OU MAIS ALGUMAS CONSIDERAÇÕES


A nossa pesquisa, tendo como objeto de estudo a comunidade quilombola Tabuleiro dos
Negros, tem como objetivo apresentar a atual condição de vida sócio-econômica e cultural dessa
comunidade. Todavia, antes percorrendo algumas historiografias, percebemos a importância do
negro africano e dos afro-descendentes na sociedade penedense, portanto, é impossível negar a
participação desses povos na formação sócio-econômica e cultural desse município, embora alguns
historiadores neguem essa realidade.
Tabuleiro dos Negros é uma área quilombola, conforme relato de Dona Marina7, formada
por negros fugidos do município de Atalaia, bem como por negros vindos do Oiteiro. Isso é
comprovado nos escritos do historiador Ernani Méro. Portanto, indiscutivelmente, o Tabuleiro dos
Negros é uma Comunidade Remanescente de Quilombo.
Hoje, Tabuleiro dos Negros é uma comunidade que apresenta sinais visíveis do descaso
público, como quase todos os Quilombos Remanescentes, comunidades negras rurais, guetos e
favelas, embora não apresentando uma unanimidade negra, mas apresentam um grande percentual
de afro-descendentes.
Dizemos que no município de Penedo houve várias Irmandades e Ordens Terceiras,
salientadas por Ernani Méro, quando nos mostra a existência de inúmeras dessas entidades com a
presença acentuada de afros em Penedo, como: a de Nossa Senhora do Rosário dos Pretos, também
a de São Gonçalo Garcia dos homens Pardos e outras. Essas irmandades foram de enorme
importância, não somente para história penedense, mas, também no processo de enraizamento do
negro e do índio no contexto sócio-cultural da historiografia alagoana. A Igreja explicava, para si
mesma, sua aceitação e incentivo da escravidão baseando-se na possibilidade de "salvar os negros
do fogo do inferno". Era de primordial importância para a ideologia cristã e para os interesses
econômicos da igreja, que os negros se transformassem em cristãos o mais rápido possível. Não que
isso lhes garantisse nenhuma regalia. Mas, isso os transformava em sujeitados à Igreja e não em
sujeitos da Igreja. Tal transformação era feita muito simplesmente através do batismo em massa. A
aceitação ou rejeição não dependiam da voz dos negros.
Nessa comunidade em tela poderíamos eleger alguns fatos relevantes esquecidos com o
passado de várias gerações, mas que foram mostrados no capítulo anterior, na voz da comunidade,
através dos Senhores José Matias e João Ferreira, e das Senhoras Maria Eurotildes e Marina da
Silva, moradores naturais do Povoado do Tabuleiro dos Negros.
Na comunidade rural existe energia elétrica, distribuída por toda a extensão em quase
totalidade das casas domiciliadas. Ressalta-se que alguns casebres não contam com a presença de
luz, seja por questões de segurança ou por razões pessoais.

6
João Ferreira Pereira, agricultor, residente na rua: do Rosário n° 107 Tabuleiro dos Negros, 62 anos de idade, casado
com a Senhora Terezinha Matias, morador da comunidade, desde o seu nascimento.
7
D. Marina da Silva, agricultora e professora, residente na rua: Sto. Antônio nº 301, Tabuleiro dos Negros, 61 anos de
idade, casada com o Sr. Manoel Vital, natural da comunidade.
Fórum Internacional do Meio Ambiente - A conferência da Terra 488

Quanto à questão habitacional existente destacam-se casas de alvenaria (tijolos ou blocos),


totalizando a maioria das construções; observa-se uma minoria de casas de taipas, ressaltando a
origem do passado de formação da comunidade, também a rusticidade de inúmeras arquiteturas das
casas de farinhas, apresentando-se com traços coloniais, movidas a força humana, nas prensas,
torração da farinha e nos próprios instrumentos de uso; existem poucas casas de farinhas mecânicas,
a base de energia elétrica, salientando-se a necessidade de conformidade com os padrões atuais da
agroindústria da farinha, vislumbrando a competitividade no mercado regional. Sabe-se que a
farinha e os derivados produzidos ali são para o auto-abastecimento das famílias que a processam.
Lembramos que as tradicionais "farinhadas", de mandioca e/ou macaxeira é hábito alimentar
predominante na culinária deste povo, descendente afro.
Preocupa a erosão genética dos hábitos culturais quanto aos cultivos agrícolas existentes no
passado em relação ao presente, como o cultivo do arroz nas várzeas da região, cultivo este
realizado de forma coletiva, mutirão organizado em famílias, que se utilizavam da mão-de-obra
familiar para plantar, realizar os tratos culturais, colher, secar os grãos nos terreiros. O monocultivo
canavieiro nas últimas décadas do Século XX, que tornou essas terras de forma abrupta, em plantio
de cana-de-açúcar aliciando a mão-de-obra local para o incremento dessa nova atividade. Observou-
se nas visitas "in loco" que alguns hábitos ainda prevaleciam, como pôde se ver o costume do varal
de secagem de grãos como o de feijão-de-arranca, amendoim; também se constatou a existência de
quintais com árvores frutíferas, condimentos, ervas medicinais e outros.
Quanto às manifestações culturais da localidade observou-se um côco-de-roda, que
sustenta traços do passado e a incorporação de elementos da contemporaneidade; a existência de um
terreiro de candomblé; e as festividades religiosas como a festa de Santo Antônio e a festa de Nossa
Senhora do Rosário.
Diante de todas essas características, o nosso objeto de estudo apresenta algumas
contradições históricas, engenho e quilombo. Onde sabemos que estas duas realidades são
antagônicas e portanto esse espaço não pode servir para essas duas realidades no mesmo tempo.
Todavia, não temos dúvida que a atual comunidade do Tabuleiros dos Negros, no
município de Penedo, Alagoas, é genuinamente remanescente quilombola, por apresentar seus
traços étnicos, culturais, socioeconômicos; apesar de atualmente está heterogênea, devido às
migrações e imigrações de outros povos.
Ressalta-se, contudo, a perda de costumes por seus descendentes afro, principalmente o
candomblé, devido às intervenções antrópicas contemporâneas, oriundas desde a colonização
européia no Brasil.
Constatou-se entre os descendentes agricultores, perda do saber local, principalmente em
relação aos cultivos agrícolas, que antes cultivavam roçados diversificados, comunitários, detenção
de sementes de seus ancestrais.
Hoje, as pessoas desta comunidade negra se encontram totalmente desprovidas de suas
terras, em sua maioria, devido à monocultura da cana-de-açúcar, predominante na região, e às
políticas públicas de âmbito Municipal, Estadual e Federal, que não chegam à prática na
comunidade local, ficando somente no discurso dominante.

REFERÊNCIAS
BASTIDE, Roger. As Religiões Africanas no Brasil. v. II. São Paulo: Livraria Pioneira/USP, 1971.
CARNEIRO, Edison. Religiões Negras. Biblioteca Scientifica. Rio de Janeiro : Civilização
Brasileira S/A, 1936.
CAROATÁ, José Próspero Jeová da Silva. Crônica do Penêdo. Maceió : DEC, 1962.
DIEGUES JÚNIOR, Manuel. O Banguê nas Alagoas. Traços da Influência do Sistema Econômico
de Engenho de Açúcar na Vida e na Cultura Regional. Rio de Janeiro : IAA, 1949.
______. Etnias e Culturas no Brasil. Rio de Janeiro : Biblioteca do Exército, 1980 (Col. General
Benício, V. 176, publ. 497).
DUARTE, Abelardo. Folclore Negro das Alagoas. Maceió : SENEC, 1974.
______. Negros Muçulmanos nas Alagoas (Os Malês). Maceió : Edições Caeté, 1958.
Fórum Internacional do Meio Ambiente - A conferência da Terra 489

FREITAS, Décio. Palmares, a guerra dos escravos. Rio de Janeiro : Edições Graal, 1981.
LINDOSO, Dirceu. Formação de Alagoas Boreal. Maceió : Edições Catavento, p.204, 2000.
MORAES FILHO, Mello. Festas e Tradições Populares no Brazil. Rio de Janeiro : Fauchon e Cia.,
1888.
MÉRO, Ernani Otacílio. História do Penedo. 1ª ed. Maceió: SERGASA, 1974.
______. Discriminação Racial nas Irmandades. Maceió: SERGASA, 1983.
______. Perfil do Penedo. Maceió: SERGASA, 1994.
MOURA, Clóvis (Org.). Os quilombos na dinâmica social do Brasil. Maceió: EDUFAL, 378p. : il.
, 2001.
RODRIGUES, Nina. Os africanos no Brasil. São Paulo, 7ª ed.: Ed. Nacional, 1988.
SANTOS, Joel Rufino dos. Zumbi. São Paulo : Ed. Moderna, 1985.
SCHUMAHER, Shuma. Gogó de Emas: a participação das mulheres do Estado de Alagoas. Rio de
Janeiro: REDEH e Imprensa Oficial do Estado de São Paulo, p. 37, 2004.
Fórum Internacional do Meio Ambiente - A conferência da Terra 490

IV. Crescimento populacional e a questão ambiental

AGLOMERADO SUBNORMAL: CARACTERIZAÇÃO SOCIOAMBIENTAL DO BAIRRO


BANANEIRA NA CIDADE DE ITABUNA BA.

Silmara Borges da Hora


Geógrafa, Especialista em Meio Ambiente e Desenvolvimento (UESB), Mestranda em Desenvolvimento Regional e
Meio Ambiente (UESC) – Universidade Estadual de Santa Cruz – Ilhéus – Bahia, Bolsista FAPESB.
silmarahora@yahoo.com
Anderson Alves Santos
Economista, Especialista em Administração Financeira e Contabilidade Gerencial (FTC-BA) Especialista em Meio
Ambiente e Desenvolvimento (UESB), Mestrando em Desenvolvimento Regional e Meio Ambiente (UESC) –
Universidade Estadual de Santa Cruz – Ilhéus – Bahia, Bolsista do Serviço Alemão de Intercâmbio Acadêmico –
DAAD. eco.economia@uol.com.br
Ronaldo Lima Gomes
Geólogo, Mestre em Geotecnia (USP), Doutor em Geotecnia (USP), professor do DCAA (UESC) – Universidade
Estadual de Santa Cruz – Ilhéus – Bahia. rlgomes@uesc.br

RESUMO
A desordenada ocupação do espaço urbano tem sido um dos problemas crescentes e, em
específico, nas cidades brasileiras. Isso porque é nas cidades que se concentrarem uma das práticas
que mais impactam as condições naturais do meio ambiente e a qualidade de vida do homem. O
processo de urbanização no Brasil, sob tais condições e características, é comumente encontrado em
todo o território nacional, onde mais de 80% da população encontra-se nos centros urbanos, com
sua maioria habitando em ocupações irregulares, subnormais e carentes de infra-estrutura e serviços
públicos essenciais. Neste contexto se insere o município de Itabuna, localizado ao sul da Bahia,
onde o crescimento populacional acelerado, atrelado ao processo de migração campo-cidade,
propiciou que 97% de sua população viesse a residir na zona urbana. Dessa forma este estudo
objetivou avaliar as características socioambientais do aglomerado subnormal Bananeira bairro
localizado na cidade de Itabuna. O trabalho teve como principal referência as informações da
Prefeitura Municipal de Itabuna. Os dados da pesquisa revelam que em relação ao seu ordenamento
urbano, prevalece no aglomerado subnormal Bananeira uma paisagem geográfica de uso e ocupação
do solo sob condições de riscos ambientais e de subnormalidade habitacional.
Palavras chaves: Ocupação desordenada, risco ambiental, urbanização

ABSTRACT
The disorder occupation of the urban space has been a growing problem and a specifically
in the Brazilian cities. It happens because in the big cities are concentrated one of the practices that
more impact the natural conditions of environmental and men’s quality of life. The process of
urbanization in Brazil, in this conditions and characteristics, is ordinarily found in all Brazilian
territory, where more than 80% of the population are in the urban center, with it´s majority living
in irregular places, lacking infra structure and essential public services. In this context the city of
Itabuna is inserted, located in the south of Bahia, where the growth of the population is fast, with
the migration process farm-city, permitted that 97% of the population were live in the urban zone.
This way, this report has the objective of evaluate the social environmental characteristics of the
neighborhood called Bananeira in the city of Itabuna. The project had as main reference the
information from the Court of the City of Itabuna. The data of the research show that related of the
neighbor urban ordered, keep the agglomerate subnormal Bananeira as a geographic space where
the use and occupation of the place are of environmental and habitations risk.
Key-words: disorder occupation, environmental risk, urbanization

INTRODUÇÂO
Fórum Internacional do Meio Ambiente - A conferência da Terra 491

Ao longo do desenvolvimento da sociedade humana e a cada nova necessidade que surge,


o homem tem explorado os recursos naturais, ocupado e transformado os espaços, realizando um
ciclo de organização e evolução demográfica, social e econômica.
A cidade, portanto, se apresenta como uma organização com aspectos estruturais
geográficos que expressam processos sociais, caracterizando particularidades desta sociedade. Esses
processos se apresentam como permanentes ou temporários, com movimentos, também, de
ocupação, organização, (des)organização, (des)ocupação e, ainda, novas ocupações.
No entanto, a desordenada ocupação do espaço urbano, como reflexo da disputa de uma
série de interesses conflitantes tem sido um dos problemas crescentes nas cidades e, em específico,
nas cidades brasileiras, desenhando um panorama desequilibrado de ocupações e relações
antrópicas, que se refletem em impactos sociais e ambientais, muitas vezes irrecuperáveis.
Nesse sentido, as cidades brasileiras têm se (des)organizado, em suas ocupações
territoriais, definidas por um inadequado zoneamento e gerenciamento ambiental, contribuindo,
significativamente, para as irregularidades do manto terrestre (movimento de massas), o
esgotamento dos recursos naturais, desequilíbrio do curso das águas e dos fatores climáticos
(inundações, secas e poluição do ar entre outros) e má qualidade de vida das populações, numa
cíclica e preocupante desarmonia do homem com o meio ambiente.
Sob essa conjuntura, cada vez mais comum nos dias atuais, é que se sustentam os
argumentos de inúmeros estudiosos das diversas áreas do conhecimento que tem seu objeto de
estudo focado no desenvolvimento humano sustentável. Eles percebem a urgência em reconhecer a
diversidade de ocupações existentes na cidade, bem como as preocupações acerca do ordenamento
territorial urbano e ambiental já que o planejamento das cidades deve evitar e corrigir efeitos
negativos do crescimento urbano sobre o meio ambiente.
Itabuna, município situado ao sul do estado da Bahia, com o total de 196.675 habitantes
dos quais 97, 20% se fixa no ambiente urbano (IBGE, 2000) esta inserido neste contexto
apresentado:
(...) um crescimento populacional acelerado e fortemente concentrado na zona urbana,
provocando sérios problemas habitacionais, principalmente para a população de baixa
renda (...) invasões e consolidação de ocupações informais. Desta forma, verifica-se que
atualmente, boa parte da população itabunense mora em assentamentos subnormais
(PREFEITURA MUNICIPAL 2001, p. 01).

Esta ocupação desordenada impacta fortemente o meio ambiente da cidade de Itabuna,


comprometendo tanto a paisagem urbana, quanto a geografia e a saúde de sua população.
Entre os assentamentos subnormais encontrados na cidade esta o Bananeira, localizado nas
margens do Rio Cachoeira e com um alto índice de risco a inundação, onde a degradação ambiental
que ocorre na área é reflexo de uma segregação socioespacial característica do sistema capitalista de
produção e do estado moderno.

FUNDAMENTAÇÃO TEÓRICA
Historicamente a urbanização tem se destacado como “um dos processos mais impactantes
no meio ambiente” (BRAGA e CARVALHO, 2001, p. 95). No Brasil, esse fenômeno não se deu de
forma diferente, a urbanização desenfreada que ocorreu nas cidades brasileiras principalmente nos
últimos sessenta anos, resultado, sobretudo de um grande êxodo rural.
As conseqüências mais evidentes do processo de urbanização nas sociedades capitalistas
colocam a miséria e a degradação ambiental das áreas habitadas pela população pobre ao lado de
espaços altamente qualificados do ponto de vista tecnológico e ambiental. (MUNIZ, 2005, p. 03).
As contradições encontradas no espaço urbano se configuram cada vez mais conflitante.
Nota-se que esse espaço é dividido em termos de espaço social e econômico e que as condições
sociais estão diretamente relacionadas às condições do poder econômico.
Esse poder é notório na demarcação aleatória do espaço urbano, que exclui e segrega uma
parcela significativa da população, a qual vive em condições de miséria, o que reflete a má
Fórum Internacional do Meio Ambiente - A conferência da Terra 492

distribuição de riquezas e de condições de bem-estar de toda a população. Nesse sentido, é possível


afirmar que o jogo de poder existente é visivelmente definido nas condições de uso e ocupação do
solo encontrado na maioria das cidades brasileiras.
(...) frutos da urbanização capitalista, nossas cidades foram marcadas pela segregação
social e diferenciação hierarquizada dos espaços, correspondendo à participação desigual
dos grupos-classes sociais no espaço. A configuração das cidades é marcada pelos
efeitos que o mercado e o Estado impõem. (VERAS 1992, p. 81)

Assim a produção do espaço urbano é influenciada por uma serie de agentes que ditam e de
certa forma definem a ocupação desse ou daquele espaço, por esta ou aquela população sendo que a
organização espacial é o resultado do trabalho humano em consonância com a natureza. A
transformação do espaço também se dá, como enfatiza Corrêa (1998), realizado através da ação do
Estado capitalista, isto quer dizer que o capital e seu Estado são os principais agentes da
organização do espaço.
(...) tal espaço configura como palco de lutas e conflitos entre os diferentes agentes e
atores que articulam uma gama de informações em busca do controle e manipulação do
poder. As articulações que ocorrem no urbano, muitas vezes organizadas pelo Estado,
geram injustiças sociais e exclusão. (MATIAS, 2005, p.175).

Dessa forma o espaço urbano torna-se segregacionista, pois a maioria das cidades segue a
lógica de um sistema de produção completamente injusto, o capitalismo. Nesse sistema, a
reprodução do capital não pode ser interrompida por nenhum motivo, os bens de consumo estão
restritos a uma pequena parte da população, e aos excluídos é negada a garantia à sobrevivência.
Dessa forma Trevisan (1999) sintetiza de forma clara essa relação sociedade capitalista, estado
moderno e degradação ambiental quando disserta que:
A sociedade capitalista e o estado moderno são vistos por ele como os maiores
responsáveis pela degradação dos recursos naturais. Ambos, sociedade capitalista e estado
moderno, estão fundados na lógica do crescimento e da acumulação de capital privado. A
competitividade é indispensável para o crescimento. O crescimento é preferível ao estado para
manter a estrutura de poder. Assim, o estado acaba subsidiando o processo de degradação dos
recursos naturais. (TREVISAN, 1999, p.24)
Como principais resultados destes processos, observa-se a propagação de habitações
subnormais e irregulares, a ocupação de áreas de proteção ambiental, a precariedade de serviços de
infra-estrutura básica, sendo que grande parte da população urbana encontra, na informalidade,
alternativas construtivas para tentar suprir sua necessidade de abrigo. Dentre essas alternativas,
podemos citar o aglomerado subnormal que de acordo com a definição estabelecida pelo IBGE no
Censo de 1991,
(...) é um conjunto constituído por unidades habitacionais (barracos, casa...), ocupando
ou tendo ocupado até período recente, terrenos ou propriedades alheias (publica ou
particular) dispostos, em geral, de forma desordenada e densa e carente, em sua maioria,
de serviços públicos essenciais. O que caracteriza um aglomerado subnormal é a
ocupação desordenada e que, quando da sua implementação, não houvesse posse da terra
ou título de propriedade (IBGE, Censo, 1991).

Decorrente dos conflitos de interesses existentes na ocupação dos espaços, a exclusão


social é um fator histórico na produção do espaço urbano brasileiro, esse conceito “é reforçado,
quando o Estado, que deveria dar garantias sociais à população como um todo, nega esse direito,
exacerbando o sentimento da população atingida por esse desamparo” (MATIAS, 2005, p. 180).
Essa situação impossibilita o cidadão de ter acesso aos bens e serviços que são direitos de todos
como saúde, educação, habitação e saneamento básico.
Fórum Internacional do Meio Ambiente - A conferência da Terra 493

METODOLOGIA
Área de estudo
A área de estudo desta pesquisa define-se como o aglomerado subnormal Bananeira
(Figura 01) localizado as margens do Rio Cachoeira na cidade de Itabuna. Possui 844 famílias,
abrangendo um total de 2.828 (PMI, 2001). É uma área de ocupação antiga localizada no subúrbio
de Itabuna, e historicamente incluído na rota dos tropeiros provenientes do distrito de Ferradas e de
outras cidades do interior que comercializavam no porto de Ilhéus.
Inicialmente, o rio Cachoeira garantia a sobrevivência dos primeiros ocupantes, que
utilizavam a água para uso doméstico e também como fonte de renda. Entre os homens, muitos
deles viviam da pesca e da captura do pitu e, entre as mulheres, havia várias lavadeiras. Atualmente,
devido ao altíssimo grau de poluição do rio, estas atividades foram praticamente extintas. Os
moradores construíram suas casas às margens do rio e sofrem, dentre muitos fatores, com as
constantes inundações. Na época das cheias, toda a área é atingida pelas águas do rio, deixando as
famílias desabrigadas.(PMI, 2001).

Figura 1 - Moradias construídas à margem do Rio Cachoeira, bairro Bananeira. Foto: PMI (2001)

Fontes e coletas de dados


A pesquisa teve como fonte de coletas de dados, informações retiradas de relatórios e
documentos oficiais da PMI, a exemplo do diagnóstico apresentado pelo Ante-projeto da
participação comunitária da Rua Bananeira, bem como de dados da Secretaria de Desenvolvimento
Urbano e Meio Ambiente (SEDUMA), pesquisas de órgãos como o IBGE, Secretaria de
Desenvolvimento Social (SDS), Empresa Municipal de Água e Saneamento (EMASA), livros,
periódicos - revistas e sites da Internet, almanaques, relatórios.

RESULTADOS
O aglomerado subnormal Bananeira apresentou resultados que reforçam a sua condição de
subnormalidade habitacional, foram identificados 827 imóveis, com 925 famílias. Das famílias
identificadas no local foram entrevistadas 844 distribuídas em 746 imóveis.
Em relação aos aspectos sociais verifico-se apenas 53,92% possuem o 1o grau incompleto,
e 16,23% são analfabetos, o que indica a baixa escolaridade da população residente no local e como
isso influencia entre outras coisas, nas condições de habitabilidade.
A identificação da tipologia habitacional dos imóveis demonstra que mais de 70% das
habitações são construídas com madeira (Tabela 01), o que confirma a predominância de barracos e
com isso o aumento do processo de favelização.
Fórum Internacional do Meio Ambiente - A conferência da Terra 494

TABELA 01 - Identificação da Qualidade dos Imóveis cadastrados quanto ao tipo das paredes,
Bairro Bananeira, Itabuna-BA, Dezembro de 2001.
Tipo Quantidade %
Alvenaria 169 22,65
Adobe 16 2,14
Madeira 540 72,40
Taipa 01 0,13
Refugos 20 2,68
Total 746 100,00
Fonte: PMI (2001)

Quanto ao tipo de ocupação do terreno, segundo dados da PMI (2001) verificou que
57,10% dos imóveis foram invadidos, 26,81% são próprios com recibo, 8,18% são escriturados,
enquanto 7,91% foram cedidos. Esses dados demonstram a falta de titulação das propriedades, o
que comprova a informalidade das ocupações configurando um panorama de irregularidades quanto
a posse do solo urbano.
Os aspectos ambientais permite destacar que é eminente os fatores de riscos que norteiam a
comunidade (Tabela 02), já que aglomerado subnormal Bananeira está localizado em trecho da
margem do Rio Cachoeira e logo inserindo-se em um contexto de ocorrência de instabilizações
ambientais. Dessa forma os dados revelam que mais de 80% da população esta vulnerável a uma
grande variedade de riscos.

TABELA 02 – Identificação dos Imóveis quanto aos fatores de risco, Bairro Bananeira, Itabuna-
BA, Dezembro de 2001.
Tipo Quantidade %
Desabamento 66 8,85
Soterramento 10 1,34
Inundação 522 69,97
Não Existe 148 19,84
Total 746 100
Fonte: PMI (2001)

Em função desses fatores grande parte dos domicílios do bairro é inundado pelas águas do
Rio Cachoeiras em tempos de cheias ocasionando muitas perdas, com isso muitas famílias ficam
desabrigadas (Figura 02) necessitando da intervenção do poder público.
Esses dados são corroborados através da identificação dos imóveis quanto ao
posicionamento na área de risco onde mais de 70% dos imóveis estão localizados em áreas de
baixada e com isso mais suscetíveis a inundações ocorridas com as cheias do Rio Cachoeira.

Figura 2 - Moradias destruídas por causa da cheias do Rio Cachoeira, bairro Bananeira. Foto: PMI
(2001).
Fórum Internacional do Meio Ambiente - A conferência da Terra 495

Outro aspecto importante a ser citado é a carência da área em relação aos serviços públicos
essenciais, a exemplo do esgotamento sanitário onde apenas 5,90% dos domicílios possuem o
referido sistema, 11,53% lançam o esgoto no sistema de drenagem e 82,57% na superfície, correndo
a céu aberto. Os dejetos e resíduos sólidos gerados pela comunidade são lançados ao longo do rio
Cachoeira contribuindo para o aumento das doenças de veiculação hídrica e poluição ambiental.

TABELA 03 - Infra-estrutura da Área quanto ao Esgotamento Sanitário, por Imóvel Cadastrado,


Bairro Bananeira, Itabuna-BA, Dez/2001.
Tipo
Quant. %
Ligado à Rede Pública 29 3,89
Fossa e Sumidouro 15 2,01
Correndo pela Superfície 616 82,57
Lançado no Sistema de Drenagem 86 11,53
Total 746 100
Fonte: Cadastro Físico Sócio-Econômico, Bairro Bananeira.

Várias deficiências foram detectadas no sistema viário do bairro bananeira, entre elas
podemos destacar a pavimentação precária e em alguns setores a falta de pavimentação, ruas
apresentando um traçado irregular o que demonstra a falta de planejamento e a forma desordenada
em que ocorreu a ocupação do solo, a existência de becos em alguns pontos o que torna impossível
o trafego de automóveis e inviável a coleta de resíduos na porta.

Figura 03: Esgoto correndo na superfície das ruas da área, Rua Bananeira, Itabuna, Bahia. Fonte:
PMI (2001).

Figura 03: Sistema viário da Rua Bananeira. Fonte: PMI (2001).


Fórum Internacional do Meio Ambiente - A conferência da Terra 496

Assim nota-e que o problema que agrava a subnormalidade na área em estudo é também a
conivência do poder publico municipal para as situações de mau uso e ocupação do solo, quando
permite ocupações irregulares em terrenos não apropriados para edificações (encostas, margens de
rios, áreas alagadiças, entre outras condições), ocupados através de invasões. Essa conivência se dá
devido à ineficácia no desenvolvimento de uma política que realmente resolva o problema da
habitação para essas pessoas.

CONCLUSÃO
A ocupação desordenada às margens do Rio Cachoeira e, consequentemente, em seu trecho
inundável, configura o cenário de calamidade da população que em períodos de enchentes ficam
desabrigadas, retornando ao espaço quando as águas voltam ao seu curso normal. Nesse contexto, o
risco ambiental é eminente, mas parece não se configurar como empecilho à permanência da
população no local, que em função de aspectos econômicos acham na informalidade uma alternativa
de abrigo.
O quadro de subnormalidade na área de estudo se caracteriza como grave na condição
habitacional. Há um número elevado de ocupações em áreas inadequadas e em situações de risco.
Essa subnormalidade se caracteriza pela precariedade da construção de grande parte das moradias,
precariedade e carência de infra-estrutura e serviços urbanos, definidas pela falta ou restrição de
abastecimento de água e esgotamento sanitário; problemas relacionados a coleta de lixo, varrição,
drenagem das águas pluviais e pavimentação de vias; pela proximidade a cursos d’água ou
construções em terrenos propícios a deslizamentos de terras e erosões, que coloca um número
elevado de domicílios sob risco de inundações, deslizamentos, entre outros; e, por último, pela
situação fundiária irregular das construções e terrenos, cujos habitantes não são proprietários
legítimos do solo que ocupam
Essa subnormalidade habitacional da área é reflexo de conflitos existentes no espaço
urbano, relacionados a fatores socioeconômicos que levaram à referida ocupação territorial pelos
respectivos atores sociais, e dados das condições de riscos em que essa população se encontra.
Esse processo de exclusão social e territorial explicar, em parte, uma das causas do
desequilíbrio social e da degradação ambiental, que ocorre na Bananeira. A população do bairro
coloca em risco sua integridade física ao aloja-se nas margens do Rio Cachoeira, área de
preservação permanente e de constate risco a inundação.
Assim, é possível afirmar que o espaço urbano mostra-se desigual e contraditório. E na
medida em que a área urbana é ampliada, os gastos econômicos, ambientais e humanos, se
agigantam. Portanto, a organização espacial, delineada pelo Estado pode favorecer ou preterir
oportunidades de melhor ou pior condição de vida aos seus atores sociais, em um dado espaço.

REFERÊNCIAS
BRAGA, Roberto, CARVALHO, Pompeu F. C; (Orgs.). Perspectiva de gestão ambiental em
cidades médias. Rio Claro: Laboratório de planejamento municipal – IGCE – UNESP, 2001, p. 95-
109.
CORRÊA, Roberto Lobato. Região e organização espacial. São Paulo: Ática, 1998. 93p.
IBGE/Censo 1970, 1980, 1991. Contagem da População. 1996, 2000. In: CDROOM. Censo, 1991.
ITABUNA. Anteprojeto de participação comunitária: Rua Bananeira. Itabuna: Prefeitura
Municipal/Secretaria de Desenvolvimento Social/ Coordenação de habitação de Bem Estar Social,
2001.
ITABUNA. Plano Estratégico para assentamentos subnormais: Diagnostico sobre a capacidade
institucional do município. Prefeitura Municipal de Itabuna, Seta Projetos, 2001.
MATIAS. Vandeir Robson da Silva. Exclusão Social e Pobreza no Espaço Urbano - O Papel do
Estado na Sociedade Capitalista Brasileira: Contribuições para um debate. Disponível em
http://www.ig.ufu.br/caminhos _de_geografia.html. Acesso em: 13/09/2005.
Fórum Internacional do Meio Ambiente - A conferência da Terra 497

MUNIZ, Maria Águeda. Construindo Cidades Sustentáveis Através do Planejamento Urbano: Uma
Visão do Processo de Gestão nas Cidades Brasileiras. Disponível em: http:// www.ub.es. Acesso em
17/06/2005.
TREVISAN, Salvador D.P. Sociedade – Natureza: Uma Concreta e necessária integração. Rio de
Janeiro: Papel e Virtual, 1999. 24p.
VÉRAS, Maura Pardine Bicudo. Cortiços em São Paulo: velhas e novas formas da pobreza urbana e
da segregação social. In BÓGUS, Lúcia Maria. WANDERLEY, Luiz Eduardo W. (Org). A luta
pela cidade de São Paulo. São Paulo: Cortez, 1992. 170 p.
Fórum Internacional do Meio Ambiente - A conferência da Terra 498

CRESCIMENTO POPULACIONAL E IMPLICAÇÕES AMBIENTAIS NA ILHA DO


BISPO

Daise Fernandes da Costa


Marcos Aurelio Martins da Costa

RESUMO
O presente trabalho, versa a respeito da análise dos principais impactos ambientais
decorrentes da problemática do crescimento populacional na área ribeirinha, do bairro da Ilha do
Bispo, localizado na parte oeste do município de João Pessoa, Paraíba. No inicio, a ocupação do
bairro da Ilha do bispo se comportou, eminentemente, como uma vila. Tendo como fator motivador
para está ocupação, a atividade extrativista, a qual permanece na atualidade de maneira menos
ostensiva. Tendo em vista a degradação do meio ambiente. O surgimento da fábrica de cimento
(CIMEPAR) foi outro ponto de atração para ocupação da referida área. A ocupação desordenada,
vem provocando ao longo dos anos o assoreamento do Rio Sanhaúa, tendo em vista que os
ribeirinhos constroem casas para novos membros da família em cima de metralhas que eles
depositam no rio, objetivando criar um espaço novo ou ampliar o espaço doméstico
A área analisada requer uma política de desenvolvimento em infraestrutura aliada a um
projeto educacional de uso e ocupação ordenada do solo e da biodiversidade.
Palavras-chave: população. moradia. solo. impacto ambiental. educação.

ABSTRACT
The present work, turms regarding the principal corrent environmental impacts of the
problem of the population growth analysis in the riverine area, of the neighborhood of the Bishop’s
island, located in the part west of the municipal district of João Pessoa, Paraiba.

APRESENTAÇÃO
O bairro da ilha do Bispo está situado às margens do Sanhauá, rio que cruza a Capital
paraibana no sentido sudeste-nordeste e deságua no rio Paraíba.
A ocupação da área da Ilha do Bispo ocorreu durante o processo de colonização da capital
paraibana, devido um desentendimento entre as tribos indígenas e os colonizadores, os tabajaras
ocuparam a margem direita do rio Sanhauá e os Potiguaras à margem esquerda.
Nesse período, o território da cidade de João Pessoa era habitado por indígenas do grupo
Tupi e Guarani, que viviam sediados em aldeias localizadas nas margens do Rio Paraíba e seus
afluentes. Com o desenvolvimento da cidade, que teve como ponto inicial o atual bairro do Porto do
Capim, e as instalações das colônias religiosas de missionários católicos (franciscanos,
capuchinhos, etc.), teve início à divisão dos bairros da cidade que passou a se expandir na direção
sul.
A princípio trataremos à respeito do uso conflitante dos recursos naturais e da forma
como se deu a ocupação urbana no município em qual o bairro está inserido. Destacamos em
seguida a avaliação de funções e condições Sócio Econômicas dos Bairros em Áreas Ribeirinhas,
estando em foco o Bairro da Ilha do Bispo.
O Objetivo deste trabalho foi analisar o crescimento populacional e sua implicação com a
condição de vida excludente, pelas quais essa comunidade passa, sobretudo sob os aspectos
econômicos, de infra – estrutura e de emprego. Também estudamos a população da comunidade
ribeirinha, dimensionando o estudo para uma proximidade de sua realidade urbana, com os
impactos ambientais causados pelo uso do solo desordenado.

DESENVOLVIMENTO
Segundo moradores mais antigos da área, a ilha do Bispo era pertencente a Fazenda da
Graça, que hoje não mais existe, tendo sido vendida em meados do século XX.
Fórum Internacional do Meio Ambiente - A conferência da Terra 499

A ocupação urbana do bairro da ilha do bIspo começa a se tornar maciça a partir da


exploração mineral, com a indústria de cal, que anos mais tarde passa a produzir cimento.
Com as freqüentes crises que se somaram do passar dos séculos, em virtude do crescente
aumento demográfico, cada governo administrativa a seu modo, de maneira mais simples e rápida,
para eles próprios uma forma de afastar a classe pobre para áreas distantes e desvalorizadas das
periferias da cidade, a ilha do bispo é um dos exemplos deste tipo de administração: de vila de
trabalhadores a favela.
Anos depois, no local onde se situava o casarão da fazenda, foi construída a fábrica de cal
que atendia pelo nome de Portela, hoje em virtude da mudança de proprietário tem como nome
fantasia Cimepar, tendo como produto de fabricação o cimento.
Mesmo com o trabalho na fábrica, há uns 40 anos essa comunidade desenvolveu um modo
de vida em que as atividades econômicas, sociais e culturais dependiam fundamentalmente, da sua
localização à margem direita do rio Sanhauá da existência do mangue e dos ciclos biológicos que
neles se desenvolve (ritmo das marés, dos peixes, dos crustáceos, etc.) e da sua proximidade com o
centro da capital. Mas a realidade atual é totalmente diferente.
O aumento do contingente populacional nessa área tem provocado conseqüências
inevitáveis aos ecossistemas, devido a construção desordenada de casas as margens do rio. Cada vez
mais, observam-se graves problemas de desequilíbrio ambiental que resultam na perda de habitats,
redução da biodiversidade e alteração nas características ecológicas dos ecossistemas, muitas vezes
de caráter irreversível. È fácil identificar que o desequilíbrio na relação homem/ natureza está por
detrás desses problemas e que esse desequilíbrio é fruto do modelo de desenvolvimento que tem
dominado os destinos da economia mundial, que, como resultado, cria, de um lado, a concentração
de renda, e do outro, a miséria, onde os dois lados se vêem alienados das relações que mantêm a
integridade dos ecossistemas. Ambos anseiam pelo dinheiro, os primeiros para produzir e acumular
mais, e os últimos, simplesmente para sobreviver.

Diegues (1996,p.44), afirma:


A vida humana e não humana têm valores intrínsecos independentes do utilitarismo; os
humanos não têm direito de reduzir a biodiversidade, excerto para satisfazer suas
necessidades vitais; o florescimento da vida humana e das culturas são compatíveis com
o decréscimo substancial da população humana. O florescimento da vida não humana
requer tal decréscimo; a interferência humana na Natureza é demasiada; as políticas
devem, portanto, ser mudadas, afetando as estruturas econômica, tecnológicas e
ideológicas.

O início do processo de urbanização se deu com o fortalecimento econômico e político da


província.
Os anos vinte foi o ponto de partida no processo que definiu os espaços da cidade, tal qual
ela se configura atualmente.
Até os anos 60, a vida girava no centro, anos mais tarde passou a se expandir a partir de
dois pontos principais: A Avenida Epitácio Pessoa na direção Leste e Avenida Cruz das armas ao
sul na direção Recife.
Atualmente, a cidade de João Pessoa encontra-se ocupada até onde se estendem seus
limites administrativos. Ocorrendo a sua expansão mais no sentido horizontal.
Ao traçarmos um perfil topoclimático e geológico da região litorânea de João Pessoa,
vamos encontrar algumas características que se estendem por quase todo o litoral da Paraíba
A história geológica dessa região está formada por momentos de transgressão e regressão
do mar, com soerguimento do relevo, além de mudanças climáticas no quaternário, e um substrato
geológico composto por formação calcária. Essa formação calcária compõe o substrato da área em
estudo, o bairro da Ilha do Bispo, (a margem direita do Rio Sanhauá), situado como um afluente do
estuário do rio Paraíba.
Fórum Internacional do Meio Ambiente - A conferência da Terra 500

A estabilidade das comunidades ribeirinhas resulta de um complexo jogo entre os


indivíduos, fatores e condições ambientais. Essa estabilidade é produzida a partir de um importante
fator que é a dispersão. Além disso, o conhecimento limitado à competência pragmática em
desempenhos de rotina combinados àquele resultante das perturbações hidrológicas, eventos de
cheias e de seca ocupam lugar eminentemente no acervo social do conhecimento das comunidades
ribeirinhas.
Na área estudada, o olhar atua na definição de territórios pelos ribeirinhos, o que parte,
portanto de aspectos visuais.
A associação entre o olhar e a construção deste espaço na percepção daqueles que o
vivenciam, mostra a participação profunda dos sentidos, na constituição dos valores atribuídos ao
lugar pelos moradores. A beira do rio existe na medida em que é visível.
Conforme Carlos (1988, p. 15):
O Espaço não é humano porque o homem o habita, mas porque o constrói e o reproduz,
tornando o objeto sobre o qual recaí o trabalho e algo que lhe é próprio. Por outro lado, o
espaço passa a ser produzido em função do processo produtivo geral da sociedade. É
assim um produto histórico cultural apresentando a cada momento as características e
determinações da sociedade que o produz.

Existem aqueles que vivem no “beiço do rio” e os que moram no “centro”, que constitui as
terras mais afastadas do rio, onde a população não convive com águas do rio de forma tão direta
quanto os ribeirinhos. Uma série de distorções quanto aos hábitos, as características do
comportamento e o modo de vida, marcaram a diferença entre quem mora em um e outro lugar, na
concepção dos ribeirinhos”. O fato de viver no “beiço do rio” é um fator de identidade muito
significado para estas pessoas. Nesse sentido, identidade e percepção espacial se relacionam e se
constroem mutuamente, interagindo com o visual.
A compreensão da interação entre a cultura da população ribeirinha e o processo de
valorização do espaço vivido, partindo da percepção e da experiência, nos conduz a um
entendimento da relação sociedade natureza na beira do rio que leva em conta a efetividade do
indivíduo e sua história de vida. É através das ações e das possibilidades de ações, que os lugares se
constroem, investidos de valor simbólico, relacionando materialmente e subjetividades.
A sobrevivência da maioria das comunidades ribeirinhas baseia-se na interatividade com o
meio natural. A pesca, é uma das atividades que mais influência nas relações entre o homem e a
natureza, tem grande representatividade, não só como fonte de alimento, mas também como
atividade profundamente envolvida nas formas da população criar seu sistema de valores a partir da
convivência com o rio.
No bairro da Ilha do Bispo, esta atividade encontra-se hoje em ritmo lento, devido à baixa
produção pesqueira, a qual foi ocasionada pela degradação ambiental do rio, causada por diversos
fatores, dentre eles o assoreamento do rio para fins de construção de casas à beira do rio.
A venda do excedente varia de acordo com a quantidade pescada e com a ocupação
principal do pescador. A atividade da pesca é algumas vezes combinada com agricultura ou
pecuária extensiva, podendo também o ribeirinho dedicar-se exclusivamente à pesca.
Outra noção fundamental para a compreensão do valor da pesca na organização das vidas
social e afetiva dos homens ribeirinho é da autonomia.
A autonomia a maneira de como a pesca se realiza em algumas áreas sempre em pequenos
barcos próprios ou pertencentes a um compadre ou um companheiro de pesca. O fácil acesso às
canoas (nem todos possuem uma, é comum tomar emprestado o barco de um amigo ou parente, ou
então sair acompanhando um companheiro que seja dono de uma pequena embarcação) e a ausência
ou flexibilidade de relações hierárquicas que os obriguem a transações comerciais pré-estabelecidas,
permite que os pescadores saiam para a pesca em função de sua necessidade e disponibilidade. Isto
não significa dizer que a vida de pescadores seja uma vida “descansada” – eles saem para pescar
todos os dias e o trabalho é muito duro, passando noites a fio sem dormir.
Segundo Gomes: (1990, p.14)
Fórum Internacional do Meio Ambiente - A conferência da Terra 501

Por intermédio do seu trabalho de cunho produtivo e social, o homem historiciza a


natureza, isto é, repassa a ela o desenvolvimento civilizatório (econômico/social,
científico/ tecnológico, artístico) na proporção de sua capacidade de transformá-la e de
sentí-la dotada de superior dimensão social.(...).

É bom frisarmos que só a socialização da natureza na medida em que ela se beneficia


concretamente dos avanços da humanidade que possibilitam mantê-la, preservada em seus valores
naturais e sociais. Caso contrário, isto é, no processo inverso de depredação, portanto, de utilização
irracional, ela é transformada em mera mercadoria descartável.
As maiores taxas populacionais da atualidade podem ser constatadas nos paises como o
Brasil (emergente), onde os rendimentos da maioria são baixos. Estas mudanças acarretam também
um aumento considerável no empece de pobreza, que passa a ser muito mais urbano, sendo uma
problemática não só dos paises subdesenvolvidos como também dos desenvolvidos. O resultado
destes inchamentos populacionais, são as formações de comunidades carentes e totalmente
excluídas, como é o caso da Ilha do Bispo.
Nesta área existe um grande percentual de área coberta com manguezal do rio Senhauá,
apesar das agressões ao meio ambiente por meio de:
Degradação de manguezais;
Subutilização e aterros dos manguezais;
Desmatamento de áreas remanescentes de Mata Atlântica e seus ecossistemas associados;

È possível observar que os representantes políticos, nos três pontos abordados, precisam
adotar medidas que dizem respeito à gestão ambiental, para essa área da Capital, de forma que
visem equilibrar o desenvolvimento socioeconômico, com uso dos recursos – naturais, de maneira
que haja uma preservação dos bens renováveis e não –renováveis da natureza.

Quadro 1 – Diferentes impactos e suas respectivas causas


Problemas Causas
Poluição do solo Esgotamento sanitário inadequado,
problemas operacionais da rede coletora.
Contaminação do lençol freático Infra – estrutura deficiente agravada pelo
esgotamento sanitário inadequado.
Poluição hídrica Lançamento do esgoto sanitário no rio,
lançamento do lixo doméstico através de
anais a céu aberto.
Poluição do ar Fumaça lançada na atmosfera devido a
produção do cimento. Odor desagradável
da água onde se localizam as casas às
margens do rio.
Poluição sonora Atividades de lazer de bares e clubes,
propagandas em carros de som, eventos
domésticos, passagem do trem.
Poluição visual Disposição inadequada de lixo nas ruas e
em terrenos baldios
Agravamento das enchentes e avanços do Assoreamento, ocupação inadequada às
rio Sanhauá margens do rio, retirada da mata.
FONTE: Organizado por Daise Fernandes, em pesquisa direta na área de estudo.

As maneiras inadequadas do uso do solo ao longo dos anos, têm comprometimento de


maneira irreversível o ecossistema desta área, a raiz deste problema são muitas, mas se fosse
possível garantir:
Uma educação ambiental para a população;
Fórum Internacional do Meio Ambiente - A conferência da Terra 502

Garantir a reconstituição das matas degradadas;


E garantir a preservação destas áreas.

CONCLUSÃO
A ocorrência do crescimento populacional nas proximidades de rios e de áreas inadequadas
para habitação humana, têm aumentado em certas áreas, sua mobilização urbana e implica em
alterações ambientais.
Quando certos ambientes começam a incomodar as classes sociais mais elevadas, estas
procuram locais mais reservados e exclusivos, longe da agitação e da miséria social. O que não
ocorre com a classe pobre que procura solucionar o problema de moradia ocupando áreas de
preservação ambiental.
Vivemos o período da informação, mas existe uma carência de leitura e educação para que
se possa melhor compreender o quanto é necessário a construção de um espaço sadio, onde se
obedeça as leis de preservação ao meio ambiente.
É possível alcançar um bem estar físico e social, desde que se construa um espaço urbano
de maneira coerente sem que se agrida o meio ambiente, sabendo aproveitar os recursos e
potencialidades oferecidas pela natureza. Mesmo, que a cada dia aumente o contingente
populacional da área de estudo.

REFERÊNCIAS BIBLIOGRÁFICAS
BRASIL. São Paulo. Instituto Oceanográfico da Usp. Setembro/1988.
CARLOS, Ana Fani A.. Espaço e Industria. São Paulo: EDUSP, 1988.
DA MATTA, Roberto. A Casa e a Rua. Rio de Janeiro. ED. Guanabara. 1987.
DIEGUES, Antonio Carlos. A Imagem das Águas. Ed. Hucitec. São Paulo. USP/2000.
---------------------------------. Programa de Pesquisa e Observação de Áreas Úmidas no
GOMES, Horieste. A Produção do Espaço Geográfico no Capitalismo. São Paulo; Ed. Contexto,
1993.
TRAVASSOS, Simão. História da Conquista da Paraíba (Sumario das Armas que se fizeram, e
guerras quase deram na conquista o Rio Parayba em 1593) Campina Grande. FURNR/UFPB, 1983.
Fórum Internacional do Meio Ambiente - A conferência da Terra 503

CRESCIMENTO POPULACIONAL E DEGRADAÇÃO AMBIENTAL: UMA VISÃO DOS


RECURSOS HÍDRICOS NO SUDOESTE DA AMAZÔNIA

Waldemir Lima dos Santos


Professor Assistente do Departamento de Geografia da Universidade Federal do Acre – UFAC.
Universidade Federal do Acre - Campus Universitário Reitor Aulio Gelio Alves de Souza –
Rodovia, BR 364, nº 6637 (Km 04) – Distrito Industrial - CEP: 69915-900 - Rio Branco – Acre.
waldemir_geo@yahoo.com.br

RESUMO
A crescente ocupação espacial das diversas cidades localizadas no sudoeste amazônico está
intimamente ligada à migração rural-urbana ocorrida, mais freqüentemente, a partir da década de
1970 em todo Estado do Acre, trazendo consigo graves problemas de ordem ecológica, sentidas no
final do século XX e início do XXI. Nesse sentido, o presente artigo analisa o processo de
crescimento urbano aliado à apropriação dos recursos naturais, focalizando a ocupação das Áreas de
Preservação Permanente (APP) dos mananciais aquáticos como ponto de desequilíbrio ecológico,
promovendo a degradação ambiental e transformando o meio ambiente em um verdadeiro caos.
Dois igarapés constituíram o estudo de caso: igarapé Batista (afluente da margem esquerda do rio
Acre) e igarapé Judia (afluente da margem direita), enfatizando o comprometimento do
funcionamento pleno desses mananciais aquáticos. Sugere-se a formulação de uma política de
gestão dos recursos hídricos, baseada na construção dos planos de bacia hidrográfica, como forma
de amenizar a pressão antrópica sobre os ecossistemas aquáticos, definindo critérios
conservacionistas de uso dos recursos hídricos.
Palavras-chave: Urbanização. Hidroecologia. Recursos Hídricos. Impactos sócio-ambientais.

ABSTRACT
A growing spatial occupation of several cities located in the southwest Amazon is closely
linked to rural-urban migration occurred, most likely, from the 1970 throughout state of Acre,
bringing serious problems in the ecological, felt at the end of XX century and beginning of the XXI.
Accordingly, this article examines the process of urban growth combined with the ownership of
natural resources, focusing on the occupation of Areas of Permanent Preservation (APP) of the
watershed as a point of ecological imbalance, promoting environmental degradation and
transforming the environment in a chaos. Two waterstreans were the case study: waterstream
Batista (tributary of the left margim of the river Acre) and waterstream Judia (tributary of the right
margim), emphasizing the commitment of full operation of these watershed aquatics. It is suggested
the formulation of a policy for water management, based on the construction of the basin plans as a
way to alleviate the pressure on anthropic aquatic ecosystems, setting conservationists criteria for
use of hydrics resources.
Key-words: Urbanization. Hydroecology. Hydrics resources. Social-environmental impacts.

INTRODUÇÃO
O acelerado crescimento das cidades de médio e grande porte em nível mundial, nacional e
regional, vem causando profundas transformações nas relações entre o homem e a natureza,
gerando a necessidade de se rever antigos conceitos quanto a finitude dos recursos naturais e
também buscar novas formas possíveis para conciliar desenvolvimento urbano e meio ambiente,
através de práticas que visem o desenvolvimento sustentável, amenizando os processos de
degradação ambiental.
A migração rural-urbana ocorrida mais freqüentemente a partir da década de 1970,
ocasionando a crescente ocupação espacial das diversas cidades localizadas no sudoeste amazônico,
principalmente em Rio Branco, capital do Estado do Acre, trouxe consigo graves problemas de
ordem ecológica, sentidas no final do século XX e início do XXI. Nesse sentido, desenvolvimento
Fórum Internacional do Meio Ambiente - A conferência da Terra 504

urbano e urbanização são termos indissociáveis, que consideram o aumento populacional nas
cidades como propulsora da fixação de novos investimentos.
Como pauta principal de discussão, já percebido global e regionalmente e também sendo
alvo de discussão local, está a questão da destruição dos ecossistemas aquáticos, aliada à falta de
água potável para suprir as necessidades da população nas próximas décadas, ferindo os princípios
do sonhado desenvolvimento sustentável para a região (SANTOS, 2005).
O desenvolvimento urbano, baseado fundamentalmente na modelagem do espaço natural
em artificial, surge como uma meta a ser atingida a partir deste início de século, motivado pela
autêntica forma de aprimorar as condições de vida dos habitantes das cidades. Na contramão disso,
apresenta-se uma desconfiguração da paisagem natural oriundos, tanto da destruição das áreas de
mata como da nova face atribuída aos mananciais aquáticos através da destruição hidro-ecológica,
principalmente nas localidades que centralizam produtos e serviços, geralmente, nas regiões
metropolitanas.
Na visão de SPOSITO (2001) a urbanização acelerada, observada a partir da segunda
metade do século XX nos países de economia dependente, é responsável pelos diversos problemas
urbanos que promovem a chamada desordem urbana, derivada de um crescimento populacional
muito rápido das cidades, em razão do alto índice de crescimento vegetativo e a intensa migração.
Com isso, a primeira observação negativa proveniente do impacto desta centralização é
referente ao processo migratório que apresenta-se constantemente das áreas menos assistidas (meio
rural) para os centros mais desenvolvidos (avançados tecnologicamente, com maior prestação de
serviços), culminando com o afloramento de graves problemas sócio-ambientais. Contudo, indicam
BURSZTYN et.al. (1993) que isso é proveniente de dois grandes fenômenos que ocorrem no Brasil
e, em especial na Amazônia: a concentração de renda e o processo de concentração fundiária, que
estimulou, este último, o deslocamento de parcelas consideráveis da população rural para as
cidades, ampliando o ritmo de favelização, tornando-se um dos maiores problemas ambientais da
região.
O problema mais agravante é a ocupação das Áreas de Preservação Permanente (APP) e
construção de moradias em fundos de vales, resultado do déficit habitacional e o “despreparo” das
cidades ao receber esses migrantes, apresentando, em sua grande maioria, aspectos de extrema
pobreza e, como conseqüência, determinando níveis muito baixos de saúde e expectativa de vida.
Conforme observou SANTOS (1989), a cidade deve ser capaz de dar resposta, por
intermédio de investimentos adequados, às necessidades criadas em matéria de serviços e de
empregos aos habitantes. Considera, ainda, que os meios técnicos e financeiros devem ser
suficientes para ativar a produtividade do campo, sob pena de experimentar resultados nocivos à
qualidade de vida.
Via de regra, o desenvolvimento urbano alimentado pelos desejos do homem não pode se
desassociar da conservação dos recursos naturais, notadamente os recursos hídricos, haja vista que
da associação dessas duas correntes (expansionista e conservacionista) depende, em grande parte, a
manutenção do ser humano enquanto ser social vivo.
No entanto, a harmonia homem - natureza não deve ser entendida como verdadeira em sua
totalidade, considerando-se que o homem ao apropriar-se dos serviços ambientais tende a destruir e
pressionar o meio natural em nome da “pós-modernidade”.
Através dos séculos, observou-se que crescimento populacional e recursos hídricos
possuem relações antagônicas entre si e que a complexidade nos usos múltiplos da água veio
aumentar e produzir um mecanismo crônico de degradação e poluição. Aliado a isso, os diversos
usos do sistema hídrico para as diversas finalidades (doméstico, industrial, irrigação, etc), têm
diminuído consideravelmente a disponibilidade de água e produzido inúmeros problemas de
escassez e, em muitas localidades, problemas de saúde pública (TUNDISI, 2003).
A intensa ocupação das Áreas de Preservação Permanentes (APP), principalmente as áreas
marginais dos rios e igarapés, representa o primeiro passo para o desequilíbrio ecológico. O
desmatamento das matas ciliares aliado a construção de moradias, procedido da destinação de
Fórum Internacional do Meio Ambiente - A conferência da Terra 505

esgoto in natura e processos erosivos das margens dos igarapés, é o sinal mais evidente de que essa
relação é tão conflituosa quanto harmoniosa (SANTOS, 2005).
Considerando esta tendência, tanto nos rios e igarapés do sudeste brasileiro, como também
em algumas cidades da região Norte, como por exemplo Manaus/AM e Belém/PA, necessário se
fez, no caso da cidade de Rio Branco/AC, dividir-mos os igarapés em duas categorias distintas:
igarapés rurais e igarapés urbanos.
Rapidamente, têm-se que os igarapés rurais são aqueles ainda providos de mata ciliar em
grande parte ainda intacta e que, por conta disso, apresenta um índice de qualidade de água
favorável ao resguardo da fauna e flora aquática, favorecendo o consumo de água “limpa” pelos
seres humanos.
Em contrapartida, os igarapés urbanos são considerados mananciais de água que possuem a
mata ciliar bastante alterada, em fragmentos, grande parte da área cedendo lugar a construções para
moradia. Nesses ambientes, a água é imprópria para o consumo humano e para a dessedentação de
animais, sendo uma forte concorrente para a disseminação de doenças de veiculação hídrica e a
instalação do caos definitivo.
Este artigo tem como funcionalidade principal de demonstrar a degradação ambiental dos
mananciais aquáticos na cidade de Rio Branco (AC), tomando como estudo de caso os igarapés
Judia e Batista, fornecendo subsídios e atentando para a recuperação das APP’s dos mesmos,
doravante a importância desses mananciais para a comunidade. Realiza-se uma análise entre o (des)
equilíbrio natural e a forma caótica de como se encontram os igarapés “urbanos” na cidade de Rio
Branco (AC).
Diante dos problemas causados pelo crescimento desordenado das cidades, necessário se
faz conciliar desenvolvimento urbano e preservação do meio ambiente, onde o planejamento
ambiental torna-se de fundamental importância como mecanismo capaz de harmonizar a relação
homem e natureza, no sentido de promover o equilíbrio sistêmico no meio natural.

MATERIAIS E MÉTODOS
A área de estudo compreende a cidade de Rio Branco (AC), onde foi realizada uma análise
sobre a relação homem - natureza, que compreendem os movimentos de (trans) formação da cidade,
em sincronia com as etapas de evolução e contradições da fragmentação e apropriação do espaço
urbano. Considerou-se como estudo de caso, as Áreas de Preservação Permanentes (APP’s) do
igarapé Batista (afluente da margem esquerda do rio Acre), com a foz localizada sob as coordenadas
9º57’43” S e 67º50’20” W, e do igarapé Judia (afluente da margem direita), situado nos municípios
de Senador Guiomard (AC) e Rio Branco (AC), com sua foz situada entre as coordenadas de
09º58’24” S e 67º47’30” W. Enfoca-se o crescimento populacional e a ocupação das APP’s, onde
foi realizada uma análise espacial para comprovar a ocupação dessas áreas e o conseqüente grau de
degradação ambiental.

RESULTADOS E DISCUSSÃO
O incremento populacional observado ao longo dos anos nas médias e grandes cidades da
Amazônia, tem despertado atenção especial entre os vários estudiosos sobre o assunto. Analisando
este crescimento, que tem como responsável a migração da população rural para as cidades,
diagnosticou-se que esse fenômeno ocorreu com maior intensidade a partir da década de 1970, onde
se observa uma inversão nos índices de residência populacional por situação de domicílio, conforme
se observa no gráfico 1.
Fórum Internacional do Meio Ambiente - A conferência da Terra 506

Como se vê, a tendência para as próximas três décadas é de aumento considerável da


população para a cidade de Rio Branco (AC), caso não seja instituído mecanismos para manter a
população do campo no campo. A população rural representará 1,25% do total em 2030 e, em
conseqüência, 98,73% estarão residindo na cidade. Como resultado, a busca por recursos naturais
para abastecer esta população será mais evidente, notadamente sobre os recursos hídricos,
considerando a poluição por despejo de dejetos nos canais fluviais e a ocupação das APP’s. O uso
diverso da água também representa problema, segundo TUNDISI (2003) a diversificação dos usos
múltiplos dos recursos hídricos depende do grau de concentração da população humana, do estágio
de desenvolvimento econômico regional e da intensidade das atividades nas bacias hidrográficas. A
região Amazônica, até então considerada como um “vazio demográfico” e detentora da maior bacia
hidrográfica do mundo, está diante de um incremento populacional precoce dos núcleos urbanos e a
relação com os recursos hídricos merece ser repensada.
Como estudo de caso, a bacia do Igarapé Batista vem sofrendo uma forte degradação
ambiental, diretamente envolvida com o processo de transformação da economia local. Nas
cabeceiras do igarapé principal, onde se localizam a maioria das nascentes, a destruição está ligada
às queimadas associadas com a prática da agricultura de subsistência, prevalecendo também a
atividade pecuária de caráter extensivo, culminando na atual pressão antrópica proporcionada pelo
crescimento urbano. Segundo HENKE-OLIVEIRA (1996) apud FERREIRA (2005) a falta de visão
e imediatismo dos administradores locais associados à urbanização convulsiva e a especulação
imobiliária são os principais responsáveis por estas práticas.
A bacia do Igarapé Batista já teve papel representativo para a comunidade local, sendo
outrora utilizada para lazer, recreação e abastecimento de residências. Hoje, configura-se,
principalmente na porção urbana da cidade de Rio Branco (AC), como depósito de lixo a céu aberto
e canal de esgoto in natura provenientes das residências, conforme observado na fotografia 1
(FERREIRA, 2005).
Fórum Internacional do Meio Ambiente - A conferência da Terra 507

O igarapé Batista apresenta, do total de sua faixa de preservação, 81% constituído de


pastagem e área urbanizada, aliada a 17% de fragmentos de floresta ciliar. Desse modo, é de se
alertar para a recuperação dessas áreas, recompondo a paisagem natural através do reflorestamento
das margens (FERREIRA, 2005).
O igarapé Judia não apresenta condição adversa da situação apresentada pelo igarapé
Batista. Conforme SANTOS (2005) o supressão da mata ciliar tem sido constante e mais
significativa após meados de 1960 e décadas seguintes. De acordo com o autor, demonstrou-se que
o desmatamento na área é representativo, vez que em 1960 a área de “mata” na APP do Igarapé
representava 68,47% do total, enquanto que em 2002 apresentava-se com apenas 42,34%,
decrescendo em 26,43%. Em contrapartida, a categoria “urbanizado” acresceu de 1960 a 2002,
passando de 3,60% a 28,83%, respectivamente. Abaixo, observa-se a localização do igarapé Judia
e, através da visualização de uma imagem Landsat do ano de 2002, observa-se o grau de
desmatamento da bacia (fig. 1).

Fig. 1 – Localização do Igarapé Judia no Estado do Acre. Fonte: SANTOS (2005)


Fórum Internacional do Meio Ambiente - A conferência da Terra 508

No detalhe, a imagem Landsat (2002), demonstra o grau avançado do desmatamento no interior da


bacia.
Os dados demonstram uma tendência à destruição desses mananciais, representando a
morte da biota aquática e a quebra do ciclo hidrológico na região. Para TUNDISI (2003) a ocupação
desordenada e irregular de mananciais é uma das principais causas da deterioração de recursos
hídricos em grandes metrópoles brasileiras, assim como em municípios de médio porte, como o
caso de Rio Branco (AC), em pleno sudoeste amazônico.
A intensa ocupação das APP’s dos igarapés em estudo representa o primeiro passo para o
desequilíbrio ecológico, haja vista a apropriação seguida dos diversos usos conflitantes realizados
em diversas áreas do sudoeste amazônico, principalmente em Rio Branco (AC), onde apresenta-se
um uso constante e indiscriminado dessas áreas, notadamente quanto a retirada da mata ciliar
cedendo lugar às mais diversas atividades: construções para moradia, formação de pasto para
criação de bovinos, etc, trazendo consigo graves problemas de ordem ecológica.
O Código Florestal brasileiro (Lei Nº 4.771, de 15 de setembro de 1965), reiterado pela
Resolução CONAMA nº 303/2002, no seu artigo 3º, define que nas APP’s devem ser mantidas
todas as florestas e demais formas de vegetação natural, bem como estabelece parâmetros para as
faixas de proteção dos rios e igarapés. Estes locais foram definidos como de proteção especial pois
representam áreas frágeis ou estratégicas em termos de conservação ambiental, não devendo ser
modificadas para outros tipos de ocupação. A manutenção da vegetação natural nesses locais
contribui para o controle de processos erosivos e de assoreamento dos rios, garantindo a qualidade
dos recursos hídricos e a proteção dos ecossistemas aquáticos.

CONCLUSÕES E RECOMENDAÇÕES
A preocupação com a conservação e preservação das APP’s dos igarapés amazônicos
representam um avanço para um debate mais promissor sobre a temática do desenvolvimento
urbano e recursos hídricos, constituindo-se em uma prática fundamental para a manutenção da vida
aquática e, consequentemente, para a sobrevivência dos habitantes humanos.
Como foi possível observar, o igarapé Batista e Judia, que outrora já representaram fonte
de abastecimento de água pura e limpa, hoje são vítimas do aumento populacional da cidade de Rio
Branco (AC). As diversas agressões sobre os recursos hídricos são constituídas, principalmente, de
despejo de esgoto sem tratamento e lixo doméstico nos canais fluviais que, caso não possam ser
assimilados (digeridos) pelas águas, o rápido acúmulo pode destruir esses ecossistemas aquáticos
(ODUM, 1988).
Diante do exposto, e considerando que a legislação ambiental brasileira prevê várias
formas de conter essas situações, propõe-se uma gestão compartilhada dos recursos hídricos para os
mananciais em estudo, fundamentando-se no que dispõe a Lei Federal 9.433/97. Como forma de
amenizar a pressão sobre as APP’s dos cursos d’água, recomenda-se, entre outras, as seguintes
ações:
• Formulação dos planos de bacia hidrográfica para ambos os igarapés;
• Reorientação da expansão urbana para fora das áreas de preservação permanentes, seguida
de uma ampla campanha de educação ambiental; e a
• Implementação de uma política de reflorestamento para as APP’s, obedecendo os
dispositivos legais.
Em sendo efetivadas tais ações, estaremos dando o primeiro passo para a harmonia entre
homem e a natureza na Amazônia, servindo de modelo a ser aplicado nas demais regiões brasileiras.

REFERÊNCIAS BIBLIOGRÁFICAS
BRASIL. Lei Federal nº 9.433, de 08 de janeiro de 1997, institui a Política Nacional de Recursos
Hídricos. Brasília, 1997.
BRASIL. Ministério do Meio Ambiente. Resolução nº 303/2002. Brasília: Conselho Nacional de
Meio Ambiente – CONAMA, 2002.
Fórum Internacional do Meio Ambiente - A conferência da Terra 509

BURSZTYN, M. et. al. (org.). Para Pensar o Desenvolvimento Sustentável. São Paulo: brasiliense,
2ª ed. 1994.
FERREIRA, M. M. Impactos ambientais da ocupação urbana na bacia hidrográfica do igarapé
Batista – Rio Branco-AC. 93f. 2005. Dissertação (Mestrado em Ecologia e Manejo de Recursos
Naturais) – Pró-Reitoria de Pesquisa e Pós-Graduação – Universidade Federal do Acre, Rio Branco,
2005.
GARAY, I. E. G.; DIAS, B. F. S. Conservação da Biodiversidade em Ecossistemas Tropicais:
Avanços conceituais e revisão de novas metodologias de avaliação e monitoramento. Petrópolis:
Vozes, 2001.
IIE, 2003.
ODUM, E. P. Ecologia. Rio de Janeiro: Guanabara, 1988.
SANTOS, M. Manual de Geografia Urbana. São Paulo: Hucitec, 2ª ed. 1989.
SANTOS, W. L. O processo de urbanização e impactos ambientais em bacias hidrográficas: o caso
do Igarapé Judia-Acre-Brasil. 165f. 2005. Dissertação (Mestrado em Ecologia e Manejo de
Recursos Naturais) – Pró-Reitoria de Pesquisa e Pós-Graduação – Universidade Federal do Acre,
Rio Branco, 2005.
SPÓSITO, M. E. B. Capitalismo e Urbanização. São Paulo: Contexto, 2001.
TAGNIN, R. A.; MAGALHÃES, E. de W. O Tratamento da Expansão Urbana na Proteção aos
Mananciais – O Caso da Região Metropolitana de São Paulo. São Paulo: EPUSP, 2001.
TUNDISI, J. G. Água no Século XXI: Enfrentando a Escassez. São Carlos: RiMa,
Fórum Internacional do Meio Ambiente - A conferência da Terra 510

DINÂMICA METROPOLITANA DE GOIÂNIA

Celene Cunha Monteiro Antunes Barreira


Profa Dra. Programa de Pós-Graduação em Geografia. IESA - UFG, Celene.barreira@uol.com.br
Edwiges C. Carvalho Corrêa
Mestranda do Programa de Pós-Graduação em Geografia do IESA – UFG.
edwigescarvalho@yahoo.com.br
Miraci Kuramoto Nucada
Doutoranda do Programa de Pós-Graduação em Geografia do IESA, UFG.
miracikuramoto@pop.com.br

RESUMO
O artigo trata das relações (fluxos sociais, econômicos, culturais...), interações no espaço
metropolitano em contradição com a regionalização imposta e a metropolização incompleta. A
prática de planejamento e as políticas públicas desestruturam as relações e por conseqüência a
região constituída de 23 municípios próximos a Goiânia, no centro do País, que integram três
estruturas geográficas sobrepostas espacialmente: o território goianiense quando da criação da
Capital de Goiás, os municípios da Região Metropolitana de Goiânia e a Região de
Desenvolvimento Integrado de Goiânia.
Palavras-chave: região, rede urbana e metrópole.

ABSTRACT
The review treated from the relations (sociais, economic, culture flows), interactions in a
space metropolitan in contradiction with the imposed regionalization and the incomplete metropolis.
The practice of planning and the public politics limited structure the relations and for consequence a
region constituted from the 23 next counties the Goiânia, in country center, this geographic space
corresponds to the counties that belonged to the goianiense territory when of the creation of the
Capital of Goiás, the counties of the Region Metropolitan of Goiânia and the Region of
Development Integrated of Goiânia.
Key words: region, urban net and metropolis.

INTRODUÇÃO
A área do presente estudo é constituída dos 23 municípios próximos a Goiânia. Esse
espaço geográfico corresponde aos municípios que pertenciam ao território goianiense quando da
criação da Capital de Goiás, incluído também os municípios que fazem parte da Região
Metropolitana de Goiânia e Região de Desenvolvimento Integrado de Goiânia. Essas três estruturas
geográficas instituídas formam um conjunto, atualmente sobrepostos espacialmente. Para efeito
neste estudo denominaremos a este conjunto de estruturas geográficas de Região do Entorno de
Goiânia.
Considerando os municípios que pertenciam à Goiânia, à época da sua fundação, não
fazem parte atualmente da Região Metropolitana de Goiânia, apenas Campestre de Goiás, Santa
Bárbara de Goiás e Varjão. Goianápolis, Nerópolis e parte de Senador Canedo, não faziam parte da
área original do município de Goiânia, hoje, fazem parte da região metropolitana da Capital.
A Região Metropolitana de Goiânia foi criada em 1999, Lei Complementar nº 27, e desde
então, até 2005, sofreu nove alterações. Na Lei de criação comportava onze municípios,
posteriormente passou a doze e por último treze. Inicialmente, faziam parte da região, Abadia de
Goiás, Aparecida de Goiânia, Aragoiânia, Goianápolis, Goiânia, Goianira, Hidrolândia, Nerópolis,
Santo Antônio de Goiás, Senador Canedo e Trindade. Foram inseridos, sucessivamente os
municípios de Bela Vista de Goiás, em 2004, e Guapó, em 2005, portanto, uma contínua integração
de novos componentes.
Fórum Internacional do Meio Ambiente - A conferência da Terra 511

TOCANTINS

SSO

BAHIA
GRO
Goiânia

O
MAT
RMG e RDIG - 2005
Brasília

Fonte: Instituto Brasileiro de Geografia e Estatística - IBGE

MINAS GERAIS
Adaptação: NUCADA, Miraci Kuramoto
PARALELO DE REFERÊNCIA:-16º00'
MERIDIANO CENTRAL:-49º45'
72 km
54
Escala Gráfica

MA
TO IS LEGENDA
36

GR RA
OS GE
SO AS Goiânia e Brasília
18

DO MIN
SU
L
Região do Entorno de Goiânia
C IBGE
0

Figura 1 - Estado de Goiás, RMG e Brasília - DF - 2008


18

A Região de Desenvolvimento Integrado de Goiânia – RDI, que era formada por sete,
depois nove e agora por dezesseis municípios, foi instituída na primeira Lei apenas por municípios
que não faziam parte da chamada Grande Goiânia na Região Metropolitana: Bela Vista de Goiás,
Bonfinópolis, Brazabrantes, Caturaí, Inhumas, Nova Veneza e Terezópolis de Goiás.
Posteriormente, em 2003, foram incluídos Caldazinha e Guapó e, em 2004, Aragoiânia,
Goianápolis, Goianira, Hidrolândia, Santo Antônio de Goiás, Senador Canedo e Trindade,
totalizando dezesseis municípios.

LEGENDA
Perímetro de Goiânia em 1935
Perímetro da RMG
Região Desenvolvimento Integrado
Inhumas Região do Entorno de Goiânia
N. Veneza
Brazab
Nerópolis
Caturaí Terezópolis
Goianira Sto. Ant
Goianáp
Lei Complementar n° 27 / 1999, 34, 37, 41, 43, 48, 49, 53 e 54 / 2005

Sta. Barb
Bonfinóp
Fonte: Fundação Instituto Brasileiro de Geografia e Estatística - IBGE

Trindade
Goiânia Escala Gráfica
20 10 0 10 20 km
S. Canedo
Caldazinha
Campestre Abadia
Aparecida
Adaptação: NUCADA, Miraci Kuramoto

Guapó
Arago Hidrolândia
Bela Vista

Varjão

Figura 2 - Região do Entorno de Goiânia e


Regiões Instituídas - 2008

Nove municípios pertencem às duas configurações regionais, Aragoiânia, Bela Vista


de Goiás, Goianápolis, Goianira, Guapo, Hidrolândia, Santo Antônio, Senador Canedo e Trindade,
Aparentemente, o critério não é mais o mesmo, e é difícil encontrar sentido, uma vez que tais
Regiões visam políticas similares. No texto da Lei não há justificativa e tampouco esclarece
objetivos para a criação da Região de Desenvolvimento Integrado de Goiânia. Transferem a
providência para o futuro, quando serão definidas as atribuições, organização e funcionamento.
Entretanto no endereço eletrônico da Secretaria de Planejamento do Estado, existe um
arquivo com o título “O que é a Região Metropolitana de Goiânia”, nesse documento se afirma que
a Região de Desenvolvimento de Goiânia tem como premissa básica buscar instrumentos de
Fórum Internacional do Meio Ambiente - A conferência da Terra 512

desenvolvimento para o crescimento sustentável e ordenar o território para a melhoria da qualidade


da vida urbana. Ali se trata de uma diretriz comum às duas Regiões.
O artigo 2º da Lei de criação da Região Metropolitana de Goiânia estabelece que esta “tem
por finalidade integrar a organização, o planejamento e a execução de funções públicas de interesse
comum dos municípios”. No atual momento, os municípios estão finalizando seus Planos Diretores
sem a assistência técnica, nem a observância de uma diretriz de planejamento regional. Perdeu-se
uma grande oportunidade de coordenar o ordenamento territorial da Região. Além de Goiânia,
apenas Aparecida de Goiânia e Trindade tinham Planos Diretores, o de Senador Canedo era muito
antigo.
Na seqüência, serão apresentados três tópicos, o primeiro contém dados sobre a formação
dessas cidades e do território municipal com seus desmembramentos até à condição atual. O
segundo apresenta dados dos Censos e Contagem da População com análises iniciais sobre o
crescimento populacional urbano e rural. O terceiro, apresenta os primeiros levantamentos sobre as
relações e os fluxos provocados pelos serviços públicos.

O SÍTIO
Recuando o olhar sobre o território, hoje compreendido pela Região Metropolitana de
Goiânia, à década de 1930 depara-se ali, obviamente, com uma divisão político-administrativa
generosa pelas grandes extensões dos domínios de cada município, eles mesmos, resultantes de
desmembramentos de três municípios: Pirenópolis, Santa Cruz e Itaberaí, desmembrados da
capitania de Goiás e emancipados, respectivamente em 1832, 1833 e 1868.
Até a criação da Capitania de Goiás, em 1736 por Carta Régia, o território goiano fazia
parte da Capitania de São Paulo. A partir de então, o Estado permaneceu, por muitos anos, com
baixíssima densidade populacional, esparsos aglomerados de poucas casas na imensidão da
Capitania, posteriormente chamada de Província e por fim, de Estado. Em 1988, Goiás foi dividido
ao meio, sendo que a parte norte tornou-se o Estado do Tocantins.
Os primeiros desmembramentos do Estado, na sua atual configuração, só ocorreram no
século XIX. A divisão político-administrativa da época constituía-se dos seguintes municípios,
Goiás; Paraná, 1814; Pilar de Goiás, 1831; Pirenópolis, 1832; Santa Cruz 1833; Luziânia, 1833; Rio
Verde, 1854; Itaberaí, 1868 e Palmeiras de Goiás 1887. Essa é a origem dos 246 municípios, nesse
ano de 2008, do Estado de Goiás.
A grande maioria das cidades goianas surgiu do chamado Patrimônio, assim denominado
por referir-se ao patrimônio, denominação que significa uma porção de solo doado por um
proprietário de terras para a edificação de igreja, seja por devoção ou por pagamento de promessa.
No entorno da igreja, muitas vezes, eram cedidos espaços para a edificação de casas de
trabalhadores e seus familiares, daí surgindo um aglomerado urbano.
Ainda hoje, existem pessoas que ao referir-se a essas cidades chamam-nas de Patrimônio.
Ao lado das igrejas se promoviam festas e eventos religiosos que atraiam as famílias das redondezas
e, até mesmo aquelas que possuíam propriedades rurais distantes ou de outras localidades, junto às
igrejas geralmente eram reservados espaços para acampamentos provisórios que se chamavam
arraiais. Com o tempo, alguns arraiais transformaram-se em aglomerados urbanos com edificações
permanentes.
As 23 cidades que compõe a Região do Entorno de Goiânia se originaram de: estrada ou
via férrea (4); famílias italianas ou com grau de parentesco(2); instituição federal de pesquisa
agropecuária (1); loteamento irregular(1); centro espírita (1); e cemitério com capela(1). As cidades
mais antigas (13) surgiram de patrimônios. A única exceção é Inhumas, originada de um
patrimônio, em meados do século XIX, às margens da Estrada Real que ligava a antiga capital de
Goiás, Vila Boa, ao Rio de Janeiro, por isso foi contabilizada como influenciada pela estrada.
Para a criação da nova capital, Goiânia, o governo estadual recorreu à apropriação dos
territórios de quatro municípios: Goianira, Hidrolândia, Trindade e Campinas. As três primeiras
cidades passaram à condição de distrito de Goiânia, anos depois se emanciparam, mas Campinas,
que se localizava próximo ao sítio escolhido para a construção da nova Capital, transformou-se num
Fórum Internacional do Meio Ambiente - A conferência da Terra 513

bairro de Goiânia. Esse evento trouxe um impulso que beneficiou o crescimento econômico e
social, o aparelhamento de equipamentos urbanos, bem como favoreceu a atração de novos
moradores na região.
Mas as cidades não cresceram em quantidade de população ou tiveram desenvolvimento
econômico e social na mesma proporção nem na mesma velocidade. Verifica-se, com certa
surpresa, que algumas cidades do entorno de Goiânia, o tempo é lento, mantém a aparência pacata e
simples que se espera de uma pequena cidade distante de um grande centro urbano. A região
tornou-se heterogênea, em todos os aspectos, até mesmo em relação à ocupação, embora o processo
de conurbação tenha se iniciado no entorno de Goiânia, esta se encontra totalmente conurbada
apenas com o município de Aparecida de Goiânia.

A POPULAÇÃO
Goiânia e Aparecida de Goiânia concentram a maior quantidade de moradores,
representam respectivamente 59,5% e 22,7%, que totalizam 82,2% da população da Região do
Entorno de Goiânia, conforme Tabela 1 abaixo. Já no Censo 2000, essas mesmas cidades reuniam a
maior população urbana e a menor residente em área rural: menos de 1% dos habitantes. Aparecida
de Goiânia está quase totalmente parcelada e parcialmente ocupada, possui a menor área rural.
Aparecida de Goiânia teve um crescimento populacional vertiginoso entre os anos de
1970/80, a cidade cresceu 37,07% ao ano, ultrapassou o recorde anterior que pertencia a Trindade,
18,85% ao ano na década 1940/50 e depois Goiânia com a taxa de 17,88%, na década 1950/60.
Atualmente a maior taxa média anual de crescimento geométrico no Estado pertence a Águas
Lindas de Goiás com 227,56%.
Tabela 1 - Municípios da Área de Estudo - Total da População e Situação do Domicílio - 1940 a 1970
1940 1950 1960 1970
REG
Total Urbano Rural Total Urbano Rural Total Urbano Rural Total Urbano Rural
Abadia s/d s/d s/d s/d s/d s/d s/d s/d s/d s/d s/d s/d
Aparecida s/d s/d s/d s/d s/d s/d s/d s/d s/d 7.470 885 6.585
Aragoiânia s/d s/d s/d s/d s/d s/d 1.594 785 809 2.848 942 1.906
Bela Vista 8.195 1.240 6.955 10.544 1.596 8.948 9.659 2.687 6.972 11.865 3.422 8.443
Bonfinópolis s/d s/d s/d s/d s/d s/d 1.923 982 941 2.665 1.381 1.284
Brazabrantes s/d s/d s/d 3.014 84 2.930 2.677 732 1.945 3.132 632 2.500
Caldazinha s/d s/d s/d s/d s/d s/d 2.051 248 1.803 2.433 281 2.152
Campestre s/d s/d s/d s/d s/d s/d s/d s/d s/d 2.724 585 2.139
Caturaí s/d s/d s/d 5.347 555 4.792 4.568 773 3.795 4.669 1.071 3.598
Goianápolis s/d s/d s/d 3.729 518 3.211 6.130 1.731 4.399 7.340 1.828 5.512
Goiânia 26.065 12.005 14.060 52.201 25.595 26.606 150.577 132.577 18.000 378.057 361.904 16.153
Goianira 1.455 315 1.140 1.188 292 896 5.060 670 4.390 6.091 1.494 4.597
Guapó 5.609 779 4.830 5.722 674 5.048 5.319 1.761 3.558 8.804 3.579 5.225
Hidrolândia 5.299 495 4.804 6.356 752 5.604 6.576 1.636 4.940 8.014 2.206 5.808
Inhumas 12.320 1.750 10.570 12.282 2.899 9.383 21.985 8.298 13.687 30.144 16.545 13.599
Nerópolis 4.758 1.114 3.644 5.739 1.726 4.013 6.596 2.969 3.627 7.735 4.234 3.501
Nova Veneza 3.977 368 3.609 2.849 493 2.356 4.092 1.371 2.721 5.733 2.682 3.051
Sta. Bárbara s/d s/d s/d s/d s/d s/d s/d s/d s/d 2.748 908 1.840
Sto. Antônio s/d s/d s/d s/d s/d s/d s/d s/d s/d s/d s/d s/d
Sen Canedo s/d s/d s/d s/d s/d s/d 2.928 885 2.043 2.716 1.152 1.564
Terezópolis s/d s/d s/d s/d s/d s/d s/d s/d s/d s/d s/d s/d
Trindade 9.738 1.423 8.315 17.342 8.002 9.340 17.135 7.015 10.120 22.519 13.793 8.726
Varjão s/d s/d s/d s/d s/d s/d 2.274 1.072 1.202 4.727 1.460 3.267
Área Estudo 77.416 19.489 57.927 126.313 43.186 83.127 251.144 166.192 84.952 522.434 420.984 101.450
Goiás 826.414 111.448 714.966 1.214.921 180.822 1.034.099 1.954.862 599.404 1.355.458 2.938.677 1.237.108 1.701.569
Fonte: IBGE, Censos 1940 a 1970.
s/d sem dado. O município foi emancipado depois.
Organização: NUCADA, Miraci Kuramoto
Fórum Internacional do Meio Ambiente - A conferência da Terra 514

continuação Tabela 1 - Municípios da Área de Estudo - Total da População e Situação do Domicílio - 1980 a 2007
1980 1991 2000 (*) 2007
REG
Total Urbano Rural Total Urbano Rural Total Urbano Rural Total Urbano Rural
Abadia de Goiás s/d s/d s/d (*) 3794 2.248 1.546 4.971 3.096 1.875 5 868 3 963 1 905
Ap. de Goiânia 42.632 20.719 21.913 174.829 172.543 2.286 336.392 335.547 845 475.303 s/d s/d
Aragoiânia 3.701 1.834 1.867 4.894 2.816 2.078 6.424 4.262 2.162 7 243 5 146 2 097
Bela Vista GO 13.211 5.609 7.602 15.953 9.076 6.877 19.210 12.278 6.932 20 615 14 296 6 319
Bonfinópolis 2.688 1.604 1.084 3.299 2.725 574 5.353 4.908 445 6 744 6 167 577
Brazabrantes 2.249 718 1.531 2.298 1.242 1.056 2.772 1.723 1.049 3 142 2 096 1 046
Caldazinha 4.043 413 3.630 1.138 446 692 2.859 1.194 1.665 3 157 1 739 1 418
Campestre GO 2.465 835 1.630 2.304 1.399 905 3.167 1.988 1.179 3 411 2 276 1 135
Caturaí 3.895 1.552 2.343 4.091 2.482 1.609 4.330 3.117 1.213 4 477 3 341 1 136
Goianápolis 7.574 2.790 4.784 7.559 5.891 1.668 10.671 9.805 866 11 159 10 109 1 050
Goiânia 714.484 702.858 11.626 916.553 907.885 8.668 1.093.007 1.085.806 7.201 1.244.645 s/d s/d
Goianira 7.488 4.721 2.767 12.877 10.116 2.761 18.719 18.064 655 24 110 23 548 562
Guapó 9.995 5.323 4.672 11.685 8.156 3.529 13.863 9.916 3.947 13 586 10 196 3 390
Hidrolândia 8.561 3.392 5.169 10.153 4.620 5.533 13.086 7.836 5.250 14 004 9 615 4 389
Inhumas 31.423 23.568 7.855 38.189 32.545 5.644 43.897 39.976 3.921 44 983 42 421 2 562
Nerópolis 9.368 7.103 2.265 12.908 11.254 1.654 18.578 17.253 1.325 19 392 18 220 1 172
Nova Veneza 5.094 3.115 1.979 4.988 3.643 1.345 6.414 5.354 1.060 6 884 5 875 1 009
Sta. Bárbara GO 3.247 1.910 1.337 3.913 3.264 649 4.963 4.233 730 5 658 5 003 655
Sto. Antônio GO s/d s/d s/d (*) 2437 1.768 669 3.106 2.564 542 3 893 3 508 385
Senador Canedo 3.042 824 2.218 21.795 8.706 13.089 53.105 50.442 2.663 70 559 67 900 2 659
Terezópolis GO s/d s/d s/d 2.789 2.435 354 5.083 3.616 1.467 5 620 4 909 711
Trindade 30.612 22.327 8.285 52.584 47.558 5.026 81.457 78.199 3.258 97 491 94 515 2 976
Varjão 3.654 1.675 1.979 3.400 1.904 1.496 3.519 2.219 1.300 3 649 2 192 1 457
REG 909.426 812.890 96.536 1.308.199 1.244.722 69.708 1.754.946 1.703.396 51.550 2.095.593 s/d s/d
Estado Goiás 3.859.602 2.401.491 1.458.111 3.979.516 3.219.936 759.580 5.003.228 4.396.645 606.583 5.644.460 s/d s/d
Fonte: IBGE, Censos 1980 a 2000, e Contagem da População 1996 e 2007. Na Contagem de 2007 a população de Aparecida de Goiânia e de Goiânia foram estimadas.
(*) Refere-se à Contagem da População de 1996 ou de 2007 do IBGE.
Organização: NUCADA, Miraci Kuramoto

A construção de uma nova cidade para exercer a função de Capital do Estado de Goiás não
influenciou no ritmo de crescimento populacional das cidades próximas, conforme tabela, esses
centros urbanos tiveram incremento populacional entre mediana e alta. As exceções são Goianira e
Guapó, ambas as cidades perderam habitantes: -0,76% e -1,44% anualmente. No Censo de 1940, o
crescimento populacional da Região do Entorno de Goiânia foi 67% acima da média do Estado e
em relação ao País foi 115% maior. Em 1930 não houve contagem da população e no Censo de
1920, a área em estudo cresceu 84% acima da média do Estado.
Os municípios que tiveram taxas de crescimento geométrico abaixo de zero, não repetiram
o resultado negativo em suas cidades. Por exemplo, Caldazinha entre 1980 e 1991, e Campestre de
Goiás entre 1970 a 1980. Houve um decréscimo da população rural enquanto a urbana cresceu.
Observa-se, que o total da população rural de municípios não mantém uma regularidade,
especialmente nos municípios com menos habitantes e desenvolvimento econômico baseado em
produção primária, como Aragoiânia, Goianápolis, Guapo, Hidrolândia e Nova Veneza. Isso aponta
a existência de trabalhadores rurais que se movimentam de acordo com a produção no meio rural.
Nota-se, igualmente, que até 1980 o movimento migratório intermunicipal da população
rural era mais nítido e nas últimas décadas diminuiu. Esses trabalhadores e suas famílias
representam o último ato de resistência à exclusão do campo, no próximo enredo a “sorte” pode
empurrá-los para um papel pouco diferente, de excluídos urbanos. As transformações no processo
produtivo, pouco contribuíram com a qualidade de vida desses trabalhadores e suas famílias, para a
grande maioria restou só a informalidade e a destituição da dignidade.
Antes de 1960, com exceção de Goiânia, as cidades realizavam festas populares,
geralmente promovidos pela igreja, que duravam vários dias e atraíam muitas pessoas do meio rural
e de outros municípios. Apenas Trindade mantém a tradicional festa. Nessas festas eram
estabelecidas relações interurbanas e intermunicipais, cabe investigar como ocorrem, na atualidade,
as relações sociais desses poucos moradores e migrantes entre áreas rurais.
Fórum Internacional do Meio Ambiente - A conferência da Terra 515

Como esperado, na Região do Entorno de Goiânia as taxas de urbanização em todos os


períodos considerados foram maiores que as porcentagens do Estado de Goiás. Em relação ao País
foram maiores com exceção dos Recenseamentos de 1940 e 1950. A urbanização brasileira já é
acelerada em relação à urbanização mundial, pouco mais de 50% segundo estimativa da ONU,
porém é mais rápido o ritmo da urbanização no Estado de Goiás e mais ainda na região, no Censo
2000, a taxa de urbanização foi de 97%, enquanto a brasileira ficou em 81,2%.
Bonfinópolis é o único município, além de Goiânia, que tinha uma taxa de urbanização
superior a 50% no Censo 1960. No Censo 1970, cinco municípios haviam ultrapassado a barreira
dos 50%, e no seguinte nove cidades, e em 1991 apenas Caldazinha, Hidrolândia e Senador Canedo
possuíam taxas inferiores a 50%, em 2000 só Caldazinha, e por fim, em 2007 as menores taxas de
urbanização pertencem a Caldazinha, 55,1% e Varjão, 60,1%. Continuou a tendência de queda da
proporção entre população rural e urbana entre os municípios estudados.
Comparando-se os totais da tabela, verifica-se que a população rural da Região cresceu até
1970 e daí em diante passou a diminuir, tal como a população rural do Estado. O incremento
populacional das cidades foi alimentado pela imigração de outros Estados, e também proveniente do
interior de Goiás, para as cidades e para o meio rural. A população rural na Região em 1940 era de
57.927 e em 2000 havia 51.550 habitantes e no Estado em anos iguais: 714.966 e 606.583, a
redução da população rural na área considerada foi proporcionalmente menor.

Anápolis
Inhumas
N. Veneza
Brazab Nerópolis
Terezópolis
Caturaí
Goianira Sto. Ant Goianáp

Sta. Barb LEGENDA


Trindade Bonfinóp
Goiânia Jurisdição do Posto
S. Canedo Inhumas
Goiânia
Fonte: Fundação Instituto Brasileiro de Geografia e Estatística - IBGE

Caldazinha Aparecida
Abadia Trindade
Campestre Aparecida
Anápolis
Escala Gráfica
Guapó 20 10 0 10 20 km
Adaptação: NUCADA, Miraci Kuramoto

Arago Hidrolândia
Ministério da Previdência Social

Bela Vista

Varjão

Figura 3 - Posto de Atendimento do INSS - 2008

OS SERVIÇOS PÚBLICOS
Os serviços públicos como INSS – Instituto Nacional de Seguridade Social, Receita
Federal e as demandas judiciárias e policiais, depois dos serviços para educação e saúde,
encontram-se no grupo dos que mais provocam fluxo de pessoas. O levantamento da localização
das agências de atendimentos desses serviços revela regionalizações distintas, em alguns casos, a
existência de pequenas regiões dentro da Região do Entorno de Goiânia.
O INSS divide o Estado em duas Gerências Executivas, uma comandada por Goiânia e
outra por Anápolis, às quais estão vinculadas todas as trinta e seis Agências da Previdência Social
distribuídos no território goiano, cada uma responde pelo atendimento de um conjunto de
municípios próximos. Na Região do Entorno de Goiânia, localizam-se quatro Agências: Goiânia,
Aparecida de Goiânia, Trindade e Inhumas, essa última vinculada a Anápolis, as outras três à
Goiânia.
Os municípios de Nerópolis, Terezópolis de Goiás, Goianápolis e Bonfinópolis são
atendidos pela Agência de Anápolis. Pertencem à jurisdição de Inhumas: Nova Veneza, Santo
Antônio, Brazabrantes, Goianira e Caturaí, além de outros que ficam fora da área. Trindade atende
Fórum Internacional do Meio Ambiente - A conferência da Terra 516

Abadia de Goiás, Guapo, Campestre de Goiás e Santa Bárbara de Goiás. A Agência de Aparecida
de Goiânia alcança Hidrolândia, e a Agência de Goiânia ficam com os municípios de Senador
Canedo, Caldazinha, Bela Vista, Aragoiânia e Varjão.
Em relação à Receita Federal, a divisão da jurisdição em Goiás segue quase o mesmo
procedimento são duas Delegacias, uma em Goiânia, coordena nove Agências e outra em Anápolis
coordena cinco Agências da Receita Federal. Na Região estão contidos a Delegacia de Goiânia e a
Agência da Receita Federal de Inhumas, vinculada à Delegacia de Goiânia, a jurisdição de ambas
vai além da área considerada de interesse para o estudo. Os municípios de Goianápolis, Terezópolis
de Goiás e Bonfinópolis são atendidos pela Delegacia da Receita Federal de Anápolis.

LEGENDA
Jurisdição das Comarcas
Mesma Jurisdição
Inhumas N. Veneza
2 Cart Fora da Região
10 Cart Nerópolis
Brazab 7 Cart
Comarca Isolada
1 Cart s/Cart
Caturaí F Sede da Comarca
1 Cart Sto. Ant Terezópolis Cart Cartório
Goianira s/Cart
s/Cart Sem Cartório
7 Cart Goianáp
7 Cart
Sta. Barb
Nazário 2 Cart Bonfinóp Leopoldo Bulhões
2 Cart
Trindade Goiânia S. Canedo
7 Cart 86 Cart 7 Cart
Secretaria de Planejamento do Estado de Goiás - SEPLAN / SEPIN

Caldazinha
Fonte: Fundação Instituto Brasileiro de Geografia e Estatística - IBGE

Campestre Abadia s/Cart


1 Cart Aparecida
2 Cart
11 Cart

Guapó
Adaptação: NUCADA, Miraci Kuramoto

6 Cart Arago
1 Cart
Hidrolândia Bela Vista
6 Cart 7 Cart Escala Gráfica
20 10 0 10 20 km

Varjão
5 Cart

Figura 4 - Comarcas - Lei 13.644/2000

No judiciário a jurisdição é cognominada de Comarca, refere-se à atuação de um juizado.


A área está organizada em quatorze Comarcas, algumas com mais de um município como a
Comarca de Goianira, atende Brazabrantes, Santo Antônio e Caturaí, de Guapó integra Abadia de
Goiás e Aragoiânia, e de dois municípios com fórum no primeiro citado, Nerópolis e Nova Veneza,
Goianápolis e Terezópolis de Goiás, Senador Canedo e Caldazinha, Trindade e Campestre de Goiás.
Bonfinópolis e Santa Bárbara de Goiás estão jurisdicionados em municípios fora da Região
pertencem à comarca de Leopoldo de Bulhões e Nazário respectivamente. Inhumas, Goiânia,
Aparecida de Goiânia, Bela Vista de Goiás, Hidrolândia e Varjão constituem Comarcas isoladas. As
cidades que não dispõem de cartório são as seguintes: Santo Antônio de Goiás; Terezópolis de
Goiás e Caldazinha. As outras possuem pelo menos o Cartório de Registro Civil.
Não dispõem de serviço bancário as seguintes cidades: Caturaí, Brazabrantes, Santo
Antônio de Goiás, Terezópolis, Bonfinópolis, Caldazinha, Varjão, Aragoiânia, Abadia de Goiás e
Campestre de Goiás. Possuem entre um e duas agências bancárias: Goianira, Nova Veneza,
Nerópolis, Goianápolis, Senador Canedo, Bela Vista de Goiás Hidrolândia, Guapo e Santa Bárbara
de Goiás. Trindade conta com quatro agências, Inhumas, cinco, Aparecida de Goiânia treze e
Goiânia cento e sessenta e quatro agências bancárias.

CONCLUSÃO
De acordo com dados acima é possível vislumbrar uma preferência na localização de
alguns serviços: Goiânia, Aparecida de Goiânia e Inhumas são as cidades que mais concentram as
representações dos governos estadual e federal. Verifica-se que Inhumas não faz parte da área de
influência de Goiânia, pelo menos na atualidade, segundo os preceitos de uma região metropolitana.
Cabe questionar e discutir a problemática da metropolização, da regionalização e das
políticas públicas que podem em seus aspectos negativos reforçar o descontrole da expansão urbana
Fórum Internacional do Meio Ambiente - A conferência da Terra 517

e desmontar outra região de influência, que no caso de Inhumas aparenta ser organizada
estruturalmente, institucionalmente e economicamente. Pode haver ainda o caso de municípios que
pertencem à outra rede de relações, como Anápolis. Assim a ação do poder público em criar regiões
para planejamento e aplicação de políticas toma o viés da insustentabilidade.
Desta maneira parece provocar uma típica fragmentação territorial que seria resultado de
clientelismo dentro do Estado, ou seja, a articulação de setores administrativos e de interesses pela
reserva de privilégios ou alguma vantagem política (VAINER 2007, p. 9 e 10). A criação das
regiões, a Metropolitana e a de Desenvolvimento Integrado de Goiânia, também foram frutos do
planejamento estratégico do governo do estadual, para Vainer, a visão pontual, a prática sob pressão
local, aprofunda os processos de fragmentação territorial.
Oliveira, (1977, p. 31), ao discutir o conceito de região econômica e política assinala a
dimensão política, o exercício de controle de certas classes dominantes, imbricada na dimensão
econômica, assim reproduzem a relação social de dominação, dessa maneira, “obstaculizam e
bloqueiam a penetração de formas diferenciadas de geração do valor e de novas relações de
produção”. Quando deixa de existir a condição de força as classes dominantes locais são
substituídas por outras não locais.
Entretanto, o reconhecimento da dimensão política no espaço sócio-econômico não isenta
ou pelo menos não significa a inexistência do caráter clientelístico da fragmentação do território.
Longe do processo de planejamento as decisões, os projetos, a estrutura do espaço e tantas outras
instâncias, muitas vezes são planejadas e definidas por grupos associados, político e de interesse de
variados matizes exceto o da função social.
Expressa, assim, uma clara relação entre Estado e dominação de classe social, significa o
que Dulong (1977, p. 190) chama de crise de hegemonia numa situação em que exacerbam os
choques de satisfação social mediante as perdas impostas por aquela configuração de força a outras
classes sociais, não monopolistas. Os arranjos locais, entre classes sociais, para Dulong, fazem de
cada parte do território um subconjunto social original de um conjunto pleno de diversidade, e
sintetizam nas regiões a manifestação espacial do desenvolvimento desigual do capitalismo, isto é,
regiões mais adiantadas, outras em estágio anterior do processo de crescimento econômico.
Já Arrais (2007, p. 177-223), contribui com a discussão ao inserir a governabilidade
associada a algo mais que uma simples técnica de gestão ou ao aparato institucional, mesmo
porque, para Arrais, o Estado tem se transformado premido pelas necessidades de nosso atual
estágio, ao estabelecer agendas de reformas econômicas e sociais de orientações internacionais e no
papel de um dos atores principais na cena regional devemos atentar para os conflitos e as tensões
sociais e também para os outros agentes que atuam no espaço de negociação, do poder e dos
conflitos, que é o espaço regional, nas palavras de Arrais, onde se desenrola a “arena política”.
Becker (2004, p. 15) é incisiva ao defender o resgate do papel do Estado como meio de
resgatar a região e a regionalização, até porque as regiões “resultam de uma relação dialética entre
decisões tecnocráticas e práticas do poder, de um lado, e práticas sociais e demandas coletivas,
processos coletivos de outro lado”, na prática, surgem sociedades locais, estas absorvem,
relativizam e transformam o processo num ímpeto desenvolvimentista. Eis aí, segundo Becker, dois
dos aspectos positivos: primeiro, o fortalecimento da sociedade local via práticas para o
estabelecimento da função social do desenvolvimento e em segundo o crescimento geral da região.
O resultado são as ilhas dinâmicas.
Então, apesar da reconhecida prática clientelística, o emprego do papel de dominação na
realização dos interesses de grupo e do Estado, não se pode negligenciar o fator transformador da
ação social, sobretudo pelos arranjos de classes não monopolistas apontados por Vainer, e pelo
próprio processo, pois leva à organização da sociedade local para alcançar as demandas coletivas,
seja dialogando ou pressionando o Estado a abrir formas de negociação, como afirma Becker.
Essa autora também adianta que não é apropriado o uso do termo fragmentação que ela já
utilizou em outros trabalhos em que se referia à região e território, porque está associado à ruptura.
Becker acredita haver, uma “reestruturação com novas relações”, e que o surgimento ou declínio de
Fórum Internacional do Meio Ambiente - A conferência da Terra 518

áreas no território faz parte do processo de reestruturação. No caso em estudo, pode haver uma
fragmentação e depois uma reestruturação territorial.
Existe entre a Capital e os municípios do entorno as relações sociais, econômicas,
administrativas e esse relacionamento provoca um grande e variado fluxo. Naturalmente, Goiânia
exerce uma influência sobre as demais cidades, afinal, nela se localiza o comando político-
administrativo do Estado, além disso, os comandos dos serviços federais se concentram na Capital,
a partir daí organiza representações em cidades maiores que funcionam como centros regionais.
A composição da Região de Desenvolvimento de Goiânia é questionável. Primeiro porque
Inhumas até hoje funciona como um centro regional de serviços e de comércio e como tal desenha
uma rede com os municípios do seu entorno. Ao inseri-la na RDI a futura implementação de suas
políticas provocaria um enfraquecimento dessa rede? De outra maneira, Inhumas poderia mudar do
status de cidade desenvolvida e economicamente independente para cidade dependente de Goiânia?
Cidades como Caturaí, Brazabrantes e Nova Veneza, que estão na Região de
Desenvolvimento Integrado de Goiânia, por enquanto se relacionam e dependem de Inhumas na
maior parte dos serviços. Da mesma forma, Goianápolis (RMG) e Terezópolis de Goiás (RDI)
possuem forte ligação com Anápolis. Então a influência de Goiânia sobre essas cidades é muito
pequena. Santos, (2004, p. 282), propõe a seguinte classificação hierárquica para o fenômeno
urbano: cidades locais, cidades regionais, metrópoles incompletas e metrópoles completas.
Uma metrópole completa é capaz de atender, nas palavras de Santos, “amplas
necessidades econômicas e sociais com meios segregados por ela própria, tais como a produção de
bens de capital ou a elaboração de tecnologias adaptadas às exigências da sociedade econômica
nacional”, enquanto a metrópole incompleta supriria àquelas necessidades a partir de contribuição
externa. Trata-se do caso de Goiânia, uma metrópole de caráter regional que se completa em outra
nacional, a metrópole completa São Paulo, que comanda uma rede de metrópoles incompletas.
Dessa maneira, a cidade de Goiânia se insere num espaço em processo de metropolização,
mas seu entorno não pode ser considerado metropolizado, pela falta de elementos sócio-econômicos
e a inexistência dos equipamentos urbanos característicos da dinâmica metropolitana. Conforme
descrito acima, as cidades se completam fora, em Goiânia, Inhumas ou Anápolis.

REFERÊNCIAS BIBLIOGRÁFICAS
ARRAIS, Tadeu Alencar. A região como arena política: um estudo sobre a produção da região
urbana Centro Goiano. Goiânia: Editora Vieira, 2007.
BECKER, Bertha. Uma nova regionalização para pensar o Brasil. In: LIMONAD, E.,
HAESBAERT, R. (Org.). Brasil séc. XXI: por uma nova regionalização: agentes processos e
escalas. Rio de Janeiro: Marx Limonad, 2004. [11 a 27]
BENKO, G & LIPIETZ, A. O novo debate regional. In: Regiões ganhadoras, distritos e redes.
Portugal: Oeiras, 2000. [3 a 18].
DULONG, Renauld. A crise da relação Estado/sociedade local vista através da política regional. In:
POULANTZAS, Nicos (Org.) O Estado em crise. Reio de Janeiro: Graal, 1977.
OLIVEIRA, Francisco de. Elegia para uma re(li)gião. Rio de Janeiro: Paz e Terra, 1977. [21 a 44].
SANTOS, Milton. O espaço dividido. São Paulo: Edusp, 2004.
VAINER, Carlos B. Fragmentação e projeto nacional: desafios para o planejamento territorial. In:
XII ENA (Encontro Nacional da ANPUR). Belém, 2007.
CELENE CUNHA MONTEIRO ANTUNES BARREIRA
EDWIGES CONCEIÇÃO CARVALHO CORRÊA
MIRACI KURAMOTO NUCADA
Fórum Internacional do Meio Ambiente - A conferência da Terra 519

REFLEXÕES SOBRE A QUESTÃO DA OCUPAÇÃO URBANA E A SITUAÇÃO DO


CRESCIMENTO OCUPACIONAL

Juan Carlos Viñas Cortez


Prof. do departamento de Psicologia da UFPB- Setor Organizacional do Trabalho. Mestre em Meio Ambiente.
Doutorando em Psicologia dos Recursos Humanos. cortez.juancarlos@gmail.com

INTRODUÇÃO
A ocupação urbana é um problema que reflete a situação sócio-econômica da população
brasileira, cada vez mais empobrecida pelos baixos salários, desemprego, subemprego. O
crescimento da população, o aumento do índice de urbanização, migrações do campo para a cidade;
fatores aliados à ausência de políticas de habitação, de saúde, de educação ambiental e do próprio
planejamento urbano das cidades, levam as pessoas, cada vez mais, a ocuparem áreas públicas,
áreas que não possuem a infra-estrutura necessária, sem a mínima condição para que se tenha
qualidade de vida. São criadas habitações improvisadas, os barracos, em conglomerados chamados
de favelas.
A concentração de grandes contingentes populacionais nos centros urbanos, sem qualquer
perspectiva de atendimento das necessidades mais elementares como: alimentação, moradia,
abastecimento de água, esgotamento sanitário, serviço de coleta, destinação final adequada do lixo
urbano e drenagem fluvial, itens fundamentais para a saúde da população, continua sendo um
grande e grave problema a ser resolvido na maioria das cidades no Brasil.
O crescimento da população mundial, que segundo a ONU, vai saltar dos atuais 5,6 bilhões
para 7,8 no ano 2050, deverá ser registrado especialmente nos grandes centros urbanos. Na virada
do século, megacidades vão ter, isoladamente, uma população superior a de cem países. Esse rápido
processo de urbanização, talvez, seja um dos dados mais marcantes do século XX, ao lado do
avanço científico e tecnológico.
Nota-se claramente que o aumento populacional nos centros urbanos tem como uma das
vítimas principais o meio ambiente. Áreas verdes e encostas são devastadas para a construção de
habitações populares e estradas. Geralmente, essas novas áreas urbanas são áreas de risco e não
contam com sistemas eficazes de saneamento básico, provocando a contaminação dos rios com
dejetos orgânicos.
Um estudo da Comissão Interministerial do Meio Ambiente (CIMA), que cuidou da Rio-
92, advertiu que sete das dez cidades mais populosas do Planeta estarão, na virada do século,
localizadas no Terceiro Mundo. Pelas estimativas, os países do Sul terão aumentado sua população
urbana, já no ano 2050, quase 16 vezes, passando de 200 milhões para 3,1 bilhões de pessoas. Uma
dessas cidades, comparada a uma bomba-relógio, é a cidade de São Paulo, hoje é a segunda região
metropolitana do mundo, com 19,2 milhões de habitantes, perdendo só para Tókio, que tem 25,7
milhões, segundo um estudo da divisão de população da ONU (1994).
Um aspecto importante que a ONU aponta em estudos demográficos, se refere quanto à
previsão de que a população mundial chegaria a 10 bilhões no fim deste século, está estimativa
varia entre 8 e 9 bilhões. Segundo o estudo, da Divisão de População da ONU, as implicações da
alteração seriam enormes, pois os governos teriam que usar as projeções populacionais para
planejar políticas de previdência social, econômicas, urbanas e até orçamentos de educação com
qualidade visando a profissionalização técnica como também de ensino superior.
Uma variável que merece atenção dentro desta temática quanto à questão do
crescimento urbano associado aos indicadores de fertilidade. Segundo dados fornecidos pela ONU
há 74 países de "grupo de fecundidade de nível intermediário", onde as mulheres têm entre 2,1 e 5
filhos. Outro grupo abriga cerca de 40% da população mundial e inclui Brasil, Bangladesh, Egito,
Índia, Indonésia, Irã, México e Filipinas países que, segundo o estudo, podem atingir, até 2050, taxa
de fecundidade de 1,85 filhos por mulher. Se o estudo estiver correto, a população mundial poderá
diminuir ainda que não neste século.
Uma das principais causas do declínio seria a disseminação do uso de métodos
contraceptivos. Agora que as mulheres têm os meios para limitar o tamanho de suas famílias,
Fórum Internacional do Meio Ambiente - A conferência da Terra 520

muitas pessoas estão se mudando para cidades, diminuindo a necessidade de ter muitos filhos para
trabalhar no campo. Declínio em taxas de mortalidade infantil e melhorias nos sistemas de
assistência médica também teriam uma forte influência. Segundo a ONU, a taxa brasileira entre
1995 e 2000 foi de 2,3 filhos por mulher.
Outro aspecto importante nos países da América Latina que deve desenvolver-se e
aperfeiçoar-se é quanto ao sistema de seguro social para enfrentar o aumento da população maior de
60 anos, haja vista que em 2050 serão de 189 milhões de pessoas.
Os países da America Latina, principalmente o Brasil, devem começar a se preparar com as
instituições de saúde e das políticas sociais, econômicas e urbanas para que os programas
amadureçam passo a passo, ou caso contrário possam estes ser executados imediatamente, posto
que em 2050, o problema do envelhecimento da população será difícil de ser trabalhado
estrategicamente.
Devem ser consideradas as implicações com as políticas de sistemas de pensões razoáveis,
para construir um atendimento eficiente, assim como, entidades de atendimento e cuidado para com
o idoso e uma política social de inserção desta população no mercado de trabalho. O aumento da
população de mais de sessenta anos é um item que precisa ser levado em conta pela autoridades
porque, em um futuro bem próximo, terá forte repercussão no crescimento urbano, podendo causar
uma situação incontrolável, o caos urbano.
Atualmente, 80% da população mundial não têm uma cobertura de assistência social, e
prevê-se que, se não houver uma mudança nas políticas, cerca de 1,2 bilhão de idosos poderão
enfrentar insegurança de renda até 2050. “Nossas sociedades (latino-americanas) ainda não estão
plenamente preparadas para abordar os desafios que derivam do envelhecimento populacional”,
afirmou Dirk Jaspers-Faijer, diretor do Centro Latino-Americano e Caribenho de Demografia da
Divisão de População da Comissão Econômica para a América Latina e o Caribe (Cepal). “Os
riscos que o envelhecimento provoca na economia, saúde e cultura se devem mais à inexperiência e
escassa visão de futuro para abordar a questão como um assunto público que preocupe os Estados
do que ao processo de mudança demográfica em si”.
O informe destaca que o envelhecimento reflete o progresso humano, já que significa
maior longevidade e menor mortalidade, e se deve considerar-se como uma oportunidade para
incorporar ativamente os mais velhos à sociedade, o que, por sua vez, implica em importantes
desafios, novas estratégias de ação e programas mais aperfeiçoados de ação.
O crescimento da força de trabalho vai desacelerar e inclusive ficar negativa, o que pode
afetar a atividade econômica. Além disso, esta tendência demográfica pode prejudicar a
sustentabilidade dos sistemas de aposentadorias e de saúde. O estudo afirma que há quatro
“respostas cruciais” para este cenário: aumentar a participação feminina na força de trabalho,
eliminar incentivos à aposentadoria antecipada, melhorar o ambiente profissional para os
trabalhadores de idade avançada e aumentar a produtividade do trabalho.
Um estudo elaborado pela Divisão da População do Departamento de Assuntos Sociais e
Econômicos das Nações Unidas indica que a população mundial que vive na cidade duplicará de
3.300 milhões de habitantes, em 2007, para 6.400 milhões, em 2050, e se estima que em 2008, pela
primeira vez na história, mais de metade dos habitantes do planeta vão residir na cidade.
Com estes indicadores em 2050, quase que 70 % dos 9.200 milhões de habitantes do
mundo ocuparão as grandes cidades, assim como, implicará num crescimento que certamente
comprometerão cada dia mais o acesso a moradia, e conseqüentemente a qualidade de vida da
população.
Por outro lado o crescimento da população nas cidades levará os habitantes rurais a migrar
para as grandes cidades, conseqüentemente começarão a diminuir sua ocupação nos próximos dez
anos até atingir os 2.800 milhões em 2050, o que representa uma perda de 600 milhões de pessoas
relativamente a 2007. As projeções das Nações Unidas apontam para que São Paulo, a capital
financeira do Brasil, se mantenha em 2025 como a quinta maior área metropolitana do mundo, com
21,4 milhões de habitantes, enquanto Tóquio, no Japão, continuaram sendo as maiores cidades do
planeta, somando mais 700 mil habitantes dos 35,7 milhões que já tinha em 2007.
Fórum Internacional do Meio Ambiente - A conferência da Terra 521

Considerando estas variáveis de crescimento e fator das correntes migratórias segundo a


Hania Zlotnik, diretora do departamento de população da ONU "A imigração não impulsionará o
crescimento da população, mas a manterá constante", como também, "Esta não é a razão para
nenhum país aceitar imigrantes [parar a queda da população]; a razão seria para que os imigrantes
sejam absorvidos pela demanda do mercado de trabalho". Atualmente, os países que recebem maior
número de imigrantes por ano são os Estados Unidos (1,1 milhão), Canadá (200 mil), Alemanha
(150 mil), Itália (139 mil), Reino Unido (130 mil), Espanha (123 mil) e Austrália (100 mil). Os
maiores países emigrantes são China, México, Índia, Filipinas, Paquistão e Indonésia.
Estudos nas diversas áreas produtivas do nosso planeta já apontam para o esgotamento dos
recursos naturais, uma vez que o ser humano consume cerca de 40 % deste total, assim como efeitos
no desenvolvimento econômico, social, político, previdenciário trará seus efeitos negativos tarde ou
cedo para o envelhecimento da população, o que poderá ocasionar a escassez de mão-de-obra.
Com estes efeitos, por exemplo, podemos já apontar o caso do Sistema Estadual de
informações e análise e dados da cidade de São Paulo em (1994), onde as cidades do interior
receberam mais gente do que expulsaram e a capital registrou o inverso. A queda do padrão de vida
fez, porém, que boa parte da classe média se mudasse para uma periferia menos cara e muitos
pobres, num contrafluxo migratório, voltassem para o centro da cidade para viver em cortiços,
favelas ou na rua.
A urbanista norte-americana Janice Perlman, idealizadora do Projeto Megacidades,
explica que: [...] a cidade formal cresce atualmente numa faixa de 3 a 4%, e a cidade
informal, com a explosão das moradias irregulares ocupadas por migrantes vindos do
campo, aumenta em dobro. A seu ver, as cidades só crescem enquanto oferecem algum
benefício aos novos imigrantes. Quando o caos urbano neutraliza os benefícios, a
migração se reduz. É o que está acontecendo hoje em São Paulo, onde a população está
diminuindo [...] (PERLMAN, 1994. p. 6).
Quase todas as cidades brasileiras, com exceções de algumas, não conseguiram controlar o
uso e a ocupação do solo. Nos últimos anos, invasores – inclusive membros da classe média
empobrecida – ocuparam conjuntos habitacionais semi-acabados ou prontos em várias capitais. Um
exemplo é a grande Belém, a maior região metropolitana da Amazônia. Segundo dados da Caixa
Econômica Federal e da Companhia de Habitação em (1996), a cidade foram considerados como a
campeã de invasões urbanas (Fundação SEADE1, 1994). Um aspecto importante que reflete
também estas circunstâncias é explicado pelas claras evidências do comportamento predatório.
Dados preliminares de um relatório preparado pelo Conselho de Mudanças Climáticas, do governo
da Alemanha em 1994, revelaram que cerca de 60% dos solos potencialmente aptos para agricultura
já estão deteriorados. O estudo informa também que vinte mil hectares de área verde são destruídos
diariamente. Serão necessários mais de dez mil anos para que o solo se regenere. Fatores naturais,
por sua vez, também contribuem para a deterioração do solo, como as chuvas intensas.
Nas cidades, a cada chuva intensa os sistemas de esgoto, cabos telefônicos e encanamento
de água são afetados. As ações mais comuns para esses problemas são a microdrenagem e a
macrodrenagem, a pavimentação e obras de estabilização dos vales receptores para facilitar o
escoamento nos pontos de lançamentos pelos emissários.
O solo é uma estrutura complexa formada por elementos sólidos (argila, areia, pedra, restos
orgânicos), líquidos (água) e gasosos (nitrogênio, oxigênio e outros). Esses elementos se infiltram
nas plantas e nos micro animais para dar vida a terra. O professor Tácio Moura Pereira de Campos
1996 da PUC-RJ, já apresentava o diagnostico dos problemas do solo e do subsolo e apontava para
as regras de prevenção e de solução para eles, propondo soluções que reduzam a instabilidade das
encostas, os mecanismos de transporte que contaminam as águas subterrâneas e lamenta a pouca
contribuição humana para a solução destes problemas.
O ser humano tem presença devastadora, ele faz uma ocupação desorganizada que aumenta
a instabilidade. A natureza pode até contribuir com esse processo através de sua evolução, mas o
homem acelera, quando deveria prevenir (CAMPOS, 1993).
Fórum Internacional do Meio Ambiente - A conferência da Terra 522

Por outro lado, o consumo de água no mundo, de 1950 até hoje, quase quadriplicou
acompanhando o rápido processo de urbanização em todos os continentes. Calcula-se hoje que 1,2
bilhões de pessoas têm um quântico de água abaixo do necessário. Os atuais níveis de consumo não
poderão ser mantidos se a população atingir 10 bilhões em 2050. Muitos pesquisadores acham que o
uso irracional dos recursos hídricos pode provocar conflitos em escala mundial.
Segundo relatório do Instituto de Saúde no Trabalho (1992), o território brasileiro não é
propriamente uma área perigosa, do ponto de vista dos chamados “riscos naturais ou telúricos”, em
comparação com zonas do planeta sujeitas a terremotos, maremotos, erupções vulcânicas, tufões e
ciclones. Mas este país se destaca pelas inundações catastróficas pelas secas graves e prolongadas,
pelos acidentes geotécnicos (como deslizamentos e soterramentos) e já registram inclusive
ocorrências de tremores de terra, alguns deles na zona de influência geológica de alguns
reservatórios de centrais hidrelétricas.
Mesmo as inundações catastróficas já não podem ser mais simplesmente atribuídas às
chamadas enchentes – fenômenos anuais de todos os rios –, pois tais situações vêm sendo agravadas
pelos demais riscos técnicos que ocorrem nas bacias hidrográficas (desmatamento, erosão,
assoreamento). Em certos casos, são provocadas pela própria existência das barragens e pela sua
operação técnica, ao longo das estações do ano e ao longo dos anos. Considerando-se o conjunto
das situações apresentadas, obtém-se um panorama completo dos riscos naturais que incluem riscos
biológicos da própria condição humana como espécie animal e, cada vez mais, riscos de origem
técnica. Estes são intrínsecos, decorrências quase obrigatórias em situações específicas, embora só
aconteçam de vez em quando, num determinado lugar e hora, o fato é que acontecem sempre em
todos os lugares onde a tecnologia é semelhante na indústria pesada, na mineração, na química, no
petróleo, na eletricidade. Segundo Mota (1979, p. 48) [...] embora a água tenha uma enorme
importância para a vida e a saúde humana, as inadequações entre a forma de ocupação do espaço e
o seu relacionamento com a mesma, podem ser bastante perigosos. Cerca de cem mil pessoas
morrem no mundo diariamente, vítimas de doenças veiculadas pela água. Esta contaminação tem
origem em micro-organismos presentes a matérias em decomposição e às fezes de pessoas doentes,
podendo ocorrer das seguintes maneiras:
a) pelo lançamento direto das fezes na água;
b) pelo lançamento de esgotos na água;
c) pela contaminação de águas subterrâneas, através de líquidos infiltrados a partir de fossas;
d) pelo lançamento de lixo e outros detritos, diretamente sobre a água.
A cidade não deixaria de reproduzir o estágio de relações entre o homem natural,
promovido pela apropriação e dominação desenvolvida pela sociedade.
Milton Santos (1988) afirma: “O espaço do homem vai se tornando cada vez mais
instrumentalizado, culturizado, tecnificado e cada vez mais trabalhado segundo os ditames da
ciência. Tudo isso se dá em um quadro de vida onde as condições ambientais são ultrapassadas
como agravo da saúde física e mental das populações. Deixamos de entender a natureza amiga e
criamos a natureza hostil”.
As evoluções das metrólopolis mostram que o crescimento urbano retrata cada vez mais a
penetração da segregação espacial por classes sociais. Vivenciamos, hoje, um problema muito sério:
o rebaixamento da qualidade de vida, juntamente com as construções das favelas, devido,
principalmente, ao baixo padrão de moradia e ao baixo nível de organização social.
Para Balassiano (1993) “caracterizar favela como uma zona de ocupação ilegal do solo e
construção em terrenos de propriedades alheias (pública ou particular), ocupação essa, de forma
desordenada, densa e carente de serviços públicos básicos e sem qualquer preservação do meio-
ambiente, gerando, na maioria das vezes, problemas de difícil solução”.
As favelas ou comunidades estão na sua maioria ocupando as margens dos rios e várzeas
das cidades. Os moradores destas áreas lavam roupa e jogam lixo continuamente no leito do rio, que
já é afetado por contínuas chuvas e inundações que causam todo um processo de proliferação e
instalação de doenças.
Fórum Internacional do Meio Ambiente - A conferência da Terra 523

A situação ambiental se apresenta com problemas graves: os riscos inerentes às condições


de seus sítios; a precariedade da maioria das habitações; a falta de drenagem pluvial, fluvial,
saneamento básico, coleta de lixo, atendimento a saúde e contaminação ambiental. Entretanto, são
os trabalhadores que, sem alternativas de moradia, ocupam terrenos públicos ou privados ociosos
para sobreviverem e trabalharem na cidade. Por outro lado, paralelamente a este contexto, é
importante verificar a presença dos “riscos” que se originam simultaneamente, para os seus
moradores, trazendo complicações nas condições da qualidade de vida da população e podendo
afetar o espaço físico no ambiente, comprometer as condições de moradia, e a vida do ecossistema
da cidade.
A inadequação de políticas de saneamento básico, desde as redes coletoras e as dos
tratamentos das águas servidas, até o abastecimento de água potável e o sistema de limpeza, tem
provocado graves problemas de saúde. Segundo relatório do Ministério da Saúde em 1996,
apontava que 70% das internações na rede hospitalar pública são conseqüências de doenças
transmitidas por vias hídricas, hoje este indicador ainda se mantém próximo dos 60 %. Essa
inadequação faz com que a população desenvolva mecanismos próprios para satisfazer suas
necessidades: fossas próximas a poços de água, lixo queimado ou jogado em rios ou terrenos
baldios. Tudo isso acentua a degradação da qualidade de vida na cidade e aumenta os riscos a que
estão expostos a comunidade.

O CRESCIMENTO POPULACIONAL
Um dos pontos mais cruciais que trata a respeito da ocupação urbana é explicado pelos
estudos e pesquisas sobre migração campo-cidade, principalmente por ser um fenômeno intenso na
maioria dos países da América Latina. Dos seis bilhões de habitantes do globo, cerca de 40% vivem
hoje em áreas urbanas. No ano 2000, metade desta população estará nas cidades e, em 2034, as
cidades abrigarão 65% da população global.
Segundo Campbell (1989), “Essa expansão, no entanto, não é mais principalmente
conseqüência do fato de pessoas deixarem o campo para tentar a sorte nas cidades”. A migração
deixou, há mais de dez anos, de ser a mola propulsora do crescimento urbano, pelo menos na
América Latina. Além do mais, a maioria dos especialistas concorda que campanhas para reduzir o
fluxo rural-urbano têm sido inúteis, porquanto os pobres urbanos da América Latina nascem de
países urbanos. Encontrar maneiras de sobreviver nesse ambiente torna-se cada vez mais difícil.

Tabela 1 - Estimativas e Projeções de Crescimento Demográfico Urbano, 1985 e 2010


1985 2010
Urbana Urbana
Região Total Rural Urbana c/ % do Total Rural Urbana c/% do
Total Total
África 453,5 336,2 117,3 25,9 988,6 566,7 421,9 42,7
Ásia 1.669,7 1.191,9 477,8 28,6 2.563,9 1.408,9 1.154,9 45,0
A 331,4 112,6 218,8 66,0 536,9 116,4 420,4 78,3
Latina
Total 2.454,6 1.640,7 813,9 33,2 4.089,4 2.092,2 1.997,2 48,8

(em milhões e percentagens).


Essa tendência à urbanização vem acompanhada de outra – a marginalização de toda
ordem em relação a um padrão urbano de vida. Esse paradoxo se faz sentir mais acentuadamente
nos países do Terceiro Mundo, que abrigam 75% da população mundial, com parte significativa de
seus habitantes urbanos vivendo em situação de marginalidade psicossocial e cultural, aglomerados
em invasões (favelas).
Fórum Internacional do Meio Ambiente - A conferência da Terra 524

No Brasil, cerca de 40% da população dos grandes centros urbanos vivem sob essas
1
condições (BRASIL, SEPLAN , 2004). Essas populações marginais são encontradas em quase
todas as nações do mundo, mas são mais comuns e numerosas nos países do Terceiro Mundo, onde
alcançam cifras expressivas, por conta das altas taxas de migração contínua do meio rural para o
urbano. No Brasil, por exemplo, a população urbana é da ordem de 75% (BRASIL, IBGE, 2003), E
hoje, representa quase que 70% com, aproximadamente, cinqüenta e seis milhões de pessoas
vivendo em favelas. Segundo números da ONU, o crescimento anual da população é de 1,14%, e
existe a expectativa de que alcance os 6,6 bilhões de habitantes em julho de 2007.
Atualmente, a população mundial é composta por 28% de crianças (menores de 15 anos),
18% de jovens (de 15 a 24 anos) e 44% de população economicamente ativa (de 25 a 59 anos).
Além disso, os idosos (acima dos 60 anos) representam apenas 10% da população mundial. No
entanto, se prevê que o número de idosos de 60 anos irá triplicar, dos 705 milhões atuais para quase
2 bilhões em 2050. "Isto quer dizer que pela primeira vez na história, o número de pessoas idosas
superará o de crianças em 2050”. A Europa, por exemplo, é a região onde a população é mais velha,
já que as pessoas idosas representam 21% do total, enquanto as crianças são 15%. Estima-se que em
35 anos, a Itália será o segundo país onde haverá a maior população idosa, atrás apenas da Espanha.
Para Oliven George (1996)... “existem uma série de autores que se preocupam justamente
com a questão da adaptação ou inadaptação de migrantes de origem rural ao contexto urbano e as
transformações que o processo migratório envolve”. Alguns estudiosos tendem a enfatizar que a
migração para a cidade requer a aprendizagem de novos padrões de comportamentos e a aquisição
de novos estoques simbólicos; outros autores tendem a argumentar que este processo é muito menos
profundo que aparenta, já que os meios de comunicação e a própria escola rural tendem cada vez
mais a criar orientações e comprometimentos compatíveis com a vida em cidades.
Milton Santos (1993) “a urbanização brasileira se tornou praticamente generalizada a partir
do terceiro terço do século XX, evolução quase contemporânea da fase atual de macrourbanização e
metropolização. O turbilhão demográfico e a terceirização são fatos notáveis. A urbanização se
avoluma e a residência dos trabalhadores agrícolas é cada vez mais urbana. Mais que a separação
tradicional entre um Brasil urbano e um Brasil rural, há, hoje, no País, uma verdadeira distinção
entre um Brasil urbano (incluindo áreas agrícolas) e um Brasil agrícola (incluindo áreas urbanas).
No primeiro os nexos essenciais devem-se, sobretudo a atividades de relação complexas e no
segundo as atividades mais diretamente produtivas.”
Registra-se, todavia, uma atenuação relativa das macrocefalias, pois além das cidades
milionárias desenvolvem-se cidades intermediárias ao lado de cidades locais, todas, porém,
adotando um modelo geográfico de crescimento espraiado, com um tamanho desmesurado que é
causa e é efeito da especulação. Pode-se, desse modo, falar de uma metropolização contemporânea
da “desmetropolização”, fenômenos que se dão simultaneamente. O perfil urbano se torna
complexo, com a tendência à onipresença da metrópole, através de múltiplos fluxos de informação
que se sobrepõem aos fluxos de matéria e são o novo arcabouço dos sistemas urbanos. Mas há,
também, paralelamente, uma certa “involução” metropolitana, o crescimento econômico das
grandes cidades sendo menor que o das regiões agrícolas dinâmicas e respectivas cidades regionais.
O novo perfil industrial decorrente da globalização tem muito a ver com esse resultado.
Para Berry (1972)... “a grande cidade, mais do que antes, é um pólo da pobreza a periferia no pólo,
o lugar com mais força e capacidade de atrair e manter gente pobre, ainda que muitas vezes em
condições subumanas. A grande cidade se torna o lugar de todos os trabalhos, isto é, o teatro de
numerosas atividades “marginais” do ponto de vista tecnológico, organizacional, financeiro,
previdenciário e fiscal”
O gasto público crescentemente orientado à renovação e à reviabilização urbana e que,
sobretudo, interessa aos agentes socioeconômicos hegemônicos, engendra a crise fiscal da cidade, e
o fato de que a população não tem acesso aos empregos necessários, nem aos bens e serviços
essenciais fomentam a expansão da crise urbana. Algumas atividades continuam a crescer ao passo
que a população se empobrece e observa a degradação de suas condições de qualidade de vida.
Fórum Internacional do Meio Ambiente - A conferência da Terra 525

O processo de urbanização brasileiro - em seu sentido mais amplo, não pode ser isolado do
processo de desenvolvimento econômico e social, de um modo geral, ele contém, no seu bojo, os
mecanismos que interligam o processo espacial e o social, pois ele associa a dimensão espacial
tanto intra como interurbana à dimensão social e econômica, e principalmente os problemas
relativos ao meio ambiente, o que diferencia cidades no interior da rede urbana.
Por outro lado, a própria idéia de que este processo de desenvolvimento e urbanização tem
conotações muito amplas, implica a admissão de tendência recente da teoria e da política de
desenvolvimento urbano-regional e meio ambiental com políticas calçadas no desenvolvimento
sustentável, de certo modo, na maioria das vezes com ênfase muito mais política que advém de
muitas contradições entre política econômica e política de desenvolvimento urbano-regional e
ambiental.
A experiência de numerosos países do Terceiro Mundo na adoção de pressupostos
neoclássicos nos planos de desenvolvimento urbano-regional tem sido frustrante, no sentido de que
os mecanismos de filtragem para baixo dos impulsos de desenvolvimento gerados nos grandes
centros urbanos e nas regiões mais desenvolvidas não funcionaram a contento.
Hay Jr. (1975) chama a atenção para o seguinte fato: [...] a urbanização no Terceiro Mundo
não tem sido acompanhada por uma concomitante prosperidade, como ocorreu nas nações
ocidentais; o contrário, ela tem sido paralela a uma crescente desigualdade nos rendimentos e
serviços, fazendo o terceiro mundo tornar-se relativamente mais pobre, enquanto o conjunto de
países desenvolvidos se torna relativamente mais rica. No caso do Brasil o processo foi exatamente
esse, em que o processo de desenvolvimento foi evoluindo, gerando fortes desequilíbrios, tanto ao
nível das pessoas como das regiões.
Na medida em que o Brasil foi se desenvolvendo nas décadas de 1950 e 1960 e mais
fortemente na década de 1970, as ligações com o resto do mundo foram se ampliando e a economia
brasileira foi se internacionalizando cada vez mais, a ponto de ser hoje uma parcela da economia
mundial.
Isto ocorreu não só porque relações de troca aumentaram intensamente, ao longo deste
processo, mais também porque o Brasil dependeu muito de investimentos externos para sustentação
do processo, tornando-se progressivamente dependente deste capital externo, seja sob a forma de
investimento direto, ou sob a forma de empréstimos.
O processo na urbanização – sem dúvida é o mais dramático e mais importante problema
que os países em desenvolvimento, em geral, estão enfrentando desde o fim da Segunda guerra
Mundial – tem sido pensado como o principal e necessário caminho na direção do desenvolvimento
econômico e social, inclusive porque pressupõe a industrialização. Conseqüentemente tem
produzido este desenvolvimento ao crescimento da industrialização, mas que envolve custos
sociais, cuja aceitação e validade hoje se precisa discutir, não como negação dos valores do
desenvolvimento, mas sim como afirmação no contexto de uma estratégia de desenvolvimento que
implique uma política urbana adequada, assim como de políticas meio ambientais mais corretas e
menos degenerativas para o ser humano.
Vale mencionar que este processo intenso de urbanização está, obviamente, gerando uma
expansão territorial das grandes aglomerações urbanas e metropolitanas, que por sua vez produz o
que, no jargão desenvolvimentista do Terceiro Mundo, se costuma chamar de periferização. Esta se
denomina, também, a formação de uma extensa faixa de populações mais ou menos marginalizadas,
onde se destacam uma severa deficiência de serviços urbanos convencionais, do tipo água, esgoto e
habitação. Esta deficiência, associada a uma generalizada situação de pauperismo nos habitantes
destas periferias, representa uma séria ameaça ao processo de metropolização. É que aí o processo
de reprodução da força de trabalho, das condições de emprego, educação e saúde fica seriamente
prejudicado por este pauperismo. Oliven (1996) afirma: “Analisando os mecanismos
institucionalizados sui generis que permitem a adaptação de setores marginais urbanos numa
estrutura social deste tipo”, para Berlinck e Hogan (1978) argumentam que, “o problema da
adaptação se refere, em última análise, ao desenvolvimento de uma rede de interação relativamente
Fórum Internacional do Meio Ambiente - A conferência da Terra 526

repetitiva e padroniza que permita à população obter do meio em que vive os recursos necessários à
satisfação de suas necessidades e seus desejos”.
Por isto, a noção de rede de relações sociais, utilizada por antropólogos em outros
contextos Radcliffe-Brown (1973), adquire uma importância fundamental para analisar o dia-a-dia
das populações urbanas marginais ou de baixa renda, bem como de outros setores sociais Lomnitz
(1975) assinala que “um estrato importante da sociedade urbana latino-americana, o marginal,
assegura sua sobrevivência mediante o uso da reciprocidade. Ao compartir seus recursos, escassos e
intermitentes, com os de outros de idêntica situação, o povoado das barriadas logra impor-se em
grupo as circunstâncias que seguramente o fariam sucumbir como indivíduo isolado.”
Outro aspecto de grande importância na análise preliminar deste processo brasileiro de
urbanização é que ele é, na realidade, um processo de metropolização, pois a população das cidades
de mais de um milhão de habitantes passou de 6,4 milhões para quase 24 milhões, ao mesmo tempo
em que o número de cidades passará de dois para 10.
O papel da grande cidade – região metropolitana – no processo de desenvolvimento é
extremamente importante, principalmente porque cada uma delas terá uma função relevante a
desempenhar no processo de mudança nos dias de hoje.
Um estudo elaborado pela Divisão da População do Departamento de Assuntos Sociais e
Econômicos das Nações Unidas indica que a população mundial que vive na cidade duplicará de
3.300 milhões de habitantes, em 2007, para 6.400 milhões, em 2050, e se estima que em 2008, pela
primeira vez na história, mais de metade dos habitantes do planeta vão residir na cidade.
Com estes indicadores em 2050, quase que 70 % dos 9.200 milhões de habitantes do
mundo ocuparão as grandes cidades, assim como, implicará num crescimento que certamente
comprometerão cada dia mais o acesso a moradia, e conseqüentemente a qualidade de vida da
população.

REFERENCIAS BIBLIOGRAFIA
ALHO, Cleber J. A. A teia da vida: uma introdução à ecologia brasileira. Rio de Janeiro:
Objetiva.1992.
BALASSIANO, Helena H. M. As favelas e o comportamento ambiental. In: MESQUITA, Olindina
V.; SILVA, Solange T. Geografia e Questão Ambiental. Río de Janeiro: IBGE, Departamento de
Geografia, 1993.
BANCO MUNDIAL. Programa de gestion urbana y meio ambiente. Washington D.C., 2005
BERLINCK, Manoel Tosta; HOGAN, Daniel J. Adaptação da população e cultura da pobreza na
cidade de São Paulo: marginalidade social ou relações de classes? In: Cidade: usos e abusos. São
Paulo: Brasiliense, 1978.
BERRY, J. L. Brian. Hierarchical diffusion; the basis of develpmental filtering and spread in a
system of growth centers. In: HANSEN, Niles M. (org.) Growth centers in regional development.
New York: The Free Press, 1972. p. 108-38.
CAMPOS. In: Revista do Programa de Pós-Graduação da PUC-Rio em Geotecnia, 1993.
CARDOSO, Adauto; RIBEIRO, Luiz. Planejamento urbano no Brasil: paradigmas e experiências.
In: Revista. Espaço e Debates. Cidades Brasileiras. Século XX. Ano XIV. São Paulo, p.77. 1994
CASTRO, Cláudio de Moura. A prática da pesquisa. São Paulo: Edgard Bluser, 1995.
Centro Latino-Americano e Caribenho de Demografia da Divisão de População da Comissão
Econômica para a América Latina e o Caribe (Cepal). 2007
CERRI, L. Riscos geológicos associados a escorregamentos: uma proposta para prevenção de
acidentes. USP. São Carlos. 1993.
CNUMAD. Conferências das Nações Unidas para o Meio Ambiente e Desenvolvimento. Rio de
Janeiro, 1996 - 2005
Comissão Interministerial do Meio Ambiente (CIMA), Rio-92
FARAH, Marta. Estado, Previdência Social e Habitação. Universidade de São Paulo – USP.
Dissertação de Mestrado - Departamento de Ciências Sociais. Ricardo. Cidades e
Urbanização,1995.
Fórum Internacional do Meio Ambiente - A conferência da Terra 527

FERREIRA F, Nelson e PALMEIRO A, Cláudio. Movimentos de Massa: Uma Abordagem


Geológico-Geomorfológica. Cap. 3. p. 123 do Texto Geomorfologia. Rio de Janeiro: Editora
Bertrand Brasil, 1966.
FRENDLEY, Roger W. Control de la Contaminação en el Brasil. Ecology Law Quarterly, v. 15, n.
1, 1988.
Fundação SEADE, 1994, São Paulo.
Fundação SEADE, 1994-2004
HAY, JR. Richard. Patterns of urbanization and socio-economic development in the third world na
over view. In: Third World Urbanization, Metheun, 1977.
HONORATO, R. C. Problemas Urbanos na cidade de João Pessoa. Jornal Correio da Paraíba. 13
abr. 1997.
LOMNITZ, Larissa. Como sobreviven los marginados. Mexico: Siglo Veintiuno, 1975.
OLIVEN. R. George. A antropologia de grupos urbanos. 4. Ed. Petrópolis: Vozes, 1996. p. 33-34.
PERLMAN, Janice. In: Revista de Ecologia e Desenvolvimento. n 3. Nov. p. 6, 1994.
Relatório da Divisão de População da ONU – 2007
RELATÓRIO DA CAIXA ECONÔMICA FEDERAL (CEF) E DA COMPANHIA DE
HABITAÇÃO (COHAB) 1996 - 2004
RELATÓRIO DA COMISSÃO INTERMINISTERIAL DO MEIO AMBIENTE (CIMA). Rio–92.
1993. In: Revista de Ecologia e Desenvolvimento. ano 3. n 45. out. 1994- 2005.
RELATÓRIO DA FUNDAÇÃO SEADE (Sistema Estadual de Análise e Dados). São Paulo, 1994-
2004.
RELATÓRIO DO CONSELHO DE MUDANÇAS CLIMÁTICAS DA ONU E CRESCIMENTO
POPULACIOANAL 1994 - 2007
RELATÓRIO DO CONSELHO DE MUDANÇAS CLIMÁTICAS. Dados preliminares. In: Revista
Ecologia e Desenvolvimento. Governo da Alemanha, 2004
RELATÓRIO DO INSTITUTO DE SAÚDE NO TRABALHO DO RIO DE JANEIRO. In Revista
Ecologia e Desenvolvimento, ano 12. 2005.
Sistema Estadual de informações e análise e dados da cidade de São Paulo 1994 – 2004.
Fórum Internacional do Meio Ambiente - A conferência da Terra 528

MEIO AMBIENTE, O LOCAL E A CIDADE: CRIANÇAS E JOVENS DESENHANDO


SEUS LUGARES

Luiz Gonzaga Falcão Vasconcellos


Geógrafo Urbanista e Professor. Instituto de Geografia da Universidade Federal de Uberlândia – UFU. Campus Santa
Mônica, Bloco H - Sala 1H09 – Santa Mônica – 38400-902 Uberlândia – MG. falcao@ufu.br

“A cidade tem uma bagagem que não pode conduzir


e, mesmo que sempre tão apressada, parece não saber onde vai
Nos seus bolsões, personagens marginais e esquecidos
são maioria clandestina que opta pelo perdão
por desconhecer a força que tem”78
Raimundo Gadelha – Anatomia

PREÂMBULO
O trabalho “Meio Ambiente: O Local e a Cidade – Crianças e Jovens Desenhando Seus
Lugares” (relato de experiência científica), integrado também pelo o filme
DesenhosCidadesDesejos (19 minutos – VHS e DVD)79, cujo conteúdo se enquadra no eixo “Ética,
Cidadania e Meio Ambiente”, da Conferência da Terra (Fórum Internacional do Meio Ambiente –
Questões Ambientais Globais e Soluções Locais) constitui-se em parte do que tem sido realizados
no desenvolvimento do Projeto “Oficina de Desenho Urbano: As Crianças, os Jovens e a Cidade”, o
qual foi iniciado em 2001.
No momento estamos realizando a Quinta Etapa do Projeto, a qual é desenvolvida sob
nossa coordenação, no contexto da programação de atividades do Laboratório de Ensino de
Geografia – LEGEO / Instituto de Geografia da Universidade Federal de Uberlândia – UFU.
Quanto ao filme, ele tem caráter cultural-educacional, e está estruturado em cinco blocos, a
saber: Primeiro - Diário da Cidade – eu sou a manhã, eu sou à tarde, eu sou à noite – eu sou a
cidade a desenhar novos roteiros e construir novos personagens; Segundo - Observações sobre a
cidade; Terceiro - O som da cidade pelo corpo de quem a habita; Quarto -
DesenhosCidadesCidadesDesenhos; Quinto - Caminhando pela muitas cidades.
Olhar e perceber a cidade – cidades, e, propor cidade - cidades, é um olhar-proposição
humano, tecido e construído pelas culturas nas quais se vive, em constante interação com seus
“meios”, “nadando, mergulhando, voltando a tona e tornando a mergulhar”, em contínuo
movimento-processo; adensado pelas inumeráveis histórias pessoais e coletivas.

PRIMEIROS PASSOS
O Projeto Oficina de Desenho Urbano: As Crianças, os Jovens e a Cidade começou a ser
pensado no início de 2001, sendo a Primeira Etapa desenvolvida entre abril de 2001 e dezembro de
2002, constituindo-se em parceria entre a Universidade Federal de Uberlândia – UFU (Pró-Reitoria
de Extensão, Cultura e Assuntos Estudantis - PROEX / Diretoria de Culturas - DICULT) e a
Prefeitura Municipal de Uberlândia - PMU.
Com caráter interinstitucional e interdisciplinar, a Etapa envolveu professores de várias
disciplinas e níveis de ensino, e colaboradores (profissionais de diversas áreas, estudantes e outros
interessados). Tais interessados se reuniram para pensar e formular o Projeto, bem como para
planejar uma ação de desenho com crianças e jovens, tendo como finalidade trabalhar com
desenhos elaborados por eles, enquanto registros gráficos que falam e mostram a cidade na qual
vivem e a cidade que desejam e querem construir. A Ação: “Desenhando e Construindo a Cidade
no Cerrado” realizou-se no dia 30 de Setembro de 2001, tendo como proposta desenhar “a cidade
78
Raimundo Gadelha in: Para não esqueceres dos seres que somos.
79
A concepção do vídeo é de autoria de Luiz Gonzaga Falcão Vasconcellos (Geógrafo Urbanista e
Professor) e de Lucimar Bello Pereira Frange (Artista Plástica e Professora Doutora). Os demais créditos
são: Trilha sonora, Marcílio Duarte Jr; direção de desenho animado, Hélio de Lima; Produção e direção,
Alexandre França.
Fórum Internacional do Meio Ambiente - A conferência da Terra 529

que você vive e a cidade que gostaria de construir”. A atividade aconteceu em trinta praças do
município (sendo 26 na cidade e 4 nos distritos de Tapuirama, Martinésia, Cruzeiro dos Peixotos e
Miraporanga) quando três milhares de pessoas especialmente crianças e jovens e também adultos e
idosos compareceram espontaneamente às praças para desenhar a cidade e as vilas sedes dos
distritos.
Entre os meses de março e abril de 2001, foi realizado em Uberlândia um projeto
objetivando pensar a cidade a partir de entendimentos e visões de diferentes profissionais, a Oficina
de Desenho Urbano: A Cidade no Cerrado (Secretaria Municipal de Planejamento e
Desenvolvimento Urbano).
A partir desse momento que propiciou o encontro entre pessoas que estavam abertas para
construir um pensamento urbano diferente do que correntemente acontece em Uberlândia,
começamos a conversar e discutir a realização de um outro projeto, este voltado particularmente às
crianças e os jovens, buscando propiciar oportunidade para que eles pudessem também desenvolver
em espaços públicos e de forma coletiva o exercício de pensar a cidade e suas construções culturais,
sociais, econômicas e políticas.

CONCEPÇÕES E METODOLOGIAS: TRAJETÓRIAS – ITINERÁRIOS


Inicialmente a proposta teve como objetivo geral, pensar a cidade e o município através
dos desenhos de crianças e jovens a serem realizados em praças assumidas como espaços de
encontros, diálogos, trocas e criação.
Em termos específicos o projeto no primeiro momento objetivou: 1) Incentivar as
percepções da cidade como espaço habitacional e de trocas culturais e sócio-políticas, com
qualidade de vida; 2) Conhecer a cidade considerando também os recursos naturais e incorporá-los
como valores existenciais; 3) Propor que as crianças e os jovens (tendo como foco de contato e
divulgação inicial escolas de ensino fundamental e médio do Município), fizessem desenhos do
lugar onde vivem e do que gostariam de construir; 4) Encaminhar as proposições feitas pelas
crianças e jovens para os órgãos públicos e outras instituições.
Assim, o Projeto se propôs a trabalhar com o desenho de crianças e jovens que, através de
seus registros gráficos, falam e mostram sobre a cidade na qual vivem e a cidade que desejam e
querem construir.
Na concepção inicial do Projeto estava contida a idéia de elaborar e desenvolver
coletivamente o trabalho, sendo que no primeiro ano (2001) estiveram diretamente envolvidos na
linha de frente do mesmo quase trinta pessoas, incluindo além de professores, técnicos e alunos da
UFU (Universidade Federal de Uberlândia), representantes de dez diferentes secretarias da
Prefeitura Municipal de Uberlândia e outros interessados.
A proposta foi de conceber, elaborar e desenvolver coletivamente o Projeto com a
participação de várias instituições e organismos; por isso, na Primeira Etapa, várias Secretarias da
Prefeitura Municipal (de Planejamento e Desenvolvimento Urbano, Educação / Centro Municipal
de Estudos e Pesquisas Educacionais – CEMEPE, de Cultura / Oficina Cultural, de Meio Ambiente
e Desenvolvimento Sustentável, de Comunicação Social, Turismo, de Ciência e Tecnologia, de
Administração dos Distritos, de Planejamento Participativo e de Desenvolvimento Social) foram
convidadas a participar do empreendimento, em conjunto com a Universidade Federal de
Uberlândia - UFU. A partir daí foi constituída a equipe coordenadora, da qual participam
representantes da UFU e das respectivas secretarias municipais, com aproximadamente quinze
pessoas.
Em termos metodológicos, mais especificamente quanto a sua Primeira Etapa (Oficina de
Desenho Urbano: As Crianças, os Jovens e a Cidade no Cerrado), o Projeto foi pensado e gestado a
partir de pesquisa participante, pesquisa-ação e da pesquisa qualitativa, entendendo o desenho a ser
trabalhado como ação cultural, social e político-pedagógica. A pesquisa é o ato de conhecimento,
tendo de um lado o cognoscente – os pesquisadores e outros profissionais da UFU e das diversas
Secretarias Municipais envolvidas, e de outro, os grupos populares, no caso, as crianças e os jovens,
tendo como objeto a ser desvelado, uma realidade concreta, a cidade na qual se vive e uma
Fórum Internacional do Meio Ambiente - A conferência da Terra 530

realidade desejada e imaginária, a cidade que se quer construir e, nela, se propõem possíveis
soluções.
Assim, foi sendo delineada como investimento do Projeto, uma cidade humana a ser
humanizável – uma cidade com qualidade digna de vida para todos seus segmentos, uma cidade
onde os benefícios do urbano enquanto produção social possam ser usufruídos por todos citadinos
reconhecidos como cidadãos, independente do poder aquisitivo, da idade, do gênero, do grupo
social, da etnia, etc.
Nesse sentido, entendemos a cultura como uma área de conhecimento e de consciência que
se constroem, se estruturam e se enriquecem a partir de um processo de ação e de reflexão
empreendidas pelos protagonistas de uma prática social vinculada a interesses concretos e
imediatos, tanto dos propositores e gestores do Projeto quanto dos participantes, nas 30 praças
selecionadas (da cidade e dos distritos - município de Uberlândia), em sua Primeira Etapa.
O objetivo da pesquisa cultural e social é motivar e instrumentar diversificados grupos de
trabalho, como fonte de conhecimento e de uma ação educativa de transformação numa perspectiva
libertadora / criadora.
Em todo o decorrer das etapas do Projeto até aqui desenvolvidas, os desenhos têm sido
tomados e entendidos como falas e discursos que mostram diferentes sintaxes culturais, e que
permitem as buscas e os encontros das semânticas culturais, ou seja, um caminhar das ações, as suas
significações no contexto da cidade e do urbano.
O conhecimento visual e sua análise são, portanto, um desvelar da consciência de um novo
sentido sobre a experiência vivida no cotidiano, que mostra e encaminha necessidades e vontades
para melhorias de vida, uma vez que a imagem tem poder de voz e de mostrar pessoas e seus
pensamentos sobre a(s) cidade(s) em que habitam. As imagens alojam tensões visuais de
movimentações e de apreensões de sentidos de experiências vividas pelo ser humano, e elas nos
permitem ver como as crianças e os jovens pensam em construir uma cidade na qual possam
participar enquanto cidadãos atuantes, críticos e emancipatórios.
Conforme já foi dito, o Projeto tem sido pensado, elaborado e desenvolvido buscando o
máximo possível um agir coletivo entre a UFU os diversos parceiros envolvidos, na perspectiva de
uma reflexão contínua sobre as relações culturais / políticas / sociais de uma cidade que se faz e
refaz, que se constrói e desconstrói diuturnamente, em um processo com cenários e enredos
envolvendo todos citadinos como atores sujeitos da história local e urbana.
Dessa forma, crianças e jovens exercem também de direito e de fato sua cidadania,
pensando, propondo e interferindo na elaboração das questões locais e urbanas da “terra” em que
vivem, buscando-se trabalhar no geral, a temática da cidade e do urbano, interligando artes, culturas
e comunidades, no contexto de um trabalho interdisciplinar, e, na medida do possível, com parceria
interinstitucional.
A Primeira Etapa do Projeto estendendo-se de abril de 2001 a dezembro de 2002,
envolvendo professores de várias disciplinas e níveis de ensino, e colaboradores (profissionais de
diversas áreas, estudantes universitários e outros interessados). Os participantes se reuniram para
pensar e formular o Projeto, contemplando a realização de uma ação de desenho com crianças e
jovens, tendo como finalidade trabalhar com desenhos elaborados por eles, enquanto registros
gráficos que falam e mostram a cidade na qual vivem e a cidade que desejam e querem construir.
Como parte do Projeto, foi realizada no dia 30 de Setembro de 2001 a Ação “Desenhando
e Construindo a Cidade no Cerrado”, tendo como proposta desenhar “a cidade que você vive e a
cidade que gostaria de construir”. A atividade aconteceu em trinta praças do município (sendo 26 na
cidade e 4 nos distritos de Tapuirama, Martinésia, Cruzeiro dos Peixotos e Miraporanga) quando
quase três milhares de crianças e jovens e também adultos e idosos compareceram espontaneamente
às praças para participar do evento, desenhando a cidade existente e a cidade desejada.
No desenvolvimento da Ação buscou-se valorizar a expressão das crianças e jovens quanto
a sua inserção (formas de inclusão / exclusão) no espaço local, compreendido enquanto produção
social, e, como resultado foram produzidos 2643 desenhos, matéria prima fundamental para os
passos seguintes , bem como para concretização mais elaborada do Projeto.
Fórum Internacional do Meio Ambiente - A conferência da Terra 531

Após essa atividade, foram realizadas reuniões de avaliação e formadas seis equipes com a
participação também de oficineiros (colaboradores que atuaram no dia 30/09/2001) e outras pessoas
interessadas, as quais além de avaliarem o que havia sido realizado, trabalharam em termos do
estabelecimento de referenciais para as “leituras / conversas” em relação aos desenhos, trabalho
esse concluído em inícios de 2002.
“Ler" e “conversar” com os desenhos desenhados nas praças, viria a constituir-se numa
atividade bastante trabalhosa e que requereu acuidade e sensibilidade, uma vez que não se tratava de
um mero constatar ou identificar o “factual”. A proposta do Projeto visou primordialmente o
encontro com crianças e jovens convidando-os para darem curso através de desenhos, aos seus
desejos, sonhos e “necessidades” quanto à cidade.
Assim, pensar a cidade e o urbano remete a sua constituição enquanto produção sócio -
cultural – econômica articulada e fragmentada, reflexo e obra dos processos e movimentos da
sociedade. Isso implica na necessidade de se buscar captar a condição e situação a partir da qual o
desenho é desenhado. Isso se aplica aos mais diversos “lugares”, sejam na cidade e seus bairros, ou
nas vilas sedes dos distritos. Quando o Projeto fala em “cidade no cerrado”, está implícito que seu
interesse é o município como um todo, considerando a amplitude de sua diversidade sócio-cultural-
ambiental.
Por outro lado, buscou-se promover “diálogos entre desenhos” procurando aperfeiçoar as
“leituras e diálogos” com cada desenho, cuidando-se para evitar a comparação qualitativa e
classificatória entre eles, uma vez que a intenção foi utilizar o desenho (linha e traço) enquanto
forma de expressão e “fala”, e não, aferir-se quanto à utilização dessa ou daquela técnica.
Como desdobramento das reuniões foram constituídas as equipes responsáveis por
trabalharem com os desenhos de cada um dos setores, a saber: Norte, Sul, Leste, Oeste, Central
(correspondente às áreas em que foi dividida a cidade), e Distritos (correspondentes as quatro vilas
sedes dos distritos).
Dando seguimento ao aprofundamento das reflexões sobre as atividades desenvolvidas até
então, aconteceram em novembro de 2001 quatro seminários com a participação da equipe do
Projeto e dos colaboradores que atuaram como oficineiros.
Em oito de novembro realizou-se o seminário “Desenhando e Construindo a Cidade no
Cerrado: Desenhos Desenhados” (palestrantes: professor Luiz Gonzaga Falcão Vasconcellos e
professora Lucimar Bello Pereira Frange). Posteriormente as exposições dos professores, foram
repassados aos participantes alguns desenhos, para exercícios, reflexões e debates quanto ao
trabalho de “leitura” a ser desenvolvido com os desenhos realizados nas praças.
Já em nove de novembro, aconteceu o seminário “A Arte Pública”, com palestra proferida
pela professora Lilian Amaral, artista plástica e mestre pela Escola de Comunicação e Artes da
USP. Na intervenção inicial, Lílian Amaral abordou concepções e conceitos presentes em seus
estudos, pesquisas e práticas de intervenção sobre a temática da arte pública. Em seguida os
participantes do seminário tiveram a oportunidade de produzir em grupo dez outdoors na
perspectiva da “ArtePinturaPública”, pintando o tema “A cidade em que você vive e a cidade que
gostaria de construir” (mesmo tema que foi trabalhado pelas crianças e os jovens na Ação realizada
em 30/09/2001) Para os participantes do seminário foi um desafio fazer pintura em grande formato
(papel branco e tinta preta), mas também um prazer incomparável ver os outdoors prontos como
síntese do pensamento e idéias do grupo.
Os outdoors em número de dez, foram expostos no período de 16 a 31 de dezembro de
2001, em pontos de duas grandes e importantes avenidas da cidade de Uberlândia, a Avenida
Rondon Pacheco (cinco outdoors), e a Avenida João Naves de Ávila (cinco outdoors), onde o
desenhos puderam ser visitados e apreciados. No entendimento da Equipe do Projeto a realização da
exposição dos desenhos em via pública constituiu-se em um tipo peculiar e inovador de atividade
artística, feita para estar na rua e buscando se integrar aos cenários da cidade, interagindo com seus
atores e enredos. Durante a exposição houve visita coletiva de membros da equipe do Projeto aos
desenhos expostos em outdoors, momento em que além de “leituras / diálogos” com desenhos, foi
possível desenvolver reflexões e discussões quanto à relevância cultural desse tipo de iniciativa.
Fórum Internacional do Meio Ambiente - A conferência da Terra 532

O terceiro seminário, “Arte e Urbano”, aconteceu dia vinte e seis de novembro tendo como
expositora a professora doutora Ana Mae Barbosa (ex-presidente da – International Association for
Education Through Art – InSEA, e responsável pela implantação dos programas de mestrado e
doutorado em sua área de estudos e pesquisas, bem como colaboradora do CNPq e da FAPESP.
O último seminário foi realizado em vinte e sete de novembro, e nele foram feitos
encaminhamentos para a seqüência das atividades do Projeto, tendo sido confirmadas as equipes
para “leitura” dos desenhos, bem como constituídas as equipes do livro, do vídeo e de fotografia
(tomadas fotográficas realizadas em 30/09/2001).
Como resultados da Primeira Etapa, em 2002 foi publicada uma coleção de dez postais
com desenhos de desenhadores, um encarte no Caderno Revista / Jornal Correio (Uberlândia,
07/07/2002), um CD Rom “Demandas Desejos” com as proposições para a cidade e o município
oriundos dos desenhos e a primeira edição do livro: “Oficina de Desenho Urbano: Desenhando e
Construindo a Cidade no Cerrado”, com tiragem de mil exemplares.
No que tange ao livro, é importante ressaltar que ele foi escrito com a participação de
praticamente meia centena de pessoas (cem mãos), que atuaram a partir das equipes constituídas
para trabalharem com os desenhos de cada um dos setores onde foi realizada a ação “Desenhando e
Construindo a Cidade no Cerrado”. Como resultado foram elaboradas as seguintes partes do
capítulo dois (Dialogando com as imagens): A praça como Moldura; Desenhos-Desenhados:
sonhos, desejos, realidades, lembranças; O meio, a cidade, o desejo, o desenho e o olhar; Propostas
para as cidades de seus sonhos: uma viagem pelos desejos-desenhados; O urbano modificando as
relações sociais através do olhar de crianças e de jovens e Leituras e diálogos com imagens nos
Distritos: Martinésia, Tapuirama, Cruzeiro dos Peixotos e Miraporanga. Este capítulo contou
também com uma parte intitulada Fotos-Percursos-Espaços dos Desenhos-Desenhados, relativa às
fotografias (mais de 1000) do dia da Ação “Desenhando e Construindo a Cidade no Cerrado”.
A Segunda Etapa do Projeto desenvolveu-se entre 2003 e 2004, com a participação da
Diretoria de Culturas – DICULT / Pró-Reitoria de Extensão, Culturas e Assuntos Estudantis /
PROEX – UFU e o Instituto de Geografia – IG / Laboratório de Ensino de Geografia / LEGEO –
UFU, tendo como finalidade publicar a segunda edição revisada do Livro (formato CD Rom); o
filme cultural-educacional: “DesenhosCidadesDesejos” (VHS e DVD - 19 minutos) e uma coleção
com três cartelas sanfonadas (onze postais cada), denominada “Conversas de Desenhos com
Desenhos”.
Para o filme e o livro, que foram lançados em novembro de 2004, contou-se com
patrocínio cultural da Caixa Econômica Federal e apoio do Mosteiro Zen Morro da Vargem /
Estação Cultural (Ibiraçu – ES) e da empresa Cinevídeo (Uberlândia – MG).
A Terceira Etapa desenvolveu-se no âmbito do Instituto de Geografia – IG /
Laboratório de Ensino de Geografia / LEGEO – UFU, entre dezembro de 2004 a fevereiro
de 2006, com o Projeto inicialmente integrando o Programa de Formação Continuada de
Professores (as), Especialistas e Gestores (as) do Ensino Básico das Redes Educacionais Públicas
(PROEX / UFU) e mais uma vez com apoio da Diretoria de Culturas – DICULT / Pró-Reitoria de
Extensão, Cultura e Assuntos Estudantis / PROEX. e financiamento parcial do Programa de Apoio à
Extensão Universitária Voltada as Políticas Públicas – PROEXT 2004 – SESu / MEC.
Esta Etapa foi desenvolvida com o objetivo de divulgar e distribuir as produções; imprimir
e distribuir as cartelas: “Conversas de Desenhos com Desenhos”; realizar quatro eventos (oficinas)
para difusão das metodologias do Projeto, voltadas especialmente para professores das redes
municipais e estadual de ensino, e outros interessados, bem como de avaliar por intermédio dos
usuários, as metodologias, conteúdos e formas de apresentação das produções, bem como os
resultados de suas utilizações.
Na Quarta Etapa, realizada no período de março de 2006 a fevereiro de 2008, foi dada
continuidade aos trabalhos de divulgação das produções, incluindo as cartelas “Conversas de
Desenhos com Desenhos” (coleção de três cartelas sanfonadas), na realização de oficinas para
difusão das metodologias do Projeto, voltadas especialmente para professores de redes municipais e
estaduais de ensino.
Fórum Internacional do Meio Ambiente - A conferência da Terra 533

Outra linha de atividades iniciada no período foi o processo de avaliação das metodologias,
conteúdos e formas de apresentação das produções, bem como dos resultados de suas utilizações,
por intermédio dos usuários do que foi produzido (pessoas que adquiriram ou acessaram as
produções por meio da Internet ou outras formas).
A coleção de três cartelas sanfonadas “Conversas de Desenhos com Desenhos (onze
postais cada): “realidadesdesejosrealidadesdesejos”; “cidade em que se vive e cidade em que se
gostaria de viver” e “cidadecidadescidadecidades”, foi laçada em 13 de setembro de 2007 em
evento que contou com uma mesa redonda na qual foi feito um debate sobre as realizações,
produções, resultados e repercussões do Projeto.
A mesa do evento foi composta pela professora Aninha Duarte, do Curso de Artes Visuais
da UFU (participante da Primeira Etapa do Projeto); por Lucimar Bello Pereira Frange, ex-
professora do Curso de Artes visuais da UFU (propositora inicial do Projeto e participante das
Primeira e Segunda Etapas do mesmo); professora Maria de Fátima Ramos de Almeida, do Curso
de História da UFU; e do Arquiteto Marco Túlio Pereira (participante da Primeira Etapa do Projeto,
na condição de aluno universitário).
Na oportunidade a professora Lucimar Bello em sua exposição, deu o seguinte
depoimento: “Falcão e eu, escolhemos na Terceira Etapa do Projeto, em sua continuidade, 300
desenhos para, com eles conversarmos. Estes desenhos foram retirados, aleatoriamente das pastas
que contém todos os desenhos realizados pelos desenhadores em 2001 (arquivadas hoje no MUnA,
Museu Universitário de Arte, da UFU, em Uberlândia).
Em fevereiro de 2003, durante doze dias convivemos quase que, exclusivamente, com as
imagens destas 300 pessoas. Ou seja, nós na aparente solidão do Mosteiro Zens Morro da Vargem,
em Ibiraçu no Espírito Santo, dialogamos, ouvimos e falamos com as marcas desenhadas de pessoas
que aceitaram nosso convite para, pelo desenho, mostrar e propor - a cidade em que se vive e que
se gostaria de construir.
Pensamos em papéis dobrados como as - sanfonas - que fazíamos com serpentinas, quando
crianças. E, a partir desta idéia, criamos as três cartelas. As 300 imagens nos propuseram emendas,
cortes, ajuntes, fissuras... Criamos três cartelas com desenhos na frente e no verso: 1ª -
CidadeCidadesCidadeCidades; 2ª - Cidade em que se vive e Cidade que se gostaria de construir e
3ª - DesejosRealidadesDesejos.
A primeira são desenhos de cidades ampliadas e seus fluxus de circulação entre
equipamentos, lugares e não-lugares, ambiências sócio-culturais, espaços de perceptos e campos de
afetos - de amorosidades. A segunda, as cidades em que se vive e que se quer construir, desejos,
denúncias e anúncios, desenhamentos de dia-a-dias, propostas, utopias possíveis. A terceira, as
realidades-desejos da cidade, das cidades, de cidades-cidadãs, de vilas, de lugares, de bairros
urbanos e rurais, fazendo-se nos embates-encontros de muitos tempos-espaços.
A cidade no singular é a pessoal; a no plural, é a coletiva, a publicizada. As cidades são as
desejadas, as construídas, as sitiadas, as vigiadas, as das densidades humanas, as imaginárias, as
sonhadas, as memorizadas. As cidades são fluxus, lugares de trânsito, de passagens, de pulsações,
de subjetivações. São territórios e linhas de fuga que ficam e fincam porque escapam.
A cidade em que se vive e se gostaria de construir é a cidade do gosto, do gosto das gentes
e do gosto das coisas, incluindo dos des-gostos, é claro. A cidade em que se vive é a atualizada, a
que se gostaria, é a virtual a se tornar real, frágil e tensa, tensa e intensa.
Desejos e realidades são as cidades de Uberlândia, nos Cerrados de Minas, e a cidade de
Ibiraçu, nas montanhas do Espírito Santo. São as dobras, dobraduras e desdobramentos de uma
cidade e suas muitas cidades, das muitas cidades em nós, as grudadas e as fugidias, as palpáveis e as
voláteis, as terrestres e as sonháveis... as... e as ...
As Cartelas das Conversas de Desenhos com Desenhos, em sua "triadicidade", são as
presenças de fragmentos-inteiros apropriados por nós - desenhadores a pensar e a propor cidades,
cidadanias e condições cidadãs “.
Destaque-se também que entre 2005 e 2007 (Terceira e Quarta Etapas), o Projeto, suas
metodologias e realizações foram apresentados, expostas, discutidas e apreciadas em quase duas
Fórum Internacional do Meio Ambiente - A conferência da Terra 534

dezenas atividades as mais diversas, e eventos, tanto em Uberlândia, quanto em outras cidades do
país.
Em janeiro de 2006, no contexto do Fórum Social Mundial – Policentrico de Caracas
(Venezuela), desenvolvemos uma atividade auto-gestionada, da qual participaram pessoas
provenientes de oito países. Na oportunidade, pudemos apresentar o filme, como também
divulgamos as experiências realizadas bem como as demais produções do Projeto.
A Quinta Etapa, que teve início em março de 2008, dá continuidade aos trabalhos de
divulgação das metodologias, ampliando a distribuição e o fomento de acesso a parte das
produções via Internet, bem como se propõe a produção de um livro retratando, refletindo e
teorizando sobre as experiências desenvolvidas nestes oito anos de concretização do Projeto
(Primeira, Segunda, Terceira, Quarta e Quinta Etapas), contando-se para tal, também com os
subsídios correspondentes às avaliações realizadas por pessoas (profissionais e outros interessados)
que estão se utilizando ou venham a utilizar as produções do Projeto.

DESENHOSCIDADESDESEJOS: O FILME E SEUS SIGNIFICADOS


A idéia edição de um filme como uma das produções do Projeto estava posta desde o
início, quando se começou a trabalhar as linhas gerais do Projeto, em termos de sua condução e
desdobramentos, considerando-se que o filme pode se constituir em importante linguagem e
instrumento de caráter cultural e educativo, no trato das questões locais e urbanas em geral.
Por outro lado, produzir um filme, tomando como referência inicial os desenhos com
caneta preta e papel A4 branco, no qual é expressa a cidade em que se vive e a cidades que se
gostaria de construir, constitui-se no fulcro privilegiado para sua realização.
Os desenhos com seus registros e manifestações dos/as desenhadores/as, incluindo os
questionamentos e aspirações das crianças, dos jovens e também de adultos, quanto à cidade que
têm, e a cidade que gostariam de construir, foi um procedimento que propiciou a valorização dos
mesmos como portadores de riquíssima contribuição na perspectiva de uma educação que não se
furta no desempenho de seu papel na formação política e cultural, genuinamente voltada para a
construção da cidadania, formadora e fomentadora de práticas críticas e, portanto cidadãs.
Os conteúdos retratados no vídeo em termos de informação e formação, bem como,
estéticos e poéticos, constituem-se em valioso subsidio no desenvolvimento das mais diversas
atividades educacionais, podendo também ser apresentados e discutidos enquanto experiência de
pesquisa e extensão em eventos científicos, artísticos e culturais, como no caso dessa Conferência
da Terra / Fórum Internacional do Meio ambiente – Questões Ambientais Globais e Soluções
Locais. Por outro lado, o filme pode ser utilizado por ONGs, associações de moradores e entidades
comunitárias entre outras, como ferramenta no desenvolvimento de suas atividades.
Ele serve também como instrumento para a atuação de educadores em geral, professores de
ensino fundamental, médio e superior, artistas plásticos, urbanistas, dirigentes e lideranças, bem
como de agentes governamentais e agentes políticos.
O filme “DesenhosCidadesDesejos” (Uberlândia, Primavera de 2004 – 19 minutos – VHS
e DVD), com caráter cultural-educacional, está estruturado em cinco blocos, a saber: Primeiro -
Diário da Cidade – eu sou a manhã, eu sou à tarde, eu sou à noite – eu sou a cidade a desenhar
novos roteiros e construir novos personagens; Segundo - Observações sobre a cidade; Terceiro - O
som da cidade pelo corpo de quem a habita; quarto - DesenhosCidadesCidadesDesenhos; e Quinto -
Caminhando pela muitas cidades.
Olhar e perceber a cidade – cidades, e, propor cidade - cidades, é um olhar-proposição
humano, tecido e construído pelas culturas nas quais se vive, em constante interação com seus
“meios”, “nadando, mergulhando, voltando a tona e tornando a mergulhar”, em contínuo
movimento-processo; adensado pelas inumeráveis histórias pessoais e coletivas.
O filme foi selecionado em 2004 pelo Comitê Avaliador do Instituto Arte na Escola
(Fundação Iochpe – São Paulo), para integrar a Videoteca Arte na Escola, cuja coleção de vídeos é
distribuída para todas a regiões brasileiras, através de pólos de arte-educação localizados nos mais
diversos estados. Como forma de colaboração com o trabalho do Instituto Arte na Escola, e também
Fórum Internacional do Meio Ambiente - A conferência da Terra 535

para ampliar a socialização dos resultados do Projeto, a Universidade Federal de Uberlândia


autorizou a reprodução de quinhentas cópias do filme, para serem repassadas aos citados pólos de
arte-educação.

PRODUÇÕES DO PROJETO: DIFUSÃO E SOCIALIZAÇÃO


Para maiores mais informações sobre o Projeto “Oficina de Desenho Urbano – As
Crianças, os Jovens e a Cidade” bem como solicitação das produções, acesse o sítio:
http://www.proex.ufu.br/2020/default.asp
O Projeto disponibiliza material de caráter educacional – cultural e artístico, composto por
livro (formato CD - Rom), filme e coleção de três cartelas sanfonadas, com dez postais cada,
direcionado a pessoas e instituições ligadas à educação, cultura, artes, formação para a cidadania
e planejamento urbano e municipal participativo (incluindo plano diretor) .
Para solicitar gratuitamente as produções acima indicadas (pagando apenas as despesas de
expedição e remessa, no valor de R$ 15,00 (quinze), basta acessar o sítio:
http://www.proex.ufu.br/Oficina/CPF.asp
O endereço eletrônico para contatos com a equipe do Projeto é: odurb@proex.ufu.br
SONHOS COLETIVOS
“Era uma vez um sonho. Um sonho que de tão grande precisava que muitas pessoas o
sonhassem ao mesmo tempo.
Era uma vez uma cidade com várias praças. Tantas praças que o tamanho do sonho não
conseguiu abarcá-las (ou que não couberam dentro do sonho).
Como sonhos sonhados em conjunto têm várias opções, foi preciso selecioná-las e
organizá-las para que abrisse os olhos, acordasse, e depois de um grande bocejo, virasse realidade.
No sonho, crianças desenhavam ao mesmo tempo em todas as praças da cidade; na
realidade, duas mil crianças e jovens desenharam em trinta praças.
Que surpresa boa!!!
O sonho grande não deu lugar a uma pequena realidade. As fadas e duendes de plantão
conspiraram para que tudo desse certo e os sonhadores se sentissem felizes.
Mas, como um bom sonho deu origem a uma boa realidade, esta faz com que os sonhos se
multipliquem em cabeças sonhadoras.
Out doors, vídeo, livro e desenhos produzidos são a confirmação de que são possíveis
sonhos coletivos!”80

REFERENCIAS BIBLIOGRAFICAS
DALLARI, D. Direitos Humanos e Cidadania. São Paulo: Moderna, 1998.
FRANGE, L. B. P., FALCÃO VASCONCELLOS, L. G. (orgs). Oficina de desenho urbano:
desenhando e construindo a cidade no cerrado. 1ª Ed. Uberlândia: Universidade Federal de
Uberlândia / PROEX, 2002.
FRANGE, L. B. P., FALCÃO VASCONCELLOS, L. G. (orgs). Oficina de desenho urbano:
desenhando e construindo a cidade no cerrado. 2ª Ed. – Cd-rom. Uberlândia: Universidade Federal
de Uberlândia / PROEX, 2004.
GADOTTI, M. Educação Cidadã Para Uma Cidade Educadora. São Paulo: Fórum Mundial de
Educação, 2004.
LE FEBVRE, H. Direito à cidade. São Paulo: Moraes, 1991.
LIMA, M. S. A cidade e a criança. São Paulo: Nobel, 1989.
MOREIRA, A. A. A. O espaço do desenho; a educação do educador. São Paulo: Loyola, 1983.
PECHMAN, R. M. (org.) Olhares sobre a cidade. Rio de Janeiro: Editora da UFRJ, 1994.
SANTOS, M. O espaço do cidadão. São Paulo: Nobel, 1992.

80
Eliane de Fátima Vieira Tinoco, Professora de Arte Educação da Rede Municipal de Ensino de
Uberlândia, e integrante da coordenação do Projeto Oficina de Desenho Urbano: As Crianças, os
Jovens e a Cidade no Cerrado – Primeira Etapa (2001 / 2002).
Fórum Internacional do Meio Ambiente - A conferência da Terra 536

ANÁLISE AMBIENTAL EM CIDADES DE PEQUENO PORTE: O CASO DAS LAGOAS


DE BOM JESUS - RN

Ademir Araújo da Costa


Professor do Programa de Pós-Graduação e Pesquisa em Geografia da UFRN. (ademir@ufrnet.br)
Francisco Ednardo Gonçalves
Professor do Curso de Licenciatura em Geografia do CEFET-RN. (ednardo@cefetrn.br)
Tiago Barreto de Andrade Costa
Mestrando do Programa de Pós-Graduação e Pesquisa em Geografia da UFRN. (tiagobac@yahoo.com.br)

RESUMO
As cidades constituem o centro das transformações advindas da conflituosa relação entre
sociedade e natureza, por agregarem num só espaço componentes complexos. Na atualidade os
problemas sócio-ambientais são perceptíveis na totalidade dos centros urbanos, independente das
dimensões territoriais e do número de habitantes. A fim de contribuir para o debate em torno dessa
problemática, o presente trabalho analisa as principais implicações sócio-ambientais decorrentes da
interferência antropogênica num sistema lacustre localizado dentro da sede municipal de Bom
Jesus. Para tanto, tomamos como base a realização de um breve diagnóstico sócio-ambiental,
buscando uma melhor compreensão da relação entre a sociedade e a natureza naquele espaço. Os
procedimentos metodológicos circunscreveram: levantamento bibliográfico e cartográfico, registros
fotográficos, observações em campo, além de entrevistas. Considerando a escala de análise e as
devidas proporções esta cidade pequena convive com vários problemas de natureza sócio-
ambiental, dentre os quais destaca-se o assoreamento e a contaminação de duas lagoas intra-
urbanas. Mesmo diante da significativa contribuição ao processo de ocupação histórica, tais lagoas
estão sendo utilizadas como destino final dos resíduos líquidos e sólidos, além de terem suas
margens desordenadamente ocupadas.

ABSTRACT
Cities are the center of the changes stemming from the confrontational relationship
between society and nature, for aggregate in one space complex components. Today the socio-
environmental problems are visible in all urban centres, independent of the territorial dimensions
and the number of inhabitants. In order to contribute to the debate on this issue, this paper analyses
the main socio-environmental implications arising from anthropogenic interference in a system lake
located within the municipal headquarters of Bom Jesus. To do so, take as a basis the achievement
of a brief diagnostic socio-environmental, seeking a better understanding of the relationship
between society and nature that space. The methodological procedures circunscreveram:
bibliographic survey and mapping, photographic records, observations in the field, in addition to
interviews. Considering the scale of analysis and the appropriate proportions this small town
together with various problems of social and environmental nature, of which there is the silting and
contamination of two lakes within cities. Even in the face of the significant contribution to the
process of historic occupation, such ponds are being used as the final destination of the liquid and
solid wastes, in addition to having their margins desordenadamente occupied.

SOBRE O TEMA
As relações entre sociedade e natureza nem sempre foram tão conflituosas como nos dias
atuais. Em épocas mais remotas o homem usava a natureza numa intensidade e extensão que dava a
esta a possibilidade de se regenerar. Contudo, nos últimos tempos, a população humana vivenciou
um acelerado crescimento aliado a um intenso desenvolvimento tecnológico, interferindo assim,
cada vez mais, nas fontes naturais de suprimento81. Em linhas gerais, foi através desse trajeto que
chegamos ao atual contexto sócio-ambiental, no qual, as necessidades e vontades humanas nunca
possuíram tantas técnicas a sua disposição e, paradoxalmente, nunca foram tão insaciáveis.
81
Esse novo período é denominado de Tecnógeno ou Quinário. Sobre o assunto ver ROSSATO & SUERTEGARAY,
2000, p. 95)
Fórum Internacional do Meio Ambiente - A conferência da Terra 537

Não obstante as transformações sócio-espaciais se processarem com mais intensidade nas


grandes cidades, onde candentes alterações ambientais podem ser encontradas, nos pequenos
centros urbanos tais transformações também são perceptíveis. Apesar da maioria da população
brasileira conviver nas áreas urbanas e, em particular, nas grandes cidades, a maioria das cidades82
brasileiras possui população inferior a 20 mil habitantes. No Rio Grande do Norte este número
chega a 93,41%, ou seja, das 167 cidades existentes em 2007, 156 possuem população inferior a 20
mil habitantes. Espacializando essa problemática, tomamos como referência à cidade pequena de
Bom Jesus, localizada na Microrregião Agreste Potiguar, a 51 km da capital, onde residem 6.275
habitantes (IBGE, 2000). Considerada a escala de análise e as devidas proporções, esta cidade
convive com sérios problemas ambientais, sendo um dos mais relevantes a degradação do sistema
lacustre localizado no perímetro urbano.
Mesmo diante da significativa contribuição ao processo de produção do espaço de Bom
Jesus, essas lagoas estão sendo utilizadas como destino final para resíduos líquidos e sólidos, além
de terem suas margens desordenadamente ocupadas. Desse modo, no visível intuito de fomentar os
estudos em pequenas cidades, este artigo analisa as principais implicações sócio-ambientais
decorrentes da interferência antropogênica num sistema lacustre localizado dentro da sede
municipal de Bom Jesus. Para tanto, tomamos como base a realização de um breve diagnóstico
sócio-ambiental de uma área urbana típica do interior norte-rio-grandense, buscando uma melhor
compreensão da relação entre a sociedade e a natureza naquele espaço. Os procedimentos
metodológicos circunscreveram: levantamento bibliográfico e cartográfico, registros fotográficos,
observações em campo, além de entrevistas e aplicação de formulários junto à população residente
na área em estudo.
No presente artigo faremos inicialmente breves considerações acerca dos referenciais
teóricos relacionados à temática, em seguida, caracterizaremos o quadro geoambiental do sistema
estudado, abordaremos o processo de produção sócio-espacial da cidade em pauta, caracterizaremos
a situação sócio-econômica, resultado do referido processo e, por fim, traçaremos um diagnóstico
da situação sócio-ambiental da área delimitada.

PRESSUPOSTOS TEÓRICOS SOBRE QUESTÕES SÓCIO-AMBIENTAIS


A discussão em torno da problemática ambiental é relativamente recente. Só a partir da
década de 1970 é que a temática vem ganhando lugar no contexto político e social. Atualmente,
diversos ramos científicos e vários organismos políticos e sociais têm dedicado atenção a essa
questão. Entretanto, grande parcela dos atores sociais não está afeita com a temática ambiental, e
muitos que possuem conhecimento sobre o tema não têm demonstrado preocupação com a
gravidade que envolve a degradação do meio ambiente.
Mas, o que seria meio ambiente? Dentre as inúmeras definições propostas elegemos a que
considera o meio ambiente como um “[...] conjunto de fatores atuando em determinado espaço e
funcionando coordenadamente. É uma estruturação particular de fenômenos, na qual partes
componentes se integram na execução de ações que têm a ver com a própria estrutura percebida e
com a sua inserção do que lhe é externo” (SILVA, 1995, p. 358). Sendo assim, o seu estudo torna-
se extremamente abrangente, pois diz respeito a várias esferas da realidade, desde as naturais até as
sociais. Logo, tais estudos devem ser feitos dentro de uma perspectiva holística, que privilegie o
conjunto de elementos – e não isoladamente as partes que integram o meio ambiente – bem como
suas inter-relações estruturais e funcionais.
Como assinalamos anteriormente, a sociedade humana vem transformando intensamente a
natureza, impondo uma nova organização ao meio ambiente. A expressão mais visível de tais
transformações pode ser observada no fenômeno urbano, o qual tem na figura da cidade a sua
espacialização. A cidade, por sua vez, pode ser definida como "uma forma de organização do
espaço pelo homem, [...] a expressão concreta de processos sociais na forma de um ambiente físico
construído sobre o espaço geográfico" (CORRÊA, 2001, p.121). Esta forma peculiar de organização
82
Levando-se em consideração o critério administrativo adotado no Brasil, que considera cidade toda sede de
município.
Fórum Internacional do Meio Ambiente - A conferência da Terra 538

do espaço, como escreve o mesmo autor, é reflexo e condicionante da sociedade que a constituiu.
Expressa também um conjunto de valores e significados sociais, além de representar um campo de
luta territorial que retrata a heterogeneidade das classes, os diversos níveis de renda e os variados
modelos culturais.
O urbano é epicentro, por excelência, de impactos e degradações ambientais. Ou seja, é o
principal motor das atividades humanas, as quais, aceleram os ciclos naturais, desestruturando os
ecossistemas a nível local, regional e até global. Tal fato ocorre porque a urbanização traz consigo a
construção de um complexo aparato infra-estrutural que altera a ordem natural do meio ambiente.
Como exemplo do referido aparato, podemos citar a construção de acessos rodoviários, de
hidrelétricas, de indústrias de grande ou de pequeno porte, dentre outros.
De acordo com Franco (2001, p. 28) o conceito de impactos e riscos ambientais surgiu nos
Estados Unidos, no final da década de 1960, em virtude dos efeitos da Guerra do Vietnã. No Brasil
as medidas de proteção vieram a se concretizar no início da década de 1980 com a criação da
Política Nacional do Meio Ambiente.
Para o Conselho Nacional de Meio Ambiente (CONAMA), em sua resolução nº 001
(23/01/1986), “impacto ambiental é qualquer alteração das propriedades físicas, químicas e
biológicas do meio ambiente, causada por qualquer forma de matéria ou energia resultante das
atividades humanas” (BRASIL, 2003).
Para Guerra (1997, p. 350), impacto ambiental é uma “expressão utilizada para caracterizar
uma série de modificações causadas ao meio ambiente, influenciando na estabilidade dos
ecossistemas”. Pelo exposto, podemos observar que o conceito de impacto possui um caráter
antropogênico, uma vez que está fundamentado nos efeitos das ações humanas sobre os
ecossistemas e sobre a própria sociedade e sua economia (FRANCO, 2001, p. 28). Sendo assim, os
impactos ambientais afetam a saúde, a segurança e o bem-estar da população, trazendo
complicações às atividades sociais e econômicas, comprometendo, acima de tudo, a biota e as
condições estéticas e sanitárias.
Os impactos ambientais urbanos, na maioria das vezes, são decorrentes do crescimento
urbano e podem ser apreendidos como “[...]produto e processo de transformações dinâmicas e
recíprocas da natureza e da sociedade estruturada em classes sociais” (COELHO, 2001, p.21).
Sendo assim, podemos afirmar que as agressões ambientais, no caso estudado, são decorrentes da
produção de um espaço urbano, ainda que de pequeno porte, sobre um sistema ambiental (a
princípio natural).
Nossa investigação se propôs a compreender a dinâmica de um sistema ambiental
antropizado, tomando como referência uma cidade de pequeno porte. Trata-se, portanto, de um
ambiente urbano nas fases introdutórias de sua construção, isto é, um espaço que não abriga
plenamente as complexas atividades urbanas. Nesse sentido, a fim de entender as relações que
originam essa realidade, delimitamos uma área dentro do ambiente urbano de Bom Jesus, no intuito
de analisar sua dinâmica, bem como, definir os elementos ou os principais elementos que estão
interagindo. Deste modo, a área delimitada para esse estudo é representada pelo sistema lacustre
localizado dentro da cidade de Bom Jesus. Por sistema lacustre compreendemos um conjunto de
lagoas que se relacionam ente si. A definição de lagoa, geneticamente falando, refere-se a uma
depressão natural que, em regime perene ou sazonal, acumula água. Sua área abrange desde as cotas
máximas de inundação (períodos de cheia) até o seu volume mínimo. Diante do exposto, no
próximo item, caracterizamos o ambiente no qual estão sendo desenvolvidas essas relações.

O QUADRO GEOAMBIENTAL
A cidade pequena, referência desse estudo, localiza-se nas coordenadas 05º59’02”S e
35º34’53”N, no município de Bom Jesus, que está encravado no Agreste Potiguar, faixa de
transição entre o Litoral e o Sertão. Sendo assim, sua paisagem possui elementos dessas duas
regiões, como é o caso de espécies vegetais típicas das duas áreas citadas, bem como, de culturas
típicas tanto do Litoral como do Sertão.
Fórum Internacional do Meio Ambiente - A conferência da Terra 539

Em termos geológicos-geomorfológicos podemos dizer que o município de Bom Jesus está


assentado sobre embasamento cristalino correspondente ao Complexo Caicó de idade Pré-
Cambriana (IDEMA, 1999, p. 8). Os afloramentos encontrados, principalmente em forma de
matacões, não são tão expressivos se comparados aos de áreas mais ao interior do estado.
Observações de campo evidenciam, no município, uma geomorfologia constituída de relevos planos
a ondulados, com altitudes variando entre 100 e 200 metros.
A estrutura hidrográfica do referido município não é muito complexa, sendo banhado pelo
rio Grande/Jundiaí e pelos riachos do Mel e do Chiquinho, com cursos d'água temporários (idem, p.
9). A sede municipal, por sua vez, está localizada à margem direita do rio Grande/Jundiaí sobre um
sistema lacustre constituído por cinco lagoas que se conectam entre si, principalmente, através de
pequenos canais, que hoje se encontram bastante descaracterizados devido à ocupação urbana. A
partir de análises cartográficas observamos que tais lagoas encontram-se num relevo inclinado,
linearmente orientadas no sentido nordeste, sobre cotas que variam de 74 a 56 metros de altitude.
Para fazer a distinção entre uma lagoa e outra, as numeramos no sentido das cotas mais
altas às mais baixas. A primeira lagoa é temporária – só possui água em períodos com pluviosidade
acima da média – as duas que se encontram nas cotas intermediárias (segunda e terceira, lagoas
inseridas na área urbana) são naturalmente perenes. Já as outras duas lagoas (quarta e quinta),
localizadas nas cotas inferiores, mais próxima ao rio, foram perenizadas com a construção de
pequenas barragens no canal que as ligam ao Grande/Jundiaí, fato que as transformaram em
pequenos açudes83 utilizados na pecuária bovina (desenvolvida na cidade) e, secundariamente, para
pesca. Este sistema lacustre é alimentado pelas chuvas e pela drenagem subsuperficial originária de
aqüíferos cristalinos (IDEMA, 1999, p. 9).
O referido sistema e, conseqüentemente, o núcleo urbano localizam-se na borda direita de
um vale no qual corre o rio Grande/Jundiaí. Portanto, o sistema formado por essas lagoas e a
pequena cidade interferem na dinâmica do rio, mesmo que topicamente, já que esse sistema fluvial
é muito grande se comparado ao das lagoas/cidade.
O clima predominante do município é o sub-seco (IDEMA, 1999, p. 7). Apesar de já terem
havido períodos de estiagem – ocorridos durante as secas mais rigorosas que assolaram o Rio
Grande do Norte – Bom Jesus apresenta um bom índice de precipitação (comparado inclusive ao de
partes do Litoral, nas quais a média anual gira em torno de 800 mm). Em Bom Jesus, a média é de
884,2 mm sendo a máxima de 1.994,8 mm, entre o período de março a julho, e a mínima de 411,1
mm, entre o período de agosto a fevereiro. As médias anuais de temperatura e umidade relativa do
ar são respectivamete, 25,6°C e 74% (idem). Portanto, o clima da área de estudo é no geral ameno,
fato que se expressa numa razoável produtividade natural agrícola, limitada, sobretudo, por fatores
de ordem sócio-econômica e pela baixa fertilidade dos solos predominantes.
Estes, em sua maioria, são os Podzólicos Vermelho-Amarelo Abrúpticos Plínthicos
(IDEMA, 1999, p. 8), e caracterizam-se pela alta profundidade e alto gradiente textural entre os
horizontes A e Bt (CUNHA, 1998, p. 184). Possuindo, portanto, uma considerável susceptibilidade
à erosão, devido à difícil infiltração pluvial ao longo dos horizontes e aos escoamentos superficial e
subsuperficial (no contato A-Bt) (idem, p.185). Esse fato associado às características climáticas da
área estudada, em especial a pluviosidade, só agravam a situação. Nesse contexto, a vegetação é um
componente fundamental para evitar desequilíbrios ambientais, principalmente, nas margens dos
corpos d’água, uma vez que estes são frágeis ao processo de assoreamento.
Constatamos que os solos do entorno da segunda, terceira, quarta e quinta lagoas são
hidromórficos (Gleissolos) – portanto, com alta taxa de umidade – de cor preta a acinzentada. Os
teores de argila e matéria orgânica desses solos favorecem a sua utilização como matéria-prima na
fabricação de tijolos brancos – atividade que até 2002 podíamos observar às margens da segunda e
terceira lagoa. Também podemos encontrar, ao longo desse sistema lacustre, áreas recobertas por
um solo arenoso (Regossolo), bastante susceptível à erosão e assoreamento das lagoas. O processo
de assoreamento, tanto pelo solo como por resíduos antropogênicos, é perceptível em várias partes
83
Contudo, para efeito de compreensão, no presente estudo achamos por bem não considerar essa distinção e chamá-los
genericamente de lagoa.
Fórum Internacional do Meio Ambiente - A conferência da Terra 540

da área de estudo. Por intermédio de entrevistas realizadas, podemos afirmar que as lagoas estão
menores. Por sua vez, os canais que correm entre elas, em várias partes, estão interditados,
prejudicando o fluxo do sistema e favorecendo o alagamento das ruas próximas as lagoas nos
períodos de chuva.
No que se refere ao revestimento florístico, a vegetação natural do município é do tipo
Caatinga Hipoxerófita caracterizada, principalmente, pela presença de espécies arbustiva e árvores
com espinhos (IDEMA, 1999 p. 8). É marcante a presença de juazeiros (Zizyphus joazeiro) ao longo
das áreas de pasto, sobre o relevo ondulado. O entorno das duas lagoas (segunda e terceira)
naturalmente perenes do ambiente estudado, praticamente não possui mais vegetação, somente
edificações urbanas. O que ainda podemos observar são gramíneas em algumas partes de suas
margens. Já as outras três lagoas (primeira, quarta e quinta) ainda apresentam algum tipo de
vegetação. A lagoa que se encontra nas cotas altimétricas superiores do sistema possui em seu
entorno pastagem. Como na maior parte do tempo ela não possui água, a área central de sua
depressão é coberta por Turco (Pakimosa aculeata) – espécie arbustiva, espinhosas e de galhos
finos. A quarta lagoa mais próxima do rio é cercada por pastagem e possui resquícios da vegetação
natural representados pela Jurema Preta (Mimosa temiflora). Por último, temos ainda, a vegetação
do entorno da lagoa mais próxima ao rio, constituída principalmente por gramíneas (“pasto
natural”), Jurema Preta (Pakimosa aculeata) e Jucá (Causaupínea ferrea). Estas duas últimas
espécies vão se adensando no caminho em direção ao rio após a quinta lagoa
De um modo geral, constatamos que a paisagem nesse ambiente lacustre é marcada pela
forte interferência antropogênica que vem alterando drasticamente os processos naturais do
ecossistema local, reformatando suas dinâmicas biológicas, hidrológicas, pedológicas e
geomorfológicas. Podemos observar, portanto, nesse contexto, um espaço reconstruído a partir da
dialética entre sociedade/natureza.
Esse quadro geoambiental foi produzido ao longo do tempo e tem íntima relação com o
processo histórico de produção do espaço. Portanto, faz-se necessário averiguarmos brevemente
como se deu esse processo em Bom Jesus.

UM POUCO DA HISTÓRIA DE BOM JESUS


No processo de produção do espaço norte-rio-grandense os primeiros núcleos de ocupação
colonizadora ocorreram na zona litorânea, tendo o cultivo da cana-de-açúcar como atividade
econômica predominante, e na área sertaneja, por meio da criação de gado e da cotonicultura. A
partir das trocas comerciais estabelecidas entre essas duas regiões surgiram os primeiros núcleos
populacionais no Agreste, área de transição, na qual está localizada a cidade de Bom Jesus.
O caminho, muitas vezes árduo e difícil, enfrentado pelos viajantes que transportavam o
gado do Sertão para ser abatido no Litoral Oriental, era contemplado com algumas paradas em
locais que recompensassem o cansaço e a sede (ANDRADE, 1981, passim). Dentro desse quadro de
referência as terras que originaram o município de Bom Jesus foram sendo ocupadas
Uma das paradas no trajeto dos viajantes era realizada às margens das lagoas naturais onde
hoje se encontra Bom Jesus. No início do século XIX, uma família vinda do brejo paraibano se
instalou nas margens de uma destas lagoas e a partir da argila encontrada, iniciou uma pequena
produção de artefatos de barro. Com a produção excedente foi feita uma feirinha de louças que
atendia aos viajantes e a população das fazendas da região. Em virtude disso a lagoa então passou a
se chamar Lagoa das Panelas (NÓBREGA, 1986, [s.p.]).
Como evidencia o referido autor, as fazendas de gado que foram se instalando e a feirinha
que cada vez mais atraía pessoas para o local deram origem a um povoado denominado Panelas.
Através de doações de terras, feitas por fazendeiros que habitavam a região, o povoado foi
crescendo e no início do século XX mudou de nome para Bom Jesus em homenagem ao padroeiro e
por sugestão de Frei Damião – líder religioso muito influente no Nordeste (idem).
As terras onde atualmente está situada a pequena cidade de Bom Jesus pertenceram
inicialmente ao Padre José Vieira Afonso (1754) a José Félix do Rego (1820), em seguida passou a
pertencer ao município de Macaíba (1953), quando foram transferidas para o município de Serra
Fórum Internacional do Meio Ambiente - A conferência da Terra 541

Caiada. Em 1958, o então distrito de Bom Jesus foi repassado a outro município, Senador Elói de
Souza, do qual desmembrou-se no dia 11 de maio de 1962, através da lei n° 2.794, passando a
constituir-se em mais um município do Rio Grande do Norte.
De acordo com entrevistas realizadas junto aos moradores, na época da emancipação
política Bom Jesus contava com um número reduzido de casas, que estavam concentradas na rua da
igreja, onde hoje existe uma Praça, denominada Padre João Maria. O núcleo urbano original
situava-se nas proximidades da Lagoa das Panelas, que era a principal fonte de abastecimento de
água para a população circunvizinha, tanto para o uso doméstico em geral, quanto para beber.
A formação do tecido urbano de Bom Jesus se deu, inicialmente, no entorno dessas lagoas,
numa área relativamente não muito próxima as suas margens, uma vez que tais corpos d'água
apresentavam uma superfície maior do que a atual, conforme relato dos moradores.
Nos primeiros anos de emancipação política, o crescimento urbano esteve atrelado à
doação de terras, feitas pelos fazendeiros (grandes proprietários de terras) que foram sendo
ocupadas por ex-moradores das fazendas. Conforme Gonçalves (2000), os primeiros traços de
urbanização surgiram na década de 1980, quando o crescimento populacional tomou um certo
impulso, nesse período a população cresceu 58,4% e a quantidade de imóveis aumentou 68,5%, em
função de alguns fatores, quais sejam: ampliação dos serviços urbanos (escolas, postos de saúde
etc.); construção de um conjunto habitacional; instalação de um loteamento considerado irregular,
em área de risco; expansão da estrutura de apoio à feira, inclusive a construção de mais um mercado
público; e, principalmente, em virtude da instalação do sistema de abastecimento d'água em 1986,
que atraiu muitos moradores de regiões desprovidas de água.
Nesse contexto, ressaltamos a drástica interferência humana na paisagem natural dessas
lagoas por meio da construção de empreendimentos imobiliários e, conseqüente, ampliação do
tecido urbano, que se deu sem a implementação de infra-estrutura básica, afetando assim o
funcionamento dos ecossistemas lacustres.
Aos poucos a sociedade foi negligenciando a importância ambiental dessas lagoas e
renegando sua utilidade, que outrora constituíam a principal fonte de abastecimento d'água da
comunidade, das quais eram retirados alimentos para sobrevivência. Atualmente, os corpos d’água
dessa cidade vêm sendo utilizados como destino final para todo tipo de rejeito urbano.
A construção de residências e de pontos comerciais nas margens dessas lagoas tem
descaracterizado a vegetação natural com o depósito de resíduos sólidos. Apesar de todos os
moradores entrevistados afirmarem que dispõem do sistema público de coleta de lixo, a poluição
visual é algo bastante perceptível.
No entorno das lagoas centrais, os contrastes sócio-econômicos não são muito
discrepantes, pois esta é uma área habitada majoritariamente por uma população de baixa renda,
assim como a maior parte da cidade. Materializam-se na paisagem construções rústicas em grande
medida sem infra-estrutura adequada, por conseguinte, existem diversos pontos de lançamento de
esgotos, em toda a extensão das margens da lagoa. Mesmo diante da caótica situação de
contaminação dessas águas, o poder público e parte da população ainda as utilizam para a
construção civil, pesca, banho de animais e irrigação do campo de futebol.
O mais preocupante é que esse problemático quadro ambiental não teve o devido lugar de
destaque na pauta de discussões do poder público ao longo dos 40 anos de emancipação política de
Bom Jesus. Cogita-se até a possibilidade de aterramento de algumas áreas, como se esse fosse o
caminho mais viável para resolver o problema causado pela interferência humana junto a tais
lagoas.
Tentaremos, a partir desse momento, traçar um breve esboço das condições sócio-espaciais
resultantes dessa produção territorial da cidade de Bom Jesus, explicando no mesmo momento o
processo de funcionamento do sistema lacustre no ambiente urbano.

ANÁLISE SÓCIO-ESPACIAL DO AMBIENTE CONSTRUÍDO


De acordo com o último Censo (IBGE, 2000) o total de pessoas residentes no município é
de 8.608, dentre quais 71,1% moram na zona urbana e 28,9%, na zona rural. Bom Jesus segue a
Fórum Internacional do Meio Ambiente - A conferência da Terra 542

tendência geral do estado e da maior parte do país, uma vez que apresenta o aumento da população
das áreas urbanas em detrimento das rurais. Em 1991 a sede municipal possuía 4.430 moradores,
uma década depois houve um acréscimo de 41,6% (1.845 moradores). Portanto, a cidade hoje
possui 6.275 habitantes. No mesmo período a área rural perdeu 15,7% de sua população (idem).
Como já foi ressaltado anteriormente, esse incremento populacional repentino na sede de
Bom Jesus trouxe conseqüências negativas para o município, ainda mais quando tal cidade dispunha
(e ainda hoje dispõe) de um setor público deficitário tanto em termos de recursos humanos como em
termos de recursos financeiros.
A inexistência de uma gestão eficiente – mesmo sendo os problemas do município simples
se comparados aos de um centro plenamente urbano – se manifesta, por exemplo, nos negativos
índices educacionais. O número de analfabetos, 3.099 e a porcentagem de chefes de família sem
instrução, 43%, na situação do esgotamento sanitário (apenas 0,3% dos 2011 domicílios são
abastecidos por esgotos, os quais, por sua vez, são jogados in natura nos corpos d’água naturais) e
no destino dado ao lixo produzido pela população (queimado, enterrado, jogado em terrenos
baldios, lançados nos corpos hídricos e mesmos o coletado é disposto a céu aberto nas imediações
da cidade em um precário lixão) (idem).
Os receptores finais dos esgotos domésticos são os mais variados e impróprios: rios,
lagoas, fossas rudimentares, a céu aberto, etc. O outro dado preocupante, como já apontado, refere-
se aos resíduos sólidos. Em torno de 2.016 domicílios, jogam seu lixo em lagoas e rios (IBGE,
2000). Fato este que possui estreita relação com o nível educacional e de consciência ambiental da
população. É neste contexto que o espaço urbano de Bom Jesus vem sendo construído. Lembramos,
ainda, que inserida nessa dinâmica social está a dinâmica do sistema lacustre alvo desse estudo (não
percamos de vista esse fato).
A ocupação das margens das segunda e terceira lagoas, que se encontram no centro da
cidade, se dá por: uma feira livre, bares, comércios em geral e sessenta e seis residências.
A feira livre ocorre aos domingos e como a maioria das feiras, produz uma quantidade
significativa de rejeitos (em especial orgânicos). Estes não raras vezes vão parar nas águas das
lagoas, como observado em campo e registrado em fotografias. A feira funciona na área de
inundação da terceira lagoa. Inclusive há alguns anos a água invadiu essa área e até mesmo algumas
casas. O mercadinho, os bares e outros empreendimentos comerciais também ocupam, de forma
irregular, sem nenhum critério urbanístico, às margens desta lagoa.
Por fim, temos ainda, nas margens dessas duas lagoas do sistema, sessenta e seis
habitações que abrigam em torno de 274 moradores. Fizemos uma enquete junto a estes moradores,
a fim de traçar um perfil da população que vive no contato mais direto com as lagoas, sofrendo de
primeira mão os feed-backs desse sistema lacustre.
Quase metade da população entrevistada (49,8%) reside no presente local há pelo menos
dez anos. Em contraposição, apenas 15,1% reside há menos de um ano. Isso sugere um certo
imobilismo da população em relação à situação que lhes cerca, pois, apesar de grande parte dos
moradores se encontram no local há um certo tempo, o quadro dos problemas sócio-ambientais
constatados, praticamente não mudou.
Da média cinco moradores por domicílio, 37,8% são analfabetos (praticamente dois
moradores por casa). Em outras palavras podemos dizer que do total de habitantes dessa área,
aproximadamente 60% da população é alfabetizada (número um pouco menor que o do município,
64% de alfabetizados).
Todos os domicílios da área em questão dispõem de abastecimento público de água.
Através de entrevistas com os moradores constatamos que a rede de abastecimento da cidade traz
água da região litorânea do estado, mais especificamente da lagoa do Bonfim, via adutora; e do
vizinho município de Vera Cruz, mais especificamente de poços artesianos. Ressaltamos, portanto,
que todo o abastecimento da população entrevistada e dos demais moradores vem de fora do
município.
A aparência da maioria dos imóveis dessa área é rústica, sendo em geral, casas sem reboco
ou mal rebocadas, espacialmente desordenadas, com precária infra-estrutura em péssimo estado de
Fórum Internacional do Meio Ambiente - A conferência da Terra 543

conservação. Desses domicílios 39,26% não possuem caixa d'água. A população residente em
aproximadamente 91% das casas bebe a água da rede pública e sem tratamentos como filtragem.
Um dado preocupante é a utilização direta das lagoas (notadamente a segunda e terceira) por 84,6%
dos domicílios, como destino final para águas servidas. De acordo com informações dos moradores,
essas águas em 7,5% das casas são potencialmente mais impactantes, por serem provenientes de
dejetos humanos (fezes e urina). É importante ressaltamos ainda que 12% dos domicílios jogam os
dejetos humanos ou a céu aberto ou diretamente na lagoa, formas ainda mais agressivas ao meio
ambiente. Outro destino final dado aos dejetos é a fossa rudimentar, utilizada por 80% das
habitações. Como essas casas se encontram nas depressões das lagoas, os contaminantes dessas
fossas escoam para as águas do sistema. Por fim, dos 66 domicílios entrevistados três não possuíam
sequer um sanitário.

EM BUSCA DE PARADIGMAS E RESPOSTAS...


A realidade de Bom Jesus, brevemente evidenciada neste trabalho, assemelha-se a várias
do interior norte-rio-grandense. O que podemos ver é uma concentração dos recursos e
investimentos, em especial no Litoral Oriental (historicamente, área mais bem assistida pelo
estado). Tal fato tem levado parte significativa da população do interior a emigrar em busca de
melhores perspectivas de vidas (educação, saúde, trabalho...).
A configuração espacial norte-rio-grandense tem gerado situações problemáticas. A título
de exemplo podemos citar os municípios que formam a área mais populosa do Litoral Oriental,
Natal e Parnamirim, que representam 0,56% do território estadual e paradoxalmente detém 31,4%
de sua população (946.981 habitantes). Tal concentração demográfica, em grande medida, é
conseqüência da deterioração sócio-espacial e negligência política vivenciada por boa parte das
áreas interioranas do estado.
Um dos reflexos desse quadro de deterioração e negligência é a situação sócio-ambiental
em que se encontram diversos municípios e, especificamente, os pequenos centros urbanos do
interior. O presente diagnóstico exemplifica, o tipo de espaço que está sendo comumente gestado no
interior do estado. Um espaço com um Estado descomprometido com o bem estar coletivo e com
uma população de baixo nível educacional, alheia aos problemas que lhes cercam.
A relação entre a sociedade (cidade – ambiente construído) e a natureza (sistema lacustre)
na área de estudo se apresenta de forma um tanto quanto complexa e conflituosa. São vários os
processos e fatores (nível de educação, condições de saúde, forma de gestão pública, relações
sociais, dinâmica do sistema ambiental, etc.) que dialeticamente interagem na concepção desse
preocupante quadro sócio-ambiental.
Segundo declarações dos moradores, durante as entrevistas, a prefeitura paga a limpeza das
fossas. Assim sendo, pode-se explicar o lançamento de esgotos por parte da população, através falta
de condições para construção de uma fossa séptica e/ou pela falta de consciência ecológica. Não
poderia ser de outro jeito. Como os dados mostram o nível educacional (por vários motivos) é
precário. Uma população sem um bom nível educacional é potencialmente menos consciente dos
problemas ambientais que causam e mais passivas diante das conseqüências que ceifam.
O crescimento urbano sobre esse sistema ambiental vem impermeabilizando o solo,
alterando a dinâmica natural do escoamento (superficial e subsuperficial) das águas pluviais e
favorecendo o assoreamento das lagoas. Como se isso não bastasse, trechos das lagoas foram
intencionalmente aterradas e ocupadas. Isso vem gerando efeitos como os constatados em algumas
casas visitadas durante o trabalho de campo. Estas apresentavam seus quintais e, em alguns casos,
até mesmo seus cômodos umedecidos e encharcados. Numa das residências o piso da cozinha
chegava a sair água quando nele pisávamos.
Nos períodos de estiagem o nível das lagoas baixa, aumentando a concentração de
poluentes. Associado a isso, a quantidade de matéria orgânica lançada nas lagoas, gera uma super
proliferação de algas (eutrofização) que consomem o oxigênio da água acima do nível normal. Esse
quadro ambiental gera em determinados períodos a mortandade em massa de peixes, fato esse
relatado por vários moradores. Como conseqüência o apodrecimento dos peixes às margens das
Fórum Internacional do Meio Ambiente - A conferência da Terra 544

lagoas gera um odor fétido que polui o ar, atingindo a população da área. As moscas e muriçocas,
que se proliferam como pragas, prejudicando a qualidade de vida dos habitantes, também, são outra
expressão do desequilíbrio desses ecossistemas.
Tomando como base esse diagnóstico sócio-ambiental, queremos lembrar que as cidades
de pequeno porte são um foco potencial para o desenvolvimento regional e, por outro lado, uma
alternativa de desafogar os já tão saturados ambientes das grandes cidades. Todavia é preciso pensar
não só como fomentar o potencial econômico das cidades pequenas e seu crescimento populacional,
mas também, desde já, desenvolver alternativas para os problemas sócio-ambientais por elas
enfrentados, na busca de um desenvolvimento sustentável.
Outro fator fundamental a ser ressaltado na busca desse desenvolvimento é a importância
que deve ser dada às estratégias que viabilizem a estruturação e organização da sociedade local em
torno de suas individualidades e potencialidades, para que assim, a população possa ter efetiva e
consciente participação nos direcionamentos e rumos do seu desenvolvimento.
Por fim, lembramos ainda, que os impactos ambientais nas cidades pequenas são de
menores proporções se comparados aos dos grandes centros, desse modo à recuperação de suas
áreas degradadas é financeiramente mais viável aos planejadores. Pensar hoje o desenvolvimento
(sustentável) das cidades pequenas é, acima de tudo, prevenir o amanhã caóticos das grandes.

REFERÊNCIAS BIBLIOGRAFICAS
ANDRADE, Manuel Correia de. A produção do espaço norte-rio-grandense. Natal: Universitária,
1981.
BRASIL. MINISTÉRIO DE MEIO AMBIENTE. Resolução Conama 001, de 23 de janeiro de
1986. Estabelece as definições, as responsabilidades, os critérios básicos e as diretrizes gerais para
uso e implematação da Avaliação de Impacto Ambiental como um dos instrumentos da Política
Nacional do Meio Ambiental. Diário Oficial da União de 17 de fevereiro de 1986. Disponível em:
<http://www.mma.gov.br/conama/> Acesso em: 20 mar 2003.
COELHO, Maria Célia Nunes. Impactos ambientais em áreas urbanas: teorias, conceitos e métodos
de pesquisa. In: GUERRA, Antonio José Teixeira; Cunha, Sandra Baptista (org.) Impactos
ambientais urbanos no Brasil. Rio de Janeiro: Bertrand Brasil, 2001. p.19- 45.
CORRÊA, Roberto Lobato. Trajetória Geográfica. 2. ed. Rio de Janeiro: Bertrand Brasil, 2001.
FRANCO, Maria de Assunção Ribeiro. Planejamento ambiental. São Paulo: EDIFURB, 2001.
GONÇALVES, Francisco Ednardo. A expansão territorial de Bom Jesus-RN. In: ENCONTRO
REGIONAL DOS ESTUDANTES DE GEOGRAFIA DO NORDESTE, 17., 2000, Salvador.
Anais... Salvador: UCSAL, 2000.
GUERRA, Antônio José Teixeira; BOTELHO, Rosângela Garrido Machado. Erosão dos solos. In:
CUNHA, Sandra Baptista da; GUERRA, Antônio José Teixeira (orgs). Geomorfologia do Brasil.
Rio de Janeiro: Bertrand Brasil, 1998. p. 181-220.
IMPACTO ambiental. In: GUERRA, Antônio Teixeira; GUERRA, Antônio José Teixeira. Novo
Dicionário Geológico-Geomorfológico. Rio de Janeiro: Bertrand Brasil, 1997. p. 350.
INSTITUTO BRASILEIRO DE GEOGRAFIA E ESTATÍSTICA. Censo Agropecuário, 1995/96.
Disponível em: <http://www.ibge.gov.br>. Acesso em: 12 fev 2003.
NÓBREGA, Reginaldo Teixeira. Bom Jesus: da sua origem aos nossos dias. Bom Jesus: [s.n.],
1986. (mimeo).
RIO GRANDE DO NORTE. Instituto de Desenvolvimento Econômico e Meio Ambiente do Rio
Grande do Norte. Informativo Municipal de Bom Jesus. Natal: IDEMA, 1999. v.5, p. 1-14.
ROSSATO, Maíra Suertegaray; SUERTEGARAY, Dirce. Repensando o tempo da natureza em
transformação. Agora, Santa Cruz do Sul, v. 6, n. 2, p. 93-98, jul./dez. 2000.
SILVA, Jorge Xavier da. A pesquisa ambiental no Brasil: uma visão crítica. In: BECKER, B. et al.
(org.) Geografia e meio ambiente no Brasil. São Paulo: Hucitec, 1995. p. 346-370.
Fórum Internacional do Meio Ambiente - A conferência da Terra 545

TERRITORIALIDADE GUARANI E IMPACTO AMBIENTAL

Nathalia Lucas Tavares de Souza


Graduanda em Geografia. Universidade Estadual Paulista “Júlio de Mesquita Filho”. Campus Rio Claro-SP.
tavres1985@yahoo.com.br
Bernadete Ap. Capriglio Castro Oliveira
Professor Assistente Doutor. Universidade Estadual Paulista “Júlio de Mesquita Filho”. Campus Rio Claro-SP.
Departamento de Planejamento Territorial e Geoprocessamento. bacco@rc.unesp.br

RESUMO
O presente trabalho busca analisar numa perspectiva sócio-ambiental as alterações do
ambiente físico causadas pela expansão urbana e por obras rodoviárias pela perspectiva indígena de
transformação da paisagem.
O estudo cabe as aldeias indígenas do Jaraguá, a Tekoá Ytu e Tekoá Pyau, localizadas no
noroeste do município de São Paulo, no distrito do Jaraguá. Buscando identificar de que modo às
alterações ambientais causadas, bem como, a pressão exercida pela sociedade envolvente alteraram
a dinâmica social indígena e de que modo estes se adaptaram as transformações.
Palavras – chave: Aldeia Indígena, Territorialidade Guarani, Impacto Ambiental, Direito Ambiental

ABSTRACT
This paper aims to analyze a socio-environmental perspective the alterations of the
physical environment caused by growth urban and road works through the indigenous perspective
into changes of the landscape.
The study is referred to village indigenous of Jaraguá, Tekoá Ytu and Tekoá Pyau, located
in the northwestern São Paulo municipality, in Jaraguá area. Identifying how the caused
environmental changes, such as, pressure provoked by society around has changed the dynamic
social indigenous and how these adapted them selves to the changes.
Key Words: Village Indigenous, Territoriality Guarani, Environmental Impact, Environmental
Right

INTRODUÇÃO
De acordo com a Fundação Nacional do Índio – a FUNAI –, as aldeias indígenas Tekoá
Ytu e Tekoá Pyau, situadas no noroeste da capital paulista, existem há mais de 40 anos, e, contam
com aproximadamente 270 índios que, sobrevivem do artesanato, mantendo a língua, educação
indígena e os costumes do povo Guarani.
Por conta da expansão urbana e dos empreendimentos rodoviários, sua autonomia há muito
se perdeu. Situada numa área de proteção ambiental permanente, o Parque Estadual do Jaraguá,
onde, de acordo com as leis ambientais, fica proibida a extração de matéria-prima para o artesanato
e outras atividades de costume indígena, a intervenção nas aldeias, por parte, de pesquisadores,
ONG’s, Poder Público e órgãos responsáveis pelos índios do Brasil – FUNAI e a Fundação
Nacional de Saúde (FUNASA) – tem-se feito necessária, indicando que é preciso encontrar meios
para assegurar o modo de vida indígena e a reprodução dos costumes Guarani.
Pressionadas pelas leis ambientais que surgiram após a década de 1990, por projetos
desenvolvimentistas e pela pressão urbana, o caso das aldeias do Jaraguá refletem uma situação
comum dos indígenas no Brasil.
Sendo assim, este trabalho tem por objetivo refletir quanto aos aspectos das leis que se
interpõe sobre o direito de uso do território e a ética empregada nos projetos que visam o
desenvolvimento, considerando os aspectos sócio-ambientais que cercam a questão.

O TERRITÓRIO INDÍGENA
Predominantemente, a ocupação da costa brasileira era feita pelos Guarani. A Coroa
Portuguesa os considerou importante instrumento para proteção das fronteiras e expansão do
território, já que, esta etnia ocupava partes estratégicas do sul do Brasil, de onde saiam em
Fórum Internacional do Meio Ambiente - A conferência da Terra 546

peregrinação feita a partir de seus territórios para a “Terra sem Mal”, que de acordo com a crença
fica à beira mar, por onde “...seus filhos caçulas (ndeary apyre) vão andar pela beirada do oceano
(yy ee rembérupy). Pela beirada do oceano é como deve ser (aeve’ veju)” (LADEIRA, 1992, p. 77),
daí justifica-se a caminhada do povo Guarani e o estabelecimento de suas aldeias em regiões
litorâneas.
Considerados índios errantes, os Guarani, sofreram durante a colonização a tomada de seus
territórios, e, ao longo do tempo, foi construída a imagem de que os Guarani, índios já
“aculturados”, não necessitavam de terra já que nem “lutavam” por ela. (LADEIRA, 2000)
A definição de terra indígena é concebida pela interpretação da lei de nº 6001 do Estatuto
do Índio, como ambiente ecológico que o índio interpreta segundo sua tradição, onde os limites são
encarados de outro modo que não o nosso.
Entretanto, a política de aldeamento empregada no período colonial, criando reservas de
mão-de-obra indígena, dentro de uma perspectiva não indígena, levou a um claro processo de
“confinamento” dos índios.
“A concessão de terras aos indígenas aldeados foi, conseqüentemente, antes de mais
nada, um instrumento de fixação. O indígena, que não possuía noção de propriedade
fundiária particular, mas que normalmente dispunha de amplos horizontes, passou a
depender de providências do europeu, que, através de um ato de posse colonial, se
tornou proprietário da terra em que promovia o processo de colonização”. (PETRONE,
1995, p. 296)

Este processo de “confinamento” faz com que a manutenção dos costumes e crenças
indígenas sejam ameaçadas, assim como, a interferência ou invasão da população nos arredores das
aldeias, o que dá origem aos processos que Egon Shaden (1954) chamou de “aculturativos”, pois, os
índios quando são atraídos ao mundo exterior à aldeia, acabam por se tornar alvo fácil de
exploradores e oportunistas. Assim, quando se tem o empobrecimento dos recursos internos das
aldeias há, em conseqüência, a fome e a doença.
O entendimento sobre o território indígena se dá a partir de um conjunto de elementos
materiais e simbólicos, articulados nos mitos, e que se referem sempre a uma base territorial,
fundamental à sua reprodução econômica e cultural. Suas trilhas e caminhos, cemitérios e as aldeias
onde viveram seus antepassados e que hoje não existem mais, representam seus lugares sagrados.
“Portadores de cultura característica de região florestal, em que as atividades de
subsistência incluem as lides da caça em combinação com o amanho da terra, os Guarani
se estabelecem, sempre que possível, no seio da mata, evitando a paisagem aberta dos
campos. As suas aldeias, longe de constituírem conglomerados compactos de habitações,
consistem em casas isoladas, mais ou menos distantes umas das outras, espalhando-se
pelas clareiras abertas na floresta. Em geral, não é possível determinar um “centro” da
aldeia, a não ser que se considere com tal a habitação do nanderú, médico-feiticeiro, ou
o oýguatsú, casa de festas religiosas”. (SHADEN, 1954, p. 37)

Uma vez que se reconhece o direito do índio à terra como direito originário não se deve
encarar/conceber, terra indígena como qualquer terra, afinal, ela só pode ser definida no contexto de
uma tradição cultural construída pelo grupo ao qual se refere. “A demarcação é justamente a
característica que distingue a terra indígena da terra devoluta, a possibilidade que a primeira tem de
se afirmar a priori, como “terra dos índios”, com limites definidos cultural e socialmente.”
(LINHARES, 1986, p. 132)
Historicamente, os Guarani enfrentaram um processo de destituição de seus territórios. Por
estarem localizados na zona costeira do país, a etnia perdeu áreas que “jamais poderão retomar”,
geralmente, devido as freqüentes pressões exercidas pela sociedade que os cerca, mas, ainda assim,
conseguiram preservar suas aldeias nos pontos estratégicos e vitais a sua cultura que é junto ao
ecossistema da Mata Atlântica e à Serra do Mar. (LADEIRA e AZANHA, 1987)
Fórum Internacional do Meio Ambiente - A conferência da Terra 547

Segundo a Constituição Federal em vigor, no artigo 231 são reconhecidos aos índios os
direitos originários sobre as terras que tradicionalmente ocupam destinadas a sua posse permanente,
cabendo-lhes o usufruto exclusivo das riquezas do solo, dos rios e dos lagos nelas existentes. As
terras tradicionalmente ocupadas pelos índios são consideradas também pela Constituição como
bens da União (artigo 20).
Tais terras são definidas no parágrafo 1º, do referido artigo:
“São terras indígenas tradicionalmente ocupadas pelos índios ou por eles habitadas em
caráter permanente, as utilizadas para suas atividades produtivas, as imprescindíveis á
preservação dos recursos ambientais necessárias para sua reprodução física e cultural,
segundo seus usos, costumes e tradições”.

No entanto nos lembra Júlio Gaiger que:


“Os direitos dos índios sobre suas terras, porém, não dependem da demarcação. A
demarcação é providência administrativa que visa identificar com maior precisão as
terras indígenas, mas não tem o condão de constituir ou desconstituir direitos. O preceito
constitucional de maior importância sobre as terras tradicionalmente ocupadas pelos
índios, todavia, é o que reconhece que o direito dos índios sobre eles é originário (art.
231, caput). Isso significa que a Constituição reconhece que os direitos territoriais
indígenas precedem o Estado enquanto fonte de direito, exatamente por serem direitos
anteriores ao próprio Estado. Coerentemente com esta compreensão, a expressão
utilizada no texto constitucional, ao se referir aos direitos indígenas, é reconhecer. Em
outras palavras, se os direitos indígenas são anteriores ao Estado, não cabe a
Constituição senão reconhecê-los sabendo-os preexistentes”. (GAIGER, 1989, p. 5)

LEIS AMBIENTAIS versus DIREITO INDÍGENA SOBRE O USO DO TERRITÓRIO


O ecossistema predominante na costa brasileira é a Mata Atlântica. Atualmente da segunda
maior floresta brasileira resta apenas cerca de 5 % de sua extensão original. Em alguns lugares
como no Rio Grande do Norte, nem vestígios. Hoje a maioria da área litorânea que era ocupada pela
Mata Atlântica é ocupada por grandes cidades, pastos e agricultura. Porém ainda restam manchas
significativas da floresta na Serra do Mar e na Serra da Mantiqueira, no sudeste do Brasil.
As aldeias indígenas do Jaraguá, Tekoá Ytu e Tekoá Pyau, estão localizadas na base do
Pico do Jaraguá, compreendido pelo Parque Estadual do Jaraguá, criado em 1961 e tombado como
patrimônio da humanidade pela Unesco em 1994.
Fórum Internacional do Meio Ambiente - A conferência da Terra 548

Localização das aldeias indígenas – Tekoá Ytu e Tekoá Pyau – pelo Google Earth. Foto organizada
por Cabral, 2006.

Segundo a lei do Sistema Nacional de Unidades de Conservação da Natureza (SNUC) de


nº 9.985/2000 fica estabelecido que até que seja “elaborado o Plano de Manejo todas as atividades e
obras desenvolvidas nas unidades de conservação de Proteção Integral deve se limitar àquelas
destinadas a garantir a integridade dos recursos que a unidade objetiva proteger”, fica proibida,
portanto, a extração de recursos naturais deste ambiente, até mesmo por populações tradicionais que
já estavam presentes na região, no entanto, a mesma lei afirma que se deve “assegurar às
populações tradicionais porventura residentes na área as condições e os meios necessários para
satisfação de suas necessidades materiais, sociais e culturais”.
Tendo em vista, que o Plano de Manejo da área do Parque está previsto para setembro de
2008, a população indígena ali estabelecida sofre não só com as restrições pelas leis ambientais
mais recentes, mas também pela expansão urbana e projetos rodoviários de grande porte, tal como,
o Rodoanel Mário Covas.
Segundo o jurista Marco Antônio Barbosa, os direitos indígenas as terras incluem também
a sua proteção:
“...ao se atribuir à União, no artigo 22, a propriedade das terras indígenas, tal
propriedade está condicionada aos limites do artigo 23. Vale dizer que, para se
compreender a propriedade da União sobre as terras indígenas ao mesmo tempo que o
reconhecimento pelo Estado brasileiro de direitos originários aos índios sobre as terras
que ocupam, há que se ver nesta propriedade da União apenas e tão somente um
expediente de ordem prática de maior proteção à guarda e garantia das terras indígenas”.
(BARBOSA, 2001: 87)

Vale dizer que a Mata Atlântica constitui-se em valorosa reserva para reprodução dos
costumes Guarani, tal como, diz Ladeira (1992):
Fórum Internacional do Meio Ambiente - A conferência da Terra 549

“As espécies vegetais, animais, a hidrografia, o relevo que compõem a Mata Atlântica
fazem parte do universo material e espiritual Guarani. Quando eles partem em busca de
seus verdadeiros lugares, a orientação divina para o assentamento das famílias se dá em
consonância também, embora não de forma exclusiva, com os recursos naturais
existentes, e as condições para o sustento do grupo. Por isso as matas, cada vez mais
raras, vão se tornando mais significativas para os Mbya”. (LADEIRA, 1992, p. 170)

Assim sendo, fica claro que a relação existente entre o modo de vida indígena e a
exploração por eles feita dos recursos naturais torna indissociável a concepção de território e
preservação ambiental. Entende-se então, que as ações de terceiros que venham a interferir nas
florestas permanentes, de uso e fruto indígena são, em suma, atos que contribuem para degradação
do modo de vida indígena nas aldeias.

A QUESTÃO DAS OBRAS RODOVIÁRIAS


No caso das aldeias do Jaraguá, a expansão urbana, bem como, os empreendimentos
públicos, tais como, a Rodovia dos Bandeirantes e o Rodoanel Mário Covas que mesmo não sendo
construídos dentro de seus limites, mas no seu entorno, provocaram um esgotamento do seu
potencial físico-natural de “fora pra dentro”. (OLIVEIRA, 2002)
A construção do Rodoanel Mário Covas foi dividida em quatro trechos: Oeste, que foi
entregue em outubro de 2002, talvez construído primeiro por ser responsável por 60 % dos veículos
que passam pela Região Metropolitana da cidade de São Paulo, Sul, Leste e Norte. Seu traçado
circunda a Região Metropolitana de São Paulo, cruzando setores urbanos e áreas, que ainda
preservam características rurais.
Estudos realizados pelo DESENVOLVIMENTO RODOVIÁRIO S.A. (Dersa),
caracterizada por ser uma das empresas brasileiras de economia mista prestadora de serviços
públicos rodoviários e hidroviários, consideraram três alternativas e inúmeras variantes do traçado
para o Rodoanel, dentro de um raio de 10 a 40 km de distância do centro da Capital.
Essas três alternativas foram avaliadas comparativamente pelo Dersa e confirmaram que os
volumes de tráfego a serem canalizados pelo empreendimento dependiam, principalmente, da
macrolocalização do traçado, ou seja, a distância em relação ao centro influi diretamente no volume
de tráfego a ser atraído pelo empreendimento, na extensão total do mesmo e nos tipos de impactos
sobre o uso e ocupação do solo onde será implantado, já que no seu planejamento é considerada a
questão dos impactos ambientais causados na região de seu traçado, ao meio ambiente.
Mesmo que, hipoteticamente, a empresa responsável pela construção do Rodoanel Mário
Covas se preocupe com os impactos ambientais gerados na região de sua implantação, em momento
nenhum no Estudo de Impacto Ambiental e Relatório de Impacto do Meio Ambiente (EIA/RIMA)
da obra referida menciona a presença de aldeias indígenas nas proximidades da construção.
Numa tentativa de diminuir os problemas causados em virtude de tais obras, a menos de
uma década o Instituto de Pesquisas Tecnológicas (IPT), introduziu no Brasil um método de
Avaliação de Impacto visando aumentar o poder de análise e prevenção nas áreas onde serão
implantadas obras de grande e médio porte que poderão de alguma forma, impactar o meio
ambiente, cultural e socialmente em determinada localidade.
O processo de Avaliação Ambiental Estratégica (AAE) consiste em “um processo
sistemático para avaliar as conseqüências ambientais de uma política, plano ou programa, de forma
a assegurar que elas sejam integralmente incluídas e apropriadamente consideradas no ESTÁGIO
INICIAL, e apropriada do processo de tomada de decisão, juntamente com as considerações de
ordem econômicas e sociais”. (SADLER E VERHEEM, 1996 apud EGLER, 2001: 177).
Segundo as literaturas sobre a Avaliação Ambiental Estratégica (AAE), existem duas
principais razões para inclui-lá nos projetos de avaliação e prevenção de impactos ambientais.
Primeiro seria a capacidade que este tem de suprimir as deficiências técnicas identificadas na
Avaliação de Impactos Ambientais (AIA) e o segundo e, principal, é que a AAE pode vir a
promover com maior eficiência a sustentabilidade nos processos de desenvolvimento.
Fórum Internacional do Meio Ambiente - A conferência da Terra 550

Sendo assim, verifica-se que atualmente há uma busca dos órgãos públicos e privados por
um desenvolvimento sustentável que se daria com a integração das dimensões ambientais, sociais e
econômicas no processo de tomada de decisão. O processo de AAE desempenharia um papel
decisivo no alcance desta integração, já que sua atuação consiste em um procedimento de
coordenação dentro dos diferentes níveis das atividades de planejamento governamentais e também,
particulares.
É importante ressaltar, que tal avaliação estaria sendo benéfica, em muito, se fosse
realizada antes de se pôr em prática os projetos de construções de grande e médio porte que
certamente serão impactantes ao meio ambiente. Pois, sua eficiência se torna questionável se
realizada posteriormente à tomada de decisão e construção de qualquer obra.
A AAE não encontra apoio explícito no Brasil, quando se trata de textos legais, no entanto,
temos na Secretaria do Meio Ambiente do Estado de São Paulo uma importante referência na
Resolução SMA-44, de 29/12/1994:

“Considerando que as políticas, planos e programas públicos, pelo seu caráter de indução
de ações antrópicas, podem acarretar conseqüências ambientais indejáveis;
(...)

Considerando que impactos ambientais secundários, de natureza cumulativa ou sinergética


podem não ser adequadamente identificados e avaliados na etapa de projeto;

Considerando que a atividade governamental deve incorporar a Avaliação Ambiental na


elaboração e apreciação de políticas, planos e programas de interesse público e para tanto, deve-se
adotar uma sistemática diferenciada da Avaliação de Impacto Ambiental de projetos e
empreendimentos, dada a sua amplitude, alcance e abstração;

Finalmente, considerando que compete ao Consema exprimir o Dever-Poder conjunto ao


Poder Público e à coletividade na gestão ambiental do estado, Resolve:

Artigo 1º - Fica designada, para atuar junto ao Gabinete do Secretário do Meio Ambiente,
Comissão de Avaliação Ambiental Estratégica, encarregada de analisar a variável ambiental
considerada nas políticas, planos e programas governamentais e de interesse público, encaminhando
relatório para apreciação do CONSEMA (...)”

Segue nesta mesma Resolução que a Comissão de AAE deve ser subordinada ao Secretário
do Meio Ambiente do Estado e, também como deveria ser sua organização. Sendo esta a única
referência explícita a tal procedimento no Brasil; existindo ainda algumas menções não diretas na
Constituição Federal, na lei 6938 de 31/08/81; Resolução do CONAMA nº. 1 de 23/01/86; na
Constituição do Estado de São Paulo no seu artigo 191, capítulo IV- Do Meio Ambiente, dos
Recursos Naturais e do Saneamento e também no artigo 192 do mesmo capítulo; nos Decretos
Estaduais de nº. 24.932 de 24/03/86, Decreto 30.555 de 03/10/89.
É importante ressaltar que o procedimento de Avaliação Ambiental Estratégica foi adotado
para construção de trechos do Rodoanel Mário Covas, mas que, no entanto, esta foi feita com a obra
já em curso, o que, certamente, torna sua eficácia questionável, pois assim teria sido realizada após
a tomada de decisão que envolve o processo de construção.
Dessa forma, fica claro que
“o “diálogo” proposto pelas empresas, via de regra, iniciam já com as negociações. O que
fica claro é que o diálogo, no sentido participativo de discutir e contar com o conhecimento e as
considerações dos índios, não é levado em conta. Pois os diálogos, isto é, as negociações, são
propostos somente quando os projetos já estão sendo implantados, o que, segundo os
empreendedores e investidores, os tornariam irreversíveis. Espera-se chegar, assim, a uma instância
de decisões definida por concessões desiguais das partes. Porque os projetos (abastecimento,
Fórum Internacional do Meio Ambiente - A conferência da Terra 551

saneamento, rodovias, imobiliários, etc) que atingem as pequenas terras indígenas nas regiões
sudeste - sul, quase sempre, têm gerado um impasse cujo desfecho, mesmo na instância jurídica,
tem considerado o peso político que, sobretudo em relação aos projetos governamentais, a decisão
acarreta”. (LADEIRA, 2000, p.8)

BREVES CONSIDERAÇÕES
Os Guarani vêem, com preocupações, o processo de invasão do entorno de suas terras,
fruto do crescimento desordenado das grandes cidades que exigem projetos de infra-estrutura.
Assim, tanto as ocupações desordenadas do entorno, como os projetos de grande porte, significam
para os Guarani, que entendem território para além de diminutas áreas demarcadas, a desfiguração
do mundo e retalhação de seu território. (LADEIRA, 2000)
Esta invasão do entorno é para eles tão fatal quanto à direta, pois, compromete os rios e
nascentes, degrada a vegetação e impede a circulação e procriação da fauna – complementos
indispensáveis À dieta indígena – levando a empobrecimento na composição alimentar, causando
altos índices de desnutrição como se verifica nas populações Guarani e demais indígenas do Brasil,
quando suas reservas são atingidas ou invadidas de alguma maneira, caracterizando graus de
“invasão” diferenciados. (OLIVEIRA, 1998)
Essa interposição de leis sobre o território trazem para reflexão geral dos pesquisadores
modos de atingir de maneira mais igualitária o interesse e necessidade de todos.
As leis ambientais restritivas e também o impacto negativo gerado pelas obras do
Rodoanel Mário Covas, trouxe, para a população Guarani do Jaraguá a escassez, pois, está impedida
da prática da caça e coleta nessas áreas o que resulta hoje no desaparecimento de componentes
básicos de sua dieta alimentar e dificuldades de coleta dos materiais para o artesanato (taquara,
imbé, etc.).
Tal situação traz consigo a dependência direta da metrópole na área da subsistência,
economia e saúde, fator que traz risco à cultura indígena, já que, o contato direto dessa população
com a violência e os vícios comuns aos juruá (brancos), como o álcool, são geralmente trazidos pelo
impacto cultural excessivo.
A demarcação do território extremamente exíguo é a causa da redução da área para roça
indígena e a criação de pequenos animais, colocando para o grupo, atualmente, a necessidade de
ampliação da demarcação das aldeias, lembrando que a Tekoá Pyau ainda não teve suas terras
homologadas pelo Estado.
A vida em grande parte das comunidades indígenas tornou-se sedentária, já que, o
território exíguo dificulta o desenvolvimento da agricultura; a pesca tornou-se inviável, em alguns
casos, devido à poluição dos mananciais e a caça já é rara.
Sendo assim, é necessário, que a sociedade civil e, principalmente, os governos passem a
reconhecer que população indígena e território são assuntos indissociáveis, afinal, só se pode
considerar o índio (indivíduo) se preservada estiver sua coletividade (etnia) e, por sua vez, esta
mantiver seu território pra sua manutenção.

REFERÊNCIAS BIBLIOGRÁFICAS
AZANHA, GILBERTO e LADEIRA, M. Inês.- Os Índios da Serra do Mar – A Presença Mbya
Guarani em São Paulo, Centro de Trabalho Indigenista, Nova Stella, São Paulo, 1987.
BARBOSA, M. A. Direito antropológico e terras indígenas no Brasil. São Paulo: Plêiade : Fapesp,
2001. 130 p.
CABRAL, M. P. “Geotecnologias no Mapeamento Etnoambiental da Aldeia Indígena Tekoa Pyau
– São Paulo/SP”. Dissertação de Mestrado. UNESP, Rio Claro, Março/2007.
CLASTRES, P. A fala sagrada: mitos e cantos sagrados dos índios Guarani. Tradução: Nícia Adan
Bonatti. – Campinas, São Paulo: Papirus, 1990.
DURHAM, E. R. A aventura antropológica. Teoria e pesquisa, et. al.; org. Cardoso, R. C. L. Rio de
Janeiro: Paz e Terra, pp. 107-123, 1986.
Fórum Internacional do Meio Ambiente - A conferência da Terra 552

EGLER, P. C. G. Perspectivas de uso no Brasil do processo de Avaliação Ambiental Estratégica.


Parcerias Estratégicas, Brasília, n. 11, p. 175- 190, jun. 2001.
FILHO, C. F. M. S. O Direito Envergonhado: O Direito e os Índios no Brasil. In: GRUPIONI, L.
D. B. Índios no Brasil. São Paulo: Secretaria Municipal de Cultura, pp. 153-168, 1992.
GAIGER, J. Direitos Indígenas na Constituição Brasileira de 1988. CIMI, 1989.
GIANNINI, I. V. Os Índios e suas Relações com a Natureza. In: GRUPIONI, L. D. B. Índios no
Brasil. São Paulo: Secretaria Municipal de Cultura, pp. 145-152, 1992.
GIL, A.C. 1996.Como elaborar projetos de pesquisa. São Paulo: Ed. Atlas S.A.159p.
GOLDENBERG, M. “A arte de pesquisar: como fazer pesquisa qualitativa em Ciências Sociais”.
Editora Record, RJ, pp. 71-99, 1998.
GOUVÊA, Y. M. G., et al. Avaliação de impacto ambiental. São Paulo: Secretaria
do meio ambiente. 1998, 84 p.
LADEIRA, M. I. “O caminhar sob a luz” – O Território Mbya à Beira do Oceano. Dissertação de
mestrado. PUC, São Paulo, Março/1992. 200 p.
LADEIRA, M. I. “Comunidades Guarani Da Barragem E Do Krukutu E A Linha De Transmissão
De 750 Kv Itaberá – Tijuco Preto III”. Relatório de Interferências. São Paulo, Novembro/2000. 68
p.
LEME-MACHADO, P. A. 2004. Direito ambiental brasileiro. 12ª edição. São Paulo: Malheiros
editores. 1075 p.
LINHARES, L. P. Ação Discriminatória: Terras Indígenas como Terras Públicas. 125 -152 pp. In:
OLIVEIRA, J. P. de (org). 1998. Indigenismo e Territorialização: Poderes, Rotinas e Saberes
Coloniais no Brasil Contemporâneo. Rio de Janeiro: Contra Capa Livraria. 310 p.
MATTA, R. Da. Relativizando: Uma Introdução à Antropologia Social. Rio de Janeiro: Vozes.
1981.
MACEDO, R. K.; BEAUMORD,A.C. 2000. A prática da avaliação e da gestão de impactos
ambientais. Disponível em: http://www.abga.com.br.
MEDAVAR, O. (org.). 2004. Coletânea de legislação de direito ambiental. 3ª edição. Ed. Revista
dos tribunais. 1022 p.
MELATTI, J. C. Índio do Brasil. 5ª ed. São Paulo: Hucitec (Brasília), 1986. 220 p.
MONTEIRO, J. Escravo Índio, esse Desconhecido. In: GRUPIONI, L. D. B. Índios no Brasil. São
Paulo: Secretaria Municipal de Cultura, pp. 105-120, 1992.
MONOSOWSKI, E. Avaliação de Impacto Ambiental na Perspectiva do Desenvolvimento
Sustentável. In. Avaliação de Impacto Ambiental, Situação Atual e Perspectivas. Escola Politécnica
da Universidade de São Paulo, pp. 3-13, 1993 – São Paulo.
OLIVEIRA. B. A. C. Relatório Antropológico- “ As Terras Indígenas da Barragem (Morro da
Saudade) e do Krukutu e o Rodoanel Mário Covas- trecho Sul”- São Paulo, pp. 92, 2002.
OLIVEIRA, B. A. C. Tempo de travessia, tempo de recriação: profecia e trajetória camponesa.
Tese de doutorado. Departamento de Antropologia/ FFLCH/ USP, 1998.
OLIVEIRA, J. P. (org.) “Terras indígenas, economia de mercado e desenvolvimento rural” In:
Indigenismo e Territorialização: poderes, rotinas e saberes coloniais no Brasil contemporâneo. Rio
de Janeiro: Contra Capa Livraria, pp. 43-68, 1998.
PETRONE, P. Aldeamentos Paulistas. São Paulo: Editora da Universidade de São Paulo, 1995. 385
p.
QUEIROZ, M. I. P. O pesquisador, o problema da pesquisa, a escolha de técnicas: algumas
reflexões. In: Lang, A. B. S. G. (org) Reflexões sobre a pesquisa sociológica. São Paulo: CERU, pp.
13-29, 1992.
RIBEIRO, B. G. O Índio na história do Brasil. 10ª ed. São Paulo: Global Ed., 2001. 125 p.
RIBEIRO, B. G. As Artes da Vida do Indígena Brasileiro. In: GRUPIONI, L. D. B. Índios no
Brasil. São Paulo: Secretaria Municipal de Cultura, pp. 135-144, 1992.
SADLER, B; VERHEEM, R., 1996 apud EGLER, op. cit., 2001.
SHADEN, E. Aspectos Fundamentais da Cultura Guarani. São Paulo, 1954. 185 p.
Fórum Internacional do Meio Ambiente - A conferência da Terra 553

SECRETARIA DO ESTADO DO MEIO AMBIENTE. Legislação Estadual: Controle de Poluição


Ambiental – Estado de São Paulo (atualizado até setembro, 1995). p. 300; Série de Documentos –
São Paulo: CETESB, 1995.
SECRETARIA DO ESTADO DO MEIO AMBIENTE. Legislação Estadual: Controle de Poluição
Ambiental – Estado de São Paulo (atualizado até outubro, 1994). p. 213; Série de Documentos –
São Paulo: CETESB, 1994.
SILVA, A. L. A questão indígena na sala de aula, subsídios para professores de 1º e 2º graus. São
Paulo: Brasiliense, 1993. 219 p.
SILVA, A. L. Mitos e Cosmologias Indígenas no Brasil: Breve Introdução. In: GRUPIONI, L. D.
B. Índios no Brasil. São Paulo: Secretaria Municipal de Cultura, pp. 75-82, 1992.
VIDAL, L. B. As Terras Indígenas no Brasil. In: GRUPIONI, L. D. B. Índios no Brasil. São Paulo:
Secretaria Municipal de Cultura, pp. 193-204, 1992.

http://www.culturaguarani.com.br
http://www.unesp.br
http://unicamp.br
http://www.usp.br/nhii
Fórum Internacional do Meio Ambiente - A conferência da Terra 554

V. Metropolização e cidades sustentáveis

A INSUSTENTABILIDADE DA EXPANSÃO URBANA

Celene Cunha Monteiro Antunes Barreira


Profa Dra. Programa de Pós-Graduação em Geografia. IESA - UFG, celene.barreira@uol.com.br
Edwiges C. Carvalho Corrêa
Mestranda do Programa de Pós-Graduação em Geografia do IESA – UFG, edwigescarvalho@yahoo.com.br
Miraci Kuramoto Nucada
Doutoranda do Programa de Pós-Graduação em Geografia do IESA, UFG, miracikuramoto@pop.com.br

RESUMO
O parcelamento do solo urbano e o ordenamento territorial devem ser questões centrais do
planejamento urbano e das cidades sustentáveis, pois as conseqüências da expansão urbana
descontrolada, ou controlada pelos interesses do capital imobiliário são claramente perversas
socialmente e danosas ao meio ambiente. A baixa densidade com enorme quantidade de lotes vazios
dotados de infra-estrutura básica ociosa ao redor das áreas centrais das cidades, enquanto grande
parte da população reside na periferia, geralmente sem a maior parte dos equipamentos urbanos e
outros serviços públicos traz desperdício de tempo e de energia. Os moradores ainda são
penalizados no uso do transporte coletivo caro, ineficiente, e longo trajeto. A sustentabilidade
urbana deve ser um direito de todos os cidadãos e como princípio deve nortear a política e o
desenvolvimento urbano em suas dimensões sociais, econômicas e ambientais de forma integrada.
Palavras-chave: sustentabilidade urbana, expansão urbana e parcelamento do solo

ABSTRACT
The urban allotment of the soil and the territorial order must be central questions of the
urban planning and from the sustainable cities, therefore the consequences of the urban expansion
uncontrolled or controlled for the interests of the capital immovable are clearly perverse and
damages socially to the environment. The low density with enormous quantity of empty plots
equipped with basic infrastructure idle around the central areas central of cities, while much of the
population resides in remote outskirts, usually without most urban equipment and other public
services brings waste of time and energy. The residents are still penalized in the use of public
transport expensive, inefficient, and long path. The urban sustainability should be a right of all
citizens and as a principle should guide the politics and the urban development in its dimensions
social, economic and environmental integrated way.
Key words: urban sustainability, urban expansion, allotment of the soil

O AMBIENTE E O PLANEJAMENTO URBANO


O Capítulo 7 da Agenda 21, documento firmado durante a ECO-92, realizada no Rio de
Janeiro, trata da promoção do desenvolvimento sustentável dos assentamentos humanos, e também,
do planejamento e manejo sustentável do uso da terra como meio de alcançar um ambiente
saudável. A Agenda 21 aponta algumas metas que as nações devem realizar pelo Desenvolvimento
Sustentável: obter ecossistemas melhor protegidos e gerenciados, elevar o nível da vida de todos e
construir um futuro mais próspero e seguro, em oposição à perpetuação das disparidades existentes
no mundo. Sob essa perspectiva será abordada a questão dos lotes vazios, parcelamentos do solo e
expansão urbana nas cidades da Região Metropolitana de Goiânia: em área de Cerrado.
De acordo com Barbosa (2002, p. 175 e 351), a área nuclear, na qual se localiza a região
foco da pesquisa, assemelha-se a uma cumeeira, que distribui águas para as grandes bacias do
continente: Amazônica, Prata e São Francisco. Essa área é coberta por Cerrados cuja grandeza
espacial abrange 2 milhões de quilômetros quadrados, formada em geral por solos bem drenados
Fórum Internacional do Meio Ambiente - A conferência da Terra 555

com maciços de planaltos de estruturas complexas e planaltos sedimentares compartimentados


originados de quase todos os tipos de rochas, cerradões e cerrados nos interflúvios.
A população indígena que povoou o cerrado não produziu qualquer modificação brusca no
equilíbrio do ecossistema, de acordo com Barbosa, porque inicialmente os homens eram poucos e o
nicho adaptativo era amplo. A chegada dos exploradores marca o início da dizimação da população
local e do processo de degradação ambiental. O aumento da densidade demográfica, a partir de
1950, provocou o recorte da área ocupada por cerrado com inúmeras estradas, represou e poluiu
rios, aplainou montanhas, derrubou vasta vegetação e extinguiu inúmeros animais num ritmo nunca
visto na história da civilização. Resultam do modelo do desenvolvimento a todo custo.
A porção do planeta ocupada pelas cidades é de aproximadamente 2%, no entanto,
respondem por 78% das emissões de carbono, 60% do consumo residencial de água e 76% da
madeira utilizada para fins industriais, de acordo com Sheehan apud Brown (2003, p. 200). Apesar
de o contingente populacional na terra somar 6,1 bilhões de pessoas, pouco menos da metade, 46%,
habitam em nucleamentos urbanos, no ano de 2000. Equivale a 2,8 bilhões de pessoas que
produzem 2,8 milhões de toneladas de lixo.
O significado do termo sustentável não é o mesmo para todos, entre os quais se destacam o
econômico e o ambientalista. No primeiro, tem o sentido de autonomia no crescimento econômico,
e no segundo, o crescimento econômico ideal é equilibrado, restringe-se ao essencial, o suficiente à
satisfação das necessidades básicas, a fim de assegurar às gerações futuras a capacidade de usufruto
dos recursos naturais. Para Sachs (1998, p. 37), o desenvolvimento deve considerar as cinco
dimensões de sustentabilidade: social, econômica, ecológica, cultural e espacial. Esta última,
“dirigida para a obtenção de uma configuração espacial rural-urbana mais equilibrada e uma melhor
distribuição territorial dos assentamentos humanos e das atividades econômicas”. Assim, a cidade
sustentável deve também conter essas dimensões. As ações humanas devem assegurar recursos
naturais para as futuras gerações.
A administração municipal das cidades não consegue implantar os serviços sociais e
urbanos e a infra-estrutura no mesmo ritmo das altas taxas de crescimento urbano. A cada dia
pioram os atendimentos de saúde, educação, segurança, saneamento, pavimentação e aumentam os
vetores de doenças endêmicas, o uso indevido. As cidades da Região apresentam setores centrais
mais densos seguidos de grandes espaços vazios, gerados pelos lotes não ocupados, resultando
numa baixa densidade nos setores periféricos. À medida que se distancia do centro diminui,
também, a renda e todas as variáveis da qualidade de vida dos moradores. Esta situação se
modificou nos últimos anos. Grupos sociais de melhor poder aquisitivo têm optado por localizar-se
em áreas periféricas da cidade, em condomínios horizontais isolados. A diferença é que ocupam
áreas com ótima acessibilidade que permite grande mobilidade e fluxos, apesar de afastados do
centro urbano.
Todavia, a questão da expansão urbana, das baixas densidades, do ordenamento territorial
e o deslocamento de seus moradores são motivos de constante preocupação dos setores de
planejamento. Como resolver o congestionamento, a tensão dos transeuntes, a moradia para a
população carente, a poluição do ar, dos cursos de água e o lazer para a população, em centros
urbanos cada vez mais carentes de equipamentos públicos?
Diante de tantos problemas que afetam a administração pública dos municípios, a recém
aprovada lei do Estatuto da Cidade vem socorrer e amparar as políticas urbanas de cada lugar ao
apresentar instrumentos de planejamento para aplicação dessa política. Porém, ainda faltam
recursos humanos, aparelhamento técnico e até interesse de grande parte das prefeituras em utilizar
tais instrumentos e de organizar o setor de planejamento, o que é dificultado pelo poder eficiente e
organizado das instituições imobiliárias em frear as tentativas de planejar o crescimento ordenado
de uma cidade. As conseqüências são claramente perversas socialmente e danosas ao meio
ambiente, pelo maior consumo de energia, o encarecimento e ineficácia do transporte coletivo e
falta de infra-estrutura e outros serviços públicos, como, por exemplo, o saneamento básico.
Muitas vezes, as intervenções urbanas e os assentamentos de infra-estrutura promovidos
pelos governos, funcionam como indutores de crescimento, de ocupação do solo e, isto atende aos
Fórum Internacional do Meio Ambiente - A conferência da Terra 556

moradores envolvidos e principalmente aos interesses imobiliários e terminam por pressionar a


expansão urbana, e gerar especulação sobre o preço da terra, além impor impactos ambientais. No
final, o processo é contraditório, pois parte dos moradores não suportam o custo de habitar naquele
lugar e se transferem para outro espaço mais distante. A construção de equipamentos urbanos não
leva em conta os impactos na estrutura espacial das cidades envolvidas, e nem as especificidades ou
diretrizes e equipes de planejamento. Os municípios não dispõem de controle e nem pessoal
capacitado para o assunto, e muito menos, estudos que possam orientar as intervenções urbanas em
seus municípios.
O Estatuto da Cidade, Lei Federal nº 10.257 de 10.07.2001, segundo Oliveira (2002, p.47),
regulamentou os artigos 182 e 183, que tratam da política urbana, da Constituição Federal de 1988,
e estabeleceu as diretrizes gerais dessa política “em prol do bem coletivo, da segurança e do bem
estar dos cidadãos, bem como do equilíbrio ambiental” conforme seu artigo 1º. Entre as dezesseis
diretrizes gerais para a política urbana expressas no artigo 2º, quatro tratam da sustentabilidade,
apesar de ser longa a transcrição a seguir, consideramo-la inevitável com o intuito de evitar a
quebra e a dispersão do assunto:
“I – garantia do direito a cidades sustentáveis, entendido como o direito à terra urbana, à moradia,
ao saneamento ambiental, à infra-estrutura urbana, ao transporte e aos serviços públicos, ao trabalho
e ao lazer, para as presentes e futuras gerações.
IV – planejamento do desenvolvimento das cidades, da distribuição espacial da população e das
atividades econômicas do município e do território sob sua área de influência, de modo a evitar e
corrigir as distorções do crescimento urbano e seus efeitos negativos sobre o meio ambiente.
VI – ordenação e controle do uso do solo, de forma a evitar:
a) a utilização inadequada dos imóveis urbanos;
b) a proximidade de usos incompatíveis ou inconvenientes;
c) o parcelamento do solo, edificação ou o uso excessivos ou inadequados em relação à infra-
estrutura urbana;
d) a instalação de empreendimentos ou atividades que possam funcionar como pólos geradores de
tráfego, sem a previsão da infra-estrutura correspondente;
e) a retenção especulativa de imóvel urbano, que resulte na sua subutilização ou não utilização; f) a
deterioração das áreas urbanizadas;
g) a poluição e a degradação ambiental.
VIII – adoção de padrões de produção de bens e serviços e de expansão urbana compatíveis com os
limites da sustentabilidade ambiental, social e econômica do município e do território sob sua área
de influência”.

Constata-se, que o parcelamento inadequado e a retenção especulativa do imóvel


prejudicam o ordenamento territorial e o bem-estar coletivo, por isso serão controlados e evitados
mediante instrumentos da política urbana e do planejamento do desenvolvimento das cidades, os
quais devem também corrigir distorções do crescimento urbano. A questão central da mesma está
no parcelamento do solo e na expansão urbana que, por sua vez, envolve mobilidade, migração e
ainda os aspectos técnicos, legais, ambientais, políticos, administrativos, sociais e econômicos, aqui
incluídas a renda fundiária e a especulação imobiliária. A sustentabilidade urbana é um direito de
todos os cidadãos e deve nortear a política e o desenvolvimento urbano em suas dimensões sociais,
econômicas e ambientais, de forma integrada, impondo restrições ao parcelamento e à especulação
imobiliária, como meio de ordenar o território e que demonstrem na prática que a qualidade de vida
urbana e sustentabilidade urbana são objetivos reais não um subtítulo do plano diretor.
Esse instrumento de planejamento do crescimento urbano ordenado não tem merecido a
devida importância como tal por parte do executivo, legislativo e até por técnicos em planejamento
urbano ou ambiental, por outro lado, os estudos sobre sustentabilidade urbana, versam sobre a
qualidade dos elementos: ar, água, energia e etc. como indicadores, no entanto, há uma lacuna,
percebida pelo Estatuto da Cidade. Como visto acima, a lei estabelece o elo entre sustentabilidade
urbana, perímetro urbano e parcelamento do solo. A omissão desse aspecto no planejamento e na
Fórum Internacional do Meio Ambiente - A conferência da Terra 557

sustentabilidade das cidades requer uma atuação constante, os técnicos em planejamento urbano
estão sempre correndo atrás do prejuízo.

A PROPRIEDADE PRIVADA
Bermudez e Metzeger (1996) assinalam o fato de que a terra, que é um bem comum dado
pela natureza, tal como o ar, não deveria transformar-se em objeto de mercado. Eles recordam que
para os povos primitivos a terra é sagrada, não existe a propriedade. Não obstante, seguimos a
lógica capitalista que não obedece a essa condição, mas às relações dos homens com a terra,
consubstanciadas pelo uso que influencia na estrutura, no espaço, no meio ambiente e na percepção
que se tem da cidade ou do campo. Por esse princípio, a terra é um bem de uso, um suporte físico de
todas as atividades, de todas as pessoas, individual ou coletivamente.
Poder-se-ia argumentar que o acesso à água é pago. No entanto, as concessionárias do
serviço de distribuição, alegam que cobram o tratamento e o serviço de captação e distribuição da
água. Portanto, realizam beneficiamento que é trabalho. Enquanto a terra é comercializada até sem
benfeitorias ou qualquer trabalho a preços distintos. Bermudez e Metzeger não são favoráveis à
propriedade coletiva da terra. Singer (1978) acredita que a socialização do imóvel fortaleceria o
capitalismo, uma vez que, a renda da terra, sendo livre, passaria a incrementar o processo de
acumulação do capital.
“No modo de produção capitalista, o produto social é produzido sob a forma de valor.
Somente o trabalho é capaz de produzir, portanto de criar valor (e, portanto, de mais-valia)”. Dessa
forma, segundo Farret (1985, p. 85), a mercadoria terra assume uma natureza peculiar, pois
incorpora valor (mais-valia) proveniente do uso, dos investimentos públicos, ou seja, mais-valia
criada pelo trabalho da sociedade. A terra não foi produzida, não poderia ter valor, então o que lhe
confere valor? O valor resulta da disputa por usos, e estes são pautados pelas regras do jogo
capitalista, que se fundamenta na propriedade privada do solo, nas palavras de Singer (1978, p. 21)
e de Marx (s/d p. 57) “O monopólio da terra habilita o proprietário fundiário a tomar parte da mais-
valia que é a renda”. Ou seja, a renda não deriva da terra ou do capital. A mais-valia apropriada pelo
proprietário fundiário é extraída do trabalhador pelo empregador, na forma de renda.
Se este empregador detém a propriedade da terra e o capital próprio para movimentar seu
negócio, então se apropria da mais-valia em todas as suas partes: renda, lucro e juro, que no
cômputo geral refere-se ao montante do trabalho não pago, a partir do qual é dividida a parte do
proprietário fundiário, do financiador e do produtor ou empregador, e do seu ponto de vista é o que
ele pode pagar pela terra e pelo empréstimo.Todavia, outros fatores concorrem para determinar o
valor da terra, tais como escassez ou o equilíbrio entre a oferta e a procura, localização, parâmetros
urbanísticos, paisagens natural ou não, e outras, também estimulam a “valorização”, que é embutida
no preço de mercado, e criam a ilusão de que a terra produz valor, mas na verdade é renda.
A disputa pelo uso confere poder ao proprietário, afinal, o solo é a condição necessária
para o estabelecimento de qualquer atividade no campo ou na cidade. Enquanto na primeira a terra é
um meio de produção, na segunda, apenas suporte de atividades para a realização da produção.
Observa-se que os preços não são os mesmos em terrenos com características e condições
semelhantes, mas de localização diversa. Isto quer dizer que os benefícios como infra-estrutura e
edificação contam muito pouco, o que determina o preço é a monopolização de acesso àquela
situação especial. Outro exemplo: quando o proprietário retira seu terreno do mercado, este passa a
valorizar-se também pelo exercício do monopólio. Dessa forma, a renda fundiária, produto da mais-
valia e o valor, resultam das duas faces da mesma moeda: monopolização e a propriedade privada
do solo, fundamentos do capitalismo. Por isso, Marx diz que a propriedade gera renda, e não a terra.
Na história da humanidade, a propriedade passou por quatro características que estão
associadas à estrutura social derivada das fases do desenvolvimento da divisão do trabalho, em cada
etapa, de acordo com Marx e Engels (1999, p. 29): propriedade tribal no período neolítico; comunal
ou estatal, na antigüidade e no Império Romano, inicialmente tinha caráter privado associado a
Fórum Internacional do Meio Ambiente - A conferência da Terra 558

aspectos coletivos. A propriedade feudal ou estamental84 no campo e na cidade ganhou aspectos


corporativos, o desenvolvimento da propriedade móvel e imóvel, ambas subordinadas à propriedade
comunal. “A divisão do trabalho e a propriedade privada são expressões idênticas: a primeira
enuncia em relação à atividade, aquilo que se enuncia na segunda em relação ao produto da
atividade” (MARX & ENGELS, 1999, p. 46). O processo de transformação da propriedade passa
necessariamente pela estrutura social que, por sua vez, resulta da divisão do trabalho, cuja base
comum é a exploração da força de trabalho85.
A história da exploração inicia-se com o grupo familiar e tribal, depois, dos escravos, dos
servos e oficiais e, por fim, dos trabalhadores em geral. Cada fase apresentou novas relações entre
indivíduos e nova organização social e política: patriarcal; escravocrata; estamentos86 e classes, os
quais foram potencializados com os meios técnicos, materiais e produtos do trabalho de cada época.
Nos tempos atuais, a propriedade formal proporciona o processo, as formas e as regras que
fixam ativos87 em uma condição que permite convertê-los em capital ativo. Este processo cria um
sistema formal de propriedade expresso em representações escritas, tais como: escrituras, finanças,
contratos e registros das qualidades econômicas e sociais mais úteis sobre os ativos que, de acordo
com De Soto (2001, p. 60), é como se fosse uma central hidrelétrica cuja energia gerada é o capital.
Este autor assinala que o sistema formal de propriedade ocidental produz seis efeitos que
permitem, a pessoas físicas e jurídicas, gerarem o capital, mediante a fixação do potencial
econômico dos ativos, integração da informação dispersa em um único sistema, responsabilização
das pessoas, transformação dos ativos em bens fungíveis88, integração das pessoas e proteção das
transações.
As representações de propriedades permitem conhecer os ativos pela descrição de suas
qualidades econômicas e sociais latentes, portanto, revelou-se como uma ferramenta para produzir
um valor excedente acima dos atributos físicos dos bens. Enquanto a sistematização das
informações facilita a avaliação e a negociação, mas também incrementa a rapidez e permite a
responsabilização das pessoas, pois com a integração o indivíduo ganha visibilidade e passa a ser
facilmente localizável, identificável e cobrado pelas contas, serviços, multas, compras e outras
tantas ações.
A gênese da propriedade formal carrega todo um aparato de formalidades burocráticas
interligadas que efetivamente fixam o potencial econômico, mas se por um lado, contribui com a
visibilidade do currículum, e informa sobre a solidez e o poder do indivíduo, por outro lado, tem o
efeito de integrar pessoas, proprietários e negócios, por conta da interligação dos registros e das
redes de informação, elementos essenciais para maior proteção e segurança das transações e da
posse, sobretudo, constitui-se em outro fator de aceleração e mobilidade da acumulação.
Quanto à capacidade de transformar os ativos em bens fungíveis, compreende-se pelas
infinitas possibilidades do título imobiliário ser dividido, substituído, combinado, mobilizado,
utilizado para estimular acordos e adaptadas a qualquer circunstância econômica para produzir mais
valores, novos negócios, principalmente para especular títulos de qualquer tipo com o objetivo de
tirar proveito de determinada situação que envolva uma valorização.
Um levantamento na Região Metropolitana de Goiânia, revelou que em cinco municípios
dos treze pertencentes à Região existiam 430 mil lotes vazios, ou seja, o suficiente para abrigar
1.460.000 habitantes, em 2000, quase a população total da Região, 2.014.612, segundo a Contagem
2007 do IBGE. Daquele ano até o presente esse número certamente é muito maior. O processo de

84
Grupos sociais relacionas de acordo com a ocupação. Por exemplo: artesãos, eclesiásticos.
85
... a propriedade, que já tem seu núcleo, sua primeira forma, na família, em que a mulher e os filhos são escravos do
marido. A escravidão na família, embora ainda tosca e latente, é a primeira propriedade, que aqui, aliás, já
corresponde perfeitamente à definição dos economistas modernos, segundo a qual a propriedade é o poder de dispor
da força de trabalho. (MARX e ENGELS 1999, p. 46).
86
Admitia grupos sociais baseados em status jurídico próprio: oficiais, servos, artesãos, etc.
87
Total dos bens móveis e imóveis, créditos e investimentos.
88
Os bens fungíveis são aqueles que podem ser substituídos ou representados, geralmente por papel, títulos, para gerar
combinações, acordos e negócios com bancos e instituições diversas de pessoas físicas ou jurídicas.
Fórum Internacional do Meio Ambiente - A conferência da Terra 559

elaboração dos Planos Diretores dos municípios da Região Metropolitana levou, em 2007, à
aceleração da aprovação dos loteamentos.
Antes dessa “corrida” do setor imobiliário juntamente com seus representantes nas
Câmaras Municipais e na administração pública, a média de lotes vazios por município era um
pouco acima de 50%. O caso do município de Hidrolândia, que pertence à Região Metropolitana,
ilustra a gravidade da desorganização territorial, 82,8% dos lotes existentes na cidade são vazios.
Veja abaixo a ilustração.

Figura 1

Região Entorno de Goiânia Sa


.d
aA
re
Copacabana / 1977
563 lotes urb 1,8% ocup.
ia

Veneza /
1978
247 lotes
urb 0% o Garavelo Sul / 1979 / 1983
cup.
Grande Goiânia / 1978 6.486 lotes urb 2,7% ocup.
1903 lotes urb 0% ocup.
Sítios Lazer / 1978

Fonte 1: IBGE e DSG - Cartas Topográficas 1:100.000


Condomínio / 2004
213 lotes - 0% ocup.
239 Sítios - 0% ocup.
Condomínio - 2001 / 2003
Nova Fátima Jardim Paris / 1978 329 lotes - 19,8% ocup.

Adaptação: NUCADA, Miraci Kuramoto


563 lotes urb 1,8% ocup Mo. Feio
BR - 153

da Bocaina
Alto da Boa Vista / 1979
Sa. 827 lotes urb 1,8% ocup.
Condomínio / 2001
182 lotes - 13,7% ocup.
Condomínio / 2002 Condomínio / 2004
340 lotes - 0% ocup.
600 lotes - 0% ocup. GO
-2
HIDROLÂNDIA
Bo
19

nit
GO - 219
Sítios Lazer / 1979
o
de
234 lotes - 0% ocup
C
Condomínio - 1999 / 2001
im
85 lotes - 37% ocup. Village dos Ipês / 2004 a
aria 377 lotes urb. - 0% ocup.
S. M
Sa. Sa.
da s
Grim Sítios Lazer / 1979
pas
305 lotes - 18,7% ocup.
LEGENDA

Cidade de Hidrolândia
Aprovados depois de 1977 Lotes Ocupados = 2.993 = 17,2%
Lotes Vazios = 14.452 = 82,8%
Lotes urbanos = 14.844
Quantidade de lotes = 17.445 = 100,0%
Condomínio, e SL = 2.601 População Urbana = 9.615, IBGE 2007

A maioria dos municípios da Região não possui leis urbanísticas de parcelamento do solo e
de zoneamento. Os loteamentos são aprovados sem critérios, e assim, o solo exposto à erosão e à
espera de valorização e ocupação são palcos para a violência, as pragas urbanas e o retrato do
desserviço público.
Deve haver uma preocupação quanto às densidades inadequadas, tal medida irá se refletir
na qualidade de vida das mesmas. Exemplificando, Mascaro compara a cidade de Paris com 10
milhões de pessoas sobre uma área aproximadamente igual à de Porto Alegre com 3 milhões de
habitantes, o que permite relações da ordem de 3 : 1, ou seja: custo de infra-estrutura de 1 : 3; com
uma renda per capita na ordem de 10 : 1, a mesma infra-estrutura pesará 30 vezes menos para cada
parisiense do que para cada gaúcho, essa relação de maiores densidades e menores custos não é
infinita. Em determinada quantidade, a curva se inverte e sua definição gráfica torna-se parabólica.
Evidentemente, pelos custos de desgaste no sistema, as soluções envolvem técnicas
construtivas mais complexas e ainda a demanda de serviços adicionais. Os estudos apresentados são
Fórum Internacional do Meio Ambiente - A conferência da Terra 560

resultados de condições específicas e são tomados como indicativos, pois podem variar de acordo
com as mais diversas situações, como a tecnologia empregada e tipo de solo.

CONCLUSÃO
A questão da propriedade é central nas relações econômicas e sociais, e sua transformação
vem desde os tempos em que a sociedade era tribal. Weber (2001, p. 9) afirma que a ânsia pelo
lucro e o impulso para o consumo e a acumulação de riqueza, sempre existiu em todo tipo de gente
e de classe social de qualquer nação. Esta atitude mental cria o espírito do capitalismo e, por fim,
evolui para a ordem capitalista.
Esta atitude mental, muitas vezes é vista como avareza, outros a vêem como instinto de
aquisição, enquanto um terceiro acredita ser um fenômeno natural nas sociedades econômicas.
Weber (2001, p. 28) a classifica como vocação, que não ligada a necessidades físicas, faz parte da
ética social da cultura capitalista. Nem todos possuem essa vocação e, nesse caso, são obrigados a
adaptarem-se às regras do jogo, o que dificulta suas vidas, quando não os exclui.
As atitudes mentais modificaram-se ao longo do tempo, em parte como resultado de
evolução natural dos costumes e hábitos principalmente premidos pelas dificuldades nas relações
econômicas e no longo e árduo processo de educação. Weber (2001, p. 30-41) aponta duas atitudes
mentais distintas. A primeira seria a tradicionalista, considerada natural, nela o trabalho é um meio
para suprir as necessidades, é típica das sociedades pré-capitalistas, mas é um tipo que coexiste com
outro em qualquer lugar e época.
A segunda trata-se de uma evolução da vocação para o trabalho como um fim em si
mesmo, aplica a capacidade de dedicação ao trabalho, com o objetivo de crescer economicamente,
de inovar e racionalizar o espírito empreendedor. Esse tipo, quando surge, modifica todo o seu
entorno, seja por necessidade de sobrevivência dos outros ou por concorrência. Numa ação contínua
e dinâmica, ele impõe uma constante transformação nos negócios, nas empresas e nas pessoas. Essa
atitude mental é característica do capitalismo moderno, composta por um grupo de indivíduos que
vê a terra como elemento de infinitas possibilidades para gerar capital e, portanto, não pode
considerar o solo como um bem comum.
A pouca participação da sociedade civil na gestão urbana, na formulação e execução das
políticas urbanas enfraquece o Executivo e o Legislativo, que ficam reféns da pressão e dos
interesses de grupos. A população, praticamente mantém-se omissa, a manifestação pública fica
restrita às instituições não governamentais e à academia nas audiências públicas, que, devemos
reconhecer, não são planejadas para que haja maior participação popular.
Um dos requisitos para a produção do espaço urbano é a existência de demanda. Quando as
atividades rurais estão em declínio, ou proporcionando menor produtividade e renda do que a
lucratividade percebida com a transformação do solo em mercadoria. Singer (1989) aponta, ainda,
outra hipótese: a pressão exercida no meio rural produtivo pela demanda por causa do crescimento
populacional, nesse caso, o preço do solo seria ditado pela renda potencial do lugar. Agrega a
valorização que é movida pelo processo de ocupação aliada a mudanças na estrutura urbana, e à
expectativa de melhores condições de mercado, sujeitando-o a oscilações no preço e na demanda.
Isto alimenta a especulação imobiliária que cria novas situações, as quais geram novas pressões,
realimentando-a.
A situação aqui pesquisada guarda maior proximidade com o primeiro fator apontado por
Singer, a transformação do solo em mercadoria, proporcionando maior renda. Os promotores
imobiliários visam atender a demanda existente, principalmente em Goiânia e outros municípios da
Região Metropolitana de Goiânia, por lotes populares ou em condomínio fechado. Em síntese, visa
atrair à migração interna da RMG, cujo motor principal é a desigualdade urbana, social e econômica
na região, mediante a dinamização dos fluxos migratórios gerados por setores econômicos e
inclusive por políticas públicas interessadas na aglomeração ou na concentração espacial.
Verifica-se que a transformação do solo em mercadoria de consumo é a prática corrente,
não existe um pólo de serviço ou produção atrator de fluxo migratório e de desenvolvimento
econômico. Na região representa a horizontalidade, a finalidade imposta de fora e de cima. Ao
Fórum Internacional do Meio Ambiente - A conferência da Terra 561

facilitar os parcelamentos do solo gera uma aglomeração e contraditoriamente essa economia não
alavanca o crescimento econômico, conforme Diniz (1993) e de acordo com os dados aqui
apresentados, o incremento populacional é formado principalmente por pessoas que trabalham,
estudam e procuram o lazer noutro município.
A administração pública é co-responsável pela possível transformação do município em
cidade-dormitório e da desorganização territorial também, afinal é a prefeitura que libera e permite
os parcelamentos do solo, a expansão urbana. O planejamento do território e do desenvolvimento
econômico passa necessariamente pela modificação dos procedimentos e das condições ali
encontradas.

REFERÊNCIAS BIBLIOGRÁFICAS
BARBOSA, Altair Sales. Andarilhos da claridade: os primeiros habitantes do cerrado. Goiânia:
UCG, 2002.
BERMÚDEZ, Nury e METZEGER, Pascale. El médio ambiente urbano em Quito. Quito, Ecuador:
Dirección General de Planificación Y Institut Français de Recherche Scientifique pour le
Développement em Coopération (ORSTOM), 1996.
BROWN, Lester R. Eco-economia: construindo uma economia para a terra. Salvador: Uma, 2003.
DE SOTO, Hernando. O mistério do capital: por que o capitalismo dá certo nos países
desenvolvidos e fracassa no resto do mundo. Rio de Janeiro: Record, 2001.
DINIZ, Clélio Campolina. Desenvolvimento poligonal no Brasil: nem desconcentração nem
contínua polarização. Belo Horizonte: Nova Economia, n 1, v 3, set 1993.
ENGELS, Friedrich & MARX, Karl. A ideologia alemã: Feuerbach. São Paulo: Hucitec, 1999.
FARRET, Ricardo Libanez (org.) Paradigmas da estruturação do espaço residencial intra-urbano.
In: O espaço da cidade: contribuição à análise urbana. São Paulo: Projeto Editores Associados,
1985.
GOTTDIENER, Mark. A produção social do espaço urbano. São Paulo: EDUSP, 1997.
HOGAN, Daniel Joseph. Migração, ambiente e saúde nas cidades brasileiras. In: HOGAN, Daniel
Joseph & VIEIRA, Paulo Freire (orgs). Dilemas sócioambientais e desenvolvimento sustentável.
Campinas: Unicamp, 1995.
IBGE. Censo 2000. Brasil 2002. Rio de Janeiro: IBGE 2002.
MARX, Karl. Salário, preço e lucro. São Paulo: Editora Centauro. (s/d)
MASCARÓ, Juan. Loteamentos urbanos. Porto Alegre: L. Mascaro, 2003.
OLIVEIRA, Aluísio Pires de. Estatuto da cidade: Anotações à lei 10.257, de 10.07.2001. Curitiba:
Juruá, 2002,
SENADO FEDERAL. Agenda 21. Brasília: Secretaria Especial de Editoração e Publicações, 2001.
SEPLAN – SEPIN. Informações sócio-econômicas de Goiás e dos municípios.
SINGER, Paul. Economia política da urbanização. São Paulo: Ed. Brasiliense, 1985.
WEBER, Max. A ética protestante e o espírito do capitalismo. São Paulo: Pioneira – Thomson
Learning, 2001.
Fórum Internacional do Meio Ambiente - A conferência da Terra 562

A SUBMISSÃO DO DESENVOLVIMENTO MUNICIPAL PERANTE A SUPREMACIA


DO CRESCIMENTO METROPOLITANO: DIRETRIZES PARA A GESTÃO
SUSTENTÁVEL DE PIRAQUARA, REGIÃO METROPOLITANA DE CURITIBA

Letícia Peret Antunes Hardt


l.hardt@pucpr.br
Carlos Hardt
c.hardt@pucpr.br
Patrícia Costa Pellizzaro
patricia.pellizzaro@gmail.com
Programa de Pós-Graduação em Gestão Urbana (PPGTU). Pontifícia Universidade Católica do
Paraná (PUCPR)

RESUMO
Em muitos casos, o desenvolvimento municipal é submetido à agressividade do
crescimento metropolitano. Este fato também é observado no município de Piraquara, integrante da
região metropolitana de Curitiba, Paraná. As fortes distorções existentes entre as metas planejadas e
a situação real, especialmente na localidade do Guarituba, denotam a necessidade de mudanças
estruturais no processo de gestão regional para o enfrentamento dos desafios atuais e futuros do
desenvolvimento sustentável, especialmente em áreas de degradação ambiental e de exclusão social.
Palavras-chave: desenvolvimento municipal; crescimento metropolitano; gestão regional;
desenvolvimento sustentável.

ABSTRACT
In many cases, the municipal development is subjected to aggressive metropolitan growth.
This fact can also be observed in Piraquara, which is part of the metropolitan region of Curitiba,
Paraná. The strong disproportions that exist between the planned goals and the real situation,
especially at the Guarituba settlement, reveal the need for structural changes in the regional
management process to face the present and future challenges of sustainable development,
especially in those areas of environmental degradation and of social exclusion.
Keywords: municipal development; metropolitan growth; regional management; sustainable
development.

CONSIDERAÇÕES PRELIMINARES
Souza (2005) aponta a existência de duas correntes do pensamento acerca do
desenvolvimento. A primeira, onde são enquadrados os modelos da tradição clássica e neoclássica,
interpreta o crescimento como seu sinônimo, enquanto a segunda o considera apenas como uma das
suas condições indispensáveis. Nesta última, o crescimento é conceituado como simples variação
quantitativa do produto interno bruto (PIB), enquanto “desenvolvimento é caracterizado por
mudanças qualitativas no modo de vida das pessoas, nas instituições e nas estruturas produtivas”
(TRENTO, 2008, p.26).
Em um contexto amplo, a sustentabilidade é conceituada por Rodriguez (2001, p.59) como
a gestão e administração dos recursos e serviços e orientação das mudanças tecnológicas e
institucionais, “no sentido de assegurar e alcançar a contínua satisfação das necessidades humanas
para as gerações presentes e futuras, dentro dos limites da capacidade de sustentação dos sistemas
ambientais”. Ao considerar que a metrópole, além de assumir funções diversificadas e
especializadas, ainda exerce forte polarização sobre outros núcleos urbanos na sua área de
influência, Hardt (2006, p.148) afirma que a gestão do desenvolvimento metropolitano sustentável,
atuando na sucessão de estados de um sistema:
não pode prescindir de duas formas básicas de integração: unidimensional, pela
dependência das diversas etapas do processo entre si e das mesmas com os objetivos pretendidos,
Fórum Internacional do Meio Ambiente - A conferência da Terra 563

estabelecendo, também, o seu relacionamento com processos de maior abrangência; e


multidimensional, pelo caráter de inter e transdisciplinaridade dos procedimentos.
A região metropolitana de Curitiba (RMC) (Figura 1) é atualmente composta por 26
municípios, abrangendo 15.243 km² e abrigando mais de 2.800.000 habitantes (COMEC, 2008).
Situado no compartimento leste da RMC, que abriga os principais mananciais hídricos
metropolitanos, sob as coordenadas geográficas médias: 25º29’42” de Latitude Sul e 49º03’29” de
Longitude Oeste Greenwich e a uma altitude média: 897 m s.n.m. (SUDERHSA, 2000), o
município de Piraquara é subdividido em dois distritos – Sede e Guarituba, possuindo área
territorial de cerca de 228 km², que abriga uma população superior a 98.890 habitantes (IBGE,
2006). O Guarituba comporta cerca de 42.000 pessoas, quantidade superior ao total da população
urbana do município em 2000 (CONSILIU et al., 2005).

Figura 1 - Mapa de localização do município de Piraquara na região metropolitana de Curitiba –


Paraná. Fonte: Elaborada com base em COMEC et al. (2002).

A SUBMISSÃO MUNICIPAL PERANTE A SUPREMACIA METROPOLITANA


Como prenúncio da formação da área metropolitana, o parcelamento sistemático do solo
no município de Piraquara teve início por volta de 1940, sendo incrementado na década seguinte,
quando ocorreu a aprovação de inúmeros loteamentos, inclusive em áreas de solos hidromórficos e
de mananciais de abastecimento de água, em especial nas regiões do Guarituba e de Pinhais. Na
Fórum Internacional do Meio Ambiente - A conferência da Terra 564

década de 1970, período em que foi criada a região metropolitana de Curitiba, sob a égide da Lei
Complementar No 14, de 08 de junho de 1973, houve acentuado crescimento populacional nestas
mesmas regiões. Nos anos 1980, por sua vez, verificou-se a redução da população no distrito Sede,
com cessão de habitantes para outros locais do território municipal (CONSILIU et al., 2005).
Mesmo diante das sérias restrições legais à ocupação e com a expectativa de desaceleração
do processo de ocupação em função das necessidades impostas pelo avanço da metrópole, na
primeira metade da década de 1990, Piraquara apresentou a maior taxa anual de crescimento
populacional da RMC, associada à formação de significativos bolsões de pobreza em seu território.
Assim, o processo de degradação ambiental tornou-se crítico, gerando significativos riscos
para o abastecimento de água da RMC (HARDT, 2004). Cabe ressaltar que o município de
Piraquara apresenta cerca de 93% de sua área territorial constituída por bacias de mananciais
hídricos da região metropolitana (SUDERHSA, 2000).
Apesar das elevadas taxas de crescimento populacional, Piraquara comporta-se como
cidade dormitório, pois, em função da reduzida oferta local de empregos não atender à demanda,
significativa parcela da população tem necessidade de se deslocar até a capital para trabalhar, fato
que pode ser aliado à incipiente presença de indústrias no município, restrição imposta pelo
processo de ordenamento metropolitano para toda a região de mananciais, restando ao município, a
princípio, alternativas econômicas basicamente de subsistência.
A partir da instituição, em 1974, da Coordenação da Região Metropolitana de Curitiba
(Comec), órgão de planejamento regional, e da promulgação da Lei Federal Nº 6.766, de 19 de
dezembro de 1979, que dispõe sobre o parcelamento do solo urbano,são implementadas medidas
que propiciaram o impedimento do parcelamento do solo em locais impróprios e em condições
inadequadas, fato que, associado à ausência de infra-estrutura, impediu a implantação e ocupação de
muitos loteamentos até a década de 1980. A associação direta da ocupação urbana de Piraquara com
a expansão territorial de Curitiba, pólo metropolitano, e de seus municípios limítrofes, induziu, em
1979, a elaboração do Plano de Estruturação Municipal de Piraquara, tendo como produtos leis
municipais de perímetro urbano da sede e do distrito de Pinhais (hoje emancipado para a condição
de município), além dos zoneamentos de uso e ocupação do solo destas duas áreas (COMEC et al.,
2002).
Atualmente, depara-se com um município subdividido em duas grandes áreas com
características urbanas: uma polarizada pela sede urbana e outra pela região do Guarituba.
Tanto o extravasamento do pólo metropolitano, reflexo da própria instabilidade econômica
nacional, quanto a elevada taxa de crescimento oriunda de processos migratórios regionais,
trouxeram conseqüências profundas para a região do Guarituba. Apesar das suas restrições
ambientais, em que são reveladas condições marcantes de insalubridade, loteamentos aprovados na
década de 1950 foram rapidamente ocupados da partir de 1970 (Figura 2); além da ocupação das
áreas legalmente parceladas, também se depara com ocupações irregulares associadas a situações de
miséria e criminalidade.
Atualmente, o município de Piraquara é estruturado em unidades de planejamento de uso e
ocupação do solo, destacando-se unidades: de conservação (especialmente áreas de proteção
ambiental – APAs89), territoriais de planejamento (UTPs) – estas duas determinadas pelo
ordenamento metropolitano –, e urbanísticas do zoneamento de uso e ocupação do solo do distrito
sede de Piraquara, dentre outras (Figura 3).

89
A Área Especial de Interesse Turístico (AEIT) do Marumbi encontra-se em processo de consolidação sob a
categoria de área de proteção ambiental (APA).
Fórum Internacional do Meio Ambiente - A conferência da Terra 565

Figura 2 - Mapas de evolução da ocupação urbana no município de Piraquara – 1970, 1980, 1990 e
2000. Fonte: COMEC et al. (2002).

Figura 3 - Mapa de principais unidades de planejamento de uso e ocupação do solo no município de


Piraquara. Fonte: COMEC et al. (2002).
Fórum Internacional do Meio Ambiente - A conferência da Terra 566

Em conjunto com as APAs, as UTPs do Guarituba e do Itaqui – criadas com o objetivo de


promover o ordenamento do território de áreas de interesse para mananciais com pressão por
ocupação e que, por suas características, são definidas como regiões de transição entre malhas
urbanas consolidadas, localidades rurais e APAs (CONSILIU et al., 2005) – compõem o Sistema
Integrado de Gestão e Proteção dos Mananciais da Região Metropolitana de Curitiba
(SIGPROM/RMC), regido pela Lei Estadual Nº 12.248, de 31 de julho de 1998 (Lei de Proteção
aos Mananciais), cujas interferências sob os desígnios municipais são contundentes..

AS DIRETRIZES PARA A GESTÃO MUNICIPAL SUSTENTÁVEL


Com base no diagnóstico das condicionantes, deficiências e potencialidades dos sistemas
natural e antrópico do município (CONSILIU et al., 2005), a Figura 4 sintetiza as principais
diretrizes propostas para a gestão municipal sustentável de Piraquara.

Figura 4 - Diagrama das principais diretrizes propostas para a gestão sustentável do município de
Piraquara. Fonte: Elaborada a partir de Consiliu et al. (2005).

Como estrutura geral de ampla política de desenvolvimento sustentável – urbano e


municipal –, considerando-se as inúmeras restrições metropolitanas, as diretrizes são estruturadas
nos seguintes componentes:
1. gestão da sustentabilidade ambiental, cuja premissa básica consiste na conservação dos
recursos naturais, em especial ênfase à proteção dos recursos hídricos metropolitanos;
2. gestão da sustentabilidade territorial, cujas premissas básicas consistem na adequada
distribuição espacial de atividades e infra-estrutura para elevação dos níveis de auto-suficiência
do município e para sua adequada inserção regional;
Fórum Internacional do Meio Ambiente - A conferência da Terra 567

3. gestão da sustentabilidade social e comunitária, cujas premissas básicas consistem na


viabilização da inclusão social e na colaboração participativa de todos os atores em diversos
níveis dos processos decisórios;
4. gestão da sustentabilidade habitacional, cuja premissa básica consiste na garantia de
condições mínimas de habitabilidade para toda a população, com base na definição de áreas de
interesse social e na regularização fundiária;
5. gestão da sustentabilidade econômica, cujas premissas básicas consistem na melhoria de
renda e na criação de postos de trabalho, a partir de novas alternativas de atividades para o
município, envolvendo, inclusive, princípios de inovação tecnológica;
6. gestão da sustentabilidade administrativa, cuja premissa básica consiste na reestruturação de
procedimentos, normas e instrumentos legais para a garantia da modernização da governança
pública e para a operacionalização de adequado sistema de informações;
7. gestão da sustentabilidade de recursos humanos, cuja premissa básica consiste na definição
das reais necessidades da administração pública para o atendimento das demandas atuais e
futuras;
8. gestão da sustentabilidade tributária e financeira, cujas premissas básicas consistem na
maximização do uso dos recursos, na definição de fontes potenciais para financiamentos e
parcerias e na aplicação de novas normas legais para tributação.

Vale ressaltar que muitas dessas diretrizes são válidas para a maioria dos municípios
brasileiros integrantes de regiões metropolitanas. Neste âmbito, Hardt (2006) destaca a necessidade
precípua de viabilização de medidas de prevenção ao invés da tradicional adoção de ações de
correção, nem sempre possível ou completa, da degradação ambiental em áreas sob a influência
direta de metrópoles. A autora comenta, ainda, que, muitas vezes, a conservação do meio pode ser
muito menos onerosa que a sua restauração.

CONSIDERAÇÕES FINAIS
Sob a assertiva de que crescimento não é sinônimo de desenvolvimento, Sachs (1995)
afirma o equívoco da aceitação dos desproporcionais custos sociais e ecológicos de determinadas
formas de crescimento, associados a danos irreparáveis no processo de desenvolvimento.
A ocupação em Piraquara é caracterizada por inúmeros contrastes, os quais constituíam
alguns dos principais aspectos a serem fortemente controlados pelo planejamento metropolitano,
sendo inevitável, portanto, o reconhecimento de um cenário municipal onde prevalece a
deterioração de áreas ambientalmente frágeis, associada à precarização das condições de vida
humana.
O afastamento das classes menos abastadas, que tendem a se deslocar rumo à periferia
carente de infra-estrutura e serviços básicos – situação comum nas metrópoles brasileiras –, gera
relevantes problemas socioambientais em Piraquara, dentre os quais se destacam as diferentes
formas de degradação ambiental, com destaque para a poluição hídrica, e as conseqüências da
exclusão social, com ênfase na perda de identidade cultural e na ampliação da violência. Por sua
vez, as intenções do planejamento metropolitano passam desapercebidas pelas comunidades locais,
as quais estão voltadas prioritariamente à sua própria sobrevivência.
Portanto, um consciente processo de gestão municipal sustentável, que integra
planejamento estratégico e administração em um único corolário (CHIAVENATO, 2000), deve ser
pautado em princípios que suplantem antigos paradigmas, considerando as necessidades da
população municipal em nível de igualdade com as da sociedade metropolitana.

REFERÊNCIAS BIBLIOGRAFICAS
CHIAVENATO, I. Administração: teoria, processo e prática. 3.ed. São Paulo: Makron Books,
2000.
COMEC – Coordenação da Região Metropolitana de Curitiba. Região metropolitana de Curitiba.
Disponível em: <http://www.pr.gov.br/comec>. Acesso em: 25 fev. 2008.
Fórum Internacional do Meio Ambiente - A conferência da Terra 568

COMEC – Coordenação da Região Metropolitana de Curitiba; CONSÓRCIO


COBRAPE / SOGREAH – Companhia Brasileira de Projetos e Empreendimentos / Société
Grenobloise d´Etudes et d´Applications Hydrauliques. Plano de desenvolvimento integrado da
região metropolitana de Curitiba. Curitiba, 2002.
CONSILIU – Consultoria e Projetos; SANEPAR – Companhia de Saneamento do Paraná;
PARANÁSAN – Projeto de Saneamento Ambiental do Paraná; PMP – Prefeitura Municipal de
Piraquara. Plano diretor do município de Piraquara. Curitiba, 2005.
HARDT, C. Gestão metropolitana: conseqüências dos paradigmas das políticas públicas na
qualidade ambiental do Compartimento Leste da Região Metropolitana de Curitiba, 2004. 313f.
Tese (Doutorado em Meio Ambiente e Desenvolvimento) – Universidade Federal do Paraná,
Curitiba, 2004.
HARDT, L. P. A. Gestão do desenvolvimento metropolitano sustentável. In: SILVA, C. A. da;
FREIRE, D. G.; OLIVEIRA, F. J. da (Org.). Metrópole: governo, sociedade e território. 1.ed. Rio
de Janeiro: DP&A, 2006, p.137-149.
IBGE – Instituto Brasileiro de Geografia e Estatística. Cidades. Disponível em:
<http://www.ibge.gov.br/cidadesat/default.php>. Acesso em: 10 dez. 2006.
RODRIGUEZ, J. M. M. Desenvolvimento sustentável: níveis conceituais e modelos. In:
CAVALCANTI, A. P. B. (Org.) Desenvolvimento sustentável e planejamento: bases teóricas e
conceituais. Fortaleza: Universidade Federal do Ceará, 1997. p.51-63.
SACHS, I. Em busca de novas estratégias de desenvolvimento. Estudos Avançados, São Paulo, v.9,
n.25, 1995. Disponível em:<http://www.scielo.br/scielo.php?script=sci_ arttext&pid=S0103-
40141995000300004&lng=pt&nrm=iso>. Acesso em: 02 set. 2007.
SOUZA, N. de J. Desenvolvimento econômico. 5.ed., São Paulo: Atlas, 2005.
SUDERHSA – Superintendência de Desenvolvimento de Recursos Hídricos e Saneamento
Ambiental. Levantamento aerofotogramétrico e cartográfico da bacia hidrográfica do Alto Iguaçu.
Curitiba, 2000.
TRENTO, A. B. Estímulo ao empreendedorismo para o desenvolvimento econômico local: estudo
de caso sobre programas públicos em Curitiba, Paraná. 2008. 164f. Dissertação (Mestrado em
Gestão Urbana) – Pontifícia Universidade Católica do Paraná, Curitiba, 2008.
Fórum Internacional do Meio Ambiente - A conferência da Terra 569

CIDADES SUSTENTÁVEIS E PLANEJAMENTO AMBIENTAL

Carina Siqueira de Souza


Universidade Federal de Sergipe, PRODEMA/UFS, Av. Marechal Rondon, s/n, Jardim Rosa Elze,
Cidade Universitária Prof. “José Aloísio Campos”, Pólo de Gestão, CEP 49100-000, São Cristóvão,
Sergipe, Brasil. carina.ssouza@yahoo.com.br
Aline Borba dos Santos
Roberto Rodrigues de Souza

RESUMO
Nos últimos 50 anos, as cidades tiveram seu espaço altamente degradado em virtude das
grandes aglomerações sociais e do acúmulo de riquezas gerados pelo desenvolvimento. Todas as
discussões travadas entre intelectuais e a comunidade internacional, da década de 80 até a
atualidade, versaram sobre os principais desafios da humanidade em desenvolver economicamente e
respeitar o meio ambiente natural e construído, segundo o padrão de desenvolvimento baseado na
sustentabilidade ambiental. Assim, para se alcançar tal fim, uma das ferramentas que vem sendo
trabalhada é o planejamento ambiental das áreas urbanas, cujo objetivo é chegar a alternativas para
a solução de problemas locais das cidades e torná-las mais sustentáveis.
Palavras-chave: degradação ambiental, cidades, sustentabilidade, planejamento ambiental.

ABSTRACT
In the last 50 years, the cities had their space highly degraded due to the high settlements
and the social wealth accumulation generated by the development. All discussions between
intellectuals and the international community from 80’s to the present were about the main
challenges of humanity to develop in terms of economy respecting the natural and built
environments, according to the development pattern based on environmental sustainability. Thus, to
achieve this target, one of the tools who has been worked is the environmental planning of urban
areas whose objective is to find an alternative to solve local problems in the cities and make them
more sustainable.
Key-words: environmental degradation, urban areas, sustainable cities, environmental planning.

INTRODUÇÃO
No século XX, o sinônimo de desenvolvimento e de crescimento passou a ser as riquezas
geradas nas aglomerações urbanas. Segundo Philippi Jr. (2004), as áreas urbanas despontaram como
força motora da economia local e regional que acabaram suscitando o surgimento de uma crise da
civilização, questionando as práticas econômicas e tecnológicas dominantes.
O crescimento vivenciado pelas cidades culminou numa série de questões dentre elas a
ambiental que possuiu como foco o crescimento e ocupação indiscriminada do território com o
auxílio de tecnologias pouco adaptadas às condições locais e que não levavam em consideração o
meio ambiente, o qual, na maioria dos casos, serviu e ainda serve de depósito para os resíduos
gerados pelas atividades humanas.
Não se pode negar que o desenvolvimento dos últimos 50 anos trouxe benefícios para a
humanidade, mas o modo de vida consumida baseado no modelo econômico vigente vem
comprometendo o meio ambiente afeta a qualidade de vida da população. O preço do
desenvolvimento acelerado é alto em termos ambientais, ameaçando as gerações futuras em virtude
da possível escassez de recursos naturais (PHILIPPI JR. et al., 2004).
Para Leff (2002) o problema ambiental tem sido debatido a partir de diversas perspectivas
ideológicas que trilham por dois caminhos:
Por um lado, a crise ambiental é percebida como resultado da pressão exercida pelo
crescimento da população sobre os limites dos recursos do planeta. Por outro, é
interpretada como o efeito da acumulação de capital e da maximização da taxa de lucro a
curto prazo, que induzem a padrões tecnológicos de uso e ritmos de exploração da
Fórum Internacional do Meio Ambiente - A conferência da Terra 570

natureza, bem como formas de consumo, que vêm esgotando as reservas de recursos
naturais, degradando a fertilidade do solo e afetando as condições de regeneração dos
ecossistemas naturais.

Diante desse quadro, vários intelectuais e a comunidade internacional, no decorrer dos


últimos 20 anos, passaram a discutir sobre os principais desafios da humanidade diante da
necessidade de crescer e instalar suas comunidades, respeitando o meio ambiente natural e o
construído, segundo padrão de desenvolvimento baseado na sustentabilidade ambiental. Para se
alcançar esta finalidade, uma das principais ferramentas que vem sendo trabalhada é o planejamento
ambiental das áreas urbanas que tem por finalidade chegar a alternativas para a solução de
problemas locais das cidades que envolvem melhor aproveitamento dos recursos naturais.

A CRISE AMBIENTAL
Até o séc. XX, o homem via a natureza como um objeto a ser explorado. Não importavam
quais impactos ambientais determinadas atividades viessem causar, o que importava era o
crescimento econômico. Com a crise ambiental, iniciou-se a discussão sobre racionalidade e os
paradigmas teóricos que impulsionaram e legitimaram o crescimento econômico em detrimento ao
meio ambiente (LEFF, 2007).
Foi a visão mecanicista da razão que prevaleceu durante anos sobre os paradigmas
organicistas dos processos de vida. Essa realidade só veio mudar a partir da década de 60 com a
obra Primavera Silenciosa de Rachel Carson e com a celebração da Conferência das Nações Unidas
sobre Meio Ambiente Humano, em 1972, no qual se discutiu, pela primeira vez, as dependências
entre desenvolvimento e meio ambiente. Segundo Ignacy Sachs (2002), naquela época existiam
duas correntes que especulavam sobre o destino do meio ambiente: a dos que previa abundância e a
dos que previam catástrofes. Os primeiros utilizavam como argumento que não importavam as
conseqüências do crescimento acelerado, pois posteriormente as externalidades negativas seriam
neutralizadas através de tecnologias, por exemplo. Entretanto, os catastrofistas afirmavam que seria
necessário estagnar o crescimento demográfico e/ou de consumo, caso contrário a humanidade
desapareceria em virtude da exaustão dos recursos naturais ou pelos efeitos caóticos da poluição.
Para Ignacy Sachs (2002), ambas as posições mencionadas foram descartadas e surgiu uma
intermediária que aceitava o desenvolvimento, mas que deveria ser socialmente aceita e
implementada por métodos favoráveis ao meio ambiente, em vez de favorável à incorporação
predatória do capital da natureza. Surgiu, assim, a idéia do aproveitamento racional e
ecologicamente sustentável da natureza em benefício das populações locais, que as levassem a
incorporar a preocupação com a conservação da biodiversidade aos seus próprios interesses, como
um componente de estratégia de desenvolvimento.
A Conferência de 1972 marcou por ter assinalado os limites da racionalidade econômica e
os desafios da degradação ambiental ao projeto civilizatório da modernidade (LEFF, 2007). O
intuito foi mostrar que a degradação ambiental é um dos sintomas da crise ambiental e que vai se
intensificar caso não sejam criadas estratégias que tornem o desenvolvimento uma atividade
sustentável.
Em 1973, Maurice Strong propôs o termo “ecodesenvolvimento”. Esse termo na verdade
buscava uma “idéia-força” capaz de direcionar iniciativas de dinamização econômica que levassem
em consideração a degradação do meio ambiente e da marginalização social, cultural e política,
mais voltada para o meio rural dos países em desenvolvimento (VIOLA et al., 2001). Mas em 1974,
Ignacy Sachs reelaborou o conceito de ecodesenvolvimento, tornando-o um estilo de
desenvolvimento aplicável a projetos localizados nas zonas rurais e urbanas, tendo como princípios
básicos: a satisfação de necessidades básicas; a solidariedade com as gerações futuras; a promoção
da autonomia das populações envolvidas nos processos de desenvolvimento; preservação dos
recursos naturais e do meio ambiente em geral; elaboração de um sistema social, envolvendo
segurança, respeito a outras culturas; e programa de educação (CAMARGO, 2003).
Fórum Internacional do Meio Ambiente - A conferência da Terra 571

Em outro momento, Viola et al. (2001) afirmam que o conceito de ecodesenvolvimento foi
associado ao planejamento participativo de estratégias plurais de intervenção adaptadas a contextos
sócio-culturais e ambientais específicos. Neste contexto, o ecodesenvolvimento formulado por
Ignacy Sachs possuía como pressupostos cinco dimensões: sustentabilidade social, econômica,
ecológica, espacial e cultural, conforme observa Jacobi (1999). As cinco dimensões refletem uma
visão do desenvolvimento que pressupõe ações que destacam a necessidade de tornar compatíveis a
melhoria da qualidade de vida e a preservação ambiental, resgatando, como menciona Viola et al.
(2001), a dimensão socioambiental das teses avançadas do paradigma da dependência sobre a
necessidade do confronto político das desigualdades sociais nos e sobre os países em
desenvolvimento.
As discussões desenvolvidas na década de 70 introduziram o tema ambiental nos esquemas
tradicionais de desenvolvimento econômico de todo o mundo. A partir deles, avançou-se na adoção
de políticas ambientais mais estruturadas, baseadas em um conjunto de características não apenas
no ponto de vista da economia.
Na década de 80, apesar da intensificação da atuação dos movimentos ambientalistas, todas
as discussões travadas anteriormente perderam impulso na prática em virtude da centralidade da
crise econômica que assolava o período. No entanto, é neste ínterim que surge o termo
desenvolvimento sustentável na tentativa de estimular o desenvolvimento sem agredir o meio
ambiente.
O termo desenvolvimento sustentável, divulgado pela obra Nosso Futuro Comum,
demorou quase uma década para ser amplamente conhecido no meio político, só se consolidando
com a Conferência das Nações Unidas sobre o Meio ambiente e Desenvolvimento, a Rio-92
(CAMARGO, 2003).
A definição de desenvolvimento sustentável foi bastante explorada no relatório Nosso
Futuro Comum e transcrita por Camargo (2003) como:
Um processo de transformação no qual a exploração dos recursos, a direção dos
investimentos, a orientação do desenvolvimento tecnológico e a mudança institucional
se harmonizam e reforçam o potencial presente e futuro, a fim de atender às
necessidades e aspirações humanas.

Dahl (1997) apud Bellen (2007) critica a definição de desenvolvimento sustentável dada
pelo Relatório Brundtland, apontando que é muito geral e que não implica responsabilidade
específica a respeito das dimensões do desenvolvimento sustentável e nem em relação às gerações
futuras. Para este autor, o termo desenvolvimento sustentável é carregado de valores e um dos
problemas do seu conceito se refere ao fato de que a sociedade deve saber para onde quer ir para
que depois possa medir se esses objetivos ou direções estão sendo seguidos ou alcançados.
A intenção do desenvolvimento sustentável, segundo Rees (1988) apud Jacobi (1999), é a
possibilidade de garantir mudanças sócio-políticas que não comprometam os sistemas ecológicos e
sociais nos quais se sustentam as comunidades.
Para Barbieri (1997) apud Camargo (2003), desenvolvimento sustentável seria a nova
forma de perceber as soluções para os problemas globais, que não se reduzem apenas à degradação
ambiental, mas que incorporam dimensões sociais, políticas e culturais, como a pobreza e a
exclusão social, na medida que, como menciona Little (2003), procura responder a cinco requisitos:
(a) integração da conservação e do desenvolvimento, (b) satisfação das necessidades básicas
humanas, (c) alcance da equidade e justiça social, (d) provisão da autodeterminação social e da
diversidade cultural e (e) manutenção da integração ecológica.

A SUSTENTABILIDADE DAS CIDADES


Os assentamentos humanos eram no passado pequenos e sustentavelmente alicerçados nos
ecossistemas e ciclos materiais biogeoquímicos do planeta. Com o crescimento dos aglomerados
urbanos, houve um aumento desenfreado do consumo dos recursos naturais que se tornaram ainda
mais intensos após a Revolução Industrial. Por isso, o modelo atual de desenvolvimento industrial e
Fórum Internacional do Meio Ambiente - A conferência da Terra 572

demográfico, distancia-se da sustentabilidade, devendo buscar o amadurecimento dirigido para que


os princípios da sustentabilidade sejam absorvidos e implementados. O ideal é encontrar um
metabolismo sustentável para a sociedade industrial e reconstruí-la nessa conformidade.
Um aspecto observado na elaboração do diagnóstico presente no capítulo cidades
sustentáveis da Agenda 21 se refere a um evidente agravamento dos problemas urbanos e
ambientais das cidades, decorrentes de adensamentos desordenados, ausência de planejamento,
carência de recursos e serviços, obsolescência de infra-estrutura, padrões atrasados de gestão e
agressões ao ambiente (Bezerra & Fernandes, 2000)
Segundo Eriksson (1999), para funcionar de maneira sustentável, a sociedade global terá
que:
• Abandonar a utilização de fluxos materiais lineares e depender quase completamente de
fluxos de recursos renováveis para o grosso de seus fluxos materiais;
• Encaminhar-se para uma situação de recursos mais eqüitativa, tanto por razões éticas como
por razões de estabilidade social.

Trata-se de um desafio muito grande incorporar os fluxos materiais da


sociedade,principalmente urbana, aos ecociclos naturais. E as adaptações na indústria em virtude
das restrições de meio ambiente na indústria, indicam que existe um vasto espectro para
melhoramentos técnicos.
Para catalisar a sustentabilidade urbana, a Agenda 21 propõe o aperfeiçoamento das
políticas públicas já em curso no país, além de apontar novas estratégias e instrumentos que
assegurem a transição da situação atual das cidades (Bezerra & Fernandes, 2000).
Eriksson (1999) também destaca um princípio que relaciona riqueza com degradação
ambiental, trata-se do uso de recursos na sociedade ser eficiente e justo no que se refere à satisfação
das necessidades humanas. Ele explica que a distribuição desigual é ineficaz no que se refere aos
recursos. De acordo com a “lei” da utilidade marginal decrescente, os privilegiados obtêm
benefícios muito limitados de uma larga parte de sua utilização de recursos. Os carentes são
forçados a usar seus poucos recursos ineficazmente, já que não têm condições para investir em
tecnologia e equipamentos que poderiam ajudá-los a economizar estes recursos. Os ricos provocam
um impacto maior na sociedade global; porém, tanto o luxo quanto a pobreza são destrutivos para a
comunidade.
Segundo Bezerra & Fernandes (2000), a Agenda 21, no seu capítulo sobre
sustentabilidade, existe uma dificuldade de implementar as propostas de redução da degradação
ambiental com geração de renda, principalmente no âmbito urbano. O argumento que se utiliza é
que os projetos nem sempre tem a intencionalidade bem-sucedida ou bem compreendida pelos
moradores. São programas que exigem um período de amadurecimento e cuja legitimação é
bastante lenta por parte dos diversos estratos sociais. Foram propostas quatro estratégias para a
sustentabilidade urbana:
1. Aperfeiçoar a regulação do uso e da ocupação do solo urbano e promover o ordenamento do
território, contribuindo para a melhoria das condições de vida da população considerando a
promoção da equidade, a eficiência e a qualidade ambiental.
2. Promover o desenvolvimento institucional e o fortalecimento da capacidade de planejamento e de
gestão democrática da cidade, incorporando no processo a dimensão ambiental urbana e
assegurando a efetiva participação da sociedade.
3. Promover mudanças nos padrões de produção e de consumo da cidade.
4. Desenvolver e estimular a aplicação de instrumentos econômicos no gerenciamento dos recursos
naturais visando à sustentabilidade.

Enfim, pensar em desenvolvimento é algo muito recente e agregar sustentabilidade às


atividades urbanas é algo ainda mais difícil por se tratar de um gerenciamento cujo resultado é um
produto social. Para Coimbra (2002), existem alguns fatores que, além de tornar uma cidade
sustentável, aumentam seu potencial de sustentabilidade, gerando uma “causação circular
Fórum Internacional do Meio Ambiente - A conferência da Terra 573

cumulativa”, são eles: orçamento participativo, parcerias, e outros fatores como: planejamento
regional e microrregional, infra-estrutura urbana, desconcentração urbana, controle demográfico
para reduzir demandas de bens e serviços, capacitação gerencial e a consciência ética.
Para consolidar as quatro proposições mencionadas, foram traçadas algumas estratégias. A
primeira estratégia se refere à regulamentação do uso e da ocupação do solo urbano e do
ordenamento territorial. A segunda estratégia está voltada para o desenvolvimento institucional e
fortalecimento da capacidade de planejamento e de gestão ambiental urbana, através:
a) Do próprio planejamento e gestão, envolvendo a necessidade de planejamento e de políticas nas
várias escalas e adequados às características regionais, da rede urbana e locais, reforçando a
bacia hidrográfica como unidade de planejamento e identificando competências, assim como
necessidades de integração intergovernamental para fiscalização e controle ambiental.
b) Política habitacional que priorize aspectos de sustentabilidade ambiental
c) Saneamento ambiental, enfocando a necessidade de avanços no campo da regulamentação
garantindo flexibilidade nas formas de gestão pelos municípios, linhas de financiamento que
priorizem os agentes mais adequados aos objetivos de universalização do atendimento e de
qualidade ambiental.

PLANEJAMENTO AMBIENTA
Santos (2004) denomina planejamento como processo contínuo que envolve a coleta,
organização e análise sistematizada das informações, por meio de procedimentos e métodos, para
chegar a decisões ou a escolha acerca das melhores alternativas para aproveitamento de recursos
disponíveis. A finalidade do planejamento é orientar os instrumentos metodológicos,
administrativos, legislativos e de gestão para o desenvolvimento de atividades em determinados
espaços e locais.
Para planejar é necessário conhecer o espaço em todos os seus aspectos, trabalhando com
os diversos estratos que compõem o meio. No planejamento tradicional, trabalha-se com as
comunidades e sua população, o uso da terra, a economia e a infra-estrutura através de um processo
de metas, planos e regulamentos. No planejamento ambiental, que se trata de um tipo de
planejamento, o enfoque maior é no meio ambiente biofísico onde se encontram as pessoas e é feita
uma análise dos efeitos de atividades de desenvolvimento e de outros planejamentos.
O planejamento ambiental surgiu recentemente no Brasil, há aproximadamente três
décadas, e está relacionada à elevada degradação ambiental, à redução da qualidade de vida do
homem e à necessidade de mudar o tipo de desenvolvimento extremamente materialista para algo
voltado para o bem-estar humano. Por isso que o seu objetivo é solucionar os conflitos entre a
conservação ambiental e o planejamento tecnológico.
Foi a partir da década de 80 que foi lançado o ideário do desenvolvimento sustentável que
passou a integrar os princípios do planejamento. Neste período, muitos entenderam o planejamento
ambiental como uma forma de planejamento voltado à integração de informações, diagnósticos
ambientais, visualizar ações futuras e normatizar seu uso tendo como base a ética do
desenvolvimento. No entanto, a amplitude do planejamento ambiental extrapola a finalidade
mencionada, já que seus princípios são baseados na sustentabilidade e na multidisciplinariedade,
que exigem uma abordagem holística de análise e posterior aplicação.
Todo planejamento ambiental deve ser construído baseado na tríade meio ambiente-
homem- sociedade, entendendo os três como uma única unidade. O planejamento ambiental se
baseia no conhecimento da realidade local descrito num diagnóstico sobre todo o território, tendo
que destacar os aspectos físicos, biológicos e antrópicos.

ETAPAS DO PLANEJAMENTO AMBIENTAL PARA AS CIDADES


De forma simplificada, as etapas do planejamento ambiental são: definição dos objetivos,
diagnóstico, levantamento de alternativas e tomadas de decisão. Na prática, o esquema fica mais
complexo porque o planejamento é um processo contínuo no qual suas fases se encadeiam e se
realimentam por meio das informações obtidas a cada passo.
Fórum Internacional do Meio Ambiente - A conferência da Terra 574

Cada autor sugere um número de fases diferentes para o planejamento, mas o que será
destacado neste estudo é o esquema apresentado por Santos (2004) das Fases e Procedimentos
Metodológicos em Planejamento Ambiental, como mostra a figura 1. Para a autora, a primeira fase
consiste na definição de objetivos por parte do grupo de órgãos e instituições, corpo técnico-
científico e comunitário que estão participando da elaboração documento.

Figura 1: Fases e Procedimentos Metodológicos em Planejamento Ambiental. Fonte: Santos (2004)

Alcançado o consenso sobre as metas e políticas adotadas, apresentar-se-á a estrutura


organizacional do planejamento, ou seja, vão ser apresentadas as metodologias a serem trabalhadas,
o programa de trabalho, definição de datas, definição da área a ser trabalhada, mobilização de
Fórum Internacional do Meio Ambiente - A conferência da Terra 575

recursos. De posse da estrutura organizacional, a equipe multidisciplinar se direciona para o


levantamento dos dados e a composição do banco de dados que são a fonte para o diagnóstico
ambiental.
As fases de levantamento de dados e de diagnóstico são de suma importância porque
representam o caminho para compreender as potencialidades e as fragilidades da área de estudo, da
evolução histórica de ocupação e das pressões do homem sobre os sistemas naturais. Estas
informações fornecem subsídios para elaborar propostas de modelo de organização territorial junto
a soluções alternativas, para minimizar as falhas e pontos desfavoráveis do diagnóstico em função
do objetivo proposto. Na verdade, o desejável é elaborar um prognóstico no qual, além de
identificar várias alternativas, constroem-se possíveis cenários futuros através de modelagem e
simulação dos dados.
Todas essas informações são levadas aos tomadores de decisão que vão avaliar as
alternativas baseadas nos critérios de avaliações técnicas, jurídicas, administrativas e financeiras.
Escolhida a melhor alternativa, formula-se as diretrizes através dos mesmos instrumentos
mencionados, a exemplo de definição de normas para organização territorial, elaboração de planos e
programas, propostas de monitoramento e controle, proposição de subsídios ao gerenciamento e
elaboração de mecanismos de gestão.
As fases mencionadas podem ser aplicadas a todos os tipos de planejamento, inclusive o
planejamento ambiental de uma cidade. O que diferencia cada tipo de planejamento é objeto
espacial a ser trabalhado, o que a diferentes variáveis a serem trabalhadas. No caso da cidade, o
espaço a ser trabalhado é a zona urbana, os ecossistemas circunvizinhos e a bacia hidrográfica na
qual está inserida, que demanda uma equipe multidisciplinar com características distintas.

CONSIDERAÇÕES FINAIS
O ecossistema urbano sofre com uma série de problemas sócio-ambientais tais como
ocupação desordenada do solo, formação de dualidades sócio-econômicas, indústrias poluentes,
problemas de tratamento de água e lixo, problemas de esgoto sanitário e baixo nível de saúde e de
educação, fatores que distanciam a cidade do ideal de sustentabilidade. Para Almeida (2006) é
necessário rever de modo justo, criativo, responsável e eficiente a crise ambiental pela qual passam
os ecossistemas, uma ferramenta administrativa para se alcançar isso seria o planejamento.
A idéia de planejamento é ligar a racionalidade à ação, sendo que esta racionalidade deve
fazer uso da criatividade e de situações locais. O planejamento também deve ser interativo e
contínuo, pois não adianta fazer um estudo tão complexo, encontrar uma alternativa ambiental
compatível ao desenvolvimento econômico e não manter as diretrizes para tornar a cidade
sustentável funcionando. O processo do planejamento é cíclico e se realimenta constantemente,
gerando soluções e propostas um processo contínuo de tomada de decisões.
A maioria das cidades não tem sido contempladas com a elaboração de planejamentos
ambientais ou os planejamentos existem e não refletem a realidade do local e também não são
realimentados. Isso implica num aumento e na manutenção de um círculo vicioso de problemas
sócio-ambientais, que alimenta a crise ambiental.

REFERÊNCIAS BIBLIOGRÁFICAS
ALMEIDA, Josimar Ribeiro et al. Planejamento ambiental e gestão de território na formação de
políticas, planos e programas setoriais. In: _____. Política e planejamento ambiental. Rio de
Janeiro: Thex Editora, 2006.
BELLEN, Hans Michael van. Indicadores de sustentabilidade:uma análise comparativa. Rio de
janeiro: Editora FGV, 2007.
BEZERRA, Maria do Carmo de Lima, Fernandes, Marlene Allan (org.) Cidades Sustentáveis:
subsídios à elaboração da Agenda 21 brasileira. Brasília: Ministério do Meio Ambiente, Consórcio
Parceria 21 IBAMA-ISER-REDEH, 2000.
CAMARGO, Ana Luiza de Brasil. Desenvolvimento Sustentável: Dimensões e desafios. Campinas:
Papirus, 2003.
Fórum Internacional do Meio Ambiente - A conferência da Terra 576

COIMBRA, José de Ávila Aguiar. O outro lado do meio ambiente: uma incursão humanista na
questão ambiental. Campinas: Millennium, 2002.
ERIKSSON, Karl-Erik. Ciência para o desenvolvimento. In. Cavalcanti, Clóvis (org.) Meio
Ambiente, desenvolvimento sustentável e políticas públicas. 2ª. Ed. São Paulo: Cortez:
Recife:Fundação Joaquim Nabuco (1999).
JACOBI, Pedro. Meio ambiente urbano e sustentabilidade: alguns elementos para a reflexão. In.
Cavalcanti, Clóvis (org.) Meio Ambiente, desenvolvimento sustentável e políticas públicas. 2ª. Ed.
São Paulo: Cortez: Recife:Fundação Joaquim Nabuco (1999).
LEFF, Enrique. Epistemologia ambiental. Tradução de Sandra Valenzuela. Revisão técnica de
Paulo Freire Vieira. 3ª. ed. São Paulo: Cortez, 2002.
LEFF, Enrique. Globalização, ambiente e sustentabilidade do desenvolvimento. Saber ambiental:
Sustentalividade, racionalidade e poder. 5 ed. Petrópolis, 2007.
LITTLE, Paul E. (org.) Políticas Ambientais no Brasil: análises, instrumentos e experiências. São
Paulo: Petrópolis; Brasília, DF: IIEB, 2003.
PHILIPPI JR, Arlindo. ROMERO, Marcelo de Andrade; BRUNA, Gilda Collet. Curso de Gestão
Ambiental. São Paulo: Manole, 2004.
SACHS, Ignacy. Caminhos para o desenvolvimento sustentável. Organização: Paula Yone Stroh.
Rio de Janeiro: Garamonde, 2002.
SANTOS, Rozely Ferreira dos. Planejamento ambiental: teoria e prática. São Paulo: Oficina de
textos, 2004.
VIOLA, Eduardo J. et al. Meio Ambiente, Desenvolvimento e Cidadania: desafios para as Ciências
Sociais. 3ª. Ed. São Paulo: Cortez; Florianópolis: Universidade de Santa Catarina, 2001.
Fórum Internacional do Meio Ambiente - A conferência da Terra 577

INDICATIVOS METODOLÓGICOS PARA A PARTICIPAÇÃO SOCIAL NA


CONSTRUÇÃO DO PLANO DIRETOR MUNICIPAL

Karla Augusta SILVEIRA


Licenciada em Letras, Especialista em Consultoria Organizacional e aluna do PRODEMA/UFPE/Mestrado.
Universidade Federal de Pernambuco/Programa de Pós-graduação em Desenvolvimento e Meio Ambiente/Mestrado
(PRODEMA/UFPE); karla.augusta@redeambiental.org
André Paulo de BARROS
Biólogo, Especialista em Planejamento e Gestão Ambiental e aluno do PRODEMA/UFPE/Mestrado. Universidade
Federal de Pernambuco/Programa de Pós-graduação em Desenvolvimento e Meio Ambiente/Mestrado
(PRODEMA/UFPE)
Vitória Régia Fernandes GEHLEN
Dra. em Políticas Públicas e professora do Centro de Ciências Sociais Aplicadas e do PRODEMA/UFPE. Universidade
Federal de Pernambuco/Programa de Pós-graduação em Desenvolvimento e Meio Ambiente/Mestrado
(PRODEMA/UFPE)

RESUMO
Este trabalho apresenta bases e princípios para a construção coletiva do Plano Diretor
Municipal, e identifica seis indicativos metodológicos capazes de orientar a efetiva participação de
cidadãos na elaboração e consolidação de políticas públicas setoriais urbanas e ambientais.
Palavras-chaves: Indicativos metodológicos, Plano Diretor, participação social, políticas
ambientais-urbanas.

ABSTRACT
This work presents bases and principles for the collective construction of the Municipal
Managing Plan, and also identifies six methodological indexes to guide the effective participation of
citizens in the elaboration and consolidation of urban and environmental public politics.
Keywords: Methodological indexes, Managing Plan, popular participation, urban environmental
policies

INTRODUÇÃO
Desde 1988, a partir da Constituição da República Federativa do Brasil, em seu artigo 182,
cada cidade com mais de 20.000 habitantes é obrigada a ter um Plano Diretor aprovado pela
Câmara Municipal, que seja instrumento de política de desenvolvimento e de expansão urbana
(FRANCO, 1999).
Além do mais, cidades integrantes de regiões metropolitanas e aglomerações urbanas que
estão inseridas em áreas de especial interesse turístico e em áreas de influência de empreendimentos
ou atividades com significativo impacto ambiental de âmbito regional ou nacional também se
enquadram na obrigatoriedade de possuir Plano Diretor (BRAGA, 2006).
De acordo com o Estatuto da Cidade (BRASIL, 2001), o Plano Diretor é parte integrante
do processo de planejamento municipal, devendo o plano plurianual (PPA), as diretrizes
orçamentárias e o orçamento anual incorporar as diretrizes e as prioridades nele contidas (LITTLE,
2003).
Todos os cidadãos estão habilitados a participar do planejamento de sua cidade e podem
intervir na realidade de seu município. Entretanto, para que essa capacidade seja realmente
efetivada de forma participativa, os processos de elaboração dos planos e projetos devem prever
métodos e passos que todo cidadão compreenda com clareza (MINISTÉRIO DAS CIDADES,
2004).
Portanto, torna-se um grande desafio garantir e possibilitar que os diferentes segmentos da
sociedade participem das atividades de planejamento e gestão de políticas urbanas e territoriais do
município. Governo e sociedade civil devem estar motivados para uma atuação coletiva e
cooperada.
Com este trabalho, pretendemos apresentar procedimentos básicos para a efetiva
participação de cidadãos no processo de elaboração do Plano Diretor Municipal, um importante
Fórum Internacional do Meio Ambiente - A conferência da Terra 578

instrumento de política pública voltado para o desenvolvimento urbano na perspectiva do


desenvolvimento sustentável. Porém, antes disso, abordaremos alguns aspectos conceituais e
práticos que envolvem a problemática da sustentabilidade das cidades, entre eles as questões do
Plano Diretor como instrumento de política pública e da participação social como elemento
essencial para efetivação das políticas urbanas.

PLANO DIRETOR COMO INSTRUMENTO DE POLÍTICA AMBIENTAl-URBANA90


Para início da discussão, torna-se necessária a delimitação do tema através da conceituação
dos elementos que estão sendo abordados, contextualizando-os frente aos desafios que as cidades
brasileiras vêm enfrentando na aplicação de políticas setoriais urbanas, que visam garantir a
sustentabilidade socioambiental no ambiente da cidade.
Segundo Souza e Barros (2007), ‘políticas públicas’ são ações de iniciativa governamental
de interesse público, que devem ser construídas com e para a coletividade, cuja efetivação depende
de quatro fatores fundamentais, a saber: 1) base na legislação; 2) aparato institucional com recursos
e infra-estruturas suficientes; 3) planejamento (programas, planos, projetos e metas); e 4) controle
social (participação dos cidadãos através de instâncias colegiadas).
A consolidação desses fatores garante a efetividade das políticas públicas. Entretanto, a
eficácia das ações políticas na gestão do bem público depende da capacidade e da maturidade do
governo e da sociedade na apropriação e na utilização dos instrumentos operacionais disponíveis e
fundamentados em base legal.
Os instrumentos de políticas públicas para gestão socioambiental do espaço urbano são
diversos, assim como os desafios de garantir para todos os cidadãos um ambiente saudável e
propício para uma boa qualidade de vida e pleno desenvolvimento da função social da cidade. Esses
desafios, de certa forma, justificam a necessidade da Gestão Ambiental Urbana, que, por sua vez,
configura-se como atividades dedicadas ao gerenciamento de uma cidade na perspectiva da
melhoria e da conservação de sua qualidade ambiental.

DESAFIOS PARA GESTÃO AMBIENTAL URBANA


Franco (1999), analisando a formação e o metabolismo urbano, caracterizado pelo
crescimento rápido e desordenado, que faz com que o espaço ou ambiente urbano sofra constantes e
agressivas modificações em seus fluxos de energia e de materiais, descreveu os principais desafios
para a gestão ambiental urbana: 1) a expansão urbana; 2) o saneamento básico: água e esgoto; 3) o
saneamento básico: resíduos sólidos; 4) a poluição industrial; 5) ruídos e conflitos urbanos de
vizinhança; 6) áreas verdes: criação e manutenção; 7) comércio e prestação de serviços impactantes;
e 8) cidadania ambiental.
Esses desafios só poderão ser enfrentados a partir da formulação de uma agenda ambiental
para a cidade, que se torna uma boa oportunidade de reflexão sobre o modelo de gestão e estratégias
de controle e mitigação de impactos ambientais sobre os ambientes urbano e natural de entorno
(MAGLIO, 1999).
Tal modelo de gestão deverá sempre estar atrelado aos instrumentos de políticas públicas
disponíveis, sempre numa perspectiva de melhoria contínua, tendo em vista a dinamicidade dos
processos socioambientais inerentes do metabolismo urbano.
Com isso, podemos também evidenciar que na obtenção de um ambiente urbano
sustentável, torna-se cada vez mais imprescindível a incorporação das questões ambientais nas

90
O texto correspondente a esta seção é oriundo de adaptações de outro artigo publicado pelos autores na 3ª Jornada
Internacional de Políticas Públicas realizada em 2007 na Universidade Federal do Maranhão: BARROS, André Paulo
de; SILVEIRA, Karla Augusta; GEHLEN, Vitória R. F.. Instrumentos de políticas públicas para gestão ambiental
urbana. In: JORNADA INTERNACIONAL DE POLÍTICAS PÚBLICAS, 3, 2007, São Luis, MA: Anais... São Luis,
MA: 2007.
Fórum Internacional do Meio Ambiente - A conferência da Terra 579

políticas setoriais urbanas (habitação, abastecimento, saneamento e ordenação do espaço), através


da observação de critérios ambientais que visem preservar recursos estratégicos, como água, solo,
ar, cobertura vegetal e biodiversidade, para proteção da saúde humana (AGENDA 21 DO CABO
DE SANTO AGOSTINHO, 2004).
Ao notarmos que a incorporação das questões ambientais é algo essencial na gestão da
cidade, fica evidente que a gestão do ambiente urbano não poderá ser praticada sem a apropriação e
utilização de instrumentos de políticas públicas consagrados legalmente na gestão ambiental
brasileira. Compreendendo essa necessidade, este trabalho pretende ordenar tais instrumentos em
uma tipologia básica capaz de orientar a aplicação deles dentro de uma agenda socioambiental, que
tem por finalidade a efetivação eficaz das políticas públicas, pelas quais todos têm direitos e
deveres.

INSTRUMENTOS DE POLÍTICAS PÚBLICAS AMBIENTAIS APLICÁVEIS À GESTÃO DO


AMBIENTE URBANO
Segundo Braga (2006), podemos agrupar os instrumentos de políticas públicas ambientais
em três categorias, conforme seus princípios preponderantes de utilização: 1) instrumentos de
ordenamento territorial; 2) instrumentos de comando e controle; 3) instrumentos de tomada de
decisão. O quadro 01 apresenta os instrumentos agrupados por tipologia seguindo esta lógica, e que
são possivelmente aplicáveis na gestão ambiental urbana.

Quadro 01 - Instrumentos de políticas públicas ambientais com potencialidade de aplicação na


gestão ambiental urbana.
Agrupamento por tipologia Instrumentos
Plano Diretor
De Ordenamento Territorial Zoneamento Ambiental
Áreas Legalmente Protegidas
Licenciamento ambiental
De Comando e Controle Fiscalização Ambiental
Compensação ambiental
Monitoramento ambiental
Sistema de informações
De Tomada de Decisão
Educação ambiental
Instâncias de Decisão Colegiada

Segundo Souza e Barros (2007) todos os instrumentos apresentados acima têm sua
fundamentação na legislação ambiental brasileira, cujos principais referenciais são: 1) Código das
Águas (Decreto n° 24.643/1934); 2) Código Florestal (Lei n° 4.771/1965); 3) Política Nacional de
Meio Ambiente (Lei n° 6.938/1981); 4) Constituição Federal (1988); 5) Política Nacional de
Recursos Hídricos (Lei n°9.433/1997); 6) Lei de Crimes Ambientais (Lei n° 9.605/1998); 7)
Política Nacional de Educação Ambiental (Lei n° 9.795/1999); 8) Lei do Sistema Nacional de
Unidades de Conservação – SNUC (Lei n° 9.985/2000); 9) Estatuto das Cidades (Lei n°
10.257/2001).

RELAÇÃO DOS INSTRUMENTOS DE POLÍTICAS PÚBLICAS DA GESTÃO AMBIENTAL


COM OS PRINCIPAIS DESAFIOS DA SUSTENTABILIDADE DAS CIDADES
Tendo exposto os principais instrumentos, faz-se necessário relacioná-los aos principais
desafios da sustentabilidade das cidades, aqueles apresentados por Franco (1999) na seção 2.1 deste
trabalho. Resolvemos apresentar a relação dos instrumentos com os desafios da sustentabilidade das
cidades através de uma matriz, para efeitos didáticos e de síntese na exposição das idéias (quadro
2).
Fórum Internacional do Meio Ambiente - A conferência da Terra 580

Quadro 2 - Relação dos instrumentos de políticas públicas ambientais com os desafios da


sustentabilidade das cidades.
Instrumentos de Políticas Públicas
Desafios da Sustentabilidade Ordenamento Comando e
Tomada de Decisão
das Cidades Territorial Controle
PD ZA ALP LA FA CA MA SIA EA IDC
Expansão Urbana X X X
Água e Esgoto X X X X X
Resíduos Sólidos X X X X X X X
Poluição Ambiental X X X X
Ruídos e Conflitos Urbanos de
X X X X
Vizinhança
Áreas Verdes: Criação e
X X X X X X X
Manutenção
Comércio e Prestação de
X X X X
Serviços Impactantes
Cidadania Ambiental X X X X X
Legenda: PD: Plano Diretor; ZA: Zoneamento Ambiental; ALP: Áreas Legalmente Protegidas; LA:
Licenciamento Ambiental; FA: Fiscalização Ambiental; CA: Compensação Ambiental; MA:
Monitoramento Ambiental; SIA: Sistema de Informações Ambientais; EA: Educação Ambiental;
IDC: Instâncias de Decisão Colegiada.

Através da matriz é possível notar que o instrumento mais preponderante frente aos
desafios da sustentabilidade das cidades é o Plano Diretor Municipal, pois se consagra na legislação
ambiental brasileira como um instrumento que orienta o desenvolvimento, o crescimento
econômico e a justiça social em condições ecologicamente equilibradas na gestão da cidade e do
seu entorno rural (BRAGA, 2006).

PARTICIPAÇÃO SOCIAL E O PLANO DIRETOR MUNICIPAL


Demo (1999) realça o caráter de conquista dos fenômenos participativos e sua tessitura
emancipatória, onde o lugar da participação na política social encontra-se no combate à pobreza
política. O autor apresenta os três eixos da política social: a face socioeconômica, o eixo assistencial
e o eixo político. Demonstra os principais canais de participação: organização da sociedade civil,
planejamento participativo, educação como formação à cidadania, cultura como processo de
identificação comunitária e processo de conquista de direitos. Para Demo os objetivos da
participação devem ser fundamentados na autopromoção, na realização da cidadania, na
implementação de regras democráticas de jogo, no controle do poder, no controle da burocracia, na
negociação e na cultura democrática. O lugar da sociedade civil e seu papel garantem a qualidade
do Estado.
Silva (1996) observa que na ação de cada individuo, seja do parlamento, dos órgãos
públicos, das organizações não governamentais ou da sociedade de um modo geral, a presença da
ação do cidadão enquanto um elemento propulsor da preservação ambiental deixa muito a desejar,
no sentido de que os indivíduos não assumem uma prática ambiental saudável. Entretanto, muitas
coisas também poderiam ser feitas, e que não são, em função de uma prática institucional.
Ainda segundo a autora, juntar a sensibilização das pessoas para o tema, à questão de
resistência ou da denúncia dos problemas com a efetivação de propostas, torna-se um desafio muito
grande que deverá sair do campo da retórica e transformar em políticas públicas as experiências que
já vêm sendo concebidas no conjunto da sociedade brasileira.
Foladori (2005) destaca a participação social como um indicador de liberdades
democráticas, de sustentabilidade, de equidade nas decisões e também um elemento decisivo na
potencialização de esforços produtivos.
Fórum Internacional do Meio Ambiente - A conferência da Terra 581

Nesse sentido, Leff (2002) também traz sua contribuição ao considerar a sustentabilidade
como um projeto social e de atuação política que aponta para o ordenamento ecológico. Projeto
este, capaz de oferecer novos princípios aos processos de democratização da sociedade que induzem
à participação direta das comunidades na apropriação e transformação de seus recursos ambientais.
Sabe-se que o conceito de participação social foi mudando ao longo do tempo, desde uma
participação simplesmente informativa até o que hoje em dia se conhece por “empoderamento”, que
supõem que os participantes dos projetos de desenvolvimento discutam até as próprias diretrizes
estratégicas (FOLADORI, 2005). O quadro abaixo, sintetiza a evolução do conceito de participação.

Quadro 03 - Tipologia e evolução do conceito de participação.


Tipologia Características
Representantes não eleitos e sem poder. Recebem informações de
Participação passiva mudanças sem poder de decisão. Contribuem eventualmente com recursos (materiais
e com o trabalho) sem nova aprendizagem.
Agências externas exigem participação para reduzir custos ou com
Participação funcional outros objetivos. Podem eventualmente participar em pequenas decisões, uma vez
que as principais foram definidas.
Participação conjunta em análises e desenvolvimento de projetos.
Fortalecimento de instituições locais. Metodologias interdisciplinares multi-
Participação interativa propositais. Na medida em que os grupos tem controle sobre as decisões locais, e
determinam como serão usados os recursos, tem interesses no mantimento das
estruturas ou práticas.
Participação para mudar sistemas com independência das instituições
externas. Estabelecem contatos com instituições externas para assessorias técnicas e
Empoderamento para própria de recursos, não obstante, conservam o controle sobre como usar tais recursos. A
mobilização auto-mobilização pode se expandir sem os governos e as ONGs oferecem suporte de
acordo com suas capacidades. Essas mobilizações auto-iniciadas podem ou não
questionar a distribuição de riqueza e do poder.

Fonte: FOLADORI, 2005, p. 73.

O Plano Diretor deve ser elaborado e implementado com a participação efetiva de todos os
cidadãos. Por competência administrativa, o processo deve ser conduzido pelo poder Executivo,
articulado com representantes do poder Legislativo e da sociedade civil.
Todas as etapas do Plano Diretor devem ser conduzidas, elaboradas e acompanhadas pelas
equipes técnicas da Prefeitura e por moradores do município. O Ministério das Cidades recomenda
que representantes do poder Legislativo participem desde o início do processo de elaboração do
Plano Diretor, evitando alterações substanciais, radicalmente distintas da proposta construída pelo
processo participativo (MINISTÉRIO DAS CIDADES, 2004).
Para participação efetiva da sociedade na construção do Plano Diretor, dois princípios
devem ser aplicados: 1) O estabelecimento de uma metodologia de construção do Plano Diretor
pactuada com representantes da sociedade civil e poder público local com definição das principais
áreas temáticas do Plano. 2) Debate das áreas temáticas definidas, realizado por regiões político-
administrativas ou regionais, estabelecendo assim uma consulta popular sistemática, levantando
objetivos, metas e estratégias para o Plano Diretor.
Em muitos casos, antes mesmo de se ter o Plano Diretor, os municípios podem já dispor de
instrumentos de planejamento urbano-ambiental construídos de forma participativa com a
população, como a Agenda 21 local, Proposições de Conferências Municipais, ou até mesmo
documentos técnico-diretivos, como Lei de Uso e Ocupação do Solo e Zoneamento Ecológico-
Econômico.
Entretanto, as diretrizes extraídas de documentos anteriores são válidas no bojo da
discussão de temas prioritários, mas não se deve excluir a discussão e a elaboração coletivas dos
temas específicos definidos para o Plano Diretor. Portanto, a participação da sociedade civil não
deve limitar-se apenas à apresentação do Plano Diretor em audiências públicas, pois a realização de
oficinas populares por regiões político-administrativas ou regionais municipais constitui-se um forte
instrumento de mobilização social e de divulgação das propostas construídas coletivamente e
Fórum Internacional do Meio Ambiente - A conferência da Terra 582

apropriadas pelo povo. A participação da população na construção do Plano Diretor é um direito


garantido pelo Estatuto das Cidades (SANTORO, 2005).

PROCEDIMENTOS BÁSICOS PARA GARANTIR UMA PARTICIPAÇÃO SOCIAL NA


ELABORAÇÃO DO PLANO DIRETOR MUNICIPAL
Enfim, para a construção do Plano Diretor Municipal, o trabalho a ser realizado deve
envolver Prefeitura, entidades da sociedade civil, empresas, Ministério Público e poder Legislativo,
além de apresentar os seguintes produtos:
Institucionalização e Consolidação do Grupo Gestor (governo + sociedade) através de uma
oficina de trabalho para levantamento de temas prioritários do Plano Diretor.
Elaboração de uma Agenda de Mobilização Social.
Nomeação e descrição das atribuições do Grupo Gestor através de Decreto Municipal para
dar publicidade oficial ao processo de participação social.
Realização de Oficinas Regionais ou setorizadas – “As Oficinas do Futuro” para discussão
dos temas prioritários do Plano Diretor definindo se possível, objetivos, metas e estratégias para o
Plano.
Sistematização da consulta e do debate popular numa Carta de Recomendações para o
Plano Diretor (Carta: A Cidade que Queremos);
Publicação da Carta de Recomendações num fórum específico ou em audiência pública
popular.
Esses são os indicativos metodológicos capazes de contribuir para uma efetiva participação
da sociedade em todo o processo, da concepção à implementação.

CONSIDERAÇÕES FINAIS
Deve ser utilizada uma metodologia de trabalho baseada no princípio de construção
coletiva de conhecimentos, que implica a co-responsabilidade e a participação de todos, com o
emprego de instrumentos adequados de diagnósticos participativos e organizacionais.
Com a Carta de Recomendação nas mãos, os técnicos da Prefeitura terão subsídios
consolidados e legitimados pela sociedade civil para a elaboração do Plano Diretor a ser
encaminhado para Audiências Públicas formais e aprovação da Câmara Municipal de Vereadores,
além de ter os segmentos sociais bem informados de todo o processo de construção do Plano
Diretor.

REFERÊNCIAS BIBLIOGRAFICAS
AGENDA 21 DO CABO DE SANTO AGOSTINHO. 2ª edição. Cabo de Santo Agostinho, PE:
Secretaria de Planejamento e Meio Ambiente do Cabo de Santo Agostinho, 2004. p. 24, 25.
BRAGA, R. A. P. Instrumentos de políticas públicas para gestão ambiental de bacias
hidrográficas. Recife, PE: Universidade Federal de Pernambuco: Curso de Pós-graduação em
Engenharia Civil, 2006, 38 p. (apostila de curso).
BRASIL. Constituição da República Federativa do Brasil. Brasília: Senado Federal, 1988.
BRASIL. Lei n°10.257 de julho de 2001. Estabelece diretrizes gerais da política urbana e institui o
Estatuto da Cidade.
DEMO, Pedro. Participação é conquista: noções de política social participativa. 5 ed. São Paulo:
Cortez, 1999.
FOLADORI, Guillermo. Por una sustentabilidad alternativa. Montevideo: Rel-UITA, 2005, p. 73.
FRANCO, Messias Roberto. Principais problemas ambientais municipais e perspectivas de solução.
In: PHILLIPPI JR. Arlindo et al. (editores). Municípios e meio ambiente: perspectiva para a
municipalização da gestão ambiental no Brasil. São Paulo: Associação Nacional de Municípios e
Meio Ambiente, 1999. p 19-31.
LEFF, Enrique. Saber ambiental: sustentabilidade, racionalidade, complexidade, poder. 2. ed. Rio
de Janeiro: Vozes, 2002.
Fórum Internacional do Meio Ambiente - A conferência da Terra 583

LITTLE, Paul E. (org). Políticas ambientais no Brasil: análises, instrumentos e experiências. São
Paulo: Peirópoles; Brasília, DF: IIEB, 2003.
MAGLIO, Ivan. Cidades sustentáveis: prevenção, controle e mitigação de impactos ambientais em
áreas urbanas. In: PHILLIPPI JR. Arlindo et al. (editores). Municípios e meio ambiente: perspectiva
para a municipalização da gestão ambiental no Brasil. São Paulo: Associação Nacional de
Municípios e Meio Ambiente, 1999. p 80-85.
MINISTÉRIO DAS CIDADES. Plano diretor participativo: guia para a elaboração pelos
municípios e cidadãos. Brasília, DF: Ministério das Cidades, 2004.
SANTORO, Paula Freire, et al. Plano diretor: participar é um direito. São Paulo: Editora Instituto
Pólis, 2005.
SILVA, Marina. Meio ambiente e cidadania. Brasília: IBAMA, 1996.
SOUZA, T. S.; BARROS, A. P. Meio ambiente e políticas públicas. In: REDE DE DEFESA
AMBIENTAL DO CABO DE SANTO AGOSTINHO. Carteira de projetos: planos de ação
comunitários de meio ambiente/Projeto Nucodema. Cabo de Santo Agostinho, PE: Rede de Defesa
Ambiental do Cabo de Santo Agostinho, 2007, p. 16.
Fórum Internacional do Meio Ambiente - A conferência da Terra 584

PRINCIPAIS DESAFIOS PARA A SUSTENTABILIDADE DAS CIDADES

Karla Augusta Silveira


Licenciada em Letras, Especialista em Consultoria Organizacional e aluna do PRODEMA/UFPE/Mestrado.
Universidade Federal de Pernambuco/Programa de Pós-graduação em Desenvolvimento e Meio Ambiente/Mestrado
(PRODEMA/UFPE); karla.augusta@redeambiental.org
André Paulo de Barros
Biólogo, Especialista em Planejamento e Gestão Ambiental e aluno do PRODEMA/UFPE/Mestrado.
Vanice Selva
Dra. em Geografia. Professora e vice-coordenadora do PRODEMA/UFPE.

RESUMO
A busca da sustentabilidade ambiental nos centros urbanos tornou-se um dos maiores
desafios ambientais do século XXI. Diante do quadro de problemas ambientais pressionados pelo
fenômeno urbano, desafios surgem para o ser humano em tornar o seu “habitat” um ambiente bom
de se viver. Este trabalho apresenta de forma sucinta cinco desafios para se instalar um quadro de
sustentabilidade nas cidades: investir na habitação no enfoque da habitabilidade; garantir o
abastecimento de água de forma sustentável; promover o saneamento ambiental; implantar a gestão
e o ordenamento do espaço; e utilizar a educação ambiental como instrumento de gestão para a
sustentabilidade. Diante dos desafios expostos, deve-se trabalhar a gestão ambiental urbana de
forma integrada e holística, observando todos os aspectos das políticas setoriais urbanas do ponto de
vista ecológico e humanista, através da adoção de critérios ambientais que visem preservar recursos
naturais (água, solo, ar, cobertura vegetal e biodiversidade) para proteção da saúde humana e
qualidade de vida da população.
Palavras-chaves: Cidades sustentáveis, gestão ambiental-urbana.

ABSTRACT
The search for environmental sustainability in urban areas has become one of the greatest
environmental challenges of the twenty-first century. Because of the environmental problems
caused by urban phenomenon, challenges arise for humans to make their "habitat" a good place to
live in. This paper presents briefly four challenges to guarantee sustainability in cities: emphasize in
housing with the focus of living; ensure the supply of water in a sustainable way; provide
environmental sanitation; seriously consider spatial management and planning; and use
environmental education as a management tool for sustainability. Facing the challenges exposed, it
should be working urban environmental management in an integrated and holistic manner,
observing all aspects of urban policies from the ecological and humanist point of view, and also
adopting environmental criteria which aim at preserving natural resources (water, soil, air,
vegetation and biodiversity) for protecting human health and population’s quality of life.
Keywords: sustainable cities, urban environmental management.

INTRODUÇÃO
Diante das diferenças econômicas e sociais verificadas em diversas nações, constata-se que
o crescimento econômico não expressa o bem-estar populacional e o desenvolvimento social. Surge
então um novo paradigma para se debater em nível mundial a questão do desenvolvimento que se
concretizaria não só nos aspectos econômicos, mas também nos aspectos sociais.
O paradigma do desenvolvimento sustentável surge no cenário internacional como
resultado de diversos relatórios produzidos pelo Programa das Nações Unidas para o
Desenvolvimento (PNUD) – Os Relatórios de Desenvolvimento Humano (RDH). Os RDHs
utilizam sobremaneira o Índice de Desenvolvimento Humano (IDH) como principal “indicador”
para se aferir o progresso humano em nível mundial, considerando aspectos da qualidade de vida
além dos econômicos. Apesar das diversas críticas relevantes relacionadas à aplicação do IDH, ele
se constitui ainda um indicador importante para se analisar a relação entre crescimento econômico e
desenvolvimento humano (VEIGA, 2005).
Fórum Internacional do Meio Ambiente - A conferência da Terra 585

Os estudos abordados nos RDHs têm demonstrado que a elevada renda per capita não se
traduz necessariamente em qualidade de vida, o que leva o novo paradigma, o paradigma do
desenvolvimento sustentável, a desconsiderar o crescimento econômico como a principal opção
para o progresso de uma nação (DIAS, 2002; VEIGA, 2005).
O paradigma do desenvolvimento sustentável vem atestar que o crescimento econômico
sem desenvolvimento humano não gera o progresso. O desenvolvimento sustentável requer
crescimento econômico com justa e eqüitativa distribuição de seus benefícios a todos os cidadãos.
Entretanto, o IDH não se constitui um parâmetro suficiente para caracterizar o desenvolvimento
sustentável. Na Declaração do Rio sobre Meio Ambiente e Desenvolvimento produzida durante a
Conferência das Nações Unidas sobre Meio Ambiente e Desenvolvimento no Rio de Janeiro (1992),
estão expressos direitos e responsabilidades, princípios básicos para o desenvolvimento sustentável.
Pretende-se com o desenvolvimento sustentável, diminuir ou erradicar as conseqüências
econômicas, ambientais, sociais e políticas que o desenvolvimento em bases capitalistas causou ao
longo de décadas (DIAS, 2002).
Objetiva-se ainda com o desenvolvimento sustentável, reduzir a exclusão social, expressa
pela pobreza de grande parte da população mundial. Nesse sentido, a pobreza se caracteriza pela
não vivência dos direitos humanos, pelo não exercício da cidadania, por carências nas áreas da
saúde, educação, moradia, saneamento básico e segurança pública, pela falta de empregos e
dificuldades de acesso à vida social. Pretende-se também mediante procedimentos e políticas
transformar o quadro sócio-político negativo com ações que viabilizem o acesso das pessoas aos
serviços básicos, ao direito à moradia, e ao exercício da cidadania com participação dos indivíduos
na gestão pública. A participação dos cidadãos em prol do desenvolvimento com bases sustentáveis
se dá pela práxis democrática. Portanto, o desenvolvimento sustentável pressupõe mudanças de
parâmetros técnicos, de conceitos filosóficos e de ações político-governamentais.
A Agenda 21 promulgada na Conferência da ONU sobre meio ambiente e
desenvolvimento relaciona atividades, programas, objetivos e estratégias em diversos campos de
atuação a serem realizados em níveis nacional, regional e local em prol do desenvolvimento
sustentável. Trata-se de um plano de ação amplo e complexo onde seus temas e sub-temas se
integram servindo de guia para todos os setores da sociedade. Este documento reconhece que o
desenvolvimento econômico não pode ser vistos separadamente do desenvolvimento social e
ambiental (DIAS, 2002).
O desenvolvimento sustentável enquanto novo paradigma de desenvolvimento econômico
requer cooperação entre Estados, intercâmbio de informações e conhecimentos científico-
tecnológicos e mudanças significativas dos rumos da economia na era da globalização e da
civilização como um todo. Entretanto, na totalidade dos encontros e discussões sobre o tema, não se
produziu qualquer comprometimento claro ou tomada de atitude que procure um novo modo de
produção, novos valores sociais, muito menos efetiva transformação nas relações de poder
existentes em sociedade, entre Estados. De fato, sob o ponto de vista formal, o paradigma do
desenvolvimento sustentável se mostra coerente e articulado às necessidades presentes de proteção
ambiental e preservação dos recursos naturais. O que resta agora é observar como Estados e
organizações internacionais concretizarão este paradigma.
Diante dos valores e objetivos inclusos na expressão desenvolvimento sustentável, vem a
questão de como transpor este paradigma para o seio das cidades. Seria possível compor um modelo
de desenvolvimento sustentável nas áreas urbanas? Não existe um padrão de sustentabilidade
aplicável a todas as cidades. Cada cidade deve traçar suas próprias estratégias rumo à
sustentabilidade. Cada cidade deve encontrar soluções para os problemas urbanos que detectar com
base em seu próprio contexto histórico, demográfico e de uso e ocupação do solo e espaço urbano.
Não é vantajoso pensar em modelo de cidade sustentável, mas em sustentabilidade de
cidades. A idéia de sustentabilidade é um conceito amplo relacionado à idéia de utilização racional
do ambiente natural paralelamente à administração das necessidades sociais de forma eficiente,
democrática e equânime.
Fórum Internacional do Meio Ambiente - A conferência da Terra 586

Buscar a sustentabilidade ambiental nos centros urbanos se tornou um dos maiores desafios
ambientais do século XXI. A formulação de uma agenda ambiental para as cidades é uma boa
oportunidade para se refletir sobre o modelo de gestão, especialmente das estratégias o e desafios de
controle e mitigação de impactos ambientais sobre os ambientes urbano e natural de entorno
(MAGLIO, 1999).
Para se ter um ambiente urbano sustentável, é imprescindível incorporar as questões
ambientais nas políticas setoriais urbanas (habitação, abastecimento, saneamento, e ordenação do
espaço), através da observação de critérios ambientais que visem preservar recursos estratégicos
como água, solo, ar, cobertura vegetal e biodiversidade, para proteção da saúde humana (AGENDA
21 DO CABO DE SANTO AGOSTINHO, 2004). A ausência de tal incorporação tem provocado ao
longo do processo de urbanização o surgimento de cidades patológicas do ponto de vista
humanístico e da sustentabilidade ambiental.
Diante do que foi exposto, este artigo tem como objetivo apresentar os principais desafios
para se instalar um quadro de sustentabilidade nas cidades com vista a orientar o debate sobre os
pontos prioritários que devem ser trabalhados na formulação de políticas públicas de promoção da
gestão ambiental urbana de forma integrada e holística. Para tanto se estruturou um conjunto de
idéias referenciadas bibliograficamente.

PRIMEIRO DESAFIO: INVESTIR EM HABITAÇÃO NO ENFOQUE DA HABITABILIDADE


A habitação se constitui um direito humano básico promulgado pela Declaração Universal
dos Direitos Humanos91 e é dever do Estado prover as condições para o pleno exercício desse
direito fundamental (CAPISTRANO FILHO, 2008).
No entanto, esse direito não se reduz apenas a garantir um teto para cada ser humano, mas
uma moradia com condições de propiciar um padrão de vida capaz de assegurar saúde e bem-estar.
Nesse sentido a questão da habitabilidade norteia toda uma concepção de garantia do
direito à habitação com foco no bem-estar físico, social, cultural.
Mas o que é habitablidade? Segundo a Habitat para a Humanidade (HPH), uma
organização global não-governamental que tem como meta principal a eliminação de todas as
formas de moradia inadequada no mundo,
a habitabilidade é um termo que não se limita a unidade habitacional em sua construção. É,
na verdade, um tema que abrange outras faces coletivas e privadas, físicas, psicológicas, sociais e
culturais. É um conceito complexo, que envolve muitos aspectos que afetam a qualidade da
moradia, como a qualidade da casa em termos de material de construção, área construída, divisões
internas e instalações, a segurança da posse da terra, a infra-estrutura de abastecimento de água,
esgoto, drenagem, sistema viário, forma do bairro e disponibilidade de equipamentos urbanos e
serviços públicos, transporte, segurança, áreas de lazer e convivência comunitária, entre outros
(HPH, 2008).
Nesse conceito amplo e complexo a habitabilidade fundamenta-se em aspectos ecológicos,
políticos, sociais, econômicos e culturais que devem ser aliados aos princípios de direito à moradia
e à cidade, com vista a construção de um habitat social digno para o ser humano (HPH, 2008).
A imensa desigualdade social decorrente da crescente concentração de renda é apontada
como um dos principais fatores que leva uma enorme parcela da população a não acessar o mercado
imobiliário, gerando assim, os problemas atuais de moradia o estabelecimento de condições de
insustentabilidade nas cidades (CAPISTRANO FILHO, 2008).

91
Artigo 25 da Declaração Universal dos Direitos Humanos: “Todo ser humano tem direito a um padrão de vida capaz
de assegurar-lhe, e a sua família, saúde e bem-estar, inclusive alimentação, vestuário, habitação, cuidados médicos e os
serviços sociais indispensáveis, e direito à segurança em caso de desemprego, doença, invalidez, viuvez, velhice ou
outros casos de perda dos meios de subsistência em circunstâncias fora de seu controle” (ONU/BRASIL. Declaração
dos Direitos Humanos. Disponível em: http://www.onu-brasil.org.br/documentos_direitoshumanos.php. Acesso em 31
Mar. 2008).
Fórum Internacional do Meio Ambiente - A conferência da Terra 587

No Brasil, apesar de várias conquistas sociais e jurídicas obtidas no campo da habitação, o


problema da moradia, caracterizado pelo déficit habitacional ainda é crescente. Mais de sete
milhões de famílias não têm casa. Calcula-se que outras quinze milhões vivam em moradias
inadequadas. Em contrapartida, os imóveis desocupados nos principais centros urbanos somam
cinco milhões, completando o cenário de déficit habitacional no país (BRAGION, 2008).
Os municípios com auxílio dos Governos Estadual e Federal devem elaborar e
implementar com participação popular, Políticas de Habitabilidade tanto na zona rural como nos
centros urbanos onde há aglomeração de pessoas. Alguns instrumentos estratégicos de gestão,
oriundos, por exemplo, do aspecto da ordenação do espaço, podem muito integrar e fortalecer as
políticas e ações nessa questão. Citamos como exemplo o Plano Diretor, o Zoneamento Ecológico-
Econômico e a Lei de Uso e Ocupação do Solo. Mas também é importante realizar Reforma Agrária
para conter o Êxodo Rural e incentivar a construção de habitações em parceria com movimentos
populares de luta pelo teto (AGENDA 21 DO CABO DE SANTO AGOSTINHO, 2004).
Uma política de habitabilidade no âmbito do poder local com forte participação social é um
pressuposto básico de sustentabilidade, pois é uma possibilidade de oferecer moradia saudável e
digna às pessoas que necessitam e possuem tal direito. Mas não só isso, também é um momento
precioso de transformar essas pessoas em verdadeiros cidadãos, pois sem esse pressuposto, a
moradia fica resumida à garantia de um teto para que essa população possa se reproduzir,
mantendo, no entanto, as mesmas condições de exclusão e miséria em que se encontram
(CAPISTRANO FILHO, 2008).

SEGUNDO DESAFIO: GARANTIR O ABASTECIMENTO DE ÁGUA NO ENFOQUE DA


SUSTENTABILIDADE.
A água para o consumo humano é um recurso finito. Grande soma de recursos financeiros
públicos (e até privados) são gastos anualmente para captar a água dos mananciais ainda
disponíveis, tratá-la e distribuí-la para toda a população, numa lógica onde o crescimento da
demanda é exponencial, num espaço que não cresce e onde o recurso hídrico torna-se cada vez mais
escasso, devido à destruição progressiva dos rios e lençóis freáticos por diversas formas de
degradação ambiental. Tudo isso torna o sistema mais caro de operacionalizar e, portanto, social e
economicamente insustentável, visto que se gasta muito para poder ter água de boa qualidade, que é
fonte de desenvolvimento econômico (na agricultura e nas indústrias) e de saúde para a população,
e o resultado não é como esperado.
As deficiências de abastecimento de água nas cidades, geralmente são observadas nas áreas
periféricas e de baixa renda, e isso está atrelado ao colapso que o sistema enfrenta diante do
crescimento desordenado de habitações e aumento da demanda pelo uso da água. Construir novas
estações de tratamento de água, novos reservatórios e ampliar a rede de distribuição são ações
necessárias e emergentes para universalizar o abastecimento. Porém, paralelo a isso, são urgentes
outras medidas concernentes à conservação dos recursos hídricos: combater o desmatamento,
proteger os mananciais e mitigar os impactos ambientais provenientes dos esgotos industriais e
domiciliares. É aí que se aborda um terceiro desafio correlacionado – A questão do saneamento.

TERCEIRO DESAFIO: PROMOVER O SANEAMENTO AMBIENTAL.


Para muitos, saneamento ainda é uma realidade distante. A ausência de infra-estrutura
básica e adequada para os serviços de saneamento ambiental está associada aos problemas de
poluição dos rios e corpos de água, e os custos da Saúde Pública têm-se elevado, por conta das
despesas relacionadas ao tratamento de doenças de conotação ambiental provocadas pela
deficiência do saneamento básico (AGENDA 21 DE PERNAMBUCO, 2002).
O desafio de promover o saneamento ambiental consiste em desenvolver políticas e
práticas gerenciais eficientes e eficazes nos sistemas de esgotamento sanitário, drenagem e limpeza
urbana.
Segundo o Livreto popular Saneamento Ambiental, publicado em 2003 pelo Fórum de
Reforma Urbana de Pernambuco – FASE, saneamento ambiental é definido como “um conjunto de
Fórum Internacional do Meio Ambiente - A conferência da Terra 588

ações com objetivo de despoluir o meio ambiente, evitando, assim, diversos tipos de doenças,
trazendo uma melhor qualidade de vida e melhorando a autoestima das pessoas que nele vivem...
SANEAR = TORNAR SAUDÁVEL” (FASE, 2003). Neste caso o saneamento ambiental inclui
ações de tratamento de esgoto, gerenciamento de resíduos sólidos, drenagem, e controle de vetores,
além de abastecimento de água.
Concernentes aos sistemas de esgotamento sanitário e de drenagem, obras estruturais são
necessárias, e requer-se muito investimento financeiro. Já o aspecto da limpeza requer muito mais
aspectos político-institucionais e gerenciais. Uma gestão e um gerenciamento “ecológico” dos
resíduos gerados na cidade podem gerar recursos financeiros, que por sua vez podem retroalimentar
o sistema e garantir a auto-sustentabilidade e mitigação de impactos ambientais. As ações de
esgotamento sanitário, coleta de lixo e limpeza pública, bem com a drenagem, já contribuem
bastante para o controle de vetores de doenças, com ratos, baratas, e outros mais.
Do ponto de vista geral, o primeiro passo é elaborar uma Política Local de Saneamento
integrada com as questões de saúde, meio ambiente, habitação, educação, infra-estrutura, etc., com
espaço aberto e forte para participação da população, visando estabelecer um eficiente controle
social sobre estas questões.

QUARTO DESAFIO: GESTÃO EFICIENTE DE ORDENAÇÃO DO ESPAÇO


O fenômeno da urbanização marcou a história da humanidade no século XX. Em todo o
Planeta, a humanidade migrou para as cidades. Nesse período, nunca se viu em toda a história da
humanidade a multiplicação de cidades em número, tamanho da população, áreas ocupadas e
complexidade dos impactos sobre os locais aonde elas vieram a se assentar (FRANCO, 1999).
Como bem assinala Franco (1999), o crescimento rápido e desordenado das cidades
apresenta um problema crucial: o espaço urbano, ou ambiente urbano, sofre modificações radicais
em seus fluxos de energia e de materiais, que incorporam novos caminhos e dinâmicas ecológicas
em sua história. Essas novas dinâmicas se caracterizam pelos alimentos que entram e o lixo que sai
e se acumula; pela água tratada e aduzida que posteriormente se transforma em esgoto, na maioria
das vezes sem o devido tratamento e despejado nos rios ou nos litorais comprometendo suas
características originais; pela crescente quantidade de automóveis, ônibus, caminhões e outros
meios de transportes que circulam utilizando combustíveis poluentes em escala maior do que o que
seria absorvível pelo ambiente; e pelas indústrias e comércios que se expandem de forma cada vez
mais complexa num espaço que permanece constante mas tem números cada vez maiores de
trabalhadores e consumidores.
Cada cidade com mais de 20.000 habitantes é obrigada pela Constituição Federal (artigo
182) a ter um Plano Diretor aprovado pela Câmara de Vereadores, para que seja seu instrumento de
política de desenvolvimento e de expansão urbana (BRASIL, 1988).
Tal plano deve se apresentar coerente e sinérgico com os planos de gestão ambiental e
devem considerar no planejamento os pontos de vulnerabilidade e áreas de riscos ambientais para
assentamentos humanos e dos empreendimentos, as áreas vocacionadas para atividades que podem
determinar distintos graus de adensamento populacional, áreas de proteção ambiental, etc.
(FRANCO, 1999).
É verdade que as cidades ou áreas de assentamento espontâneo, sem planejamento e
diretrizes traçadas, possuem enormes dificuldades para execução de políticas e planos ambientais e
provocam pressões e impactos negativos sobre os recursos naturais. Mesmo assim, é imprescindível
a elaboração do Plano Diretor.
Alguns municípios enquadrados na obrigatoriedade constitucional, ainda não têm seus
Planos Diretores, mas possuem outros instrumentos de política e gestão de ordenamento do solo,
como a Lei de Uso e Ocupação do Solo (LUOS), o Zoneamento Ecológico – Econômico e até
mesmo o Zoneamento Agroecológico, que poderão ser integrados ou consolidados em um Plano
Diretor. Acima de tudo, seja lá qual forem os instrumentos político-institucionais, de gestão ou
gerenciais, que abordam a questão do ordenamento do espaço, a participação de todos os segmentos
da sociedade nos processos de discussão e execução é fundamental.
Fórum Internacional do Meio Ambiente - A conferência da Terra 589

QUINTO DESAFIO: UTILIZAR A EDUCAÇÃO AMBIENTAL COMO INSTRUMENTO DE


GESTÃO PARA A SUSTENTABILIDADE
Cada aspecto acima citado não pode ser visto ou trabalhado de forma isolada. A ordenação
do espaço está atrelada diretamente a todas as questões acima discutidas. Sem políticas e ações na
área habitacional é impossível deter a expansão espontânea e desordenada dos assentamentos
humanos. Logo, empreender nesses locais planos ambientais, de abastecimento e de saneamento,
torna-se extremamente difícil. O todo é muito mais que a soma de suas partes.
Diante dos quatro desafios expostos, uma questão maior surge: como trabalhar a gestão
ambiental urbana de forma integrada e holística, observando todos os aspectos das políticas setoriais
urbanas do ponto de vista ecológico e humanista?
Uma resposta preliminar a essa questão seria a adoção de critérios ambientais na
formulação e implementação de políticas setoriais urbanas visando preservar recursos naturais
(água, solo, ar, cobertura vegetal e biodiversidade) para proteção da saúde humana e qualidade de
vida da população. No entanto, para a adoção de tais critérios a sociedade como um todo tem que
está motivada, sensibilizada e instrumentalizada para a ação.
Nesse sentido, a Educação Ambiental é vista como um importante processo, como também
um instrumento de reflexão, sensibilização e ação comunitária capaz de resolver problemas
socioambientais e manter condições de sustentabilidade.
É necessário que se reconheça a Educação Ambiental como um instrumento de gestão
ambiental que se operacionaliza fundamentalmente na criação e manutenção de espaços
democráticos de exercício do poder de gestão, o que implica o compartilhamento das informações
necessárias à compreensão da complexidade das questões socioambientais e a criação de espaços de
decisão relacionados às políticas públicas a serem adotadas.

CONSIDERAÇÕES FINAIS
O Estado Brasileiro como signatário de diversas convenções internacionais – Declaração
de Estocolmo (1972), Declaração sobre o Direito ao Desenvolvimento (1986), Convenção sobre a
Biodiversidade e a Declaração sobre Meio Ambiente e Desenvolvimento (1992), a Agenda 21, o
Programa Habitat II – deve observar o paradigma internacional do desenvolvimento sustentável
para a criação e efetivação de políticas de desenvolvimento urbano (DIAS, 2002).
Diante do quadro de problemas ambientais pressionados pelo fenômeno urbano,
desafios surgem para o ser humano em tornar o seu “habitat” um ambiente bom de se viver.
Observando bem a questão, uma cidade é considerada e suspirada como “humana” e boa de se
viver, quando se aproxima da natureza e facilita o relacionamento natural e descontraído entre seus
habitantes (COIMBRA, 1999). No entanto, os desafios para tornar as cidades sustentáveis,
perpassam por questões complexas que deverão ser vistas de um ponto de vista ecológico e
holístico, ligados à gestão ambiental urbana, que por sua vez dependem de mecanismos políticos e
institucionais pelas quais as cidades sobrevivem. Os desafios aqui apresentados são imprescindíveis
para estabelecer e manter cidades sustentáveis.

REFERÊNCIAS BIBLIOGRÁFICAS
AGENDA 21 DO CABO DE SANTO AGOSTINHO. Agenda 21 do Cabo de Santo Agostinho. 2ª
Edição. Cabo de Santo Agostinho-PE: Secretaria de Planejamento e Meio Ambiente do Cabo de
Santo Agostinho, 2004.
AGENDA 21 DE PERNAMBUCO. Recife-PE: Secretaria de Ciência, Tecnologia e Meio Ambiente
do Estado de Pernambuco, 2002. p. 105.
BRAGION, Luiza. Déficit habitacional exige medidas urgentes. In: Com Ciência: Revista
Eletrônica de Jornalismo Científico. Disponível em:
http://www.comciencia.br/comciencia/?section=8&edicao=25&id=281. Acesso em: 31 Mar. 2008.
BRASIL. Constituição da República Federativa do Brasil. Brasília: Senado Federal, 1988.
Fórum Internacional do Meio Ambiente - A conferência da Terra 590

CAPISTTANO FILHO, David. Poder local e habitação popular. in: Biblioteca CF+S
Ciudades para un futuro más sostenible. Disponível em:
http://habitat.aq.upm.es/iah/ponenc/a002.html. Acesso em : 31 Mar. 2008.
COIMBRA, José de Ávila Aguiar. A cidade, esfera da vida em sociedade: uma visão ecológica
humanista. In: Municípios e meio ambiente: perspectiva para a municipalização da gestão
ambiental no Brasil. São Paulo: Associação Nacional de Municípios e Meio Ambiente, 1999. p 85-
90.
DIAS, Daniella S. Desenvolvimento urbano: princípios institucionais. Curitiba: Juará, 2002
(Capítulo 3).
FASE – FÓRUM DE REFORMA URBANA DE PERNAMBUCO. Saneamento ambiental. Recife-
PE: FASE – Fórum de Reforma Urbana de Pernambuco. 2003. p. 1.
FRANCO, Messias Roberto. Principais problemas ambientais municipais e perspectivas de solução.
In: Municípios e meio ambiente: perspectiva para a municipalização da gestão ambiental no
Brasil. São Paulo: Associação Nacional de Municípios e Meio Ambiente, 1999. p 19-31.
HPH, Habitat para Humanidade Brasil. O que é habitabilidade. Disponível em:
http://www.habitatbrasil.org.br/search?SearchableText=defict+habitacional. Acesso em: 31
Mar.2008.
MAGLIO, Ivan. Cidades sustentáveis: prevenção, controle e mitigação de impactos ambientais em
áreas urbanas. In: Municípios e meio ambiente: perspectiva para a municipalização da gestão
ambiental no Brasil. São Paulo: Associação Nacional de Municípios e Meio Ambiente, 1999. p 80-
85.
VEIGA, José Eli da. Desenvolvimento sustentável: o desafio do século XXI. Rio de Janeiro:
Geramond, 2005.
Fórum Internacional do Meio Ambiente - A conferência da Terra 591

OS SINDICATOS COMO ATORES SOCIAIS NA BUSCA DE UMA MODERNIZAÇÃO


ECOLÓGICA

Iderval Borges Lima Filho


Instituto de Educação Profissional – IEPRO, Itabuna, Bahia, Professor, Diretor e Mestre em Desenvolvimento Regional
e Meio Ambiente; iderval@iepro.com.br
Inatiane Campos Lima Martins
Universidade Estadual de Santa Cruz – UESC, Ilhéus, Bahia, Mestranda em Desenvolvimento Regional e Meio
Ambiente, bolsista DAAD – Serviço Alemão de Intercâmbio Acadêmico; inatiane.martins@gmail.com

RESUMO
As considerações atuais a cerca das questões ambientais traduz-se numa apreensão
apocalíptica. Representa uma ansiedade com um misto de incapacidade e impotência ante o quadro
dicotômico entre os resultados econômicos e os prejuízos ambientais. No intermédio desses
extremos, há a sociedade formada por cidadãos. Estes anseiam melhores condições de vida por
disponibilizar-se como mão-de-obra. Nesta condição, reconhece, ou não, as externalidades
negativas oriundas do processo de produção que ajuda a concretizar. De outro lado, enquanto
cidadão, percebe-se com uma consciência de um fazer melhor pelo espaço no qual se insere: o
ambiente além das fronteiras fabris. A velocidade necessária à mudança deste cenário, advém de um
novo cidadão, inserido numa sociedade que clama uma nova concepção da relação desenvolvimento
econômico e cidadania. Nela, a mão-de-obra que não produz por tecnologias limpas, respeitando os
limites da natureza, é o mesmo cidadão que ajuda a construir a nova sociedade fora das indústrias.
Cabe aos movimentos sociais contribuir na formação da mentalidade cidadã coerente em que o
ponto central da questão ambiental tem relação com a organização dos sistemas sociais. Os
movimentos sindicais, enquanto ator social tem um papel a cumprir, por intermediar as relações
entre o capital e o trabalho num contexto de economia capitalista.
Palavras-chave: cidadania; desenvolvimento econômico; meio ambiente; movimentos sociais;
sindicalismo.

ABSTRACT
The considers about the ambient questions are expressed an apocalyptic apprehension. It
represents an anxiety with a compound of incapacity and impotence before the dichotomy picture
between the economic results and the ambient damages. In the intermediary of these extremities,
the society formed for citizens. These yearn for better conditions of life for disponibilizar itself as
man power. In this condition, it recognizes, or not, the deriving negative results of the production
process that helps to materialize. Of another side, while citizen, perceives itself with a conscience
of one to make better for the space in which if she inserts: the environment beyond the borders
manufacter. The necessary speed to the change of this scene, happens of a new citizen, inserted in a
society that clama a new conception of the relation economic development and citizenship. In, the
man power that produces for clean technologies, respecting the limits of the nature, is the same
citizen who helps to construct the new society is of the industries. It fits to the social movements to
contribute in the formation of the mentality coherent citizen where the central point of the ambient
question has relation with the organization of the social systems. The syndical movements, while
social actor has a paper to fulfill, for intermediating the relations between the capital and the work
in a context of capitalist economy.
Keywords: citizenship; economic development; environment; social movements; syndical
movements.

INTRODUÇÃO
O movimento ambientalista constitui-se da formação de diversos atores sociais. Sua
expansão e penetração em outras áreas e dinâmicas organizacionais têm proporcionando o
engajamento de grupos sócio-ambientais, científicos, movimentos sociais e empresarias, nos quais o
discurso do desenvolvimento sustentável assume papel de preponderância. Exercem pressão, criam
Fórum Internacional do Meio Ambiente - A conferência da Terra 592

consciência ambiental, mas também são propositivos visando reduzir riscos de degradação das
condições sócio-ambientais, tanto em nível de atuação local, como regional e global.
A história do sindicalismo no mundo esta diretamente ligada às lutas de classes motivadas
pela relação capital-trabalho. Resultou em avanços nas relações trabalhistas a exemplo de
estabelecimento de jornadas de trabalho, periculosidade, insalubridade, dentre outros. Associado à
questão de defesa de uma determinada coletividade, representa a organização autônoma das classes
trabalhadoras para melhoria das condições de vida no meio intra e extra fabril.
Do ponto de vista do movimento sindical, apesar do crescimento e importância do tema
meio ambiente na agenda da sociedade brasileira, a percepção é que a incorporação deste tema à sua
agenda não se deu, ou não se dá, na mesma proporção da sua importância enquanto ator social –
exceto por questões mais pontuais relativas à saúde e segurança do trabalhador.
Justificar tal possibilidade pela assertiva que lutar por melhores condições ambientais é
sinônimo de redução de empregos conduz um grande equivoco. Como afirma Carvalho (2002):
São usuais afirmativas que considerem as questões ambientais e a criação e manutenção
de emprego, como questões firmemente antagônicas. Outras, categoricamente afirmam
ser a manutenção dos níveis de emprego mais relevantes do que a proteção ambiental,
quando na realidade são aspectos indissociáveis.

Dessa perspectiva, a defesa da saúde e segurança dos trabalhadores nos locais de trabalho
deve abarcar uma dimensão mais ampla, qual seja, a proteção da comunidade e do meio ambiente
em que a unidade fabril encontra-se inserida.
Sobre esta realidade crítica e emergencial, há o caminho da construção de uma nova
proposta, constituída de um longo percurso, em que é implícita a construção de uma nova
consciência nas entidades sindicais, quanto a importância da preservação ambiental, vinculada
diretamente à sobrevivência das espécies.
Este artigo visa demonstrar a contribuição dos movimentos sindicais, enquanto
representantes de classes laborativas, na formação de cidadãos quanto à capacidade de interferir e
provocar mudanças no processo produtivo, num contexto de desenvolvimento sustentável. Assim,
há uma reflexão da atual política industrial, na ótica de um ator social representativo no contexto de
uma economia capitalista.
Com este objetivo, a metodologia para sua constituição trouxe como fonte de pesquisa
dados secundários que caracterizem a necessidade de uma nova concepção de cidadania e o
movimento sindical, numa dinâmica que possa ser utilizada na sua complexidade, voltada às
questões ambientais, fazendo valer a sua integração enquanto ator social nas discussões e ações
ambientais.

O MEIO AMBIENTE SOB A ÓTICA CAPITALISTA


A atual situação sócio-econômica e ambiental do país não pode ser revertida de uma hora
para outra, pois é o produto de séculos de exploração predatória das riquezas naturais. Na história
mais recente do país, quando tem início o predomínio das relações de exploração capitalistas, o
ritmo e as dimensões da degradação ambiental alcançaram níveis qualitativamente diferentes. Sob a
égide do capital a apropriação predatória da natureza coloca em risco a própria vida e a
sobrevivência das espécies.
Todas as variantes de políticas desenvolvimentistas implementadas no país até agora
foram, sem exceção, marcadas pelo uso extensivo das riquezas naturais, pelo princípio da
maximização do lucro, desconsiderando as necessidades sociais e a qualidade de vida das camadas
populares e da classe trabalhadora.
A modificação do atual quadro para uma realidade de desenvolvimento sustentável
consiste em iniciar um novo caminho em que é preciso ações para recuperação da atual situação
ambiental. Esta assertiva fica claro quando segundo Brown (2003), “Modificar esse quadro significa
simultaneamente implementar políticas voltadas à recuperação e preservação ambiental e iniciar a
trilha rumo ao conceito de desenvolvimento com sustentabilidade.”
Fórum Internacional do Meio Ambiente - A conferência da Terra 593

Mas esse desafio não depende apenas de políticas governamentais, por mais importantes
que sejam. Requer o engajamento dos movimentos sociais em todos os níveis, desde as instâncias
nacionais até o nível local.
Sem essa intervenção, as políticas públicas por mais eficazes que sejam, não poderão
concretizar-se em ações e medidas concretas, acabando por se perder nos meandros da burocracia
ou, principalmente, esvaziadas e barradas por interesses contrários a sustentabilidade.
Um desenvolvimento econômico e social digno traduz-se na melhoria da qualidade de vida
da população, intimamente ligado a melhoria de condições ambientais. Ultrapassa o patamar de
simplesmente obter lucros.
A concepção de uma completa compreensão do que vem a ser meio ambiente contribui na
forma de pensar o mundo. Assim, como afirma Maimon (2003) há:
• Meio ambiente natural: também conhecido com ambiente físico. Engloba o ar, água, solo,
subsolo, flora e fauna.
• Meio ambiente construído ou artificial. O produzido pela ação do homem ao transformar a
natureza: as cidades. Há as planejadas e as que crescem desordenadamente.
• Ambiente cultural: engloba, segundo definição da própria Constituição da República
Federativa do Brasil, o que se faz “referência à identidade, à ação e a memória dos diferentes
grupos formadores da sociedade brasileira.
• Ambiente de trabalho: refere-se ao local onde as pessoas exercem suas atividades laborais.
Envolve instalações físicas do local.

O desenvolvimento almejado deve compatibilizar sustentabilidade com justiça social e


crescimento econômico. A perspectiva da sustentabilidade qualifica, confere perspectiva de longo
prazo ao crescimento econômico, enfeixando numa única totalidade a justiça socioeconômica e
socioambiental e, crescimento econômico.

MOVIMENTO SINDICAL: ATORES SOCIAIS NA FORMAÇÃO DE UMA NOVA


CONSCIÊNCIA AMBIENTAL
A discussão sobre o meio ambiente passa por várias frentes e tipos de abordagens, o que
requer a inserção de novos atores, aumentando a massa de discussões e reflexões sobre a temática.
A Central Única dos Trabalhadores (CUT) como entidade de representatividade de classes
sindicais em nível nacional, inicia o processo de conscientização da classe trabalhadora, ao
apresentar que:
Os trabalhadores, estando presentes nos diversos setores produtivos, são atores centrais
deste processo e sofrem as conseqüências deste modelo predatório. Assim, a luta sindical
e ecológica se fundem na busca por uma sociedade sustentável em que a apropriação da
natureza se dê de outra forma (CUT, 2001).

O movimento sindical, diante de suas limitações, deve concentrar esforços para conseguir
ações efetivas. Deve avançar na causa socioambiental, instrumentalizando os dirigentes sindicais
nessa luta e estimulando assim o envolvimento de suas instâncias e sindicatos filiados.
Por ser uma instituição voltada a defesa de uma sociedade justa, democrática e igualitária,
implica necessariamente na busca de aspectos sociais de sustentabilidade, pois a atividade
econômica deve se sujeitar em primeira instância às restrições de ordem ecológica. Nesse aspecto, a
sociedade industrial deve ser transformada, visando novas formas de apropriação da natureza,
garantindo a sustentabilidade dos recursos naturais e a manutenção ou ampliação dos postos de
trabalho. Assim afirma a CUT, 2001:
A atual forma de exploração da natureza nos levará ao agravamento das crises
ambientais, com o esgotamento dos recursos naturais e a destruição do meio ambiente,
por conseqüência, os postos de trabalho serão também eliminados. Esta realidade
expressa a grande contradição entre capital e natureza que é parte inseparável da
contradição capital e trabalho
Fórum Internacional do Meio Ambiente - A conferência da Terra 594

Desta forma, os trabalhadores por suas entidades sindicais devem priorizar a luta em defesa
do meio ambiente e da qualidade de vida, posicionando-se sobre as questões fundamentais no
cenário mundial acerca do meio ambiente, com respostas ágeis sobre esta questão, partindo da
compreensão de que o planeta é único, que as crises ambientais são um problema de todos e que os
trabalhadores e as camadas populares são os principais afetados por essa crise.
A prioridade deve ser dada à relação entre trabalho e meio ambiente, sempre procurando
demonstrar que é o primeiro transforma a natureza e a apropriação da mesma esta subordinada ao
modo de produção vigente: o capitalista.
Entre os direitos a ter direitos pelos quais os movimentos sindicais devem lutar e criar
novos direitos, encontram-se os relativos a vida, ao meio ambiente e ao trabalho, que se encontram
devidamente entrelaçados, pois, não é possível a existência de vida sadia em meio ambiente
degradado, como também, ambiente degradado significa a impossibilidade de populações
trabalharem (CUT, 2001).
Assim sendo, deve-se ter claro que todas as ações que comprometem as condições
ambientais de existência e trabalho das populações, como por exemplo, os diversos tipos de
poluição, atentam contra direitos ambientais de indivíduos e da coletividade.
Portanto, trata-se de entender que a crise ambiental resultante deste modelo insustentável
de desenvolvimento é a manifestação de conflitos sociais que tem a natureza por base, e que quando
esta se torna explícita, exprime a consciência de que um direito ambiental foi ameaçado.

UMA NOVA CIDADANIA


Essa nova ordem de valores apontam para a introdução de princípios democráticos nas
relações sociais mediadas pela natureza.
Estes princípios democráticos são descritos como sendo
A igualdade no uso fruto dos recursos naturais e na distribuição dos custos ambientais do
desenvolvimento; liberdade de acesso aos recursos naturais, respeitados os limites físicos e
biológicos da capacidade de suporte da natureza; a solidariedade das populações que compartilham
o meio ambiente comum; o respeito à diversidade da natureza e aos diferentes tipos de relação que
as populações com ela estabelecem; a participação da sociedade no controle das relações entre os
indivíduos e a natureza (ACSELRAD, 1999).
Na medida em que estes princípios sejam observados e que o meio ambiente é o suporte
natural da vida e do trabalho das populações, restringi-se de forma mais conseqüente a utilização
dos recursos naturais e por conseqüência assegurando os direitos dos cidadãos à vida e ao trabalho.
O processo de constituição desta nova cidadania, liderado pelos novos movimentos
sociais, entre os quais os sindicatos, é que deverão ser capazes de imprimir o direcionamento
referido acima. Contribuirá, por conseqüência, na construção de uma empresa cidadã, definida por
Cortina (2001) como:
La que em su actuación assume las responsabilidades como cosa propria, y no se
desentiende del entorno social o ecológico, limitándose a buscar el máximo benefício
material posible. Y precisamente es este tipo de empresas el que actúa de forma
inteligente porque adquiere legitimidad social comportàndose de esta forma, genera
credibilidad y capital simpatía en su entorno y configura una <<cultura de confianza>>
entre sus meimbros.

Assim sendo, a competitividade de um país está ligado à competitividade das empresas


nele existente, e que a competitividade das empresas está ligada a inovações e trajetórias
tecnológicas, e estas estão sendo direcionadas pelos novos movimentos sociais, que por sua vez
corporificam e constroem esta nova cidadania.
Podemos então afirmar que a competitividade de um país, de suas empresas, no que tange
as questões relativas ao meio ambiente, dependerá em última instância do processo de constituição
desta nova cidadania.
Fórum Internacional do Meio Ambiente - A conferência da Terra 595

Aplicada una consciencia moral critica al mundo de la empresa, el primer resultado que
se nos ofrece es el de que cada uno de los afectados por las decisiones empresariales es un
<<ciudadano económico >>, y no u súdito; un protagonista, y no un sujeito paciente de la
actividad empresarial (CORTINA, 2001).
Com isto, se entende que a futura competitividade de um país, emerso num processo de
construção de uma sociedade sustentável, estará diretamente relacionada ao grau de radicalização
da cidadania construída neste processo, que em última instância significa, a construção de uma nova
sociabilidade, caracterizada por relações sociais mais igualitárias.

LUTAR PELO MEIO AMBIENTE X MANUTENÇÃO DOS POSTOS DE TRABALHO


O processo de reversão da crise ambiental, que é político-cultural, constituídos pelos vários
movimentos sociais, entre os quais o movimento sindical, é que conseguirá estabelecer uma nova
forma de apropriação da natureza.
“Portanto, a forma atual como a sociedade se organiza para produzir, produz também
problemas ambientais que, nem sempre são explícitos para a maioria da população, mas que
significam que são a manifestação de conflitos sociais que tem por base a natureza” (CUT, 2001).
Em várias ocasiões a relação entre preservação do meio ambiente, da biodiversidade e a
geração manutenção dos postos de trabalho é apresentada como um dilema. Ou se preserva o meio
ambiente e a biodiversidade ou se mantêm os postos de trabalho. Esta é uma falsa questão.
Para se compreender esta relação entre trabalho e meio ambiente duas questões gerais
devem estar perfeitamente claras.
A primeira delas diz respeito a reestruturação produtiva e a ação sindical frente as
mudanças tecnológicas e organizacionais. O processo de globalização e de reestruturação produtiva,
que se fundamenta em novo paradigma tecnológico baseado na microeletrônica, em nova forma de
organização do trabalho que é o modelo de flexível de produção, e que tem como resultado um
altíssimo nível da produtividade do trabalho, os postos de trabalhos só serão mantidos e/ou criados,
evitando ou minorando o desemprego estrutural, mediante a redução da jornada de trabalho;
proibição de horas extras e reestruturação ecológica do aparato produtivo. Aqui se deixa claro que o
objetivo ilusório de alcançar o pleno emprego mediante um crescimento acelerado não se coloca.
Em segundo lugar, toda as atividades produtivas têm por suporte a nossa nave mãe Terra,
direta ou indiretamente. A insustentabilidade deste modelo de desenvolvimento levará a destruição
das condições naturais de realização dos trabalhos. Nestas condições certamente teremos redução e
destruição de postos de trabalho, decorrente de crises ambientais localizadas ou planetárias (CUT,
2001).
Em outros campos também é possível que o movimento organizado, principalmente o
sindical, apresente propostas que articulem a relação trabalho, meio ambiente e sociedade
sustentável. Um exemplo pode ser o campo das intervenções do setor público, mais voltada a gestão
e a serviços do que a produção material.
O objetivo de tais ações seria procurar assegurar uma maior estabilidade na geração e/ou
manutenção de postos de trabalho, incentivando alguns setores dinâmicos e inovadores que
permitisse atacar algumas das principais emergências ambientais do país.
Para ilustrar as possibilidades de emprego, contrapondo a falsa assertiva de que postos de
trabalho serão reduzido pela luta em defesa do meio ambiente, Serafini (2003) aponta que na Itália,
através da ONG chamada Lagambiente temos a proposta de atuação em quatro setores: Gestão da
mobilidade urbana; defesa do solo e das bacias hidrográficas; gestão dos sistemas energéticos e
reabilitação do patrimônio habitacional público e privado e dos centros históricos. A estimativa feita
por esta proposta é de que a inversão pública de 13 bilhões de liras nos setores acima descritos deve
gerar 203.000 ocupações ano, repartido entre novas ocupações; ocupados; desempregados com
subsídios de desemprego para setores em crise e ocupados no emprego público utilizáveis ativando
mecanismos de mobilidade interna.
Estudos apontam para uma relação positiva entre inversão ambiental e criação de postos de
trabalho. Bermejo (2000) indica os seguintes: “Armin Bechmann (1992) calcula que na Alemanha
Fórum Internacional do Meio Ambiente - A conferência da Terra 596

Ocidental as inversões ambientais haviam criado 400.000 postos de trabalho, tendo destruído só
10.000 em empresas incapazes de adaptar-se as normas ambientais”.
Ainda segundo o mesmo autor, estima-se em 86.000 o número de pessoas que trabalham
para os diversos organismos ambientais da administração norte americana e mais 50.000 são
empregados nas principais companhias ambientais.
Segundo Renner (1999) nos Estados Unidos, até 1988, se havia investido em meio
ambiente uns 100 bilhões de dólares e criados quase 3 milhões de empregos. Na Comunidade
Européia, segundo o mesmo autor, estão empregados em atividades de controle ambiental de 1,2 a
1,5 milhões pessoas.
Com os argumentos, propostas, avaliações e exemplos até aqui apresentados, admite-se ter
demonstrado que é possível se construir uma relação positiva entre trabalho e meio ambiente no
rumo da sociedade sustentável.

CONSIDERAÇÕES FINAIS
Os processos que podem trazer à realidade uma nova sociedade através de um
desenvolvimento sustentável, esta fundamentado da concepção de uma nova cidadania.
Esta concepção sinaliza o direito de lutar pela causa ambiental pelos diversos movimentos
sociais, entre os quais o movimento sindical. Assim, estar-se-á construído o desejado ambiente
social e econômico, provocando as empresas a incorporarem o meio ambiente como um novo fator
de competitividade. Em paralelo, surgirão novas tecnologias numa concepção de “clean tecnology”
e “cleaner tecnology”.
Este desafio emergencial constitui-se na busca de uma nova concepção de sociedade e
desenvolvimento, construído por novos cidadãos.
É preciso focalizar as classes sociais e bases ideológicas institucionais e organizacionais
para uma luta em defesa do meio ambiente.

REFERÊNCIA BIBLIOGRAFIA
ASCELRAD, H. Cidadania e Meio Ambiente. Meio Ambiente e democracia. Rio de Janeiro,
IBASE, 1999. 123 p.
BROWN, L. R. Eco-economia, construindo uma economia para a Terra. Salvador, UMA-Editora,
2002. 295 p.
CALIL, L.E.S. Vários aspectos do meio ambiente. 2003. São Paulo. Atlas, 1999. 114 p.
CARVALHO, I.C.M., Territorialidades em luta: uma análise dos discursos ecológicos. IF Série
Registros, São Paulo, n° 9, 2002 17 p.
CORTINA, A. Ciudadanos Del Mundo. Madrid, Alianza Editora, Madrid, 2001. 265 p.
CUT - Central Única dos Trabalhadores. Sindicalismo e meio ambiente. São Paulo, 2002. 23 p.
MAIMON, D. Estratégias Empresariais, meio ambiente e políticas públicas. Rio de Janeiro, UFRJ,
2001. 215 p.
Fórum Internacional do Meio Ambiente - A conferência da Terra 597

O VERDE NA CIDADE: ANÁLISE DA COBERTURA VEGETAL E QUALIDADE


AMBIENTAL NOS BAIRROS DO CENTRO EXPANDIDO DA CIDADE DO RECIFE - PE

Aldemir Dantas Barboza


Professora da Universidade Federal de Pernambuco – aldemirbarboza@hotmail.com
Ana Regina Marinho Dantas Barboza da Rocha Serafim
Professora substituta da Universidade Federal Rural de Pernambuco – anarserafim@hotmail.com

RESUMO
Para que consiga atingir um processo de urbanização menos prejudicial para o meio
ambiente é necessário haver um planejamento e gestão ambiental nas cidades que atinja toda a
parcela da população existente, que esteja preocupado com a conservação das características
naturais e com a melhoria da qualidade ambiental. A presença da cobertura vegetal é um dos fatores
primordiais a ser contemplado no planejamento de cidades, pois colabora para a melhoria da
qualidade ambiental através do aumento da qualidade de vida, da diminuição das ilhas de calor, do
embelezamento, do sombreamento, assim como a redução de ruídos. Essa se encontra sujeita a
diferentes níveis de vulnerabilidade, especialmente pelas diferentes intervenções verificadas ao
longo da história e pelos novos projetos que estão sendo implantados. Com isso, esse trabalho teve
por objetivo analisar as condições ambientais com ênfase na cobertura vegetal do espaço urbano dos
bairros do Recife, Santo Antônio, São José e Santo Amaro, localizados no centro expandido da
cidade do Recife, no Estado de Pernambuco. Procurou enfocar os aspectos naturais e socioculturais
do meio urbano com ênfase nas transformações. O corte espacial do estudo pautou-se pela sua
importância histórica, cultural e pela intensidade e velocidade das transformações incidentes nesse
espaço, principalmente pelos recentes projetos de revitalização dos bairros que podem contribuir
para o desaparecimento de áreas naturais existentes. Através da análise da legislação, das condições
ambientais, da percepção da população e da espacialização da cobertura vegetal através do
sensoriamento remoto foi proposta uma forma para a gestão desses espaços, onde a manutenção e a
criação de novos espaços de lazer e convívio social contribuem para o embelezamento, a
diminuição da violência, a aproximação entre as pessoas, relaxamento e sombreamento, provocando
uma maior sensação de conforto térmico e um maior comprometimento ambiental.

ABSTRACT
For that to achieve a process of urbanization less harmful to the environment it is necessary
to be a planning and environmental management in cities that reaches every part of the existing
population, which is concerned with the conservation of natural features and to the improvement of
environmental quality. The presence of vegetation is one of the primary factors to be considered in
the planning of cities, because works for the improvement of environmental quality by increasing
the quality of life, the reduction of the islands of heat, the beautification of shading, as well as the
reduction of noise. This is subject to different levels of vulnerability, particularly by the different
interventions recorded throughout history and the new projects that are being deployed. With that,
this essay aimed to analyze environmental conditions with emphasis on the vegetation of the area of
urban neighborhoods of Recife, Santo Antônio, São José and Santo Amaro, located in the centre of
the expanded city of Recife in the state of Pernambuco. A focus on the natural and socio-cultural
aspects of the environment with emphasis on urban transformations. Cutting space of the study is
guided by its historical importance, cultural and the intensity and speed of the changes incidents in
this space, mainly by recent projects to revitalize the neighborhoods that may contribute to the
disappearance of natural areas exist. Through analysis of the legislation, environmental conditions,
the perception of the population and the spatial coverage of the plant through remote sensing
proposal was a way to manage those areas where the maintenance and creation of new spaces of
leisure and social coexistence contribute to the beautification, the reduction of violence, the
rapprochement between people, relaxation and shading, causing a greater sense of thermal comfort
and greater environmental commitment.
Fórum Internacional do Meio Ambiente - A conferência da Terra 598

Key-words: mulching, expanded center of the city of Recife, planning and environmental
management in cities.

INTRODUÇÃO
Toda cidade apresenta uma organização sócio-espacial e cultural que varia de acordo com
seus usos, funções e sua forma além dos costumes e tradições de seus habitantes. O homem, durante
o processo de desenvolvimento socioeconômico, estruturou o espaço urbano, de acordo com as suas
necessidades de moradia, trabalho e lazer, o que caracteriza um padrão espacial que se apresenta de
modo diferente em cada cidade. No Recife o processo de ocupação e de organização do espaço
urbano principalmente do centro expandido foi realizado de forma não prioritária com a
manutenção dos aspectos naturais, principalmente com relação à cobertura vegetal.
O processo de urbanização deveria ser menos prejudicial para o meio ambiente,
respeitando o equilíbrio dos ecossistemas urbanos, dessa forma é salutar um planejamento e uma
gestão ambiental nas cidades que atinja toda a população e esteja preocupado com a conservação
das características naturais e com a melhoria da qualidade ambiental de modo geral.
Esse trabalho tem por objetivo identificar e analisar as condições ambientais e a cobertura
vegetal nos bairros do Centro expandido da cidade do Recife (Recife, Santo Antônio, São José e
Santo Amaro), no Estado de Pernambuco, identificando os aspectos naturais e socioculturais do
espaço urbano com ênfase nas transformações, que (re)produzem a organização espacial das
sociedades em sua relação dialética com a natureza.
O enfoque ambiental adotado procura refletir e entender como se dá a interação do
conjunto de elementos naturais e os construídos e articulados pela ação do homem. Engloba tanto o
espaço natural quanto o patrimônio construído e a interação das formas de vida existentes entre eles,
ressaltando a complexidade entre os elementos naturais e a sociedade humana. Assim, o conceito de
meio ambiente utilizado inclui os domínios ecológico, sócio-cultural, econômico e político.

QUALIDADE AMBIENTAL URBANA E COBERTURA VEGETAL


Para a compreensão do espaço urbano como um todo é necessário estudar o uso do solo,
como uma expressão sócio-econômica de apropriação do homem no meio natural e da cobertura
vegetal, que, são aspectos que contribuem para a qualidade ambiental. “O conceito de qualidade
ambiental, em sentindo amplo, está relacionado com o nível de satisfação que a pessoa obtém ao
comparar as percepções do entorno, com suas expectativas, seus ideais e necessidades” (MORENO,
2001, p.7).
Qualidade ambiental: Estado do meio ambiente em uma determinada área ou região.
Como é percebido objetivamente em função da medição de qualidade de alguns de seus
componentes, ou mesmo subjetivamente em relação a determinados atributos, como a
beleza da paisagem, o conforto, o bem-estar. (Vamos cuidar do Brasil – Conferência
Nacional do Meio Ambiente – Texto-base, MMA, 2003, 31p.). In:
www.cprh.pe.gov.br/frme-index-secao-asp?idsecao=276 em 01/11/2007.
A qualidade ambiental é comprometida, durante os diferentes estágios de evolução e
desenvolvimento urbano, pois dependendo de cada sistema e épocas distintas, as percepções com
relação à natureza vão sendo modificadas e provocam sensíveis mudanças no meio.
Os espaços públicos da cidade do Recife, também chamados de espaços abertos, são de uso
comum do povo (RECIFE, 2007). Uma boa parte deles deixa a desejar quanto à qualidade
ambiental, pois nos últimos anos parece que a administração pública, as empresas privadas e os
moradores esqueceram de ter cuidado e atenção com esses espaços, características de uma
sociedade apressada, preocupada com o concreto esquecendo do abstrato, nesse caso esquecendo do
natural.
O espaço público tem sido tratado, muitas vezes, como simples espaço residual e não como
elemento fundamental da forma urbana que a cidade adquire e expressa. Isto é, implanta-se um
canteiro qualquer em espaços “que sobram” entre ruas e avenidas ou em “sobras” de loteamentos,
sem que se atente para a qualidade do espaço ofertado como resultado dessa ação. De modo
Fórum Internacional do Meio Ambiente - A conferência da Terra 599

semelhante, projetam-se praças e parques sem que se atente para a função desses espaços na vida
urbana contemporânea. Dessa desatenção resultam espaços qualitativamente pouco expressivos,
pobres do ponto de vista urbanístico e, freqüentemente, pouco atraentes que em nada contribuem
para a qualidade do ambiente construído. RECIFE, 2007.
Aspectos da qualidade ambiental podem ficar claros em algumas localidades das áreas
urbanas dependendo da distribuição da vegetação e indicar a qualidade de vida dos moradores. Por
isso a importância da compreensão efetiva da distribuição das áreas verdes. Essas áreas no espaço
urbano proporcionam inúmeros benefícios, tais como conforto térmico, atenuação da poluição do
ar, sonora e visual, proteção das margens dos rios, abrigo para fauna, áreas de lazer, etc.
Apesar das importantes funções ambientais proporcionadas pelas áreas verdes no espaço
urbano, a população das cidades nem sempre está consciente a respeito da necessidade de um
manejo adequado das mesmas e, muitas vezes, não contribui para a sua manutenção. Aliado a isto, a
falta de um planejamento adequado não permite aproveitar todas as vantagens e benefícios que
essas áreas proporcionam em uma cidade.
As comunidades precisam se relacionar com a natureza. Para poder haver uma melhora no
ambiente em que vivem e que os direitos ambientais possam ser preservados é necessário uma
democratização, um maior acesso as informações (licenciamentos, registros, participar de
audiências públicas), assim, conhecendo os aspectos legais, a sociedade civil organizada pode
identificar as fontes geradoras de impactos e exigir o cumprimento da legislação ambiental vigente.
A qualidade ambiental está diretamente ligada com a qualidade de vida, e esta está
relacionada com a sustentabilidade e não apenas com o seu entorno natural, pois a população além
de um ambiente agradável precisa também de desenvolvimento, de certos padrões de consumo, mas
que este não destrua o meio ambiente.
O que unifica e dá sentido a esse modo de ver específico da sustentabilidade é a
necessidade de uma nova ética do desenvolvimento. Além de importantes elementos morais,
estéticos e espirituais, essa concepção tem relação com pelo menos dois fundamentos da justiça
social: a justiça produtiva e a justiça distributiva. Isso significa que deve haver um desenvolvimento
econômico para que haja emprego e assim a população consiga atender as suas necessidades
básicas, é necessário haver produção, mas que esta seja realizada de forma sustentável e, mas
importante que haja uma distribuição das riquezas, que todos recebam os benefícios dessa
produção, pois com a diminuição da miséria e o aumento da consciência de preservação o
desenvolvimento sustentável pode ficar mais fácil (GUIMARÃES, 2001).
Então, para que as comunidades busquem uma maior qualidade de vida, surgem os
movimentos sociais, que servem para viabilizar e expandir os direitos das sociedades. No Brasil a
cidadania é precária, pois nem todas as pessoas têm direito a educação, saúde, proteção contra o
desemprego, etc. Essa cidadania também decorre das condições ambientais de existência,
comunidades localizadas em lugares precários. Pessoas que vivem e trabalham em condições
ambientais adversas, sem condições de exercer seu direito de cidadania (ACSELRAD, 1992).
As vítimas de agressões ambientais têm os seus direitos gravemente desrespeitados. Essas
vão ser a imposições do interesse de poucos sobre o mundo de todos, pois sempre vai haver um
grupo social mais diretamente atingido em seus direitos. A população então visa lutar pela garantia
do caráter público do meio ambiente e pela introdução da política na gestão do meio ambiente
(ACSELRAD, 1992).
Os movimentos ambientais, as associações, lutam para combater a degradação do meio
ambiente e há uma articulação para implantar um novo modelo de cidadania, para que sejam
atendidos os interesses coletivos da sociedade, como o acesso aos bens coletivos de qualidade para
todos, terra, por exemplo, sem distinção de classe social. É importante salientar que a população
deve lutar pelos seus direitos e não apenas esperar que alguém resolva a situação para elas.
Bens coletivos são algo que todo mundo pode usar e que não devem ser destruídos. Eles
não podem ser apropriados por um grupo de pessoas e tem que estar disponíveis para todos sem
limitação de uso, pois as populações dependem direta ou indiretamente deles para a sua
sobrevivência. O acesso a esses bens pode estar sujeito à cobrança de taxas, como ocorre com a
Fórum Internacional do Meio Ambiente - A conferência da Terra 600

água nas cidades, que são cobradas devido aos serviços necessários para que chegue às casas e
estabelecimentos e não pelo recurso natural água. Apesar do entendimento de que os recursos
naturais são um bem de todos, alguns tiveram seu acesso limitado, como é o caso da terra, que
passou a ser objeto de uso privado (SCOTTO, 1997).
As lutas buscam a democratização do controle sobre os recursos naturais, pois o meio
ambiente é o suporte natural da vida e do trabalho das populações (das atividades humanas) e,
portanto ele tem que ser preservado para que o ser humano possa viver e trabalhar com dignidade.
Apesar de tudo isso é necessário percorrer um grande caminho para fazer com que a
questão ambiental entre na cabeça da população, agora de forma completa e crítica, sabendo o papel
de cada um, pois a mídia mostra uma visão deturpada, onde a consciência deve ser só relacionada à
proteção do verde. É preciso saber quais as competências do Estado e fazer com que este funcione
de acordo com as leis, para que tenha condições de viabilizar um futuro desejável.
Miller92 apud Alvarez (2004), fala que um dos primeiros critérios para estabelecer um
espaço livre seria onde a maioria da população tivesse acesso. Kürsten93 apud Miller apud Alvarez
(2004), diz que todos os moradores de uma comunidade deveriam ter contato com a natureza e que
em no máximo cinco minutos a pé estivessem em contato parques e espaços livres. Esses estudos
levam em consideração na maioria das vezes apenas espaços de recreação, pois é assim que os
espaços livres são considerados na maioria da literatura existente. Sendo que nesse trabalho o que
está sendo levado em consideração é a cobertura vegetal existente nos espaços livres e áreas verdes.
A caracterização da cobertura vegetal é muito importante, principalmente para auxiliar a
tomada de decisões pelos planejadores que devem visar principalmente à qualidade ambiental aliada
a qualidade de vida da população. Por isso, deve-se avaliar o perfil do usuário do espaço estudado,
almejando compreender como a população percebe o seu ambiente, quais os valores que estas
atribuem às áreas verdes e as suas funções e assim realizar um planejamento urbano/ambiental mais
condizente com a realidade.
MERCANTE, (1991:511), relaciona as árvores como um componente físico importante da
paisagem urbana, pois elas dão “noção de relação espacial para o ser humano, diminuem a
temperatura devido ao efeito sombra, enriquecem o ar com a umidade devido à transpiração da
massa verde e contribuem com efeitos positivos, em relação aos aspectos ecológicos, ao bem estar
das pessoas nas calçadas e nas praças e passam a ter um efeito psicológico considerável”. As
árvores e outros vegetais, interceptando, absorvendo, refletindo e transmitindo radiação solar
(diminuem a ilha de calor da cidade), captando e transpirando água e interferindo na direção e
velocidade dos ventos podem ser extremamente eficientes na melhoria do micro clima urbano,
LIMA, (1991:709). (BARROS, 1998, p.35-36).
Segundo índices fornecidos pelo Projeto Padrões Urbanos da SUDENE/FIAM apud Veras
(1985), a área verde por habitante da cidade do Recife em 1977 era de 6m². Dado este metade do
que a LOMR trata como aceitável.
A quantificação de área verde é um importante meio para tratar da qualidade ambiental,
porém esse é apenas um dos indicadores, não se deve limitar o estudo apenas a esse, pois isso seria
reduzir o problema, porém neste trabalho além da preocupação com a quantidade, houve também
uma atenção especial para a qualidade ambiental.

ESTRATÉGIAS PARA O PLANEJAMENTO E GESTÃO AMBIENTAL DOS BAIRROS DO


RECIFE, SANTO ANTÔNIO, SÃO JOSÉ E SANTO AMARO, COM ÊNFASE NA
CONSERVAÇÃO DA COBERTURA VEGETAL.
As propostas aqui lançadas para o planejamento e a gestão de alguns espaços dos bairros
em estudo são idéias baseadas nos estudos teóricos, na legislação vigente e na percepção e vontades
da população. São idéias gerais que podem servir para que haja um aumento na qualidade ambiental

92
MILLER, R.W. Urban forest: plannig and managing urban greenspaces. 2.ed. New Jersey: Prentice Hall, 1997. 502p.
93
KÜRSTEN, E. Landscape ecology and urban forest corridors. Proc. Sixth Natl. Urban For. Conf. Washington, D. C.: Am. For. Assoc., p.242-
243, 1993.
Fórum Internacional do Meio Ambiente - A conferência da Terra 601

desse espaço e na qualidade de vida da população, além de contribuir para a conservação do


patrimônio natural e cultural existente, principalmente na cobertura vegetal.
Segundo Oliveira (1996), em primeiro lugar é necessário que os governos federal, estadual
e municipal realizem ações conjuntas visando o melhor para a população e que haja um
investimento em equipamentos adequados para arborização, profissionais capacitados e
geoprocessamento. O órgão que trata de assuntos ambientais deve estar em consonância com os
demais, principalmente com a saúde, educação, saneamento e departamento de trânsito. Com
relação às áreas verdes e a arborização urbana também é importante “considerar as práticas e
normas utilizadas por empresas de telefonia, energia elétrica, televisão a cabo ou qualquer outra
empresa que esteja diretamente relacionada à prestação de serviços em redes aéreas ou
subterrâneas”. (p.96-97).
Segundo Milano94 apud Oliveira (1996, p.97) alguns elementos devem ser destacados
quando se fala de arborização:
a) o ambiente urbano, observado e caracterizado em termos de clima, solos e qualidade do ar,
fatores fundamentais à seleção de espécies adaptadas ao local;
b) o espaço físico disponível, observado e caracterizado detalhadamente em termos de largura de
ruas e calçadas, afastamento predial, ocorrência e posicionamento de redes de utilidades aéreas
e subterrâneas, entre outros fatores fundamentais para a definição de espécie a ser plantada, da
posição de plantio e do tipo de condução;
c) as características das espécies a utilizar, observadas em termos de adaptabilidade climática,
resistência a pragas e doenças, tolerância à poluição e características morfológicas e fenológicas
(forma, porte, raiz, floração, frutificação, etc.).
Pela falta de cobertura vegetal, segundo os parâmetros globais, nos bairros do Recife,
Santo Antônio, São José e Santo Amaro é necessário segundo Mesquita (1996, p.9):
a) medidas incentivadoras da preservação dos quintais, dos parques e maciços arbóreos pertencentes
a instituições particulares;
b) ênfase na arborização pública, em especial das ruas, dados os custos relativos reconhecidamente
inferiores aos da implantação de praças.

Nos bairros estudados deve haver um aumento da arborização no acompanhamento viário,


porém deve existir um estudo específico sobre essas áreas, pois como é uma área de intenso
movimento de veículos é necessário que as árvores não atrapalhem a visualização dos motoristas e
nem a circulação dos pedestres. Portanto, as espécies a serem implantadas nessa área não podem ter
as flores e frutos com uma coloração que atrapalhe a visibilidade e que as raízes da mesma não
atrapalhem a pavimentação. (OLIVEIRA, 1996).
Deve-se adicionalmente disciplinar o tráfego de veículos pesados de acordo com a
estrutura da vegetação e espécies utilizadas, considerando-se que a vegetação pode
sofrer injúrias, seja indiretamente pelo excesso de vibração do terreno, podendo
comprometer as raízes ou danos diretos pela quebra de ramos e galhos sobre as pistas.
(op. cit., p.101).

Outros problemas que podem ocorrer com a implantação da arborização viária são: a falta
de espaço nas ruas, expulsão do pedestre, veículos altos podem topar nas copas, alguns ramos
podem ficar pendentes, escuridão e insegurança à noite, o pedestre pode ser obrigado a se curvar,
cortes nos troncos devido a colisões de veículos, atração de animais, destruição do calçamento,
sujeira por causa da queda de folhas e outras falhas relacionadas à escolha das espécies compatíveis
com o espaço.
No espaço estudado existem algumas avenidas que possuem características que podem
levar ao aumento da arborização viária. No bairro do Recife no refúgio da Ponte Giratória, em São
José tem o refúgio da Rua de Santa Rita, em Santo Antônio tem o refúgio da Avenida Guararapes e

94
MILANO, M.S. Planejamento da arborização urbana: relações entre áreas verdes e ruas arborizadas. In: CONGRESSO BRASILEIRO SOBRE
ARBORIZAÇÃO URBANA, 4, 1990. Curitiba. Anais... Curitiba: Sociedade Brasileira de Arborização Urbana, 1990.
Fórum Internacional do Meio Ambiente - A conferência da Terra 602

uma parte da Dantas Barreto e no bairro de Santo Amaro tem a Avenida Cruz Cabugá. Todos esses
possui pouco ou nenhum resquício de cobertura vegetal.
Segundo Lorusso95 apud Oliveira (1996) a demanda por áreas verdes vai ser maior em
lugares com densidades populacionais elevadas, isso faz com que seja importante a criação e a
manutenção desses espaços nos centros urbanos, para um planejamento ambiental mais eficiente.
Por isso a importância, nos bairros em estudo de revitalizar as áreas existentes com cobertura
vegetal e criar novos espaços.
Mesquita (1996) considera inviável o acréscimo de novos espaços destinados à arborização
nos centros urbanos, isso porque por já terem um espaço consolidado a criação só iria ter altos
custos e poucas alternativas, que causariam em demolições, desapropriações, criação artificial do
solo e o uso oneroso de áreas particulares. Portanto, nesse trabalho considera-se que é importante
utilizar de forma efetiva espaços ociosos e transformá-los em áreas verdes, priorizando a cobertura
vegetal e o lazer da população, além de melhorar o desempenho da arborização existente e
revitalizar os espaços que já possuem cobertura vegetal.
Essa preocupação em cuidar dos parques, praças e refúgios existentes é importante para
que a população passe a freqüentar mais esses espaços, os utilizem como pontos de encontro, como
lugares de apreciação e não apenas passem por eles. Na pesquisa notou-se que a maioria das
pessoas estão satisfeitas com o que vêem, portanto reclamam de problema de infra-estrutura que
devem ser resolvidos pelo poder público ou pela iniciativa privada quando se trata de praças
adotadas.
Essas áreas não podem ser privilégios de apenas uma parcela da população. Segundo
Lorusso apud Oliveira (1996, p.89): “deve-se evitar que um usuário tenha que dispender, andando
normalmente, mais de 10 minutos para alcançar o equipamento mais próximo”.
A iluminação é um dos fatores da infra-estrutura que tanto na pesquisa de campo feita para
verificação da situação das espécies e das localidades quanto na percepção da população não está
em sua maioria em bom estado de conservação. A boa iluminação é imprescindível, como diz
Jacobs (2003, p.43):
O valor da iluminação forte nas ruas de áreas apagadas e desvitalizadas vem do
reconforto que ela proporciona às pessoas que precisam andar nas calçadas, ou
gostariam de andar, as quais não o fariam se não houvesse boa iluminação. Assim, as
luzes induzem essas pessoas a contribuir com seus olhos para a manutenção da rua.
Além do mais, como é óbvio, a boa iluminação amplia cada par de olhos – faz com que
os olhos valham mais porque seu alcance é maior. Cada par de olhos a mais e qualquer
aumento em seu alcance representam um trunfo para as áreas apagadas e desvitalizadas.
Porém, as luzes não têm efeito algum se não houver olhos e não existir no cérebro por
trás dos olhos a quase inconsciente reconfirmação do apoio geral na rua para a
preservação da civilidade.

Com relação às espécies arbóreas adequadas às condições ambientais do Recife e que


contribuem para os efeitos benéficos da vegetação indicados pela maioria da população pesquisada
são segundo Mesquita (1996, p.40):
De folhagem densa, produtora de boa sombra. Perenifólias, de preferência às
caducifólias e, neste caso, de folhagem caduca no inverno – para amenizar a insolação
nos meses mais quentes. De copa arredondada – globosa, ovóide, meia lua – de
preferência à piramidal, de base muito ampla ou pendente.

Ainda comentando sobre o sombreamento, no planejamento deve haver uma preocupação


para que as espécies escolhidas estejam floridas nos períodos mais quentes do ano. “Limitando-se a
incidência dos raios solares em, pelo menos, dois terços da área dos caminhos de pedestres, praças e
estacionamentos”. (L.MASCARÓ; J,MASCARÓ, 2005, p.33).

95
LORUSSO, D.C.S. Gestão de áreas verdes urbanas. In: CONGRESSO BRASILEIRO SOBRE ARBORIZAÇÃO URBANA, 1, 1992. Vitória.
Anais... Vitória: Sociedade Brasileira de Arborização Urbana, 1992. p.39-52.
Fórum Internacional do Meio Ambiente - A conferência da Terra 603

De acordo com Mesquita (1996) são necessárias na arborização de ruas priorizarem


árvores de crescimento lento e as podas devem ser freqüentes. “A falta de compatibilização entre a
altura da rede aérea de eletricidade e o porte das árvores pode ser atenuada pela poda de condução
bem executada” (p.10). As espécies de crescimento rápido podem ser destinadas a parques e praças
que tenham espaço suficiente para sua expansão.
Também devem ser priorizadas: “Espécies, qualquer que seja o porte, de raízes-pivotantes
e profundas; árvores resistentes a pragas e doenças, a atos de vandalismo, a danos físicos em geral e
com maior capacidade de tolerância à poluição atmosférica”. (p.41). Uma homogeneidade das
espécies é desaconselhável, pois grandes concentrações de uma única espécie aumentam sua
vulnerabilidade a pragas e doenças. E “maciços heterogêneos favorecem a biodiversidade, ajudando
a manter a avifauna local”. (L.MASCARÓ; J,MASCARÓ, 2005, p.28).
Uma árvore plantada sozinha, como acontece em alguns refúgios estudados pode significar
muita coisa, como por exemplo: ponto focal de um pequeno grupo de habitações, eixo ao redor do
qual gira uma rua curta, ou uma meta visual. Portanto elas também são válidas no espaço urbano,
pois, ameniza o desconforto do microclima urbano, diminuindo a temperatura e elevando a umidade
do ar embaixo de sua copa. (L.MASCARÓ; J,MASCARÓ, 2005).
Outro fator pouco percebido com a população da cidade é a influência da vegetação na
diminuição de ruídos. Até porque segundo L.Mascaró; J,Mascaró, (2005, p.53) “alguns autores
consideram que o efeito de redução de som pelas plantas é mais psicológico do que físico”. Opinião
esta que não é compartilhada pelos autores: “Plantas amenizam o ruído. As barreiras vegetais
desviarão o som para longe dos ouvintes e refletirão o ruído para sua fonte uma vez que encontre os
ângulos adequados em relação à sua origem. Se o ruído passa através ou ao redor da vegetação, será
refratado e, em conseqüências dissipado”.
Segundo Detzel apud Oliveira (1996, p.12): “Mesmo barreiras de vegetação de pequeno
porte (2 metros), as quais não operam eficientemente como barreira acústica, tem um efeito
psicológico benéfico, pelo isolamento visual da fonte geradora de ruído, além de proporcionarem a
sensação de privacidade”.
A atenuação sonora pela vegetação é mais efetiva para sons de alta freqüência (agudos). As
plantas perenifólias tendem a refletir mais som, enquanto que as decíduas são mais eficientes na
absorção, sugerindo-se que a mistura de várias espécies seja uma estratégia especialmente efetiva na
redução de sons de freqüência intermediária. (FORMAN; GODRON96 apud OLIVEIRA, 1996,
p.11).
Para Jacobs (2003) nas cidades não deve haver uma total descentralização das atividades e
sim numa localidade deve haver diversas atividades, como por exemplo, residências, áreas de lazer
diurna (de preferência verde) e noturna (bares, restaurantes), comércio, trabalho. Pessoas andando
ininterruptamente, pois assim, diminui um pouco o perigo das ruas. “Quanto maior e mais
diversificado o leque de interesses legítimos (no estrito sentido legal) que a cidade e as empresas
possam satisfazer, melhor para as ruas, para a segurança e para a civilidade das cidades”. (p.42).
As pessoas passam a freqüentar um bairro e seus diversos espaços sem serem obrigados
quando se identificam com algo nele. Por isso é importante atender as reivindicações da população
quando elas são plausíveis. Por isso, o planejamento dos bairros deve almejar as seguintes metas
segundo Jacobs (2003, p.141):
Primeira, fomentar ruas vivas e atraentes.
Segunda, fazer com que o tecido dessas ruas forme uma malha o mais contínua possível
por todo um distrito97 que possua o tamanho e o poder necessário para constituir uma
subcidade em potencial.
Terceira, fazer com que parques, praças e edifícios públicos integrem esse tecido de
ruas; utilizá-los para intensificar e alinhavar a complexidade e a multiplicidade de usos
desse tecido. Eles não devem ser usados para isolar usos diferentes ou isolar subdistritos.

96
FORMAN, R.T.T., GODRON, M. Landscape ecology. New York. John Wiley e Sons. 1986. 620p.
97
Distrito nesse caso é entendido como bairro.
Fórum Internacional do Meio Ambiente - A conferência da Terra 604

Quarta, enfatizar a identidade funcional de áreas suficientemente extensas para funcionar


como distritos.

Todas as estratégias mostradas aqui para um planejamento e gestão ambiental das cidades
visando principalmente a qualidade ambiental servem tanto para os governos quanto para a
população, pois o primeiro pode realizá-las e o segundo pode cobrá-las, para que assim todos
possam desfrutar de lugares sadios para a sua vivência e convivência.

CONSIDERAÇÕES FINAIS
Nesse trabalho foram evidenciadas várias constatações sobre o espaço urbano dos bairros
do Recife, Santo Antônio, São José e Santo Amaro e a seguir vão ser feitas algumas considerações
sem a pretensão de esgotá-las.
Inicialmente se verifica no centro expandido da cidade do Recife, a existência de um
planejamento urbano inadequado, fazendo com que seus edifícios, casas, monumentos e, sobretudo
os espaços públicos (praças, parques e refúgios) fossem parcialmente abandonados por parte de
algumas camadas da população, sob a justificativa de não oferecerem condições de
desenvolvimento da vida coletiva, com atividade de lazer e recreação e contemplação. Inúmeros
motivos são alegados, entre eles, a insegurança e o crescimento da violência.
Para ocorrer um pleno desenvolvimento dessas áreas é necessário oferecer condições para
atrair a população. Uma dessas seria a criação de novos espaços ou revitalização dos já existentes,
pois contribuem para melhoria da qualidade ambiental dos bairros, principalmente se for dada
ênfase à cobertura vegetal, pois como já foi visto a maioria da população pesquisada que freqüenta
essas localidades disse que consideram a vegetação importante e que a sua presença torna o
ambiente mais agradável, devido ao sombreamento, a amenização da temperatura, a redução de
ruídos, etc. e que tudo isso junto influencia na qualidade de vida.
Sendo que se deve ter a preocupação com a forma da cidade e sua sustentabilidade,
levando em consideração o seu rico patrimônio histórico-cultural, além da legislação ambiental
vigente.
É importante verificar o potencial de recursos que a cidade apresenta e a disponibilidade de
áreas para arborização, pois as espécies não podem ser colocadas em todos os lugares, pois existe a
questão da adaptação ecológica (aclimatação, naturalização, acomodação). O planejamento é muito
importante, principalmente na escolha das espécies e nos espaços onde vão ser plantadas,
atentando-se ao conceito de áreas verdes, que não se deve apenas descrever sua estrutura
(vegetação), mas, sobretudo enfatizar a sua importância em termos de funções estéticas, ecológicas,
sociais e econômicas.
Partindo-se do pressuposto de que as intervenções urbanísticas modificam o ambiente
natural, podendo melhorar ou piorar os padrões de qualidade dos espaços livres e da cobertura
vegetal. É necessário operacionalizar e atualizar as informações com relação aos projetos sobre a
cobertura vegetal urbana. Assim, é imprescindível conhecer a cidade para saber quais os lugares
onde é mais viável e mais importante a implantação das áreas verdes e da arborização viária que
contribua para a qualidade ambiental e a qualidade de vida da população como um todo.
A criação de novas áreas de lazer (espaços livres) ou ampliação dos espaços é válida para o
convívio social e que estes possuam cobertura vegetal que contribuem para o controle climático,
diminuição das ilhas de calor nos centros urbanos, da poluição do ar e acústica, embelezamento, a
diminuição da violência, valorização econômica das propriedades, aproximação entre as pessoas,
relaxamento e sombreamento, promovendo um maior comprometimento ambiental tanto das
gestões públicas quanto da sociedade, com vistas à manutenção do conforto ambiental.
É preciso levar em consideração os interesses da população que freqüenta e mora nas
localidades, pois efetivamente vão ser elas que serão beneficiadas ou sofrerão as conseqüências dos
problemas ambientais, e geralmente na gestão não democrática do espaço suas vontades ficam em
segundo plano para que prevaleçam os interesses de determinados grupos políticos e econômicos.
Fórum Internacional do Meio Ambiente - A conferência da Terra 605

Isso divide a população que não sabe quem de imediato vai ser beneficiado e quem vai sair
prejudicado, então é necessário propor soluções que satisfaçam todos os envolvidos.
Deve ser incentivada uma mudança de valores e de atitudes para com o meio ambiente.
Onde uma maneira de pensar e ver as coisas somente através de uma visão econômica não pode
continuar, pois a vida não é regida somente através do dinheiro e da tecnologia. É importante pensar
na qualidade de vida e nas questões espirituais, onde o corpo e o meio devem estar em equilíbrio.
O desafio ambiental é mais complexo do que a mídia e a até a ciência mostra. É
essencialmente político, pois esta é a arte de estabelecer limites, e ele se resume a idéia de que há
limites da relação do homem para com a natureza. É preciso que a justiça social e a sustentabilidade
ecológica se façam por meio da liberdade e que todos tenham direitos iguais para assumirem suas
diferenças. Só assim para estimular uma outra relação da sociedade com a natureza.
Modernidade e meio ambiente são responsáveis pelas verdadeiras tensões e conflitos que
ocorrem no espaço urbano, para enfrentá-los é necessários grandes desafios, como o do
desenvolvimento sustentável, e da ética que é quem vai aprofundar o debate e o significado do
planejamento e da gestão ambiental nas cidades.

REFERÊNCIAS BIBLIOGRAFICAS
ACSELRAD, Henri. Cidadania e meio ambiente. In: ACSELRAD, Henri. Meio ambiente e
democracia. Rio de Janeiro: IBASE, 1992.
ALVAREZ, Ivan André. Qualidade do espaço verde urbano: uma proposta de índice de avaliação.
Piracicaba, 2004. Tese (doutorado) – Escola Superior de Agricultura Luiz de Queiroz – USP.
BARROS, Mirian Vizintim Fernandes. Análise ambiental urbana: estudo aplicado à cidade de
Londrina-PR. Tese de doutorado. São Paulo: USP, 1998.
JACOBS, Jane. Morte e vida de grandes cidades. Tradução Carlos S. Mendes Rosa. São Paulo:
Martins Fontes, 2003.
MASCARÓ, Lucia; MASCARÓ, Juan. Vegetação urbana. 2ªed. Porto Alegre: Mais Quatro
Editora, 2005.
MESQUITA, Liana de Barros. Arborização do Recife: notas técnicas para ajustes na execução e
manutenção. Recife: PCR, Secretaria de Planejamento Urbano e Ambiental, Diretoria de
Desenvolvimento Ambiental, 1996.
MORENO, Manuel Francisco Navarro. 2001. Qualidade ambiental nos espaços livres em áreas
verticalizadas da cidade de São Paulo. Tese (doutorado). São Paulo. Faculdade de arquitetura e
urbanismo da Universidade de São Paulo. Doutorado em arquitetura e urbanismo.
OLIVEIRA, Carlos Henke. Planejamento ambiental na cidade de São Carlos/SP com ênfase nas
áreas públicas e áreas verdes: diagnóstico e propostas. Dissertação de mestrado. São Carlos:
UFSCar, 1996.
RECIFE. http://www.recife.pe.gov.br/pr/secplanejamento/planodiretor. Acessado em 2007.
SCOTTO, Gabriela (supervisão geral). Conflitos ambientais no Brasil: natureza para todos ou
somente para alguns? Rio de Janeiro: IBASE, 1997.
VERAS, Lúcia Maria de Siqueira Cavalcanti. Plano de arborização do Prof. Célio Bermann:
cidades: metodologia. Recife: PCR, 1985.
Fórum Internacional do Meio Ambiente - A conferência da Terra 606

O PARQUE DAS DUNAS DE NATAL-RN E O CAMPUS CENTRAL DA UNIVERSIDADE


FEDERAL DO RIO GRANDE DO NORTE (UFRN): CONTROLANDO O GABARITO
PARA MANTER O EQUILÌBRIO AMBIENTAL DA CIDADE DO NATAL-RN.

Ricardo Farias Amaral


Professor Dr. do Departamento de Geologia (UFRN)
Glauber Richard Sobreira de Carvalho
Técnico em Controle Ambiental (CEFET-RN)
Espedito Lima de Carvalho Segundo
Biólogo (UNP–Universidade Potiguar) espedito_19@hotmail.com

RESUMO
Este trabalho contém algumas conclusões dos estudos realizados para o Plano Diretor do
Campus Central da Universidade Federal do Rio Grande do Norte – UFRN, envolvendo
especificamente, a definição de parâmetros de controle de ocupação do solo e o mapeamento
termal. Tais aspectos tornam-se importante, pois o Campus limita-se com o Parque Estadual das
Dunas do Natal-RN, situada na área oriental do Estado na faixa costeira da cidade. Um dos mais
importantes componentes ambientais da cidade de Natal-RN, ocupando uma área de 1.172 ha. A
proposta orienta-se pelos seguintes argumentos: a manutenção do Parque das Dunas como
componente do patrimônio ambiental da cidade que depende de condições visibilidade e
valorização do seu caráter cênico–paisagístico; o equilíbrio do micro-clima da cidade depende do
controle da ocupação do solo nas áreas ao Parque. Atendendo a esses pressupostos, tomam-se como
referência as linhas de contorno das Dunas, e a topografia natural da área de estudo, a fim de
propor-se limites diferenciados de gabaritos para edificações localizadas no Campus Central da
UFRN.
Palavras Chave: Campus Central. Mapeamento termal. Ocupação do Solo. Parque das Dunas.

ABSTRACT
This work specifically contains some conclusions of the studies carried through for the
Managing Plan of the Central Campus of the Universidade Federal do Rio Grande do Norte -
UFRN, involving, the definition of parameters of control of occupation of the ground and the
thermal mapping. Such aspects become important, therefore the Campus is limited with the State
Park of Dunes of the Natal-RN, situated in the eastern area of the State in the coastal band of the
city. An one of the most important ambient components of the city of Natal-RN, occupying area of
1.172 ha. The proposal is oriented for the following arguments: the maintenance of the Park of
Dunes as component of the ambient patrimony of the city that depends on conditions visibility and
valuation of its scenic-paisagístic character; the balance of the microclimate of the city depends on
the control of the occupation of the ground in the areas to the Park. Taking care of to these
estimated, the lines of contour of Dunes, and the natural topography of the study area are overcome
as reference, in order to consider differentiated limits of answer sheets for constructions located in
the Central Campus of the UFRN.
Keywords: Central campus. Thermal mapping. Occupation of the Ground. Park of Dunes.

INTRODUÇÃO
O Parque Estadual das Dunas, primeira Unidade de Conservação implantada no Rio
Grande do Norte, criada através do decreto Estadual n.º 7.237, de 22 de novembro de 1977. É uma
importante área de Mata Atlântica com remanescente 80% da cobertura original do sitio onde esta
localizada o município de Natal-RN, sendo reconhecido pela Unesco em 1993 como "Reserva da
Biosfera da Mata Atlântica ".
Uma área de grande importância para a cidade do Natal-RN, o lugar que o cenário natural
ocupa discussão sobre a preservação do patrimônio ambiental e paisagístico do Município de Natal-
RN, não será necessários muitos esforços para percebermos a função do Parque das Dunas nesse
contexto serve de proteção e recarga para os lençóis freáticos dunar, de desempenhar um papel de
Fórum Internacional do Meio Ambiente - A conferência da Terra 607

contendor das areias dunares, evitando que atinjam a área urbana e para contribuir para a
amenização climática da cidade do Natal-RN.
Com diversificados elementos floristicos e faunisticos, geológico e geomorfologicos e
cênico – paisagísticos.
Os agrupamentos dunares apresentam valores paisagísticos e cênicos únicos na paisagem
urbana de Natal-RN, com locais diversificados, com texturas e fisionomias especificas. São
paisagens amplas sob um relevo suave, revestida por cobertura vegetal de Tabuleiro Litorâneo;
paisagens da Mata Atlântica sob um relevo diversificados, com varias tonalidade de verdes aberto,
de cores esbranquiçadas, podendo ser remanejadas pela ação dos ventos. Enfim, são paisagens de
beleza ímpar (CARVALHO, 2001).
Trata – se de uma área rica em recursos naturais, onde são propicias atividades de cunho
cientifico – educacional, turística e de lazer.
A legislação federal relativa aos Parques Ecológicos define que, em seu entorno, nenhuma
edificação pode ser executada a uma distância inferior a 10.000m (10 KM) de seus limites (Artigo
27 da Lei n.º 99.274/90 – CONAMA). Tal restrição, cujo objetivo e impedir alterações no
patrimônio biológico da Unidade de Conservação, certamente não se aplica ao nosso caso, uma vez
que o Parque das Dunas foi criado muito tempo depois da existência da cidade.
No Plano Diretor do Município (Lei 007/94), toda a área ocupada pelo Parque foi
delimitada como “Subzona de Preservação da Zona de Proteção Ambiental", sendo lhe aplicadas as
restrições de controle da ocupação do solo próprias chamadas de "Área de Preservação
Permanente". Além das restrições relativas à ocupação interna do Parque, o Plano Diretor
incorporou um parâmetro de controle urbanístico especial a ser aplicado às áreas da cidade como
características ambientais peculiares, denominada de "Controle de Gabarito". Por meio deste, a
exemplo de outras áreas do município localizado na faixa litorânea, todo o entorno do Parque das
Dunas, cuja a ocupação ainda apresenta níveis de verticalização controláveis, foi delimitado como
Área Especial de Controle de Gabarito.
Nessa área da cidade, que o Plano Diretor de Natal delimita como sujeita a um controle de
gabarito fixando até 6,0 (seis) metros a altura máxima das edificações, mas também considera como
passível de adensamento localiza-se o Campus Central da UFRN. No entanto, por ocasião dos
estudos para a elaboração de um Plano Diretor especifico para a área do Campus, observou – se que
os limites dos gabaritos poderiam sofrer alterações em função do conjunto de determinantes físico –
ambientais que caracterizam, a qual apresenta neste trabalho. Salienta-se que esta proposição tem
servido de referência ao processo de revisão do próprio Plano Diretor de Natal.

LOCALIZAÇÃO E CARACTERIZAÇÃO DA ÁREA DE ESTUDO


Nos últimos anos a cidade do Natal/RN vem passando por um intenso processo de
crescimento urbano caracterizado por estruturas horizontais e verticais, e a expansão da malha
urbana, em direção às cidades vizinhas.
O Parque Estadual das Dunas do Natal, esta situada na área oriental do Estado, na faixa
costeira da Cidade do Natal-RN, é possui uma área de 1.172 hectares. Está limitadas pela Via
Costeira, pelos bairros de Ponta Negra, Capim Macio, Nova Descoberta, Tirol, Petrópolis e Mãe
Luiza.
O Campus ocupa hoje uma área de 123 hectares, situado às margens da Avenida Senador
Salgado Filho, limita-se ao norte com o Conjunto Habitacional de Potilândia e com o Quartel do 7º
Batalhão de Engenharia de Combate – 7º BEComb.), ao sul com o Conjunto Habitacional de
Mirassol e a Cidade Jardim, a leste com o Parque das Dunas e a oeste com o Bairro de Candelária.
Atualmente as mudanças que o Campus esta sofrendo para ajustar a nova realidade da
cidade do Natal-RN, impulsionada pelo crescimento populacional perceptível são elas os
surgimentos de novos cursos, aumento da demanda de alunos assim como dos números de
laboratórios e setores de aula.
Fórum Internacional do Meio Ambiente - A conferência da Terra 608

Figura 1 - Localização do Campus da UFRN em vermelho ao centro.

A escolha dessa área se deve principalmente ao adensamento urbano que vem sofrendo na
última década. Localizada na sombra de vento do Parque das Dunas, está pouco favorecida pela
brisa do mar, além de apresentar elementos na forma urbana inadequados ao clima da região,
constitui fração urbana que merece maiores cuidados.

PARÂMETROS QUE ORIENTAM O ESTUDO DE GABARITO NA ÁREA DO CAMPUS EM


RELAÇÃO AO PARQUE DAS DUNAS.
A área do Campus Central da UFRN recorreu-se a categorias de analise situadas na esfera
das concepções e imagens de satélite, buscando-se basicamente, perceber o meio ambiente a partir
da relação interativa entre o objeto observado (percebido), e o observador e utilização de técnicas de
sensoriamento remoto, com base no geoprocessamento.
a – A percepção é uma forma de interação entre o observador e o objeto havendo grandes diferenças
entre os individuo estático em ação contemplativa e percepções configura-se em função do
efeito " estromboscópio " proporcionando pela ação dinâmica. Assim, seguindo os princípios da
Gestalt perceptiva, a pessoa, movimentando – se, poderá inferir o todo a partir das partes
observáveis, sendo as eventuais interrupções preenchidas automáticamente pelo conhecimento
acumulado, desde que tais lacunas sejam relativamente pequenas e em quantidade reduzida;
b – A paisagem modifica-se devido à perspectiva passível de ser adotada pelo observador, isto é, a
visão altera-se em função da distância entre o observador e o objeto observado. Assim, é obvio
que um pedestre andando na calçada frontal a uma edificação de apenas um pavimento (mesmo
com uma altura mínima de 3 m) ou mesmo a um muro mais alto (2,5m, por exemplo), estará
impedido de ver o que se passa após a construção e, dependendo da largura desta calcada e sua
relação em relação ao anteparo, não estará em condições de ver nenhuma outra coisa do lado da
via. O mesmo acontecerá com os ocupantes de um automóvel que trafega neste mesmo lado da
rua, os quais, mesmo estando mais distante do anteparo – o muro -, encontram-se em
desvantagem de estarem sentados e, portanto, com os olhos colocados numa cota inferior ao
individuo em pé. Entretanto, esta situação pode modificar –se radicalmente se tomarmos como
referência o ângulo de visão e a percepção de um passante com a mesma altura do primeiro, que
esteja na calçada oposta, num veículo na outra mão de trafego, ou mesmo mais alto (ônibus).
Fórum Internacional do Meio Ambiente - A conferência da Terra 609

Algumas técnicas do SPRING (Sistema de Processamento de Informações


Georreferenciadas). O Sistema SPRING é um banco de dados geográficos que gerencia e organiza
dados vetoriais e matriciais e realiza a integração de dados de sensoriamento remoto (INPE, 2004).
Após a aquisição de uma imagem de uma imagem IKONOS II, do ano de dezembro de
2005, com resolução espacial de 1 m, teve inicio um levantamento de pontos com o GPS
topográfico Promark 2, no Campus (figura 03) e adjacências.
Transportados para o Spring 4.1, os pontos obtidos possibilitaram o georeferenciamento da
imagem e a geração do Modelo Numérico do Terreno (MNT) e, consecutivamente, conduziram a
ortoretificação da imagem.
Em seguida, a modelagem do Banco de Dados no Spring foi discutida e esboçada, com a
definição de categorias e modelos de dados, planos de informação (PIs), classes, fontes e
informações.
A partir da imagem, a digitalização de vetores deu origem aos PIs ou mapas temáticos que
representam o conjunto das edificações (figuras 04 e 05) e o mapa termal do Campus extraído do
trabalho de CARVALHO et al (2006), analisando a compreensão da dinâmica térmica intra-urbana
e nos seus arredores, contribuindo para a formação de microclimas, diferenciado em diferentes
ambientes.
Posteriormente, estes mapas foram exportados para outros PIs, do modelo cadastral e, a
partir daí, os objetos foram editados, a tabela de atributos construída e a alimentação do banco de
dados propriamente dita pode ter o seu início. Na tabela, estão sendo disponibilizadas informações a
respeito das edificações (número de pavimentos, usos, área, entre outras).

RESULTADOS
A proposta desenvolvida para o Plano Diretor do Campus orienta-se conceitualmente pelo
paradigma do Plano Diretor de Natal e corrobora todos os seus pressupostos, restringindo-se a
rediscuti-los a necessidade de uma regulamentação que leve em frente às considerações as
peculariedades da área analisada, notadamente seus aspectos locacionais e topograficos. No que se
refere ao Controle de Gabarito, a proposta aponta para uma certa flexibilidade da Lei, tendo levado
em consideração os seguintes fatores:
• Perfil das Dunas;
• Topografia e forma de ocupação da área do Campus Central da UFRN;
• Perspectiva, a partir da BR – 101, do usuário considerado em atividade dinâmica (observador
em movimento).

Buscando garantir ao observador visualizasse o contorno completo do corpo dunar,


determinou-se um parâmetro traçado de linhas visuais localizando o individuo em posição
estratégicas, ou seja no trecho que contorna o Campus compreendido pelo Viaduto da estrada de
Ponta Negra e a Praça Cívica do Campus. Neste local, apesar das barreiras físicas produzidas pelo
conjunto habitacional Mirassol e pelo Shopping Via Direta.
Fórum Internacional do Meio Ambiente - A conferência da Terra 610

Limitado pelo Plano Diretor da Cidade de Natal, bem como pela própria tipologia e partido
adotados para a maioria das edificações, desde sua fundação, o Campus apresenta pouca
diversidade de altura. Predominam edificações com um ou dois pavimentos, e algumas exceções
com três ou quatro pavimentos. As edificações térreas são maiorias e estão distribuídas por toda a
área, as de dois pavimentos são freqüentes, mas as de três e quatro são raras, conforme a figura 07.
Fórum Internacional do Meio Ambiente - A conferência da Terra 611

Figura 07 – Mapa de Altura das Edificações

CONCLUSÕES
Respeitando essa necessidade de preservação do campo visual destacado, que os
parâmetros estabelecidos para o controle de gabarito na área do Campus (máximo de 6m de altura)
não se deve aplicar de maneira uniforme. A caracterização topográfica da área sugere uma
ocupação que admita uma variação nas alturas das edificações, as quais devem estar sintonizada
com os limites estabelecido pelo campo dunar.
Embora seja evidente que, pelas suas dimensões e por sua inserção na malha urbana de
Natal-RN, em perpectiva aérea se possa vislumbrar o Parque em sua totalidade e que, além disso,
pelas características atuais da ocupação de parte de seu entorno, seja impossível visualizar o Parque
de todos os pontos da cidade, não se deve permitir o aumento da dificuldade de visualização. A
liberação irrestrita dos gabaritos das edificações no entorno do Parque das Dunas poderá produzir
uma barreira visual densa e um aumento da temperatura e diminuição das direções dos ventos para
o restante da cidade, e intransponível criando grande lacunas à percepção e eliminando por
completo a relação de identidade entre os usuários (munícipes ou visitantes) e um dos bens do
patrimônio mais significativo para a cidade.

REFERÊNCIA BIBLIOGRÁFICA
ASSIS, Eleonora Sad de. Mecanismo de Desenho Urbano Apropriado a Alterações da Ilha de Calor
Urbano: Analise do Desempenho de Áreas Verdes em Clima Tropical. Dissertação (Mestrado).
UFRJ, Facudade de Arquitetura e Urbanismo, Rio de Janeiro, 1990.
CARVALHO, Glauber Richard et al: O Mapa Termal do Campus Central da UFRN. In: Anais em
CD-ROM. XI CONGRESSO NORDESTINO DE ECOLOGIA, Recife, PE, 2006.
CARVALHO, Márcia Monteiro. Clima urbano e vegetação estudo analítico e prospectivo do
Parque das Dunas em Natal. Dissertação (Mestrado)-UFRN, Departamento de Arquitetura, Natal,
2001.
CARVALHO; Glauber Richard Sobreira. Educação Ambiental no Contexto de Ecologia Urbana.
Monografia (Graduação)-Universidade Potiguar,Natal-RN 2006.
CONAMA. CONSELHO NACIONAL DO MEIO AMBIENTE, Lei n.º 99.274 /90, de 06 de junho
de 1990. Disponível em: www.mma.gov.br/port/conama , Acesso em 03 janeiro 2007.
Fórum Internacional do Meio Ambiente - A conferência da Terra 612

INPE – Instituto Nacional de Pesquisas Espaciais, 2004. Tutorial Introdução ao SPRING,


Geoprocessamento ao Alcance de Todos. www.dpi.inpe.br.
RIO GRANDE DO NORTE. Decreto n.º 7.237, de 22 de novembro de 1977. Declara de utilidade
pública, para fins de desapropriação, bens situados na área das dunas, adjacente ao Oceano
Atlântico, no município de Natal. Diário Oficial [do] Estado do Rio Grande do Norte, Natal, ano 80,
n. 4177, p. 2, 23. nov. 1977.
SILVA, Elisangela Alves de Jesus. As Dunas Eólicas de Natal/RN: datação e evolução. Dissertação
(Mestrado).PPGG. Programa de Pós Graduação em Geodinâmica e Geofísica. Departamento de
Geologia da UFRN. Natal, 2002.
Fórum Internacional do Meio Ambiente - A conferência da Terra 613

A PERMACULTURA EM UMA MOSTRA DE ARQUITETURA URBANA

Adriana Ayub
Graduanda em Ciências Biológicas/Bacharelado – Universidade Federal de Pernambuco (UFPE);
(ayub.adriana@gmail.com)
Bruno Paes Castelo-Branco
Cientista Ambiental, CASA (Criações alternativas pela sustentabilidade ambiental)
Carolina Lopes Moura
Bióloga, CASA.

RESUMO
O presente trabalho relata a experiência do grupo CASA – Criações de Alternativas pela
Sustentabilidade Ambiental -, composto por biólogos e arquitetos, no planejamento e execução do
Jardim Permacultural em uma mostra de arquitetura em Pernambuco em 2007, a Casa Cor®. A
Permacultura, norteadora do projeto, dentro de uma tendência ideológica, consiste na criação de
sistemas que sejam ecologicamente corretos e social e economicamente viáveis, que supram suas
próprias necessidades, não explorem ou poluam e que sejam sustentáveis a longo prazo. O espaço,
então, teve como objetivo despertar o interesse de visitantes, além de profissionais da Casa Cor
2007®, à reflexão de princípios e práticas que condizem com a cultura permanente do homem no
planeta, buscando uma vida com qualidade e diversidade biológica, cultural e tecnológica.
Procurando otimizar o uso do espaço, de forma a transformá-lo no mais funcional possível, os
elementos permaculturais pensados e alocados foram a horta mandala, o laguinho, o espiral de ervas
e o banco de mosaico sempre utilizando-se da técnica do mutirão para tais intervenções.
Palavras-chave: Permacultura, bioconstrução, arquitetura urbana

ABSTRACT
This paper tells the experience of the group CASA – Alternatives Creations for
Environmental Sustainability -, composed by biologists and architects, in the planning and
execution of the Permacultural Garden in one architecture exposition in Pernambuco – Brasil, Casa
Cor®. Permaculture, who guide the project, inside an ideological tendency, it is a creation of
ecologically correct and social and economically viable systems, that provide its own necessities,
don´t explore or pollute and be sustainable. The purpose of this area, therefore, was awake the
visitors and the Casa Cor 2007® professionals interests to the reflexion of the principles and actions
that agree with the human permanent culture in the planet, looking for a life with quality and
biological, cultural, technological diversity. To optimize the area use, to convert in a very functional
place, the permacultural elements was the mandala vegetable-garden, the lake, the herb spiral and
the mosaic bench, where the group always worked together for these interventions.
Keywords: Permaculture, bioconstruction, urban arquiteture

INTRODUÇÃO
Como é já sabido e bastante discutido entre os mais diversos ramos da sociedade,
especialmente no científico, o planeta vive sob a pressão de uma grande e grave crise ecológica, a
qual reflete diretamente nas condições econômicas, políticas e, sobretudo, sociais. Tal crise decorre
principalmente porque vivemos sob a hegemonia de um modelo de desenvolvimento baseado em
relações econômicas que privilegiam o mercado e usam a natureza e os seres humanos como
recursos e fontes de renda (Gadotti, 2000; Wilson, 2002).
Como resposta, primeiramente, aos impactos ambientais e sociais gerados pela agricultura
convencional, os australianos Bill Mollison e David Holmgren, criaram a Permacultura nos anos 70.
Segundo Mollison & Slay (1991), as culturas não sobrevivem sem uma base agricultural sustentável
e uma ética no uso da terra e, dessa forma, cunharam a palavra, cujo significado era agricultura
permanente, para referenciar “um sistema evolutivo integrado de espécies vegetais e animais
perenes úteis ao homem”. Logo depois, o conceito evoluiu para um sistema de planejamento para a
Fórum Internacional do Meio Ambiente - A conferência da Terra 614

criação de ambientes humanos sustentáveis, como resultado de um salto na busca de uma cultura
permanente, envolvendo aspectos éticos, socioeconômicos e ambientais (Mollison & Slay, 1991).
Pode-se acrescentar que a Permacultura oferece as ferramentas para o planejamento, a
implantação e a manutenção de ecossistemas cultivados no campo e nas cidades, de modo a que
eles tenham a diversidade, a estabilidade e a resistência dos ecossistemas naturais. (Rede Permear,
2006; Holmgren, 2002). Ao contrário de outros sistemas agrícolas modernos, a Permacultura está
ancorada fundamentalmente nos ombros da ecologia (Morrow, 1993). Ou seja, a filosofia por trás
visa trabalhar com a natureza e não contra esta. Caracteriza-se, portanto, como um trabalho de
observação do mundo natural com conclusões transferidas para o ambiente planejado (Mollison &
Slay, 1991, Holmgren, 2002).
Estes pesquisadores buscaram princípios éticos universais surgidos no seio de
sociedades indígenas e de tradições espirituais, que estão orientados na lógica básica do universo de
cooperação e solidariedade (Rede Permear, 2006; Holmgren, 2002). A Permacultura, portanto, é
também uma rede de pessoas e grupos difundindo soluções de design propostas em países ricos e
pobres de todos os continentes. Embora não seja em grande parte reconhecida pelo meio acadêmico
e ou apoiada pelo poder público ou pelo setor empresarial, os permacultores vêm contribuindo para
um futuro mais sustentável através de mudanças locais que influenciam direta e indiretamente ações
nos campos de desenvolvimento sustentável, agricultura orgânica, tecnologias alternativas e
planejamento de comunidades intencionais (Holmgren, 2002).
A Permacultura chegou ao Brasil com o primeiro curso dado por Bill Mollison em Porto
Alegre em 1992 (Rede Permear, 2006). Atualmente, existem vários Institutos de Permacultura e
comunidades baseadas em seus princípios (ver em http://www.permacultura.org.br/).
Além disso, alguns eventos que visam à sustentabilidade ambiental e social têm sido
observados em diversas áreas no Brasil. Para a arquitetura isso não tem sido diferente, como é o
caso de diversos encontros, congressos e afins. O Prêmio Planeta Casa - organizado pela Revista
Casa Cláudia - por exemplo, já teve 5 edições e incentiva com prêmios trabalhos na área de Ação
Social, Produtos, Projeto Arquitetônico, Projeto de Design de Interiores e Estudantes. A
participação em mostras e exposições tem sido, contudo, bastante limitada. Apenas alguns
elementos (luminárias, pisos, móveis de madeira certificada, etc.) podem ser vistos. Um ambiente
inteiro projetado para este fim, portanto, nunca foi observado.
No ano de 2007, porém, a Casa Cor PE abriu as portas para um paisagismo sustentável e
ecológico sob os princípios da Permacultura. Esta exposição de arquitetura, paisagismo e decoração
é realizada em imóveis desocupados, onde os profissionais são convidados a elaborar um projeto
para cada espaço. Encontra-se presente em todo o Brasil (13 capitais), outros pontos na América
Latina (Peru e Panamá) e Europa (Suécia). O evento existe há 22 anos e já soma 4 milhões de
visitantes com alto poder de consumo. A mostra no Estado de Pernambuco, que abrange os
territórios de Alagoas, Paraíba e Rio Grande do Norte, porém, existe há 12 anos e no ano de 2007
obteve um público de 458 009 pessoas (L&M, 2008).
Dessa maneira, o Jardim Permacultural, teve como objetivo central despertar o interesse
dos visitantes para a reflexão de seus princípios e práticas demonstrando a viabilidade e qualidade,
seja do ponto de vista estético e/ou funcional, de ambientes mais sustentáveis através de técnicas
permaculturais.

MATERIAIS E MÉTODOS
Com a idéia de divulgar em meios elitizados e a uma classe formadora de opinião,
tomadora de decisões e de alto nível de consumo, maneiras mais sustentáveis de se viver, um grupo
de amigos reuniu-se com a proposta de planejar um ambiente com elementos da Permacultura à
organização Casa Cor PE. Este grupo, o qual se consolidou durante o evento como o CASA
(Criações Alternativas pela Sustentabilidade Ambiental), é formado em sua maioria (8) por
estudantes, sendo apenas 3 profissionais. O espaço, o qual é pago pelos arquitetos que participam do
evento, foi cedido para o grupo trabalhar as idéias de sustentabilidade, ficando responsável, porém,
por gastos de obra, como diária de mão de obra e materiais de consumo.
Fórum Internacional do Meio Ambiente - A conferência da Terra 615

Na primeira visita ao espaço houve uma leitura da paisagem com o objetivo de se conhecer
as características locais e fazer o levantamento da área (figura 1A). Nesta leitura, foi observado o
caminho do sol, a passagem de vento e a influência das ruas próximas. Com essas informações, o
grupo, então, entrou em uma maratona de reuniões e discussões para planejar o espaço e de que
forma a Permacultura seria abordada. Afinal, não interessava apenas mostrar um ambiente bonito,
ele tinha que ser funcional, interativo, informativo e educativo. Por este motivo, as discussões eram
extremamente necessárias para o próprio desenvolvimento da idéia e do coletivo.
Nesta primeira fase, contatos começaram a se estabelecer a fim de firmar parcerias para a
execução do projeto. As parcerias se deram em forma de apoio com algumas empresas, uma ONG,
e alguns contatos dos integrantes do grupo, sendo elas: Serviço de Tecnologia Alternativa
(SERTA), Sementeira Atmosphera, Tramontina, Sementeira Dapraça, Aldeia Bonsai, Sítio Nova
Canaã, StudioCoisa, Sandra Paro, SEBRAE e Jorge Barbosa.
No início de setembro de 2007 começaram as intervenções no espaço. As primeiras foram
focalizadas nas podas das espécies vegetais, visando o aumento de incidência de luz solar, uma
maior circulação de vento e, conseqüentemente, um desenvolvimento sadio das espécies podadas.
Essas intervenções beneficiariam diretamente a horta do projeto. O canteiro para a horta em
mandala foi demarcado reaproveitando as podas das árvores e elevado a 20 cm (vinte centímetros)
do nível do terreno. O solo foi avaliado e fertilizado com adubo orgânico e curtido. Após o tempo
de preparo, foram plantadas mudas das espécies vegetais escolhidas para estabelecer o consórcio
dentro dos cultivos.
Ao mesmo tempo, foi demarcado o lago com a finalidade de armazenar as águas pluviais
para irrigação e atração de insetos, anfíbios, pássaros e outros animais. O lago foi construído com a
técnica utilizada no SERTA, utilizando-se fina camada de cimento, areia e tijolos maciços de
demolição na sua borda. Foi necessário ainda lavar o lago por alguns dias, eliminando a toxina do
cimento utilizado. Assim, foram inseridos peixes e plantas aquáticas criando um microambiente
propiciando a fertilização natural da água. A irrigação foi realizada através de um sistema, também
desenvolvido pelo SERTA, feito de mangueiras e garrafas PET, onde a água era bombeada duas
vezes ao dia para a horta, o espiral, o pomar e alguns canteiros.
O espaço trabalhado era composto por dois ambientes denominados “Jardim
Permacultural” e “Jardim Central”. Neles, houve a reutilização de muitos materiais (tijolos de
demolição, placas de ferro, madeira de poda, azulejos e cerâmicas, etc.) a fim de aumentar a vida
útil dos mesmos, diminuir a produção de lixo, seja da obra do evento, seja de outras construções
vizinhas, e diminuir o custo com a construção do espaço.
Para o grupo conseguir financiar a realização do projeto, os próprios integrantes doaram
cotas e três bazares foram realizados com o apoio de um bar local, Toca da Joana, o qual forneceu o
espaço para a venda de produtos usados, como roupas, CDs, livros, bijuterias e mudas de plantas,
algumas retiradas do Jardim Permacultural. Este evento, portanto, encontrava-se dentro de um dos
princípios que nortearam o grupo na construção do espaço; o de reutilização, dando, assim, uma
maior vida útil aos produtos. Além disso, os integrantes também trabalharam na execução do
projeto, sempre buscando a realização de mutirões. Este tipo de intervenção é muito utilizado na
Permacultura e áreas afins, pois se trata de mobilizações coletivas para lograr um fim, baseando-se
na ajuda mútua prestada gratuitamente. É uma expressão usada originalmente para o trabalho no
campo ou na construção civil de casas populares, em que todos são beneficiários e,
concomitantemente, prestam auxílio (Wikipedia, 2008).
Como prediz alguns princípios da Permacultura, procurou-se sempre estabelecer contato
com pessoas diversas, para a formação de uma rede de ajuda mútua, e utilizar os produtos locais
para valorizar estes recursos e diminuir os impactos com o transporte (Mollison & Slay, 1991,
Holmgren, 2002). Algumas fotos dos processos de construção pelos membros e colaboradores do
grupo podem ser vistas na figura 1 (B, C e D).
Fórum Internacional do Meio Ambiente - A conferência da Terra 616

Figura 1. (A) Processo de reconhecimento do espaço cedido para o coletivo CASA; (B) Construção
dos canteiros da horta (à esquerda) com terra retirada do lago (à direita); (C) Construção da horta
em mandala utilizando madeira de poda do próprio espaço e de ruas próximas ao local. Jardim
Permacultural. (D) Construção do mosaico do banco de ferrocimento com cerâmicas reutilizadas.
Jardim Central - Casa Cor PE 2007.

RESULTADOS E DISCUSSÃO
O Jardim Permacultural (figura 2) foi um projeto baseado nos conceitos de Permacultura;
técnica que se utiliza da integração do homem com o meio ambiente buscando a sustentabilidade
ambiental. Os elementos que compõem o ambiente - a horta em mandala, o laguinho, o espiral de
ervas, o banco de mosaico, obras de arte e pisos - foram dispostos de forma a otimizar a utilização e
fluxo de energia. Tudo o que foi construído foi pensado primeiramente em sua funcionalidade e
finalidade, sendo o elemento estético incorporado posteriormente.
O uso intenso de energia é uma das características da atividade de construção civil, sendo
sua maior utilização nos processos de extração e transporte das matérias primas, dadas as grandes
distancias das jazidas aos centros de produção e/ou consumo (Schenini et al, 2004). Dessa maneira,
procurou-se utilizar sempre materiais locais. A economia de energia também encontra-se presente
no jardim a partir da utilização de materiais que seriam descartados em construções comuns, no
reaproveitamento de águas pluviais e de irrigação e na economia de energia que seria gerada caso
fossem utilizados matérias-primas novas. Todos os elementos foram dotados de curvas e caminhos
sinuosos que, segundo a Permacultura, possibilitam circulação de energia no ambiente.
A horta em mandala (figura 3), construída em forma circular para evitar o desperdício da
água e facilitar o manuseio (Nakasato, 2005), é uma marca registrada da Permacultura. A palavra
mandala vem do sânscrito que significa sagrado ou círculo mágico. Uma das características da
Permacultura é a diversidade e, por isso, a produção de diversas espécies no mesmo canteiro da
horta reduz as perdas por pragas e doenças, melhorando as condições do solo e resultando em
alimentos mais saudáveis. As espécies vegetais cultivadas dentro da horta totalizaram 11 espécies:
açaí (Arecaceae), alface (Asteraceae), beijo de moça (Balsaminaceae), cebolinho (Liliaceae),
corama (Crassulaceae), feijão de porco (Fabaceae), morango (Rosaceae), rabanete (Brassicaceae),
rúcula (Brassicaceae), tomate (Solanaceae) e salsa (Apiaceae).
No Jardim Permacultural, o espiral de ervas (figura 4) é ideal, pois além da beleza estética
economiza muito espaço, sem deixar de produzir (Hemenway, 2000). Na medida em que a espiral
sobe, os espaços produtivos e as bordas aumentam criando diferentes microclimas úteis. De um lado
Fórum Internacional do Meio Ambiente - A conferência da Terra 617

da espiral incide sol direto, enquanto que do outro existe sombra parcial. Oferecendo, assim,
diferentes aspectos e drenagens, onde parcelas mais ensolaradas e secas são destinadas a ervas ricas
em óleos, e parcelas úmidas e sombreadas para ervas de folhagem verde (Mollison & Slay, 1991).
Cada erva utilizada, portanto, deve ser posicionada no seu melhor microclima dentro da espiral.
Neste elemento, foram utilizadas 9 espécies vegetais dentro do espiral: babosa (Liliaceae), bredo
(Portulacaceae), chambá (Acanthaceae), hortelã-miúda (Lamiaceae), hortelã-graúda (Lamiaceae),
mastruz (Chenopodiaceae), manjericão (Lamiaceae), pimenta (Solanaceae) e anador (Acanthaceae
O espaço do pomar didático foi dedicado a 12 espécies de plantas que tivessem a função
alimentícia e medicinal também agregando a função estética. Foram elas: abacate (Lauraceae), açaí
(Arecaceae), amora (Moraceae), sapoti (Sapotaceae), graviola (Annonaceae), banana (Musaceae),
bredo (Portulacaceae), laranja (Rutaceae), mamão (Caricaceae), ubaia (Myrtaceae), pimenta
(Solanaceae) e quiabo (Malvaceae).
A escolha das espécies vegetais dentro do jardim foi feita sempre levando em consideração
a diversidade que poderíamos proporcionar dentro de cada elemento projetado. A possibilidade de
se cultivar diferentes tipos de plantas num mesmo espaço possibilita e estimula o aparecimento de
novas vidas e interações entre espécies, a partir da horta, do pomar, do espiral e dos canteiros do
ambiente foi possível perceber o aparecimento de espécies animais (pelas plantas e pelo lago).
Dentro do Jardim Permacultural, a atenção aos sistemas biodiversos foi sempre uma
preocupação do grupo no planejamento do ambiente. (Procurar a citação de Mollison de consórcio).
As vantagens que estes sistemas apresentam na diminuição de insumos externos e na auto-regulação
do ambiente conduzem a uma sustentabilidade na sua produção e manutenção. A diversificação das
atividades garante, também, maior flexibilidade aos sistemas para que tanto reajam a conjunturas
adversas como potencializem as condições favoráveis. Apesar das múltiplas vantagens da
manutenção de sistemas agrícolas biodiversificados, os últimos cinqüenta anos têm sido marcados
pela tendência de simplificação exagerada destes sistemas (Almeida et al, 2002). Sendo assim, a
abordagem dentro do ambiente torna-se disseminadora da prática de cultivos biodiversos mesmo
dentro do paisagismo urbano.
O lago (Figura 5) possuiu a função de armazenar água, criar peixes, atrair anfíbios e
pássaros, além de produzir plantas aquáticas. O retorno da água ao solo é feito através da irrigação
com o uso da água do lago, naturalmente fertilizada pela fauna e flora. Outra importante função do
lago é criar um microclima úmido próximo a horta, amenizando o calor provocado pelas altas
temperaturas de verão e fornecer plantas aquáticas como biofertilizantes.
O banco de mosaico (Figura 6), com base feita a partir de tijolos reutilizados da obra, foi
construído com a técnica de ferrocimento, o qual é um material constituído de uma argamassa de
cimento e de areia envolvendo um aramado de vergalhões finos e telas. Na prática, as características
do ferrocimento são parecidas com as do concreto armado. A argamassa, assim como o concreto, é
mole nas primeiras horas e depois endurece. Portanto, também é moldável. A grande diferença é
que as peças do ferrocimento são bem mais finas (1,5cm a 3,5cm) que as de concreto armado, mas
exigem formatos arredondados para ficar resistentes. O banco foi revestido por mosaico de
cerâmica e azulejos retirados do próprio imóvel e de outras obras presentes na cidade, buscando
sempre resgatar a história do local e o reaproveitamento de materiais locais.
As obras de arte do jardim pertenceram a dois artistas, um da capital pernambucana, Jorge
Alberto Barbosa, e outro do sertão, Zé Bezerra. O ponto em comum entre eles é o reaproveitamento
de materiais para a confecção das obras. O totem (figura 7) e os bancos em forma de cachorros
foram concebidos pelo artista Jorge, onde o primeiro foi feito com madeira de um antigo coqueiro
caído e os segundos com placas de ferro encontradas em ferro velho. A obra do Zé Bezerra, o
pássaro, foi feita também com madeira reutilizada. Este artesão utiliza em suas obras árvores caídas,
pedaços de tronco e raízes, retratando o universo do sertanejo. Dessa forma, os artistas também
foram escolhidos cuidadosamente para que estivessem em conformidade com os princípios da
Permacultura.
Mais exemplos de reutilização de material no ambiente foram: a construção dos pisos com
tijolos maciços reutilizados (tijolos de demolição), utilizando a menor proporção de cimento
Fórum Internacional do Meio Ambiente - A conferência da Terra 618

possível; a ponte - chapa de ferro de ferro-velho; e as luminárias de garrafa pet, cujo fornecedor
também foi escolhido com base em sua preocupação com o meio ambiente.
No Brasil, em particular, a falta de uma consciência ecológica na indústria da construção
civil resultou em estragos ambientais irreparáveis, agravados pelo maciço processo de migração
havido na segunda metade do século passado, quando a relação existente de pessoas no campo e nas
cidades, de 75 para 25%, foi invertida, ocasionando uma enorme demanda por novas habitações
(Schenini et al, 2004). A construção civil é, ainda, a maior fonte geradora de resíduos de toda a
sociedade, sendo responsável por 41 a 70% da massa total de resíduos sólidos urbanos nas cidades
de médio e grande porte do Brasil (Pinto, 1999).
Dada a dimensão do problema e a abrangência do impacto que a atividade da construção
civil exerce sobre o meio ambiente, a economia e sobre o homem, é necessário que a sociedade em
toda a sua dimensão - governamental, privada e organizações não governamentais - contribua para a
busca de soluções que a racionalizem, visando o equilíbrio entre o econômico e a sustentabilidade
(Schenini et al., 2004). A reutilização de materiais de origem da construção civil, então, surge
dentro do projeto Jardim Permacultural com a perspectiva de disseminar uma contribuição na
minimização do impacto ambiental gerado por estes.

Figura 2. Jardim Permacultural. Casa Cor PE Figura 3. Canteiro esquerdo da horta em


2007 mandala com canteiro feito a partir de madeira
de poda. Casa Cor PE 2007

Figura 4. Espiral de ervas do Jardim Figura 5. Lago do Jardim Permacultural


Permacultural construído com entulho e pedra construído com uma fina camada de cimento
rachão da obra da Casa Cor PE 2007. sob consultoria do SERTA. Casa Cor PE 2007
Fórum Internacional do Meio Ambiente - A conferência da Terra 619

Figura 6. Banco de mosaico construído com a Figura 7. Totem representando o homem e o


técnica de ferrocimento e decorado com azulejos elemento místico no espaço Jardim
reutilizados. Piso em mandala de mosaico de Permacultura na Casa Cor PE 2007.
pedras. Casa Cor PE 2007

CONCLUSÃO
O grupo CASA baseando-se nos princípios da Permacultura, com o objetivo de contribuir
para uma transformação do modelo econômico atual e possibilitar uma mudança de paradigma na
direção de uma cidadania planetária, teve como primeira experiência uma mostra de arquitetura
urbana. O ambiente projetado, Jardim Permacultural, dentro do profundo envolvimento do grupo
com as causas ecológicas, surgiu como uma maneira de difundir valores e princípios de uma cultura
de sustentabilidade do planeta.
O Jardim Permacultural, espaço proposto para a reflexão das pessoas acerca de seus
princípios e práticas demonstrando a viabilidade e qualidade de técnicas alternativas, cumpriu,
então, o seu papel no sentido de demonstrar aos visitantes da mostra, Casa Cor PE 2007, a
possibilidade de planejamento e execução de um espaço preocupado com a temática ambiental.
Sendo assim, foi um dos espaços mais elogiados do evento por sua beleza, criatividade e,
principalmente, inovação. Conseguiu reunir pessoas interessadas, as quais dificilmente recebem este
tipo de informação pela mídia, para conversas, questionamentos e discussões. Entretanto, o
processo educativo é mais longo e contínuo e apenas um espaço temporário com princípios que
visam à sustentabilidade é insuficiente para a obtenção do êxito no processo de educação.
Os elementos projetados dentro do espaço foram escolhidos e construídos com intuito de
demonstrar a possibilidade de um ambiente esteticamente bonito, funcional e em harmonia com o
meio natural. Tanto a horta em mandala, o espiral e o lago foram importantes nestas questões; a
primeira e o segundo com sua diversidade de culturas trouxeram ao ambiente diversas
possibilidades de cultivos numa mesma área, sendo atrativo para a biodiversidade local, como o foi
também o lago. As escolhas quanto aos elementos empregados no espaço foram, portanto,
satisfatórias no sentido de preencher as funções de abundância de vida e atividade menos
impactantes propostas.

REFERÊNCIAS BIBLIOGRÁFICAS
ALMEIDA, P.; TARDIN, J. M. & PETERSEN, P. 2002. Conservando a biodiversidade em
ecossistemas cultivados - Ação comunitária na manutenção de variedades locais no Agreste da
Paraíba e no Centro-Sul do Paraná.
GADOTTI, M. 2000. Pedagogia da Terra. 5 ed. Editora Peirópolis – São Paulo. 217 pp.
HEMENWAY, T. 2000. Gaia’s Garden: A guide to Home-Scale Permaculture. Chelsea Green
Publishing Company. White River Junction, Vermont. 222 pp.
HOLMGREN, D. 2002. Permaculture: Principles & Pathways Beyond Sustainability. Holmgrem
Design Services. Australia.
Fórum Internacional do Meio Ambiente - A conferência da Terra 620

LEGAN, L. 2007. A Escola Sustentável: Eco-Alfabetizando pelo Ambiente. Imprensa Oficial-


Ecocentro IPEC, GO. 173 pp.
L&M Eventos e Participações LTDA. 2008. Apresentação do Histórico Casa Cor®
McDONOUGH, W & BRAUNGART, M. 2002. Cradle to Cradle: Remaking the way we make
things. North Point, New York. 193 pp.
MOLLISON, B. & SLAY, R. M. 1991. Introdução à Permacultura. Tagari Publications. Tyalgum,
Australia. 203 pp.
MORROW, R. 1993. Permacultura Passo a Passo. Ecocentro IPEC, GO. 155 pp.
NAKASATO, V. 2005. Imersão total: No Ecocentro IPEC, em Pirenópolis (GO), o conceito de
desenvolvimento sustentável é traduzido para a vida cotidiana. Revista Educação 102. Disponível
em < http://revistaeducacao.uol.com.br/textos.asp?codigo=11290>. Acesso em 13/03/08.
PINTO, T. P. 1999. Metodologia para a gestão diferenciada de resíduos sólidos da construção
urbana. São Paulo, Tese (doutorado) - Escola Politécnica, Universidade de São Paulo, 189pp.
Rede Permear – Rede de Permacultores. Disponível em: <http://www.permear.org.br/.> Acesso em
11/03/08
SCHELL, J. 1985. O destino da Terra. Record, Rio de Janeiro.
SCHENINI, P. C., BAGNATI, A. M. Z. & CARDOSO, A. C. F. 2004. Gestão de Resíduos da
Construção Civil. Congresso Brasileiro de Cadastro Técnico Multifinalitári. UFSC - Florianópolis.
TOYNBEE, A. 1982. A humanidade e a mãe Terra. Zahar, Rio de Janeiro.
Wikipedia – A enciclopédia livre. Disponível em: <http://pt.wikipedia.org/wiki/Mutir%C3%A3o.>.
Acesso em 07/04/2008.
WILSON, E.O. 2002. O futuro da vida. Editora Campus, Rio de Janeiro. 242 pp.
Fórum Internacional do Meio Ambiente - A conferência da Terra 621

ANÁLISE DA PERCEPÇÃO DE POLUIÇÃO VISUAL: ESTUDO DE CASO COM


TRANSEUNTES DA AVENIDA CONDE DA BOA VISTA, RECIFE-PE.

Adauto Alex Dos Santos


Gabriela Souza Cavancanti
ga_bi_ela@yahoo.com.br
Ralph Albuquerque Lacerda
Graduandos do curso de Ciências Ambientais da Universidade Federal de Pernambuco

RESUMO
A poluição visual pode ser definida como qualquer tipo de “agressão” aos olhos da
população. Isso engloba lixo espalhado pelas ruas, pichação em muros, o excesso de outdoors,
placas publicitárias e fios elétricos, por exemplo. Neste trabalho, objetivou-se identificar os
principais poluentes visuais existentes na avenida, bem como averiguar se a lei municipal que trata
da disposição de propagandas está sendo cumprida, e analisar a percepção dos transeuntes acerca
dos poluidores visuais. A área de estudo compreendeu a Avenida Conde da Boa Vista, localizada na
cidade do Recife, um dos principais pólos comerciais da capital. Foram aplicadas 400 entrevistas
estruturadas, em abril de 2006. Os Poluentes visuais mais freqüentes ao longo da avenida foram:
painéis, placas/letreiros, lambe-lambe, calçada imperfeita, poste com fiação aérea e lixo acumulado,
dentre esses o mais citado pelos transeuntes foi calçada imperfeita (26%). A maior parte dos
entrevistados preocupa-se mais com o conteúdo dos outdoors (58%) do que com sua quantidade
(42%), desconhecem o órgão que fiscaliza as propagandas (60%) e são a favor de sua redução
(60%). Homens (25%) e mulheres (24%) elegem a calçada imperfeita como maior poluente visual.
Todas as faixas etárias perceberam no mínimo 90% dos poluentes visuais presentes na avenida. Os
cidadãos que mais freqüentam a avenida, percebem lixo (25%) e calçada (16%) como maiores
poluentes visuais. Indivíduos com diferentes graus de instrução demonstram percepções distintas.
Vários descumprimentos da lei municipal de propaganda foram encontrados, fato grave, afinal, no
geral seus efeitos são notados pela população o que agrava o estresse no dia-a-dia dos centros
urbanos.
Palavras-chave: Poluição visual, Percepção, Propaganda.

ABSTRACT
Visual pollution can be defined as any type of “aggression” to the eyes of the population.
In that is included trash in the streets, excess of advertising announcements, electric wires, etc. The
objective of this study was to identify the main visual pollutants in the avenue, to inquire if the local
law is being respected and analyze the passer-bys perception about visual pollution. The area of
study was the Conde da Boa vista avenue, one of the main commercial point of Recife (PE). 400
interviews were made in April, 2006. The most frequents pollutants were panels, announcements,
lick-it licks, damaged sidewalk, accumulated trash and pole wires. Amongst these the most cited
was damaged sidewalk (26%). The most of the interviewed worry more with the content (58%) of
announcements then with their quantity (42%), are unaware of the announcements fiscalization
agency (60%) and are favorable to reduction the external midia (60%). Men (25%) and women
(24%) has the damaged sidewalk as the worst visual pollutant. All the ages have notices at least
90% of the pollutants being present in the avenue. The citizens who have more frequency in the
avenue say that the trash (25%) and damaged sidewalks (16%) are the worst pollutant. Individuals
with different instruction degrees show different perceptions. In various situations the
announcements law has been broken, serious fact, becouse the effects are noticed by the population,
aggravating the stress in the urban centrers.
Key-words: Visual pollution, Popular perception, Midia.

INTRODUÇÃO
Fórum Internacional do Meio Ambiente - A conferência da Terra 622

A poluição visual é um conceito que gera controvérsias, afinal ela seria o contrário a um
ambiente belo e harmônico. Mas afinal o que é belo? É um conceito subjetivo, que depende da
cultura, sexo, idade, experiência de vida, período histórico, entre outros aspectos em que se encaixa
um determinado observador da paisagem (YI-FU TUAN 1980). Seria correto impor um padrão a
ser seguido?
FERRARI 2004 in GENTIL 2007, define poluição estética como: "presença no ambiente
de elementos que, isoladamente ou pela concentração excessiva, provocam sensação visual
desagradável, contrária ao bom gosto, inestética”. Trata-se de conceito subjetivo porém de consenso
unânime; ex.: a ninguém agrada uma excessiva concentração de painéis com mensagens, ainda que
úteis. Isso engloba lixo espalhado pelas ruas, pichação em muros, o excesso de outdoors, placas
publicitárias e fios elétricos, por exemplo (PRADO, 2004).
Para CAMPOS 2006, os efeitos desta poluição atinge diversas áreas como a economia, o
turismo, o trânsito e a saúde. Ele argumenta que uma cidade mal conservada, um imóvel em mesma
situação, não é uma imagem atraente e conseqüentemente causa prejuízos ao proprietário.
Do mesmo modo o mal posicionamento de um semáforo, placa de sinalização ou
propaganda, pode trazer confusão aos motoristas e pedrestes, pois distraem a atenção causando
irritação, nervosismo e para RAMOS, 2004 podem causar acidentes.
LEMOS 2006 in GENTIL 2007 diz que "cada cidade constrói certa identidade visual,
diferenciando-se das demais. Entretanto, tal identidade perde o significado com os excessos do
mundo capitalista, em especial com o fenômeno da poluição visual."
“Muito em breve, todas as cidades se parecerão! E não será preciso conhecer mais
nenhuma delas. Estar numa delas será um pouco como estar em qualquer uma delas, ou ainda, estar
em nenhum lugar.", comenta CARVALHO in LEMOS 2006.
Segundo FIOROLO, 2001 a utilização de cores e materiais distintos, de acordo com cada
uso estabelecido no edifício, segmenta-o e impossibilita sua leitura como uma obra de arquitetura; e
a utilização de marquises encobrindo todo o edifício, bloqueia sua valorização como elemento
histórico na cidade.
Conclui-se que o turismo passa a ser prejudicado, já que o interesse do turista é conhecer
locais fora de sua rotina que apresentem patrimônio histórico, cultural e natural conservados.
O estudo científico intitulado “Stress, Saúde e Poluição Visual” realizado por
VASCONCELLOS 2003 in CAMPOS 2006 provou que a poluição visual acentua o nível de stress,
acarretando desta forma prejuízos à saúde humana. O autor afirma que existem estudos assegurando
que um indivíduo civilizado recebe cerca de 23.000 informações por dia,e aquelas que são
causadoras de stress, desencadeiam um processo estruturado no qual os núcleos cerebrais
responsáveis pela elaboração das informações, são acionados e preparam uma resposta
comportamental a cada uma delas. A poluição visual deprecia a qualidade de vida (ROLLO e
ROLLO, 2004).
Cabe destacar que a Lei Federal nº 6.938/81, que “dispõe sobre a Política Nacional do
Meio Ambiente, seus fins e mecanismos de formulação e aplicação, e dá outras providências”, em
seu inciso III do art. 3º, define o que é poluição:
“III – poluição, a degradação da qualidade ambiental resultante de atividades que direta ou
indiretamente:
a) prejudiquem a saúde, a segurança e o bem-estar da população;
b) criem condições adversas às atividades sociais e econômicas;
c) afetem desfavoravelmente a biota;
d) afetem as condições estéticas ou sanitárias do meio ambiente;
e) lancem matérias ou energia em desacordo com os padrões ambientais estabelecidos;”
A poluição visual também pode ser entendida como um problema de ocupação do solo
urbano, que de acordo com o artigo 30 da Constituição Federal compete aos Municípios, e não à
União, legislar.(PEREIRA 2002)
Diante de interferências esteticamente prejudiciais ao panorama natural ou urbano, faz-se
necessário identificar a existência da poluição visual como o comprometimento aos valores
Fórum Internacional do Meio Ambiente - A conferência da Terra 623

ambientais, da mesma maneira como outras formas de poluição (do ar, das águas, dos solos e etc.)
(MAURANO, 2007).
Nesse contexto, o presente artigo visa identificar e qualificar os poluentes visuais,
averiguar se a lei municipal de publicidade está sendo cumprida, e confrontar a percepção dos
transeuntes da avenida em questão, em relação aos poluidores visuais com a percepção científica. E
analisar se os transeuntes percebem e se sentem afetados com a poluição visual .
Foram testadas as hipóteses de que (1) graus de instrução diferentes resultam em
percepções distintas de poluentes visuais; (2) os entrevistados do sexo feminino percebem mais
propagandas como poluentes visuais do que o sexo masculino; (3) pessoas que transitam com
menor freqüência na avenida percebem a propaganda como o principal poluente visual; (4)
indivíduos com mais idade percebem mais poluentes visuais que os jovens;
(5) um maior número de indivíduos responda que a quantidade excessiva de outdoor é pior
do que um conteúdo de má qualidade (este conteúdo foi definido pelo próprio entrevistado); (6) a
maioria das pessoas seja a favor de uma redução no número de propagandas; (7) a maioria dos
transeuntes desconhecem o responsável pela fiscalização da disposição de propagandas.

MATERIAIS E MÉTODOS
A área de estudo compreendeu a Avenida Conde da Boa Vista, localizada na cidade do
Recife, Pernambuco, selecionada pelo grupo de estudo porque possui um fluxo intenso de pessoas
(em média 40 mil transeuntes por dia) e vasta área comercial.
Inicialmente foi feito um levantamento bibliográfico sobre poluição visual e da legislação
federal e municipal pertinente à realização do trabalho, em seguida, listou-se os poluentes visuais
presentes em campo, e elaborou-se uma entrevista estruturada (ANEXO I) destinadas a 400
transeuntes da avenida, realizada durante uma semana no mês de abril de 2006. Os pedestres
entrevistados foram abordados aleatoriamente em horários diurnos .
Foram contabilizados a freqüência com que as pessoas passam na avenida, o sexo, o
grau de instrução e a idade. Relacionou-se cada uma dessas categorias, separadamente, com o que o
transeunte percebe como o elemento mais desagradável visualmente. O questionário constou de
perguntas relativas ao o que o entrevistado acha pior, o excesso de outdoors ou o conteúdo exposto
por ele; quais os poluentes presentes no local; se os entrevistados gostariam que fosse reduzido o
número de propagandas na avenida, e se eles sabem que órgão fiscaliza as propagandas. Por fim, os
resultados da pesquisa foram analisados, dispondo-os em porcentagem.
Detectou-se a presença e ausência dos poluentes ao longo de cada quarteirão da
avenida (caso estivesse presente em todos os quarteirões teria 100% de freqüência ao longo da
avenida). Com o intuito de flagrar o desacordo entre a lei municipal e poluição visual, foram
fotografadas irregularidades ao longo da Av. Conde da Boa Vista (Figuras 1, 2, 3 e 4).

RESULTADOS E DISCUSSÃO
Os poluentes visuais detectados no local de estudos foram: banner, folhetos/folder, totens,
outdoor, cartazes, marquises, faixas, árvores mal podadas, cavaletes, obras inacabadas, prédio mal
conservados, engarrafamento, asfalto imperfeito, pichação/grafite, painéis, placas/letreiros, lambe-
lambe, calçada imperfeita, poste com fiação aérea e Lixo acumulado. Sendo os seis últimos
poluentes listados acima com 100% de presença ao longo da avenida (isto significa que em cada
quarteirão foi observada a presença de pelo menos uma unidade de cada poluente).
Traçando um perfil do transeunte da Avenida Conde da Boa Vista, a maioria é do sexo
masculino (56%), trafega semanalmente (24%), possui o ensino fundamental completo (30%) e tem
entre 15 e 20 anos (32%).
A maior parte dos entrevistados se incomoda mais com o conteúdo dos outdoors (58%) do
que com a quantidade, desconhecem o órgão fiscalizador de propagandas (60%) e gostariam que
fosse reduzido o número de propagandas na avenida (60%).
Fórum Internacional do Meio Ambiente - A conferência da Terra 624

A sociedade está condicionada a aceitar essas invasões ao ambiente visual seja por
conservadorismo, seja porque não vislumbra formas de reagir. Tal maneira de pensar está sem
dúvida relacionada ao problema da tradicional confusão do público com o privado, a caracterizar a
formação da própria identidade brasileira, o que é historicamente verificável. Entre nós, a partir da
colonização portuguesa, vige o patrimonialismo, ordem de coisas em que o Estado não se distingue
dos particulares e procede como sendo um deles. A contrapartida é que a sociedade também não
consegue distinguir o público do privado, com tendência a considerar "de ninguém" os espaços
públicos e, portanto, utilizáveis a benefício dos interesses particulares. Atirar na rua objetos de
dentro dos carros é só um pálido exemplo dessa verdadeira filosofia de vida.(GENTIL, 2007)
Assim a população se sente inibida a reclamar desses exageros porque entende que o
patrimônio alheio - no caso os estabelecimentos comerciais - não têm qualquer compromisso com a
paisagem geral, nem, de resto, com a sociedade. Desde que as coisas sejam feitas "na propriedade
privada", o cidadão comum não se sente com direito de reclamar. (GENTIL, 2007)
Por sua vez, o comerciante, ou o prestador de serviços, se vê sinceramente no direito de
instalar, no âmbito físico do seu imóvel, toda sorte de placas, tabuletas, faixas e imagens,
simplesmente porque é o proprietário. A paisagem pública é uma categoria que nunca contou para
ele, ou mesmo nunca chegou a existir como tal (GENTIL, 2007).
Além disso, não há interesse por parte do governo em fiscalizar as propagandas e manter
íntegras as vias públicas, no caso da Poluição Visual, seus males são mais psicológicos que
materiais e, talvez por isso, é deixada para segundo plano por nossos governantes. Os instrumentos
legais são oferecidos aos poderes públicos para coibir a degradação pela poluição visual. Só que na
maioria das vezes falta vontade política para que possa cumprir a lei (NASCIMENTO E
PASQUALETO, 2004).
Não há tradição jurídica na aplicação do art. 54 da Lei n. 9605/98, que reza: "Causar
poluição de qualquer natureza em níveis tais que resultem ou possam resultar em danos à saúde
humana, ou que provoquem a mortandade de animais ou a destruição significativa da flora: Pena –
reclusão, de 1 (um) a 4 (quatro) anos, e multa; § 1º. Se o crime é culposo: Pena – detenção, de 6
(seis) meses a 1 (um) ano, e multa. Objeto da tutela é o "meio ambiente ecologicamente equilibrado,
que propicie boas condições de desenvolvimento à vida e à saúde humana [...]", no dizer de
CONSTANTINO, 2001.
O tipo de poluição visual perceptível mais citado na opinião dos entrevistados foi a calçada
imperfeita (26%) (Figura 1).
De acordo com o sexo do entrevistado, quanto à percepção de propagandas em geral como
maior poluente visual, os homens (23%) se incomodam mais que as mulheres (13%) (Figura 4).
Quanto ao grau de instrução e percepção dos poluentes, pessoas com níveis mais baixo de
escolaridade reconhecem o lixo (31%) como maior poluente (Figura 3), talvez porque afetam
diretamente a elas (faz parte de sua realidade conviver com um serviço de limpeza e saneamento
ruim) e tem outros fatores maléficos associados ao lixo que não se restringem à estética.
No trabalho intitulado “O que é lixo afinal? Como pensam mulheres residentes na periferia
de um grande centro urbano” As entrevistadas definem o lixo como tudo que não serve para ser
utilizado e o consideram como um problema quando este se encontra acumulado no ambiente,
sendo capaz de provocar incômodos como mau cheiro ou poluição visual; quando serve como foco
da presença de animais; provoca doenças em crianças e adultos. Alguns estudos realizados no Brasil
têm apontado para uma possível associação entre manejo inadequado de resíduos sólidos e o
aumento de eventos mórbidos, notadamente diarréia e parasitoses intestinais, em crianças
(Catapreta & Heller, 1999; Heller, 1995; Moraes, 1997; Rêgo, 1996).
Fórum Internacional do Meio Ambiente - A conferência da Terra 625

Legenda: no sentido horário (figura 1) calçada imperfeita, (figura 2) prédio mal conservado, (figura
3) lixo acumulado, (figura 4) lambe-lambes ilegais

À medida que o grau de instrução do indivíduo aumenta a percepção é diferente, pessoas


com o ensino fundamental e médio concluídos perceberam calçadas imperfeitas como o principal
poluente visual na avenida (33% e 24% respectivamente). Sugerimos que este fato esteja ligado à
questão de segurança, já que foi muito relatado nas entrevistas o perigo de acidentes durante o
tráfego em vias de má manutenção.
Já pessoas com nível superior e pós-graduados acham mais desconfortante ao seu olhar
prédios mal conservados (27% e 29% respectivamente) (Figura 2).
Estes dados corroboram nossa hipótese de que para indivíduos situados em determinado
grau de instrução existe uma maioria que percebe um mesmo poluente como sendo o principal da
avenida, caracterizando este grupo, e, que difere dos outros graus de instrução.
Comparando-se a percepção dos transeuntes com a freqüência de visita na avenida, àqueles
que passam na avenida diariamente ou semanalmente se incomodam mais com as calçadas (25%) e
lixo (16%) do que com a propaganda (14%). Já os visitantes esporádicos (freqüência mensal)
reconhecem prédios mal conservados como o maior causador de danos à paisagem (25%) do que
com propaganda (16%).
Àqueles indivíduos que transitam na avenida freqüentemente, provavelmente, se
preocupam mais com sua mobilidade no percurso que fazem na avenida (seja à pé ou em
automóvel) e isto é diretamente proporcional aos fatores que atuam neste tráfego (calçadas, asfaltos
imperfeitos, engarrafamentos e lixo). Talvez isto justifique a escolha destes componentes como os
principais poluentes visuais. Em contrapartida, indivíduos que freqüentam mensalmente a avenida,
possivelmente, farão uso dos serviços oferecidos no comércio, que vem acompanhado de todo tipo
de propaganda e talvez por isto identificaram propagandas em geral como o maior poluidor.
Comparando a percepção visual com a faixa etária dos entrevistados temos uma maior
percepção de propaganda como poluente na faixa etária de 15 à 20 anos, em relação a pessoas de
31 à 40 anos. No entanto, ambos os grupos perceberam (mesmo que em menor representatividade
para os mais velhos) todas as formas de poluição presentes na avenida.
A percepção dos poluentes visuais está diretamente relacionada à quantidade dos
poluentes. Ou seja, os poluentes mais citados foram os que tiveram 100% de presença na avenida.
Fórum Internacional do Meio Ambiente - A conferência da Terra 626

Foram identificadas e fotografadas várias irregularidades na prática da Lei Municipal nº


16.476/99 que diz respeito a veiculação de anúncios e dispõe sobre o ordenamento da publicidade
no espaço urbano e dá outras providências. Foram encontrados: postes de iluminação pública
portando lambe-lambes (Figura 4); outdoors desrespeitando o limite mínimo de altura do piso à
borda inferior do mesmo, em alguns casos sem número de licença e nome da empresa responsável
pela propriedade; outdoors excedendo o número máximo (5) de outdoors num mesmo logradouro,
ou com distância inferior à permitida entre unidades; estrutura de sustentação sem pintura e a
péssima condição dos materiais fixados nos mesmo; painéis de grande porte com distância entre os
mesmos inferior à permitida, alguns mal conservados (oferecendo riscos de acidentes à população),
outros com estrutura de sustentação superior à permitida; propagandas variadas dificultando a
visualização de sinais de trânsito; faixas excedendo a altura permitida e vários tipos de propaganda
em uma mesma propriedade.
De acordo com nossos registros fotográficos e medições dos poluentes visuais na
avenida houve um consentimento por parte do poder público municipal, ou no mínimo ineficiência
ou negligência dele.

REFERÊNCIAS BIBLIOGRÁFICAS
CAMPOS, W. S. S. Poluição visual segundo o direito brasileiro. Dissertação de Mestrado.
Universidade Católica de Santos. 127 pg. 2006.
CONSTANTINO, Carlos Ernani. Delitos ecológicos. São Paulo: Atlas, 2001, p. 176
FIORILLO, Celso Antônio Pacheco. - Curso de Direito Ambiental Brasileiro. 2ª ed. ampl. São
Paulo: Saraiva, 2001. p. 121-130.
GENTIL, P. A. B. Poluição visual é crime. Disponível em:
http://jus2.uol.com.br/doutrina/texto.asp?id=10153&p=2 . Acessado em: 10 de abril de 2008.
MAURANO, A. - A poluição visual e a nova lei paulista de publicidade. Disponível em:
http://jus2.uol.com.br/doutrina/texto.asp?id=9498. Acessado em: 9 de março de 2008.
NASCIMENTO, E. R. & PASQUALETTO, A. 2004. Poluição visual por outdoors em Goiânia-GO.
Monografia de especialização, Universidade Católica de Goiás.
PEREIRA JR., J. de S. – Legislação federal sobre poluição urbana. Nota técnica. 2002. Disponível
em:http://apache.camara.gov.br/portal/arquivos/Camara/internet/
PERSICHETTI, S. 2005. - A percepção visual pela psicologia social. Disponível
em:http://www.universovisual.com.br/publisher/preview.php?edicao=1205&id_mat=990. Acessado
em 9 de março de 2008.
PRADO, J. - Poluição visual um mal desnecessário. Disponível em:
http://www2.uol.com.br/joanaprado/joana_natureza/natureza_poluicaovisual.htm. Acessado em 9
de março de 2008.
publicacoes/estnottec/pdf/114361.pdf Acessado em: 10 de abril de 2008.
RAMOS, I. C. N. - Poluição visual. Disponível em:
http://www.redeambiente.org.br/opiniao.asp/artigo=65. Acessado em 9 de março de 2008.
RECIFE. Lei Municipal nº 16.476, de 12 de fevereiro de 1999. Recife: Secretaria de Planejamento,
Urbanismo e Meio Ambiente (SEPLAM) e Diretoria de Controle Urbano do Recife (DIRCON)
RÊGO, R. C. F. et.al. O que é lixo afinal? Como pensam mulheres residentes na periferia de um
grande centro urbano. Caderno de Saúde Pública, Rio de Janeiro, 18(6): 1583-1592, nov-dez, 2002.
ROLLO, Alberto & ROLLO, Arthur. - Propaganda eleitoral e poluição visual. Boletim Jurídico,
Uberlândia/MG, nº. 61, Disponível em:
http://www.boletimjuridico.com.br/doutrina/texto.asp?id=192. Acessado em 9 de março de 2008.
TUAN, YI-FU. 1980. Topofilia: um estudo da percepção, atitudes e valores do meio ambiente. São
Paulo: Editora Difel, 288 pg.
Fórum Internacional do Meio Ambiente - A conferência da Terra 627

ANEXO I
QUESTIONÁRIO
1-Com que frequência você passa na Conde da Boa Vista?
todo dia ( ) uma vez por semana ( ) uma vez por mês ( )

2- Sexo masc ( ) fem ( )

3- Grau de instrução
( )s. escolaridade ( )fundamental ( )médio ( )superior ( )pós-graduação

4- Idade
( ) 15 a 20 ( ) 21 a 30 ( )31 a 40 ( )41 a 50 ( )mais de 51

5-Em relação ao visual da avenida o que você acha feio?Dentre os citados qual o mais feio?
( )pichações e grafites ( )postes com fiação aérea ( )engarrafamento
( )lixo acumulado ( )prédio mal conservado ( )obras inacabadas
( )calçadas quebradas ( )lambe-lambe ( )outdoor
( )faixas ( ) cartazes ( )placas/letreiros
( )marquises ( )árvores ( )gelo baiano

6-O que um outdoor ruim tem em seu conteúdo?


( ) combinação de cores ruim ( )muito texto ( ) assunto erótico
( ) cor berrante ( ) falta de criatividade ( ) assunto de bebida
( ) cores claras demais ( ) assunto de política ( ) assunto de cigarro
( )outro

7- É pior um outdoor com conteúdo ruim, ou um excesso de outdoors, independente do conteúdo?


( )conteúdo ( ) quantidade

8-você gostaria que fosse reduzido o número de propagandas aqui ?


( ) sim ( )não

9-Você sabe qual o responsável por fiscalizar a disposição das propagandas?


________________________
Fórum Internacional do Meio Ambiente - A conferência da Terra 628

IDENTIFICAÇÃO DA COBERTURA VEGETAL EM ÀREAS URBANAS POR MEIO DE


SENSORIAMENTO REMOTO: UM CASO DE ESTUDO PARA O BAIRRO DE
PETROPOLIS – NATAL - RN.

Glauber Richard Sobreira de Carvalho


Técnico em Controle Ambiental Centro Federal de Educação Tecnológica do Rio Grande do Norte (CEFET-RN).
glauberrichard@rn.gov.br
Amanda Fabiola Costa da Silva
Bióloga – Universidade Potiguar- (UnP)
Ricardo Farias do Amaral
Professor Dr. do Departamento de Geologia da Universidade Federal do Rio Grande do Norte (UFRN).

RESUMO
O objetivo deste trabalho foi avaliar a situação da cobertura vegetal no bairro de
Petrópolis, localizado na zona leste do Município de Natal – RN, apresentar dados que possam
servir de base para o Plano Diretor de Arborização. Para o desenvolvimento da pesquisa foram
utilizados produtos de sensoriamento remoto, com base em geoprocessamento, e inventario total das
árvores existente no bairro no ano de 2003. Foram encontradas 799 arvores, sendo a maioria espécie
exótica. A analise dos dados demonstra que a área estudada, requer cuidados especiais de todos os
cidadãos e órgãos competentes.
Palavra – Chaves: Cobertura Vegetal, Plano Diretor de Arborização e Sensoriamento Remoto.

ABSTRACT
This paper aims to evaluate the present situation of the tree cover in the district of
Petrópolis, eastern Natal-RN, by presenting data which can be used in the Tree cover Master Plan.
Remote sensing data were used in a GIS environment, allowing an inventory of the existing trees in
the year of 2003. A total of 799 trees were found and mostly were exoctic species. Data analysis
suggests the area demands special care by citizens and governmental environmental organizations.
Key words: Tree cover, Tree cover Master Plan and Remote Sensing.

Introdução
A partir da revolução industrial o processo de urbanização e o crescimento populacional se
intensificaram de tal maneira que os espaços urbanos passaram a assumir a responsabilidade do
impacto máximo da atuação humana sobre a organização na superfície terrestre e na deteriorização
do ambiente (MONTEIRO, 1976).
O crescimento desordenado das cidades brasileiras, o aumento populacional, a especulação
imobiliária, e as conseqüências geradas pela falta de planejamento urbano despertam a atenção de
planejadores e da população no sentido de perceber a cobertura vegetal como componente
necessário ao espaço urbano.
Para Nucci e Cavaleiros (1999), a cobertura vegetal pode ser definida como qualquer área
promovida de vegetação na área urbana, compreendendo a vegetação herbácea, arbustiva e arbórea.
Os jardins os quintais, as praças, os parques, os canteiros em via de circulação, as áreas preservadas,
dentre outras formas de cobertura vegetal estão compreendidas dentro desta categoria.
Nesse sentido, a vegetação urbana, surge como um atenuante, tornando o ambiente
antroposocial menos hostil, fornecendo inúmeras vantagens: age purificando o ar por fixação de
poeira e materiais residuais e pela reciclagem de gases através da fotossíntese, regula a umidade e
temperatura do ar, minimiza os efeitos da ilha de calor, mantém a permeabilidade, fertilidade do
solo e o protege contra erosão e reduz os níveis de ruídos servindo como amortecedor de barulho
das cidades. Ao mesmo tempo, do ponto de vista psicológico e social, influenciam sobre o ânimo
dos indivíduos massificando com os transtornos das cidades, alem de propiciarem ambientes
agradáveis para a pratica de esporte, exercícios físico e recreação em geral.
Árvores nas ruas, avenidas, praças, quintais, são na maioria das vezes elas o elemento
naturais mais aparentes, o verde é o elemento mais frágil da cidade, que sofrem com os efeitos da
Fórum Internacional do Meio Ambiente - A conferência da Terra 629

urbanização e o adensamento populacional. As árvores têm que concorrer pelos espaços das
calçadas, no subsolo com a rede de distribuição de água, gás e coleta de esgotos, na superfície com
postes, placas e guias rebaixados, e ao nível da copa, com a fiação telefônica e a eletricidade.
Lima (1993) cita vários outros problemas prejudiciais à vegetação urbana como: poluição
do ar, a pavimentação e o excesso ou falta de água no solo, além de pouco ou nenhuma
disponibilidade de nutrientes, ph mais elevado do que as condições naturais em prejuízo de vida
microbiana, ocorrência de insetos e doenças, altas temperaturas, iluminação artificial e excesso de
reflexão de energia pelas casas e pavimentos, adiciona ainda os danos físicos causado por acidentes
com veículos, vandalismo e técnicas de manejo inadequadas.
Vários são os procedimentos para realizar o levantamento da cobertura vegetal, em áreas
urbanas, por meio de trabalho em campo, pela analise de cartas e planta topográficas, pela
interpretação de fotografias aéreas, e pela analise de imagens obtidas no nível orbital.
Atualmente, existe uma variedade de sistema de sensores projetados para o fornecimento
de dados referente às porções da superfície terrestre. Esse sistema, entre os quais estão os sistemas
fotográficos, os sensores de varreduras (scanners) e os radares, idealizados para a produção de
imagens do terreno utilizam a radiação eletromagnética como fonte de energia.
Assim a analise da vegetação por meio de imagens, possibilita interferências sobre o
embasamento litológico e os tipo de solo de uma área. Nas áreas urbanas, a maneira como a
vegetação e distribuída revela aspectos da qualidade ambiental, podendo indicar a qualidade de vida
da população presente nestes espaços.
E necessário entender o comportamento espectral da vegetação para aplicar as técnicas de
sensoriamento remoto aos estudos relacionado à cobertura vegetal.
Em relação à aplicação de dados de sensoriamento remoto, Foresti & Perreira (1987)
comentaram que o ambiente urbano e composto de vários materiais como o concreto, o asfalto, as
coberturas cerâmicas e metálicas dos edifícios, as áreas desnudas e os vários tipos de vegetação. Em
relação à aplicação das técnicas de sensoriamento remoto o conjunto desses materiais, ocorrem em
pequenas áreas resultado em texturas variações de tonalidade e padrões bastante complexos. A
composição química e a estrutura física desses materiais fazem com que cada um possua uma
maneira característica de interação com a energia eletromagnética revelando respostas esectrais
diferentes. Considerando as variações climáticas sazonais, a maioria desses materiais revela um
comportamento espectral mais ou menos constante, não existindo grande variação no mecanismo de
interação com a energia eletromagnética durante o ano. A vegetação, por sua vez, possui um
mecanismo de interação muito mais dinâmico; suas resposta espectral e altamente influenciada
pelas variações climáticas, pela poluição atmosférica, pelo ataque de pragas e doenças e pela
deficiência de água em períodos secos e prolongados.
Os avanços tecnológicos nos sensores ópticos dos satélites de Observação da Terra têm
introduzido melhorias significativas nas resoluções espacial, radiométrica e temporal destes
sensores. O aparecimento, no fim da década de noventa e início da nova década, de satélites de
muito grande resolução, tais como o IKONOS, Quick Bird e Orbview, veio revolucionar os estudos
nesta área, sobretudo devido ao potencial destes sensores na discriminação dos elementos da
superfície terrestre. Assim, o grande potencial destas imagens está essencialmente relacionado com
a sua grande resolução espacial.
O presente trabalho tem por objetivo a utilização de imagem de alta resolução, proveniente
de sensoriamento remoto e um inventariam total das árvores (In Loco) para avaliar a situação da
cobertura vegetal e que os dados possam servir de base para o Plano Diretor de Arborização do
Município de Natal-RN.

LOCALIZAÇÃO E CARACTERIZAÇÃO DA ÁREA DE ESTUDO


O Município do Natal, capital do Estado do Rio Grande do Norte, situa-se na Zona
Litorânea Oriental do Estado, na Subzona de Natal, a qual limita-se a Oeste com o Município de
São Gonçalo do Amarante; ao Norte, com Extremoz; ao Sul, com Parnamirim; e a Leste, com
Fórum Internacional do Meio Ambiente - A conferência da Terra 630

Oceano Atlântico (Figura 1) , nas coordenadas geográficas aproximadas de 5º 44’ 50” de latitude
sul e 35º 12’ 34” longitude oeste.
A área de estudo está inserido no município de Natal-RN, que possui 36 bairros, dividido
em 4 (quatro) regiões administrativa: Leste, Oeste, Sul e Leste, como ilustra a figura 1, está ultima
compreende os seguintes bairros: Santos Reis, Rocas, Ribeira, Praia do Meio, Cidade Alta,
Petrópolis, Areia Preta, Mãe Luiza, Alecrim, Bairro Vermelho, Tirol e Lagoa Seca. O bairro de
Petrópolis possui um área de 77, 63 hectares e uma densidade demográfica de 65,76 Hab/Ha (IBGE,
2000).
O Bairro objeto de estudo constatar a grande deficiência de vegetação e a utilização de
espécies exoticas, pois a maior parte da vegetação existente encontra-se nos canteiros centrais das
avenidas, Ainda se observa o crescente uso da vegetação como elemento estético em pequenos
jardins na frente dos lotes que abrigam edificações comerciais e principalmente de serviços, além de
edificações residenciais multifamiliares.

Figura 01 – Região Administrativa do Município de Natal-RN

MATERIAIS E MÉTODOS
Fórum Internacional do Meio Ambiente - A conferência da Terra 631

Para realização deste trabalho foi realizando um levantamento das espécies arbóreas e
arbustivas, do bairro de Petrópolis, in loco. Foram feito levantamento de todas as 26 ruas da área de
estudo. O período da coleta estendeu-se de janeiro a março de 2003.
Foram efetuadas coletas de material férteis e vegetativas dos indivíduos, herbarizados de
acordo com a metodologia usual. As identificações das espécies foram coletadas o materiais
botânico, que foi comparado com a bibliografia especializada, além de consulta especialista quando
necessárias. Todas as espécies foram fotografadas e a comparação com o material depositado no
Herbário “Parque das Dunas” da Universidade Federal do Rio Grande do Norte.
Após a identificação das espécies estas foram separadas, em: regional, nativas e exóticas.
A utilização de imagem de satélite IKONOS 2, foi adquirida à Space Imaging com
resolução espacial de 1 metro, após fusão com a banda pancromática, datadas do ano de 2003,. As
referidas imagens foram geo-referenciadas para o sistema de projeção UTM, Zona 25, Datum SAD
69.
Para o processamento da imagem, utilizou-se os "softwares" ENVI versão 4.0 e Arc Gis
versão 9.0
A imagem foram mosaicadas e corrigidas geometricamente, através do registro
(georreferenciamento) tendo como referência a base cartográfica digital e a utilização de GPS
topográfico da marca Trimble, modelo ProXR para captura de pontos de controle. Visando realçar
as informações relativas à vegetação, foram realizados procedimentos tradicionais em
processamento digital de imagens (PDI), tais como: aumento de contraste, produção de
composições coloridas, filtragem de freqüências espaciais, operações aritméticas e classificação. E
composições coloridas em RBG, melhorando-se a qualidade visual para extração de informações.
Utilizaram-se também técnicas de análise por componentes principais e classificações
supervisionadas, pelo método estatístico de máxima verossimilhança
O resultado final é um plano de informação (PI), que pode ser visualizado como imagem
temática. Figura 2.

RESULTADOS
Na área de estudo foram encontrados 4,76 hectares de cobertura vegetal pode se verificar
(figura 02), e o levantamento de espécie de via publica, verificou 799 indivíduos de 31 espécies,
contabilizando as 26 ruas do bairro, e as espécies estão distribuídas de forma heterogenia.
Na tabela 1, A freqüência das espécies: Senna multijuga Rich (Aleluia), Moquilea
tomentosa Benth (Oitizeiro), Terminalia catappa L. (Castanhola) e Copernica cerifera Mart.
(Carnaúba) representam 45,18% do total do numero de indivíduos e temos 14 espécies com
freqüência menores do que 1%.
Fórum Internacional do Meio Ambiente - A conferência da Terra 632

Figura 02 – Mapa da Cobertura Vegetal do Bairro de Petrópolis localizado no município de Natal-


RN, no Ano de 2003, com apoio de Sensoriamento Remoto.

Observamos um grande predomínio das principais espécies, conforme ilustra a tabela 1.


Nº Nome popular Origem Nome Científico Quant. %
1 Aleluia Exótica Senna multijuga Rich. 102 12,75
2 Algaroba Exótica Prosopis hassleri Harms. 25 3,13
3 Algodão-da-praia Nativa Hibiscus tiliaceus L. 3 0,37
4 Brasileirinho Exótica Erythrina indica picta 18 2,25
5 Cajueiro Regional Anacardium occidentale L. 8 1
6 Carolina Nativa Adenanthera pavonina L. 40 5
7 Carnaúba Regional Copernica cerifera Mart. 71 8,9
8 Cassia-rosa Exótica Cassia javanica Ried. 6 0,75
9 Chichá Nativa Sterculia apetala Jacq 1 0,12
10 Castanhola Exótica Terminalia catappa L. 73 9,12
11 Casuarina Exótica Casuarina equisetifolia L. 1 0,12
12 Ceriguela Nativa Spondias purpurea L. 2 0,25
13 Chuva-de-ouro Exótica Cassia fistula L. 3 0,37
14 Craibeira Nativa Tabebuia caraiba Bur. 6 0,75
15 Espinheira Nativa Mimosa farnesiana L. 59 7,37
Fórum Internacional do Meio Ambiente - A conferência da Terra 633

16 Figo-de-salão Exótica Ficus benjamina L. 17 2,12


17 Flamboyant Exótica Delonix regia Raf. 32 4
18 Figueira Exótica Ficus microcarpa L. 51 6,36
18 Gameleira Nativa Ficus cyclophylla Miquel. 6 0,75
20 Ipê-roxo Nativa Tabebuia avellanedae Lor. 14 1,8
21 Jambeiro Exótica Eugenia malaccensis Linn. 68 8,5
22 Jamelão Nativa Eugenia jambolana Lam. 3 0,37
23 Leucena Exótica Leucena leucocephala.(Lam.) DeWit. 1 0,12
24 Mangueira Exótica Mangifera indica L. 6 0,75
25 Mungubeira Nativa Pachira aquática Aubl. 2 0,24
27 Oitizeiro Nativa Moquilea tomentosa Benth. 113 14,41
28 Oiticica Regional Licania rigida Benth. 3 0,37
29 Pau-brasil Nativa Caesalpinia echinata Lam. 17 2,12
30 Sombreiro Nativa Clitoria racemosa Benth. 40 5,25
31 Tulipa-africana Regional Calliandra spinosa Ducke. 8 0,98

No bairro analisado, constatou 50% de espécies exóticas, 40,12% espécies nativas e 9,89%
espécies regionais, conforme ilustra o gráfico 1. A porcentagem de espécie exótica supera a nativa.
O costume de plantar espécie exótica no meio ambiente urbano, sem prévio conhecimento, e uma
pratica muito comum nas cidades, o que demonstra a falta de opção e uma imitação de uma cidade
para outra.

Exótica
Nativa
Regional

Gráfico 01 – Tipos de espécies encontrada no Bairro de Petrópolis

CONCLUSÃO
A degradação das paisagens urbanas está assumindo proporções insustentáveis, no que diz
respeito à qualidade como quatidade. A urbanização e sem duvida uma tendência na vida do homem
contemporâneo. O crescimento das cidades, isto é o aumento físico da malha urbana, numa
substituição gradativa do espaço natural pelo espaço construído. Tradicionalmente as maneiras em
geral, surgiram e se desenvolveram valorizando os espaços construídos (símbolo de civilização) em
detrimento ao espaço natural (símbolo de barbárie). O domínio do homem do homem sobre a
natureza fica claramente explicito nas cidades, como um grande espaço aberto desprovido do verde.
Os produtos obtidos pela técnica de Sensoriamento Remoto e coleta de informações para o
mapeamento de áreas verdes urbanas, mostraram - se eficiente, propiciando uma visualização
espacial da tipologia analisada.
Além disso, os dados digitais proporcionam uma flexibilidade escalar, o que facilita a
análise de detalhe do bairro de estudo. Desse modo, os resultados mostram que é necessário um
planejamento de áreas verdes, visto que sua distribuição é desigual e a uma predominância de
espécies exóticas dados que podem ser incorporados ao Plano de Arborização do Município.
Fórum Internacional do Meio Ambiente - A conferência da Terra 634

A preocupação com a preservação do verde, deve ser uma constante para todos os
cidadãos, poder publico e profissionais da área no sentido de entender a cidade, quando cultivada e
mantida a educação ambiental. Constitui um ambiente mais saudável, na busca de uma melhor
qualidade de vida.

REFERÊNCIA BIBLIOGRÁFICAS
ALVAREZ, Ivan André; Qualidade do espaço verde urbano: uma proposta de índice de avaliação.
Tese (Doutorado). USP. Escola Superior de Agricultura Luiz de Queiroz (ESALQ), Piracicaba –
São Paulo, 2004.
CARVALHO, Glauber Richard Sobreira de. Educação Ambiental no contexto de Ecologia Urbana
e as conseqüências das nossas ações: Estudo para o município de Natal/RN. Monografia
(Graduação), UnP, 2006.
CARVALHO, Glauber Richard Sobreira; CLEMENTINO, E. V. A. ; QUEIROZ, A. F. F. .
Levantamento das Espécie Arbórea de vias publicas do bairro de Petrópolis Natal-RN. In: 55 º
Congresso Nacional de Botânica, 2004, Viçoca MG.. 55 º Congresso Nacional de Botânica, Viçoca
MG., 2004.
CARVALHO, Glauber. Richard. Sobreira; LUNA, James Barbosa. ; AMARAL, Ricardo Farias.
Levantamento da Cobertura Vegetal em Áreas Urbanas por Meio de Produtos de Sensoriamento
Remoto. In: XI Congresso Nordestino de Ecologia, 2006, Recife, PE.
FORESTI, C.; PEREIRA, M. D. B. Utilização de índices. vegetativos obtidos com dados do sistema
TM LANDSAT. no estudo da qualidade ambiental urbana: Cidade de São Paulo, São Jose dos
Campos, INPE, Maio (INPE – 4177.PRF/ 1071). 1987. 18p.
LIMA, A.M.L.P. Piracicaba/SP: Análise da arborização viária na área central e em seu entorno.
Piracicaba. Tese (Doutorado) Escola Superior de Agronomia “Luiz de Queiroz”, Piracicaba – São
Paulo, 1993.
LORENZI, H. 1992. Arvores Brasileiras - Manual de identificaçäo e cultivo de plantas arbóreas
nativas do Brasil. Editora Plantarum Ltda., Nova Odessa – SP
MEDEIROS, Eugênio Mariano Fonseca de. Estética do Apocalipse. Dissertação (Mestrado).
UFRN. Departamento de Arquitetura e Urbanismo, Natal, 2003.
MONTEIRO, C. A. de F. Teoria e clima urbano. São Paulo: Instituto de Geografia da USP, 1976.
NUCCI, J,C; CAVALEIROS, F. Cobertura vegetal em áreas urbanas: Conceitos e Métodos.
Geousp, Nº 6, p.29-36.
SILVA FILHO, Demóstenes Ferreira da; Aplicação de videografia aérea multiespectral na
avaliação da floresta urbana. Tese (Doutorado). UNESP, Jaboticabal - São Paulo, 2004.
Fórum Internacional do Meio Ambiente - A conferência da Terra 635

POLUIÇÃO SONORA: A PROBLEMÁTICA DE UM DESEQUILÍBRIO AMBIENTAL NA


CIDADE DE CAMPINA GRANDE – PB

Emmanuelle Rodrigues Araújo


Bióloga, Mestra em Agronomia pela Universidade Federal da Paraíba, Campus II, Areia – PB,
e-mail: manucg@gmail.com
Eduardo Rodrigues Araújo
Graduando em Agronomia, Universidade Federal da Paraíba, Campus II, Areia – PB,
e-mail: eduaraujocg@gmail.com
Tancredo Augusto Feitosa Souza
Graduando em Agronomia, Universidade Federal da Paraíba, Campus II, Areia – PB,
e-mail: tancredo_agro@hotmail.com

RESUMO
A sustentabilidade evidenciada a partir de tempos passados, passa a ser uma palavra
contraditória para nossos dias cada vez mais consumistas e faz com que o curso normal da natureza
seja moldado artificialmente pelas mãos dos homens, e como conseqüência adicional surge o
desequilíbrio ecológico ou impacto ambiental, ao qual chamamos de poluição. A poluição sonora
afeta diariamente milhares de pessoas no mundo e poucas sabem o risco que correm à sua
exposição. O objetivo deste trabalho foi avaliar os níveis de ruídos nas principais ruas centrais na
cidade de Campina Grande-PB, no período de Outubro de 2003 a Junho de 2004, identificando os
principais agentes poluidores. Para tanto foi utilizado decibelímetro nas avaliações realizadas em
visitas “in locu” nas ruas de maior fluxo de pessoas e veículos (estabelecimentos comerciais, casa
de Show, bares, carros de som, etc). Os principais agentes poluidores observados nesta pesquisa
foram os carrinhos de som (vendedores de cd’s), carros de som (utilizados para fazer propagandas)
e os estabelecimentos comerciais, com médias de ruído de 90, 95 e 87dB, respectivamente. Com
base nos resultados do diagnóstico da poluição sonora na cidade de Campina Grande - PB, pode-se
afirmar que a situação é preocupante, com elevados níveis de poluição sonora ultrapassando em sua
grande maioria 65dB. Tais resultados mostram a evolução desse tipo de poluição em nosso meio,
constituindo uma ameaça ao bem-estar e à saúde dos cidadãos em um dos poucos lugares da cidade
capazes de oferecer alívio para as atribulações do cotidiano urbano.
Palavras-chave: Níveis de ruídos, poluição, desequilíbrio ambiental.

ABSTRACT
Sustainability, a concept highlighted in the past years, has developed into a contradictory
term in our current life which is more and more consumerist and, therefore, changes the natural
course of nature, which starts to be modelled by human hands, and has an additional consequence,
the environmental imbalance or environmental impact, called pollution. Noise pollution daily
affects thousands of individuals worldwide and few of them know the risks they are taking when
exposed to this type of pollution. This work aimed at analysing the levels of noise in the main
streets of the City Centre of Campina Grande, Paraiba, within the period of October, 2003 and June,
2004, identifying the main polluting agents. In order to attain this objective, a sound level meter
was used in on-site assessments carried out on streets whose traffic and people flows are more
intense (retail shops, concert hall, bars, sound trucks, etc.). The main polluting agents identified in
the present study are sound trolleys (trolleys equipped with loudspeakers usually used to sell CDs
and DVDs on streets), sound trucks (used for propaganda), and retail shops, with average sound
levels of 90, 95 and 87 dB, respectively. Based on the results found in the analysis of the noise
pollution data of the City Centre of Campina Grande, Paraiba, one may say that the situation is
alarming, since high noise levels, over 65dB, were found in most areas. Such results show the
evolution of this type of pollution in our environment, constituting a hazard to citizens’ well being
and health in one of the few places in the City which is able to soothe the troubles of urban daily
life.
Key-words: noise levels, pollution, environmental imbalance.
Fórum Internacional do Meio Ambiente - A conferência da Terra 636

INTRODUÇÃO
A sustentabilidade evidenciada a partir de tempos passados, passa a ser uma palavra
contraditória para nossos dias cada vez mais consumistas e faz com que o curso normal da natureza
seja moldado artificialmente pelas mãos dos homens, e como conseqüência adicional surge o
desequilíbrio ecológico ou impacto ambiental, ao qual chamamos de poluição.
O desequilíbrio ambiental não compreende apenas um impacto sobre o ambiente natural,
mas também sobre a sociedade, sobre o ambiente social e as relações sociais. Neste sentido é válido
questionar o papel do ser humano no ambiente natural. O homem é obra e também construtor. O
homem constrói o ambiente que o cerca e ao mesmo tempo o destrói. O bem estar do homem está
diretamente ligado a associação do ambiente natural e artificial. Ocorrendo esta interação
harmônica o homem pode dizer que vive em um ambiente saudável e livre de impactos ambientais.
Rocha et al (2002) definem poluição como sendo qualquer tipo de transformação física,
química ou biológica que sofre um recurso natural, de tal modo que esta poluição cause prejuízo a
um ou vários seres vivos.
A definição de poluição aparece em documentos relacionados ao poder legislativo. No
inciso III do art. 3° da Lei n° 6.938, de 31 de agosto de 1981 da Constituição do Brasil fica clara a
definição do que é poluição:

Art. 3° Para os fins previstos nesta Lei, entende-se por:


III – poluição, a degradação da qualidade ambiental resultante de atividades que direta ou
indiretamente:
a) prejudiquem a saúde, a segurança e o bem-estar da população;
b) criem condições adversas às atividades sociais e econômicas;
c) afetem desfavoravelmente a biota;
d) afetem as condições estéticas ou sanitárias do meio ambiente;
e) lancem matérias ou energia em desacordo com os padrões ambientais estabelecidos

Segundo Coelho (2000) a relação entre sociedade e natureza se transforma dinamicamente,


reestruturando o espaço. Desta forma o desequilíbrio ecológico não compreende apenas o impacto
causado sobre o ambiente natural preservado, mais também sobre o meio urbano, a sociedade e suas
relações. Esse desequilíbrio, nada mais é que o uso abusivo e descontrolado dos recursos naturais
pelo homem, que inúmeras vezes causa poluições de todos os tipos.
Poluição é qualquer tipo de transformação física, química ou biológica que cause acúmulo
ambiental de resíduos sólidos, líquidos ou gasosos decorrentes da atividade do homem que venham
a provocar prejuízo a um ou vários seres vivos (BRAGA, 2003).
Este desequilíbrio nada mais é que o uso abusivo e descontrolado dos recursos naturais
pelo homem, que inúmeras vezes causa poluições de todos os tipos, como é o caso da poluição
atmosférica tão comum, principalmente nos grandes centros industrializados, ou a poluição das
águas, causada por esgotos de indústrias ou residenciais.
Um caso especial de poluição, que vem crescendo ao longo dos anos é a poluição sonora.
Afeta diariamente milhares de pessoas no mundo e poucas sabem o risco que correm a sua
exposição. A poluição sonora e sua conseqüente influência sobre o meio ambiente e sobre a
qualidade de vida dos seres humanos têm sido alvo de várias pesquisas em diversas partes do
mundo (KURRA et al., 2000). Em estudos realizados por Francisco (2005), os principais problemas
socioambientais urbanos são de origem da poluição sonora por atividades noturnas (bares,
restaurantes, danceterias e casas de show).
O número crescente da população e do número de veículos ocasionou o aparecimento de
um novo componente na vida urbana: o ruído. Sendo uma categoria especifica de som, usualmente
descrito com um som indesejável e que possa causar algum distúrbio para a saúde das pessoas
(ARANA & GARCIA, 1998). O ruído é um fato comum nos grandes centros urbanos, gerado
principalmente pelos meios de transporte.
Fórum Internacional do Meio Ambiente - A conferência da Terra 637

Avaliações mostram que o ruído de trafego de 66dB é considerado como o limiar do dano
à saúde, e conseqüentemente, a Organização mundial da Saúde (OMS) estabelece 65dB como o
nível máximo tolerado a que um cidadão pode se expor no meio urbano, sem causar danos
auditivos, acima disso o nosso organismo sofre de estresse, o qual aumenta o risco de doenças. Com
ruídos acima de 85 dB aumenta o risco de comprometimento auditivo. Sabe-se também que quanto
mais tempo exposto ao ruído, maior o risco do individuo sofrer danos à saúde. Quanto a estes, dois
fatores são determinantes para a sua amplitude: o tempo de exposição e o nível de ruído (barulho) a
que se expõe o individuo ou indivíduos, sendo de se observar que cada caso tem suas características
e seu grau de conseqüência, o que exige estudos específicos para cada um (BELOJEVIC et al, 1997;
MASCHKE, 1999).
A emissão de sons e ruídos em níveis que causam incômodos às pessoas, animais e que
prejudica, assim, a saúde e as atividades humanas, enquadra-se perfeitamente no conceito de
poluição.
A legislação brasileira é bem rigorosa com relação aos crimes ambientais, e neste sentido a
poluição sonora ganha lugar em algumas resoluções na Constituição Federal. A Resolução
CONAMA nº 1/90: Estabelece critérios, padrões, diretrizes e normas reguladoras da poluição
sonora; Resolução CONAMA nº 2/90: Estabelece normas, métodos e ações para controlar o ruído
excessivo que possa interferir na saúde e bem-estar da população; Resolução CONAMA nº 20/94:
Institui o Selo Ruído como forma de indicação do nível de potencia sonora medido em decibel,
db(A), de uso obrigatório a partir desta Resolução para aparelhos eletrodomésticos, que venham a
ser produzidos, importados e que gerem ruído no seu funcionamento.
A poluição sonora é responsável por alterações no organismo, como vertigens, neurose,
redução da acuidade visual, mudança no ritmo cardíaco, insônia e conseqüentemente queda da
produtividade física e mental (ROCHA, GARCIA & ATAIDE, 2002). Sendo para os autores, a
poluição sonora não acontece somente através de aparelhos que emitem sons audíveis. O
condicionador de ar, por exemplo, emite ruídos infra-sônicos e suas ondas atingem diretamente o
cérebro, cansando dor de cabeça, enjôo, perda de equilíbrio, etc.
Buzinas, alto-falantes, carro de som muitos são os agentes poluidores na sociedade atual e
infelizmente outros surgem diariamente com toda a força. Um exemplo de poluição sonora que vem
crescendo é a poluição vinda de mini carros de som. São comerciantes ambulantes que vendem
CD’s piratas nas ruas das cidades, como é o caso da cidade de Campina Grande-PB. O som na
maioria das vezes colocado em níveis acima do suportável acaba causando problemas de saúde para
a toda a população.
A chamada poluição sonora é a mais difundida forma de poluição no mundo moderno. É a
principal causa de diversos problemas de saúde, tanto para comerciantes e consumidores como para
os operadores desses mini carros de som que não estão equipados adequadamente para suportar o
ruído do seu próprio material de trabalho. Portanto, tratado o tema ruído, sua repercussão na saúde,
não apenas auditiva, e a maneira de estabelecer controles, tem sido objeto de crescentes estudos e
preocupações em vários campos.
No setor de serviços e comércio a maioria dos estabelecimentos, vislumbrando maiores
lucros, adotam práticas de propagandas para prevalecer sobre sues concorrentes e atrair o
consumidor, gerando dessa forma uma guerra auditiva que provoca uma sensação de mal-estar à
população.
O presente trabalho teve como objetivo principal analisar os níveis de ruídos nas principais
ruas na cidade de Campina Grande-PB, através da detecção dos limites de ruídos emitidos pelos
agentes poluidores.

MATERIAL E MÉTODOS
Fórum Internacional do Meio Ambiente - A conferência da Terra 638

A pesquisa foi desenvolvida no município de Campina Grande – PB, no período de


outubro de 2003 a junho de 2004. Neste período foram realizadas medições dos níveis sonoros das
principais ruas centrais da cidade, especialmente nos horários comerciais de pico.

Caracterização da área de estudo


O município de Campina Grande – PB está realizado na região oriental do Planalto da
Borborema (Latitude: -7°14’, Longitude: 35°53’, 551m), ficando a uma distância de 130km da
capital do estado, João Pessoa. Apresenta uma área de 970km² e densidade demográfica de 356
hab/km².

MATERIAIS UTILIZADOS
Para medição dos ruídos foi utilizado decibelímetro (DEC-5030), para tanto, inicialmente
realizava-se a medição dos ruídos de fundo (níveis sonoros do ambiente sem poluição), seguindo-se
da medição do ambiente nos horários de pico.
As medições realizadas dos níveis sonoros nos diferentes pontos da cidade de Campina
Grande foram comparados com os níveis permitidos por Lei, tomando por base a ABNT (2000).

MÉTODO ANALÍTICO
As avaliações foram feitas através de visitas “in loco”, nas principais ruas centrais da
cidade, dando ênfase às ruas de maior movimentação comercial, casas de shows e bares. Outro foco
da pesquisa foi realizar medições dos níveis sonoros de carrinhos de som (vendedores ambulantes
de cd’s que em períodos eleitorais utilizam este veículo para fazer propagandas políticas).

RESULTADOS E DISCUSSÃO
As médias dos níveis sonoros verificados na cidade de Campina Grande – PB, podem ser
observados na Tabela 1.
Agentes Poluidores Média dos Níveis Sonoros (dB)
Carrinhos de Som (vendedores de cd’s) 90
Carros de Som (propaganda) 95
Estabelecimentos Comerciais 87

De acordo com o observado nas ruas centrais de Campina Grande – PB, pode-se relatar
que os principais agentes causadores de poluição sonora foram os carrinhos de som, estes estão
presentes nas principais ruas centrais da cidade e geralmente fixam-se em locais comercialmente
movimentados para chamar atenção dos clientes para realizar a venda de seus produtos (cd’s
piratas). Durante o período da pesquisa, foram realizadas 60 vistorias nas ruas centrais em horários
comerciais, e em todas estas os carrinhos de som apresentaram níveis de ruídos acima do permitido
para o horário, atingindo cerca de 90 dB.
Os carros de som, que são contratados para fazer propagandas, também foram fiscalizados
em vários pontos da cidade, durante algumas das 60 vistorias. Os níveis sonoros oriundos deste
agente atingiram uma média de 95 dB. O mais preocupante quanto a utilização deste veículo é que o
mesmo foi flagrado inúmeras vezes com os níveis sonoros acima do permitido em frente a escolas
em horários de aula e em hospitais, onde de acordo com a Lei ao passar por tais locais os carros de
som devem baixar ou mesmo desligar o equipamento sonoro, visto que requerem níveis
consideráveis de silêncio.
Além do registro do excesso de ruídos ocasionados pelos carrinhos de som, verificou-se
nesta pesquisa que as casas comerciais também são agentes poluidores. Os estabelecimentos
comerciais centrais da cidade foram fiscalizados também nas 60 visitas e em sua grande maioria
mantém equipamento de som ligado, para tentar atrair os consumidores. Entretanto, os níveis de
ruídos nestes locais também foram considerados abusivos, bem acima do permitido por Lei,
Fórum Internacional do Meio Ambiente - A conferência da Terra 639

chegando também a atingir aproximadamente 87 dB. No momento que o som ambiente começa a
incomodar, ao invés de atrair, começa a distanciar cada vez mais toda a clientela.
O que acontece nas ruas centrais de Campina Grande é uma disputa pelo espaço comercial,
onde existe a utilização incorreta do recurso sonoro para fazer propagandas que geralmente chegam
a distanciar o consumidor.
Com base nos resultados do diagnóstico da poluição sonora na cidade de Campina Grande
– PB pode-se afirmar que a situação é preocupante, com elevados níveis de poluição sonora: 80%
ultrapassam 65dB (A). Tais resultados mostram a evolução desse tipo de poluição em nosso meio,
constituindo uma ameaça ao bem-estar e à saúde dos cidadãos. Este estudo serve inicialmente como
alerta a toda população deste município, e como base para que as autoridades competentes possam
tomar as devidas providências, principalmente no campo da educação ambiental, buscando
sensibilizar a sociedade quanto à seriedade da problemática da poluição sonora e suas
conseqüências na saúde das pessoas.

REFERÊNCIAS BIBLIOGRÁFICAS
ARANA, M.; GARCIA, A. A social survey on the effects on environmental noise on the residents
of Pamplona, Spain. Appl Acoust 1998;53:245-53.
ASSOCIAÇÃO BRASILEIRA DE NORMAS E TÉCNICAS. NBR 10151: Avaliação do ruído em
áreas habitadas visando o conforto acústico da comunidade. Rio de Janeiro, 2000.
BELOJEVIC, G.; JAKOVLEVIC, B. & ALEKSIC, O., 1997. Subjective reactions to traffic noise
with regard to some personality traits. Environment International, 23: 221-226.
BRAGA, A. Poluição Atmosférica e seus Efeitos na Saúde Humana, Faculdade de Medicina, USP,
2003.
BRASIL, CONAMA. Resolução 002/90, de 08 de março de 1990. Dispõe sobre o Programa
Nacional de Educação e Controle da Poluição Sonora – SILÊNCIO. Disponível em:
http://www.mma.gov.br/port/conama/index.cfm. Acesso em: 08 out. 2003.
BRASIL. CONAMA. Resolução 001/90, de 08 de março de 1990. Dispõe sobre critérios e padrões
de emissão de ruídos, das atividades industriais. Disponível em:
http://www.mma.gov.br/port/conama/index.cfm. Acesso em: 08 out. 2003
BRASIL. CONAMA. Resolução 20/94, de 07 de dezembro de 1994. Institui o Selo Ruído, como
forma de indicação do nível de potência sonora, de uso obrigatório para aparelhos eletrodomésticos.
Disponível em: http://www.mma.gov.br/port/conama/index.cfm. Acesso em: 08 out. 2003.
BUNDESANSTALF FÜR ARBEITSSCHUTZ UND ARBEITSMEDIZIN, 1996
COELHO, M. C. N(Maria Célia Nunes). Impactos ambientais em áreas urbanas – teorias, conceitos
e métodos de pesquisa. In: GUERRA e CUNHA (Org.). Impactos ambientais urbanos no Brasil.
Rio de Janeiro: Bertrand Brasil, 2000. p. 17-45.
FRANCISCO, D. P. Danos socioambientais urbanos em Curitiba: uma abordagem. Editora UFPR.
RA'E GA - O Espaço Geográfico em Análise, v. 9, 2005. 47-58 p.
KURRA, S.; MORINOTO, M.; MAEHOURA, Z. I. Transportation noise annoyance a simulated
environmental study for road, railway and aircraft noises. Part 1: Overall annoyance. J Sound Vib
2000;220:251-78.
MASCHKE, C. Preventive Medical Limits for Chronic Traffic Noise Exposure. Acustica. 1999; 85:
448.
MORATA, T. C.; LEWIS, D.; BEVILACQUA, M. C. . Quando o som polui. In: P. Menezes.
(Org.). A Terra Gasta. São Paulo: EDUC-Razão Social, 1992, v. 1, p. 67-78.
Fórum Internacional do Meio Ambiente - A conferência da Terra 640

VI. Biodiversidade, biocombustível e segurança alimentar

POLINIZAÇÃO, UM IMPORTANTE SERVIÇO PRESTADO AO MEIO AMBIENTE

Aline Borba dos Santos


Universidade Federal de Sergipe, PRODEMA/UFS, Av. Marechal Rondon, s/n, Jardim Rosa Elze, Cidade Universitária
Prof. “José Aloísio Campos”, Pólo de Gestão, CEP 49100-000, São Cristóvão, Sergipe, Brasil. alineborba@oi.com.br.
Fábio Santos do Nascimento
Universidade Federal de Sergipe, PRODEMA/UFS.
Carina Siqueira Souza
Universidade Federal de Sergipe, PRODEMA/UFS.

RESUMO
A polinização é um serviço de extrema importância aos ecossistemas, realizado pelos mais
diversos agentes; é uma relação antiga principalmente quando se trata do mutualismo entre as
plantas e os insetos. No decorrer de sua existência essa atividade sofreu várias alterações tanto em
relação aos vegetais, que passaram a apresentar vários atrativos aos seus visitantes, como aos
animais, que se adaptaram aos mais diversos tipos de flores na busca pelo seu alimento, dentre os
invertebrados destacam-se os insetos. Este mutualismo também é uma atividade de grande
importância econômica, principalmente no que diz respeito à atividade agrícola. Apesar de tão
conhecida importância pouco é feito em relação à preservação desse mutualismo, principalmente no
que diz respeito à divulgação da importância dessas espécies, e muito ainda necessita ser estudado.
Sendo de grande importância mostrar a influência desta em todos os sentidos, por exemplo, através
de ações que visem à conservação dos polinizadores buscando a manutenção dos ecossistemas.
Palavras-chave: Polinização, polinizadores, entomofilia

ABSTRACT
The pollination is a service of extreme importance to the ecosystems, performed by several
agents; it is an old mutualistic relationship between the plants and the insects. During its existence,
the parties involved this activity developed several modifications, mainly the vegetables, that
evolved several attractive cues to their visitors. Animals, also evolved many mechanisms to find the
flowers during the search for food. Moreover, pollination is an activity of great economic
importance, mainly in respect to the agricultural activity. In spite of such well-known importance
very few is done in relation to the preservation of this relationship . In this paper we discuss the
implications of pollination concerning the conservation of plants and pollinators.
Keywords: Pollination, pollinators, entomophily

INTRODUÇÃO
A polinização é um fenômeno que permite a reprodução das plantas, por transferência de
pólen da antera para o estigma da flor, alterando caracteres para aumentar a adaptação ao meio
através de frutos e sementes melhores (Free, 1993).
Este é apenas um dos serviços ambientais que permitem a manutenção da vida e a
permanência do homem no planeta Terra que, embora pouco conhecido, como vários outros
processos de interações entre as espécies, permite não só a reprodução das plantas como a produção
de alimentos e outros produtos vegetais, representando uma grande parcela nos dados econômicos
principalmente quando se trata da agricultura (Kearns et al, 1998).
Os ecossistemas naturais e agrícolas dependem dos polinizadores para manter a
diversidade biológica global, para tanto, buscou-se aqui apresentar a importância do serviço da
polinização, em especial a polinização entomófila, aos diversos ecossistemas bem como enforcar a
importância da preservação das espécies que se relacionam mutuamente na busca de um equilíbrio
da natureza.
Fórum Internacional do Meio Ambiente - A conferência da Terra 641

MECANISMOS DA POLINIZAÇÃO
Existem três maneiras de se realizar a polinização: a primeira forma é na própria flor,
chamada de autogamia ou autopolinização, a segunda que recebe a denominação geitonogamia
ocorre entre flores diferentes da mesma planta, a terceira e ultima maneira é a polinização cruzada
ou xenogamia que acontece entre flores diferentes de plantas diferentes (Faegri & van der Pijl,
1979; De Jong et al., 1993, Freitas, 1995).
Como pode ser visto, a polinização pode ser entre diferentes flores ou entre o pólen e o
gineceu da mesma flor sendo esta última menos vantajosa, pois não proporciona descendentes com
grandes variedades (Ferri, 1999).
Já a intensidade em que ocorre esse processo depende, por sua vez, de fatores internos e
externos, os internos relacionam-se à estrutura da flor, o estado nutricional da planta e da própria
flor, e a incompatibilidade genética em determinadas variedades; dentre os externos estão os
ambientais como temperatura, umidade, nível de pluviosidade e nutrientes (São José et al., 1994).
Apesar de ser constantemente realizada de forma natural, esta pode também se amplificar
através da intervenção humana, ou seja, uma polinização programada onde deixa de sofrer apenas
influência de fatores do meio, para que haja um controle através de ações antrópicas visando
aumentar a produção da cultura desejada (São José et al., 1994).

POLINIZAÇÃO E POLINIZADORES
Sendo as plantas incapazes de deslocar para se reproduzir, elas utilizam intermediários que
transferem os grãos de pólen para os estigmas das flores, estes são os polinizadores. Agentes que
podem ser o vento (caso dos pinheiros, milho, trigo, arroz, etc.), a água (como em algumas plantas
aquáticas), a gravidade (caso de plantas com pólen pesado) e seres vivos, como acontece com 80%
de todas as plantas com flores (Nabhan & Buchmann, 1997, Kevan & Imperatriz-Fonseca, 2002;
Freitas & Imperatriz-Fonseca, 2005).
Sem estes agentes polinizadores, a grande maioria das espécies de plantas não reproduziria
sexualmente e, conseqüentemente, não seria possível produzir sementes, grãos, amêndoas,
castanhas, frutas, vagens, folhagens, raízes, óleos vegetais, essências, corantes naturais, etc.
utilizadas em larga escala pela sociedade humana (Freitas & Imperatriz-Fonseca, 2005).
O tipo de agente de transporte de pólen, também influencia a atividade metabólica do
vegetal, por exemplo, quando se dá pelos insetos, a perda pelo caminho é muito pequena, o que
torna desnecessária uma superprodução de pólen, ao contrário da polinização por outros meios
(Ferri, 1999).
Outra forma de influência sobre a reprodução vegetal é a ação antrópica de forma
intencional ou involuntária, isso ocorre principalmente em áreas agrícolas; ou seja, quando na
plantação, se realiza a polinização manual, com ou sem auxílio de equipamentos especiais, ou
quando ao cuidar da sua plantação o homem, balança as flores, provocando uma vibração que leva a
queda do pólen sobre o estigma das mesmas (Malagodi-Braga, 2005). A polinização abiótica e
biótica é classificadas de acordo com o agente que a realiza como pode ser observado na tabela 1:
Fórum Internacional do Meio Ambiente - A conferência da Terra 642

Tabela 1. Tipos de polinização e seus polinizadores


Agente Tipo
Vento Anemofilia
Água Hidrofilia
Polinização Abiótica Superfície da água Epidrofilia
Gravidade Polinização gravitacional
Chuva Ombrofilia
Insetos Entomofilia
Besouros Cantarofilia
Moscas Miofilia
Mosca e vespas Sacromiofila
Polinização Biótica Formigas Mimercofilia
Abelhas Melitofilia
Borboletas Lepidopterofilia
Pássaros Ornitofilia
Morcegos Quiropterofilia
Fonte: Adaptado de Kevan, 2007.

A depender do tipo de polinização e o agente que visita as flores, estas desenvolvem alguns
mecanismos que facilitam sua dispersão através da atração para a visitação, como coloração intensa
e odores fortes (Ferri, 1999). As abelhas, por exemplo, são atraídas por diversas características,
entre elas a liberação de aroma, coloração de suas pétalas, as quais são brilhantes e/ou refletem a luz
ultravioleta, além da produção de néctar substância açucarada apreciada pelos visitantes, onde as
abelhas adquirem não só alimentos como também abrigo e material para a construção de seus
ninhos (Campos et al., 1987).
Ainda que existam plantas que se auto-polinizem, algumas outras espécies de plantas
dependem exclusivamente da ação dos polinizadores para o sucesso de sua reprodução, podendo até
mesmo desaparecer caso seus polinizadores tornem-se raros ou entrem em extinção (Schowalter,
2006).
Dentre os diversos tipos de polinização destaca-se a polinização entomófila devido às suas
vantagens. Quando comparada à anemófila pode ser citados benefícios como, por exemplo, a
redução da perda de pólen, a possibilidade de polinização em condições inadequadas para
polinização pelo vento e à dispersão de espécies a maiores distâncias (Gullan & Cranston, 1998).
Os insetos além de serem grandes agentes polinizadores, auxiliam na dispersão das plantas atuando
como predadores de sementes ou ainda como dispersores destas (Schowalter, 2006).

EVOLUÇÃO DO MUTUALISMO: PLANTA X POLINIZADOR


A relação de mutualismo entre plantas e insetos é de grande importância para ambos e já
passou por diversos tipos de alterações durante a sua evolução na busca de propiciar melhores
condições aos seus participantes, já que de um lado temos as plantas buscando se reproduzir e de
outro os insetos querendo se alimentar.
Sendo esta muito antiga, provavelmente do Carbonífero, os primeiros insetos polinizadores
eram os fitófagos, agentes que só vieram a ser tornar mais diversos no Cretáceo com um aumento
exacerbado das angiospermas (Gullan & Cranston, 1998).
Inicialmente, nas primeiras plantas, as flores eram fertilizadas apenas com o auxílio do
vento, já que o pólen apresentava pouco valor nutricional e não possuía atrativos para os visitantes
entomológicos. Esta situação veio a ser revertida a partir do momento em que os grãos receberam
uma cobertura pegajosa, um líquido oleaginoso, que além de ter sido considerado um valioso
alimento pelos insetos agarrava ao corpo dos mesmos facilitando sua disseminação (Wigglesworth,
1974).
Por isto, embora os insetos neste momento tenham passado a atuar, estes primeiros
polinizadores de angiospermas e gimnospermas não eram insetos especializados como as abelhas e
Fórum Internacional do Meio Ambiente - A conferência da Terra 643

lepidópteros, mas insetos com menores adaptações que além de polinizar algumas vezes destruíam
as flores, estes insetos eram principalmente besouros e dípteros (Panizzi & Parra, 1991).
Para superar esses danos modificações na morfologia dos insetos, como nas peças bucais, e
nas flores através da liberação de odores, modificação na coloração e a liberação de néctar foram
aplicadas na busca de melhorar esta relação, além do que inicialmente os animais visitavam as
flores sem maiores intenções ou na busca de pólen passaram a visitar na busca de um alimento de
maior valor nutritivo (Wigglesworth, 1974).
Atualmente os mais significantes e diversos grupos de insetos polinizadores pertencem a
três ordens: Diptera na qual se encontra as moscas e os mosquitos, Hymenoptera onde vespas e
abelhas estão classificadas, e Lepidoptera da qual pertencem as mariposas e as borboletas, que
visitam as flores em busca de pólen ou néctar, embora até mesmo alguns predadores durante sua
visita sejam capazes de polinizar (Gullan & Cranston, 1998).
Estimativas atuais avaliam que aproximadamente 73% das espécies vegetais cultivadas no
mundo sejam polinizadas por alguma espécie de abelha, 19% por moscas, 6,5% por morcegos, 5%
por vespas, 5% por besouros, 4% por pássaros e 4% por borboletas e mariposas (FAO, 2004;
Guimarães, 2006).
Essa coevolução entre plantas, em especial as angiospermas, e insetos fez com que estes
grupos se tornassem dois dos maiores grupos de organismos e as angiospermas atingiram um alto
nível de organização (Takhtajan, 1969).
Richards (1993) mostra que ao se considerar o total de animais e produtos das plantas, a
polinização por insetos representa um terço do total dos vegetais utilizados na dieta humana,
dependente, direta ou indiretamente da polinização dessas plantas pelos insetos. E que o valor
econômico e agronômico do efeito polinizador das abelhas em diferentes culturas tem sido destaque
no mercado financeiro e científico. É imensa a diversidade dos polinizadores invertebrados e
vertebrados, destes invertebrados cerca de 20.000 são espécies de abelhas, estes proporcionam um
serviço essencial ao ecossistema (Eardley et al., 2006).
Como pode ser visto, dentre os diversos insetos polinizadores os que mais se destacam são
as abelhas, por isso servem como padrão ao se utilizar a polinização programada em áreas agrícolas.
Estas podem aumentar até 140 vezes o valor de sua produção comparada à produção de mel (Gillot,
1995).
Além disso, se observadas as estimativas sobre o valor econômico proporcionado pela
polinização pelos diversos polinizadores tem-se cerca de $112 bilhões de dólares por ano, sendo
que quando aplicado à agricultura global é responsável por um valor de $ 200 bilhões de dólares
demonstrando ainda mais sua importância (Kearns et al, 1998).

FRAGILIDADE DESTA ATIVIDADE


Embora de grande importância para os ecossistemas o número de polinizadores tem
entrado em declínio, fato que está atrelado à extinção de algumas espécies de plantas. Essa extinção
já foi evidenciada em todos os continentes com exceção da Antártica e, embora não tenham sido
avaliadas grandes extensões em todos os continentes, pode-se presumir que a degradação desses
organismos seja ainda maior já que esta vem associada às ações humanas, dentre as quais destaca: a
fragmentação de hábitat e outras mudanças implantadas no uso da terra, como a agricultura, e o
pastoreio, a utilização de praguicidas e herbicidas, e a introdução de espécies exóticas (Buchmann
& Nabhan, 1996; Kearns et al., 1998).
Apesar da importância e fragilidade da polinização para os ecossistemas conhecidos há
tanto tempo os estudos sobre a ecologia da polinização não estão avançando adequadamente
principalmente no que diz respeito aos diversos polinizadores e as plantas que são polinizadas
(Eardley et al., 2006).
A fragmentação reduz a abundancia de polinizadores e consequentemente a reprodução
vegetal e o fluxo genético; em regiões, nas quais há presença de abelhas nativas e Apis mellifera,
que sofrem fragmentação a população das primeiras entra em declínio enquanto as outras aumentam
sua freqüência de visitação (Schowalter, 2006).
Fórum Internacional do Meio Ambiente - A conferência da Terra 644

Quando se trata de impactos causados pela agricultura uma dos piores danos ao meio e
consequentemente aos polinizadores é a monocultura, das quais Malagodi-Braga (2002), aponta que
quanto maiores as plantações, mais vulneráveis estão à ausência de polinizadores, já que a
quantidade de insetos pode ser muito menor na região central do que nas bordas da cultura,
provocando uma redução na produção e uma qualidade inferior. Além disso, a grande carga de
defensivos agrícolas, que geralmente são necessários para este tipo de área, pode repelir ou mesmo
matar os polinizadores silvestres existentes, reduzindo ainda mais a produtividade.
A perda de uma planta não leva apenas a perda de uma espécie ou animal, mas sim a perda
de uma comunidade que faz parte de uma rede de interações e que estão constantemente conectados
no tempo e espaço dependendo das trocas que realizam (Kearns et al., 1998).
A importância desses agentes polinizadores ganhou destaque com dois eventos de grande
importância: a publicação do livro: “The Forgotten Pollination” de Buchmann e Nabhan, 1996, e a
COP decisão III/1 da CBD (www.biodiv.org), produzindo uma lista de polinizadores em 1996
(Eardley et al., 2006). Ressaltar a importância dos polinizadores nas diversas atividades em que se
relacionam é uma das formas de mostrar como estes organismos são relevantes para o equilíbrio e
manutenção do meio. A exemplo, pode ser visualizada a seguir (Figura 1), a relação nos
ecossistemas agrícolas, de forma a aumenta sustentavelmente a produção, além de enfocar técnicas
de conservação:

Figura 1: Polinizadores em ecossistemas agrícolas (Adaptado de Eardley et al., 2006)


Fórum Internacional do Meio Ambiente - A conferência da Terra 645

CONCLUSÕES
A preservação dos polinizadores é algo de extrema importância para a manutenção dos
ecossistemas, bem como para preservar a diversidade genética dos vegetais. Pensando nas razões
econômicas a conservação da atividade polinizadora proporciona um aumento nos ganhos
principalmente quando se trata da produção de frutos e sementes.
Para manter a quantidade e a variedade dos polinizadores, deve-se inicialmente modificar
as ações antrópicas através da conscientização o que vai ser dado através da divulgação de estudos
que ressaltem esta importância e valorizem este mutualismo. A partir daí poderão ser vistas atitudes
como a redução de pesticidas nas áreas agrícolas, diminuição do desmatamento o que levará a um
aumento da diversidade floral, redução da utilização de polinizadores exóticos.

REFERENCIAS BIBLIOGRAFIA
BUCHMANN SL, NABHAN GP. The Forgotten Pollinators. Washington, DC: Island. 1996. 292p.
CAMPOS, L.A.O.; MORATO, E.; MELO, G.R.; SILVEIRA, F.A. Abelhas – características e
importância. In: Informe Agropecuário. v. 13, n. 149, 1987. p 7-14
EARDLEY, C.; ROHT, D.; CLARKE, L; BUCHMANN, S.; GEMMILL, B. Pollinators and
pollination: A resource book for policy and practice. Pretoria, South Africa: African Pollinator
Iniciative (API). 2006.
FÆGRI K, van der Pijl L. The Principles of Pollination Ecology, Oxford: Pergamon. 1979. 244 p.
3ª ed.
FAO. Conservation and management of pollinators for sustainable agriculture – The internacional
response. In: FREITAS, B.M.; PEREIRA, J.O.P. (Eds.). Solitary bees; Conservation, rearing and
management for pollination. Fortaleza, Brasil: Imprensa Universitária,2004. p. 19-22.
FERRI, M.G.; Botânica – Morfologia externa das plantas (organografia). São Paulo: Nobel, 1999.
FREITAS, B.M. The pollination efficiency of foraging bees on apple (Malus domestica Borkh) and
cashew (Anacardium occidentale L.). University of Wales, Cardiff, UK. 1995. 197p.
FREITAS, B.M.; IMPERATRIZ-FONSECA, V.L. A importância econômica da polinização.
Mensagem doce, n 80, 2005.
GILLOT, C. Entomology. Nova York, Londres: Plenum Press. 1995. 798 p.
GUIMARÃES, R.A. Abelhas (Hemynoptera: Apoidea) visitantes das flores de goiaba (Psidium
guajava L.), laranja (Citrus sinensis L.) e tangerina (Citrus reticulata B.) em pomares comerciais
em Salinas – MG. 2006. 85f. Dissertação, Universidade Estadual do Sudoeste da Bahia, Vitória da
Conquista – BA.
GULLAN, P. J.; CRANSTON, P. S. The insects: an outline of entomology. Londres: Chapman &
Hall, 1998. 491 p.
KEARNS, C. A.; INOUYE D. W.; WASER N. M. Endangered mutualisms: The Conservation of
Plant-Pollinator Interactions. Annu. Rev. Ecol. Syst. 1998. 29:83–112.
KEVAN, P.G. Pollination Biology. International Pollination Course. Chapada Diamantina, Bahia,
Brasil. 2007.
KEVAN, P.G.; IMPERATRIZ-FONSECA, V.L. Pollinating bees: the conservation link between
agriculture and nature. Brasília: Ministério do Meio Ambiente. 2002. 313p.
MALAGODI-BRAGA, K.S. Estudo de agentes polinizadores em cultura de morango (Fragaria x
ananassa Duchesne – Roseaceae). 2002. 104f. Dissertação, Instituto de Biociências da
Universidade de São Paulo, São Paulo-SP.
MALAGODI-BRAGA, K.S. Abelhas: por quê manejá-las para a polinização? Mensagem doce, n.
80, 2005.
NABHAN, G.P.; BUCHMANN, S. Services provided by pollinators. In Daily, G.C. (ed.) Nature's
services: societal dependence on natural ecosystems. Island Press: Washington D.C. p. 133-150.
1997.
PANIZZI, A. R.; PARRA, J. R. P. Ecologia nutricional de insetos e suas implicações no manejo de
pragas. São Paulo: Manole, 1991. 361p.
Fórum Internacional do Meio Ambiente - A conferência da Terra 646

SÃO JOSÉ, A.R; BOARETTO, M.A.C; BRANDÃO, A.L.S. Interação Agricultura x Apicultura. In:
Apicultura Atual: diversificação de produtos. UESB: Vitória da Conquista - BA, 1994. 150p.
SCHOWALTER, T.D. Insect ecology: an ecosystem approach. Canadá: Academia Press. 2006.
572p.
TAKHTAJAN, A. Flowering Plants, Origin and Dispersal. Edinburgh, Oliver & Body LTD. 1969.
620p.
WIGGLESWORTH, V. B. La vida de los insectos. Barcelona: Talleres, 1974. 396 p. (Historia
Natural Destino)
Fórum Internacional do Meio Ambiente - A conferência da Terra 647

GESTÃO AMBIENTAL EM INDÚSTRIAS DE LATICÍNIOS - SOUSA/PARAÍBA

Maria de Fátima Nóbrega Barbosa


Doutoranda em Recursos Naturais – UFCG/PB
José Dantas Neto
Doutor em Agronomia – UNESP/SP
Erivaldo Moreira Barbosa
Doutor em Recursos Naturais – UFCG/PB

RESU MO
A pesquisa científica em alusão teve como preocupação fundamental investigar a gestão
ambiental em indústrias de pequeno porte, no setor de laticínios, na cidade de Sousa – PB.
Especificamente apresentou os seguintes objetivos: investigar quais os princípios ambientais que
fazem parte do planejamento das empresas; verificar quais eram os pontos fortes e fracos em
relação à questão ambiental; analisar as ameaças e as oportunidades em relação à questão ambiental
e propor estratégias ambientais na contribuição do setor de laticínios em Sousa – PB. A
metodologia adotada pautou-se na seguinte sistemática: quanto aos fins tratou-se de uma pesquisa
descritiva, uma vez que apresentou as características da gestão ambiental das indústrias de laticínios
pesquisadas; quanto aos meios representou uma pesquisa de campo, em que foi feita uma pesquisa
in loco no sentido de colher informações acerca da problemática em alusão e propor algumas
alternativas estratégicas para o gerenciamento ambiental desse setor econômico. Os resultados
podem ser resumidos da seguinte forma: o interesse pelas questões ambientais ainda não é um dos
pontos mais importante para as empresas; elas não fazem reciclagem; o consumo de energia elétrica
é alto; não realizam um trabalho de conscientização ambiental com os funcionários; não têm
exigências ecológicas em relação aos seus fornecedores; acreditam que é possível manter o atual
estilo de desenvolvimento. Propõem-se as seguintes estratégias ambientais: que as empresas
conheçam com mais profundidade os impactos ambientais negativos do setor de laticínios; tenham a
preocupação em oferecer produtos que não agridam ao meio ambiente e que consumam pouca
energia elétrica; o processo produtivo leve em consideração os seguintes aspectos: diminuição ou
eliminação da poluição, pouca ou nenhuma produção de resíduos, pouco ou nenhum risco para os
trabalhadores; a empresa como um todo tenha conhecimento dos aspectos de suas atividades que
podem provocar problemas ambientais irreversíveis para a sociedade.
Palavras-chave: gestão ambiental; laticínios; estratégias.

ABSTRACT
The main objective of this work was to investigate the environmental management of small
dairy companies in Souza –PB. it was specifically aimed the following objectives : to investigate
the environmental principles that take part in the companies management; to observe the weak and
the strong aspects in relation to the environmental management; to analyze the threats and the
opportunities considering the environmental issues; to suggest environmental strategies in order to
promote the dairy companies of Sousa-PB. It was applied a descriptive methodology due to the
environmental management characteristics of the dairy companies analyzed, it was made an in loco
field research in order to collect information on the issue and propose some strategic alternatives to
the environmental management of this area.
The reached results could be summarized as follow : the interest for the environmental
issues is not one of the most important point to the companies ;those companies do not give their
staff any improvement training; there is a high consume of electrical energy ;they do not make
any effort in order to make their employees aware of the environmental issues; they do not demand
from their suppliers any ecological concern; they believe that is possible to maintain the current
development behavior. The following environmental proposal are suggested: the companies need to
know better the negative environmental effects on dairy companies; they should have offer products
that consume less electrical energy and do not harm the environment; the productive process should
Fórum Internacional do Meio Ambiente - A conferência da Terra 648

take into consideration aspects such as : removal or reduction of the pollution levels; reduction or
removal of the residues, little or no harm to the employees ; the company should be aware of the
irreversible damages that their activities could cause to society.
Key words: environmental management; dairy products; strategies.

INTRODUÇÃO
A pesquisa em alusão teve como preocupação fundamental investigar a gestão ambiental
em indústrias de pequeno porte, no setor de laticínios, na cidade de Sousa – PB.
Atualmente, a questão ambiental é de suma relevância no planejamento e gerenciamento
das empresas, principalmente naquelas que utilizam recursos naturais escassos, como é o caso das
organizações do ramo de laticínios, que são grandes usuárias de água.
Outro fator que reforça o caminhar nessa direção diz respeito aos impactos ambientais que
podem ser provocados pelas empresas com conseqüências danosas na sociedade.
Assim, torna-se imprescindível a observância de princípios de gestão ambiental para o
desenvolvimento sustentável das empresas. Princípios esses já apresentados pela comissão Mundial
sobre Meio Ambiente e Desenvolvimento patrocinado pela Organização das Nações Unidas –
ONU.
Além do mais, a Carta Empresarial para o Desenvolvimento Sustentável da Câmara de
Comércio Internacional considera a gestão ambiental uma prioridade para a empresa.
Diante do exposto, foi realizada uma pesquisa teórico-prática sobre a temática em debate.
Assim, tornou-se relevante o procedimento de revisão literária, tendo por propósito fortalecer o
arcabouço teórico, que por sua vez, sustentou os trabalhos de investigação in loco (atividades
práticas).
Das argumentações anteriores apresentadas, apreende-se a importância de debruçar olhares
científicos ambientais, ainda que preliminares, sobre as empresas produtoras de derivados do leite
na região semi-árida do sertão paraibano.

OBJETIVOS DA PESQUISA
O trabalho teve como objetivo geral pesquisar a Gestão Ambiental em indústrias de
pequeno porte na cidade de Sousa – Paraíba no setor de laticínios. Especificamente, procurou
investigar quais os princípios ambientais que fazem parte do planejamento da empresa; Verificar
quais são os pontos fortes e fracos da empresa em relação à questão ambiental; Analisar as ameaças
e as oportunidades da empresa em relação à questão ambiental; Propor estratégias ambientais na
contribuição do setor de laticínios em Sousa – Paraíba.

FUNDAMENTAÇÃO TEÓRICA
Os fundamentos teóricos relativos a essa pesquisa têm a preocupação fundamental de
mostrar como deve ser o posicionamento das empresas, especialmente, das indústrias, em relação à
gestão ambiental.
Antes, porém, de se fazer tal explanação serão descritas algumas considerações sobre o
setor de laticínios, uma vez ser o escolhido para estudo dessa pesquisa. As considerações abaixo
têm por base uma pesquisa do FINEP (Financiamento de Estudos e Pesquisas).
A principal matéria-prima dos produtos lácteos é representada pelo leite. As etapas de
produção da cadeia láctea são: ordenha da vaca; resfriamento ou armazenamento; processamento;
distribuição e consumidor final.
De acordo com o Cadastro Nacional de Atividades Econômicas (CNAE) o setor de leite
pode ser classificado em dois grandes grupos: o grupo 15.4 e o 15.8.
No primeiro grupo o setor de leite está representado através de três classes. A primeira é
formada pela preparação do leite, a segunda pela fabricação de produtos de laticínios e a terceira
representada pela fabricação de sorvetes. O segundo grupo refere-se à preparação de produtos
dietéticos, alimentos para crianças e outros conservados que são derivados do leite.
Fórum Internacional do Meio Ambiente - A conferência da Terra 649

Segundo essa pesquisa a produção mundial de leite e derivados em 1999 estava em 539
milhões de toneladas. O Brasil, em 2001 atingiu o sexto maior volume de leite produzido no
mundo, sendo o seu consumo de 73 kg/habitante/ano, que segundo o Ministério da Saúde, este
consumo, está abaixo do ideal.
O leite representa um produto de fundamental importância na economia nacional, estando
entre os seis produtos mais importantes da agropecuária brasileira. È um produto direcionado ao
consumo interno. Entretanto, em épocas de entressafra torna-se necessário importá-lo no sentido de
atender ao consumidor local.
Apesar de ser um setor de extrema importância para a economia local representa um
segmento considerado crítico em termos de poluição ambiental, sendo que os principais impactos
ambientais causados pelas indústrias de laticínios estarem representados por: lançamento de
efluentes líquidos; geração de resíduos sólidos e emissões atmosféricas, que na maioria das vezes
não apresentam nenhum controle ou tratamento.
Atualmente, segundo Buchholz (apud DONAIRE, 1999) é exigido das empresas não só
uma postura do ponto de vista econômico, mas fundamentalmente um posicionamento que leve em
consideração questões como: proteção ao consumidor, controle da poluição, segurança e qualidade
de produtos, assistência médica e social, dentre outros. Quando a empresa visualiza também fatores
como os citados anteriormente, passa a atuar com uma visão sociopolítica que privilegia não só as
variáveis internas como também as externas, dentre elas, a questão ambiental.
Backer (2002) evidencia que a empresa e o meio ambiente devem ser visualizados como
pertencentes a um único ecossistema e que a empresa necessita aprender a aprender o meio
ambiente e chama a atenção para três esferas essenciais para um conhecimento maior do meio
ambiente por parte de engenheiros e dirigentes empresariais, quais sejam: “saber explicar as
necessidades em matéria de defesa ou melhoria do meio ambiente; dispor de ferramentas de gestão
ambiental e saber negociar o ecossistema que ele contribui para criar”.
De acordo com Barbieri (2004, p. 137), sistema de gestão ambiental “é um conjunto de
partes inter-relacionadas para abordar os problemas ambientais atuais ou para evitar o seu
surgimento”. Como a questão ambiental hoje é um tema que tem gerado preocupações entre vários
segmentos e setores, como governos, empresas nacionais e internacionais, organizações não-
governamentais e a sociedade - organismos nacionais e internacionais - têm buscado de várias
formas criar instrumentos e modelos que tenham por escopo minimizar os impactos ambientais
negativos provocados, especialmente, pelas atividades produtivas das empresas industriais.
Pautando-se nas considerações acima e para um melhor entendimento de um sistema de
gestão ambiental serão descritos a seguir alguns modelos de sistemas de gestão ambiental, por se
tratar de instrumento de valiosa importância para àquelas empresas que estão preocupadas com a
melhoria contínua de seu desempenho ambiental.

SISTEMA PROPOSTO PELA CÂMARA DE COMÉRCIO INTERNACIONAL (ICC)


A International Chamber of Commerce (ICC) é uma Organização Não-Governamental
(ONG) que criou um modelo de Sistema de Gestão Ambiental (SGA) e de Auditoria Ambiental
com o propósito de minimizar os problemas ambientais em prol da competitividade das empresas
no mercado internacional.
O SGA é um modelo que objetiva atingir um desempenho sustentável no sentido de
atender as contínuas modificações em vários setores da sociedade, como: mudanças na
regulamentação, riscos ambientais, pressões econômicas, políticas, sociais, dentre outras. Os
objetivos de um SGA podem ser enumerados da seguinte forma: assegurar a conformidade com as
leis locais, regionais, nacionais e internacionais; criar políticas internas e maneiras de atingi-las em
consonância com os objetivos ambientais da empresa; identificar e gerir os riscos da empresa que
foram produtos dos riscos ambientais; identificar o grau de recursos financeiros e o pessoal
necessário para uma gestão ambiental efetiva, ou seja, uma gestão ambiental que seja ao mesmo
tempo eficiente e eficaz (Barbieri, p.138, in: International of Commerce). Esse modelo é
operacionalizado através das funções que fazem parte do processo administrativo, tais como:
Fórum Internacional do Meio Ambiente - A conferência da Terra 650

planejamento, organização, implementação e controle. A observância dessas funções é


imprescindível para a colocação do modelo em funcionamento. Cada uma delas tem papel decisivo
para o aprimoramento do modelo.

SISTEMA COMUNITÁRIO DE ECOGESTÃO E AUDITORIA (EMAS)


Representa outro modelo de SGA que foi criado pelo Regulamento nº 1.836 de 1993 do
Conselho da Comunidade Econômica Européia. A princípio, esse sistema de gestão ambiental era
exclusivo para empresas industriais, entretanto, o Regulamento nº 761/2001 do Parlamento Europeu
e Conselho da União Européia, quando substitui o de 1993, faz com que o Emas possa ser utilizado
por qualquer tipo de organização preocupada com a gestão dos aspectos de suas atividades que
provoquem impactos ambientais negativos advindos do seu processo de gestão.
O Emas tem por escopo proporcionar a melhoria contínua da postura ambiental de uma
empresa através dos seguintes critérios: criação e implantação de um SGA em conformidade aos
requisitos da Resolução 761/2001; avaliação metódica, objetiva e periódica do desempenho do
SGA; disponibilização de informações relativas à postura ambiental da empresa para os diversos
públicos que tenham algum interesse no seu desempenho ambiental, como: acionistas, fornecedores,
consumidores, governo, dentre outros; motivação e treinamento de todos os colaboradores
envolvidos com a implantação do SGA nas empresas, especialmente, àquelas de pequeno e médio
porte têm muitas dúvidas a respeito da real necessidade de implantação de um SGA em suas
empresas. Elas se questionam até que ponto é viável economicamente a criação de um SGA na sua
estrutura organizacional e se o mesmo trará benefícios que compensem os custos envolvidos.
Enfim, falta informações consistentes para uma tomada de decisão consistente acerca da
implantação de um SGA.
Moreira (2001) chama a atenção para alguns benefícios que um SGA pode trazer para uma
empresa e que muitas vezes o empresário não consegue perceber. O primeiro deles e de
fundamental importância é a melhoria contínua do desempeno ambiental; redução de desperdícios;
prevenção de riscos; capacidade de se posicionar perante o mercado nacional e internacional como
uma empresa que apresenta consciência ambiental; bem como, vários benefícios intangíveis que
agregam vantagens competitivas de longo prazo para a empresa.
Para que uma empresa possa agir com segurança no sentido de mitigar os impactos
ambientais de suas atividades, necessário se faz um estudo de impacto ambiental com o escopo de
estabelecer medidas para poder agir em conformidade com a legislação ou com a sua política
ambiental.
De acordo com Barbieri (2004, p. 246) “[...] o estudo dos impactos constitui um
instrumento de gestão ambiental sem o qual não seria possível promover a melhoria dos sistemas
produtivos em matéria ambiental”.
Na implantação e operação de um SGA é imprescindível que a empresa estude os impactos
ambientais advindos de suas atividades e identifique aqueles que são negativos ao meio ambiente no
sentido de agir neles em busca de sua minimização ou eliminação.
A empresa que almeja uma gestão ambiental, em sintonia com a atual realidade
empresarial, pode se utilizar de algumas estratégias, que, se bem direcionadas podem lhes trazer
vantagens competitivas de longo prazo tanto no âmbito local como internacional, dependendo da
amplitude de atuação que a mesma esteja interessada em alcançar.

ESTRATÉGIAS DIFERENCIADAS DE GESTÃO AMBIENTAL


Andrade, Tachizawa e Carvalho (2003) chamam a atenção para as diferentes estratégias
que podem ser adotadas pelas empresas dependendo do setor econômico em que as mesmas estejam
inseridas.
De acordo com os autores citados anteriormente existe o setor econômico simiconcentrado,
formado por empresas tradicionais de bens de consumo não-duráveis, como alimentos, têxtil,
confecções, metalurgia, plásticos e borracha, madeira e móveis. Para esse setor econômico as
estratégias empresarias ambientais são diferenciadas em relação às estratégias que devem ser
Fórum Internacional do Meio Ambiente - A conferência da Terra 651

adotadas para outros setores econômicos. Como o setor de laticínios está inserido nesse segmento
econômico, serão expostos a seguir alguns direcionamentos estratégicos que devem ser observados
nesse setor.
As empresas que se encontram inseridas nesse tipo de setor econômico apresentam
impactos ambientais de grau elevado e podem adotar as seguintes atitudes estratégias ambientais no
sentido de mitigar os impactos provocados no meio ambiente: adotar uma estratégia ambiental em
consonância com a legislação vigente; reduzir gastos com insumos produtivos através da utilização
de métodos racionais ligados às origens de suprimentos; criação e aprimoramento de seus processos
produtivos; criação e desenvolvimento de produtos que estejam em sintonia com as demandas
ambientais e redução e/ou eliminação de riscos ambientais no sentido de promover qualidade de
vida para os colaboradores da empresa e redução de custos para os proprietários do negócio.
(ANDRADE; TACHIZAWA; CARVALHO, 2003).

METODOLOGIA
A metodologia adotada na pesquisa fundamenta-se na classificação proposta por Vergara
(1997). Quanto aos fins trata-se de uma pesquisa descritiva, uma vez que apresenta as
características da gestão ambiental das indústrias de laticínios pesquisadas. Quanto aos meios
representa uma pesquisa de campo, em que foi feita uma pesquisa in loco, com todas as empresas
do setor, num total de 6(seis), no sentido de colher informações acerca da problemática em alusão e
propor algumas alternativas estratégicas para o gerenciamento ambiental desse setor econômico.

ANÁLISE E INTERPRETAÇÃO DOS RESULTADOS: DIAGNÓSTICO DAS ESTRATÉGIAS


AMBIENTAIS UTILIZADAS NAS EMPRESAS
Interesse por Questões Ambientais
Verificou-se que 33,3% das empresas estão muito interessadas e 66,7% estão apenas
interessada pelas questões ambientais.
Pode-se observar que a temática questão ambiental ainda não se encontra internalizada de
forma mais consistente pelas empresas pesquisadas.

Motivos Indicados pelo Interesse das Questões Ambientais


Os motivos indicados pelo interesse das questões ambientais foram bastante diversificados,
descritas de forma individual:
“Nós dependemos do meio ambiente”;
“Para diminuir a poluição”;
“Ter a preocupação de construir a fábrica em local que não prejudique o meio ambiente”.

Uso de Matérias-Primas Renováveis


Quando indagadas sobre o uso de matérias-primas renováveis, apenas uma delas (33,3%)
afirmou o uso de tal procedimento. A maior parte das empresas não utilizam matérias primas
renováveis na gestão de seu empreendimento.

Existência de Reciclagem
Apenas uma empresa afirmou ter o uso da reciclagem em sua empresa.
Intensidade do Consumo de Energia, Poluição, Produção de Resíduos e Risco para os as estratégias
empresarias
A análise destas variáveis revelou que, a totalidade das empresas pesquisadas (100,0%)
considerou o consumo de energia alto, que a poluição gerada pelas suas atividades é baixa, a
produção de resíduos é baixa e os riscos oferecidos para os trabalhadores também foi baixo.

Atividades de Conscientização Ambiental com os Funcionários


Dentre as empresas pesquisadas observou-se que apenas uma delas (33,3%) realiza algum
tipo de atividade de conscientização ambiental com os seus colaboradores.
Fórum Internacional do Meio Ambiente - A conferência da Terra 652

A consciência ambiental entre muitas empresas ainda é uma atitude estranha a sua
estrutura interna. Isso não foi diferente para as empresas nesse estudo.
As justificativas dadas pelas empresas para não realizam tais atividades foram: “Não entra
na pauta de exigências” e “por falta de instrução dos funcionários”.

Investimento em Equipamentos e Instalações


A totalidade (100,0%) das empresas pesquisadas afirmou que nos últimos 5 anos fez algum
investimento em novas máquinas, instalações e equipamentos. Dentre estas empresas, duas delas
justificaram tais investimentos devido ao “crescimento empresarial” e “mais facilidade da
empresa/custo x beneficio”.

Legislações Ambientais Seguidas Pelas Empresas


A obrigatoriedade de legislações ambientais foi constatada para duas empresas (67,7%)
pesquisadas. Dentre essas legislações, foram citadas: IBAMA e SUDEMA.
De acordo com esse resultado percebeu-se que a maior parte das empresas abordam as
questões ambientais apenas de forma impositiva, não levando em consideração aspectos
preventivos.

Pontos Fortes e Pontos Fracos em Relação à Questão Ambiental


Em relação aos pontos fortes e fracos apresentam-se abaixo os resultados identificados em
relação aos questionamentos feitos. Pontos Fortes: não danifica nada no meio ambiente; conhecem a
legislação ambiental e fazem reúso de águas . Os pontos fracos foram: ausência de tratamento de
esgoto e pouca arborização.
Quando uma empresa afirma que suas atividades não danificam o meio ambiente, essa
afirmativa pode representar um desconhecimento dos aspectos inerentes a sua atividade que possam
causar algum impacto negativo ao meio ambiente. A mesma análise pode ser feita em relação aos
pontos fracos, quando a empresa afirma não possuir nenhum em relação à questão ambiental.

Oportunidades e Ameaças Relacionadas às Questões Ambientais


Quanto a esta questão os resultados encontrados para as oportunidades em grande parte das
empresas pesquisadas foram: obter benefícios para as empresas e arborizar o ambiente. A grande
ameaça para a maioria das empresas foi a poluição e algumas responderam não apresentarem
nenhuma ameaça.
Quando uma empresa afirma não possuir nenhuma ameaça em relação ao meio ambiente
isso pode implicar a falta de um conhecimento mais aprofundado sobre as reais conseqüências de
não se levar em consideração em seu funcionamento aspectos ligados ao tema ambiental.

Fontes de Informações Sobre o Meio Ambiente


Dois terços (66,7%) das empresas pesquisadas afirmaram ter alguma fonte de informação
sobre o meio ambiente.
Abordagens sobre o Meio Ambiente (Primeira abordagem: não é possível manter o atual
estilo de desenvolvimento); (Segunda abordagem: é possível manter o atual estilo de
desenvolvimento)
A primeira abordagem considerada sobre o meio ambiente considerou, na sua totalidade
(100,0%), que a natureza deve ser preservada pelo seu próprio valor, estado acima dos interesses do
homem. A segunda teve uma aceitação de dois terços (66,7%) das empresas em questão, que
considerou que é possível manter nosso atual estilo de desenvolvimento.
Em relação à segunda afirmativa consta-se que a maior parte das empresas pesquisadas
estão equivocadas quando dizem ser possível manter o atual estilo de desenvolvimento em busca da
sustentabilidade.

Exigências Ecológicas em Relação aos Fornecedores


Fórum Internacional do Meio Ambiente - A conferência da Terra 653

Apenas uma das empresas pesquisadas afirmou que tem alguma exigência ecológica em
relação aos seus fornecedores. A justificativa dada por essa exigência foi “só compra material de
reflorestamento”.
Mais uma vez fica evidente que a maioria das empresas não têm uma visão mais
aprofundada em relação à temática ecológica.

Meio Ambiente como Responsabilidade Social


Foi unânime entre as empresas pesquisadas considerar o meio ambiente como
responsabilidade social.

Plano de Emergência para os Funcionários em Caso de Acidente Técnico


A existência do plano de emergência para os funcionários em caso de acidente técnico foi
observada para dois terços (66,7%) das empresas pesquisadas.

Plano de Responsabilidade Moral, Penal, Civil e Administração do ponto de vista Ambiental.


Não foi constatada, pela totalidade das empresas, a existência de um plano que descreve,
do ponto de vista ambiental, as responsabilidades moral, penal, civil e administrativa.

Indicação das Funções Contabilidade e Auditoria Ambiental no Organograma


A totalidade das empresas pesquisadas afirmou que não indicam em seu organograma as
funções contabilidade e auditoria ambiental.
Apesar dessas funções serem comuns em empresas de grande porte, atualmente não é de se
estranhar que empresas de médio e pequeno porte não possam enquadrá-las em sua estrutura
funcional.

CONSIDERAÇÕES FINAIS
As conclusões obtidas em relação a esta pesquisa podem ser resumidas da seguinte forma:
o interesse pelas questões ambientais ainda não é um dos pontos mais importante para a empresa;
não usam matérias-primas renováveis; a maior parte das empresas não fazem reciclagem; o
consumo de energia apresenta-se alto; não realizam um trabalho de conscientização ambiental com
os funcionários; têm informações sobre o meio ambiente; não têm exigências ecológicas em relação
aos seus fornecedores; meio o meio ambiente uma responsabilidade essencial de todos os
funcionários; meio para os funcionários em caso de acidente técnico; não existe um plano que
descreva do ponto de vista ambiental as suas responsabilidades moral, civil, penal e administrativa e
acreditam que é possível manter o atual estilo de desenvolvimento.
Fica evidente na pesquisa que as empresas pesquisadas precisam conhecerem com mais
profundidade alguns princípios que podem melhorar o seu desempenho ambiental, tendo por escopo
uma visão de longo prazo na condução de seus negócios.
Pautando-se nos resultados apresentados pela pesquisa, sugere-se que essas empresas
levem em consideração no seu modelo de gestão alguns princípios em alguns aspectos do seu
funcionamento que podem ser bem visualizados da seguinte forma:
Em relação ao ramo de atividade – Que as empresas pesquisadas conheçam com mais
profundidade os impactos ambientais negativos do setor de laticínios.
Em relação aos produtos – Que essas empresas se preocupem em oferecer produtos que
não agridam ao meio ambiente e que consumam pouca energia.
Em relação ao processo produtivo – As empresas precisam levar em consideração em seu
processo o alcance dos seguintes objetivos: diminuição ou eliminação da poluição; pouca ou
nenhuma produção de resíduos pouco ou nenhum risco para os trabalhadores; baixo consumo de
energia e eficiente uso dos recursos.
Em relação ao comprometimento gerencial – Que os donos dessas empresas assumam a
melhoria da gestão ambiental de seus negócios em todos os níveis da empresa. Esse compromisso é
Fórum Internacional do Meio Ambiente - A conferência da Terra 654

de fundamental importância para as ações de melhoria contínua que a empresa esteja propensa a
implementar.
Capacitação dos funcionários – É de suma importância que as empresas capacitem seus
funcionários quando do uso de equipamentos que tenham por objetivo mitigar impactos negativos
ao meio ambiente.
Conscientização ambiental – Que a empresa como um todo tenha conhecimento dos
aspectos de suas atividades que podem provocar problemas ambientais irreversíveis para a
sociedade. O papel dos donos de empresas é fundamental nesse processo.
Enfim, para estar em sintonia com princípios de uma gestão ambiental efetiva, faz-se
necessário que as empresas adotem o seguinte posicionamento estratégico em prol da causa
ambiental.
Em primeiro lugar é necessário se fazer um diagnóstico intensivo para identificar a
estratégia ecológica que a empresa precisa adotar em prol da melhoria ambiental.
Em segundo lugar precisa adotar uma estratégia ambiental que obedeça aos seguintes
critérios: esteja em consonância com a legislação vigente; reduza gastos com insumos produtivos
através de métodos racionais; crie e aprimore seu processo produtivo; ofereça produtos que estejam
em sintonia com as demandas ambientais e reduza e/ou elimine os riscos ambientais.
Finalmente, que as empresas pesquisadas criem condições que lhes propiciem implantarem
um Sistema de Gestão Ambiental levando em consideração os princípios ambientais que fazem
parte dos valores da empresa e que estão em conformidade com as exigências legais em relação à
questão ambiental.

REFERÊNCIAS BIBLIOGRÁFICAS
ANDRADE, Rui Otávio Bernardes de; TACHIZAWA, Takeshy; CARVALHO, Ana Barreiros de.
Gestão ambiental: enfoque estratégico aplicado ao desenvolvimento sustentável. 2. ed. São Paulo:
MAKRON Books, 2003.
BACKHER, Paulo de. Gestão ambiental: a administração verde. Rio de Janeiro: Qualitymark, 2002.
BARBIERI, José Carlos. Gestão ambiental empresarial: conceitos, modelos e instrumentos. São
Paulo: Saraiva, 2004.
DONAIRE, Denis. Gestão ambiental na empresa. 2. ed. São Paulo: Atlas, 1999.
MOREIRA, Maria Suely. Estratégia e implantação do sistema de gestão ambiental modelo ISO
14000. Belo Horizonte: Editora do Desenvolvimento Gerencial, 2001.
TACHIZAWA, Takeshy. Gestão ambiental e responsabilidade social corporativa: estratégias de
negócios focadas na realidade brasileira. 2. ed. São Paulo: Atlas, 2004.
VERGARA, Sylvia Constant. Projetos e relatórios de pesquisa em administração. São Paulo: Atlas,
1997.
Fórum Internacional do Meio Ambiente - A conferência da Terra 655

FLORA ARBUSTIVA-ARBÓREA DE UMA ÁREA DE CAATINGA NO MUNICÍPIO DO


SENHOR DO BONFIM, BAHIA, BRASIL.

Cícera Izabel Ramalho


Aluna do Programa de Pós-graduação em Agronomia, DSER/CCA/UFPB, CEP 58.397-000, Areia – PB.
isaramalho3@hotmail.com
Alberício Pereira de Andrade
Professor Adjunto, DSER/CCA/UFPB, CEP 58.397-000, Areia – PB. andrade@cca.ufpb.br
Alecksandra Vieira de Lacerda
Bolsista - Pesquisadora do INSA/MCT, CEP: 58100-001, Campina Grande, PB. alecvieira@yahoo.com.br

RESUMO
A pesquisa objetivou avaliar a composição florística do componente arbustivo-arbóreo em
uma área de caatinga no município de Senhor do Bonfim - BA. O levantamento florístico foi
realizado em uma área de 1 ha. O período de amostragem compreendeu três coletas, sendo estas
realizadas em novembro de 2006 e em março e agosto de 2007. Assim, todas as espécies arbóreas e
arbustivas foram coletas e depositadas no Herbário Jaime Coelho de Moraes da Universidade
Federal da Paraíba. A vegetação foi representada por 53 espécies, distribuídas em 23 famílias e 38
gêneros. As famílias que apresentaram o maior número de espécies foram Euphorbiaceae,
Mimosaceae, Malvacea e Rubiaceae. A maior parte dos gêneros (31) possui apenas uma espécie,
ficando sete gêneros com mais de uma. Portanto, estes dados apontam para uma tendência na
vegetação estudada, a exemplo do que ocorre em outros levantamento na caatinga, em apresentar
baixa diversidade dentro dos táxons.
Palavras-chave: Florística, riqueza, Semi-Árido.

ABSTRACT
Aimed to study the floristic composition of the shrub-tree layer in the caatinga of Senhor
do Bonfim, Bahia. The floristics was developed in an area of 1 ha. The sampling period
comprehended three collections. The plants were deposited at Herbarium Jaime Coelho of Moraes
(UFPB). The shrub-tree layer presented 53 species from 38 genera and 23 families. The families
with the highest number of species were: Euphorbiaceae, Mimosaceae, Malvacea and Rubiaceae.
The greater number genera presented a species, being seven genera with more than one. Thus, these
results indicate for a tendency in the studied vegetation, to example of what happens in other areas
in caatinga, in presenting low diversity inside of the taxa.
Word-key: floristic, species richness, semi-arid.

INTRODUÇÃO
O Nordeste do Brasil tem a maior parte de seu território ocupado por uma vegetação
xerófila, de fisionomia e florística variada, denominada caatinga. A vegetação de caatinga é
constituída, especialmente, de espécies lenhosas e herbáceas, de pequeno porte, dotadas de
espinhos, sendo, geralmente, caducifólias, perdendo suas folhas no início da estação seca, e de
cactáceas e bromeliáceas (DRUMOND et al., 2000).
ANDRADE-LIMA (1981) afirma que as caatingas situadas em locais onde as
precipitações são mais elevadas apresentam um maior número de espécies. Por outro lado, segundo
RODAL (1992), embora a precipitação seja um fator importante, o maior ou menor número de
espécies nos levantamentos realizados deve ser resposta a um conjunto de fatores, tais como
topografia, classe, profundidade e permeabilidade do solo e não apenas ao total de chuvas.
A Bahia possui uma boa representatividade de quase todos os ecossistemas existentes no
Brasil, sendo que o semi-árido ocupa mais de 50% do Estado incluindo uma grande diversidade de
tipos de caatingas (GIULIETTI, 2004). As caatingas do estado da Bahia estão distribuídas, no
sentido Leste-Oeste, entre as formações vegetacionais atlânticas, a leste, e a seção baiana do
planalto central brasileiro, a oeste, geralmente associadas a pediplanos que constituem o piso das
depressões interplanalticas (SILVA, 1986). As condições ecológicas mais típicas do semi-árido são
Fórum Internacional do Meio Ambiente - A conferência da Terra 656

encontradas nas depressões interplanálticas de grande extensão encaixadas entre os maciços mais
antigos (AIOUAD, 1986).
O município de Senhor do Bonfim apresenta vegetação formada por caatinga hipoxerófila
com trechos de floresta subcaducifolia e caducifolia. Essa vegetação apresenta um grande número
de ‘’licuris’’ Syagrus coronata ao lado de espécies como Piptadenia moniliformis Benth; Mimosa
sp.; Cereus jamacaru DC.; Opuntia sp.; Cereus sp. entre outras (EMBRAPA, 1977).
O estudo da composição florística em áreas de Caatinga é de fundamental importância na
elaboração de planos de manejo voltados para a conservação da diversidade de espécies. Assim, é
preciso ampliar rapidamente o conhecimento sobre os organismos e comunidades já que este é o
terceiro bioma brasileiro mais alterado pelo homem e o menos conhecido da América do Sul
(TABARELLI & VICENTE, 2002). Segundo os autores, faz-se necessário ampliar a amostragem
dos trabalhos realizados, tendo em vista que a baixa riqueza de espécies alegada para o bioma,
muitas vezes, pode significar amostragem insuficiente. Ainda segundo esses autores, o nível de
informação sobre a organização e formas de ocorrência de plantas lenhosas da caatinga é reduzido
ou até inexistente para 80% do Bioma. Assim, informações sobre riqueza, endemismo, distribuição
geográfica e ecológica de plantas lenhosas da caatinga existem apenas de forma preliminar
(GAMARRA-ROJAS, 2003).
Portanto, este trabalho teve por objetivo avaliar a composição florística do componente
arbustivo-arbóreo em uma área de caatinga no município de Senhor do Bonfim-BA.

METODOLOGIA
Área de Estudo
O município de Senhor do Bonfim está localizado na Mesoregião Centro Norte do Estado
da Bahia (Figura 1). A sede do município está situada geograficamente nas coordenadas 10º 28’
00’’de latitude sul e 40º 11’ 00’’ de longitude oeste do meridiano de Greenwich e altitude 558,24 m
acima do nível do mar (SEI, 1997). A média anual da precipitação está em torno de 800 mm
(INMET, 2007). A vegetação predominante é caatinga hipoxerófila. Nesse sentido, são observadas
espécies como Syagrus coronata (Mart.) Becc. (licuri) ao lado de espécies como Piptadenia
moniliformis Benth; Mimosa sp.; Cereus jamacaru DC.; Opuntia sp.; Cereus sp. (EMBRAPA,
1977).

Figura 1. Localização geográfica dos municípios de Senhor do Bonfim - BA.


Fórum Internacional do Meio Ambiente - A conferência da Terra 657

Inserida na zona rural de Senhor do Bonfim, a área de caatinga amostrada na pesquisa


ficou localizada na fazenda Rancharia (71º 13’ 74’’ S e 88º 47’ 12’’ W). Pertencente a uma
associação de moradores, a fazenda possui uma área avaliada em torno de 500 hectares e se
encontra a uma distância aproximada de 18 km da sede municipal. Apresenta uma vegetação
arbóreo-arbustiva com palmeiras. Considerando informações locais sobre o uso e ocupação dessa
área, tem-se referenciado, segundo o presidente dessa associação, que desde a sua aquisição, a mais
de 15 anos, a área de mata, com cerca de 10 hectares, vem sendo utilizada apenas para pastejo de
animais em épocas secas, o que pôde ser observado em loco. Assim, não há na área registro de
queimadas ou cultivos agrícolas. O relevo da área foi classificado como suave - ondulado com
declividade em torno de 3%, sem presença de cascalhos na superfície.

Coleta e Análise dos Dados


Para a amostragem do componente arbustivo-arbóreo foi selecionada uma área de 1 ha.
Assim, seguindo o método adotado por MULLER-DOMBOIS & ELLEMBERG (1974) e RODAL
et al. (1992) foram estabelecidas nesta área 100 parcelas contíguas de 10 x 10m. No interior das
parcelas, trabalhou-se o levantamento florístico. A escolha deste método se apóia na base teórica
que o define como aquele que permite efetuar comparações relativamente simples e eficientes entre
as áreas (VAN DEN BERG & OLIVEIRA-FILHO, 2000).
O período de amostragem compreendeu três coletas, sendo estas realizadas em novembro
de 2006 e em março e agosto de 2007. O material coletado foi encaminhado ao Herbário Jaime
Coelho de Moraes da Universidade Federal da Paraíba, para secagem em estufa e posterior
herborização. A identificação foi realizada usando bibliografia especializada (BARROSO et al.,
1978; BARROSO et al., 1984; LEWIS, 1987; LORENZI, 1992), ajuda profissional, e análise das
exsicatas depositadas no herbário. O sistema de classificação utilizado foi o de CRONQUIST
(1988).

RESULTADOS E DISCUSSÃO
Na área de caatinga do Senhor do Bonfim foram registradas 53 espécies, distribuídas em
23 famílias e 38 gêneros. O hábito arbóreo apresentou com 27 espécies, sendo assim um pouco
superior ao componente arbustivo (Tabela 1).
Autores como PEREIRA et al. (2002) e ALCOFORADO FILHO et al. (2003) colocam
que as caatingas dos Agrestes, na borda mais úmida do semi-árido, podem chegar a ter entre 50 e 60
espécies, em um único local. Nesse sentido, observa-se que os valores apresentados são semelhantes
ao encontrados nesse estudo. Assim, pode-se verificar nítido efeito da maior disponibilidade hídrica
no aumento da riqueza florística. Ratificando essas assertivas, ANDRADE-LIMA (1981) coloca
que as caatingas situadas em locais onde as precipitações são mais elevadas apresentam maior
Fórum Internacional do Meio Ambiente - A conferência da Terra 658

Tabela 1. Famílias e espécies amostradas na área de caatinga no município de Senhor do Bonfim –


BA.
Família/Espécie Nome Popular Hábito
Anacardiaceae
Myracrodruon urundeuva Fr. All. Aroeira Árvore
Schinopsis brasiliensis Engl. Braúna Árvore
Spondias tuberosa Arruda Umbuzeiro Árvore
Annonaceae
Rollinia leptopetala R.E.Fr. Pinha brava Árvore
Arecaceae
Syagrus coronata (Mart.) Becc. Licuri Árvore
Cactaceae
Cereus jamacaru DC. Mandacaru Árvore
Opuntia palmadora Britton & Rose Palmatória Arbusto
Caesalpiniaceae
Caesalpinia pyramidalis Tul. Catingueira Árvore
Capparaceae
Capparis jacobinae Moric. ex Eichler Icó piloso Árvore
Capparis yco (Mart.) Eichler Icó liso Arbusto
Erytroxylaceae
Erytroxylum lindmanii Plowman Arbusto
Euphorbiaceae
Cnidoscullus urens (L.) Arthur Cansanção Arbusto
Cnidoscullus sp. Árvore
Croton sp. 1 Caçatinga branca Arbusto
Croton sp. 2 Arbusto
Croton sp. 3 Arbusto
Croton sp. 4 Quebra facão Arbusto
Jatropha gossypiifolia L. Pinhão-roxo Arbusto
Jatropha ribifolia (Pohl) Baill. Arbusto
Jatropha sp. Pinhão Árvore
Manihot glaziovii Müll. Arg. Maniçoba Árvore
Fabaceae
Amburana cearensis (Allemão) A.C.Sm. Umburana Árvore
Poecilanthe ulei (Harms) Arroyo & Rudd Mucitaíba-branca Árvore
Lamiaceae
Hyptis martiusii Benth Arbusto
Malvaceae
Helicteris mollis K. Schum. Guaxuma Arbusto
Helicteris eichleri K. Schum. Fumo de macaco Arbusto
Luehea grandiflora Mart. Açoita cavalo Arbusto
Melochia tomentosa L. Malva-roxa Arbusto
Meliaceae
Melia azedarach L. Cinamomo Árvore
Mimosaceae
Acacia piauhiensis Benth Calumbi branco Arbusto
Mimosa arenosa (Willd.) Poir. Calumbi Árvore
Mimosa tenuiflora (Willd.) Poir. Jurema preta Árvore
Mimosa sp. 1 Árvore
Mimosa sp. 2 Árvore

continua...
Fórum Internacional do Meio Ambiente - A conferência da Terra 659

Família/Espécie Nome Popular Hábito


Piptadenia viridiflora (Kunth.) Benth Jurema branca Árvore
Myrtacea
Myrtaceae 1 Arbusto
Nyctaginaceae
Pisonia sp. Árvore
Oxalidaceae
Oxalis psoraleoides Kunth. Arbusto
Polygonaceae
Coccoloba confusa How Pajeu Árvore
Triplaris sp. aff T. tomentosa Wedd. Árvore
Polygonaceae 1 Árvore
Rhamnaceae
Rhamnidium sp. Árvore
Rubiaceae
Alseis floribunda Schott Árvore
Basanacantha spinosa var. pubescens (Jacq.) K. Schum. Árvore
Coutarea hexandra(Jacq.) K. Schum. Quina - quina Árvore
Guettarda platypoda DC. Angélica do mato Arbusto
Rutaceae
Balfourodredon molle (Miq.) Pirani Pau - chumbo Arbusto
Simaroubaceae
Pricamia cf. bahiensis Turcz Arbusto
Solanaceae
Solanum sp. Arbusto
Verbenaceae
Lantana camara L. Cidreira do mato Arbusto
Lippia cf. thymoides Mart. & Schauer Arbusto
Lippia sp. Arbusto
Indeterminada
Indeterminada Arbusto

Número de espécies. No entanto, para RODAL (1992) o maior ou menor número de


espécies nos levantamentos realizados deve ser resposta a um conjunto de fatores, tais como
situação topográfica, classe, profundidade e permeabilidade do solo e não apenas ao total de chuvas
embora esse seja um dos fatores mais importantes.
As famílias com maior número de espécies no estrato arbustivo-arbóreo foram
Euphorbiaceae com dez espécies, Mimosaceae representadas com seis espécies e ainda Malvacea e
Rubiaceae com quatro espécies cada (Figura 2). Diversos autores têm citado Euphorbiaceae,
Mimosaceae e Malvaceae como famílias de grande representatividade em vários levantamentos
realizados em área de caatinga (ARAÚJO et al. 1995; FERRAZ et al. 1998, RODAL, 1992,
GOMES, 1979; FERREIRA & VALE, 1992; ANDRADE et al., 2005, SANTANA & SOUTO,
2006). Relacionado particularmente à ocorrência de Rubiaceae, pode-se observar que
particularmente no componente lenhoso da vegetação caducifólia espinhosa (VCE) a ocorrência
dessa família tem sido registrada apenas em áreas mais úmidas como São José do Belmonte e
Caruaru, ambas no estado de Pernambuco (TAVARES et al., 1969; ALCOFORADO-FILHO et al.,
2003) e Barbalha no estado do Ceará (TAVARES et al., 1974). Autores como FERRAZ et al.
(1998) também destacam Rubiaceae como uma família típica de matas mais úmidas.
Fórum Internacional do Meio Ambiente - A conferência da Terra 660

Figura 2. Distribuição do número total de espécies amostradas por famílias para a área de caatinga
no município de Senhor do Bonfim - BA.

A maior parte dos gêneros (31) possui apenas uma espécie, ficando sete gêneros com mais
de uma, ou seja, Croton e Mimosa com quatro espécies cada, Jatropha com três e ainda Capparis,
Cnidoscullus, Helicteris e Lippia com duas cada. Estes dados apontam para uma tendência na
vegetação estudada, a exemplo do que ocorre em outros levantamento na Caatinga, em apresentar
baixa diversidade dentro dos táxons. Especificamente para a Caatinga, este fato é também
destacado nos trabalhos de FERREIRA (1988), RODAL (1992) e ARAÚJO et al. (1995).

CONCLUSÕES
O total de espécies listado nesse trabalho é semelhante aos encontrados em áreas mais
úmidas do Semi-Árido. Assim como em alguns levantamentos de caatinga, as famílias
Euphorbiaceae, Mimosaceae e Malvaceae foram também bem representadas em número de
espécies, o que demonstra a ampla distribuição das mesmas nos vários ecossistemas do semi-árido.
Particularmente Rubiaceae, que também se encontra entre as famílias com maior número de
espécie, tem sua ocorrência registrada apenas em áreas mais úmidas. Relacionado aos gêneros
verificou-se uma tendência na vegetação estudada, a exemplo do que ocorre em outros
levantamentos na Caatinga, em apresentar baixa diversidade dentro dos táxons.

REFERÊNCIAS BIBLIOGRÁFICAS
AIOUAD, M. S. Clima da caatinga. In: Simpósio sobre caatinga e sua exploração racional.
Embrapa/ Universidade Estadual de Feira de Santana. Feira de Santana, Bahia, p.37- 48. 1986.
ALCOFORADO FILHO, F.G.; SAMPAIO, E.V.S.B.; RODAL, M.J.N. Florística e fitossociologia
de um remanescente de vegetação caducifólia arbórea em Caruaru, Pernambuco. Acta Botanica
Brasilica v., p. 287-303. 2003.
ANDRADE-LIMA, D. 1981. The caatingas dominium. Revista Brasileira de Botânica 4:149-163.
Árvore, Viçosa, v.26, n.2, p.165-172, 2002.
Fórum Internacional do Meio Ambiente - A conferência da Terra 661

ANDRADE, L.A.; PEREIRA, I.M.; LEITE, U.T.; BARBOSA, M.R.V. Análise da cobertura de
duas fitofisionomias de caatinga, com diferentes históricos de uso, no município de São João do
Cariri, estado da Paraíba. Cerne, Lavras, v.11, n.3, p.253-262, 2005.
ARAÚJO, E. L.; Sampaio, E. V. S. B. & Rodal, M. J. N. Composição florística e fitossociológica
de três áreas de Caatinga de Pernambuco. Revista Brasileira de Biologia, v. 55, n. 4, p. 595-607.
1995.
BARROSO, G. M., GUIMARÃES, E. F., ICHASO, C. L. F., COSTA, C. G. & PEIXOTO, A. L.
Sistemática de angiospermas do Brasil. Livros Técnicos e Científicos, EDUSP, São Paulo, 1o vol.,
255p. 1978.
BARROSO, G.M.; PEIXOTO, A.L.; COSTA, C.G.; ICHASO, C.L.F.; GUIMARÃES, E.F.
Sistemática de Angiospermas do Brasil. v. 3. Viçosa, Universidade Federal de Viçosa, Imprensa
Universitária. 1984.
CAMARGO, F. A. O.; SANTOS, G. A.; GUERRA, J. G. M. Macromoléculas e substâncias
húmicas. In.: SANTOS, G. A.; CAMARGO, F. A. O. Fundamentos da Matéria Orgânica do Solo -
Ecossistemas Tropicais e Subtropicais. Porto Alegre: Gênesis, 1999. Cap. 2. p. 27-39.
CRONQUIST, A. 1988. The evolution and classification of flowering plants. 2nded. New York.
New York Botanical Garden.
DRUMOND, M.A. et al. Estratégias para o uso sustentável da biodiversidade da caatinga. In:
SEMINÁRIO BIODIVERSIDADE DA CAATINGA, 2000, Petrolina. Anais...Petrolina: Embrapa
Semi-árido, 2000.
EMBRAPA. Sistema Brasileiro de classificação de solos. Rio de Janeiro:EMBRAPA, 1999. 412 p.
EMBRAPA. Levantamento exploratório - reconhecimento de solos da margem direita do Rio São
Francisco - Estado da Bahia. 2v. Recife, 1977/79. (Brasil-SNLCS. Boletim Técnico, 52; Brasil.
SUDENE-DRN. Série Recursos de Solos, 10)
FRANCELINO, M. R.; FERNANDES FILHO, E. I.; RESENDE, M. Elaboração de um sistema de
classificação da capacidade de suporte em ambiente semi-árido. Revista Brasileira de Engenharia
Agrícola e Ambiental. Campina Grande (PB), v. 9, n. 1, p. 83-91, 2005.
FERRAZ, E. M. N.; RODAL, M. J. N.; SAMPAIO, E. V. S. B.; PEREIRA, R. C. A. Composição
florística em trechos de vegetação de caatinga e brejo de altitude na região do Vale do Pajeú,
Pernambuco. Revista Brasileira de Botânica, v. 21, n. 1, p: 7-15. 1998.
FERREIRA, R. L. C. Análise estrutural da vegetação da estação florestal de experimentação de
Açu-RN, como subsídio básico para o manejo florestal. 90f. Dissertação de Mestrado –
Universidade federal de Viçosa, Viçosa. 1988.
GAMARRA-ROJAS, C.F.L., MESQUITA, A.C., MAYO, S., SOTHERS, C., BARBOSA, M.R.V.
& DALCIN, E. 2003. Checklist das plantas do nordeste.
http://www.cnip.org.br/bdpn/bd.php?bd=bdpn_check (acesso em 23/11/2007).
GIULIETTI, A.M., et al. Diagnóstico da vegetação nativa do bioma Caatinga. In: SILVA, J.M.C.;
TABARELLI, M.; FONSECA, M.T.; LINS, L.V. (Orgs.). Biodiversidade da Caatinga: áreas e
ações prioritárias para a conservação. Brasília: Ministério do Meio Ambiente, 2004. p. 48-90.
GOMES, M. A. F. Padrões de caatinga nos Cariris Velhos, Paraíba. 1979. Dissertação (Mestrado
em Botânica) - Universidade Federal Rural de Pernambuco, Recife, 1979.
INMET. Instituto Nacional de Meteorologia. www.inmet.gov.br/. 2007;
LEWIS, G.P. Legumes of Bahia. London, Royal Botanic Gardens-Kew. 1987.
LORENZI, H. Árvores Brasileiras. Manual de Identificação e Cultivo de Plantas Arbóreas Nativas
do Brasil. Editora Platarum, Nova Odessa, São Paulo, p. 287. 1992.
MUELLER-DOMBOIS & ELLENBERG, H., Aims and methods of vegetation ecology. New York:
John Willey & Sons, 1974. 525 p.
PEREIRA, I.M.; ANDRADE, L.A.; BARBOSA, M.R.V.; SAMPAIO, E.V.S.B. Composição
florística e análise fitossociológica do componente lenhoso de um remanescente de caatinga no
Agreste Paraíbano. Acta Botanica Brasilica v. 16, n. 3, p. 357-369. 2002.
Fórum Internacional do Meio Ambiente - A conferência da Terra 662

RODAL, M.J.N.; ANDRADE, K.V.A.A.; SALES, M.F.; GOMES, A.S. Fitossociologia do


componente lenhoso de um refúgio vegetacional no Município de Buíque, Pernambuco. Revista
Brasileira de Biologia, São Carlos, v.58, n.3, p.517-526, 1998.
RODAL, M. J. N. Fitossociologia da vegetação arbustivo-árborea em quatro áreas de caatinga em
Pernambuco. 1992, 198 f. (Tese) Universidade Estadual de Campinas.
RODAL, M. J. N.; SAMPAIO, E. V. S.; FIGUEIREDO, M. A. Manual sobre métodos de estudo
florístico e fitossociológico: ecossistema caatinga. Brasília: Sociedade Botânica do Brasil, 1992. 24
p.
SANTANA, J.A. da S.; SOUTO, J. S. Diversidade e Estrutura Fitossociológica da Caatinga na
Estação Ecológica do Seridó-RN. Revista de Biologia e Ciências da Terra. v. 6, n. 2. 2006.
SEI. SUPERINTENDÊNCIA DE ESTUDOS ECONÔMICOS E SOCIAIS DA BAHIA
Informações Geográficas. Disponível em www.sei.ba.gov.br. Acesso em 15/01/08
TABARELLI, M.; VICENTE, A. Conhecimento sobre plantas lenhosas da Caatinga: lacunas
geográficas e ecológicas. In: SILVA, J.M.C.; TABARELLI, M.; FONSECA, M.T.; LINS, L.V.
(orgs.). Biodiversidade da Caatinga: áreas e ações prioritárias para a conservação. Brasília:
MMA, 2004. p. 101-111.
TAVARES, S.; PAIVA, F. A.F.; TAVARES, E. J. de. S.; LIMA, J. L. S. de. Inventário florestal do
Ceará. III. Estudo preliminar das matas remanescentes do município de Barbalha. SUDENE.
Boletim de Recursos Naturais, Recife. V. 13, n. 2, p. 20-46, 1974.
TAVARES, S.; PAIVA, F. A. V.; TAVARES, E. J. S.; CARVALHO, G. H. & LIMA, J. L. S.
Inventário florestal do Ceará. l. Estudo preliminar das matas remanescentes do município de
Quixadá. Boletim de Recursos Naturais v. 7 n. 1/4, p: 93-111. 1969.
VAN DEN BERG, E.; OLIVEIRA-FILHO, A.T.Composição florística e fitossociológica de uma
floresta estacional semidecidual montana, município de Itutinga-MG. , Revista Brasileira de
Botânica São Paulo,v.23,n.3, p.231-253. 2000.
Fórum Internacional do Meio Ambiente - A conferência da Terra 663

LEVANTAMENTO FLORÍSTICO EM UMA ÁREA DE CAATINGA NO MUNICÍPIO DE


JACOBINA, BAHIA, BRASIL.

Cícera Izabel Ramalho


Aluna do Programa de Pós-graduação em Agronomia, DSER/CCA/UFPB, CEP 58.397-000, Areia – PB.
isaramalho3@hotmail.com
Alberício Pereira de Andrade
Professor Adjunto, DSER/CCA/UFPB, CEP 58.397-000, Areia – PB. andrade@cca.ufpb.br
Alecksandra Vieira de Lacerda
Bolsista - Pesquisadora do INSA/MCT, CEP: 58100-001, Campina Grande, PB.
alecvieira@yahoo.com.br

RESUMO
Objetivou-se realizar o levantamento da composição florística do componente arbustivo-
arbóreo em uma área de caatinga no município de Jacobina, semi-árido baiano. O registro da
composição da flora foi definido em uma área de 1 ha. A amostragem compreendeu três coletas,
sendo estas realizadas em novembro de 2006 e em março e agosto de 2007. Assim, todas as
espécies arbóreas e arbustivas foram coletas e depositadas no Herbário Jaime Coelho de Moraes da
Universidade Federal da Paraíba. Na área amostrada, a vegetação ficou representada por 56
espécies, distribuídas em 24 famílias e 39 gêneros. O hábito predominante foi o arbóreo, com 30
espécies. As famílias que apresentaram o maior número de espécies foram Mimosaceae,
Euphorbiaceae e Myrtacea. A maior parte dos gêneros (30) possui apenas uma espécie, ficando
nove gêneros com mais de uma.
Palavras-chave: Flora, arbustivo-arbórea, Semi-Árido.

ABSTRACT
The survey aimed to study the floristic composition of the shrub-tree layer in the caatinga
of Jacobina, Bahia. The floristics was developed in an area of 1 ha. The sampling period
comprehended three collections. The plants were deposited at Herbarium Jaime Coelho of Moraes
(UFPB). The shrub-tree layer presented 56 species from 39 genera and 24 families. The tree layer
presented the highest number of species (30). The families with the highest number of species were:
Mimosaceae, Euphorbiaceae and Myrtacea. The greater number genera presented a species, being
nine genera with more than one.
Key-words: floristic, shrub-tree, semi-arid.

INTRODUÇÃO
Representando uma parcela significativa do território brasileiro, a região Semi-Árida é
definida pela heterogeneidade das condições naturais como o clima, solo, topografia e vegetação.
Inseridas nos domínios do Semi-Árido encontram-se as áreas de Caatinga. Nesse sentido, tem-se
que a Caatinga é um tipo vegetacional Semi-Árido único, ocorrendo somente no Brasil (AGUIAR
et al., 2002) quase que exclusivamente na região Nordeste. É a quarta maior formação vegetacional
brasileira, após a Amazônia, o Cerrado e a Mata Atlântica. Para autores como DRUMOND et al.
(2000) as áreas de Caatinga absorvem um tipo de vegetação xerófila de fisionomia e composição
florística variada. Para o autor referenciado, a vegetação de caatinga é constituída, especialmente,
de espécies lenhosas e herbáceas, de pequeno porte, dotadas de espinhos, sendo, geralmente,
caducifólias, perdendo suas folhas no início da estação seca, e de cactáceas e bromeliáceas
(DRUMOND et al., 2000). Nesse sentido, discutindo os seus aspectos característicos, ANDRADE-
LIMA (1981) afirma que as caatingas situadas em locais onde as precipitações são mais elevadas
apresentam um maior número de espécies. Por outro lado, segundo RODAL (1992), embora a
precipitação seja um fator importante, o maior ou menor número de espécies nos levantamentos
realizados deve ser resposta a um conjunto de fatores, tais como topografia, classe, profundidade e
permeabilidade do solo e não apenas ao total de chuvas.
Fórum Internacional do Meio Ambiente - A conferência da Terra 664

Particularmente relacionado à Bahia, este possui uma boa representatividade de quase


todos os ecossistemas existentes no Brasil, sendo que o semi-árido ocupa mais de 50% do Estado
incluindo uma grande diversidade de tipos de caatingas (GIULIETTI, 2004). As caatingas do estado
da Bahia estão distribuídas, no sentido Leste-Oeste, entre as formações vegetacionais atlânticas, a
leste, e a seção baiana do planalto central brasileiro, a oeste, geralmente associadas a pediplanos que
constituem o piso das depressões interplanalticas (SILVA, 1986). As condições ecológicas mais
típicas do semi-árido são encontradas nas depressões interplanálticas de grande extensão encaixadas
entre os maciços mais antigos (AIOUAD, 1986).
O município de Jacobina apresenta vegetação formada por caatinga hipoxerófila com
trechos de floresta subcaducifolia e caducifolia. Essa vegetação apresenta um grande número de
‘’licuris’’ Syagrus coronata ao lado de espécies como Piptadenia moniliformis Benth; Mimosa sp.;
Cereus jamacaru DC.; Opuntia sp.; Cereus sp. entre outras (EMBRAPA, 1977).
Nesse sentido, o estudo da composição florística em áreas de Caatinga é de fundamental
importância na elaboração de planos de manejo voltados para a conservação da diversidade de
espécies. Assim, é preciso ampliar rapidamente o conhecimento sobre os organismos e
comunidades já que este é o terceiro bioma brasileiro mais alterado pelo homem e o menos
conhecido da América do Sul (TABARELLI & VICENTE, 2002). Segundo os autores, faz-se
necessário ampliar a amostragem dos trabalhos realizados, tendo em vista que a baixa riqueza de
espécies alegada para o bioma, muitas vezes, pode significar amostragem insuficiente. Ainda
segundo esses autores, o nível de informação sobre a organização e formas de ocorrência de plantas
lenhosas da caatinga é reduzido ou até inexistente para 80% do Bioma. Assim, informações sobre
riqueza, endemismo, distribuição geográfica e ecológica de plantas lenhosas da caatinga existem
apenas de forma preliminar (GAMARRA-ROJAS, 2003).
Portanto, objetivou-se nesta pesquisa realizar o levantamento da composição florística do
componente arbustivo-arbóreo em uma área de caatinga no município de Jacobina, semi-árido
baiano.

METODOLOGIA
Área de Estudo
O município de Jacobina está localizado na Mesoregião Centro Norte do Estado da Bahia
(Figura 1). Este município localiza-se nas coordenadas 11º 11´8" latitude sul e 40º28´longitude
oeste do meridiano de Greenwich e encontra-se a uma altitude de 470,44 m acima do nível do mar
(SEI, 1997). A média anual da precipitação está em torno de 963 mm (INMET, 2007). A vegetação
predominante é caatinga hipoxerófila, sendo observada ainda Floresta subcaducifolia e caducifólia.
Nesse sentido, são registradas espécies como Syagrus coronata (Mart.) Becc. (licuri) ao lado de
espécies como Piptadenia moniliformis Benth; Mimosa sp.; Cereus jamacaru DC.; Opuntia sp.;
Cereus sp. (EMBRAPA, 1977).
Inserida na zona rural de Jacobina, a área de caatinga amostrada na pesquisa ficou
localizada na fazenda Exu (69º 11´79´´ S e 87º 50´ 60’’ W). A fazenda se encontra a uma distância
aproximada de 25 km da sede municipal. Neste espaço a vegetação é arbóreo-arbustiva com
palmeiras e presença em quase toda a área de lianas (Arrabidaea sp., Arrabidaea cf celastroides
Bureau & K. Schum. e Arrabidaea parviflora (Mart. ex. DC.) Bureaw & F. Schum). Considerando
informações de uso e ocupação, o proprietário da fazenda, coloca que desde a sua compra (há pelo
menos dez anos) esta vem sendo utilizada para pastejo animal, sobretudo durante a época seca. Não
foi observado durante o levantamento nenhum sinal de fogo na área. O relevo foi classificado como
suave – ondulado com declividade em torno de 3% sem presença de afloramentos rochosos.

Coleta e Análise dos Dados


A amostragem do componente arbustivo-arbóreo foi definida em uma área de 1 ha. Assim,
seguindo o método adotado por MULLER-DOMBOIS & ELLEMBERG (1974) e RODAL et al.
(1992) foram estabelecidas nesta área 100 parcelas contíguas de 10 x 10m. No interior das parcelas,
Fórum Internacional do Meio Ambiente - A conferência da Terra 665

Figura 1. Localização geográfica dos municípios de Jacobina - BA.

Trabalhou-se o levantamento florístico. A escolha deste método se apóia na base teórica


que o define como aquele que permite efetuar comparações relativamente simples e eficientes entre
as áreas (VAN DEN BERG & OLIVEIRA-FILHO, 2000).
O período de amostragem compreendeu três coletas, sendo estas realizadas em novembro
de 2006 e em março e agosto de 2007. O material coletado foi encaminhado ao Herbário Jaime
Coelho de Moraes da Universidade Federal da Paraíba, para secagem em estufa e posterior
herborização. A identificação foi realizada usando bibliografia especializada (BARROSO et al.,
1978; BARROSO et al., 1984; LEWIS, 1987; LORENZI, 1992), ajuda profissional, e análise das
exsicatas depositadas no herbário. O sistema de classificação utilizado foi o de CRONQUIST
(1988).

RESULTADOS E DISCUSSÃO
Na área de caatinga amostrada em Jacobina foram registradas 56 espécies, distribuídas em
24 famílias e 39 gêneros. O hábito predominante foi o arbóreo, com 30 espécies (Tabela 1). Discutindo
Fórum Internacional do Meio Ambiente - A conferência da Terra 666

Tabela 1. Famílias e espécies amostradas na área de caatinga no município de Jacobina – BA.


Família/Espécie Nome Popular Hábito
Anacardiaceae
Schinopsis brasiliensis Engl. Braúna Árvore
Spondias tuberosa Arruda Umbuzeiro Árvore
Arecaceae
Syagrus coronata (Mart.) Becc. Licuri Árvore
Boraginaceae
Varronia nivea (Fresen) Borhidi Arbusto
Burseraceae
Commiphora leptophloeos (Mart.) J.B. Gillett Imburana Árvore
Cactaceae
Cereus jamacaru DC. Mandacaru Árvore
Opuntia palmadora Britton & Rose Palmatória Arbusto
Caesalpiniaceae
Poeppigia procera Presl Árvore
Senna acuruensis (Benth) H.S.Irwin & Barneby Arbusto
Senna rizzinii H.S.Irwin & Barneby Arbusto
Senna splendida (Vogel) H.S.Irwin & Barneby Fedegoso grande Árvore
Capparaceae
Capparis jacobinae Moric. ex Eichler Icó piloso Árvore
Clusiaceae
Vismia micrantha Mart. Ex. A. St. Hil. & Nawdin Arbusto
Combretaceae
Combretum pisoniodes Teub Árvore
Combretum sp. Arbusto
Erytroxylaceae
Erytroxylum lindmanii Plowman Árvore
Euphorbiaceae
Cnidoscullus sp. Árvore
Croton sp. 1 Caçatinga branca Arbusto
Croton sp. 2 Arbusto
Croton sp. 3 Arbusto
Jatropha ribifolia (Pohl) Baill. Arbusto
Jatropha sp. Pinhão Árvore
Manihot brachyandra Pax & K.Hoffm. Árvore
Fabaceae
Dalbergia cearensis Ducke Árvore
Dalbergia cf glaucescens (Mart. Ex Benth.) Benth Árvore
Machaerium cf acutifolium Vogel Barreiro Árvore
Malpighiaceae
Byrsonima cf cydonicefolia A. Juss Arbusto
Byrsonima vacciniifolia A.Juss. Murici Árvore
Byrsonima sp. Arbusto
Heteropteris tricanthera A. Juss Arbusto
Malvaceae
Helicteris mollis K. Schum. Guaxuma Arbusto
Helicteris eichleri K. Schum. Fumo de macaco Arbusto
Helicteris sp. Arbusto
Melochia arenosa Benth Arbusto

continua...
Fórum Internacional do Meio Ambiente - A conferência da Terra 667

Família/Espécie Nome Popular Hábito


Mimosaceae
Acacia glomerosa Benth Espinheiro preto Árvore
Acacia langsdorfii Benth Unha de gato Árvore
Acacia piauhiensis Benth Calumbi branco Arbusto
Acacia riparia Kunth Calumbi Árvore
Albizia inundata (Mart.) Barneby & J.W.Grimes Canafístula Árvore
Chloroleucon sp. Canafístula Arbusto
Piptadenia moliniformis Benth Catanduva Árvore
Piptadenia viridiflora (Kunth.) Benth Jurema branca Árvore
Myrtacea
Campomanesia sp. Árvore
Eugenia sp. Árvore
Pisidium sp. Árvore
Myrtaceae 1 Arbusto
Myrtaceae 2 Arbusto
Nyctaginaceae
Guapira graciliflora (Mart. Ex I. A. Schmidt) Lundel João Mole Árvore
Olacaceae
Ximenia americana L. Limão – bravo Árvore
Polygonaceae
Bredemeyra kunthiana (A.St.-Hil.) Klotzsch ex A.W.Benn. Arbusto
Rhamnaceae
Rhamnidium sp. Árvore
Rubiaceae
Alseis floribunda Schott Árvore
Solanaceae
Capsicum parvifolium Sendt Pimenta-de cutia Arbusto
Solanum sp. Arbusto
Trigonaceae
Trigonia nivea Cambess Arbusto
Verbenaceae
Lantana camara L. Cidreira do mato Arbusto

Questões relacionadas com a riqueza, autores como PEREIRA et al. (2002) e


ALCOFORADO FILHO et al. (2003) colocam que as caatingas dos Agrestes, na borda mais úmida
do semi-árido, podem chegar a ter entre 50 e 60 espécies, em um único local. Nesse sentido,
observa-se que os valores apresentados são semelhantes ao encontrados nesse estudo. Assim, pode-
se verificar o nítido efeito da maior disponibilidade hídrica no aumento da riqueza florística.
Ratificando essas assertivas, ANDRADE-LIMA (1981) coloca que as caatingas situadas em locais
onde as precipitações são mais elevadas apresentam maior número de espécies. No entanto, para
RODAL (1992) o maior ou menor número de espécies nos levantamentos realizados deve ser
resposta a um conjunto de fatores, tais como situação topográfica, classe, profundidade e
permeabilidade do solo e não apenas ao total de chuvas embora esse seja um dos fatores mais
importantes.
As famílias com maior número de espécies no estrato arbustivo-arbóreo foram
Mimosaceae com oito espécies, Euphorbiaceae representada com sete e Myrtacea com cinco
espécies (Figura 2). Diversos autores têm citado Mimosaceae e Euphorbiaceae como famílias de
grande representatividade em vários levantamentos realizados em área de caatinga (ARAÚJO et al.
1995; FERRAZ et al. 1998, RODAL, 1992, GOMES, 1979; FERREIRA & VALE, 1992;
ANDRADE et al., 2005, SANTANA & SOUTO, 2006). Relacionado particularmente à ocorrência
Fórum Internacional do Meio Ambiente - A conferência da Terra 668

de Myrtacea, pode-se observar que particularmente no componente lenhoso da vegetação


caducifólia espinhosa (VCE) a ocorrência dessa família tem sido registrada apenas em áreas mais
úmidas como São José do Belmonte e Caruaru, ambas no estado de Pernambuco (TAVARES et al.,
1969; ALCOFORADO-FILHO et al., 2003) e Barbalha no estado do Ceará (TAVARES et al.,
1974). De modo geral, a presença de algumas famílias pode indicar o estado de conservação da
flora de determinados ambientes, uma vez que não são adaptadas a colonizar ambientes fortemente
antropizados (ANDRADE et al., 2005). A família Burseraceae, por exemplo, é comumente
encontrada em áreas de caatinga mais conservadas, embora na área de Jacobina tenha sido
encontrado apenas um indivíduo dessa família.

Figura 2. Distribuição do número total de espécies amostradas por famílias para a área de caatinga
no município de Jacobina - BA.

A maior parte dos gêneros (30) possui apenas uma espécie, ficando nove gêneros com mais
de uma, ou seja, Acacia com quatro espécies, Senna, Croton, Byrsonima e Helicteris com quatro
espécies cada e ainda Combretum, Jatropha, Dalbergia e Piptadenia com duas cada. Estes dados
apontam para uma tendência na vegetação estudada, a exemplo do que ocorre em outros
levantamento na Caatinga, em apresentar baixa diversidade dentro dos táxons. Especificamente
para a Caatinga, este fato é também destacado nos trabalhos de FERREIRA (1988), RODAL (1992)
e ARAÚJO et al. (1995).

CONCLUSÕES
Considerando o total de espécies registrada nesta pesquisa é observado que o mesmo é
semelhante aos encontrados em áreas mais úmidas do Semi-Árido. Seguindo outros levantamentos
de Caatinga, as famílias Mimosaceae e Euphorbiaceae foram também bem representadas em
número de espécies, o que demonstra a ampla distribuição das mesmas nos vários ecossistemas do
semi-árido. Particularmente Myrtacea, que também se encontra entre as famílias com maior número
de espécie, tem sua ocorrência registrada apenas em áreas mais úmidas. Analisando os gêneros
Fórum Internacional do Meio Ambiente - A conferência da Terra 669

registrados nessa pesquisa verificou-se uma tendência na vegetação estudada, a exemplo do que
ocorre em outros levantamentos na Caatinga, em apresentar baixa diversidade dentro dos táxons.

REFERÊNCIAS BIBLIOGRÁFICAS
AGUIAR, J.; LACHER, T. & SILVA, J. M. C. The Caatinga. In: GIL, P. R. (ed.). Wilderness –
Earth’s Last Wild Places. CEMEX, Cidade do México. 2002. p.174-181
AIOUAD, M. S. Clima da caatinga. In: Simpósio sobre caatinga e sua exploração racional.
Embrapa/ Universidade Estadual de Feira de Santana. Feira de Santana, Bahia, p.37- 48. 1986.
ALCOFORADO FILHO, F.G.; SAMPAIO, E.V.S.B.; RODAL, M.J.N. Florística e fitossociologia
de um remanescente de vegetação caducifólia arbórea em Caruaru, Pernambuco. Acta Botanica
Brasilica v., p. 287-303. 2003.
ANDRADE-LIMA, D. 1981. The caatingas dominium. Revista Brasileira de Botânica 4:149-163.
Árvore, Viçosa, v.26, n.2, p.165-172, 2002.
ANDRADE, L.A.; PEREIRA, I.M.; LEITE, U.T.; BARBOSA, M.R.V. Análise da cobertura de
duas fitofisionomias de caatinga, com diferentes históricos de uso, no município de São João do
Cariri, estado da Paraíba. Cerne, Lavras, v.11, n.3, p.253-262, 2005.
ARAÚJO, E. L.; Sampaio, E. V. S. B. & Rodal, M. J. N. Composição florística e fitossociológica
de três áreas de Caatinga de Pernambuco. Revista Brasileira de Biologia, v. 55, n. 4, p. 595-607.
1995.
BARROSO, G. M., GUIMARÃES, E. F., ICHASO, C. L. F., COSTA, C. G. & PEIXOTO, A. L.
Sistemática de angiospermas do Brasil. Livros Técnicos e Científicos, EDUSP, São Paulo, 1o vol.,
255p. 1978.
BARROSO, G.M.; PEIXOTO, A.L.; COSTA, C.G.; ICHASO, C.L.F.; GUIMARÃES, E.F.
Sistemática de Angiospermas do Brasil. v. 3. Viçosa, Universidade Federal de Viçosa, Imprensa
Universitária. 1984.
CAMARGO, F. A. O.; SANTOS, G. A.; GUERRA, J. G. M. Macromoléculas e substâncias
húmicas. In.: SANTOS, G. A.; CAMARGO, F. A. O. Fundamentos da Matéria Orgânica do Solo -
Ecossistemas Tropicais e Subtropicais. Porto Alegre: Gênesis, 1999. Cap. 2. p. 27-39.
CRONQUIST, A. 1988. The evolution and classification of flowering plants. 2nded. New York.
New York Botanical Garden.
DRUMOND, M.A. et al. Estratégias para o uso sustentável da biodiversidade da caatinga. In:
SEMINÁRIO BIODIVERSIDADE DA CAATINGA, 2000, Petrolina. Anais...Petrolina: Embrapa
Semi-árido, 2000.
EMBRAPA. Sistema Brasileiro de classificação de solos. Rio de Janeiro:EMBRAPA, 1999. 412 p.
EMBRAPA. Levantamento exploratório - reconhecimento de solos da margem direita do Rio São
Francisco - Estado da Bahia. 2v. Recife, 1977/79. (Brasil-SNLCS. Boletim Técnico, 52; Brasil.
SUDENE-DRN. Série Recursos de Solos, 10)
FRANCELINO, M. R.; FERNANDES FILHO, E. I.; RESENDE, M. Elaboração de um sistema de
classificação da capacidade de suporte em ambiente semi-árido. Revista Brasileira de Engenharia
Agrícola e Ambiental. Campina Grande (PB), v. 9, n. 1, p. 83-91, 2005.
FERRAZ, E. M. N.; RODAL, M. J. N.; SAMPAIO, E. V. S. B.; PEREIRA, R. C. A. Composição
florística em trechos de vegetação de caatinga e brejo de altitude na região do Vale do Pajeú,
Pernambuco. Revista Brasileira de Botânica, v. 21, n. 1, p: 7-15. 1998.
FERREIRA, R. L. C. Análise estrutural da vegetação da estação florestal de experimentação de
Açu-RN, como subsídio básico para o manejo florestal. 90f. Dissertação de Mestrado –
Universidade federal de Viçosa, Viçosa. 1988.
GAMARRA-ROJAS, C.F.L., MESQUITA, A.C., MAYO, S., SOTHERS, C., BARBOSA, M.R.V.
& DALCIN, E. 2003. Checklist das plantas do nordeste.
http://www.cnip.org.br/bdpn/bd.php?bd=bdpn_check (acesso em 23/11/2007).
GIULIETTI, A.M., et al. Diagnóstico da vegetação nativa do bioma Caatinga. In: SILVA, J.M.C.;
TABARELLI, M.; FONSECA, M.T.; LINS, L.V. (Orgs.). Biodiversidade da Caatinga: áreas e
ações prioritárias para a conservação. Brasília: Ministério do Meio Ambiente, 2004. p. 48-90.
Fórum Internacional do Meio Ambiente - A conferência da Terra 670

GOMES, M. A. F. Padrões de caatinga nos Cariris Velhos, Paraíba. 1979. Dissertação (Mestrado
em Botânica) - Universidade Federal Rural de Pernambuco, Recife, 1979.
INMET. Instituto Nacional de Meteorologia. www.inmet.gov.br/. 2007;
LEWIS, G.P. Legumes of Bahia. London, Royal Botanic Gardens-Kew. 1987.
LORENZI, H. Árvores Brasileiras. Manual de Identificação e Cultivo de Plantas Arbóreas Nativas
do Brasil. Editora Platarum, Nova Odessa, São Paulo, p. 287. 1992.
MUELLER-DOMBOIS & ELLENBERG, H., Aims and methods of vegetation ecology. New York:
John Willey & Sons, 1974. 525 p.
PEREIRA, I.M.; ANDRADE, L.A.; BARBOSA, M.R.V.; SAMPAIO, E.V.S.B. Composição
florística e análise fitossociológica do componente lenhoso de um remanescente de caatinga no
Agreste Paraíbano. Acta Botanica Brasilica v. 16, n. 3, p. 357-369. 2002.
RODAL, M.J.N.; ANDRADE, K.V.A.A.; SALES, M.F.; GOMES, A.S. Fitossociologia do
componente lenhoso de um refúgio vegetacional no Município de Buíque, Pernambuco. Revista
Brasileira de Biologia, São Carlos, v.58, n.3, p.517-526, 1998.
RODAL, M. J. N. Fitossociologia da vegetação arbustivo-árborea em quatro áreas de caatinga em
Pernambuco. 1992, 198 f. (Tese) Universidade Estadual de Campinas.
RODAL, M. J. N.; SAMPAIO, E. V. S.; FIGUEIREDO, M. A. Manual sobre métodos de estudo
florístico e fitossociológico: ecossistema caatinga. Brasília: Sociedade Botânica do Brasil, 1992. 24
p.
SANTANA, J.A. da S.; SOUTO, J. S. Diversidade e Estrutura Fitossociológica da Caatinga na
Estação Ecológica do Seridó-RN. Revista de Biologia e Ciências da Terra. v. 6, n. 2. 2006.
SEI. SUPERINTENDÊNCIA DE ESTUDOS ECONÔMICOS E SOCIAIS DA BAHIA
Informações Geográficas. Disponível em www.sei.ba.gov.br. Acesso em 15/01/08
TABARELLI, M.; VICENTE, A. Conhecimento sobre plantas lenhosas da Caatinga: lacunas
geográficas e ecológicas. In: SILVA, J.M.C.; TABARELLI, M.; FONSECA, M.T.; LINS, L.V.
(orgs.). Biodiversidade da Caatinga: áreas e ações prioritárias para a conservação. Brasília:
MMA, 2004. p. 101-111.
TAVARES, S.; PAIVA, F. A.F.; TAVARES, E. J. de. S.; LIMA, J. L. S. de. Inventário florestal do
Ceará. III. Estudo preliminar das matas remanescentes do município de Barbalha. SUDENE.
Boletim de Recursos Naturais, Recife. V. 13, n. 2, p. 20-46, 1974.
TAVARES, S.; PAIVA, F. A. V.; TAVARES, E. J. S.; CARVALHO, G. H. & LIMA, J. L. S.
Inventário florestal do Ceará. l. Estudo preliminar das matas remanescentes do município de
Quixadá. Boletim de Recursos Naturais v. 7 n. 1/4, p: 93-111. 1969.
VAN DEN BERG, E.; OLIVEIRA-FILHO, A.T.Composição florística e fitossociológica de uma
floresta estacional semidecidual montana, município de Itutinga-MG. , Revista Brasileira de
Botânica São Paulo,v.23,n.3, p.231-253. 2000.
Fórum Internacional do Meio Ambiente - A conferência da Terra 671

BIODIESEL E PRODUÇÃO DE ALIMENTO NO NORDESTE BRASILEIRO: REFLEXÃO


NECESSÁRIA98

Vania Fonseca
(ITP – vania@infonet.com.br)
Verônica Teixeira Marques
(ITP/CNPq-UFBA/UFS – veronica.marques@hotmail.com)
Lício Valério Lima Vieira
(SEMARH-SE – NPGEO/UFS– liciovalerio@gmail.com)

RESUMO
A região Nordeste, tradicionalmente agrária, a partir de meados do século XX perdeu
importância devido à competição da agricultura das regiões Sul e Sudeste e, posteriormente, do
Centro Oeste. As desigualdades regionais se aprofundaram e a região Nordeste ficou cada vez mais
à margem do desenvolvimento brasileiro e passou a ser considerada um entrave ao desenvolvimento
do país. Muitas foram as ações desenvolvidas para reverter esse quadro, mas o descompasso
permaneceu e até foi acentuado. Agravadas as pressões sociais, com destaque para a zona rural e
para o problema da estrutura fundiária – aspecto básico na questão nordestina – as atenções se
voltaram novamente para a agricultura, especialmente a agricultura irrigada, eleita como a grande
alavanca propulsora do desenvolvimento da região Nordeste. No final da década de setenta foram
implantados numerosos perímetros irrigados em vários estados nordestinos para a produção de
alimentos aproveitando recursos hídricos superficiais e de sub-solo, com parte da produção voltada
para abastecer o mercado mundial com frutas e produtos derivados. Com esse novo direcionamento
do uso das terras, o Nordeste voltou a se destacar na produção do setor primário, especialmente na
área de alimentos, onde se insere a fruticultura para exportação. Mas essa situação está ameaçada
quando é imputada ao Nordeste a responsabilidade pela produção de combustíveis, com aumento da
produção de álcool e instalação de usinas produtoras de biodiesel, o que só pode ser realizado com o
redirecionamento de parte do uso do solo agrícola para o cultivo de espécies não alimentares.
Considerando que a capacidade instalada de geração de energia elétrica está quase toda
comprometida e vem sendo esperado um possível “apagão” dentro de poucos anos, e que a solução
preconizada pelo governo federal é a construção de termoelétricas, a produção de biodiesel passou a
ser prioridade, o que pode ameaçar a produção de alimentos.
Palavras-chave: Biodiesel; Nordeste brasileiro; Produção de alimentos.

ABSTRACT
The North East, traditionally agrarian, from the middle of the last century has lost
importance due to the competition of the agriculture of the South and Southeast region and later, the
Center West. The regional inequalities were deepened and the Northeast area was more and more to
the margin of the Brazilian development and it becomes considered an obstacle to the development
of the country. Many were the actions taken to reverse this framework, but the imbalance remained
and was pronounced. Social pressures became worse, with prominence for the rural area and for the
problem of the land structure - Northeastern basic aspect – and the attention turned again for
agriculture, particularly the irrigated agriculture, elected as the great lever propulsion development
of the Northeast region. At the end of the decade seventy were implanted many irrigated perimeters
in several Northeastern states for the production, taking advantage of superficial and sub-soil water
resources, with part of the production destined to supply the world market with fruits and derived
products. With this new direction in the land use, the Northeast returned the stand out in the
production of the primary sector, especially in the area of food, which fits the horticulture for
export. But that situation is threatened when it is imputed to the Northeast the responsibility for the
production of biofuels, with increase of the production of alcohol and installation of factories

98
Temática discutida pelos autores no FOMERCO-2007
Fórum Internacional do Meio Ambiente - A conferência da Terra 672

producing the biodiesel, what can only be accomplished with the redirection of use in part of the
agricultural soil for the cultivation of no-food species. Considering that the installed capacity of
electric power generation is almost all committed and has been expected a possible black out within
a few years, and that the solution advocated by the federal government is the construction of
thermo-electrical, the biodiesel production started to be priority, what can threaten the production of
foods.
Key-words: Biofuel; Brasilian North East; Foods production.

INTRODUÇÃO
As diferenças de desenvolvimento entre as regiões do Brasil tiveram início, praticamente,
na época do Brasil Colônia. E durante a fase de Brasil Império, já havia a preocupação com as
disparidades regionais, se destacando o Nordeste como região problema, sendo elaborados os
primeiros planejamentos visando o desenvolvimento regional.
Inicialmente a preocupação se voltava para as condições do meio natural, consideradas um
obstáculo ao desenvolvimento econômico e social. Assim, em 1877 foi criada uma Comissão
Imperial com a incumbência de indicar medidas para reduzir os efeitos das secas, que se
constituíam em entrave para o desenvolvimento da região semi-árida brasileira, enfatizando a
necessidade de melhorar os meios de transportes, o armazenamento de água e a instalação de
observatórios meteorológicos.
Posteriormente outras comissões foram criadas, ações foram propostas e executadas. A
história registra, para o Nordeste do Brasil, uma verdadeira constelação de planos, projetos e
programas, com o objetivo declarado de promover o desenvolvimento dessa região deprimida e
promover a sua maior integração econômica com as demais regiões do Brasil. Assim, em 1900 foi
assinado decreto estipulando fundos especiais de socorro para uso em obras públicas; em 1909 foi
criada a Inspetoria de obras Contra as Secas (IOCS), que realizou levantamentos geológicos e
botânicos e outros estudos; em 1919 a IOCS passou a Inspetoria Federal de Obras Contra as Secas;
em 1920 foi criada a Caixa Especial das Obras de Irrigação de Terras Cultiváveis no Nordeste
Brasileiro, com recursos de 2% da receita da União; já em 1934, a Constituição Brasileira destinou
4% da renda tributária nacional para a seca do Nordeste; em 1936 foi demarcado o Polígono das
Secas. (FONSECA, 1988, p.25); em 1952 foi criado o Banco de Desenvolvimento do Nordeste
(BNB), responsável pela criação do Grupo de Trabalho para o Desenvolvimento do Nordeste
(GTDN), que produziu um documento sugerindo a centralização da atuação governamental na
região.
Essa recomendação desembocou na criação do Conselho de Desenvolvimento do Nordeste
(CODENO), embrião da Superintendência do Desenvolvimento do Nordeste (SUDENE), criada em
1959. A criação da SUDENE, foi uma medida utilizada pelo governo federal para evitar a iminente
explosão social no Nordeste e a perda do controle sobre a região, especialmente devido à pressão da
população rural, comandada pelas “ligas camponesas” e pelos emergentes sindicatos rurais, que
reivindicavam alteração da estrutura fundiária. Duas saídas se impunham: fixar o homem no
campo, através de uma reforma agrária, ou incentivar o rápido crescimento industrial nas cidades,
de forma a possibilitar a absorção do contingente de pessoas expulsas do campo. E o governo, não
desejando mexer na estrutura fundiária, aproveitou a recomendação do relatório do GTDN –
industrialização, aumento da produtividade agrícola e diversificação de seus produtos, dando ênfase
à tecnificação e capitalização, sem tocar no problema fundiário - e priorizou a industrialização e a
agricultura modernizada. A estratégia utilizada foi a de formação de pólos industriais e coube à
SUDENE e ao BNB administrar os incentivos fiscais e financeiros para esse fim.
Assim, o pequeno produtor rural não foi beneficiado, o êxodo rural ganhou volume e as
levas de migrantes expulsos do campo foram absorvidas pela crescente atividade industrial das
cidades maiores, em geral capital dos Estados nordestinos, passando de agricultores sem terra e, ou,
sem capital, para proletários explorados na zona urbana.
A SUDENE, que privilegiou o Estado de Pernambuco, começou a perder força e
autonomia com a mudança do regime governamental do país, em 1964, quando os diversos órgãos
Fórum Internacional do Meio Ambiente - A conferência da Terra 673

subordinados à ela passaram a integrar Ministérios setoriais. A partir dessa data, vários planos,
projetos e programas se sucederam, fazendo com que o estilo de política via criação de programas
se assemelhasse muito ao tradicional estilo pré-SUDENE, de criação de órgãos.
A desigualdade entre o Nordeste e as regiões mais desenvolvidas do país continuou a se
constituir em problema grave, pois se acentuaram os desníveis internos e a elevação da renda
regional se deu em grande parte através de maciças ingestões de recursos do governo federal. A
situação foi ainda mais agravada, pois o aumento da renda per capita se deu concomitantemente a
um aumento da concentração da renda (FONSECA, 1988)
O parque industrial instalado no Nordeste, após um período inicial de crescimento, sofreu
uma desaceleração e muitos estabelecimentos foram fechados, pois não conseguiram competir com
a produção industrial do Sudeste nem criar um mercado consumidor regional. E agravaram-se
novamente as pressões sociais, com destaque para a zona rural e para o problema da estrutura
fundiária, aspecto básico na questão nordestina.
As atenções se voltaram novamente para a agricultura, especialmente a agricultura
irrigada, eleita como a grande alavanca propulsora do desenvolvimento da região Nordeste e no
final da década de setenta foram implantados vários perímetros irrigados para a produção de
alimentos, principalmente com a interveniência da Companhia de Desenvolvimento do Vale do São
Francisco (CODEVASF), aproveitando o potencial desse rio. Em outras áreas também foram
aproveitados recursos hídricos superficiais e de sub-solo para a implantação de cultivos irrigados,
merecendo destaque os projetos de irrigação do Rio Grande do Norte que utilizam água extraída do
sub-solo que chega à superfície com altas temperaturas e precisa ser resfriada antes de ser
distribuída pelas plantações.

A UNIÃO DOS RECURSOS NATURAIS SOLO E ÁGUA E A PRODUÇÃO DE ALIMENTOS


NO NORDESTE
O direcionamento das ações governamentais para a união dos recursos naturais de solo e
água foi tão significativo que em meados da década de oitenta, embora por breve período, o Brasil
contou com um Ministério da Irrigação. E muitas foram as idéias que resultaram em estudos
visando a melhor distribuição da água doce pela região Nordeste. E alguns desses estudos se
transformaram em proposta de transposição de águas entre bacias hidrográficas. (FONSECA, 1988;
FONSECA, 1998; FONSECA, 1999)
Mas a idéia de transposição não é recente, pois no século dezenove já havia sido
“...levantada a possibilidade de transposição das águas do São Francisco para abastecimento do
semi-árido cearense, idéia apresentada, em 1877, pelo deputado Tristão de Alencar Araripe, ao
Governo Imperial.” (FONSECA, 1988, p. 384). A transposição que estava sendo proposta
apresentava duas justificativas: produção durante todo o ano, através da irrigação e aumento da
evaporação o que resultaria em possibilidade de chuvas.
O primeiro projeto de transposição, elaborado pelo Departamento Nacional de Obras e
Saneamento (Ministério do Interior), foi substituído por outro, em 1994, e várias foram as
sucessivas versões desse projeto, a cargo de diferentes setores do executivo. A polêmica em torno
da transposição do rio São Francisco está longe de terminar, e a pressão por recursos hídricos vem
promovendo disputas acirradas que, extrapolando o nível dos usuários e de instituições, passaram a
verdadeiro embate político quando assistimos o jogo de forças em torno da transposição do rio São
Francisco. A discussão saiu da esfera técnica e se tornou inteiramente política, onde são negociados
recursos para as obras da transposição sem qualquer discussão sobre a utilização das águas
transpostas e os impactos ambientais que serão gerados.
A região Nordeste do Brasil, além de vasta extensão de solos potencialmente agricultáveis,
dispõe de uma riqueza incomensurável: a energia solar intensa e constante durante todo o ano.
Assim, para a produção vegetal, especialmente de alimentos, o único empecilho é a restrição da
oferta hídrica. Mas, se os recursos hídricos disponíveis forem melhor distribuídos e racionalmente
aproveitados, a região poderá se tornar uma grande produtora de alimentos, não apenas para
Fórum Internacional do Meio Ambiente - A conferência da Terra 674

consumo local e mercado interno mas, sobretudo, para exportação, o que poderá colocar o Brasil em
lugar de destaque no cenário mundial. (SACHS, 1999).
A “vocação” da região vem sendo visada não apenas por empresários brasileiros, mas por
representantes de diversos países, especialmente do continente europeu, que acompanham com
grande interesse o sucesso de cultivos irrigados no vale do rio São Francisco, no vale do Gurguéia,
na região semi-árida do Rio Grande do Norte e outros. São várias as missões estrangeiras que
procuram instituições brasileiras voltadas, sobretudo, para a agricultura nas regiões semi-áridas. E
são várias as empresas agrícolas que estão nas mãos de empresas de capital extra-nacional ou
internacional e têm a sua produção dirigida basicamente para a exportação, especialmente de frutas
(FONSECA, 1999). A exportação de frutas produzidas no Nordeste brasileiro, segundo a SUDENE,
cresceu significativamente a partir da década de oitenta do século passado, o que se deve,
basicamente, aos cultivos irrigados.
Mas esse crescimento econômico vem acompanhado de estagnação – ou mesmo retrocesso
– no desenvolvimento social, evidenciando a inadequação do modelo de desenvolvimento e a falta
de políticas públicas adequadas para a região Nordeste. Alguns setores podem ser alavancados pela
geração de emprego e compete ao governo brasileiro tornar o potencial em realidade. Para o
Nordeste vem sendo apregoado o desenvolvimento rural, que deve se embasar nos preceitos do
ecodesenvolvimento, gerando emprego – inclusive auto-emprego em agronegócio familiar – o que
antes era conhecido como economia camponesa, pois o camponês era plurifuncional construía a
casa, a cerca, consertava o arado, plantava, colhia, negociava, e o ritmo das estações permitia e
exigia diferentes atividades em épocas diferentes.
O desenvolvimento rural deve se dar a partir do melhor aproveitamento dos recursos
naturais renováveis, considerando renovável a manutenção das condições de renovabilidade, onde
se inclui a noção relativa de reaproveitamento. E o aumento da produtividade da biomassa é
fundamental, o que deve ser feito através da tecnologia, especialmente, da biotecnologia, que
deverá servir ao pequeno produtor rural.

BIODIESEL X ALIMENTOS
A produção de alimentos no Nordeste brasileiro, que vem ganhando importância
especialmente devido aos perímetros irrigados – onde se inserem os projetos do tipo colonização e
reforma agrária –, pode sofrer profundas alterações, decorrentes da política que estimula a produção
de biocombustíveis, especialmente do biodiesel. De acordo com o Programa Nacional de Produção
e Uso do Biodiesel.
“A Lei nº 11.097, de 13 de janeiro de 2005, estabelece a obrigatoriedade da adição de um
percentual mínimo de biodiesel ao óleo diesel comercializado ao consumidor, em qualquer parte do
território nacional. Esse percentual obrigatório será de 5% oito anos após a publicação da referida
lei, havendo um percentual obrigatório intermediário de 2% três anos após a publicação da mesma.”
(BRASIL, 2007a).
Assim, já em 2008 o diesel comercializado no Brasil deve conter percentual de biodíesel, o
que siginifica grande volume desse biocombustível face ao volume de diesel consumido anualmente
no país. Para tanto, várias são as ações de estímulo à produção de biodiesel, vinculadas ao Programa
Nacional de Produção e Uso do Biodiesel, do governo federal, inclusive financiamentos.
“...Destinados a todas as fases de produção do biodiesel, entre elas a agrícola, a de
produção de óleo bruto, a de armazenamento, a de logística, a de beneficiamento de sub-produtos e
a de aquisição de máquinas e equipamentos homologados para o uso deste combustível.” (BRASIL,
2007).
Com esse incentivo à produção de biodiesel, deve ser considerado o risco de insegurança
alimentar em virtude da produção de biocombustível, assim como risco ambiental. Assim, algumas
reflexões devem ser feitas, de imediato, embora esses riscos só possam ser avaliados corretamente
quanto for conhecida a realidade da utilização das terras e da situação econômica e financeira dos
agricultores do Brasil.
Fórum Internacional do Meio Ambiente - A conferência da Terra 675

Hoje o biodiesel está sendo produzido basicamente com o excedente de óleo de soja, o que
se mostrou benéfico para os produtores e auxiliou na estabilização dos preços dessa oleaginosa.
Espera-se que dentro de alguns anos o biodiesel seja produzido de oleaginosas que não competem
diretamente com os alimentos, como a mamona, o pinhão manso e algumas palmeiras, cultivos mais
mais adequados para a agricultura familiar (ROCHA e AQUINO, 2007). Mas certamente haverá
impacto no preço de alimentos, pois com a competitividade deverá aumentar, embora seja esperado
equilíbrio futuro.
Alguns especialistas vêm apregoando os benefícios do biodiesel e outros biocombustíveis
na geração de renda para o pequeno produtor rural, especialmente na agricultura familiar e nos
assentamentos da reforma agrária. Mas é ingenuidade imaginar que a produção de biocombustíveis
ficará à cargo dos pequenos produtores desenvolvendo agricultura sustentável. E mais ingenuidade
ainda, considerar que existe um grande estoque de terras agricultáveis não utilizadas no Brasil, pois
se assim fosse não teríamos os constantes e brutais desmatamentos da região amazônica para a
implantação de pastos e para a monocultura de grãos, independente dos interesses e acordos
políticos inerentes à questão.
Dados do Instituto Brasileiro de Geografia e Estatística (IBGE, 2007), evidenciam a
crescente utilização do solo da Amazônia para o cultivo de grãos, em especial da soja, milho e
arroz, e mais recentemente sendo introduzido o algodão, com o uso intensivo de máquinas,
equipamentos e insumos, determinantes dos elevados índices de produtividade aí alcançados. As
análises do IBGE ainda destacam que essa utilização das terras da Amazônia é bastante
significativa, pois os dados informam que “...o município de Sorriso, isoladamente, detém,
atualmente, mais de 10% da produção nacional de soja.”
As áreas que vêm sendo ocupadas são predominantemente de cerrado, de baixa densidade
demográfica, onde a inovação tecnológica se alia à expansão horizontal, o que modifica
radicalmente a dinâmica do ambiente natural da Amazônia.
“Associada ao processo de expansão da fronteira agrícola, a distribuição espacial das áreas
desmatadas, assim como dos focos de calor, reflete, diretamente, o crescimento de atividades
intrinsecamente articuladas a esse processo,..” (IBGE, 2007).
Vários são os alertas sobre o uso da floresta amazônica para a criação de gado e
agricultura, inclusive por fontes do próprio governo federal, que alerta:
De acordo com as projeções para o agronegócio do Ministério da Agricultura, Pecuária e
Abastecimento, divulgadas em fevereiro deste ano, faz-se necessário agir com prudência quanto ao
uso da floresta tropical para fins econômicos imediatos. (BRASIL-MME, 2007)
Na Oficina Regional para América Latina y el Caribe, da Organização das Nações Unidas
para a Agricultura e a Alimentação (FAO), foi informado pelo representante do Brasil e
coordenador geral do programa de biodiesel, Arnoldo Campos, que para acrescentar 2% de
biodiesel no diesel comercializado no país, seriam necessários 1,5 milhões de hectares de terras
agricultáveis, o que equivale a cerca de 1% dos 150 milhões de hectares plantados e disponíveis
para a agricultura no Brasil (FAO, 2007).
Essa necessidade de grande volume de terras para a produção de biodiesel é analisada pela
Comisión Económica Para América Latina y el Caribe (CEPAL), que considera haver grande
estoque de terras potencialmente agricultáveis no Brasil, que estão disponíveis para a produção de
produtos, visando a fabricação de biodiesel. Mas no cálculo da disponibilidade de terras aráveis,
foram incluídas as pastagens e as terras não utilizadas, o que modifica o indicador de potencial
agricultável, pois coloca como disponíveis áreas produtivas utilizada para a criação de animais e
áreas de florestas que são protegidas por lei e já bastante ameaçadas.
Também estudos da FAO apontam a expansão da fronteira agrícola para a pecuária e a
agricultura como uma das causas da redução das florestas em todo o mundo, com destaque para o
Brasil:
Um estudo divulgado nesta semana pela FAO mostra que os países que mais desmataram
no mundo entre 2000 e 2005 são Indonésia, México, Papua-Nova Guiné e Brasil. Esses países
Fórum Internacional do Meio Ambiente - A conferência da Terra 676

concentram 80% das florestas do planeta. O Brasil, segundo o relatório, é responsável por 74% do
desmatamento sul-americano. (BRASIL, 2007b)
Outros estudiosos também alertam que a expansão da fronteira agrícola vem ocupando
áreas florestais, resultando em elevadas taxas de desmatamento e queimada, contribuindo tanto para
o agravamento do efeito estufa, quanto para a degradação da qualidade do solo. Manifestando a sua
preocupação, Daniela Bacchi Bartholomeu, do Centro de Estudos Avançados em Economia
Aplicada (CEPEA) do Departamento de Economia, Administração e Sociologia (DEAS) da
Esalq/USP coloca:
Deve-se atentar até para o papel dos combustíveis limpos, tais como o álcool e a
agroenergia em geral, na expansão da fronteira agrícola. Se por um lado são importantes fontes de
energia limpa, auxiliando na redução do uso de combustíveis fósseis e, portanto, nas emissões de
gases de efeito estufa, por outro, o Plano Nacional de Agroenergia (lançado em 2005) aponta para
uma área de expansão necessária de aproximadamente 200 milhões de ha/ano para a produção da
chamada “agricultura energética”, considerando projeção até 2030. Este programa objetiva elaborar
diretrizes e desenvolver tecnologias para a produção sustentável da “energia da agricultura”, que
contempla, além do biodiesel, o etanol, a madeira, o biogás e o aproveitamento de resíduos e
dejetos. Deve-se atentar para políticas que visem à redução desta taxa de desmatamento e da
velocidade do avanço da fronteira agrícola. Aumentos de produtividade, através de pesquisas
científicas e tecnológicas e otimização da utilização do solo, podem diminuir a necessidade de
fertilizantes ou da água para irrigação devem ser prioridades. (BARTHOLOMEU, 2007)
A potencialidade de aumentos de produtividade e otimização do uso do solo agricultável
são também apregoados por Maria José Silva e Luz, da Empresa Brasileira de Desenvolvimento
Agropecuário, que considera viável a ocupação de terras com o uso da irrigação, com a vantagem
de se constituir em
...Alternativa para diminuir a pressão pela ocupação e uso agrícola das terras brasileiras,
via aumento de renda econômica, produção e produtividade agrícola. (LUZ, 2007)
No estudo da CEPAL, “Oportunidades y riesgos del uso de la bioenergía para la seguridad
alimentaria en América Latina y el Caribe”, elaborado em parceria com a Oficina Regional de la
FAO para América Latina y Caribe (CEPAL-FAO, 2007), são discutidos alguns aspectos
importantes do debate sobre o tema, que tiveram por objetivo preparar um conjunto de
recomendações para discussão do Comitê de Segurança Alimentar da FAO em sua reunião
realizada em Roma, entre 07 e 10 de maio de 2007.
Nesse documento da CEPAL e FAO é analisado o potencial de impactos entre a produção
de alimentos e produção de bioenergia, sendo considerada necessária a realização de investigações
mais detalhadas sobre a temática, de forma a minimizar os riscos de impactos negativos sobre a
segurança alimentar. Sobre estes últimos impactos, os mesmos são abordados a partir de quatro
dimensões: disponibilidade, acesso, estabilidade e utilização.
A partir dessas especificidades, considera-se que são negativos os impactos decorrentes da
introdução ou intensificação de cultivos para produção de bioenergia, mesmo quando o país tenha
condições de produção que não exijam a sobre exploração de seus recursos naturais. Segundo esse
documento, estudos recentes mostram que o aumento na demanda por biocombustíveis pode
resultar em aumento do preço tanto dos cultivos energéticos quanto dos tradicionais, embora
acompanhados por redução do preço dos subprodutos da fabricação de biocombustíveis: torta de
soja e grãos destilados.
Outro ponto levantado pelo documento da CEPAL e FAO que merece destaque, é que a
produção de bioenergia, devido ao enorme consumo de água para o cultivo da matéria prima e pelo
processo de produção, poderá afetar a dimensão da segurança alimentar, embora de forma indireta,
devido à diminuição da disponibilidade hídrica para usos doméstico, ameaçando a saúde pública e,
como conseqüência, a segurança alimentar das pessoas afetadas. Assim, recomendam que não seja
permitido que os sistemas de produção de bioenergia intensivos na utilização de recursos naturais –
principalmente água – causem impactos em zonas onde tradicionalmente são produzidos alimentos.
Fórum Internacional do Meio Ambiente - A conferência da Terra 677

CONCLUSÕES
O biocombustível, como fonte alternativa de energia, com menor exploração da natureza,
menor poder de poluição, e característica de renovabilidade, é viável no Brasil, especialmente na
Região Nordeste, face às suas condições peculiares de abundância de terras, constância de sol e
disponibilidade hídrica impar. Além disso, a sua produção poderá se constituir em alternativa de
renda para os pequenos produtores rurais, muitos deles vivendo abaixo da linha da pobreza. Mas
para isso é necessário um planejamento integrado, intersetorial, que tenha como direção norteadora
a geração de biocombustíveis sem o comprometimento da segurança alimentar, tanto humana
quanto animal, sem a degradação do meio natural e com a melhoria do meio social. Deve-se,
sobretudo, refletir sobre como será empregada essa energia e quem será beneficiado.
Assim, a produção de biocombustíveis deve ter suas vantagens bastante superiores a
potenciais desvantagens, representadas pelos impactos negativos da sua produção, onde se destaca
inicialmente o aumento do preço dos alimentos. E devem ser consideradas as especificidades
regionais e respeitadas as sociedades e culturas de cada lugar, impedindo que esse modelo ameace
os territórios de comunidades camponesas, ribeirinhas, indígenas, quilombolas e tantas outras.
Os principais pontos que devem ser observados no planejamento integrado para a produção
de biocombustível, especialmente biodíesel, de forma a não ameaçar a segurança alimentar e o meio
ambiente, são:
- A garantia de sustentabilidade da segurança alimentar para consumo interno e exportação;
- A priorização da produção sustentável, dando oportunidade, principalmente, aos pequenos
produtores rurais, onde se incluem os projetos de assentamento de agricultores sem terra;
- As monoculturas, que degradam o ambiente e marginalizam os pequenos produtores, além de
comprometerem a produção de alimentos para consumo no Brasil e no exterior, devem ser
energicamente evitadas;
- As áreas desmatadas, quando protegidas por lei devido ao equilíbrio frágil e as condições especiais
de biodiversidade e proteção de nascentes e margens de rios, só devem ser destinadas à
produção de insumos da fabricação de biocombustíveis através de modelos recuperadores, como
os sistemas agroflorestais;
- Devem ser incentivados estudos que visem o aumento da produtividade com menor exploração do
solo, menor demanda de recursos hídricos e menor vulnerabilidade perante variações climáticas;
- Parte da produção de biocombustíveis, especialmente biodiesel, deve ser fruto do
reaproveitamento de matéria prima descartada por outros processos produtivos;
- O aproveitamento/comercialização dos sub-produtos da fabricação de biocombustíveis deve ser
alvo de programa integrado à produção de biocombustíveis.
Neste sentido, por todo conhecimento histórico e científico relativo à produção agrícola no
Nordeste já acumulado, toda a legislação já em vigor atrelada à incentivos para produção do
biodisel, torna-se imprescindível que essas observações sejam ponto de partida para a continuidade
das discussões, sem que se tornem problemas a serem solucionados por novos projetos de salvação
da região.

REFERÊNCIAS BIBLIOGRÁFICAS
BARTHOLOMEU, Daniela Bacchi. 2007. Questões ambientais. Especial Agro Cepea. Centro de
Estudos Avançados em Economia Aplicada (CEPEA) do Departamento de Economia,
Administração e Sociologia (DEAS) da Esalq/USP.
http://www.cepea.esalq.usp.br/especialagro/EspecialAgroCepea_6.doc – acesso em 19/jun/2007
BRASIL. CEI. 2007a. Programa Nacional de Produção e Uso do Biodiesel. Governo Federal.
Comissão Executiva Interministerial. http://www.biodiesel.gov.br/ - acesso em 22/07/2007
BRASIL. MME. 2006. Amazônia é a nova fronteira agrícola do país. Expansão da soja gera
denúncias de impactos sócioambientais. Compet. 21/07/2006. Ministério de Minas e Energia.
http://www.conpet.gov.br/noticias/noticia.php?segmento=&id_noticia=868 – acesso em
11/junho/2007.
Fórum Internacional do Meio Ambiente - A conferência da Terra 678

BRASIL-RADIOBRAS. 2007b. Representante da FAO diz que expansão da fronteira


agrícola é uma das causas do desmatamento. Radiobras Agência Brasil. 16/mar/2007.
http://www.agenciabrasil.gov.br/noticias/2007/03/16/materia.2007-03-16.3706952469/view. acesso
em 19/jul/2007
CEPAL-FAO. 2007. Oportunidades y riesgos del uso de la bioenergía para la seguridad
alimentaria en América Latina y el Caribe. Comisión Económica Para América Latina y el Caribe/
Oficina Regional de la FAO para América Latina y Caribe.
http://www.fao.org/Regional/LAmerica/prior/segalim/pdf/bioenergia.pdf - acesso em 13/08/07
CODEVASF. 1996. Projeto Semi-Árido: proposta de desenvolvimento sustentável da bacia do rio
São Francisco e do semi-árido nordestino. Brasília: CODEVASF.
FAO. 2007. El Programa de Biodiesel del Brasil. Oficina Regional Para América Latina y el
Caribe. http://www.fao.org/regional/lamerica/prensa/coms/2007/06.swf - acesso em 19/jul/2007
FONSECA, Vania. 1988. A intervenção do Estado no Baixo São Francisco Sergipano. Rio Claro:
UNESP (tese de doutorado).
FONSECA, Vania. 1998. Transposição de bacias e desenvolvimento no Nordeste brasileiro. In
DINIZ, José Alexandre Felizola e FRANÇA, Vera Lúcia Alves (organizadores). Capítulos de
geografia nordestina. Aracaju: NPGEO-UFS, p. 383-405.
FONSECA, Vania. 1999. Desenvolvimento e a questão regional no Brasil: alternativas para o
nordeste. Seminário Integrador do PRODEMA. Ilhéus, Universidade Estadual de Santa Cruz (mesa
redonda).
IBGE. 2007. Mapa da Amazônia Legal – Fronteira agrícola. Ministério do Planejamento,
Orçamento e Gestão/IBGE. http://www.ibge.gov.br/home/geociencias/geografia/mapas_doc3.shtm
- acesso em 14/jul/2007
ROCHA, Vicente; AQUINO, José Soares de. 2007. Artigos. Agrosoft Brasil -
http://www.agrosoft.org.br/index.php?q=node/24638 - acesso em 12/junho/2007
SACHS, Ignacy. 1999. Agenda 21. Biodiversidade, biomassa e biotecnologia. Seminário Integrador
do PRODEMA. Maceió: Universidade Federal de Alagoas (mesa redonda).
Fórum Internacional do Meio Ambiente - A conferência da Terra 679

FAVORABILIDADE E POTENCIALIDADE BIOCLIMÁTICA DO AEDES AEGYPTI:


UMA ABORDAGEM COM VISTAS À SUSTENTABILIDADE DA RELAÇÃO
AMBIENTE-SAÚDE NO ESTADO DO RIO GRANDE DO NORTE/BRASIL

Bruno Claytton Oliveira da SILVA


PRODEMA/UFRN. brunoclaytton@yahoo.com.br
Fernando Moreira da SILVA
PRODEMA/UFRN. fmoreyra@ufrnet.br

RESUMO
A partir da observância dos efeitos e da abrangência de uma das doenças emergências mais
relevantes na atualidade – o dengue – o trabalho objetivou ampliar os conhecimentos a despeito dos
fatores naturais, sobretudo, os bioclimáticos, inerentes ao desenvolvimento do principal vetor
urbano da doença, o Aedes aegypti; contribuindo, assim, para a sustentabilidade das relações
ambiente-saúde no estado do Rio Grande do Norte (RN). Na pesquisa, procurou-se estimar
mensalmente a probabilidade e, conseqüente, potencialidade do estado do RN, em promover
condições de (não)favorabilidade ao desenvolvimento do Aedes aegypti. Para tanto, foram
consideradas cinco condições biofísicas na avaliação, sendo elas: diapausa, dificuldade de
desenvolvimento, desenvolvimento favorável, potencial máximo ao desenvolvimento e declínio do
potencial máximo de desenvolvimento. Tais condições foram delimitadas a partir dos trabalhos
desenvolvidos por: Augusto et al. (2005), Bejerán et al. (2003), Confaloniere (2003), Consoli e
Oliveira (1999), Donalísio e Glasser (2002), Ferreira (2003), Fernandes et al. (2006), Gillett (1974),
Gomes et al. (2006), Schweigmann et al. (2004). Ao final da investigação, pôde-se observar que o
RN, durante todo o ano, possui de regular a boa, condição de desenvolvimento favorável ao vetor,
ampliando-se, substancialmente, no período de março a maio (76,4%, 81,08%, 76,5%). Em se
tratando das outras quatro condições biofísicas, não foram constatados resultados com a mesma
significação, estando estas na faixa de probabilidade compreendida de baixa (condições de
dificuldade de desenvolvimento, potencial máximo de desenvolvimento e declínio do potencial
máximo de desenvolvimento) a muito baixo (condição biofísica de diapausa). Ainda, realizou-se
uma análise comparativo/correlativa entre o número de casos notificados do dengue no RN, no
período de 2000-2005, e os resultados obtidos da condição biofísica favorável ao desenvolvimento
do Aedes aegypti. Os resultados desta análise indicaram excelente correlação positiva, em média
95,1%, demonstrando grande significação das análises propostas e realizadas.
Palavras-Chave: Aedes aegypti, Condições Biofísicas, Potencialidade, Variáveis Bioclimáticas,
Dengue.

ABSTRACT
From the observance of the purposes and scope of one of the diseases most relevant
emergencies nowadays - the dengue - the work aimed to enlarge the knowledge despite the natural
factors, especially the bioclimatic, inherent in the development of major urban vector of the disease,
Aedes aegypti, thus contributing to the sustainability of health-environment relationships in the state
of Rio Grande do Norte (RN). In search, is monthly estimate the probability and, consequently, the
potential of the state RN, in promoting conditions of (not) favorable development of Aedes aegypti.
Thus, biophysical five conditions were considered in the assessment, and so: diapause, difficulty in
developing, developing favorably, maximum potential development and decline of the maximum
potential of development. Such conditions were bounded from the work done by: Augusto et al.
(2005), Bejerán et al. (2003), Confaloniere (2003), Consoli and Oliveira (1999), and Donalísio
Glasser (2002), Ferreira (2003), Fernandes et al. (2006), Gillett (1974), Gomes et al. (2006),
Schweigmann et al. (2004). At the end of the investigation, could be observed that the RN,
throughout the year, has to regulate the good, a condition conducive to the development of vector,
extending up significantly in the period from March to May (74.0%, 81.1% and 77.8%). When it
comes biophysical conditions of the other four were not observed results with the same meaning,
Fórum Internacional do Meio Ambiente - A conferência da Terra 680

these are in the range of low probability understood (conditions of difficulty of development,
potential for development and decline of the maximum potential of development) to very low (
biophysical condition of diapause). Still, an analysis was carried out comparative / correlative
between the number of reported cases of dengue in the RN, in the period 2000-2005, and the results
of the biophysical conditions conducive to the development of Aedes aegypti. The results of this
analysis indicated excellent positive correlation, on average 95.1%, showing great significance of
the analyses and proposals made.
Key words: Aedes aegypti, Conditions Biophysics, Capability, Variable Bioclimatics, Dengue.

INTRODUÇÃO
No presente momento, percebe-se a (re)emergência crescente de acentuado número de
enfermidades de impacto direto à saúde humana. Entre elas destacam-se o dengue, doença
considerada infecciosa febril aguda que provoca dores musculares e nas articulações e, em alguns
casos, febres hemorrágicas – responsáveis por maior número de mortes – que se manifestam por
diversificadas porções do corpo humano. A manifestação do dengue dar-se-á através de quatro
sorotipos distintos: DEN-1 (infecção inaparente), DEN-2 (dengue clássico), DEN-3 (dengue
hemorrágica) ou DEN-4 (síndrome do choque) (PNCD, 2002).
Dados obtidos e divulgados pelo Programa Nacional de Controle do Dengue (PNCD,
2002), apud Organização Mundial de Saúde (OMS, 2002), revelam que, anualmente 80 milhões de
pessoas são infectadas pelo vetor do dengue. Desse total, 550 mil necessitam de cuidados médico-
hospitalares e pelo menos 20 mil chegam a óbito. Não se diferenciando desta realidade, o Rio
Grande do Norte tem apresentado elevados índices da doença; a exemplo, no período de 2000 a
2005, segundo a Secretária Estadual de Saúde do RN (SESAP-RN, 2006), foram totalizados
114.719 casos notificados da doença.
Em se tratando do vetor do dengue, Aedes aegypti, a literatura afirma que seu principal
habitat é o meio urbano. Sabendo que o lócus da população mundial atualmente é a cidade – mais
da metade da população mundial vive nas cidades – e por conseqüência o urbano; ainda, sabendo
que o principal alimento do mosquito Aedes aegypti é o sangue, preferencialmente o humano,
fecha-se assim o circuito completo para favorabilidade do vetor, ou dos casos de dengue nessas
áreas.
O Aedes aegypti espalhou-se por uma área onde vivem cerca de 3,5 bilhões de pessoas em
todo o mundo. Nas Américas, está presente desde os Estados Unidos até o Uruguai, com exceção
apenas do Canadá e do Chile, por razões climáticas e de altitude (PNCD, 2002).
Na atualidade, vêem crescendo significativamente os estudos que têm se desenvolvido
preocupados em observar, analisar, diagnosticar, prognosticar e, principalmente, investigar, no
tempo e no espaço, áreas potenciais tanto ao Aedes aegypti quanto aos casos do dengue. Entre estes
se destacam:
Augusto et al. (2005). A obra trás uma série de trabalhos que, em suma, discorrem a
despeito do papel da análise ecossistêmica/integrada na saúde, no que tange a problemática do
dengue. Os autores criticam o modelo clássico de controle vetorial do dengue, principalmente, pela
ausência de atitudes precausionária frente o uso de inseticidas químicos. Ainda, afirmam que uma
nova concepção deve ir além dos limites tradicionais, com base, entre outros, nos processos
ecológicos, climáticos e epidemiológicos; com construção de indicadores de risco e vulnerabilidade
para a predição de eventos epidêmicos, orientando, assim, os programas de controle das condições
que estão presentes na dinâmica ecológica do Aedes aegypti.
Bejerán et al. (2003). O trabalho aborda as condições da atmosfera limitantes para a
sobrevivência do mosquito Aedes aegypti adulto na cidade de Buenos Aires, na Argentina,
pontuando-as nas seguintes faixas: temperatura máxima diária maior ou igual a 40ºC; temperatura
mínima diária menor ou igual a 0ºC; persistência durante 10 dias de um déficit de vapor de água
médio maior a 15 mb; persistência durante 5 dias de um déficit de vapor de água médio maior a 20
mb; persistência durante 3 dias de um déficit de vapor de água médio maior a 25 mb; persistência
Fórum Internacional do Meio Ambiente - A conferência da Terra 681

durante 2 dias de um déficit de vapor de água médio maior a 30 mb; temperatura máxima diária
menor a 15º C durante mais de 5 dias.
Confaloniere (2003). O trabalho objetivou observar os efeitos das flutuações ou variações
climáticas na abundância e disseminação de vetores patógenos transmissores de diversas doenças
impactastes á saúde humana. O autor concluiu que fatores tais como temperatura, umidade relativa
e precipitação pluviométrica afetam na capacidade de reprodução e sobrevivência de agentes
patogênicos no meio ambiente.
Consoli e Oliveira (1998). Na obra os autores destacaram, entre outros pontos, a relevância
da influência das variáveis bioclimáticas no ciclo biológico de mosquitos. Os autores afirmam que o
desenvolvimento embrionário, processado logo após a oviposição, é influenciado principalmente
pela temperatura e umidade. Ainda, enfatizam que entre os fatores ambientais, que interferem no
desenvolvimento larvário, a temperatura ótima encontrando-se entre 24ºC e 28ºC, para a maioria
dos mosquitos tropicais. Além disso, observaram que a longevidade dos adultos depende de fatores
intrínsecos e extrínsecos... Entre os fatores extrínsecos estão à temperatura e a umidade.
Donalísio e Glasser (2002). Na pesquisa, os autores destacam a relevância da temperatura,
(isotermas de 10ºC em latitudes norte e sul) que impõe limites à distribuição de dengue no mundo.
Os mesmos asseguram que a influência da temperatura interfere nas atividades de repasto sanguíneo
das fêmeas dos mosquitos, em sua longevidade e no período de incubação extrínseco do vírus.
Citam, o estudo epidemiológico realizado no México, por Koopman e colaboradores (1991), que
verificou que a temperatura média durante a estação chuvosa correspondeu ao mais forte preditor de
infecção por dengue naquele país. O modelo matemático proposto no estudo estimou o período de
incubação extrínseco do vírus a 22ºC (16,67 dias) e a 32ºC (8,33 dias).
Ferreira (2003). A autora realizou um trabalho dissertando sobre algumas doenças
tropicais, entre elas o dengue. A mesma afirma que, estudando-se a ecologia de vetores das doenças
ditas tropicais, percebe-se que, as altas temperaturas, a umidade relativa do ar, o tempo de duração
da estação de verão ou das condições de calor e umidade, favorecem a proliferação de mosquitos.
Ainda, indica que os insetos vetores da malária e da dengue beneficiam-se com a elevação das
temperaturas, cujo optimum situa-se entre 25ºC e 27ºC; outros fatores favoráveis à proliferação são
às precipitações, responsáveis pela criação e manutenção das coleções hídricas utilizadas como
criadouros, e a permanência de altos índices de umidade relativa do ar, superior a 70%.
Fernandes et al. (2006). A pesquisa objetivou determinar as exigências térmicas para o
desenvolvimento e estimar o número de gerações anuais do Aedes aegypti. Entre seus resultados, os
autores destacam que a temperatura favorável de desenvolvimento do vetor está entre 21ºC e 29ºC.
Para que o vetor mantenha boa longevidade, a temperatura deve encontra-se na faixa de 22ºC a
30ºC. Além disso, ressaltam que não ocorreu eclosão dos ovos a temperatura a baixo de 18ºC; que a
faixa térmica de 29ºC a 32ºC apresenta-se como potencialmente máxima ao desenvolvimento; e que
extremos de 18ºC e 34ºC implicam em efeitos negativos ao desenvolvimento.
Gillett (1974). O autor discorrer a respeito dos efeitos diretos e indiretos da temperatura
sobre parasitas. O mesmo assinala, em relação à taxa de maturação de ovos do Aedes aegypti, que
sua evolução varia diretamente com a temperatura. Sendo que a 23º C os ovos levam três dias para
amadurecer; em altas temperaturas, eles se desenvolvem num tempo menor que três dias; e que a
temperaturas inferiores à citada, os ovos levam bem mais tempo para completar seu
desenvolvimento. Ao final do trabalho, o autor conclui que qualquer modelo epidemiológico que
não leva em consideração tais questões, não pode oferecer um panorama completo da doença.
Gomes et al. (2006). O objetivo deste trabalho foi determinar a periodicidade de
oviposição para fêmeas de Aedes aegypti em condições de laboratório e campo. Os autores
ressaltaram a relevância de estudos relacionados ao padrão de oviposição de fêmeas do vetor na
compreensão de aspectos biológicos e ecológicos desse vetor, pois proporcionam dados que podem
subsidiar os métodos atuais de monitoramento e controle da espécie. Os resultados apontaram que a
oviposição observada por fêmeas de Aedes aegypti evidencia, na fotofase, o período da tarde como
sendo o de maior oviposição (13:15h às 17:15h); enquanto na escotofase, a maior atividade de
oviposição foi observada no período crepuscular do entardecer (17:15h às 19:15h).
Fórum Internacional do Meio Ambiente - A conferência da Terra 682

Schweigmann et al. (2004). O trabalho estudou o padrão de abundância do Aedes aegypti,


em Buenos Aires/Argentina. Os autores destacam que, em termos gerais, as maiores elevações de
proliferação de mosquitos ocorreram durante meses com as maiores temperaturas e precipitações
registradas – temperaturas médias acima de 20ºC e precipitações acumuladas acima de 150 mm.
Ainda, a diminuição acentuada da atividade de oviposição foi observada quando a temperatura
média mensal diminuiu para 16,5ºC. Além disso, ovos não foram encontrados a temperaturas
médias mensais abaixo de 14,5º C.
A partir da observação dos estudos até então desenvolvidos, a pesquisa objetiva observar,
analisar e diagnosticar a influência e potencialidade das variáveis bioclimáticas temperatura média
do ar e umidade relativa em relação às condições biofísicas do Aedes aegypti no estado do Rio
Grande do Norte, possibilitando, assim, ampliar o campo de conhecimento da dinâmica vetorial do
dengue, com vistas à na melhoria da qualidade de vida e a sustentabilidade das relações ambiente-
saúde da população local.

MATERIAL E MÉTODOS
Área de estudo
O estado do Rio Grande do Norte possui grande diversidade de elementos bióticos e
abióticos, proporcionada pelas diferenciações físico-naturais presentes em seu território. Contudo,
dar-se-á ênfase ao comportamento das variáveis climáticas.
Segundo o Instituto de Desenvolvimento Econômico e Meio Ambiente (IDEMA, 2000), o
território do Rio Grande do Norte localiza-se no Hemisfério Sul Ocidental, e seus pontos extremos
são 4° 49'53”S - 6° 58'57”S e 34° 58'03”W - 38° 36'12”W. Tal localização, entre outros fatores,
será decisiva em sua configuração climática. Assim, o estado apresentará os seguintes tipos de
climas: úmido – porção sul do litoral oriental, com índices de pluviosidade média acima de 1.200
mm anuais; sub-úmido – litoral oriental, áreas serranas do interior e porção oeste, com pluviosidade
média de 800 a 1.200 mm anuais; semi-árido – toda a porção central e parte do litoral norte com
pluviosidade média de 400 a 600 mm anuais.

Metodologia
As ferramentas empregadas no desenvolver da pesquisa, até sua finalização, constituíram-
se:
Coleta de Dados
A coleta de gabinete foi realizada no período de fevereiro a outubro de 2006 junto às
instituições que coletam e quantificam dados relacionados às variáveis climáticas em estudo
(temperatura média do ar e umidade relativa do ar): Nacional de Meteorologia (INMET), Instituto
Nacional de Pesquisas Espaciais (INPE) e Empresa de Pesquisa Agropecuária do Rio Grande do
Norte (EMPARN). Em se tratando dos dados de saúde, estes foram obtidos a partir da Fundação
Nacional de Saúde (FUNASA) e da Secretária Estadual de Saúde do Rio Grande do Norte (SESAP-
RN), além de Secretárias Municipais de Saúde.

Normal Climatológica
As Normais Climatológicas são dados relativos às médias de variáveis climáticas diversas
observadas no período de 1961 a 1990, conforme normas estabelecidas pela Organização
Meteorológica Mundial (OMM). As Normais foram editadas, no Brasil, em 1992 pelo Instituto
Nacional de Meteorologia (INMET). Entretanto, no estado do Rio Grande do Norte, há apenas seis
Estações Climatológicas Convencionais de Superfície que coletam dados estandardizados pela
OMM. São elas: Apodi, Ceará-Mirim, Cruzeta, Florânea, Macau, Mossoró. A partir desta realidade,
configurou-se como necessário a estimativa de temperaturas mínimas, médias e máximas, para o
restante dos municípios que integram o território Norte-Rio-Grandense.
Fórum Internacional do Meio Ambiente - A conferência da Terra 683

Software Estima T
O software Estima T é um modelo de regressão múltipla aplicado à estimação da
temperatura do ar para a região Nordeste do Brasil, tendo sido proposto pelo Departamento de
Ciências Atmosféricas da Universidade Federal de Campina Grande (DCA/CCET/UFCG) no ano
de 1994. Segundo Cavalcanti (2005), no modelo:
“Foram utilizadas as séries temporais das médias mensais de temperatura do ar (média
diária, mínima e máxima) de 69 estações meteorológicas do Nordeste do Brasil (NEB) e
ATSM do oceano Atlântico Tropical”.

O modelo empírico de estimativa da temperatura do ar é uma superfície quadrática dada


por:
Tij = a0 + a1λ + a2φ + a3h + a4λ2 + a5φ2 + a6h2 + a7λφ + a8λh + a9φh + ATSMij
Onde:
λ é longitude, φ é a latitude, em graus; h é a elevação de cada estação meteorológica
analisada, em metros; e a0, a1... a9 são os coeficientes de regressão. Os índices i e j indicam,
respectivamente, são o mês e o ano para o qual se está calculando a temperatura do ar (Tij).

Correlação Linear de Pearson


A correlação Linear de Pearson pode ser compreendida, segundo Andriotti (2003),
como uma associação numérica entre duas variáveis, não implicando necessariamente uma relação
de causa e efeito ou mesmo a existência de uma estrutura com interesses práticos. A mesma foi
utilizada: na escolha das variáveis com comportamentos atinentes a distribuição sazonal dos casos
de dengue no RN; Na comparação entre a probabilidade da condição biofísica favorável ao
desenvolvimento e o número de casos notificados de dengue no período de 2000 a 2005 no estado.
A equação para o coeficiente de correlação é:
r=
∑ (x − x )(y − y )
∑ (x − x ) ∑ (y − y )
2 2

Onde:
r = Um índice situado entre -1 e 1;
x e y = valores respectivos as variáveis em estudo.

Regressão
As equações, segundo Andriotti (2003), são úteis para predizer o valor de uma variável,
dado um certo valor de outra variáveis. Estas foram empregadas quando da necessidade de estimar a
umidade relativa do ar para os municípios onde inexistem dados relativos à normal climatológica.
Em tal processo, gerou as equações de regressão polinomial de grau dois e três, dadas por:
^
Y = aX + bX 2+ cX 3+ d

Onde:
Ỷ é o valor estimado da umidade relativa do ar;
X é o valor da temperatura do ar;
a, b e c são os coeficientes angulares;
d o coeficiente linear.

Lógica Nebulosa
A lógica nebulosa, também conhecida como lógica fuzzy, foi desenvolvida por Lofti A.
Zadeh em 1965. A teoria é aplicada a conceitos de natureza imprecisa, fugindo de uma descrição
matemática usual (SILVA, 1995). Os conjuntos nebulosos foram criados a partir da certeza de que
os métodos tradicionais de análise e sistemas não serviam para lidar com sistemas em que relações
entre variáveis não prestavam para representação em termos de diferenciação ou equações
diferenciais (CAMARGOS, 2002). Na presente pesquisa tal conhecimento foi utilizado na seleção,
Fórum Internacional do Meio Ambiente - A conferência da Terra 684

interpretação, elaboração e aplicação das diferentes condições biofísicas do Aedes aegypti, citadas
por vários autores durante a revisão literária.

Distribuição Normal Reduzida ou Gaussiana


“Denomina-se a distribuição normal ou Gaussiana, uma função que apresenta média zero e
variância 1” (VIEIRA, 1980). A equação foi utilizada nos cálculos mensais de probabilidade para
cada condição biofísica do Aedes aegypti no estado do Rio Grande do Norte. A distribuição é
expressa pela seguinte equação:
⎡ 1 ⎤ −
( z ²)
F (z) = ∫ ⎢ ( 2 π ) 0 ,5 ⎥ε
⎣ ⎦
2

x−x
Onde : Z =
σ
x = variável aleatória (temperatura ou umidade relativa)
z = variável aleatória normalizada (temperatura ou umidade relativa)
σ = desvio padrão da amostra.

Estatística Descritiva
Por fim, fez-se necessário a utilização da estatística descritiva, representada por medidas de
tendência central (média e mediana), bem como medidas de dispersão (desvio padrão, coeficiente
de variação e amplitude).

RESULTADOS E DISCUSSÕES
Em se tratando da observação das implicações das variáveis bioclimáticas (temperatura
média do ar e umidade relativa do ar) sob o desenvolvimento do Aedes aegypti constatou-se que
temperaturas médias: abaixo de 0ºC e acima de 40°C são letais ao mosquito; entre 0ºC a 18ºC,
implicam na suspensão de suas atividades, entrando o vetor no estágio de diapausa; entre 18ºC a
21ºC e entre 34ºC a 40ºC, o Aedes aegypti encontra dificuldades de desenvolvimento; a faixa de
21ºC a 29ºC apresenta-se como favorável ao seu desenvolvimento; entre 29ºC a 32ºC oferece-lhe
potencialidade máxima ao desenvolvimento; e na faixa de 32ºC a 34ºC haverá um declínio no
potencial máximo de desenvolvimento. No que tange a umidade relativa do ar, o mosquito encontra
grande favorabilidade quando a mesma apresenta-se com índices entre 70% e 100%.
Diante de tais resultados pôde-se criar cinco condições biofísicas para o Aedes aegypti no
estado, estando estas correlatas com as variáveis bioclimáticas em estudo e o comportamento
biológico do vetor do dengue. Assim, as condições biofísicas compreendem: diapausa, dificuldade
de desenvolvimento, desenvolvimento favorável, potencial máximo ao desenvolvimento e declínio
do potencial máximo de desenvolvimento. A partir daí, foi desenvolvido um trabalho bioestatístico
de estimação da probabilidade mensal para cada condição biofísica do Aedes aegypti no RN. Os
resultados desta análise são apresentados na figura 1.
Fórum Internacional do Meio Ambiente - A conferência da Terra 685

POTENCIALIDADE DAS CONDIÇÕES BIOFÍSICAS DO Aedes aegypti NO


ESTADO RIO GRANDE DO NORTE A PARTIR DA INFLUÊNCIA DE
VARIÁVEIS BIOCLIMÁTICAS
100,0
90,0
80,9
PROBABILIDADE (% 80,0 76,4 76,5

70,0
60,0
60,0 57,2
54,8
50,0
50,0 46,4
40,0
33,5
29,5
30,0 26,9 DIAPAUSA
23,8
20,0 DIF.DESENVOL.
10,0
FAVORÁVEL
0,0
POT EN.MÁXIMO
JAN FEV MAR ABR MAI JUN JUL AGO S ET OUT NOV DEZ
MES ES DECLÍNIO DO
POT EN. MÁX

Figura 1: Potencialidade e condições biofísicas do Aedes aegypti para o estado do Rio Grande

Os resultados apontaram como: muita baixa, a probabilidade do vetor encontrar-se em


diapausa, variando entre 0,0% e 0,9%; baixa, a probabilidade da existência de dificuldades de
desenvolvimento, sendo maio o mês que apresentou uma maior probabilidade, 9,27%; de regular a
boa, a probabilidade da condição favorável ao desenvolvimento, aumentando significativamente no
período de março a maio, 76,4% e 76,5%, respectivamente. Essa condição de desenvolvimento
apresentou-se como a mais expressiva, com favorabilidade de ocorrência máxima no mês de abril
(81,08%). Sua curva de favorabilidade segue a climatologia da precipitação, acompanhando a
atuação dos sistemas sinóticos mais expressivos e influentes no estado do Rio grande do Norte,
Zona de Convergência Intertropical e Ondas de Leste; baixa, a probabilidade de ocorrência de ter-se
um potencial máximo de desenvolvimento, com amplitude nos meses de julho e março, 2,9% a
11,3% respectivamente; e muito baixa, a probabilidade de ocorrência da condição de declínio do
potencial máximo de desenvolvimento, que se apresentou, durante todo o ano, abaixo de 4,00%.
Um outro aspecto de análise no trabalho foi à comparação/correlação da condição de
favorável desenvolvimento (ou seja, entre 21ºC e 29ºC e acima de 70%, concomitantemente) do
Aedes aegypti com o número de casos notificados de dengue no período de 2000-2005. Para tanto,
buscou-se, inicialmente, levantar e apresentar os dados relativos ao número de casos notificados do
dengue no estado no período de 2000-2005 que, em todos os anos analisados, apresentou uma maior
contabilização entre os meses de março e maio, inclusive. Este resultado é apresentado na figura 2.
CASOS NOTIFICADOS DO DENGUE NO RIO GRANDE DO NORTE
(2000-2005)

8.000

7.000
Nº DE CASOS NOTIFICADOS

6.000

5.000

4.000

3.000

2.000

1.000

0 2000 2001
JAN FEV MAR ABR MAI JUN JUL AGO SET OUT NOV DEZ
2002 2003
MESES
2004 2005

Figura 2: Casos notificados do dengue no estado do Rio Grande do Norte (2000-2005).


Fórum Internacional do Meio Ambiente - A conferência da Terra 686

A posteriori, realizou-se a comparação/correlação da condição de favorável


desenvolvimento com o número de casos notificados de dengue no período de 2000-2005. Como
mostra a figura 3, no estado do Rio Grande do Norte, os dados analisados apresentaram alta
correlação positiva, variando de 74,0% (2002) a 93,7% (2005). Além disso, em escala temporal
(jan./dez.), os dados médios relativos à probabilidade da condição de favorável desenvolvimento,
quando analisados em relação aos dados médios do número de casos do dengue no RN,
descreveram-se de igual modo, com comportamentos temporais semelhantes, o que contribuiu para
com uma forte correlação positiva (95,3%).
ANÁLISE CORRELATIVA ENTRE A CONDIÇÃO DE FAVORÁVEL
DESENVOLVIMENTO DO Aedes aegypti E O NÚMERO MÉDIO DE CASOS
NOTIFICADOS DE DENGUE NO RN (2000-2005)

100,0 3.500
90,0
3.000
PROBABILIDADE(%)

80,0

MÉDIA DOS CASOS


70,0 2.500

NOTIFICADOS
60,0 2.000
50,0
40,0 1.500

30,0 1.000
20,0
500
10,0
Prob (%) da
0,0 0 condição favorável
JAN FEV MAR ABR MAI JUN JUL AGO SET OUT NOV DEZ
M édia dos casos
MES ES notificados

Figura 3: Análise correlativa entre a condição biofísica de favorável desenvolvimento ao Aedes


aegypti e o número médio de casos notificados de dengue no RN (2000-2005).

CONCLUSÕES
Com base nos resultados, pôde-se concluir que as variáveis bioclimáticas temperatura
média e umidade relativa do ar exercem papel relevante no acondicionamento do habitat do Aedes
aegypti no estado do Rio Grande do Norte; figurando como determinantes no desenvolvimento do
principal mosquito vetor do dengue no meio urbano. Ainda, embasado nos dados obtidos, observou-
se que o vetor tem suas condições de desenvolvimento facilitadas, ou favoráveis, no período de
março a junho, o que coincidiu, como demonstrou o trabalho correlativo realizado, com os picos
epidêmicos do dengue notificados no estado. Finalmente, acredita-se que estes resultados,
associados aos modelos de previsão climática e trabalhos que levem em conta os condicionantes
físico-ambientais do Aedes aegypti, podem ser de grande relevância no momento do incremento de
políticas voltadas à saúde pública e a melhoria da qualidade de vida da população Norte-Rio-
Grandense.

REFERÊNCIAS
AUGUSTO, L. G. da S; CARNEIRO, R. M; MARTINS, P. H. Abordagem ecossistêmica em saúde:
ensaios para o controle de dengue. Recife-PE: Editora Universitária da UFPE, 382 p. 2005.
BEJERÁN, R; GARÍN, A. de; SCHWEIGMANN, N. Aplicación de la predicción meteorológica
para el pronóstico de la abundancia potencial del Aedes aegypti en Buenos Aires. Terra Livre, v. 1,
n. 20, 2003.
BESERRA, E. B; CASTRO Jr., F. P. de; SANTOS, J. W; SANTOS, T. da S; FERNANDES, C.
R.M. Biologia e Exigências Térmicas de Aedes aegypti (L.) (Diptera: Culicidae) Provenientes de
Quatro Regiões Bioclimáticas da Paraíba. Neotropical Entomology 35(6): 853-860, 2006.
BRASIL. Ministério da Agricultura e Reforma Agrária. Normais Climatológicas. Brasília:
Departamento Nacional de Meteorologia, 1992.
Fórum Internacional do Meio Ambiente - A conferência da Terra 687

CAMARGOS, F. L. Lógica Nebulosa: uma abordagem filosófica e aplicada. Santa Catarina:


INE/UFSC, 2002.
CAVALCANTI, E. N; SILVA, V. de P. R; SOUSA, F. de A. D. de. Programa computacional para
estimação da temperatura do ar para a região Nordeste do Brasil. Revista Brasileira de Engenharia
Agrícola e Ambiental, v.10, n.1, p.140–147, 2006.
CONFALONIERI, Ulisses E. C. Variabilidade climática, vulnerabilidade social e saúde no Brasil.
São Paulo: Fiocruz, 2005.
CONSOLI, R. A .G. B; OLIVEIRA, R. L. de. Principais mosquitos de importância sanitária no
Brasil. 2. ed. Rio de Janeiro: Fiocruz, 1998. Capítulo 2. 225 p. p. 39-56.
DONALÍSIO, M. R; ocorrência GLASSER, C. M. Vigilância Entomológica e Controle de Vetores
do Dengue. Rev. Brasileira de Epidemiologia, vol. 5, n. 3, 2002.
FERREIRA, Maria Eugênia M. Costa. Doenças tropicais: o clima e a saúde coletiva. Alterações
climáticas e malária na área de influência do reservatório de Itaipu-PR. Terra Livre,v.1, n.20. 2003.
GILLETT, J. D. Direct and indirect influences of temperature oon the transmission of parasites
from insects to man. Symposia of th British Society for Parasitology, vol. 12. 1974.
GOMES, A. dos S; SCIAVICO, C. J. de S; EIRAS, Á. E. Periodicidade de oviposição de fêmeas de
Aedes aegypti (Linnaeus, 1762) (Diptera: Culicidae) em laboratório e campo. Revista da Sociedade
Brasileira de Medicina Tropical, vol. 39 (4): 327-332, jul./ago. 2006.
INSTITUTO DE DESENVOLVIMENTO ECONÔMICO E MEIO AMBIENTE (IDEMA-RN).
Perfil do estado do Rio Grande do Norte. Natal: IDEMA, 2002.
MENDONÇA, Francisco. Aspectos da interação clima-ambiente-saúde humana: da relação
sociedade-natureza à (in)sustentabilidade ambiental. RA’EGA, UFPR, n. 4, p. 85-99. 2000.
MINISTÉRIO DA SAÚDE. Fundação Nacional de Saúde. Programa nacional de controle do
dengue. Brasília: FUNASA, jun. 2002. 34 p.
SCHWEIGMANN, N; VEZZANI, D; VELÁZQUEZ, S. M. Seasonal Pattern of Abundance of
Aedes aegypti (Diptera: Culicidae) in Buenos Aires City, Argentina. Instituto Oswaldo Cruz, Rio de
Janeiro, vol. 99(4), jun. 2004.
SILVA, B. C. O. da; SILVA, F. M. da. Condições bioclimáticas de proliferação do Aedes aegypti
em Natal/RN. I SIMPÓSIO INTERNACIONAL DE CLIMATOLOGIA. 2005, Fortaleza-Brasil.
Anais. Sociedade Brasileira de Meteorologia (SBMET).
SILVA, F. M. da. Modelo inferencial com previsão de tempo com lógica nebulosa. 1995, 172 p.
Tese (em Engenharia Elétrica) – Departamento de Engenharia Elétrica, UFPB.
Fórum Internacional do Meio Ambiente - A conferência da Terra 688

ALTERAÇÃO NA PAISAGEM VEGETAL EM DIFERENTES COMPARTIMENÇÕES


GEOMORFOLÓGICAS

José Falcão Sobrinho


Universidade Estadual Vale do Acaraú/UVA. falcao@sobral.org
Jurandyr Luciano Sanches Ross
Universidade de São Paulo/USP. juraross@usp.br

RESUMO
O presente ensaio enfatiza as características das paisagens relacionadas à vegetação em três
compartimentações geomorfológicas do Vale do Acaraú, priorizando uma área de maciço residual
úmido (Monsenhor Tabosa); uma área na superfície sertaneja (Varjota) e, por fim, uma área nos
tabuleiros litorâneos (Morrinhos).
Palavras-chave: Relevo, Vegetação, Vale do Acaraú.

ABSTRACT
This paper emphasizes the features of the landscape related to vegetation in three
compartimentações geomorphologic Valley of Acaraú, prioritizing an area of massive residual wet
(Tabosa Bishop), an area on the surface sertaneja (Varjota) and, finally, a coastal area in trays
(Morrinhos).
Words keys: Relief, Vegetation, Valley of Acaraú

INTRODUÇÃO
Conjugar o estudo do relevo e da vegetação propicia o entendimento da paisagem em seus
aspectos naturais e as modificadas pela ação antrópica. O referido entendimento é perceptível
quando avaliamos as divergentes paisagens das montanhas, das planícies e das zonas litorâneas.
Este fato é bem observado e narrado por René Dubos, em sua obra Namorando a Terra, 1981,
referindo-se aos ambientes selvagens.
Relatos de Hack e Goodlett (1960) comprovaram a distribuição da vegetação em vertentes
de ambientes diferentes, através de decorrentes processos, relacionando-as a um sistema aberto em
contínuo ajustamento.
Nesta perspectiva, o presente artigo enfatiza o Vale do Acaraú, no estado do Ceará,
tratando de três áreas decorrentes de suas compartimentações geomorfológicas e, associando-as a
vegetação. Optou para fins de análise, uma área de maciço residual (Serra das Matas), na
localidade de Monsenhor Tabosa; a segunda área de superfície sertaneja, em Varjota e, por fim, a
área de tabuleiros litorâneos, em Morrinhos.
O enfoque consiste no entendimento da paisagem atual analisada através do aspecto do
mais visível, no caso a vegetação, e, na medida dos registros documentais e da memória da
comunidade local, resgatando a vegetação antecedente.

GEOMORFOLOGIA DO VALE DO ACARAÚ


A área de estudo, situa-se no estado do Ceará, entre as coordenadas geográficas: Latitude
sul de 02º47´a 04º58´ e Longitude oeste de 39º40' a 40º51'. No cenário de sua compartimentação
geomorfológica, dispõem de paisagens com relevos elevados, superiores a 1000 m de altitude, os
chamados maciços residuais úmidos e, relevos rebaixados, com altitudes de até 400 m, ocupando
cerca de 90% do Vale, designado de superfície sertaneja, além da zona litorânea, na qual se inserem
os tabuleiros (ver figura 1).
Fórum Internacional do Meio Ambiente - A conferência da Terra 689

Figura 1: Perfil longitudional do Vale do Acaraú

Os maciços residuais úmidos são tidos como uma área que foi resistente aos processos
erosivos no decorrer de eventos climáticos. São áreas que quebram a monotonia no cenário da
paisagem da superfície sertaneja, em formas de maciços cristalinos. Possuem extensão variada e
altitudes que, em geral, situam-se acima dos 800. Na Serra das Matas as cotas que ultrapassam
1.000m são raras.
Ressalta-se que estas formas dos relevos constituídos pelos maciços residuais úmidos do
estado do Ceará obedecem a uma estrutura, a qual corresponde a intrusões graníticas e rochas
metamórficas, de acordo com Souza (1988).
A Serra das Matas é composta por elevações que chegam a 1.000m de altitude, intercaladas
com patamares que oscilam entre 500 a 700m, amparados por migmatitos, conforme mapa
geológico do estado do Ceará, elaborado pelo CRPM (2003) e, que segundo RADAMBRASIL
(1981) apresenta efeitos do tectonismo plástico e ruptural.
Observam-se, neste ambiente, uma forma de relevo menos acidentado na porção central,
com topos convexos e formas tabulares. É comum a presença de solos Argissolos, com espessuras
que chegam a mais de 1 metro. A vegetação, nessa área, corresponde a um porte elevado, arbóreo,
ainda que resquício e pontual. Existem algumas variações de espécies. São as áreas ocupadas
primariamente por florestas e que justificariam a toponímia do compartimento em questão.
A superfície sertaneja é uma área deprimida localizada entre os ambientes elevados. Sua
extensão no estado do Ceará corresponde, a um total de 92% da área total do estado. No Vale do
Acaraú, sua dimensão ocupada aproximadamente o mesmo percentual.
Com altitude inferior a 400m, a superfície sertaneja é área de aplainamento resultante do
trabalho erosivo em que, indistintamente, diferentes litologias, põem em destaque as rochas mais
resistentes, caso de Varjota. Expõe, entre suas formas, formações residuais, constituídos por
pequenos maciços secos, que, de forma isolada compõe o cenário da paisagem do Vale do Acaraú.
No aspecto geral, a morfologia das superfícies sertanejas caracteriza-se pela presença de
amplas rampas de pedimento que se inclinam da base dos relevos residuais em extensão ao litoral.
Com isso, a altitude vai gradativamente diminuindo (figura 1).
Fórum Internacional do Meio Ambiente - A conferência da Terra 690

Tendo evoluído sob condições climáticas semi-áridas, a superfície sertaneja apresenta


como revestimento generalizado a caatinga, com capacidade mínima de deter ou atenuar a ação
erosiva.
Uma longa extensão de área é recoberta por solos da classe dos Luvissolos Crômicos,
Neossolos Litólicos e Gleissolos Melânicos, de acordo com a SEPLAN (1994).
Os tabuleiros sub-litorâneos são constituídos por sedimentos plio-pleitocênicos do Grupo
Barreiras, representam o mais típico glacis de deposição do território cearense. Inclinando-se
suavemente do interior para o litoral, a superfície dos tabuleiros situa-se, quase sempre, abaixo dos
100m de altitude. Fracamente pela drenagem, os tabuleiros sublitorâneos são constituídos por
amplos retalhos de superfícies horizontais, separados por vertentes pouco pronunciadas, donde o
caráter inoperante dos interflúvios.
Segundo Souza (1988), as áreas de tabuleiros, de forma generalizada, representam um
típico glacis de deposição, que, sulcado pela drenagem que demanda o litoral, isola interflúvios de
feições tabuliformes. Daí o termo popular – “tabuleiros” – consagrado pela literatura geográfica
brasileira.
Nos tabuleiros pré-Litorâneos, as classes de solos que mais se destacam são os Argissolos,
Neossolos Aluviais, Nessolos Regolitico e os Neossolos Quartzarênicos. No contexto geral, a
vegetação da caatinga se faz presente neste ambiente, intercalando a vegetação das carnaúbas.
Características estas pertinentes em Morrinhos.

RESGATANDO A VEGETAÇÃO – DO PASSADO AO PRESENTE


Iniciamos a pesquisa com a reconstituição da vegetação nativa, com entrevista a 100
moradores mais antigos para fins de registros referentes à vegetação, que, outrora, pudesse figurar o
local. Na oportunidade, realizaram-se coletas botânicas de espécies lenhosas nas três áreas e em
pontos diversos, sempre dimensionando uma extensão de 100 x 100m. As espécies foram
identificadas através de literatura especializada, por comparação com o material da EAC/UFC. As
exsicatas foram incorporadas ao acervo do Herbário da Universidade Estadual Vale do
Acaraú/UVA. “Prof. Francisco José de Abreu Matos”. Logo depois, foram estabelecidas as relações
entre os fatores geocológicos atuantes nas áreas de estudo, correlacionado-as às espécies
identificadas.
A seguir, descreveremos as mudanças visíveis no Vale do Acaraú, decorrente da
substituição da vegetação primária por uma secundária. É através da cobertura vegetal que os
agricultores exercem a primeira fase de alteração no cenário da paisagem. Começamos com esta
asserção:
No ambiente de maciço residual úmido, em Monsenhor Tabosa, tem-se nos setores mais
elevados, resquícios de uma Floresta Subperenifólia Tropical Plúvio-Nebular (Matas Úmidas
Serranas), que, segundo os moradores, já foi intensa em dimensão territorial. Mesmo nas partes
mais baixas da serra encontrava-se uma vegetação fechada, de alto porte e de aspecto visual verde.
As chuvas orográficas são os condicionantes principais da ocorrência das florestas serranas
aliadas à outra forma de precipitação, como o orvalho determinado pelo nevoeiro sobre os níveis
mais elevados. Por essa razão, o limite das matas serranas com outro tipo de vegetação.
A fisionomia da vegetação que ainda reside compões de árvores que chegam atingir até 30
metros. Na lembrança dos agricultores, as árvores grandes possuíam caules retilíneos, eram cobertas
por uma camada de massa branca (presença de liquens) e ainda, tinham as samambaias enfeitando a
vegetação. Hoje, o cenário da paisagem é contrastante com o imaginário do agricultor, já que a
presença da caatinga, de porte baixo e galhos retorcidos, figura no cenário da paisagem do ambiente
alto, denominado de “Serra das Matas”.
A marcha dos agricultores adentrou contra as matas deixando atrás de si terrenos
descobertos e exauridos. Comumente essas terras não receberam um outro tipo de vegetação por
parte do agricultor, se não o algodão, o café, a mamona, o milho e o feijão, além da palma (ver
figura 2) que se figura, em grande dimensão no cenário da paisagem local.
Fórum Internacional do Meio Ambiente - A conferência da Terra 691

Figura 2: Plantio de palma. (out/2005).

Mesmo em troca de suas colheitas, o agricultor não investe em suas roças, já que a mesma
não recebe nem um tipo de substância para recompor o que lhe foi tirado através da colheita.
A adubagem natural se torna de difícil acesso. O pequeno agricultor não possui gado, e a
criação de galinha não é o suficiente para coletar adubo. A adubagem química torna-se impossível,
uma vez que o preço é incompatível com o suporte financeiro dos agricultores.
Com isso a palma forrageira resistente às condições adversas que outras culturas
necessitam. Tem o seu espaço reservado no quintal do pequeno agricultor, e vai servir de ração para
o gado que circunda no ambiente da serra. E, em uma relação dialética, a produção do adubo natural
que o gado oferece, vai ser trocado por produtos hortaliças e frutíferos em outras áreas úmidas,
produtos estes, em épocas passadas já cultivados neste ambiente e perfaziam o cenário da paisagem.
Nesta sucessiva substituição da vegetação, seja para fins comerciais ou apenas para
subsistências, a espécie nativa, segundo os agricultores, era composta por Balsamo (Myroxylon
peruiferum L), Ingá (Ingá bahiensis Benth), Jatobá (Hymenaea martiana Hayne), Cedro (Cedreia
odorata Linn.), Paraíba (Simarouba versicolor St. Hill.) e Freijó (C. trichotoma (Stend) Vell.), deu
lugar as timbaúba (Enterolobium contortisiliquun (Vell.) Morong.), jurema (M. tenuiflora (Willd.)
Poir), mulungu (Erythrina velutina Jacq.) e, em áreas mais degradadas, tem-se o sabiá (Mimosa
caesalpinifolia Benth.), o angico (Anadenanthera macrocarpa (Benth.) Brenan), a jurema (M.
tenuiflora (Willd.) Poir) e marmeleiro (Cronton sonderianus).
No ambiente da superfície sertaneja, em Varjota, figura no cenário da paisagem a
vegetação da caatinga (popularmente, mato branco), da comunidade xerófila resiste às intensas
irradiações que permeia na superfície sertaneja. A expressão Caatinga é uma das ricas
denominações deixada pelo povo indígena, vem do tupi-guarani usado na literatura e no meio
popular para designar um tipo de vegetação que compõe o cenário da paisagem do semi-árido
nordestino.
Em um passado distante, a referida vegetação tinha um porte elevado, era compacta,
impenetrável pela densidade e pelos espinhos, ocupava áreas extensas em Varjota.
Embora haja dificuldades de se encontrar restos de vegetação nativa no estágio de
“clímax”, nos dias atuais, conforme relato dos agricultores, é possível pensar em uma vegetação
nativa, constituída por uma mata seca de alto porte, dominada por Braúnas (Schinopsis glabra
(Engl.) F. Barkey & T. Meyr.), Aroeiras (Myracrodruon urundeuva Fr. All.), Pereiros
(Aspedosperma pirifolium Mart.), Sabiá (Mimosa caesalpinifolia Benth.), Catingueiras verdadeiras
e Cumaru (Amburana cearensis (Fr. All.) A. C. Smith).
O clímax do xerofilismo foi alterado pela necessidade de subsistência dos José, dos Joões,
dos Antônios e das Marias, O fogo, o machado e a enxada, alteraram o clímax do xerofilismo. Eles
deixaram como flora sucessora uma outra caatinga mais baixa, mais aberta, mais seca, em luta para
recuperar a posição de equilíbrio da antiga comunidade vegetativa. Associação Pau branco
(Auxemma oncocalyx Taub.), da Jurema , do Angico (Parapiptadenia zenhtnen (Harms.) M. P. Lms
e Lima), da Aroeira (Myracrodruon urundeuva Fr. All.), do Xique-xique e do Mandacaru (ver foto
3), que passaram a ganhar espaços no cenário da paisagem. Em áreas mais ocupadas o mofumdo
Fórum Internacional do Meio Ambiente - A conferência da Terra 692

(Combretum ieprosum Mart.) e o marmeleiro (Cronton sonderianus), o Moleque duro, a Quebra


faca entre outros ganharam espaço.

Figura 3: Mandacuru sobre rocha. (Nov/05).

De modo geral, as caatingas possuem um forte poder de se adaptar as condições que o


ambiente oferece. Contudo o seu poder de readaptação oferece situações, no mínimo, admiráveis
em relação a sua condição de sobrevivência (ver figura 4). Onde há o verde de sua folhagem nos
meses de janeiro a junho, torna-se o cinza do sertão nos meses de julho a dezembro, expressão
maior no imaginário popular de muitos brasileiros. O juazeiro (Ziziphus joazeiro Mart.) é outra
espécie sertaneja de grande importância e particularmente singular. Ele contraste com o cinza da
vegetação no período de estiagem, já que ele não perde a folhagem verde e brilhante nas mais
prolongadas secas.

Figura 4: A resistência da Jurema preta no período seco. (out/2005).


No ambiente da zona litorânea, precisamente nos tabuleiros litorâneos, em Morrinhos, a
vegetação já sofreu uma série de alterações em decorrência do avanço do plantio do cajueiro e da
carnaúba nos ambiente de planície fluvial mais extensa.
Um fator agravante que contribui para a disseminarão da vegetação primária, dá-se pela
própria estrutura da terra, pois tendo o pequeno agricultor uma extensão reduzida, o mesmo
menciona que se vê obrigado a não preservar área de vegetação nativa.
Com isso, algumas espécies, que perfaziam o cenário da paisagem da zona litorânea estão
apenas na memória dos agricultores. Dentre elas, cita-se: Jangada (Cordia tetranda Aubi); Café-
bravo (Bocoa molis (Benth.) Cowan); Amargoso (Vatairea macrocarpa (Benth) Ducke); Murici de
tabuleiro (Byrsonima verbascifolia Rich); Jucá (Caesalpina férrea Mart.); Imbaúba (Cecropia sp.);
Timbaúba (Enterolobium contotosiliguium (Vell.) Morong) e o Pau-sangue (Pterocarpus violaceus
Vog).e o Pau-d’arco-roxo (Tabebuia impetiginosa (Mart. Ex DC) Standi.).
Nas planícies aluviais, assim constituídas, aliadas as altas temperaturas encontra-se o
habitat da preferência da carnaúba (Copernicia prunifera (Milll.) H.E.Moore), dominante entre as
demais espécies arbóreas. Esta palmeira endêmica do Nordeste do Brasil ocorre no Ceará,
geralmente, em associação com o mulungu (Erythrina velutina Jacq.), juazeiro (Zizyphus joazeiro
Fórum Internacional do Meio Ambiente - A conferência da Terra 693

Mart.) oiticica (Licania rígida Benth.) e ingá-brava (Lonchocarpus sericeus (Poir.) DC.), além de
outras espécies arbustivas trepadeiras.
E nas áreas intensamente ocupadas pelos agricultores registram-se espécies como a
Jurema, marmeleiro e o mofumbo (Combretum leprosum Mart.).
Para alguns agricultores a relação com a vegetação está atrelada à moradia. O carnaubal,
por exemplo, oferece desde a madeira até a palha, para servir como telhado para as casas feitas com
paredes de argila, as chamadas casas de barro.
Entretanto, o que se tem em comum nos ambiente maciço residual (Monsenhor Tabosa),
superfície sertaneja (Varjota) e zona litorânea (Morrinhos) é a depredação da vegetação, através da
queimada, em que se consta o emprego de 100% dos agricultores, situação esta que às vezes foge ao
controle e devasta a vegetação das áreas vizinhas. A figura (5) abaixo evidência uma área de
carnaúba sendo atingida pelo fogo, quando a madeira estava sendo retirada da área próxima.

Figura 5: Carnaubal atingido pelo fogo (nov/2005).

Nos emaranhados de galhos retorcidos que cobrem as áreas de cultivo do milho e do feijão,
já foram cobertas por plantas de porte elevado, estas que foram objetos de mercadorias ao serem
cortadas e vendidas para a produção do carvão. Este fato é tido com bons olhos pelos agricultores,
pois havia há possibilidade de uma renda mais. Hoje, para muitos, isso não é possível, já que sua
propriedade não oferece mais este tipo de produto que foi sucumbido ao longo da necessidade do
agricultor. Como opção, sua mão de obra é servida periodicamente em outras propriedades onde
esta pratica ainda é difundida.
No Vale do Acaraú esta pratica é mais difundida da superfície sertaneja, conforme mostra
os quadros (1, 2, e 3).
Quadro 1: Produção de carvão vegetal (municípios inseridos em maciço residual úmido no Vale do
Acaraú)
Municípios 1995 1996 1997 1998 1999 2000 2001 2002 2003
Meruoca - 1 1 1 1 1 - - -
Mons. Tabosa 1 1 1 1 1 1 2 2 1
Total 1 2 2 2 2 2 2 2 1
Média 1 1 1 1 1 1 2 2 1

Quadro 2: Produção de carvão vegetal (municípios da superfície sertaneja inseridos no Vale do


Acaraú)
Municípios 1995 1996 1997 1998 1999 2000 2001 2002 2003
Catunda 9SS) 3 2 7 6 6 6 7 7 8
Cariré 50 10 10 10 10 10 21 23 24
Forquilha 33 33 32 28 25 26 26 28 28
Graça 7 32 33 33 33 32 32 32 33
Groaíras 9 - - - - - - - -
Hidrolândia 168 34 52 60 25 26 28 30 32
Fórum Internacional do Meio Ambiente - A conferência da Terra 694

Municípios 1995 1996 1997 1998 1999 2000 2001 2002 2003
Ipú 2 154 140 170 166 150 70 74 50
Ipueiras 2 34 35 38 37 40 30 38 30
Massapê 65 145 149 157 136 123 125 126 126
Mucambo 9 6 6 12 11 12 12 12 12
Nova Russas 1 4 5 5 5 4 5 5 6
Pacujá 7 24 25 23 22 21 22 23 23
Pires Ferreira - 3 5 25 26 25 15 16 15
Reriutaba - - 4 3 4 10 8 10 9
Santana 47 143 147 140 126 122 132 140 145
Acaraú
Sobral 69 157 148 160 161 161 159 161 161
Santa Quitéria 6 185 190 124 115 118 126 129 145
Tamboril 3 3 3 3 3 3 4 4 4
Varjota - - 1 3 4 4 4 4 4
Total 481 969 992 1000 435 893 826 862 855
Média (t) 30 60 55 55 24 49 45 47 47

Quadro 3: Produção de carvão vegetal (municípios inseridos na zona litorânea no Vale do Acaraú
Municípios 1995 1996 1997 1998 1999 2000 2001 2002 2003
Acaraú 17 - 18 19 20 21 21 23 24
Bela Cruz 11 2 3 3 3 3 3 3 4
Cruz 5 - 5 5 5 5 5 6 6
Marco 8 1 1 1 1 1 1 1 1
Morrinhos 6 2 3 3 3 3 3 3 4
Total 47 5 30 31 32 33 33 36 38
Média 9 1 6 6 6 6 6 7 7

Fica o agricultor com sua reserva madereira para o consumo interno, posto que o principal
combustível de seu forno é a lenha.
A vegetação que se expressa através do milho e do feijão como principal fonte de
subsistência, não incidi de forma decisiva no fator econômico do agricultor, já que sua terra não
apresenta uma diversidade de uso. Apenas em Monsenhor Tabosa a palma é encontrada incide em
50% das residências, porém com pouca extensão de plantio, em função da pequena quantidade de
terras. E o caju, na zona litorânea, oferece uma alternativa de renda no período da extração da
castanha (ver quadro 4)

Quadro 4: Alternativas de uso da terra em ambientes diferentes do vale do Acaraú


Uso da terra
Município Mamona Palma Cajú Plantas frutíferas diversas
Monsenhor Tabosa 5 45 12 15
Varjota 2 0 0 2
Morrinhos 0 0 65 61

Abaixo segue uma representação esquemática da evolução da vegetação nos ambientes:


maciços residuais úmidos, superfície sertaneja e zona litorânea, evidenciado a fala dos agricultores.
Fórum Internacional do Meio Ambiente - A conferência da Terra 695

CAATINGA ARBUSTIVA-ARBOREA
( Imburana, Catingueira, Braunas e Cumaru)

Corte da madeira

FLORESTA PLUVIO
NEBULAR
(Jatobá, Cedro, Paraiba,
Fre Jorge branco.
Fre Jorge roxo))

Desmatamento Cultura

Terra esgotada
Sobrepastejo

CAATINGA
RALA
(Marmeleiro,
Jurema)

CAATINGA ARBUSTIVA
(Catingueira, Angico,
Jurema preta, Marmeleiro,
Macambira)

Sem a presença dos Presença moderada dos Presença acentuadas dos


agriculrores agricultores agricultores

Figura 7: Cenário da paisagem no ambiente de maciço residual úmido: a reorganização da


vegetação.
Fórum Internacional do Meio Ambiente - A conferência da Terra 696

CAATINGA ARBUSTIVA-ARBOREA
(Pau branco, Jurema, Marmeleiro)

Corte da madeira

MATA SECA
NATIVA
(Sabia, Pereiro preto,
Cumaru, Pereiros,
Aroeiras)

Desmatamento Cultura

Terra esgotada
Sobrepastejo
Erosão

DESCAMPADA
(Marmeleiro,
Mandacaru)

CAATINGA ARBUSTIVA
(Moleque duro,
Jurema preta, Xique xique
Quebra faca)

Sem a presença dos Presença moderada dos Presença acentuadas dos


agricultores agricultores agricultores

Figura 8: Cenário da paisagem no ambiente da superfície sertaneja: a reorganização da vegetação


Fórum Internacional do Meio Ambiente - A conferência da Terra 697

CAATINGA ARBUSTIVA-ARBOREA
( Juazeiro, Oiticica)

Corte da madeira

VEGETAÇÃO DE
TABULEIRO
(Jangada, Café bravo,
Murici de tabuleiro
Jucá, Imbaúba)

Desmatamento Cultura

Terra esgotada
Corte da madeira
Erosão

CAATINGA
RALA
(Marmeleiro,
Jurema)

CAATINGA ARBUSTIVA
(Angico,
Jurema preta,
Ingá brava)

Sem a presença dos Presença moderada dos Presença acentuadas dos


agricultores agricultores agricultores
Figura 9: Cenário da paisagem no ambiente de tabuleiro: a reorganização da vegetação

REFERÊNCIAS BIBLIOGRÁFICAS
DUBOS, R. Namorando a Terra. Ed. Melhoramentos. São Paulo, 1981.
CPRM. Mapa Geológico do Estado do Ceará. Escala: 1:500.000. Fortaleza, Ceará. 2003.
FALCÃO SOBRINHO, J. Relevo, Elemento e Âncora, na Paisagem, do Vale Verde e Cinza, do
Acaraú. Tese de doutorado. USP. São Paulo, 2006.
HACK, J.T.; GOODLETT, J.C. Geomorphology and florest ecology of a mountain region in the
central Appalachians. U.S. Geological Survey. Prof. paper. Waschington, 1960.
RADAMBRASIL, Levantamento Exploratório – Reconhecimento de Solos do Estado do Ceará.
Recife, MA/DNPES – SUDENE/DRN. 1973.
SOUZA, M. J. N. Contribuição ao Estudo das Unidades Morfo-estruturais do Estado do Ceará. in:
Revista de Geologia/UFC. Fortaleza, 1988.
Fórum Internacional do Meio Ambiente - A conferência da Terra 698

FACTIBILIDADE ECONÔMICA SOB CONDIÇÕES DE RISCOS: ANÁLISE DE


UNIDADE DE PRODUÇÃO CONTÍNUA DE BIODIESEL NA BAHIA

Geovânia Silva de Sousa


UESC – Universidade Estadual de Santa de Cruz – Ilhéus, Bahia; Mestranda em Desenvolvimento Regional e Meio
Ambiente, bolsista DAAD – Serviço Alemão de Intercâmbio Acadêmico. gsilvadsousa@yahoo.com.br
Mônica de Moura Pires
UESC – Universidade Estadual de Santa de Cruz – Ilhéus, Bahia; Professora Doutora titular; bolsista produtividade
FAPESB.
Jaênes Miranda Alves
UESC – Universidade Estadual de Santa de Cruz – Ilhéus, Bahia; Professor Doutor titular.

RESUMO
O biodiesel, combustível renovável obtido a partir da transesterificação de óleos vegetais e
animais in natura ou residuais, já se constitui em uma realidade como fonte de energia, que além de
minimizar a esgotabilidade dos recursos não renováveis energéticos, apresenta características
capazes de mitigar problemas ambientais causados pelo uso dos combustíveis não renováveis.
Nacionalmente amparado pelo Programa Nacional de Produção e Uso do Biodiesel (PNPB) e no
âmbito estadual pelo PROBIODIESEL Bahia, poucos são os trabalhos que analisam a
sustentabilidade da implantação de tais programas. Nesse contexto, este estudo visa analisar a
viabilidade econômica, baseada em métodos quantitativos, da produção contínua de biodiesel, a
partir da transesterificação do óleo de mamona, adotando-se complementarmente análises de
sensibilidade por meio da construção de cenários, tomando como referência o estado da Bahia. Será
empregado no modelo de simulação o método de Monte Carlo, a fim de se detectar a probabilidade
de ocorrência de situações adversas e seus efeitos sobre os indicadores econômicos de viabilidade.
Palavras-chave: biocombustível, viabilidade-econômica, análise de risco.

ABSTRACT
Biodiesel, a renewable fuel made from the transesterification process of vegetable and
animal oils in natura or residual oils, is already a reality as an energy source, which in addition to
minimize the exhaust problem of non-renewable energy resources, introduces and brings
characteristics able to mitigate environmental problems caused by the use of non-renewable fuels.
Nationally supported by Programa Nacional de Produção e Uso do Biodiesel – PNPB (National
Program for Production and Use of Biodiesel) and regionally (in the State of Bahia) by
PROBIODIESEL Bahia, there are few studies that aim to analyze the sustainability of such
programs. In that context, this study means to examine the economic viability, based on quantitative
methods, of the continuous production of biodiesel, made from the transesterification of castor bean
oil in Bahia, employing complementary analysis of sensitivity through the construction of
scenarios. To consider the effects of the independent variables, it will be used in the simulation
model the Monte Carlo method, to detect the probability of occurrence of adverse situations on the
results of the economic indicators of viability.
Keywords: biofuel, economic-feasibility, risk analysis

INTRODUÇÃO E JUSTIFICATIVA
Na era do desenvolvimento a energia torna-se cada vez mais indispensável ao
desenvolvimento da humanidade. Marcada pela Revolução Industrial, a demanda por esse fator
cresce a cada ano numa projeção de 1,7% ao ano. Cerca de 90% do total de energia consumida no
mundo provém de origem fóssil, cujas reservas deverão permitir o suprimento somente para os
próximos 40 anos ou um pouco mais (Agroanalysis, 2005). Além da esgotabilidade e da sua ampla
utilização, vem provocando ao longo do tempo, relevantes impactos ambientais, tal qual o efeito
estufa, mudança climática gerada pela emissão de gases poluentes na atmosfera, especialmente o
CO2. Assim, em função desse consumo, as pesquisas sobre fontes de energias têm-se voltado para
materiais orgânicos com a finalidade de se obter um produto capaz de substituir os combustíveis
fósseis e de minimizar os impactos sobre o meio ambiente (Sousa, 2006).
Fórum Internacional do Meio Ambiente - A conferência da Terra 699

Nesse sentido, o biodiesel constitui-se em uma alternativa tanto para redução da


dependência dos países quanto aos derivados do petróleo, como para redução dos problemas
ambientais. Esse combustível é obtido da transesterificação de óleos e gorduras vegetais ou animais,
podendo ser utilizados parcial ou totalmente em motores a combustão interna com ignição por
compressão ou para geração de outro tipo de energia que utilize o diesel como combustível.
Dada a limitação da oferta energética, o Brasil, vem incentivando pesquisas, especialmente
as provenientes de biomassa. Nesse sentido, em 2000, o Ministério da Ciência e Tecnologia (MCT),
estruturou uma rede de pesquisas para o desenvolvimento científico e tecnológico da produção de
biodiesel, originando assim o Programa Brasileiro de Biocombustíveis - Probiodiesel, cuja meta
inicial era introduzir o biodiesel na cadeia energética do país a partir de uma mistura de 5% ao
diesel. Em dezembro de 2004, o programa traçou como objetivo e dos seus pilares a inclusão social
de agricultores familiares a partir da geração de emprego e renda, por meio da participação desses
produtores na cadeia do biodiesel. O intuito de tal medida de política é reduzir as disparidades
regionais, explorar o potencial local e diminuir a importação de petróleo e seus derivados,
fortalecendo assim componentes renováveis da matriz energética brasileira. Partindo-se dessas
metas foi lançado o Programa Nacional de Produção e Uso do Biodiesel (PNPB). Neste programa,
constam os percentuais de mistura de biodiesel a ser adicionado ao diesel, o modelo tributário a ser
adotado, os incentivos quanto ao uso da matéria-prima e da categoria de produção (agronegócio ou
agricultura familiar), a forma de utilização, dentre outras diretrizes políticas. Em janeiro de 2005,
foi sancionado o decreto lei 11.097 autorizando o uso comercial da mistura B2 (2% de biodiesel e
98% de diesel), atribuído à Agência Nacional de Petróleo, Gás Natural, e Biocombustíveis a
competência para regulação e fiscalização das atividades econômicas integrantes da indústria do
petróleo, gás natural e dos biocombustíveis (Sousa, 2006).
Na Bahia, em 2003, sob a coordenação da Secretaria de Ciência, Tecnologia e Inovação
(SECTI) e articulação de diversos órgãos estaduais, universidades, pesquisadores da área,
empresários e trabalhadores rurais, foi estruturado o PROBIODIESEL Bahia. Esse programa
objetiva estimular a produção e processamento de matérias-primas no estado, incentivar a instalação
de micro e mini-usinas de biodiesel, estimular empreendimentos agroindustriais e frotas privadas e
públicas de veículos para uso do biodiesel, fortalecer e integrar a agricultura familiar ao processo
produtivo do biodiesel, dentre outros (SUERDIECK, 2006). O Programa ressalta, ainda, o potencial
da Bahia pelas suas características edafoclimáticas favoráveis à produção de diversos tipos de
oleaginosas, disponibilidade de terra para produção de matéria-prima, dentre outras características
relevantes para a sustentabilidade de um programa de tal importância.
Com a introdução do biodiesel na matriz energética do país criou-se mais um mercado-
destino para essa oleaginosa. O seu uso na produção de biodiesel advém do forte apelo social pela
inserção da agricultura familiar na cadeia produtiva, a não concorrência na cadeia alimentar e a
geração de emprego e renda na região do semi-árido nordestino.
A inserção do biodiesel na matriz energética implica em efeitos multiplicadores nos mais
variados segmentos da economia, representando uma nova dinâmica para o setor agroindustrial. Em
nível de produção agrícola há um requerimento para expansão dos cultivos a fim de sustentar o
programa, para tanto, são necessários uma produção de, aproximadamente, 800 milhões de litros de
biodiesel a fim de atender a mistura de 2% de biodiesel ao diesel, para um consumo médio anual de
40 bilhões de litros. Para responder a essa demanda torna-se necessária a ampliação dos plantios de
oleaginosas.
Segundo Crestana (2005), o Brasil além da diversidade de matéria-prima (oleaginosas),
possui áreas agricultáveis que podem viabilizar a expansão desse tipo de cultura sem precisar
desmatar ou deixar de produzir alimentos. Quanto ao setor industrial espera-se que a instalação e
ampliação de unidades de esmagamento ampliem o mercado de óleo bruto, permitindo assim a
sobrevivência das unidades de produção do biodiesel. Espera-se que essa dinâmica resulte em
impactos positivos sobre o setor de serviços, por meio da demanda do setor de transporte, isso
deverá implica em maior oferta de empregos na economia. Segundo Holanda (2004) citado por
Lopes et al. (2005), a cada substituição de 1% de diesel por biodiesel a partir do óleo de mamona,
Fórum Internacional do Meio Ambiente - A conferência da Terra 700

produzido com a participação da agricultura familiar, podem ser gerados cerca de 45 mil empregos
no campo, proporcionando uma renda anual de R$ 4.900,00 por trabalhador. Para Holanda seriam
criados 180 mil empregos, admitindo-se que um emprego no campo seja capaz de gerar três na
cidade. Destarte, percebe-se a grande relevância desse mercado sob o ponto de vista
socioeconômico.
Diante do exposto, este estudo propõe analisar a viabilidade econômica da instalação de
unidades de produção contínua de biodiesel desde o processo produtivo incorporando análises de
risco e incerteza. É necessário salientar que esse tipo de análise é de fundamental importância para
implementação de políticas e diretrizes para o setor, pois subsidiam a tomada de decisão de
empreendedores e governo, colaborando assim para o atingimento de metas propostas para o
programa de biodiesel.

OBJETIVOS
• Estruturar os custos de produção definindo os níveis de despesas aceitáveis;
• Analisar a viabilidade econômica da produção de biodiesel a partir de diferentes estruturas de
custo tendo como fonte de matéria-prima a mamona;
• Determinar a rentabilidade da produção;
• Avaliar os efeitos de alterações nos preços dos insumos empregados e seus impactos sobre a
viabilidade da atividade;
• Estabelecer o grau de risco do investimento sob diferentes cenários de produção.

METODOLOGIA
Sob a fundamentação teórica da teoria da firma por meio da análise de produção e dos
custos procura-se identificar o comportamento da firma no mercado, e a engenharia econômica, que
apresenta um conjunto de critérios que subsidia a comparação científica dos resultados na tomada
de decisão de diferentes alternativas (HAMMEL; TSCHNER, 1995). Sabendo que o mercado é
dinâmico, utiliza-se da análise de sensibilidade para se incorporar os efeitos de mudanças de
determinadas variáveis sobre a lucratividade e viabilidade econômica do negócio. Posteriormente,
adotam-se os modelos de simulação para identificar a probabilidade de ocorrência de situações
adversas, e seus efeitos sobre os indicadores econômicos de viabilidade.
Os custos de produção, agrupados em fixos e variáveis, são estruturados a partir da
definição das despesas incorridas na produção e dos seus respectivos coeficientes técnicos, essas
informações subsidiam na determinação das receitas e da lucratividade do empreendimento.
Conhecendo-se os custos e as receitas, elaboram-se os fluxos de caixa, que representam os
valores monetários das entradas e saídas dos recursos e produtos por unidade de tempo
(NORONHA, 1987). A partir dessas informações são calculados os indicadores de rentabilidade da
atividade estudada, que permitem analisar a viabilidade econômico-financeira da unidade de
produção. Os indicadores econômicos empregados neste estudo são: Valor Presente Líquido (VLP),
Taxa Interna de Retorno (TIR) e a relação Benefício/Custo (B/C).
O valor presente líquido (VPL), segundo Semanez (2002), mede o valor presente dos
fluxos de caixa gerados pelo projeto ao longo da vida útil. Dessa forma, esse indicador consiste em
transferir para o instante atual todas as variações de caixa esperadas, desconta-las a uma
determinada taxa de juro e somá-las algebricamente (NOGUEIRA, 1999). Assim, o modelo
matemático do VPL do projeto de investimento pode ser descrito da seguinte forma:
n
VPL = -I + Σ [(FCt)/(1+k)t
I=1

Em que, I é o investimento de capital na data zero, FCt representa o retorno na data t do


fluxo de caixa, n é o prazo de análise do projeto e k é a taxa mínima para realizar o investimento ou
custo de capital do projeto de investimento.
Fórum Internacional do Meio Ambiente - A conferência da Terra 701

O critério para seleção, segundo este indicador, é somente aceitar projetos com VPL
positivo. Ou seja, para aceitar o projeto, este deve apresentar valor presente dos retornos, calculado
com a taxa mínima requerida k, superior ao valor presente do investimento.
A taxa interna de retorno (TIR) de um projeto é a taxa que torna nulo o VPL do fluxo de
caixa do investimento. É aquela que torna o valor presente dos lucros futuros equivalentes aos dos
gastos realizados com o projeto, caracterizando, assim, a taxa de remuneração do capital investido
(FRIZZONE; SILVEIRA, 2000). A vantagem desse indicador é que ele não requer conhecimento
prévio da taxa de desconto, sendo esta determinada endogenamente, como resultado da anulação do
fluxo descontado do projeto. No entanto, esse indicador pode apresentar resultados múltiplos ou
indeterminados, em situações onde o fluxo de caixa não se apresenta na forma convencional, ou
seja, com uma única inversão de sinal. O cálculo da TIR consiste em obter, por meio da expressão
matemática do VPL, a taxa de juro que a torne nula. Assim:

VPL = 0 = -I + (FC1)/(1 + TIR) + (FC2)/(1 + TIR)2 + ...+ (FCn)/(1 + TIR)n

De acordo com esse método, aceitam-se apenas investimentos que apresentem TIR
superior à taxa mínima requerida k.
O cálculo do benefício/custo (B/C) consiste na relação entre o valor presente dos
benefícios e o valor presente dos custos. Assim, um projeto deve apresentar um B/C maior que a
unidade para que seja viável, e quanto maior esta relação, mais atraente torna-se o investimento e tal
projeto. Portanto,
B/C = RT/CT
em que RT representa as receitas totais obtidas ao longo do período de tempo determinado
e CT os custos totais para esse mesmo período.
Além da produtividade, outros elementos que afetam o orçamento possuem probabilidade
de variarem como, por exemplo, os preços dos insumos e produtos. Na avaliação econômica de um
projeto precisam-se decidir que preços utilizar no orçamento para se fazer as recomendações. No
entanto, prevenir níveis de preços futuros, ou mesmo estimar os custos de oportunidade de um
determinado insumo, como a mão-de-obra, o óleo, por exemplo, é uma tarefa difícil. Assim,
necessita-se de um mecanismo que estime a amplitude de preços sob os quais possa ser
recomendado um dado investimento. Um método para se fazer tal avaliação é a análise de
sensibilidade.
A análise de sensibilidade consiste em medir a magnitude de uma alteração sobre um ou
mais fatores e como o resultado final é afetado. Esse procedimento permite avaliar de que forma as
alterações de cada uma das variáveis do projeto podem influenciar na rentabilidade dos resultados
esperados (BUARQUE, 1991). Assim, escolhe-se o indicador a sensibilizar, determinar sua
expressão em função dos parâmetros e variáveis escolhidas. Por meio de um programa de
computação obtêm-se os resultados a partir da introdução dos valores dos parâmetros na expressão.
Faz-se a simulação mediante variações em um ou mais parâmetros e verifica-se de que forma e em
que proporções essas variáveis afetam os resultados finais, em termos de probabilidade.
Qualquer empreendimento está sujeito, portanto, a riscos e incertezas, sobretudo aqueles
que envolvem o setor agrícola, haja vista a enorme quantidade de variáveis aleatórias que possuem.
Para avaliar o risco envolvido em tais atividades, empregar-se-á a técnica da simulação de Monte
Carlo, conforme trabalhos de Araújo e Marques (1997), Biserra (1994), Noronha e Latapia (1988),
Shirota et al. (1987) e Almeida et al. (1985).
Conforme Noronha (1987), a simulação de Monte Carlo é um dos métodos que utiliza
probabilidade na análise dos riscos. O princípio básico do processo de simulação reside no fato de
que a freqüência relativa de ocorrência do evento de certo fenômeno tende a aproximar-se da
probabilidade matemática de ocorrência desse mesmo fenômeno, quando a experiência é repetida
um grande número de vezes e assume valores aleatórios dentro dos limites estabelecidos (HERTZ,
1964).
Fórum Internacional do Meio Ambiente - A conferência da Terra 702

Devem-se seguir quatro etapas na seqüência dos cálculos no método de simulação de


Monte Carlo:
1 – Identificar a distribuição de probabilidade de cada uma das variáveis relevantes do fluxo de
caixa do projeto.
2 – Selecionar ao acaso um valor de cada variável, a partir de sua distribuição de probabilidade.
3 – Calcular o valor do indicar de escolha cada vez que for feito o sorteio indicado no item 2.
4 – Repetir o processo até que se obtenha uma confirmação adequada da distribuição de freqüência
do indicador de escolha.
Como não é possível estudar a distribuição de probabilidade de todas as variáveis do
projeto, a melhor alternativa consiste em identificar, através da análise de sensibilidade, aquelas que
têm maior efeito sobre o resultado financeiro do projeto. Embora existam vários tipos de
distribuições de probabilidade, a tarefa de identificar a distribuição específica de uma determinada
variável é freqüentemente difícil e custosa. Assim, o procedimento usual é a distribuição triangular.
Essa distribuição é definida pelo nível médio mais provável ou moda, por um nível mínimo e um
nível máximo que é especialmente importante quando não se dispõe de conhecimento suficiente
sobre as variáveis. Para a realização dessa distribuição serão gerados números aleatórios, em que os
valores obtidos para as variáveis, resultarão em vários fluxos de caixa e, conseqüentemente, vários
indicadores de resultados. Pela repetição desse procedimento gerar-se-á a distribuição de
freqüências do indicador do projeto, que permite aferir a probabilidade de sucesso ou insucesso do
empreendimento.
Será tomado como parâmetro o projeto de instalação de unidades de produção contínua de
biodiesel a partir de óleo de mamona para determinação dos coeficientes técnicos, e os dados de
preço a serem utilizados para determinar o fluxo de caixa das atividades serão pesquisados na
própria região, a partir dos quais será feito o scale-up. Assim, ter-se-á diferentes níveis de
tecnologia para produção do biodiesel.

RESULTADOS PARCIAIS
A unidade de produção considerada para o cálculo possui capacidade operacional de
4000L de biodiesel/hora, funcionando diariamente ao longo de 300 dias por ano.
Para identificar o comportamento da firma no mercado, foram estruturados os custos,
determinando receita e lucratividade. A estruturação dos custos envolveu a definição de despesas,
da instalação à produção, e o levantamento de preços de produtos e insumos usados na produção;
sendo os principais componentes da estrutura de custos apresentados na Tabela 1.

Tabela 1 – Principais componentes da estrutura de custos da instalação de uma pequena unidade de


produção contínua de biodiesel na Bahia, 2008
Componentes da estrutura de custos Valor (R$)
Investimento total 14.360000,00
Custo Total 39.900.338,67
Custo Variável 38.684.172,35
Custo fixo 1.216.166,32
Custo médio (R$/L) 3,07

Fonte: dados da pesquisa.

Ao custo por unidade produzida (R$ 3,07/L) foram agregados mark-ups de 10%, 15% e
20% para obtenção do preço do biodiesel puro (B100). Foram também calculados os preços das
misturas B2 (98% diesel e 2% de biodiesel) e B5 (98% diesel e 5% de biodiesel) (Tabela 2).
Fórum Internacional do Meio Ambiente - A conferência da Terra 703

Tabela 2 – Preço do Biodiesel em nível de consumidor final, 2008


Mark-up (%) B100 (R$/L) B2 (R$/L) B5 (R$/L)
10 3,373 1,887 1,988
15 3,527 1,890 1,996
20 3,680 1,893 2,004

Fonte: dados da pesquisa.

Analisando-se apenas os preços do B100 foram calculadas as receitas R$ 43.890.372,53,


R$ 45.885.389,47, R$ 47.880.406,40 para os mark-up de 10%, 15% e 20%, respectivamente. Essas
informações subsidiaram a construção do fluxo de caixa e, posteriormente, o cálculo dos
indicadores econômicos: VPL, TIR, B/C, conforme Tabela 3.

Tabela 3 – Indicadores de viabilidade econômica da instalação de uma unidade de produção


contínua na Bahia, 2008
Mark-up (%) VPL (R$) TIR(%) B/C
10 37.620.206,53 26 1,10
15 49.573.864,70 41 1,15
20 61.527.522,88 55 1,20

Fonte: dados da pesquisa.

O resultado obtido demonstra viabilidade de implantação da unidade estudada, de acordo


com a tecnologia empregada, uma vez que o VPL foi positivo, a TIR foi maior que, 14,5%, a
relação benefício/custo apresenta-se maior que a unidade. Todos esses valores mostram, em certa
medida, sob as condições analisadas, viabilidade para empreendimentos de tal natureza.

CONCLUSÕES PARCIAIS
Diante dos resultados parciais apresentados observa-se que uma possibilidade de redução
dos custos seria a expansão dos cultivos das oleaginosas, em especial nesta análise da mamona, pois
isso levaria a menores preços da matéria-prima e, conseqüentemente redução nos custos, o que
poderia gerar um produto mais competitivo no mercado.
Comparando o preço da mistura comercialmente autorizada (B2) ao preço do diesel
(R$ 1,858/L) e adotando mark-up de 10%, observa-se que o biodiesel atingira o preço de
R$ 1,887/L, uma diferença de R$ 0,02/L. No entanto, se considerarmos os impactos positivos
gerados pala produção e uso do biodiesel, esse valor pode acabar sendo incorporado nos benefícios
gerados pela redução nos níveis gerados de poluentes.
Os indicadores econômicos calculados evidenciaram viabilidade de se produzir biodiesel
sob as condições analisadas em função dos valores obtidos para todos os indicadores analisados.

REFERÊNCIA BIBLIOGRÁFICA
Agroenergia: Safra mais alcooleira. Agroanalysis: a revista de agronegócios da FGV. vol. 25, nº.
10, p. 32-36, out. 2005.
ALMEIDA, C.A. Biocombustível: Uma Análise Econômica Para a Região Metropolitana de
Salvador. 2002. Monografia (Bacharelado em Ciências Econômicas) – Faculdade de Ciências
Econômicas. UESC - Universidade Estadual de Santa Cruz. Ilhéus
BISSERA, J.V. Rentabilidade da irrigação pública no Nordeste, sob condições de risco: o caso do
perímetro Morada Nova. Revista de Economia e Sociologia Rural, 1994, nº 3, artigo 4.
BRASIL. Lei n 11.097, de 13 de janeiro de 2005. Disponível em:
http://www.mct.gov.br/legis/leis/11097_2005.htm. Acesso em 9 ago. 2006.
BUARQUE, C. Avaliação econômica de projetos. 12 ed. Rio de Janeiro: Campus, 1991.
Fórum Internacional do Meio Ambiente - A conferência da Terra 704

CRESTANA, Silvio. As sementes da agroenergia. Agroanalysis: a revista de agronegócios da FGV.


vol. 25, nº. 10, p. 4-6, out. 2005.
FRIZZONE, J. A.; SILVEIRA, S. F.R. Análise econômica de projetos hidroagrícolas. In SILVA, D.
D., PRUSKI, F. F. Gestão de recursos hídricos: aspectos legais econômicos, administrativos e
sociais. Brasília: Secretaria de Recursos Hídricos. Porto Alegre: Associação Brasileira de Recursos
Hídricos, 2000.
HALL, R. E., LIEBERMAN, M.. Microeconomia: princípios e aplicações. 3 ed. São Paulo:
Pioneira Thompson, 2003.
HERTZ, O.B. Risk analysis in capital investmente. Harvard business Reviw, 42(1)-95-106, jan.
feb.1964
HUMMEL, P. R. V., TASCHNER, M. R. B. Análise e decisão sobre investimentos e
financiamentos. Engenharia econômica: teoria e prática. 4 ed. São Paulo: São Paulo: Atlas, 1995.
LOPES, J. S., BELTRÃO, N. E. M., JÚNIOR, J. F. P. Produção de mamona e biodiesel: uma
oportunidade para o semi-árido. Revista Bahia Agrícola. Vol. 7, nº. 1, p. 37-41, set. 2005.
NOGUEIRA, E. Análise de investimentos. In BATALHA, M. O. Gestão Agroindustrial. São Paulo:
Atlas, 1999.
NORONHA, J. F. Projetos Agropecuários: administração financeira, orçamento e viabilidade
econômica. 2. ed. São Paulo: Atlas, 1987.
NORONHA, J. F., LATAPIA, M.X.L.P.C. Custos de produção agrícola sob condições de risco no
estado de São Paulo. 2.. ed. São Paulo: Atlas, 1987.
SEMANEZ, C.P. Matemática Financeira: aplicações à análise de investimentos. São Paulo: Prentice
Hall, 2002.
SHIROTA, R., SILVA, R.D.M., LIMA, R. A. S., NEVES, E. M. A. A técnica de simulação
aplicada a avaliação econômica de matriz de suas linhagens de frango de corte. Revista de
Economia e Sociologia Rural, 1987, nº 1, artigo 5.
SOUSA, G. S. de, PIRES, M. de M., ALMEIDA, C. M. ; ALVES, J. M. ; ALMEIDA NETO, J. A.
de . Viabilidade econômica do biodiesel e impacto do seu uso no preço da tarifa de ônibus na cidade
de Itabuna, Bahia. In: XLIV Congresso da Sociedade Brasileira de Economia e Sociologia Rural,
2006, Fortaleza. Anais do Congresso Brasileiro de Economia e Sociologia Rural. Brasília : Sober,
2006. p. 1-8
SOUSA, Geovânia Silva. Análise Econômica de Diferentes Sistemas de Produção de Biodiesel na
Bahia. 2006. Monografia (Bacharelado em Ciências Econômicas) – Faculdade de Ciências
Econômicas. UESC - Universidade Estadual de Santa Cruz. Ilhéus
SUEDIERCK, Sidnei Silva. Políticas Públicas de fomento ao biodiesel na Bahia e no Brasil:
impactos socioeconômicos e ambientais com a regulamentação recente. Revista Bahia Análise &
dados. Salvador, Vol. 16. nº 1, p. 65-77, jun. 2006.
Fórum Internacional do Meio Ambiente - A conferência da Terra 705

ENSAIO PRELIMINAR SOBRE A ADAPTABILIDADE EM CATIVEIRO DO PEIXE


ARIACÓ (Lutjanus synagris) NA PRAIA DA PENHA/PB

Lidyane Lima Silva


(UFPB) – lidyane1007@yahoo.com.br
Maria Cristina Crispim
(UFPB/CCEN/DSE)
Maristela Oliveira Andrade
(UFPB/CCSA)

RESUMO
Com o aumento contínuo e descontrolado da utilização dos recursos naturais. Os estoques
pesqueiros sofrem acentuadamente, uma vez que desde o período pós-II Guerra Mundial este
recurso vem sendo acentuadamente mais consumido como fonte alimentar, seja principal ou
complementar. Em países em que esta atividade é importante fator econômico, cotas máximas de
exploração são criadas, infelizmente no Brasil tais cotas ainda não foram adotadas, resultando em
acentuadas modificações nos estoques marinhos. Paralelamente a isso a aqüicultura cresce em
passos largos. Tal fato pode ser comprovado questionando-se a origem do pescado consumido
atualmente, parcela significativa é oriunda de fazendas especializadas em seu cultivo. Diversas
espécies periodicamente somam-se a listas “de proibida de pesca” do Ministério do Meio Ambiente.
Numa tentativa de evitar a inclusão do ariacó (Lutjanus synagris), por todas as suas potencialidades
gastronômicas e econômicas, se propôs a realização deste ensaio preliminar sobre a adaptabilidade a
condições de cativeiro. Resultados preliminares mostram a não modificação de preferências
alimentares in natura e em cativeiro; adaptabilidade do peixe ao cativeiro, animais muito
resistentes. Os níveis de estresses analisados gradativamente reduziram-se, ou mantiveram-se
constantes, ao longo do estudo. Verificou-se um baixo ganho de peso, mas, o mesmo foi
proporcional ao crescimento registrado. Animais de hábitos predatórios possuem ritmo de
crescimento mais lento, porém, comparando-se com peixes de água doce, o fator econômico pode
agir de forma compensatória a longo prazo, por se tratar de um apreciado item alimentar, e de alto
valor de venda, havendo a possibilidade de sua viabilidade em cultivo de longo prazo.
Palavras-chave: Lutjanus synagris, conservação, manejo sustentável, alimentação.

ABSTRACT
The continuous and uncontrolled use natural resources has caused declines in food
supplies. Among them fisheries has suffered a great decrease. Since the period after the second war,
consumption of fish has been intensified, both as a main or complementary food source. In
countries were this activity represents an important economic factor, maximum quotas of
exploration are created. Unfortunately in Brazil those quotas were not adopted yet, causing great
modifications to the marine resources. Simultaneously, aquaculture has increased in a fast rhythm.
This fact can be confirmed by researching about origin of fishery currently consumed, where a
significant parcel comes from aquaculture farms. Many species are continually added into
“forbidden fishing lists” from the Brazilian Ministry of Environment. Trying to avoid the inclusion
of Ariacó (Lutjanus synagris) in these lists, for its gastronomic and economic potentialities, this
work proposes a preliminary essay about its adaptability to the captivity conditions. According to
preliminary results, there were no changes on food preferences from in natura habitat to captivity; a
satisfactory fish adjustment to the captivity, indicating tough animals. Stressors levels were
analyzed and there was a constant maintenance or a reduction of these factors throughout the study
period. It was verified a low rate of weight gain. However, the weight gain rate was equivalent to
the growth rate recorded. A low growth rate is a characteristic of predator animals. However in
comparison with freshwater fishes, the economical factor may act as a long-term compensation,
since Ariacó is a high-valued species and is highly appreciated as a food item. Ariacó species in
captivity can be seen as a possibility for income purposes, at least for a long-term culture.
Keywords: Lutjanus synagris, conservation, sustainable management, alimentation.
Fórum Internacional do Meio Ambiente - A conferência da Terra 706

INTRODUÇÃO
De acordo com a FAO (1999), após a Segunda Guerra Mundial, a prática pesqueira sofreu
um acentuado aumento, o número de espécies capturadas pela pesca quadruplicou, demonstrando
desta forma que houve um considerável acréscimo no uso deste recurso para fins alimentícios. O
aumento contínuo no uso destes recursos levou a uma diminuição nos estoques pesqueiros, o que
proporcionou um rápido desenvolvimento da aqüicultura, a qual consiste segundo Stickney (1979)
na criação de organismos aquáticos em condições controladas ou semi-controladas, dando-se
prioridade aos animais que podem ser utilizados para alimentação humana, para suprir as carências
do extrativismo. Historicamente, a aqüicultura possui registros desde o antigo Egito (VIEIRA;
VIEIRA, 1999).
Nos dias atuais a aqüicultura enfrenta o desafio de enquadrar-se no conceito de
sustentabilidade, para isso faz-se necessário a junção de novas dimensões à racionalidade que move
a elaboração de conhecimento e as práticas desta área (MAIA, 2003). Nas últimas décadas, a
atividade pesqueira vem sendo efetuada de maneira desordenada, sendo a pesca predatória apontada
por especialistas como um dos principais elementos que contribuem para a redução e/ou
esgotamento dos nossos estoques marinhos (MORAIS-RIODADES et al., 1999). Em virtude desta
extração descontrolada, boa parte do pescado que circulam no mercado internacional é oriunda de
viveiros intensivos, nos quais é possível realizar a manipulação de quase todas as variáveis
biológicas e físico-químicas que se encontram envolvidas nos eventos reprodutivos e do
crescimento destas espécies (RIBEMBOIM, 1999).
Através da Instrução Normativa 005/2004, o Ministério do Meio Ambiente (2004) tornou
pública uma listagem em que apresenta todas as espécies que, em virtude do acentuado declínio
populacional, não podem mais ser pescadas, já que agora compõem a lista de espécies ameaçadas
de extinção. Entre todas estas espécies, podemos mencionar a cioba (Lutjanus analis), a qual é
largamente consumida. Porém, de acordo com a Instrução Normativa 052/2005, esta espécie teve o
seu nome retirado da listagem, voltando a ter a sua pesca liberada. A decisão partiu unilateralmente
do governo, cujas alegações baseou-se em aspectos socioeconômicos das comunidades pesqueiras.
O ariacó (Lutjanus synagris) faz parte do mesmo gênero e compartilha características
semelhantes com a cioba, e em virtude disso, acredita-se que esta espécie passará a ser mais
pescada. Atualmente, já é largamente capturada por pescadores artesanais. Numa tentativa de evitar
a inclusão do ariacó na lista de espécies em extinção e sujeita a proibições de pesca, realizou-se
ensaios preliminares sobre alimentação com indivíduos juvenis, a fim de se adquirir mais
informações sobre sua taxa de crescimento em condições de confinamento e possível viabilidade de
cultivo. A sua escolha ocorreu em virtude de se tratar de uma espécie residente na costa paraibana
durante todo o ano e pelo fato já mencionado, de guardar semelhanças com L. analis (cioba),
espécie de apreciado sabor e eficiência econômica.

Lutjanus synagris
L. synagris (Linnaeus, 1758), popularmente conhecido como ariacó, apresenta como
características morfológicas, um corpo alongado e moderadamente alto, coberto por escamas
ctenóides e cabeça em forma triangular (Figura 1). Possui 10 espinhos e 12 raios na nadadeira
dorsal (podendo, mais raramente ser observados 11 espinhos e 13 raios). Apresenta uma mancha
negra, bastante evidente, situada abaixo dos raios moles da nadadeira dorsal, maior ou igual ao
tamanho do olho, pouco acima da linha lateral (MENEZES & FIGUEIREDO, 1980). A boca
contém dentes caninos moderados, similares em ambas as mandíbulas, com placas de dentes no céu
da boca em forma de âncora e o maxilar chega à margem anterior do olho. O corpo possui uma
coloração cor de rosa na lateral inferior e avermelhado na superior, com 8-10 faixas horizontais
amarelo-dourado e 3-4 faixas irregulares e delgadas na cabeça (CARVALHO-FILHO, 1999;
CERVIGÓN, et al. 1992).
Fórum Internacional do Meio Ambiente - A conferência da Terra 707

Figura 2 – Exemplar capturado nas águas do litoral Paraibano. (Foto: Lidyane Lima, 2006).

A espécie distribui-se no Oceano Atlântico, deste a Carolina do Norte até a região sudeste
do Brasil. Possuem um significativo valor comercial já que são utilizados tanto como fonte
alimentar como ornamento em aquários públicos. Como hábito alimentar os organismos deste
gênero exibem uma preferência por crustáceos e peixes (MENEZES & FIGUEIREDO, 1980;
ALMEIDA, 2000).
A idade de maturidade sexual para muitas espécies de peixes é questionada, apesar da
maioria dos autores a relacionarem com o tamanho corporal do animal. Thompson & Munro (1974)
relatam para ambos os sexos do peixe vermelho, que estes atingem a maturidade sexual com
aproximadamente 18 cm de comprimento. De acordo com estudos realizados por Lara, et al (1990),
na Costa de Veracruz com L.synagris, observou-se a ocorrência de fêmeas maduras a partir dos 16
cm de comprimento furcal.
A família Lutjanidae representa um dos grandes recursos pesqueiros da atualidade para as
populações dos trópicos e subtrópicos (DUARTE; GRACIA, 1999). Na região litorânea do Caribe,
está entre as mais importantes espécies de extração do gênero (LUCKHURST, 2000). De acordo
com Acera e Garzón (1985), o L. synagris é, provavelmente, o representante dos Lutjanídeos mais
abundante na costa do Caribe Colombiano, o que o coloca numa posição de destaque na prática da
pesca artesanal.
Os primeiros estudos acerca desta espécie no Brasil ocorreram no Ceará, dando-se ênfase à
coleta de dados sobre a idade da população, suas taxas de crescimento (ALEGRIA; MENEZES,
1970), morfologia (RODRIGUES, 1975) e taxas de fecundidade (GESTEIRA; ROCHA, 1976). De
acordo com Klippel e Perez (2002), o L. synagris encontra-se entre as dez principais espécies
apreendidas na pesca de linha da costa central do Brasil. Em virtude disso, quando se avaliou seu
estoque natural, verificou-se que o mesmo se encontra em condições de “plenamente explotado” a
“sobre-explotado” (COSTA et al., 2002), o que mostra a importância de se iniciarem pesquisas que
demonstrem ou não a viabilidade do seu cultivo em cativeiro.

Local da Pesquisa
A área de estudo localiza-se na costa litorânea paraibana, em frente à ponta do Seixas, nas
coordenadas 07º 09’ 12” S e 34º 46’ 36” W. Caracteristicamente possui um clima do tipo quente e
úmido (As’) com chuvas de outono e inverno, de acordo com W. Koppen. Possui uma variação
térmica entre 22º e 28ºC. Seu solo é arenoso e possuidor de imensos coqueirais e vegetação praieira
(Figura 2).
Fórum Internacional do Meio Ambiente - A conferência da Terra 708

Figura 2- Vista aérea de parte da praia dos Seixas/ PB. (Fonte: Imagens aéreas da Prefeitura
Municipal de João Pessoa/PRODEMA).

METODOLOGIA
Captura de Espécimes no Ambiente
Quando da captura para a realização do estudo da dinâmica de população, estes foram
pescados com anzol e iscas naturais, por pescadores colaboradores. Para análises de conteúdo
estomacal, estes indivíduos foram armazenados em caixas térmicas, contendo gelo, para a
interrupção o processo de digestão natural. Para a verificação de adaptação ao cativeiro foram
capturados com o auxílio de covos. Todos os indivíduos que chegaram à base do projeto foram
cuidadosamente examinados.
Foram realizados dois experimentos-piloto na praia do Seixas entre os meses de março e
maio/2006. A duração de cada experimento-piloto foi em média de 2 meses, sendo encerrado
sempre por mortes dos peixes em estudo.

Manejo durante o Experimento


Após aclimatação (15 dias) realizava-se a primeira biometria para o experimento (dia um),
na qual obtinha-se os valores de peso, comprimento e verificava-se mais uma vez, o estado geral do
peixe. A qualidade da água foi acompanhada através de análises mensais realizadas no Laboratório
de Ecologia Aquática do DSE/UFPB. As amostras coletadas no ambiente de estudo eram
transportadas para o laboratório (garrafas PET etiquetadas) onde eram armazenadas em temperatura
inferior a 0 ºC, a fim de preservar suas características físico-químicas. As análises hidrológicas
seguiram os métodos descritos por Winkler (Golterman et al.,1978), para o oxigênio dissolvido
(O.D); Mackeret et al. (1978), para o nitrito; para a amônia, o nitrato e o fosfato seguiu-se os
métodos descritos no Standard Methods (1998). A temperatura foi registrada com um termômetro
de mercúrio com precisão de 0,1º C. O pH com o auxílio de phmetro. As amostras foram filtradas
em filtros comuns de celulose, e, posteriormente, armazenadas em novas garrafas (tipo PET) no
refrigerador, até o momento das análises.

Caixas de Água
Foram utilizadas 6 (seis) caixas d’água de amianto com capacidade, individual, de 1000
litros. Estas se encontravam dispostas na beira-mar com um sistema básico de tubulação que as
mantinha conectadas entre si, para facilitar o fluxo de água, com o ambiente marinho. Em cada
caixa d’água foram alocados 5 (cinco) juvenis de L. synagris, verificou-se a partir de experimentos-
piloto que tal população era mais eficiente, pois permitia um menor estresse gerado pelo cativeiro,
qualidade de água mais satisfatória, disponibilidade de oxigênio, e também, mais espaço para a
circulação dos peixes. Com este número de indivíduos/caixa d’água conseguiu-se reduzir a
Fórum Internacional do Meio Ambiente - A conferência da Terra 709

mortalidade e manter uma população com crescimento mais homogêneo. Ao término de cada
experimento, todas as caixas eram esvaziadas e desinfetadas com cloro. Em todas as caixas d’água
foram colocados aeradores, que permaneciam ligados 24 horas ininterruptamente.

Análises Biométricas
A periodicidade das análises biométricas foi quinzenal. Realizando-se todas as medições, a
saber: comprimento padrão (CP), comprimento total (CT), altura corporal (AC) e peso total (PT).
Acompanhou-se o desenvolvimento dos peixes através das análises de peso total e comprimento
padrão. Para a medição e o acompanhamento do peso utilizou-se uma balança digital, em gramas,
com precisão de três casas decimais. A medição do comprimento padrão foi realizada com a
utilização de um paquímetro. Todas as análises biométricas foram realizadas na base do projeto,
praia do Seixas, e as mesmas sempre foram efetuadas no período da manhã.

RESULTADOS E DISCUSSÕES
Análises da espécie no ambiente
Foram estudados os conteúdos estomacais de 84 ariacós, durante os meses de abril a junho
de 2006. O tamanho médio dos indivíduos foi de 18,977cm (CT). A partir deste ensaio pode-se
confirmar as informações obtidas em Santos (1952), Cervigón (1966) e Rodrigues (1962), que a
dieta alimentar do ariacó é constituída de vários itens, com predomínio de peixes e crustáceos. Em
paralelo à análise de conteúdo estomacal realizou-se um estudo quanto à relação sexual dos peixes
coletados. Dos 84 indivíduos estudados, verificou-se a predominância de machos, em todos os
estágios de maturação, desde “em maturação” até “esgotados”. A relação foi de 66 machos para 6
fêmeas e 12 imaturos (sem sexo definido).

Avaliação do crescimento
A taxa de sobrevivência ao longo do período experimental foi de 93,3%. Verifica-se que
apesar do peso médio dos indivíduos capturados em campo não ser homogêneo, o desenvolvimento
final foi similar em todos. Ocorreu um ganho de peso diário médio de 0,292g/peixe, e durante todo
o período constatou-se um ganho de peso médio de 39,455 g/peixe. De forma mais específica, o
ganho de peso observado em cada caixa foi bastante variado alcançado valores desde 26,96 g até
74,39 g. O melhor desempenho observado pode estar relacionado com o menor número de peixes
presente nesta caixa (A1), em virtude de terem morrido 2 no início do experimento (Figura 3). Isto
revela que as condições ambientais presentes no experimento foram estressantes e que é possível
que diminuindo este estresse, os peixes possam apresentar um melhor desenvolvimento, o que será
testado, em trabalhos futuros, em que será repetido este cultivo, mas em tanques-rede no mar.

80
70
60

g 50
40
30
20
10
0
A1 A2 A3 B1 B2 B3
caixas

Figura 3 - Ganho médio de peso ao longo do cultivo, em todas as réplicas.


Fórum Internacional do Meio Ambiente - A conferência da Terra 710

Quanto aos dados preliminares de seu ritmo de crescimento (engorda), verificou-se o


mesmo da descrição literária de Rodrigues-Pino (1962), que se trata de um peixe que possui um
crescimento muito lento. O presente trabalho baseou-se em dados colhidos ao longo de meses de
acompanhamento quinzenal do desenvolvimento desta espécie, que apesar de apresentar um baixo
rendimento, mostrou-se possuidora de uma elevada adaptabilidade a condições de estresse. Não se
observou rejeição alimentar. Com relação ao ganho de peso corporal total obtido neste experimento,
constatou-se um fraco aumento alcançado por estes indivíduos, provavelmente devido a todas as
condições de estresse às quais foram submetidos. Contudo, isso também pode ser reflexo do fato
que, de acordo referências bibliográficas, os ariacós estudados poderiam estar em dimensões de
reprodução. Quanto ao seu comprimento, tanto no total como o parcial, não se observaram grandes
modificações ao longo do período de experimentação, porém, ressalta-se que a altura corporal dos
peixes em confinamento foi gradativamente modificando-se, indicando-nos um crescimento em
largura, o qual coincide com o ganho de peso, mesmo que em pequena quantidade. Quando
compara-se este desempenho com peixes, tipo tilápia, verifica-se o quão lento é o desenvolvimento
do L. synagris , porém deve-se reforçar que tal animal é um predador, possuindo
caracteristicamente um ritmo de crescimento diferenciado. Embora os resultados aqui obtidos, não
sejam muito promissores, acredita-se que o seu desempenho poderá melhorar, quando criados em
situações ambientais menos estressantes.

Compostos Físicos e químicos


A temperatura, o pH e o oxigênio mantiveram-se estáveis durante as análises. Os níveis de
oxigênio foram auxiliados por bombas de oxigenação que permaneceram ligadas por um período de
24 horas. De uma forma geral, ao longo dos meses de experimentação, as condições médias da
qualidade da água apresentaram-se relativamente estáveis. Pontualmente, pôde-se observar que os
níveis de amônia e nitrito mantiveram-se relativamente baixos e constantes ao longo de todos os
meses. Para o nitrato, inicialmente verificou-se um decréscimo em sua concentração, o qual foi
seguido por uma gradual elevação. Dentre os parâmetros analisados o nitrato foi o mais oscilante ao
longo de todas as análises, alcançando os valores mais elevados. A concentração do fosfato sofreu
pequenas alterações por todo o período.

CONCLUSÕES FINAIS
• Mesmo em confinamento não se observou alteração no padrão alimentar L. synagris;
• O desenvolvimento de L. synagris em caixas de água demonstrou ser muito lento;
• Os ambientes usados para cultivo promoveram situações de estresse aos animais atrasando o
seu crescimento;
• São animais de alta adaptabilidade e resistência ao manejo e as condições de estresse.

REFERÊNCIAS BIBLIOGRÁFICAS:
ACERO, P.; GARZÓN, F. J. Los Pargos (Pisces: Perciformes: Lutjanidae) del Caribe
ALEGRIA, J. R. C., MENEZES, M. F. Edad y crecimento del ariacó, Lutjanus synagris
(Linnaeus), en el nordeste del Brasil. Arq. Ciên. Mar. v. 10, n. 1, 1970. p. 65-68.
ALMEIDA, F. B. C. Aspectos da dinâmica reprodutiva do ariocó Lutjanus synagris
(Pisces:Lutjanidae) no litoral de Salvador e adjacências. Monografia de bacharelado em Ciências
Biológicas apresentada ao Depto. de Zoologia /IB/UFBA. 2000. 65 p.
APHA. Standard Methods for the Examination of Water and Wastewater. American Public Health
Association. 18ª ed. 1998
CARVALHO-FILHO, A. Peixes: costa brasileira. São Paulo. Melro. 1999. 320p.
CERVIGÓN, F et al. Fichas FAO de identificación de especies para los fines de la pesca. Guía de
campo de las especies comerciales marinas y de aguas salobres de la costa septentrional de sur
America. Comisión de Comunidades Europeas y de NORAD. Roma, FAO, 1992. 513p.
Colombiano. Actual. Bio., v. 14, n. 53, 1985. p. 89-99.
Fórum Internacional do Meio Ambiente - A conferência da Terra 711

COSTA, P. A. S., SILVA, G. O. M., MARTINS, A. S. Avaliação de estoques de pesca de linha de


na costa central do Brasil. In: Relatório Síntese: Área de estatística pesqueira, dinâmica de
populações e avaliação de estoques. Programa REVIZEE. Rio de Janeiro, 2002.
DUARTE, L.O., GARCIA, C.B. Diet of the lane snapper, Lutjanus synagris (Lutjanidae), in the
Gulf of Salamanca, Colombia. Caribe. J. Sci. 35(1/2). 1999. p. 54- 63.
GESTEIRA, T. C. V., ROCHA, C. A. S. Estudo sobre a fecundidade do ariocó, Lutjanus synagris
(Linnaeus), da costa do estado do Ceará (Brasil). Arq. Ciên. Mar., v. 16, n. 1, 1976. p. 19-22.
KLIPPEL, S., PERES, M. B. Resultados da avaliação de estoques das dez principais espécies na
pesca de linha de mão da costa central do Brasil. Relatório de Atividades. Rel. Téc., Programa
REVIZEE, Rio Grande, 2002.
LARA, R.T., PEREZ, L. A. A., MARQUEZ, S. S. Determinación de alguns parâmetros de la
reproducción de la rubria Lutjanus synagris em las costas de Veracruz en 1983. Instituto de
Ciencias del mar y limnologia-UNAM. 1990.
MAIA, W.M.JR. Dinâmica das Variações Limnológicas em Sistemas de Criação de Peixes. Tese
(Doutorado) – Universidade Federal de Campina Grande, 2003. 466p.
MENEZES, N. A., FIGUEIREDO, J. L. Manual de Peixes Marinhos do Sudeste do Brasil. IV.
Teleósteo (3). São Paulo. Museu de Zoologia. Universidade de São Paulo, 1980.
MORAIS-RIODADES, P.M.C., VALENTI, W.C., PERALTA, A.S.L., AMORIM, M.D.L.
Carcinicultura de Água Doce no Estado do Pará: Situação Atual e Perspectivas. In: ANAIS do 11º
Congresso Brasileiro de Engenharia de Pesca (CONBEP) – Vol. 02. Recife 1999.
NELSON, J.S. Fishes of the Word. John Willy & Sons, New York. 1976. 416p.
RIBEMDOIM, J. Otimização Bioeconômica de Estoques Pesqueiros. In: ANAIS do 11º Congresso
Brasileiro de Engenharia de Pesca (CONBEP) – Vol. 02. Recife, 1999.
RIVERA-ARRIAGA, E. et al. Ecology and Population Dynamics of Lutjanus synagris on
Campeche Bank. ICLARM, n. 48. 1996. p. 11-18.
RODRIGUEZ-PINO, Z. Estudios estadisticos y biológicos sobre la biajaiba Lutjanus synagris.
Centro de Investigaciones Pesqueras. Nota sobre investigaciones. v. 4. 1962. 99 p.
THOMPSON, M.,J.L. MUNRO. The biology, ecology, exploitation and management of
Caribbean reef fishes; scientific report of the O.D.S./U.W.I. fisheries. Ecology Research Project
1969-1973. Part V. The biology, ecology and bionomics of Caribbean reef fishes: V.D. Lutjanidae
(snappers). Zool. Dep. Univ. West Indies, Kingston, Jamaica. Res. Rep. 3. 1974. p.01-69.
VIEIRA, M.J.A.F., VIEIRA, C.M.T. Potencial do Cultivo de Peixe no Ceará e no Nordeste,
Algumas Perspectivas. In: ANAIS do 11º Congresso Brasileiro de Engenharia de Pesca (CONBEP)
– Vol. 01. Recife, 1999.
Fórum Internacional do Meio Ambiente - A conferência da Terra 712

ALTERNATIVAS PARA A REDUÇÃO DOS DANOS AMBIENTAIS GERADOS NA


PRODUÇÃO CANA DE AÇÚCAR E ETANOL NO BRASIL

Márcia Batista da Fonseca


UFPB - mb_marcia@hotmail.com
Márcia Cristina Silva Paixão
UFPB - marciapaixao@terra.com.br

RESUMO
A produção de cana-de-açúcar no Brasil remota ao período colonial. Atualmente o Brasil é
o maior exportador de açúcar mundial e desde 1920 desenvolve estudos para o uso do etanol de
cana como um combustível renovável. Entretanto, a produção de cana de açúcar é considerada uma
atividade geradora de danos ambientais, tais como, redução da biodiversidade; queimadas, a
contaminação das águas e do solo, produção da vinhaça, um resíduo de forte odor. Este estudo,
portanto, se propõe a comentar as ações alternativas já desenvolvidas pelo setor para redução dos
impactos ambientais. A reutilização da vinhaça no processo produtivo para fornecer nutrientes e
equilíbrio hídrico ao solo reduz custos de produção. A rotação de cana com grãos elimina, no caso
do Brasil, a escolha entre a produção de etanol e a redução da produção de alimentos. Há, portanto,
necessidade de ações governamentais que estimulem programas voltados para a redução de
impactos ambientais na produção de cana de açúcar.
Palavras chaves: cana de açúcar; etanol; meio ambiente.

ABSTRACT
The sugar-cane production in Brazil dates from the colonial period. Now Brazil is the
world’s largest sugar exporter and since 1920 it has been developing studies regarding the use of the
ethanol cane as a renewable fuel. However, the sugar cane production is considered as an activity
that causes damage to the environment, such as, reduction of the biodiversity; fires, the
contamination of water and the soil, production of a stench residue called vinasse. This study,
therefore, intends to comment the alternative actions already developed by the sector to reduce the
environmental impacts. The use of the vinasse in the production process to supply fertilization and
balance to the soil reduces production costs. The sugar cane and wheat rotation eliminates, in the
case of Brazil, the choice between the ethanol production and the reduction of food production.
There are therefore governmental actions needed that stimulate programs regarding the reduction of
impacts on the environment in the production of sugar cane.
Key words: sugar cane; ethanol; environment.

INTRODUÇÃO
A produção de cana-de-açúcar no Brasil remota ao inicio da organização econômica do
período colonial, com o principal pólo de produção no Nordeste nos séculos XVI e XVII.
Atualmente o Brasil é o maior exportador de açúcar mundial e desde os anos 1920 desenvolve
estudos para o uso do etanol de cana como um combustível renovável.
No início do século XXI, notadamente os EUA e UE discutem e promovem o uso de
políticas específicas de estímulo à substituição de combustíveis fósseis por fontes renováveis de
origem de biomassa. A produção de etanol brasileira, de baixo custo e alta produtividade, dadas as
vantagens existentes junto aos recursos naturais e mão de obra, é destinada principalmente para o
mercado norte americano e o mercado europeu.
No Brasil desde os anos 70 a produção do etanol representa uma alternativa ecológica
geradora de emprego e renda. Os primeiros passos rumo ao etanol no Brasil foram dados pós-crise
do petróleo nos anos 70 com o Pró-Alcool e um novo boom de crescimento da produção ocorreu a
partir de do inicio dos anos 2000 com a introdução dos veículos bicombustíveis no mercado.
Segundo Bastos (2007) o etanol fabricado no Brasil implica no uso da biomassa
lignocelulósica proveniente de sobras e resíduos de produtos naturais - tais como, no caso da cana
Fórum Internacional do Meio Ambiente - A conferência da Terra 713

de açúcar, o bagaço, as pontas e a palha. Essa produção, portanto, tem como característica o
aproveitamento de toda a sobra da cana, por exemplo, destinada a produção do açúcar.
Segundo dados do Ministério do Desenvolvimento, Indústria e Comércio Exterior
(MDIC/SECEX), em 2007 o Brasil exportou 3,4 bilhões de litros de etanol. A União Européia e os
Estados Unidos foram os principais compradores, importando 25% e 29% desse volume,
respectivamente.
Desde 2002 a produção mundial de etanol aumentou 50% e a evolução deve continuar
liderada pela produção no Brasil, com o etanol proveniente da cana de açúcar e nos Estados Unidos
(EUA), com o etanol proveniente do milho, sendo ampliada pelo consumo dos países membros da
União Européia (UE), de acordo com dados da PNUD (2006).
O etanol da cana-de-açúcar é o mais atraente entre os usos comerciais de energia
alternativa no mundo, notadamente por causa de sua autonomia energética. São cerca de nove
unidades de energia renovável para cada unidade de energia fóssil usada na sua produção. O Brasil
é líder na produção de cana-de-açúcar e pode gerar divisas com a produção de etanol expandindo
suas lavouras em milhões de hectares sem desmatamento e sem avançar em áreas destinadas a
outras culturas. O país pode, por exemplo, aproveitar os 200 milhões de hectares de pastagens e
incentivar a rotação de culturas.
A literatura que trata dos impactos ambientais como as emissões atmosféricas,
contaminação nas águas e no solo ainda é muito restrita. Entretanto, existem empecilhos para as
exportações do etanol produzido no Brasil para os EUA e União Européia devido a produção do
etanol de cana ser considerada uma atividade geradora de danos ambientais.
Mediante este cenário, este estudo se propõe a comentar a literatura atual existente sobre a
produção de cana de açúcar e etanol de cana no Brasil, e as ações alternativas já discutidas e
desenvolvidas pelo setor sucroalcooleiro para redução dos impactos ambientais gerados pela
atividade.
A pesquisa centra-se em impactos da queima de cana, do uso da vinhaça e da rotação de
outras culturas com a cana e o impacto gerado pelo aumento da produção de etanol para exportação
no Brasil. Além desta introdução, o artigo está dividido em mais duas sessões: uma discute os
impactos ambientais gerados a partir da produção do setor sucroalcooleira no Brasil e outra que
discute algumas alternativas para a redução dos danos ambientais da produção. Por fim, são
apresentadas as considerações finais e as referencias.

IMPACTOS GERADOS A PARTIR DA PRODUÇÃO DE CANA DE AÇÚCAR NO BRASIL.


O setor sucroalcooleiro tem apresentado altas taxas decrescimento da produção de álcool e
de açúcar no Brasil. O Brasil é o maior exportador mundial de açúcar e de etanol e produção de
cana de açúcar está centrada no Centro-Sul e Norte-Nordeste do país, veja-se Gráfico 1.
O resultado da produção na região Centro-Sul é decorrente do parque industrial forte, base
para pesquisa agropecuária tradicional, enquanto na região Norte-Nordeste a atividade enfrenta
dificuldades de topografia e clima, o que implica em menor mecanização, além de sofrer também da
falta de política agrícola. (WAACK et al. 1998).
Fórum Internacional do Meio Ambiente - A conferência da Terra 714

Quantidade (em tonelada)


400.000.000

300.000.000

200.000.000

100.000.000

0
93/94 94/95 95/96 96/97 97/98 98/99 99/00 00/01 01/02 02/03 03/04 04/05 05/06
Anos

CENTRO-SUL NORTE-NORDESTE (*)

Gráfico 1 – Produção de cana-de-açúcar (em toneladas) nas regiões Centro-sul e Norte-nordeste em


1993 a 2006. Fonte: Elaboração própria a partir dos dados da UNICA (2007).

Quanto à produção de etanol, o Brasil possui 376 fábricas de açúcar e de etanol cadastradas
no Ministério da Agricultura, Pecuária e Abastecimento (MAPA), segundo levantamento divulgado
em 08 de abril de 2008. Do total, 241 das unidades são produtoras mistas (fazem os dois produtos),
120 produzem exclusivamente etanol e 15 processam apenas açúcar. O estado de São Paulo é líder
no ranking com 178 fábricas, seguido de Minas Gerais e do Paraná, com 31 unidades cada.
A região Nordeste é bem representada pelos estados de Alagoas, Pernambuco e Paraíba.
Alagoas está em terceiro lugar, com 25 fábricas, enquanto Pernambuco conta com 24 e Goiás com
21 fábricas. O estado da Paraíba possui 9 unidades, das quais 7 produzem exclusivamente álcool,
1 produz somente açúcar e 2 são mistas (MAPA, 2007). O Gráfico 2 apresenta a produção de etanol
no Brasil.

M3
25,000,000
20,000,000
15,000,000
10,000,000
5,000,000
0
*
19 995

19 996

97 7

98 8
19 999

00 0

01 1
20 002

03 3

04 4
20 005

20 006

07 07
19 99

19 99

20 00

20 00

20 00

20 00

8
20 /20

00
/1

/1

/1

/1

/1

/2

/2

/2

/2

/2

/2

/2

/2
94

95

96

99

02

05

06
19

N/NE C/SUL Brasil

Gráfico 2 – Produção de etanol (em metros cúbicos) nas regiões Centro-sul e Norte-nordeste em
1994 a 2008. Fonte: Elaboração própria a partir dos dados do MAPA (2008).

Langowski (2007) destaca que os principais impactos ambientais gerados no processo


produtivo da produção de cana-de-açúcar, seja para a produção de açúcar ou etanol, podem ser
divididos em duas categorias: os da fase agrícola e os da fase industrial. São destacados como
impactos gerados na fase agrícola: redução da biodiversidade em função do desmatamento e da
monocultura; contaminação das águas e do solo devido o uso de defensivos e fertilizantes;
compactação do solo devido a maquinaria usada; erosão do solo e conseqüente assoreamento; e o
efeito das queimadas implicando no aumento de gases que provocam o efeito estufa.
Sobre a fase industrial destaca que a atividade de produção industrial da cana de açúcar
utiliza a água em larga escala e gera resíduos da produção tais como a vinhaça e o seu odor no
período de fermentação e destilação do caldo para a produção de álcool.
Fórum Internacional do Meio Ambiente - A conferência da Terra 715

Além dos problemas ambientais, Langowski (2007) aponta impactos negativos sociais tais
como a concentração da posse da terra. Há que se destacar neste âmbito as condições de trabalho no
manejo e corte da cana e as baixas remunerações pagas aos operários do setor.
Yevich & Logan (2003) apud Ribeiro (2008), em estudo global para o ano de 1985,
estimaram que 400 teragramas99 de resíduos agrícolas eram queimados nos campos das três grandes
regiões em desenvolvimento, África, Ásia e América Latina, e que o Brasil era o principal gerador
de resíduos agrícolas na América Latina, notadamente de palha de cana-de-açúcar.
Existem poucos estudos sobre os atuais impactos ambientais potenciais da queima da cana-
de-açúcar no Brasil. O trabalho divulgado mais recentemente foi o de Ometto et al (2005) que
fizeram estudo sobre a quantidade de gases emitidos por município no Brasil em 1996. Os autores
apresentaram a distribuição espacial de alguns potenciais de impactos das emissões de monóxido de
carbono (CO), metano (CH4), óxidos de nitrogênio (NOx) e óxido nitroso (N2O) causadas pela
queimada de cana-de-açúcar, avaliando as seguintes categorias: aquecimento global, formação de
ozônio troposférico, acidificação e toxicidade humana.
O estudo revelou que a região Centro-Sul do Brasil, onde a área de concentração de cana-
de-açúcar é alta, foi a grande fonte dos potenciais de impactos avaliados para 1996. A Figura 1
mostra que a Região Nordeste respondeu por uma parcela do volume dos gases emitidos pela
queima de cana-de-açúcar naquele ano.

Figura 1: Distribuição espacial de impactos ambientais potenciais da queima da cana-de-açúcar no


Brasil em 1996. Fonte: Embrapa

O governo do maior estado produtor de cana-de-açúcar do Brasil, o Estado de São Paulo,


tem se utilizado de ações em conjunto com o setor sucroalcooleiro para o combate aos danos
ambientais. Em setembro de 2002, o governo paulista promulgou a Lei No. 11.241 estipulando um
cronograma gradativo de extinção da queima da cana-de-açúcar até o ano de 2021 em áreas
mecanizáveis, e até 2031 em áreas não mecanizáveis.

99
1 Teragrama equivale a 106 toneladas; a 109 quilogramas e a 1012 gramas.
Fórum Internacional do Meio Ambiente - A conferência da Terra 716

Mais recentemente, como ação estratégica em resposta a países que ameaçam impor
barreiras técnicas aos produtos brasileiros, lançou o Protocolo Agroambiental. O Protocolo é um
acordo de cooperação, assinado em junho de 2007, entre o governo do Estado de São Paulo e a
União da Agroindústria de São Paulo (ÚNICA) que, entre outras medidas100 para o controle de
impactos ambientais, antecipa o prazo final para a eliminação da queima da cana-de-açúcar no
Estado de São Paulo de 2021 para 2014 e de 2031 para 2017. Apesar de o Protocolo Agroambiental
não ter força de lei e não ser obrigatório houve grande aceitação por parte das usinas.101
Neste cenário, a Associação Nacional de Fabricantes de Veículos Automotores
(ANFAVEA) já apontou o Protocolo Agroambiental como fator relevante que está contribuindo
para impulsionar a mecanização na lavoura em 2007 e 2008, notadamente no Estado de São Paulo.
Entretanto, não se pode perder de vista que as inovações tecnológicas e as mudanças no
ambiente institucional geram impactos sobre o mercado de trabalho no setor. Moraes (2007) destaca
a relevância de se considerar que existe um balanço entre a redução das queimadas e o número de
empregados envolvidos com a colheita manual da cana-de-açúcar.
Uma colheitadeira substitui ao redor de 80 cortadores de cana e a União da Indústria de
Cana-de-Açúcar (ÚNICA), considerando que não haja colheita manual a partir da safra 2015/2016
no Estado de São Paulo, estima que entre as safras de 2006/2007 e 2020/2021 haverá uma redução
de 114 mil empregos.
Considerando tais números, Moraes (2007) observa que “para que parte dos empregados
agrícolas seja realocada para as atividades do corte mecânico, é maior grau de escolaridade que a da
grande maioria dos empregados” tendo em vista que a maior parte dos trabalhadores da lavoura
canavieira tem poucos anos de estudo.
Uma peculiaridade do Nordeste destacada por Silva (2007) é que o processo de
mecanização da colheita tem ocorrido de forma mais lenta na região devido à topografia inadequada
de algumas áreas cultivadas. Se por um lado essa característica dificulta a expulsão total dos
trabalhadores da lavoura canavieira, por outro afeta a competitividade da região em termos de
produtividade.

ALTERNATIVAS PARA A REDUÇÃO DOS DANOS AMBIENTAIS DA PRODUÇÃO


SUCROALCOOLEIRA.
A vinhaça usada como nutriente para aumentar a produtividade da cana.
A vinhaça é o principal resíduo líquido de uma usina sucroalcooleira e representa uma
fonte de problemas ambientais por ser um efluente altamente poluidor de cursos d’água e do lençol
freático e apresentar-se em grande volume, o que dificulta seu transporte e eliminação. Na fase atual
de expansão do setor e visando a atender simultaneamente as exigências ambientais e a necessidade
de otimizar os resultados da empresa, novos estudos, equipamentos e técnicas estão sendo
desenvolvidos para o uso adequado deste resíduo.
Pereira (2008) destaca que desde os incentivos à pesquisa durante o Proálcool em 1975,
várias inovações tecnológicas foram introduzidas no setor sucroalcooleiro tanto na etapa agrícola
quanto na industrial para aumentar a produtividade e garantir sua competitividade. Em 1975 o setor
produzia aproximadamente três metros cúbicos por hectare de cana-de-açúcar plantada alcançando
aproximadamente seis metros cúbicos em 2005, um crescimento de 100% na produtividade do
setor.

100
“Outras medidas referem-se à não utilização da queima na área de expansão de canaviais; não permitir queima de
subprodutos (por exemplo, bagaço de cana) a céu aberto; proteger as matas ciliares; proteger e reflorestar as nascentes;
desenvolver plano de conservação do solo e dos recursos hídricos; adotar boas práticas para o descarte de embalagens
vazias e minimizar a poluição atmosférica na indústria.” (MORAES, 2007)
101
Em novembro de 2007, 125 unidades produtoras de açúcar e de álcool já tinham aderido ao protocolo agroambiental,
superando a meta prevista pela Secretaria do Meio Ambiente, que era de 100 a 120 unidades em 2007. (Jornal O Estado
de São Paulo, 22/11/2007)
Fórum Internacional do Meio Ambiente - A conferência da Terra 717

Pereira (2008) ainda apresenta dados de subprodutos gerados atualmente na etapa


industrial de uma usina autônoma, produzindo somente álcool102, tais como, a produção do bagaço,
que representa 270 quilogramas por tonelada (Kg/ton) de cana esmagada; a torta de filtro - 35
kg/TC (quilograma por tonelada de cana); a vinhaça - 10 litros de vinhaça por litro de álcool; águas
residuárias – 1,5 m3/TC e outros subprodutos (lodo, cinzas, palha, etc.) - 190 kg/TC.
Segundo o Centro de Tecnologia Canavieira (CTC), a adição da vinhaça in natura em
áreas de plantio de cana, o que atualmente é chamado de fertirrigação, representa uma importante
opção para o aproveitamento deste resíduo. Destaca-se que grande parte dos solos brasileiros
apresenta baixa fertilidade e a vinhaça, por ser um produto rico em matéria orgânica, pode suprir
essa deficiência. Uma vantagem sobre a adubação mineral é que a vinhaça fornece nutrientes
apenas para a planta enquanto, segundo os pesquisadores, a vinhaça aumenta a produtividade da
cana, a longevidade do canavial e melhora as propriedades físicas, químicas e biológicas do solo.
(Idea News, 2007)
Outro diferencial que tem sido apontado como relevante para o uso da vinhaça é que esta
por ser rica em água ajuda a garantir o equilíbrio hídrico do solo, proporcionando um suprimento
importante para a rebrota ou nascimento da cana e mantendo o canavial em boas condições no
período da estiagem.
Por outro lado, Szmrecsanyi (1994) apud Piacente (2004) há mais de uma década já
destacava que o uso da vinhaça no campo é prática antiga e bem disseminada, mas que não pode ser
excessiva ou indiscriminada dado que seu potencial poluidor compromete o meio ambiente.
Já existem usinas brasileiras que aplicam a vinhaça em 70% da sua área de cultivo ao
mesmo tempo em que existem outras unidades com áreas de fertirrigação muito abaixo deste valor.
Destaca-se ainda que uma fertirrigação com vinhaça bem feita respeita as dosagens calculadas de
acordo com as características físico-químicas de cada tipo de solo e que, no âmbito das usinas,
projetos de fertirrigação que levem em conta os riscos ambientais envolvidos devem ser elaborados
por profissionais capacitados.
Constata-se, assim, que a prática da fertirrigação das usinas deve ser rigidamente
controlada para representar efetivamente uma alternativa viável na minimização dos problemas
ambientais e aumentar o retorno econômico na forma de melhorias na produtividade.
Um fator que seguramente ampliará a incorporação de novas tecnologias de produção
agrícola e automação da produção industrial do etanol em sintonia com as exigências ambientais é o
processo de aumento da participação estrangeira no setor.
A participação de empresas estrangeiras no setor sucroalcooleiro nacional com foco na
produção de etanol é significativa e crescente no país. De acordo com a Datagro103, no fim de
agosto de 2007 o capital estrangeiro detinha cerca de 12% de toda a cana-de-açúcar produzida no
Brasil com perspectivas de alcançar 25% nos anos seguintes por conta de novos investimentos
anunciados. (Idea News, 2007)
A região Nordeste também vem atraindo os investimentos estrangeiros. A LDC
Bioenergia, empresa brasileira do grupo francês Louis Dreyfus, adquiriu, em fevereiro de 2007 as
cinco unidades do grupo Tavares de Melo, sendo que duas delas estão localizadas no Nordeste: a
Usina Estivas no Rio Grande do Norte e a destilaria autônoma de álcool Giasa na Paraíba. As outras
três estão situadas no Centro-Oeste do país. (Jornal Cana, 2007)
A abertura de capital, uma nova tendência entre as usinas brasileiras, tem sido a porta de
entrada de boa parte dos aportes de estrangeiros no país. Segundo informação divulgada pela União
dos Produtores de Bioenergia (UDOP), as expectativas atuais são as de que o setor passará por um
processo de compra e fusão de empresas, e que as fusões resultarão em maior concentração da
produção e aumento da participação estrangeira.

102
Dados coletados em uma unidade fabril que realiza esmagamento diário de 8100 TC/dia (tonelada de cana por dia) e
cuja produção de álcool é 82 l/TC (litros por tonelada de cana).
103
Empresa de Consultoria em nível mundial e que desde 1985 tem assessorado o Governo Brasileiro em iniciativas
relacionadas com planejamento energético, desregulamentação do setor sucroalcooleiro e negociações internacionais do
comércio de commodities agrícolas.
Fórum Internacional do Meio Ambiente - A conferência da Terra 718

A rotação e a consorciação de culturas com a cana gera divisas sem prejudicar a produção de
alimentos
Pesquisas feitas na Fundação Cândido Rondon (UFMT) apontam para a consorciação ou a
rotação de cana-de-açúcar com feijão, milho, amendoim, soja ou outra cultura é uma alternativa
vantajosa para o setor. A Embrapa mostra que a consorciação com feijão já é tradicional em alguns
lugares, como no norte do Estado do Rio de Janeiro, e gera uma redução de 35% nos custos da
plantação do canavial.
Na região de Ribeirão Preto, com o desenvolvimento de tecnologias específicas, as
rotações de cana/soja e cana/amendoim têm possibilitado redução de 50% dos custos da renovação
da cana. Nessa região renovam-se anualmente 60.000 hectares de cana e metade dessa área é
utilizada para rotação com outras culturas, principalmente o amendoim. A estratégia transformou a
região em uma das maiores produtoras de amendoim do Estado de São Paulo, que é o grande
produtor brasileiro dessa oleaginosa.
De acordo com a Fundação Cândido Rondon (UFMT) percebe-se que há muitos benefícios
indiretos obtidos com a rotação e a consorciação de culturas com a cana, quais sejam: “a
possibilidade de manter o empregado na época da entressafra; a diminuição da erosão do solo, que
passa a ter uma cobertura vegetal mais intensa e por um período maior; a incorporação de matéria
orgânica ao solo; a fixação de nitrogênio no solo, em caso de rotação ou intercalação com
leguminosas; e a redução de invasoras”.
A soja já é outra opção de rotação no estado de São Paulo. Por sua vez, a Cocamar, uma
cooperativa agroindustrial presente no estado do Paraná, está estimulando seus cooperados a
adotarem o sistema de rotação da cana com a soja. Ressalta que cerca de 25 mil hectares de terra
ficam anualmente sem aplicação entre os meses de junho e fevereiro e que além dos ganhos
agronômicos, os benefícios econômicos serão expressivos com os atuais preços da soja em alta.

CONSIDERAÇÕES FINAIS
O setor sucroalcooleiro brasileiro passa por um de seus melhores momentos, recebendo
novos investidores e projetos que apontam para horizontes promissores, principalmente no que diz
respeito a produção de etanol. Contudo, a produção da cana-de-açúcar tem recebido críticas
principalmente em vista de informações que se não forem esclarecidas representam um risco de
comprometer a imagem do setor diante da comunidade mundial.
São exemplos de impactos ambientais associados a produção de cana de açúcar a redução
da biodiversidade devido a monocultura; o efeito das queimadas e a emissão de gases poluentes que
provocam o efeito estufa, a contaminação das águas e do solo devido ao processo de produção e
ainda a utilização de água em larga escala gerando a produção da vinhaça, um resíduo de forte odor.
Entretanto, já existem soluções alternativas que transformam problemas em soluções,
como é o caso da reutilização da vinhaça no processo produtivo com o objetivo de fornecer
nutrientes e equilíbrio hídrico para o solo, sendo uma economia de escala, via redução dos custos de
produção.
A saída para o problema da monocultura e o empobrecimento do solo e da biodiversidade
está ligada a rotação de culturas. Percebe-se que a expansão da rotação de cana com grãos
representa uma relevante estratégia para o setor sucroalcooleiro em termos de benefícios
agronômicos, econômicos e notadamente de imagem ao mostrar sua capacidade de produzir
alimentos. Essa solução elimina no caso do Brasil o trade-off entre a produção de etanol e a redução
da produção de alimentos.
Mediante este cenário, é possível apontar alguns direcionamentos específicos, em termos
de políticas públicas:
(i) instituição de leis específicas em níveis estaduais e municipais, fiscalização rigorosa e
controle estrito da produção e utilização deste resíduo como fertilizante, a exemplo da experiência
do governo paulista e do setor produtor.
Fórum Internacional do Meio Ambiente - A conferência da Terra 719

(ii) oferta de uma linha de crédito específica para o investimento em projetos de tecnologia
para atingir bons resultados econômicos respeitando as leis ambientais;
(iii) criação de programas governamentais envolvendo as unidades produtores de etanol,
universidades e centros de pesquisa para estimular a adoção de sistemas de fertirrigação viáveis
técnica e economicamente e que efetivamente reduzam os riscos de contaminação do meio
ambiente pelo subproduto; e incentivar a prática de rotação de culturas da cana com grãos.
(iv) programas de capacitação para recolocação da mão de obra desempregada no setor em
razão da mecanização da lavoura.

REFERÊNCIAS BIBLIOGRÁFICAS
INSTITUTO de Desenvolvimento Agroindustrial. Idea News. Ribeirão Preto, 2007.
BASTOS, V. D. Etanol, alcoolquímica e biorrefinarias. BNDES Setorial, Rio de Janeiro: BNDES,
n. 25, p. 5-38, mar. 2007.
Langowski, E. Queima da cana – uma prática usada e abusada. 2007. Disponível em:
<http://www.apromac.org.br/QUEIMA%20DA%20CANA.pdf >. Acesso em: 11 abr. 2008.
MORAES, M. A. F. D. O mercado de trabalho da agroindústria canavieira: desafios e
oportunidades. Econ. Apl., Ribeirão Preto, v. 11, n. 4, 2007. Disponível em:
<http://www.scielo.br/scielo.php?script=sci_arttext&pid=S1413-
805020070004080502007000400008&lng=en&nrm=iso>. Acesso em: 12 abr. 2008.
PAIVA, L. “O investidor continua gostando do setor.” Revista CanaMix. Ano 1, v. 1, p.8-10, 2008.
PEREIRA, C. de L. F. Avaliação da sustentabilidade ampliada de produtos agroindustriais. Estudo
de caso: suco de laranja e etanol. Campinhas, 2008. 268 f. Tese (Doutorado) – Faculdade de
Engenharia de Alimentos, Universidade Estadual de Campinhas, 2008.
Piacente, F. J.; Piacente E. A. Desenvolvimento sustentável na agroindústria canavieira: uma
discussão sobre resíduos. In: 1o Seminário Internacional Ciência e Tecnologia na América Latina: a
universidade como promotora do desenvolvimento sustentável, 2004, Campinas. Anais
eletrônicos... Campinas: UNICAMP, 2004. Disponível em:
<http://www.cori.unicamp.br/IAU/meio4.htm>. Acesso em: 10 abr. 2008.
RIBEIRO, H. Queimadas de cana-de-açúcar no Brasil: efeitos à saúde respiratória. Revista Saúde
Pública, São Paulo, v. 42, n. 2, 2008. Disponível em:
<http://www.scielosp.org/scielo.php?script=sci_arttext&pid=S0034-
89102008000200026&lng=pt&nrm=iso>. Acesso em: 10 abr. 2008.
Ometto, A. R.; Mangabeira, J. A. de C.; Hott, M. C. Mapeamento de potenciais de impactos
ambientais da queima de cana-de-açúcar no Brasil. In: XII Simpósio Brasileiro de Sensoriamento
Remoto, 2005, Goiânia. Anais eletrônicos... Goiânia: INPE, 2005. Disponível em:
<http://marte.dpi.inpe.br/col/ltid.inpe.br/sbsr/2004/11.19.16.07/doc/2297.pdf >. Acesso em: 10 abr.
2008.
PNUD. Prorograma das Nações Unidas para o Desenvolvimento. Disponível em:
<http://www.pnud.org.br/idh/>. Acesso em: 18 mar. 2008.
Silva, A. B. S. E. da. Panorama da produção do setor sucoalcooleiro no Brasil: uma análise do
período 1996 – 2006. 2007. 42 f. Monografia (Graduação) – Centro de Ciências Sociais Aplicadas,
Universidade Federal da Paraíba, 2007.
WAACK, S. R. et al. Competitividade do sistema agroindustrial da cana-de-açúcar. São Paulo:
PENSA/FIA/FEA/USP: Jul. 1998. Disponível em:
<http://www.fundacaofia.com.br/pensa/pdf/ralatorios/ipea/vol_v_canaparte1.pdf. >. Acesso em: 16
abr. 2007.

Sites consultados
ANFAVEA – Associação Nacional dos Fabricantes de Veículos Automotores. Disponível em:
<www.anfavea.com.br>.
DATAGRO – Datagro Consultoria e acessoria Empresarial. Disponível em:
<www.datagro.com.br>.
Fórum Internacional do Meio Ambiente - A conferência da Terra 720

EMBRAPA – Empresa Brasileira de Pesquisa Agropecuária. Disponível em:


<http://www.embrapa.br>
Fundação Cândido Rondon. Disponível em:<http://www.fcr.org.br>.
JORNAL CANA. Disponível em: <http://www.jornalcana.com.br/Conteudo/SAC.htm>
MAPA – Ministério da Agricultura, Pecuária e Abastecimento. Disponível em:
<www.agricultura.gov.br>.
UDOP - União dos Produtores de Bioenergia. Disponível em: < http://www.udop.com.br>.
ÚNICA - União da Agroindústria de São Paulo. Disponível em: <http://www.unica.com.br>.
Fórum Internacional do Meio Ambiente - A conferência da Terra 721

PRODUÇÃO DE PEIXES DE ÁGUA DOCE NA ALDEIA INDÍGENA POTIGUARA DE


JARAGUÁ, RIO TINTO, PARAÍBA

Aline de Sousa Silva


Universidade Federal da Paraíba - Centro de Ciências Exatas e da Natureza Departamento de Sistemática e Ecologia.
Campus Universitário, João Pessoa, PB/Brasil
Jane Enisa Ribeiro Torelli de Souza
Universidade Federal da Paraíba - Centro de Ciências Exatas e da Natureza Departamento de Sistemática e Ecologia.
Campus Universitário, João Pessoa, PB/Brasil janetorelli@yahoo.com.br
Randolpho Sávio de Araújo
Universidade Federal da Paraíba - Centro de Ciências Exatas e da Natureza Departamento de Sistemática e Ecologia.
Campus Universitário, João Pessoa, PB/Brasil

RESUMO
O presente trabalho tem como objetivo capacitar piscicultores indígenas para o
conhecimento da aplicação de técnicas de piscicultura em viveiro escavado, como forma de
aumentar a produção pesqueira na região para suprir as necessidades nutricionais e a subsistência da
comunidade indígena, bem como, minimizar as ações antrópicas no ambiente natural. Foram
capacitados 5 atores indígenas todos do sexo masculino, na faixa etária de 21 a 30 anos, casados,
com grau de escolaridade do Ensino Fundamental I incompleto. Inicialmente os atores realizaram a
escavação e limpeza do viveiro, e em seguida, a desinfecção e a fertilização utilizando esterco
bovino. Antes e após o peixamento os atores monitoraram a qualidade da água, como também
acompanharam o crescimento das espécies de tilápia nilotica (Oreochromis niloticus) e carpa
comum (Cyprinus carpio) no viveiro. Com base nos resultados obtidos, os atores constataram um
desenvolvimento satisfatório para as duas espécies durante todo o período de cultivo. Concluí-se
que, a capacitação proporcionou aos atores indígenas um maior aprimoramento do conhecimento
acerca da piscicultura, tornando-os capacitados a aumentar suas opções de produção, com
perspectivas de gerar um maior rendimento para toda a comunidade.
Palavras-chaves: capacitação, piscicultura, viveiro escavado

INTRODUÇÃO
O homem está constantemente agindo sobre o meio onde vive a fim de sanar suas
necessidades e desejos. No entanto, essas ações sobre o ambiente, natural ou construído, afetam a
sua qualidade de vida.
Dentre as ações de intervenção do homem no meio, a redução dos recursos pesqueiros
marinhos e estuarinos se dá pela destruição gradativa do meio ambiente, oriundo da poluição, sobre-
exploração, aterro de manguezais, dentre outros impactos (Dias et al, 2007).
Estes processos têm se concentrado principalmente nas áreas mais utilizadas pela pesca
artesanal, como a plataforma continental e águas costeiras rasas de manguezais e estuários,
incidindo no atendimento das necessidades protéicas alimentares e econômicas dos pescadores, que
retiram desses ecossistemas, parte de sua subsistência.
Diversos estudos apontam a crise do setor pesqueiro e a necessidade de opções
econômicas, ambientalmente sustentáveis, que visem a reduzir a pressão extrativa sobre os estoques
de peixes (Sanches et al, 2006).
Com o crescimento da população e a tendência mundial na busca de alimentos saudáveis e
indicados para saúde humana, o consumo do pescado tem aumentado no Brasil, o que é importante
não apenas em termos de mudança de hábitos alimentares, mas também, pelo valor nutricional
desse alimento.
Segundo a Agencia Nacional das Águas (ANA), o Brasil que detém considerável malha
fluvial e extensa costa marítima, apresenta quedas sucessivas de produção a cada ano, com diversas
espécies estando ameaçadas de extinção, por este motivo, não consegue atender à demanda interna
de consumo de pescado.
A piscicultura é uma das alternativas que vem minimizar o consumo e as ameaças de
extinções dos estoques pesqueiros, utilizando-se de diversas técnicas e formas de manejo que torna
Fórum Internacional do Meio Ambiente - A conferência da Terra 722

possível o desenvolvimento do pescado (peixes) em menor tempo de criação, de forma a atingir o


tamanho e o peso ideal para o consumo humano e fonte de renda para a população.
Segundo Castagnolli (1992) a piscicultura pode ser viabilizada a partir de diferentes
sistemas produtivos do tipo, mono e policultivo, que se diferenciam quanto à forma do
aproveitamento dos recursos alimentares disponíveis no ambiente, o uso adequado de espécies com
diferentes hábitos alimentares e uma melhor utilização do espaço físico na coluna d’água, de forma
a melhorar o desempenho no crescimento dos peixes, para suprir as necessidades nutricionais da
população de baixa renda, bem como, minimizar o desperdício e os impactos ambientais.
Devido ao escasso conhecimento da comunidade indígena a cerca das técnicas aplicadas na
piscicultura, fez-se necessário a capacitação dos atores como forma de proporcionar uma maior
sustentabilidade dos recursos pesqueiros e um melhor aproveitamento do pescado produzido.
O presente trabalho teve como objetivo capacitar os atores da aldeia Potiguara de Jaraguá
para a instalação de um viveiro escavado, monitoramento da qualidade da água e do crescimento
das espécies de peixes Oreochromis niloticus Linnnaeus, 1758 (tilápia nilótica) e Cyprinus carpio
Linnnaeus, 1758 (carpa comum), de modo a suprir as necessidades nutricionais e a subsistência da
comunidade indígena, bem como minimizar as ações antrópicas no ambiente natural.

MATERIAL E MÉTODOS
O presente trabalho foi subdividido em dois momentos e locais diferentes da aldeia
indígena de Jaraguá, no município de Rio Tinto, Estado da Paraíba. A primeira etapa (mobilização e
a capacitação teórica) ocorreu na Escola Estadual Indígena do Ensino Fundamental Cacique
Domingos Barbosa dos Santos, durante o primeiro mês da execução do trabalho, e a segunda etapa
(capacitação prática) foi desenvolvida diretamente no viveiro escavado pré-existente na aldeia com
40 x 22 x 0,70 m3 de área (Fig. 1), durante um período de 8 meses, a partir de novembro de 2006.

Figura 1. Viveiro de piscicultura da aldeia Potiguara, Jaraguá, Rio Tinto/PB.


A primeira etapa constou da mobilização dos atores para o conhecimento dos aspectos
sócio-econômico e cultural, que foram obtidos a partir da aplicação de questionários pré-
formulados, e posteriormente, foi realizada a capacitação teórica a cerca das técnicas aplicadas a
piscicultura, e informações sobre a escolha das espécies de peixes de melhor potencial para o
cultivo através de palestras, aulas expositivas e debates.
Na capacitação prática, os atores aplicaram as técnicas apresentadas durante a capacitação
teórica, para a preparação e instalação do viveiro de piscicultura (escavação, limpeza, fertilização
com esterco bovino e o abastecimento), em seguida, o monitoramento da qualidade da água e o
crescimento dos peixes.
Passado a fase de instalação do viveiro, os atores verificaram quinzenalmente as condições
físico-químicas da água através durante todo o período do cultivo, utilizando o kit colorimétrico
ALCON (para a verificação do pH, oxigênio dissolvido, amônia e nitrito), bem como, a medição da
temperatura da superfície da água, através de um termômetro digital, e a transparência da lâmina
d´água do viveiro, fazendo uso do disco de Secchi.
Também foi monitorado os fatores biológicos quinzenalmente através de coletas da água
do viveiro realizadas pelos atores e analisados pela equipe do trabalho (EDMONSON, 1959;
GERMAIN, 1981; MENEZES & DIAS, 2001)
Fórum Internacional do Meio Ambiente - A conferência da Terra 723

Com as condições ambientais favoráveis ao cultivo, foi dado inicio o peixamento, com
alevinos de espécies de peixes pré-selecionadas, as quais passaram por uma biometria para a
determinação do comprimento e peso total, com o intuito de conhecer a biomassa inicial do viveiro.
O acompanhamento do desempenho no crescimento dos peixes foi realizado mensalmente
através da biometria de 10% da biomassa total presente no viveiro, para o conhecimento da
biomassa total e a correção da quantidade da ração a ser administrada no viveiro.
Os espécimes foram alimentados até os 30 primeiros dias com alimento natural oriundo do
florescimento do Fito e Zooplâncton produzidos a partir da fertilização do solo do viveiro. E após o
trigésimo dia do cultivo dos peixes foi adicionado ração comercial (PURINA) como complemento
alimentar.

RESULTADOS E DISCURSSÕES
Aspectos sócio-econômicos e culturais dos atores da aldeia Potiguara de Jaraguá, Rio
Tinto, PB.
Foram entrevistados um total de 5 atores indígenas da aldeia Potiguara, representados em
sua maioria por uma faixa etária entre 21 e 30 anos de idade, todos casados e com nível de
escolaridade até o 5º ano do Ensino Fundamental.
Os atores registraram como ocupações principais a atividade da pesca e a agricultura,
podendo ocorrer uma inversão de prioridades dependendo da sazonalidade das marés do Rio
Mamanguape.

Monitoramento dos fatores físico, químicos e biológicos da água do viveiro


Com a instalação do viveiro, os atores analisando a qualidade da água, constataram que, os
resultados obtidos referentes as condições físico-químicas apresentaram padrões adequados para o
cultivo de peixes, segundo Proença & Bittencourt, (1994); Sipauba-Tavares, (1995), desde antes e
após o peixamento (Tabela I).

Tabela I. Média bimestral dos parâmetros físicos e químicos da água do viveiro durante o período
de capacitação dos atores
Parâmetros/meses Dez/2006 Fev2007 Abril/2007 Jun2007 Jul/2007

Os
Temperatura (ºC) 26,5 26 26 25 25
fatores
Oxigênio dissolvido (mg/l) 8,0 8,0 11,0 7,5 5,5 biológicos
foram
pH 7,5 7,5 7,0 6,7 6,9 determinados a
Transparência da água (cm) 30 30 - - - partir da análise
dos
Nitrito (ppm) 0,0 0,0 0,0 0 0,15 microrganismos
Amônia (ppm) 0,0 0,0 0,15 0,25 0,15 presentes na
água do viveiro,
os quais foram representados por diferentes espécies de zooplâncton como: Nauplio e adulto de
microcrustáceos do tipo Copepoda (Ciclopoide e Calanoide), e Rotífera (Brachionus falcatus) sendo
esta a espécie mais freqüente (Fig. 2; além de algumas larvas de insetos aquáticos. Esses
microorganismos serviram de alimentos para os peixes durante os 30 primeiros dias do cultivo.

A C
Fórum Internacional do Meio Ambiente - A conferência da Terra 724

Figura 2. Fito e Zooplâncton presentes na água do viveiro: Diatomáceas - Pinnullaria sp. (A);
Synedra sp (B), Clorofíceas- Coelastrum sp.(C), Nauplio de microcrustáceo (Copepoda) (D).

O peixamento no viveiro foi realizado com a introdução pelos atores das espécies:
Oreochromis niloticus Linnnaeus, 1758 (tilápia nilótica) e Cyprinus carpio Linnnaeus, 1758 (carpa
comum), que foram obtidas na Estação de Piscicultura da EMPASA de Itaporanga/PB num total de
455 alevinos, com 262 e 193 indivíduos cada. (Fig. 3).

A B

Figura 3. Espécies selecionadas para o cultivo no viveiro de Jaraguá, Rio Tinto-PB (A) Cyprinus
carpio Linnnaeus, 1758 (carpa comum); (B) Oreochromis niloticus Linnnaeus, 1758 (Tilapia
nilótica).

De acordo com Castagnolli (1992), as espécies Tilápia nilótica e carpa comum, são peixes
de importância econômica, podem ser exploradas em sistemas de policultivo, por apresentarem
cadeia alimentar curta ou intermediária, dando resposta mais imediata produção, devido a sua
melhor aceitação a uma dieta complementar.
Salienta-se também que, estas espécies são caracterizadas pela sua rusticidade, possuem
carne saborosa com boa aceitação em todo o mundo (GURGEL, 1998).
Os atores realizaram a primeira biometria e a assepsia dos espécimes das referidas
espécies, onde verificaram o comprimento padrão e o peso total inicial dos lotes de Tilapia nilótica,
que tiveram como médias de 5,8 cm e 7,2 g, e da carpa comum de 5,5 cm e 9,5 g, respectivamente
(Fig. 4).
E em seguida, os atores introduziram os espécimes no referido viveiro, os quais passaram
por um período de adaptação de 30 dias.

20

15 Tilapia nilotica Carpa comum


15
11 15

10 9,5
7,2 6,6 10
5,8 7,72
Fórum Internacional do Meio Ambiente - A conferência da Terra 725

Figura 4 - Desempenho do crescimento da tilapia nilótica e a carpa comum em 30 dias de cultivo no


viveiro de Jaraguá- Rio Tinto - PB

Após esse período, os atores iniciaram o manejo para o monitoramento do crescimento e o


desenvolvimento corporal dos peixes, retirando do viveiro 10% do total de alevinos introduzidos
para serem submetidos a uma nova biometria, sendo posteriormente devolvidos ao mesmo viveiro
(Fig. 5).

Figura 5. Biometria dos peixes sendo realizado pelos atores

Após a despesca do viveiro constatou-se que, as espécies obtiveram padrões diferenciados


de crescimento, onde a Tilápia nilótica apresentou um incremento menor que a carpa comum tanto
em comprimento quanto em peso corporal, apesar das duas espécies terem um desenvolvimento
corporal bastante satisfatório durante todo o período de cultivo (Fig. 6).
Ganho em comprimento (cm)

500 20
Ganho em peso(g)

400 15

300
10
200
5
100

0 0
Carpa com um Tilapia nilotica Carpa com um Tilapia nilotica

Figura 6. Desempenho dos peixes no viveiro durante o período do cultivo.

CONCLUSÕES
As atividades propostas pelo presente trabalho, proporcionaram aos atores indígenas
aumentaram o conhecimento sobre a aplicação das diversas técnicas de piscicultura em viveiro,
Fórum Internacional do Meio Ambiente - A conferência da Terra 726

tornando-os capacitados a aumentar a produção do pescado local, com perspectivas de gerar uma
melhor sustentabilidade da comunidade.

REFERENCIAS BIBLIOGRÁFICAS
CASTAGNOLLI, N. Criação de peixes de água doce. Jaboticabal, FUNEP,189p. 1992.
DIAS, T.L.P.; ROSA, R.S. & DAMACENO, L.C.P. Aspectos socioeconômicos, percepção
ambiental e perspectivas das mulheres marisqueiras da Reserva de Desenvolvimento Sustentável
Ponta do Tubarão (Rio Grande do Norte, Brasil). Gaia Scientia, v.1. n.1. p.25-35. 2007.
EDMONSON, W. T. Freshwater Biology. 2ª ed. New York, London, John Wiley & Sons, INC.
1248p. 1959.
GERMAIN, H. Flore dês diatomées dês eaux douces et saumâtres. Société Nouvelle dês éditions
Boubée, Paris. 444p. 1981.
GURGEL, J. J. S. Potencialidades do cultivo da tilápia no Brasil. In: 1 CONGRESSO
NORDESTINO DE PRODUÇÃO ANIMAL, Anais... Fortaleza. p.345-352. 1998.
MENEZES, M. & DIAS, I. C. A. Biodiversidade de algas de ambientes continentais do estado Rio
de Janeiro. Museu Nacional do Rio de Janeiro. Série Livros, n. 9. 256p. 2001.
PROENÇA, C. E. M & BITTENCOURT, P. R. L. Manual de piscicultura tropical. Brasília:
IBAMA 195 p. 1994.
SANCHES, E. G.; HENRIQUES, M. B.; FAGUNDES, L. & SILVA, A.A. Viabilidade econômica
do cultivo da garoupa verdadeira (Epinephelus marginatus) em tanques-rede, região sudeste do
Brasil Informações Econômicas, SP, v.36, n.8, 2006.
SIPAÚBA-TAVARES, L. H. Influência da luz, manejo e tempo de residência sobre algumas
variáveis limnológicas em um viveiro de piscicultura. Biotemas, v. 8, n.1, p.61-71. 1995.
Fórum Internacional do Meio Ambiente - A conferência da Terra 727

A CULTURA DO CAFÉ SOMBREADO NO MACIÇO DE BATURITÉ - CEARÁ

Selma Maria Peixoto Alcântara


Economista. Aluna do Programa de Pós-graduação em Desenvolvimento e Meio Ambiente na Universidade Federal do
Ceará. Centro de Ciências, Bloco 902 - Campus do Pici - Fortaleza/CE. CEP - CEP 60.455-970.
selmaalcantara@gmail.com
José Levi Furtado Sampaio
Geógrafo. Professor do Programa de Pós-graduação em Desenvolvimento e Meio Ambiente/UFC. Centro de Ciências,
Bloco 902 - Campus do Pici - Fortaleza/Ce. CEP - CEP 60.455-970. joselevi@uol.com.br

RESUMO
A história do Brasil está ligada à produção do café, sendo essa atividade responsável pelo
desenvolvimento e colonização de áreas agrícolas. No Ceará, a espécie chegou no século XVIII e
foi plantada nas serras úmidas – dentre elas, Baturité – devido às condições edafoclimáticas
favoráveis. Estas forçaram o produtor a optar por um sistema de cultivo consorciado do café com
árvores de sombra e frutíferas, uma vez que a tentativa de trabalhar essa atividade num sistema de
pleno sol não funcionou.
No Maciço de Baturité a atividade cafeeira realizada num sistema de cultivo de
sombreamento tem cumprido um papel importante na manutenção da estrutura florestal, a qual
sustenta a diversidade faunística, o ciclo hidrológico local e a regulação microclimática, além de
propiciar um importante produto para a economia local.
O café sombreado é um dos fatores de sustentabilidade e de conservação dentro dos eixos
ecológico, socioeconômico e cultural. Durante a década de 1990, com o objetivo de buscar solução
para o problema, o governo estadual criou a Área de Proteção Ambiental - APA de Baturité. Mesmo
com a ação governamental, a Serra de Baturité continua sendo degradada decorrente da
monocultura, especulação imobiliária e turismo não planejado.
Palavras-chave: Café sombreado, Maciço de Baturité, História ambiental, sociedade-natureza.

ABSTRACT
The history of Brazil is linked to coffee production, this activity being responsible for
development and colonization of agricultural areas. In the state of Ceará, this specie arrived in the
eighteenth century and it was cultivated in the mountains – among them Baturite – due to the
favourable soil and climate conditions. Initially cultivated under the sun, coffee trees adapted better
together with local and fruitful trees. In Maciço de Baturité the coffee plantation carried out in a
fellowship system has played an important role in maintaining forestry structure, which is in turn
responsible for faunal diversity, the local hydrological circle and microclimate regulation.
Furthermore coffee is an important product for the local economy.Shaded coffee is one of the
factors responsible for sustainability and conservation on the ecologic, social economic and cultural
aspects. In the nineties, looking for a solution to the problems related to use and occupation of the
land in that area, the Governor of Ceará created the Protected Area for the Conservation of the
Environment - APA104 of Baturité. Even after that move, Maciço de Baturité is in a process of
continuous degradation as a result of monoculture, real estate trading and unsustainable tourism.
Keywords: Shaded coffee, Maciço de Baturité, Environmental history, society- nature

INTRODUÇÃO
Desde sua chegada a Mata Atlântica, o café tem se afirmado como importante produto para
a economia brasileira. Para entendermos sua trajetória, utilizamos as ferramentas da história
ambiental a qual se distingue da história convencional pelo seu caráter de tentar “aprofundar o
nosso entendimento de como os seres humanos foram, através dos tempos, afetados pelo seu
ambiente natural e, inversamente como eles afetaram esse ambiente” (WORSTER, 1991:2).
Partindo dessa abordagem histórica, o presente artigo mostra a importância do café no
Maciço de Baturité como um dos fatores de sustentabilidade e de conservação ecológica,
104
Área de Proteção Ambiental
Fórum Internacional do Meio Ambiente - A conferência da Terra 728

socioeconômica e cultural durante os anos de cultivo na região serrana. Assim como sua
contribuição para manutenção do patrimônio ambiental (solo, recursos hídricos, remanescentes
florestais) naquela área.
A discussão compreende as concepções de natureza desde a visão dos gregos, baseada na
natureza viva com vontade e domínio, sustentada no constante movimento e transformação, até a
visão moderna, a qual entende os processos de mudanças naturais como evolutivos.
É dentro desses pressupostos da modernidade sobre a relação sociedade-natureza que o
café é plantado na Mata Atlântica. O Rio de Janeiro foi o berço desse produto, o qual se espalhou
para outras regiões do País, chegando ao Maciço de Baturité. Nessa região, o sistema de cultivo a
pleno sol foi insuficiente para sustentar essa atividade por um longo período. Passou-se, então, a
cultivar o café sombreado.
A área de estudo está localizada na sub-região dos sertões no Nordeste, mas aparece como
um enclave úmido. Localizada a 90km de Fortaleza, A serra de Baturité como também é conhecida
é composta por 13(treze) municípios, estando 08(oito) destes nos limites da Área de Proteção
Ambiental – APA criada pelo governo estadual na década de 1990.

PERCEPÇÃO DA HISTÓRIA
A história que faz lembrar as análises do passado, feitas a partir de fatos, datas e heróis tem
se modificado ao longo do tempo. Hoje, ela traz à tona pesquisas sobre pessoas comuns, do meio
ambiente e da diversidade nas relações entre os diferentes grupos sociais, permitindo melhor
compreender a realidade (Worster, 1991).
Drummond (1991), aponta que a análise histórica dos ambientes tem se confrontado com
as visões clássicas. A partir da década de 1960, a literatura utilizada para a análise dos ciclos
econômicos, tais como do pau-brasil, cana-de-açúcar, gado, algodão, ouro, café etc., passa a dar
ênfase às relações dialéticas, às articulações e aos movimentos do capital. Esta percepção gerou
uma reflexão sobre a necessidade de novos enfoques, sustentada num conhecimento histórico mais
consistente, de forma que se pudesse entender o passado e o presente de um país rico em recursos
naturais, contudo com muitas dívidas sociais. “‘A nova historiografia’ tem sido incapaz de
esclarecer exatamente os tipos de sociedades gerados pela exploração de um recurso natural ou de
vários recursos simultaneamente, ou de vários recursos em seqüência” (DRUMMOND, 1991:18).
A história ambiental se inseriu neste debate e reflexões ao se propor a um rompimento com
a premissa convencional de que a experiência humana se desenvolve sem restrições naturais, sendo
o homem um ser distinto e que suas ações passadas não afetam a sociedade atual e as gerações
futuras. Nesse sentido, o trabalho com a história ambiental leva em conta os três níveis: o
entendimento da natureza propriamente dita, como se organizou no passado; domínio
socioeconômico quando interage com o ambiente; e interação humana, intelectual (Worster, 1991).
Considerando os aspectos enfatizados pela história ambiental, partimos para o
entendimento da relação sociedade-natureza, a qual na maioria do tempo se estabelece como uma
relação de dominador-dominado. Tal relação envolve a interação sobre os aspectos social, cultural,
econômico e ecológico. Partindo dessa perspectiva faremos um resgate histórico da visão de
natureza, buscando compreender como essas visões influenciaram a dinâmica da Mata Atlântica e
as implicações disso para a atividade cafeeira.

A RELAÇÃO SOCIEDADE - NATUREZA


Um retorno à cultura grega nos permite encontrar uma concepção de natureza baseada no
entendimento da natureza viva com vontade e domínio, sustentada no constante movimento e
transformação. Nesta percepção, a natureza se inscreve como um mundo provido de inteligência no
qual o homem é parte dele. Segundo Collingwood (1986), no período renascentista, prevalecia a
percepção sobre a natureza como algo em constante transformação. Todavia, a partir desse
momento predomina a concepção de uma natureza sem inteligência, dependente da vontade de um
ser superior, criador de tudo. O mundo natural, visto como um organismo na cultura grega, passa a
ser considerado como uma máquina operacional administrada por um Deus onipotente.
Fórum Internacional do Meio Ambiente - A conferência da Terra 729

No final do século XVIII, começa a aparecer, e permanece até hoje, a visão moderna da
natureza. Essa maneira de observar as relações dentro do meio natural tem como base uma
“analogia entre os processos do mundo natural, estudados pelos cientistas da natureza, e as
vicissitudes dos problemas humanos, estudadas por historiadores” (COLLINGWOOD, 1986:16).
Trata-se da visão que entende os processos de mudanças naturais como evolutivos e não mais
cíclicos como, anteriormente, eram defendidos pelos gregos. Tanto na visão renascentista como na
visão moderna, a natureza é considerada como algo externa ao ser humano e este é tido como
dominador.
Tal pensamento tem predominado na maioria das teorias do século XVIII ao XXI.
Remetendo-nos a sociedade americana no século XIX, vemos rejeição à natureza selvagem. Para
Collingwood (1986:37), “O natural e o selvagem eram uma coisa só”. No entanto, a natureza
selvagem vai sendo colocada como um obstáculo a ser vencido. A vitória representa a sobreposição
da sociedade e a sua afirmação como ser superior aos demais organismos da terra. Daí surge o
conceito de “natureza humanizada”, colocado por Collingwood (1986) que poderíamos também
entender como “natureza escravizada”, a qual é considerada pelo homem como perfeita. É a
natureza limpa, organizada de forma lógica e capaz de satisfazer àqueles desejosos por alternativa
de lazer.
Outro aspecto da dominação está relacionado ao caráter de mercadoria atribuído à
natureza. De um lado, seu valor de uso, expresso por “suas propriedades materialmente inerentes”
(MARX, 1982:42); de outro, seu valor de troca, representado numa relação quantitativa como
outros valores de uso.
Marx (2004) considera a relação sociedade-natureza como inseparável, sendo o primeiro
dependente da segunda, considerada como natureza inorgânica. A universalidade humana está
presente na universalidade da natureza que é para o homem um meio de vida imediato assim como
um instrumento vital. É pelo trabalho que o ser humano modifica as formas das matérias naturais
com o fim de satisfazer suas necessidades, (MARX, 2004). Essa atitude pode ser percebida pela
forma como se tem tratado a natureza, em especial as florestas em todo planeta.
“A história florestal corretamente entendida é, em todo o planeta, uma história de
exploração e destruição. O homem reduz o mundo natural à ‘paisagem’ - entornos
domesticados, apurados moldados para se adequarem a algum uso prático ou à estética
convencional (…) As intervenções humanas quase nunca realizam as expectativas
humanas” (DEAN, 2004:23).

A Mata Atlântica tem sido explorada dentro da visão moderna com uma concepção
evolutiva e ao mesmo tempo como mercadoria. Esse aspecto da floresta foi validado com a
colonização. A partir desse período a devastação acelerou-se consideravelmente. Para entendermos
melhor esse processo, buscamos a definição que se tem hoje da área de Mata Atlântica e em que
contexto o café sombreado do Maciço de Baturité se insere nesse ecossistema.

O café na Mata Atlântica: O que muda?


Compreender os aspectos da relação sociedade-natureza nos auxilia na análise da história
ambiental, dentro da qual está inserida a Mata Atlântica, e das relações de exploração estabelecidas
no seu interior.
Após muitas discussões e visões distintas, conseguiu-se finalmente chegar a um nível de
concordância quanto à abrangência do termo Mata Atlântica.
Este [...] deveria abranger as florestas pluviais do litoral, as matas sulinas mistas com
araucárias, as florestas estacionais decíduas e semidecíduas interioranas e os sistemas associados,
incluindo manguezais, restingas, campos de altitude, enclaves de campos, cerrados e matas
montanhas da região nordeste (SOS Mata Atlântica, 2005).
Sabe-se que a área de domínio das espécies que compõem a Mata Atlântica, originalmente,
estendia-se por todo o litoral brasileiro, enveredando o interior do país. Sua abrangência
representava 16% do território nacional (IBGE 1993,), passando por 17 estados. Em dados mais
Fórum Internacional do Meio Ambiente - A conferência da Terra 730

recentes do Ministério do Meio Ambiente, estima-se hoje que as áreas remanescentes são de apenas
7,25% da cobertura original, (SOS Mata Atlântica, 2005).
A explicação para isso está dentro do que foi colocado nos parágrafos anteriores que
mostraram uma história florestal como uma “história de exploração e destruição” (DEAN,
2004:23). Mesmo depois do alto nível de devastação, resultante dos modos de produção baseados
na exploração, a Mata Atlântica é reconhecida por sua diversidade florística e faunística, com várias
espécies endêmicas. A composição florestal é favorecida pelas variações que acarretam diferentes
regimes climáticos.
Para compreendermos o contexto do café na Mata Atlântica, partiremos dos seus ciclos
econômicos, iniciados pela descoberta do ouro.
A exploração do ouro, no século XVIII, estendeu-se até o século XIX. As políticas de
estímulo a essa atividade econômica contribuíram para o surgimento de cidades como o Rio de
Janeiro, as quais foram palco de uma exploração desmedida. O declínio do seu ciclo leva a uma
queda nas exportações, levando esses estados a buscar outras alternativas. O estado do Rio de
Janeiro, sob o domínio do governo português, emerge como precursor na experiência de exportação
de culturas tropicais que se expandiram mais tarde para São Paulo e outros estados do País. O chá
foi a primeira delas. Essa espécie, que era cultivada na China desde muito tempo, aqui no Brasil,
encontrou um clima propício a expansão. Mesmo assim, o chá brasileiro não teve sucesso. Inicia-se,
então, um sistema de plantation com o cultivo da cana-de-açúcar, visando a produção do açúcar.
Segundo Dean (2004), buscando encontrar um novo produto que estimulasse o interesse do
império em dar continuidade às trocas com o Brasil, alguns poucos proprietários iniciaram o plantio
da espécie que seria mais tarde a base de exportação do Rio de Janeiro, o café. O Coffeea Arábica
L. é originário da Etiópia e foi trazido ao Brasil por um oficial da armada brasileira. Inicialmente, as
sementes foram plantadas no Pará e Maranhão. Em meados do século XVIII, iniciou-se o cultivo do
café no Rio de Janeiro onde este encontrou as condições propícias para o seu desenvolvimento.
Desde o século XIX, o café tem sido de grande importância para a economia e para a
história do Brasil, sendo responsável pelo desenvolvimento e colonização de áreas agrícolas,
captação de divisas, assim como impediu que grandes contingentes populacionais das áreas
agrícolas tradicionais migrassem para as grandes cidades. Hoje o país é o maior produtor de café e
possui o segundo maior mercado consumidor interno do mundo que gira em torno de 11 milhões de
sacas, (Almeida, 2002).
O Café Chega ao Ceará
No Ceará, o plantio do café aconteceu no século XVIII e a espécie era diferente da que
foi para Belém. As mudas eram procedentes do Jardim das Plantas em Paris. A partir de
então essa atividade tem se constituído uma importante cultura, sobrevivente a
instabilidades do mercado nacional e internacional e limitações locais, (Severino &
Oliveira, 2000). Devido as condições edafoclimáticas favoráveis, o café passou a ser
produzido prioritariamente nas áreas úmidas, dentre elas no Maciço de Baturité.
Inicialmente se restringia às pequenas áreas, mas rapidamente se espalhou na região
serrana. O sistema de cultivo a pleno sol adotado no começo, associado a técnicas
simples, como as queimadas para limpa do terreno, favorecia o processo de degradação.
Entretanto, a prioridade, naquele momento, era garantir uma alta produtividade de
forma a atender o mercado. “Na metade do século XIX, o Maciço de Baturité respondia
por 50% de todo o café produzido no estado do Ceará, seguida pelas serras de
Maranguape e Pacatuba (Aratanha)” (Oliveira & Araújo, 2007:26). “Na década de 50, o
café cearense chegou a representar mais de 2% do total exportado pelo Brasil” (OTANI
et al, 2001:3).
No final do século XIX, as plantações de café foram sendo reduzidas, decorrentes do uso
inadequado do solo e exploração excessiva dos demais recursos naturais locais. Outro fator que
contribuiu para a crise foi a longa recessão iniciada em 1929 com a quebra da bolsa de Nova Iorque.
As aplicações do setor cafeeiro foram perdidas, levando a uma desestruturação desse segmento
dentro do país.
Fórum Internacional do Meio Ambiente - A conferência da Terra 731

Paralelo a crise econômica internacional, o sistema de cultivo sombreado, iniciado no final


do século XIX, toma espaço na serra de Baturité. A partir da percepção de que algumas das árvores
de café cresciam embaixo das sombras de árvores maiores, alguns produtores iniciaram suas
plantações consorciadas.
Os cafeicultores passaram então a se preocupar em proteger as plantações contra o sol e
chuvas intensas no local, utilizando uma cultura em consórcio com árvores de sombra (Ingazeiras,
Camunzés etc.) e com outras espécies (fruteiras), inserindo árvores maiores que pudessem criar as
condições ideais para essa cultura, (Souza, 1994).
A queda da produção experimentada anteriormente foi substituída, em 1960, por um
excesso de estoque. O número de sacas em estoque excedia 42 milhões e a previsão de produção
para aquele ano era de 36 milhões, (Severino, 1997). Com o objetivo de buscar uma solução para
esse problema, o governo federal, por intermédio do Instituto Brasileiro do Café (IBC), inicia a
política nacional de erradicação dos cafezais. No Maciço de Baturité os produtores de café
chegaram a ser pagos por cada pé de café arrancado.
Uma mudança na conjuntura nacional e internacional na década de 1960 leva a uma
mudança nos planos do governo, no que concerne ao plantio de café. Em 1971, surge o Plano de
Renovação e Revigoramento de Cafezais no Nordeste. Em especial, Bahia, Ceará e Pernambuco,
(Campos, 2000). Os cafeicultores da serra de Baturité voltaram a ser estimulados à atividade
cafeeira, entretanto, não mais no sistema de cultivo sombreado, mas a pleno sol. O novo plano
previa um plantio de pleno sol em todas as áreas do país, não sendo diferente no Maciço de
Baturité. A meta era promover um aumento da produtividade, a partir de inovações tecnológicas e
novas técnicas de cultivo. Devido às condições sensíveis de relevo daquela região, não demorou
muito para se perceber o alto nível de degradação, refletida na queda da produção. Dentro desse
contexto, os produtores foram forçados a um retorno ao sistema de cultivo sombreado.
Além de sua importância econômica, o café sombreado contribui como um dos
responsáveis para a manutenção de uma interação ecológica e conservação, a qual envolve
conservação dos ciclos hidrológicos, tornando-se o principal responsável pela manutenção da
cobertura florestal em mais de 1.800 hectares, (Cepema, 2005).
Em 1990, o Governo do Estado cria a Área de Proteção Ambiental (APA), a qual abrange
oito municípios: Guaramiranga, Pacoti, Baturité, Aratuba, Mulungu, Palmácia, Redenção e
Capistrano de Abreu.
O Decreto Estadual nº 20.956 considerou “que o objetivo de uma área de proteção
ambiental é a conservação e melhoria das condições ecológicas regionais assegurando o bem estar
das populações humanas, sendo, portanto, uma unidade de conservação de uso direto”.

ONDE ESTAMOS E PARA ONDE VAMOS


A exemplo de outras regiões na América do Sul e Central, os cafezais na Área de
Preservação Ambiental do Maciço de Baturité, e sua conexão com os remanescentes florestais
nativos cumprem um papel relevante na manutenção da estrutura funcional de serviços ambientais,
tais como a regulação do clima, regulação do fluxo hidrológico, armazenamento e retenção de água,
polinização e a produção de alimentos. Todos esses serviços ambientais se dão em uma extensa área
marcada por endemismos e espécies ameaçadas.
Outro fator importante é a sua contribuição para a manutenção da cobertura florestal nos
limites da APA que tem sido afetada pela mudança drástica nos Sistemas de Uso da Terra. A
realidade atual é de avanço da degradação ambiental, e causas e efeitos se confundem na percepção
local (Cepema, 2005).
O surgimento da agricultura marca o processo de diferenciação entre o modo de inserção
do homem na natureza em relação às demais espécies animais. A agricultura provoca modificação
radical nos ecossistemas. Mesmo assim, a inserção do homem não é necessariamente incompatível,
sendo possível a construção de um ecossistema agrícola baseado em sistemas de produção que
preservem certos mecanismos básicos de regulação ecológica, (May et al, 2003). A serra de Baturité
tem experimentado uma degradação decorrente do regime de monocultura imposto àquela área.
Fórum Internacional do Meio Ambiente - A conferência da Terra 732

Mesmo após a criação da APA, o Maciço enfrenta um elevado índice de desmatamento da floresta
remanescente por conta do turismo sem o devido controle e a especulação imobiliária para
construção de casas de veraneio e pousadas. A população mais jovem tem perdido o interesse em
dar continuidade ao cultivo do café sombreado, assim como da cultura que circunda essa atividade.
Apesar disso, existe uma ação de diferentes agentes sociais comprometidos e resistentes a
esse processo de elitização local. Dentre eles podemos citar a Associação de Produtores Ecologistas
do Maciço de Baturité. Os associados da APEMB, apoiados pela Fundação Cultural, Educacional
em Defesa do Meio Ambiente, Fundação Cepema, foram responsáveis pela exportação do café
ecológico na década de 1990 e hoje desenvolvem um importante trabalho junto aos pequenos e
meios produtores de café da região.

REFERENCIAS BIBLIOGRAFICAS
ALMEIDA, N.G. Um indicador de sustentabilidade para o café ecológico. Fortaleza, 2002.
CAMPOS, J.A. Aspectos histórico-econômicos, geoambientais e ecológicos do Maciço do Baturité.
Fortaleza, 2000.
COLLINGWOOD, R.G. Ciência e Filosofia. 5o edição – Lisboa: Editorial Presença, 1986.
DEAN, W. A Ferro e Fogo. 5a edição – São Paulo: Companhia das Letras, 2004.
DRUMMOND, J.A. A história ambiental: Temas, fontes e linhas de pesquisa. 1991. Estudos
históricos, RJ, Vol 4, nº. 8. http://www.cpdoc.fgv.br/revista/arq/84.pdf Acesso em 10/01/07.
FUNDAÇÃO CEPEMA. Projeto recuperação, conservação e manejo de florestas nativas e
antropogênicas na área de proteção ambiental da Serra do Baturité, Ceará – Fortaleza, 2005.
MARX, K. Manuscritos econômico-filosóficos. 1a edição – São Paulo: BOITEMPO, 2004.
MARX, K. O Capital. 8o edição – São Paulo: DIFEL Difusão Editorial S.A., 1982.
MAY, H.P(Org); LUSTOSA, C.M(Org); VINHA, V.de(Org). Economia do meio ambiente teoria e
prática. 3a edição – Rio de Janeiro: Campus, 2003.
OTANI, M.N.; SOUZA, M.C.M. de.; SAES, M.S.M. Actions to promote sustainable development:
the case of Baturité shaded coffee, state of Ceará, Brazil. 2001.
http://www.fundacaofia.com.br/pensa/pdf/papers_jornais/norico.pdf. Acesso em 20/09/06.
SEMACE. Decreto Nº 20.956, de 18 de Setembro de 1990 (DOE - 24.09.90).
http://www.semace.ce.gov.br/biblioteca/legislacao/conteudo_legislacao.asp?cd=56. Acesso
19/06/2007.
SEMACE. Zoneamento ambiental da APA da serra de Baturité: diagnóstico e diretrizes. Fortaleza,
1992.
SEVERINO, S.L; OLIVEIRA, S.T. Café sombreado no Maciço de Baturité. Fortaleza, 2000.
SOUZA, S. et al. História do Ceará. 2a edição – Fortaleza: Fundação Demócrito Rocha, 1994.
WOSTER, D. Para fazer história ambiental. 1991. Estudos históricos, RJ, Vol 4, nº. 8.
http://www.cpdoc.fgv.br/revista/arq/84.pdf Acesso em 10/01/07.
Fórum Internacional do Meio Ambiente - A conferência da Terra 733

IMPACTOS AMBIENTAIS EM ÁREA CANAVIEIRAS: A MORTE DO RIO UNA


(PEDRAS DE FOGO)
Plínio PEREIRA Filho
Escola Municipal Edgar Guedes da Silva – Pedras de Fogo – PB. professor_plinio@yahoo.com.br
Wellington ALVES Aragão
Escola Municipal Edgar Guedes da Silva – Pedras de Fogo – PB
Rick Landia BARBOZA da Silva
Escola Municipal Edgar Guedes da Silva – Pedras de Fogo – PB

RESUMO
Este artigo apresenta os dados de um diagnóstico agroflorestal realizado na região
canavieira de Una de São José, em área onde atualmente se encontra o Rio Una, mostrando os
impactos sobre a biodiversidade provocados pela expansão da atividade canavieira nas últimas
décadas.
Palavras-Chave: Rio Una, Biodiversidade, Agroecologia.

ABSTRACT
This article relates a agroforestry diagnostic in Una of São José, a sugarcane region, where
the “Una River”. The research focusing the sugarcane expansion in the last decades and this impact
on biodiversity.
Key Words: Una River, biodiversity, agroecology

INTRODUÇÃO
A Região de Pedras de Fogo, região da zona da mata paraibana, é considerada um ponto de
referência para o agronegócio estadual, tendo nas últimas décadas a cultura da cana-de-açúcar como
a principal alavanca desta economia. No entanto, nos últimos anos intensificaram-se na região o
desenvolvimento das atividades agricolas e como conseqüência vieram também os problemas de
ordem dos impactos ambientais.
A origem de Pedras de Fogo, diz o historiador Cariolano de Medeiros em seu "Dicionário
Corográfico do Estado da Paraíba", se deu assim:
"Em 23 de dezembro de 1680, o Capitão-General André Vidal de Negreiros, doou a Nossa
Senhora do Desterro de També, o Engenho Novo de Goiana, com as terras que se estendiam à
Paraíba, para que criasse uma colegiada, nomeando três testamenteiros, em cujo número entrava a
Santa Casa de Misericórdia de Lisboa. Esta, por falecimento dos outros dois, simulou cumprir a
vontade do testador e mandou uma cura, que se locupletou com os rendimentos, revelando desleixo
que deixou cair a Capela, sendo as imagens recolhidas a um telheiro. Foi em torno dessa capela que
se formou a povoação de Pedras de Fogo.
As ruínas dessa povoação ainda hoje existem e distam dois quilômetros da atual sede
municipal.
A colonização do todo litoral Paraibano foi determinada pelos interesses do Sistema
Colonial, montado no Brasil pela elite portuguesa, desde o início do século XVI. Naquela época,
Pedras de Fogo, assim como todo litoral paraibano, eram cobertos por matas, com madeiras de
excelente qualidade, para a construção de naus de guerra, fragatas e móveis. Estas madeiras eram
conduzidas para os Portos do Recife, Cabedelo ou mesmo Jacumã, de onde tomavam rumo para a
Europa. Aliás, por sua proximidade ao litoral - 56 km - Pedras de Fogo foi visitada não somente por
portugueses, mas por outros povos europeus, como os franceses e holandeses, à procura da melhor
mercadoria que a região produzia no início da colonização (o Pau Brasil).
Enquanto a ação do conquistador limitou-se às atividades extrativistas, os nativos não
ofereceram maiores resistências. Entretanto, quando começou o processo de colonização, com a
ameaça da posse da terra, a luta entre as comunidades primitivas e o branco teve início. Como não
há notícias da presença de grandes tribos na região naquela época, é provável que esses conflitos
não tenham sido significativos.
Fórum Internacional do Meio Ambiente - A conferência da Terra 734

Sabe-se que, em tempos primordiais, o grupo indígena que ocupava a região onde ora se
situa Pedras de Fogo era o Tupi, formado, na época, por Tabajaras e Potiguaras, originários das
margens do Rio São Francisco, em Pernambuco. Estes últimos rumaram mais para o litoral norte,
ficando grande parte entre Baía da Traição e Serra da Raiz.
Outras versões, como a de Balduíno Lélis, estudioso da ocupação indígena, no território
paraibano, afirmam que, neste território, além da presença dos Tabajaras, verificam-se também
incursões dos Cariris, tribo pertencente ao grupo Jê, chamados Tapuias (bárbaros) pelos Tupis.
Comprovando esta hipótese, teriam sido encontrados na área vestígios, sob forma de material lítico,
característicos da cultura dos cariris.
Essas comunidades primitivas tinham como base para subsistência o cultivo rudimentar de
alguns produtos agrícolas, como milho, mandioca, batata-doce, etc. Praticavam, também para
subsistência, a caça e a pesca.
Quanto à origem do nome Pedras de Fogo, fala-se que, antigamente era muito comum
pedras avermelhadas, que soltavam faíscas quando em atrito com os cascos dos cavalos e dos bois
dos colonos tropeiros.
A comunidade surgiu de uma grande feira de gado, pois os tropeiros, vindos de
Pernambuco, com destino ao interior da Paraíba e Rio Grande do Norte, faziam ali parada
obrigatória,às margens do Rio Itambé.
A história de Pedras de Fogo confunde-se com a história de Itambé, antigamente També,
cidade gêmea, que fica do lado de Pernambuco. Não existe registro da data precisa do período exato
em que essas duas comunidades se constituíram. Segundo versão mais comum, ambas surgiram
como um único conglomerado que, mais tarde, por questões políticas, se separaram. As terras ao
Norte, na Paraíba, couberam a Pedras de Fogo. As terras ao Sul, em Pernambuco, passaram a
pertencer a També, hoje Itambé.
A questão dos limites, por muito tempo, gerou inúmeras confusões que demoraram a ser
solucionadas. Havia acirradas polêmicas entre forças políticas de Pernambuco e da Paraíba. A
população dos dois municípios é que sofria com a falta de definição. Fez-se necessária a
intervenção do Governo Federal, para solucionar de vez o impasse.
A proximidade de Pernambuco e, porque não dizer, do Recife, sempre influenciou os
acontecimentos de Pedras de Fogo. Por sua posição estratégica sempre foi alvo de atenções por
parte das autoridades da Paraíba, e, por muito tempo foi considerada a porta de entrada das
novidades para o litoral paraibano.
Atualmente é uma cidade de porte médio paraibano, mas com forte influência de
Pernambuco, haja vista que, há uma completa interação entre as duas cidades.
O presente trabalho tem como objetivo apresentar os principais resultados relativos ao
impactos ambientais pelos quais um importante rio local vem sofrendo, e através dele, sensibilizar
a população local e as autoridades competentes para minimizar tais agressões.
Fórum Internacional do Meio Ambiente - A conferência da Terra 735

Figura 1. Mapa do Município de Pedras de Fogo ( Atlas de Desenvolvimento Humano/PNUD)

Localização
O Rio Una nasce no lugarejo denominado Alagadiço. Suas águas trascorrem por outras
vilas que fazem também consumo animal e para fins agricolas. A população local faz uso das águas
do rio para lavar roupas, bem como é utilizada pelos aricultores para irrigação da lavoura. As águas
do Rio Una vão despejar nas nascentes do Rio Paraíba.

Figura 2. Localização da nascente do rio Uma.

MATERIAL E MÉTODOS
Fórum Internacional do Meio Ambiente - A conferência da Terra 736

Inicialmente procedeu-se a escolha de comunidades que apresentam uma certa relação de


depandência das águas do Rio Una. As comunidades escolhidas inserem-se na direção sul da cidade
de Pedras de Fogo.
O clima da região é do tipo quente e úmido, com registros de temperatura médias mensais
de 30,5 ºC (máxima), 24,4 ºC (média) e de 20 ºC (mínima). A pluviosidade apresenta-se bem
distribuída durante todo o ano, com precipitações média anual e mensal de 1.886 mm e 157 mm,
respectivamente.
Foram feitas visitas iniciais as áreas escolhidas para verificação dos aspectos sociais,
econômicos e ambientais que iriam ser contemplados nos questionários. Só após este procedimento,
os questionários foram elaborados, constando de informações referentes a condições de uso das
águas e importância do rio para as famílias, importância ecológica do rio, atividade econômica e
principais carências locais. Assim, tais questões objetivavam fornecer subsídios para uma análise e
entendimento da interação das comunidades da Bela Rosa, com o rio, verificando os possíveis
impactos causados pelas diversas formas de uso. O questionário apresentava uma pequena
subjetividade e, em sua maioria, exigia respostas simples como sim ou não. Foram aplicados, nos
meses de janeiro e fevereiro de 2008, 15 questionários em Una, 15 em Bela Rosa, além de uma
entrevista com o administrador. Os dados obtidos foram tabelados e percentualizados, como uma
maneira de facilitar a análise e permitir estabelecer inter-relações entre as informações.
Os agricultores contam que há 30 ano o rio tinha maior fluxo de agua durante o ano.
Acredita-se que ação do homen no desmatamento da mata ciliar foi responsável direto da
diminuição das águas do rio.
Abaixo, vemos as características atuais do rio Una:

Figura 3. Rio Uma: as setas mostram e extensão e limite do curso do rio há 30 anos

Figura 4. Rio com profundidade de 50 cm


RESULTADOS E DISCUSSÃO

Os resultados obtidos mediante a análise de problemas de ordem degradativa, observa-se


falta de conservação de solo com as fortes chuvas que caíram no início do ano estão sendo uma
combinação fatal para ocasionar erosões em propriedades rurais. O maior problema da falta de
conservação de solo é que as erosões vão aparecendo e a terra é levada para os córregos e represas
da região, causando assoreamento. "Estamos perdendo parte do nosso rio a cada di", afirma José
Fórum Internacional do Meio Ambiente - A conferência da Terra 737

Carlos, morador local. Ele diz que os proprietários rurais ainda não se conscientizaram da
importância de se fazer a conservação do solo. José lembrou também que existem áreas que
possuiam curvas de nível, porém o proprietário, ao arrendar essas terras para cultivo de culturas
anuais, permite que o arrendatário destrua todas as curvas de nível, a fim de facilitar os trabalhos de
plantio e cultivo.
As áreas cultivadas vão de encontro ao rio.

Figura 5. Cana-de-açucar plantada as margens do rio

As legislação brasileira prevê que as Áreas de Proteção Permanente deve odedecer as


seguintes regulamentações: Um exempo de caracterização de APP:

Revista Ciência Hoje, n146, jan-fev 1999 - Em o desaparecimento de pequenos corregos - Antonio
Carlos

A lei estabelece os seguintes parâmentos:


Art. 2.º - Consideram-se de preservação permanente, pelo só efeito desta Lei, as florestas e demais
formas de vegetação natural situadas:
a) Ao longo dos rios ou de qualquer curso d'água desde o seu nível mais alto em faixa marginal
cuja largura mínima seja:
1- de 30 m (trinta metros) para os cursos d'água de menos de 10 m (dez metros) de largura;
Fórum Internacional do Meio Ambiente - A conferência da Terra 738

2-de 50 m (cinqüenta metros) para os cursos d'água que tenham de 10 (dez) a 50 m (cinqüenta
metros) de largura;
3- de 100 m (cem metros) para os cursos d'água que tenham de 50 (cinqüenta) a 200 m (duzentos
metros) de largura;
4- de 200 m (duzentos metros) para os cursos d'água que tenham de 200 (duzentos) a 600 m
(seiscentos metros) de largura;
5- de 500 m (quinhentos metros) para os cursos d'água que tenham largura superior a 600 m
(seiscentos metros).
b) ao redor das lagoas, lagos ou reservatórios d'água naturais ou artificiais;
c) nas nascentes, ainda que intermitentes e nos chamados "olhos d'água", qualquer que seja a sua
situação topográfica, num raio mínimo de 50 m (cinqüenta metros) de largura;
d) no topo de morros, montes, montanhas e serras;
e) nas encostas ou partes destas, com declividade superior a 45 , equivalente a 100% na linha de
maior declive;

CONSEQÜÊNCIAS PARA O RIO UNA


Através do registro fotográfico, percebe-se que a mata ciliar não compreende os limites
estabelecidos pela lei de APP. A cultura canavieira tem se extendido até as margens do rio, o que
compromete mais ainda os impactos causados pelas chuvas. Sem a mata ciliar, o Rio Una sofre com
o assoreamento e a morte pre-matura de seus córregos. Outro agravante é a poluição das águas do
rio mediante o uso intensivo e discriminado de defensivos agricolas.

O LIXO
A própria comunidade também tem contribuído para a poluição deste rio. As familias e os
visitantes teem jogado constantemente lixo ora domestico ora industrial as margens do rio. No que
diz respeito aos impactos ambientais e sua conseqüente influência na saúde da comunidade local, o
quadro torna-se crítico. Moradores e visitantes – nas cheias durante o inverno - lançam lixo
diretamente nas margens do rio Una, sem nenhum tratamento prévio dos seus poluentes, estes fatos,
associados à exploração pesqueira descontrolada dos últimos anos, diminuiu, consideravelmente, a
população de peixes com valor de mercado.
Segundo relato do presidente da associação dos agricultores, as leis ambientais referentes a
reflorestamento de áreas, não vem sendo respeitadas, agravando ainda mais o problema.

Figura 3. Lixo jogado ao longo do rio Una

DESMATAMENTOS AO LONGO DO RIO UNA


Esta situação faz supor que o desmatamento tem contribuido sistematicamente para o
aterramento do Rio Una. Além disso, evidenciam que o modelo agrícola, baseado na monocultura
extensiva, incorpora solos potencialmente frágeis e inadequados para o uso agrícola convencional.
Este quadro é similar ao encontrado por FIORIO et al. (2000) em uma microbacia hidrográfica do
município de Piracicaba/SP, no período 1962 a 1995, onde concluíram que a expansão desordenada
Fórum Internacional do Meio Ambiente - A conferência da Terra 739

da cana-de-açúcar causou impacto ambiental negativo, na medida em que levou em consideração


apenas aspectos econômicos, sem preocupação com a aptidão das terras. No presente caso, nota-se
que a expansão canavieira se deu de forma significativa sobre áreas de mata nativa, caracterizando
um contínuo processo de desmatamento, apesar de já existirem leis coibindo este processo, como é
o caso do Código Florestal (Lei Federal 4771/65).
A relutância na recomposição da vegetação nativa em áreas canavieiras, tanto no que ser
refere à mata ciliar como principalmente à Reserva Legal, vem sendo registrada por diversos
estudos, como o de GONÇALVES (2005). Do ponto de vista ambiental, este quadro é mais grave
ainda na região de Ribeirão Preto, que está situada sobre área de recarga do Aqüífero Guarani, uma
das maiores reservas de água potável do mundo. Resumos do V CBA - Uso e Conservação de
Recursos Naturais Rev. Bras. de Agroecologia/out. 2007 Vol.2 No.2 1363
Dentro da perspectiva agroecológica, a biodiversidade é vista como crucial para conferir
equilíbrio aos sistemas. Monocultivos extensivos carecem da base de biodiversidade suficiente para
garantir a estabilidade e o equilíbrio, necessários para sua manutenção sem o uso de agroquímicos.
Portanto, na ausência de reformas de base, os monocultivos não comportam mais do que uma
ecologização parcial, insuficiente para lograr uma sustentabilidade de longo prazo (EMBRAPA,
2006).
O diagnóstico realizado reforça as evidências de que a expansão da monocultura canavieira
no Brasil tem se dado de forma desordenada, sem mecanismos de regulação que protejam os
interesses da sociedade em relação ao uso sustentável dos recursos naturais, provocando severos
danos à biodiversidade.

REFERÊNCIAS BIBLIOGRÁFICAS
CARVALHO, P. F. e BRAGA, R. Perspectivas de gestão ambiental em cidades médias. Rio Claro:
LPM-UNESP, 2001.
CAVALHEIRO, F. Urbanização e Alterações Ambientais in: TAUK, S.M. (org.) Análise
Ambiental: uma visão multidisciplinar, ed. Unesp/Fapesp, São Paulo, 1991 , pp 88-99
DREW, David. Processos interativos homem-meio ambiente. São Paulo: DIFEL, 1986.
EMBRAPA. Marco Referencial em Agroecologia. Embrapa Informação Tecnológica, Brasília,
2006, 70p.
FIORIO, P.R. et al. Cronologia e impacto ambiental do uso da terra na microbacia hidrografica do
ceveiro, em Piracicaba, SP. Pesquisa Agropecuaria Brasileira, Brasilia, v.35, n.4, p.671-679, abr.
2000.
GONÇALVES, D. B. Mar de cana, deserto verde? Os dilemas do desenvolvimento sustentável na
produção canavieira paulista. 2005. 256f. Tese (Doutorado em Engenharia de Produção) –
Departamento de Engenharia de Produção, Universidade Federal de São Carlos, São Carlos, 2005.
JACOBI, Pedro. Cidade e Meio Ambiente. São Paulo: Anablume, 2000.
Resumos do V CBA - Uso e Conservação de Recursos Naturais 1364 Rev. Bras. de
Agroecologia/out. 2007 Vol.2 No.2
TAUK, Sâmia Maria. ANÁLISE AMBIENTAL: Uma visão multidisciplinar. Editora Unesp, 206 pg.
________, INTRODUÇÃO À AVALIAÇÃO DE IMPACTOS AMBIENTAIS, texto da graduação
do curso de Ecologia/Unesp - Rio Claro, 36 pg.
Fórum Internacional do Meio Ambiente - A conferência da Terra 740

BIODIESEL: UM PRODUTO DA AGRICULTURA SUSTENTÁVEL A FAVOR DE UM


MUNDO MENOS POLUÍDO

Juliana Espada Lichston


(Universidade Federal do Rio Grande do Norte – UFRN. E-mail: lichston@cb.ufrn.br)
Beatriz Cavalcante da Silva
(Universidade Federal do Rio Grande do Norte – UFRN e Centro Federal de Educação Tecnológica do Rio Grande do
Norte – CEFET-RN. E-mail: beacavalcante@yahoo.com.br)

RESUMO
As principais fontes energéticas mundiais, o petróleo, o carvão e o gás natural, têm seu
esgotamento previsto, evidenciando a necessidade de buscarmos fontes alternativas de energia.
Nesse contexto, surge o biodiesel, um combustível renovável e biodegradável, estudado no Brasil
desde a década de 80. Em 2005, os biocombustíveis derivados de óleos e gorduras foram incluídos
em nossa matriz energética. O biodiesel pode ser produzido a partir de óleos e gorduras residuais,
gorduras animais, óleos vegetais e óleo proveniente de microalgas. Ele reduz a poluição ambiental
nos centros urbanos, ajuda no controle do efeito estufa, é o mais viável combustível obtido a partir
de biomassa e capaz de fazer funcionar um motor de ignição por compressão, é mais versátil que o
hidrogênio e outros sistemas de propulsão, gera emprego e renda e aproveita o potencial agrícola de
cada região. Entretanto, ainda há alguns entraves na produção do biodiesel, como: baixo piso do
preço do diesel, falta de garantia de que os produtores destinarão as oleaginosas para suprir a
demanda nacional, geração de subprodutos, necessidade de adaptações tecnológicas nos veículos,
determinação das culturas agrícolas mais adequadas, aproveitamento das terras agricultáveis para
produção de combustível em detrimento da de alimentos. Assim, o biodiesel possui muitas
vantagens ecológicas, econômicas e sociais, embora ainda seja necessário estabelecer estratégias
que maximizem sua viabilidade econômica e investir em pesquisa e tecnologia, para que sua
produção e consumo sejam mais eficientes.
Palavras-chave: biodiesel, redução da poluição, agricultura sustentável.

ABSTRACT
The main world energetic sources, petroleum, coal and natural gas, are limited, which
makes evident the need for alternative energy sources. Then, a renewable and biodegradable fuel
appears: biodiesel. It has been studied in Brazil since the 80’s. In 2005, biofuels derived from oils
and fats were included in our energetic sources. Biodiesel can be produced from residual oils and
fats, animal fats, vegetal oils and microalgae oils. It reduces pollution in urban centers, it helps to
control greenhouse effect, it’s the most feasible fuels among those made of biomass and capable of
making a compression ignition engine work, it’s more versatile than hydrogen and than other
propulsion systems, it enhances levels of employment and gain and it profits the agricultural
potential of each region. However, there are still a few obstacles in biodiesel production, such as:
diesel’s low price, lack of guarantee that producers will destine the plants that produce oil to supply
national demand, generation of secondary products, need of technological adaptations in vehicles,
determination of the most suitable agricultural cultures, utilization of land to produce fuel instead of
food. Thus, biodiesel has many ecological, economical and social advantages, in despite of the need
to establish strategies that increase its economical viability and to invest in research and technology,
to make its production and its consumption more efficient.
Keywords: biodiesel, reduction of pollution, sustainable agriculture.

HISTÓRICO
As principais fontes energéticas mundiais, o petróleo, o carvão e o gás natural, são
limitadas e têm seu esgotamento previsto, evidenciando a necessidade de buscarmos fontes
alternativas de energia (Shuchrdt, 1998) em virtude da alta taxa de consumo. Nesse contexto, surge
o biodiesel, um combustível renovável que, dentre os combustíveis obtidos de biomassa, é o mais
viável para fazer funcionar motores de ignição por compressão.
Fórum Internacional do Meio Ambiente - A conferência da Terra 741

Rathmann et al. (2005) destacam algumas tentativas de produzir biocombustíveis,


anteriores aos atuais níveis mundiais críticos de consumo energético. Em 1900, Rudolf Diesel
realizou em Paris o primeiro ensaio de um motor movido a óleos vegetais. Em 1937, foi concedida
a primeira patente a combustíveis obtidos a partir de óleos vegetais (óleo de palma), na Bélgica. Em
1938, foi feito o primeiro registro de uso de combustível de óleo vegetal para fins comerciais, em
ônibus de passageiros da linha Bruxelas-Lovaina.
Parente (2003) relata a importância que a conservação ou economia de energia e o uso de
fontes alternativas de energia receberam após a crise energética de 1973. Naquele ano, o preço do
barril de petróleo aumentou e sofreu outras oscilações nos anos seguintes, fazendo com que muitos
países sofressem uma crise econômica. Os mais prejudicados, os importadores de petróleo,
passaram a ter como estratégia o aumento da produção interna e a substituição do petróleo por
outras fontes de energia (Moreira e Sene, 2005).
No Brasil, foram feitas algumas tentativas para substituir o petróleo e seus derivados, como
o Programa Nacional do Álcool (para que os veículos a gasolina fossem abastecidos com etanol).
Outra proposta foi o uso de ésteres como substitutos para o óleo diesel do petróleo, o que deu
origem ao prodiesel, combustível à base de vegetais feito em Fortaleza (CE) ao fim da década de
1980, o qual é hoje conhecido como biodiesel e é o principal dos combustíveis capazes de mover
um motor a diesel. Esse novo combustível era feito com ésteres de óleos vegetais por uma reação de
transesterificação e foram testadas várias matérias-primas, como os óleos de soja, de babaçu, de
amendoim, de algodão, de girassol e de dendê. Antes de ser direcionado para a produção de
cosméticos, até mesmo o óleo de semente de maracujá foi usado no diesel vegetal, bem como óleo
de peixe, que, como óleo diesel animal, teve bons resultados, semelhantes aos de origem vegetal
(Parente, 2003).
Devido à diminuição dos preços do petróleo e ao desinteresse da Petrobras, a produção do
prodiesel na época foi abandonada no Brasil, ao contrário do que ocorreu em países da América do
Norte e da Europa, onde se continuou a produzir óleo diesel vegetal (Parente, 2003). Rathmann et
al. (2005) destacam que, em 1988, foi iniciada a produção de biodiesel na Áustria e na França e foi
feito o primeiro registro do uso da palavra “biodiesel” na literatura. Entretanto, a primeira patente
mundial dada ao biodiesel pelo Instituto Nacional de Propriedade Industrial foi brasileira (Parente,
2003).
O interesse do Brasil na produção de biodiesel, contudo, tem sido bastante incrementado
nos últimos anos. Pode-se citar como exemplo, o Programa Biodiesel do Governo Federal, cujo
objetivo é promover a implantação de projetos auto-sustentáveis, produzindo biodiesel a partir de
diferentes oleaginosas cultivadas em diversas regiões do país e gerando renda às famílias que lá
habitam, incluindo-as de forma sustentável na sociedade brasileira. A lei nº 11.097, de 13 de janeiro
de 2005, incluiu os biocombustíveis derivados de óleos e gorduras em nossa matriz energética.
O terceiro e o quarto leilões de biodiesel no País, finalizados em julho de 2006, pela
Agência Nacional do Petróleo, Gás Natural e Combustíveis Renováveis (ANP), no Rio de Janeiro,
alcançaram a meta de venda de 600 milhões de litros e houve uma maior participação das regiões
Nordeste e Sul na oferta arrematada. O Nordeste representou 43% da oferta adquirida nos dois
leilões, sendo uma importante fonte supridora para o resto do Brasil. Segundo dados do Ministério
do Desenvolvimento Agrário, os resultados indicam a participação efetiva de 208 mil agricultores
familiares envolvidos no cultivo de oleaginosas para a produção do biodiesel arrematado nos
leilões, sendo a maioria da região Nordeste. A estimativa é de que seja necessária uma área de pelo
menos 600 mil hectares de diversas culturas agrícolas no Brasil para suprir a demanda do
biocombustível decorrente desses dois pregões.

BIODIESEL: CONCEITO E MATÉRIAS-PRIMAS


Segundo o National Biodiesel Board, o biodiesel é um derivado mono-alquil éster de
ácidos graxos de cadeia longa, proveniente de fontes renováveis como óleos vegetais ou gordura
animal, cuja utilização está associada à substituição de combustíveis fósseis em motores de ignição
por compressão. Na definição de Parente (2003), o biodiesel é um combustível renovável,
Fórum Internacional do Meio Ambiente - A conferência da Terra 742

biodegradável e ambientalmente correto, sucedâneo ao óleo diesel mineral, constituído de uma


mistura de ésteres metílicos ou etílicos de ácidos graxos, obtidos da reação de transesterificação de
qualquer triglicerídeo com um álcool de cadeia curta (metanol ou etanol).
O biodiesel pode ser produzido a partir de óleos e gorduras residuais (evitando o descarte
no meio ambiente), gorduras animais e óleos vegetais (Parente, 2003). O biocombustível obtido a
partir da extração destes tem sido muito estudado (Piyaporn et al., 1996). Em pesquisa realizada por
Azam et al. (2005), foram examinados perfis de ácidos graxos de óleos de sementes de 75 espécies
de plantas tendo 30% ou mais de óleo fixado em sua semente. Muitos desses vegetais têm potencial
para uso na produção de biodiesel e concluiu-se que 26 delas contêm óleos com ácidos graxos de
ésteres metílicos adequados para transformação em biodiesel de acordo com os padrões da
Organização de Padrões dos Estados Unidos e Europa. Segundo Parente (2003), os óleos vegetais
utilizados para a produção de biodiesel são aqueles classificados como óleos fixos ou triglicerídicos.
Os óleos essenciais não podem ser utilizados para esse fim devido a sua natureza volátil, mas
podem servir em misturas com o diesel mineral e/ou com o biodiesel.
Outra matéria-prima para o biodiesel também muito bastante estudada é o óleo proveniente
de microalgas. Conforme Chisti (2007), as microalgas parecem ser a única fonte de biodiesel com
potencial para substituir completamente os combustíveis derivados do petróleo e permitem que as
culturas agrícolas sejam destinadas a outros fins, como a alimentação. O autor diz que 1 a 3% da
área destinada ao cultivo agrícola nos Estados Unidos seriam suficientes para produzir biomassa
algal para satisfazer metade da necessidade de combustível para transporte. O conteúdo de óleo nas
microalgas pode exceder 80% em peso de biomassa seca, entretanto, nem todos os óleos
provenientes de microalgas têm potencial para produção de biodiesel. A produção de biodiesel de
microalgas pode ter o custo minimizado por intermédio de uma estratégia de produção baseada em
biorefinarias (de modo a aproveitar todos os componentes da biomassa seca para subprodutos),
melhoramento das microalgas por engenharia genética e avanços na engenharia dos fotobioreatores.

VANTAGENS DO BIODIESEL
O biodiesel é adequado por vários motivos, como a redução da poluição ambiental nos
grandes centros urbanos (Masjuk, 1995), podendo reduzir em 78% a emissão de gás carbônico, em
90% as emissões de fumaça e praticamente eliminar as emissões de óxido de enxofre (Lima, 2004).
O cultivo agrícola voltado para a produção de biodiesel capta gás carbônico durante o crescimento e
apenas parte desse composto é liberada durante a combustão nos motores, ajudando no controle do
efeito estufa. Esse biocombustível também promove a diversificação da matriz energética e permite
que países como o Brasil atinjam as metas do Protocolo de Kyoto e participem do mercado de
créditos de carbono (Rathmann et al., 2005).
Atualmente com alta demanda nos Estados Unidos e na Europa (Martínez-Herrera et al.,
2006), o biodiesel é o mais viável combustível obtido a partir de biomassa e com capacidade para
fazer funcionar um motor de ignição por compressão, além de ser renovável e biodegradável. As
propriedades físicas e químicas do biodiesel necessárias para que ele funcione como substituto ao
diesel mineral (combustibilidade, lubricidade, corrosividade e teor de enxofre e de hidrocarbonetos
aromáticos, por exemplo) são semelhantes naqueles obtidos de diferentes matérias-primas ou com
diferentes agentes de transesterificação (Parente, 2003). Ramos et al. (2000) citam dados do
Programa Nacional de Óleos Vegetais, segundo os quais houve bons resultados em testes feitos com
caminhões, ônibus e tratores abastecidos com biodiesel puro ou acrescido ao diesel convencional.
Os veículos percorreram mais de um milhão de quilômetros e os problemas apresentados foram
associados a um pequeno acúmulo de material nos bicos injetores e um leve decréscimo da
viscosidade do óleo lubrificante.
Além disso, o biodiesel é mais versátil que o hidrogênio e outros sistemas de propulsão,
pode promover o transporte sustentável, diminuir as emissões de gases do efeito estufa e aumentar a
mobilidade, mesmo em áreas remotas. A diminuição do aquecimento global e a criação de novas
oportunidades de trabalho locais podem ser importantes bases de quaisquer sistemas de transporte
com visão de futuro para economias emergentes (Francis et al., 2005). Na região nordeste do Brasil,
Fórum Internacional do Meio Ambiente - A conferência da Terra 743

a produção de mamona pela agricultura familiar, visando ao abastecimento industrial do biodiesel,


tem sido uma promissora alternativa para pequenos produtores da região. Esse modelo de cultivo
permite a fixação da população rural e também o aproveitamento interno dos óleos vegetais,
tornando seu preço mais competitivo em relação ao mercado mundial. Desse modo, há um crescente
incentivo por parte do governo federal em políticas que apóiem o projeto do biodiesel na área,
favorecendo seu desenvolvimento sustentável. A geração de emprego e renda também se aplica à
pesquisa e à indústria de equipamentos (Rathmann et al., 2005), bem como às próprias unidades
produtivas de biodiesel.
Segundo o Programa Nacional de Produção e Uso do Biodiesel, o Brasil importou em 2003
10% do diesel que consumiu principalmente no transporte de passageiros e de cargas. Este
combustível é o mais utilizado no país, correspondendo a 57,7% do consumo nacional de
combustíveis veiculares e com comercialização anual da ordem de 38,2 bilhões de litros. O
biodiesel ajuda na auto-suficiência de petróleo no Brasil, pois permite a economia na importação de
petróleo e de óleo diesel, além de minimizar a poluição gerada pelos motores a diesel. O uso do B2
(mistura de 2% do biodiesel ao diesel) pode gerar a comercialização de 800 milhões de litros de
biodiesel por ano, representando uma economia de 160 milhões de dólares na importação do diesel.
Por possuir solo e clima propícios ao cultivo de oleaginosas que servem para a produção de
biodiesel, o Brasil pode se tornar um dos maiores produtores desse combustível, usado tanto
internamente quanto para exportação. Uma prova da confiança no potencial do biodiesel e de sua
viabilidade é a lei nº 11.097, que determinou que até este ano o óleo diesel comercializado deveria
conter 2% de biodiesel, percentual que deve ser aumentado para 5% em 2013.
Também conforme dados do Programa Nacional de Produção e Uso do Biodiesel, existem
dezenas de espécies vegetais no Brasil que podem ser utilizadas, tais como mamona, dendê (palma),
girassol, babaçu, amendoim, soja e pinhão manso (Amorim, 2005, acresce a esse rol nabo forrageiro
e algodão). Como os óleos vegetais escolhidos para a produção de biocombustíveis variam de
acordo com o local, que deve apresentar clima, geografia e economia específicos (Ferrari, Oliveira e
Scabio, 2005), as culturas energéticas mais adequadas ao nordeste semi-árido são aquelas que não
necessitam de irrigação intensa e convivem bem com o regime pluviométrico da região, a qual
possui diversas espécies xerófitas nativas (como os pinhões e a leucena) que podem servir para a
produção de óleo para o biodiesel. Sendo implantado no nordeste brasileiro, um programa de
produção de culturas vegetais para o biodiesel seria uma solução para muitas famílias que sofrem
com a seca, passam fome e não têm uma renda digna (Parente, 2003).
Rathmann et al. (2005) e Parente (2003) salientam que não é apenas o nordeste que possui
um grande potencial para a produção de oleaginosas, já que a diversidade de ambientes encontrada
no Brasil favorece a cultura de variadas espécies (adaptadas a diferentes condições ambientais), o
que é uma vantagem em relação aos demais países. A Amazônia, por exemplo, tem excelentes
resultados na produção de palmeiras oleaginosas, como o dendezeiro, o que facilita a utilização do
biodiesel em lugar do diesel, o qual é a fonte de energia mais usada na região, embora apresente
preços elevados em razão do alto custo com transporte. Na região que abrange Maranhão e
Tocantins e parte do Piauí, Goiás, Mato Grosso e Pará, há potencial para a produção de babaçu,
uma cultura natural que pode gerar óleo para biodiesel e diversos outros produtos, além de poder ser
inserida em consórcio agrícola com outras oleaginosas para produção alimentícia e energética. Já as
regiões Sul e Centro Sul têm vocação agrícola para culturas temporárias e mecanizáveis, como o
amendoim, cujo teor de óleo é superior a 45%. Uma motivação para o consumo de biodiesel nessas
regiões é a melhora da qualidade ambiental nos grandes centros urbanos (Parente, 2003). Assim,
cada região tem potencial para matérias-primas específicas.

ENTRAVES NA PRODUÇÃO DE BIODIESEL


No Brasil, a dinâmica de preços dos combustíveis comandada pelo Estado não favorece,
por enquanto, o biodiesel. Isso ocorre porque o preço da gasolina em relação ao diesel foi fixado
para que houvesse lucro com a gasolina (com preços superiores aos do mercado internacional) e
subsídios para o diesel, cujo preço permanece abaixo da cotação média. O biodiesel é prejudicado
Fórum Internacional do Meio Ambiente - A conferência da Terra 744

pelo baixo piso do preço do diesel, o que tem sido contornado com os subsídios implícitos no
sistema de leilões de compra dos contratos de fornecimento (Dias, 2007).
Também no Brasil, um dos problemas na fabricação de biodiesel é a falta de garantia de
que os produtores destinarão as oleaginosas de forma a suprir a demanda nacional, já que a
produção de grãos no país é sujeita a variações nos preços internacionais e há risco de que o
abastecimento das indústrias seja voltado para o mercado externo. Além disso, estudos apontam que
a demanda mundial por biomassa pode dobrar até 2050, havendo também tensões na apropriação de
terras agricultáveis (Rathmann et al., 2005).
Outro problema no que concerne à viabilidade econômica é a geração de subprodutos na
fabricação do biodiesel, como a glicerina, lecitina, farelo e torta de oleaginosa. O incremento na
produção de biodiesel aumentará, por exemplo, a oferta de glicerina, que é um subproduto da
transesterificação. Desse modo, devem surgir novas utilizações da glicerina no Brasil e também
deve ser aproveitada a demanda externa, que vem aumentando (Rathmann et al., 2005). Desse
modo, devem ser encontrados usos para os variados subprodutos, abrindo novos mercados e
maximizando a viabilidade da produção de biodiesel.
Já em relação aos motores movidos a biodiesel, são necessárias adaptações tecnológicas
para que o produto deixe de ser usado como um aditivo (acrescentado ao diesel em baixas
concentrações) e passe a ser usado puro. Neste último caso, ele é chamado B100 (100% de
biodiesel) e, apesar de sua viscosidade melhorar o desempenho do motor, suas características de
solvente e as relativas à oxidação ainda comprometem a eficiência em relação ao diesel (Dias,
2007). O ponto de névoa (a temperatura inicial de cristalização) dos óleos vegetais já investigados é
superior ao do diesel, prejudicando o sistema de alimentação do motor e o filtro de combustível,
principalmente quando em baixas temperaturas. Para evitar a solidificação parcial do óleo bruto,
diminuir o ponto de névoa e aumentar a fluidez deve-se aquecê-lo previamente, o que pode ser feito
com a própria água de arrefecimento do motor, ou utilizar aditivos apropriados no óleo vegetal. Um
aditivo também é importante para melhorar a ignição, que tem melhor qualidade quando é utilizado
o diesel convencional (Ramos et al., 2000). Ademais, o progresso na frota de veículos é necessário
para que a diminuição na emissão de partículas quando da utilização do biodiesel seja significativa
(Dias, 2007). São, portanto, valiosas a pesquisa e a realização de experiências de modo a tornar o
uso do biodiesel mais eficaz.
A pesquisa científica também deve avançar na determinação das culturas agrícolas mais
adequadas para fornecer matéria-prima para o biodiesel, pois, além de alto teor de óleo, elas devem
ter preço competitivo em relação aos derivados de petróleo e, de preferência, não serem utilizadas
largamente na alimentação humana. Esta fomenta uma crítica freqüente ao uso do biodiesel, no que
concerne ao aproveitamento das terras agricultáveis para produção de combustível em detrimento
da de alimentos. Isso remete a uma característica intrínseca a muitas culturas de plantas de clima
semi-árido que pode ser aproveitada: o excelente desenvolvimento em ambientes que não são
favoráveis ao cultivo de vegetais usualmente destinados à alimentação. Um exemplo dessas plantas
é o pinhão manso, que possui sementes com teor de óleo bastante alto e do qual não são retirados
outros produtos, alimentícios ou não. Conforme exposto anteriormente, devem ser utilizadas as
plantas adaptadas a cada região, o que, segundo Dias (2007), é importante pra evitar gastos
excessivos com transporte do local de produção ao de consumo.

CONSIDERAÇÕES FINAIS
O biodiesel apresenta-se hoje como um combustível que contribui para a substituição dos
combustíveis derivados do petróleo, o qual não suportará por muito tempo os níveis de consumo
energético da nossa população. Além de renovável, o biodiesel minimiza as emissões de poluentes
atmosféricos e de gases que intensificam o efeito estufa e promove geração de emprego e renda para
as populações rurais.
A despeito das vantagens ecológicas, econômicas e sociais do biodiesel, ainda há
problemas que vão de encontro a sua implantação definitiva, os quais podem ser contornados com,
por exemplo, o estabelecimento de estratégias que aumentem sua viabilidade econômica e os
Fórum Internacional do Meio Ambiente - A conferência da Terra 745

investimentos em pesquisa e tecnologia, para que as culturas agrícolas utilizadas sejam adequadas e
de alta produtividade e para que seu consumo se torne mais eficiente.

REFERÊNCIAS BIBLIOGRÁFICAS
Alcançada meta de venda de 600 milhões de litros nos leilões de biodiesel. Disponível em:
<http://www.mda.gov.br/index.php?sccid=134&ctuid=9764>. Acesso em: 12 jul. 2006.
AMORIM, P. Q. R. Perspectiva histórica da cadeia da mamona e a introdução da produção de
biodiesel no semi-árido brasileiro sob o enfoque da teoria dos custos de transação. Monografia
apresentada à Escola Superior de Agricultura Luiz de Queiroz. 2005.
AZAM, M. Mohibbe; WARIS, Amtul; NAHAR, N. M. Prospects and potential of fatty acid methyl
esters of some non-traditional seed oils for use as biodiesel in India. Biomass and bioenergy, v. 29,
n. 4, p. 293-302, out. 2005.
BRASIL. Lei nº 11.097, de 13 de janeiro de 2005. Dispõe sobre a introdução do biodiesel na matriz
energética brasileira; altera as Leis nos 9.478, de 6 de agosto de 1997, 9.847, de 26 de outubro de
1999 e 10.636, de 30 de dezembro de 2002; e dá outras providências. Diário Oficial da República
Federativa do Brasil. Brasília, 14 jan. 2005. Seção 1. p. 8.
CHISTI, Y. Biodiesel from microalgae. Biotechnology Advances 25: 294–306. 2007.
DIAS, G. L. da S. Um desafio novo: o biodiesel. Estudos Avançados, 21 (59). 2007.
FERRARI, Roseli Aparecida; OLIVEIRA, Vanessa da Silva; SCABIO, Ardalla. Biodiesel de soja
— taxa de conversão em ésteres etílicos, caracterização físico-química e consumo em gerador de
energia. Química Nova, São Paulo, v. 28, n.1, jan./fev. 2005.
FRANCIS, George; EDINGER, Raphael; BECKER, Klaus. A concept for simultaneous wasteland
reclamation, fuel production, and socio-economic development in degraded areas in India: need,
potential and perspectives of Jatropha plantations. Natural Resources Forum, v. 29, n. 1, p. 12, fev.
2005.
LIMA, P. C. R. 2004. O Biodiesel e a inclusão social. Consultoria Legislativa da Câmara dos
Deputados, Brasília.
MARTÍNEZ-HERRERA, J.; SIDDHURAJU, P.; FRANCIS, G.; DÁVILA-ORTIZ, G.; BECKER,
K. Chemical composition, toxic/antimetabolic constituents, and effects of different treatments on
their levels, in four provenances of Jatropha curcas L. from Mexico. Food Chemistry, v. 96, n.1, p.
80-89, mai. 2006.
MASJUK, H.; SAPUAN, M. S.; Journal of American Oil Chemical Society. 12, 609, 1995.
MOREIRA, João Carlos; SENE, Eustáquio de. Geografia Geral e do Brasil: espaço geográfico e
globalização. 2. ed. São Paulo: Scipione. 2005. 560p.
National Biodiesel Board; In: Anais do Congresso Internacional de Biocombustíveis Líquidos;
Instituto de Tecnologia do Paraná; Secretaria de Estado da Ciência, Tecnologia e Ensino Superior;
Curitiba, PR, 19 a 22 de julho, 1998; p. 42.
PARENTE, Expedito José de Sá. Biodiesel: uma aventura tecnológica num país engraçado.
Fortaleza: Tecbio, 2003, 68p.
PIYAPORN, I. K.; JEYASHOKE. N.; KANIT. K. Journal of American Oil Chemical Society. 73:
741. 1996.
Programa nacional de produção e uso do biodiesel. Disponível em: <www.biodiesel.gov.br>.
Acesso em: 6 de maio de 2006.
RAMOS, L. P.; ZAGONEL, G. F.; ROSSI, L. F. S.; COSTA NETO, P. R. Produção de
biocombustível alternativo ao óleo diesel através da transesterificação de óleo de soja usado em
frituras. Química Nova, v. 23, n. 4, jul./ago. 2000.
RATHMANN, R.; PLÁ, J. A.; PADULA, A. D.; BENEDETTI, O. Biodiesel: Uma Alternativa
Estratégica na Matriz Energética Brasileira?. In: II SEMINÁRIO DE GESTÃO DE NEGÓCIOS,
2005, Curitiba. Biodiesel: Uma Alternativa Estratégica na Matriz Energética Brasileira?. Curitiba:
UNIFAE, v. 1, 2005.
SHUCHRDT, U.; SERCHELI, R.; VARGAS, M.; J. Braz. Chem. Soc. 9, 190, 1998.
Fórum Internacional do Meio Ambiente - A conferência da Terra 746

CONSERVAÇÃO DOS RECURSOS VEGETAIS NO MUNICÍPIO DE CUSTÓDIA – PE

Edneida Rabelo Cavalcanti


Pesquisadora da Coordenação Geral de Estudos Ambientais da Fundação Joaquim Nabuco. E-mail:
edneida.cavalcanti@fundaj.gov.br.
Natália Cristina Farias de Araújo
Discente do Curso de Licenciatura em Geografia da Universidade de Pernambuco. Discente do Curso de Bacharelado
em Geografia da Universidade Federal de Pernambuco. Bolsista do programa PIBIC/CNPq/Fundaj. E-mail:
nataliacfa@yahoo.com.br.

RESUMO
A pesquisa em questão foi desenvolvida no Município de Custódia, no Estado de
Pernambuco. O foco de estudo se baseou nas questões ambientais envolvidas na convivência do
sistema produtivo rural, utilizado no município, com as necessidades de conservação ambiental do
Bioma Caatinga, predominante na região. Tendo em vista que a existência da Reserva Legal e a
aplicação de técnicas de manejo florestal sustentado são elementos importantes no processo de
conservação dos recursos vegetais, foi dada especial atenção à problemática da falta de adoção
destes por parte dos produtores rurais da região. Para isso, buscou-se fazer também um
levantamento do tipo de sistema agrícola empregado por esses produtores, assim como as condições
de degradação ambiental nas quais se encontra o bioma.
Palavras-chave: Conservação; Manejo Florestal; Reserva Legal.

ABSTRACT
This research was developed in the city of Custódia, in Pernambuco’s state. The focus of
study was based on environmental problems that exist between the agricultural productive system,
used in the city, and environmental conservation’s necessities of Caatinga Bioma, predominating on
this region. Legal Reserve and the application of Forest Handling’s techniques are important
elements in the process of conservation of natural researches, that’s why was analyzed in special the
fact that these instruments are not adopted by most of agricultural producers from Custódia. It was
necessary make a survey about the type of agricultural system used by these producers, as well as
about the conditions of environmental degradation of Caatinga Bioma.
Keywords: Conservation; Forest Handling; Legal Reserve.

VEGETAÇÃO DA CAATINGA
O Município de Custódia encontra-se localizado na Mesorregião do Sertão Pernambucano,
especificamente na Microrregião do Sertão do Moxotó, dentro do Estado de Pernambuco, no
Nordeste do Brasil. Custódia estende-se sobre uma área de 1484,6 km, distante 340 km da cidade
do Recife, e possui como municípios limítrofes Iguaraci ao Norte, Ibimirim e Floresta ao Sul,
Sertânia à Leste e os municípios de Betânia e Flores à Oeste. Além disso, apresenta uma população
de 29.298 habitantes, dos quais 13.318 residem na zona rural e 16.612 na zona urbana,
configurando uma densidade demográfica de 20,24 hab/km2.
Custódia está inserida no domínio do clima semi-árido que tem como principais
características: a má distribuição e a concentração das chuvas em apenas 2 ou 3 meses no decorrer
do ano; pluviometria média anual variando entre 800 e 300 mm e elevada evapotranspiração,
devido às altas e constantes temperaturas.
No semi-árido, em grande parte de sua extensão territorial predominam solos de baixa
produtividade e altos níveis de degradação e erodibilidade, com limitações para as atividades
agrícolas. Esses solos geralmente são rasos e em certas condições bastante pedregosos, mas, de
forma geral, possuem boa fertilidade natural. Na verdade, o que existe é uma verdadeira colcha de
retalhos e na escala dos municípios isso também se evidencia e deveria consistir, através do uso do
zoneamento agroecológico, numa base consistente para o planejamento territorial das atividades
produtivas.
Fórum Internacional do Meio Ambiente - A conferência da Terra 747

Como resultado do clima e do tipo de solo, surge a vegetação da Caatinga, que em Tupi
Guarani significa “mata branca”, refletindo o aspecto esbranquiçado que a vegetação assumi no
período de estiagem, quando boa parte das espécies perde as folhas. De acordo com Leal et al
(2004, p. 140) “a Caatinga é um mosaico de arbustos espinhosos e florestas sazonalmente secas que
cobre a maior parte dos estados do Piauí, Ceará, Rio Grande do Norte, Paraíba, Pernambuco,
Alagoas, Sergipe, Bahia e a parte nordeste do de Minas Gerais, no vale do Jequitinhonha”.
Distribui-se numa amplitude de precipitação que varia entre 240 e 1500mm, sendo que predomina
espacialmente as que estão abaixo dos 800mm. Considera-se, a partir de evidências geológicas, que
a vegetação da Caatinga tem sua origem como parte de uma floresta tropical seca e sazonal que
ocupou grandes áreas da América do Sul durante o Pleistoceno, no qual o clima foi mais seco e frio.
Segundo os estudiosos do tema essa forma de vegetação não tenha sofrido alterações durante um
longo período, explicando o acentuado grau de endemismo encontrado.
Esse mosaico apresenta feições que vão de uma caatinga arbustiva aberta a uma caatinga
arbórea fechada, sendo esta última raramente encontrada em função do alto grau de destruição ao
qual esteve submetida desde o período da colonização, estando hoje restrita a manchas esparsas e
fragmentadas. É comum a divisão da caatinga em hipoxerófita, correspondendo à zona fisiográfica
do agreste, e a caatinga hiperxerófica, correspondendo a zona fisiográfica do sertão, subdividido por
Vasconcelos Sobrinho (1970) em Carrasco, Curimataú, Cariri, Seridó e ainda outros tipos
vegetacionais menos precisos e incertos.
Todo esse conjunto de clima, vegetação e solo compõe o Bioma Caatinga. A definição de
bioma permite entendê-lo como sendo uma comunidade, ou um conjunto de seres vivos de espécies
diferentes, que é determinada pelo clima local. Sendo assim, ele é caracterizado por uma área
desenvolvida e adaptada às condições morfoclimáticas da região onde se encontra, e ainda por uma
vegetação predominante, nesse caso a caatinga. Diante disso, pode-se afirmar que esse biociclo se
apresenta como um imenso ecossistema terrestre inserido na biosfera.
A Caatinga se estende de forma restrita aos limites do Brasil, se constituindo portanto em
um bioma exclusivamente brasileiro. Seu domínio abrange uma área de aproximadamente 844.453
km2 – IBGE; 2004 – e inclui parcialmente os estados do Piauí, Rio Grande do Norte, Paraíba,
Pernambuco (domina cerca de 2/3 de seu território), Alagoas, Sergipe, Bahia e Minas Gerais.
Segundo Silva et al apud Leal et al (2005, p. 140), “apesar de ser a única grade região
natural brasileira cujos limites estão inteiramente restritos ao território nacional, pouca atenção tem
sido dada à conservação da variada e marcante paisagem da Caatinga, e a contribuição de sua biota
à biodiversidade extremamente alta do Brasil tem sido subestimada”. Tem o menor número e a
menor extensão protegida dentre todos os biomas brasileiros e, além disso, o que existe é falho para
proteger a biodiversidade que a Caatinga possui.
De acordo com Leal et al (2004, p.142), “a agricultura de corte e queima – que converte,
anulamente, remanescentes de vegetação em culturas de ciclo curto –, o corte de madeira para
lenha, a caça de animais e a contínua remoção da vegetação para a criação de bovinos e caprinos
tem levado ao empobrecimento ambiental, em larga escala, da Caatinga”.
A riqueza biológica e geográfica do Bioma Caatinga é de tal forma peculiar que se acredita
na existência não de uma, mas sim de várias “Caatingas”, levando à delimitação de oito ecorregiões
dentro do próprio bioma. Cada ecorregião representa um dos diferentes tipos de Caatinga,
classificados de acordo com as especificidades bióticas e abióticas, bem como com as interrelações
ecológicas, e com as condições de exploração em que se encontram as ecorregiões delimitadas.
Dessa forma, o Bioma da Caatinga se traduz hoje, principalmente, em fonte de recursos
florestais para o setor agrário, através da matéria-prima e da pastagem natural, e para o industrial e
o residencial como fornecedor de matéria-prima para a produção de energia.
Na área da Caatinga são realizadas diversas atividades agrícolas e o extrativismo, sem
dúvida, é a mais danosa ao meio ambiente, de forma que vai desde a simples retirada de plantas
medicinais e alimentícias de florestas primárias e secundárias, até a extração de lenha, muito
comum na região. Essa atividade provoca de maneira intensiva a degradação ambiental no bioma
que já tem uma perda anual estimada em 350 mil hectares de vegetação nativa. As atividades
Fórum Internacional do Meio Ambiente - A conferência da Terra 748

tradicionais – incluindo a agricultura de subsistência com o cultivo principalmente de feijão, milho,


palma adensada e algaroba – são a base econômica da região, sendo formadas pelo conjunto de
gado e lavouras alimentares, bem como pela agropecuária de sequeiro, que é responsável por
explorar o algodão, o couro, a carnaúba e a mamona.
Essas culturas são caracterizadas por baixa eficiência, baixa produção e também baixa
produtividade, devido à sua forma de uso convencional do solo, substituindo as áreas de mata nativa
por lavouras e, principalmente, pela difícil adaptação às especificidades climáticas do bioma
Caatinga, visto que são vulneráveis às freqüentes estiagens.
Tendo em vista que os recursos naturais se constituem na fonte primária de energia capaz
de viabilizar o funcionamento da economia, a problemática surge quando se percebe que o meio
ambiente não é inesgotável, nem tampouco, suporta indiscriminadamente todos os efeitos
produzidos pelas atividades comerciais fomentadas pelos atores da economia.
No caso da região que abrange o Bioma Caatinga, o que representa e intensifica
gradativamente a imposição do sistema produtivo sobre as questões de relevância ambiental é a
substituição massiva das atividades de autoabastecimento e abastecimento do mercado interno, por
parte do produtor rural, pelo sistema capitalista de agroindústrias e pecuarização em grande escala.
Há, inclusive, a necessidade, muitas vezes, de substituir a vegetação nativa por pastagens artificiais
para abarcar a grande demanda da pecuária. O quadro é ainda agravado com a utilização de técnicas
rudimentares de manejo como a “coivara”, por exemplo, que consiste na queima da vegetação e,
conseqüentemente, dos minerais do solo.

DEGRADAÇÃO DA CAATINGA E FORMAS DE CONSERVAÇÃO DISPERSAS


De acordo com a lei brasileira nº 6.938, de 31 de agosto de 1981, a
degradação ambiental é a “alteração adversa das características do meio ambiente”, ou seja,
a degradação se traduz nos danos ao meio ambiente que promovem a perda da capacidade produtiva
deste, afetando a biodiversidade e até mesmo a qualidade de vida do ser humano.
A degradação ambiental está ocorrendo no Bioma Caatinga de maneira exacerbada e
inescrupulosa, visto que, 50% de sua área já foi alterada pela ação antrópica e apenas 0,002% do
seu território é protegido sob a forma de Unidades de Conservação, segundo dados do Ministério do
Meio Ambiente.
Do ponto de vista da propriedade rural existe uma categoria estabelecida pelo Código
Florestal que firma a obrigatoriedade de respeitar o ambiente natural de parte da propriedade rural.
É o caso da Reserva Florestal Legal (RL), uma Área de Proteção Ambiental que corresponde a uma
parcela da propriedade rural onde a vegetação nativa deve ser mantida com o intuito de assegurar a
conservação dos recursos naturais e, conseqüentemente, da biodiversidade. Isso inclui as interações
ecológicas que se dão entre as diferentes espécies vegetais e animais daquele habitat.
De acordo com a Medida Provisória nº 2.166-66, de 26 de julho de 2001, a Reserva Legal
é uma “área localizada no interior de uma propriedade ou posse rural, excetuada a de preservação
permanente, necessária ao uso sustentável dos recursos naturais, à conservação e reabilitação dos
processos ecológicos, à conservação da biodiversidade e ao abrigo e proteção de fauna e flora
nativas”. Para o Nordeste a área estipulada é de 20% da propriedade.

CONSERVAÇÃO DA CAATINGA NO MUNICÍPIO DE CUSTÓDIA


O Município de Custódia está localizado na Bacia do Moxotó, afluente do Rio São
Francisco e não foge a regra no diz respeito a pressão sobre a vegetação nativa, constituindo-se em
uma área que ainda oferta cobertura florestal com esse tipo de vegetação sendo alvo de
atravessadores na compra da lenha e do carvão.
Apesar de representar tamanho grau de importância no que se refere à conservação das
características e necessidades ambientais intrínsecas a uma região florestal, a Reserva Legal não é
implementada por uma parcela considerável dos produtores agrícolas, em especial pelos produtores
convencionais. No município de Custódia, por exemplo, há um dado alarmante de que apenas uma
Fórum Internacional do Meio Ambiente - A conferência da Terra 749

propriedade rural possui área de Reserva Legal averbada junto à CPRH e duas junto ao Ibama,
evidenciados nos quadros 1 e 2 a seguir:

Quadro 1 – Propriedade com Reserva Legal (RL) averbada pela CPRH


Proprietário Propriedade Área Total (ha) Área de RL (ha)
Amaro Florêncio dos Santos Sítio Mulungu 40 8
Fonte: CPRH,2007.

Quadro 2 – Propriedades com Reserva Legal (RL) averbada pelo Ibama


Imóvel Rural Área de RL (ha)
Sítio Lajedo 52,68
Sítio Itãn 24,44
Fonte: Ibama,2007.

Da mesma forma que a Reserva Legal, as APPs (Áreas de Preservação Permanente)


também são consideradas Áreas de Proteção Ambiental e sofrem, com intensidade ainda mais
agravante, a pressão antrópica através principalmente de atividades agropecuárias, que, por sinal,
vêm crescendo, chegando a representar no Sertão Pernambucano quase 30% da participação do
estado nesse ramo no ano de 1998.
Segundo o Código Florestal (Lei nº 4777/65), a APP é uma “área (...) coberta ou não por
vegetação nativa, com a função ambiental de preservar os recursos hídricos, a paisagem, a
estabilidade geológica, a biodiversidade, o fluxo gênico de fauna e flora, proteger o solo e assegurar
o bem-estar das populações humanas”.
Dentre as áreas consideradas de Preservação Permanente, como as diversas formas de
vegetação que asseguram a não erodibilidade das terras e a proteção de dunas, por exemplo,
destacam-se as matas ciliares ou ripárias que são encontradas nas margens de cursos de rios ou
córregos, nas ribanceiras de lagos ou represas, bem como, nas superfícies de inundação, chegando
até as margens do corpo d'água.
A importância das matas ciliares é indiscutível para o meio ambiente, pois são sistemas
que funcionam como reguladores do fluxo de água, sedimentos e nutrientes entre os terrenos mais
altos da bacia hidrográfica e o ecossistema aquático, de tal forma que sua retirada implica na
supressão de uma barreira natural capaz de evitar a entrada de sedimentos provenientes das margens
dos biociclos aquáticos. Com isso, ocorre o processo de assoreamento desse biociclo e,
conseqüentemente, seu desaparecimento com a perda gradativa da água, visto que, a profundidade
deste tende a diminuir com a entrada dos sedimentos, favorecendo a evaporação.
Uma outra categoria que pode repercutir favoravelmente na conservação da vegetação da
caatinga é o manejo florestal sustentado, cuja adoção não é feita pela maior parte dos produtores
rurais que dependem do extrativismo vegetal para sua subsistência. A exemplo disso retoma-se o
município de Custódia, no qual apenas 3 das 2046 propriedades rurais possuem manejo florestal,
como pode ser confirmado no quadro 3 abaixo:
Fórum Internacional do Meio Ambiente - A conferência da Terra 750

Quadro 3 – Propriedades que possuem Manejo Florestal Sustentado no município de Custódia-PE


Ciclo de
Área da Área
Nome da Nome do Produto Restrições Corte
Propriedade Manejada
Propriedade Proprietário do PMFS de Corte Proposto
(ha) (ha)
(ano)
1 Amaro Espécies
Faz. Santo
Everaldo da 276,00 209,06 Carvão Protegidas 13
Amaro
Silva por Lei
2 Espécies
Faz. São Luiz Nunes Lenha e
441,00 180,00 Protegidas 10
Francisco Ferreira Carvão
por Lei
3
Faz. Lenha, Espécies
José Ronaldo
Baraúna de 409,00 270,00 Estaca e Protegidas 10
Elesbão
São João Carvão por Lei
1
Dados coletados no ano de 2004; 2Dados coletados no ano de 2000; 3Dados coletados no ano de
2003. Fonte: CPRH,2007.

O manejo florestal sustentado consiste no uso racional dos recursos naturais, de maneira a
respeitar a capacidade de suporte de plantação em um determinado lugar, levando-se em
consideração as condições climáticas e fisiográficas às quais está submetido o solo a ser manejado.
Para isso, a região de mata ou de floresta deve sofrer o mínimo de impacto possível, através da
aplicação de técnicas que assegurem a manutenção do potencial de fornecimento de matéria-prima
para a subsistência dos produtores rurais, bem como a resiliência, ou seja, a capacidade de
regeneração dos recursos ambientais. Para se elaborar um Plano de Manejo é necessário ter
conhecimento sobre a capacidade de produtividade dos diversos ecossistemas a fim de que sejam
aplicadas as mais adequadas técnicas possíveis no uso dos recursos naturais de cada região.
De acordo com a Lei Federal 11.284/06 a responsabilidade quanto as aprovações e
instituições de atividades florestais, no Estado de Pernambuco, está a cargo da CPRH. Isso significa
que é papel da CPRH, dentre outros, fazer a aprovação da localização das áreas de Reserva Legal
nas propriedades rurais assim como aprovar o Plano de Manejo.
Essa descentralização da organização institucional que repassa aos estados
responsabilidades em procedimentos como a averbação da Reserva Legal e a autorização dos
Planos de Manejo, pode acarretar em inúmeras limitações, tanto no entendimento, quanto nas
atividades de apoio e monitoramento.
Prova disso é que a implantação do Manejo Florestal e o cumprimento da área de Reserva
Legal no Bioma Caatinga esbarram muitas vezes nas dificuldades para se modificar a maneira de
lidar com os recursos naturais. Enxergá-los não só como fonte energética e de subsistência, mas
também como um sistema de grande diversidade biológica que requer cautela no momento da
intervenção antrópica.

CONSIDERAÇÕES FINAIS
É quase impossível tratar da conservação da Caatinga sem tocar nos sistemas produtivos e
nas relações de produção, aí também incluindo a questão fundiária. É necessária uma abordagem
integrada para garantir a diminuição da pressão sobre os recursos e/ou o uso inadequado do solo,
cujas conseqüências levam a processos muitas vezes irreversíveis ou muito caros de recuperação.
A visão que se tem após toda a análise feita no município de Custódia é a da emergência
ambiental em que se encontra a região devido à ausência de Manejo Florestal Sustentado, bem
como de Reserva Legal na maior parte das propriedades rurais, principalmente quando confrontado
com a demanda e pressão existente sobre a vegetação nativa.
Os recursos naturais representam um conjunto de ecossistemas dinâmicos em sua evolução
e distribuição e, portanto, as perdas em termos da qualidade e oferta destes e mesmo do ciclo
biológico interrompido nas áreas afetadas por sistemas de produção capitalista como a área de
Fórum Internacional do Meio Ambiente - A conferência da Terra 751

Custódia, são, na maior parte dos casos, irreversíveis. Como exemplo de casos extremos tem-se a
desertificação enquanto processo representativo do resultado da superestimação de danos
ambientais.
Sendo assim, os recursos naturais dependem de mudanças sócio-políticas que, por sinal,
devem ser veementemente empregadas no modelo de desenvolvimento atual de forma condizente
com as particularidades de cada região, analisando as potencialidades edáficas e fitogeográficas
locais. Mudanças essas, cujo direcionamento deve ser dado por efetivas políticas públicas, qual seja,
pelas ações do governo que venham para responder as demandas da população, ou ainda, sob uma
perspectiva mais holística, através da educação ambiental.
A principal meta de transformações no quadro social do semi-árido deve ser a aplicação de
técnicas de Manejo Florestal. Essa perspectiva resultará, sem dúvida, em alternativas mais viáveis
não somente para a conservação dos recursos naturais e aproveitamento dos recursos hídricos, como
também, com relação à melhoria dos meios de subsistência dos produtores rurais nesse ambiente
complexo e tão rico em biodiversidade.

REFERÊNCIAS
Conselho Nacional da Reserva da Biosfera da Caatinga (Brasil). Cenários para o Bioma Caatinga.
Recife: SECTMA, 2004.
JOELS, Liliane Miranda. Reserva Legal e Gestão Ambiental da Propriedade Rural: um estudo
comparativo da atitude e comportamento de Agricultores Orgânicos e Convencionais do Distrito
Federal. Mar. 2002. Disponível em: <www.planetaorganico.com.br/trabjoels2.htm>. Acesso em 25
de janeiro de 2007.
LEAL, R. Inara; SILVA, José Maria C.; TABARELLI, Marcelo; LACHER JR., Thomas E..
Mudando o rumo da conservação da biodiversidade da Caatinga no Nordeste do Brasil.
Megadiversidade, Vol. 1, N. 1, jul, 2005.
MACHADO, Paulo Affonso Leme. Comentários sobre a Reserva Florestal Legal. Set. 2001.
Disponível em: <http://www.ipef.br/legislacao/comentariosreserva.asp>. Acesso em 25 de janeiro
de 2007.
METZGER, Jean Paul. Bases Biológicas para a Reserva Legal. Ciência Hoje, São Paulo, vol.31,
nº183, 48-49.
Ministério de Minas e Energia. Secretaria de Geologia, Mineração e Transformação Mineral.
Diagnóstico do Município de Custódia. Recife, set. 2005. Disponível em:
<http://www.cprm.gov.br/rehi/atlas/pernambuco/relatorios/CUST054.pdf>. Acesso em 03 de março
de 2008.
Fórum Internacional do Meio Ambiente - A conferência da Terra 752

DECLÍNIO DE POPULAÇÕES DE ANFÍBIOS E MUDANÇAS CLIMÁTICAS: REVISÃO

S. P. L. Santos
Aluna do Curso de Bacharelado em Ciências Biológicas/Ambientais da Universidade Federal de Pernambuco. Av. Prof.
Moraes Rego, 1235 - Cidade Universitária, Recife - PE - CEP: 50670-901
Fone PABX: (81) 2126.8000 / Fax: (81) 2126.8029. sueny_paloma@hotmail.com
E. M. Santos
Professora orientadora da Universidade Federal Rural de Pernambuco/ Unidade Acadêmica de Serra Talhada. R. Dom
Manoel de Medeiros, s/n - Dois Irmãos, Recife- PE – CEP: 52171-900 – Fone: (81) 3320.6011.
ednilzamaranhao@yahoo.com.br

RESUMO
Este trabalho traz uma revisão dos principais estudos realizados nos últimos anos sobre o
problema no declínio de anfíbios relacionados às mudanças climáticas globais. Este fenômeno está
sendo observado em diferentes países, inclusive o Brasil. Vários temas foram abordados, como
flutuações nas populações, aumento da incidência dos raios solares, infecção por fungos ou
parasitas, tudo relacionado com a mudança no clima. A partir desses estudos, conclui-se que não
existe uma única causa que explique esse fenômeno, mas sim vários fatores que atuam em conjunto.
Palavras-Chaves: anfíbios, população em declínio, mudanças climáticas, conservação.

ABSTRACT
This paper provides a review of major studies in recent years about the problem in the
decline of amphibians related global climate change. This phenomenon is being observed in
different countries, including Brazil. Several issues were raised such as fluctuations in population,
increased incidence of sunlight, infection by fungi or parasites, all related to the change in climate.
From these studies, it is concluded that there is no single cause that explains this phenomenon, but
several factors that act together.
Keywords: amphibians, population declines, climate change, conservation.

INTRODUÇÃO
Os anfíbios formam um grupo de organismos vertebrados com cerca de mais de seis mil
espécies conhecidas em todo o mundo (Figura I), que incluem rãs, sapos, pererecas, salamandras e
cecílias, que existem há aproximadamente 300 milhões de anos, e só entre os anos 1970 e 2000 se
crê que cerca de 170 espécies tenham sofrido extinção (Figura II) e pelo menos 2.469 (43%)
espécies apresentem um declínio na sua população, indicando que provavelmente o número de
espécies ameaçadas continue a aumentar (Stuart et al, 2004).
Após alguns anos de estudos, debates, conferências, workshops, sobre o declínio nas
populações de anfíbios, esse fenômeno tem sido pouco estudado pelos pesquisadores brasileiros
(Juncá, 2001). Nesse trabalho, nós fazemos uma compilação dos principais estudos que
investigaram e propuseram as diferentes causas, fornecendo ferramentas para futuros trabalhos
sobre a real situação das populações de espécies de anuros brasileiros.
Os declínios têm sido particularmente intensos no oeste dos Estados Unidos da América,
América Central, América do Sul e no leste da Austrália. Não obstante, casos de extinções maciças
de anfíbios têm aparecido por todo o mundo. As atividades humanas estão causando uma grande
perda na biodiversidade a nível global, parecendo que os anfíbios estão sofrendo com um efeito
muito maior do que o registrado em outros organismos (Blaustein, 1990).
O tema foi primeiramente abordado em 1989 durante o 1º Congresso Mundial de
Herpetologia, na Inglaterra. Mas os primeiros registros datavam 1970, que tinha como explicação
que as mudanças no clima, não afetavam apenas populações situadas em áreas obviamente
ameaçadas, mas também aquelas localizadas em áreas protegidas. Em 1971, cerca de 40 cientistas
de todas as áreas realizaram na Califórnia, EUA, um workshop para debater o assunto (Barinaga,
1990; Phillips, 1990; Stebbins & Cohen, 1995).
Como causas inicialmente sugeridas para o declínio foram listadas infecção por fungos,
bactérias, vírus, aumento da luz ultravioleta, habitats poluídos, introdução de espécies exóticas,
Fórum Internacional do Meio Ambiente - A conferência da Terra 753

desmatamento (Barinaga, 1990; Phillips, 1990; Stebbins & Cohen, 1995). Desde 1990, pesquisados
de vários países e instituições estão se esforçando para determinar o porquê dos anfíbios estão
desaparecendo
Apesar do tema ter sido abordado em 1970, ele foi amplamente reconhecido no final da
década de 1980, quando uma assembléia de herpetólogos relatou a existência de um decréscimo nas
populações em todo o planeta (Blaustein, 1990). Entre estes declínios, encontra-se o caso do sapo-
dourado de Monteverde, Costa Rica, uma espécie que se considerava proeminente. O sapo-dourado,
Bufo periglenes, era tema de investigação científica, até que a sua população começou a diminuir
em 1987 e desapareceu completamente em 1989 (Crump et al, 1992). Outras espécies em
Monteverde, incluindo a rã-arlequim de Monteverde, Atelopus varius, também desapareceram ao
mesmo tempo. Ambas espécies encontravam-se distribuídas numa reserva natural, e esta extinção
não podia estar relacionada com as atividades humanas da zona, este fato gerou uma particular
preocupação entre os cientistas (Pound et al, 1994).
Em finais da década de 1980, quando o declínio das populações de anfíbios foi apresentado
como um tema de maior interesse para a conservação de espécies, alguns cientistas não acreditavam
na realidade e gravidade que apresentava a problemática de conservação destas espécies (Pechmann
et al, 1997). Alguns biólogos argumentaram que as populações da maioria dos organismos variam
naturalmente. Eles discutiam que a falta de informação em longo prazo sobre as populações de
anfíbios faziam com que fosse difícil determinar se os declínios relatados pelos biólogos eram
dignos de recursos e esforços de programas de conservação (Jensen & Cump, 2003). No entanto, e
após este cepticismo inicial, os biólogos chegaram ao consenso que os declínios nas populações de
anfíbios são uma real e dura ameaça para a biodiversidade (Stuart et al, 2004). Este consenso surgiu
com o implemento do número de estudos de monitoramento das populações de anfíbios e a
observação direta da mortalidade maciça em lugares que careciam de causas aparentes, e o
conhecimento de que o declínio nas populações de anfíbios é verdadeiro a nível global (Houlahan et
al, 2000).
No Brasil existe hoje cerca de 285 espécies, dessas 16 estão na lista de animais em risco de
extinção e 1 já foi considerada extinta. Devido à falta de estudos e monitoramento em diferentes
regiões não se tem um diagnóstico mais confiável sobre atual situação geral desse grupo. A primeira
lista foi divulgada em 1989 com apenas 9 espécies ameaçadas e em 2002 (IBAMA, 2003) foi
acrescentado a essa lista mais 6 espécies de anfíbios, e 3 são endêmicas da região do Nordeste do
Brasil.
Existem muitas hipóteses sobre o recente declínio, mas no geral são separadas em alguns
grupos principais (Tabela I), e algumas soluções para tentar reverter esses casos (Tabela II),
baseados nas pesquisas de Collins e Storfer (2003):

MUDANÇAS CLIMÁTICAS
É uma das principais causas dos possíveis declínios das populações de anfíbios anuros que
vem sendo debatida constantemente entre pesquisadores de diversas áreas como a causa responsável
pelo desaparecimento de muitas espécies, antes menos de serem conhecidas.
Entretanto, as verdadeiras dimensões da influência da mudança no clima ainda não estão
totalmente claras. Na Reserva Monteverde, Costa Rica, em uma área montanhosa de Florestas de
Neblina, as mudanças da temperatura do ar, cuja a causa foi um aquecimento das massas de ar
oceânicas tropicais registradas desde 1980, têm coincidido com o processo de declínio registrado
para 20 das 50 espécies de anuros, incluindo Bufo periglenes (Pounds et al., 1994). Além de anuros,
o estudo também revela alterações em populações de espécies de aves que se reproduzem na
Floresta de Neblina, acima de 1500 m. Estas espécies teriam diminuído muito, enquanto que
espécies que se reproduzem na região dita “pré-montana”, abaixo de 1500 m, teriam tido aumento
populacional. Algo semelhante também foi encontrado para populações de espécies de lagartos.
Neste trabalho foi demonstrado que o aumento de temperatura nos oceanos tropicais diminuiu
drasticamente a freqüência da neblina nas montanhas durante a estação seca, proporcionando uma
alteração da hidrologia local. A diversidade de mudanças demográficas relacionadas a estas
Fórum Internacional do Meio Ambiente - A conferência da Terra 754

mudanças, sugeriram que o clima poderia ser o fator principal destes declínios, agindo por vários
mecanismos físicos ou abióticos. Assim, o indício de que uma seca mais drástica, ocorrida em 1983,
aumentou a vulnerabilidade do sapo arlequim, Atelopus varius, a um parasita letal, sugeriu a
hipótese de epidemias ligadas ao clima. Quando o ambiente secou, os indivíduos se reuniram
próximo a água disponível, aumentando a probabilidade do ataque de parasitas. Uma mudança
climática inesperada pode afetar as relações entre hospedeiros e parasitas por vários caminhos,
influenciando em um aumento na mortalidade. Desta forma, as amplas extinções de diferentes
espécies de anuros observadas em florestas primárias montanhosas, estariam atestando quanto
profundas e imprevisíveis podem ser as alterações provocadas pelas mudanças climáticas nas
interações ecológicas (Green, 1997; Blaustein 2003).

RAIOS ULTRAVIOLETAS
O segundo grupo de fatores, mais complexos, que potencialmente estão relacionados com
o declínio é aumento da radiação UV-B. Os mecanismos subjacentes a este fator são complexos e
podem estar em sinergia com alguns outros fatores, tais como contaminantes químicos, doenças
infecciosas emergentes e deformações ou malformações, destruição de habitats e introdução de
espécies, exacerbando os resultados (Blaustein, 2003).
Tem detectado um notável incremento da radiação UV-B devido às mudanças climáticas e
à redução do ozônio estratosférico. Os anfíbios são extremadamente susceptíveis à radiação UV-B
dado que os seus ovos carecem de casca, e a sua pele, tanto a dos adultos quanto aos dos jovens, é
delgada e delicada. É altamente provável que os incrementos na radiação UV-B tenham contribuído
significativamente para o declínio das populações de anfíbios (Blaustein & Wake, 1995).
Os investigadores chegam à conclusão que não existe apenas uma única causa para o
declínio global. Todos os fatores acima expostos estão a ameaçando populações de anfíbios, em
maior ou menor grau. Muitas das causas do declínio são bem compreendidas e explicadas e
parecem afetar outros grupos de organismos para além dos anfíbios (Stwart, 1995).

DESTRUIÇÃO E FRAGMENTAÇÃO DO HABITAT


Um grupo que tem maior proeminência inclui fatores gerais relacionados com a crise de
biodiversidade: destruição, modificação e fragmentação de habitats, introdução de espécies e
exploração excessiva. Para estas ameaças, têm-se uma melhor compreensão dos declínios de
anfíbios, subjacentes aos mecanismos ecológicos. No entanto, as populações de anfíbios têm sofrido
declínios em ambientes naturais remotos sem perturbações aparentes (Stwart, 1995). A alteração e a
destruição de habitats é, claramente, o fator mais dramático que afeta as populações de anfíbios em
todo o mundo. A fragmentação de habitat tem lugar quando os habitats são isolados por
modificações de caráter físico, como por exemplo, quando uma pequena área de um bosque é
completamente rodeada por campos de agricultura. As pequenas populações que sobrevivem nestes
habitats fragmentados ficam também susceptíveis à endogamia, deriva genética ou extinção, devido
a pequenas flutuações no meio ambiente (Blaustein, 2003).
Uma grande quantidade de ecossistemas está sendo destruída a um ritmo elevado,
diminuindo a disponibilidade de habitats. Os agentes contaminantes afetam indiretamente os
anfíbios, devido à diminuição da camada de ozônio, fazendo com que a radiação solar danifique as
suas peles úmidas, afetando também o seu sistema imunológico. A permeabilidade da pele dos
anfíbios, os seus ciclos de vida com duas fases e seus ovos sem casca protetora, tornam os anfíbios
extremadamente susceptíveis a pequenas modificações da temperatura e níveis de umidade
(Blaustein, 2003).
O aquecimento parece ser a causa da maturação ou reprodução prematura por parte de
algumas espécies de anfíbios de climas temperados, deixando as espécies susceptíveis aos efeitos
climáticos que acontecem em estações onde elas deveriam estar em processo de hibernação
(Stewart, 1995).
Uma série de estudos realizados na região dos trópicos revelou uma relação causal entre
irregularidades climáticas e declínios populacionais. No Brasil, registrou-se a extinção de cinco
Fórum Internacional do Meio Ambiente - A conferência da Terra 755

espécies de sapos em conseqüência de uma série de geadas. Também no Brasil, detectaram-se


declínios nas populações de anfíbios relacionados com invernos mais secos (Heyer et al, 1998). Em
Porto Rico, relacionou-se o acentuado declínio na população da espécie Eleutherodactylus coqui
com o crescente número de extensos períodos secos (baixa quantidade de precipitação, com menos
de 3 mm) (Stewart, 1995). É também o caso da extinção do sapo da espécie Bufo periglenes, e do
declínio de outras espécies de rãs da zona, associadas com uma freqüência irregular do índice de
umidade da neblina dos bosques tropicais de Monteverde (Pound et al, 1994).
Outros estudos revelaram que em dias extremamente secos, reduz-se a profundidade dos
charcos onde algumas espécies de anfíbios depositam os seus ovos. A diminuição da profundidade
aumenta a exposição dos embriões a radiação UV-B, aumentando a susceptibilidade a doenças
infecciosas como a que é provocada por Saprolegnia ferax, que causa a mortalidade dos ovos
(Blaustein et al, 1994).

FUNGO QUITRÍDEO
Na Austrália, a partir de um número grande de anuros mortos, suspeitou-se inicialmente de
um vírus. Os cortes histológicos obtidos de indivíduos infectados apontavam para um vírus, do
gênero Ranavírus, que já havia sido isolado de um anuro de hábito fossório, Limnodynastes
ornatus, em 1989. Em 1998, entretanto, pesquisadores australianos descreveram uma nova espécie
de fungo quitrídeo, Batrachochytrium dendrobatidis, como um fungo letal para anuros (Morell,
1999). O interesse por este grupo de fungos cresceu diante da alta mortalidade observada em áreas
sem pesticidas ou qualquer produto tóxico. Os fungos foram encontrados em quase todas as
populações observadas. A epidemia aparentemente surgiu no final dos anos 70 e início dos anos 80.
O primeiro registro de uma grande mortalidade foi em 1979 e suspeita-se que o fungo tenha sido
introduzido na Austrália no início dos anos 70, talvez por uma espécie de anuro exótico (Laurance
et al., 1996; Morell, 1999). Algumas espécies tem mostrado resistência a este fungo. A rã de olhos
vermelhos, Litoria chloris apresentou alta mortalidade no final dos anos 80. As espécies mais
ligadas a ambientes de águas lóticas, incluindo Rheobatrachus silus e R. vitellinus, parecem, no
entanto, ter sido dizimadas pelo fungo. Outras 24 espécies têm sido afetadas, das quais onze
dramaticamente (Morell, 1999). Ao mesmo tempo, na América Central, o fungo foi encontrado em
dez espécies diferentes que mostraram alta mortalidade no oeste do Panamá. Suspeita-se que ele
esteja também na Costa Rica. Trabalhos genéticos preliminares sugerem que o fungo da América
Central é o mesmo encontrado nos anuros australianos, mas os resultados ainda não são
conclusivos. Os fungos quitrídeos, em geral, utilizam a quitina, queratina e celulose como nutriente,
apresentando, portanto, uma ampla gama de hospedeiros. Nos anuros, eles foram localizados na
pele e devem, portanto, estar utilizando a queratina. Não se sabe ainda como eles matam o
indivíduo infectado. Em outros vertebrados, a infecção por fungos é considerada uma infecção
secundária. Centros de patologia nos EUA estão fazendo testes para verificar se outros fatores
poderiam estar envolvidos, predispondo os animais à infecção por fungos (Morell, 1999).

CONSIDERAÇÕES FINAIS
Países como Austrália e alguns da América Central já apresentam um satisfatório
conhecimento sobre as espécies de anfíbios anuros ameaçados e algumas possíveis causas inter-
relacionadas, já estão sendo investigadas e discutidas. Através da discussão desse trabalho, conclui-
se que os declínios observados não necessariamente apresentam causa única. Além disso, fatores
como mudança no clima, aumento dos raios ultravioletas poderiam agir com outros fatores bióticos
e abióticos, como a presença do fungo quitrídeo.
No Brasil ainda há problemas ainda de base sobre declínios e extinções, não apenas com
anfíbios. Porque alguns países da América Latina ainda não apresentam uma boa política de
conservação. Desmatamentos para formação de áreas agropecuárias ocorreram e ocorrem
indiscriminadamente, sem estudos que indiquem o real impacto desta ação sobre a fauna. Desta
forma, faltam trabalhos de monitoramento para o conhecimento da composição da anurofauna. Com
Fórum Internacional do Meio Ambiente - A conferência da Terra 756

isso, várias espécies estão sendo perdidas antes mesmo de serem reconhecidas e estudadas pela
comunidade científica.

Tabela I. Alguns fatores que provavelmente causam o declínio na população de anfíbios no mundo.
FATORES PROCESSOS
Padrões de temperatura e precipitação são alterados de modo a
Mudanças Climáticas
causar perturbações nas condições micro e macroclimáticas.
Florestas são derrubadas para povoamento e agricultura; zonas
Modificações no habitat
úmidas são drenadas.
Construção de estradas, introdução de espécies, criação de
Fragmentação de habitat
barreiras para dispersão.
Introdução de espécies Introdução de predadores ou competidores de anfíbios.
Radiação UV-B causa danos ou morte de células, causando
Radiação UV-B mortalidade doa ovos, danos na retina, lesão, e um aumento na
susceptibilidade a doenças.
Toxidade pode causar mortalidade de ovos e adultos, redução de
Contaminantes químicos
presas base.
Toxinas criam barreiras para dispersão e causam altas
Precipitação ácida e solo
mortalidades de ovos e larvas.
Doenças causam mortes nos anfíbios; algumas doenças em
Doença
anfíbios são desconhecidas.
Anfíbios são removidos dos seus habitats selvagens para serem
Comércio
comercializados internacionalmente para culinária, medicina.
Sinergismos Múltiplos fatores podem atuar juntos causando mortalidade.
Fonte: YOUNG. B. E. et al, 2001.

Tabela II. Algumas soluções para reverter ou tentar reverter o declínio de anfíbios
SOLUÇÃO PROCESSOS
Reprodução Programas de reprodução de espécies em cativeiro.
Programas de reintrodução de espécies em habitats
Reintrodução selvagens na esperança de que novas populações possam
ser estabelecidas.
Programas de remoção de espécies exóticas que
Remoção das espécies exóticas
competem com espécies nativas.
Melhorar o entendimento das causas dos declínios e das
extinções;
Documentar a diversidade de anfíbios e como esta muda
Programas de conservação ao longo do tempo;
Desenvolvimento e implementação de programas de
conservação de longo prazo;
Dar respostas de emergência a crises imediatas.
Fonte: AmphibianWeb e Global Amphibian Assessment (2008).
Fórum Internacional do Meio Ambiente - A conferência da Terra 757

Figura I. Distribuição global das espécies de anfíbios (AmphibianWeb ,2008).

Figura II. Distribuição global das espécies de anfíbios em perigo (AmphibianWeb, 2008).

REFERÊNCIAS BIBLIOGRÁFICAS
AmphibianWeb. 2008. California Learning Resource Network. Disponível em:
http://www.clrn.org/weblinks/details.cfm?id=224 (acessado em 02 de fevereiro de 2008).
Barinaga, M. 1990. Where have all the froggies gone? Science 247: 1033- 1034.
Blaustein, A. R. and P. T. J. Johnson. 2003. The complexity of deformed amphibians. Frontiers in
Ecology and the Environment 1: 87-94.
Blaustein AR, Wake DB, Sousa WP. 1994. Amphibian declines: judging stability, persistence, and
suceptibility of populations to local and global extinctions. Conserv. Biol. 8:60-71.
Blaustein, A.R. and D.B. Wake. 1990. Declining amphibian populations: a global phenomenon?
Trends in Ecology and Evolution 5:203-204.
Blaustein, A. R., and D. B. Wake. 1995. The Puzzle of Declining Amphibian Populations. Scientific
American 272:52-57.
Collins, J. P., and A. Storfer. 2003. Global amphibian declines: Sorting the hypotheses. Diversity &
Distributions 9:89-98.
Fórum Internacional do Meio Ambiente - A conferência da Terra 758

Crump, M.L., F.R. Hensley, and K.I. Clark. 1992. Apparent decline of the golden toad:
Underground or extinct? Copeia 1992:413-420.
GAA. 2008. Global Amphibian Assessement. Disponível em: http://www.globalamphibians.org/
(acessado em 02 de fevereiro de 2008).
Houlahan, J.E., C.S. Findlay, B.R. Schmidt, A.H. Meyer, and S.L. Kuzmin. 2000. Quantitative
evidence for global amphibian population declines. Nature 404:752-758.
IBAMA (Instituto Brasileiro do Meio Ambiente e dos Recursos Naturais Renováveis). 1989.
Portaria nº 1.522 de 19 de dezembro de 1989. Lista Oficial da Fauna Brasileira Ameaçada de
Extinção. IBAMA, Brasília.
IBAMA (Instituto Brasileiro do Meio Ambiente e dos Recursos Naturais Renováveis). 1989.
Instrução Normativa nº3 de 27 de maio de 2003. Lista Oficial da Fauna Brasileira Ameaçada de
Extinção. IBAMA, Brasília.
Green DM. 1997. Perspectives on amphibian population declines: defining the problem and
searching for answers. In Amphibians in Decline. Canadian Studies of a Global Problem, ed. DM
Green Herpetological Conserv 1: 291-308.
Hays JB, Blaustein AR, Kiesecker JM, Hoffman PD, Pandelova I, Coyle D, Richardson T. 1996.
Developmental responses of amphibians to solar and artificial UVB sources: a comparative study.
Photochem. Photobiol 64:449-55.
Heyer, W. R., A. S. Rand, C. A. G. Dacruz, and O. L. Peixoto. 1988. Decimations, Extinctions, and
Colonizations of Frog Populations in Southeast Brazil and Their Evolutionary Implications.
Biotropica 20:230-235.
Jensen, J. B., and C. D. Camp. 2003. Human exploitation of amphibians: direct and indirect
impacts. In R. D. Semlitsch, editor. Amphibian Conservation. Smithsonian Institution, Washington
199-213.
Johnson B. 1992. Habitat loss and declining amphibians populations. See. 22: 71-75.
Johnson, P.T.J., and J.M. Chase. 2004. Parasites in the food web: linking amphibian malformations
and aquatic eutrophication. Ecology Letters 7:521-526.
Johnson, P. T. J., K. B. Lunde, D. A. Zelmer, and J. K. Werner. 2003. Limb deformities as an
emerging parasitic disease in amphibians: Evidence from museum specimens and resurvey data.
Conservation Biology 17:1724-1737.
Juncá, F. A. 2001. Declínio Mundial das Populações de Anfíbios. Sitientibus séroe Ciências
Biológicas 1:84-87.
Morell, V.1999. Are pathogens felling frogs? Science 284: 728-731
Pechmann JHK, Wake DB. 1997. Declines and disappearances of amphibian populations. In
Principles of Conservation Biology, ed. GK Meffe, CR Carroll Sunderland, MA: Sinauer. 135-37p.
2nd ed.
Phillips, K. 1990. Where have all the frogs and toads gone? BioScience 40:422-424.
Pounds, J. A., and M. L. Crump. 1994. Amphibian declines and climate disturbance: The case of the
golden toad and the harlequin frog. Conservation Biology 8:72-85.
Stebbins, R. C. & N. W. Cohen. 1995. A natural History of Amphibians. Princeton University
Press, Princeton, New Jersey 3rd ed.
Stewart, M. M. 1995. Climate Driven Population Fluctuations in Rain-Forest Frogs. Journal of
Herpetology 29:437-446.
Stuart, S.N., J.S. Chanson, N.A. Cox, B.E. Young, A.S.L. Rodrigues, D.L. Fischman, and R.W.
Waller. 2004. Status and trends of amphibian declines and extinctions worldwide. Science
306:1783-1786.
Young, B.E., Lips, K.R., Reaser, J.K., Ibáñez, R., Salas, A.W., Cedeño, J.R. Coloma, L.A., Ron, S.,
La Marca, E., Meyer, J.R., Muñoz, A. Bolaños, F., Chaves, G. & Romo, D. 2001. Population
declines and priorities for amphibian conservation in Latin America. Conservation Biology 15:
1213-1223.
Fórum Internacional do Meio Ambiente - A conferência da Terra 759

DIVERSIDADE DE MICROORGANISMOS EM SOLO CACAUEIRO

Éwerton Ávila Teixeira de Souza


Faculdade de Tecnologia e Ciências de Itabuna (Graduandos em Engenharia Ambiental);
Guilherme Paternostro
Faculdade de Tecnologia e Ciências de Itabuna (Graduandos em Engenharia Ambiental);
Antonio Fontes de Faria Filho
Faculdade de Tecnologia e Ciências de Itabuna (Docente Engenharia Ambiental) – afilho.ita@ftc.br;

RESUMO
A abundância e a diversidade são duas palavras que melhor definem a microflora do solo
que habitam na mesma uma profundidade de 15 cm. Formas macroscópicas de vida também
existem em números bem significativos, como minhocas terrestres, nematódeos, acarídeos e insetos
e o sistema radicular das plantas. Com isso retrata-se a complexidade destes seres vivos que
habitam no solo. Direta ou indiretamente os dejetos e corpos dos animais mortos e tecidos de
plantas acabam por penetrar no solo, com um tempo estes desaparecem e dão origem a uma série de
nutrientes enriquecendo o mesmo. A proposta de se estudar a micro biota do solo partiu da
necessidade de saber de suas funções e de sua biodiversidade, sendo de grande relevância
acadêmica, pois o solo é responsável por alimentar os seres vivos através de suas culturas. Com
isso, o presente artigo tem os seguintes objetivos: estudar a biodiversidade do solo cacaueiro em
específico a quantificação de fungos e bactérias nos períodos chuvosos e secos, bem como suas
frações orgânicas e não orgânicas, e a relação com o pH.
Palavras-chave: microorganismos; biota; solo

ABSTRACT
The abundance and diversity are two words that best define the soil microflora living in the
same depth of 15 cm. Ways of life macroscopic also exist in significant numbers well as terrestrial
earthworms, nematodes, insects and mite and the root system of plants. This shows up the
complexity of living things that inhabit the soil. Direct or indirect waste and the bodies of dead
animals and tissues of plants ultimately penetrate the soil with a time they disappear and give rise to
a number of nutrients enriching it. A proposal to study the micro soil biota out of the need to know
their duties and their biodiversity, and of great importance academic because the soil is responsible
for feeding the living through their crops. Thus, this paper has the following objectives: to study the
biodiversity of soil cacaueiro in the quantification of specific fungi and bacteria in the rainy and dry
periods, as well as its organic and non-organic fractions, and the relationship with the pH.
Keywords: microorganisms; biota, soil

INTRODUÇÃO
O solo é composto por uma quantidade expressiva de seres vivos microscópicos. A
abundância e a diversidade são duas palavras que melhor definem a microflora do solo que habitam
na mesma a uma profundidade de 15 cm. Formas macroscópicas de vida também existem em
números bem significativos, como minhocas terrestres, nematódeos, acarídeos e insetos e o sistema
radicular das plantas. Com isso retrata-se a complexidade destes seres vivos que habitam no solo.
Direta ou indiretamente os dejetos e corpos dos animais mortos e tecidos de plantas acabam por
penetrar no solo, com um tempo estes desaparecem e dão origem a uma série de nutrientes
enriquecendo o mesmo. Esses microorganismos têm o poder de transformar plantas e matérias
animais, em substâncias inorgânicas simples, que nutrem as plantas, que por sua vez, servem de
alimentos para os animais. Funcionam como um ciclo sendo de fundamental importância na
manutenção da vida na terra (MICHAEL et al., 1996).
A proposta de se estudar a micro biota do solo partiu da necessidade de saber de suas
funções e de sua biodiversidade, sendo de grande relevância acadêmica, pois o solo é responsável
por alimentar os seres vivos através de suas culturas. Com isso, objetivou-se estudar a
Fórum Internacional do Meio Ambiente - A conferência da Terra 760

biodiversidade do solo cacaueiro em específico a quantificação de fungos e bactérias nos períodos


chuvosos e secos, bem como suas frações orgânicas e não orgânicas, e a relação com o pH.

METODOLOGIA
A coleta das amostras de solos com o auxílio do trado foi projetada em quatro coletas do
período seco e quatro coletas do período chuvoso, sendo que cada coleta era compostas por quatro
sub-coletas em pontos distintos. Essas amostras eram coletadas em forma de zig e zag com coletas
nos 15 cm primeiros e nos 15 cm posterior, sendo estocadas em sacos, diferentes por fração
orgânica e não orgânica e devidamente identificados. Em seguida, realizou-se o processo de
autoclavagem, utilizando câmara com raios UV (responsável por exterminar microorganismos).
No caso dos fungos, em especial, foi adicionado 0,05 g de rosa de bengala para inibir o
crescimento desordenado das colônias, facilitando a quantificação.
Para as bactérias, foram feitas duas diluições em seguida levados a câmara esterilizada.
Verteram-se duas placas para bactérias por amostra contendo o meio de cultura batata, sendo em
seguida lacradas com papel filme, identificadas e estocadas na estufa por um período de quatro dias
para serem quantificadas.
Para a obtenção do pH do solo foram utilizadas 25ml de água fervida para cada 10 g da
amostra do substrato (solo), agitando com o bastão de vidro aferindo duas análises por amostra com
o auxílio do phgômetro.

RESULTADOS E DISCUSSÃO
Colônias de fungos e bactérias relacionando com a sazonalidade
A técnica de cultura em placas utilizada na pesquisa tem sido uma das mais usadas no
processo de análise de microorganismos, pois com a utilização de agar e dextrose que são nutrientes
que facilitam o desenvolvimento de qualquer tipo de microorganismos, se tratando de meio não
seletivo. A partir do número de colônias existentes nas placas, pode-se constatar o número de
organismos vivos por grama de substrato.
No entanto, esses microorganismos se desenvolveram em ambiente propício, no caso em
específico, na estufa a 35º C no escuro por um período de quatro dias, mais sabendo que não seria
possível identificar alguns tipos de microorganismos como os foto autotróficos, porque requerem
luz como fonte de energia, o muitos heterotróficos que necessitam de nutrientes que o agar e a
dextrose não proporcionam.
Com a obtenção dos resultados da quantificação dos fungos e bactérias pelo método de
plaqueamento, gerou-se uma tabela com as quantidades dos mesmos no período chuvoso e seco das
frações orgânicas e não orgânicas bem como os seus respectivos pH (Tabela 1).
Fórum Internacional do Meio Ambiente - A conferência da Terra 761

Tabela 1: Amostras coletadas no período chuvoso e seco, bem como o pH das frações orgânicas e
não orgânicas e as quantidades de colônias de bactéria e fungos existentes nos respectivos períodos.
PERÍODO CHUVOSO
FUNGOS BACTERIAS pH
AMOSTRAS
F.O. F.N.O. F.O. F.N.O. F.O. F.N.O.
1 245 8 0 0 6,4 6,1
2 23 64 25 20 6,0 6,1
3 1 1 55 16 6,8 6,1
4 1 1 100 1 6,3 6,3
PERÍODO SECO
FUNGOS BACTERIAS pH
AMOSTRAS
F.O. F.N.O. F.O. F.N.O. F.O. F.N.O.
1 1 4 3 3 6,3 6,4
2 0 0 15 2 6,1 6,2
3 2 2 0 0 6,4 6,4
4 27 1 37 30 6,2 6,2

No que concerne ao pH não houve grandes variações, tendo no período chuvoso entre
fração orgânica (FO) e não orgânica (FNO) ficado entre 6,0 e 6,8 confirmando a afirmação da
literatura de Siqueira e Franco (1988), que explicita que fungos e bactérias existem em solos ácidos
que, nesse caso, foi levemente ácido.
Com as coletas do período chuvoso obteve-se em termos de colônias na primeira, segunda,
terceira e quarta coleta para bactérias (Figura 01) das FO respectivamente 2, 25,55 e 100 colônias e
FNO, zero, 20, 16 e 1. Esses valores eram esperados especialmente a discrepância entre as frações
com exceção da segunda amostra na FNO, onde foi constatado no período de coleta um teor
elevado de umidade fazendo com que a diferença em termos quantitativos das frações fosse ínfima.

P E R ÍODO C HUVOS O
B A C T É R IAS
120
100
100
C OL ÔNIAS

80

60 55
F .O .

40 F .N.O .
25
20 16
20
2 0 1
0
1 2 3 4
AMOS T R AS

Figura 01: Quantidade de Colônias de Bactérias no Período Chuvoso.

Constatou-se que o antibiótico rosa de bengala usado para inibir o crescimento


desordenado das colônias de fungos, impediu o aparecimento dos mesmos. Como se havia
estabelecido que fossem contados fungos em duas placas contendo o antibiótico e bactérias em
Fórum Internacional do Meio Ambiente - A conferência da Terra 762

outras duas sem o antibiótico, optou-se por quantificar fungos e bactérias nas quatro placas por
amostras não prejudicando o experimento.
Com relação aos fungos (Figura 02) no período chuvoso constataram-se os seguintes
resultados respectivamente da FO 245, 23, 1,1 e da FNO 8, 64, 1,1. Como nos resultados da
segunda coleta evidenciou-se o alto teor de umidade da FNO refletiu em 64 colônias de fungos da
FNO e 23 da FO, ou seja, invertendo as posições naturais a qual normalmente teria mais colônias a
FO por conta da existência da matéria orgânica onde os microorganismos agem na decomposição
dos mesmos para obtenção de nutrientes.

P E R ÍODO C HUVOS O
F UNG OS
300
245
250
C OL ÔNIAS

200

150 F .O .

100 F .N.O .
64
50 23
8 1 1 1 1
0
1 2 3 4
AMOS T R AS

Figura 02: Quantidade de Colônias de Fungos no Período Chuvoso

O pH do período seco esteve entre 6,1 e 6,4 também levemente ácido. Os resultados
obtidos no período seco para bactérias (Figura 03) da FO foram seqüencialmente 3, 15, zero e 37 e
para FNO obteve-se 3, 2, zero e 30. Apesar das amostras terem sido terem sido coletadas no
período seco, mas que por conta de mudanças climáticas nos dias que antecediam a primeira coleta
constatou-se um teor elevado de umidade na FNO, explicando o equilíbrio nos resultados da
primeira amostra com três colônias cada fração. A amostra quatro e a dois destacaram-se com a
maior quantidade de bactérias dentre essas amostras.

P E R ÍODO S E C O
B A C T É R IAS
40 37
35
30
30
C OL ÔNIAS

25
20 F .O
15
15 F .N.O .
10
5 3 3 2
0 0
0
1 2 3 4
AMOS T R AS

Figura 03: Quantidade de Colônias de Bactérias no Período Seco

Já com os fungos da primeira amostra ocorreu a predominância por parte da FNO com
diferença expressivas sendo 4 colônias da FNO para 1 colônia da FO. Destaque para a quarta
amostra com 27 colônias da FO para 1 colônia de fungos da FNO, a segunda não foi encontrado
colônias e a terceira amostra ficou em equilíbrio apresentando 2 colônias cada (Figura 04).
Fórum Internacional do Meio Ambiente - A conferência da Terra 763

P E R ÍODO S E C O
F UNG OS
30 27

25
C OL ÔNIAS

20

15 F .O

10 F .N.O .

4
5 2 2
1 0 0 1
0
1 2 3 4
AMOS T R AS

Figura 04: Quantidade de Colônias de Fungos no Período Seco

Comparação de bactérias e fungos com a sazonalidade


Realizando as quantificações de colônias de bactérias, observou-se a significativa diferença
entre a FO com 182 no período chuvoso para 55 do período seco e da FNO com 37 no período
chuvoso e 35 no período seco (Figura 05). Já os fungos em predominância no que concerne ao total
de bactérias também obtiveram 270 na FO do período chuvoso para 74 da FNO, e 55 da FO a 7 da
FNO (Figura 06).

C OMP A R AÇ Ã O DE B A C T É R IA S
NOS P E R ÍODOS S E C O E C HUVOS O
182
200
C O L ÔNIAS

150
100 P E R ÍO DO S E C O
55 37
50 P E R ÍO DO
35
0
F .O.
F .N.O .

Figura 05: Comparação de colônias de bactérias entre períodos.

C OMP AR AÇ ÃO DE F UNG OS NOS P E R ÍODOS


S E C O E C HUVOS O
270
300
C O L Ô NIA S

200
P E R IODO S E C O
74
100 P E R IODO
30
0 7
F .O.
F .N.O.

Figura 06: Comparação de colônias de fungos entre períodos.

CONCLUSÃO
As técnicas de enriquecimento de cultura auxiliam no isolamento de microorganismos que
são capazes de metabolizar um determinado substrato e que pode estar presentes em quantidades
expressivas das amostras. A análise feita em laboratório é pra se ter uma visão da quantidade de
microorganismos existentes no solo.
Fórum Internacional do Meio Ambiente - A conferência da Terra 764

Constatou-se com o presente trabalho a diversidade de microorganismos em solo


cacaueiro, bem como a confirmação da discrepância entre frações orgânica e não orgânica. No
entanto confirmou-se o que retratava a literatura com relação a incidência de microorganismo
superior na fração orgânica em relação a não orgânica e pela necessidade que os mesmos têm em
decompor matéria orgânica liberando nutrientes.
Os resultados foram satisfatórios ate mesmo com a interferência do clima a exemplo da
amostra 2 do período chuvoso e a 1 do período seco, que acabou invertendo o processo natural com
maior incidência de microorganismos na fração não orgânica ou até mesmo a aproximação da
fração orgânica.
Fica nesta pesquisa a necessidade de perdurar os estudos, mas com identificação de
espécies analisando os seus benefícios e impactos causados não só na cultura do cacau, mas nas
demais. Como os fito-nematóides que afetam boa parte das culturas não tanto o cacau, mas que
ataca o sistema radicular das plantas provocando perdas de até 80% de determinadas culturas,
necessitando de controle.

REFERÊNCIAS
AZEVEDO, Antônio Carlos; DALMOLIN, Ricardo Simão Diniz. Solos e Ambiente: Uma
Introdução. Editora Pallotti, 2004.
FREITAS, Leandro Grassi et al. Introdução a Nematologia. Viçosa: UFV, 2001.
MICHAEL, j. Pelczar Jr et al. Microbiologia Conceitos e Aplicações. Volume II, 2a Edição, Editora
Makrom Books. São Paulo, 1996.
SIQUEIRA, José Oswaldo; FRANCO, Avílio Antônio. Biotecnologias do Solo: Fundamentos e
Pespectivas. Lavras: ESAL, FAEPE, 1988.
Disponível em: http// WWW. Folha topográfica.com. br, Visitado em 10/11/2007.
Disponível em: http://www.sindag.com.br/legislacaoE.php
Fórum Internacional do Meio Ambiente - A conferência da Terra 765

EFEITO DE FONTES MINERAIS ORGÂNICAS NA CULTURA DA CENOURA (Daucus


carota L.)

José Carlos Ribeiro de Carvalho


jcrc48@yahoo.com.br
Victor Vinícius Machado de Oliveira
viniciusmbv@gmail.com
Camila da Silva Dourado

ABSTRACT
The carrot (Daucus chayote L. ) that's a important olerícola as of birthplace of Europe and
Asia, is fancied at the culinária Brazilian , being categorised among the ten breeds more farmed as
of vegetables. Along objetivo as of access fonts as of nutrients than it is to I minimized the costs
with the fertilization at the capacity from the carrot , he went conduced research at the arena
experimental from the Center of the city as of Expertise Agrarian , Environmental and Biologic –
UFRB. Latossolo Yellow álico Cohesion , being used as a tracing experimental blocks at random ,
all-time as of six treatments and Quatro reduplications. The treatments have been : T1 he testifies
absoluta ; T2 muck bovine ; T3 hardware mineral as of Ipirá ; T4 fertilization NPK ; T5 fertilization
NPK + muck bovine ; and T6 fertilization NPK + muck bovine + hardware mineral as of Ipirá. The
variables evaluated have been : length , bore and onus of the tubérculos , as well as mass drought
from the he breaks aerial , by the test as of Tukey the one Apr 5 % likelihood. Verifies - in case that
than it is to the one fertilization organic AND mineral as you diligent separately (T2 and T4)
respectively , did not supriu the needs nutricionais from the crop , merely as you associated (T5).
The equipment mineral as of Ipirá , did not he presented effect considerable as you diligent bleak
(T3) nor affiliated á fertilization mineral and organic (T6), probably , due to the short cycle from the
crop , being insufficient for the abasement from the hardware at the earth, ground, soil, land.

RESUMO
A cenoura (Daucus carota L.) é uma importante olerícola de origem da Europa e Ásia, é
apreciada na culinária brasileira, estando classificada entre as dez espécies mais cultivadas de
hortaliças. Com objetivo de determinar fontes de nutrientes que minimize os custos com a adubação
na produtividade da cenoura, foi conduzida pesquisa no campo experimental do Centro de Ciências
Agrárias, Ambientais e Biológicas – UFRB. Latossolo Amarelo álico Coeso, sendo utilizado como
delineamento experimental blocos ao acaso, constando de seis tratamentos e quatro repetições. Os
tratamentos foram: T1 - testemunha absoluta; T2 - esterco bovino; T3 - material mineral de Ipirá;
T4 - adubação NPK; T5 - adubação NPK + esterco bovino; e T6 - adubação NPK + esterco bovino
+ material mineral de Ipirá. As variáveis analisadas foram: comprimento, diâmetro e peso dos
tubérculos, bem como massa seca da parte aérea, pelo teste de Tukey a 5% de probabilidade.
Verificou-se que a adubação orgânica e mineral quando aplicadas isoladamente (T2 e T4)
respectivamente, não supriu as necessidades nutricionais da cultura, somente quando associadas
(T5). O material mineral de Ipirá, não apresentou efeito significativo quando aplicado isolado (T3)
nem associado á adubação mineral e orgânica (T6), provavelmente, devido ao ciclo curto da cultura,
ser insuficiente para a degradação do material no solo.
Palavras chave: fontes alternativas, farelo mineral, adubação mineral.

INTRODUÇÃO
A cenoura (Daucus carota L.) é uma cultura de alta expressão econômica, considerada a
principal hortaliça-raiz em valor alimentício, rica em vitaminas (principalmente pró-vitamina A) e
sais minerais, sendo largamente empregada na dieta alimentar brasileira. Importante olerícola, cuja
origem remota aos continentes europeu e asiático, sendo muito apreciada na culinária brasileira,
estando classificada entre as dez espécies mais cultivadas de hortaliças, os manejos adequados do
solo, a irrigação e a fertilização são de grande importância para obtenção de boa produtividade e
qualidade da cenoura. A parte comercial da planta é a raiz tuberosa com o formato variável entre
Fórum Internacional do Meio Ambiente - A conferência da Terra 766

cônico e cilíndrico, de coloração também variável (Herbareo, 2003). Além disso, é caracterizado
por ser uma cultura de grande amplitude do período de florescimento, o que leva á maturação
desuniforme de sementes e, segundo Andrade et al. (1993), à diferenciação em sua qualidade
fisiológica.
Filgueira (1982) descreve que a cenoura é uma cultura exigente em nutrientes em formas
prontamente assimiláveis capazes de promover um crescimento rápido e contínuo da parte aérea e
tuberosa. A produção é mais lucrativa em solos naturalmente férteis, sendo necessária adubação
química e orgânica para o cultivo em solos pobres. A adubação orgânica pode ser feita pela adição
de matéria orgânica ou incorporação ao solo de adubos orgânicos ou restos culturais, anteriormente
á cultura da cenoura. A aplicação de esterco de curral ou de aviário deve ser feita á lanço, cobrindo
toda a leira, promovendo se a incorporação antes do plantio, prevenindo, assim danos á germinação,
emergência das plântulas e formação de raízes tuberosas defeituosas. A adubação foliar é uma
alternativa raramente utilizada na cultura da cenoura. Visa prevenir ou controlar alguma deficiência
mineral e/ou doença na planta, suplementando à aplicada ao solo. É realizada por meio de
pulverizadores (costais ou motorizados) e equipamentos maiores tracionados por trator, ou ainda
empregando-se avião agrícola.
A adubação nitrogenada dessa cultura tem causado controvérsias, onde alguns
pesquisadores condenam o uso de nitrogênio, nas formas amoniacal ou orgânica, encontradas no
sulfato de amônio, na uréia e nos estercos de animais que provocariam ramificações na raiz
tuberosa. O nitrogênio, então, deveria ser aplicado na forma nítrica, encontrada no salitre do Chile.
Todavia, experimentos efetuados em Goiânia, não houve diferenças significativas entre aplicação
do nitrogênio nas formas amoniacal, orgânica e nítricas, sendo a incidência de cenouras deformadas
esporádica, ocorrendo em todos os tratamentos. A uréia é um fertilizante nitrogenado de uso
relativamente recente, sendo uma das melhores opções, porém há restrições ao uso do produto,
devido às suas propriedades físicas indesejáveis como alta higroscopicidade e índice salino elevado,
porém esse fertilizante apresenta também muitas vantagens, por ser concentrado, contendo 45% do
elemento e em condições propicias de umidade e temperatura, pode ser rapidamente absorvido pelo
sistema radicular das plantas (Raij, 1991).
O cloreto de potássio denominado comercialmente nos Estados Unidos muriato de potassa,
é o fertilizante potássico mais empregado no mundo. Esse adubo contém 60% de K20, é solúvel em
água e pode ser aplicado juntamente com outros adubos nitrogenados e fosfatados, sem causar
qualquer reação desfavorável. Em relação aos adubos fosfatados, existem diversos no comércio,
estes diferem na sua concentração em fósforo e solubilidade, ou seja, varia a riqueza em fósforo
pelo adubo, e também seu aproveitamento pelas plantas, podendo-se dizer que de modo geral
quanto mais solúvel o adubo, maior seu aproveitamento (Malavolta, 1981). Além da adubação
mineral e orgânica, busca - se alternativas econômicas, ecológicas e capazes de restituir ao solo
todas as características minerais originais, com a utilização das farinhas de rochas (Pinheiro &
Barreto, 2000)
O objetivo deste trabalho foi viabilizar fontes orgânicas e/ ou minerais de nutrientes que
venham diminuir os custos de produção com o insumo/adubo e aumentar a produtividade na cultura
da cenoura.

MA TERIAL E MÉTODOS
A pesquisa foi conduzida no campo experimental II do Centro de Ciências Agrárias,
Ambientais e Biológicas da Universidade Federal do Recôncavo da Bahia, no município de Cruz
das Almas - BA, no período de 23/05/2003 à 30/10/2003. O experimento foi realizado em um
Latossolo Amarelo álico coeso de textura tranco-argilo arenoso, baixo teor de matéria orgânica,
fracamente ácido e com boa capacidade de retenção de umidade O solo é bastante profundo de
baixa fertilidade química, topografia com áreas planas e irregulares, altitude de 225 m acima do
nível do mar.
O clima segundo a classificação de Coopen é tropical quente e úmido, com estação seca
compensada pelos elevados totais anuais de precipitação pluviométrica, com média anual 1197 mm.
Fórum Internacional do Meio Ambiente - A conferência da Terra 767

A temperatura média é de 24,4°C, umidade relativa do ar é de 82% insolação média de 6,6 horas
por dia e radiação solar global média anual de 354 kWh. dia-1 (Centro de Estatística e Informação,
1994)
Foi utilizado como delineamento experimental blocos ao acaso, constando de seis
tratamentos e quatro repetições. Os tratamentos foram: T1 - testemunha absoluta; T2 esterco
bovino; T3 - material mineral de Ipirá; T4 - adubação NPK; T5 - adubação NPK + esterco bovino; e
T6 - adubação NPK + esterco bovino + material mineral de Ipirá. As recomendações de N, P20s e
K20 de 80, 80 e 100 kg respectivamente, foram determinadas.
Através do manual de adubação e calagem para o Estado da Bahia (1989) para a cultura e
conforme análise química do solo. Complementando-se as fontes empregadas nos tratamentos
foram utilizados 2.000 kg/ha. da rocha de Ipirá e 25.000kg/ha. de esterco de bovinos.
A parcela experimental teve a dimensão de 1,20 m2. A adubação fosfatada, adubação
potássica e 1/3 da adubação nitrogenada, bem como a rocha moída foram aplicadas a lanço sobre a
parcela antes do plantio juntamente com o adubo orgânico. Os 2/3 restantes do adubo nitrogenado
foram empregados aos 20 e 40 dias após o plantio.
Como fontes de NPK foram empregados respectivamente uréia, superfostato simples e
cloreto de potássio, As variáveis avaliadas foram comprimento, diâmetro, peso dos tubérculos, e
massa seca da parte aérea, sendo avaliadas estatisticamente pelo teste de Tukey a 5% de
probabilidade.

RESULTADOS E DISCUSSÕES
A partir a análise dos dados quantitativos obtidos no experimento é possível inferir que, a
aplicação isolada da adubação orgânica e mineral na quantidade utilizada, não atendeu às
necessidades nutricionais da cultura (T2) e (T4) respectivamente, de modo que somente obtiveram-
se resultados significativos na associação (T5) e (T6). O peso dos tubérculos não obtiveram
diferencias significativas nos tratamentos (T2), (T5) e (T6) como se observa na figura 1. Estes
resultados foram obtidos também por Bittencourt et al (1996), citado por Oliveira (2001), quando
avaliou a cultura da alface, quanto ao efeito da adubação orgânica associada à adubação mineral
onde não encontrou diferenças entre os tratamentos para o diâmetro da cabeça, peso da cabeça,
altura da planta e peso verde das folhas.

Figura 1. Massa seca da parte aérea e peso de tubérculos de cenoura. Letras iguais não
diferem significativamente entre si pelo teste de Tukey (p<0,05).

A resposta da cultura a aplicação de fertilizantes orgânicos é muito variável, devido á


diversidade na composição desses materiais orgânicos empregados no seu cultivo, especialmente os
estercos de animais e componentes orgânicos tem sido responsáveis por aumento de produção (Vi
eira, 1998). Em relação ao efeito do material mineral de Ipirá (T3), não se obteve resultados
significativos quando aplicado isoladamente ou associado aos demais tratamentos, assemelhando-se
á testemunha (T 1).
Fórum Internacional do Meio Ambiente - A conferência da Terra 768

Com relação à produção, embora a adubação orgânica (T2) tenha atingido altos
rendimentos quando aplicados isoladamente, os maiores valores absolutos ocorreram quando em
associação com adubação mineral. A adubação orgânica na cultura desempenha papel fundamental
no aumento da produção de raízes, principalmente em solos com baixo teor de matéria orgânica
(Oliveira, 2001), também não se obteve resultados significativos na aplicação isolada da adubação
mineral. A resposta da cenoura a aplicação do material mineral de Ipirá (T3) apresentou um
comportamento semelhante a testemunha em relação a essa variável. Para Pinheiro & Barreto
(2000), materiais minerais (rocha) decompõem se lentamente, não repondo imediatamente
nutrientes ao solo e as exigências da planta. Com base nos resultados, e sendo a cultura da cenoura
de ciclo curto, pressupõe-se que não houve tempo suficiente para a degradação desse material no
solo, para aproveitamento de nutrientes pela cultura, de modo que há maior possibilidade da
obtenção de resultados positivos usando-se a rocha com certa antecedência ao plantio o que
possibilitaria maior liberação de elementos nutritivos.
Observa se na figura 2, que com referência as variáveis diâmetro e comprimento dos
tubérculos, os resultados obtidos não foram significativos quando se fez a comparação dos demais
tratamentos em relação a testemunha.

Figura 2. Diâmetro e comprimento de tubérculos de cenoura. Letras iguais não diferem


significativamente entre sim pelo teste de Tukey (p<0,05).

CONCLUSÕES
• O material mineral de Ipirá, não evidenciou melhora química no solo para a cultura da
cenoura, aplicado isolado ou associado à adubação orgânica e mineral;
• A adubação mineral somente demonstrou efeito significativo na produção de massa seca
da parte aérea e tubérculos, quando associada à adubação orgânica;
• A adubação orgânica, embora quando aplicada isoladamente tenha demonstrado efeito
significativo para a produção de tubérculos, somente foi eficiente para a produção de massa seca da
parte aérea, quando associada á adubação mineral.

REFERÊNCIAS BIBLIOGRÁFICAS
ALMEIDA, P.C.C. de. Minhocultura: tudo que você precisa saber. Cuiabá; MT: SEBRAE, 2ª
edição, 1996, 96p (coleção agroindústria, v. 07).
CENTRO DE ESTATÍSTICA E INFORMAÇÃO - BA Informações básicas dos municípios
baianos: recôncavo sul-Salvador, 1994, 761 p.
COMISSÃO ESTADUAL DE FERTILIDADE DO SOLO. Manual de adubação e calagem da
Bahia. Salvador: CEPLAC/ EMATERBA/EMBRAPA/ NITROFÉRTIL. 1989, 176p.
Embrapa, hortaliças. Disponível em: http://www.cnph.embrapa.br/sistprod/cenoura/adubacao.htm
FILGUEIRA, F.A.R. Manual de oleicultura: cultura e comercialização de hortaliças. São Paulo: Ed.
Agronômica "Ceres" Ltda., v.2, 1982. 357 p.
Fórum Internacional do Meio Ambiente - A conferência da Terra 769

HERBÁREO. Disponível em: http://www.herbareo.com.br/dataherb12/cenoura.htm. Acesso em 05


de junho de 2003.
MALAVOLTA, Eurípedes. Manual de química agrícola: adubos e adubação. 3aed. São Paulo: Ed.
Agronômica “Ceres”, 1981. 602 p.
OLIVEIRA, A P et al. Rendimento de feijão - caupi cultivado com esterco bovino e adubo mineral.
Horticultura brasileira, Brasília, v.19, n.0l, p.81-84, março 2001.
PINEIRO, S. & BARRETO, S. B. MB-4 - agricultura sustentável, trofobiose e biofertilizantes.
6aed. São Paulo: Fundação Junguira Candiru, 2000, 273p.
RAIJ, B.V. Fertilidade do solo e adubação. São Paulo: Ed. Agronômica "Ceres" Ltda., 1991. 343 p.
VIEIRA, M. C do C et alo Crescimento e produção da mandioquinha-salsa em função da adubação
fosfatada e da utilização de cama de aviário. Horticultura Brasileira. Brasília, v.16, n.1, p. 68-73,
1998.
Fórum Internacional do Meio Ambiente - A conferência da Terra 770

FORMIGAS URBANAS: IMPORTÂNCIA NO ECOSSISTEMA TERRESTRE E NA


VEICULAÇÃO DE PATÓGENOS EM HOSPITAIS

S. L. S. Silveira
D. C. J. Santos
J. O. Dantas
lorisobral@gmail.com, Universidade Federal de Sergipe, Departamento de Biologia do CCBS, Laboratório de
Entomologia, Av. Marechal Rondon s/n, Bairro Rosa Elze, São Cristóvão – SE, CEP 49100-000.

RESUMO
As formigas apresentam uma grande diversidade com aproximadamente 20.000 espécies
descritas. Estes insetos exercem papel de grande importância nos ecossistemas terrestres na aeração
do solo, trituração de folhas ajudando na decomposição de substâncias orgânicas, polinização e
dispersão de sementes, além de sua participação na cadeia alimentar. As formigas, assim como
outros organismos, também estão associadas aos ambientes urbanos e domiciliares, o que pode
causar diversos transtornos em residências, fábricas, restaurantes e hospitais. Desta forma, tornam-
se um perigo à saúde pública devido sua facilidade em veicular microrganismos patogênicos
promovendo a contaminação de medicamentos e equipamentos hospitalares podendo aumentar os
riscos de infecções. O sucesso no controle de formigas urbanas depende da escolha de uma
metodologia adequada, que pode ser pelo método físico e/ou químico, para isso é fundamental o
conhecimento das espécies ocorrentes e sua biologia. Diversas pesquisas vêm sendo realizadas no
Brasil e no mundo, mostrando a necessidade do levantamento das espécies e da implementação de
métodos de controle das formigas nestas instituições. No entanto, a ausência de referências da
mirmecofauna e trabalhos relacionados a sua ocorrência em ambientes urbanos de vários estados do
Nordeste do Brasil mostram a necessidade do levantamento das espécies e da implementação de
métodos de controle das formigas nas instituições públicas como forma de diminuir a ocorrência de
contaminação. Desta forma há a necessidade de um estudo sobre a fauna destes insetos nas
instituições, objetivando sua identificação, monitoramento e o treinamento de pessoal para a
identificação e controle utilizando métodos alternativos de baixo impacto para o ambiente.
Palavras-chaves: formigas, sinantropia, ambiente hospitalar, controle.

ABSTRACT
Ants present a great diversity with about 20.000 species described. These insects play an
important role in the terrestrial ecossystems, for example in the soil airing, trituration of leaves and
organic matter, pollination and seed dispersion. Ants, like other organisms, are associated to urban
and other human environments, which causes several problems to residences, factories, restaurants
and hospitals. Therefore, they become a serious threat to public health due to their hability to carry
pathogens, which can increase, through the contamination or hospital environment, the risks of
infeccion deseases. The successful control of urban ants depends on the use of right metodologies
that can be used as an association of both physical and chemical methods. Moreover, it is important
the knowledge of local species and their basic biology. Studies made in several regions of Brazil
have showed that the implementation of management technics depends upon a previous monitoring
of species and the apllication of specific methods. However, the almost complete absence of studies
about the urban mirmecofauna in the Northestearn of Brazil shows the necessity of a checklist of
urban species and the correct application of control methods in public intitutions. Therefore, this
review aims to highlight the ant species found in brazilian hospitals as well their identification,
monitoring and management.
Key-words: Ants, sinantropy, control, hospital environment

INTRODUÇÃO
Diversidade
Os insetos pertencem ao grupo de animais com maior diversidade de espécies do mundo.
Estima-se que aproximadamente um terço das espécies de organismos vivos sejam insetos. Essa
Fórum Internacional do Meio Ambiente - A conferência da Terra 771

característica deve-se ao fato de terem sido um dos primeiros grupos de animais a conquistar o
ambiente terrestre (Hölldobler & Wilson, 1990). As formigas são insetos eussociais pertencentes à
ordem Hymenoptera agrupadas em uma única família (Formicidae), são dominantes na maioria dos
ecossistemas terrestres, exceto os pólos (Wilson, 1987; Brown Junior, 2000). Existem cerca de
20.000 espécies de formigas no mundo, das quais aproximadamente 11.000 já foram descritas; no
Brasil ocorrem cerca de 2.000 espécies (Campos-Farinha 2004). Apesar de pertencerem à mesma
família, as diversas espécies apresentam diferenças marcantes na biologia e comportamento,
colonizando ambientes naturais e artificiais, comum no interior de residências, infestando áreas
alimentares e hospitais, contaminando medicamentos e equipamentos (Campos-Farinha et al., 2002,
Fowler et al., 1994).

Importância Ecológica das Formigas


As formigas exercem papel de grande importância nos ecossistemas por participar da
aeragem do solo, da decomposição de substâncias orgânicas, polinização e dispersão de sementes,
pela participação na cadeia alimentar, atuando como herbívoros, carnívoros ou onívoros (Beatson,
1972; Eichler, 1962 e 1978; Hölldobler e Wilson, 1990). Algumas espécies de formigas são neutras
em relação aos aspectos econômicos da humanidade, outras espécies vivem em associação com os
humanos por todo o mundo (Passera, 1994; Passera e Aron, 2005), sua disseminação é facilitada
pelo tráfego de mercadorias, pela migração, condições de habitações e higiene (Berndt & Eichler,
1987, Fowler et al., 1994).
Apesar da grande diversidade, cerca de 1% das espécies de formigas são consideradas
pragas e aproximadamente 50 espécies estão adaptadas ao ambiente urbano (Fowler & Bueno,
1998; Wilson, 1987).

Sinantropia e Infestação
Como qualquer ambiente natural, os ambientes artificiais podem ser colonizados e
explorados por diversas espécies de formigas. A colonização dos ambientes urbanos há muito tem
sido observada; a intensa urbanização cria condições adequadas à sobrevivência das formigas
(Bueno & Campos-Farinha, 1999; Campos-Farinha et al. 2002; Silva & Loeck, 1999). Estas
formigas apresentam um conjunto de características que favorece a sua dispersão e adaptação nos
diversos ambientes, tais como a formação de populações unicoloniais; altas taxas de reprodução;
ninhos poucos estruturados facilitando o recolhimento e transporte pelas operárias dos ovos,
imaturos e das rainhas para outros locais, baixa agressividade intraespecífica, alta agressividade
interespecífica, ausência de vôo nupcial, tamanho reduzido das operárias, baixa longevidade das
rainhas, que é compensada pela rápida produção de novas rainhas, poliginia, associadas à
variabilidade da espécie (Bueno & Campos-Farinha, 1999; Passera, 1994). O sucesso adaptativo de
colonizar e explorar ambientes artificiais favoreceu sua sobrevivência de tal modo que passaram a
causar problemas em residências, hospitais, fábricas de alimento, apiários e cabinas de eletricidade
(Wilson, 1987; Fowler & Bueno, 1998; Eichler, 1962, 1978).
A estrutura arquitetônica, a proximidade a residências (que estimula a migração desses
insetos), embalagens de medicamentos que podem trazer ninhos de formigas para o ambiente
interno, circulação de grande número de pessoas com roupas e objetos que podem conter ninhos de
formigas, além de alimentos que funcionam como atrativo extra são alguns fatores que favorecem a
presença de formigas em hospitais (Zarzuela et al., 2002).
Desta forma residências, hospitais, estabelecimentos comerciais, fábricas de alimento,
biotérios, zoológicos, e muitos outros lugares são colonizados pelas formigas. A colonização em
hospitais requer maior atenção uma vez que as formigas têm acesso a várias superfícies, podendo
atuar como vetores mecânicos de microorganismos patogênicos.

Problemática das formigas urbanas


Dentro das residências, a presença de formigas é constante, causando incômodo e
deteriorando alimentos. Podem se tornar um perigo à saúde pública quando infestam hospitais,
Fórum Internacional do Meio Ambiente - A conferência da Terra 772

devido sua facilidade em veicular microrganismos patogênicos em seus corpos. Esse fato foi
inicialmente mostrado na Inglaterra por Beatson (1972) e Edwards & Backer (1981), na ex-
Checoslováquia por Alekseev et al. (1972), na Alemanha por Eichler (1990), em Trinidad por
Chadee & Maitre (1990), no Chile por Ipinza-Regla et al. (1981), nos Estados Unidos por Williams
(1989) e Fowler et al. (1980).
No Brasil, pesquisas com formigas urbanas são recentes, tendo início na década de 1980
em hospitais do Estado de São Paulo (Fowler et al., 1991). Desde então, levantamentos realizados
por Fowler et. al. (1993); Bueno & Fowler (1994); Delabie (1995); Peçanha (2000); Campos-
Farinha et al., (2002); e Costa et al., 2006) têm confirmado a presença dessas formigas na área
urbana, inclusive em ambientes hospitalares.
Trabalhos realizados em hospitais brasileiros (Bueno & Fowler, 1994; Fowler et al., 1991;
Fowler et. al., 1993; Peçanha, 2000, Costa et al., 2006; Santos et al., 2007) demonstram que a
diversidade de espécies de formigas é alta quando comparada à mirmecofauna, nos mesmos
ambientes, em países de clima temperado como nos Estados Unidos, países da Europa e Chile
(Baker, 1981; Beatson, 1972; Edwards, 1986; Edwards &; Eichler, 1990).

Formigas em ambiente hospitalar


Os problemas de saúde pública relacionados à presença de formigas em ambientes
hospitalares podem variar de picadas doloridas, que causam irritações e lesões na pele, à veiculação
de patógenos que promove a contaminação de medicamentos e equipamentos hospitalares podendo
aumentar os riscos de infecções em pacientes debilitados, como também alterar resultados
laboratoriais (Beatson, 1972; Eichler, 1990, 1962 e 1978; Ipinza-Regla et al., 1981). Por não serem
associadas à sujeira e a propagação de patógenos, as formigas não despertam aversão às pessoas,
como acontece com as baratas. Portanto, não há o empenho necessário para o seu controle, até
mesmo em ambientes hospitalares, onde a dispersão microbiana pode representar ameaça à saúde
dos pacientes (Bueno, 1995; Wetler et al, 2002)

Principais espécies de formigas em ambientes hospitalares


Tapinoma melanocephalum (nome-comum: formiga-fantasma) Origem: África Tropical.
São pequenas, com a cabeça e mesossoma escuros e cintura e gáster claros. Nidificam tanto dentro
como fora de residências (atrás de azulejos, batentes de portas e rodapés). Os ninhos são pouco
estruturados e mudam constantemente de lugar. Têm preferência por alimentos adocicados
recrutando um grande número de operárias. Não apresentam vôo nupcial.
Paratrechina longicornis (nome-comum: formiga-louca) Origem: África Tropical. São de
coloração marrom escura a preta, antenas longas. Andam de forma irregular quase em semicírculos.
Geralmente nidificam fora das construções (atrás das pedras usadas em revestimentos externos de
paredes ou nas calçadas), porém podem explorá-las à procura de alimento. Ao encontrá-lo recrutam
muitas operárias facilitando a localização do ninho. O acasalamento ocorre na entrada do ninho.
Monomorium pharaonis (nome-comum: formiga-do-faraó) Origem: África Tropical. As
operárias apresentam coloração marrom-amarelada, com o gáster mais ou menos escurecido na
parte posterior, o corpo é finamente pontuado exceto o gáster que é liso e brilhante. Nidificam em
vários locais, inclusive aparelhos eletrônicos e outros eletrodomésticos. Durante o forrageamento as
operárias formam uma trilha retilínea com movimentos não muito rápidos. Podem infestar edifícios
por meio do transporte de ninhos em caixas de alimento, caixas de medicamentos, embalagens e até
em livros. Não apresentam vôo nupcial.
Solenopsis spp. (nome-comum: formiga lava-pés) Origem: América do Sul. Sua coloração
varia do marrom avermelhado ao preto. Existem várias espécies, a maioria é polimórfica, porém,
dentro do gênero algumas são muito pequenas, com operárias monomórficas, anteriormente
agrupadas no gênero Diplorhoptrum. Nidificam fora das casas, facilmente identificados pelo
murundum de terra solta, do qual, quando mexido, sai um número de operárias, que ferroam
dolorosamente. Há relatos de problemas com lava-pés atacando crianças em berços. Podem infestar
aparelhos elétricos e cabines de eletricidade. São onívoras e atraídas para dentro das casas por
Fórum Internacional do Meio Ambiente - A conferência da Terra 773

migalhas de alimentos espalhadas pelo chão, principalmente substâncias oleosas, recrutando um


grande número de operárias. As principais espécies são: S. invicta e S. saevissima.
Camponotus spp. (nome-comum: formiga-carpinteira) Origem: Espécies nativas. Cerca de
200 ocorrem na região Neotropical. A coloração varia do amarelo ao preto, são polimórficas,
podendo apresentar operárias bastante grandes. Geralmente fazem seus ninhos em cavidades no
solo e árvores, fendas nas paredes e pisos, gavetas, forros de madeira e aparelhos elétricos,
danificando-os. Algumas espécies têm hábito noturno, dificultando a localização dos ninhos.
Possuem ninhos satélites. Preferem substâncias adocicadas, porém podem alimentar-se de pedaços
de carne, transportados para o ninho por poucas operárias em pedaços relativamente grandes.
Apesar do nome popular, a madeira serve apenas como local de nidificação. No final da primavera
ocorrem as revoadas, sendo comum encontrar rainhas fecundadas no chão a procura de locais para
construir seus ninhos. As principais espécies são: C. atriceps, C. crassus, C. rufipes, C. arboreus e
C. fuscocinctus.

Principais espécies de bactérias transportadas por formigas em ambientes hospitalares


Diversas espécies de bactérias são encontradas associadas com as formigas em ambientes
hospitalares, estas são agrupadas como bacilos (Gram negativas) e cocos (Gram positivo) (Martins,
1989; Silva, 1999); pertencentes aos gêneros Acinetobacter, Alcaligenes, Oerskovia, Citrobacter,
Corynebacterium, Comomonas, Escherichia, Enterobacter, Enterococcus, Listeria, Neisseria,
Planococcus, Pseudomonas, Sphingobacterium, Staphylococcus, Sphingomonas,
Stenotrophomonas, Streptococcus, Serratia, Shigella, Klebsiella, Providencia e Proteus (Alekseev
et al., 1972; Beatson, 1972; Chadee & Maitre, 1990; Denise et al.,2005; Edwards & Backer, 1981;
Eichler, 1990; Fowler et al., 1980; Ipinza-Regla et al., 1981; Peçanha et al., 1999).
Merecem destaque as bactérias do gênero Acinetobacter sp. que são encontradas
freqüentemente em associações com infecções hospitalares, embora sua incidência, seja pequena
quando comparada a outros agentes etiológicos, sendo resistentes a vários antibióticos e são capazes
de causar infecções graves (Trabulsi, 1991).
S. saprophyticus é causadora de infecções do trato urinário, enquanto que S. agalactiae é
normalmente encontrada nas vias aéreas superiores, no trato gastrointestinal e genito-urinário. Estas
bactérias são causadoras de infecções como faringites e infecções celulares levando à septicemia,
podendo causar glomerulonefrite aguda e febre reumática. S. bovis é normalmente encontrada no
intestino humano e é causadora de infecções urinárias e endocardite, além disso, aparece associada
ao câncer do intestino grosso, embora não se tenham evidências de relação etiopatogênica
(Levinson & Jawetz, 1998, Trabulsi 1991).
As espécies de N. gonorrhoeae e N. meningitidis, são agentes causadores da blemorragia e
da meningite, são também resistentes a alguns antibióticos (vancomicina e polimixina), as demais
espécies do gênero são habitantes da mucosa nasofaringe. A espécie C. jeikeium pode ser
encontrada em hemoculturas e em feridas de pacientes imunossuprimidos, a espécie de C.
diphtheriae pode produzir a toxina diftérica (Toledo & Trabulsi 1991; Mims et al., 1999).
As bactérias do gênero Sphingobacterium podem ser encontradas na água, solo, esgoto e
equipamentos hospitalares expostos à água contaminada podem ocasionar meningite, bacteremia,
endocardite e infecções do trato respiratório, S. paucimobilis é encontrados principalmente na água
e no solo, sendo isolados de amostras de pacientes que fazem hemodiálise, e em ambiente
hospitalar. As Pseudomonas apresentam grande número de espécies, porém poucas espécies são
patogênicas para os humanos (Mims et al., 1999, Franzolin 2004).
L. monocytogenes é patogênica para o homem podendo causar septicemia e meningite. O
gênero Enterococcus esta entre os principais causadores de infecção hospitalar, principalmente em
unidades de tratamento intensivo, as bactérias são encontradas no trato gastrointestinal, e são
transmitidas pela falta de higiene. Os enterococos podem causar endocardite, mas por serem
cultivados com outras espécies de bactérias torna-se difícil definir seu papel patogênico (Jawetz et
al., 1998; Levinson & Jawetz 1998).
Fórum Internacional do Meio Ambiente - A conferência da Terra 774

S. maltophilia é uma bactéria comum em ambiente hospitalar, causando diversas doenças,


como pneumonia, bacteremia, endocardite, infecção do trato urinário, meningite e infecções de
feridas (Franzolin 2004).

COLETA E IDENTIFICAÇÃO
Para obter uma boa amostragem é necessária a realização de coletas em diferentes períodos
(diurno e noturno). Os espécimes podem ser coletados através de inspeções nos locais visitados
(busca ativa), tanto na área interna como na externa das unidades de saúde como também através da
utilização de iscas atrativas (mel, carne, fígado desidratado, sardinha). As formigas são coletadas
com auxílio de pincel e pinça e fixadas em álcool 70%, devidamente etiquetadas, depois são
alfinetadas e identificadas.
Para isolamento e identificação das bactérias as formigas são acondicionadas em meio de
cultura líquido, depois é semeado em diferentes meios, para isolamento e identificação das colônias.
Pode-se também coletar as bactérias de forma direta, neste caso monta-se um sistema no qual as
formigas obrigatoriamente passam sobre as placas com meio de cultura para chegarem até a isca.

Controle
A presença de formigas em hospitais brasileiros é uma preocupação constante pelo fato da
veiculação de agentes infecciosos, por isso se faz necessário um estudo mais aprofundado sobre a
fauna destes insetos nestas instituições, objetivando sua identificação, monitoramento e o
treinamento de pessoal para a identificação e controle utilizando métodos alternativos de baixo
impacto para o ambiente.
O sucesso no controle de formigas depende da escolha de uma metodologia adequada, para
isso é fundamental conhecer a situação real da infestação, as espécies, natureza da infestação e a
localização dos ninhos. Iscas atrativas podem ajudar na localização das colônias. A eliminação do
ninho é de grande importância para o controle de formigas, matar apenas as forrageadoras pode
promover a fragmentação da colônia e aumento da infestação (Spencer, 1941; Fowler & Bueno,
1996; Campos-Farinha, 2004). Iscas adesivas também são utilizadas para matar as operárias
(Bellevoye, 1889; Riley, 1889; Spencer, 1941, Delabie et al. , 1989). Outra medida importante para
evitar a presença de formigas é a limpeza de migalhas de alimentos.
O controle químico de formigas é quase sempre baseado nos métodos clássicos, como o
uso de produtos venenosos e persistentes nem sempre eficazes. O uso constante de pesticidas
representa fonte de contaminação ambiental e perigo ao ser humano e animais domésticos. No
Brasil, existe uma grande variedade de inseticidas comercializados em diversos locais, muitas vezes
sem o controle adequado, esse consumo gira em torno de 100 milhões de reais por ano (Ulloa-
Chacon & Cherix, 1994, Campos-Farinha, 2004).
O controle químico requer cuidados importantes, iscas atrativas com inseticida produzem
bons resultados desde que o ingrediente ativo esteja em baixa concentração para que não mate as
formigas por contato, já que o objetivo é o transporte e a distribuição por trofalaxia para os
membros da colônia, além de amenizar o risco de contaminação de outros organismos (Newell,
1909; Barber, 1920), é necessário também cuidados com o atrativo alimentar e a estratégia de
aplicação. Inicialmente é importante colocar as iscas com diferentes atrativos e sem o ingrediente
ativo e determinando qual a formulação que melhor atrai as formigas (Eichler, 1990), a inclusão do
ingrediente ativo deve ocorrer depois de dois ou três dias de observação. Inseticidas em forma de
pó seco podem ser utilizados em tubulações elétricas (Campos-Farinha, 2004).
Diversos produtos químicos têm sido testados no controle das formigas, os compostos
organoclorados (DDT); fosforados (malathion, parathion); dodecacloro; endosulfan e fenthion,
sendo que alguns deles encontram-se em desuso por serem bastante tóxicos (Fernald, 1947; Osburn,
1948; Nickerson, 1983; Sacoto, 1981; Delabie, 1989). Existem ainda os reguladores de crescimento
como o metoprene e fenoxicarbe (Williams, 1987; Ulloa-Chacon & Cherix, 1994).
Para o controle de M. pharaonis é recomendado o uso de iscas com cloredecone (Beatson,
1968), ácido bórico (Newton, 1980), Bacillus thuringiensis (Vankova et al., 1975), esterilizantes
Fórum Internacional do Meio Ambiente - A conferência da Terra 775

químicos (Berndt & Nitschmann, 1972) e metoprene (Edwards, 1975), piretro (Lintner, 1895) e
outros inseticidas orgânicos e inorgânicos (Rogers & Herrick, 1953; Morgan & Price, 1954;
Papworth, 1958).
As sugestões para controlar as formigas lava-pés vão desde os métodos caseiros, de
controle duvidoso e de manuseio perigoso, como a gasolina e outros derivados do petróleo, soluções
de detergente, alvejantes, água quente, cinza, vinagre, fermento e cascas de laranja e melão, até o
uso de tecnologias como microondas, sonda elétrica e explosivos (Williams, 1994). Os produtos
químicos de contato líquido, "sprays", pós, granulados, aerossóis e iscas tóxicas dão melhores
resultados no controle destas formigas. O uso dos inseticidas por contato teve inicio em 1937 com o
uso de cianido de cálcio em pó, a partir daí várias outras substâncias foram utilizadas na tentativa do
controle das formigas lava-pés (Eden & Arant, 1949; Drees & Vinson, 1991; Williams, 1994).
O controle físico para as formigas carpinteiras consiste no reparo de falhas na estrutura e
vazamentos, retirada de objeto que possa servir de nidificação; já o controle químico consiste na
localização das colônias e aplicação de inseticida à base de piretróides (ciflutrin e cipermetrina),
clorpirifós, bendiocarbe, diazinon ou propoxur, e iscas tóxicas (avermectina) (Back, 1937; Akre &
Hansen, 1990). Iscas tóxicas apresentam melhores resultados do que a aplicação de líquidos e pós
molháveis, visto que são transportadas e compartilhadas por trofalaxia e os líquidos e pós molháveis
atingem apenas as operárias em forrageamento, desta forma a maior parte da população sobrevive
ao controle (Williams & Vail, 1994; Edwards, 1986).
Há diversos tipos de iscas tóxicas no mercado, em 1916 foram registrados no Estado da
Califórnia, Estados Unidos, 39 tipos de iscas contendo arsênico (De Ong, 1916). Em 1920 era
comum a utilização de iscas com açúcar e arsênico, no início dos anos 60, iscas tóxicas com
dodecacloro foram aplicadas para controlar a formiga Solenopsis invicta (Lofgren et al.,1964), no
início dos anos 70, foram encontrados resíduos de dodecacloro em outros organismos (Baetcke et
al., 1972). Em 1977, foi testado o metoprene, um regulador de crescimento, no controle da formiga
do faraó (Edwards, 1977).

PERSPECTIVAS
Pesquisa com formigas em ambientes hospitalares no Estado de Sergipe foi iniciada em
meados de 2007 pela equipe de Entomologia da Universidade Federal de Sergipe. Santos et al.,
(2007) publicaram dados preliminares da mimercofauna do Hospital Governador João Alves Filho,
apresentando as espécies coletadas no ambiente externo (Dolichoderus sp., Ectatomma sp.,
Acromyrmex sp., Crematogaster sp.) e interno (Paratrechina longicornis, Tapinoma
melanocephalum e Pheidole sp.). Torna-se necessário a continuação das coletas incluindo outras
unidades de saúde do Estado de Sergipe, pois os trabalhos já desenvolvidos mostram a necessidade
do levantamento das espécies e da implementação de métodos de controle das formigas nestas
instituições. Para isso é necessário que os profissionais de saúde e os administradores se
conscientizem e promovam um programa efetivo de saneamento ambiental que seja adotado por
todos de forma padronizada e sistematizada.

BIBLIOGRAFIA
1. AKRE, R.D.; HANSEN, L.D. Management of carpenter ants. In:VANDER MEER, R.K.,
JAFFE, K., CEDENO, A. (Ed.) Applied myrmecology: A world perspective. 1990. p.691-700, 741p
2. BACK, E. A. House ants. USDA leaflet. v.147, p.8, 1937
3. BAETCKE, K.P.; CAIN, J.D.; POE, W.E. Residues in fish, wildlife,and estuaries: mirex and
DDT residues in wildlifeand miscellaneous samples in Mississippi-1970. Pestic.Monit. J., v.6, p.14-
22, 1972.
4. BARBER, E.R. The Argentine ant as a household pest. USDA Farmers' Bulletin. p.1101, 1929.
5. BEATSON, S.H. Eradication of the pharaoh's ant and cricketsusing chlordecone baits. Int. Pest
Control., v.10, p.8-10, 1968.
6. BEATSON, S.H. Pharaoh's ants as pathogen vectors in hospitals. Lancet., v.1, p.425-427, 1972.
Fórum Internacional do Meio Ambiente - A conferência da Terra 776

7. BERNDT, K.P.; EICHLER, W.D. Die Pharaoameise, Monomorium pharaonis (L.) (Hym.,
Myrmicinae). Mitt.Zool. Mus. Berl., v.63, n.1, p.3-186, 1987.
8. BERNDT, K.P.; NITSCHMANN, J. Koninginnentechnik zur Ameisenbekampfung 1. Der
EinfluBvon Tepa auf Laaborkolien der Pharaomeise. Angew Parasitol., v.18, p.1-18, 1
9. BROWN JUNIOR, W.L. Diversity of ants. In: DONAT, A.; MAJER,J.D.; ALONSO, L.E.;
SCHULTZ, T.R. (Eds.). Ants: standard methods for measuring and monitoring biodiversity.
Washington:Smithsonian Institution Press, p.45-79,2000.
10. BUENO, O. C. Formigas nos Hospitais. Ciência Hoje 19: 12-13,1995.
11. BUENO, O.C.; CAMPOS-FARINHA, A.E.C. Formigas Urbanas: Comportamento das espécies
que invadem as cidades brasileiras. Revista Vetores & Pragas 12: 13-16, 1998.
12. BUENO, O.C.; CAMPOS-FARINHA A.E.C. As formigas domésticas, p.135-180 in
MARICONI, F.A.M. (ed.). Insetos e outros invasores de residências. FEALQ, Piracicaba,1999.
13. BUENO, O.C. & FOWLER, H.G. Exotic ants and the ant fauna of Brazilian hospitals: In:
WILLIAMS, D.F. (Ed.) Exotic ants: biology, impact and control of introduced species. Boulder:
Westview Press, p.191-198,1994.
14. CAMPOS-FARINHA, A.E.C.; JUSTI Jr. J.; BERGMANN E.C.; Zorzenon F.J.; RODRIGUES
NETTO S.M. Formigas urbanas. Bol. Tec. Inst. Biol. 8: 5-20,1997.
15. CAMPOS-FARINHA, A.E.C.; BUENO O.C.; CAMPOS M.C.G.; KATO, L.M. As formigas
urbanas no Brasil: retrospecto. Biológico 64: 129-133,2002.
16. CHADEE, D.D.; MAITRE, A. Ants: potential mechanical vectors of hospital infections in
Trinidad. Transaction of the Royal Society of Tropical Medicine e Hygiene 84: 297, 1990.
17. COSTA, S.B. da; PELLI, A.; CARVALHO, G.P. de; OLIVEIRA, A.G.; SILVA, P.R. da;
TEIXEIRA, M.M.; MARTINS, E.; TERRAL, A.P.S.; RESENDE, E.M.; OLIVEIRA, C.C.H.B.;
MORAIS, C.A. Formigas como vetores mecânicos de microorganismos no Hospital Escola da
Universidade Federal do Triângulo Mineiro. Revista da Sociedade Brasileira de Medicina Tropical
39(6): 527-529, nov-dez, 2006.
18. DE ONG, E. Municipal control of the Argentine ant. J. Econ. Entomol., v.9, p.468-472, 1916.
19. DELABIE, J.H.C.; SANTOS, M.F.S.; ALVES, M.J.; NASCIMENTO, I.C.; ASSIS, J.S.;
VIANA, C.; LAVIGNE de MELLO, V.R. Formicidae do setor de saúde pública no Sudeste da
Bahia. Anais do XII Encontro de Mirmecologia, Unisinos, São Leopoldo,RS, p.84,1995.
20. DENISE D.O.MOREIRA.;VERÔNICA DE MORAIS.;OLNEY VIEIRA-DA-MOTA.;ANA E.
de C.CAMPOS-FARINHA &ATHAYDE TONHASCA JR.,Ants as Carriers of Antibiotic-
Resistant Bactéria
21. DREES, B.M.; VINSON, S.B. Fire ants and their management. Texas Agric. Extension Ser. B-
1536, 20-M-3-86-revised.Texas A&M Univ., College Staion, TX, 1991.
22. EDEN, W.G.; ARANT, F.S. Control of the imported fire ant in alabama. J. Econ. Entomol.,
v.42, p.976-979, 1949.
23. EDWARDS, J.P. The effects of a juvenile hormone analogue on laboratory colonies of
Pharaoh's ant, Monomorium pharaonis (Hymenoptera: Formicidae). Bull. Entomol. Res., v.65, p.75-
80, 1975.
24. EDWARDS, J.P. Control of Monomorium pharaonis (L.) with methoprene baits: implications
for the control of other pest species. In: Congress of the International Union for the Study of Social
Insects. 8., 1977, Wageningen, Netherlands. Wageningen: p.119-123, 1977.
25. Eduard JP, Baker LF. Distribuition and importance of Tha Pharaoh's Monomorium pharaonis
(L) in national Health Service Hospitals in England. Journal of Hospital Infection 2: 245-254, 1981.
26. EDWARDS, J.P. The biology, economic importance, and control of the Pharaoh's ant,
Monomorium pharaonis (L.). In: VINSON, S.B. (Ed.). Economic impact and control of social
insects. New York: Praeger Publishers; p.257-271,1986.
27. EICHLER, W.D. Verbreitung und Ausbreitungsterndenzen der Pharaoameise in Mitteleuropa.
Prakt. Schad., v.14, p.1-2, 1962 .
28. EICHLER, W.D. Die verbreitung der Pharaoameise in Europa.Memor. Zool., v29, p.31-40,
1978.
Fórum Internacional do Meio Ambiente - A conferência da Terra 777

29. EICHLER, W.D. Health aspects and control of Monomorium pharaonis. In: CEDENO, A.;
JAFFÉ, K.; VANDER MERR, R.K. (Eds.). Applied Mymercology: a world perspective. Boulder:
Westview., p.671-675,1990.
30. FERNALD, H.T. The little fire ant as a house pest. J. Econ. Entomol. Soc., v.27, p.257-258,
1947.
31. FOWLER, H.G.; FORTI, L.C.; BRANDÃO, C.R.; DELABIE, J.H.C.; VASCONCELOS, H.L.
Ecologia nutricional de formigas. In: PANNIZZI, A.R.; PARRA, J.R.P. (Ed.). Ecologia nutricional
de insetos. São Paulo: Manole, p.141-223,1991.
32. FOWLER, H.G.; BUENO, O.C.; SADATSUNE, T.; MONTELLI, A. Ants as potential vectors
of pathogens in hospitals in the state of São paulo, Brazil. Insect. Sci. Applic., v.14, n.3, p.367-370,
1993.
33. FOWLER, H.G. & BUENO, O.C. Congruent spatial and temporal foraging by a dominant ant
(Hym., Formicidae) and its replacement in an assemblage in a large urban structure in southeastern
Brazil. J. Appl. Ent., v.120,p.29-32, 1996.
34. FOWLER, H.G.; BUENO, O.C. O avanço das formigas urbanas. Ciência Hoje 23: 73-80, 1998
35. FOWLER, H. G.; SCHLINDWEIN, M. N.; MEDEIROS, M. A. Exotic ants and community
simplification in Brazil: A review . Exotic Ants, Boulder: Westveiw Press, p. 23-43, 1994
36. FRANZOLIN, M.R.. Bacilos gram-negativos aeróbios e anaeróbios facultativos, p.369-376 In
TRABULSI, L.R. (ed.). Microbiologia. Atheneu, Rio de Janeiro,2004.
37. HÖLLDOBLER B. & WILSON, E.O. The ants. Cambridge: Havard University Press, 1990.
38. IPINZA- REGLA, J.; FIGUEROA, G.; OSORIO, J. Iridomyrmex humilis, "hormiga argentina",
como vector de infecciones intrahospitalar. I- Estudio bacteriologico. Folia Entomológica, n.50,
p.81-96, 1981.
39. JAWETZ, E.; MELNICK J.; ADELBERG, A. Microbiologia Médica. Guanabara Koogan, Rio
de Janeiro, 424p,1998.
40. LEVINSON, W.; JAWETZ. E. Microbiologia Médica e Imunologia. Artmed, Porto Alegre,
415p,1998.
41. LINTNER, J. A. Monomorium pharaonis (linn.). In: 49th Ann. Report. N.Y. State Museum,
p.109-114,1985.
42. LOFGREN, C.S.; BARTLETT, F.J.; STRINGER, C.E.; BANKS, W.A. Imported fire ants ant
toxic bait studies: further tests with granulated mirex-soybean oil bait. J. Econ. Entomol., v.57,
p.695-698, 1964.
43. MIMS, C.; PLAYFAIR, J.; ROITT, I.; WAKELIN, D.; WILLIAMS, R. Microbiologia Médica.
2. ed. São Paulo: Manole, 1999
44. MORGAN, M.T. & PRICE, M.D. Insect proofing of hospitals with the new insecticidal resins.
Hospital. p.767-771, 1954.
45. NEWELL, W. Measures suggested against the Argentine ant as a household pest. J. Econ.
Entomol. v.2, p.324-332, 1909.
46. NEWTON, J. Alternatives to chlordecone for Pharaoh's ant control. Int. Pest Control., v.22,
p.112
47. NICKERSON, J.C. The little fire ant, Ochetomyrmex auropunctata (Roger) (Hymenoptera:
Formicidae). Florida Dep. Agr.Cons. Serv. Entomol. Circ., p.248, 1983.
48. OSBURN, M.R. Comparison of DDT, chlordane and chlorinated camphene for control of the
little fire ant. Florida Entomol., v.31, p.11-15, 1948.
49. PAPWORTH, D.S. Practical experience with the control of ants in Britain. Ann. Appl. Biol.,
v.46, p.106-111, 1958.
50. PASSERA, L. Characteristic of tramp species. In: WILLIAMS, D.F. (Ed.). Exotic ants: biology,
impact and control of introduced species. San Francisco: Wetsview Press, p.23-43, 1994.
51. PASSERA, L. ; ARON, S. Les fourmis: comportement, organisation sociale ET evolution.
Ottawa: Les Presses scientifiques du, 480p ;2005.
52. PEÇANHA, M. P. et al. Bactérias patogênicas isoladas de formigas de ambiente hospitalar.
Naturalia 24: 81-83,1999.
Fórum Internacional do Meio Ambiente - A conferência da Terra 778

53. PEÇANHA, M.P. Formigas como vetor de propagação bacteriana no Conjunto Hospitalar de
Sorocaba, SP. [Tese (Doutorado) - Instituto de Biociências UNESP].110p, 2000.
54. RILEY, C.V. The little red ant. Insect Life. v.2, p.106-108, 1889.
55. ROGGERS, T.H. & H ERRICK, G. W. Fieldwork against Pharaoh ants. Sanitaria., v.61, p.399-
402, 1953.
56. SACOTO, S.L. Pruebas en laboratorio para el control de la hormiga Wasmannia auropunctata
mediante la utilizacion de cuatro cebos. Universidad Central del Ecuador, Quito, 1981.
57. SANTOS, D.C.J.; SILVEIRA, S.L.S.; MOREIRA, T.S.; DANTAS, J.O., NASCIMENTO, F.S.
Identificação de formigas em ambientes hospitalares e transferência de tecnologia de controle
alternativo. Anais do XVI Encontro de Zoologia do Nordeste, Vol 1:Fauna Entomológica.
Garanhuns, 15 a 18 de novembro de 2007.
58. SILVA, E.J.E.; LOECK, A.E. Ocorrência de formigas domiciliares (Himenóptera: Formicidae)
em Pelotas, R.S. Revista Brasileira de Agrociência, v.5, n.3, p.220-224,1999.
59. SPENCER, H. The small fire ant Wasmannia auropunctata in citrus groves – a preliminary
report. Florida Entomol.,v.24, p.6-14, 1941
60. TOLEDO, M.R.F.; TRABULSI, L.R. Neisseria, pp.121-126 In TRABULSI L.R. (ed.).
Microbiologia. Atheneu, São Paulo,1991.
61. TRABULSI, L. R. Microbiologia. Atheneu, Rio de Janeiro, 386p,1991.
62. ULLOA-CHACON, P.; CHERIX, D. Perspectives on Control of the Little Fire ant (Wasmannia
auropunctata) on the Galapagos Islands. In: WILLIAMS, D.F. (Ed.) Exotic ants.Biology, Impact,
and Control of Introduced Species.Boulder: Westview Press, p.63-77,1994.
63. WILLIAMS, D. Foreign travel report in Galapagos Islands. Attini (An International Newsletter
on Pest Ants), v.18, p.16-17, 1987.
64. WILLIAMS,D.F. (Ed.) Exotic ants: biology, impact, and control of introduced species. Boulder:
Westview,1994.
65. WILLIAMS, D.F.; VAIL, K.M. Control of a natural infestation of the Pharaoh Ant
(Hymenoptera: Formicidae) with a corn grit bait of fenoxycarb. J. Econ. Entomol., p.109-115, 1994.
66. WILSON, E.O. Causes of ecological successes: the case of the ants. Journal of Animal Ecology,
v.56, p.1-9, 1987.
67. ZARZUELA, M.F.M.; RIBEIRO, M.C.C.; CAMPOS-FARINHA, A.E.C. Distribuição de
formigas urbanas em um hospital da região Sudeste do Brasil. Arquivos do Instituto Biológico, São
Paulo, v.69, n.1, p.85-87, 2002.
Fórum Internacional do Meio Ambiente - A conferência da Terra 779

STATUS CONSERVACIONISTA DA ANUROFAUNA E OS POSSÍVEIS EFEITOS DAS


MUDANÇAS CLIMÁTICAS NA RPPN FREI CANECA, JAQUEIRA, PERNAMBUCO

S. P. L. Santos
Aluna do Curso de Bacharelado em Ciências Biológicas/Ambientais da Universidade Federal de Pernambuco. Av. Prof.
Moraes Rego, 1235 - Cidade Universitária, Recife - PE - CEP: 50670-901
Fone PABX: (81) 2126.8000 / Fax: (81) 2126.8029. sueny_paloma@hotmail.com
E. M. Santos
Professora orientadora da Universidade Federal Rural de Pernambuco/ Unidade Acadêmica de Serra Talhada. R. Dom
Manoel de Medeiros, s/n - Dois Irmãos, Recife- PE – CEP: 52171-900 – Fone: (81) 3320.6011.
ednilzamaranhao@yahoo.com.br

RESUMO
A principal ameaça à conservação de anfíbios no Brasil é a destruição de seus habitas, o
desmatamento acelerado, o avanço da fronteira agrícola, a mineração, o fogo, os projetos de
desenvolvimento, esses fatores acarretam sérias mudanças climáticas. Anfíbios são animais bastante
sensíveis às mudanças físicas e químicas no ambiente sendo considerados excelentes
bioindicadores. O presente estudo teve como objetivo amostrar a anurofauna, seu status e os
possíveis impactos ambientais que podem estar contribuindo para as mudanças. A presente pesquisa
está sendo realizada em um fragmento de Mata Atlântica conhecido como Reserva Particular
Patrimônio Frei Caneca (08º 43’S e 035º 50’W), município de Jaqueira no Estado de Pernambuco,
os dados apresentados refere-se ao período entre setembro de 2007 a fevereiro de 2008 através de
visitas mensais que duraram três a quatro noites. Foram encontradas 46 espécies distribuídas em
nove famílias, à maioria espécies generalistas de ampla distribuição em áreas abertas e 22 espécies
dependentes de recursos da mata para sobreviverem. Dessas, uma espécie (H. freicanecae) foi
registrada com a presença do fungo quitrídeo, outra (H. granulosa) é considerada pela lista da
IUCN e IBAMA como animal ameaçado e outras duas são novas ocorrências ou espécies não
descritas. O principal impacto ao fragmento é a retirada parcial da madeira e nos seus arredores, o
desmatamento e as queimadas, principalmente devido à época de colheita da cana-de-açúcar. O
declínio de anfíbios tem sido alardeado por conservacionistas e biólogos, pois há um grande número
de extinções e reduções populacionais. Isso ocorre porque esses animais são extremamente
sensíveis a alterações ambientais e por isso há maior risco de extinção, é possível que alguns anuros
tenham já sido extintos na reserva sem ao menos serem estudados, é de extrema necessidade mais
atenção e fiscalização nas áreas de proteção.
Palavras-Chaves: anurofauna, status conservacionista, mudanças climáticas, extinção.

ABSTRACT
The main threat to the conservation of amphibians in Brazil is the destruction of their live,
the accelerated deforestation, the advance of the agricultural frontier, mining, fire, the projects of
development, these factors imply serious climate change. Amphibians are animals quite sensitive to
changes in the physical and chemical environment is considered excellent bioindicators. This study
aimed to sample the anuran, its status and the possible impacts environmental that may be
contributing to the changes. This study is being conducted in a fragment of Atlantic known as
Private Reserve Heritage Frei Caneca (08 ° 43'S, 035 º 50 'W), Jaqueira, municipality in the state of
Pernambuco, the data presented refers to the period between September 2007 to February 2008
through monthly visits, which lasted three to four nights. We found 46 species distributed in nine
families, the majority species generalists with broad distribution in open areas and 22 species
dependent on the forest resources to survive. Of these, a kind (H. freicanecae) was recorded in the
presence of the chytrid fungus, another (H. granulosa) is considered by the IUCN list of threatened
and IBAMA as animal and other two species are new records or not described. The main impact is
to fragment the partial withdrawal of wood and its surroundings, deforestation and the burning,
mainly due to the time of harvest of sugar cane. The decline of amphibians has been spoken by
conservationist and biologists, because there are a large number of extinctions and population
reductions. This is because these animals are very sensitive to environmental change, and so there's
Fórum Internacional do Meio Ambiente - A conferência da Terra 780

greater risk of extinction, it is possible that some frogs have already been extinct in the reserve
without at least being studied, it is of extreme need more attention and supervision in the areas of
protection.
Keywords: anuran fauna, conservation status, climate change, extinction.

INTRODUÇÃO
Atualmente, são conhecidas no mundo 5.918 espécies pertencentes à classe Amphibia, e a
ordem Anura é a mais diversificada do mundo (GAA, 2007). O Brasil, segundo IUCN (2006),
Global Amphibian Assessment (GAA, 2007) e a Sociedade Brasileira de Herpetologia (2008),
abriga 825 espécies de anfíbios, das quais a maioria é endêmica e 110 estão ameaçadas de extinção.
Essa diversidade de anuros encontrada no Brasil é devido à grande variedade de ambientes úmidos
(Duellman & Trueb, 1994).
A Mata Atlântica é uma das florestas mais diversificadas em organismos do mundo, em
contrapartida este bioma está reduzido a 7%, segundo algumas literaturas, e cerca de 340 espécies
de anuros foram encontradas (Haddad e Abe, 1999; Trindade et al, 2005). Há uma carência de
informações sobre as espécies que pode estar induzindo uma avaliação incorreta de sua real
distribuição (Haddad e Abe, 1999).
O tema mudanças climáticas X declínio de anfíbios foi primeiramente abordado, em 1989,
durante o primeiro Congresso Mundial de Herpetologia, realizado na Inglaterra. Naquele momento,
chamou a atenção que o declínio de anfíbios, cujos primeiros registros datavam de 1970, não
afetava apenas populações de espécies localizadas em áreas obviamente ameaçadas, mas também
aquelas situadas em áreas protegidas. Em 1971, aproximadamente 40 cientistas, incluindo
herpetólogos, ecólogos, climatólogos e patologistas, realizaram na Califórnia, EUA, um workshop
para debater o assunto. A partir daquele ano surgiram diferentes trabalhos abordando os aspectos
então debatidos (Barinaga, 1990; Phillips, 1990; Stebbins & Cohen, 1995).
Alguns pesquisadores questionam-se sobre os efeitos das mudanças climáticas e
perturbações antrópicas no declínio populacional, mas sim como flutuações cíclicas naturais (Pough
et al., 1998). Este mesmo fenômeno foi observado em outros grupos animais como peixes e aves
(Stebbins & Cohen, 1997). Desta maneira, estudos em longo prazo envolvendo comunidades são de
fundamental importância para uma melhor compreensão e avaliação dessas flutuações
populacionais.
O declínio de populações de anfíbios no Brasil é pouco documentado e compreendido. Isto
se deve à falta de conhecimento sobre a biologia das espécies e de estudos de monitoramento há
longo prazo (Haddad e Abe, 1999), bem como a falta de inventários em diferentes localidades,
principalmente na região Nordeste.
Recentemente, a Serra do Urubu, que é localizada na RPPN Frei Caneca (pertencente à
Usina Colônia), Jaqueira, Pernambuco, foi selecionada como de extrema importância biológica
durante o workshop Atlas da Biodiversidade do Estado de Pernambuco (Silva & Tabarelli, 2001),
no qual surgiu à necessidade de criação de uma unidade de conservação no local em virtude dos
endemismos, espécies ameaçadas além de novas espécies. Agora, com a RPPN já estabelecida,
resta, portanto, a elaboração através de um planejamento estratégico para a tomada de ações
prioritárias para sua efetiva conservação, para isso trabalhos envolvendo diversidade de diferentes
grupos de animais são importantes na implementação de plano de manejo. Durante expedições
esporádicas realizadas entre 2000-2001 nesta área por especialistas do Rio de Janeiro foi possível
documentar uma espécie nova de Hylideo, a Hypsiboas freicanecae (Carnaval & Peixoto, 2006), e a
ocorrência de anfíbios infectados por um fungo quitrídeo, Batrachochytrium dendrobatidis,
inclusive alguns indivíduos de Hypsiboas freicanecae estavam infectados (Toledo, Haddad,
Carnaval & Brito, 2006). A ocorrência de nova espécie de anfíbios infectados por fungo deve ser
alvo de investigação para área e estudo de monitoramento da anurofauna local deve ser realizado
urgentemente.
Nossa intenção foi ter boa compreensão da anurofauna local, já que a maior dificuldade é a
falta de informações básicas sobre as espécies. Através disso, foi possível produzir um modelo
Fórum Internacional do Meio Ambiente - A conferência da Terra 781

explicativo da diversidade, bem como, da variação da distribuição temporal das populações de


anuros em relação às variáveis bióticas e abióticas e identificar espécies bioindicadoras. O presente
trabalho é de extrema importância e vai contribuiu com informações ecológicas e geográficas sobre
os anfíbios anuros da mata atlântica do Nordeste.

MATERIAIS E MÉTODOS
Área de Estudo
Os estudos estão sendo realizados na RPPN Frei Caneca (8º 43’S e 35º50’W), localizado
no município de Jaqueira, Zona Mata Sul de Pernambuco. A área totaliza 630,42 ha e o clima é
tropical úmido (IBGE, 1985).
A área de estudo está inserida no Centro de Endemismo de Pernambuco (CEPE) (Silva &
Tabarelli, 2001). Os fragmentos amostrados na RPPN foram: Mata da Serra do Quengo (8º42’ S
35º50 ‘O, 648 m alt.), Mata da Bernadina e no “inselberg” denominado Pedra do Cruzeiro ou Mata
do Espelho (8º43 S, 35º50 O, 700 m alt.). Os locais se encontram circundados por cana-de-açúcar,
banana e pequenas lavouras temporárias (ex.macaxeira, batata-doce, chuchu). Encontram-se
fragmentos conhecidos como:
A Mata da Serra do Quengo, com 500 ha, é fragmento mais preservado da RPPN, é
classificado como um misto de Floresta Madura (árvores com altura entre 20-25m) e Floresta Alta
(árvores entre 10-15m) e é o fragmento que apresenta menor pressão antrópica;
A Mata do Espelho, com 50 ha, é um fragmento com forte pressão antrópica, muitas áreas
com predominância de espécies pioneiras, muitas clareiras e com uma grande evidência de caça, é
classificada como Floresta Baixa e algumas áreas de Floresta Alta e áreas abertas com
predominância de Poaceae;
A Mata da Bernadina é uma mata com áreas de floresta madura e uma grande área de
floresta secundária. Em algumas áreas o fragmento apresenta um bom estado de conservação.
Apresenta regiões alagadiças e algumas estradas abandonadas.

Amostragem.
As visitas à área de estudo foram mensais com duração de três a quatro noites entre
Setembro de 2007 a fevereiro de 2008. O esforço de captura e registro foi distribuído em coletas
diurnas e noturnas através de buscas usando equipamentos básicos, como binóculos, lanternas,
sacos plásticos, entre outros. Dados ecológicos e comportamentais das espécies ocorrentes foram
registrados em ficha de campo. Informações como: tipo de ambiente, habitat, microhábitat,
possíveis associações com plantas, comportamento e aspectos reprodutivos serão devidamente
anotadas. Espécimes com problemas taxonômicos foram coletados e informações referentes ao
CRC (comprimento rostro-cloacal) utilizando paquímetro e massa utilizando balança pesola®
foram registrados, bem como informações referentes ao comportamento e microhábitat.
Dados climatológicos como temperatura do ar, da água e umidade relativa do ar foram
obtidos no próprio local de estudo durante as observações, e parâmetros pluviométricos mensais
obtidos através da estação meteorológica de Jaqueira (LAMEPE/ITEP).

RESULTADOS E DISCUSSÃO
Riqueza de espécie e Status de conservação
Até o momento foram registradas para RPPN Frei Caneca 46 espécies de anfíbios anuros,
distribuídas em nove famílias (Tabela I), 76,09 % ocuparam borda de mata, e 23,91 % interior de
mata. Das 46 espécies 86,96 % tem distribuição ampla para o Brasil, 13,04 % são registradas para a
região Nordeste, e dois casos de endemismo para Pernambuco. A H. granulosa, registrada na lista
da IUCN e IBAMA como animal ameaçado (Silvano & Segalla, 2005) e outra, até o momento,
apenas encontrada na RPPN, H. freicanecae, ameaçada pelo fungo quitrídeo (Carnaval & Peixoto,
2006), ambas com apenas dois registros durante a pesquisa, todavia é importante destacar que as
coletas de dados irão até setembro/2008 e existe a possibilidade de mais registros. Comparando aos
trabalhos realizados em Pernambuco com anurofauna (Santos & Carnaval, 2002) a lista aqui
Fórum Internacional do Meio Ambiente - A conferência da Terra 782

apresentada ultrapassa as listas obtidas para outras localidades do estado, destacando a importância
da localidade como área de grande importância biológica, possivelmente essa riqueza esta
relacionada as característica edafoclimática da região, podendo ser um modelo ecológico
interessante para propor outras unidades de conservação. A Mata do Espelho foi a que obteve um
número maior de espécies, 27, e a maioria das espécies foram observadas vocalizando. Vale
salientar que a maioria dessas espécies são generalistas, típicas de áreas abertas. A capacidade das
populações de algumas espécies em colonizar a área alterada é que são poucos exigentes,
apresentando hábitos alimentares variados. A Mata do Quengo foi observada a que obteve o menor
número, como é uma área relativamente preservada, as espécies são mais exigentes quanto aos
habitats que a ocupam (Tabela I).
Em conseqüência dos desmatamentos, as espécies de anuros de áreas abertas têm
expandido geograficamente os seus limites, em detrimento das espécies de mata. Algumas espécies
mais generalistas como, por exemplo, Rhinella crucifer, (Bufonidae), Hypsiboas albopunctata,
Scinax fuscovarius (Hylidae), Leptodactylus fuscus e Physalaemus cuvieri (Leptodactylidae), foram
beneficiadas, passando a ocorrer também nas áreas outrora cobertas por mata. Ao mesmo tempo,
algumas espécies de mata, que ocorrem em clareiras naturais, se adaptaram às novas condições dos
ambientes abertos. Este é o caso de Hyla faber (Hylidae) (Haddad e Abe, 1999). Este fenômeno
pode levar a uma interpretação errônea dos dados de riqueza apresentados para uma determinada
área. O número de espécies generalistas, dependendo do grau de perturbação antrópica, pode ser o
maior responsável por uma grande riqueza, o que não significa que esta área seja importante no
quadro regional ou local de conservação. Mais importante que a riqueza, portanto, é o número de
espécies raras, endêmicas ou restritas a ambientes de mata, como é o caso da Mata do Quengo, pois
estas serão realmente afetadas pelos processos de desmatamento e ocupação em razão da
modificação de seus habitats (Silvano & Pimenta, 2003).

Possíveis ameaças e efeitos das mudanças climáticas


A principal ameaça à conservação de anfíbios no Brasil é a destruição de seus habitats, e
esse fato é mais grave na Mata Atlântica (Fundação SOS Mata Atlântica, 2002). O desmatamento
acelerado, o avanço da fronteira agrícola, a mineração, o fogo e os projetos de desenvolvimento (p.
ex., barragens, estradas, indústrias e empreendimentos imobiliários) são as principais causas dessa
destruição. Na RPPN Frei Caneca apesar de ser uma área protegida e que faz parte de um complexo
de pequenos fragmentos já se encontra desfigurada pelas ações antrópicas. A monocultura de cana-
de-açúcar, que predomina na região, gera um amplo e desordenado desmatamento, e uma prática
que parece comum na área é o desmatamento dos grotões úmidos para a plantação de bananeira, é
também comum registrar retirada de madeira nos seus fragmentos para fazer carvão clandestino e
isso ocorre de uma forma mais disfarçada, sempre à noite.
O presente estudo revela que a comunidade de anfíbios anuros apresenta-se um possível
risco de extinção local, fato que já é observado em algumas espécies com o fungo quitrídeos que
antes não era observado.
O número de espécies encontradas é grande em relação a alguns fragmentos de Mata
Atlântica, principalmente em áreas altas de vales e rios e a presença de espécies ameaçadas de
extinção justifica que a área estudada deve ser priorizada para investimentos de medidas
conservacionistas.

Soluções para a conservação do local seriam:


Reflorestamento, principalmente envolver conexão de fragmentos;
Educação Ambiental;
Translocação das famílias que vivem nas áreas de reserva.
Com base nesses estudos vale ressaltar a importância da proteção integral de habitats, mas
também a necessidade de políticas públicas e proteção legal mais proeminente, criação em
cativeiro, educação ambiental, pesquisas sobre doenças infecciosas, inventários e além de tudo fazer
Fórum Internacional do Meio Ambiente - A conferência da Terra 783

novas abordagens de pesquisa para identificação de problemas-chave, espécie a espécie, que são a
causa de declínio de anfíbios.

Tabela I. Lista das espécies de anfíbios registradas no período de setembro/2007 a fevereiro/2008


na RPPN Frei Caneca, Jaqueira/PE. Área: Mata-M, Borda-B e Área aberta-AB; Local: Mata do
Quengo, Mata do Espelho e Mata da Bernadina; Microhabitat: 1- sobre rochas, 2- vegetação
arbórea, 3- vegetação herbácea, 4- solo, 5- água, 6- bromélias e 7- folhedo; Status de conservacão:
endêmicos (en), ampla distribuição (ad), potenciais bioindicadores (pb), que pode estar sofrendo
extinção local (el), raras (r), abundante (ab), ameaçados pela lista do IBAMA e IUCN (ae) e
registros novos (n); Aspecto reprodutivo: 1- vocalização, 2- amplexo, 3- desova ou ninho de
espuma, 4- girinos em fase inicial.
Fórum Internacional do Meio Ambiente - A conferência da Terra 784

Status Aspectos
Grupo taxonômico Área/ Local Microhabitat
Conservacionistas reprodutivos
AMPHIGNATHODONTIDAE
(GASTROTHECINAE)
Gastrotheca fissipes AB/Espelho 6 EM, PB 1, 4
(Boulenger)
BUFONIDAE
Rhinella crucifer (Wied- M e B/ 1 e 4 AD, PB -
Neuwied) Quengo e
Bernadina
Rhinella granulosa (Spix) B/ Espelho 4 AD -
Rhinella schneideri (Werner) AB/ Espelho 4 AD, AB 1
BRACHYCEPHALIDAE
Ischnocnema gr. ramagii B e M/ 1, 4, 6 e 7 AD, PB 1
(Boulenger) Espelho e
Bernadina
Ischnocnema binotatus (Spix) B e M/ 4, 6 e 7 AD, PB 1
Espelho
Eleutherodactylus sp. 1 B e M/ 6 AD, PB 1
Espelho e
Bernadina
Eleutherodactylus sp. 2 B e M/ 7 AD, PB -
Espelho e
Bernadina
CYCLORAMPHIDAE
(ALSODINAE)
Proceratophrys boiei (Wied- M e B/ 4e7 PB 1
Neuwied) Espelho e
Quengo
HYLIDAE

Dendropsophus branneri B e AB/ 3 AD 1e2


(Cochrane) Espelho,
Quengo e
Bernadina
Dendropsophus decipiens AB/Bernadina 3 AD 1
(Lutz)
Dendropsophus elegans B e AB/ 3 AD 1
(Wied-Neuwied) Espelho e
Bernadina
Dendropsophus minutus B e AB/ 3 AD 1
(Peters) Espelho e
Bernadina
Dendropsophus oliveirai AB/Bernadina 3 AB 1
(Bokermann)
Dendropsophus sp. gr. AB e 4 R -
marmoratus (Laurenti) M/Quengo
Hypsiboas albomarginatus M e B/ 1, 2 e 3 AB 1, 2 e 3
(Spix) Espelho,
Quengo e
Bernadina
Fórum Internacional do Meio Ambiente - A conferência da Terra 785

Hypsiboas albopunctatus AB/Bernadina 3 AB 1


(Spix)
Hypsiboas atlanticus AB/ 3 AB 1
(Caramaschi & Velosa) Bernadina
Hypsiboas crepitans (Wied- AB/ Espelho 4e5 AB 1e2
Neuwied)
Hypsiboas faber (Wied- AB/ Espelho 4e5 PB e R 1, 2, 3 e 4
Neuwied)

Hypsiboas freicanecae M/ Quengo 5 EN, EL, R e N -


(Carnaval & Peixoto)
Hypsiboas raniceps (Cope) AB/ Espelho 2 AD 1
Hypsiboas semilineatus (Spix) M, B e AB/ 1, 2, 3 e 4 AB 1, 2, 3 e 4
Espelho,
Quengo e
Bernadina
Hypsiboas cf. exastis B/Bernadina 6 PB 1
(Caramaschi & Rodriguez)
Phyllodytes cf. luteolus (Wied- M,B e 6 AB e PB 1e4
Neuwied) AB/Espelho,
Quengo e
Bernadina
Phyllodytes sp. AB/Espelho - - 1
Scinax eurydice (Bokermann) AB/Bernadina 3 AB -
Scinax auratus (Wied- AB/Espelho 3e4 AB 1
Neuwied)
Scinax nebulosus (Spix) AB/Bernadina 3 AB e AD -
Scinax catharinae (Boulenger) AB/Quengo - AB -
Scinax x-signatus (Spix) AB/ Espelho 3 AB e AD 1
Scinax pachrycrus (Miranda- AB/ Espelho 1, 3 e 4 AB 1
Ribeiro)
Scinax fuscovarius (A. Lutz) AB/ Espelho 3 AB e AD 1
Scinax sp. AB e - PB -
B/Quengo
Trachycephalus mesophaeus AB/ Espelho 1 AB -
(Hensel)
HYLIDAE
(PHYLLOMEDUSINAE)
Hylomantis granulosa (Cruz) M/Quengo - PB, EL, R e AE -
Phyllomedusa nordestina AB/ Espelho 3e4 PB e R 1
(Caramaschi)
LEIUPERIDAE
Physalaemus cuvieri AB/ Espelho 3e4 AD e AB 1
(Fitzinger)
Pseudopaludicola sp. AB/ Espelho 1e5 AB -
LEPTODACTYLIDAE
Leptodactylus fuscus AB/ Espelho 4 AB 1
(Schneider)
Leptodactylus natalensis AB/ Espelho 4 AB 1
(Lutz)
Leptodactylus ocellatus AB/ Quengo 4 AD e AB -
Fórum Internacional do Meio Ambiente - A conferência da Terra 786

(Linnaeus)
Leptodactylus marmoratus B/ Espelho - AD -
(Steindachner)
Leptodactylus vastus (Lutz) AB e B/ 4e5 AD 1e4
Espelho e
Bernadina
Leptodactylus troglodytes (A. AB/ Quengo 4 AD -
Lutz)
RANIDAE
Lithobates palmipes (Spix) AB e B/ 3, 4 e 5 AD 4
Quengo e
Bernadina

REFERÊNCIAS BIBLIOGRÁFICAS
Andrade-Lima, D. 1960. Estudos fitogeográficos de Pernambuco. Arquivos do Instituto de
Pesquisas Agronômicas 5: 305-341.
Andreani, P., Santucci, F. & Nascetti, G. 2003. Le rane verdi del complesso Rana esculenta come
bioindicatori della qualità degli ambienti fluviali italiani. Biologia Ambientale 17: 35-44.
Carnaval, A. C. O. Q & Peixoto, O. L. 2004. A new species of Hyla from northeastern Brazil
(Amphibia, Anura, Hylidae). Herpetologica 3: 387–395.
Carnaval, A. C. O. Q. & Peixoto, O. L. 2006. Amphibian Chytrid Fungus Widely Distributed in
Brazilian Atlantic Forest. EcoHealth. 3:41-48.
Duellman, W. E. & Trueb, L. 1994. Biology of amphibians. McGraw Hill, New York. 670p.
Fundação SOS Mata Atlântica, 2002. Atlas da Mata Atlântica. Disponível em:
http://www.sosmataatlantica.org.br/. Acessado em: 01/03/2008.
GAA. 2006. Global Amphibian Assessment. Website: http://www.globalamphibians.org/. Acessado
em 12/01/2008.
Haddad, C. F. B. & Abe, A.S. 1992. Anfíbios anuros da Serra do Japi. In:MORELLATO,L. C. P.
ed. História natural da Serra do Japi. Campinas: Editora da Unicamp /FAPESP, p. 188-211.
Haddad, C.F.B. & Abe, A.S. 1999. Anfíbios e Répteis. In: Workshop Floresta Atlântica e Campos
Sulinos. Disponível em: http://www.bdt.org.br/workshop/mataatlantica /BR/rp_anfib.
Heyer, W. R., et al. Frogs of Boracéia. 1990. Arquivos de Zoologia da Universidade de São Paulo,
31: 1-410.
IUCN. 2001. 2001 IUCN Red List Categories and Criteria version 3.1. Website:
http://www.redlist.org/ info/categories_criteria2001. Acessado em 12/01/2008.
IUCN. 2006. 2006 IUCN Red List of Threatened Species. Website: http://www.iucnredlist.org.
Acessado em 12/01/2008.
Krebs, C. J. 1989. Ecological methodology. New York: Harper & Row, 654 p.
Pough, F. H.; Andrews, R. M.; Cadle, J. E.; Savitzky, A. H.; Wells, K. D. 1998. Herpetology. New
Jersey, Prentice Hall, 577p.
Pounds, A., Carnaval, A. C. O. Q. , Puschendorf, R. ; Haddad, C. F. B. ; Masters, K. L. 2007.
Action on amphibian extinctions: Going beyond the reductive. Science, http:/, p. http://www.scie-
http://www.sci.
Santos, E. M. & Carnaval, A. C. O. Q. 2002. Anfíbios Anuros do Estado de Pernambuco. In: M.
Tabarelli & J.M.C. Silva (orgs.). Diagnóstico da Biodiversidade de Pernambuco. Recife, Editora
Massagana, 2:529-533.
SBH. 2005. Lista de Espécies de Anfíbios do Brasil. Sociedade Brasileira de Herpetologia (SBH).
Disponível em: http://www.sbherpetologia.org.br/checklist/anfíbios.htm. Acessado em 07/03/2008.
Silvano, D. L. & Pimenta, B. V. S. 2003. Diversidade e distribuição de anfíbios na Mata Atlântica
do Sul da Bahia. (Acessado em 23/07/2007: www.rbma.org.br)
Silvano, D. L. & Segalla, M. V. 2005. Conservação de anfíbios do Brasil. Megadiversidade 1:79-
86.
Fórum Internacional do Meio Ambiente - A conferência da Terra 787

Silvia, J.M.C. & Tabarelli, M. 2001 . The future of Atlantic forest in northeastern Brazil.
Conservation Biology 15: 819-820.
Skelly, D. K. 1996. Pond drying, predators and the distribution of Pseudacris tadpoles. Copeia, p.
599-605.
Sparlling, D. W., Linder, G. & Bishop, C. A. 2000. Ecotoxicology of Amphibians and Reptiles.
Pensacola, SETAC Press.
Stebbins, R. C.; Cohen. 1997. N. W. A Natural History of Amphibians. New Jersey: Princeton
University Press, 316p.
Toledo, L. F., Haddad, C. F. B., Carnaval, A. C. O. Q. & Britto, F. B., 2006. A Brazilian anuran
(Hylodes magalhaesi: Leptodactylidae) infected by Batrachochytrium dendrobatidis: a conservation
concern. Amphibian and Reptile Conservation 1:17-21.
Trindade, M. B. et al. 2004. A fragmentação da Mata Atlântica no litoral do norte de Pernambuco:
Uma análise da estrutura da paisagem. IV Jornada de Ensino, Pesquisa e Extensão da UFRPE. -
Recife, Imprensa Universitária.
Trindade, M. B. et al. 2005. Uso de sensoriamento remoto na análise da fragmentação da Mata
Atlântica no litoral norte de Pernambuco, Brasil. Anais XII Simpósio Brasileiro de Sensoriamento
Remoto, Goiânia, Brasil, 16-21, INPE, p. 705-712.
Vasconcelos, T. S. & Rossa-Ferres, D. C. 2005. Diversidade, distribuição espacial e temporal de
anfíbios anuros (Amphibia, Anura) na região noroeste do estado de São Paulo, Brasil. Publicado na
Biota Neotropica v5(n2)-http://www.biotaneotropica.org.br/v5n2/.
Vitt, L. J. et al. 1990. Amphibians as harbingers of decay. Bioscience 40: 418.
4° Relatório Temático do Projeto Parcelas Permanentes Parte VIII. 2006. In: Jaime Bertoluci.
Anfíbios em parcelas permanentes e sua aplicação como bioindicadores da qualidade ambiental. 4
Processo FAPESP 1999/09635-0
Fórum Internacional do Meio Ambiente - A conferência da Terra 788

A CULTURA DO EUCALIPTO E AS TRANSFORMAÇÕES SÓCIO-AMBIENTAIS NO


EXTREMO SUL BAIANO.

Cristiane Queiroz de Almeida


Estrada do Bem Querer, Km 04, Bairro Universitário - Vitória da Conquista – BA. CEP 45.083-900.
cristianedequeiroz@gmail.com
Silvânia Brito Araújo
Estrada do Bem Querer Km, 04, Bairro Universitário - Vitória da Conquista – BA. CEP 45.083-900
Meirilane Rodrigues Maia
Estrada do Bem Querer, Km 04, Bairro Universitário - Vitória da Conquista – BA. CEP 45.083-900.
meire.rmaia@gmail.com

RESUMO
Este trabalho tem como principal objetivo analisar o processo de implementação da cultura
do eucalipto no extremo Sul da Bahia, levando em consideração as transformações impostas à
região. Assim, esta pesquisa consta de um levantamento histórico desse processo, principalmente,
quanto às adaptações às leis para atender às grandes indústrias de produção de eucalipto e celulose,
instaladas na Bahia. As transformações sócio-ambientais ocorridas nesse curto espaço-tempo
apresentam impactos relevantes para o meio ambiente, e, sobretudo, para a população local.
Contudo novos modelos de produção que valorizem a biodiversidade e as culturas regionais devem
ser discutidos e colocados em prática para que esse modelo de “desenvolvimento” vigente não
decrete o fim das riquezas naturais presentes no Sul da Bahia.
Palavras–chave: Eucalipto. Legislação. Impacto sócio-ambiental.

ABSTRACT
This work has as main objective to analyze the process of implementation of the culture of
eucalypt in the South extremity of the Bahia taking into account the transformations imposed to the
region. Thus, this research consists of a historical survey of this process, rather, as to the fittings to
the laws to serve the great industries of production of eucalypt and cellulose, installed in the Bahia.
The socio-environmental transformations, occurred in this short space-time, present relevant
impacts to the environment, and, over all, to the local population. However, new models of
production which appraise the regional biodiversity and the cultures must be argued and put into
practice so that this model of effective “development" doesn’t decree the end of the natural
recourses from the South of the Bahia.
Keywords: Eucalypt. Legislation. Socio-environmental Impact.

INTRODUÇÃO
Uma das faces mais importantes da exclusão social é a segregação ambiental. Testemunha-
se um ambiente cada vez mais degradado, espaços totalmente corrompidos por contradições,
satisfações e insatisfações.
Nesse contexto, o sistema capitalista não garante os meios de subsistência a toda a
sociedade. Pelo contrário, é condição do sistema a existência de uma massa de trabalhadores
desempregados. Existe uma incompatibilidade entre as duas classes principais da sociedade
capitalista: os empresários, que são os donos dos meios de produção, e os assalariados, que são os
donos da força de trabalho.
O espaço físico sempre foi visto como um mero território mercadológico, provedor de
insumos e matérias primas, e consumidor de bens e serviços, com nenhuma ou escassa inquietação
ambiental por parte do estado, das empresas e da sociedade em geral, inclusive com relação aos
recursos naturais não renováveis.
De acordo com Branco,
A preservação do meio ambiente é, também, um problema que passa pela história
cultural do Ocidente capitalista, voltado para a tecnologia, que tem por meta a produção
em massa e a padronização e que dá a ilusão de um crescimento ilimitado, privilegiando
alguns segmentos da sociedade, em detrimento de outros. O poder político e econômico
Fórum Internacional do Meio Ambiente - A conferência da Terra 789

é exercido por uma classe organizada e dominante, que tem em vista somente o seu bem-
estar econômico. Caracteriza-se essa sociedade, o espírito competitivo e não-
cooperativo. É a competição da economia no mundo dos negócios, do consumismo, e
esse comportamento leva à exploração e à destruição dos recursos naturais. Branco
(2003, p. 5).

Assim, a educação ambiental se insere com o propósito de mostrar as correlações


econômicas, políticas, sociais, culturais e ecológicas do mundo, contribuindo, portanto, para o
desenvolvimento de um espírito de responsabilidade entre o indivíduo e a sociedade, para com a
natureza.
Aspecto significativo no que se refere à agroindústria é o estrago praticamente irreversível
que esse processo causa ao meio ambiente. A busca incessante pelo lucro que faz com que as
indústrias produzam cada vez mais, se apropriando dos recursos naturais sem o devido controle,
permitiu um notável aumento da capacidade extrativa da espécie humana. No aspecto funcional, “o
progresso tecnológico posterior seguiu a mesma orientação das técnicas mais primitivas e originou
uma extração de recursos ainda mais eficiente”. (CAMPBELL, 1983, p. 234).
A partir desta afirmativa é possível deduzir que o capitalismo como sistema econômico
utilizado na maioria dos países, se caracteriza pela propriedade privada dos meios de produção, é o
principal responsável por esta reformulação do espaço.
A economia mais do que nunca tem ditado as regras da sociedade global. O mundo se
torna menor à medida que avançam as telecomunicações. Esta é uma dentre as várias estratégias,
que sujeitam o homem trabalhador ao sistema de mecanização, principalmente nas fábricas onde o
mesmo sofre um processo especializado e alienado de adaptação à máquina.
Ao mesmo tempo em que as grandes empresas estudam formas de ampliarem seu sistema
de produção, aproveitam todos os recursos para ampliarem suas teias de negócios.
Cabe destacar que tanto os desastres ecológicos quanto grupos ambientalistas tem
despertado a sociedade para a preservação do meio ambiente. Ele se torna importante, na medida
em que vai se degradando, ficando escasso e, portanto, se convertendo em um bem econômico.
Existe, portanto a necessidade de se incrementar os meios e a acessibilidade à
informação, bem como o papel indutivo do poder público nos conteúdos educacionais e
informativos de sua oferta, como caminhos possíveis para alterar o quadro atual de
degradação sócio-ambiental. Trata-se de promover o crescimento da consciência
ambiental, expandindo a possibilidade da população participar em um nível mais alto no
processo decisório, como uma forma de fortalecer sua co-responsabilidade na
fiscalização e no controle dos agentes de degradação ambiental. (JACOBI, 2003, p. 4).

Com o crescimento desordenado da espécie humana e o progresso da civilização, a


humanidade começou a interagir de maneira bastante sensível no equilíbrio do meio ambiente. Esta
intervenção tem sido muitas vezes, extremamente nociva. A maneira como tem se desenvolvido a
industrialização, o uso de agrotóxicos, a produção crescente de lixo, a intensa exploração os
recursos naturais não renováveis e a destruição dos recursos renováveis, sem que se dê um tempo
para que estes sejam renovados, têm retirado de seu equilíbrio, sistemas inteiros de vida vegetal e
animal, condenando inúmeras espécies à extinção.
A poluição do solo, do ar e da água tem mostrado que o homem vem realizando, ao longo
dos tempos, uma profunda e nociva modificação na natureza, pondo em risco sua própria
sobrevivência. Assim, a capacidade de autolimpeza dos lagos não pode seguir o ritmo
extremamente rápido do lançamento de esgotos. O dispositivo de filtragem dos lençóis subterrâneos
é incapaz de absorver as maciças infiltrações de adubos nítricos nas regiões de intensas atividades
agrícolas e industriais, marcada pela química.
A mundialidade do mercado é uma mundialidade de concorrências e conflitos, e está ligada
à expansão mundial do capitalismo e da técnica. Segundo Morim:
Fórum Internacional do Meio Ambiente - A conferência da Terra 790

A economia mundial é cada vez mais um todo independente: cada uma de suas partes
tornou-se dependente do todo, e, reciprocamente, o todo sofre as perturbações e
vicissitudes que afetam as partes, conseqüentemente a mundialização econômica unifica
e divide, iguala e desiguala os mercados. Morim (2005, p.34).

Deve-se romper com a concepção do progresso como certeza histórica, para fazer dele uma
possibilidade incerta e deve-se compreender que nenhum desenvolvimento é adquirido para sempre;
como todas as coisas vivas e humanas, ele sofre o ataque do princípio de degradação e precisa
incessantemente ser regenerado. “Hoje em dia, o desenvolvimento não passa, em muitos casos, de
um eufemismo que apenas significa exploração ambiental” (CAMPBELL, 1983, p. 225).
Corroborando a idéia anterior, Dias (2004, p. 226) vem ressaltar que:
O desenvolvimento econômico e o bem-estar do ser humano dependem dos recursos da
terra. [...] A chave para o desenvolvimento é a participação, a organização, a educação e
o fortalecimento das pessoas. O desenvolvimento sustentado não é centrado na
produção, é centrado nas pessoas. Deve ser apropriado não só aos recursos e ao meio
ambiente, mas também à cultura, história e sistemas sociais do local onde ele ocorre.
Deve se eqüitativo, agradável. (DIAS, 2004, p. 226).

O desafio ambiental está no centro das contradições do mundo moderno colonial. Segundo
Gonçalves (2004, p. 24), “a idéia de progresso é o que se chama de desenvolvimento, que é
rigorosamente, sinônimo de dominação da natureza”.
A capacidade, cada vez maior de intervenção na natureza, levou homem a assumir uma
postura antropocêntrica que tende a considerar apenas a sua integridade, valorizando-se em
detrimento das outras espécies.O antropocentrismo, segundo Filho (1987, p.40) “levou o homem a
um tipo de comportamento predatório, consumista e irracional, que não somente coloca em risco
“sua casa” e tudo o que ela contém, mas também a sua própria sobrevivência”.
Este trabalho vem tratar um pouco do processo de implantação do cultivo de eucalipto na
região do extremo Sul da Bahia e como ele se encaixa em um modelo de desenvolvimento voltado
para a satisfação de poucos e insatisfação de muitos.
Tradicionalmente, o extremo Sul da Bahia teve sua ocupação econômica como resultado
da expansão da lavoura cacaueira, permanecendo, segundo dados da Sei (1992) francamente
ocupado e com frágil integração ao resto do estado até os anos 50. A partir desta data, inicia-se o
ciclo recente de exploração madeireira que estabeleceu profundas mudanças regionais,
principalmente após a construção da BR 101, inaugurada em 1973.
A Bahia apresenta perspectivas favoráveis para atração desse tipo de empreendimento
(indústria de celulose105), pois é dotada de condições edafoclimáticas106 excelentes para o cultivo do
eucalipto e de terras relativamente baratas, quando comparada com outras regiões do país, podendo
mesmo vir a tornar-se uma nova fronteira de celulose e papel.
Dentre as regiões do Estado, propícias a instalação desse segmento, o extremo Sul, oferece
as melhores condições, pois apresenta clima quente e úmido, com chuvas bem distribuídas o ano
todo, e uma topografia plana que favorece a mecanização. Isso possibilitou a instalação da Bahia
Sul e em médio prazo a Vera Cruz Florestal, já a implantação dessa empresa efetivou-se depois da
adequação à Lei (Estadual) nº 6.569 de 17 de janeiro de 1994:
Art. 9º - Consideram-se de produção as florestas e de demais formas de vegetação destina
as necessidades sócio-econômicas através do suprimento sustentado de matéria-prima de origem
vegetal inclusive àquelas originárias de plantio integrante de projetos florestais.
Art. 44º - Depende de prévia autorização do Departamento Florestal – DDF, qualquer tipo
de alteração do uso alternativo do solo.

105
A celulose é uma fibra natural de madeira (dos constituintes da madeira, cerca de 50% é
celulose, o restante é lignina, que tem a função de um agente ligante)
106
As condições ambientais, o clima e o solo.
Fórum Internacional do Meio Ambiente - A conferência da Terra 791

Inciso 1º - A implantação da floresta de produção em áreas de estágio inicial de


regeneração e pastagens ou agricultura, mesmo não implicando em desmatamento, depende de
prévia autorização do Departamento de Desenvolvimento Florestal – DDF, quando o somatório da
área pretendida, um ou mais anos, for superior a 100 (cem) hectares.

Observa-se que tais empresas têm amparo legal quanto à apropriação e utilização do
espaço, incentivos fiscais foram concedidos para que as empresas de exploração vegetal se
instalassem nos locais. Como exemplo tem-se o Programa de Incentivos Municipais (PIM), Lei nº
180/930 de 22 de dezembro de 1993 da Prefeitura de Eunápolis, que possui os seguintes objetivos:
a) promover a instalação da indústria no município; b) estimular a transformação, no próprio
município, de seus recursos naturais e c) incentivar o aumento da qualidade e produtividade dos
bens industriais do município, visando sua maior competitividade. No Art. 2º o Programa concede
inserção total de ISS107 e IPTU108 pelo prazo de 10 anos as micro-empresas e médias indústrias já
instaladas e que se instalarem no município de Eunápolis a partir da promulgação da Lei.

MATERIAL E MÉTODO
O objetivo geral desta pesquisa foi analisar o processo de implementação da cultura do
eucalipto no extremo Sul da Bahia. Para tanto, faz-se necessário um levantamento dos impactos
desse processo do ponto vista sócio-ambiental.
Os procedimentos metodológicos que serviram de guia na execução deste artigo, partiu de
um estudo sistematizado acerca do desenvolvimento em detrimento da conservação dos recursos
naturais e de um levantamento bibliográfico que pudesse balizar a pesquisa teórica. Posteriormente
buscaram-se informações em outros trabalhos publicados sobre o tema, além de literaturas afins, foi
utilizada a rede mundial de computadores na busca de dados mais recentes sobre o assunto. De
posse das informações foi sistematizada uma análise do processo de implementação da cultura do
eucalipto na Bahia destacando as contraditoriedades (impactos) existentes. Para o desenvolvimento
da pesquisa, optou-se por uma abordagem sistêmica, que possibilitou um estudo integrado dos
componentes do sistema geoambiental e suas inter-relações.

RESULTADOS E DISCUSSÕES
A região determinada como extremo Sul da Bahia abrange atualmente 21 municípios, a
saber: Belmonte, Itapebi, Itagimirim, Eunápolis, Porto Seguro, Santa Cruz de Cabrália, Guaratinga,
Itabela, Itamaraju, Prado, Jucurú, Vereda, Alcobaça, Caravelas, Teixeira de Feitas, Itanhém,
Medeiros Neto, Legedão, Ibirapuã, Mucuri, Nova Viçosa. Este último faz fronteira com o Estado do
Espírito Santo.
Foi nesta região que, há aproximadamente 507 anos, aonde chegaram os primeiros
“colonizadores”. É onde se encontra não somente “ainda” ecossistemas essenciais para o país e o
mundo inteiro, como o Parque Marinho de Abrolhos, Parque de Monte Pascoal e os remanescentes
da Mata Atlântica com sua fauna e flora únicas, e ainda remanescentes de uma cultura antiga do
Povo Pataxós e dos Quilombos.
A região vem, com o passar dos anos, sofrendo “novas ocupações”. Isso se intensifica com
a chegada da rodovia BR 101, que teve sua implantação da década de 60 provendo não somente
uma interligação interna, mas também uma ligação da região com a capital do estado e com grandes
centros econômicos do país.
A chegada do capital agrícola e agroindustrial nacional conseguiu introduzir novas
culturas, ocupando grandes áreas com monoculturas intensivas. O cultivo mais intensivo foi o do
mamão e o da cana-de-açúcar. Mais recentemente, a monocultura de florestas homogêneas de
eucalipto vem ocupando imensas áreas em toda região.

107
É o imposto sobre serviços de qualquer natureza, que tem como fator gerador a prestação por empresas ou
profissional autônomo, com ou sem estabelecimento fixo, de serviço constante, da lista de serviços.
108
É o imposto predial e territorial urbano que todo cidadão que tiver um imóvel predial ou territorial no município.
Fórum Internacional do Meio Ambiente - A conferência da Terra 792

No fim da década de 60 o Governo Federal iniciou uma política de apoio e incentivo ao


“reflorestamento”. Nos últimos anos desta década foram sancionadas várias leis que viabilizam um
novo código, além de inúmeras portarias do Instituto Brasileiro de Desenvolvimento Florestal
(IBDF), facilitando esse ramo da agricultura.
A grande maioria da população ignora a implantação de um pólo de celulose e papel na
região. Eles conheciam a existência das empresas Bahia Sul, Vera Cruz ou Aracruz, isoladamente,
mas faltava essa visão mais global e regional. Segundo Koopmans (2005), 45% declararam-se a
favor da instalação do pólo de celulose, 38% se posicionaram contra a instalação e 17% declararam-
se nem contra, nem a favor. Entre os declarantes a favor, destacam-se o setor de comércio e o
judiciário e entre os contra, o setor dos movimentos sociais, sindicatos e produtores rurais.
Essa pesquisa foi realizada em 1991/1992, antes da implantação da Vera Cruz Florestal na
parte Norte da região. Em geral foram citados 40 tipos diferentes de vantagens e 71 tipos de
desvantagens. Entre as vantagens mais citadas entre os entrevistados estão a criação de mais
empregos, mais arrecadação de impostos, mais construção de escolas, postos de saúde, hospitais e
estradas etc.
Segundo as desvantagens mais citadas foi verificado que os danos ambientais foram a sua
grande maioria, depois vieram a questão agrícola-agrária e a questão urbana. Como danos concretos
foram citados; - ampla poluição do ar e dos rios; – ressecamento e esgotamento do solo, tornando-o
improdutivo; - agressão e destruição tanto da fauna como da flora e a monocultura de eucalipto.
Houve um consenso de que o pólo de celulose e papel iria ameaçar a sobrevivência de
pequenos produtores na região, prejudicando a produção agrícola, sobretudo a produção de
alimentos básicos.
Quando se quer implantar uma indústria de grande porte, como grandes indústrias de
celulose e papel, ou projetos com grandes áreas de monoculturas como eucalipto, deve-se obter o
licenciamento do Estado e cumprir as leis federais, estaduais e municipais existentes, e mais ainda
quando se trata de indústrias, como a de celulose e papel, com grande risco e potencial de poluição.
O primeiro passo é que a empresa solicite o licenciamento da implantação do seu projeto
(industrial e/ou florestal) ao CRA (Centro de Recursos Ambientais). Este solicita à empresa que
faça um Estudo de Impacto Ambiental-EIA. Estes estudos devem atender as leis do Conselho
Nacional de Meio Ambiente (CONAMA). O Estado tem suas exigências particulares e por isso tem
a necessidade da elaboração de um documento chamado “Termo de Referência”, onde devem
constar os pontos do projeto, que devem ser estudados e analisados no EIA: deve conter um
Relatório de Impacto Ambiental ou RIMA.
No caso específico das empresas supracitadas, essa etapa de licenciamento fora cumprida,
mesmo que para isso fossem criadas novas configurações na legislação, conforme mencionado
anteriormente, a fim de atender aos interesses políticos e econômicos.
A monocultura do eucalipto traz danos significativos para o meio-ambiente, em vários
aspectos naturais. É uma realidade que as empresas desmataram áreas remanescentes de Mata
Atlântica em estado avançado de regeneração. Hoje os moradores que ainda restam estão cercados
de eucalipto.
A implantação e operação dessas empresas na região produziram a expropriação de um
grande número de pequenos camponeses, para a utilização das terras que serviram para o plantio do
eucalipto, como também na implantação de suas plantas industriais, como afirma Koopmans (2005,
p. 60),
Como outra vertente deste mesmo processo forma empregadas táticas de
“convencimento” dos camponeses. Os intermediários para a compra das terras,
chamados de “corretores”, argumentavam que as terras eram improdutivas, difíceis de
serem cultivadas e que sua venda daria ao proprietário a possibilidade de “aplicar o
dinheiro na Caixa” e viver bem melhor na cidade. Entre os atrativos que a cidade passa a
ter para os moradores da área rural, destaca-se a importância crescente atribuídas pelos
camponeses à “educação dos filhos”.
Fórum Internacional do Meio Ambiente - A conferência da Terra 793

A conseqüência mais visível desse procedimento persuasivo é o crescimento populacional,


desordenado dos centros urbanos, especialmente, aqueles situados às margens da BR – 101. O
desdobramento dessa situação são a favelização, a marginalidade de parcela da população e o
aumento da violência.
A implantação dos grandes projetos de celulose na região é marcada pelo dualismo, à
medida que a produção era implantada, foi-se melhorando a infra-estrutura, com a ampliação e a
melhoria da malha viária, o reforço das linhas de transmissão de energia elétrica, investimentos em
saneamento básico, melhoria da coleta de lixo e tratamento de afluentes domésticos, mas a atração
cada vez maior de pessoas na busca de emprego agravou as condições sócio-econômicas, frustrando
as expectativas de uma considerável parte da população.
Vale lembrar que a implantação da unidade industrial da Bahia Sul, empregou um
contingente significativo, chegando a ocupar cerca de 7 mil pessoas durante a construção. Porém,
antes da implantação da empresa, a agropecuária ocupava 15.420 da mão-de-obra local. Observa-se
que essas empresas geraram um grande contingente de desempregados da região. No entanto, boa
parte dos empregos em nível técnico é preenchida por pessoas oriundas de estados vizinhos, como
Espírito Santo e Minas Gerais. Em menor escala, de São Paulo e Rio de Janeiro e parte da cidade de
Salvador.
A atração da população de outras regiões, com modos de vidas diferenciadas e costumes
próprios e a disputa por espaço dentro da sociedade regional tem gerado graves conflitos
e dificultado o acesso da população local a esse mercado de trabalho em expansão,
frustrando as expectativas que povoavam a população regional, quando do início do
processo de implantação dos empreendimentos analisados. (DIAS 2001, p. 323)

Além de tudo isso, a cultura do eucalipto vem trazendo sérios riscos para os recursos
hídricos, o solo, o ar, a fauna e a flora local. Utiliza-se de áreas que seriam destinadas a reforma
agrária, terras indígenas e no entorno de Unidades de Conservação com importantes reservas da
Mata Atlântica. Concomitantemente as fábricas de celulose promovem o uso abusivo da água
potável, além de lançar resíduos nos rios da região matando peixes de diversos tipos.
A indústria utiliza no seu sistema de branqueamento cloro, ou algum de seus derivados que
contém substâncias organocloradas, altamente tóxicas, provocando câncer e mutilação genética nos
seres vivos. Dentro de um universo maior que mil, apenas 300 substâncias são conhecidas.
Por estar em áreas úmidas costeiras, esta microrregião seria pouco sustentável à
desertificação. No extremo Sul, como nas demais áreas úmidas costeiras do Nordeste, são
encontrados solos pouco profundos e de baixa fertilidade. Percebe-se assim que o esgotamento do
húmus e a desertificação são possibilidades bastante plausíveis e que já se verificam em áreas do
Espírito Santo onde a monocultura do eucalipto já é antiga. Segundo Koopmans,
Apesar de que houve vários avanços no combate à poluição do ar por essas indústrias, os
odores nefastos das indústrias que usam sulfato (Kraft), como BSC e (provavelmente)
Veracruz, não é resolvido por completo. Por um detalhe técnico, praticamente insolúvel,
a indústria de celulose gerará sempre, em graus menores ou maiores, os compostos
reduzidos de enxofre, responsáveis por odores insuportáveis à população vizinha.
Koopmans (2005, p. 86).

A proliferação de pragas típicas do eucalipto desencadeia um efeito dominó, pois o plantio


do eucalipto se destina ao corte mecanizado, conseqüentemente as mesmas se espalharão pela flora
nativa. Sem deixar de mencionar os ninhos que são destruídos no período do corte.
O município do Prado possui o maior remanescente de Mata Atlântica do Nordeste. A Lei
Orgânica dispõe que “é dever do município preservar a faixa da Mata Atlântica, permitindo o
plantio de maciços florestais, a exemplo de eucaliptos e pinheiros nas demais regiões de seu
entorno”. Até 1999 a Lei Orgânica Municipal proibia o plantio destas árvores em função do
território municipal ter enclave entre as áreas de Mata Atlântica, mangues, restingas e recifes.
Atualmente as áreas de mata encontram-se, em sua maior parte, no Parque Nacional do
Fórum Internacional do Meio Ambiente - A conferência da Terra 794

Descobrimento, em alguns trechos pode ser encontrada vegetação secundária em regeneração. No


restante do município, existe o predomínio da cobertura vegetal formada por pastagens e o plantio
comercial de eucalipto foi liberado a partir da distorção da Lei que passou a considerar tal ação
preservacionista, seguindo padrões ecológicos impostos pelos programas ambientais da Veracel. O
quadro 1 sintetiza os impactos positivos e negativos provocados pela implantação da cultura do
eucalipto na área de estudo.

Quadro 1- Tipos de impactos na área de estudo


Impactos Positivos Impactos Negativos
Ampliação da receita governamental Aumento da poluição
Mudança sócio-cultural da região Grande número de imigrantes em relação aos
Estímulo a fornecedores e prestadores de empregos gerados.
serviços
Aumento da renda regional Alta de preços do comércio local
Geração de empregos diretos e indiretos Desarticulação sócio-cultural
Especulação imobiliária local
Aumento da demanda por serviços públicos
Fonte: Adaptado de Carneiro (1994, p. 34).

CONSIDERAÇÕES FINAIS
Existe uma tendência mundial para instalação das indústrias de celulose e papel nos países
subdesenvolvidos, pois além da necessidade de plantio em grandes áreas, a poluição e a
contaminação do meio ambiente, somados aos baixos custos da mão-de-obra faz com que as
multinacionais procurem países em desenvolvimento para se instalarem.
Não é à toa que grandes empresas estão se instalando na Bahia, especificamente no
extremo Sul, pois além das condições endoclimáticas privilegiadas, os grandes conglomerados
contam com incentivos fiscais, renúncia de arrecadação por parte do Estado e municípios que
receberam os investimentos, além da flexibilização das Leis Ambientais que permitem o plantio em
grandes áreas e o beneficiamento do eucalipto.
De um lado, volumosos investimentos continuam privilegiando uma monocultura que é
destinada à produção para exportação aos países ricos, gerando pouquíssimos empregos,
legitimando o latifúndio, impedindo a reforma agrária e aumentando mais ainda o êxodo rural e o
desespero de milhares de famílias que ficaram sem terra e sem sustento.
É preciso que se discuta o presente modelo, propondo e desenvolvendo experiências novas
no campo da produção, valorizando a biodiversidade e os conhecimentos locais, construindo assim
uma outra relação com o ambiente.

REFERÊNCIAS BIBLIOGRAFICAS
BRANCO, Sandra. Educação Ambiental: metodologia e prática de ensino. Rio de Janeiro: Dunya,
2003.
Cadernos de Pesquisa - vol. 118 - março 2003 - Fundação Carlos Chagas.
CAMPBELL, Bernard. Ecologia Humana.Lisboa,:Edições 70, 1983.
CARDOSO, Ciro F. e VAINFAS, R (Org.). Domínios da História: Ensaios de teoria e
metodologia. Rio de Janeiro: Campus, 1997.
CARNEIRO, Roberto Antônio Fortuna. Impactos da indústria de papel e celulose sobre o Extremo
Sul: principais vetores de crescimento. Salvador: CPE, 1994.
DIAS, Genebaldo Freire. Educação Ambiental: princípios e práticas. 9ª. ed. São Paulo: Gaia, 2004.
FILHO, Seara. Apontamentos de Introdução à Educação Ambiental. Ambiente Revista. CETESB
de Tecnologia. São Paulo: (1987, p. 40).
GONÇALVES, Carlos Walter Porto. O desafio ambiental. Rio de Janeiro: Record, 2007.
JACOBI, Pedro. Educação Ambiental, Cidadania e Sustentabilidade. In:
Fórum Internacional do Meio Ambiente - A conferência da Terra 795

KOOPMANS, José. Além do Eucalipto: o papel do extremo Sul. 2ª Ed. DDH, Teixeira de Freitas –
BA, 2005.
MORIN, Edgar. Terra-Pátria. Porto Alegre, 2005.
SANTOS, Boaventura de S. Pela mão de Alice: o social político na pós-modernidade. 3ª ed. São
Paulo: Cortez, 1997.
Fórum Internacional do Meio Ambiente - A conferência da Terra 796

AVALIAÇÃO DA EFETIVIDADE DE FUNGOS MICORRÍZICOS ARBUSCULARES


ORIUNDOS DE RAÍZES DE BATATA DOCE (IPOMOEA BATATAS L.) PROVENIENTES
DO SOLO E DA AEROPONIA NO CRESCIMENTO DE MUDAS DE MAMOEIRO
(CARICA PAPAYA L.)

Jadson Diogo Pereira Bezerra


Laboratório de Micorrizas, Departamento de Micologia/ CCB, Universidade Federal de Pernambuco. 50.646-420.
Recife –PE. jadsondpb@hotmail.com
Talita Fernanda Brandão-Silva
Laboratório de Micorrizas, Departamento de Micologia/ CCB, Universidade Federal de Pernambuco. 50.646-420.
Recife –PE.
Laura Mesquita Paiva
Laboratório de Micorrizas, Departamento de Micologia/ CCB, Universidade Federal de Pernambuco. 50.646-420.
Recife –PE.

RESUMO
Os Fungos Micorrízicos Arbusculares (FMA) constituem uma das alternativas para a
otimização da produção de mudas de mamoeiro. Nesse trabalho objetivou-se avaliar o crescimento
de mudas de mamoeiro variedades ‘Sunrise’ e ‘Formosa’ inoculadas com FMA provenientes de
raízes de batata doce oriundas do Solo e da Aeroponia. Plantas de batata doce após 64 dias de
plantio, constatada a colonização das plantas, metade permaneceram nos sacos e as demais foram
transferidas para duas câmaras aeropônicas (uma para Glomus clarum uma para Glomus
etunicatum) montadas em tanques de amianto, contendo 200L de água destilada mais 1L de solução
nutritiva. Após 90 dias todas as plantas da Aeroponia foram retiradas e suas raízes cortadas e
colocadas para secar a temperatura ambiente por 72 horas. O mesmo foi realizado com as raízes de
batata doce do solo. Depois de secas as raízes foram trituradas e acondicionadas em recipientes
plásticos, até o período de inoculação nas mudas de mamoeiro. Após o surgimento das plântulas
essas foram transplantadas individualmente para vasos e inoculadas com 1,5g das raízes vindas da
Aeroponia e do Solo, com G. clarum e G. etunicatum. O experimento foi avaliado a cada 15 dias,
sendo aferidos os parâmetros: altura da planta, diâmetro do caule e número de folhas. Plantas de
mamoeiro apresentaram uma elevada dependência micorrízica principalmente quando inoculadas
com G. clarum. O fungo G. clarum destacou-se durante todo o experimento proporcionando
aumentos significativos diferenciando de G. etunicatum.
Palavras-chave: Fungo micorrízico arbuscular, mamoeiro, dependência micorrízica.

ABSTRACT
Avaliation of the effectiveness of Arbuscular Mycorrizal Fungi originating from wroots of
sweet potato (Ipomoea batatas L.) proceeding from the soil and of the aeroponic in the growth of
papaya tree seedlings (Carica papaya L.). The arbuscular mycorrizal fungi (AMF) constitute one of
the alternatives to the otimization of the shift of the papaya tree. In this work, our objective was to
evaluate the papaya tree shift growing up “sunrise” and “formosa” varieties innoculated with AMF
that comes from the sweet potato root originating of the soil and aeroponic culture. The plants of
the sweet potatoes after 64 days of plantation, checked the colonization of the plants, half of them
remained in the sacks and the others were transferred by two aeroponics chambers (one for Glomus
clarum, one for Glomus etunicatum) mounted in asbestas tank (brasilit) containing 200 l of destilled
water plus 1l of nuctritive solution. After 90 days, all the plants of the aeroponic were taken out and
their roots were cut and put to dry in ambient temperature for 72 hours. The same was made with
the sweet potatoes roots originating of the soil. After the dryment of the roots, they were triturated
and packed in recipients, untill the time of being innoculated in the shift of the papaya tree. After
the emergence of the seedling the, varieties were transplated singly to vases ans innoculated with
1,5g of the root coming from the aeroponia and soil, with G. clarum and G. etunicatum. The
experiment was evaluated in each 15 days, were gauged the parameter, plant height, diameter of
stem and number of leaves. Plants of the papaya tree showed an elevated mycorrhiza depedence
Fórum Internacional do Meio Ambiente - A conferência da Terra 797

mainly when innoculated with G. clarum. Fungus G. clarum detached itself during all the
experiment porportioning significant increases differentiating from G. etunicatum.
Key words – Arbuscular mycorrizal fungi, papaya tree, mycorrhiza depedence.

INTRODUÇÃO
A micorriza é uma associação mutualística, na qual as raízes das plantas vasculares são
invadidas por fungos específicos, ocorrendo uma perfeita integração morfológica e funcional entre
os simbiontes (Silveira, 1992). Trata-se de uma simbiose de ocorrência universal, não apenas pelo
elevado número de plantas suscetíveis a micorrização, mas também, por ter ocorrência generalizada
na maioria dos habitats naturais (Aguiar & Barea, 1980). Os fungos micorrízicos arbusculares
(FMA) apresentam elevado potencial para utilização prática na agricultura devido à capacidade de
promover o crescimento das plantas. Entretanto, a condição “biotrófico obrigatório” impossibilita
seu cultivo “in vitro” o que dificulta a produção de inoculo de boa qualidade e em grande
quantidade.
O sistema de cultura aeropônica utiliza uma mistura definida de nutrientes e água como
substrato e foi inicialmente proposto por Zobel et al., (1976). Esse sistema de cultura tem se
mostrado promissor na multiplicação de esporos e na produção de raízes que, crescendo na ausência
de solo, apresentam-se limpas e sem a contaminação de nematóides e insetos, o que facilita a
preparação de materiais para estudos ultraestruturais, fisiológicos e genéticos (Hung &
Sylvia,1988).
A batata doce (Ipomoea batatas L.) tem sido utilizada como excelente hospedeiro dos
FMA no sistema de cultura aeropônica, devido à facilidade de cultivo, associado a grande
multiplicação das raízes, que se apresentam delgadas e perfeitas para serem estudadas (Miranda &
Cabral, 1993).
Os FMA são de grande importância para o crescimento e nutrição de plantas frutíferas e de
acordo com Silva & Siqueira (1991), as espécies que passam por fase de formação de mudas em
viveiros, apresentam vantagens quando inoculadas com FMA. Além de crescerem mais
rapidamente, devido aos fatores mais elevados de alguns nutrientes, tornando-se mais resistentes
aos estresses bióticos e abióticos.
O mamoeiro (Carica papaya L.) é uma espécie nativa da América Tropical, intensamente
cultivada nas regiões climáticas favoráveis. Sendo um planta que responde acentuadamente a
formação de micorrizas, onde o emprego da inoculação é prática possível em função da etapa de
formação de mudas (Trindade et al., 2001). A micorrização tem sido de grande importância em
mudas de mamoeiro por torna-las mais fortes e resistentes ao serem transferidas para o campo
(Saggin Jr. & Siqueira, 1996). Dessa forma o presente trabalho teve como objetivo avaliar o
crescimento de mudas de mamoeiro variedades ‘Formosa’ e ‘Sunrise’ inoculadas com FMA
provenientes de raízes de batata doce oriundas do Solo e da Aeroponia.

MATERIAL E MÉTODOS
O experimento foi conduzido em casa de vegetação e no Laboratório de Micorrizas do
Departamento de Micologia da Universidade Federal de Pernambuco.
Os substratos utilizados foram:
⇒ Solo Latossolo Amarelo Distrófico Argissólico, esterilizado 20 dias antes da utilização,
por fumigação com Bromex (brometo de metila 980 g. Kg-1 e cloropicrina 20 g.Kg-1 ). Análises
física e química do solo foram realizadas pela Empresa Pernambucana de Pesquisa e Agropecuária
(IPA). O solo, do tipo franco arenoso.
⇒ Solução nutritiva utilizada no sistema de cultura aeropônica, recomendada por Jarstfer
& Sylvia (1992) com a seguinte composição: 0,30 mL L-1 KH2PO4 (0,01 M); 1,5 mL L-1 KNO3 (1
M); 0,30 mL L-1 NaFe EDTA (1 M); 1,5 mL L-1 Ca(NO3)2 (1 M); 0,45 mL L-1 NaCl (0,1 M); 0,60
mL L-1 MgSO4 (1 M); 0,30 mL L-1 H3BO3 (50 mM); 1,81 mL L-1 MnCl2.4H2O (1 mM); 0,22 mL L-1
ZnSO4.5H2O (0,7 mM); 0,80 mL L-1 CuSO4.5H2O (3 mM); 0,016 mL L-1 Na2MoO4.2H2O (0,07
mM).
Fórum Internacional do Meio Ambiente - A conferência da Terra 798

Produção de inóculo: Para a produção de inóculo do FMA foi utilizando 10 vasos de 5Kg
contendo solo esterilizado + sementes de painço (Panicum miliacium L.) + solo inóculo de G.
clarum (5 vasos) e G. etunicatum (5 vasos) os quais permaneceram em casa de vegetação por 90
dias para a multiplicação dos fungos. Em seguida amostras de solo de cada vaso foi processada pelo
método de peneiramento úmido (Gerdemann & Nicolson 1963) seguido de centrifugação em água e
sacarose a 40% (Jenkins 1964). O material foi recolhido em placas de Petri e contado em
microscópio estereoscópico (40x). Logo depois da análise o solo foi acondicionado em sacos
plásticos e guardado no laboratório de micorriza em temperatura ambiente.
Inoculação das ramas de batata doce: Para a propagação e inoculação foram utilizadas
ramas de batata doce variedade Co-branca, fornecidas pelo IPA, com segmentos de
aproximadamente 15cm de comprimento, desinfestadas com solução de Hipoclorito de sódio
(1:1000) por sete minutos. As ramas foram plantadas em 240 sacos plásticos (2 Kg) de cor preta,
tendo como substrato uma mistura de solo + vermiculita (2:1 v/v), sendo a metade inoculada com
50 esporos de G.clarum e o restante inoculada com 50 esporos de G. etunicatum. Os inóculos foram
cedidos pela Embrapa – Centro Nacional de Pesquisas em Agrobiologia do Rio de Janeiro.
Montagem das câmaras aeropônicas: Sessenta e quatro dias após o plantio, constatada a
colonização das plantas, metade permaneceu nos sacos e as demais foram transferidas para duas
câmaras aeropônicas (uma para G.clarum outra para G. etunicatum) montadas em tanques de
amianto, contendo 200 L de água destilada mais 1 L de solução nutritiva (Jarstfer & Sylvia
1992).Com o auxílio de um conjunto de microaspersores, as plantas receberam solução nutritiva por
pulverização durante 1 minuto com intermitência de três minutos, o que permitiu o crescimento do
sistema radicular suspendido em atmosfera arejada. Associada ao sistema, foi instalada uma fonte
luminosa (GRO-LUX F – 30 T 12) a 70 cm de altura das plantas para aumentar o fotoperíodo e
estimular o crescimento e a multiplicação dos FMA. O pH ajustado diariamente para 6,0. Foram
registrados os valores de temperatura e umidade relativa do ar, em termohigrômetro. A irrigação foi
feita em intervalos de 24 horas. Tanto os sacos contendo as ramas de batata doce inoculadas com G.
clarum e G. etunicatum, quanto as duas câmaras aeropônicas permanecendo por 90 dias. Após esse
período todas as plantas da aeroponia foram retiradas e suas raízes cortadas e colocadas para secar a
temperatura ambiente por 72 horas. O mesmo foi realizado com as raízes de batata doce oriundas
dos sacos contendo solo. Depois de secas as raízes foram trituradas e acondicionadas em recipientes
plásticos, até o período de serem inoculadas nas mudas de mamoeiro.
Preparo das Mudas: Foram colocadas em copos plásticos (50 ml) sementes de mamoeiro
variedades ‘Formosa’ e ‘Sunrise’ para a germinação. A rega foi efetuada diariamente até surgirem
às primeiras plântulas.
Transplantio e Inoculação: Após o surgimento das plântulas aproximadamente 20 a 30 dias
e estando cada uma com dois pares de folhas foram transplantadas individualmente para vasos
plásticos de 4 Kg e inoculadas com 1,5 g das raízes vindas da aeroponia e do solo, com G. clarum e
G. etunicatum.
Avaliações: A cada 15 dias (15, 30, 45 e 60, 75 dias) foram analisadas alturas dos
mamoeiros, diâmetro do caule e número de folhas. As raízes utilizadas para avaliação da
colonização foram lavadas, clarificadas com KOH (10%) coradas com azul de Trypan (Phillips &
Hayman, 1970), lavadas mais uma vez para retirada do excesso de corante, e feitas cinco lâminas
com dez fragmentos de raiz para cada lâmina, onde foram avaliadas quanto à porcentagem de
colonização (Giovannetti & Mosse, 1980). A parte aérea e radicular foi colocada em estufa de
circulação de ar (65º) até o peso constante para a determinação da biomassa seca. O solo foi
homogeneizado e alíquotas de 50g foram usadas para avaliação da densidade de esporos no solo,
após extração por peneiramento úmido (Gerdemann & Nicolson, 1963) utilizando peneiras com
aberturas de 0,105 e 0,045 µm, seguido de centrifugação em água e sacarose 40% (Jenkins, 1964).
Ao final da centrifugação os esporos foram recolhidos em peneiras e colocados em placa
canaletada, para contagem em microscópio estereoscópico (40x).
Fórum Internacional do Meio Ambiente - A conferência da Terra 799

Análise Estatística: Os dados foram submetidos a análises de variância (ANOVA) e as


médias comparadas pelo teste de TUKEY (P > 0,05 ). Para análise de regressão foi utilizado o
programa NTIA (Embrapa).

RESULTADOS E DISCUSSÃO
Comparando as variedades de mamoeiros (‘Sunrise’ e ‘Formosa’) após 75 dias em casa de
vegetação em relação à altura de planta, diâmetro do caule e número de folhas foi observado que a
variedade ‘Formosa’ apresentou diferença significativa nos parâmetros avaliados (Tabela 1).
Quanto à biomassa seca da área foliar e radicular, bem como, biomassa fresca da área foliar e
radicular não houve diferença significativa em relação às duas variedades (Tabela 1). Lins et al.,
(1999) registraram que a presença de FMA em mudas de mamoeiro em substrato adicionado de
matéria orgânica diferenciou apenas para os parâmetros número de folhas e biomassa seca, sendo
assim, não houve diferença significativa entre os tratamentos com FMA em relação à altura da
planta e ao diâmetro do caule. Silva & Siqueira (1991) observaram um aumento da matéria seca de
87% para mudas de mamoeiro inoculadas com G.clarum, esses resultados diferem do obtido nesse
trabalho.

Tabela 1. Avaliação da altura (AP), diâmetro do caule (DC), número de folhas (NF), biomassa seca
área foliar (AF) e área radicular (AR), biomassa fresca área foliar (AF) e área radicular (AR) das
variedades de mamoeiro (‘Sunrise’ e ‘Formosa’) após 75 dias em casa de vegetação.
AP DC NF Biomassa Seca Biomassa Fresca
Variedades
(cm) (mm) (n◦) AF(g) AR(g) AF(g) AR(g)
Sunrise 25,55 b 0,55 b 10,98 b 6,46 a 2,05 a 44,17 a 21,38 a
Formosa 29,30 a 0,64 a 12,04 a 7,37 a 2,00 a 46,48 a 24,57 a
Médias seguidas pela mesma letra na coluna não diferem estatisticamente pelo teste de Tukey (P>
0,05).

A variedade ‘Sunrise’ quando inoculada com G. clarum e sem inóculo (controle) no


substrato Solo aos 75 dias apresentou diferenças significativas com relação à altura das plantas de
mamoeiro. No mesmo substrato, a variedade ‘Formosa’ apresentou diferença significativa quando
inoculada com G. etunicatum e sem inóculo. Entretanto, no substrato Aeroponia as variedades
‘Sunrise’ e ‘Formosa’ não apresentaram diferença significativa em relação à altura da planta quando
inoculadas ou não com FMA (Tabela 2). Trindade et al., (2000) diz que G.etunicatum foi eficiente
em todas as mudas de mamoeiro nos substratos inoculados com 5% e 10% de esterco.

Tabela 2. Interação dos FMA no parâmetro altura da planta (AP), nas variedades de mamoeiro
(‘Sunrise’ e ‘Formosa’), utilizando os substratos (“Solo” e “Aeroponia”) aos 75 dias em casa de
vegetação.
SUBSTRATOS
FMA Solo Aeroponia
Sunrise Formosa Sunrise Formosa
Não inoculado 36,50 abAA 38,00 abAA 33,75 aAA 36,75 aAA
Glomus clarum 42,83 aAA 24,00 bBB 36,25 aAA 39,83 aAA
Glomus etunicatum 31,33 bAA 38,5 aAA 31,33 aAA 30,50 aAA
Médias seguidas pela mesma letra minúsculas na coluna, e maiúsculas na linha não diferem
estatisticamente pelo teste de Tukey (P> 0,05)

Em relação à densidade de esporos foi observado que aos 75 dias a variedade ‘Sunrise’ no
substrato Solo não apresentou diferença significativa quando inoculada com G. clarum e G.
Fórum Internacional do Meio Ambiente - A conferência da Terra 800

etunicatum. Enquanto que a variedade ‘Formosa’ no mesmo substrato quando inoculada com G.
clarum apresentou maior densidade de esporos. No substrato Aeroponia a variedade ‘Sunrise’ não
apresentou diferença significativa em nenhum tratamento (com/FMA e sem/FMA); enquanto a
variedade ‘Formosa’ diferenciou nas plantas inoculadas e não inoculadas (Tabela 3). Segundo
Sieverding (1991) algumas espécies necessitam de seis meses para formar esporos.

Tabela 3. Interação dos FMA no parâmetro densidade de esporos (n◦/50g de solo), das variedades
de mamoeiro (‘Sunrise’ e ‘Formosa’), utilizando os substratos (Solo e Aeroponia) 75 dias após
inoculação em casa de vegetação.
SUBSTRATOS
FMA Solo Aeroponia
Sunrise Formosa Sunrise Formosa
Não inoculado 0,00 bAA 0,00 cAA 0,00 bAA 0,00 bAA
Glomus clarum 55,0 aBB 467,00 aAA 195,00 aBA 264,66 aAB
Glomus etunicatum 83,66 aBB 295,25 bAA 239,33 aBA 311,00 aAA
Médias seguidas pela mesma letra minúsculas na coluna, e maiúsculas na linha não diferem
estatisticamente pelo teste de Tukey (P> 0,05).

As raízes de mamoeiro da variedade ‘Sunrise’ no substrato solo apresentou maior


porcentagem de colonização quando inoculada com G. clarum. Enquanto que nos substratos solo e
aeroponia as variedade ‘Formosa’ e ‘Sunrise’ não apresentaram diferença significativa em relação à
colonização pelos FMA, após 75 dias de inoculação (Tabela 4).

Tabela 4. Porcentagem de colonização de raízes de variedades de mamoeiro (‘Sunrise’ e


‘Formosa’) por G. clarum e G. etunicatum em solo e aeroponia após 75 dias de inoculação em
casa de vegetação.
SOLO AEROPONIA
FMA
Sunrise (%) Formosa (%) Sunrise (%) Formosa (%)
Glomus clarum 108,00 a 118,00 a 86,00 a 109,00 a
Glomus etunicatum 84,00 b 114,00 a 85,00 a 92,00 a
Médias seguidas pela mesma letra minúscula não diferem estatisticamente pelo teste de Tukey (P>
0,05).

CONCLUSÕES
Aos 75 dias em casa de vegetação a variedade de mamoeiro ‘Formosa’ apresentou
diferença significativa nos parâmetros: altura da planta, diâmetro do caule e número de folhas.
Em relação à biomassa seca e fresca da área foliar e área radicular não houve alteração nas
variedades de mamoeiro ‘Sunrise’ e ‘Formosa’.
No parâmetro densidade de esporos, a variedade ‘Formosa’ apresentou uma melhor
resposta quando inoculada com G. clarum no substrato Solo.
As raízes de mamoeiro variedade ’Sunrise’ no substrato Solo quando inoculadas com G.
clarum promoveu maior eficiência na colonização.
Plantas de mamoeiro apresentaram uma elevada dependência micorrízica principalmente
quando inoculadas com G. clarum.
De uma forma geral o fungo G. clarum destacou-se durante todo o experimento
proporcionando aumentos significativos diferenciando de G. etunicatum.

REFERÊNCIAS BIBLIOGRÁFICAS
AGUIAR- ÁZCON, C.; BAREA, J.M. Micorrizas Investigacion y Ciência, 47:8-16, 1980.
GERDEMANN, J.W.; NICOLSON, T.H. Spores of mycorrhizal Endogone species extracted from
soil by wet sieving and decanting.Transactions of British Mycological Society, v. 46, p. 235-244,
1963.
Fórum Internacional do Meio Ambiente - A conferência da Terra 801

GIOVANNETTI, M. & MOSSE, B. An evaluation of techniques for measuring vesicular arbuscular


mycorrhizal infection in roots. New Phytol. 84: 489-500, 1980.
HUNG, L.L.; SYLVIA, D.M. Production of vesicular-arbuscular mycorrhizal fungus inoculum in
aeroponic culture. Applied and Environmental Microbiology, v. 54, p. 353-357, 1988.
JARSTFER, A.G.; SYLVIA, D.M. Inoculum production and inoculation strategies for vesicular-
arbuscular mycorrhizal fungi. In: Soil Microbial Ecology: Applications in Agricultural and
Environmental Management. Ed. B. Metting. Marcel Dekker, Inc. p. 349-377, 1992.
JENKINS, W. R. A rapid centrifugal flotation technique for separating nematodes from soil. Plant
Disease Reporter. v. 48. p. 692, 1964.
LINS, C. E. L.; AGUIAR, R. L. F.; CAVALCANTE, U. M. T.; MAIA, L. C. Influência da
adubação com esterco bovino e inoculação de fungos micorrízicos arbusculares no crescimento de
mudas de Carica papaya L. (Var. Formosa). Acta botânica. 13(3): 257-261, 1999.
MIRANDA, M. & CABRAL, J. B. Análise da produção e do consumo de batata doce (Ipomoea
batatas (L.) Lam.) no Estado de Pernambuco. Anais do I Congresso de Iniciação Científica da
UFPE. 90 p., 1993.
PHILLIPS, J.M. & HAYMAN, D.S. Improved procedures for clearing roots and staining parasitic
and vesicular arbuscular mycorrhizal fungi for rapid assessment of infections. Trans. Br. Mycol.
Soc. 55: 158-161, 1970.
SAGGIN-JÚNIOR, O.J.; SIQUEIRA, J.O. Micorrizas arbusculares em cafeeiro. Pp. 203-254. In:
J.O. Siqueira (Ed.), Avanços em fundamentos e aplicação de micorrizas. UFLA- DCS1996.
SIEVERDING, E. Vesicular-arbuscular mycorrihiza managemente in tropical agrosystems.
Eschborn: Gesellschaft furtecnische Zusammenarbeit, 1991 - 371p.
SILVA, L.F.C.; SIQUEIRA, J.O. Crescimento e teores de nutrientes de mudas de abacateiro,
mangueira e mamoeiro sob influência de diferentes espécies de fungos micorrízicos vesículo
arbusculares. Revista Brasileira de Ciência do Solo, v.15, n.3, p.283-288, 1991.
SILVEIRA, A.P.D. Micorrizas. In: CARDOSO, E.J.B.N.; TSAI, S.M.; NEVES, M.C.P. (eds.)
Microbiologia do Solo, Sociedade Brasileira Ciência Solo. p. 258-282, 1992.
TRINDADE, A. V.; FARIA, N. G.; ALMEIDA, F. P. Uso de esterco no desenvolvimento de mudas
de mamoeiro colonizadas com fungos micorrízicos. Pesquisa Agropecuária Brasileira, v. 35, n. 7,
p.1389-1394, 2000.
TRINDADE, A.V.; SIQUEIRA, J.O.; ALMEIDA, F.P. Dependência micorrízica de variedades
comerciais de mamoeiro. Pesquisa Agropecuária Brasileira, v.36, n.12, p.1485-1494, 2001.
ZOBEL, R.W.; TREDICE, P.D.; TORREY, J.G. Methods for growing plants aeroponically. Plant
Physiology, v. 57, p. 344-346, 1976.
Fórum Internacional do Meio Ambiente - A conferência da Terra 802

ENTEROBACTÉRIAS EM ÁGUAS DE POÇOS NO MUNICÍPIO DE


PINDAMONHANGABA, SP

Sandra Cristina Mitsue


Instituto Básico de Biociências - Universidade de Taubaté
Leonília Vieira de Souza
Instituto Básico de Biociências - Universidade de Taubaté
Mariko Ueno
Instituto Básico de Biociências - Universidade de Taubaté. mariueno@unitau.br

RESUMO
Em áreas rurais, o saneamento básico, que é uma das medidas necessárias para prevenção
de doenças não atinge toda a população. Na periferia destas áreas, as águas subterrâneas
provenientes de poços são importantes fontes de suprimentos de água para consumo humano. Este
estudo teve por objetivo identificar bastonetes Gram-negativos, com o intuito de analisar a
qualidade da água consumida. A coleta foi realizada no Bairro da Colméia, localizado na Zona
Rural, município de Pindamonhangaba, SP, onde moram atualmente 97 famílias que utilizam 43
poços para suprimento de água. Foram realizadas analises de coliformes totais e termotolerante e
identificação e enterobactérias. O resultado da análise de coliformes indicou que 73.8% dos poços
se encontram contaminados pela bactéria Coliformes Termotolerantes, a identificação das
enterobactérias revelou presença de grande diversidade, incluindo os gêneros Enterobacter e
Pseudomonas, seguida das espécies Escherichia coli, Hafnia alvei, Serratia rubidea, Klebsiella
oxytoca e Chromobacterium violaceum potencialmente patogênicos. Diante dos resultados, conclui-
se que as águas procedentes destes poços são impróprias para consumo humano, sendo necessário
um planejamento junto à área de saúde para conscientização dos moradores em relação a
conhecimentos de medidas simples como ferver e filtrar a água, visando não só a prevenção de
doenças, como também melhores condições de higiene.
Palavras chaves: Coliformes, poços, água, patógenos entéricos.

ABSTRACT
In rural areas, sanitation, which is one of the necessary steps for prevention of diseases
does not reach the entire population. In the periphery of these areas, the groundwater from wells are
important sources of supply of water for human consumption. This study aimed to identify Gram-
negative bacilli, in order to analyse the quality of water consumed. The gathering was held in the
District of Colméia, located in the Rural, municipality of Pindamonhangaba, SP, which currently
live 97 families who use 43 wells to supply water. We performed analyses of total coliforms and
thermotolerant coliform and identification and enterobacteria. The result of the analysis of coliform
indicated that 73.8% of the wells are contaminated by the bacteria termotolerant coliform, the
identification of isolated enterobacteria revealed presence of great diversity, including
Pseudomonas and Enterobacter, then the species Escherichia coli, Hafnia alvei, Serratia rubidea,
Klebsiella oxytoca and Chromobacterium violaceum potentially pathogenic. Given the results, it is
concluded that the water coming these wells are unfit for human consumption, requiring extensive
planning at the area of health for awareness of the residents on knowledge of simple measures such
as boiling and filtering water, targeting not only the prevention of diseases, as well as better hygiene
conditions.
Key Words:Wells, water, coliforms, enteric pathogens.

INTRODUÇÃO
No mundo, mais de um bilhão de pessoas têm problemas de acesso à água potável e a crise
da água tem sido uma ameaça permanente à humanidade preocupando cientistas das diversas áreas
no mundo e conseqüentemente representado um sério problema de saúde pública. (TUNDISI,
2003).
Fórum Internacional do Meio Ambiente - A conferência da Terra 803

Muitos critérios são adotados para assegurar a qualidade da água fornecida à população e
estas medidas têm por objetivo fornecer uma base para o desenvolvimento de ações, que se
implementadas junto à população, garantirão a segurança do fornecimento de água por meio da
eliminação ou redução de microorganismos patogênicos. A contaminações da água é originada pelo
lançamento de água residuais, domésticas e industriais, em rios e lagos, sendo que a contaminação
da água ocorre principalmente pela ausência de uma consciência ambientalista, pela falta de cultura
em relação ao uso da água e pela falta de uma política de saneamento ambiental onde os gestores
deveriam ter como objetivo alcançar melhores níveis de salubridade ambiental por meio de
abastecimento de água potável, coleta e disposição sanitária de resíduos líquidos e sólidos e uso
adequado do solo.
Considerando que os agentes patogênicos veiculados pela água são eliminados pelas fezes
de pessoas infectadas, a análise microbiológica da água para coliformes fecais ou coliformes
termotolerante é empregada como indicador de poluição fecal.
A relação entre fatores ambientais e efeitos sobre à saúde, pressupõe uma seqüência de
eventos do processo de produção de doenças representada por riscos em determinados lugares, que
podem ser delimitados e identificáveis no espaço (BARCELLOS et al., 1998). Estabelecer um
padrão de potabilidade de uma água é definir, para cada parâmetro, um valor ou concentração à
partir do qual o consumo pode induzir riscos à saúde. A vigilância da qualidade da água, que é
atribuição do órgão de Vigilância Sanitária, baseia-se na certificação de que a água consumida pela
população se encontra dentro do padrão de potabilidade, como pela observação sistemática de
ocorrência de surtos de doenças relacionadas à qualidade da água. (QUITÉRIO et al.,1998).
A água é um dos elementos vitais para a existência do homem, sendo utilizada para vários
fins. Depois de utilizada pode ser devolvida ao meio ambiente carregada de substâncias tóxicas,
materiais orgânicos ou microrganismos patogênicos, podendo comprometer a qualidade dos
recursos hídricos disponíveis na natureza, aumentando o risco de doenças de transmissão hídrica.
Estimativas apontam que mais de 4 milhões de crianças no mundo, menores de 5 anos,
principalmente nos países em desenvolvimento vão a óbito, devido à diarréia infecciosa aguda. No
Brasil, apesar das limitações do sistema de informações, há registros de que mais de 600 mil
internações por ano ocorrem devido à doença infecciosa intestinal, causando quase 8 mil mortes, o
que representa um importante prejuízo à saúde da população.
A doença diarréica ainda persiste como um problema de saúde pública e a mortalidade
infantil causada por diarréia é um indicador de pobreza A literatura aponta à falta de disponibilidade
de água domiciliar, a pobreza e a falta de higiene como fatores predisponentes e causadores de
episódios diarréicos graves. Relacionando suprimento de água e saneamento ambiental, um estudo
de intervenção demonstrou redução de 65% da mortalidade por diarréia entre as crianças com a
melhoria das condições de saneamento e de aporte de água. (VANDERLEI et al., 2003).
Sendo um bem essencial, e indispensável á vida, a água deve, a princípio, ser servida a
cada pessoa indistintamente, a menos que se detectem boas razões, eticamente sustentáveis, para
agir de outro modo. O que se observa, no entanto, é que a apropriação da água é feita de forma
diferenciada, ocorrendo desigualdades, situações de injustiças, que vão refletir negativamente na
qualidade de vida de pessoas e populações humanas. (PONTES, 2004)
No meio rural, as principais fontes de abastecimento de água são soluções alternativas
como os poços rasos, e estas fontes são contaminadas com grande facilidade visto que os poços são
quase sempre abertos ou vedados inadequadamente, estão muitas vezes próximos a fossas
rudimentares, lixos, dejetos a céu aberto, animais domésticos e outras fontes de contaminação.
No meio rural, as principais fontes de abastecimento de água sãos os poços rasos, fontes
bastante susceptíveis à contaminação, causando riscos de surtos de doenças de veiculação hídrica
em função da possibilidade de contaminação bacteriana de águas que muitas vezes são captadas em
poços velhos, abertos ou inadequadamente fechados e próximos de fontes de contaminação como
fossas rústicas feitas em locais inadequados e de forma incorreta, áreas de pastagem ocupadas por
animais. No entanto, no meio rural, não se verifica esforços das autoridades em implementar ações
Fórum Internacional do Meio Ambiente - A conferência da Terra 804

que visem fornecer à população uma água com boa qualidade, como ocorre no meio urbano
(AMARAL et al., 2003).
Para evitar a contaminação é necessário que o poço esteja devidamente fechado evitando a
entrada pela boca, de objetos contaminados, animais, detritos, baldes entre outros. Segundo Barros
et al. (1998), a proteção dar-se-á com a colocação de uma tampa selada, com caimento para fora.
Sendo necessário deixar-se uma abertura de inspeção de 0,60m x 0,60m, com tampa selada com
argamassa fraca (BARROS et al., 1998).
No Brasil, estudo realizado na comunidade rural de Minas Gerais os dados mostraram que
os fatores sócio-econômicos, condições de moradia, presença de fossa, tipo de água e índice de bens
de consumo foram relacionados significativamente ao uso de água (GAZZINELLI et al.,1998).
Segundo as autoras os dados pesquisados sugeriram uma relação entre fonte de água, condições
sanitárias e a ocorrência de doenças transmitidas pela água.
Com um enfoque mais abrangente em relação às questões de saúde e meio ambiente,
propôs-se estudar um bairro de zona rural denominado Bairro da Colméia, situado no município de
Pindamonhangaba, Estado de São Paulo. Trata-se de uma região que não recebe água tratada, não
possui rede de esgoto, não apresentando saneamento ambiental, e como conseqüência um número
significativo de doenças de veiculação hídrica. O propósito deste estudo foi avaliar a presença de
coliformes totais e termotolerante e identificar as enterobactérias em poços localizados no
Município de Pindamonhangaba, SP, visando confirmar as condições da água destinada para
consumo humano.

MATERIAL E MÉTODOS
O estudo foi desenvolvido no bairro da Colméia, localizado na zona rural no município de
Pindamonhangaba, no Estado de São Paulo. O bairro possui 97 famílias cadastradas no Programa de
Saúde da Família, totalizando 380 pessoas que vivem em estado precário em relação às condições
sanitárias, higiene, esgoto e água.
As amostras foram das águas dos poços coletadas em recipientes plásticos esterilizados,
armazenadas em caixas isotérmicas e enviadas diretamente para o Laboratório de Microbiologia da
Universidade de Taubaté – UNITAU, SP, onde foram imediatamente realizadas as análises
microbiológicas.

Análise de coliformes
A análise foi feita pelo método de tubos múltiplos, para determinação do número mais
provável (NMP/100ml) de coliformes totais ou coliformes termotolerante. Essa técnica consiste de
volumes e diluições de amostras de água inoculadas em meio lactosado em séries de cinco tubos,
encubados a 35°C durante 24 horas para posterior verificação de tubos positivos para a produção de
gás, descrita no Standard Methods for the examination water and wastewater (American Public
Health Associaton,1997).

Teste presuntivo para determinação de coliformes


Para a determinação do teste presuntivo para Coliformes totais utilizou-se caldo lactosado
(Difco) pH= 6,9, que foi distribuído em tubos de ensaio com tubos de Durhan no seu interior.
Foram utilizadas 5 séries com diluições diferentes sendo, incubados a 37° C°, por 24 a 48 horas.

Teste confirmativo para coliformes totais


A partir dos tubos positivos, isto é formação de gás no interior dos tubos de Durhan eram
repicados em caldo verde brilhante com tubos de Durhan e incubados a 37C° por 24 horas. Os tubos
que apresentaram formação de gás no período estipulado confirmaram a presença de coliformes
totais.
Teste confirmativo para coliformes termotolerantes
Fórum Internacional do Meio Ambiente - A conferência da Terra 805

A partir dos tubos positivos, isto é formação de gás no interior dos tubos de Durhan eram
repicados em caldo EC com tubos de Durhan e incubados a 44,5ºC em banho-maria, durante 24
horas. A formação de gás nestes tubos indicou a presença de coliformes termotolerantes.

Isolamento de enterobactérias
Amostra de água foi inoculado em placas com agar MacConkey isolou-se colônias e
posteriormente foram identificadas por meio de testes bioquímicos baseados em Silva et al., (2007)
com algumas modificações.
Foram utilizadas várias provas diferenciais para identificação definitiva das
enterobactérias. Dentre elas, testes de Lisina, Triple Sugar Iron (TSI), Indol, Motilidade,
Fenilalanina, Vermelho de Metila (VM), Voges-Proskauer (VP), Citrato e Urease.

RESULTADOS E DISCUSSÃO
Tabela 1- Coliformes totais e termotolerante de amostras da água dos poços de acordo com o
método padrão da American Public Health Association, empregando-se a técnica dos tubos
múltiplos (NMP/100).
Poço Coliformes Coliformes Poço Coliformes Coliformes
totais termotolerante totais termotolerante
1 500 2 23 240 34
2 900 ≥1600 24 ≥1600 ≥1600
3 ≥1600 ≥1600 25 ≥1600 ≥1600
4 500 300 26 ≥1600 ≥1600
5 350 280 27 ≥1600 -
6 ≥1600 ≥1600 28 ≥1600 80
7 - - 29 ≥1600 50
8 60 - 30 1600 1600
9 900 500 31 1600 -
10 ≥1600 ≥1600 32 ≥1600 1600
11 280 - 33 ≥1600 ≥1600
12 ≥1600 - 34 ≥1600 -
13 1600 - 35 ≥1600 500
14 ≥1600 - 36 ≥1600 4
15 ≥1600 - 37 ≥1600 4
16 ≥1600 ≥1600 38 300 -
17 ≥1600 280 39 ≥1600 2
18 170 140 40 280 2
19 ≥1600 350 41 ≥1600 ≥1600
20 ≥1600 ≥1600 42 1600 280
21 ≥1600 ≥1600 43 ≥1600 170
22 220 220

Os principais contaminantes biológicos da água são os microrganismos patogênicos de


origem entérica e os principais indicadores desse tipo de contaminação são as concentrações de
coliformes totais e coliformes termotolerante, expressos em número mais provável de organismos
por 100 mL de água. A água para consumo humano deve ser livre de Escherichia coli ou coliformes
termotolerantes e apresentar ausência em 100 mL ou positividade de até 5% para coliformes totais,
estabelecida pela Portaria 518/2004 (BRASIL, 2004).
A água do poço encontra-se imprópria para o consumo sob o ponto de vista bacteriológico,
segundo a portaria 518/2004 do Ministério da Saúde, pois 73.8% dos poços encontram-se
contaminados por coliformes termotolerantes.
Fórum Internacional do Meio Ambiente - A conferência da Terra 806

As fontes de contaminação antropogênica de água subterrâneas (poços) estão diretamente


associadas à distância inadequada entre o poço e a fossa pois não atendem a Lei n 7.750/92 da
CETESB que preconiza que a distância ideal entre a fossa e o poço deve ser de 30 metros ou
mais. Observa-se que dos 42 moradores questionados, apenas 1 poço está de acordo com esta lei e
que a maioria dos poços tem a distância entre a fossa e o poço fica entre 5 a 10 metros.
Todos os poços analisados eram poços rasos escavados, geralmente abertos por escavação
manual, o que exige grandes diâmetros (de 0,80 a 1,50m), variando de 1 metro a 10 metros de
profundidade, aumentando a possibilidade de contaminação pelo diâmetro e por apresentarem-se
totalmente aberto ou fechado inadequadamente, com tábuas, telha de eternite, sem construção de
paredes na lateral, havendo infiltrações de água contaminada da superfície com possíveis entrada de
objetos contaminados, animais e detritos.
A avaliação da qualidade higiênico-sanitária da água de poços rasos mostra que 92,12%
das amostras de água dos poços rasos apresentaram-se contaminadas por coliformes fecais, em
desacordo com os padrões de potabilidade estabelecidos pelo Ministério da Saúde, evidenciando,
portanto, o risco à saúde da população consumidora deste tipo de água sem nenhum tratamento
(AMARAL et al., 1994).
Para Freitas et al. (2001) em pesquisa realizada pelos autores em duas regiões do Estado do
Rio de Janeiro a água do poço apresenta índices de coliformes fecais acima dos padrões
estabelecidos na Portaria 36/90 do Ministério da Saúde, colocando a população consumidora desta
água a diversos riscos para a saúde, como doenças de veiculação hídrica. Segundo Silva et al.
(1995) a água subterrânea tem se tornado uma fonte alternativa de abastecimento de água para o
consumo humano, isto se dá, devido tanto à escassez quanto à poluição das águas superficiais,
formando os custos de tratamento, em níveis de potabilidade, cada vez mais elevados.
Em 1994, Amaral et al., investigando amostras de água colhidas de poços rasos
localizados em área urbana no Município de Jaboticabal, SP, evidenciaram a ocorrência de 92,3%
das amostras fora dos padrões bacteriológicos de potabilidade estabelecidos pelo Ministério da
Saúde.
Os resultados das análises bioquímicas indicaram contaminação por diferentes
membros da para família Enterobacteriaceae (Figura 1). Dentre elas destacam-se os do gênero
Enterobacter, sendo esta, encontrada em 100% das amostras analisadas, as espécies Enterobacter
aglommerans e Enterobacter aerogenes, encontrados em 90% e 80% dos poços respectivamente.
Seguidas de espécies de Escherichia coli, Hafnia alvei, Serratia rubidea, Klebsiella oxytoca e
Chromobacterium violaceum potencialmente patogênicas.

10% Klebsiella oxytoca


Bactérias

20% Serratia Rubidea


30% Hafnia alvei
50% Escherichia coli
100% Enterobacter

Figura 1: Bactérias da família Enterobacteriaceae encontradas nos poços no Bairro da Colméia,


Município de Pindamonhangaba, SP.

Há poucas regiões no mundo ainda livres dos problemas da perda de fontes potenciais de
água doce, da degradação na qualidade da água e da poluição das fontes de superfície e subterrâneas
(MORAES E JORDÃO, 2002).
Fórum Internacional do Meio Ambiente - A conferência da Terra 807

Pode-se atribuir a origem destas bactérias à ocorrência de poluição fecal oriunda


principalmente ao estado precário em relação às condições sanitárias, como falta de higiene, em que
estas famílias vivem.
Em um dos poços foi isolada uma cepa de Chromobacterium violaceum, que é um
microrganismo de vida livre do solo e da água de regiões tropicais e subtropicais, nas quais grande
parte do território brasileiro está inserida; onde as condições ambientais de temperatura são ideais
para o seu desenvolvimento. Trata-se de bastonete Gram negativo, móvel, anaeróbio facultativo,
cresce nos meios usuais e as colônias normalmente produzem um pigmento violáceo não difusível e
raramente apresentam colônias não pigmentadas. Embora seja considerado saprófita e não
patogênico. Casos esporádicos de infecção humana têm sido descritos, principalmente em crianças e
indivíduos imunodeficientes. Embora raro, as infecções por C. violaceum são caracterizados por
rápida disseminação, provoca quadros septicêmicos e alta mortalidade.

CONCLUSÃO
O alto índice de contaminação nos poços estudados, ocasionado pela falta de tratamento
dos dejetos e inadequação na construção das fossas vem a ser preocupante, visto que a qualidade
ambiental é um dos fatores fundamentais para prevenir a ocorrência de doenças de veiculação
hídrica
Diante dos resultados, conclui-se que as águas procedentes destes poços são impróprias
para consumo humano, sendo necessário um planejamento junto à área de saúde para
conscientização dos moradores em relação ao conhecimento de medidas simples como ferver e
filtrar a água, visando não só a prevenção de doenças, como também melhores condições de
higiene.
Outra medida de controle de infecções transmitidas pela água é prevenir a contaminação
dos reservatórios e isto pode ser alcançado por medidas sanitárias simples, tais como tratamento dos
reservatórios e eliminação apropriada de excretas humanas.

REFERÊNCIAS BIBLIOGRÁFICAS
AMARAL, LA; ROSSI JUNIOR, OD; NADER FILHO, A; et al, Avaliação da qualidade higiênico-
sanitária da água de poços rasos localizados em uma área urbana: utilização de colifagos em
comparação com indicadores bacterianos de poluição fecal. Rev. Saúde Publica, 1994, vol 28, n.5,
p.345-348.
AMARAL, LA; NADER FILHO, A; ROSSI JUNIOR, OD; et al. Água de consumo humano como
fator de risco à saúde em propriedades rurais. Rev. Saúde Pública, v. 37, n.4,.2003.
AMERICAN PUBLIC HEALTH OF WATER AND WASTEWATER. Standard methods for the
examination of water and wastewater. 21. ed. Washington: APWA, AWWA, WPCF, 2005. 1268 p.
BRASIL. Portaria n° 518, de 25 de março de 2004. Estabelece os procedimentos e
responsabilidades relativos ao controle e vigilância da qualidade da água para consumo humano e
seu padrão de potabilidade, Ministerio da Saùde, Brasilia, DF.
BARCELLOS, C; COUTINHO, K; PINA, M.F; et al, linkage of enveironmentl and health data:
health risk analysis of the Rio de Janeiro water supply using Geographical information
systems.Cad. Saude Pública, 1998, v.14, n.3, p.597-6-5.
BARROS, TV et al; Manual de saneamento e proteção ambiental para os municípios, Universidade
Federal da Paraíba, centro de ciências e tecnologia, área de saneamento rural. v.2, set.1998.
FREITAS, MB; BRILHANTE, OM; ALMEIDA, LM. Importância da análise de água para a saúde
pública em duas regiões do Estado do Rio de Janeiro: enfoque para coliformes fecais, nitrato e
alumínio. Cad. Saúde Pública v.17, n.3 Rio de Janeiro 2001.
GAZZINELLI, A; SOUZA, MCC; NASCIMENTO, I; SÁ, IR; CADETE, M M M; KLOOS, H.
Domestic water use in a rural village in Minas Gerais, Brazil, with an emphasis on spatial patterns,
sharing of water, and factors in water use. Cad. Saúde Púb., v. 14, n. 2, p. 265-277, 1998.
MORAES, DSL; JORDÃO BQ. Degradação de recursos hídricos e seus efeitos sobre a saúde
humana. Rev. Saúde Pública v.36 n.3, p. 370-374, 2002.
Fórum Internacional do Meio Ambiente - A conferência da Terra 808

PONTES, CAA; SCHRAMM, FR. Bioética da proteção e papel do Estado: problemas morais no
acesso desigual à água potável. Cad. Saúde Pública, vol.20, no.5, p.1319-1327, 2004
QUITÉRIO, LAD et al. Padrões de potabilidade da água – Programa Estadual de Vigilância da
qualidade da água para consumo humano. Ed. Unirepro S/C, Ltda, v.2.1998.
SILVA, N; JUNQUEIRA, VCA; SILVEIRA, NFA; TANIWAKI, MH; SANTOS, RFS; GOMES,
RAR. 2007. Manual de métodos de análise microbiológica de alimentos. 3 ed. São Paulo,
Ed.Varela, 317 p.
TUNDISI, JG. Água no século XXI: enfrentando a escassez, São Carlos, Editora Rima, 2003.cap.1,
p.1-4.
VANDERLEI, LCM; SILVA, GAP; BRAGA, JU. Fatores de risco para internamento por diarréia
aguda em menores de dois anos: estudo de caso-controle. Cad. Saúde Pública vol.19, n.2, p. 2003.
Fórum Internacional do Meio Ambiente - A conferência da Terra 809

INFLUÊNCIA DA DENSIDADE DE FUNGOS MICORRÍZICOS ARBUSCULARES NA


PRODUÇÃO DE MUDAS DE MARACUJAZEIRO-DOCE (PASSIFLORA ALATA CURTIS)

Arivânia de Oliveira Carmo


Laboratório de Micorrizas, Departamento de Micologia/ CCB, Universidade Federal de Pernambuco. 50.646-420.
Recife –PE. oliveira_arivania@hotmail.com
Talita Fernanda Brandão-Silva
Laboratório de Micorrizas, Departamento de Micologia/ CCB, Universidade Federal de Pernambuco. 50.646-420.
Recife –PE.
Laura Mesquita Paiva
Laboratório de Micorrizas, Departamento de Micologia/ CCB, Universidade Federal de Pernambuco. 50.646-420.
Recife –PE.

RESUMO
A produção de mudas de maracujazeiro-doce é dificultada pela presença de solos que
muitas vezes não atendem a demanda nutricional da planta, necessitando então de adubação. Uma
forma de disponibilizar estes nutrientes no solo é a utilização de fungos micorrízicos arbusculares
(FMA). Estes podem levar a uma diminuição do tempo das mudas no viveiro, antecipando o
transplantio para o campo, e aumentar o crescimento, incrementando a biomassa da planta e a
produção de frutos de qualidade. O objetivo desse trabalho foi analisar o crescimento das mudas de
maracujazeiro-doce de acordo com os níveis de concentração desses inóculos. O experimento foi
conduzido em delineamento inteiramente casualizado (DIC) com arranjo fatorial de 2 x 4 x 5,
sendo: 2 tratamentos de inoculação (Gigaspora albida Schenck & Smith e Scutellospora
heterogama Nicolson & Gerdemann) 4 níveis de inoculação (sem inoculo, N1=100 esporos, N2=
200 esporos, N3=300 esporos) x 5 repetições. A cada trinta dias após a inoculação foram tomadas
medidas de altura, diâmetro do caule e número de folhas. Após a colheita (90 dias), foram também
avaliados: área foliar, biomassa fresca e seca da parte aérea e radicular, colonização de raízes e
densidade de esporos de FMA. Plantas de maracujazeiro-doce apresentaram alta dependência
micorrízica quando inoculadas com Gigaspora albida, fungo este que proporcionou nas plantas de
maracujazeiro-doce melhores respostas em relação aos parâmetros avaliados.
Palavras-chave: Dependência micorrízica, maracujá-doce, fungos micorrízicos arbusculares.

ABSTRACT
Influence of the density of Arbuscular Mycchorizic fungus in the production of seedlings
of passion fruit tree (Passiflora alata Curtis). The production of shifts sweet is hampered by the
presence of soils that, sometimes, doesn’t tend to nutritional demand of the plant, needing, then,
fertilization. The application of Arbuscular Mycchorizic Fungus (AMF) is a way to available this
nutrients in the soil. It can take to a reduction of time of the shifts in vegetation house anticipating
the transplantation for the field, increasing the growth, developing the biomass of the plant and the
production of fruits of quality. The aim of this work was to analyze the growth of the shifts of sweet
passion fruit according to the levels of concentration of this innoculus. The experiment was
conducted in casualty entirely lineation (CEL) with factorial arrangement of 2 x 4 x 5, as: 2
innoculation treatments (Gigaspora albida Schenck & Smith and Scutellospora heterograma
Nicolson & Gerdemann) x 4 levels of innoculation (without innoculus = WN/I 100 spores = N1,
200 spores = N2 and 300 spores = N3) x 5 repetitions. In each 30 days after the innoculation were
measured the height, stem diameter and number of leaves. After harvest (90 days) also were
evaluated: leaf area, fresh and dry biomass of the air and radicular part, colonization of roots and
density of spores of Arbuscular Mycchorizic Fungus. Plants of sweet passion fruit showed high
Mycchorizic dependence when innoculated with Gigaspora albida, this fungus proportioned in the
plants of sweet passion fruit better answers in relation to the evaluated parameters.
Key words – Mycchorizic dependence, sweet passion fruit, arbuscular mycchorizic fungus

INTRODUÇÃO
Fórum Internacional do Meio Ambiente - A conferência da Terra 810

O termo micorriza refere-se a uma associação mutualística formadas entre certos fungos do
solo e raízes da maioria das espécies vegetais, desde briófitas e pteridófitas até gimnospermas
(Smith & Read, 1997). A colonização das raízes por esses fungos e os benefícios da simbiose
resultam em inúmeras melhorias no estado nutricional da planta hospedeira, onde a planta fornece
fotossintatos ao fungo, e este, por meio da extensão e ramificação do seu micélio aumenta área de
absorção das plantas.
Os fungos micorrízicos arbusculares (FMA) produzem benefícios em numerosas plantas,
resultantes de melhorias no estado nutricional, melhor utilização e conservação de nutrientes no
sistema, redução de perdas por estresses de natureza biótica: pragas e doenças (Bagyaraj, 1986) ou
abióticas: desbalanço nutricional, déficit hídrico, modificações fisiológicas e bioquímicas
(Zambolim et al., 1992). Atribui-se a proporção do aumento no crescimento da planta a capacidade
que os fungos micorrízicos tem de absorver nutrientes do solo, principalmente aqueles de baixa
mobilidade (Colozzi-Filho & Balota, 1994).
Para regiões tropicais e subtropicais os FMA são muito importantes pois estas regiões
possuem: solos pouco férteis, condições ambientais estressantes, culturas que necessitam de elevado
teor de nutrientes e suprimento limitado de fertilizantes em diversas áreas. Além disso, muitos
produtores são minifundiários e tem pouco poder aquisitivo dificultando, assim, o uso de
fertilizantes. As micorrizas seriam, então, uma alternativa biotecnológica de insumo agrícola para
estas regiões (Siqueira, 1996).
Apesar dos comprovados benefícios da inoculação de FMA em culturas agronomicamente
importantes, sua produção é limitada, pois estes fungos são biotróficos obrigatórios e não se
desenvolvem em sistemas tradicionais para cultivos de fungos daí a dificuldade do uso de FMA
como insumo agrícola.
Maracujazeiros com alta produtividade de frutos são obtidos com a utilização de mudas de
qualidade, que são em geral produzidas com a adição de adubos orgânicos e/ou químicos (Ruggiero
et al., 1996). Gigaspora albida, Gigaspora margarita e Glomus etunicatum contribuíram para
incrementar o desenvolvimento de mudas de maracujazeiro amarelo reduzindo o tempo de produção
(Cavalcante et al., 2002). O maracujazeiro-doce (Passiflora alata Curtis) produz frutos ainda pouco
difundidos no mercado, que atingem preços relativamente altos para o consumidor das classes alta e
média, constituindo uma cultura rentável, que vem crescendo nos últimos anos (Vasconcellos et al.,
2001). Atualmente a propagação desse maracujazeiro é feita por via sexuada, ou seja, por sementes
e segundo Vasconcellos et al. (2001), a cultura necessita de pesquisas em todas as áreas, inclusive
em relação à formação das mudas.
Tendo em vista a importância dos FMA, como ferramenta biotecnológica para uma melhor
adaptação, redução de estresse no transplantio e um melhor desenvolvimento das mudas dessas
fruteiras, o presente trabalho teve como objetivo avaliar espécies de FMA e seus respectivos níveis
ótimos de concentração de inóculo para promover maior crescimento de mudas de maracujazeiro-
doce (Passiflora alata Curtis).

MATERIAL E MÉTODOS
O experimento foi realizado em casa de vegetação, no laboratório de Micorrizas do
Departamento de Micologia, CCB/UFPE. Sendo diariamente registradas temperatura e umidade
relativa do ar, em termohigrômetro digital. Como substrato foi utilizado solo Latossolo Amarelo
Distrófico Argissólico, esterelizado 20 dias antes da utilização, por fumigação com Bromex
(brometo de metila 980 g.Kg-1). Análises física e química do solo foram realizadas pela Empresa
Pernambucana de Pesquisa e Agropecuária (IPA). O solo, do tipo franco arenoso, tem as seguintes
características: pH 5,7; P 4 mg.dm-3 ; 1,9; 0,7; 0,12; 0,10; 0,06 cmolc. dm-3 respectivamente de Ca,
Mg, K, Al, Na.
O experimento foi conduzido em delineamento inteiramente casualizado (DIC) com
arranjo fatorial de 2 x 4 x 5, sendo: 2 tratamentos de inoculação (Gigaspora albida Schenck &
Smith e Scutellospora heterogama Nicolson & Gerdemann) x 4 níveis de inoculação (sem
Fórum Internacional do Meio Ambiente - A conferência da Terra 811

inóculo= S/I, 100 esporos= N1, 200 esporos= N2 e 300 esporos= N3) x 5 repeticções totalizando 40
vasos.
Foram utilizados os isolados de Gigaspora albida (UFPE-01), Scutellospora heterogama
(UFPE-19). Os FMA foram multiplicados em painço (Panicum miliacium L.).
Mudas de Passiflora alata Curtis foram obtidas a partir da germinação de sementes
uniforme, desinfestadas com hipoclorito de sódio ( 0,05% por 2 minutos ), e semeadas em copos
plásticos de 50 ml, contendo como substrato solo esterilizado. Plântulas com duas folhas definitivas
foram colocadas em potes plásticos de 500g e inoculados na região da raiz com solo inóculo.
A cada trinta dias após a inoculação foram tomadas medidas de altura, diâmetro do caule e
número de folhas. Após a colheita (90 dias), foram também avaliados: área foliar, biomassa fresca e
seca da parte aérea e radicular, colonização de raízes e densidade de esporos de FMA na rizosfera.
Para minimizar os efeitos da deficiência mineral do substrato, as plantas receberam
aplicações semanais de solução nutritiva de Jarstfer e Sylvia (1992).
As raízes utilizadas para avaliação da colonização, foram lavadas, clarificadas com KOH
(10%) coradas com azul de Trypan (Phillips & Hayman, 1970), lavadas mais uma vez para retirada
do excesso de corante, e feitas cinco lâminas com dez fragmentos de raiz para cada lâmina, onde
foram avaliadas quanto à porcentagem de colonização (Giovannetti & Mosse, 1980). A parte aérea
e radicular foi colocada em estufa de circulação de ar (65º) até o peso constante para a determinação
da biomassa seca.
O solo foi homogeneizado e alíquotas de 50g foram usadas para avaliação da densidade de
esporos no solo, após extração por peneiramento úmido (Gerdemann & Nicolson, 1963), seguido de
centrifugação em água e sacarose 40% (Jenkins, 1964). Ao final da centrifugação os esporos foram
recolhidos em peneiras e colocados em placa canaletada, para contagem em microscópio
estereoscópico (40x).
Os dados foram submetidos a análises de variância (ANOVA) e as médias comparadas
pelo teste de TUKEY (P< 0,05). Para análise de regressão foi utilizado o programa NTIA
(Embrapa).

RESULTADOS E DISCUSSÃO
Em relação ao crescimento das mudas de maracujazeiro-doce podemos verificar que aos 30
e 60 dias as mudas inoculadas com Gigaspora albida na densidade de 200 esporos, apresentaram
maior altura em relação as inoculadas com 100 e 300 esporos e as não inoculadas. No
maracujazeiro-amarelo o crescimento é favorecido na associação com FMA (G. albida e S.
heterogama) em solos com baixas ou médias quantidades de P, sendo esta cultura extremamente
dependente quando em níveis de 4 mg/dm3 , Cavalcanti et al. (2001a). Em relação à inoculação
com S. heterogama não foi observado nenhuma diferença significativa quanto à altura das mudas de
maracujazeiro-doce.
O diâmetro e o número de folhas não apresentaram diferença significativa em nenhum
tratamento e tempo analisado. O desenvolvimento dos maracujazeiros aos 90 dias foi beneficiado
pela inoculação dos FMA, sendo G. albida mais eficiente na altura e formação de gavinhas.
Em relação à biomassa fresca da parte radicular G. albida diferenciou de S. heterogama e
das mudas não inoculadas (Tabela 1).
Fórum Internacional do Meio Ambiente - A conferência da Terra 812

Tabela 1. Efeito de espécies de fungos micorrízicos arbusculares (FMA) sobre biomassa fresca da
raiz (BFR), biomassa seca da raiz (BSR), biomassa seca da parte aérea (BSA), área foliar (AF) e
densidade de esporos (DE) no crescimento de mudas de maracujazeiro-doce (Passiflora alata) aos
90 dias após a inoculação em casa de vegetação.
Parâmetro avaliados
BFR (g) BSR (g) BSA (g) AF (cm2) DE
Tratamentos
(nº/50g de
solo)
Gigaspora albida 6,00 a 0,55 a 4,30 a 654,99 a 177,42 a
Scutellospora heterogama 4,25 b 0,45 a 3,26 a 622,60 a 196,15b
Controle 1,56 b 0,15 b 2,76b 207,75 b 0,00 c
Médias seguidas pela mesma letra, na coluna, não diferem estatisticamente entre si pelo teste de
Tukey (P> 0,05).

Resultado semelhante ao encontrado por Silva et al. (2001) onde G. albida proporcionou
incrementos de 2138% na biomassa fresca da parte aérea, 1430% na biomassa seca da parte aérea,
1937% na biomassa fresca da raiz e 2671% na área foliar das mudas. A área foliar e a biomassa
seca da parte radicular e foliar das plantas inoculadas com G. albida e S. heterogama diferiram
significativamente das plantas não inoculadas. A biomassa seca da parte área e área foliar atingiram
valores máximos com 300 esporos/planta, independente da espécie de FMA (Cavalcante et al.,
2002). Várias culturas quando associadas ao gênero Gigaspora são beneficiadas, como em mudas de
maracujazeiro-amarelo a inoculação de Gigaspora albida, Gigaspora margarita, e Glomus
etunicatum beneficiou o crescimento, o que não ocorreu nas mudas associadas a Scutellospora
heterogama e Acaulospora. longula, que se comportaram de modo similar ao controle (Cavalcanti
et al., 2002). No maracujazeiro-doce, o aumento no crescimento só ocorreu em mudas associadas a
Gigaspora albida Chu et al. (2001) tiveram maior incremento no crescimento das mudas de
gravioleiras inoculadas com Gigaspora margarita. O mesmo ocorreu com mamoeiro x Gigaspora
margarita (Trindade et al., 2001). Observou-se crescimento progressivo das plantas até os 70 dias,
quando atingiram a altura ideal (15 cm), com presença de gavinhas, critério referido como condição
para o transplantio (Ruggiero et al., 1996).
O tipo de substrato influencia a simbiose, principalmente devido à quantidade de nutrientes
disponíveis no solo, o P é um dos mais importantes nessa associação. De acordo com Silva et al.
(2001) verificaram maior aumento em maracujazeiro-amarelo cultivado em vermiculita e inoculado
com FMA do que com substrato rico em nutrientes (PlantmaxR).
A porcentagem de colonização das raízes de maracujazeiro-doce não apresentou diferença
significativa quando inoculadas com 100 e 200 esporos de Gigaspora albida e Scutellospora
heterogama. Entretanto, as plantas inoculadas com 300 esporos de Gigaspora albida apresentaram
maior porcentagem de colonização após 90 dias inoculação.
A inoculação com Scutellospora heterogama promoveu resposta tardia em relação aos
isolados inoculados com Gigaspora albida, em mudas de maracujazeiro-amarelo o benefício da
simbiose só é evidenciado a partir dos 50 dias após a inoculação, onde Gigaspora albida promoveu
maiores resultados que Scutellospora heterogama, Gigaspora margarita, Glomus etunicatum,
Glomus clarum, Cavalcanti (2002). Silveira et al. (2003) analisaram o desempenho de FMA na
produção de mudas de marcujazeiro-amarelo em diferentes substratos, e observou que a maior
porcentagem de colonização radicular foi obtida com Gigaspora clarum que superou
significativamente os demais fungos.

CONCLUSÃO
Fórum Internacional do Meio Ambiente - A conferência da Terra 813

Por proporcionarem maior vigor à planta e reduzirem o tempo necessário para o


transplantio de mudas de maracujazeiro-doce para o campo, Gigaspora albida foi entre os FMA
testados o mais promissor para a inoculação neste hospedeiro.

REFERÊNCIAS BIBLIOGRÁFICAS
BAGYARAJ, D.J. Biologia interactions with VA mycorrhizal fungi. In: POWELL, C.L.;
BAGYARAJ, D.J. Vesicular Arbuscular Mycorrhiza. Boca Raton: CRC Press, p.131-153, 1986.
CAVALCANTE, U.M.T.; MAIA, L.C.; MELO, A.M.M.; SANTOS, V.F. Influência da densidade
de fungos micorrízicos arbusculares na produção de mudas de maracujazeiro-amarelo. Pesquisa
Agropecuária Brasileira, v. 37, n. 5, p. 643- 649, 2002.
CAVALCANTE, U.M.T.; MAIA, L.C.; NOGUEIRA, R.J.M.C.; SANTOS, V.F. Respostas
fisiológicas em mudas de maracujazeiro amarelo (Passiflora edulis Sims. f. flavicarpa Deg.)
inoculadas com fungos micorrízicos arbusculares e submetidas a estresse hídrico. Acta Botânica
Brasílica, v. 15, n. 3, p. 379 -390, 2001a.
CHU, E. Y.; MÜLLER, M.R.; CARVALHO, J.G. Efeitos da inoculação micorrízica em mudas de
gravioleira em solo fumigado e não fumigado. Pesquisa Agropecuária Brasileira, v. 36, n. 4, p. 671-
680, 2001.
COLOZZI-FILHO, A.; BALOTA, E.L. Micorrizas arbusculares. In: HUNGRIA, M.; ARAÚJO,
R.S. Manual de métodos empregados em estudos de microbiologia agrícola. Brasília: EMBRAPA
– Serviço de Produção, p. 383 – 418, 1994.
GERDEMANN, J.W.; NICOLSON, T.H. Spores of mycorrhizal Endogone species extracted from
soil by wet sieving and decanting. Transactions of British Mycological Society, v.46, p.235-244,
1963.
GIOVANNETTI,M.; MOSSE, B. An evoluation of techniques for measuring vesiculra-arbuscular
mycorrhizal infection in roots. New Phytologist, Cambridge, Grâ Bretanha, v.84, p 489-500, 1980.
JARSTFER, A.G.; SYLVIA, D.M. Inoculum production and inoculation strategies for vesicular-
arbuscular mycorrhizal fungi. In: Soil Microbial Ecology: Applications in Agricultural and
Environmental Management. Ed. B. Metting. New York, Marcel Dekker, Inc. p. 349-377, 1992.
JENKINS, W. R. A rapid centrifugal-floation technique for separating nematodes from soil. Plant
Disease Reporter, v.48, p.692, 1964.
PHILLIPS, J. M.; HAYMAN, D.S. Improved proccdures for elearing roots and staining parasitie
and vesicular-arbuscular mycorrhizal fungi for rapid assessment of infection. British Mycological
Society Tranations, Cambridge, Grã-Bretanha, v.55,p.158-161,1970.
RUGGIERO, C.; SÃO JOSÉ, A.R.; VOLPE, C.A.; OLIVEIRA, J.C.; DURIGAN, J.F.;
BAUMGARTNER, J.G.; SILVA, J.R.; NAKAMURO, K.; FERREIRA. M.E.; KAVATI,R. &
PEREIRA, V.P. Maracujá para exportação: aspectos técnicos da produção, Ministério da
Agricultura e do Abastecimento. Secretaria de Desenvolvimento Rural, Brasília, Brasil, Embrapa –
Spi, Publicações Técnicas Frupex, v.19, 64p., 1996.
SILVA, R.P.; PEIXOTO, J.R.; JUNQUEIRA, N.T.V. Influência de diversos substratos no
desenvolvimento de mudas de maracujazeiro azedo (Passiflora edulis f. flavicarpa Deg.). Revista
Brasileira de Fruticultura, v. 23, n. 2, p. 377 – 381, 2001.
SILVEIRA, A.P.D.; SILVA, L. R.; AZEVEDO, I.C.; OLIVEIRA, E.; MELETTI, L.M.M.
Desempenho de fungos micorrízicos arbusculares na produção de mudas de maracujazeiro-amarelo,
em diferentes substratos. Revista Bragantia Campinas, v.62, n.1, p. 89-99, 2003.
SIQUEIRA, J.O. Micorrizas e micorrizologia. In: SIQUEIRA, J.O. Avanços em fundamentos e
aplicação de micorrizas (ed.). Lavras: Universidade Federal de Lavras, p. 203 – 254, 1996.
SMITH, S.E.; READ, D.J. Mycorrhizal Simbiosis. Second edition. Califórnia: Academic Press,
605 p.,1997.
TRINDADE, A.V.; SIQUEIRA, J.O.; ALMEIDA, F.P. Dependência micorrízica de variedades
comerciais de mamoeiro. Pesquisa Agropecuária Brasileira, v. 36, n. 12, p. 1485 – 1494, 2001.
Fórum Internacional do Meio Ambiente - A conferência da Terra 814

VASCONCELOS, M.A.S.; BRANDÃO FILHO, J.U.T.; VIEITES, R.L. Maracujá-doce. In:


BRUNCKNER, C.H.; PICANÇO, M.C. Maracujá: tecnologia da produção, pós-colheita,
agroindústria, mercado (eds.). Porto Alegre: Cinco Continentes. p. 33-49, 2001.
ZAMBOLIM, L.; REIS, M.A.; COSTA, L.M. Substratos para multiplicação de inóculo do fungo
micorrízico vesículo-arbuscular Glomus etunicatum. Fitopatologia Brasileira, v.17, n.1, p. 28-31,
1992.
Fórum Internacional do Meio Ambiente - A conferência da Terra 815

UMA PRÁTICA AGROECOLÓGICA NO ENSINO AGRICOLA , UTILIZANDO


CONTROLE BIOLÓGICO.

Arnaldo Ribeiro
Mestrando em Educação Agrícola na UFRRJ,
Professor de Agricultura do Centro Federal de Educação Tecnológica de Bambuí ( CEFET-BAMBUI), Município de
Bambuí, Estado de Minas Gerais, Brasil. arnaldo@cefetbambui.edu.br
Aparecida Maria de Jesus Coelho
Mestre em Educação pela UFRJ. Pedagoga no CEFET- BAMBUI. coelha@cefetbambui.edu.br

RESUMO
Este artigo apresenta um estudo que está sendo desenvolvido no CEFET- BAMBUI, com
os alunos do Curso Técnico Agrícola sobre práticas agroecológicas. Consiste no controle biológico
de insetos - pragas na cultura do milho, oportunizando a comparação com o método químico.
Demonstra como o aprendizado pela prática, pela vivência e pela experiência contribui para
melhorar o desempenho dos alunos e mudar sua postura em relação ás questões ambientais
relacionadas à agricultura.
Palavras chave: agricultura sustentável; ensino agrícola.

ABSTRACT
This paper presents a study on Agroecological practices that is being developed by
students of the Agricultural Technician Course of CEFET-BAMBUI. The control of insect pests in
a corn crop will be tested through biological and chemical methods, and the results will be
compared for efficacy. We believe that learn by practicing helps improve the performance of
students as well as stimulate their thinking about environmental issues related to agriculture.
Key-words: biological control; agroecological teaching.

INTRODUÇÃO
Atualmente, a ocorrência de insetos considerados como pragas nas lavouras tem
acontecido de forma alarmante, devido, principalmente, aos desequilíbrios ambientais provocados
por práticas agrícolas inadequadas. Portanto, o controle biológico torna-se uma técnica eficiente e
viável para o agricultor, na medida em que diminui ou até mesmo elimina o uso de agroquímicos.
Neste sentido, pretende-se com esse trabalho, contribuir para o desenvolvimento de
práticas agroecológicas no Ensino Agrícola do CEFET- BAMBUI de forma a promover uma
mudança de postura em relação às questões ambientais, para formação de agentes que atuarão
diretamente no processo produtivo, durante as próximas décadas. Assim, a instituição de ensino
estará cumprindo seu papel formador de cidadãos comprometidos com a vida e aptos a atuar na
realidade sócio- ambiental.

CONTROLE BIOLÓGICO NA CULTURA DO MILHO


A nova matriz energética, fundamentada na utilização, em grande escala, dos
biocombustíveis e, principalmente, no aumento da demanda de grãos em todo mundo, desperta
preocupações em relação ao desequilíbrio ambiental, considerando a crescente expansão de
grandes áreas cultivadas principalmente com milho e cana-de-açúcar.
Este fato tem causado, em diversas regiões, uma correspondente multiplicação de insetos-
pragas, principalmente aqueles pertencentes à ordem Lepidoptera, que representam cerca de 40%
das pragas que atacam plantas no Brasil (GALLO et al., 2002) e têm provocado grandes danos
econômicos, devido à desfolha e baixo rendimento das culturas.
No Brasil, o manejo dessas pragas na cultura do milho baseia-se no uso de agrotóxicos, de
preços elevados e amplo espectro de ação, cujos princípios ativos são substâncias químicas de
elevado risco ecotoxicológico. Sua aplicação freqüente e, às vezes, excessiva, provoca o aumento
no custo de produção e causa intoxicações no trabalhador rural e contaminações ambientais.
Fórum Internacional do Meio Ambiente - A conferência da Terra 816

Esse cenário se reflete em várias regiões do Estado de Minas Gerais. Para a região do
município de Bambuí, este procedimento tem provocado impactos ambientais de grande relevância,
devido à conformação dos recursos naturais que apresentam vários cursos d’água, estreitos e
próximos muito vulneráveis à contaminação.
Diante destas e de outras circunstâncias, percebe-se a necessidade de metodologias
ambientalmente corretas de controle de tais pragas que observem a preservação ambiental e a
saúde das populações rurais sujeitas a influências diretas e indiretas dessas explorações agrícolas.
Para transformar os sistemas produtivos atuais em sistemas de maior sustentabilidade,
Souza Filho (2001) apud Noronha; Ribeiro (2005), acredita que a tecnologia agrícola tem um papel
importante a desempenhar. Sugere a adoção de “tecnologias limpas” como: compostagem;
adubação verde; fertilização mineral; cobertura morta; rotação de culturas; armadilhas para insetos e
roedores; pesticidas derivados de plantas; cultivo mínimo (técnica com pouco revolvimento do
solo); plantio direto e controle biológico de pragas e pestes.
Estas práticas compõem a Agroecologia que é uma ciência que integra princípios
agronômicos, ecológicos e socioeconômicos com o objetivo de melhor entender o efeito das
tecnologias agrícolas sobre a produção e a sociedade como um todo. Entende-se que estas devem
promover a agrobiodiversidade e os processos biológicos naturais, conferindo aos sistemas de
produção maior estabilidade e resistência a perturbações. (VANDERMEER, 1995; TILMAN et al.,
1996; ESPINDOLA et al., 2006).
O controle biológico é uma alternativa na agroecologia para o manejo de pragas em
sistemas agrícolas, visto constituir-se em processo natural de regulação do número de indivíduos da
população da praga por ação dos agentes de mortalidade biótica, sendo denominados inimigos
naturais ou agentes de controle biológico. Infere-se daí sua importância para o manejo de pragas em
sistemas de produção agrícola de bases agroecológicas.
Ultimamente, tem crescido o interesse por este tipo de controle e as perspectivas deste
método, em condições de campo, são cada vez mais promissoras (PARRA et al., 2002a). O controle
biológico de lepidópteros, por exemplo, tem se mostrado bastante eficiente com a introdução de
parasitóides, principalmente do gênero trichograma, cuja cadeia alimentar é restrita a tais insetos.
Outro aspecto a ser considerado relaciona-se com certas restrições quanto ao emprego de
certas práticas agroecológicas em situações das grandes culturas e de frutíferas. Nestes casos, o
controle biológico, pode ser estudado como uma opção para que o agricultor diminua ou até mesmo
elimine o uso de agrotóxicos os quais, o Brasil é o terceiro maior consumidor do mundo e o
primeiro na América Latina, segundo quadro recentemente exposto pela Anvisa (Agência Nacional
de Vigilância Sanitária), (BRAGION, 2006).
Observa-se, portanto, a ocorrência de uma grave alteração ecológica ocorrida nas últimas
décadas, provocada principalmente pelas inter-relações do homem com o meio ambiente. Com a
agroecologia surge a perspectiva de amenizar os efeitos dessas ações antrópicas em relação ao
ambiente, integrando-se com várias áreas do conhecimento científico.
Grande parte destas ações são atribuídas à difusão dos princípios da revolução verde com
toda tecnologia e os impactos ambientais (negativos) a ela inerentes, a qual. segundo Noronha &
Ribeiro (2005), surgiu após a Segunda Guerra Mundial adotando novas modalidades de assistência
técnica e extensão rural nos países em desenvolvimento.

A FORMAÇÃO DO TÉCNICO AGRÍCOLA E A RESPONSABILIDADE AMBIENTAL


Em vista destas questões que envolvem a exploração agrícola, a Secretaria de Educação
Tecnológica do MEC, vem desenvolvendo um trabalho de revisão do ensino agrícola, observando
que o conceito de formação agrícola utilizado durante muitos anos vem perdendo o sentido e está
sendo apontada a necessidade de elaborar novas políticas educacionais para a área.
Torna-se necessário buscar um modelo educativo para o ensino agrícola que leve em
conta o surgimento de novas tecnologias, de novas formas de agir e produzir,
aumentando a produtividade, com menor impacto ambiental e que contemple os
movimentos sociais e a agricultura familiar (SETEC 2007, p. 01) .
Fórum Internacional do Meio Ambiente - A conferência da Terra 817

Neste sentido o documento lembra que as estratégias de ensino devem considerar como
função da educação profissional agrícola, aspectos como:
• contemplar de forma indissociável teoria com prática e dar ênfase ao saber fazer, por quê e
para quem;
• promover a formação de técnicos, tendo como fundamento a agroecologia e
desenvolvimento sustentável;
• conduzir à geração de tecnologias através da pesquisa aplicada, em especial aquelas
compatíveis com a exploração familiar;
• formar um técnico ético, comprometido com as causas sociais e preservação ambiental.

A transição do modelo de agricultura tradicional para o sustentável deve ser entendida


como um processo de mudança gradual e multilinear que ocorre ao longo do tempo, nas formas de
manejo dos agrosssistemas.
Conforme Souza (2003), para o sucesso dessa transição deve ser considerada,
principalmente, uma dimensão educativa em que o processo envolva reflexão sobre a realidade e
assimilação dos princípios agroecológicos.
Em relação ao ensino agrícola, este processo deve considerar também a metodologia
adotada nos cursos técnicos e sua abordagem como educação para o trabalho. Esta é uma questão
fundamental na prática pedagógica das escolas profissionais.

Como convergir o ensino profissional para a formação do cidadão útil à sociedade?


Tradicionalmente, a escola sempre formou o homem que dirige separado do que produz,
distanciando aqueles que se destinavam ao conhecimento da natureza e da produção, daqueles a
quem eram entregues as tarefas de execução. Para Gramsci, foram necessários muitos séculos para
que se recuperasse, em teoria, a possibilidade unitária da formação do novo ser político (GRAMSCI
apud FRANCO, 1993, p. 8).
Introduzir e manter tal filosofia de ensino em uma instituição brasileira constitui-se um
grande desafio educacional. Nossa cultura caracteriza-se pelo dualismo em relação ao trabalho,
discriminando nitidamente trabalho manual de intelectual, ranço da escravidão e do coronelismo.
Enquanto o trabalho intelectual é visto como atividade nobre, destinada aos ricos e privilegiados, o
trabalho manual é destinado aos pobres, aos negros, aos desprivilegiados da sorte.
Fato oposto ocorre e pode ser comprovado através da agricultura familiar desenvolvida em
regiões onde a dependência da escravidão foi menor e em que, dentro de uma mesma propriedade,
todos fazem tudo, sem discriminação entre trabalho braçal e trabalho intelectual. O próprio
estudante tem suas tarefas definidas e trabalha como qualquer outro membro da família, antes de
seguir para a Escola.

Com relação a este tipo de aprendizado:


A qualificação para o trabalho não quer significar uma divisão da vida em dois tempos:
um tempo próprio para estudos e outro, sucedâneo, para trabalhar. Considerando que não
existem valores pedagógicos descontextualizados da prática social e da vida real,
entende-se que a educação NO e PARA o trabalho é inerente à educação política. Não se
pode pensar em formação humana do aluno se, pela ação do trabalho, o cidadão não
contribuir para humanizar as estruturas políticas, sociais e econômicas. (CARNEIRO,
1988)

O aprendizado pela prática, pela vivência e pela experiência tem contribuído para que os
alunos consigam um melhor índice de desempenho na aprendizagem, uma vez que se trata de
atividades contextualizadas e multidisciplinares. Este modelo de formação tem proporcionado
resultados expressivos nos cursos técnicos e mesmo tecnológicos, através do qual o aluno
Fórum Internacional do Meio Ambiente - A conferência da Terra 818

desenvolve um perfil dinâmico, realizador, empreendedor e adquire capacidade de resolver


problemas.
Historicamente, as Escolas Agrotécnicas evoluíram com este princípio básico no Ensino
Agropecuário que é a educação pelo trabalho, envolvendo a formação geral. Entretanto, a
organização destas como “Escolas Fazendas” foi se modificando, ou por problemas na manutenção
do sistema ou por mudança na orientação político educacional advinda das reformas de ensino que
inicialmente definiram que estas deveriam cuidar apenas da formação profissional para atender ao
setor produtivo.

DESENVOLVIMENTO DO ESTUDO
Os alunos do ensino Técnico Agrícola, como herdeiros da geração que implementou a
revolução verde, ainda acreditam nos pacotes tecnológicos e duvidam da eficiência dos sistemas
agroecológicos. Com este estudo, pretende-se utilizar o controle biológico como alternativa de
produção, buscando desenvolver o interesse dos alunos pela agroecologia, através da vivência desta
prática.
É importante considerar, também, a necessidade urgente das instituições de ensino
profissional se empenharem em desenvolver metodologias de ensino capazes de provocar mudanças
de postura fundamentais para melhoria da qualidade de vida das pessoas, através da implementação
de práticas agroecológicas na formação agrícola.
Nesta perspectiva este estudo, que está sendo desenvolvido no CEFET- BAMBUI,
pretende contribuir para a formação de técnicos agrícolas, envolvendo os alunos na aplicação e
análise dos resultados do controle de insetos –praga, permitindo uma comparação entre os métodos
aplicados. Tal procedimento, além de permitir ao pesquisador uma avaliação da postura e
aprendizagem discentes em relação a estas práticas, contribuirá para uma investigação a respeito
do controle de insetos- praga na cultura do milho.
Espera-se, ao mesmo tempo que possibilite a observação e análise do procedimento
pedagógico para promover os resultados na aprendizagem dos alunos, sendo . baseado em um
modelo de avaliação contínua descrita por (PÁDUA, 1997):
(...). avaliar continuamente cada etapa para que se possa obter indicadores de eficácia ou
ineficácia das atividades e das estratégias adotadas. Dessa forma a avaliação passa a ser
um veículo importante para a educação ambiental, podendo contribuir não só para
melhorar a qualidade dos programas implantados, mas a credibilidade da área como um
todo.

Esta autora lembra que os programas relacionados à educação ambiental devem ter
princípio, meio e fim e serem implantados passo a passo. Com base nesta metodologia este estudo
será desenvolvido por etapas, que serão descritas e avaliadas durante sua execução.
Para isto será desenvolvido um projeto de cultivo de milho com um grupo de alunos do
curso Técnico em Agricultura do CEFET-Bambuí, enfatizando a análise dos resultados da aplicação
dos métodos de controle químico e biológico em relação à lagarta-do-cartucho (Spodoptera
frugiperda) na cultura do milho.
A cultura do milho será desenvolvida em uma área de cultivo comercial, irrigada por pivô
central, de aproximadamente 3 ha no campus do CEFET- BAMBUI, onde serão instaladas,
aleatoriamente, parcelas de 20 m x 20 m para aplicação dos métodos de controle com 3
tratamentos em quatro repetições: ( 1 ) Controle Biológico (Trichograrma sp) ; ( 2 ) Controle
Químico (clorpirifós); ( 3 ) Testemunha, onde será avaliada a presença de inimigos naturais.
Os dados coletados observarão variáveis como: estádios fenológicos da planta; sintomas de
ataque de inseto-praga; porcentagem de plantas atacadas; presença de postura de insetos-praga;
coleta de insetos; ovos parasitados; presença de inimigos naturais; níveis de danos e avaliação dos
resultados. Os resultados serão analisados com os alunos e divulgados, constituindo-se, também na
dissertação de mestrado a ser apresentada na UFRRJ.
Fórum Internacional do Meio Ambiente - A conferência da Terra 819

Espera-se que os alunos percebam a importância das práticas agroecológicas na


agricultura, considerando a sustentabilidade dos agroecossistemas e o desenvolvimento de posturas
ambientalmente corretas.

REFERENCIAS BIBLIOGRAFICAS
BRAGION, L. Controle biológico deve ser uma alternativa aos agrotóxicos. Revista Eletrônica de
Jornalismo Científico, 6/10/2006. Acesso em: fevereiro de 2008.Disponível em:
www.comciencia.br/ comciencia/?section=3&noticia=219.
CARNEIRO, M. A. LDB FÁCIL, Editora Vozes, Petrópolis, 1988
GALLO, D.; NAKANO, O.; SILVEIRA NETO, S.; CARVALHO, RP.L.; BATISTA, G.C. de;
BERTI FILHO, E.; PARRA, J.R.P; ZUCCHI, R.A.; ALVES, S.B. Manual de entomologia
agrícola. São Paulo: Ed. Agronômica Ceres, 1988, 531p.
GRAMSCI. A. Os intelectuais e a organização da cultura, Rio de Janeiro: Civilização Brasileira,
1968.
MEC-SECRETARIA DE EDUCAÇÃO MÉDIA E TECNOLÓGICA- “Contribuição à construção
de Políticas para o Ensino Agrícola da Rede Federal Vinculada ao MEC/ SETEC”. - Maio de
2007
NORONHA, C.M.S.; RIBEIRO, F.L. Desenvolvimento Sustentável e Prática Profissional: discurso
ou Prática? XV Congresso IFMA e V Congresso da ABAR. Anais, Campinas, SP, Agosto/2005.
PADUA, S.; TABANES, M. 1997. Uma abordagem participativa para a conservação de áreas
naturais: Conservação Ambiental na Mata Atlântica:Anais do Congresso de Unidades de
Conservação. Curitiba, Paraná, 1997.p.371-379.
PARRA, J.R.P; BOTELHO, P.S.M.;CORRÊA-FERREIRA, B.S.;BENTO, J.M.S. Controle
biológico no Brasil: parasitóides e predadores. São Paulo: Manole, 2002a.609p.
Fórum Internacional do Meio Ambiente - A conferência da Terra 820

VII. Planejamento e gestão dos recursos hídricos

OCUPAÇÃO E IMPACTOS SÓCIO-AMBIENTAIS EM ÁREA DE MANANCIAL NA


AMAZÔNIA SUL-OCIDENTAL: ANÁLISE DA BACIA DO IGARAPÉ JUDIA (AC)109

Waldemir Lima dos Santos


Professor Assistente do Departamento de Geografia da Universidade Federal do Acre – UFAC -
Mestre em Ecologia e Manejo de Recursos Naturais. Universidade Federal do Acre - Campus
Universitário Reitor Aulio Gelio Alves de Souza - Rodovia BR 364, nº 6637 (Km 04) – Distrito
Industrial - CEP: 69915-900 - Rio Branco – Acre. waldemir_geo@yahoo.com.br

RESUMO
A qualidade ambiental aliada às atividades humanas vem se constituindo em temas que são
profundamente debatidos nos fóruns e encontros que tratam da questão da sustentabilidade dos
recursos naturais, realizados pelas diversas instituições nacionais e internacionais que lidam com a
causa “meio ambiente”. Questões como o manejo de recursos naturais no âmbito das bacias
hidrográficas, assumem uma posição de destaque quando se trata de uma possível escassez,
principalmente, de água potável nas próximas décadas, fato que merece atenção até mesmo à região
Amazônica. Com isso, o presente trabalho vem demonstrar os impactos ambientais ocasionados no
canal principal da bacia hidrográfica do igarapé Judia (afluente da margem direita do rio Acre),
abrangendo o trecho urbano da cidade de Rio Branco (AC), através de análise sócio-ambiental dos
ocupantes dessa área.
Palavras-chave: Urbanização. Recursos hídricos. Geossistema. Amazônia.

ABSTRACT
The environmental quality allied to human activities has been constituted on issues that are
deeply discussed in forums and meetings which deal with the issue of sustainability of natural
resources, made by the various national and international institutions that deal with the cause
"environment." Issues such as the management of natural resources within the river basin, assume a
position of prominence in the case of a possible shortage, mainly of drinking water in the coming
decades, a fact that deserves attention even to the Amazon region. Thus, the present work comes to
demonstrate the caused environmental impacts in the main canal of the hydrographic basin of the
waterstream Judia (affluent of the right margim of the river Acre), cover the urban stretch of the city
of Rio Branco (AC), through social-environmental analysis of the occupants of this area.
Key-Words: Urbanization. Hydrics resources. Geosystem. Amazonia.

INTRODUÇÃO
No início do século XXI emerge uma temática que reflete uma problemática nas médias e
grandes cidades – a conciliação entre a qualidade ambiental e o incremento populacional. Diante
disso, este trabalho tem por objetivo demonstrar os impactos ambientais negativos advindos da
ocupação do espaço na bacia hidrográfica do igarapé Judia (AC), localizado na Amazônia Sul-
Ocidental, no estado do Acre.
Reportar-se em transformação e (re) organização espacial é fazer um estudo detalhado do
espaço onde se processam essas transformações, tanto de forma artificial (impostas pela
humanidade) quanto pelos agentes naturais, entendido aqui como geossistema.

109
Artigo elaborado a partir da dissertação de Mestrado do autor, intitulada: “O Processo de Urbanização e Impactos
Ambientais em Bacias Hidrográficas – O caso do igarapé Judia – Acre – Brasil”, defendida em 2005 junto ao PPG-
UFAC.
Fórum Internacional do Meio Ambiente - A conferência da Terra 821

Nessa perspectiva há que situar as atividades humanas no contexto devastador da natureza,


como sendo as principais modificadoras das relações ecossistêmicas. Tais mudanças podem
provocar rupturas no equilíbrio dos ecossistemas que promovem prejuízos incontroláveis e
irreversíveis, afetando até mesmo as possibilidades de sobrevivência da espécie humana
(MAGALHÃES, 1982).
O caso da poluição dos mananciais, que outrora eram considerados rurais e hoje são
considerados urbanos, em razão do processo de urbanização, reflete bem este questionamento, uma
vez que a adição e o depósito de elementos químicos, advindos do mau acondicionamento do lixo e
das mais variadas fontes de poluição, são uma realidade, paradoxalmente, na região Amazônica,
alterando o comportamento do ecossistema, ocasionando impactos ambientais negativos.
É de profunda preocupação estudar meios para conter as agressões ambientais no tocante
ao uso racional dos recursos hídricos, pensando sempre num futuro harmônico entre homem versus
natureza. Neste compasso, a idéia de desenvolvimento sustentável estará sempre presente, a fim de
garantir a sobrevivência das espécies no futuro e definir uma política sócio-econômica no presente
que não venha de forma alguma prejudicá-la.
Assim, considera-se como componente do desenvolvimento sustentável qualquer atividade
econômica que aumente o bem-estar social com a máxima quantidade de conservação de recursos e
mínima quantidade de degradação ambiental permitida dentro das limitações econômicas, sociais e
tecnológicas (GARAY e DIAS, 2001).
TAGNIN e MAGALHÃES (2001), analisando as questões sobre qualificação e nível de
renda aliada à expansão urbana e proteção dos mananciais na Região Metropolitana do Estado de
São Paulo, afirmam que nas experiências brasileiras de proteção aos mananciais, o enfrentamento
da expansão urbana mostrou-se desafiador, vez que se dispõe de recursos reduzidos para elevadas
demandas de baixa renda. Excetuando-se a cidade de Belo Horizonte, que impediu a ocupação e
reorientou o seu crescimento para longe dos mananciais, os demais casos brasileiros toleraram a
expansão urbana, sem observar que um grande contingente populacional estava se direcionando
para as áreas dos mananciais.
É com este entendimento que analisamos e propomos respostas e soluções condizentes
para esta realidade, tentando inserir o homem como parte integrante da natureza, levando-se em
consideração as transformações espaciais geradas e as causas desses impactos ambientais no igarapé
Judia (AC).

MATERIAIS E MÉTODOS
O igarapé Judia localiza-se a sudeste do município de Rio Branco, apresentando uma de
suas nascentes principais na zona urbana do município de Senador Guiomard/AC e sua
desembocadura no bairro 06 de Agosto, segundo distrito da cidade de Rio Branco. A nascente
principal está localizada entre as coordenadas 10º9’14” S e 67º44’14” W e a desembocadura entre
as coordenadas de 9º58’24” S e 67º47’30” W (figura 1).
O referido igarapé constitui o principal afluente da margem direita do rio Acre, recebendo,
ao longo de seu curso de 36 km, carga de sedimentos dos subafluentes: Buriti, Almoço, Alagado e
Capitão Ciríaco, além de outros pequenos contribuintes de pequena expressão
Na zona urbana do município de Rio Branco, após percorrer um trecho na zona rural, o
igarapé Judia abrange 05 (cinco) bairros populacionais, quais sejam: Santa Inês, Mauri Sérgio, Belo
Jardim, Seis de Agosto e Santa Terezinha.
Na figura 1, podemos observar a localização da bacia do Igarapé Judia em pequena escala
no Estado do Acre e em grande escala no município de Rio Branco (AC) e Senador Guiomard
(AC).
Fórum Internacional do Meio Ambiente - A conferência da Terra 822

A unidade de estudo abrangida para esta temática foi a área urbana da cidade de Rio
Branco (AC), constituindo-se nos bairros já citados, compreendendo a Área de Preservação
Permanente (APP) do igarapé Judia.
Para a análise das condições sócio-econômicas e ambientais dos habitantes da área, foi
considerada uma população amostral de 50 (cinqüenta) moradores, correspondente a 50 (cinqüenta)
imóveis, sendo levantadas questões sócio-econômicas e ambientais, bem como a relação dos
moradores com o curso d’água estudado, no tocante aos usos múltiplos da água.
Para a realização das entrevistas, convencionou-se a visita de 1 (um) imóvel intercalando-
se a cada 3 (três) imóveis, em cada margem do igarapé. Desse modo, foram realizadas 50
(cinqüenta) entrevistas de um universo de 194 (cento e noventa e quatro) imóveis, representando
25,8% do total, percentual este que consideramos representativo para o estudo sócio-econômico dos
habitantes da área.
A coleta de dados correspondeu a uma distância de 100 (cem) metros de ambas as margens
do manancial, de acordo com o disposto no art. 2º, alínea “a”, nº3, da Lei nº4771/65 (Código
Florestal brasileiro).
A pesquisa de campo neste sentido foi do tipo quantitativo-descritivo, com visitas feitas in
loco coletando dados com questionários específicos, através de entrevistas padronizadas com
perguntas diretas que englobaram, entre outros aspectos, condições sanitárias, moradia, usos
múltiplos do curso d’água e origem dos habitantes, conforme método proposto por LAKATOS e
MARCONI (1991).

RESULTADOS E DISCUSSÃO
A pesquisa realizada possibilitou diagnosticar a mudança espacial e a relação conflituosa
entre homem versus natureza, considerando-se que a organização do espaço e a sua transformação
são resultados do equilíbrio dos fatores de dispersão e concentração em um dado momento da
história desse espaço.
No caso em tela, a concentração populacional na área urbana de Rio Branco (AC) traz
consigo vários problemas ambientais, dentre os quais os desequilíbrios ecológicos advindos da má
ocupação do espaço. No gráfico 1, podemos observar o comportamento do crescimento
populacional total, urbano e rural de Rio Branco (AC), desde 1970 e a perspectiva de aumento até
2030.
Fórum Internacional do Meio Ambiente - A conferência da Terra 823

O que ocorre na área em estudo, em relação a ocupação desordenada, tem raízes no


processo migratório campo-cidade, que levou a população da zona rural a procurar melhores
condições de vida na cidade e, através da prática do desmatamento, iniciaram-se as invasões de
áreas rurais próximas da cidade, culminando com o surgimento dos bairros periféricos e a ocupação
de fundos de vales que constituem áreas de preservação permanentes, legalmente proibidas para
ocupação pelo Código Florestal brasileiro. Observe o gráfico 2 abaixo, sobre a procedência dos
habitantes da área de estudo, que vem confirmar que a maioria (52%) são oriundos da zona rural.

Em virtude disso, a saída de uma população expropriada da zona rural para os centros
urbanos contribuiu para a concentração dessa massa populacional em uns poucos pontos
privilegiados do espaço, tendo como alvo principal as margens dos igarapés, que ao longo do
tempo, em conseqüência do processo de desmatamento e urbanização, tornaram-se praticamente
igarapés urbanos com diversas moradias situadas às suas margens, fornecendo aos habitantes água e
comida, através da pesca de subsistência.
Para que haja a racionalização no uso dos recursos hídricos, faz-se necessário impor um
mecanismo de gestão da bacia hidrográfica do igarapé Judia, onde estará presente a prática do
manejo ambiental, impedindo a sua destruição. Não restam dúvidas que, com o aumento
populacional, as necessidades também aumentarão e surgirão novos padrões de consumo,
juntamente com enormes problemas ambientais relacionados, principalmente, à poluição.
Fórum Internacional do Meio Ambiente - A conferência da Terra 824

A urbanização exerce um papel duplicador em seus efeitos, ao mesmo tempo em que


promove o bem-estar das pessoas originadas da zona rural, traz consigo o problema dos impactos
ambientais ocasionados, principalmente, pela falta de informação necessária à preservação e
conservação dos recursos naturais.
Como exemplo disso, observe o gráfico 3 abaixo que trata da disposição do lixo nas
residências pesquisadas.

Há uma profunda desinformação da população quanto ao armazenamento de disposição de


resíduos, contribuindo para que esses resíduos sejam depositados em maior quantidade no leito do
manancial (29,2%) do que mesmo na rua (16,6%). A queima representa também uma preocupação
com a qualidade do ar, culminando com as campanhas contra as queimadas urbanas, promovidas
pela Prefeitura Municipal de Rio Branco.
Mas, que significado pode ter a idéia de ecossistema, de estabilidade biológica ou de
contaminação ambiental para as imensas massas analfabetas do mundo subdesenvolvido, cuja luta
cotidiana e desigual é por sua própria sobrevivência em condições precárias e absolutamente hostis?
Na realidade necessitamos não só de uma conscientização ecológica da população, mas, também, de
uma solução aos problemas sócio-econômicos que visem uma vida digna para as populações
carentes, principalmente, as do meio rural que migram para as cidades em busca de sobrevivência,
educando-os e alocando-os em áreas anteriormente dotadas de um planejamento adequado, o que
não foi observado até então na cidade de Rio Branco (AC), com relação à ocupação das margens
dos mananciais de água (BURSZTYN, 1994). Observe o gráfico 4 abaixo, sobre o índice de
alfabetização dos habitantes pesquisados.
Fórum Internacional do Meio Ambiente - A conferência da Terra 825

Resta claro que o processo de transição de uma população rural para urbana, configurando-
se no processo de urbanização vigente, é uma das principais responsáveis pelos impactos ambientais
relacionados aos recursos hídricos, carecendo de planejamento e execução de ações a curto, médio e
longo prazo para mudar esta realidade.
Além dessas variáveis, observou-se que o igarapé Judia transporta grande quantidade de
material em suspensão e dissolvido, tendo origem no processo erosivo das suas margens, bem
como, da grande quantidade de resíduos domiciliares que são lançados em seu curso ao longo de
sua extensão, dada a ocupação humana que se apresenta em sua planície de inundação.
Tal ocupação é registrada já na sua nascente principal no município de Senador Guiomard
(AC), sem haver a preocupação de conservá-la ou preservá-la, apresentando uma área já bastante
antropizada e degradada, inclusive, fazendo fundos com grandes chácaras que fazem, no início do
igarapé Judia, barragens para a formação de açudes, conforme se observa na figura 2, alterando
bruscamente o ciclo de vida do igarapé.

As barragens já fazem parte do cotidiano do Igarapé


Judia e, no caso acima, faz fundos com grandes
chácaras que estão situadas no curso superior,
próximas à sua nascente principal no centro da
cidade de Senador Guiomard/AC, recebendo dejetos
domiciliares, alterando significativamente o ciclo de
vida do Igarapé e diminuindo a vazão nos cursos
inferiores.

Foto/Arquivo: autor – Janeiro/2004

FIGURA 2 – Açude formado no leito do Igarapé Judia – Senador Guiomard/AC

No meio curso do igarapé Judia, é notável a presença de propriedades que margeiam esse
manancial, com unidades habitacionais construídas, cujos dejetos são carreados para o leito do
igarapé.
A ocupação desenfreada das margens e o uso da terra na área de abrangência desse
manancial estão sobremaneira afetando a cobertura vegetal original da área uma vez que, para
Fórum Internacional do Meio Ambiente - A conferência da Terra 826

plantar, os moradores dessas localidades necessitam desmatar e, posteriormente, proceder à queima


da vegetação como de costume nessa região.
Aliado a isso, apresenta-se ao longo do trecho que compreende o igarapé, a prática da
criação de bovinos que trazem conseqüências desastrosas ocasionando a degradação do solo e
conseqüentes processos erosivos das margens do igarapé, dado ao intenso pisoteio do gado (figura
3).

Com a retirada da mata ciliar para


a plantação de capim e criação
bovina, o Igarapé Judia sofre com
o assoreamento de seu leito dada a
erosão das margens em
conseqüência do pisoteio do gado
que, além de compactar o solo e
frear o crescimento natural da
vegetação faz com que a erosão
ocorra frequentemente.
Foto/Arquivo: autor/2004

FIGURA 3 – A prática da criação de bovinos as margens do igarapé Judia

Na parte que compreende o curso inferior do igarapé Judia, a problemática é ainda mais
dramática, uma vez que esta área é receptora de toda a carga poluidora que esse manancial recebe
ao longo de seu curso. Ali, a poluição torna-se mais evidente, em razão do alto grau de urbanização
na área, apresentando residências que estão situadas na margem do igarapé, com o despejo in
natura de esgoto e lixo, ameaçando de extinção a vida existente nesse manancial (figura 4).

Igarapé Judia A canalização de esgotos domésticos e a


retirada da mata ciliar, já no curso inferior do
igarapé Judia, é realizada sem precedentes. O
Tubo de Esgoto principal motivo dessa ocorrência é a falta de
implantação de infra-estrutura nos bairros
que abrangem o igarapé aliada à falta de
fiscalização do poder público.

Foto/Arquivo: autor – Janeiro/2004

FIGURA 4 – Canalização de esgoto doméstico para o leito do igarapé Judia

Em Rio Branco (AC), o igarapé Judia recebe a maior carga de poluentes devido as
construções em sua planície de inundação e o despejo de dejetos domiciliares cotidianamente
observados. Com isso, tanto a vida do igarapé está ameaçada, como também a vida dos próprios
habitantes dessas áreas que utilizam a água do igarapé, seja para beber, lavar, tomar banho ou para
práticas agrícolas de subsistência.
Torna-se claramente visível o descaso com que é tratado o Igarapé Judia pelos habitantes
da área, evidenciando nos dados acima que a degradação ambiental dos mananciais, não só na
cidade de Rio Branco como também nos grandes centros do País, é provocada pela dissociação
sociedade versus natureza e cidade versus natureza, culminando com os conflitos e impactos
ambientais que ocorrem nestas áreas, tais como:
• ausência ou deficiência nos serviços de coleta e tratamento de resíduos sólidos e líquidos;
• concentração da degradação dos recursos ambientais, principalmente a poluição do ar, solo e
das águas; ocupação de áreas de risco por diversas atividades humanas;
Fórum Internacional do Meio Ambiente - A conferência da Terra 827

• arruamento e pavimentação potencializando processos erosivos, com ravinas e voçorocas


instalando-se em ruas e nos fundos de vales, principalmente nas periferias pobres;
• cursos d’água e fundos de vale transformados em depósitos de lixo, escoadouros de esgotos e
locais de residências precárias;
• assoreamento dos cursos d’água;
• disseminação de doenças infecto-contagiosas provocadas pela degradação do meio ambiente;
e
• alienação da população pobre sobre a origem e o destino das águas que abastecem suas
moradias (LEAL e HERMANN, 1999).

CONSIDERAÇÕES FINAIS E RECOMENDAÇÕES


Como explicitado ao longo do texto, o igarapé Judia (AC) apresenta vários problemas de
ordem estrutural devido ao adensamento populacional nesta região, carecendo de medidas
corretivas e punitivas para evitar que outras áreas sejam também afetadas pelo fenômeno da
urbanização.
Como fundamento nas idéias apresentadas, remetemo-nos ao aumento significativo dos
índices populacionais como fator de transformação das condições ambientais até então observados
no Estado do Acre e, em especial, nos municípios de Rio Branco (AC) e Senador Guiomard (AC).
Neste toar, apresentamos uma problemática atual nas médias e grandes cidades do País e
que, sem exclusão, hoje é motivo de preocupação também na cidade de Rio Branco (AC) – a
questão da urbanização e a degradação dos mananciais de água -, obtendo como estudo de caso o
igarapé Judia, que vem apresentando, ao longo de quatro décadas, constante ocupação e
urbanização de suas margens, exercendo pressão negativa sobre a qualidade ambiental dessa região.
Através do levantamento sócio-econômico, realizado com os habitantes da área, constatou-
se que as condições financeiras de uma vasta camada populacional aliada às ineficientes políticas
públicas de habitação, evidenciam a ocupação de áreas inóspitas à moradia na cidade.
Neste sentido, ao ocupar essas áreas, a grande massa populacional ocasiona um dano
duplo. Primeiro porque há um dano ambiental quando direciona toda carga de esgoto doméstico in
natura e grande parte do lixo produzido para o leito do igarapé Judia e, segundo, quando o resultado
da primeira prática atua sobre a saúde da própria população que faz uso daquele manancial
diariamente ocasionando, assim, um dano social.
A competição pelo uso diversificado ocasionou o aumento da degradação dos recursos
hídricos em Rio Branco (AC), através da deposição de lixo e emissão in natura de esgotos não
tratados direcionados aos mananciais de água.
Como forma de amenizar a pressão humana exercida sobre aquele manancial, sugere-se
algumas medidas que deverão ser tomadas a curto, médio e longo prazo, no intuito, também, de
melhorar a qualidade ambiental daquela região, a saber:

Curto Prazo
Proceder, de início, uma ampla campanha educacional sobre a importância do igarapé para
os habitantes da cidade.
Recomenda-se a desobstrução de pontos que se encontram com entulhos (lixo), bem como
a retirada de cercas e unidades sanitárias (latrinas), presentes nas margens do igarapé;

Médio Prazo
Reorientar a expansão urbana para fora da área dos mananciais, visando a sua proteção e
conservação;
Proceder ao cumprimento da Lei de Uso e Parcelamento do Solo Urbano de modo a conter
a invasão de áreas que fazem parte da APP da Bacia Hidrográfica do igarapé Judia (AC).

Longo Prazo
Fórum Internacional do Meio Ambiente - A conferência da Terra 828

Proceder com a possível desocupação e isolamento da área que, legalmente, faz parte da
APP, fundamentando-se no Código Florestal brasileiro;
Difundir uma Política de Reflorestamento para a totalidade da Bacia do igarapé Judia
(AC).
Com o diagnóstico dos impactos ambientais daquela área, fica evidente que a preocupação
para as práticas de conservação e preservação dos cursos d’água que fazem parte da imensa bacia
Amazônica deve ser quotidiana, carecendo de ações de educação ambiental que vise, acima de tudo,
cessar a destruição dos ecossistemas aquáticos.

REFERÊNCIAS BIBLIOGRÁFICAS
BRASIL, República Federativa do. Lei Federal nº4.771/65, institui o Código Florestal brasileiro,
1965.
BURSZTYN, M. Para Pensar o Desenvolvimento Sustentável. São Paulo: brasiliense, 2ª ed. 1994.
FUNDAÇÃO NACIONAL DE SAÚDE – FUNASA. Quantitativo Populacional. Rio Branco:
CCGE, 2003.
GARAY, I. E. G.; DIAS, B. F. S. Conservação da Biodiversidade em Ecossistemas Tropicais:
Avanços conceituais e revisão de novas metodologias de avaliação e monitoramento. Petrópolis:
Vozes, 2001.
INSTITUTO BRASILEIRO DE GEOGRAFIA E ESTATÍSTICA - IBGE. Censo Demográfico. Rio
de Janeiro: IBGE, 1970.
_____. Censo Agropecuário. Rio de Janeiro: IBGE, 1996.
_____. Censo Demográfico (Dados Preliminares). Rio de Janeiro: IBGE, 2003.
_____. Censo Demográfico. Rio de Janeiro: IBGE, 1980.
_____. Censo Demográfico. Rio de Janeiro: IBGE, 1990.
_____. Censo Demográfico. Rio de Janeiro: IBGE, 2000.
LAKATOS, E. M.; MARCONI, M. de A. Fundamentos de Metodologia Científica. São Paulo:
Atlas, 1991.
MAGALHÃES, J. P. Recursos Naturais, Meio Ambiente e sua Defesa no Direito Brasileiro. Rio de
Janeiro: FGV, 1982.
TAGNIN, R. A.; MAGALHÃES, E. de W. O Tratamento da Expansão Urbana na Proteção aos
Mananciais – O Caso da Região Metropolitana de São Paulo. São Paulo: EPUSP, 2001.
Fórum Internacional do Meio Ambiente - A conferência da Terra 829

DINÂMICA FLUVIAL DO RIO ACRE: TRANSFORMAÇÕES DA PAISAGEM E


IMPACTOS A PARTIR DA MINERAÇÃO DE AREIA110

Edílson Silva de ARAÚJO


Licenciado em Geografia pela Universidade Federal do Acre – UFAC.
Secretaria de Estado de Educação – Departamento de Ensino Rural. Rio Branco-AC. edilsonaraujo_geo@yahoo.com.br
Waldemir Lima dos SANTOS
Professor do Departamento de Geografia da Universidade Federal do Acre – UFAC.
Universidade Federal do Acre - Campus Universitário Reitor Aulio Gelio Alves de Souza - Rodovia BR 364, nº 6637
(Km 04) – Distrito Industrial - CEP: 69915-900 - Rio Branco – AC. waldemir_geo@yahoo.com.br

RESUMO
Este trabalho tem por finalidade mostrar como esta sendo degradada às margens do Rio
Acre (afluente da margem esquerda do rio Purus), em razão das dragas que atuam em Rio Branco,
bem como contribuir para tomadas de decisões dos gestores públicos ligados a questão ambiental,
no sentido de empreender medidas que resultem na preservação das margens do referido manancial.
A verificação in loco compreendeu a metodologia adotada para este trabalho, que foi desenvolvido
a partir de expedições a campo, como parte das atividades práticas das disciplinas de
Geomorfologia e Hidrografia, ambas do curso de Geografia da Universidade Federal do Acre.
Posteriormente às expedições, analisou-se em gabinete as fotografias convencionais tomadas nas
áreas em estudo. A partir das análises finais, restou comprovado a ocupação inadequada das
margens do rio Acre, culminando com a fragmentação de sua mata ciliar, evolução de talude, em
razão da má adequação da tubulação utilizada, bem como a compactação do solo com uso de
máquinas pesadas, resultando no intenso processo erosivo das margens e aumentando,
consideravelmente, a quantidade sedimentos em suspensão.
Palavras-chave: Exploração mineral. Impactos ambientais. Rio Acre.

ABSTRACT
This work has for purpose to show as this being degraded to the edges of the Acre River, in
reason of drags them that they act in Rio Branco, as well as contributing for taking of decisions of
on public managers the ambient question, in the direction to undertake measured that results in the
preservation of the edges of the flowing related one. The verification in lease understood the
methodology adopted for this work, through the conventional photograph taking and posterior
analysis of cabinet. From the final analyses, it remained proven the inadequate occupation of the
edges of the river Acre, culminating with the spalling of its ciliar bush, slope evolution, in reason of
the bad adequacy of the used tubing, as well as the compacting of the ground with use of weighed
machines, resulting in the intense erosive process of the edges and increasing the amount sediments
in suspension.
Key-words: Mineral exploration. Ambient impacts. River Acre.

INTRODUÇÃO
O Rio Acre, tem sido de vital importância para as comunidades que residem, não só na
cidade de Rio Branco, mas também nos demais municípios que compõem as regionais do alto e
baixo Acre, ora localizados às suas margens. Tal manancial é fundamentalmente indispensável, uma
vez que além de favorecer ao abastecimento de água das cidades para fins diversos inclui também,
dentre outros usos, a utilização como via de transporte tanto para pessoas, como para o escoamento
da produção ribeirinha. Ademais, é utilizado para a pesca, contribuindo na obtenção de alimento; o
uso do entorno de suas margens para o cultivo da lavoura branca; e pastagens para a criação de
alguns poucos animais, para a subsistência.
No entanto, é preocupante a forma como vem se estabelecendo a ocupação humana nas
margens desse rio, no que se refere principalmente à formação de bairros periféricos nas cidades
acreanas, em especial em Rio Branco. Paralelamente outros fatores têm contribuído com uma gama
110
Artigo elaborado a partir de expedições a campo, nas disciplinas curriculares de Hidrografia e Geomorfologia.
Fórum Internacional do Meio Ambiente - A conferência da Terra 830

de impactos ambientais de efeitos negativos de grandes proporções sobre o referido manancial em


conseqüência do uso que se faz. Assim pode-se constatar que os fatores de degradação do rio Acre,
variam em suas origens, apresentando desde o lançamento de esgoto in natura no seu leito até
servindo como depósito de lixo doméstico e industrial (pó- de- serra e restos de madeira de
indústrias de beneficiamento de madeira – serrarias), passando pela construção de fossas negras em
seus terraços e a edificação de moradias (tipo palafitas) em suas planícies de inundação.
Estes fatos geram graves problemas ambientais e sociais, especialmente durante o período
chuvoso, quando o nível da água se eleva inundando áreas que são ocupadas por ribeirinhos, tanto
na zona rural, quanto na zona urbana, neste último ocasionando elevados prejuízos econômicos e
sociais para as famílias.
A retirada do material sedimentado em seu leito - em sua maioria constituída de areia – é
realizada, em muitos casos, de forma clandestina, sem amparo nos dispositivos ambientais,
representando passivos ambientais que, entre outros danos ambientais, implicam no favorecimento
do assoreamento do rio.
Por estas razões, a atividade da extração de areia do leito do rio Acre constitui a temática
para a elaboração deste trabalho, quando foram observados os impactos ambientais oriundos dessa
atividade econômica, de sua complexidade, uso tecnológico e ritmo de produção. A dinâmica desse
tipo de atividade tem sido investigada por vários estudiosos e, nesse sentido, entendemos ser de
fundamental importância proceder a uma continuidade de tais estudos, no sentido de uma análise
que possa traduzir o ritmo e os efeitos decorrentes dessa atividade produtiva em especial no
município de Rio Branco.
Deste modo, este artigo científico tem por objetivo abordar como vêm sendo utilizadas as
margens do rio Acre no perímetro urbano de Rio Branco, levando em conta os riscos decorrentes do
uso inadequado das margens em razão das atividades das dragas, além de tentar identificar os níveis
de comprometimento das margens do rio Acre do ponto de vista estrutural e ambiental.

MATERIAIS E MÉTODOS
A área de estudo compreende as áreas à montante do rio Acre, no trecho que abrange o
sítio urbano de Rio Branco. Procedeu-se uma ida a campo para reconhecimento da área a ser
pesquisada, onde foi diagnosticado, ao longo do trajeto, as diversas agressões ao meio natural e as
atividades de extração mineral (areia) no leito do rio Acre.
Após, realizou-se uma discussão entre a equipe no intuito de proceder a uma filtragem do
que foi coletado no campo, notadamente quanto à análise das tomadas fotográficas.
O levantamento bibliográfico constituiu etapa pré e pós-campo, fundamentando-nos quanto
aos objetivos a serem atingidos e as conclusões que nortearam a confecção do relatório final.
Esta fase da pesquisa foi de fundamental importância para o trabalho de campo, com visita
as áreas de atuação de uma amostragem de três dragas, do universo de dezesseis licenciadas pelo
IMAC para esta atividade, que atuam na extração mineral de areia no leito do rio Acre, no
perímetro urbano e suburbano de Rio Branco.
Com a visita as áreas verificaram-se e documentaram-se através de fotografias digitais os
locais onde as dragas estão localizadas, que vão desde as áreas bastante povoadas de Rio Branco,
como por exemplo, a rua campo novo no bairro Airton Senna, até as que estão localizadas em áreas
mais afastadas da cidade a exemplo a que atua no bairro do Amapá a margem direita do rio Acre
próximo à terceira ponte no município de Rio Branco.

ASPECTOS GEOAMBIENTAIS DA ÁREA DE ESTUDO


A geologia acreana é constituída de bacia sedimentar perfazendo uma área de 230.000 km²
(ZEE 1ª fase vol.1 p. 17), formada por várias formações geológicas que vão desde o pré-cambriano
até o último período do cenozóico.
Entretanto, o foco deste trabalho está direcionado para as formações Solimões e as
formações holocênicas presentes na área de estudo, os sedimentos da formação Solimões, que
datam do plioceno – pleistoceno, afloram ao longo dos rios, em recortes de estradas nos
Fórum Internacional do Meio Ambiente - A conferência da Terra 831

interflúrvios. Na sua maior parte predomina rochas argilosas com concreções carbonáticas e
gipsíferas (MAIA 2003).
Ainda de acordo com MAIA (2003), a formação Solimões abrange mais de 80% do Estado
do Acre, cobrindo quase toda região interfluvial, com exceção do extremo oeste do Estado.
Além da formação Solimões, temos também inserido neste estudo a formação mais
recente, presente nas planícies e em parte dos terraços fluviais do rio Acre, trata-se dos aluviões
holocênicos, constituídos de sedimentos de rochas incosolidados. Para ACCORSI (2001), esta
conseqüência é quase totalmente dominada pelos sedimentos resultantes da dinâmica fluvial que
consolida a formação de depósito aluvionário constituídos por areias finas, silte e argilas.
No que concerne ao relevo da área de estudo, identificamos os terraços fluviais superiores
oriundos principalmente da formação Solimões, apresentando formação mais resistente. No entanto,
não há atividade mineradora nas margens que são constituídas por esses terraços, devido à
topografia do relevo que dificulta a atividade extrativa.
Por outro lado, a atividade é desenvolvida principalmente nos terraços inferiores e com
menor freqüência nos intermediários. Todavia, os terraços inferiores como já foi citado
anteriormente são constituídos de materiais inconsolidados (areia, silte e argila), denominadas de
aluviões holocênicos que estão presentes também nas planícies de inundações do rio Acre. Esta é a
formação geológica mais recente, comandada pela dinâmica natural do manancial em suas cheias e
vazantes que ocorrem sazonalmente.
De acordo com ACCORSI (2001), os solos predominantes nas planícies e terraços fluviais
são gleissolos húmicos, gleissolos pouco húmicos e os neossolos flúvicos. Estes solos jovens e
férteis oriundos da sedimentação de material aluvial são bastante aproveitados pelos ribeirinhos no
cultivo da lavoura branca temporária.
O clima reinante na área de estudo se caracteriza como equatorial quente e úmido, com
duas estações distintas, inverno e verão, apresentando um verão com altos índices pluviométricos ao
contrário do inverno, sendo caracterizados como verão e inverno “amazônicos”.
Quanto à cobertura vegetal para ACCORSI (2001), nesta área predomina a Floresta
Ombrófila Aberta e Floresta Ombrófila Densa. Dentro destes dois grandes domínios, coexiste uma
grande densidade de formações vegetais, determinado pela qualidade do solo, sendo verificado
também áreas de matas de floresta com bambu, floresta aberta com palmeiras, e gramíneas
arbustivas de praias.

A DINÂMICA FLUVIAL E A EXTRAÇÃO MINERAL DE AREIA


O rio Acre é um sistema aberto e complexo e, por isso, o mesmo é analisado a partir de sua
dinâmica natural, resultante do feed back referente a intensa troca de energia entre os demais
elementos e fatores da natureza já explicitados acima. É possível, a partir desta análise, constatar
algumas situações importantes que devem ser levadas ao conhecimento da comunidade cientifica,
bem como da sociedade civil, considerando a importância do manancial em estudo.
Neste sentido, foi constatado o manejo inadequado da atividade de extração de areia, tanto
no que se refere à forma utilizada, constituída da extração no leito do rio, bem como à degradação a
partir do uso indiscriminado das margens.
O ritmo de exploração é, na maioria das vezes, intensivo, onde as dragas que usam o
método de retirada de areia de forma irregular fazendo a sucção muito próxima da margem do rio, o
que provoca um espaço mais profundo entre a margem e o talvegue, fato este que provoca, em
razão da força gravitacional e a inconsolidação do material em contato, um intenso processo erosivo
das margens (fig. 1).
Fórum Internacional do Meio Ambiente - A conferência da Terra 832

Figura 1 - Draga operando junto à margem do rio Acre. Foto: Edilson Araújo/ 2007

Observa-se o descaso com as condições ambientais, através da operação inadequada que,


posteriormente, ocasionará processos erosivos pela ação gravitacional.
Segundo ACCORSI (2001), outro problema ligado à má aplicação deste método de
extração está no retorno da água que é retirada juntamente com areia à margem, o que provoca,
também, erosão e, conseqüentemente, o desbarrancamento.
Paralelamente a esta, tem-se ainda o cancho (poço de decantação da polpa), localizado fora
dos padrões permitidos pela legislação ambiental. De acordo com as normas ambientais, o topo do
terraço teria que ter cerca de 20 metros de largura, e daí ser construído a caixa de decantação, fato
este que não foi constatado durante o trabalho de campo, onde foram constatadas distâncias de até 4
metros do topo do terraço, conforme se observa na figura 2.

Figura 2 - Poços de decantação construído a aproximadamente 3m do talude e vasilhame


de óleo combustível usado pelas dragas. Foto: Edílson Araújo/2007.

Como se observa, a forma inadequada na operação das dragas traz sérios prejuízos ao
ambiente, que vão desde falta de fiscalização quanto a manter as distâncias dispostas em lei, até o
abandono de material inorgânico (vasilhames) à cargo da autodepuração pela natureza, poluindo
solo e água.
Algumas dragas se localizam em bairros bastante povoados operando inclusive em espaço
bastante reduzido e com isso potencializando ainda mais os impactos ambientais negativos e
diminuindo a qualidade de vida da população de entorno. A fragmentação da mata ciliar ou a sua
total retirada, também constitui prática não observada pelo poder público no tocante a fiscalização.
Ao longo das observações em campo, constatou-se esta prática, considerada como crime ambiental
contra as Áreas de Preservação Permanente, legalmente protegidas pela legislação ambiental
(Resolução CONAMA nº 303/2002) (fig. 3).
Fórum Internacional do Meio Ambiente - A conferência da Terra 833

Figura 3 – Planície de inundação e mata ciliar degradada em razão da operação de equipamentos


pesados (tratores e caminhões) na extração de areia.

Foto: Francisco Elionardo – março/2007.

Outros fatores de grande relevância a esse respeito, é a escavação do material


inconsolidado na planície de inundação (aluviões holocênicos), principalmente para a construção
dos poços de decantação, aliados ao intenso trânsito de máquinas pesadas – tratores e caminhões,
impactando e compactando ainda mais o solo, levando-o ao processo erosivo em bloco. Cabe
salientar que, isso ocorre numa proximidade reduzida, considerando a altura, inclinação, vegetação
e os materiais constituintes dos terraços (fig. 4 –A e B).

Figura 4 – Poço de decantação construído as margens do rio Acre e utilização de máquinas


pesadas no trato da areia extraída. Foto: Edílson Araújo – março/2007.

Amostragem de fotografias comprovando in loco o manejo inadequado das margens do


Rio Acre, no município de Rio Branco – AC. Na figura “A”, demonstra-se um poço de decantação
de areia extraída do rio Acre. Na figura “B”, visualiza-se o uso de máquinas pesadas, ocasionando a
compactação do solo e posterior processo erosivo das margens do rio.
Em síntese, de acordo com as análises realizadas pelo grupo de pesquisa é factual que as
margens do rio Acre, não estão sendo manejadas adequadamente do ponto de vista ambiental, social
e economicamente, como requer a ideologia do desenvolvimento sustentável.
No que compete à legislação ambiental, quanto a atividade de extração mineral de areia no
leito do rio Acre, de acordo com o CONAMA (Conselho Nacional de Meio Ambiente) através da
Resolução nº 237 de 19 de dezembro de 1997, corroborada pela lei de crimes ambientais nº
9605/98, esta se insere no universo das atividades consideradas efetivas ou de significativo
potencial degradador e poluidor do meio ambiente, por isso, práticas de fiscalização e ajustamento
devem ser constantes na região, melhorando as condições ambientais quanto ao uso e utilização do
rio Acre.
Fórum Internacional do Meio Ambiente - A conferência da Terra 834

CONSIDERAÇÕES FINAIS E APONTAMENTOS


Diante do exposto neste trabalho, constatou-se de maneira sistematizada que as margens do
rio Acre estão sendo utilizadas indiscriminadamente, havendo um comprometimento estrutural e
estético da paisagem, ocasionando irreversíveis ao meio ambiente. Esta potencial degradação ocorre
devido as mais diversas atividades desenvolvidas às margens do manancial, que são uma
conseqüência da ocupação humana de forma desordenada, fato marcante no município de Rio
Branco (AC). A partir das observações em campo, foi diagnosticado o manejo inadequado das
margens do referido rio pela atividade das dragas, notadamente na extração mineral de areia.
Não há fiscalização eficiente e, por conseguinte, aplicação das medidas que discipline o
controle de forma satisfatória às atividades de dragagem no município de Rio Branco (AC), fazendo
com que, tal atividade extrativa não ocorra de maneira satisfatória, ficando o ambiente sufocado por
um modo capitalista que visa, acima de tudo, lucro e acumulação de riqueza com rapidez, não
levando em consideração o meio ambiente e o bem estar das comunidades vivas, principalmente a
sua. Sendo assim, não atende de forma nenhuma o que preconiza o desenvolvimento sustentável
algo atualmente tão difundido e propalado, principalmente, para a Amazônia.
Sugerem-se, dessa forma, a elaboração de um projeto de recuperação vegetal das margens
do rio Acre, no trecho abordado, dando preferências as espécies da região, estimulando a
recuperação dos ambientes degradados e a ocupação pela fauna regional.
O zoneamento do perfil longitudinal e latitudinal do rio Acre para atividade de mineração
de areia, se faz necessário, levando em conta as particularidades do quadro natural, de maneira a
conter os prejuízos ambientais, diminuindo os riscos de contaminação e erosão das margens.

REFERÊNCIAS BIBLIOGRÁFICAS
ACCORSI, Osmar José. Mineração de Areia no Rio Acre e os Problemas Ambientais Associados:
Trecho da Área Urbana de Rio Branco/Ac. 2001. Dissertação (Mestrado em Geociências),
Universidade Estadual Paulista. Instituto de Geociências e Ciências Exatas, Campo de Rio Claro.
São Paulo. 2001.
ACRE (Estado). Secretaria de Estado de Ciência, Tecnologia e Meio Ambiente. Programa Estadual
de Zoneamento Ecológico-Econômico do Estado do Acre. Zoneamento Ecológico-econômico:
recursos naturais e meio ambiente – documento final. Rio Branco, 2000. v 1,116f.
CONSTITUIÇÃO FEDERAL. Artigo 225. 1988. Disponível em: < http:// www.
valeverde.org.br/html/pesq.php>. Acesso em: 23/02/2007.
GUERRA, Antônio Teixeira. Estudo Geográfico do Território do Acre. Ed. Integral – Brasília:
Senado Federal, 2004.
MAIA, Maria do Socorro Oliveira. Zoneamento Geotécnico do Sitio Urbano do Município de Rio
Branco/Ac e Seus Arredores, Para fins de Planejamento com Ênfase À Expansão Urbana, Através
do Sensoriamento Remoto. 2003. Dissertação (Mestrado em Geociências), Universidade Estadual
Paulista. Instituto de Geociências e Ciências Exatas, Campo de Rio Claro. São Paulo. 2003.
RESOLUÇÃO CONAMA Nº 237, de 19 de dezembro de 1997. Disponível em: < http://
www.lei.adv.br/237-97.htm>. Acesso em: 23/02/2007.
Fórum Internacional do Meio Ambiente - A conferência da Terra 835

CARACTERIZAÇÃO DA VULNERABILIDADE DOS AQÜÍFEROS LIVRES NO


MUNICÍPIO DE JOÃO PESSOA - PB

Leonardo Figueiredo de Meneses


Geógrafo; Mestre em Engenharia Urbana - UFPB, Av. Francisco Moura, 167 – apt 103 – João Pessoa-PB – CEP:
58.025-650 – lfmeneses@hotmail.com
Elaine Cristina Teixeira Pedrosa
Geógrafa; Mestranda em Engenharia Urbana - UFPB, Av. Francisco Moura, 167 – apt 103 – João Pessoa-PB – CEP:
58.025-650 - elaine.pedrosa@terra.com.br
Tarciso Cabral da Silva
Eng. Civil; Dr. Eng. Hidráulica; Prof. Titular UFPB – Campus I – João Pesoa – PB – CEP: 58.059-900 –
tarcisocabral@yahoo.com.br

RESUMO
Neste trabalho apresenta-se uma análise sobre a vulnerabilidade dos aqüíferos livres
presentes no município de João Pessoa/PB. A vulnerabilidade foi estimada com base na
metodologia do Índice DRASTIC, desenvolvido pela Agência de Proteção Ambiental Norte
Americana – USEPA, para a definição dos níveis de vulnerabilidade dos aqüíferos daquele país. Os
mapas de vulnerabilidade foram gerados através da utilização de um Sistema de Informações
Geográficas, que permitiu, ainda, a elaboração do mapa síntese da vulnerabilidade através de
álgebra de mapas. A análise dos mapas permitiu a verificação das regiões onde os aqüíferos livres
se apresentam mais vulneráveis no município. A vulnerabilidade apresentou-se em níveis
moderados em mais da metade do território do município. Os resultados obtidos devem servir como
uma ferramenta para o planejamento de ações de ordenamento do uso do solo visando a
conservação dos recursos hídricos subterrâneos.
Palavras-chave: águas subterrâneas; aqüíferos livres; vulnerabilidade de aqüíferos.

ABSTRACT
In this work is presented an analysis of the vulnerability of free aquifers in the county of
João Pessoa, PB, Brazil. The vulnerability WAS estimated based on the methodology of DRASTIC
Index, developed by the United States Environmental Protection Agency - USEPA, to define the
levels of vulnerability of aquifers that country. The maps of vulnerability were generated through
the use of a Geographic Information System, in which was produced the map summary of the
vulnerability through of map algebra. The analysis of the maps allowed the verification of the
regions where the free aquifers are presented most vulnerable in the county. The vulnerability
presents moderate level in more than half of the territory of the county. The results of this work can
serve as a tool for the planning land use to promote the conservation of groundwaterwater resources
underground.
Keywords: groundwater; free aquifers; aquifer vulnerability

INTRODUÇÃO
As cidades, ao longo de seu processo histórico de evolução, tem enfrentado problemas
cada vez mais complexos, seja pela excessiva concentração populacional, seja pela incapacidade
dos gestores em prover uma infra-estrutura compatível com as necessidades mínimas da população
ali residente.
A expansão territorial das cidades, quase sempre ocorrendo sem qualquer planejamento,
gera desequilíbrios nos ecossistemas naturais, implicando em alterações nos ciclos naturais que, por
sua vez, acabam por alterar a dinâmica do sistema terrestre. Um dos recursos naturais que mais
sofre os efeitos do caos urbano é a água. A disposição de resíduos sólidos a céu aberto, em terrenos
sem o menor tratamento para impedir a infiltração de elementos contaminantes, juntamente com o
lançamento de efluentes in natura nos cursos d’água, são os principais vilões urbanos a serem
combatidos para que seja possível manter a qualidade da água em níveis aceitáveis para o
abastecimento humano e manutenção do equilíbrio dos ecossistemas.
Fórum Internacional do Meio Ambiente - A conferência da Terra 836

A perda de qualidade das águas dos mananciais próximos aos centros urbanos acaba por
onerar a própria população dos centros urbanos, devido à necessidade de implementação de técnicas
de descontaminação da água ou por se tornar necessária à captação de água para abastecimento em
pontos cada vez mais distantes dos centros consumidores.
Uma alternativa que atualmente vem sendo bastante utilizada em diversas cidades para
complementar o abastecimento público é a captação de águas subterrâneas através de poços. Esta
alternativa tem como principal vantagem uma relativa proteção que as águas subterrâneas
apresentam por não estarem, na maioria das vezes, em contato direto com os produtos das
atividades humanas desenvolvidas em superfície.
Entretanto, apesar desta relativa proteção, a qualidade das águas subterrâneas pode ser
facilmente comprometida caso não seja observada a capacidade de suporte do meio que a comporta,
de modo que agentes contaminantes sejam introduzidos no ambiente subterrâneo. Pesquisas que
visem estabelecer os níveis de proteção dos aqüíferos devem ser desenvolvidas como etapa
primordial no processo de planejamento de atividades em superfície, como no caso dos
zoneamentos, de modo que seja mantido o equilíbrio entre desenvolvimento e sustentabilidade.
Uma das formas de se estabelecer o nível de proteção de um aqüífero é através do
mapeamento da vulnerabilidade do mesmo, de forma a que sejam determinadas as características
intrínsecas do aqüífero que mais influenciam em sua fragilidade ou proteção. Porém, são raros os
casos em que este tipo de estudo é realizado ou levado em consideração nos planos de
desenvolvimento das cidades, muitas vezes ficando tais estudos restritos aos ambientes acadêmicos.
Tal fato deve-se, possivelmente, ao desconhecimento desta ferramenta por parte dos gestores e pela
dificuldade muitas vezes encontrada na elaboração dos mesmos, devido à inexistência,
inconsistência ou incompatibilidade dos dados disponíveis e necessários ao mapeamento da
vulnerabilidade.
Neste contexto, buscou-se, com este trabalho, realizar a caracterização da vulnerabilidade
dos aqüíferos livres do município de João Pessoa, capital do Estado da Paraíba, através da utilização
de um modelo paramétrico que possibilita, além de uma apresentação numérica e qualitativa do
índice de vulnerabilidade das águas subterrâneas, a visualização do índice em forma de mapas,
propiciando um melhor entendimento da variação espacial da vulnerabilidade.
O município do João Pessoa localiza-se no extremo Leste do Estado da Paraíba, entre as
coordenadas 7º14’29” de Latitude Sul / 34º58’36” de Longitude Oeste e 7º03’18” de Latitude Sul /
34º47’36” de Longitude Oeste (Figura 1). Possui área total de, aproximadamente, 211 km2, e é o
município mais populoso do Estado, com população estimada em 674.762 habitantes (IBGE, 2000).
Até 1950 o abastecimento de água de toda a cidade era proveniente do açude do Buraquinho,
localizado na atual Mata do Buraquinho, em João Pessoa, entretanto, o crescimento da cidade e a
pressão ambiental sobre o Rio Jaguaribe, responsável pelo abastecimento do referido açude,
inviabilizaram o uso deste reservatório para o abastecimento da cidade. Atualmente, a água para o
abastecimento do município é proveniente dos reservatórios Gramame-Mamuaba e Marés,
localizados, respectivamente, nos municípios de Alhandra e João Pessoa.

Figura 1 – Localização da área de estudo


Fórum Internacional do Meio Ambiente - A conferência da Terra 837

Por se tratarem de sistemas baseados na captação de águas superficiais, ficam mais


expostos a possíveis contaminações e bastante dependentes do regime climático local e regional.
Existe na cidade, ainda, uma rede de poços profundos perfurados pela Companhia de Águas e
Esgoto do Estado da Paraíba – CAGEPA, que é utilizada para complementação do abastecimento
urbano.
Ainda que os poços utilizados pela companhia de águas sejam todos perfurados de modo a
captar água do aqüífero Beberibe, aqüífero este confinado/ semiconfinado, muitos poços
particulares são perfurados de modo a captar água apenas no aqüífero Barreiras, mais superficial
que o Beberibe e do tipo livre. Por suas características naturais, o aqüífero Barreiras apresenta-se
bem mais susceptível à contaminação que o Beberibe e, aliado a este fato, a perfuração de poços
não tem se baseado em um planejamento voltado à conservação das águas subterrâneas e, por vezes,
os procedimentos de manutenção de tais poços não obedecem aos padrões sanitários mínimos, o
que pode vir a comprometer a qualidade também do Beberibe devido à possibilidade de transmissão
de contaminantes de um aqüífero para o outro.
Justifica-se, assim, a elaboração de estudos do caráter como o que ora se apresenta, de
modo que seja possível gerar um conjunto de dados úteis ao planejamento territorial e dos recursos
naturais.

Mapeamento da vulnerabilidade de aqüíferos


Dentre os sistemas pesquisados para avaliação da vulnerabilidade de um aqüífero, optou-se
pela utilização do modelo DRASTIC (ALLER et al, 1985), por se tratar de um modelo paramétrico
e que possibilita a apresentação dos resultados de forma gráfica, através de mapas e não apenas em
índices numéricos. Segundo Tucci e Cabral (2003), o Índice DRASTIC é um dos modelos mais
utilizados no Brasil para a caracterização da vulnerabilidade de aqüíferos.
O modelo DRASTIC foi desenvolvido na década de 80 e, para sua eficaz aplicação deve-se
ter, como pressupostos, que o contaminante é introduzido à superfície do terreno e não diretamente
no aqüífero e que o mesmo se desloca com a mesma mobilidade da água, verticalmente, até
alcançar o aqüífero. O índice é calculado pelo somatório do produto dos valores relativos pelos
pesos de cada parâmetro, conforme apresentado na Equação 1.

Índice DRASTIC = DrDw+RrRw+ArAw+SrSw+TrTw+IrIw+CrCw (1)

Onde:
D = profundidade da zona não-saturada T = topografia
R = recarga do aqüífero I = material da zona não-saturada
A = material do aqüífero C = condutividade hidráulica
S = tipo de solo

Os valores indexados em “r” são relacionados às condições locais de cada parâmetro e


podem variar entre 1 e 10, sendo que, quanto maior o valor, maior a vulnerabilidade. Os valores
“w” correspondem à importância relativa de cada fator na quantificação da vulnerabilidade do
aqüífero, podendo variar entre 1 e 5. Quanto maior o índice DRASTIC, maior deverá ser a
vulnerabilidade do aqüífero à contaminação. Entretanto, segundo Kohnke (2002), um valor baixo
do índice não significa que não possa ocorrer contaminação, apenas que a mesma será menos
provável e menor que em outras áreas.
Uma vez definidos os valores relativos de cada fator e seus pesos, o índice pode ser
calculado e parte-se para a elaboração dos mapas de vulnerabilidade de cada um dos fatores. A
análise integrada da vulnerabilidade de cada um dos parâmetros possibilita o entendimento do grau
de influência de cada variável na vulnerabilidade geral do aqüífero, que é obtida, conforme visto na
Equação 01, através da soma das vulnerabilidades de cada um dos parâmetros.

Caracterização física da área de estudo


Fórum Internacional do Meio Ambiente - A conferência da Terra 838

O município de João Pessoa apresenta um clima quente e úmido, caracterizado por curtos
períodos de seca no verão, geralmente entre 1 e 3 meses, e chuva concentrada no outono e inverno
(meses de abril, maio e junho). O índice pluviométrico anual é da ordem de 1.700 mm (PARAÍBA,
1985), podendo oscilar de acordo com a variabilidade dos sistemas circulatórios, responsáveis por
transportar a umidade do oceano para o continente. As médias térmicas anuais ficam em torno de
25ºC, podendo variar entre os valores de médias de 28ºC e 23ºC, máxima e mínima,
respectivamente.
Os principais tipos de solos identificáveis na área de estudo são os Latossolos, ocorrentes
principalmente sobre os Tabuleiros Litorâneos; os Argissolos, situados em áreas de relevo pouco
mais acidentado, em geral nas encostas de colinas e morros; os Neossolos Quartzarênicos,
distribuídos nas faixas costeiras de praia; os Neossolos Fluvicos, distribuídos às margens dos cursos
d’água da região; e os Solos Indiscriminados de Mangue que, apesar de também se apresentarem ao
longo dos cursos d’água, fazem-se sentir apenas até onde se percebe a ação do fluxo e refluxo das
marés (TUMA, 2003).
Em relação à geologia, João Pessoa encontra-se inserida na Bacia Sedimentar Pernambuco-
Paraíba, constituída por uma seqüência relativamente pouco espessa de sedimentos e distribuída ao
longo da faixa litorânea do Estado da Paraíba e de parte do Estado de Pernambuco, podendo atingir
cerca de 40 km de largura.
A seqüência litoestratigráfica da Bacia Pernambuco-Paraíba, da base para o topo, na área
de estudo é caracterizada pelos depósitos sedimentares do Grupo Paraíba, pela Formação Barreiras
e pelos depósitos Quaternários. Para este estudo, o conjunto litológico mais importante é constituído
pela Formação Barreiras e pelos depósitos Quaternários, sobrepostos à referida Formação, uma vez
que é nestes sedimentos que se encontram os aqüíferos em análise (MENESES, 2007). Sendo
assim, cabem alguns comentários sobre tais depósitos.
Formação Barreiras: possui uma espessura aproximada de 70 a 80 metros e apresenta-se
aflorante em todo o litoral paraibano. A constituição básica desta Formação é de sedimentos areno-
argilosos, mal selecionados, de origem continental, depositado em um paleoclima semi-árido. Tal
constituição propicia o acúmulo de água em subsuperfície, nos espaços vazios entre os grãos da
rocha. A alternância entre paleoclimas quentes e úmidos propiciou a precipitação de elementos
pouco solúveis, como hidróxidos de ferro e de alumínio, que, por lixiviação, foram transportados
para níveis mais inferiores do solo, gerando camadas endurecidas em subsuperfície, o que dificulta,
em alguns casos, a infiltração de água para níveis mais profundos do terreno. A Formação Barreiras
ocupa quase a totalidade do território do município de João Pessoa, conforme pode ser observado na
Figura 2, sendo responsável pela sustentação do relevo tabular, característico da região em estudo e
adjacências.
Depósitos Quaternários: compreendem os depósitos de mangue, os terraços marinhos, os
aluviões e sedimentos de praia.
Depósitos de mangue: constituídos, em sua essência, de sedimentos pelíticos,
inconsolidados, associados a restos vegetais e matéria orgânica em decomposição e influenciados
pela oscilação diária das marés. São inexpressivos como aqüíferos, não tendo sido considerados
como tal para efeitos desta pesquisa;
Terraços marinhos: constituídos, basicamente, por areias quartzosas de granulação média a
grossa. Representam o testemunho de antigas linhas de praia que tiveram seus níveis alterados por
variações do nível do mar;
Aluviões: localizados nas bacias fluviais e constituídos de areias siltosas, as quais, por suas
características de boa porosidade e permeabilidade, apresentam grande possibilidade de infiltração
de água. Os aqüíferos nestes locais são livres e dependem da chuva que é drenada pelos rios.
Fórum Internacional do Meio Ambiente - A conferência da Terra 839

Figura 2 – Mapa geológico do município de João Pessoa (adaptado de BRASIL, 2002).

Neste estudo foram analisados os aqüíferos presentes na Formação Barreiras e aqueles


formados nos sedimentos de praia e nas aluviões, estes últimos caracterizados por serem mais
superficiais que o Barreiras.

Caracterização dos Aqüíferos Livres da Área de Estudo


Sistema Aqüífero Barreiras: encontra-se inserido na formação geológica de mesmo nome e
que se estende ao longo de quase toda a costa brasileira. Apresenta uma profundidade média do
nível do aqüífero em torno de 65 metros, nível estático médio estimado em 13,8 metros, vazão de
captação média de 8,7 m3/h e capacidade específica de 3,16 m3/h/m (MENTE, 1997). Por se tratar
de um sistema predominantemente livre, o aqüífero Barreiras apresenta-se bastante susceptível a
problemas ocasionados pela ocupação desordenada do território e pela disposição inadequada de
resíduos sólidos e líquidos. Dentre os problemas mais comuns e que podem refletir diretamente na
qualidade das águas deste aqüífero, destacam-se o lançamento de resíduos industriais no solo; o
déficit do sistema de saneamento básico, comum à maioria das cidades brasileiras; superexplotação,
podendo ocasionar a entrada da cunha salina no aqüífero; a construção e desativação de poços sem a
adoção de medidas de proteção sanitária; lançamento de efluentes líquidos industriais in natura nos
cursos d’água superficiais que, através da interação com as águas subterrâneas, terminam por
contaminá-las; e os postos de combustíveis, que representam importantes fontes de contaminação
por hidrocarbonetos.
Aqüíferos de Sedimentos Quaternários: Apresentam-se inseridos nos sedimentos recentes,
localizados nas áreas de cotas mais baixas do município, onde o processo morfogenético
predominante é o de acumulação sedimentar. O nível da água nestes aqüíferos é bem próximo à
Fórum Internacional do Meio Ambiente - A conferência da Terra 840

superfície e, por vezes, aflorante. Estudos desenvolvidos por Vieira et. al. (2003), indicaram valores
de alta condutividade hidráulica, com média de 12,27 m/dia para os aqüíferos costeiros da praia do
Bessa no município de João Pessoa. Já para os aqüíferos aluvionares, o valor sugerido no Projeto
RADAMBRASIL (1981), apud Geoconsult (2004) para a condutividade hidráulica das aluviões do
Rio Paraíba, cuja bacia na sua baixa porção abrange grande parte do município, é de 51,84
metros/dia, enquanto que para o coeficiente de armazenamento o valor indicado é de 0,05.

MATERIAIS E MÉTODOS
Para a caracterização da vulnerabilidade à poluição dos aqüíferos livres do município de
João Pessoa, e a conseqüente elaboração do mapa de vulnerabilidade, realizou-se primeiramente
uma extensa revisão bibliográfica de modo que fosse possível estabelecer os valores padrão para
cada um dos parâmetros DRASTIC a serem utilizados. Uma vez adquiridas as informações
necessárias, realizou-se a avaliação das mesmas de modo a definir os valores relativos de cada uma
das classes observadas para os parâmetros, possibilitando estimar a vulnerabilidade relativa a cada
um deles.
Definidos os valores relativos e os pesos de cada parâmetro, passou-se à elaboração dos
mapas propriamente ditos. Para esta etapa foi utilizado um Sistema de Informações Geográficas –
SIG, que é um sistema específico para o tratamento de informações espaciais e que, de modo geral,
dispõem de ferramentas para análises complexas e para integração dados de diversas fontes a
bancos de dados georreferenciados (CÂMARA e DAVIS, 2000). Especificamente neste trabalho,
utilizou-se o Sistema de Processamento de Informações Georreferenciadas – SPRING (CÂMARA
et al, 1996), desenvolvido pelo Instituto Nacional de Pesquisas Espaciais – INPE.
No SPRING foram importados todos os dados cartográficos referentes ao município e
necessários para a confecção dos mapas temáticos dos parâmetros, tais como limite da área de
estudo, altimetria e rede hidrográfica – extraída de cartas topográficas em escala 1:10.000, isoietas,
geologia, solos e profundidades médias dos aqüíferos em estudo.
Para cada parâmetro foi gerado um mapa temático que, através da utilização da linguagem
de programação LEGAL foi convertido para grades numéricas, onde os valores da grade
correspondem ao valor da vulnerabilidade de cada classe do parâmetro. A Figura 3 apresenta um
exemplo do resultado desta conversão.

Figura 3 – Mapa temático do parâmetro Topografia, convertido para grade numérica


Fórum Internacional do Meio Ambiente - A conferência da Terra 841

Ao final da conversão dos mapas dos sete parâmetros, foi realizada a soma dos mesmos,
originando a grade numérica do índice DRASTIC, grade esta convertida posteriormente para um
mapa temático, representando classes de vulnerabilidade no município.

RESULTADOS
A análise do mapa da vulnerabilidade dos aqüíferos livres do município de João Pessoa
possibilitou a compartimentação do município em quatro setores básicos, a saber: áreas planas de
cotas baixas (entre zero e 5 metros, aproximadamente), representadas pela Planície Marinha e pelas
áreas de aluviões; áreas planas de cotas mais elevadas (entre 20 e 70 metros, aproximadamente),
localizadas na Superfície dos Tabuleiros Litorâneos; áreas de mangue; e áreas de encostas, estas
últimas representando a interface entre as áreas baixas e as áreas altas do município.
Como o estudo desenvolvido visou a avaliação da vulnerabilidade nos aqüíferos livres,
foram excluídas das análises as áreas de mangue e as áreas de ocorrência de afloramentos, naturais
ou ocasionados por mineração, da Formação Gramame que, por padrão, encontra-se sotaposta à
Formação Barreiras. Sendo assim, tais áreas foram excluídas do cômputo geral das classes de
vulnerabilidade do município, o que reduziu a área de estudo em aproximadamente 17 km2.
A definição das classes existentes no município para cada parâmetro do modelo se baseou
na comparação com a proposição de intervalos, índices e pesos do modelo DRASTIC original
(ALLER et all, 1985), e os mapas de cada parâmetro seguiram os apresentados por Meneses (2007).
Para o município de João Pessoa, o intervalo de valores de vulnerabilidade obtido variou de 93 a
202, tendo sido este intervalo dividido em quatro classes, que variaram de baixa a muito elevada
vulnerabilidade, conforme se apresenta na Tabela 1.

Tabela 1 – Classes e índices de vulnerabilidade para o município de João Pessoa


Vulnerabilidade Índice DRASTIC
Muito Elevada 162 – 202
Elevada 139 – 162
Moderada 116 – 139
Baixa 93 – 116

Apresenta-se na Figura 4 o mapa síntese da vulnerabilidade dos aqüíferos livres no


município de João Pessoa, enquanto que a Tabela 2 apresenta um resumo com o total de áreas do
município por classe de vulnerabilidade.
Observa-se que predomina a classe de vulnerabilidade moderada no município,
influenciada em grande parte pelas características da Superfície dos Tabuleiros, que se apresenta
como um compartimento quase que homogêneo em relação ao tipo de solo, litologia e declividade.
As áreas mais vulneráveis são aquelas onde predominam condições de forte infiltração
devido, principalmente, à textura dos solos que, sendo mais arenosos, apresentam maior quantidade
de vazios. Estas áreas localizam-se quase que totalmente na Planície Marinha e nas aluviões às
margens dos cursos d’água. Outra característica definidora das áreas de maior vulnerabilidade é a
proximidade do nível freático em relação à superfície do terreno, o que torna o aqüífero altamente
propício à contaminação nestas áreas.
Fórum Internacional do Meio Ambiente - A conferência da Terra 842

Figura 4 – Mapa de vulnerabilidade dos aqüíferos livres no município de João Pessoa, baseado no
modelo DRASTIC

Tabela 2 – Áreas do município por classe de vulnerabilidade


Classe Área (km2) Percentual (%)
Muito Elevada 12,19 6,30
Elevada 18,13 9,37
Moderada 109,07 56,40
Baixa 54,01 27,93
Total 193,4 100

As áreas menos vulneráveis identificadas no município ficam localizadas nas encostas, fato
este devido especialmente ao fator declividade do terreno, que propicia um maior escoamento
superficial, em detrimento da infiltração das águas de chuva, dificultando a percolação de elementos
contaminantes.
Portanto, ao final da pesquisa, percebe-se que o município encontra-se em uma situação
delicada em relação à proteção dos recursos hídricos subterrâneos, uma vez que a ocupação urbana
tem se dado de forma não controlada sobre as áreas onde a vulnerabilidade é acentuada, como é o
caso dos bairros litorâneos. Muitos condomínios e empresas têm optado pela perfuração de poços
visando reduzir os custos com o abastecimento de água, muitas vezes sem que os órgãos gestores
tenham conhecimento, podendo ocasionar problemas relacionados com a superexplotação e
contaminação das águas por procedimentos não adequados de manutenção dos mesmos.
Fórum Internacional do Meio Ambiente - A conferência da Terra 843

Este documento deve servir, assim, para que os órgãos responsáveis pela gestão territorial
e dos recursos hídricos possam pensar a evolução dos centros urbanos sem perder de vista a
manutenção da qualidade ambiental.

REFERÊNCIAS BIBLIOGRAFICAS
ALLER, L.; BENNET, T.; LEHR, J.H.; PETTY, R.J. DRASTIC: a standardized system for
evaluating groundwater pollution potential using hydrogeologic settings. U.S. EPA, 1985. Report
600/2-85/018.
BRASIL. Ministério das Minas e Energia. CPRM. 2002. Geologia e recursos minerais do Estado
da Paraíba. Recife, CPRM. 142p. il. 2 mapas (Escala: 1:500.000).
CÂMARA, G.; DAVIS, C. Introdução ao Geoprocessamento. in: CÂMARA, G.; Davis, C.;
Monteiro, A. M. V; Paiva, J. A.; D’Alge, J. C. L. (orgs.) Geoprocessamento: teoria e aplicações.
2000. Disponível em <http://www.dpi.inpe.br/gilberto/livro>. 5p.
CÂMARA, G.; SOUZA R.C.M.; FREITAS, U.M.; GARRIDO, J. SPRING: Integrating remote
sensing and GIS by object-oriented data modelling. Computers & Graphics, 20: (3) 395-403, May-
Jun 1996.
GEOCONSULT, CONSULTORIA, GEOLOGIA E MEIO AMBIENTE. Estudo de Impacto
Ambiental do Moinho Dias Branco – Diagnóstico Ambiental. Cabedelo, PB. 94p. 2004.
IBGE. CD BIM - Base de Informações Municipais, Rio de Janeiro, 2000.
KOHNKE, M.W. Vulnerabilidade de aqüíferos. In: ABAS Informa – Boletim Informativo da
Associação Brasileira de Águas Subterrâneas. N. 126. 2002.
MENESES, L.F. Avaliação da vulnerabilidade dos aqüíferos livres no município de João Pessoa/
PB, através do modelo DRASTIC. Dissertação de mestrado. PPGEU/UFPB. João Pessoa: 2007.
MENTE, A. As Condições hidrogeológicas do Brasil. In: FEITOSA, F.A.C. (Org.); FILHO, J.M.
(Org.) Hidrogeologia Conceitos e Aplicações. Serviço Geológico do Brasil – SPRM. Fortaleza,
Ceará, 389p. 1997.
PARAÍBA. Secretaria da Educação/UFPB. 1985. Atlas Geográfico da Paraíba. João Pessoa:
Grafset.
TUCCI, C.E.M.; CABRAL, J.J.S.P. Qualidade da Água Subterrânea. Porto Alegre; Recife:
IPH/UFRGS; CT/UFPE, 2003. 53p.
TUMA, L.S.R. Mapeamento geotécnico da Grande João Pessoa - PB. Tese (Doutorado) - Escola
Politécnica, Universidade de São Paulo, São Paulo, 2004.
VIEIRA, L. J. S.; BARBOSA, J.M.S. F.; RÊGO, J. C.; ALBUQUERQUE, J. P. T. Influência do
aquifero freático sobre a drenagem superficial. Estudo de caso. In: XV Simpósio Brasileiro de
Recursos Hídricos. Curitiba, PR. Anais em CD-Rom. Vol. Único. 2003.
Fórum Internacional do Meio Ambiente - A conferência da Terra 844

ANÁLISE DA BACIA HIDROGRÁFICA DO CÓRREGO BORORÓ NO MUNICÍPIO DE


POXORÉU, ESTADO DE MATO GROSSO, NUMA PERSPECTIVA
GEOLÓGICA/GEOMORFOLÓGICA E GEOAMBIENTAL

Lucelma Aparecida Nascimento


Universidade Federal de Mato Grosso - Departamento de Geografia. Av. Fernando Correa da Costa S/N. 78060-900 -
Boa Esperança, Cuiabá, MT. Programa de Pós-Graduação em Geografia. lucelmamt@yahoo.com.br
Deocleciano Bittencourt Rosa
Universidade Federal de Mato Grosso - Departamento de Geografia. Av. Fernando Correa da Costa S/N. 78060-900 -
Boa Esperança, Cuiabá, MT. Programa de Pós-Graduação em Geografia.
Vantuir Bom Despacho da Silva
Secretaria de Educação do Município de Poxoréu – Poxoréu, MT. dbrosa@terra.com.br

RESUMO
Este artigo está baseado em estudos geológicos e geomorfológicos e geológicos-
ambientais, tendo como objetivo maior à questão ambiental na área da bacia hidrográfica do
córrego Bororó, que drena o município de Poxoréu, situado na porção sudeste do Estado de Mato
Grosso. Aqui estão contidos resultados obtidos em trabalhos de campo e de gabinete, realizados
dentro da ótica de um levantamento geológico, geomorfológico e geo-ambiental regional na escala
regional 1:100.000. Dentro deste pensamento foram evidenciados os aspectos mais significativos,
onde foram relevados os recursos naturais, tais como: as características climáticas, a geologia
regional, a compartimentação geomorfológica, os solos, a rede hidrográfica e a cobertura vegetal,
que associados com os resultados dos trabalhos de campo e de laboratório nos conduziram a
edificação de um mapa geo-ambiental desta bacia.
Palavras Chave: Estado de Mato Grosso, município de Poxoréu, ambiental, córrego Bororó,
geológico, geomorfológico.

ABSTRACT
This article is based in geological, geomorphological and environmental geological studies,
having as major objectif the environmental question in the Bororo stream hydrographic basin which
drain the Poxoréu district, situated at the south-east portion of the Mato Grosso State. Here were
included the results obtained in works fields and of cabinet, realized inside of the geological,
geomorphological and environmental geological lifting optics in the regional scale 1:100.000.
Inside of this mind were attested the more significant aspects, where were to relieved the natural
ressources, just as the: the climate characteristics, the regional geology, the geomorphological
division, the soils, the hydrographical network and the vegetable covering which associated with
the results of work fields and of laboratory us conduct to efification of the environmental geological
map of this basin.
Key words: Mato Grosso state, Poxoréu district, environmental, Bororó stream, geological,
geomorphological.

INTRODUÇÃO
Estudos de caráter geológico, geomorfológicos e geológicos-ambientais foram
desenvolvidos na área compreendida pela bacia hidrográfica do Córrego Bororó, que circunscreve
áreas do setor sudoeste do município de Poxoréu e do sul da cidade homônima.
Este trabalho tem como objetivos a determinação da nova constituição geológica regional,
da compartimentação geomorfológica, e de uma divisão desta bacia em unidades geoambientais em
face da continuidade dos trabalhos de mapeamento geoambiental referidos ao projeto de pesquisa
denominado “Estudo das Rochas com Potencial para o Desenvolvimento de Crostas nas Áreas das
Bacias Hidrográficas do Alto Rio Paraguai, do Rio Juruena e do Rio Teles Pires no Estado de
Mato Grosso e de suas Relações na, Elaboração do Relevo” tendo como uma das partes relevantes
à questão ambiental.
Esta área está situada na porção sudeste do Estado de Mato Grosso. É parte integrante da
bacia do alto rio São Lourenço, e é palco de atividades garimpeiras, para a obtenção de diamantes.
Fórum Internacional do Meio Ambiente - A conferência da Terra 845

Foi demarcada entre, as coordenadas geográficas de latitudes 15º 50’ 40” e 15º 53’ 30” Sul e
longitudes 54º 22’ 00” e 54º 30’ 00” Oeste de Greenwich, a aproximadamente a 4º 5’ à direita do
Meridiano Rondon (Figura 1). O acesso a mesma é possível saindo-se de Cuiabá, capital do Estado
de Mato Grosso, através das rodovias federais BR’S–070, 163 e 364, que juntas se dirigem para o
município vizinho de Santo Antonio do Leverger, até a localidade de Serra de São Vicente, onde a
BR-070 parte para o leste na direção da capital Brasília, e as BR’S-163 e 364 para o sul, rumo
respectivamente aos Estados de Mato Grosso do Sul, Goiás e Minas Gerais.

MATERIAL E MÉTODOS
Estes trabalhos foram desenvolvidos inicialmente através de uma compilação bibliográfica
e confecção de mapas índices para acompanhamento dos trabalhos de campo. Depois foi realizada
uma observação dos aspectos físico-bióticos para a caracterização da cobertura vegetal regional a
partir das fotografias aéreas verticais obtidas pelo AST-10/USAF (United States Air Force) em
1965/67 na escala 1:60.000. Estas fotografias foram comparadas com as imagens do satélite
LANDSAT/TM-7, bandas 3, 4 e 5, obtidas em 2004, e com as mais recentes datadas de 02/08/2005 e
14, 20, e 23/01/2006. Entretanto, com a desativação do satélite LANDSAT/TM – 7, as imagens
utilizadas nesta etapa foram as dos Satélites CBERS 1 e CBERS 2, Brasil/China (China-Brazil
Earth Resources Satellite), Satélite Sino-Brasileiro de Recursos Terrestres, nas bandas 2, 3, 4 e 5
(red/green e blue), órbita/ponto 164/118, datadas de 21/07/2006, fornecidas pelo Instituto Nacional
de Pesquisas Espaciais - INPE, utilizando-se o conhecimento das técnicas de sensoriamento remoto.
O mapa utilizado como base cartográfica foi à carta planialtimétrica publicada pela DSG -
Diretoria de Serviço Geográfico do Ministério do Exército na escala 1:100.000, folha de Poxoréo,
CN–30/100, MT–2202 de índice de nomenclatura SD.21-Z-D-VI, impressa em 1976.
Nesta etapa de trabalhos foram realizados também, estudos nas cartas temáticas publicadas
pelo Projeto RADAMBRASIL, Folhas SD.21/Cuiabá, na escala 1: 1000.000 de Barros et al. (1982),
Ross & Santos (1982), Amaral et al. (1982), Oliveira et al. (1982) e Roessing et al. (1982), e por
Bittencourt Rosa et al. (2002) e Bittencourt Rosa (2005).
Fórum Internacional do Meio Ambiente - A conferência da Terra 846

Figura 1 – Mapa de localização da bacia hidrográfica do córrego Bororó no Estado de Mato Grosso.
Fonte: Carta Planialtimétrica, folha de Poxoréo, sigla SD.21-Z-D-VI, impressa pela DSG em 1976.

ASPECTOS FISIOGRÁFICOS
O clima regional não apresenta uma uniformidade, sendo possível à identificação de duas
estações diferenciadas, ou seja, uma seca e outra das grandes precipitações pluviométricas, o que
caracteriza um clima tropical a estações contrastadas, isto é, o de número 2 (dois), segundo a
Fórum Internacional do Meio Ambiente - A conferência da Terra 847

classificação climática para as grandes linhas do clima de Durand-Dastès (1968), modificada por
Estienne & Godard (1970).
A rede de drenagem pertence à bacia hidrográfica do alto rio Poxoréo, que tem sua
principal nascente no reservatório da Usina Hidrelétrica de Poxoréu, a partir da junção dos rios
Areia e Poxoreozinho e do córrego Água Emendada. O córrego Bororó tem suas nascentes na
localidade de Morro dos Pinga, na falda meridional do Morro dos Pinga. Tem seu curso no sentido
geral SW–NE (Cf.Figura 1), num percurso de aproximadamente 30 km, e vai desaguar no rio
Poxoréo á jusante das dependências da usina em apreço. A drenagem é variável, podendo ser
subdendrítica a subparalela, possuindo densidade média, alto grau de uniformidade, orientada, com
ângulos de confluência agudos e, às vezes, quase retos com as drenagens possuindo em geral os
seus leitos encaixados em zonas de falhas e de fraturas, sendo os vales superficiais e pouco
profundos.
Os solos estão representados por latossolos, neossolos regolíticos, litólicos e
quartzarênicos, argissolos e organossolos (EMBRAPA, 2006).
Na cobertura vegetal predominam o Cerrado (Savana) com presença de Campo Cerrado
(Savana Arbórea Aberta), Campo Sujo (Savana Parque), Campo Limpo (Savana Gramino-
Lenhosa), Matas, Cerradão (Savana Arbórea Densa) e Áreas Desmatadas correspondendo as
Pastagens e aos Cultivos. (Amaral et al. 1982 e Bittencourt Rosa et al. 2002).
Geologicamente a bacia hidrográfica em apreço está constituída por uma seqüência de
rochas sedimentares que evidenciam episódios deposicionais que tiveram lugar, desde o período
Carbonífero até as Aluviões Recentes, correspondendo respectivamente ás unidades
litoestratigráficas: Formações Aquidauana (Carbonífero Superior/Permiano Inferior) e Palermo
(Permiano Médio ao Superior), Coberturas Detrito-Lateríticas do Terciário e Aluviões referidas ao
Quaternário (Barros et al. 1982, Bittencourt Rosa et al. 2002).
a) Formação Aquidauana - Esta unidade litoestratigráfica, foi descrita primeiramente por
Derby em 1895, no município de Aquidauana, no antigo Estado do Mato Grosso. Está posicionada
como pertencente ao Grupo Itararé, e este ao Super Grupo Tubarão. Na área de estudos e
regionalmente ela se constitui de clastos grossos (diamictitos, arenitos grossos a conglomeráticos) e
finos (siltitos, argilitos e arenitos finos). O contato com a Formação Palermo se faz por discordância
angular (Foto 1).
b) Formação Palermo - Esta formação pertence ao Grupo Guatá, e este ao Super Grupo
Tubarão. Foi descrita pela primeira vez por White (1908), que retirou esta denominação de Palermo
da vila homônima, situada no município de Lauro Muller no Estado de Santa Catarina. Esta unidade
litoestratigráfica aflora no leito e nas margens do córrego Bororó na área da Usina Hidrelétrica de
Poxoréu, e também em cortes na rodovia estadual, MT–458 (Poxoréu – Guiratinga) no perímetro
urbano ao sul da cidade de Poxoréu. Está constituída por conglomerados na base, arenitos claros a
arroxeados, finos a muito finos, siltitos finalmente estratificados, muito silicificados com diversas
intercalações de sílex oolítico ou pisolítico, com laminação suavemente ondulada, presença de
coquinas silicificadas, mais opalas e silcretes no topo.
c) Coberturas Detrito-Lateríticas – Estão dispostas em discordância erosiva recobrindo, às
vezes, as rochas das Formações Aquidauana e Palermo, e do Grupo Parecis. As espessuras podem
variar de 0,5 a 3 metros, estando constituídas por detritos eluvionares, coluvionares e aluvionares.
As lateritas constituem crostas de óxido de ferro de cor avermelhada escura, e ocorrem
maciçamente, ou em oólitos e pisólitos, por vezes irregularmente. As formas maciças estão
caracterizadas por níveis de crostas regulares de espessura de alguns centímetros (0,5 a 5 cm). As
oolíticas e pisolíticas correspondem a nódulos de segregação de óxido de ferro, e as formas
irregulares constituem níveis de crostas irregulares. Em alguns pontos podem ser encontrados grãos
quartzosos dispersos na crosta laterítica.
Fórum Internacional do Meio Ambiente - A conferência da Terra 848

Foto 1 – Aspectos em afloramento da Formação Aquidauana (F.A.) em contato com a Formação


Palermo (F.P.) Corte na rodovia estadual MT-458 (Poxoréu – Guiratinga) (Fotografia –
Deocleciano Bittencourt Rosa, 2008).

d) Aluviões Recentes – As aluviões estão relacionadas à bacia hidrográfica do córrego


Bororó e seus afluentes, correspondendo às áreas marginais e aos leitos dos mesmos. Estas aluviões
compreendem um conjunto de sedimentos finos a grossos, areno-argilosos, silicificados e lateríticos
ferruginosos, sendo constituídas por areias, cascalhos quartzosos, cascalhos areníticos, opalas, sílex,
silcretes, silte e argila com grande presença de seixos nas calhas e nos leitos das drenagens
oportunamente citadas tais como as do córrego Bororó (Foto 2). A espessura pode variar de 2 a 6
metros.

Foto 2 – Faixa aluvionar do córrego Bororó antes da sua confluência com o rio Poxoréo (Fotografia
– Vantuir Bom Despacho da Silva, 2007)
Geomorfologicamente, a bacia hidrográfica do córrego Bororó e suas adjacências estão
posicionadas, na grande unidade conhecida como Planalto dos Alcantilados, que foi descrita tal
como vimos anteriormente por Almeida (1948, 1954), que chamou os relevos recortados por
escarpas e os residuais com vertentes abruptas observados nas bacias hidrográficas dos rios São
Lourenço e Poxoréo na porção sudeste do Estado de Mato Grosso. Os estudos posteriores de Ross
& Santos (1982) determinaram o posicionamento do Planalto dos Alcantilados na porção sudeste da
Folha SD. 21/Cuiabá. Bittencourt Rosa et al. (2002), separaram este planalto do Planalto dos
Guimarães.
O Planalto dos Alcantilados trata-se de uma unidade com feições morfológicas
relativamente complexas, marcadas por extremidades com escarpas em alcantís (abruptas em forma
de despenhadeiros), em rampas não muito bem definidas e recortadas no município de Poxoréu por
Fórum Internacional do Meio Ambiente - A conferência da Terra 849

relevos residuais de topos planos, tabuliformes, e as significativas formas de relevo tabuliforme que
ocorrem na área em foco, tal como os Morros da Mesa (Foto 4), e dos Pinga estão referidas à
Formação Aquidauana que ocorre predominantemente, no sul da mesma, até a porção central no
contato com a Falha de Poxoréu de Barros et al. (1982).

Foto 4 – Morro da Mesa, que compreende uma expressiva forma de relevo tabuliforme sustentada
por arenitos pertencentes à Formação Aquidauana. Margem direita do córrego Bororó. Setor sul da
cidade de Poxoréu (Fotografia - Lucelma Aparecida Nascimento, 2007).

Notadamente estas feições geomorfológicas se apresentam em escarpas altas e abruptas,


que se destacam na paisagem regionalmente. Estes patamares segundo Ross & Santos (1982), estão
posicionados com as frentes escarpadas para sudeste e a presença dos mesmos está relacionada a
uma conjugação de fatores, tais como movimentos tectônicos e atuação de processos erosivos
diferenciais.

MAPEAMENTO GEOAMBIENTAL
Generalidades
Os estudos geoambientais associados com Geomorfologia, a Ecologia Aplicada, e a dos
Ecossistemas, podem ser evidenciados na caracterização de determinados espaços geográficos e
geológicos, e trabalhos realizados dentro deste enfoque pelo IBGE (1994) e por Del’Arco et al.
(1995), consideram que um mapa geoambiental se constitui no alicerce para as avaliações acerca da
qualidade ambiental de uma área, já que ele determina o meio físico-biótico, onde se desenrolam as
ações políticas e as pressões sócio-econômicas, sendo também a representação da
compartimentação de um espaço geográfico físico, a partir da análise das inter-relações de seus
principais constituintes como o condicionamento climático, a litologia, o relevo, os solos, a rede
hidrográfica e a cobertura vegetal, em consonância com os Princípios da Teoria Geral de Sistemas
de Bertalanffy (1975) e do Esboço do Modelo de Divisão da Paisagem Física de Bertrand (1968).
Neste trabalho apresentamos então o modelo hierárquico estabelecido por Bertrand (1968),
que determina de uma parte os taxons, Zona, Domínio e a Região Natural, como as unidades
maiores e de outra parte o Geossistema ou Sistema Natural, o Geofácies e o Geótopo como as
menores, para as unidades físicas da paisagem. Daí ser possível caracterizar num mapa
geoambiental da área estudada as unidades geoambientais distribuídas numa Região Natural
compartimentada em três geossistemas, cuja qualificação está ligada à associação da geologia, do
relevo, dos solos, da vegetação e as intervenções de natureza humana, ou seja, a Região Natural da
Bacia Hidrográfica do Córrego Bororó, que se estende desde as nascentes do córrego Bororó na
localidade de Morro dos Pinga, até o lado sul da cidade de Poxoréu, e se descortina através de
feições predominantemente, em relevo de serrania a montanhoso, onde são reconhecidos os Morros
Fórum Internacional do Meio Ambiente - A conferência da Terra 850

dos Pinga e da Mesa e são comuns áreas de fraqueza com exposições de rochas falhadas, fraturadas
e dobradas como na margem direita córrego Bororó, espelhos de falhas (slikensides) e vales abertos
(Figura 2), relatados a Falha de Poxoreu. Estão presentes regionalmente inúmeros focos de
atividades garimpeiras para a busca de diamantes.

4.2 - Região Natural da Bacia Hidrográfica do Córrego Bororó


a) Geossistema Seqüência de Arenitos do Carbonífero, Permiano as Aluviões Recentes
(G.S A.C.P.AR).
Relevo de Serrania a Montanhoso, Coberturas Detrito-Lateríticas Terciárias, Solos
Concrecionários, Neossolos Regolíticos e Litólicos, Neossolos Quartzarênicos e Argissolos e
Organossolos.
b) Geossistemas com Predomínio de Matas Ciliares e Galerias (G.P.M.C.G.)
c) Geossistemas com Predomínio do Cerrado, Campo Cerrado e Cerradão com Fortes
Intervenções de Natureza Humana (G.P.C.Cc.Ce.F.INH.)
Latossolos, Neossolos Regolíticos, Litólicos e Quartzarênicos e Organossolos.
Neossolos Quartzarênicos, Argissolos e Organossolos.

Figura 2 – Mapa geoambiental da bacia hidrográfica do córrego Bororó. Fonte: Carta


Planialtimétrica, folha de Poxoréo, sigla SD.21-Z-D-VI, impressa pela DSG em 1976.
Fórum Internacional do Meio Ambiente - A conferência da Terra 851

O Geossistema Seqüência de Arenitos do Carbonífero, Permiano as Aluviões Recentes está


representado pela sequência litológica predominante em toda área da bacia hidrográfica do córrego
Bororó onde ocorrem diamictitos e arenitos avermelhados pertencentes à Formação Aquidauana e
aos conglomerados e arenitos silicificados contendo níveis de sílex, opalas e silcretes referidos à
Formação Palermo, mais as Coberturas Detrito-Lateríticas e as Aluviões atuais. Na cobertura
pedológica destacam-se Neossolos Regolíticos, Litólicos e Quartzarênicos e também Organossolos.
O Geossistema com Predomínio de Matas Ciliares e Matas Galerias é a unidade que
corresponde a faixa de cobertura vegetal existente na bacia hidrográfica em referência,
principalmente, nos vales do rio Poxoréo e do córrego Bororó. Áreas desmatadas (pastagens e áreas
cultivadas) podem ser observadas ao longo das áreas marginais de todo curso do córrego Bororó e
de seus afluentes localmente.
No Geossistema com Predomínio do Cerrado e Campo Cerrado com Fortes Intervenções
de Natureza Humana ocorrem Neossolos Regolíticos, Litólicos e Quartzarênicos
predominantemente, mais Organossolos e Latossolos, correspondendo aos conjuntos de tipos de
solos, que recobrem a área de estudos, onde intercalações dos latossolos com os neossolos
regolíticos, litólicos e quartzarênicos podem ser observadas, isto porque, a faixa de organossolos se
encontra bastante depredada pelas antigas e atuais atividades de garimpagem de diamantes (Foto 4).

Foto 4 – Detalhes da faixa de organossolos que se encontra bastante depredada pelas antigas e
atuais atividades de garimpagem de diamantes (Fotografia – Deocleciano Bittencourt Rosa, 2007).

Algumas áreas úmidas provenientes de represamentos ou de alagamentos na faixa de


garimpagens de diamantes se constituem em ecossistemas frágeis, tais como as nascentes de água,
os açudes e os terrenos inundados. Convém ressaltar que a maior parte dos tipos de uso dos solos
para estas áreas úmidas regionalmente, está associada aos aterros das mesmas, o que pode acarretar
em suas destruições. Concentrações de seixos quartzosos, opalas, silcretes, sílica criptocristalina,
calcedôneas, areia, que constituem o cascalho diamantífero nas catas abertas para garimpagem
(Foto 5), e também o rejeito dos garimpos, entre outros estão amontoados aleatoriamente na catas,
nas áreas marginais do córrego Bororó, assim como nas circunvizinhanças da área da bacia em
referência.
Fórum Internacional do Meio Ambiente - A conferência da Terra 852

Foto 5 – Concentração de seixos quartzosos, opalas, sílica criptocristalina, calcedôneas, areia, entre
outros, que constituem o cascalho diamantífero numa cata aberta para garimpagem de diamantes na
margem direita do córrego Bororó. Local - Setor sul da cidade de Poxoréu (Fotografia – Lucelma
Aparecida Nascimento, 2007).

CONSIDERAÇÕES FINAIS
Este mapeamento geoambiental foi realizado na escala regional de 1:100.000, em razão das
características locais, isto porque um caminhamento em escala de detalhe seria dificultoso em face
dos inúmeros endereços degradados ambientalmente, ora pelas atividades garimpeiras, ora pelos
cultivos, que se constituem em barreiras para o avanço dos trabalhos, e também pelos problemas
que são oriundos nos contatos com os garimpeiros e proprietários de terras, apesar da área de
estudos se situar perto de Poxoréu e nos limites da própria cidade. Entretanto foi possível aplicar o
modelo de divisão da paisagem física na bacia em referência apresentando somente uma região
natural referida ao nome da bacia do córrego Bororó, para facilitar a compreensão daqueles que
mostram interesse por este tipo de trabalho e dos resultados que ele pode apresentar. Desta maneira
apresentamos esta parte desta bacia hidrográfica mais simplificada em termos de unidades
geoambientais, com a divisão nos três geossistemas descritos relacionados com os recursos naturais,
e o aprofundamento até os geofácies, que estão relacionados ás localidades de Morro da Mesa,
Morro dos Pinga, Cabeceira Bonita e Fazenda Serrana e aos altos, médios e baixos cursos dos
córregos afluentes com suas redes de drenagem.

REFERÊNCIAS BIBLIOGRÁFICAS
ALMEIDA, F. F. M. de. 1948. Reconhecimento geomórfico nos planaltos divisores das Bacias
Amazônica e do Prata entre os meridianos 51º e 56ºW Gr., Revista Brasileira de Geografia, 10
(3): 397 – 440, Rio de Janeiro.
ALMEIDA, F. F. M. de. 1954. Geologia do Centro-Leste Matogrossense. Boleti da Divisão de
Geologia e Mineralogia, (150) : 1 – 97, Rio de Janeiro.
AMARAL, D. L.; FONZAR, B. C. & OLIVEIRA FILHO, L. C. 1982. As Regiões Fitoecológicas,
sua Natureza e seus Recursos Econômicos. Folha SD.21/Cuiabá. BRASIL/Ministério das Minas e
Energia, Projeto RADAMBRASIL (Levantamento dos Recursos Naturais, 26), p. 401 – 452, Rio de
Janeiro.

BARROS, A. M.; SILVA, R. W. de.; CARDOSO, O. R. F. A.; FREIRE, F. A.; SOUZA JUNIOR,
J. J. de.; RIVETTI, M.; LUZ, D. S. da.; PALMEIRA, R. C. de. B. & TASSINARI, C. C. G. 1982.
Geologia, Folha SD.21/Cuiabá. BRASIL/Ministério das Minas e Energia, Projeto RADAMBRASIL
(Levantamento dos Recursos Naturais, 26), p. 25 – 192, Rio de Janeiro.

BERTALANFFY, L. V. 1975. Teoria Geral dos Sistemas. Ed. Vozes, Petrópolis, RJ, 351 p.
Fórum Internacional do Meio Ambiente - A conferência da Terra 853

BERTRAND, G. 1968. Paysage et Géographie Physique Globale. Esquisse Méthodologique. Revue


Géographique des Pyrenées et du Sud Ouest, 39 (3) : 249 – 272, Toulouse, France.
BITTENCOURT ROSA, D. 2005. Estudo das Rochas com Potencial para o Desenvolvimento de
Crostas na Elaboração do Relevo nas Áreas das Bacias Hidrográficas dos Rios Alto Paraguai,
Juruena e Teles Pires no Estado de Mato Grosso. Rel. Final de Pesquisa, Conselho Nacional de
Desenvolvimento Científico e Tecnológico-CNPq, 184 p, Brasília, DF.
BITTENCOURT ROSA, D.; ALVES, D. de. O.; MACEDO, M.; GARCIA NETTO, L. da. R.;
NASCIMENTO, L. A.; PINTO, S. D. S.; BORGES, C. A.; ROSSETO, O. C.; TOCANTINS, N.;
LOPES dos SANTOS, P.; GELA, A. & GERALDO, A. C. H. 2002. Um Estudo Geoambiental
Comparativo das Características Morfoestruturais e Morfoesculturais nas Áreas das Bacias do Alto
Rio Paraguai e do Rio Teles Pires no Estado de Mato Grosso. Projeto de Pesquisa, Relatório Final
FAPEMAT/CNPq - Fundação de Amparo à Pesquisa do Estado de Mato Grosso/Conselho
Nacional de Desenvolvimento Científico e Tecnológico, 319 p.
DEL’ARCO, D. M.; DEL’ARCO, J. de. O.; RIOS, A. J.W.; DAMBRÓS, L. A.; NOVAES, A. S. S.
& PINTO, J. C.1995. Mapa Geoambiental do Estado de Tocantins – Escala 1 :1000.000. In:
SIMPÓSIO NACIONAL DE GEOGRAFIA FÍSICA APLICADA, 6, Goiânia, GO, Universidade
Federal de Goiás, Anais do., p. 511 – 513, Goiânia, GO.
DERBY, O. A. 1895. Nota sobre a Geologia e a Paleontologia de Mato Grosso. Archivos do Museu
Nacional, (9): 59 – 88, Rio de Janeiro.
DURAND-DASTÈS, F. 1968. Climatologie. Encyclopaedia Universalis France, 4, p. 618 – 624,
Paris, France.

EMBRAPA/BRASIL/Ministério da Agricultura, Pecuária e Abastecimento - Centro Nacional de


Pesquisa de Solos. 2006. Sistema Brasileiro de Classificação dos Solos. 2ª Edição. Revisada, Rio de
Janeiro, RJ, 306 p.
ESTIENNE, P & GODARD, A. 1970. Climatologie. Armand Colin Colection U, 365 p, Paris,
France.

IBGE – Fundação Instituto Brasileiro de Geografia e Estatística.1994. Zoneamento Ecológico-


Econômico do Aglomerado Urbano de Goiânia. SEPLAN-Secretaria de Planejamento e
Desenvolvimento Regional do Estado de Goiás, Diretoria de Geociências, Goiânia, GO.
ROESSING, H. M.; NOVAES, J. A. C. de.; MOTTANA, C. E. & MONTORO, R. M. R. 1982. Uso
Potencial da Terra, Folha SD.21/Cuiabá, BRASIL/M.M.E., Projeto RADAMBRASIL,
(Levantamento dos Recursos Naturais, 26), p. 453 – 540, Rio de Janeiro.
ROSS, J. L. S. & SANTOS, L. M. dos. 1982. Geomorfologia. Folha SD.21/Cuiabá.
BRASIL/Ministério das Minas e Energia, Secretaria Geral, Projeto RADAMBRASIL (Levantamento
dos Recursos Naturais, 26), p.156 – 193, Rio de Janeiro.
WHITE, I. C. 1908. Relatório Final da Comissão de Estudos das Minas de Conservação de
Carvão. Tradução de Carlos Moreira. Imprensa Nacional, 617 p, Rio de Janeiro.
Fórum Internacional do Meio Ambiente - A conferência da Terra 854

RECURSOS HÍDRICOS NA ZONA RURAL DO SEMI-ÁRIDO BRASILEIRO:


DISPONIBILIDADE, DISTINTOS CENÁRIOS E MECANISMOS DE GESTÃO

Josandra Araújo Barreto de Melo


Professora do Departamento de História e Geografia/Universidade Estadual da Paraíba; Doutoranda
do Programa de Pós-Graduação em Recursos Naturais/Universidade Federal de Campina Grande,
PB. ajosandra@yahoo.com.br
Ronildo Alcântara Pereira
Mestrando do Programa de Pós-Graduação em Recursos Naturais/Universidade Federal de Campina
Grande. ronalcantara@gmail.com.br

RESUMO
À luz da literatura pertinente e da conseqüente construção de um posicionamento crítico
derivado de experiências empíricas observadas na área do Polígono das Secas, o presente ensaio se
propõe a analisar a questão da oferta/demanda de recursos hídricos nessa região; destacar a
precariedade do sistema de captação e abastecimento de água nas comunidades rurais; relatar a
prática de algumas experiências de sucesso na região, que configura o delineamento de dois
cenários distintos; e, por fim, ressaltar a necessidade de gestão adequada dos recursos hídricos na
região em pauta, visando ampliar a quantidade/qualidade das fontes existentes, com um maior
controle da poluição nas fontes de fornecimento doméstico, além de ampliação dos sistemas de
tratamento de água de abastecimento na zona rural, visto que sua ausência e/ou precariedade poderá
acarretar seqüelas à saúde da população local, que desprovida de água tratada, consume água de
qualidade inferior.
Palavras-chave: Semi-árido brasileiro, oferta/demanda d’água, captação e uso na zona rural.

ABSTRACT
Through pertinent literature and consequent construction of a critical positioning derived
from observed empirical experiences in Brazilian's Droughts Polygon, this assay aims to analyze
hydric resource's offer/demand matter in this region; besides emphasizing captivation system and
water supply precariousness when it comes to agricultural communities. It is also intended to
discuss some successful experiences in such region, which sketches out two distinct scenes; and,
finally, to project the need for adequate hydric resources management in guideline region. By doing
so, it is expected to extend existing resources amount/quality, with a higher pollution control in
domestic supply sources, besides supplying water treatment systems enlargement in agricultural
zone, since its absence and/or precariousness will be able to cause sequels to local population's
health, who consumes poor quality water because they cannot count on properly treated one.
Keywords: Brazilian Semi-Arid, water offer/demand, captivation and use in agricultural zone

INTRODUÇÃO
Representando 18,3% do território brasileiro, o Nordeste é formado por nove estados e
engloba a área do Polígono das Secas do Brasil, comumente conhecida como região semi-árida que
é, fundamentalmente, caracterizada pela ocorrência do bioma Caatinga, presente nas Mesorregiões
do Sertão, Borborema e Agreste. Esta vasta área do interior nordestino apresenta com forte
predominância, clima seco e quente, com chuvas que se concentram nas estações de verão e outono.
A região sofre a tímida influência de várias massas de ar (a Equatorial Atlântica, a Equatorial
Continental, a Polar e as Tépidas Atlântica e Calaariana) que interferem na formação do seu clima,
mas essas massas adentram o interior do Nordeste com pouca energia, tornando extremamente
variáveis não apenas os volumes das precipitações caídas, mas, principalmente, os intervalos entre
as chuvas (SUASSUNA, 2002).
Somados a esses aspectos, existem inúmeros equívocos nos programas de convivência com
a seca, que vão desde o desconhecimento das condições para o armazenamento de água, que busque
minimizar os efeitos das altas taxas de evaporação (cerca de 2.000 mm anauis), até a falta de
Fórum Internacional do Meio Ambiente - A conferência da Terra 855

conhecimento científico que forneça suporte à utilização da água salobra existente, de modo a que
possa produzir com eficiência, causando menos impactos nas áreas receptoras dessas águas.
Soares (2007) reconhece essa necessidade ao afirmar que o conhecimento que viabilize o
uso dos recursos hídricos não deve ser prerrogativa apenas das regiões semi-áridas, antes de todas
as áreas de produção, tendo em vista a urgência em se estabelecerem usos racionais para tão
precioso componente, não apenas da produção, mas de resto para a sustentabilidade dos sistemas.
Nessas condições, a avaliação do problema da água de uma dada região já não pode se restringir ao
simples balanço entre oferta e demanda. Para Rebouças (1997), “deve abranger também os inter-
relacionamentos entre os seus recursos hídricos com as demais peculiaridades geoambientais e
sócio-culturais, tendo em vista alcançar e garantir a qualidade de vida da sociedade, a qualidade do
desenvolvimento socioeconômico e a conservação das suas reservas de capital ecológico”.
Em contraposição a face insustentável da maior parcela do semi-árido está o agro-negócio,
praticado com tecnologia avançada nos vales férteis da região, cujo mercado tem como destinação
as exportações. Esses “Oasis”, que muitas vezes se localizam a poucos quilômetros das áreas secas,
têm vida própria e em nada lembram as dificuldades e a escassez, não apenas de água, mas também
de oportunidades de bons negócios em contraste com a agricultura convencional local.
Diante dessas questões, o presente ensaio se propõe a analisar a questão da oferta/demanda
de recursos hídricos no semi-árido brasileiro; destacar a precariedade do sistema de captação,
abastecimento e qualidade de água nas comunidades rurais dessa área do país; relatar a prática de
algumas experiências de sucesso na região, que configura dois cenários distintos; e, por fim,
ressaltar a necessidade de gestão adequada dos recursos hídricos na região em pauta.

DELIMITAÇÃO E CARACTERIZAÇÃO CLIMÁTICA DO SEMI-ÁRIDO BRASILEIRO


Segundo Andrade (2005), o Nordeste é uma das regiões geográficas mais discutidas do
país, apesar de ainda ser a menos conhecida. Freqüentemente, a área é associada ao fenômeno
climático das secas – característico de parte significativa da região – e das conseqüências sobre a
população local; entretanto nem todo o Nordeste é castigado pela estiagem e, por este motivo e para
melhor administrar tal fato, nas áreas mais afetadas do mencionado território, foi delimitada a
região que compreende, de acordo com os critérios estabelecidos, as maiores adversidades
condicionadas pela semi-aridez climática. Essa área é denominada de Polígono das Secas ou, mais
comumente, de semi-árido.
O Polígono das Secas foi primeiramente delimitado pela Lei 1.348/51 como área de
atuação do Departamento Nacional de Obras Contra as Secas – DNOCS. Segundo Rebouças
(1997), tal delimitação foi alterada várias vezes, obedecendo sempre a critérios mais políticos que
ecológicos.
Até o ano de 1995, sob os efeitos da Lei 7.827/89, os critérios utilizados para a delimitação
geográfica do semi-árido eram baseados nas precipitações pluviométricas iguais ou inferiores a 800
mm (oitocentos milímetros). Com essa característica climática, os municípios eram inseridos na
área de atuação da Superintendência de Desenvolvimento do Nordeste – SUDENE.
A última atualização dos municípios pertencentes ao semi-árido foi feita em 1995, pela
SUDENE, através da Portaria 1.181 do referido órgão. Com a extinção da Autarquia mencionada,
passou-se para o Ministério da Integração Nacional a responsabilidade de posicionar-se acerca dos
pleitos de inclusão dos municípios interessados em dispor de tratamento diferenciado das políticas
de crédito e benefícios fiscais conferidos àquela parcela do território brasileiro.
A partir da constatação da insuficiência dos critérios estabelecidos anteriormente, o
Ministério da Integração Nacional instituiu, em 2005, uma nova delimitação para a área em foco,
atualizando os critérios de classificação, a partir de três variáveis climáticas ao invés de uma:
precipitação pluviométrica média anual inferior a 800 mm (oitocentos milímetros); índice de aridez
de até 0,5, calculado pelo balanço hídrico que relaciona as precipitações e a evapotranspiração
potencial, no período entre 1961 e 1990; e risco de seca maior que 60%, tomando-se por base o
período entre 1970 a 1990 (http://www.integracao.gov.br).
Fórum Internacional do Meio Ambiente - A conferência da Terra 856

Com essa atualização, a área classificada oficialmente como Polígono das Secas ou região
semi-árida aumentou de 892.309,4 km2 para 969.589,4 km2 sendo, hoje, composta por 1.133
municípios, com uma população de 20.858.264 pessoas, conforme destaca a figura 1.

Figura 1: Nova delimitação do semi-árido brasileiro. Fonte: Ministério da Integração Nacional,


Secretaria de Políticas de Desenvolvimento Regional, disponível em: http://www.integracao.gov.br.

Segundo apreciação informal feita pelo geógrafo francês Jean Dresch, quando esteve na
década de 1970 visitando a região, e mencionada por Ab´Sáber (1999), o Polígono das Secas é uma
das regiões semi-áridas mais povoadas entre todas as terras secas existentes nos trópicos ou entre os
trópicos, visto que nas outras áreas secas a população se concentra em alguns oásis, enquanto que
no semi-árido distribui-se ao longo de todo o território, entretanto Ab’Sáber (2003) complementa a
informação acrescentando que, possivelmente, se trata da região que possui a estrutura agrária mais
rígida da face da Terra.

FORMAS DE CAPTAÇÃO E POSSÍVEIS IMPLICAÇÕES DECORRENTES DA AUSÊNCIA


DE TRATAMENTO DA ÁGUA CONSUMIDA PELA POPULAÇÃO RURAL DO SEMI-ÁRIDO
O abastecimento de água tem uma significativa participação na qualidade de vida das
comunidades. Nas áreas de secas freqüentes, particularmente, a questão é mais grave, tendo em
vista que se somam os problemas advindos da pequena disponibilidade hídrica e os de gestão da
água existente, que estão associados as formas de captação e armazenamento, para suprir as
necessidades da população e oferecer melhores condições de vida em momentos de escassez
hídrica.
No que se refere as formas de captação de águas no semi-árido brasileiro, as alternativas a
seguir mostram alguns exemplos de como se processa tal mecanismo:
Fórum Internacional do Meio Ambiente - A conferência da Terra 857

Tanques em rochas: são cavidades naturais encontradas em afloramentos rochosos no


semi-árido brasileiro. Essa forma de captação, muito comum na área em foco, não requer nenhum
investimento por parte da população, fazendo-se necessária apenas a limpeza ao término da
utilização da água, tendo em vista que ficam dispostos no fundo do reservatório os sedimentos
advindos da correnteza das águas, à montante na bacia.
Barreiros/pequenas barragens: constituem o tipo de reservatório mais comum nas bacias
hidrográficas do semi-árido. Na verdade, trata-se de pequenas áreas de represamento construídas na
área de confluência do sistema de drenagem local. Geralmente, são construídas sobre o solo
desnudo, sem maiores preocupações do ponto de vista da engenharia. Porém, há alguns fatores
limitantes para o uso como reservatórios, tais como, as perdas por evaporação, que levam à
concentração dos sais contidos na água, a perda de água por vazamentos, além do fato de que todos
os poluentes dispostos na bacia hidrográfica são carreados para esses reservatórios, ficando
sedimentados na área de fundo até o término de utilização da água.
Açudes: possuem a mesma configuração anteriormente descrita, sendo diferenciados pelo
tamanho. São construídos nos leitos de rios, para captação e armazenamento das águas pluviais e de
escoamento superficial, com o intuito de satisfazer a população em todas as suas necessidades,
incluindo, muitas vezes, a pequena irrigação. Esses reservatórios são de grande importância
estratégica para o fornecimento de água à população, representando, principalmente nos períodos de
seca, as únicas fontes de abastecimento local. Na região semi-árida, por exemplo, os açudes são
alimentados nos períodos de “cheia”, onde a elevada precipitação concentrada em poucos meses,
semanas ou dias, aliados ao embasamento rochoso cristalino, favorecem o acúmulo de água.
Cisternas: bastante freqüentes na paisagem no semi-árido brasileiro, principalmente em
decorrência das ações desencadeadas pelo Programa de Formação e Mobilização Social para
Convivência com o Semi-Árido (P1MC): um milhão de cisternas rurais
(http://www.asabrasil.org.br). São depósitos construídos em alvenaria e destinados a captar as águas
de chuvas precipitadas sobre telhados, pátios e superfícies limpas. A água é captada por meio de
estruturas simples, como calhas feitas com chapas metálicas, sendo conduzida por meio de condutos
abertos ou fechados (canais ou tubos, respectivamente) para as cisternas.
Barragens subterrâneas: são barramentos subterrâneos feitos transversalmente nos leitos
dos rios. Podem ser usadas tanto para o abastecimento público quanto para a sub-irrigação.
Exploram as águas subsuperficiais dos rios, quando estes deixam de escoar as águas superficiais.
Cacimbas: exploram a água subterrânea. São escavadas, na maioria das vezes, à pequenas
profundidades e com técnicas rudimentares. Quase sempre não utilizam estruturas de alvenaria e
dão vazões geralmente pequenas, sendo apenas suficientes para o uso pecuário, principalmente em
função dos elevados níveis de sais presentes na água.
Poços tubulares: são poços que exploram o lençol freático a profundidades relativamente
maiores que a das cacimbas. São construídos por meio de máquinas de perfuração, têm diâmetros
pequenos e são revestidos com tubos. A água chega a superfície por meio de uma estação
elevatória, podendo dar boa vazão se o lençol freático for caudaloso.
Poços amazonas: exploram o aqüífero aluvial, sendo construídos em alvenaria. São
indicados para áreas de lençol freático mais alto e de grande poder de recarga. A própria estrutura
do poço é um reservatório de água a céu aberto. Nos períodos de seca, essas estruturas reduzem
seus volumes de água, chegando a secar nas áreas mais castigadas.
Poços artesianos: são perfurados, geralmente, a grandes profundidades, explorando os
lençóis artesianos. Têm pequenos diâmetros e podem dar grandes vazões, o suficiente para
abastecer uma pequena comunidade. São chamados de artesianos se a água jorrar na superfície pela
sua própria pressão de confinamento e de semi-artesiano, se necessitam de bombeamento.
Mediante o exposto, observa-se que o abastecimento de água da zona rural do semi-árido
ainda ocorre de forma bastante rudimentar, em que se verifica uma ausência total de mecanismos de
remoção de poluentes, quer seja do ponto de vista microbiológico quer do aspecto físico-químico.
Esse fato acarreta preocupações, tendo em vista que a água de consumo humano é um dos
importantes veículos de enfermidades diarréicas de natureza infecciosa, denominadas de doenças de
Fórum Internacional do Meio Ambiente - A conferência da Terra 858

veiculação hídrica, que são causadas, principalmente, por microorganismos patogênicos de origem
entérica, animal ou humana, transmitidos pela rota fecal-oral. Diante disso, torna-se primordial a
avaliação da qualidade microbiológica e físico-química da água de abastecimento, fato que inexiste
na realidade em foco.
No Brasil, apesar da existência de mecanismos de regulamentação dos níveis de qualidade
da água para o consumo humano, presentes na Resolução do CONAMA 357/2005 e nas Portarias
do Ministério da Saúde, número 1.469/2000, que apresenta diretrizes para controle e vigilância da
qualidade da água para consumo humano e seu padrão de potabilidade e 518/2004, que normatiza a
qualidade da água para o consumo humano, o modelo de abastecimento de água e saneamento, é
centrado nas companhias estaduais, o que induziu a uma atenção maciça para as sedes municipais,
sem que a população rural seja contemplada com tratamento de água e/ou esgoto.
No que concerne à qualidade da água, só existe tratamento para as águas do sistema de
abastecimento via adutoras, ficando a população rural, mesmo a que mora vizinha as áreas dos
mananciais e/ou adutoras, relegada ao esquecimento, fazendo uso da água sem qualquer tratamento
prévio. A Tabela 1 apresenta um panorama dos sistemas de abastecimento de água na zona urbana
(para efeito de comparação) e na zona rural, por região do país.

Tabela 1: População residente por situação do domicílio e forma de abastecimento de água nas
grandes regiões do Brasil.
Região População urbana (%) População rural (%)
Rede Geral Poço/nascente Outra forma Rede geral Poço/Nascente Outra
forma
Norte 63,0 30,1 6,9 9,6 59,4 31,0
Nordeste 85,3 6,7 8,0 18,3 41,1 40,6
Sudeste 94,4 4,4 1,2 22,5 69,6 7,9
Sul 93,3 5,4 1,3 18,2 74,6 7,3
C.Oeste 81,8 15,9 2,3 11,5 81,2 7,3
Brasil 89,1 7,6 3,3 17,8 56,4 25,8
Fonte: IBGE (2000).

A observação da tabela permite verificar que, no meio rural, a maior parte da população é
abastecida por poços ou nascentes e por outras formas não especificadas no banco de dados do
IBGE, entretanto por conhecimento prévio, acrescenta-se que tais formas são o armazenamento de
água em cisternas, barreiros, açudes, tanques, dentre outras, fazendo com que, para algumas
comunidades, desprovidas de infra-estrutura de captação/armazenamento, a água possa estar
localizada a quilômetros de distância das residências, implicando em longas caminhadas e muito
esforço físico para carregar. O transporte da água, nesses casos, é feito em lombo de animais e/ou
latas de água carregadas na cabeça pela população pobre.
Com relação à construção de poços mencionada nos dados do IBGE, segundo Rebouças
(1997), devido à falta de controle das atividades de perfuração, tanto no nível federal e estadual
quanto municipal, o número total existente na região Nordeste é apenas estimado. Com base nos
levantamentos realizados pela SUDENE, estima-se em 50 mil o número poços existentes na região,
dos quais, apenas, cerca de 20 mil, estariam em operação por razões diversas, desde falta de recurso
financeiro para a instalação de bombas, casos de obtenção de água de qualidade imprópria ao
consumo, até razões de ordem político-eleitoreiras.
É importante assinalar que a maioria dos poços existentes não apresenta as características
esperadas de uma obra de engenharia geológica, isto é, construída e operada dentro de padrões
técnicos recomendados. A falta de fiscalização e controle necessário nos níveis federal, estadual e
municipal tem, sem dúvida, grande responsabilidade pelo quadro de improvisação e empirismo.
Além dos problemas mencionados, o risco de ocorrência de surtos de doenças de
veiculação hídrica no meio rural é alto, principalmente em função da possibilidade de contaminação
bacteriana de águas que muitas vezes são captadas em poços velhos, inadequadamente vedados e
Fórum Internacional do Meio Ambiente - A conferência da Terra 859

próximos de fontes de contaminação, como fossas e áreas de pastagem ocupadas por animais
(AMARAL et. al., 2003).
Segundo Amaral et. al. (idem), um dos maiores perigos da contaminação da água no meio
rural é o escoamento superficial, tendo em vista que o uso do solo na bacia hidrográfica é de
fundamental importância, do ponto de vista da gestão dos recursos hídricos. De acordo com esses
autores, em estudo realizado no México, concluiu-se que a presença de coliformes nas amostras das
águas dos mananciais estudados e dos domicílios tiveram relação direta com a presença de chuva,
devido ao arraste de excretas humanas e animais.
De acordo com Clarke & King (2005), o caso é tão grave que nos países subdesenvolvidos,
cerca de 4 milhões de pessoas são afetadas anualmente, e muitas delas, na maioria crianças, morrem
em conseqüência da desidratação que acompanha os casos de diarréias graves e sem tratamento.
Além disso, cerca de 80% de todas as doenças diagnosticadas nos países pobres são disseminadas
pelas águas. Algumas como a diarréia, são transmitidas pela água por microorganismos. Outras, a
exemplo da malária, que ainda mata mais de 1 milhão de pessoas por ano, são transmitidas por
animais maiores (mosquitos), que vivem sobre ou na água parada. Afora isso, ainda deve-se
considerar os casos de contaminação química das águas pelas atividades produtivas, tanto nas zonas
urbanas pelos esgotos e atividades industriais, quanto nas zonas rurais pelas atividades agrícolas que
utilizam agrotóxicos e outros insumos agrícolas que vão parar nos leitos dos rios e reservatórios de
águas. Entretanto, apesar da importância do levantamento desses parâmetros, há ainda um número
reduzido de estudos quanto à qualidade das águas das zonas rurais usadas para o consumo humano e
dessedentação de animais.

O PAPEL DA TECNOLOGIA NA CONFIGURAÇÃO DE DISTINTOS CENÁRIOS NO


NORDESTE SEMI-ÁRIDO
A idéia de que a condição semi-árida está diretamente relacionada com a baixa
produtividade agrícola é totalmente falsa, pois a região semi-árida do Brasil não é pior, em termos
de potencialidades agrícolas, que muitas outras áreas semi-áridas do mundo, notadamente o Oeste
dos Estados Unidos. A existência de ilhas de sucesso e prosperidade no contexto semi-árido
brasileiro indica ser viável a ocorrência de significativas e positivas mudanças no seu cenário
agrícola (SILVA, 1996, p.103).
Na perspectiva de um aproveitamento com racionalidade do potencial hídrico existente,
várias são as ações com tal intuito. Muitas podem ser consideradas carregadas êxito, a exemplo da
agricultura irrigada do vales férteis possibilitados pela construção de represas e as margens dos rios
perenes.
Além disso, já se registram providências por parte das políticas públicas e iniciativas de
organizações não governamentais com o propósito de efetivarem um melhor aproveitamento das
águas, através de atividades compatíveis com a oferta e, principalmente, adequadas a qualidade,
muitas vezes não potáveis. Algumas destas práticas são elencadas na seqüência deste trabalho.
Uma delas é o Sistema Integrado de Reuso dos Efluentes da Dessalinização, que consiste
na produção de água potável e no reaproveitamento do sal extraído da dessalinização para a criação
de tilápia rosa, uma espécie adaptada as condições climáticas do semi-árido. Noutra etapa do
processo, a água salgada já utilizada na piscicultura é reaproveitada para o cultivo de uma planta
conhecida como erva-sal, comumente aproveitada na alimentação de caprinos e ovinos
(EMBRAPA, 2007).
O projeto, incluído no programa Água Doce, permite fixar o homem na região e ainda
gerar renda para o sertanejo. Este conjunto de ações tem como meta possibilitar o fortalecimento
nutricional da população, melhorando as condições de vida e garantindo a segurança alimentar,
oferecendo água de boa qualidade. Numa etapa seguinte, o sistema avaliará os resultados do uso do
rejeito da dessalinização na criação de Tilápia Rosa e, dependendo do êxito alcançado, projeta-se
expandir a experiência com a criação, nos mesmos moldes, do Camarão Branco do Pacífico.
Outro projeto que merece destaque refere-se as Técnicas Agrícolas para Contenção de Solo
e Água, realizado pela Fundação Nacional de Saúde em parceria com a Universidade Federal de
Fórum Internacional do Meio Ambiente - A conferência da Terra 860

Campina Grande, que contempla algumas ações de manejo como: barramento com pneus usados
para a plantação em curvas de nível, cujo objetivo é reter solo e água; barragens subterrâneas
utilizando lona plástica; anéis pré-moldados para a captação de água dos rios e riachos e
terraceamento com tiras de pneus usados com o intuito de conter a erosão de vertentes por ocasião
das fortes enxurradas (BARACUHY et. al., 2007). Os programas mencionados objetivam a
conservação dos recursos naturais da caatinga, seja por contemplar uma visão sistêmica do
ambiente, seja por reaproveitar materiais de difícil decomposição na natureza, em benefício dela
própria, no caso do segundo exemplo.
Esses exemplos configuram a existência, na região em análise, de dois cenários: o
primeiro, que pode até ser designado de pré-capitalista e outro de agricultura moderna. Em ambos
existe a confluência de um conjunto de aspectos integrados, que determinam a nível de
vulnerabilidade local.
No primeiro, tem-se alta vulnerabilidade socioeconômica por parte da população,
decorrente da expropriação dos bens de produção e de consumo, que remonta ao período colonial, o
que implica em uso de tecnologias arcaicas e, no que se refere aos recursos hídricos, vincula-se a
dependência de fontes de abastecimento de caráter rudimentar e sem nenhuma forma de tratamento
para remoção de poluentes, tornando a população vulnerável também do ponto de vista da saúde
humana; quanto ao segundo cenário, trata-se, portanto, da inserção de pequenas manchas de
modernidade no interior de um contexto mais amplo, provenientes de uma agricultura altamente
tecnificada, voltada para a exportação e que faz uso da irrigação, o que vai ocasionar a ascensão
econômica de um pequeno segmento de produtores rurais. Para esses empresários, a água não
representa um fator limitante, o que mostra que a seca não é um fenômeno limitante para a região,
ao contrário, serve de redenção para uma classe política privilegiada, que se promove à custa do
fenômeno natural.

MECANISMOS DE GESTÃO DA ÁGUA NO SEMI-ÁRIDO


Afora a certeza do fenômeno cíclico das secas, seus desdobramentos posteriores podem ser
creditados a uma construção social realizada, através de uma série de ações cotidianas. Este
conjunto de ações tem contribuído para a constatação de que os malefícios presentes no seio da
sociedade local não decorrem de problemas unilaterais.
A visão equivocada da abundancia da água está, hoje, em declínio. Aos poucos e
progressivamente vai surgindo um nível de conscientização que, de forma alguma, brota de
qualquer política governamental. Isso mostra que o hábito de consumir a água com racionalidade,
mormente em áreas de grande deficiência hídrica, a exemplo do semi-árido, deve está ligado a
práticas do cotidiano, seja na agricultura, nas residências ou em qualquer esfera do processo
produtivo.
Nesse sentido, Baú apud Velasco (1991) assegura que ações simples como a captação de
água da chuva, reusar a água de qualidade inferior para tarefas menos nobres, utilizar equipamentos
que poupam água, ou uma ação de âmbito maior -, caso do manejo de uma bacia hidrográfica, tudo
isso representa o uso eficiente de água e podem ser consideradas ações educativas e
conservacionistas.
Baracuhy et. al. (2007) e Rebouças (2001) preconizam que a solução para atenuar os
impactos advindos dos baixos níveis de precipitação reside no manejo integrado dos recursos, por
meio de uma série de ações que vão desde a conscientização, passando por diagnósticos e
prognósticos, até a implementação de obras de conservação e correção em uma unidade natural.
A participação da sociedade é, portanto, a maior ação no sentido de uma maior
racionalidade no uso eficiente da água, num contexto de escassez se encontra ao alcance de todos os
indivíduos que dela se servem, mas não deve fugir a responsabilidade das instituições de
fiscalização e controle, com vistas a atingir os mesmos fins. Dessa forma, para adequar a
disponibilidade da água existente ao desenvolvimento de comunidades do semi-árido, instituições
públicas e parceiros devem se unir com a criação de um sistema que possa prover o uso eficiente
dos recursos, em suas diferentes etapas.
Fórum Internacional do Meio Ambiente - A conferência da Terra 861

Nesse contexto, segundo Rebouças (2001), a avaliação do problema da água de uma região
já não pode se restringir ao simples balanço entre oferta e demanda. Deve abranger também os
inter-relacionamentos entre os seus recursos hídricos com as demais peculiaridades geoambientais e
sócio-culturais, tendo em vista alcançar e garantir a qualidade de vida da sociedade, a qualidade do
desenvolvimento socioeconômico e a conservação das suas reservas de capital ecológico.

CONSIDERAÇÕES
Diante do exposto, fica evidente que a principal agravante da pobreza da população do
semi-árido brasileiro não é o fenômeno das secas, que embora seja uma realidade, seus efeitos são
mais perceptíveis por uma parcela da população (a maioria), que não dispõe das condições mínimas
para a existência humana: alimentação adequada, água de boa qualidade, emprego/renda, dentre
outras.
Por sua vez, é sobre essa população que se encontra o maior risco no que concerne a
possibilidade de contrair doenças de veiculação hídrica, pois o modelo de saneamento ambiental
brasileiro foi idealizado para atender as áreas urbanas, ficando a população rural, mesmo a que
reside próximo aos grandes mananciais, dependente do consumo de água in natura, se expondo aos
riscos e, muitas vezes, desprendendo muito esforço físico para ter acesso a uma pequena quantidade
de água.
No âmbito dessa região, caracterizada nacionalmente como atrasada em vários aspectos,
surge outro cenário, formado por áreas de agricultura intensiva, voltada à exportação, que não vê
nos recursos hídricos um agravante para a produção agrícola.
Por fim, a limitação que caracteriza os recursos hídricos no Nordeste semi-árido é no que
se refere a necessidade de adoção de mecanismos de gestão adequada tanto dos recursos hídricos,
através da adoção da bacia hidrográfica enquanto unidade de planejamento ambiental, quanto do
potencial humano existente na região, que vem sendo preterido, ao longo de cinco séculos de
colonização.

REFERÊNCIAS BIBLIOGRÁFICAS
AB’SÁBER, A. N. Sertões e Sertanejos: uma geografia humana sofrida. Estudos Avançados, v. 13,
n. 36, p. 7-59, 1999.
______. Os domínios de natureza no Brasil: potencialidades paisagísticas. São Paulo: Ateliê
Editorial, 2003.
AMARAL, L. A. do; NADER FILHO, A.; ROSSI JÚNIOR, O. D.; FERREIRA, F. L. A.;
BARROS, L. S. S. Água de consumo humano como fator de risco à saúde em propriedades rurais.
São Paulo: Revista de Saúde Pública, V. 37, n. 4, 2003.
ANDRADE, M. C. de. A terra e o homem no Nordeste. 7. ed. São Paulo: Cortez, 2005.
ASA, Articulação para o Semi-Árido. Obtido em <http://www.asabrasil.org.br/>. Acesso em 08 de
junho. 2007.
BARACUHY, J. G. V. FARIAS, S. A. R.; DANTAS NETO; LIMA, V. L. A.; FURTADO, D. A.;
ROCHA, J. S. M.; PEREIRA, J. P. G. Técnicas Agrícolas para contenção de solo e água. Campina
Grande: Impressos Adilson, 2007.
CLARKE, R.; KING, J. O Atlas da Água: o mapeamento completo do recurso mais precioso do
Planeta. São Paulo: Publifolha, 2005, 128 p.
Embrapa, EMPRESA BRASILEIRA DE PESQUISA AGROPECUÀRA. Semi-árido. Uso de
rejeitos como insumo produtivo. Disponível em: www.cpatsa.embrapa.br/noticias/ Acesso em set.
2007.
IBGE, Instituto Brasileiro de Geografia e Estatística. Censo 2000. disponível em www.ibge.gov.br
Acesso: abril 2005.
MINISTÉRIO DA INTEGRAÇÃO NACIONAL – Governo do Brasil. Cartilha Nova Delimitação
do Semi-árido, Brasília, 2005. Disponível em: http://www.integracao.gov.br. Acesso: 18 de fev. de
2008.
Fórum Internacional do Meio Ambiente - A conferência da Terra 862

REBOUÇAS, A. da C. Água na região Nordeste: desperdício e escassez. Estudos Avançados, 11


(29), 1997.
______. Água e Desenvolvimento rural. Estudos Avançados, 15 (43) 2001.
SILVA, W.L.C. Irrigação para a produção de alimentos no semi-árido brasileiro. EMBRAPA-
CPATSA. Brasília, 4a Reunião Especial da SBPC, Anais..., p103-105, 1996.
SOARES, Tales Miler. Utilização de águas salobras no cultivo de alface em sistemas hidropônicos
NFT como alternativa agrícola condizente ao Semi-árido brasileiro. Tese (Doutorado) 267 p.
Piracicaba, 2007.
SUASSUNA, J. Semi-árido: proposta de convivência com a seca. Fortaleza: Fundação Konrad
Adenauer, 2002, 13 p.
VELASCO, H. G. Uso Eficiente da Água: um enfoque multidimensional. Seminário Internacional
Sobre o Uso Eficiente da Água. Cidade do México, 1991.
Fórum Internacional do Meio Ambiente - A conferência da Terra 863

A APLICAÇÃO DO INSTRUMENTO DE COBRANÇA PELO USO DA ÁGUA SOB A


ÓTICA DOS CONSUMIDORES INDUSTRIAIS NA CIDADE DE ITABUNA-BA.

Anderson Alves Santos


Economista, Especialista em Administração Financeira e Contabilidade Gerencial (FTC-BA)
Especialista em Meio Ambiente e Desenvolvimento (UESB), Mestrando em Desenvolvimento
Regional e Meio Ambiente (UESC) – Universidade Estadual de Santa Cruz – Ilhéus – Bahia,
Bolsista do Serviço Alemão de Intercâmbio Acadêmico – DAAD. eco.economia@uol.com.br
Fabiana Faxina
Bacharel em Turismo, Especialista em Educação e Gestão Ambiental, Mestranda em
Desenvolvimento Regional e Meio Ambiente (UESC) – Universidade Estadual de Santa Cruz –
Ilhéus – Bahia, Bolsista do Serviço Alemão de Intercâmbio Acadêmico – DAAD.
fabi_fa@hotmail.com
Silmara Borges da Hora
Geógrafa, Especialista em Meio Ambiente e Desenvolvimento (UESB), Mestranda em
Desenvolvimento Regional e Meio Ambiente (UESC) – Universidade Estadual de Santa Cruz –
Ilhéus – Bahia, Bolsista FAPESB. silmarahora@yahoo.com

RESUMO
O presente trabalho foi realizado com o propósito de observar a opinião dos consumidores
de água, considerando somente as organizações do setor industrial, quanto a aplicação da cobrança
pelo uso da água, na cidade de Itabuna – BA. O estudo buscou identificar o nível de informação que
o referido público dispunha sobre esse mecanismo de controle e estímulo ao uso racional dos
recursos hídricos. Não obstante, buscou-se saber o que os consumidores achavam da aplicação da
cobrança, justificando com os principais motivos que os levavam a concordar ou não com a
cobrança. Depois da aplicação criteriosa de 130 questionários, buscou-se identificar aspectos
relevantes quanto às opiniões expressas pelos consumidores. Além da pesquisa, utilizou-se
informações técnicas do Diagnóstico dos Serviços de Água e Esgoto do ano de 2000, fornecidas
pelo Sistema Nacional de Informações Sobre Saneamento – SNIS e, complementarmente, foram
utilizados alguns dados publicados pelo Instituto Brasileiro de Geografia e Estatística – IBGE, além
de fontes da EMASA - Empresa Municipal de Água e Saneamento do município de Itabuna – BA.
Os cálculos realizados apoiaram-se em formulações matemáticas e estatísticas concebidas
especificamente para a realização desse trabalho, sendo possível avaliar a correlação entre duas
variáveis pesquisadas (valor de tarifa e concordância à cobrança). A avaliação dos resultados
revelou, dentre outras informações, que os entrevistados apresentam resistência quanto à cobrança
e, sobretudo, àqueles que demandavam um maior consumo de água.
Palavras-chave: Abastecimento de água; cobrança; recursos hídricos.

ABSTRACT
The aim of this writing is to observe the opinion of the industrial consumers about the
exaction for the water utilization at Itabuna-BA. The study tries to identify if the consumers have
information about the new mechanism of control used by the responsible company and if they agree
or not with this step. After careful application of 130 questionnaires, sought to identify relevant
issues on the views expressed by consumers. In addition to research, it was used technical
information Diagnosis of the Water and Sewerage Services in the year 2000, provided by the
National System of Information About Sanitation - SNIS and in addition, we used some data
published by the Brazilian Institute of Geography and Statistics - IBGE, in addition to sources of
EMASA - responsible company for the basic sanitation at Itabuna-BA. Calculations performed
backed up in statistics and mathematical formulations designed specifically for the completion of
this work, and to evaluate the correlation between two variables surveyed (value of the collection
rate and correlation). The evaluation of the results showed, among other information, that the
Fórum Internacional do Meio Ambiente - A conferência da Terra 864

respondents have resistance on the recovery, and especially those who have a greater consumption
of water.
Key-words: water supply; exaction; water resources.

INTRODUÇÃO
Com o advento da revolução industrial, o homem evoluiu seus conceitos quanto ao meio
ambiente, passando a observá-lo como um fator de produção inesgotável e infinito. Com isso, suas
atividades passaram a ter um maior grau de dependência quanto aos recursos naturais. Como
conseqüência disso observou-se o crescimento exacerbado de plantações, exploração de minérios e,
não obstante, o uso indiscriminado da água como insumo de produção. Tudo isso necessário à
sustentação do contingente populacional e do crescimento exponencial da atividade industrial.
Ainda durante a segunda metade do século XVIII, com a grande pujança da revolução
industrial, as indústrias de modo geral, exploravam suas matérias-primas de maneira arbitrária sem
nenhum controle quanto à manutenção dos recursos existentes. Nesta época os elementos extraídos
das reservas naturais eram tidos como “dádivas da natureza” e por isso entendia-se que o seu uso e
exploração não estavam condicionados a algum tipo de restrição. A concepção de “uso irrestrito e
infinito” dos recursos naturais se perpetuou até meados do século XX com a grande transformação
da indústria mundial.
No Brasil, com a promulgação da Lei no 9.433/97111, a cobrança pelo uso da água passou a
ser amparada pela crescente demanda pelos recursos hídricos. Por se tratar de um bem escasso, a
água deverá ser submetida às forças de mercado, bem como à lei da oferta e da procura, que
conseguinte irão traduzir-se em preço.
Como a importância da água é indiscutível e a cobrança é um fato real e inegável, entende-
se como oportuno conhecer melhor a opinião dos consumidores industriais quanto a aplicação da
cobrança, principalmente no que se refere aos valores propostos e sua destinação como forma de
investimento. Assim, o objetivo deste trabalho foi conhecer a opinião dos consumidores de água,
considerando como consumidor as organizações do setor industrial, situadas no município de
Itabuna – BA, quanto a um dos instrumentos de gestão de recursos hídricos: a cobrança pelo uso da
água.

OBJETIVO
Avaliar a opinião dos consumidores de água quanto a aplicação do instrumento de
cobrança pelo uso da água, considerando como público de investigação as organizações do setor
industrial da cidade de Itabuna – BA.

METODOLOGIA
Área de Estudo
A presente pesquisa abrange os usuários industriais situados na cidade de Itabuna,
localizada na microrregião Litoral Sul do Estado da Bahia, distante 433 quilômetros da capital –
Salvador. O município possui uma área territorial de 444,8 Km², sendo limítrofe de importantes
cidades na região, como Ilhéus, Itajuípe e Buerarema, por exemplo.
Segundo dados do Instituto Brasileiro de Geografia e Estatística – IBGE (2000), a
população do município de Itabuna totaliza 196.675 habitantes, sendo que, sua área urbana possui
191.184 e a rural com 5.491 habitantes. Mas, conforme estimativas da própria instituição, o ano de
2007, quando foi realizado o presente trabalho, o município de Itabuna dispunha de 203.816
habitantes, aproximadamente.
Para o levantamento dos dados primários, foram realizadas entrevistas com colaboradores
de vinte e duas organizações do setor industrial do município de Itabuna – BA. Utilizou-se como
premissa a escolha de um colaborador ligado à área de relacionamento institucional e que,

111
É por meio desta lei que o Congresso Nacional instituiu a Política Nacional de Recursos Hídricos, cujos
fundamentos interessantes de serem ressaltados para este trabalho são: “ I – A água é um bem de domínio público; II –
A água é um recurso natural limitado, dotado de valor econômico.”
Fórum Internacional do Meio Ambiente - A conferência da Terra 865

necessariamente, fosse responsável pela gestão da água na organização. Para o caso das que não
possuíam colaboradores neste enquadramento, optou-se por entrevistar o diretor ou gerente mais
próximo da área.

Procedimento da Pesquisa
Conforme previamente idealizado, a pesquisa supra-descrita limitou-se, apenas, às
observações referentes às indústrias instaladas no perímetro urbano de Itabuna – BA.
Embasada por amostragem não probabilística, a pesquisa foi constituída pelo método
indutivo, no qual consiste em tirar conclusões sobre determinada população, com base em
resultados verificados em amostras (subconjuntos finitos) dessa população.
Com relação a amostragem utilizou-se no trabalho o método por acessibilidade. Segundo
Gil (2000), nesse tipo de amostragem o pesquisador seleciona os elementos a que tem acesso,
admitindo que estes possam, de alguma forma, representar o universo pesquisado. Sendo assim,
isenta a necessidade de se estabelecer critérios mais rebuscados e complexos para a definição de
parâmetros para amostra. Os dados primários foram oriundos de entrevistas realizadas, nas
organizações pré-selecionadas para a realização da pesquisa, as quais foram realizadas de forma
direta, divididas em duas etapas: pesquisa-piloto e pesquisa definitiva.

Processamento dos Dados


Os dados coletados foram tabulados e concomitantemente processados graficamente,
utilizando-se o programa Microsoft Excel. Os resultados obtidos tornaram-se a base para análise e
conseqüente interpretação dos dados, proporcionando respostas às investigações deste trabalho,
estabelecendo, portanto, relações necessárias entre os dados obtidos e as questões formuladas.

RESULTADOS E DISCUSSÃO
Os resultados desenharam um cenário no qual embora se perceba que a preocupação com
os recursos hídricos já esteja disseminada entre as organiações do setor industrial, nota-se, por outro
lado, que reina grande desconhecimento a respeito da respectiva legislação. Este quadro implica a
premente necessidade de se elucidar e ampliar a divulgação da Política Nacional de Recursos
Hídricos, instituída pela Lei no 9.433/97, de forma a permitir decisões mais eficientes no tratamento
deste recurso tão essencial, não apenas ao bom desempenho das organizações, mas à própria
existência humana.
A pesquisa foi realizada em vinte e duas organizações do setor industrial da cidade
Itabuna-BA, no período de 05 a 08 de agosto de 2007. Foi utilizado um questionário semi-
estruturado com quinze questões que, entre outras, possibilitaram averiguar o nível de
sensibilização do empresariado industrial no que diz respeito à situação da disposição dos recursos
hídricos. Observar-se-á se o mesmo está ciente do desenho do Sistema de Gestão proposto na
legislação, como por exemplo, da existência de comitês, vigência do instrumento de outorga e da
criação do instrumento de gestão e, ainda, sua posição com relação a esta cobrança.
As organizações alvo da pesquisa se concentraram em seis distintos setores industriais:
fabricação de calçados e material esportivo, laticínio, indústria química (fabricação de esmaltes),
fábrica de pré-moldados, vestuário e metalurgia.
A maioria das organizações pesquisadas (72,7%) utiliza a água diretamente no seu
processo de fabricação, ou seja, a água é, além de insumo, matéria-prima para a indústria. As outras
27,3%, apenas fazem uso da água como recurso indispensável às atividades de suporte e
manutenção diária à planta da fábrica.
Dentre outras informações relevantes, observou-se uma baixa capacidade das organizações
em destinarem corretamente seus efluentes. Constatou-se que 55% destas fazem uso da rede de
esgoto da EMASA como forma de transporte dos seus efluentes. Apenas 27% possuem lagoa
anaeróbia ou facultativa para tratamento do esgoto. As demais (18%) possuem sistemas alternativos
com precário sistema de tratamento, ou em alguns casos, os efluentes são lançados sem qualquer
tipo de tratamento.
Fórum Internacional do Meio Ambiente - A conferência da Terra 866

Um fato interessante que pode ser observado é a participação da água nos custos
operacionais da empresa. Ao analisar as organizações pesquisadas, percebeu-se que em 36,4% delas
o impacto no custo total está entre 2,6 a 5,0%. Não havendo organizações que ultrapassassem o
índice de 10% de participação nos custos totais.
No que se refere a disponibilidade hídrica na região, mais da metade dos entrevistados
responderam que a situação é crítica (54,5%) ou emergencial (9,1%). Outros 36,4% acreditam que a
situação da cidade de Itabuna é parcialmente satisfatória. Esse resultado é, provavelmente, um
resultado da atual conjuntura dos sistemas de abastecimento de água da cidade, onde o mesmo é
caracterizado por um sistema de abastecimento de água com sérios períodos de intermitência.
De modo geral, o fato que mais chamou a atenção é o desconhecimento por parte das
organizações pesquisadas naquilo que se refere a existência de um instrumento de gestão baseado
na cobrança pelo uso da água (Figura 1). Perguntados sobre o assunto, 72,7% delas demostraram
não saber da existência deste mecanismo. Esse resultado pode-se considerar como não satisfatório,
pois a cobrança é uma realidade irreversível e que, do ponto de vista, da responsabilidade ambiental
é inadmissível que ainda existam empresas com tal desconhecimento. Em outras palavras,
organizações do setor industrial, por serem um usuárias significativas em termos de volume de água
consumido, deveria estar a frente dos demais usuários no que tange ao conhecimento e a preparação
estrutural para a aplicação da cobrança pelo uso da água.

Figura 1 – Organizações que conhecem o instrumento de cobrança pelo uso da água. Fonte: Dados
da Pesquisa.

Para Viegas (2001) é paradoxal que, por ser considerado o setor mais bem organizado e de
maior visibilidade, a prioridade da cobrança esteja voltada para a indústria, privilegiando ou até
mesmo isentando outros usos que têm, em várias bacias hidrográficas, maior percentual de consumo
de água. Pelo fato desses setores não estarem tão estruturados ou se desconhecerem dados mais
consistentes sobre o seu consumo ou carga poluidora.
Ao se questionar sobre a concordância ou não com a lei nº. 9.433/1997, no que tange a
cobrança pelo uso da água, 81,81% do total se mostraram desfavoráveis, enquanto 18,19%
concordaram com a aplicação do referido instrumento (Figura 2). Interpretando a posição contrária
a cobrança, Viegas (2001) cita que em experiências existentes no Brasil, dependendo dos critérios
de cobrança estabelecidos, algumas indústrias poderão ser pesadamente oneradas e afetadas em sua
competitividade, principalmente aquelas intensivas no uso da água.
Fórum Internacional do Meio Ambiente - A conferência da Terra 867

Figura 2 – Número de indústrias que concordam com a cobrança.pelo uso da água. Fonte: Dados da
Pesquisa.

Para a minoria que concordou com a cobrança (quatro organizações) os motivos alegados
como justificáveis à sua implementação foram: evitar desperdício; preocupação com o impacto
ambiental, e preocupação com a escassez de água. A princípio, não foi possível traçar um
referencial sobre essa questão, pois o número de organizações que responderam e, sobretudo pelas
respostas distintas que foram dadas, não fornecem subsídios suficientes capaz de delinear um perfil
destes usuários.
A Figura 3 apresenta as razões que fazem com que as indústrias não concordem com a
cobrança. Metade dos entrevistados afirmou que tem dúvidas quanto a finalidade da cobrança, isso
significa dizer que os mesmos não têm garantias concretas de que os recursos auferidos com a
cobrança seja, de fato, investidos no destino a que se almeja. Para 25%, a cobrança irá aumentar os
custos operacionais, assim como preconizou Viegas (2001) em observações realizadas na região
Sudeste do Brasil. Outros 25% alegaram que a água já é cobrada na prestação do serviço e,
portanto, não é possível aceitar tal cobrança.

Figura 3 – Motivos que levam as organizações a discordarem da cobrança. Fonte: Dados da


Pesquisa.

Por fim, perguntadas sobre o destino que os recursos oriundos da cobrança deveriam
tomar, as quatro indústrias que haviam concordado indicaram como sendo prioritário o
Fórum Internacional do Meio Ambiente - A conferência da Terra 868

investimento em projetos de redução do impacto de ambiental nos mananciais (33,33%) e projetos


contra escassez dos recursos hídricos (66,66%).

CONCLUSÃO
Os resultados obtidos na pesquisa refletiram alguns aspectos importantes quanto a opinião
dos usuários no que tange a disponibilidade hídrica da cidade de Itabuna – BA. Para 63,6% das
organizações do setor industrial pesquisadas consideraram a situação como sendo emergencial,
crítica ou parcialmente satisfatório. Isso permite concluir que existe uma deficiência significativa
com relação ao abastecimento de água, do ponto de vista da oferta do produto.
Um resultado esperado, mas que demonstra muita preocupação é quanto ao conhecimento
dos usuários em relação a cobrança pelo uso da água. A maioria dos entrevistados responderam que
não conheciam sobre tal fato, o que totalizou 72,7% do rol de entrevistados. E de maneira geral,
esse resultado não é satisfatório porque é fundamental o envolvimento efetivo dos diversos setores
interessados no uso da água para que os vários aspectos reguladores sejam bem conhecidos e
aplicados a contento.
Os Comitês de Bacias apresentam-se como fórum adequado para a promoção desses
debates, sendo relevante estabelecer negociações entre os diversos setores usuários para definição
das bases, critérios e procedimentos a serem seguidos para avançar nos estudos da cobrança,
garantindo mais participação do setor industrial no processo de evolução da temática. O que se pode
observar é que a cobrança como instrumento de garantia do uso sustentável da água vai depender do
seu uso relativo.
Para Maia (1999) nas regiões onde a água tem qualidade e é abundante, não parece ser
justificável grandes investimentos na implementação de mecanismos de cobrança e monitoramento.
Por outro lado, contrapondo essa afirmação, Itabuna onde a água é escassa e possui um déficit na
distribuição de aproximadamente 40%, parece ser importante estabelecer um monitoramento e
cobrança eficaz para um uso mais eficiente.
Portanto, os problemas relativos à gestão de recursos hídricos ultrapassaram os limites do
interesse estrito das companhias de abastecimento e de especialistas no assunto, na medida em que a
escassez de recursos hídricos emerge como uma das questões sócio-econômicas mais graves do
novo milênio. Para Itabuna, a situação da disponibilidade dos recursos hídricos se tornou um
assunto que monopoliza o centro dos debates quando o assunto é crescimento e desenvolvimento
econômico.
Mesmo diante das dificuldades encontradas no abastecimento de água, os entrevistados não
se manifestaram adeptos à implementação da cobrança. Infelizmente, esse quadro revela um cenário
paradoxal levando-se em consideração alguns pontos importantes: a) a cidade não dispõe de água
suficiente para atender toda a população; b) existe um alto índice de perdas no abastecimento; e c)
mesmo na situação de déficit na oferta de água tratada, a população não concorda com o pagamento
da cobrança pelo uso da água.
O que se percebe é que a aversão quanto a aplicação da cobrança é falseada pela impressão
de abundância e regularidade de abastecimento, estimulando a sua qualificação como a de um bem
inferior, sem que seu valor real seja percebido pelos usuários locais. E, em último caso, desculpa-se
pelo fato de não saber quanto a aplicação dos recursos auferidos com a cobrança. Por fim, a
presente pesquisa deixa claro duas importantes observações: 1) a falta de conhecimento por parte da
sociedade quanto aos mecanismos gestão e 2) a grande lacuna existente entre o discurso e a prática,
ou mais precisamente, a diferença entre querer e fazer efetivamente.
Observa-se, entretanto, que o desconhecimento da sociedade, apontado pela pesquisa, no
que permeia aos mecanismos de gestão dos recursos hídricos é concomitante com a opinião aversa à
aplicação do instrumento de cobrança pelo uso da água. Desta forma, para que este cenário pudesse
ser revertido, a sociedade deveria ser sensibilizada primeiramente sobre a situação em que o
elemento água se encontra na natureza, ou seja, para o agravamento da disposição deste recurso. Em
conseqüência, a Política Nacional de Recursos Hídricos e o Sistema Nacional de Gerenciamento de
Fórum Internacional do Meio Ambiente - A conferência da Terra 869

Recursos Hídricos, deveriam ser melhor assimilados principalmente pelo setor industrial, em função
de representar grande parcela no consumo da água.
Contudo, enquanto iniciativas como estas não forem concretizadas, os problemas
originados com esta resistência quanto à aplicação do instrumento de cobrança pelo uso da água
persistirá, o que dificultarão os esforços de conservação deste bem que a cada dia se encontra de
modo mais escasso à oferta humana.

REFERÊNCIAS BIBLIOGRÁFICAS
BRASIL. Lei no 9.433/97 de 08 de janeiro de 1997. Institui a Política Nacional de Recursos
Hídricos, cria o Sistema Nacional de Gerenciamento de Recursos Hídricos, regulamenta o inciso
XIX do art. 21 da Constituição Federal, e altera o art. 1º da Lei nº 8.001, de 13 de março de 1990,
que modificou a Lei nº 7.990, de 28 de dezembro de 1989. Disponível em <
http://www.planalto.gov.br/CCIVIL/LEIS/L9433.htm>. Acesso em 16 de abr. 2008.
CEIVAP (Comitê para Integração da Bacia Hidrográfica do Rio Paraíba do Sul), 2001,Bacia do Rio
Paraíba do Sul: Livro da Bacia. Projeto PROAGUA / MMA / ANA / Banco Mundial / UNESCO,
Brasília-DF.
FERNANDEZ, J. C.; GARRIDO, R. J. Economia dos Recursos Hídricos. Editora Edufba, Coleção
Pré-textos, Salvador-BA, 2002.
MAIA, Marcus Vinicius Soares de Souza. A questão da utilização dos recursos hídricos no Brasil e
a necessidade de seu uso racional com vistas à sua não extinção. In: Revista de Direito Agrário,
nº...., Brasília-DF, 1999
MOTTA, Ronaldo Seroa da. A Utilização de Critérios Econômico para Valorização da Água no
Brasil. Textos para discussão nº. 556, BNDES, Rio de Janeiro – RJ, 1998.
VIEGAS, Mauro. A Água e seu Valor Econômico no Contexto Nacional. SEMINÁRIO O VALOR
ECONÔMICO DA ÁGUA: impactos sobre o setor industrial nacional, Vitória, 09 de julho de 2002.
Anais. Brasília-DF, 2002.
Fórum Internacional do Meio Ambiente - A conferência da Terra 870

GESTÃO DE RECURSOS HÍDRICOS: UM ESTUDO DE CASO NA BACIA DO RIO


PIRAPAMA - PE

Antonio Jeronimo BARBOSA FILHO


FUNESO/UNESF. antoniofilho79@hotmail.com
Celso Cardoso GOMES
FUNESO/UNESF. marmecel@gmail.com

RESUMO
Esta monografia consiste em uma reflexão sobre a problemática da água no século XXI e a
sua gestão. A água: o principal bem natural do Planeta atualmente vem sendo usado de forma
desordenada, levando a ocorrência de diversos impactos ambientais, que trazem como
conseqüência, a diminuição de sua oferta, ou mesmo, a poluição da água potável. Neste estudo foi
realizado; uma análise da distribuição da água em nível mundial e nacional, verificando o aumento
da população em relação ao consumo de água, além da concentração populacional e seus impactos
na quantidade e qualidade da água. Analisou-se, também, a água sob a ótica da legislação brasileira
e a sua política, apresentando um panorama geral da gestão dos recursos hídricos no Brasil tomando
como exemplo a bacia do rio pirapama, onde são abordados aspectos legais relacionados aos
recursos hídricos, estrutura organizacional do sistema nacional de gerenciamento de recursos
hídricos e a atuação dos comitês de bacia em especial, o comitê da bacia hidrográfica do rio
pirapama e suas perspectivas para o avanço de sua gestão. As técnicas de pesquisa utilizadas para a
realização deste trabalho monográfico, foi o levantamento de dados através de pesquisa
bibliográfica especializada com base na questão ambiental, bem como um levantamento de dados
através de uma entrevista com o representante da Secretaria de desenvolvimento urbano e meio
ambiente, do município de Moreno. Neste estudo podemos constatar que a gestão dos recursos
hídricos através dos comitês de bacias hidrográficas prioriza a elaboração e implementação de um
plano de desenvolvimento sustentável para a região através da gestão integrada e participativa dos
recursos hídricos e a inserção dos princípios da Agenda 21 Global, acordados na ECO–92.
Palavras-Chave: Água, Bacias Hidrográficas, Comitês de Bacias, Gestão dos Recursos Hídricos.

ABSTRACT
This paper is a reflexion about some issues concerned to water and its management.Water,
the main natural good in the planet , has been used in a disorganized way , causing huge
environmental impacts which have as consequences its own reduction or even the pollution of
drinking water. In this study, it was done an analysis of the real distribution of water in the world
and in Brazil, apart from the people concentration and their impacts on the amount of water and its
quality. This fact was analyzed, on the other hand, from the perspective of Brazilian laws and its
politics, showing an overview of water resources in the country, taking as example the Pirapama
river basin, where legal aspects related to water resources and its national structure and the actions
of rivers committee, specially the Pirapama river committee and the expectations for improvement
of its management were exposed. The researches techniques used in this work were the raising of
information through an interview with the urban and environmental development secretary
representative from Moreno. It was possible to notice that the water resources management through
the water basin committee focus the starting and carrying of a sustainable development plan to the
region through the management of water resources and the usage of Agenda 21 global principles
dealed in ECO 92’.
Word-Key: Water, water basin, basin committee, water resources management.

CONSIDERAÇÕES INICIAIS
O presente artigo consiste em uma reflexão sobre a problemática da água no século XXI e
a sua gestão. A água: o principal bem natural do Planeta atualmente vem sendo usado de forma
desordenada, levando a ocorrência de diversos impactos ambientais, que trazem como
conseqüência, a diminuição de sua oferta, ou mesmo, a poluição da água potável. Este estudo tem
Fórum Internacional do Meio Ambiente - A conferência da Terra 871

como objetivo geral a análise da gestão dos recursos hídricos, dando ênfase à bacia do rio Pirapama;
para isso sendo objetivada de forma específica a análise da distribuição da água em nível mundial e
nacional, verificando o aumento da população em relação ao consumo de água, além da
concentração populacional e seus impactos na quantidade e qualidade da água. Analisou-se,
também, a água sob a ótica da legislação brasileira e a sua política, apresentando um panorama
geral da gestão dos recursos hídricos no Brasil tomando como exemplo a bacia do rio Pirapama. As
técnicas de pesquisa utilizadas para a realização deste trabalho foi o levantamento de dados através
de pesquisa bibliográfica especializada com base na questão ambiental, bem como um levantamento
de dados através de uma entrevista com o representante da Secretaria de desenvolvimento urbano e
meio ambiente, do município de Moreno. Neste estudo podemos constatar que a gestão dos recursos
hídricos através dos comitês de bacias hidrográficas prioriza a elaboração e implementação de um
plano de desenvolvimento sustentável para a região através da gestão integrada e participativa dos
recursos hídricos e a inserção dos princípios da Agenda 21 Global, acordados na ECO–92.

A ÁGUA NO CONTEXTO MUNDIAL


A água é fundamental para o planeta. Nela, surgiram as primeiras formas de vida, e a partir
destes, originaram-se as formas terrestres, as quais somente conseguiram sobreviver na medida em
que puderam desenvolver mecanismos fisiológicos que lhes permitiram retirar da água do meio e
retê-las em seus próprios organismos. A evolução dos seres vivos sempre foi dependente da água,
uma vez que as reações do metabolismo dos seres vivos ocorrem por via aquosa, pois além da água
ser quimicamente neutra, a mesma possui a propriedade de dissolver substâncias químicas minerais
e orgânicas, sólidas, líquidas ou gasosas (BRANCO, 1993).
Dados geológicos indicam que a quantidade total de água na terra permaneceu
praticamente constante nos últimos milhões de anos percorrendo seu ciclo natural ( REBOUÇAS,
2004).
A Água depois de prestar enormes serviços a toda espécie de vida na terra, elas novamente
evaporam, recomeçando seu ciclo, porém, os volumes existentes em cada um dos grandes
reservatórios de água na terra como; os oceanos, as calotas polares, as geleiras, as águas
subterrâneas podem ter variado durante esse tempo como afirma Rebouças (2004, pág. 22).
“Assim, a energia solar que atinge a terra transforma a água em vapor, que sobe à
atmosfera e esfria, formando as nuvens, a água líquida dos oceanos, rios, lagos, pantanais e que
escoa pelos rios (blue water flow), a umidade dos solos que dá suporte ao desenvolvimento da
exuberante cobertura vegetal (green water flow), e as águas subterrâneas (gray water flow) rasas.
Por sua vez, as nuvens são atraídas pela gravidade da terra, voltam a cair nos continentes e nos
oceanos na forma de chuvas, neblinas e neves, donde são novamente evaporadas, fechando o
infindável ciclo hidrológico.”
Segundo Lira (2007) a conservação das reservas deste recurso, vital para o planeta, tornou-
se um dos principais desafios da humanidade no século XXI (CONFERÊNCIA NACIONAL DOS
BISPOS DO BRASIL – CNBB, 2003). Assim, diante destes fatos é necessário criar uma
consciência crítica mundial em torno do uso desse recurso natural, baseando-se na premissa de que
este é um bem vital e finito, e dele todos dependem, e que, é de responsabilidade de todos, os
cuidados para a sua preservação.
Neste mesmo sentido, a Organização das Nações Unidas (ONU), coloca a água para
consumo humano no contexto do “direito humano à alimentação”. São várias as organizações não-
governamentais (ONG’s), que lutam por essa dimensão da água em nível planetário (CNBB, 2003).
A questão da água em nível mundial revela o agravamento da exclusão dos povos pobres;
além do escasseamento resultante da ação humana e das grandes concentrações demográficas, onde
afirmar que existirão guerras pela água faz parte do discurso contemporâneo. Os conflitos vão a
nível local, regional e até mesmo internacional, onde a possibilidade real de guerra é mais que
possibilidade: em vários lugares, é fato (CNBB, 2003).
A água tornou-se um elemento de disputa entre nações. Um relatório do Banco Mundial,
do ano de 1995, alerta para o fato de que “as guerras do século XXI serão por causa da água”; onde
Fórum Internacional do Meio Ambiente - A conferência da Terra 872

o número de 250 milhões de pessoas que enfrentam a escassez crônica de água, em 30 anos saltará
para 3 bilhões. Esses dados aumentam o risco de guerras, pois a questão das águas torna-se
internacional (VALE, 2006).
Segundo a Agência Nacional das Águas - ANA (2004), citada por Ferreira (apud
MESSIAS E COSTA, 2005, pág. 191), o Brasil possui aproximadamente 14% da água doce
superficial do planeta e cerca de 34,9% da água da América do Sul, entretanto este recurso é mal
distribuído por todo o território nacional. Conforme Carvalho apud MESSIAS E COSTA (2005,
pág. 210).
“No caso do Brasil, a situação também é preocupante, apesar do país ter uma situação de
disponibilidade hídrica privilegiada, pois grande parte da reserva de água doce do
mundo concentra-se em nosso território; mas, não estando, porém, distribuída de forma
uniforme [...]”.

A oferta hídrica brasileira conforme mencionado é bastante irregular sendo mais acentuado
nos Estados de Pernambuco e da Paraíba (SUASSUNA, apud MESSIAS E COSTA 2005). Assim
como, segundo dados da Organização Pan-america de Saúde – OPAS, o direito à água no Brasil é
bastante comprometido, principalmente nas regiões rurais do território (Associação Brasileira de
Reforma Agrária - ABRA).

Água versus Crescimento Populacional


Apesar do volume de água ser o mesmo desde a formação do planeta terra, o seu consumo
vem a cada dia aumentando, principalmente nos últimos 100 anos. Segundo o WWF – BRASIL
(2006, pág. 12).
“Até pouco tempo, o planeta funcionava como um autopurificador e seus sistemas
naturais de filtragem eram suficientes para garantir a limpeza dos poluentes. O aumento
da taxa populacional, somado ao modelo de desenvolvimento, propiciou o crescimento
desordenado das cidades e o lançamento de lixo e esgotos sem tratamento nos corpos
d’água. Indústrias que lançam produtos tóxicos e o uso irracional de água na agricultura
levaram ao aumento crescente da demanda por água. A redução de áreas verdes pelos
desmatamentos vem alterando a quantidade e a qualidade da água.”

Com a revolução industrial o mundo experimentou uma transformação demográfica e logo


após espalhou-se aos demais países no mundo ocorrendo um aumento na produção dos diversos
tipos de bens além de mudanças na vida e no trabalho das pessoas onde os fatores merecedores de
destaque são: o crescimento desordenado da demanda localizada da água, grandes desperdícios e a
degradação da sua qualidade em níveis nunca imaginados nas cidades, na indústria e na agricultura.
contribuindo com a chamada “crise da água” (REBOUÇAS, 2004).
O crescimento urbano, no inicio do século XX, intensificou-se devido à concentração
comercial e industrial nas cidades; iniciando então um predatório crescimento urbano, causando
diversos tipos de problemas ambientais: um desenfreado crescimento na produção do lixo; a
poluição das águas fluviais; o descaso com o saneamento básico, o que está diretamente ligado à
conservação do meio ambiente e a qualidade de vida; dentre outros conforme Bernardes e Ferreira
(apud CUNHA E GUERRA, 2003, pág. 17).
“Até então se acreditava que o crescimento econômico não tinha limites e que o
desenvolvimento significava dominar a natureza e os homens. Entretanto, nos anos
60/70 percebeu-se que os recursos naturais são esgotáveis e que o crescimento sem
limites começava a se revelar insustentável”.

A “Crise da água” não é apenas uma carência quantitativa, mas também qualitativa; Pois a
destruição dos mananciais por conta da devastação das matas ciliares e sua contaminação por
agroquímicos, resíduos industriais, metais pesados dos garimpos, e esgotos urbanos e hospitalares,
Fórum Internacional do Meio Ambiente - A conferência da Terra 873

além de um aumento do consumo de água na agricultura (a irrigação), a pecuária, a indústria e o


consumo humano, contribuem para o “escasseamento progressivo” das águas (CNBB, 2003).

A qualidade da Água e seus múltiplos usos


A Qualidade das águas depende de condições geológicas, geomorfológicas, de cobertura
vegetal da bacia de drenagem, do comportamento dos ecossistemas terrestres e de águas doces e das
ações do homem. Porém, quanto à última, as ações que mais influenciam na qualidade da água são:
os lançamentos de cargas nos sistemas hídricos, a alteração do uso do solo rural e urbano, além das
modificações no sistema fluvial (TUCCI, et al, 2001).
A disponibilidade da água significa que a mesma encontra-se não apenas em quantidade
adequada, mas também que a sua qualidade seja satisfatória para suprir as necessidades de um
determinado conjunto de seres vivos; Pois há a necessidade de que os recursos hídricos apresentem
condições adequadas para a sua utilização, onde deve conter substâncias essenciais à vida e estar
isentos de outras substâncias que produzem efeitos deletérios aos organismos que compõem as
cadeias alimentares como afirma Braga, et al. (2005, pág. 74).
“Além dos problemas relacionados à quantidade – tais como: escassez, estiagens e
cheias – há também aqueles relacionados à qualidade da água. A contaminação de
mananciais impede, por exemplo, seu uso para abastecimento humano. A alteração da
qualidade da água agrava o problema da escassez desse recurso.”

De Acordo com o Ministério do Meio Ambiente / Secretaria de Recursos Hídricos (2006),


as principais formas de utilização da água são: o abastecimento doméstico, o abastecimento
industrial, a irrigação, a dessedentação de animais, a aqüicultura, a preservação de fauna e flora, a
recreação e lazer, a harmonia paisagística, a geração de energia elétrica, a navegação e a diluição de
despejos.

Reuso da Água: uma questão de necessidade


O reuso da água apresenta-se como uma ferramenta bastante útil para minimizar o
problema de escassez de água, satisfazendo demandas menos restritivas, liberando assim, as águas
de melhor qualidade para usos mais nobres, como abastecimento doméstico. As águas de qualidade
inferior como: esgoto de origem domestica, águas de drenagem agrícola e águas salobras, devem
sempre que possível, serem consideradas como fontes alternativas para usos menos restritivos
(BRAGA, et al, 2005).
Embora o reúso seja considerado uma ferramenta importante a sua adoção deve ser sempre
planejada de maneira a minimizar principalmente os riscos sobre a saúde humana e sobre o
desempenho das atividades nas quais serão aplicadas como afirma Braga, et al. (2005, pág. 112).
“Graças ao ciclo hidrológico, a água é um recurso renovável. Quando reciclada por meio
de sistemas naturais, é um recurso limpo e seguro que é pela atividade antrópica,
deteriorada a níveis diferentes de poluição. Entretanto, uma vez poluída, a água pode ser
recuperada e reusada para fins benéficos diversos. A qualidade da água utilizada e o
objeto específico do reúso estabelecerão os níveis de tratamento recomendados, os
critérios de segurança a serem adotados e os custos de capital e de operação e
manutenção. As possibilidades e maneiras de reúso dependem, evidentemente, de
características, condições e fatores locais, tais como decisão política, esquemas
institucionais, disponibilidade técnica e fatores econômicos, sociais e culturais.”

O reuso da água na irrigação de parques, de jardins públicos, centros esportivos, gramados,


árvores de avenidas e rodovias, reservas de proteção contra incêndio dentre outros usos que exigem
menores riscos, devem ser considerados como a primeira opção de reutilização da água em meio
urbano. Os custos elevados da água industrial juntamente com as demandas crescente têm levado as
indústrias a avaliar as possibilidades de reuso da água; na indústria as atividades com maior
potencial de aproveitamento de reuso são em torres de resfriamento, caldeiras, na construção civil,
Fórum Internacional do Meio Ambiente - A conferência da Terra 874

irrigação de áreas verdes de instalações industriais, lavagens de pisos entre outros processos
industriais. Já no uso agrícola, diante das grandes vazões envolvidas uma especial atenção deve ser
atribuída ao reuso nesta atividade, pois a agricultura atualmente depende de um bom suprimento de
água, pois, caso contrário, a produção não é mantida em mesmo nível (BRAGA, et al, 2005).

Gestão de Recursos Hídricos na Bacia do rio Pirapama


O Zoneamento Ecológico-Econômico da Bacia do Pirapama é resultado do Projeto
Pirapama que através de ações de gestão ambiental objetiva, o uso sustentável dos recursos hídricos,
como afirma a Secretaria de Ciência, Tecnologia e Meio Ambiente – SECTMA / Agência Estadual
de Meio Ambiente e Recursos Hídricos – CPRH (2000, pág. 3).
“O Zoneamento Ecológico-Econômico da Bacia do Pirapama, enquanto instrumento de
gestão ambiental, deverá constituir referencial para um desenvolvimento sócio-
econômico compatível com o uso sustentável dos recursos naturais e a ocupação
ordenada do território, valorizando potencialidades locais e minimizando os impactos
ambientais das atividades humanas. Este zoneamento também visa preencher a carência
de instrumentos normativos integrados e atualizados que norteiem os empreendimentos e
auxiliem o exercício do controle do uso e ocupação do solo por parte das autoridades
competentes.”

O Zoneamento Ecológico-Econômico da Bacia do Pirapama considerou três premissas


como base principal para a identificação dos possíveis usos a serem incentivados: I - A existência
de água, em quantidade e qualidade adequada; II - A conservação dos ecossistemas e III - O
desenvolvimento sócio-econômico ambientalmente sustentável, posteriormente o mesmo destacou-
se como ação estratégica, passando a ser elaborado por um Grupo de Trabalho; o que fez com que o
Zoneamento Ecológico-Econômico da Bacia do Pirapama absorvesse elementos de Grupos de
Trabalhos anteriores, passando assim, a adquirir novos padrões de uso e ocupação do solo
(SECTMA / CPRH, 2000).
Assim, o Zoneamento Ecológico-Econômico da Bacia do Pirapama encontra-se
representado em cinco Zonas: I – Costeira; II – Proteção Ambiental e Ecossistemas Integrados; III –
Urbana; IV – Industrial e V – Rural Diversificada (SECTMA / CPRH, 2000).
A Zona Costeira estende-se pelo litoral iniciando na Lagoa olho d’água e na
desembocadura dos Rios Pirapama e Jaboatão até a foz do Rio Massangana; esta região atualmente
enfrenta um acentuado crescimento demográfico, principalmente nos centros urbanos como Gaibu,
Itapoama e Suape, fato este que citado como a principal causa dos problemas ambientais; porém
esta região ainda possui características de preservação que caso inicie investimentos no local
juntamente com estratégias de ocupação do solo poderão iniciar um desenvolvimento da área de
forma sustentável (SECTMA / CPRH, 2000).
A Zona de Proteção Ambiental e Ecossistemas Integrados situa-se paralelamente à costa e
compreende os manguezais do estuário do Rio Jaboatão e Pirapama, remanescentes da mata
atlântica, áreas alagadas, área de reflorestamento do complexo industrial portuário de Suape e o
Parque Armando Holanda Cavalcante no Cabo de Santo Agostinho até a divisão Cabo-Ipojuca.
Nesta região destacam-se os espaços protegidos pela legislação Estadual e Federal, classificadas
como: Zona de Proteção Ecológica (ZPEC) e a Zona Agrícola Florestal (ZAF) (SECTMA / CPRH,
2000).
Diferente da Zona Costeira e da Zona de Proteção Ambiental e Ecossistemas Integrados a
Zona Urbana é constituída pelos Núcleos urbanos de Cabo de Santo Agostinho, Ponte dos
Carvalhos e Prazeres, caracterizados por alta densidade de ocupação e distribuídos em sua maioria
por espaços inadequados sem infra-estrutura com uma diversificação no comércio e serviços, porém
com precária qualidade ambiental urbana; o que vem resultando ao longo dos anos em uma
progressiva degradação ambiental e das condições de vida (SECTMA / CPRH, 2000).
A Zona Industrial é constituída por áreas descontínuas ao longo da BR–101 Sul e parte do
complexo industrial portuário de Suape; embora situado em terreno plano e servido pela malha
Fórum Internacional do Meio Ambiente - A conferência da Terra 875

rodoviária, o Cabo apresenta problemas relacionados ao seu espaço; por outro lado, o setor
industrial de Prazeres que é margeado em sua maioria pelo Rio Jaboatão apresenta limitações em
seu sistema de abastecimento de água potável. Porém cabe ressaltar que grandes transformações
vêem acontecendo sobre esta área, o que requer o emprego de medidas mitigadoras para
minimização e controle dos impactos ambientais, assim como, a reparação e o monitoramento de
danos ambientais desta área (SECTMA / CPRH, 2000).
A Zona Rural corresponde à área Oeste do Projeto Pirapama, compreendendo áreas rurais
dos municípios do Cabo de Santo Agostinho, Jaboatão dos Guararapes, Moreno, Pombos e Vitória
de Santo Antão, além da presença de remanescentes de mata atlântica, águas superficiais e
subterrâneas, sedes de engenhos, lugares históricos dentre outros representando mais de dois terços
da área contemplada pelo Projeto Pirapama, constituindo em um grande potencial de exploração
agrícola e turístico; no entanto, as atividades humanas de forma irracional dos recursos naturais vem
sendo o maior responsável pela degradação desta área em que o Zoneamento define tais conflitos
como o principal alvo, objetivando a recuperação, preservação e o manejo sustentável dos recursos
naturais (SECTMA / CPRH, 2000).

RESULTADOS E DISCURSSÕES
Ao analisarmos a entrevista do Secretário de Desenvolvimento Urbano e Meio Ambiente
da Cidade de Moreno, constatamos várias semelhanças entre o conteúdo relatado e a realidade. Com
base na leitura da entrevista concluímos que o Comitê da bacia do rio Pirapama criado pela lei de
n.º 7.663/91 possui como objetivo principal o gerenciamento das águas da região, de forma
descentralizada e participativa além da utilização; a conservação, proteção e recuperação dos
recursos hídricos também se encaixam como objetivos secundários, que quando comparamos com a
realidade vemos que tal afirmação é verídica, pois o comitê de bacia do rio Pirapama realizou ações
com o mesmo objetivo, dentre elas: o Diagnostico Sócio Ambiental Integrado da Bacia do
Pirapama, definindo a Estratégia para o Plano de Desenvolvimento Sustentável da Bacia do
Pirapama, capacitações dos membros do Comitê, da Sociedade Civil e outros, além de algumas
oficinas de trabalho, mediação de conflitos do Uso da água a media que surgem, a elaboração e
aprovação do Zoneamento Ecológico-Econômico para a Bacia do rio Pirapama dentre outras ações.
Segundo a relato do Secretário de Desenvolvimento Urbano e Meio Ambiente da Cidade
de Moreno, o comitê realiza o gerenciamento da bacia do rio Pirapama dando prioridade ao uso
racional da água para o abastecimento público de forma descentralizada, participativa e integrada, o
mesmo realiza planejamentos e orientações para uma gestão equilibrada de água em quantidade e
qualidade adequada, o que realmente condiz com atitudes como o monitoramento e avaliação da
qualidade de suas águas.
Segundo os técnicos os problemas registrados na área da bacia do rio Pirapama durante a
sua implantação está associado à presença da população carente e a degradação dos ecossistemas
naturais são nítidos e que o monitoramento do comitê da referida bacia através de ações de
sistematização foi identificado um conjunto de carências e entraves ao desenvolvimento sustentável
da região como a erradicação do analfabetismo, a ampliação e melhoria da rede de infra-estrutura de
transporte, circulação e comunicação além de outros fatores. Atualmente a infra-estrutura se
encontra mais otimizada, sendo utilizada por todos os usuários, sejam ricos ou pobres, mulheres ou
homens; deforma mais eficiente onde o comitê através de programas passa para os usuários que a
água deve ser usada de forma racional e que dessa forma os benefícios serão compartilhados por
toda a sociedade da região.
O comitê da bacia do rio Pirapama também vem realizando projetos dos quais a população
do entorno da bacia é a maior beneficiária como o Projeto Piloto Marisqueira Cidadã, Projeto Piloto
de Saneamento em Áreas Carentes, Projeto Piloto de Conservação a Floresta e Água da Mata
Atlântica, Mediação de conflitos para resolução do deslocamento dos assentamentos da Barragem
do Pirapama e a Mediação de conflitos do uso da água.
Diante de tais fatos vemos que a realidade da população antes da implantação do comitê de
bacia do rio Pirapama era bastante diferenciada da realidade atual, pois o comitê já citado tem
Fórum Internacional do Meio Ambiente - A conferência da Terra 876

implantado uma série de ações definidas no Plano de Ação da Agenda 21 da bacia do rio Pirapama
denominadas estratégias como: A Melhoria da Qualidade de Vida, O Fortalecimento da Gestão
Ambiental, A Melhoria do Meio Ambiente Natural e o Controle do Uso das Águas na Bacia do
Pirapama.

CONSIDERAÇÕES FINAIS
A principal proposta deste trabalho monográfico foi apresentar os diversos aspectos da
atual situação dos recursos hídricos no mundo e no Brasil, bem como suas conseqüências para a
sociedade; onde foi partido do princípio de que a água é um direito e patrimônio de todos os seres
vivos e que está diretamente ligada às relações sociais em todo o mundo. Não há mais dúvida de
que a água é um recurso estratégico fundamental para a vida no planeta e que a desigualdade em sua
distribuição e proteção vem gerando um estado de escassez crescente; ameaçando a continuidade
das gerações futuras.
O meio ambiente sempre está sujeito a transformações, decorrentes da dinâmica natural da
terra. Estas transformações atualmente geram sérios impactos provocados pelas ações antrópicas.
No Brasil, o crescimento urbano teve inicio a partir do século XX, e intensifficou-se devido à
concentração comercial e industrial nas cidades gerando grandes impactos na quantidade e
qualidade dos recursos hídricos além de um consumo sem a devida responsabilidade. O problema é
que grande parte da sociedade no Brasil possui uma visão equivocada de que o país possui recursos
naturais abundantes e nos esquecemos que atualmente, existem milhões de pessoas sem
disponibilidade suficiente de água para consumo doméstico e com tendência de se agravar ainda
mais essa situação.
A Situação do meio ambiente no globo nos desafia a preservar os recursos hídricos e ao
mesmo tempo, possibilitar um desenvolvimento social com o objetivo de melhorar a qualidade de
vida em todos os aspectos através de um conjunto de leis bastante avançadas para a proteção
ambiental, pois atualmente se faz necessário consolidar novos modelos de desenvolvimento
sustentável no país e no mundo. Para garantir um melhor aproveitamento dos recursos hídricos a
presente e futuras gerações em bases sustentáveis, várias medidas tem sido tomadas nos últimos
anos. Entre elas, tornou-se necessária a cobrança da água no Brasil, regulamentada pela Lei n.º
9.433/97, que por outro lado passou a ser mais discutida com a sociedade, ao invés de ser imposta;
além de propor uma gestão mais participativa, considerando a água não apenas como um bem
social, mais também como um recursos econômico.
No nosso campo de estudo, a bacia hidrográfica do Rio Pirapama/PE, os comitês e os
gestores locais são, geralmente, os responsáveis pela qualidade da água que se distribui à
população; através de uma política ativa de proteção desses recursos; o que envolve tecnologia,
educação e informação para as suas populações; porém a mesma também é responsável pelos
recursos hídricos, devendo estar envolvida e objetivando a sustentabilidade da comunidade local,
sem prejuízo ao meio ambiente.
Dentre os recursos naturais, os recursos hídricos mais especificamente, têm atualmente se
destacado bastante devido à “crise da água” ser uma realidade reconhecida, além de conflitos
envolvendo seus múltiplos usos serem cada vez mais freqüente.

REFERÊNCIAS BIBLIOGRÁFICAS
BERNARDES, Júlia A.; FERREIRA, Francisco P. de M. Sociedade e Natureza. apud: CUNHA,
Sandra B. da; GUERRA, Antonio J. T. (Org.). A Questão Ambiental: diferentes abordagens, Rio de
Janeiro: Editora Bertrand Brasil, 2003. p. 17-42.
BRAGA, Benedito. et al. Introdução à Engenharia Ambiental: O desafio do desenvolvimento
sustentável, 2. ed. São Paulo: Pearson Prentice Hall, 2005. 313 p.
BRANCO, Samuel Murgel. Água: Origem, Uso e Preservação, 7. ed. São Paulo: Editora Moderna,
1993. 69 p. (Coleção Polêmica).
BRASIL, Ministério do Meio Ambiente – MMA / Secretaria de Recursos Hídricos – SRH.
Conjunto de Normas Legais: Recursos Hídricos, 4. ed. Brasília – UNESCO, 2006. 361 p.
Fórum Internacional do Meio Ambiente - A conferência da Terra 877

CARVALHO, Rodrigo S. de; Água, um bem que precisa ser cuidado!. apud: MESSIAS, Arminda
S.; COSTA, Marcos R. N. (Org.). Água fonte de vida, Recife: UNICAP, 2005. p. 207-241. (Série
encontro das águas, n. 1).
CONFERÊNCIA NACIONAL DOS BISPOS DO BRASIL – CNBB, 2003, São Paulo,
Fraternidade e água: Manual Campanha da Fraternidade – CF-2004, São Paulo, Editora Salesiana,
2003. 116 p.
FERREIRA, Maria da G. de V. X.; A Ciência e a conscientização a serviço dos recursos hídricos:
da ciência à consciência. apud: MESSIAS, Arminda S.; COSTA, Marcos R. N. (Org.). Água fonte
de vida, Recife: UNICAP, 2005. p. 185-205. (Série encontro das águas, n. 1).
LIRA, Dogival da Silva. O Uso dos Recursos Hídricos no Município de Bonito (PE) para fins
Agroecológicos e Turísticos. Olinda, 2007, 63 p. (Monografia de especialização apresentada ao
Curso de Pós-Graduação em O Ensino da Geografia e a Questão Ambiental da Fundação de Ensino
Superior de Olinda – FUNESO).
PERNAMBUCO (Estado). Secretaria de Ciência, Tecnologia e Meio Ambiente – SECTMA /
Agência Estadual de Meio Ambiente e Recursos Hídricos – CPRH; Agenda 21: Pirapama –
Zoneamento Ecológico-Econômico da Bacia do Pirapama. Recife, 2000. 34 p. (Publicações Projeto
Pirapama CPRH/DFID).
REBOUÇAS, Aldo da Cunha. Uso inteligente da água, São Paulo: Escrituras Editora, 2004. 207 p.
SUASSUNA; João; Potencialidades Hídricas do Nordeste Brasileiro: O Uso Múltiplo da Água e a
Importância do Rio São Francisco. apud: MESSIAS, Arminda S.; COSTA, Marcos R. N. (Org.).
Água fonte de vida, Recife: UNICAP, 2005. p. 77-103. (Série encontro das águas, n. 1).
TUCCI, Carlos E. M. et al. Gestão da água no Brasil, Brasília, edições UNESCO, 2001. 156 p.
VALE, Jaqueline S. Alves do. Á Água no Século XXI: Os desafios da Escassez. Olinda, 2006, 46 p.
(Monografia de especialização apresentada ao Curso de Pós-Graduação em Ciências Ambientais da
Fundação de Ensino Superior de Olinda – FUNESO).
WORD WILDLIFE FUND – BRASIL / FUNDO MUNDIAL PARA A NATUREZA, Caderno de
Educação Ambiental, Água para vida, Água para todos, Livro das Águas, Brasília, 2006. 68 p.
Fórum Internacional do Meio Ambiente - A conferência da Terra 878

LAGOAS E LAGOINHAS-ESTUDO DE CASO DOS MANANCIAIS LAGOA DA


FEITICEIRA E LAGOA FONTE DOS PADRES NO MUNICIPIO DE ALAGOINHAS – BA

Naildes de Jesus Silva


Bacharel em turismo e pós graduanda em Meio Ambiente e Sustentabilidade com ênfase em Educação Ambiental e
Ecoturismo pelas Faculdades Jorge Amado

RESUMO
O presente trabalho faz uma analise das condições ambientais de dois mananciais do
município de Alagoinhas - Bahia, que no passado foram pontos determinantes para o seu
povoamento, tentando identificar seu estado de conservação atual e sugerindo ações para a melhoria
de sua estrutura, evidenciando que esses recursos hídricos podem ser usados de maneira racional
para promover o desenvolvimento sócio econômico de Alagoinhas.
Palavras - chave. Lagoas, mananciais, recursos hídricos, meio ambiente, desenvolvimento
sustentável.

ABSTRACT
This work is a review of environmental conditions of two springs from the town of
Alagoinhas - Bahia, which in the past were crucial points for its settlement, trying to identify their
current state of preservation and suggesting actions for the improvement of its structure, showing
that these water can be used for rational way to promote the socio economic development of
Alagoinhas.
Words - key. Ponds, fountains, water resources, environment, sustainable development.

INTRODUÇÃO
Situada na região do Litoral Norte baiano, a cidade de Alagoinhas tem seu nome derivado
da grande quantidade de pequenas lagoas existentes à época de seu povoamento.
Muitas dessas lagoas têm importância fundamental no povoamento e construção da
identidade cultural do povo alagoinhense, seja pela sua localização, seja pela utilização de suas
águas para os rituais da religião africana.
Uma dessas lagoas ficou conhecida como Fonte dos Padres, pois era lá que um padre
português de nome desconhecido, primeiro habitante a se fixar nestas terras, se abastecia de água
potável para seu uso pessoal.
Outra lagoa importante para o município de Alagoinhas é a Lagoa da Feiticeira, que possui
esse nome porque as pessoas acreditavam que ela era povoada por seres mágicos e encantados.
Ao longo dos anos as lagoas foram sendo aterradas graças à expansão imobiliária, as que
restaram no perímetro urbano foram relegadas a segundo plano pelo poder público e estão
completamente degradas precisando urgentemente de alguma ação prática que possa recuperá-las.
Fórum Internacional do Meio Ambiente - A conferência da Terra 879

JUSTIFICATIVA
A água é a riqueza mais importante para a humanidade, ela é atualmente a causa de
conflitos isolados em algumas partes do globo, e no futuro poderá causar um conflito mundial de
proporções igual ou pior ao da Segunda Guerra Mundial, por isso os governos, as organizações não
governamentais ligadas ao meio ambiente e a população em geral estão a cada dia mais
preocupados em preservar esse recurso tão ameaçado e de vital importância pra a manutenção da
vida no Planeta Terra.
Nesse sentido a cidade de Alagoinhas é privilegiada, pois está situada sobre um aqüífero de
grande proporção e de qualidade inestimável, o que a faz possuidora de uma das melhores águas do
mundo, e proporciona que empresas de grande porte e que usam a água como matéria prima
venham se instalar no município.
Mas como em todos os lugares do mundo, o município de Alagoinhas não está livre
daqueles que fazem mau uso dos recursos ambientais, pessoas que pensam que a água é infinita e
pouco se importam com a preservação dos recursos da natureza, mas, felizmente existem aqueles
que se preocupam com o futuro do planeta e lutam para que ele seja preservado da melhor maneira
possível.
Por isso esse trabalho tem como objetivos, fazer uma analise das condições ambientais da
lagoa Fonte dos Padres e da Lagoa da Feiticeira.
Identificar alternativas possíveis para o desenvolvimento de atividades de lazer e turismo
para a população local e para visitantes de cidades circunvizinhas.

CARACTERIZAÇÃO DA ÁREA
Lagoa Fonte dos Padres
A origem do nome dessa lagoa é devido a grande concentração de padres jesuítas que no
inicio do século XVIII, iniciaram a construção de uma igreja próxima à lagoa, e que usavam as suas
águas para banhar-se, suprir as suas necessidades. (SILVA e OLIVEIRA . 2005. p.69)
Fórum Internacional do Meio Ambiente - A conferência da Terra 880

Situada no bairro de Alagoinhas Velha, escondida entre ladeiras, ela foi no passado um
ponto de passagem e descanso dos tropeiros e viajantes que utilizavam suas margens para o
restabelecimento durante a viagem e para encher suas moringas com a água cristalina que emanava
da lagoa.
A Lagoa da Fonte dos Padres foi no passado o mais famoso manancial de Alagoinhas,
eram nela que os aguadeiros abasteciam suas botijas para venderem água potável aos munícipes
mais abastados.
Próximo à lagoa, a Vila de Alagoinhas começou a se formar e a se desenvolver, tornando-
se um dos mais prospero município daquelas cercanias.
Atualmente a Lagoa da Fonte dos Padres passa por um processo de abandono e
degradação, sua mata ciliar praticamente desapareceu e suas margens diminuíram sensivelmente
devido à expansão imobiliária. Tudo isso contribuiu para que a paisagem natural e o meio ambiente
do entorno fossem visivelmente alterados.
Mas apesar de todos esses problemas, a água da lagoa ainda é utilizada pelas moradoras
locais para a lavagem de roupas, e as suas margens existe um banco que utilizado pelos moradores
para aquela conversa de fim de tarde.

Figura – 1.Fonte dos Padres, ano de 2006. Fonte: Arquivo pessoal da pesquisadora.

Figura – 2. Fonte dos Padres, ano de 2008. Fonte: Arquivo pessoal da pesquisadora.
Fórum Internacional do Meio Ambiente - A conferência da Terra 881

Lagoa da Feiticeira
Situada na rua 3ª Travessa Conselheiro Junqueira, bairro da Rua do Catu, essa lagoa
possui esse nome devido à crendice popular de que suas águas eram encantadas, e sua utilização
para os rituais de religiões africanas ajudou a reforçar esse mito dando a origem do nome para a
lagoa, até os dias atuais, mitos e lendas ainda povoam o lugar.
Suas águas escuras que lhe davam ar de mistério e encantamento, aos poucos foram sendo
soterradas e os esgotos das construções locais passaram a competir com as águas da lagoa. Mas
apesar de tudo isso é impressionante ver a vida fluindo dentro e ao redor desse manancial, são
inúmeras a quantidade de animais que vivem ali, a exemplo de peixes, patos d’água, pássaros de
várias espécies que iluminam o ar com suas cores e alegram o ambiente com seus cantos.
Recentemente o SAAE (Serviço Autônomo de Água e Esgoto), autarquia da prefeitura
municipal foi multada pelo CRA (Centro de Recursos Ambientais) por causa de um vazamento na
estação de tratamento, e fez com que o esgoto que era captado derramasse na lagoa durante a
pavimentação das ruas do bairro onde a lagoa está localizada. Se atitudes como essa do CRA,
acontecessem com mais freqüência, certamente coibiria as ações danosas contra os recursos
hídricos, beneficiando dessa maneira o meio ambiente.

Figura- 3.Vista parcial da Lagoa da Feiticeira. Fonte: Arquivo pessoal da pesquisadora

Proposta de ações.
Os mananciais analisados estão localizados em áreas importantes da cidade, de fácil acesso
para a população alagoinhense, que contam com meios de transporte público para poder chegar até
eles, as estradas de acesso não são pavimentadas, mas estão em estado razoável.
Eles podem ser recuperados e abertos para a visitação pública, promovendo o resgate da
cultura e historia do município de Alagoinhas.
Esses recursos hídricos estão localizados em uma área pública, e se as autoridades
competentes, com a ajuda da sociedade cível tiverem interesse em recuperá-los eles serão grandes
espaços de lazer para a população e gerar divisas para o município.
A limpeza e despoluição desses mananciais, é requisito fundamental para iniciar qualquer
ação de melhoria daqueles espaços; sugerimos a seguir algumas propostas que podem contribuir
para tornar essas áreas de mananciais verdadeiros espaços de lazer e entretenimento para o
município de Alagoinhas:

Lagoa Fonte dos Padres


Criação de um parque municipal com um pequeno museu, ou de um memorial , onde
houvesse uma exposição permanente da história do município;
Fórum Internacional do Meio Ambiente - A conferência da Terra 882

Construção de uma praça arborizada, com brinquedos infantis, pista para caminhadas e
ciclovia.

Figura – 4. Lagoa Fonte dos Padres. Fonte – FADES.

Lagoa da Feiticeira

Figura – 5. Vista parcial da Lagoa da Feiticeira. Fonte – Acervo pessoal da pesquisadora

A Lagoa da Feiticeira possui uma área maior que a Lagoa Fonte dos Padres, por isso, a
implementação de equipamentos de lazer e de práticas ecoturísticas proporcionariam maior
conforto para os visitantes e a geração de emprego e renda para a população local, se ali fosse feito
um trabalho de recuperação e melhoria de suas condições físicas e ambientais, segue abaixo
algumas sugestões;
Construção de um parque municipal, semelhante ao Parque Metropolitano de Pituaçu na
cidade do Salvador –Ba;
A lagoa é propicia para passeios de canoa e pedalinhos;
Trilhas guiadas,
Ciclovia, área para caminhadas e corridas;
Construção de um ponto de apoio e delimitação de área restrita para a observação de aves.
Fórum Internacional do Meio Ambiente - A conferência da Terra 883

Figura- 6. Vegetação da Lagoa da Feiticeira- em destaque ave nativa. Fonte – Acervo pessoal da
pesquisadora.

Figura- 7. Vegetação da Lagoa da Feiticeira


Fonte – Acervo pessoal da pesquisadora

CONSIDERAÇÕES FINAIS
O Art. 7º da Declaração Universal dos Direitos da Água (apud SILVA e OLIVEIRA . 2005
p,85),diz que;
A água não deve ser desperdiçada, nem poluída, nem envenenada. De maneira geral, sua
utilização deve ser feita com consciência e discernimento, para que não se chegue a uma situação
de esgotamento ou de deterioração da qualidade das reservas atualmente disponíveis.
Diante dessa afirmação, podemos concluir que os recursos hídricos analisados no
município de Alagoinhas, estão em estado de total abandono, o que deixa triste todos aqueles que
Fórum Internacional do Meio Ambiente - A conferência da Terra 884

lutam pela preservação dos mananciais e da cultura do município, haja vista que eles possuem uma
ligação intima com a cultura da cidade.
Em 2001, foi sancionada a Lei nº. 1.423, onde foram considerados APAs (Áreas de
Proteção Ambiental), alguns mananciais importantes do município de Alagoinhas, dentre eles se
encontram as lagoas da Feiticeira e Fonte dos Padres, o Art. 2º dessa Lei faz a seguinte afirmação:
“a presente Lei visa proteger nossos mananciais hídricos, a flora e a fauna no seu entorno, bem
como disciplinar as ações e as atividades antrópicas, com vistas a preservar o meio ambiente, a
identidade cultural e a historia do município.” infelizmente as metas previstas na lei não foram
cumpridas, e a maioria dos recursos hídricos do município está em estado de total abandono.
Porém esses mananciais podem ser recuperados, e tornarem-se equipamentos de lazer para
a população local e atrativos turísticos que atraiam visitantes dei cidades circunvizinhas, Silva
(2006, p.), faz uma analise desses recursos hídricos, identificando sua potencialidade para a
atividade turística como um fator de desenvolvimento sócio econômico para o município de
Alagoinhas.
A qualidade da água de Alagoinhas, no passado foi à mola propulsora que deu origem ao
seu nascimento, e por muitos anos impulsionou seu crescimento e desenvolvimento, mas há muito
tempo seus mananciais vêm sendo destruídos por conta de um desenvolvimento desordenado que
não respeita o meio ambiente, mas esses recursos podem ser recuperados através de políticas
publicas que contemple as questões ambientais, proporcionando um desenvolvimento sustentável
para o município, a preservação dos seus mananciais e da sua história cultural para as futuras
gerações.

REFERENCIAS BIBLIOGRÁFICAS
ÁGUA. Disponível em: www.água//httm. Acessado em 10 de abril 2008
http://www.amigodaagua.com.br . Acessado em 10 de abril de 2008
http://www.fadesalagoinhas.org. Acessado em 31de março de 2008
http://www.uniagua.org.br. Acesso 14de abril 2008
SERVIÇO AUTÔNOMO DE ÁGUA E ESGOTO DE ALAGOINHAS. Informativo Folha D’Água.
Alagoinhas. Ba. Ano III, 2003.
SILVA, José Arcanjo e OLIVEIRA, Marcos Antonio e. Os mananciais de alagoinhas como
elemento de desenvolvimento turístico do município. Monografia. (Bacharelado em Turismo).
Faculdade Santíssimo Sacramento, Alagoinhas.Ba., 2005, 95 f.
SILVA, Naildes de Jesus. O potencial turístico do município de Alagoinhas. Monografia.
(Bacharelado em Turismo). Faculdade Santíssimo Sacramento, Alagoinhas.Ba., 2006, 137f.
Fórum Internacional do Meio Ambiente - A conferência da Terra 885

EXPLORAÇÃO DA ÁGUA SUBTERRÂNEA PELAS ATIVIDADES AGRÍCOLAS E


DEGRADAÇÃO AMBIENTAL NA REGIÃO DE IRECÊ NO SEMI-ÁRIDO BAIANO

Carlos Ney Nascimento de Oliveira


Geógrafo, UEFS, Mestrado em Engenharia Civil e Ambiental, Departamento de Tecnologia, Av.Universitária, Módulo
3, Labotec II. cnnogeo@yahoo.com.br

RESUMO
Na região de Irecê fatores climáticos, geológicos e antrópicos influenciam fortemente na
renovação das reservas hídricas e na variação da qualidade das águas. Nessa área prática-se uma
diversidade de sistemas de produção, a maioria de baixa eficiência de aplicação da água de irrigação
e com inadequado manejo dos solos e do uso de fertilizantes e defensivos favorecendo,
conseqüentemente, a poluição das águas, podendo ocorrer danos irreversíveis caso a ocupação
continue predatória e desordenada. Objetivou-se, neste estudo, analisar e caracterizar o uso agrícola
das águas subterrâneas do aqüífero região de Irecê e diagnosticar os impactos decorrentes; a partir
da avaliação dos impactos das atividades agrícolas sobre a qualidade das águas visa-se definir
medidas de preservação e conservação dos recursos hídricos.
Palavras chaves: aqüífero , irrigação, agrotóxicos.

ABSTRACT
In the region of Irecê climatic factors, geological and man-made strongly influence the renewal of
reserve water and variation of water quality. Here practice is a diversity of production systems, the
majority of low efficiency of application of irrigation water and inadequate management of soil and
the use of fertilizers and defensive encouraging, therefore, water pollution, irreversible damage may
occur if the occupation continues predatory and disorderly. The objective of this study, analyze and
characterize the agricultural use of groundwater from the aquifer region Irecê and diagnose the
impacts arising; from the assessment of the impacts of agricultural activities on the quality of water
is aimed at developing measures for the preservation and conservation of water resources.
Key Words: aquifer, irrigation, pesticides.

INTRODUÇÃO
O consumo mundial de água aumentou mais de seis vezes em menos de um século, mais
que o dobro das taxas de crescimento da população. Em nível global, os recursos hídricos tendem a
se tornar mais escassos, devido aos processos de uso e de poluição crescentes, caso não haja ações
enérgicas visando à melhoria da gestão da oferta e da demanda da água (Freitas & Santos, 1999).
De acordo com Brown et al. (2000) a escassez de água refletirá na produção de alimentos, uma vez
que são necessárias 1000 toneladas de água para produzir uma tonelada de grãos.
No contexto da influência das atividades antrópicas na qualidade das águas, a agricultura é
tida como a principal consumidora e uma das principais poluidoras dos recursos hídricos, sendo a
salinidade e a contaminação por nitrato os principais indicadores de poluição das águas (Ongley,
2001;Brown et al., 2000). Segundo Resende (2002), sob determinadas condições de solo e clima e o
uso excessivo ou o manejo inadequado de fertilizantes, podem acarretar o enriquecimento das
fontes hídricas, promovendo a eutrofização de suas águas, com sérios prejuízos ao ambiente e à
própria saúde humana.
Na região de Irecê esta situação não é diferente; fatores climáticos, geológicos e antrópicos
influenciam na renovação das reservas hídricas e na variação da qualidade das águas. Nessa área
prática-se uma diversidade de sistemas de produção, a maioria de baixa eficiência de aplicação da
água de irrigação e com inadequado manejo dos solos e do uso de fertilizantes e defensivos
favorecendo, conseqüentemente, a poluição das águas, podendo ocorrer danos irreversíveis caso a
ocupação continue predatória e desordenada.
Partindo dos pressupostos acima expostos objetivou-se, neste estudo, analisar e caracterizar
o uso agrícola das águas subterrâneas do aqüífero região de Irecê e diagnosticar os impactos
decorrentes; a partir da avaliação dos impactos das atividades agrícolas sobre a qualidade das águas
Fórum Internacional do Meio Ambiente - A conferência da Terra 886

visa-se definir medidas de preservação e conservação dos recursos hídricos. E essas medidas
determinam a relevância do presente trabalho.

LOCALIZAÇÃO DA ÁREA
A microrregião de Irecê constitui-se na região econômica nº 11 do estado da Bahia, e
localiza-se entre 10º12’ e 12º20’ de Latitude Sul e 41º20’ e 43º17’ de Longitude Oeste, no Noroeste
do Estado, totalmente inserida no Semi-árido.

Figura 1 - Mapa da microrregião de Irecê. Fonte: SEI,1996.

MATERIAL E MÉTODOS
Os estudos desenvolvidos apoiaram-se no enfoque holístico-sistêmico como referencial
para a integração dos componentes geoambientais que formam o conjunto da bacia hidrográfica e
aqüíferos subterrâneos, consideradas com o um sistema natural. Neste sistema, os elementos
interdependentes funcionam harmonicamente, conduzidos por fluxos de energia, de modo que cada
um dos seus componentes reflete sobre os outros as mudanças nele impostas por estímulos externos.
Foi realizada, vasta pesquisa bibliográfica, leitura dos documentos: legislação ambiental,
plano diretor das bacias dos rios jacaré e verde, plano estadual de recursos hídricos, relatórios dos
projetos governamentais de recursos hídricos e agricultura. Análise dos mapas: hidrogeológico,
geológico, hidrográfico, pedológico, uso do solo, projetos de irrigação, concentração dos poços e
isolinhas e linhas de fluxo do lençol freático.
Caracterização e estudo dos métodos de irrigação (tipo, quantidade de água utilizada,
horário da irrigação, culturas irrigadas, tipo de solo da área e respectiva capacidade de
armazenamento de água). Pesquisa no banco de dados da SRH (Superintendência de Recursos
Hídricos), CERB (Companhia de Engenharia Rural da Bahia) e CODEVASF (Companhia de
Desenvolvimento do Vale do São Francisco) sobre poços, irrigação e situação da água na área.
Trabalhos de campo, junto com a equipe da SRH Irecê, e em áreas caracterizadas como muito
problemáticas, com o uso de maquina fotográfica, GPS, mapas e realização de entrevistas
despadronizadas.

RESULTADOS E DISCUSSÃO
A região de Irecê apresenta alta vulnerabilidade aos impactos das freqüentes secas e
considerando a irregularidade das chuvas, a água apresenta-se como um recurso escasso na região,
podendo ser obtida de duas origens, águas pluviais drenadas pelas bacias dos rios Verdes e Jacaré ,
tributários do São Francisco e águas subterrâneas acumuladas no substrato calcário do grupo
Bambuí, caracterizadas pela elevada concentração de carbonatos, consideradas águas salobras.
Fórum Internacional do Meio Ambiente - A conferência da Terra 887

Suas estruturas agrícolas e agrárias vêm sofrendo modificações significativas, sobretudo


nas últimas décadas, onde vem ocorrendo a passagem de uma economia tipicamente tradicional e
extrativista, para uma agricultura mais tecnificada. Existem desde os sistemas de cultivos mais
tradicionais, até técnicas e práticas agrícolas, mais modernas como o uso de equipamentos de
irrigação, máquinas, implementos e insumos.
A atividade irrigada na região teve inicio, na década de 70, quando alguns agricultores, por
iniciativa própria, começaram pequenas irrigações a título de experiência, obtendo êxito tanto em
rendimento quanto em qualidade dos produtos. Os agricultores mais antigos ofereciam uma
resistência muito grande à atividade irrigada sob a alegação de que a qualidade do subsolo (água
calcária) limitaria o desenvolvimento e o rendimento das culturas.
A partir de 1976 a iniciativa governamental reconheceu a importância da irrigação para a
região e implantou projetos pilotos, através da CERB-CODEVASF. Com o inicio do PROINE
(Programa de Irrigação do Nordeste), em 1985, a área irrigada aumentou substancialmente. E em
virtude da grande disponibilidade de solos, planos e férteis, para as atividades agrícolas tem-se
observado um aumento desordenado de áreas irrigadas, utilizando a água do extenso lençol
subterrâneo do platô cárstico, estimada em 250 milhões de m³ segundo a CODEVASF (1996).
Devido este uso desordenado já em 2001 um estudo da SEPLANTEC caracteriza o platô
de Irecê como uma das áreas do estado onde ocorre conflito entre usuários de recursos hídricos...”
os conflitos ocorrem entre usuários da irrigação e abastecimento. A implantação indiscriminada de
projetos de irrigação, a partir de águas subterrâneas vem provocando sérios problemas de
superexploração concentrada dos aqüíferos, causando quedas dos níveis de vazão, rebaixamento de
níveis hidrostáticos e, conseqüente colapso na oferta da água para os sistemas de abastecimento e
projetos de irrigação”.
Existem, no platô de Irecê, aproximadamente 320.000 ha de solos aptos para irrigação,
porém a potencialidade de recursos hídricos subterrâneos para a exploração permite irrigar apenas
26.000 ha (BAHIA,1995).Dados da SRH estimam que a região de Irecê que é conhecida
nacionalmente pela grande potencialidade agrícola, especialmente a cultura de feijão, agora irriga
mais de 6.083 ha de terras, com água subterrânea para produzir cenoura, beterraba , cebola e
tomate.
A área irrigada total, no conjunto de municípios polarizados por Irecê no planalto cárstico,
era de 1.076 ha, em 1991, com 11 sistemas de pivô central e 1.466 poços cadastrados. O uso dessa
água subterrânea correspondia a um volume de 22,6 milhões de m3/ano, com a agricultura
absorvendo 16,1 milhões m3/ano, o abastecimento público 3,9 milhões m3/ano e outras destinações
2,6 milhões m3/ano, segundo dados do GEF-São Francisco/ UFBA (2004).
Em 12 anos o número de poços cresceu descontroladamente, para de 3.066 poços
cadastrados , segundo levantamento da SRH 2003 que utilizam cerca de 25 milhões de m3/ano, e
estão concentrados especialmente ( 60%) na área de 4 (quatro) municípios (Irecê, João Dourado,
América Dourada e Lapão), ver figura 2. Fato muito grave é que segundo informações de empresas
locais, ONG's e usurários, estima-se que existam na realidade atualmente, aproximadamente,
10.000 poços perfurados em regime de explotação, a maioria instalados sem critérios de outorga ,
sem estudo de raio e interferência entre poços, cadastro ou se quer autorização pelo órgão gestor
SRH, com todos os riscos de conflitos e comprometimento da qualidade da água.
As áreas avaliadas estão submetidas a regime de explotação com agricultura irrigada
intensiva, utilizando os métodos de irrigação por pivô central e irrigação localizada, com baixa
eficiência no uso da água. Como principais problemas decorrentes tem-se: métodos de irrigação
ineficientes que sub aproveitam a água; superexploração concentrada dos aqüíferos; queda dos
níveis de vazão dos poços e rebaixamento dos níveis hidrostáticos; poluição do lençol subterrâneo
com resíduos das atividades desenvolvidas (fertilizantes químicos, agrotóxicos, reservas de
combustíveis, resíduos sólidos, dentre outros) e salinização dos solos (GEF-São Francisco/ UFBA,
2004).
Fórum Internacional do Meio Ambiente - A conferência da Terra 888

Figura 2 - Áreas de maior concentração de poços em explotação. Fonte: Projeto GEF São
Francisco/UFBA,2004.

Figura 3 - Aspecto da irrigação na área. Fonte: o autor.


Fórum Internacional do Meio Ambiente - A conferência da Terra 889

Os próprios usuários dos recursos Hídricos da região, em depoimentos, afirmam que os


impactos mais perceptivos, cuja causa raiz pode ser associada à implementação da agricultura
intensiva irrigada na bacia é a redução da quantidade e a degradação da qualidade das águas.

Figura 4- Desperdício da água por irrigação mal


feita. Fonte: Projeto GEF São
Francisco/UFBA,2004..

Figura 5-Solapamento de dolina em


conseqüência da sobre-explotação. Fonte:
Projeto GEF São Francisco/UFBA,2004.

Através dos depoimentos constatou-


se também que alguns dos agricultores que se utilizam do processo de irrigação encontram-se
obcecados pela idéia de buscar incessantemente a elevação da produtividade, não se importando
com as conseqüências ambientais. Desta forma, o crescimento da produtividade e a garantia de
renda, são argumentos comumente usados para defender tal modelo.
Mas, pela observação de dados da área, pode-se afirmar que, na verdade, o aumento da
produtividade inicial com a introdução de tecnologias modernas e dos insumos artificiais não é
constante no decorrer do tempo. Após algum período de cultivo nesse sistema, as produtividades se
reduzem e, os produtores, têm que utilizar cada vez mais os produtos químicos para continuar
mantendo a mesma renda.
A utilização intensa e não criteriosa desses produtos químicos, sua produção em escala, a
compra no mercado sem controle de receituário e inspeção, bem como a falta de cuidado na sua
aplicação e conhecimento sobre sua persistência no solo e na água, após aplicação, é risco
inquestionável para o ambiente e para a saúde publica.
Esse problema se potencializa quando se trata de culturas de ciclo curto (hortaliças) e de
grande susceptibilidade, a exemplo da cultura do tomate. Face a esta particularidade, a agricultura
irrigada praticada na área requer uma atenção visto que tradicionalmente se vem praticando um
modelo de agricultura convencional com uso de grandes quantidades de herbicidas, pesticidas e
fertilizantes químicos, na maioria das vezes utilizados sem nenhuma obediência aos limites de uso
regidos pela legislação e sem receituário do produto utilizado (NEGRÃO, 2000).
Segundo SRH (1999) , diagnostico realizado através do Plano Diretor indica que a zona
denominada Platô de Irecê utiliza cerca de 10% de suas reservas aqüíferas para fins de
abastecimento humano e animal, mesmo com todos os riscos de contaminação pelo uso de grande
Fórum Internacional do Meio Ambiente - A conferência da Terra 890

quantidade de produtos químicos (pesticidas, fertilizantes e herbicidas) sem monitoramento e


critérios de aplicação adequados.
O significado ambiental da presença desses resíduos químicos é quase desconhecido, já
que pouco se sabe sobre sua natureza, efeitos, composição, biodegradabilidade, toxidade e natureza
acumulativa dos produtos aplicados, além da dificuldade de detecção pelos métodos analíticos
convencionais, que podem subestimar a carga total de pesticidas nas águas, solo ou alimento.

Figura 5- Embalagens de agrotóxicos


descartadas do lado de um poço. Fonte: Projeto GEF
São Francisco/UFBA,2004.

Resultados de pesquisas realizadas por NEGRÃO (2000) concluem que grande parte dos
produtos aplicados na agricultura fica retida no solo, de 50 a 70% aproximadamente pode atingir a
água. O que representa “perda de pesticidas” e também de fertilizantes para os agrônomos, significa
risco concreto de transferências de resíduos tóxicos para mananciais de água, com todas as
conseqüências para a saúde publica e dos animais quando o manancial é utilizado para
desedentação.
É evidente a necessidade de disciplinar, reduzir e monitorar o uso de tais produtos, dos
lançamentos de efluentes e disposição de resíduos para mitigar e reduzir riscos de contaminação dos
recursos naturais água e solo.

CONSIDERAÇÕES FINAIS
O gerenciamento dos recursos hídricos nas áreas cársticas requer estudos específicos e
planejamentos especiais adequados, no caso especifico de Irecê, às condições de semi-áridez e
pressão de explotação a que esta submetido o aqüífero. Necessita de métodos eficazes para
possibilitar o conhecimento ou estimar parâmetros hidrodinâmicos necessários para a caracterização
e modelagem do sistema cárstico.
Considerando o quadro atual e a tendência da agricultura irrigada na bacia, com contínua e
crescente aplicação de fertilizantes e agrotóxicos, faz-se indispensável a implantação e
funcionamento sistemático de um programa de vigilância e controle de risco de contaminação
difusa dos resíduos tóxicos n ambiente, determinando seus efeitos e os riscos de poluição, das
águas, do solo e da população.
Com relação à utilização de recursos hídricos e considerando a potencialidade dos solos e
a tradição agrícola da região, tem havido um aumento significativo da demanda de água para
irrigação, o que poderá comprometer criticamente a disponibilidade hídrica na bacia (CODEVASF,
1993),caso a capacidade de suporte do aqüífero não seja respeitada e/ou a dinâmica da recarga seja
comprometida pelos impactos negativos sobre os fluxos da água nas zonas saturada e não saturada.
Deste modo, se ações urgentes que possam impedir o uso desordenado das águas
subterrâneas não forem tomadas, a região de Irecê já tão castigada pelas freqüentes secas perderá o
maior recurso natural da área: um dos maiores lençóis da água subterrânea do Brasil.
Tal constatação é conseqüência do processo de ocupação do território, apropriação e uso
dos recursos naturais solo, água, vegetação que transformou o ecossistema natural da região
(caatinga) em um agrosistema caracterizado pela agricultura de sequeiro, pecuarização e mais
Fórum Internacional do Meio Ambiente - A conferência da Terra 891

recentemente olericultura irrigada, na maioria das vezes em sistemas de manejo inadequados, sem
adoção de técnicas de conservação do solo e da água.

REFERÊNCIAS BIBLIOGRÁFICAS
BAHIA, Secretaria de Planejamento Ciência e Tecnologia-SEPLANTEC Diagnóstico dos Recursos
Hídricos do Semi-Árido Baiano. Salvador:FAPESB,1996.
BAHIA. Secretaria de Planejamento, Ciência e Tecnologia- SEPLANTEC; Centro de Recursos
Ambientais- CRA (BA). Diagnostico ambiental da APA Gruta dos Brejões Vereda do Romão
Gramacho: relatório de diagnostico ambiental. Salvador: HIGESA, mar.2001. 4 pt.
BAHIA. Secretaria de Recursos Hídricos, Saneamento e Habitação. Plano diretor de recursos
hídricos das bacias dos rios Verde e Jacaré: documento síntese. Salvador: PROJETEC, 1999. 150 p.
BAHIA. Secretaria do Planejamento, Ciência e tecnologia – SEPLANTEC. Programa de
Desenvolvimento Sustentável da Região do Semi-árido do Estado da Bahia: versão preliminar.
Salvador. Jun. 1995.
BRASIL. Presidência da República. CODEVASF: Comissao do Vale do Sao Francisco. Estudo das
possibilidades agrícolas e hidro-agricolas das Bacias dos Rios Verde e Jacare do estado da Bahia:
relatório final. [x]. fotocopiado. Bahia: LASA- HIDROBRASILEIRA, out. 1993. n p. ilus, mapa,
tab.
BROWN, L.; FLAVIN, C.; FRENCH, H. Estado do mundo 2000. Tradução H. Mallett. Salvador:
UMA Editora, 2000. 288p.
CODEVASF, Companhia de Desenvolvimento do Vale do Rio São Francisco-. Relatório anual de
monitoria. Brasília: 1993 1994,1995 e 1996.
CODEVASF, Companhia de Desenvolvimento do Vale do São Francisco-Plano diretor para o
desenvolvimento do Vale do São Francisco – PLANVASF. Brasília: 1995.
FREITAS, M.A.V. de; SANTOS, A.H.M. Importância da água e da informação hidrológica. In:
Freitas, M.A.V. de. (Ed.). O estado das águas no Brasil; perspectivas de gestão e informações de
recursos hídricos. Brasília: ANEEL/MME/ MMA-SRH/OMM, 1999. p.13-16.
GEF-SÃO FRANCISCO/UFBA Projeto de Gerenciamento Integrado das Atividades Desenvolvidas
em Terra na Bacia do São Francisco. Subprojeto 1.5C–Impacto da agricultura nos recursos hídricos
subterrâneos da bacia do rio verde/jacaré -Ba. Brasília – Distrito Federal. 2004. 54 p.
NEGRÃO F. I. . Monitoramento em Rede de Poços Equipados com Dessalinizadores no Semi-árido
do Estado da Bahia. : Determinação do índice de qualidade da água subterrânea – IQAS, com base
nos dados de poços tubulares do estado da Bahia: áreas piloto: recôncavo e platô de Irecê. Io
Congresso Mundial Integrado de Águas Subterrâneas, p. 21-44 Fortaleza CE. 2000.
ONGLEY, E.D. Controle da poluição da água pelas atividades agrícolas. Campina Grande: UFPB,
2001. 92p. FAO. Irrigação e Drenagem, 55
Projeto GEF São Francisco (ANA/GEF/PNUMA/OEA) - Subprojeto 15: Impacto da agricultura
intensiva irrigada nos recursos hídricos subterrâneos da bacia dos rios Verde e Jacaré (BA).
RESENDE, A.V. de; Agricultura e qualidade da água: contaminação da água por nitrato. Brasília:
EMBRAPA Cerrados. 2002. 29p. Documentos 57.
SEI - Superintendência de Estudos Econômicos e Sociais da Bahia. Balanço hídrico do Estado da
Bahia. Salvador, 1999. 250p. SEI. Série Estudos e Pesquisa, 45
Fórum Internacional do Meio Ambiente - A conferência da Terra 892

ANÁLISE FISIOGRÁFICA COMO INDICADOR POTENCIAL DE PROTEÇÃO OU DE


DEGRADAÇÃO DOS RECURSOS NATURAIS DA BACIA HIDROGRÁFICA DO RIO DA
DONA - BAHIA

Djalma Villa Gois


UFS, Cidade Universitária. São Cristovão - SE. villa_gois@hotmail.com.
José A. Pacheco de Almeida
UFS. Cidade Universitária. São Cristovão - SE. jalmeida@ufs.br

RESUMO
A análise fisiográfica da bacia de drenagem do rio da Dona tem como objetivo oferecer
indicadores ambientais que subsidiem o disciplinamento do uso e ocupação do solo, voltados para o
campo do planejamento e gestão ambiental. O procedimento metodológico para obtenção da
fisiografia da referida bacia se deu pela delimitação do divisor de águas e dos limites municipais
estabelecendo áreas, perímetros e comprimentos, além de hierarquização dos cursos de água,
densidade de drenagem, forma, hipsometria e declividades. Como resultado, verificou-se que a
bacia hidrográfica do rio da Dona abrange parte dos municípios de Varzedo, São Miguel das Matas,
Jaguaripe, Aratuípe, Santo Antonio de Jesus, Laje, Conceição do Almeida e Castro Alves,
totalizando uma área de 792,62km2 e perímetro de 279,43km. O curso principal percorre 116,23km
de extensão dividido em três setores: alto curso caracterizado por apresentar altitudes entre 200m e
800m, médio curso com altitudes que variam de 100m a 200m e baixo curso com altitudes menores
que 100m. A rede de drenagem é do tipo dendrítica e o índice de circularidade é igual a 0,13 que
atribui à bacia uma forma alongada, com menor possibilidade de sofrer enchentes. A classificação
dos seus canais confere-lhe a posição hierárquica de 5ª ordem. A densidade de drenagem é de
1,22km/km2 conferindo à bacia maior infiltração de água no solo, menor erosão e maior
possibilidade de contaminação de águas subterrâneas. Constatou-se que a análise morfométrica
pode ser considerada uma das etapas do diagnóstico ambiental, porém não podemos desconsiderar
os aspectos humanos para complementação da pesquisa. Por ser uma bacia com características
ambientais diversas, é necessário ações diferenciadas para cada setor, visando melhor
aproveitamento do seu potencial, porém não esquecendo da abordagem holística e integrada das
transformações que ocorrem no espaço.
Palavras-Chave: fisiografia, bacia de drenagem, indicadores ambientais.

ABSTRACT
The physiography analysis of the drainage basin of the river's Dona is intended to provide
environmental indicators that subsidize the disciplinamento the use and occupation of land, facing
the field of planning and environmental management. The methodological procedure for obtaining
the morphometry of the basin made by the delimitation of the divisor of water and setting limits
municipal areas, perimeters and lengths, in addition to ranking of watercourses, drainage density,
shape, and hipsometria slope. As a result, it was found that the Dona’s river basin covers part of the
Varzedo, São Miguel das Matas, Jaguaripe, Aratuípe, Santo Antonio de Jesus, Laje, Conceição do
Almeida and Castro Alves, municipality, totaling an area of 792.62km2 and perimeter of 279.43km.
The main course covers 116.23km of extension divided into three sectors: advanced course
characterized by presenting altitudes between 200m and 800m, shorthaul with altitudes ranging
from 100m to 200m and with current with lesser altitudes that 100m. A network of drainage is the
kind of circularity dendrítica and the index is equal to 0.13 that attaches to an elongated basin, with
less chance of suffering flood. The classification of its channels gives you the hierarchical position
of 5 th order. The density of drainage is of 1.22 km/km2 giving greater infiltration basin of water in
the soil, less erosion and increased possibility of contamination of groundwater. It was that the
morphometric analysis can be considered one of the stages of environmental diagnosis, but we can
not disregard the human aspects of the search for complementation. As a basin with various
environmental characteristics, we need differentiated shares for each sector, seeking better use of
Fórum Internacional do Meio Ambiente - A conferência da Terra 893

their potential, but not forgetting the holistic and integrated approach of the changes that occur in
space.
Keywords: physiography, drainage basin, environmental indicators

Introdução
A análise fisiográfica da rede de drenagem como indicador ambiental para o
disciplinamento do uso e ocupação do solo, é uma garantia para estabelecer o zoneamento
ecológico–econômico e subsidiar o planejamento e gestão ambiental da bacia do rio da Dona, assim
como eleger potenciais de proteção ou de degradação dos recursos naturais renováveis da bacia
hidrográfica. A área de estudo está situada na bacia do Recôncavo Sul112, entre as latitudes 12º 50’
12” S e 13º 11’ 16” S e longitude 38º 48’ 08” W e 39º 28’ 24” W, tendo como divisores de água a
bacia do rio Jaguaripe ao norte, a bacia do rio Jequiriçá ao oeste e sul, e o Oceano Atlântico ao
leste. Abrange parte dos municípios de Varzedo, São Miguel das Matas, Jaguaripe, Aratuípe, Santo
Antonio de Jesus, Laje, Conceição do Almeida e Castro Alves, compondo uma área de 792,62 km2
e um perímetro de 279,43 km.
O curso principal do rio da Dona tem sua nascente a uma altitude aproximada de 600
metros localizada na Serra Pioneira, no município de Varzedo, que se somando às demais nascentes
nas Serras Monte Cruzeiro e Água Branca, no mesmo município, irão contribuir para formação do
leito principal, que percorre 116,23km de extensão, acompanhando suas sinuosidades até o estuário
que forma com o rio Jaguaripe e deságua no oceano Atlântico. A rede de drenagem possui uma
fisiografia predominantemente do tipo dendrítica e a forma da bacia, alongada, assemelha-se à
geometria de um retângulo. A classificação dos seus canais confere a posição hierárquica de 5ª.
ordem, perfazendo um total de 839 canais.
Tendo por base a hipsometria e a declividade, a bacia hidrográfica do rio da Dona foi
dividida nos setores do alto, médio e baixo curso. O alto curso está caracterizado por apresentar
altitudes superiores a 200 metros e conter as principais nascentes brotando em relevos
predominantemente fortes ondulados e em montanhosos. O médio curso apresenta altitudes que
variam de 100 a 200 metros e relevos ondulados a forte ondulados. O baixo curso da bacia
hidrográfica apresenta dominantemente relevo plano com algumas inserções de relevo suave
ondulado em altitudes que variam entre o nível médio do mar e 100 metros (Figura 1).

Figura 1. Setores da Bacia Hidrográfica do Rio da Dona. Fonte: SRTM. (Shuttle Radar Topography
Mission), 2000. Software: SPRING.
Geoprocessamento dos dados cartográficos: José Antonio Pacheco de Almeida e Djalma
Villa Gois.
112
Lei Estadual no. 6.855 de 12 de maio de 1995. Divide o Estado da Bahia em treze bacias hidrográficas, sendo a
oitava a Bacia do Recôncavo Sul.
Fórum Internacional do Meio Ambiente - A conferência da Terra 894

MATERIAIS E MÉTODOS
Os materiais utilizado para obtenção dos dados fisiográficos nesse trabalho iniciaram-se
com o manejo das cartas topográficas SD.24-V-B-VI (Santo Antonio de Jesus), SD.24-V-D-III
(Valença) e a SD.24-J-I (Jaguaripe) elaboradas pela extinta Superintendência do Desenvolvimento
do Nordeste (SUDENE), 1ª. impressão em 1977, na escala de 1:100.000 e digitalizadas em
2004/2005, mantendo as informações originais, pela Superintendência de Estudos Econômicos e
Sociais da Bahia – SEI, disponibilizados no formato de arquivo em dwg (autocad).
O software utilizado para a elaboração das cartas temáticas desta pesquisa foi o Sistema
para Processamento de Informações Geográficas - SPRING 4.3.3, desenvolvido pelo Instituto
Nacional de Pesquisas Espaciais – INPE a partir de 1991, por ser eficiente e de fácil acessibilidade.
A caracterização morfométrica, obtida através das ferramentas do SPRING para definir a
fisiografia da bacia hidrográfica do rio da Dona, iniciou-se pela delimitação do divisor de águas nas
cartas topográficas digitalizadas da SEI. Posteriormente foram traçados os limites municipais que
compõem a referida bacia, por meio da Legislação Político/Administrativa de criação dos
municípios, SEI (2004/2005). Criou-se ainda um banco de dados que foi possível estabelecer área,
perímetro e comprimento da bacia hidrográfica, hierarquização dos cursos de água, densidade de
drenagem, forma da bacia. Para elaborar o mapa hipsométrico e o mapa de declividade da bacia do
rio da Dona, foi necessário gerar as curvas de nível pelo SRTM (Shuttle Radar Topography
Mission), que é uma missão espacial liderada pela NASA com parceria das agencias espaciais da
Alemanha (DLR) e Itália (ASI) realizada no ano de 2000 visando gerar um modelo digital de
elevação global. Nessa técnica a altitude é obtida através da medição da diferença de fase entre duas
imagens de RADAR sobre um mesmo local da terra.

RESULTADOS E DISCUSSÕES
A indicação de bacias hidrográficas como unidade territorial para implementar a Política
Nacional de Recursos Hídricos foi estabelecida pela Lei Federal no. 9.433 de 08 de janeiro de 1997,
tornando-se um instrumento valioso de integração dos aspectos socioambientais nas políticas de
desenvolvimento de uma região. Como unidade de estudo e planejamento ambiental, a bacia
hidrográfica permite uma abordagem integrada das transformações que ocorrem no espaço, pois
esta constitui um sistema completo com entrada e saída de energia, uma vez que qualquer ação
imprópria ao meio, logo é refletida em toda extensão da rede hidrográfica (Aguiar Netto, 2007).
Na perspectiva de um estudo hidrológico, a bacia hidrográfica é uma área de captação
natural de água de precipitação e que faz convergir os escoamentos para um único ponto de saída.
Compõe-se basicamente de um conjunto de vertentes e de uma rede de drenagem, formado por
cursos de água que confluem até resultar em leito único. As vertentes são áreas onde produzem os
sedimentos por fenômeno de erosão e estes são transportados com a água pela rede de drenagem à
seção de saída da bacia (Tucci, 2004). A dinâmica hidrológica que ocorre nas bacias hidrográficas
podem ser medidas, gerando um banco de dados geo-bio-físico que, interagindo aos estudos das
relações sócio-econômicas e culturais, permitem um conhecimento sistemático para o planejamento
e a gestão dos recursos naturais. Nesse sentido, a bacia hidrográfica é o suporte das atividades
humanas, pois ela é uma unidade física encontrada em toda superfície continental.

Análise morfométrica da bacia do rio da Dona


Através de ferramentas do programa SPRING e de dados secundários foi possível
caracterizar fisiografica e morfometricamente a bacia do rio da Dona. Analisando as áreas
territoriais dos municípios que compõem a bacia correlacionando-as com a área da bacia em
questão, observou-se que a totalidade das áreas dos municípios é 3,6 vezes maior do que a área da
bacia hidrográfica, ou seja, apenas 27,34% dos territórios dos municípios estão no interior da
referida bacia. O Quadro1 mostra a área total dos municípios e seu percentual no interior na bacia.
Fórum Internacional do Meio Ambiente - A conferência da Terra 895

Quadro 1. Relação entre a área municipal e a área do município na bacia do rio da Dona
MUNICÍPIO ÁREA DO ÁREA DO MUNICÍPIO NA BACIA
MUNICÍPIO HIDROGRÁFICA
2
(Km ) (Km2) (%)
Aratuípe 163,23 62,14 38,07
Castro Alves 699,73 7,99 1,14
Conceição do Almeida 298,95 6,61 2,21
Jaguaripe 547,41 251,29 45,90
Laje 502,70 108,10 21,50
Santo Antonio de Jesus 281,45 66,98 23,80
São Miguel das Matas 201,57 103,31 51,25
Varzedo 196,81 186,20 94,61
TOTAL 2.891,85 792,62 27,34
Fonte: Base de Dados Georeferenciados da SEI.

Através desse Quadro, verifica-se que os municípios de Castro Alves e Conceição do


Almeida possuem respectivamente 1,14% (7,99km2) e 2,21% (6,61km2) dos seus territórios
inseridos na bacia hidrográfica o que conduz para baixo a relação entre a superfície territorial dos
municípios e a área total da bacia do rio da Dona; entretanto as áreas territoriais desses dois
municípios são a base para formação do lençol freático que origina as nascentes mais distantes do
rio da Dona. Por outro lado, o município de Varzedo possui quase sua totalidade territorial dentro
da referida bacia. A Figura 2 mostra AA áreas em quilômetro quadrado de cada município no
interior da bacia hidrográfica em estudo.

Figura 2. Distribuição territorial dos municípios ao longo da bacia hidrográfica. Fonte: SEI.
Superintendência de Estudos Econômicos e Sociais da Bahia. Software: SPRING.
Geoprocessamento dos dados cartográficos: José Antonio Pacheco de Almeida e Djalma
Villa Gois.

Estabeleceu-se a hierarquia fluvial dos canais de drenagem da bacia hidrográfica do rio da


Dona, definindo a ordem dos cursos de água segundo a classificação de Arthur N. Strahler (1952),
apud CHRISTOFOLETTI (1974), visualizada na Figura 3. Foram identificados 839 canais fluviais,
sendo 420 de primeira ordem (nascentes de rios e riachos), muitos desses sobre o embasamento
cristalino, que se juntaram dando origem aos canais de segunda ordem, esses ao de terceira ordem e
assim sucessivamente até o de quinta (5ª) ordem após a confluência do rio Preto e o de Areia com o
Fórum Internacional do Meio Ambiente - A conferência da Terra 896

rio principal se estendendo até a sua foz. Após o reservatório de água para abastecimento humano
localizado no médio curso da referida bacia, os canais tributários alcançam no máximo a terceira
ordem, a exceção do riacho Macaco que atinge a quarta ordem. Verifica-se que a maior presença de
canais fluviais está no médio curso da bacia hidrográfica, que é um indicador natural de maior
possibilidade de cheias e transportes de sedimentos nos leitos dos rios.

Figura 4. Hierarquização fluvial segundo a classificação de Strahler. Fonte: SEI. Superintendência


de Estudos Econômicos e Sociais da Bahia. Software: SPRING.
Geoprocessamento dos dados cartográficos: José Antonio Pacheco de Almeida e Djalma
Villa Gois.

O padrão da rede de drenagem em quase toda bacia do rio da Dona é do tipo dendrítica,
apresentando seus tributários distribuídos em todas as direções sobre a superfície do terreno, unidos
ao canal principal em ângulos agudos de graduações variadas, mas sem chegar nunca ao ângulo
reto. Entretanto no canal tributário denominado de rio de Areia, localizado no médio curso da bacia,
verifica-se o tipo de drenagem anelar caracterizada pela forma circular causada pela esfericidade de
seus morros típicos de áreas dômicas encontradas na transição dos substratos cristalinos com as
rochas sedimentares. Esses rios correm em um curto percurso e forte declive.
A densidade de drenagem (Dd) definida inicialmente por R.E.Horton (1945) apud
CHRISTOFOLETTI (1974), e LEOPOLD (1998), é reconhecida como uma das mais significativas
das análises morfométricas das bacias de drenagem, expressando as disponibilidades de canais de
escoamento para o fluxo de água e materiais detríticos, bem como o grau de dissecação do relevo
resultante da atuação da rede de drenagem. Tem como objetivo comparar o comprimento dos canais
fluviais com a área da bacia. É expressa pela equação: Dd=∑L/A. O índice empregado varia de 0,5
km/km2, para bacias com drenagem baixa e de 3,5 km/km2 ou mais, para bacias excepcionalmente
bem drenadas. No caso da rede hidrográfica do rio da Dona, o comprimento dos seus cursos de
água, sejam eles permanentes, intermitentes ou efêmeros, estão na ordem de 968,59km e a área da
bacia é de aproximadamente 792,62km2. Assim sendo, a densidade de drenagem é de 1,22 km/km2
o que caracteriza uma bacia de baixa a medianamente drenada. A análise desses dados nos conduz à
discussão sobre “transmissibilidade” trazido por Carlston pela primeira vez em 1963, apud
CHRISTOFOLETTI (1974). Esta, refere-se à capacidade da permeabilidade ou infiltração da água
do terreno relacionada a densidade de drenagem, ou seja, a transmissibilidade aumenta quando a
densidade de drenagem diminui, e a transmissibilidade diminui quando a densidade de drenagem
aumenta. Nessa análise, a bacia do rio da Dona com Dd = 1,22km/km2, tem maior probabilidade de
Fórum Internacional do Meio Ambiente - A conferência da Terra 897

apresentar infiltração, e maior possibilidade de contaminação de águas subterrâneas; por outro lado
a maior capacidade de infiltração gera menor erosão. Portanto, como exemplo, deve ser evitado nas
práticas agrícolas o uso de agrotóxicos, pesticidas e emissão de dejetos humanos sobre áreas planas
com solos Latossólicos, pois como os dados revelam, essas áreas permitem maiores infiltrações, e
dessa forma a capacidade de contaminação do lençol freático é real.
Outra característica fisiológica da bacia hidrográfica importante como indicador ambiental
refere-se à forma da bacia. Esta característica constitui um índice indicativo da maior ou menor
tendência para enchentes de uma bacia devido ao tempo de concentração que leva a água dos
limites físicos da bacia (divisores de água), no início da precipitação, para chegar à saída da mesma
(foz). Bacias hidrográficas com formas mais circulares têm possibilidade maiores de sofrer
enchentes por receber as águas pluviométricas em toda sua extensão, enquanto que as de forma
mais retangular (alongadas) têm possibilidade de receber as águas pluviométricas em uma
determinada extremidade, por exemplo, enquanto que na outra não. Utilizando o método do índice
de circularidade (Ic) para definir a forma da bacia do rio da Dona, chegou-se aos seguintes
resultados: Ic = A/Ac, onde: A = área da bacia do rio da Dona = 792,62 km2; Ac = área do círculo
de perímetro igual ao da bacia do rio da Dona = πR2; P = Perímetro da bacia = 279,43 km. Sabe-se
que o perímetro da circunferência (P) = 2πR, então, 279,43 km = 2 x 3,1416 x R Î R = 44,47km.
Como Ac = πR2 Î Ac = 3,1416 x 44,472 Î Ac = 6.212,77km2. Então, Ic = 792,62km2 /
6.212,77km2 Î Ic = 0,13.
Sendo 0,13 o índice de circularidade, significa que a bacia em questão possui formas
alongadas, pois o valor máximo obtido na equação é igual a 1,0 (um), e quanto maior o valor, mais
próximo da forma circular estará a bacia considerada. Quanto mais afastado da unidade (1,0) a
bacia torna-se mais alongada, portanto com poucas possibilidades de enchentes ao mesmo tempo
em todo seu percurso.
Observando o mapa hipsométrico (Figura 4) da bacia hidrográfica do rio da Dona, notam-
se as áreas de maiores altitudes no setor oeste modelada pelas Serras da Pioneira, Monte Cruzeiro,
Água Branca e do Caporó compondo a Serra da Jibóia. De acordo com VALADÃO (2005), esse
modelado contribuiu para o início do desbravamento de toda a região através de expedições em
busca de minérios e caça de índios, visto que havia minas de prata nesta área e era habitada pelos
Índios Cariris e Sabujás. Esta serra se caracteriza por apresentar um relevo bastante movimentado
chegando a apresentar escarpas rochosas, cujos topos possuem altitude entre 740m e 805m. Sua
crista mede 26km de comprimento, estendendo-se no sentido Norte-Sul e possui uma área
aproximada de 50 km2 dentro da bacia, calculando-se a partir da curva de nível de 400m, a qual
coincide com a sua base.
Na bacia hidrográfica de referência, a Serra da Jibóia abrange parte do território dos
municípios de Varzedo, São Miguel das Matas, Castro Alves e Laje. Possui localização geográfica
em uma zona de transição que lhe confere uma grande diversidade de climas, relevos, solos,
vegetação e fauna. Sua área encontra-se sobre uma estrutura de escudo cristalino, com rochas
pertencentes ao Complexo de Jequié, do período Pré-Cambriano Inferior. A estrutura
geomorfológica da Serra da Jibóia e do seu entorno está incluída no domínio dos Planaltos
Cristalinos, na região do Planalto Rebaixado e na unidade dos Tabuleiros Pré-Litorâneos. Os tipos
de solo, associados a um relevo forte ondulado e montanhoso, variam em função da altitude, mas,
predominam os Latossolos e os Argissolos, associados em menor escala aos Neossolos com aptidão
regular para agricultura. RADAM BRASIL, (1981).
Nas áreas com altitudes entre 400m a 200m, a predominância de processos morfogenéticos
associados ao intemperísmo químico e ao entalhe fluvial, provocou o desgaste das rochas
cristalinas, modelando um relevo típico de “mares de morros” (Ab’ Saber, 2003), predominando os
interflúvios de forma convexa e retilineas, constituindo-se em pequenas colinas. Este tipo de
modelado quando mais próximo à referida serra é caracterizada pelo domínio dos Planaltos
Inumados, região dos Baixos Planaltos e unidade geomorfológica dos Tabuleiros Interioranos;
quando mais próximo à Bacia Sedimentar do Recôncavo (médio curso) caracteriza-se pela região
dos Planaltos Rebaixados e unidade dos Tabuleiros Pré-Litorâneos, nessa unidade algumas
Fórum Internacional do Meio Ambiente - A conferência da Terra 898

vertentes côncavas existentes resultaram do escoamento concentrado sobre áreas de material menos
resistentes aos processos erosivos, originando formações denominadas anfiteatros que, geralmente,
favorecem o afloramento do aqüífero, onde brotam as nascentes.
As áreas com baixas altitudes variando entre 100m e 25m, são caracterizadas pelo domínio
das Bacias e Coberturas Sedimentares da unidade geomorfológica das Baixadas Litorâneas. As
áreas com altitudes entre o nível médio do mar até aproximadamente 25m de altitude são
caracterizadas pelos Depósitos Sedimentares localizadas nas Planícies Litorâneas Marinhas e
Fluviomarinhas. Estas áreas são compostas por brejos, manguezais e restingas, e retratam um
ecossistema frágil, de maior interesse pela ocupação humana.

Figura 4. Distribuição das Classes Altimétricas na Bacia Hidrográfica. Fonte: SRTM. (Shuttle
Radar Topography Mission), 2000. Software: SPRING.
Geoprocessamento dos dados cartográficos: José Antonio Pacheco de Almeida e Djalma
Villa Gois.

A variação de declividade do terreno se refere à inclinação da superfície do solo com


relação ao seu plano horizontal, definido em metros para cada 100m deste plano. Esses dados são
fundamentais para compreender a intensidade dos processos erosivos e o transporte de sedimentos.
As fortes declividades são parâmetros indicativos das variações abruptas do terreno, intensificando
a ação erosiva das chuvas. A declividade da bacia hidrográfica controla quase sempre a velocidade
com que vai ocorrer o escoamento superficial, afetando o tempo em que a água da chuva leva para
concentrar-se no leito dos rios, constituindo a rede de drenagem e controlando também o tempo de
permanência de água no solo e, consequentemente, a quantidade de água infiltrada.
Na bacia do rio da Dona foram definidas seis classes de declividade (Figura 5), de acordo
com Vieira (1983), descritas em função da dinâmica da água e das limitações oferecidas para o
trabalho com máquinas agrícolas, a saber:
Relevo plano – predominante em 65% da área da bacia hidrográfica, sendo característico
das planícies litorâneas do baixo curso e nos tabuleiros pré-litorâneos situados no médio curso; são
superfícies suaves ou praticamente planas, com declividades de até 3%, que podem ser aradas em
todas as direções e sentidos.
Relevo suave ondulado – corresponde as meio-encostas e aos terrenos ligeiramente
movimentados, equivalendo a 7% da área da bacia, com predominância de declives de 3% a 8 %.
São superfícies pouco inclinadas, ligeiramente onduladas ou com declives moderados. Não existe
impedimento ao uso da máquina agrícola, a aração deve ser feita em curvas de nível e a agricultura
necessita de práticas simples de proteção.
Relevo ondulado – 8% a 20% - declives moderados a forte, áreas de ligeiramente
movimentadas a movimentadas. Devem ser trabalhadas em curvas de nível com trator de rodas e
necessitam de medidas de preservação contra a erosão. Correspondendo a 17% da área da bacia,
característicos do alto e médio curso.
Fórum Internacional do Meio Ambiente - A conferência da Terra 899

Relevo forte ondulado – 20% a 45% - superfície movimentada correspondente a 8% da


área da bacia, predominando nos divisores de água, em morros tipo meia laranja e vales pouco
profundos, podendo ser trabalhados mecanicamente apenas em curva de nível e por máquinas
simples de tração animal, ou até certo limite com trator de esteira.
Relevo montanhoso – totaliza 2% da área da bacia, correspondendo às encostas das Serras
Pioneira, Monte Cruzeiro, Água Branca e Caporó, e por serem áreas delimitadas entre o topo e a
curva de nível referente à 2/3 (dois terços) da altura em relação à base, são consideradas áreas de
preservação permanente, como descrito na Lei 6.569/94, que dispõe sobre a Política Florestal do
Estado da Bahia, Artigo 4º, parágrafo V. São áreas com declives muito fortes, entre 45% a 75%,
que não mais podem ser trabalhadas nem mesmo com máquinas simples de tração animal.
Escarpados – são classes de declividades pontuais na bacia hidrográfica do rio da Dona,
menos de 1% da área, predominando nas linhas de cumeadas na Serra da Jibóia; são áreas com
predominância de formas abruptas, compreendendo escarpas, e declividades acima de 75%. Área
protegida pela Lei (artigo 2º, Lei 4.771/65, Código Florestal Brasileiro), não podendo ser cultivada,
sendo considerada de preservação permanente.

Figura 5. Distribuição das Classes de Declividade na Bacia Hidrográfica. Fonte: SRTM. (Shuttle
Radar Topography Mission), 2000. Software: SPRING.
Geoprocessamento dos dados cartográficos: José Antonio Pacheco de Almeida e Djalma
Villa Gois.

CONSIDERAÇÕES FINAIS.
A análise morfométrica pode ser considerada uma das etapas do diagnóstico ambiental da
bacia hidrográfica do rio da Dona, porém não podemos desconsiderar os aspectos humanos para
complementação da pesquisa.
Por ser uma bacia hidrográfica com mais de 100km de extensão, com características
ambientais diversas, é necessário ações diferenciadas para cada setor: alto, médio e baixo curso,
visando melhor aproveitamento do seu potencial, porém não esquecendo da abordagem holística e
integrada das transformações que ocorrem no espaço.
Esta pesquisa proporciona informações que contribuem para um planejamento e gestão
ambiental da bacia hidrográfica do rio da Dona, fazendo com que se minimizem os impactos
ambientais decorrentes da ação humana, de acordo com os quais só vê o ambiente como uma fonte
de geração de riquezas e não como o local no qual se vive.

REFERÊNCIAS BIBLIOGRÁFICAS
Ab’ Sáber, A. N. Os Domínios de Natureza no Brasil. Potencialidades Paisagísticas. 3ª Edição.
São Paulo: Ateliê Editorial, 2003. 159 p.
Fórum Internacional do Meio Ambiente - A conferência da Terra 900

Aguiar Netto, A. O., Moreira, F. D., Ferreira, R. A. Análise Fisiográfica de Sub-Bacia Hidrográfica
do Rio Poxim – SE/BR. Anais do XII Simpósio Brasileiro de Geografia Física Aplicada. Natal,
2007, p. 1-17
Christofoletti, A. Geomorfologia. São Paulo, Edgard Blücher, Ed. da USP, 1974. 149 p.
Christofoletti, A. Modelagem de Sistemas Ambientais. 2ª reimpressão. São Paulo, Ed.Edgard
Blücher Ltda., 2002. 236 p.
EMBRAPA, Centro Nacional de Pesquisa de Solo, RJ. Sistema Brasileiro de Classificação de Solos
– Brasília: Embrapa Produção de Informação: Rio de Janeiro: Embrapa, 1999. 412 p.
Leopold, L. B., Wolman, M. G., Miller, J. P. The Drainage Basin as a Geomorphic Unit. In Fluvial
Processes in Geomorphology. Dover Publications, INC., New York, 1998. Cap. 5, p. 131-150
Política Florestal do Estado da Bahia. Lei n.º 6.569 de 17 de janeiro de 1994. Decreto n.º 6.785 de
23 de setembro de 1997. DDF. Diretoria de Desenvolvimento Florestal. Secretaria da Agricultura,
Irrigação e Reforma Agrária. Salvador – BA. 1997. 62 p.
RADAM Brasil. Ministério das Minas e Energia. Departamento Nacional de Produção Mineral.
Folha SD.24 Salvador: geologia, geomorfologia, solos, vegetação, clima. RJ, 1981. 620 p.
Schiavetti, A. e Camargo, A.F.M. Conceito de bacias hidrográficas. Teorias e aplicações.
Ed.UESC. Bahia, 2002. 290 p.
Silveira A. L. L. Cíclo Hidrológico e bacia Hidrográfica. In: Hidrologia. Ciências e Aplicação.
Porto Alegre, Editora da UFRGS/ABRH, 2004. Cap.2. p. 35-52.
Superintendência de Estudos Econômicos e Sociais da Bahia – SEI, Gerência de Recursos Naturais
– GERN. Base Cartográfica Digital. 2004/2005.
Tucci, C. E. M. Hidrologia: ciências e aplicações. Cap. 1 PA, Ed. da UFRGS/ABRH, 2004. 943 p.
Valadão, H. Santo Antonio de Jesus, Sua Gente e Suas Origens. Cap. 2, registrado na Biblioteca
Nacional sob nº. 344.944, livro nº. 635, folha nº. 104, 2005. 152 p.
Vieira, L. S. e Vieira, M. N. Manual de morfologia e classificação de solos. Ed. Agronômica Ceres,
ltda. S.Paulo, 2ª. ed. 1983. 319 p.
Fórum Internacional do Meio Ambiente - A conferência da Terra 901

CARACTERÍSTICAS HÍDRICAS DA MICROBACIA DE DRENAGEM DA BARRAGEM


VACA BRAVA – AREIA-PB, UM SUPORTE AO PLANEJAMENTO SUSTENTÁVEL DOS
RECURSOS HÍDRICOS

Lucas da Silva
Geógrafo, Mestrando do Programa de Pós-Graduação em Manejo de Solo e Água, CCA/UFPB.
lucasgeografia@yahoo.com.br
Hermes Alves de Almeida
Prof. Titular, Dr. Universidade Estadual da Paraíba. Depto. de História e Geografia/CEDUC/UEPB,
hermes_almeida@uol.com.br
José Ferreira da Costa Filho
Prof. Associado-I Dr. Universidade Federal da Paraíba, Areia, e-mail: costafi@cca.ufpb.br

RESUMO
O objetivo principai deste trabalho foi quantificar os índices climáticos relacionados a
disponibilidade hídrica e estabelecer o regime pluvial da microbacia de drenagem da barragem
Vaca Brava, Areia, PB. Esses elementos são importantes no planejamento dos recursos hídricos.
Utilizou-se uma série de oitenta e sete anos de dados de precipitação e de temperatura do ar,
determinando-se: a precipitação pluvial, ao nível de 75% de probabilidade (P75%), a
evapotranspiração potencial (ETP) e o balanço hídrico climatológico. A partir do balanço hídrico
foram determinados os índices hídricos de aridez e de umidade, a relação P75%/ETP e o índice de
disponibilidade de umidade (IDU). De acordo com os resultados obtidos a precipitação pluvial é
irregular, tem assimetria positiva e a mediana é a medida de tendência central mais provável de
ocorrer. O balanço hídrico mostrou ser uma ferramenta extremamente importante para caracterizar
o regime hídrico da bacia hidrográfica, quantificando os meses com excesso e com deficiência
hídrica. Há meses com deficiência hídrica mesmo em anos mais chuvosos na microbacia. A
evapotranspiração potencial média anual é de cerca de 1200 mm e os índices de disponibilidade de
umidade (IDU e Im) permitem monitorar a disponibilidade hídrica em diferentes escalas de tempo.
Palavras chave: balanço hídrico, índice hídrico, evapotranspiração.

ABSTRACT
The main objective of this study was to quantify the climate indices related to water
availability and establish the rainfall regimen of micro-basin drainage of the Vaca Brava dam,
Areia, PB, This elements are important in the planning of water resources. It was used a series of
eighty-seven years of data of rain and air temperature, determining: the rainfall at the level of 75%
probability (P75%), potential evapotranspiration (ETP) and the water balance. From the water
balance were determined the arid and humidity, indices, the relationship P75% / ETP and the rate
of availability of moisture (IDU). According to the results the rainfall is irregular, it has positive
asymmetry and the median is the measure of central tendency more likely to occur. The water
balance could be an extremely important tool to characterize the regime of the water basin,
quantifying the months with deficit and excess. There are some months with water deficit in the
year even more in the rainy year in the microbasin. The annual average potential evapotranspiration
is about 1200 mm and the rates of availability of moisture (IDU and Im) to allow monitoring the
water availability in differents scales of time.
Key words: water balance, humidity index, evapotranspiration.

INTRODUÇÃO
O grau de susceptibilidade das bacias hidrográficas à degadação está associado ao manejo
sustentável de seus recursos naturais. Entretanto, as ações antrópicas tem contribuíndo de forma
desastrosa na sua degradação. Nem a água, que é um elemento vital para os seres vivos, tem sido
preservada e para analise desse problema, é fundamental a identificação de fatores que fazem com
que a água seja ou venha a ser um fator limitante (OLIVEIRA, 2003). Uma bacia hidrográfica é
uma área fisiográfica drenada por um curso ou cursos de água, conectados, que convergem direta ou
indiretamente para um leito ou espelho de água tendo um ponto de saída comum.
Fórum Internacional do Meio Ambiente - A conferência da Terra 902

A precipitação pluvial é o principal elemento meteorológico alimentador das bacias e que


apresenta maior variabilidade tanto espacial como temporal, principalmente em regiões áridas e
semi-áridas. Deste modo, planejar o manejo dos recursos hídricos de uma bacia consiste é
fundamental para viabilizar a implementação de ações capazes de ajustar as características da água
disponível no local de utilização àquelas exigidas por cada um dos usos. (SAAD, 2000), Segundo
STIKKER (1998), o gerenciamento dos recursos hídricos, conduzido de maneira ineficiente, resulta
na escassez de água.
Atribui-se a falta de chuvas, a ausência ou a sua carência ao fenômeno denominado seca,
sendo definida como o intervalo de tempo no qual a disponibilidade hídrica é inferior ao esperado.
Admite-se, que existam quatro tipos de secas: meteorológica, hidrológica, agrícola e
socioeconômica (WILHITE & GLANTZ, 1987; RASMUSSEN, 1993). A seca meteorológica, por
exemplo, pode se desenvolver rapidamente e/ou "acabar abruptamente", já a seca agrícola está
relacionada à baixa disponibilidade de umidade no solo, a qual torna o suprimento de água às
culturas insuficiente para repor as perdas por evapotranspiração (WMO, 1975).
Estudos têm mostrado que existem correlações entre a variação interanual da precipitação
com as flutuações da temperatura da superfície do mar (TSM), nos oceanos tropicais, notadamente
os oceanos Atlântico e Pacífico (MOURA & SHUKLA, 1981), o que demonstra, o vínculo
existente entre os oceanos e a atmosfera (HASTENRATH & GREISCHAR, 1993; NOBRE &
SHUKLA, 1996).
Os excedentes hídricos podem se contrapor às deficiências de água, que se verificam na
estação seca, para plantas de sistema radicular profundo. Com base na definição de que o excesso
de água em uma estação compensaria uma deficiência em outra, THORNTHWAITE & MATHER
(1955) propuseram os índices hídrico (Ih), de aridez (Ia) e o de umidade (Im).
Os índices climáticos relacionados às condições de umidade, auxiliam no monitoramento
da disponibilidade hídrica. Por isso, quantificar os índices de disponibilidade de umidade (IDU),
propostos por HARGREAVES & MERKLEY (2000) e os estabelecidos por Thornthwaite &
Mather (1955), e estabeler o regime pluvial da microbacia de drenagem da barragem vaca Brava
foram os objetivos principais deste trabalho.

MATERIAL E MÉTODOS
Para realização do presente trabalho, foram utilizados dados mensais e anuais de
precipitação pluvial, correspondentes ao período de 1920 a 2006, coletados na Estação
Meteorológica do Departamento de Solos e Engenharia Rural do Centro de Ciências Agrárias da
Universidade Federal da Paraíba, Areia -PB, latitude 06º 58'S, longitude 34º 51' W e altitude de
642m.
Fórum Internacional do Meio Ambiente - A conferência da Terra 903

Figura 1: Mapa esquematico da Microbacia de Drenagem da Barragem Vaca Brava, Areia, PB.

Analisou-se, estatisticamente, uma série histórica pluvial, com oitenta e seis anos de dados,
da cidade de Areia. Os dados mensais e anuais de chuvas foram arranjados em classes, mediante a
distribuição de frequência, calculados as medidas de tendência central e de dispersão e ajustados à
distribuição normal reduzida de probabilidade. De posse das chances de ocorrência de chuvas,
escolheu-se os valores equivalentes a 75% de probabilidade (P75%).
A partir dos dados médios mensais de temperatura, estimou-se a evapotranspiração
potencial pelo método de THORNTHWAITE (1948), sendo a contabilidade hídrica feita pelo
método do balanço hídrico climatológico, proposto por THORNTHWAITE & MATHER (1955),
que resultou na quantificação da deficiência (DEF) e do excedente hídrico (EXC).
Os índices hídricos (Ih), de aridez (Ia), de umidade (Im) foram determinados a partir do
BHC, mediante as expressões:
EXC
Ih = (1)
ETP
DEF
Ia = ( 2)
ETP
Im = Ih -0,61 × Ia (3)
O índice de disponibilidade de umidade (IDU), proposto por HARGREAVES & MEKLEY
P
(2000), foi obtido pela relação: IDU= 75% , sendo adotado os seguintes critérios: IDU
ETP
<0,33→déficit de umidade; IDU> 1,33 → excesso e 0,33≤ IDU≤1,33 → condições favoráveis de
umidade.
Fórum Internacional do Meio Ambiente - A conferência da Terra 904

A estação chuvosa foi considerada aquele que apresentou uma seqüência de pelo menos
três meses com os maiores valores medianos, sendo adotado a mediana, como medida de tendência
central.
Estabelecida a estação chuvosa, foi determinado o índice R mediante a expressão:
ETR
R= (4)
ETP
Quanto menor for o índice R, maior será o déficit hídrico. Para R=1 e R=0 tem-se às
condições extremas de umidade (máxima e mínima), no solo, respectivamente.
As análises estatísticas, elaboração de gráficos e demais cálculos foram feitas utilizando-se
a planilha eletrônica Excel.

RESULTADOS E DISCUSSÕES
As médias mensais das médias, medianas e desvios padrão (DP) da precipitação pluvial da
microbacia drenagem da barragem vaca Brava são mostradas na Figura 2. Observa-se que, as
médias mensais estão sempre associadas a uma elevada dispersão, quantificadas mediante os
respectivos desvios padrão, cuja relação DP/média foi de 78,8%, sendo a maior em outubro (160%)
e as menores de março a agosto (média de 48,2%). As flutuações que ocorrem nos meses de
outubro-dezembro, por exemplo, superam as próprias médias.

200 Média Mediana DP 200

150 150
Chuva (mm)

DP(mm)
100 100

50 50

0 0
J F M A M J J A S O N D
meses

Figura 2. Médias mensais da média, mediana e desvio padrão da chuva. Barragem Vaca Brava,
Areia, PB, período:1920-06.

As médias aritiméticas mensais da precipitação (Figura 3) foram sempre maiores que as


medianas. Quando uma distribuição de freqüência tem essa característica (média ≠ mediana) ela é
dita assimétrica, sendo de assimetria positiva aquela que apresentar média maior que a mediana.
Para esse tipo de distribuição, a mediana é a medida de tendência central mais provável de ocorrer
e, portanto, a recomendada. Destaca-se, ainda, que na relação mediana/média, ela equivale à cerca
de 80,9% da média.
Fórum Internacional do Meio Ambiente - A conferência da Terra 905

100

DEF e EXC (mm)


50

-50
DEF EXC

-100
jan fev mar abr mai jun jul ago set out nov de z
meses
Figura 3. Médias mensais da deficiência e excedente hídrico. Barragem Vaca Brava. Média do
período: 1920-2006.

As médias mensais das deficiências e dos excedentes hídrico, resultantes do balanço


hídrico climatolígicos, são mostradas na Figura 3. Verifica-se que, mesmo para a condição média, a
microbacia da barragem vaca Brava é deficitária de setembro-outubro a fevereiro, que coincidem
com a estação seca, e superavitária de março a agosto-setembro (estação chuvosa). Destaca-se,
ainda, que os excedentes hídricos podem se contrapor às deficiências que se verificam na estação
seca, para plantas de sistema radicular profundo.
Os índices para caracterizar o grau de disponibilidade de umidade são mostrados na Figura
4. Observa-se que o índice de umidade (Im) é menor que zero nos meses da estação seca (setembro a
fevereiro) e positivo nos demais. Como este índice anual é cerca de 30%, o tipo de clima, pela
classificação climática de Thornthwaite, é úmido (B), com ou sem deficiência hídrica. O tipo
climático superúmido (A) ocorre somente nos meses de junho e junho quando o Im ultrapassa os
100%.
300
IDU Im
250
índices de umidade (%)

200

150

100

50

-50
Jan Fev Mar Abr Mai Jun Jul Ago Set Out Nov Dez
meses

Figura 4. Médias mensais dos índices de disponibilidade de umidade (IDU e Im). Barragem Vaca
Brava, Areia, PB.

O critério baseado no índice de disponibilidade de umidade (IDU) tem sido utilizado com
êxito em zoneamentos agrícolas e na quatificação das necessidades de irrigação. Quando o IDU for
≤ 33%, indica que a chuva não é suficiente para agricultura, sendo considerado normal no intervalo
entre 33 e 133%. Fora dessa faixa, há deficiência ou excedente hídrico. A IDU na faixa insuficiente
a agricultura ocorreu de outubro-dezembro, coincidindo também, com déficit hídrico (Figura 3). Os
índices mostrados nas Figuras 3 e 4 permitem quantificar a disponibilidade hídrica da citada bacia
em diferentes escalas de tempo.
Fórum Internacional do Meio Ambiente - A conferência da Terra 906

CONCLUSÕES
Baseado nos resultados encontrados, conclui-se que: a precipitação pluvial na microbacia
de drenagem da barragem vaca Brava é irregular e tem coeficiente de assimetria positivo; a
evapotranspiração potencial média anual é de cerca de 1200 mm. A mediana é a medida de
tendência central mais provável de ocorrer e equivale a 78,8% da média; a estação chuvosa
corresponde aos meses de março a agosto (955,0 mm), e equivale a 79,2% do total anual.
Os índices de disponibilidade de umidade (IDU e Im) permitem monitorar a
disponibilidade hídrica em diferentes escalas de tempo. O estudo dos componentes hidricos da
micribacia hidrográfica é indispensável para um planejenmeto local sustentado.

REFERÊNCIAS BIBLIOGRÁFICAS
ALMEIDA, H. A. de. Balanço hídrico climatológico pelo método de Thornthwaite-Mather (1955).
Software, 1988.
HARGREAVES, G. H., MERKLEY, G. P. Fundamentos del riego. Water Resources Publications,
CLC, 221p, 2000.
KERZNER, Harold. Planning. In Prosect Management: a systems approach to planning.
Scheduling, and controlling. 6. Ed. Ohio: John Wiley & sons Inc., 1997. 990p.
MATHER, J.R. Preface. (Publications in Climatology, v. XI, n.3), Centerton, N.J., p. 247-248,
1958.
NOBRE, P., SHUKLA, J. Variations of sea surface temperature, wind stress and rainfall over the
tropical Atlantic and South America. J. Climate, 10(4): 2464-2479, 1996.
OLIVEIRA, Gustavo Costa de. Gestação de recursos hídricos: Fatores que influem no planejamento
(Tese de doutorado)– UNITAL, 2003.: 86 il Taubaté- SP 2003
RASMUSSEN, E. M., DICKINSON, R. E., KUTZBACH, J. E., CLEAVELAND,M. K.
Climatology. In: MAIDMEMT, D.R. Handbook of hydrology. New York: McGraw-Hill, 1993. cap.
SAAD, Antonio Melhem: IWASA, OSWALDO YUJIRO Planos de Bacias (UGRHI-1 e UGRHI)
2000/2003. Coopetarivoas de Servisos Pesquias tecnologicas e industriais-SP, 2000
THORNTHWAITE, C.W. An approach toward a rational classification of climate. Geographical
Review, New York, v.38, n.1, p.55-94, 1948.
THORNTHWAITE, C.W.; MATHER, J.R. The water balance. Centerton, N.J.: Drexel Institute of
Technology, Laboratory of Climatology, publications in Climatology, v. 8, n. 1, 104p, 1955.
WILHITE, D. A.; GLANTZ, M.H. Understanding the drought phenomenon: The role definitions.
In: WILHITE et al. Planning for drought toward a reduction of societal vulnerability. Colorado:
Westview, 1987. cap. 2, p. 11-14. 1987.
WORLD METEOROLOGICAL ORGANIZATION (WMO). Drought and agriculture. Geneva,
Switzerland, (WMO Tech. Note 138, Publ. WMO-392), 127p, 1975.
Fórum Internacional do Meio Ambiente - A conferência da Terra 907

ECO-RESIDÊNCIA RURAL DE ADEQUADA GESTÃO HÍDRICA

Aline C. Ferreira
Engenheira Agrícola, Mestranda em Irrigação e Drenagem, UAEAg/CTRN/UFCG, Campina Grande-PB.
alinecfx@yahoo.com.br
Sidcley de Castro
Engenheiro Civil, Campina Grande-PB.
J. G. V. Baracuhy
Engenheiro Agrônomo, Professor Dr. da UAEAg/CTRN/UFCG.

RESUMO
O principal problema da comunidade é a escassez d’água e o mau uso dos recursos naturais
existentes, afetada pela escassez de chuvas, agravada pela falta de recursos financeiros e
conhecimento tecnológico. Isso acarreta sérios danos aos moradores de uma casa convencional no
semi-árido, com uma inadequada gestão hídrica, refletindo na saúde de todos e no meio ambiente.
Portanto, o objetivo deste trabalho é o desenvolvimento de um módulo residencial rural com 56 m2
e com comportamento e aproveitamento dos recursos hídricos de forma racional, desde a captação
de água do telhado ao uso eficiente e reuso da água residuária em horta, além da componente
ambiental utilizando o tijolo solo-cimento, o qual não é submetido a tradicional queima utilizando a
vegetação local, com enfoque de economia de materiais, gestão de água e meio ambiente menos
agredido, além de um padrão arquitetônico garantindo conforto para seus usuários.
Palavras–Chave: Água, Meio Ambiente, Habitação e Saúde.

ABSTRACT
The main problem is the community's water shortage and misuse of natural resources
available, affected by the shortage of rains, exacerbated by the lack of financial resources and
technological expertise. This brings serious damage to the residents of a house in the conventional
semi-arid, with an inadequate water management, reflecting in to the health of everyone and the
environment. Therefore, the objective of this work is the development of a module with 56 m2
residential rural and with behavior and utilization of water resources in a rational way, from the
abstraction of water from the roof to the efficient use and reuse of wastewater in the garden, in
addition to the component environmental using soil-cement brick, which is not subject to traditional
burning using the local vegetation, with focus-saving materials, management of water and
environment less assaulted, in addition to a standard architectural ensuring comfort for its users.
Keywords: Water, Environment, Housing and Health

INTRODUÇÃO
O principal problema da comunidade é a escassez d’água e o mau uso dos recursos naturais
existentes. Por ser localizada em uma região geograficamente isolada e climatologicamente afetada
pela escassez de chuvas, agravada pela falta de recursos financeiros e conhecimento tecnológico,
utiliza a mesma, inadequadamente, seus recursos hídricos, por despejarem sem nenhum tratamento
seus efluentes altamente poluidores próximos a leitos de rios, dos quais são fontes principais de
abastecimento d’água da comunidade. Residem em habitações sem levar em conta o bem estar da
família, com baixo ‘pé direito’ e tendo a área coberta calculada apenas pela necessidade primária de
morada, sem levar em conta a capacidade de coleta de recurso hídrico. Tudo isso acarreta sérios
danos aos moradores de uma casa convencional no semi-árido, com uma inadequada gestão hídrica
na célula familiar, refletindo na saúde de todos e no meio ambiente.
Esta tecnologia fez parte de uma das metas de um projeto financiado pelo CNPq-CT-
HIDRO, o qual visava aplicar o projeto Manejo Integrado de Bacias Hidrográficas (diagnóstico
físico-conservacionista, diagnóstico sócio-econômico, diagnóstico ambiental, levantamento da
vegetação, levantamento dos solos e diagnóstico da qualidade das águas na microbacia). Para tanto,
criar tal modelo representava dentro de uma gestão hídrica em microbacias, nossa primeira célula a
ser focalizada (Habitação). Após definir os prognósticos adequados para cada local da microbacia,
Fórum Internacional do Meio Ambiente - A conferência da Terra 908

torna-se mais fácil aplicar as medidas mitigadoras. Escolhido o local de maiores dificuldades em
captação de água, sem poços tubulares, onde se dependia apenas das águas de chuvas para serem
represadas, mas que ao final do ano (período seco), apenas um poço amazonas atendia a 22
famílias. Dentro das ações realizadas escolheu-se uma família que estava sendo formada e se
planejou a construção visando ao seu uso convencional de residência para este novo núcleo
familiar. Outra questão importante no uso e reuso das águas domésticas, onde se objetiva o mínimo
de desperdício, além dos habitantes locais, apresentarem costume de confeccionar tijolos comuns,
com queima em clareiras, o que cada vez mais reduz a vegetação de grande porte na serra, a opção
por tijolos de solo-cimento vem como uma alternativa, na visão de preservar as matas, não
desmatando e não queimando (esse fato também tem relação direta com uma adequada gestão
hídrica na bacia).

METODOLOGIA
Toda a residência foi construída por métodos ambientalmente corretos, seguindo essa linha
de pensamento não pode-se deixar de aplicar tecnologias que reduza os impactos ambientais de uma
construção do gênero. Para tanto, optou-se pela tecnologia do “solo-cimento” que utiliza tijolos
ecológicos (tijolos que não precisam passar pelo processo de queima, com um percentual de
cimento de 6,7%, solo do próprio local e um pouco de água, prensados em máquina manual,
moldados no formato desejado), além de baratear o custo final da construção. Todo o processo teve
início com a produção dos tijolos, onde foi montada uma máquina de modelagem próxima ao local
da construção residencial. Como a tecnologia não era do conhecimento da população, foram
oferecidos cursos de capacitação da produção dos tijolos, e com as pessoas habilitadas teve-se início
o processo de produção, que ficou sob a responsabilidade dos beneficiários da residência. Entre a
capacitação e a produção de todos os tijolos de solo-cimento, foram gastos dois meses. Para início
das atividades de construção da residência realizou-se uma consulta aos futuros proprietários, com
vários modelos de casas, para que a escolha fosse a que mais se adaptasse aos costumes locais. O
início do processo de construção teve um agente retardador devido a falta de conhecimentos
essenciais de processos construtivos, tendo-se resolvido de forma prática trabalhar com mão-de-
obra local e promover um processo de capacitação ao longo de toda a construção. O processo
construtivo foi facilitado por motivo do tipo de técnica empregada, com tijolos de solo-cimento,
que, para o caso em questão, apresentavam tijolos com dimensões de 10cmx20cmx5cm, com dois
furos de 5 cm de diâmetro que agilizam o assentamento (tijolos de encaixe) e dispensam o uso de
fôrmas para a parte estrutural, e evita a quebra de parede para a colocação de instalações hidro-
sanitárias e elétricas, além de necessitar de apenas um pequeno filete de argamassa na ora do
assentamento. Os tijolos usados, por sua forma, dispensam maiores cuidados na hora do
acabamento, devido à qualidade e aparência estética. A técnica do solo-cimento não limitou-se
apenas a etapa das alvenarias. Empregou-se esta tecnologia também nas fundações corridas e no
contra-piso da residência, barateando consideravelmente o custo final da construção, deixando a
população local com a consciência de poder construir sem agressões ao meio ambiente, além da
redução dos custos unitários da construção civil.
Cisterna de Placas: A cisterna de placas construída na residência, para a captação de águas
dos telhados foi de 21.000 litros com maior capacidade do que as cisternas de placas convencionais
de 16.000 litros. O telhado foi projetado com inclinação e quedas d’água favoráveis a uma melhor
captação das águas das chuvas. O posicionamento da cisterna foi feito na parte superior do terreno,
próximo à residência e com uma altura maior (maior pressão), permitindo o abastecimento direto
para a casa (por gravidade) até metade do volume total, dispensando o uso de bombas ou o contacto
direto com a cisterna, apenas por gravidade, pode-se captar a água em dois pontos, tanto dentro da
cozinha como na lateral da casa, tornando as atividades rotineiras mais práticas, principalmente
quanto não há possibilidade deslocamento de até a cisterna ou se deseja evitar possíveis
contaminações desse tipo de água de tão boa qualidade. O volume de água projetado permite em
média após a cisterna cheia ser suficiente para alimentação, bebida e outras demandas com fins de
melhor qualidade. Para o preenchimento desse volume de captação, considerando uma área coberta
Fórum Internacional do Meio Ambiente - A conferência da Terra 909

de 65,61 m2, (área de captação = casa+beiral = 56,60 + 9,01) apenas é necessário 320 milimetros de
chuva coletada num ano para atender 57,5 litros dia para a família usuária. Pensando desta forma,
considerando-se as chuvas médias do local de 557 mm por ano (Santa Luzia, PB), calcula-se obter
até 1,5 a 2 vezes o volume da cisterna, de acordo com o uso do reservatório durante o ano, e a
distribuição das chuvas ao longo do ano, possibilitando recargas na cisterna, quando as mesmas
forem mais espaçadas durante o ano.
Sistema Lavanderia/Descarga Sanitária: Foi adotada uma alternativa para minimizar o
excessivo consumo de água nas descargas diárias do vaso sanitário. Observou-se que os moradores
não dispunham de locais apropriados para a lavagem de roupas e que toda a água da lavagem após
seu uso era despejado no solo para escoar, infiltrar ou evaporar. Diante da situação se propôs a
instalação de uma lavanderia na área externa da casa, com um tratamento simples de todas as águas
residuárias da lavagem de roupas. Construída no ponto mais alto e próximo do terreno ocupado pela
casa, projetou-se uma tanque com três divisórias: a primeira em forma de labirinto com areia lavada
(isenta de argilas e/ou impurezas) para conter os saponáceos existentes nas águas servidas; a
segunda como ponto de decantação de possíveis impurezas remanescentes do primeiro tratamento; e
por fim um terceiro tanque que serve de reservatório para a destinação das águas para à caixa de
descarga. Feito o tratamento primário, a água sai por gravidade até a descarga sanitária que por sua
vez, dispõe de dois registros em que, dependendo da disponibilidade, os usuários o acionam com
água limpa, vindo do reservatório superior (caixa d’água), ou do terceiro tanque do tratamento de
águas da lavanderia. Com isto pode-se reduzir consideravelmente o consumo de água, tão rara na
região do Semi-Árido (residência em estudo).
Sistema Banheiro/cozinha: O reaproveitamento das águas residuárias oriundas do chuveiro,
pia do banheiro e pia da cozinha foi estabelecido para o reuso na agricultura familiar através de
canteiros de infiltração. É bastante recomendável que todo morador tenha em sua residência
fruteiras em seu quintal, e pensando nisso, projeta-se um sistema de tratamento através de filtro de
areia com disposição final em um canteiro de infiltração. Todo o afluente é direcionado até o filtro
passando antes por uma caixa de gordura direcionados para um canteiro de infiltração composto por
uma vala de 50cm de profundidade, uma tubulação de cano 100mm em PVC com furos ao longo do
seu comprimento, revestida de britas e areia, para facilitar a distribuição e melhorar a infiltração do
efluente no solo. Partindo desse princípio continua-se aproveitando toda a água residuária produzida
nas atividades domesticas diárias da residência.
Reuso do Efluente da Descarga: Não deve-se deixar de aproveitar também, os efluentes
oriundos da descarga sanitária da casa, rico em macronutrientes e micronutrientes. Após um
tratamento através de um tanque séptico (filtro anaeróbio) com um processo trifásico, o efluente é
direcionado para uma vala semelhante ao tratamento dos efluentes vindos da cozinha e banheiro,
passando por uma vala de 50cm de profundidade, uma tubulação de cano 100mm em PVC com
furos ao logo do seu comprimento, revestida de britas e areia, para facilitar a distribuição e melhorar
a infiltração do efluente no solo. Com isto consegue-se potencializar ao máximo todas efluentes
produzidos na residência em estudo.
Enfoque arquitetônico para maior conforto do ambiente: A escolha da arquitetura e
materiais empregados na construção da residência além da visão de preservação do meio ambiente e
redução dos custos exigiu a preocupação com aspectos de ambiência na habitação e o resgate de
velhos costumes da região, como a existência de um sótão na casa. A casa possui uma arquitetura
bem peculiar, com um pé direito de 2,80m e janelas maiores do que as de costumes locais,
proporcionado uma maior ventilação, que favorece a circulação do ar no interior da casa,
promovendo fisiologicamente nos seus moradores, menor transpiração e consumo de água. Os
tijolos possuem comportamento termo-acústico deixando ainda mais a residência climatizada e com
menor incidência de ruídos tornando-a mais aconchegante. Como o telhado possui um designer
diferenciado com variação de altura iniciando no pé direito da casa com 2,80m e uma cumeeira na
diagonal e inclinada atingindo uma altura de 5,20m, o que proporcionou o resgate do “sótão”, onde
bastou apenas construir uma laje sob o quarto do casal e área de serviço para conseguir realizar tal
Fórum Internacional do Meio Ambiente - A conferência da Terra 910

ambiente, e como conseqüência deixar o quarto do casal com mais privacidade e segurança pela
presença da laje.
Com relação aos aspectos estruturais, a residência foi construída sob fortes fundações,
pilares e vigas projetadas em concreto armado. Apesar de ser uma residência situada na zona rural,
a economia com a utilização do solo-cimento proporcionou a aplicação de elementos estruturais de
uma residência de maior porte financeiro, tal situação poderá ser estudado futuramente, em menor
consumo de ferragens, podendo atingir situações mínimas a serem aplicadas em módulos seguintes.
Metas: Módulo Residencial Rural:
1 – Produção de 16.000 tijolos ecológicos em 1 mês e
2 – Construção de uma residência com métodos ecológicos e mecanismo de reuso de água
residencial.

RESULTADOS ALCANÇADOS
Todos os resultados foram alcançados, porém, devido ao envolvimento da comunidade,
observou-se a importância de passar as técnicas de construções para todos os que mostraram
interesse. Devido ainda ao leque de utilidades que as técnicas disponibilizam, foi definido ampliar o
projeto, passando a capacitar as pessoas na produção de tijolos ecológicos com cursos e ensinar
técnicas de construção aos moradores da localidade, tendo em vista que optou-se em se trabalhar na
construção com mão-de-obra local. É ampliado a área da residência de 54 m² (previsto no projeto)
para 78 m², cisterna de 16 m³ para 21 m³, optou-se em construir a lavanderia externa para melhor
aproveitamento das águas. Toda a construção da residência se tornou um curso prático, visto que os
operários locais tinham pouco conhecimento de técnicas de construção. Com isso aumentou-se o
prazo de construção de 3 meses para 5 meses, mas conseguiu-se envolver a comunidade e
enriquecer o conhecimento e valorar o trabalho empregado por todos.
O processo construtivo da eco-residencia pode ser observado através do registro
fotográfico (Figuras de 1 a 48).

Figura 1: Escolha do local de construção produção Figura 2: Tenda para armazenagem dos tijolos
dos tijolos de solo-cimento de solo-cimento

Figura 3: Dosagem racional do solo para a mistura Figura 4: Homogeneização da mistura solo-
solo-cimento cimento
Fórum Internacional do Meio Ambiente - A conferência da Terra 911

Figura 5: Produção dos tijolos de solo-cimento Figura 6: Retirada do tijolo da prensa manual

Figura 7: Otimização com água para auxiliar o Figura 8: Escolha do local de construção da
processo de cura residência

Figura 9: Marcação e início das escavações da Figura 10: Sapatas isoladas em concreto
residência ciclópico

Figura 11: Abafamento das fôrmas da viga Figura 12: Execução da viga baldrame
baldrame.

Figura 13: Alvenaria “guia” de solo-cimento Figura 14: Furos dos tijolos dispensando
fôrmas paras as armaduras dos pilares
Fórum Internacional do Meio Ambiente - A conferência da Terra 912

Figura 15: Início das escavações da cisterna de Figura 16: Produção das placas superiores da
placas cisterna

Figura 17: Produção das vigas de sustentação da Figura 18: Execução das cisternas de placas
cisterna de placas

Figura 19: Montagem da cobertura da cisterna Figura 20: Acabamento da cisterna de placas

Figura 21: ▓ água potável vinda do reservatório Figura 22: Reservatório elevado para
elevado da residência abastecimento da casa e lavanderia externa

Figura 23: Instalações hidro-sanitárias: ▓ água Figura 24: Instalações sanitárias embutidas
potável; ▓ água de reuso vinda da lavanderia; ▓
Fórum Internacional do Meio Ambiente - A conferência da Terra 913

água para tratamento em filtro de areia; ▓ água


para tratamento anaeróbio; ▓ abastecimento da
descarga com duas opções de escolha: água de
reuso e/ou água potável

Figura 25: ▓ pontos embutidos de instalações Figura 26: Instalações elétricas embutidas
elétricas

Figura 27: Pontos de captação de energia da rede Figura 28: Contra-piso em solo-cimento-cal
externa embutidos nas paredes

Figura 29: Execução das vigas de sustentação Figura 30: Concretagem dos pilares utilizado
os tijolos como fôrma

Figura 31: Construção do sótão Figura 32: Execução da laje do sótão


Fórum Internacional do Meio Ambiente - A conferência da Terra 914

Figura 33: Localização do sótão da residência Figura 34: Execução da empena do telhado da
casa

Figura 35: Cumeeira da casa na diagonal Figura 36: Estrutura do madeiramento do


conforme modelo do telhado telhado

Figura 37: Execução da cobertura em telhas Figura 38: Encontro das calhas coletoras das
cerâmicas duas águas do telhado

Figura 39: Acabamento da alvenaria com Figura 40: Sistema de tratamento das águas da
frizamento no rejunte dos tijolos e pintura, sem lavanderia para reuso na descarga
custos de reboco e chapisco
Fórum Internacional do Meio Ambiente - A conferência da Terra 915

Figura 41: Lavanderia em tijolo de solo-cimento, Figura 42: ▓ água da cisterna direcionada para
uso e reuso das águas: ▓ água potável vindo da cozinha; ▓ água da caixa d’água para a
caixa d’água; ▓ água tratada para reuso na lavanderia; ▓ água de reuso da lavanderia; ▓
descarga afluente de pia de cozinha/banheiro e chuveiro
para tratamento em filtro de areia; ▓ afluente
de descarga para tratamento anaeróbio

Figura 43: Direcionamento dos afluentes para Figura 44: ▓ afluente para tratamento em filtro
tratamento de areia

Figura 45: ▓ Vala de infiltração dos efluentes de Figura 46: Lavanderia pronta com sistema de
descarga sanitária tratados para reuso na tratamento primário de efluentes
agricultura; ▓ vala de infiltração para os efluentes
tratados de cozinha e pia de banheiro e chuveiro
para reuso na agricultura

Figura 47: Residência finalizada com sistema de Figura 48: Detalhe dos fundos e lateral
aproveitamento e direcionamento das águas das esquerda da residência mostrando o aspecto
chuvas para a cisterna de placas visual do telhado em diagonal
Fórum Internacional do Meio Ambiente - A conferência da Terra 916

CONCLUSÃO
A escolha da arquitetura e materiais empregados na construção da residência além da visão
de preservação do meio ambiente e redução dos custos exigiu a preocupação com aspectos de
ambiência na habitação e o resgate de velhos costumes da região, como a existência de um sótão na
casa. A casa possui uma arquitetura bem peculiar, com um pé direito de 2,80m e janelas maiores do
que as de costumes locais, proporcionando uma maior ventilação, que favorece a circulação do ar
no interior da casa, promovendo fisiologicamente nos seus moradores, menor transpiração e
consumo de água. Os tijolos possuem comportamento termo-acústico deixando ainda mais a
residência climatizada e com menor incidência de ruídos tornando-a mais aconchegante. Apesar de
ser uma residência situada na zona rural, a economia com a utilização do solo-cimento
proporcionou a aplicação de elementos estruturais de uma residência de maior porte financeiro, tal
situação poderá ser estudado futuramente, em menor consumo de ferragens.

REFERÊNCIAS BIBLIOGRÁFICAS
Projeto: Pesquisa na realização de Diagnóstico físico-conservacionista, diagnóstico socio-
economico e ambiental, diagnóstico de vegetação e recursos hidricos, e classificação do solo da
microbacia. Carater extensionista pela construção de 5 barragens subterrâneas, 5 poços amazonas,
06 cisternas de placas, 01 módulo de residência rural com gestão hídrica utilizando tijolos solo-
cimento, em propriedades localizadas dentro da microbacia, incluindo capacitações em barragens
subterrâneas, poços amazonas e confecção de tijolos solo cimento.
Fórum Internacional do Meio Ambiente - A conferência da Terra 917

ANÁLISE DO DESPERDÍCIO DE ÁGUA TRATADA NO BAIRRO GERALDO SIMÕES


NO MUNICÍPIO DE ITABUNA-BA

Antonio Fontes de Faria Filho


Faculdade de Tecnologia e Ciências de Itabuna (Docentes Engenharia Ambiental) – afilho.ita@ftc.br
Fábio dos Santos Massena
Faculdade de Tecnologia e Ciências de Itabuna (Docentes Engenharia Ambiental) – fabiomassena@gmail.com
Jeferson Silva
Faculdade de Tecnologia e Ciências de Itabuna (Graduando em Engenharia Ambiental)

RESUMO
Objetivando contribuir com a identificação de potencialidades de uso da água, este artigo
trata do desperdício de água tratada no bairro Geraldo Simões, localizado próximo a BR-101, no
município de Itabuna-BA, como também aspectos de impactos ambientais no que diz respeito à
perturbação da mata ciliar, erosão, lançamento de esgoto e fossas sépticas. O conteúdo da analise
foi adquirido e elaborado a partir de entrevista com moradores da área de estudo, observação “in
loco” e a utilização da Matriz de Leopold, como método de avaliação das ações antrópicas sobre o
meio ambiente. Aborda o nível de conscientização da população em relação à problemática
justificando o elevado grau de influência do homem, degradando e tornando escassos os recursos
naturais. Conclui-se por ser baixo o nível de conscientização aumentando o grau de ação da
população de forma negativa sobre seu próprio ambiente e o desperdício de água.
Palavras-chave: Mata ciliar, esgotos, erosão superficial, desperdício de água tratada.

ABSTRACT
Objectifying to contribute with the identification of potentialities of water´s use, this article
deals with the water wastefulness treated in the Geraldo Simões quarter, located next the BR-101, in
Itabuna´s city - BA, as also environmental impacts aspects which respects to the disturbance of the
ciliar bush, erosion, sewer and cesspool septic launching. The analysis content was acquired and
elaborated from the studied area inhabitants interview, comment "in loco" and the use of the
Leopold Matrix, as method of evaluation of the human actions on the environment. It approaches
the awareness level of the population in relation to the problematic, justifying the raised degree of
man´s influence, degrading and becoming scarce the natural resources. It is concluded that the
awareness level is low, increasing the population action degree as a negative form on its proper
environment and the water wastefulness.
Keyword: Ciliar bush, sewers, superficial erosion, treated water wastefulness.

INTRODUÇÃO
Durante muito tempo, os homens usaram a água como se fosse um recurso inesgotável, por
ser renovável, esperava-se que mesmo com o acúmulo de resíduos a água retornaria purificada,
pronta para ser utilizada novamente. Mas, nos dias atuais, os povos do mundo já estão com
dificuldade para obter a água necessária para viver, tanto na zona rural como urbana e em outros
locais o uso indiscriminado, a falta de conscientização de parte das pessoas, principalmente os mais
carentes contribuem para o mau uso e o desperdício desse recurso natural, atualmente considerado
não renovável (BRAGA, 2002).
O desperdício de água no planeta representa, hoje uma preocupação mundial. Dados da
ONU sinalizam para uma situação preocupante, em 2025, ou seja, dentro de 20 anos 2/3 da
população mundial começarão a sentir os efeitos do desperdício da água. A escassez de água
agravada em virtude da desigualdade social e de falta de manejo e uso sustentáveis dos recursos
naturais, as diferenças registradas entre países desenvolvidos chocam e evidenciam que a crise
mundial dos recursos hídricos está diretamente ligada as desigualdades sociais e o desperdício
destaca-se juntamente com a baixa qualidade de vida (SOUTO, 2004).
O problema do desperdício de água é um fato presente em vários municípios da Bahia. Em
Itabuna nota-se que há um consumo irregular de água em alguns bairros. O bairro Geraldo Simões
Fórum Internacional do Meio Ambiente - A conferência da Terra 918

vem enfrentando vários problemas em relação o desperdício de água, há carência de esgotamento


sanitário, falta de tanques para reservação de água, impactos causados pela invasão de área
manancial, erosão, perturbação da mata ciliar, crescimento populacional desordenado, com centenas
de barracos de madeira de péssimas condições, falta de orientação ao cidadão, que mesmo sem
consciência causa uma série de problemas relacionados ao uso indevido da água como também a
falta de raciocínio ecológico no que se refere aos recursos naturais degradando os mesmos.
Já não resta a menor dúvida que a conscientização humana em relação ao consumo deste
recurso natural é a melhor maneira de evitar o desperdício e o consumo desenfreado principalmente
com as populações mais carentes, pois pensam devido ao fato de não pagarem tarifa de água tratada
usam sem a menor preocupação com o tamanho do uso relativo a esse recurso.(REBOUÇAS,
1995).
Neste contexto a Matriz de Leopold, vem ajudar a identificar as ações do homem sobre o
meio ambiente, é uma técnica bidimensional que relacionam ações com fatores ambientais, sendo
constituída de 100 colunas que representam as ações antrópicas, e de 88 linhas relativas aos fatores
ambientais. Pela dificuldade de operar com esse numero de interações, trabalha-se normalmente
com Matrizes reduzidas que consiste em avaliar a magnitude e a importância de cada impacto,
provocado pela ação sobre o fator ambiental (MARGULIS, 1990).
A presente pesquisa pretende avaliar a problemática do desperdício de água tratada no
bairro Geraldo Simões, observando o índice de influência da população em relação ao contexto e
através da avaliação de impactos ambientais descobrir quais fatores interferem de forma mais ou
menos intensa em relação às ações humanas.

MATERIAL E MÉTODOS
Área de estudo
O município de Itabuna localiza-se, aproximadamente entre os meridianos 39º 17’ e 39º
17’ W e os paralelos 14º 47’ e 14º 47’ S (Fig. 1), na zona fisiográfica denominada região cacaueira
da Bahia e região econômica litoral Sul do estado da Bahia. Sua área limita-se ao norte com o
município de Itajuípe, ao sul por Buerarema, ao sudoeste com Jussarí e Itapé, a oeste Ibicaraí, ao
noroeste, Lomanto Junior e ao Leste Ilhéus e o Oceano Atlântico (CEI, 1993).
Foram aplicados 52 formulários na parte mais antiga do Bairro. A amostra da população
em estudo corresponde a 10,7 % das residências ainda restantes na parte mais pobre do bairro que
ainda não foi remanejada pelo atual projeto Habitar Brasil.
Foram pesquisados 52 barracos de madeira, no bairro Geraldo Simões no município de
Itabuna - BA.

Figura 1: Localização do município de Itabuna e detalhe da rua principal do bairro Geraldo Simões.
Fonte: FARIA FILHO E ARAUJO (2000), adaptado.

Tipologia de Estudo
Fórum Internacional do Meio Ambiente - A conferência da Terra 919

A pesquisa teve início com observação direta na localidade. Foram fotografados os locais
mais críticos que, apresentam a realidade do bairro. Em outro momento foram aplicados
formulários dirigidos com questões abertas e semi-abertas, no momento em que foi verificada a
existência de desperdício desse recurso natural.
Numa terceira visita foi medida a vazão de 30% dos canos externos com um vasilhame
medindo um volume de dois litros e um cronômetro para medir o tempo gasto para mensurar uma
quantidade necessária para elaborar os cálculos de vazão verificando o volume de água gasto em
função do tempo que contribui de forma secundária para aumentar a perturbação da margem do rio
e também foi avaliado as interações entre o homem e o seu ambiente através da técnica de avaliação
de impacto ambiental que foi a Matriz de Leopold (1971), usando uma Matriz adaptada, interagindo
6 (seis) fatores ambientais com 11 (onze) ações humanas.

Análise de Dados
Foram feitas análises qualitativas e quantitativas dos dados coletados nos formulários,
tabulação dos dados, descrição dos resultados e interpretação da Matriz de Leopold elaborada. Após
analisar e discutir as respostas dos formulários e do método de avaliação de impactos ambientais
utilizados foi possível detectar problemas reais.

Avaliação de Impacto Ambiental (AIA)


Para avaliação dos impactos oriundos da população local sobre o meio ambiente foi
escolhido como método de AIA a Matriz de Leopold, 1971, elaborada parcialmente para mensurar
as ações humanas sobre os fatores ambientais que os rodeiam. Baseado em observação “in loco”
escolheu-se ações do tipo reservação de água em cada moradia, tubulação que fornece água tratada
a população, desperdício de água, escavações superficiais, emissão de esgotos, fossas sépticas,
deposição de lixo, perturbação da mata ciliar, urbanização e controle de insetos com os fatores
ambientais da qualidade de água tratada, escassez de água, erosão das margens, inundações, padrões
de vida e uso do território para propiciar uma ampla informação de valores criando uma legenda
numérica para mensurar essas interferências.
Classificaram-se as ações pouco impactantes com valor 1, 2, 3, ações de médio impacto
com valor 4, 5, 6 e ações altamente impactantes com valores de 7 em diante, referente a magnitude
da ação sobre o fator identificando se o mesmo é positivo ou negativo e a pontuação da importância
é subjetiva ou normativa, no que se refere a questão dos recursos ambientais com os valores que a
população desconhece que precisa ter para obter melhores condições de vida.
Classificou-se tanto o índice pontual, ação com fator, como o índice dos fatores com
valores de 0 a 15 de pouco impacto, de 15,1 a 25 de médio impacto e valores maiores que 25 para
situações em que o impacto é altíssimo mesmo podendo ser positivo ou negativo, para poder ter um
parâmetro racional dos estudos realizados.
Multiplicaram-se os valores atribuídos de ações com fatores de cada célula somando o
resultado da multiplicação de cada célula de cada coluna cuja soma dividiu-se pela quantidade de
fatores ambientais para obter uma media aritmética denominada índice pontual do impacto de cada
ação sobre os fatores ambientais.
Somaram-se os resultados da multiplicação de cada célula em cada linha, o resultado
encontrado dividiu-se pela quantidade de ações da matriz, encontrou-se o índice pontual do impacto
de cada fator sobre cada ação relacionada.

RESULTADOS E DISCUSSÃO
Consciência Ambiental da Comunidade.
O Bairro Geraldo Simões está localizado às margens do Rio Cachoeira, caracterizado por
uma população com uma situação socioeconômica e cultural agravantes, possui 1715 habitantes,
correspondendo a 490 famílias, que residem em barracos sem infra-estruturas adequadas para uma
boa qualidade de vida (Prefeitura Municipal de Itabuna, 2006).
Fórum Internacional do Meio Ambiente - A conferência da Terra 920

O estudo denota clareza da questão cultural da população com ações negativas sobre os
fatores ambientais que os rodeiam, evidenciasse o alto impacto ambiental negativo da reservação na
qualidade da água tratada porque grande parte da população não possui local adequado a reservação
da água, sendo contaminada por poluentes diversos (lixo, esgoto), por não ter reservação adequada
à falta de água enquadrou-se em médio impacto negativo devido alternância de água fornecida pelo
sistema público. A água desperdiçada é rapidamente escoada favorecendo a erosão da margem do
rio sendo uma ação altamente impactante (Fig. 2). Devido à população local não possuir um bom
nível cultural desconhece a necessidade da boa reservação para manter o padrão da qualidade da
água e reduzir o desperdício.

Figura 2 - A água desperdiçada é rapidamente escoada favorecendo a erosão da margem do rio.

A tubulação usada para fornecimento de água apresenta várias emendas, vazamentos,


ligações clandestinas que vem afetar a qualidade da mesma na sua trajetória final. Devido ao
vazamento e desperdício originou-se um alto impacto ambiental negativo, porque a água não chega
as partes mais altas do bairro. Fossas e esgotos lançados sem nenhum critério técnico interfere tanto
na qualidade da água como na erosão demonstrando um alto impacto ambiental negativo.
Praticamente não existe vegetação nas margens do rio além de escavações superficiais que
aumentam o impacto ambiental negativo.
Quanto ao desperdício de água, revelou-se que 90% da população afirma que existe
desperdício e apenas 10% disse que não, (Fig. 3). É notável que a grande parcela da população tem
conhecimento da existência de desperdício de água no bairro, embora não tenham se mobilizado
para solucionar o problema devido ao baixo nível cultural que se encontra submetida aquela
população. É evidente também que apenas uma pequena parcela da população se preocupa com a
questão do uso racional da água, alguns dos entrevistados disseram que contribuem para amenizar o
desperdício de água fechando os registros que encontram abertos, e tentando convencer os vizinhos
a fazer o mesmo, porém outra parcela da população ainda não tem essa preocupação com a questão
do desperdício.
Fórum Internacional do Meio Ambiente - A conferência da Terra 921

Desperdício de Água

10%

Sim
Não

90%

Figura 3 – Desperdício de água, afirmado pela população.

Foi medida a vazão existente em 30% dos canos externos do local e concluiu-se que os
canos com registro tem uma vazão maior, em um intervalo de tempo menor do que os canos com
torneiras. Nos canos com registro observou-se uma vazão de 1,5 L de água em um intervalo de
tempo variando entre 1 a 15 segundos e nos canos com torneira, notou-se a vazão de 1 L de água
entre 11 a 25 segundos.
Durante a aplicação dos formulários os entrevistados com faixa etária de 29 a 54 anos, são
mais sensíveis à problemática do desperdício da água no bairro. Assim há necessidade de maior
esclarecimento entre os adolescentes e jovens, voltados para a racionalização da água, pressupondo
mudanças de atitude e uma visão mais ampla de como se deve utilizar a água envolvendo a ação
individual para diminuir as agressões ao meio ambiente como também evitar a proliferação de
doenças de veiculação hídrica.
O grau de escolaridade dos entrevistados demonstra que a população pesquisada tem uma
grande dificuldade em concluir os estudos. Apenas 8% possuem o Ensino Médio Incompleto, a
maioria não concluiu o ensino fundamental e 22% nunca estudaram.

Avaliação dos Impactos Ambientais.


Apresentou-se de acordo com a avaliação dos autores na Matriz de Leopold (Quadro 1),
um aspecto positivo sobre a qualidade da água com relação ao programa público de controle de
insetos tipo fumacê diminuindo os insetos e vetores causadores de doenças como a dengue. Na ação
de urbanização apresentou-se médio impacto ambiental negativo, porque não existe rede coletora de
esgoto como também a rua principal do bairro não é pavimentada, acumulando água empoçada
aumentando assim a proliferação de doenças. A deposição de sucatas causa um médio impacto
ambiental negativo, pois acumula muitos materiais favorecendo a proliferação de insetos e roedores
que causam contaminação das águas reservadas aumentando a degradação ambiental do Bairro
Geraldo Simões. Constatou-se pela função fator X ação que a qualidade de água gera um médio
impacto ambiental negativo devido à água fornecida ser de boa potabilidade, mas podendo ser ainda
contaminada quando surge perfuração na tubulação da rede de distribuição.
O uso do território como também o padrão de vida dos moradores do bairro demonstra que
esses fatores forçam um alto impacto ambiental negativo despertando as principais causas dos
maiores pontos de intervenção humana no entorno. São esses principais fatores que contribuem de
forma negativa o seu ambiente devido a carência de políticas públicas que contemplem a população
do bairro para melhorar o padrão de vida como também um uso racional do território pelas pessoas.

→ Reserva Reserva Desper Escava Fossa Esgoto Sucata Pertuba Urbani Control Deposi Interaçã
↓ - - - - s s s ç. - e - o
ção ção dício ções Superf Ambien zação. de ção de Fator X
. t. insetos lixo Ação

Qualidad -8 -5 -3 -2 -5 -6 -1 -2 -6 2 -4
e 6 7 1 6 3 2 6 5 5 -19,6
de Água 4 6
Fórum Internacional do Meio Ambiente - A conferência da Terra 922

Falta de -5 -7 -8 -1 -1 -3 -1 -2 -4 1 1
Água 7 7 9 1 1 1 3 5 1 2 -16,8
1
Erosão -3 -2 -5 -7 -5 -5 -1 -10 -5 -1 -2
das 4 2 6 8 7 2 9 1 1 3 -24,2
Margens 5
Padrão -5 -2 -5 -1 -6 -8 -4 -9 -6 2 -3
de 8 7 10 1 7 5 9 9 3 7 -33,3
Vida 6
Inunda- 1 3 -1 -1 3 -5 -4 -8 -6 1 -1
ções 8 6 5 4 7 1 9 10 4 5 -10,8
2
Uso do -5 -4 -4 -5 -6 -7 -2 -10 -8 4 -8
Territóri 9 8 3 7 8 6 3 10 5 1 4 -37
o
Índice
Pontual -28 -19,3 -30,2 -16,5 -22,3 -34,5 -6 -59 -35 4 -13,6 -

LEGENDA 1: LEGENDA 2:
Pouco impacto – de 1 a 3 Pouco impacto – de 0 a 15
Médio impacto – de 4 a 6 Médio impacto – de 15,1 a 25
Alto impacto – maiores que 7 Alto impacto – maiores que 25 ur
→ - ações
↓ - fatores

Quadro 1 – Método de Avaliação de Impactos Ambientais (AIA) - Matriz de Leopold, 1971.

CONSIDERAÇÕES FINAIS
A realização dessa pesquisa oportunizou a abertura de um espaço para refletir sobre as
questões relacionadas ao desperdício de água, com destaque para o uso racional da água e as
dificuldades sócio-econômicas vividas pela população, mostrando o quanto é importante o
desenvolvimento de programas sociais que venham atender as reais necessidades da população.
A questão da conscientização quanto ao uso racional da água e atitudes contra o
desperdício, requer um trabalho dinâmico na comunidade, melhorando a questão do nível cultural
da população local.
A população do bairro, em sua maioria, necessita de um esclarecimento aprofundado
quanto ao uso racional da água, suas vantagens e desvantagens para que no futuro possam passar
esses ensinamentos para seus sucessores, possibilitando uma nova forma de vida, recuperando os
padrões ambientais com ações contra o grande desperdício de água, ações contra erosão das
margens, recuperação da mata ciliar, e uma perfeita obra de captação dos esgotos e posteriormente
um destino correto para não contribuir com a contaminação e perturbação do bairro, priorizando a
educação de futuras gerações.
A área não é indicada para moradia, pois se trata de uma área de preservação permanente
que precisa ser relocados em outro local todos os seus moradores para posteriormente recuperar
conforme a Lei Federal nº 4771/ 65. Para a realização de uma mudança no quadro observado é
necessária a intervenção do poder público local, fornecendo subsídios para a construção de infra-
estruturas que possibilitem melhores condições das instalações hídricas residenciais. É necessária
uma ação consistente que viabilize a perfeita reservação em cada moradia e um programa de
educação para que as pessoas usem-na de forma correta.
Com base nas investigações feitas e na análise dos dados obtidos através das respostas dos
formulários e também na interpretação do método de avaliação de impacto ambiental utilizado que
foi uma parcela da Matriz de Leopold, 1971, conclui-se que apenas parte da população possui água
encanada dentro das residências e que sendo baixo o nível de conscientização aumenta o grau de
ação humana de forma negativa sobre o meio propiciando além do desperdício acentuado outras
ações humanas potenciais que venha causar alto índice de degradação ambiental.
Fórum Internacional do Meio Ambiente - A conferência da Terra 923

REFERÊNCIAS
BRAGA, B. Introdução a Engenharia Ambiental. 1 ed. São Paulo: Prentice Hall, 2002.
Cadastro do Bairro Bananeira. Prefeitura Municipal de Itabuna, mar. 2006.
CEI – Centro de Estatística e Informações. Salvador – BA. Município do Estado da Bahia.
Salvador, 1998.
FARIA FILHO, F. e ARAUJO, Q. R. Degradação ambiental causada pela ocupação antrópica em
áreas de manguezais de Ilhéus. Bahia In: I Congresso Internacional de Desenvolvimento e Meio
Ambiente. Caucaia – CE, 2002.
FILIPPO et al. Avaliação de Impacto Ambiental: Aplicação aos Sistemas de Transporte.
Interciência, Rio de Janeiro, 2004.
MARGULIS, S. Meio Ambiente: Aspectos Técnicos e Econômicos. Rio de Janeiro: IPEA, 1990.
REBOUÇAS, A. C. Falta uma política nacional de água. São Paulo: Ciência Hoje, v.13, n.3, p
52.1995.
SOUTO, P. Bahia Viva. Salvador, v.1, n.1, p. 5, março. 2004.
Fórum Internacional do Meio Ambiente - A conferência da Terra 924

ASPECTO CONSTRUTIVO DE TRÊS TÉCNICAS DE CAPTAÇÃO DE ÁGUA E SOLO


IMPLANTADAS NA REGIÃO DO CURIMATAÚ PARAIBANO

Denise de Jesus Lemos FERREIRA


Graduanda em Engenharia Agrícola, UAEAg/CTRN/UFCG, e-mail: djlf_deni@hotmail.com
Soahd Arruda Rached FARIAS
Profª. Dra. da UAEAg/CTRN/UFCG, e-mail: soahd_rached@hotmail.com
José Geraldo de Vasconcelos BARACUHY
Prof. Dr. da UAEAg/CTRN/UFCG, e-mail: baracuhy@terra.com.br

RESUMO
Este trabalho foi desenvolvido no município de Barra de Santa Rosa (sítio Cupira), após
seleção do local conforme recomendações técnicas. Foi realizada a construção de uma barragem
subterrânea utilizando-se lona plástica (200 micras) com 60 m de largura, a vala escavada
apresentou uma profundidade média de 2,0 m, ocorrendo variação ao longo da escavação de 1,50 m
a 2,90 m chegando a obter como base da barragem a rocha mãe de material conhecido no local
como “pedra preta”. Em conjunto com a barragem subterrânea foi construído um poço amazonas
tipo anel pré-moldado com 1,5 m de diâmetro e 0,5 m de altura, tendo profundidade de 3,0 m
inserido na bacia hidráulica a montante da barragem e, a jusante foi construído um barramento
superficial com pneus usados (BAPUCOSA) com 17 m de largura dentro da calha viva do riacho. O
volume de água em média previsto de acumulação foi estimado através de porosidade do solo,
profundidade e declividade longitudinal média, resultando potencialmente, no acumulo máximo de
6.180 m3 de água. Durante a escavação foram coletadas três amostras de solo a 1,0; 2,0 e 3,0 m de
profundidade, tendo como resultado texturas entre Franco Argilo Arenoso a Franco Arenoso,
possuindo assim, duas características de disponibilidade de água: para extração em poço amazonas
(macroporos do solo) ou para exploração agrícola (microporos do solo). A salinidade encontrada no
solo variou entre salino a 1,0 m e normal nas camadas mais profundas (2,0 e 3,0 m), sendo
importante realizar práticas de monitoramento do poço amazonas ao longo dos anos para avaliar o
nível de salinidade do mesmo.
Palavras-Chaves: barragem subterrânea, disponibilidade de água, exploração agrícola.

ABSTRACT
This work was developed in the municipality of Barra de Santa Rosa (Cupira County),
after being selected using technical recommendations. It was built a underground dam, using
plastic canvas (200 microns) which were 60 m wide, the excavated mass grave had an average
depth of 2.0 m occurring variation along the excavation of 1.50 m 2.90 m coming to get, as base of
the dam, the basal rock, composed by a material popularly known as "black stone". Together with
the underground dam was built an Amazon well, made of pre-molded rings with 1.5 m of diameter
and 0.5 m of height, the Amazon well was of 3.0 m depth and was inserted in the hydraulic basin
upstream of the dam and downstream was built a bus surface with used tyres (BAPUCOSA) with
17 m wide inside the central axis of the stream. The provided average volume of water for
accumulation was estimated through the soil porosity, depth and longitudinal average slope, with a
potential maximum accumulation of 6,180 m3 of water. During the excavation were collected three
samples of soil 1.0, 2.0 and 3.0 m deep, with resulting textures between Sandy Clay Loam and
Sandy Loam Alfisol, possessing for this reason, two characteristics of water availability: for
extraction in Amazon well (soil macro pores) or to the agricultural exploration (micro pores). The
salinity found in the soil ranged from saline at 1.0 m from the top and normal in the deeper layers
(2.0 and 3.0 m), being important to make monitoring tasks of the Amazon well over the years to
assess the level of salinity of it.
Keywords: underground dam, water availability, agricultural exploration.

INTRODUÇÃO
Fórum Internacional do Meio Ambiente - A conferência da Terra 925

A região do curimataú Paraibano durante muito tempo utilizou açudes como forma de
armazenar água na época do inverno e, assim, se beneficiar durante o verão. Mas, o resultado diante
de uma precipitação média inferior a 500 mm ano-1 (AESA, 2008) associada a alto índice de
evapotranspiração de referência, em torno de 1.800 mm ano-1 (Hargreaves, 1974), gera um
expressivo déficit hídrico nos reservatórios durante os períodos secos do ano, justificando a
importância da tecnologia de barragem subterrânea, que acumula água nos poros do solo,
minimizando a perda por evaporação. O volume de água acumulada corresponde a
aproximadamente 50% que é a porosidade média desses solos. Uma utilização importante dessa
prática é a exploração de cultura de vazantes praticada pelos agricultores do Nordeste.
A fim de otimizar o armazenamento de água na barragem subterrânea é construído em
conjunto um poço amazonas (tendo como função, a utilização da água e a extração de sais do lençol
freático, evitando com isso a salinização da água da barragem subterrânea) e um barramento com
pneus usados (constituindo um obstáculo na enxurrada, aumentando assim a infiltração e
diminuindo a perda de solo por escoamento superficial).
Segundo Baracuhy et al. (2007), a técnica de barragem subterrânea consiste em construir
um septo (obstáculo) no depósito aluvial, com a finalidade de impedir que a água nele acumulada
continue a escoar durante o período de estiagem, promovendo acúmulo de água para alimentar,
através de subirrigação, culturas perenes (forrageiras e frutíferas), além de garantir a produção de
culturas anuais mesmo com distribuição irregular do inverno.
Para a construção da barragem subterrânea, escava-se uma trincheira ou vala
transversalmente ao curso do rio, por intermédio de uma retroescavadeira ou manualmente
(dependendo da extensão da vala); para a abertura da vala é importante que se conheça
antecipadamente através de uma série de sondagens, a granulométrica do material a ser escavado,
para poder dimensionar a largura da trincheira e o ângulo de inclinação do talude, bem como ainda
detectar a existência de eventual zona saturada (COSTA, 1997).
A barragem subterrânea além de proporcionar o armazenamento de água no solo promove
a recuperação da vegetação mediante bom manejo, recuperando com isso as primeiras camadas de
solo que geralmente são carreadas pelas chuvas, as quais são as de melhor qualidade para
exploração agrícola. O presente trabalho teve como objetivo avaliar a construção das técnicas
agrícolas para contenção de solo e água (barragens subterrâneas, poços amazonas e barramento de
pneus para contenção de solo e água – BAPUCOSA), na cidade de Barra de Santa Rosa.

MATERIAIS E MÉTODOS
O trabalho foi realizado no município de Barra de Santa Rosa, decorrente de uma
capacitação para produtores rurais do referido conjunto (Barragens subterrâneas, poço amazonas e
BAPUCOSA), financiado pela FUNASA e executado pela Unidade Acadêmica de Engenharia
Agrícola UAEAg/UFCG ocorrendo antes da sua realização visitas feitas por professores e alunos da
UFCG para escolha do melhor local para realização das três técnicas, tendo por base de escolha a
representatividade em relação às características da microrregião, bem como, o fator socioeconômico
do município, buscando contemplar pequenos agricultores e/ou assentamentos. Outros fatores que
contribuíram para a escolha foram sua acessibilidade, o interesse da comunidade e do município
(prefeitura) e a UFCG. A identificação geográfica do município está apresentada na Figura 1.
Fórum Internacional do Meio Ambiente - A conferência da Terra 926

Figura 1. Localização do município de Barra de Santa Rosa.

No processo construtivo das três técnicas, foram coletadas amostras de solo retiradas do
perfil da vala a profundidade de 1,0 m, 2,0 m e 3,0 m. Esse procedimento teve como objetivo
caracterizar o solo em diferentes profundidades na área de captação/plantio.
Ainda no local onde foi construído o conjunto de técnicas realizou-se a coleta de água de
um poço amazonas da própria propriedade, para análise dos parâmetros referentes ao teor de sais
presentes na água. Classificando-a de acordo com a metodologia de Richard (1954) e comparando o
resultado com a recomendação da FAO, classificação proposta pelo Comitê dos Consultores da
Universidade da Califórnia – UCCC (1974) citado por Ayers e Westcot (1999), para uso na
irrigação de áreas cultivadas. Segundo a Academia Nacional de Ciências dos EUA (1972) citado
por Ayers e Westcot (1999), através do parâmetro de Condutividade Elétrica da Água (CEa), é
observado os limites toleráveis à salinidade da água para consumo animal.
As análises de água foram obtidas quanto à salinidade e as amostras de solo foram
submetidos a leituras de salinidade e parâmetros físico-hídricos, ambos realizados no Laboratório
de Irrigação e Salinidade, (LIS) da Universidade Federal de Campina Grande – UFCG.
O município de Barra de Santa Rosa está inserido na microrregião do Curimataú
Paraibano, possui uma precipitação média de 373,2 mm ano-1 (AESA, 2008) associada a uma
evapotranspiração de referência de 1805,5 mm ano-1 (HARGREAVES, 1974). A construção das
três técnicas foi realizada no sítio Cupira do pequeno agricultor José Antônio de Vasconcelos. A
área de construção das técnicas está entre as coordenadas de GPS: 06º 49’ 44.2” de Latitude Sul,
36º 06’ 07,1” de Longitude Oeste e 508 m de Altitude (início da escavação da vala da barragem
subterrânea), e 06º 49’ 44,3” de Latitude Sul, 36º 06’ 04,8” de Longitude Oeste e 507 m de Altitude
(final da escavação da vala da barragem subterrânea).
Na Figura 2 está à rede de drenagem do município de Barra de Santa Rosa, onde foram
visitados cinco locais, dentre eles os pontos em vermelho correspondem aos locais não selecionados
e o ponto em preto corresponde ao local selecionado, de acordo com um conjunto de critérios
comparativos entre outros locais e merecendo ser definido como o mais adequado para sua escolha.
Fórum Internacional do Meio Ambiente - A conferência da Terra 927

Figura 2. Local selecionado (preto) para construção das técnicas para contenção de solo e água para
o município de Barra de Santa Rosa.
Para possibilitar uma exploração agrícola na bacia hidráulica da barragem subterrânea é
imprescindível que se tenha água disponível para as plantas. Assim, através do cálculo de volume
total obstruído de água e solo (Vt), Equação 1, determina-se o volume total de água no solo e, com
esse resultado calcula-se o volume de máxima captação de água (Vc) da barragem subterrânea
(Equação 2).
H .L.S
Vt = (1)
2
Onde:
H – Altura média da secção transversal do riacho; L – Largura do riacho; S – Declividade 1%

Vc = Vt.α (2)
Onde:
Vt – Volume total obstruído de água+solo; α – Porosidade média do solo= 51,5%

RESULTADOS E DISCUSSÕES
Seleção do Local
No município de Barra de Santa Rosa, foi feito visitas para a escolha do local onde seria
realizada a construção das técnicas agrícolas para contenção de solo e água, onde se levou em
consideração a área com melhor característica técnica e de infra-estrutura. Na Tabela 1 encontra-se
a localização georeferenciada de cada propriedade.

Tabela 1. Pontos georeferenciados dos locais visitados em Barra de Santa Rosa.


Fórum Internacional do Meio Ambiente - A conferência da Terra 928

Avaliaram-se as propriedades sendo a de melhor características o sítio Cupira a qual


apresentou um leito de riacho com mais de 60 m de largura, com estimativa de profundidade do
sedimento em torno de 2,0 m a 3,0 m e possuindo declividade de 1%.

Qualidade das Águas


A água coletada para análise no sítio Cupira foi proveniente de um poço amazonas com
uma profundidade de 3,0 m dentro do sedimento do leito do rio, e com escavação de 1,50 m abaixo
da rocha localizada a jusante do local escolhido (100 m). Os valores dos parâmetros encontrados
após análise em laboratório (Tabela 2) foram avaliados de acordo com a metodologia de Richards
(1954) e comparados à classificação feita pela UCCC (1974) para o uso em irrigação, e pela
Academia Nacional de Ciências dos EUA (1972) citado por Ayers e Westcot (1999) para consumo
animal.

Tabela 2. Parâmetros de qualidade de água no município de Barra de Santa Rosa.

Pela classificação de Richard (1954) a água foi classificada como sendo uma C4S3.
Indicando que pelo valor da condutividade elétrica da água (CEa), a água não é recomendada para
irrigação sob condições normais, porém pode ser usada em solo de boa drenagem cultivando-se
plantas com alta tolerância a salinidade. Com relação à sodicidade apresenta alta concentração de
sódio, pode produzir níveis críticos de sódio trocável na maioria dos solos, necessitando de práticas
especiais de manejo de solo.
Comparando os valores contidos na Tabela 2 com os parâmetros apresentados pela UCCC
(1974), a água apresentou quanto à salinidade um grau de restrição severo para irrigação, e quanto a
RAS nenhum grau de restrição, indicando que para a planta haverá grandes riscos de toxidade e,
para o solo não apresentará problemas de desagregação das partículas e consequentemente
sodicidade. O valor de CEa da Tabela 2, comparado com os limites toleráveis para consumo animal,
demonstra que a salinidade a água é adequada para todas as classes de gado e aves confinadas. Vale
salientar que a água foi coletada no verão onde existe maior concentração de sais devido à
evaporação.

Classificação do Solo
Analisando os parâmetros físicos do solo a profundidade de 1,0 m, obteve-se a
classificação como Franco Argilo Arenoso, densidade do solo 1,22 g cm-3, porosidade de 55,31%,
capacidade de campo – CC (0,33 atm) foi de 25,0%, e ponto de murcha permanente – PMP (15
atm) de 11,0%; quanto à salinidade o solo foi classificado como salino. Para a profundidade de 2,0
m, a classificação do solo foi Franco Arenoso, porosidade de 48,55%, densidade do solo 1,42 g cm-
3
, CC (0,33 atm) foi de 10,0%, e PMP (15 atm) de 4,0%; quanto à salinidade o solo foi classificado
como normal. Para a profundidade de 3,0 m, a classificação do solo foi Franco Arenoso, porosidade
de 50,71%, densidade do solo 1,38 g cm-3, CC (0,33 atm) foi de 10,0%, e PMP (15 atm) de 5,0%;
quanto à salinidade o solo foi classificado como normal.
Fórum Internacional do Meio Ambiente - A conferência da Terra 929

Execução das Técnicas


A barragem subterrânea foi construída com 60,0 m de comprimento e cerca de 0,80 m de
largura. A profundidade média atingida foi de 2,0 m e, ao longo de seu perfil ocorreu variação de
1,50 m a 2,90 m chegando a obter como base da barragem, a rocha mãe de material conhecido no
local como “pedra preta”, que representa a base mais sólida.
O solo do local apresentou textura grossa, sendo um solo predominantemente arenoso, com
presença de pedras e cascalho. No local da escavação foram retiradas muitas pedras uma das quais
rasgou a concha da retroescavadeira, retardando o serviço que em média seria executado em cerca
de 8 horas (um dia), passando a ser executado em 16 horas (dois dias). Para impermeabilização da
barragem subterrânea utilizou-se lona plástica 200 micras, com 60,0 m de comprimento e 6,0 m de
largura repousando 0,5 m no fundo da vala e 1,0 m no leito do riacho. O poço amazonas construído
a montante da barragem subterrânea atingiu a profundidade de 3,0 m (local mais profundo), sendo
colocado 8 anéis pré-moldados, ficando 1,0 m acima do nível do solo, evitando que nas enxurradas,
o nível da água invada o mesmo e possa entupir. Para maior proteção, o proprietário iria realizar o
rejunto lateral dos anéis e a confecção da tampa.
A BAPUCOSA foi construída com 30 pneus de caminhão e 5 de carro de passeio,
distribuídos em três camadas e grampeados com vergalhão de diâmetro ½ polegada, preenchidos
com pedra para dá maior estabilidade a obra. A presença de pedras no leito do riacho facilitou o
trabalho da equipe, ao final da construção a extensão da BAPUCOSA foi de 17,0 m de
comprimento, a distância de 2,0 m à jusante da barragem subterrânea, o terreno apresentou
declividade longitudinal média do riacho de 1%. Utilizando a Equação 1 e Equação 2, obtém-se o
valor do volume total obstruído de água e solo e o volume de máxima captação de água da
barragem subterrânea respectivamente (Tabela 3).

Tabela 3. Cálculo do volume máximo de captação da barragem subterrânea no município de Barra


de Santa Rosa.

Na Figura 3, pode-se verificar o perfil de escavação da barragem subterrânea (limitada pela


rocha mãe), onde foi realizadas medições de profundidade a cada 2,0 m de distância transversal da
vala, bem como, observa-se a área de captação de água “in situ” ao longo da área da barragem
subterrânea.
Fórum Internacional do Meio Ambiente - A conferência da Terra 930

Figura 3. Perfil de escavação da vala da barragem subterrânea no município de Barra de Santa Rosa.

Os detalhes construtivos das técnicas agrícolas para contenção de solo e água podem ser
acompanhados pela seqüência de Figuras 4 a 15.

Figura 4. Início da construção da barragem, Figura 5. Detalhe do início do trabalho da


sendo o risco branco transversal à limpeza do retroescavadeira na retirada do solo.
terreno.
Fórum Internacional do Meio Ambiente - A conferência da Terra 931

Figura 6. Limpeza da lateral da vala para Figura 7. Medição da profundidade da vala


colocação da lona plástica. para conhecimento do perfil da barragem
subterrânea.

Figura 8. Colocação da lona 200 micras ao Figura 9. Colocação da lona plástica de 200
longo da vala da barragem subterrânea. micras, 6 m de largura dentro da vala.
Fórum Internacional do Meio Ambiente - A conferência da Terra 932

Figura 10. Momento da colocação dos Figura 11. Poço amazonas concluído.
anéis pré-moldados após escavação.

Figura 12. Preparação para o barramento com Figura 13. Realização das leituras de nível da
pneus usados no lado jusante da barragem primeira camada de pneus ao solo.
subterrânea.
Fórum Internacional do Meio Ambiente - A conferência da Terra 933

Figura 14. Colocação de pedras dentro dos Figura 15. Colocação dos vergalhões de ½
pneus polegada, dentro dos pneus para maior
sustentabilidade.

CONCLUSÕES
No processo de construção das técnicas para contenção de solo e água, pode-se avaliar que
o uso de pneus além da função de diminuir a velocidade da água, possibilita a retirada desse
material do meio ambiente, favorecendo a sua conservação. Já com relação à construção da
barragem subterrânea foi notável a aceitação e confiança dos pequenos agricultores a essa
tecnologia. E com relação ao poço amazonas, observa-se sua importância por disponibilizar água
livre para consumo animal e de subirrigação de culturas perenes.
Considerando os resultados obtidos com as análises de água coletadas nas propriedades e
de solo retirado do perfil da vala, faz-se necessário o monitoramento do conjunto de técnicas devido
ao risco de salinização do solo.
Verificou-se que os solos do depósito aluvial do local foram classificados com texturas
variando entre Franco Argilo Arenoso a Franco Arenoso, tendo assim, características de
disponibilidade de água para extração em poço amazonas (macroporos do solo) e exploração
agrícola (microporos do solo).

REFERÊNCIAS BIBLIOGRÁFICAS
AESA, 2008. Monitoramento de chuvas, através do site
http://site2.aesa.pb.gov.br/aesa/jsp/monitoramento/chuvas/climatologiasGraficos.jsp acessado em
05 de abril de 2008.
AYERS, R. S.; WESTCOT, D. W. A Qualidade da Água na Agricultura. Estudos, Irrigação e
Drenagem 29 revisado 1.2ª Ed. Campina Grande, UFPB, 1999,153p.
BARACUHY, J. G. V.; FARIAS, S. A. R.; NETO, J. D.; LIMA, V. L. A.; FURTADO, D. A.;
ROCHA, J. S. M.; PEREIRA, J. P. G. Técnicas Agrícolas para Contenção de Solo e Água. Campina
Grande, 2007, 44p.
COSTA, W. D. Manual de Barragens Subterrâneas: Conceitos Básicos, Aspectos Locacionais e
Construtivos. Secretária de Ciência, Tecnologia e Meio Ambiente de Pernanbuco – PE, 1997.
HARGREAVES, G.H. Potential Evapotranspiration and Irrigation Requirements for Northeast
Brazil, Utah State University-E.U.A., Dept. of Agriculture and Irrigation Engineering
(CUSUSWASH), 1974 55p.
RICHARDS, L. A. (ed) Diagnosis and improvement of saline and alkali soils. Washington, United
States Salinity Laboratory, 1954. 164p. (USDA. Agriculture Handbook;60)
Fórum Internacional do Meio Ambiente - A conferência da Terra 934

POÇOS JORRANTES DO VALE DO RIO GURGUÉIA (PI): CARACTERIZAÇÃO DE UM


ESPAÇO MARCADO PELO DESPERDÍCIO HÍDRICO

Antonio Joaquim da Silva


Graduando em Licenciatura Plena em Geografia, pela Universidade Federal do Piauí, joakim.ufpi@yahoo.com.br
Daniel César Menêses de Carvalho
Graduando em Licenciatura Plena em Geografia, pela Universidade Federal do Piauí, daniel_ufpi@yahoo.com.br

RESUMO
Este trabalho propõe analisar a dinâmica das águas subterrâneas na região do Vale do Rio
Gurguéia – PI, caracterizado pelo grande desperdício de recursos hídricos, através da má utilização
e falta de administração, contextualizado através dos poços jorrantes Violeta I e II, localizados no
município de Cristino Castro – PI. Considerou-se a inter-relação com a Bacia Hidrográfica do Rio
Parnaíba, sua análise geohidrológica, caracterizando os sistemas de aqüíferos locais, relacionando
com o sistema hidrológico maior ou fechado – como o ciclo hidrológico – contemplando a
conservação dos recursos hídricos e o planejamento ambiental voltados ao vale do Rio Gurguéia. A
metodologia utilizada deu-se através de referencial bibliográfico, além de visita aos poços jorrantes
Violeta I e II. Concluiu-se que a região dos poços, localizados no vale do Rio Gurguéia e em
destaque os poços Violeta I e II necessita ser melhor aproveitada, através do apoio público, em
todas as esferas: federal, estadual e municipal, para a devida conservação dos mesmos e a
necessidade de um estímulo ao Desenvolvimento Sustentável local.
Palavras-Chave: Águas subterrâneas, Ciclo hidrológico, Conservação ambiental, Poços jorrantes.

ABSTRACT
The following dissertation analizes the groundwater of Gurguéia River valley, Piaui State,
Brazil, where there is a large wastefulness of hydric ressources through the bad use and lack of
administration, showed by Violeta I and II Poços Jorrantes located in the city of Cristino Castro -
PI. It was considered interrelation with the river basin of the Parnaíba River, its hydrogeological
analysis, characterizing the local aquifer systems, relating with the bigger or closed hydrological
system - as the hydrological cycle - contemplating the conservation of the hydric resources and the
enviroment planing related to the Gurguéia River valley. The used methodology was given through
bibliographical referencial, beyond visits to Violet I and II Poços Jorrantes. It was concluded that
the wells site, located in the Gurguéia River valley and in prominence Violet I and II wells need to
be better used to advantage, through the public support, in all the spheres: federal, state and
municipal, for the it had conservation and the necessity of stimulaton to the local Sustainable
Development.
Keywords: Groundwater, Hydrological Cycle, Enviromental Conservation, Poços Jorrantes.

INTRODUÇÃO
Desde as últimas décadas do século XX, a humanidade defronta-se com uma série de
problemas, que, de certa forma, associam-se à Revolução Industrial, mundialização do capitalismo,
Revolução Verde, urbanização e à grande densidade demográfica, aumentando a carga de uso dos
recursos naturais, que visam atender as necessidades consumistas da sociedade contemporânea.
Consequentemente, os problemas globais mais evidentes relacionam-se à economia, às finanças, às
relações sociais, culturais, religiosas e ambientais.
Nessa perspectiva, este trabalho analisa o processo de uso e gestão dos recursos hídricos,
através da análise de planejamento ambiental voltados à hidrografia, interpolados através de um
estudo de caso dos poços jorrantes Violeta I e II, localizados no município de Cristino Castro – PI.
É exposto o problema do desperdício, a pouca estrutura para o aproveitamento deste recurso natural,
salientando uma maior necessidade de apoio político e da sociedade local.
A metodologia utilizada baseou-se em referências bibliográficas e visita aos poços
jorrantes, caracterizando a dinâmica mundial e local das águas superficiais e subterrâneas,
Fórum Internacional do Meio Ambiente - A conferência da Terra 935

relacionando à Bacia Hidrográfica do Rio Parnaíba, sua análise hidrogeológica, com perspectivas de
uma melhor conservação desse recurso ambiental como forma de desenvolvimento sustentável.

CARACTERIZAÇÃO HIDROLÓGICA DO PLANETA


Nos últimos anos, as preocupações com o aquecimento global tomaram grande impulso,
através dos meios de comunicação, das Ong’s, da comunidade científica, entre outros. Porém, há
um problema que ganha cada vez mais a atenção dos mesmos atores citados acima e, que em épocas
diferentes da história da formação social do homem foi o centro de conflitos e guerras: a água. A
mesma está intrinsecamente contida na história de evolução da Terra, na origem e evolução das
espécies, como fonte essencial para a vida.
Segundo Rebouças (2002) ao longo da história geológica da Terra, as erupções vulcânicas,
associadas à tectônica de placas lançaram na sua atmosfera grandes quantidades de oxigênio,
hidrogênio e gases tais como dióxido de carbono, nitrogênio, dióxido de enxofre e monóxido de
carbono. Portanto, é a água que mantém a vida no planeta, através da fotossíntese, que produz
biomassa através da reação entre CO2 e H2 O, além de evidenciar no contexto biológico que 80 %
do corpo humano é composto por água (KARMANN, 2003).
Rebouças (2002, p.4) acrescenta que essa parte líquida da Terra concentra o maior
percentual, pois:
Da mesma perspectiva cósmica, a água existente na Terra forma também uma esfera, a
assim chamada hidrosfera. A água é de longe a substancia mais abundante da Terra,
cobrindo cerca de 77% da sua superfície, assim distribuído: 361,5 milhões km² de
oceanos e mares, 17,5 milhões km² de calhas de rios e pântanos, 16,3 milhões km² de
calotas polares e geleiras, e 2,1 milhões de lagos (...) (REBOUÇAS, 2002, p.4)

Conti e Furlan (2005) descrevem o papel dos oceanos no clima como muito importante,
com 71% de massa líquida cobrindo a superfície do Planeta. No hemisfério sul, 81% da superfície é
coberta por água; no hemisfério norte, essa porcentagem cai para 51%. A variável porcentagem
hídrica distribuída nos estados sólido, líquido e gasoso é também comentada por Silveira (2001),
pois a circulação da água na superfície terrestre e na atmosfera sistematiza o ciclo hidrológico.

Tabela 01: Áreas, volumes totais e relativos de água dos principais reservatórios da Terra
% DE VOLUME
ÁREA VOLUME % DO VOLUME
RESERVATÓRIO DE ÁGUA
(10³ KM²) (106 KM³) TOTAL
DOCE
OCEANOS 361.300 1.338 97,50 -
SUBSOLO 134.800 23,40 1,70 -
ÁGUA DOCE - 10,53 0,76 29,90
UMIDADE DO SOLO - 0,016 0,001 0,08
CALOTAS 16.227 24,10 1,74 68,90
POLARES
ANTÁRTICA 13.980 21,60 1,56 61,70
GROENLÂNDIA 1,802 2,30 0,17 6,68
ÁRTICO 226 0,084 0,006 0,24
GELEIRAS 224 0,041 0,003 0,12
SOLOS GELADOS 21.000 0,300 0,022 0,86
LAGOS 2.059 0,176 0,013 0,26
ÁGUA DOCE 1.236 0,091 0,007 -
ÁGUA SALGADA 822 0,085 0,006 -
PÂNTANOS 2.683 0,011 0,0008 0,03
CALHA DOS RIOS 14.880 0,002 0,0002 0,006
BIOMASSA - 0,001 0,0001 0,003
VAPOR - 0,013 0,001 0,04
Fórum Internacional do Meio Ambiente - A conferência da Terra 936

ATMOSFÉRICO
TOTAIS 1.386 100 -
ÁGUA DOCE 35,00 2,53 100
Fonte: IHP/UNESCO, 1998

Na tabela 01, são caracterizados os volumes totais e relativos de água dos principais
reservatórios da Terra. A análise confere que a distribuição das águas, de um total de 1.386 milhões
km³ é: 97,5% água salgada; 2,53% água doce; 68,90% estão nas calotas polares e geleiras; 29,90%
água subterrânea doce; 0,3% de água doce nos rios e lagos; e 0,9% outros reservatórios.
De acordo com Rebouças (2002), as águas da Terra encontram-se em permanente
movimento, caracterizando o ciclo hidrológico. Efetivamente desde os primórdios dos tempos
geológicos, a água em forma líquida ou sólida que é transformada em vapor pela energia solar
atinge a superfície terrestre e a transpiração dos organismos vivos, subindo à atmosfera, resfriando-
se, originando as nuvens.
Temos no ciclo a precipitação meteórica – condensação de gotículas a partir do vapor de
água presente na atmosfera, originando a chuva, associando-se à evapotranspiração (KARMANN,
2003). Há, portanto, três variáveis regionais que caracterizam a gênese local das águas: as
precipitações, o escoamento superficial e a recarga dos teores de umidade dos solos (REBOUÇAS,
2002). O mesmo autor também acrescenta que a maior mudança de chuvas no mundo é verificada
nas regiões intertropicais e temperadas.
O sistema terra, água e ar estão intrinsecamente ligados pela influência da insolação; esta é
difundida principalmente por moléculas de ar, vapor d’água e partículas naturais dentro da
atmosfera (AYOADE, 2003). Portanto, a terra e a água apresentam diferentes propriedades
térmicas, e reagem de modo diferente à insolação, com diferenças de temperatura entre ambos,
influindo na continentalidade (AYOADE, 2003) e no clima.
A origem da água na Terra relaciona-se à própria formação da atmosfera, a degaseificação
do Planeta (KARMANN, 2003), fenômeno de liberação de gases por um sólido ou líquido quando
este é aquecido ou resfriado, processo atuante até hoje, que iniciou-se na fase de resfriamento geral
da Terra, após a fase inicial de fusão parcial.
De acordo com o tempo geológico, o ciclo hidrológico divide-se em dois sub-ciclos: o
ciclo “rápido”, que opera em curto prazo, envolvendo a dinâmica externa da Terra (movido pela
energia solar e gravitacional) e o ciclo “lento”, movido pela dinâmica interna (tectônica de placas),
onde a água participa do ciclo das rochas – intemperismo químico (KARMANN, 2003).

DINÂMICA DA ÁGUAS SUBTERRÂNEAS


Desde os primórdios das civilizações antigas, a água subterrânea é bastante utilizada como
fonte de abastecimento de grandes populações nas zonas áridas e semi-áridas. Durante a Revolução
Industrial, suas demandas aumentaram para o abastecimento das nascentes atividades industriais e
crescimento acelerado dos centros urbanos.
No Brasil, o uso da água subterrânea, sua captação para o abastecimento das populações
vem sendo realizada desde os tempos da colonização, com evidências de “cacimbões”, existentes
em fortes militares, conventos, igrejas e outras construções (REBOUÇAS, 2002). As águas
subterrâneas apresentam uma parcela significativa na Terra, tendo três origens principais: Meteórica
(97% dos estoques de água doce encontradas em estado líquido nas terras emersas), ocorrendo pela
infiltração de uma fração das precipitações; Conatas ou água de formação, pois estão retidas nos
sedimentos desde as épocas de formação dos depósitos; e Juvenil, a água gerada pelos processos
magmáticos da Terra.
Os maiores níveis de conhecimento hidrogeológico no Brasil, são encontrados nas áreas
com densidades demográficas mais elevadas, em especial nos domínios metropolitanos. No
Nordeste do Brasil, os principais trabalhos sobre a hidrogeologia da região foram desenvolvidos
pela SUDENE durante as décadas de 1960-1980, resultando no Inventário Hidrogeológico Básico
do Nordeste (REBOUÇAS, 2002).
Fórum Internacional do Meio Ambiente - A conferência da Terra 937

POTENCIAL HÍDRICO SUBTERRÂNEO NO ESTADO DO PIAUÍ


O Estado do Piauí, com 250.934 km², apresenta na sua base litológica dois grandes grupos
de rochas: as rochas cristalinas e as rochas sedimentares; aproximadamente 83% da superfície do
Estado está no contexto da Bacia Geológica Sedimentar do Parnaíba (REBOUÇAS, 2002). As
rochas cristalinas são impermeáveis fazendo com que as águas das chuvas escoem pelas encostas e
serras, morros e também pelos rios, porém, as rochas sedimentares são permeáveis, permitindo que
a água das chuvas infiltre até grandes profundidades (LIMA, 2006).
O regime hídrico superficial e subterrâneo do Estado é condicionado pelo clima, pois,
Baptista (1975), utilizando a classificação de Köppen, define os climas no Estado em: Tropical –
AW, AW’ (Tropical com chuvas de verão retardadas) e Semi-árido – BSH (Quente, com inverno
seco). As temperaturas médias são superiores a 18° C, com pluviosidade média acima de 600mm,
apresentando apenas duas estações anuais, uma chuvosa e uma seca.
A Bacia do rio Parnaíba situa-se na porção ocidental da região Nordeste do Brasil, estando
75% de sua área no Estado do Piauí, 19% do Maranhão e 6% do Estado do Ceará (IBGE, 1996). As
seções geológicas permitem constatar dois sistemas genéticos de aqüíferos (águas localizadas em
grandes profundidades) de características distintas: o sistema fissural e o sistema intergranular. O
fissural envolve todas as rochas do embasamento cristalino do Cambriano, compondo a faixa norte-
nordeste e sudeste da Bacia Sedimentar do Maranhão-Piauí, com um volume de água de 17.500 km³
(ARAÚJO, 2006), e mais as vulcânicas basálticas datadas em diferentes períodos. O sistema
intergranular reúne sedimentos não consolidados e consolidados, onde o caminho de percolação das
águas subterrâneas é estabelecido de acordo com a permeabilidade e a porosidade.
Geologicamente, distinguem as seguintes unidades que formam os diferentes aqüíferos:
Formação Serra Grande, Pimenteiras, Cabeças, Longá, Poti, Piauí, Pedra-de-Fogo, Motuca,
Sambaíba, Pastos Bons, Cordas, Areado, Urucuía, Santana, Exu e Itapecuru, Grupos Barreiras e
sedimentos recentes (aluviões, coluviões e dunas); em ordem decrescente de potencialidade, têm-se
os principais aqüíferos: Serra Grande, Cabeças, Poti, Piauí, Motuca, Sambaíba, Corda e Itapecuru,
isto em extensão regional. Em âmbito local, os demais aqüíferos satisfazem pequenos projetos
agrícolas, com grande destaque à área aflorante e de melhores condições de exploração, aos
aqüíferos Cabeças, Serra Grande e Poti (IBGE, 1996).
De modo geral, o potencial hídrico subterrâneo para as rochas cristalinas e sedimentares
apresenta-se de muito fraco a fraco. Contudo, abaixo do paralelo 7° nos vales dos rios Parnaíba,
Uruçuí-Preto e Gurguéia (Micro-bacia do Rio Parnaíba) predomina um potencial que vai de fraco a
médio, apresentando áreas de forte a muito forte potencial (as regiões do alto Parnaíba, a área de
Tasso Fragoso, Gilbués e parte de Jerumenha).
A figura 01 caracteriza a Bacia do Rio Gurguéia e suas classificações do potencial hídrico
subterrâneo da região.
Fórum Internacional do Meio Ambiente - A conferência da Terra 938

Figura 01: Potencial Hídrico Subterrâneo da Bacia do Rio Gurguéia. Fonte: Adaptado do PLANAP,
2006.

A área do Vale do Gurguéia, situa-se em uma faixa de transição de climas tropical AW e


semi-árido BSH. Essas características climáticas influenciam a composição dos solos no Vale do
Rio Gurguéia, pois, segundo Baptista (1975) os principais solos encontrados na região são: Bruno
não-cálcicos, laterítico bruno avermelhado eutrófico, brunizem avermelhados, podzólicos
vermelho-amarelo equivalente eutrófico, areias quartzosas e vertissolos tipo A (solos aluviais
eutróficos e solos hidromórficos indiscriminados).
As influencias climáticas e de solos refletem-se nas vegetações do Vale, encontrando desde
a caatinga arbórea arbustiva ao cerrado campo e cerradão. Segundo Baptista (1975), 82,50% da área
do estado está inserido no Polígono das Secas, abrangendo 208.326 km² da área piauiense. Esses
dados são fatores que permitem caracterizar as políticas de combate à seca (que objetivaram a
construção de poços jorrantes, açudes, etc) orientadas pela SUDENE.
Nosso enfoque principal compreende o vale do rio Gurguéia, caracterizado pelas maiores
condições para captação de água subterrânea na Bacia, com ênfase no sistema intergranular
Cabeças, o mais explorado da região, apesar de sua superfície aflorante reduzida. Segundo
ARAÚJO (2006), as formações Serra Grande, Cabeças e Poti-Piauí, formam uma grande reserva de
água subterrânea, a terceira maior do Brasil, podendo ser utilizado um volume de 10 bilhões de m³
por ano, sem que haja um rebaixamento das águas dos aqüíferos, em um prazo de cinqüenta anos
seguidos.
De acordo com o IBGE (2006), vários poços já foram perfurados, alguns dos quais estão
jorrando centenas de m³/h há mais de trinta anos, esperando que haja bom senso e decisão político-
administrativa para o uso efetivo, tal como ocorre na região do Vale do Gurguéia.
Os poços jorrantes mais conhecidos no Estado encontram-se no município de Cristino
Castro, destacando-se os poços Violeta I e II, perfurados pela Petrobrás, com 1.000 metros de
profundidade, adentrando 250m na formação Serra Grande, como principais entradas de água na
formação Cabeças (PESSOA, 1979 apud IBGE, 2006).
Fórum Internacional do Meio Ambiente - A conferência da Terra 939

Figura 02: Localização do Município de Cristino Castro – PI. Fonte: CPRM, 2004.

O grande desperdício hídrico nos poços Violeta I e II é criticado por ARAÚJO (2006),
acrescentando a falta de uso econômico, tornando o poço um símbolo de grande potencial
econômico e também de desperdício. A altura do jorro da água chega a mais de 60 metros e uma
vazão aproximada de 600 m³/h (ARAÚJO, 2006); a vazão dos poços é também discutido por Neto
(2003), admitindo uma vazão de 930.000 litros/h e jorrando mais de 60 metros de altura.

Figura 03: Poços jorrantes Violeta I e II. Fonte: Os autores (2006)

Na proposta de conservação dos recursos ambientais, e nela inserida as águas subterrâneas,


verifica-se a necessidade de planejamento para a utilização do ambiente. O manejo dos recursos
naturais tem sua melhor expressão no conceito de “Produção Sustentada” ou sustentabilidade dos
recursos. A conservação ambiental pode ser traduzida pela maximização das aptidões dos recursos e
pela minimização do impacto produzido. O planejamento ambiental deve adotar um enfoque
ecológico-holístico, no qual o homem integra esse sistema, devendo buscar o uso múltiplo do
território e a reutilização, como forma lógica de maximizar o aproveitamento dos recursos naturais,
como é o caso aqui citado das águas subterrâneas, para satisfazer as necessidades da produção,
lembrando que a sociedade deve ter participação intrínseca no processo.
Portanto, faz-se necessária maior atenção por parte do poder público e da sociedade local
para o grande desperdício de recursos hídricos, verificado nos poços jorrantes Violeta I e II. Há
necessidade, pois, da elaboração de projetos para o aproveitamento hídrico local com uso da
Fórum Internacional do Meio Ambiente - A conferência da Terra 940

irrigação, principalmente para agricultura familiar e incentivos de orientação a pequenos


produtores.
Rebouças (2002) admite a necessidade de uma nova lei sobre águas subterrâneas,
substantiva, com normas gerais sobre o aproveitamento, avaliação, controle, proteção, utilização
racional de direitos e obrigações de seus usuários e não de gerenciamento das águas subterrâneas
que já está disciplinado pela lei 9.433/97 e pelas leis estaduais correspondentes.
A Gestão das Bacias Hidrográficas relacionam-se diretamente à Gestão dos recursos
hídricos no país (CUNHA, 2003). Portanto, vários esforços estão sendo feitos para a organização do
setor através da criação de comitês de bacias, priorizando uma política sustentável para o
desenvolvimento sócio-ambiental.

CONSIDERAÇÕES FINAIS
O Brasil possui grandes potenciais de águas subterrâneas, seja na forma de umidade do
solo, seja como água que flui no subsolo. As reservas de águas subterrâneas móveis são estimadas
em 112.000 km², sendo cerca de 5.000 m³/hab/ano poderiam ser extraídos de forma racional
(REBOUÇAS, 2006).
A globalização, através da sociedade consumista, torna o meio ambiente mais propenso à
explorações, ao uso exagerado dos recursos naturais, desequilibrando assim o ambiente. No Brasil,
a falta de vontade político-administrativa concorre para o agravamento dos grandes problemas da
sociedade, estendendo-se a várias áreas, como: saúde, educação, transportes, moradia,
abastecimento de água, etc.
As águas subterrâneas constituem-se em um dos insumos mais importantes do nosso
Planeta, sendo utilizada de forma inadequada e rapidamente apropriada pelos setores econômicos
dominantes do mercado. O exemplo dos poços jorrantes Violeta I e II no Estado do Piauí revelam a
falta de estrutura e bom senso do poder público para o uso adequado e correto desse recurso,
principalmente pela falta de projetos de aproveitamento, evitando assim o desperdício.
Mesmo com a criação de instituições como Agencia Nacional de Águas (ANA) e Conselho
Nacional do Meio Ambiente (CONAMA), voltadas à gestão e manejo da água e problemas
ambientais no Brasil, é necessária maior proteção jurídica e institucional, com a participação local
da sociedade no controle, uso e aproveitamento das águas subterrâneas, principalmente as
localizadas no Vale do Gurguéia, para que se garanta o direito de uso às gerações futuras.

REFERÊNCIAS
AGUIAR, Robério Bôto de. (org.) Projeto cadastro de fontes de abastecimento por água
subterrânea, estado do Piauí: diagnóstico do município de Cristino Castro. Fortaleza: CPRM -
Serviço Geológico do Brasil, 2004.
ARAÚJO, José Luis Lopes (Coord.). Atlas Escolar do Piauí: Geo-Histórico e Cultural. João
Pessoa. Editora Grafiset, 2006.
BAPTISTA, João Gabriel. Geografia Física do Piauí. 2. ed. Teresina: Fundação CEPRO, 1975.
BRASIL, Codevasf. Planap: Atlas da Bacia do Parnaíba. Brasília, DF: TODA Desenho & Arte ltda,
2006.
CONTI, José Bueno; FURLAN, Sueli Angelo. Geoecologia: O Clima, os Solos e a Biota. In:
ROSS, Jurandyr L. Sanches (org). Geografia do Brasil. 5. ed. São Paulo. Editora: EDUSP, 2005.
CUNHA, S.B. da; GUERRA, A.J.T. (org). Geomorfologia do Brasil, 3. ed. Rio de Janeiro, Bertrand
Brasil, 2003.
KARMANN, Ivo. Ciclo da Água: Água Subterrânea e sua Ação Geológica. In: TEIXEIRA, Wilson
et all. Decifrando a Terra. São Paulo: Oficina de Textos, 2003
LIMA. Iracilde M. de. M. F.; ABREU, I. G. de. O Semi-Árido Piauiense: Vamos conhecê-lo?
Teresina-PI, Editora: Nova Expansão, 2006.
MARGARETE, P. R. (coord.). Macrozoneamento Geoambiental da Bacia Hidrográfica do Rio
Parnaíba/Primeira Divisão de Geociências do Nordeste. Rio de Janeiro: IBGE, 1996.
Fórum Internacional do Meio Ambiente - A conferência da Terra 941

NETO, Adrião. Geografia e História do Piauí para estudantes: da Pré-História à Atualidade. 2. ed.
Teresina-PI. Edições Geração 70, 2003.
REBOUÇAS, A. da C. Água Doce no Mundo e no Brasil. In: REBOUÇAS, A. da C. et all (org).
Águas Doces no Brasil: Capital Ecológico, Uso e Conservação. São Paulo. Editora Escrituras, 2002.
SALATI, E.; LEMOS, H. M. de. Água e o Desenvolvimento Sustentável. In: REBOUÇAS, A. da
C. et all (org). Águas Doces no Brasil: Capital Ecológico, Uso e Conservação. São Paulo. Editora
Escrituras, 2002.
SILVEIRA, André L. L. O Ciclo Hidrológico e Bacia Hidrográfica. In: TUCCI, Carlos E. M. (org).
Hidrologia: Ciência e Aplicação. 2. ed. Porto Alegre. Editora: UFRGS: ABRH, 2001.
VESENTINI, José Willian; VLACH, Vânia. Geografia Crítica: O Espaço Natural e a Ação
Humana. São Paulo. Editora: Ática, 2002.
Fórum Internacional do Meio Ambiente - A conferência da Terra 942

CARACTERIZAÇÃO DE OUTORGA DE RECURSOS HÍDRICOS SUPERFICIAIS NO


ESTADO DE GOIÁS

Thaís Moreira Alves


Graduanda em Geografia, Universidade Federal de Goiás – IESA. Caixa Postal 31 – 74001-970 - Goiânia - GO, Brasil.
thaistememeil@hotmail.com
Stélia Braga Castro
Graduanda em Geografia, Universidade Federal de Goiás – IESA. Caixa Postal 31 – 74001-970 - Goiânia - GO, Brasil.
steliageo@gmail.com
Pollyana Vaz Ferreira Mesquita
Graduada em Geografia, Universidade Federal de Goiás – IESA. Caixa Postal 31 – 74001-970 - Goiânia - GO, Brasil.
pollyanavazufg@yahoo.com.br

RESUMO
O processo de apropriação do espaço goiano vem ocorrendo de forma intensa impactando
significativamente os recursos naturais, em decorrência da grande demanda nas últimas décadas do
século XX e início do século XXI. Nesse contexto o Estado de Goiás apresenta um aumento das
áreas de irrigação, de barramento, abastecimento público e industrial, atividades que demandam
grande quantidade de água. A outorga de direito de uso das águas no Estado alcança cerca de 80%
dos usos significativos dessas. O presente trabalho refere-se ao levantamento da distribuição do uso
atual de outorgas dos recursos hídricos superficiais para o Estado de Goiás, buscando avaliar sua
tipologia quanto à destinação. A metodologia desse trabalho contou com um levantamento
bibliográfico referente ao tema e área de estudo. Visitas técnicas à Secretaria Estadual do Meio
Ambiente e dos Recursos Hídricos (SEMARH) para coleta de dados e tratamento da informação
coletada, fizeram parte do roteiro metodológico.
Palavras-chave: Recursos hídricos, Águas superficiais.

ABSTRACT
The intensive process of appropriation of the Goiano space had a deep impact on the
natural resources, in result of the great demand in the last decades of the 20th and at the beginning of
the 21st century. In this context, the state of Goiás presents an important increase of the irrigation
areas, of slide bars, public and industrial supplying and activities which demand a great amount of
water. The state habilitation for the use of water in the state of Goiás reaches about 80% of the
significant uses of water. The present work is based on a survey concerning the distribution of the
current use of grants of the superficial waters resources in Goiás state, searching to evaluate its
typology and its destination. The methodology of this work counted as a referring bibliographical
survey on the subject and the area of study. Technical visits to the “Secretaria Estadual do Meio
Ambiente e dos Recursos Hídricos (SEMARH)” for collection of data and treatment of the collected
information, had been part of the research plan.
Key-words: Waters resources, Superficial waters.

INTRODUÇÃO
O processo de ocupação do Centro-Oeste brasileiro, sobretudo nas últimas décadas, vem
ocorrendo de forma intensa, impactando significativamente os recursos naturais. Esse processo vem
sendo feito de forma desordenada e descontínua no espaço, através de manejo inadequado do solo,
desencadeando vários problemas como: o surgimento ou a aceleração dos processos erosivos, o
assoreamento e poluição dos rios, a contaminação, tanto do lençol freático, quanto do solo, dentre
outros, que promovem, consequentemente, a destruição da biodiversidade, além de comprometerem
os demais recursos naturais das áreas impactadas.
Dentre os elementos impactados pela ação humana, um dos mais preocupantes, devido
principalmente à sua importância, podendo até levar às disputas internacionais, é a água. A
utilização da água é uma necessidade humana fundamental, considerada pela Organização das
Nações Unidas (ONU), como um direito humano essencial para sobrevivência. Além de atender às
Fórum Internacional do Meio Ambiente - A conferência da Terra 943

necessidades humanas básicas de limpeza e suprimento, a água é empregada nos mais diversos tipos
de usos, como, por exemplo, na produção de energia elétrica.
Contudo, a utilização inadequada dos recursos hídricos e sua demanda cada vez mais
crescente vêm despertando preocupações na sociedade (TUNDISI, 2005), como demonstrada por
importantes conferências realizadas nas últimas décadas. Esse precioso e disputado líquido é
colocado como centro das questões referentes ao desenvolvimento sustentável, pois especialistas
apontam a má distribuição e o mal gerenciamento da água como um dos principais problemas
ambientais a serem enfrentados pela humanidade no século XXI.
A desenfreada utilização dos recursos hídricos, os conflitos entre os tipos de uso
(principalmente o agrícola, o industrial e o residencial) e os prejuízos causados pelo excesso de
consumo e poluição da água, fazem com que tanto o planejamento como a gestão de uso e do
domínio da água se faça racionalmente. Para tal, é fundamental integrá-los à política de
desenvolvimento econômico-social dos territórios, através de autorizações oficiais de concessão de
uso denominadas de outorga, além da subseqüente fiscalização.
Essa pesquisa teve como objetivo fazer um levantamento da distribuição do uso atual de
outorgas dos recursos hídricos superficiais, buscando avaliar sua destinação, para o Estado de
Goiás. Estado esse situado no planalto central brasileiro, caracterizado por uma ampla e densa rede
hidrográfica, fornecendo água para três importantes bacias hidrográficas do país (Parnaíba,
Araguaia e São Francisco).

METODOLOGIA
A pesquisa foi realizada no contexto dos programas de pesquisa do Laboratório de
Geologia e Geografia Física (LABOGEF) do Instituto de Estudos Sócio-Ambientais (IESA) da
Universidade Federal de Goiás. Para seu desenvolvimento foram previstas várias etapas.
Na primeira etapa realizamos um levantamento da revisão bibliográfica referente ao tema e
ao objeto de estudo, seguido pelo levantamento e compilação dos documentos bibliográficos.
A segunda etapa contou com visitas técnicas à Secretaria Estadual do Meio Ambiente e dos
Recursos Hídricos (SEMARH), junto à Superintendência de Recursos Hídricos, órgão responsável
pela liberação da outorga e fiscalização para coleta de dados e informações sobre o sistema de
outorga. Dados e informações sobre os recursos hídricos superficiais foram coletados,
particularmente dados sobre as outorgas para o Estado de Goiás. Essa coleta restringiu-se aos
materiais disponíveis para consulta, alguns inclusive já tratados estatisticamente. Tratamento
estatístico convencional foi feito, para melhor representar os dados.
A análise e a interpretação da distribuição e tipos das outorgas para águas superficiais no
Estado constituíram a última etapa da pesquisa.

ÁREA DE ESTUDO
A área de estudo situa-se a leste da região Centro-Oeste, no planalto central brasileiro.
Conhecido como uma das 27 unidades federativas da República Federativa do Brasil, Goiás é uma
área limítrofe com os Estados de Tocantins (norte), Bahia (nordeste), Mato Grosso (oeste), Mato
grosso do sul (sudoeste), Minas Gerais (leste e sul) e pelo Distrito Federal, totalizando
aproximadamente 340.086 km2 (Figura I).
Fórum Internacional do Meio Ambiente - A conferência da Terra 944

Figura I – Localização do Estado de Goiás. Fonte: Escolas e Concursos (2008).

Com quase seis milhões de habitantes (IBGE, 2008), esse Estado é considerado o mais
populoso do Centro-oeste, sendo, conseqüentemente, área representativa do processo de ocupação,
pois vem sofrendo intensificação de uso e ocupação, resultando num aumento das áreas de
pastagem e de agricultura, inclusive irrigada, que substituíram as fito fisionomias do Cerrado, além
do crescimento urbano, agroindustrial e rodoviário, todas atividades que demandam grande
quantidade de água.
Atualmente, segundo o IBGE (Instituto Brasileiro de Geografia e Estatística) sua economia
se baseia no comércio, na indústria (de mineração, alimentícia, farmacêutica, de vestuário,
mobiliária, metalúrgica, madeireira), na pecuária (principalmente bovinos, aves e suinos) e na
agricultura (soja, milho, arroz, algodão, cana-de-açúcar, sorgo, trigo e girassol).

A OUTORGA PARA ÁGUAS SUPERFICIAIS NO ESTADO DE GOIÁS


A implementação da Política Recursos Hídricos no Estado de Goiás tem como responsável
a SEMARH, Secretaria Estadual do Meio Ambiente e dos Recursos Hídricos, com seus diversos
instrumentos, entre eles a concessão de outorga do direito de uso dos recursos hídricos, o plano
estadual de recursos hídricos, a organização dos comitês de bacias hidrográficas, que entre outros
objetivam a gestão compartilhada do uso da água.
Conforme essa secretaria113, a outorga de direito de uso das águas de domínio estadual é
um importante instrumento de gestão e foi iniciada há mais de 10 anos em Goiás. Apesar do esforço
empreendido para a fiscalização, observa-se a necessidade de maiores investimentos que assegurem
a eficiência de sua aplicação no sentido de regularizar os usos e minimizar a ocorrência de conflitos
pelo uso da água. Atualmente esse sistema alcança cerca de 80% dos usos significativos de águas de
domínio estadual.
O Sistema de Outorga do Direito de uso de águas de domínio do Estado de Goiás, criado
para gerenciar os usos de águas tanto superficiais quanto subterrâneas, conta atualmente, segundo a
SEMARH (2007)114, com mais de 8000 processos e sofre uma grande pressão em função do
aumento da demanda, intensificado principalmente desde 1998, o que pode ser visualizado na figura
abaixo (Figura II), que demonstra a evolução das solicitações de outorga de águas superficiais.
Observa-se como exemplo o ano de 2003, período no qual foram solicitadas 1456 outorgas para os
diversos tipos de usos e foram emitidas 807 portarias (MESQUITA, 2007).

113
Informações disponíveis no site da SEMARH: <http://www.semarh.goias.gov.br>
114
Informações disponíveis no site da Secretaria Estadual do Meio Ambiente e dos Recursos Hídricos:
<http://www.semarh.goias.gov.br>.
Fórum Internacional do Meio Ambiente - A conferência da Terra 945

Figura II – Evolução dos processos de outorga de águas superficiais. Fonte: SEMARH (2007).

Observa-se que a partir de 2000, as solicitações de outorgas para águas superficiais aumentaram,
efeitos decorrentes não só pelo aumento populacional, e pela aceleração da economia, mas também
pelo desenvolvimento cultural fazendo com que outras necessidades sejam incorporadas, como o
turismo, ampliando usos múltiplos desses recursos (TUNDISI, 2005). Atualmente, no estado de
Goiás existem 4476 outorgas em vigor, sendo a agricultura irrigada o uso mais representativo, pois
das 1487 portarias concedidas, 1139 são para sistemas de irrigação do tipo Pivô Central (Figura III).

Figura III – Outorgas válidas no Estado de Goiás em 01 de nov. de 2006. Fonte: SEMARH (2007).

Em se tratando das águas superficiais dos 242 municípios do Estado de Goiás, 142 utilizam
outorgas, correspondendo a 59% do total dos municípios (Figura IV), totalizando 3804 outorgas.
Dentre as microrregiões que detêm o menor número de outorgas, destacam-se, Aragarças com 20
outorgas, Chapada dos Veadeiros e Vão do Paranã com 37, cada um, e Iporá com 45. As
microrregiões que possuem os maiores números de outorgas são: Entorno de Brasília com 597
outorgas, microrregião do Meia Ponte com 532; Vale do Rio dos Bois com 332, Goiânia com 236, e
Anápolis com 181 outorgas.
Fórum Internacional do Meio Ambiente - A conferência da Terra 946

Figura IV – Número de outorgas superficiais concedidas para cada município do Estado de


Goiás. Dados da SEMARH (2007).

A figura V mostra a destinação das águas outorgadas. Voltadas à irrigação, barramento,


geração de energia elétrica, piscicultura, abastecimento de indústria, extração de minério, dentre
outras. O maior representante, em termos de outorgas, do Estado de Goiás é a microrregião do
Entorno de Brasília, nessa destaca-se o município de Cristalina, com 155 barramentos e 225
outorgas para irrigação utilizando Pivô Cental, o que corresponde a 66% do total, valor bastante
representativo. Em segundo temos a microrregião do Vale do Rio dos Bois, essa apresenta valores
menos discrepantes, se comparado com a microrregião do Entorno de Brasília, tendo um total de
332 outorgas. O município que se destaca é o de Paraúna, com 48 barramentos e 47 autorizações
para a implementação de Pivôs Centrais.
Fórum Internacional do Meio Ambiente - A conferência da Terra 947

Tipos de usos outorgados para água superficial


do Estado de Goiás (%)
Abastecimento Público
Barramento
Bombeamento
Canalização
Extração de Minério
8,12 2,64
3,88 Geração de Energia Hidroelétrica
Indústria
42,28
Irrigação (Asp. Conven.)
Irrigação (Autopropelido)
32,62 Irrigação (Gotejamento)
Irrigaçao (P. Central)
2,80 4,22 3,42
Irrigaçao (microaspersao)
Piscicultura
Outros

Figura V – Tipos de usos outorgados para água superficial nas microrregiões do Estado de Goiás.
Dados da SEMARH, 2007.

No caso das microrregiões que detêm o maior número de outorgas pode-se constatar que as
destinações dominantes são para barramentos e irrigações com pivô central, os quais concentram
mais da metade das outorgas. O barramento e a irrigação estão presentes e representam a maior
parte das outorgas em quase toda a área do Estado.
A agricultura irrigada por pivôs centrais apresenta seu consumo correlacionado com a
cultura a ser irrigada e também com os índices de evaporação, umidade do ar, temperaturas médias
e outros fatores climáticos. A grosso modo, segundo a Agência Ambiental de Goiás (2001), se
trabalha com o consumo de 1 litro por segundo para cada hectare, por 20h/dia durante 60 dias/ano.
Já o barramento, que possui seu consumo dependente do tipo de uso, represando um manancial, em
geral, traz alguns danos ao meio ambiente, desde a sua construção ou até mesmo sua utilização
(MESQUITA, 2007).
Assim sendo, o município de Paraúna, importante na produção industrial com unidades
representativas do Estado nele instaladas (Nestlé, Parmalat, dentre outras), detêm o 5º lugar do
Estado de Goiás na produção de algodão e tomate115 com sua base de produção também voltada
para a soja, o arroz e o milho. Com vazões que variam de 8 a 618 m³/s, Paraúna se insere na sub-
bacia Claro sendo abastecida pelos afluentes do Rio Preto e Ribeirão Formoso, além dos córregos
São Lourenço e do Macaco (MESQUITA, 2007).
Os usos que apresentam menores solicitações para outorgas são: bombeamento,
canalização, extração de minério e geração de energia elétrica.

AS CONSIDERAÇÕES FINAIS
A destruição e a fragmentação de habitats consistem, atualmente, na maior ameaça à
integridade do bioma Cerrado: 60% da área total é destinada à pecuária e 6% aos grãos,

115
Informações disponíveis no site do município de Paraúna: <http://www.parauna.go.gov.br>
4
Informações disponíveis no site da WWF:<http://www.wwf.org.br/natureza_brasileira/biomas/bioma_
cerrado/bioma_cerrado_ameacas/index.cfm>
Fórum Internacional do Meio Ambiente - A conferência da Terra 948

principalmente soja. De fato, cerca de 80% do Cerrado já foi modificado pelo ser humano por causa
da expansão agropecuária, urbana e construção de estradas, aproximadamente 40% conserva
parcialmente suas características iniciais e outros 40% já as perderam totalmente. Somente 19,15%
corresponde a áreas nas quais a vegetação original ainda está em bom estado.
A área já apresenta impactos ambientais como erosão, assoreamento e contaminação de
solos e água, além de significativa perda de biodiversidade, todos relacionados com uso e manejo
inadequados das terras em geral, mas não há registro sistemático de impactos sobre os recursos
hídricos notáveis, mesmo para a questão de assoreamento, tampouco nada se sabe sobre a questão
relativa à outorga de água nessa região. Onde não há um plano de manejo e gestão adequados,
causando assoreamento dos rios, como é o caso do rio Araguaia, que pelo menos no Estado de
Goiás, existem muitas voçorocas nas encostas dos rios, onde a mata ciliar tem grande parte
destruída.
O uso de outorga de direito de uso das águas é um instrumento de gestão e fiscalização
importante, criada através da Política Nacional de Recursos Hídricos e iniciado há 10 anos em
Goiás. Tem como objetivo garantir o controle quantidativo e qualitativo da água. Porém será
realmente eficiente quando houver a gestão dos usos de recursos outorgados. Pois observou-se,
nesse trabalho, que o maior número de outorgas está direcionado para irrigação com o uso de pivô
central, o que não é surpreendente ao sabermos que a economia do Estado baseia-se na produção
agrícola, produção esta, que segundo a Agência Nacional consome 70,2% dos recursos hídricos
mundiais. Assim era esperado este número de outorgas. Agora, este trabalho torna-se interessante e
útil à sociedade quando a partir dos dados expostos aqui ser feita uma análise no âmbito da
preservação, a partir de conceitos que garantam a qualidade da vida em todas as suas manifestações.
Diante de exposto, este trabalho caminhou na busca de contribuir para a avaliação do
sistema de outorgas para as águas superficiais e subterrâneas na alta bacia do rio Araguaia, bem
como na busca de alertar quanto à necessidade de mais estudos e relações entre os órgãos
envolvidos, como de concessão de outorga, a SEMARH, de fiscalização, a AGR, junto com outras
instituições públicas, usuários de águas e a comunidade direta ou indiretamente envolvida, no
sentido de monitorar não apenas 80%, mas 100% de todas as outorgas concedidas para o Estado de
Goiás, sejam elas para águas superficiais ou subterrâneas.
É importante atualizar os dados como os de abastecimentos efetuados pelas prefeituras e
pela SANEAGO, como por exemplo, para que estes possam contribuir para pesquisas futuras, além
de serem essenciais para os órgãos de gestão dos recursos hídricos, sejam eles municipais, estaduais
e nacionais. É válido ressaltar a necessidade desses dados sobre outorga serem georreferenciados
para que se possa espacializar a informação. Há também a necessidade de se implantar outras
modalidades de outorga, sobretudo, outorga para lançamento de efluentes, instrumento essencial
para a integração dos aspectos quantitativos e qualitativos da água.

REFERÊNCIAS BIBLIOGRÁFICAS
AGÊNCIA AMBIENTAL DE GOIÁS. Estado ambiental de Goiás. Goiânia: Fundação CEBRAC,
2001.
AGÊNCIA NACIONAL DAS ÁGUAS. Superintendência de Planejamento de Recursos Hídricos.
Panorama da qualidade das águas superficiais no Brasil. Superintendência de Planejamento de
Recursos Hídricos. Brasília, 2005.
CASTRO, S. S. Erosão hídrica na alta bacia do rio Araguaia: distribuição, condicionantes, origem e
dinâmica atual. Revista do Departamento de Geografia, São Paulo, 17, 38-60, 2005.
ESCOLAS E CONCURSOS. Disponível em: <http://www.escolaseconcursos.com.br/index.php>.
Acesso em 18 de jan. 2008.
GOIÁS (Estado). Secretaria de Indústria e Comércio. Hidrogeologia do Estado de Goiás. Goiânia:
Superintendência de Geologia e Mineração, 2006. (Geologia e Mineração, n.1).
III SIMPÓSIO DE RECURSOS HÍDRICOS DO CENTRO-OESTE, 2004, Goiânia. Preservação
de cursos de água, em particular o Rio Araguaia e a hidrologia urbana. Associação Brasileira de
Recursos Hídricos, 2004.
Fórum Internacional do Meio Ambiente - A conferência da Terra 949

MESQUITA, P. V. F. Outorga De Uso Dos Recursos Hídricos Na Alta Bacia Do Rio Araguaia –
GO. Monografia – Instituto de Estudos Sócio-Ambientais, Universidade Federal de Goiás, 2007.
Goiânia, 2007.
TUNDISI, J.G. Água no século XXI: enfrentando a escassez. 2. ed. São Paulo: RiMa, IIE, 2005.
Fórum Internacional do Meio Ambiente - A conferência da Terra 950

ÁGUA COMO INSUMO OU MEIO DE VIDA? - RIBEIRINHOS NA REDE DE SABERES

Lúcia Helena Gratão


DGEO – UEL. lugratao@uel.br

RESUMO
O texto a que se inscreve tem como propósito, o diálogo com as diversas áreas de estudo
das águas no sentido do envolver o segmento de saberes das populações ribeirinhas no processo de
planejamento e gestão das águas. Como um espaço de debate e reflexão, pela (re)criação de idéias,
procura postular o lugar das águas ribeirinhas no espaço geográfico através dos significados
múltiplos que tem a água nas suas práticas e representações. Um lugar definido pelos saberes que
escoam das águas e ecoam dos povos do rio. Por esta perspectiva, se inicia com a indagação: água
como insumo ou meio de vida? para então, entender o contraponto das duas vertentes. É importante
anunciar que a abordagem parte do campo da Geografia seguindo pelo ponto de vista projetado pela
perspectiva de uma reflexão sobre os fenômenos geográficos com o propósito de alcançar melhor
entendimento do homem e de sua condição. Assim anunciado, faz-se então, um recorte geográfico
delimitando as duas vertentes de saber das águas – hidrologia e saberes ribeirinhos –, procurando
rapidamente, apresentar os significados que contêm cada um, para em seguida, dirigir o foco aos
saberes ribeirinhos. Ao longo do (per)curso procura contemplar as múltiplas manifestações da água
passando pelo valor econômico de uso e os danos ambientais para, então, projetar os saberes que
vêm das águas.
Palavras-chaves: Água. Insumo. Meio de vida. Ribeirinhos. Rede de saberes.

ABSTRACT
The text that fits is to regard the dialogue with the various fields of study of waters in order
to involve the segment of knowledge of people living in the process of planning and water
management. As a forum for debate and reflection, the (re) creation of ideas, demand postulate the
place of geographic space in the coastal waters through the multiple meanings that has water in their
practices and performances. A place defined by the knowledge that flow of water and echoed the
peoples of the river. In this perspective, is to begin with the question: water as input or way of life?
Then understand the counterpoint of two parts. It is important that announce the approach of the
field of Geography followed by point of view designed by the prospect of a reflection on the
geographical phenomena with the aim of achieving better understanding of man and his condition.
Once announced, it is then a cut geographic delimiting the two sides to know the waters - hydrology
and riparian knowledge - and looking for quickly make the meanings that each contain, to then turn
the focus to knowledge riparian. Over the (per) course demand include the many manifestations of
water through the economic value of use and environmental damage to then design the knowledge
that come from the waters.
Key words: Water. Insumo. Half of life. Riverine. Network of knowledge.

ÁGUA COMO INSUMO OU MEIO DE VIDA?


Á água como insumo ou meio de vida? Duas vertentes diversas de concepção,
representação e uso da água. Porém, na perspectiva de sustentabilidade, o planejamento e gestão
dos recursos hídricos deve contemplar e envolver as águas enquanto meio de vida, ou seja, se o
processo de planejamento e gestão das águas segue os saberes técnicos-científicos, institucionais e
acadêmicos, é preciso que também, se orienta pelos saberes das populações ribeirinhas. Como um
rio que conceitualmente e naturalmente, é a convergência de duas vertentes e que, as águas que se
encontram formam uma rede hidrográfica e, assim, formam também, uma rede de saberes. Nesse
(per)curso, as águas que brotam de vertentes ribeirinhas devem naturalmente, se convergir neste
mesmo rio e, naturalmente, deve integrar esta mesma rede de saberes. Esta vertente que concebe (e
concede) a água enquanto elemento essencial e, portanto, como meio de vida.
Por esta visão, inscrevendo-se no temário sobre planejamento e gestão dos recursos
hídricos segue este texto buscando confluências por este segmento de saberes de gestão da água. O
Fórum Internacional do Meio Ambiente - A conferência da Terra 951

temário sempre apresenta-se como um grande desafio no exercício do ensinar hidrografia pelo
campo disciplinar da Geografia. Por isso, este é um espaço importante para dialogar com outros
profissionais no sentido de dar sustentabilidade a essa posição e postura epistemológica diante da
água no ato de ensinar geografia das águas.

O ENVOLVER-SE NA REDE DE SABERES DA ÁGUA


Como um espaço de debate, reflexão e (re)criação de idéias o sentido desta escrita
geografizada é postular o lugar das águas ribeirinhas no espaço geográfico através dos significados
múltiplos que tem a água nas suas práticas e representações. Um lugar definido pelos saberes que
escoam das águas e ecoam dos povos do rio. Desta maneira, procura-se o envolver dos ribeirinhos
na rede de saberes.
Dessa vertente de apreensão de saber, faço desse texto uma oferenda aos povos do rio que
ensinaram-me a escrita da água. Essa escrita que se inscreve e circunscreve na concepção de Dardel
quando diz: «La géographie est, selon l’ étymologie, la «description» de la Terre; plus
rigoureusement, le terme grec suggère que la Terre est une écriture à déchiffrer, le dessin du
rivage, les découpures de la montagne, les sinuosités dês fleuves forment les signes de cette
écriture» (DARDEL, 1952, p. 2). Assim, o conhecimento geográfico tem como papel decifrar estes
signos que “la Terre revele à l’homme sur sa condition humaine et son destin” (DARDEL, 1952,
p. 2).
Pela geografia das águas – escrita das águas - se revelam então, os sentidos destes signos
para os povos ribeirinhos. Por este caminho é entendido e concebido portanto, que o temário deve
estar contemplando também, esta vertente geográfica, como um transcurso ou uma travessia entre
uma vertente e outra das águas. Uma que segue pela determinação econômica, outra se destina à
mediação humana pela sabedoria dos povos das águas. Como um rio, as duas vertentes devem se
convergir e não, se contrapor.
Do ponto de vista apontado por esta via geográfica, esta escrita segue traçada pela
abordagem “que reflete sobre os fenômenos geográficos com o propósito de alcançar melhor
entendimento do homem e de sua condição (TUAN, 1982, p. 143). Assim anunciado, faço então,
um recorte geográfico delimitando as duas vertentes de saber das águas – hidrologia e saberes
ribeirinhos –, procurando rapidamente como num (per)curso encachoeirado, apresentar os
significados que contêm cada um, para em seguida, dirigir o foco aos saberes ribeirinhos.
Passando então a discorrer o tema, encontra-se no dicionário da língua portuguesa
(FERREIRA, 1986, p. 893-894): hidr(o) do grego hýdor - ‘água’, ’líquido’ suor. Hidrologia [de
hidr(o) + log(o) + ia]. O estudo da água nos estados líquido, sólido e gasoso, da sua ocorrência,
distribuição e circulação na natureza. É dito também, que Hidrologia é a ciência da água, uma
expressão muito mais utilizada nas áreas das engenharias do que em Geografia. A Hidrografia pela
própria composição hidro-grafia se aproxima muito mais do que é o propósito de estudos no
campo geográfico. A expressão grafia que se encontra em Geografia já é uma aproximação e
tradução do que se encontra em Hidrografia – geographia e hidrographia. Graphia enquanto
“escrita” e geografia enquanto escrita da Terra. « La Terre est une écriture à déchiffrer»
(DARDEL, 1952, p. 2). Desse ponto de vista, entende-se a hidrografia como o estudo geográfico
das águas – graphia das águas – “une écriture à déchiffrer”.
Os saberes ribeirinhos, concebidos como os saberes que vêm das comunidades hídricas –
aquelas com características culturais ligadas à água, como a pesca artesanal, a navegação, a pequena
agricultura, a religião e outras mais. A relação dessas comunidades, muitas vezes centenárias, com o
meio propiciou a construção de territórios, nos quais se desenvolvem vários aspectos da cultura
local e de fixação do homem. Esses espaços de cultura vão muito além das danças, das crenças, da
religiosidade e passam por uma visão de unicidade com os recursos naturais que interferem de
forma decisiva na sobrevivência desses núcleos populacionais. A visão que possuem,
essencialmente da água, traduz-se em uma relação ribeirinha, em que o rio faz parte – está envolto -
da vida cotidiana, uma relação de geograficidade hídrica. Esta relação que constrói e reconstrói
saberes da água; saberes que vêm dos rios; saberes que brotam dos povos dos rios.
Fórum Internacional do Meio Ambiente - A conferência da Terra 952

Com o olhar voltado para o entendimento do homem e de sua condição-existência, essa


escrita parte de um fenômeno aprendido e apreendido enquanto investigação pelo campo
experiencial da geografia, embrenhando-se pelo universo da percepção e do imaginário da água
(GRATÃO, 2002; 2005). Por esta trajetória, a geografia das águas segue pelo campo de
conhecimento e saber que historicamente, substancia a relação Homem/Terra. Uma relação visceral
que o Homem mantém com a Terra, como sustenta a geografia de Eric Dardel (1952). Uma
geografia que se encarrega das relações que nós mantemos com o mundo terrestre, na medida em
que ela é uma indagação sobre as diferentes maneiras possíveis de falar deste mundo. A geografia é
aqui vista não como conteúdo de saber, mas na dimensão de sentido que ela proporciona aos
discursos e às ações em relação ao mundo, não como saber, mas como orientação em relação ao
mundo (BESSE, 2006, p. 83). Com eses olhos, a geografia não pode mais ser vista somente na
perspectiva de uma indagação sobre seu grau e sua forma de cientificidade. Nesse mesmo sentido, o
estudo da água vai também além desta indagação.
Por esta dimensão, Besse afirma que Dardel colocou a questão do sentido da geografia
para o ser humano e aponta que a “geografia é definida por Dardel como uma dimensão originária
da existência humana. Por consequência, a questão sobre a geografia deve ser ligada a uma questão
mais ampla, mais fundamental também, mas no interior da qual a geografia ocupa um lugar
decisivo: é a questão do ser humano” (BESSE, 2006, p. 85). Nesse contexto de abordagem e de
entendimento da geografia se projeta o estudo da água enquanto elemento da superfície da Terra,
considerando-a na repercussão de suas significações para o pensamento e a sensibilidade humana.
O espaço geográfico é como o prolongamento de uma série de devaneio da matéria, porque
a materialidade terrestre não está fechada nela mesma, na indiferença simples de uma pura
facticidade, porque ela é fundamentalmente fisionomia, porque ela manifesta direções de sentidos
numa consistência própria, em suma, porque ela excede sua pura facticidade e se apresenta
irredutivelmente carregada de qualidades. Segundo Dardel, certos fenômenos naturais como a água,
a sombra das nuvens ou a cor, permitem ao ser humano provar direta e visualmente esta potência de
irrealização ou de surrealização que está presente na matéria terrestre. É a água que, pelos seus
reflexos que ela distribui na superfície do mundo, permite à matéria se prolongar além dela mesma
em imagens (BESSE, 2006, p. 85). A geografia não nos ensina nada do mundo terrestre se nós não
percebermos antes que ele é o meio do sentido. A água é um elemento (essencial) como meio de
sentido – meio de vida.
Se o espaço geográfico é um espaço da vida, mas um espaço pelo qual a vida se expressa,
um espaço no interior do qual a vida descobre significações, é a água também um espaço pelo qual
a vida se expressa. E assim, se inscreve como elemento de subjetivação e de envolvimento no
espaço geográfico enquanto dimensão do humano. Nesta dimensão está o lugar dos ribeirinhos na
rede de saberes da água. Por esta perspectiva, a visão da água vai além das (suas) condições
hidrológicas seguindo por um (per)curso experiencial e existencial. Água que liga povos e culturas;
água de sentidos e valores. Águas de amores! Uma perspectiva vislumbrada pela idéia de conexões
e (con)fluências de canais que formam redes de conhecimento científico e saberes populares,
interligados pela ciência e pela cultura.
Por esta visão vislumbra-se a água como espaço da vida. Fonte de vida, (en)volta de
mistérios e conexões que fazem do passado uma espécie de “rede arterial vital” do presente. Uma
matéria/artéria que substancia a vida. Água é vida!

A ÁGUA E SUAS MANIFESTAÇÕES


Cada sociedade, grupo, comunidade tem uma relação singular e plural com a água, que
“reflete” a diversidade de valores e de experiências acumuladas. Como referência cultural e social,
a água encontra grande expressão nas artes, nas religiões, na mitologia, no folclore na ciência e na
política. Mais do que produzir meras satisfações, a água costuma ser responsável por um amálgama
de experiêcias sensoriais que envolvem os cinco sentidos, como aponta Castelo (1996, p. 28). A
água na verdade, constitui num dos mais poderosos recursos do mundo da simbologia (DÉFERT,
1972; ELIADE, 1991) e, particularmente, da psicologia. Diria que pela projeção onírica (GRATÃO,
Fórum Internacional do Meio Ambiente - A conferência da Terra 953

2005) inspirada pelo filósofo e poeta das águas (BACHELARD, 1989), a água na verdade, constitui
num poderoso meio de mediar e desatar a imaginação. Vai além, portanto da percepção, do
sensório. Escoa e ecoa pelo universo do imaginário. É sentida, vivida, experienciada, mas é
também, uma evocação do imaginário que transcorre pelo mundo das imagens.
Diante dessas concepções surge uma pergunta que não se quer calar: Qual é ressonância
que se encontra nos dias de hoje no sentido de dar sustentabilidade às estas referências?
Na sociedade moderna o que se tem constatado é que o meio ambiente é o resultado da
produção humana, do trabalho em todos os seus domínios e determinações. O homem submete e
explora o próprio homem transformando a natureza em recursos e, a sua própria natureza. A relação
de produção faz dos homens donos da Terra. “A natureza passa a ser considerada como um objeto,
uma mercadoria; uma fonte de riqueza” (GRATÃO, 2002, p. 11). Nesse processo, são arrancadas as
raízes e cortados os laços naturais e culturais com a Terra.
E então, não se podendo calar diante desta ação, ecoa uma nova indagação: É esse o
tratamento que queremos para a água? Para os rios? Para a vida? É esta relação que desejamos
estabelecer com a água? Como expresa a composição musical de César Augusto e Mário Marcos
em “O Rio”: Envenenam tudo, até o próprio amor/Será que eles não percebem/Que a natureza pede
para viver/Enquanto vai morrendo o rio/Nada em sua volta poderá nascer
As versões acerca da origem do universo, sejam a partir do enfoque religioso, do científico
ou de qualquer outra versão, são enfáticas em ressaltar a importância da água na vida das
populações humanas. A água está sempre ligada às condições de existência dos diversos sistemas
vivos confrontados com o homem na vida da terra (MORAES, 2003, p. 227). Este é o sentido pelo
qual se busca envolver as populações ribeirinhas no processo de gestão da água, enquanto elemento
fundamental nas suas culturas e nas suas vidas.
A água dá margem a um riquíssimo elenco de simbologias e representaçãoe, a despeito de
ter ela deixado de ser, desde os fins do século XVIII, uma substância priomordial, qualitativamente
diferenciada, para tornar-se H2O. “Depois que a água tornou-se objeto da razão científica, passou a
ser um corpo entre os outros, muito importante, é certo, mas sem alma, sem sentido, uma coisa
morta” (BRUNI, 1993, p. 57)
Nosso planeta possui mais de dois terços de seu território formado por águas. Por sua vez,
a constituição do nosso corpo humano é de 75 % de líquido, ou seja, somos mais líquidos do que
qualquer outro estado da matéria, portanto temos uma relação direta, estreita e vital com a água e,
que se manifesta de forma simbólica e imaginária pelas diversas culturas ou povos.
Como Queiroz (2002, p. 670) ao abordar as simbologias e representações da água, lembra
que o banho não se resume apenas à eliminação das impurezas do corpo. Mais do que isso, o banho
remove ritualmente a sujeira, a “poluição social” que a todos contamina, de que resulta uma
profunda sensação de pureza e bem-estar. Certas imersões na água, por exemplo, estão prenhes de
significado religioso, como é o caso do batismo. E, retornando a Bruni, a água é também um
remédio muito eficaz tanto psíquico quanto ótico. Água fresca faz os olhos claros. E que beleza é
olhar uma água límpida! Encantos mágicos! Espelho! “A água é a imagem da consciência de si
mesmo, a imagem do olho humano – a água é o espelho natural do homem”(BRUNI,1993, p. 58).
No caminho do rio, o encontro do homem com a natureza e/ou consigo mesmo? (GRATÃO, 2002).
Associações aqui à noção de reflexo/espelho no sentido da etimologia que vem de reflectere
significando “voltar para trás”, “inclinação para trás”. “A reflexão, por conseguinte, deve ser
entendida como uma tomada de consciência” (BRANDÃO, 1987, apud QUEIROZ, 2002, p. 671).
E assim, se nos enveredarmos e nos embrenharmos por este universo de simbolismo e
representação da água, encontraríamos as mais diversas formas de realizações experienciais e
existenciais pelo mundo da água. Não cabe nesse texto, aprofundar e prosseguir por todas estas
dimensões. O que se procura projetar é que por esse enveredar-se é que se encontra os saberes
riberinhos. É preciso portanto, ir além da vertente da “ciência das águas” chamada hidrologia e
seguir pelas “suas margens”. Lá estão “eles”. Esta busca encontra resistência até mesmo nos
espaços disciplinares da geografia.
Fórum Internacional do Meio Ambiente - A conferência da Terra 954

A “consciência geográfica” - ou seja, os estudos por esta abordagem geográfica - não têm
despertado os sentimentos (e o coração) de tantos aqueles que têm buscado a geografia que se
ensina – ou seja, não despertado os sentimentos de “geógrafos” sobre a consciência geográfica. Esta
concepção é concedida em Dardel (1952) quando escreve que a “ciência geográfica pressupõe [...]
que o homem possa sentir e conhecer a si como sendo ligado à Terra” (DARDEL, 1952, p. 42).
Essa geograficidade combina efetivamente, com descrições de experiência geográfica feitas por
poetas, novelistas e geógrafos (RELPH, 1979, p. 2).
Esta fonte conduz ao “mundo vivido” dos povos d’ “O Rio” (GRATÃO, 2002). Por esse
campo a geografia tem ressonância no mundo da experiência geográfica: experiências de lugares e
paisagens, que todos têm, embora não conheçam nada de Geografia como ciência formal (RELPH,
1979, p. 1).Por esse campo, encontram-se outras maneiras de fazer geografia. Não uma só ou uma
única Geografia mas, outras maneiras de geografar e geografizar as águas. A vertente primordial é o
relacionamento (íntimo) – dos povos das águas - com as águas. Os ribeirinhos produzindo uma
evocação vivida postulada entre a condição humana e a natureza – aquario – sua existência.
Por esse (per)curso já se pode visualizar a vertente de abordagem e concepção da água –
insumo ou meio de vida? Elemento vital ou recurso? Bem social ou recurso econômico? Bem
comum? Duas vertentes que se contrapõem mesmo pela via de conhecimento de que o Planeta
Terra é um complexo sistema de organismos vivos no qual a água é elemento fundamental e
insubstituível. Sem água não existe vida. Ponto de vista já referenciado por muitos teóricos e pelas
práticas ribeirinhas.
Nesse contraponto a água é concebida e tratada como elemento vital e como recurso
hídrico. Na primeira página da extensa e importante obra “Águas Doces no Brasil: capital
ecológico, uso e conservação”, assim está escrito: “O termo água refere-se, em regra geral, ao
elemento natural, desvinculado de qualquer uso ou utilização. Por sua vez, o termo recurso hídrico
é a consideração da água como bem econômico, passível de utilização com tal fim.Entretanto, deve-
se ressaltar que toda a água da Terra não é, necessariamente, um recurso hídrico, na medida em que
seu ou utilização nem sempre tem viabilidade econômica”(REBOUÇAS; BRAGA; TUNDISI,
2002, p. 1). Nesse processo, de substância natural a água passa a categoria de recurso/mercadoria.
Esta é a vertente pela qual a água é também insumo indispensável à produção e recurso
estratégico para o desenvolvimento econômico. Todas as atividades humanas dependem da água.
Navegação, turismo, indústria, agricultura e geração de energia elétrica são alguns exemplos de uso
econômico.
No contraponto desta vertente encontra-se a escrita que o acesso à água é um direito
humano fundamental. Toda pessoa deve ter água potável em quantidade suficiente, com custo
acessível e fisicamente disponível, para usos pessoais e domésticos, conforme previsto na legislação
brasileira e na Agenda 21.
Água elemento vital, água purificadora, água recurso natural renovável, são alguns dos
significados referidos em diferentes mitologias, religiões, povos e culturas, em todas as épocas.
Dessa perspectiva hídrica, saber o significado da importância da água é uma questão cultural, que
envolve o hábito de cultivar a terra, de se relacionar com o elemento água desde a sua representação
como manancial de sustentação e de enraizamento do mito até a renovação espiritual. Para isso,
vamos ao encontro com Eliade (1991) através dos (per)cursos de Gratão (2002, p. 230): “Os
símbolos e os mitos vêm de longe: eles fazem parte do ser humano, e é impossível não os encontrar
em qualquer situação existencial do homem no Cosmos”.
E assim, o poeta, compositor e músico revela suas experiências místicas com “O Rio” –
ARAGUAIA! Remador deixa o barco correr/Que estas águas nos levem p’ além/Mas de volta elas
sempre nos trazem/O Araguaia não solta ninguém.
“Ele leva, prende, e as pessoas acabam voltando” na narrativa do homem d’ “O Rio” e em
versos “Como uma serpente se enrosca” ele canta a magia emanada e emanente d’ “O Rio”. É o
“surgir de longe” e o (re)encontrar na consciência d’ “O Rio” (GRATÃO, 2002, p. 231).
No campo da imaginação pelo signo dos elementos materiais Bachelard (1989) revela-nos
que as imagens da água, nós as vivemos ainda, vivemo-las sinteticamente em sua complexidade
Fórum Internacional do Meio Ambiente - A conferência da Terra 955

primordial, dando-lhes muitas vezes a nossa adesão irracional. Escreve o filósofo sonhador da
fenomenologia da água: “Foi perto da água e de suas flores que melhor compreendi ser o devaneio
um universo em emanação, um alento odorante que se evola das coisas pela mediação de um
sonhador”. E continua: “Se quero estudar a vida das imagens da água, “preciso portanto, devolver
ao rio e às fontes de minha terra seu papel principal. [...] Não é preciso que seja o riacho da nossa
casa, a água da nossa casa” (BACHELARD, 1989, p. 8 e 9).
Por este campo de contemplação e de envolvimento da água, o valor da sobrevivência
humana está acima de qualquer valor monetário. Dar valor monetário a um bem social não é algo a
ser tratado somente por leis. É rever uma série de fatores e reconhecer a importância de uma política
social que envolva os ribeirinhos nas suas práticas e saberes, para que não fiquem à margem mas,
que possam continuar nas suas condições existenciais e de destinos enraizados na suas margens.
Insumo (input) é tudo aquilo que entra no processo de produção; como produto (output) é
tudo aquilo que sai como final do processo de produção. Portanto, insumo é uma categoria da
economia: combinação de fatores de produção (matérias primas, horas trabalhadas, enrgia
consumida, taxa de amortização, etc ), que entram na produção de determinada quantidade de bens
ou serviços (input).
Desta forma, a água enquanto insumo é uma mercadoria prescrita pelo mercado como
objeto de comécio. A água é um produto comercial, portanto exposto à venda numa relação de
apropriação. Relação onde a Natureza se transforma em recurso, entendido como “recorrer” às
fontes de riquezas naturais e transformá-las em bens; haveres; posses.
O ato de administrar o bem público deve ser de responsabilidade de todos.
Compreendendo-se a água como um bem público, todos os atores sociais (pelos seus saberes e
práticas) devem participar da gestão dos recursos hídricos do seu espaço geográfico.

MAS, O QUE É A ÁGUA? SE TUDO É ÁGUA! - ÁGUA DE BEBER, ÁGUA DE BANHAR,


ÁGUA DE BENZER
O Dicionário de Símbolos (CHEVALIER & GHEERBRANT, 2000) traz oito páginas
sobre “Água”. Assim começa: As significações simbólicas da água podem reduzir-se a três temas
dominantes: fonte de vida, meio para purificação, centro de regenerescência. Esses três temas se
encontram nas mais antigas tradições e formam as mais variadas combinações imaginárias – e as
mais coerentes também. Não cabe aqui, abordar todas as suas significações, mesmo porque, não é
esse o propósito da intervenção. Todavia, é preciso grafar algumas delas: “A água é a forma
substancisl de manifestação, a origem da vida e o elemento da regeneração corporal e espritual, o
símbolo da fertilidade, da pureza, da sabedoria, da graça e da virtude” (p. 15). “A água viva, a água
da vida se apresenta como um símbolo cosmogônico que cura, purifica e rejuvenesce” (p. 18). “A
água é prima materia” (p. 19). “A água simboliza a pureza e é compreendida como instrumento de
purificação” (p. 19). “Enfim, a água simboliza a vida: a água da vida, que se descobre nas trevas, e
que regenera” (p. 19). “Dos símbolos antigos da água como fonte de fecundação da terra e de seus
habitantes podemos passar aos símbolos analíticos da água como fonte de fecundação da alma: a
ribeira, o rio, o mar representam o curso da existência humana e as flutuações dos desejos e dos
sentimentos” (p. 20).
Tales de Mileto, o primeiro filósofo, da antiga Grécia do século VI a.C. afirmava ‘tudo é
água’. A interpretação da frase que se encontra nos livros de filosofia, segundo Bruni (1993, p. 53),
aponta para o contexto do surgimento de uma filosofia da natureza, sendo preocupação dos
primeiros filósofos a determinação de uma substância material primordial, concebida como
princípio, origem e matriz de todas as coisas. Para Tales, essa substância, a physis, seria a água, e
todos os seres existentes seriam, essencialmente, produto da transformação da água ou água
transformada.
‘Tudo é água’. Mas, o que isso quer dizer? Procuremos observar o que ocorre de mais
simples sob nossos olhos, bem perto, no nosso dia-a-dia. Por mais superficial que seja uma
descrição das nossas atividades diárias é impossível deixar de notar a presença constante do
elemento água especialmente, nos cuidados diários com nosso próprio corpo e nos afazeres
Fórum Internacional do Meio Ambiente - A conferência da Terra 956

domésticos comuns (BRUNI, 1993, p. 54). Com esse propósito, façamos um (per)curso pelos
caminhos das águas ribeirinhas para observarmos o que ocorre de mais simples sob nossos olhos. O
que nos ex-põem os seus povos aos ‘olhos’ da água.
‘A água é essencial para a vida’. A civilização é, em parte, um diálogo entre o homem e a
água, já revelara as civilizações antigas e orientais. A vivência e percepção são um ‘instrumento’
para declarar existência da água. A vida está impressa nas imagens (imaginário e imaginação) que
revelam a ação, os sentimentos, o amor, as intenções, as intencionalidades – na pureza e na
impureza das águas.
‘As águas falam’. As águas expressam. Pelos ‘olhos’ das águas observa-se, percebe-se,
estrutura-se uma paisagem e um lugar. ‘Olhos’ que se envolvem e deslumbram com a magia das
águas. As águas revelam o estado de ser – cheiros, sons, cores, sabores, saberes; dores, amores,
desamores. O cheiro das águas; o cheiro das lembranças; a infância. O mesmo ‘olhar’ de
encantamento é o ‘olhar’ que denuncia! Águas de significados múltiplos (CUNHA, 2000). Águas
mesmas que exercem atração sobre o ser humano, fonte inesgotável de simbologias e
representações mentais.

OS RIOS NAS FRONTEIRAS DE RESISTÊNCIAS


Como muito bem lembra Queiroz (2002, p. 674), a partir de Cassiano Ricardo (1970), além
da contribuição para o desbravamento dos sertões, com a conseqüente ampliação das nossas
fronteiras, os rios brasileiros resistiram-se de relevante função simbólica, sobretudo quanto à
configuração de uma identidade nacional. “Um grande rio – o Tiête – escreve o poema histórico da
penetração. Um pequeno rio – o Ipiranga – batiza o grito de nossa emancipação política. Outro
grande rio – o Paraíba – abre caminho às bandeiras que demandam o centro meridional; outro
pequeno rio – o ribeirão do Carmo – é a fonte de onde brota, magnífica, a civilização do ouro”
(RICARDO, 1970, p. 68 apud QUEIROZ, 2002, p. 674). Poder-se-ia destacar, a partir desta
sugestiva lista, o vínculo estabelecido entre o rio Parnaíba e a expressão mais nítida da fé cristã em
sua versão nacional, uma vez que de suas águas retirou-se, conforme conhecido relato, a sagrada
imagem de Nossa Senhora Aparecida, padroeira do Brasil. Talvez se possa também dizer, que a
melhor manifestação do apreço que os brasileiros devotam aos seus cursos d’água é dada pela
singular forma de tratamento concedida ao importante rio São Francisco, carinhosamente chamado
de “o velho Chico” (QUEIROZ, 2002, p. 674).
Nestas fronteiras encontra-se o rio Araguaia resistindo a sua função simbólica e o seu papel
identitário. “O Araguaia é o maior rio que já vi. Este caudal do Araguaia me chega cheio de
Llobregats (pequeno rio na Espanha). O Araguaia é o rio mais piscoso de toda a região amazônica.
É uma bênção de Deus. Gostaria que me enterrassem - se morrer aqui – no cemitério de São Félix,
que está ao lado do Araguaia. Minha vida é este Araguaia”: Revelações de Dom Pedro Casaldáliga
(ESCRIBANO, 2000 apud GRATÃO, 2002, p. 189).
Porém, nem tudo que é rio tem resistido às forças e as pressões da sociedade moderna,
barrando e inundando os seus cursos naturais e rompendo as manifestações simbólicas e
imaginárias do seus povos, produzindo danos ambientais irreversíveis. Danos ambientais mais
atuais e significativos, atingindo sobretudo, os rios e as formas de vida que neles florescem, são
aqueles provocados pelo barramento do curso normal de um rio para a geração de energia por meio
de usinas hidrelétricas. A inundação de milhares de quilômetros quadrados que essas gigantescas
obras de engenharia promovem leva à submersão da flora e da fauna, modificação brusca de ciclos
biológicos e ecológicos e sensíveis alterações climáticas (QUEIROZ, 2002, p. 682).
Exemplo dessas forças energéticas é o investimento desenvolvido na região amazônica,
que tem como motor propulsor as águas, é a barragem Hidrelétrica de Tucurui, que represou o rio
Tocantins. Desde a década de 1980, quando foram fechadas as comportas da represa, este
investimento vem provocando a escassez de pescado à jusante da barragem, configurando um
quadro de desequilíbrio ambiental, provocando mudanças em todo ecossistema da região, segundo
Moraes (2003, p. 229). Esse desajuste ambiental provocado pela intervenção humana no
ecossistema exemplifica bem a dinâmica paradoxal entre o o homem e a natureza.
Fórum Internacional do Meio Ambiente - A conferência da Terra 957

Não bastassem tantos prejuízos e sofrimentos, os ribeirinhos reassentados ficam


desprovidos de meios para operacionalizar o conhecimento que acumularam sobre os usos materiais
e simbólicos da natureza. Assim, os impactos refletem-se e são sentidos tanto na dimensão cultural
destes grupos e famílias quanto em seu equilíbrio psíquico. Na fala transcrita a seguir, segundo
Queiroz, Rebouças encontrou, ademais da percepção de que o rio é fonte ou meio de vida para esses
ribeirinhos, uma apreciação estética sobre a própria Natureza: O rio para mim era um meio de vida
porque o rio era que nem a roça, eu tirava o sustento do rio, vendia o peixe. A água do rio servia
para tomar banho, para lavar louça, as roupas. Lá a gente tinha Natureza. Aqui não, aqui não tem
Natureza, não tem um córrego, não tem uma árvore, não tem mata verde. É só cerrado” (QUEIROZ,
2002, p. 682).
Em ressonância com Moraes, rios e homens precisam reatar os laços de parcerias e
simbiose que permitem gerar vida mútua. Para isso, uma nova ética da relação homem-natureza
precisa ser colocada hoje em construção por cada um de nós (2003, p. 230). Uma nova (po)ética -
cultural - de relacionamento Homem/Paisagem precisa ser (re)criada no interior de cada um de nós
pelos laços de pertencimento, abrindo as janelas da percepção e desatando a imaginação geográfica.
No decorrer da história, cada segmento social elaborou representações e significados
próprios relativamente aos rios e os emprega ainda hoje, na luta pela afirmação de seus interesses e
identidades grupais. Considerando as múltiplas dimensões e os numerosos significados da água para
a existência humana, poder-se-ia encerrar este texto lembrando que, cada vez mais, o controle das
suas fontes de abastecimento constitui também fonte de poder. Tal como acentuado nas narrativas
místico-religiosas, a água tanto pode representar uma dádiva primordial concedida às coletividades
humanas quanto um instrumento para a sua aniquilação.

DOS SABERES QUE VÊM DA ÁGUA


A busca para compreender o misterioso mundo da água é nobre e gratificante. (En)volver-
se com ela (nela) requer uma vívida imaginação criadora, embalada por uma firme disciplina,
baseada num corpo consistente de observações comprovadas. Espera-se que o debate (en)volto
deste temário, seja uma fonte fluente e que dela possa fluir novas idéias, motivações ou desafios
(respeitando nossos limites) na direção de ampliar e aprofundar nossas visões, subjetivando esse
elemento substancial da vida e para a vida! Que estas páginas geografadas possam conduzir a mais
um passo no caminhar dos rios respeitando os saberes ribeirinhos nas suas práticas imaginárias e
simbólicas de cuidar a água.

REFERÊNCIAS BIBLIOGRAFICAS
BESSE, Jean-Marc. Ver a terra: seis ensaios sobre a paisagem e a geografia. São Paulo:
Perspectiva, 2006.
BRUNI, José C. A água e a vida. Tempo Social; Rev. Sociologia, USP, 5(1-2): 53-65, 1993.
CASTELO, Lineu. A percepção em análises ambientais – o Projeto MAB/UNESCO em Porto
Alegre. In: DEL RIO, Vicente; OLIVEIRA, Lívia de (Orgs). Percepção Ambiental – experiência
brasileira. São Paulo: Studio Nobel, 1996.
CHEVALIER, Jean; GHEERBRANT, Alain. Dicionário de Símbolos: mitos, sonhos, costumes,
gestos, formas, figuras, cores, números. Rio de Janeiro: José Olympio, 2000.
CUNHA, Lúcia H. O. Significados múltiplos das águas. In: DIEGUES, Antônio C. (Org.). A
Imagem das Águas. São Paulo: Ed. HUCITEC, p. 15-25, 2000.
DARDEL, Eric. L’ Homme et la Terre – nuture de la réalité géographique. Paris: Ed. PUF. 1952.
DÉFERT, Pierre. Les Ressources et les Activités Touristiques. Aix-em-Provence: Centre d’Études
du Tourisme, 1972.
ELIADE, Mircea. Imagens e Símbolos. São Paulo: Martins Fontes, 1991.
GRATÃO, Lúcia Helena. A Poética d’ “O RIO” – ARAGUAIA! De Cheias... & Vazantes... (À)
Luz da Imaginação! 2002. Tese (Doutorado em Geografia Física) – Faculdade de Filosofia, Letras e
Ciências Humanas, Universidade de São Paulo, São Paulo.
Fórum Internacional do Meio Ambiente - A conferência da Terra 958

________. (À) luz da imaginação! “O Rio” se revela na voz dos personagens do lugar –
ARAGUAIA! In: Simpósio Nacional sobre Geografia, Percepção e Cognição do Meio Ambiente,
2005, Londrina. Anais. [CD-ROM].
MORAES, Sérgio C. De rios e homens. In: ALMEIDA, Angela M.; KNOBB, Margarida;
ALMEIDA, Maria C. Polifônicas idéias – por uma ciência aberta. Porto Alegre: Sulina, 2003, p.
227-230.
QUEIROZ, Renato S. Caminhos que andam: os rios e a cultura brasileira. In: REBOUÇAS, Aldo da
C.; BRAGA, Benedito; TUNDISI, José G. (orgs). Águas Doces no Brasil: capital ecológico, uso e
conservação. São Paulo: Escrituras Editoras, 2002, p. 669-686.
REBOUÇAS, Aldo da C.; BRAGA, Benedito; TUNDISI, José G. (orgs). Águas Doces no Brasil:
capital ecológico, uso e conservação. São Paulo: Escrituras Editoras, 2002.
RELPH, Edward C. As Bases Fenomenológicas da Geografia. Geografia, vol. 4, n. 7, p. 1-25, abril
1979.
TUAN, Yi-Fu. Geografia Humanística. In: CHRISTOFOLETTI, Antônio. Perspectivas da
Geografia. São Paulo: DIFEL, 1982.
Fórum Internacional do Meio Ambiente - A conferência da Terra 959

REPRESENTAÇÕES SOCIAIS DO ACESSO À ÁGUA POTÁVEL E DAS PRÁTICAS DE


USO

José Rocha Filho Cavalcanti


UNIARA - Centro Universitário de Araraquara. Rua Carlos Gomes, 1338 Centro Araraquara-SP CEP 14.801-340. (16)
3301 7100 (Geral) 0800 556588. rocha-cp@uol.com.br

RESUMO
A cidade de Cabaceiras, localizada no semi-árido paraibano, é o município onde menos
chove no país. Apresenta temperatura média de 30o e menos de 200mm de chuva durante o ano
todo, com precipitações em apenas 2 meses anuais, alcançando períodos secos de até 10 meses. É
uma região habitada por populações pobres e de extrema carência, cuja fonte de sustentabilidade
encontra-se na agricultura familiar. Os Projetos Sociais desenvolvidos têm o caráter de atender
apenas as necessidades imediatas, socorrendo estas populações com o abastecimento de água
através de carros-pipa, a distribuição de cestas básicas e o trabalho realizado pelas frentes de
emergência. A água é elemento vital no desenvolvimento sustentável e a seca ou as enchentes
constituem-se em um fato social agravado pelo comportamento humano. Sendo a região carente de
chuvas, percebe-se nas minorias religiosas a acomodação para este fator climático, levando-as a
perceber a água como um dom de Deus. Para entender melhor este simbolismo, a Teoria das
Representações Sociais fundamenta a análise dessa condição específica de construção do
conhecimento e de práticas sobre a água (acesso, uso e manejo) por esta população profundamente
influenciada por sua formação religiosa.
Palavras-chaves: Manejo da água – Estudo sociológico – Grupos de cristianismo popular –
Semi-árido nordestino – Município de Cabaceiras (Pb)

ABSTRACT
The city of Cabaceiras, located in the semi-arid paraibano, is the municipal district with the
smallest index of rains in the country. It presents medium temperature of 30o and less than 200mm
of rain during the whole year, just raining for 2 months, reaching dry periods of up to 10 months.
Area inhabited by poor populations and of extreme lack where the maintainability source can be
found in the family agriculture. The developed Social Projects has the character of just assisting the
immediate needs, helping these populations with the provisioning of water through tanks cars, the
distribution of basic baskets and the work accomplished by the emergency fronts. The water is vital
element in the maintainable development and the drought or the floods they are constituted in a
social fact worsened by the human behavior. Being the lacking area of rains, it is noticed in the
religious minorities the accommodation for this climatic factor taking them to notice the water as a
talent of God. To understand better that symbolism, the Theory of the Social Representations is
grounded on analysis of that specific condition of the knowledge’s construction and practices about
the water (the access, use and handling of the water) for this population deeply influenced by its
religious formation.
Keywords: Handling of the water – Sociologic study – Popular Groups of Christianity – Semi-arid
of northeast – City of Cabaceiras (Pb).

INTRODUÇÃO
O presente artigo propõe um estudo sociológico sobre o acesso e uso da água potável por
grupos minoritários entendidos como vulneráveis, segundo o Programa Nacional de Direitos
Humanos. O grupo de estudo será composto pelas minorias religiosas (grupos de cristianismo
popular) no semi-árido nordestino, tendo sido escolhida a região de Cabaceiras – PB para realizar o
estudo.
Essa região do semi-árido nordestino apresenta altos níveis de degradação, os quais,
segundo Souza et al (2007) são resultantes da extrema carência das camadas mais pobres da
população e somente um manejo racional adequado dos recursos naturais, com a recuperação das
Fórum Internacional do Meio Ambiente - A conferência da Terra 960

áreas degradadas e desertificadas, pode vir a garantir a sustentabilidade à agricultura familiar e


reduzir as vulnerabilidades a níveis aceitáveis.
Segundo Lima (1994), os projetos sociais que têm o objetivo de desenvolver as áreas
carentes do semi-árido em geral são ineficientes, por não atenderem às necessidades e não se
adequarem à realidade da população que vive nestas regiões. A grande maioria dos projetos visa
apenas prestar assistência imediata, como o abastecimento temporário de água por carros pipas,
doações de cestas básicas e frentes de emergência.
A partir dessas considerações, propõe-se um estudo sobre o manejo do recurso natural da
água pelas populações menos favorecidas da região de Cabaceiras (representando outras populações
carentes do semi-árido) e sobre como sua condição social e religiosa influencia suas práticas.
Com base nos dados levantados e levando-se em conta as considerações de Valencio et al
(2001a), a respeito de que um processo acadêmico passível de reverter a degradação sócio-
ambiental é o de colocar as temáticas ambiental e dos direitos humanos em contato, o objetivo deste
trabalho é contribuir com um estudo sociológico sobre os grupos minoritários religiosos seguidores
de um cristianismo popular em Cabaceiras e suas práticas de uso e manejo da água, a fim de
formular diretrizes para as políticas públicas de regulamentação do setor hídrico na região, com
enfoque na questão dos direitos humanos.

RELIGIÃO E SUAS REPRESENTAÇÕES SOCIAIS


A religião é uma forma de construção simbólica da realidade. Sendo assim, a forma como
os recursos naturais são explorados está diretamente vinculada à construção religiosa existente em
alguns grupos sociais do semi-árido nordestino. Dentre os recursos naturais mais fundamentais,
numa região que sofre com sua escassez, está a água, que possui uma função central tanto na
subsistência dessa população quanto nas suas práticas religiosas. A água, por esse ponto de vista, é
um elemento central sobre o qual a cultura do sertanejo no semi-árido nordestino se estrutura. As
práticas religiosas, por sua vez, fazem a mediação entre as esferas do sagrado (ou seja, o que é
divino) e o profano, sobre as quais se constroem as representações sociais que estão na base da
identidade do sertanejo, entre as quais, as que estão relacionadas aos recursos naturais e aos
fenômenos hidrometereológicos como a seca e a chuva.
Este artigo fundamenta-se na psicologia social. Pretende-se analisar a problemática do
manejo e acesso à água potável na região de Cabaceiras, pelas minorias religiosas rurais, com base
na forma como estas minorias constroem suas práticas de manejo deste recurso natural, tomando
como arcabouço teórico a Teoria das Representações Sociais de Moscovici (2003). O estudo de
como o aspecto religioso influi na relação desses indivíduos com a situação de escassez de água
será feito a partir da abordagem fenomenológica dos significados conferidos à água nas formas em
que se apresenta no ambiente e no imaginário social, a partir do estudo desenvolvido por Bachelard
(1989) em A água e os sonhos.
Uma vez fundamentado o problema, tentar-se-á identificar conflitos pelo uso e manejo da
água entre as minorias religiosas de Cabaceiras e os grupos radicados em práticas hegemônicas. As
bases teóricas para a análise desses conflitos serão buscadas nos conceitos apresentados por Elias
(2000) em Os estabelecidos e os outsiders: sociologia das relações de poder a partir de uma
pequena comunidade, e por Bourdieu (2005), em O poder simbólico. A seguir, apresenta-se uma
breve descrição da interface entre a problemática abordada neste artigo e os estudos elaborados
pelos autores de referência.

Grupo investigado: As minorias religiosas (grupos de cristianismo popular) no município de


Cabaceiras
A região de Cabaceiras, na porção central no estado da Paraíba, está localizada no polígono
das secas no semi-árido nordestino e possui um dos menores índices pluviométricos do Brasil. A
pluviometria média na região de Cabaceiras é de 280 mm anuais, distribuídos entre os meses de
janeiro a maio. Em virtude de a região apresentar solos muito expostos sem uma significativa
cobertura vegetal, ocorre degradação acelerada e erosão, propiciando o aparecimento de ravinas,
Fórum Internacional do Meio Ambiente - A conferência da Terra 961

voçorocas e o escoamento superficial dos nutrientes do solo por meio das chuvas. Atualmente, a
região encontra-se em processo de desertificação devido às práticas não-sustentáveis de manejo dos
recursos naturais.
A população local é de aproximadamente 5000 habitantes, concentrados
predominantemente na área rural. Essa população é predominantemente cristã, em sua maioria,
seguidora de um catolicismo popular. As suas práticas de uso e manejo da água são profundamente
afetadas por sua fé religiosa e, por este motivo, o grupo é investigado principalmente sob o aspecto
religioso. Pretende-se investigar como as condições religiosa, cultural e social influenciam nas
práticas de manejo da água por parte desses indivíduos e a sua relação com a condição de seca.
Segundo Souza et al (2007), os altos índices de degradação dos recursos naturais
registrados na região de Cabaceiras são resultantes da extrema carência das camadas mais pobres da
população e somente um manejo racional adequado dos recursos naturais, com a recuperação das
áreas degradadas e desertificadas, pode vir a garantir a sustentabilidade à agricultura familiar e
reduzir as vulnerabilidades a níveis aceitáveis.
No entanto, conforme salienta Lima (1994), os projetos sociais desenvolvidos com as
populações carentes do semi-árido são de natureza fundamentalmente assistencialista (p.ex.
abastecimento temporário de água por carros pipas, doações de cestas básicas e frentes de
emergência) e não promovem, de fato, o desenvolvimento sustentável da região.

As representações sociais
Moscovici, em seu estudo “Representações sociais: investigação em psicologia social”
(2003), reflete sobre a teoria psico-sociológica das representações sociais, que tem raízes na
sociologia e profunda interface com a psicologia social, com aplicações em diversas áreas das
ciências humanas. Este estudo será de grande auxílio para uma interpretação mais aprofundada
sobre a fundamentação das práticas de manejo da água pelo grupo social investigado e,
principalmente, acerca de sua relação com a condição de escassez de água e a constante ameaça de
seca.
O conceito de representação social tem seu início com o sociólogo Durkheim, mas é na
psicologia social que esse conceito ganha uma teorização mais aprofundada por Moscovici, que
reflete sobre as interações entre indivíduo e sociedade. Ela reflete sobre como os indivíduos
constroem o seu conhecimento a partir de sua inscrição social e cultural e, em outra via, como a
sociedade se dá a conhecer e constrói este conhecimento com os indivíduos. Em suma, trata das
interações entre sujeito e sociedade para a construção da realidade, ou das diversas realidades
possíveis acerca de uma mesma situação construídas pelos diferentes grupos culturais e sociais.
Água e escuridão formaram a matéria prima da criação, na compreensão judaico-cristã. No
sertão do Nordeste a tradição religiosa, de origem predominantemente judaico-cristã, foi transmitida
ao longo das gerações principalmente via linguagem oral, uma vez que se tratava de populações
extremamente carentes, a grande maioria não alfabetizada. Ou seja, é um povo de cultura mais oral
que escrita.

O aspecto psicológico, o imaginário social e a simbologia da água


Bachelard (1989) discorre sobre a imaginação que surge da materialidade do mundo em
um poema sobre a psicologia das águas. Segundo o autor, há duas formas de imaginação: a formal,
ligada ao aspecto sentimental, e a material, surgida do mundo físico. Ambas somente existem
interligadas, uma a partir da outra. O ensaio de Bachelard trabalha este aspecto a partir do estudo
psicológico sobre a água em suas diversas formas de ocorrência no ambiente: as águas calmas e
amorosas de um riacho límpido, as águas obscuras e dormentes das profundezas da terra, as águas
violentas do oceano e a água pura de beber. O sentido do imaginário sobre a água potável é o de
pureza, de fonte de vida, de alimento.
Cada elemento no mundo material é cercado de um universo de significados
correlacionados que lhe são atribuídos. A água traz um universo muito vasto de simbologias e
significados, a ela inerente, os quais, por sua vez, são intimamente ligados à condição do
Fórum Internacional do Meio Ambiente - A conferência da Terra 962

observador e aos sentimentos que lhe são atribuídos. A água tem, conforme salienta Bachelard
(1989), a peculiar característica de ser foco, lente e espelho. Ela se deixa ver, permite ver através de
si e reflete o observador. Neste sentido, as metáforas que lhe são permitidas são inúmeras, e ainda
mais abundante o universo de sentimentos a ela associados.
Também na tradição judaico-cristã, Deus constrói o mundo a partir da condição inicial em
que apenas existiam água e escuridão e a ação do criador sobre esses elementos é de separar as
várias águas em oceanos, rios, lagos, mares e águas subterrâneas. Essa tradição é uma das
importantes bases do povo do nordeste brasileiro que tem, portanto, profundas raízes de diferentes
significados para as várias formas em que a água se apresenta no ambiente.
Com o auxílio do estudo de Bachelard (1989) será possível extrapolar para a interpretação
da ausência de água no psicológico social, para o significado da escassez real ou iminente, ou seja, a
convivência do indivíduo com a constante possibilidade da falta de água; de qualquer indivíduo,
mais especificamente do sertanejo, com sua raiz cultural e religiosa. Como citaram Brandão et al
(2005), “o sertão e a água estão indissociáveis: mesmo quando não há a presença de água por perto,
ela aparece na imaginação dos personagens”. E essa imaginação se dá sob influência do aspecto
moral e religioso ligado à água.

O aspecto religioso e a compreensão sobre a água pelo grupo investigado


O sertão nordestino é uma região extremamente castigada pela seca. Este fator traz grandes
complicações à vida do Homem nordestino, que é extremamente religioso na sua formação e cujas
práticas e manejo da água são profundamente influenciadas por suas tradições religiosas, quase
sempre vindas de um catolicismo popular.
A religiosidade no Nordeste teve origem na formação das irmandades, confrarias,
associações religiosas formadas nos primeiros séculos da colonização européia. A chegada do
cristianismo foi vivida por duas correntes que terminaram por ser sufocadas: as religiões de origem
africana, trazidas pelas populações que viriam a ser escravizadas na “Terra de Santa Cruz” e as de
origem indígena, dos que eram batizados e catequizados na religião cristã e obrigados a deixar suas
práticas religiosas, para então serem também escravizados. Esses povos mantinham, ainda que na
clandestinidade, suas práticas religiosas de origem.
Com as fusões entre essas três religiões, nasceu a primeira religião essencialmente
brasileira, a Umbanda, bem como uma nova forma de catolicismo, o catolicismo popular. No sertão
do Nordeste, este catolicismo popular foi a forma de religião que mais se desenvolveu e permanece
nos dias de hoje.
Nas várias formas de religião existentes desde o início da colonização no nordeste do
Brasil, o elemento água sempre foi de grande importância e especial significado. As religiões
africanas tinham seus orixás, que eram deuses e deusas que representavam elementos da natureza.
Iemanjá era considerada a deusa do mar; Ogum, a deusa das águas doces, que morava nas
cachoeiras; Iansã representava os ventos e tempestades.
Também nas religiões indígenas, a água tinha importante papel ligado ao ritual e ao
sagrado. O batismo cristão utiliza a água como elemento de purificação, de imersão e nascimento
para a iniciação e pertença do indivíduo na comunidade cristã, como condição fundamental para a
vivência neste grupo. No catolicismo popular há santos ligados especificamente à água, como São
Pedro, que é responsável pelas chuvas, e São José, responsável pelo plantio e pela colheita.
Segundo a crença popular, se houver chuva no dia de São José – 19 de março – significa que haverá
naquele ano chuva e uma boa colheita. A colheita é feita no dia de São João Batista – 24 de junho.
Assim, a água, além se ser essencial à vida, faz também parte do imaginário religioso e da formação
religiosa do povo do semi-árido.

Dimensões sócio-culturais do acesso e uso da água


A principal diferenciação que se faz das águas na realidade do semi-árido é entre a água
que pode ser bebida e a que não pode. A água que pode ser bebida é aquela encontrada nas fontes,
nas cisternas, tanques de pedras e poços, ou trazida por carros-pipa. As águas superficiais,
Fórum Internacional do Meio Ambiente - A conferência da Terra 963

encontradas em açudes, são em geral impróprias para beber. Como a água potável é pouca, os
usuários têm de estabelecer prioridades de uso: consumo humano, preparo de alimentos, consumo
animal, irrigação das lavouras, higiene pessoal e doméstica.
Além disso, não raro ocorrem conflitos entre os diversos usuários pela água, os quais
devem ser claramente identificados, bem como as razões desses processos conflitivos. Segundo
Valencio et al (2001b), a unidade compreendida pelo meio natural e pelo meio sócio-cultural de
uma região entra em risco quando não são reconhecidos esses conflitos como elementos de escolha
que fragilizam ainda mais os grupos sociais e ecossistemas naturais já fragilizados.
Nos processos conflitivos, tende-se a estabelecer prioridades entre os grupos no acesso à
água. Esta prioridade pode se dar pela condição social, econômica, política e cultural, ou mesmo
pode não haver a condição de diferença e, ainda assim, existirem relações de poder entre os grupos,
como mostra Elias (2000) em “Os estabelecidos e os outsiders”.
Neste trabalho, o autor realizou um estudo empírico sobre as relações de poder existentes
em uma pequena comunidade industrial inglesa nos anos 50 do século XX, com base no qual
validou seu modelo teórico sobre o poder e as relações entre indivíduo e sociedade – o modelo das
configurações. Segundo este modelo, a sociedade é uma teia flexível de relações entre indivíduos
interdependentes temporal e espacialmente. Esta visão rompe com o conceito clássico de
polarização que avalia indivíduo e sociedade de forma separada.
Uma característica importante do grupo investigado por Elias (2000) é o fato da relação de
poder claramente identificada entre dois grupos daquela comunidade não ser baseada em diferenças
de raça, condição financeira e cultural, educação, credo, cor ou gênero – mas ao tempo de
residência no lugar. Identificou-se que a população estabelecida na comunidade investigada possuía
elevado grau de coesão e identidade social, ao passo que a comunidade imigrante era desarticulada.
Elias (2000) estuda os aspetos diferenciais de poder devidos a diferenciais no grau de organização
dos diversos grupos.
Elias estudou o poder relacionado a um determinado atributo daquele que o detém. No
projeto ora proposto, as relações sociais de poder serão avaliadas a partir da condição do acesso à
água, dos grupos que detêm a prerrogativa de uso e manejo deste raro recurso natural no semi-árido.
Porém, há contornos diversos que permeiam a relação do Homem com a água e que
estabelecem relações conflitivas de acesso a ela não apenas entre os grupos usuários, mas entre um
determinado grupo de elite que detém os meios de produção da água e os grupos usuários, e que
fazem da seca um grande negócio.
A água no semi-árido é vista como um dom de Deus. Existe, no mundo religioso do
Homem do semi-árido, uma certa explicação para a ausência de chuvas. A grande maioria da
população atribui a escassez de chuvas e ausência de água potável não a uma condição climática,
geográfica e histórica, mas com interpretação no campo religioso: trata-se da “vontade de Deus”. O
sofrimento, a desertificação, o processo migratório, a desidratação e a desnutrição decorrentes da
seca são fortemente associados a essa mitificação.
A parcela da sociedade que detém o poder de influência (ou poder do discurso) sobre o
restante da sociedade toma proveito dessa compreensão religiosa, e passa a compor o processo
conhecido como “indústria da seca”, o qual tem fundamento principalmente econômico e político
naquela região.
A erradicação real da seca, em lugar de políticas assistencialistas que somente reforçam as
relações de dependência entre os grupos sociais no semi-árido, de fato não acontece. A cada ano vê-
se fortalecer uma elite política e latifundiária que se beneficia da condição de extrema miséria
provocada pela seca.
Neste sentido, a análise de Bourdieu (2005) permite uma compreensão do processo de
poder identificado no discurso. Segundo o autor, o poder do discurso é proporcional à sua
hegemonia e o que ele descreve como “poder simbólico” é “esse poder invisível que só pode ser
exercido com a cumplicidade daqueles que não querem saber que lhe estão sujeitos ou mesmo que
o exercem”. (p.322). Aqueles que falam em nome da ciência ou de Deus são concebidos como
agentes privilegiados, atuantes na produção e reprodução do discurso.
Fórum Internacional do Meio Ambiente - A conferência da Terra 964

Bourdieu (2005) faz um estudo sobre o poder simbólico e interpreta o discurso como
mecanismo de constituição da realidade, função que vai muito além da simples representação da
realidade. O autor apresenta uma análise de discursos como prática social de hegemonia. Esta
análise de Bourdieu (2005) será utilizada no trabalho ora proposto como ferramenta de
interpretação das relações de poder exercidas pelas elites no semi-árido a partir da condição de
acesso à água e do discurso religioso que se faz em torno da situação de seca.

METODOLOGIA
Caracterização da área de estudo e do grupo vulnerável investigado
A partir de estudos baseados na bibliografia disponível, em índices sociais e visitas a
campo, a região do município de Cabaceiras será caracterizada de modo a possibilitar uma
investigação qualitativa das práticas de uso e manejo da água pelos seus habitantes.
Por se tratar de uma região com baixa densidade populacional (apenas 5000 habitantes no
município), cujos hábitos de manejo da água e práticas de convivência com a situação de extrema
seca são influenciados por sua fé religiosa, advinda de um modelo popular de cristianismo
(predominantemente católico), o grupo investigado pode ser considerado como minoria religiosa,
sendo, portanto, um grupo social vulnerável, conforme o Programa Nacional dos Direitos Humanos
(PDNH II).
Nesta etapa da metodologia, serão registradas todas as informações acerca da região e da
população investigada no que se refere ao manejo da água e à convivência com a seca.

Análise das dimensões sócio-culturais do acesso à água pelas minorias religiosas em Cabaceiras
A partir das entrevistas e observações de campo, será possível identificar se ocorrem
disputas pela água por diferentes grupos sociais e se existem práticas hegemônicas que favoreçam
especialmente algum desses grupos. Feita esta pesquisa qualitativa, com base na bibliografia de
apoio, poderão ser analisadas as situações de conflito e as suas principais características, tomando
como base o modelo das configurações sociais em que a comunidade é vista como uma teia de
indivíduos interdependentes que ocupam diversas funções. Nesta etapa do estudo, os autores de
referência serão Bourdieu (2005) “o poder simbólico” e Elias (2000) “Os estabelecidos e os
outsiders”.

Levantamento de projetos e ações sociais já desenvolvidos ou em desenvolvimento no local


Muitos projetos sociais foram e são desenvolvidos no sertão nordestino, p.ex. Pastoral da
Seca (sertão do Ceará), ASA (Paraíba), Pastoral da Terra (em todo o sertão do Nordeste), projeto
SECCA (Pernambuco), projeto Cisternas e outros. Esses projetos serão estudados e serão analisadas
sua metodologia e sua adequação à região de estudo, visando a dimensão humana do problema do
acesso à água potável no semi-árido, sua abrangência e possíveis causas de seu sucesso ou
insucesso. O estudo será feito com foco na dimensão humana da população atendida pelos projetos
e se esta está incorporada em seus métodos.

REFERÊNCIAS BIBLIOGRAFICAS
BACHELARD, G. (1989) A água e os sonhos – ensaio sobre a imaginação da matéria. São Paulo:
Martins Fontes, 202p.
BORDIEU, P. (2005) O poder simbólico. Rio de Janeiro: Bertrand Brasil, 322p.
BRANDÃO, C. R. et al. (2005). Um estudo sobre as águas em Gaston Bachelard. III Simpósio
Nacional de Geografia Agrária – II Simpósio Internacional de Geografia Agrária, Presidente
Prudente – SP. < http://www.geograficas.cfh.ufsc.br/geoeventos/geoagraria.pdf> acesso em 21 de
setembro de 2007.
ELIAS, N. & SCOTSON, J. (2000) Os estabelecidos e os outsiders: sociologia das relações de
poder a partir de uma pequena comunidade. Rio de Janeiro: Zahar, 213p.
Fórum Internacional do Meio Ambiente - A conferência da Terra 965

LIMA, R. F.; FERRO, F. F. & SILVA, A. DE M. (1994). Projeto SECCA: Os impactos ambientais
e o desenvolvimento sustentável na região árida de Cabaceiras – PB. Departamento de Ciências
Geográficas, Universidade Federal de Pernambuco.
MOSCOVICI, S. (2003) Representações sociais: investigação em psicologia social. Petrópolis:
Vozes, 404p.
SOUZA, R. F. et al (2007) Estudo do processo de desertificação e das vulnerabilidades do
município de Cabaceiras – PB. Engenharia Ambiental – Espírito Santo do Pinhal, V.4, n.1, p. 89-
102.
VALENCIO, N. F. L. da S.; MARTINS, R. C. & LEME, A. A. (2001a). A água como valor social:
considerações acerca de uma prática acadêmica em torno do tema. In VALENCIO, N.F. (org).
Caminhos da cidadania; um percurso universitário em prol dos direitos humanos. São Carlos:
EdufSCar, capítulo 15.
VALENCIO, N. F. L. da S.; VARGAS, M. C. & MIRANDA, C. O. (2001b). O processo de
interiorização do desenvolvimento e suas implicações ao acesso e uso da água pelo cidadão:
desafios econômicos, sociais e político-institucionais do Caso Paulista. In VALENCIO, N.F.;
MARTINS, R.C. & LEME, A.A. (orgs). Uso e gestão dos recursos hídricos no Brasil. São Carlos:
Rima, capítulo 13.
Fórum Internacional do Meio Ambiente - A conferência da Terra 966

VIII. Turismo e meio ambiente

AS UNIDADES DE CONSERVAÇÃO COMO ABRIGO ÀS ATIVIDADES DE TURISMO


SUSTENTÁVEL

Cláudio Eduardo Castro


Universidade Estadual do Maranhão – UEMA. castrouel@yahoo.com.br
Ana Rosa Marques
IBAMA-MA / Universidade Estadual do Maranhão – UEMA. anclaros@yahoo.com.br

RESUMO
A paisagem vem sendo um dos elementos mais importantes na seleção de atrativos para o
turismo, sendo ela invariavelmente o fator transformador para o turismo. A atualidade, e cada vez
mais, apresenta uma concentração da vida urbana cujos vínculos com a naturalidade vêm se
perdendo, gerando necessidades de busca duma ‘ancestralidade’ inerente ao homem. O mundo que
ora exige tal vida impôs ainda a eliminação de grande parte dos ambientes naturais, abrigados
obrigatoriamente sob a hégide da lei como Unidades de Conservação das mais diversas categorias.
Esses ambientes naturais preservados ou conservados vêm servir à crescente demanda do turismo
dos núcleos urbanos. No Brasil o número dessas unidades tem crescido, especialmente no início
deste século, dada a exigüidade dos remanescentes naturais e a exigência de se frear impactos
irreversíveis no âmbito planetário, assegurando, também locais para a prática turística. Ocorre que o
uso turístico destas U.C.’s causa impactos que merecem e devem ser geridos de forma as mais
rigorosas, como garantia de sua perpetuidade. Outra exigência foi a valoração dos recursos naturais,
para fazer frente à tão propalada idéia de progresso com base na geração de renda, mas que gera
múltiplos impactos.
Palavras chave: Turismo sustentável; Unidades de Conservação; Ecoturismo

ABSTRACT
The landscape is a more important fact to select a attractive to tourism, invariablement it is
a translator for tourism. The actuality present a crescent urban life whose the link with naturalness
no have more, being the necessity of search the ancestrally life of humanity. The actually world to
impose something still the elimination of the large part of naturals ambient, preserved in
Conservation Unitys, as Park, Reserve, Ecologic Station, Biosphere Reserve, Natural Monument.
The natural ambient to the useful the crescent claim for the tourism. In Brazil the number of
Conservation Units have expanded, especially in the born of XXI century, for one’s necessity of
revert planetary impacts and scanty naturals reminiscent, but too ensure place to tourism. The
tourism use of U.C.’s motive a impact that must to be severity manage. Other exigency is the
economic valor of the natural resources, to make front to the idea of progress based in the revenue
generation, but that generate impact multiples.
Keywords: Sustainable tourism; Conservation Units; Ecotourism.

INTRODUÇÃO
A sustentabilidade vem defrontar os paradigmas que acompanham a sociedade desde que o
ser humano assim se estabeleceu, especialmente após a segunda revolução industrial, para não se ir
mais além, com novas necessidades de desenvolvimento e de práticas que a sociedade deve realizar.
A superação deve construir uma forma de se encarar o ambiente não mais como fonte inesgotável
para as alternativas geradoras dos aparatos criados por nós, mantendo a natureza tão somente como
espaço de construção social, receptáculo de atividades, contemplando ainda o desenvolvimento
econômico, produtivo, mesmo que usando do ‘ecodesenvolvimento’ ou ‘desenvolvimento
sustentável’.
Fórum Internacional do Meio Ambiente - A conferência da Terra 967

Mensurar o quanto existe, o quanto pode gerar, quanto se perde na proteção e recuperação
de áreas naturais, qual o valor gerado pelas atividades promovidas em ambientes naturais, quanto de
recursos ainda existe, tudo isso está sendo realizado sob os alicerces paradigmáticos que baseiam a
sociedade donde hora urge a necessidade de busca de novos parâmetros no uso dos recursos. Com
respeito à sustentabilidade, Godard (2000, p. 203/4) mostra-nos que o desenvolvimento é um dos
valores centrais da sociedade e de sua ideologia, já o progresso técnico é identificado como o
progresso humano e o domínio da natureza é um objetivo a ser alcançado o que leva à escassez dos
recursos pelo desejo cada vez maior de consumo.
A prática desta ideologia remeteu o mundo ao questionamento que baseia sua manutenção,
já que se percebeu que os recursos não renováveis estariam realmente sendo usados à exaustão. Os
caminhos poderiam levar a uma paralisação total da economia, se mantidos os patamares de
consumo até então utilizados, o caminho apontou para: menor desperdício através de novas
tecnologias ou crescimento considerando o ambiente como finito?
A ideologia do desenvolvimento, posta em xeque, precisa harmonizar-se ao meio
ambiente, para tal, transformações no modelo deveriam ser assumidas, como o desenvolvimento
sustentável (UICN, 2003, p. 1-15).
A forma encontrada para preservar remanescentes ambientais e também para manter em
certo grau a qualidade de vida no planeta - até que se saiba algo sobre as conseqüências de nossas
ações sobre ele – foi um modelo de preservação de ambientes naturais calcado na efetivação de
áreas declaradas de preservação que podem ou não receber alterações, dependendo de sua categoria,
mas que dependem grandemente da gestão dessas Unidades de Conservação (U.C.s). Maria Cecília
Wey de Brito (2000, p.35-45) chama a atenção para o fato de que as áreas de preservação devam
constar de um planejamento regional amplamente discutido e que elas devem ser estabelecidas de
forma a melhor representar a biodiversidade dos países e responder aos requerimentos para sua
conservação. Ela salienta que dentre essas U.C.´s deve-se elencar as necessidades turísticas, nesse
caso a preocupação é com as necessidades dos turistas... que tenha condições de oferecer-lhe o
máximo de sua expectativa.
O ecoturismo transformou-se na alternativa mais viável para a geração de renda em U.C.
onde ganhou a expressão de “turismo sustentável”, que reconhece a comunidade local como
importante, enseja que as relações entre turistas e comunidade sejam harmoniosas e que haja uma
maximização da geração de renda para essas comunidades (COSTA, 2002, p. 64). Concorre para
esse aumento a mudança de comportamento das pessoas que viajam que agora tendem a querer cada
vez mais ter contato com a natureza, segundo Hawkins (2001, p.207-8) que salienta ainda que os
turistas de países desenvolvidos, portanto altamente urbanizados, tendem a afluírem para os países
com recursos naturais ainda preservados.
No Brasil o número de U.C.’s vem crescendo gradativamente, como que acompanhando a
mudança dos paradigmas da sociedade que apesar de crescer em grau de consumo, legítima a
preservação de ambientes naturais.

UNIDADES DE CONSERVAÇÃO FEDERAIS


A federação tem sob a tutela de U.C. um total de 291, sendo 126 de proteção integral,
43,98%, e as outras 165 de uso sustentável, ou 56,02% (AGÊNCIA BRASIL, 2007), em 2003 elas
eram preservadas em 6,3% do território nacional, com um total de 236 U.C.’s (FONSECA,
RIBEIRO, 2004, p.3). Como podemos observar abaixo o bioma com maior área preservada é o
amazônico, com mais de 7,5% do território nacional. O bioma mais ameaçado é a caatinga com
apenas pouco mais de 822.000 ha preservados, mas se considerarmos que dentro dessas unidades
estão áreas com relevo alto que recebem maior umidade e, portanto possuem ecótonos diferentes –
como a Parque Nacional de Ubajara, o da Chapada Diamantina e o da Serra das Confusões (este o
maior de todos com 502.000 ha) – podemos inferir a idéia de que a caatinga é o bioma menos
preservado no Brasil. Outro bioma quase extinto é o das florestas dos planaltos sulinos, com apenas
1,1% do território nacional ainda preservados.
Fórum Internacional do Meio Ambiente - A conferência da Terra 968

Tabela 1 - Remanescentes dos Biomas Brasileiros Protegidos pelo governo federal


BIOMAS Áreas de uso não Áreas de uso restritivo
restritivo Porcentagem do Porcentagem do território
território
Amazônia 3,5% 4,1%
Amazônia e Cerrado (transição) 0,2% 0,7%
Caatinga 0,1% =
Mata Atlântica 1,5% 0,5%
Pantanal = 0,7%
Planalto Sul Brasileiro 0,8% 0,3%
Extraído de Brito, Maria Cecília Wey de. 2000, p. 90.

Essas áreas preservadas sofrem ainda com a caça, os desmatamentos e exploração ilegal da
fauna, e os incêndios, como lembra Maria Cecília Wey de Brito (2000, p. 72) ao ressaltar ainda os
principais problemas dos parques na América do Sul que são: falta de recursos e de pessoal
qualificado; ausência de infra-estrutura e planejamento de manejo; pouca vigilância ou nenhuma;
ocupação; regularização fundiária; entorno sem planejamento e sem solução às questões fundiárias
e pressão turística, além dos citados anteriormente.
Em uma análise fria dos números podemos dizer que a Amazônia, o bioma com maior
remanescente contínuo do planeta e a maior floresta preservada que conhecemos tem também a
maior área preservada do território nacional, ao passo que os outros que sofreram com a ocupação
pela colonização do território nacional possuem o que se pode preservar política e economicamente
diante da pressão que sofrem por vários segmentos da sociedade. Por outro lado o órgão
responsável pela administração das U.C.’s, o IBAMA, vem sofrendo de longa data da insuficiência
de recursos financeiros e de pessoal para gerir as unidades a ele vinculadas. Já em 1994, a carta de
Curitiba chamou a atenção para essa questão, pois devido às dezenas de atribuições que possui
também de grande importância para a Nação, que fará com que continue a não poder responder
adequadamente às solicitações e exigências impostas pelo setor de conservação da natureza...
(carta de Curitiba, 1/09/1994).
O IBAMA vem assumindo uma prerrogativa para a administração que se encaixa na facção
ambiental que Diegues (2002, p. 15-17) chama de Conservacionista, portanto pregam a utilização
racional dos recursos naturais, considerando-se a relação da unidade com a sociedade em que está
inserida e os modelos de desenvolvimento econômico. Essa atitude vem superar a antiga premissa,
que o autor chama de facção Preservacionista, que querem apenas proteger a natureza contra o
desenvolvimento e contra os avanços tecnológicos, mantendo as áreas de U.C.’s como abrigos
intocados da natureza. A dualidade do Sistema Nacional de Unidades de Conservação, SNUC,
impõe que as unidades sejam de uso sustentável ou de proteção integral, o que contempla as
necessidades da sociedade de também usufruírem os ambientes naturais, contribuindo também para
a educação que construa uma sociedade com maior respeito à natureza.
O SNUC atribui à conservação o caráter de conservar ecossistemas e habitats naturais e a
manutenção e recuperação de populações seja em ambientes naturais ou domesticadas,
especificamente nos meios onde tenham desenvolvido suas características. A preservação é um
conjunto de métodos e políticas que visem à proteção a longo prazo das espécies, hábitats e
ecossistemas, além da manutenção dos processos ecológicos... (projeto de lei nº 2.892 e lei SNUC
nº 9.985 de 18 de junho de 2000). Podemos identificar que as U.C.’s podem abrigar várias
atividades, desde que ajudem na conservação e preservação os ambientes nelas inseridos.

O VALOR ECONÔMICO DOS RECURSOS DA NATUREZA


Uma das alternativas, senão a única, para a manutenção dos biomas de forma sustentável
foi a elaboração de uma valoração dos recursos da natureza. Essa questão remonta às primeiras
discussões sobre a longevidade dos recursos, mas com enfoque na manutenção dos mercados, neste
caso não agregando valor à escassez e finitude. Esta economia de valor de mercado chamada por
Fórum Internacional do Meio Ambiente - A conferência da Terra 969

Montibeller (2001, p. 126) de economia ambiental neoclássica, o recurso é valorizado no jogo do


mercado, cujo objetivo é a maximização dos lucros, o que forçosamente levam os valores dos
recursos naturais à patamares os mais baixos.
O autor (2001, p.124) lembra-nos a publicação da obra de Nicolas Georgescu – Roger em
1971 que serve como o divisor de águas na economia que quer dar valores econômicos aos recursos
naturais como forma de buscar uma referência às relações de mercados globalizadas que impõe
papéis específicos a cada pólo de países e localidades no planeta, o que eles vem chamar de trocas
economicamente desiguais.
Os produtores de matéria prima vendem seus produtos por valores vis praticados no
mercado, que é mantido baixo pelos grandes consumidores industriais. Os consumidores desses
bens, em contrapartida, exportam bens de consumo com valores agregados aos produtores de
matérias primas. Este quadro acaba por concentrar a geração de renda nos locais de consumo de
bens básicos, relegando a pobreza aos produtores primários. Esta desigualdade na relação de troca,
somada à dominação cultural que impõe consumo desses bens, confina algumas áreas sob um
quadro de absoluta pobreza (CASTRO, 2003, p.50-1).
Montibellier (2001, p. 128 ) aponta o livro O preço da Riqueza de 1995, de Altvater como
o marco definitivo na elaboração do diagnóstico na relação entre os países com tradição maior na
acumulação de capitais, e os fornecedores de matérias primas. Uma vez que os preços dos produtos
primários não contém o valor do desgaste ambiental e social, levando ao aumento de “entropia” na
região de extração, e a “sintropia” positiva países consumidores de recursos. Os benéficos ficam,
pois, nos países consumidores desses bens, ou seja, nos países sintrópicos.
Houve algumas tentativas práticas de valoração dos recursos naturais que acabaram por
trocar a dívida de alguns países por áreas preservadas (AGUILAR, 1992; GOELDNER, 2002), mas
como ressaltou Diegues (2002, p.19) em O mito da natureza intocada isso acabou por tornar os
banqueiros internacionais mais ricos ao invés de minimizar os problemas dos devedores. No Brasil
o órgão responsável pela mensuração das áreas naturais, o IBAMA, usa uma metodologia da
Convenção sobre Diversidade Biológica, que considera a conservação e uso sustentável do recurso.
O IBAMA (2002) aceita e assume essa valoração no Brasil, propondo que o Valor
Econômico Total, assente-se nos seus valores de uso e de não-uso. São valores de uso direto e
indireto que dão, para o primeiro caso, e de usos futuros, no segundo, o valor total. A base da
valoração nesta metodologia é o valor de mercado, mas assegura a valoração mesmo que estes não
existam.
Valorar os recursos naturais segundo o mercado nada mais é que garantir a perpetuação do
paradigma que lhes faz uso irrestrito e voraz desde que a geração de capitais passou a ser a base do
sistema social. É necessário que se faça uma valoração baseada no bem estar social e na
manutenção da qualidade de vida de todos os povos contemporâneos e vindouros, só assim poder-
se-á falar em sustentabilidade e assumir-se um valor ao ambiente natural.

O USO TURÍSTICO DAS UNIDADES DE CONSERVAÇÃO


As U.C.’s brasileiras reservam um enorme potencial à atividade de turismo que busca o
contato com a natureza, uma vez que abrigam remanescentes de vários ecossistemas e exemplares
únicos da história da natureza e da humanidade, como são, por exemplo esculturas em rochas,
animais pouco comuns e sítios arqueológicos. Esses atrativos contribuem para uma grande
atratividade dessas unidades para a visitação por pessoas.
Há um grande debate sobre como o turismo em áreas naturais, ou ecoturismo, pode
contribuir com a qualidade de vida das populações abrangidas pela atividade, dentro ou fora dos
limites das áreas tombadas. Costa (2002, p.46) enumerou alguns benefícios que podem advir da
atividade de turismo nesses ambientes, os quais resumo a seguir: geração de emprego local; geração
de divisas; aquecimento da economia local e no entorno; estímulo ao aperfeiçoamento das infra-
estruturas em geral; instalações recreativas que são usadas pela população local; organização que
ajuda na manutenção da área visitada contribuindo para sua manutenção.
Fórum Internacional do Meio Ambiente - A conferência da Terra 970

A contribuição benéfica do ecoturismo referenciada na geração de renda e infra-estrutura à


comunidade é óbvia, mas deve ser relativisada e bem planejada, com o que concorda sucintamente
o autor. Em sua obra Costa (2002, p. 67-119) apresenta a evolução das atividades turísticas no
Parque Estadual Paulo César Vinha, no Espírito Santo e enumera os grandes êxitos conquistados
pela população e área de entorno, mas não deixa de mostrar-nos os problemas que advêm da falta de
planejamento, fiscalização, monitoria e plano de manejo.
A construção de estrada pedagiada, de melhor qualidade, acelerou a busca de alternativas
de caminhos gratuitos que adentram ao parque, os veículos que ao encontrarem areia fofa acabam
por criar estradas calçadas com argila, barro, brita e terras de outros lugares, alterando a paisagem e
o solo. Jipeiros e bugueiros começaram por usar o ‘desafio’ das areias para praticar trilhas, que
ficam lotadas em feriados prolongados e na temporada de férias. Inclusive realizam uma atividade
de caminhada em trilha criada por eles, sem planejamento, estudo de impacto ou mesmo
monitoramento. Uma caminhada criada para rememorar Anchieta, que peregrinou por lá, acabou
abrindo inúmeras outras trilhas laterais que ficam repletas de lixo, pois muitos turistas ficam na área
por mais de dois dias. Um problema gravíssimo é a prática da fogueira que provocou alguns
incêndios no parque. Atropelamentos da fauna silvestre são também comuns, e em maior número na
área da praia.
Outro exemplo de turismo em área natural citado por Bròckelman (2002, p.248-250) é o
grande número de turistas que afluíram ao parque Khao Yai, na Tailândia. Lá, um grande número
de pessoas passeia na estrada que ladeia a área e vai visitar as cachoeiras , faz pique nique, assiste a
conferências e apresentações feitas pelo pessoal do parque. Pelos portões do parque passam mais de
1,2 milhão de visitantes anualmente, em sua maioria do próprio país. Apesar de interferir na vida de
elefantes e bois selvagens, a grande massa populacional que se desloca para lá tem facilitado a
manutenção da área pela simpatia causada pelas visitas realizadas. A maior parte da população de
BangKoc já esteve no parque, ajudando na afirmação duma ética ambiental.
Lá nascem três bacias da Tailândia e o rio Mekong quem vêm sendo cobiçadas para a
construção de barragens, mas das quatro até agora planejadas, três foram canceladas e uma passa
pelo processo político aberto criado graças à educação desenvolvida que alterou a representação das
pessoas que querem participar das decisões. Fato relevante é a preservação do boi selvagem, que
teve sua população aumentada. Tantos benefícios só puderam ocorrer graças a combinação de
...fatores fortuitos: pessoal de proteção motivado, com encorajamento e participação de ONG’s,
pesquisadores e imprensa; proteção de minas de sal-gema críticas e das pradarias; e manutenção
de boas relações com os aldeãos que vivem nas proximidades dos hábitats críticos (op. cit, p. 250).
No campo das experiências bem sucedidas de turismo em ambientes naturais, o Brasil
apresenta alguns exemplos dos quais venho ultimar, como o da RPPN (Reserva Particular do
Patrimônio Natural) de Salto Morato situada em Guaraqueçaba, litoral do Paraná, com um total de
1.716 ha de vegetação que transitam da floresta atlântica aos campos de altitude. A área contou com
uma discussão ampla das possibilidades ecoturísticas, incluindo um aquário natural em um meandro
causado pela ação antrópica; o Salto Morato, queda d’água de 80 metros; centro de visitantes; portal
de entrada; casa de hóspedes; centro de pesquisa; lanchonete; área para camping, para churrasco e
pique nique.
Costa (2002, p. 121-131) realizou uma avaliação dos efeitos positivos e negativos de Salto
Morato e constatou vantagens mais que desvantagens. Nessa avaliação, mostrada em tabela abaixo,
notamos que quanto aos aspectos ambientais, há explicitamente maiores ganhos quanto à proteção,
regeneração e perpetuidade dos recursos como um todo. Nos aspectos sócio culturais, há evidente
perda de um ingrediente importante na dinâmica social, o uso social do espaço e mudanças culturais
vinculadas à renda. Isto pode ser visto como paradoxal, uma vez que um dos aspectos positivos é a
geração de renda, sem a qual a nova cultura não se estabelece, então ela é item obrigatório no
cenário ações que atinjam comunidades e preservação. Ainda a valorização da cultura local,
elencada como positiva, não pode ser considerada, uma vez que essa cultura é apenas o quadro de
uma comunidade que não há mais, senão os mutantes dessa cultura e seus produtos passam a ser
Fórum Internacional do Meio Ambiente - A conferência da Terra 971

objeto de lucro, não mais alternativa de consumo comunitário encontrada na relação ambiente-
sociedade.

Tabela 2 – Impactos de plano ambiental implementado na RPPN Salto Morato


Plano Ambiental
Positivos Negativos
Área degrada pela criação de búfalos recuperada; Poluição sonora e ambiental;
Acesso somente área preservada e ou recuperada; Impactos à fauna;
Monitoramento e pesquisas de carga realizados pela
própria fundação Boticário, UFPR e outras instituições;
Mudança do hábito predatório da comunidade em
relação a área.
Sócio culturais
Positivos Negativos
Alternativa de trabalho em substituição ao hábito Mudanças significativas nos costumes
predatório; da população local gerando choques
Acesso gratuito à reserva da população de entorno sociais;
através de cadastro; Diminuição das alternativas de lazer,
Divulgação e valorização da cultura através de folheteria agora usadas para o turismo;
e venda de produtos locais; Elevação do custo de vida;
Aumento do ganho de 1 para 3 salários mínimos por
família
Montada a partir do livro Unidades de Conservação, matéria prima do ecoturismo, Patrícia Côrtes
Costa, São Paulo: Aleph, 2002, p. 127-131.

A reserva de Salto Morato tem um planejamento alicerçado por pesquisadores e em ações


constantes na efetivação de um turismo sustentável, gerador de renda local e que busca a
transformação dos paradigmas de seus visitantes e população de entorno, cientes das
transformações que gera a atividade turística em áreas preservadas, daí a positividade da avaliação
referida acima, calcada na solução econômica local ante a necessidade de preservação.
Ela representa uma experiência exemplar de promoção de mudanças benéficas à
conservação e restauração de ambiente natural. Não podemos deixar de salientar que a mantenedora
dessa iniciativa é uma empresa de capital nacional que investe na imagem de benfeitora para o
ambiente, uma vez que seus produtos usam a flora nacional como base de formulação de perfumes,
sabonetes e desodorantes e que certamente os investimentos em marketing e preservação são
vantajosamente recompensados com dividendos do mercado consumidor.

PALAVRAS CONCLUSIVAS
As U.C.’s por abrigarem remanescentes de ambientes naturais, hoje tão raros, têm um
valor que vai além do que se pode auferir com as teorias ora colocadas e elas têm o dever social de
contribuir com a qualidade de vida da geração atual de ser garantida por esta para as gerações que
hão de vir. A questão da sustentabilidade para a manutenção desses ambientes é uma premissa que
deve ser amplamente discutida uma vez que várias experiências têm demonstrado a aplicabilidade
pouco efetiva de manejos realmente sustentáveis.
O turismo em ambientes naturais vem apresentando crescente demanda e as áreas naturais
preservadas por lei são as mais aptas a essa prática. Porém pela dinâmica da visitação turística os
impactos são uma constante, sejam eles positivos ou não. Infelizmente dos casos apresentados os
mais comuns relacionam-se ao que ocorre no Espírito Santo, onde a busca por oportunidades de
visitação ao ambiente prevalece ao bom senso e gera inúmeros impactos negativos.
Outros dois exemplos salientaram a significância de bons manejos e resultados ao
ambiente natural cada qual com suas características específicas, um pelas circunstâncias e outro
Fórum Internacional do Meio Ambiente - A conferência da Terra 972

pelo planejamento minucioso, que tanto é pregado e propalado pelos planejadores e cientistas que
lidam com turismo em áreas naturais preservadas. Mas que estes casos são ilhas na realidade
nacional, onde a escassez de recursos é a fonte principal do planejamento e monitoramento da
atividade ecoturística.
Fica claro que há uma busca de alternativas para a relação conflituosa entre o uso dos
recursos pela sociedade e a permanência deles para as gerações vindouras, e mesmo com a
interferência cultural nas comunidades, o caminho buscado é o de equilibrar a convivência e a
preservação. Se neste momento o valor econômico ainda tem alta significância, podemos crer que
estas alternativas vêm-se construindo baseadas em avaliações que primam por aperfeiçoamentos
constantes ante os conflitos gerados pelas mudanças necessárias, mas que são resultado de
constantes discussões dos mais variados segmentos do saber, contando sempre com bases na
educação para uma sociedade de novos paradigmas.

REFERENCIAS BIBLIOGRAFICAS
AGÊNCIA BRASIL. Decreto amplia em 150 mil hectares o total de Áreas preservadas no
Brasil. Disponível em: http://www.agenciabrasil.gov.br/noticias/2007/12/21/materia.2007-12-
21.1307344374/view, capturado em 28/12/2007.
AGUILAR, M; Marcelo, W. Deuda ecologica. Santiago: Instituto de Ecologia Política, 1992 .
BRITO, Maria C. de. Unidades de Conservação interações e resultados. São Paulo:
Annablume/Fapesp, 2000.
BRÒCKELMAN, Srikosamatara. Conservação em áreas Protegidas da Tailândia: uma
Diversidade de Problemas, uma Diversidade de Soluções. In: Tornando Parques eficientes,
estratégias para a conservação da natureza nos trópicos, org. Terborgh, John et all. Curitiba:
UFPR/Fud. Boticário, 2002.
CASTRO, C.E. Fresca, Tânia. Valoração dos recursos naturais, quantificação sob o paradigma da
dominação e do mercado. XIX Semana de Geografia, Dpto Ciências Exatas- Universidade Estadual
de Londrina – Associação de Geógrafos Brasileiros, 2003
COSTA, Unidades de Conservação. Série turismo. São Paulo: Aleph, 2002.
DIEGUES, A.C. O mito moderno da natureza intocada. 4ªe. São Paulo: Annablume-Hucitec
Napaub-USP, 2002
FONSECA, Larissa Nacif; RIBEIRO, Eduardo Pontual . Preservação ambiental e crescimento
econômico no Brasil. In: anais Anpec, 2004, ÁREA 5: Economia Regional e Economia Agrícola,
JEL: R14, Q56. ANPEC, 2004. Disponível em: http://www.anpec.org.br/encontro2004/artigos/
A04A117.pdf
GODARD, Olivier. Gestão dos Recursos Renováveis e desenvolvimento: Novos desafios para a
pesquisa ambiental. Org. Paulo Freire Vieira e Jacques Weber, trad. Anne Shophie de Pontbriand e
Cristina de Lassus Vieira, 2 ed. São Paulo: Cortez, 2000.
GOELDNER, Charles R; J.R. Brent R; Robert, W. McIntosh Turismo, princípios, práticas e
filosofias. Trad. Roberto Cataldo Costa, 8e, Porto Alegre: Bookmam, 2002
HAWKINS, Donald E.; Kahn, Maryan M. Oportunidades para o turismo ecológico nos países em
desenvolvimento. In: Turismo Global, org: Theobald, Wilian F. trad: Anna Maria Capovilla, Maria
Cristina Guimarães Cupertino, João Ricardo Barros Penteado. São Paulo: editora Senaca, 2001.
IBAMA. Lista das Unidades de Conservação Federais (não inclui as RPPNs). Disponível em
www.ibama.gov.br; acessado em novembro de 2003
IBAMA. Valoração do Meio Ambiente. Disponível em www.ibama.gov.br, capturada em
21/08/2002.
UICN. Recomendaciones del Quinto Congreso Mundial de Parques. Versión en español, Durban,
setembro de 2003, disponível em: http://iucn.org/themes/wcpa/wpc2003/espanol/ index.htm,
capturado em 10/12/2003, 92p.
Fórum Internacional do Meio Ambiente - A conferência da Terra 973

AS CATEGORIAS DE PERCEPÇÃO DO ECOTURISTA EM SUA RELAÇÃO COM A


NATUREZA COMO SUBSÍDIO PARA O DESENVOLVIMENTO DA EDUCAÇÃO
AMBIENTAL NO PARQUE ESTADUAL DA SERRA DE CALDAS NOVAS/GO

Laura Marina Jaime RAMOS


Campus Samambaia, Instituto de Estudos Sócio-ambientais. CEP 74001-970 Goiânia, Goiás - laurajaime@pop.com.br
Sandra de Fátima OLIVEIRA
Campus Samambaia, Instituto de Estudos Sócio-ambientais. CEP 74001-970 Goiânia, Goiás sanfaoli@iesa.ufg.br

RESUMO
Esse artigo discorre a respeito das categorias de percepção de natureza que os ecoturistas
do Parque Estadual da Serra de Caldas Novas - GO (PESCAN) representam e suas relações com o
ambiente natural. Para isso, considera-se que as áreas naturais preservadas como unidades de
conservação (UCs) têm como um de seus objetivo a promoção da educação ambiental (EA) aliada
ao uso turístico. O próprio ecoturismo se constitui enquanto uma prática turística de caráter
intrinsecamente educativa. O planejamento do uso público e das ações educativas a serem
implementadas nas UCs devem considerar a percepção e as relações construídas com a natureza.
Isso facilita a receptividade das ações de EA por parte do visitante e auxilia no desenvolvimento de
práticas adequadas à uma relação mais harmoniosa entre os seres humanos e a natureza e
principalmente, contribuir para mudança dos paradigmas antropocêntricos da sociedade em relação
à natureza.
Palavras-chave: Percepção, categorias de análise, ecoturismo e relação com a natureza.

ABSTRACT
This paper has as intention to present and to discourse regarding the categories of
perception that the ecoturistas of the Parque Estadual da Serra de Caldas Novas - GO (PESCAN)
represents, and which the relations established for these and the natural environment. Considering,
for this, that the preserved natural areas as units of conservation (UCs) have as the one of its
objective promotion of the environmental education allied to the tourist use, the proper ecoturismo
if it constitutes while tourist practical one of educative character. The planning of the public use and
the educative actions to be implemented in the UCs must consider the perception and the relations
constructed with the nature. This facilitates of the actions of environmental education on the part of
the visitor, assisting in the development of practical adjusted to each created expectation, beyond to
favor a more harmonious relation between the human beings and the nature.
Keywords: Perception, categories, ecotourism and relation with the nature.

RELAÇÃO COM A NATUREZA E A APREENSÃO DE SIGNIFICADOS DO PARQUE


ESTADUAL DA SERRA DE CALDAS NOVAS - GO.
As Unidades de Conservação da Natureza (UCs) desempenham uma importante função
social quando promovem ações de Educação Ambiental (EA) aliadas ao seu uso lúdico e recreativo.
Essa integração entre visitantes e natureza possibilita o desenvolvimento de uma postura ecológica
harmoniosa, quando cada indivíduo consegue perceber-se como parte integrante da natureza. A
partir daí, o entendimento e a adoção de atitudes respeitosas e afetivas correspondentes às inter-
relações e à energia dinâmica próprias do ambiente tornam-se mais fáceis de serem compreendidas
pelos indivíduos. A EA é parte fundamental desse processo, quando possibilita a mudança do
paradigma de uma percepção antropocêntrica da sociedade.
A paisagem é a escala visível da relação entre o ser humano e a natureza; é através dela
que o turista percebe o lugar visitado. Um contato mais direto com o meio natural deve ser a porta
de entrada, uma excelente oportunidade de se inserir ações eficientes de EA para os turistas, além
de se constituir um dos principais objetivos das UCs. É através desse contato, e da percepção que o
turista tem da nova paisagem, que a EA deve ser desenvolvida. Além disso, a percepção está
diretamente relacionada ao fato de que a EA tem no turismo um grande caminho como processo
cognitivo pela experiência direta com o local visitado, como propõe Forgus (1971, p03):
Fórum Internacional do Meio Ambiente - A conferência da Terra 974

A percepção pode ser entendida como o processo pelo qual um organismo recebe ou
extrai certas informações acerca do ambiente. A aprendizagem é o processo pelo qual
essa informação é adquirida através da experiência e se torna parte do armazenamento
de fatos percebidos.

Em relação às UCs, e ao Parque Estadual de Serra de Caldas (PESCAN), objeto de nosso


estudo, em especial, é importantíssimo que todas as suas características de relevância ecológica e
social sejam aproveitadas para o desenvolvimento de programas de EA. Uma vez que, o conteúdo
apreendido pelo turista através da experiência e da percepção da paisagem natural deve ser
sensibilizador de tal forma que propicie o seu aprendizado, a sua cognição. E para que se possa
entender melhor esse processo, é preciso propor uma explicação, conforme Oliveira, L.:
Ao falar de percepção ambiental, é preciso diferenciar entre sensação, percepção e
cognição: sensação significa que há um órgão corporal para realização da percepção,
enquanto percepção tem o sentido de apreensão de uma realidade sensível, acrescida de
uma significação e cognição tem a conotação de conhecer (-se) e construir o objeto do
conhecimento. (OLIVEIRA, L., 2002, p.191 grifos nossos)

A experiência turística nesta UC deve ter, portanto, um caráter não apenas contemplativo,
mas também educativo quando permeada por ações efetivas de EA. E é nesse sentido que permeiam
os objetivos da nossa pesquisa. A percepção dos indivíduos e suas relações construídas com a
natureza, neste trabalho apresentada em categorias, estabelecidas através da realização de uma
pesquisa empírica, devem ser consideradas na propositura e desenvolvimento das ações de EA e no
planejamento do uso público nas UCs. Isso porque as ações de EA devem contribuir para mudança
dos paradigmas antropocêntricos da sociedade em relação à natureza, o que só se é possível à
medida que se tem conhecimento desses paradigmas vigentes que se pretende mudar. Assim a EA
passa a ser melhor compreendida por parte do visitante, auxiliando no desenvolvimento de práticas
adequadas a uma relação mais harmoniosa entre os seres humanos e a natureza.

O PARQUE ESTADUAL DA SERRA DE CALDAS NOVAS E SUAS CARACTERÍSTICAS:


A Serra de Caldas Novas está localizada a aproximadamente 170 km de Goiânia, capital do
Estado de Goiás, e a aproximadamente 290 km de Brasília, DF (Fig. 1). De acordo a Agência
Ambiental (GOIÁS, 1998), a Serra de Caldas está situada a 1.043 metros de altitude em relação ao
nível do mar e pertence a microrregião 015 ou Meia Ponte, conforme a classificação do Instituto
Brasileiro de Geografia e Estatística - IBGE. Segundo diversos estudos empreendidos na região, a
Serra de Caldas constitui uma das mais importantes áreas de recarga dos aqüíferos termais da região
de Caldas Novas e Rio Quente.
Fórum Internacional do Meio Ambiente - A conferência da Terra 975

Figura 1 - Localização dos Municípios de Caldas Novas e Rio Quente e do Parque Estadual da
Serra de Caldas – Goiás.

Criado em setembro de 1970 sob a Lei n° 7.282, o PESCAN, uma UC de Proteção


Integral, localiza-se entre os municípios de Caldas Novas e Rio Quente (Fig.1). Estas cidades se
caracterizam como as principais receptoras de turistas do Estado de Goiás, atraindo mais de um
milhão de visitantes por ano, como apontado pela Secretaria de Planejamento e Desenvolvimento de
Goiás – SEPLAN (GOIÁS, 2005), constituindo o importante pólo turístico das Águas Quentes,
conhecido por turistas brasileiros e estrangeiros. Os principais atrativos turísticos de lazer, educação
e recreação do PESCAN são: Centro de Visitantes, composto pelo Museu da Fauna e pela Sala de
Leitura; Trilha da Cascatinha, que possui cerca de 950 metros e passa por áreas de mata e de
cerrado; e a Trilha do Paredão, que possui cerca de 1.500 metros de extensão, em trechos de cerrado
e campo sujo, passando pelo córrego de Caldas.

ESTABELECENDO CATEGORIAS: A PERCEPÇÃO DOS TURISTAS E A RELAÇÃO COM A


NATUREZA E O PESCAN
Os diferentes entendimentos, e as várias formas de relações que cada indivíduo estabelece
com a natureza, influenciam diretamente nos distintos tipos de abordagens educativas, cujo
conteúdo deve ser inserido nos programas ou ações de EA no uso público das UCs. Esses conteúdos
devem, portanto, se adequar ao relativo esperado por seu público correspondente. Isso porque, seus
objetivos devem atuar, especificamente, na mudança de determinados paradigmas que esses
indivíduos possuem em relação à natureza. O levantamento do que a área natural representa para
cada sujeito auxilia, portanto, na formulação de estratégias para implementação das atividades
educativas nas UCs.
A pesquisa foi realizada no ano de 2006, nas dependências do parque, durante os meses de
janeiro e fevereiro. Foram entrevistados 30 turistas entre 19 e 53 anos, das mais diversas regiões do
país. As questões principais utilizadas para análise foram: a) “Como é e para que serve uma área
natural como esta aqui?” e b) “O que de mais importante e interessante você encontrou aqui?”.
Estas questões, de caráter subjetivo, foram aplicadas com intuito de levantar traços representativos
das percepções de natureza e de área natural, e sua relação com os indivíduos, elementos esses
trazidos de seu meio social e configurados posteriormente à experiência no PESCAN. É importante
salientar que, em alguns relatos, nos quais aparece o termo meio ambiente, entendemos sua
correspondência ao aspecto natural do mesmo. Isso porque, para a maioria das pessoas, meio
ambiente é entendido por seu aspecto unicamente natural, e não pelas demais interações que o
Fórum Internacional do Meio Ambiente - A conferência da Terra 976

compõem. Desse modo, a partir dos depoimentos obtidos, estabelecemos seis categorias que
representam a relação que os visitantes entrevistados no PESCAN estabelecem com a natureza,
conforme apresentamos a seguir.
Área natural como alternativa e oposição ao ambiente urbano. Intenção criada de retorno.
Alternativa para a melhoria da qualidade de viver.
Pra quê que serve? Essa área natural aqui... É bem bonito! E assim, da maneira que nós
temos indústrias poluindo, isso aqui é... As pessoas da cidade grande, com indústria, é muito
poluído! Agora isso aqui, é uma beleza, sabe? Não tem igual.
Turista A(1) – interior de Goiás

Olha só, a sensação que agente tem, realmente é de que, a natureza é outro astral, outra
energia que traz pra gente, principalmente pra gente que vive em grandes centros, e só dentro de
salas com ar condicionado. Realmente é fantástico.
Turista M(1) – Brasília, DF.

Ah, eu acho muito importante por estar preservado e aberto ao público né? Pro pessoal
conhecer né?! Que estão tão acostumados com cidade e prédio, e aqui você pode entrar dentro de
uma mata, acho que praticamente virgem né? Nativa mesmo né?
Turista C(2) – São Paulo, SP.

Nos relatos acima apresentados, podemos perceber que a representação de natureza se dá a


partir de sua importância enquanto alternativa ao modo de vida da maioria das pessoas. Vivendo em
centros urbanos, as áreas naturais, em especial àquelas protegidas em forma de parques, constituem-
se como uma alternativa de fuga do cotidiano gerado nos modos de vida das populações urbanas. O
retorno a essas áreas configura-se como a única chance de contato destas populações com a
natureza.
Olha só, eu até vinha meditando ai pelo caminho, é eu acho que o povo mais avançado
que tem são os monges do Tibet do que o americano que vive em alta tecnologia. Eu acho que eles
já passaram... eles tão a frente, agente um dia vai ter que chegar, talvez a mesma percepção deles
em termos de uma relação deles com o ambiente e com as pessoas Eu acho é que isso que mostra,
talvez, a evolução do ser humano, e não a involução que agente vê por causa de tecnologia e
economia. Então, eu acho que é essa a sensação.
Turista M(1) – Brasília, DF.

O relato deste visitante nos apresenta uma percepção de natureza dada pela importância de
um contato mais respeitoso e próximo com a mesma, representado pelo modo de vida de
populações tradicionais, em contraposição à dependência de tecnologia das populações urbanas. A
sabedoria estaria, portanto, num possível retorno ao convívio com a natureza e na mudança de
valores em relação à mesma.
... acho que ter mais espaço como esse, pras pessoas conhecerem, pra saber, pra valorizar
o ambiente... Porque é lindo, é maravilhoso, mas pouquíssimas pessoas têm... A pessoa que mora
na cidade, e que vem aqui conhecer muda a consciência ecológica, cria outra relação com o meio
ambiente...
Turista F(1) – Goiânia, GO.

Neste relato, que se assemelha ao anterior, a possibilidade dos moradores de centros


urbanos de se relacionarem com a natureza, de uma forma mais próxima e respeitosa, permitiria
uma mudança na relação com o seu meio ambiente. A partir da experiência na natureza, os valores
relacionados ao respeito com o meio ambiente seriam alterados. Esse relato nos fundamenta para
ressaltar a importância de se fazer cumprir a função social das UCs: educação para a vida a partir da
oportunidade de recreação.
Fórum Internacional do Meio Ambiente - A conferência da Terra 977

O que eu achei mais interessante foi a diferença do ar, qualidade do ar. Quando agente ta
na cidade que tá poluído, agente não para pra pensar. Mas quando agente tá diante de um ar bem
puro, agente vê a diferença, é bem melhor...
Ah é muito bom né? Agente sente um ambiente totalmente diferente do da cidade né?... é
assim, tão fresquinho, tão bom...
Turista D(1) – interior de Goiás

A natureza aqui estaria representada como o ambiente da melhoria na qualidade de viver.


Novamente, o desagradável convívio com os diversos problemas ambientais das cidades é
amenizado com o contato proporcionado pela área natural do PESCAN.
A natureza do PESCAN como atrativo turístico: um complexo de atrativos naturais da
paisagem, árvores, animais e cachoeiras. Uma percepção voltada ao macrocosmo.
Ah... o prazer do turismo né? Realizar um passeio... e conhecer o lugar que eu não
conheço... Natureza... viva, nova e virgem... basicamente... uma cascatinha...
Turista C(4) – Porto Alegre, RS.

É que agente ta fazendo um passeio né? Uma excursão pra Caldas Novas e um dos pontos
turísticos trabalhados é a Serra, como ponto turístico...
Turista V – Goiânia, GO.

A atratividade do pólo turístico das águas quentes está concentrada, especificamente, no


uso dessas águas. Algumas vezes, os turistas procuram outras possibilidades de lazer na região, e o
PESCAN acaba sendo considerado um ponto turístico alternativo. Os turistas visitam-no, muito
mais como meio variado de lazer do que pela própria busca do contato com a natureza. Por esse
motivo, os elementos percebidos como importante por estes turistas estão intrinsecamente
relacionados com aqueles os quais possibilitam a recreação, como forma de distração alternativa.
Ah, mais assim... a vegetação mesmo, as plantas, algum animal... Eu gosto muito de água,
então é a cachoeira mesmo. O que eu mais gosto é água... água limpa... É isso que eu vou levar pra
mim desse parque.
Turista AC – Goiânia, GO.

O que vi de mais importante desse parque? São as árvores viu? Vi umas árvores assim..., a
diversidade, são umas finas, eu vi umas grossas, assim..., bem diferentes.
Turista A(1) – interior de Goiás

Ah! Eu espero encontrar cachoeira... eu adoro... E bastante verde, árvores, montanhas,


pedras...
Eu gostei muito da variedade de árvores que tem, não é? Não é repetido, muito repetido, a
variedade de árvores...
Turista C(2) – São Paulo, SP.

A natureza percebida na experiência no PESCAN é representada, nos relatos acima, a


partir de macroelementos, cuja referência se dá pela função que os mesmos possam desempenhar
para os turistas. Funções estas diretamente ligadas ao visual e ao recreativo. A natureza estaria,
então, sendo representada como um complexo de árvores, de animais e de cachoeira.
...agente teve bem próximo da natureza, vimos muito coisa, só não vimos animais né? Mas
foi até bom, que eu tenho medo... mas foi bom...
Turista E(2) – Manaus, AM.

Eu não vi nenhum animal, né? O que eu senti bem mesmo, o que eu mais gostei foi a
sensação mesmo, do passeio...
Turista D(1) – interior de Goiás
Fórum Internacional do Meio Ambiente - A conferência da Terra 978

A percepção baseada no visual, que gera uma visão de mundo fragmentada, dificulta uma
observação da natureza que vai além dos elementos percebidos pelos olhos. O ouvir, o sentir, seja
por meio do contato seja pelo desenvolvimento da intuição, e o cheirar são formas de percepção
normalmente abandonadas pelos indivíduos em nosso contexto social. Nesse sentido, os visitantes
de uma área natural esperam visualizar algum elemento da fauna local, mas se esquecem de
observar os pequenos fragmentos que os mesmo imprimem na natureza. Esquecem-se também da
existência de um micro-universo, presente em todas as relações da natureza, bem como do ultra-
universo, aquele que só podemos perceber por meio dos cheiros, do contato e das sensações.
O Cerrado como o ambiente do diferente, da paisagem exótica, que merece ser preservado.
Da aproximação para o conhecimento para a valorização. Ou valoração?
De conservar o Cerrado né? Que hoje é o Bioma mais devastado, por causa dos pastos
né? É o Cerrado....
Turista A(1) – interior de Goiás.

Conhecer o parque mesmo, que eu não conheço.... Já passeei nos parques lá de São Paulo,
mas aqui não. No Cerrado nunca... eu acho que é tão diferente...
Turista C(1) – Taubaté, SP.

Eu vim, pra conhecer a questão da conservação do Cerrado, da fauna, flora, a


manutenção... eh..., agente sabe da importância de preservar o Cerrado...
Turista G(1) – Brasília, DF.
O Cerrado é apresentado nestes relatos como o elemento importante da existência do
parque, bem como um motivador da visita ao mesmo. Percebemos uma vontade intrínseca nesses
indivíduos de conhecer este Bioma, principalmente por não terem essa oportunidade
cotidianamente, a não ser por meio de uma visita a uma área preservada. No primeiro dos três
relatos apresentados acima, o turista concebe a problemática da devastação do Cerrado, e da falta do
mesmo como lugar de vivência, quando o contrapõem à existência dos pastos. Morador do interior
do Estado de Goiás, região onde, provavelmente a produção agropecuária é praticada, a relação que
este indivíduo estabelece para a importância da preservação do Cerrado se dá a partir do
crescimento dos impactos gerados por esta atividade na sua região. E a partir desse crescimento, o
indivíduo transfere a necessidade e importância da UC como mantenedora do bioma.
... ter mais espaço pras pessoas pra conhecer, pra saber, pra valorizar o Cerrado...
Porque é lindo, é maravilhoso, mas pouquíssimas pessoas vêm... A pessoa que mora na cidade, e
que vem conhecer muda a consciência ecológica, cria outra relação com o meio ambiente...
Turista F(1) – Goiânia, GO.

Sem dúvida alguma, pra preservação na sua totalidade. Tanto a flora, quanto a fauna, é
fauna né? A minha geração não tinha uma consciência ecológica, tudo ‘porcão’... sujava rio,
jogava plástico que fica 100 anos pra derreter... Mas hoje não. Eu mudei, eu seria incapaz de
quebrar uma árvore, ou até mesmo agredir um bichinho, alguma coisa assim.
Turista G(2) – São Paulo, SP.

Ah! Acho que principalmente pra conservação, pra os nossos descendentes né? Um lugar
de educação mesmo, ambiental. O que eu pude observar é a preservação do Cerrado mesmo né? E
o conhecimento das espécies, das plantas...
Turista AC – Goiânia, GO.

A natureza do Cerrado existente no PESCAN aparece nestes relatos como uma


oportunidade para os visitantes adquirirem conhecimento em relação às suas peculiaridades.
Podemos estender essa reflexão quando novamente apontamos à função social de uma UC. Além, é
claro, da preservação e conservação da biodiversidade do Cerrado, neste caso, as UCs são
fundamentais como espaços educativos, principalmente quando com a finalidade da visitação. Cada
Fórum Internacional do Meio Ambiente - A conferência da Terra 979

visitante torna-se um sujeito potencialmente aberto à aquisição de novos conhecimentos. Cabe à


implementação de uma política de EA e a execução de seus devidos programas e ações, para que
esses conhecimentos adquiridos sejam relevantes ao ponto de serem interiorizados pelo indivíduo,
transformando seus valores, suas atitudes cotidianas, sua visão e relação com o mundo.
Gostei muito, assim..., é importante, pros nossos alunos perceberem o Cerrado. Porque
eles estão muito acostumados a ver o Cerrado como lixo mesmo né? Não é interessante para eles,
Cerrado é mato, num é mais nada. Querem tirar tudo, quer colocar só um jardim lindo, pra eles
jardim é só graminha..., arbustinho... E aqui eles percebem assim, as árvores tortas, com frutinhas,
que não são daquele jeito que eles tão acostumados a desenhar, a ver, as plantas tem uma cor
diferenciada, a flor é diferente, que não é tudo cinza...
Turista G(1) – Brasília, DF.

A questão das plantas, que apesar d’agente achar que elas são feias, mas não, elas ficam
adaptadas aquele ambiente e fazem parte daquele contexto, então alguma finalidade ela tem...
Turista M(1) – Brasília, DF.

Os casos apresentados demonstram como essa atividade turística em ambientes naturais


pode ser conduzida, de maneira à desconstruir falsos paradigmas e a reconstruir novos valores
ambientalmente positivos nos indivíduos. A experiência na natureza proporcionada pelos estudos do
meio em uma UC é um excelente instrumento pedagógico quando utilizado por escolas. No
primeiro relato acima, a experiência de um grupo de estudantes do ensino médio foi enriquecida
pelo acompanhamento e pelo trabalho dos professores de diversas disciplinas. Cada um desses
professores conduziu o trabalho de estudo do meio no PESCAN a partir da perspectiva de sua área,
imprimindo às atividades um caráter interdisciplinar e interpretativo. Mas isso não significa que
atividades enriquecedoras, como as vividas por esses estudantes, devem se limitar a atividades
eventuais, diretamente ligadas ao trabalho de professores/as e escolas. Cabe, invariavelmente, a
própria gestão da UC, contemplar, no Programa de Uso Público de seu Plano de Manejo, o
desenvolvimento de atividades educativas enriquecedoras com os visitantes.
Hoje... o Brasil tá muito degradado, tá tendo muita... retirada de árvore, devastação... E
essa região aqui de Caldas Novas é uma região que está crescendo muito, então é importante
preservar esta área de meio ambiente porque nós temos um sistema que depende disso, depende da
área verde para nos termos mais oxigênio.
Turista MA – interior de Goiás.

Eu acho que a principal importância é a seguinte: que... agente tem que ter áreas que
sejam tombadas, porque senão elas vão ser tachadas como áreas improdutivas. Não é que elas
sejam improdutivas, é que a produtividade delas, ainda não é enxergada pelas pessoas, então, o
que agente chama de área improdutiva... Ela não é improdutiva, ela tem outra finalidade num
contexto ainda maior, que é o que agente conversava lá em questão de pasto de plantação de soja e
tal... Caracterizar, o que significa o improdutivo? Porque, se agente for olhar pelo lado econômico,
improdutivo é uma área que não tem..., que não gera algum tipo de... retorno econômico, mas eu
acho que pelo ambiental, agente teria que..., que vê que improdutivo são aquelas outras áreas e
não essa. Dar um outro tipo de valorização.
Turista M(1) – Brasília, DF.

Ambos os depoimentos acima apresentados nos remetem a um contra-senso bastante


comum na relação dos indivíduos com a natureza. A fragmentação dessa relação se dá a partir de
uma excessiva valoração dos recursos da natureza, em contrapartida à, normalmente minimizada,
valorização afetiva dos elementos da natureza.
Novos paradigmas, como o da sustentabilidade, nos foram apresentados. Estes nos
possibilitaram elaborar a idéia de que a necessidade de manter a natureza preservada se dá,
prioritariamente, pela dependência direta que os seres humanos têm em relação à natureza, para
Fórum Internacional do Meio Ambiente - A conferência da Terra 980

manutenção de seus padrões sociais e de vida. A natureza é, portanto, valorada, no sentido da


importância que a ela se atribui enquanto recurso a ser utilizado. No outro lado dessa fragmentação
está a percepção de que o convívio com a natureza deve ser baseado na valorização de seus
elementos simplesmente enquanto seres vivos, pela afetividade. Propõe respeito ao direito de
existência desses elementos no mesmo planeta, no qual todos fazemos parte, independente do uso
ou benefício direto que possam representar para nós humanos.
O caráter de complexidade que fundamenta as bases da EA, voltada à mudança de valores,
de atitudes, de ações e da ética, deve permear, justamente, a junção destes pensamentos. Ao
contrário de díspares e opostas, ambas as concepções são complementares e de grande importância,
com vistas à construção de um mundo melhor, mais digno, e ambientalmente mais justo.
Preservação da natureza como recurso futuro. Recursos para manutenção da vida futura.
Nós que estamos acostumados a viver na cidade, primeiro representa uma continuação de
vida tá? De preservação de espécies, porque agente vê... a coisa vem crescendo, crescendo,
arrebentando,... e agente não come concreto, não come ferro... Então... quer dizer, é uma
esperança de continuação da própria vida, é refúgio entendeu?... E a questão mesmo de saúde,
orgânico, porque é o único lugar que você pode falar assim, to respirando e não to me
envenenando, entendeu?
Turista D(2) – Brasília, DF.

Ah, eu acho que é pra poder deixar pras pessoas, principalmente pras crianças, que se
agente não preservar, agente vai tá fazendo contra nós mesmos, ou seja, é... se essas crianças não
criarem a cultura de preservação, quando eles tiverem na minha idade, eles vão ter um planeta que
eles não vão conseguir mais habitar aqui.
Turista M(1) – Brasília, DF.

Assim como nas últimas categorias acima trabalhadas, aqui a natureza aparece como um
mecanismo de manutenção da vida humana futura. As UCs seriam representadas como o reduto
genético de espécies preservadas para que, futuramente, mantenhamos os elementos naturais para as
futuras gerações. Em se tratando dos paradigmas atuais, o próprio conceito de desenvolvimento
sustentável, bastante utilizado pelos diversos atores da sociedade atual, apresenta a idéia de
manutenção dos recursos da natureza com vistas às gerações futuras.
Este tipo de percepção é de grande importância quando compreendida na sua totalidade,
cujas idéias devem ser praticadas por todas as classes, ou seja, quando todos os membros da
sociedade, principalmente aqueles cujo poder hegemônico representam, adotarem-nas como prática
cotidiana. O alcance desta sustentabilidade surgiria como forma de cumprimento da ética ambiental,
pelo respeito às diferenças entre os seres e à igualdade de direitos humanos no acesso aos bens
naturais como de direito a vida.
Relações preservacionistas: Natureza como algo intocável.
Bom, a grande importância pra preservação... do nosso País, da nossa geografia, da
nossa ecologia... E isso aqui é imexível né, é nosso, é de todo povo? De maneira alguma, não se
pode tocar nisso aqui, não pode se alterar de maneira alguma... Todo mundo tem obrigação de
cuidar do que é nosso.
Turista G(2) – São Paulo, SP

Oh, é... preservação... Eu acho que... agente tem que olhar pra um negócio e tem que ter
respeito, na hora que bateu o olho tem que ter respeito. Tem que deixar do jeito que ta aí né, pra
quem vier aí, mais pra frente, vê do jeito que você tá vendo, cada vez melhor.
Turista J – Araguari, MG.

Uma relação preservacionista com a natureza pressupõe que para mantê-la preservada,
qualquer relação humana para com a mesma deve ser evitada, no sentido de utilizá-la apenas para
contemplação. Isso quer dizer que o ser humano deve manter um distanciamento em relação à
Fórum Internacional do Meio Ambiente - A conferência da Terra 981

natureza. Esse distanciamento foi a base conceitual que levou á criação das primeiras áreas naturais
preservadas em forma de UCs no mundo. Autores como Oliveira, S. (2002), Brito (2003) e
Gonçalves (2004) apresentam relevantes discussões a esse respeito.
Entretanto, o papel das UCs atualmente vai muito além da questão única de preservação,
ou seja, de se manter uma natureza intocada. As UCs devem ampliar sua função social ao
permitirem, mesmo que em uso restrito e limitado, como no caso das Unidades de Proteção Integral,
a aproximação humana com intuito educativo, lúdico e sensibilizador. Isso transforma as UCs em
espaços voltados à conservação e à proteção da natureza sem, no entanto, excluir os indivíduos do
direito de com ela conviver e da obrigação de contribuir para sua proteção.
O paradigma da fragmentação entre Ser humano-Natureza. O indivíduo alheio, díspare,
dissociado da natureza.
Ah, acho que é importante não invadir né? ...aquilo que não me pertence, que não é meu
espaço, meu caminho né? Preservar né? ...o biológico, os animais...
Turista R – Uberlândia, MG.

Olha, uma harmonia entre a natureza, com a fauna e flora vivendo é, na maneira natural
dela. E pra mim o parque é algo que deveria existir mais, infelizmente temos muito poucas áreas
preservadas.
Turista E(1) – interior de Goiás

Bom, primeiro pra reserva natural, que nós precisamos de verde, não interessa qual
qualidade de mata..., e também os animais, porque, principalmente, se você tirar o habitat deles aí
como é que vai ser, vai se perder tudo...
Turista F(2) – São Paulo, SP.

Seguindo a análise apresentada na categoria do item V, uma natureza representada como


algo intocável pressupõe certo distanciamento humano da mesma como atitude necessária para
mantê-la intocada.
Foi a partir da construção dessa concepção de dissociação entre os indivíduos e a natureza
que nossa espécie estabeleceu uma relação de hierarquização, de poder, de disparidade com os
outros seres viventes. Mantendo-se alheio a natureza, era possível dominá-la, adestrá-la e controlá-
la conforme suas necessidades e vontades.
A proposta de uma EA crítica, deve estar voltada, entre outros objetivos, à mudança dessa
concepção. Deve trabalhar nos indivíduos um sentimento de pertencimento a natureza e ao Planeta
Terra. Um sentimento de que somos feitos a partir do mesmo princípio criador que os demais seres
vivos, e que tanto nós humanos, quanto os demais seres temos o direito à existência digna e
respeitosa em nossa casa planetária.

ÚLTIMAS CONSIDERAÇÕES
A convivência harmoniosa entre seres humanos, e destes com a natureza, em que esta seja
respeitada pelo seu próprio direito a existência, independente do valor que possa representar aos
indivíduos, é o grande sonho de uma EA integradora. Quando se trata do uso humano nas UCs, a
EA deve ser condição primária no cumprimento da função social destas áreas, além de essencial
para a conservação dos elementos naturais ali presentes. A experiência dos indivíduos nestas áreas,
através da prática do ecoturismo, deve ir, portanto, além da simples contemplação da paisagem.
Deve proporcionar o conhecimento, o entendimento e a interpretação das relações intrínsecas a ela.
As UCs, em seu documento gestor, o plano de manejo, deve propor as melhores ações educativas
no sentido de tornar o ecoturismo uma oportunidade de ampliação da consciência ecológica dos
indivíduos.
Tanto a preservação quanto a conservação das UCs contam com o turismo como um
colaborador para o desenvolvimento de uma relação mais intensa e uma sensibilidade
conservacionista e/ou preservacionista das populações alóctones em relação à natureza. Isso porque
Fórum Internacional do Meio Ambiente - A conferência da Terra 982

os espaços estão sendo conhecidos a partir de uma experiência vivenciada e de uma percepção
construída diretamente na presença do indivíduo nestes novos lugares. É importante ressaltar, com o
que Mendonça propõe em sua conceituação – a “ecologia do Turismo” fortalece o caráter
indispensável da EA no ecoturismo:
Para haver uma relação mais intensa com o lugar é preciso vivenciá-lo. É preciso ter outra
relação com o tempo. É preciso que o turismo possibilite alguma relação mais direta, em que a
vivência represente uma relação de troca, de aprendizado, de respeito. Muitas vezes, a melhoria da
qualidade da percepção requer conhecer melhor as características ambientais locais. O turismo pode
possibilitar isso... Só a vivência pode levar ao afeto que formalmente levará ao respeito e a
solidariedade com as populações atuais e futuras. (MENDONÇA, 1996 apud AZEREDO; IRVING,
2002, p. 31)
Portanto, a EA no PESCAN deve ser tomada como ação prioritária para a preservação da
área. Além disso, enquanto função social, o PESCAN deve ser conhecido, por todos aqueles que o
visitam, por sua real importância, tanto ecológica quanto social. Esses seriam os objetivos principais
das ações de EA a serem adotadas para o parque. Cada visitante deveria agregar algo de novo ao
seu conhecimento, ampliando sua percepção, e expandindo, consequentemente, sua consciência.
Cada turista deveria levar consigo, além da memória de uma beleza cênica da paisagem do Cerrado,
a real importância da preservação do PESCAN para toda a região, inclusive para ele próprio.
Enquanto responsável pela manutenção do lençol freático das águas quentes, a preservação da Serra
de Caldas Novas diz respeito não só a quem depende dela como fonte econômica, como a própria
população de Caldas Novas e Rio Quente, mas também para aqueles que usufruem dela de modo
esporádico, como uma fonte de lazer e saúde, no caso dos turistas.
É preciso, portanto, que a viagem proporcione um tempo maior voltado à vivência, à troca
e à ampliação da consciência, gerando no visitante um sentimento de respeito e de amor para com o
lugar. A EA é capaz, e seu objetivo é justamente esse, de mudar as diversas percepções
paradigmáticas sobre o meio ambiente como um todo e sobre a natureza em especial.
É nesse sentido que acreditamos na sua iminente importância, pois acreditamos que a partir
da sensibilidade no conhecer e da consciência daquilo que se conhece, geramos um sentimento de
amor no indivíduo. Isso porque, melhorando a qualidade da percepção da sociedade em relação ao
mundo, consequentemente, é possível gerar uma ampliação na consciência individual, suscitando os
sentimentos do amor e do cuidado que precisamos para construirmos um mundo melhor, um planeta
mais saudável.

REFERÊNCIAS BIBLIOGRÁFICAS
BRITO, M. C. W. Unidades de Conservação: intenções e resultados. 2ªed. São Paulo: Annablume:
Fapesp, 2003.
FORGUS, R.H. Percepção: o processo básico do desenvolvimento cognitivo. São Paulo: Herder,
1971.
GOIÁS. Agência Ambiental do Estado de. Plano de Manejo do Parque Estadual da Serra de Caldas
Novas. Goiânia: Centro Tecnológico de Engenharia LTDA, 1998.
GOIÁS. Secretaria de Planejamento e Desenvolvimento do Estado de - SEPLAN. Revista
Economia e Desenvolvimento. Ano VI n° 19 Abril/Junho de 2005. Disponível em
<http://www.seplan.go.gov.br>. Acesso em: 27 de agosto de 2005.
GONÇALVES, C.W.P. Os Descaminhos do Meio Ambiente. São Paulo: Contexto, 2004.
IRVING, M. A; AZEVEDO, J. Turismo: O Desafio da Sustentabilidade. São Paulo: Futura, 2002.
OLIVEIRA, L. Ainda sobre Percepção, Cognição e Representação em Geografia. In:
MENDONÇA, F.; KOZEL, S. (Org.). Elementos de Epistemologia da Geografia Contemporânea.
Curitiba: UFPR, 2002, p.189-196.
OLIVEIRA, S. F. Unidades de Conservação (UCs): Contexto histórico e a realidade de Goiás. In:
ALMEIDA, M.G. Abordagens geográficas de Goiás: o natural e o social na contemporaneidade.
Goiânia, 2002.
Fórum Internacional do Meio Ambiente - A conferência da Terra 983

TERRITORIALIDADES DO TURISMO: O IMPASSE ENTRE A CONSTRUÇÃO DE UMA


CIDADE TURÍSTICA E A DEMARCAÇÃO DA TERRA INDÍGENA TREMEMBÉ NO
LITORAL DO CEARÁ.

Simone Eugênia Melo de LIMA


(Mestranda do Programa de Desenvolvimento e Meio Ambiente da UFC). simaseugenia@yahoo.com.br
Edson Vicente da SILVA
(Professor Pós-doutor da Universidade Federal do Ceará). cacau@ufc.br

Resumo
O trabalho é um estudo de caso dos impactos sociais decorrentes da expansão do turismo
no litoral cearense em detrimento das comunidades indígenas, abordando a temática sob a
perspectiva da luta do índio pela manutenção da sua cultura e conservação do meio ambiente como
condição indispensável para identificação e reconhecimento de sua cidadania indígena e da posse de
suas terras.
Palavras-chave: turismo, territorialidades, comunidades indígenas, impactos.

Abstract
This research is a case study about the social impacts resulting from expansion of tourism
on cearense’s seashore in damage of autochthon communities, broaching the theme under the
perspective of autochthon’s contest for the support of their culture and conservation of natural
environment as an indispensable condition for identification and recognition of their autochthon
citizenship and their lands ownership.
Keywords: tourism, territory division, indians communities, impacts.

[...] o que reivindica uma sociedade ao se apropriar de um território é o acesso, o controle


e o uso, tanto das realidades visíveis quanto dos poderes invisíveis que os compõem, e que parecem
partilhar o domínio das condições de reprodução da vida dos homens, tanto a deles próprias
quanto à dos recursos dos quais eles dependem. (GODELIER, apud COSTA, 2006, p. 69).

INTRODUÇÃO
No contexto atual de valorização do turismo como atividade capaz de dinamizar economias
periféricas e estagnadas, identifica-se também, com a expansão dessa indústria, a ativação,
reativação ou ampliação das lutas sociais pelo território.
Diante da situação, procurou-se, no presente artigo, visualizar as estratégias sociais e
didáticas da comunidade indígena Tremembé Buriti e São José, localizada no litoral do município
de Itapipoca – CE, na tentativa de resgatar os costumes, valores, crenças e formas de lidar com a
terra do homem índio, como condição indispensável para identificação e reconhecimento como
grupo indígena.
Uma vez reconhecidos pela sociedade e poder público como índios, poderão ter a
demarcação e posse de seu território, hoje disputado com a indústria turística e imobiliária que
procura instalar-se no litoral de Itapipoca. Pois, de acordo com Faria (2007), para os povos
indígenas, a primeira condição para a sobrevivência física e cultural é a demarcação de suas terras.
Isso se deve porque o território é a base da subsistência econômica, social, cultural dessas
organizações sociais, sendo, portanto, a terra o recurso primário de sobrevivência e identificação.
A metodologia adotada para o desenvolvimento do trabalho foi a pesquisa participante,
com utilização de técnicas etnográficas, tendo-se a oportunidade de, através de visitas de campo,
observar o dia-a-dia da comunidade, conversar com alguns dos seus membros, realizar entrevistas
semi-estruturadas com atores focais e uma oficina sobre turismo na localidade. Como foco da
pesquisa, utilizou-se a Escola Diferenciada de Ensino Fundamental Buriti, que é uma Escola
Indígena. Nas entrevistas, foram focados temas como: atividades produtivas, posicionamento da
comunidade diante da indústria turística, conflito de terra, papel da escola no resgate da cultura e
luta pela terra, entre outros.
Fórum Internacional do Meio Ambiente - A conferência da Terra 984

TERRITORIALIDADES DO TURISMO
A valorização, pela indústria do turismo, de espaços naturais pouco alterados pela ação
antrópica e de rica beleza cênica fez com que o Nordeste brasileiro ganhasse destaque como
importante produto de atração turística no mercado nacional e internacional. Tal fato deu origem ao
processo de valorização de alguns espaços116, especialmente os litorâneos, seguidos da qualificação
da expansão territorial do setor através da ocupação e reorganização de vastas áreas, com
implantação de novos equipamentos e sistemas de engenharia, conforme interesses do mercado e
segundo modelos econômicos que programam de cima para baixo.
Todavia, a valorização, modificação e modernização da costa nordestina com a expansão
do turismo têm influenciado diretamente a relação sociedade-espaço nestes territórios, e porque não
dizer sociedade-natureza, na qual as comunidades autóctones, em grande maioria possuidoras de
uma complexa rede de interação homem e meio ambiente que as qualificam como comunidades
tradicionais117, estão sendo gradativamente expropriadas de suas terras (desterritorializadas) ou
mesmo sujeitas a um processo de submissão social, política e financeira.
Tais circunstâncias têm ativado e reativado lutas sociais pelo território ou lutas de
territorialização, em que estas são, segundo Costa (2006, p. 16), “[...] um processo de domínio
(político-econômico) e/ou de apropriação (simbólico-cultural) do espaço pelos grupos humanos”,
podendo ser aquele compreendido como um espaço de identifição social, onde um grupo cria suas
redes de relação sociais e com o meio natural, desenvolvendo também suas atividades cotidianas
(habitar, circular, trabalhar etc.) e suas simbologias (referenciais religiosos, mitos, costumes,
outros).
Para as sociedades indígenas, o território é uma área controlada para usufruto de seus
recursos, especialmente os naturais, sendo importantes também os referentes espaciais, os quais
farão parte da criação e recriação de mitos e símbolos, podendo os mesmos serem responsáveis pela
própria definição do grupo enquanto tal. (COSTA, op. cit.).
No caso de comunidades litorâneas tradicionais, os territórios são espaços de uso comum
que estão divididos entre o mar e a terra, sendo ambos de fundamental importância para seu
equilíbrio, utilizados e geridos pela “lei do respeito”. Existe uma relação dual (terra/mar,
sertão/praia, roça/pesca). O mar é o lugar do trabalho, cheio de mistérios e perigos, mas de onde
provém o sustento da família fixada e segura na terra. Do sertão, vem o complemento da

116
A valorização do espaço pode ser apreendida com processo histórico de identificação de um território. A construção
de um território é um processo cumulativo, em contínuo movimento, engendrado pela relação de uma sociedade
específica, com um espaço localizado, onde, a cada momento, um resultado e uma possibilidade nova pode estabelecer-
se. Assim, não se pode pensar território apenas enquanto realidade natural. É necessário associar o uso, o trabalho do
grupo social que o ocupa. O estudo da valorização do espaço agrega também os elementos da análise de processos
próprios do campo da política, posto que é sustentado em projetos e guiado por concepções de atores sociais
específicos, em especial o Estado. Os usos do solo, os estabelecimentos humanos, as formas de ocupação e as
hierarquias entre os lugares expressam os resultados de lutas, hegemonias, violências. São resultados de atos políticos.
O processo de valorização do espaço não é fruto de determinações econômicas tout court, ele é antes o instituidor de
condições necessárias para a fluência dos processos econômicos, condições muitas vezes mais dependentes das decisões
políticas do que da economia. (MORAES, 2002)
117
Para Diegues (1992, apud DIEGUES, 1996, p. 87), as “comunidades tradicionais estão relacionadas com um tipo de
organização econômica e social com reduzida acumulação de capital, não usando força de trabalho assalariado. Nelas
produtores independentes estão envolvidos em atividades econômicas de pequena escala, como agricultura e pesca,
coleta e artesanato. Economicamente, portanto, essas comunidades se baseiam no uso de recursos naturais renováveis.
Uma característica importante desse modo de produção mercantil (...) é o conhecimento que os produtores têm dos
recursos naturais, seus ciclos biológicos, hábitos alimentares etc. Esse “know-how” tradicional, passado de geração em
geração, é um instrumento importante para a conservação. Como essas populações no geral não tem outra fonte de
renda, o uso sustentado de recursos naturais é de fundamental importância. Seus padrões de consumo, baixa densidade
populacional e limitado desenvolvimento tecnológico fazem com que sua inferência no meio ambiente seja pequena.
Outras características importantes de muitas sociedades tradicionais são: a combinação de várias atividades econômicas
(dentro de um complexo calendário), a reutilização dos dejetos e o relativamente baixo nível de poluição. A
conservação dos recursos naturais é parte integrante de suas cultura, uma idéia expressa no Brasil pela palavra ‘respeito’
que se aplica não somente a natureza como também aos membros da comunidade”.
Fórum Internacional do Meio Ambiente - A conferência da Terra 985

subsistência: a lavoura, a caça e a coleta. A praia é o lugar privilegiado das relações sociais, o lugar
de morada, das festas, do convívio social. A atividade da pesca transcende o caráter de atividade
econômica e de sobrevivência, é uma multiplicidade de ações e relação social que une a
comunidade (LUCHIARI, 2002).
Desta forma, entende-se o território não apenas no seu contexto político, mas, antes de
tudo, como um território simbólico, um espaço de referência para construção de identidades, e,
ainda, fruto da interação sociedade – natureza, adquirindo uma concepção de múltiplas dimensões.
No turismo, através de estudos, tem-se observado três formas recorrentes de processos de
definição do território: a territorialização118, a desterritorialização119 e a reterritorialização120, as
quais andam naturalmente juntas, pois, conforme Costa (2006), são movimentos concorrentes,
indissociáveis e, por vezes, concomitantes.
A primeira tem ocorrido com a ativação e reativação das lutas pela posse jurídica, e por
que não política, dos territórios pelas comunidades tradicionais, até então apenas simbolicamente e
culturalmente pertencentes a si, diante do risco de perdê-los para o mercado imobiliário e turístico.
É nesta perspectiva que identificamos a luta de povos indígenas e quilombolas pela demarcação de
suas terras e de comunidades extrativistas ou que desenvolvem atividades primárias para sustento
familiar com vistas à criação de unidades de conservação de uso sustentável das categorias RESEX
(Reservas Extrativistas) e Reservas de Desenvolvimento Sustentável, respectivamente.
A desterritorialização é justamente a expulsão das comunidades autóctones de seus
territórios ou de limitação de suas ações, de tal forma que não tenham mais o ideal de pertencimento
ao lugar e percam gradativamente o vínculo simbólico e cultural com a terra.
A reterritorialização pode ser entendida como a construção de um território, antes
sustentáculo das atividades de subsistência das populações autóctone, para dar suporte a práticas
turísticas de elite. Implicando em um conjunto de mudanças na paisagem e instalação de infra-
estruturas e equipamentos aos moldes do modelo europeu de urbanização turística – concentração
de empreendimentos em grandes propriedades, uso intensivo do solo, elevado custo de implantação,
alto nível de destruição de fontes e recursos naturais, destinado a atender um público estrangeiro.
É neste contexto de luta pelo território e na perspectiva de criação e recriação de
territorialidades que se enquadra um dos maiores impasses e impactos sociais do turismo no litoral
cearense, a construção do Complexo “Nova Atlântida Cidade Turística Residencial e de Serviços”,
previsto para ser implantado no litoral do município de Itapipoca, próximo à foz do rio Mundaú, em
terras reivindicadas pela comunidade indígena Tremembé de Buriti e São José.
Orçada em US$ 15 bilhões, a Cidade Turística Nova Atlântida, com obras embargadas
desde 2004 pelo Ministério Público Federal, é indicada como o maior projeto turístico do país.
Neste prevê-se, após retirada da comunidade autóctone, a construção de treze hotéis cinco estrelas,
quatorze resorts, seis condomínios residenciais e três campos de golfe, numa área contínua de 12
quilômetros de praia e 3,1 mil hectares. Infra-estruturas que implicarão na destruição do território
indígena Tremembé.
De acordo com Luchiari e Serrano (2005), os complexos turísticos, salvas poucas
exceções, são inacessíveis ao mercado interno e não melhoram as condições de vida da população
local, pois pouco se comunica ou permite a comunicação dos visitantes com o local, a não ser em
pontos turísticos pré-estabelecidos.

COMUNIDADE TREMEMBÉ BURITI E SÃO JOSÉ: A LUTA PELA TERRA E A VISÃO DA


COMUNIDADE COM RELAÇÃO AO TURISMO
Não faz muito tempo que o turismo verdadeiramente tornou-se algo discutido pela
comunidade Tremembé Buriti e São José, pois até então se concentrava no núcleo praiano da

118
Territorialização é o processo de construção do território. (COSTA, 2006, p. 123).
119
Desterritorização é o movimento pelo qual se abandona o território. (COSTA, op. cit., p. 127).
120
Reterritorialização é o movimento de construção de um novo território, no sentido de modificação do espaço ou
construção de novas simbologias para ele. (COSTA, op. cit.).
Fórum Internacional do Meio Ambiente - A conferência da Terra 986

Baleia121. A atividade passou a ser falada e a interferir no modo de vida da população a partir de
2002, quando o projeto do Complexo “Nova Atlântida Cidade Turística Residencial e de Serviços”
foi divulgado, tornando-se a questão motivo de grande temor e produtora de conflitos internos e
externos aos povoados.
O início da mobilização política dos Tremembé pela identificação e demarcação de suas
terras data do fim da década de 1970, estando intimamente relacionado com a progressiva
concentração fundiária por parte de empresas agroindustriais e posseiros nas localidades de
Almofala, Varjota e Tapera, no município de Itarema – CE. No entanto, foi apenas com a assinatura
da portaria nº 1.366 da FUNAI, em 1992, a qual determinou a criação do Grupo Técnico de
identificação e delimitação da Terra Indígena Tremembé de Almofala122, que se iniciou
efetivamente o processo de regularização fundiária das terras indígenas Tremembé; processo até
então não finalizado, em virtude de tramitações das ações judiciais movidas pelas partes
interessadas (VALLE, 2005).
Segundo pesquisas do historiador Thomás Pompeu Sobrinho (1955, apud SAMPAIO et
al., 2002), os índios Tremembé ocupavam terras litorâneas dos atuais Estados do Maranhão, Piauí,
Ceará, chegando até a foz do rio Açu, no Rio Grande do Norte. Porém, ao longo do processo de
ocupação do território pelos não – índios, sua área foi reduzida, tornando-se a região da barra do rio
Aracatimirim refúgio e aldeamento dos índios desta etnia, e onde, no início do século XVIII, foi
constituído o aldeamento missionário Nossa Senhora da Conceição de Almofala. (Ibid., 2002).
Os índios Tremembé de Buriti e São José são originários da região de Almofala, dispersos
dali com o processo de avanço das dunas e soterramento de alguns povoados no final do século
XIX, que se assentaram nas terras dos distritos de Marinheiros e Baleia, no Município de Itapipoca -
CE, há mais de três gerações. (BRASIL, 2005).
A luta jurídica pela posse da terra, por esta comunidade, teve início em 2002, porém o
processo de regularização123 encontra-se na etapa de identificação, não estando ainda homologada a
demarcação124, visto que não foi concluído o trabalho de levantamento antropológico.
Segundo dados da Secretaria de Saúde Itapipoca, de 2007, as comunidades Buriti e São
José são constituídas por 184 famílias, das quais 114 são do primeiro e 70 do segundo povoado. Do
total de famílias, de acordo com o censo da Fundação Nacional de Saúde de 2006, 101 assumem a
identidade étnica indígena Tremembé e buscam, assim, a retomada cultural de seus antepassados e
reivindicam a posse da terra. Dessas famílias, 36 estão no Sítio São José e 65 em Buriti.
Os povoados de Buriti e São José estão localizados em região de transição entre a Planície
Litorânea e o Tabuleiro Pré-litorâneo, sendo ricos em reservas hídricas e paisagens de significativa
beleza cênica, aspectos muito valorizados pela indústria turística. Em seus territórios, podem ser
encontradas importantes lagoas interdunares, responsáveis pelo abastecimento de água e lazer da
comunidade; um campo de dunas composto por diversificadas feições dunares (móveis, semi-fixas,
fixas e eolianitos); uma área de mata de tabuleiros em estado secundário de regeneração; uma faixa

121
A praia da Baleia fica a 206 km de Fortaleza e 54 km da sede do município de Itapipoca – CE , sendo a maior praia
do município e a melhor estruturada.
122
Segundo Valle (2005), os índios Tremembé da região do rio Aracatimirim compõem três grupos sociais em situação
interétnica bastante complexa, heterogênea e tensa, preferindo o autor referir-se individualmente aos índios Tremembé
de Almofala, Tremembé de Tapera e Varjota (compreende localidades da Varjota, do Córrego Preto, do Amaro e da
Batedeira) e Tremembé do Córrego do João Pereira (compreende localidades de São José, Capim-açu, Cajazeiras e
Telhas). No entanto, para a FUNAI, os dois primeiros grupos formam os Tremembé de Almofala. Em virtude de
condições distintas de organização e interesses econômico-político pela terra, atualmente apenas a Terra Indígena
Tremembé Córrego João Pereira encontra-se completamente regularizada. De acordo com Sampaio (2002), a
comunidade indígena Tremembé de Almofala compreende dez núcleos principais de adensamento: Varjota, Tapera,
Passagem Rasa, Batedeira, Mangue Alto, Barro Vermelho, Praia de Almofala, Pana, Saquinho e Lameirão.
123
O processo de regularização das Terras Indígenas passa por: identificação, delimitação, demarcação, homologação e
registro. (SILVA, 2007)
124
Com a demarcação, as Terras Indígenas são consideradas bem da União, sob posse permanente dos povos indígenas,
podendo, assim, usufruir de seus recursos, exceto os recursos minerais.
Fórum Internacional do Meio Ambiente - A conferência da Terra 987

de praia de aproximadamente 3,5 km, além de ser porta de acesso ao estuário do rio Mundaú e ao
seu manguezal, pelo lado de Itapipoca.
Tradicionalmente, as atividades produtivas desenvolvidas pela população nativa são a
pesca no mar, nos rios e nas lagoas; a agricultura de subsistência; a coleta de frutos (caju e murici)
nas matas de tabuleiro e dunas fixas; a mariscagem na área de planície flúvio-marinha e o artesanato
de renda de bilro. Considerando-se a comunidade constituída por pescadores, agricultores e
rendeiras. As atividades desenvolvidas alimentam a população durante todo o ano e ajudam no
sustento das famílias com a venda do excedente nas feiras de Itapipoca e da Baleia.
No convívio com o não-índio, marcante na história do povo Tremembé, esse grupo étnico
perdeu muito de suas características primitivas, fazendo com que não preservassem sua língua
original e alguns da comunidade não se reconheçam como índios. Condição que tem dividido a
população, gerado conflitos internos e enfraquecido o movimento de auto-reconhecimento como
sociedade indígena e de reivindicação pela posse da terra.
Em Marinheiros, os que não se reconhecem índios desejam a implantação do Complexo
Turístico Nova Atlântica previsto para a localidade. Muitos desses já foram ou são trabalhadores da
empresa, que mantém parte da propriedade sobre o seu domínio e restringe o livre trânsito da
população local neste espaço através de segurança armada 24 horas ao dia. Tal situação tem gerado
entre os membros da comunidade, e até da própria família, brigas, sendo constante a necessidade de
força policial e jurídica para apaziguar as conflagrações.
Para os que se reconhecem como índios, a implantação do Complexo Turística significa a
destruição do território indígena Tremembé Buriti e São José, de uso coletivo e flexível dos
recursos por sua população e de apropriação simbólica, para a produção de um novo território – o
turístico – modificado, urbanizado e segregado, o qual só estará disponível aos que podem pagá-lo.
Para os índios Tremembé da localidade, que não são do conhecimento de muitos
moradores do município e dos visitantes do litoral de Itapipoca, o turismo que vem sendo
implantado no litoral cearense não os interessa.
[...] pra nós como comunidade indígena, essa forma de turismo que eles querem implantar
no município, nas comunidades, não serve pra nós e a gente não vai aceitar. Esse turismo que eles
querem aqui é um turismo desgovernado, desenfreado. [...] Ele destrói, ele não constrói a natureza,
ele destrói, porque aonde ele chega ele vai desmatando.
Eles vão fazer uma cidade, vão transformar nossa paisagem e essa nossa natureza. Vão
transformar tudo numa cidade. E você vê a dificuldade que o pessoal passa na cidade por
conta de fábrica, do comércio, essas coisas tudo. O ar que a gente respira na cidade, um
ar poluído. É a mesma coisa que eles vão fazer aqui. (ERBENE ROSA VERÍSSIMO, 43
anos, líder comunitária do Buriti)

Eles vão acabar com tudo que nós tem. Esse turismo deles aqui, ele vai acabar só tudo,
porque é grande demais. É uma cidade, nós nunca nem vimos. Nós nem sonhamos que
jeito é. Só em a gente ouvir falar a gente já tem medo. (FABIANA CARNEIRO
CASTRO, 24 anos, membro da comunidade)
A comunidade reconhece as potencialidades paisagísticas e do artesanato local, mas deseja
um turismo estruturado por eles, para benefício de todos da localidade e até de fora, porém que não
venha desestruturar seu modo de vida, que seja apenas mais uma alternativa de subsistência.
Querem continuar tendo seus roçados, de onde tiram a comida do ano inteiro, e aprender outras
técnicas para aprimorar e exportar seus artesanatos (renda, colares, brincos, bolsas de palhas,
cestos), porém, para isso, necessitam de investimento financeiro.
Queremos o turismo bom, que preserve o ambiente e dê valor a nossa cultura. Um
turismo nosso, feito pela comunidade e para ajudar a comunidade, onde as pessoas daqui
trabalhem, façam e vendam seu artesanato. (Conclusão de uma oficina com a
comunidade do turismo desejado – novembro de 2007)
Fórum Internacional do Meio Ambiente - A conferência da Terra 988

Nós queremos o turismo sim, porque o turismo é uma fonte de renda e pode beneficiar a
comunidade indígena e os que vêm de fora também. Mas qual o turismo que a nossa
comunidade indígena reivindica? É o turismo que seja feito pela própria comunidade.
Que alguém venha apreciar. Apreciar nossa beleza natural e não destruir, não chegar e se
apossar e se dizer dono. (ERBENE ROSA VERÍSSIMO, 43 anos, líder comunitária do
Buriti).

O turismo desejado pela comunidade hoje já é reconhecido pelas organizações de turismo e


no meio acadêmico como turismo rural ou agroturismo e que, quando vinculada à cultura indígena,
pode também adquirir nomes como ecoturismo indígena, etnoturismo, turismo indígena e turismo
étnico, conforme abordado por Faria (2007).
Porém, segundo a autora, para o desenvolvimento destes segmentos de turismo em
território indígena, é preciso que alguns cuidados sejam tomados: o turismo deve respeitar os
valores socioculturais destes grupos e deve ser monitorado e avaliado o grau de envolvimento
desses com a sociedade envolvente e visitante. Aspectos os quais se recomenda que sejam
ressaltados nos planejamentos turísticos, de modo a não permitir a descaracterização,
mercantilização da cultura e a desterritorização dos povos indígenas.
Na visão da comunidade, para que possam desenvolver o turismo desejado por eles e que
venha realmente para melhorar a qualidade de vida de seu povo, em ordem decrescente de
prioridade, indicam: a demarcação da terra indígena; a implantação de infra-estruturas básicas:
energia, estrada, saneamento; capacitações para melhoria do artesanato, comunicação (línguas),
educação ambiental, guias turísticos, relações humanas, empreendedorismo, culinária (higiene e
conservação); campanhas de conscientização sobre drogas, prostituição, violência, manutenção dos
costumes; ter representantes da comunidade na política local; campanhas de divulgação do turismo
deles nos núcleos turísticos próximos; ampliar as medidas de preservação: encontrar meios de evitar
as queimadas, não poluir as águas, os rios e as lagoas, preservar os animais, evitar o desmatamento,
proibir implantação de viveiros de camarão na região; apoio financeiro a empreendimentos a serem
abertos por pessoas da comunidade; implantação de sinalização turística; inclusão das temáticas
turismo e potencialidades de Itapipoca no currículo escolar.

O PAPEL DA ESCOLA INDÍGENA NA LUTA PELO TERRITÓRIO


Com o objetivo de minimizar os conflitos e riscos de agressões às crianças índias das vilas,
foi implantada em 2005, com o apoio do Núcleo de Educação Indígena da SEDUC (Secretaria de
Educação do Ceará) e aval da comunidade, a escola indígena na localidade - Escola Diferenciada de
Ensino Fundamental Buriti, hoje com 163 alunos do pré-escolar ao 8º ano.
Em meio a condições estruturais precárias, poucas salas, as quais são escuras em
decorrência da inexistência de energia elétrica na localidade, cadeiras e lousas insuficientes e, por
vezes, a falta de material e merenda escolar, a escola atua socialmente como um instrumento de
auto-determinação frente à situação de opressão imposta pela indústria imobiliária e turística que,
com apoio de algumas instituições dos governos estadual e municipal, tentam tirá-los de suas terras.
Através da escola, as professoras têm desenvolvido com os alunos atividades de
levantamento do modo de vida dos seus antepassados, de maneira a possibilitar tanto a construção
do histórico da comunidade, como a melhor compreensão e valorização dos costumes, das
tradições, dos valores, das crenças, dos mitos, da história, do artesanato e das formas de manejo dos
recursos naturais. Trabalhos que adornam as paredes das salas de aula, distribuídos pelo que eles
denominaram de cantinhos do saber: cantinho da matemática, da geografia, do artesanato, da
ciência etc.
Nos trabalhos, identifica-se que temas como a luta pela terra e resgate da cultura, assim
como do reconhecimento da ligação do índio com seu ambiente, são levados a debates nas aulas, as
quais não se limitam ao espaço físico da escola. Os alunos também, no dia-a-dia do processo de
ensino-aprendizagem, são estimulados a conhecerem o português, a matemática, a ciência, a
geografia, a história, mas também o seu território, suas plantas, sua fauna, a história de seus
Fórum Internacional do Meio Ambiente - A conferência da Terra 989

antepassados; a coletar e contar conchas e sementes para fazer colares, a montar iscas para
crustáceos, a recolher a palha para fazer o artesanato, a pegar casca da raiz do mangue e pigmentos
das árvores para fazer tinta, a reconhecer e a valorizar cada pedaço do seu território.
Tais atividades, que integram os conhecimentos tradicionais aos conhecimentos
pedagógicos na sala de aula, têm reforçado a identidade cultural Tremembé nos membros da
comunidade, especialmente crianças e adolescentes, conscientizado a nova geração quanto aos
cuidados que se deve ter com a terra e os riscos que eles correm em deixar adormecer sua cultura e
perder seu território. Têm também fortalecido internamente a articulação do movimento de auto-
afirmação, fazendo com que os alunos sejam os principais colaboradores nos eventos em prol da
identifição, demarcação e retomada de suas terras.
Todavia, são às sextas–feiras, nas aulas de arte e cultura, que a expressão da escola no
resgate da cultura Tremembé e luta pelo território se potencializa, pois nesses dias, com os alunos
devidamente enfeitados com pinturas corporais e adornos artesanais, é dançado o Torém. Este é um
ritual e uma dança que vem dos antepassados Tremembé, mas que também não deixa de ser uma
grande “brincadeira”. As músicas guardam em suas letras palavras e histórias que expressam os
animais e as plantas da região, os mitos, os símbolos, os costumes indígenas e a luta do índio pela
posse de suas terras, conforme pode ser visto na oração iniciação do ritual:
Nós Tremembé acreditamos: num deus que é nosso Pai Tupã, na terra que é nossa mãe, na
mata que é nossa vida, na lua e nas estrelas que são nossa energia, no sol que é nossa luz, no
relâmpago e no trovão que são nossa previsão, nas pedras e nos galhos que são nossas árvores, no
fogo que é nossa visão e em toda a atmosfera. Vivemos a força da terra, que nos dá energia para
lutar e vencer todas as nossas batalhas. Por isso somos povo da luta, por isso somos povo
Tremembé.
No contexto atual de luta pela identificação, pode-se dizer que o Torém é o importante elo
de integração da comunidade para resgate da sua cultura e de construção da identidade étnica
Tremembé, tornando-se ainda um lazer, uma festa, para crianças, adolescentes, jovens e adultos às
sextas feiras (Ver Figuras 01 e 02).

FIGURA 01: Dança do Torém para adolescentes FIGURA 02: Dança do Torém para alunos do EJA
e jovens do 5º ao 8º ano. Fonte: LIMA (2007) (Ensino de Jovens e Adultos). Fonte: LIMA (2007)

Ao questionar as professoras sobre o que é ser uma professora indígena, fica marcante nas
suas respostas o papel de transmitir a história, a cultura do seu povo para os alunos, mas também de
ser uma líder.
Ser professora indígena é preparar o aluno para que a história do seu povo esteja sempre
viva; é praticar no dia-a-dia os costumes deixados pelos antepassados para que os alunos possam
amar e respeitar as riquezas deixadas por eles. É também ser um líder, um lutador. (SANDRA
VÍRGÍNIO DE SOUSA, 26 anos, professora do pré-escolar, fundamental II e 6º ano)
Ser professor indígena é ser uma pessoa engajada na luta pelos direitos de seu povo, é
ser um conhecedor da história, costumes e tradições de seu povo e um educador
Fórum Internacional do Meio Ambiente - A conferência da Terra 990

incansável na busca da aprendizagem. (NEUSA VÍRGÍNIO DE SOUSA, 39 anos,


professora do 4º e 5º ano)

Nota-se, então, que o papel da escola em uma comunidade indígena ganha ainda mais força
e múltiplas dimensões, inclusive para o corpo funcional que a compõe. A Escola Indígena, muito
mais do que se dedicar ao ensino da educação formal para crianças e adultos da comunidade
estudada, tem funcionado como importante veículo de comunicação e conscientização da luta pelo
resgate e valorização da cultura e do ambiente indígena. Nos povoados de Buriti e São José,
carentes de equipamentos públicos, ela é o ponto de encontro, união, conscientização, de onde
irradia a luta pela terra.

CONSIDERAÇÕES FINAIS
No turismo, a construção de territorialidades pode apresentar-se de várias formas, como
pela construção de territorialidades estrangeiras para dar suporte a práticas turísticas de elite, que
vão implicar em desterritorialização ou ativação de movimentos de territorialização por
comunidades autóctones de modo a impedir a destituição de seus territórios pela indústria turística.
A implantação do Complexo “Nova Atlântida Cidade Turística Residencial e de Serviços”,
no litoral de Itapipoca - CE, significa a destruição do território indígena Tremembé Buriti e São
José, passando de uso coletivo e flexível dos recursos por sua população e de apropriação
simbólica, para a produção de um novo território – o turístico – modificado, urbanizado e
segregado, o qual só estará disponível para aqueles que podem pagá-lo, sendo o estudo de caso
reflexo do impasse existente entre as territorialidades do turismo e seu impacto ao modo de vida das
comunidades tradicionais litorâneas.
Conhecer as estratégias de resistência à política econômica associada ao turismo de massa
e reconhecer as expectativas das comunidades autóctones e sua relação com o seu território
contribuem para o desenvolvimento de novas estratégias de turismo, numa perspectiva de menor
impacto e maior inserção das comunidades. Aspectos que são fundamentais em estudos e
planejamentos turísticos - práticas que se tornam cada vez mais relevantes e indispensáveis ao
contexto atual, dado o reconhecimento do potencial econômico e ao mesmo tempo impactante desta
indústria “limpa”.
Reconhecendo o papel que a Escola Indígena adquiriu na comunidade estudada,
recomenda-se que a conscientização, planejamento e capacitação para o turismo em comunidades
indígenas devem, inicialmente, ser desenvolvidas pela escola ou necessariamente passar ou ter essa
como o seu ponto de apoio.

REFERÊNCIAS BIBLIOGRÁFICAS
BRASIL. Ministério Público Federal. Procuradoria da República no Ceará. Ação Civil Pública n°
001/2005. Fortaleza, 2005.
COSTA, R. H. O mito da desterritorialização: do “fim dos territórios” à multiterritorialidade. 2. ed.
Rio de Janeiro: Ed. Bertrand Brasil, 2006. 400p.
DIEGUES, A. C. S. O mito moderno da natureza intocada. São Paulo: Ed. HUCITEC, 1996. 169p.
FARIA, I. Ecoturismo indígena como princípio de autonomia e afirmação cultural. In: SEBRA, G.
(Org). Turismo de base local: identidade cultural e desenvolvimento regional. João Pessoa: Ed.
Universitária/ UFPB, 2007. p. 287-308.
FREIRE, J. R. B. Lições de carnaval. Taqui Pra Ti, 2005. Disponível em:
<http://www.taquiprati.com.br/apresenta-cronica.php3?cronica=cronica06-02-2005>. Acesso em:
27 nov. 2007.
LUCHIARI, M. T. D. P. Turismo e Cultura Caiçara no Litoral Norte Paulista. In: RODRIGUES, A.
B. R. (Org.). Turismo, Modernidade, Globalização. 3. ed. São Paulo: Editora Hucitec, 2002. p. 136-
154.
Fórum Internacional do Meio Ambiente - A conferência da Terra 991

LUCHIARI, M. T. D.; SERRANO, C. (Eco) turismo e Meio Ambiente no Brasil: Territorialidade e


Contradições. In: TRIGO, L. G. G. Pires et al. Análises Regionais e Globais do Turismo no
Brasileiro. São Paulo: Ed. Roca, 2005, p. 505-515.
MORAES, A. C. R. Território e História no Brasil. São Paulo: Ed. Hucitec, 2002. (Geografia:
Teoria e Realidade, 48. Série “Linhas de Frente”. Edusp, 1999).
SAMPAIO, J. L.; VERÍSSIMO, M. E. Z. V.; SOUZA, M. S. (Org.). A Comunidade Tremembé:
meio ambiente e qualidade de vida. Fortaleza: Ed. INESP, 2002. 177p.
SILVA, E. V. Índios do Brasil: Material Didático Gratuito para as Escolas Indígenas Diferenciadas.
v. 6. Produto de estágio Pós-Doutorado em Educação Ambiental. FACED/UFBA, 2006. CD-ROM.
VALLE, C. G. Tremembé. In: Povos Índios no Brasil. Instituto Socioambiental, 2005. Disponível
em: <http://www.socioambiental.org/pib/epi/tremembe/tremembe.shtm>. Acesso em: 26 nov. 2007.
Fórum Internacional do Meio Ambiente - A conferência da Terra 992

GUIA DIGITAL ECOTURÍSTICO DO PARQUE ESTADUAL DA PEDRA BRANCA (RJ):


UM EXEMPLO DE MANEJO DE UNIDADE DE CONSERVAÇÃO VIA SIG-WEB

Vivian Castilho da COSTA


Professora Visitante do Departamento de Geografia Física, Instituto de Geografia, Universidade do Estado do Rio de
Janeiro (UERJ), e-mail: vivianuerj@gmail.com
Jefferson Pereira Caldas dos SANTOS
Bolsista de Iniciação Científica (IC/Pibic/UERJ) do Departamento de Geografia Física, Instituto de Geografia,
Universidade do Estado do Rio de Janeiro (UERJ), e-mail: jeffe_ufrj@yahoo.com.br

RESUMO
Os estudos desenvolvidos no Parque Estadual da Pedra Branca, localizado na zona oeste do
município do Rio de Janeiro, conduziram à elaboração de um “Guia Digital” que tem por objetivo
disponibilizar, via Internet e outros meios de comunicação digital, mapas temáticos sobre a área
protegida. Tais recursos cartográficos se traduzirão em produtos de divulgação que visam
proporcionar, aos visitantes e pesquisadores, informações detalhadas sobre as atividades
ecoturísticas desenvolvidas na referida unidade de conservação. A metodologia utilizada está
alicerçada na montagem de um banco de dados georreferenciado (SBDG) e na utilização de Sistema
de Informação Geográfica na Internet (SIG-WEB). Estas ferramentas foram utilizadas para realizar
consultas necessárias e para auxiliar os gestores na tomada de decisões relativas à gestão do
ecoturismo no PEPB. Todas as informações ajudarão o usuário que visita este espaço a planejar
convenientemente suas atividades e roteiros que atendam plenamente à uma melhora na demanda
ecoturística local.
Palavras-chave: manejo ambiental, ecoturismo, unidades de conservação, geoprocessamento e SIG-
WEB

ABSTRACT
The studies inside Pedra Branca State Park, located at west of the Rio de Janeiro city, led
to the elaboration of a "Digital Guide" whose objective is the availability of thematic maps of such
protected area, through Internet and/or other digital means. Such visual resources will result in
products that seek to provide, to visitors and researchers, detailed informations about ecotouristic
activities in this protected area. The methodology is based on the assembly of a georeference
database (SBDG) and Geographic Information System in Internet tools (GIS-WEB). Those
GIS tools will be used to the necessary consultations and to help managers in decision making
concerning to ecotourism in PEPB. All the generated information will help visitors in conveniently
planning their activities and itineraries to fully improve the local ecotourism demand.
Key-words: environmental management, ecoturism, protected areas, geoprocessing and GIS-WEB.

INTRODUÇÃO
As unidades de conservação públicas são o grande destino dos milhares de visitantes, que
buscam os ambientes naturais para lazer e prática de esportes e as trilhas, inseridas nelas. As trilhas
são a principal infra-estrutura de manejo de visitantes em áreas de elevado potencial para atividades
ecoturísticas. Infelizmente, a grande maioria das unidades de conservação brasileiras não dispõe de
recursos humanos e materiais para o manejo eficiente da malha de trilhas disponíveis aos visitantes.
Planos de manejo atualizados, definição de capacidade de suporte à visitação, rotinas de
monitoramento e, principalmente, equipes treinadas para a manutenção de trilhas são pouco
comuns, embora a relevância do tema seja evidente entre os dirigentes e seus parceiros.
O estabelecimento de atividades recreativas e de ecoturismo, principalmente em trilhas no
interior das unidades de conservação cariocas, ainda não ocorreu com base em planejamento
detalhado e eficaz, tanto no que diz respeito ao controle e mitigação dos impactos negativos, quanto
no fomento às atividades potenciais.
Uma das preocupações dos pesquisadores e administradores das principais unidades de
conservação do município do Rio de Janeiro é a proposição e/ou implementação de atividades de
Fórum Internacional do Meio Ambiente - A conferência da Terra 993

uso público voltadas para o lazer e ecoturismo, considerando o potencial (ainda pouco conhecido)
dessas áreas, paralelamente ao interesse crescente da população - tanto daqueles que residem
contíguos ou próximos a elas, quanto do visitante que vem de outras regiões (bairros e/ou cidades) e
países, atraídos pelo contato com a natureza. Na realidade, tais práticas já vêm sendo desenvolvidas
e divulgadas pela mídia em uma das mais importantes áreas protegidas da cidade do Rio de Janeiro
e de visitação intensificada, principalmente por estrangeiros, como é o caso do Parque Nacional da
Tijuca (de proteção integral), que inclusive apresenta publicações de divulgação internacional.
Outra forma de divulgação dessas atividades, que vem crescendo, principalmente nas
regiões e pólos ecoturísticos brasileiros, é a Internet, em resposta ao avanço tecnológico da
informática. Neste sentido, o geoprocessamento e as tecnologias de Sistema de Informação
Geográfica (SIG ou GIS - Geographic Information System), Processamento Digital de Imagens,
Cartografia Digital e Global Positioning System – GPS, têm-se tornado ferramentas valiosas nas
mais diversas áreas de conhecimento.
Na visão de Novo (1996, p.1), o Sistema de Informação Geográfica consiste em:
(...) um sistema computacional que permite o gerenciamento de dados espaciais. A
palavra ‘geográfica’ significa que os dados armazenados no sistema encontram-se
referenciados a um sistema de coordenadas geográficas (latitude e longitude). A palavra
sistema implica que um dado SIG comporta um conjunto de componentes que permite
não apenas armazenar dados, mas, sobretudo, manipular espacialmente tais dados de
modo a produzir informações relevantes.

Os SIGs constituem-se também em um ambiente tecnológico e organizacional que vêm


recebendo, cada vez mais, adeptos no mundo todo e se configurando como importante recurso
educacional (MENEGUETTE, 2004). Entretanto, para atender as necessidades dos usuários dessas
tecnologias, os diversos profissionais (Geógrafos, Engenheiros Cartógrafos, Biólogos, etc.) devem
considerar que o mapa é um meio de comunicação eficaz, quando associado a um projeto de banco
de dados cartográfico que considere a localização e caracterização ambiental da área e das
atividades a serem mapeadas.
O SIG voltado para a World Wide Web (Internet), ou seja, a publicação de mapas pela rede
mundial de computadores, vem conseguindo alcançar o objetivo maior que é a disseminação de
informação espacial para a sociedade, apesar de muitos aplicativos existentes não conseguirem
publicar mapas pela Internet de forma a caracterizar um SIG com todas as suas funcionalidades.
Isso significa que há limitações na velocidade de transmissão, tipos de representação (a estrutura
matricial é mais lenta que a estrutura vetorial dos mapas, apesar de terem proliferado vários
algoritmos de compactação e manipulação de imagens matriciais), custos de armazenamento, entre
outros fatores.
Neste contexto, o presente projeto teve como plano inicial demonstrar como utilizar
softwares de SIG Livre (OpenGIS) para manipulação de banco de dados (mapas digitais temáticos),
pesquisando e aplicando softwares de SIG e de disponibilização de mapas via Web. Neste
contexto, foi estudado o software de SIG Open Jump <http://openjump.org/wiki/show/OpenJUMP>
e sua publicação na rede (Web), usando o servidor de mapas livre denominado ALOV Map
<http://alov.org>.
A pesquisa então teve como objetivo principal desenvolver um projeto de divulgação dos
atrativos ecoturísticos, tomando como exemplo a segunda maior unidade de conservação do
município do Rio de Janeiro – o Parque Estadual da Pedra Branca, localizado na zona oeste da
cidade, cujos limites estão a partir da cota altimétrica de 100 m do maciço da Pedra Branca.
A referida unidade de conservação apresenta uma área com cerca de 12.500 hectares e o
Plano de Manejo do Parque encontra-se em fase de aprovação pelo órgão gestor (Fundação Instituto
Estadual de Florestas – IEF/RJ). O maciço da Pedra Branca compõe, juntamente com os maciços da
Tijuca e Gericinó-Mendanha, as principais feições geomorfológicas da cidade e apresenta o ponto
culminante do município com 1.024 m de altitude.
Fórum Internacional do Meio Ambiente - A conferência da Terra 994

As informações geográficas sobre as atividades ecoturísticas em trilhas foram ainda


disponibilizadas digitalmente através da confecção de uma interface de home-page, usando
ferramentas também livres como o software grátis de criação de sites denominado “Nvu” versão 1.0
<http://www.nvu.com>, criado pela Linspire Inc. O site, denominado “Projeto Mapa Virtual do
Parque Estadual da Pedra Branca” <http://www.guiapepb.infotrilhas.com>, está na Web, em caráter
provisório, através do portal da internet sobre trilhas e ecoturismo denominado Infotrilhas
<http://www.infotrilhas.com>. O objetivo de realizar a home Page é o de divulgação do produto,
para disseminar o conhecimento do PEPB ao público (eco)turista em geral e pesquisadores
interessados nas informações geográficas e ambientais do maciço.
Uma das metas do projeto é o de possibilitar o planejamento e o manejo da unidade de
conservação pelos seus administradores (Instituto Estadual de Florestas – IEF –
http://www.ief.rj.gov.br/), no que se refere aos mapas detalhados sobre a área proposta: o Parque
Estadual da Pedra Branca – PEPB e seu maciço de mesmo nome (figura 1) e seus roteiros de
ecoturismo. A elaboração dos mapas virtuais através de softwares livres e disponibilizados na Web
é uma forma de atingir esta meta.

Figura 1: Mapa de localização com limite do PEPB na cidade do Rio de Janeiro (à


esquerda) e “zoom” do PEPB (à direita) com divisão de bairros, visualizados através do site do
Projeto “Guia Digital”. Composição colorida da imagem de satélite Landsat 7 (INPE, 1997). Fonte:
Elaboração própria.

FASES METODOLÓGICAS DA PESQUISA


A presente pesquisa teve como metodologia principal a construção de um Guia Digital
(Atlas) contendo mapas virtuais disponibilizados via Internet e através de mídia eletrônica (CD-
rom). Os mapas virtuais, realizados com recursos de SIG (Sistema de Informação Geográfico),
disponibilizam também banco de dados geográfico, contendo informações sobre as características
geográficas e as atividades ecoturísticas passíveis de serem desenvolvidas nas principais trilhas do
PEPB (principalmente na sua sede do Rio Grande e subsede do Camorim).
Portanto, as fases para o desenvolvimento da pesquisa, respeitando o plano inicial da
pesquisa que constava no seu cronograma de atividades do projeto encaminhado por ocasião do
pedido de bolsa, foram as seguintes:
Levantamento da cartografia digital do maciço da Pedra Branca e de softwares de SIG.
Confecção dos mapas digitais para Web e mídia eletrônica.
Realização de trabalho de campo para o mapeamento de atrativos (culturais e bióticos).
Confecção do Tutorial (“passo-a-passo”) do uso do Alov Map no projeto.
Para melhor entendimento, cada uma das fases será detalhada no item de resultados a seguir.

RESULTADOS OBTIDOS
Fase 1: Levantamento da cartografia digital do maciço da Pedra Branca e de softwares de SIG.
Fórum Internacional do Meio Ambiente - A conferência da Terra 995

O Guia obteve, como apoio cartográfico, os mapas digitais temáticos realizados por
pesquisadores na área de estudo, a exemplo de COSTA (2002) e COSTA (2006), além de
mapeamentos realizados pela Prefeitura da Cidade do Rio de Janeiro (IPP, 2000).
Inicialmente procurou-se entender o funcionamento de algumas das ferramentas de SIG
voltadas ao mapeamento de atrativos, trilhas e informações cartográficas digitais, para que fossem
usados sem custos para todos os usuários da internet e para auxiliar os gestores na tomada de
decisões relativas ao planejamento e gestão do ecoturismo no PEPB.
Os cartogramas digitais temáticos trabalhados no Alov Map foram:
Regiões Administrativas do município do Rio de Janeiro, baseado em cartografia digital da
Prefeitura da Cidade (IPP, 2003).
Bairros (divisão) do município do Rio de Janeiro, baseado em cartografia digital da Prefeitura da
Cidade (IPP, 2003).
Limite do PEPB (curva de nível - cota altimétrica de 100 metros), baseado em cartografia digital da
Prefeitura da Cidade (IPP, 2003).
Estradas do maciço da Pedra Branca (COSTA, 2006).
Acessos Secundários (trilhas, caminhos, circuitos, travessias e bifurcações), COSTA (2002 e 2006).
Bacias Hidrográficas (divisão) do maciço da Pedra Branca, COSTA (2002 e 2006).
Drenagem (rios e córregos) do maciço da Pedra Branca, baseado em mapeamento copilado por
COSTA (2002 e 2006).
Pontos notáveis (pontos culminantes e mirantes), COSTA (2006).
Curvas de nível (plano altimétrico do PEPB), COSTA (2006).
Vertentes (norte, leste e oeste) do PEPB, COSTA (2006).
Landsat, SPOT e Ortofoto (imagem de satélite do município do Rio de Janeiro) em suas
composições coloridas: Landsat 7 (INPE, 1998) de todo o município e Spot 5 (2004) do PEPB
(COSTA, 2006), além do mosaico de ortofotos (fotografias aéreas digitais) do PEPB (COSTA,
2006).
Uso do Solo, dividido nas classes: área ocupada, corpos d´água, cultivo/cultura, floresta,
macega, capim/campo, reflorestamento, pedreira/saibreira e terrenos rochosos, COSTA (2006).
Litologia do maciço da Pedra Branca, dividido em: direção e mergulho de xistos,
bostonito, lamprófiros não especificados, campitonito, monchiquito, fonolito, diabásio ou diques de
basalto, zonas de falhamentos ou fraturas e veios de quartzo, COSTA (2002 e 2006).
Geologia do maciço da Pedra Branca, dividido nos seguintes tipos: aluvião, granito
plutônico, área de ocorrência mista de microclinas-gnaisses e plagioclásio-quartzo, biotita-
plagioclásio, granodiorito, gnaisses da série inferior e aplitos/biotita-gnaisse da série inferior,
COSTA (2002 e 2006).
Atrativos (culturais e bióticos da bacia do rio Grande e da bacia do rio Camorim), com os
seguintes tipos: travessia de córrego, sub-sede, sede, reservatórios e açudes, pontos de observação
de pássaros, pontos de observação de paisagem (mirantes), pontos de interesse histórico, grutas,
cachoeiras e árvores centenárias, mapeamento baseado em observações de trabalhos de campo
realizados em 2006/2007 pela pesquisadora.
Foram realizados levantamentos e estudos detalhados dos tipos de softwares que seriam
necessários para alicerçar tanto a visualização em aplicativos cartográficos automatizados como o
mapeamento, em escala de detalhe, da área de estudo, utilizando Sistema de Informação Geográfica
(SIG).
Existem dois tipos de servidores de mapas disponíveis no mercado: os comerciais e os
livres (MIRANDA & SOUZA, 2003). Os produtos comerciais geralmente são oriundos de
empresas tradicionais do mercado do SIG, como: Autodesk – http://www.autodesk.com.br,
Intergraph – http://www.intergraph.com, Sisgraph – http://www.sisgraph.com.br, ESRI
(Environmental Systems Research Institute) – http://www.esri.com, entre outras. Porém, o maior
entrave no uso dos produtos comerciais é o seu custo, aliado ao fato da necessidade de fidelidade
que o usuário deve ter com o seu fornecedor, adquirindo novas licenças e atualizações para o seu
uso.
Fórum Internacional do Meio Ambiente - A conferência da Terra 996

Os produtos livres são aqueles que apresentam a facilidade de possuírem código fonte
aberto e não possuírem custos de compra, sendo apenas necessário compartilhar com a comunidade
de usuários e seus criadores as funcionalidades, alterações ou criações de novas aplicabilidades de
seus programas. Por estes motivos, é que neste projeto foi priorizada a utilização de produtos
livres, optando-se por dois deles: um de SIG e outro de servidor de mapas para a Web, dentre vários
que foram encontrados disponíveis.
Neste sentido, foram utilizados os seguintes softwares:
(a) Licenciado (comercial): Licença do software da ESRI - ARCVIEW GIS 9.0, disponibilizado
pelo Núcleo de Ensino e Pesquisas em Geoprocessamento (NEPGEO) do Deptº de Geografia da
UERJ, coordenado pela Profª Drª Liane Maria Dornelles;
(b) Gratuitos (de acesso livre/Open GIS/Open Source e de uso acadêmico): estes foram os mais
utilizados no projeto, principalmente o Open Jump (VIVID Solutions e JTS) por ser de interface
parecida com o ArcGIS.

Para cada plano de informação foi definida uma legenda. Todos os mapas estavam,
originalmente, na escala de 1:10.000, foram georreferenciados na projeção UTM (Universal
Transversa de Mercator) e na extensão tipo shape (ESRI), podendo ser visualizados e manipulados
através do software de SIG Open Jump, conforme mostram as figuras 2 e 3.

Figura 2: Exemplos de mapas com limite dos bairros da cidade do Rio de Janeiro e bacias
hidrográficas do PEPB, visualizado no software de SIG Open Jump. Fonte: Elaboração própria.

Figura 3. Exemplo de mapa com trilhas, drenagem e curvas de nível do PEPB, visualizado no
software de SIG Open Jump. Fonte: Elaboração própria.
A área de Geotecnologias (uso de tecnologias em geoprocessamento), durante vários anos,
esteve dominada por soluções em softwares de elevado custo e formatos proprietários. Contudo,
softwares de sistema livre (SL) e código aberto estão, cada vez mais, modificando este cenário no
Brasil, pois não só as empresas, mas órgãos públicos das várias áreas das geociências (Geografia,
Cartografia, Biologia, entre outras) - contando com um forte apoio do Governo Federal, com a
Fórum Internacional do Meio Ambiente - A conferência da Terra 997

criação do “Guia Livre do Governo Federal” <http://www.governoeletronico.gov.br/> - vêm


utilizando em seus projetos softwares de SIG Livre (Free GIS) - <http://freegis.org/>. A isenção do
custo de licenciamento é apenas uma característica do SIG Livre que tem criado um ambiente ideal
para a contínua expansão e melhoria dos serviços públicos, como destaca Uchoa & Ferreira (2004):
O rápido crescimento do SL tem “inundado” o mercado com diversas aplicações em vários
segmentos. Hoje quando se pensa numa solução livre para groupware, tem-se uma variedade de
soluções disponíveis sem custo de licenciamento. O mesmo já está ocorrendo na área de
Geotecnologias onde vários sistemas podem atender uma determinada demanda do usuário. Com
vários caminhos possíveis, fica a dúvida sobre como escolher a melhor solução para uma
determinada situação. (p. 15).
Dois recentes movimentos mudaram este quadro abrindo possibilidades de uso e interações
entre os vários sistemas, principalmente para os SIGs. Estes movimentos foram: a criação do
consórcio internacional Open Geospatial (OGC Open Geospatial Consortium, Inc) -
<http://www.opengeospatial.org/>, a revolução do software livre regida pela Free Software
Foundation, pela Gnu Public License (GPL) <http://www.gnu.org/philosophy/> e pelo Open Source
GIS <http://opensourcegis.org/>.
Portanto, a pesquisa foi apoiada no uso das tecnologias livres, não esquecendo a
interoperabilidade, ou seja, sem deixar de pensar que diferentes sistemas proprietários ou livres
podem interagir entre si, estando em conformidade com os pressupostos da OGC, e, por este motivo
foi aplicando no projeto o Open JUMP (Java Unified Mapping Platform) como software de Open
Source GIS.

Fase 2: Confecção dos mapas digitais para Web e mídia eletrônica


Quanto aos servidores de mapas na Web, existem diversos métodos para disponibilizá-los
que diferem entre si. Um deles tem relação com a apresentação e outro com a forma de execução.
A apresentação dos mapas pode ser estática ou dinâmica e cada uma destas categorias pode ainda
ser subdividida em mapas “somente para ver” (view-only) e mapas interativos (KRAAK, 2001 e
MEDEIROS et al, 2005), conforme podemos observar a seguir:
Mapas estáticos
“somente para ver” - são mapas disponíveis para visualização, apenas como produtos
cartográficos originais, não permitindo alteração de escala e de temas a serem visualizados;
interativos - são também denominados mapas “clicáveis”, funcionando como uma interface
para outras fontes de informação na Internet. O usuário pode executar funções como as de: zoom
(aproximação e afastamento) e pan (deslocamento no mapa), além de definir conteúdos a serem
exibidos na página através da troca de camadas de informação.
Ambos os tipos foram usados na home-page confeccionada para o projeto (figura 4).
Alguns mapas estáticos “somente para ver” foram ainda disponibilizados nos links do site “O
projeto” e “Mapas virtuais”, podendo ser visualizados em arquivo no formato Acrobat Reader
(PDF) e abrindo imagens no Google Earth, como demonstra a figura 5, além do link para os mapas
interativos que podem ser abertos pelo Alov Map.
Fórum Internacional do Meio Ambiente - A conferência da Terra 998

Figura 4: Página inicial (à esquerda), os links de explicação da home-page sobre o Projeto


Mapa Virtual com mapas estáticos (PDF) (ao centro) e o link para os mapas interativos em Alov
Map – Java (à direita). Fonte: Elaboração própria.
Mapas dinâmicos
“somente para ver” – podem ser simplesmente imagens animadas onde cada uma
representa um quadro da animação, continuamente disponibilizados pelo browser;
interativos – as informações de um banco de dados são integrados às informações de
elementos gráficos em um único mapa e, através de um clique do mouse, possibilitam a obtenção
dos elementos. Permitem também: adicionar e subtrair temas na forma de camadas para serem
visualizados; localizar objetos geográficos através de seus atributos; e executar operações de zoom,
através de menus interativos sobre o mapa.
Os mapas dinâmicos “somente para ver” estão disponíveis no ALOV Map quando o usuário
abre o browser para visualizar os mapas.
O ALOV Map <http://alov.org/index.html> é um software gratuito para uso pessoal,
educacional e não comercial, e é uma aplicação cliente-servidor que permite a publicação, consulta
e exploração de informação geográfica vetorial e raster na Internet e permite também que sejam
visualizadas camadas, legendas, pop-ups ou até imagens. O acesso à informação é feita por
browsers de Internet, com retorno de imagens raster (imagens nos formatos GIF, JPG, MrSID,
WMS-OGC) ou vetorial (mapas nos formatos shapefile, Mapinfo MIF, SQL database - Interbase,
MySQL, MSSQL, Hypersonic e MIF), utilizando-se da máquina virtual Java para rodar. O ALOV
Map é de simples instalação e possui ótima interação com o usuário. Uma vez carregada, a
aplicação possibilita ao utilizador acessos rápidos às informações, facilidade de inserção de imagens
e possui boa documentação de consulta e manual de instalação e uso via Web (disponível em
HTML pelo site do programa).
O ALOV Map pode ser usado de duas maneiras: cliente ou cliente/servidor. A versão
cliente é um applet (programa escrito na linguagem de programação Java - FLANAGAN, 1996;
FLANAGAN, 1999, apud MIRANDA & SOUZA, 2003) para visualização de dados no formato
SHAPE da ESRI que, cada vez que é inicializado, permite que o servidor HTTP baixe todos os
arquivos de mapas na máquina cliente, desde que se tenha cuidado com o tamanho dos arquivos, se
não o tempo de transmissão se torna longo. A versão cliente/servidor do ALOV Map (usando
servlet) é mais flexível (permitindo transferir dados mais rapidamente e de forma eficiente), pois os
atributos espaciais são armazenados em um banco de dados SQL (Interbase ou MySQL) de acordo
com padrões SFS da OpenGIS (ALOV, 2002).
Para que os mapas sejam exibidos pelo ALOV Map é preciso configurar em um arquivo
escrito na metalinguagem XML (Extended Markup Language) ou chamado arquivo do projeto,
composto de quatro seções: identificação, domínio, mapas temáticos e planos de informação.
No início do projeto, optou-se pelo tipo applet do ALOV Map, visto que a home-page do
“Guia Digital” ainda estava sendo confeccionada. A partir da finalização do banco de dados dos
Fórum Internacional do Meio Ambiente - A conferência da Terra 999

mapas temáticos125, trabalhados no Open Jump, a sua apresentação na rede pôde ser efetivada
através da versão cliente-servidor do Alov Map, definidos em planos de informação126 e hospedada
no portal do Infotrilhas.com.
Além disso, o método de disponibilização considerado para os mapas foi o dinâmico
interativo (figura 5 e 6), para que o usuário avalie e troque as camadas (planos de informação) dos
mapas do PEPB, além de realizar consultas mais detalhadas sobre a base de dados, através de
ferramentas “query” denominada “Consulta” e que se encontra ao final da janela principal de
apresentação dos mapas temáticos.

Figura 5: Mapa dinâmico interativo com planos de informação: RAs, Bairros, limite do
PEPB, estradas e acessos secundários (à esquerda) e limite do PEPB, drenagem, bacias, drenagem e
pontos notáveis (à direita). Fonte: Elaboração própria.

Figura 6: Mapa contendo os layers (planos de informação): curvas de nível, vertentes e


imagem de satélite Landsat 7 (à esquerda) e uso do solo e imagem SPOT 5 do PEPB (à direita).
Fonte: Elaboração própria.

Fase 3: Realização de trabalho de campo para o mapeamento de atrativos (culturais e bióticos).


Foram realizados trabalhos de campo às trilhas principais que saem da sede (Rio Grande) e
Subsede (Camorim) do PEPB, a fim de detalhar os principais atrativos dessas áreas mais visitadas
da UC.
O Guia Digital, tanto através de sua interface da internet quanto de seu conteúdo em mídia
eletrônica (cd-rom), foi concebido com base em estudos sobre a utilização da semiótica e de
modelos iconográficos próprios para a confecção das legendas. A legenda de um mapa ou
representação cartográfica é um elemento importante e de grande auxílio para a leitura e

125
O conceito de “mapa temático” no ALOV Map não representa o mesmo conceito de “mapa temático geográfico”.
Quando se escolhe um “mapa temático” no ALOV, o aplicativo não interpreta a ordem como “mostre os atributos
geográficos deste tema”, mas sim “mostre a legenda associada a este tema”.
126
Os planos de informações no Alov Map são os dados espaciais reais que serão mostrados no navegador e que são
definidos no arquivo de configuração XML do projeto, fazendo a ligação física destes com os mapas existentes no
diretório de trabalho.
Fórum Internacional do Meio Ambiente - A conferência da Terra 1000

interpretação das informações que se quer representar. Formar conjunto de símbolos, cores e texto
nas legendas não é uma tarefa fácil e ainda mais quando se trata de expô-las através de meios
digitais ou na internet. Alguns símbolos e cores são convenções, ou seja, utilizados no mundo
inteiro para representar uma mesma feição ou objeto.
No entanto, se tratando do Alov Map, algumas representações visuais para as legendas
(cores e simbologias) foram usadas através de exemplos que podem ser baixados do site do
software em <http://alov.org/docs/mapspace3.html> e/ou através da importação de dados para o
layout do Applet <http://alov.org/docs/applet_layout.html> que possui exemplos de projetos que
podem ser aproveitados, como foi o caso do Projeto do “Guia Digital”.
Outros símbolos (pictogramas) foram usados para representar algumas informações
referentes ao contexto turístico, principalmente no plano de informação “atrativos”. Para tal, foram
usados os pictogramas do “Guia de Sinalização Turística” produzido pela EMBRATUR, Denatran
(Departamento Nacional de Trânsito) e Iphan, disponível na internet em:
<http://institucional.turismo.gov.br/sinalizacao/conteudo/basemenu.html> que podem ser
visualizados na figura 7.

Figura 7: Plano de informação contendo símbolos turísticos (EMBRATUR/Denatran/Iphan) usado


como legenda para os “atrativos” do PEPB. Fonte: Elaboração própria.

Fase 4: Confecção do Tutorial (passo-a-passo) do uso do Alov Map no projeto.


O Projeto concebido através do Alov Map pode ser difícil de ser utilizado por usuários
leigos em aplicativos da internet. Por este motivo, foi pensado na capacitação do usuário em
entender como funciona as ferramentas do projeto de Guia Digital do PEPB através da Web,
realizando um passo-a-passo sobre o uso do Alov com a criação de um link em HTML contendo
texto e vídeo explicativo (figura 8). Neste sentido, o tutorial também serve de meio de disseminação
sobre SIG e softwares livres de criação e disponibilização de mapas via Web.

Figura 8: “Passo-a-passo” em HTML e vídeo explicativo (tela de abertura).

Acessado através do site em <http://www.guiapepb.infotrilhas.com/pepb_1/2008-02-


01_1615.swf>, o “passo-a-passo” foi feito em HTML, bastando clicar no ícone de interrogação
(figura 7). O vídeo foi confeccionado através do software gratuito denominado “Jing Project”
Fórum Internacional do Meio Ambiente - A conferência da Terra 1001

(versão 1.4.8028) da TechSmith Corporation, que é uma ferramenta de animação e criação de


imagens e vídeos, salvando-os no formato PNG, possuindo 5 minutos de duração.
4 – Considerações Finais
Apesar de fácil instalação e com recursos simples de utilização, o Alov Map, é uma
aplicação que não roda em todos os browsers: exige 128 Kps de velocidade mínima na Internet, há
limitação no tamanho das imagens raster (máximo de 1 Mb) e para criação de novas
funcionalidades é necessário conhecimentos de Java e JavaScript.
Manipular mapas na Internet não é tão simples assim, pois não é o mesmo que manipular
um SIG convencional. Os mapas na Web são para um público diferenciado, o desenvolvimento da
arquitetura é complexo e outros fatores como: a segurança dos dados, a interação analista-aplicação,
a gerência dos dados, a base de suporte para o sistema funcionar, os equipamentos etc, são
abordados de maneira diferente entre os dois modelos, o que exige uma equipe multidisciplanar
composta por engenheiros cartográficos, analistas de sistemas ou de processamento de dados
(experts em Java e internet), a qual foi difícil obter em função dos custos e da disponibilidade do
projeto realizado durante 1 ano de vigência, por ocasião da bolsa de fomento “Fixação de
Pesquisador” fornecida pela Fundação de Amparo à Pesquisa do Estado do Rio de Janeiro –
FAPERJ.
Estão sendo estudados novos recursos do Alov Map para que possam ser realizados
cálculos estatísticos e medidas de distâncias entre atrativos em uma trilha, extensão de feições como
estradas e acessos secundários, entre outras análises à semelhança do que um usuário de SIG
poderia realizar. Tal tarefa irá possibilitar que os gestores do PEPB possam realizar uma interação
maior com o Guia Digital, inclusive realizando análises mais detalhadas sobre a referida unidade de
conservação. Outros softwares livres de geração de mapas para servidor serão testados a exemplo o
Map Server para dinamizar as interações cliente-servidor e dos usuários com os mapas interativos.
As perspectivas futuras da pesquisa é que o projeto obtenha maiores recursos,
proporcionados por parcerias com o poder público (através do Instituto Estadual do Ambiente -
INEA, novo órgão de gestão das unidades de conservação, criado pelo Governo do Estado do Rio
de Janeiro), além de organizações do terceiro setor que estejam interessadas em realizar projetos de
divulgação de banco de dados geográficos através da Internet, auxiliando no manejo integrado e na
preservação das unidades de conservação.

REFERÊNCIAS BIBLIOGRÁFICAS
ALOV. ALOV map: free Java GIS. [On line.]. <http://alov.org/index.html>. 2002. [Abril de 2007].
COSTA, Nadja Maria Castilho da. Análise Ambiental do Parque Estadual da Pedra Branca, por
Geoprocessamento: Uma Contribuição ao seu Plano de Manejo. Tese de Doutorado, PPGG -
UFRJ, Rio de Janeiro. 317p., v. 1 e 2, 2002.
COSTA, Vivian Castilho da. Propostas de Manejo e Planejamento Ambiental de Trilhas
Ecoturísticas: Um estudo no Maciço da Pedra Branca - Município do Rio de Janeiro (RJ). Tese de
Doutorado, PPGG - UFRJ, Rio de Janeiro. 304p., v. 1 e 2, 2006.
INSTITUTO MUNICIPAL PEREIRA PASSOS - IPP. [On line.]. Base GeoWeb do Município do
Rio de Janeiro. Mapas digitais em shape disponíveis no Armazém de Dados – IPP - DIG, 2003.
Rio de Janeiro: Prefeitura Municipal do Rio de Janeiro, Secretaria Municipal de Urbanismo.
<http://www.armazemdedados.rio.rj.gov.br>. [21 de Abril de 2006].
KRAAK, Menno-Jan. Setting and needs for web cartography. In: M. J. Kraak & A. Brown (Eds.),
Web cartography: Developments and prospectus, pp. 1-7. London: Taylor & Francis, 2001.
<http://kartoweb.itc.nl/webcartography/webbook>.
MEDEIROS, Levindo Cardoso; OLIVEIRA, Luciano Correia Santos de & SILVA, Márcio Martins
da. Sistema de disponibilização de informações geográficas do Estado de Goiás na Internet (SIG
OnLine). [On line.]. Trabalho de conclusão do curso de Tecnologia em Geoprocessamento. CEFET:
Goiás. 2005. 55p. <http://www.seplan.go.gov.br/sieg/ downloads/SIG_ONLINE.pdf>. [17 de
janeiro de 2008, 21:20].
Fórum Internacional do Meio Ambiente - A conferência da Terra 1002

MENEGUETTE, Arlete & GIRARDI, Eduardo Paulon. Introdução ao software de Cartografia


Temática Philcarto. [On line.]. Revista Ciência em Extensão. v.1, Educação (Supl.), p. 122. 2004
<http://www.unesp.br/proex/repositorio/revista/ rev_cien_ext.htm>. [18 de janeiro de 2008, 21:30].
ISSN: 1679 – 4605.
MIRANDA, José Iguelmar & SOUZA, Kleber Xavier Sampaio de. Como publicar mapas na Web.
[On line.]. In: Anais do XI Simpósio Brasileiro de Sensoriamento Remoto (XI SBSR), INPE: Belo
Horizonte, 2003. p. 349-355. <http://www.dsr.inpe.br/sbsr2007/biblioteca/>. [17 de janeiro de
2008, 19:50]. ISBN: 85-17-00017-X.
NOVO, Evlyn Márcia Leão de Moraes. Sensoriamento Remoto: Princípios e Aplicações. São
Paulo: Edgard Blücher. 2a Edição, 1996. 308p.
OPENJUMP. What is OpenJump? [On line.]. The JUMP Pilot Project.
<http://openjump.org/wiki/show/OpenJUMP>. [18 de janeiro de 2008].
UCHOA, Helton Nogueira & FERREIRA, Paulo Roberto. Geoprocessamento com software livre.
[On line.]. Versão 1.0. GeoLivre. 30p. <http//:www.geolivre.org.br>. [26 de outubro de 2004].
Fórum Internacional do Meio Ambiente - A conferência da Terra 1003

TERRITÓRIOS, IDENTIDADE E MEIO AMBIENTE: IMPLICAÇÕES ÉTICAS DAS


POLÍTICAS PÚBLICAS DO TURISMO NO RN

Antonio Jânio FERNANDES


Professor do departamento de Turismo da Universidade do Estado Rio Grande Norte, Discente do Curso de Doutorado
do Instituto de Geo-Ciências da Unicamp. birdpeace@hotmail.com
Dra. Arlêude BORTOLOZZI
Professora do departamento de Geografia da Universidade Estadual de campinas. arleude@unicamp.br

RESUMO
O presente artigo tem a pretensão de partindo das concepções sobre territórios, identidade
avaliar de um ponto de vista ético os impactos que as políticas públicas para o turismo, enquanto
principal atividade econômica do RN tem gerado sobre o meio ambiente e as populações autóctones
litorâneas.
Palavras-chave: Territórios, Identidade, Ética, Meio ambiente, Turismo

ABSTRACT
The present article has the pretension of leaving of the conceptions on territory, identity to
evaluate of an ethical point of view the impacts that the public politics for the tourism, while main
economical activity of RN has been generating on the environment and the autochthonous
populations
Key words: Territories, identity, ethics, environment, tourism.

INTRODUÇÃO
O turismo nas últimas décadas, pós-segunda guerra mundial, tem sido colocado como o
segmento que mais tem crescido e provocado o desenvolvimento da economia a nível mundial,
inserindo populações antes distantes, nos processos de produção e consumo capitalistas. Tem sido
também justificado como uma atividade que gera impactos socioambientais relativamente baixos se
comparados a outros setores econômicos, configurando-a em muitos aspectos a uma indústria sem
chaminé.
Uma analise, entretanto, mais cuidadosa de determinadas categorias conceituais como
território e identidade, permite-nos identificar impactos tão ou mais significativos quanto aos que
são gerados em outros setores da economia. Isto, todavia se coloca para que se avalie com mais
rigor ético o discurso do mainstream econômico e dos setores da administração pública usam para
justificar esta ou aquela atividade produtiva como sustentável.
No Rio Grande do Norte, assim como no nordeste, ases políticos públicas de
desenvolvimento do turismo, tão recentes, expressam também a forma como a nível nacional ocorre
a ocupação do seu território. Primeiramente de forma pontual e estanque, e na seqüência, mesmo
assumindo uma dimensão mais conseqüente, continuou de certa forma desconexa das realidades
locais e dos anseios dos segmentos populacionais menos privilegiados.
O grande foco desta política atribuiu às grandes extensões dos “vazios litorâneos”, ao
clima quente e a disponibilidade de sol o ano todo, a justificativa para que no NE se promova a
partir dos anos setenta o incremento do turismo de massa e assim se colocar a região na rota do
desenvolvimento nacional.
Com esta premissa se atribui a capacidade deste segmento em promover o
desenvolvimento regional a partir da inclusão de grandes contingente populacionais que estão a
décadas fora do mercado de trabalho, colocando o nordeste em estatísticas mais positivas quanto
aos indicadores sociais, marcados por uma longa trajetória de miséria e pobreza social. O turismo
passa assim a representar uma nova semiótica frente às antigas “frete de trabalho” que no século
vinte funcionou como políticas públicas de “ajuste social” entre as regiões no Brasil.
Nesta realidade, categorias como identidade, território e meio ambiente foram, de certa
forma, homogeneizadas em nome de uma política pública de desenvolvimento de uma região
geográfica com uma gama de diversidade geomorfoclimáticas, bióticas e culturais. E é por isso que
Fórum Internacional do Meio Ambiente - A conferência da Terra 1004

avaliá-las a partir da dimensão ética seja fundamentação para compreendermos os impasses que este
projeto vem causando ao longo de sua aplicação
Num primeiro tópico se situara o Rio Grande do Norte no contexto nacional e regional
quanto ao surgimento da atividade turística e das políticas públicas. Em seguida, as conceituais
atribuídas ao termo território e identidade que emergem com as discussões sobre globalização no
final do século XX. Por fim, a partir da dimensão ética e ambiental, destaca-se as premissas que
norteiam as políticas de turismo implementadas pelo BID para o RN

O RIO GRANDE DO NORTE E AS POLÍTICAS PÚBLICAS DO TURISMO


O Rio Grande do Norte, considerado a “Esquina do Mundo”, o ponto mais próximo da
África e da Europa, e escolhido como ponto estratégico pelas forças aliadas na segunda guerra
mundial, com seu território de 53.077 km2, uma faixa de litoral de 410 km de praias, com um
conjunto de belezas naturais paradisíacas, de riquezas minerais as mais diversas (IDEMA, 2002) e
os relatos de sua historia, desde o Brasil colônia, permite-nos afirma que a atividade turística,
mesmo de maneira informal, precária, prematura já podia ser percebida como uma tendência, uma
possibilidade a ser desenvolvida e estruturada.
Neste sentido, três momentos parecem ser marcantes para compreendermos esta hipótese:
inicialmente a década de 1920, em seguida a década de 1940 ambas caracterizadas pela ausência de
políticas públicas especificas para o setor; e por fim, a década de 1980 marcada por uma política
pública inovadora, e dinâmica que coloca o turismo como uma das prioridades nas ações do
governo Estadual.
O mundo acabara de iniciar o século XX, e já vinha marcado pela possibilidade de
conflitos territoriais que culminaram em duas grandes guerras. Todavia, estas tiveram como palco a
Europa, espaço onde a atividade turística ocorria de certa forma estruturada. Do “novo mundo” a
incipiente imprensa européia dava destaque à vida modesta, e tranqüila que este povo desfrutava, às
belezas paradisíacas e as riquezas naturais que abasteciam as indústrias do velho mundo com
matérias-prima, como algodão, látex, madeira, cana-de-açúcar.
Estes destaques colocaram o RN no século 1920 como rota que liga o Brasil com o mundo,
através de Dakar, tornando-se o destino de inúmeros viajantes, curiosos, empreendedores e
saqueadores. (Cascudo,1999). Este fluxo gerou o surgimento de equipamentos rudimentares de
hotelaria, prostíbulos que podem ser indicadores de que a atividade turística ocorria, mesmo que
não fosse explicitamente identificada como a designação oficial proposta pela OMT.
Entretanto, esta é uma questão epistemológica que se encontra no cerne do entendimento
do que seja turismo, e que deve ser feita com brevidade para dirimir a dimensão economicista a que
foi submetida à prática turística.
O segundo momento (década de 1940) caracterizado pelo período de guerra provocou
alterações profundas na dinâmica socioambiental, econômica, política, no ordenamento urbano do
território potiguar, nas noções de territorialidade e identidade. A presença de grandes fluxos de
militares, de cargas, se associadas aos os fluxos contínuos de civis (principalmente advindos do Rio
de Janeiro e São Paulo); a existência de equipamentos tais como hotéis, espaços de lazer (mini-
cassinos, prostíbulos, cinemas) e a presença de um mercado imobiliário já bastante atuante (SILVA,
2003) permite-nos afirmar que neste período a atividade turística no RN, diferentemente dos anos
vinte, já toma proporções muito maiores e anunciava alguns indicadores que caracterizam esta
atividade na atualidade.
Todavia, do entusiasmo inicial a depressão do pós-guerra somente a partir da década de
1970 é que o RN passa a despertar o interesse de empresários e do governo pela atividade turística
(Trindade, 2007) mais ainda de forma muito residual ate o início da década de 1980, embora já se
destacasse como um destino doméstico (LOPES JUNIOR, 2000).
A construção da “Via Costeira” em 1985 é o marco que muitos justificam como o início da
atividade turística no RN. As ações de governo para a efetivação deste empreendimento foram
decisivas e incitou diversos segmentos locais, estabelecendo publicamente pela primeira vez na
historia do Estado um conflito territorial, identitário e ético onde o foco era a questão dos impactos
Fórum Internacional do Meio Ambiente - A conferência da Terra 1005

ambientais que a construção causaria por mais de 10 km de extensão em uma área de proteção
ambiental (Parque das Dunas) e pelo deslocamento de antigas comunidades pesqueiras.
O objetivo inicial do Projeto inicial era de construir uma “Copacabana Local” (LOPES
JUNIOR, 2000). Mas os conflitos territoriais e identitários se expressaram de forma midiática, e,
mesmo não deixando de expressar uma opção preferencial pelas elites econômicas locais tem seu
foco destinado para indústria hoteleira que passa a adquiri-la ao custo de U$ 0,68 a U$ 5,60 o metro
quadrado, quando em Ponta Negra esta mesma razão já correspondia a U$ 55,00 e na periferia a U$
8,00 (LOPES JUNIOR, 2000).
Com o propósito de interligar as antigas praias do centro com a de Ponta Negra, a Via
costeira consolida o seu objetivo final de tornar o Rio Grande do Norte um destino internacional.
Dos 100 leitos e um Hotel (Parque da Costeira) de sua construção inicial, atualmente possui
aproximadamente três mil leitos, distribuídos em doze empreendimentos, quase todos de redes
internacionais.
Contudo, esta política é notoriamente um marco divisor nas relações entre o Estado
Brasileiro e o RN, pois até então observável que desde o Brasil colônia, até o segundo império,
tanto na republica velha, como na nova. Assim como na república democrática populista até o
regime militar as ações governamentais em relação ao desenvolvimento econômico do RN
(Trindade, 2007) salvo algumas exceções, sempre foram esporádicas e difusas, mesmo para aqueles
setores onde o estado já havia demonstrado um potencial127.
A política pública para o turismo representou assim, de certa forma uma ruptura com a
lógica nacional que tinha no nordeste, e no RN uma imagem histórica vinculada ao assistencialismo
governamental como forma de minimizar as mazelas provenientes das condições ambientais.
Parecia que o RN mediante as inúmeras dificuldades finalmente alçou ao patamar de
reconhecimento pelo governo federal mediante a descoberta de sua vocação econômica, depois de
mais de três séculos.
O Programa de Desenvolvimento do Turismo-Nordeste – Prodetur/NE128 consolida esta
perspectiva a partir dos anos noventa investindo na sua primeira faze (1996-2000) mais de US$ 40
milhões e destinou para uma segunda faze US$ 65 milhões (PDITS, BNB,2002) já estão sendo
aplicados. Em todo o Nordeste esta cifra ultrapassa dos bilhões de dólares, e tem o objetivo
precípuo de fomentar um turismo maciço e internacionalizado na região (CRUZ, 2007).
Tal magnitude de investimentos num setor que é basicamente voltado para o atendimento
de fluxos humanos exógenos e exaustivamente circulantes, provoca profundas alterações nas
dinâmicas ambientais e sociais de localidades transformadas em destinos turísticos. Os fluxos
tangíveis e intangíveis, materiais e simbólicos, na contra encenação do cotidiano mistificam os
significados sociais de pertença e alteridade e tornam complexas as noções de território e identidade
como dimensões construídas num processo de interação entre homem e meio ambiente, a partir de
concepções éticas elaboradas num processo relacional, contiguo-continuo onde sentimentos,
produção, ócio, entretenimento-lazer fazem parte de um mesmo cotidiano.
Estas perspectivas tem sido a tônica de quase todos os projetos de turismo desenvolvidos
com financiamento do BIB, do BIRD, do FMI no Equador, Argentina, Peru, Índia, Indonésia,
Palestina, apresentados no V Fórum Social Mundial em janeiro de 2005. No Brasil.
A exacerbação midiática do destino RN (mais exclusivamente a região metropolitana de
sua Capital, tem dentre outros impactos gerado um (deso)rdenamento urbano resultado de um
crescimento do mercado imobiliário, prioritariamente destinado a segunda moradia e a mega
empreendimentos de Hotelaria no estilo “All inclusive”. Segundo dados do Sindicato da Industria

127
Como no caso da agricultura onde conforme nos indica Santos (1994) após a década de 1970 o Governo Cortez
Pereira cria algumas políticas governamentais para a fruticultura irrigada.
128
Conforme BENI (2006) e Cruz (2007) este programa foi criado em 1991 com previsão de ser implementação durante
26 anos e tem recebido recursos externos oriundos do BID, do BIrd e do Banco Mundial. Na concepção de Silva e
Nogueira, estes não figuram apenas como agentes financiadores, mas como mentores intelectuais, construtores da lógica
desses programas ((Silva e Nogueira, V Fórum Social Mundial, 2005).
Fórum Internacional do Meio Ambiente - A conferência da Terra 1006

da Construção Cível do RN (Sinduscon) a expectativa de lançamentos nos últimos três anos, batem
a casa de R$ 1,15 bilhões e a quantidade de lançamentos previstos para 2007 atingiu mais de 100%
dos dois anos anteriores (TRIBUNA DO NORTE, EDITORIA ECONÔMICA, 14/10/2007), no ano
passado (1996) dos 123 milhões de reais de capital estrangeiro que entraram no estado, 68% foram
destinados para o turismo imobiliário (http;//www.rnnoticias.com.br).
Esta realidade, entretanto nos leva a afirmar que uma nova forma de colonização, um neo-
colonialismo esta em curso e o papel do Estado, dos seus gestores tem sido de fomentá-lo ainda
mais à medida que engendram políticas públicas que conduzem ao favorecimento destes
empreendimentos, ao mesmo tempo em que não apresentam uma política séria que reduza as
carências habitacionais anunciadas pelas estatísticas públicas
Os Investimentos em infra-estrutura: saneamento básico, coleta de resíduos sólidos e
líquidos, dentre outros anunciados nos PDITS para o RN tem nitidamente este propósito atendendo
em parte estes destinos, criando áreas de periferização que estas localidades não tinham. Neste
contexto fica claro que as formas de globalização apóiam uma forma de desenvolvimento que não
tem beneficiado as comunidades locais (SURESH e RANGAM, 2005).
As políticas públicas para o turismo no RN seguem o mesmo roteiro de tantas outras em
todo o mundo. No entanto, o impasse maior reside na forma como tem se dado esta construção que
sublima os conflitos éticos, territoriais, identitarios, e ambientais numa dimensão de uma
participação que não tem nada de dialógico.

DAS NOÇÕES CONCEITUAIS DE TERRITÓRIO E IDENTIDADE A


(RE)TERRITORIALIZAÇÃO DO RN PELO TURISMO
As noções sobre território conduz a uma compreensão imbricada a noção de identidade.
São ambas fundamentais para compreensão das dinâmicas sociais, econômicas, políticas e
ambientais porque expressam as relações de poder que fundamentam as superestruturas em
qualquer sociedade.
O Turismo como parte destas dinâmicas na atualidade, pelas complexas e intrincadas
relações, (re)edita implicitamente no cotidiano noções “reificadas” de identidade que parece não ter
nada a ver com o território-lugar vivido, ou o território pouco expressa estes laços identitarios.
Quando nos referimos a território, inúmeras noções a designam com um vínculo intrínseco
as relações de poder que são inerentes ao convívio humano. Seguindo a mesma idéia de Raffestins
onde território é “um espaço onde se projetou um trabalho, e que, por conseqüência, revela relações
marcadas pelo poder (1993). Andrade (1995) Souza (2001), Santos (2002), Saquet (2004) revelam
implicitamente as noções de identidade como construto que, somente no cotidiano se revelam.
Sendo necessário ir muito além das noções de poder como um conceito abstrato, mas, sobretudo,
como algo que se revela nas relações e ações concretas e simbólicas do convívio entre os humanos e
entre estes e seu meio ambiente.
Estas, entretanto explicitam a ligação com os sentidos sobre identidade. A identidade tem
como necessidade premente a identificação com um território, enquanto espaço onde se
“materializam” as mais diversas ações humanas (MARTINS, 2003). A identidade é o espaço onde o
sentido de poder individual ou coletivo se revela como uma ação que resulta do seu conhecimento
enquanto agente, sujeito de uma vida cotidiana, de uma historia dentro de um determinado espaço,
agora tido como territorializado. Por ser este o espaço onde as expressões das ações simbólicas e
tangíveis tomam corpo-sentido, é nele mesmo que a noção de identidade se expressa e toma o
sentido de território. Como os alicerces de uma responsabilidade mútua que se dão pelo
reconhecimento da alteridade e da afirmação da diversidade cultural (ROCHA, 2003).
Na atividade turística, o fluxo de pessoas, informações, a velocidade com que ocorrem as
dinâmicas traduzem um conjunto de reflexos descontínuos que criam tanto no turista quanto no
autóctone, noções desconexas da realidade que dificultando as comunidades receptoras locais
alcancem o “empoderamente” de suas riquezas culturais e sociais (KASSIS, 2005)
No Turismo de massa, estas visões desconexas complexificam, por um lado a noção sobre
a realidade e por outro naturalizam realidades distintas à medida que induzem o autóctone a assumir
Fórum Internacional do Meio Ambiente - A conferência da Terra 1007

padrões culturais distintos dos seus, a tentar explicar seu cotidiano com outros códigos de valores e
lingüísticos.
Como forma de atender a um código citado universalmente como “de qualidade”
paisagens, valores, hábitos são re-inventados. Novos usos e formas de percepção são introduzidos.
E ao implementar a necessidade da “qualidade” noções exógenas são imposta de forma subliminar
no imaginário coletivo, onde o que vem “de fora” é melhor que o “produzido no local, percebido
do local”. Marcadamente o conjunto arquitetônico que compreende o complexo turístico costeiro do
RN é exemplo singular de como estas construções redesenharam a orla, a (re)territorializaram a
medida que promoveram outros usos.
Com esta política, entretanto, perpetuou-se a mesma lógica colonial de priorizar os
territórios litorâneos próximos do centro administrativo do Estado, urbanizando-o cada vez mais em
detrimento ao abandono de regiões mais interioranas, sertanejas.
Estas áreas são do ponto de vistas das decisões políticas muita mais representativa. Há um
fluxo intenso de disputas simbólicas, tornando-o espaço prioritário para que as ações de governo
sejam percebidas. Neste contexto fluxos humanos, uns em busca de melhor qualidade de vida, de
trabalho, passam gerar conflitos de identidade entre a população autóctone, moradores adventícios
(Fonteles, 2004) e os turistas.
A complexidade deste fenômeno aqui enunciada e distante de seu esgotamento, a luz dos
princípios sobre meio ambiente, desenvolvimento sustentável aprofundam as críticas a este modelo
e se torna fundamental para revelar as implicações éticas que as ações do turismo têm produzidos
sobre as noções de território, territorialidade e identidade no RN.

DE UMA “ÉTICA AMBIENTAL” A UMA “ÉTICA PRODUTIVISTA”. OS (DES)CAMINHOS


DO TURISMO
O turismo tem sido um dos segmentos da atividade produtiva no capitalismo o que mais
tem explicitado o discurso do desenvolvimento sustentável e da necessidade da promoção do
desenvolvimento humano com qualidade de vida como uma de suas premissas fundamentias.
Todavia observado seus processos constitutivos, nos permite afirma que as noções de
sustentabilidade, assim como da ética tem esbarrado, tanto nas dimensões micro como macro, em
profundas contradições nas mais diversas matizes do cotidiano.
Primeiro porque, mesmo entendendo as limitações do conceito de Desenvolvimento
sustentável por derivar-se da lógica capitalista, os gestores do turismo insistem em adotam uma
racionalidade “economicista” para justificar os impactos que tem produzido. Bastante perceber que
a premissa da geração de emprego e renda, assim como o da preservação das paisagens naturais é
um “slogam” comum em todos os projetos ao mesmo tempo em que espaços e populações são
estilizados e sacralizados para a admiração dos turistas.
Segundo porque, da inserção do micro (do local) numa produção macro, como ocorre na
atividade turística (economia global), rotineiramente se tem, a justificativa da preservação, ao
mesmo tempo em que se programa um modelo estandardizado, uniformizado tantos dos espaços
privados quantos dos públicos. Modelo que altera significativamente as dimensões culturais,
políticas, sociais e, sobretudo identidarias das comunidades agora receptoras.
A terceira e das maiores contradições, é que, se aprofunda os processos de segregação
social à medida que populações autóctones ou são retiradas, ou são expulsas, e geralmente são
sublimadas a inserirem-se na roda do turismo (de qualquer forma) como única alternativa de
sobrevivência. Gerando um processo urbano onde é fácil perceber as diferenças entre os espaços
destinados para os usos turísticos e os outros, ocupados pelos segmentos mais pobres.
Uma quarta observação é que; um modelo que privilegia o aumento dos níveis de
crescimento econômicos (através dos números de empreendimentos hoteleiros de grande porte, o
aumento do fluxo de turistas, principalmente internacionais), vai contra as premissas da
conservação do “capital ambiental” e do “capital social” que fundamentam as noções de
sustentabilidade.
Fórum Internacional do Meio Ambiente - A conferência da Terra 1008

Assim é fundamental entender que as noções de “desenvolvimento sustentável” estão


explicitamente vinculadas à diretiva “agir localmente e pensar globalmente”. E isto implica a noção
de totalidades a qual toda a atividade humana, toda a práxis tem de dependência com o suporte
ambiental. Medidas mitigatórias locais, quase sempre, são ineficientes quanto aos impactos
causados nas regiões de seus estornos, quanto mais com as dimensões globais.
Neste sentido é fundamental conceber uma ética não utilitarista, não coorporativa como
expressam os inúmeros códigos de éticas dos mais diversos segmentos produtivos e profissionais n
modernidade. A ética sem ser um princípio absoluto, acima de tudo, à medida que se observa as
relações humanas e suas imbricações como o meio ambiente, exige uma dimensão biocêntrica
(Capra, 1989, 1996). A ética é antes de tudo a expressão de conectividade entre um coletivo e seu
meio natural. A racionalidade capitalista ao subverter essa ordem, subverte as noções sobre a
compreensão da vida e das relações de complexidade e dependência existe com o todo cósmico.
Não é ético, justificar interesses particulares em detrimentos dos interesses coletivos.
Mesmo que se afirme não existir um pensamento “aético”, no sentido daquilo que se contrapõe aos
interesses/necessidades de um coletivo que anteriormente construiu num processo dialógico, um
conjunto de valores e de relações de mutualismo com seu meio ambiente natural, este se revela
quando os interesses individuais de grupos, empresas são subliminarmente impostos como o único
devir, como verdades absolutas. Uma mudança social equitativa não ocorre por “um processo
mecânico, realizado por uma decisão, mas é um processo social, histórico, intimamente relacionado
à suas condições políticas, econômicas e culturais” (KASSIS, 2005).
Mas é bem verdade que em todas as épocas e inserções de atividades produtivas, os
conflitos éticos sempre surgiram e se revelaram através dos conflitos de identidade e de território.
Mas o turismo, enquanto atividade produtiva da modernidade diferentemente das demais, atua de
forma “horizontalizada”, pois pode ser aplicáveis nas mais diversas paisagens, localidades,
ecossistemas. Não há nesta um “ente” específico enquanto materialidade, embora seja somente na
materialidade que ela se revela. Exemplo muitos, o “souvenir” é o atestado de um lugar.
Para além destes impactos provenientes de sua própria lógica, pelas imbricações que cria
com os vários setores da economia geram outros impactos indiretos que precisam ser avaliadas e
mensuradas para que se possa estabelecer a capacidade de suporte socioambiental local.
No Rio Grande do Norte, mais especificamente no seu Litoral Oriental, com 205 Km2 de
linha de costa, que correspondendo a 3.803 km2 e abriga 40 % da população do Estado (IDEMA,
2002) Os incentivos as políticas públicas para o turismo - Prodetur-NE, oriundos de parcerias junto
com o BID vem reproduzindo essa mesma lógica.
Com características geomorfológicas e ecossistêmicas considerados de alta fragilidade,
áreas de restingas, falésias, dunas móveis e fixas, manguezais, lagunas, lagoas interdunares,
tabuleiros e a segunda maior reservam de Mata Atlântica em sítio urbano no Brasil tem recebido os
mais constantes e crescentes fluxos turísticos do Estado
Tal estratégia incorre numa profunda contradição quanto aos princípios de sustentabilidade
que tanta evidência, pois à medida que impacta regiões frágeis, despreza todo um potencial
existente em outras áreas do Estado que podem, com investimentos semelhantes ou até inferiores
oferecerem e diversificarem a oferta turística no Estado.
Desta estratégia resultam também conseqüências sócias e ambientais facilmente
perceptíveis. O “Desenvolvimento desigual do Estado”, priorizando o litoral Oriental, gera êxodo
das regiões interioranas para a região metropolitana da capital. O marketing turístico
midiaticamente que transforma estas áreas em destinos turísticos, transforma-o também no destino
da esperança de emprego e melhor qualidade de vida para contingentes populacionais cada vez
maiores vindos do interior.
A situação dos 16 municípios que compõem o litoral norte é reveladora à medida que
tendo 13% da população do Estado, uma área de 205 km2 de linha de costa, e de 3807 km2 da
superfície (IDEMA, 2002), não há investimentos significativos para o setor, embora as
potencialidades naturais e as condições sociais sejam bem mais fáceis de justificar a necessidades
de projetos desta envergadura.
Fórum Internacional do Meio Ambiente - A conferência da Terra 1009

Entretanto, estas são algumas dos matizes, impossíveis de serem esgotados neste artigo,
diante a complexidade quando se revelam a luz de uma discussão ética os impasses em que se
encontra o projeto de desenvolvimento do (turismo) para o RN. Os conflitos territoriais, de
identidade e dos usos dados ao meio ambiente pela atividade turística precisam ser investigados,
registrados e tornados público para não se perder no presente a possibilidade de construir desde já,
(no local - Rio Grande do Norte) a sustentabilidade fundamental para o futuro próximo.

ALGUMAS CONSIDERAÇÕES
Esta tentativa de estabelecer uma reflexão sobre o turismo no Rio Grande do Norte através
do diálogo entre as categorias conceituais território, identidade e meio ambiente, a partir da
concepção de que a ética não pode ser entendida como uma “intencionalidade individual,
corporativista” surge à medida que observamos o modo desigual, autocrático e acrítico como vem
ocorrendo o desenvolvimento econômico do RN. E de como o discurso do consenso, da
participação, da democratização, que tanto caracteriza este momento, das políticas públicas para o
turismo, tem servido para perpetua a lógica secular da segregação tão presente entre a “casa grande
e senzala”.
As políticas públicas destinada para a “turístitificação” de trechos do litoral Sul vêm
gerando impactos os mais diversos à medida que impõem sua lógica modernizadora.
As noções de identidade, de pertença, de alteridade ao qual esta impregnada os discursos
da sustentabilidade veiculada pelos projetos oriundos do consorcio Governo do Estado, com o BID
e o BIRD, e das conseqüências resultantes destes, tem gerado uma nova fase de “colonização” à
medida que política de ordenamento do solo urbano tornou-se ineficiente para impedir o
crescimento desenfreado do setor imobiliário destinado a segunda residência, e aos grandes
empreendimentos de hospedagem.
A ocupação dos espaços e das paisagens mais nobres e belas, requisito imprescindível para
a posse pelos estrangeiros, mantêm a lógica da segregação ao mesmo tempo em que sublimam a
capacidade daqueles que aqui vivem de percebem os impactos ou de lutarem.
Realidade que não parece resultante de uma ordem abstrata, como queria Santos (1999),
mas que enuncia implicitamente os laços simbólicos existentes entre segmentos hegemônicos locais
e o mainstream econômico global. E que denunciam também a ausência de setores organizados
contra-hegemônicos que possam propor uma política pública que promova o desenvolvimento
integrado e sustentável do Estado.

REFERÊNCIAS BIBLIOGRAFIA
ANDRADE, Manuel Correia. A questão do território no Brasil. São Paulo: Hucitec; Recife:
IPESPE, 1995.
BANCO DO NORDESTE DO BRASIL – BNB. CD-RUM. Prodetur - RN. Plano de
Desenvolvimento Integrado do Turismo Sustentável, Polo Costa das Dunas. Natal, dezembro, 2002.
BENI, Mário Carlos. Política e planejamento de turismo no Brasil. São Paulo: Aleph, 2006.
CAPRA, Fritjof. A teia da vida: uma nova compreensão científica dos sistemas vivos. São Paulo:
Cultrix, 1996.
CASCUDO, Luis da Câmara. História do Rio Grande do Norte. 2 ed. Natal: Fundação José
Augusto; Rio de Janeiro: Achiamé, 1984.
CRUZ, Rita de Cássia Ariza da. Geografia do Turismo de lugares a pseudos-lugares. São Paulo:
Roca,2007.
________________________Historia da Cidade do Natal. 3 ed. Natal:RN Econômico,1999.
FONTELES, José Osmar. Turismo e impactos socioambientais. São Paulo: Aleph, 2004.
HTTP;//WWW.RNNOTICIAS.COM.BR. TURISMO IMOBILIÁRIO: RN é tema de reportagem
na TV. (visitado em 02 de janeiro de 2007).
INSTITUTO DE DESENVOLVIMENTO ECONÔMICO E MEIO AMBIENTE DO RIO
GRANDE DO NORTE- IDEMA, GOVERNO ESTADO DO RIO GRANDE DO NORTE,
SERVIÇO BRASILEIRO DE APOIO ÁS MICRO E PEQUENAS EMPRESAS – SEBRAE.
Fórum Internacional do Meio Ambiente - A conferência da Terra 1010

Projeto de Zoneamento Ecológico-Econômico do Litoral do Rio Grande do Norte – ZEE/RN, Fev,


2005.
KASSIS, Rami. Turismo de base comunitária como instrumento de redução da pobreza e inclusão
social – o caso da palestina. In. NEUHAUS, E.; SILVA, J. S. (Orgs). UM OUTRO TURISMO É
POSSÍVEL!: Reflexões sobre desigualdades, resistências e alternativas no desenvolvimento
turístico. Fórum Social Mundial, Porto Alegre, Janeiro, 2005.
LIMA, Diógenes da Cunha. Natal: biografia de uma cidade. Rio de Janeiro: Lidador, 1999.
LOPES JUNIOR, Edmilson. A construção Social do Prazer – Natal. Natal: EDUFRN, 2000.
MARTINS, Clerton. (org). Turismo, Cultura e Identidade. São Paulo: Roca, 2003.
NEUHAUS, E.; SILVA, J. S. (Orgs). UM OUTRO TURISMO É POSSÍVEL!: Reflexões sobre
desigualdades, resistências e alternativas no desenvolvimento turístico. Fórum social Mundial,
Porto Alegre, Janeiro, 2005.
PINTO, Lenine. Natal USA – II Guerra Mundial: a participação do Brasil no Teatro de Operações
do Atlântico Sul. Natal: RN Econômico, 1995.
RAFFESTINS, Claude. Por uma geografia do poder. Tradução de Maria Cecília frança. São Paulo:
Ática, 1993.
ROCHA, S, S. O turismo na Prainha do Canto Verde (CE): comunidades e sustentabilidade. Tese
de Mestrado, COPPE/UFRJ, Rio de Janeiro, RJ, Brasil, 2003.
SANTOS, Paulo Pereira dos. Evolução Econômica do Rio Grande do Norte (do século XVI ao
século XX). Natal: Clima, 1994.
SANTOS, Milton. A natureza do espaço habitado: fundamentos teóricos metodológicos da
geografia. São Paulo: Edusp, 2002.
_______________.; M. A. A. de SILVEIRA, M, L. (org). Território: globalização e fragmentação.
São Paulo: Hucitec; Annablumme, 2002
SAQUET, Marcos Aurélio. O território: diferentes interpretações na literatura italiana. In RIBAS,
A. D.; SPOSITO, E. S.; SAQUET, M. A. Território e desenvolvimento: diferentes abordagens.
Francisco Beltrão: Unioeste, 2004.
SOUZA, Marcelo José Lopes. O território: sobre espaços e poder: autonomia e desenvolvimento. In
Castro, I. E. de; GOMES, P. C.; CORRÊA, R. L. (org). Geografia: conceitos e temas. Rio De
Janeiro: Bertrand Brasil, 2001.
SURESH, KT.; RANGAM, Vidya. Desenvolvendo um marco de Avaliação do Impacto do
Turismo dentro da OMC e do Acordo Geral sobre o Comércio de Serviços para Países em
Desenvolvimento. In. NEUHAUS, E.; SILVA, J. S. (Orgs). UM OUTRO TURISMO É
POSSÍVEL!: Reflexões sobre desigualdades, resistências e alternativas no desenvolvimento
turístico. Fórum Social Mundial, Porto Alegre, Janeiro, 2005.
TRIBUNA DO NORTE, EDITORIA ECONOMICA. “Mercado Imobiliário do RN tem promessa
de crescimento” 14/10/2007.
TRINDADE, Sérgio Luiz Bezerra. Introdução à historia do Rio Grande do Norte. Natal: sebo
Vermelho, 2007.
Fórum Internacional do Meio Ambiente - A conferência da Terra 1011

LAZER EM UNIDADE DE CONSERVAÇÃO


Rosalva de Jesus dos Reis
Universidade Estadual do Maranhão – UEMA. rosalvareis@oi.com.br

RESUMO
As APA’s são unidades de conservação de uso sustentável. Legalmente, as atividades
econômicas podem ser praticadas nestas áreas contanto que considerem as vocações locais,
envolvam a comunidade e conservem os recursos utilizados. Neste trabalho destaca-se a atividade
de lazer desenvolvida na Área de Proteção Ambiental da Região do Maracanã. Esta unidade está
situada na zona rural e porção Centro-Sul do município de São Luís, capital do Maranhão. O bairro
do Maracanã é destaque dentro da APA homônima pelo conjunto dos aspectos naturais, históricos e
culturais. O clima tropical, característico no município, é amenizado pela vegetação exuberante,
composta principalmente de palmáceas. Rios entrecortam a área contribuindo para a ocorrência de
inúmeros brejos. O relevo é composto de terras baixas e algumas colinas. Somam-se a estes
aspectos naturais as manifestações culturais que tão bem identificam o lugar, como o Bumba-meu-
boi, um dos mais tradicionais e principais grupos do estado. Ao longo do ano ocorrem outras
manifestações como a Festa da Juçara, os festejos de Santos Reis e os festejos de São Sebastião.
Este conjunto de aspectos singulariza o Maracanã no município. Aliados à fácil acessibilidade e à
infra-estrutura já existente, o bairro torna-se destino de inúmeros visitantes. Durante o ano de 2007
foi desenvolvido um projeto de extensão no bairro do Maracanã pelos alunos do curso de Geografia
da Universidade Estadual do Maranhão (UEMA). Durante a realização das atividades do grupo foi
possível constatar a grande utilização da área para a prática do lazer. Foram identificadas as
principais ofertas de lazer, como ocorre a organização das mesmas, o envolvimento da comunidade,
a participação do poder público, as épocas de maior incremento, entre outros. O lazer é uma prática
permanente, sistemática, no Maracanã, mas a área ainda apresenta grandes potencialidades.
Palavras-chave: APA. Lazer. Atributos naturais. Aspectos culturais.

ABSTRACT
The so called APAs (Environmental Protection Areas) are sustainable use conservation
units. Legally, economic activities can be carried on in these areas as long as the local
predispositions are taken into account, the community is engaged, and the resources used are
preserved. This project highlights the leisure activity developed in the environmental protection
area of Maracanã. This unit is located in the rural area, center-south portion of the municipality of
São Luís, capital of the state of Maranhão. Maracanã’s neighborhood is outstanding in the
homonymous APA for the combination of natural, historic, and cultural elements. The tropical
climate, characteristic in the municipality, is soothed by the lustful vegetation, mainly composed of
palms. Rivers cross the area contributing for the existence of countless swamps. The relief is
composed of low lands and several hills. Cultural manifestations are added to these natural aspects;
manifestations that paramountly identify the site, such as Bumba-meu-boi, one of the most
traditional and main popular group in the state. All year long other public displays take place, such
as the açai festival, the Three Kings festival, and St Sebastian’s festival. This combination of
elements distinguishes Maracanã within the municipality. Due to easy access and existent infra-
structure the neighborhood is destination to many visitors. During 2007 an extension project was
carried on in Maracanã by the students of the degree in Geography of Universidade Estadual do
Maranhão (State University of Maranhão – UEMA). During the accomplishment of the activities of
this group it was possible to notice the vast use of the area for recreational practices. Among other
characteristics, the main leisure possibilities were identified, how they are organized, the
community participation, the government’s contribution, and the periods of higher increment.
Leisure activities are ongoing and systematic practices in Maracanã, however, the area has still high
potentialities.
Keywords: APA. Leisure. Natural attributes. Cultural aspects.
Fórum Internacional do Meio Ambiente - A conferência da Terra 1012

LAZER EM UNIDADE DE CONSERVAÇÃO


O Estado do Maranhão, situado em uma área de transição biogeográfica, possui diversos
biomas e ecossistemas comuns a três macroregiões brasileiras. Entre eles podem ser citados:
florestas, cocais, manguezais, cerrados, campos e restingas.
Grande parte dessas áreas integra as unidades de conservação existentes no estado. São
parques, reservas, APA's, tanto federais quanto estaduais.
Entre as unidades situadas no município de São Luís está a Área de Proteção Ambiental
(APA) da Região do Maracanã. Situada na zona rural, ela se destaca no contexto ambiental
ludovicense pelo arranjo de seus atributos naturais e culturais. Foi criada em 1/10/1991, pelo
Decreto Estadual nº. 12.103, com uma área de 1.831ha.
A APA é caracterizada por vegetação arbórea onde destacam-se espécies de relevante
interesse ecológico como Orbygnia martiana (babaçu), Euterpe oleraceae (juçara), Mauritia
flexuosa (buriti), Theobroma grandiflorum (cupuaçu), Platonia insignis (bacuri). Na Fauna
destacam-se inúmeras espécies de pássaros. Entre os rios podem ser citados o Maracanã e o
Ambude.
A criação da APA objetivava, entre outros, disciplinar o uso e a ocupação do solo, a
exploração das áreas naturais, a integridade biológica das espécies e os padrões de qualidade da
água.
Além da manutenção e/ou melhoria da qualidade ambiental deve haver, em uma APA, o
fomento de atividades geradoras de emprego e renda. Este fomento deve considerar as vocações da
área e envolver a comunidade local. Esta deve ter um papel decisivo na definição das atividades.
O bairro do Maracanã, inserido na APA homônima, dista cerca de 25km do centro da
capital e é de fácil acessibilidade. É detentor de expressivas manifestações culturais com destaque
para o bumba-meu-boi de matraca, a Festa da Juçara e a Festa de Santos Reis. Mas, é importante
ressaltar a existência de outras manifestações com a Festa do Divino Espírito Santo e a Festa de São
Sebastião. A localidade conta, ainda, com ruínas de edificações do séc. XIX e uma igreja, cujo altar
é tombado. O micro-clima do lugar é muito agradável devido à abundante cobertura vegetal
representada, principalmente, pelas palmáceas.
A paisagem natural do Maracanã, aliada aos aspectos culturais e históricos, tornam o
mesmo uma área singular no contexto municipal, bastante procurada para o lazer. Alguns atrativos
são utilizados de forma incipiente. As potencialidades de lazer são inúmeras, podendo, inclusive,
evoluir para a prática do turismo.
O fomento às atividades geradoras de emprego e renda é totalmente admissível em uma
APA. No entanto, é necessária uma harmonia entre o crescimento econômico e as necessidades de
conservação.

TRILHAS
A natureza exuberante do Maracanã composta de juçarais, rios, pássaros, aliada a aspectos
culturais serve de base para a realização de trilhas. Inicialmente a Prefeitura Municipal de São Luís
promoveu uma capacitação para pessoas da comunidade, a fim de que as mesmas pudessem
recepcionar visitantes e explorar as trilhas.
Atualmente existe uma pequena agência composto por jovens que realizam três trilhas
(Figura 1 a 4):
Rosa Mochel: o nome é uma homenagem à Rosa Mochel, defensora da preservação
ambiental. Tem aproximadamente 1 km, e é composto por brejos, pelo rio Maracanã e inúmeras
espécies da flora;
Baluarte: na mesma é possível observar a vegetação de capoeira, palmáceas, juçarais,
manguezais centenários. É composta, ainda, por ruínas históricas do século XIX;
Joca Guimarães: essa trilha homenageia o agrônomo João Guimarães, nascido em Alegria
do Maracanã. É a mais extensa, com 1,5 km. Seus destaques são o rio Ambude e o brejo repleto de
juçarais e outras inúmeras árvores frutíferas.
Fórum Internacional do Meio Ambiente - A conferência da Terra 1013

Figura 1 – Trilha Rosa Mochel Figura 2 – Trilha Baluarte - Brejo

Figura 3 – Trilha Rosa Mochel Figura 4 – Trilha Rosa Mochel

Uma nova trilha está sendo organizada nas proximidades de um antigo hotel-fazenda. Na época da
festa da juçara (outubro) há uma procura intensa pelas trilhas.

FESTA DA JUÇARA
A palmácea euterpe oleraceae é conhecida no Maranhão como juçara e já foi muito
abundante na região do Maracanã. Conforme relato de dona Cotinha, os moradores do local tinham
dificuldade em comercializar a produção. Foi então que a engenheira agrônoma Rosa Mochel,
moradora do Maracanã e Secretária de Educação e Ação Comunitária do Município de São Luís,
organizou uma festa da juçara em 1970. A idéia deu certo, e desde então a Festa da Juçara acontece
todos os anos no mês de outubro.
Com o término da gestão de Rosa Mochel na Secretaria citada, a organização da festa ficou
a cargo da Empresa Maranhense de Turismo (MARATUR). Após a extinção do órgão, os
barraqueiros se organizaram e fundaram a Associação dos Amigos do Parque da Juçara. A partir de
1997 é a Associação que organiza a festa com ajuda de órgãos governamentais, principalmente
ligados ao município (Figura 5 e 6).
Fórum Internacional do Meio Ambiente - A conferência da Terra 1014

Figura 5 – Entrada do Parque da Juçara Figura 6 – Festa da Juçara

A festa é realizada em um sítio, de fácil acesso, composto de cerca de 33 barracas


padronizadas, onde o prato principal é a juçara. Esta pode ser acompanhada de camarão seco, peixe
frito ou seco.
Durante a festa são realizadas trilhas, acontece shows com artistas da terra e são
comercializados produtos artesanais da região.
O Parque da Juçara, nome dado ao sítio onde ocorre o evento, funciona ao longo do ano,
com número reduzido de barracas funcionando.

BUMBA-MEU-BOI
Uma das manifestações culturais de maior destaque no Maranhão é o bumba-meu-boi. E
no Maracanã está um dos maiores grupos de estado, no sotaque de matraca.
Humberto Barbosa Mendes, mais conhecido como Humberto de Maracanã está à frente do
grupo há 35 anos. Ele é o cantador e compositor de inúmeros toadas. De acordo com o mesmo, o
bumba-meu-boi de Maracanã, conta com cerca de 1.000 integrantes, divididos em cantadores,
matraqueiros, pandeireiros, brincantes de fita, brincantes de pena, índias, tocadores de tambor onça
e outros.
Humberto intitulou-se guriatã, codinome alusivo à uma espécie de pássaro cantador. Ele é
possuidor de uma das vozes mais conhecidas entre cantadores desta manifestação no estado. Suas
toadas são amplamente conhecidas localmente e muitas delas já foram gravadas por artistas como
Alcione, Margareth Menezes e Maria Betânia.
O bumba-meu-boi do Maracanã possui vários cd’s e 1 DVD gravados e se apresenta em
vários estados brasileiros. Durante as festas juninas é necessário a locação de inúmeros veículos (10
ônibus, 3 caminhões, 1 van e um carro de som) para locomover integrantes e equipamentos.
O boi é um dos grandes atrativos maracanenses. Atrai visitantes durante os ensaios, que
são realizados ao ar livre, em uma grande área; no batizado e na sua morte (esta marca o
encenamento das apresentações durante o ano).
Segundo Humberto, dezenas de pessoas são beneficiadas durante os momentos acima
citados a partir de comercializações de bebidas, comidas da instalação de banca de jogos, parques,
estacionamentos. Estas atividades ajudam no aumento de renda familiar dos moradores da
comunidade.

FESTA DO DIVINO
A Festa do Divino Espírito Santo é realizada no Maracanã em diversas residências, mas a
que mais se destaca é a realizada na residência de Dona Célia. A festa é de caráter religioso e tem
como principal homenageado o Divino Espírito Santo, uma das três componentes da Santíssima
Trindade, doutrinada pelas religiões cristãs. O símbolo que representa o Divino Espírito Santo na
festa é a pomba (Figura 7). Dona Célia conta que a festa que realiza em sua residência é uma
herança deixada por sua mãe, e que a festa conta com a ajuda do governo do Estado.
Fórum Internacional do Meio Ambiente - A conferência da Terra 1015

A festa conta com a participação de um império que é formado por um casal de mordomos
mós (Figura 8), por um casal de mordomos régios, e por um casal de imperadores. Todos
representados por crianças da comunidade e conta também com a participação de caixeiras
(mulheres que batem uma espécie de caixa com couro de bode), sendo que as mesmas são as
responsáveis pela percussão e cantigas da festa.

Figura 7 – Festa do Divino Espírito Santo Figura 8 – Império da Festa do Divino

Além da ajuda governamental a festa conta com uma espécie de ajuda de todos
participantes, chamada de jóia, que varia de e R$ 25,00 (vinte cinco reais) a R$ 300,00 (trezentos
reais). E conta também com o patrocínio de produtos alimentícios e de bebidas de diversos
comerciantes da região.
A Festa do Divino Espírito Santo de Dona Célia foi realizada no ano de 2007 na 2ª semana
do mês de junho.

FESTA DE REIS
Honorina Algarves, conhecida carinhosamente na comunidade do Maracanã pelo apelido
de Nonoca, é a atual comandante da Festa de Reis do Alecrim que é realizada todos os anos nos dias
5, 6 e 7 de janeiro na comunidade.
Dona Nonoca conta que a festa de Reis à qual faz parte iniciou-se no ano de 1936, tendo
como uma das fundadoras a sua mãe, Maurícia Algares, também conhecida como Tia Iça,
motivação essa que faz com que Dona Nonoca até hoje, mesmo com a saúde bastante debilitada,
mantenha a festa viva.
A entrevistada ressalta que o grande ápice e diferencial da Festa de Reis do Alecrim em
relação as outras existentes na comunidade é o chamado Reis Pobre, que acontece no último dia da
festa, mais precisamente nos dias 7 de janeiro de todos os anos. O Reis pobre é uma espécie de
carnaval, só que com uma ressalva as músicas que são cantadas são todas originadas da festa e não
são aceitos outros tipo de musicas como marchinhas e similares. O Reis Pobre sai pela manhã com
uma multidão acompanhando, anda por toda a comunidade arrecadando bebidas e donativos,
retornando para o barracão da festa só ao anoitecer, momento esse que é realizada uma grande festa
com a distribuição das bebidas e donativos adquiridos durante o percurso.
Ao ser indagada se sabia que o Maracanã estava inserido dentro de uma Área de Proteção
Ambiental (APA), a mesma mostrou-se surpresa e disse que não sabia e que só tinha conhecimento
da existência das trilhas, mas que ainda não tinha realizado nenhuma delas. Considera de grande
importância essa inclusão, pois no Maracanã de hoje está tornando-se difícil até mesmo apreciar a
natureza, os rios, enfim, até as frutas tradicionais. A juçara cada dia que passa está mais escassa,
devido ao desmatamento de grande parte dos juçarais.
Fórum Internacional do Meio Ambiente - A conferência da Terra 1016

Pediu-se para a entrevistada finalizar com uma frase sobre o Maracanã: “O Maracanã para
mim é tudo, é meu chão, minha gente, minha terra”.
A maior parte dos visitantes que se dirige ao Maracanã vai atraída principalmente pela
Festa de Juçara e pelo Bumba-meu-boi. Mas conforme foi exposta anteriormente, a localidade conta
com outros atributos (festas, trilhas) que podem atrair visitantes o ano inteiro para o local. Além
destes atributos, existentes as potencialidades. Entre eles podem ser citadas:
• a abertura de novas trilhas, para apreciação dos cursos d’água, da vegetação e da fauna;
• há inúmeros sítios e chácaras no Maracanã. Alguns deles podem receber visitantes para café da
manhã, ou podem ser transformados em hotéis-fazendas;
• o barracão do Bumba-meu-boi de Maracanã poderia ter uma exposição permanente das
indumentárias e instrumentos utilizados;
• o artesanato, que utiliza, inclusive, matéria-prima local, também poderia contar com um espaço
para exposição permanente e não só na Festa da Juçara.

A ampliação das atividades de lazer deve ser acompanhada da infra-estrutura necessária


para realização das mesmas. Para tanto é muito importante a participação das diversas
entidades/organizações existentes na área para requerer do poder pública aquilo que é de sua
competência.
Durante o trabalho de extensão, realizado na área em 2007 pelos alunos do Curso de
Geografia da Universidade Estadual do Maranhão (UEMA) verificou-se que a maior parte da
comunidade maracanense não sabe o que é uma APA e desconhece o fato de que o Maracanã está
inserido em uma unidade de conservação. Em contrapartida, reconhece a importância das riquezas
naturais, culturais e religiosas existentes na área.
Nesse sentido tornam-se necessários estudos que levem em consideração os aspectos
naturais e sócio-econômicos, a cultura local, as relações da comunidade com a natureza, os
conflitos. A identificação destes aspectos deve servir de base para uma gestão que harmonize o
desenvolvimento sócio-econômico da área com as necessidades de conservação. É importante a
participação de todos os segmentos que atuam na APA, sendo que a participação da comunidade é
de extrema importância.
As experiências têm mostrado que quando o poder público age sozinho, os objetivos da
APA, quando alcançados, são parciais. Quando a comunidade é envolvida no processo e se
reconhece como parte deste, a viabilidade do alcance dos objetivos é muito maior.

REFERÊNCIAS BIBLIOGRAFICAS
BRITO, Francisco A.; CÂMARA, João B.D. Democratização e gestão ambiental: em busca do
desenvolvimento sustentável. 3. ed. Petrópolis, RJ: Vozes, 2002.
CABRAL, Nájila Rejanne Alencar Julião; RÖHM, Sérgio Antonio; SOUZA, Marcelo Pereira de.
Políticas públicas de áreas protegidas: contribuição para sua implementação e manutenção da
biodiversidade. In: WENDLAND, Edson; SCHALCH, Valdir. Pesquisas em meio ambiente:
subsídios para a gestão de políticas públicas. São Carlos: RiMa, 2003.
CUNHA, L. H.; COELHO, M. C. N. Política e gestão ambiental. In: CUNHA, S. B.; GUERRA, A.
J. T. (Orgs). A questão ambiental. Rio de Janeiro: Ed. Bertrand Brasil, 2003.
Fórum Internacional do Meio Ambiente - A conferência da Terra 1017

ECOTURÍSMO NOS CARIRIS VELHOS: UMA POSSIBLIDADE DE


REESTRUTURAÇÃO SOCIOECONÔMICA PARA O SEMI-ÁRIDO BRASILEIRO

Ronildo Alcântara PEREIRA


Mestrando do Programa de Pós-Graduação em Recursos Naturais/Universidade Federal de Campina Grande.
ronalcantara@gmail.com.br
Josandra Araújo Barreto de MELO
Professora do Departamento de História e Geografia/Universidade Estadual da Paraíba; Doutoranda do Programa de
Pós-Graduação em Recursos Naturais/Universidade Federal de Campina Grande, PB. ajosandra@yahoo.com.br

RESUMO
O presente estudo teve por objetivo demonstrar a viabilidade econômica do potencial
turístico dos municípios dos Cariris Velhos da Paraíba, mesmo em se tratando de uma área
fragilizada econômica e socialmente pelos efeitos das estiagens. Essa viabilidade se fundamenta, em
pesquisas desenvolvidas por vários estudiosos, com resultados unânimes em apontar a atividade
turística como a mais adaptável às condições climáticas locais. Na atualidade, contrariando uma
tendência de décadas, onde apenas o turismo do litoral recebia investimentos e fluxos, outras
modalidades de turismo, a exemplo do ecoturismo, vêm se difundindo por todo o Planeta, em
virtude da forma como é praticada. No Brasil, o ecoturismo encontrou forte aceitação e alcança
rápida expansão por todas as regiões. Em particular, no Semi-árido brasileiro, que apresenta como
características marcantes, os solos, o relevo, a vegetação e a rusticidade do ser humano. No cenário
dessa paisagem, destaca-se um expressivo patrimônio natural, composto por formações geológicas
contendo sítios arqueológicos, gravuras e pinturas rupestres, bem como outras atrações turísticas
constituídas pelo patrimônio histórico e cultural, ainda pouco explorado.
Palavras-chave: ecoturismo; desenvolvimento sustentável; semi-árido.

ABSTRACT
The present study has the objective to demonstrate the economical viability of the tourist
potential of the region of Cariris of Paraíba, because it is one fragile economical and social area by
effects of the drought. This viability found it in researches developed by lots of studious with
unanimous results that show us the tourist activity is the most adaptable to the local climate
conditions. Currently, it is opposed a tendency of the decade where only the littoral tourism
received investment and flux, another modalities of the tourism are spreading it for all planet, cause
of the way that it is practiced. At Brazil, it finds strong reception and reaches fast expansion for all
regions. In particular in North-east Semi-arid that have striking characteristics, for example the
ground, the relief, the vegetation and the rusticity of the people. In the scenery, this landscape
detach it a expressive natural patrimony consisting of archaeological area, inhabiting rocks painting
and another tourists activities constituted by historical and cultural patrimony that it is still a few
explored.
Key words: ecotourism; sustainable development; semi-arid.

INTRODUÇÃO
A mobilidade do ser humano pela superfície da Terra é tão antiga quanto sua própria
existência, motivo pelo qual, nos tempos modernos, favorecido pelos avanços dos transportes e
comunicações o turismo se tornou a atividade econômica em maior crescimento no mundo. Outro
fator que impulsiona tal expansão é o direcionamento dos recursos e da publicidade sempre às áreas
costeiras, sendo por isso, um dos maiores responsáveis por impactos ambientais e socioculturais
devido ao caráter massivo que a atividade adquiriu nos últimos anos (RODRIGUES, 1997).
Em contraposição ao turismo tradicional exercido nas áreas mais densamente povoadas, o
chamado "turismo praia e sol" surgiu no último quartel do século XX, como uma modalidade
alternativa, que tem se difundido por todos os continentes, em função da valorização da ecologia
(SEABRA, 2001).
Fórum Internacional do Meio Ambiente - A conferência da Terra 1018

Nesse contexto, o ecoturismo constitui uma nova modalidade turística, deixando de ser
visto como “uma atividade alternativa de aficionados por meio ambiente”, ganhou uma conotação
diferenciada, passando a ser considerado por órgãos governamentais e promotores, como um
segmento do turismo que utiliza, de forma sustentável, o patrimônio natural e cultural, incentiva sua
conservação e busca formação de uma consciência, promovendo o bem estar das populações
envolvidas (AULICINO, 1997).
No interior nordestino, particularmente, onde vivem aproximadamente 25 milhões de
pessoas, cujos costumes e tradições são singulares, assim como outras características naturais, como
as precipitações pluviométricas reduzidas e irregulares, associadas às temperaturas elevadas, que
dão lugar ao aparecimento de uma geomorfologia de formas exóticas e multiformes, consideradas
por especialistas, como de alto valor paisagístico. Toda essa paisagem se constitui em atrativo ao
visitante citadino, quase sempre, estressado pela agitação dos grandes centros urbanos.
Visando o aproveitamento desse potencial, o estado brasileiro vem trabalhando no sentido
de criar mecanismos para fomentar o ecoturismo no país, através da Empresa Brasileira de Turismo,
nas mais longínquas comunidades, através de ações que gerem renda e qualidade de vida. Em
decorrência, o ecoturismo pode se tornar uma alternativa viável ao desenvolvimento de localidades
com potencial natural e cultural, a exemplo dos Cariris Velhos na Paraíba.
Hoje, a atividade ecoturística se enquadra nas estratégias de desenvolvimento alternativo
ao interesse do grande capital e pode ser exercida de forma plena, bastando para isso, que o
município ou região disponha de aptidões e que haja por parte da comunidade local, um movimento
endógeno, no sentido de difundi-lo e reverter seus benefícios em prol de sua população
(BUARQUE, 1999). Com base no exposto, o presente trabalho, tem por objetivo mostrar a
relevância do potencial turístico da região dos Cariris Velhos, do Estado da Paraíba, bem como a
importância do seu aproveitamento como alternativa para o desenvolvimento socioeconômico
sustentado, desde que desenvolvida a partir dos pressupostos de preservação/conservação
ambiental.
A metodologia adotada pode ser enquadrada no método analítico descritivo, a partir do uso
da literatura pertinente ao assunto, bem como da pesquisa documental, diálogo informal com alguns
moradores e registro fotográfico de atrativos turísticos importantes na área em foco.

O POTENCIAL TURÍSTICO DOS CARIRIS VELHOS


Localizado entre as coordenadas geográficas 07º e 8º S e 36º e 37º W (Figura 1), distante
200 km de João Pessoa, capital do estado da Paraíba, os Cariris Velhos têm como principal via de
interligação a rodovia BR 412.

Figura 1: Localização Geográfica dos Cariris Velhos. Fonte: Pereira R. A., arquivo, 2006

Os municípios inseridos nessa área oferecem produtos turísticos tanto culturais quanto
naturais, podendo-se dar relevância aos inselbergs (formas de relevo testemunho de outras situações
Fórum Internacional do Meio Ambiente - A conferência da Terra 1019

climáticas mais severas), sítios arqueológicos e paleontológicos, vegetação de caatinga em várias


fases de xerofilismo, singularidade da rede hidrográfica (exorréica), cidades históricas, entre outros.
A seguir, apresentar-se-á alguns atrativos que já foram reconhecidos pela Empresa
Brasileira de Turismo como sendo de potencial turístico no município de São João do Cariri, PB,
com destaque para a grande quantidade de sítios arqueológicos:
Sítio Serrote129 dos Letreiros: localizado a leste da sede municipal, na comunidade Poço de
Pedra, apresentando vegetação e relevo característicos da região dos Cariris. As gravuras foram
realizadas sobre blocos de rochas, os quais se encontram bastante desgastados pelo intemperismo
físico-químico, processo bastante comum na região, em virtude das condições climáticas extremas.
A Muralha do Meio do Mundo: também localizada em São João do Cariri, na porção
sudoeste, distante cerca de 8 km, da sede municipal. Trata-se de uma formação geológica (em forma
de monumento rochoso) que desperta a curiosidade dos visitantes e aguça o imaginário (GOUVÊA,
2004; PERES, 2004), motivo pelo qual é objeto de visitações e estudos por parte de estudantes e
pesquisadores de universidades da região. Segundo Peres (2004), não bastasse o interesse
despertado pela formação da Muralha, o mesmo se multiplica, por motivo da ocorrência, em vários
pontos, de eventos arqueológicos na forma de pinturas e gravuras rupestres. O mais expressivo
deles, encontra-se no sítio Picoito, composto por painéis pintados em vermelho, com formas
geométricas e circulares.
Sitio Formigueiro: localiza-se a oeste da sede municipal, às margens da estrada PB 216,
contendo um painel pintado em vermelho, onde pode ser identificada a letra U invertida, além de
vários símbolos semelhantes ao número um em algarismo romano.
Sítio Mares: distante da sede do município, cerca de 18 km, na direção sul, encravado na
Serra do Facão, guarda duas versões de vestígios rupestres. Segundo Almeida (1979), no primeiro,
pinturas em um painel com cerca de 2,90 m x 1,40m, onde pode ser identificada uma representação
de mãos, além de outros símbolos abstratos. Em outra propriedade, encontra-se uma gravura de
difícil identificação.
Sítio Serrote da Macambira: situado na localidade Caatinga, a NNE da sede do município,
distante cerca de 18 km. O local foi alterado em virtude de ações policiais executadas na área,
objetivando averiguações, tendo em vista existir a suspeita de que o local abrigava possíveis ações
de criminosos, (RODRIGUEZ e BEZERRA, 2000). Numa busca mais minuciosa, percebe-se que os
ossos comumente ali encontrados são uma pequena parcela dos que foram retirados pelos policiais e
vândalos. Também existe a possibilidade de o local se tratar de um possível cemitério indígena.
Todos esses atrativos turísticos são conhecidos desde a época da colonização, através dos
relatos do padre Jesuíta Martin de Nantes, o qual deixou farto material a respeito das atividades dos
silvícolas da região aludida. Todavia, o assunto relativo a esses sítios arqueológicos foi relatado
mais detalhadamente, na obra de Irineu Jofilly, no final do século XIX, o qual afirma que:
Quem não admirara esse trabalho paciente e ao mesmo tempo hercúleo, pois que o obreiro
provavelmente só tinha como instrumento um estilete da mesma rocha. A simetria e a combinação
destes signaes não podem ser lançadas por conta do acaso: ellas exprimem com certeza
pensamentos humanos; são monumentos escriptos de uma raça que ali habitou (SIC!).
Além dos atrativos supracitados em São João do Cariri, em outros municípios dos Cariris
Velhos encontram-se outros elementos que fazem parte do potencial turístico da região, a exemplo
dos sítios arqueológicos Tamburil, Craibeira, Serra do Jatobá e Areia em Serra Branca; Em Boa
Vista, encontram-se os sítios, Bravo e Lagoa do Cunhã, neste último, segundo Passos (2002), têm
sido encontrados inúmeros fosseis da preguiça gigante, animal extinto há milhares de anos. No
município de São José dos Cordeiros, encontra-se a Reserva Particular do Patrimônio Natural,
denominada de Almas, onde ainda podem ser encontradas espécies de árvores não catalogadas.
Nessa área, segundo informações de populares, existem pinturas inéditas no sítio Maracajá.
Os atrativos turísticos existentes na zona urbana dos Municípios de São João do Cariri e
Cabaceiras são formados por uma história político-administrativa que remonta a meados do século

129
Pequena elevação, quase sempre constituída de uma formação rochosa, comumente encontrada no semi-árido.
Fórum Internacional do Meio Ambiente - A conferência da Terra 1020

XVII, cujas rugosidades encontram-se presentes por meio de uma arquitetura colonial preservada
(conforme figura 3), bem como por outros eventos inerentes à cultura popular (contos, mitos e
anedotas), presentes no cotidiano do povo do Cariri, e que se difundem através de estórias que
passam de geração em geração.

Figura 3: Arquitetura dos Municípios de Cabaceiras e São João do Cariri, PB. Fonte:
(www.paraiba.pb.gov.br/temp/cabaceiras/fotos)

Embora mereça uma reflexão o fato de haver pouca infraestrutura, fato que não permite a
acomodação de visitantes para apreciar as potencialidades locais, por períodos prolongados
(RODRIGUES e BEZERRA, 2000), segundo os critérios de inventário de Pellegrine Filho (1997),
esse fato em nada subtrai o valor, em potencial, desses atrativos, hierarquizados de acordo sua
potencialidade realizada ou esperando realização.
Para melhor aproveitamento desse potencial, sugere-se a articulação dos atores locais, no
sentido de criarem, em conjunto, ações que viabilizem um calendário unificado, em consonância
com outros eventos turísticos já consolidados, a exemplo dos eventos turísticos de Campina Grande.

Figura 4: Lajedo de Pai Mateus – Cabaceiras – PB. Fonte:


www.paraiba.pb.gov.br/temp/cabaceiras/fotos

O PATRIMÔNIO IMATERIAL
Nessa parte do interior paraibano, a figura do “homem rude e simples” cultivou, ao longo
do tempo, estórias fantasiosas que permeiam o imaginário e se disseminam de forma hereditária.
Entre estas crendices encontram-se os mitos associados a existência da Muralha do Meio do
Mundo, tendo em vista sua aparência e modo como surge na paisagem da Caatinga, pois suas
características diferem das rochas encontradas no entorno, tanto no sentido de direcionamento,
quanto pela aparência e textura, e pelo modo como os blocos se encaixam, suscitando dúvida
quanto a sua origem.
Fórum Internacional do Meio Ambiente - A conferência da Terra 1021

Frente a tantas diferenças, os questionamentos são pertinentes. Seria a muralha, uma


formação geológica natural, que ali aflorou pelo desgaste da erosão diferencial? Ou poderia ser uma
construção realizada por uma antiga civilização que ali habitou em uma época remota? Se assim o
for poderia ali ter sido construído um aqueduto para suprir aquela região, tão carente de água
potável como sugerem outros? Diante de tantas dúvidas, apenas um estudo arqueológico, a partir
de escavações, poderia responder a essas indagações.
Por tudo isso, há entre os moradores locais, sobretudo os mais velhos, crenças de que a
construção da Muralha, teria servido de demarcação de território, na disputa de poder entre índios
gigantes – Tupis e Tapuias, que se acredita, seriam filhos de “Sumé130 – venerado pelos índios e
chamado o “pai do estrangeiro”, dando a entender que esse personagem vindo de outras partes do
mundo e tendo aqui aportado, vivera entre os índios em época pretérita à chegada do colonizador.
Também, as inscrições rupestres existentes em várias partes da muralha seriam atribuídas a
Sumé, segundo relatos dos indígenas, os quais se apressaram em dar noticias deste ao primeiro
contato com os colonizadores portugueses (SANTOS 2004). Coincidência ou não, a milhares de
quilômetros do Semi-Árido nordestino, na costa do Sudeste do Brasil, outra nação indígena - os
Tamoios, também reverenciava um personagem denominado “Sumé”.
Segundo a “Lenda dos Tamoios”, Sumé era enviado de Tupã, senhor do Céu e da Terra,
por isso mesmo, operava prodígios nunca antes por eles vistos (VOLPATO, 2005). E os Tamoios,
cativos de sua bondade, conquistados pelo assombro dos seus milagres, tomaram-lhe para seu
conselheiro. E todas as tardes, os chefes adiantavam-se para ele vinham contar-lhe a história de seu
povo, e interrogá-lo sobre as suas crenças, e pedir-lhe conselhos e lições (VOLPATO, op. cit.)
Lendas à parte, estudiosos do assunto sustentam que o nome Sumé, com alguma lógica,
poderia ser uma alusão a São Tomé Apostolo ou, aos Sumérios, povo originário do Golfo Pérsico,
conhecidos como construtores de cidades fortificadas. (GOUVEIA, 2004).
O fato é que são muitas as teorias a respeito da Muralha, porém nenhuma se assenta em
bases cientificas, o que acaba por suscitar mais especulações a seu respeito.
Da mesma forma que nesta parte do interior crê-se na estória de Sumé, acredita-se também
na lenda do Caboclo “Brabo” ou Caipora ou ainda, Comadre Fulozinha, que consiste de um zumbi
indígena, protetor das matas e da fauna, cujos pés são virados para traz, para confundir os caçadores
que o perseguem. Os nativos, contam as peripécias desse zumbi, que dita as normas pelas quais os
caçadores devem portar-se durante as caçadas pelas matas, sobretudo à noite.
O código de conduta, por assim dizer, deve ser seguido, sob pena de o infrator arcar com
os castigos pela desobediência, os quais podem ir, desde uma simples desorientação – o que
costumeiramente o caririzeiro chama “se ariar”, ou a um péssimo resultado na caçada e até mesmo
violentas surras nos cachorros dos caçadores (PEREIRA, 2006). Contudo, ainda segundo a lenda, é
possível corrompê-lo, lhes oferecendo fumo em troca de sua cumplicidade (PEREIRA, op. cit).
Quanto ao imaginário popular nessa parte do interior nordestino, Passos (2002), assim se
refere: a “Cumadre Fulozinha” ou “caipora” é um mito predominantemente indígena que se
incorporou à Cultura Popular, que assim como outros personagens do vastíssimo acervo de valores
culturais brasileiros, representa os mistérios da natureza relacionando-se diretamente com os
moradores das áreas rurais, advertindo-os para respeitarem a mata e seus habitantes.
Ainda no contexto das manifestações populares e que se constitui em forte tradição local,
estão: as festas juninas, os encontros de repentistas e a tricentenária festa da padroeira do Cariri. O
que faz especial nessa última comemoração é a esperança do caririzeiro, que busca na fé, superar as
infindáveis dificuldades de viver em uma área afetada constantemente por sucessivas estiagens e
que, por esse motivo, adquiriu forte conotação de misticismo. A devoção À Padroeira, no entender
do homem do Cariri, representa a certeza ou a esperança de bons “invernos” e colheitas fartas.
Por outro lado, se constitui em importante fator de valorização da festa de setembro em
São João do Cariri, a festa dos remédios em Monteiro, a festa de São Bento em Cabaceiras, entre

130
Muitos estudiosos têm dedicado considerável esforço no sentido de desvendarem os mistérios que cercam esse
personagem da História Pré-cabraliana no Nordeste brasileiro, bem como sua importância e significado para os
indígenas, na agricultura, na pesca e nas regras de convivência.
Fórum Internacional do Meio Ambiente - A conferência da Terra 1022

outras. A parte profana é, na atualidade, o diferencial e que propicia a realização de outras


atividades, tais como: desfiles cívicos estudantis, leilões, feiras, exposições, mostras de artesanato,
pavilhões, barracas, etc., motivando a freqüência de um público numeroso. A parte litúrgica, de
acordo com Peres (2004), é composta por muitas atividades nas comunidades e o encerramento
acontece com o cortejo em procissão pelas principais ruas das cidades, com um público estimado
em cinco ou seis mil pessoas, segundo estimativa da policia militar-PB.
Com relação às festas religiosas, de suma importância para manter viva a cultura e as
raízes do povo brasileiro, Moura (2003) assim se refere: “apesar de muitas vezes, não se
conservarem a autenticidade de suas raízes, originadas na devoção, elas constituem-se em um dos
principais atrativos turísticos do Brasil, tanto nos grandes centros urbanos, como nas pequenas
cidades, onde as manifestações profanas, o cortejo e o culto estão ligados efetivamente a realidade
de seus atores”.

ECOTURISMO INTEGRADO: FORTALECER PARA DESENVOLVER


Segundo Seabra (2001), uma alternativa para o fortalecimento do turismo no interior do
Nordeste brasileiro advém da implantação dos circuitos turísticos, através da criação de uma rota de
ligação entre os municípios integrantes do projeto. Essa providência possibilita menores custos de
investimento em infra-estrutura e serviços e encurta as distâncias percorridas, dando maior
mobilidade aos turistas e possibilitando-lhes maiores oportunidades para conhecer os ritos e festejos
característicos de diferentes localidades e, com isso, diversificam-se as opções de lazer.
Visando o aproveitamento do potencial ali disponível, algumas ações do Estado, já podem
ser percebidas em resposta à mobilização dos atores destas comunidades, como por exemplo:
autoridades, através dos órgãos ligados ao turismo, conceberam, em 1999, um plano estratégico de
desenvolvimento, que contempla os municípios paraibanos, denominado Plano Amanhecer. Esse
plano, contem as metas traçadas pela Empresa Paraibana de Turismo (PBTUR) para serem
implementadas em longo prazo.
Paralelo a isso, algumas ações estão sendo desenvolvidas através de parcerias
institucionais, que incluem membros da sociedade civil, através de Programas como: Empreendedor
Cultural da Paraíba (PEC/PB) e do Pacto Novo Cariri, em conjunto com empresários, dirigentes
públicos e a comunidade, a fim de criarem-se as condições para o desenvolvimento da atividade.
Recentemente, a PBTUR elaborou alguns roteiros turísticos, entre os quais, se encontra um que
contempla a área aludida, denominado “Pedras da Paraíba” (Figura 5).

Figura 4: Roteiro turístico “Pedras da Paraíba". Fonte: Governo do Estado da Paraíba – PBTUR
(2001).
Fórum Internacional do Meio Ambiente - A conferência da Terra 1023

Um fator que não deve ser ignorado é a integração que deve ocorrer entre as várias
localidades por intermédio de circuitos aqui aludidos. Deve ser elaborado um plano de atuação das
várias etapas da atividade como, por exemplo, a formação de pessoal especializado, desde guias
mirins, até agentes receptores, tais como donos de restaurantes e pousadas, dentre outros. Nessa
perspectiva, o documento “Diretrizes para uma Política Nacional de Ecoturismo", lançado
oficialmente em 1995, veio reforçar a necessidade de gestores e operadores turísticos qualificados e
diagnostica a ausência de programas de desenvolvimento que atendam a essa demanda.
O documento supracitado não garante, por si só, a consolidação de uma política para o
setor, despontando assim, alguns empreendimentos isolados que podem servir como parâmetros e
outros tantos que surgem muito mais por uma oportunidade mercadológica imediata, que por um
trabalho profundo de pesquisa e análise de mercado, onde se permita um planejamento adequado
para o desenvolvimento do setor.
Necessário se faz reforçar-se, aqui, as principais ações no sentido de desenvolver o
ecoturismo nessa região, destacando-se a valorização dos atrativos potenciais, incluindo a prática de
metodologias onde se determinem as suas condições de uso e envolvimento, esclarecimento e
sensibilização da população, estabelecimento de sistemas de monitoração dos parâmetros de
preservação das áreas afetadas, formação e treinamento dos prestadores de serviço, priorizando-se a
mão-de-obra local.
As ações que ora se projetam, objetivando a incrementação da atividade ecoturística
integrada em todos os municípios dos Cariris Velhos podem significar a concretização da idéia
concebida por Seabra (2001), que vislumbrou o circuito da cultura do bode e do algodão, como
sendo expressão máxima do agrupamento dos atrativos dessa área. Esse feito, se concretizado, trará
desenvolvimento e melhoria na qualidade de vida da população local e ao mesmo tempo,
desmontará a tese sustentada pelas elites dominantes de que a seca representa a razão principal da
miséria instalada, há séculos, nessa parte do território brasileiro.

CONSIDERAÇÕES
Quando uma determinada população carece de atividades econômicas alternativas para
sobreviver, em função da inviabilidade proveniente das condições climáticas e/ou da ausência de
outros meios para ganhar seu sustento, qualquer outro meio – lícito, que se constitua em emprego e
renda, deve ser aproveitado. Assim sendo, torna-se necessário à exploração do potencial turístico
existente nos Cariris Velhos, como forma de ocupar uma parcela considerável de mão-de-obra
ociosa, contribuindo para melhoria da qualidade de vida da população local.
Essa carência, já demonstrada em publicações anteriores (Pereira & Ramos, 2004; Pereira
et al., 2005; Pereira, 2006), enfatiza a importância do ecoturismo nessa área, o qual não deve ser
concebido apenas do ponto de vista do entretenimento, mas de modo que a atividade se processe em
bases sustentáveis. Existe, no entanto, a necessidade premente da implementação de uma política
de aproveitamento desses atrativos como fator de desenvolvimento econômico atingindo objetivos
como, preservação, conservação e valoração histórica e cultural desse patrimônio.
Para que essas mudanças se processem, cabe às autoridades deixarem de lado as
divergências políticas, oferecendo mecanismos, através dos órgãos de fiscalização e controle,
fazendo com que as leis e normas vigentes sejam observadas, a fim de que a utilização produza
melhorias para a qualidade de vida dos moradores locais e minimize os possíveis impactos à
ambiência, respeitando-se os limites da capacidade receptora da localidade, quanto ao fluxo
turístico.
Para uma tarefa de tamanha magnitude, a participação da sociedade civil organizada pode
ser o fator de equilíbrio entre o poder público, muitas vezes instável, outras vezes omisso e a
população, que urge por melhorias.

REFERÊNCIAS BIBLIOGRAFICAS
ALMEIDA, R. T. A Arte Rupestre nos Cariris Velhos. João Pessoa: Editora Universitária, 1979,
125 p.
Fórum Internacional do Meio Ambiente - A conferência da Terra 1024

AULICINO, M. P. Algumas Implicações da Exploração dos Recursos Naturais. In: AULICINO, M.


P. (org.). Turismo e ambiente. Reflexões e propostas. S.Paulo: Hucitec, 1997, p.27-36.
BUARQUE, S. C. Globalização e desenvolvimento local sustentável. In: BUARQUE, S. C. (org.).
Metodologia de planejamento do desenvolvimento local e municipal sustentável. 2. ed. Recife: Iica,
1999.
GOUVEIA, H. O Enigma do Meio do Mundo. In: Jornal A União. p.12-14. João Pessoa, PB,
22/06/2004.
GOVERNO DA PARAÍBA. <http:www.paraiba.pb.gov.br/temp/cabaceiras/fotos> Acesso em:
Dez/2006.
JOFILLY, I. Notas Sobre a Parahiba, Livro I. Rio de Janeiro: Thesaurus Editora, 1892. 311p.
MOURA, A. de P. Turismo e festas folclóricas no Brasil. In: MOURA, A. de P. Turismo e
Patrimônio Cultural. 3. ed. São Paulo: Contexto, 2003.
OMT, Organização Mundial do Turismo. <http:www.world.tourism.org>. Acesso em Out/2005.
PASSOS, L. A. dos. Paisagem natural, patrimônio cultural e turismo nos Cariris Paraibanos, 2002.
136f. Dissertação (mestrado) – UFPB/CCEN. João Pessoa - PB, 2002.
PELLEGRINE FILHO, Ecologia cultura e turismo. 2.ed. Campinas: Papirus Editora,1997.
PEREIRA, R. A. Arquivo fotográfico. Campina Grande, 2005/2006.
PEREIRA, R. A. e RAMOS, M. Mª. Q. Potencialidades turísticas de São João do Cariri – PB: uma
via para o desenvolvimento socioeconômico no Semi-Árido. In: Congresso Latino Americano de
Iniciação Científica 8, 2004. São Jose dos Campos, SP, p. 1114-1117.
PEREIRA, R. A. et al., Geologia, Arqueologia e Imaginário nos Cariris Velhos: uma alternativa
socioeconômica, através do turismo ecológico para o Semi-Árido. In: Simpósio Brasileiro de
Geografia Física Aplicada, 11, 2005, São Paulo, 2005, p.3956 – 3964.
PEREIRA, R. A. São João do Cariri-PB, Potencialidades turísticas versus sêca: uma alternativa ao
desenvolvimento socioeconômico de uma área semi-árida. 2006, 75f. Monografia (Curso de
Geografia), Campina Grande-PB, UEPB, 2006.
PERES, M. R. de H. Turismo sostenibleen el Cariri paraibano: relato de una experiencia. FORUM,
GLOBALIZACIÓN y DESARRO: Barcelona, Espanha, 2004.
RODRIGUES, A. B. Turismo e ambiente. Reflexões e propostas. São Paulo: Hucitec, 1997.
RODRIGUEZ, J. L. e BEZERRA, C. P. Conhecendo o Cariri. Recife: Gráfica Liceu, 2000.
SANTOS, J. de S. As Belezas Naturais da Muralha do Meio do Mundo. Diário da Borborema.
Campina Grande-PB, 11/06/2004.
SEABRA, G. Turismo, cultura e desenvolvimento. Disponível em
<http://www.adufpbjp.com.br/publica/conceito>. Acesso em Maio/2004.
VOLPATO, R. Sumé: Lenda dos Tamoios. Disponível em: www.unicamp.br/iel/memoria/ensaios.
Acesso em: Jan./2005.
Fórum Internacional do Meio Ambiente - A conferência da Terra 1025

SOCIEDADE, IDENTIDADE E MEIO AMBIENTE: UTILIZANDO A INTERPRETAÇÃO


TURÍSTICA PARA TRAZER UM NOVO OLHAR SOBRE O PARQUE “PAU POMBO”,
EM GARANHUNS – PE

Esp. Edmilson RAMOS


FAGA. Atheliê Lúdico. edsilvaramos@hotmail.com
Mdo. Gustavo L. SANTOS
FAGA. Atheliê Lúdico. gugapessoas@hotmail.com
Esp. Sérgio H. V. XAVIER
Maurício Nassau. Atheliê Lúdico. shvx79@hotmail.com

RESUMO
O presente trabalho justifica-se porque buscamos identificar e analisar as atividades do
Parque Ruber Van Der Linden, ou Pau Pombo, relativas ao uso Público com intuito de contribuir
para melhorar a qualidade de vida da comunidade na região, transformando-o também em um
grande ponto de visitação turística, além de ajudar consideravelmente a preservar um dos seus
biomas mais importantes, caracterizando-se assim como uma ferramenta eficaz para a prática da
sustentabilidade. Assim sendo, chamamos a atenção para a importância da cultura no processo de
construção da idéia de patrimônio cultural e deste para o resgate da auto-estima de uma sociedade, a
partir da identidade cultural. É com base nesta análise, que formulamos uma proposta de
ressignificação do Parque Ruber Van Der Linden, que fica localizado na região central da cidade de
Garanhuns.
Palavras-chaves: Desenvolvimento Sustentável, Identidade Cultural, Interpretação Turística.

ABSTRACT
This work is justified because seek identify and analyse the activities of the Park Ruber
Van Der Linden, or Pau Pombo on the public use in order to contribute to improving the quality of
life of the community in the region, transforming it also in a large point of tourist visitation, and
help considerably to preserve one of its most important biomes, characterizing themselves as an
effective tool for the practice of sustainability. Therefore, we draw attention to the importance of
culture in the process of building the idea of cultural heritage in this for the redemption of self-
esteem in a society, from cultural identity. It is the basis of this analysis, which make a proposal to
the Park ressignificação Ruber Van Der Linden, which is located in the central region of the town of
Garanhuns.
Keywords: Sustainable Development, Cultural Identity, Interpretation Tourist.

IDENTIDADE CULTURAL
Ao longo do tempo, a compreensão do significado da palavra “cultura” sofreu inúmeras
alterações, até se chegar à idéia atual de que ela permite ao homem não somente adaptar-se a seu
meio, mas adaptar esse meio a si próprio, adequando-o às suas necessidades e projetos.
Convém repetir que o conceito de cultura é construído, modificado e transformado ao
longo do tempo, influenciado por diferentes fatores sociais, culturais, econômicos ou ambientais. Os
valores de determinada sociedade atual não são mais nem menos corretos que os praticados há
séculos. Trata-se apenas de valores diferentes em épocas diversas.
A Declaração do México (1985) recomenda ao órgão multiplicar seus esforços destinados
a preservar tais valores e a aprofundar sua ação em benefício do desenvolvimento da humanidade,
destacando:
[...] a conferência concorda em que, no seu sentido mais amplo, a cultura pode ser
considerada atualmente como o conjunto dos traços distintivos espirituais, materiais,
intelectuais e afetivos que caracterizam uma sociedade e um grupo social. Ela engloba,
além das artes e das letras, os modos de vida, os direitos fundamentais do ser humano, os
sistemas de valores, as tradições e as crenças. Concorda também que a cultura dá ao
homem a capacidade de refletir sobre si mesmo. É ela que faz de nós seres
Fórum Internacional do Meio Ambiente - A conferência da Terra 1026

especificamente humanos, racionais, críticos, e eticamente comprometidos. Através dela,


discernimos os valores e efetuamos opções. Através dela o homem se expressa, toma
consciência de si mesmo, se reconhece como um projeto inacabado, põe em questão as
suas próprias realizações, procura incansavelmente novas significações e cria obras que
o transcendem.

O texto acima, além de trazer concepção ampliada do que vem a ser cultura, mostra ainda a
importância desta para a vida humana e dá o alicerce para a compreensão da importância da
identidade cultural.
A cultura não deve e não pode ser pensada como algo estagnado, acabado, que tenha
começo, meio e fim; ela é dinâmica. A vantagem de estudá-la reside na possibilidade de se
compreenderem os processos de suas constantes transformações. Ela integra uma realidade onde a
mudança é fundamental. Enfatizando esse pensamento, trazemos mais um trecho de Cuche:
Toda cultura é um processo permanente de construção, desconstrução e reconstrução. O
que varia é a importância de cada fase, segundo as situações. Talvez fosse melhor
substituir a palavra “cultura” por “culturação” (já contido em aculturação) para sublinhar
esta dimensão dinâmica da cultura. (CUCHE, 2002, p. 46).

Pelo exposto, pode-se inferir que os valores, os costumes espontâneos da comunidade,


como festas, crenças, religiosidade, danças e folguedos, possibilitam conhecimento daquilo que fala
deles para eles mesmos, dos elementos comuns diferenciadores dos outros grupos, gerando a
identidade cultural, importante para assegurar o caráter excepcional de cada povo, pois cada
comunidade é única em seu modo de criar, fazer e viver.
Todas as culturas fazem parte do patrimônio cultural da humanidade. A identidade cultural
de um povo se renova e enriquece em contato com as tradições e valores dos demais. A cultura é
um diálogo, intercâmbio de idéias e experiências, apreciação de outros valores e tradições; no
isolamento, esgota-se e morre [...] A identidade cultural é uma riqueza que dinamiza as
possibilidades de realização da espécie humana ao mobilizar cada povo e cada grupo a nutrir-se de
seu passado e a colher as contribuições externas compatíveis com a sua especificidade e continuar,
assim, o processo de sua própria criação. (DECLARAÇÃO DO MÉXICO, 1985).

Essa transcrição sintetiza as concepções que entendemos de cultura (apresentamos apenas


algumas aqui) e ressalta a importância de um novo conceito – identidade cultural. Assim, entende-
se identidade cultural como o sentido de pertencimento que as pessoas trazem enquanto seres
simbólicos: ser de algum lugar, pertencer a algum grupo, sentir afinidade com algo.
De acordo com Macena (2003), os indivíduos recorrem a um conjunto de referências para
recuperar ou manter sua identidade, o sentido de pertencer, resgatando a própria história, sobretudo
no processo de globalização em curso, em que o individual se perde no padrão..
Os indivíduos se sentem mais seguros quando reconhecem um elo entre eles e seus
antepassados, o qual pode ser representado pelo território que ocupam ou por seus hábitos,
indicando-lhes as origens e criando uma referência cultural que os diferencia do todo. Como
destaque ao sentido de resgate da auto-estima atribuído à identificação cultural, observemos a
citação abaixo.
A continuidade e a contigüidade com o passado dão certezas, permitem traçar uma linha
na qual nosso presente se encaixe, permitem que saibamos mais ou menos quem somos e
de onde viemos, ou seja, que tenhamos uma identidade [...] Manter algum tipo de
identidade – étnica local ou regional – parece ser essencial para que as pessoas se sintam
seguras, unidas por laços extemporâneos aos seus antepassados, a um local, a uma terra,
a costumes e hábitos que lhes dão segurança, que lhes informem quem são e de onde
vêm, enfim, para que não se percam no turbilhão de informações, mudanças repentinas e
quantidade de estímulos que o mundo atual oferece. (BARRETO, 2003, p. 43 - 46).
Fórum Internacional do Meio Ambiente - A conferência da Terra 1027

O estudo da identidade cultural é bastante complexo, por isso exige diversas abordagens.
Mas, aqui, partimos do princípio de que a identidade cultural hoje nada mais é que a busca por
referências culturais que permitam o reconhecimento individual e grupal diante do panorama de
homogeneização de globalização.
Segundo a Declaração do México, qualquer povo tem o direito e o dever de defender e
preservar o patrimônio cultural, uma vez que as sociedades se reconhecem a si mesmas nos valores
em que encontram fontes de inspiração criadora. Além do mais, a preservação e o apreço do
patrimônio cultural permitem, aos povos defender sua soberania e independência e, por
conseguinte, promover a identidade cultural.

TURISMO E DESENVOLVIMENTO SUSTENTÁVEL


A partir da segunda metade do século XX diversos movimentos surgiram em busca de
questionamentos e soluções para o crescimento econômico mundial acelerado e os problemas
ambientais ocasionados por esse desenvolvimento desenfreado. Esse frenético ritmo de
desenvolvimento, juntamente à falsa idéia de que os recursos naturais são infinitos, causou o uso
inadequado desses recursos, alterando as condições ambientais e comprometendo a qualidade de
vida das próximas gerações. Contudo, a sociedade atual tem-se mostrado atenta a crise ambiental,
exigindo e buscando ações para que as empresas, governos e toda população respeitem a natureza
(GONÇALVES, 2004).
Ao longo dos últimos 50 anos, a compreensão sobre esse fenômeno seguiu uma trajetória
crescente com o engajamento de número cada vez maior de estudiosos dispostos a enfrentar todos
os desafios que a empreitada requer. Um deles, talvez o maior que podemos destacar, é o
reconhecimento da insuficiência do conhecimento tradicional para abordar a problemática
ambiental. A visão mecanicista do mundo e o método reducionista a ela correlato, que compõem a
base paradigmática em que se desenvolveram as ciências no mundo moderno, deixam os estudiosos
da relação homem-natureza em difícil e perplexa situação de impotência.
A aproximação aos termos dessa relação releva que se está lidando não mais com
problemas localizados, circunscritos e de causalidade linear. Mas sim, com redes causais
complexas, de dimensão planetária e de desdobramento quase sempre imprevisível, quando não
inevitável. Reconhece que o ambiente não é um entorno pré-estabelecido, ao qual as espécies
devem se adaptar, mas que co-evolui com a própria evolução da vida. Tais percepções mostram que
é necessário adotar outra forma de pensamento, não-reducionista, que possa dar conta de dimensões
ocultas entre os diversos fenômenos que dão sustentação à vida no planeta. Neste sentido, é possível
afirmar que os desafios teóricos e conceituais vão encontrar respostas em propostas de reforma do
pensamento em curso, que podem ser agrupadas sob o título de pensamento sistêmico ou
pensamento complexo. Assim, os objetos deixam de ser visto como entidades isoladas que agem
umas sobre as outras, para serem, eles mesmos, compostos por redes de relações que se aninham
uma dentro das outras.
Dessa forma, a vida é concebida como uma rede de relações, em constante processo de
auto-produção, movido pela energia proveniente do sol, aproveitada graças à permanente
reciclagem dos compostos minerais. As sociedades humanas nada mais são que fios dessa teia
complexa que é a vida, que se desenrola há bilhões de anos desenvolvendo equilíbrios profundos e
ao mesmo tempo sutilíssimos. O que o pensamento complexo ou sistêmico propõe é compreender
com que padrão de relações a vida se utiliza para se auto-sustentar em sua longíssima história, e a
partir daí aprender de que maneira nós humanos podemos nos aninhar nessa teia sem provocar
deslocamentos tais que possam resultar em comprometimento da sobrevivência de nossa própria
espécie.
Nesse sentido, a atividade turística também passa a ser repensada, à idéia de um “novo
turismo” em que os turistas vivenciem a forma de vida da comunidade receptora, a fim de que
passem a respeitar e valorizar o ambiente e a cultura dessas comunidades, gerando além de renda
para a comunidade, também a melhoria da qualidade de vida e conservação do ambiente, surge em
oposição ao turismo massificado, de larga escala, caracterizado pela padronização dos destinos
Fórum Internacional do Meio Ambiente - A conferência da Terra 1028

turísticos, organizados com fins unicamente comerciais, em que o turista, em sua maioria, não
valoriza a cultura da comunidade e destrói a paisagem do local (SEABRA, 2001). A partir da
concepção do turismo alternativo, surgem vários segmentos que incorporam as idéias desse turismo,
mas que adquirem identidades próprias.
ARRUDA, FARIAS E HOLANDA (2003) nos apresentam a compilação de alguns autores
que Beni fez para aprofundar a compreensão do conceito de sustentabilidade, a partir de quatro
vertentes: turismo sustentável, turismo ecologicamente sustentável, desenvolvimento econômico e
ecologicamente sustentável e desenvolvimento sustentável do turismo.
A primeira proposta tem seu objetivo à viabilidade da atividade turística, preocupando com
a sustentabilidade econômica. Sua atuação é para o melhoramento, fortalecimento e solidificação da
infra-estrutura e serviços turísticos a fim de ter um diferencial no produto turístico. Segundo esse
raciocino são analisados todos os investimento feitos com esse intuito para que o produto possa
competir em todos os âmbitos do mercado turístico com preço justo e atraente.
A abordagem do turismo ecologicamente sustentável tem seu foco principal a preservação
e manutenção dos ecossistemas naturais. Defendem a ecologia por uma causa política e
sociocultural. Usam o turismo não para denegrir o meio ambiente e, sim, para ajudá-lo a
desenvolver.
A vertente do desenvolvimento econômico ecologicamente sustentável é a junção das
duas primeiras linhas, o autor afirma que tem haver os investimentos para o
desenvolvimento do turismo, porém ele tem que estar atrelado à preservação do meio
ambiente, que também tem seu papel social e econômico dentro da sociedade. A política
de turismo é tão importante quanto às outras: econômicas, sociais, ambientais e todas
tem que andar uma ao lado da outra sem nenhuma querer se sobre por. O autor entende
“que essa abordagem é a mais próxima do pensamento contemporâneo do turismo” (op.
Cit., pág 148).

E para terminar a linha do desenvolvimento sustentável do turismo defende que não basta
proteger o meio ambiente com uma visão imediatista, é necessário pensar a longo prazo, para as
outras gerações e essa proteção tem que ir além da, simples, proteção ambiental, e chegar aos
âmbitos “da qualidade de vida nas comunidades e, em última instância, o planeta, num esforça a
longo prazo. (op. Cit., pág 148).

EDUCAÇÃO AMBIENTAL
A Educação Ambiental (doravante EA) surge dentro de um contexto que se originou da
utilização de um modo inadequado dos bens coletivos da Terra em diferentes escalas (espaço-
tempo). Diversos conceitos foram elaborados e apresentados sobre o que vem ser a EA. Apesar do
vários conceitos sobre a mesma, decidimos conceituá-la sobre, apenas, três pontos de vista de
alguns teóricos do assunto, que GUEDES, 2006, nos mostra.
O primeiro conceito de EA é delimitado à formação dos cidadãos em torno do ambiente
biofísico e os seus respectivos problemas: pecam por não considerarem de fundamental importância
as relações do homem com o meio ambiente, a definição nos é dada por Stapp (in Guedes, 2006)
“O processo que deve objetivar a formação de cidadãos, cujos conhecimentos acerca do
ambiente biofísico e seus problemas associados possam alertá-los habilitá-los a resolver
seus problemas”.

Preocupam-se em mostrar que a função da EA é apenas oferecer condições favoráveis a


um ambiente, para que possa desenvolver os seus recursos e as suas habilidades, a fim de poderem
se confrontar às questões promovidas pelo próprio homem, no tocante ao desrespeito com o Meio
ambiente. Uma definição mais recente e atual de Meyer, Regota e Sorrentino (Op. Cit.) nos dá um
novo sentido de EA:
“...a EA é uma reivindicação legítima e um processo contínuo de aprendizagem de
conhecimentos para o exercício da cidadania”.
Fórum Internacional do Meio Ambiente - A conferência da Terra 1029

“Para a EA lidar com a realidade, pode e deve ser o agente otimizador de novos
processos educativos que conduzam as pessoas por caminhos onde se vislumbre a
possibilidade de mudança e melhoria do seu ambiente total”.

Esse novo conceito nos mostra uma visão mais ampla da EA, que não apenas o homem
preocupado com o seu bem estar dentro do ecossistema, mas a sua participação, e dever de
preservação, desse ecossistema. Como um processo de sociabilização e reivindicação de seus
direitos através da EA.
Com a Eco-92 novos aspectos foram acrescentados a EA, deixando, a partir daí, a natureza
de ser uma fornecedora de recursos naturais para os seres e passando a ter seu caráter ideológico.
Não mais sendo uma forma de exercer a cidadania, porém mais do que isso um ato político. E por
fim tendo que ser vista e compreendida num ponto de vista holístico e sistêmico.
“A Educação ambiental não é neutra, mas ideológica. É um ato político”.
“A EA deve envolver uma perspectiva holística, enfocando a relação entre o ser humano, a
natureza e o universo de forma interdisciplinar”.
“A EA deve tratar das questões globais críticas, suas causas e inter-relações em uma
perspectiva sistêmica, em seu contexto social e histórico. Aspectos primordiais relacionados como
desenvolvimento e o meio ambiente, tas como população, saúde, direitos humanos, democracia,
fome degradação da fauna e da flora, devem se abordados dessa maneira”. (Cassino, in op. Cit.).

As ações da EA possibilitam aos visitantes uma aproximação e aprendizagem maior sobre


os recursos naturais e culturais dos espaços visitados e são estimulados a perceber elementos que a
princípio eram insignificantes (WWF, 2003). Contudo, para que estas informações sejam repassadas
ao visitante é importante que as ferramentas da EA sejam adequadas ao processo de visitação. No
caso de visitantes a Interpretação Ambiental traduz-se na ferramenta ideal para atingir este público,
pois esses indivíduos estão em um momento de liberação e, portanto, não devem ser condicionados
a um regime amplo de discussão e aproximação das questões ambientais (MELO, 2006).
INTERPRETAÇÃO TURÍSTICA
Tendo em vista que o espaço geográfico é o local onde a vida acontece e nele estão
expressas não somente a cristalização da vida, mas também o seu movimento presente, a
interpretação deste espaço deve considerar as questões expostas acima sobre o tempo e a cultura – o
movimento. Ao estar restrita a uma leitura do espaço sob o enfoque da paisagem (cristalização), a
experiência turística proposta pelos produtos de massa, não estaria inserida dentro do movimento
cotidiano que se desenrola e se expressa no espaço urbano, reconstruindo-o continuamente. Voltada
para a paisagem e às cristalizações presentes nos seus fixos, as interpretações que desconsideram tal
movimento presente proporcionariam uma experiência visual. Mais especificamente, a visualidade
estaria imbricada à interpretação focada apenas nas cristalizações histórico-culturais impressas na
paisagem, da qual são concebidos os produtos turísticos.
Ainda, desconsiderando o movimento de transformação, a interpretação turística oferece a
cultura através dos simulacros, uma vez que tem autenticidade no cerne da concepção de atrativo
turístico. O autêntico é, então, tomado de forma engessada, cristalizada, simulada – o outro
autêntico, vendido através do Turismo, talvez nem seja mais o outro na sua condição presente, uma
vez que o processo de transformação da cultura é contínuo.
De acordo com Meneses (2004), esta interpretação é precária e a partir dela há uma
monumentalização dos eventos (o recorte de um passado dado) e a musealização da experiência.
Para o autor o patrimônio é vivo, contém em si a condição histórica de uma sociedade e
conseqüentemente o presente no qual o monumento é apropriado, resignificado, ou tem o papel de
manter vivo um sentido identitário que se mantém ao longo do tempo. Portanto, a cultura e a
história devem ser interpretadas a partir da vivência cotidiana da população que se quer
compreender. Logo, a dinâmica da cultura imposta pela sua historicidade deve ser considerada –
“pensar o patrimônio social de uma sociedade é pensar a própria sociedade e problematizar sua
existência e sua forma de participação na vida” (MENESES, 2004, p.49).
Fórum Internacional do Meio Ambiente - A conferência da Terra 1030

Tendo em vista que o espaço geográfico é o local onde a vida acontece e nele estão
expressas não somente a cristalização da vida, mas também o seu movimento presente, a
interpretação deste espaço deve considerar as questões expostas acima sobre o tempo e a cultura – o
movimento. Ao estar restrita a uma leitura do espaço sob o enfoque da paisagem (cristalização), a
experiência turística proposta pelos produtos de massa, não estaria inserida dentro do movimento
cotidiano que se desenrola e se expressa no espaço urbano, reconstruindo-o continuamente. Voltada
para a paisagem e às cristalizações presentes nos seus fixos, as interpretações que desconsideram tal
movimento presente proporcionariam uma experiência visual. Mais especificamente, a visualidade
estaria imbricada à interpretação focada apenas nas cristalizações histórico-culturais impressas na
paisagem, da qual são concebidos os produtos turísticos.
Contudo, para que estas informações sejam repassadas ao visitante é importante que as
ferramentas da EA sejam adequadas ao processo de visitação. No caso de visitantes a Interpretação
Ambiental traduz-se na ferramenta ideal para atingir este público, pois esses indivíduos estão em
um momento de liberação e, portanto, não devem ser condicionados a um regime amplo de
discussão e aproximação das questões ambientais (MELO, 2006).

A CIDADE COMO ESPAÇO DE LAZER


No século XXI, o ócio será essencial para as sociedades pós-industriais. As barreiras entre
trabalho e lazer diminuirão cada vez mais, tempos sociais surgirão em que a prioridade das pessoas
será seu bem estar, sua família e seu divertimento e não mais o trabalho, assim sendo o lazer
assumirá posição de maior destaque.
O mercado criado pela globalização fez surgir um novo setor na economia, que é definido,
por alguns estudiosos da área, como quarto setor. A busca de novos negócios para investimentos, na
criação de novas profissões e espaços alternativos, trouxe para a população novas opções de lazer,
tendo desde as gratuitas até as mais sofisticadas.
Como o tempo gasto no trânsito é cada dia maior, devido ao aumento das distâncias e o
aumento da frota de carros, logo causando os longos e demorados engarrafamentos uma alternativa
para o lazer seria contemplar os espaços urbanos. WILHEIM nos diz que: “percorrer a cidade pode
ser enfadonho e desgastante ou, pelo contrário, revelar-se uma experiência altamente informativa e
agradável para os sentidos”, daí a importância de se preservar também os parques e praças públicas.
Segundo CASTROGIOVANNI (2000, pág 02):
“As cidades, ao mesmo tempo em que sintetizam as tensões sociais existentes, são
espaços privilegiados de atrações, serviços, simbolismos e produções culturais. O papel
que assumem na etapa pós-industrial e da globalização econômica tem possibilitado
incrementar estruturas, equipamentos, serviços e revitalizar áreas adormecidas, mas
com grande expressividade na formação histórica do lugar”.

De acordo com MARCELLINNO (2000; pág 25), “o espaço para o lazer é o espaço
urbano”. É nos centros urbanos que a população encontra os chamados equipamentos de lazer
mais variados e de fáceis acessos, sejam eles específicos ou não.

APRESENTANDO GARANHUNS
Diz a sabedoria popular de um povo que vive no coração do Agreste Pernambucano que,
quem beber da água de Garanhuns, um dia volta. Não é para menos: essa Cidade, de 122 mil
habitantes, ergue-se imponente entre sete colinas. Talvez seja essa a explicação para um clima tão
agradável. Garanhuns está situada no planalto da Borborema, 896 metros acima do nível do mar. No
ponto mais elevado, a altitude chega a 1.030 metros. É o principal Município do Agreste
Meridional, distante apenas 230 quilômetros da Capital do Estado.
A Cidade, incrustada entre sete colinas e belas paisagens, tem sua história iniciada na
primeira metade do século XVII, sendo contemporâneo às guerrilhas dos escravos fugidos para o
Quilombo dos Palmares, dando início a uma série de fazendas e sítios.
Fórum Internacional do Meio Ambiente - A conferência da Terra 1031

Em 1700 foi instalada a Capitania do Ararobá e a Freguesia de Santo Antônio do Ararobá,


tendo como sede o território da fazenda do Garcia, depois Sítio Tapera, sede da capitania, hoje
Cidade de Garanhuns. Por Carta Régia, em janeiro de 1777 foi criada a freguesia de Garanhuns. O
Município foi criado em 1811 e elevado à categoria de Cidade em Fevereiro de 1879.
Vários ciclos econômicos marcaram a evolução do Município ao longo do século XX. O
primeiro deles estava ligado ao traço mais forte de sua identidade: o cultivo do café, seguido pela
diversificação de produtos agro-pecuários. A partir de 1966, inicia-se novo ciclo, com ênfase para o
comércio, o turismo e serviços no Município
Garanhuns é a soma de história, progresso, folclore, festas e feiras culturais, belezas
naturais, da convivência harmônica de técnicas artesanais, de hospitalidade do seu povo, com
atrativos turísticos inigualáveis. Além do clima frio, as principais atrações urbanas da Cidade são: o
Relógio de Flores, Cristo do Magano, o Centro Cultural Alfredo Leite Cavalcanti, Mosteiro de São
Bento, Santuário Mãe Rainha, Parque Euclides Dourado e o Parque Ruber van der Linder, antigo
Parque “Pau Pombo” e objeto principal desse estudo.

O PARQUE “PAU POMBO”


O parque foi montado onde ficava a companhia de abastecimento de água e luz de
Garanhuns, administrada pelo engenheiro Ruber Van Der Linden. Era chamado de Parque Pau
Pombo e após uma reforma em 1994, mudou de nome para Parque Ruber Van Der Linden (porém
continuou sendo chamado pelo seu antigo nome pelos Garanhuenses) e atualmente é um parque
arborizado, com flores raras, lagos, fontes de água, grutas e pássaros.
O Parque é administrado pela prefeitura de Garanhuns, e possui um enorme potencial para
atividades voltadas para o lazer e contemplação da natureza, já que é dono de uma rica variedade da
fauna (sagüis, sabiás, preguiças, etc); E da flora (gameleira, figueira, mamão jaracatiá, bambu, quiri,
senhoravó, pau-brasil, Arapiraca, cana fista, barriguada, palmeira imperial, pau-ferro, bordão-de-
velho, caruá, ipê, oiti, ingazeira e pau-pombo) (CAVALCANTI, 1983). Porém, grande parte deste
parque vem sendo destruído por falta de uma gestão mais comprometida por parte das autoridades,
e pela falta de uma política voltada para a educação ambiental da comunidade local.
O Parque Ruber Van Der Linden situa-se no centro da cidade e devido ao processo de
urbanização, vem sofrendo com o uso e ocupação do solo inadequados ao longo dos anos. Ele está
inserido em um local de extrema importância devido ao fato de ter, entre outros atrativos naturais,
uma nascente de água mineral encravada dentro de sua área geográfica.
No entanto, a poluição das águas da nascente, oriunda do acúmulo de dejetos de lixo que
são jogados pelos moradores do entorno do parque, além do esgoto que jorra ininterruptamente do
interior das residências e dos estabelecimentos comerciais da circunvizinhança, comprometem
fortemente a qualidade da água que vai para diversas áreas.
Além disso, há uma ocupação irregular no Parque por parte de alguns moradores da cidade,
que tem provocado um enorme transtorno aos freqüentadores do local. Um bar funciona dentro do
parque, além de servir como residência dos seus proprietários. Embora ofereça aos visitantes um
serviço de alimentação e entretenimento, o empreendimento apresenta muitos pontos negativos à
proposta sugerida ao aproveitamento do parque. O comprometimento da conservação da local é um
dos principais problemas provocados pelo funcionamento do bar, pois as mesas são espalhadas pelo
parque sem que para isso haja nenhum critério, pondo seriamente em risco a vida naquele ambiente.
Além do mais, a oferta de bebidas alcoólicas e de cigarros, além de não ser adequada aos objetivos
de utilização do local, acaba atraindo um público consumidor destes produtos, e que em sua grande
parte, inibe a permanência dos freqüentadores interessados em conhecer melhor e prestigiar o
parque.
Para que as pessoas desfrutem dos benefícios do lazer realizado nos parques, é
fundamental que elas sejam atraídas para realizar atividades com forte apelo na saúde e focadas na
importância da interação com a natureza nestes ambientes. Alguns atributos podem ser
considerados para tornar um parque mais valorizado, combinando ofertas de: atividades sociais,
acesso adequado, áreas verdes com seus recursos naturais conservados, infra-estrutura básica com
Fórum Internacional do Meio Ambiente - A conferência da Terra 1032

banheiros, locais para descanso, pistas ou trilhas para locomoção dentro do parque, espaços para
atividades de educação ambiental, entre muitas outras ofertas que variam de acordo com o uso
estipulado ao parque, tornando-o um ambiente cada vez mais atrativo para os seus freqüentadores
É através da EA, que o Parque pode gerar uma conscientização sobre a importância da
conservação e valorização do local, e em relação à responsabilidade de cada um como seres
integrantes deste mesmo ambiente, gerando para toda população local uma melhor qualidade de
vida.
Em relação ao Parque Ruber Van Der Linden, objeto do estudo,verifica-se que ele,
atualmente, está abandonado. Durante a semana, ele recebe apenas a visita de alguns casais de
namorados ou jovens que lá permanecem fumando, bebendo ou escondendo-se de algo. Nos fins de
semana há um maior movimento devido ao bar e as apresentações de música ao vivo. O Parque
durante todo ano apresenta um volume baixo de visitação, porém no período do Festival de Inverno
(evento anual) abriga um dos pólos mais freqüentados pelos turistas e pelos habitantes do
município.
De acordo com Kinker,
Um dos objetivos do manejo é controlar a interação homem / natureza, de modo que o
meio ambiente não sofra impactos negativos e o turista tenha não só uma experiência
agradável, mas seja levado, por meio da interpretação da natureza e do lazer dirigido, a
incorporar mudanças de atitudes e comportamentos (KINKER, 2002, p.30).

Não há um Plano de Manejo ou de Uso público que defina os tipos de atividades que
poderiam ser realizadas ali dentro, bem como não há nenhum estudo e regras de uso. Em geral,
pouco ou nenhum investimento é feito e há a carência de recursos humanos, pessoal devidamente
treinado e preparado para realizar atividades educativas no local, juntamente com a falta de infra-
estrutura e materiais para realização de atividades.

CONCLUSÃO
O Parque Ruber Van Der Linden, ou Pau Pombo, como continua sendo chamado pela
comunidade local, precisa receber uma maior atenção do Poder Público e Privado para que possa se
tornar um Patrimônio Cultural Material dos Garanhuenses e turistas que freqüentam a cidade
possam percebê-lo com o uma identidade de cada um, tornando-se assim responsável pelo mesmo.
É preciso urgentemente definir objetivos e metas para Recuperação do parque, ação a qual
ficaria mais fácil, objetiva e sustentável através de um Plano de Manejo para o espaço.
Acreditamos que primeiro é importante trabalhar o Parque de uma forma que ele passe a
“fazer parte” da Identidade Cultural da cidade e só assim será possível desenvolver um trabalho de
Interpretação turística para um desenvolvimento sustentável do mesmo. E quando falamos em
Interpretação Turística, não queremos dizer um trabalho voltado somente para o turismo, pelo
contrário primeiro a comunidade local tem que se sentir parte integrante e responsável para só
depois o turista poder fazer parte do processo.

REFERENCIAS BIBLIOGRAFICAS
BARRETO, Margarita. Turismo e Legado Cultural: as possibilidades do planejamento. 4ª. Ed.
Campinas: Papirus, 2003.
CAMARGO, Luiz Otávio de Lima. O que é Lazer. Campinas –SP, Ed. Brasiliense S.A., 1986.
CASTROGIOVANNI, Antonio Carlos. Turismo Urbano. Porto Alegre; Ed. Contexto, 2000.
CAVALCANTI, Alfredo Leite. História de Garanhuns. Recife, FIAM/ Centro de estudos de
história municipal, 1983.
CONSELHO INTERNACIONAL DE MONUMENTOS E SÍTIOS. Declaração do México.
Conferência Mundial sobre as Políticas Culturais, de 1985. Disponível em:
<http://www.iphan.gov.br>. Acesso em: 14 de Abril 2008.
CUCHE, Denys. A noção de cultura nas ciências sociais. 2ª ed. Bauru: EDUSC, 2002.
Fórum Internacional do Meio Ambiente - A conferência da Terra 1033

DELGADO, J. A interpretação ambiental como um instrumento para o ecoturismo. In. SERRANO,


C. (Org.) A educação pelas pedras. São Paulo: Chromos, 2000.
DIAS, G. FREIRE. Educação Ambiental: princípios e práticas. 2 ed. São Paulo: Gaia, 1993.
GUEDES, José Carlos de Souza. Educação Ambiental nas escolas de ensino fundamental: Estudo
de caso. Garanhuns, PE. Ed do Autor, 2006.
KINKER, S. Ecoturismo e conservação da natureza em Parques Nacionais. Campinas: 2002.
LOUREIRO, C.F.B. Educação Ambiental crítica: princípios teóricos e metodológicos. Rio de
Janeiro: Hotbook, 2002. Disponível em: <http//: www.hotbook.com.br> Acesso em 10 Abril 2008.
MACENA, Lourdes. Festas, Danças e Folguedos: elementos de identidade local. In: MARTINS, J.
(Org.) Turismo Cultura e Identidade. São Paulo: Roca, 2003.
MARCELLINNO, Nelson Carvalho. Estudos do lazer. Uma Introdução. Campinas. Ed. Autores
Associados, 2000.
MELO, Ana Carolina Rodrigues de. A Interpretação Ambiental no Parque Nacional do Itatiaia –
RJ, Juiz de Fora: UFJF/DEP.TUR, 2006. Monografia.
MENESES, José Newton Coelho. História & Turismo Cultural. Belo Horizonte: Autêntica, 2004.
PROJETO DOCES MATAS / Grupo Temático de Interpretação Ambiental. Manual de introdução
à interpretação ambiental. Belo Horizonte, 2002.
SANTOS, José Luiz dos. O que é Cultura. 16a. ed. São Paulo: Brasiliense, 2003.
SEABRA, G.F. Ecos do Turismo: O turismo ecológico em áreas protegidas. Campinas: Papirus.
TRIGUEIRO, A. (Org.) Meio ambiente no século 21: 21 especialistas falam da questão ambiental
em suas áreas de conhecimento. Rio de Janeiro: Sextante, 2003.
WWF Brasil. Áreas protegidas ou espaços ameaçados? Ana Cláudia Barbosa; Ulisses Laçava.
Brasília, 1999.
Fórum Internacional do Meio Ambiente - A conferência da Terra 1034

O INSELBERGUE DE SERRA CAIADA: MAIS DO QUE O PRÉ-CAMBRIANO A SER


PRESERVADO

Ademir Araújo da Costa


Professor do Programa de Pós-Graduação e Pesquisa em Geografia da UFRN. (ademir@ufrnet.br)
Francisco Ednardo Gonçalves
Professor do Curso de Licenciatura em Geografia do CEFET-RN. (ednardo@cefetrn.br)
Tiago Barreto de Andrade Costa
Mestrando do Programa de Pós-Graduação e Pesquisa em Geografia da UFRN. (tiagobac@yahoo.com.br)

RESUMO
O presente trabalho pretende discutir a importância da formação granítica de Serra Caiada,
situado no município de mesmo nome, no estado do Rio Grande do Norte. Afloramento rochoso
que se constitui num dos primeiros remanescentes da Chapada da Borborema, ele representa um dos
inselbergues mais característicos do estado, sendo, portanto, de importância tanto para os estudos da
geografia física com da geologia. Entretanto, apesar de toda essa importância para a pesquisa
científica e pela potencialidade turística que possui o local vem sendo alvo de depredação, através
de desmatamentos e de outros usos indevidos, favorecendo a extinção da vegetação, da fauna e do
solo local. Nesse contexto, a preservação da Serra é imprescindível, pois essa formação e o
ambiente que a envolve exerce um papel importante na perpetuação da fauna regional. Nas suas
encostas, existe uma vegetação, que durante o período de seca serve de refúgio e fonte de
sobrevivência para essa fauna. Quando ocorrem as chuvas, essa fauna volta à povoar a caatinga da
região, exercendo um papel de equilíbrio da natureza local, se constituindo num ciclo permanente
entre o período de seca e de chuva. Diante dessa problemática, a pesquisa ainda em andamento,
pretende encaminhar as autoridades competentes propostas de tombamento desse monumento
geográfico, bem como, a criação de uma unidade de conservação ambiental, visando estabelecer um
plano de manejo para que o local tenha um uso racional, preservando assim as espécies existentes
bem como a sua paisagem natural.

ABSTRACT
This paper seeks to discuss the importance of the training of Sierra granite Caiada, located
in the municipality of the same name, in the state of Rio Grande do Norte. Levelling rocky which is
in one of the first remnants of the Chapada Borborema, he represents one of the most incelbergues
characteristic of the state and therefore of importance both for the study of physical geography with
the geology. However, despite all this importance to scientific research and the tourism potential
that the place has been the target of pillage, through thinning and other uses undue, promoting the
extinction of vegetation, fauna and soil site. In this context, the preservation of the Sierra is crucial,
because such training and the environment that involves plays an important role in perpetuating
regional fauna. In its slopes, there are a vegetation, which during the drought serves as a refuge and
source of survival for such fauna. When the rains occur, the fauna back to populate the caatinga the
region, acting a role in local balance of nature, if constituting a permanent cycle between the period
of drought and rain. Given this problem, the search still ongoing, aims to forward proposals to the
competent authorities tombamento this monument geographic, as well as the creation of a unit of
environmental conservation, aiming to establish a management plan for the site has a rational use,
preserving thus the species existing in its natural landscape.

INTRODUÇÃO
O presente trabalho tem como objetivo analisar a importância do monumento geográfico
“Serra Caiada”, dos riscos de degradação ambiental que o envolvem e apontam alternativas de
preservação do referido ambiente natural. Trata-se de uma pesquisa em andamento na qual foi
utilizada a metodologia de observação direta e entrevistas com pessoas residentes no lugar que
mantém uma relação de identidade e afetividade com o referido monumento natural. A Serra Caiada
é o mais importante símbolo da paisagem do município do mesmo nome e da Microrregião Agreste
Fórum Internacional do Meio Ambiente - A conferência da Terra 1035

Potiguar. Como vemos, foi este Inselbergue que deu o nome ao lugar, tendo em vista a cor
esbranquiçada de sua rocha. A mesma fica localizada a aproximadamente 1 quilômetro da sede
municipal e a 70 quilômetros da capital do estado, no sentido Natal-região do Seridó via BR-226,
apresentando uma altura aproximada de 285 metros.
É um afloramento granítico que se constitui, segundo alguns estudiosos, num relevo
residual que remonta à formação da Chapada da Borborema. Estudos realizados apontam esse
resíduo pré-cambriano como o mais antigo da América Latina, estando entre os fragmentos mais
antigos do mundo. A Serra Caiada é um dos incelbergues mais característico do estado sendo,
portanto, um acidente geográfico importante para o estudo da Geografia Física e da Geologia. A
“Serra”, como é comumente chamada pela população do lugar, tem uma beleza indescritível que
encanta os olhos da sua população e dos transeuntes que passam próximos ao local, sendo um
marco de referência, um motivo de orgulho e de identidade para todos os seus moradores.
Neste sentido, é importante ter em mente que a identidade de um grupo pode ser expressa
pelo seu dispositivo espacial, sendo essa identidade do lugar e vetor de união e congregação do
grupo, um “espelho” para a comunidade como um todo. Este fato se reflete nas diversas formas
encontradas pelo homem para se adaptar ao meio para a sua sobrevivência e o relacionamento com
os seus semelhantes, conservando assim um sentido peculiar na linguagem da identidade. É
importante compreendermos que o elo afetivo entre o homem e o lugar, e com o ambiente físico,
constituem um dos elementos alicerçantes das relações sociais. Ou seja, as sociedades não se
edificam sem marcar e serem marcadas pelo ambiente físico que as cercam. Este fato é
perfeitamente perceptível com relação à identidade que a população de Serra Caiada tem mantido,
ao longo de sua formação histórica, com a “Serra”, principal símbolo geográfico do município.
Além disso, graças à beleza e imponência que lhes são inerentes e o valor científico-
cultural, esse inselbergue se constitui num local de potencialidades turísticas que vem despertando o
interesse de alguns segmentos sociais para o desenvolvimento do turismo esportivo e ecológico e
pela pesquisa científica. Entretanto, apesar de todos esses atributos a Serra vem, ao longo do tempo,
sendo alvo de degradação ambiental, devido ao uso indevido por parte de pessoas inescrupulosas,
sem o poder público tomar medidas que coíba e discipline a forma de uso do referido local.
Na busca de entendermos a identidade que os habitantes do lugar têm com o a Serra e a
importância que esta representa, tanto para a preservação ambiental quanto para as potencialidades
turísticas e científicas que lhes são peculiares, procuraremos, a partir de agora, detalhar, de forma
sucinta, alguns elementos importantes que justificam a realização do presente trabalho.
Fruto do imaginário das pessoas do lugar, a Serra Caiada é locus de lendas, histórias que
contribuem para a preservação do passado num momento presente o qual “tudo” que se reporte
contribui para apagar tais imagens, tais identidades.
Assim, mediante as relações que o homem estabelece com o ambiente no seu dia a dia,
favorece, através de suas ações, a construção de um museu imaginário repleto de contradições
subjetivas, que devido as suas próprias imagens nos reportam a um certo lugar (MIRANDA, 2002).
Nesse contexto, partindo-se da idéia de que o imaginário de uma sociedade tem como base
o mundo vivido, o mundo real e concreto, procuraremos evidenciar aqui, com base nos depoimentos
de algumas pessoas as lendas, as fantasias ou histórias alimentadas pela comunidade serracaiadense
sobre a Serra, fatos estes que contribuem para retratar a identidade de seu povo com o lugar.

LENDAS E HISTÓRIAS
Contadas ao longo dos anos e passadas de geração em geração, algumas lendas e histórias
aqui apresentadas parecem elucidativas, que nos levam a descobrir a identidade da população com
um local que é considerado como um marco de referência e que representa o orgulho para os seus
moradores:
Na frente da Serra tem uma gruta, e contam que nela vivia uma mulher muito bonita e
bondosa que emprestava sal aos moradores do lugar, quando estes estavam desprovidos de recursos.
Assim, quem precisava de sal ia até a Serra e colocava um litro ou qualquer recipiente vazio na
entrada da gruta, na parte mais baixa da Serra, e virava-se. Com alguns minutos, o recipiente estava
Fórum Internacional do Meio Ambiente - A conferência da Terra 1036

cheio de sal. Quando estavam em melhores condições voltavam a gruta e devolviam a mesma
quantidade de sal que haviam recebido por empréstimo. Entretanto, um certo dia, alguém pegou o
sal emprestado e não devolveu, rompendo assim o pacto, e a magia cessou. Lamentavelmente,
desde esse dia nunca mais essa mulher foi vista e nunca mais ninguém recebeu sal emprestado.
As lendas sobre a Serra Caiada nos remetem a fatos ainda mais curiosos. Além da mão
caridosa de uma mulher em emprestar sal aos necessitados, segundo a crendice popular do lugar, a
rocha abriga também em uma de suas grutas um caçador lendário que sem esforço, como uma
palavra mágica, abre e fecha um certo local da rocha como se tivesse o mesmo poder de Ali Babá.
Nessa gruta ele vive bem com gêneros alimentícios à sua disposição (GRILLO, 2001).
Falam também que lá existe um galo que é o primeiro a cantar nas redondezas. Entretanto,
apesar de alguns afirmarem ouvir o seu cantar, nunca alguém afirmou ter visto o referido galo. Os
aventureiros que se arriscam a escalar a Serra, na madrugada, afirmam: a Serra é um habitat de um
galo. Os que acampam a noite, no sopé da Serra, já ouviram seu canto, à meia noite, mas nunca
chegaram a vê-lo (GRILLO, 2001).
O povo do lugar e da região acredita que na Serra existe um reino encantado. Acredita
também existir uma ovelha de ouro que sobe e desce da rocha diariamente, embora não hajam
testemunhas que tenham visto a referida ovelha e ninguém tenha ficado rico, porque a mesma ainda
não foi encontrada.
Com relação às histórias sobre acontecimentos que envolvem a Serra, elas parecem
elucidar fatos verídicos, fugindo assim das lendas e crendices populares, uma vez que essas
histórias precisam anos e pessoas envolvidas, assim vejamos:
Conta-se que no final do século XIX, aproximadamente no ano de 1890, morava uma
família próxima ao sopé da Serra. Certo dia, uma criança dessa família saiu para brincar e se perdeu
na mata que ladeava a referida serra. Não voltando para casa, os pais resolveram procurá-la, mas a
mata era muito fechada e havia muitos animais silvestres e ferozes. Como a escuridão não permitia
nenhuma visibilidade, desistiram da busca. A mãe aflita fez uma promessa para encontrar o filho e
como prova de agradecimento colocaria um cruzeiro no topo da Serra. No dia seguinte, logo
cedinho, encontraram a criança sã e salva dormindo a sombra de uma grande rocha. A fé daquele
casal passou de geração em geração, e ainda hoje permanece o cruzeiro, que é ponto de visitação da
população local e de pessoas ditas de “fora”.
Conta-se ainda que o senhor Antonio José de Melo e Souza, ex-governador do Rio Grande
do Norte por duas vezes, era proprietário da Fazenda Invernada que ladeava a referida Serra. Um
certo dia, quando estava “invernando” na referida fazenda, ocorreu o desaparecimento de um de
seus filhos menores que seguira um animal fugido do pátio da fazenda. Aflitos com a situação e não
obtendo êxito nas buscas empreendidas por diversas pessoas do povoado, os pais fizeram uma
promessa em que se encontrassem a criança, doariam uma imagem de Nossa Senhora Aparecida à
igreja do povoado (Serra Caiada) e fariam uma grande festa. No dia seguinte a criança foi
encontrada do outro lado da Serra, distante aproximadamente seis quilômetros, em companhia de
uma vaca. Segundo depoimentos, a criança estava sendo protegida e alimentada (leite) pelo animal.
Podemos afirmar que a imagem foi doada a igreja acompanhada de uma grande festa e procissão
com a participação popular. Ainda hoje Nossa Senhora Aparecida faz parte da coleção de imagens
da referida igreja.

GEOLOGIA
Segundo estudos realizados e ainda em andamento por diversos pesquisadores, a Serra
Caiada existe há 3,4 bilhões de anos. Através de métodos de datação por elementos radiativos, um
grupo de geólogos constatou que aquela área do Rio Grande do Norte é a mais antiga da América
Latina e está entre os fragmentos rochosos mais antigos do mundo.
Encravada no Agreste Potiguar, a rocha formou-se há 3 bilhões e 450 milhões de anos, no
chamado período Arquiano – fase mais antiga do período pré-cambriano, quando a terra começava
a esfriar, criando a crosta terrestre. A datação da Serra Caiada foi feita em 1996, pelo geólogo
Fórum Internacional do Meio Ambiente - A conferência da Terra 1037

potiguar Elton Luiz Dantas, na época doutorando pela Universidade Estadual Paulista de Rio Claro
(SP).
Segundo Dantas (1997), Serra Caiada está entre as mais antigas reminiscências do período
que antecedeu a vida no planeta. Levando-se em conta que a Terra tem 4,5 bilhões de anos, Serra
Caiada só perde em idade para as rochas dos rincões da Groelândia, da África, Canadá e Austrália,
que têm entre 3,3 a 3,9 bilhões de anos.
No Velho Mundo as formações rochosas têm entre 2 a 2,5 bilhões de anos. De acordo com
Dantas (1997), os fragmentos do período Arquiano identificados no mundo são isolados e de
pequenas proporções. Serra Caiada, ocupando uma área de 10 quilômetros quadrados, é um
exemplo típico desse período geológico.
A Serra é composta por Gnaisses, formados sob intensas condições de metamorfismo entre
15 a 20 quilômetros abaixo da superfície terrestre da era Pré-cambriana. O soerguimento da Serra
para além da superfície se deu ao longo de seus 3,4 bilhões de anos através de movimentos
tectônicos e processos de pediplanação.
A datação do inselbergue, realizada por DANTAS (1996), foi feita a partir do método
Urânio-Chumbo, o teor desses elementos nos minerais das rochas é utilizado como indicador da
idade das rochas. Quanto maior a concentração desses elementos químicos, mais antiga é a rocha.
Portanto, além de sua beleza cênica e valor simbólico, a Serra tem uma importância
enquanto remanescente dos primórdios da história da Terra. Para Dantas (1996), a rocha deriva de
uma fonte ainda mais antiga: uma outra rocha com mais de 3,9 bilhões anos. Segundo o
pesquisador, as evidências apontam para uma época em que o Rio Grande do Norte ou estava
colado à África, ou era um pedaço da Bahia, pois fragmentos da mesma idade foram identificados
nessas duas regiões (DANTAS, 1996).

TURISMO
A Serra Caiada, pela imponência e pela beleza que chama a atenção aos que passam
próximos ao local, apresenta uma potencialidade turística que precisa ser incentivada pelas
autoridades municipal e estadual. Além disso, o fato de ser um remanescente rochoso dos mais
velhos do mundo é um diferencial a mais que se constitui num atrativo à parte para o turismo
científico-cultural. É preciso que o poder público aproveite este diferencial com vistas a trazer
contribuições para o turismo, tanto a nível estadual quanto a nível local. Neste sentido, é preciso
criatividade para saber explorar de forma racional a potencialidade turística que a área detém. Para
tanto, é necessário que as autoridades municipais ou estaduais elaborem um projeto de criação de
uma unidade de conservação ambiental da Serra, se constituindo assim numa área de proteção
ambiental, podendo ser administrada pelo município em parceria com o Instituto de
Desenvolvimento Econômico e Meio Ambiente (IDEMA) do estado. Somente assim, a Serra e o
ambiente que a envolve, será conservado e utilizado racionalmente para atividades turísticas.
Apesar de não existir ainda um plano de manejo para uma utilização sustentável desse
patrimônio natural, no que tange ao turismo, nos últimos anos,
nos finais de semana, o silêncio na Serra Caiada é quebrado pelo barulho dos ganchos
atirados à Serra. São forasteiros – munidos de cordas coloridas e capacetes de segurança – que
exploram a rocha para o montanhismo. O esporte virou rotina na Serra há mais de dez anos, [...].
Ao todo, três vias de acesso já foram batizadas na Serra Caiada ou seja, nessas trilhas os
ganchos de metal já foram encravados e demarcaram o caminho por onde os alpinistas devem subir.
Eles são usados com freqüência, [...]. Outras quatro vias já estão em projeto (GRILLO, 2002, p. 3).
Com base na citação acima, a Serra Caiada, além de objeto de estudos científicos, já está
sendo utilizada também para o turismo esportivo, através da prática de Rappel. Essas realidades
apontam para a potencialidade turística do lugar e isso, sem considerar o potencial da própria beleza
do local e da vista panorâmica da região que pode ser apreciada do topo da Serra.
É importante destacar que, graças à existência desse acidente geográfico, segundo a
Secretaria do Turismo do Rio Grande do Norte (SETUR-RN), o município de Serra Caiada
encontra-se incluído entre os que detêm potencialidade turística, mas não está no roteiro turístico
Fórum Internacional do Meio Ambiente - A conferência da Terra 1038

estadual, uma vez que não existe até o presente, nenhum projeto que a viabilize e divulgue as suas
potencialidades. Entretanto, neste sentido, o poder público municipal tem sinalizado o interesse em
viabilizar a elaboração do referido projeto, constituindo-se assim em uma alternativa importante
para a economia do município.

CONSIDERAÇÕES FINAIS
A área onde está encravada a Serra – cerca de 350 hectares – é privada. Pertence ao
fazendeiro José de Azevedo Catão. Segundo ele, muitas pessoas da região e até do exterior como os
americanos, há mais de 20 anos que aterrissam de helicóptero na área, com a intenção de comprá-la,
devido à possibilidade da existência de minerais.
Se algum dia este fato vier a se concretizar, ou seja, a Serra seja vendida para fins de
exploração, isto se constituirá numa traição a identidade do seu povo, pois este acidente geográfico
é considerado por todos como um marco para a população da cidade e do município. Segundo os
seus moradores, a Serra representa para o seu povo o mesmo que o Pão de Açúcar ou o Corcovado
representam para o Rio de Janeiro. Neste contexto, a Serra é uma referência para o município, que
foi povoado a partir de 1754, quando o Padre José Vieira Affonso recebeu a Data de terras situada
entre dois rios e ladeadas pela referida Serra e que até hoje é cultuada e venerada pelo povo do
lugar. A prova disto é que em 1963, uma tentativa de mudar o nome do município para Presidente
Juscelino, em homenagem ao ex-presidente, provocou revolta e em sinal de protesto, apesar de
oficial, ninguém nunca se referia ao lugar com este nome e sim Serra Caiada. Devido à cobrança
permanente, por parte dos seus habitantes junto às autoridades locais, vinte e oito anos depois, ou
seja, em 1991, a Câmara Municipal aprovou, respaldada por um abaixo assinado, a Lei Orgânica do
Município, estabelecendo o retorno do antigo nome, ou seja, Serra Caiada, através do Art. 3o das
Disposições Gerais e Transitórias da referida Lei.
Além disso, a preservação da Serra é imprescindível e vital ao meio ambiente. Este
acidente geográfico exerce um papel importante e fundamental na preservação da fauna regional,
pois nas suas encostas, a exemplo de outros acidentes geográficos com as mesmas características,
existe uma vegetação até certo ponto exuberante, ao longo das vertentes existentes, que durante o
período de seca serve de refúgio e meio de sobrevivência para parte da fauna da região. Quando
ocorrem as chuvas, essa fauna volta a povoar a caatinga da região, se constituindo num ciclo
permanente entre o período de seca e de chuva. Nesse contexto, podemos perceber a importância da
preservação desse ambiente, pois ele exerce um papel de equilíbrio da natureza. Entretanto,
percebemos também que infelizmente devido à ação inescrupulosa de exploração de terras, vem
ocorrendo, ao longo dos anos, um processo de desmatamento no entorno da Serra e nas suas
encostas, que poderá já estar comprometendo o equilíbrio desse ecossistema.
Acreditamos, portanto que, somente com o tombamento e a criação da unidade de
conservação ambiental e a elaboração de um plano de manejo que restrinja e discipline o uso desse
monumento geográfico é que poderemos evitar esse processo de degradação ambiental,
preservando-o para a geração do presente e para as gerações futuras. Para tanto, é necessário o
envolvimento do poder público e da sociedade em geral, visando com isto preservar o ambiente
natural e o marco de referência e de identidade da população do lugar.

REFERÊNCIAS BIBLIOGRAFICAS
GRILLO, Margareth. Serra Caiada, o pedaço mais antigo da América Latina. Natal: Tribuna do
Norte, 04 de fev. de 2001. Especial, p. 2.
GUERRA, Antonio Teixeira; GUERRA, Antonio José Teixeira. Novo Dicionário Geológico-
Geomorfológico. Rio de Janeiro: Bertrand Brasil, 1997.
DANTAS, Elton .L. Geocronologia U-Pb e Sm-Nd de terrenos arqueanos e paleoproterozóicos do
Maciço Caldas Brandão, NE do Brasil. Tese de Doutoramento, IGCE-UNESP/Rio Claro-SP, 1996.
Fórum Internacional do Meio Ambiente - A conferência da Terra 1039

ECOTURISMO: ENTRE A DOMINAÇÃO E A SUSTENTABILIDADE

Edilza Laray de Jesus


Professora da Universidade do Estado do Amazonas (www.uea.edu.br) e doutoranda em Educação pela Universidade
Federal do Rio Grande do Sul (www.ufrgs.br). edilzalaray@uol.com.br
Marcos Vinícius Laray de Jesus
Estudante de Bacharelado em Geografia pela Universidade Federal do Amazonas (www.ufam.edu.br) e voluntário de
projetos para o Desenvolvimento Rural no Amazonas. marcoslaray@hotmail.com

RESUMO
Muito se têm debatido acerca do ecoturismo, suas propostas, ganhos e implicações para o
meio físico e social. Ao apresentar um conceito complexo e muitas vezes contraditório, esta prática
ou filosofia ligada ao turismo, é vista, por um lado, como uma estratégia de marketing da indústria
do turismo para romantizar a natureza e oferecer aos indivíduos e grupos hostilizados dos grandes
centros urbanos momentos de convivência com o “mundo natural” e, por outro, para catalisar
mudanças na maneira de conceber natureza e sociedades, possibilitando o desenvolvimento de
práticas sustentáveis. Numa sociedade historicamente marcada pela dominação econômica, política,
cultural e ideológica, quais as possibilidades e os desafios apresentados para o Ecoturismo? Até que
ponto programas de desenvolvimento nessa área asseguram uma mudança estrutural no local onde
eles são implementados? Preocupados com estas questões, este trabalho objetiva analisar a
efetivação do Programa para o Desenvolvimento do Ecoturismo na Amazônia Legal (Proecotur) no
município de Novo Airão, no interior do Amazonas, onde está localizado Anavilhanas, o segundo
maior arquipélago fluvial do mundo e o Parque Nacional do Jaú, o maior Parque Nacional do
Brasil, o maior do mundo em floresta tropical úmida contínua e intacta. Para tanto apresentamos
conceitos de ecoturismo, elementos históricos e geográficos de Novo Airão e algumas dimensões de
sustentabilidade inclusas no Proecotur. Ao analisarmos o Proecotur e sua efetivação na sede do
município, tomamos como parâmetro de análise o contraponto entre a fala dos entrevistados
literaturas sobre sustentabilidade de Ruscheinsky e Irving.
Palavras-chave: ecoturismo, comunidade, sustentabilidade.

ABSTRACT
Nowadays much has been discussed about ecotourism, its proposals, earnings and
implications for the physical and social environment. In presenting a complex concept and often
contradictory, this practice or philosophy linked to tourism, is seen on the one hand as a marketing
strategy of the tourism industry to romanticizing the nature and offer to different groups of people
from the major urban centres, moments of coexistence with the “natural world” and, secondly, to
catalyse changes in the design of nature and companies, enabling the development of sustainable
practices. In a society historically marked by the economic domination, political, cultural and
ideological, what are the opportunities and challenges presented to the Ecotourism? Until that point
of development programmes in this area ensure a structural change in the place where they are
implemented? Concerned with these issues, this study aims to examine the effectiveness of the
Programme for the Development of Ecotourism in Amazonia Legal (Proecotur) in the Novo Airão
village, in the interior of the Amazon, where it is located Anavilhanas, the second largest river
archipelago in the world and the National Park Jaú of the largest National Park in Brazil, the largest
in the world in continuous and humid tropical forest intact. To present both concepts of ecotourism,
historical and geographical elements of Novo Airão and some dimensions of sustainability included
in Proecotur. In reviewing the Proecotur and its effectiveness at the village, As parameter, we
sought making analysis of the contrast between the interviewees speeches and Ruscheinsky and
Irving’s literature about sustainability.
Key words: Ecotourism, Community, Sustainability.

INTRODUÇÃO
Fórum Internacional do Meio Ambiente - A conferência da Terra 1040

A concepção de ecoturismo ocorreu nos anos de 1960 no contexto de expansão do turismo


de massa enfatizando a necessidade de comportamentos mais comedidos que implicassem na
redução de impactos sobre os ecossistemas naturais. Em nosso país, a expansão desta modalidade
de turismo é simultânea ao neocolonialismo enquanto processo de dominação econômica, política e
cultural, cujas estratégias estão implícitas nos inúmeros projetos de desenvolvimento
implementados pelo e para o Capital, concorrendo para o processo de industrialização e urbanização
das décadas de 60 e 70 do século passado. Desses projetos uns serviram (e servem) para a expansão
e manutenção do capital por meio do endividamento, da dominação, exploração dos recursos
naturais, da expropriação de direitos, da dizimação de culturas e dos saberes socialmente
produzidos. Outros promoveram (e promovem) a autonomia e/ou emancipação de pessoas, a
construção de alternativas pela via solidária, o acesso à melhoria da qualidade de vida, da
preservação e conservação do meio físico, do direito aos direitos (JESUS, 2005).
A Zona Franca de Manaus, no Amazonas, que atraiu milhares de turistas de todo o Brasil,
foi instalada sob os auspícios do Estado autoritário em 1967 e serve como exemplo de um grande
projeto econômico que contribuiu para a expansão dos processos de internacionalização da
produção capitalista criados para atender as necessidades do mercado brasileiro e internacional.
No âmbito dos projetos alternativos ao capital destacamos a experiência da Associação de
Silves pela Preservação Ambiental e Cultural (Aspac). Frente à ameaça ao estoque pesqueiro dos
lagos do município provocado pela pesca comercial os comunitários se organizaram coletivamente,
criaram a Aspac e buscaram financiamento visando à conservação dos rios e lagos. Em seguida
iniciaram um projeto comunitário de ecoturismo e perseguem seus princípios por meio da
conservação e uso sustentável dos recursos naturais e culturais, trabalham com a informação e
interpretação ambiental; enquanto atividade econômica captam e geram recursos financeiros do
ecoturismo que são revertidos para a comunidade local e para a conservação dos recursos naturais e
culturais.
A experiência da Aspac revela a tênue ligação entre o ecoturismo e a sustentabilidade
ecológica, econômica, social, espacial e cultural trabalhada por Ignacy Sachs (2004), haja vista que
ambos caracterizam-se pela interdependência com os setores econômicos, sociais, ambientais e
culturais, objetivando a preservação dos recursos naturais e culturais, com vistas a garantir a
sustentabilidade das comunidades locais.
Ocorre, porém, que nas sociedades capitalistas atravessadas pelas contradições entre o
capital e o trabalho representados respectivamente pelos donos dos meios de produção e os
trabalhadores, como analisou Marx, os conceitos, definições e práticas deles decorrentes também
são contraditórios e podem servir tanto para a emancipação dos seres humanos quanto para
manipulações e oportunismos marqueteiros no sentido de legitimar formas de exploração em
dimensões diversas, como observaram Wearing e Neil, (2001, p XII), ao fazerem referência ao
ecoturismo:
A palavra “ecoturismo” é um termo amplo e vago. Para alguns, é um subconjunto de
atividades turísticas “baseadas na natureza”; para outros, é um nicho de mercado, um tipo específico
de “turismo de interesse especial”.
Ainda de acordo com os autores supracitados, a vastidão e amplitude da palavra
ecoturismo de certo modo dissimulam excesso de formas de turismo que se apresentam com o
prefixo “eco” anexado, como se fosse algum título honorífico (Op. Cit., p. XII). O incremento do
ecoturismo como alternativa ao turismo de massa não garante por si só uma mudança de paradigma
na economia do setor e nem a inversão de valores dos turistas e empresários do setor se não estiver
sólido envolvimento da comunidade em todas as etapas do processo. Necessariamente não há
homogeneidade de concepções e práticas do ecoturismo para comunitários, turistas, agentes de
viagens, economistas, turismólogos, antropólogos, sociólogos, educadores. Uns percebem os
sistemas naturais pela possibilidade da utilização dos recursos para gerar renda e lucro para
determinado seguimento social; outros sob o prisma da topofilia discutida por Y Fu Tuan como uma
relação muito mais afetiva com o espaço e, por extensão, do valor ecológico desse lugar para a
promoção da vida.
Fórum Internacional do Meio Ambiente - A conferência da Terra 1041

Para o World Wildlife Fund (WWF) Brasil, o ecoturismo é o seguimento da indústria do


turismo que apresenta os mais elevados índices de crescimento no contexto econômico mundial.
Movimenta cerca de US$ 3,5 trilhões anualmente e, apenas na última década, expandiu sua
atividade em 57%. Somente no ano de 2004, segundo esta Organização Não-Governamental, o
ecoturismo mundial cresceu três vezes mais do que o esperado pela indústria do turismo
(www.wwf.org - acesso em 10 abr. 2008).
E no Amazonas, como o ecoturismo vem sendo praticado? Não obstante os programas e
projetos criados sob o escudo da preservação, da conservação ambiental e do desenvolvimento
sustentável, do investimento estatal ou privado, aumentam as taxas de desmatamento, a população
rural diminui e as riquezas naturais se esgotam. Historicamente na Amazônia, a economia local
alcançou patamares expressivos em tempos de dominação e exploração: drogas-do-sertão (século
XII), borracha (século XIX e meados do século XX), Zona Franca de Manaus. Sob o escudo do
progresso e do desenvolvimento, tribos indígenas foram dizimadas, caboclos e ribeirinhos foram
obrigados a partir de suas terras e se amontoar nas violentas áreas de ocupação desordenada de
Manaus e Belém, as metrópoles regionais.
Este é um cenário crítico de produção de destruição, de excluídos e precarizados, como
citou Antunes (2002). Essa é mais nova faceta do capital que tem a pretensão de se auto-regular por
meio da mão invisível do mercado, demonstrando a sua incapacidade civilizatória (MÉSZÁROS
2005), porque a sua reprodução está diretamente relacionada com a destruição do conjunto de
direitos e conquistas dos trabalhadores em luta. Sob esse contexto os paradoxos do capital se
acentuam.
Em Novo Airão, município do Estado do Amazonas objeto de nossa análise, as
contradições engendradas pelo capital e a luta de moradores por melhores condições de vida
evidenciam propostas e objetivos diferentes: os que seguem na direção do lucro e os que lutam por
autonomia, pelo acesso ao trabalho, a educação, a saúde, a renda e ao ambiente ecologicamente
equilibrado.
O município está localizado à margem direita do rio Negro, a uma distância de 115 km de
Manaus em linha reta e 143 km por via fluvial. Novo Airão tem parte de seu território ocupado pelo
Parque Nacional do Jaú, patrimônio da humanidade com uma área de 2.272.000 hectares (JESUS,
1998); abriga também parte do segundo maior arquipélago fluvial do mundo, Anavilhanas,
composto por cerca de 400 ilhas compridas e finas que formam um labirinto de canais e lagoas
recortando o leito principal do Rio Negro. Todos os cerca de 350 mil hectares que compõem
Anavilhanas foram elevados, em 1981, à categoria de Estação Ecológica (RICARDO &
CAMPANILI, 2007).
Debruçado à margem do Rio Negro, é um dos mais ricos e importantes ecossistemas da
Amazônia. As praias fluviais de areias brancas, a densa floresta equatorial, a biodiversidade e a
indústria de barcos são destaques para moradores e visitantes.
A história oficial do município iniciou-se em Santo Elias do Jaú (Airão), hoje conhecido
como Airão velho. A ocupação, dominação e exploração portuguesa foi consolidada pelas
atividades missionárias e extrativistas do século XVII. Inicialmente o núcleo inicial do povoamento
era formado pelos índios Tarumã (de língua Aruak) catequizados inicialmente pelos jesuítas
(1657/1658) e depois pelos mercedários (padres da ordem dos Mercês). Com a instalação definitiva
do povoamento de Santo Elias do Jaú, a vida econômica girou em torno de atividades extrativistas,
da pesca e de trabalhos de catequização de outros povos indígenas do baixo Rio Negro. Em 1759 a
aldeia de Santo Elias do Jaú é elevada à categoria de “lugar” e passa a ser chamada de Airão. Nesse
século Airão mergulha em uma grave crise. Segundo Alexandre Rodrigues Ferreira131 (1983) não
havia nenhum sinal de riqueza material de opulência e nenhum indício de atividade econômica.
Airão apresentava sinais evidentes de estagnação, de isolamento e abandono.

131
Alexandre Rodrigues Ferreira foi um naturalista brasileiro. Empreendeu uma extensa viagem que percorreu o interior
da Amazônia até o Mato Grosso, entre 1783 a 1792. Durante a viagem, descreveu a agricultura, a fauna, a flora e os
habitantes locais.
Fórum Internacional do Meio Ambiente - A conferência da Terra 1042

Uma lenta recuperação econômica começou a partir de 1860 com a chegada de novos
moradores nordestinos, portugueses e chineses que introduziram a criação de gado e carneiro,
cultivaram café, produziram breu, estopa e lenha para a navegação a vapor. Mas foi só a partir de
1880, com a produção da borracha e o consumo de mercadorias importadas até mesmo da Europa
nos anos de 1890, 1900 e 1910, que a economia foi intensificada tanto no povoado de Airão quanto
em comunidades ribeirinhas. O ritmo de vida econômica de Airão foi acelerado com a construção
de várias casas de alvenaria e de armazéns, bem como a inserção de novos hábitos alimentares e de
consumo introduzidos pelos migrantes e imigrantes (REIS, 1959).
Em 1938 Airão passou a integrar o município de Manaus até 1955, ano em que o
município torna-se autônomo pela lei nº 96, de 19 de dezembro. Com a deflagração da crise da
borracha na segunda metade do século XX, os esquemas de dominação de Airão foram alterados.
Os seringais começaram a se esvaziar com centenas de nordestinos voltando para seus estados de
origem; as relações de trabalho nos seringais impetradas pelos portugueses deixaram lastros de
epidemias que causaram mortes e despovoamento no baixo Rio Negro; políticos e comerciantes se
arvoraram pela conquista dos recursos naturais como madeira e pescado subtraindo da população
remanescente sua dignidade e, junto com ela, conhecimentos e saberes tradicionais que foram
postos a serviço das novas formas de dominação dos seres humanos e da natureza. (REIS, 1959;
REIS, n/d).
No ano de 1970 a sede do município passou a ser Novo Airão e a justificativa para tal
mudança se deve principalmente a menor distância entre Novo Airão e Manaus, a capital do Estado
do Amazonas e a facilidade de transportes fluviais para as populações se deslocarem. Ainda nesse
ano a cidade possuía apenas duas ruas, a luz elétrica era fornecida até a 00h00 (meia noite), a água
encanada, era precária e fornecida em dias alternados. Só a partir de 1983 houve crescimento
econômico e melhoria de infra-estrutura na cidade de Novo Airão por meio da abertura de novas
ruas, da construção da praça municipal, da construção do primeiro conjunto residencial e pelo início
das obras da estrada que ligaria Novo Airão a Manacapuru (AM-352). Em 1993 a estrada foi
concluída e entregue (REIS, 1959).
Até o final da década de 90 do século passado, destacavam-se no setor secundário os
estaleiros navais especializados em construção e reformas de barcos e iates. Muitos destes foram
desativados por falta de demanda, de investimentos e pela dificuldade de aquisição da madeira, que
tem sua exploração proibida pelo IBAMA.
No setor primário o segmento agrícola é o de maior representatividade econômica, porém é
insuficiente para atender a demanda do município. A maioria dos produtos agrícolas é para
subsistência familiar e pouco excedente para a comercialização. Os principais produtos agrícolas
são: mandioca, banana, abacaxi, milho, melancia, farinha e macaxeira. No setor secundário o
segmento industrial municipal é pouco explorado, indicando que existem oportunidades para o
ingresso de novas atividades industriais. No setor terciário o segmento comercial está muito bem
desenvolvido atualmente. O município dispõe de hotéis, pousadas, mercearias, distribuidoras de
produtos alimentícios e supermercados (Apostila PMNA).
A despeito do relativo crescimento da indústria moveleira e da piscicultura, a economia do
município tem sido alimentada pelo turismo que impulsiona o artesanato. Novo Airão possui um
potencial turístico extraordinário, mas o município ainda está em fase de estruturação para assumir
seu gerenciamento. Atualmente a exploração do turismo é feita por empresas oriundas de Manaus,
de outros municípios e até de outros estados. Além do Parque Nacional do Jaú e do Arquipélago de
Anavilhanas, outros atrativos turísticos são a visita aos botos cor-de-rosa, no porto principal da
cidade.
Pelo potencial ecoturístico, Novo Airão foi selecionado pelo Ministério do Meio Ambiente
para o desenvolvimento do Proecotur no Amazonas. (Além deste município fazem parte Manaus,
Barcelos, Manacapuru, Presidente Figueiredo, Rio Preto da Eva, Itacoatiara e Autazes)
(http://www.mma.gov.br/port/sca/proeco/turverde.html).
Este programa atua no sentido de maximizar os benefícios econômicos, sociais e
ambientais do ecoturismo e tem como objetivos gerar alternativas para as atividades
Fórum Internacional do Meio Ambiente - A conferência da Terra 1043

degradadoras do meio ambiente, criar empregos, renda e oportunidades de negócios de


natureza sustentável com planejamento, assistência técnica e capacitação dos sujeitos
envolvidos. Para tanto os setores públicos e, principalmente o setor privado investiram
em planejamento, gestão e organização do setor ecoturístico visando à sustentabilidade
em suas dimensões econômica, social, ambiental, cultural institucional e legal
(http://www.worldbank.org/rfpp/news/debates/proecotur2.doc).
A preocupação com a sustentabilidade está presente em todas as fases do Proecotur.
Examinando, porém, a literatura disponível, constatamos a complexibilidade conceitual e
operacional visto que “o envolvimento com a sustentabilidade produz uma magia, um mito ou uma
mística. Inclusive o mercado pode num piscar de olhos se apropriar do discurso ambiental”
(RUSCHEINSKY, 2004, p. 8). Para o autor, os termos “sustentável” e “sustentabilidade” servem de
estratégia para aprovar projetos econômicos ou para alterar políticas públicas, angariar fundos e
conquistar mercados. Qual o olhar dos moradores de Novo Airão sobre o ecoturismo em seu
município?
Das 12 pessoas que responderam ao questionário de campo mais os três líderes
entrevistados, todos entendem que o turismo e o ecoturismo são atividades importantíssimas para o
desenvolvimento econômico e social do município, ainda que não estabeleçam diferença entre uma
atividade e outra. 87% dos sujeitos da pesquisa acham que quer dizer a mesma coisa, 13% não
sabem opinar. Ao serem interrogados sobre os produtos e serviços oferecidos pelo município eles
observam que ainda há muito a ser feito para que o turista se sinta realizado, no que diz respeito à
infra-estrutura urbana, hotelaria, restaurantes, etc. Observam ainda a necessidade da interação da
comunidade local com os planejadores do turismo. Para o Sr. Mariano, Presidente da Associação
dos Pescadores de Novo Airão Turismo é...
... quando o turista vem pra cá e tem uma estrutura. Seria a parte mais importante de
Novo Airão, com a questão do peixe-boi. O ecoturismo está desvalorizado. Porque a
gente tem o festival aqui, e parece que o prefeito vira de costas, se tivesse um galpão,
poderia ser feito um pequeno museu para que quando o turista vier, conheça um pouco
mais do município. (Entrevista concedida em fev. 2008).

A falta de informação, a confusão ou a simplificação conceitual dos moradores apresenta


indícios da falta de envolvimento desses sujeitos no ecoturismo e poderá reduzir a capacidade de
intervenção em processos participativos e solidários, como destaca Sachs (2004). Segundo ele a
sustentabilidade se realiza por meio do desenvolvimento includente, sustentável e sustentado. Sob
que condições a comunidade participa do ecoturismo?
Eu vejo que o município tem um potencial imenso, Anavilhanas, Parque Nacional do
Jaú, afora os parques nas zonas norte e sul. Mas a população local precisa estar
informada quanto a isso! (Sr. Simeão - Presidente da Associação de Produtores de Novo
Airão. Entrevista concedida em 12 fev. 2008).

Outro problema apresentado pelos comunitários é a falta de apoio e a definição de datas


fixas, pelas autoridades, para a realização de eventos que a cidade realiza ao longo do ano, tais
como festival folclórico e o festival da canção. As disputas políticas pela prefeitura tornam-se
prejudiciais à população e aos turistas porque quando se inicia novo mandato, geralmente as
políticas públicas implantadas pelo prefeito anterior são interrompidas. Estas posturas novamente
revelam descaso com a comunidade e, se formos capazes de analisar criticamente, saberemos a
serviço de quem trabalha o poder público. A sustentabilidade institucional é garantida pela
excelência do setor público quanto à organização e estruturação do turismo e ecoturismo na região.
Considerando que sustentável é o que sustenta alguém ou alguma coisa, onde está o respeito dos
administradores pelos comunitários, seus saberes e experiências?
Em Novo Airão estão presentes populações caboclas e ribeirinhas, organizações e
instituições governamentais, empresas privadas e do terceiro setor, organizações não
governamentais. É importante lembrar que as cinco comunidades visitadas encontram-se atualmente
Fórum Internacional do Meio Ambiente - A conferência da Terra 1044

inseridas ou no entorno de Unidades de Conservação (Estação Ecológica de Anavilhanas, Parque


estadual do Rio Negro – setor sul, Reserva de Desenvolvimento Sustentável do Tupé, APA da
margem esquerda do rio Negro) além do Programa de assentamento sustentável (PAS) do INCRA
havendo, portanto, a intervenção de órgãos ambientais, das esferas federal, estadual e municipal,
(IBAMA, IPAAM e SEMMA). Mesmo assim o poder público é visto pelos comunitários como
ausentes; não atende as demandas apontadas e solicitadas por eles.
Para que a sustentabilidade proposta pelo Proecotur se realize faz-se necessário um
redimensionamento das instituições públicas municipais e estaduais no sentido de descentralizar as
decisões sobre as políticas públicas, especificamente quanto ao direcionamento do ecoturismo e os
benefícios sociais, econômicos e culturais para os moradores locais. Dito de outro modo, é preciso
enfatizar a diversidade dos padrões e caminhos sociais do desenvolvimento, como ressalta Irving:
A visão de sustentabilidade enfatiza a diversidade dos padrões e caminhos sociais do
desenvolvimento, dependendo das peculiaridades de uma dada sociedade e o seu “estado
de arte” sob a ótica cultural, política e ecológica. Tanto é assim que em termos globais
de avaliação dos países, novos indicadores estão sendo estabelecidos, incluindo os
aspectos sociais (como é o caso do índice do Índice de Desenvolvimento Humano –
IDH) e ambientais (2002, p. 36).

Os moradores são os sujeitos sociais de direito ao desenvolvimento humano que o turismo


pode e deve proporcionar. Em Novo Airão, dos moradores 19 entrevistados, 59% apontam a
atividade turística como uma solução para os problemas econômicos e sociais do município, visto
que poucos conseguem recursos em dinheiro/moeda ou doações de objetos pelos turistas, para
atenderem algumas de suas necessidades mais imediatas. RUSCHEINSKY (2004, p. 19) nos ajuda
nesta análise:
A emergência da sociedade sustentável compreende o desenvolvimento de AÇÕES
COLETIVAS (grifo nosso) que venham a enfrentar as desigualdades sociais ou emerge como
resultado de mudanças sociais e econômicas contemporâneas que permitem novo formato
organizativo da sociedade. É a ênfase que privilegia os atores sociais, o reordenamento jurídico, o
Estado de compromisso, as alterações dos condicionamentos sociais e as bases de sustentação
material da vida.
Fica evidente que a dimensão política da sustentabilidade está diretamente relacionada aos
processos participativos democráticos e coletivos, completamente diferente de doações que mais
parecem pena, misericórdia, favor. Esta dimensão se completa na dimensão ética, até porque o
ecoturismo não é apenas ecológico, mas também social. Os comunitários de Novo Airão deverão
participar efetivamente dos processos geracionais e intrageracionais assumindo responsabilidades
consigo mesmo, com o município e com o ambiente físico. Caso contrário o ecoturismo será apenas
mais uma estratégia para garantir a exploração de seres humanos e do meio físico, a produção de
riqueza e lucro para aqueles que detêm os meios de produção e poder de decisão.
Esse fortalecimento do processo de organização comunitária permite a elaboração e a
implementação de projetos socioambientais mediados pelo ecoturismo, pois se a comunidade não se
organizar nenhuma ONG, nenhuma equipe técnica ou de consultoria realizará um trabalho capaz de
gerar autonomia e emancipação dos comunitários. Nas palavras do Sr. Simeão (Presidente da
Associação de Produtores de Novo Airão), “é preciso ter uma sensibilização e capacitação da
população junto às empresas de turismo. Para que isso aconteça de uma maneira mais rápida é
preciso uma união dos órgãos com as pessoas”. Segundo Simeão o município deveria trabalhar no
sentido de gerar “uma conscientização por meio de palestras nas escolas esclarecendo o que pode e
o que não pode ser feito. Assim quando chegar o turista, os moradores já saberão dizer do que
aprenderam”. Suas palavras expressam o sentimento comunitário de maiores conhecimentos,
assunção de responsabilidades, de poder de decisão, de descentralização.
Durante conversas informais com líderes comunitários percebemos insatisfação destes com
as agências turísticas, pois a maior parte do lucro se concentra somente nas mãos dessas agências,
que decidem os roteiros turismo. Outro problema a ser resolvido é a falta de capacitação dos
Fórum Internacional do Meio Ambiente - A conferência da Terra 1045

moradores para a recepção e tratamento aos turistas. Enfim, é preciso que o planejamento
participativo se torne prática e a comunidade tenha reais benefícios com o ecoturismo.
Como observa Azevedo (2002), ainda que condicionada a grau significativo de matizes,
descentralização corresponde sempre a uma transferência de responsabilidade do poder público
teoricamente visando a uma maior efetividade na tomada das decisões e no exercício de funções
relevantes. (AZEVEDO, 2002). É necessário e urgente que haja uma descentralização da tomada de
decisões para que a comunidade possa participar do processo e da efetivação do plano de
ordenamento turístico para o município.
O grande desafio que se apresenta para o ecoturismo em Novo Airão é a participação e o
envolvimento da comunidade nos projetos, além do compromisso com a geração e distribuição de
renda, medidas estas que se traduzam em real melhoria nas condições de vida das populações locais
para que dessa forma o ecoturismo passa não se restrinja apenas a um conjunto de boas intenções. E
neste lugar no Amazonas, historicamente marcado por sistemas de dominação, que o turismo
definitivamente contribua para autonomia, a emancipação das sociedades e para o desenvolvimento
social.

REFERÊNCIAS BIBLIOGRAFICAS
ANTUNES, Ricardo. Os sentidos do Trabalho. São Paulo: Boitempo. 2002.
AZEVEDO, Juliana. Turismo: aproveitamento da biodiversidade para a sustentabilidade. In:
IRVING, M. A. & AZEVEDO, J. Turismo: o desafio da sustentabilidade. São Paulo. Editora
Futura, 2002, pp. 149-165.
Banco Mundial. Programa para o Desenvolvimento do Ecoturismo na Amazônia Legal. Disponível
em <http://www.worldbank.org/rfpp/news/debates/proecotur2.doc>. Acesso em 15 mar. 2008.
BRASIL - MICT/MMA, 1994 - Diretrizes para uma Política Nacional de Ecoturismo.
FERREIRA, Alexandre Rodrigues. Viagem Filosófica ao Rio Negro. Belém: Museu Paraense
Emílio Goeldi, 1983.
INSTITUTO DE DESENVOLVIMENTO SUSTENTÁVEL MAMIRAUÁ. Ecoturismo Mamirauá:
reserva de desenvolvimento sustentável. Tefé. Disponível em:
<http://www.mamiraua.org.br/ecoturismo>. Acesso em: 20 jun. 2004.
IRVING, Marta de Azevedo. Participação: questão central na sustentabilidade de projetos de
desenvolvimento. In: IRVING, M.A. & AZEVEDO, J. Turismo: o desafio da sustentabilidade. São
Paulo. Editora Futura, 2002, pp. 35-45.
JESUS, Edilza Laray de. Banzeiros e correntezas: contradições na relação entre a escola e a
Comunidade Sagrado Coração de Jesus, Itacoatiara-AM. Projeto de Doutorado. Porto Alegre:
UFRGS, 2005.
________________. Sociodiversidade no Jaú: a ética de (com)viver. 1998. 96 f. Dissertação
(Mestrado) - Mestrado em Educação Ambiental, Departamento de Educação. Fundação
Universidade do Rio Grande, Rio Grande, 1998.
MÉSZAROS, István. Para além do capital. São Paulo/Campinas: Boitempo Editorial/ Editora da
Unicamp, 2002.
MINISTÉRIO do Meio Ambiente. Programa para o Desenvolvimento do Ecoturismo
na Amazônia Legal. Disponível em: <http://www.mma.gov.br/port/sca/proeco/turverde.html>.
Acesso em 12 mar. 2008.
PMNA (Prefeitura Municipal de Novo Airão). História e Geografia de Novo Airão. Novo Airão.
Mimeo, s/d.
Reis, Arthur Cezar Ferreira. A Amazônia que os portugueses revelaram. Brasília: MEC, n/d.
________________. A expansão portuguesa na Amazônia nos séculos XVII e XVII. Rio de Janeiro:
SPVEA, 1959.
RICARDO, Beto; CAMPANILI Maura. Almanaque Brasil Socioambiental 2008. São Paulo:
Instituto Socioambiental, 2007.
RUSCHEINSKY, Aloísio (Org.). Sustentabilidade: uma paixão em movimento. Porto Alegre:
Sulina, 2004.
Fórum Internacional do Meio Ambiente - A conferência da Terra 1046

SACHS, Ignacy. Desenvolvimento: includente, sustentável, sustentado. Rio de Janeiro: Garamond,


2004.
WORLD WILDLIFE FUND. Ecoturismo integrado ao manejo de várzea em Silves. Silves, 1994.
Disponível em: <http://www.wwf.org.br/projetos/projeto.asp?lista=bioma& item=1&item=53>.
Acesso em: 20 ago. 2004.
Fórum Internacional do Meio Ambiente - A conferência da Terra 1047

GEOTURISMO NA CHAPADA DO ARARIPE CEARENSE

Celso Cardoso Gomes


FUNESO/UNESF. marmecel@gmail.com
Antonio J. Barbosa Filho
FUNESO/UNESF. Antoniofilho79@hotmail.com

RESUMO
Sabe-se que no momento atual uma das atividades que tem progredido de forma acelerada
é a indústria turística, dentre esta se pode destacar a atuação do geoturismo, o qual é conceituado
como atividade que busca a valorização do potencial geológico e geomorfológico de uma paisagem,
no sentindo de divulgar e apresentar os elementos da paisagem aos visitantes, já a “Travel Industry
Association of America” (TIAA, 2003) define o geoturismo como o “turismo que se apóia ou
valoriza as características geográficas do lugar em foco, incluindo-se o meio-ambiente, cultura
local, a herança estética e o bem estar da população local”, contudo Hose (1997) define como “a
atividade de prover subsídios que possibilitem aos turistas adquirir o conhecimento necessário
para compreender a geologia e geomorfologia de um local além da apreciação de sua beleza
cênica”. Essa prática é uma atividade importante para a Área de Proteção Ambiental da Chapada do
Araripe, que se destaca por apresentar uma relevante amostra dos ecossistemas existentes e
caracteriza-se por sua riqueza, tanto em termos de biodiversidade, como de tradição cultural,
religiosa, e, sobretudo de caráter paleontológico, espeliológico e geológico.
Os aspectos mencionados fazem com que a região tenha um potencial geoturístico bastante
interessante. A presente pesquisa vislumbrará a importância do geoturismo na região da Chapada do
Araripe Cearense, buscando verificar suas potencialidades para uma possível implantação do
turismo de base local, com isso podendo gerar atividades complementares para a população local,
podendo ainda mitigar os problemas sócio-econômicos e ambientais, já que as políticas públicas
relacionadas à temática estão ausentes, necessitando sensibilizar tanto a comunidade local, quanto
os turistas para a preservação ambiental e sustentabilidade.
Palavras-chave: Geoturismo – Geologia – preservação

ABSTRACT
We know that when one of the current activities that have progressed so accelerated is the
tourism industry, and it can highlight the role of geoturismo, which is regarded as activity that seeks
the recovery of the potential geological and geomorphological a landscape, No feeling to disclose
and present the elements of the landscape to visitors, as a "Travel Industry Association of America
(TIAA, 2003) defines the geoturismo as" tourism which supports or enhances the geographical
characteristics of the place in focus, including the environment, local culture, heritage and aesthetic
welfare of the local population ", however Hose (1997) defines as" the activity of providing
subsidies that allow tourists to acquire the knowledge necessary to understand the geology and
geomorphology of a place apart the evaluation of its scenic beauty. " This practice is an important
activity for the field of Environmental Protection of the Chapada do Araripe, which is highlighted
by submitting a sample of the relevant existing ecosystems and is characterized by its wealth in
terms of biodiversity, and of cultural tradition, religious, and , especially of character paleontološki,
espeliológico and geological.
The areas mentioned are such that the region has a potential geoturístico quite interesting.
This visual search geoturismo the importance of the region of the Araripe Chapada Cearense,
seeking verify its potential for a possible deployment of tourism on a local basis, it can generate
complementary activities for the local population, and may even mitigate the socio-economic
problems and environmental, as the public policies related to the theme are absent, requiring both
sensitize the local community, as the tourists for environmental preservation and sustainability.
Key words: Geotourism - Geology - preservation

CONSIDERAÇÕES INICIAIS
Fórum Internacional do Meio Ambiente - A conferência da Terra 1048

Sabe-se momento atual que uma das atividades que tem progredido de forma acelerada é a
indústria turística, dentre esta se pode destacar a atuação do geoturismo, o qual é conceituado como
atividade que busca a valorização do potencial geológico e geomorfológico de uma paisagem, no
sentindo de divulgar e apresentar os elementos da paisagem aos visitantes, já a “Travel Industry
Association of America” (TIAA, 2003) define o geoturismo como o “turismo que se apóia ou
valoriza as características geográficas do lugar em foco, incluindo-se o meio-ambiente, cultura
local, a herança estética e o bem estar da população local”, contudo Hose (1997) define como “a
atividade de prover subsídios que possibilitem aos turistas adquirir o conhecimento necessário
para compreender a geologia e geomorfologia de um local além da apreciação de sua beleza
cênica” O conceito da TIAA (2003), servirá como base para a pesquisa, uma vez que, engloba não
só os aspectos geológicos e geomorfológicos, mas também destaca a paisagem natural. O
geoturismo é um segmento interessante para a Área de Proteção Ambiental da Chapada do Araripe,
em virtude de apresentar uma relevante amostra dos ecossistemas existentes e caracteriza-se por sua
riqueza, tanto em termos de biodiversidade, como de tradição cultural, religiosa, e, sobretudo de
caráter paleontológico, espeleológico e geológico. Esses aspectos fazem com que a região tenha
potencialidades geoturísticas. A presente pesquisa vislumbrará a importância do geoturismo na
região da Chapada do Araripe Cearense, buscando verificar suas potencialidades para uma possível
implantação do turismo de base local, com isso podendo gerar atividades complementares para a
população local, podendo ainda mitigar os problemas sócio-econômicos e ambientais, já que as
políticas públicas relacionadas à temática estão ausentes, necessitando sensibilizar tanto a
comunidade local, quanto os turistas e o estado para a preservação ambiental e sustentabilidade.
Os resultados desta perquirição buscam formular proposta de roteiro geoturístico com base
nas suas potencialidades, bem como de forma integrada com a população local, de maneira a
praticar o turismo de base local, ou seja, a prática do turismo sertanejo que segundo Seabra (2007,
p.282) “é uma forma de lazer fundamentada na paisagem natural, no patrimônio cultural e no
desenvolvimento social do interior do Brasil”, claro que é necessário um planejamento baseado nos
princípios do turismo local, tal qual mencionou Ruschmann (1997)
“- Preservação e conservação do patrimônio natural;
-Valorização do patrimônio histórico e cultural;
- Desenvolvimento econômico com equidade social;
- Incentivo aos micros e pequenos negócios;”
Assim como através de um planejamento de utilização da paisagem de maneira sistêmica
(BERTRAND, 1971 e SOTCHAVA, 1972).
A pesquisa objetiva ainda fornecer informações geológico-geomorfológicas através de
mapas, perfis e fotos dos pontos de interesse aos visitantes, fazendo com que estes se familiarizem
com a temática, desta forma podendo sensibilizar para que os visitantes também possam contribuir
com a conservação do patrimônio geoturístico, tal qual Conti (2003) menciona sua importância
fazendo relação com a sua utilização “as características geológicas e as formas de relevo são um
dos componentes naturais da paisagem de uma área com aptidão turística que necessitam ser
conhecidas pelos envolvidos nas atividades de lazer e uso do espaço”.De acordo com Hart (1986).
“Muitas das características que fazem de uma paisagem um local atrativo são
geomorfológicas, e, dessa forma, o pesquisador deve estar apto a responder aos anseios dos gestores
e dos visitantes – quais formas de relevo existem numa determinada parte da superfície terrestre,
quais os riscos de se andar por essas áreas, quais os seus potenciais e que cuidados devem ser
tomados, para que não venha a ser degradada pelos turistas.” (HART in GUERRA & MARÇAL,
2006).
A área de estudo localiza-se na chamada Bio-Região do Complexo do Araripe (bacia
sedimentar) a qual contempla uma planície ao longo do topo da chapada, áreas de talude nas bordas
do sopé, uma região de intensa sedimentação e largura variável (pediplano) irrigada pelas fontes
oriundas dessa geomorfologia, e geologicamente apresenta nos seus arredores o embasamento
cristalino do Nordeste, área que possui uma intensa urbanização.
Fórum Internacional do Meio Ambiente - A conferência da Terra 1049

GEOLOGIA E PALEONTOLOGIA
Os pesquisadores Silva Santos e Valença (1968, p. 340) descreveram a chapada
geologicamente como testemunho resultante da erosão, de uma seqüência sedimentar com cerca de
600 a 700 metros e de bloco espesso nesta extensão, sendo a região formada no período mesozóico
e que área de posição dos sedimentos transcende os limítrofes da chapada.
Ainda retratando a respeito da geologia local o Departamento Nacional de Pesquisas
Minerais – DNPM apresenta a estratigrafia da Bacia do Araripe sob dois enfoques o de estratigrafia
genética e o da litoestratigrafia formal, no entanto o presente artigo vislumbrará apenas a
litoestratigrafia forma l tal quando menciona PONTE (1991 e 1992 apud DNPM) onde o mesmo
identificou as seguintes unidades:
“Formação Mauriti – De idade Siluro-Devoniano (?), compõe-se de arenitos claros,
quartzosos e/ou feldispáticos, de granulometria média a grossa, com grãos subangulares, mal
selecionados. Em algumas exposições, pode-se reconhecer uma gradação granulométrica
decrescente em direção ao topo, que se inicia com níveis conglomeráticos, na base, sucedidos por
arenitos médios com estratificações cruzadas de médio porte. Fechando o ciclo deposicional,
ocorrem leitos delgados de siltitos e arenitos finos de cor cinza;
Formação Brejo Santo – De idade Jurássico superior (?), compõe-se de arenitos finos,
siltitos e argilitos vermelhos, na base, e argilitos e folhelhos vermelhos ou marrons escuro
estratificados e esporádicos leitos de folhelhos verdes no topo;
Formação Missão Velha – De idade Jurássico superior (?)/Cretáceo inferior (?), compõe-se
de arenitos grossos, mal selecionados, de coloração esbranquiçada ou amarelada, mostrando
estratificação cruzada e leitos conglomeráticos;
Formação Abaiara – De idade Cretáceo inferior, compõe-se de alternâncias bem
estratificadas de arenitos micáceos cinzas, amarelos ou avermelhados, predominantemente finos
(com grãos subangulares), argilosos e semi-friáveis com siltitos, argilitos e folhelhos de cores
variegadas;
Formação Rio da Batateira – De idade Cretáceo médio, compõe-se de arenitos fluviais
médios a grossos, gradando, ascendentemente, para arenitos médios a finos, siltitos argilosos bem
estratificados e se encerra com uma seção de folhelhos negros, orgânicos, fossilíferos;
Formação Santana – De idade Cretáceo médio, divide-se nos Membros Crato, Ipubi e
Romualdo. O Membro Crato é composto, da base para o topo, de folhelhos cinzas, castanhos,
calcíferos, laminados e calcários micríticos cinza claro e creme, argilosos, finamente laminados e
fossilíferos. O Membro Ipubi repousa sobre a unidade anterior em contato normal e gradacional,
constituído por bancos estratiformes de gipsita, contendo intercalações de folhelhos cinza e verdes.
O Membro Romualdo é composto por folhelhos e margas fossilíferos cinza-esverdeados, com
intercalação de um horizonte rico em concreções carbonáticas de dimensões variadas, contendo, na
sua grande maioria, peixes fósseis.
Formação Arajara – De idade Cretáceo médio, compõe-se de siltitos, argilitos, arenitos
finos argilosos e/ou caulínicos, bem estratificados, exibindo marcas onduladas, laminações cruzadas
e, eventualmente estruturas de fluidização e coloração variegada;
Formação Exu – De idade Cretáceo médio, compõe-se de arenitos vermelhos friáveis,
argilosos, em geral caulínicos, de granulometria variável, contendo, leitos intercalados de arenitos
grossos a conglomeráticos.
Depósitos Cenozóicos – Representados pelas coberturas tércio-quaternárias arenosas,
areno-argilosas e areno-síltico argilosas, depósitos de tálus e pelas aluviões quaternárias.”

Diante da premissa a respeito das questões geológicas e paleontológicas logo se pode


retirar como ponto interessante que a Formação Santana é a de maior importância, por conta da
infinidade de fósseis já encontrados na área, além dos mesmos estarem numa situação bastante
preservada (KELNER, 1987), merecendo destaque os peixes das concreções calcárias, os ictiólitos,
com aproximadamente 25 espécies diferentes já relatadas, se podem citar também três espécies de
Fórum Internacional do Meio Ambiente - A conferência da Terra 1050

peixes no calcário laminado, são eles: o Dastilbe elongatus,Cladocyclus ferus e uma espécie não
classificada (SILVA SANTOS).
São encontrados na área também quelônios, répteis, lagartos, insetos, crustáceos,
ostracodes, conchostráceos, gastrópodes, bivalves, equinóides e foraminíferos, como também vasta
quantidade de restos de vegetais, é o caso das folhas, resinas, troncos, ramos folhosos. A datação
corresponde ao albiano se baseando nos fósseis. Exemplares desses fósseis podem ser encontrados
no Museu de Paleontologia da Universidade Regional do Cariri, como por exemplo, troncos
silicificados e carbonatados, impressões de samambaias, coníferas e plantas com flores,
foraminíferos, moluscos, artrópodes (ostracoides, aranhas, escorpiões e insetos), peixes, tubarões,
arraias e diversos peixes ósseos e condrictios, anfíbios, répteis (tartarugas, crocodilianos, lagartos e
pterossauros).
O processo de sedimentação da Bacia do Araripe começou no âmbito de água doce, mas o
mar invadiu a região, formando camadas de gipso e rochas associadas. Restos de peixes
característicos de ambiente marinho que testemunham à presença do mar. A ligação com o mar
interrompeu-se temporariamente e a redução de salinidade propiciou o desenvolvimento de faunas
não marinhas. O estabelecimento da conexão é atestado pela ocorrência de gêneros de bivalves
tipicamente marinhos e equinóides (PROJETO ARARIPE, 1998).

CLIMAS
A região da Chapada do Araripe possui um clima semi-árido do tipo BSh’, da classificação
de Köeppen, marcado por duas estação bem diferentes, uma chuvosa no verão e outra seca,
variando para Aw’ na região do Cariri, caracterizado por ser quente e úmido com chuvas máximas
no outono (DNPM, 1996).
Já em relação ao quadro pluviométrico, a região da Chapada do Araripe tem a seguinte
estrutura: no setor noroeste (territórios dos Municípios de Salitre, Araripe e Santana do Cariri, no
Ceará) as médias anuais variam entre 650 a 850 mm; na área norte-nordeste (territórios dos
Municípios de Santana do Cariri, Crato, Barbalha, Juazeiro do Norte, Missão Velha e Milagres, no
Ceará) variam entre 950 a 1.100 mm (BEZERRA et alli, 1997); no setor sudoeste (territórios dos
Municípios de Araripina e Ouricuri, em Pernambuco) a média é de 720 mm; no setor oeste
(território do Município de Simões, no Piauí) a média é de 640 mm (DNPM, op. cit).
Outros indicadores que caracterizam bem a região, segundo DNPM (op. cit) são:
temperatura, com médias anuais variando entre 21º a 26º no inverno (julho) e 25º a 27º no verão
(janeiro); umidade relativa do ar, com média anual de 63,6% em Barbalha (CE) e 71,4% em
Araripina (PE); insolação, com total anual de 2.848 horas em Barbalha e 2.681 horas em Araripina;
ventos, variando entre 0,93 m/s em dezembro a 1,33 m/s em julho, medidos na estação
climatológica de Araripina.

HIDROGRAFIA
No contexto hidrográfico destaca-se a drenagem superficial que é representada pelos altos
cursos da Bacia do Alto Jaguaribe e do Rio Salgado, no Estado do Ceará, do Brígida e Garças, em
Pernambuco, e do Poti, no Piauí, sendo a chapada, portanto, um divisor de águas regional.
O Rio Jaguaribe é formado no seu alto curso pelos Rios Bastiões, que vem de Araripe,
Cariús, que nasce em Santana do Cariri, e Salgado, que drena toda a Região do Cariri cearense. O
Rio Salgado, por sua vez, recebe contribuição dos Riachos Batateiras, Granjeiro e Carás, vindos de
Crato e Juazeiro do Norte, Salamanca, em Barbalha, Seco, em Missão Velha, e do Riacho dos
Porcos, que drena os Municípios de Milagres, Mauriti, Brejo Santo, Porteiras, Jardim e Jati
(DNPM, op cit).

GEOMORFOLOGIA
A Chapada do Araripe apresenta cotas altimétricas médias em torno de 800 a 900 metros.
A topografia é configurada de maneira uniforme, seu topo horizontal é influenciado pela
Fórum Internacional do Meio Ambiente - A conferência da Terra 1051

estratificação dos arenitos e siltitos da Formação Exu, Grupo Araripe (Cretáceo médio), Bacia
Sedimentar do Araripe (SOUZA, 1997).
A região apresenta três zonas distintas, segundo DNPM (op. cit): Zona de Chapada, Zona
de Talude e Zona de Pediplano, cada uma delas com características próprias, nos aspectos litologia,
relevo, clima, hidrografia e vegetação. Uma “seção tipo” pode ser vista na porção nordeste da bacia
sedimentar, que compreende o Vale do Cariri, o qual inclui os Municípios de Crato, Juazeiro do
Norte, Barbalha, Missão Velha, Abaiara, Milagres, Mauriti, Jardim, Porteiras e Brejo Santo, todos
no Estado do Ceará.

ESPELEOLOGIA
No século XIX já ocorriam notícias no tocante a existência de cavernas na Chapada do
Araripe, durante a passagem da Comissão Científica do Império, em 1861, quando foi feita uma
descrição da Gruta do Brejinho, no Município de Araripe. Fato que vem ocorrendo gradativamente
durante as últimas décadas, como por exemplo, os registros sobre a Gruta do Farias, no Município
de Barbalha, através da imprensa escrita e pela cultura popular, como xilogravuras.
Em 1997 foi reconhecida uma nova área espeleológica não carabonática, a partir das
informações obtidas dentro do Projeto de Diagnóstico Ambiental da Área de Proteção Ambiental da
Chapada do Araripe foram primordiais para caracterizá-la como a mais recente Província
Espeleológica Arenítica brasileira (XIMENES, 1998).
Através de pesquisas por parte do Projeto Araripe foram identificadas e confirmadas as
seguintes formações espeleológicas, as Grutas do Farias, do Brejinho, das Corujas, das Onças e do
Romualdo, no Estado do Ceará, e Gruta da Ladeira, no Piauí. O projeto também identificou abrigos
sob rocha, onde existem cavernas em fase embrionária são o Abrigo do Quinco, no Ceará, e as
Furnas da Batinga, no Piauí.
“Os ecossistemas cavernícolas, identificados até o presente, representam apenas uma
pequena parte do real potencial do patrimônio espeleológico na área da APA da Chapada do
Araripe, sendo que novas cavernas podem ser descobertas com um trabalho de prospecção mais
detalhado.” (PROJETO ARARIPE – FUNDETEC, 1998)

METODOLOGIA
A pesquisa abordará as questões relacionadas às potencialidades geoturísticas da Chapada
do Araripe Cearense (Figura), especialmente as seguintes cidades: Crato, Barbalha, Missão Velha,
Santana do Cariri, Nova Olinda e Juazeiro do Norte.

Figura: 01. FONTE: PROJETO ARARIPE, 1998


Fórum Internacional do Meio Ambiente - A conferência da Terra 1052

A pesquisa tem por base o caráter qualitativo, tal como Haguette (1987) sugere, que “os
métodos qualitativos enfatizam as especificidades em termos de suas origens e de sua razão de ser,
de maneira que na sua fase inicial foi realizada uma análise bibliográfica de artigos, dissertações de
mestrado e teses de doutorado sobre a geologia e a geomorfologia, além de livros, jornais, revistas e
sites referentes à temática.
Num segundo momento foi dada ênfase à percepção ambiental que resultaram em duas
etapas, a primeira com a pesquisa de campo através da análise da paisagem e obtenção de
fotografias, na segunda etapa se fez o uso da técnica de entrevista que para Haguete (1987. p.75)
têm a seguinte abordagem, “a entrevista pode ser definida como um processo de interação social
entre duas pessoas na qual uma delas, o entrevistador, tem por objetivo a obtenção de informações
por parte do outro, o entrevistado”. Todavia é importante mencionar que a técnica será qualitativa,
contrastando com a quantitativa para que haja uma melhor compreensão do espaço, assim como diz
Barros & Lehfeld (1997) que “cabe ressaltar, que o projeto deverá possuir certa flexibilidade,
demonstrando capacidade de adaptação às possíveis mudanças existentes no desenrolar do
trabalho, principalmente, devido a situações frente às dificuldades muito freqüentes na fase de
coleta de dados (...)”. A observação de campo também fez uso de fotografias, mapas, cartas, entre
outros, a partir dessa análise se conseguiu caracterizar as potencialidades.
As atividades de campo para o reconhecimento da área de estudo e seleção dos pontos para
a pesquisa realizou-se com o apoio de aparelho de GPS – Sistema de Posicionamento Global com
máquina fotográfica digital para registro fotográfico dos pontos de interesse geoturístico.
As etapas de trabalho contaram com pesquisa bibliográfica e documental; caracterização
geológica e geomorfológica, e identificação das áreas potenciais à atividade geoturística,
O terceiro e último momento foi a formatação dos dados gerando um roteiro geoturístico
da área, bem como a análise dos pontos favoráveis para tal implantação, além dos pontos
vulneráveis que a região alvo da pesquisa apresenta.

RESULTADOS E DISCUSSÕES
A área de estudo localiza-se na chamada Bio-Região do Complexo do Araripe (bacia
sedimentar) a qual contempla uma planície ao longo do topo da chapada, áreas de talude nas bordas
do sopé, uma região de intensa sedimentação e largura variável (pediplano) irrigada pelas fontes
oriundas dessa geomorfologia, e geologicamente apresenta nos seus arredores o embasamento
cristalino do Nordeste, área que possui uma intensa urbanização.
A Chapada do Araripe Cearense apresenta um significativo potencial para o geoturismo
devido seu território possuir diversos contrastes paisagísticos resultantes de diferentes processos
geológico-geomorfológicos, que resultaram em uma grande heterogeneidade de feições
paisagísticas relevantes ao desenvolvimento dessa categoria turística, além de sua beleza cênica
muito interessante, uma vez que ocorre o contraste da paisagem sertaneja marcada pela seca e a cor
cinzenta, principalmente, no lado pernambucano, enquanto existe a ocorrência de mais de duzentas
fontes de água minerais no entorno da chapada, fazendo ressurgir a vida vegetal e animal, ao
mesmo tempo em que a paisagem se apresenta perene.
Durante a pesquisa bibliográfica foi identificado o posicionamento no período geológico
da bacia sedimentar do Araripe, a qual contempla o neocomiano e o albiano, no Cretáceo inferior,
fato que a faz ser muito rica em termos fossolíferos, correlacionando com bacias sedimentares da
mesma cronologia, em virtude destas características a região alvo da pesquisa é intensamente
visitada por pesquisadores do mundo inteiro, ou seja, o chamado turismo científico no intuito de
vislumbrar os fósseis, como também para verificar a exploração da gipsta, uma vez que, é um dos
maiores depósitos desse mineral no mundo.
No momento de averiguação de campo e paralelamente confrontando com a pesquisa
documental, podem-se retirar os seguintes resultados relacionados aos fatos geoespeleológicos:
grande parte das cavernas são formadas nos arenitos com contribuições argilosas da Formação
Arajara, sendo exceção a Gruta das Onças, as cavernas são formadas prioritariamente pela
percolação de água em sistemas de fraturas em seu estágio inicial, já os processos de
Fórum Internacional do Meio Ambiente - A conferência da Terra 1053

alteração/desagregação e remoção de material ocorreram de maneira intensa nas zonas de interseção


entre fraturas, logo é perceptível que as atividades geoturísticas podem utilizar algumas dessas
cavernas para a visitação, claro que de maneira sustentável, ou seja, dando pelo menos a infra-
estrutura mínima e procurando envolver de maneira ativa a população do entorno dessas formações
no sentido do turismo de base local (SEABRA op cit, 2007).
Em relação aos aspectos paleontológicos e arqueológicos foi percebido ao longo da
pesquisa de campo e tomando por base o referencial bibliográfico que a Gruta do Brejinho se
apresenta como fosse abrigo sob rocha, marcando com esta característica a total possibilidade da
existência dos nossos ancestrais na região, sendo evidenciados alguns sítios por toda região, tal
qual: O sítio Santa Fé (Crato), O Sítio Olho D’Água de Santa Bárbara (Nova Olinda), O Sítio
Tatajuba e Tatajuba 2 (Santana do Cariri), A Pedra do Convento (Serra dos Bastiões), A Pedra do
Letreiro e o Sítio Cajueiro (Riacho da Brígida) (LIMAVERDE, 2007), ambos sítios apresentam
pinturas, gravuras e gravuras pintadas, predominando de forma marcante a tradição nordeste
(LIMAVERDE op cit).
As marcas arqueológicas e paleontológicas da Chapada do Araripe são mais uma
peculiaridade que a faz ter grande potencial geoturístico, no entanto sendo necessário estruturar o
espaço físico para que assim possa ter possibilidade de receber o geoturista na área em questão,
ponto qual foi dado um passo notável para organização do espaço com a inauguração do Geopark
Araripe, é uma iniciativa do Governo do Estado do Ceará, representado através da Secretaria de
Estado da Ciência, Tecnologia e Educação Superior, coordenado pela Universidade Regional do
Cariri – URCA. Em dezembro de 2005, o Governo do Estado do Ceará apresentou postulação, junto
à Divisão de Ciências da Terra da UNESCO, que reconheceu em setembro de 2006 o Geopark
Araripe como primeiro Geopark das Américas (www.geoparkararipe.org, acessado em 11.04.2008
às 12:44 h).
O Geopark Araripe é formado por nove sítios de interesse, definidos pela relevância
geológica e paleontológica, que receberam a denominação de geotopes, distribuídos pelo Cariri. São
os locais mais representativos de seus estratos geológicos e de suas formações fossilíferas
(GEOPARK ARARIPE, 2006), são eles:
GEOTOPE ARAJARA - Parque do Riacho do Meio
GEOTOPE EXU - Pontal da Santa Cruz
GEOTOPE SANTANA - Parque dos Pterossauros
GEOTOPE NOVA OLINDA - Mina Triunfo
GEOTOPE BATATEIRAS - Rio das Batateiras/ Crato
GEOTOPE MISSÃO VELHA - Floresta Fóssil
GEOTOPE DEVONIANO - Canyon do Rio Batateira
GEOTOPE IPUBI - Mina Chaves
GEOTOPE GRANITO - Colina do Horto

Outra particularidade do objeto de estudo é a presença da Floresta Nacional do Araripe,


denominada de FLONA que representa a 1ª unidade de conservação da natureza do Brasil em 1946,
com grande biodiversidade nos seus 500km². Esta floresta é uma importante amostra da Floresta
Subcaducifólia e Caducifólia existente na região Nordeste, assim como da sua fauna, ambas
bastante comprometidas por diversas atividades econômicas, principalmente pelas carvoarias e
extração da gipsita na região, uma vez que servem de fonte de energia para atividade mencionada,
não obstante os gestores da FLONA, juntamente com ONG’s, governo e setor privado precisam
interagir ao que concerne a estruturação das trilhas, já que as mesma possuem pouca identificação,
como também fazer estudo de capacidade de carga da mesma para que possam ser utilizadas de
acordo com a sustentabilidade.
Diante do exposto é perceptível que a região apresenta um quadro geológico-
geomorfológico, mas também nos demais aspectos naturais de forma bastante diversificada
provocando uma possível implantação das atividades geoturísticas.
Fórum Internacional do Meio Ambiente - A conferência da Terra 1054

CONSIDERAÇÕES FINAIS
A ciência geográfica media a relação entre a sociedade e a natureza, desta forma podendo
fazer uso das características geológicas, paleontológicas, arqueológicas, biológicas, espeleológicas e
geomorfológicas de uma região como atributos naturais que possam ser utilizadas na atividade
turística por sua beleza cênica ou por sua importância no meio científico, de maneira a elaborar
teorias e metodologias que auxiliem o desenvolvimento de parâmetros para ajudar num contexto
alternativo de renda necessária ao desenvolvimento endógeno de uma dada região (FILHO, 1996).
Apesar dos atrativos naturais da área de estudo beneficiarem a realização do geoturismo,
turismo científico, turismo cultural, turismo religioso e do ecoturismo, ainda não existem um
planejamento adequado, com algumas áreas potenciais não equipadas com estrutura adequada para
recepção dos visitantes. É importante ressaltar que a ação governamental, nos níveis estadual e
municipal, é de fundamental importância para gerir a correta exploração destes atrativos.
Diante da dimensão do seu território e da grande quantidade de atrativos naturais,
necessita-se realizar estudos mais detalhados para identificar os sítios geológico-geomorfológicos
potenciais para o geoturismo, bem como aqueles que devem ser preservados e/ou ter uso restrito às
pesquisas científicas, além de mapear e realizar perfis da área, com isso fazendo o planejamento
estratégico sempre margeado pelos princípios do turismo de base local.
São tantas as riquezas naturais que a Chapada do Araripe apresenta que é notódica a sua
potencialidade turística. Pois podem ser destacados potenciais arqueológicos, paleontológicos,
espeleológicos, geológicos, vegetacionais, biológicos, além de sua fauna exuberante, assim como
suas fontes de água natural. Está última já bastante utilizada pelos chamados balneários que
podemos destacar o Clube Serrano, o Clube Grangeiro, o Arajara Park e o Balneário do Caldas,
dentre outros existentes na área, todavia será necessário reorganizar e adequar suas instalações
estruturando-se de maneira respeitosa com o meio ambiente, ficando de acordo com os princípios
de sustentabilidade e educação ambiental, além levar em consideração o planejamento turístico
(Ruschmann op cit).
A área alvo da pesquisa esta localizada no centro da Região Nordeste, fato que privilegia o
espaço para o turismo regionalizado, bem como podendo gerar roteiros integrados com outros
parques próximos da área, como é o caso do Seridó no estado da Paraíba e o da Serra da Capivara
no Estado do Piauí, assim como o Vale do Catimbau no estado de Pernambuco.

REFERÊNCIAS BIBLIOGRÁFICAS
CONTI, J.B. Ecoturismo: Paisagem e Geografia. In: RODRIGUES, A.B. (org.) Ecoturismo no
Brasil – Possibilidades e Limites. São Paulo: Contexto, 2003, p.59-69.
BEZERRA, E. C.; BEZERRA, J. E. G.; MENDES, M. de F. S. – 1997. Precipitações. In: Atlas do
Ceará. Fortaleza, IPLANCE, Governo do Estado do Ceará, p. 22-23.
DNPM – 1996. Projeto Avaliação Hidrogeológica da Bacia Sedimentar do Araripe. Recife,
Departamento Nacional da Produção Mineral (DNPM), Ministério das Minas e Energia, v. I – texto,
101 pp.
GERVAISEAU, Pierre Maurice (Responsável técnico). Projeto Araripe de Proteção Ambiental e
Desenvolvimento sustentável da APA Chapada do Araripe e da Bio-Região do Araripe. Ministério
do Meio Ambiente - MMA, Fundação de Desenvolvimento Tecnológico do Cariri – FUNDETEC e
Universidade Regional do Cariri - URCA, 1998.
GUERRA, A.J.T & MARÇAL,M.S. Geomorfologia Ambiental. Rio de Janeiro: Bertrand Brasil,
2006, p.42-45.
HAGUETE, Teresa Maria Frota. Metodologias qualitativas na sociologia. 2ª edição, editora Vozes:
Petrópolis, 1987.
HOSE, T.A. Geoturism – Selling the Earth to Europe. In: MARINOS, P.G.; KOUKIS,
G.C.Disponível em http://www.unesco.org.br/areas/ciencias/areastematicas/turismo. Acesso em:
10-04-06
LIMAVERDE, Rosiane. Os registros rupestres da Chapada do Araripe, Ceará, Brasil. 2006.
Mestrado (Mestre) - Curso de Arqueologia, Departamento de Programa de Pós-graduação em
Fórum Internacional do Meio Ambiente - A conferência da Terra 1055

Arqueologia e Preservação do Patrimônio, Universidade Federal de Pernambuco, Recife, Junho de


2006.
SEABRA, Giovanni. Turismo Sertanejo. João Pessoa: Editora Universitária/UFPB, 2007.
SIGEP – SÍTIOS GEOLÓGICOS E PALEONTO’LÓGICOS. Disponível em:
http://www.unb.br/ig/sigep. Acesso em: 02-05-06.
UNESCO BRASIL – TURISMO. Disponível em: XIMENES, C. L. – 1997. Área espeleológica do
Município de Araripe, Estado do Ceará. Relatório de reconhecimento de campo. Fortaleza, ICCN,
15 pp.
XIMENES, C. L.; SILVA FILHO, W. F. da; FRANKLIN JÚNIOR, W.; LOMÔNACO, A.;
XIMENES, C. L. – 1998. Proposta para uma nova província espeleológica brasileira: a Chapada do
Araripe. In: Encontro de Espeleologia do Nordeste, 1. Resumos... Ubajara, ICCN, p. 15.
XIMENES, C. L. (no prelo). Breve panorama sobre o patrimônio espeleológico do Estado do Ceará.
www.geoparkararipe.org, acessado em 11.04.2008 às 12:44 h
Fórum Internacional do Meio Ambiente - A conferência da Terra 1056

ANÁLISE DA PAISAGEM TURÍSTICA DA CHAPADA DO ARARIPE CEARENSE,


COMO PROPOSTA PARA O ENSINO DA GEOGRAFIA

Celso Cardoso Gomes


FUNESO/UNESF. marmecel@gmail.com
Antonio J. Barbosa Filho
FUNESO/UNESF. antoniofilho79@hotmail.com

Resumo
A região Nordeste se destaca no contexto nacional por apresentar grandes desigualdades
sociais, todavia abriga um complexo paisagístico belíssimo que poderia ser utilizado para gerar
sustentabilidade, é o caso da Chapada do Araripe, localizada entre os estados do Pernambuco, Piauí
e Ceará, este último será enfoque desta pesquisa, no intuito de analisar a paisagem local.
A perquirição irá vislumbrar a análise da paisagem na pretensão de incitar a utilização de
tal processo no ensino da Ciência Geográfica, já que ensinar não se faz apenas em quatro paredes, é
preciso e bem mais além de maneira a envolver o cotidiano do discente a esta prática de ensino, ou
seja, lembrar dos propósitos de Célestin Freinet que procurava mostrar que “a escola não deve ser
vista como um meio didático, mas como uma prática ligada à vida e ao contexto histórico-social
dos alunos (apud ELIAS, 1997, p. 31)”.
Palavras-chave: Análise da Paisagem – Geografia - Ensino

ABSTRACT
The Northeastern region is highlighted in the national context by presenting major social
inequalities, however beautiful harbors a complex landscape that could be used to generate
sustainability, is the case of the Chapada do Araripe, located between the states of Pernambuco,
Piauí and Ceará, the latter will be focus of this research, in order to analyse the local landscape.
The perquirição will see the analysis of the landscape in the pretence of encouraging the use of this
process in the teaching of Science Geographic, since teaching is not just four walls, and we need
much more than a way to involve the life of this discente practice of teaching, or remember the
purpose of Célestin Freinet that sought to show that "the school should not be seen as a way
didactic, but as a practice linked to the life and the historical and social context of the students
(apud ELIAS, 1997, p. 31). "
Key words: Analysis of Landscape - Geography - Teaching

CONSIDERAÇÕES INICIAIS
A região Nordeste se destaca no contexto nacional por apresentar grandes desigualdades
sociais, todavia abriga um complexo paisagístico belíssimo que poderia ser utilizado para gerar
sustentabilidade, é o caso da Chapada do Araripe, localizada entre os estados do Pernambuco, Piauí
e Ceará, este último será enfoque desta pesquisa, no intuito de analisar a paisagem local.
A perquirição irá vislumbrar a análise da paisagem na pretensão de incitar a utilização de
tal processo no ensino da Ciência Geográfica, já que ensinar não se faz apenas em quatro paredes, é
preciso e bem mais além de maneira a envolver o cotidiano do discente a esta prática de ensino, ou
seja, lembrar dos propósitos de Célestin Freinet que procurava mostrar que “a escola não deve ser
vista como um meio didático, mas como uma prática ligada à vida e ao contexto histórico-social
dos alunos (apud ELIAS, 1997, p. 31)”.
O Nordeste do Brasil vive um grande contraste social diretamente ligado à questão
paisagística, já que clima, relevo, hidrografia, fauna, vegetação, etc. de certa forma estão
interligados, conseqüentemente influenciando a paisagem nordestina em vários contextos, seja
social, econômico ou ambiental, no entanto possui condições plenas de sustentabilidade fazendo uso
da própria paisagem, é necessário para isso uma análise conjuntural deste ambiente considerando a
teoria geossistêmica, ou seja, como define Sotchava (1977)
“são sistemas territoriais naturais, que se distinguem no envoltório geográfico, em diversas
ordens dimensionais, generalizadamente nas dimensões regional e topológica. São constituídos de
Fórum Internacional do Meio Ambiente - A conferência da Terra 1057

componentes naturais intercondicionados e inter-relacionados em sua distribuição e se desenvolvem


no tempo, como parte do todo.’’
Além do uso da análise da paisagem proposta de Milton Santos. Essas diferenciações no
espaço geográfico nordestino são mais acirradas na área sertaneja, porém é onde podem ser
encontradas as mais belas paisagens da região, como é o caso da Chapada do Araripe localizada na
chamada Bio-Região do Complexo do Araripe (Figura 01) a qual contempla uma planície ao longo
do topo da chapada, áreas de talude nas bordas do sopé, uma região de intensa sedimentação e
largura variável (pediplano) irrigada pelas fontes oriundas dessa geomorfologia, e geologicamente
apresenta nos seus arredores o embasamento cristalino do Nordeste, área que possui uma intensa
urbanização.

Figura 01 – Mapa da Biorregião do Araripe. Fonte: FUNDETEC, 1998.

A Chapada do Araripe está localizada numa área de bacia sedimentar com mais de um
milhão de hectares e abriga uma beleza cênica indiscutível, devido a sua grande extensão a pesquisa
está restrita ao lado cearense, destacando as cidades mais relevantes, são elas: Crato, Barbalha,
Santana do Cariri, Juazeiro do Norte e Nova Olinda, municípios que foram identificados paisagens
peculiares e que serão analisadas na perquirição.
A APA do Araripe destaca-se por apresentar uma relevante amostra dos ecossistemas
(Figura 02) existentes e caracteriza-se por sua riqueza, tanto em termos de biodiversidade, como de
tradição cultural e religiosa, características que a fazem ter potencialidades turísticas, contudo o
enfoque principal da pesquisa é a análise dessa paisagem, lembrando que paisagem segundo Maciel
(2002) “é, em essência, uma forma da Terra cujos processos de modelagem são físicos e culturais
a um só tempo, possuindo uma identidade calcada em uma constituição reconhecível, limites e
relações com outros lugares num contexto maior”. O autor é bastante enfático no que diz respeito
às relações existentes, mesmo aquelas com outras localidades, reconhecendo assim com grande
exatidão a visão geossistêmica.
Fórum Internacional do Meio Ambiente - A conferência da Terra 1058

Figura 02 – Chapada do Araripe. Fonte: GEOPARK ARARIPE, 2006

O estudo da área em questão contribuirá efetivamente para a compreensão da paisagem


local e melhoria da prática de ensino da ciência geográfica, uma vez que se precisa quebrar o
paradigma dos velhos conceitos decorebas, ou seja, da visão retrógrada de que parte da sociedade
possui da geografia, podendo com isso ter um ensino motivador, aliado ao cotidiano do discente,
fora das quatro paredes, assim como crítico e formador de cidadãos, para isso objetivamos analisar
a paisagem e potencialidade turística da Chapada do Araripe Cearense, como proposta para o ensino
da Geografia, buscando inicialmente de maneira específica identificar e classificar o potencial
turístico, com intuito de utilizá-lo no processo de ensino-aprendizagem, além de analisar e planejar
o uso da paisagem na prática do ensino da geografia, bem como incitar o uso da análise da
paisagem como elemento motivador para ciência geográfica, fazendo uso da aula de campo.

Figura 03 – Visão Panorâmica da Chapada do Araripe. Fonte: GEOPARK ARARIPE, 2006

Paisagem
As atividades mundiais giram em torno de um fato chamado tempo, segundo Sacconi
(1996) “duração de toda a existência, passado, presente e futuro”, diante do exposto é preciso levar
em consideração a duração dos acontecimentos inclusive ao que concerne a formação da paisagem
(Figura 03), em virtude da dinâmica existente. Mas claro o que é paisagem?
Para MACEDO (1994, p.54) paisagem é “a expressão morfológica de um determinado
tempo, do processo constante de ação dos seres vivos sobre os diversos pontos do planeta
associado ao movimento contínuo das diferentes estruturas geológicas e águas.” Macedo busca
Fórum Internacional do Meio Ambiente - A conferência da Terra 1059

refletir sobre a formação da paisagem através de uma dimensão tanto temporal, assim como de
maneira visual, no entanto, fato que pode ser consumido de forma concreta ou abstrata, bem de uso
ou bem de troca, muitas vezes representada de maneira estática através de uma imagem delimitada,
tal qual Viard (1990) correlaciona como “Um quadro representando certa extensão do espaço onde
a natureza tem o primeiro papel e as figuras humanas e animais são apenas acessórios”, se
percebe que este autor não leva em consideração a dinâmica existente na formação da paisagem,
além de considerá-la estática e ainda desconsiderar seu lado social, Barcellos (1999, p.30) trata
muito bem dessa questão dizendo que “a solução de limitar a paisagem como algo limitado ao
percebido é insatisfatória, por significar um reducionismo da problemática da paisagem.” é
preciso compreender que a paisagem vai mais além do que o visível fica muito claro quando se
observa a definição de Santos (1997) onde o mesmo expõe como sendo “Tudo aquilo que nós
vemos, o que nossa visão alcança, é a paisagem. Esta pode ser definida como o domínio do visível,
aquilo que a vista abarca...” contudo Santos é bem enfático neste segundo trecho “... Não é
formada apenas de volumes, mas também de cores, movimentos, odores, sons, etc. ... é formada por
objetos materiais e não materiais”, ficando perceptível o dinamismo da paisagem, assim como o
seu lado imaterial o qual autor se refere como sendo as cores, o odor, os sons, etc., ou seja, “a
paisagem é sempre construção e (re)construção, é pensamento e sentimento” (BAPTISTA &
GRATÃO, 2006, p.111), não se pode retirar conclusões antecipadas sem fazer uma análise
profunda da paisagem. No entanto toda paisagem “implica a existência de um observador, de
alguém que contempla e analisa esta porção do espaço desde um ponto de vista determinado”
(NOGUETTI I FONTI, 1986), comumente carregado de conotações culturais e ideológicas, forma
de verificação do mundo através da observação (SELVA, 2007), que poderá ocorrer de maneira
ativa, gerando descrição, percepção e sensação.
A percepção significa a sensação mais atribuição de valor, processo que ocorre de maneira
seletiva, já que irá depender do estado de espírito, do local, do dia, entre outros, se tornando assim
individual, pois cada um percebe um destaque, por conta da cultura, idade, sexo e valores, podendo
a percepção ser considerada como excludente, uma vez que os valores a precedem, Santos (1997,
p.62) debate muito bem essa questão informando que “a percepção é sempre um processo seletivo
de informações”, mais que ainda nesse sentido Santayna (apud BAPTISTA & GRATÃO, 2006,
p.111) escreveu:
“Se nossas percepções não tivessem nenhuma conexão com os nossos prazeres, então
deveríamos fechar os nossos olhos sobre este mundo. Raramente diferenciamos entre
pessoas, lugares ou coisas até que tenhamos um interesse pessoal sobre elas.”

Já Lowenthal (apud BAPTISTA & GRATÃO, 2006, p.110) escreveu:


“A superfície da terra é elaborada para cada pessoa pela refração de segundos através de
lentes culturais e pessoas de costumes e fantasias. Todos nós somos artistas e arquitetos
de paisagens, criando ordem e organizando espaços, tempo e causalidade, de acordo com
nossas percepções e predileções”.

A partir desse pressuposto se verifica que a paisagem é dependente do observador, assim


como da percepção deste, logo se precisa levar em consideração os aspectos materiais e imateriais
(SANTOS, 1997).
A paisagem na visão clássica é considerada de forma material, contrapondo a visão pós-
moderna que atribui valorização as representações sociais, culturais, políticas e econômicas, tal qual
Santos (1997) retrata com muita propriedade, seja no que concerne aos objetos ditos materiais ou
mesmo os imateriais, além de mencionar suas espacialidades, ou seja, terminologia utilizada por
Soja (1993) para designar o espaço socialmente produzido. Desta forma caracteriza-se o espaço
urbano e espaço rural, sendo representações espaciais dos valores culturais.

Análise da Paisagem
Fórum Internacional do Meio Ambiente - A conferência da Terra 1060

O processamento da análise da paisagem ocorrerá através da identificação e classificação


da paisagem na Chapada do Araripe Cearense para que seja planejado o devido uso, podendo assim
contribuir com o desenvolvimento endógeno, nada obstante para isso será levado em consideração a
Ecologia das paisagens, tal qual é considerado como o estudo da estrutura, função e dinâmica de
áreas heterogêneas compostas por ecossistemas interativos (METZGER, 2001) no tocante a
abordagem ecológica.
A perquirição também considerará como já foi mencionada anteriormente a sistêmica da
paisagem, ou seja, as características naturais, econômicas, sociais e ambientais, bem como suas
relações, para isso será norteada pela classificação do ambiente ao que concerne a ecodinâmica que
segundo TRICART (1977) “é a dinâmica dos ecótopos, análise da estrutura da paisagem em sua
morfodinâmica sem preocupação em delimitar unidades territoriais singulares”.
O embasamento da pesquisa será efetivado através da abordagem geográfica, ou seja,
categoria de análise do espaço e da paisagem, conhecido por método geográfico (SANTOS, 1992):
Processo pode ser definido como uma ação contínua desenvolvendo-se em direção a um
resultado qualquer implicando em conceitos de tempo e mudança;
Forma é o aspecto visível de uma coisa, refere-se ademais ao arranjo ordenado de objetos,
a um padrão;
Função sugere uma tarefa ou atividade esperada de uma forma, pessoa, instituição ou
coisa;
Estrutura implica a inter-relação de todas as partes de um todo, o modo de organização ou
construção.

Ensino da Geografia
Uma das grandes artes da sociedade mundial é o ensinar que para Luft (2005, p.324) é
“transmitir conhecimentos, instruir, educar; Ministrar o ensino de; Adestrar, treinar...”, já Freire
(1996, p.22) contraria esse conceito frisando que “ensinar não é transferir conhecimento, mas criar
as possibilidades para a sua produção ou a sua construção”, o mesmo enfatiza ainda que “Quem
ensina aprende ao ensinar e quem aprende ensina ao aprender” (Freire, 1996, p.23) ficando
evidente que o “Aprender precedeu ensinar ou em outras palavras ensinar se diluía na experiência
realmente fundante de aprender”. (Freire, 1996, p.24). Ainda questionando a arte do ensinar é
preciso ressaltar a proposta de Freinet (apud Elias, 1997, p. 13) que “propõe uma escola prazerosa,
onde o coração, a afetividade e as emoções predominem, onde haja alegria e prazer para descobrir
e aprender”, este autor busca uma inserção do cotidiano do aluno para que ocorra um ensino-
aprendizagem satisfatório, ficando evidente quando o mesmo cita que “A educação não é uma
fórmula de escola, um verniz espalhado sobre o metal fundido. É uma obra que deve gravar-se na
criança por toda a vida, produzir marcos permanente” Freinet (apud Elias, 1997, pp. 45 e 46.),
com mais afinco ainda é citado por Delors (apud GADOTTI, 2002, p.32)
“O professor deve estabelecer uma nova relação com quem está aprendendo, passar do
papel de ‘solista’ ao de ‘acompanhante’, tornando-se não mais alguém que transmite
conhecimentos, mas aquele que ajuda os seus alunos a encontrar, organizar e gerir o saber, guiando,
mas não modelando os espíritos, e demonstrando grande firmeza quanto aos valores fundamentais
que devem orientar toda a vida”
Tais preceitos precisam ser encarados de maneira séria, comprometida e com bastante
tenacidade, em virtude que o conhecimento é a única coisa que não pode ser retirado do ser
humano, pois possui um valor imaterial, além de poder gerar transformações tanto na ordem
pessoal, como coletiva, seja para qualquer ciência, como cita Kaercher (1999, p.39):
“Que fique claro: o conhecimento é uma ferramenta fundamental, tanto para as pessoas
como para as nações terem chances de se desenvolverem mais equitativa e
soberanamente, seja porque conhecimento desenvolve a produção econômica, seja
porque possibilita aos que detêm, mais independência na formulação dos seus juízos”.
Fórum Internacional do Meio Ambiente - A conferência da Terra 1061

Com relação à ciência geográfica não pode ocorrer de maneira diferente, precisando fazer
uso das atitudes de Freinet (apud Elias, 1997, p. 31) quando o mesmo cita que “a escola não deve
ser vista como um meio didático mas como uma prática ligada à vida e ao contexto histórico-social
dos alunos”, ou seja está sempre utilizando o cotidiano do discente, assim como a parte externa da
escola.
O ensino da geografia é muito mais do que as grandes enciclopédias contêm, ultrapassa as
fronteiras da visão, fica bastante concreto tal fato na citação de Kaercher (1999, p.78) onde retrata
que a “Geografia não é só o que está no livro ou que o professor fala. Você a faz diariamente”, ou
seja, a utilização da análise da paisagem, por exemplo, como instrumento de mudança no ensino da
geografia, já que poderá assim envolver o dia-a-dia do alunado, ao invés de ficarem trancafiados
entre quatro paredes (re)verificando conceitos involúveis que de nada irão contribuir para uma
formação crítica.
O autor Monbeig (1940, p. 248) já verificava a civilização como reflexo da paisagem,
considerando que:
“A análise da paisagem apresenta-se como um jogo de quebra-cabeças; mas, enquanto o
jogo se torna logo fastidioso, é apaixonante o estudo da paisagem: apaixonante porque
nos põe em contato com a humilde tarefa quotidiana e milenar das sociedades humanas;
ela mostra o homem lutando sem cessar para aperfeiçoar-se”.

Já Sauer (1998, p.22) considerava que “a tarefa da geografia é concebida como o


conhecimento de um sistema crítico que envolva a fenomenologia da paisagem, de modo a captar
em todo o seu significado e cor a variada cena terrestre”. Ambos os autores defendem o ensino da
ciência geográfica de maneira ativa, buscando novas metodologias, trazendo o cotidiano do discente
para sala de aula, bem como levando o mesmo a áreas do seu conhecimento para que se possa
realizar um confrontamento de informações empíricas e científicas promovendo o desenvolvimento
do ensino-aprendizagem.
De acordo com Carvalho (1996) “A vida cotidiana pode ser um espaço redescoberto e até
modificado através das informações das trocas”, ainda aludindo o autor, já que noutro trecho é por
demais enfático, no qual diz que “o cotidiano pode deixar de ser algo pacato e sem graça para ser
um mundo novo, onde os homens sejam transformados”. É de grande significância compreender
que a percepção geográfica da paisagem se torna fundamental para que haja uma interpretação das
relações da sociedade X natureza, dessa forma possibilitando a dinamização do ensino da ciência
geográfica, além de possibilitar a sustentabilidade.

RESULTADOS E DISCUSSÕES
No transcorrer da pesquisa foi realizada a pesquisa bibliográfica sobre a área em questão,
assim como relativo aos temas mensurados neste artigo, para que assim pudéssemos afrontar o
contexto real, logo ficou fatídico que a geografia tem se apresentado ao longo das últimas décadas
como uma ciência meramente decorativa e fadigante, ponto que foi inquietante, visto como se perde
o enfoque da proposta de ensino da ciência geográfica, em virtude de vislumbrar apenas conceitos e
questionários, que nem ao menos envolvem o cotidiano do discente, com isso sendo desmotivador e
estático. Essa questão foi fruto da própria evolução da geografia, pois ora era ciência que estuda a
terra, ora era ciência que estuda o sócio-econômico, perdendo seu caráter geossistêmico
(SOTCHAVA op cit), ou seja, de inter-relação da sociedade com a natureza, recordando que são
complementares.
Outro mote interessante foi à utilização da análise da paisagem em sala de aula, porquanto
na observação de campo também se fez uso da técnica de entrevista que contribuiu para verificar se
o uso é freqüente por parte dos docentes de tal método, tema que também gerou insatisfação, já que
infelizmente as imagens, mesmo de fotografias, são pouco usufruídas na proposta pedagógica dos
professores, principalmente a aula extraclasse para visualização direta da paisagem, podendo
contemplar tantos os objetos materiais, como os imateriais (SANTOS, op cit), detalhes que só
Fórum Internacional do Meio Ambiente - A conferência da Terra 1062

reforçaram a excitação para modificar as formas de atuação do professor relacionadas ao ensino da


ciência geográfica.
A observação de campo trouxe a possibilidade de identificação da paisagem local, tanto de
maneira contemplativa, como através da obtenção de imagens da região por meio de máquina
fotográfica digital para posteriormente fazer análise da paisagem, além de poder verificar as
potencialidades turísticas da Chapada do Araripe Cearense, sendo auxiliado pelo referencial
bibliográfico, mas também pela cultura popular (entrevista) e a própria averiguação da paisagem.
Este objetivo da inquirição logo percebeu a infinidade de localidades turísticas e de potencialidades
turísticas, como por exemplo, os balneários, a FLONA, os museus, a cultura popular, o Geopark
Araripe, os sítios paleontológicos e arqueológicos, os atrativos geológicos, entre outros, todavia os
mesmo precisam ser adequados para a devida utilização.
Uma vez identificadas as potencialidades turísticas se pode classificar a paisagem,
vislumbrando que a mesma é recheada de aspectos culturais pela influência das cidades inseridas
dentro da Área de Proteção Ambiental do Araripe, no entanto locais como a FLONA, ainda
apresentam a fauna e flora semelhantes a décadas anteriores, diante disso podendo ser utilizadas
para despertar nos discentes a vontade do cuidar para as gerações futuras poderem contemplar e
vivenciar tipos de biomas como o da floresta caducifólia e subcaducifólia.
É perceptível que as potencialidades turísticas da região podem e devem ser utilizadas para
o ensino da ciência geográfica, pois farão com que o alunado insira o seu cotidiano, desta forma
contextualizando a temática, relacionando com sua prática diária e saindo das quatro paredes da sala
de aula. A partir dessa premissa se poderá ter uma geografia fascinante, entusiástica e motivadora,
visto que os conceitos decorativos ficaram para trás, enquanto a prática e a vida dos alunos estarão
sendo usufruídas como conhecimento empírico/informal em favor da formalidade e da
sistematização do conhecimento científico, com isso facilitando o ensino-aprendizagem.

CONSIDERAÇÕES FINAIS
A ciência geográfica media a relação entre a sociedade e a natureza, desta forma podendo
fazer uso fruto destes aspectos naturais, como também dos aspectos sócio-econômicos, todavia para
que se tenha uma geografia dinâmica é necessário sair da sala de aula (quatro paredes) para uma
nova sala de aula que será o cotidiano do aluno, os lugares que o discente freqüenta, as viagens que
o mesmo já realizou ou está para realizar, é contemplar o mundo através da mídia, das fotos, do
virtual e do presencial, este último provavelmente será extremamente motivador, em virtude desse
observador, o aluno, ta sempre em contato direto. .
São tantas as riquezas naturais que a Chapada do Araripe apresenta que é notódica a sua
potencialidade turística. Pois podem ser destacados potenciais arqueológicos, paleontológicos,
espeleológicos, geológicos, vegetacionais, biológicos, além de sua fauna exuberante, assim como
suas fontes de água natural. Está última já bastante utilizada pelos chamados balneários que
podemos destacar o Clube Serrano, o Clube Grangeiro, o Arajara Park e o Balneário do Caldas,
dentre outros existentes na área, todavia será necessário reorganizar e adequar suas instalações
estruturando-se de maneira respeitosa com o meio ambiente, ficando de acordo com os princípios
de sustentabilidade e educação ambiental, além de levar em consideração o planejamento turístico
(Ruschmann, 1997).
A área alvo da pesquisa esta localizada no centro da Região Nordeste, fato que privilegia o
espaço para o turismo regionalizado, bem como podendo gerar roteiros integrados com outros
parques próximos da área, como é o caso do Seridó no estado da Paraíba e o da Serra da Capivara
no Estado do Piauí, assim como o Vale do Catimbau no estado de Pernambuco.
Os aspectos naturais e sócio-econômicos dessa área podem ser utilizados na sala de aula
para corroborarem com a melhoria do ensino da ciência geográfica, gerando proposta pedagógica
com o pretexto de entusiasmar o discente com o processamento da analise da paisagem, podendo
ser tanto através de fotografias, multimídia, mas também de maneira presencial, momento que o
aluno está em contato direto com a natureza, fazendo-o refletir e se sentir parte integrante do meio
Fórum Internacional do Meio Ambiente - A conferência da Terra 1063

ambiente e não apenas o dono. já que o homem não é dono do todo, e sim faz parte do todo, tal qual
é citado na carta do Chefe Seatle “Somos parte da terra e ela faz parte de nós.”

REFERÊNCIAS BIBLIOGRÁFICAS
ASARI, A. Y.; ANTONELO, T. I.; TSUKAMOTO, R. Y. (Orgs). Múltiplas Geografias: Ensino,
pesquisa e reflexão. Londrina: Humanidades, 2004. (V. I).
ANDRADE, Manuel Correia de. O Pensamento geográfico e a realidade brasileira. Boletim
Paulista de Geografia, São Paulo, n. 54, 1977.
ANDRADE, Manuel Correia de. Pierre Monbeig e o pensamento geográfico no Brasil. Boletim
Paulista de Geografia, São Paulo, n.72, 1994.
ANTONELO, T. I.; MOURA, J. D. P.; TSUKAMOTO, R. Y. (Orgs). Múltiplas Geografias: Ensino,
pesquisa e reflexão. Londrina: Humanidades, 2005. (V. II).
BERTRAND, G. Cadernos de Ciências da Terra – Paisagem e Geografia Física Global. USP. São
Paulo – 1971.
DEFFONTAINE, J.P. Analyse du paysage et etude régionale des systèmes de production agricole.
Economie Rurale n. 98, p. 3-13, 1973.
DELORS, Jacques (org.). Educação: um tesouro a descobrir – Relatório para a UNESCO da
Comissão Internacional sobre Educação para o Século XXI. São Paulo: Cortez, 1998, p.154-155.
ELIAS, Maria Del Cioppo. Célestin Freinet: uma pedagogia de atividades e cooperação. Petrópolis,
RJ: Vozes, 1997.
FREIRE, Paulo. Pedagogia da autonomia: saberes necessários à prática educativa. São Paulo: Paz e
Terra, 1997, p. 96.
GERVAISEAU, Pierre Maurice (Responsável técnico). Projeto Araripe de Proteção Ambiental e
Desenvolvimento sustentável da APA Chapada do Araripe e da Bio-Região do Araripe. Ministério
do Meio Ambiente - MMA, Fundação de Desenvolvimento Tecnológico do Cariri – FUNDETEC e
Universidade Regional do Cariri - URCA, 1998.
GOMES, Cristiano C. Princípios sobre Desenvolvimento Sustentável - RAS.
http://www.agrisustentavel.com. Acessado em 19.01.2004.
HAGUETE, Teresa Maria Frota. Metodologias qualitativas na sociologia. 2ª edição, editora Vozes:
Petrópolis, 1987.
KAERCHER, Nestor André. Desafios no ensino de geografia. 3ª edição. Santa Cruz do Sul:
EDUNISC, 1999.
LIMAVERDE, Rosiane. Os registros rupestres da Chapada do Araripe, Ceará, Brasil. 2006.
Mestrado (Mestre) - Curso de Arqueologia, Departamento de Programa de Pós-graduação em
Arqueologia e Preservação do Patrimônio, Universidade Federal de Pernambuco, Recife, Junho de
2006.
MACIEL, Caio. Morfologia da paisagem e imaginário geográfico: uma encruzilhada onto-
gnoseológica. UFPE.
METZGER, Jean Paul. O que é ecologia de paisagens? Biota Neotropica. Vol. 1, nº 1 e 2, 2001 –
BN00101122001. ISSN 1676-0603.
PARRA FILHO, Domingos, SANTOS, João Almeida. Apresentações de trabalhos científicos:
monografias, TCC, teses e dissertações. 3ª edição. São Paulo: Editora Futura, 2000.
PENTEADO, Heloísa Dupas. Metodologia de ensino de história e geografia. São Paulo: Cortez,
1991.
RAMOS, Elizabeth Christmann. Educação ambiental: evolução histórica, implicações teóricas e
sociais. Uma avaliação crítica. Curitiba, 1996 (dissertação de mestrado).
Santos, M. A natureza do espaço – Técnica e tempo. Razão e emoção. São Paulo: Hucitec, 1996,
308p.
RODRIGUES, Cleide. A teoria geossistêmica e sua contribuição aos estudos geográficos e
ambientais. Revista do Departamento de Geografia, 14 (2001) 69-77.
SEABRA, Giovanni. Turismo Sertanejo. João Pessoa: Editora Universitária/UFPB, 2007.
Fórum Internacional do Meio Ambiente - A conferência da Terra 1064

SEABRA, Giovanni (Organizador). Turismo de Base Local: identidade cultural e desenvolvimento


regional. João Pessoa: Editora Universitária/UFPB, 2007. 358p.
SEABRA, Giovanni de Farias. Paisagem, turismo e gestão de recursos naturais no meio técnico -
científico globalizado. João Pessoa: UFPB, 2004.
SELVA, Vanice S. F. O Sertão do semi-árido nordestino: um olhar sobre o consumo da paisagem
pelo turismo. Anais Sertões: espaço, tempo e movimentos. Recife: UFPE, 2006.
VIEIRA, Paulo Freire et al. Desenvolvimento e Meio Ambiente do Brasil: a contribuição de Ignacy
Sachs. Editora PALLOTT/APED: Porto Alegre, 1998.
http://www.pcts.org.br/pubpcts/cgi/cgilua.exe/sys/start.htm?sid=18&mletra=T, acessado em
09.03.2007 às 23:35 h.
TRIGO, Mariana. “Juazeiro do Norte, um templo de devoção”. http://www.feriasbrasil.com.br
acessado em 10.03.2007, às 15h30.
Fórum Internacional do Meio Ambiente - A conferência da Terra 1065

TURISMO, MEIO AMBIENTE E LAZER: RELAÇÕES E POSSIBILIDADES POSSÍVEIS


EM UM PARQUE NO CORAÇÃO DE UMA METRÓPOLE.

Mdo. Gustavo L. Santos


FAGA. Atheliê Lúdico. gugapessoas@hotmail.com
Esp. Sérgio H. V. Xavier
Maurício Nassau. Atheliê Lúdico. shvx79@hotmail.com

RESUMO
Este trabalho tem por objetivo mostrar que é possível equilibrar lazer, comunidade local,
meio ambiente, progresso e o turismo, garantindo assim melhorias na qualidade de vida. Localizado
no Bairro de Boa Viagem, e com uma área em torno de 419ha, está um dos mais belos e maiores
ecossistemas urbanos ainda existente no país o qual é desconhecido pelo próprio morador do
Recife. Correndo o risco de ser parcialmente destruído para a construção de uma avenida com a
finalidade de desafogar o trânsito, o Parque do Recife “clama” por socorro a população e ao poder
público, para não ser destruído, podendo ser transformado em uma opção de lazer e de turismo
Ecológico, gratuita ou a baixo custo.
Palavras-chaves: Meio Ambiente, turismo e lazer.

ABSTRACT
This paper aims to show that it is possible to balance leisure, local community, the
environment, progress and tourism, thereby ensuring improvements in quality of life. Located in the
district of Boa Viagem, in an area around 419ha, is one of the most beautiful and largest city
ecosystems still existing in the country which is unknown by itself inhabitant of Recife. At the risk
of being partially destroyed for the construction of an avenue for the purpose of desafogar traffic,
the Park of Recife "calls" for the people and the rescue public power, not to be destroyed and can be
transformed into a choice of leisure and Ecological tourism, free or at low cost.
Keywords: Environment, Tourism and Leisure.

A CIDADE COMO ESPAÇO DE LAZER


De acordo com MARCELLINNO (2000; pág 25), “o espaço para o lazer é o espaço
urbano”. No século XXI, o ócio será essencial para as sociedades pós-industriais. As barreiras entre
trabalho e lazer diminuirão cada vez mais, tempos sociais surgirão em que a prioridade das pessoas
será seu bem estar, sua família e seu divertimento e não mais o trabalho, assim sendo o lazer
assumirá posição de maior destaque.
O mercado criado pela globalização fez surgir um novo setor na economia, que é definido,
por alguns estudiosos da área, como quarto setor. A busca de novos negócios para investimentos, na
criação de novas profissões e espaços alternativos, trouxe para a população novas opções de lazer,
tendo desde as gratuitas até as mais sofisticadas.
Como o tempo gasto no trânsito é cada dia maior, devido ao aumento das distâncias e o
aumento da frota de carros, logo causando os longos e demorados engarrafamentos uma alternativa
para o lazer seria contemplar os espaços urbanos. WILHEIM nos diz que: “percorrer a cidade pode
ser enfadonho e desgastante ou, pelo contrário, revelar-se uma experiência altamente informativa e
agradável para os sentidos”, daí a importância de se preservar também os parques e praças públicas.
Segundo CASTROGIOVANNI (2000, pág 02):
“As cidades, ao mesmo tempo em que sintetizam as tensões sociais existentes, são espaços
privilegiados de atrações, serviços, simbolismos e produções culturais. O papel que assumem na
etapa pós-industrial e da globalização econômica tem possibilitado incrementar estruturas,
equipamentos, serviços e revitalizar áreas adormecidas, mas com grande expressividade na
formação histórica do lugar”.
É nos centros urbanos que a população encontra os chamados equipamentos de lazer mais
variados e de fáceis acessos, sejam eles específicos ou não. XAVIER (2006) conceitua os
equipamentos de lazer como:
Fórum Internacional do Meio Ambiente - A conferência da Terra 1066

“Os equipamentos de lazer, são espaços onde a população realiza suas práticas de lazer,
sendo eles planejados para o lazer ou não...”

Para nosso estudo vamos focalizar os Macroequipamentos específicos do lazer, que


segundo CAMARGO (1979)

MACROEQUIPAMENTO POLIVALENTES
Estes equipamentos são reservados para atender uma grande massa, tentando atingir vários
interesses sócio-culturais com programações diferenciadas, eles ficam localizados em pontos
estratégicos de cada região ou estado em alguns casos eles também podem ficar na periferia da
cidade graças a necessidade de uma grande área ou extensão de terreno, como por exemplo: Parque
de exposições estaduais, praias, grandes parques aquáticos e temáticos como “Veneza Wather
Park”, “Beto Carreiro Word” e etc.
O seguinte estudo procurou especificar seus olhares dentro do parque e suas possibilidades,
ainda viajando nos conceitos segundo SÁ CARNEIRO (2000) o parque é;
“É um espaço com função predominante de recreação, ocupando a malha urbana com uma
área igual ou superior a quadra típica urbana, em geral, apresentam componentes da paisagem
natural – vegetação, topografia, elementos aquáticos alem das edificações recreativas, culturais e/ou
administrativa.”

EDUCAÇÃO AMBIENTAL
A Educação Ambiental (doravante EA) surge dentro de um contexto que se originou da
utilização de um modo inadequado dos bens coletivos da Terra em diferentes escalas (espaço-
tempo). Diversos conceitos foram elaborados e apresentados sobre o que vem ser a EA. Apesar do
vários conceitos sobre a mesma, decidimos conceituá-la sobre, apenas, três pontos de vista de
alguns teóricos do assunto, que GUEDES, 2006, nos mostra.
O primeiro conceito EA é delimitado à formação dos cidadãos em torno do ambiente
biofísico e os seus respectivos problemas: pecam por não considerarem de fundamental importância
as relações do homem com o meio ambiente, a definição nos é dada por Stapp (in Guedes, 2006)
“O processo que deve objetivar a formação de cidadãos, cujos conhecimentos acerca do
ambiente biofísico e seus problemas associados possam alertá-los habilitá-los a resolver seus
problemas”.

Preocupam-se em mostrar que a função da EA é apenas oferecer condições favoráveis a um


ambiente, para que possa desenvolver os seus recursos e as suas habilidades, a fim de poderem se
confrontar às questões promovidas pelo próprio homem, no tocante ao desrespeito com o Meio
ambiente. Uma definição mais recente e atual de Meyer, Regota e Sorrentino (Op. Cit.) nos dá um
novo sentido de EA:
“...a EA é uma reivindicação legítima e um processo contínuo de aprendizagem de
conhecimentos para o exercício da cidadania”.
“Para a EA lidar com a realidade, pode e deve ser o agente otimizador de novos processos
educativos que conduzam as pessoas por caminhos onde se vislumbre a possibilidade de mudança e
melhoria do seu ambiente total”.

Esse novo conceito nos mostra uma visão mais ampla da EA, que não apenas o homem
preocupado com o seu bem estar dentro do ecossistema, mas a sua participação, e dever de
preservação, desse ecossistema. Como um processo de sociabilização e reivindicação de seus
direitos através da EA.
Com a Eco-92 novos aspectos foram acrescentados a EA, deixando, a partir daí, a natureza
de ser uma fornecedora de recursos naturais para os seres e passando a ter seu caráter ideológico.
Não mais sendo uma forma de exercer a cidadania, porém mais do que isso um ato político. E por
fim tendo que ser vista e compreendida num ponto de vista holístico e sistêmico.
Fórum Internacional do Meio Ambiente - A conferência da Terra 1067

“A Educação ambiental não é neutra, mas ideológica. É um ato político”.


“A EA deve envolver uma perspectiva holística, enfocando a relação entre o ser humano, a
natureza e o universo de forma interdisciplinar”.
“A EA deve tratar das questões globais críticas, suas causas e inter-relações em uma
perspectiva sistêmica, em seu contexto social e histórico. Aspectos primordiais relacionados como
desenvolvimento e o meio ambiente, tas como população, saúde, direitos humanos, democracia,
fome degradação da fauna e da flora, devem se abordados dessa maneira”.
(Cassino, in op. Cit.).

MEIO AMBIENTE
Importância dos Manguezais
Pelo menos 2/3 das espécies de peixes explorados economicamente dependem desse
ecossistema para a sua existência. O manguezal é um dos ecossistemas mais importantes do planeta.
A grande quantidade de detrito vegetal, produzida por esse ecossistema constitui-se de
alimento para à fauna estuarina e marinha, uma vez que, durante o processo de decomposição são
colonizados por microorganismos. Assim, formam a base para diversas cadeias alimentares.
Além da produção de matéria orgânica, a estrutura das raízes de mangue, formando
emaranhados, oferece proteção para espécies da fauna marinha. Estudos mostram que há uma
relação entre a produtividade da pesca nas regiões litorâneas e a conservação desses ecossistemas.
Produzem ainda vários serviços indiretos, que passam despercebidos. Os manguezais
protegem a linha de costa e as margens dos estuários contra erosão. São importantes retentores de
metais pesados e grande seqüestrador de carbono.
Impactos Ambientais
Aterro corte, expansão urbana, marinas, portos, estradas, agricultura, carcinocultura,
industriais, derramamento de petróleo, lançamento de esgoto, lixo, poluentes industriais e
agrotóxicos, são as principais formas encontradas pelo homem para destruir um berçário de vida; o
manguezal. A destruição desses ecossistemas gera grandes prejuízos, seja direta ou indiretamente,
visto que são perdidas importantes funções ecológicas.
Outro problema grave observado é a pesca predatória, onde é muito comum a captura de
crustáceos, fora da época ideal. E principalmente a pesca com petrechos inadequados, bombas e
demais artifícios usados pelos que não respeitam a verdadeira arte da pesca. É preciso conhecer e
respeitar os ciclos naturais dos manguezais para que o uso sustentado de seus recursos sejam
estabelecidos.
Leis que protegem os manguezais
A Constituição do Brasil, em 1988, no Capítulo VI (do Meio Ambiente), Art. 225, diz que:
“Todos têm direito ao meio ambiente ecologicamente equilibrado, bem de uso comum do
povo essencial à sadia qualidade de vida, impondo-se ao Poder Público e à coletividade, o dever de
defendê-lo e de preservá-lo para as presentes e futuras gerações”.

O manguezal dispõe de diplomas legais para sua proteção, tanto a nível federal como,
estadual e ou municipal. Os manguezais são Áreas protegidas ou de Preservação Permanente ou
Reservas Ecológicas, conforme o Código Florestal, Lei n. 4.771, Art. 2, de 15/09/1965, Art. 18 da
Lei n 6.938, de 31/08/1981, Decreto n 89336, de 31 de abril de 1984 e resolução n 4 do CONAMA,
de 18/09/1985.

TURISMO E MEIO AMBIENTE


ARRUDA, FARIAS E HOLANDA (2003) nos apresentam a compilação de alguns autores
que Beni fez para aprofundar a compreensão do conceito de sustentabilidade, a partir de quatro
vertentes: turismo sustentável, turismo ecologicamente sustentável, desenvolvimento econômico e
ecologicamente sustentável e desenvolvimento sustentável do turismo.
A primeira proposta tem seu objetivo a viabilidade da atividade turística, preocupando com
a sustentabilidade econômica. Sua atuação é para o melhoramento, fortalecimento e solidificação da
Fórum Internacional do Meio Ambiente - A conferência da Terra 1068

infra-estrutura e serviços turísticos a fim de ter um diferencial no produto turístico. Segundo esse
raciocino são analisados todos os investimento feitos com esse intuito para que o produto possa
competir em todos os âmbitos do mercado turístico com preço justo e atraente.
A abordagem do turismo ecologicamente sustentável tem seu foco principal a preservação
e manutenção dos ecossistemas naturais. Defendem a ecologia por uma causa política e
sociocultural. Usam o turismo não para denegrir o meio ambiente e, sim, para ajudá-lo a
desenvolver.
A vertente do desenvolvimento econômico ecologicamente sustentável é a junção das duas
primeiras linhas, o autor afirma que tem haver os investimentos para o desenvolvimento do turismo,
porém ele tem que estar atrelado a preservação do meio ambiente, que também tem seu papel social
e econômico dentro da sociedade. A política de turismo é tão importante quanto às outras
econômicas, sociais, ambientais e todas têm que andar uma ao lado da outra sem nenhuma querer se
sobre por. O autor entende “que essa abordagem é a mais próxima do pensamento contemporâneo
do turismo” (op. Cit., pág 148).
A para terminar a linha do desenvolvimento sustentável do turismo defende que não basta
proteger o meio ambiente com uma visão imediatista, é necessário pensar a longo prazo, para as
outras gerações e essa proteção tem que ir além da, simples, proteção ambiental, e chegar aos
âmbitos “da qualidade de vida nas comunidades e, em última instância, o planeta, num esforça a
longo prazo. (op. Cit., pág 148).

DESENVOLVIMENTO DESORDENADO
Crescimento da Cidade do Recife
O crescimento desordenado da população na cidade do Recife exige maior atenção para
questões como planejamento sustentável municipal. Prevê-se que em 2020 a população mundial
ultrapasse a marca de 8 bilhões de habitantes, sendo 65% desse total vivendo em áreas litorâneas. É
o que vem acontecendo no Recife, em 1991 a população era de 1.298.229, em 1996 passou para
1.346.045 e em 2000 e agora em 2006 chegou-se aos 1.515.052 habitantes (Fonte: IBGE, Base de
Informações Municipais).
A cidade em rápido crescimento, caso mal administrada, deparar-se-á com problemas
ambientais gravíssimos. As cidades vêm se deteriorando e se “enfeando” com os avanços
tecnológicos, pois as populações crescem bem mais que a infra-estrutura necessária para comportá-
las, as inovações ou renovações vem tardias, tendo, sempre, que sacrificar algo já existente em
nome desse avanço.
Os fatores humanos são elementos fundamentais na formulação de políticas abrangentes
para o desenvolvimento sustentável. Essas políticas devem atentar para as tendências e fatores
demográficos, ao planejamento de tecnologias adequadas e ao desenvolvimento. Há também a
necessidade de se pensar em estratégias para suavizar o impacto das atividades humanas sobre o
meio ambiente e vice-versa. É preciso também identificar áreas para ação e desenvolvimento dessas
estratégias e analisar uma perspectiva mais ampla de meio ambiente e desenvolvimento baseada
num estudo interdisciplinar e unir a teoria à prática.
Percebendo assim que fatores demográficos exercem uma influência crítica sobre os
padrões de consumo, produção, estilo de vida e sustentabilidade em longo prazo.

METODOLOGIA
Para a realização desta pesquisa foi necessário realizar uma pesquisa de campo de caráter
quantitativo e descritivo tempo como principais instrumentos um questionário aplicado entre os
moradores dos bairros com os quais o Parque faz fronteira, guias de turismo, agentes de viagens e
professores de geografia, ciências, biologia, história e estudos sociais, com perguntas fechadas e
semi/abertas que totalizarão 200 questionários válidos.
Par finalizar foram feitas algumas entrevistas semi - estruturadas com: O presidente do
grupo de proteção ao Parque dos Manguezais, o engenheiro José de Britto, com os profissionais que
gerenciam o os espaços livres na cidade.
Fórum Internacional do Meio Ambiente - A conferência da Terra 1069

O PARQUE DO RECIFE
O parque faz limites como os Bairros da Imbiribeira, Boa Viagem, Pina, Cabanga e
Afogados, locais de intenso movimento. Apesar de toda sua grande extensão o parque está correndo
o risco de desaparecer, até 1994 a área se encontrava sobre proteção da Marinha que mantinha em
funcionamento a sua estação de rádio, construída durante a II Guerra Mundial. atualmente,
desativado, e em poder da união, toda essa área requer a sua utilização racional em favor da
população antes que desapareça.
Descobrimos este imenso tesouro ecológico casualmente, enquanto trabalhávamos e após
leitura e tabulação chegamos até alguns números: Apenas 12% já ouviram falar do Parque dos
Manguezais e só 6%, realmente, conhecem e já foram visitá-lo. Em seguida conversamos com o
líder do grupo de proteção ao Parque dos Manguezais, o engenheiro José de Britto. Que nos
explicou a diferença do Projeto Parque dos Manguezais para o do Parque do Recife, esta seria que
no Projeto Parque do Recife entraria as Lagoas do Encanta Moça e do Pina, os rios Jordão e Pina, o
Manguezal da Beira do Rio e bacias adjacentes mais os 35ha de vegetação rasteira, pois a
preocupação não seria, apenas, preservar o Mangue, mas todo o Ecossistema. O Parque passaria de
212ha para 419ha, tornando-se bem superior ao Ibirapuera e seis vezes maior que o Parque da
Jaqueira, o maior Parque na cidade.
Apesar de está hoje bastante degradado, principalmente, pelo despejo da antiga Compesa
de toneladas de esgoto inatura no Rio Jordão, inúmeros viveiros de camarão com licença ambiental
do CPRH e também pela invasão de favelas, aterros clandestinos e construções de prédios no
entorno do mangue.
O Parque dos Manguezais tem grande importância para toda cidade do Recife, além de
abrigar várias espécies animais é de grande potencial sócio-econômico-ambiental, irá oferecer aos
visitantes a oportunidade de desfrutar de uma infra-estrutura natural no meio urbano, dando-lhes
chance de fugir do caos de cidade grande sem precisar fazer qualquer viagem, e ainda impedindo
que toda essa área venha a ser extinta com a passagem da “Linha Verde” ou invadida pela
especulação imobiliária.

POSSIBILIDADES PARA O PARQUE


O projeto prevê a preservação e recuperação do Mangue e da repovoação das áreas das
lagoas e rios para que os pescadores, da comunidade local, possam voltar a tirar seu sustento.
Na área de lazer, criar-se-ia no espaço da vegetação rasteira, campo de futebol e de vôlei,
área de pic-nic, quiosques de lanchonete e artesanatos, pista de Cooper, bicicleta, patins e half-
pipe132, tudo respeitando o meio ambiente para haver o mínimo de degradação possível.
Ter-se-ia ainda bases de apoios para as universidades, empresa ou organizações com fins
ecoturísticos e biológicos que desejassem fazer pesquisas de cunho cientifico. E para
desenvolvimento do turismo pedagógico. As construções já existentes tornar-se-iam uma biblioteca,
salão para palestra sobre meio ambiente, educação ecoturística, e de outros temas, com intuito de
conscientizar a população, tendo ainda um museu da marinha, posto policial e do Ibama.
Nos rios e lagoas, far-se-ia um mini-pólo náutico com: Pedalinhos, Caíque, Barcos a Remo
e Catamarã, os quais poder-se-ia fazer passeios por todos os limites do parque. Construindo-se
ainda trilhas ecológicas, de madeiras, suspensas por dentro dos manguezais, proporcionando aos
visitantes maior contato com a natureza, em alguns pontos seriam construídos também mirantes
e/ou pontos de observação.
A fim de evitar o impacto ambiental, não seria permitido o trânsito de veículos, só
bicicletas, skates, patins, podendo vir a contar com carrinhos elétricos, ou tendo, ainda, a opção de
entrar pelo Rio Jordão, não sendo permitido a navegação de embarcações de grandes portes, visto
que a Maré mínima é de 1m e a máxima de 9m.

5
Local específico para manobras de skate em forma de U.
Fórum Internacional do Meio Ambiente - A conferência da Terra 1070

Com relação a construções, o Código Florestal do Recife proíbe a construção de


edificações a menos de 50 metros da lagoa e entre 51m a 300m de distância edificações de no
máximo 2º andar.
Feito o Relatório de Impactos Ambientais (EIA & RIMA), a partir da implantação do
Parque dos Manguezais, constatou-se que o projeto é viável, causando dano quase 0 (zero) ao Meio
Ambiente.

AS VIABILIDADES TURÍSTICAS DESTE EQUIPAMENTO


Turismo Educacional
Atualmente a escola é vista como centro de educação sistemática e cabe a ela oferecer aos
alunos situações que lhes permitam desenvolver suas potencialidades de acordo com a fase
evolutiva. A educação é vista como fator de mudanças, renovação e progresso, sendo ela um
processo de vida e não uma preparação para a vida futura.
O Turismo Escolar ganha força neste final de século, quando há uma série de reflexões
sobre o papel da escola, sua função social, o significado das experiências escolares e extra-classe. O
Turismo Pedagógico apresenta-se como uma concepção de posturas pedagógicas e não meramente
como uma técnica de ensino mais atrativa para os alunos. É um trabalho capaz de fazer a escola ir
além dos seus muros e criar pontos entre os conteúdos estudados e o meio físico e social
proporcionando melhor compreensão.
Tem como função tornar a aprendizagem ativa, interessante, significativa, real e atractiva
para o aluno, conseguindo isso à medida que o aluno passa a vivenciar “in loco” o que foi visto em
sala de aula. Dentro dessas perspectivas, os conteúdos disciplinares, antes teóricos e abstratos
deixam de ser um fim em si mesmo e passam a ser meios para ampliar a formação dos alunos e sua
interação com a realidade, de forma crítica e dinâmica.
Nos últimos anos houve uma vertiginosa aceleração no que se refere a turismo com
estudantes, este deixou de ser turismo com e passou a ser para o estudante.
Turismo de Natureza
Dentre as várias segmentações do turismo, existe uma (de percepção recente, porém há
muito já praticado, mesmo que de forma indiferente ao turismo) que merece destaque devido a sua
crescente demanda nos últimos tempos, é o “ecoturismo”.
Contudo, o ecoturismo abrange muito mais do que o simples desejo de estar em contato
com o ecossistema, existe a grande possibilidade de um desenvolvimento sustentável numa
localidade que desenvolve este segmento do setor turístico, embora alguns não tenham a noção dos
benefícios que o ecoturismo acarreta.
Daí percebe-se a capacidade do ecoturismo em desenvolver uma atividade sustentável no
local de seu processamento, porém seria uma hipótese totalmente utópica, pensar que o ecoturismo,
de forma alguma, traga danos ao meio ambiente. Quando realizado de maneira desproporcional,
sem o conhecimento da sociedade sobre problemas relativos ao ecossistema, ou mesmo quando
existe algum setor que deseja tirar proveitos econômicos induzindo a um desenvolvimento
desregrado da atividade.

CONCLUSÃO
O objetivo primordial é alerta a comunidade para que não deixem um ecossistema como
esse ser destruído em troca do progresso. A área é de uma riqueza, única, que não só os Recifenses,
mas todos os Pernambucanos tem: uma floresta ambiental dentro de um centro urbano.
È necessário torná-lo organizado e capaz de receber visitação pública, seja pessoas
querendo somente se divertirem descansarem, passearem, ter contato com a natureza ou aprender a
partir dele.
Para que assim esse ecossistema fique cada vez mais conhecido e ao mesmo tempo consiga
pessoas dispostas a mantê-lo preservado para as gerações seguintes, seja poder público ou privado.
Destruir um ecossistema estuarino, desse porte significa destruir um nascedouro de vida
aquático e oportunidade de sustento para muitas famílias, independente se aproveitando o próprio
Fórum Internacional do Meio Ambiente - A conferência da Terra 1071

meio ambiente para seu alento ou através das novas oportunidades de negócios e empregos que
possam aparecer.
Além de que asseguramos a importância cada vez maior do lazer para o homem
globalizado, sabendo ainda que o mesmo dispõe cada dia de menos tempo e dinheiro para usufruir
deste lazer, não podemos permitir que uma grande e inovadora opção igual ao Parque do Recife seja
trocado por mais um produto do mundo alienante em que vivemos.

REFERENCIAS BIBLIOGRAFICAS
ARRUDA, Danielle Miranda de Oliveira, FARIAS, Mônica Maria Bezerra, HOLANDA, Sandra
Maria Monteiro. Gestão Mercadológica dos equipamentos turísticos em área de Proteção
Ambiental: o caso de Jericoacoara (CE). In. REJOWSKI, Mirian e COSTA, Benny Kramer (Orgs.).
Turismo contemporâneo. Desenvolvimento, estratégia e Gestão. São Paulo, Ed. Atlas, 2003.
BRITTO, José (2001). O Parque do Recife e as Ecovias Elevadas. Clube de Engenharia em Revista
(Ano 01, nº02), 08 - 09.
CAMARGO, Luiz Otávio de Lima. O que é Lazer. Campinas –SP, Ed. Brasiliense S.A., 1986.
CASTROGIOVANNI, Antonio Carlos (Org.). Turismo Urbano. Porto Alegre; Ed. Contexto, 2000.
GUEDES, José Carlos de Souza. Educação Ambiental na escolas de ensino fundamental: Estudo de
caso. Garanhuns, PE. Ed do Autor, 2006.
MARCELLINNO, Nelson Carvalho. Estudos do lazer. Uma Introdução. Campinas. Ed. Autores
Associados, 2000.
MOTA, Hélio (Org.). Pernambuco. Caminhos da Liberdade. Editora Tempo Real - 1998 - Brasília.
PELLEGRINI Filho, Amerino - Ecologia, cultura e turismo. Campinas -SP, Ed. Papirus,
1993.
PORTUGUEZ, Anderson Pereira. Consumo e Espaço. Turismo Lazer e outros temas. São Paulo,
Ed. Rocca, 2001.
SÁ CARNEIRO, Ana Rita; MESQUITA, Liana de Barros. Espaços livres do Recife. Recife-PE, Ed.
UFPE, 2000.
WERNECK, Christianne. Lazer, Trabalho e Educação. Belo Horizonte; Ed. UFMG, 2000.
Fórum Internacional do Meio Ambiente - A conferência da Terra 1072

UMA CONTRIBUIÇÃO AO ESTUDO DOS IMPACTOS SÓCIO-AMBIENTAIS DA


ATIVIDADE TURÍSTICA EM COMUNIDADES RECEPTORAS.

Aline Gisele Azevedo Lima


Faculdade Natalense de Ensino e Cultura –FANEC. Av. Prudente de Morais, 4890. Lagoa Nova. Natal/RN. Tel.: 84
3234-3637. aline_pep@yahoo.com.br
Sérgio Marques Júnior
Universidade Federal do Rio Grande do Norte. Departamento de Agropecuária – CT/UFRN. Av. Senador Salgado
Filho, S/N. Bairro: Lagoa Nova. Natal/ RN. Tel.: 84 3215-3708. sergio@ct.ufrn.br

RESUMO
O presente trabalho teve como objetivo investigar os impactos sócio-ambientais advindos
da atividade turística a partir da visão de uma comunidade receptora. Para tanto, foram enfocados
aspectos ambientais, sociais, econômicos, além de apresentar o desenvolvimento sustentável no
turismo, conceitos de indicadores e modelos de métodos de avaliação sócio-ambiental como forma
de incrementar a avaliação proposta neste estudo. Foi realizada uma pesquisa amostral do tipo
Survey com 100 habitantes da Vila de Ponta Negra, uma comunidade inserida em uma das
principais regiões da atividade turística da cidade do Natal, capital do Estado do Rio Grande do
Norte, e que consequentemente vem sofrendo com os impactos do crescimento desta atividade. O
instrumento de pesquisa utilizado foi o formulário, estruturado com perguntas abertas e fechadas. O
método de coleta de dados foi a entrevista pessoal. Os resultados mostram que a população estudada
percebe que a educação, o emprego, a distribuição de renda e o lazer, possuem uma relação direta
com os benefícios sociais advindos do turismo. Entretanto, não percebem uma relação no que se
refere à saúde e a qualidade de vida. Já aspectos como impactos ao meio ambiente, prostituição,
criminalidade e violência, são percebidos, na visão da comunidade, como problemas, mas que não
influenciam diretamente na geração de benefícios sociais para a comunidade.
Palavras-Chave: Turismo, Impactos sócio-ambientais, Comunidades Receptoras.

ABSTRACT
The present work had as objective to investigate the social environmental impacts of the
tourism activity from the vision of a welcoming community. Therefore, social environmental and
economic aspects were focused, besides presenting the sustainable development in the tourism,
concepts of indicators and models of social environmental evaluation methods as a way to increase
the evaluation proposed in this study. A sample research type Survey with 100 inhabitants from
Ponta Negra village, a community inserted in one of the main regions of the tourism activity in the
city of Natal, capital of Rio Grande do Norte State, was carried out and consequently found out that
the village has been suffering with the impacts of the growth of this activity. The used instrument of
research was the form structured with open and closed questions. The method of data collection was
the personal interview. The results show that the studied population notices that the education, the
employment, the distribution of income and the leisure have a direct relation with the social benefits
from the tourism. However, they do not notice a direct relation with the health and the quality of
life. While aspects as impacts on the environment, prostitution, crime and violence are noticed as
problems in the vision of the community but that they do not directly influence the generation of
social benefits for the community.
Keywords: Tourism, Social environmental impacts, receiving communities.

INTRODUÇÃO
O turismo é considerado uma das maiores atividades econômicas da atualidade com um
faturamento mundial estimado em US$ 681,5 bilhões, sendo no Brasil em torno de 4,3 bilhões, que
em 2006 empregava um trabalhador em doze, em termos mundiais (BRASIL, 2006). Trata-se de um
fenômeno que deveria preocupar-se com o desenvolvimento sustentado, porque depende
intrinsecamente dos recursos da natureza e da herança cultural da sociedade. O turismo vende esses
recursos como parte de seu produto empírico, mas também precisa compartilhar dos mesmos
Fórum Internacional do Meio Ambiente - A conferência da Terra 1073

recursos com outros usuários, inclusive a população local, que muitas vezes tem no turismo a
principal fonte para o seu desenvolvimento. Conseqüentemente, é do próprio interesse do turismo
buscar ativamente o desenvolvimento sustentado e cooperar com outros grupos, setores e governos
para garantir a integridade de seus recursos.
Mas o que se tem observado é um crescimento desordenado gerador de impactos, positivos
e negativos, sendo esses últimos, quase sempre, em maior proporção, principalmente em relação ao
meio ambiente e a população local, esquecendo-se que estão na natureza e nas características
específicas da localidade os atrativos essenciais dessa atividade.
Por isso, a presente pesquisa tem como objetivo verificar os impactos sócio-ambientais
advindos da atividade turística a partir da visão de uma comunidade receptora.
E para que se possa entender o atual estágio da atividade turística é necessário fazer uma
retrospectiva histórica no que diz respeito ao processo de urbanização, ao sistema industrial e pós-
industrial da sociedade contemporânea, pois esses acontecimentos implicaram no aparecimento e
desenvolvimento do lazer, como necessidade a ser satisfeita, e consequentemente do turismo.
Atualmente, com a globalização essa busca desenfreada pelo preenchimento do tempo livre
com o lazer se torna mais visível. O lazer, como necessidade numa sociedade que precisa estar em
equilíbrio e gerar novas fontes econômicas, ganha um ritmo acelerado. O turismo é uma dessas
formas de lazer, procurando organizar e planejar o tempo livre da sociedade atual. Ele passa a exigir
novos modelos de espaços que correspondem aos novos tipos de relações no nível humano, além de
contribuir para a circulação de capital, melhoria econômica de uma região e o consumo dos lugares
e do meio ambiente.
O turismo, segundo Bissoli (1992), é entendido como o conjunto de recursos capazes de
satisfazer as aspirações mais diversas, que incitam o indivíduo a deslocar-se do seu universo
cotidiano, e assim caracterizar-se por ser uma atividade essencialmente ligada à utilização do tempo
livre.
Assim, a atividade turística surge como resposta a uma necessidade de descompressão,
resultante da própria dinâmica do sistema da sociedade industrial e pós-industrial e do processo de
urbanização, que ao mesmo tempo em que cria e aumenta o tempo livre e a necessidade do lazer
não consegue atender à população, deixando para o turismo o papel de cumprir tal designação.

RELEVÂNCIA
A atividade turística é conhecida pela sua capacidade econômica de geração de emprego e
renda. Apresenta-se como uma das maiores atividades econômicas da atualidade, gerando divisas na
casa dos bilhões mundialmente. Gera lucros, tanto para os “produtores”, como para a região à qual
está inserida, não só pela geração de empregos, como também pela geração de dividendos, uma vez
que movimenta a economia melhorando o desempenho da balança comercial, não só da localidade e
do estado, como do próprio país. No entanto, pouco se tem pesquisado a respeito dos impactos
positivos e negativos, sociais e ambientais para a população local como um todo. O que se observa
são estudos concentrados na medição de impactos e benefícios mais tangíveis, como os
econômicos. Valorizando-se excessivamente os impactos positivos, deixando de lado as
conseqüências indesejáveis, restringindo a amplitude e a exatidão dos estudos voltando-se para as
análises de situações específicas de forma isolada.
É com a pretensão de melhor compreender os impactos causados pelo crescimento do
turismo em uma determinada comunidade, que, neste estudo, considerou-se alguns indicadores
sócio-ambientais, representando recortes da realidade vivenciada, por ser instrumentos que auxiliam
na representação dessa realidade, possibilitando a construção do panorama das condições dos
espaços observados no qual uma avaliação deve se basear. “Considerando que o turismo é uma
atividade dinâmica e que os impactos e suas conseqüências mudam constantemente – como
conseqüência das modificações dos objetivos, tanto dos turistas como das comunidades receptoras
das flutuações nos processos relacionados com a economia, o meio ambiente e com as mudanças
tecnológicas – o seu monitoramento periódico torna-se uma necessidade imprescindível.”
(RUSCHMANN, 2001, p.36)
Fórum Internacional do Meio Ambiente - A conferência da Terra 1074

Nesse sentindo, entende-se a relevância da presente pesquisa em contribuir na apresentação


de algumas situações inerentes à atividade, quanto aos impactos positivos criados pelo setor, e
principalmente pelos impactos negativos sociais e ambientais, trazendo subsídios às autoridades,
aos órgãos interessados e a população local em geral para a tomada de decisão, quanto ao apoio e
melhor compreensão desse segmento.
Do ponto de vista acadêmico, visa-se contribuir com a geração de informações e dados que
auxiliem os estudos de avaliação sócio-ambiental, assim como na identificação de fatores
direcionadores de uma comunidade receptora frente à atividade turística, contribuindo na
construção do conhecimento para tomadas de decisão mais apropriadas à realidade do setor.

TURISMO, IMPACTOS SÓCIO-AMBIENTAIS E ASPECTOS DA SUSTENTABILIDADE.


Para entender a atividade turística se faz necessário reforçar a importância do meio
ambiente, pois grande parte dessa atividade tem como base a organização, o planejamento e o
consumo desse meio, onde as experiências concebidas pelo turismo se desenrolam.
O termo meio ambiente provém do latim medium (meio), que se refere ao lugar onde
qualquer ser vivo pode ser encontrado e ambire (ambiente), que se relaciona a tudo que envolve
esse lugar. Portanto, o ambiente reforça o conceito de meio, repassando a idéia de entorno ou da
realidade física que envolve todos os seres vivos.
Santos et al (1994), verifica que o meio ambiente é o que se pode chamar de Sistemas da
Natureza sucessivos, que inclui os objetivos, as ações, as crenças, os desejos, a realidade
esmagadora e as perspectivas, onde esta é continente e conteúdo do Homem. E ainda, segundo
Ferreti (2002), o termo meio ambiente envolve o ser humano e toda sua evolução, inclusive a
tecnológica.
A confluência entre esses dois setores de grande interesse na atualidade, o turismo e o meio
ambiente, contempla vários enfoques, o que incentiva o estudo das inter-relações e, principalmente,
do entendimento das influências que se estabelecem entre esses setores.
Atualmente, a globalização tende a tornar a natureza mundial, tornando-a
tecnificada/hostil, dominada por certos grupos sociais que imprimem uma nova relação, não mais
de complementaridade, mas sim de exploração. A atividade turística está presa ao processo de
mundialização, portanto utilizando-se dessa natureza/ambiente hostil.
É pela utilização desse falso ambiente que o turismo caminha. Esse processo acaba por
transmitir uma realidade falsa e comprometedora para a atividade turística que deveria ter por base
o espaço local, real.
A globalização, dessa forma, tende a tornar os espaços iguais. Ou seja, uma
homogeneização fragmentária, dominada pelos grandes capitais e movida constantemente pela
competição mundial.
A natureza se vê equiparada a qualquer outra mercadoria. O consumidor é induzido a
comprar a paisagem, como bem de consumo no supermercado. O processo de convencimento, que é
ideológico, é o mesmo. Produz-se, recorta-se, escolhe-se o que se vai mostrar, vende-se e ainda se
garante a satisfação. A paisagem não é construída em cima do vazio. Ela é feita a partir de
interesses, levando-se em conta tendências do mercado. Há uma turistificação não só da natureza,
mas da própria sociedade. O turista entra na contabilidade do negócio e sua subjetividade é
trabalhada por uma objetividade que determina os lugares aonde ele deve ir.
O processo de globalização exige uma velocidade de transformação dos lugares que afeta
diretamente o ambiente. Esses lugares produzidos e comercializados constituem matéria-prima para
o turismo. Este, muitas vezes, afirma o processo de globalização dos lugares, sem refletir essa ação
que necessita da singularidade do ambiente para efetivar plenamente suas atividades.
Ao verificar o fenômeno do turismo sob as perspectivas da globalização observa-se que
essas atuais premissas impostas pela nova ordem mundial, de construção de novos lugares, vão de
encontro aos objetivos desta atividade. Começando pelos próprios consumidores do turismo: os
turistas. Destes, desejos e necessidades não são satisfeitos, pois um indivíduo em viagem,
principalmente de lazer, busca ao se deslocar de suas cidades de origem a outras localidades, o
Fórum Internacional do Meio Ambiente - A conferência da Terra 1075

desejo de evasão, de fuga da rotina, a busca por novas paisagens, novos estilos de vida, que muitas
vezes não são atingidos simplesmente pelo fato dos lugares serem praticamente iguais. Não ocorre,
assim, a mudança de vida, mesmo que por um determinado período, tão desejada. Segundo Urry
(1996), o turista, sai de seu domicílio para procurar o diferente, o inusitado, e não espaços já vistos,
(re)criados e globalizados.
Considerando o turista um elo muito importante para o turismo, não se pode esquecer que
não existe turismo sem meio ambiente e população local, sem a cidade a receber. Por isso que a
presente pesquisa enfoca esses dois setores, pouco estudados e sem a devida importância que
realmente possuem. Sendo assim, é preciso considerar o estudo das inter-relações e, principalmente,
do entendimento das influências que se estabelecem entre o meio ambiente e a população local, para
que realmente possa-se ter um turismo ordenado que produza benefícios não só para quem visita, ao
ver paisagens, mudar de vida, mas também, e principalmente, aos dois elos menos favorecidos com
a expansão da atividade turística: o meio ambiente e a comunidade.
O turismo ao se estabelecer em uma localidade, na maioria das vezes, surge à primeira
vista, como uma “tábua de salvação” para problemas da comunidade, devido ser um gerador de
emprego e distribuidor de rendas. Mas, a longo prazo, devido a falta de um planejamento prévio, as
mudanças na localidade que deveriam ser símbolo de desenvolvimento começam a aparecer como
mazelas que assolam toda uma estrutura social.
Assim, a não consideração do nível de desenvolvimento da comunidade, o tipo de turismo
a que a comunidade fica exposta e a falta de um planejamento, resultam no atual estágio em que
muitas comunidades receptoras se encontram: tentando solucionar os impactos negativos,
ressaltando-se alto índice de prostituição, marginalidade, uso de drogas, poluição, descaracterização
das paisagens, especulação imobiliária, falta de infra-estrutura adequada, deslocamento dos antigos
moradores para áreas afastadas, entre outros. Assim, uma atividade que inicialmente seria a
salvação para os problemas de uma sociedade, aparece como o principal agravante desses impactos
negativos.
Embora esse setor seja considerado menos agressivo para o ambiente que a maioria das
atividades econômicas, como relata Ouriques (2005), suas dimensões e sua presença difusa em
algumas locações, como se pôde observar, têm conseqüências negativas para o meio ambiente, em
termos físicos e sociais. Desta forma, requere-se uma administração mais ampla dessa atividade,
para estimular uma maior participação do governo e um número maior de parcerias entre setores
público e privado. Ou seja, prevalecer a necessidade de se desenvolver formas alternativas de
turismo com uma abordagem mais sistêmica, visando a beneficiar os visitantes e principalmente os
visitados.
Como alternativa, pode-se discutir o turismo como uma atividade sustentável, baseando-se
nas premissas da sustentabilidade que evoca a importância de harmonizar as necessidades de seus
quatro componentes: a comunidade receptora, os visitantes, o meio-ambiente e a própria atividade.
Também, com a finalidade de se ampliar os conhecimentos, a utilização de indicadores como
instrumentos auxiliar, na compreensão de fatos sócio-ambientais, se revela como uma ferramenta
rica de informações. Principalmente, quando se busca verificar qualquer situação em que a
população local seja o ator fundamental para uma avaliação.
Assim, é nessa perspectiva que a presente pesquisa pretende desenvolver um estudo no
qual se considere os impactos sócio-ambientais sobre uma comunidade receptora como um fator
primordial de análise da atividade turística na localidade, para posteriormente se desenvolver um
turismo que venha valorizar os recursos sociológicos, direcionar equipamentos e infra-estrutura,
considerando anseios, crenças e valores da população tradicional, pois está nesses elementos um
dos principais atrativos para um indivíduo sair de sua residência a procura do inusitado, de um lugar
onde possa “renovar suas energias”. É nesse sentido que aparece, com a ajuda de indicadores, a
premissa do turismo sustentável, que busca justamente na população local as bases para seu
desenvolvimento.
METODOLOGIA DA PESQUISA
População em Estudo
Fórum Internacional do Meio Ambiente - A conferência da Terra 1076

Como população a ser estudada, a presente pesquisa selecionou os habitantes da Vila de


Ponta Negra, uma comunidade da cidade do Natal, capital do Estado do Rio Grande do Norte. Essa
população foi baseada em um percentual estatístico constante no Censo Demográfico de 2000, do
Instituto Brasileiro de Geografia e Estatística – IBGE (2003), considerando-se um morador por
domicílio, catalogando-se na Vila de Ponta Negra, 2.387 (dois mil trezentos e oitenta e sete)
domicílios particulares.

Plano Amostral
O presente trabalho caracteriza-se por ser uma pesquisa não-probabilística acidental,
considerando o total de domicílios particulares da Vila de Ponta Negra como população, sendo sua
amostra determinada pelo modelo de Triola (2005) de acordo com a equação:
2
Npˆ qˆ z
n= [1]
pˆ qˆ z + ( N − 1) ε
2 2

Instrumento de Coleta de Dados


Utilizou-se um formulário estruturado com perguntas abertas e fechadas, as quais podem
contribuir para mensurar e avaliar os parâmetros antecedentes e conseqüentes da avaliação sócio-
ambiental da atividade turística na Vila de Ponta Negra, sob ponto de vista dos moradores.
As variáveis mensuráveis foram selecionadas de acordo com os indicadores sociais que o
IBGE utiliza em seus estudos, como aspectos demográficos, trabalho e rendimento, educação e
condições de vida (IBGE, 1997)

Método de Coleta de Dados


O presente estudo caracteriza-se por ser uma pesquisa exploratória descritiva do tipo
survey, com utilização de um formulário estruturado, como instrumento de pesquisa, e a entrevista
pessoal como método utilizado para a coleta de dados.

Técnicas de Análise dos Dados


Os dados foram analisados de duas formas: técnicas descritivas e exploratórias, a partir de
uma estatística descritiva; e através da análise de regressão múltipla, que possibilita entender que a
variável dependente está sendo explicada, enquanto que as variáveis independentes estão fazendo a
predição da variável dependente.
Forma geral da equação de regressão múltipla estimada:
y = b0 + b1 x1 + b2 x 2 + ... + bk x k + ε

2]

CONCLUSÃO
A primeira conclusão que se pode chegar sobre a atividade turística em relação aos
impactos sócio-ambientais analisados sob a ótica de uma população receptora é a geração de
emprego e renda, talvez por serem os benefícios mais perceptíveis ou mesmo por serem os mais
divulgados e fáceis de quantificar. Principalmente, quando se trata da análise do poder público,
quando se diz que o turismo é a maneira mais rápida de se mudar os indicadores sociais das
pessoas, sendo uma área que movimenta muitos recursos e que oferece mais possibilidades de
emprego. (FARIA, 2007).
Neste trabalho, pode-se comprovar que esse pensamento é o que ainda prevalece.
Principalmente, através da análise descritiva, na qual as variáveis são analisadas uma a uma,
verifica-se que as únicas variáveis que sofreram alguma melhora foram justamente o emprego e a
renda. Já os benefícios sociais e a qualidade de vida permaneceram do mesmo jeito, sendo
perceptível uma melhora sutil e a distribuição de renda tendendo para uma pequena baixa.
Fórum Internacional do Meio Ambiente - A conferência da Terra 1077

Variáveis como saúde, educação e lazer, obtiveram respostas negativas em seu


crescimento. Essa situação pode ser comprovada, pelo baixo nível de escolaridade da população
estudada a qual 57% possui apenas o nível médio, 21 % o ensino fundamental e 22% o ensino
superior.
Já variáveis como, criminalidade, violência e prostituição obtiveram respostas muito
negativas. Essa realidade é comprovada quando autores como Ruschmann (2001) e Archer e
Cooper (2002), explicam que a não consideração do nível de desenvolvimento da comunidade, o
tipo de turismo que é desenvolvido e a falta de um planejamento, têm como resultado a tentativa de
se solucionar os impactos negativos, como o alto índice de prostituição, marginalidade, uso de
drogas, poluição, descaracterização das paisagens, especulação imobiliária, falta de infra-estrutura
adequada, entre outros.
Outra variável bastante negativa foi o impacto ao meio ambiente. Como foi uma questão
abrangente, teve-se que explicar o que significa “impacto ao meio ambiente” às pessoas
entrevistadas. Mesmo com alguma dificuldade para entender o termo o percentual do impacto ao
meio ambiente aumentou bastante. Infelizmente, essa é uma realidade frustrante para o turismo e
para a sociedade, além de ser o meio ambiente onde tudo se desenrola, seja para o turismo ou não, é
nele que está a matéria-prima desta atividade, como a paisagem, a cultura da população local.
Enfim, se é preciso desenvolver e construir estrutura para a atividade turística que se faça com
planejamento e responsabilidade, pois por suas próprias características há uma apropriação direta ou
indireta e uma produção espacial simbólica da beleza natural ou da cultural, alterando-se tanto a
paisagem física como as relações sociais dos moradores da área que passam a gravitar em torno da
atividade turística.
Assim, se conclui, com a análise descritiva, que no impacto do turismo, os positivos, são os
empregos e renda gerados, surtindo efeito na distribuição de renda. Os impactos negativos refletem
o que muitos autores pesquisados abordam: o aumento da criminalidade, da violência, da
prostituição, da degradação ao meio ambiente, do uso de drogas, agravados, também, pela péssima
condição da educação, da saúde e dos espaços de lazer. Constatados nos depoimentos dos
moradores da Vila de Ponta Negra entrevistados.
Com relação à análise de regressão múltipla, foi identificada como variável dependente a
BEN_SOCI (Opinião do entrevistado quanto os benefícios sociais na comunidade gerados pela
atividade turística) e como variáveis independentes que se relacionaram à dependente, EMPREGO
(Opinião do entrevistado quanto à situação do emprego na comunidade devido à atividade
turística.), EDUCAÇÃO (Opinião do entrevistado quanto à situação da educação devido à atividade
turística), DIST_REN (Opinião do entrevistado quanto à situação da distribuição de renda na
comunidade devido à atividade turística), SAUDE (Opinião do entrevistado quanto à situação da
saúde na comunidade devido à atividade turística.), LAZER (Opinião do entrevistado quanto à
situação dos espaços de lazer na comunidade devido à atividade turística) e Q_VIDA (Opinião do
entrevistado quanto à situação da qualidade de vida na comunidade devido à atividade turística).
Notou-se que a percepção dos entrevistados sobre os benefícios sociais que a atividade turística
pode trazer para a comunidade estão diretamente ligados à geração de emprego, à distribuição de
renda, a educação, ao lazer, e inversamente ligados às condições da saúde e a qualidade de vida.
Com esta análise pode-se confirmar, mais uma vez, que quando fala-se em turismo pensa-
se imediatamente nos benefícios econômicos, principalmente na geração de emprego e
conseqüentemente renda e sua distribuição. É interessante observar que a população analisada,
quando pensa em benefícios sociais advindos do turismo, também percebe que o crescimento da
atividade turística pode acarretar melhoria em algumas necessidades básicas como educação e lazer,
que deveriam ser supridas pelo setor público de modo geral, servindo como alicerces para o
desenvolvimento de um turismo sustentável.
Assim, através desta pesquisa, onde foram investigados os impactos positivos e negativos
da atividade turística em uma comunidade receptora, no caso os moradores da Vila de Ponta Negra
em Natal, capital do estado do Rio Grande do Norte, pode-se perceber o quanto são necessários
estudos que enfoquem não só os aspectos econômicos e positivos desta atividade, que de um modo
Fórum Internacional do Meio Ambiente - A conferência da Terra 1078

geral, são mais fáceis de ser analisados e quantificados, mas também aspectos que vislumbrem a
sociedade como um todo, como social, ambiental, político, cultural, de modo que os elementos de
uma dimensão se liguem com os de outra, em vez de optar por um ponto de vista exclusivo.
É nessa perspectiva de novos horizontes que nasce a premissa do desenvolvimento
sustentável através do levantamento do uso de indicadores, cuja função é a de auxiliar a
compreensão dos fatos sociais, onde se enfoca a participação social orientada por três eixos: a
preservação ambiental, a eqüidade social e o crescimento econômico. Como expõe Dias (2003),
sem a integração da comunidade local em todas as fases do processo não há desenvolvimento.
Logo, para o turismo ser um meio positivo para o aumento da vida econômica, social, cultural e
ambiental, é preciso que se volte para a população local, a fim de detectar os possíveis problemas e
escolher o melhor método de avaliação condizente com a realidade encontrada. Portanto, a presente
pesquisa oferece uma base sobre o estudo dos impactos sócio-ambientais que utiliza o
conhecimento de indicadores e de métodos de avaliação sócio-ambiental, no intuito de pensar que
sempre existirá degradação, mas que se pode minimizá-las. Deixar de estudar esses assuntos é que
seria um desrespeito com a sociedade que clama por ajuda.

REFERÊNCIAS BIBLIOGRÁFICAS
ARCHER, Brian; COOPER, Chris. Os impactos positivos e negativos do turismo. In: THEOBALD,
William F. (org.). Turismo global. 2. ed. São Paulo: SENAC São Paulo, 2002. (tradução Anna
Maria Capovilla, Maria Cristina Guimarães Cupertino, João Ricardo Barros Penteado).
BISSOLI, M. A. A problemática econômica e social do espaço turístico. Revista COMUNICARTE.
Campinas, n. 16-17, p. 116-149, 1992.
BRASIL. MINISTÉRIO DO TURISMO. INSTITUTO BRASILEIRO DE TURISMO -
EMBRATUR. Diretoria de Estudos e Pesquisas. Anuário Estatístico EMBRATUR – 2006. v. 33.
236p. Dados de 2005.
DIAS, Reinaldo. Sociologia do turismo. São Paulo: Atlas, 2003.
FARIA, Wilma. Retirado da falada da Governadora. Disponível em:
http://www.setur.rn.gov.br/index1.html. Acesso em: 17 de maio 2007.
FERRETI, E. R. Turismo e meio ambiente: uma abordagem integrada. São Paulo: Roca, 2002.
INSTITUTO BRASILEIRO DE GEOGRAFIA E ESTATÍSTICA – IBGE. Censo Demográfico
2000. Agregado por Setores Censitários dos Resultados do Universo. 2. ed. Rio de Janeiro: IBGE,
2003.
___________________. Pesquisa nacional por amostra de domicílios: síntese de indicadores 1996.
Rio de Janeiro:IBGE, 1997
OURIQUES, Helton Ricardo. A Produção do turismo: fetichismo e dependência. Campinas, SP:
Alínea, 2005.
RUSCHMANN, Doris van de Meene. Turismo e planejamento sustentável: a proteção do meio
ambiente. 7. ed. Campinas: Papirus, 2001.
SANTOS, M. et al (org). O novo mapa do mundo: fim de século e globalização. São Paulo:
HUCITEC/ANPUR, 1994.
TRIOLA , Mario F. Introdução à Estatística. 9ª ed. Rio de Janeiro. Editora LTC. 2005.
URRY, J. O olhar do turista: lazer e viagens nas sociedades contemporâneas. São Paulo:
SESC/Studio Nobel, 1996.
Fórum Internacional do Meio Ambiente - A conferência da Terra 1079

A PRESERVAÇÃO ATRAVÉS DE UM TURISMO SENSÍVEL À NATUREZA

Bruna Raquel Alves Pinheiro


Universidade Gama Filho. SGAS Quadra 603 Conjunto C. CEP: 70200-630. Brasília – DF. brunaraquel@joaolobo.com

RESUMO
O presente artigo trata de um estudo inicial sobre a preservação do meio ambiente pelo
turismo. Para tanto, abordou-se a natureza como atrativo turístico de apego definido por seus
valores estéticos e beleza natural capazes de promover no turista uma interação transformadora
criando assim, um elo de ligação dialético que ultrapassa os limites do consumo e do espaço-
mercadológico. Esta abordagem é apresentada aqui como mais uma forma de preservação do
planeta Terra, através de um olhar mais profundo e sucinto do meio natural através de uma
atividade turística de cunhos filosófico e sociológico, relacionada a uma natureza capaz de mudar
comportamentos e ações que outrora a depredavam.
Palavras-chave: natureza, turismo, preservação e consumo.

ABSTRACT
This article is an initial study on the preservation of the environment for tourism. Thus,
addressed to nature as tourist attraction as defined by their aesthetic values and natural beauty
capable of promoting an interaction in the tourist sector thus creating, a link dialectic that goes
beyond the limits of consumption and space-mercantile. Promoting well, more a way of preserving
the planet Earth, through a deeper look and succinct of the natural environment through tourism.
Conducting activities related to a stamp philosophical and sociological nature capable of changing
behaviors and actions that once the damaged.
Key-words: nature, tourism, conservation and consumption.

INTRODUÇÃO
A preservação da natureza vem, há muito tempo, se tornando o principal tema de debates
entre os líderes mundiais. Especialistas de todo o planeta afirmam que lutar contra os poluidores e
depredadores não é garantir que a Terra será preservada. Para isso, é necessário o esforço de cada
cidadão em mudar seus valores consumistas, hábitos e comportamentos que provocam poluição,
atitudes depredatórias com os animais, as plantas e o meio ambiente. Deve-se assim, ter uma
consciência ambientalmente correta, através de ações mais fraternas, democráticas, justas e
pacíficas com os semelhantes e com o meio natural.
O ser humano está em intensa construção de seus valores, conhecimento e
amadurecimento, ou seja, de sua identidade. A viagem é uma das únicas formas que possibilita ao
sujeito de buscar o seu “ser” interior, fora do seu local de experiência cotidiana. Desta forma, o
então turista move-se com a nítida imagem do prazer, que lhe fornece a imaginação de um ideário
de desprendimento das diferenças, de superioridade ou inferioridade social, de possibilidades de
trocas, enfim de um rápido e progressivo enraizamento e desraizamento sociogeográfico dos
destinos.
Existe a premissa de que o relacionamento do turismo com a natureza seja contraditório e
paradoxal. Tal pensamento pode ser definido no fato da atividade turística ser considerada um fator
de degradação ambiental, devido em grande parte a seus equipamentos e a certas formas de
utilização, que degradam o meio ambiente, a curto ou longo prazos e geralmente de custosa solução.
A relação do turismo com o meio ambiente é complexa, haja vista que numerosos
acontecimentos de conflito são registrados. Para tanto, promovem-se medidas que podem provocar
efeitos perversos e difíceis de controlar. O desafio encontra-se no equilíbrio entre o
desenvolvimento da atividade e a proteção ambiental.
O presente artigo pretende mostrar o atrativo natural como motivador essencial de sua
própria preservação, relacionado com os indivíduos que o estão visitando. A autora levanta a
hipótese de que a natureza pode transgredir a capacidade de consumo do ser humano, tornando este
menos acessível ao ambiente natural, devido a sua não possibilidade de mercado. Pois, o meio
Fórum Internacional do Meio Ambiente - A conferência da Terra 1080

ambiente como será abordado aqui, é visto como algo que transmite sensações diferentes em cada
turista, em uma relação pessoal e até mesmo semi-espiritual.
A autora retira em parte, o destino turístico de natureza para contemplação da utilização
reducionista paisagística, explicando que o valor da paisagem não será determinado exclusivamente
por critérios formais estéticos, como a harmonia das cores ou a disposição das linhas, nem por
questões exclusivamente economicamente lucrativas, mas de acordo com o potencial que os lugares
possuem em despertar a mente para o sublime que proporcionam questões diversas da filosofia e da
sociologia.

CONSIDERAÇÕES SOBRE OS FATORES AMBIENTAIS NO TURISMO


De acordo com BENI (2004), a ecologia é o sustentáculo de todas as manifestações de vida
no planeta Terra. Assinala, que a parte referida ao meio ambiente no turismo, possui como principal
elemento a contemplação e o contato com a natureza. Onde são analisados os fatores do espaço
turístico natural e urbano, seu planejamento territorial, atrativos e conseqüências da atividade no
meio ambiente, preservação da flora, fauna e paisagens constituindo assim, todas as funções,
variáveis e regras de consistência de cada um desses fatores.
A ciência ecológica possui um importante papel no desenvolvimento de permanentes
atividades turísticas, sobretudo as que efetuam em espaços naturais. Por isso, é imprescindível
incorporar a visão ecológica em todas as etapas do processo de planejamento turístico, como algo
onipresente e estar indissoluvelmente ligado ao trabalho de educação ambiental.
Apesar de possuírem o mesmo prefixo eco, segundo BENI (2004), questões econômicas
avançam sobre fatores ecológicos, provocando uma discrepância em sua relação, onde cuidar do
econômico não garante preservação ecológica, porém dar atenção a esta, proverá benesses para o
futuro daquele. Para o autor, toda atividade econômica participa em maior ou menor grau da
gradual deterioração ambiental. Portanto, não se deve afirmar, que o turismo é o único responsável
pelos danos causados aos ecossistemas.
Na área de políticas protecionistas, poucos países ou órgãos públicos de turismo ressaltam
os aspectos econômicos, ligados à necessidade premente da proteção no meio ambiente. Já os
estudos científicos, enfatizam pesquisas interdisciplinares conduzidas com certa timidez, uma vez
que o turismo relacionado ao meio ambiente são objetos recentes das pesquisas dos estudiosos da
área.
A criação de áreas protegidas tem obtido alto grau de importância enquanto estratégia de
conservação dos patrimônios naturais, à medida que os mais destacados ecossistemas do planeta
encontram-se ameaçados. Existe um elevado número de fatores que explicam o aumento da
preocupação mundial pelas áreas protegidas, pode-se citar a perda da biodiversidade, a devastação
das florestas, dentre muitos outros.

A DEPREDAÇÃO DO MEIO AMBIENTE E O CONSUMO NO TURISMO


O meio ambiente no funcionamento turístico está dentro da classe dos atrativos e como tal,
ele denota uma idéia de consumo superficial e mercadológico da natureza. As ações relacionadas ao
ócio, à primeira vista, transformam uma considerável parcela do espaço natural em mercadoria,
submetendo-o ao circuito de troca. (AZEVEDO, 2003)
Entre os inúmeros impactos negativos que a indústria das viagens sem planejamento
e integração pode trazer, destacam-se com maior incidência o acúmulo de lixo, contaminação das
fontes e dos mananciais de água doce e do mar, pinturas e rasuras nas rochas, pisoteio da vegetação,
caça ilegal, incêndios nas áreas mais secas, desmatamento para a construção de equipamentos que
descaracterizam a paisagem e cujo estilo contrastam com o meio natural. (RUSCHMANN, 1997, p.
63-64)
O cerne do problema que causa a crise ecológica nos espaços de uso turístico, segundo
BENI (2004, p. 52), talvez possa ser o complexo conflito que ocorre no espaço cultural e o espaço
natural. Haja vista, que o ser humano tem como uma de suas necessidades, a ocupação do espaço
Fórum Internacional do Meio Ambiente - A conferência da Terra 1081

natural que é manipulado de forma muitas vezes irracional. Torna-se desta forma, em um lugar
abstrato que faz parte do cultural e fora do âmbito das leis da natureza.
Trata-se o meio ambiente como se os recursos fossem inesgotáveis. A ciência e a técnica
descobrem sempre novos meios de impelir os limites impostos pelo equilíbrio do ecossistema. Os
efeitos secundários negativos do crescimento econômico baseado na tecnologia parecem, cada vez
que surgem, simples de coordenar e de remediar. (KRIPPENDORF, 2003)
BEDIM (2007), afirma que no atual mundo globalizado, o espaço natural destinado ao
turismo é um espaço-mercadoria, cuja essência está envolta em simulacros. Onde o local é
produzido e reproduzido enquanto mercadoria reprodutível. Neste processo de apropriação do meio
natural pelo homem, afirma que o sujeito antropomorfiza a sua natureza externa e,
conseqüentemente, transforma a sua própria natureza interior. Ressalta ainda, que o ambiente sem a
intervenção do homem, a luz da Teleologia133, possui papel de objeto e meio de trabalho para o
homem. Focando assim à satisfação das necessidades humanas, processo onde são originadas as
riquezas.
Em URRY (1996), a satisfação que as pessoas obtêm do consumo, depende das escolhas
consumistas dos outros, ao que ele chama de suburbanização. Isso pode ser percebido de forma
clara na obtenção de certos bens, como a paisagem natural, que são escassos em sentido absoluto.
Promovendo assim, a idéia de que o aumento do consumo por parte de uma pessoa, conduz a uma
redução por outra. Para o melhor entendimento deste consumo coagido, vale lembrar o exemplo de
HIRSCH apud URRY (1996, p. 67), onde as pessoas mudam-se para os subúrbios, a fim de fugir da
congestão da cidade, no entanto, à medida que prossegue o crescimento econômico, os subúrbios
ficam mais congestionados e muitas vezes mais até do que nas cidades.
Krippendorf (2003), indica que o atual sistema econômico não está interessado em cobrir
as necessidades humanas que realmente existem, pois estas já estão satisfeitas. A economia
distanciou-se da sociedade, colocou-se acima deste e apoderou-se de sua liberdade. Pois o custo
suportado pelo ser humano, pela economia e pelo meio ambiente ultrapassa largamente os
benefícios obtidos.
Tal entendimento pode ser constatado, na capacidade que as sociedades pós-industriais
possuem em produzir novas necessidades, que sofisticam cada vez mais a relação homem/homem e
homem/natureza. (BEDIM, 2007, p. 76)
O turista que não é sensível ao meio ambiente sabe que não existe nada a ganhar pelo
adiamento de uma visita à um lugar. Pelo contrário, existe uma forte motivação para viajar o mais
rápido possível, para assim poder apreciar a paisagem ainda intocada, antes que as multidões
cheguem. Por conseguinte, tem-se o consumo do tempo e do espaço, onde o valor de uso cede aos
termos de troca.
Assim sendo, o tempo dedicado as atividades de lazer, como também os espaços aqui
envolvidos, podem ser concebidos como um prolongamento das cidades. Pois estão cada vez mais
incorporados ao mundo da mercadoria e aos processos produtivos de consumo. (Ibid., 2007)
Mesmo que o homem possa alterar em grande escala a paisagem natural, ele o faz sem
avaliar ou dimensionar formal e racional integralmente, o impacto causado por tal perturbação. Tais
formas de comportamento e ação só aproximam o turismo de um colapso, como resultado do
consumo da qualidade dos atrativos naturais, provocado pela contaminação e deterioração. (BENI,
2004, p. 53)
À respeito do grau de deterioração causado pelas ações de ócio pode ser notado por
exemplo pelo aumento de vôos fretados, a um determinado lugar, que podem significar que este
destino está em ritmo de depredação, como afirmou um profissional da classe média: “Agora que
tenho condições de ir lá, sei que tudo vai se estragar.” HIRSCH apud URRY (1996, p. 68)
MISHAN apud URRY (1996, p.66), critica o desenvolvimento do turismo, pois para ele a
difusão do turismo de massa não produz uma democratização das viagens, sendo na realidade uma
ilusão que destrói o espaço geográfico, fazendo com que as próximas gerações não tenham acesso a
133
Neste caso a Teleologia diz respeito à qualidade do homem em possuir consciência, ao contrário da irracionalidade
dos outros animais.
Fórum Internacional do Meio Ambiente - A conferência da Terra 1082

lugares de “beleza natural intocada”. Afirma que, o lugar que é vivido em liberdade por alguns, é
destruído pela multidão. Devido a tudo isso, propõe um acordo de regulamentação internacional
para que não haja a autodestruição desses locais.
Esse confronto de forças, as humanas contra as físicas e ambientais, caracteriza-se pelo
aumento da população de turistas e de residentes permanecentes que congestionam os centros
turísticos. Tendo em vista que, a população autóctone sente a necessidade de crescer
quantitativamente, através da atração e concentração de capitais que, logo em seguida, se
transformam em unidades produtoras de serviços turísticos que fazem o uso de uma operação
assistida de uma tecnologia nociva para a qualidade ambiental.
Essa forma de argumento pessimista é desfocado por BECKERMAN apud URRY (1996,
p.66), para ele o principal fator problemático oriundo do turismo de massa é basicamente, uma
ansiedade de classe média, a exemplo de muitas outras preocupações com o meio ambiente. Uma
vez que, a classe realmente rica está a salvo em lugares muito caros, em iates, ilhas particulares ou
em suas propriedades isoladas. Outro ponto ressaltado pelo autor, é que geralmente as pessoas
afetadas pelo turismo de massa, se beneficiam dele quando este promove o desenvolvimento de
certos serviços de comodidade, que outrora eram impossíveis de se obter, pois o número de turistas
e habitantes eram ínfimos.
Para o sociólogo Krippendorf (2003), é necessário que a economia descentralize-se e que o
sistema de valores do homem e da sociedade volte a acentuar mais o “ser” do que o “ter”. Faz-se
preciso que se considere o fato de que os recursos naturais não são inesgotáveis.

O ATRATIVO NATURAL E O TURISTA


Segundo a Teoria “The Optimal Arousol” de Iso-Ahola, as pessoas viajam para retornarem
aos seus locais de morada melhor do que eram, na idéia de que as viagens, através de suas
atividades de lazer, reconstroem e recriam o homem, para curar e sustentar o corpo e a alma, que
proporcionando uma fonte de forças essenciais que trazem um sentido à vida. (KRIPPENDORF,
2003)
Geralmente, os objetivos de uma viagem são permutáveis, como em um catálogo, onde as
imagens daquilo que se encontrará, são vendidas pelas organizadoras de turismo. Isto faz com que o
ato de viajar seja relativizado pelos turistas e pelos próprios estudiosos e empresários da área.
Contudo, para se obter melhor proveito das viagens PANOSO NETTO (2005), propõe a utilização
dos estudos filosóficos nas reflexões turísticas.
De acordo com o filósofo BOTTON (2003), a proximidade de uma catarata, de uma
montanha ou de qualquer outro elemento da natureza, torna mais difícil a vivência de inimizades e
desejos adjetos. Em sua análise pelos escritos de Wordsworth134, ele observou que a natureza
promoveria uma disposição na vida e entre as pessoas, apenas o desejável e bom, forma-se assim
uma “imagem da razão correta” que forneceria o equilíbrio dos impulsos desvirtuados da vida
urbana.
A filosofia preconiza que o conceito da capacidade de percepção, modifica a situação.
Embora a trilha ainda possa ser fisicamente percorrida, ela já não significa aquele ermo ainda não
desbravado que o visitante esperava contemplar. Assim, sua capacidade de percepção seria
alcançada, mas não sua capacidade física.
A capacidade de percepção é volátil, pois depende de determinadas concepções da
natureza e das circunstâncias pelas quais os visitantes desejam contemplá-la. WALTER apud
URRY (1996, p. 71) demonstra esta reflexão com o exemplo de uma montanha nos Alpes,
mostrando que como sendo um bem material ela pode ser contemplada pela sua grandiosidade,
beleza e conformidade com uma paisagem alpina idealizada. Contudo, essa mesma montanha pode
ser encarada como um bem posicional, uma espécie de santuário da natureza, que os indivíduos
desejam gozar na solidão. Surge assim, aquilo que URRY (1996, p. 122) denominou de “olhar

134
William Wordsworth (1770- 1850) foi um poeta romântico inglês que ficou conhecido por seus poemas de
enaltecimento da natureza de sua terra natal, o Distrito dos Lagos. Sua obra influenciou muitos visitantes que se
transformou em um destino turístico, formando-se a base da economia local.
Fórum Internacional do Meio Ambiente - A conferência da Terra 1083

romântico” do turista, na qual a ênfase é colocada na solidão, na privacidade e em um


relacionamento pessoal e semi-espiritual com o objeto do olhar.
A conotação de divindade e sacralidade a certos locais de beleza natural está associada ao
legado da cultura judaico-cristã. Isto explica, em parte, a defesa de alguns ambientalistas em
proibirem a visitação pública às Unidades de Conservação, referindo o turismo como uma ameaça à
vida selvagem e como mecanismo indutor de ações depredatórias. (SCHAMA apud BEDIM, 2007,
p.78)
Com relação ao olhar do turista, de acordo com EISENSTEIN apud ECHTNER (1999, p.
48) existe uma teoria em relação ao objeto e a reação humana que ele provoca. Trata-se de um
sentimento simples e complexo ao mesmo tempo. Simples quando nos referimos a sua participação
originária nas emoções bases da psique e complexa, pois elas se desenvolvem e se fundem em
outras, numa dimensão quase que incalculável. Segundo Peirce135, o signo provoca um efeito
significativo traduzido em sentimentos por ele produzido, assim este sentimento mostra que
compreendeu-se o efeito que o signo queria provocar, mesmo assim, ainda pode-se afirmar que o
seu relacionamento com a verdade seja tênue.
Segundo BOTTON (2003), as pessoas possuem uma identidade maleável, pois muda-se de
acordo com quem – e às vezes com o quê – estamos. A companhia de certas pessoas estimulam a
experiência turística, de forma que as reações em relação ao que é visitado são crucialmente
moldadas pela sua visão pessoal de quem o outro pode vir a ser. Ser observado de perto por um
companheiro, pode inibir o viajante a observar outros. Permanece-se absorto na tarefa de ajustar-se
às perguntas e comentários do acompanhante. O autor chega a afirmar que as pessoas, quando estão
nesta posição, fazem um esforço para conter o entusiasmo provocado pela curiosidade em estar
observando algo de novo para assim, parecerem mais normais. Depois desta reflexão, ele conclui
que viajar sozinho seria mais vantajoso.
Contudo, quando um indivíduo está na presença de uma catarata ou montanha, entes que
no fundo não têm interesses conscientes, portanto não poderiam encorajar ou censurar
comportamentos, podem segundo Wordsworth, exercer certa influência quando os elementos
naturais têm o poder de sugerir valores, como por exemplo, o carvalho, a dignidade; pinheiros, a
determinação; lagos, a calma, as flores, humildade e mansidão.
Para o poeta inglês, a beleza da natureza poderia estimular a localizar o bem nas pessoas.
Duas pessoas paradas numa saliência rochosa com vista para um regato e um magestoso vale
coberto de bosques poderiam mudar não só sua relação com a natureza mas sua relação entre elas.
BOTTON (2003), relata em seu livro “A arte de viajar”, sua excursão pelo deserto do
Sinai. Onde diante de sua imensidão de rochas, camadas de granito, tabuleiros de cascalho torrando
ao sol e montanhas de lava solidificada ele indaga-se da procura do ser humano por aquele tipo de
sensação de pequenez. O filósofo repara que sente-se humilhação pelo que tem poder e é
mesquinho, porém faz-se referência ao que tem poder e é nobre. Este tipo de lugar com natureza tão
sublime permite ao turista encarar uma deficiência conhecida de uma outra forma, pois eles repetem
uma lição que a vida rotineira costuma ensinar com crueldade, a que o universo é mais poderoso
que o ser humano, sendo este, frágil e efêmero. Portanto, visitar estes lugares tão majestosos não
refletirá humilhação, pelo contrário, promoverá inspiração aos visitantes, que se sentirão
privilegiados diante de exigências tão grandiosas. A noção de assombro pode até se transformar em
um desejo de culto.

CONSIDERAÇÕES FINAIS
Segundo Urry (1996), existe um conflito de interesses entre as atuais a as futuras gerações,
refletido no custo do turista marginal que não leva em consideração os custos de uma congestão
adicional, devido o turista extra. Tais taxas determinam os efeitos indesejáveis de praias
superlotadas, falta de sossego e silêncio, além da irremediável depredação da natureza.

135
Charles Sanders Peirce (1839-1914), um filósofo americano, que expandiu o conceito semiótico quando incluiu uma
estrutura de signos não verbais, no seu triângulo semiótico que faz a relação entre o objeto, o signo e o interpretante.
Fórum Internacional do Meio Ambiente - A conferência da Terra 1084

Deseja-se, pois, um mundo em harmonia, onde possa-se encontrar ou reencontrar um


estado de equilíbrio, onde cada parte seja um centro que não viva às custas das outras, mas em
conformidade com a natureza e a solidariedade com as gerações futuras.
O turismo nos espaços naturais feito de acordo com a relação transcendental com a qual foi
mostrada neste estudo, pode ser uma das saídas para a preservação ambiental com visitação. Pois, a
atividade turística, quando idealizada como um fenômeno que envolve infinitas facetas do existir
humano, aprofunda assim o atrativo natural e sai de sua superficialidade comercial para um espaço
qualitativo de reflexão, apenas entre o homem e o meio ambiente.
Entende-se que o turista certamente melhor proveito das viagens obteria, assim como a
natureza. Através da prática de um turismo não só de apreciação da paisagem mas que vai além,
através dos fatos e relatos que foram expressos aqui nesta pesquisa, entre os visitantes de lugares
“sublimes” que revigoram pela sua grandiosidade. Estes locais são capazes de mudar
comportamentos que outrora depredavam a natureza.
Os impactos ambientais são reduzidos com a relação do foco romântico do turista, pois o
torna mais próximo da natureza e distante do consumismo da sociedade pós-moderna. Fazendo com
que a conscientização ambiental seja realizada espontaneamente ou com mais facilidade.
Portanto, desenvolve-se dessa maneira uma nova sensibilidade em uma parcela da
população turística que pratica um turismo de natureza, não tolerando abusos cometidos contra o
meio ambiente, pois estes acabariam também abusando os seus visitantes que tanto necessitam
destas paisagens para reencontrarem suas buscas e respostas e seu sentido de vida.

REFERÊNCIAS BIBLIOGRÁFICAS
AZEVEDO, Julia. “Enraização de propostas turísticas. In: RODRIGUES, Adyr. Turismo e
desenvolvimento local. 3. ed. São Paulo: Hucitec, 2002.
BECKERMAN, W. In defence of economic growth. In: URRY, John. O olhar do turista – Lazer e
viagens nas sociedades contemporâneas. São Paulo: Studio Nobel, 1996.
BEDIM, Bruno. P. O espaço capitalista da natureza e seu (contra)uso turístico: a dialética da
visitação pública em áreas protegidas – um ensaio teórico. Caderno Virtual de Turismo. Rio de
Janeiro, v. 7, n. 3, pp. 76-89, 2007.
BENI, Mário Carlos. Análise estrutural do turismo. São Paulo: Editora Senac, 2004.
ECHTNER, Charlotte M. The semiotic paradigm: implications for tourism research - Tourism
Management. Pergamon, v. 20, pp. 47-57, 1999.
GASTAL, Susana. Alegorias urbanas: O passado como subterfúgio. Campinas, SP: Papirus, 2006.
HIRSCH, F. Social limits to growth. In: URRY, John. O olhar do turista – Lazer e viagens nas
sociedades contemporâneas. São Paulo: Studio Nobel, 1996.
KRIPPENDORF, Jost. Sociologia do turismo. 3 ed. São Paulo: Aleph, 2003.
MARX, Karl; ENGELS, Friedrich. A ideologia alemã. Trad. José Carlos Bruni e Marco Aurélio
Nogueira. São Paulo: Hucitec, 1984.
MISHAN, E. The costs of economic growth. In: URRY, John. O olhar do turista – Lazer e viagens
nas sociedades contemporâneas. São Paulo: Studio Nobel, 1996.
PANOSSO NETTO, Alexandre. Filosofia do turismo: teoria e epistemologia. São Paulo: Aleph,
2005.
RUSCHMANN, Doris van de M. Turismo e planejamento sustentável: A proteção do meio
ambiente. Campinas, SP: Papirus, 1997.
URRY, John. O olhar do turista – Lazer e viagens nas sociedades contemporâneas. São Paulo:
Studio Nobel, 1996.
Fórum Internacional do Meio Ambiente - A conferência da Terra 1085

ANÁLISE DA EFETIVAÇAO DA INFRA-ESTRUTURA TURISTICA ESTABELECIDA


PELO PROECOTUR PARA NOVO AIRAO 136

Eda Marissa dos Santos Michiles


Graduanda em Geografia/bacharelado pela Universidade Federal do Amazonas-UFAM, bolsista de PIBIC pelo
INPA/CNPq e membro do Grupo de Pesquisa de Clima e Recursos Hídricos.
Waldemir Rodrigues Costa Júnior
Graduando em Geografia/ bacharelado pela Universidade Federal do Amazonas- UFAM, bolsista de PIBIC pelo CNPq
e membro do Grupo de Pesquisas Geografia da Amazônia: Ambiente e Cultura.
Susanne Cunha Cavalcante
Graduanda em Geografia/bacharelado pela Universidade Federal do Amazonas- UFAM e em Turismo/bacharelado pela
Universidade do Estado do Amazonas- UEA.

RESUMO
A infra-estrutura turística pré-estabelecida pelo PROECOTUR foi posta em prática para
Novo Airão? Este foi o problema desta pesquisa que visou analisar se as seguintes diretrizes: a
capacitação de recursos humanos, a valorização e conservação do patrimônio cultural, a melhoria na
infra-estrutura básica de apoio turístico e ecoturístico, e implementação de ações de promoção e
marketing do município, foram efetivadas. Para tanto, foram realizadas observações in loco, além
de entrevistas a fim de captar a dimensão da realidade vivenciada pelos entrevistados tal como ela é,
mas que essa vivência esta revestida internamente de fatos contraditórios. Nesse sentido, a pesquisa
não esteve rotulada por nenhum método pré-estabelecido. Ademais, como apontou Roberto Lobato
a realidade vivida é muito mais rica do que as teorias. Viu-se na geografia do turismo o caminho
dessas investigações, já que da infra-estrutura turística advém alterações no espaço, sendo
fundamental refletir questões como estas a partir do horizonte da Geografia, pois esta pensa a
organização e produção do espaço. Constatou-se que nem todas as diretrizes foram postas em
prática. Entre os motivos, está a desintegração entre poder publico, privado e as pessoas que
dependem da atividade turística, além da falta de capacitação profissional, de sinalização turística e
de trânsito, e de estabelecimentos próprios para a atividade turística no município. Das diretrizes e
estratégias propostas e efetivadas, destaca-se a construção do Centro de Atendimento ao Turista
(CAT). No plano da valorização da cultura local, o boto se constitui numa identidade coletiva,
embora tenha sido apropriado de maneira individual, além do fato de o símbolo da cidade ser o
peixe-boi.
Palavras-chave: PROECOTUR; Novo Airão; infra-estrutura; turismo.

INTRODUÇÃO
O turismo proposto pelo plano deveria estar de acordo com as especificidades de Novo
Airão que dizem respeito ao potencial cênico de belezas naturais. Mas tais potencialidades deveriam
estar atreladas à realidade daqueles que vivem a cidade, considerando não só a vida “harmoniosa”
da relação homem-meio, como também a sociabilidade do homem com a natureza na sociedade
capitalista. Trata-se da relação homem-meio de maneira dialética e intersubjetiva, pois como nos
ensina Cosgrove (1999), a realidade no espaço não se dá a partir de uma dissociação do vivido e
percebido das relações concretas instituídas na sociedade.
Nesse contexto, o espaço é vivido, percebido, além de concebido (CARLOS, 2001).
Vivido porque está ligado às experiências pessoais. Percebido devido à relação que se tem com o
espaço a partir dos sentidos, como destacou Tuan (1983). Concebido já que o espaço também é
“projetado”. Trata-se de dimensões do espaço que se contrapõem, pois o vivido e o percebido nem
sempre correspondem ao concebido, mas se intercalam.

136
A pesquisa é parte de um projeto maior intitulado Análise do Plano de Desenvolvimento do Ecoturismo para a
cidade de Novo Airão desenvolvida sob a orientação da Prof.ª Dr.ª IVANI FERREIRA DE FARIA, professora adjunto I
do Departamento de Geografia da Universidade Federal do Amazonas. Tal projeto contou ainda com a participação das
alunas Nilza Carvalho e Adriana Bindá, discentes de Geografia na UFAM.
Fórum Internacional do Meio Ambiente - A conferência da Terra 1086

Viu-se Novo Airão como um município constituído a partir dessas três dimensões
espaciais. Introjetou-se o olhar para uma cidade que já é alvo de um plano ecoturístico: o Proecotur,
desenvolvido para os municípios do Amazonas, entre os quais está o de Novo Airão.
Ao passo que tal plano deveria ou está sendo concretizado, observou-se que o mesmo se
choca com a visão vertical das Unidades de Conservação Estaduais e Federais que por lei são
“intocáveis”. Aí o concebido, ilustrado por essas Unidades de Conservação “inutilizáveis” em Novo
Airão, não correspondeu à realidade da cidade porque se trata de uma visão imposta de cima pra
baixo, confrontando-se com o percebido e vivido pelos moradores do município.
Ademais, como destacou Yázigi (2005) é preciso que o planejamento tome também como
ponto de partida uma visão lateral que está relacionada à realidade daqueles que experienciam o
espaço, ou ainda de maneira geral às especificidades do lugar.
O turismo em Novo Airão está baseado na modalidade do Ecoturismo, definido por
Lindeberg (et al. 2001) como a viagem responsável a áreas naturais, visando preservar o meio
ambiente e promover o bem-estar da população local, visto que o município possui atrativos
naturais, como o boto que é visto nas margens do rio Negro e culturais como as atividades
comunitárias que conta com índios ou descendentes.
O Proecotur se preocupou com as esferas ambientais, sociais, econômicas e culturais de
maneira sustentável, pois como Capra (1996) assinalou não há como se analisar o todo sem que
suas partes sejam vistas de maneira interligada e contextualizada.
Dessa forma o plano é sustentável, tendo levado em conta as dimensões da realidade que
compõe o todo (Novo Airão) interligado com suas partes (elementos culturais, sociais, ambientais e
econômicos). O plano foi firmado como “um compromisso com a natureza, como responsabilidade
social” (LINDERBERG, et al, 2001, p. 17), que visou satisfazer à população e ao turista a partir do
contato com o meio ambiente.
A presente pesquisa partiu de um projeto maior, que visava apresentar em primeiro plano
as características históricas, ambientais, sociais e culturais do município, para em seguida serem
demonstradas as diretrizes e estratégias estabelecidas pelo plano. Por fim, procedeu-se à observação
in loco verificando se tais metas foram efetivadas no que concerne á infra-estrutura turística e
ecoturística para Novo Airão.

METODOLOGIA
A presente pesquisa esteve pautada na análise da implantação de infra-estrutura turística
para o município de Novo Airão, entre outras cidades, prevista pelo PROECOTUR-Plano de
Desenvolvimento do Ecoturismo. Para tanto, foram levadas em conta as diretrizes e estratégias de
ecoturismo elaboradas para o município, além da observação em campo a fim de verificar se as
metas foram atingidas. O levantamento consistiu na aplicação de entrevistas informais com
presidentes de associações comunitárias e representantes de instituições governamentais. Recorreu-
se também a dados obtidos em campo cujas temáticas se reportavam à capacitação de recursos
humanos para a atividade turística, à valorização e conservação do patrimônio cultural, à melhoria
de infra-estrutura básica e de apoio turístico e ecoturístico, além da divulgação do município pelo
marketing.
Dessa forma o método utilizado foi o dialético, uma vez que se visou à captura da fala dos
atores sociais envolvidos (DEMO, 1995). Contudo, a dimensão da realidade tal como é vivenciada
pelos entrevistados também foi considerada. Quanto aos procedimentos e técnicas se utilizou um
MP3 para a gravação das conversas. Remontou-se à revisão bibliográfica inerente ao tema.

DE VELHO A NOVO AIRÃO: CARACTERIZAÇÃO DO MUNICIPIO


Breve histórico
As terras de Novo Airão foram habitadas primeiramente pelos índios Waimiri-atroarí,
Crichanã, Carabinari e Jauaperi. Acredita-se que a aldeia de Santo Elias tenha sido o segundo ou
terceiro núcleo de povoamento organizado por portugueses em terras amazonenses. Por volta de
1748 denominou-se freguesia de Airão, porém em 1858 a Lei provincial nº 92 reduziu o número de
Fórum Internacional do Meio Ambiente - A conferência da Terra 1087

freguesias e acabou excluindo Airão da Província. Após cem anos, integrou-se a Manaus pela Lei
estadual nº 96, tornando-se município de Novo Airão em 10 de dezembro de 1981, pela emenda
constitucional Nº 96 (PROECOTUR, 2002).

Potenciais naturais
Localizado na margem direita do Rio Negro, a 143 km de Manaus por via fluvial, o
município é área principal para a preservação dos invertebrados, dos répteis e dos anfíbios. Dos
estudos e inventários realizados na região devem ser destacadas espécies em extinção, como por
exemplo, o peixe-boi (PROECOTUR, 2002). Além disso, Novo Airão é cortado pelo Rio Negro,
sendo os tributários: Jaú, Padauari, Curluari, Camanau e Carabinani, além de muitos igarapés e
lagos inseridos, permeando o relevo com planura ondulada (RADAMBRASIL, 1978). Quanto à
fauna e flora do município, estas são biodiversas estando difusas em dois sistemas naturais: o
Parque Nacional do Jaú e a Estação Ecológica de Anavilhanas.
O Parque nacional do Jaú, criado pelo Decreto N° 85.200 de 24/09/80, corresponde à área
de proteção integral, totalizando 2.272.000 ha. O parque é cortado pelo rio Jaú, apresentando
corredeiras e saltos, além de 16 sítios arqueológicos (IBAMA, 2005; PROECOTUR, 2002), ao qual
o acesso é possível por, entre outros meios, barcos pelos rios Jaú, Carabinani e Unini. São pontos
atrativos: a Cachoeiras do Jaú, Praias do rio Jaú, Rio Unini, Rio Pauinini, Cachoeira do Igarapé
Preto, Trilha da Campina e Ruínas de Airão (IBAMA, 2005137; PROECOTUR, 2002).
Já a Estação Ecológica de Anavilhanas, conta com cerca de 400 ilhas, tendo sido criada
pelo Decreto n.° 86.061 de 02/06/81 para proteger e preservar o maior arquipélago fluvial do
mundo, como também promover pesquisas. Sua extensão é de 90 km ao longo do rio Negro e
centenas de igarapés, canais e lagos entre os municípios de Manaus e Novo Airão.
A área é de 350 mil hectares (IBAMA, 2005)138, contando com espécies de peixes
(tucunaré, pirarucu...), mamíferos aquáticos (peixe-boi e o boto), aves (papagaios, garças, araras,
além de tantas outras). Contudo, a estação não é vinculada diretamente ao turismo, já que é proibida
a visitação pública, exceto com objetivo educacional (PROECOTUR, 2002; IBAMA, 2005).
É proibida também a infra-estrutura turística em suas terras, embora conte com infra-
estrutura de apoio, incluindo base flutuante, casa com dormitórios, cozinhas e laboratórios em terra
firme, além de barcos regionais e motorizados, para garantir transporte e abastecimento aos usuários
(IBAMA, 2005).

AS DIRETRIZES DE INFRA-ESTRUTURA TURÍSTICA PRÉ-ESTABELECIDAS PELO


PROECOTUR

Novo Airão estando inserido em Unidade de Conservação Estadual e Federal, foi tido pelas
diretrizes do plano como um município a ser desenvolvido de maneira integrada entre aqueles que
vivem no município e os que visitam a cidade, sem desconsiderar todo esse patrimônio natural,
incluindo aí a identidade do município que é configurada pelos atrativos (o boto, por exemplo) do
município como também pelas festas desenvolvidas na cidade (festa do peixe-boi, por exemplo).
Havia sido previsto assim o desenvolvimento holístico para o município, preocupando-se
em capacitá-lo em recursos humanos, valorizando e conservando o patrimônio cultural, prevendo
ainda a melhoria na infra-estrutura básica e de apoio turístico, além da divulgação do município via
Brasil e mundo.

Capacitação dos Recursos Humanos


No âmbito da mão-de-obra local, estavam previstos pelo PROECOTUR cursos de
qualificação e capacitação de profissionais da atividade ecoturística. Entre esses cursos, figurava a
formação de guias contemplando o conhecimento da culinária amazônica e de Novo Airão. Falou-se
137
Com base no folder explicativo intitulo como ”Parque Nacional do Jaú”.
Fórum Internacional do Meio Ambiente - A conferência da Terra 1088

então, no preparo de profissionais que deveriam ter não só tais conhecimentos, como também
deveriam ter conhecimento no que concerne à recepção dos visitantes e turistas, com os quais a
comunicação por meio de línguas como o inglês era fundamental.

Valorizar e Conservar o Patrimônio Cultural


Como toda cidade, Novo Airão tem relíquias culturais que se remontam à sua história.
Como vimos à cidade surgiu com a denominação de Airão, transformando-se em Novo Airão após a
mudança de sua sede. Tudo que restou de Airão Velho, logo se constitui numa riqueza patrimonial
do município, configurando um valor arqueológico inestimável. Com o objetivo de valorizar e
conservar esse “acervo” histórico, entre as diretrizes do plano estava a de tombar o sítio de Airão
Velho.
Entretanto, a identidade da cidade não diz respeito somente a seu valor histórico, mas
também à festa do peixe-boi que já faz parte tanto do calendário festivo e cultural da cidade como
do cotidiano das pessoas. Buscar o fortalecimento dessas identidades de Novo Airão, consistiu num
outro objetivo do PROECOTUR.
Além de ser potencialmente assistido por suas riquezas naturais, o município é um dos
principais fabricantes de embarcações do Amazonas por conta da disponibilidade de autodidatas
nesse tipo de atividade, ou melhor, de trabalhadores que possuem acurado conhecimento empírico.
Nesse contexto, a construção naval se apresenta também aos “olhos” do plano como parte também
da história daquele povo, sendo necessária a construção de um museu naval que rememore esta
outra identidade da cidade.

Melhorar a Infra-Estrutura Básica de Apoio Turístico e Ecoturístico e Promoção do Marketing do


município
Para o desenvolvimento do turismo no município é crucial a construção de uma infra-
estrutura que possibilite à cidade a capacidade de atender e acomodar aqueles que vão a sua
procura. Fala-se então em infra-estrutura de acesso, além da ampliação de equipamentos turísticos.
Assim, o acesso à cidade, deveria satisfazer às condições para a efetivação da atividade, de
forma que pavimentar e recuperar a AM 352, rodovia que interliga o município a outras cidades do
Amazonas, configura-se entre as metas a serem atingidas pelo plano na infra-estrutura de acesso.
Porém, para o ponto de chegada à cidade, estava prevista a construção de um terminal rodo-fluvial
de modo a garantir a segurança e conforto no sistema. Completando essas metas, estavam as de
sinalização turística.
Já no que diz respeito aos equipamentos turísticos e de apoio, a criação de agências de
transportes e viagens, além da melhoria da infra-estrutura hoteleira, de serviços gastronômicos e
construção do Centro de Atendimento ao Turista corresponderam a outras metas a serem atingidas
pelo plano. Mas a cidade deveria estar apta também a oferecer redes de telefonia móvel.
No que concerne à promoção do marketing, o município também precisaria ser divulgado
nacional e internacionalmente. Para isso, seria indispensável para o plano a divulgação de Novo
Airão via marketing.

METAS CUMPRIDAS PARA A INFRA-ESTRUTURA TURÍSTICA? A CIDADE DE NOVO


AIRÃO REVISTA DO IDEAL AO REAL
Dos recursos humanos voltados às atividades turísticas
Com base nas informações obtidas no CAT (Centro de Atendimento ao Turista), foi
constatado que não houve a criação de cursos de capacitação profissional voltados para o ensino de
idiomas. A cidade conta com apenas dois guias que falam o inglês, sendo que um fala também
alemão. Em outras palavras, não foram formados novos guias capacitados para falarem outros
idiomas, conforme o estabelecido pelo plano.
No âmbito do atendimento ao turista, a recepção não deve se dá somente mediante bons
hotéis e restaurantes. O atendimento aos “visitantes” é outra variável indispensável para o
funcionamento do ecoturismo. Nesse sentido, fala-se num adequado tratamento ao mesmo pelos
Fórum Internacional do Meio Ambiente - A conferência da Terra 1089

atendentes de hotéis, restaurantes e outros. Isso também não tem sido cumprido, visto que os
trabalhadores envolvidos com o turismo não têm sido capacitados para recebê-los.
A esse respeito Jaqueline revelou “[...] o pessoal quando volta diz que a mulher
(“responsável” pelo boto) tratou mal eles, com ignorância. É lamentável, muitas pessoas não voltam
mais...” Simeão (Presidente da Associação de Produtores) afirmou que a preparação não deve ser
feita só da mão-de-obra envolvida para receber o turista. Este também precisa ser preparado: “O
turista tem que ser preparado pra ir pra um local. Pela falta de preparação, as pessoas perdem um
pouco da sua cultura.” Mariano teve a mesma perspectiva de Simeão e disse: “...é preciso capacitar
a comunidade, pra se preparar. Falta uma educação pro turismo.”
Contudo, por capacitar o turista inclui também o respeito que este deve ter para com o
ambiente, já que turismo ecológico não é só o que está voltado para, entre outras atividades, visitas
ao viveiro de serpentes. Inclui muito mais que isso: a não degradação ambiental. Mariano revelou
“...o que não pode também é a gente limpar as praias e os turistas quando chegam aqui sujarem
tudo.” Jaqueline indicou que “às vezes [os turistas] vem pra cá e deixam tudo sujo...”
Simeão foi ainda mais longe ao dizer que deveria “ter uma sensibilização e capacitação da
população junto às empresas de turismo. Para que isso aconteça de uma maneira mais rápida é
preciso uma união dos órgãos com as pessoas.” O entrevistado deixa claro também que essa
capacitação de mão-de-obra comunitária deve ter o apoio não só do poder público como também do
privado. Fala-se num dos pontos chaves para que o ecoturismo em Novo Airão viesse a funcionar.
Entretanto, esta integração Comunidade-Poder público-Poder privado não tem sido
cumprida tal como havia sido estabelecida pelas Diretrizes e Estratégias propostas no Proecotur
para o município. Ao invés desse “tripé” integrado se efetivar de maneira que todos fossem
beneficiados, uma minoria detém os ganhos oriundos das atividades turísticas. O apoio do poder
público às comunidades tem sido pouco efetivado ou restrito apenas a algumas: “Temos apoio da
Fundação Vitória Amazônica. A Prefeitura também nos apóia.” (Índia da Etnia Baré).

Da valorização e preservação do patrimônio cultural


O peixe-boi: símbolo da cidade?
Novo Airão inovou aliando desde 1989 sua imagem a do Peixe-boi, o símbolo do
Município. Por este motivo a festa regional de Novo Airão é o festival do Peixe-Boi, que neste ano
ocorrerá por volta de setembro. O festival envolve muitos habitantes, tanto para a confecção das
fantasias, como para a representação.
Essa manifestação acontece durante um final de semana prolongado e permite aos grupos
representarem as duas UC (Unidades de Conservação) da região que se confrontam: o Peixe-Boi do
Parque Nacional do Jaú e o Peixe-Boi da Estação Ecológica das Anavilhanas. O evento atrai para
Novo Airão cerca de cinco mil visitantes oriundos principalmente de Manaus e de outros
municípios do interior.
Todavia, segundo depoimentos de representantes das associações, a data deste festival tem
sido interferida pela sucessão dos governantes do município. Com relação ao desenvolvimento
dessa festa, o plano é bem claro quando diz que o festival do peixe-boi deve se dá
independentemente das eleições e das sucessões dos cargos dos dirigentes. Moradores revelaram
que o prefeito não tem dado o mínimo apoio ao festival, “virando até mesmo as costas” para essa
realização da cultura local.
O peixe-boi, portanto, configura-se como um símbolo da cidade. Porém, Novo Airão ainda
não tem o seu prefeito definido. Consequentemente o apoio que deveria ser dado pelo Governo do
Estado à festa não tem sido efetivado.

Identidade Individual ou Coletiva?


O caso da “mulher do boto”
Com base em observação in loco verificou-se que o principal atrativo turístico da cidade é
o boto-tucuxi. Contudo, trata-se de um patrimônio natural que ao invés de ser utilizado em
Fórum Internacional do Meio Ambiente - A conferência da Terra 1090

benefício de uma coletividade, sendo portanto uma identidade coletiva do município, tem sido
apropriado por uma única pessoa. Nesse sentido, o boto passou a ser uma identidade individual.
A “mulher do boto” como é conhecida ainda pré-estabelece os horários de
“trabalho”do animal, interferindo em seu relógio biológico, já que os botos “trabalham” em horário
comercial. Além disso, para ter um contato mais direto ao animal, contribuindo ainda na sua
alimentação, a “proprietária” cobra uma taxa de R$ 15,00 para que o turista adquira um peixe para
alimentar os botos. Como se não bastasse o peixe é vendido ainda pela mesma pessoa que se diz ser
dona dos animais.
Isto tem se constituído num outro obstáculo a ser ultrapassado para o desenvolvimento do
turismo no município, já que o não cumprimento de tais exigências para a “proprietária” a deixa
frustrada, ao ponto de os visitantes serem destratados. A principal causa disso está na falta de
legislação turística, que embora estabelecida pelo plano não foi efetivada, desorganizando o espaço
quanto ao uso pela atividade turística.

E como ficam o dinossauro e o peixe-boi?


Conforme informações obtidas no CAT, o dinossauro construído na praça central da
cidade, não está ligado à historia da cidade. No dizer das atendentes: “É devido Novo Airão ser o
segundo município arqueológico do Estado do Amazonas. E o prefeito... colocou o dinossauro
devido... ter muito a ver com a arqueologia né?” (Ilza, 2008)
E ainda: “Primeiramente no município temos o boto né? Que as pessoas já vêm na intenção
de ver o boto...? (...) Até falam ‘como o prefeito botou um Dino bem na praça, se deveriam colocar
um peixe- boi que na entrada (da cidade) tem um peixe-boi... e no meio tem um dinossauro?’ (Ilza,
2008)
Como é possível verificar trata-se de uma iniciativa do Prefeito que pouco levou em conta
a alma do luar, pois como destacou Yázigi (2001) todo planejamento deve levar em conta a
personalidade do lugar. Ademais cada lugar possui a sua identidade. No caso de Novo Airão
podemos perceber que o boto e o peixe-boi se configuram como uma identidade da cidade. Além do
dinossauro não ter nada a ver com Novo Arão, as pessoas que visitam a cidade terminam por ficar
confusas. Além do boto, do peixe-boi (patrimônios naturais e culturais) e do dinossauro (patrimônio
construído), a construção do museu naval, que reforçaria a tradição naval da cidade, não se realizou,
segundo informações do CAT. Fato também confirmado pelo representante de um estaleiro em
Novo Airão.

Melhoria na Infra-Estrutura Básica de Apoio Turístico e Ecoturístico


Infra-estrutura de acesso
Através de observações realizadas em campo, constatou-se que todo o trajeto das rodovias
AM 070 e AM 352, encontram-se bem pavimentada.
Ainda nesta direção, observou-se também, a construção de calhas coletoras ao longo da
AM- 352, já que estas, além de serem um dos componentes do sistema de micro drenagem, são
destinadas também à coleta das águas pluviais provenientes das encostas e como a AM- 352 possui
muitos trechos relativamente íngremes, o poder público cumpriu com a construção dessas calhas
para evitar o processo de erosão.
Vale ressaltar que quando as moléculas de água da chuva caem nessas encostas são de tal
velocidade e impacto que, se a encosta for destituída de vegetação, a tendência é que grande
quantidade de terreno seja erodido causando assim, desmoronamentos de terra provocados pela
erosividade das chuvas, comprometendo a estrutura da estrada. No entanto, não se constatou tal
terminal rodo-fluvial no município de Novo Airão.

Infra-estrutura Turística
Meios de hospedagem
Na sede de Novo Airão e em seus arredores foram encontrados 08 estabelecimentos, estes
estão divididos em Pousadas e Hóteis. Segundo pesquisas realizadas em campo, o hotel mais antigo
Fórum Internacional do Meio Ambiente - A conferência da Terra 1091

foi criado em 1989, chamado de Hotel Josely e os mais recentes são a Pousada Jandira e Pousada
Jaú, ambas em 2007.
Os estabelecimentos em geral, possuem poucos leitos, a média é de 14 leitos. No entanto, a
Pousada Bela Vista foge totalmente a esse cálculo, pois oferece 70 leitos, possuindo a maior
capacidade de ocupação. A Pousada Jaú têm apenas 08 leitos, correspondendo a uma menor
capacidade de ocupação.
Um fator que chamou bastante atenção foi o fato de que, além do Turismo na cidade ainda
não está em pleno vigor, apesar de a cidade apresentar belezas cênicas únicas, grande parte dos
turistas são de origem regional, pois os turistas estrangeiros normalmente vão de passagem pela
cidade ou vêm como passageiros de navios de empresas turísticas. Apenas duas pousadas
hospedavam turistas estrangeiros e nacionais: a Bela Vista e a Águas Negras.
O grau de escolaridade dos funcionários das pousadas era bastante baixo, pois mais de
50% das pousadas de Novo Airão possuíam funcionários cujo nível de escolaridade era o
fundamental, fator bastante prejudicial para o relacionamento com os hóspedes e também para uma
futura expansão dos negócios. Nesse sentido, contar com funcionários capacitados
profissionalmente é essencial para as atividades turísticas já que é
[...] igualmente importante que o empreendedor que está a frente de uma empresa
disponha das competências e habilidades para programar estratégias de crescimento,
dentre as quais se destaca a capacidade de obter informações (...), assim como a visão
clara de um modelo de negócios específicos e diferenciado para asa suas
empresas”(VIEIRA FILHO e FERREIRA, 2006 apud Bounois; Marion; Toulouse,
1993, p. 21).

Além disso, 40% tinham funcionários com nível médio, sendo que nem sempre este era
totalmente finalizado e apenas 10% das pousadas, ou seja, uma possuía funcionário com nível
superior: a Pousada Jandira.
Grande parte das pousadas hospedam turistas, em sua maioria, provenientes da região
amazônica, embora fosse falha com relação a proficiência em outros idiomas. Dessa forma, para
uma cidade como Novo Airão que quer ser turística apresenta-se a necessidade de profissionais
qualificados que falem outros idiomas (inglês, espanhol, alemão...).
As Pousadas apresentavam serviços, em sua grande maioria, nas U.H’s (Unidades
Habitacionais), com ar-condicionado, televisão, estacionamento, serviço de lavanderia, tendo alguns
serviços adicionais como café-da-manhã e internet.
Os parâmetros ambientais indicavam que, conforme dados obtidos in loco apenas dois
estabelecimentos (Pousada Bela Vista e Hotel Josely) não possuíam coleta seletiva. Todas
destinavam o lixos à Lixeira Pública do município. A água potável era proveniente de poços
artesianos, sendo que a Pousada Gimon obtinha água do rio.
Nenhum dos estabelecimentos visitados possuía tratamento de efluentes líquidos. A
energia elétrica era proveniente da CEAM-Companhia Energética do Amazonas. Dos oito
estabelecimentos estudados, apenas quatro possuíam capacitação ambiental, e outros quatro não. É
importante chamar a atenção para a capacitação ambiental, uma vez que esta tarefa ‘‘...implica
planejar adequadamente o gerenciamento ambiental do equipamento, aprimorando continuamente
as políticas, princípios básicos e as estratégias de planejamento ambiental”(VIEIRA FILHO e
FERREIRA, 2006, p. 21).

Estabelecimentos de Alimentação
Na sede do município foram contabilizados 12 estabelecimentos de alimentação, um
número bastante considerável para um município ainda em fase de desenvolvimento de seus
atrativos turísticos. Os restaurantes e lanchonetes puderam se classificados em 03 categorias,
levando em consideração a capacidade de atendimento dos mesmos: 1ª categoria- de 0 a 50
assentos, possuindo 04 restaurantes (Lanchonete do Gordo, Restaurante Kigostoso, Restaurante
Boto Cor de Rosa e Churrascaria Beira Rio); grupo 2- variou de 51 a 100, estando inseridos 04
Fórum Internacional do Meio Ambiente - A conferência da Terra 1092

restaurantes (Esquinão Pizzaria, Restaurante Carioca, Giga baity e Restaurante 3 irmãos) e a 3ª


categoria correspondeu aos estabelecimentos com assentos acima de 101, tendo sido encontrados
apenas 02 (Restaurante Anavilhanas e Lanchonete da Preta).
Entretanto, sob o ponto de vista dos moradores parece que a quantidade de hotéis ainda não
era o suficiente para receber os turistas. Em entrevista, os moradores assinalaram que ainda há uma
necessidade de melhoria: “Primeiramente era muito bom ter uma rede de celular aqui, pras pessoas
se comunicarem. Parece que aqui as pessoas ficam paradas no tempo. Mais pousadas, hotéis que ta
faltando, iluminação também. O povo reclama muito sobre isso.” (Jaqueline). Uma integrante da
etnia Baré foi à mesma linha que Jaqueline e relatou que “é preciso melhorar a infra-estrutura de
hotéis e principalmente restaurantes.” Semelhantemente respondeu Mariano (Presidente da
Associação dos Pescadores) destacando que o turismo em Novo Airão deveria contemplar “[...] uma
infra-estrutura melhor, com melhor hotéis [...]”
Os cardápios dos restaurantes e lanchonetes variam entre o regional e o nacional, sendo
que a grande maioria possui os dois tipos de Menu´s. A culinária internacional era ausente, pois é
preciso levar em conta que os turistas também optam por uma alimentação que se assemelhe a
deles. Os cardápios internacionais deveriam ser inseridos principalmente nos 03 estabelecimentos
(Esquinão Pizzaria, Restaurante Anavilhanas e Restaurante Boto Cor de Rosa) da cidade que
recebem turistas estrangeiros. Os demais restaurantes recebem turistas locais, da região e do
restante do País.
A Coleta Seletiva é bem efetiva nos restaurantes e lanchonetes, embora 03 não a realizem,
correspondendo a: Lanchonete da Preta, Restaurante Kigostoso e Churrascaria Beira Rio. Todos
depositam o lixo na Lixeira Pública do Município. Com relação aos seus efluentes líquidos nenhum
restaurante realiza o tratamento.
A energia elétrica é proveniente da CEAM que possui uma termoelétrica na sede de Novo
Airão. Para finalizar, 02 restaurantes não foram contatados por motivos adversos, os
estabelecimentos são: Lanche e Restaurante Baliza e Banca do Churrasco.

Do Marketing do município
Pelo fato de Novo Airão ainda ter definido seu prefeito, pouco ou nada tem sido feito no
sentido de promover o município via marketing nos roteiros nacionais e internacionais. Com a
indefinição do prefeito da cidade, não tem ocorrido o repasse de verbas estaduais para o município.

CONSIDERAÇÕES FINAIS
Novo Airão só irá de fato se desenvolver como centro turístico quando for definido o seu
dirigente na esfera política municipal. Não há como planejar e efetivar o turismo como receptivo,
visto que a infra-estrutura básica do lugar é parcialmente isenta para a comunidade local. Porém a
própria sociedade civil tem autonomia para ser criativa e para a efetivação do projeto criado para o
turismo.
Uma das alternativas seria a busca de aperfeiçoamento pessoal sobre serviços para o
turismo, exigindo por meio do Governo estadual programas educacionais que visem este mercado
promissor. Também a comunidade da sede de Novo Airão pode organizar os vários serviços da
cidade, mediante a divulgação de seus pontos hoteleiros e turísticos.
Podemos identificar pontos críticos que precisam ser revistos tanto pelas esferas
governamentais, como pelas não governamentais: 1- A falta de capacitação profissional da mão- de-
obra envolvida (com ausência de cursos de relações humanas e idiomas), bem como também a
precariedade da infra-estrutura; 2- Os atrativos culturais (boto, peixe-boi) precisam ser reavaliados,
pois confundem os turistas levando-os a questionar qual desses elementos tem a ver de fato com o
lugar enquanto identidade: 3- Embora a quantidade de hotéis tenha crescido conforme os dados
apresentados, é necessário que a quantidade de leitos seja revista em caso de a cidade receber um
grande número de turistas em algum evento no município.
Fórum Internacional do Meio Ambiente - A conferência da Terra 1093

REFERENCIAS
ALVES, Kerley dos Santos; SILVA, Jersone Tasso Moreira; CAVALCANTI, José Euclides
Alhadas. Gestão Ambiental de resíduos sólidos no setor hotelaria. In: DIAS, Reinaldo; VIEIRA
FILHO, Nelson Quadros (Org.). Hotelaria e Turismo: Elementos de Gestão e Competitividade. São
Paulo: Alínea, 2006.
AMAZONAS. Governo do Estado.Plano de desenvolvimento do pólo de ecoturismo do Estado do
Amazonas. Antônio de Lima Mesquita (Coordenador - Geral). Manaus : Ambiental Amazônia,
2002.
CAPRA, Fritjof. A Teia da Vida: Uma nova compreensão cientifica dos sistemas vivos. São Paulo:
Cultrix, 1996.
COSGROVE, Denis. Geografia Cultural do Milênio. In: CORRÊA, Roberto Lobato;
ROSENDAHL, Zeny (Org.). Manifestações da Cultura no Espaço. Rio de Janeiro: Ed.UERJ, 1999.
p.17- 46.
CRUZ, Rita de Cássia Ariza da. Introdução à geografia do turismo. São Paulo: Roca, 2001.
DEMO, Pedro. Metodologia Científica em Ciências Sociais. São Paulo: Atlas, 1995.
FARIA, Ivani Ferreira de (Coord). Turismo: lazer e políticas de desenvolvimento local. Manaus:
EDUA, 2001.
LINDENBERG, Kreg ET AL. Ecoturismo: Um guia para planejamento e gestão. Traduzido por:
Leila Cristina de. 3.ed. São Paulo: SENAC, 2001.
TUAN, Yi-fu. TOPOFILIA: Um estudo da Percepção, atitudes e valores do meio Ambiente.
Tradução de Lívia de Oliveira. São Paulo: DIFEL, 1980.288 p. Título original: TOPOPHILIA: A
estudy of environmental perception, atpitudes, and values.
VIEIRA FILHO, Antônio; FERREIRA, Maria Araújo Tavares. In: DIAS, Reinaldo; VIEIRA
FILHO, Nelson Quadros (Org.). Hotelaria e Turismo: Elementos de Gestão e Competitividade. São
Paulo: Alínea, 2006.
______. Política de turismo e território. 2 ed. São Paulo: Contexto, 2001.
YAZIGI, Eduardo. A alma do lugar: turismo, planejamento e cotidiano em litorais e montanhas.
São Paulo: Contexto, 2001.
______. Deixe sua estrela brilhar: criatividade nas ciências humanas e no planejamento. São Paulo:
CNPq/ Editora Plêiade, 2005.
Fórum Internacional do Meio Ambiente - A conferência da Terra 1094

ANÁLISE DOS PROCESSOS GEOMORFOLÓGICOS A CAMINHO DE ANGRA DOS


REIS/RJ

Andréa de Oliveira Raimundo


UERJ, sl. 4005-B – andrea.minney@ig.com.br

RESUMO
A compreensão dos fenômenos naturais e antrópicos possibilita o planejamento das
atividades realizadas pelo homem sobre o espaço e a manutenção dos impactos gerados. Assim, este
trabalho teve como objetivo analisar os processos geomorfológicos a caminho de Angra dos Reis /
RJ, no entorno da rodovia Rio-Santos (BR-101). Tendo em vista a intensificação do turismo na área
e as suas possíveis conseqüências, hoje há uma preocupação no futuro do meio ambiente e da
população local, já que se observa um fluxo intenso de veículos, principalmente, em feriados e
finais de semana.
Palavras-chave: Processos geomorfológicos – Rodovia Rio-Santos – Angra dos Reis

ABSTRACT
The understanding of natural and man-made phenomena enables the planning of activities
undertaken by humans on space and the maintenance of impacts generated. Therefore, this study
aimed to examine the processes geomorphologic the path of Angra dos Reis / RJ, in the
surroundings of Rio-Santos highway (BR-101). In view of the intensification of tourism in the area
and their possible consequences, today there is a concern in the future of the environment and local
people, as it observes a stream of vehicles intense, especially on holidays and weekends.
Key-words: Processes geomorphologic – Rio-Santos highway – Angra dos Reis

INTRODUÇÃO
A Geomorfologia tem como objeto de estudo as formas do relevo. Essas são conhecidas do
ser humano desde quando o homem teve que compreender a natureza ao seu redor a fim de se
locomover, construir moradias e cultivar o solo. Com o desenvolvimento de seus conhecimentos, a
percepção de origem e evolução das formas geomorfológicas foi sendo compreendida. As visões e
os conceitos sobre as paisagens geomorfológicas, somente nos últimos séculos, foram sendo
direcionadas a um conjunto coerente de ações que se relacionam (CUNHA, 1995). Ao longo da
história buscou-se compreender os processos geomorfológicos, ou seja, analisar o resultado da
atuação dos agentes geomorfológicos (internos ou endógenos e externos ou exógenos) em função
das características do relevo.
Visto a preocupação no futuro do meio ambiente, este estudo tem como objetivo analisar
os processos geomorfológicos a caminho de Angra dos Reis / RJ, no entorno da rodovia Rio-Santos
(BR-101), especificamente, no trecho de fluxo mais intenso: a partir do encontro com a Avenida
Brasil (principal via de circulação do município do Rio de Janeiro/RJ) até Angra dos Reis, passando
por outros municípios. Tendo em vista a intensificação do turismo na área e as suas possíveis
conseqüências, hoje há uma preocupação no futuro do meio ambiente e da população local, já que
se observa um fluxo intenso de veículos, principalmente, em feriados e finais de semana, podendo
acarretar no aumento do número de faixas da rodovia ou outras engenharias que busquem aumentar
a capacidade de fluxo de automóveis.
Este estudo também contribui com a análise ambiental, cuja abrangência incorpora não só
a Geomorfologia, mas como também a Geologia, a Geografia, a Climatologia, a Pedologia, a
Ecologia e outras disciplinas. Essa interdisciplinariedade além de permitir uma análise das relações
sociedade/natureza, possibilita uma visão holística da paisagem e a sua complexidade.
Como metodologia foi realizado trabalho de campo pelo trajeto da BR-101 e análise de
pontos críticos para a efetivação dos estudos geomorfológicos. A visualização das formas do relevo
e das marcas nele presente direciona a identificação de sua gênese e evolução, complementando
houve levantamento bibliográfico antes e após o campo. Assim, o entendimento dos processos que
Fórum Internacional do Meio Ambiente - A conferência da Terra 1095

atuaram no relevo no passado permite repassá-los para o presente, possibilitando um planejamento


sustentável no futuro.

RODOVIA RIO-SANTOS
Através do percurso analisado, início da Rodovia Rio-Santos (BR-101) passando por
Sepetiba até Angra dos Reis em sentido ao estado de São Paulo, observa-se a predominância das
baixadas litorâneas e da Serra do Mar.

FONTE: www.transportes.gov.br

Figura 1 – Rodovias principais do sul fluminense.

A rodovia BR-101 (Figura 1) apresenta 505 km e liga a cidade do Rio de Janeiro a Santos,
porém ela é um prolongamento da estrada federal que acompanha o litoral brasileiro, desde o
Nordeste até o Rio Grande do Sul. Sua construção foi concluída na década de 70 do século XX em
plena ditadura militar, cuja proposta era de desenvolvimento do país. Juntamente a esse projeto, o
governo planejou a construção de estaleiros, do terminal da Petrobrás e da Usina Nuclear Angra 1 e
2. Em 1975, há o término dessa rodovia, contribuindo para um aumenta abrupto da população de
Angra dos Reis.
Um dos problemas gerados foi a especulação imobiliária, pois há poucas áreas planas na
região. A fim da melhor compreensão da morfologia local foi necessário a análise dos mapas a
seguir.

FONTE: www.ibge.gov.br

Figura 2 – Mapa do esboço geológico


Fórum Internacional do Meio Ambiente - A conferência da Terra 1096

FONTE: www.ibge.gov.br

Figura 3 – Mapa dos compartimentos de relevo

No primeiro mapa de esboço geológico (Figura 2) do Instituto Brasileiro de Geografia e


Estatística (IBGE) – Esboço geológico da área em estudo, a cor bege representa rochas gnáissicas
de origem magmática e/ou sedimentar de médio grau metamórfico e rochas graníticas
desenvolvidas durante o tectonismo (Era Paleoproterozóico). No trajeto do Rio de Janeiro até Angra
dos Reis há predominância, observado pela cor verde que representa sedimentos arenosos e argilo-
carbonáticos de grau metamórfico fraco a médio (Era Neoproterozóico) e a amarela que simbolizam
sedimentos relativos a aluviões atuais e terraços mais antigos do Holoceno (Era Cenozóico).
No segundo, o mapa dos compartimentos de relevo (Figura 3), a cor amarela representa
Planícies Marinhas, Fluviomarinhas e/ou Fluviolacustres (classe: Depósitos sedimentares
inconsolidados Terciários e/ou Quaternários, subclasse: Litorâneos) e a cinza representa Escarpas e
Reversos da Serra do Mar (classe: Faixas de dobramentos e coberturas metassedimentares
associadas, subclasse: Faixas de Dobramentos do Sudeste/Sul).
Comparando com o mapa das rodovias principais do sul fluminense, conclui-se que a
rodovia BR-101 foi construída em local de falhas e fraturas, caracterizando uma área de
instabilidade. Isso está relacionado com o soerguimento da Serra do Mar, que antes era um bloco
único com um sistema de fraturas existentes e com o soerguimento desse, houve falhas de tensão,
originando a Serra da Mantiqueira, a Serra do Mar, os Maciços Litorâneos, as ilhas e novas fraturas.
Essas formas sofreram e continuam a sofrer erosão suavizando o contorno delas.
Antes da rodovia, o acesso à Angra do Reis era difícil, entretanto, com a sua construção
facilitou o transporte até essa região, cortando e contornando as áreas elevadas, tendo em grande
parte da estrada a visualização do mar ao lado esquerdo sentido Santos. Percebendo o entorno,
verifica-se a presença de vossorocas, deslizamentos e suportes para evitar desmoronamentos. Isso é
devido ao tipo de relevo da região associado ao clima quente úmido que contribui ao intemperismo
químico.
Quanto à metodologia para a localização em campo das áreas anteriormente representadas
e citadas foi necessário a utilização de mapa, principalmente, nesta região cercada de barreiras
naturais que impedem a visão de alcançar o horizonte. A primeira ação feita ao chegar na área de
estudo foi orientar o mapa, vendo alguma referência, a exemplo uma estrada (a rodovia BR-101).
Após, baseando-se no mapa identificou-se o Norte, o Sul, o Leste e o Oeste, e os relevos (ou um
outro marco) a cada orientação cartográfica. A exemplo, no primeiro ponto analisado, o morro mais
alto (Serra do Mar) é o Leste, a planície está a Oeste. Como a parte superior do mapa é o Norte,
deve-se mobilizar o mapa para que a parte superior dele seja também o mesmo.
No trajeto percorrido na rodovia Rio-Santos, pode-se observar uma vegetação conservada.
Isso é devido que anteriormente a sua construção, o acesso era feito pelo mar ou pelo Vale do
Paraíba, acabando por restringir a área. Assim, a Mata Atlântica se tornou nas últimas décadas um
dos atrativos da área em estudo, apesar do impacto que vem ocorrendo devido à pressão urbana
Fórum Internacional do Meio Ambiente - A conferência da Terra 1097

oriunda, principalmente, da construção da rodovia, ameaçando um dos biomas mais ricos em


espécies endêmicas do mundo, em função de diferenças de solo, relevo e características climáticas
existentes (ARRUDA, 2005).

A CAMINHO DE ANGRA DOS REIS


Conforme apresentado na Introdução deste trabalho, a metodologia foi desenvolvida nos
pontos críticos observados na BR-101. Em Itaguaí ocorreu a analise do primeiro ponto, havendo a
visualização de três tipos de formas de relevo: planície (baixada, no caso), colinas e montanhas, ou
seja, o nível mais baixo, o nível colinoso e o nível montanhoso, respectivamente. Somente, essa
percepção possibilitou afirmar que há mais erosão na montanha do que na planície, sendo esta
última, geralmente, depósito.
Por ser o relevo o objeto deste estudo, ao chegar no local, observou-se as topografias
isoladas ou em conjunto e suas altitudes, enfim, analisou-se o relevo, pois é através da definição de
sua posição, altitude e forma que se pode distinguí-lo. Primeiramente, notou-se o conteúdo do
relevo em estudo, porque é a partir desse que há possibilidade de identificar os processos no qual foi
formado. O meio utilizado foi o mapa geológico mostrado anteriormente.
Já a análise dos processos atuantes ocorreu através da observação dos resultados e da
capacidade de relacioná-los com o primeiro. Como não se vê o intemperismo (atuante em nível
molecular), e somente se sabe que ele acontece através das características que o mesmo acarreta, a
exemplo o desmoronamento.
Nesse mesmo ponto, observou-se os usos que o homem faz da superfície, associando
características do relevo ao seu interesse. A exemplo, um corte observado, cuja retirada da terra
possivelmente foi para aterrar uma outra área. Também, visualizou-se saibros que são formados de
argilas e encontram-se em terrenos sedimentares, ou em rocha in situ, a exemplos, colinas que
sofreram dobramentos e material cristalino decomposto, respectivamente.
Continuando a análise da área, notou-se que havia pouca vegetação ao redor. Este
desmatamento ocorreu porque em Itaguaí houveram loteamentos, porém, sem muita ocupação.
Assim, aproveitaram-se o espaço para produzir grama impedindo o crescimento de vegetação e
lucrando com a venda da mesma.
Outra característica observada foram as rachaduras no solo devido às chuvas. A água
infiltra porque o solo é argiloso e poroso. E esse se expande, porém, com o sol ele retrai, formando
canais na superfície devido ao escoamento da água por essas rachaduras. A fim de saber se o solo é
argiloso colocou-se uma pequena quantidade na mão para atritar entre os dedos, como a porção se
dissolveu é argila.
Ainda, pode-se afirmar que esse solo é constituído por argila 2:1, do tipo montmorilonitas,
por terem duas lâminas tetraédricas e uma octaédrica. Assim, o solo adquiriu uma menor coesão,
permitindo uma maior penetração. Essas argilas são denominadas expansivas, pois as partículas das
mesmas se expandem quando umedecidas, mas ao se secarem se contraem e aparecem rachaduras
no solo. Este último apresenta uma vantagem química muito boa, já que ele tem uma grande
capacidade de adsorção de cátions (Ca, Mg, Na, K), mas há uma desvantagem física porque ele é
muito suscetível à erosão devido a sua formação química.
Na encosta houve formação de leques aluvionais devido ao declive, à ausência de
vegetação por facilitar sua ocorrência e a uma certa compactação, que propicia o escoamento
formando ravinas e ao se aproximar do solo forma esses leques ou canais. Através dos mesmos,
pode-se perceber que as texturas (tamanhos de partículas) dos materiais variam (matacão >
cascalho > seixos > granulo > areia > silte > argila). Os sedimentos mais grosseiros se localizam
próximo ao declive. E aqueles mais leves alcançam uma distância maior, pois o gradiente é baixo e
houve dissipação de energia, e por possuírem um peso menor precisam de menos energia para o seu
transporte comparando com os materiais mais pesados.
Para se ter um maior conhecimento da área em estudo é preciso investigar o material
existente. Assim, pode-se verificar qual seria o tipo do terreno, fazendo furos com um martelo no
sentido vertical para verificar se há camadas no local. Após notar um alinhamento vertical,
Fórum Internacional do Meio Ambiente - A conferência da Terra 1098

materiais intrusivos e materiais decompostos in situ, ou seja, são vestígios de materiais que se
decompuseram a partir de uma rocha matriz, concluiu-se a presença de rocha cristalina e os
materiais que não estão decompostos são aqueles mais resistentes.
No segundo ponto, pode analisar as várias formas de relevo de um morro recortado (Figura
4). Apresentando formas côncavas e convexas, esta última representa um relevo mais erodido. É
bom ressaltar que um morro pode apresentar uma única forma, como aqueles que se assemelham a
uma meia laranja (forma convexa).

FONTE: Própria autora


D
C A
B

Figura 4 – Segundo ponto de análise

O local apresenta uma ruptura de declive (Figura 4 – destaque A), ou seja, uma perda da
continuidade do relevo. Isso pode ter ocorrido por processo erosivo ou falhamento. Também há
algumas reentrâncias e saliências, sinal de que há diferença litológica ou geológica no relevo. Esses
materiais têm relação com os sedimentos encontrados dentro da Baía de Sepetiba, devido ao
processo de formação.
Nessa mesma área pode haver a formação de um rio, pois o grotão possibilita o mesmo,
além da tendência em cortar o relevo. Há, também, afloramentos rochosos (Figura 4 – detalhe B)
que devido a uma rocha cujo formato se assemelha a de um sapo, esse local recebeu o nome de
“parada da rocha sapo”. Sabe-se que esses blocos isolados são afloramentos rochosos, pois a sua
viscosidade é irregular, ou seja, ele não foi intemperizado no mesmo local, houve movimentação.
Essa mesma figura visualiza-se três tipos de impactos ambientais: o bananal (Figura 4 –
detalhe C) propicio a esta área devido ao clima úmido e insolação constante (elevada temperatura)
que está acima da APA (Área de Proteção Ambiental), ou seja, da cota de 100m; as redes de
transmissão de energia (Figura 4 – detalhe D), cuja empresa responsável mantém um clarão para a
realização de manutenções.
A paisagem no terceiro ponto em Muriqui (Figura 5) é constituída por baixada, vale, antigo
vale, várias linhas de crista e bordas da Serra do Mar. Os vales seguem uma hierarquia, e as cristas
sofrem oscilações porque entre elas há um material menos resistente que é erodido facilmente. As
ombreiras são parecidas, demonstrando que há uma relação entre elas, ou seja, sofreram uma
mesma ação no passado, pois essas são marcas de antigos níveis de erosão.

FONTE: Própria autora

Figura 5 – Terceiro ponto de análise

Nota-se a costa afogada devido à elevação do nível do mar e o “corredor verde”, cuja zona
de instabilidade pode ter sido oriunda da implantação de um gasoduto ou um oleoduto. Também
Fórum Internacional do Meio Ambiente - A conferência da Terra 1099

pode-se observar a baixada como sendo o nível de base, os sedimentos no fundo dos depósitos de
plataforma que são os mais antigos e rias que são baixos cursos dos rios “afogados” no litoral pelo
aumento do nível do mar.
O quarto ponto foi entre Muriqui e Mangaratiba, onde destaca-se os vestígios do vale
estreito que havia no local e o material arenoso depositado. No lado oposto há o Pontal de
Marambaía, ou seja, o final do cordão arenoso da Marambaía, onde é possível ver a Baía de
Sepetiba, apesar da presença da restinga. Nesta área de litoral há antigas dunas que apesar de
estarem cobertas por vegetação, elas são um vestígio da ação eólica. Uma planície pode ter algumas
nuanças, sendo as áreas sem vegetação as melhores para vê-las. Outra característica que essa área
plana pode apresentar é o represamento de água, pois bem como os sedimentos marinhos, essa
forma de relevo pode também impedir a passagem de água, represando-a.
Nesse mesmo ponto, notou-se uma antiga vossoroca (Figura 6) próxima à estrada, e para
evitar que ela fosse interditada pelos sedimentos carreados, fizeram-se um corredor de cimento,
uma estrutura de dispersão, para diminuir a velocidade da água e assim amenizar a erosão. Uma
característica que comprova que uma vassoroca é antiga é a presença de vegetação, o que significa
que ela é mais velha que a camada vegetal. No local também foi visto dois terraçamentos que foram
construídos para evitar desmoronamento.
Outra característica notória na paisagem foi o aterro que fizeram para construir a rodovia,
onde se foi tirada a fotografia, e o corte no relevo para construir o resto da rodovia que aparece na
figura. E assim foi durante todo o percurso na BR-101.

FONTE: Própria autora

Figura 6 – Quarto ponto de análise

Bem como essa vossoroca no relevo, há muitas cicatrizes antigas e recentes. O grotão
anteriormente citado era recente. Enquanto que o bloco destacado em vermelho na figura 6 é antigo.
Quando mais o bloco estiver próximo do topo da área elevada (bloco destacado em azul),
provavelmente, menor será a sua idade, e quando estiver longe, mais velho será, pois as chances de
ter ocorrido movimento (exposição) é maior.
A Usina Nuclear de Angra dos Reis, foi o quinto ponto de análise, local suscetível ao
intemperismo químico devido às rochas cristalinas serem fraturadas aumentando a possibilidade de
sua degradação. A construção da rodovia BR-101 e o desflorestamento expôs o relevo gerando um
aumento nos movimentos de massa. Como já foi explicado, a especulação mobiliária valorizou as
propriedades e a população de baixa renda começou a ocupar as encostas que já estão frágeis,
aumentando o risco de desmoronamento. E para evitar os deslizamentos são feitas obras, porém,
somente no entorno da rodovia.
Visto que o acesso a essa região era difícil antes da construção da Rodovia Rio-Santos, a
vegetação foi preservada. Assim, hoje há muitas reservas ambientais que garantem um mínimo de
vegetação perante a ferocidade da urbanização. Devido à distância do lugar e a baixa concentração
populacional, a usina nuclear foi instalada em Angra dos Reis, sendo o material necessário a sua
construção vindo pelo mar e após conclusão da rodovia, veio através dela.
Fórum Internacional do Meio Ambiente - A conferência da Terra 1100

Retomando o caminho, sentido Rio


FONTE: Própria autora
de Janeiro, ocorreu a análise do sexto ponto,
havendo a visualização da diferença bem
definida das cores dos materiais de uma
vossoroca (Figura 7). Também foram vistos
ravinas, afloramentos rochosos, blocos
superficiais que foram carreados e blocos
embutidos que apareceram devido ao
escoamento superficial ter retirado o solo
que o cobria. Esses blocos são perigosos por
poderem deslizar até a rodovia em períodos
de chuva, pois o solo se tornar úmido
podendo causar um desmoronamento.
A fim de solucionar o problema da
remoção excessiva de materiais das áreas
íngremes, o reflorestamento não seria a
solução ideal, pois sendo muito íngreme,
logo o solo é instável. As raízes das plantas
acrescentadas só iriam aumentar o
“empapamento” do solo que provocaria mais Figura 7 – Sexto ponto de análise
desmoronamento. O melhor seria a criação de canais de drenagem artificiais para conduzir a água
dentro destes e assim a água não carreava consigo materiais e nem pesaria o solo.
No sétimo ponto destacou-se um entalhamento fluvial, oriundo da variação no tamanho do
vale, e caracterizado por concentrar seixos em um rio muito pequeno, sendo o normal era que esses
estivessem na parte mais elevada. Isso acontece porque o rio está retrabalhando depósitos antigos. E
como o desnível não era grande, o fluxo fluvial se expandiu para os lados (antigo terraço) gerando
uma lavagem dos materiais finos. Por esse rio, cujo nível está inferior, cortar antigos depósitos que
tinham seixos, houve o carreamento do material fino, ficando os grosseiros, no caso os seixos.
Ao chegar no oitavo ponto, observou-se um paredão sofrendo intemperismo diferencial
com a inserção de água corrente, porém, não ultrapassou um certo nível. Isso é devido um dique que
impedi o aprofundamento da erosão. Também, notou-se marcas no relevo que parecem ser camadas,
mas, na verdade são viscosidades. E ao retirar um pouco desse material, percebe-se que não é uma
rocha e sim argila, apesar da profundidade em que se encontra. No chão há formação de demoiselles
ou torres de fada (Figura 8). Elas ocorrem quando em um solo existe a retirada de materiais e a
presença de pedras (material resistente) que não permitem a erosão atuar abaixo delas. Porém, o
material do entorno é retirado formando pequenas torres.

FONTE: Própria autora

Figura 8 – Oitavo ponto de análise


No nono ponto, observou-se as ocupações nas encostas, gerando uma instabilidade nas
mesmas, já que as saibreiras estão altamente decompostas e há cortes no relevo realizados para
construir ruas e amplificar a rodovia.
Fórum Internacional do Meio Ambiente - A conferência da Terra 1101

Os problemas de encosta e as medidas tomadas para impedi-las foram observados no


décimo ponto. Em uma encosta havia impermeabilização com concreto para conter a erosão,
havendo drenos (canos) para evitar o acúmulo de água. Outra forma de conter uma encosta é através
da utilização do muro de arrima (concreto), mas há o perigo de entupir os canos e o mesmo se
romper (Figura 9 – destaque A).
FONTE: Própria autora

Figura 9 – Décimo ponto de análise

E a forma mais eficaz vista, porém, de alto custo foi o gabião (Figura 9 – destaque B) que
são caixas de telas de aço preenchido com pedras, não havendo perigo de retenção de água. Em
cima dessas contenções existem estacas para impedir que pedras rolem até a pista. Há trechos na
BR-101 que precisam de obras de contenção, mas, por serem caras não as fazem. E aquelas já
existentes precisam de manutenção, então pode haver desmoronamento.

CONCLUSÃO
Este trabalho buscou possibilitar a compreensão dos processos geomorfológicos e como o
município de Angra dos Reis sofreu com o advento da rodovia BR-101, principal via de circulação
entre Santos (SP) e Rio de Janeiro (RJ). Este trajeto foi percorrido em parte da rodovia BR-101
podendo notar as diversas características geomorfológicas.
Com a pesquisa de campo realizada foi possível apontar algumas relações da forma do
relevo com as ações que atuaram no recorte e, dependendo do caso, continuam a ocorrer. Os mapas
contribuíram na localização do trajeto percorrido, dos relevos e da geologia. Relatou-se o contexto
histórico da construção da Rodovia Rio-Santos e as suas conseqüências à natureza e à população
residente.
No total foram dez pontos analisados importantes para compreensão de como o advento da
rodovia afetou o meio ambiente. Além de possibilitar a visualização de planícies, colinas,
montanhas, afloramentos rochosos, vossorocas, ravinas, leques aluvionais, desmoronamentos,
entalhamento fluvial, saibros, grotões, diques, demoiselle, seixos e diversas ações antrópicas. Sendo
todas essas características explicadas no decorrer do trabalho, com o auxílio de fotografias tiradas
no local.
Conclui-se que a cada dia, o homem vem buscando compreender a ação biológica e
antrópica que merece destaque por interferir na dinâmica local e/ou global, em freqüência,
magnitude e intensidade. E cabe ao ser humano conscientizar-se de que o mesmo faz parte do meio
ambiente, buscando um equilíbrio entre desenvolvimento e preservação.

REFERÊNCIAS
ARRUDA, M. B. (Org.). Ecossistemas Brasileiros. IBAMA. www.ecoterrabrasil.com.br. Acessado
em 28 de maio de 2007.
Fórum Internacional do Meio Ambiente - A conferência da Terra 1102

CUNHA, S. B.; GUERRA, A. J. T. (Org.). Geomorfologia : Uma Atualização de Bases e


Conceitos. 1ª ed. Rio de Janeiro, 1995.
IBGE - Instituto Brasileiro de Geografia e Estatística. Servidor de Mapas. www.ibge.gov.br.
Acessado em 28 de maio de 2007.
MINISTÉRIO DOS TRANSPORTES. Banco de Informações e Mapas de Transportes.
http://www.transportes.gov.br. Acessado em 20 de maio de 2007.
Fórum Internacional do Meio Ambiente - A conferência da Terra 1103

ECOTURISMO, UM MODELO DE GESTÃO: ALGUMAS REFLEXÕES

José Wellington Carvalho Vilar


Prof. Dr. CEFET/SE (wvilar@yahoo.com.br)
Marister Alves Loureiro
CEFET/SE (marister_alves@hotmail.com)
Michelle Alexandre da Silva
CEFET/SE (miachelle@hotmail.com)

RESUMO
Os problemas de cunho socioambiental nunca tiveram tanta evidência no planeta quanto na
atualidade. Mudanças climáticas, poluição, desmatamento, além de fatores relacionados ao
desemprego são barreiras a um almejado desenvolvimento socioambiental. Nesse sentido, pode-se
afirmar que a ação do homem no meio em que vive, por si só, já provoca impactos, tanto positivos
quanto negativos, e estes impactos não são limitados por fronteiras, afetando não só na esfera local,
mas seus efeitos são sentidos globalmente. Tendo em vista a idéia equivocada de que a solução para
os problemas vivenciados deve ser alcançada de imediato, nota-se a necessidade de reverterem-se as
atuações voltadas à solução de problemas de grande amplitude em ações mais direcionadas e
focadas ao âmbito local. Deve-se sensibilizar a população para voltar suas ações ao foco dos
problemas ambientais, que muitas vezes tem início localmente propagando-se sistematicamente ao
âmbito global. Não se obstando aos problemas ambientais globais resultantes das mais diversas
atividades humanas, a atividade turística é também um fator preocupante, pois apesar de
movimentar grande parte da economia em diversas partes do mundo é responsável pela ocorrência
de impactos negativos aos locais onde esta se desenvolve. Por isso, nota-se a necessidade de
alternativas que minimizem os impactos ocasionados por esta atividade. Um exemplo de ações
centradas na busca de melhorias socioambientais em determinada localidade é a prática da atividade
ecoturística, pois a forma de sua atuação pode servir de modelo a um desenvolvimento local forte e
integrado. Associadas a este desenvolvimento, as ações do ecoturismo, regidas por princípios
sustentáveis, podem servir de exemplo às mais diversas atividades humanas na busca de um meio
ambiente mais equilibrado.
Palavras-chave: problemas socioambientais, gestão, sustentabilidade, ações locais, ecoturismo.

ABSTRACT
The problems of socio-environmental matrix never had as much evidence in the planet
how much in the present time. Climatic changes, pollution, deforestation, beyond factors related to
the unemployment are barriers to one longed for socio-environmental development. In this sense,
the man´s action in the mean can be affirmed that where it lives, by itself, already it provokes
impacts, in such a way positive how much negative and these impacts are not limited by borders,
affecting not only in the local sphere, but its effect are felt globally. In view of the maken a mistake
idea of that the solution for the lived deeply problems must immediately be reached, it is noticed
necessity more to revert the performances directed to the solution of problems of great amplitude in
directed and focused actions to the local scope. The population must itself be sensitized to come
back its action to the focus of the ambient problems that many times has beginning local spreading
systematically to the global scope. If not hindering to the ambient problems global resultants of the
most diverse activities human beings, the tourist activity is also a preoccupying factor, therefore
although to put into motion great part of the economy in diverse parts of the world it is responsible
for the occurrence of negative impacts to the places where this if develops. Therefore, it is noticed
necessity of alternatives that minimize the impacts caused for this activity. An example of actions
centered in the search of socio-environmental improvements in determined locality is practical of
the tourist activity the echo, therefore the form of its performance can serve of model to a strong
and integrated local development. Associates to this development, the actions of the ecotourism,
prevailed for sustainable principles, can more serve of example to the most diverse activities human
beings in the search of a balanced environment.
Fórum Internacional do Meio Ambiente - A conferência da Terra 1104

Word-key: socio-environmental problems, local management, supportability, actions, ecotourism.

INTRODUÇÃO
Uma diversidade de problemas socioambientais tem tido grande destaque na atualidade e
seus efeitos tornam-se a cada dia motivo de preocupação por parte dos diversos setores da
sociedade. Dentre as atividades humanas causadoras de efeitos socioambientais, a atividade turística
torna-se um fator preocupante, pois apesar de seus benefícios é responsável pela ocorrência de
impactos negativos aos locais onde se desenvolve.
O turismo vem se consolidando ao longo da história pelas mais variadas necessidades de
deslocamento, é praticado intensamente como atividade de lazer se caracterizando, principalmente,
pela curiosidade de seus praticantes em vivenciar novas experiências e conhecer novas culturas.
Além dessas características, o turismo configura-se como uma importante atividade
econômica para o mercado, uma vez que abrange uma significativa rede de serviços e movimenta o
mercado informal, ou seja, proporciona a circulação efetiva do capital como também a geração de
emprego e renda para os envolvidos no processo. Entretanto, vale ressaltar, que apesar dos
benefícios gerados pelo turismo, esta atividade, quando mal ou não planejada, pode trazer
problemas ao meio em que se desenvolve. Como afirma Lemos (1999), o turismo depende da
apropriação e exploração da natureza e das sociedades locais o que ocasiona transformações
socioambientais nas regiões receptoras. Assim, nota-se que a atividade que deveria servir para o
desenvolvimento sócio-econômico do local pode lhe trazer desordem.
Pelas transformações socioambientais que ocasiona, o turismo é um forte gerador de
impactos, tanto positivos quanto negativos, o que permite repensar a forma como está sendo
executado. Sua massificação, seguida da falta de planejamento, tem ocasionado, dentre outros
problemas, a homogeneização das culturas, a perda da identidade das comunidades locais, a
descaracterização do lugar e a exclusão social, além de impactos muitas vezes irreversíveis aos
recursos naturais de que se utiliza.
Percebe-se, a partir desses problemas, a necessidade de provocar mudanças na forma de
atuação da atividade, elaborando-se estratégias que visem minimizar esses impactos, tornando a
atividade mais promissora e sustentável. Por este motivo, esse estudo tem como objetivo discutir o
ecoturismo enquanto modelo de gestão que visa a unir a preservação e conservação dos recursos
naturais e culturais, e que também considera as necessidades econômicas e a inclusão social,
associados ao desenvolvimento turístico de uma determinada localidade.
Este estudo está voltado a reflexões a respeito dos problemas ambientais globais sentidos
na atualidade e a necessidade de buscarem-se alternativas à sua minimização, alternativas estas que
podem ser geridas eficaz e especificamente em cada área das atividades humanas com vistas a um
melhor desenvolvimento socioambiental. Neste contexto, o estudo toma como exemplo a prática da
atividade ecoturística. Para sua elaboração foi utilizada a pesquisa bibliográfica, através da qual se
procurou destacar assuntos relacionadas ao turismo, sustentabilidade, ecoturismo e
desenvolvimento local.

O ECOTURISMO E SEUS VIESES


O ecoturismo é uma atividade cujas características fundamentais seguem as “idéias
organizacionais” do turismo convencional, no entanto esta atividade se baseia em princípios
voltados ao desenvolvimento sustentável. Os objetivos são permeados pela busca em reverter os
modos de atuação convencionais a um “turismo doméstico, interno que valoriza o lugar, que gera
renda, que dinamiza a economia local, que protege o patrimônio natural, que recupera e preserva o
patrimônio histórico cultural” (CORIOLANO, 2003, p. 25).
De acordo com a EMBRATUR (1994) o ecoturismo conceitua-se como
um segmento da atividade turística que utiliza de forma sustentável o patrimônio natural
e cultural, incentiva sua conservação e busca a formação de uma consciência
ambientalista através da interpretação do ambiente, promovendo o bem estar das
populações envolvidas (MITRAUD, 2003, p. 12).
Fórum Internacional do Meio Ambiente - A conferência da Terra 1105

A partir de um processo de sensibilização das comunidades para o despertar da valorização


dos recursos de que dispõem e do fortalecimento da identidade cultural, seguido das práticas de
educação ambiental e da capacitação e inserção das comunidades na atividade turística, a prática do
ecoturismo torna-se viável a um almejado desenvolvimento local sustentável.
Esta atividade se baseia, portanto, em três pilares da sustentabilidade: o ambiental, pois
busca a conservação e preservação dos recursos naturais; o econômico, uma vez que procura
melhorar as condições de vida das populações receptoras da atividade turística, buscando a geração
de emprego e renda para as mesmas; e o social, pois busca valorizar o patrimônio cultural e
fortalecer os valores e tradições das comunidades envolvidas. Entre seus vieses pode-se destacar:

VIÉS CULTURAL
Tendo em vista a atual desvalorização das culturas locais devido à imposição permanente
de um modelo homogeneizado de cultura, tem-se notado a perda de valores e tradições das
comunidades locais. Embasado neste fato, o ecoturismo tem como um de seus objetivos estimular a
cultura local, utilizando-se desta como atrativo de determinada localidade de maneira que a
população participe ativamente no processo de fortalecimento sócio-econômico. Conforme explica
Mitraud (2003, p. 25) “as comunidades têm o direito de manter e controlar a sua herança cultural e
assegurar que o turismo não tenha efeito negativo sobre ela”.
A falta de estímulo a um reconhecimento do patrimônio cultural, presente em determinada
localidade, está ligada diretamente à falta de apoio político. Além disso, esse enfraquecimento deve-
se à falta de interesse e sensibilização da população local quanto à importância dos recursos tanto
culturais quanto naturais de que esta dispõe.
O patrimônio cultural de determinada sociedade é definido contemporaneamente,
conforme explica Almeida (2007, p. 151), “pelo conjunto de bens materiais, hábitos, crenças e
forma de vida cotidiana de todos os segmentos que compuseram e compõem as sociedades”. Dentre
as manifestações culturais que servem de atrativo à atividade turística podem ser destacados:
Danças populares regionais: a dança é uma rica manifestação cultural, pela valorização das
tradições locais, por estimular atividades coletivas, além de ser uma alternativa de lazer tanto da
comunidade quanto de visitantes. Para os visitantes essa manifestação da cultura local, muitas vezes
representada pelo folclore regional, serve de importante atrativo, uma vez que é um produto
diferenciado para satisfação das opções de lazer que procuram.
Monumentos Históricos: é uma representação física da evolução de determinada
comunidade, pois através deles pode ser conhecida a história da população local a partir de fatos
que marcaram algum momento histórico daquela comunidade ou mesmo sua formação. Essa
característica serve para enaltecer a atividade turística através da visitação desses monumentos.
Devido a isso, faz-se necessário a preservação e conservação desse patrimônio e um intenso
trabalho de sensibilização da população local para valorização desses recursos.
Somado a isto, faz-se necessário, também, a atuação do poder público na capacitação de
profissionais aptos tanto para a transmissão de conhecimentos aos visitantes quanto para despertar
na comunidade o interesse de participar do processo de fortalecimento do patrimônio, não só pela
geração de renda que este pode proporcionar como também pela representatividade ligada à
identidade local.
Artesanato: é representado por artefatos comerciais que ressaltam a singularidade local
através do uso de matéria-prima típica e/ou a confecção de produtos que representam o diferencial
de uma comunidade. Esses produtos, além de estimular a produção local e trazer à tona as
habilidades manuais, são também responsáveis pela circulação interna de capital, servindo para
fortalecer o comércio e divulgar o município.
Culinária: é uma forte representação da cultura local e, em geral, contempla a essência do
lugar. Como atrativo turístico deve oferecer produtos que não se contraponham à realidade local,
sendo interessante, também, que seja dada ênfase ao regionalismo através da caracterização dos
Fórum Internacional do Meio Ambiente - A conferência da Terra 1106

serviços ofertados, a fim de que os visitantes possam perceber a essência cultural presente na
localidade.
Haja vista que a cultura é um viés que permeia o ecoturismo e que este dá ênfase às
relações internas das comunidades, as fragilidades locais são minimizadas e, de forma sistêmica,
seus benefícios poderão repercurtir numa escala mais ampliada. Desta forma, torna-se evidente que
o fortalecimento da cultura é de fundamental importância para a boa execução da atividade
ecoturística.

VIÉS SÓCIO-ECONÔMICO
O ecoturismo é embasado pela busca de alternativas socioeconômicas no âmbito do
turismo. Além da proteção aos recursos culturais e naturais do lugar onde é desenvolvida, esta
atividade procura também alcançar melhorias na qualidade de vida das comunidades. Através do
respaldo econômico, o ecoturismo busca promover a inclusão social utilizando-se de potenciais
internos. Segundo Dias (2003, p. 104), o ecoturismo “possibilita nova organização produtiva e
social que permite melhorar a qualidade de vida da população e articular relações sociais de
cooperação e solidariedade humana”.
Os potenciais utilizados no ecoturismo referem-se, primordialmente, à cultura e aos
recursos naturais, que se geridos sustentavelmente, tornam-se uma alternativa economicamente
correta para quem usufrui, além de proporcionar o bem-estar da comunidade envolvida. Nesse
sentido, conforme apresenta Dias (2003), o ecoturismo é algo mais que a publicidade de um cenário
e a proteção de alguma espécie; esta atividade pretende oferecer opção real de desenvolvimento
sustentável para as populações locais bem como gerar recursos para proteger efetivamente os
ecossistemas.

VIÉS AMBIENTAL
O ecoturismo depende dos recursos ambientais das regiões receptoras e preocupa-se com a
forma como vem sendo executada a atividade turística. Tendo como foco o respeito ao meio
ambiente, o ecoturismo busca alcançar uma relação harmônica entre a atuação da atividade e o meio
em que se desenvolve.
Assim, através da atuação do ecoturismo, visa-se a preparar a área receptora com uma
infra-estrutura compatível com as características locais de forma que a originalidade do lugar não
seja substituída. Não obstante o cuidado no manejo dos recursos naturais, faz-se necessário o
controle da capacidade de carga dos ambientes visitados.
Posteriormente, uma ferramenta imprescindível para fortalecer a atividade é o diagnóstico
ambiental, pois com este podem-se conhecer as fragilidades, as necessidades e as potencialidades
existentes no local. Para se obter sucesso com a execução da atividade ecoturística deve-se
sensibilizar a comunidade, ouvi-la e ressaltar a responsabilidade da mesma para com os recursos
utilizados.
A sensibilização é importante para que as pessoas possam conhecer onde e como podem
atuar dentro das premissas da atividade do ecoturismo. Para tanto, deve existir um trabalho de
educação ambiental que enfoque uma relação harmônica entre homem e natureza e envolva
primordialmente a comunidade, e através dela sejam transmitidas, aos visitantes, noções a respeito
da importância de preservar e conservar os recursos utilizados de forma que se possa refletir sobre
suas atitudes em relação ao meio em que se inserem. Isso porque, conforme afirma Mitraud (2003),
os visitantes encontram-se desvinculados dos ambientes naturais, desconhecendo seus mais simples
processos e não se dando conta de que cada uma de suas ações corresponde a um efeito ambiental.
Loureiro (2002) apud Loureiro (2003) destaca que a educação ambiental, além do
conhecimento do cenário global, trabalha os problemas específicos de cada grupo social ou
comunidade, principalmente quando se tem por finalidade básica a gestão ambiental. Os grupos
sociais possuem peculiaridades relacionadas à situação particular de seus ambientes, ao modo como
interagem neste e à percepção qualitativa dos problemas. A partir da ação territorializada dos
diferentes atores sociais, com seus distintos interesses, compreensões e necessidades, instauram-se
Fórum Internacional do Meio Ambiente - A conferência da Terra 1107

os processos de apropriação e uso do patrimônio natural e realizam-se os atos educativos voltados


para a gestão democrática do ambiente.
Tendo em vista o que foi citado anteriormente, percebe-se que a educação ambiental é um
processo necessário para o desenvolvimento da atividade turística nos moldes de um turismo
responsável, estando intimamente ligado ao desenvolvimento local sustentável.

DESENVOLVIMENTO SUSTENTÁVEL
O desenvolvimento sustentável é o resultado da junção entre dois modelos de
desenvolvimento: o econômico e o social, aliados à preocupação com o usufruto do meio ambiente
para as atuais e futuras gerações.
Percebe-se, na evolução dos modelos econômicos, que o desenvolvimento estava
diretamente ligado ao crescimento econômico, desconsiderando-se a forma como este era
alcançado. No entanto, notou-se que apesar do sucesso desse modelo, o mesmo tornou-se um
processo inviável, uma vez que gerou problemas, principalmente em âmbito social, como pobreza,
desemprego, desperdício, exclusão social e de gênero, etc. Daí constatou-se que as noções de
desenvolvimento não estavam unicamente relacionadas ao crescimento econômico e acúmulo de
capital, mas sim à forma como este era distribuído.
A partir do avanço do suposto desenvolvimento e do crescimento econômico, percebeu-se
a necessidade de manter a hegemonia de mercado, para isso, deu-se acessibilidade à população para
participar ativamente deste processo, como forma de manter o mercado aquecido e com base na
idéia de que fosse promovido um desenvolvimento sócioeconômico.
Não obstante a busca por um desenvolvimento socioeconômico, surgiu a preocupação com
as questões ambientais, visto que diversos impactos ocasionados pela atuação do modelo
econômico vigente começaram a influir no cotidiano da população, nas formas de consumo e,
consequentemente, na estabilidade do mercado.
Como alternativa para solucionar esse problema, buscou-se unir harmonicamente o
crescimento econômico, a preocupação social e o respeito ao meio ambiente, surgindo daí o modelo
de desenvolvimento denominado sustentável. Segundo Mitraud (2003, p. 429)
o desenvolvimento sustentável é uma teoria segundo a qual o bem estar da humanidade
depende da conservação dos recursos naturais. Em outras palavras, o desenvolvimento
sustentado permite o progresso para atender às necessidades do presente, mas sem
comprometer a capacidade das futuras gerações de atender às suas próprias
necessidades.

Tendo em vista estas características, o desenvolvimento sustentável busca conciliar os


avanços tecnológicos ao uso regrado dos recursos, proporcionando uma relação menos conflitante
entre ambas as partes para que estes recursos sejam preservados para as futuras gerações.
O desenvolvimento sustentável é permeado por princípios que buscam: i) uma equidade
social através da satisfação das necessidades básicas da população e do reconhecimento dos
cidadãos quanto a seus direitos e deveres para com o próximo e o meio ambiente; ii) uma eficiência
econômica com o fortalecimento da cidadania através da geração de emprego e renda; iii) prudência
ecológica através da preservação e conservação dos recursos naturais, além da mitigação dos
impactos socioambientais ocasionados pelo sistema vigente.

ECOTURISMO E DESENVOLVIMENTO LOCAL


Não diferente das premissas do desenvolvimento sustentável, o ecoturismo procura
adequar a prudência ecológica aos valores sociais de forma a não prejudicar a eficiência econômica,
sendo sua atuação voltada, primordialmente, ao âmbito social.
Sabe-se que cada comunidade bem como cada lugar tem suas características particulares,
entretanto estes são fatores que se tornam bastante desvalorizados e cuja importância vem sendo
enfraquecida diante de quem deveria demonstrar interesse: a própria comunidade. Esta situação
torna-se fundamental para que seja promovida uma atividade aos moldes do ecoturismo.
Fórum Internacional do Meio Ambiente - A conferência da Terra 1108

Através de seus princípios voltados ao desenvolvimento local, o ecoturismo pode ser


denominado um modelo de gestão, pois busca destacar as características principais de cada
localidade, identificando suas potencialidades e vocações e visando a uma adequação da atividade
turística ao lugar e não o contrário como se constata na atualidade. Quanto a este desenvolvimento,
Franca (2003, p. 75) afirma que “a estratégia de desenvolvimento local se propõe, ao mesmo tempo,
a impulsionar aspectos produtivos e a potencializar as dimensões sociais, culturais, ambientais e
político-institucionais que constroem o bem-estar da sociedade e a realização humana”.
O desenvolvimento local é englobado pelas premissas do desenvolvimento sustentável e,
como tal, tem como característica fundamental a busca por um desenvolvimento voltado à
valorização do potencial interno de cada lugar. Além disso, há a busca de capacitação dos recursos
humanos e a motivação destes quanto à sua capacidade de se beneficiar com o potencial de que
dispõem.
As ações voltadas ao âmbito do desenvolvimento local contribuem para a geração de
empregos e renda para as comunidades, favorecendo uma inclusão social e, consequentemente, a
redução da pobreza na esfera local. Tendo em vista estes fatores e conforme cita Aguiar (2007,
p.104), para pensar um desenvolvimento local “não é aceitável um desenvolvimento que não esteja
baseado na consolidação e extensão de direitos iguais para todos os grupos da sociedade”, assim
sendo “não é possível deixar de considerar fatores como qualidade de vida, socialização do poder,
distribuição de renda e democratização do acesso aos serviços públicos, aos bens culturais”.
As ações voltadas ao âmbito de um desenvolvimento local, de forma contínua, podem se
perpetuar em âmbito externo ao lugar onde se desenvolve. Para isso, deve haver o fortalecimento do
processo de sensibilização, que é uma ferramenta-chave para a atuação do ecoturismo.
Através da sensibilização, o ecoturismo contribui com a formação de uma população ativa
na busca de seus direitos e de uma melhoria na qualidade de vida. Isso pode ser alcançado uma vez
que, conforme afirma Beni (2007, p. 139), a identidade própria das comunidades as leva a tomarem
iniciativas que visam a assegurar o seu desenvolvimento. O autor ainda complementa que estas
comunidades “quando conseguem fortalecer sua capacidade organizacional, têm condições de evitar
que empresas e organizações externas limitem suas potencialidades de atuação”.
Aliado à sensibilização, faz-se necessário o interesse por parte do Poder Público para que,
além de investir no desenvolvimento da atividade ecoturística em determinada região, incentive a
participação da comunidade neste processo de forma que este desenvolvimento, tido como
endógeno, reflita-se globalmente.
Não se pode negar que, na maioria das vezes, a ação humana negativa para com o meio
ambiente corresponde a uma reação, também negativa. Isso pode ser retratado nos diversos
problemas socioambientais com os quais se depara a contemporaneidade, tais quais o efeito estufa
(tão evidente na atualidade), mudanças climáticas, homogeneização das culturas, pobreza, exclusão
social, dentre outros.
Da mesma forma que as ações negativas, as ações positivas também vão provocar reações,
por isso estas ações devem ser maximizadas em prol de um desenvolvimento local cujo exemplo
deve ser expandido e, de forma sistêmica, contribuir para o desenvolvimento regional ou até mesmo
global, uma vez que quaisquer impactos, sejam eles negativos ou positivos, não se delimitam por
fronteiras.

CONCLUSÕES
É inegável que os problemas vivenciados na atualidade em todo o planeta decorrem de
uma série de ações humanas que, a princípio, parecem insignificantes, mas a longo prazo tem
mostrado efeitos muitas vezes irreversíveis, cuja dimensão torna-se preocupante não só ao bem-
estar das gerações atuais como das futuras.
Diante desta problemática, percebe-se a necessidade de incentivar, inicialmente, atuações
voltadas a solução de problemas mais específicos dentro de cada localidade. Se todos os setores da
economia atuarem em seu entorno na busca de minimizar os impactos que estes provocam ao meio
Fórum Internacional do Meio Ambiente - A conferência da Terra 1109

ambiente e à comunidade na qual estão inseridas e estas estiverem motivadas a contribuir,


constatar-se-ão resultados mais significativos na busca de amenizar os problemas globais.
Vale ressaltar que cada ator social pode contribuir de alguma forma dentro de sua área de
atuação para o fortalecimento interno da comunidade. No caso do ecoturismo, sua ação em âmbito
local contribui para que os problemas de cunho socioambiental presentes em localidades receptoras
da atividade turística possam ter seus efeitos minimizados.
Tendo em vista suas características, o ecoturismo torna-se um modelo de gestão
sustentável considerado viável para estabelecer a relação do homem com o meio em que se insere.
Além disso, os princípios básicos que permeiam esta atividade podem ser adaptados a outras áreas
de atuação, de acordo com as necessidades de cada localidade. Partindo dessa idéia pode-se obter
êxito através do encadeamento de ações locais que irão contribuir para uma significativa redução
dos problemas vivenciados na atualidade.

REFERÊNCIAS BIBLIOGRAFICAS
AGUIAR, Geraldo Medeiros de. Turismo, desenvolvimento local e integração regional. In:
SEABRA, Giovanni. Turismo de Base Local: identidade cultural e desenvolvimento regional. João
Pessoa: UFPB, 2007
ALMEIDA, Maria Geralda de. Desafios e possibilidades de planejar o turismo cultural. In:
SEABRA, Giovanni. Turismo de Base Local: identidade cultural e desenvolvimento regional. João
Pessoa: UFPB, 2007
BENI, Mário Carlos. Planejamento estratégico e gestão local/regional do turismo. In: SEABRA,
Giovanni. Turismo de Base Local: identidade cultural e desenvolvimento regional. João Pessoa:
UFPB, 2007
CORIOLANO, Luzia Neide M. T; LIMA, Luiz Lima. Turismo comunitário e responsabilidade
socioambiental. Fortaleza: EDUECE, 2003
DIAS, Reinaldo. Turismo sustentável e meio ambiente. São Paulo: Atlas, 2003
FRANCA, Nahyda. Formar para a gestão participativa: métodos em construção. In: LOUREIRO,
Carlos F. B (org). Cidadania e meio ambiente. 1 ed. Salvador: Centro de recursos ambientais, 2003
LEMOS, Amália Ines G. Turismo: impactos socioambientais. 2. ed. São Paulo: HUCITEC, 1999
LOUREIRO, Carlos. F. B. História e Pressupostos da Educação Ambiental. In: _____. Cidadania e
Meio Ambiente. 1 ed. Salvador: Centro de Recursos Ambientais, 2003
MITRAUD, Sylvia (org). Manual de ecoturismo de base comunitária: ferramentas para um
planejamento responsável. Brasília, DF: WWF-Brasil, 2003
Fórum Internacional do Meio Ambiente - A conferência da Terra 1110

IMPACTOS SÓCIO-AMBIENTAIS CAUSADOS PELO TURISMO NA REGIÃO DE


BARRA GRANDE – BA

Rafael M. Zilioli
Unesp/Rosana. rafael_zilioli@ yahaoo.com.br
Claudia C.A. Moraes
Unesp/Rosana claudia@ rosana.unesp.br.

RESUMO
Esse artigo apresenta resultados parciais do levantamento dos efeitos provocados pelo
turismo no espaço geográfico do povoado de Barra Grande e do Rio Carapitanguí, localizados na
Península de Maraú, no sul do estado da Bahia. Esta região ainda guarda um patrimônio natural
bastante preservado, porém com o avanço do turismo nas cidades e praias próximas já há eminência
de problemas relacionados com as questões antrópicas e bióticas ocasionadas pela presença de
visitantes. Por isso, é fundamental que se levante a situação atual para que se prevejam as alterações
possíveis e planeje o futuro de maneira responsável. A pesquisa foi realizada através de dados
bibliográficos, visitas a campo e entrevistas com os moradores, empresários e turistas. Para
dimensionar os efeitos foram criados indicadores sócio-ambientais que permitiram mensurar o grau
de intensidade deste impacto na qualidade de vida da população local e na preservação ambiental.
Os resultados apontam para um provável crescimento dos impactos e de medidas urgentes para sua
mitigação ou prevenção.
Palavras-chave: Turismo, Impactos ambientais e socioeconômicos do turismo, Barra Grande.

ABSTRACT
This article presents results of the partial lifting of the effects caused by tourism in the
geographical area of the town of Barra Grande and the Carapitanguí River, located in the Maraú
Peninsula, in the south of the Bahia state. This region still holds a very natural heritage preserved,
but with the advancement of tourism in the cities and beaches, problems related to the human and
biotic issues caused by the presence of visitors are already coming verge. So it is crucial that we lift
the current situation to the possible changes that are foreseen and plan the future in a responsible
way. The research was conducted through bibliographic data, field visits and interviews with
residents, business people and tourists. To scale the effects were created socio-environmental
indicators that allowed measure the intensity degree of this impact on the life quality of local people
and environmental preservation. The results point to a likely growth of impacts and urgent measures
for their mitigation or prevention.
Key-words: Tourism, environmental and socio-economical impacts of tourism, Barra Grande.

INTRODUÇÃO
Este artigo tem como objetivo apresentar dados parciais de um levantamento de impactos
que o turismo pode causar em uma área litorânea no sul da Bahia. O resultado esperado para esta
pesquisa é um documento que poderá auxiliar as autoridades e a comunidade a estabelecerem
políticas de mitigação ou mesmo de prevenção dos impactos que o turismo trouxe ou pode trazer.
O território estudado fica no povoado de Barra Grande que pertence ao município de
Maraú (BA) e situado numa península de mesmo nome.
Fórum Internacional do Meio Ambiente - A conferência da Terra 1111

Figura 3: Mapa da área de estudo localizada no leste do Estado da Bahia. (site:


www.barragrande.net).

Barra Grande e as praias do entorno ocupam uma área litorânea de mar aberto e uma área
em mar fechado na Baía de Camamu. Na área de mar aberto localizam-se as praias com melhor
estrutura e mais visitadas como Ponta do Mutá, Três Coqueiros e Bombaça. Nestas praias estão
concentradas algumas residências secundárias, meios de hospedagem, incluindo um resort e
restaurantes. Virada para a Baia de Camamu localiza-se o povoado de Barra Grande, com várias
residências de autóctones e secundárias, além de bares, restaurantes e comércio em geral. A
principal praia do local, a praia das Mangueiras, também está voltada para a Baía. Ao descer do
cais, seguindo para o lado direito, no final da praia das mangueiras, encontra-se o rio Carapitanguí
que separa Barra Grande da ilha do Campinho.
Nesta última década o povoado de Barra Grande e o entorno do rio Carapitanguí tem
recebido um bom fluxo de turistas, motivados pela suas praias rústicas e de grande beleza. Um lugar
onde antes era uma vila de pescadores está se transformando em um destino turístico. O turismo
chegou com força nesta região da Bahia e vem avançando rapidamente nas áreas isoladas e estão se
incorporando a essa nova condição sem planejamento por parte do poder público e/ou da
comunidade. Essa ausência de planos preventivos demanda medidas que ajudem a planejar o futuro
da atividade.
Fórum Internacional do Meio Ambiente - A conferência da Terra 1112

A população do povoado a e das praias do entorno é estimada em aproximadamente 1.695


habitantes, podendo alcançar até nove mil pessoas na alta temporada devido ao crescente número de
turistas que visitam o lugar durante o verão 139.
Ao ver a cada ano o turismo crescer nos municípios vizinhos e/ou semelhantes ao povoado,
com seus diversos problemas, paira uma preocupação em levantar os impactos causados por esta
atividade e as suas repercussões. As pressões de um turismo descontrolado, com conseqüente
incremento de impactos ambientais exigem reflexões sobre alternativas.
Nesta última temporada 2007-2008, as preocupações que vinham se delineando a partir do
inicio desta pesquisa em 2006 acabaram se tornando parcialmente realidade. O turismo até então,
era realizado por estrangeiros ou brasileiros vindos de lugares distantes, usavam o avião como
principal forma de locomoção até um centro maior e para chegar à praia veículos de tração 4 x 4
que tem custos mais elevados para o deslocamento, mas eram os únicos que conseguiam vencer os
difíceis quilômetros da esburacada estrada de terra, ou então desembarcavam no povoado em aviões
fretados (táxis aéreos), hospedavam-se em pousadas e alimentavam-se em restaurantes, além de
comprarem mercadorias no comércio local. Também quanto ao número desta demanda, não era
muito expressiva, por isso, não havia a percepção de conflitos mais prementes entre moradores e
visitantes. A presença de visitantes trazia alguns recursos para a população e movimentava sua
economia. É preciso salientar que vários problemas existiam, entre eles, a falta de infra-estrutura
básica e turística, a ausência de capacitação técnica para os moradores trabalharem com o turismo e
também projetos governamentais preventivos de planejamento turístico. A atenção especial a este
item deve-se por Barra Grande situar-se em uma Área de Proteção Ambiental (APA).
A estrada entre Barra Grande a Maraú recentemente foi melhorada permitindo que veículos
tradicionais pudessem atingir o povoado. A mudança no acesso também ocasionou alteração na
demanda. Os moradores de municípios vizinhos passaram a visitar esta vila em grande quantidade
na modalidade denominada “turismo de um dia” ou excursionista, ou seja, não pernoita, não
consome alimentos em restaurantes, não usa o transporte turístico do receptivo local por viajar com
seu próprio carro e traz consigo outros comerciantes como os ambulantes que concorrem com o
comércio estabelecido.
A presença desta nova demanda afugentou muitos turistas estrangeiros e nacionais que
passaram a procurar outras praias sem a presença do turismo de massas.

METODOLOGIA
Para realizar esta investigação, exploratória e descritiva foram trabalhadas diversas formas
de fontes e estabeleceu-se uma série de passos:
informações documentais (documentos, livros e teses que abordam as questões referentes à
região de Maraú e na seqüência, sobre impactos do turismo).
trabalho de observação de campo (visitas ao local quando foi observado e registrado dados
por escrito e fotos a respeito da situação ambiental e poluição provocada pelo turismo. Estes
registros seguiram o modelo de indicadores desenvolvidos para esse trabalho adaptados do modelo
de Kaiser (1969) e Mukherjee (1975 apud PEREIRA E NELSON, 2004)140.
Os indicadores devem ser estabelecidos a partir do objetivo específico de cada pesquisa e
no presente caso, deverá auxiliar na verificação da situação atual dos impactos turísticos. Para este
estudo selecionaram-se os seguintes indicadores:

139
Dados obtidos em entrevista realizada com funcionários da Prefeitura Municipal de Maraú em janeiro de 2007.
140
Segundo Mukherjee (1975 apud PEREIRA E NELSON, 2004) indicadores são medidas desenvolvidas para elucidar
o estado ambiental, social, político e econômico de uma região, a estabilidade financeira de um empreendimento ou até
de saúde de pessoas.
Fórum Internacional do Meio Ambiente - A conferência da Terra 1113

Quadro 1 – Impactos e Indicadores


Impactos Indicadores
Alteração das atividades profissionais Número de trabalhadores em cada setor
profissional.
Distribuição de salários e renda Números de pessoas empregados no setor
turístico.
Mudanças culturais relativas ao consumo Número de estabelecimentos que atendem
as necessidades dos moradores e não turistas
Aumento do Custo de Vida Preços da cesta básica.

Aumento da violência. Número de crimes e delitos.

Degradação do ecossistema área do entorno Volume de lixo/Porcentagem área


do rio. desmatada áreas desprotegida
Poluição no rio Carapitanguí Destinação dos efluentes/ Volume de Lixo/
Diminuição da pesca/ Tráfego local.
Responsabilidade Ambiental Empresarial Códigos de responsabilidade ambiental e
empresarial.
Indicadores levantados por ZILIOLI, 2007.

Entrevistas (Para verificar a preocupação dos moradores a respeito da preservação do rio


Carapitangui e de seu entorno. Foram realizadas no período de janeiro de 2007 na forma
estruturadas com residentes e proprietários de equipamentos turísticos que habitam o entorno do
Carapitanguí, escolhidas de maneira aleatória. Estas entrevistas tiveram como meta levantar dados
sobre a preservação do rio e do povoado e as possíveis alterações geradas pela chegada do turismo
ao local. Quanto à demanda foram aplicados questionários quali-quantitativos estruturados para
estes viajantes, também escolhidos de maneira aleatória).

ANÁLISE DOS IMPACTOS


Marco Teórico
Atualmente muitas são as discussões e indagações a respeito dos problemas ambientais
causados pelo homem. Nos últimos anos as agressões ao meio natural em prol do crescimento
econômico extrapolaram o discurso dos ambientalistas e especialistas chegando aos governantes,
industriais e a grande mídia.
Os problemas ambientais começam a ser agravados a partir da Revolução Industrial no
século XVIII, acentuando-se nos séculos XIX e XX até chegar a um nível insustentável. O alto
padrão de consumo de tecnologias elevou a necessidade de se produzir cada vez mais energia para
satisfazer rapidamente as necessidades da vida moderna. Por extraírem do meio ambiente as
matérias primas sem a preocupação com o futuro, acabaram por sobrecarregá-lo e esta atitude
afetou todo o planeta Terra.
A partir da década de 1960, as pesquisas na área da ecologia se multiplicaram rapidamente
e os anos de 1980 foram marcados pelos estudos interdisciplinares e diversificados que procuraram
definir balizas para o desenvolvimento. Dentre elas estão: Área de Proteção Ambiental (APA),
Biomassa, Chuva Ácida, Desenvolvimento Sustentado ou Ecodesenvolvimento, Fumante Passivo,
Povos da Floresta, Relatório de Impacto Ambiental (RIMA), derivado de Estudo de Impacto
Ambiental (EIA), entre outros (PELLEGRINI, 1993).
Juntamente com estas ações aconteceram muitos eventos como a Conferência das Nações
Unidas sobre Meio Ambiente Humano em Estocolmo (1972) despertando uma consciência
universal sobre a importância do meio ambiente; a Conferência sobre Mudanças na Atmosfera, em
Toronto (1988) e Conferência do Rio de Janeiro (1992) que se baseou na idéia da defesa do
desenvolvimento sustentável, onde humanos conviveriam de forma harmoniosa com a natureza
Fórum Internacional do Meio Ambiente - A conferência da Terra 1114

considerando os seus limites (BENI, 2003), posteriormente as reuniões do Painel


Intergovernamental de Mudanças Climáticas que se seguiram nos últimos anos.
A polêmica a respeito da deterioração ecológica ganhou espaço nas mesas de discussões e
planos de desenvolvimento dos países. Produção e poluição até então eram indissociáveis,
atualmente, são vistas de outra forma. Diante dessa realidade tornou-se fundamental que o ser
humano repense suas atitudes face aos recursos naturais, essa mudança exige que se olhe o meio
ambiente como algo integrado ao homem e mantenedor da vida. O consumo humano precisa ser
controlado e os produtos adaptados para produzir menores impactos ao ambiente.
Dentre as áreas que podem provocar impactos ao ambiente está o turismo e no Brasil as
áreas litorâneas de grande beleza cênica têm sido exploradas, muitas vezes, sem uma preocupação
com a comunidade local e com o meio ambiente. Já são de conhecimento público os vários
exemplos encontrados na literatura turística ou em áreas afins que se referem aos impactos do
turismo no meio ambiente, como a especulação imobiliária voltada ao turismo e ao lazer, que
ocorreu no litoral brasileiro antes de se fazer reservas para praias nacionais ou estaduais
comprometendo o espaço costeiro e seus moradores. Em muitos casos, a propriedade da terra dos
autóctones passou para as mãos de empresários imobiliários por preços insignificantes que foram
revendidos com muito lucro a terceiros. Após a venda de suas terras os moradores locais saem de
seus espaços para formar os bolsões de pobreza no entorno destes balneários (MÜLLER-
PLATENBERG, AB’SABER, 2006).
Ao longo da extensa fachada litorânea do País com alguns milhares de quilômetros de
extensão desenvolveu-se um tipo de espaço super partilhado e super desejado para atividades
múltiplas de lazer. Balneários de diversos padrões de organização e indiferentes estágios de
implantação ocorrem lado a lado com loteamento especulativos, situados mais próximos ou mais
distantes da faixa de praia. Cidades turísticas e balneárias com excesso de casas e apartamentos,
enquanto se vende a imagem de uma natureza deslumbrante, mas que, na verdade, está totalmente
comprometida pelos próprios planos de loteamento e urbanização: glebas a espera de valorização,
condomínios fechados que privatizam praias ilegalmente e espaços de antigas colônias de pesca
sendo invadidos ponto a ponto por residências de lazer. Projetos de loteamento ou edificações a
espera do aval dos órgãos de meio ambiente (MÜLLER-PLATENBERG, AB’SABER, 2006 p.44).

Em certos lugares o turismo pode ser a única possibilidade de desenvolvimento de uma


região e se implementado sem os devidos cuidados, leva a destruição de ecossistemas causando
danos e desarticulando culturas locais. Luchiari (2000) aponta que esta situação ocorreu na maioria
de nossas comunidades litorâneas onde turismo passou a existir. Cruz (1996) acrescenta que a
implantação do turismo em certas formações litorâneas como dunas, mangues e restingas podem ser
facilmente ameaçadas pela visão imediatista imperante no país nas ações dos gestores públicos e
dos empresários do setor. Por serem ecossistemas frágeis a menor alteração antrópica pode
representar um impacto negativo irreversível (CRUZ, 1996).
Pode-se ainda enumerar diversos impactos: diminuição da flora e de fauna original
ocasionadas pelo o acréscimo da construção de residências e equipamentos urbanos e turísticos; o
aumento do tráfego urbano em vias nem sempre planejadas para o grande fluxo de veículos; a
presença de uma população maior que a planejada usufruindo do espaço comum; filas no comércio
local e um aumento de preços nos produtos encarecendo a vida do morador; a vinda de migrantes
para o trabalho na construção civil ou para investimentos em negócios da cadeia turística sem
planejamento para recebê-los e alteração nas atividades econômicas.
O turismo também ocasiona novas relações de poder e de decisões. Em certos casos, acaba
incidindo um controle local por parte dos empresários do setor turístico e dos especuladores
imobiliários visando seus interesses particulares em detrimento dos coletivos. Acrescenta-se ainda a
desorganização da população que a impede de impor-se aos empresários e alija-se das decisões de
poder local, tornando-se espectadora e não protagonista de sua própria vida.
Para evitar que essas ações ocorram, poder público, comunidade e empresários precisam
planejar o turismo dentro dos princípios da sustentabilidade (SWARBROOKE, 2000). Barkin
Fórum Internacional do Meio Ambiente - A conferência da Terra 1115

(1998) considera que o desenvolvimento sustentável é um processo ou uma mudança de paradigma


para um “ser” em vez de “ter”. Esta mudança é radical e se impõe a sociedade através de princípios
e práticas holísticas e assim, oportuniza as vivências sãs, onde a qualidade de vida não se traduza só
no poder de consumo. Em uma sociedade sustentável deve existir a diversidade, a auto-suficiência,
o controle a nível local, a participação e um trabalho de base em nível comunitário. Para evitar os
impactos é preciso desenvolver abordagens de ordem ambiental, social, cultural e econômica
adotando critérios e indicadores estabelecidos e observados ao longo da prática turística no lugar.
As abordagens são divididas em três áreas: Ambientais, Socioculturais e Econômicas. Os critérios
podem ser: prevenção de danos irreversíveis, melhoramento da qualidade de vida e melhoramento
econômico.
Por fim, as ferramentas, que são diversas como: o monitoramento ambiental, o uso de
energia alternativa, o incentivo à reciclagem, os programas de habilitação profissionais, as
campanhas educacionais, as promoções sociais, a formação e incentivos a investidores locais, as
associação de moradores, o incentivo a programas que mantém preços ao alcance dos moradores e
muitas outras, são fundamentais.

RESULTADOS PARCIAIS SOBRE OS IMPACTOS AMBIENTAIS E SOCIOECONÔMICOS


Os impactos observados do objeto de estudo podem ser classificados, segundo Kaiser
(1969), como costeiros de especulação para lazer, turismo de temporada e “segunda residência”.
Através das entrevistas e estudos de campos realizados em 2007 pode-se aferir que os
impactos “Poluição no rio Carapitanguí” e “Degradação do ecossistema na área do entorno do rio”
não foram significativos. O volume de lixo observado nas margens e no leito do rio é muito
pequeno, também não há desmatamento de matas ciliares, o rio continua bem conservado, piscoso e
o tráfego local pequeno.
Quando foi realizada a primeira visita no lado oeste do rio Carapitanguí encontrou-se na
Ilha do Campinho uma vila com o mesmo nome e outra ao sul a denominada “Comunidade da Ilha
do Sapinho”. Os moradores da Ilha do Campinho são pescadores e trabalhadores em equipamentos
turísticos do povoado de Barra Grande e do comércio de Camamu. As residências dos moradores
locais são bastante singelas e a vila tem pouca infra-estrutura urbana. No lado leste da Ilha, bem
próximo à desembocadura do rio Carapitanguí há ocupação turística com pousada, algumas casas de
veraneio, cuja principal atração era uma pizzaria de proprietários estrangeiros que recentemente foi
fechada. Do outro lado do rio a estrutura é composta de dois bares, um deles voltado para a praia e
outro pequeno e improvisado que é também restaurante direcionado para o rio que atende aos
visitantes na margem pertencente à Barra Grande.
Na segunda visita, realizada em 2008, a estrutura turística encontrada no lado leste da Ilha
estava desativada. Sem infra-estrutura é provável que no lugar de aumentar os impactos provocados
pela visitação turística, esta tende a diminuir, sendo possível ainda realizar estudos e implantar
mecanismos preventivos.
Quanto ao indicador “Alteração das atividades profissionais” foi diagnosticado que ao
longo das margens do rio há mais ou menos noventa pescadores, entre estes, dez famílias estão em
condições ilegais por habitarem a região próxima da desembocadura do rio em uma área protegida.
Em entrevistas realizadas soube-se que uma parte destes pescadores trabalha com o turismo e a
outra parte sobrevive do comércio da pesca e dos caranguejos retirados do “mangue” do rio
Carapitanguí. Já entre os moradores do povoado de Barra Grande poucos se dedicam à pesca, a
maioria trabalha de maneira informal ou formal em atividades econômicas no setor turístico. O que
se encontrou durante a pesquisa foi uma realidade já conhecida na literatura turística. A atividade
turística trouxe para a região uma nova dinâmica econômica e aumento e/ou complementação de
renda para a população local, principalmente na alta temporada. Porém, a baixa escolaridade e
qualificação profissional destinaram aos nativos trabalhos de menor remuneração e sazonal. Esta
situação torna-se premente a criação de uma política e maior profissionalização dos nativos e
soluções para a baixa temporada.
Fórum Internacional do Meio Ambiente - A conferência da Terra 1116

Outro agravante que vem afetando o comércio local é a presença de muitos ambulantes
oriundos das cidades vizinhas que interferem na renda de antigos moradores donos de
estabelecimentos, como restaurantes e bares que dependem do turismo. Diante a invasão de pessoas
de fora e a falta de qualquer ação por parte do poder público, os comerciantes estabelecidos
regularmente entraram em confronto com os ambulantes.
Quanto ao “Aumento da violência” até o verão de 2008, poucas ocorrências foram
registradas nos lugares pesquisados. Com o aumento e diferenciação da demanda muitos problemas
começaram a surgir. Pode-se se citar o desrespeito ao silêncio ocasionado por pessoas que param
com seus carros nas ruas e abrem o porta-malas contendo aparelhagem sonora de alta potencia e a
põe a funcionar com o volume máximo como se a área pública fosse privada. Outra questão a ser
considerada foi o aumento de conflitos entre moradores e visitantes ocasionados pela insatisfação
com a mudança de público sem respeito pelo local que visita. Também foram registrados aumento
em relação a furtos, prostituição e drogas.
Quanto à “responsabilidade ambiental e empresarial” e a “existência de códigos”, foi
encontrada o Código de Postura do Município de Maraú (Lei Número 02/2000 de 13 de Dezembro
de 2000) 141 estatuindo as necessárias relações entre o Poder Público e os moradores, mas este ainda
não foi posto em prática, gerando descontentamento na população local que reclama por um
posicionamento dos órgãos competentes. Também existe outra Lei da criação da APA Maraú que
institui uma área de Proteção Ambiental na qual Barra Grande faz parte.
Os indicadores “Mudanças culturais relativas ao consumo” e “Aumento do Custo de Vida”
estão previstos para serem realizados nos meses de abril e maio de 2008 após a temporada para
avaliar o comportamento dos custos da cesta básica e da estrutura de estabelecimentos em ambiente
sem turistas.

CONSIDERAÇÕES FINAIS
Os impactos turísticos irão incidir de qualquer maneira em territórios e comunidades onde
o turismo for implantado. A possibilidade de minimizá-los estimula o estudo e a divulgação dos
resultados, oferecendo as instancias: governamental e comunitária, informações para o
planejamento de ações mitigadoras ou preventivas.
Esta pesquisa iniciou-se em dezembro de 2006 e em seus quinze meses de trabalho
deparou com mudanças grandes em relação à ocupação turística da vila e seu entorno.
Possibilitando afirmar que a dinâmica do turismo pode ser bastante frenética em determinados
casos.
Os pesquisadores ao desenvolverem a pesquisa esperavam que o levantamento dos
impactos propostos pudessem ser levantados e analisados ainda dentro da primeira conjuntura
observada, porém, mesmo antes do término de todas as pesquisas a situação já delineava outro
caminho.
Foram duas realidades distintas analisadas, a região do rio Carapitanguí que se mantém
ambientalmente satisfatória e foi pouco afetada pelo turismo, porém, socioeconomicamente houve
interferência da atividade que acabou transformando vários pescadores ou catadores de caranguejo
em trabalhador do setor. Quando o estudo foi iniciado, havia no povoado de Barra Grande um
desenvolvimento turístico voltado ao visitante de minoria que apreciava principalmente a
rusticidade do lugar e os habitantes locais também passaram a trabalhar e a investir no turismo.
Quanto a outras questões sócio-ambientais observou-se uma interferência negativa muito grande
provocada pelo turismo, principalmente após a última temporada (2007 – 2008).
Destaca-se no povoado, a falta de estrutura urbana para receber este novo tipo de turista,
sendo assim, imprescindível em unidades de conservação como a APA Maraú programas de
educação ambiental para o turista e os moradores baseado em ações de cidadania, como também, a
necessidade urgente de um planejamento turístico de base local, que segundo Rodrigues (2002; 09)
é aquele voltado para a “[...] melhoria da qualidade de vida da população dos lugares e regiões onde
141
Este código contém as medidas em relação à higiene, segurança, ordem pública, bem estar público, localização e
funcionamento dos estabelecimentos comerciais, industriais e prestadores de serviços.
Fórum Internacional do Meio Ambiente - A conferência da Terra 1117

novos projetos se encontram em fase de implantação, ou em áreas que já sofreram degradação


devido ao uso indiscriminado e necessitando de estratégias urgentes para mitigação de impactos”.
A necessidade de planejamento da exploração da atividade turística de forma responsável,
aproximando ao máximo da sustentabilidade, é primordial para o lugar manter o equilíbrio e
melhorar algumas questões negativas e a etapa de avaliação dos possíveis impactos decorrentes da
atividade turística faz parte do processo de planejamento.
Antever os futuros problemas e agir, pode evitar grandes impactos ou ainda reverter
questões já presentes. Por isso, torna-se essencial rever os estudos e intervir rapidamente para que
os problemas não cheguem a níveis insolúveis.

REFERÊNCIAS BIBLIOGRAFICAS
BARKIN, David. Riqueza, pobreza y desarrollo sustentable. México: Jus, 1998.
BENI, Mario Carlos. Como Certificar o Turismo Sustentável? Turismo em Análise. São Paulo:
Aleph/ECA USP, v. 14, n.2 p.5-16 novembro 2003.
COSTA, Maria Lúcia Ferreira. Arquipélago de Fernando de Noronha: uma avaliação dos conflitos
entre a demanda turística e os objetivos de conservação da natureza. RODRIGUES, Adyr Balastreri,
(org). Turismo e Ambiente Reflexões e Propostas. São Paulo: Hucitec, 2002, 3ª ed.
CRUZ, Rita de Cássia Ariza. Políticas de Turismo e Construção do Espaço Turístico-Litorâneo do
Nordeste do Brasil. LEMOS, Amália Inês G. (org). Turismo: Impactos SocioAmbientais. São Paulo:
Hucitec, 1996.
KAISER, Bernard. As Divisões do Espaço Geográfico nos Países Subdesenvolvidos. MÜLLER-
PLATENBERG, Clarita; AB’SABER, Aziz Nacib. Previsão de Impactos. 2ª ed. 2ª reimpr. São
Paulo: Edusp, 2006.
LUCHIARI, Maria Tereza D.P. Urbanização Turística um Novo Nexo entre o Lugar e o Mundo.
RODRIGUES, Adyr Balastreri, (org). Turismo e Ambiente: Reflexões e Propostas. São Paulo:
Hucitec, 2002, 3ª ed.
Mapa de Barra Grande. Disponível em < http://www.barragrande.net> acessado em 06 de agosto de
2007.
NELSON, Sherre Prince; PEREIRA, Ester Maria (orgs). Ecoturismo: Práticas para turismo
sustentável. Manaus: Editora Vale/UniNorte, 2004.
PELLEGRINI, Américo. Ecologia, Cultura e Turismo. Campinas: Papirus, 1993.
SALVATI, Sérgio Salazar. O WWF-Brasil e o Turismo Responsável. MITRAUD, Sylvia (org).
Manual de Ecoturismo de Base Comunitária: ferramentas para um planejamento responsável.
Brasília: WWF Brasil, 2003.
SWARBROOKE, John. Turismo Sustentável: Conceitos e Impacto Ambiental. Vol 1. São Paulo:
Aleph, 2000, 3ª ed.
Fórum Internacional do Meio Ambiente - A conferência da Terra 1118

EDUCAÇÃO AMBIENTAL E TURISMO ECOLÓGICO NO RIO CHORÃO MUNICIPIO


DE JUNCO DO SERIDO-PB

Ailton Francisco dos Santos


Agrônomo, Mestre em Manejo de Solo e Água pela Universidade Federal da Paraíba, Campus II, Areia – PB, e-mail:
ailton.agronomo@gmail.com
Eduardo Rodrigues Araújo
Graduando em Agronomia UFPB/CCA, e-mail: eduaraujocg@gmail.com
Kleber Fernandes de Medeiros
Agrônomo, Extensionista da EMATER/PB, e-mail: kleberufpb@yahoo.com.br

RESUMO
A diversidade paisagística nordestina é rica e distinta das demais regiões, a qual possui
peculiaridades só vistas em áreas isoladas. Neste cenário está incluso o município de Junco do
Seridó, onde está inserido o rio Chorão, que possui em suas margens figuras ruprestes denominadas
Itaguatiaras, cujo valor histórico é reconhecido pelo IPHAN (Instituto do Patrimônio Histórico e
Urbanístico Nacional). O presente trabalho teve como objetivo conscientizar a população de Junco
dos Seridó - PB, quanto ao impacto ambiental da ação antrópica sobre o rio Chorão, bem como
desenvolver o turismo ecológico na região e formar guias turísticos buscando geração de renda
local. Um dia antes da trilha foram realizadas reuniões com os trilheiros sobre, o comportamento
que se deve adotar durante o percurso, bem como ouvir e seguir atentamente as orientações dos
bombeiros e guias turísticos. Durante a reunião foram enfatizados os primeiros socorros e lixo. A
primeira etapa das trilhas conta com a visualização das Itaguatiaras, contando com uma
argumentação sobre a importância e história dessas figuras e uma análise do estado de conservação
da mesma. Continuando nas margens do rio Chorão, verificou-se o desmatamento da mata ciliar,
outro ponto relevante foi o constante uso de queimadas o que vem devastado ainda mais a mata
ciliar desse rio. Na etapa final das trilhas observam-se as cavernas, barragens subterrâneas naturais e
o belíssimo leito do rio Chorão, mas devido à poluição também se observa à parte mais poluída do
mesmo, com lixos e odores fortes. A última parte da trilha é formada por escaladas, considerada a
parte mais difícil da trilha. A conscientização da população, embora um pouco lenta, já é possível
ver resultados positivos, tais com: mais pessoas estão cobrando das autoridades soluções urgentes
para a problemática do rio e em alguns locais o desmatamento da mata ciliar diminuiu.
Palavras chaves: trilhas, conscientização ambiental, poluição, figuras ruprestes

ABSTRACT
Landscape diversity in Northeastern Brazil is vast and distinct to the landscape diversity of
other Brazilian regions, which is characterized by peculiarities only seen in isolated areas. The City
of Junco do Serido is within this scenario, there is where River Chorao is located. On its river side,
cave paintings called Itaguatiaras whose historic value is recognized by IPHAN (Instituto do
Patrimônio Histórico e Urbanístico Nacional) are found. The present study aimed at raising the
awareness of Junco do Serido’s local population to the environmental impact of human actions on
River Chorao as well as developing eco-friendly tourism in the region and training tour guides in
order to generate income to local individuals. One day before trekking, a meeting with trekkers on
how to behave through the pathway as well as on the importance of listening and following fire-
fighters’ and tour guides’ instructions were carried out. During this meeting, first-aid procedures
and garbage issues were highlighted. The first step of the trekking included the viewing of the
Itaguatiaras and involved a discussion on the historic importance of these paintings and on their
conservation status. Following the River Chorao, the deforestation of the ciliary forest was
perceived. In the final step of the trekking, the landscape is composed of caves, natural underground
dams, and the beautiful Chorao riverbed, but, due to pollution, it is also the most polluted stage,
with garbage and strong smells. The last part of the trekking is formed by climbs, considered the
most difficult part of the way. The awareness-raising of local individuals, although a little slow,
Fórum Internacional do Meio Ambiente - A conferência da Terra 1119

resulted in some positive achievements as follows: more individuals are requiring urgent solutions
to the problems of the river and, in some places, the deforestation of the ciliary forest was reduced.
Key-words: trekking, environmental awareness, pollution, cave paintings.

INTRODUÇÃO
O Nordeste brasileiro apresenta uma diversidade paisagística enorme, rica e distinta das
demais regiões do país, possuindo peculiaridades só presentes em áreas isoladas da região
(SEBRAE, 2002). Em termos de características da superfície territorial, a vegetação predominante
desta região é a Caatinga (IBGE, 1993). A Caatinga ocupa uma área de 734.478 km2, e é o único
bioma exclusivamente brasileiro. Do ponto de vista vegetacional, é bastante diversificada por
incluir outros ambientes associados. Este bioma tipicamente brasileiro apresenta uma fauna própria,
com várias espécies endêmicas, diferenciando-se de muitos outros por ser exclusivo do Brasil, o que
torna a sua fauna ainda mais atrativa do ponto de vista científico e também turístico.
A emergência do ambientalismo contribui para criar um interesse e atração crescente pelas
áreas naturais remanescentes do planeta (GOMES, 2003). Portanto, o ecoturismo, surge como uma
alternativa de turismo desenvolvido em ambientes naturais, este é potencializado pelo
ambientalismo e se apresenta como uma atividade econômica que aproxima a espécie humana dos
espaços ecologicamente conservados. Em contrate com o turismo tradicional o ecoturismo segue
um “referencial de princípios básicos” dando ênfase à natureza e à cultura autêntica, conservação da
natureza, envolvimento e benefícios à população local, sensibilização ecológica através da educação
ambiental e menor impacto negativo no meio.
Pensando nessa potencialidade, o turismo no meio rural, constitui-se numa forma de
valorização do território, pois ao mesmo passo que depende da gestão do espaço local e rural para o
seu sucesso, contribui para a proteção do ambiente e para a conservação do patrimônio natural,
histórico e cultural do meio rural. Constitui-se, portanto, em um mecanismo de estímulo à gestão e
ao uso sustentável do espaço local, que deve beneficiar, prioritariamente, as populações locais,
diretas e indiretamente, envolvidas com as atividades turísticas (CAMPANHOLA E GRAZIANO
DA SILVA, 1999).
Neste contexto, o turismo no meio rural é uma das funções produtivas das áreas rurais e,
portanto, entendido como capaz de promover o desenvolvimento rural. Consiste em atividades de
lazer realizadas no meio rural e abrange várias modalidades definidas com base em seus elementos
de oferta: turismo rural, turismo ecológico ou ecoturismo, turismo de aventura e turismo cultural
(GRAZIANO DA SILVA ET AL., 1998).
Ao apropriar-se de localidades possuidoras de paisagens naturais e históricas, o turismo
pode constituir-se tanto como um aliado como um destruidor dessas paisagens, dependendo da
forma como é executado na prática (RODRIGUES, 2000).
Neste cenário está incluso o município de Junco do Seridó, onde está inserido o rio
Chorão, que possui em suas margens, figuras ruprestes denominadas Itaguatiaras, cujo valor
histórico é reconhecido pelo IPHAN (Instituto do Patrimônio Histórico e Urbanístico Nacional).
Atentando-se saber, que a conservação ambiental quer dizer o uso apropriado do meio ambiente
dentro dos limites capazes de manter sua qualidade e seu equilíbrio (BRASIL, 2004).
No entanto, devido à constante poluição provocada pelos dejetos humanos, que foram
lançados sem nenhum tratamento prévio em seu leito, aliado à destruição da mata ciliar e o
assoreamento proporcionado pelos resíduos das empresas mineradoras, responsáveis pelo
beneficiamento do caulim, este rio ficou impróprio para qualquer uso humano, chegando a estar
ameaçado por esses motivos ao desaparecimento.
Uma das primeiras alternativas encontradas para solucionar o problema foi conscientizar a
população, através do turismo ecológico ou ecoturismo, onde se buscou sensibilizar a comunidade
perante - a beleza paisagística, a importância arqueóloga e cultural das Itaguatiaras e a educação
ambiental - demonstrando os impactos que o homem e suas ações sem planejamento, vem acusando
ao rio.
Fórum Internacional do Meio Ambiente - A conferência da Terra 1120

Sendo indispensável às ações de preservação ambiental, poder envolver a máxima restrição


de uso, permitindo apenas o manejo controlado dos recursos naturais segundo objetivos específicos,
como a pesquisa científica, atividades educativas ou recreativas, enquanto as ações de conservação
ambiental envolvem o uso racional destes recursos, buscando o equilíbrio entre os objetivos
econômicos e ecológicos, ou seja, buscando conciliar as demandas socioeconômicas com as ações
de proteção ambiental.
O presente trabalho teve como objetivo, conscientizar a população do município do Junco
dos Seridó – PB, quanto ao impacto ambiental da ação antrópica sobre o rio Chorão, bem como
estimular o desenvolvimento do turismo ecológico na região, através da abertura de trilhas e
formação de guias turísticos locais.

METODOLOGIA
O turismo ecológico foi desenvolvido no município de Junco do Seridó – PB, localizado a
240 km da capital João Pessoa, possui clima tipo AW (quente e úmido com chuvas de verão),
seguindo classificação climática de com precipitação média anual de 500 mm, população de seis
mil habitantes e caatinga como vegetação predominante, a cidade esta inserida na microrregião do
Seridó Ocidental (MOREIRA, 1989; Köppen,1936; IBGE, 2000).
Para atingir os objetivos do trabalho foram realizadas duas trilhas ecológicas, uma no ano
de 2005 e outra em 2007, tais trilhas tiveram 7 km de extensão percorridos grande parte nas
margens do rio Chorão. A primeira trilha teve 45 participantes, sendo a maioria jovem entre 15 e 18
anos, onde se buscou principalmente a formação desses jovens para futuros guias turísticos. Houve
a participação do corpo de bombeiros da cidade de Patos - PB, bem como uma equipe de saúde
formada por duas enfermeiras e médico, além de kit’s de primeiros socorros. Na segunda edição da
trilha participaram 60 pessoas, esta visou demonstrar o impacto ambiental que o rio Chorão esta
sofrendo, contou com o apoio de uma equipe da saúde, além da participação da TV Cabo Branco,
que fez toda a cobertura da trilha.

RESULTADOS
Um dia antes da trilha foram realizadas reuniões com os trilheiros sobre, o comportamento
que se deve adotar durante o percurso, bem como ouvir e seguir atentamente as orientações dos
bombeiros e guias turísticos, durantes estas reuniões ministrou-se aulas sobre primeiros socorros,
cuja responsabilidade foi da equipe média que acompanhou a trilha, e aula sobre educação
ambiental, onde se passou informações básicas como, não jogar lixo durante o percurso e como
cada pessoa pode contribuir para recuperar e minimizar os impactos ambientais no rio Chorão.
A primeira etapa das trilhas conta com a visualização das Itaguatiaras, feito uma breve
argumentação sobre a importância e história dessas figuras, o estado que elas se encontram, ou seja,
cobertas por uma grossa camada de lama proveniente dos esgotos que são despejados a 50 m das
figuras, e as possíveis soluções para minimizar o problema. Continuando nas margens do rio
Chorão, verificou-se o desmatamento da mata ciliar, outro ponto relevante observado foi o
constante uso de queimadas o que vem a devastar ainda mais a mata ciliar desse rio. No decorrer do
percurso foi observada a exuberância da vegetação, alguns pontos da trilha chegavam a ser
bastantes difíceis devido à vegetação ser muito fechada.
Umas das paradas obrigatórias, realizadas nas minas de extração de caulim, os trilheiros
tiveram a oportunidade de visualizar a degradação ambiental que tais minas provocam no meio
ambiente. No ponto mais íngreme das trilhas é possível visualizar paredões de rochas, umas das
mais belas paisagens da região. Na etapa final das trilhas observam-se as cavernas, as barragens
subterrâneas naturais e o belíssimo leito do rio Chorão, mas devido à poluição também se observa à
parte mais poluída do mesmo, com lixos e odores muito fortes, a última parte da trilha é formada
por escaladas, considerada a parte mais difícil da trilha. A trilha finaliza no centro da cidade depois
de percorridos 7 km na caatinga hiperxerófila. Posteriormente, houve a divulgação da atividade para
as escolas e demais instituições municipais públicas e privadas, que participaram direta e
Fórum Internacional do Meio Ambiente - A conferência da Terra 1121

indiretamente do evento, havendo o compromisso de compartilhar as idéias de resgate ambiental e


cultural da localidade em questão.

CONSIDERAÇÕES FINAIS
Através da divulgação, para realização das trilhas, pôde-se aglutinar diversas pessoas de
áreas e interesses distintos para visualização e conscientização da problemática atual do estado de
degradação que o Rio Chorão e suas matas ciliares se encontram. Sendo essas pessoas em grande
parte oriundas do próprio município do Junco do Seridó – PB, interessadas diretamente na
resolução gradativa e definitiva dos problemas que assolam atualmente o Rio Chorão.
A partir da participação efetiva de representantes da comunidade local, em especial os
jovens de ate 18 anos, surgiram iniciativas que convergem para a formação de um grupo de guias
turísticos locais através do aproveitamento do recurso humano disponível, vinculando ainda mais o
munícipe as demandas locais emergentes, proveniente do turismo rural, começando a construir
assim, uma infra-estrutura permanente que venha dá suporte as posteriores trilhas.
Embora um pouco lento, o processo de conscientização da população do município,
começa a despontar e aparece como etapa fundamental na cobrança das autoridades locais
responsáveis, por soluções urgentes e inadiáveis para a problemática do rio. Sendo possível
perceber ainda, uma diminuição, em alguns locais das trilhas, do desmatamento da mata ciliar do
Rio Chorão.
O ecoturismo, por sua vez, impulsionado pela busca de novos circuitos alternativos do
setor, poderia ser explorado criando-se o “Circuito do Rio Chorão”, neste, a região disponibilizaria
aos interessados uma organização local fixa para o acompanhamento, através de guias e de todo
pessoal de apoio, das trilhas que foram marcadas.
Neste sentido o alerta feito para a problemática do estado de degradação que o rio e sua
mata ciliar se encontram, possibilitou a percepção das trilhas ecológicas como um mecanismo de
geração de emprego e renda, bem como uma forma de fixação dos moradores locais na região
sempre visando à preservação e a sustentabilidade da atividade.

Figura 1. Vista da parte final da trilha ecológica do rio Chorão. Localizado no município do Junco
do Seridó – PB.
Fórum Internacional do Meio Ambiente - A conferência da Terra 1122

REFERÊNCIA BIBLIOGRÁFICA
BRASIL. Ministério do meio Ambiente. Unidades de Conservação. Disponível em:
<http://www.mma.gov.br/port/sbf/dap/apconserv.html>. Acesso em: 13 abril. 2008
CAMPANHOLA, C.; GRAZIANO DA SILVA, J. Panorama do turismo no espaço rural: nova
oportunidade para o pequeno agricultor. in Turismo no espaço rural brasileiro - I Congresso
Brasileiro de Turismo Rural. Anais...FEALQ, Piracicaba, 1999.
GRAZIANO SILVA, J. ET AL. Turismo em áreas rurais: suas possibilidades e limitações no
Brasil. in Almeida, J.; Froehlich, J.; Riedl, M. (Orgs.), 1998.
INSTITUTO BRASILEIRO DE GEOGRAFIA E ESTATÍSTICA (IBGE). Anuário estatístico do
Brasil 2000. Disponível em: http://sidra.ibge.gov.br/bda/tabela. Acesso em: 05 de setembro. 2007
INSTITUTO BRASILEIRO DE GEOGRAFIA E ESTATÍSTICA (IBGE)/ Recursos Naturais e
Meio Ambiente: uma visão do Brasil. Sueli Sirena Cladeiron – coordenadora. Rio de Janeiro:
IBGE, Departamento de Recursos naturais e Estudos Ambientais, 1993, 154p
KÖPPEN, W. Das geographische System der Klimate (Handbuch der Klimatologie, Bd. 1, Teil C)
1936.
MOREIRA, E.R.F. Mesorregiões e Microrregiões da Paraíba da Paraíba. Delimitação e
caracterização. O Processo de planejamento na Paraíba – A nova lógica. Governo do Estado da
Paraíba. Gabinete do Planejamento e Ação Governamental. João Pessoa. 1989. pg. 71.SUDENE.
RODRIGUES, I. S. Turismo e Paisagem: Interfaces de uma Relação. Instituto Superior e Centro
Educacional Bom Jesus/IELUSC. IV Encontro Nacional de Turismo com Base Local. Joinville-SC,
2000.
SERVIÇO DE APOIO A MICRO E PEQUENAS EMPRESAS. Turismo ecológico V. 2. Porto
Alegre: SEBRAE,. 60p, 2002.
Fórum Internacional do Meio Ambiente - A conferência da Terra 1123

TURISMO, GEOGRAFIA E CIDADANIA

Bruna Maria Rodrigues de Freitas


Graduanda de Geografia pela Universidade Federal do Ceará. E-mail: bfreitas_@hotmail.com
Edson Vicente da Silva
Professor Doutor do Departamento de Geografia da Universidade Federal do Ceará. E-mail: cacau@ufc.br

RESUMO
O turismo expandiu-se no mundo após o final do século XIX e início do XX, tendo
diferenciações na forma de expansão em diferentes paises. Apresenta-se como um setor da
economia global, assumindo aspectos diferenciais tanto espaciais como de serviços, acarretando
impactos socioambientais positivos e negativos. O turismo contemporâneo induziu que surgissem
novas modalidades de turismo, fazendo com que houvesse uma maior preocupação com os recursos
naturais e as transformações sociais, nesse contexto surge o planejamento turístico. Nesse propósito,
o mercado de trabalho exigiu novas bases para que o turismo pudesse se desenvolver
aceleradamente, através do marketing, da utilização dos recursos naturais e educacionais. A partir
da discussão acerca do turismo, a pesquisa tem como principal objetivo identificar o turismo como
conteúdo na Geografia Escolar no ensino médio, na busca de uma orientação cidadã para os alunos,
propiciando que o aluno perceba sua importância como sujeito ativo na sociedade. Finalizando o
processo com propostas que possibilitem os professores dinamizar o conteúdo posto no material
didático e para os que não detem especificamente do conteúdo, possam perceber a importância de
inseri-lo no currículo escolar. Para realização do trabalho, primeiramente houve uma pesquisa
bibliográfica que se preocupasse com a temática, além do que foram escolhidos temas inseridos no
material didático do ensino médio para o enfoque do trabalho. Conclui-se que o trabalho revela uma
preocupação de inserir o turismo na Geografia Escolar numa perspectiva cidadã, explorando
característica e dinamismo. Tendo uma importância na contribuição do processo de ensino-
aprendizagem, além do que fornece subsídios que possibilitem os professores a trabalhar e
“explorar” temas transversais.
Palavras-chaves: Turismo, Expansão, Geografia Escolar e Cidadania.

ABSTRACT
Tourism expanded in the world after the end of the nineteenth century and beginning of
twenteeth and having differentiation in the form of expansion in different countries. It presents as a
sector of the global economy, assuming both differential aspects such as spacial and services,
causing positive and negative social impacts. The contemporary tourism induced the arising of new
forms of tourism, so that there was a greater concern with the natural resources and social
transformations, in this context comes the trip planning. In this regard, the labour market demanded
new foundations so that tourism could be developed quickly, through marketing, the use of natural
resources and education. From the discussion about tourism, the research is main objective is to
identify tourism as a content in Geography Elementary in high school, in search of a citizen
orientation for students, providing that the student understands it’s importance as active beingan in
society. Finalizing the process with proposals that allow teachers to boost the content put on
educational materials and for those that don’t holds the content specifically can understand the
importance of insert it into the school curriculum. For the accomplishment of this work, first there
was a bibliographic research that was concern about the subject, beyond the themes that were
chosen including the teacher’s material for middle school to focus on the work. It is concluded that
the work reveals a concern about inserting the tourism in Geography Elementary in a citizen
perspective, exploring characteristics and dynamism. Having an importance in the contribution of
the teaching-learning, besides providing grants that allow teachers to work and "explore" cross-
cutting themes.
Key-words: Tourism, Expansion, School Geography and Citizenship.

INTRODUÇÃO
Fórum Internacional do Meio Ambiente - A conferência da Terra 1124

Para Coriolano (2005), a Geografia é a ciência que estuda a produção espacial e as relações
sociais e de poder no espaço geográfico, e o turismo consiste um fenômeno relacionado às pessoas e
aos lugares, ocorre forte inter-relação destas duas áreas.
Não é raro em falar a palavra turismo e muitas pessoas lembrar de sol, praias, dos meios
hospedagem, da natureza, das estradas e outros elementos. Desde épocas remotas, mesmo antes de
Cristo, as pessoas já faziam turismo, com suas viagens, necessidades básicas, como alimentação e
descanso, e conhecimentos geográficos.
A partir do final do século XIX e início do XX, o turismo surgiu com uma estrutura mais
fortalecida, expandiu-se pelo mundo, criando em cada local seus diferenciais, sejam estruturais,
culturais ou sociais. Com o crescimento da indústria de equipamentos turísticos, tornou-se este um
dos setores da economia mais crescente dentre os serviços.
“[...] foi a partir do século XX, e mais precisamente após a Segunda Mundial, que ele
evoluiu, como conseqüência dos aspectos relacionados à produtividade empresarial, ao
poder de compra das pessoas e ao bem estar resultante da restauração da paz no mundo”.
(RUSHCMANN, 1997).

Nessa perspectiva de enfoque, as informações a cerca do turismo passaram a ser mais


divulgadas. Desenvolveram-se estratégias na busca de mais turistas, na divulgação dos locais
turísticos para terceiros e planejando-se possíveis retornos, a mídia tornou-se o caminho mais rápido
e ilustrativo neste sentido, mostrando diferentes paisagens e serviços. Especificaram-se alguns
serviços direcionados a obtenção de melhor qualidade através da efetuação de cursos
profissionalizantes, técnicos e superiores.
Os cursos alavancaram de certa forma o sistema educacional para suprir necessidades e
demandas do turismo e capacitar profissionais nesta área econômica sejam através de cursos
particulares ou públicos. Em algumas comunidades potencialmente turísticas cursos gratuitos,
geralmente são ofertados tanto a nível federal como municipal principalmente com atuação de
ONG’s e associações comunitárias. Atualmente o Ministério de Turismo do Brasil desenvolve
programas de capacitação técnica, nos quais ao término do curso os alunos, podem ser
potencialmente empregados em diferentes empreendimentos hoteleiros e turísticos.
Nesse dinamismo de procura pelos cursos e o crescimento profissional, o mercado de
trabalho tornou-se bem mais competitivo. Esse setor de grande crescimento mostrou-se exigente,
tanto nos aspectos dos próprios serviços, como no conhecimento cultural, histórico, lingüístico,
territorial, comportamental, dentre outros aspectos que envolvem o desenvolvimento da atividade
turística.
Diversos são os impactos socioambientais positivos e negativos provocados pelo turismo,
sendo mais destacados como positivos a geração de emprego e respectivamente como negativo, as
transformações e impactos socioambientais sobre o meio ambiente. Em síntese ocorre, a
expropriação e degradação dos recursos naturais que são transformados em produtos para o
consumo turístico. Quando não ocorrem um planejamento e ações de manejo adequado para as
áreas onde o mesmo se desenvolve, ocorrem graves conflitos entre a população local e as atividades
turísticas.
No intuito de buscar uma melhor gestão, fala-se muito de Turismo Sustentável, que se
referencia ao Desenvolvimento Sustentável, e em geral coloca uma utilização limitada e racional
dos recursos naturais, conservando-os para futuras gerações e buscando com que os impactos
ambientais sejam mais reduzidos e de possível monitoramento ou mitigação.
Esse tipo de desenvolvimento almejado deve considerar as características naturais e
socioculturais da região. De acordo com Sachs (1993), o Desenvolvimento Sustentável é explicada
pelo seguinte tripé: a equidade social, a prudência ecológica e o crescimento econômico.
“A formação do espaço, de acordo com o pensamento dos geógrafos, não pode ser
explicada somente nas diferenças sociais e econômicas, e sim, no relacionamento do
com o meio ambiente”. (DIÓGENES 2002).
Fórum Internacional do Meio Ambiente - A conferência da Terra 1125

O turismo e as possibilidades de sua analise e gestão insere-se no material didático como


conseqüência da própria expansão do turismo nas relações sociedade e natureza, setor econômico e
até mesmo pela questão do conhecimento da realidade socioambiental atual nos locais onde esta
atividade é ou poderá ser explorada. Neste sentido e de forma diferente do que é proposto pelos
Parâmetros Curriculares Nacionais (PCNs) de Geografia, no ensino fundamental o aluno deve criar
“noções de paisagem, espaço, natureza, estado e sociedade”, para assim correlacionar essas relações
com o turismo.
Para o ensino médio a aprendizagem deve permitir ao aluno “uma análise do real,
revelando as causas e efeitos, as intensidades, às heterogeneidades e o contexto espacial dos
fenômenos que configuram cada sociedade” (P.C.N.s, 1999).
Lendo os P.C.N’s de Geografia, identifica-se que o turismo não é discutido como proposta
nos eixos temáticos para o ensino médio, mas verifica-se que existem conteúdos que podem ser
relacionados e destacados, referenciando ao turismo no material didático.
Para Carvalho (2004), a escola produz conteúdos escolares, nos quais estes não apresentam
significados, fazendo com que muitos alunos se perguntem: isso servirá para que em minha vida?
Com análise no método de trabalho em conjunto no processo de ensino-aprendizagem, Carvalho
(2004) cita que “passa a pensar que o problema da falta de significado dos conteúdos, não estaria
apenas centrado no âmago dos próprios conteúdos, mas como são eles veiculados na escola”.
De acordo com a Lei de Diretrizes e Bases da Educação Nacional n° 9394 de 20 de
Dezembro de 1996, em seu Art. 12, “cabe a escola elaborar e executar sua proposta pedagógica”.
Os Art.13 e 14 complementam sobre a elaboração do projeto pedagógico.
Um projeto didático que envolva a questão do turismo é uma oportunidade de trabalhar na
prática a interdisciplinaridade, sendo possível incluir ainda mais os temas transversais,
possibilitando assim que os professores dinamizem suas aulas.

OBJETIVOS
A pesquisa tem como principal objetivo identificar o turismo como conteúdo na Geografia
Escolar no ensino médio, na busca de uma orientação cidadã para os alunos, propiciando que os
alunos percebam sua importância como sujeito ativo na sociedade. Apresenta como objetivos
específicos propor formas que possibilitem os professores dinamizar o conteúdo posto no material
didático e para os que não detem especificamente do conteúdo, possam perceber a importância de
inseri-lo no currículo escolar, assim relacionando com o cotidiano do aluno e que as comunidades
onde o turismo assume uma tônica importante nas condições socioambientais locais, possam tratar
de inserir seus conteúdos e abordagens no ensino fundamental, médio e superior.

METODOLOGIA
Para realização do trabalho, primeiramente houve uma pesquisa bibliográfica que se
preocupasse com a temática, além do que foram escolhidos materiais didáticos do ensino médio
para o enfoque do trabalho. As análises dos temas e bibliografias relacionadas ocorreram de duas
maneiras: primeiramente o turismo como subtema já posto no material e a segunda, verificando
elementos no material didático que propiciam estudos à cerca do turismo.

RESULTADOS E DISCUSSÃO
O primeiro enfoque analisado foi a interpretação da Geografia quanto aos aspectos
relacionados ao mundo do trabalho. Encontra-se o turismo como subtema de uma unidade sobre o
Espaço Industrial. Propriamente no subtema, justifica-se a relação máxima do turismo com o setor
econômico. Verifica-se que há um contexto histórico, com a evolução e importância, apresentando
os principais tipos de turismo e seus efeitos, além de uma síntese do potencial turístico brasileiro.
A questão das imagens utilizadas é de grande importância, porém ao se trabalhar com elas,
devem existir complementos com outros recursos didáticos, nessa perspectiva, o livro apresenta
tabelas, gráficos, mapas e leituras complementares. As imagens apresentam-se relacionadas ao
conteúdo, propiciando ao aluno aspectos positivos e negativos sobre as diferentes paisagens
Fórum Internacional do Meio Ambiente - A conferência da Terra 1126

apresentadas, além do que a imagem visual propicia para que ele imagine outros elementos no
entorno do espaço destacado, criando outras imagens e até memoriza. Assim pode-se contar para
outras pessoas, a sua visão a cerca de uma paisagem.
Ainda neste percebe-se a abrangência de conteúdo que existe, possibilitando que o
professor demonstre aos alunos a grande influencia da sociedade sobre a natureza, resultando na
construção do espaço geográfico e suas diferentes paisagens culturais.
Já no segundo enfoque analisado, tratou-se sobre Panorama geográfico do Brasil: aspectos
físicos, humanos e econômicos, apresentando as características gerais do país e a importância da
natureza e suas diferentes feições paisagísticas. Os mapas são muito utilizados e um grande numero
de imagens identificam os diferentes ecossistemas brasileiros, relacionando texto com imagens. Não
verificou-se a existência de assuntos que enfoquem o turismo, porém pode-se trabalhar em outro
víeis. Os docentes podem explorar teorias, como a sociedade transforma a natureza, acarretando
muitas vezes impactos socioambientais e também trabalhar as propostas de soluções de diminuir a
impactação da sociedade na natureza.
Finalizando, a terceira abordagem geográfica trata sobre o quadro político e econômico do
mundo atual, enfoca a questão econômica e política do espaço mundial. Identifica o histórico dos
continentes, atividades, a cultural e o social. Interpreta-se a dinâmica econômica e social dos
continentes, observando as relações socioeconômicas, na caracterização do espaço.
Praticamente não se encontra o turismo como tema ou subtema nos textos didáticos, porém
nota-se na abordagem a importância para o aluno poder diferenciar e conhecer os continentes, além
da relação entre o local e o internacional, podendo ser analisados a preocupação como uso e
ocupação intensa e desordenada da natureza, trabalhando com a questão de Planejamento
Socioambiental X Desenvolvimento Sustentável. Diferente dos outros dois temas analisados, neste
último as imagens de paisagens são poucas, verificando-se uma maior caracterização espacial
através de mapas.
De acordo com Sacristan (1991), “o professor não é um técnico nem um improvisador, mas
sim um profissional que pode utilizar o seu conhecimento e a sua experiência para se desenvolver
em contextos pedagógicos práticos pedagógicos pré-existentes”.
Percebe-se que essa análise realizada se fez por escalas, por grau de identificações de
elementos que propiciem o estudo sobre o turismo. Nesse contexto os professores devem
inicialmente pesquisar sobre as novas tendências que cercam o turismo, relacionando com seu
histórico, seguindo deve-se pensar que o turismo proposto para os alunos não é o de somente
conhecer sobre o assunto, mas de discutir que turismo é esse na atualidade, serviços e impactos.
Nesse propósito “o saber que o (a) professor (a) utiliza no desempenho de sua profissão
tem uma especificidade que exige uma formação inicial e continuada, não é uma profissão que se
possa improvisar. Mesmo baseando-se em experiências e em conhecimentos práticos, outros
conhecimentos interagem na forma como o (a) professor (a) desenvolve sua ação e enfrenta as
questões cotidianas de sua profissão”.(PASSOS, 2000).
Em continuidade, as cores são de fundamentais importâncias, chama atenção além da
leitura, o papel da mídia como mediador no mercado de trabalho e divulgação facilita na busca de
informações sendo estas, verificadas, além do que discutir sobre o desenvolvimento territorial,
projetar filmes sobre Educação Ambiental, assim com o tempo aprimorando.
“O (a) professor (a) que centra sua ação docente apenas na transmissão-assimilação de
conteúdos não está em sintonia com os cenários históricos e contemporâneos, atuais com
suas características sociais, econômicas, culturais, políticas e ritmo acelerado de
transformações, que põem em xeque um processo de ensino-aprendizagem pautado num
modelo conteudista”. (PASSOS, 2000).

Não se faz obrigado ter necessariamente no material didático um tema específico para se
trabalhar com o turismo, mas deve-se verificar elementos que viabilizem o estudo sobre o turismo,
como o patrimônio histórico-cultural de uma região, a questão do Desenvolvimento Sustentável e as
Fórum Internacional do Meio Ambiente - A conferência da Terra 1127

diferentes paisagens brasileiras, propiciando que o aluno faça uma reflexão sobre suas atitudes na
sociedade, relacionando com o meio-ambiente.
Os principais conceitos geográficos que devem ser trabalhados no turismo, associados aos
espaços característicos do turismo são: espaço geográfico, paisagem, técnica, natureza, turismo
comunitário, unidade geoambiental, litoral, cidade, cultura e relações entre sociedade/natureza, para
a compreensão do processo de produção espacial para o turismo.
Verifica-se que são conceitos encontrados em diferentes materiais didáticos, porém o
professor deve ter uma sistematização e ordenamento ao trabalhar com eles.
Portanto “há que se considerar o educando não como mero espectador, mas como ativo
participante detentor de capacidades próprias e modos de pensar distintos, cujos valores e práticas
se fundamentam tanto numa história pessoal quanto social. O desenvolvimento do ser humano é
uma extraordinária malha de interação de fatores psicogenéticos, sociais e ambientais, de tal forma
que a formação da pessoa é simultaneamente a formação de seu próprio meio ambiente”.
(HIGUCHI, 2003)
O sentimento de ser um cidadão que tem direitos e deveres na sociedade, gera expectativas
de valorização e construção de uma sociedade justa e igualitária, no qual a mesma ao inter-
relacionar com o meio-ambiente nos diferentes espaços, cria respeito, cuidado e proteção nesses
espaços.

REFERÊNCIAS
BRASIL / MEC. Parâmetros Curriculares Nacionais. PCNs: Apresentação dos temas transversais e
Ética: MEC / SEF. Brasília: Secretaria de Educação de Ensino Fundamental, 1997.
CARVALHO, Maria Inês. O contrario também pode acontecer: ponderações curriculares sobre a
geografia escolar. In: FARZ, M.S. SANTOS, J.M. DOS. (Orgs.). Reflexões e Construções
Geográficas Contemporâneas. Salvador: 2004.
CEARÁ, Secretaria de Educação Básica. Cartilha do Cidadão. Fortaleza: 1999. 76 p.
CORIOLANO, Luzia Neide Menezes Teixeira. SILVA, Sylvio C. Bandera de Mello e. (orgs).
Turismo e Geografia: abordagens criticas. Fortaleza: Ed. UECE, 2005.
DIÓGENES, Vânia Gomes Brito. As atividades turísticas no litoral de Tibau-RN e Icapui-CE:
Desenvolvimento Socioambiental e Perspectivas de Sustentabilidade. Dissertação de Mestrado em
Desenvolvimento e Meio-Ambiente – PRODEMA. Mossoró: 2002.
FIGUEIREDO, J.B. Educação Ambiental e Desenvolvimento Sustentável: Apostila do curso de
Pós-Graduação latu sensu Educação Ambiental. UECE.
HIGUCHI, Maria Inês Gasparetto. Crianças e Meio Ambiente: dimensões de um mesmo mundo. In:
NOAL, F. O. BARCELOS, V. H. de L. (Orgs.). Educação ambiental e cidadania: cenários
brasileiros. Santa Cruz do Sul: EDUNISC, 2003.
PASSOS, Carmensita Matos Braga. Trabalho docente: características e especificidades. Nota de
Aula, Fortaleza, 2000.
RUSCHMANN, Doris Van de Meene. Turismo e planejamento sustentável: a proteção do meio
ambiente. Campinas, SP: Papirus, 1997.
SACRISTÁN, J. G. Consciência e Ação sobre a Prática como Libertação Profissional dos
Professores. In: NÓVOA, A. (Org.). Profissão Professor. Porto: Porto Editora, 1991.
Fórum Internacional do Meio Ambiente - A conferência da Terra 1128

OS IMPACTOS AMBIENTAIS DO DESENVOLVIMENTO NA COMUNIDADE

José Rogério Braz de Figueiredo


Universidade do Estado do Rio de Janeiro
rfrogeriogeo@yahoo.com.br

RESUMO
Esta pesquisa está sendo realizada a partir dos estudos de observação empírica e
questionário aplicado aos moradores, aos veranistas e turistas procurando entender como o
desenvolvimento da comunidade foi acelerado a partir da participação do turismo, provocando
impactos ambientais na natureza local do distrito de Conceição de Jacareí, pertencente ao município
de Mangaratiba no Estado do Rio de Janeiro.
Este distrito fica localizado na chamada região da Costa Verde, que se estende desde o
distrito de Itacuruça até o município de Paraty no sul do Estado, formada por praias, cachoeiras e
montanhas.
O objetivo dessa pesquisa é mostrar como o turismo interferiu (interfere), qual a sua
importância para o desenvolvimento do distrito e quais as conseqüências causadas ao meio
ambiente e a natureza local. A partir dessas observações, procurar criar condições de uso dos
recursos naturais com o mínimo possível de impactos ambientais, podendo dessa maneira o distrito
continuar a desenvolver a sua atividade turística com a participação da comunidade e do município
de maneira a criar um ambiente propício ao bom desenvolvimento das atividades turísticas, com o
mínimo de agressão possível à natureza local. Uma vez que não é possível reverter totalmente o
quadro atual de degradação ambiental, que sejam realizadas ações que visem amenizar esta situação
atual, colaborando dessa maneira com a preservação da natureza local que ainda existe.
Palavras-chave: comunidade, desenvolvimento, impactos e turismo.

ABSTRACT
This research has been carried out from studies of empirical observation and a poll carried
out with inhabitants, people on vacation and tourists aiming at comprehending how the
community’s development has been hastened by tourist participation. The result was environmental
impacts on the local nature of Conceição de Jacareí, which belongs to Mangaratiba district in the
State of Rio de Janeiro.
This district is located in the Costa Verde region, which stretches from Itacuruçá district to
Paraty, in the south of the state. It is constituted by beaches, waterfalls and mountains.
The objective of this study is to show how tourism has interfered (interferes), what is its
importance for the development of the district and what are the consequences it causes to the
environment and local nature. From these observations, less harmful conditions of how to use the
natural resources could be created in a way that the district could continue developing its tourist
activities counting on community and district’s participation.
The result would be an opportune environment to the development of tourist activities,
harmless to the local nature.
Since it’s not possible to reverse the present situation of environmental degradation, it is
necessary to carry out actions aiming at softening the present situation, in order to collaborate with
the preservation of the existing local nature.
Key-words: community, development, impacts and tourism.

INTRODUÇÃO
O distrito de Conceição de Jacareí fica a aproximadamente 30 minutos do município de
Angra dos Reis e 30 minutos da sua sede administrativa, o município de Mangaratiba. Por sua
posição geográfica bastante estratégica, há bastante tempo esse distrito vem sendo freqüentado por
um número significativo de turistas (serve de base para ida a Ilha Grande, pois em Angra dos Reis,
devido a sua grande importância turística, os serviços turísticos oferecidos são muito mais caros),
haja vista que sua população local que é de aproximadamente 2385 habitantes, sendo composta de
Fórum Internacional do Meio Ambiente - A conferência da Terra 1129

1260 homens e 1125 mulheres (IBGE-censo 2000), com a aproximação dos feriados prolongados e
a alta estação do verão sua população quadruplica, causando com isso graves problemas de infra-
estrutura na localidade.
Essa mesma comunidade local não estava (está) preparada para atender uma demanda tão
grande de pessoas, com isso os serviços que são oferecidos à comunidade local de uma forma um
tanto quanto precária, nesses períodos de feriados prolongados e principalmente na alta temporada
do verão se complicam ainda mais. Contando ainda com outro fator agravante desta situação caótica
que se instala no distrito, que são o grande número de trabalhadores informais que todo dia surgem
no distrito pela manhã, só retornando para suas origens no cair da noite, sendo que muitos desses
trabalhadores permanecem no próprio distrito, dormindo em suas próprias barracas com mínimas
condições de higiene possíveis. Somados todos esses fatores, um quadro bastante complexo e de
difícil solução se forma, necessitando de medidas urgentes para amenizar esses problemas.
O recorte temporal escolhido para realização desta pesquisa que está sendo desenvolvida é
a partir do ano de 1992 até o ano de 2007, compreendendo assim os últimos 15 anos de atividades
turísticas nesse distrito, com seus impactos positivos e negativos na população e negativos na
natureza local que foi bastante modificada. A população local desse distrito basicamente vivia da
pesca, durante todo o ano e de pequenas atividades comerciais, principalmente realizados durante a
temporada de verão e feriados prolongados, a infra-estrutura do distrito também sempre foi bastante
precária, com apenas um pequeno posto médico para atendimento ambulatorial, duas escolas de
ensino básico, nível médio apenas em Angra dos Reis ou Mangaratiba, um pequeno mercado apenas
com produtos básicos, duas padarias, uma farmácia, pequenos varejos, três pequenas pousadas com
o mínimo de conforto e um hotel que atendia exclusivamente o seu quadro de sócios, atualmente
pertence à prefeitura de Mangaratiba que desenvolve projetos sociais. Grande parte da população
era composta de moradores com baixa escolaridade e os jovens não tinham muitas perspectivas de
vida, ficando grande parte ociosa por falta de escolas ou trabalho, com isso passavam grande parte
do dia na mata caçando, na praia ou na cachoeira, os que queriam estudar tinham que se deslocar
para Angra dos Reis ou Mangaratiba.
Conceição de Jacareí sempre foi um local bastante calmo e agradável e possui uma praia
de areia monazítica bastante calma e com grande fartura de peixes, era possível observar todas as
tardes, famílias pescando na praia e saindo com seus baldes cheios, nas cachoeiras de águas
límpidas e transparentes era possível beber de sua água e tomar banho despreocupado, as
cachoeiras estavam repletas de pitus e lagostins de tamanho considerável, esse era o modo de vida
da população de Conceição de Jacareí até aproximadamente o ano de 1995. Esta natureza local
sofria pouca interferência antrópica da comunidade, mas a sua exuberante beleza cênica foi também
o responsável pelas grandes modificações que começaria a ser implantada.
A superfície da terra é extremamente variada. Mesmo um conhecimento casual com sua
geografia física e a abundância de formas de vida, muito nos dizem. Mas são mais
variadas as maneiras como as pessoas percebem e avaliam essa superfície. Duas pessoas
não vêem a mesma realidade. Nem dois grupos sociais fazem exatamente a mesma
avaliação do meio ambiente. A própria visão científica está ligada à cultura – uma
possível perspectiva entre muitas. (TUAN, 1980, p. 6)

A partir desse ano de 1995, a natureza local de Conceição de Jacareí começou a ser
modificada bastante significativamente, principalmente com a construção de um grande complexo
hoteleiro tipo Resort, venda de casas de veraneio (segunda residência), residências de alto luxo que
viria a atender principalmente a elite classe A de São Paulo e aluguel de apartamentos tipo Flats,
com marinas para barcos, lanchas e veleiros. Este empreendimento foi visto pela comunidade local
como um acontecimento de grande importância, pois os trabalhadores da construção civil foram na
sua grande maioria captados no próprio distrito, gerando dessa maneira desenvolvimento e trabalho
para a população local.
A mão-de-obra dos trabalhadores da comunidade não era qualificada, normalmente eram
utilizados como serventes, vigias, serviços de limpeza e outros serviços que não necessitassem de
Fórum Internacional do Meio Ambiente - A conferência da Terra 1130

nenhum tipo de qualificação. Para uma comunidade que tinha pouquíssima ou nenhuma oferta de
trabalho, foi visto com otimismo esta oferta de trabalho.
Acontece que com o início das obras começaram a surgir os primeiros problemas, diversos
explosões com uso de dinamite explosões com uso de dinamite, para o desmanche de morros para a
construção do empreendimento e também para construção da marina, começaram a causar os
primeiros danos na natureza local, que veio dessa maneira atingir principalmente a população mais
antiga de moradores que viviam basicamente da pesca. As explosões com dinamite quase que
diárias causaram o desaparecimento de peixes na região e mesmo pescadores que possuíam cercos,
existem dois grandes cercos, um ligado ao continente e outro a ligado a ilha Ceia que fica de frente
a praia de Conceição de Jacareí, começaram a passar por dificuldades financeiras, alguns inclusive
abandonando a atividade da pesca, após toda uma vida dedicada à mesma. A única peixaria que
existia e que também servia de entreposto para outras localidades, fechou as suas portas
definitivamente. Os poucos que resistiram à atividade da pesca, basicamente o fizeram por não ter
condições de mudar de atividade ou ainda por não ter habilidade em outro tipo de tarefa que não
fosse aquela desenvolvida durante toda a sua vida.
O impacto ambiental não é, obviamente, só resultado (de uma determinada ação
realizada sobre o ambiente): é relação (de mudanças sociais e ecológicas em movimento)
Se impacto é, portanto, movimento o tempo todo, ao fixar impacto ambiental ou ao
retratá-lo em suas pesquisas o cientista está analisando um estágio do movimento que
continua. Sua pesquisa tem, acima de tudo, importância de um registro histórico,
essencial ao conhecimento do conjunto de um processo, que não finaliza, mas se
redireciona, com as ações mitigadoras. (COELHO, 2006, p. 25).

Dois grandes alojamentos foram construídos no distrito para dar suporte à obra,
aproximadamente 500 trabalhadores faziam parte desse contingente, e com esse número fixo de
trabalhadores diariamente na localidade, alguns moradores começaram a realizar atividades que
atendiam as necessidades desses trabalhadores e como conseqüência aumentou a oferta de serviços
e mercadorias na região.
Mesmo crescendo desordenadamente sem nenhum controle ou orientação dos órgãos
municipais responsáveis, Conceição de Jacareí começava a vislumbrar algumas melhoras na
transformação do seu espaço urbano, pois para muitos o desenvolvimento enfim estava chegando.
Segundo Moraes e Costa (1999) a sociedade valoriza o espaço, dessa maneira as formas
espaciais que são criadas tem um papel fundamental na economia dominante, fazendo com que as
diversas particularidades dos modos de produção tenham sua valorização diferenciada, por isso este
empreendimento imobiliário de grande impacto social no distrito de Conceição de Jacareí, fez com
que os seus espaços se tornassem altamente valorizados, terrenos e imóveis se valorizaram e casas
velhas e antigas deram lugar a novos prédios, casas e lojas comerciais. Casas históricas em estilo
colonial, da época do café iam se deteriorando, pois os proprietários não tinham dinheiro para
reformá-las, simplesmente deixavam que o próprio tempo se encarregasse de destruir as casas, pois
a prefeitura de Mangaratiba não permitia que fossem feitas mudanças na arquitetura das casas, toda
reforma deveria respeitar a arquitetura colonial, o que para muitos era impossível de se realizar,
pois esse tipo de reforma era muito cara exigindo uma mão-de-obra especializada dessa maneira o
pouco que resta de passado histórico na localidade é a Igreja de Nossa Senhora da Conceição, que
comemora sua data de aniversário no dia 08/12, sempre com uma grande festa no distrito que já se
tornou atração turística também.
Essas mudanças ocorridas em Conceição de Jacareí, a partir da construção do
empreendimento turístico, a construção de casas, lojas, prédios, asfaltamento de ruas,
impermeabilização do solo e aumento do escoamento superficial das águas, trouxeram alterações
significativas para a natureza local. “O turismo dá também inicio ao processo de especulação
imobiliária que, ao valorizar novas áreas, faz com que suas características ambientais se tornem
completamente secundárias.” (MENDONÇA, 1999, p. 22.).
Fórum Internacional do Meio Ambiente - A conferência da Terra 1131

Além dos problemas com as explosões já citadas no início, um outro grave problema e
também bastante impactante, foi com certeza à construção de casas de veraneio ao longo das
margens direita e esquerda das duas cachoeiras principais que cortam o distrito. Estas construções
foram sendo realizadas em áreas que eram vendidas por grileiros ao longo dos cursos das
cachoeiras, não houve a preocupação de preservação das matas ciliares, sendo derrubadas diversas
árvores da Mata Atlântica para aproveitamento de espaço para novas construções. Pouquíssimas
casas construíram sumidouros ou filtros biológicos, a grande maioria jogava e ainda jogam o esgoto
in natura direto na cachoeira, o que ao longo desses anos tornou a cachoeira na parte baixa
totalmente poluída por esgoto doméstico. Não é mais possível beber a água ou tomar banho na parte
baixa da cachoeira, 400 metros até a praia, sem correr o risco de se contaminar ou contrair alguma
doença de pele, tamanha é a quantidade de esgoto na água.
Para quem é conhecedor do local, ainda existe na própria cachoeira na parte alta da serra,
caminhando aproximadamente uns 800 metros por dentro da mata em uma trilha demarcada, um
local conhecido como “poço do encantado” (quinze metros de comprimento, cinco de largura e três
de profundidade), local que era possível tomar banho e beber água sem riscos, o problema é que
nesse local também já começam a ser construídas casas muito próximas a cachoeira, contaminando
também esta parte alta da cachoeira. A maioria dos turistas quando chegam não são orientados e
normalmente tomam banho na cachoeira poluída ou ficam na praia com seus filhos se banhando “no
rio que vem da cachoeira”, acontece que este rio também está poluído, e está poluindo também a
praia e a areia, e esses turistas não são orientados para os riscos que estão correndo.
O turismo é uma atividade que pode estar intimamente relacionada com o meio físico,
em especial aquele que está vinculado à exploração das belezas naturais de uma
determinada área, o turismo de aventura, o turismo ecológico, o turismo saúde, o turismo
lazer, o turismo rural, o turismo climático e hidrotermal etc. Dessa forma, o
conhecimento geomorfológico da área a ser aproveitada par essa atividade econômica
pode tornar a atividade mais rentável, segura e menos impactante. Tem sido a atividade
econômica que mais tem crescido nas últimas décadas, acontecendo praticamente em
qualquer parte da superfície terrestre. (GUERRA E MARÇAL, 2006, p. 42.).

Na praia de Conceição de Jacareí desembocam dois rios provenientes das duas cachoeiras
que cortam o distrito, sendo que um desses rios e que possui um fluxo de águas menor e que
desemboca no canto esquerdo da praia, está totalmente poluído por esgoto devido à grande
quantidade de casas que despejam seus esgotos diariamente na cachoeira. Independente da
quantidade de turistas que se encontre no distrito, esse rio tem a sua coloração bastante escura e
apresenta uns cheiros bastante desagradáveis, fazendo com que os próprios moradores evitem este
lado da praia (em época de finais de semana prolongados ou na alta estação isso não ocorre, ficando
bastante cheio do mesmo jeito, não por moradores, mas por turistas desavisados), o outro rio como
tem um fluxo de água bastante grande apresenta a coloração das suas águas transparentes e sem
nenhum odor, o que apresenta a falsa impressão de estar totalmente límpido, fazendo com que os
turistas coloquem suas cadeiras de praia dentro da água e as crianças brinquem em volta, acontece
que este rio também está poluído, apenas com um grau menor de poluição (com isso tanto os
moradores, quanto os turistas se banham tranqüilamente nessa água desconhecendo a real situação)
e por fim outro problema que não existia na praia de Conceição de Jacareí é a grande quantidade de
óleo na água, causado pela marina que foi construída em frente à praia.
Todos esses problemas que se apresentam poderiam ser de certa forma minimizados, no
momento do início da construção do empreendimento turístico, com uma política séria e de acordo
com as normas ambientais vigentes, procurando dessa maneira impactar o menos possível a
natureza local., pois o desenvolvimento que a comunidade ganhou está sendo perdido pela
destruição de sua natureza local. Da mesma maneira o município de Mangaratiba antes de permitir a
construção de casas ao longo das margens das cachoeiras, deveria orientar os moradores e
veranistas sobre o limite mínimo de proteção de margens e matas ciliares, determinar a instalação
de filtros biológicos e fossas sépticas (evitando assim que o esgoto fosse jogado in natura nas
Fórum Internacional do Meio Ambiente - A conferência da Terra 1132

cachoeiras), dessa maneira às cachoeiras não estariam tão seriamente degradadas como agora, as
matas ciliares menos agredidas, com a preservação das mesmas e uma interferência antrópica menor
na natureza local.
Segundo Coriolano (2003), o desenvolvimento do ser humano deve ter sua centralidade
voltada para o ser e não o ter, fazendo com que o desenvolvimento local e turístico deva ser voltado
para a escala humana, onde a busca por colaboração e parceria devem ser uma constante na busca
da satisfação do homem, pois as suas potencialidades poderão propiciar uma condição de vida digna
como verdadeiro cidadão. A partir do momento em que o ser humano é respeitado em sua dignidade
de cidadão, as relações interpessoais se tornam mais freqüentes e ao mesmo tempo pode-se tornar a
base para que o indivíduo possa assim se desenvolver, possa sentir-se capaz, realizado a partir do
reconhecimento do outro, enquanto responsável por sua própria condição social.

METODOLOGIA
A metodologia que foi usada para desenvolver essa pesquisa partiu a princípio da
observação empírica da localidade e de um questionário aplicado aos moradores e turistas, pois
como freqüentador assíduo desse distrito há muitos anos, venho observando ao longo dos anos a
degradação ambiental se acentuando. Como o progresso traz diversas transformações para o meio
ambiente e para o homem, não se pode esquecer que o grande agente responsável por estas
mudanças foi (é) o turismo e que a partir do próprio turismo, pode-se reverter esse quadro, fazendo
com que todas essas transformações ocorridas em Conceição de Jacareí, possam então ser revistas e
trabalhadas de modo que a natureza local possa ser revitalizada, preservada, conservada e menos
impactada.
“O desenvolvimento excessivo e mal planejado do turismo afeta o ambiente físico e os
destinos” (ARCHER E COOPER, 2002, p. 96.). Como já foram mencionadas anteriormente, as
mudanças ocorridas na natureza local foram bastante acentuadas. O marco inicial de todo o
processo de mudança da natureza local, com certeza foi à construção do empreendimento turístico,
mas outros fatores também serviram para colaborar com esta situação como o aterramento de um
pequeno manguezal que ficava na boca da barra, para construção de casas e aproveitamento do
espaço “sujo”.
Estas atitudes tiveram grande impacto no curso e fluxo das águas das cachoeiras, que vem
diminuindo através dos anos (informação colhida com moradores antigos e por minha observação
como freqüentador do local), além da grande quantidade de esgoto lançado nas cachoeiras
interferindo e impactando seriamente no ecossistema local. Através dessas observações foi possível
verificar que o turismo quando não é realizado de maneira consciente, profissional, planejada, pode
trazer sérios riscos à natureza; em contra partida quanto é feito em parceria com outros agentes
modeladores do espaço e com comprometimento com o desenvolvimento sustentável do local,
torna-se verdadeiramente um elemento capaz de transformar a comunidade positivamente.
O turismo é considerado a maior indústria do mundo com um faturamento, estimado em
US$ 3,5 trilhões, que em 1995 empregava um trabalhador em cada nove, em termos mundiais.
Trata-se de uma indústria que deveria preocupar-se com o desenvolvimento sustentado, porque
“depende intrinsecamente dos recursos da natureza e da herança cultural da sociedade”. Ela vende
esses recursos como parte de seu produto empírico, mas também precisa compartilhar dos mesmos
recursos com outros usuários, inclusive a população local. Conseqüentemente, é do próprio
interesse do turismo buscar ativamente o desenvolvimento sustentado e cooperar com outros
grupos, setores e governos para garantir a integridade dos seus recursos. (MURPHY, 2002, p. 192.).

OBJETIVO
A partir da coleta de dados que foi realizada, foi possível verificar que em diversos pontos
da pesquisa, as idéias, sugestões e críticas convergiam para um pensamento comum e que de certa
forma atendia aos interesses dos diversos agentes envolvidos.
Chegou-se a algumas considerações de que se necessita realmente tomar algumas
providências imediatas, para que os efeitos negativos que atualmente agridem a natureza local
Fórum Internacional do Meio Ambiente - A conferência da Terra 1133

sejam minimizados, uma vez que com a interferência antrópica bastante acentuada, não é possível
eliminar totalmente os problemas ambientais resultantes dessa interferência, nem reverter
totalmente o processo que já se encontra em fase bastante avançada, mas acreditamos que possam
ser tomadas medidas que amenizem esse problema.
Os objetos que interessam à Geografia não são apenas objetos móveis, mas também
imóveis, tal uma cidade, uma barragem, uma estrada de rodagem, um porto, uma
floresta, uma plantação, um lago, uma montanha. Tudo isso são objetos geográficos.
Esses objetos geográficos são do domínio tanto do que se chama a Geografia Física
como do domínio do que se chama a Geografia Humana e através da história desses
objetos, isto é, da forma como foram produzidos e mudam, essa Geografia Física e essa
Geografia Humana se encontram. Para os geógrafos, os objetos são tudo o que existe na
superfície da Terra, toda herança da história natural e todo resultado da ação humana
que se objetivou. (SANTOS, 2006, p. 72).

Faz-se necessário então que parcerias sejam firmadas entre a comunidade local, veranistas,
agentes turísticos que atuam na localidade e prefeitura de Mangaratiba, na solução dos problemas já
mencionados. Nesse contexto a pesquisa desenvolvida, tem o objetivo de minimizar os problemas
ambientais encontrados no distrito de Conceição de Jacareí (desmatamento, esgoto in natura na
cachoeira, despoluição da praia, preservação de nascentes e outros), procurando orientar moradores,
veranistas e turistas no sentido de que todos têm um papel importante na defesa e proteção da
natureza.
A participação e integração do turismo com a causa ecológica são dessa forma primordiais
para o uso racional e sustentável dos recursos naturais e como conseqüência a preservação da
natureza local. É importante lembrar que a pesquisa não está encerrada, que existe muito ainda a ser
realizado e que o aprofundamento dessa pesquisa pode de fato colaborar na preservação da natureza
local, no desenvolvimento da comunidade de maneira consciente e sustentável e no trabalho
turístico desenvolvido na localidade.
Esse tipo de mudança de atitude em relação à natureza, com certeza trará benefícios
imediatos à comunidade, contudo o mais importante serão os benefícios alcançados em longo prazo
que terão um papel fundamental na sustentabilidade para natureza local, melhorias na qualidade de
vida da comunidade e dos turistas que freqüentam o distrito de Conceição de Jacareí.

CONSIDERAÇÕES FINAIS
O desenvolvimento dessa pesquisa realizada no distrito de Conceição de Jacareí está sendo
feito de maneira que fique bastante claro ao término do mesmo, a importância que o turismo
representa na melhora da condição social da comunidade, mas ao mesmo tempo mostrar que se não
houver um trabalho sério de desenvolvimento com responsabilidade social e ambiental, todo o
desenvolvimento que for realizado estará seriamente comprometido, pois o ônus da degradação
ambiental será muito mais impactante do que qualquer transformação social positiva que tenha
ocorrido na comunidade.
É importante que os agentes envolvidos percebam a situação atual e busquem alternativas
para reverter esse quadro. Por isso é necessário que a sociedade, a comunidade local, a prefeitura de
Mangaratiba, os agentes turísticos estejam todos centrados com objetivos comuns, bem definidos e
que possam trabalhar de acordo com o que é determinado nas legislações ambientais vigentes,
procurando dessa maneira desenvolver e potencializar o turismo, contribuindo para o
desenvolvimento da comunidade, mas com o mínimo possível de agressão a natureza local,
procurando sim desenvolver a comunidade, mas consciente do seu papel enquanto agente
modelador do espaço.

REFERÊNCIAS BIBLIOGRÁFICAS
Fórum Internacional do Meio Ambiente - A conferência da Terra 1134

ARCHER, Brian & COOPER, Chris. Os impactos positivos e negativos do turismo. In:
THEOBALD, William F. (Org.) Turismo global. Tradução de Anna Maria Capovilla, Maria
Cristina Guimarães Cupertino e João Ricardo Barros Penteado. 2 ed. São Paulo: Editora SENAC,
2002. p.85-102.
COELHO, Maria Célia Nunes. Impactos ambientais em áreas urbanas – teorias, conceitos e
métodos de pesquisa. In: GUERRA, Antonio José Teixeira & CUNHA, Sandra Baptista (Orgs.)
Impactos ambientais urbanos no Brasil. 4 ed. Rio de Janeiro: Bertrand Brasil, 2006. p. 25
CORIOLANO, Luzia Neide M.T. O desenvolvimento voltado às condições humanas e o turismo
comunitário. In: CORIOLANO, Luzia Neide M.T.; LIMA, Luiz Cruz (Orgs.) Turismo comunitário
e responsabilidade socioambiental. Fortaleza: Eduece, 2003. p. 26-41.
GUERRA, Antonio José Teixeira & MARÇAL, Mônica dos Santos. Geomorfologia ambiental. Rio
de Janeiro: Bertrand Brasil, 2006. 189 p.
MENDONÇA, Rita: Turismo ou meio ambiente: uma falsa oposição? In: LEMOS, Amália Inês G.
de (Org.) Turismo: impactos socioambientais. 2 ed.São Paulo: Hucitec, 1999. p. 19-25.
MORAES, Antonio Carlos Robert & COSTA, Wanderley Messias da. A valorização do espaço. 4
ed.São Paulo: Hucitec. 196 p.
MURPHY, Peter E. Turismo e desenvolvimento sustentado. In: ______. Turismo global. Tradução
de Anna Maria Capovilla, Maria Cristina Guimarães Cupertino e João Ricardo Barros Penteado. 2
ed. São Paulo: Editora SENAC, 2002. p. 187-203.
SANTOS, Milton. A natureza do espaço. 4 ed. 2 reimpr. São Paulo: Edusp, 2006. 390 p.
TUAN, Yi-Fu. Topofilia um estudo da percepção, atitudes e valores do meio ambiente. Tradução
de Lívia de Oliveira. São Paulo / Rio de Janeiro: DIFEL - Difusão Editorial S/A, 1980, 288 p.

SITES:
Municípios brasileiros. Disponível em <http://www.brazilchannel.com.br/municipios/> Acesso em
20 nov. de 2007
Educação ambiental. Disponível em <http://www.ibama.gov.br/> Acesso em 30 nov. 2007.
IBGE – Cidades@. Disponível em <http://www.ibge.gov.br/cidadesas/default.php> Acesso em 15
dez. de 2007.
Turismo. Disponível em <http://www.mangaratiba.rj.gov.br/> Acesso em 29 dez. de 2007.

Anexos:

Foto 01 - Vista de Conceição de Jacareí, ilha Ceia a frente, Resort à esquerda.

Autor: Rogério Figueiredo, 2007.


Foto 02 - Praia de Conceição de Jacareí, construção do cais impactos positivos e negativos.
Fórum Internacional do Meio Ambiente - A conferência da Terra 1135

Autor: Rogério Figueiredo, 2007.

Foto 03 - Um dos rios que desembocam na praia, coloração comprova a poluição por esgoto.

Autor: Rogério Figueiredo, 2007.


Fórum Internacional do Meio Ambiente - A conferência da Terra 1136

Foto 04 - Parte alta do distrito, pretendido por empresa espanhola, para transformação em hotel
fazenda, com chalés, tirolesa, montanhismo, arvorismo, construção de lago.

Autor: Rogério Figueiredo, 2007.


Fórum Internacional do Meio Ambiente - A conferência da Terra 1137

PLANEJAMENTO EM TRILHAS ECOLÓGICAS: ANÁLISE SITUACIONAL E


ESTRATÉGIAS PARA UTILIZAÇÃO DE TRILHAS NO MUNICÍPIO DE RAPOSA-MA

Fabio Abreu Santos


UEMA – Faculdade São Luís/MA - famille22@gmail.com
Jairo Henrique Sousa Monteiro
Faculdade São Luís/MA - jayrohenrique21@yahoo.com.br
Sabrina Maria Ranzolin da Costa
Faculdade São Luís/MA – saranzolin@hotmail.com

RESUMO
O presente trabalho aborda como objeto de estudo as trilhas ecológicas do município de
Raposa, no Estado do Maranhão, enfatizando o planejamento para o aproveitamento sustentável das
mesmas, buscando novas formas de compatibilizar o uso dos recursos naturais e proporcionar
benefícios adequados, com destaque para o bem estar da comunidade e para o compromisso com a
conservação e preservação do meio ambiente. Analisa-se, no contexto do diagnóstico, a situação
atual dos roteiros existentes, destacando seus fatores de atratividade e potencialidades. Apresenta-se
ainda proposta com alternativas para a adequação e organização da oferta das trilhas como meios
para otimizar sua utilização e manejo pelos órgãos públicos gestores e pelas empresas que prestam
serviços turísticos no município.
Palavras-chave: Ecoturismo; Planejamento Ambiental; Trilhas Ecológicas.

ABSTRACT
This paper approaches as a subject of study the ecological trails in the municipality of
Raposa, in the state of Maranhão, and emphasizes the planning for the sustainable exploitation of
them in order to find new ways of suiting the use of natural resources and to provide appropriate
benefits, with emphasis on the welfare of the community and the commitment to the conservation
and the preservation of the environment. Concerning the context of the diagnosis, it is analysed the
current situation of existing routes, highlighting its factors of attractiveness and potential. There is
also a proposal of alternatives to the adequacy and organization of the tracks as a means to optimize
their use and management by the public agency managers and the companies that provide tourist
services in the municipality.
Keywords: Ecotourism; Environmental Planning; Ecological Trails.

INTRODUÇÃO
A sustentabilidade em nível ambiental tem sido alvo de inúmeros debates cuja finalidade é
buscar novas formas de compatibilizar o uso dos recursos naturais, suprir as necessidades da
população e proporcionar uma adequada qualidade de vida, com destaque para o bem-estar da
comunidade e o compromisso com a conservação e preservação do meio ambiente.
Desta forma, o ecoturismo enquadra-se como adequada proposta no desenvolvimento da
atividade turística de forma sustentável, proporcionando melhores oportunidades para as localidades
e consequentemente às comunidades locais, minimizando os impactos negativos causados no meio
ambiente com a preservação do patrimônio natural e cultural por meio da manutenção da
integridade dos ecossistemas. Nessa perspectiva, percebe-se o aumento significativo de literaturas e
projetos que abordam a temática do ecoturismo, configurando-se como oportunidade real de
negócios e atividades no setor de turismo que podem proporcionar a integração homem-natureza,
despertando e envolvendo o exercício da conservação, a partir da experiência observacional que a
prática ecoturística propicia.
O presente trabalho aborda como objeto de estudo, as trilhas ecológicas de Raposa,
município integrante da Ilha de São Luís, no Estado do Maranhão e se propõe a apresentar uma
análise dos roteiros existentes, averiguando seus fatores de atratividade e potencialidades,
apontando também alternativas para a adequação e organização da oferta como meios para otimizar
Fórum Internacional do Meio Ambiente - A conferência da Terra 1138

sua utilização e manejo pelos órgãos públicos gestores e pelas empresas que prestam serviços
turísticos no município.
Esse artigo está dividido em seis partes. Na primeira, tem-se esta introdução. Na segunda,
descreve-se o percurso metodológico empregado na pesquisa. Na terceira, apresentam-se
considerações sobre o Ecoturismo e o Planejamento Ambiental. Na quarta, abordam-se aspectos
conceituais e tipológicos sobre Trilhas Ecológicas e Interpretação Ambiental. Na quinta, tem-se a
Analise Situacional e as estratégias sugeridas para a utilização e manejo das trilhas no município.
Na sexta e última parte, apresentam-se as Considerações Finais do trabalho.

PROCEDIMENTOS METODOLÓGICOS
Os procedimentos metodológicos empregados no desenvolvimento dessa pesquisa,
consistiram em pesquisas bibliográficas, pesquisa documental e pesquisa de campo, com
observação participante e aplicação de questionários com roteiro estruturado.
Quanto à pesquisa de campo, esta configurou-se com a realização de 13 (treze) visitas
técnicas ao município, com a finalidade de investigação sobre a história local, identificação de
potencialidades e seleção das trilhas que seriam contempladas no trabalho, além do mapeamento
por meio de GPS, registros fotográficos e aplicação de questionários de avaliação, tendo essas
etapas sido realizadas no período de janeiro a novembro de 2006.
Na aplicação de questionários para avaliação das trilhas, teve-se um registro de 64
(sessenta e quatro) participantes, todos estudantes universitários de faculdades particulares de São
Luís/MA, que fizeram o percurso das trilhas e colaboraram respondendo as questões do instrumento
de pesquisa. Ressalta-se que essa amostra foi intencional, pois aproveitou-se a oportunidade
disponibilizada pelos Coordenadores das atividades das faculdades que estavam com visitas
previamente organizadas para seus alunos, o que facilitou o agendamento das pesquisas para os
períodos de realização desses passeios.
Todos os passeios pelas trilhas, contaram como o apoio e acompanhamento de um guia
local, cujos conhecimentos práticos contribuíram bastante para a análise dos roteiros. O
mapeamento do percurso das trilhas deu-se a partir da elaboração de mapas descritivos elaborados
por profissionais especializados, sendo que o instrumento utilizado para a formulação dos mapas
descritivos referentes aos roteiros foi o Software Arc View 3.3, a partir da inclusão dos dados de
pontos geográficos obtidos pelo aparelho receptor GPS, para a identificação de dados reais no
percurso das trilhas e a marcação de pontos de interpretação ambiental.

ECOTURISMO E PLANEJAMENTO AMBIENTAL


A preocupação com a conservação do meio ambiente tomou nas últimas décadas
proporções mundiais, ou seja, o mundo está se conscientizando sobre a necessidade da preservação
ambiental. Diante disso, modalidades do turismo como o ecoturismo, o turismo ambiental e outras
ligadas a atividades em áreas naturais vêm se acentuando, tomando proporções consideráveis
devido ao aumento das discussões relacionadas às causas ambientais que primam pela preservação
dos ecossistemas.
No Brasil, conforme Costa (2002), as discussões em torno do Ecoturismo iniciaram a partir
da década de 1980 nas universidades nacionais, sendo que no ano de 1987 foi instituída pelo
governo federal uma comissão técnica, representada pelo IBAMA e pela EMBRATUR, com o
propósito de ordenar a prática da atividade e solucionar os problemas do desenvolvimento
desordenado e sem planejamento deste segmento do turismo. A partir daí, o poder público começou
a implantar medidas que tinham como objetivo proteger as áreas naturais do país, criando as
Unidades de Conservação – UC`S, definido pelo Sistema Nacional de Unidades de Conservação -
SNUC, em seu artigo 2º (apud COSTA, 2002, p. 27) como:
“espaços territoriais e seus recursos ambientais, incluindo as águas jurisdicionais, com
características naturais relevantes, legalmente instituídos pelo Poder Público, com
objetivos de conservação e limites definidos, sob regime especial de administração, ao
qual se aplicam garantias adequadas de proteção”.
Fórum Internacional do Meio Ambiente - A conferência da Terra 1139

Segundo Dias (2003, p.103), o ecoturismo se evidência do turismo tradicional pela


iniciativa de que as pessoas se deslocam do seu local de residência fixa em busca de áreas naturais e
culturais diferenciadas, tendo como objetivo melhorar as condições de vida das populações
receptoras, ao mesmo tempo em que preserva os recursos e o meio ambiente, compatibilizando a
capacidade de carga e a sensibilidade de um meio ambiente natural e cultural com a prática
turística.
Nos últimos anos, com o surgimento dessa atividade, percebe-se uma mudança
significativa dos pensamentos e atitudes por parte da sociedade civil e das autoridades em âmbito
global, pois o meio ambiente tornou-se hoje, uma preocupação primordial para a sobrevivência
humana. Assim, tal modalidade se bem planejada, possibilita a melhoria da qualidade de vida das
pessoas, a dinamização da economia e principalmente, a proteção do meio ambiente.
Para Sogayar (2001), o planejamento em uma região ecoturística deve considerar ações
para a conscientização da população como: a realização de exposições educativas, elaboração de
matérias educativos e de interpretação ambiental, a elaboração de diretrizes que estipulem normas
aos visitantes para a conservação de cenários ecológicos e culturais frágeis, e outras. A autora
salienta ainda que a educação ambiental tem sua eficiência relacionada com a sua capacidade de
mudar paradigmas na relação do homem com o meio ambiente, permitindo, dessa forma, a
conscientização da sociedade para conservação da natureza , o desenvolvimento do ecoturismo.
Apesar de já se ter alcançado um avanço nas políticas de planejamento ambiental, percebe-
se que ainda há deficiências no que se refere às medidas executadas na prática, isso porque os
envolvidos com a atividade normalmente entendem o desenvolvimento sustentável do meio
ambiente com a “figura” do homem fora do contexto. Dessa forma, se faz necessário uma mudança
urgente de pensamento e atitudes coletivas, para que se possa alcançar a sustentabilidade e,
consequentemente, à melhoria da qualidade de vida das populações.

TRILHAS ECOLÓGICAS E INTERPRETAÇÃO AMBIENTAL


O ser humano começou a utilizar trilhas, primeiramente, em busca de alimento e água e,
posteriormente, estas passaram a ser utilizadas em peregrinações religiosas, viagens para trocas
comerciais e ações militares. Assim, percebe-se que a principal função das trilhas, desde os tempos
remotos, é a de suprir as necessidades de deslocamento das pessoas para diversos fins, havendo uma
alteração de valores em relação as suas atividades, onde passam de simples meios de deslocamento
para novos meios de contato com a natureza. Desta forma, a caminhada incorpora um novo
contexto, em que às pessoas para fugirem do cotidiano estressante e disponibilizando de tempo livre
para o lazer, procuram estabelecer estreito contato com a natureza a partir do deslocamento para
áreas naturais diferenciadas.
Para Guillaumon (1997), uma Trilha Ecológica consiste em um instrumento pedagógico
importante que possibilita o conhecimento da fauna, flora, geologia, geografia, processos
biológicos, relações ecológicas, do meio ambiente e sua proteção. Murta & Goodey (2002)
consideram uma trilha como uma rota já existente ou planejada, que liga pontos de interesse em
ambientes urbanos ou naturais. Esses pontos de interesses ambientais citados pelas autoras podem
ser vistos como os fatores de atratividade existentes nos percursos, sendo que a percepção destes só
pode ser dada por meio da interpretação, ou seja, os pontos de interesse do roteiro dependerão da
interpretação de cada pessoa ao visitar uma trilha.
Nesse contexto, sabe-se que as trilhas, antes com função específica de suprir as
necessidades de deslocamento, configuram-se hoje como uma nova atividade vinculada a
segmentos como o ecoturismo e o turismo ecológico, para a interpretação e contemplação da
natureza, passando a serem chamadas, segundo Dias (2003), de trilhas de interpretação das áreas
naturais.
Para Campos e Ferreira (2006, p. 30), uma trilha interpretativa é caracterizada por vários
aspectos, dentre os quais: os fatores ambientais como forma de atrativo, a aquisição de
conhecimentos referentes à área visitada, a organização das paradas estratégicas de acordo com o
público e ainda alguns métodos que definem que tipo de roteiro formulado. Nesse sentido, a
Fórum Internacional do Meio Ambiente - A conferência da Terra 1140

aplicação de atividades em áreas naturais vem exigir a organização de roteiros e equipamentos bem
estruturados para atender os visitantes, suportados por minuciosos estudos para verificação da
capacidade de suporte, fragilidades ambientais e a realidade local, tendo em vista a sustentabilidade
do meio ambiente.
Segundo Lemos (1996 apud CAMPOS e FERREIRA, 2006, p.32) as trilhas para
interpretação ambiental dividem-se em: trilhas interpretativas guiadas e auto-guiadas. Na Trilha
Interpretativa Guiada, o guia e/ou condutor ambiental deve estar presente acompanhando o grupo,
podendo existir três tipos destas: a natural geral - onde o guia percorre um caminho de um ponto de
partida até outro ponto final, sem estruturar atividades ou paradas fixas; a natural temática - onde as
paradas são fixadas com antecedência, dando maior coerência ao passeio; e a específica - que
objetiva satisfazer interesses dos visitantes, como a observação de aves. Na Trilha Interpretativa
Auto-guiada, não há a necessidade do guia e/ou condutor ambiental, sendo utilizado material
ilustrativo para orientação como folder, placas dispostas durante o trajeto e cartilhas com literatura
referente ao roteiro. Podem ser visualizadas em três tipos: a temática - que tem a finalidade de
interpretar um tema coerente à trilha; a miscelânea - que objetiva interpretar vários aspectos, mas
sem tentar estabelecer uma relação entre eles; e a natural - que tem a finalidade de identificar as
características naturais do local através de placas.
Desta forma percebe-se que as trilhas interpretativas têm uma estreita ligação com o
ecoturismo, pois seus aspectos característicos estabelecem uma forte relação com a concepção das
atividades ecoturísticas desenvolvidas em ambientes naturais, onde as mesmas são elaboradas de
forma responsável e ambientalmente racional.
De acordo com Andrade (2003, p.5), as trilhas podem ser classificadas quanto à função,
forma, grau de dificuldade e quanto à intensidade. Essa classificação está detalhada a seguir:
a) Quanto à função – Nesse aspecto, as trilhas podem ser categorizadas da seguinte forma:
As utilizadas em serviços administrativos (normalmente utilizadas por guardas ou vigias, em
atividades de patrulhamento ou pelo público visitante); as de interpretação do ambiente natural; e as
de viagens de travessia ou aventura.
b) Quanto à forma - Quanto à forma, as trilhas podem ser de quatro tipos: Circular,. Oito,
Linear e Atalho (ANDRADE,2006). O Formato Circular oferece a possibilidade de voltar ao ponto
de partida sem repetir o percurso ou cruzar com outros visitantes. Trilhas no formato de oito são
muito eficientes em áreas limitadas, pois aumentam a possibilidade de uso destes espaços. A
experiência do visitante nestas permite o conhecimento de espaços diferenciados e sem repetição na
observação e contemplação dos atrativos existentes. O Formato Linear é o formato de trilha mais
simples e comum e normalmente seu objetivo é conectar o caminho principal, quando já não é o
próprio, a algum destino como lagos, clareiras, cavernas, picos, etc. Esse tipo de Trilha apresenta
como desvantagem o fato do caminho de volta ser igual ao de ida, e a possibilidade de cruzar com
outros visitantes. Enfim, no Formato Atalho, o início e fim da trilha estão em diferentes pontos ou
caminhos principais. O trajeto desse tipo de trilha é muito interessante, pois o ponto de partida não é
o mesmo, permitindo ao visitante conhecer diferentes atrativos e percursos sem repetir.
c) Quanto ao grau de dificuldade - Esse tipo de classificação é bastante subjetivo, pois o
grau de dificuldade varia de pessoa para pessoa, dependendo basicamente do condicionamento
físico de cada uma e também do peso da eventual bagagem (mochila) carregada. Andrade (2003,
p.8) ressalta que a classificação é elaborada utilizando-se combinações de letras (variando de A e E)
e de números de (1 a 3), um referindo-se, respectivamente, ao nível técnico e outro à intensidade.
d) Quanto à intensidade - As trilhas são consideradas: Leve, sem obstáculos naturais;
Regular, com obstáculos naturais, mas sem grandes dificuldades; Semi-pesada, com obstáculos
naturais, necessitando de bom condicionamento físico. (Andrade, 2003).
Com relação à sinalização de trilhas devem-se considerar alguns fatores importantes para o
desenvolvimento das atividades, buscando a segurança dos visitantes nas rotas a serem percorridas
como a implantação de um conjunto de placas sistemáticas, de fácil compreensão, projetadas de
forma que se possa evitar a ação de vândalos e também integradas esteticamente ao conjunto
Fórum Internacional do Meio Ambiente - A conferência da Terra 1141

natural, dando visibilidade e valorizando os recursos existentes nos percursos, sem comprometer
sua integridade.

AVALIAÇÃO E ESTRATÉGIAS PARA AS TRILHAS DO MUNICÍPIO DE RAPOSA/MA


O município de Raposa localiza-se no litoral da Ilha de São Luís, há 32 km do centro da
capital. Para se chegar à Raposa deve-se partir da Praia do Olho D`Água, pela Rodovia MA-203.
Segundo dados do IBGE (2006), o município possui uma área equivalente a 64 km2, limitando-se
ao norte com o Oceano Atlântico, ao sul com o Rio Iguaíba e Paço do Lumiar, a leste com a Ilha de
Curupu e a oeste com a Praia de Araçagy, num trecho da costa maranhense denominado Amazônia
Oriental.
Almeida e Costa (2006) relatam que o povoado se desenvolveu entre as praias de Carimã a
leste e do Pucal a oeste, assumindo uma direção geral nordeste-sudeste. Pertence à 31º micro-região
homogênea do Estado do Maranhão, situando-se em uma região onde há uma grande extensão de
manguezais, uma média de dez quilômetros. Conforme dados do IBGE (2006), o município de
Raposa-MA foi emancipado no dia 10 de novembro de 1994, através da lei nº 6.132, e possuía uma
população de 14.780 habitantes na época de sua emancipação. Atualmente sua população
equivalente a 20.698 habitantes.
O município foi povoado por pescadores cearenses que no ano de 1954, devido a um longo
período de seca no Estado do Ceará, resolveram sair em busca de outras áreas litorâneas com
melhores condições de pesca, encontrando no município as condições propícias para o exercício
dessa atividade. Na oportunidade a região era habitada por grande quantidade de raposas, fato esse
que deu origem ao nome do município.

Análise Situacional das Trilhas Ecológicas


A princípio, as trilhas surgiram como um acesso para as comunidades pesqueiras
localizadas nas Ilhas de Primirim, Pucal, Itaputiua e Carimã, sendo utilizadas principalmente para
pescarias. Com o desenvolvimento da atividade turística no município e a necessidade de criar
novas opções de entretenimento para os visitantes, os guias locais, estudantes universitários e
membros do poder público, começaram a investigar as áreas naturais do município para averiguar
possibilidades de desenvolvimento de caminhadas e roteiros em trilhas, visto a grande
potencialidade de áreas para a prática dessa atividade.
Diante disso, durante a pesquisa no município, para o melhor conhecimento e análise do
potencial existente, decidiu-se pela escolha de três trilhas, como intuito de focalizar uma
investigação detalhada e propor intervenções que contribuam para o seu manejo e inserção na oferta
turística local. Nesse contexto, apresentar-se-á a seguir os resultados da pesquisa, envolvendo como
foco de investigação as trilhas de Primirim-Pucal, Itaputiua e Carimã, que estão em fase
experimental de estudos para futura formatação como produto turístico, dentro dos padrões e
princípios da sustentabilidade.
a) Trilha Primirim-Pucal.
A Trilha Ecológica Primirim-Pucal, está localizada entre dois povoados, chamados
Primirim e Pucal, daí a sua denominação. O ponto de referência de acesso a trilha é à estrada
principal da Raposa, MA 203, logo após o Comando da Aeronáutica, há 6,5 Km da área urbana de
Raposa. A trilha possui 2,3 Km de extensão (dados obtidos através do aparelho GPS II).
A Figura 1, que segue, ilustra um dos trechos dessa trilha, destacando a área dos mangues.
Fórum Internacional do Meio Ambiente - A conferência da Terra 1142

Figura 1: Trilha Ecológica Primirim-Pucal. Fonte: Os Autores, 2006.

Em relação à flora nativa do local, os tipos encontradas durante a visita foram: capim,
feijão bravo, palmeiras, árvores frutíferas como buriti, murici, goiaba, cajueiros de espécies doces e
azedas, manguezais com 4 (quatro) tipos de espécie tais como mangue vermelho, mangue de botão,
mangue seriba e mangue branco ou manso. Na fauna local, tem-se a criação de caprinos, bovinos e
aves como guarás, garças, gaviões, entre outras, além de berçários de caranguejos e diferentes tipos
de peixes que vivem no mar, nos criatórios (açudes) e mangues. Os 10 (dez) açudes existentes no
percurso se tornam atraentes pela criação de diferentes espécies de peixes como: tilápia, tambaqui,
traíra, curimatá e outras espécies de água doce.
Quanto a seu trajeto a duração do percurso varia de 30 a 40 minutos, sendo esta de forma
linear e do tipo guiada, enquadrando-se como natural temática e de grau de dificuldade leve e fácil,
com terreno plano e áreas residenciais que possibilitam (com permissão dos proprietários) paradas
para descanso e degustação de frutas típicas da região.
Em resumo, a sua situação atual pode ser então considerada como conservada, mas com
necessidade de planejamento para melhor manejo e execução de atividades em seu ambiente.
b) Trilha Ecológica de Itaputiua
A Trilha Ecológica de Itaputiua tem esse nome pelo fato de seu principal atrativo ser a
praia de Itaputiua, onde a trilha é finalizada. Seu acesso tem como ponto de referência o restaurante
O Capote, na MA-203, há aproximadamente 5,5 km da área urbana da cidade. A sua extensão é de
2,5 km (dados obtidos por meio do aparelho GPS II), sendo este um dos percursos de trilha
existentes na ilha. A Figura 2, que segue, ilustra o trecho final da trilha que finaliza na Praia de
Itaputiua.

Figura 2: Trilha Ecológica Itaputiua. Fonte: Os Autores, 2006.

Com relação à flora local, tem-se 4 (quatro) tipos de mangue, árvores frutíferas como
muricizeiro, cajueiros, goiabeiras e diversos tipos de plantas, dentre as quais a janaúba, tucum,
mandacaru, e outras. Quanto à fauna local, foi possível identificar, berçários de caranguejos
encontrados nas áreas alagadas do mangue, criação de bovinos, criatórios de peixes nos açudes,
mariscos (sarnambi, tarióba e sururu), pássaros, especificamente, garças e guarás, além de várias
espécies de caranguejos nos manguezais.
Uma particularidade da Trilha Itaputiua são os seus dois percursos, que começam por
locais diferentes e se encontram em um dos corredores de mangue com o mesmo acesso a praia,
ponto final da trilha, apresentando nesse contexto a forma de um oito. Quanto a seu trajeto a
duração do percurso varia de 40 a 50 minutos, tanto na ida quanto na volta por
caminhada.ressaltando-se que é possível fazer o retorno por meio de um passeio náutico com
Fórum Internacional do Meio Ambiente - A conferência da Terra 1143

duração média de duas horas. Esta trilha é do tipo guiada enquadrando-se também como natural
temática, sendo o grau de dificuldade leve e fácil no primeiro percurso e moderado no segundo
percurso por apresentar alguns obstáculos naturais como declives acentuados e ultrapassagem de
cercas de arames.
Numa avaliação geral, essa trilha, apresenta-se com grande potencial para sua
operacionalização, pois sua finalização na praia permite uma interação dos participantes com vários
elementos naturais, com possibilidade de relaxamento da caminhada com um bom mergulho no
mar, o que é sempre agradável para quem busca experiências diferenciadas que aliviem o estresse
do cotidiano.
c) Trilha Ecológica de Carimã
A Trilha Ecológica de Carimã está localizada na Ilha de Carimã há aproximadamente 20
minutos da área urbana do município de Raposa-MA. O acesso é feito por meio de embarcação,
normalmente pelo tipo “Biana”, onde se faz a travessia saindo do cais da Raposa até a ilha. A Ilha
de Carimã possui muitas trilhas com vários tamanhos e atrativos diferenciados, sendo que durante
as investigações optou-se por apenas uma delas, considerando aspectos relacionados à atratividade,
duração, acessibilidade e grau de dificuldade.

Figura 3: Trilha Ecológica Carimã. Fonte: Meireles Jr., 2006.

A trilha escolhida possui em média 3,5 km de extensão, (dados do aparelho GPS II). No
que diz respeito à flora local, tem-se uma cobertura vegetal muito rica e diversificada com grande
predominância de mata nativa e árvores frutíferas como cajueiro, goiabeira, muricizeiro, mandacaru
e guajirú e outros tipos de vegetação derivadas da mata atlântica. Quanto à fauna local, observou-se
a criação de bovinos nas áreas de mata próximas às dunas, caranguejo da espécie Uça nas áreas de
mangue e grande quantidade de pássaros nativos como: guarás, garças, socós, gaviões e outros.
Ressalta-se que em alguns trechos do percurso, principalmente próximos das lagoas naturais,
encontrou-se grande quantidade de resíduos sólidos deixados pelos moradores, que utilizam estes
espaços em seus momentos de lazer. Assim, torna-se necessário à implementação de estratégias de
controle baseadas na sensibilização dos moradores por meio da educação ambiental no sentido de
serem evitados impactos negativos, evidentes em parte do percurso.
A trajetória tem duração média de 1 h 30, variando de acordo com o público, pois trata-se
de uma trilha com grau médio por conter alguns obstáculos naturais como as áreas de dunas,
necessitando de um bom condicionamento físico. Quanto à forma é considerada atalho, por se tratar
de uma trilha com diferentes pontos para iniciar e finalizar, sendo do tipo guiada e natural geral.
Essa Trilha é propícia para a produção de eventos de aventura, visto que seus vários
percursos, propiciam graus de dificuldade ideais para práticas esportivas organizadas, o que pode
atrair o interesse de organizadores de eventos de competição a nível nacional.
No contexto geral percebe-se que as trilhas pesquisadas possuem uma mistura de cenários
singulares com belezas naturais com fortes fatores de atratividades, onde se pretende programar
nestas, atividades ecoturísticas de forma responsável e sustentável, complementando a renda local e
mantendo a integridade de seus ecossistemas.

Estratégias para Utilização e Manejo das Trilhas Ecológicas


Como estratégias a serem adotadas no processo de incremento da atividade ecoturística no
município de Raposa-MA, especificamente no manejo e utilização das trilhas ecológicas existentes,
pontuam-se, proposições construídas a partir da análise das sugestões dos respondentes dos
Fórum Internacional do Meio Ambiente - A conferência da Terra 1144

questionários de avaliação das trilhas, além de propostas decorrentes de observações técnicas de


profissionais especialistas no assunto e de observações dos pesquisadores e autores do presente
artigo.
Como estratégias direcionadas à criação de Infra-estrutura e organização das trilhas
existentes sugerem-se: A construção de passarelas de madeira nos trechos das trilhas que envolvam
passagens por áreas frágeis como os manguezais, por exemplo; Construção de quiosques de madeira
para instalação de base de apoio, orientação e suporte aos passeios guiados; Implantação de placas
de sinalização dos atrativos, Placas descritivas da tipologia da fauna e flora da região, além de
placas educativas; Desenvolvimento de Sistema de Informação computadorizado, para
monitoramento e controle das atividades realizadas nas trilhas do município; Instalação de coletores
seletivos de lixo, além da implementação de programa regular de coleta; e Implantação de um
pesque e Pague nos açudes da Trilha Primirim-Pucal.
Considerando as estratégias voltadas a área de Recursos Humanos, propõe-se: a criação e
capacitação de um batalhão especial para fiscalização e monitoramento das áreas naturais do
município, incluindo as trilhas existentes; a Formação de agentes condutores locais; o Cadastro e
Treinamento dos funcionários de empresas turísticas quanto à procedimentos para a realização de
atividades com grupos nas trilhas do município; a Preparação da comunidade para o
desenvolvimento da atividade, afim de que se estabeleçam operações ecoturísticas sustentáveis,
mantendo-a sempre informada e integrada ao processo da atividade nas trilhas; Promoção de
Campanhas de Educação Ambiental junto às Escolas da rede Municipal de Ensino do Município e
Também para a Comunidade em Geral.
Considerando estratégias voltadas ao Controle Administrativo das áreas naturais do
município têm-se como propostas: a Criação de uma Coordenação de Meio Ambiente ou
Patrimônio Natural para o exercício de atividades de Gestão, Fiscalização e Controle das áreas
naturais do Município; a Implantação da taxa ambiental a ser cobrada para todos os grupos que
forem utilizar as áreas naturais da região, com a devida autorização de órgão fiscalizador, no caso a
Coordenação de Meio Ambiente, anteriormente citada; a Realização de estudo regular de
capacidade de carga em cada trilha, além da implantação de mecanismos de controle do fluxo de
visitantes; a Criação e implantação de um sistema de avaliação dos visitantes, com aplicação regular
de questionários.
Na área de Comunicação e Promoção das Trilhas como Produto Turístico, propõe-se: a
Realização de Famtour (Visita de Familiarização) pelas trilhas com as agências de viagens de São
Luís, afim de proporcionar o melhor conhecimento sobre os roteiros existentes facilitando sua
comercialização; a Promoção de Campanhas Educativas junto à comunidade e turistas, com peças
promocionais disseminadas em outdoors no entorno do município e a produção de cartilhas
educativas; e a Confecção de guias e mapas ilustrados sobre as trilhas.

CONSIDERAÇÕES FINAIS
O município de Raposa-MA detém significativo potencial ecoturístico, mas com atrativos
naturais frágeis, necessitando de propostas que visem seu desenvolvimento a partir de um
planejamento ambiental adequado, evitando-se com isso, sérios riscos de degradações, que muitas
vezes são irreversíveis. Com um planejamento que prime pelo desenvolvimento sustentável, a partir
de medidas efetivas de controle ambiental, o município poderá se constituir em referencial na
prática do ecoturismo no estado, visto que apresenta áreas naturais com grande potencial para
atividades dessa natureza.
A atividade ecoturística nas trilhas do município exige a manutenção da integridade de
seus patrimônios naturais, devendo transmitir, tanto para o visitante quanto para a comunidade
local, a necessidade e o desenvolvimento de hábitos e atitudes de consciência ecológica para que os
benefícios possam ser traduzidos de forma positiva para a sustentabilidade local.
Analisando o contexto das trilhas ecológicas Primirim-Pucal, Itaputiua e Carimã, conclui-
se que estas podem ser consideradas trilhas interpretativas por apresentarem, no decorrer de seus
percursos, diferentes elementos naturais e fatores significativos para interpretação ambiental, além
Fórum Internacional do Meio Ambiente - A conferência da Terra 1145

de agregarem importante valor na composição da oferta turística local. Constatou-se com a


pesquisa, que os residentes no entorno dos roteiros analisados possuem um forte vínculo com os
ambientes naturais das trilhas, usufruindo de seus recursos para a manutenção de suas culturas e
subsistência, como no caso, a pesca, a cata do caranguejo nas áreas de mangue e de frutas regionais.
Diante disso, a elaboração de projetos ecoturísticos pode ser um instrumento importante
para o desenvolvimento de uma localidade com potencial natural, tendo em vista que com o
estabelecimento de parcerias entre as entidades, empresas de turismo e organizações não-
governamentais, além do envolvimento da comunidade, pode-se chegar a resultados positivos em
termos de equilíbrio sustentável da atividade ecoturística no município de Raposa/MA.

REFERÊNCIAS BIBLIOGRAFICAS
ALMEIDA, Daniele Silva; COSTA, Luize de Jesus Câmara. O produto cultural do município de
Raposa/MA: uma abordagem sobre as culturas da renda, da pesca e gastronomia. 2006. Trabalho de
Conclusão de Curso (Graduação em Turismo) - Faculdade São Luís, São Luís, 2006.
ANDRADE, Waldir Joel de. Manejo de trilhas. 2003. Disponível em:
<http://geocities.yahoo.com.br/dowloads/trilhas> Acesso em: 30 setembro 2006.
CAMPOS, Ângelo M. N.; FERREIRA, Eduardo A. Trilhas Interpretativas: busca por conservação
ambiental. 2006. Disponível em:<http://www.ivt-rj.net/caderno/anteriores > Acesso em: 20 outubro
2006.
COSTA, Patrícia Cotes. Unidades de conservação. São Paulo: Aleph, 2002.
DADOS GEOGRÁFICOS DO MUNICÍPIO DE RAPOSA. In: IBGE – Instituto Brasileiro de
Geografia e Estatística. 2006. Disponível em:< http://www.ibge.gov.br/cidadesat/default.php >
Acesso em: 25 outubro 2006.
DIAS, Reginaldo. Turismo sustentável e meio ambiente. São Paulo: Atlas, 2003.
GUILLAUMON, J. R. et alii. 1977. Análise das trilhas de interpretação. São Paulo, Instituto
Florestal. 57 p. (Bol. Técn. 25).
MURTA, Stela Maris; GOODEY, Brian. Interpretação do Patrimônio para visitantes: um quadro
conceitual. Belo Horizonte: Editora UFMG, 2002.
SOGAYAR, Roberta Leme. Educação ambiental e a prática do ecoturismo. UNIFAC em Revista,
Boucatu: Graphpress, v.1, n.1, p.17-24, abr. 2001.
Fórum Internacional do Meio Ambiente - A conferência da Terra 1146

RELAÇÕES AMBIENTAIS: UM ESTUDO DE CASO EM PITIMBU

Felipe Ribeiro De Alcântara


UFPB, Cidade Universitária, João Pessoa/PB – Brasil. CEP: 58059-900. felipe.turis@gmail.com
Paloma de Sousa Regala
UFPB, Cidade Universitária, João Pessoa/PB – Brasil. CEP: 58059-900. paloma.tur@hotmail.com

RESUMO
Este trabalho de abordagem qualitativa, objetiva analisar o funcionamento das Relações
Ambientais (R.A.) do Sistur – Sistema de Turismo proposto por Beni (2004) – no município de
Pitimbu, localizado no Estado da Paraíba – Brasil. Para o alcance deste propósito, foi realizado um
estudo bibliográfico e uma pesquisa de campo com utilização de observação participante, aplicação
de questionários e entrevistas junto a representantes do setor público e privado, e residentes. Apesar
da falta de estrutura atual o município tem muito que oferecer, tanto para os turistas quanto para a
população local.
Palavras-chave: Relações Ambientais (R.A.), Sistur, Sustentabilidade.

ABSTRACT
This work of qualitative, objective approach to analyse the functioning of the
Environmental Relations (R.A.) of the Sistur – System of Tourism proposed by Beni (2004) – in the
local authority of Pitimbu, located in the State of the Paraíba – Brazil. For this purpose, the
participant carried out a bibliographical study and field work with use of observation, application of
questionnaires and interviews with representatives of the public and private sector, and residents. In
spite of the lack of current structure, the local authority has much to offer, as much for the tourists
as for the local population.
Keywords: Sistur, Environmental Relations (R.A.), Sustentabilidade.

INTRODUÇÃO
O Turismo, por sua complexidade, é considerado um sistema aberto de acordo com a
Teoria Geral dos Sistemas, responsável pela fundamentação do Sistema de Turismo. (BENI, 2004)
O Sistur, por sua vez, tem a função de organizar os elementos turísticos para poder, a partir de um
referencial, trabalhar com a atividade do Turismo dando uma visão mais ampla ao processo. O
sistema é formado por elementos que interagem entre si e são organizados para que cada um tenha
sua função, que de certa forma influenciam as outras partes. No Sistur esses elementos são
diretamente ligados ao Turismo e nenhum é mais importante do que o outro.
O subsistema das relações ambientais (R.A.), que é focalizado no trabalho, envolve os
aspectos econômico, social, cultural e ecológico, que estão interligados e são interdependentes. Tal
subsistema deve ser revisto continuamente. A administração do sistema é de grande importância,
pois além de criar planos, cuida para que sejam executados. Cada elemento pode ter diversas
variáveis, e essas podem se referir ao tamanho, números, fluxos, formas, entre outros. A junção de
todas as variáveis dimensiona o fenômeno turístico.
A sustentabilidade é vista como conservação do meio ambiente, mas existem outros fatores
e elementos que ligados e desenvolvidos simultaneamente trazem o desenvolvimento sustentável,
são os elementos que estão inseridos nas relações ambientais.

HISTÓRIA DE PITIMBU
O município de Pitimbu, localizado na Paraíba – Brasil, foi habitado por índios Tabajaras e
Potiguares. Devido à troca do Pau-Brasil com os franceses, já foi chamada de Porto dos Franceses,
mas seu nome atual tem origem indígena que quer dizer “olho d’água do fumo”.
Em 1867 Pitimbu deixou de fazer parte da capitania de Itamaracá e passou a fazer parte do
estado paraibano, e em 1961 foi emancipada.
Pitimbu possui 16.140 habitantes (IBGE- 2007), é o ultimo município do litoral sul
Paraibano, e possuí a maior orla da Paraíba, com nove praias e diversos atrativos naturais na sua
Fórum Internacional do Meio Ambiente - A conferência da Terra 1147

extensão de 29 km. Fica a 64 km de João Pessoa e 92 km de Recife, fazendo fronteiras com a


cidade de Goiana-PE e com o Conde-PB.

A ORGANIZAÇÃO DAS RELAÇÕES AMBIENTAIS EM PITIMBÚ


Atualmente Pitimbu passa por uma fase de transição no setor público, desenvolvendo-se
através de novas secretarias anteriormente inexistentes ou integradas umas as outras, como é o caso
da Secretaria do Turismo que era interligada a do Lazer e do Esporte, limitando dessa maneira o
desenvolvimento de projetos específicos.
Através de entrevistas, com a população e com alguns membros das secretarias do
município, pôde-se perceber que os projetos ainda se encontram bastante restritos por conseqüência
da falta de coordenação, dificultando o andamento de vários projetos que podem ser desenvolvidos.
Nessas pesquisas também constatou-se a dimensão da falta de conhecimento da população a
respeito do Turismo e de sua importância para o progresso da região.
As relações ambientais auxiliam no desenvolvimento do Turismo Sustentável, pois todos
os elementos pertencentes a esse subsistema trazem com ele a base do desenvolvimento sustentável.
Segundo o autor John Swarbrooke, o turismo sustentável estimula uma compreensão dos impactos
do turismo nos ambientes natural, cultural e humano. Ou seja, para que exista a sustentabilidade, é
necessário que a sociedade esteja envolvida no processo, a economia seja favorável a todos, e o
meio ambiente e a identidade local preservados.

SUBSISTEMA ECONÔMICO
O Turismo por ser uma das principais atividades geradoras de renda do mundo, é
considerado uma atividade econômica e envolve vários serviços que estão economicamente ligados.
No Turismo esses serviços envolvem várias atividades que são destinadas ao viajante, desde o
deslocamento do seu local de origem até o destino desejado. A economia começa no planejamento
da viagem, envolvendo dessa forma os preços oferecidos pelas empresas do ramo turístico (
transporte, alimentação, hospedagem, etc.) envolvendo também o custo de vida do local visitado
interferindo dessa maneira na economia das localidades emissoras e receptoras.
Em Pitimbu pôde-se notar que essa economia ainda se encontra debilitada. Foi observado
que a infra-estrutura local contribui bastante para isso, pois as ruas apesar de calçadas se encontram
bastante desgastadas, dificultando o acesso dos transportes em geral. A organização dos bares na
praia é outro fator que chama a atenção do visitante, por não haver uma ordenação no local onde
são implantados. A poluição em algumas praias e nas ruas ainda são bastante visíveis, passando
dessa maneira uma imagem negativa aos visitantes que vão conhecer as belezas do local.
O Turismo apesar de não ser o foco da economia de Pitimbu, está começando a ganhar
espaço gradativamente. Há pouco tempo um grande passo foi dado com a criação da Secretaria de
Turismo e Meio Ambiente do município, dando uma ênfase a esse grande setor gerador de rendas.
Um projeto que vem aumentando a expectativa do desenvolvimento do turismo e da população de
Pitimbu, quanto à geração de emprego, é a construção do Golf Marine Resort. Já se está pensando
em projetos voltados para a qualificação da população para trabalhar nesse resort que irá trazer
junto com ele muitos empregos e oportunidades diferenciadas para a comunidade.
O projeto anteriormente citado retrata a importância da sincronia entre os setores públicos,
privados e a sociedade local, pois a contribuição de cada grupo torna mais complacente o
desenvolvimento turístico do local.

SUBSISTEMA SOCIAL
Muitos setores e governos têm o turismo como salvador para o desenvolvimento
econômico. Para que dê certo e se tenha um desenvolvimento de forma sustentável é necessário
esclarecer a sociedade o que representa o turismo, quais os aspectos positivos e negativos que ele
pode trazer para a comunidade local, e principalmente se a população local está fazendo parte dos
projetos a serem desenvolvidos. “O turismo sustentável não pode existir se protegermos o meio
ambiente, mas ignorarmos as necessidades sociais dos turistas e das comunidades
Fórum Internacional do Meio Ambiente - A conferência da Terra 1148

locais”.(SWARBROOKE, 2000) A população tem que estar de acordo com a implantação do


Turismo.
O planejamento é importante para que o turismo não cresça de forma desordenada e para
que haja mais impactos positivos do que negativos, evitando conflitos que podem ser gerados entre
as necessidades e desejos dos turistas, com as dos residentes . Em Pitimbu o planejamento social é
fundamental para que, a partir dele, a sociedade, se torne mais bem organizada para a recepção de
novas culturas, aprenda a respeitá-las mantendo e valorizando sua identidade, seja consciente a
respeito da preservação ambiental e a partir disso se insira no mercado turístico visando sempre um
desenvolvimento sustentável.
A comunidade passou a ser considerada uma força dinâmica, em constante mudança, e
cada vez mais organizada e dirigida. As instituições públicas e privadas sabem que essa nova força
comunitária pode pressioná-las fortemente, e impulsioná-la ou até mesmo arruiná-las, ocasionando
profundas alterações sociais e destruindo crenças tidas como imutáveis. (BENI,pág.62,2004)

SUBSISTEMA CULTURAL
A cultura envolve a história de um povo, sendo conservada através do imaterial (ex.:
tradições,musicas) e do material (ex.: monumentos), a gastronomia também faz parte deste
subsistema. Todos esses elementos formam a identidade local. Pitimbu dispõe dessa identidade, seja
ela através de grupos tradicionais, de lendas e histórias contada pelos pescadores, ou de seus
monumentos.
Existe o grupo Aruênda da Saudade que é organizado pela população local e através da
dança, retrata a história dos seus antepassados negros (escravos). Segundo o coordenador do grupo
Rogério, uma das únicas ajudas recebidas pelo grupo veio através de um turista, que ao assistir uma
apresentação resolveu doar os instrumentos musicais, já que o grupo não os possuía. Com esse
exemplo pode-se perceber o quanto o Turismo fortalece a cultural das mais diversas formas. As
manifestações culturais e a produção de artesanato também podem ser revitalizadas a partir da
demonstração do interesse do turista, assim movimentando o setor econômico e trazendo trabalho
para as pessoas que atuam nessa área.
A gastronomia é algo que também faz parte da cultura, Pitimbu, por ser um município
localizado em uma área litorânea, tem suas comidas tradicionais à base de frutos do mar. A Lagosta
é preferida nos pratos servidos no município.
Por ser uma população onde parte significativa é de pescadores, correm muitas lendas que
são passadas de geração para geração, despertando a curiosidade de crianças e de turistas. Os
artesãos também repassam a história de sua cidade, através da produção de artesanato, como é o
caso de Seu Joca e Dona Irene.
A riqueza cultural do município, apesar de vasta, ainda é pouco reconhecida por parte da
população e pelos investidores. Não foi detectado durante a pesquisa nenhum projeto em andamento
no setor público para a cultura, mas existe uma grande vontade de parte da população de que a
cultura local seja desenvolvida, e por isso alguns grupos tradicionais funcionam por conta própria.

SUBSISTEMA ECOLÓGICO
As investigações e estudos sobre o meio ambiente há algumas décadas pertenciam apenas à
área da bioecologia, mas algo que vem sendo observado nesses últimos anos é a preocupação e o
valor que outras áreas tem dado ao assunto. O Turismo é uma das poucas atividades econômicas
que concilia geração de renda e preservação ambiental, pensando no futuro tanto da atividade
turística quanto da população.
Hoje, o conceito de turismo sustentável é mais abrangente e transcende a preocupação
centrada na conservação e manejo do meio ambiente e recursos naturais, incluindo os aspectos de
comercialização, marketing, qualidade, produtividade e competitividade dos bens e serviços
turísticos. (BENI, 2004, pág. 61)
Fórum Internacional do Meio Ambiente - A conferência da Terra 1149

Pitimbu é um espaço com potencial turístico natural. “Os recursos turístico naturais são
aqueles elementos da natureza com determinada atração, que motivam as pessoas a sair de seus
domicílios e permanecer fora deles um certo tempo”. (BENI, 2004, pág. 58). Na figura 1 é mostrada
uma das áreas naturais em potencial turístico do município de Pitimbu,a Barra do Abiaí.

FIGURA 1 – Belezas naturais que potencializam a Barra do Abiaí.

Um trabalho de conservação e conscientização da população deve ser feito, e campanhas


devem ser aplicadas a partir do momento que se tem o uso de um certo ambiente natural, para que
se minimize ou anule os impactos negativos. Uma das formas de evitar a degradação é o trabalho
da educação ambiental para que se haja a preservação. Segundo Munhoz (2004), uma das formas de
levar educação ambiental à comunidade é pela ação direta do professor na sala de aula e em
atividades extracurriculares.
É necessária também a capacitação profissional de pessoas para orientação e
acompanhamento na permanência de turistas e moradores das proximidades do espaço natural, a
distribuição de folhetos explicativos, e trabalhos com a população (com peças, musicas...) de forma
que a população se sinta integrada e perceba o quão importante é a conservação do meio natural.
Um dos grandes problemas enfrentados em áreas litorâneas é a poluição causada por
visitantes, sejam eles turistas ou membro da população local, e alguns fatores que auxiliam estes
problemas é a falta da preocupação do poder público com a limpeza dessas áreas, e a falta de
informações ou campanhas para que se reduza essa poluição. “Ambientes costeiros e marinhos
estão amplamente sujeitos aos impactos decorrentes de vazamento de óleo de embarcações”
(Conduta consciente em ambientes recifais 2007).

CONCLUSÃO
Neste artigo foi entendido que não é possível o funcionamento da sustentabilidade
trabalhando com um só elemento, um exemplo disto são as Relações Ambientais do Sistur,
exploradas no artigo. “O conceito de sustentabilidade engloba claramente o meio ambiente, as
pessoas e os sistemas econômicos”.(SWARBROOKE, 2000) A partir do momento em que todos os
elementos começam a desenvolver-se, a economia começa a ter seus benefícios.
Pitimbu ainda não possui infra-estrutura para atender um grande fluxo turístico, mas existe
o interesse do setor público. A maior dificuldade encontrada para o desenvolvimento de projetos
Fórum Internacional do Meio Ambiente - A conferência da Terra 1150

que beneficiem o Turismo Sustentável, é o fato da Secretaria do Turismo não está interligada a
outras secretarias.
A riqueza cultural de Pitimbu é imensa, mas pouco valorizada pelos próprios moradores
locais. Sua diversidade artesanal, ainda não é muito difundida. Para mudar esse quadro poderiam
ser realizados projetos de incentivo a cultura, através de debates e feiras que envolvessem a
população por meio de dança, artesanato, gastronomia entre outros.
As paisagens naturais de Pitimbu são belas, exóticas e bem preservadas. O pouco uso da
área ajudou bastante essa conservação. Com o desenvolvimento do turismo, deve ser feito um
planejamento para que a área não seja degradada.
Através dos questionários aplicados aos cidadãos da localidade, foram destacados como
principais atrativos naturais da região, a Barra do Abiaí (anteriormente citada), Praia do Pontal e
Praia Bela.
Um projeto que está contribuindo para a preservação do lugar é a campanha educativa
ambiental “PRAIA LIMPA”, que tem a pretensão de atingir turistas e principalmente a população
local.
Projetos como esse deve ter continuidade, rompendo barreiras entre secretarias e
estimulando a criação de novos projetos voltados a sustentabilidade, trazendo desenvolvimento
social e econômico para o local, visando sempre à preservação do patrimônio e da natureza.

REFEERENCIAS BIBLIOGRAFICAS
BENI, Mario Carlos. Análise estrutural do turismo / Mário Carlos Beni. - 10ª. ed. atual. – São
Paulo: Editora Senac São Paulo, 2004.
BENI, Mario Carlos. Política e Planejamento de turismo no Brasil / Mário Carlos Beni - São Paulo:
Aleph, 2006.
FÁVERO, Profª Ivane Maria Remus. A necessária multidisciplinaridade no planejamento público
do turismo (Artigo) – coord. Do curso de ecoturismo da FISUL
IGNARRA, Luiz Renato. Fundamentos do turismo / Luiz Renato Ignarra. – 2ª ed. ver. E ampl. –
São Paulo: Pioneira Thomson Learning, 2003.
SWARBROOKE, Jonh. Turismo Sustentável: conceitos e impacto ambiental, vol.1 / Jonh
Swarbrooke; (tradução Margarete Dias Pulido). - São Paulo: Aleph, 2000.
www.mapavivo.com.br/content/view/6074/60/lang,pt-br/ visitado 25/02/08
www.paraibabrasil.com/lit_rot_litoral_sul.php visitado 01/03/08
Fórum Internacional do Meio Ambiente - A conferência da Terra 1151

TURISMO E MEIO AMBIENTE: UM ESTUDO DA SAZONALIDADE NO MUNICÍPIO


DA BAÍA DA TRAIÇÃO – PB.

Jefferson Oliveira da Silva


Graduando de Hotelaria – UFPB; jeffersoncantalice88@hotmail.com
Paula Dutra Leão de Menezes
Professora do Curso de Hotelaria UFPB; paula-leao@uol.com.br
Patrícia Pinheiro Rafael de Sousa
Coordenadora Curso de Hotelaria – UFPB; patriciap@ccae.ufpb.br

RESUMO
O turismo e o meio ambiente são elementos que devem ser trabalhados juntos para o
desenvolvimento sustentável de destinos turísticos. A sazonalidade, entretanto, constitui um dos
problemas nos diversos destinos do litoral brasileiro e paraibano. O turismo no município da Baía
da Traição é caracterizado pelo turismo de segunda residência e de massa com a sazonalidade
turística bem definida. O presente trabalho avaliou os efeitos da sazonalidade no município da Baía
da Traição. Trata-se de um estudo descritivo com a utilização de método comparativo, realizou-se
pesquisa de campo para observação estruturada com registros fotográficos e medição de ruídos para
verificar invasão urbana, poluição sonora e crescimento excessivo de resíduos sólidos. A coleta de
dados ocorreu em duas etapas: a primeira no período de alta temporada (durante o carnaval –
fevereiro 2008) e a segunda na baixa temporada (fim de semana – março 2008). Constatou-se que o
município recebe na alta estação um número de turistas maior que o ideal, ultrapassando a
capacidade de carga. Em relação aos resíduos sólidos observou-se grande concentração de lixo nas
praias e praças e ruídos acima do recomendado.
Palavras-chave: meio ambiente; sazonalidade; turismo de segunda residência; turismo de massa.

ABSTRACT
Tourism and environment are elements that should be worked together for the maintainable
development of touristic destinies. However the seasonality constitutes one of the problems in the
several destinies of Brazil's coast and Paraiba's as well. The tourism in the city of Baia da Traição
has been characterized by the tourism of second residence and mass tourism with a very defined
touristic seasonality. The present work evaluated the effects of the seasonality in the city of Baia da
Traição. It is a descriptive study which used the comparative method where field researches have
been done for structured observation with photographic registrations and noise measurement to
verify urban invasion, sound pollution and excessive growth of solid residues. The collection of
data happened in two stages: the first one in the high season holiday (during the carnival - february
2008) and the second in the low season (weekend - March 2008). It was verified that the city
receives in the high season a number of tourists larger than the ideal expected, surpassing the load
capacity. In relation to the solid residues, a great garbage concentration was observed in the beaches
and squares and noises above recommended were noticed as well.
Key words: environment; seasonality; tourism of second residence; mass tourism.

INTRODUÇÃO
Entre as diversas formas de se fomentar a economia de uma localidade podemos destacar o
turismo como um dos setores que mais tem crescido nos últimos anos, impulsionado pelas como
novas relações sócio-econômicas e culturais como também pelas novas tecnologias. Contudo, o
turismo é uma atividade econômica com características distintas a de outros setores, desenvolvê-lo
significa receber fluxos de pessoas, no caso turistas, que entram no cotidiano dos destinos
transformando a dinâmica local.
O Brasil oferece ao turista uma imensa variedade de opções naturais e culturais de
entretenimento, como: Amazônia, Pantanal, Cidades Históricas e Cidades Litorâneas com belas
praias, além da diversidade cultural (música, dança, gastronomia).
Fórum Internacional do Meio Ambiente - A conferência da Terra 1152

O turismo de sol e mar, no período de verão constitui umas das maiores demandas dentro
do país, em virtude da extensão do litoral brasileiro aliado a outros fatores, a exemplo das férias
escolares. Assim, observa-se ao longo do país, pólos receptores como Balneário Camboriú em Santa
Catarina, Ubatuba em São Paulo, Ilhéus na Bahia, entre outros, levando a um aumento substancial
de pessoas, chegando muitas vezes a triplicar a população circulante nos meses de dezembro a
fevereiro.
Neste contexto, o turismo de massa, representado pelo crescimento populacional local,
repentino e instável, corrobora para que ocorra no destino receptor, impactos que podem ser
positivos ou negativos, fruto da acumulação da demanda ou fluxo turístico em um determinado
período do ano, fenômeno denominado de sazonalidade.
Essa mesma tendência pode ser notada no estado da Paraíba, que possui um litoral de 138
quilômetros de praias com características peculiares como falésias, dunas, estuários, restingas,
manguezais, áreas de mata atlântica. O pólo turístico do litoral paraibano encontra-se dividido em
litoral sul (Conde, Pitimbu), João Pessoa e litoral norte (Lucena, Rio Tinto, Baía da Traição,
Marcação e Mataraca).
A preocupação com o meio ambiente é uma constante hoje em todos os setores da
sociedade, contudo observa-se que as ações ainda são lentas no tocante à proteção da natureza. É
muito importante a realização de estudos a partir da definição das condições ambientais e de
análises contínuas de mudanças, visto que o turismo é uma atividade dinâmica e os impactos e suas
conseqüências modificam constantemente.

Compreendendo a Sazonalidade
A palavra sazonalidade é um termo muito utilizado pelos profissionais do setor turismo
e/ou hotelaria, mas não é tão (re)conhecida pela sociedade por ser um termo técnico.
Derivada da palavra sazão que tem a sua origem do latim, Satione e segundo Ferreira
(2000, p.625) a palavra significa “s.f., estação do ano; estado de maturação em que os frutos devem
ser colhidos; fig., oportunidade; ensejo; ocasião propícia”. Introduzida no contexto do turismo a
sazonalidade turística é um fenômeno que é caracterizado pelo movimento da demanda em
determinados períodos do ano, mais especificamente, quando se tem um fluxo muito grande em
determinado período chamamos de alta temporada e de pouco fluxo de baixa temporada, sendo
assim a sazonalidade um dos fatores básicos do turismo de massa, constituindo-se em um problema
para destinos turísticos.
No Brasil, diversos destinos sofrem com a sazonalidade, tal fato ocorre por inúmeros
fatores e, segundo Mota (2003) as principais causas são as férias escolares, tempo livre, fatores
mercadológicos (concorrência, moda, baixa segmentação de produtos) fatores ambientais (guerras,
situações políticas), fatores ecológicos (clima, furacões, enchentes), fatores econômicos (variações
no câmbio, poder aquisitivo) e fatores estruturais (violência, epidemias).
O processo de interação entre os turistas e as comunidades, em destinos receptores, pode
acarretar os mais diferentes impactos, que variam em tipo, intensidade, expressão; essas causas se
interagem, provocando danos muitas vezes irreversíveis aos ambientes aonde vem se
desenvolvendo a atividade.
Os efeitos da sazonalidade são diferentes, entre os que mais afetam a baixa temporada
estão a queda no faturamento das empresas e o desemprego, enquanto que, na alta temporada
podem ocasionar a inflação no núcleo receptor, aumento do mercado informal, prostituição e
degradação do meio ambiente.
Soo Ann (1973 apud Bastos & Kawamoto, 2007) afirma que a alta estação, em decorrência
do turismo de massa, é gerador dos efeitos mais danosos ao meio ambiente, em relação aos
causados por outros segmentos turísticos, como: o ecoturismo, turismo cultural, de eventos, entre
outros.

As questões Ambientais em Pólos Turísticos


Fórum Internacional do Meio Ambiente - A conferência da Terra 1153

O turismo e o meio ambiente é um binômio necessário para o incremento do setor nos


pólos receptores, devendo as discussões estar em sintonia com os modelos de desenvolvimento
sustentável, o que tem repercussão direta com o planejamento e gestão turística, tornando-se uma
inquietação crescente entre estudiosos e profissionais da área.
O conceito de turismo sustentável está ligado às questões de desenvolvimento sustentável
que começaram a ser discutida na década de 70 e, efetivamente, nos anos 90. Se a preocupação com
as questões ambientais é importante para a sobrevivência do homem, é também fundamental para o
desenvolvimento da atividade turística, considerando que os recursos naturais formam a base da
oferta turística e, sob essa perspectiva, em 1994, a Organização Mundial do Turismo (O.M.T.)
instituiu diretrizes para o desenvolvimento sustentável do setor.
Para tanto, Beni (2000) afirma que se devem considerar as seguintes medidas: Educação
Ambiental; Capacitação Profissional (com guias especializados para orientar e acompanhar os
turistas); Estudo de Impacto Ambiental, Capacidade de Carga; Plano de Manejo e Controle
Ambiental. Desta forma, para obter desenvolvimento sustentável do turismo é preciso planejamento
dos recursos naturais sendo primordial uma nova concepção de tratar as relações humanas com o
meio ambiente.
O turismo pode ocasionar impactos tanto positivos quanto negativos para um destino,
entretanto, geralmente valorizam-se os impactos positivos, principalmente econômicos, deixando de
lado os impactos negativos.
Há muitos aspectos negativos nos impactos do turismo no meio ambiente, sendo que estas
conseqüências incidem sobre os locais, que são agentes passivos dessas mudanças. Esses impactos
surgem, por exemplo, no desenvolvimento da infra-estrutura para o turismo, invasão urbana,
poluição sonora, crescimento excessivo de resíduos sólidos e conseqüentemente, poluição das águas
e degradação de ecossistemas frágeis.
Sobre os impactos ambientais do turismo, Ruschmann (1994) descreve que “em alguns
casos, eles não são relevantes e, em outros, comprometem as condições de vida ou a atratividade
das localidades turísticas”.

TURISMO NA BAÍA DA TRAIÇÃO


O município da Baía da Traição está localizado no litoral norte da Paraíba, a 78 km da
capital, com uma população de 7.630 habitantes (IBGE, 2007). A base da economia é a agricultura
(com o cultivo de raízes como: mandioca, batata doce, inhame, além da cana-de-açúcar) e a pesca
(lagosta, camarão, mariscos e peixes).
Outra atividade que também vem sendo desenvolvida é o turismo, devido principalmente
aos atrativos naturais: praias, lagoas e rios. Seu litoral é formado por um conjunto de praias, falésias
muticoloridas, dunas, mangues e arrecifes. Dentre os pontos turísticos podem-se citar as praias
Cardosas, Tambá e Forte; a enseada da Baía da Traição; a da Trincheira e a praia de Coqueirinhos.
Salienta-se também a presença da reserva indígena dos Potiguaras.
No verão, época do chamado veraneio, é o período em que ocorre a maior demanda de
turistas na cidade. Esse tem se caracterizado pelo turismo de segunda residência, ou seja, um tipo de
hospedagem vinculada ao turismo de fins de semana e de temporada de férias. Tulik (1995, p. 21)
conceitua segunda residência como “...um alojamento turístico particular, utilizado
temporariamente, nos momentos de lazer, por pessoas que têm seu domicílio permanente num outro
lugar”. A maioria das residências que pertencem a veranistas na Baía da Traição é de pessoas dos
municípios de Campina Grande, João Pessoa e Guarabira, ou seja, da Paraíba. Beni (2000) afirma
que essa particularidade, por sua própria natureza, determina uma afluência turística razoavelmente
uniforme, não se verificando uma maior renovação da demanda e a conseqüente diversificação da
oferta.
O carnaval na cidade faz parte do calendário turístico da Empresa Paraibana de Turismo
(PBTUR), sendo um dos mais conhecidos do Estado, constituindo assim ponto alto de fluxo de
turistas. Constata-se que o turismo local é de turismo de segunda residência e turismo de massa, que
segundo Souza & Corrêa (1998) é representado pela classe média, que hoje representa o maior
Fórum Internacional do Meio Ambiente - A conferência da Terra 1154

movimento de pessoas em todo o mundo. Tal segmento turístico implica na expressiva quantidade
de turistas nos pólos receptores em determinados períodos do ano.

PROCEDIMENTOS METODOLÓGICOS
O objetivo desta pesquisa foi avaliar os efeitos da sazonalidade no município da Baía da
Traição – PB. Adotou-se a pesquisa descritiva com a utilização de método comparativo, pois se
pretendia observar, registrar e analisar o fenômeno da sazonalidade turística no município.
Para tanto, foi realizada pesquisa de campo para observação estruturada com registros
fotográficos e medição de ruídos para verificar invasão urbana, crescimento excessivo de resíduos
sólidos e poluição sonora. Schlüter (2003) explica que a observação estruturada consiste na
observação e registro de acordo com procedimentos explícitos, de comportamentos e ações sociais
previamente especificados.
A coleta de dados ocorreu em duas etapas: a primeira no período de alta temporada
(durante o carnaval – fevereiro 2008) e a segunda na baixa temporada (fim de semana um mês após
o período de carnaval – março 2008).
Como o objetivo básico das medições foi o de estimar a intensidade média sonora, foi
calculado o Leq (nível equivalente contínuo), através de 30 (trinta) leituras com o Decibelímetro na
escala (A) de ponderação, em intervalos de 10 (dez) segundos entre uma leitura e outra (NBR -
10.151, 2000). Para análise foi aplicado o modelo estatístico de distribuição dos níveis pontuais de
intensidade sonora. As medições foram realizadas com o equipamento a 1,50 metros do solo. A
coleta de dados ocorreu na zona urbana do município em três pontos diferentes no período diurno.
A NBR 10.152 fornece “níveis de ruído para conforto acústico”. Inobstante a Resolução 0001/90 –
CONAMA refere-se à proteção à saúde, consta da nota a do n° 1 – objetivo da NBR 10151 – que
“as questões relativas a risco de danos à saúde em decorrência do ruído são estudados em normas
específicas”. Desta forma, a proteção da saúde humana poderá exigir valores mais baixos em
decibéis, mas dependerá da aplicação das chamadas normas específicas ou de exames
administrativos ou periciais.

ANÁLISE DOS DADOS


Em relação ao estudo relativo a poluição sonora, nos três pontos em que foram realizadas
as pesquisas, no período de carnaval, foi registrado nível de ruído de até 109,7 dB(A) explicitando
assim valores acima dos recomendados pela ABNT para ruídos externos durante o dia. Conforme
pode ser observado na tabela:

Tabela 1: Caracterização da ocorrência de ruído


Local Alta temporada – dB(A) Baixa temporada – dB(A)
Praça central 109,7 58,8
Em frente à delegacia 79,4 65,0
Em frente a estabelecimento hoteleiro 73,7 55,6
Fonte: Dados da pesquisa, 2008.
Quando uma pessoa é submetida a altos níveis de ruído, existe reação de todo o corpo a
esse estímulo. As principais alterações reversíveis podem ser: hipertensão sangüínea, dilatação das
pupilas, irritação geral e incômodo, prejuízo à concentração e performance, estresse, entre outros.
De acordo com a Resolução/001/90 – CONAMA, a emissão de ruído em decorrência de
quaisquer atividades industriais, comerciais, sociais ou recreativas, inclusive as de propagandas
políticas obedecerá no interesse da saúde, do sossego público aos padrões, critérios e diretrizes
estabelecidas nesta resolução; são prejudiciais à saúde e ao sossego público, para os fins do item
anterior, os ruídos superiores aos considerados aceitáveis pela norma NBR 10.151, avaliação de
ruídos habitáveis – visando ao conforto da comunidade da Associação Brasileira de Norma
Técnicas – ABNT.
Fórum Internacional do Meio Ambiente - A conferência da Terra 1155

Figura 1: Alta temporada, carnaval, 2008. Figura 2: Baixa temporada, pós-carnaval, 2008.

As figuras acima foram registradas na mesma praia do município, contudo em períodos


distintos, não foi possível registrar tal fato de um mesmo ângulo em virtude da maré que se
encontrava alta, como pode ser verificado na figura 2. Contudo, constata-se a alta demanda de
turistas no período de veraneio e, mais precisamente, no período carnavalesco (figura 1), com
aumento substancial do número de pessoas circulando pelas praias, ou seja, crescimento
descontrolado. O fato observado demonstra o excesso de número de pessoas em um mesmo
ambiente, excedendo assim os limites de capacidade de carga turística, podendo causar degradação
no meio ambiente físico e conseqüentemente declínio na qualidade de experiência obtida pelos
visitantes.
O turismo praticado na localidade denomina-se turismo de massa, sendo considerado como
uma das atividades turísticas mais nocivas ao meio ambiente. Ruschmann (2000) afirma que
ecologicamente, o turismo de massa implica na ocupação e na destruição de áreas naturais que se
tornam urbanizadas e poluídas pela presença e pelo tráfego intenso de turistas.
Fórum Internacional do Meio Ambiente - A conferência da Terra 1156

Figura 3: Alta Temporada, carnaval, 2008. Figura 4: Baixa Temporada, pós-carnaval, 2008.

A análise das figuras 3 e 4 permitem observar o nível de poluição ocasionado pelos


turistas. Em decorrência da alta demanda, aumenta também, significativamente, a quantidade de
lixo inorgânico depositado nas praias. De acordo com Ruschmann (2000), a concentração sazonal
em áreas do litoral e, principalmente nas praias, provocam a poluição das águas e o acúmulo de
detritos na areia.
Ressalta-se que após um mês do período carnavalesco (figura 4) e, por tanto, em época de
baixa temporada, o acúmulo do lixo diminui consideravelmente devido à equipe de manutenção de
vias públicas que executa esse trabalho no município de Baía da Traição. Contudo, não significa
que o meio ambiente ainda não esteja sofrendo as conseqüências da alta temporada.

Figura 5: Alta temporada, carnaval, 2008. Figura 6: Baixa temporada, pós-carnaval, 2008.

Observa-se na figura 5, o turismo de massa ou também conhecido, turismo de sol e praia,


prática nociva ao meio ambiente. Segundo Ignarra (2003) os serviços turísticos podem ser
ampliados de acordo com o crescimento da demanda, mas a natureza é um recurso turístico que não
pode ser ampliado.
No período de alta temporada foi observada a grande quantidade de turistas por toda a orla
marítima do município de Baía da Traição, e exatamente um mês depois no período de alta
temporada já não se constata mais esse número de pessoas e sim as conseqüências deixadas por eles
devido a ocupação sazonal, por esta razão Ruschmann (2000) assegura que as conseqüências do
grande afluxo de pessoas nesses ambientes – extremamente sensíveis – fazem com que o
planejamento dos espaços, dos equipamentos e das atividades turísticas se apresente como
Fórum Internacional do Meio Ambiente - A conferência da Terra 1157

fundamental para evitar os danos sobre os meios visitados e manter a atratividade dos recursos para
as gerações futuras.

CONSIDERAÇÕES FINAIS
Ao final do trabalho conclui-se que o turismo desenvolvido na Baía da Traição, marcado
pelo turismo de segunda residência e de massa, com características bem definidas da alta
temporada, com amplo crescimento do número de visitantes e prolongada duração da estada,
contribui para impactos negativos ambientais.
Dentre os efeitos da sazonalidade turística detectou-se os seguintes problemas ambientais:
Geração e acréscimo do lixo urbano com mudanças na qualidade da água e do meio ambiente;
Aumento da densidade populacional; Níveis de poluição sonora acima do recomendado pela
legislação; Aumento da demanda por água e energia.
Os serviços de apoio ao turista e a infra-estrutura básica local não estão preparados para
receber o expressivo fluxo de turistas.
A cidade apresenta um importante conjunto de atrativos turísticos, mas requer um
planejamento turístico, pois o turismo utiliza o contorno natural, ocupa espaços e recursos do meio
ambiente. Ressalta-se, ainda, que para desenvolvimento sustentável existe a necessidade de infra-
estrutura adequada para evitar desgastes do meio-ambiente e saturação do destino turístico.
A partir da descrição das condições ambientais citadas é relevante que ocorram
monitoramentos e avaliações permanentes para determinar as mudanças, os impactos e suas
conseqüências, com intuito de determinar ações para preservar o meio ambiente.

REFERÊNCIAS BIBLIOGRAFICAS
ASSOCIAÇÃO BRASILEIRA DE NORMAS TÉCNICAS. NBR 10151: Avaliação do ruído em
áreas habitadas visando o conforto acústico da comunidade. Rio de Janeiro, 2000.
BASTOS, A.L.; KAWAMOTO, C.T. A degradação ambiental do turismo de massa na Amazônia.
In: IX ENGEMA – Encontro Nacional sobre Gestão Empresarial e Meio Ambiente. Curitiba: 2007.
Diponível em: < http://engema.up.edu.br/arquivos/engema/pdf/PAP0048.pdf > Acesso em:07 de
março de 2008.
BENI,M.C. Análise estrutural do turismo. 3ªed. São Paulo: SENAC, 2000.
BRASIL. Conselho Nacional do Meio Ambiente. Resolução/CONAMA/nº001 de 08 de março de
1990. Disponível em:< http://www.mma.gov.br/pot/conama/res/res90/res190.html > Acesso em: 07
de março de 2008.
FERREIRA, A. B. de H. Miniaurélio século XXI escolar: o minidicionário da língua portuguesa.
4ed. rev. Ampliada - Rio de janeiro: Nova fronteira, 2000.
IBGE. Baía da Traição. Disponível em:
<http://www.ibge.gov.br?cidadesat/xtras/perfil.php?codmun=250140&r=2> Acesso em 06 de
março de 2008.
IGNARRA, L. R. Fundamentos do turismo. São Paulo: Thomson, 2003.
MOTA, K.C.N. Gestão Estratégica da sazonalidade turística: transformando ameaças em
oportunidades. In: BEZERRA, D.M.F. (Org). Planejamento e gestão em turismo. São Paulo: Roca,
2003.p.15-27.
RUSCHMANN, D.V.de M. Turismo e planejamento suatentável: a proteção do meio ambiente.
Campinas: Papirus, 2000.
SCHLÜTER, R.G. Metodologia da pesquisa em turismo e hotelaria. São Paulo: Aleph, 2003.(Série
Turismo).
SOUZA, A.M.; CORRÊA, M. Conceitos, definições e siglas. Manaus: Editora Valer, 1998.
TULIK, O. Residencias secundárias: presença, dimensão e expressividade do fenômeno no Estado
de São Paulo. 1995. 154 p. Tese (Livre-Docência) – Escola de Comunicação e Artes, Universidade
de São Paulo. São Paulo.
Fórum Internacional do Meio Ambiente - A conferência da Terra 1158

IX. Resíduos e saneamento ambiental

GERENCIAMENTO DO LIXO ANTÁRTICO NO TERRITÓRIO NACIONAL:


CONFLITO AMBIENTAL?

Rogério M. Gandra

RESUMO
A questão ambiental na Antártica, cuja gênese se confunde com a própria geopolítica
empreendida pelos Estados signatários do Tratado Antártico (estabelecido em Washington, 1959),
passa a adquirir maior dimensão a partir de 1991 com a ratificação do Protocolo ao Tratado da
Antártica sobre Proteção ao Meio Ambiente, mais conhecido como Protocolo de Madri.
Esse instrumento jurídico internacional se tornou a referência maior na tomada de decisões
políticas relativas ao continente antártico, em especial as que dizem respeito à conciliação entre as
ações antropológicas, desenvolvidas em função das atividades científicas na região antártica, e
medidas de proteção e conservação do meio ambiente antártico.
A principal orientação do Protocolo de Madri é a retirada da área do Tratado (ao sul do
paralelo 60º Sul) de todo o tipo de lixo, produzido em função das atividades científicas. Todo o lixo
deve retornar ao território nacional dos respectivos Estados signatários.
No caso específico do Brasil, que aderiu ao Tratado em 1975, o lixo antártico sempre teve
livre acesso no território nacional. Todavia, em março de 2000 o lixo antártico ficou retido no Porto
do Rio Grande pelos órgãos ambientais. A partir desse incidente surgiu o objeto de estudo dessa
pesquisa, concernente ao gerenciamento do lixo antártico no território nacional, trazendo consigo a
inquietante questão: conflito ambiental?
O que acontece quando o gerenciamento do lixo antártico se sobrepõe ao universo da
legislação ambiental brasileira? Qual é o destino do lixo antártico no território nacional? É possível
quantificar o lixo antártico desde as primeiras Operações Antárticas Brasileiras, bem como
equacionar a sua evolução?
No que diz respeito ao primeiro questionamento, o resultado final dessa sobreposição
dependerá da forma como se irá interpretar a legislação vigente. Quanto ao destino do lixo
antártico, apesar de se rastrear sua provável disposição final em território brasileiro, o mesmo
comporta-se como uma incógnita . Contudo, apesar da carência de dados, e até de uma certa
imprecisão, foi possível quantificar o lixo antártico, chegando-se a uma provável evolução de tais
resíduos.
Palavras –chave: Tratado Antártico - Lixo Antártico - Programa Antártico Brasileiro - Conflito
Ambiental

ABSTRACT
The Antarctica’s environmental question, whose beginning is confused with the proper
geopolitics undertaken for the signatory States of the Antarctic’s Treaty (Established in
Washington, 1959), gets a bigger dimension from 1991 with the ratification of the protocol to the
Antarctica’s Treaty under the Environments Protection, well known by the name of Madrid’s
Protocol.
This juridical international instrument became the bigger reference in the politics decisions
making relative to the Antarctic continent, in special the ones which are related to conciliation
among the human actions, developed in consequence of the scientific activities in the Antarctica’s
region, and protection measures and conservation of the Antarctica’s environment.
The Madrid’s Protocol main orientation is to take away from the Treaty’s area (in the south
of the parallel South 60) all the trash, produced in consequence of the Scientifics’ activities. All
trash must return to the national territory of the respective signatory States.
Fórum Internacional do Meio Ambiente - A conferência da Terra 1159

In Brazil’s specific case, which joined the Treaty in 1975, the Antarctic’s trash always had
free access to the national territory. However, in March of 2000 the Antarctic’s trash was retained in
Rio Grande’s Port by the environmental agencies. From this incident emerged the need for this
research, concerning to the Antarctic’s trash management in the national territory, bringing the
disturbing question: environmental conflict?
What is the destiny of the Antarctic trash in the national territory? Is it possible to quantify
the Antarctic trash since the first Antarctica Brazilian’s Operations, as well as calculate its
evaluation?
Regarding in point of the first doubt, the final result of this superposition will depend on
the way the legislation in vigor will be interpreted. For the Antarctic trash destiny, in spite of
tracing down its probable final disposition in the Brazilian territory, the same one behaves as an
incognito. However, in spite of lack of data, and even a certain impression, it was possible to
quantify the Antarctic trash, reaching a probable evolution of such residuals.
Keywords: Antarctic Treaty - Antarctic Trash - Brazilian Antarctic Program - Environmental
Conflict

INTODUÇÃO
Considerando-se que o jovem Programa Antártico Brasileiro (Proantar) dinamiza-se
rapidamente, em virtude de sua importância geopolítica, tende-se a uma incidência cada vez maior
de lixo antártico no território nacional, em especial no município do Rio Grande.
A recente estrutura geomorfológica da restinga de Rio Grande (pleistoceno/holoceno), com
*
terrenos ainda pouco consolidados, contribui para restringir as áreas apropriadas para a disposição
racional do lixo urbano. O próprio lixão municipal já não está sendo compatível com a atual
demanda de resíduos urbanos e com o contínuo adensamento populacional em seu entorno.
Foi nesse sentido que se buscou a justificativa para a presente pesquisa, pois se entendeu
que o município, além de administrar o seu lixo interno, terá, a médio-longo prazo, que buscar
alternativas para gerir também a questão do lixo antártico. A pesquisa teve por objetivos:
Objetivo central - analisar o manejo do lixo antártico no território nacional, enfocando ou
desmistificando conflitos ambientais, tendo o município do Rio Grande como marco espacial
prioritário.
Objetivos específicos - analisar os procedimentos adotados pelo Proantar no manejo do
lixo antártico na área do Tratado Antártico e no território nacional; quantificar o lixo antártico
recebido no território nacional ao longo das sucessivas Operações Antárticas, bem como analisar a
natureza de tais resíduos, buscando um padrão de incremento ou retraimento que justifique ou não
um conflito ambiental.
Quanto à metodologia, a referida pesquisa revestiu-se de caráter empírico, fundamentado
em base teórica, consistindo de:
a)revisão bibliográfica relativa aos seguintes referenciais:
-legislação e políticas ambientais
-gerenciamento ambiental
-impactos ambientais
-política e questão ambiental na Antártida
b)coleta de dados:
-junto ao PROANTAR
-junto a órgãos públicos ambientais
-junto a entidades privadas
c)cruzamento e análise dos dados, sobrepostos a referenciais teóricos

O PROANTAR E O MANEJO DO LIXO ANTÁRTICO NA ÁREA DO TRATADO

* Objeto de Estudo de dissertação de mestrado defendida junto à Universidade Federal do Rio Grande do Sul- UFRGS
** Professor de Geografia – Mestre em geografia e doutorando em geografia pela UFRGS.
e.mail : Gandra3@ibest.com.br
Fórum Internacional do Meio Ambiente - A conferência da Terra 1160

Ao se tornar membro do Tratado Antártico, o Brasil assumiu uma série de compromissos


internacionais em relação ao gerenciamento e uso da área ao sul do paralelo de 60º S. Entre esses
compromissos está a proteção do meio ambiente antártico, regulada pelo Protocolo ao Tratado da
Antártida sobre Proteção Ambiental (Protocolo de Madri), assinado pelo Brasil em outubro de
1991.
Todos os resíduos gerados na Estação Antártica Comandante Ferraz, no Navio de Apoio
Oceanográfico Ary Rongel, áreas de refúgios e acampamentos são cuidadosamente separados em
quatro grupos, conforme o quadro abaixo:

Classificação dos Resíduos Gerados na Antártida


Grupo 1 Grupo 2 Grupo 3 Grupo 4
Esgotos e líquidos líquidos químicos e sólidos combustíveis outros resíduos sólidos
domésticos lubrificantes
Fonte: Plano de Atividades Brasileiras na Antártica (1995-1996)

Os resíduos dos grupos 2, 3 e 4 são removidos pelo Navio de Apoio Oceanográfico para
fora da área do tratado(entenda-se território nacional). Registre-se, contudo, que os esforços do
Proantar, no sentido de minimizar os impactos ambientais, decorrentes das atividades brasileiras no
continente antártico, tornou-se uma constante a partir da instituição do Protocolo de Madri(1991).
Todavia, o único registro oficial em que constam informações importantes quanto à
natureza, quantificação e local de produção do lixo antártico são os Relatórios das Atividades
Brasileiras na Antártica (Planos de Atividades). Esses relatórios são repassados anualmente aos
Estados-signatários, conforme preconiza o parágrafo 5º do artigo 7º do Tratado Antártico, segundo
o qual cada uma das Partes Contratantes informará, por antecipação, sobre toda a expedição à
Antártida que participem seus nacionais. O atual formato dos Planos de Atividades do Proantar
passou a ser preenchido a partir de 1994, razão pela qual os dados quanto à natureza e a
quantificação do lixo antártico somente estão disponíveis a partir da Operação Antártica 1995-1996.
Infelizmente, da primeira expedição antártica brasileira(1982) até 1994, não há registros sobre o
lixo supracitado.

A OUTRA FACE DA QUESTÃO: O CONFLITO AMBIENTAL


Apresentam-se agora dados que deslocam a dialética do gerenciamento do lixo antártico no
território nacional para uma dimensão muito próxima do conflito ambiental. O artigo 1º da
Resolução 001/86 do CONAMA, que versa sobre o conceito de impacto ambiental, considerada que
o mesmo consiste em qualquer alteração das propriedades físicas, químicas e biológicas do meio
ambiente, causada por qualquer forma de matéria ou energia resultante das atividades humanas.
Nota-se que o referido conceito tem início com a expressão “qualquer alteração”, não especificando
a magnitude mínima desta alteração.
Contudo, como determinar uma situação que se configure em um impacto ambiental?
Alguns autores(MILARÉ, 2002, p.63) consideram que muitas vezes o insignificante se reveste da
maior significância, quando, por exemplo, um projeto tenha a capacidade de romper o ponto de
saturação ambiental. Nesse sentido, entende-se que o lixo antártico é passível de uma situação de
impacto ambiental no território nacional. Se ele é considerado nocivo ao ecossistema antártico, por
que perderia tal característica ao desembarcar no Brasil?
Todavia, quanto mais se imerge no arcabouço legislativo-ambiental brasileiro, mais
vinculado se torna o gerenciamento do lixo antártico no território nacional a uma Avaliação de
Impacto Ambiental. O artigo 3º da Resolução do CONAMA 001/86 estabelece: dependerá de
elaboração de Estudo de Impacto Ambiental e respectivo RIMA, o licenciamento de atividades que,
por lei, sejam de competência federal. É oportuno lembrar que o Proantar, criado pelo Decreto nº
86.830 de 1982, é um projeto federal, a cargo da Comissão Interministerial para os Recursos do
Mar, a qual dentro do Sistema Antártico, vincula-se diretamente ao Presidente da República.
Fórum Internacional do Meio Ambiente - A conferência da Terra 1161

Por outro lado, é retirado da área do Tratado um grande número de resíduos com
significativos graus de periculosidade, como alumínio, outros metais, plásticos, metais pesados,
borracha e resíduos biológicos. Observou-se que os resíduos do Grupo 3 (sólidos combustíveis) que
tiveram maior incremento foram: o papel, que saltou de 55kg (1995-1996) para 1585 kg (1999-
2000), o plástico, que saiu de 788kg (1995-1996) para 1449 kg (1999-2000), e a madeira, que
embora aparecendo nos registros apenas em 1998-1999, sofreu em 1999-2000 um aumento
percentual de 395%. No entanto, os incrementos mais acentuados se encontram no Grupo 4 (outros
resíduos sólidos): o vidro retirado da área do Tratado no período 1995-1996 foi de 647 kg, em
1999-2000 chegou a 1088kg; os metais saíram dos 580kg (1995-1996) para 9077kg(1999-2000); o
alumínio, por sua vez, superou os demais em percentual de incremento, no período inicial da
análise(1995-1996) contava com 35kg , chegando ao fim do período a um total de 1061kg,
representando um percentual de crescimento da ordem de 2930%.
No cômputo total (Grupo 3 + Grupo 4), constatou-se um crescimento linear da quantidade
de lixo retirado da Antártida, para o período de análise dessa pesquisa (1995-2000). Em 1995/1996
a quantidade de lixo antártico que chegou ao Brasil foi de aproximadamente 2245kg, em 1999/2000
atingiu 21580kg, ou seja, um crescimento percentual de 861%, superando o próprio percentual de
crescimento do lixo urbano gerado no município do Rio Grande, cuja estimativa é, para o período
2000-2010, de 12% (OLIVEIRA, 2002, p.173).

CONSIDERAÇÕES FINAIS
Uma das características desse objeto de estudo foi a sua singularidade. Entretanto, esse
caráter singular privou avanços mais significativos, em direção a uma maior compreensão dos
fenômenos e processos relacionados ao gerenciamento do lixo antártico no território nacional.
Entendeu-se, todavia, que tão importante quanto produzir novos dados, foi resgatar do
anonimato dialético aqueles dados que, até então, ficavam restritos à esfera do Proantar e dos
Estados signatários do Tratado Antártico. Esse objeto de estudo não possibilitou referências
anteriores, por ser este o primeiro trabalho a abordar o gerenciamento do lixo antártico no território
nacional. Não obstante, ficou uma certeza: a dinâmica do lixo antártico, na verdade, extrapola a
esfera nacional, coincidindo sua gênese com a própria dialética ambiental no continente antártico. O
Tratado Antártico, via Protocolo de Madri, simplesmente determina: “retirem seu lixo da área do
Tratado”. A partir daí, gera-se o conflito, ou seja, o que fazer com esse lixo?

REFERÊNCIAS BIBLIOGRÁFICAS
AB’SABER, Aziz Nacib et al. Previsão de Impactos. O Estudo de Impacto Ambiental no Leste,
Oeste e Sul. Experiências no Brasil, na Rússia e na Alemanha. 2a. ed. São Paulo: Edusp, 2002.
AGENDA 21. Conferência das Nações Unidas sobre o Meio Ambiente e Desenvolvimento. Brasília
: Câmara dos Deputados, 1995.
AZAMBUJA, P. . Antártida – História e Geopolítica. Porto Alegre: Companhia RioGrandense de
Artes Gráficas, [ s.d.].
BECKER, B. K.. et al. Geografia e Meio Ambiente no Brasil. São Paulo: Editora Hucitec, 1995.
BRAZIL IN ANTARCTICA. Atividades Brasileiras na Antártica – Planos de Atividades.
CAPRA, F. . O Ponto de Mutação. São Paulo: Editora Cultrix Ltda., 1982.
CASSETI, V. . A Essência da Questão Ambiental. Goiânia Boletim Goiano de Geografia, vol. 11,
nº 1, 1991.
CASTRO, T. de. Rumo à Antártica. Rio de Janeiro: Freitas Bastos, 1976.
CHRISTOFOLETTI, A. Modelagem de Sistemas Ambientais. São Paulo: Editora Edgard Blücher
Ltda., 2002.
DECRETO Nº 95.733, de 12 de fevereiro de 1988, dispõe sobre a inclusão no orçamento dos
projetos e obras federais, de recursos destinados a prevenir ou corrigir os prejuízos de natureza
ambiental, cutural e social, decorrentes da execução desses projetos e obras.
DIAS, G. F. . Educação Ambiental: Princípios e Práticas. 5a. edição, São Paulo: Editora Gaia Ltda.,
1998, p. 272.
Fórum Internacional do Meio Ambiente - A conferência da Terra 1162

FOUCAULT, M. . Microfísica do Poder. Rio de Janeiro: Edições Graal, 1979.


GUATTARI, F. As Três Ecologias. 3a. Edição Campinas: Editora Papirus, 1991.
GUERRA, Antônio José Teixeira et al . Avaliação e Perícia Ambiental. 3a. ed. Rio de Janeiro:
Bertrand Brasil, 2002.
JORNAL AGORA - Rio Grande - 23 de março de 2000.
JORNAL AGORA - Rio Grande, 14 de Janeiro de 2004.
LEI Nº 9.921, de 27 de julho de 1993 – dispõe sobre a gestão dos resíduos sólidos no Estado do
Rio Grande do Sul, nos termos do artigo 247, parágrafo 3º da Constituição do Estado.
LEI FEDERAL Nº 9.966, de 28 de abril de 2000 – dispõe sobre a prevenção, o controle e a
fiscalização da poluição causada por lançamento de óleo e outras substâncias nocivas ou perigosas
em águas sob jurisdição nacional.
LEIS, Héctor R. (Org.). Ecologia e Política Mundial. Rio de Janeiro: Vozes, 1991.
MARPOL – Convenção Internacional para Prevenção da Poluição Marinha – 1973/ 1978.
MORIN, E. . Ciência com Consciência. Rio de Janeiro: Editora Bertrand Brasil, 1996.
NOSSO FUTURO COMUM - Comissão Mundial sobre Meio Ambiente e Desenvolvimento. 2a.
edição, Rio de Janeiro: Fundação Getúlio Vargas, 1991.
OLIVEIRA Artur Santos Dias de. Lixo (Resíduos Sólidos Municipais) – Desvelando Coisas
MALditas. Rio Grande: Tese de Doutorado, 2002..
ORELLANA, M. P. . Metodologia Integrada no Estudo do Meio Ambiente. Simpósio sobre
Questões Ambientais e a situação de Belo Horizonte . Belo Horizonte: 1983.
PROANTAR. Estação Antártica Comandante Ferraz. Brasília: CIRM/UNB, 1997.
PROTOCOLO DE MADRI – Protocolo ao Tratado da Antártica sobre Proteção ao Meio
Ambiente. Madri: 1991.
RESOLUÇÃO DO CONAMA Nº 001/86, de 23/01/86 – estabelece as definições, as
responsabilidades, os critérios básicos e as diretrizes gerais para o uso e implementação da
Avaliação de Impacto.
RESOLUÇÃO DO CONAMA Nº 005/93, de 5 de agosto de 1993 – redefine as normas para
tratamento de resíduos sólidos oriundos de serviços de saúde, portos, aeroportos e terminais
ferroviários e rodoviários.
RIBEIRO, G. L. Cuanto Más Grande Mejor? Proyectos de Gran Escala: Una Forma de Producción
Vinculada a la Expansión de Sistemas Económicos. Desarrollo Económico – Revista de Ciencias
Sociales, Buenos Aires, 1987.
SANTOS, M. Técnica Espaço Tempo. Globalização e Meio Técnico-Científico-Informacional. São
Paulo: Editora Hucitec, 1994.
SCHUCH, L. A. . Operação Antártica X – Uma Experiência Vivenciada. 3a. edição, Santa Maria:
UFSM/INPE , 1994, p. 87.
SEMINÁRIO INTERNACIONAL SOBRE RESÍDUOS SÓLIDOS DE PORTOS, AEROPORTOS
E FRONTEIRAS – Rio Grande: agosto de 1996.
SILVA, G. do C. .Geopolítica do Brasil. 2a. edição, Rio de Janeiro: J. Olympio, 1967.
SUBSTITUTIVO DO PROJETO DE LEI Nº 203 / 1991.
TRATADO DA ANTÁRTICA. Washington: 1959.
VALLE, Cyro Eyer do. Qualidade Ambiental – O Desafio de Ser Competitivo Protegendo o Meio
Ambiente. São Paulo: Pioneira, 1995.
VIEIRA, E. F. .Geografia Física do Município do Rio Grande. Rio Grande: SMEC, 1970.
Fórum Internacional do Meio Ambiente - A conferência da Terra 1163

GESTÃO DA ÁGUA EM ABATEDOURO DE AVES NO SEMI-ÁRIDO DE


PERNAMBUCO

Jorge Luiz Araújo da Silva


Médico Veterinário pela UFRPE. Mestre em Gestão e Políticas Ambientais - UFPE. Consultor Ambiental – Prefeitura
Municipal de Itacuruba – PE. Rua Expedicionário Sebastião Clementino, 56 - Recife - PE - CEP: 50.780-530 - Brasil - Tel:
+55(81)34552408 - 87405497 . Fax: +55(81)32721205 e-mails: jlasilva@msn.com
Ronaldo Faustino da Silva
Engenheiro Agrônomo pela UFRPE. Mestre em Gestão e Políticas Ambientais - UFPE. Professor do CEFET-PE.
Doutor em Engenharia Civil - UFPE.

RESUMO
O setor avícola de Pernambuco é de relevância sócio-econômica, em especial as atividades
ligadas à produção e industrialização do frango de corte. Neste contexto a sustentabilidade
ambiental da cadeia produtiva é imprescindível. O objetivo deste trabalho foi identificar os
impactos ambientais gerados pelos efluentes e recomendar soluções para otimização da água e seu
reúso, mediante um modelo microeconômico de controle aplicado no abatedouro avícola da
Agropecuária Serrote Redondo no município de Afogados da Ingazeira, semi-árido de Pernambuco.
Para isso foi realizada uma análise do processo de abate e, posteriormente a identificação da
demanda de água e a geração de efluentes. Foram estabelecidas quais as áreas com maior potencial
para aplicação de alternativas para o uso racional e reúso da água. O consumo médio de água
por ave abatida foi de 23,76 litros dos quais 72,3 % estão diretamente ligados ao abate. O efluente
gerado apresentou DQO e DBO de 4325 e 3346 mg/L, respectivamente. Para as lagoas de
estabilização, as eficiências calculadas para a DQO, DBO e remoção de óleos e graxas foram de
92,0 %, 94,6 % e 94,4 %, respectivamente. Com base nos resultados obtidos foram identificadas
ações pontuais para a melhoria dos processos de tratamento dos efluentes. Mediante o uso da
hidrometração foi possível identificar os principais pontos de consumo de água no abatedouro e
propor medidas de gestão de água. Os levantamentos obtidos por meio do desenvolvimento deste
trabalho permitem concluir que o uso racional e reúso da água são ferramentas básicas para os
programas de gestão de águas e efluentes em abatedouros de aves, mas que as mesmas devem ser
criteriosamente analisadas, pois podem apresentar restrições de ordem técnica ou econômica.
Palavras-chave: abatedouro de aves, efluentes, hidrometração, reuso de água

ABSTRACT
Poultry industry in Pernambuco State is of social and economic relevance, mainly the
activities connected to broiler production and processing. So far, the environmental sustainability of
the supply chain is of main importance. The objective of this research was to identify the
environment impacts of poultry slaughterhouses wastewater and to consider solutions on recycling
water, using a microeconomic model of control at the poultry abbatoir owned by Agropecuária
Serrote Redondo, located in the city of Afogados da Ingazeira, semi-arid of Pernambuco State. An
analysis of the slaughter process and an identification of the water consume and wastewater
production were made. The activities with greater potential for the application of alternative ways
of water use and reuse were detected. The mean value of water spent by each broiler slaughted was
23.76 liters of wich 72.3 % were directly linked to slaughter process. The wastewater presented
COD and BOD values of 4325 and 3346 mg/L, respectively. The estabilization lagoons presented
COD, BOD and oil and grease remotion efficiency of 92.0 %, 94.6 % and 94.4 %, respectively.
Considering the results pinch actions to improve the wastewater treatments were identified. By
means of water flow analysis it was possible identify the main points of water consume and to
sugest rational water management. The information gotten during the development of this work
allow to conclude that rational use and recycling are basic tools for the programs of water
management in poultry slaughterhouses, however they must be carefully analyzed, because they can
present economic or technique restrictions.
Keywords: poultry slaughterhouse, wastewater, water flow analysis, water reuse
Fórum Internacional do Meio Ambiente - A conferência da Terra 1164

INTRODUÇÃO
A avicultura no estado de Pernambuco abate anualmente em torno de 100 milhões de
frangos de corte, o que equivale ao consumo médio de 2,7 milhões de metros cúbicos de água
potável ao ano. O Ministério da Agricultura, Pecuária e Abastescimento (MAPA) recomenda que
para cada frango de corte abatido sejam utilizados 27 litros de água. As atividades de
industrialização da produção agropecuária, além de agregar valor à produção, permitem a geração
de emprego e renda. Mas também apresentam elevada demanda de água potável em todas as etapas
de processamento e transformação das matérias-primas. Dessa forma considerando a realidade
econômica do Semi-árido o uso racional da água, integrado na gestão dos recursos hídricos nas
atividades e tarefas dos processos de industrialização agropecuária, é um fator de primordial
importância para a sustentabilidade da região.
Os recursos da área de gestão ambiental devem ser rigorosamente mensurados e avaliados
econômico, financeira e fisicamente, de forma a garantir um adequado balanceamento de recursos
possuídos pela empresa, para assegurar a eficácia da aplicação destes recursos e para satisfazer as
exigências do público externo ou, mais precisamente, para o cumprimento da responsabilidade
social da empresa, o modelo de custeio ABC pode ser utilizado para uma avaliação da gestão da
água ao longo do processo produtivo, principalmente em atividades consumidora de recursos
hídricos, como é o caso dos abatedouros avícolas. Dessa forma o sistema do custeio ABC não se
prende apenas a área financeira, mas contempla outros aspectos físicos das atividades e processos.
O ABC tem o objetivo de mitigar os impactos de alocações inadequadas, através do
custeamento das atividades exigidas pelos produtos ou demais atividades operacionais. O objetivo
do trabalho é aplicar o modelo ABC no gerenciamento do uso da água em abatedouro avícola
localizado em uma região com disponibilidade crítica deste recurso.

MATERIAL E MÉTODOS
O manejo da água em um abatedouro de aves foi monitorado e os cálculos referentes aos
consumos e as perdas foram registradas utilizando a técnica de avaliação ABC.
FASE 1: Avaliação Técnica Preliminar
Nesta etapa efetuou-se o levantamento de todos documentos existentes e relevantes, como
subsídio para o início de entendimento do uso da água no abatedouro.
FASE 2: Levantamento de Campo
Foram coletadas informações de cada setor consumidor, avaliando-se os procedimentos de
utilização da água, condições dos sistemas hidráulicos, perdas físicas, usos inadequados e usuários
envolvidos. O levantamento foi acompanhado por funcionários da equipe de manutenção com
conhecimento do sistema hidráulico e gerente do abatedouro. Para medição dos fluxos de água em
cada setor foram instalados hidrômetros.

RESULTADOS E DISCUSSÃO
Documentos levantados
Os relatórios técnicos e as plantas arquitetônicas forneceram as seguintes informações: a
captação da água bruta na barragem de Brotas fica a uma distância de mil metros da ETA, Estação
de Tratamento de Água, e possui um sistema de bombeamento com capacidade de tratar 80m3 de
água por hora. A capacidade de armazenamento da barragem é de 22.000.000 m3, esta barragem
tem contínuo monitoramento e fiscalização pela CPRH desde 2005.
A ETA tem a capacidade de tratar 80 m3/hora de água bruta, que depois de tratada é
armazenada em um reservatório com capacidade de 2.000 m3 de água e bombeada para outro
reservatório localizado em cima do abatedouro, na parte central, onde é distribuída por gravidade às
várias tarefas. A quantidade de água do reservatório da ETA supre quase dois dias de abate nas
operações de abate de 50.000 aves/dia. As tarefas executadas nas atividades do processo consomem
88% da água incluindo a limpeza geral, o restante do consumo é destinado ao uso sanitário e outros
(Der LEEDEN, 1990).
Fórum Internacional do Meio Ambiente - A conferência da Terra 1165

Foram levantados os custos da obtenção e manejo da água tratada mediante coleta de dados
do centro de custos da empresa. Os valores estão apresentados na Tabela 1.
Os custos levantados são referentes ao mês de janeiro de 2007 para tratamento de
27.068,39 m3 de água usadas no abate de 1.037.103 aves. O custo atual representa R$ 1,02 por
metro cúbico de água tratada ou 2,662 centavos por ave abatida.

Tabela 1 – Custos fixos e variáveis para obtenção e manejo da água tratada.


Custos Fixos Valor (R$)
Mão de obra com encargos sociais 1.480,00
Depreciação da construção 2.500,00
Depreciação de máquinas e equipamentos 1.250,00
Manutenção 1.250,00
Custos Variáveis Valor (R$)
Produtos químicos 1.386,74
Energia 3.500,00
Outorga* 16.241,03
Total 27.607,77
* custo R$ 0,60 m3 no setor industrial do estado do Ceará.

Levantamento de campo
1 - Quantidade de água consumida em cada setor
Mediante as informações da equipe técnica da empresa e acesso aos relatórios da
consultoria técnica reconheceu-se as micro-vazões da água das atividades envolvidas no abatedouro
para mensuração dos consumos. Depois de identificadas as micro-vazões da água foi realizada a
instalação dos hidrômetros para cada setor e foram criadas as planilhas para registrar os consumos
nos dias de abate, pois até o momento do levantamento não se monitorava o consumo da água das
tubulações. Para implantação desta ação foi mapeada a micro-vazão da água relacionando-a às suas
atividades de uso final, a água entendida aqui como um input relevante à execução da tarefas. Neste
procedimento foi utilizado o modelo de custeio baseado em atividades ABC (Robert Kaplan e
Robin Cooper, 1980).
O Quadro 1 mostra a distribuição dos hidrômetros de cada tubulação atende de 1 a 7
atividades para o uso na execução das tarefas, inclusive destinada à tarefa bastante distinta, por
exemplo, a tubulação onde está instalado o hidrômetro 1 conduz a água desde a recepção, localizada
fora do processo de abate até a lavagem de caixas dentro do processo fabril, entretanto, o modelo
usado (ABC) apropria os custos indiretos, neste caso, o uso indireto da água no consumo total do
processo, por entender que as tarefas realizadas fora do processo de abate, apesar da não inserção
direta, mas está vinculada ao abate, aqui considerado uso indireto.
As quantidades de água consumidas nas atividades foram levantadas por planilha em Excel
durante o mês de janeiro de 2007, esse mês foi escolhido devido a alta demanda, e os valores estão
consolidados na Tabela 2. Os hidrômetros eram lidos todos os dias a partir das 5:00 horas antes de
iniciar o abate e ás 5:30 horas, tempo suficiente para realizar a leitura dos hidrômetros. As
atividades de depenagem, pré-resfriamento, resfriamento, lavagem de carcaça e lavagem geral
iniciada logo após o término do abate demandam bastante água, enquanto outras como cortes,
embalagem e acondicionamento nas câmaras frigoríficas necessitam de menos água.
Fórum Internacional do Meio Ambiente - A conferência da Terra 1166

Quadro 1 – Descrição das atividades relacionadas a cada hidrômetro.


Hidrômetro

Referência Descrição

1 Linha que abastece recepção, escritório, gerência, banheiros, lavador de


AF1.1A
mãos, lavador de botas e sala de lavagem de caixa.
2 AF1.1B Refeitório e casa de máquina
3 Sala de embalagem, sala dos carrinhos, corredor das câmaras frias, corredor
AF1.2
do carregamento e um bodelor.
4 AF1.3A Sala dos compressores e graxaria
5 AF 1.3B Caldeiras
6 Salas de pendura, sangria e embalagem, além de água quente nas salas
AF1.4
escaldagem, depenadeira e evisceração.
7 AF1.5 Máquina de gelo
8 AF2.1 Máquina de moela
9 Máquinas de atordoamento, escaldagem de pés, depenadeira de pés e
AF2.2
frango.
10 AF2.3 Pré-chiller e mesa de separação das vísceras

Tabela 2 – Consumo de água e abate de aves em janeiro de 2007.


Consumo de água
Referência Hidrômetros Total (m3/mês) Volume médio diário (m3/dia)
AF1.1A 1 255 11
AF1.1B 2 2093 87
AF1.2 3 1478 62
AF1.3A 4 4626 193
AF1.3B 5 1293 54
AF1.4 6 1775 74
AF1.5 7 480 16
AF2.1 8 968 40
AF2.2 9 5924 247
AF2.3 10 4656 202
TOTAL - 23548 986
Abate de aves
Total Aves abatidas 1037103 aves ao mês 41481 aves ao dia
Consumo por ave Litros/ave 22,71 23,76

O padrão de qualidade da água nos para usos nobres (lavagem de carcaça, evisceração, pré-
resfriamento, resfriamento, etc...) é alto, exigência do Ministério da Agricultura (RISPOA, Artigo
62). A média do consumo de 23,76 litros/ave abatida foi comparada a alguns padrões pesquisados a
nível nacional e internacional, como apresentado na Tabela 3.
Fórum Internacional do Meio Ambiente - A conferência da Terra 1167

O resultado do consumo encontrado revela que a média está inferior as encontradas nos
Estados Unidos, o maior produtor de frango do mundo, Israel que tem uma pequena produção e a
recomendação do Ministério da Agricultura, porém superior ao intervalo médio encontrado na
pesquisa brasileira. O intervalo encontrado na média nacional depende da reposição de água do
chiller, eficiência do processo de desinfecção e, principalmente, a disponibilidade hídrica da região.

Tabela 3 – Consumo de água por ave abatida em abatedouros referenciados na literatura e na


presente avaliação.
Autores País Litros por ave
VAN der LEEDEN (1990) EUA 25
TROISE e TODD (1990) Israel 33
MACEDO (2006) Brasil 18 a 22
MAPA (Portaria 210) Brasil 27
O presente estudo Pernambuco 23,8

Pelos resultados da Tabela 3 o abatedouro da Agropecuária Serrote Redondo está com seu
consumo acima da média nacional e está localizado no nordeste onde se tem o menor percentual de
disponibilidade de água, além da com a segunda maior população do Brasil. Estes dados são
preocupantes por se tratar de um setor com importância sócio-econômica para a região, portanto,
uma estratégia organizacional do projeto em relação à gestão dos recursos hídricos é
imprescindível, pois a redução desta média no mínimo para o menor índice do intervalo da média
brasileira, ou seja, 18 litros por ave abatida é fundamental para o desenvolvimento sustentável
regional.
A média de aves abatidas no mês de janeiro foi de 41.481 com uma variação de abate entre
25.103 a 51.700 aves, cuja oscilação em percentual é de 39,48% do menor abate e 24,64% do
maior, correspondente a um desvio padrão médio de 5.320 aves, o que implica em uma ineficiência
no planejamento do abatedouro em função do mercado e/ou logística. A medição do consumo por
atividades evidencia as demandas de água em fixa e variável, o que contribui para um eficiente
planejamento da quantidade de aves abatidas e, conseqüentemente, uma gestão racional do recurso
hídrico. Com o abatedouro em operação foram identificados os usos fixos e variáveis da água de
janeiro de 2007 e os resultados médios estão apresentados na Tabela 4.

Tabela 4 – Identificação dos usos fixos e variáveis de água


Descrição da atividade Consumo (m3) Tipo do uso % Hidrômetro
3
Refeitório, banheiros e vestuário 1.320m Fixo 5,61 2
Máquina de gelo 480m3 Fixo 2,04 7
3
Casa das máquinas 773 m Fixo 3,28 2
3
Recepção das aves, lavagem de 246m Variável 1,04 1
caixa, lavador de mãos e botas.
Sala de embalagem, corredor da 203m3 Variável 0,86 3
câmaras frias, bodelor
Sala dos compressores, graxaria 5.919m3 Variável 25,13 4e5
e caldeiras
Salas pendura, sangria, 9.418m3 Variável 39,99 6, 8, 9 e 10
embalagem, escaldagem,
depenagem, escaldagem dos pés,
chiller, separação de vísceras,
máquina da moela.
Lavagem dos caminhões 1.505 m3 Variável 6,39
3
Lavagem geral 3.260m Fixo 13,84 Todos
Gerência, irrigação, banheiros. 423,87 m3 Fixo 1,80 Todos
3
Total 23.547,87 m - 100 -
Fórum Internacional do Meio Ambiente - A conferência da Terra 1168

Esta seria uma medida de redução com decisões tomadas ao nível administrativo
comercial, econômico e operacional, pois levaria a uma economia de 38.550m3 / ano, para um ano
operacional de 300 dias úteis.
O abatedouro tem a capacidade operacional de abate 50.000 aves/dia com uma demanda
fixa de 6.257 m3 mensal para uma carga horária de 250 horas/mês. A eficientização do plano de
abate é uma maneira de minimizar os gastos hídricos e econômico, também, já que a quantidade de
água de uso fixo no abatedouro quando opera com 20.000 aves é o mesmo para 50.000 unidades, ou
seja, um consumo de 26,57% do abate na sua capacidade total. Na Tabela 5 estão apresentados os
valores estimados para o consumo otimizado de água por ave abatida.

Tabela 5 – Estimativa do consumo na capacidade máxima de abate


Quantidade diária de abate janeiro/07 41.481
Consumo de água por 1000 aves 23,76m3
Dias de abate 25
Consumo de água na limpeza geral do abate de jan/07 - (A) 15,08m3
Consumo de água na limpeza geral no abate de 50.000 aves/dia – (B) 12,51m3
Diferença - (B-A) (2,57m3)
Consumo de água na capacidade operacional total 21,19m3

Segundo a OMS uma pessoa necessita no mínimo de 40 litros de água para as suas
necessidades diárias, porém, ao mensurar os consumos com refeitório, banheiros e vestuários
verificou-se que a demanda no mês de janeiro de 2007 foi de 1.320m3 de água. Essas atividades
estão ligadas diretamente aos funcionários que são 300 e trabalham em turno longo de 10 horas
durante 25 dias por mês, portanto, o consumo por pessoa é de 176 litros. Nesse caso um programa
de educação ambiental com certeza reduziria esse consumo com ganhos à empresa. As perdas
físicas verificadas estão relacionadas à vazamento ocasionado por problemas no sistema hidráulico,
um programa de manutenção voltado à parte hidráulica e implementação de novas tecnologias na
área hídrica como torneiras mais eficientes, descarga de sanitários modernas e outros equipamentos
com controles de vazão mais eficiente.
Esta situação ocorreu com o abatedouro fora de operação, mesmo assim foram encontrados
vários vazamentos e não mensurados porque os hidrômetros não estavam instalados.
Uma outra medição foi realizada nos hidrômetros no dia domingo em que o abatedouro
estava totalmente parado, com exceção da casa de máquinas e fábrica de gelo.
Os hidrômetros foram mensurados com intervalo de 1:00 hora e o resultado encontrado
está apresentado na Tabela 6.

Tabela 6 – Medição dos hidrômetros em período sem abate de aves


Hidrômetro Medição (1) – m3 Tempo (1) Medição (2) – m3 Tempo (2) Consumo m3
1 000663,59 8:35 000663,64 9:35 0,05
2 005179,04 8:37 005180,81 9:37 1,77
3 003135,36 8:40 003135,36 9:40 0,00
4 013861,28 8:41 013861,49 9:41 0,13
5 004223,11 8:42 004223,33 9:42 0,22
6 005258,28 8:43 005258,28 9:43 0,00
7 - - - - 2,00
8 01954 8:44 01954 9:44 0,00
9 012322,91 8:45 012322,91 9:45 0,00
10 009473,94 8:46 009473,94 9:46 0,00

No momento desta mensuração só tinham quatro pessoas no abatedouro e verificou-se que


alguns hidrômetros não movimentaram (3, 6, 8, 9 e 10) e outros mudaram de posição (1, 2, 4, 5, 7).
Fórum Internacional do Meio Ambiente - A conferência da Terra 1169

Os hidrômetros dois e sete pertencem às tubulações que abastecem a casa de máquinas e fábrica de
gelo, respectivamente, atividades que funcionam vinte horas por dia, portanto, não consideramos
desperdício. Os hidrômetros um, quatro e cinco que atendem a recepção, escritório, gerência,
banheiros, lavador de mãos, lavador de botas, sala de lavagem de caixa, sala dos compressores,
graxaria e caldeiras deslocaram 0,40m3 em uma hora, o que neste caso trata-se de desperdício, pois
o abatedouro estava totalmente sem funcionar. Esta situação vem confirmar os vazamentos
detectados anteriormente e para a empresa que opera em média trezentos dias úteis por ano restam
sessenta e dois dias parados. Os dias sem atividades equivalem a 1.488 horas mais 4 horas de
paralisação nos dias de operação correspondente a 1.200 horas somam 2.688 horas / ano paralisado
e um desperdício de 1.0755,20 m3/ano. Os investimentos para economizar água nesta situação são
de baixo custo frente a um recurso natural de tamanha importância.
A empresa realiza um reúso de efluente não tratado para o transporte das penas até a
graxaria, onde os efluentes das próprias penas retornam ao local da depenadeira fechando o ciclo.
Esta ação ocorre durante todo tempo do abate, no final tem sua disposição nas lagoas de tratamento.
As penas são transformadas em farinha e utilizadas como ingrediente na ração.
A vazão desse reúso é de aproximadamente 10.000 litros/hora, assim foram registrados no
mês de janeiro uma média 9 horas/abate/dia, portanto, nos 25 dias úteis foram gastos 225 horas, o
equivalente a 2.250 m3/mês, neste caso considerada uma boa economia de água.
Essa prática de reúso deveria acontecer em outras tarefas do abatedouro, como por
exemplo, na lavagem dos caminhões. A empresa possui 60 caminhões para transportar aves vivas e
abatidas e cada veículo consome por lavagem 4,28 m3 (SENAI, 2002), como esses transportes são
lavados, no mínimo, quatro vezes por semana, a empresa tem um consumo de água de 4.108,80 m3
mensal de uso não nobre, proporcional a uma demanda de água para quatro dias de abate.

CONCLUSÕES
O levantamento detalhado da demanda de água nas atividades do abatedouro de aves, em
relação à macro vazão e micro vazão, é o primeiro passo para se ter uma visão do consumo de água
nas atividades do processo de abate para identificação de suas ineficiências e, posteriormente,
correção.
A qualidade da água é outro ponto imprescindível no desempenho das atividades de
abatedouro de aves, uma vez que se trata de alimentos para consumo humano e a vunerabilidade de
contaminação pela água é alta, o que faz necessário um monitoramento nas características dos
recursos hídricos utilizados, tanto nas áreas físico-química e bacteriológica.
A hidrometração das atividades de abate e a conscientização dos funcionários são pontos
relevantes na organização de um programa de gestão da água com o objetivo na otimização e reúso,
de forma sistemática e contínua, principalmente em regiões de escassez do recurso hídrico, como é
o semi-árido do nordeste brasileiro.
No reúso deve-se levar em consideração fatores limitantes como técnicas, operacionalidade
e econômico, muito embora, em regiões com pouca disponibilidade de água devem ser lançadas
alternativas que visem evitar conflitos e desenvolver um programa de sustentabilidade. O reúso do
efluente das penas é um bom exemplo de uma ação de redução da água.

REFERÊNCIAS BIBLIOGRÁFICAS
DER LEEDEN, VAN F.; TROISE, F. L.; TODD, D.K. The water encyclopedia. 2. ed. Michigan:
Lewis Publishers, 564 pp, 1990.
KAPLAN, R. S.; COOPER, R. Custo e desempenho: administre seus custos para ser mais
competitivo. São Paulo: Futura, 450 pp.,1998.
MACEDO, J.A.B. Otimização do uso da água na avicultura. In: CONFERÊNCIA APINCO 2006
DE CIÊNCIA E TECNOLOGIA AVÍCOLAS. 2006, Santos. Anais... Campinas: Facta, 2006. 29
pp., 2006.
MINISTÉRIO DA AGRICULTURA – Portaria 210 RIISPOA – Ministério da Agricultura , art. 62.
Fórum Internacional do Meio Ambiente - A conferência da Terra 1170

MINISTÉRIO DO MEIO AMBIENTE. Disponibilidade de água doce no Brasil. Disponível em


http//:www.mma.gov. Acesso em 18 de maio de 2005.
PALHARES, J.C.P. Impacto ambiental causado pela produção de frango de corte e aproveitamento
racional de camas. In: CONFERÊNCIA APINCO 2005 DE CIÊNCIA E TECNOLOGIA
AVÍCOLAS. 2005, Santos. Anais... Campinas: Facta, 2005. p.43-60, 2005.
SENAI, SEBRAE, UNEP – Estudo de caso na Perdigão Agro-Industrial – Serrafina Cörrea, 45pp.,
2001.
Fórum Internacional do Meio Ambiente - A conferência da Terra 1171

A CRISE DO MEIO AMBIENTE ENTRE AS VÁRIAS AGENDAS CONTEMPORÂNEAS

Boaz Antonio de Vasconcelos LOPES


Doutorando em Recursos Naturais (UFCG). bboaz@bol.com.br

RESUMO
Neste artigo, iremos evidenciar as principais agendas para a gestão dos recursos naturais
sem deixar de desvendar as contradições interna a todo o processo de desenvolvimento sócio-
ambiental. Optamos por uma dissertativo em que são identificadas as seguintes categorias de
análise: visão, procedimento, instrumento, agentes principais e espaço. Então, com esse
encaminhamento são caracterizadas as seguintes agendas da gestão ambiental: a tese de Pigou, a
tese de Coase, a tese da gestão Integrada dos recursos naturais e da crítica radical ao modelo de
produção e consumo.
Palavras-chave: Ambientalismo; gestão ambiental; agendas ambientais; recursos naturais.

ABSTRACT
In this article, we will evidence the main agendas for the administration of the natural
resources without leaving of unmasking the internal contradictions to whole the process of the
partner-environmental development. We opted for a dissertation in that are identified the following
analysis categories: vision, procedure, instrument, main agents and space. Then, with that direction
the following calendars of the environmental administration are characterized: the thesis of Pigou,
the thesis of Coase, the thesis of the Integrated administration of the natural resources and of the
radical critic to the production model and consumption.
Key-words: Environmental; Environmental administration; Environmental calendars; Natural
resources.

INTRODUÇÃO
A partir da Eco 92, a crise do meio ambiente passou a ser uma percepção muito mais
presente na vida de todos. Todavia, as soluções para os problemas ambientais não são consensuais,
ao contrário, elas dependem da visão de mundo e de interesse de cada um dos atores sociais.
Existem opiniões divergentes sobre suas causas e os seus efeitos e quais são as respostas mais
adequadas para a gestão de seus recursos.
O atual modelo capitalista de produção e consumo tem uma tendência "natural" de
expandir sua centralidade econômica. Sua lógica é transformar os valores de uso, aqueles que
satisfazem as necessidades humanas, em valores de troca, aqueles que satisfazem as necessidades
do mercado, cada vez mais globalizado.
É clássico o conhecimento de que o modelo de crescimento dominante, desde a Revolução
Industrial, tem gerado uma massa cada vez maior de excluídos sociais. Agora, como se fosse pouco,
o modelo tem degradado, às vezes de forma irreversível, o meio ambiente. Estamos diante de um
novo tipo de crise, nunca vista, a sócio-ambiental.
Inicialmente, podemos aceitar a definição de meio ambiente como sendo o produto da
interação entre os homens e a natureza de forma equilibrada. A interação entre os próprios homens,
em espaços e tempos concretos e com dimensões históricas e culturais específicas que expressam
também o significado político e econômico das mudanças que se pretende induzir ou sustar. Esta
visão está dentro de um escopo de estudo chamado desenvolvimento sustentável.
O Relatório Brundtland traz uma das definições mais conhecidas, a qual afirma que o
desenvolvimento sustentável é aquele que atende às necessidades das gerações presentes sem
comprometer a possibilidade das gerações futuras atenderem suas próprias necessidades. Neste
sentido, é indispensável pensarmos um desenvolvimento em que é considerada a correlação entre,
pelo menos, as seguintes dimensões: sociais, ambientais e econômicas. Assim, uma pergunta se
faz necessária: há compatibilidade entre o atual sistema de produção/consumo e uma saída
sustentável para o desenvolvimento?
Fórum Internacional do Meio Ambiente - A conferência da Terra 1172

Mediante a análise de algumas obras, neste artigo, iremos evidenciar as principais agendas
para a gestão dos recursos naturais sem deixar de desvendar as contradições interna a todo o
processo do desenvolvimento sustentável.
Optamos, também, por uma dissertação em que são identificadas as seguintes categorias de
análise: visão, procedimento, instrumento, agentes principais, e espaço.
Problemática.
O que está em jogo nessa problemática é que tipo de desenvolvimento queremos e como
ele se articula com a gestão dos recursos naturais?

SOLUÇÃO ECONÔMICA PARA A CRISE AMBIENTAL


Durante muito tempo, desde a Revolução Industrial, os insumos naturais têm sido usados
de forma infinita. A partir do momento em que o fornecimento deste insumo, fundamental para o
processo da reprodução do modelo econômico, começou a ficar crítico, o paradigma dominante
buscou, no controle econômico deste, uma solução para o problema.
Na perspectiva da crise da escassez de recursos naturais, o controle econômico do consumo
das fontes naturais tem se constituído como uma solução duplamente útil. Porque, ao mesmo tempo
em que se diminui o consumo destes recursos, dirigindo-os para lógica da indústria, conserva-se o
paradigma vigente, uma vez que o modelo tem fundamento, também, na ordem da economia de
mercado.
O campo da economia que o paradigma dominante aplica à teoria econômica, a questões
ligadas ao manejo e à preservação do meio ambiente é chamado de Economia Ambiental ou
Economia do Meio Ambiente. Essa é uma das razões que, nos últimos anos do século XX,
justificam um claro crescimento da preocupação e do interesse das empresas com os assuntos
relacionados ao meio ambiente. Entre as razões apresentadas para esse crescente interesse
corporativo pelo meio ambiente, podemos citar:
a) Sobrevivência corporativa a longo prazo: está relacionada à necessidade de tecnologias que
possibilitem a geração de recursos básicos para a manutenção de alguns importantes setores da
economia, como, por exemplo, energia e celulose.
b) Oportunidades de mercado: um exemplo de mercado gerado a partir de ações de preservação do
meio ambiente é a venda de quotas de absorção de CO2.
c) Mercado financeiro: devido a novas regulamentações e a um agressivo clima de litígio, um
atestado de saúde ambiental está tornando-se cada vez mais vital para assegurar investimentos e
financiamentos a novos projetos nos mais diversos setores produtivos.
d) Responsabilidade criminal e legal: as novas leis de proteção ao meio ambiente têm sido
responsáveis pela adequação tecnológica de várias empresas, sob pena de inviabilizar a implantação
ou a ampliação das mesmas.
e) Informação globalizada: a globalização traz consigo a distribuição praticamente uniforme da
informação, o que está derrubando as práticas indiscriminadas dos recursos naturais.
A seguir trataremos de conceitos fundamentais para a economia do meio ambiente como premissas
e importantes instrumentos de análise, constituindo-se em conceitos-chave para o desenvolvimento
de nosso estudo, são eles:

Critério de Pareto: é o critério utilizado para julgar se a alocação do recurso é ou não o


mais eficiente, é indicado para estabelecer um ponto ótimo para a sociedade nas negociações entre
governo e mercado para a preservação do meio ambiente.
Externalidade: a compreensão desse conceito demonstra a idéia de como o mercado faz
uso dos recursos naturais, muitas vezes não atribuindo o devido valor a esses bens por usufruir deles
gratuitamente.
Internalidade: alternativa econômica para a compensação pelos níveis de poluição
provocados pelo uso dos recursos naturais no processo de produção das indústrias. Mediante
inclusão dos custos ambientais no cálculo de custo da produção.
Fórum Internacional do Meio Ambiente - A conferência da Terra 1173

Taxa pigouviana: constitui-se no estabelecimento de uma taxa sobre a emissão de


poluentes. É uma política de cunho econômico de controle dos níveis de poluição feito pelo poder
público.
Teorema de Coase: faz um contraponto às taxas pigouvianas, propondo o controle da
poluição pelo mercado por meio de quota para poluir fornecido para as indústrias. Esta teoria usa o
conceito de equilíbrio competitivo mediante o critério de Pareto.

FUNDAMENTOS DA TESE DE PIGOU


A taxa pigouviana, assim chamada em homenagem ao economista inglês Arthur Cecil
Pigou, quem primeiro sugeriu essa taxa, conceitualmente, trata de um imposto sobre unidade de
poluição emitida que deve ser igual ao custo marginal social dessa poluição no nível ótima da
emissão.
A alternativa proposta por Pigou, para o controle da escassez dos recursos naturais, seria a
aplicação de uma taxa que igualaria o montante total do custo marginal imposto à sociedade. Dessa
forma, o fabricante passaria a assumir o total dos custos de sua produção pelo pagamento de uma
taxa pré-fixada pelo Estado.
Analisemos um exemplo proposto por Costa (2002), o caso de dois poluidores: um deles
pode reduzir sua poluição a um custo relativamente pequeno, enquanto o outro tem de arcar com
pesadas reduções em seus lucros para cada unidade produzida a menos. Nesse caso, seria mais
coerente impor uma redução maior àquele poluidor que pode fazê-lo a baixo custo. Esse objetivo
seria automaticamente alcançado com o mecanismo da taxa pigouviana.
A taxa pigouviana alcança seu objetivo de reduzir os níveis de poluição, minimizando o
custo dessa redução para a sociedade. Outro ponto apresentado a favor da taxa pigouviana é o
estímulo gerado para que as firmas busquem desenvolver tecnologias menos poluidoras. Isso ocorre
porque, com a taxa pigouviana, a emissão de poluição passa a ter um custo e, evidentemente, toda
firma busca possuir tecnologias que reduzam seus custos.
De acordo com a proposta metodológica sugerida na introdução de nosso artigo, podemos
sintetizar a tese de Pigou pelas seguintes configurações:
Visão: solução política e quantitativa para a crise do meio ambiente;
Procedimento: gestão gerenciada pelo Estado;
Instrumento: econômico.
Agentes principais: Estado e os agentes econômicos;
Espaço: jurídico.

FUNDAMENTOS DA TESE DE COASE


A abordagem econômico-liberal de mercado aposta nas forças de autoregulação do
mercado, e parte do pressuposto de que pressão de concorrência, crescimento econômico e
prosperidade levariam automaticamente ao uso racional dos recursos naturais, ao progresso
tecnológico e a novas necessidades de consumo compatíveis com as exigências do meio ambiente.
Por essa visão, o mercado é o melhor mecanismo para garantir a satisfação dos desejos
individuais, inclusive dos desejos ambientais na medida em que os consumidores manifestassem
sua consciência ecológica nas decisões de compra, o mercado verde responderia a esta demanda
com a oferta crescente de produtos e serviços ecológicos
Para Ronald Coase, desde que os direitos de emissão de externalidades sejam
adequadamente definidos e que não haja custos de transação entre as partes, a livre negociação entre
as mesmas deve levar ao nível ótimo de emissão destas externalidades.
Costa (2002), para exemplificar a tese de Coase, descreve o seguinte exemplo: uma
empresa de celulose que se instalou em uma sociedade cuja base econômica são cooperativas
agropastoris. Na localidade onde as duas indústrias estão instaladas há um importante rio que em
um primeiro momento atendia a irrigação da lavoura e o consumo da criação de gado da
cooperativa e da região.
Fórum Internacional do Meio Ambiente - A conferência da Terra 1174

A nova indústria foi implantada e em pouco tempo foram sentidos danos, principalmente
em relação à água. Os níveis de poluentes emitidos na água geraram a necessidade, por parte das
cooperativas, de tratarem a água antes de consumi-la para sua produção, uma vez que, o consumo
direto gerou doenças no rebanho e perdas nas plantações.
Nessa situação, ocorre que quanto mais resíduos lançar no rio a empresa de celulose, que
utiliza grande quantidade de água em seu processo produtivo, maior será o custo das cooperativas
da região com instalações de tratamento para a água, o que resulta em um lucro menor.
A sociedade local encontra-se em um dilema: as cooperativas da região gostariam que a
empresa de celulose reduzisse a emissão de poluentes, o que reduziria seus custos e aumentaria seus
lucros. Por outro lado, a indústria de celulose não tem interesse em reduzir a poluição que gera, pois
isso só seria possível de duas formas: ou reduzindo a produção, ou desenvolvendo tecnologias de
tratamento para água antes de lançá-la ao rio. Qualquer uma dessas opções geraria uma redução no
seu lucro.
Coase (1960) sugeriu, em um exemplo semelhante ao apresentado anteriormente, que a
indústria poluente seja levada a emitir o nível ótimo de poluição desde que fosse determinado a ela
o direito de poluir o quanto quisesse, ou seja, até o limite em que o outro agente tem o direito a usar
a água limpa.
Aqui entramos em uma questão que traz uma função essencial do Estado: a definição e a
preservação dos direitos de propriedade para poluir. Ou seja, se não houver uma determinação legal
proibindo que qualquer indústria polua a água sem prévia autorização, a cooperativa autorizará a
produção até o nível em que será compensada por seus lucros.
Aplicando-se à realidade, quando uma indústria pretende implantar uma nova sede ou
ampliar sua planta, ela deverá pedir autorização à sociedade, que aceitará ou não conforme seus
critérios. Teoricamente, o representante da sociedade é o Estado, que através dos órgãos
especializados aprova ou não a implantação ou a ampliação de determinada indústria.
Para Coase (1960) o controle feito pelo Estado pode ser utilizado como uma grande arma
política, favorecendo ou prejudicando um ou outro grupo de poder. E uma maneira de evitar o
protecionismo a alguns grupos em detrimento de outros seria estipular o nível máximo de poluição
aceito pela sociedade em determinada região e, a partir daí, o mercado fixar quotas de poluição para
as indústrias de uma localidade.
Nesse caso o Estado define a propriedade para poluir e permite que haja um livre mercado
de quotas de poluição, garantindo à sociedade que seu limite de aceitação de poluição não será
ultrapassado, já que as próprias indústrias envolvidas auxiliarão os órgãos públicos.
De acordo com a proposta metodológica sugerida na introdução de nosso artigo, podemos
sintetizar a tese de Coase pelas seguintes configurações:
Visão: solução econômica e quantitativa para a crise do meio ambiente;
Procedimento: gestão gerenciada pelo mercado;
Instrumento: econômico.
Agentes principais: indústria;
Espaço: mercado de troca.

GESTÃO INTEGRADA DOS RECURSOS NATURAIS


Para Frey (2001), a teoria moderna afirma que o Estado contemporâneo perde
progressivamente sua capacidade de condução hierárquica unilateral à medida que as redes de
negociação entre os diferentes atores dentro de cada sociedade, como também entre os diferentes
Estados, diversificam-se.
A lógica funcional que está na base do sistema político-administrativo prevalecente nas
democracias representativas do mundo ocidental pressupõe que aqueles que exercem funções
públicas deveriam, a princípio, estar em condições de transformar as concepções politicamente
defendidas também em planos de ação pertinentes e, por conseguinte, em correspondentes
resultados políticos.
Fórum Internacional do Meio Ambiente - A conferência da Terra 1175

Mas, à medida que aumenta a complexidade e a diferenciação funcional da sociedade


moderna, declina a capacidade de condução e de governabilidade por parte do sistema político-
administrativo. Particularmente os problemas ambientais mostram de forma mais nítida, que a
política deveria conseguir muito e acaba conseguindo pouco, perante a incapacidade de controle dos
resultados do sistema político e da esfera do Estado.
Diante das limitações desse Estado, a gestão integrada reivindica a transferência de
maiores responsabilidades para os sistemas de negociação da sociedade civil e o aumento das
possibilidades de informação, de influência e de controle exercidas pela sociedade baseando-se nas
teorias da democracia participativa.
As teorias da democracia participativa e da democracia deliberativa, como também o
comunitarismo, evidenciam a crescente desilusão com o potencial transformador do Estado. Por
outro lado, tentam uma alternativa ao livre mercado como modelo único de tomada de decisão sobre
os rumos de desenvolvimento das sociedades e da gestão do meio ambiente em crise. Esta nova
visão deposita na própria sociedade civil, a possibilidade de ser o ator principal rumo ao
desenvolvimento sustentável da sociedade.
Em oposição às abordagens ecocêntricas, cujo foco de atenção é a natureza e sua proteção,
a abordagem política de participação democrática parte do pressuposto de que o homem e a
sociedade devem estar no centro da atenção e de reflexão. Portanto, essa abordagem pode ser
considerada como uma visão sócio-dicursiva da gestão do meio ambiente e de seus recursos
naturais.
A democracia liberal privilegia os interesses econômicos particulares de pessoas ou grupos
sociais afetados, em detrimento dos interesses ecológicos de caráter geral e difuso. Contudo, a
abordagem política de participação democrática parte da necessidade de uma ampla participação
para determinar os objetivos das políticas ambientais, tomando como princípio a idéia de que todas
as dimensões da relação homem-natureza são fundamentais e importantes.
Outro ponto crítico é que uma democracia discursiva não trata de uma abordagem
elaborada explicitamente a partir de uma preocupação com a questão ambiental, porém, a proposta
apresentada é possuidora de características que podem ser úteis para se pensar uma concepção do
desenvolvimento sustentável e possíveis soluções para a crise ecológica mediante a radicalização
dos mecanismos democráticos, quando buscam o consenso na construção da escala de prioridade da
gestão do meio ambiente.
Daí a gestão integrada – sociedade, instituições, costumes e cultura - como estratégia de
desenvolvimento, onde os recursos naturais possam ser vistos como fonte de bem-estar e de
conservação para manutenção de um meio ambiente equilibrado e saudável e à disposição das
futuras gerações.
De acordo com a proposta metodológica sugerida na introdução de nosso artigo, podemos
sintetizar a tese da gestão integrada pelas seguintes configurações:
Visão: solução integrada das dimensões da gestão dos recursos naturais;
Procedimento: criação de ambiente democrático de decisão;
Instrumento: participação social;
Agentes principais: todos;
Espaço: discursivo-consensual.

VISÃO PELA CRÍTICA RADICAL DO MODELO DE PRODUÇÃO E CONSUMO


Para Hora (2007), a estrutura econômica é responsável pela crise ambiental em que
vivemos. Vemos fatores sócio-ambientais como as alterações do equilíbrio natural causadas por
fenômenos como: aquecimento global, as ilhas de calor, escassez de recursos hídricos, assim como
a constante miserabilidade que grande parte da população do globo enfrenta,
O que existe é a consolidação de um sistema produtivo capitalista que orienta uma
necessidade vital de manter o atual padrão de consumo. E por outro lado, uma tentativa de recorrer
à teoria de Malthus, para defender a tese de que é o crescimento populacional, em particular os
pobres, os responsáveis pelos problemas ambientais e sociais.
Fórum Internacional do Meio Ambiente - A conferência da Terra 1176

O processo de urbanização e a atual situação de crise sócio-ambiental são vivenciados pela


globalização e pelo modelo de desenvolvimento econômico que imputa, aos países do mundo, uma
divisão geopolítica de um norte rico e um sul cada vez mais pobre. É isso que nos faz refletir sobre
o tipo e o conceito de desenvolvimento e progresso desejado.
Não é possível mais não pensar em meio ambiente, quando o mundo já vive problemas de
escassez de água, mas também, não é possível pensá-lo, sem alimentar os milhões de famintos que
se encontram em continentes inteiros. Mas também, já não é possível dar sustentabilidade aos
padrões de consumo dos países desenvolvidos.
Primeiramente, de quê Desenvolvimento Sustentável (DS) falamos? Se considerarmos a
definição da ONU, expressa no Relatório Brundtland, temos que: “desenvolvimento sustentável é
aquele que atende às necessidades do presente sem comprometer a possibilidade de as gerações
futuras atenderem suas próprias necessidades”.
Aparentemente é coeso, o discurso do desenvolvimento sustentável, da garantia do “nosso
futuro comum”, no entanto, apresenta-se como uma demanda genérica da sociedade – como
elemento homogêneo e único. Desconsiderando, justamente, as singularidades e necessidades dos
povos do mundo. Não contestando nem apontando para uma necessidade histórica de superação do
atual modelo de crescimento.
A questão ambiental ou do DS pode orientar matrizes de desenvolvimento diferenciadas e
antagônicas, destacando-se de um lado àquelas que suprimem a idéia da disputa de classe, que serve
de suporte ao próprio modelo capitalista. E por outro, aponta para a superação do modelo de
desenvolvimento atual, para a construção de novas relações societárias.
Quando a ascensão do ecologismo dilacera o positivismo com suas denúncias contra
degradação ambiental, denota-se não apenas uma preocupação ético-estética do ponto de vista da
vida, mas uma alteração na essência do entendimento da relação homem-natureza. Neste instante
torna-se mais que latente a indagação: de qual natureza falamos? E ainda: como o meio ambiente
torna-se uma questão ambiental?
A questão ambiental tem sido um fator de reprodução do sistema na proporção em que
gera resíduos para garantir a exploração do trabalho e a construção da mais valia como princípio
inato de sua sobrevivência. Nele, num momento, a natureza precisa ser privatizada e no outro
precisa ser conservada, para ser explorada. Assim, longe de ser um debate fora de seu seio, é
justamente a (re)inserção da visão de mundo que inclui o homem como elemento da natureza que
aponta a forma de sua reprodução.
É preciso ter nítido que a proteção da fauna, flora e da mitigação dos impactos ambientais
com a proposta de sistemas de conservação e preservação do meio ambiente esteja consorciadas à
proteção de todos os homens sem a exclusão.
Mudar hábitos de consumo, repensar os processos produtivos, urbanizar sem causar
impactos, gerar formas alternativas de produção energética, distribuir renda. Enfim, criar e
estabelecer outros princípios e valores perpassa a transformação do atual modelo dominante de
produção e consumo.
Os críticos dessa visão afirmam que não podemos nos deixar enganar por aqueles que
insistem em humanizar o capital. Porque, o grande desafio é como humanizar a diferença, a
pobreza e a degradação ao mesmo tempo.
A pobreza, a exclusão social e o desemprego devem ser tratados como problemas
planetários. Porque, tanto quanto a chuva ácida, o efeito estufa, a depleção da camada de ozônio e o
entulho espacial, assim como todos os projetos de gestão dos recursos naturais, estão no cerne das
mesmas concepções de desenvolvimento, e fora da lógica atual do crescimento econômico global.
De acordo com a proposta metodológica sugerida na introdução de nosso artigo, podemos
sintetizar a tese da visão pela critica radical do modelo de produção e consumo pelas seguintes
configurações:
Visão: postura crítica radical diante do modelo econômico de produção e consumo;
Procedimento: desenvolvimento de uma consciência política ambiental;
Instrumento: a política econômica ambiental;
Fórum Internacional do Meio Ambiente - A conferência da Terra 1177

Agentes principais: os excluídos do modelo econômico dominante;


Espaço: sociológico.

CONSIDERAÇÕES FINAIS
Este artigo procura evidenciar os fundamentos da ciência do meio ambiente para identificar
o que de novo pode dar conta da crise ambiental que estamos vivendo. Se tivéssemos lidando com
uma ciência disciplinar, de larga maturidade, em que se tem um campo (para onde se olha) e um
objeto (como se olha) bem definidos, o novo aconteceria pela busca do estado da arte, para então,
agregar-se novos conteúdos à área de conhecimento.
A ciência do meio ambiente não é disciplinar. Não podemos olhar para um único ponto,
nem tão pouco, temos a nossa disposição um objeto bem definido. Então, o que temos é um objeto
complexo que possibilita várias formas de se olhar.
Lidar com um objeto com esse nível de mobilidade, requer que sejam mostradas todas as
contradições possíveis; que caminhemos por várias dimensões, sem nos perdemos e sem sermos
consumidos por alguma delas. Não basta tentarmos mostrar conteúdos, até porque eles não existem
de forma cristalina. Temos que avançar no mérito do método e da diversidade, para não sermos
apenas reprodutores.
Por estarmos diante de uma ciência interdisciplinar, procedemos selecionando entre
algumas agendas sobre a gestão de recursos naturais aquelas que possuem as características mais
distintas. De posse destas agendas, por uma leitura crítica, fomos “enquadrando”, em nossa
proposta de sistema de categorias, os fundamentos de cada uma dessas agendas.
Assim procedemos, porque pelos motivos já expostos, não foi suficiente identificar apenas
os instrumentos de gestão. Bem mais ainda porque, seja nas ações científicas ou nas práticas de
cotidiano, os instrumentos guardam, no seu escopo, fundamentos que se estendem além de sua
utilidade.
O que guia a prática de uso de um instrumento, nos exercícios da vida científica ou na
sociedade, são as visões de mundo que ficam resguardadas. Essas ações são feitas mediante
procedimentos que beneficiam algum ou vários agentes, nos limites de um espaço de ações e
disputas. Onde não cabe a neutralidade de posições.
Pela leitura dessas agendas, sobre a gestão dos recursos naturais, é possível identificar que
em um extremo temos um paradigma que é dominante, que tenta se apresentar enquanto um mero
instrumento, sem muitas pretensões. Este é mais bem definido, atuante, mais voltado para
resultados e sem muitos questionamentos. No nosso caso, baseado na tese de Coase.
Do outro lado, temos um paradigma totalmente oposto que, mesmo com toda uma tradição
discursiva, apresenta-se, ainda, sem uma vertente instrumental consistente. Pois, é natural que um
paradigma periférico desenvolva mais seu escopo teórico que instrumental. Esta descrição de visão
sobre a gestão dos recursos naturais foi apresentada pelo modelo de crítica radical do modelo de
produção e consumo.
Assim como, também, temos o “paradigma” que, algumas vezes, está dentro do escopo da
visão dominante da gestão dos recursos naturais, e outra, defende as teses do paradigma periférico.
Este, geralmente, se apresenta mais bem definido, instrumentalmente, em relação ao segundo. Para
esta descrição, no nosso caso, enquadra-se o conceito de desenvolvimento sustentável.

BIBLIOGRAFIA
BELLEN, M. van Hans. Indicadores de sustentabilidade. Rio de Janeiro: FGV, 2005.
BOFF, Leonardo. 1995. Ecologia: Grito da Terra, Grito dos Pobres. Editora Ática. São Paulo, 1995
COASE, R. The problem of social cost. Journal of Law and Economics, 1960, disponível em: <
www.sfu.ca/~allen/CoaseJLE1960.pdf > acessado em: 26 junho 2007.
COSTA, Simone S. T. Economia do meio ambiente produção versus poluição. Dissertação
(Mestrado) – Porto Alegre: Universidade Federal do Rio Grande do Sul, 2002.
FREY, Klaus. A dimensão político-democrática nas teorias de desenvolvimento sustentável e suas
implicações para a gestão local, Ambiente & Sociedade , Ano IV - No 9 , 2o Semestre de 2001.
Fórum Internacional do Meio Ambiente - A conferência da Terra 1178

HORA, Karla Emmanuela Ribeiro. O processo de urbanização e papel da educação ambiental no


limiar do século, Disponível: em < http:// www.abrali.com/
016meio_ambiente/016meio_ambiente_o_processo_de_urbanizacao_e_o_papel_da_educacao_ambi
ental_no_limiar_do_seculo_xxi.html> acessado em: 26 de junho 2007.
MARTINS, Paulo Roberto. O Desafio da Sustentabilidade. São Paulo: Editora Fundação Perseu,
2001.
Fórum Internacional do Meio Ambiente - A conferência da Terra 1179

DIAGNÓSTICO DO IMPACTO AMBIENTAL OBSERVADO NA DESTINAÇÃO FINAL


DE EFLUENTES GERADOS NO CEFET CUIABÁ

Afonso Takao Murata


Professor Doutor, efetivo do Cefet Cuiabá - Rodovia BR 364, Km 329, São Vicente da Serra – Sto. Antonio de Leveger
–MT. CEP 78106-970 afonsomurata@yahoo.com.br
Janáine Vieira da Silva Donini
Professora Efetiva do Cefet Cuiabá - Rodovia BR 364, Km 329, São Vicente da Serra – Sto. Antonio de Leveger –MT.
CEP 78106-970 ambiental02@yahoo.com.br
João Marcelo Silva do Nascimento
Professor MSc. do Cefet Cuiabá - Rodovia BR 364, Km 329, São Vicente da Serra – Sto. Antonio de Leveger –MT.
CEP 78106-970 jmarceloeagricola@yahoo.com.br

RESUMO
O diagnóstico do impacto ambiental observado na destinação final de efluentes gerados no
CEFET Cuiabá foi desenvolvido com o intuito de se fornecer dados relevantes, além de auxiliar a
administração da referida instituição no manejo dos resíduos sólidos gerados. Este diagnóstico foi
iniciado com visitas in loco onde foram detectadas irregularidades no manejo desses dejetos que
atualmente são descartados em conjunto os resíduos suínos e humanos. A conseqüência é que estes
dejetos estão afetando uma área de preservação e próxima a um pequeno córrego, podendo num
futuro próximo estar contaminando suas águas. Assim, após um intenso estudo foi diagnosticado
que a medida mais adequada para a solução do problema seria a utilização de biodigestores para os
resíduos de suínos e de reatores anaeróbios para os dejetos humanos.
Palavras-chaves: Resíduos sólidos, Meio ambiente, Efluentes.

ABSTRACT
This study was carried out with the objective to determinate and to look for solution for the
problem of the solid residues in CEFET Cuiabá, it is one of the largest challenges of the Institute. In
this context, the research looked for to identify the mains problem caused by solid residues. The
start grew from a theoretical referential, with identification of the factors and analysis of the
administration of residues in CEFET Cuiabá. The data were obtained through direct observation,
visits in loco and documental researches. The result of analyzes of the institution situation with the
parameters presented in the theoretical base, it showed that flaws still exist in the system. In that
way, recommendations and suggestions were presented seeking auxiliary the administration with
suggestions about residues management.
Key words: Solid residues, degradation conditions, preservation.

INTRODUÇÃO
A idéia de se realizar o diagnóstico surgiu após a constatação do problema e a necessidade
de manejar os dejetos humanos e suínos gerados no CEFET Cuiabá, aliado a isso foi observado a
necessidade de se dar correta destinação aos mesmos, pois estes dejetos estão sendo dispostos de
forma incorreta, já que eles têm sido descartados dentro de lagoas de contenção sem qualquer tipo
de tratamento primário ou impermeabilização de fundo e talude das mesmas infiltrando no solo sem
nenhum tratamento, conseqüentemente, impactando o meio ambiente local e podendo em um futuro
próximo contaminar o lençol freático.
Como definição, impacto ambiental é considerado como toda e qualquer ação que
provoque alteração das propriedades físicas, químicas e biológicas do meio ambiente, causada por
qualquer forma de matéria ou energia resultante das atividades humanas e direta ou indiretamente,
afetam a saúde, a segurança e o bem-estar da população; as atividades sociais e econômicas; a biota,
as condições estéticas e sanitárias do meio ambiente; a qualidade dos recursos ambientais
(CONAMA, 1986).
Devido a esta constatação notou-se a necessidade de implementação de ações no intuito de
se eliminar esta ameaça e evitar danos ao meio ambiente e a comunidade local.
Fórum Internacional do Meio Ambiente - A conferência da Terra 1180

Com isso, este projeto teve por objetivo diagnosticar o impacto ambiental causado na
destinação final de efluentes gerados no CEFET Cuiabá.

OBJETOS DE PESQUISA
Neste diagnóstico foram estudados os efluentes advindos da produção de suínos, bem
como dos efluentes humanos gerados no CEFET Cuiabá, juntamente ao diagnóstico foram
planejadas as ações para sanar o problema detectado.

FUNDAMENTAÇÃO TEÓRICA
A suinocultura ocupa uma posição de grande relevância no cenário econômico mundial,
porém, a atividade ainda necessita de melhorias em seu processo produtivo, propiciando maior
sustentabilidade à cadeia e protegendo o meio ambiente.
Estas adequações são necessárias também no estado de Mato Grosso que possui um
rebanho de suínos de 1.230.043 cabeças (INDEA, 2005 in Acrismat, 2007), ocupando o sexto lugar
no ranking a nível nacional, com 34.180.519 cabeças (AnualPec 2005/ Departamento de
Agricultura dos Estados Unidos – USDA, in Acrismat 2007), tendo expressivo potencial para
expandir seu rebanho, em virtude das seguintes características: O estado produz 27% da soja
brasileira, 5% do milho, além disso, há uma baixíssima densidade por km2 (0,8 suínos por km2),
excelente nível sanitário, boa oferta de energia, infra-estrutura de transporte e logística em
consolidação, política ambiental exigente e bem fundamentada, conduzindo à sustentabilidade das
operações.(Acrismat, 2007).
Esses dados demonstram claramente a importância do setor na economia do Estado e a
atratividade de incremento à produção, visto as características favoráveis, no entanto, não devem ser
esquecidas as necessidades de disponibilidade de recursos hídricos e de qualidade ambiental,
adotando-se novas técnicas de manejo e no tratamento e disposição dos resíduos produzidos.
A preocupação em relação ao tratamento dos efluentes de suinocultura é relativamente
recente, tendo maior importância nas duas últimas décadas, visto que os dejetos de suínos não se
constituíam em problema grave até a década de 70, pois o número de animais era menor e o destino
dos dejetos era o solo com a finalidade de adubação orgânica. Com a necessidade da produção de
quantidades cada vez maiores de alimentos, desenvolveu-se uma suinocultura tecnificada,
caracterizada por sistemas de confinamento com grande densidade populacional nas diversas fases
do ciclo produtivo, trazendo, como conseqüência, a produção e o acúmulo de grande quantidade de
resíduos nas granjas suinícolas que, inadequadamente manejados, passaram a ser considerados uma
das principais fontes poluidoras dos mananciais de água.(Lucas Jr,1998).
A problemática ambiental da suinocultura também está no fato de que, a partir do
momento em que se optou por explorações em regime de confinamento, o total de dejetos gerados,
anteriormente distribuído na área destinada à exploração extensiva, ficou restrito a pequenas áreas
(Silva, 1973; Oliveira, 1993), pressionando o ecossistema local.
O desenvolvimento de tecnologias para o tratamento e utilização dos dejetos é o grande
desafio para as regiões com atividade suinícola. A restrição de espaço e a necessidade de atender
cada vez mais as demandas de energia e água de boa qualidade e alimento, tem colocado alguns
paradigmas a serem vencidos, os quais se relacionam principalmente à questão ambiental e a
disponibilidade de energia (Santana, 2005), mostrando a necessidade de implementação de medidas
mitigadoras promovendo um desenvolvimento sustentável para o setor, uma vez que um suíno pode
produzir em média 8,6 L/dia/animal de dejetos e consumir 15 L/dia de água por dia (Palhares 2007),
e, comparando o potencial poluidor, cada suíno equivale a poluição de 3,5 pessoas.
(Segundo Palhares, Jacob, 2007) algumas das conseqüências da incorreta disposição destes
resíduos no meio ambiente para os recursos hídricos são: 1-) redução da disponibilidade de água
para os seus mais diversos usos, causando situações de conflito entre os diversos usuários da água;
2-) imposição de limitações ao desenvolvimento agropecuário, econômico e social devido a falta de
água, em quantidade e qualidade em nível de bacias hidrográficas, municípios e estados; 3-) aporte
de elevadas concentrações de elementos à água, como, cálcio, nitrato, fósforo, cobre, zinco e ferro
Fórum Internacional do Meio Ambiente - A conferência da Terra 1181

com conseqüências em todo ambiente; 4-) potencialização do processo de eutrofização dos corpos
d’água com conseqüentes danos econômicos e ambientais; 5-) alterações na biodiversidade
aquática, ocorrendo a presença de organismos prejudiciais a saúde humana, animal e ambiental; 6-)
elevação do custo de produção da atividade dado a necessidade de implantação de sistemas de
tratamento mais eficientes; 7-) elevação do custo de vida da população, pois com a poluição dos
corpos d’água estes necessitam ser tratados antes de serem utilizados.
Após breve estudo sobre as alternativas de tratamento de efluentes, encontra-se o
biodigestor, que é um sistema de câmara fechada que em condições adequadas e com o auxílio de
bactérias mesófilas, realizam o processo de digestão anaeróbia da matéria orgânica, produzindo
subprodutos como o gás metano e fertilizante. O estudo sobre biodigestor aumentou nos últimos
anos, principalmente pela questão ambiental, porém, o aspecto energia é cada vez mais evidenciado
pela interferência no custo final de produção, e a crise energética e a alta dos preços do petróleo têm
determinado uma procura por alternativas energéticas no meio rural.

Esgotos Sanitários
Dentre as principais fontes de poluição de água e solo estão as de origem natural, como as
decomposições de plantas, erosão, salinização do solo, etc; esgotos domésticos e industriais e de
origem agropastoril, como dejetos de animais, fertilizantes e agrotóxicos.
Esgoto é o termo usado para caracterizar os despejos provenientes dos diversos usos da
água (Braga et al, 2005).
Os esgotos domésticos (ou sanitários) são os originários, predominantemente, das
habitações, sendo provenientes de instalações sanitárias, banheiros e outros usos (Mota, 1995),
enquadrando perfeitamente a realidade do CEFET Cuiabá, uma vez que o mesmo possui
característica de uma cidade de pequeno porte, pela quantia de residências de funcionários e
alojamento de alunos, realizando todas as atividades da rotina doméstica.
Os esgotos domésticos compõem-se, basicamente, das águas de banho, urina, fezes, restos
de comidas, sabões, detergentes e águas de lavagem (Braga, 2000).
Segundo Mota (1995), em média, os esgotos domésticos apresentam as seguintes
características: Demanda Química de Oxigênio (DBO a 5 dias, 20ºC) de 300 mg/l; Alcalinidade
(em CaCo3) de 120 mg/l; Cloretos - 75mg/l; Sólidos totais - 500 mg/l; Coliformes fecais -
105 a 106 por mililitro; Nitrogênio total - 10 mg/l; Sulfato - 10 mg/l; Sabões e gorduras - 10 mg/l.
Os esgotos sanitários contêm, ainda, inúmeros organismos vivos, tais como bactérias,
vírus, vermes e protozoários que, em suas maioria, são liberados junto com os dejetos humanos.
Alguns são de suma importância no tratamento de águas residuárias, pois decompõe a matéria
orgânica complexa, transformando-a em compostos orgânicos mais simples e estáveis; outros,
denominados organismos patogênicos, são causadores de doenças (Braga, 2000).
A disposição de efluentes in natura diretamente no solo ou em corpos d` água, é uma
opção que já foi a única empregada, mas ainda é muito utilizada, degradando solo, água e ar em seu
processo de decomposição, quando disposto acima de sua capacidade de autodepuração,
contaminando águas superficiais e subterrâneas.
A disposição adequada dos esgotos é essencial para a proteção da saúde pública. A redução
do índice de mortalidade infantil, a elevação da expectativa de vida e a redução da ocorrência das
verminoses que, via de regra, não é letal, mas desgastam o ser humano, somente podem ser
alcançadas por meio da disposição correta dos esgotos.
Dependendo da carga orgânica lançada, o meio demonstra ter condições de receber e de
decompor os contaminantes até um nível que não cause problemas ao ecossistema, isso demonstra
que o tratamento biológico pode ocorrer naturalmente no solo ou na água, desde que em condições
apropriadas. Uma estação de tratamento é, em essência um sistema que explora esses mesmos
organismos, procurando-se otimizar o processo, buscando maior eficiência possível (Campos et al,
1999).
As estações de tratamento de esgoto são comumente classificadas em função do grau de
redução dos sólidos em suspensão e da DBO, proveniente da eficiência do tratamento: a)Tratamento
Fórum Internacional do Meio Ambiente - A conferência da Terra 1182

Preliminar; b) Remoção de sólidos grosseiros, gorduras e areia; c) Tratamento Primário; d)


Decantação, flotação, digestão e secagem do lodo; e) Tratamento secundário; f) Filtração biológica,
processo de lodos ativados, decantação, lagoas de estabilização; g) Tratamento Avançado; h)
Remoção de Nutrientes e remoção de complexos orgânicos.

BIODIGESTORES
A pesquisa e incremento de biodigestores desenvolveram-se muito na Índia, onde, em 1939
o Instituto Indiano de Pesquisa Agrícola, em Kanpur, desenvolveu a primeira usina de gás de
esterco. Tais pesquisas resultaram em grande difusão da metodologia de biodigestores como forma
de tratar os dejetos animais, obter biogás e ainda conservar o efeito fertilizante do produto final
(biofertilizante).
A utilização do biogás, como fonte de energia motivou a china a adotar a tecnologia a
partir de 1958, tornando-se estes, um dos principais modelos aplicados mundialmente.
O biodigestor é indispensável no processo de tratamento dos dejetos, pois realiza a
remoção da carga orgânica. A digestão dos sólidos no fundo do biodigestor processa a formação de
uma camada de lodo vivo onde ocorre o processo de fermentação anaeróbica e a degradação da
matéria orgânica com geração dos gases. Sendo o biodigestor de compartimento fechado o gás não
é mais liberado para a atmosfera, ao contrario, ele é conduzido por canalização com uso para
aquecimento ou produção de energia.
Existem diversos tipos de biodigestor, mas, em geral, todos são compostos, basicamente de
duas partes, um recipiente (tanque) para abrigar e permitir a digestão da biomassa, e o gasômetro
(campânula), para armazenar o biogás. Em relação ao abastecimento de biomassa, o biodigestor
pode ser classificado como contínuo (abastecimento diário de biomassa), com descarga
proporcional à entrada de biomassa, retendo-a até a completa biodigestão. Então, retiram-se os
restos da digestão e faz-se nova recarga. O modelo de abastecimento intermitente é mais indicado
quando da utilização de orgânicos de decomposição lenta e por longo período de produção, como
no caso de palha ou forragem misturada a dejetos animais.
Dentre os biodigestores de sistema de abastecimento contínuo, os mais difundidos no
Brasil estão os modelos chinês e indiano. O modelo chinês é mais rústico e construído em alvenaria,
ficando quase que totalmente enterrado no solo. Funciona, normalmente, com alta pressão, a qual
varia em função da produção e consumo de biogás. Portanto necessita de uma câmara de
regulagem, a qual lhe permite trabalhar com baixa pressão.
Uma das maiores críticas feitas ao modelo chinês de biodigestor é a técnica requerida para
sua construção. O trabalho, todo em alvenaria, requer o trabalho de pedreiro de primeira linha, pois
os tijolos usados na construção da câmara onde a biomassa é digerida (e que é encimada pela
câmara do gás) precisam ser assentados sem escoramento.
A técnica utilizada emprega o próprio peso do tijolo para mantê-lo na posição necessária
até que a argamassa seque. As paredes externas e internas precisam de uma boa camada de
impermeabilizante, como forma de impedir infiltrações de água (proveniente da água absorvida
pelo solo durante as chuvas ou de algum lençol freático próximo) e trincas ou rachaduras. Outra
critica, diz respeito à oscilação da pressão de consumo.
O biogás fornecido pelo biodigestor modelo chinês é levado até o destino de consumo
(normalmente o interior da residência, embora possa ser utilizado, por exemplo, para acionar
ventiladores que mantenham a temperatura ideal em uma incubadora de aves) por tubos e conexões
soldáveis em PVC. A instalação do biodigestor deve ser feita sob a supervisão de pessoal
capacitado na área de condução de gases. Tais profissionais podem ser encontrados, geralmente,
com o auxílio da EMATER de cada Estado ou das cooperativas e associações pecuaristas
(bovinocultores, suinocultores, avicultores, entre outros).
O modelo indiano é o mais usado no Brasil devido à sua funcionalidade (Sganzerla, 1983).
que é o local onde ocorre aQuando construído, apresenta o formato de um poço, digestão da
biomassa, coberto por uma tampa cônica, isto é, pela campânula flutuante que controla a pressão do
Fórum Internacional do Meio Ambiente - A conferência da Terra 1183

gás metano e permite a regulagem da emissão do mesmo. Outra razão para sua maior difusão está
no fato do outro modelo, o chinês, exigir a observação de muitos detalhes para sua construção.
Sganzerla (1983) salienta que uma das vantagens do modelo indiano é a sua campânula
flutuante, que permite manter a pressão de escape de biogás estável, não sendo necessário regular
constantemente os aparelhos que utilizam o metano. Uma desvantagem, razoavelmente
significativa, é o preço da construção da campânula, normalmente moldada em ferro. Este modelo
oferece, em relação ao modelo chinês, algumas vantagens no momento da construção, pois pode ser
adaptado ao clima local e ao tipo de solo. Não há necessidade de se estabelecer medidas fixas para o
diâmetro e a profundidade, bastando que se observe a relação de capacidade do tanque digestor e da
campânula.

Reator anaeróbio
No Brasil, o reator de manta de lodo é utilizado para tratamento de esgoto desde o inicio da
década de 1980, principalmente no Paraná, onde tem evoluído em forma e função, mediante a
experiência de mais de 200 unidades construídas (Campos, 1995).
Os reatores de manta de lodo permitem grande liberdade de projeto em formas de modelos
variados e ainda podem ser bastante aperfeiçoados em detalhes construídos, podendo ainda ser
associado a outras unidades de tratamento, como lagoa de estabilização, disposição controlada no
solo e outros reatores compactos, anaeróbios ou aeróbios.
O processo anaeróbio por meio de reatores manta de lodo apresenta inúmeras vantagens
em relação aos processos aeróbios convencionais, notadamente quando aplicado em locais de clima
quente.
Nas situações em que o esgoto é predominantemente doméstico, a presença de compostos
de enxofre e de materiais tóxicos usualmente ocorre em níveis muitos baixos, sendo perfeitamente
toleráveis pelo sistema de tratamento.
Quanto à partida do sistema, esta pode ser realmente lenta (4 a 6 meses), mas apenas em
condições em que não são utilizados inóculos. Quanto ao projeto de reatores manta de lodo, este é
bastante simples, não demandando a implantação de qualquer equipamento sofisticado ou de meios
suportes para a retenção da biomassa.
O reator de manta de lodo é capaz de aceitar altas taxas de carga orgânica e a grande
diferença, quando comparado com outros reatores de mesma geração, é a simplicidade construtiva e
os baixos custos operacionais.

METODOLOGIA
O diagnóstico foi realizado no Departamento de Produção, Setor de Suinocultura do
Centro Federal de Educação Tecnológica de Cuiabá, localizada na Serra de São Vicente – MT.
As ações foram realizadas a partir de observações in loco, documentação fotográfica,
pesquisa com moradores e com a administração local.

DIAGNÓSTICO AMBIENTAL
O a área de destinação final dos efluentes está localizada em áreas próximas a trechos de
proteção ambiental, onde se localizam riachos e matas típicas de cerrado.
O solo é do tipo arenoso de alta infiltração, o que facilita a percolação de resíduos as
camadas mais profundas, podendo levar a contaminação do lençol freático. A topografia local é
ondulada e próxima a áreas de alto declive, o solo é arenoso e pedregoso, servindo única e
exclusivamente para pastagens e que se possível deve ser destinado a área de preservação.
Na mata são encontrados diversos tipos de animais, desde pequenos artrópodes até
mamíferos de grande porte, em alguns lugares são encontradas árvores de grande porte, além de
estar próximo a um riacho que aparentemente ainda não apresenta sinais de contaminação.
Observou-se ainda pouca presença de batráquios que são ótimos bioindicadores, levando-
nos a atentar pelo início de contaminação do ambiente.
Fórum Internacional do Meio Ambiente - A conferência da Terra 1184

Os tanques estão localizados em áreas vizinhas a pastagens, a aproximadamente 300


metros do setor de suinocultura. Que consta de um galpão de alvenaria com 400 m², telha de fibro-
cimento sobre estrutura de madeira e beiral, que conduz as águas de chuvas para fora.
O plantel é composto por no máximo 350 animais e os dejetos estão sendo encaminhados
para canaletas laterais abertas, que não recebem água da chuva. A limpeza das baias é feita através
de bomba de alta pressão direcionando os dejetos e efluente gerado para o sistema de coleta destes
efluentes, o empreendimento conta bebedores tipo "chupeta".
A produção de suínos desta unidade é fomentada para fins didáticos, nas aulas práticas do
setor de zootecnia (manejo, zoonoses, alimentação e abate) e para suprir a necessidade de carne do
refeitório estudantil.
O efluente dos dejetos de suínos coletados diretamente das canaletas e os dejetos humanos
coletados dos vestiários, restaurante e pavilhões de salas de aula, são conduzidos por tubo de PVC
de 150 mm, passando por caixas de passagem até uma lagoa de acumulação, que se apresenta sem
nenhuma medida de proteção quanto à contaminação de solo ou recurso hídrico.
O sistema de coleta dos efluentes funciona de forma conjunta para a coleta dos dejetos de
suínos e humanos sem qualquer critério técnico adotado. Nas lagoas (Figura 1), o efluente disposto
já ultrapassou a capacidade de acúmulo, extravasando e contaminado a microbacia onde se insere a
área de disposição, e possivelmente um córrego a aproximadamente dois quilômetros de distância
do local, podendo afetar a qualidade e disponibilidade de água para outras atividades produtivas e
de necessidades fisiológicas.

Figura 1. Vista geral do tanque de descarga.

É evidente a ausência de assistência técnica para o acompanhamento do manejo dos


dejetos produzidos no CEFET Cuiabá, o que demonstra que as ações de análise e gestão ambiental
desta atividade deverão ocorrer baseando-se em uma área de passivo ambiental maior do que a que
é visível. São dispostos nos solos dejetos que ainda não foram degradados, portanto, com total risco
ambiental.
A disposição nesta lagoa mostra outro fato, que demonstra a falta de planejamento com o
meio ambiente ao longo dos anos. Pois desde o início as lagoas deveriam ter sido dimensionadas de
acordo com a demanda de dejetos produzidos.
Com o aumento do número de alunos e do plantel de suínos sem que houvesse o aumento
na capacidade de contenção de dejetos das lagoas, ocorreu o fato diagnosticado, ou seja, os
efluentes acabaram por extravasar e contaminar as áreas marginais a ela.
Foi diagnosticado ainda que o manejo dos resíduos não faz parte da produção, sendo esta
realizada sem se importar com as ações ambientais que deveriam ocorrer em paralelo. Com isto,
apesar da presença de uma lagoa, esta não desenvolve sua função de forma integral.
Fórum Internacional do Meio Ambiente - A conferência da Terra 1185

AÇÕES PROPOSTAS
Devido às observações realizadas determinou-se a necessidade de se efetuar ações com o
sentido de destinar corretamente os efluentes gerados, para isto foi diagnosticado que a melhor
medida seria a utilização de biodigestores para os dejetos suínos e reatores anaeróbios para os
dejetos humanos. Assim, esses resíduos podem ser aproveitados como biofertilizantes para a
adubação de hortas, fruticultura, pastagens, dentre outros, além disso, essas ações irão proporcionar
saneamento ao meio ambiente e proteção à saúde pública.
A possibilidade de adoção de dois sistemas separados de tratamento, um para os efluentes
gerados na suinocultura, com a implantação de biodigestores que deverá ser construído no terreno
lateral da suinocultura, na parcela mais baixa buscando aproveitar a declividade natural da área, e
outro para os dejetos humanos, com a implantação de um reator anaeróbio de fluxo ascendente, visa
o aproveitamento máximo do produto final, com a aplicação para a agricultura, como dito
anteriormente, e ainda como oficina didática, uma vez que os alunos apenas têm a visão do manejo
de produção destes animais, não tendo contato algum com a gestão dos resíduos produzidos, o que
somente aumenta o descaso com o ambiente pela falta de formação de futuros profissionais técnicos
agropecuários.
Com o tratamento dos dejetos humanos, além da proteção do meio com a diminuição da
carga orgânica que é disposta diariamente sobre o solo, ar e recursos hídricos, ainda possibilitará
experimentos na utilização destes efluentes tratados como adubo na agricultura.

CONSIDERAÇÕES FINAIS
Devido a essas necessidades urgentes foram realizados estudos preliminares para se
determinar qual a melhor solução para o tratamento dos dejetos, determina que a ação mais indicada
seria a utilização de biodigestão anaeróbia. Esses sistemas não serão utilizados somente como
ferramenta para solucionar o problema do manejo de dejetos, mas também como ferramenta de
ensino e extensão, ou seja, na educação dos alunos dos cursos oferecidos pelo CEFET Cuiabá, mas
também aos agricultores da região e dos estudantes de outras instituições.

REFERENCIAS BIBLIOGRAFICAS
ACRISMAT, Disponível em www.acrismat.com.br/acrismat.
BRAGA, B et all. Introdução a engenharia ambiental - 2º ed. São Paulo: Pearson Prentice Hall,
2005.
CAMPOS, J.R. Tratamento de esgotos sanitários por processo anaeróbio e disposição controlada no
solo - Coletânea de Trabalhos Técnicos, 2000
GRZYBOWSKI, N. A Suinocultura e o Mecanismo de Desenvolvimento Limpo. Disponível em
http://www.acsurs.com.br/a_suinocultura_e_o_mecanismo_de_.htm
LUCAS JÚNIOR, J. Aproveitamento energético de resíduos da suinocultura. UFLA/SBEA, 1998.
MOTA, S. Preservação de recursos hídricos. 2 ed. Rio de Janeiro: ABES, 1995.
OLIVEIRA, P.A.V. Manual de manejo e utilização dos dejetos de suínos. Concórdia:
EMBRAPA/CNPSA, 1993.
PALHARES, J.C.P. Análise ambiental para criação de suínos no sul do Brasil,
EMBRAPA SUINOS E AVES
PALHARES,J.C.P, JACOB,A.D. Impacto ambiental da suinocultura nos recursos hídricos.
Disponível em www.abcs.org.br/portal/mun_sui/meio_ambiente/artigos/1.rtf
Resolução CONAMA nº 1/1986
SANTANA, A.M., OLIVEIRA R.A. Desempenho de reatores anaeróbios de fluxo ascendente com
manta de lodo em dois estágios tratando águas residuárias de suinocultura, 2005
SGANZERLA, Edílio. Biodigestores: uma solução. Porto Alegre. Agropecuária, 1983.
Fórum Internacional do Meio Ambiente - A conferência da Terra 1186

GESTÃO DE RESÍDUOS SÓLIDOS URBANOS: UMA ANÁLISE DO MUNICÍPIO DE


CAMPO VERDE - MATO GROSSO

Janáine Vieira da Silva DONINI


Professora efetiva Cefet Cuiabá, Rodovia BR 364 – Km 329, São Vicente da Serra – Sto. Antonio de Leveger –MT.
ambiental02@yahoo.com.br
Afonso Takao MURATA
Professor Doutor efetivo do Cefet Cuiabá, Rodovia BR 364 – Km 329, São Vicente da Serra – Sto. Antonio de Leveger
–MT. afonsomurata@yahoo.com.br
Josimare Vieira da SILVA
Professora Escola Estadual Antonio Ferreira Sobrinho, Av. Piracicaba, s/n – Jaciara – MT. Josi_murilo@hotmail.com

RESUMO
Buscar solução para a problemática dos resíduos sólidos urbanos, é um dos maiores
desafios da atualidade, para as administrações públicas. Com a ascensão da população urbana e a
evolução tecnológica de produtos acontecendo a cada instante, suscitando nas pessoas necessidade
de consumo cada vez maior, as dificuldades em relação à gestão dos resíduos sólidos se
multiplicaram e se diversificaram. Neste contexto, a pesquisa buscou identificar os principais
fatores que influenciam a gestão dos resíduos sólidos urbanos. A pesquisa se desenvolveu a partir
de um referencial teórico, com identificação dos fatores e análise da gestão de resíduos municipal
do estudo de caso desenvolvido no Município de Campo Verde-MT. Os dados foram obtidos
através de observação direta, visitas in loco e pesquisas documentais. O resultado da analise da
situação do município com os parâmetros apresentados na base teórica, mostrou que ainda existem
falhas no sistema. Dessa forma, foram apresentadas recomendações e sugestões visando auxiliar a
administração pública na formulação das políticas a serem aplicadas na gestão de resíduos urbanos.
A condição encontrada no município de Campo Verde pode se refletir para outros municípios que
apresentam características semelhantes, como o crescimento acelerado da urbanização causando
desequilíbrios ambientais e sociais.
Palavras Chaves: Resíduos sólidos, gestão, Campo Verde-MT.

ABSTRACT
To look for solution for the problem of the urban solid residues, it is one of the largest
challenges of the present time, for the public administrations. With the ascension of the urban
population and the technological evolution of products happening to each instant, raising in the
people consumption need every time larger, the difficulties in relation to the administration of the
solid residues multiplied and they were diversified. In this context, the research looked for to
identify the principal factors that influence the administration of the urban solid residues. The
research grew starting from a theoretical referential, with identification of the factors and analysis
of the administration of residues municipal of the case study developed in the Municipal district of
Campo Verde-MT. The data were obtained through direct observation, visits in loco and
documental researches. The result of analyzes of the municipal district situation with the parameters
presented in the theoretical base, it showed that flaws still exist in the system. In that way,
recommendations and suggestions were presented seeking auxiliary the administration publishes in
the formulation of the politics they be her applied in the administration of urban residues. The
condition found in the municipal district of Campo Verde, it can be reflected for other municipal
districts that present similar characteristics, as the accelerated growth of the urbanization causing
environmental and social unbalances.
Key words: Solid residues, administration, Campo Verde (MT).

INTRODUÇÃO
Com o advento da industrialização, ascensão da população urbana e a evolução tecnológica
de produtos acontecendo a cada instante, suscitando nas pessoas necessidade de consumo cada vez
maior, torna a questão dos resíduos sólidos, uma das problemáticas mais importantes da atualidade
e de gerações futuras.
Fórum Internacional do Meio Ambiente - A conferência da Terra 1187

Sustentabilidade ambiental que é um dos temas mais estudados na atualidade sinaliza que
se as municipalidades não trabalharem com a redução de consumo e o reaproveitamento dos
produtos, quer por reuso ou reciclagem, o lixo se tornará um caos em pouquíssimo tempo, pois a
disponibilidade de áreas está cada vez mais escassa, quer pelo uso e ocupação do solo, com o
incremento populacional a cada dia, ou com as exigências ambientais, que também são bastante
criteriosas.
A gestão de resíduos sólidos urbanos visa minimizar os impactos ambientais e sociais por
eles gerados, a sistematização do processo, o conhecimento dos fatores que influenciam na
execução dos serviços prestados, as características e composição dos resíduos, os estudos técnicos
para a disposição correta e tratamento adequado, o conhecimento da população, o trabalho de
educação ambiental, formação técnica da equipe, são partes do processo, que entre outros, devem
estar ligados continuamente e sistematicamente para apresentar solução viável e sustentável ao
município.
Este trabalho teve por objetivo obter dados para o diagnóstico da gestão de resíduos sólidos
urbanos do município de campo verde - mato grosso e apresentar alternativas de contribuição
a administração pública.

REVISÃO DE LITERATURA
Resíduos sólidos são definidos pela NBR 10004/87 como “resíduos nos estados sólidos ou
semi-sólidos ou que resultam da atividade da comunidade, de origem industrial, doméstica,
agrícola, de serviços e de varrição”.
Segundo James (1997), são várias as formas possíveis de classificar o lixo, considerando o
local de origem, as fontes geradoras e as características e hábitos de consumo da sociedade
brasileira, como exemplo: por sua natureza física: seco e molhado; por sua composição química:
matéria orgânica e matéria inorgânica; pelos riscos potenciais ao meio ambiente: perigosos, não
inertes e inertes.
A norma NBR 10.004, além de classificar os resíduos, preencheu uma lacuna existente
quanto à periculosidade dos resíduos, vinculados à referida norma procedimentos que permitam a
identificação com relação aos riscos potenciais para a saúde e o meio ambiente. (Bidone e Povinelli,
1999).
O conhecimento antecipado das características dos resíduos sólidos é fundamental para a
escolha do sistema de coleta, tratamento e destinação final dos mesmos, dando ainda abertura para
possíveis modificações futuras no sistema.
Segundo Dias (2000) a geração de resíduos sólidos é proporcional ao aumento da
população e desproporcional à disponibilidade de soluções para o gerenciamento dos detritos,
resultando em sérias defasagens na prestação de serviços, tais como a diminuição gradativa da
qualidade do atendimento, a redução do percentual da malha urbana atendida pelo serviço de coleta
e o seu abandono em locais inadequados. Equacionar o desequilíbrio entre o incremento de resíduos
e as escassas possibilidades de dispô-lo corretamente, sem agredir o meio ambiente é o grande
desafio que se impõe segundo o mesmo autor.
De maneira geral, a maioria dos municípios realiza os serviços de limpeza urbana, coleta
de resíduos sólidos e remoção de entulhos. As diferenças maiores surgem quando são considerados
os resultados da coleta seletiva e reciclagem. Um número reduzido de municípios brasileiros (451
municípios) possui sistema de coleta seletiva. A coleta seletiva e a reciclagem são inexpressivo nas
regiões Norte, Nordeste e Centro Oeste. Abrelpe (2003)
As formas de disposição mais conhecidas e utilizadas pela afirmação de D`Almeida (2000)
dos resíduos sólidos urbanos são: Lixões; Aterro Controlado; Aterro Sanitário.
A coleta seletiva de lixo é um sistema de recolhimento de materiais recicláveis, tais como
papéis, plásticos, vidros, metais e “orgânicos”, previamente separados na fonte geradora. Estes
materiais são sempre vendidos às indústrias recicladoras ou aos sucateiros (CEMPRE, 1999 in
D´Almeida, 2000). Para Calderoni (1998), este sistema facilita a reciclagem, porque os materiais
estarão mais limpos, e conseqüentemente, com maior potencial de reaproveitamento.
Fórum Internacional do Meio Ambiente - A conferência da Terra 1188

Segundo Pereira (1999) os impactos gerados pela falta de manejo de lixo urbano são
bastante variados e envolvem aspectos sanitários, ambientais, econômicos e sociais.
A política de gestão de resíduos sólidos inclui a coleta, tratamento e a disposição adequada
de todos os subprodutos e produtos finais do sistema econômico, tanto no que se refere ao lixo
convencional como ao lixo tóxico. (Silva et al, 2003)
Como a gestão de resíduos é uma atividade essencialmente municipal e as atividades que a
compõe se restringem ao território do Município, não são muito comuns no Brasil as soluções
consorciadas, a não ser quando se trata de destinação final em aterros, Municípios com áreas mais
adequadas para a instalação dessas unidades operacionais às vezes se consorciam com cidades
vizinhas para receber os seus resíduos, negociando algumas vantagens por serem os hospedeiros,
tais como isenção do custo de vazamento ou alguma compensação urbanística, custeada pelos
outros consorciados.(Monteiro et al, 2001)
De acordo com D`Almeida (2000), apesar da competência outorgada, os municípios tem
permanecido mais no âmbito da execução da legislação em vigor e não no de criar leis sobre o
assunto. Diante desse fato, a responsabilidade do município em relação aos resíduos sólidos é a de
organizar os serviços de limpeza de vias e locais públicos, coletar e destinar os resíduos
domiciliares e outros resíduos, conforme estabelecido na Lei Orgânica do município, que também
determinará a forma de gestão, se direta, indireta, centralizada ou descentralizada.
Um dos principais aspectos tratados acerca dos impactos ao meio ambiente é a questão de
minimização de consumo, visto que o fator inesgotabilidade do lixo e o crescente aumento da
população, já fazem notar que a coleta seletiva é imprescindível, porém não é a única saída para o
equilíbrio entre geração e destinação final adequada. A minimização apresenta-se também como
forma de redução de custos do processo de limpeza urbana e proteção ao meio ambiente.
Atualmente falar em resíduos sólidos domiciliares, nos reporta à Coleta Seletiva e à
política dos 3 Rs: reduzir o consumo, reaproveitar e reciclar. Mas a ênfase dos programas de coleta
seletiva está no reaproveitar e reciclar e não no reduzir o consumo, que é o principal problema. Para
que estas relações sejam viáveis, é necessário que haja uma Educação integrada no processo de
Gestão Ambiental que: “proporcione as condições necessárias para a produção e aquisição de
conhecimentos e habilidades, e, que desenvolva atitudes, visando a participação individual e
coletiva na gestão do uso de recursos ambientais e na concepção e aplicação das decisões que
afetam a qualidade dos meios físico-natural e sociocultural” (Quintas, 2000 in Zaneti).
O gerenciamento se dá pela elaboração e aplicação de plano de trabalho específico para
todas as etapas do serviço, desde a limpeza urbana, coleta, transporte, tratamento e
destinação final adequado, conforme a realidade vivida em cada município.

METODOLOGIA DA PESQUISA DE CAMPO


O presente trabalho foi desenvolvido no município de Campo Verde – MT, a partir da
análise da gestão de resíduos sólidos urbanos, efetuada pela Secretaria Municipal de Viação e
Obras, da Prefeitura Municipal de Campo Verde – MT.

Instrumentos de coleta e análise de dados


Na pesquisa foram utilizados procedimentos de observação, com visitas aos locais de
interesse, como os vazadouros, área de disposição final dos resíduos urbanos, a fim de verificar in
loco a realidade da gestão de resíduos sólidos urbanos. Adotou-se também pesquisa documental em
fontes secundárias, como IBGE, Secretaria Municipal de Saúde, entre outras fontes. Foi efetuada
pesquisa de dados, na Secretaria de Viação e Obras, com o intuito de obter informações sobre o
trabalho desempenhado pela mesma, e ainda realizando estudo de quantificação e
composição física dos resíduos gerados no município.

Estudo de Caso
A pesquisa foi baseada em um estudo de caso realizado no município de Campo Verde –
MT. O município tem grande expressão econômica e política no Estado, sendo a 9º economia de
Fórum Internacional do Meio Ambiente - A conferência da Terra 1189

Mato Grosso, com expansão urbana acelerada, Campo Verde proporcionalmente, é um grande
gerador de resíduos, pelas características da cidade.

RESULTADOS E DISCUSSÃO
Após intensa pesquisa e coleta de dados foram obtidos os seguintes resultados: Elaborou-se
um histórico do Município de Campo Verde sobre a Gestão de Resíduos Sólidos, onde se observou
que as primeiras famílias campoverdenses começaram a habitar o município ainda na década de
Setenta, porém apenas na segunda metade da década de oitenta é que o aglomerado urbano
começou a se intensificar, e com ele, a necessidade de infra-estrutura básica, como energia elétrica,
abastecimento de água potável, educação.
De acordo com o incentivo político foi sendo suprido, com a evolução do município.
Também evoluiu a geração de resíduos urbanos, que neste primeiro período, tinham sua geração e
destinação final na fonte, ou seja, os resíduos eram enterrados, queimados ou mesmo dispostos em
outros locais pelos próprios moradores e comerciantes locais.
No inicio da década de noventa, mais precisamente em 1990, com a emancipação política
de Campo Verde, teve início o serviço de coleta de resíduos sólidos no município, conforme
informações da Secretaria de Viação e Obras, sendo que inicialmente utilizava-se somente
caminhão caçamba para o serviço.
No ano de 1994, com a Lei Complementar 001/94, que cria o Código Administrativo do
Município de Campo Verde, é que se estabeleceu a organização e Responsabilidade da Prefeitura
em relação aos resíduos sólidos urbanos que, conforme Art. 30, Capitulo II da referida Lei
estabelece que o lixo das habitações será recolhido pelo serviço de limpeza pública ou por
concessão.
Atualmente, parte da organização dos resíduos sólidos urbanos é realizada pela secretaria
de Viação e Obras e parte pela Secretaria de Habitação e Urbanismo, sendo que a primeira é
responsável pela coleta e destinação final dos mesmos, e a segunda pela varrição e ajardinamento de
logradouros públicos. Desde o início da implantação dos serviços de coleta de resíduos no
município, este sempre foi efetuado pelo poder público, sendo que os únicos que foram
terceirizados foram os de varrição e conservação de logradouros públicos, como ajardinamento.
Após o serviço de coleta, a disposição final dos resíduos sólidos ainda é em um lixão a céu
aberto, a área já está com sua capacidade suporte esgotada, sendo que por um pequeno período o
resíduo foi disposto em outra área, em uma das entradas da cidade, sendo que este sofreu um
processo de remediação, para que a mesma voltasse a ser pasto, como originalmente.
A prefeitura efetua o serviço de coleta convencional, com dois caminhões compactadores
com capacidade de 6 toneladas, em bom estado de conservação, estando um com treze anos, e o
outro com 4 anos de uso, as equipes trabalham em dois turnos, matutino e vespertino, com equipe
treinada, uniformizada e com uso de EPI (equipamento de proteção individual). Em relação aos
serviços de coleta, não existem indícios de reclamações, visto que o serviço atende toda a cidade e
distrito industrial.
Foi implantado em 2005 o Programa de Coleta Seletiva, que é realizado pela cooperativa
de trabalhadores de materiais recicláveis. A Coleta Seletiva vem aumentado gradativamente seus
serviços no município, sendo que o serviço foi oferecido inicialmente com a passagem de um
caminhão caçamba semanalmente nas rotas pré-estabelecidas, e atualmente o serviço é realizado
por equipes setorizadas utilizando carrinhos manuais, nas mesmas rotas iniciais.
Para a coleta convencional, a cidade foi dividida em quatro regiões, sendo que no período
matutino, é realizada a coleta nas vias principais de comércio, e mais duas regiões e no período
vespertinos as outras duas. Semanalmente utiliza-se da troca de rotas pelas equipes. Não existe
estação de transbordo no município, indo os resíduos, direto para o lixão.
Os valores gastos com o serviço de coleta e limpeza pública (2005), são, segundo
informações das secretarias de Viação e Obras e Habitação e Urbanismo, as seguintes: R$ 65,00 a
tonelada para a coleta de resíduos domiciliares e comerciais, não há cobrança para prestação de
serviço especial para coleta de resíduos industriais e de saúde, porém esta é realizada; R$ 58,00 por
Fórum Internacional do Meio Ambiente - A conferência da Terra 1190

tonelada/dia com o serviço de varrição e jardinagem; ainda não existe um custo efetivo para a
destinação final dos resíduos, visto que os mesmos são dispostos a céu aberto.
Para efeito de cobrir os custos com o serviço de limpeza urbana, o município cobra no
IPTU uma taxa referente à limpeza urbana, conforme Código Tributário, com o valor de R$ 24,00 e
R$ 36,00, proporcional ao tamanho e localização do lote, podendo o mesmo ser parcelado
juntamente com o IPTU.

Tabela 1 – Valores correspondente à arrecadação e despesas com resíduos sólidos


Ano Receitas Despesas Coleta Despesas Dest. Final Variações
2005 240.000,00 *306.240,00 - - 66,240,00
2006 264.000,00 *336.864,00 *30.000,00 - 102.864,00
Notas: * valores aproximados. Fonte: Secretarias de Administração e Finanças.

Pela Tabela 1 pode-se observar os valores previstos a serem arrecadados com a taxa de
Limpeza Urbana e as despesas de coleta e limpeza das vias e logradouros púbicos para o ano de
2006 (valores correspondentes de 2005).
Nota-se que o valor das despesas com os serviços de coleta, que já tinha uma significativa
discrepância entre receita e despesa no ano anterior, aumentará ainda mais no ano de 2006 após a
implantação do Aterro Sanitário para a disposição correta dos resíduos gerados no município.
Entretanto, fica claro que haverá uma melhoria na qualidade dos serviços oferecidos e na qualidade
de vida da população.
É perceptível que o município caminha para a diminuição dos problemas relativos aos
resíduos sólidos, pois já em caráter de Gestão, está sendo efetuado simultaneamente, o serviço de
coleta seletiva, o serviço de coleta convencional, o projeto para a implantação do aterro sanitário
municipal; trabalho de educação ambiental, nas escolas inicialmente, e todos os estudos
quantitativos e qualitativos do lixo. Neste aspecto, na subseção seguinte, será feita uma análise
comparativa dos processos de gestão propostos com a situação encontrada no município, referente
às etapas de geração de resíduos, coleta, tratamento e disposição final de resíduos sólidos.
Análise comparativa de proposta de gestão de resíduos sólidos, com a situação encontrada
no município de Campo Verde - MT.
A partir dos dados obtidos a campo, observações, pesquisas de documentos, foi efetuada
uma análise comparativa, tendo como parâmetros a diminuição de resíduos, a coleta, a valorização
dos mesmos, o tratamento e destinação final, a fim de se conseguir um cenário geral do município
frente à Gestão de Resíduos Sólidos Urbanos.
Em relação à geração de resíduos urbanos, observou-se nunca existiu um trabalho
organizado de registros para a construção de uma série histórica de geração de resíduos no
município o que dificulta a análise evolutiva da geração per capita, também não são conhecidas as
características físico químicas dos resíduos, uma vez que somente agora é que se iniciou um estudo
para determinação dos mesmos, por parte da administração municipal.
De acordo com estudo quantitativo realizado no mês de Fevereiro de 2006, observou-se
que a média diária de coleta foi de 16 ton/dia. A taxa de geração de resíduos per capta da população
urbana obtida baseado nos dados levantados, é de 0,84 kg/hab/dia, situando-se acima da média
brasileira, que é de 0,73 kg/hab/dia, de acordo com o IBGE.
Quanto ao estímulo em se evitar o desperdício, visando a preservação de recursos naturais
e o aumento da vida útil do futuro Aterro Sanitário, já se constata a veiculação vídeos e áudios
institucionais nos canais de comunicação, panfletos e campanhas pontuais e continuadas de
educação ambiental, sensibilizando a população quanto à segregação na fonte, acondicionamento
adequado dos materiais, utilização de vasilhames/objetos retornáveis.

Coleta e Valorização dos Resíduos Sólidos


A coleta de resíduos sólidos domiciliares, comerciais e de varrição é feita de forma
convencional, porém, já existe, por parte da população a segregação de resíduos na fonte, sendo este
Fórum Internacional do Meio Ambiente - A conferência da Terra 1191

resíduo coletado pela cooperativa e levado para o pátio de triagem, para a separação por tipo,
prensagem e comercialização.
Embora exista a cooperativa de trabalhadores de materiais recicláveis organizados, com o
perfil conhecido pela prefeitura, que apóia suas ações de coleta seletiva dentro do município, ainda
é bastante comum ver catadores sozinhos ou em grupos pequenos, a realizar coleta, em festas
grandes ou locais propícios a um montante grande de materiais recicláveis.
Outro fato de bastante relevância no município na questão relativa à coleta seletiva e ao
trabalho de educação ambiental é de que as secretarias estão bem entrosadas para uma ação
conjunta que no início da campanha em 2005, notou-se um processo de evolução interna para que
as ações tenham maior abrangência. Também se tem mostrado em destaque, a questão da limpeza
prévia das embalagens vazias de produtos, visto que, se a embalagem estiver limpa, no momento da
comercialização este produto tem um maior valor agregado, pois o processo de limpeza posterior
terá seu custo minimizado.
Em Campo Verde, os resíduos sólidos urbanos, somente são coletados e destinados ao
lixão. Contudo, há o Programa de Coleta seletiva para a recuperação de materiais recicláveis
segregados na fonte, e o projeto da implantação do aterro sanitário, que segundo informações da
Prefeitura Municipal, visa o trabalho em três pontas; a recuperação de materiais recicláveis não
segregados na fonte, com uma linha de triagem em barracão dentro do aterro, a realização de
compostagem com os resíduos orgânicos, visando mais uma fonte de renda para os cooperados
através da comercialização do composto produzido e diminuição de custos com adubo da prefeitura,
e por último o aumento da vida útil do aterro, encaminhando para as células somente o rejeito, que é
o material que não pode ser reciclado.
A quantidade de resíduos recuperados através da coleta seletiva não foi obtida.
Segundo informações da Secretaria de Saúde e Saneamento, frente a realidade de
disposição a céu aberto, a Prefeitura de Campo Verde, pleiteou junto a Fundação Nacional de Saúde
em 2005, recursos para a implantação do Aterro Sanitário Municipal, visando oferecer um serviço
de qualidade a população e atender às normas vigentes acerca da questão de resíduos sólidos.
O projeto do aterro sanitário e recuperação da área degradada, esta orçada em meio milhão
de reais, como dito anteriormente, pleiteados junto à FUNASA. A prefeitura em parceria com
técnicos ambientais da SEMA (Secretaria do Meio Ambiente), já identificaram uma área de 10 ha,
para a construção do aterro dentro das normas vigentes. Conforme informações obtidas, já estão
sendo realizados os levantamentos necessários para a construção do mesmo.

DISCUSSÃO
Após analisar e comparar a situação em que se encontra a gestão de resíduos sólidos
urbanos no município com parâmetros ambientalmente corretos, percebeu-se que há ainda algumas
divergências. Um dos objetivos deste trabalho é apresentar alternativas de contribuição, auxiliando
à administração pública na promoção de uma gestão ambientalmente correta.
Recomenda-se ao município, realizar um estudo quantitativo e qualitativo dos resíduos
sólidos gerados no município, assim como verificar se há registros efetuados nas administrações
passadas, a fim de se criar uma série histórica, acompanhado desta forma a evolução na geração de
resíduos, identificar ocorrência de sazonalidade, e ainda verificar o perfil sócio econômico de
consumo, mediante o conhecimento do tipo de resíduos gerado. Além de que, o conhecimento
prévio da quantidade e características dos resíduos, favorecerá no desenvolvimento de planejamento
e ações adequadas, para definições de metodologias de trabalho, ainda revisão nos instrumentos
jurídicos municipais, relativos a Resíduos sólidos e estudo para novos parâmetros de cobrança da
taxa de coleta de lixo.
O envolvimento das diversas secretarias municipal na gestão dos resíduos sólidos, em
equipe multidisciplinar, visando sanar problemas das diversas áreas, como exclusão social, limpeza
de terrenos, transmissão de doenças, geração de emprego e renda, questões ambientais.
O município é o principal articulador da gestão de resíduos, também principal responsável
pelo planejamento e implementação das ações e soluções técnicas adequadas à sua realidade.
Fórum Internacional do Meio Ambiente - A conferência da Terra 1192

As recomendações aqui apresentadas visam preencher alguns espaços encontrados entre a


teoria e a realidade do município, sem a intenção e resolver todos os problemas. Espera-se estar
contribuindo para a melhoria da qualidade de vida da população, como também ajudar a
promover os ajustes necessários ao bom andamento do processo.

CONSIDERAÇÕES FINAIS
Face ao acelerado processo de urbanização por que vem passando as cidades brasileiras,
principalmente nas ultimas décadas, traz a tona alguns problemas de grande relevância dentro de
uma administração, como é o caso da problemática dos resíduos sólidos urbanos e ausência de
infra-estrutura, para a resolução de tais problemas.
Ao se estudar gestão de resíduos sólidos, percebeu-se que para que realmente haja um
caminho para uma solução realmente sustentável, o caminho é a interação dos diversos atores
envolvidos direta ou indiretamente no processo, pois há que ver os fatores sociais, de exclusão e
inclusão social, fatores ambientais, fatores econômicos, buscando a sustentabilidade do sistema, e
também a revisão dos instrumentos jurídicos acerca do assunto.
À administração pública cabe oferecer e executar com qualidade o serviço, porém os
resultados efetivos de qualquer ação proposta somente terão resultados significativos, quando da
adesão e participação da população, pois, mais que ter um serviço de qualidade, deve a população
rever seus hábitos e costumes, no sentido de adaptar-se aos novos modelos de Gestão, primando
pelas necessidades ambientais e sociais que surgem a todo o momento.
Este trabalho foi desenvolvido a partir da identificação dos principais fatores que
influenciam na gestão de resíduos sólidos urbanos, desta forma, espera-se que este trabalho tenha
contribuído como subsidio para a administração pública, na implantação da gestão de resíduos
sólidos urbanos no município.
As principais dificuldades encontradas na pesquisa realizada, no estudo de caso, referiu-se
principalmente ao levantamento de dados, visto que no município não existe um sistema de registro
de informações sobre as ações realizadas por administrações anteriores.
Foi constatado, que a gestão de resíduos sólidos do município já trabalha em várias etapas
do processo, sendo a coleta e destinação final com maior ênfase e a para redução na geração,
segregação na fonte, trabalha-se a sensibilização, com campanhas de educação ambiental e
veiculação de vídeos e áudios institucionais produzidos pela prefeitura e ainda, para completar o
processo a implantação do aterro sanitário municipal.
O resultado da análise da situação da gestão dos resíduos sólidos urbanos no município
mostrou que ainda há muitos ajustes a serem feitos, porém é claro o interesse do município para
chegar a um modelo ideal de gestão, visto que foi observado o início de trabalhos técnicos e da
sistematização das informações referentes aos serviços prestados.

Conclusões e recomendações do estudo de caso


O tema gestão de resíduos sólidos é muito amplo, portanto, ainda há muito que se estudar.
Para que se possa intervir de maneira mais efetiva na gestão de resíduos sólidos, apresentam-se
algumas sugestões para pesquisas futuras, pois este estudo é apenas uma pequena parcela de
contribuição, diante da problemática de resíduos sólidos, em grandes centros ou pequenas
comunidades.
Investigar e analisar as características sociais dos geradores para determinar quais níveis de
redução na geração de resíduos podem ser alcançados.
Buscar ferramentas gerenciais para a problemática dos resíduos sólidos, como o
planejamento estratégico, que faz um cruzamento entre o potencial organizacional e os recursos
disponíveis para se atingir os objetivos; buscar exemplos com desempenhos superiores,
visando a melhora de seu desempenho, adaptando a sua realidade.

REFERÊNCIAS BIBLIOGRÁFICAS
Fórum Internacional do Meio Ambiente - A conferência da Terra 1193

ABRELPE- Associação Brasileira de empresas de Limpeza Pública e Resíduos especiais, Panorama


dos Resíduos Sólidos no Brasil, 2003
ASSOCIAÇÃO BRASILEIRA DAS NORMAS TÉCNICAS – ABNT.1987. Resíduos Sólidos –
Classificação; . NBR 10004. São Paulo.
AZAMBUJA, E. A. K. de. Proposta de Gestão de Resíduos Sólidos Urbanos – Análise do Caso de
Palhoça/SC. Florianópolis: Universidade Federal de Santa Catarina, 2002.
BIDONE, F. R. A.; POVINELLI, J. Conceitos Básicos de Resíduos Sólidos. São Paulo:
EESC/USP, 1999.
CALDERONI, S.. Os bilhões perdidos no lixo. 2.ed. São Paulo: Humanistas, 1998.
CHIAVENATO, I. Teoria Geral da Administração. 6. ed. Rio de Janeiro: Campus, 2001.
CÓDIGO ADMINISTRATIVO DE CAMPO VERDE – Lei Complementar n°001/90 de 16 de
Dezembro de 1994.
D`ALMEIDA, M. L.; VILHENA, A.. Lixo Municipal: Manual de Gerenciamento Integrado. 2.ed.
São Paulo: IPT/CEMPRE, 2000.
DIAS, G. F. Educação Ambiental: Princípios e Práticas, São Paulo, Editora Gaia, 6. ed. Revisada e
Ampliada, 2000.
JAMES, B.. Lixo e Reciclagem. São Paulo, Scipione, 1997.
MONTEIRO, J. H. P., et al. Manual de Gerenciamento Integrado de Resíduos sólidos. Rio de
Janeiro: IBAM, 2001.
ZANETTI, I.C.B.; BACELLAR; SÁ, L. MOURÃO Educação Ambiental como instrumento de
mudança para concepção de gestão dos resíduos sólidos domiciliares e na preservação do meio
ambiente.
Fórum Internacional do Meio Ambiente - A conferência da Terra 1194

OS AGROTÓXICOS NO COTIDIANO DA COMUNIDADE DE BASE FÍSICA,


IPANGUAÇU-RN

Erineide da Costa e SILVA


erineide@cefetrn.br
Professora de Geografia do Centro Federal de Educação Tecnológica do RN - UNED - Ipanguaçu.

RESUMO
A agricultura desenvolvida em nosso país ainda tem uma forte dependência da utilização
de agrotóxicos. Essa realidade é vivenciada tanto na produção em grande escala, como pelos
pequenos produtores rurais, em diferentes áreas do nosso território. A comunidade de “Base Física”,
Ipanguaçu, RN, retrata bem esse quadro. Pesquisa realizada durante os meses de novembro e
dezembro de 2007, através da aplicação questionário, em que se procurou averiguar a incidência do
uso do agrotóxico pelos agricultores locais, mostrou que 92% faz o seu uso em seus plantios. O
preocupante é que nem todos seguem as normas de segurança e cuidados recomendados quanto ao
preparo, aplicação e descarte das embalagens. Os problemas ambientais decorrentes dessa prática
são poucos conhecidos pela comunidade, tendo em vista ausência de estudos que os comprovem e
restrições educacionais. A preocupação principal quanto ao uso de agrotóxicos dar-se pela falta de
conhecimento da maneira correta de como manuseá-los, o que implicaria a não minimização dos
impactos que esses produtos podem causar ao meio ambiente e a saúde pública.
Palavras-chaves: agricultura; agrotóxicos; impactos; meio ambiente.

ABSTRACT
Farming developed in our country still has a strong dependence on the use of pesticides.
This reality is experienced both in production on a large scale, such as by small farmers in different
areas of our territory. The community of "Base Física," Ipanguaçu, RN, and portrays this
framework. Research conducted during the months of November and December 2007, by the
application questionnaire, which sought to ascertain the incidence of the use of pesticides by local
farmers, showed that 92% is its use in its plantations. The concern is that not all follow the safety
standards and recommended care about the preparation, application and disposal of packaging.
Environmental problems arising from such practice are few known by the community in order
absence of studies showing that the educational and restrictions. The main concern about the use of
pesticides make up for the lack of an accurate knowledge of how to handle them, which would
imply not minimizing the impact that these products may cause to the environment and public
health.
Keywords: agriculture; pesticides; impacts; environment.

INTRODUÇÃO
O presente artigo tece algumas reflexões sobre o uso dos agrotóxicos na comunidade “Base
Física” pertencente ao Município de Ipanguaçu-RN, a partir de dados coletados em pesquisa
exploratória, realizada com intuito investigar a incidência do uso destes pelo pequenos produtores
locais.
O interesse pela temática surgiu durantes as aulas de Geografia, ao estudar o tema espaço
rural, no curso de Agroecologia, modalidade Educação de Jovens e Adultos – EJA. Tratar-se de
uma investigação didática, realizada em curto período pelos alunos, por essa razão observa-se a
necessidade de avançar em alguns aspectos relevantes, que não foram contemplados nesse
momento.
Discutir sobre a relação sociedade-natureza, convém lembrar que ao longo da história, esta
desencadeou uma série de problemas, resultando em uma crise que é, ao mesmo tempo, ambiental,
ecológica, social, econômica, cultural e política. Essa crise implica a destruição dos recursos
naturais e, conseqüentemente, a saturação da capacidade de recuperação do meio natural e afeta a
Fórum Internacional do Meio Ambiente - A conferência da Terra 1195

qualidade de vida dos seres vivos, tendo em vista a capacidade limitada do planeta para auto-
sustentar-se e absorver os rejeitos resultantes dessa relação insustentável.
Para Junges (2004) essa crise não significa apenas o surgimento de problemas ambientais,
mas a necessidade de novas formas de enxergar o mundo e, especialmente, a natureza. Trata-se da
passagem de um reducionismo científico-metodológico que fragmenta a natureza para conhecê-la a
uma cultura sistêmica que compreende as inter-relações presentes no ambiente.
Quanto à prática da agricultura, à medida que o mundo foi se tornando cada vez mais
tecnológico, essa prática foi deixando de lado o olhar natural em relação ao seu cultivo e buscando
outros mecanismos que pudessem oferecer respostas mais rápidas e rentáveis para a produção,
deixando de ser de subsistência para tornar-se comercial.
Diante da busca incessante pelo lucro, o homem passou a modificar cada vez mais
natureza, sem se preocupar com os desequilíbrios que sua ação pudesse provocar. Na prática da
agricultura, não bastava apenas mecanismos de armazenar e conservar os alimentos. Seria
necessário ir além, daí a descoberta dos inseticidas para combater pragas e fertilizantes ou adubos
químicos para aumentar a produção. No entanto, a preocupação com desequilíbrios provocados por
tais ações não caminharam com a mesma intensidade.
Em nosso país, a realidade da agricultura que se pratica, ainda tem uma forte dependência
da utilização de agrotóxicos, cuja finalidade é controlar pragas, doenças e plantas daninhas, garantir
patamares mais elevados de produtividade e, conseqüentemente, maior retorno econômico da
produção. Por outro lado, os agrotóxicos, apresentam em comum, efeitos danosos, por alterar ciclos
biológicos, destruírem o equilíbrio da natureza e agirem como tóxicos altamente perigosos ao
homem e aos diversos organismos não-alvos da ação (BRANCO, 1990).

Situando a comunidade investigada


“Base Física” localiza-se no Município de Ipanguaçu-RN, Microrregião do Vale do Açu.
Distante aproximadamente 3 quilômetros do centro urbano, surgiu em 1921, como unidade
pertencente ao Governo Federal, sob cuidados do Ministério da Agricultura, como campo
experimental de sementes. Em 1940 foram construídas as primeiras residências, dez casas, por
esse Ministério, para os seus trabalhadores. Após alguns anos, essa unidade passou para a
administração do Departamento Nacional de Obras Conta a Seca - DNOCS.
Esse espaço sempre teve o objetivo voltado ao desenvolvimento de atividades agrícolas,
como a escola de tratorista e em seguida um Posto de Sementes, sob responsabilidade do Governo
do Estado do RN. Recentemente essa área, com 132 hectares, foi doada para O Centro Federal de
Educação Tecnológica do RN para o funcionamento da Unidade de Ensino Descentralizada de
Ipanguaçu-RN. Esta iniciou suas atividades em 28 de junho de 2006, com dois cursos técnicos:
Agroecologia e Informática. Hoje, a denominação “Base Física” excede a área da Escola, cujo
entorno está ocupado por 132 residências e 261 habitantes, conforme dados coletados por Agente de
Saúde.
O nome de origem dessa comunidade era Malhada de Areia, mas em virtude da presença
do referido campo experimental de sementes, seu nome passou por várias modificações, como
Campos de Sementes, Posto Agropecuário e, por último, “Base Física” – Base de Seleção de
Semente.
Como configuração espacial, essa comunidade possui como paisagem predominante as
plantações de bananas e as mangueiras pertencentes, principalmente, às grandes empresas voltadas
para o agronegócio da fruticultura irrigada. A presença dessa empresas no Vale do Açu deu-se a
partir da década de 80 com a construção da Barragem Armando Ribeiro Coutinho.
Mesmo assim, os dados da pesquisa mostram que sua população tem como atividade
econômica principal a agricultura de subsistência e, nenhum dos sujeitos entrevistados informou
trabalhar nessas referidas empresas. A maioria deles (56%) tem acesso à terra em forma de
parcerias e/ou são arrendatários e os principais produtos por eles cultivados são: manga, banana,
feijão, milho, melancia, tomate e outros.
Fórum Internacional do Meio Ambiente - A conferência da Terra 1196

O convívio com o perigo


Pesquisa realizada durante os meses de novembro e dezembro de 2007, através da
aplicação e questionários, objetivando averiguar a incidência do uso de agrotóxicos pelos pequenos
produtores locais, mostrou que 92% destes os utilizam em seus plantios, conforme registro na tabela
01. Esta apresenta resumidamente os resultados de alguns pontos questionados na pesquisa.

Tabela 01: A presença de agrotóxicos na comunidade de Base Física


Questionamentos Sim Não Não respondeu
(%) (%) (%)
Utilizam agrotóxicos nos seus plantios? 92 8 -
Você acha que o uso do agrotóxico é benéfico aos consumidores? 85 15 -
Costuma usar EPI no momento em que prepara a calda? 69 31 -
Costuma usar EPI no momento em que aplica a calda? 72 28 -
Respeita o período de carência para realizar a colheita? 72 28 -
Aplica a dosagem correta? 100 - -
O produto que ele utiliza é o recomendado para a praga que deseja 100 - -
combater?
Costuma ler o rótulo das embalagens dos agrotóxicos? 82 18 -
Você sabe o que significa classe toxicológica? 72 28 -
Em sua opinião, a aplicação (aérea) de agrotóxicos é mais prejudicial 87 8 5
que a manual.
Você tem consciência do mal que o uso dos agrotóxicos pode causar 100 - -
ao ambiente e a nossa saúde?
Você sabe que o uso dos agrotóxicos pode comprometer a fertilidade 97 3 -
do solo?
Fonte: Pesquisa realizada in loco, por alunos do 2° ano EJA, curso de Agroecologia. Dez. 2007

Observa-se que todos entrevistados (100%) afirmaram utilizar o produto recomendado para
a praga que desejam combater e aplicam a dosagem correta. Porém, 18% informou que não
costuma ler o rótulo das embalagens e 22% não sabe o significado da classe toxicológica. Esta tem
como finalidade situar o produto analisado conforme o grau de toxidade.
Outro ponto agravante é que apenas 69% costuma usar equipamentos de proteção
individual - EPIs no momento em que prepara a calda e 72% no ato de sua aplicação. Também
merece preocupação o fato que nem todos (8%) respeitam o período de carência para realizar a
colheita, isto é, o intervalo correspondente ao número de dias que devem transcorrer entre a última
aplicação do produto e colheita da cultura, para assegurar a degradação adequada do veneno, a
ponto de garantir um consumo sem risco direto à saúde.
Bull e Hathaway (1982) ao discutirem esse problema, destacaram a raridade de registro de
intoxicação por resíduos de agrotóxicos na comida, mesmo quando não se respeita o período de
carência. Porém, citaram o caso de um funcionário da Ceasa, Teresópolis-RJ, que retirou um tomate
de uma das caixas destinadas ao Rio Janeiro e o comeu sem lavar, apenas limpando-o na calça. Em
poucos minutos esse funcionário começou a sentir os sintomas de intoxicação: náuseas, vômitos,
desarranjo intestinal e febre. Ao ser levado inconsciente para o Hospital das Clínicas de
Teresópolis, a causa da doença foi logo identificada como intoxicação e após vários dias de
tratamento, foi posto fora de perigo.
Para esses autores, a raridade de registros como esse se deve, em certa medida, à
dificuldade de identificar casos dessa natureza. Provavelmente, o tomate que envenenou o referido
funcionário no domingo, tinha sido pulverizado na sexta-feira e colhido junto a milhares de outros,
no sábado e, sem dúvida, logo chegou a uma feira livre, supermercado ou quitanda no dia seguinte
e, adornou saladas de muitos cariocas a partir do almoço da segunda-feira.
Também é pouco provável que alguém tenha morrido nessa história, porém, o mais difícil
seria investigar a causa da doença e relacioná-la ao “inofensivo” tomate. Até por que os agrotóxicos
Fórum Internacional do Meio Ambiente - A conferência da Terra 1197

fosforados se degradam rapidamente e os tomates letais no domingo, provaria apenas febre e


diarréia na segunda-feira, a não ser entre algumas pessoas muito sensíveis; enquanto que na terça-
feira os sintomas provocados poderiam não passar de um leve mal-estar ou dor de cabeça.
Essa discussão colocada por Bull e Hathaway (1982) foi identificada na fala do médico que
atende à comunidade de “Base Física”, através do Programa Saúde da Família – PSF, há três anos.
Segundo ele, até o momento, não conseguiu identificar nenhuma causa a intoxicação por agrotóxico
nessa comunidade. Em opinião, esse problema é vivenciado por trabalhadores que mantém contato
com a pulverização e estes, ao se intoxicarem, não procuram atendimento médico e no outro dia, já
estão de volta ao trabalho.
O jornalista Wilson da Costa Bueno, em artigo intitulado “Os agrotóxicos invadem a mesa
do brasileiro” chamou atenção para pesquisa realizada pelo Programa de Análise de Resíduos de
Agrotóxicos em Alimentos - PARA, da ANVISA, cuja descoberta, após analisar amostras de frutas
e verduras nos estados de São Paulo, Minas Gerais, Paraná e Pernambuco, foi que 81,2% delas
(1.051 de um total de 1.278 amostras coletadas entre junho de 2001 e junho de 2002) continham
resíduos de agrotóxicos. O pior que os resultados não foram só isso: mais de 22% das amostras
apresentavam porcentuais de resíduos superiores aos limites máximos que a legislação brasileira
permite e uma parte significativa dessas 22% incluía resíduos de agrotóxicos (pesticidas) proibidos
para aquelas culturas. E ainda mais: três ingredientes ativos de uso não permitido no Brasil, sob
qualquer forma, foram detectados - Clorpirifós Metil, Paration Etílico, Dieldrin.
Na lista dos produtos mais contaminados dessa pesquisa estavam os morangos, mamões,
tomates, maçã, batata e banana. Lamentavelmente, essa lista pode ser estendida para grande parte de
frutas e verduras ingeridas diariamente, quando se imagina estar seguindo uma dieta saudável. É um
caso de atentado à saúde da população e um desrespeito evidente à legislação brasileira.
Nesse artigo, o autor alerta os consumidores para buscar produtos certificados da
agricultura orgânica, investigar a origem desses certificados, devido a práticas enganosas e, quando
não for possível encontrá-los, tomar algumas providências importantes. Por exemplo, descascar as
frutas, lavar frutas e verduras em água corrente e colocá-las em solução de água com um pouco de
vinagre - 1 litro de água para 4 colheres de vinagre - por 20 minutos e retirar as folhas externas das
verduras. Além disso, ficar atento a sintomas comuns de intoxicação, como dor de cabeça, vômito e
diarréia e procurar socorro médico, se desconfiar que eles estão associados à ingestão destes
alimentos.
Outro fator preocupante é o descarte das embalagens desses produtos. Como se observa no
Gráfico 01, a comunidade se preocupação com a disposição final adequada desses rejeitos. Apenas
33% é devolvido ao vendedor, enquanto 31% é queimado e igual número descartado a céu aberto e
5% enterrado. Esses dados são bastante inquietantes, pois se verifica que 67% desses rejeitos têm
destino final inadequado.

Enterra
Queima
5%
31%
Descarta a
céu aberto
31%

Devolve ao
vendedor/fab
ricante
33%

Gráfico 01: Formas de descarte das embalagens dos agrotóxicos. Fonte: Pesquisa realizada in loco
por alunos do 2° ano EJA, curso de Agroecologia. Dez. 2007
Fórum Internacional do Meio Ambiente - A conferência da Terra 1198

Quanto às implicações decorrentes dessas formas de descarte inadequado, chama-se


atenção para o processo de queima, por esse colocar em risco a vida dos próprios responsáveis por
esse ato, como da comunidade que passa a ter contato com gases tóxicos emitidos, aumentando o
risco de problemas respiratórios e intoxicação. Já o descarte a céu aberto provoca diversos tipos de
poluição, como visual, do solo e das águas. A poluição destas pode ocorrer tanto pelo processo de
lixiviação ou pelo escoamento superficial. Quanto ao fato de enterrar, mesmo parecendo inofensivo,
não é recomendado como destino final correto para esse tipo de rejeitos.
Vale destacar que o processo de lixiviação e escoamento superficial são conseqüências
diretas do uso dos agrotóxicos. Ao serem aplicados diretamente nas plantas têm como destino final
o solo e os reservatórios de águas superficiais e subterrâneas, pois ao serem lavados das folhas
através da ação da chuva ou da água de irrigação, chegam ao solo e infiltram-se até as camadas
mais profundas, podendo atingir o lençol freático (lixiviação) e/ou escoar pela superfície e chegar
aos reservatórios do entorno (escoamento superficial).
Merece destaque que a maioria dos sujeitos da pesquisa (97%) informou saber que o uso
de agrotóxicos pode comprometer a fertilidade do solo e afirmou ter consciência do mal que o seu
uso pode causar ao ambiente e saúde humana. Mesmo assim, esses trabalhadores fazem constante
destes em suas plantações, embora 90% destes sejam os próprios consumidores dos produtos
cultivados. Resta-nos questionar, que consciência é essa?
Acredita-se que a palavra consciência poderia ser substituída pela palavra informação, pois
recentemente a questão ambiental torna-se cada vez mais em evidência, porém, a construção de uma
consciência ético-ambiental e cidadã ainda se distancia bastante da realidade. Isso porque a
construção de uma consciência / “alfabetização ecológica”, como defende Capra, ou uma
consciência terrena, como enfatiza Morin (2000) exige um outro olhar, uma nova postura na relação
homem-natureza. Requer um patamar mais elevado: a visão do todo em uma teia complexa,
patamar esse que exige uma visão integral entorno da ética da vida.
Para isso acontecer, destaca-se o papel da educação ambiental como um dos pilares a dar
sustentáculo a essas mudanças, visto que seus objetivos gerais insistem na ampliação de uma
consciência individual para uma consciência coletiva.
A construção dessa consciência passa pela adoção de novos comportamentos e estilos de
vida da sociedade moderna, em que se deve refletir sobre os padrões de produção, consumo e
proteção. A educação ambiental ao oportunizar essa reflexão, torna-se indispensáveis à garantia de
uma atitude de respeito ambiental e, por conseguinte, à sustentabilidade do planeta.
Ao possibilitar à sociedade adquirir uma compreensão do meio ambiente em sua
totalidade, as ações educativas comprometidas com as questões ambientais procuram incluir os
aspectos naturais e humanos no mesmo contexto, no mesmo grau de interdependência, pois
reconhecem que o meio natural, sócio-econômico e cultural integram-se mutuamente. Nesse
sentido, trabalhar por um meio ambiente sadio constrói-se num fazer diário, numa relação pessoal e
grupal, pois a tomada de consciência ambiental cidadã só pode traduzir-se em ação efetiva, quando
segue acompanhada de uma população organizada e preparada para conhecer, entender e exigir seus
direitos e exercer suas responsabilidades (BÁRCENA, 2000).
Para a comunidade investigada, a necessidade de construção de conhecimento ficou
bastante evidente quando foram interrogados se o CEFETRN- UNED - Ipanguaçu viesse oferecer
cursos sobre agricultura orgânica e agrotóxicos, 97% afirmou ter interesse em participar. Esses
cursos estão sendo programados. Acredita-se que através de um processo educativo os impactos
causados pelo uso indiscriminado de agrotóxico possam ser minimizados, bem como haja um
despertar para a busca de alternativas em prol de uma agricultura sustentável.
As estratégias alternativas no combate a pragas objetivam maximinizar o uso de técnicas
seguras, baratas e simples, incluindo técnicas tradicionais já utilizadas pelos agricultores que são
substituídas por uso exclusivo por agrotóxicos e outros produtos químicos. Baseada em abordagem
ecológica, a idéia de controle integrado de pragas, lida com os problemas de pragas como um parte
sistêmica. Nesse caso inclui as pessoas, cultivo, insetos benéficos e demais espécies vivas no
ambiente, bem como as pragas e produtos químicos disponíveis (BULL E HATHAWAY, 1982).
Fórum Internacional do Meio Ambiente - A conferência da Terra 1199

Trata-se, portanto, de escolhas conscientes comprometida com a produção de alimentos e


com a vida. Na opinião de Dias (1992), o desenvolvimento econômico e o cuidado com o meio
ambiente são compatíveis, interdependentes e necessários. A alta produtividade, a tecnologia
moderna e desenvolvimento econômico podem e devem coexistir com o meio ambiente saudável.
Essa observação sinaliza para o fato que um novo modelo de desenvolvimento passa
diretamente pela transformação das consciências. Essa consciência não advém apenas de ações
conceituais voltadas para esclarecer as pessoas em relação à determinada temática ambiental, mas
de um processo educativo que favoreça mudanças comportamentais e atitudinais. Em razão disso, a
educação ambiental se configura não somente como instrumento de persuasão, mas particularmente,
de renovação cultural do cidadão.

CONSIDERAÇÕES FINAIS
Enfrentar a problemática ambiental vigente requer uma busca comprometida com a
construção de novos comportamentos em relação ao meio ambiente e a conscientização de que
relações harmoniosas entre homem e natureza são indispensáveis à manutenção da vida na Terra.
A busca de alternativas para a sustentabilidade no campo perpassa por um novo olhar, cujo
horizonte deve oferecer uma modernidade ética, e não apenas uma modernidade técnica, ou seja,
uma ciência cidadã, cujo vetor de contribuição deveria ser o comprometimento com o bem estar
social e conservação do meio natural. Nesse sentido, a visão de um mundo justo, passa ser tão
importante, quanto um mundo produtivo e ambiental correto. Estes não podem ser vistos
isoladamente, mas entrelaçados, pois escolher um em detrimento dos outros não se constitui avanço
e sim recuo.
Sob essa ótica, torna-se evidente que os cuidados com o meio ambiente jamais poderão
emergir da ferocidade de um mercado agressivo com a biosfera, por isso o imenso desafio a ser
enfrentado, diz respeito ao princípio de uma ética que supere um modelo de produção e consumo
que esgota e contamina nossos recursos naturais, além de criar e perpetuar desigualdades gritantes
entre as nações, bem como dentro delas.
Esse princípio ético aplicado no âmbito dos agrotóxicos sugere a superação do uso
indiscriminado destes, políticas educacionais para agricultores, que são vítimas de um modelo
educacional excludente que perdurou séculos em nosso país e uma legislação efetiva, acompanhada
de um processo de fiscalização sério que contemple a escala de produção, comercialização, uso e
descartes residuais.
A comunidade investigada retrata a realidade do uso indiscriminado de agrotóxicos em
nosso país, quando 92% dos agricultores informaram fazer uso destes em seus plantios, enquanto a
maioria não segue as normas de segurança e cuidados recomendados quanto ao preparo, aplicação e
descarte das embalagens. Infelizmente, os problemas ambientais decorrentes dessa prática são
poucos conhecidos pela população local, tendo em vista ausência de dados que os comprovem e
restrições educacionais dos agricultores e demais habitantes. Estes não têm consciência que são
vítimas de sua prática inadequada e, ao mesmo tempo, em que esta é extremamente danosa ao meio
ambiente, compromete sua qualidade de vida.
Embora não tenha sido objeto de estudo, vale destacar que a comunidade ainda convive
com a prática da pulverização aérea, utilizada por empresa multinacional que pulveriza
periodicamente sua plantação de banana, através do uso de avião. Essa prática caracteriza-se por ser
bastante danosa e esbanjadora. Apenas cerca de 25 a 50% do produto acaba caindo na área do
cultivo, enquanto isso esbanja-se uma quantidade excessiva de agrotóxico que expõe os
trabalhadores e moradores do campo que sofrem com as conseqüências diretas, além do impacto
sobre o meio ambiente (BULL; HATHAWAY, 1982).
Como essa pesquisa teve caráter exploratório, os resultados obtidos mostram a necessidade
de avançar em alguns aspectos relevantes, como por exemplo, não foram abordados o grau de
escolaridade dos entrevistados e a identificação dos produtos utilizados na pulverização e pragas
que desejam combater e outros. Por essa razão, pretende-se dar continuidade as investigações, na
perspectiva de trazer melhores contribuições na discussão dessa temática, bem como despertar a
Fórum Internacional do Meio Ambiente - A conferência da Terra 1200

comunidade na busca de alternativas para o controle de pragas almejando um convívio mais


harmônico com o meio.

REFERÊNCIAS BIBLIOGRAFICAS
BÁRCENA, Alícia. Cidadania ambiental. In: GUTIÉRREZ, Francisco; PRADO Cruz.
Ecopedagogia e cidadania plantária. 2. ed. São Paulo: Cortez, Instituto Paulo Freire, 2000.
BRANCO, Samuel Murgel. Natureza e agrotóxicos. São Paulo: Moderna, 1990.
BUENO, Wilson da Costa. Os agrotóxicos invadem a mesa do brasileiro. Disponível em:
BUENO, Wilson da Costa. Os agrotóxicos invadem a mesa do brasileiro. Disponível em:
BULL, David. Pragas e venenos: agrotóxicos no Brasil e no Terceiro Mundo.Petróplis,RJ: Voses,
1986.
BULL, David. Pragas e venenos: agrotóxicos no Brasil e no Terceiro Mundo.Petróplis,RJ: Voses,
1986.
CAPRA, Fritjof; et al. Alfabetizacao ecológica: a educação das crianças para um mundo
sustentável. São Paulo: CULTRIX, 2006.
DIAS, Genebaldo Freire. Educação Ambiental: princípios e práticas. 3. ed. São Paulo: Gaia,1994.
JUNGES, José Roque. Ética ambiental. São Leopoldo, RS: Editora Unisinos, 2004.
<http://www.agricoma.com.br/agricoma/artigos/agrotoxicos/artigo1.php> 10 mar. 2008.
<http://www.agricoma.com.br/agricoma/artigos/agrotoxicos/artigo1.php> 10 mar. 2008.
Fórum Internacional do Meio Ambiente - A conferência da Terra 1201

EXPERIÊNCIA DO PROJETO DE COLETA SELETIVA NA FACULDADE DE CIÊNCIAS


DA ADMINISTRAÇÃO DE PERNAMBUCO – FCAP/UPE

Bárbara CAVALCANTI
Faculdade de Ciências da Administração de Pernambuco – FCAP/UPE
Av. Sport Club do Recife, 252 - Madalena - Recife/PE CEP 50750-500
E-mail: nga_fcap@yahoo.com.br
Fábio PEDROSA
Faculdade de Ciências da Administração de Pernambuco – FCAP/UPE
Juliana Maria HENRIQUES¹
Faculdade de Ciências da Administração de Pernambuco – FCAP/UPE

RESUMO
O trabalho objetivou apresentar o Projeto de Coleta Seletiva: Ferramenta de Educação
Ambiental desenvolvido pela Faculdade de Ciências da Administração da Universidade de
Pernambuco FCAP/UPE, desde agosto de 2000, coordenado pelo Núcleo de Gestão Ambiental -
NGA desta Instituição. O projeto visa, principalmente: Promover o correto tratamento e destino
final dos resíduos sólidos; destinar os materiais recicláveis a famílias que sobrevivem da
comercialização destes materiais; sensibilizar sua comunidade acadêmica para uma mudança de
valores, comportamento, ética, hábitos e atitudes com relação às questões sociais e ambientais no
intuito de contribuir para a almejada e necessária harmonia do planeta Terra.
Palavra Chave: Coleta Seletiva; Educação Ambiental; Resíduos Sólidos FCAP/UPE.

ABSTRACT
This work aimed to present the Project of Selective Collect: A tool for environmental
education developed by the College of Administration Sciences from Pernambuco University, since
August 2000, coordinated by the Environment Management Staff of the same institution. The
project intends to: promote the correct treatment and final destination of solid waste; send the
recycling material to the families who purchase them for their survival: touch the academic
community and promote a real change of values, behavior, ethics, habits and attitudes related to
social and environmental questions in order to help attain the desired and indispensable harmony of
the Earth planet.
Word Key: Selective Collect; Environmental Education; Solid Waste; FCAP/UPE.

INTRODUÇÃO
A produção de lixo nas grandes cidades brasileiras é um fenômeno inevitável, que ocorre
diariamente e em composições que dependem do tamanho da população e do seu desenvolvimento
econômico. Os sistemas de limpeza urbana, de competência municipal, devem afastar o lixo da
população dando-lhe um destino ambiental e sanitário adequado. Mesmo sendo uma tarefa difícil, o
assunto deve ser cada vez mais priorizado nas gestões públicas municipais (Grippi, 2006).
Lixo é o nome dado a todos os tipos de resíduos sólidos resultantes das diversas atividades
humanas ou ao material considerado imprestável ou irrecuperável pelo usuário, seja papel, papelão,
restos de alimentos, vidros, embalagens plásticas (Carvalho & Oliveira, 2007).
Porém, vale destacar que, na composição atual do lixo ou resíduos sólidos, denominação
técnica do lixo, existe um volume de material com valor para comercialização e reciclagem, e que
inúmeras famílias sobrevivem da venda destes recicláveis (CEMPRE, 2000).
Nos últimos anos, a reciclagem vem destacando-se como método de tratamento dos
resíduos sólidos. A palavra reciclagem tornou-se bastante popular. Do ponto de vista do cidadão, a
reciclagem tem sido a única alternativa para o problema dos resíduos. Todavia, os programas de
reciclagem devem ser cuidadosamente projetados para que um eventual fracasso não cause uma
sensação de frustração na população, o que poderia desperdiçar irremediavelmente uma ferramenta
de grande potencial. Programas muitos pretensiosos, mal projetados e com um grande número de
itens a serem reciclados, podem resultar em uma contaminação excessiva dos produtos e também
em altos custos (Tenório & Espinosa, 2004).
Fórum Internacional do Meio Ambiente - A conferência da Terra 1202

No Brasil, a quantidade de programas de reciclagem de resíduos urbanos é ainda bastante


inexpressiva; ainda há muito a se fazer e a se desenvolver. Para efeito de comparação, nos Estados
Unidos, em 1991, já havia cerca de 4 mil programas de coleta seletiva, enquanto a pesquisa do
IBGE em 2000 apontou apenas cerca de seiscentos programas de reciclagem no Brasil (Tenório &
Espinosa, op. cit.).
Ao contrário do que intuitivamente se poderia acreditar, os custos dos programas de coleta
seletiva não são cobertos pelos custos das vendas dos produtos, o que se observa em todo o mundo.
O custo líquido do processo de coleta seletiva por tonelada é maior que o custo do simples
aterramento do resíduo. Conseqüentemente, a decisão de adotar um determinado programa de coleta
é uma questão mais de gestão de resíduos do que de gerenciamento, cabendo à comunidade investir
mais ou menos na valorização dos resíduos e da cidadania, fazendo um balanço entre sua
possibilidade financeira e os benefícios do ponto de vista de sustentabilidade e cidadania (Tenório
& Espinosa, op. cit.).
Diante desta conflituosa realidade, a Agenda 21, um dos compromissos firmados na
Conferência Mundial do Meio Ambiente, a ECO 92, em prol do desenvolvimento sustentável
propõe, dentre outros pontos, que o lixo seja tratado tendo em vista três Rs, seguindo uma
hierarquia: 1º R :Reduzir a geração do lixo; 2º R: Reutilizar antes de descartar como lixo e, 3º R:
Reciclar, que é reintegrar o material que perdeu seu potencial de uso no ciclo produtivo de novos
produtos (Cavalcanti, 2000).
Embasada nesta filosofia a Faculdade de Ciências da Administração de Pernambuco –
FCAP/ UPE, através de seu Núcleo de Gestão Ambiental - NGA, implementou, em agosto de 2000,
o projeto de Coleta Seletiva de Resíduos Sólidos – A Função Social do Lixo, que está
fundamentado no princípio dos ditos 4R`s, acrescentado 1 R, que é: REPENSAR os valores,
práticas e comportamentos, com relação ao consumo, a geração, ao tratamento e destino final do
lixo. Enfim, o projeto mira além do correto destino do lixo, orientar e informar as pessoas sobre o
seu rebatimento no meio ambiente, objetivando, assim, que cada cidadão assuma sua parcela de
compromisso com o lixo que gera e com a sustentabilidade do ambiente. Desse modo, este projeto
se coloca como um instrumento de educação ambiental, inclusão social e geração de renda,
conforme salientado por Campelo e Cavalcanti (2004).
Diante do exposto, pode-se dizer que, através deste projeto almeja-se estimular reflexões e
debates sobre a temática ambiental visando contribuir na construção de novos paradigmas de
comportamento e práticas com responsabilidade social e ambiental. Busca-se, com isso, inserir na
formação dos futuros gestores a temática ambiental, qualificando-os para atenderem às atuais
demandas da sociedade, que exigem uma maior compatibilidade entre os objetivos econômicos e as
questões ambientais e sociais.

MATERIAL E MÉTODOS
A Faculdade de Ciências da Administração Pernambuco - FCAP compõe uma das 12
instituições de ensino público superior vinculadas à Universidade de Pernambuco - UPE.
Ao longo de seus 50 anos de existência, a FCAP vem conquistando posição de destaque
nacional na área de ensino, com um curso de graduação em Administração de Empresas, bem
sucedido, alguns cursos de especialização que funcionam há mais de uma década na área da gestão
do meio ambiente, de cidades, do governo e de organizações em geral, e a Escola do Recife,
unidade organizacional da FCAP/UPE, que ocupa uma posição de destaque no sistema educacional
do Estado de Pernambuco, promovendo, em alto nível, o Ensino fundamental, a partir da 5 ª série,
Ensino Médio e Técnico em Administração (http://www.fcap.adm.br/site.php?p=sf_historico).
O Núcleo de Gestão Ambiental (NGA) da FCAP foi criado em fevereiro de 1999 e desde
então desenvolve ações de ensino, que abrange todos os níveis educacionais existentes na
Instituição, desde a Escola do Recife até a Pós-Graduação, assim como ações de pesquisa e
extensão.
Na área de extensão, destaca-se a implantação do Programa de Gestão e Educação
Ambiental, onde inicialmente foi deflagrado, em agosto de 2000, o projeto de Coleta Seletiva de
Fórum Internacional do Meio Ambiente - A conferência da Terra 1203

Resíduos Sólidos, com o principal objetivo de discutir com a comunidade da FCAP a necessidade
de mudança de valores e comportamento gerenciais em relação ao Meio Ambiente.
A estruturação e desenvolvimento do projeto foram embasados em pesquisas
bibliográficas, participação no Fórum Lixo e Cidadania de Pernambuco, visitas de campo a locais
de tratamento e destino final de lixo, assim como a grupos que trabalham com coleta de recicláveis,
objetivando, desta maneira, o estudo dos conceitos teóricos que fundamentam a temática ambiental
e sobretudo a vivência nas questões dos resíduos sólidos.
O projeto é desenvolvido pelo NGA com a contribuição de estagiários e de uma equipe de
voluntários – funcionários e alunos dos mais diversos níveis de escolaridade existentes na
Instituição.
O Processo de Coleta Seletiva na Instituição iniciou-se com a implantação da coleta de
papel nos setores administrativos e salas de aula, através de uma parceria firmada entre a FCAP e a
KLABIN S. A. (Empresa de Reciclagem de Papel) que forneceu as caixas coletoras de papéis.
Semanalmente, uma estagiária e voluntários do NGA acompanham os catadores de
recicláveis da comunidade Caranguejo/Tabaiares (vizinha da FCAP, as quais recebem a
denominação de Agentes da Reciclagem) na coleta dos papéis depositados nas caixas, assim como
realiza a pesagem dos mesmos (Figura 1).

Figura 1. Agentes de Reciclagem na coleta de papel (Foto: Cavalcanti, 2006).

Posteriormente, após instalação das caixas coletoras de papéis nos setores administrativos e
salas de aula da FCAP – primeira etapa do plano – houve a ampliação do Processo de Coleta
Seletiva para outros materiais recicláveis além do papel. Este Processo teve início por meio de uma
parceria entre a FCAP e a Empresa de Manutenção e Limpeza Urbana do Recife – EMLURB que
afixou no pátio da Instituição um jogo de PEV – Posto de Entrega Voluntária - com o objetivo de
acondicionar os materiais recicláveis: metal, vidro, papel e plástico depositados tanto pela
comunidade da Faculdade como pela do seu entorno. A localização do PEV (Figura 2) é estratégica,
estando próxima à guarita do portão principal de acesso da FCAP, onde o vigilante, orientado
previamente, permite e acompanha a entrada de pessoas que querem depositar seus materiais
recicláveis nestes equipamentos. Também houve a aquisição pela faculdade de 4 jogos de coletores
de materiais recicláveis, que foram afixados no pátio da Instituição nos locais onde o trânsito de
pessoas é mais intenso, sendo 2 jogos móveis (Figura 3 A) e 2 fixos (Figura 3 B). Toda semana, os
funcionários responsáveis pela limpeza do pátio recolhem os materiais colocados nos equipamentos
menores e depositam nos PEVs para posteriormente estes recicláveis serem coletados pela
EMLURB que os destinam a projetos sociais com catadores de rua desenvolvidos pela própria
empresa.
Fórum Internacional do Meio Ambiente - A conferência da Terra 1204

Figura 2. PEVs (Foto: Cavalcanti, 2007).

A B

Figura 3. A. Coletores de Recicláveis móveis; B. Coletores de Recicláveis fixos ( Fotos: Cavalcanti, 2007).

Ainda no pátio, foi instalada pela FCAP através do NGA, uma Estação de Monitoramento
de Recicláveis (Figuras 4 A e B), implantada em fevereiro de 2005, que tem a função pedagógica de
subsidiar os trabalhos desenvolvidos por professores da Escola do Recife bem como mostrar o
processo de decomposição dos materiais e o tamanho da responsabilidade que cada pessoa tem com
os resíduos gerados.
A B

Figura 4. A. Estação de Monitoramento de Recicláveis da FCAP/ UPE (Foto: Cavalcanti, 2005), B.. Voluntário do
Fórum Internacional do Meio Ambiente - A conferência da Terra 1205

Para que nenhum setor ficasse de fora do projeto, o NGA estimulou a participação da
cantina que, mesmo sendo um setor terceirizado, tratou de instalar dois coletores no interior da
mesma, um para materiais recicláveis e outro para não recicláveis. Além disso, disponibilizou um
espaço para que fosse colocado um quadro de avisos onde são afixados textos sobre resíduos
sólidos.
O projeto inclui ainda um trabalho de divulgação sistêmica através do Mural do Meio
Ambiente, um espaço onde todos podem participar enviando textos, cartazes e informações para
que sejam divulgados.
O acompanhamento e fortalecimento do projeto são realizados por parte do NGA, de seus
estagiários e voluntários que monitoram o pátio, as salas de aula e os setores administrativos da
Instituição. As principais atividades desempenhadas por eles têm como objetivos principais:
observar o estado dos equipamentos; o volume e os tipos de materiais colocados nos depósitos;
prestar esclarecimentos sobre o NGA, o projeto em si e a coleta seletiva como um todo e estimular a
participação no projeto através de cursos, oficinas, concursos – nos quais um deles, inclusive, deu
origem a Turma da Reciclagem (Figura 5) que são bonecos referentes a cada material reciclável
idealizados pelos próprios alunos da Escola do Recife - murais, passeios ecológicos, e, ainda, de
maneira sistêmica capacitações junto aos responsáveis pela limpeza, cantina e demais grupos na
busca de fortalecer e garantir a continuidade do projeto.

Figura 5. Turma da Reciclagem (Leal, 2006).

Dando continuidade as intervenções de caráter social e ambiental iniciou-se em 2007


auditoria ambiental, interna, na FCAP sob orientação da professora do curso MBA em
Planejamento e Gestão Ambiental. A partir desta iniciativa ficou determinada pelo NGA a
elaboração de Procedimentos Ambientais. Em janeiro de 2008 iniciou a implantação dos
Procedimentos, desenvolvido com a colaboração da Analista Ambiental do NGA, Valéria
Cavalcanti, e, em fevereiro ocorreu à primeira auditoria.

RESULTADOS E DISCUSSÃO
A implantação das caixas coletoras de papel nos setores administrativos e nas salas de aula
contribui para a inclusão social dos Agentes da Reciclagem que cada vez mais se integram na
comunidade da FCAP, hoje já reconhecendo o aspecto, não só ambiental, mas também social e
econômico da coleta seletiva, trazendo inclusive papéis recicláveis de casa para que sejam
recolhidos pelas Agentes. Da mesma forma que, além de ter subsidiado a entrada destas Agentes em
outras instituições como o SEBRAE e o Banco do Brasil, apoiou a implantação de uma Biblioteca
na Comunidade Caranguejo/ Tabaiares fazendo, inclusive, com que aumentasse a procura de outros
catadores da comunidade citada para participarem do projeto de coleta seletiva da FCAP.
Durante toda a implantação do projeto de Coleta Seletiva de Resíduos Sólidos na FCAP, o
lixo gerado diariamente na Instituição ultrapassava os 300 litros diários permitidos pela Lei
Municipal Nº 14.903/86 (Brasil, 1986) para coleta regular diária. Desta forma o lixo tinha que ser
recolhido por uma empresa especial contratada, gerando ônus para a Instituição. Em agosto de
2007, na ocasião de renovar o contrato para a coleta ficou determinada pela Direção da faculdade a
Fórum Internacional do Meio Ambiente - A conferência da Terra 1206

não renovação, visto que o projeto tinha evoluído e o volume de resíduos a ser encaminhado à
coleta regular atendia a legislação citada. O tempo de implantação deste procedimento é bastante
recente, apenas seis meses, logo ajustes estão sendo feitos para reduzir cada vez mais o volume de
resíduos, como exemplo junto à cantina que é uma empresa prestadora de serviço à instituição.
Também foi observado um maior interesse da comunidade da FCAP sobre as questões
ambientais, assim como sobre a importância da preservação do Meio Ambiente, visto que o NGA é
freqüentemente procurado por alunos e funcionários no intuito de serem voluntários, de obterem
maiores informações sobre o projeto em andamento na FCAP e orientações para a implementação
de novos projetos de coleta seletiva nas suas localidades de convivências sociais.
Na cantina conforme citado foram colocados coletores para o correto destino dos
recicláveis, e ao longo do projeto observou-se que além do crescimento na utilização dos mesmos,
também pessoas que circulam neste espaço procuram o NGA para obterem informações sobre o
projeto, no intuito de implantá-lo em suas instituições, residências, etc.
Em janeiro, do ano em curso, foi implantado o procedimento nas copiadoras. Apesar de
curto espaço de tempo já se observa uma mudança além do cumprimento das normas estabelecidas,,
tal como: A aquisição pela terceirizada de coletores de recicláveis que são utilizados tanto pelos
funcionários quanto pelos seus clientes. Vale destacar que os recicláveis são destinados pela
empresa para os PEVs, e que também foi firmado um acordo para a copiadora providenciar os
informativos elaborados pelo NGA (banner, cartazes, etc).

CONCLUSÕES
Apesar das dificuldades inerentes a todo processo de mudança, pode-se concluir que este
projeto está atingindo os objetivos propostos através da educação ambiental, que envolve o estímulo
a reflexões e debates visando à adoção de novos paradigmas de responsabilidade sócio-ambiental;
da inclusão social e da geração de renda, onde cada vez mais as Agentes da Reciclagem se integram
na comunidade da FCAP e naquelas do seu entorno; de um maior envolvimento dos participantes
(alunos e familiares, professores, funcionários, moradores e comerciantes do entorno da FCAP) na
execução da coleta seletiva de materiais recicláveis e, conforme observado durante os oito anos de
projeto, ter deixado de enviar ao meio ambiente uma grande quantidade de material reciclável,
aumentando, desta forma, a vida útil do aterro da Muribeca, reduzindo o desperdício de recursos
naturais, destino dos recicláveis para os catadores e, sobretudo, mudanças de comportamentos a
favor da harmonia do planeta Terra.

REFERÊNCIAS BIBLIOGRAFICAS
BRASIL. Lei Nº 14.903/86, de 03 de outubro de 1986. Dispõe sobre as sanções aplicáveis aos atos
ofensivos à limpeza urbana e dá outras providências. In: Empresa de Manutenção e Limpeza
Urbana – EMLURB. Disponível em: <http://www.recife.pe.gov.br/pr/servicospublicos/emlurb/Lei-
14903-86.pdf>. Acesso em: 03 mar. 2008.
CAMPELO, P. M. de A. P. & CAVALCANTI, B. V. P.. Proposta para Implantação de um Plano de
Gerenciamento de Resíduos Sólidos em Shoppings Center. Recife, Monografia, 2004.
CARVALHO, A. R. de. & OLIVEIRA, M. V. C. de..Princípios Básicos do Saneamento do Meio. 8.
ed. – São Paulo: Senac, 2007. 211p.
CAVALCANTI, B. V. P.. O Outro lado do Lixo: A Concepção do Aterro de Aguazinha – Olinda
sobre Resíduos Sólidos. Olinda, Monografia, 2000.
CEMPRE – Compromisso Empresarial para Reciclagem. São Paulo, 2000.
GRIPPI, S. Lixo. Reciclagem e sua história. Guia para as prefeituras brasileiras. 2. ed. - Rio de
Janeiro: Interciência, 2006. 166p.
TENÓRIO, J. A. S. & ESPINOSA, D. C. R.. Controle Ambiental de Resíduos. 155-211. In:
PHILIPPI JR.,A.; ROMÉRO, M. de A.;BRUNA, G. C. (Eds.). Curso de Gestão Ambiental. São
Paulo: Manoele LTDA, 2004. 1045p.
Fórum Internacional do Meio Ambiente - A conferência da Terra 1207

A RELAÇÃO ENTRE MORBIDADE POR DOENÇAS DIARRÉICAS E REDES DE


ABASTECIMENTO DE ÁGUA E ESGOTAMENTO SANITÁRIO NA CIDADE DE
PRATA, MINAS GERAIS, 2007.

Vanessa Davi Vilela


Bióloga, Especialista em Biotecnologia e Qualidade em Alimentos
Maria Inês Machado
Bióloga Sanitarista, Doutora em Ciências/USP e Docente do Curso de pós graduação em Gestão Ambiental –
UNIMINAS, minesoca@gmail.com .

RESUMO
As doenças diarréicas de veiculação hídrica são responsáveis por elevadas taxas de
mortalidade e morbidade infantil especialmente em áreas com condições sanitárias precárias ou
inadequadas. No Brasil, há forte correlação entre coleta e tratamento de esgoto e fornecimento de
água tratada, com os casos de diarréia notificados no Sistema Único de Saúde. Objetivou-se analisar
as ocorrências por doenças diarréias, notificadas em 2007 no município de Prata, Minas Gerais, e
sua possível relação com a rede de abastecimento de água e esgotamento sanitário. Utilizaram-se as
fichas de Monitorização de Doenças Diarréicas Agudas (MDDA), da Secretaria Municipal de Saúde
para cálculos de prevalências e incidências por “semanas epidemiológicas” e do coeficiente de
Morbidade entre menores de cinco anos. A extensão e cobertura da rede de abastecimento de água
foram fornecidas pela Companhia de Saneamento Minas Gerais (COPASA), e os dados sobre a
extensão e disposição da rede coletora de esgoto pela Secretaria de Obras da Prefeitura Municipal.
Foram notificados no período 314 casos de diarréia aguda, média de 26,1 casos mensais. A
Morbidade Infantil para esta causa no período foi de 6,84/1000 nascidos vivos. Do total de
notificados 59,55% receberam tratamento e permaneceram internados nas unidades do SUS. Os
serviços de abastecimento de água e a rede coletora de esgoto atendem praticamente a toda
população 97,69% e 98%, respectivamente. A distribuição das prevalências por bairros indica que o
Bairro Cruzeiro do Sul concentra as maiores freqüências em todas as faixas etárias. Este bairro é
percorrido por dois córregos, do Carmo e dos Moreira, ambos receptores dos esgotos domiciliares
sem qualquer tipo de tratamento. Outros bairros também percorridos pelos córregos e utilizados
para esgotamento sanitário como o bairro Bela Vista apresentaram freqüências significativas de
casos. Constata-se uma relação direta entre deficiência de saneamento básico e diarréias agudas no
município de Prata, Minas Gerais.
Palavras-chave: Doenças Diarréicas, Saneamento básico, Vigilância Ambiental em Saúde.

ABSTRACT
The diarrhea related diseases of hydric propagation are responsible for high mortality rates
and morbidity among children under five years old, especially in areas with low sanitary conditions.
In Brazil, there is a strong correlation between treatment of wastewater and clean water supply with
cases of diarrhea registered at public healthcare system. This paper aims to analyze the occurrences
of diseases by hydrical propagation, notified by 2007 in the city of Prata, Minas Gerais, and their
possible relation with the water supply and sewerage. Data provided by the Municipal Health
Department, through “Monitorização de Doenças Diarréicas Agudas” (MDDA), cards, were used
to calculate the prevalence and incidence by epidemiological weeks and the coefficient of morbidity
on children under five years old. All figures about extension and coverage of the water supply
network were provided by the sanitary company of Minas Gerais (COPASA), and the data about
wastewater were acquired by the local authorities. There were 314 cases of diarrhea observed in
2007, a rate of 26.1 cases for month. The distribution of the frequency of the cases of diarrhea by
age band indicates higher prevalence among children under 5 years old, equal to 42.99%. The child
morbidity for this cause in 2007 was calculated at 6.48/1000 born alive. From the total of 314 cases
of diarrhea notified by SUS, 59.55% received treatment in the units and remained under
observation. The service of water supply and sewerage covers almost the entire population, at
97.69% and 98% respectively. The distribution of prevalence by neighborhood indicates that the
Fórum Internacional do Meio Ambiente - A conferência da Terra 1208

“Cruzeiro do Sul” neighborhood concentrates the higher annual frequencies by epidemiological


weeks, in all age bands. This neighborhood is crossed by two streams, “Carmo and Moreira”, both
receptors of household wastewater. Other neighborhoods, also crossed by the streams used for
wastewater, like “Bela Vista”, also presented significant frequency of cases. This paper presents a
direct relationship between the deficiency in basic sanitization and diarrhea in the city of Prata, MG.
Keywords: Diarrhea, Basic sanitation, Environmental Vigilance in Health.

INTRODUÇÃO
Para a Organização Mundial de Saúde (WHO, 2000), todas as pessoas, em quaisquer
estágios de desenvolvimento e condições sócio-econômicas têm direito a um suprimento adequado
e seguro de água potável - não apenas quanto à ausência de riscos para a saúde, mas em quantidade
suficiente, disponibilidade contínua e custo acessível. Entretanto são 2,4 bilhões de pessoas (quase a
metade da população do planeta), vivendo sem condições aceitáveis de saneamento, 1,1 bilhões
delas sem acesso a um adequado abastecimento de água e ocorrem no mundo 4 bilhões de casos de
diarréia anuais, com 2,2 milhões de mortes, a maioria crianças de até cinco anos.
Os serviços de saneamento são de vital importância para proteger a saúde da população,
minimizar as conseqüências da pobreza e preservar o meio ambiente. No entanto, os recursos
financeiros disponíveis para o setor são escassos nos países latino-americanos e caribenhos, a
despeito das carências observadas na cobertura por serviços de saneamento. Os países em
desenvolvimento entram no terceiro milênio ressuscitando patologias do início do século XX.
Grande parte das doenças registradas nesses países decorre da falta de saneamento, como diarréias,
cólera, dengue, hepatite tipo A, leptospirose, esquistossomose e várias parasitoses - em
conseqüência, uma alta taxa de mortalidade infantil também é encontrada (TEIXEIRA e
PUNGIRUM, 2005). Na América Latina e Caribe, existem 168 milhões de pessoas sem
abastecimento de água e as enfermidades de origem hídrica aparecem entre as três principais causas
de mortalidade geral. E estima-se que saneamento básico adequado e água tratada podem reduzir
nestas regiões em até um quarto os casos de doenças diarréicas e as taxas de morbidade e
mortalidade entre 20% e 80% (OPS, 2004)
Tem sido fortemente documentada a situação paradoxal do Brasil, que apresenta
indicadores econômicos em níveis incompatíveis aos dos seus indicadores sociais, incluindo-se os
de saúde, como, por exemplo, taxa de morbimortalidade infantil. Enquanto essa taxa, para o Brasil,
era de 29,6 óbitos por 1.000 nascidos vivos em 2000, o Chile (10,1), o Uruguai (13,8) e a Argentina
(17,4 apresentavam taxas muito inferiores (CARMO, BARRET e SILVA, 2003). A relação de
causalidade entre as condições de saneamento e o quadro epidemiológico é reconhecida como um
dos fatores determinantes para a gestão da saúde pública. Condições inadequadas de saneamento
podem resultar em diversos riscos, principalmente a transmissão de doenças – importante fator
gerador de altos custos ao SUS. A OMS estima que para cada R$ 1 empregado em saneamento
seriam economizados de R$ 4 a R$ 5 em despesas com saúde pública (WHO, 2000). Para Libânio,
Chernicharo e Nascimento (2005), os países que apresentam IDH mais elevado (IDH > 0,7) e maior
longevidade (esperança de vida ao nascer > 60 anos) situam-se no quadrante de maior cobertura dos
serviços de saneamento (cobertura de água > 60% e cobertura de esgoto > 50%). Por sua vez, os
pontos correspondentes aos países com menor IDH (IDH < 0,7) e longevidade (esperança de vida
ao nascer < 60 anos) encontram-se mais dispersos no mapa, ocupando em grande número os
quadrantes equivalentes a uma pior situação sanitária (cobertura de água < 60% e cobertura de
esgoto < 50%). Estima-se que a diarréia seja responsável por 4,3% dos anos de vida perdidos ou
com incapacitação no mundo e que 88% desta carga de doenças, estão concentradas em crianças de
0 a 5 anos, e atribuídas ao abastecimento de água, esgotamento sanitário e higiene inadequados.
Um dos desafios presentes ao desenvolvimento do Brasil consiste na definição de
indicadores epidemiológicos e sanitários que permitam nortear as ações no campo da saúde
ambiental.
A análise da ocorrência de doenças diarréicas agudas e sua relação com as redes de
abastecimento de água e de esgotamento sanitário na cidade de Prata, MG, têm a finalidade de
Fórum Internacional do Meio Ambiente - A conferência da Terra 1209

selecionar um indicador epidemiológico passível de correlação com indicadores sanitários e


verificar se o indicador Coeficiente de morbidade infantil por doenças diarréicas permitiria avaliar a
influência da melhoria do abastecimento de água e do esgotamento sanitário.

INDICADOR DE SAÚDE
Como indicador epidemiológico, elegeu-se a variável de indiscutível importância para a
saúde pública “morbidade por doenças diarréica” para todas as idades, com ênfase nas crianças
menores de um ano e menores de cinco anos. Os dados utilizados para compor as prevalências e
freqüências percentuais dos casos notificados foram fornecidos pela Secretaria Municipal de Saúde
de Prata, Minas Gerais. A Monitorização das Doenças Diarréicas Agudas – MDDA é um programa
da Secretaria de Vigilância em Saúde/MS, cujas unidades de saúde municipais monitoram os casos
de diarréias agudas (cólera, diarréia, gastrenterite e outras doenças de origem infecciosa
presumível), por semanas epidemiológicas preconizadas pelo Ministério da Saúde. Estas, em
número de 52
Anuais foram posteriormente agrupadas a cada quatro semanas para análise das variáveis.
Os números absolutos de casos de doenças diarréicas notificados em 2006 e 2007 foram extraídos
das fichas de monitorização e posteriormente submetidos à distribuição percentual quanto a
ocorrência por semana epidemiológica, faixa etária, tipo de tratamento clínico e distribuição
segundo a procedência por Bairro.

ABASTECIMENTO DE ÁGUA
A distribuição quantitativa e espacial urbana de rede de abastecimento de água, no período
de Janeiro a Dezembro de 2007, foi obtida junto à COPASA (Companhia de Saneamento Minas
Gerais), órgão responsável pelo abastecimento do município, através do SIOP (Sistema de
Informações Operacionais). Foram ainda disponibilizados os relatórios de monitoramento da
qualidade microbiológica da água distribuída, e os exames laboratoriais periódicos realizados em
conformidade com a legislação (BRASIL, 2004).

ESGOTAMENTO SANITÁRIO
Os dados referentes a rede de esgotamento sanitário foram coletados junto à Secretaria de
Obras do município e dimensionados para determinar o percentual de bairros com ou sem cobertura
estimando assim a população atendida no período de estudo.

ANÁLISE ESTATÍSTICA.
Inicialmente construiu-se um banco de dados composto pelos indicadores epidemiológico e
sanitário para análise descritiva da distribuição de freqüências percentuais dos indicadores e
calculadas as respectivas prevalências e incidências, distribuídas por idade, tipo de tratamento e
procedência das ocorrências segundo bairro. Para calcular a Morbidade por doenças diarréicas em
menores de 5 anos segundo dados MDDA, utilizou-se a população residente na faixa etária no
período ( Brasil,2008) calculada para 1000 nascidos vivos.

RESULTADOS
De acordo com os dados do MDDA, no período de Janeiro a Dezembro de 2007 foram
notificados 314 casos de diarréia aguda no município de Prata, enquanto para o ano de 2006 foram
notificados apenas 127 casos. Assim, a prevalência média mensal de casos de diarréia aguda para o
ano 2007 foi igual a 26,1 casos e para 2006 de apenas 10,6 casos mensais. O aumento
representativo de 247% no número total de casos em 2007 justifica-se a princípio, pela melhoria do
sistema de notificação informatizado a partir deste ano. Até então o preenchimento de das fichas de
notificação e encaminhamentos eram realizados manualmente. O aumento da prevalência de casos
de diarréias até a 25ª semana de 2007 ele foi igual a 695,24 % (Gráfico1).
Fórum Internacional do Meio Ambiente - A conferência da Terra 1210

45 40 40 42
40

Número de casos
35 29
30 28 26
25 22
19 19 20 17
20 16 15 15 17 16
15 13 13 13
10 4 6 3 4
3 0
5 1
0
4

8
12

16

20

24

28

32

36

40

44

48

52
a

a
a

a
1

5
9
13

17

21

25

29

33

37

41

45

49
Semana Epidemiológica

Número de casos 2006 Número de casos 2007


Gráfico 1 – Número de casos de Diarréia Aguda notificados nos anos de 2006 e 2007.

A incidência (aumento de casos novos) oscilou muito no período, com os maiores aumento
entre as semanas epidemiológicas 5-9 e 13-16 e 33-36 e 37-49 correspondendo a 21casos a mais e
entre os agrupamentos 41- 44 e 45 - 48 com 22 casos a mais (Gráfico2).

50
Número de casos

40 40 42
40
30 29
22
19 26
20 19 13
20

10 16 15 13

0
13 2

17 6

21 0

25 4

29 8

33 2

37 6

41 0

45 4

49 8
2
a4

a8
a1

a1

a2

a2

a2

a3

a3

a4

a4

a4

a5
1

5
9

Semanas Epidemiológicas
Número de casos 2007

Gráfico 2 – Incdências de Diarréia Aguda notificadas no ano 2007.

A distribuição de casos de diarréias agudas por faixas etárias no ano 2007, indica a maior
prevalência entre as crianças menores de 5 anos de idade, isto é, 135 casos, 42,99 % de todas as
ocorrências notificadas (Gráfico 3).
Fórum Internacional do Meio Ambiente - A conferência da Terra 1211

Número de casos

100 84

Número de casos
80
60 51 44
40 32 32
18 26
17 10
20
0
1

19

29

39

49

59

60
a

a
<

>
a

a
1

10

20

30

40

50
Feixa etária

Gráfico 3 – Número de casos por faixa etária segundo informações das fichas de MDDA.

Considerando a população residente em risco e menor de 5 anos no ano 2007 segundo


DATASUS/2008 (Brasil,2008), e a prevalência de casos de diarréias segundo os dados MDDA, o
coeficiente de morbidade foi calculado em 6,84/1000 nascidos vivos.
Quanto à gravidade clínica do paciente e o tipo de tratamento terapêutico recebido,
verificou-se que dentre os 314 casos notificados que em 127 deles (40,45%), houve diarréia sem
desidratação e o paciente recebeu cuidados domiciliares, em 69 casos (21,97%), houve diarréia com
desidratação, e o paciente ficou em observação na unidade de saúde e recebeu tratamento oral e 118
pacientes (37,58%), tiveram diarréia com desidratação grave e recebeu hidratação venosa como
tratamento.
A distribuição da prevalência dos casos de diarréia segundo a procedência dos mesmos por
Bairro, apresenta os seguintes percentuais em ordem decrescente: Cruzeiro do Sul (18,15%),
Oliveira (Oliveira, Oliveira I e Oliveira II) com 14,01%, Bela Vista com 13,38% e Bairro Jardim
Brasil com 11,15% e os demais bairros apresentaram prevalências menores que 10%.
Evidencia-se facilmente a concentração de casos nos bairros Cruzeiro do Sul (57), Oliveira
(44), Bela Vista (42) e Jardim Brasil (35), fato que a princípio poderia estar associado às condições
sanitárias quanto a amplitude e qualidade dos serviços de abastecimento de água e esgotamento
sanitário dos logradouros. Entretanto verificou-se que a rede de abastecimento de água atende
praticamente toda a população do município de Prata. O atendimento variou pouco e para mais no
período de janeiro a dezembro de 2007, ou seja, de 97,69% no mês de janeiro para 98,83%, no mês
de julho. Verificou-se que os procedimentos utilizados para o tratamento da água distribuída, atende
os requisitos estabelecidos pela portaria n° 518 do Ministério da Saúde.
Desta forma, a variável “extensão da cobertura da rede de abastecimento de água” foi
considerada inadequada ao estudo de correlação de risco, compreendo que a totalidade dos
logradouros, com ou sem casos de diarréia aguda recebem o mesmo serviço qualitativo e
quantitativo de abastecimento de água. Assim como a variável acima, foi desconsiderada também a
possível correlação quanto ao serviço de esgotamento sanitário domiciliar da cidade de Prata.
Segundo a Secretaria de Obras da prefeitura municipal, 98% das residências são atendidas
pela rede coletora de esgoto, que corresponde simplesmente a captação domiciliar. Todo
esgotamento é lançado sem qualquer tipo de tratamento em dois córregos, o Córrego dos Moreira e
o Córrego do Carmo. Ambos apresentam extensos cursos em área urbana por entre bairros
populosos da cidade.
Observando-se a distribuição espacial dos bairros no mapa da cidade de Prata, verifica-se
que o Córrego dos Moreira percorre os bairros: Esperança, Nossa Senhora do Carmo e Cruzeiro do
Sul, onde se encontra com o Córrego do Carmo que por sua vez percorre os bairros, Bela Vista,
Cruzeiro do Sul, Primavera e Morada do Sol.
Fórum Internacional do Meio Ambiente - A conferência da Terra 1212

Quando analisamos conjuntamente o Gráfico 4 e a distribuição espacial dos casos de


diarréias notificados pelo MDDA segundo a procedência e as respectivas freqüências por bairro,
nota-se que o bairro Cruzeiro do Sul é o que apresenta maior prevalência ( 18,15%), e por onde
ambos os córregos receptores do esgoto sem tratamento, fazem o maior curso em área urbana.
57
60
Número de casos

50 42 44
40 35
28
30 18
14 11 16
20 9 13
7 4 6
10 2 3 2 2 1
0

do Sol

l a i ma
ro elo

pe a

Pr era

d e ral
a

na
l
Cr re A k
lin ro

a
sta

sil
a C ri a

rm
ad ra

on so
Es dn
Su
in


ar

eir
ng
t

ra

lia
u
a

s
do
ol

av
Vi

en

t
An leg

ra
E

Ca
.P aP

re
M uss


Vi a R
do

liv
.B
ar

Ju
im
C

og
a
ela
A

O
J
Jd

Pr
B

ei
ad
Co Co

or

Vi
la
S.
uz

N.
nj

Bairros

Gráfico 4 – Número de casos de diarréia aguda segundo procedência-Bairro.

Outro bairro percorrido por córrego e com prevalência significativa é o bairro Oliveira,
embora altas prevalências, acima de 10% tenham sido verificadas nos bairros Jardim Brasil
(11,15%) e Oliveira (14,33%), independente da proximidade de córregos receptores de esgotamento
sanitário. De igual maneira, bairros situados próximos ao percurso dos referidos córregos
apresentam prevalências abaixo de 10% tais como: Esperança (3,5%) e Nossa Senhora do Carmo
(4,1%), associados ao percurso do Córrego Moreira e Primavera (5,1%) e Morada do Sol (1,27%),
percorridos pelo Córrego do Carmo. E curiosamente verificamos que:
a) O bairro Cruzeiro do Sul, além da maior prevalência geral (57 casos), apresenta uma média anual
muito mais elevada para casos de diarréias nas faixas etárias acima de 50 anos = a 11 casos;
enquanto todos os demais bairros tem prevalência igual ou abaixo de 3 casos anuais.
b) Se considerarmos as prevalências para menores de 5 anos , a verificada no Bairro Bela Vista é
superior às dos Bairros Cruzeiro do Sul , Jardim Brasil e Oliveira, todos com 20 casos anuais.

DISCUSSÃO
Um dos atuais desafios à saúde pública e ao desenvolvimento do país, consiste na
definição de indicadores epidemiológicos e sanitários que permitam nortear as ações de vigilância
em saúde. Esta integração para ser profícua ela deve ocorrer a partir das informações do setor saúde
com as dos setores de meio ambiente e saneamento, ou seja, integrar as informações das vigilâncias
sanitária, epidemiológica e ambiental na construção da Vigilância em Saúde.
São os indicadores epidemiológicos importantes ferramentas para a vigilância ambiental na
medida em que refletem as ações e informações relativas à prestação dos serviços de abastecimento
de água e de esgotamento sanitário nos aspectos da cobertura e qualidade. Avaliações do impacto da
melhoria do abastecimento de água e de esgotamento sanitário sobre a saúde de crianças em 28
paises (ESREY, et al 1985), mostram correlação direta quanto as variáveis morbi-mortalidade por
diarréias, freqüência de parasitoses, estado nutricional e mortalidade infantil (HELLER, 1997).
Visando selecionar indicadores epidemiológicos de doenças e agravos relacionados ao
saneamento e mais apropriados ao presente estudo, optamos pelo indicador epidemiológico
Morbidade por doenças diarréicas com ênfase na faixa etária representada por crianças menores de
cinco anos.
Para Costa e outros (2005), esse indicador com base em dados extraídos da Monitorização
das Doenças Diarréicas Agudas – MDDA é mais consistente que o de dados procedentes dos
registros das internações hospitalares. Insiste o autor que um aspecto importante na análise desse
indicador é que sua correlação com as mortalidades infantil e até cinco anos por todas as causas
Fórum Internacional do Meio Ambiente - A conferência da Terra 1213

mostrou-se muito baixa, ao passo que a correlação com a mortalidade até cinco anos por doenças
diarréicas, mesmo sendo baixa (r = 0,228), é bem mais elevada que a correlação entre a morbidade
por doenças diarréicas decorrentes das internações hospitalares e a mortalidade por doenças
diarréicas (r = 0,09).
Nossos achados no município de Prata apresentam um total de 314 casos notificados de
diarréias no ano 2007 sendo que a maior prevalência, equivalente a134casos (42,67%), encontra - se
entre as crianças com até cinco anos de idade. Quando calculamos a prevalência infantil,
considerando crianças de até 10 anos, surpreende-se a freqüência percentual = a 52,68! E a sub-
notificação de casos deve ainda ser lembrada - assim como para os estudos em mortalidade, seja
pela dificuldade em se diagnosticar a diarréia; a sua notificação em outro grupo de causas; a baixa
incidência em alguns bairros influenciando, sobretudo aqueles com reduzida população.
Observou-se que a maioria dos casos os pacientes precisou receber cuidados nas Unidades
de Saúde, 37,58% dos pacientes receberam hidratação venosa e 21,97% receberam tratamento oral.
O único indicador sanitário, para Costa e outros (2005), que apresenta associação
estatística significativa e em sentido inverso à mortalidade por doenças diarréicas até cinco anos é o
cloro residual. E o único indicador sanitário que apresenta associação estatística significativa e em
sentido inverso à morbidade por doenças diarréicas decorrentes do monitoramento de doenças
diarréicas agudas foi o percentual da população do município com sistemas de abastecimento de
água com desinfecção. A qualidade da água para consumo humano é um dos indicadores ambientais
de grande importância para a saúde pública. A eficiência do tratamento da água reflete diretamente
na saúde da população uma vez que é consumida com muita freqüência e está direta ou
indiretamente ligada a todos os alimentos por nós consumidos.
A cidade de Prata tem hoje uma rede de abastecimento público com cobertura de 99% da
população, e considerando que o tratamento físico químico obedece as normas técnicas
preconizadas, não existe uma associação direta com a distribuição espacial dos casos de diarréias
notificados na cidade. Embora se deva comemorar a ampla cobertura da rede para abastecimento,
bem como a qualidade da água tratada, o mesmo não se pode dizer quanto ao esgotamento sanitário.
Se por um lado informa a Secretaria de Obras a captação de esgoto domiciliar em 97,69% das
residências, sabe-se que o destino do mesmo “in natura” ou sem tratamento são córregos com
cursos urbanos por populosos bairros da cidade.
Considerando que a poluição dos recursos hídricos por dejetos de origem humana e ou
animal é diária e constante e que o volume hídrico dos córregos receptores a cada dia diminui sua
capacidade de diluir e conduzir grande número de patógenos é importante questionar a freqüência e
intensidade do acesso da população às águas contaminadas e como ela utiliza-as para atividades
domésticas e produtivas tais como as hortifrutigranjeiras, como a irrigação de hortas produtoras de
verduras.
Os autores Libânio, Chernicharo e Nascimento (2005), fizeram uma comparação da
relação de indicadores de disponibilidade hídrica e de saneamento com indicadores sociais e de
saúde (IDH), e evidenciaram que nos estados com piores indicadores de saúde – maior taxa de
mortalidade e morbidade apresentam menores índices de cobertura por rede de esgotamento
sanitário mas não necessariamente, menores índices de cobertura por rede de água. Por sua vez, os
estados com melhores indicadores de saúde – menores taxas de mortalidade e morbidade – situam-
se entre aqueles que apresentam os maiores índices de cobertura por rede de abastecimento de água.
De acordo com Barroso, Cherubini e Cordeiro (2005), onde a incidência de diarréia é alta,
a coleta de esgoto desempenha um papel mais importante do que o abastecimento de água. Pode-se
notar que nos bairros onde a incidência de diarréia é maior a infra-estrutura é mais precária. Costa e
outros (2005), também verificaram que a cobertura da coleta de esgoto e por abastecimento de água
apresentou relação direta com o indicador de mortalidade infantil, o que, em caráter especulativo,
foi atribuído a fatores como a maior geração e exposição de esgotos no meio urbano, aumentando
riscos de transmissão de enfermidades na infância. E Freitas e outros (2001), verificaram que a
contaminação da água pode ocorrer no próprio domicílio, por falta de manutenção do reservatório,
pela sua localização, pela ausência de cuidados com manuseio e higiene e, também pelo tipo de
Fórum Internacional do Meio Ambiente - A conferência da Terra 1214

material que é empregado na construção da caixa d’água. Isso evidencia q importância de se


trabalhar com a educação em saúde para a população, demonstrando que para se ter água de
qualidade é preciso tomar alguns cuidados. Em 2000, de acordo com a Pesquisa Nacional de
Saneamento Básico (PNBS), 97,9% dos municípios brasileiros possuíam serviços de abastecimento
de água. Na região sudeste 70,5% dos municípios eram atendidos pela rede.
Segundo Borja e Morais (2002), o fato de estar ligado a rede de água não significa que um
domicílio esteja bem abastecido. As freqüentes manobras nas redes, em função da própria
obsolência do sistema e da disponibilidade de água, fazem com que determinadas populações
recebam quantidades de água insuficiente para suas necessidades básicas, além de sofrer
contaminação química ou microbiológica durante esse percurso. Tal constatação evidencia a
importância da discussão das interfaces da gestão de recursos hídricos com setores dependentes de
água de boa qualidade, em especial, com o setor de saneamento, sob cuja responsabilidade
encontram-se os serviços de água e de esgotos indispensáveis à promoção da saúde pública.

CONCLUSÃO
Constatou-se a relação direta entre os indicadores sanitários e epidemiológicos no
município de Prata. Ainda que abaixo da média nacional, os índices locais de prevalência e de
morbidade infantil por doenças diarréicas, evidenciaram a necessidade de investimento em obras de
infra-estrutura, para garantir a melhoria da qualidade de vida da população. Uma vez que condições
inadequadas de saneamento quanto ao destino dos esgotos domiciliares podem resultar em riscos à
saúde quanto à transmissão de doenças e respondem em especial pela alta mortalidade na infância.
Priorizar as obras de infra-estrutura sanitária reduz sensivelmente os gastos com a Saúde
Pública, beneficia qualidade de vida da população e do meio ambiente, evitando a contaminação
dos rios e córregos – em especial quando percorrem áreas urbanas e populosas.

REFERENCIAS BIBLIOGRAFICAS
ANDRADE, R. R.; SILVA, J. C., Saneamento e saúde ambiental: hospitalizações por doenças
infecciosas intestinais no RS. IN: 23° CONGRESSO BRASILEIRO DE ENGENHARIA
SANITÁRIA E AMBIENTAL, Campo Grande. 2005.
BARROSO, M. M; CHERUBINI, K. V; CORDEIRO, J. S.,. Análise critica da sustentabilidade
ambiental, saneamento e saúde publica no município de Porto Velho. IN: 23° CONGRESSO
BRASILEIRO DE ENGENHARIA SANITÁRIA E AMBIENTAL, CAMPO GRANDE. 2005
Borja, P. C., Moraes, L. R. S.; Indicadores de Saúde Ambiental com enfoque para a área de
saneamento. ENGENHARIA SANITÁRIA E AMBIENTAL, v.8,n.1, p. 13-25, 2002.
BRASIL, DATASUS/ Ministério da Saúde/ Informações de Saúde - data consulta: 21/02/2008
horário: 21:45 http://tabnet.datasus.gov.br/cgi/tabcgi.exe?ibge/cnv/popmg.def
BRASIL, Ministério da Saúde. PORTARIA N° 518, DE 25 DE MARÇO DE 2004. Estabelece os
procedimentos e responsabilidades relativas ao controle e vigilância da qualidade da água para
consumo humano e seu padrão de potabilidade e dá outras providências. 2004.
Carmo, H. E.; Barreto, M. L.; Silva, J. B.. - Mudanças nos padrões de morbi-mortalidade da
população brasileira: os desafios para um novo século - EPIDEMIOLOGIA E SERVIÇOS DE
SAÚDE, 12 (2) :63-75, 2003.
COPASA – Companhia de Saneamento de Minas Gerais. Disponível em:
<http://www.copasa.com.br/cgi/cgilua.exe/sys/start.htm>, acessado em: 15/09/2007.
COSTA, S. S; HELLER, L; BRANDÃO, C. C. S; COLOSIMO, E. A. Indicadores Epidemiológicos
Aplicáveis a estudos sobre a associação entre saneamento e saúde de base municipal. Ver.
ENGENHARIA SANITÁRIA AMBIENTAL, vol. 10, n° 2, p.: 118-127, 2005
dangers for the public water supply?, ANNUAL REVIEW OF MEDICINE, Virginia, v. 48, p.329-
340, fevereiro, 1997.
ESREY, S. A.; FEACHEM, R. G.; HUGHES,J.M. Interventions for the control of diarrhea
ldiseases among young children: improving watersupplies and excreta disposal facilities.
BULLETIN OF THE WORLD HEALTH ORGANIZATION, 63(4), 757-772. 1985.
Fórum Internacional do Meio Ambiente - A conferência da Terra 1215

FREITAS, M.B; BRILHANTE, O. M; ALMEIDA, L. M, Importância da análise de água para a


saúde publica em duas regiões do estado do Rio de Janeiro: enfoque para coliformes fecais, nitrato e
alumínio. CADERNO DE SAÚDE PÚBLICA, v.17, n°3, 2001.
GUIMARÃES, Z. A.; COSTA, M. C. N; PAIM, J. S.; SILVA, L. M. V. Declínio e desigualdades
sociais na mortalidade infantil por diarréia. REVISTA DA SOCIEDADE BRASILEIRA DE
MEDICINA TROPICAL. Vol. 34, nº5, Uberaba; 2001.
HELLER, L. Estado da arte da investigação epidemiológica na área de saneamento.
ENGENHARIA SANITÁRIA E AMBIENTAL, Rio de Janeiro, v.2, n.1, p 176-189,1997.
HELLER, L. Relação entre saúde e saneamento na perspectiva do desenvolvimento CIÊNCIA &
SAÚDE COLETIVA, 3 (2):73-84, 1998
IBGE – Instituto Brasileiro de Geografia e Estatística (2007). Censo Demográfico 2007. Disponível
em: http://www.ibge.gov.br/home, pesquisado em 10/09/2007.
LIBÂNIO, P. A. C.; CHERNICHARO, C. A. L.; NASCIMENTO, N. O. A dimensão da qualidade
da água: Avaliação da relação entre indicadores sociais, de disponibilidade hídrica, de saneamento e
de saúde pública. Ver. ENGENHARIA SANITÁRIA AMBIENTAL, vol. 10, n.3, p: 219-228.2005.
MORAES, TCN MONTEIRO, MJ SALLES, LM ALMEIDA & J CÂNCIO (orgs.) – Saneamento e
Saúde nos Países em Desenvolvimento. CC&P EDITORES, Rio de Janeiro. 1997
OPAS - Organização Pan-Americana de Saúde. Iniciativa Regional de Datos Básicos em Salud.
2004, Disponível <http://www.paho.org/Spanish/SHA/coredata/tabulator/newTabulator.htm.
acessado em 22 de setembro de 2007.
PINHO, A. – Brasil melhora 27 postos no ranking de morte de crianças – JORNAL FOLHA DE
SÃO PAULO – Cotidiano; pág.c1, Janeiro, 2008.
PRÜSS, A. et al. Estimating the burden of disease from water, sanitation, and hygiene at a global
level. ENVIRONMENTAL HEALTH PERSPECTIVES . v-110, n.5, p.537-542, May 2002.
STEINER T S, THIELMAN N M., MD, AND GUERRANT R. L. Protozoal agents: What are the
TEIXEIRA J C e PUNGIRUM M E M C Análise da associação entre saneamento e saúde nos
países da América Latina e do Caribe, empregando dados secundários do banco de dados da
Organização Pan-Americana de Saúde– OPAS. REVISTA BRASILEIRA DE EPIDEMIOLOGIA.
vol.8 no.4 São Paulo Dec. 2005
WHO – Word Health Organization www.who.int/inf-pr-2000/en/pr2000-73.html, acessado em
fevereiro de 2007.
Fórum Internacional do Meio Ambiente - A conferência da Terra 1216

A COMPOSTAGEM COMO OPÇÃO DE GERIR RESÍDUOS BIODEGRADÁVEIS NA


ESCOLA AGROTÉCNICA FEDERAL DE UBERLÂNDIA

Marilda Resende de Melo


EAFUDI - marildaresende@hotmail.com
Manfred Fehr
UFU - josemanf@yahoo.com

RESUMO
Este artigo é parte de uma pesquisa de mestrado cujo objetivo foi construir um modelo de
gestão descentralizado de resíduos biodegradáveis na Escola Agrotécnica Federal de Uberlândia
(EAFUDI) MG, a fim de contribuir para o cumprimento da sétima Meta de Desenvolvimento do
Milênio – Garantir a Sustentabilidade Ambiental - traduzindo-a em ações locais. Como a pesquisa
se ancorou em um sistema de comunicação dialógica entre pesquisador e pessoas da comunidade
envolvida, rumo à construção de um modelo de gestão descentralizado, que minimiza a quantidade
de resíduos encaminhados para o aterro sanitário local, a metodologia utilizada foi a pesquisa-ação.
A pesquisa passou pelas etapas de diagnóstico, conscientização e aplicação do modelo de Coleta
Diferenciada. A partir de uma situação inicial onde todos os resíduos produzidos na Escola eram
enviados ao aterro municipal, atingiu-se uma situação final em que 770 kg/semana de resíduos
biodegradáveis e 91 kg/semana de resíduos inertes são desviados do aterro. Os biodegradáveis são
transformados no local em composto orgânico e os secos são reciclados por meio da logística
reversa existente no município.
Palavras- chave: compostagem, gestão de resíduos, sustentabilidade.

ABSTRACT
This article is part of a master's degree research whose objective was to construct a
decentralized management residues model in Escola Agrotécnica Federal de Uberlândia (EAFUDI)
MG, in order to contribute for the fulfillment of the seventh Millennium Development Goal -
Ensuring Environmental Sustainability - translating it in local actions. As the research was anchored
in a dialogical communication system between researcher and people of the community involved,
towards the construction of a decentralized management model, which minimizes the amount of
waste sent to the landfill site, the methodology used was the research-action. The research went
through the steps of diagnosis, awareness and application of differentiated collection model. From
an initial situation where all waste produced in the school were sent to the municipal landfill, we
reached a final situation with 770 kg / week of biodegradable waste and 91 kg / week of inert waste
are diverted from the landfill. The biodegradable waste is processed in the organic compound and
the other, the dries ones are recycled through the reverse logistics existing in the Council.
Key words: composting, sustainability, waste management.

INTRODUÇÃO
Nos últimos tempos, a sociedade tem poluído a natureza pelo consumo exagerado de
produtos industrializados e tóxicos que, ao serem descartados, acumulam-se no ambiente, causando
danos ao planeta e à própria existência humana. A produção de resíduos em larga escala - entenda-
se não só no sentido de resíduos sólidos, mas também no sentido social: miséria, fome e exclusão -
caracteriza a sociedade de consumo que cresce assustadoramente desde o século passado.
Devemos ressaltar, porém, que o sistema capitalista em si, não pode ser considerado o
vilão das catástrofes ambientais, pois, se assim fosse, não se tinha presenciado o colapso ambiental
vivido pelos antigos países comunistas da Europa oriental. O que se pode afirmar é que a
apropriação privada dos recursos naturais, guiada pela falta de regulamentação por parte do Estado
é o fator responsável pela crise ambiental e pela grande quantidade de lixo gerado na produção e no
consumo. Existe atualmente uma enorme diferença de ritmos e intensidade entre o metabolismo
industrial e o biológico, este último baseado nos ciclos de auto-eco-organização dos sistemas
naturais que realizam, sem cessar, as transformações entre energia e matéria em todo o planeta.
Fórum Internacional do Meio Ambiente - A conferência da Terra 1217

Para a questão dos resíduos, a adoção de um modelo capaz de minimizar os impactos


ambientais por eles gerados faz-se necessária e deve ser urgente.
O modelo de gestão de resíduos sólidos urbanos predominante em nosso País baseia-se na
coleta e afastamento dos resíduos gerados e, quando muito, na sua disposição adequada. Representa
uma solução isolada e estanque, necessitando de mudanças.
A solução para esse problema pode estar no desenvolvimento de modelos integrados e
sustentáveis que considerem, desde o momento da geração dos resíduos, a maximização de seu
reaproveitamento e reciclagem e conseqüente redução do volume destinado aos aterros, até o
processo de tratamento e destinação final.
Programas de educação ambiental devem ser implementados de forma reflexiva e não de
forma apenas reducionista, considerando-se a reciclagem não só como produto desses programas,
mas como uma forma de se repensar os valores culturais sobre a sociedade do consumo.
Analisando-se a interface entre a educação ambiental e a questão do lixo, Layrargues (2002, p.181),
faz a seguinte observação:
Qualquer modelo de gestão dos resíduos evidencia a importância de estudos e ações
voltados à sua correta disposição final. É composto de fases que envolvem desde a sua geração até a
disposição final, entendendo-se como um conjunto de partes que, interligadas, visam a atingir
determinados objetivos, de acordo com um planejamento elaborado com fundamentação teórico-
metodológica.
Seguindo esse raciocínio, a utilização de indicadores lógicos para a construção da filosofia
de gestão mais adequada à comunidade local, faz-se necessária. A filosofia internacional hoje
considerada moderna busca o maior desvio possível de resíduos dos aterros, no intuito de prolongar
a sua vida útil (FEHR, 2001).
Objetivar um modelo gerencial com o qual se possa coletar separadamente o material
putrescível e reaproveitá-lo por meio da compostagem é sem dúvida, o primeiro passo rumo ao
cumprimento da Sétima Meta do Milênio. Para o cumprimento desse passo, é importante que se
inicie com a coleta diferenciada (CALÇADO,1998), modelo resultante das ponderações feitas com
relação às variadas formas de coleta, em que se tem a separação dos resíduos em duas categorias:
seco e úmido. Como conseqüência, obtém-se uma redução significativa da quantidade de resíduos
levada ao aterro, tornando a comunidade em questão sustentável sob esse prisma.
Segundo Tchobanoglous, Theisen e Virgil (1993), o modelo mais adotado para reverter a
disposição inadequada dos resíduos sólidos urbanos em lixões é baseado no gerenciamento
integrado, em que todos os elementos fundamentais são avaliados e utilizados, e todas as interfaces
e conexões entre os diferentes elementos são avaliadas com o objetivo de se obter a solução mais
viável.
Estudos feitos por Fehr e Castro (1999) sobre a caracterização do lixo domiciliar da cidade
de Uberlândia mostram que 72% dele é constituído de matéria orgânica putrescível. Um índice
preocupante que induz um repensar sobre a cultura de que as coisas somente são resolvidas com
dinheiro. Este trabalho tentará mostrar a importância de se adotar políticas descentralizadas pela
própria sociedade por meio de projetos de educação sanitária e ambiental, com ações para redução
do desperdício e para a mudança na destinação dos resíduos. Podem ser eficazes e contribuir
efetivamente para a mudança de postura das pessoas, melhorando a sua qualidade de vida e,
conseqüentemente, indo de encontro ao cumprimento de uma das Metas do Milênio, objeto deste
trabalho.
O objetivo principal do presente trabalho centrou-se na construção de um modelo de gestão
descentralizado de resíduos na Escola Agrotécnica Federal de Uberlândia (EAFUDI) MG, a fim de
contribuir para o cumprimento da sétima Meta de Desenvolvimento do Milênio – Garantir a
Sustentabilidade Ambiental - traduzindo-a em ações locais. Para tanto fez-se necessário estabelecer
os objetivos específicos, que, ao longo do trabalho contribuíram para a concretização dessa
pesquisa. Estão assim elencados: sensibilização de toda a comunidade da EAFUDI para uma
tomada de consciência sobre a necessidade de aproveitamento dos resíduos orgânicos; determinação
do percentual de desvio dos resíduos sólidos do aterro alcançável por iniciativas particulares
Fórum Internacional do Meio Ambiente - A conferência da Terra 1218

descentralizadas; destinação dos resíduos orgânicos produzidos no refeitório da Escola Agrotécnica


Federal de Uberlândia e nas residências de seus funcionários moradores à compostagem; combate à
cultura do desperdício; utilização do composto orgânico produzido durante a pesquisa para
adubação das mudas de cerrado existentes no Viveiro de mudas da Escola e no setor de
Olericultura; identificação e separação dos resíduos secos recicláveis gerados na Escola retornando-
os ao seu centro produtivo por meio da logística reversa; adoção de um modelo piloto de gestão
descentralizada de manejo dos resíduos sólidos que possa ser imitado tanto por instituições de
educação similares à pesquisada.

METODOLOGIA
Como a pesquisa ancorou em um sistema de comunicação dialógica entre pesquisador e
pessoas da comunidade envolvida, rumo à construção de um modelo de gestão descentralizado que
minimiza a quantidade de resíduos encaminhados para o aterro, a metodologia utilizada no trabalho
de campo foi a pesquisa-ação.
De acordo com Thiollent (2003), a pesquisa-ação é um tipo de pesquisa social com base
empírica que é concebida e realizada em estreita associação com uma ação, ou com a resolução de
um problema coletivo, ou para a tomada de consciência, ou ainda para a produção de
conhecimentos. Em outras palavras, a pesquisa-ação se apóia no diálogo entre pesquisadores e
atores para a produção de um novo tipo de conhecimento que favorece a orientação da ação em um
determinado contexto. Não existe um sujeito e um objeto de pesquisa; todos são sujeitos e
participam ativamente rumo a um objetivo.
O trabalho de campo consistiu das fases relatadas a seguir. Inicialmente procurou-se em
toda a área disponível da Escola Agrotécnica, um local adequado para a realização da compostagem
e também um local coberto onde se poderiam acondicionar e separar os resíduos secos.
Em seguida, montou-se um vídeo e uma palestra para serem utilizados na sensibilização de
toda a comunidade envolvida neste projeto. O vídeo e a palestra reportam a importância da coleta
diferenciada e o papel que cada ser humano tem na geração de resíduos e de que forma pode-se
reduzir esse percentual e dar uma destinação adequada a eles.
Detalhando melhor a comunidade envolvida, podem-se citar os 11 servidores do refeitório;
os 21 funcionários residentes na Instituição e suas respectivas famílias totalizando 61 pessoas; os 43
docentes; os 553 discentes e 82 servidores administrativos. Estão envolvidas na pesquisa 750
pessoas.
Posteriormente, a esses três passos relatados acima, iniciou-se o processo de sensibilização,
começando primeiramente com os servidores do refeitório da Escola, pois, este local é o maior
gerador de resíduos putrescíveis.
Realizou-se um diagnóstico dos resíduos gerados nos principais setores da Escola, como
refeitório, os 20 alojamentos com seus 98 alunos residentes, as duas cantinas (a do prédio
pedagógico e a do administrativo) e as moradias dos servidores, verificando a quantidade e o tipo.
Foram distribuídas lixeiras aos moradores e aos alunos residentes, para que eles pudessem
acondicionar adequadamente os resíduos secos e úmidos. Também foram informados do horário e
dia que o trator de recolhimento passaria.
Após o início da coleta diferenciada, fazia-se a remoção diária dos resíduos. O secos foram
transportados para o local cedido onde acontecia a separação e posteriormente encaminhados à
reciclagem por meio da logística reversa. Os molhados (sobras de alimentos ) foram levados
diariamente para as leiras de compostagem, área não coberta, localizada na Unidade Educativa de
Produção (UEP) da Olericultura, com aproximadamente 160 m², onde foram montadas 20 leiras
(espécie de canteiros retangulares) com peso entre 600 e 700 quilos cada e altura variando de 70 e
80 centímetros. Essas leiras foram montadas num local que recebe pouco sol sobre o solo, tendo,
cada uma, uma área de aproximadamente 5 m². As leiras foram separadas umas das outras por
pequenas áreas de terra.
Um total de 20 leiras foram preparadas. Em cada uma se depositavam diariamente os
resíduos durante uma semana. Do total das leiras, fez-se um tratamento estatístico em apenas
Fórum Internacional do Meio Ambiente - A conferência da Terra 1219

quatro. Em cada uma dessas quatro, foram utilizadas diferentes matérias secas. A cada 30 dias
foram coletadas as amostras da massa existentes nas diferentes leiras para análises físico-químicas e
microbiológicas, com o objetivo de comparar temperatura, pH, percentual de umidade, relação
Carbono/Nitrogênio, além de verificar a necessidade de interferência ou não.
O número dimensionado para o total de leiras existentes neste projeto, foi baseado na
quantidade de resíduos gerados diariamente. Como foi feito um procedimento piloto, verificou-se
que como cada leira teria que comportar os resíduos orgânicos da semana, que em média, estavam
em torno de 350 kg, e como se optou por utilizar a mesma quantidade de resíduos estruturantes, as
pilhas comportariam cerca de 700 kg.
Ao final da compostagem, houve a coleta da amostra das diferentes leiras, para se fazer a
comparação dos nutrientes de cada uma delas, com o objetivo de verificar em qual delas se tinha o
melhor composto orgânico. O melhor composto orgânico é aquele que tem os nutrientes necessários
ao melhor desenvolvimento das plantas. O composto gerado está sendo utilizado como substrato na
produção de mudas do cerrado do Viveiro da Escola.
Foi realizada a quantificação do desvio dos resíduos gerados na Escola Agrotécnica
Federal de Uberlândia, destinados ao aterro sanitário e avaliação do atendimento da Meta 7 do
Desenvolvimento do Milênio.
Como o sistema utilizado para a realização da compostagem foi o aeróbio, à medida que se
fazia necessário, as leiras eram reviradas, geralmente a cada 2 ou 3 dias, a fim de homogeneizar
toda a massa, aumentar a quantidade de oxigênio existente nelas e propiciar uma degradação
uniforme da matéria orgânica. Freqüentemente media-se a temperatura das leiras, com o objetivo de
verificar a necessidade de umidificá-las ou não.
Foram realizadas uma análise inicial e outra final, sendo que a inicial foi apenas para
verificar a umidade e a relação de carbono/nitrogênio; já a final, além de ser para verificar a relação
carbono/nitrogênio, também as amostras foram encaminhadas ao laboratório de solos da
Universidade Federal de Uberlândia, para se fazer uma análise dos nutrientes de cada composto
formado.Ao final da compostagem, houve o peneiramento do composto.

RESULTADOS E DISCUSSÃO
A gestão de resíduos, na Escola Agrotécnica Federal de Uberlândia, até então, consistia
apenas na coleta e afastamento dos resíduos gerados. O caminhão de coleta de lixo, que faz parte da
empresa terceirizada que presta serviços à Prefeitura do município, é o responsável pelo
recolhimento de todos os resíduos ali gerados, passando às terças e sextas feiras.
Não havia nenhum tipo de separação na fonte, com exceção do óleo de cozinha, que
inicialmente era utilizado pelos próprios servidores do refeitório para o feitio de sabão, e hoje é
destinada à fábrica de ração da Escola.
Para dar início à construção de um modelo adequado de gestão de resíduos na Escola
Agrotécnica Federal de Uberlândia e que atenda à Sétima Meta do Milênio, primeiramente fez-se
uma divulgação do que é a Coleta Diferenciada, utilizando-se para isto, cartazes, com informações
sobre de que consiste tal Coleta, que foram espalhados por locais estratégicos da escola juntamente
com duas lixeiras: uma para resíduos secos e a outra para resíduos molhados (Figuras 10 e 11). Foi
uma forma encontrada de fazer com que a comunidade tomasse conhecimento e ao mesmo tempo,
se tornasse sensível e despertasse para a problematização que envolve os resíduos. Supõe-se que a
partir daí, com uma separação mais sistemática, houve maior precisão na quantificação desses
resíduos.
Após esse primeiro passo, com a implementação da Coleta Diferenciada, realizou-se o
diagnóstico no refeitório da escola, durante 10 semanas, pesando-se diariamente os resíduos
orgânicos e recicláveis. A quantidade de resíduos orgânicos obtida foi desdobrada em: sobra nas
panelas, sobra nos bandejões e restos de folhas e cascas de verduras. Os dados foram condensados
semanalmente para facilitar a sua visualização. Encontram-se na Tabela 1, abaixo:
Fórum Internacional do Meio Ambiente - A conferência da Terra 1220

Tabela 1: Quantidade de resíduos gerados no refeitório da EAFUDI


Nº de refeições Sobra Sobra Folhas e cascas de Recicláveis
servidas panelas bandeijões verduras (c) (kg) secos
Data (a) (kg) (b)(kg) (kg)
1ª semana 600 150,5 398 143,5 38
2ª semana 600 40 174 56 8
3ªsemana 600 103 201 150 26
4ª semana 600 146 195 165 24
5ª semana 600 55 113 164 10,5
6ª semana 600 87,5 125,5 119,5 12,5
7ª semana 600 80 126,5 157,5 6
8ªsemana 600 61 162 206 4,5
9ª semana 600 150 356,5 332 10
10ªsemana 600 147 344 212 5
Fonte: Dados da pesquisa/2007.

Para que se possa melhor compreendê-los, encontra-se, abaixo, a síntese dos dados acima
descritos, por meio do gráfico abaixo (Figura 1):

Diagnóstico dos resíduos do refeitório da EAF-


Udi
450
400
Quantidade em Kg

350
300
250
200
150
100
50
0

1 2 3 4 5 6 7 8 9 10
Sem ana

Sobra nas panelas Sobra nos bandeijões

Folhas e cascas de verduras Recicláveis

Figura 1: Diagnósticos dos resíduos sólidos gerados no refeitório da EAF-Udi. Fonte: Dados da
pesquisa/2007

Verifica-se que a quantidade de resíduo orgânico gerada no refeitório da escola, da 2ª à 8ª


semana, foi bem inferior às da 9ª e 10ª semanas. Isso se deve ao fato de que, nessas semanas
intermediárias, os resíduos sólidos, embora adequadamente separados dentro do refeitório, à medida
que enchiam as lixeiras, tinham de ser levados para os latões colocados do lado de fora. Como não
havia nenhuma identificação nesses latões, os funcionários do setor depositavam em qualquer um
deles, sem a preocupação e a iniciativa de separá-los também fora da cozinha. Assim, ao realizar o
diagnóstico, como os resíduos estavam misturados nos latões, a quantificação correta dos resíduos
secos dos putrescíveis não foi precisa, ficando a desejar. Verificou-se que, o se pesava antes, era
apenas uma parte do resíduo orgânico, em virtude de ele estar misturado com plásticos, latas de
conservas e outros resíduos não orgânicos. Somente com a detecção dessa falha, fazendo a
identificando dos latões que ficam do lado de fora do refeitório, é que se pôde obter uma precisão
nos dados apresentados.
Acredita-se também que o fato de se estar sempre em contato com esses funcionários,
inclusive realizando as palestras e conversando sobre a importância da separação dos resíduos na
Fórum Internacional do Meio Ambiente - A conferência da Terra 1221

fonte, tenha também contribuído para a eficiência do modelo de gestão ali implantado. Outro ponto
pendente solucionado, foi a reclamação desses funcionários, que alegavam não ter lixeiras em
número suficiente, razão pela qual, não faziam a separação como deveriam. Como o desafio era
fazer com que o trabalho tivesse êxito, providenciaram-se então as lixeiras.
Pode-se, portanto, levar em consideração que os dados das 9ª e 10ª semanas, são os mais
significativos. Isso representa, em média, um descarte semanal de 770 kg de resíduos orgânicos no
refeitório.
Com o intuito de estimar a quantidade de resíduos secos recicláveis, foi realizado também
o diagnóstico deles em toda a escola, durante uma semana. Para tanto, foram recolhidos
diariamente, quantificados e separados, a fim de que se pudesse ter uma noção do que estava sendo
gerado na instituição, para então encaminhá-los à logística reversa. A Tabela 2 resume os dados
obtidos:

Tabela 2: Quantidade diária de resíduos sólidos recicláveis gerados na EAFUDI.


Tipos de Quantidade ( em kg)
resíduos 1º dia 2º dia 3º dia 4º dia 5ºdia 6º dia 7º dia semanal
latas 1,5 2,1 0,2 0 0,2 0,1 4,1
papelão 12 4 2 37,5 0 1,2 4 60,7
PET 3 2 2,1 4,3 0,3 2 0,3 14
sacos plásticos 2 1,3 0,3 0 2,7 6,3
copos plásticos 2,5 1 1 0,2 0,4 0,5 5,6
Papel 0 4 0 0 0 0 0 4
Fonte: Dados da pesquisa/2007.

Para melhor compreensão dos resultados encontrados, os dados acima foram compactados
e mostrados por meio do gráfico de setores (Figura 2) com os tipos de resíduos sólidos e seus
respectivos percentuais:

6% 5%
7%

15%

67%

lata papelão PET Sacos plásticos Copos plásticos

Figura 2: Quantidade de resíduos sólidos gerados na EAF- Udi. Fonte: Dados da pesquisa/2007.

CONCLUSÕES
Verificou-se com a pesquisa que é possível desenvolver um modelo eficaz de gestão de
resíduos orgânicos. Especificamente, a Escola Agrotécnica Federal de Uberlândia, está a 8 meses
sem levar para o aterro sanitário local, os resíduos orgânicos produzidos no refeitório e residências
de seus servidores/moradores. Isto significa que foram desviados 27,72 toneladas desses resíduos do
aterro sanitário local. Está dessa forma contribuindo para o cumprimento da sétima Meta do
Milênio: Garantir a Sustentabilidade Ambiental e não somente reduzindo-os pela metade como é
um dos objetivos previstos para esta determinada meta. A instituição conseguiu ir além, reduziu em
Fórum Internacional do Meio Ambiente - A conferência da Terra 1222

100% a quantidade de resíduos desviados, melhorando significativamente a qualidade de vida das


pessoas da comunidade local..
Pensar em tornar o ambiente em que se vive sustentável, é direcionar ações capazes de
trazer satisfação e qualidade de vida às pessoas. Ações que possam engajar todos na construção de
metas para se alcançar a harmonia com o meio ambiente. Desta forma, trabalhar um projeto de
compostagem seria uma solução que, além de dar destinação aos resíduos orgânicos gerados na
comunidade, desviando significativamente a quantidade deles levada ao aterro, promoveria a sua
utilização, combatendo o desperdício, proporcionando o cumprimento de uma das Metas do
Milênio, objetivo principal deste trabalho. Com o objetivo de cumprir a sétima Meta do Milênio,
pensou-se na implementação de um sistema de gestão desses resíduos, com enfoque em métodos de
pesquisa quali-quantitativa, contribuindo para minorar os impactos negativos no ambiente e criando
alternativas de uso e produção de novos produtos e processos.
Sendo assim, o trabalho se revestiu de importância porque além de instigar a busca da
melhoria dos processos de produção, identificando os meios para a máxima utilização da matéria
prima, criando oportunidades para a utilização do composto formado no viveiro de mudas e no setor
de Olericultura, a partir de resíduos em cadeias de produção, com efeitos positivos na diminuição
dos impactos ambientais e de acordo com os princípios da produção sustentável.
A relevância da presente proposta está em fornecer subsídios que permitam tornar os
modelos de gestão mais produtivos, visando minimizar o impacto causado pelos resíduos orgânicos
produzidos na escola, no atual contexto em que a visão multidimensional tem sido pouco explorada
para fundamentar os processos decisórios, bem como para entender e analisar o significado desses
resíduos para as pessoas direta ou indiretamente envolvidas.
O que se busca é o envolvimento, cada vez maior, de toda a comunidade, no sentido de se
desviar a maior quantidade possível de resíduos do aterro, por meio de desenvolvimento de projetos
locais como este, que visa a refletir sobre o comportamento de cada um, mostrando que é possível,
numa atitude descentralizada, minimizar a geração de resíduos, garantindo o cumprimento efetivo
da sétima Meta de Desenvolvimento do Milênio.
A implantação do modelo de coleta diferenciada de resíduos na Escola passou
primeiramente por um trabalho de esclarecimento e conscientização que levou três meses. Todos os
resíduos são agora separados em biodegradáveis e inertes. Os biodegradáveis são usados para
produzir composto orgânico. Os secos são encaminhados aos atores da logística reversa no
município. O desvio do aterro municipal conseguido com este modelo é de 770 kg por semana de
resíduos biodegradáveis e de 90,7 kg por semana de resíduos secos. Este resultado vai ao encontro
da sétima meta do milênio sobre a sustentabilidade ambiental.

REFERÊNCIAS
CALÇADO, R. Resíduos sólidos domiciliares: da proposta aos testes de um modelo pró-ativo de
gestão. 1998. 231 f. Dissertação (Mestrado em Engenharia Química) - Faculdade de Engenharia
Química, Universidade Federal de Uberlândia, Uberlândia, 1998.
FEHR, M.; CASTRO, M. S. M. V . Análise do lixo induz modelo empírico de gestão. Saneamento
Ambiental, São Paulo, v. 10, n. 55, p. 38-41, 1999.
FEHR, M.; CASTRO, M. S. M. V; CALÇADO, M dos R. Lixo biodegradável no aterro, nunca
mais. Banas Ambiental, Rio Grande do Sul, ano II. 10, n. 10, p. 12-20, 2001.
LAYRARGUES, P. P. O cinismo da reciclagem: o significado ideológico da reciclagem da lata de
alumínio e suas implicações para a educação ambiental. In: LOUREIRO, C. F. B.; LAYRARGUES,
P. P.; CASTRO, S. de C. (Org.). Educação ambiental: repensando o espaço da cidadania. 2. ed. São
Paulo: Cortez, 2002.
TCHOBANOGLOUS, G; THEISEN, H.; VIRGIL, S. Integrated solid waste management:
engineering principles and management issues. New York: McGraw-Hill, 1993.
THIOLLENT, Michel. Metodologia da Pesquisa-ação. São Paulo: Cortez Editora, 2003.
Fórum Internacional do Meio Ambiente - A conferência da Terra 1223

LIXÃO DE MOSSORÓ (RN): LAR E FONTE DE RENDA DOS EXCLUÍDOS.

Maria de Socorro Moura Paulino


Geógrafa. Mestre em Desenvolvimento e Meio Ambiente. Professora do CEFET-RN/UNED-Mossoró-RN. Rua:
Raimundo Firmino de Oliveira, nº 400 - Costa e Silva
Mossoró - RN - CEP: 59.628-330 - e-mail: sendoluasol@yahoo.com.br
Régia Lúcia Lopes
Engenheira Civil pela UFRN. Mestre em Engenharia Química pela UFRN, Doutoranda do Programa de Pós-Graduação
em Engenharia Civil da UFPE. Professora do CEFET-RN Unidade Sede – Rua Salgado Filho, Lagoa Nova – Natal-RN.
Romero Rossano Tertulino da Silva
Geógrafo. Professor. Rua: Raimundo Firmino de Oliveira, nº 400 - Costa e Silva
Mossoró - RN - CEP: 59.628-330.

RESUMO
O lixão de Mossoró-RN encontra-se em processo de desativação em função da construção
do Aterro Sanitário da cidade que irá proporcionar melhorias na qualidade ambiental do município.
Dessa forma os catadores que trabalham diretamente no lixão daquela localidade se dizem
ameaçados quanto ao destino que suas vidas irão tomar quando isso acontecer. A prefeitura
elaborou um projeto de coleta seletiva porta a porta como meta do município em relação à gestão
dos resíduos sólidos urbanos, para diminuir o encaminhamento de resíduos para o aterro,
aumentando assim sua vida útil e, principalmente, inserir os catadores nessa atividade minimizando
o impacto social decorrente do fechamento do lixão. Esse trabalho tem por objetivo apresentar o
diagnóstico dos catadores que atuam no lixão das Cajazeiras e analisar os impactos sócio-
econômicos resultantes da desativação do lixão sob a visão dos catadores. A pesquisa de campo foi
realizada no período de fevereiro a maio de 2007 e se deu através de 60 visitas ao local, aplicação
de questionários abertos e semi-abertos e entrevistas. Foram identificados 120 catadores, sendo que
apenas 58 se dispuseram a participar efetivamente da pesquisa. Constatou-se que mesmo em um
ambiente insalubre, inóspito e perigoso, as pessoas que retiram de lá o seu sustento não querem sair
do local, pois esse é o único refúgio de que dispõem, já que se sentem excluídas seja pelo
desemprego, analfabetismo ou problemas de cunho familiar. O desemprego e a falta de opção,
segundo eles, é o grande mal, sendo esse o grande impacto social e econômico que a desativação do
lixão vai ocasionar, caso não sejam implementadas ações de inserção desses catadores numa
atividade produtiva.
Palavras-chave: Catadores – Coleta seletiva – Lixão – Impacto social – Gestão de resíduos sólidos.

ABSTRACT
The landfill in Mossoró – RN – Brazil is in a process of deactivation because of the
building of the sanitary landfill which will improve the environmental quality of the urban
community. In this way, the people who work straight in the landfill feel threatened about how they
will survive when this takes place. The city hall has elaborated a project on collective select door in
door aiming to reduce the conduction of waste to the sanitary landfill, thus increasing their useful
life and mainly inserting those people in this kind of activity minimizing the social impact for the
closure of the landfill. This research aims to present a diagnosis of the people who work in the
Cajazeiras Landfill and to analyze the social-economical impact because of the deactivation of that
place through these people’s way of view. This field research took place from February to May in
2007. There were 60 visits to the landfill, some open and semi-open questionnaires and interviews.
120 people were identified but only 58 worked effectively for the research. Although the
surrounding be unhealthy, inhospitable and dangerous the people who work there do not feel
comfortable to leave the place, for this is the only refugee which they have since they feel excluded
even for the unemployment, the illiteracy or family problems. The unemployment and the lack of
options, according to them, is the great problem and this is the big social and economical impact
that the deactivation will cause if no insertion actions are implemented to provide these people with
a productive activity.
Keywords: collective select – landfilll – social impact
Fórum Internacional do Meio Ambiente - A conferência da Terra 1224

INTRODUÇÃO
O lixão do Município de Mossoró-RN, conhecido como “Lixão das Cajazeiras”, encontra-
se em processo de desativação com a entrada em funcionamento do aterro sanitário já construído e
licenciado. Os catadores daquela localidade se dizem ameaçados quanto aos rumos que suas vidas
irão tomar após essa efetivação. O aterro sanitário da cidade de Mossoró-RN é um empreendimento
de relevante importância no que diz respeito ao gerenciamento dos resíduos sólidos municipais.
Atualmente os resíduos de origem domiciliar, comercial e pública, exceto os resíduos de serviços de
saúde, estão sendo dispostos no local denominado “lixão das Cajazeiras”, às margens da Estrada da
Raiz. Local esse onde se encontra uma massa trabalhadora desenvolvendo a atividade de catação de
resíduos diretamente no lixão, configurando um quadro social degradante.
Nesse contexto, um problema social precisa ser enfatizado: a erradicação da atividade de
catação de resíduos no lixão que vai ocasionar a perda da renda dos catadores que sobrevivem dessa
atividade. Esses catadores desenvolvem essa atividade no local há um longo período e exercem a
função de principais atores na reciclagem de resíduos no âmbito municipal. Uma forma de
minimizar os impactos sócio-econômicos aos quais essas pessoas estão expostas é a implantação de
um programa de coleta seletiva do qual os catadores retirem o sustento, de forma digna, organizada,
segura e com uma gestão participativa da sociedade.
Esse trabalho tem por objetivo apresentar o diagnóstico dos catadores que atuam no lixão
das Cajazeiras e analisar os impactos sócio-econômicos resultantes da desativação do lixão sob a
visão dos catadores. Os questionamentos acerca do tema centraram-se em: qual a representação
econômica do lixão? Os trabalhadores e trabalhadoras tem consciência do perigo que correm ao
manejar aqueles resíduos contaminados? Eles têm consciência da importância daquele trabalho para
a sociedade? Aceitam participar da coleta seletiva?
A pesquisa de campo foi realizada no período de fevereiro a maio de 2007 e se deram
através visitas ao local, aplicação de questionários abertos e semi-abertos e entrevistas. Foram
identificados 120 catadores, sendo que apenas 60 se dispuseram a participar efetivamente da
pesquisa. Dos quais 81% são do sexo masculino e estão em idade economicamente ativa.
Constatou-se que mesmo em um ambiente insalubre, inóspito e perigoso, as pessoas que retiram de
lá o seu sustento não querem sair do local, pois esse é a única fonte de renda que dispõem, e
enfrentam a falta de emprego, conseqüência do analfabetismo, falta de moradia e problemas sociais
de cunho familiar. O desemprego e a falta de opção, segundo eles, é o grande mal, sendo esse o
grande impacto social e econômico que a desativação do lixão vai ocasionar, caso não sejam
implementadas ações de inserção desses catadores numa atividade produtiva.
O desenvolvimento desse trabalho contou com o a participação da Secretaria Municipal de
Serviços Urbanos, Trânsito e Transportes Públicos e do Centro Federal de Educação Tecnológica
do Rio Grande do Norte (CEFET-RN) - Unidade Descentralizada de Mossoró.

MATERIAIS E MÉTODOS
O trabalho de diagnóstico foi realizado através de visitas de campo e aplicação de
questionários e entrevistas. Durante a coleta de dados foram identificados 120 catadores, 58 dos
quais se dispuseram a participar efetivamente da pesquisa. Foram feitas 60 visitas a área no período
de fevereiro a maio de 2007.
Nesse estudo diagnóstico foi contemplado também o aspecto qualitativo que prioriza o
discurso de homens e mulheres que retiram sua sobrevivência da catação de resíduos na área do
lixão. Dessa forma fez-se necessário a observação participante através de convivência com a
comunidade, aplicação de questionários, entrevistas e histórias de vida. As abordagens foram
direcionadas para a visão que eles têm da coleta seletiva e a aceitação desse projeto que a prefeitura
quer implantar.
A metodologia utilizada nesse trabalho se dividiu em duas fases. A primeira de
conhecimento da área e de convivência com os catadores na área do lixão. A segunda representou
Fórum Internacional do Meio Ambiente - A conferência da Terra 1225

na elaboração e aplicação de instrumentos de coleta de dados para diagnóstico sócio-econômico


seguindo-se da análise dos dados.
Na primeira fase foram feitas 40 visitas ao lixão com o objetivo de conhecer e obter
informações pertinentes à atividade desenvolvida naquela área bem como também, de certa forma,
conquistar a confiança dos mesmos. Como se dava a catação, os horários e as turmas para cada
turno foram os dados utilizados no projeto para se estabelecer os parâmetros a serem avaliados,
dessa forma foi conhecida toda a rotina de trabalho. A partir dessas visitas 58 catadores se
dispuseram a participar da pesquisa como também apresentavam certa aceitação com relação à
coleta seletiva, e sua participação no projeto. A segunda fase constou da elaboração de instrumento
de coleta de dados para ser aplicado entre os 58 catadores visando um diagnóstico socioeconômico
mais detalhado e da análise de dados e elaboração de trabalho final. Foram realizadas nesse decorrer
de 20 visitas. O questionário foi composto de perguntas diretas a respeito do grau de escolaridade,
renda mensal, número de filhos, faixa etária, tempo de trabalho na área, conhecimento da população
sobre o programa de coleta seletiva, seus objetivos e sua participação no mesmo.

RESULTADOS
Perfil dos catadores
De acordo com os dados obtidos no levantamento de dados em campo o perfil dos
catadores, 81% dos catadores que trabalham no lixão são do sexo masculino e isso inclui jovens e
idosos, ou seja, pais de família com faixa etária variando de 18 anos até idosos acima de 70 anos.
De acordo com a Figura 01 observa-se que 49% dos catadores estão na faixa etária entre 21
a 40 anos, fazendo parte da PEA (população economicamente ativa).

Faixa etária
acima de 70 não sabem
anos 10% 18 a 20 anos
2% 7%

61 a 70 anos
21 a 30 anos
9%
21%

51 a 60 anos
14%
31 a 40 anos
41 a 50 anos 27%
10%

Figura 1: Faixa Etária dos catadores que trabalham no lixão das Cajazeiras – Mossoró-RN.

Com relação à escolaridade, 57% dos catadores são analfabetos, 26% são apenas
alfabetizados existindo 5% com ensino fundamental completo e apenas 1 catador possui o ensino
médio completo como pode ser visto na Figura 02.
Fórum Internacional do Meio Ambiente - A conferência da Terra 1226

Grau de escolaridade
ensino
fundamental ensino médio
completo 2%
5%
ensino
fundamental
incompleto
31%
analfabetos
57%
alfabetizados
5%

Figura 2: Grau de escolaridade dos catadores que trabalham no lixão das Cajazeiras – Mossoró-RN.

A questão da escolaridade é, portanto, um problema sério a ser atacado, haja vista a


necessidade de profissionalizar esses catadores de forma que eles possam gerenciar seu negócio
através da criação de Associação ou Cooperativa, elevando seu nível de ensino e os capacitado para
o trabalho.
A atividade de catação em lixão é exercida por mais de 10 anos por 17% dos catadores e
32% já faz de 5 a 10 anos que se encontram atuando nessa atividade como apresentado na Figura
03.
Tempo de Trabalho no Lixão das Cajazeiras
menos de 1 ano
7%
mais de 10
anos 1 a 2 anos
17% 10%

2 a 3 anos
10%

3 a 4 anos
5 a 10 anos 17%
32%
4 a 5 anos
7%

Figura 3: Tempo de trabalho no lixão das Cajazeiras – Mossoró-RN.

Em função do baixo nível de escolaridade e dentro de um contexto de empregabilidade, os


catadores permanecem fora do mercado de trabalho, inexistindo até então políticas de inserção
dessas pessoas em programas de trabalho e geração de renda e programas de educação de jovens e
adultos, necessidade fundamental para melhoria da qualidade de vida e minimização de impacto
social da desativação do lixão.
Com relação à renda obtida através da catação no “Lixão das Cajazeiras”, 33% dos
catadores afirmam que conseguem de 2 a 3 salários mínimos, 21% conseguem de 1 a 2 salários
mínimos e 46% conseguem até um salário mínimo. Eles são pais de famílias que lutam para o
sustento de suas famílias, com número de filhos variando de 1 a 8 como apresentado na Figura 04.
Fórum Internacional do Meio Ambiente - A conferência da Terra 1227

Número de filhos

7 a 8 filhos
5 a 6 filhos 5% nenhum
14% 26%

3 a 4 filhos
21%
1 a 2 filhos
34%

Figura 4: Número de filhos dos catadores que trabalham no lixão das Cajazeiras – Mossoró-RN.

Em seu dia-a-dia os catadores têm o desafio de manter o seu sustento e de sua família em
um ramo de trabalho que a sociedade em geral ainda vê com grande preconceito. Quanto ao perigo
a que estão expostos podem-se citar as doenças transmitidas pelos vetores existentes no “Lixão”,
algumas vezes pelo contato com alimentos estragados e materiais perfuro-cortantes, tais como
vidros quebrados, metais enferrujados, etc. e principalmente pela proximidade de equipamentos de
descarga e espalhamento do lixo como pode ser observado na Figura 05.

Figura 5: Proximidade dos catadores com equipamentos espalhamento do lixo – Mossoró-RN

O QUE REPRESENTA A ATIVIDADE DE CATAÇÃO NO CONTEXTO DA CIDADE


Para os catadores do “Lixão das Cajazeiras” a falta de opção, acarretada principalmente
pelo desemprego e o baixo índice de escolaridade, é o principal motivo que leva os catadores a
exercerem essa profissão.
Eles não sabem quantificar qual é a economia para o meio ambiente com a atividade que
exerce, nem mesmo estão organizados para obter melhores preços pelos materiais. Na maioria dos
casos, a comercialização é feita no próprio local oferecendo ao catador à vantagem de não ter custos
com transporte, porém com preço muito inferior ao preço de mercado.
Muitos catadores citam a independência como uma vantagem da atividade, pois não
possuem chefe nem horários a cumprir, sendo essa uma das principais dificuldades a ser trabalhada
Fórum Internacional do Meio Ambiente - A conferência da Terra 1228

para a implantação de um programa de coleta seletiva vista a necessidade de cumprimento de


freqüência e horários para que a comunidade se sinta confiante.
Outra questão importante é que eles não têm noção da importância de sua atividade para a
limpeza da cidade, fator de extrema importância para a preservação do meio em que vivemos. Ser
catador significa ser o primeiro agente do ciclo da cadeia produtiva de reciclagem, que realiza uma
atividade que poucas pessoas se dispõem a fazer. Ele, portanto, é imprescindível e muito importante
haja vista que não é um trabalho fácil.
Outro ponto importante é que com os resíduos coletados seletivamente, a vida útil do
aterro a ser implantado pode ser ampliada, além da minimização do impacto ambiental da
disposição em lixão que deixará de existir.
Foram detectadas oito pessoas morando dentro do lixão. Lá eles selecionam os materiais e
improvisam uma moradia, locais esses completamente inadequados para esse fim, com presença
constante de insetos e roedores. Quanto às doenças ligadas ao trabalho diretamente com o lixo, essa
não é uma preocupação para os catadores, confirmando-se assim o total desconhecimento deles em
relação às noções básicas de saúde, meio ambiente e segurança no trabalho.
Durante os trabalhos muitos catadores se mostraram amedrontados com a desativação do
lixão e a proposta de implantação da coleta seletiva. Uma associação que tem pouca
representatividade se mostrou contrário ao modelo proposto pela Prefeitura Municipal de Mossoró
de coleta porta a porta, tendo inclusive estimulado os catadores a não participarem das reuniões para
capacitação do projeto. O principal argumento apresentado pelo presidente da associação para o
posicionamento contrário a proposta em implantação, está baseado na reivindicação da construção
de uma central de triagem para os catadores trabalharem, fato que foi descartado pela prefeitura em
vista ao modelo proposto.
É natural que na visão dos mesmos à mudança propicie o medo do novo. O risco de sair do
lixão e ficar sem renda, a obrigatoriedade de horário de trabalho, trabalho comunitário, nova forma
de executar as atividades, necessidade de capacitação, negociação com a Prefeitura, etc. levam a
uma inquietação.

CONCLUSÕES
O catador de material reciclável possui uma importância fundamental em todo o ciclo que
sustenta o mercado de reciclagem. Essa atividade faz a inter-relação entre os aspectos sociológicos,
econômicos, políticos, ambientais e sanitários, de forma a sensibilizar a população quanto ao
consumo consciente dos recursos.
No município de Mossoró, cerca de 120 catadores realizam atividade de catação no lixão
as Cajazeiras. A grande maioria é do sexo masculino e estão em idade economicamente ativa. A
principal causa da inquietação dos catadores não diz respeito à construção do aterro sanitário, pois é
como se isso não fosse interferir nas suas vidas, mas ao se derem conta que com a entrada em
funcionamento do aterro sanitário o lixão vai ser desativado e que eles não terão acesso ao lixo, foi
o que deixou-os bastante aflitos e preocupados.
Os catadores vivem em um contexto social à parte, pois o lixão apesar de todos os
agravantes representa a segurança de renda e sobrevivência. Para eles aquele ambiente é muito bem
aceito, pois é o único refúgio que lhes restou. Adaptados àquelas condições, eles percebem-se como
vítimas da sociedade, o lixão funciona não como um estigma e sim como uma alternativa.
Esse trabalho procurou mostrar que um impacto social relevante se dará com a entrada em
funcionamento do aterro sanitário de Mossoró-RN. Dessa forma são necessárias ações de inserção
dos catadores oriundos do lixão em programas que possam proporcionar ocupação e renda de forma
digna para que esses agentes ambientais se sintam valorizados, e participantes da gestão
ambientalmente e socialmente adequadas dos resíduos do município.

REFERÊNCIAS BIBLIOGRÁFICAS
ABREU, M. F. Do lixo à cidadania: Estratégias para a ação. Brasília: CEF, 2001.
Fórum Internacional do Meio Ambiente - A conferência da Terra 1229

LOPES, R. L.; PINHEIRO, S. B.; COSTA, O.; PAULINO, M. S. M. Projeto de Coleta Seletiva de
Mossoró-RN. 51p. Impresso. 2007.
LOPES, R. L.; PINHEIRO, S. B.; PAIVA, E. M. Coleta seletiva em Natal - avaliação de
mplantação sob o ponto de vista da comunidade e dos catadores. Anais do 23º. Congresso
Brasileiro de Engenharia Sanitária e Ambiental. Campo Grande –MS. 2003.
PORTO, M. F. S.; JUNCÁ, D. C. M.; CONÇALVES, R. S e FREITAS FILHOTE, M. I. Lixo,
trabalho e saúde: um estudo de caso com catadores em um aterro metropolitano no Rio de Janeiro,
Brasil. Cad. Saúde Pública, Rio de Janeiro, 20(6):1503-1514, nov-dez, 2004.
ROMANI, A. P. O Poder Público municipal e as organizações de catadores: formas de diálogo e
articulação. Rio de Janeiro: IBAM/DUMA/CAIXA, 2004. Disponível em <
http://www.ibam.org.br> acesso em 20 set 2007.
Fórum Internacional do Meio Ambiente - A conferência da Terra 1230

AVALIAÇÃO DOS EFEITOS SANITÁRIOS DO LIXO NA COMUNIDADE TEREZA


RIBEIRO – CRUZ DAS ALMAS – BAHIA

Camila da Silva Dourado


Bolsista do PET-Agronomia.Universidade Federal do Recôncavo da Bahia, Centro de Ciências Agrárias Ambientais e
Biológicas.E-mail: milasdourado@hotmail.com
Gabriel C.Monteiro Moreira
Bolsista do PET-Agronomia.Universidade Federal do Recôncavo da Bahia, Centro de Ciências Agrárias Ambientais e
Biológicas.E-mail: gcmmoreira@gmail.com
Cláudia B. Vaz Sampaio
Núcleo de Engenharia de Água e Solo (NEAS), Universidade Federal do Recôncavo da Bahia (UFRB), Centro de
Ciências Agrárias, Ambientais e Biológicas. E-mail: claudiabloisi@gmail.com

RESUMO
Uma das questões mais complexas e problemáticas enfrentadas pela sociedade
contemporânea é a destinação dos resíduos gerados pelo consumismo, o que comumente
denominamos de lixo. No Brasil, a gestão dos resíduos sólidos produzidos pela população urbana
dos municípios que envolvem: coleta, transporte, manejo, tratamento e destino final é de
responsabilidade dos poderes municipais, que tem deixado a desejar e alegam dificuldades
econômicas para implantação de programas ambientalmente corretos para a destinação do lixo. O
Estado da Bahia, assim como a maioria dos Estados brasileiros, nas últimas décadas registrou um
significativo e desordenado crescimento populacional urbano, e como resultado da falta de
planejamento problemas de ordem sócio-ambiental e sanitária também se avolumaram. Desta
forma, a realização desta pesquisa tornou-se bastante pertinente tendo em vista as condições
sanitárias em que se encontra a comunidade de Tereza Ribeiro no município de Cruz das Almas
(Bahia). As avaliações dos efeitos sanitários do lixo nessa comunidade envolveram os métodos de
observação não participativa e o questionário com questões abertas e fechadas. O estudo dos efeitos
sanitários do lixo na comunidade Tereza Ribeiro apresentou dados que indicam impactos sanitários
e ambientais negativos, conforme metodologia adotada. Estes dados foram explanados para
comunidade como palestra numa reunião, onde houve a presença de 90% das famílias entrevistadas.
Houve uma sensibilização a conscientização sobre a atual situação ambiental e sanitária
relacionadas ao aterro. Incentivando a formação de um grupo interessado em organizar a
comunidade Tereza Ribeiro sobre tal situação, para recorrer às autoridades governamentais a
adoção de medidas mitigadoras dos impactos identificados.
Palavras – chave: Aterro Sanitário; Resíduo Sólido.

ABSTRACT
One of the most complex questions and issues facing the contemporary society is the
destination of the waste generated by consumerism, which is commonly called garbage. In Brazil,
the management of solid waste produced by the urban population of the municipalities that
involves: collection, transport, handling, treatment and final destination, is the responsibility of
municipal powers. However, the services provided by the public power are still deficient in many
aspects, and there are economic difficulties for the implementation of programs directed to the
environmentally correct destination of waste. Which has ceased to be desired and economic
difficulties to contend deployment of programs for environmentally correct the destination of the
waste. The state of Bahia, as well as the majority of Brazilian states, in recent decades, recorded a
significant and disorderly urban population growth, and as a result of the lack of planning, there has
also been verified a growth in socio-environmental and health problems.. Thus, the execution of this
research has become very relevant considering the health conditions in the community of Tereza
Ribeiro, part of the municipality Cruz das Almas (Bahia). To evaluate the sanitary effects of waste
in that community, the research adopted methods of non-participatory observation and the
application of questionnaires with both discursive and objective questions opened e closed of the
health effects of waste in that community surrounding the methods of non-participatory observation
and questionnaire with questions. The study of the health effects of waste in the community Tereza
Fórum Internacional do Meio Ambiente - A conferência da Terra 1231

Ribeiro resulted in data that indicated adverse health and environmental impacts, according to the
methodology adopted. These data were presented in a community meeting, which had the presence
of 90% of the families interviewed. There was an awareness on the current situation related to
environmental and sanitary landfill, encouraging the formation of a group interested in organizing
the community Tereza Ribeiro to take actions about this situation, and to pressure the government
to adopt measures to lower the impacts identified.
Key words: Sanitary Landfill, Solid Waste.

INTRODUÇÃO
O Estado da Bahia, assim como a maioria dos Estados brasileiros, nas últimas décadas,
registrou um significativo e desordenado crescimento populacional urbano, e como resultado da
falta de planejamento problemas de ordem sócio-ambiental e sanitária também se avolumaram.
Uma das questões mais complexas e problemáticas enfrentadas pela sociedade
contemporânea é a destinação dos resíduos gerados pelo consumismo, o que comumente
denominamos de lixo. Segundo dados da Compam (Comércio de Papéis e Aparas Mooca Ltda.),
estima-se que uma pessoa produza em média, 5 kg de resíduo sólido por dia.
“É comum definir como lixo todo e qualquer resíduo que resulte das atividades diárias do
homem na sociedade. Estes resíduos compõem-se basicamente de sobras de alimentos, papéis,
papelões, plásticos, trapos, couros, madeiras, latas, vidros, lamas, gases, vapores, poeiras, sabões,
detergentes e outras substâncias descartadas pelo homem no meio ambiente” (LIMA, 1991).
Existem também os resíduos tóxicos, os quais necessitam de destino especial para que não
contaminem o ambiente como embalagens de aerosol vazios, pilhas, baterias, lâmpadas
fluorescentes, restos de medicamentos e agrotóxicos.
“Os aterros sanitários modernos incorporam uma série de aspectos de projeto e operação,
de modo a minimizar ao máximo os impactos ambientais decorrentes da fase de implantação,
operação e encerramento” (CASTILHOS, 2002). Desta forma, a disposição final dos resíduos
sólidos, normalmente é feita de forma inadequada nos chamados lixões, a qual é caracterizada pelo
simples depósito do lixo sobre o solo, sem medidas de proteção ao meio ambiente e à saúde pública,
ou seja, descarga de resíduos a céu aberto sem considerar as condições adequadas da área para
receber o lixo; o escoamento de líquidos, que percolados juntamente com a água das chuvas
lixiviam compostos orgânicos para as camadas mais profundas do solo; a liberação de gases
poluentes como o metano, o qual pode ser utilizado com fonte de energia; a disseminação do lixo na
área circunvizinha pela ação do vento e a existência de recursos naturais e de população de pessoas,
plantas e animais nas proximidades da área onde o lixo é depositado.
Segundo IBGE 2000, 30,5% dos resíduos sólidos domésticos são dispostos a céu aberto ou
lixões. 22,3% em aterros controlados e 47,1% têm disposição adequada na forma de aterro sanitário.
Sendo assim, estes resíduos dispostos a céu aberto causam sérios problemas à saúde pública,
advindos da proliferação de vetores de doenças (moscas, mosquitos, ratos, baratas) e odores
nauseantes. Causam também a poluição do solo e das águas superficiais e subterrâneas através do
chorume – líquido com elevado potencial poluidor, de cor escura e mau cheiro originado de
processos biológicos, químicos e físicos da decomposição de resíduos orgânicos, que exposto na
natureza sem medidas adequadas, causa a poluição do solo, do ar e dos recursos hídricos.
Soma-se a esta situação a ausência de controle seletivo dos resíduos depositados no lixão,
os quais vão desde resíduos orgânicos a tóxicos. Ficando os lixões comumente associados a fatos
indesejáveis como a proliferação de animais “carniceiros” e moradia de catadores de lixo; seres
humanos que se alimentam e sobrevivem com os restos de comida encontrados no lixão.
No Brasil, a gestão dos resíduos sólidos produzidos pela população urbana dos municípios
que envolvem: coleta, transporte, manejo, tratamento e destino final é de responsabilidade dos
poderes municipais, que tem deixado a desejar e alegam dificuldades econômicas para implantação
de programas ambientalmente corretos para a destinação do lixo.
Durante doze anos a prefeitura da cidade de Cruz das Almas, localizada no Recôncavo
Baiano, depositou em uma área com declividade superior a 15 %, com solo de textura grossa e
Fórum Internacional do Meio Ambiente - A conferência da Terra 1232

próximo a nascente do Riacho Tomás cerca de trinta toneladas de lixo diariamente sem nenhuma
precaução de preservação ambiental. Em Abril de 2005, por intervenção do poder público, os
resíduos sólidos existentes na área foram transferidos para a base do aclive da área do lixão e a
partir daí o local passou a ser denominado de “Aterro Sanitário”.
A Associação Brasileira de Normas Técnicas (ABNT) define os aterros sanitários da
seguinte forma:
Aterros sanitários de resíduos sólidos urbanos consiste na técnica de disposição de
resíduos sólidos urbanos no solo, sem causar danos ou riscos à saúde pública e à
segurança, minimizando os impactos ambientais, método este que utiliza os princípios
de engenharia para confinar os resíduos sólidos ao menor volume permissível, cobrindo-
os com uma camada de terra na conclusão de cada jornada de trabalho ou a intervalos
menores se for necessário.

Existem pelo menos dois agravantes para a relocação do lixo: o lençol freático, que de
acordo com a legislação deveria estar a pelo menos três metros de profundidade, aflora na superfície
do solo durante o período chuvoso da região, fato este que potencializa a contaminação das águas
subterrâneas e superficiais. Outro agravante é que o local onde os resíduos são depositados dista
apenas de trezentos metros do corpo de água do Riacho Tomás, sendo que no Brasil, recomenda-se
que a distância mínima de um aterro sanitário para um curso de água deve ser de quatrocentos
metros (ABNT).
A exposição direta ou indireta aos resíduos sólidos, para as pessoas residentes em torno do
lixão na comunidade Tereza Ribeiro pode acarretar problemas e riscos de saúde, dados os seus
efeitos carcinogênos, mutagênicos, teratogênicos, respiratórios, sistema nervoso e danos no sistema
reprodutivo.
Devido à exigüidade de dados quantitativos sobre associação entre a disposição ambiental
dos resíduos sólidos e a saúde pública, o presente estudo será de grande relevância e terá como foco
central recolher dados e avaliar os impactos causados na saúde da comunidade Tereza Ribeiro pelo
indevido uso da área para deposição de resíduos sólidos (lixo).

METODOLOGIA E EXECUÇÃO
A comunidade Tereza Ribeiro está localizada no município de Cruz das Almas no estado
da Bahia. Segundo dados da Prefeitura Municipal de Cruz das Almas, o município abrange uma
superfície de 144 km2, com uma altitude de 220m. . Dista de Salvador, capital do Estado da Bahia,
70 km em linha reta e aproximadamente 146 km por rodovia (BR 101), em conexão com a BR 324
(Salvador - Feira de Santana). E possui uma população estimada de 58.293 habitantes (2006) e
densidade demográfica de 386,3 hab./km².
O trabalho foi realizado no período de Junho de 2007 até Dezembro do mesmo ano, pelos
estudantes bolsistas do Programa de Educação Tutorial (PET – Agronomia) da Universidade
Federal do Recôncavo da Bahia. As avaliações dos efeitos sanitários do lixo nessa comunidade
envolveram os métodos de observação não participativa. Foram realizadas visitas ao local
proporcionando a visualização de irregularidades ambientais, das quais foram observadas a
proximidade de 300m do aterro sanitário com o Riacho Tomás, alta declividade e a proximidade do
lençol freático da superfície do solo, e questionário socioeconômico com questões abertas e
fechadas. As perguntas fechadas nos permitem obter informações sócio-demográficas do
entrevistado e respostas de identificação de opiniões e as perguntas abertas são destinadas a
aprofundar as opiniões do entrevistador (RICHARDSON et al, 1999). No questionário, abrangeram-
se os seguintes itens: identificação; dados da renda; grau de escolaridade; tempo de moradia na
comunidade Tereza Ribeiro; efeito sanitário do lixão em cada família; benefícios com a
implantação do aterro sanitário na comunidade. Essa metodologia é essencialmente dialógica,
deixando aflorar a participação dos moradores da comunidade no levantamento de informações
(Gomes, Souza & Carvalho, 2005).
Fórum Internacional do Meio Ambiente - A conferência da Terra 1233

Os questionários aplicados na comunidade abrangeram um total de 20 famílias, das quais,


foram selecionadas 10 famílias com residência no perímetro mais próximo do “aterro sanitário”,
supondo que as mesmas tenham relação direta com o lixo e 10 famílias que residem mais distante
do “aterro sanitário”, supondo que as mesmas tenham uma relação indireta. Após a aplicação dos
questionários, ocorreu o levantamento dos dados coletados.

RESULTADOS E DISCUSSÃO
A partir da análise dos dados qualitativos e quantitativos que foram obtidos por meio da
aplicação do questionário com os moradores da comunidade Tereza Ribeiro, diagnosticou-se que a
maioria das famílias, cerca de 80%, possui renda de um a três salários mínimos, tendo como fontes
predominantes: aposentadoria e agricultura familiar; outra constatação é que a maioria dos
indivíduos tem acesso à educação, prevalecendo o nível de ensino fundamental. Correlacionando as
condições econômicas e escolares com a proximidade das famílias ao lixão, foi possível observar
menor poder aquisitivo e menor nível de escolaridade das famílias residentes próximo ao aterro
sanitário.
Outro aspecto analisado foi à influência do lixão na saúde das famílias, onde com a
deposição e incineração do lixo, como um método de redução do seu volume, alcançava geralmente
90% e redução de peso cerca de 70% (ABREU 1995). Segundo relatos dos moradores, dores de
cabeça, dores de barriga, verminoses, enjôo e doenças respiratórias são recorrentes na comunidade,
devido ao mau cheiro e a fumaça; alergias, decorrentes da presença de moscas; acidentes na BR
101, por causa da má visibilidade provocada pela fumaça excessiva e a presença de animais
carniceiros. Houve relatos de óbitos supostamente atribuídos aos efeitos do lixão.
As questões referentes à influência da implantação do aterro sanitário no cotidiano da
comunidade, observou-se que em relação à saúde, houve mudanças de caráter positivo, como o
desaparecimento de animais necrófagos e vetores de doenças; diminuição da fumaça e mau cheiro,
como também a redução de acidentes de trânsito na BR 101. Contudo, moradores relataram que
ainda existem seqüelas deixadas pelo lixão, como tosse e mau cheiro da água necessitando assim de
políticas governamentais capazes de liquidar ou reduzir esses impactos.
Segundo LIMA 1991, a escassez de recursos técnicos e financeiros vem limitando os
esforços no sentido de ordenar a disposição dos resíduos sólidos, que terminam por ser lançados
diretamente no solo, no ar e nos recursos hídricos. Esta prática foi observada na comunidade e isso
acarreta a poluição do meio ambiente (lençóis freáticos, açudes, nascentes, terras para agricultura) e
reduz a qualidade de vida do homem, graças às condições sanitárias do local. A implantação do
aterro também teve impactos de cunho social, ex-catadores de lixo os quais tinham essa atividade
como principal fonte de renda, atualmente encontram-se em condições de subsistência. Isso se deve
ao fato da deficiência presente no planejamento do projeto de implantação do aterro visando
principalmente, a região circunvizinha.

CONCLUSÃO
O acúmulo de lixo urbano em áreas inadequadas associado à ausência de um planejamento
eficaz, pode concentrar níveis elevados de metais pesados e outros elementos tóxicos no solo, assim
como um alto acúmulo de matéria orgânica em estado de putrefação, contaminando os lençóis
freáticos, colocando em risco à saúde humana e dos animais.
O estudo dos efeitos sanitários do lixo na comunidade Tereza Ribeiro apresentou dados
que indicam impactos sanitários e ambientais negativos, conforme metodologia adotada.
Entendendo a importância da pesquisa realizada e as dificuldades enfrentadas pela comunidade,
estes dados foram explanados como palestra numa reunião, onde houve a presença de 90% das
famílias entrevistadas.
Na reunião citada, houve uma sensibilização à conscientização sobre a atual situação
ambiental e sanitária relacionadas ao aterro, incentivando assim a formação de um grupo
interessado em organizar a comunidade Tereza Ribeiro sobre tal situação, para recorrer às
autoridades governamentais exigindo a adoção de medidas mitigadoras dos impactos identificados.
Fórum Internacional do Meio Ambiente - A conferência da Terra 1234

REFERÊNCIAS BIBLIOGRÁFICAS
ABNT – Associação Brasileira de Normas Técnicas. Disponível em:
http://www.abnt.org.br/default.asp?resolucao=800X600. Acessado em 02.12.2007.
ABREU, C.A; ABREU, MF; RAIJ, B.V & SANTOS, W.R. Comparação de Métodos de Análise
para Avalias a Disponibilidade de Metais Pesados em Solos. Revista Brasileira de Ciência do
Solo, Campinas, 19 (3): 464 - 468 1995.
Acessado em 02/12/2007
CASTILHOS, A.B.de J. LANGE, Lisete Celina. GOMES, Luciana Paulo. PESSIN, Neide.
Alternativas de Disposição de Resíduos Sólidos Urbanos para Pequenas Comunidades (Coletânea
de trabalhos científicos).São Carlos- SP, 2002.
COMPAM – Comércio de Papéis e Aparas Mooca Ltda. Disponível em:
http://www.compam.com.br/porquereciclar.htm. Acessado em 02.12.2007.
FEUERSTEIN, Marie-Thérèse. Avaliação: como avaliar programas de desenvolvimento com a
participação da comunidade. Tradução Beatriz Cantanhede Orsini, São Paulo, 1990.
GOMES, M.A.O. SOUZA, A.V.A. de. CARVALHO, R.S. de. Diagnóstico Rápido Participativo
(DRP) como mitigado de impactos socioeconômicos negativos em empreendimentos agropecuários.
In: Metodologia participativa: uma introdução a 29 instrumentos. BROSE, Marcuse (org.). Porto
Alegre: Tomo Editorial, 2005.
IBGE - Pesquisa Nacional de Saneamento Básico 2000. Instituto Brasileiro de Geografia e
Estatística. Disponível em:
http://www.ibge.gov.br/home/estatistica/populacao/condicaodevida/pnsb/default.shtm
LIMA, Luiz Mario Queiroz. Tratamento de Lixo, São Paulo: Hemus Editora, 1991.
RICHARDSON, R.J. Pesquisa Social: métodos e técnicas. 3.ed. São Paulo Atlas: 1999.
SABOURIN, Eric; TEIXEIRA, Olívio Alberto. Planejamento e desenvolvimento dos territórios
rurais. EMBRAPA informações tecnológicas, Brasília, 2002, 402 p.
VERDEJO, M.E. Diagnóstico rural participativo: guia prático DRP. Brasília – DF: SAF/MDA,
2005.
Fórum Internacional do Meio Ambiente - A conferência da Terra 1235

AVALIAÇÃO PROTOZOOLÓGICA DA ÁGUA DA LAGOA DA PINDOBA – FEIRA DE


SANTANA – BA, E SUAS IMPLICAÇÕES NA QUALIDADE DE VIDA DA
COMUNIDADE CIRCUNVIZINHA.

Jackeline Lisboa Araújo


Discentes do Curso de Ciências Biológicas da Universidade Estadual de Feira de Santana (UEFS), Feira de Santana,
Bahia, Brasil. E-mail: jacklisb@yahoo.com.br
Dalila de Souza Santos
Discentes do Curso de Ciências Biológicas da Universidade Estadual de Feira de Santana (UEFS), Feira de Santana,
Bahia, Brasil.
Diego Oliveira Cerqueira
Discentes do Curso de Ciências Biológicas da Universidade Estadual de Feira de Santana (UEFS), Feira de Santana,
Bahia, Brasil.

RESUMO
Na atualidade, a água é um bem precioso, é um recurso estratégico. A ausência deste
recurso ou a sua presença em quantidade ou qualidade inadequadas têm sido um dos principais
fatores limitantes ao crescimento social e econômico de várias regiões do Brasil e do mundo. Uma
avaliação protozoológica da água da lagoa da Pindoba, através de coletas em diferentes pontos e
posterior análise em laboratório, com descrição e identificação dos organismos permite-se aferir que
a lagoa é um ambiente eutrofizado em conseqüência do despejo de detritos e curso de esgotos.
Sendo a água da lagoa um recurso utilizado para atividades diárias da comunidade circunvizinha se
faz necessário a tomada de medidas que melhorem a qualidade da água e conscientizem a
população local do uso adequado.
Palavras-chave: água, Lagoa da Pindoba, protozoários.

ABSTRACT
In the present time, the water is a precious good, is a strategical resource. The absence of
this resource or its presence in inadequate amount or quality has been one of the main limitantes
factors to the social and economic growth of some regions of Brazil and the world. A
protozoológica evaluation of the water of the lagoon of the Pindoba, through collections in different
points and posterior analysis in laboratory, with description and identification of the organisms
allows to survey that the lagoon is an environment eutrofizado in consequence of the ousting of
debris and course of sewers. Being the water of the lagoon a resource used for daily activities of the
surrounding community if makes necessary the taking of measures that improve the quality of the
water and acquire knowledge the local population of the adequate use.

INTRODUÇÃO
Atualmente dezenas de milhões de pessoas vivem com menos de cinco litros de água por
dia, isto é surpreendente levando-se em conta que vivemos num planeta onde se têm 70% da
superfície coberta por água. Aproximadamente 72.000 Km3/ano de água retornam à atmosfera por
evapotranspiração, dos 119.000 Km3/ ano da precipitação que caem sobre os continentes. Os
47.000 Km3/ ano restantes que circulam pelo planeta, através de escoamento superficial e
subterrâneo representam o excedente hídrico, que é a diferença entre o volume precipitado e o
evapotanspirado. TEIXEIRA (2000). É certo que a hidrosfera aproveitável é suficiente para o
abastecimento de água de toda a população da terra, mas ela é irregularmente distribuída. Esta má
distribuição não ocorre apenas espacialmente. Muitas vezes várias regiões são acometidas por
grandes enchentes e em outras épocas do ano há períodos de seca. O tempo de residência na
superfície terrestre também acaba por limitar a sua disponibilidade.
O termo água refere-se ao elemento natural, desvinculado de qualquer uso ou utilização
sendo desta forma, mais escasso. As águas utilizadas para abastecimento de consumo humano e de
suas atividades socioeconômicas são captadas nos rios, lagos, represas e aqüíferos subterrâneos. Por
se encontrarem nos domínios terrestres são conhecidas como águas interiores. Estas águas
apresentam características de qualidade muito variadas que lhes são conferidas pelos ambientes de
Fórum Internacional do Meio Ambiente - A conferência da Terra 1236

origem, por onde circulam, percolam ou onde são armazenadas. Considerando a importância dos
fatores antrópicos na qualidade das águas – formas de uso e ocupação do meio físico e das
atividades socioeconômicas - torna-se necessário, distinguir as suas características naturais daquelas
engendradas pela ação do homem.
Os sistemas aquáticos dependem de períodos de cheia e vazante, onde ocorre um aumento
do nível de água e a inundação de vastas áreas adjacentes à calha principal. Funcionam, em sua
maioria, impulsionadas por flutuações de curta ou longa duração que tem impacto na organização
das comunidades, nos ciclos biogeoquimicos e na sucessão temporal e espacial. Estes pulsos podem
ser definidos como qualquer tipo de flutuação natural ou induzida pelo homem que afetam os
sistemas aquáticos. Podendo resultar numa entrada ou saída de material ou energia no sistema.
Analisando a quantidade de água para consumo humano devemos nos ater à sua qualidade.
Além de usar a água para beber, o homem tem que se banhar, lavar roupa, utensílios, chão,
regar o jardim, etc. Diante desta gama de utilidades, devem ser feitas análises qualitativas da água
para garantir que esta seja saudável. Baseado nisso foi realizada uma avaliação protozoológica na
água da lagoa da Pindoba, Feira de Santana – BA. Estudando a morfologia e o comportamento dos
protozoários infere-se quais as relações entre estes organismos e o homem, e qual a influência da
presença destes para a vida dos moradores das redondezas da lagoa, que utilizam a água para tarefas
cotidianas.

OBJETIVO
Esse trabalho objetiva realizar o levantamento da taxonomia dos protozoários encontrados
na lagoa da Pindoba- a nível de gênero- através da observação de suas estruturas e dos mais
diversos comportamentos apresentados. Dessa forma, pretende-se aferir a qualidade da água que
compõe a lagoa da Pindoba, indicando a viabilidade de sua utilização pelos habitantes da
comunidade local.

METODOLOGIA
A coleta foi realizada em um único dia, 25 de setembro de 2006, por volta das 16:00 horas.
A estação do período de coleta era a Primavera e o dia estava ensolarado.O local escolhido para tal
finalidade foi a Lagoa da Pindoba (Fig1), um ambiente dulcícola lêntico, que possui um alto teor de
matéria orgânica distribuída em suas águas. Localizada na periferia da cidade de Feira de Santana,
no limite do Campus da Universidade Estadual de Feira de Santana, Bahia.
Foram escolhidos dois pontos amostrais, em torno da lagoa, caracterizados como P1 e P2.
Em cada ponto a amostra de água foi obtida com o auxílio de uma balde comum de 10L, o qual foi
mergulhado sobre a superfície de cada ponto, recolhendo cerca de 8L de água.
As amostras foram levadas para o laboratório, onde se procedeu toda a metodologia de
armazenamento e observação do material coletado. Elas foram armazenadas em frascos de vidro de
volumes variados, cerca de 200 mL, tamponados com gases estéreis. Cada um dos frascos foi
identificado com um dos pontos amostrais (P1 ou P2) e com o nome dos pesquisadores
responsáveis.
Uma vez armazenadas, as amostras foram avaliadas semanalmente no período de um mês.
Em cada semana a análise procedeu da seguinte forma: inicialmente eram preparadas dez lâminas
com o material contido em cada fraco e em seguida cada lâmina era analisada com o auxílio de um
microscópio óptico (marca:INALH, nº. 001488), nas objetivas de 10 e de 40.
Os organismos observados em cada lâmina e caracterizados como protistas heterotróficos
foram notificados num caderno de campo em forma de desenho, afim de realizar-se uma posterior
análise da morfologia de cada um deles.
Para a identificação das mais variadas espécies que foram observadas utilizou-se diversas
bibliografias, as quais foi imprescindíveis para a eficiência dos resultados obtidos, e quando
necessário, a ajuda de profissionais da Instituição de ensino referida.

RESULTADOS E DISCUSSÃO
Fórum Internacional do Meio Ambiente - A conferência da Terra 1237

A partir da observação do material coletado e posterior análise, foram identificados alguns


gêneros de protistas e outros organismos que estavam presentes nas amostras. Abaixo, segue a
descrição taxonômica e as demais características. A taxonomia das espécies encontradas está
definida pelo Sistema Integrado de Informação Taxonómica (ITIS).

Euplotes (Fig. 2)
Taxonomia (ITIS)
Reino
Animalia
Filo
Ciliophora
Classe
Ciliatea
Subcl
asse Spirotricha
Ord
em Hypotrichida
S
ubordem Sporadotrichina

Família Euplotidae

Gênero Euplotes

Euplotes é um gênero de protozoários ciliados achatados dorsoalmente com cirros no lado


ventral. As espécies Euplotes aediculatus, Euplotes crassus, Euplotes vannus, Euplotes woodruffi e
Euplotes minuta são as mais conhecidas do gênero. O gênero como um todo é utilizado em
pesquisas medicinais, biológicas e industriais. O Euplotes tem cílios na parte inferior da célula,
denominados cirros. São também criaturas bentônicas, ovóides, com células muito especializadas,
com cavidade bucal, membranelas e citóstoma. São tipicamente filtradores.

Paramecium (Fig. 3)
Taxonomia (ITIS)
Reino Animalia
Filo
Ciliophora
Classe Ciliatea
Subcl
asse Rhabdophorina
Ord
em Hymenostomatida
S
ubordem Peniculina

Família Parameciidae

Gênero Paramecium

Paramecium é um género bem conhecido de protozoários ciliados normalmente estudado


Fórum Internacional do Meio Ambiente - A conferência da Terra 1238

como representante deste grupo. São organismos unicelulares em forma de sola de sapato, com
dimensões entre 50 e 300 micra, dependendo das espécies. O corpo das paramécias é coberto de
cílios simples, mas o sulco oral (a "boca") contém pequenos cílios orais compostos, que são típicos
da ordem Peniculida. As paramécias habitam a água doce e são especialmente frequentes em
pequenas poças de água suja (por exemplo, perto de estábulos).Pode ingerir cerca de 5.000.000 de
bactérias em 24 horas. O género Paramecium foi descrito pela primeira vez no século XVIII, mas a
divisão em espécies ainda não está completamente esclarecida - por exemplo, P. aurelia foi
recentemente dividida em 14 espécies.

Vorticella (Fig. 4)
Taxonomia (ITIS)
Reino
Animalia
Filo
Ciliophora
Classe
Ciliatea
Subcl
asse Peritricha
Ord
em Peritrichida
S
ubordem Sessilina

Família Vorticellidae

Gênero Vorticella

Vorticella é um ciliado pedunculado, séssil, com um pedúnculo sem ramificação, ocorre


em lodos de sistemas eficientes, juntamente com Opercularia. Aspidisca e Lionotus. Elas podem
estar em grupo, mas não formam colônia. Possuem na superfície anterior um formato discóide, com
uma larga abertura rodeado por cílios,e estes não existem em todas as partes do corpo, mas somente
nesta região. Sofrem movimentos contráteis por encurtamento da haste pela qual o corpo se prende,
produzindo movimentos explosivos que são característicos da Vorticella e dos gêneros
relacionados. No interior da haste, existe uma fibra única, grande e espiral, a qual não é composta
por proteínas actina e miosina, mas por uma proteína chamada de espasmina, que requer ATP para
extensão.

Colepa (Fig.5)
Taxonomia (ITIS)
Reino
Animalia
Filo
Ciliophora
Class
Ciliatea
e
Sub
classe Holotrichia
O
Fórum Internacional do Meio Ambiente - A conferência da Terra 1239

rdem Gymnostomatida

Família Colepidae
Colepa
Gênero

Colepa parece uma miniatura de granada. O formato do corpo é em forma de barril; com as
placas ectoplasmática regularmente arranjadas, a extremidade anterior é cercada por cílios
ligeiramente mais longos; um ou mais cílios caudal longo. Boca colocada na extremidade anterior,
suportada por trichites. Frequentemente predatória.

Chilodonella (Fig. 6)
Taxonomia (ITIS)
Reino
Animalia
Filo
Ciliophora
Class
Ciliatea
e
Sub
classe Rhabdoporina
O
rdem Cyrtophorida

Família Chilododontidae

Gênero Chilodonella

Chilodonella possue uma boca que é suportada frequentemente pelos pseudópodos. Corpo
cilíndrico ou aplainado ventralmente. O macronúcleo é de formato oval, sendo bem visível no
campo luminoso. Célula com formato ovóide, com a estrutura pré-oral enviesada à esquerda a um
ponto; aplainado ventralmente, a parte dorsal do corpo é convexo. A superfície dorsal falta cerdas e
a zona central é destituída de cílios.

Arcella (Fig.7)
Taxonomia (ITIS)
Reino
Animalia
Filo
Protozoa
Subfilo
Sarcodina
Super
classe Rhizopoda
Cla
sse Lobosa
O
rdem Arcellinida
Fórum Internacional do Meio Ambiente - A conferência da Terra 1240

Família Arcellidae

Gênero Arcella

Arcella é uma das amebas de água doce mais comum, a concha protéica marrom ou cor-de-
palha tem a forma de domo achatado com a abertura no meio do lado de baixo. È uma ameba
testácea. A testa é circular, transparente, com uma abertura central (pilomar). Quando jovens, é de
cor amarelo claro e ao começar a envelhecer fica mais escura. Geralmente, Arcella tem dois, às
vezes mais núcleos.
Dos 6(seis) gêneros de protistas heterótrofos encontrados, através da análise das águas, na
Lagoa da Pindoba, pode-se apontar 5(cinco) deles como pertencentes ao filo dos ciliados, enquanto
que apenas um é pertencente ao filo dos sarcodíneos. A dominância da população de ciliados em
um ambiente é descrito na literatura como um bioindicador de eutrofização, ou seja, um alto nível
da quantidade de nutrientes e/ou matéria orgânica no ecossistema, resultando num aumento da
produtividade primária. O processo de eutrofização pode ser natural ou efeito de atividades
humanas. No caso específico da Lagoa da Pindoba, pode-se deduzir que a
eutrofização é conseqüência do despejo do esgoto sanitário da população vizinha, além da evidente
devastação da flora nativa da região. O que preocupa é o fato de que apesar deste tratamento
dispensado pelos moradores são eles mesmos que utilizam a água para atividades diárias.

CONCLUSÃO
Esse trabalho contribui para o conhecimento da biodiversidade dos organismos presentes
na Lagoa da Pindoba, a partir do qual foi possível inferir as relações ecológicas existentes entre os
protozoários analisados e a dinâmica da lagoa, bem como sua influência para a comunidade local.
Ações precisam ser tomadas para melhoria na qualidade de vida da população.
A primeira medida a ser implementada deve ser o controle dos aportes de nutrientes
que chegam até a Lagoa da Pindoba, caso contrário, toda e qualquer outra medida técnica que se
ouse empregar tornar-se-á ineficaz para controlar a densidade populacional dos protistas
heterótrofos e outros seres deletérios à qualidade da água.
A segunda medida, diz respeito a população que faz uso constante das águas da Lagoa da
Pindoba. Campanhas educacionais, que podem (e devem) ser implementadas pela comunidade
acadêmica, fazem-se urgente, a fim de apresentar a importância sanitária, ambiental, ecológica e
econômica, esta última caracterizada como um argumento de grande eficiência na preservação e
utilização sustentada dos recursos naturais.
Por fim, é de extrema importância social a análise da qualidade dessa água baseado em
parâmetros físico-químicos e a intervenção dos órgãos de Saúde pública da região a fim de
promover o bem-estar daqueles que necessitam dessa água para desenvolver suas atividades
cotidianas.

Referências
DUARTE, Dagmar. Análise da degradação de lagoas e seu entorno pelo crescimento urbano
através da análise multitemporal de fotografias aéreas com técnicas de geoprocessamento: o caso
das Lagoas da Tabua e da Pindoba (Feira de Santana -BA). Anais X SBSR, Foz do Iguaçu, 21-26
abril 2001, INPE, p. 1089-1096, Sessão Poster - Iniciação Científica. Gutierrez. Mexico
: Trillas, 1985.
JEBRAM, Diethardt H. A. Métodos básicos e novos para o cultivo de protistas livres.
Comunicações do Museu de Ciências da PUCRS, N. 51 , p. 3-20., nov. 1993.
KUDO, Richard Roksabro. Handbook of protozoology. Springfield: Charles C. Thomas, 1931.
LIMA, Josanidia Santana. Bioindicação em ecossistemas terrestres. UFBA, Salvador, Ba, 2000.
Fórum Internacional do Meio Ambiente - A conferência da Terra 1241

LOBÃO, Jocimara Souza Britto. Avaliação multi-temporal, da ocupação das Lagoas urbanas de
Feira de Santana-BA, por meio de Sistema de Informação Geográfica. Anais XII Simpósio
Brasileiro de Sensoriamento Remoto, Goiânia, Brasil, 16-21 abril 2005, INPE, p. 3797-3804
RUPPERT, Edward E; BARNES, Robert D.1927-1993. Zoologia dos invertebrados. 6. ed Sao
Paulo: Roca, 1996. 1029 p.S. Roberts, Allan Larson. Guanabara Koogan S.A. RJ.2004
TEIXEIRA, Wilson. Decifrando a terra. Wilson Teixeira [et al.]. Sao Paulo: Oficina de
Textos, 2000Universidade Federal de São Carlos. São Carlos, SP.
Fórum Internacional do Meio Ambiente - A conferência da Terra 1242

COLETA SELETIVA SOLIDÁRIA NO MUNICÍPIO DE MARTINÓPOLIS – SP: UMA


VISÃO SÓCIO-AMBIENTAL

Frederico G. Moraes
Departamento de Geografia, Universidade Estadual Paulista. Encarregado da Coleta Seletiva Solidária da Prefeitura
Municipal de Martinópolis e graduando em Geografia na FCT/UNESP. fredgambardella@yahoo.com.br
Klenia M. D. Silva
Departamento de Geografia, Universidade Estadual Paulista. Estagiária da Prefeitura Municipal de Martinópolis e
graduanda em Geografia na FCT/UNESP. kmanoel@hotmail.com
Antônio C. Leal
Departamento de Geografia, Universidade Estadual Paulista. cezar@fct.unesp.br

RESUMO
O desenvolvimento da sociedade atual fez com que o consumismo tivesse um aumento
considerável na geração de resíduos sólidos, o que se torna um sério problema para a sociedade,
principalmente no que se refere à limpeza urbana, organização de catadores de material reciclável e
disposição final do lixo. Assim, a Prefeitura Municipal de Martinópolis, em parceria com a UNESP
realiza estudos relacionados ao gerenciamento de resíduos sólidos urbanos no município. Esta
parceria institucional tem como objetivo viabilizar estudos e ações sobre os resíduos sólidos no
município, incluindo diagnóstico da geração, descarte, coleta, tratamento e disposição; sistema de
limpeza urbana, gerenciamento integrado; organização de catadores e implantação de coleta
seletiva. A adequação do atual sistema existente de coleta convencional realizou-se em duas fases.
Primeiro a verificação da quilometragem, análise das rotas dos caminhões e pesagem para obtenção
dos custos operacionais. Também triou-se e pesou-se o lixo para quantificar os materiais recicláveis
descartados nos resíduos domiciliares. Segundo foram realizados a identificação dos catadores de
rua, realização de atividades relacionadas à educação ambiental em todas as escolas de ensino
fundamental e divulgação nas residências, comércio e indústrias do município reforçando a
importância do descarte seletivo para a implantação da coleta seletiva.
Palavras-chave: resíduos ,coleta seletiva,material reciclável,catadores.

ABSTRACT
The development of the present society has caused the consumerism had a considerable
increase in the generation of solid waste, which becomes a serious problem for society, particularly
with regard to urban cleaning, organization of catadores of recyclable material and arrangement of
the final garbage. Thus, the Municipality of Martinópolis, in partnership with UNESP conducts
studies related to the management of municipal solid waste in the municipality. This partnership
aims to enable institutional studies and actions on the solid waste in the municipality, including
diagnosis of generation, disposal, collection, treatment and disposal; system of urban cleaning,
integrated management, organization of catadores and deployment of selective collection. The
adequacy of current existing system of collecting conventional held in two phases. First the
verification of mileage, analysis of the routes of trucks and weighed to obtain operating costs. Also
triou up and weighed up the trash to quantify the recyclable materials discarded in household waste.
According were performed to identify the catadores street, carrying out activities related to
environmental education in all schools of basic education and dissemination in homes, commerce
and industries of the county reinforcing the importance of selective disposal for the implementation
of selective collection.
Keywords: waste, selective collection, recyclable material, catadores.

INTRODUÇÃO
A geração de resíduos é um dos assuntos que está em voga na atualidade e algumas
alternativas têm sido propostas para as administrações públicas municipais com intuito de auxiliar
no seu gerenciamento. Neste contexto, a Prefeitura Municipal de Martinópolis, município situado
no oeste do Estado de São Paulo, estabeleceu um convênio com a Universidade Estadual Paulista
Fórum Internacional do Meio Ambiente - A conferência da Terra 1243

para a realização de estágios e pesquisas voltadas ao estudo da situação dos resíduos sólidos no
município, dentro do qual se insere a proposta de implantação da Coleta Seletiva Solidária.

Mapa 1: Localização do Município de Martinópolis, SP. Organizador: Silva et al, 2007.

Para compreender a origem da expressão resíduo sólido é necessário compreender a


acepção da expressão lixo. Em sua etimologia, a palavra lixo, embora controversa, remete sempre à
língua latina. Para alguns filósofos deriva de lix, que em latim tem o significado de cinza ou lixívia.
Contudo, outros estudiosos entendem que a palavra provém do latim medieval já decadente, no qual
o verbo lixare indicava o ato de polir, desbastar, tomando em português a conotação de sujeira,
restos ou o supérfluo que é removido ou arrancado, na tarefa de lixar materiais diversos como
metal, a madeira, etc. Desde a década de 1960, um novo jargão técnico foi adotado pelos
sanitaristas - resíduos sólidos. A expressão resíduo deriva do latim residuu, significando aquilo que
resta de qualquer substância. Logo foi adjetivada de “sólido” para se diferenciar dos restos líquidos
lançados com os esgotos domésticos e das emissões gasosas. (SMA, 1993). Feita esta distinção,
passemos ao diagnóstico sobre os resíduos sólidos no Município de Martinópolis.
Com intuito de desenvolver um adequado gerenciamento dos resíduos sólidos urbanos no
município, foi realizada uma série de levantamentos visando buscar informações sobre os mesmos.
Estes consistem, no caso de Martinópolis, em resíduos de varrição, entulhos, saúde, pneus e
domiciliares. Assim, foi verificada como se dá geração e disposição final dos mesmos e a partir
disto elaborou-se um relatório com propostas para ajustá-los às legislações municipal, estadual e
federal. Este relatório abrange inicialmente a geração e disposição final dos resíduos sólidos
domiciliares e contém proposta para implantação da coleta seletiva de materiais recicláveis.
Pretende-se, progressivamente, elaborar outros planos de ação para os outros tipos de resíduos
visando sua gestão integrada.
O Município de Martinópolis possui aproximadamente 25.000 habitantes, os quais geram
cerca de 13 toneladas de resíduos sólidos domiciliares por dia, totalizando aproximadamente 390
toneladas/mês, ou cerca de 0,5 kg/dia/habitante. Os resíduos coletados são destinados para a usina
de triagem e compostagem do município e, após seu processamento, os rejeitos são destinados para
o aterro em valas.
No diagnóstico realizado em 2006, verificou-se que o percentual de materiais recicláveis
contido nos resíduos sólidos domiciliares gerados pela população martinopolense compreendia
6,35% do total de resíduos. Os materiais recicláveis eram descartados pela população sem nenhuma
separação, implicando na inutilização de grande quantidade de materiais recicláveis e redução da
vida útil do aterro, dentre outros.
Fórum Internacional do Meio Ambiente - A conferência da Terra 1244

Para resolver esse problema, foram planejadas várias ações visando obter benefícios no
que diz respeito à questão ambiental e social, com ênfase para a implantação de coleta seletiva no
município e organização dos catadores de material reciclável que trabalhavam nas ruas da cidade.
A coleta seletiva pode ser definida como um sistema de recolhimento de resíduos
recicláveis previamente separados na fonte geradora, compreendendo papéis, plásticos, vidros e
metais. Estes materiais recicláveis, após um pré-beneficiamento, que inclui a separação por cores,
tipos e prensagem, são comercializados, transformados por indústrias recicladoras e voltam para o
mercado.
Com a implantação da coleta seletiva ocorre uma série de benefícios sócio-ambientais,
como redução de custos com a disposição final dos resíduos, aumento da vida útil do aterro
controlado em vala, diminuição de gastos com remediação de áreas degradadas pelo mau
acondicionamento de lixo (a exemplo de lixões clandestinos), maior aproveitamento dos recicláveis
em virtude da melhor qualidade dos materiais triados, educação ambiental da população, melhoria
das condições ambientais e de saúde pública no município, inserção social de indivíduos através da
criação de associações ou cooperativas de catadores.
Diante desses benefícios, iniciou-se o processo de implantação da coleta seletiva em
Martinópolis, em setembro de 2006, com várias ações realizadas no intuito de efetivar sua
implantação. Houve o cadastramento dos catadores de materiais recicláveis para quantificar e
verificar sua situação sócio-econômica, sendo identificados 13 catadores cuja renda variava de R$
80,00 a R$ 220,00 mensais.
A partir desta verificação, foram realizadas reuniões para esclarecer e incentivar os
catadores a participarem de uma associação ou cooperativa municipal, com intuito de trabalhar com
os materiais recicláveis oriundos das residências da população martinopolense. Dentre os catadores
identificados, 8 se interessaram pela proposta.
Concomitantemente a isso e pensando na importância ambiental dessa proposta, foram
realizadas ações de divulgação e conscientização da população. Palestras sobre educação ambiental
foram realizadas inicialmente em todas as escolas de educação básica municipais, nas quais o
conteúdo sobre a importância da separação diferenciada dos resíduos sólidos foi explorado. Para um
maior envolvimento das crianças em idade escolar, foi realizado um concurso educativo abrangendo
os alunos de 1ª a 4ª séries do ensino fundamental, no qual elas deveriam criar um desenho
utilizando as quatro cores correspondentes aos materiais recicláveis (amarelo, azul, verde e
vermelho) e também lhe dar um nome, o qual seria adotado como mascote da coleta seletiva no
município. O desenho ganhador foi elaborado por uma aluna da 2ª série, que criou como mascote da
coleta seletiva o “Reciclaudo”, que posteriormente foi utilizado nos folderes, cartilhas e uniformes
da associação de catadores (Fig. 1). Também foi utilizado um espaço semanal no jornal de
circulação municipal, para divulgar para a população a importância ambiental e social do descarte
seletivo em suas residências e no comércio em geral.

Figura1: Personagem Reciclaudo.


Fórum Internacional do Meio Ambiente - A conferência da Terra 1245

Após estas ações, foi criada em março de 2007, a Associação dos Catadores de Materiais
Recicláveis de Martinópolis (ACAMART), inicialmente contando com 11 pessoas e hoje (agosto de
2007) com 17 pessoas no seu quadro de associados, das quais 8 são ex-catadores. As demais
pessoas foram escolhidas pelos catadores fundadores da associação.

Foto1: Os associados da ACAMART142

Com o suporte da administração municipal, foi aprovado um termo de concessão para que
a ACAMART (Foto1) realize a “Coleta Seletiva Solidária” e também usufrua a infra-estrutura da
Usina de Reciclagem e Compostagem143 do município (Fotos 2, 3, e 4), – a qual possui galpões para
desenvolvimento das atividades de separação, prensagem e armazenamento, banheiro, vestiários,
cozinha, sala para reunião e maquinário (esteira, prensa e trator) – e do caminhão (Foto 5) para
coleta seletiva diária.

Fotos 2, 3 e 4: Prédio da Usina de Reciclagem e Compostagem onde os associados trabalham.

Foto 5: Caminhão cedido pela Prefeitura para a


ACAMART realizar a coleta seletiva.

O município de Martinópolis foi então dividido em setores de coleta, nos quais a coleta
seletiva é realizada uma vez por semana em cada bairro, distribuindo-se em dias alternados aos dias

142
Nesta foto dois dos associados estão ausentes.
143
Usina para onde os resíduos sólidos domésticos são destinados; embora se denomine Usina de Reciclagem e
Compostagem não realiza a reciclagem do material, apenas a triagem. A compostagem do material orgânico está
temporariamente interrompida.
Fórum Internacional do Meio Ambiente - A conferência da Terra 1246

de coleta de lixo. Os setores para coleta seletiva foram definidos após levantamento em campo das
áreas de coleta. Dividiu-se a cidade em 4 setores de coleta abrangendo também a Represa Laranja
Doce – espaço aberto ao turismo regional – e em um dia da semana a coleta também é realizada em
2 distritos - Vila Escócia e Teçaindá.

Mapa 2: Setores de Coleta Seletiva na Cidade de Martinópolis. Organizador: Silva et al, 2007

Criada a ACAMART, as atividades de educação ambiental nas escolas continuaram. Para


tanto, realizou-se um teatro com propósitos educativos para os alunos do ensino básico, no qual o
envolvimento e participação efetiva dos mesmos eram imprescindíveis para disseminar informações
sobre a coleta, sendo distribuídas, ao final da apresentação, cartilhas educativas contando a
trajetória do “lixo” na cidade. No restante do município, os associados da ACAMART, juntamente
com os elaboradores do projeto, distribuíram nas residências folderes explicativos, justificando a
importância da participação na Coleta Seletiva Solidária, conscientizando e convidando os
moradores a participarem desse ato de cidadania.

Foto 6 e 7: Educação Ambiental nas escolas de ensino básico: a mascote Reciclaudo


falando sobre como colaborar com a coleta seletiva e sua importância.

Após a implantação da coleta seletiva, verificou-se a diminuição da quantidade de


materiais recicláveis junto aos demais resíduos coletados pela coleta comum. A ACAMART coleta
aproximadamente 4t de materiais recicláveis por semana, cerca de 16t por mês. A intenção desta
iniciativa é de diminuir ao máximo a quantidade de materiais recicláveis junto ao lixo que vai para
Fórum Internacional do Meio Ambiente - A conferência da Terra 1247

o aterro controlado, podendo a eficiência da coleta seletiva aumentar em 0,6t por semana. Essa meta
tende a ser alcançada à medida que as campanhas de educação ambiental e divulgação aumentem.
Já ocorre divulgação mensal, na qual os associados fazem a divulgação porta a porta a respeito da
coleta seletiva, além de intervenções trimestrais nas escolas sobre a importância de questões
relacionadas ao meio ambiente.

Foto 8 e 9: Educação Ambiental nas escolas de ensino fundamental e médio.

Com relação à eficiência da coleta seletiva, ainda existe a questão da interferência dos
carrinheiros (catadores de rua) os quais aumentaram consideravelmente em número (hoje já são 12
catadores de rua) após a implantação da coleta seletiva e também da dificuldade que alguns
munícipes afirmam ter em separar os resíduos, por isso não descartam seletivamente.
Os associados da ACAMART estão sendo beneficiados de várias maneiras. Atualmente, o
salário varia mensalmente de 1,5 a 2 salários-mínimos, pois o valor depende da quantidade de
materiais recolhidos e vendidos mensalmente. Também alguns relatos foram observados com
relação à valorização dos mesmos como cidadãos principalmente pelo papel que têm desenvolvido
junto à limpeza municipal e conservação dos recursos naturais. Os associados vão receber aulas de
alfabetização e ainda estão recolhendo INSS para que possam futuramente recorrer junto aos órgãos
governamentais e requisitar sua aposentadoria além de seguridade quando da ocorrência de
acidentes de trabalho.
Uma das inovações da ACAMART é a coleta/recolhimento do óleo vegetal de cozinha
usado (óleo de fritura), o qual é repassado a um morador local, para que seja transformado em
biodiesel para movimentar o maquinário agrícola de sua propriedade. Este morador recebe o óleo de
fritura o qual é filtrado (para retirar as impurezas), onde são adicionados 3% de etanol e 50 % de
óleo diesel . O produto final é composto de 50% do óleo de fritura mais 50% de óleo diesel,
obtendo assim um combustível de rendimento eficiente para os motores. Para o recebimento deste
combustível, os motores não necessitam de nenhuma adaptação, ou procedimento especial para
funcionarem.
A implantação da coleta seletiva e gerenciamento adequado dos resíduos em geral é uma
das proposições necessárias para que o município se enquadre nas normas do “Município Verde”
junto ao governo do Estado de São Paulo. Sendo assim, este trabalho torna-se de grande valia para
as mudanças e ações que devem ser adotadas.
O intuito desse projeto é fazer também com que os associados da ACAMART se
autogerenciem, conseguindo assim negociar seus produtos e ter independência financeira e
administrativa, mas também evidenciar a importância de seu trabalho para a comunidade e o meio
ambiente.

REFERÊNCIAS BIBLIOGRÁFICAS
ASSOCIAÇÃO BRASILEIRA DE NORMA TÉCNICAS. Resíduos sólidos – Classificação. NBR
10004, 2004.
_____. Amostragem de resíduos sólidos. NBR 10.007, 2004.
Fórum Internacional do Meio Ambiente - A conferência da Terra 1248

_____. Resíduos de Serviço de Saúde. NBR 12.808, 1993.


_____. Resíduos de Serviço de Saúde – procedimentos na coleta NBR 12.810, 1993
BARREIRA, L. P. Avaliação das usinas de compostagem do estado de São Paulo em função da
qualidade dos compostos e processos de produção. São Paulo, 2005. 204p.Tese (Doutorado em
Saúde Pública) – Faculdade de Saúde Pública, Universidade de São Paulo.
CARVALHO, P. F., et al [org.]. Manejo de resíduos: pressuposto para a gestão ambiental. Rio
Claro: Laboratório de Planejamento Municipal – Deplan – IGCE, INUSP, 2002, 112p.
CASTILHO, J. R. F., PUGLIESI, E. A Plano Diretor de Martinópolis. Martinópolis: 2005. 93 p.
CEMPRE. Compostagem: a outra metade da reciclagem. Caderno de reciclagem 6. 2ºed, 2001.
CEMPRE. Guia da coleta seletiva de lixo. São Paulo, 1999, 84p.
CEMPRE. O papel da prefeitura. Caderno de reciclagem 2. 3º ed, 1997, 40p.
COMPROMISSO EMPRESARIAL PARA RECICLAGEM, CEMPRE. Pneus – O mercado para
reciclagem. Disponível em <http://www.cempre.org.br/fichas_tecnicas_pneus.php> Acesso em 15
de junho de 2006.
COUTO, M. C. L., BRAGA F. S. Tratamento de chorume de aterro sanitário por associação de
reator anaeróbio de fluxo ascendente com manta de lodo e reator anaeróbio por infiltração rápida,
[200?].
DALTOZO, J. C. Martinópolis, sua história e sua gente. Martinópolis: Martipel, 1999, 200p.
FAGUNDES, D. C. Diagnóstico dos resíduos sólidos em Teodoro Sampaio – SP. 2005. 84p.
Monogafia (Graduação em Geografia) – Faculdade de Ciências e Tecnologia, Universidade
Estadual Paulista, Presidente Prudente.
FIORILLO, C. A. P. Curso de Direito Ambiental Brasileiro. 5º ed. ampl. São Paulo: Saraiva, 2004,
428p.
FONSECA, E. Iniciação ao Estudo dos Resíduos Sólidos e da Limpeza Urbana. 2º ed. Paraíba: JRC
Gráfica e Editora, 2001.
FUZARO, J. A. RIBEIRO, L. T. Coleta seletiva para prefeitura: guia de implantação. 2º ed. São
Paulo: Secretaria do Meio Ambiente. CETESB, 2002, 48p.
JARDIM N. S., et al. (Coord.). Lixo municipal: manual de gerenciamento integrado. 1º ed. São
Paulo: IPT: CEMPRE, 1995.
KROM, V. Estudo da viabilidade econômica de uma usina de compostagem de lixo. Dissertação
(mestrado) - Universidade Estadual Paulista, Fac. de Ciências Agronômicas: Botucatu, 1997, 95 p.
LAJOLO, R. D. [coord.]. Cooperativa de catadores de materiais recicláveis: guia para
implantação. São Paulo; IPT: SEBRAE, 2003, 111p.
LEAL, A.C., et al. Resíduos sólidos no Pontal do Paranapanema. Presidente Prudente: Viena,
2004, 280p.
LIMA, J. D. Gestão de resíduos sólidos urbanos no Brasil. Campina Grande:Inspira Comunicações
e design, [200?], 266p.
LIMA, L. M. Q. Lixo: Tratamento e Biorremediação. São Paulo: Hemus, 264p.
LOPES, A.L.B. (Coord.). Como destinar os resíduos sólidos urbanos. Belo Horizonte: FEAM,
2002, 45p.
MANSUR, G. L., MONTEIRO, J.H.R.P. O que é preciso saber sobre limpeza urbana. Rio de
Janeiro: IBAM/CPU, 1991, 128p.
MONTEIRO, J. H. P., et al. Manual de Gerenciamento de Resíduos Sólidos. Rio de Janeiro: IBAM,
2001, 200p.
SÃO PAULO (Estado). Secretaria do Estado de Meio Ambiente, SMA. Procedimentos para a
implantação de aterro sanitário em valas. São Paulo, 2005, 34p.
SÃO PAULO (Estado). Secretaria do Estado de Meio Ambiente, SMA. Resíduos sólidos e meio
ambiente no Estado de São Paulo.São Paulo: A Secretaria, 1993, 144p.
SAVI, J. Gerenciamento integrado de resíduos sólidos urbanos em Adamantina – SP: Análise de
viabilidade da Usina de triagem de RSU com coleta seletiva. Presidente Prudente, 2005. 236 p.
Tese (Doutorado em Geografia) – Faculdade de Ciências e Tecnologia, Universidade Estadual
Paulista.
Fórum Internacional do Meio Ambiente - A conferência da Terra 1249

SCHNEIDER, V.E., et al. Manual de gerenciamento de resíduos sólidos de serviço. Caxias do Sul:
EDUCS, 2004, 319p.
Site visitado: <http://www.sebraesp.com.br>. Acesso em 08 ago 2006.
TAUK S. M. [org.]. Análise Ambiental: uma visão multidisciplinar. São Paulo: UNESP, 1995,
206P.
ZANIN, M. et al. Resíduos plásticos e reciclagem: aspectos gerais e tecnologia. São Carlos:
EdUFSCAR, 2004, 143p.
Fórum Internacional do Meio Ambiente - A conferência da Terra 1250

MAPEAMENTO TEMÁTICO APLICADO AO DIAGNÓSTICO DE SANEAMENTO


BASICO A PARTIR DE CENÁRIOS AMBIENTAIS.144

Edvaldo Oliveira
Departamento de Geografia. UESB - Universidade Estadual do Sudoeste da Bahia, Estrada do Bem Querer, km 4 –
Vitória da Conquista – Bahia. CEP 45100-000. edvaldocartografia@gmail.com
Mauricio Santana Moreau
Departamento de Ciências Agrárias e Ambientais – Universidade Estadual de Santa Cruz - mmoreau@uesc.br

RESUMO
O presente trabalho objetivou aplicar a cartografia temática na elaboração de diagnósticos
de saneamento básico, na cidade de Itambé – BA a partir de dados censitários do IBGE e de
trabalho de campo. A pesquisa considerou a teoria do desenho ambiental e do planejamento por
cenários, divididos em cenário de alta, media e baixa visibilidade. Levantou as questões do cenário
de média visibilidade que envolve uma área de 1 a 5km, própria dos sítios urbanos. Os resultados
identificaram problemas de saneamento quanto ao esgotamento sanitário embora a coleta seja de
85,3%, com tratamento zero, e coleta de lixo em torno de 76,5%. A aplicação de mapas temáticos
foi feita utilizando o software MapViewer 7.0 a partir de base urbana cedida pela empresa de
saneamento.
Palavras Chave: Cartografia temática, desenho ambiental, cenários, saneamento básico.

ABSTRACT
The present work had the objective to apply the thematic cartography in the elaboration of
diagnoses of basic sanitation, in the city of Itambé - BA, starting from census datas of IBGE and of
field work. The research considered the theory of the environmental drawing and of the planning
goes sceneries, divided in discharge scenery, it measured and it lowers visibility. It lifted the
subjects in the scenery of average visibility that involves an area from 1 to 5km, own of the urban
sites. The results identified problems of sanitation with relationship to the sanitary exhaustion
although the collection of 85,3%, with treatment zero, and it collects of garbage around 76,5%. The
application of thematic maps was made using the software MapViewer 7.0 starting from urban base
given in by the company of sanitation.
Key words: Thematic cartography, I draw environmental, sceneries, basic sanitation.

INTRODUÇÃO
Os problemas urbanos revelam uma grande quantidade de variáveis de estudo que vão
desde o enfoque sociológico a problemas espaciais que exigem análises mais acuradas, envolvendo
a demanda por documentos cartográficos. Nesse sentido, buscou-se avaliar uma metodologia de
planejamento urbano ambiental para a cidade de Itambé, com ênfase na elaboração dos cenários
ambientais a partir da proposta teórica de elaboração de cenários de média visibilidade utilizando
como técnica principal a cartografia temática.
Este trabalho faz parte de um trabalho maior envolvendo os três pontos de visibilidade
estabelecido Franco (1997), divididos em cenário de alta, média e baixa visibilidade, que permite
vários enfoques. Neste caso, avaliou-se a aplacação efetiva da cartografia temática relativas às
questões do saneamento básico, com ênfase no esgotamento sanitário e coleta de lixo. Nesse
propósito, foram elaborados os cenários com a aplicação de técnicas da cartografia numa base
cartográfica única e segura para geração de mapas temáticos que evidenciassem a realidade das
condições ambientais, favoráveis ou não, da área de estudo.

Área de estudo

144
O presente trabalho é parte do resultado da dissertação de mestrado intitulada Mapeamento temático aplicado á
elaboração de cenários urbanos: estudo e caso: Itambé –BA, UESC/Prodema.
Fórum Internacional do Meio Ambiente - A conferência da Terra 1251

A cidade de Itambé – BA está situada entre as coordenadas 15º 24’50 de latitude sul “e
40º 62’40” de longitude oeste, na região de planejamento denominada Sudoeste da Bahia
A cidade apresenta uma dimensão retangular no sentido norte sul margeado pelo Rio
Verruga a Leste e Rio Pardo a oeste.. O aumento populacional levou abertura do Bairro Felipe
Achy, a oeste da cidade definido como área de regularização fundiária, por iniciativa do poder
municipal. A abertura desse bairro fez avançar a pressão da habitação sobe o Rio Pardo avançando
sobre a vertente norte na margem direita do Rio.
A cidade apresentou as condições para aplicação da pesquisa por apresentar problemas
recorrentes da maioria das cidades de porte pequeno e médio, no Brasil. A situação e o sitio urbano
implantados na confluência dos Rios Verruga e Pardos, além de várias microbacias, trazem os
problemas típicos das cidades implantadas às margens de rios, sobretudo quanto ‘a questão do
esgotamento sanitário.

Córr
ego BAHIA

Ve

o
Riach
rru
ga
ITAMBÉ - BA
Rio
Verr uga

Córr
ego

2005
da

Ven
da

o
g
C ó r r e
Ri
o

O
Ve

D
rru

Rio
ga

Pard
o

R
A
P

0 100 200 300 400


metros

Fig 1- localização da área de estudo.

Cenário de média visibilidade - abordagem conceitual


Os métodos que conduziram aos resultados e às análises, na pesquisa, foram orientados
pelos trabalhos de Sales (2004), Buarque (1999), Franco (1997, 2000), Alves (2004) para a
determinação do cenário de media visibilidade. Os aspectos relacionados à cartografia básica foram
tomados de trabalhos de referencia nesta técnica como Rosa e Brito (1996) e Oliveira (1988) e
Teixeira e Christofolete, (1999). Os resultados obtidos para a cartografia temática contaram com
recomendações de Martinelli (1991), Oliveira (1988) Duarte (1988). Os parâmetros para cálculo do
esgotamento sanitário foram embasados nos indicadores desenvolvidos pela SABESP (2005) e
dados coletados pela EMBASA (2005)
O cenário da média visibilidade, segundo a proposta de Franco (1997), remete a um espaço
menor em relação ao cenário de alta visibilidade e maior em relação ao cenário de curta
visibilidade. Nesse sentido, propõe critérios de visibilidade aos quais denominou pontos de
visibilidade divididos em: pontos de alta visibilidade, aqueles em que se observa a uma distância
mais longa – dez quilômetros; média visibilidade, como o alcance variando entre três a seis
quilômetros e de curta visibilidade na escala do lote ou da quadra. (FRANCO, 1997).
Segundo Alves (2004), outra classificação pode ser efetuada como Cenário de recuperação,
Cenário de conservação, Cenário de preservação, Cenário de lazer, Cenário de meios de consumo
coletivo, Cenário de participação popular, Cenário de educação ambiental.
Jara (1999) e Buarque (1998) trabalham na perspectiva de cenários no plano municipal, em
especial nas comunidades onde devem ser implementados projetos de desenvolvimento local.
Buarque propõe, então, três tipos de tipos de cenários: alternativos, prováveis, normativo ou
desejado.

MATERIAL E MÉTODOS
Fórum Internacional do Meio Ambiente - A conferência da Terra 1252

Por se tratar de uma pesquisa envolvendo diretamente a cartografia temática foi dividida
em duas etapas.

Aquisição do mapa básico.


Nesta etapa foram utilizados os seguintes procedimentos:
- Estabelecimento da escala 1:2 000 para elaboração das cartas temáticas; escolha da base
cartográfica (planta urbana), retificação, reambulação e testes de campo; definição do software
MapViewer 7.0.
2. Geração da de dados do trabalho de campo.
Foi utilizada a base cartográfica da cidade obtidas junto à Empresa Baiana de Água e
Saneamento – EMBASA
Foi elaborado o banco de dados a partir doze Setores Censitários com dados relativos ao
lixo, ligação de água e esgoto por domicilio. O universo trabalhado foi de 17.412 moradores para a
população de 22.175 habitantes somando dos doze setores censitários 78,52% da população total.
Estes dados foram extraídos do banco de dados delimitados para a cidade de Itambé. Foi feito filtro
das variáveis coletadas em campo pelo IBGE com isolamento dos dados de interesse da pesquisa e
montagem do banco de dados. Foi digitalizado sobre o mapa básico a delimitação dos setores
censitários, enumerados e geocodificados no software MapViewer 7.0 para link com o banco de
dados e posterior geração dos mapas temáticos. Os produtos da cartografia considerou alem dos
mapas temáticos a carta de orientação de vertentes e uso a fotografia aérea para estudo da expansão
da área urbana sobre as vertentes dos rios.

RESULTADOS E DISCUSSÃO
A destinação do esgotamento sanitário, levantado pelo Censo 2000 do IBGE constatou
que no Brasil 5,9% dos domicílios jogam esgoto em valas, rios, lagos ou no mar. Esta proporção é
maior nas áreas rurais (10%) do que nas urbanas (5%). Além disso, 8,3% dos domicílios do Brasil
não têm instalações sanitárias, situação que pode ser vista mais nas zonas rurais (35,5% das casas
não têm instalações). Segundo dados do BNDES, o custo médio do investimento em esgoto
sanitário composto de coleta e tratamento, varia proporcionalmente ao tamanho do município, de
US$ 420.00 a US$ 840.00 por domicílio atendido. Os custos médios anuais de operação variam, de
forma igualmente proporcional, entre US$ 6.00 e US$ 13.00 por domicílio atendido.
O problema do saneamento básico se apresenta como de maior relevância na cidade de
Itambé onde o esgoto não é tratado pela empresa de Saneamento Estadual, ficando a cargo do
município. A ausência de um planejamento urbano sobre as vertentes, aliada ao não tratamento do
esgoto, criou condições para o quadro que se apresenta dividido em: avanço da malha urbana sobre
as vertentes dos rios; coleta no sistema de esgotamento no sistema unitário; coleta de lixo sem
tratamento e despejo direto nos rios.
A inserção da planta urbana e das curvas de nível sobre a fotografia aérea de 1974 e a
elaboração da carta de orientação de vertentes (fig 2) mostra o processo de expansão urbana para
as vertentes mais íngremes dos Rios Verruga e Pardo, refletindo a ausência de planejamento sem
levar em conta a destinação dos efluentes.
Fórum Internacional do Meio Ambiente - A conferência da Terra 1253

R io V
345

325
330

320

e rr u g
340
335
VI
TO
RI
A
X

DA

X X X XXXXXXXX X
X X
XX XX XX XX

X
X X XX X

Córreg

CO

X
X X X
X X
XX

NQ
X

a
o da

325
IS
Venda

TA

345
X
X
X
X
X

ITAMBÉ - BA
X
X
X 0
33
X
X

X
X

0
34
X
2005
X
335

X
X
X X X

X X XX
X
XX XX
335

X
XX XX

X
X
340

X X

X
X
X

X
XX XX

X
345

X
XX XX X

Carta de orientação
XX XX

350
XX XX X

X
XX X

das vertentes
X XX
X XX

X
355
X X

X
X X
X X
X
X X

X
X
X
X
X

Vertente do Rio Pardo


X

X
X
X

X
X X

X
X

360
X X X X X X
X
X X X X X
X X X

Vertente do Rio Verruga


X

X X X
X

X X

XX
XX
X

X X

X
X
X

X X X

X
X X

X X
X

X
X

X X
Curvas de nível
X
X

X
360

X
X

X
X
X

Rio
X
355
X

34 34 350
X

X
X XX X
X X
3350 5
X X

Sentido das crênulas


X

X X X X X X X
X X
X

X X X X 330
X

X X X X X
X

V er
X

R io

ru g
Pa
X
X X

rdo
X
X XX

X
X

a
X
X
X
X
X
X
X

X X
X
X

X X
X
X
X

X
XX X
X

X X X
X X X
X X
X

X XX X
X
X

X
X
X

X
X

X
X
X

X
X
X

X
X
X

X
X

X
X
XX

X
X
X
X
X
X
IT
X
A
X
X PE
T
5
X
IN
G
A 33

Bairro Felipe
BA
M
O

0
T

32
/

0 100 200 300 400


P

0
0 250 500 33
5
metros
33
meters

330
0

325
34 5
3 4 50
3
0 5

335
34 0
35 34

Figura 2 - Inserção da planta urbana e curvas de nível sobre fotografia aérea de 1974 e a Carta de
orientação de Vertentes. Fonte: Foto: Cruzeiro do Sul/Embasa.Carta de orientação das vertente –
resultados da pesquisa.

Para efeito de estudo da pesquisa, buscou-se a classificação dos sistemas de esgoto


elaborada pela SABESP (2005), identificados como:
Sistema unitário: a coleta dos esgotos pluviais, domésticos e industriais em um único
coletor. Tem custo de implantação elevado, assim como o tratamento também é caro;
Sistema separador: os esgotos domésticos e industriais ficam separados do esgoto pluvial.
É o usado no Brasil. O custo de implantação é menor, pois as águas pluviais não são tão prejudiciais
quanto o esgoto doméstico, que tem prioridade por necessitar tratamento. Assim como o esgoto
industrial nem sempre pode se juntar ao esgoto sanitário sem tratamento especial prévio;
Sistema misto: a rede recebe o esgoto sanitário e uma parte de águas pluviais.
O consumo de água está diretamente relacionado com a produção de esgoto. Estudos
revelam que do consumo de água per capta, 80% vai para o esgoto. Aqui foram tomados os
parâmetros médios de consumo de água representados no quadro 5 revelando a situação no Brasil,
por estados, e a produção média de resíduos produzidos.
O sistema implantado na cidade de Itambé é do tipo unitário, na maioria dos setores
censitários estudados. O sistema misto é encontrado nas ruas do Centro especialmente nos Setor
Censitário 12.
Segundo informações dos moradores e da prefeitura, com as chuvas nos períodos de
novembro a março eleva o nível dos corpos d’água provocando o retorno até às residências.
Os dados, tanto do IBGE quanto os dados consultados do BNDES indicam que o
município apresenta boas condições quanto a ligação de água e esgotamento. Contudo, não há o
tratamento do esgoto, que é lançado no Córrego da Venda, Rio Pardo, e Rio Verruga. Segundo os
dados levantados na pesquisa de campo e dos coletados no banco de dados, a cidade conta uma
qualidade de coleta acima da media das cidades brasileiras conforme o Quadro 1. No entanto o
tratamento do esgoto é zero e o lixo depositado em “ lixão” nas margens do Rio pardo.
Fórum Internacional do Meio Ambiente - A conferência da Terra 1254

Quadro 1 Condição de atendimento referente ao saneamento básico domestica na cidade de Itambé -


BA.

Item %
Ligações de água 97,4
Ligações de esgoto sanitário 85,3
Coleta de lixo: 76,5
Fonte: Dados da pesquisa.

A identificação dos vetores de deslocamento do esgotamento sanitário na fotografia área e


na carta de orientação das vertentes da cidade a partir das curvas de nível, contando com duas
vertentes, mostra a ausência do planejamento. A figura 3 mostra os vetores de deslocamento do
esgotamento sanitário para o Rio Pardo a sudoeste e Rio Verruga no sentido noroeste/ sudeste da
cidade.

Figura 3- Vista da cidade com direções da declividade. Foto: Antenor. Hann/ Edvaldo. Oliveira

Observou-se a impossibilidade de calcular a produção de esgoto por medição da vazão


diante das condições precárias da tubulação de lançamento de esgoto nos córregos e rios. Ainda
assim, a identificação de doze pontos de lançamento em tubos de 30 mm e 70mm, uma galeria com
de aproximadamente 2,00 x 2,00m.de concreto e despejo direto correndo a céu aberto mostra a
disparidade entre o nível de atendimento e tratamento dos efluentes. A Figura 4 mostra o mapa de
levantamento, em campo dos pontos de lançamentos de esgoto nos Rios Verruga e Pardo.
Fórum Internacional do Meio Ambiente - A conferência da Terra 1255

Rio
5

Verr
34

325
0

0
33

32
0
5
34
33

u
ga
Córre
go da

325
Vend
a

5
34
ITAMBÉ - BA
0
33

0
34
335
335
340
2005
345

350

355

360

360

Rio
355
3 345 350
3340
5
330

V
err
Rio
P

ug
ard
o

a
5
33

0
32
0 0 100 200 300 400
33
metros
5
33
0
33

0
325

34 5
34 50
3
0 5
335
340

35 34

Figura 4 Mapa de pontos de lançamento de esgoto nos Rios

No estudo dacidade de Itambé, considerando que a população em 2002 de 23.264


habitantes os resultados de produção de esgoto sanitário são avaliados partir da formula:
Pr= p/C
Onde Pr = produção de resíduo, p = população e C consumo d’água. Assim obteve-se:
Consumo de água - 55.548m3 /mês,
Consumo médio per capta - 2,38m3 / mês,
Consumo medio /dia - 79,33 litros/dia

Os dados apontados revelam que a média de consumo do Estada da Bahia é de 115,3


litros/dia a cidade apresenta um consumo abaixo da média estadual e nacional que de 127,14
litros/dia
A tabela 1 mostra os dados coletados na EMBASA, sobre o consumo, distribuição e perda.

Tabela 1 - Consumo d’água na cidade de Itambé


Referências Mês
Disponibilizado 65.208m3
Consumo 55.548m3
Perda na distribuição 9.960m3
Consumo médio por residência 14.1m3
Consumo p/ economia/residencia/dia 483 litros
Fonte: EMBASA/2005
Fórum Internacional do Meio Ambiente - A conferência da Terra 1256

Segundo os manuais de Engenharia Sanitária, tecnicamente, em média, cada cidadão


produz 180 litros de esgoto sanitário por dia. A taxa para a cidade de Itambé é baixa se comparada
com a previsão da SABESP onde uma família com 4 pessoas, com mudança de hábitos de
desperdício nas atividades diárias, consome no máximo 15m3/mês produzindo em média 12m3 de
esgoto.
Considerando que o consumo d’água, é de 63,46 litros ou 1,9m3/mês, per capta, para a
cidade de Itambé a produção média de esgoto é de 7,56m3, per capta. A produção mensal de
esgoto calculada é de 44.916m3/ mês lançados diretamente nos Rios Verruga e Pardo. Ainda assim,
a produção média de esgoto fica abaixo das médias nacional e estadual, diante do baixo consumo,
embora o atendimento seja elevado para os padrães da cidade
A partir dos dados dos setores censitários do IBGE (2000) foi possivel montar o banco de
dados do saneamnto básico da cidade para a geração dos maps tematicos, que evidenciasse melhor a
situação. A tabela 2 apresenta o banco de dados sanitário considerando as variáveis observadas nos
Setores Censitários. No quadro 3 estão resumidas as condições de saneamento básico na cidade. Os
percentuais apresentados mostram uma realidade pouca conhecida nas cidades brasileiras
referendadoa pelos trabalhos de campo e o levantamento pelo Censo do IBGE.

Tabela 2 - Resumo das condições sanitárias extraído do banco de dados, por Setor Censitário.
Abastecimento Água Esgotamento sanitário Coleta de lixo
Queim
Com Sem
ado
Nº de Sem banheir sanitári Rede de
PI Abastecimento de Lançamento Fo Cole enterra Lançamento
dominicíl ligação de o/ o esgoto/
D água - rede geral em vala ou rio ssa tado do/ em vala/ rio
ios água sanitári banhei pluvial
terreno
o ro
baldio
CS
322 316 6 319 3 310 2 7 297 25 0
01
CS
158 158 0 152 6 151 1 0 158 0 0
02
CS
367 365 2 364 3 362 0 2 352 5 1
03
CS
320 316 4 269 51 262 4 3 262 25 0
04
CS
569 549 20 497 72 456 33 8 390 175 0
05
CS
296 282 14 272 15 267 1 4 250 36 1
06
CS
325 321 4 309 14 309 0 0 266 57 0
07
CS
296 289 7 287 5 287 0 0 289 3 0
08
CS
372 358 14 305 60 283 16 6 259 105 1
09
CS
327 309 18 299 23 259 36 4 257 24 40
10
CS
252 234 18 235 4 216 13 6 223 13 3
11
CS
280 274 6 266 13 264 2 0 264 15 0
12
To 3
3 884 3 771 113 3 574 269 3.426 108 40 483 46
tal 267
Fonte: IBGE- Censo 2000 – organizado pelo autor.
Fórum Internacional do Meio Ambiente - A conferência da Terra 1257

Quadro 3 - Quadro resumo do saneamento básico (%)


Abastecimento Água Esgotamento sanitário Coleta de lixo
Rede
Abastecimento Sem Com Sem Lançamento Lançamento
Nº de de
PID de água - rede ligação banheiro/ sanitário em vala ou em vala/ rio
dominicílios esgoto/ Coletado
geral de água sanitário banheiro rio ou outros
pluvial
Total 3 884 97,09 2,91 92,01 7,99 88,05 11,95
83,29 16,71
Fonte: IBGE- Censo 2000 – organizado pelo autor.

A partira das análise e da formulação do banco de dados foi possivel gerar os mapas
temáticos das condições de esgotamento sanitário envolvendo a destinação dos resíduos. Outra
variável de análise foi as condições sanitárias nas casas com a ausência de banheiros, o que
demosntra que a implantação de esgotamento em 88,05% das residências convive com o
percentual de 7,99% de residências sem hábitos sanitários dignos. A Figura 5 mostra os mapas
comparativos entre esgotamento sanitário e instalação doméstica de banheiros. Permite avaliar, por
setor censitário, que o quadro de saneamento da cidade Itambé, no que diz respeito à capacidade de
atendimento da população é satisfatoria do pontode vista da coleta, contudo deficiente quanto ao
tratamento.
Ve rrug

Verru
259
ITAMBÉ BA ITAMBÉ BA
ITAMBÉ - BA
36

ga
órre 4
Cór

2005
rego
go
2005
da SC 09
a

da
Vend 92.86%
SC 10
Ven a

2005
da 287
0
SC 10
7.14%
0

309

ITAMBÉ - BA
0 98.29%
0 216
SC 08 13
6 1.71%
95.67% SC 08
Lançamento esgotamento sanitáro 98.33%
2005
SC 07
283 SC 11 4.33% 1.67%
16
6 267
1
4
por Setor Censitário SC 07 SC 11
264 SC 06
2
83.56%
SC 09 0
94.77%
SC 06 16.44%
5.23%
95.34%
SC 12
Rede de esgoto/pluvial
151
1
SC 09
SC 12
4.66%
Residencias
310
362
0
0
com/sem banheiro
2
7 SC 02
2 vala rio Fossa 96.20%
Ri

3.80%
o

R
SC 02

io
SC 01
SC 01 SC 03
151 456 0 36 0 8 99.07% 99.18%
Ve

0.93% 0.82%
rru

Ve
Rio 262 SC 03
Com Banheiro Sem banheiro
rru
ga

P ardo 4 Rio

ga
Par
3 do
456
33
8
SC 04
84.06% 158 3843

15.94%
SC 05 87.35%
SC 04
12.65%
SC 05

0 100 200 300 400


meters 0 100 200 300 400
meters

Figura 5 - Mapas comparativos de esgotamento sanitário e atendimento da população.

Os mapas apresentados na Figura 6 mostram que tanto o abastecimento de água, quanto a


coleta de lixo, apresentam índices elevados para os padrões médios das pequenas cidades
brasileiras, comparando dados do Censo 2000. Os setores que apresentam maiores deficiências são
aqueles em que a proximidade dos rios que facilitam a ação dos moradores em depositar lixo.
Fórum Internacional do Meio Ambiente - A conferência da Terra 1258

257

Verru
24
40 ITAMBÉ BA

Verru

ga
309
18 ITAMBÉ BA rego
da SC 09 2005

ga
Cór
SC 10
2005
rego
da SC 09 Vend 289
a
SC 10 3
Ven 0
da
289
7 266

ITAMBÉ –
57 223

ITAMBÉ – BA
0 13
321 3
4 234
18
SC 08

358
SC 08
259
105
1 250
36
2005
14 SC 07 1 SC 11
SC 07 282
SC 11
SC 06 264
15
14SC 06
0
274
6

Coleta de lixo
Abastecimento d'água SC 09 SC 12
SC 09
158
Coletado
SC 12
158
por Setor Censitário 0
352
0
297 5
0
SC 01
25
0
1 Queimado
365
316 2
Com Ligação SC 02 P/ Vala/rio

R
6

io
R
SC 02

io
SC 01

158 390 0 175 0 40

Ve
Sem ligação SC 03 262

rru
Ve
Rio
25

ga
SC 03 Pard

rru
Rio o 0

ga
Par 316
do
4
SC390
01
175
549 158 549 0 20 0
20

SC 04
SC 04

SC 05
SC 05

0 100 200 300 400


0 100 200 300 400
meters
meters

Figura 6- Mapas comparativos de abastaeciemto de agua e coleta de lixo.

Os mapas temáticos de fato revelam os resultados do Censo 2000 comparados com as


observações de campo. No Bairro Felipe Achy, a leste da cidade, foi observado a ausência de caixas
de passagem. A informação coletada junto aos moradores é de que os tubos de ligação das
residências são conectados diretamente nos dutos interceptores que levam o esgotamento para os
rios
O posicionamento do aterro merece estudo ambiental mais acurado por ocupar área
elevada na margem esquerda do Rio Verruga. As inferencias é que o deslocamento do Chourume
pode ser depositado no leito do rio trazendo problemas ambientais como verificado na Figura 7.

Figura 7- Lixão. Foto:A. Hann/ Edvaldo Oliveira. Fonte: Pesquisa de campo.

Dessa forma o quadro do saneamento básico na cidade de Itambé não se apresenta


diferente da maioria das cidades brasileiras. Contudo, torna se mais preocupante o mascaramento a
partir dos dados levantados criando uma falsa idéia de que a coleta significa melhora das condições
ambientais

CONSIDERAÇÕES FINAIS
Os propósitos da pesquisa para o cenário de médio alccance, utilizando a cartografia
temática, mostram resultados satisfatórios, embora a discussão sobre o tema careça de uma
discussão teórica mais aprofundada, uma vez que a teoria do desenho ambiental e o planejamento
por cenários precisam ser melhor debatidos. Quanto aos procedimentos adotados, o Censo na cidade
de Itambé revelou as condições próximas do real, por ser uma cidade pequena, com um universo de
coleta de dados próximo da população residente. Isso facilitou a analise combinando com os
resultados dos trabalhos de campo. A situação do esgotamento sanitário e coleta de lixo revelada no
Fórum Internacional do Meio Ambiente - A conferência da Terra 1259

banco de dados e nos mapas temáticos, embora sejam elevados, mascaram a realidade uma vez
que o produto final acaba degradando o meio ambiente.

REFERENCIAS BIBLIOGRAFICAS
ALVES, Adriana Olívia. Planejamento ambiental urbano na micro bacia do Córrego da Colônia
Mineira – Presidente Prudente. Dissertação de Mestrado. Presidente Prudente: UNESP, 2004. 128p
<www.unesp.br> Acesso em junho 2004.
BUARQUE, Sergio C Metodologia de planejamento do Desenvolvimento Local Sustentável.
Brasília: IICA, 1999. 172 p.
DUARTE P. A Cartografia Temática Florianópolis: UFSC, 1988. 125 p.
FRANCO, Maria de Assunção Ribeiro. Planejamento ambiental para a cidade sustentável. São
Paulo: Anmablume: FAPESP, 2000. 296 p.
FRANCO, Maria de Assunção Ribeiro. Desenho Ambiental: uma introdução à arquitetura da
paisagem com o paradigma ecológico. São Paulo: Anmablume: FAPESP, 1997. 224 p.
IBGE - Fundação Instituto Brasileiro de Geografia e Estatística Itambé – Setores Censitários. Rio
de Janeiro, 2003. 1 CD ROOM.
MARTINELLI, Marcelo. Curso de cartografia Temática SP: Contexto, 1991. 180 p.
OLIVEIRA Céurio. Curso de Cartografia Moderna RJ: IBGE, 1988. 195 p.
OLIVEIRA, D. P. R Sistemas de Informações Gerencias: estratégias, táticas operacionais. 2ª. Ed.
São Paulo Atlas, 1993. 274p.
ROSA, Roberto. BRITO Jorge L.S. Introdução ao Geoprocessamento. Sistema de Informações
Geográficas. Uberlândia: UFU, 1996. 104 p.
SABESP - Serviço de Abastecimento de Água e Esgoto de São Paulo. Consumo per capta no
Brasil. Disponível em <http://www.sabesp.com.br/pura/noticias_dados/consumo_per_capta.htm>
Acesso em 22 de agosto de 2005.
SALES, Maria do Socorro T. M. Educação Ambiental: A preservação do verde na zona urbana de
Teresina – PI. Dissertação (Mestrado) Prodema/UFPI : 2004. 1 CDRoom
TEIXEIRA, Amandio L A, Christofolete, Sistema de Informações Geográficas São Paulo: Hucitec,
1999. 244 p.
Fórum Internacional do Meio Ambiente - A conferência da Terra 1260

UM ESTUDO DA PROBLEMÁTICA DA COLETA DO LIXO NA CIDADE DE


ANÁPOLIS, GOIÁS, SOB A PERSPECTIVA DOS CATADORES DE LIXO

Nathali Cardoso Costa


Aluna do Curso de Ciências Biológicas, Uni Evangélica, Centro Universitário de Anápolis, Av. Universitária, km 3,5,
75070 290, Anápolis, Goiás.
Josana de Castro Peixoto
Professora do Curso de Ciências Biológicas, Uni Evangélica, Centro Universitário de Anápolis, Av. Universitária, km
3,5, 75070 290, Anápolis, Goiás. E-mail: josana@ueg.br.

RESUMO
A vida contemporânea propõe um cotidiano mais dinâmico, proporcionando várias
comodidades, porém outros aspectos danificam-se, pois como conseqüência existe o acúmulo de
resíduos sólidos. Embora a reciclagem de lixo urbano gere vantagens ambientais indiscutíveis,
sobressaem os aspectos econômicos; o que faz do catador um incluído ao ter um trabalho e excluído
pelo trabalho que realiza. O trabalho proposto objetivou suscitar novos olhares e preocupações em
relação aos catadores de lixo, aprimorando o conhecimento sobre as questões enfrentadas por esses
trabalhadores diariamente, beneficiando-os de forma direta e indireta, mobilizando a sociedade
como um todo. Os dados foram coletados no município de Anápolis, Goiás, com entrevistas semi-
estruturadas, realizadas individualmente com 31 catadores de lixo em seus locais de trabalho,
constando questões relacionadas à identificação e dados sócio-demográficos. Os dados mostraram
os obstáculos enfrentados pelos catadores para reingressarem ao mercado formal de trabalho. A
catação de material reciclável é uma atividade que faz do excluído um trabalhador inserido no
mundo do trabalho, mesmo sendo um trabalho árduo que expõe os catadores a vários problemas é a
única alternativa que encontram para sobreviver. A criação de soluções para resolver os problemas
de gerenciamento do lixo, deve agir forma que para ordenar essa trajetória, deva-se operar de
maneira que o singular possa interagir com o coletivo, formando um todo.
Palavras-chave: resíduos sólidos, catadores de lixo, educação ambiental.

ABSTRACT
The contemporary life proposes a more dynamic daily, providing various facilities, but
other aspects damage, and then as a consequence there is the accumulation of solid waste. Although
the recycling of urban waste manages environmental advantages indisputable, out economic
aspects; what makes to pick garbage included to have a job and excluded from the work he
performs. The proposed work aimed to raise new visions and concerns in relation to of waste,
improving the knowledge of the issues faced by these workers every day, benefiting them in a direct
way and indirect, mobilizing the society as a whole. Data were collected in the municipality of
Anapolis, Goias, with semi-structured interviews, conducted individually with 31 pick of garbage in
their workplaces, appear issues related to the identification and socio-demographic data. The data
showed the obstacles faced by to work the formal labour market. The to pick of recyclable material
is an activity that is excluded from an employee entered the world of work, although hard work that
exposes the to various problems is the only alternative they find to survive. The creation of
solutions to solve the problems of waste management, should act that way to sort this path, should
operate as is the natural can interact with the public, forming a whole.
Keywords: solid waste, pick of waste, environmental education.

INTRODUÇÃO
Nos últimos 30 anos, o Brasil mudou muito o seu tipo de lixo. O lixo atual é diferente em
quantidade e qualidade, em volume e em composição. A industrialização trouxe consigo,
naturalmente, materiais a serem descartados. O fato do homem existir, traz consigo a existência do
lixo na mesma proporção. Já nascemos gerando descartes (GRIPPI, 2006).
Vários problemas atualmente invisíveis podem, em pouco tempo, causar grandes
dificuldades para a população brasileira. Não há qualquer vantagem para o Brasil de hoje, deixar a
Fórum Internacional do Meio Ambiente - A conferência da Terra 1261

solução para mais tarde em relação à problemática do lixo (GRIPPI, 2006). No Brasil, não há uma
legislação específica para o tratamento e o descarte de resíduos sólidos. Esses resíduos são gerados
em uma quantidade significativa: 229 mil toneladas de lixo por dia, sendo que desse total 60% não
tem um destino adequado, provocando grandes impactos ambientais e ocasionando problemas de
saúde pública (LOURENZANI et al., 2004).
Na cidade de Anápolis são produzidas 230 toneladas de resíduos sólidos urbanos
diariamente, dos quais 15,7% ou mais de 36 toneladas por dia são totalmente recicláveis
(SEMARH, 2005).
Os catadores estão construindo sua história e demarcando sua área de atuação,
conquistando também seu reconhecimento como categoria profissional, oficializada na
Classificação Brasileira de Ocupações (CBO), no ano de 2002. Nessa classificação, os catadores de
lixo são registrados pelo número 5192-05 e sua ocupação é descrita como catador de material
reciclável. Desde essa época, os avanços em relação à formalização das relações de trabalho foram
tímidos, havendo o predomínio da informalidade. No Brasil, estima-se que o número desses
trabalhadores seja de aproximadamente 500.000 (MEDEIROS & MACEDO, 2006).
Desta forma, o objetivo deste trabalho foi o de avaliar o perfil sócio-econômico dos
catadores de lixo bem como a percepção dos mesmos acerca dos problemas relacionados à geração
do lixo, acondicionamento e coleta seletiva na cidade de Anápolis, Goiás.

MATERIAL E MÉTODOS
O presente estudo foi realizado na cidade de Anápolis, Goiás. Município com uma área
total de 918 km2 e que conta atualmente com uma população de 318.808 habitantes (IBGE, 2006).
Efetuou-se uma pesquisa de caráter descritivo-exploratório. A coleta de dados foi realizada
utilizando-se entrevistas semi-estruturadas com os catadores de lixo. Foram entrevistados 31
catadores no período de 18 a 26 de setembro de 2007. As categorias abordadas na entrevista se
relacionaram à identificação e aos dados sócio-demográficos; à escolaridade; à profissão de catador
e às relações de trabalho.
As entrevistas se realizaram de forma individual, com autorização expressa de cada
participante, seguindo orientações técnicas do Comitê de Ética em Pesquisa (CEP), utilizando-se
uma câmera digital. Cada entrevista foi transcrita na íntegra, com autorização dos participantes,
preservando-se o anonimato dos mesmos.
Incluíram-se na pesquisa todos os informantes - catadores de material reciclável - com
idade igual ou superior aos 18 anos, que aceitaram participar da pesquisa voluntariamente e
concordaram em assinar o Termo de Consentimento Livre e Esclarecido.20
Todos os informantes que apresentaram idade inferior a 18 anos, que não aceitaram
participar voluntariamente da pesquisa e não quiseram assinar o Termo de Consentimento Livre e
Esclarecido foram excluídos da amostragem.
Os dados obtidos com as entrevistas semi-estruturadas foram qualitativos e quantitativos,
após análise foram computados e transcritos na íntegra. A fim de garantir o anonimato os nomes
foram substituídos e enumerados.

RESULTADOS E DISCUSSÃO
O levantamento demonstrou que dos trinta e um entrevistados; 61,30% são do sexo
masculino. Um dado aproximado ao da presente pesquisa foi apresentado por MEDEIROS &
MACEDO (2006) onde obtiveram na amostragem que 60% dos entrevistados eram do sexo
masculino.
Quanto à idade, os dados revelaram uma média de 40,79 anos entre os trabalhadores do
sexo masculino, com predominância de sujeitos com 50 a 60 anos. A média entre as trabalhadoras
foi de 39,09 anos, com maior incidência de mulheres com idades entre 30 e 50 anos. A média geral
entre homens e mulheres neste quesito foi de 40,13 anos com prevalência de sujeitos entre 30 a 60
Fórum Internacional do Meio Ambiente - A conferência da Terra 1262

anos, confirmando o resultado apresentado por MEDEIROS & MACEDO (2006). Segundo os
entrevistados, a idade constitui-se em obstáculo para o reingresso no mercado formal de trabalho.
De acordo com Castro (apud MEDEIROS & MACEDO, 2006) a idade é um dos fatores
que mais afetam a forma de participação no mercado de trabalho urbano formal, o qual, no Brasil, é
mais favorável o recrutamento de jovens. Já na catação, a idade não constitui fator excludente, pois
uma das características dessa atividade é a ausência de exigências para o seu ingresso.
Notou-se que maior parte dos catadores teve pouco ou nenhum acesso à escola. O nível de
escolaridade encontrado foi entre os homens foi de que 21,05% eram analfabetos; entre as mulheres
este dado é de 33,34%. A média geral de sujeitos analfabetos encontrada foi de 25,80%. Nenhum
dos trabalhadores nem ao menos começaram o ensino médio.
Considerando os dados sócio-demográficos, notou-se que a maioria dos sujeitos eram
provenientes do Estado de Goiás cerca de 80% entre os indivíduos do sexo masculino, 58 % entre
as entrevistadas do sexo feminino, num total de 70% indivíduos goianos, conforme apresentado nas
figuras 1, 2 e 3.

21,05%

Anapolinos
47,37% Outros municípios do Es -
tado de Goiás
Outros Estados brasilei-
ros

31,58%

Figura 1 – Dados sócio-demográficos dos indivíduos do sexo masculino.

25,00%

41,67%
Anapolinas
Outros municípios do Es -
tado de Goiás
Outros Estados brasilei-
ros

33,33%

Figura 2 – Dados sócio-demográficos dos indivíduos do sexo feminino.


Fórum Internacional do Meio Ambiente - A conferência da Terra 1263

29,04%

38,70%
Anapolinos
Outros municípios do Es-
tado de Goiás
Outros Estados brasilei -
ros

32,26%

Figura 3 – Dados sócio-demográficos dos indivíduos envolvidos na pesquisa.

Além da naturalidade, um dado sócio-demográfico de bastante relevância, foi com relação


à origem, se esses trabalhadores vinham de uma área urbana ou rural. Obtiveram-se os seguintes
dados: entre os homens 36,85% eram provenientes da zona rural, entre as mulheres o número
encontrado foi que 58,34% também vinham de uma área rural. No total 45,16% dos sujeitos
entrevistados procediam de uma área rural.
No trabalho MEDEIROS & MACEDO (2006), realizado em Goiânia, obteve-se um
resultado de que 70% dos trabalhadores eram provenientes da zona rural.
Com base na problemática do lixo, muitos trabalhadores descobriram na catação de
material reciclável uma inusitada maneira de garantir seu sustento. Apesar de proporcionar
benefícios ambientais indiscutíveis, os catadores de material reciclável são notados de maneira
preconceituosa, vistos como mendigos, pedintes ou vadios. Sendo que são pessoas como outras
quaisquer que vêem nesta atividade a única forma de garantir uma possibilidade de trabalho em um
mercado tão exigente e excludente (MEDEIROS & MACEDO, 2006).
A média do tempo trabalhado na catação de material reciclável entre os homens é de 7,69
anos, entre as mulheres os dados mostram que uma média de 8,21 anos trabalhados. Num total 7,9
anos de trabalho por indivíduo.
As mulheres entrevistadas têm na catação de material reciclável o único emprego. Entre os
homens 10,53% conciliam a catação de lixo com outra atividade. Portanto 6,45% dos trabalhadores
desta classe desempenham mais uma atividade para complementar a renda.
Sujeito IX: “é o único emprego, pra te fala a verdade é o seguinte eu sou igual empresário,
odeio ser mandado, não tenho horário, não tenho nada.”
O trabalho entre os homens é realizado cerca de 10 horas por dia. Entre as mulheres a
catação de material reciclável é feita em torno de 9,67 horas por dia. Totalizando um total de 10,20
horas trabalhadas por indivíduo diariamente.
A catação de material reciclável entre os indivíduos do sexo masculino ocorre cerca 6,05
dias por semana e entre as mulheres o total de dias trabalhados por semana é de 6,08, fornecendo
uma média de 6 dias trabalhados por semana pelos entrevistados na pesquisa. Sujeito XVII: ”tem
dia de domingo que eu não venho não que eu vou cuida da minha casa né.”
Sujeito XIX: “eu sou sozinha, tenho quatro filhos pequenos, então às vezes eu falto pra
lavar roupa, arruma casa, fazer os serviços domésticos, que nunca dá tempo deu chegar em casa e
fazer, sempre eu falto um dia da semana pra fazer isso.”
A média salarial encontrada entre os trabalhadores foi de R$ 567,42 por mês trabalhado.
Entre os homens a renda foi um pouco superior as mulheres em uma média de R$ 571,05 tendo as
mulheres uma renda média em torno de R$ 561,67 por mês.
Fórum Internacional do Meio Ambiente - A conferência da Terra 1264

Sujeito I: “Depende né, aqui (referindo-se a AGECOSA) é por produção, tem vez que cai,
às vezes o mês que agente produz bastante agente ganha mais mió, quando o material é pouco a
renda é pouca, não tem como cê tê um fixo.”
Sujeito III: “Varia porque aqui é rateio (referindo-se a AGECOSA) né”.
Em relação ao tipo de material coletado, entre os indivíduos do sexo masculino e feminino
é basicamente o mesmo, o que os difere é a quantidade coletada de cada material como apresentado
nas figuras 4.

70,00%
65,00%
60,00%
55,00%
50,00% PET

45,00% Mangaba
Alumínio
40,00%
Plástico
35,00% Papelão
Sucata
30,00%
Cobre
25,00%
Vidro
20,00% Todo material seco
Isopor
15,00%
10,00%
5,00%
0,00%
Coluna B

Figura 4 – Tipo de material coletado entre os indivíduos envolvidos na pesquisa.

No presente trabalho encontraram-se algumas vertentes de trabalho: os catadores de rua


que não fazem parte de nenhuma organização, os catadores da coleta seletiva que são organizados
em uma associação a AGECOSA e os catadores do lixão, entre estes têm-se um grupo de faz parte
do MNCR (Movimento Nacional dos Catadores de Materiais Recicláveis) e outro grupo que não
participa de nenhuma organização. Entre os entrevistados do sexo masculino 26,32% faziam parte
de alguma organização, entre as mulheres este dado era de 25%, num geral de 25,81% de catadores
organizados.
A organização do trabalho em cooperativas configura-se em uma alternativa de
fortalecimento dos catadores de materiais recicláveis na busca de melhores condições de trabalho.
MIGUELES (2004) (apud MEDEIROS & MACEDO, 2006) correlaciona o significado social do
lixo, que é preponderantemente negativo, com os processos de formação da identidade e a
motivação dos sujeitos para lidar com essa atividade. A autora conclui que o significado social do
lixo influencia no sucesso da gestão das cooperativas, tendo em vista que os catadores-cooperados
não investem em seu potencial profissional, pois não se identificam com a profissão que exercem.
Numa direção oposta, MIURA (2004) (apud MEDEIROS & MACEDO, 2006) comenta
que, embora a catação ocorra em condições desfavoráveis e não altere a estrutura da desigualdade
social ela possibilita, mesmo que temporariamente, a inserção social. Segundo a autora, a
organização em cooperativas possibilita, uma condição de trabalho mais favorável, com estrutura
física mais adequada e oportunidades de ganho maiores, tanto na perspectiva material como social.
Sujeito I: a AGECOSA é uma firma, porque antes agente trabaiava no aterro, mas ai agente
fez o curso pa podê trabaiá aqui na cidade. Ai funciona assim, nóis tem uma equipe lá na cidade que
coleta nas casas e traz pra cá (referindo-se ao galpão onde é feita a triagem do material), agente vai
nas casas e sibiliza os morado, agente passamo os vaziame, agente dá a cartilhinha pra es
expricando qual o material que agente pega né, que o recicrável mesmo é só o seco, o orgânico vem
pro aterro. Quando agente começou, agente passava nus bairro de oito em oito dia, mas o material
cumeço a diminui e agente tá passando só de quinze em quinze dia em cada bairro.
Fórum Internacional do Meio Ambiente - A conferência da Terra 1265

Sujeito VIII: a associação é assim (referindo-se ao MNCR), porque o Luiz Henrique qué
tira nóis daqui, ai sempre eles dão uma força pa gente, fazenu passeata, distribuindo folheto, essas
coisa.
Em relação aos familiares a maioria dos catadores admitiram que pelo menos mais um
membro da família desempenha a mesma função. Entre os homens 57,90% possuem mais alguém
da família trabalhando na catação de material reciclável, entre as entrevistadas do sexo feminino
esse número foi de 91,67%, tendo um média de que 70,97% entre todos os entrevistados que
possuem mais alguém da família trabalhando como catador de lixo.
A situação do desemprego aparece como elemento fundamental para o direcionamento
para atividade de catação, tendo em vista que essa se constitui em uma atividade alternativa para a
obtenção de renda que garanta a sobrevivência do catador e de seus familiares (MEDEIROS &
MACEDO, 2006).
A problemática acerca dos catadores de lixo, principalmente àqueles próximos ao aterro,
conhecido popularmente como “lixão”, acarretam várias discussões, dentre elas, a preocupação da
permanência dos catadores no aterro, devido à incidência de doenças e pagamento de um salário
como ajuda de custo à família do catador até a construção da central de triagem (SEMARH, 2006).
Não há como ignorar que as condições em que os catadores desenvolvem seu trabalho são
extremamente precárias. Isso porque são inúmeros os ricos a saúde existentes na atividade de
catação no lixo, os catadores são desprovidos de garantias trabalhistas que os amparem,
principalmente em condições de acidentes de trabalho, doenças, aposentadoria, décimo terceiro, e
seguro desemprego. Além disso, são mal remunerados, vítimas de preconceitos e não são
reconhecidos (MEDEIROS & MACEDO, 2006).
Sujeito I: não, não é probrema nenhum, eu acho bão esse serviço, é bão que é um serviço
sem perigo sem nada, aqui (referindo-se a AGECOSA) cê num vê mau cheiro, cê num vê nada aqui,
que esse material é pegado na casa limpo né.
Sujeito VI: é a catinga desconfortável demais, e na hora de comer fede demais e agente
tem que ficar mais ritirado assim, na hora de comer vai lá pra dentro do mato.
Sujeito VII: Os problemas aqui é que o prefeito não dá oportunidade pra ninguém e ele fala
de fechar e tirar o pessoal daqui e não fala em arruma outro tipo de trabalho.
Quanto ao uso de Equipamentos de Proteção Individual (EPI's), verificou-se o uso em
alguns catadores. A luva foi o EPI mais destacado, confirmando o resultado obtido por MEDEIROS
& MACEDO (2006). Cerca de 73,68% dos homens utilizam luvas no trabalho, entre as mulheres o
dado encontrado foi de que 83,33% faziam uso de luvas durante o trabalho. A pesquisa totalizou
que 77,42% dos indivíduos utilizam luvas como equipamento de proteção.
Sujeito I:”a gente já pede pros morado que aguia num pode vim dentro do saco se não
machuca agente. Nóis tem a luva, a equibe é toda bem arrumada, é só porque a luva quando agente
vai mexer com esse papel aqui dá muito trabai, escorrega muito.”
Sujeito VI: “na hora que eu sai aqui agora eu vou lá e agente acha luva véia lá e vai
remediando como pode.”
Fórum Internacional do Meio Ambiente - A conferência da Terra 1266

Em relação às doenças decorrentes do trabalho entre as mulheres nenhuma admitiu


qualquer tipo de doença relacionada ao trabalho e entre os homens apenas 15,79% admitiram ter
alguma doença em conseqüência do trabalho. Como pode ser observado na figura 7.
Figura 7 – Doenças causadas em conseqüência do trabalho realizado entre indivíduos do
sexo masculino.

5,26%
5,26%

5,26%

Não tiveram nenhuma


doença em con-
sequência do trabalho
Constipação
Gripe
Frequentes dores de
cabeça

84,22%

Embora não haja como negar a insalubridade existente na atividade de catação, um dado
que chamou a atenção foi a baixa menção dos participantes a doenças relacionadas ao lixo. Esse
dado também foi verificado nas pesquisas de PORTO et al. (2004) e MIURA (2004) (apud
MEDEIROS & MACEDO, 2006).
Segundo MIURA (2004) (apud MEDEIROS & MACEDO, 2006) comenta que os
catadores não parecem preocupados com os prejuízos provocados a saúde pelo trabalho, estes são
suplantados pelo fato dessa atividade garantir a sua subsistência e promover sua inserção social e
profissional.
PORTO et al. (2004) (apud MEDEIROS & MACEDO, 2006) ressaltam que os catadores
percebem o lixo como fonte de sobrevivência, a saúde como capacidade para o trabalho e, portanto,
tendem a negar a relação direta entre o trabalho e problemas de saúde.

CONSIDERAÇÕES FINAIS
A implantação de projetos de coleta seletiva e de educação ambiental são de grande valia
para a reestruturação da qualidade de vida e, certamente geram uma hierarquia de benefícios as
comunidades locais e também aos catadores de materiais recicláveis que lidam diretamente com o
material a ser reciclado, pois há uma melhora significativa nas condições de trabalho e no material a
ser recolhido; a atuação em conjunto solidifica o estímulo a cidadania, além dos indiscutíveis
benefícios ambientais, que possibilitam uma nova rota aos materiais que seriam descartados sem
nenhum cuidado como materiais inutilizáveis.
Trata-se de um assunto relevante e atual, e que certamente não se esgotará em uma
pesquisa, propõe-se que outros trabalhos sejam desenvolvidos envolvendo a temática com o
objetivo de aprimorar o conhecimento em várias questões enfrentadas pelos catadores de materiais
recicláveis e que afetam diretamente a população.

REFERÊNCIAS BIBLIOGRÁFICAS
ARAÚJO, A. SEMARH expande coleta seletiva de lixo em Anápolis. Anápolis, 2006 b. Disponível
em:<http://www.semarh.goias.gov.br/informativos/14-06-2006/EXPANS_O_
COLETA_SELETIVA_DE_LIXO_DE_AN_POLIS.swf>. Acesso em: 08 de mar. 2007.
GRIPPI, S. Lixo: reciclagem e sua história: guia para as prefeituras brasileiras. 2ª ed. Rio de
Janeiro: Interciência, 2006.
Fórum Internacional do Meio Ambiente - A conferência da Terra 1267

IBGE. Resultado do Universo do Censo 2006. Disponível em:


<http://www.ibge.gov.br/cidadesat/defaut.php>. Acesso em: 18 abr. 2007.
LEITE, M. F. A taxa de coleta de resíduos sólidos domiciliares uma análise crítica. 2006. 94f.
Dissertação (Mestrado em Engenharia Civil: Planejamento e operação de sistemas de transporte).
Escola de Engenharia de São Carlos, Universidade de São Paulo, São Carlos.
LOURENZANI, W.L; RODRIGUES, L.H.A; SANTOS, A.D; SILVA, F.C. Compostagem de lixo
orgânico sólido nos municípios, agricultura e informática. Campinas. Pró reitoria de Extensão e
Assuntos Comunitários. Campinas. UNICAMP, 2004.
MEDEIROS, L.F.R.; MACEDO, K.B. Catador de material reciclável: uma profissão para além da
sobrevivência? Goiânia. Psicologia & Sociedade; v. 18, n. 2, p. 62-71; mai./ago.2006.
PREFEITURA DE ANÁPOLIS. Prefeitura garante apoio para cooperativa de catadores de lixo.
Anápolis, 2006. Disponível em: <http://www.anapolis.go.gov.br/noticias.asp?cod=2410>. Acesso
em: 06 mar. 2007.
SEMARH. Anápolis terá central de triagem. Anápolis, 2005. Disponível em:
<http://www.semarh.goias.gov.br/informativos/informativo_1512a.htm>. Acesso em: 04 mar. 2007.
SEMARH. Goiás agora quer expandir projeto de coleta seletiva. Anápolis, 2006. Disponível em:
<http://www.noticias.goias.gov.br/index.php?idMateria=13056&tp=positivo>. Acesso em: 11 mar.
2007.
Fórum Internacional do Meio Ambiente - A conferência da Terra 1268

CONDICIONANTES AMBIENTAIS E ESQUISTOSSOMOSE, NOS MUNICÍPIOS DE


APARECIDA E ROSEIRA, SP, BRASIL

Rosa Maria Brás Roque


Maria Lucia Fadel Condino
Herminia Yohko Kanamura
Vigilância Epidemiológica do Município de Aparecida; Superintendência de Controle de Endemias
(SUCEN); Programa de Pós Graduação em Ciências Ambientais da Universidade de Taubaté e
Instituto Básico de Biociêcnias da Universidade de Taubaté. Avenida Tiradentes 500, Taubaté, SP.
CEP: 12030-180. E-mail: kanamura@usp.br

RESUMO
Foram investigados alguns fatores ambientais relacionados à ocorrência de
esquistossomose nos municípios de Aparecida e Roseira, localizados no Vale do Paraíba, Estado de
São Paulo. Dados epidemiológicos relativos à esquistossomose e aspectos ambientais observados
nos focos de transmissão foram obtidos nos relatórios da Superintendência de Controle de
Endemias (SUCEN), da Secretaria de Estado da Saúde de São Paulo. Os coeficientes de
prevalência, entre 1995 e 2004, indicaram queda do número de casos em ambos os municípios,
porém de forma mais evidente em Aparecida. Apesar da melhoria das condições de saneamento
básico, os municípios ainda mantêm ambientes propícios à transmissão da esquistossomose.
Palavras chaves: Esquistossomose; Vale do Paraíba; epidemiologia; fatores ambientais.

ABSTRACT
Environmental conditions and schistosomiasis in the municipalities of Aparecida and
Roseira, Sao Paulo, Brazil. Some environmental factors were investigated and related to the
occurrence of schistosomiasis in two cities, Aparecida and Roseira, located in the Valley of the
Paraíba river, Sao Paulo State, Brazil. Epidemiological data and environmental aspects observed in
the schistosomiasis transmission foci were obtained from the reports of the Superintendence for the
Control of Endemic Diseases (SUCEN) of the Health Department of the Sao Paulo State. The
prevalence coefficients, between 1995 and 2004, showed fall in the number of cases in both
municipalities, but more evident in Aparecida. Despite the improvement of the basic sanitation
conditions, both cities continue to have potential areas for schistosomiasis transmission.
Key words: Schistosomiasis; Paraíba Valley; epidemiology; environmental factors.

INTRODUÇÃO
Nas últimas décadas, com o aumento da preocupação em relação ao meio ambiente e à
qualidade de vida, intensificaram-se os debates sobre os problemas que a poluição, o uso
descontrolado de recursos naturais, a perda da biodiversidade e o consumo desenfreado de produtos
industrializados, entre outros, podem ocasionar ao planeta e à própria existência humana. O
processo de desenvolvimento social e econômico, com perversas ações antrópicas sobre os
ambientes naturais e urbanos, vem intensificando os processos de degradação sócio-ambientais,
com forte repercussão sobre a saúde dos seres humanos. O aumento de concentração populacional
em áreas sem saneamento, onde a disposição inadequada de esgotos domésticos provoca a
contaminação do solo e dos corpos d’água, resulta em riscos à saúde pública, favorecendo a
disseminação de doenças de veiculação hídrica, como diarréias, hepatite, cólera, amebíase e febre
tifóide, entre outras (HELLER et al 1997, MOTA 2005).
A água contaminada com fezes apresenta também papel importante na veiculação de uma
importante doença parasitária, com ampla distribuição geográfica no Brasil, a esquistossomose
mansônica, cujos hospedeiros intermediários, caramujos do gênero Biomphalaria, vivem em
coleções hídricas. No Brasil, esta doença está presente nas regiões Norte, Nordeste, Leste, Sudeste e
Sul, em dezenove estados. Estimam-se aproximadamente seis milhões de indivíduos infectados,
com taxa de prevalência que varia de acordo com a região. No Estado de São Paulo, os primeiros
Fórum Internacional do Meio Ambiente - A conferência da Terra 1269

relatos de casos autóctones, no Vale do Paraíba, datam de 1956, e a transmissão ocorria nos
municípios próximos ao rio Paraíba do Sul, nas imediações da Rodovia Presidente Dutra. Os
municípios de Aparecida e Roseira constituem antigas áreas de transmissão, com os primeiro focos
registrados em 1957 (SILVA 1992, SÃO PAULO 2005, BRASIL 2005).
A esquistossomose é considerada uma doença complexa, pela interação de vários fatores
causais que incluem, além dos biológicos, os fatores ambientais e sociais, como o modo de vida,
aspectos culturais, atividades de lazer e trabalho que, associados, podem definir o perfil
epidemiológico característico da localidade. As alterações nos ecossistemas, resultantes de
desmatamentos, uso inadequado da terra, desenvolvimento comercial, construções de represas,
canais e sistema de irrigação, são responsáveis por alterações climáticas, que tem como
conseqüência a modificação do comportamento e da distribuição espacial das doenças infecciosas
em geral, incluindo as parasitárias (COURA- FILHO et al. 1995, PATZ et al. 2000).
Assim, propõe-se neste estudo identificar fatores sociais e ambientais associados à
ocorrência de esquistossomose nos municípios de Aparecida e Roseira, de forma a contribuir para a
sensibilização da população afetada e das autoridades locais quanto à necessidade de integrar
esforços para a vigilância desta e de outras doenças que venham a afetar a comunidade.

MATERIAL E MÉTODOS
O município de Aparecida localiza-se no Vale do Paraíba, a 168 km de distância de São
Paulo e 240 km do Rio de Janeiro. Com uma população de 35754 habitantes (IBGE 2004),
apresenta vocação turístico-religiosa, é considerada a Capital Mariana do país e recebe
aproximadamente sete milhões de peregrinos ao ano; na agricultura, predomina a rizicultura.
Roseira, com população de 9788 habitantes (IBGE 2004) possui vocação para o turismo rural,
ecológico e histórico, com agricultura predominante na rizicultura e plantação de eucaliptos; foi
distrito de Aparecida até 1965 e na década de 1950 foi uma das áreas com maior número de casos
de esquistossomose no Vale do Paraíba. Estes municípios foram escolhidos pelo seu papel histórico
em relação à endemia de esquistossomose. Os dados epidemiológicos e ambientais foram coletados
junto às Secretarias Municipais de Saúde e na Superintendência de Controle de Endemias
(SUCEN). Os dados demográficos foram coletados na sede do IBGE em Guaratinguetá.

RESULTADOS E DISCUSSÃO
O ano de 1995, ponto inicial do presente estudo, se caracterizou por um número
relativamente elevado de casos (Figura 1), com coeficiente de prevalência por 10000 habitantes de
8,7 em Aparecida e 98,3 em Roseira. A partir de 1996, é evidente a diminuição no número de casos
notificados de esquistossomose. Em 2003 e 2004, não houve notificação de casos em ambos os
municípios. Todos os casos notificados de Aparecida eram de indivíduos que residiam na zona
urbana; em Roseira, a maioria (73,9%) também se concentrava na zona urbana e somente 26,1%
dos casos residiam na zona rural.
100 Aparecida
Prevalência/10000 hab.

Roseira
80
Coeficiente de

60

40

20

0
1995 1996 1997 1998 1999 2000 2001 2002 2003 2004

Ano

Figura 1 - Coeficiente de Prevalência de esquistossomose (número de casos notificados em 10000


habitantes) nos municípios de Aparecida e Roseira, no período de 1995 a 2004.
Fórum Internacional do Meio Ambiente - A conferência da Terra 1270

Os dados de esgotamento sanitário, oferecimento de água potável e coleta de lixo, obtidos


a partir dos relatórios do IBGE, para os anos de 1991 e 2000 foram comparados entre si (Figura 2).
De maneira geral, os dados indicam melhoria do padrão sanitário para ambos os municípios.
100%
98% Esgo tamento
96% Á gua
94% Lixo
92%
90%
88%
86%
84%
82%
80%
1991 2000 1991 2000

Aparecida Roseira

A n o s/ M u n i c í p i o s

Figura 2 – Comparação entre porcentagens de residências com esgotamento sanitário, água


encanada e coleta de lixo, em 1991 e 2000, nos municípios de Aparecida e Roseira. Fonte: IBGE.

A Figura 3 mostra a localização dos bairros, com maior número de casos notificados de
esquistossomose no período do estudo e os respectivos números de casos.

Figura 3 – Localização dos bairros com maior número de casos notificados de esquistossomose, nos
municípios de Aparecida (A) e de Roseira (B), no período de 1995 a 2004 (Fonte para o mapa:
Prefeitura Municipal de Aparecida e Prefeitura Municipal de Roseira, com modificações
introduzidas pelos pesquisadores).
Fórum Internacional do Meio Ambiente - A conferência da Terra 1271

Em Aparecida, o bairro de São Geraldo está totalmente urbanizado e os dois bairros com
mais casos, Vila Mariana e Itaguaçu, estão situados em área de várzea e com atividades agrícolas
(plantação de arroz), com características ambientais propícias à proliferação de moluscos do gênero
Biomphalaria, hospedeiro intermediário do parasito responsável pela doença em estudo. No
município de Roseira, o bairro com o maior número de casos, Pedro Leme, é uma área de várzea
com várias fazendas desenvolvendo atividades agrícolas ligadas à plantação de arroz; já o
Barretinho é um bairro residencial, em zona urbana, com córregos, valas e charcos nos seus
arredores, onde se desenvolvem atividades comerciais e produção de tijolos, na olaria; o bairro de
Roseira Velha possui área de charcos, minas de água, valetas e córregos, com atividades
relacionadas à horticultura e o bairro do Veloso possui áreas de charco, valetas e plantação de arroz.
As Figuras que se seguem representam algumas áreas de Aparecida (Figuras 4 a 7), que
constituíam importantes focos de transmissão da esquistossomose no passado; foram
esquematizadas e analisadas certas características ambientais e as alterações ocorridas em cada uma
delas, observadas em dois momentos diferentes, 1995 e 2004.

LEGENDA (Figuras 4 a 11):


Charco Presença de caramujo Ausência de caramujo Coleção hídrica (valas de
irrigação)

Mina de água. Lago Quadras de plantação de arroz Canalização para a bomba


d’água.

Ribeirão (Vala) Vala (seca) Área de pasto Represa Comporta

Figura 4 - Croqui da área de foco no bairro de São Geraldo, em Aparecida, 1995 e 2004 (Fonte:
SUCEN).
Fórum Internacional do Meio Ambiente - A conferência da Terra 1272

Figura 5 - Croqui da área de foco da Fazenda Itaguaçú, em Aparecida, 1995 e 2004 (Fonte:
SUCEN)

Figura 6 - Croqui da área de foco do bairro de Vila Mariana, em Aparecida, 1995 e 2004 (Fonte:
SUCEN).

Figura 7 - Croqui da área de foco do bairro de Vila Mariana, em Aparecida, 1995 e 2004 (Fonte:
SUCEN)
Fórum Internacional do Meio Ambiente - A conferência da Terra 1273

O bairro São Geraldo (Figura 4) representa uma área onde ocorreram modificações
econômicas e ambientais mais profundas, com obras de saneamento básico, arborização e
calçamento, tendo sido totalmente urbanizada, o que levou à extinção dos criadouros de caramujos;
situado próximo ao rio Paraíba do Sul, no passado esta área era rica em nascentes e áreas de charco,
mas hoje contempla uma área comercial, com atividades voltadas ao turismo religioso. Algumas
áreas (Figuras 5 e 6) mantiveram, em geral, as características ambientais originalmente observadas,
mas os caramujos hospedeiros, detectados no passado, não foram encontrados na pesquisa realizada
em 2004: na Fazenda Itaguaçu (Figura 5), a aplicação de agrotóxicos provavelmente contribui para
a redução dos caramujos; e na Vila Mariana (Figura 6), foi observada redução na área de várzea, em
decorrência da exploração imobiliária, com a construção de conjuntos residenciais em áreas
próximas às utilizadas para rizicultura, condição esta que pode ter contribuído para a contaminação
do ambiente, tornando-o desfavorável à proliferação dos caramujos. A outra área de Vila Mariana
(Figura 7), é também bastante próxima a uma região urbanizada, mas considerada ainda de risco,
pois caramujos do gênero Biomphalaria foram detectados em 2004; caracteriza-se pela presença de
várzea, com plantação de arroz, nascente, sendo classificada como uma área com potencial de
transmissão de esquistossomose.
Quanto às áreas de focos de Roseira, em nenhuma delas se observaram grandes
modificações ambientais, com obras de saneamento e urbanização, como descritas em Aparecida.
Na Fazenda Itajuva (Figura 8), a área de cultivo de arroz foi transformada em pasto, para
desenvolvimento das atividades agropecuárias, com extinção dos criadouros de caramujos e,
portanto, dos focos de esquistossomose.

Figura 8 - Croqui da área de foco do bairro de Pedro Leme, em Roseira, Fazenda Itajuva, 1995 e
2004 (Fonte: SUCEN).

Também em Roseira, várias áreas com características semelhantes às descritas em


Aparecida, com rizicultura ou rica em nascentes e charcos, que eram classificadas como focos de
transmissão de esquistossomose no passado, embora sem evidentes alterações ambientais, deixaram
de ser classificadas como focos, pois os caramujos hospedeiros, detectados no passado, não foram
encontrados na pesquisa realizada em 2004. As mesmas considerações já feitas, como aumento da
contaminação por esgotos em virtude da proximidade de áreas urbanizadas, com condições
precárias de saneamento, ou aplicação de agrotóxicos pelos rizicultores podem parcialmente
explicar o desaparecimento de caramujos nos locais que, aparentemente, apresentam condições
propicias à proliferação de moluscos hospedeiros de S. mansoni. Vale ainda lembrar que pode ter
contribuído para o desaparecimento dos caramujos o uso de moluscicidas, aplicadas pelos próprios
agricultores, fato este comentado informalmente pelos mesmos durante as visitas realizadas às
fazendas. Por outro lado, áreas consideradas com potencial de transmissão, onde caramujos do
gênero Biomphalaria foram detectados em 2004, como a esquematizada na Figura 9, que se
caracteriza pela presença de charcos e nascentes, ou as representadas nas Figuras 10 e 11, com
Fórum Internacional do Meio Ambiente - A conferência da Terra 1274

plantação de arroz, foram observadas com maior freqüência em Roseira. Apesar da manutenção dos
potenciais focos de transmissão, a introdução do cultivo mecanizado, com menor chance de contato
direto do homem com a água e, consequentemente, diminuição do risco de contrair a infecção, pode
também ter sido o responsável pela queda no número de casos de esquistossomose no município.

Figura 9 - Croqui da área de foco do bairro de Pedro Leme em Roseira, Fazenda N.S. Aparecida,
1995 e 2004 (Fonte: SUCEN).

Figura 10 - Croqui da área de foco localizada no Bairro do Veloso, Fazenda São Geraldo em
Roseira, ano 1995 e 2004 (Fonte: SUCEN).
Fórum Internacional do Meio Ambiente - A conferência da Terra 1275

Figura 11 - Croqui da área de foco do bairro de Pedro Leme em Roseira, Fazenda Santa Helena,
1995 e 2004 (Fonte: SUCEN).

De acordo com os trabalhos de Coura-Filho (1995) e Dias et al. (1994), são fatores de risco
para esquistossomose, o modo de contato com as coleções hídricas, o tipo de agricultura e as
condições ambientais que favorecem a proliferação de caramujos do gênero Biomphalaria,
hospedeiros intermediários de S. mansoni. Tanto em Aparecida como Roseira, os bairros com maior
número de notificações de esquistossomose possuem áreas com características ambientais
favoráveis à manutenção de criadouros de caramujos, representadas por várzeas com cultivo de
arroz, presença de nascentes, valas, pequenos lagos e charcos. Alguns bairros, além dessas
características, possuem ainda olarias e valetas, estas últimas utilizadas pelos moradores para
atividades de lazer, como também o é o rio Paraíba do Sul. Alguma dessas áreas, como observado
nas figuras apresentadas, sofreu mudanças importantes, deixando de ser áreas de risco de
transmissão da esquistossomose, com transformação da área de cultivo de arroz em pasto, ou com
urbanização e obras de saneamento. Outras áreas sofreram pequenas modificações ambientais, com
aterramento de pequenos lagos ou diminuição das áreas de várzea e charco, mas ainda preservando
algumas nascentes e outras condições ambientais favoráveis à proliferação dos caramujos, embora
não detectados nas pesquisas planorbídicas realizadas nos últimos anos. Estas áreas necessitam
ainda de vigilância contínua e de estudos para se entender melhor as razões que proporcionaram o
desaparecimento dos caramujos, e se isso aconteceu de forma definitiva ou apenas temporária. Vale
ainda lembrar que a redução dos casos de esquistossomose, na região em estudo, se deve também à
introdução do uso das sementes pré-germinadas, que influenciaram a forma de trabalhar a terra,
diminuindo o contato com a água dos trabalhadores rurais envolvidos nestas atividades, além da
mecanização da agricultura. Entretanto, ainda existem em ambos os municípios, com presença mais
marcante em Roseira, algumas áreas importantes, com presença de caramujos detectada na pesquisa
planorbídica realizada em 2004, que constituem potenciais focos para transmissão da
esquistossomose.
Alguns autores destacam como responsáveis pela transmissão da esquistossomose nas
áreas peri-urbanas, das pequenas e grandes cidades, as mudanças ambientais que ocorrem no
processo de urbanização, com ocupação desordenada dos espaços, destruindo os ecossistemas e
proporcionando locais propícios para a proliferação de moluscos (LIMA 1995). Esse processo de
urbanização da esquistossomose, que em geral está associado com as condições precárias de vida
dos grupos populacionais, é o que pode estar ocorrendo em Aparecida e Roseira. De fato, é evidente
a intensa pressão de urbanização que se identifica nos dois municípios. Na distribuição dos casos de
esquistossomose de acordo com a zona de ocorrência, urbana ou rural, o município de Aparecida
tem 100% dos casos notificados como sendo de zona urbana, porém é grande a possibilidade do
indivíduo ter adquirido a infecção não propriamente na zona urbanizada do município, mas sim em
uma das possíveis áreas de risco de transmissão, localizadas nas regiões peri-urbanas ou mesmo na
zona rural, pois não há uma clara definição de limites entre as zonas urbana e rural no município.
Fórum Internacional do Meio Ambiente - A conferência da Terra 1276

Os dados de esgotamento, oferecimento de água potável e coleta de lixo indicam melhoria


no padrão sanitário para ambos os municípios, o que pode estar associado com a diminuição da
prevalência de esquistossomose nos dois municípios, mas com maior evidência em Aparecida, onde
esta melhoria ocorreu de forma mais completa. Entretanto, é importante salientar que os municípios
de Aparecida e Roseira, apesar das melhorias sanitárias, continuam a ter áreas com potencial para
transmissão da esquistossomose, exigindo a continuidade de um programa de controle, com novas
estratégias de vigilância, dando maior ênfase aos aspectos ambientais.

AGRADECIMENTOS
A todos os funcionários da SUCEN, de Taubaté e de Guaratinguetá, pela colaboração nas
atividades de campo para identificação dos locais prováveis de infecção (LPI) e ao Fábio Henrique
Ventura Roque, pela elaboração do documento digital a partir dos croquis disponibilizados pela
SUCEN, com as características dos focos de transmissão (LPI).

REFERÊNCIAS BILIOGRAFICAS
Brasil. Ministério da Saúde. Esquistossomose mansônica. In: _______ Guia de Vigilância
Epidemiológica/Ministério da Saúde, Secretaria de Vigilância em Saúde. 6ª. ed. Brasília:Ministério
da Saúde, 2005, p. 297-306.
Coura-Filho, P et al. Determinantes ambientais e sociais da esquistossomose mansoni em Ravena,
Minas Gerais, Brasil. Cadernos de Saúde Pública.Rio de Janeiro, v.11, n.2, p. 254-265, 1995.
DATASUS-Banco de dados do Sistema Único de Saúde. Mapa da Região da DIR XXIV.
Disponível em: < www.datasus.gov.br/tabwin/mapa> acessado em 30/01/06.
Dias LCS et al. P. Epidemiologia da esquistossomose mansônica em área de baixa endemicidade.
Cadernos de Saúde Pública. Rio de Janeiro, 10 (supl. 4): 254-260, 1994.
Eduardo MBP et al. Esquistossomose mansônica no Estado de São Paulo: Aspectos
epidemiológicos. Boletim Epidemiológico Paulista 2(18): 2-8, 2005b [on-line]. Disponível em: <
http://www.cve.saude.sp.gov.br >
Heller L et al. Saneamento e Saúde nos países em desenvolvimento. Rio de Janeiro: CC&P
Editores Ltda., 1997. 390 p.
[IBGE] Instituto Brasileiro de Geografia e Estatística. Dados demográficos. 2004. Disponível em:
<www.sidra.ibge.gov.br.> Acesso em 10/05/05.
Lima VLCA. esquistossomose urbana e a heterogeneidade social e epidemiológica da população do
município de Campinas, São Paulo, Brasil. Cadernos de Saúde Pública, Rio de Janeiro, 11 (1): 45-
56, 1995.
Mota FSB. Conhecimento para Promoção do Saneamento, Saúde e Ambiente. In: Philippi Júnior,
Arlindo (editor). Saneamento, Saúde e Ambiente: fundamentos para um desenvolvimento
sustentável. Barueri, USP, 2005. p.809-832. (Coleção ambiental: 2).
Patz JA et al. Effects of environmental change on emerging parasitic diseases. Internacional Journal
for Parasitology, v. 30, p. 1395-1405, 2000.
Rey L. Bases da Parasitologia Médica. 2ª ed., Rio de Janeiro: Guanabara Koogan, 2002.
São Paulo. Secretaria de Estado da Saúde. CVE/DDTHA. Manual de doenças transmitidas por água
e alimentos. Schistosoma mansoni/Esquistossomíase, 2005. Disponível em:
<www.cve.saude.sp.gov.br/htm/hidrica/IF_ESQUI05.htm.> Acesso em 10/06/05.
Silva LJ. A esquistossomose mansônica no Estado de São Paulo. Origens, distribuição,
epidemiologia e controle. 1992. 140 f. Tese de livre-docente em Doenças Transmissíveis.
Universidade de Campinas, Campinas.
Fórum Internacional do Meio Ambiente - A conferência da Terra 1277

ASPECTOS POLÍTICOS-INSTITUCIONAIS NA GESTÃO DE RESÍDUOS URBANOS

André Paulo de Barros


Biólogo, Especialista em Planejamento e Gestão Ambiental e aluno do PRODEMA/UFPE/Mestrado.
andre.paulo@redeambiental.org
Tatiana Santana de Souza
Bióloga e aluna do Curso de Especialização em Gestão, Educação e Política Ambiental (UFRPE) e do
PRODEMA/UFPE/Mestrado.
Vitória Régia Fernandes Gehlen
Dra. em Políticas Públicas e professora do Centro de Ciências Sociais Aplicadas e do PRODEMA/UFPE.

RESUMO
A preocupação com a questão ambiental torna o gerenciamento de resíduos um processo
de extrema importância na preservação da qualidade da saúde e do meio ambiente, e o
estabelecimento de uma política pública para o setor poderá contribuir para mudança dos padrões de
produção e consumo no país, além de produzir melhorias na qualidade ambiental e nas condições de
vida da população. O objetivo deste trabalho é apresentar a importância de uma política local para
os resíduos sólidos urbanos, e quais aspectos legais, institucionais e instrumentos de políticas
socioambientais estão à disposição do poder local para a efetivação de uma gestão integrada para o
setor. Para isso, são abordados conceitos básicos sobre formulação de políticas públicas, e uma
visão geral do arcabouço legal para implementação de um Plano de Gestão Integrada de Resíduos
Sólidos Urbanos (PGIRSU).
Palavras-chaves: Resíduos Sólidos, Política Pública, Legislação, Gestão Integrada.

ABSTRACT
The concern with the environmental issues makes people consider the waste management a
process extremely important in preserving the quality of health and of the environment. The
establishment of a public policy for this area may contribute to change producing and consuming
patterns in the country, as well as to improve the quality of the environment and of the population’s
living conditions. Thus, the aim of this paper is to discuss the importance of a local policy for urban
solid wastes, and also present the legal, institutional aspects of social and environmental policies
available to the local authorities to gain an integrated management for this matter. The basic
concepts of public policies formulation are here discussed. Moreover, we show an overview of the
legal framework for implementation of a Plan of Integrated Management of Urban Solid Wastes
(PGIRSU).
Keywords: solid wastes, public policies, legislation, integrated management.

INTRODUÇÃO
A Gestão dos Resíduos Sólidos Urbanos (RSU) no Brasil é um dos principais desafios
colocado aos municípios e à sociedade. Sendo assim, torna-se fundamental a existência de políticas
locais de resíduos sólidos que sejam capazes de disciplinar uma gestão integrada, assim como,
contribuir para a implementação mais eficaz de políticas socioambientais existentes.
Segundo dados do IBGE da Pesquisa Nacional de Saneamento Básico – PNSB/2000, no
Brasil são coletados diariamente cerca de 154.000 toneladas de resíduos sólidos urbanos
(residenciais e comerciais), o que corresponde a 94,44% de cobertura na área urbana (ABRELPE,
2006 apud ZICA, 2007); a geração média per capita é de 0,91 kg/hab.dia (dos quais 0,71 kg/hab.dia
são resíduos domiciliares e o restante é resíduo público); as 13 maiores cidades são responsáveis
por 32 % de todo o lixo urbano coletado; 524 municípios (10%) com mais de 50 mil habitantes
geram 80% do total do lixo coletado.
A PNSB/2000 destaca um panorama de destinação final dos RSU preocupante (59 %
lixões; 13 % aterros sanitários; 17 % aterros controlados; 0,6% áreas alagadas; 03% aterros
especiais; 2,8% reciclagem; 04% compostagem; e 02 % incineração) onde até mesmo os vários
aterros municipais recebem seus resíduos de forma inadequada, sem um efetivo controle necessário
à manutenção da condição do aterro sanitário, ou no mínimo de aterro controlado.
Fórum Internacional do Meio Ambiente - A conferência da Terra 1278

Tal panorama é resultado de uma série de fatores, políticos, técnicos e operacionais, dentre
os quais se destacam: as ações não planejadas ou desarticuladas de um planejamento; a pouca
capacidade de gestão dos municípios em geral; a quantidade insuficiente de pessoal qualificado para
o gerenciamento e gestão dos serviços; o custo elevado da prestação dos serviços para municípios
com baixa arrecadação; o baixo índice de reciclagem dos resíduos sólidos gerados; a inércia na
solução de problemas antigos; e a ausência do Estado como articulador e fomentador da gestão
associada dos serviços públicos (ZICA, 2007).
Ainda não existe uma Política Nacional de Resíduos Sólidos, entretanto, o País e todos os
seus entes federativos possuem a sua disposição um arcabouço legal e institucional com capacidade
de intervir de forma adequada na gestão de resíduos sólidos. Na verdade, se o cumprimento mínimo
da legislação ambiental vigente fosse realmente efetivado (Constituição Federal, Política Nacional
de Meio Ambiente, Lei de Crimes Ambientais, Política Nacional de Recursos Hídricos, etc.) a
disposição dos resíduos sólidos não estaria numa situação tão preocupante (JURAS, 2000).
A preocupação com a questão ambiental torna o gerenciamento de resíduos um processo
de extrema importância na preservação da qualidade da saúde e do meio ambiente, e o
estabelecimento de uma política pública para o setor poderá contribuir para mudança dos padrões de
produção e consumo no país, além de produzir melhorias na qualidade ambiental e nas condições de
vida da população.
O objetivo deste artigo é apresentar a importância de uma política local para os resíduos
sólidos urbanos, e quais aspectos legais, institucionais e instrumentos de políticas socioambientais
estão à disposição do poder local para a efetivação de uma gestão integrada para o setor.
Para isso, serão abordados conceitos básicos sobre formulação de políticas públicas, e uma
visão geral do arcabouço legal para implementação de um Plano de Gestão Integrada de Resíduos
Sólidos Urbanos (PGIRSU).

GESTÃO DE RESÍDUOS SÓLIDOS E POLÍTICA PÚBLICA


Segundo Souza e Barros (2007), uma política pública pode ser considerada como um
conjunto de ações de iniciativa governamental de interesse público, que deve ser construído com e
para a coletividade, cuja efetivação depende de quatro fatores fundamentais, a saber: 1) base na
legislação; 2) aparato institucional (com recursos e infra-estruturas suficientes); 3) planejamento
(programas, planos, projetos e metas); e 4) controle social (participação dos cidadãos através de
instâncias colegiadas).
Política pública ainda pode ser considerada como a forma de se efetivar direitos, intervindo
na realidade social, e como principal instrumento para coordenar programas e ações públicas
(PÓLIS, 2006).
Nesse sentido, Silva (2001) destaca a formulação e implementação de políticas públicas
como processo que conjuga um conjunto de momentos, não lineares, articulados e interdependentes
representados pela: 1) constituição do problema ou agenda governamental; 2) formulação de
alternativas de política; 3) adoção da política; e 4) implementação de programas e projetos.
Entretanto, vale salientar que, a eficácia das ações políticas na gestão do bem público
depende da capacidade e da maturidade do governo e da sociedade na apropriação e na utilização
dos instrumentos operacionais disponíveis e fundamentados em base legal (BARROS, SILVEIRA e
GEHLEN, 2007).
No caso dos resíduos sólidos urbanos, um plano de gestão integrada pode ser adotado
como uma política local para o setor, ou se configurar como um instrumento de política. Porém,
outros instrumentos de políticas públicas disponíveis em outros marcos legais e institucionais,
especialmente os instrumentos de políticas ambientais, podem e devem ser utilizados na efetivação
do PGIRSU.

ARCABOUÇO LEGAL PARA GESTÃO DE RESÍDUOS SÓLIDOS URBANOS NO BRASIL


Historicamente, o primeiro marco legal estabelecido no Brasil referente ao manejo de
resíduos sólidos urbanos é datado da época do Segundo Império. Em 25 de novembro de 1880, era
Fórum Internacional do Meio Ambiente - A conferência da Terra 1279

estabelecido na cidade de São Sebastião do Rio de Janeiro, então capital do Império, o primeiro
serviço sistemático e oficial de limpeza urbana no Brasil, através do Decreto de nº. 3024 assinado
pelo Imperador Dom Pedro II. Mediante este ato oficial aprovou-se um contrato de limpeza e
irrigação da cidade cuja execução ficou aos encargos dos irmãos Aleixo e Luciano Francisco Gary.
É do sobrenome Gary que se origina o termo “gari”, empregado hoje em dia para designar os
trabalhadores da limpeza urbana nas cidades (MONTEIRO, 2001).
Todavia, foi a partir do final da década de 1970 que começou a se estruturar no Brasil um
conjunto de políticas, leis e regulamentos com capacidade de intervenção no manejo de resíduos
sólidos.
Em março de 1979 o Ministério do Interior, publica a Portaria Minter n°. 53, visando
orientar o controle de resíduos sólidos no país, de natureza industrial, domiciliar, de serviço de
saúde e demais resíduos gerados pelas diversas atividades humanas; e em agosto de 1981 é
instituída a Política Nacional do Meio Ambiente, com estabelecimento de instrumentos capazes de
promover a gestão ambiental no Brasil e combater toda e qualquer forma de poluição e degradação
sobre o meio ambiente.
Como se sabe, a Constituição Federal de 1988 estabeleceu, no âmbito do Direito
Ambiental, um audacioso sistema de cooperação legislativa e administrativa entre os diversos entes
federativos, onde se determinou a competência comum da União, dos Estados, do Distrito Federal e
dos Municípios para proteger o meio ambiente e combater a poluição em qualquer de suas formas
(SCHMIDT, 2005).
O art. 225 da Constituição Federal estabeleceu o direito de todos ao meio ambiente
ecologicamente equilibrado, onde as “as condutas e atividades consideradas lesivas ao meio
ambiente sujeitarão os infratores, pessoas físicas ou jurídicas, a sanções penais e administrativas,
independentemente da obrigação de reparar os danos causados.” (art. 225, § 3º, CF).
No que se refere à legislação infraconstitucional, dentre as políticas nacionais e leis
ambientais existentes que contemplam a questão de resíduos sólidos, destacam-se aquelas que
dispõem sobre:
A Política Nacional de Meio Ambiente (Lei n°. 6.938 de 31/08/1981), recepcionada pela
Constituição Federal de 1988;
A Política Nacional de Saúde (Lei Orgânica da Saúde n°. 3.080 de 19/09/90);
A Política Nacional de Educação Ambiental (Lei n°. 9.795 de 27/04/1994);
A Política Nacional de Recursos Hídricos (Lei n°. 9.433 de 08/01/1997);
A Lei de Crimes Ambientais (Lei n°. 9.605 de 12/02/1998);
O Estatuto das Cidades (Lei n°. 10.257 de 10/07/2001);
A Política Nacional de Saneamento Básico (Lei n°. 11.445 de 05/01/2007);
A Política Nacional de Resíduos Sólidos (projeto de lei) ainda em apreciação junto ao Congresso
Nacional 145.
A Política Nacional de Saneamento Básico (PNSB), além de regulamentar o setor, estabelece as
diretrizes a serem adotadas pelos serviços públicos de saneamento básico. A lei beneficia o setor de
resíduos sólidos com a possibilidade de viabilizar a adequada gestão, com a instituição da Lei de
Consórcios e das Parcerias Público-Privadas, beneficiando os municípios que enfrentam problemas
referentes à prestação dos serviços de limpeza urbana, proporcionando a diminuição dos custos
principalmente da disposição final dos resíduos (BRASIL, 2006).
Mesmo o Brasil não possuindo uma lei que disciplina de forma abrangente a gestão de
resíduos sólidos no território nacional, a questão vem sendo tratada principalmente pela atuação dos
órgãos regulatórios, por meios de resoluções do Conselho Nacional de Meio Ambiente (CONAMA)
e da Agência Nacional de Vigilância Sanitária (ANVISA), no caso de resíduos do serviço de saúde

145
Com relação à Política Nacional de Resíduos Sólidos, as primeiras iniciativas legislativas para a definição de
diretrizes à área de resíduos sólidos surgiram no final da década de 80. Desde então, foram elaborados mais de 70
Projetos de Lei, os quais se encontram apensados ao PL 203/91 e pendentes de apreciação (BRASIL, 2006).
Fórum Internacional do Meio Ambiente - A conferência da Terra 1280

(BRASIL, 2006). O quadro abaixo demonstra os principais dispositivos legais e normativos que
disciplinam de forma específica a questão dos resíduos sólidos em nível nacional.

Quadro 01 - Principais dispositivos legais e normativos para a gestão de resíduos sólidos no Brasil.
Dispositivo legal/normativo Matéria que aborda

NBR 10.004: Classificação de Classifica os resíduos sólidos quanto aos seus riscos potenciais ao meio ambiente e à saúde pública, para
Resíduos Sólidos que estes resíduos possam ter manuseio e destinação adequados.

NBR 12.235: Armazenamento Fixa condições exigíveis para armazenamento de resíduos sólidos perigosos, de forma a proteger a saúde
de Resíduos Sólidos Perigosos pública e o meio ambiente.

Fornece informações sobre vários aspectos desses produtos químicos (substâncias ou preparos) quanto à
NBR 14.725: Ficha de
proteção, à segurança, à saúde e ao meio ambiente. A FISPQ fornece, para esses aspectos, conhecimentos
Informações de Segurança de
básicos sobre esses produtos químicos, recomendações sobre medidas de proteção e ações em situações de
Produtos Químicos (FISPQ).
emergência. Em alguns países, essa ficha é chamada de “Material Safety Data Sheet – MSDS”.

Regulamenta a Lei no 7.802, de 11 de julho de 1989, que dispõe sobre a


pesquisa, a experimentação, a produção, a embalagem e rotulagem, o transporte, o armazenamento, a
Decreto Nº. 4.074 de 4 de
comercialização, a propaganda comercial, a utilização, a importação, a exportação, o destino final dos
janeiro de 2002.
resíduos e embalagens, o registro, a classificação, o controle, a inspeção e a fiscalização de agrotóxicos,
seus componentes e afins, e dá outras providências.

Resolução CONAMA 005 de Estabelece definições, classificação e procedimentos mínimos para o gerenciamento de resíduos sólidos
05 de agosto de 1993. oriundos de serviços de saúde, portos e aeroportos, terminais ferroviários e rodoviários.

Resolução CONAMA 283 de


Dispõe sobre o tratamento e a destinação final dos resíduos dos serviços de saúde.
12 de julho de 2001.

Resolução - RDC nº. 33, de 25


Aprova o Regulamento Técnico para o Gerenciamento de Resíduos de serviços de saúde.
de fevereiro de 2003.

Resolução CONAMA 334 de 3 Dispõe sobre os procedimentos de licenciamento ambiental de estabelecimentos destinados ao
de abril de 2003. recebimento de embalagens vazias de agrotóxicos.

Resolução CONAMA 314 de


Dispõe sobre o registro de produtos destinados à remediação e dá outras providências.
29 de outubro de 2002.

Resolução CONAMA 316 de Dispõe sobre procedimentos e critérios para o funcionamento de sistemas de tratamento térmico de
29 de outubro de 2002. resíduos.

Resolução CONAMA 06 de 15 Disciplina que no processo de licenciamento ambiental de atividades industriais, os resíduos gerados ou
de junho de 1988. existentes deverão ser objeto de controle específico.

Resolução CONAMA 264 de Aplica-se ao licenciamento de fornos rotativos de produção de clínquer para atividades de co-
26 de agosto de 1999. processamento de resíduos.

Resolução CONAMA 20 de
Que trata da classificação das águas e estabelece limites para emissão de efluentes.
1986.

Resolução CONAMA 263 de


"Pilhas e Baterias" - Inclui o inciso lV no Art. 6º da resolução CONAMA n.º 257 de 30 de junho de 1999.
12 de novembro de 1999.
Fórum Internacional do Meio Ambiente - A conferência da Terra 1281

Dispositivo legal/normativo Matéria que aborda

Norma da ABNT - NBR


Apresentação de projetos de aterros de resíduos industriais perigosos - procedimento.
8.418/NBR 842.

Norma da ABNT - NBR


Aterros de resíduos perigosos - Critérios para projeto, construção e operação - procedimento.
10.157.

Norma da ABNT - NBR


Aterros de resíduos não perigosos - Critérios para projeto, implantação e operação - procedimento.
13.896.

Norma da ABNT - NBR


Construção de poços de monitoramento e amostragem - procedimento.
13.895.

Norma da ABNT - NBR


Armazenamento de resíduos classes II - não inertes e III - inertes.
11.174/NBR 1.264.

Norma da ABNT - NB 1.183. Armazenamento de resíduos sólidos perigosos.

Norma da ABNT - NBR


Transporte de resíduos.
13.221.

Norma da ABNT - NBR


Incineração de resíduos sólidos perigosos padrões de desempenho - procedimento.
11.175/NB 1.265.

Norma da ABNT - NBR


Tratamento no solo (landfarming) – procedimento.
13.894.

Norma da ABNT - NBR


Lixiviação de Resíduos – Procedimento.
10.005.

Norma da ABNT - NBR


Solubilização de Resíduos - Procedimento.
10.006.

Norma da ABNT - NBR


Amostragem de Resíduos - Procedimento.
10.007.

Norma da ABNT - NBR


Degradação do Solo – Terminologia.
10.703.

Norma da ABNT - NBR


Transporte de resíduos.
13.221.

Norma da ABNT - NBR


Resíduos em solos - Determinação da biodegradação pelo método respirométrico - Procedimento.
14.283.

Enquanto o país ainda não estabelece sua Política Nacional de Resíduos Sólidos, alguns
estados brasileiros (CE, GO, MT, PE, PR, RJ, RO, RS) se anteciparam no estabelecimento de suas
políticas estaduais de resíduos sólidos por meio de legislação específica. Em outros estados (AC,
AP, ES, MS, PA, RR, SC, SE, SP, TO), os projetos de lei se encontram em fase de elaboração
(SCHMIDT, 2005; BRASIL, 2006).

A GESTÃO DE RESÍDUOS SÓLIDOS NO CONTEXTO MUNICIPAL


Nos últimos 20 anos, a descentralização do poder político tem sido um fator importante na
efetivação de políticas públicas compatíveis com as realidades locais. A Constituição Federal de
1988 garantiu a abertura para a descentralização política, fortalecendo a autonomia estadual e
municipal no enfrentamento de seus problemas particulares.
Atualmente, a geração dos resíduos sólidos urbanos pode ser considerada um dos maiores
desafios das administrações municipais. Na medida em que o volume de resíduos nos depósitos
cresce de forma ininterrupta, os custos aumentam e surgem maiores dificuldades de se encontrar
áreas e tecnologias ambientalmente seguras disponíveis para recebê-los e tratá-los. Com isso, faz-se
necessária, pela administração municipal, a gestão eficiente, eficaz e efetiva dos resíduos sólidos
Fórum Internacional do Meio Ambiente - A conferência da Terra 1282

urbanos, que passou a ser condição indispensável para se atingir o desenvolvimento sustentável
(AGENDA 21 DO CABO DE SANTO AGOSTINHO, 2004).
De uma maneira geral, algumas situações podem indicar no âmbito da administração
municipal uma boa ou má gestão dos resíduos sólidos urbanos (BARROS, 2007). Para se
caracterizar um “bom manejo” dos resíduos não basta apenas universalizar a coleta do lixo, mas,
sobretudo, acabar com uma série de situações negativas que indicam um “mau manejo” da questão,
além de efetivar medidas que mitiguem os impactos sócio-ambientais da geração, coleta e
tratamento final dos resíduos urbanos (quadro 05).

Quadro 05 - Situações que indicam “bom” ou “mau” manejo de resíduos sólidos urbanos.
Indicadores socioambientais de uma boa gestão de RSU Indicadores socioambientais de uma má gestão de RSU

Coleta (convencional e seletiva) universalizada. Existência de lixões.


Desenvolvimento sócio-econômico de catadores. Exploração e desorganização social de catadores.
Fim dos lixões e do trabalho infantil com o lixo. Trabalho infantil nos lixões e na catação.
Cidade mais bonita e agradável. Poluição visual, do solo, do ar e da água pela disposição
Economia nos gastos públicos com a limpeza urbana. inadequada de RSU.

Programas permanentes de Educação Ambiental mediante parcerias Proliferação de insetos e outros animais transmissores de
entre poder local, organizações da sociedade civil e empresas. doenças, etc.

Aterros sanitários, usinas de reciclagem, centrais de compostagem.

Fonte: Barros, 2007.

Nesse sentido, a elaboração de um Plano de Gestão Integrada de Resíduos Sólidos Urbanos


(PGIRSU) tem sua relevância estabelecida, por trazer na sua efetivação diversas vantagens para o
município. São elas:
Integra atividades e atores;
Define a política para o bom manejo dos resíduos;
Favorece a Captação de recursos;
Favorece o Turismo;
Promove a inclusão social;
Promove a integração com outros setores.

De acordo com o Projeto de Lei da Política Nacional de Resíduos Sólidos, a gestão


integrada de resíduos urbanos (GIRSU) se refere à tomada de decisões voltada aos resíduos sólidos
de forma a considerar as dimensões políticas, econômicas, ambientais, culturais e sociais,
considerando a ampla participação da sociedade, tendo como premissa o desenvolvimento
sustentável (BRASIL, 2006).
Schmidt (2007) ao delinear a GIRSU apresenta 8 componentes essenciais a serem
considerados na elaboração de um plano para o setor, conforme demonstrado na figura 01.
Portanto, a União e os estados têm o importante papel de estabelecer as leis e normas de
caráter geral como princípios orientadores. Estas servem de base para leis e normativas municipais
que devem tratar os problemas locais, considerando suas especificidades. Ressalte-se que os
poderes públicos têm responsabilidade não só na elaboração de leis que contribuam para a
sustentabilidade ambiental, mas principalmente em fazer com que sejam cumpridas, propiciando
condições para isso.
Fórum Internacional do Meio Ambiente - A conferência da Terra 1283

Figura 01: Componentes da Gestão Integrada de Resíduos Sólidos Urbanos. Fonte: Schmidt (2007).

A gestão de resíduos sólidos é considerada um serviço de interesse público de caráter


essencial. O artigo 30 da Constituição Federal define como competência dos municípios
organizarem e prestarem diretamente ou sob regime de concessão ou permissão os serviços de
interesse local, que incluem os de limpeza urbana.
A gestão integrada de resíduos deve ter como premissa o desenvolvimento sustentável.
Para atingir tal meta é imprescindível que os planos abordem os princípios da precaução, da
prevenção, da participação, da transparência, da universalização dos serviços e do poluidor-
pagador, bem como, adotar os conceitos dos 3 Rs como padrões sustentáveis (SCHMIDT, 2007;
BRASIL, 2006).
Apesar de muitos municípios e estados já terem aprovado e implementado seus planos de
gestão de resíduos sólidos, observa-se que faltam recursos financeiros e capacitação técnica, pois os
planos são genéricos e não respeitam a logística e as peculiaridades ambientais dos municípios. A
ausência e mesmo a ineficiência da implementação e elaboração destes planos colaboram para o
incremento da degradação ambiental do solo, das águas superficiais e subterrâneas, por meio do
transporte de cargas poluentes, que é responsável pelo agravo de diversas doenças que podem
atingir a população, principalmente de baixa renda (BRASIL, 2006).

INSTRUMENTOS DE POLÍTICAS AMBIENTAIS E URBANAS PARA A GESTÃO DE


RESÍDUOS SÓLIDOS.
Franco (1999), analisando a formação e o metabolismo urbano, caracterizado pelo
crescimento rápido e desordenado, descreveu os principais desafios para a gestão ambiental urbana:
1) a expansão urbana; 2) a água e o esgoto; 3) os resíduos sólidos; 4) a poluição industrial; 5) ruídos
e conflitos urbanos de vizinhança; 6) áreas verdes: criação e manutenção; 7) comércio e prestação
de serviços impactantes; e 8) cidadania ambiental.
No caso dos resíduos sólidos, um modelo de gestão deverá sempre estar atrelado aos
instrumentos de políticas ambientais disponíveis, sempre numa perspectiva de melhoria contínua,
tendo em vista a dinamicidade dos processos socioambientais inerentes do metabolismo urbano.
Ao notarmos que a incorporação das questões ambientais é algo essencial na gestão da
cidade, fica evidente que a gestão dos resíduos sólidos urbanos não poderá ser praticada sem a
apropriação e utilização de instrumentos de políticas públicas consagrados legalmente na gestão
ambiental brasileira.
Segundo Braga (2006), podemos agrupar os instrumentos de políticas ambientais em três
categorias, conforme seus princípios preponderantes de utilização: 1) instrumentos de ordenamento
territorial; 2) instrumentos de comando e controle; 3) instrumentos de tomada de decisão. No
quadro 19 são apresentados os principais instrumentos agrupados por tipologia seguindo esta lógica,
e que são possivelmente aplicáveis na gestão dos RSU.
Fórum Internacional do Meio Ambiente - A conferência da Terra 1284

Quadro 06 - Instrumentos de políticas ambientais aplicáveis na gestão dos RSU.


Agrupamento por tipologia Instrumentos
Plano Diretor
De Ordenamento Territorial Zoneamento Urbano e Ambiental
Áreas Legalmente Protegidas

Licenciamento ambiental
De Comando e Controle
Fiscalização Ambiental

Monitoramento ambiental
Sistema de informações
De Tomada de Decisão Educação ambiental
Instâncias de Decisão Colegiada

Fonte: Braga (2006).

Segundo Souza e Barros (2007), todos os instrumentos apresentados acima têm sua
fundamentação na legislação ambiental brasileira, cujos principais referenciais são: 1) Código das
Águas (Decreto n°. 24.643/1934); 2) Código Florestal (Lei n°. 4.771/1965); 3) Política Nacional de
Meio Ambiente (Lei n°. 6.938/1981); 4) Constituição Federal (1988); 5) Política Nacional de
Recursos Hídricos (Lei n°. 9.433/1997); 6) Lei de Crimes Ambientais (Lei n°. 9.605/1998); 7)
Política Nacional de Educação Ambiental (Lei n°. 9.795/1999); 8) Estatuto das Cidades (Lei n°.
10.257/2001).
Diante da diversidade dos instrumentos de políticas ambientais disponíveis para a gestão
integrada dos resíduos sólidos urbanos, cabe ao poder local e à sociedade, promoverem a integração
desses instrumentos. O primeiro passo é agrupar os instrumentos e relacioná-los com os principais
desafios para a gestão integrada de resíduos sólidos urbanos. Entretanto, além de tudo isso, torna-se
necessário o desenvolvimento institucional dos sujeitos políticos (governo e sociedade), que deve se
configurar no planejamento, especialmente com participação efetiva das partes interessadas, e no
controle social, que passarão imprescindivelmente pelo fortalecimento político-institucional das
organizações da sociedade civil e dos cidadãos no processo de gestão do espaço urbano e seus
ambientes de entorno (BARROS; SILVEIRA; GEHLEN, 2007).

REFERENCIAS BIBLIOGRÁFICAS
AGENDA 21 DO CABO DE SANTO AGOSTINHO. Cabo de Santo Agostinho/PE: Prefeitura
Municipal do Cabo de Santo Agostinho/Secretaria Executiva de Meio Ambiente e Saneamento,
2004.
BARROS, André Paulo de. Importância do PGIRSU para o Cabo: mini-conferência. In: Oficina de
diagnóstico rápido participativo: PGIRSU – Cabo. Cabo de Santo Agostinho/PE: Prefeitura
Municipal do Cabo de Santo Agostinho/Secretaria Executiva de Meio Ambiente e Saneamento,
nov. de 2007. (palestra).
BARROS, André Paulo de; SILVEIRA, Karla Augusta; GEHLEN, Vitória R. F.. Instrumentos de
políticas públicas para gestão ambiental urbana. In: JORNADA INTERNACIONAL DE
POLÍTICAS PÚBLICAS, 3, 2007, São Luis, MA: Anais... São Luis, MA: 2007 (CD Rom).
BRASIL. Manual de gerenciamento de resíduos de serviços de saúde. Brasília: Ministério da
Saúde, Agência Nacional de Vigilância Sanitária, 2006. 182 p.
CPRH, Agência Pernambucana de Meio Ambiente e Recursos Hídricos. Disponível em:
http://www.cprh.pe.gov.br/frme-index-secao.asp?idsecao=36. Acesso em 27.11.2007.
IBGE. Pesquisa Nacional de Saneamento Básico - PNSB/2000. Rio de Janeiro, IBGE/DPE, 2002.
(CD Rom).
Fórum Internacional do Meio Ambiente - A conferência da Terra 1285

JURAS, Ilídia da A. G. Martins. Destino dos resíduos sólidos e legislação sobre o tema. Brasília:
Câmara dos Deputados/Consultoria Legislativa, 2000 (Nota Técnica).
MONTEIRO, José Henrique Penido et al. Manual de gerenciamento integrado de resíduos sólidos.
Coordenação técnica Victor Zular Zveibil. Rio de Janeiro: IBAM, 2001. p. 1-7.
PÓLIS. Política pública como garantia de direitos. Repente: participação popular na construção do
poder local. São Paulo: Pólis - Instituto de Estudos, Formação e Assessoria em Políticas Sociais, n.
26, Dez., 2006. (boletim eletrônico disponível em:
http://www.polis.org.br/publicacoes_interno.asp?codigo=255).
SCHMIDT, Thilo. Oficina 1: apoio à elaboração do plano de gestão integrada de resíduos sólidos
urbanos do Cabo de Santo Agostinho. Cabo de Santo Agostinho/PE: Secretaria Executiva de Meio
Ambiente e Saneamento/GTZ, set. de 2007.
SCHMIDT, T. Planos de gestão integrada de resíduos sólidos urbanos: avaliação do estado da arte
no Brasil, comparação com a situação na Alemanha e proposições para uma metodologia
apropriada. Recife: Ministério do Meio Ambiente/Agência de Cooperação Técnica Alemã, 2005.
SILVA, Maria Ozanira da Silva e (org). Avaliação de políticas e programas sociais: teoria e
prática. São Paulo: Veras, 2001.
SOUZA, Tatiana Santana de; BARROS, André Paulo de. Meio ambiente e políticas públicas. In:
REDE DE DEFESA AMBIENTAL DO CABO DE SANTO AGOSTINHO. Carteira de projetos:
planos de ação comunitários de meio ambiente/Projeto Nucodema. Cabo de Santo Agostinho, PE:
Rede de Defesa Ambiental do Cabo de Santo Agostinho, 2007, p. 16.
ZICA, Luciano. Panorama e política nacional de resíduos sólidos. In: I Seminário de Resíduos
Sólidos da Bahia. Salvador: Secretaria de Recursos Hídricos e Ambiente Urbano/Ministério do
Meio Ambiente, nov. de 2007. (palestra). Disponível em:
http://www.sedur.ba.gov.br/seminario.residuos.solidos.lista.htm. Acesso em 22.11.2007
Fórum Internacional do Meio Ambiente - A conferência da Terra 1286

COLETA SELETIVA E ORGANIZAÇÃO SOCIAL DOS CATADORES NO CABO DE


SANTO AGOSTINHO: UMA ABORDAGEM PRELIMINAR SOBRE AS RELAÇÕES DE
PRODUÇÃO NO SETOR DA RECICLAGEM

Tatiana Santana de SOUZA


Bióloga e aluna do Curso de Especialização em Gestão, Educação e Política Ambiental (UFRPE) e do
PRODEMA/UFPE/Mestrado. tati.santana@pop.com.br
Karla Augusta SILVEIRA
Licenciada em Letras, Especialista em Consultoria Organizacional e aluna do PRODEMA/UFPE/Mestrado.
Vitória Régia Fernandes GEHLEN
Doutora em Políticas Públicas e professora do Centro de Ciências Sociais Aplicadas e do PRODEMA/UFPE.

RESUMO
Este trabalho analisa de forma preliminar as relações de produção existentes entre as
classes dos catadores e seletores de materiais recicláveis agregados aos depósitos privados no
município do Cabo de Santo Agostinho (Pernambuco). Com base em conceitos fundamentais sobre
modo de produção, o texto aborda os seguintes aspectos: as relações de produção existentes no seio
do trabalho da catação de lixo e da reciclagem e as ações governamentais do município do Cabo de
Santo Agostinho, em organizar socialmente um grupo de catadores atuantes na região. Percebe-se
que a subordinação do trabalho aos interesses do capital produz a alienação tanto dos catadores e
seletores de materiais recicláveis que possuem carteira assinada, como daqueles que trabalham por
conta própria. A reflexão sobre as relações de produção dos catadores e seletores de materiais
recicláveis agregados a depósitos privados torna possível um melhor entendimento de como se dá a
inserção dessa classe de trabalhadores dentro da divisão social e técnica do trabalho e a
funcionalidade desta ocupação informal, socialmente desvalorizada, para o capital, visto que esta
categoria é de fundamental importância para a cadeia de reciclagem do país.
Palavras-chaves: Catadores e seletores de material reciclável; modo de produção; relações de
produção; capitalismo.

ABSTRACT
This paper analyzes in a preliminary way the producing relations which exist between
garbage collectors and recyclable materials selectors who work in private deposits of the city of
Cabo de Santo Agostinho (Pernambuco, Brazil). Based on fundamental concepts of producing
ways, this text discusses the following aspects: the existing producing relations within the work of
garbage collecting and recycling, as well as the governmental actions in Cabo de Santo Agostinho,
especially in socially organizing a group of active collectors from the region. What we can notice is
that the subordination of their work to the money is responsible for the alienation of both the
garbage collectors and recyclable materials selectors, having or not a formal job contract. An
analysis of this relationship gives conditions to a better understanding of how is the insertion of this
class of workers within the social and technical division of work. We can also understand the
functionality of this informal occupation, socially devalued. This category is of fundamental
importance in the recycling process in our country.
Keywords: garbage collectors and recyclable material selectors; producing ways; producing
relations; capitalism.

INTRODUÇÃO
O objetivo deste trabalho é analisar preliminarmente as relações de produção existentes
entre as classes dos catadores e seletores de materiais recicláveis146 agregados aos depósitos
privados no município do Cabo de Santo Agostinho (Pernambuco).

146
Catador de material reciclável – profissão reconhecida pela Classificação Brasileira de Ocupação - CBO em 2002 a
atividades executada consiste em: Catar, selecionar e vender materiais recicláveis como papel, papelão e vidro, bem
como materiais ferrosos e não ferrosos e outros materiais reaproveitáveis (SIQUEIRA, 2000, p. 07).
Fórum Internacional do Meio Ambiente - A conferência da Terra 1287

Especificamente, o assunto aqui tratado insere-se no bojo da discussão sobre a organização


social dos catadores e suas relações de produção na cadeia da reciclagem atuante na região, cuja
análise aqui proposta, subsidiará aspectos descritivos do diagnóstico sócio-econômico e ambiental,
previsto como uma das primeiras ações da linha estratégica “organização social de catadores” do
Programa de Cooperação Técnica para Gestão de Resíduos Sólidos do município do Cabo de Santo
Agostinho/PE – O PRORESÍDUO147.
A análise de aspectos das relações de produção existentes entre catadores e seletores de
material reciclável teve como fundamentação teórica principal a obra Sobre a Reprodução (1999) de
Louis Althusser, especificamente o capítulo segundo, que trata sobre modo de produção148.
Como recurso de trabalho foi utilizada a pesquisa qualitativa e quantitativa com entrevistas
semi-estruturadas, que permitiu redefinir posturas, formas de abordagem e ordem das questões
circunscritas ao foco de interesse da análise.
Um grupo formado por 18 catadores informais atuantes nos Distritos de Ponte dos
Carvalhos e Pontezinha no município do Cabo de Santo Agostinho foi o universo preliminar da
pesquisa. O PRORESÍDUO pretende com esse grupo estabelecer processos de capacitação e
estruturação organizacional, visando transformá-lo numa cooperativa de trabalho de coleta seletiva
de material reciclável.

O TRABALHO DA COLETA SELETIVA DE MATERIAL RECICLÁVEL E AS RELAÇÕES


DE PRODUÇÃO
A inserção dos catadores e seletores de materiais recicláveis na cadeia produtiva da
reciclagem se dá como estratégia encontrada por estes sujeitos para superar o desemprego e obter
renda para garantir sua própria sobrevivência e de sua família. Sem vínculo empregatício, os
catadores e seletores (enquanto mão-de-obra excluída do mercado formal de trabalho) recriam no
trabalho com o lixo a sua identidade de trabalhador.
Estes trabalhadores não estão inseridos na indústria e no setor formal da economia,
entretanto, contribuem de forma decisiva com o processo produtivo da indústria de reciclagem, pois
através do seu trabalho, muitas vezes imperceptível e pouco valorizado pela sociedade, fornecem
matéria prima para a indústria de reciclagem do país. É a partir desta alternativa de trabalho que um
novo setor econômico é criado, permitindo a sobrevivência de milhares de famílias, sendo
apropriada pelos interesses do capital, e, portanto, subordinada ao modo de produção capitalista,
mesmo tendo processos de trabalho cooperativos, que em muitos casos, apresenta a insígnia da
“economia solidária” 149.
Segundo Althusser (1999), modo de produção designa a maneira, forma ou modo de
produzir os bens indispensáveis para a existência material dos seres humanos que vivem em
determinada formação social. Nesse caso, produzir trata-se de um conjunto de processos de
trabalho, que se caracteriza por uma seqüência de operações sistematicamente regulamentadas. Tais
processos são efetuados por agentes de trabalho. Esses agentes atuam sobre determinado objeto de
trabalho e utilizam instrumentos para transformar o objeto de trabalho em produto que atenda às

147
O PRORESÍDUO é um programa de cooperação técnica concebido pela Prefeitura do Cabo de Santo Agostinho,
com o objetivo de estabelecer mecanismos institucionais para promoção de parcerias entre os setores público, social e
empresarial numa gestão integrada dos resíduos sólidos.
148
No capítulo segundo (O que é um modo de produção?) Althusser aborda conceitos importantes da teoria marxista:
formação social, modo de produção, meios de produção e relações de produção, e descreve o modo de produção
capitalista e como se dão suas relações de produção, num sistema de exploração cujo principal objetivo não é atender as
necessidades materiais de dada formação social, mas, sobretudo, produzir e ampliar o Capital. O autor destaca as bases
ideológicas das relações de produção do modo de produção capitalista, que, além de ser o lugar da produção, é onde se
dá a exploração de classe.
149
Althusser (1999) considera as cooperativas de compra, venda e de produção fazendo parte efetivamente do modo de
produção capitalista e não como formas de antecipação direta do modo de produção socialista, como afirmam alguns.
Fórum Internacional do Meio Ambiente - A conferência da Terra 1288

necessidades humanas e do próprio processo de trabalho. De um modo geral, o modo de produção é


constituído pela unidade forças produtivas e relações de produção.
É possível então notar que o trabalho dos catadores e seletores de material reciclável
insere-se fortemente no modo de produção capitalista, cujas relações de produção se dão pela
exploração capitalista. Esses trabalhadores podem ser qualificados como importantes agentes de
trabalho, essenciais para manutenção da cadeia produtiva da reciclagem.

Tabela 1: Quadro esquemático da constituição do modo de produção da reciclagem nos âmbitos dos
mercados informal e formal.
Fórum Internacional do Meio Ambiente - A conferência da Terra 1289

Modo de Produção

Forças Produtivas Relações de Produção

Meios de Produção Forças de


Trabalho:

Formas
Não-agentes de
diferentes de
produção, que
dispêndio de Agentes de produção
Objeto de Instrumentos intervém na
trabalho de trabalho atividades do
produção.
conjunto dos
agentes dos
processos.

Carroças.
Catação,
Carro de mão.
Material transporte e
reciclável Locais para triagem de Deposeiros/atravessa-
Catadores e seletores.
Informal bruto depósito. material dores150 .
adquirido reciclável para
Caminhões.
da catação. depósito e
Prensas e
venda.
balanças.

Triagem e
Deposeiros/atravessa-
Material Linha de preparação de
dores (fornecedores).
reciclável industrial de materiais para
Proprietários das
selecionado processamento processamento Operários.
Formal indústrias de
e preparado do resíduo de reciclagem Agentes reciclagem.
pelo (máquinas e (gasto com administrativos e
deposeiro. equipamentos). mão-de-obra comerciais.
operária,

150
Deposeiros é um termo que designa os proprietários de depósitos (estruturados ou não) que separam e acondicionam
materiais recicláveis para destinação em grande volume às indústrias de reciclagem. Os deposeiros são considerados na
maioria dos casos como “atravessadores”, quando possuem estrutura de trabalho suficiente para recepcionar os
materiais dos catadores, comercializando-os diretamente com as indústrias de reciclagem.
Fórum Internacional do Meio Ambiente - A conferência da Terra 1290

energia, água,
etc.).

As Relações de produção são relações muitos especiais entre os agentes da produção e


outros sujeitos que não são agentes da produção, mas intervêm na produção. Esses “não agentes”
ocupam geralmente as extremidades do processo produtivo, detendo a propriedade dos meios de
produção (objeto de trabalho e instrumentos) e os produtos do processo. São nessas relações que a
exploração se inicia e se desenvolve, com implicações profundas no seio da formação social, muitas
vezes expressas, nas divisões e lutas de classe (ALTHUSSER, 1999).
Na cadeia produtiva da reciclagem a exploração ocorre de várias maneiras, seja na fábrica,
nos depósitos, na rua, nas residências. No caso particular dos catadores e seletores estes são
explorados desde a coleta do material nas ruas até o momento em que o mesmo é reciclado nas
grandes indústrias, contribuindo para a acumulação capitalista, na produção de trabalho excedente.
Althusser (1999) demonstra que o modo de produção, além de ser o lugar da produção, é onde se dá
a exploração de classe.
Percebe-se que a subordinação do trabalho aos interesses do capital produz a alienação
tanto dos catadores e seletores de materiais recicláveis que possuem carteira assinada, como
daqueles que trabalham por conta própria, já que não têm acesso ao processo completo de
reciclagem da mercadoria por ele catada e selecionada, e nem detêm a propriedade dos principais
instrumentos de trabalho (carroças, balanças, prensas, etc.) tirando a possibilidade de criar algo
novo, de se emanciparem enquanto sujeitos históricos e sociais.
O trabalhador assalariado, no mercado formal, é um agente direto de acumulação de
capital, realizada através da exploração do sobretrabalho. Contrapondo a este, no
trabalhador por conta própria, esta exploração só se realiza no circuito mais amplo da
reprodução da sociedade. O menor catador de papel é um trabalhador por conta própria
e, portanto, a mais valia sobre esses trabalhadores só se realizará no circuito mais amplo
da sociedade (SIQUEIRA, 2000, p. 16).

A exploração da força de trabalho ainda é mais perversa com os catadores e seletores que
executam sua atividade de maneira autônoma e informal, pois nessa circunstância, a presença dos
atravessadores como mediadores da relação de compra e venda dos materiais recicláveis gera uma
desvalorização significativa da mercadoria por eles catadas e selecionadas.
Estes intermediários, interligados entre si de forma corporativista, padronizam o valor da
mercadoria e as relações de trabalho estabelecidas nos depósitos151. Conseqüentemente submetem
os catadores e seletores a condições desfavoráveis de trabalho, impondo a eles o cumprimento de
cotas mínimas de entrega diária, prolongando muitas vezes a jornada de trabalho ao extremo. Na
verdade, a jornada de trabalho é prolongada não pela vontade do trabalhador, mas pela imposição
do capital.
A introjecção desta alienação por parte desses trabalhadores produz rebatimentos político-
ideológicos que favorecem a acumulação capitalista, oferecendo bases para a legitimação da
dominação do capital sobre o trabalho. Conseqüentemente, este fenômeno colabora para o
crescimento desordenado de depósitos de materiais recicláveis privados (e até mesmo públicos) que
se conservam, na sua maioria, à margem da legalidade, fazendo com que a atividade executada por
esses trabalhadores seja o elo inicial de uma engrenagem econômica, que se reproduz em condições
151
Numa conversa com um dos catadores entrevistados os autores tomou ciência de um fato que serve como exemplo
da exploração existente nas relações de produção entre os “atravessadores” e os catadores: Os catadores vendem a
“catemba” (plástico polipropileno – PP – das cadeiras de plástico e recipientes de margarina) aos atravessadores pelo
valor de R$ 0,20 o quilo. O atravessador (deposeiro) vende o material em grande quantidade para a indústria, com nota
fiscal, num valor de R$ 1,20 o quilo.
Fórum Internacional do Meio Ambiente - A conferência da Terra 1291

de marginalidade, devido à ausência quase absoluta de direitos trabalhistas e na compra de


mercadorias por parte dos intermediários ou atravessadores152, e das fábricas de modo informal ou
formal.

Processo de
exploração crescente

Figura 1: Relação de desigualdade de ampliação e acúmulo de capital na cadeia de trabalho da


reciclagem (esquema elaborado pelos autores). Os catadores, aos milhares, são a base da cadeia
produtiva da reciclagem, entretanto, o capital que chegam a produzir, servem apenas para sua
subsistência.

ASPECTOS DA AÇÃO GOVERNAMENTAL


Tem-se visto muitas iniciativas governamentais de apoio aos catadores. Movimentos
sociais de catadores vêm ao longo de seu desenvolvimento pressionando governos a adotarem
políticas que oportunizem melhores condições de trabalho para a categoria com justiça social e sob
a bandeira da “economia solidária”. Apesar dos avanços, o Estado ainda funciona como aparelho
ideológico e repressor a favor do modo de produção dominante – o sistema capitalista.
No caso particular do município do Cabo de Santo Agostinho, o PRORESÍDUO
(Programa de Cooperação Técnica e Institucional para Gestão Integrada de Resíduos) predispõe
ações governamentais para a implantação de sistema público de coleta seletiva com organização
social dos catadores. Na prática, tal projeto constitui-se de etapas básicas, algumas já em fase de
execução. Entre elas temos a realização de diagnóstico sócio-econômico e ambiental dos catadores,
que virá acompanhada com a promoção de cursos de qualificação e assessoria técnica-gerencial por
parte do governo, em parceria com organizações do setor produtivo e não-governamentais, para
estruturação física e organizacional de cooperativas de trabalho no âmbito da coleta seletiva e da
reciclagem.
Entretanto, tudo isso se caracteriza como um esforço da “superestrutura” em prover
melhorias na “infra-estrutura” do modo de produção dominante que subordina os agentes de
trabalho à produção e à ampliação do capital.
Como bem destacou Althusser (1999), os agentes do processo devem ser “qualificados”,
capazes de utilizar bem os instrumentos de trabalho. Para tanto, devem possuir experiência técnica,
rigorosamente definida conforme exigências de utilização dos instrumentos existentes, onde o nível
técnico dos agentes de um processo de trabalho é determinado pela natureza dos instrumentos de
trabalho, e de uma maneira geral, pelos meios de produção existentes. Desse modo, em todo o
processo de trabalho os agentes podem trabalhar de modo não-cooperado ou cooperado.

152
Aquele que compra mercadorias por preço baixo para revendê-las com uma margem grande de lucro, obtendo lucro
em detrimento do produtor que por sua vez recebe menos, tendo a sua mercadoria desvalorizada. O lucro vai todo para
os revendedores, isto é para os atravessadores.
Fórum Internacional do Meio Ambiente - A conferência da Terra 1292

A introdução da cooperação e, sobretudo, de suas diferentes formas, dependem também,


em última instância, do estado dos meios de produção existentes [...] As relações de
produção dominantes existentes, e a política correspondente, podem impor ou tornar
viáveis certas formas de cooperação que, com as mesmas forças produtivas, permitem
obter resultados que seriam impossíveis com antigas relações de produção e a antiga
política (ALTHUSSER, 1999, p. 47).

Evidentemente que o apoio governamental poderá trazer benefícios e melhoria sócio-


econômica para os trabalhadores da coleta seletiva. Porém, sabe-se que por traz de tudo isso, ainda
permeia a idéia de melhorar cada vez mais o processo produtivo em função do aumento e acúmulo
do capital, pois apesar do modo de produção capitalista produzir objetos (bens e serviços) de
utilidade social, isso não se apresenta como o seu objetivo principal. “Marx mostrou que o objetivo
número 1 do modo de produção capitalista é, acima de tudo, a produção da mais-valia e a produção
do próprio capital” (ALTHUSSER, 1999, p. 56).

PERFIL SOCIO-ECONÔMICO DOS CATADORES ENTREVISTADOS


Os dados aqui apresentados são resultados da tabulação e análise de freqüências absolutas
e relativas dos questionários de entrevistas aplicados a 18 trabalhadores de coleta e seleção de
material reciclável que atuam nos Distritos de Ponte dos Carvalhos e Pontezinha (Cabo-PE). Como
foi explícito no início deste trabalho, a Prefeitura Municipal pretende com esses catadores, formar
uma cooperativa de trabalho, visando atender as diretrizes do Programa de Cooperação Técnica e
Institucional para Gestão Integrada de Resíduos (PRORESÍDUO). A aplicação de um questionário
semi-estruturado foi uma das primeiras alternativas para reconhecer preliminarmente o perfil sócio-
econômico desse grupo-objetivo. As figuras e quadro a seguir, demonstram os principais
indicadores analisados na tabulação e avaliação dos dados sócio-econômicos.

10 9
8
8

2 1

0
Até 17 anos 18 – 30 31-50 51-64 m ais de 65
anos

Gráfico 1: Perfil de faixa etária dos trabalhadores entrevistados.


Fórum Internacional do Meio Ambiente - A conferência da Terra 1293

11

Homens Mulheres

Gráfico 2: Perfil de gênero dos entrevistados.

Tabela 2: Distribuição dos entrevistados por aspecto de escolaridade.


Ensino
Não Ensino Ensino Ensino Ensino Ensino
fundame
freqüent fundame médio médio superior superior
ntal Outros Total
ou a ntal incompl complet incompl complet
incomple
escola completo eto o eto o
to
n % N % n % n % n % n % n % n % n %
1
2 3 2 1 1
5 6 4 0 0 1 6 0 0 0 0 2 0
8 3 2 1 8
0

Legenda: n - Número de vezes que a alternativa foi marcada (freqüência absoluta).

Quinze trabalhadores ganham com a catação menos de 01 salário-mínimo por mês. Apenas
um catador consegue apurar entre 02 a 03 salários-mínimos mensalmente. Todos vendem os
materiais coletados a deposeiros da localidade. Onze (11) trabalham com carroças, porém, apenas
04 possuem a propriedade das mesmas. O restante utiliza carroças emprestadas de outros catadores.
A maioria faz a triagem preliminar do material na própria casa (14 catadores). Nove (09)
vendem imediatamente o material para os deposeiros. Os outros nove (09), acumulam o material em
casa, para depois vender aos depósitos.
Nenhuns dos entrevistados participam ou participaram de associações e cooperativas de
catadores. Tampouco, participaram de cursos de capacitação específicos para o serviço de coleta
seletiva. Todos atuam na informalidade e trabalham apenas para a subsistência diária. Apenas três
(03) catadores possuem outra ocupação além da catação e seleção de materiais recicláveis.

CONSIDERAÇÕES FINAIS
Refletir sobre as relações de produção dos catadores e seletores de materiais recicláveis
agregados a depósitos privados torna possível um melhor entendimento de como se dá a inserção
dessa classe de trabalhadores dentro da divisão social e técnica do trabalho e a funcionalidade desta
ocupação informal, socialmente desvalorizada, para o capital, visto que esta categoria presta um
serviço de alta relevância pública e, por conseguinte, de fundamental importância para a cadeia de
reciclagem do país.
Apesar das ações governamentais destinarem uma atenção especial à categoria dos
trabalhadores da coleta e seleção de material reciclável, visando incluí-los economicamente no
mercado formal, ainda assim, todo o processo de trabalho ainda estará sujeito às alienações da
exploração capitalista, onde os “investimentos” do governo apenas promoverão alguns ajustes de
Fórum Internacional do Meio Ambiente - A conferência da Terra 1294

ordem “técnica” com adequação dos agentes de trabalho aos processos de produção regulados pelo
modo de produção dominante.

REFERÊNCIAS BIBLIOGRAFIA
ALTHUSSER, Louis. Sobre a reprodução. Petrópolis, RJ: Vozes, 1999. (Capítulo 2).
PREFEITURA DO CABO. Programa de cooperação técnica e institucional para gestão integrada
de resíduos sólidos: carta consulta. Cabo, PE: Secretaria Executiva de Meio Ambiente e
Saneamento, 2007.
SIQUEIRA, Sueli, O catador de papel: Um trabalho discriminado ou uma fonte de construção de
identidade? Trabalho e Violência desvendando a realidade social. Governador Valadares:
Universidade do Rio Doce, 2000, p. 07 à 39.
Fórum Internacional do Meio Ambiente - A conferência da Terra 1295

TOXOCARÍASE E CARACTERIZAÇÃO SÓCIO-AMBIENTAL DE UMA POPULAÇÃO


RURAL DO MUNICÍPIO DE PINDAMONHANGABA, SÃO PAULO, BRASIL

Francine Alves da Silva Coelho


Ana Júlia Urias dos Santos Araújo
Hermínia Yohko Kanamura
Programa de Pós Graduação em Ciências Ambientais da Universidade de Taubaté e Instituto Básico de Biociências da
Universidade de Taubaté. Avenida Tiradentes 500, Taubaté, SP. CEP: 12030-180. E-mail: kanamura@usp.br

RESUMO
A contaminação do solo por ovos e larvas de helmintos, aliada às condições sanitárias
precárias, tem se tornado fato importante para a aquisição de parasitoses, principalmente na zona
rural. No presente estudo, anticorpos anti-Toxocara foram pesquisados em 253 amostras de sangue
de uma população rural do município de Pindamonhangaba, Estado de São Paulo, com o objetivo
de relacionar os fatores sócio-ambientais e a freqüência de toxocaríase nessa população. Foram
analisadas algumas características das famílias, como presença de cães e gatos na residência,
cuidados com a água de beber, presença e localização do banheiro, tipo de piso da casa, condições
sanitárias e renda familiar. Os dados obtidos neste estudo fornecem fortes indicações quanto ao
risco de exposição a infecções pelo Toxocara canis na população estudada, sugerindo a necessidade
da adoção de medidas profiláticas e melhoria das condições sociais e sanitárias.
Palavras-chave: Toxocara sp. Toxocaríase. Epidemiologia. Fatores sócio-ambientais.

ABSTRACT
The environmental contamination of the soil with helminth eggs and larvae, allied to the
precarious sanitary conditions, is an important factor for the acquisition of parasite infections by the
population, mainly in the rural zone. In the present study, blood samples from 253 inhabitants of a
rural area of the city of Pindamonhangaba, Sao Paulo, were submitted to detection of anti-Toxocara
antibodies, in order to associate the social and environmental factors to the toxocariasis. Some
characteristics of the families such as presence of dogs and cats, care with drinking water, presence
and localization of the toilet, type of floor, sanitary conditions and family income were analyzed.
The data of this study provide indications about the risks of exposition to Toxocara canis infections
in this rural population of Pindamonhangaba, suggesting the need to adopt some prophylactic
measures and improvement of the social and sanitary conditions.
Key-Words: Toxocara sp. Toxocariasis. Epidemiology. Social and environmental factors.

INTRODUÇÃO
Fatores sócio-ambientais têm sido apontados como elementos favorecedores da
transmissão de parasitoses, principalmente no ambiente, onde as condições sanitárias e a grande
circulação de animais contribuem para a aquisição dessas doenças. Várias espécies de helmintos e
protozoários são conhecidas por causarem infecções humanas, e alguns agentes parasitários que têm
como hospedeiro definitivo animais, principalmente cães e gatos, têm importância em saúde
pública, por causarem doenças no homem. Dentre as espécies de helmintos com potencial
antropozoonótico, Toxocara canis, nematóide da família Ascaridae, pode ser destacado por ser o
principal agente etiológico envolvido na Síndrome da Larva Migrans Visceral (SLMV) e na
Síndrome da Larva Migrans Ocular (SLMO) (REY, 2001; NEVES et al, 2003).
Toxocara canis tem como habitat o intestino delgado de cães e seus ovos são eliminados
junto com as fezes, necessitando de um período no solo para se tornarem infectantes. O risco de o
homem ingerir ovos desse parasito é alto, principalmente na infância quando se tem maior contato
com a terra e os hábitos higiênicos são mais precários. Após a ingestão, uma larva eclode do ovo no
intestino delgado do hospedeiro e penetra na mucosa intestinal, caindo na circulação sangüínea e, a
partir daí, dissemina-se no organismo. Como o homem é hospedeiro acidental do T. canis não
ocorre desenvolvimento de verme adulto e em função disso, a larva pode permanecer em
quiescência ou migrando em diversos órgãos, causando a SLMV e/ou SLMO (LOGAR et al. 2004).
Fórum Internacional do Meio Ambiente - A conferência da Terra 1296

O diagnóstico clínico da infecção humana por T. canis é bastante dificultoso, pois a


sintomatologia nesse caso é inespecífica e similar a de outras doenças hepáticas. Atualmente, para
se diagnosticar a toxocaríase em humanos são empregadas técnicas imunológicas, por meio da
demonstração de anticorpos específicos no soro e fluídos oculares.
A realização de estudos da soropositividade para anticorpos contra Toxocara spp na
população humana, em conjunto com a análise das condições sócio-ambientais da comunidade,
constitui instrumento valioso para fundamentar a adoção de medidas profiláticas úteis no combate a
esta importante zoonose.

MATERIAL E MÉTODOS
População Estudada: O estudo foi realizado no bairro da Colméia, zona rural do município
de Pindamonhangaba, Estado de São Paulo. Foram visitadas 92 famílias, sendo que dessas 76
concordaram em participar do presente estudo, perfazendo um total de 302 indivíduos.
Levantamento dos Fatores Sócio Ambientais: O responsável por cada família respondeu a
um questionário para levantamento dos aspectos sócio-ambientais, estruturado, com perguntas
abertas e fechadas.
Amostras de Sangue: Foram coletadas amostras de sangue de 253 indivíduos, de ambos os
sexos e diferentes faixas etárias, por meio da técnica de punção capilar, realizada na polpa do dedo
anular direito dos participantes e recolhida em papel filtro Whatman® nº 3, segundo metodologia
descrita por Ferreira e Carvalho (1982).
Detecção de anticorpos anti-Toxocara no sangue eluído: A técnica de ELISA foi realizada
segundo metodologia descrita por Alderete et al. (2003). Os eluatos de sangue, previamente
preparados, foram diluídos em meio contendo antígeno total de Ascaris lumbricoides, para adsorção
de anticorpos contra determinantes antigênicos comuns aos ascarídeos e obtenção de uma diluição
final correspondente a 1:320. Foram incluídas, em cada dia de realização do experimento, amostras
controle constituídas de soro controle positivo (CP), soro controle negativo (CN) e soro limiar de
reatividade (LR), todas diluídas em Solução salina tamponada com fosfatos na concentração final
1:320. A leitura da absorbância foi realizada em leitora de microplaca em comprimento de onda de
492nm, e foram consideradas positivas amostras cujas leituras de densidade óptica (DO) se
mostraram superiores ao LR determinado para cada placa.
Análise estatística: Utilizou-se o programa Epi-info para os tratamentos estatísticos que
consistiram, para comparação entre as freqüências, no cálculo do intervalo, com 95% de confiança,
e aplicação do teste do qui-quadrado, admitindo-se como limite de significância o valor de p
inferior a 0,05.
Aspectos Éticos: O projeto foi aprovado pelo Comitê de Ética em Pesquisa da
Universidade de Taubaté (Protocolo n.º 489/05).

RESULTADOS E DISCUSSÂO
A invasão do organismo humano por parasitos próprios de outros animais leva ao
desenvolvimento atípico da espécie envolvida, como acontece com espécies do gênero Toxocara,
que, ao penetrarem no organismo humano por via oral, mostram-se incapazes de completar seu
ciclo evolutivo e acabam por alcançar alguns órgãos como o fígado, pulmões e sistema nervoso
central, ou permacem migrando pelo organismo, provocando a Síndrome da Larva Migrans
Visceral. O aperfeiçoamento de alguns testes diagnósticos permitiu demonstrar que, na maioria dos
casos de LMV, as formas larvárias de Toxocara spp podem estar presentes, razão pela qual o termo
toxocaríase tem sido usado com freqüência crescente, sempre que confirmado o diagnóstico
específico (REY, 2001).
Levando em consideração que o verme adulto de T. canis não se desenvolve no homem, e
que, portanto não existem ovos nas fezes, o exame coproparasitológico deve ser descartado como
método diagnóstico desta parasitose; além disso, testes hematológicos e biópsias também não são
conclusivos; em função disso, o diagnóstico da toxocaríase tem sido baseado predominantemente na
detecção de anticorpos contra antígenos de excreção e secreção de larvas desse nematóide,
Fórum Internacional do Meio Ambiente - A conferência da Terra 1297

utilizando técnicas imunoenzimáticas, como Western Blot e ELISA, sendo esta última aceita como
teste padrão para o diagnóstico da toxocaríase, em função de sua alta sensibilidade e especificidade
(FAN et al., 2004).
No presente estudo, o nível de exposição dos indivíduos estudados foi demonstrado por
meio da presença de anticorpos contra antígeno de T. canis e.foi realizado levantamento dos fatores
sócio-ambientais que poderiam estar envolvidos na transmissão da toxocaríase.
Dos 302 indivíduos das 76 famílias envolvidas no estudo, 253 (84%) cederam amostras de
sangue para realização da técnica de ELISA; destes, 67 (26%) foram reativas para anticorpos anti-
Toxocara. Quando se compararam as taxas de soropositividade entre as famílias com cães filhotes e
as que possuíam apenas animais adultos (Tabela 1), a taxa foi significativamente mais elevada no
primeiro grupo (73,3%) do que no segundo (27,7%). Este achado pode ser explicado pelo fato de
que cães jovens são os principais responsáveis pela contaminação do meio ambiente, como já
demonstrado por outros autores quando verificaram que animais com até 7 meses de idade
eliminavamm muito mais ovos que os adultos (SAMANTA e GHORUI, 1998, GENNARI et al.,
2001). Os fatores sócio-ambientais têm sido apontados como elementos favorecedores da
transmissão dessa zoonose, principalmente em ambientes onde as condições sanitárias são
inadequadas e a população de caninos seja expressiva. A importância da contaminação ambiental
foi discutida por diversos autores, que concluíram que a associação entre infecção humana e
contaminação ambiental é mais intensa quando observado contato direto com cães (MIZGAJSKA,
2001, YBANEZ et al., 2001; COELHO et al., 2001; MURADIAN et al. 2005).

Tabela 1 – Freqüência (%) de soropositivos ao T. canis entre os indivíduos residentes no bairro da


Colméia, Pindamonhangaba, em função da idade dos cães presentes nos domicílios dos indivíduos.
FAMÍLIA INDIVÍDUOS
IDADE DOS (N=69) (N = 243)
CÃES ELISA + ELISA +
Total Total
Nº* ( % ) Nº ( % )
Adultos 54 15 (27,7%) 175 36 (20,6%)
Filhotes** 15 11 (73,3%) 68 31 (45,5%)
TOTAL 69 26 (37,6%) 243 67 (27,6%)
* Número de famílias com pelo menos um indivíduo soropositivo para Toxocara sp
** Cães com menos de 1 ano de idade

Quando algumas características da moradia dos participantes como presença/ausência de


banheiro ou de cobertura no chão da moradia foram relacionadas com os resultados sorológicos
(Tabela 2), maior freqüência de soropositivos foi observada entre indivíduos que moravam em casas
sem banheiro ou com chão sem cobertura, o que nos permite sugerir que estes fatores devem
favorecer o contato humano com ovos de Toxocara sp naquela população.
Embora a amostra populacional estudada não permita definir a prevalência da toxocaríase
para a população rural de Pindamonhangaba, os resultados apontam para a provável relevância
desta zoonose nesse ambiente. Os fatores sócio-ambientais levantados com o auxílio de
questionário podem caracterizar a qualidade de vida dos indivíduos dessa comunidade (Tabela 3).
As condições de saneamento podem ser consideradas precárias em função de alguns itens: 75% da
população utilizam água de poço para consumo, sendo que 67% dos indivíduos não têm nenhum
tipo de cuidado com a água ingerida; não existe rede de esgoto no bairro e 88% dos indivíduos
desprezam seus dejetos em fossa rudimentar. Esse tipo de fossa não é recomendado pela
Organização Mundial de Saúde, pois não separa os detritos sólidos dos líquidos, podendo
contaminar o solo e o lençol freático. Um pouco mais que a metade da população (51%) tem coleta
pública de lixo, o restante queima (43%) ou simplesmente joga seus resíduos em terreno baldio
(4%), o que acaba gerando outros problemas, como a presença de animais veiculadores de doença,
Fórum Internacional do Meio Ambiente - A conferência da Terra 1298

entre eles moscas e baratas. Segundo Alderete (2003), a baixa renda familiar, associada a condições
sanitárias inadequadas, constitui forte empecilho para a saúde da população, auxiliando na
transmissão de toxocaráse e outras doenças.

Tabela 2 - Freqüência (%) de soropositivos ao T.canis (ELISA+) entre os indivíduos residentes no


bairro da Colméia, Pindamonhangaba, em função de algumas características da moradia.
FAMÍLIA (N=76) INDIVÍDUOS (N=253)
DETALHES DA MORADIA ELISA + ELISA +
Total Total
Nº* (%) Nº (%)

Sim 69 13 (18,8%) 229 55 (24,0%)


Presença de banheiro
Não 07 01 (14,2%) 24 12 (50,0%)

Sim 69 13 (18,8%) 227 54 (23,8%)


Chão da casa com cobertura
Não 07 01 (14,2%) 26 13 (50,0%)
* Número de famílias com pelo menos um indivíduo soropositivo

O perfil da população rural estudada difere bastante dos estudos realizados em áreas
urbanas, onde os focos de contaminação geralmente são áreas de lazer como praças, parques, praias,
caixas de areia. Já na comunidade estudada, apesar de não terem sido analisadas as amostras de
solo, acredita-se que toda a região percorrida oferece condições para o desenvolvimento dessa
antropozoonose, visto que a presença de cães é bastante expressiva e o solo arenoso pode oferecer
condições para o embrionamento desses ovos.
Os dados obtidos neste estudo fornecem indicações quanto ao risco de exposição ao
Toxocara canis dessa população rural de Pindamonhangaba, sugerindo a necessidade de adoção de
medidas profiláticas como tratamento dos animais e melhoria nas condições sociais e sanitárias.
Fórum Internacional do Meio Ambiente - A conferência da Terra 1299

Tabela 3 - Caracterização sócio-ambiental da população rural do bairro da Colméia,


Pindamonhangaba.

ITEM TIPO %
Nº FAMÍLIAS (N=76)
Poço 57 75,0

Água de consumo Bica/Mina 08 10,5

Rio 07 9,2

Nenhum 51 67,1
Cuidados c/ água
Filtrada 25 32,8
SANEAMENTO

Fossa Rudimentar 67 88,1

Rio 06 7,8
Esgoto
Solo 02 2,6

Fossa Séptica 01 1,3

Coleta Pública 39 51,3

Queimado 33 43,4
Destino do Lixo
Jogado em terreno baldio 03 3,9

Enterrado 01 1,3

< 1 SM 11 14,4
RENDA FAMILIAR

1 - 1,5 SM 44 57,8
Salário Mínimo (SM)
2 - 2,5 SM 13 17,1

> 3 SM 8 10,5

REFERENCIAS BIBLIOGRÁFICAS
ALDERETE, JMS et al. Prevalence of Toxocara infection in schoolchildren from the the Butantã
region, São Paulo, Brazil. Memórias do Instituto Oswaldo Cruz, v. 98, n. 5, p. 593-597, 2003.
COELHO, LMPS et al. Toxocara spp eggs in public squares of Sorocaba, São Paulo state, Brazil.
Revista do Instituto de Medicina Tropical de São Paulo, São Paulo, v.43, n.4, p.189-191, 2001.
FAN, CK et al Seroepidemiology of Toxocara canis infection among mountais aboriginal adults in
Taiwan. The American Society of Tropical Medicine and Hygiene, v.71, n.2, p. 216-221, 2004.
Fórum Internacional do Meio Ambiente - A conferência da Terra 1300

GENNARI, SM et al. Freqüência de ocorrência de parasitos intestinais em amostras de fezes de


cães e gatos da cidade de São Paulo. Veterinary News, London, v. 52, p. 1012, 2001
LOGAR, J et al Seroprevalence of Toxocara antibodies among patients suspected of ocular
toxocariais in Slovenia. The Korean Journal os Parasitology, v. 42, n. 3, p. 137-140, 2004.
MIZGAJSKA, H. Eggs of Toxocara spp in the environmental and their public health implications.
Journal of Helmintology, London, v. 75, p. 147-151, 2001
MURADIAN, V. et al. Epidemiological aspects of visceral larva migrans in children living at São
Remo Community, São Paulo (SP), Brazil. Veterinary Parasitology, Amsterdan, v. 134, p.93-97,
2005
NEVES, D. P.; MELO, A. L.; GENARO, O.; LINARDI, P. M. Parasitologia Humana. 10ª ed., São
Paulo: Editora Atheneu, 2003.
REY, L. Bases da Parasitologia Médica. 2ª ed., Rio de Janeiro: Guanabara Koogan, 2001.
SAMANTA SK; GHORUI, SK. Prevalence of Toxocara canis indogs in anda round Bareilly (UP).
The Indian Journal of Animal Sciences, New Delli, v. 37, p.53-54, 1998.
YBANEZ, MRR et al. Prevalence and viability of eggs of Toxocara spp and Toxocara leonine in
public parks in eastern Spain. Journal of Helminthology, London, v. 75, p. 169-173, 2001.
Fórum Internacional do Meio Ambiente - A conferência da Terra 1301

À MARGEM DA GLOBALIZAÇÃO: TRABALHO INFANTIL NO “LIXÃO” DE


CAMPINA GRANDE, PB – UMA TRISTE REALIDADE

Suellen Silva Pereira,


Mestranda em Desenvolvimento e Meio Ambiente – PRODEMA/UEPB. Graduada em Geografia pela Universidade
Estadual da Paraíba – UEPB. E-mail: suellenssp@hotmail.com
Josandra Araújo Barreto de Melo,
Doutoranda em Recursos Naturais – UFGC. Mestre em Desenvolvimento e Meio Ambiente – PRODEMA/UEPB.
Graduada em Geografia pela Universidade Estadual da Paraíba – UEPB. E-mail: jossandra.barreto@gmail.com
Ronildo Alcântara Pereira,
Mestrando do Programa de Pós-Graduação em Recursos Naturais - UFCG. Graduado em Geografia pela Universidade
Estadual da Paraíba – UEPB. E-mail: ronalcantara@gmail.com

RESUMO
A presença de crianças nos “lixões” municipais surge, principalmente, devido ao aumento
da exclusão social, evidenciada pelo capitalismo e pela globalização, que torna o mercado de
trabalho cada vez mais concorrido e qualificado provocando, com isso, o aumento do desemprego e
da pobreza, bem como pela falta e políticas públicas que assegurem a essas pessoas um mínimo de
dignidade para sobreviver. Aliado a esse problema, os resíduos sólidos (outro grave problema,
também agravado pelo capitalismo e pela globalização) surgem como uma alternativa para geração
de emprego e renda para uma parcela da sociedade que, sem alternativas, recorre aos “lixões” para
dele retirar sua subsistência. O mais preocupante é que a inserção de crianças nessa atividade está
cada vez mais crescente. O município de Campina Grande, PB enfrenta este mesmo problema, que
é comum nos grandes e pequenos centros do país. Dessa forma, este trabalho tem por objetivo
ressaltar a questão da desigualdade social, aliada a crescente produção de resíduos e a presença de
crianças nos “lixões”. Para realização do mesmo, procedeu-se visitas a repartições públicas
municipais, bem como ao ambiente de trabalho dessas crianças – “lixão” municipal, além do
registro visual. Conclui-se que cabe ao poder público municipal tomar iniciativas para a retirada
dessas crianças de um ambiente insalubre e impróprio para o desenvolvimento das mesmas,
assegurando condições de sobrevivência para que estas crianças não mais precisem retornar aos
“lixões”.
Palavras-chave: Exclusão social, resíduos sólidos urbanos, trabalho infantil.

ABSTRACT
The presence of children in "lixões" municipal surge, mainly due to increased social
exclusion, evidenced by capitalism and globalization, making the labour market more competitive
and qualified provoking, with this, the increase in unemployment and poverty and the lack in public
policies that ensure these people a minimum of dignity to survive. Allied to this problem, the solid
waste (another serious problem, also aggravated by capitalism and globalization) emerge as an
alternative for generation of employment and income for a portion of society that without
alternatives, it draws on the "lixões" for him withdraw his subsistence. The most worrying is that
the insertion of children in this activity is increasingly growing. The council of Campina Grande,
CR faces the same problem, which is common in large and small centres of the country. Thus, this
work aims to highlight the issue of social inequality, combined with increased production of waste
and the presence of children in "lixões". To achieve the same, made up visits to local government
allocations, and the working environment of these children – “lixão” municipal, in addition to the
visual record. It is concluded that it is up to the municipal public power take initiatives for the
withdrawal of these children an environment unhealthy and unfit for the development of the same,
ensuring conditions for survival for these children no longer need to return to "lixões."
Keywords: Social exclusion, municipal solid waste, child labour.

INTRODUÇÃO
Diante da grave crise social que assola o Brasil, um dos países de maiores desigualdades
do Planeta, observa-se, cada vez mais, a inserção de crianças e adolescentes no mercado informal e
Fórum Internacional do Meio Ambiente - A conferência da Terra 1302

em subempregos como forma de complementar a renda familiar. Um dos exemplos mais atuais é a
presença de crianças vivendo no e do lixo, abdicando do estudo e do lazer para catar materiais
recicláveis encontrados, em sua maioria, nos “lixões”.
Tal realidade não é diferente na cidade de Campina Grande, PB, onde cerca de 40
(quarenta) crianças ocupam o lixão municipal, sobrevivendo do e no lixo, numa situação de extrema
pobreza. Muitas abandonaram a escola para exercer a atividade de “catação”, outras, desempenham
ambas as atividades, ora são crianças e ora trabalhadores.
Diante desse quadro, este trabalho tem como objetivo analisar a emergência de mais uma
categoria de trabalho informal como produto da exclusão ocasionada pelo processo de globalização
da economia; compreender a grave crise social que assola o Brasil, refletindo-se na ampliação do
trabalho informal, sobretudo, em condições subumanas; analisar a produção do espaço no “Lixão”
de Campina Grande, PB, avaliando a contribuição da atividade de “catação” sobre a sócioeconomia
da comunidade local, elencando os problemas diários enfrentados pela população que reside ou
sobrevive da supracitada atividade, além, de ressaltar a presença de crianças no interior do “lixão”
municipal.
Além da consulta a literatura, para realização deste trabalho, foram realizadas visitas a
repartições públicas municipais; aplicação de questionários com 20 (vinte) catadoras de materiais
recicláveis, escolhidas aleatoriamente, com o objetivo de levantar o porquê do grande número de
crianças no “lixão” municipal; além do registro visual, este feito no local de “trabalho” dessas
crianças para, assim, evidenciar a problemática em questão e a necessidade de políticas públicas
com inclusão social para esta população.

Exclusão social e aumento do trabalho informal: a atividade de “catação” de recicláveis


Por ser o Brasil um dos campeões de má distribuição de renda do mundo, a questão do
desemprego ganha mais ênfase, pois se percebe que poucos encontram oportunidades de
sobrevivência “digna” e de exercerem seus direitos de cidadãos. A introdução na atividade de
“catação” acaba sendo o único meio de sobrevivência para milhares de famílias. De acordo com
Calderoni (2003), as perspectivas dos catadores de rua e dos carrinheiros são limitadas pela situação
de clandestinidade ou de semiclandestinidade em que eles se encontram, constituindo-se sua
atividade em uma alternativa à marginalidade.
Devido à grande concorrência vivenciada no mercado de trabalho, conforme ressaltado por
Santos (2006, p. 46) quando afirma que: “há, a todo custo que vencer o outro, esmagando-o, para
tomar o seu lugar”, o mercado exige cada vez mais qualificação dos trabalhadores, o que acirra a
competitividade e quem não consegue vencer esta “batalha” termina por ficar de fora do mercado
de trabalho formal. Para Santos (2006, p. 48) esta concorrência e busca constante por status social,
onde o valor econômico é maior que o valor humano, a compaixão e solidariedade faz aumentar a
desigualdade social do País, conforme explicitado a seguir:
Essa nova lei do valor – que é uma lei ideológica do valor – é uma filha dileta da
competitividade e acaba por ser responsável também pelo abandono da noção e do fato da
solidariedade. Daí as fragmentações resultantes. Daí a ampliação do desemprego. Daí o abandono
da educação. Daí o desapreço a saúde como um bem individual e social inalienável. Daí todas as
novas formas perversas de sociabilidade que já existem ou se estão preparando neste país, para fazer
dele – inda mais – um país fragmentado, cujas diversas parcelas, de modo a assegurar sua
sobrevivência imediata, serão jogadas umas as outras e convidadas a uma batalha sem quartel.
Muitas dessas pessoas nunca tiveram oportunidade de se aperfeiçoar, tendo apenas uma
escolha: ou estudam para se qualificar e ingressar no concorrido mercado de trabalho ou trabalham
para garantir o sustento de sua família, não é muito difícil saber qual é a escolha da maioria dessas
pessoas. Fato que pode ser justificado por Conceição (2005, p.17) ao afirmar que:
A exclusão social em que se encontram bilhões de seres humanos, provocada pelo
próprio sistema capitalista, concentrador e criador de uma reserva de mão-de-obra com o
objetivo de controlar salários, têm levado à formação de um exercito de pessoas que
trabalham e vivem do lixo urbano no mundo todo.
Fórum Internacional do Meio Ambiente - A conferência da Terra 1303

Como forma de contornar toda esta problemática, o trabalho informal surge como
alternativa de sobrevivência. Com isso, essas pessoas tentam retomar suas vidas de uma forma mais
digna, mesmo que este trabalho, na maioria das vezes, seja de forma desumana, a exemplo dos
catadores de material reciclável, que retiram seu sustento dos resíduos despejados nas centenas de
“lixões” espalhados pelo Brasil, ou nas ruas das cidades. De acordo com Santos S. (2002, p. 375):
A estas pessoas é atribuindo o status mais baixo entre os pobres urbanos e
economicamente são os mais pobres entre os pobres. Muitos destes coletores e lixo são mulheres e
crianças. Eles vagam pelas ruas a pé, procurando lixo, que colocam dentro de sacos que
transportam. Deixam suas casas ao amanhecer, andando vários quilômetros todos os dias,
completando ao fim da tarde. Seus instrumentos de trabalho são um saco para coleta e uma vara
para espetar e remexer o lixo. No trabalho, correm vários riscos: ficam com cortes e ferimentos
produzidos por objetos cortantes e pedaços de vidros ou contraem, no lixo, alergias de pele
causadas por lixo químico. Depois de terminada a coleta do dia, os coletores separam os materiais,
vendidos aos comerciantes. O que recebem como pagamento pela coleta é muito pouco, vivendo
estas pessoas no limite da pobreza.
Dessa forma, os “lixões” surgem como único meio de sobrevivência, onde separam os
recicláveis e encontram seu alimento. São miseráveis, semi-analfabetos e, embora marginalizados,
não são marginais. São pessoas que trabalham em condições extremamente adversas, num ambiente
de alto risco.
O que é mais preocupante é que, cada vez mais, se percebe a inserção de crianças e
adolescentes no exercício desta atividade, que é bastante sacrificante, inclusive para os adultos.
Cabe ao poder público fiscalizar os “lixões” existentes em seus municípios para, dessa forma,
garantir que o mínimo de crianças possível esteja exercendo tal atividade.

Crianças vivendo no e do lixo no Brasil


Segundo o UNICEF (2000), foi possível constatar que existiam cerca de 43.500 crianças
vivendo do e no lixo. Elas estavam presentes em 36% das cidades brasileiras, sendo que 60% desses
casos ocorreram nas cidades com população até 50.000 habitantes. Como se pode observar na
Figura 1.

36%
há crianças nos
lixões
não há crianças
nos lixões
64%

Figura 1 - Freqüência da presença de crianças nos lixões do Brasil. Fonte: UNICEF, 2000.

Os dados apresentados comprovam que, cada vez mais, crianças e adolescentes estão se
submetendo a trabalhos pesados (como a “catação” de materiais recicláveis nos “lixões” ou aterros),
deixando de lado seus estudos e seu lazer, para ajudar na complementação da renda familiar.
Muitas das crianças nascidas no lixão são filhas de pais que também nasceram ali. São
meninas e meninos, de diferentes idades. Desde os primeiros dias de vida, são expostos aos perigos
dos movimentos de caminhões e de máquinas, à poeira, ao fogo, aos objetos cortantes e
contaminados, aos alimentos podres. Ajudam seus pais a catar pesados fardos, a alimentar porcos.
Muitas dessas crianças estão desnutridas e doentes. Sofrem de pneumonia, doenças de pele,
diarréia, dengue, leptospirose, febre tifóide, etc. (ABREU, 2001).
Fórum Internacional do Meio Ambiente - A conferência da Terra 1304

Ainda de acordo com a referida autora, para essas crianças, o lixo é a sua “sala de aula”,
seu “parque de diversões”, sua “alimentação” e “fonte de renda”. Ganham de R$ 1.00 a R$ 6.00 por
dia, mas o trabalho que fazem é fundamental para aumentar a renda de suas famílias. Vivem em
condições de pobreza absoluta. Realizam um trabalho cruel. São crianças no lixo, uma situação
dramática e comum no Brasil.
As pesquisas demonstram que existem crianças e adolescentes em lixões de cerca de 3.500
municípios brasileiros. Quase metade dessas crianças, 49% estão na Região Nordeste, 18% na
Região Sudeste e 14% na Região Norte, a região Centro-Oeste é a que tem menos crianças em
lixões, com 7% do total, seguida da Região Sul, com 12% (UNICEF, 2000).
Fazendo uma análise dos dados acima apresentados, pode-se concluir que na Região
Nordeste, por ser uma das Regiões que mais sofre com o problema do desemprego e da pobreza,
onde a desigualdade social impera, este problema é mais evidente, uma vez que apenas uma
pequena parcela da população é beneficiada com uma boa qualidade de vida.
Os resíduos recolhidos por estas crianças, muitas vezes, acaba tendo duplo valor: de troca
(venda propriamente ao sucateiro, a cooperativa ou atravessadores) e valor de uso, quando ela faz
do resíduo sua alimentação básica do dia:
Na tristeza do crepúsculo uma criança mistura-se ao lixeiro, onde o supermercado jogou o
que apodrecera. E a sombra pequenina agarra faminta algo para seu estômago vazio. Morde sem
apreciar o gosto já que está acostumada com o cheiro... Miséria criança-velha! Para ela é espada de
dois gumes: ou come ou morre ou morre porque comeu. Não. Não morre. Continua semiviva vive
semimorta. Os vermes não a matam, pois têm nela seu lixeiro vivo...! (Sem Fronteiras, nº 228,
04/1995 in LAGASPE, 1996 apud CONCEIÇÃO, 2005, p. 34)
O Fundo das Nações Unidas para a Infância – UNICEF, a partir da identificação, em
especial, de crianças e adolescentes brasileiras cuja substância deriva de trabalho nos inúmeros
“lixões” existentes em áreas urbanas do país, conforme observado anteriormente concebeu o
“Programa Nacional Lixo e Cidadania”, lançado com a Campanha “Criança no Lixo Nunca Mais”,
em junho de 1998, por um grupo constituído de 19 instituições. Entre suas metas destacam-se
(INFORMATIVO DO FORUN LIXO E CIDADANIA, 2000):
A erradicação do trabalho de crianças e adolescentes que sobrevivem como catadores de
lixo em lixões e nas ruas, inserindo essas crianças na escola e em atividades sócio educativas
complementares;
A melhoria da situação socioeconômica das famílias que sobrevivem da reciclagem de
resíduos sólidos, apoiando e fortalecendo o seu trabalho em programas de coleta seletiva,
reutilização e reciclagem de resíduos;
A redução do impacto ambiental produzido pelos lixões e aterros inadequados, erradicando
os lixões, recuperando as áreas já degradadas e implantando aterros sanitários;
A construção de conhecimento sobre o tema no intuito de subsidiar a formulação de
políticas públicas.
O trabalho de crianças e adolescentes em “lixões”, apesar de até o momento não ter
despertado maior interesse da sociedade, é bastante alarmante. É inadmissível que, em pleno século
XXI, ainda existam crianças e adolescentes se alimentando de lixo, como o fato ocorrido no lixão
de Aguazinha, em Olinda, em 1994, onde várias crianças foram hospitalizadas com intoxicação
alimentar. Suspeitou-se que haviam ingerido carne humana do lixo hospitalar que era depositado no
lixão municipal, juntamente com os demais resíduos coletados na cidade, tudo isso, por não
possuírem o mínimo necessário para a obtenção de uma vida saudável, onde possam realmente
viver como crianças que são, sem que exista a necessidade de se expor a um ambiente tão
desumano, para ajudarem na renda familiar e, assim, sobreviverem.
De acordo com MONTEIRO (2001), “em qualquer hipótese, não deve ser permitida a
presença de crianças na área do aterro e lixões, devendo o poder público criar, para elas, programas
de permanência integral em escolas ou centros de esportes e lazer, além de um sistema de
compensação de renda aos pais pela não participação dos seus filhos no trabalho infantil”. Para que
assim, não mais ocorram exemplos como o de Aguazinha/PE.
Fórum Internacional do Meio Ambiente - A conferência da Terra 1305

Instrumentos legais em defesa de crianças e adolescentes: não ao trabalho infantil


As crianças e os adolescentes têm seus direitos reservados em declarações e leis, estas
tanto de âmbito mundial como local, sempre ressaltando o direito a educação, moradia, alimentação
saudável e uma boa qualidade de vida. Neste sentido, a Declaração e Programa de Ação de Viena
(1993) apuld Dias & Salgado (1999), reitera o princípio da “Criança Antes de Tudo”, enfatizando o
dever de respeito aos direitos de proteção, desenvolvimento e participação.

DECLARAÇÃO E PROGRAMA DE AÇÃO DE VIENA (1993):


II – 4. Dos Direitos da criança
45. A Conferencia Mundial sobre Direitos Humanos reitera o principio “Criança Antes de
Tudo” e, nesse particular, enfatiza a importância de se intensificar os esforços nacionais e
internacionais, principalmente no âmbito do Fundo das Nações Unidas para a Infância, para
promover o respeito aos direitos da criança à sobrevivência, proteção, desenvolvimento e
participação.
48. A Conferencia Mundial sobre Direitos Humanos insta todos os Estados a abordarem,
com o apoio da cooperação internacional, o agudo problema das crianças que vivem em
circunstâncias particularmente difíceis. A exploração e o abuso de crianças devem ser ativamente
combatidos, atacando-se suas causas. Deve-se tomar medidas eficazes contra o infanticídio
feminino, o emprego de crianças em trabalhos perigosos, a venda de crianças e de órgão, a
prostituição infantil, a pornografia infantil e outras formas de abuso sexual.
No mesmo sentido, disposições constantes do Pacto Internacional dos Direitos
Econômicos, Sociais e Culturais (1966) e da Convenção sobre os Direitos da Criança (1989) apuld
Dias & Salgado (1999), estabelecem, respectivamente:

PACTO INTERNACIONAL DOS DIREITOS ECONÔMICOS, SOCIAIS E CULTURAIS (1966):


Art. 10 – Os Estados-partes no presente Pacto reconhecem que:
Deve-se adotar medidas especiais de proteção e assistência em prol de todas as crianças e
adolescentes, sem distinção alguma por motivo de filiação ou qualquer outra condição. Deve-se
proteger as crianças e adolescentes contra a exploração social e econômica. O emprego de crianças
e adolescentes, em trabalho que lhes seja nocivo à moral e à saúde, ou que lhes faça correr perigo de
vida, ou ainda que lhes venha prejudicar o desenvolvimento normal, será punido por lei. Os Estados
devem também estabelecer limites de idade, sob os quais fique proibido e punido por lei o emprego
assalariado na mão-de-obra infantil.
CONVENÇÃO SOBRE OS DIREITOS DA CRIANÇA (1989):
Art. 3º - 1. Em todas as medidas relativas às crianças, tomadas por instituições de bem
estar social publicas ou privadas, tribunais, autoridades administrativas ou órgãos legislativos, terão
consideração primordial os interesses superiores da criança.
Art. 24º - 1. Os Estados-partes reconhecem o direito da criança de gozar do melhor padrão
possível de saúde e dos serviços destinados ao tratamento das doenças e à recuperação da saúde. Os
Estados-partes envidarão esforços no sentido de assegurar que nenhuma criança se veja privada de
seu direito de usufruir desses serviços sanitários.
Em nível nacional, a Constituição Federal (BRASIL, 1988) acolhe tais princípios e deixa
clara a preocupação e obrigação dos órgãos estatais em reduzir as desigualdades e priorizar a
infância, procurando soluções para problemas sociais, como este do trabalho de crianças e
adolescentes nos “lixões”.
Art. 3º - Constituem objetivos fundamentais da República Federativa do Brasil:
Art. 227 - É dever da família, da sociedade e do Estado assegurar à criança e ao
adolescente, com absoluta prioridade, o direito à vida, à saúde, à alimentação, à educação, ao lazer,
à profissionalização, à cultura, à dignidade, ao respeito, à liberdade e à convivência familiar e
comunitária, além de colocá-los a salvo de toda forma de negligencia, discriminação, exploração,
crueldade e opressão.
Fórum Internacional do Meio Ambiente - A conferência da Terra 1306

O Estatuto da Criança e do Adolescente é a principal Lei existente no Brasil, quando o


assunto é a criança e o adolescente, conforme o Artigo 3º descrito a seguir, sendo o mesmo tema,
abordado em diversas outras leis, como se observou anteriormente, inclusive no Código Penal que,
em alguns casos, estabelece punição para as pessoas que atentarem contra a criança.
Art. 3º - as crianças e os adolescentes gozam de todos os direitos fundamentais inerentes à
pessoa humana, sem prejuízos da proteção integral de que trata esta Lei, assegurando-lhes, por lei
outros meios, todas as oportunidades e facilidades, a fim de lhes facultar o desenvolvimento físico,
mental, moral, espiritual e social, em condições de liberdade e de dignidade (DIAS e SALGADO,
1999).
Como se observa, a proteção à infância é uma prioridade mundial, existindo vários
instrumentos legais internacionais e nacionais regulamentando o assunto. Contudo, estes
instrumentos parecem não ser tão eficazes na proteção da infância existindo, ainda, em todo o
Planeta, vários casos de violação desses direitos.

A REALIDADE DAS CRIANÇAS DO “LIXÃO” DE CAMPINA GRANDE/PB.


Resíduos Sólidos no Município e o Ambiente do “Lixão”
Segundo a Secretaria de Obras e Serviços Urbanos do município - SOSUR, a quantidade
de resíduos coletados todos os dias no município é de, aproximadamente, 400 toneladas, deste total,
mais da metade é de lixo hospitalar, limpeza de cemitérios e coletas especiais. Estima-se que algo
entre 35 a 45% desses resíduos são materiais não degradáveis que ocupam grandes espaços e que
poderiam ser reaproveitados. Todavia, apenas um pouco mais de 1% é catado e encaminhado para a
reciclagem. Vale salientar que desse total, devido à precariedade das condições de catação, cerca de
30% é rejeito e volta para o lixo.
Como o município de Campina Grande, PB, não dispõe de aterro sanitário, que seria a
forma mais adequada para a destinação dos resíduos gerados na cidade, nem de outras formas de
acondicionamento para estes resíduos, os mesmos são dispostos a céu aberto, no “Lixão”. Neste
local, não existe nenhum tipo de controle prévio do que é descarregado, não havendo nenhuma
preocupação no tocante à saúde pública, em principal, para com a população que termina se
instalando no interior do próprio “lixão”. Essas pessoas todos os dias se misturam aos destroços em
busca de alimentos para o seu sustento ou material reaproveitável com fins de revenda e, dessa
forma, garantir alguma renda para a família. Conforme observado na Figura 2.

Figura 2: Caminhão coletor descarregando os resíduos no ambiente do “lixão”. Fonte: Pesquisa


Direta

A área do “lixão” municipal foi ocupada desde 1996, à primeira ação impactante foi à
erradicação da cobertura vegetal, provocando a degradação da paisagem natural, redução da
produtividade, desvalorização econômica da área, tudo isso provocando danos à saúde humana e,
conseqüentemente, à qualidade de vida da população. (LEITE et al, 2003).
Devido às más condições encontradas no lixão, é bastante comum encontrar pessoas com
problemas respiratórios por causa da exposição diária ao sol e a chuva, bem como a poeira, o que
em alguns casos, devido à falta de cuidados com a sua saúde (isto é justificado pelo fato de que os
Fórum Internacional do Meio Ambiente - A conferência da Terra 1307

mesmos dependem do seu trabalho diário para a sua sobrevivência, ou seja, um dia de trabalho
perdido, implica numa diminuição do orçamento que já é bastante sacrificado) acaba por
transformar-se em pneumonia. Também podem ser encontrados casos de catadores com problemas
de pele, vermes e até germes de cachorro, todos decorrentes do contado direto e diário com o lixo,
apesar de muitos quando entrevistados ficarem constrangidos em afirmar tais mazelas.

As Crianças do “Lixão”
Em Campina Grande/PB, cerca de 40153 crianças trabalham com a catação de materiais
recicláveis no lixão municipal, estando expostas a precárias condições de “trabalho”, convivendo
diariamente com os despejos lá descarregados, de baixo de sol e chuva, como forma de ajudarem na
renda familiar, que já é tão comprometida, uma vez que esta depende do tipo e quantidade de
material que é separado para posterior venda.
Um fator que contribui para a inserção de crianças nesta atividade insalubre é a constatação
que, das mulheres que foram entrevistas no ambiente do “lixão”, a maioria ou são mães separadas
(dez) ou mães solteiras (oito). Desse total, constatou-se que dezessete possuem filhos ou filhas
desenvolvendo a atividade de catação de material reciclável, o que pode ser verificado na Figura 3.

Figura 3: Crianças trabalhando na instalação do Lixão Municipal de Campina Grande/PB. Fonte:


Pesquisa Direta.

Estas crianças, em sua maioria, encontram-se matriculados nas escolas, e recebem o


benefício do PETI – Programa de Erradicação do Trabalho Infantil que, atualmente, corresponde ao
valor de R$ 40,00 (quarenta reais) por criança. De acordo com a SEMAS – Secretaria de
Assistência Social do Município, existe uma fiscalização por parte da prefeitura, para observar se
estas crianças estão retornando ou não para o trabalho de catação de materiais recicláveis no “lixão”
municipal. Mas, o que se observa é que, não existe nenhuma fiscalização na prática, ou esta não é
realizada de modo eficiente pelo poder público municipal, (tendo em vista que é bastante comum a
presença de crianças dentro do lixão, fato que acaba por atrair um número cada vez maior de
crianças, já que a fiscalização é precária), para verificar se de fato estas crianças estão realmente
fora do lixo, dedicando o seu tempo ao estudo, ao lazer, a obtenção de uma vida mais saudável e
com menos responsabilidades. Afinal, elas são apenas crianças.

CONSIDERAÇÕES FINAIS
Diante do exposto, este trabalho reafirma a necessidade de implementação de novas
políticas públicas de inclusão social para as milhares de pessoas que vivem numa situação de
extrema pobreza, devido à má distribuição de renda e ao processo cada vez mais excludente que se

153
Este valor refere-se às crianças que vivem da atividade de catação no interior do lixão municipal, este valor foi
fornecido durante entrevista realizada com a presidente da Cooperativa dos Trabalhadores de Material Reciclável –
COTRAMARE, do município em estudo. Este número pode aumenta se forem levadas em consideração as crianças que
desenvolvem a supracitada atividade nas ruas da cidade.
Fórum Internacional do Meio Ambiente - A conferência da Terra 1308

vivencia atualmente que é a globalização, que força uma grande parcela da população a buscar
alternativas para sobrevivência, mesmo que estas sejam totalmente insalubres, conforme a realidade
em pauta.
O fato de maior preocupação é que, juntamente com estes homens e mulheres, estão
também seus filhos e filhas, os mesmos são levados a exercerem esta atividade como forma de
complementação da renda familiar, já bastante castigada pelo sistema econômico vigente.
Dessa forma, se faz necessária a urgente intervenção do poder público local, para retirar
essas crianças do ambiente que elas se encontram, proporcionando condições para que as mesmas
não mais precisem exercer a atividade de “catação”, oferecendo assim, melhores condições e vida
para elas e suas famílias. O lugar dessas crianças é na escola, desenvolvendo suas habilidades, se
dedicando ao lazer, sendo felizes. Portanto, cabe ao poder público municipal fazer cumprir o que
diversas Leis determinam: “não ao trabalho infantil.”.

REFERÊNCIAS BIBLIOGRAFICAS
ABREU, M.F. Do Lixo à Cidadania: estratégias para a ação. Brasília: Caixa Econômica Federal e
UNICEF, 2001.
BRASIL, CONSTITUIÇÃO (1988). Constituição da República Federativa do Brasil, 20 ed.
Brasília/DF. Câmara dos Deputados, Coordenação de Publicações, 2003. Art. 3º e Art. 227º.
CALDERONI, S. Os Bilhões Pedidos no Lixo. 4 ed. São Paulo: Humanitas editora/FFLCH/USP,
2003.
CONCEIÇÃO, M.M. Os empresários do Lixo: um paradoxo da modernidade: analise
interdisciplinar das cooperativas de reciclagem de lixo. Campinas, SP: Editora Átomo, 2005.
DIAS, J.A. & SALGADO, M.G. Manual do Procurador Público. Programa Lixo e Cidadania:
criança no lixo nunca mais. Procuradoria geral da República. 4ª Câmara de Coordenação e Revisão.
Brasília, 1999.
INFORMATIVO DO FORUN NACIONAL LIXO E CIDADANIA – “criança no lixo nunca mais”.
Uma campanha com resultados. CAMPOS, H. K. T. (org.). Brasília, 2000.
LEITE, V.D, et al. Estudo Sócio-Ambiental do Lixão da Cidade de Campina Grande, PB. In: Anais
do XXI Congresso Brasileiro de Engenharia Sanitária. Joinville, 2003.
MONTEIRO, J.H.P, et al. Manual de Gerenciamento Integrado de Resíduos Sólidos. Rio de
Janeiro: IBAM, 2001.
SANTOS, B.S, et al. Produzir para Viver: os caminhos da produção não capitalista. Rio de Janeiro:
Civilização Brasileira, 2002.
SANTOS, M. Por uma outra Globalização: do pensamento único à consciência universal. 13 ed. Rio
de Janeiro: Record, 2006.
UNICEF - FORUM NACIONAL LIXO E CIDADANIA. Campanha: “Criança no lixo, Nunca
Mais”. Julho de 2000. Disponível em: <http://www.lixoecidadania.org.br >. Acesso em: 25 de
maio de 2005.
Fórum Internacional do Meio Ambiente - A conferência da Terra 1309

RESÍDUOS URBANOS EM PATOS-PB: IMPACTOS AMBIENTAIS, POLÍTICAS


PÚBLICAS E REPRESENTAÇÕES SOCIAIS

Sônia Correia Assis da Nóbrega


Professora Dra da Universidade Federal de Campina Grande (UFCG), Centro de Saúde e Tecnologia Rural (CSTR) –
Unidade Acadêmica de Medicina Veterinária - Endereço UFCG: Universidade Federal de Campina Grande - Centro de
Saúde e Tecnologia Rural / Unidade Acadêmica de Medicina Veterinária UAMV) - Campus de Patos – PB - Cx.P.: 64 -
58.700-970 - Patos- Paraíba- Brasil - e-mail: soniacorreianobrega@bol.com.br

RESUMO
Neste estudo foram analisados os impactos ambientais decorrentes da geração, coleta,
transporte e disposição final dos resíduos sólidos urbanos gerados no município de Patos-PB e as
representações sociais sobre a temática. Buscou-se identificar também as medidas minimizadoras e
potencializadoras que podem substituir a atual prática de deposição desses resíduos em terreno a
céu aberto. Utilizaram-se o Método de Rede de Interação para relacionar os impactos; o Check-list,
para propor as medidas minimizadoras e potencializadoras; e a análise de conteúdo, para identificar
as representações sociais que a população possui sobre lixo e meio ambiente. Foram entrevistados
representantes das associações de moradores de três bairros localizados nas regiões sul, leste e oeste
do município, dez moradores do bairro localizado na região norte, que não possuía associação de
moradores, o secretário de serviços públicos de Patos, o representante de uma organização
comunitária e os catadores do lixão. Os resultados mostram que, do ponto de vista socioambiental, a
prática da deposição dos resíduos a céu aberto é absolutamente condenável, denotando a
necessidade de se estabelecerem novas formas de disposição e tratamento desses resíduos. Embora
a população pesquisada tenha uma visão naturalista quando se trata da relação sociedade/natureza,
verificou-se a existência de potencialidade para processos de mobilização por melhoria da qualidade
de vida por parte dela. Torna-se importante a execução de um projeto de gestão pública do meio
ambiente no qual estejam contidas, além de procedimentos relacionados ao uso dos recursos
naturais, estratégias voltadas para a educação ambiental formal e informal, pode-se concluir que o
município apresenta potencialidades para a execução de projetos sustentáveis de desenvolvimento,
capazes, além de minimizarem os impactos socioambientais decorrentes da prática da deposição dos
resíduos urbanos a céu aberto, de promover uma melhor qualidade de vida, principalmente para a
população mais diretamente afetada pelos impactos ambientais das atividades produtivas existentes
no município.
Palavras-Chave: resíduos urbanos; impactos ambientais; representações sociais.

ABSTRACT
This study analyzed the environmental impacts caused by the production, collection,
transport and final disposal of urban solid wastes of the municipality of Patos-PB, Brazil and the
social representatives of this topic, as well as to search for measures of minimizing and potentiality
actions which could replace the present practice of waste disposal in open lands. The interaction net
method was used to relate the impacts, a check-list to suggest minimizing and potentiality measures,
and the content analysis to identify the social representatives that the population is aware of
regarding wastes and environment. Representatives of three community associations located in the
South, East and West regions of the municipality, ten residents of the Northern district that did not
have a community association, the town public service secretary, the representative of a
communitary organization and the garbage gatherers were interviewed. The results show that from a
social and environmental point of view, the open land waste disposal is absolutely unfit, showing
urgent need of establishing new ways of disposal and treatment of these residuals. Although the
population interviewed has a naturalistic vision in the case of the society/nature relation topic, a
potentiality for mobilization processes regarding a life quality improvement for themselves was
verified. It is important to prepare a public project of environmental management which includes,
besides actions related to the use of natural resources, strategies towards the formal and informal
environmental education. The municipality shows potentialities for the accomplishment of
Fórum Internacional do Meio Ambiente - A conferência da Terra 1310

sustainable development projects capable of promoting better life quality mainly for that portion of
population more directly affected by the environmental impacts of the productive activities existent
in the municipality. In addition they minimize the social and environmental impacts caused by the
urban open land disposal waste.
Keys works: Urban solid; environmental impacts; social representatives.

INTRODUÇÃO
A degradação ecológica impulsionou o debate sobre a relação entre crescimento
econômico e bem-estar dos seres humanos, levando atores sociais organizados – especialmente os
ambientalistas, organizações governamentais ou não, outros movimentos sociais – a repensarem a
insustentabilidade do modelo de desenvolvimento e sobre a desigualdade social na distribuição dos
custos ambientais por ele gerado.
Surge como desafio para o mundo contemporâneo a transformação dos princípios éticos e
econômicos de desenvolvimento. A educação, nesse novo contexto de reorganização social, tem
papel fundamental na formação da consciência ambiental, na construção de uma sociedade
sustentável, democrática, participativa e socialmente justa, capaz de exercer uma mudança básica na
maneira de pensarmos sobre nós mesmos, nos valores e nas crenças que orientam nossas ações e
nossos pensamentos.
A crise generalizada do mundo atual coloca a necessidade de modelos alternativos de
práticas educativas que favoreçam a formação de cidadãos participativos no processo de construção
de novos paradigmas capazes de apontar soluções para os problemas identificados.
As respostas a esses problemas surgirão a partir da reflexão da problemática ambiental
como conseqüência da história e da cultura da humanidade e da nossa formação social, econômica e
política.
Dentre esses problemas, a deposição inadequada de resíduos sólidos nos centros urbanos
tem motivado os mais diversos setores sociais a envidar esforços no sentido de apresentar
alternativas capazes de, se não resolver definitivamente, ao menos dar um tratamento adequado à
questão, de modo que envolva segmentos sociais interessados em avaliar os impactos ambientais
provenientes de tais práticas, assim como as ações necessárias ao enfrentamento dessa
problemática.
Nesse sentido, este trabalho é resultado de um estudo sobre os impactos ambientais
decorrentes da geração, coleta, transporte e disposição final dos resíduos urbanos em Patos-PB.

OBJETIVOS
Conhecer os mecanismos utilizados pela administração municipal para a gestão do lixo.
Apontar as maiores dificuldades para a gestão ambiental do município.
Identificar as ações ambientais que ocorrem na coleta convencional do lixo urbano.
Identificar e caracterizar os impactos ambientais do lixo em positivo e negativo.
Analisar as relações entre os impactos ambientais provenientes do lixo e a potencialidade
de processos de mobilização popular por melhoria da qualidade de vida.
Sistematizar alternativas apontadas tanto na perspectiva técnica quanto nas sugestões de
medidas para a resolução da problemática do lixo.
Sistematizar as medidas ambientais visando a minimização da problemática do lixo, assim
como identificar os atores responsáveis por sua execução.

MATERIAL E MÉTODOS
A orientação metodológica desta pesquisa coadunou-se com os princípios da pesquisa
qualitativa, justificada pela natureza do objeto de estudo ora analisado. Tratar a questão dos
impactos ambientais dos resíduos sólidos relacionando-a com a potencialidade de processos de
mobilização popular por melhoria de vida é uma proposta que visou contribuir para um
conhecimento da realidade de forma mais unitária e integral.
Fórum Internacional do Meio Ambiente - A conferência da Terra 1311

Os procedimentos metodológicos utilizados neste estudo estão direcionados à avaliação


dos impactos ambientais da geração, coleta, transporte e disposição final dos resíduos. Para isso,
utilizou-se o Método de Redes de Interação, com vistas a identificar os impactos ambientais. Os
dados foram coletados no período de setembro a dezembro de 2003.

O método da rede de interação


A Rede de Interação utilizada foi do tipo fluxograma, tendo sido construída com base nas
atividades impactantes da coleta, transporte e disposição do lixo, bem como no emprego de três
níveis de identificação de impactos. O número de impactos encontrados em cada nível foi variável,
e a caracterização qualitativa dos impactos identificados foi feita considerando especificamente o
critério de valor, ou seja, se os impactos foram positivos (+) ou negativos (-).

Descrição da área de estudo


O município de Patos-PB está situado no sertão paraibano, possuindo uma área de 512,7
2
km e uma população média de 91.761 habitantes (IBGE-2000). É caracteristicamente urbano, uma
vez que 87.949 pessoas residem na zona urbana e 3.812 na zona rural. Está situado nas coordenadas
geográficas de 7o 01’28” latitude sul e 37o 16’ 23” longitude oeste.
Patos apresenta uma densidade demográfica de 169,13 hab/km2. Está localizado numa área
considerada privilegiada do ponto de vista geográfico, ligando o Litoral Paraibano ao Alto Sertão e
Vale do Piancó, limitando-se com vários municípios do Sertão e próximo às divisas do Estado da
Paraíba com os Estados de Pernambuco e Rio Grande do Norte. O clima é quente e seco, do tipo
semi-árido, e a temperatura anual varia em torno de 28,01 oC.
Os setores produtivos mais representativos do município estão ligados ao comércio e à
indústria, estando 85% de sua base econômica voltada para o setor comercial e 15% para a indústria
(MELO, 2001:45).
Em relação à infra-estrutura, existem sérios problemas relacionados ao saneamento básico
(esgotos, resíduos sólidos). De acordo com a Companhia de Águas e Esgotos da Paraíba –
CAGEPA (1999), cerca de 92,8% da população não é atendida por serviços de esgotamento
sanitário, levando-a a lançar os dejetos in natura em corpos d’água ou diretamente sobre o solo.
Os indicadores sociais do município apontam a necessidade de melhoria dos serviços de
saúde e de educação, principalmente. Isso se deve ao fato de que a esperança de vida gira em torno
de 63,5 anos, a taxa de alfabetização de adultos é de 75,1%, e a taxa bruta de freqüência escolar
varia em torno de 80,3% (IBGE, 2000). Considerando que a renda per capita do município é de R$
160,20, fica evidenciada a estreita relação entre baixa escolaridade e renda.
O ponto de partida para a elaboração de um programa local de desenvolvimento
sustentável seria o conhecimento da referida realidade, por meio de um amplo banco de dados, onde
constassem informações capazes de refletir as condições socioeconômicas e ambientais da
população local e, a partir destas, uma proposta de gestão municipal fosse elaborada com vistas ao
enfrentamento de problemas que impedem a melhoria de vida da sociedade local.154

Os resíduos urbanos em Patos


A prefeitura de Patos, através da secretaria de serviços públicos155, é responsável pela
coleta, pelo transporte e pela disposição final dos resíduos sólidos do município. A coleta nos
bairros é feita três dias por semana. Diariamente são realizadas a varrição das ruas e a coleta de
resíduos no centro da cidade.

2
O IBGE (2002) fornece, através da publicação dos Indicadores de Desenvolvimento Sustentável, subsídios para a
elaboração de políticas de desenvolvimento através de instrumentos de mensuração que servirão para “guiar a ação e
subsidiar o acompanhamento e a avaliação de progresso alcançado rumo ao desenvolvimento sustentável” (p.10).
155
Após a reforma administrativa realizada pela atual administração, a coordenação do serviço de coleta de lixo ficou
sob a responsabilidade da recém criada Secretaria de Infra-estrutura e Serviços Urbanos. Essa terceirizou o serviço de
coleta e segundo fonte ligada à prefeitura a empresa prestadora de serviço contratou os garis e regularizou a situação
trabalhista de todos, o que significou um expressivo ganho salarial para estes.
Fórum Internacional do Meio Ambiente - A conferência da Terra 1312

À época da realização da pesquisa, cabia à secretaria de serviços públicos, além da coleta


do lixo residencial, comercial e industrial (os resíduos hospitalares são coletados pela vigilância
sanitária, vinculada à secretaria da saúde), manutenção da rede de iluminação pública; limpeza de
terrenos baldios, mercado, matadouro, cemitério, lavanderia; concessão de alvarás para táxi,
mototáxi, barracas para vendedores ambulantes; retirada de animais da rua; varredura e limpeza do
meio fio, limpeza do estádio municipal; manutenção das estradas municipais e liberação de
ambulância.
O sistema de coleta, transporte e destinação final dos resíduos urbanos ainda é realizado de
forma convencional. Os resíduos são transportados para um lixão a céu aberto, que fica a dois
quilômetros do aeroporto Firmino Ayres e a aproximadamente 12 km do centro da cidade. Para a
coleta são utilizados cinco caminhões compactadores, três caçambas basculantes e um veículo baú
(onde é transportado o lixo hospitalar)156.
A indiferença com as questões relacionadas à coleta seletiva e ao acondicionamento
adequado dos resíduos está relacionada à ausência de um programa de gerenciamento local,
associado à inexistência de projetos de educação ambiental na comunidade. Além disso, outros
problemas de ordem econômica e social (desemprego, falta de saneamento básico, habitação)
existentes no município canalizam as reivindicações da população local para a resolução destes,
minimizando, temporariamente, a preocupação com a disposição do lixo urbano do município.
Quanto ao transporte dos resíduos, verificou-se que ele não é realizado de forma
satisfatória, uma vez que, além de a frota de veículos ser defasada e sucateada, os resíduos são
lançados no interior dos caminhões sem qualquer seleção prévia dos materiais, tanto por parte da
população como dos garis responsáveis pela coleta (à exceção de latas de alumínio).
Em relação à disposição final, percebe-se que, do ponto de vista socioambiental, é
totalmente inadequado e sem qualquer planejamento técnico, advindo seja por parte da secretaria de
serviços públicos ou da secretaria de meio ambiente157. Os resíduos coletados nas residências são
lançados na área destinada para tal fim sem que haja um acompanhamento técnico para evidenciar
os possíveis impactos dessa prática para o ambiente local.

RESULTADOS E DISCUSSÃO
Com intuito de facilitar a visualização dos impactos ambientais provenientes da disposição
dos resíduos em terreno a céu aberto, serão apresentadas medidas ambientais minimizadoras ou
potencializadoras e, em seguida, o(s) responsável (eis) pela referida ação.

Principais impactos ambientais na etapa de geração dos resíduos


Depreciação da qualidade do ar, decorrente da produção de chorume. Medidas
minimizadoras: acondicionar adequadamente os recipientes nos quais estão os resíduos; centralizar
os resíduos nos locais de descarga no lixão, limpando as áreas que não estão sendo utilizadas.
Responsável: todas as fontes geradoras e prefeitura.
Impacto visual. Medidas minimizadoras: instalar em todas as ruas contêineres devidamente
identificados por cores, para que a população possa dispor adequadamente os resíduos; realizar
campanhas educativas. Responsável: prefeitura.
Perda econômica decorrente da contaminação dos materiais potencialmente recicláveis.
Medida minimizadora: realizar a coleta seletiva dos resíduos. Responsável: todas as fontes
geradoras.
Diminuição da proliferação de insetos e roedores nas residências. Medida potencializadora:
fazer campanhas na comunidade sobre a importância do acondicionamento adequado dos resíduos.
Responsável: prefeitura.

156
Segundo o secretário de serviços públicos, o número insuficiente de veículos apropriados para a coleta e transporte
do lixo compromete a eficiência do trabalho, considerando que alguns terrenos ficam durante semanas e até meses com
uma enorme quantidade de lixo advindo tanto de residências como de construções e de granjas.
157
Até dezembro de 2003, a secretaria de meio ambiente só existia de direito. De fato, não exerce qualquer influência
sobre as ações da prefeitura, uma vez que nem o secretário nem os funcionários cumprem expediente.
Fórum Internacional do Meio Ambiente - A conferência da Terra 1313

Alteração na capacidade de adsorção do solo, em decorrência do chorume produzido.


Medida minimizadora: implantar usina de compostagem de matéria orgânica. Responsável:
prefeitura.
Contaminação do lençol freático por metais pesados encontrados no chorume e percolados
através do solo. Medidas minimizadoras: fazer a drenagem superficial das áreas do entorno do
lixão, para diminuir a contribuição das águas da chuva, na produção do chorume; construir drenos
para coleta do chorume; fazer o tratamento do chorume; instalar locais para o descarte de produtos
como baterias e pilhas. Responsável: prefeitura.

Principais impactos ambientais na etapa de coleta dos resíduos


Redução do número de pedintes no município quando da contratação de mão-de-obra.
Medidas potencializadoras: realizar a efetivação dos atuais prestadores de serviço de acordo com o
que prevê a legislação trabalhista em vigor; capacitar os funcionários que executam o serviço de
coleta. Responsável: prefeitura.
Diminuição das migrações para os grandes centros urbanos. Medidas potencializadoras:
ampliar o número de contratações de acordo com a demanda exigida pela expansão urbana local;
recrutar mão-de-obra que resida nas áreas de expansão; garantir as condições adequadas para a
realização do serviço de coleta, como assistência médica e utilização de EPIs. Responsável:
prefeitura.
Aumento do risco de acidentes de trânsito entre os varredores, decorrente do serviço de
varrição e limpeza das vias públicas. Medida minimizadora: efetuar o serviço em horários de menor
fluxo de pedestres e veículos. Responsável: prefeitura.
Melhoria da qualidade paisagística pelo serviço de varrição e limpeza das vias públicas.
Medidas potencializadoras: intensificar o serviço de varrição e limpeza das vias públicas; fazer
campanhas educativas na comunidade sobre a importância de se acondicionar o lixo em local
adequado. Responsável: prefeitura.
Diminuição da presença de macro e microvetores em virtude da limpeza dos terrenos
baldios. Medidas potencializadoras: promover campanhas educativas na comunidade e nas escolas,
para que as pessoas não joguem lixo nos terrenos; elaborar normas que disponham sobre a prática
de disposição dos resíduos em terreno baldio. Responsável: prefeitura.
Possibilidade de acidentes de trabalho com garis, pelo manuseio de ferramentas utilizadas
na limpeza dos terrenos. Medidas minimizadoras: treinar os funcionários que executam o serviço de
limpeza dos terrenos; exigir uso de EPI por parte dos funcionários. Responsável: prefeitura.
Melhoria das condições sanitárias do mercado quando da sua varrição e limpeza. Medida
potencializadora: oferecer melhores condições de trabalho para os varredores, como equipamentos
de proteção individual e ferramentas adequadas para o melhor rendimento do trabalho.
Responsável: prefeitura.

Principais impactos ambientais na etapa de transporte dos resíduos


Depreciação temporária da qualidade do ar, pela emissão de gases, odores fétidos e
partículas sólidas gerados pela decomposição dos resíduos provenientes das fontes geradoras
dispostos nos caminhões. Medidas minimizadoras: efetuar limpeza dos caminhões após a última
coleta do dia; incentivar a população a acondicionar adequadamente os resíduos. Responsável:
prefeitura.
Redução da capacidade de percolação da água, por efeito da compactação do solo
ocasionada pelo tráfego intenso de caminhões na área de acesso ao lixão. Medidas minimizadoras:
providenciar a construção de acesso alternativo à área de descarga, de tal forma que o tráfego seja
dividido; pavimentar as vias de acesso ao lixão. Responsável: prefeitura.
Redução da fauna local da área do lixão, causada pelo ruído dos caminhões e/ou pela
presença humana. Medidas minimizadoras: colocar limites de velocidade nas vias de acesso ao
lixão; preservar áreas do município capazes de acolher os animais de modo que possam se
reproduzir nesses locais. Responsável: prefeitura.
Fórum Internacional do Meio Ambiente - A conferência da Terra 1314

Redução da quantidade de resíduos dispostos no lixão pelo transporte dos materiais para os
postos de recebimento. Medida potencializadora: estabelecer acordo com os sucateiros no sentido
de retirarem os materiais diariamente, para evitar o seu acúmulo na área do lixão. Responsável:
prefeitura e sucateiros.

Principais impactos ambientais na etapa de disposição final dos resíduos


Capitalização temporária dos proprietários rurais que venderam suas terras. Medidas
potencializadoras: Incentivar os agricultores a adquirirem novas propriedades, preferencialmente
em áreas devolutas do município; isentar os agricultores de imposto territorial rural (IPTR) durante
cinco anos em caso de compra de nova propriedade; orientar os proprietários a investirem os
recursos adquiridos com a venda da propriedade em outros ramos da atividade econômica.
Responsável: prefeitura.
Desestruturação fundiária em decorrência da venda das terras. Medida minimizadora:
priorizar a doação de terras desapropriadas no município para os agricultores que venderam as suas.
Responsável: prefeitura.
Afugentamento da fauna terrestre por ruídos ou pela presença humana em decorrência do
desmatamento da área. Medidas minimizadoras: priorizar a implantação desse tipo de infra-
estrutura em locais já alterados antropicamente; implantar um programa de
recolhimento de germoplasma vegetal nas áreas onde se dará a erradicação a fim de utilizar
esse material em ações de revegetação. Responsável: prefeitura.
Aparecimento de focos de erosão pelo revolvimento e/ou compactação do solo em
decorrência do talhonamento da área. Medida minimizadora: desenvolver sistemas de rodízio em
mosaicos, para disposição dos resíduos. Responsável: prefeitura.
Artificialização da paisagem pelo talhonamento da área. Medidas minimizadoras: desativar
parte da área para recuperação ambiental por meio de plantio de espécies da região; implantar
sistema de rodízio para evitar o desgaste maior do solo. Responsável: prefeitura.
Redução espacial do habitat silvestre em decorrência do talhonamento da área. Medidas
minimizadoras: monitorar as condições que a área em torno do lixão apresenta para garantir a
sobrevivência das espécies faunísticas; revegetar áreas próximas ao lixão com espécies da região.
Responsável: prefeitura.
Depreciação da qualidade do ar, devido à suspensão de partículas sólidas e gases
resultantes tanto dos resíduos como da combustão dos motores dos veículos, decorrente do
lançamento dos resíduos urbanos em terreno a céu aberto. Medida minimizadora: realizar coleta
seletiva dos materiais na fonte de origem. Responsável: prefeitura.
Alteração da qualidade potável das águas superficiais e subterrâneas em decorrência da
lixiviação do chorume pelas águas da chuva. Medida minimizadora: suspender a colocação dos
resíduos diretamente sobre o solo. Responsável: prefeitura.
Redução da microbiota do solo decorrente da sua contaminação por resíduos de
detergentes, tintas, solventes, óleos, etc., presentes nas embalagens descartadas e dispostos
inadequadamente. Medida minimizadora: encaminhar todos os resíduos coletados para um centro de
triagem. Responsável: prefeitura.
Redução da fauna da área do lixão, pelo afugentamento causado pelo ruído e movimento
de caminhões e pela presença humana. Medida minimizadora: Instalar uma usina de reciclagem de
resíduos. Responsável: prefeitura.
Danos à saúde da população residente nas proximidades do lixão, decorrentes da presença
de vetores transmissores de doenças. Medidas minimizadoras: extinguir a prática de deposição final
dos resíduos urbanos do município de Patos em terreno a céu aberto; fazer campanhas na
comunidade para efetuar a coleta seletiva dos resíduos; instalar usina de reciclagem de resíduos.
Responsável: prefeitura.
Danos à saúde dos catadores, pela realização da coleta de materiais sem a utilização de
equipamentos de proteção individual (EPIs). Medida minimizadora: fundar uma cooperativa de
catadores; oferecer aos catadores cursos sobre utilização de equipamentos, formas de
Fórum Internacional do Meio Ambiente - A conferência da Terra 1315

organização de acordo com a atividade que exercem, entre outros; doar EPIs para os catadores;
fiscalizar se os catadores estão usando os EPIs. Responsável: prefeitura.
Danos à microflora e macroflora do solo, quando da exposição a altas temperaturas.
Medidas minimizadoras: adotar a prática da coleta seletiva no município; instalar um centro de
triagem de materiais; estabelecer normas para o uso do fogo; instalar incinerador na área do lixão.
Responsáveis: prefeitura e câmara de vereadores.
Danos ao banco de propágulos vegetais do solo e à microflora e macroflora do solo,
quando da exposição a altas temperaturas. Medidas minimizadoras: adotar a prática da coleta
seletiva no município; instalar um centro de triagem de materiais; estabelecer normas para o uso do
fogo; instalar incinerador na área do lixão. Responsáveis: prefeitura e câmara de vereadores.

CONSIDERAÇÕES FINAIS
Durante toda a composição deste trabalho, ficou evidente que tanto a administração
municipal como a população de modo geral têm se confrontado com o problema causado pela
geração, coleta, transporte e destinação final dos resíduos urbanos. No entanto, as ações voltadas
para a minimização dessa problemática ainda são bastante tímidas e desarticuladas de um projeto
local de desenvolvimento. A ausência de uma atuação política que gere as transformações
individuais e coletivas necessárias para uma melhor relação sociedade/natureza tem aprofundado o
quadro de miséria e a falta de acesso aos bens materiais que permitem objetivamente uma vida
digna.
A prática da disposição dos resíduos urbanos em terreno a céu aberto em Patos-PB é
absolutamente condenável do ponto de vista socioambiental, necessitando de uma discussão com os
diversos segmentos sociais a respeito de formas alternativas para a questão. As maiores dificuldades
encontradas para uma gestão mais adequada dos resíduos no município situam-se entre dois pólos: a
ausência de uma política municipal de gestão ambiental, especificamente de gestão dos resíduos
urbanos, e o comodismo da população em resolver
coletivamente os principais problemas que a afetam. Além disso, os atores sociais
envolvidos na pesquisa apresentam dificuldade em relacionar os seus problemas com questões mais
gerais de ordem social, econômica, política e ambiental que afetam o município e o planeta.
Uma das formas viáveis de saída do atual impasse sobre gestão ambiental no município,
que vise a operacionalização de propostas inovadoras de gestão pública, é a gestão participativa, na
qual a prefeitura convocaria os diversos atores sociais para lançarem sugestões e, a partir
destas, se elaboraria um plano de gestão democrático e capaz de coadunar os vários segmentos.
A participação, além de contribuir para fortalecer os laços comunitários de solidariedade e
incrementar o poder técnico e político das comunidades nos processos decisórios, implica,
necessariamente, em um trabalho que atravessa diversas formas de conhecimentos, especializados e
leigos, e que envolve a participação das comunidades locais na definição das variáveis,
instrumentos e coleta de dados quantitativos e qualitativos para a investigação e avaliação dos
problemas ambientais, de modo a refletir a realidade das suas formas de vida e suas experiências
(FREITAS, 2004:152-153).
A contribuição de pessoas comprometidas com a causa da justiça ambiental é fundamental
nesse processo, conforme aponta Gould (2004:78):
Os que professam a causa da justiça ambiental podem trabalhar para fortalecer as
comunidades mais vulneráveis, como um ponto de partida através do qual alavancar a degradação
ambiental, empurrando-a para os segmentos superiores do sistema de estratificação, movendo-as
dos menos responsáveis pelo dano ecológico em direção aos mais responsáveis pela degradação
ecológica. Isso implica que a tarefa política começa nas comunidades mais pobres, onde a
desigualdade econômica é maior. O processo de construção do poder (empowerment) deve começar
na base e fazer seu caminho para cima, em direção aos detentores do poder.
Assim, a consideração por parte dos atores sociais – de que os problemas enfrentados pela
comunidade do município têm vinculação estreita com a ausência de um projeto local de
Fórum Internacional do Meio Ambiente - A conferência da Terra 1316

desenvolvimento sustentável – poderia desencadear uma série de ações voltadas para a melhoria das
relações homem/natureza, contribuindo para um meio ambiente ecologicamente sustentável.
Os resultados deste estudo demonstram que há uma inquietação local sobre a problemática
dos resíduos urbanos. Mesmo que os interesses pela temática tenham causas diferentes e até
antagônicas, como no caso dos catadores (condições de trabalho) e de moradores de bairros de
classe média (impacto visual), percebe-se que há uma vontade geral de resolução deste problema.
Por isso, embora seja difícil, em curto prazo, a adoção de práticas de coleta de resíduos comungadas
com as recomendações técnicas, o primeiro passo está dado: as pessoas demonstram interesse e
vontade de ter uma cidade mais limpa, com aspecto visual agradável, sem resíduos nas ruas e
terrenos baldios, sem animais soltos pelas ruas, etc.
A educação, passa a ter um papel relevante nessa perspectiva, pois será também através
dela que a comunidade irá despertar para a importância da conservação e preservação dos recursos
naturais associada à melhoria da qualidade de vida urbana.

REFERÊNCIAS BIBLIOGRÁFICAS
BARDIN, L. Análise de conteúdo. Lisboa: Edições 70, 1977. 226p.
FREITAS, C. M de. Ciência para a sustentabilidade e a justiça ambiental. In: ACSERALD, H.;
HERCULANO, S.; PÁDUA, J. A. (orgs). Justiça ambiental e cidadania. Rio de janeiro: Relume
Dumará, p. 141-157, 2004.
GOULD, K.A. Classe social, justiça ambiental e conflito político. In: ACSERALD, H.;
HERCULANO, S.; PÁDUA, J. A. (orgs). Justiça ambiental e cidadania. Rio de janeiro: Relume
Dumará, p. 69-80, 2004.
LEFF, E. Epistemologia Ambiental. São Paulo: Cortez, 2001a. 240 p.
MELO, A.C. Uma abordagem sócio-ambiental dos resíduos urbanos da cidade de Patos –
Paraíba. 2001. 133f. Dissertação (Mestrado) – Universidade Federal de Pernambuco, Pernambuco,
2001.
STROH, P. Y. As ciências sociais na interdisciplinaridade do planejamento ambiental para o
desenvolvimento sustentável. In: CAVALCANTI, C (org.). Desenvolvimento e natureza: Estudos
para uma sociedade sustentável. São Paulo: Cortez; Recife, Fundação Joaquim Nabuco, 2003. p.
276-292.
Fórum Internacional do Meio Ambiente - A conferência da Terra 1317

FUNGOS FITOPATOGÊNICOS EM CULTURA DE Passiflora alata, CURTIS EM NOVA


FLORESTA – PB

José Jacinto Silva Santos


1.jacinto.bio19@yahoo.com.br
Edeltrudes de Oliveira Lima
Profª. Drª. CCS/UFPB

RESUMO
O estudo da microbiota fúngica em vegetal é de grande significado e importância, pois
numerosos fungos isolados de vegetais são responsáveis por patologias que afetam o
desenvolvimento do vegetal, atacando desde a raiz, área folear e frutos comprometendo a qualidade
do produto final e como conseqüência prejuízos econômicos. A incidência de fungos está
condicionado a fatores geográficos, ambientais e a condições metereológicas. O presente trabalho
trata de uma pesquisa sobre fungos fitopatogênicos a partir da cultura vegetal de (Passiflora alata,
Curtis), no município de Nova Floresta/PB. A necessidade de usar a cultura dessa espécie vegetal
como fonte de pesquisa é devido a sua presença na atividade econômica no município Nova
Floresta-PB. O objetivo trabalho foi fazer um levantamento e identificação dos gêneros de fungos
de maior freqüência na cultura da P. alata. Para identificação das espécies fúngicas foi utilizando o
preparo de lâminas para a microscopia e cultivo em ágar Sabourand dextrose,(Difco).Os ensaios
foram incubados a temperatura ambiente (28º - 30º C) durante 7 – 14 dias. Posteriormente as
espécies fúngicas isoladas foram contabilizadas e identificadas pela macromorfologia e
micromorfologia. Foi observado em maior prevalência dos fungos não esporulados e Penicillium na
cultura do P.Alata em todos os ambientes estudados.
Palavras – Chave: Passiflora. alata, Fungos Fitopatogênicos.

ABSTRACT
The study of the fungal microbiota in vegetable is of great significance and importance,
because numerous isolated fungi in vegetables are responsible for pathologies which affect the
development of the vegetable, attacking from the root, the foliar area to the fruit, compromising the
quality of the final product and, as a consequence, bringing economic losses. The incidence of fungi
is conditioned to geographical and environmental factors as well as meteorological conditions. The
present work deals with a piece of research on phytopathogenic fungi, taking into account the
vegetable culture of Passiflora alata, Curtis in the municipal district of Nova Floresta, in the state
of Paraíba. The need to use the culture of that vegetable species as a source of research is due to its
presence in the economic activity in that district. The aim of this work was to do a survey and
identify the kinds of fungi which occur most frequently in the culture of Passiflora alata. To
identify the fungal species, it was used the preparation of sheets for the microscopy and cultivation
in Sabourand dextrose agar. The experiments were incubated at room temperature 28o C – 30o C for
7 – 14 days. Later the isolated fungal species were counted and identified according to their
macromorphology and micromorphology. It was observed that a greater amount of non-sporulated
fungi prevail in the culture of Passiflora alata in all the environments studied.
Keywords: Passiflora alata. Phytopathogenic Fungi

INTRODUÇÃO
A maioria dos fungos é constituída de espécies saprófitas que desempenham a importante
função de decomposição da biosfera, degradando produtos orgânicos e desenvolvendo carbono,
nitrogênio e outros componentes ao solo, tornando assim disponíveis as plantas. Outros fungos
apresentam importância econômica para o homem por serem destruidores de alimentos estocados e
de outros materiais. (RAVEN.H.P; et al. 2007).
Os fungos fítopatogênicos passam parte de seu ciclo de vida nas plantas que lhe servem de
hospedeiro, e outra parte no solo ou em restos vegetais depositados sobre este substrato. A
sobrevivência e a atividade da maioria dos fungos fitopatogênicos dependem das condições
Fórum Internacional do Meio Ambiente - A conferência da Terra 1318

predominantes de temperatura e umidade, ou da presença de água em seu meio ambiente.


(MENEZES, 1993).
Passiflora alata é originário da América Tropical, com mais de 150 espécies, sendo uma
planta de clima tropical e sub-tropical. Apesar de produzir frutos ainda pouco disponíveis para
venda e que atingem preços relativamente altos no mercado, constitui cultura rentável que vem
crescendo nos últimos anos (VACONCELOS, et al, 2001). No entanto, são necessárias pesquisas
em todas as áreas, inclusive com relação a fungos que atacam esta cultura.
Os fungos que causam doenças em plantas constituem um grupo diversificado e abundante,
(SILVEIRA, 1968). Como Fusarium moniliforme, Cepholosporim sp, Aspergillus spp e Penicillium
spp que são os principais fungos que infestam as sementes podem até inibir o desenvolvimento de
raízes das plântulas. (PINTO.N.F.J.A.; 2000)
Deste modo o presente trabalho visa isolar, identificar a microbiota fúngica de P. alata
Curtis (Maracujazeiro doce), uma vez que a economia do município está voltada à agricultura e a
fruticultura, destacando-se o cultivo de P. alata como principal fonte de renda da zona rural. Bem
como avaliar a freqüência fúngica no material estudado (caule, folha, fruto).

METODOLOGIA
Coleta do material
O material vegetal caule, folha e fruto foram coletados da espécie P. alata cultivado no
município de Nova Floresta-PB, sítio estrondo. Foram selecionadas 15 plantas de quatro ambientes
sendo cinco amostras de folha, cinco de fruto e cinco de caule. As amostras foram coletadas de
ambientes quadrantes , Norte, Sul, Leste, Oeste. Cada um quadrante medindo 100m2 contendo 40
pés de P. alata.
A coleta foi realizada fazendo-se a raspagem do caule e do fruto e a folha por completo. As
amostras foram acondicionadas em sacos plásticos e etiquetadas, perfazendo um total de 15
amostras por ambiente, totalizando 60 amostras.

Exame presuntivo microscópio


Foram utilizados os postulados de Koch, onde foi iniciado o processo de identificação,
presuntivamente, do microrganismo causador da parasitose. Foram preparados esfregaços ou cortes
do material colocado sobre a lâmina. Em seguida foram classificados com hidróxido de potássio
(KOH) a 20%. (LACAZ; et al, 1991) (SIDRIN; MORIERA; 1999).
A inoculação do material botânico no meio de cultura foi realizada em placas de Petri (90x
15 mm/disco-Petri) contendo 20 mL de ágar dextrose (DIFCO). (NUNES; LOPES; 2004).
A incubação foi desenvolvida a temperatura ambiente (28 – 30º C) durante 7 a 14 dias.
Decorrido o tempo de incubação adequado foi feito a quantificação de colônias crescidas com
características de fungos filamentosos, através da macromorfologia e micromorfologia pela técnica
de microcultivo. REDDEL, 1950; LACAZ et al, 200, et al 2000; LARRONE, 1995; HOOG.
GUARRO, 1995) .

RESULTADOS E DISCURSSÕES
Os resultados obtidos no presente trabalho encontram-se registradas nas tabelas de 1,
2,3,4,5 e 6. Na análise dos resultados por ambientes sul, norte, leste e oeste ocorreu predominância
dos gêneros Penicillum, fungos não esporulados, A. niger, Aspergillus, Fusarium, Cladasporium,
Acremorium, Risopeus. Este resultado se deve provavelmente ao mecanismo de reprodução dos
fungos filamentosos, mais adaptados ao transporte de esporos pelo ar. Além do que, segundo
SIDRIM & MOREIRA(1999), o gênero Penicillium apresenta ampla distribuição na natureza,
podendo ser encontrado sobre todos os tipos de substratos. Assim é um gênero contaminante por via
aérea mais freqüente isolado em laboratório de micologia, podendo alcançar elevadas concentrações
de seus canídeos na atmosfera na dependência da região geográfica, PINHEIRO; Juliana (2003).
Fórum Internacional do Meio Ambiente - A conferência da Terra 1319

Tabela 1 – Freqüência de colônias isoladas do caule de P. alata dos ambientes Sul, Norte, Leste,
Oeste
Espécies Fúngicas
FNE Penicillium Fusarium Clodosporium Acremorium Aspergillus spp
Caule Número Número Número Número Número Número
de de de de de de
Colônias % Colônias % Colônias % Colônias % Colônias % Colônias %
Amb. Sul 9 81,81 2 16,66 1 8,33
Amb. Norte 10 71,43 1 7,14 1 7,14 2 14,28
Amb. Leste 13 76,47 3 17,65 1 5,88
Amb. Oeste 8 72,72 1 9,09 2 18,18
Total 40 5 4 2 1 2

Tabela 2 – Freqüência de colônias isoladas do fruto de P. alata dos ambientes Sul, Norte, Leste,
Oeste
Espécies Fúngicas
FNE Penicillium Aspergillus spp Rhizopus
Fruto Número Número Número Número
de de de de
Colônias % Colônias % Colônias % Colônias %
Amb. Sul 2 63,63 1 33,33
Amb. Norte 1 50,00 1 50,00
Amb. Leste
Amb. Oeste 1 100
Total 3 1 1 1

Tabela 3 – Freqüência de colônias isoladas da folha de P. alata dos ambientes Sul, Norte, Leste,
Oeste
Espécies Fúngicas
Folha FNE
Número de
Colônias %
Amb. Sul 2 100
Amb. Norte
Amb. Leste
Amb. Oeste
Total 2

Tabela 4 – Freqüência de colônias isoladas do caule de P. alata dos ambientes Sul, Norte, Leste,
Oeste para cada espécie fúngica encontrada.
Espécies Fúngicas
FNE Penicillium Fusarium Clodosporium Acremorium Aspergillus spp
Caule Número Número Número Número Número Número
de de de de de de
Colônias % Colônias % Colônias % Colônias % Colônias % Colônias %
Amb. Sul 9 22,5 2 100 1 100
Amb. Norte 10 25,0 1 20,0 1 25,0 2 100
Amb. Leste 13 32,5 3 60,0 1 25,0
Amb. Oeste 8 20,0 1 20,0 2 50,0
Total 40 5 4 2 1 2
Fórum Internacional do Meio Ambiente - A conferência da Terra 1320

Tabela 5 – Freqüência de colônias isoladas do caule de P. alata dos ambientes Sul, Norte, Leste,
Oeste para cada espécie fúngica encontrada.
Espécies Fúngicas
FNE Penicillium Aspergillus spp Rhizopus
Fruto Número Número Número Número
de de de de
Colônias % Colônias % Colônias % Colônias %
Amb. Sul 2 66,6 1 100
Amb. Norte 1 33,3 1 100
Amb. Leste
Amb. Oeste 1 100
Total 3 1 1 1

Tabela 6 – Freqüência de colônias isoladas do caule de P. alata dos ambientes Sul, Norte, Leste,
Oeste para cada espécie fúngica encontrada.
Espécies Fúngicas
FNE
Folha Número
de
Colônias %
Amb. Sul 2 100
Amb. Norte
Amb. Leste
Amb. Oeste
Total 2

CONCLUSÃO
Prevaleceu em maior quantidade o fungo não esporulado em todos os ambientes estudados;
Norte, Sul, Leste, Oeste, a parte do vegetal que prevalecia foi o caule, conforme os percentuais
abaixo:
• Amb. Sul 81,81%
• Amb. Norte 71,43%
• Amb. Leste 76,47%
• Amb. Oeste 72,72%

Qualitativamente e quantitativamente houve uma diferenciação entre os tipos de fungos


encontrados em relação as partes do vegetal analisado.
Dos fungos mais encontrados, destacam-se: Penicillium sp e Fusarium sp.
Os conjuntos de dados revelam que a parte do vegetal com o maior número de fungos é o
caule.

AGRADECIMENTOS
À UFPB/CCS e SBM.

REFERÊNCIAS BIBLIOGRAFICAS
LACAZ, C. S.; PORTO, G.; MARTINS, J.E.C. MICOLOGIA MÉDICA: Fungos, actominicetos e
algas de interesse médico, 8 ed. São Paulo: Savier, 1991.
NUNES, G.; S.F. LOPES, OLIVEIRA V., Microbiologia, manual de aulas práticas. Florianópolis,
UFSC. P. 155, 2007.
RAVEN, P. H.; EVERT, F. R.; EICHHORN. E. S. Biologia Vegetal. 7 ed. Rio de Janeiro.
Guanabara Koogan, 2007.
HOOG, G. S.; GUARRO, J. Atlas of clinical fungi. Central bereau voor schimmelcultures. Virgili:
Universitat Roviva, 1995.
Fórum Internacional do Meio Ambiente - A conferência da Terra 1321

HOMRICI, M.H . Observações sobre a ocorrência de esporos de fungos alergógenos no ar de Porto


Alegre e arredores. Revista Brasileira de Biologia. N. 21, p. 149-153, 1961.
SIDRIM, J. J.C.; MOREIRA, J.L.B. Fundamentos Clínicos e Laboratoriais da Micologia Médica.
Rio de Janeiro, Guanabara Koogan, 1999.
Fórum Internacional do Meio Ambiente - A conferência da Terra 1322

CATADORES DE RESÍDUOS SÓLIDOS: IMPORTÂNCIA DA ATIVIDADE LABORAL


NUM ASPECTO SOCIOAMBIENTAL

Inatiane Campos Lima Martins


Universidade Estadual de Santa Cruz – UESC, Ilhéus, Bahia, Mestranda em Desenvolvimento
Regional e Meio Ambiente, bolsista DAAD – Serviço Alemão de Intercâmbio Acadêmico;
inatiane.martins@gmail.com
Cristina Setenta Andrade
Universidade Estadual de Santa Cruz UESC, Ilhéus, Bahia, Professora Titular e Drª em Saúde
Pública; cristina70@uol.com.br

RESUMO
Este estudo pretende contribuir com a reflexão sobre o papel dos catadores de rua de
resíduos sólidos desprovidos de qualquer vínculo empregatício, mediante importância da sua função
no contexto conservação ambiental, já que participa de forma significativa do processo de
reciclagem e, as generalizações a respeito da sua função na sociedade. A reciclagem de materiais
usados vem se tornando uma prática cada vez mais comum. É evidente que a solução não está
simplesmente neste processo, mas sim numa reflexão crítica sobre os hábitos de consumo. Para o
conhecimento desta relação nas áreas de produção, ambiente e trabalho, é essencial a compreensão
do ambiente como resultado de processos ecológicos conduzidos pela sociedade, mediante a
aplicação das tecnologias e técnicas com as quais os humanos interagem com a natureza. Esses
ambientes configuram situações de risco para a saúde e a qualidade de vida dos catadores de rua.
Por se tratar de um assunto ainda pouco estudado na realidade regional, proporcionará o
conhecimento de aspectos condicionantes que venham fundamentar o desenvolvimento e
direcionamento de políticas públicas a estes trabalhadores.
Palavras Chave: Catadores de rua; reciclagem; resíduos sólidos

ABSTRACT
This study it intends to contribute with the reflection on the role the catchers of recycled
solid residues of the street unprovided of any employment bond, by means of importance of its
function in the context environmental conservation, since it participates of significant form of the
process of recycling and the generalizations regarding its function in the society. The recycling of
used materials comes if becoming practical one each more common time. It is evident that the
solution is not simply in this process, but yes in a critical reflection on the consumption habits. For
the knowledge of this relation in the production areas, environment and work, the understanding of
the environment as resulted of ecological processes lead by the society is essential, by means of the
application of the technologies and techniques with which the human beings interact with the
nature. These environments configure situations of risk for the health and the quality of life of the
catchers of recycled solid residues of the street. For if dealing with a subject still little studied in the
regional reality, it will provide the knowledge of condicionantes aspects that come to base the
development and aiming of public politics to these workers.
Words Key: Catadores of street; recycling; solid residues

INTRODUÇÃO
A intervenção do homem no meio natural, resultado das necessidades de abrigo, geração
de alimentos, produção de bens e serviços, comunicação, interação social, enfim, de todas as
questões inerentes à sociedade humana, tem transformado as condições ambientais e a própria
existência das pessoas. De um ritmo calmo com pouco poder de intervenção sobre o ambiente, a
sociedade passou, em menos de um século, para um modo de vida que espelha as mudanças de
perfil tecnológico, econômico e social.
Estas transformações trouxeram inúmeros benefícios à humanidade, mas também gerou
um processo de urbanização acentuado, resultado da forte atração das cidades sobre o meio rural, do
Fórum Internacional do Meio Ambiente - A conferência da Terra 1323

aumento da expectativa de vida e do próprio crescimento vegetativo. Assim, gerou problemas


relacionados à ocupação do espaço físico e à saúde das pessoas, interferindo diretamente nos
ecológicos.
Neste aspecto as cidades têm-se apresentado como o palco de inúmeros contrastes. A
grande concentração de massas edificadas e as altas densidades causam impactos na estabilidade do
ambiente, produzem espaços desqualificados e insalubres, propiciam exclusão e marginalidade. Da
mesma forma, proporcionou um crescimento da inclusão de um contingente de desempregados em
atividades informais como forma de garantir a sobrevivência, impondo um ritmo de vida, à maioria
dos seus ocupantes, incompatível com os conceitos estabelecidos como qualidade de vida.
Paralelo a isto, a grande quantidade de resíduos sólidos provenientes do consumismo
exarcebado são evidenciados pelo acúmulo de lixo em locais inapropriados. Resultado de uma ação
antrópica desprovida da consciência ambiental necessária para a conservação dos elementos
naturais, importantes para a manutenção da sobrevivência humana.
Neste cenário, o processo de reciclagem passa a ser um assunto relevante, tanto pela
contribuição que pode dar ao desempenho das empresas, na economia de custo, na aquisição de
matérias primas e insumos, quanto pelos resultados ambientais decorrentes da queda de produção
dos resíduos.
É neste contexto que se insere a atuação laboral dos catadores de rua de resíduos sólidos.
Caracterizado por um ambiente de coleta totalmente insalubre, favorece a vulnerabilidade a agravos
mediante os riscos ambientais a que estão expostos. Exercem sua atividade de forma primária,
munidos de pequenos veículos, muito deles de tração humana e animal recolhendo objetos como
latas, papéis, plásticos; por vezes perfuro-cortantes, para posteriormente serem vendidos a empresas
voltadas que tem como matéria-prima estes resíduos.
A origem dos catadores está em um processo com diversos matizes: de um lado, a
intensificação da produção de mercadorias, e conseqüente aumento de resíduos sólidos, e do outro,
processos migratórios em direção aos grandes centros urbanos.
A segregação de grande parte da população levou a atividade de catação a ser “uma prática
do cotidiano pela sobrevivência que o modelo econômico adotado no Brasil não possibilitou à
maioria das pessoas” (DIALÓGOS SUSTENTÁVEIS, 2006).
Bertrand (2006) mostrou como o trabalho isolado, individualista e precário destes
trabalhadores não tem possibilitado gerar ganhos suficientes a uma vida mais digna, pois além de
comporem a base da cadeia de produção (seguidos por inúmeros atravessadores e pela indústria de
reciclagem), há diversos problemas sociais como preconceito, discriminação, vulnerabilidade a
agravos, má condições laborais, dentre outros.
Torna-se imperativo contribuir com reflexões e discussões a cerca do papel desenvolvido
por pessoas que estão arreda do mercado formal de trabalho, conseqüência do sistema econômico
brasileiro que privilegia a minoria da população, deixando de fora segmentos populacionais que
desenvolvem atividades de relevância para as questões ambientais, a exemplo dos catadores de rua
de resíduos sólidos. O trabalho desenvolvido é desprovido de qualidade higiênico-sanitária
satisfatória, tornando-os expostos a possíveis agravos à saúde.
Esta susceptibilidade decorre de um comportamento rotineiro, não implicando que estejam
sendo levados a ter informações sobre as situações de risco existentes (físicos, químicos, biológicos,
mecânicos, ergonômicos e psicossociais), e as características especiais do ambiente que interferem
no padrão de saúde.
Ressalta-se uma das temáticas da Agenda 21, a relação laboral (segurança do trabalhador)
e meio ambiente, ratificando a necessidade de abordagens neste aspecto. Por outro lado, são poucos
os trabalhos realizados sobre este assunto na realidade local, o que estimula a busca por um
conhecimento mais especifico. Analisar esta atividade laboral torna-se indispensável o aporte da
questão ambiental, ou seja, da “categoria ambiente” em suas múltiplas dimensões para a
compreensão integralizada deste problema.

ABORDAGEM CONCEITUAL DE LIXO


Fórum Internacional do Meio Ambiente - A conferência da Terra 1324

De acordo com Contardi (1997), lixo são restos das atividades humanas, considerados
pelos geradores como inúteis. Na visão de Calderoni (1998) é todo material inútil, descartado, posto
em lugar público sendo tudo aquilo que se “joga fora”, cujo objeto ou a substância que se considera
inútil ou cuja existência em dado meio é tida como nociva.
O lixo, também chamado de rejeito, passa por um processo de exclusão: ele é “posto para
fora de casa”. Cumpri ritos de passagem, respeitando regras próprias. Numa situação de coleta
pública sistematizada, não pode ser deixado em qualquer lugar, devendo ser acondicionado, em
sacos e/ou latas, com horários estabelecidos para seu recolhimento.
Em outras situações a conceituação de lixo é equivalente à de resíduo. É nesse sentido a
definição dada ao termo resíduo pela Associação Brasileira de Normas Técnicas (ABNT), como
sendo todo “Material desprovido de utilidade pelo seu possuidor”. (NBR 12.960, 1993, p. 5).
Observando os conceitos apresentados por Contardi (1997), Calderoni (1998) e NBR
(1993), nota-se que lixo esta relacionado a materiais que não mais possuem utilidades,
desconsiderando a possibilidade de aplicação do princípio dos 3 R (Reduzir, Reciclar e Reutilizar).
Isto remete a reflexão dos atributos que esses resíduos têm, seja no aspecto econômico e/ou
ambiental. Quanto ao primeiro pode-se destacar a economia gerada pelo processo de
reaproveitamento dos materiais descartados, assim como a oportunidade dada a indivíduos que
estão à margem da sociedade que encontram no processo de reciclagem uma fonte de geração de
renda. A segunda refere-se à questão da conservação de recursos naturais uma vez que favorecerá a
minimização da extração de matéria-prima.

O LIXO COMO PROBLEMA SOCIOAMBIENTAL


A partir de uma idéia de crescimento e desenvolvimento da sociedade industrial (modo de
produção capitalista), começaram a surgir problemas ligados à degradação ambiental e humana,
resultando no enfrentamento de uma crise de identidade. Segundo Theis (1996, p.54) “o processo de
degradação ambiental foi amplamente acelerado com a Revolução Industrial e com a corrida pelo
desenvolvimento econômico”.
A Agenda 21(1996, p.433) alerta para o seguinte fato:
“Em meados do século XXI, mais de 2 bilhões de pessoas não terão acesso aos serviços
sanitários básicos e metade da população urbana dos países em desenvolvimento não
contarão com serviços adequados de depósito dos resíduos sólidos. Hoje, não menos de
5,2 milhões de pessoas, entre elas 4 milhões de crianças menores de 5 anos, morrem a
cada ano devido às enfermidades relacionadas com os resíduos.”

Até poucos séculos atrás, o lixo era constituído quase que exclusivamente de matéria
orgânica - talos de verduras, cascas de frutas, etc. Além disso, as concentrações humanas, como as
cidades, eram bem menores. Hoje, o mundo tem mais de seis bilhões de habitantes que geram
resíduos sólidos em quantidades colossais, e dos mais diversos tipos, seja pela necessidade, pelo
consumismo e praticidade do mundo contemporâneo.
A problemática dos resíduos sólidos urbanos está cada dia mais presente na vida da
população. Basta um dia sem coleta convencional para que se instale uma situação altamente
desagradável em termos visuais, em relação ao mau cheiro e também criando um meio propício a
proliferação de vetores e agentes etiológicos para diversas doenças infecciosas. Isto possibilita uma
idéia da dimensão do problema criado pelo homem e que atinge todo o planeta.
Este fato demanda a criação de soluções viáveis objetivando resolver ou minimizar os
problemas gerados pela acumulação do lixo, como também pela falta de opção no mercado formal
de trabalho. A principal alternativa que se apresenta é a reciclagem. Contudo, antes disto, abre-se
um espaço para a discussão acerca de reduzir e reutilizar.
Reduzir é necessário e é o primeiro passo. Mas, há de ser considerado o consumo
impulsivo em que uma parte tende a acabar no lixo. Tal nível de consumo precisa ser eliminado por
ser oneroso para a natureza. Portanto, nesta ótica, em não sendo possível reduzir, deve-se aplicar a
Fórum Internacional do Meio Ambiente - A conferência da Terra 1325

segunda regra, reutilizar. Finalmente, não havendo possibilidade de aplicação destes dois processos,
faz-se o último: reciclar.
Adota-se aqui a definição de reciclagem de Fialho (1996, p.22) que apresenta como sendo
“a reintrodução de produtos finais, subprodutos e resíduos em qualquer estágio do fluxo, que vai
desde o recurso material até o consumo final, em um novo ciclo de produção – consumo”. Nesta
concepção, incluem-se os fatores de ordem social, econômica e ambiental.
A reciclagem deve ser precedida por um sério programa de reavaliação dos
comportamentos de consumo, de maneira que a comunidade envolvida perceba cada vez mais
claramente o impacto de cada uma das suas escolhas individuais e também o impacto desses ao
ambiente. Baasch (1995, p.56), afirma ser a prevenção, hoje, colocada como prioritária e urgente. E
prevenir em lixo significa lidar com estilo de vida e educação". Neste cenário, Blauth (1998, p.175)
levanta uma importante questão:
“Afinal, o que é mais ‘ecológico’: reciclar o lixo ou evitar sua produção? O processo de
estímulo da reciclagem como solução para os males do consumismo contemporâneo,
quando desvinculado das noções de redução e de reutilização, pode servir para legitimar
o desperdício.”

É evidente que a solução não está na reciclagem pura e simplesmente, mais numa
reflexão crítica sobre os hábitos de consumo. Só se produz aquilo que tem um mercado consumidor,
mesmo sendo um produto supérfluo. Além do mais, há produtos que se apresentam com três ou
quatro embalagens diferentes, sendo que uma única já atenderia ao propósito.
Pode-se afirmar que o combate ao consumismo está de encontro aos próprios interesses do
capital. Este parece ser o grande desafio.

O CATADOR DE RUA: AGENTE ATIVO DO PROCESSO DE CONSERVAÇÃO


AMBIENTAL
Calderoni (1998, p.298) define o catador como “... o agente da reciclagem que retira os
materiais recicláveis diretamente dos lixões ou aterros, ou do lixo deposto nas calçadas, entregando-
os a carrinheiros ou a sucateiros”.
Conforme o Fundo das Nações Unidas para a Infância - UNICEF, a participação dos
catadores como agente da coleta seletiva é importantíssima para o abastecimento do mercado de
recicláveis bem como suporte para a indústria recicladora.
Estima-se que hoje, no Brasil, existam 200 mil catadores de rua autônomos ou associações
e cooperativas, responsáveis pela coleta seletiva de vários tipos de materiais. Muitos deles estavam
à margem da sociedade e ao ingressar no trabalho de catação passam por um processo de “resgate
de cidadania”, tendo um papel definido e importante na sociedade, bem como usufruem de uma
fonte regular de renda (ABREU, 2001).
A definição do seu papel socioambiental não conduz a afirmar a existência de um resgate
de cidadania. No sentido etimológico da palavra, cidadão deriva da palavra civita, que em latim
significa cidade, e que tem seu correlato grego na palavra politikos – aquele que habita na cidade.
Neste contexto, são considerados cidadãos. Todavia, o dicionário Aurélio define este como “o
indivíduo no gozo dos direitos civis e políticos de um estado, ou no desempenho de seus deveres
para com este”.
Diante tais concepções há um hiato que tem como extremos a etimologia grega e no outro
o entendimento jurídico do que vem a ser cidadão. Neste espaço, transita a figura do catador de rua,
com reconhecimento científico de seu papel, mas sem a devida assistência e reconhecimento
socioeconômico, cultural e política pelos poderes públicos.
Continuando a discussão, o fato de estabelecer relações de convívio social, ter função
definida na sociedade ou ainda ter consciência de si mesmo, do outro e do mundo, desenvolvem
cidadania? Ou tornar-se-iam cidadãos quando interviessem na realidade em que vive?
Calderoni (1997, p.281) demonstra que a economia possível através da reciclagem do lixo
no ano de 1996 no Brasil, pode ser estimada em, ao menos, R$ 5,8 bilhões. Deste total, foi obtida
Fórum Internacional do Meio Ambiente - A conferência da Terra 1326

economia de R$ 1,2 bilhões, tendo sido perdidos, pela não reciclagem, R$ 4,6 bilhões. Isso significa
que existe um potencial de crescimento econômico oriundo da reciclagem. Portanto, o papel dos
catadores de rua são exemplos nessa direção, e percebe-se que há um vasto campo a ser explorado,
necessitando de respaldo cientifico para o surgimento e aprimoramento de ações nesta óptica.
Ainda de acordo com Calderoni (1998, p.76), “o lixo deposto a céu aberto compromete
tanto o meio ambiente quanto à saúde pública”:
“Os resíduos assim lançados acarretam problemas à saúde pública, como a proliferação
de vetores de doenças (moscas, ratos, baratas, etc), gerando maus odores e,
principalmente, a poluição do solo e das águas superficiais e subterrâneas através do
chorume, [...] comprometendo os recursos hídricos. Acrescenta - se a esta situação o
total descontrole quanto aos tipos de resíduos recebidos nestes locais, verificando-se até
mesmo a disposição de dejetos originados dos serviços de saúde e das indústrias.”

Percebe-se diante do exposto que a ação desses trabalhadores extrapola os fatores


ambientais físicos. Envolve aspectos voltados para a prevenção de doenças e agravos a saúde
coletiva.
Em contraposição lhes é oferecido um ambiente hostil de trabalho (locais de coleta),
nocivo e de difícil adaptação às condições perigosas. A solução do conflito entre riscos e benefícios
é decorrente de um nexo entre fatores sociais e suas relações complexas com o ambiente, mediados
dentre outros, pelos processos produtivos. Submetidos a agravos, exclusão e preconceito social, não
são reconhecidos pela sociedade como atores de importância ambiental por participarem do
processo de reciclagem, ação de relevância e demanda no atual contexto ambiental.
Os catadores devem ser estimulados e apoiados para trabalharem em condições dignas, em
galpões apropriados para a triagem de recicláveis e coletados antes de ir para o lixo. É
imprescindível sua inserção em políticas públicas que visem melhoria da qualidade de vida,
garantindo acesso a condições mínimas de educação e saúde.

CONSIDERAÇÕES FINAIS
Acredita-se ser a reciclagem a opção que pode propiciar a curtíssimo prazo, a qualidade de
vida ambiental e humana, tendo em vista que a sua adoção não só gerará direta e indiretamente
empregos, bem como, na outra ponta, evitará todos os problemas e custos ambientais, sociais e
saúde da população.
Do ponto de vista econômico, a reciclagem proporciona a redução do custo de
gerenciamento dos resíduos, com menores investimentos em instalações de tratamento e disposição
final, e promove a criação de empregos.
A administração pública em conjunto com entidades de assistência às populações carentes
(ONG’s) podem incentivar a formação de associações de catadores, formalizando uma atividade de
longa data marginal, auxiliando com a dotação de uma infra-estrutura mínima e ajudando a
construir cidadania desse segmento excluído.
É preciso que haja uma consciência coletiva para a reutilização dos resíduos sólidos. Uma
consciência ecológica que vislumbre desde o não desperdício até o fato de se maltratar a natureza,
através da exposição do meio ambiente aos resíduos sólidos urbanos. O destino final dado aos
resíduos da forma como propõe a coleta seletiva e a reciclagem, oferece integridade e qualidade
ambiental. Para que isto aconteça, faz-se necessário uma conscientização por parte da administração
pública e da população. A adoção de políticas públicas direcionadas aos catadores de rua como
também, de programas sócio-ambientais direcionadas a sociedade para o desenvolvimento da
conscientização de responsabilidade ambiental, conseqüentemente suscitará ações de
sustentabilidade.

REFERÊNCIAS BIBLIOGRÁFICAS
ALENCAR, Bertrand S. de, Seminário – Desenvolvimento Sustentável: quem é responsável?
Relatório Diálogo Setorial. UMAPAZ, São Paulo, 22 a 24 de novembro de 2006.
Fórum Internacional do Meio Ambiente - A conferência da Terra 1327

AUGUSTO, Lia Giraldo da Silva, FREITAS, Carlos Machado de e TORRES, João Paulo Machado.
Risco ambiental e contextos vulneráveis: implicações para a vigilância em saúde. Inf. Epidemiol.
Sus, set. 2002, vol.11, no.3, p.155-158. ISSN 0104-1673.
BAASCH, Sandra S. Nahas. Um sistema de suporte multicritério aplicado na gestão dos resíduos
sólidos nos municípios catarinenses. 1995. Tese (Doutorado em Engenharia de Produção).
Programa de Pós-Graduação em Engenharia de Produção, UFSC, Florianópolis.
BLAUTH, P. R. Usp Recicla. In: EIGENHEER (Org.). Coleta seletiva de lixo: experiências
brasileiras. N. 2. Rio de Janeiro: In-Fólio, 1998, p. 173-184.
BRADLEY, Jana. Methodological issues and practices in qualitative research. Library Quarterly, v.
63, n. 4, p. 431-449, Oct. 1993.
CALDERONI, Sabetai. Os bilhões perdidos no lixo. São Paulo: Humanitas/FFLCH/USP, 1997.
FERREIRA, Aurélio B.de Holanda, Dicionário da língua portuguesa.
FIALHO, Mirian L. O papel reciclado: uma análise de aspectos sociais e ambientais. Florianópolis.
1996. Dissertação (Mestrado em Engenharia de Produção) - Programa de Pós-Graduação em
Engenharia de Produção, UFSC, Florianópolis.
KAPLAN, Bonnie & DUCHON, Dennis. Combining qualitative and quantitative methods in
information systems research: a case study. MIS Quarterly, v. 12, n. 4, p. 571-586, Dec. 1988.
PALACIOS, Marisa, CAMARA, Volney de Magalhães e JESUS, Iracina Maura de. Considerações
sobre a epidemiologia no campo de práticas de saúde ambiental. Epidemiol. Serv. Saúde, jun. 2004,
vol.13, no.2, p.103-113. ISSN 1679-4974.
PATTON, Michael Q. Qualitative evaluation methods. Beverly Hills, CA: Sage, 1980. 381p.
TAMBELLINI AT. Notas provisórias sobre uma tentativa de pensar a saúde em suas relações com
o ambiente. Fiocruz. Por uma rede Trabalho, Saúde e Modos de Vida no Brasil 1996 jun;2(1-2):12-
16.
WIEBECK, Hélio, PIVA, Ana Magda. Reciclagem Mecânica do PVC. Uma Oportunidade de
Negócio. , São Paulo, p.97-A21, ago/99
Fórum Internacional do Meio Ambiente - A conferência da Terra 1328

DISTÚRBIOS MENTAIS EM AGRICULTORES EXPOSTOS AO USO DE


AGROTÓXICOS: UM DRAMA VIVÊNCIADO NO SILÊNCIO DA TERRA

Rogéria Pereira Fernandes Soares


Psicóloga Clínica – CRP: 02/13265 - Clínica de Psicologia da Faculdade de Ciências Humanas
Esuda – Projeto Incubadora. Pós-graduanda em Neuropsicologia – Esuda. Aluna Especial do
Mestrado em Ciências da Saúde – Universidade de Pernambuco. E-mail: rogeriaf@ibest.com.br

RESUMO
Otimizar a qualidade de vida em relação ao respeito ao direito universal, à vida, à saúde do
trabalhador e ao meio ambiente legitima a sustentabilidade como um conceito integrador de
políticas públicas, incorporando nas políticas de desenvolvimento social e econômico, o
entendimento de que a qualidade de vida envolve o direito de trabalhar e viver em ambientes
saudáveis. Desenvolvido a partir de uma revisão bibliográfica, o trabalho discute a necessidade de
analisar a atuação das políticas públicas nas questões relacionadas aos vínculos saúde, doença
mental, trabalho e meio ambiente, em conseqüência do crescente aumento da prevalência e
incidência de distúrbios neuropsicológicos (exposição de curto período) e alterações
neurocomportamentais (exposição de longo período) em trabalhadores expostos ao uso de
agrotóxicos.
Palavras-chave: Agrotóxico, Saúde; Doença Mental; Trabalho e Meio Ambiente

ABSTRACT
To optimize the quality of life in relation to the respect to the universal right, of life, of the
worker's health and of the environment, legitimates the sustainability as an integrator concept of
public politics, incorporating in the social and economical development politics, the understanding
that the quality of life involves the right of work and live in healthy atmospheres. Developed
starting from a bibliographical revision, the work discusses the need to analyze the performance of
the public politics in the subjects related the links of health, mental disease, work and environment,
in consequence of the crescent increase of the prevalence and incidence of neuropsychological
disorders (exhibition of short period) and alterations of the neurological behavior (exhibition of
long period) in workers exposed to the use of pesticides.
Key words: Pesticides; Health; Mental Disease; Work and Environment

CONSIDERAÇÕES INICIAIS
A realização da primeira Conferência Internacional sobre Meio Ambiente, promovida pela
Organização das Nações Unidas, realizada na cidade de Estocolmo, Suécia, em 1972, abriu um
novo capítulo na história da atividade ambiental do Brasil, quando, após a Conferência, em 1973,
foi instituída a SEMA – Secretaria Especial do Meio Ambiente –, inserida no Ministério do Interior.
A partir daí formulou-se o conceito de meio ambiente, abrangendo o ser humano e o ambiente que o
envolve, criando-se um elo entre as ciências humanas e as ciências naturais, vendo-se nas atividades
em defesa do meio ambiente uma ligação direta com a proteção da saúde humana.
A Lei de Política Nacional do Meio Ambiente – Lei 6.938 de 31 de agosto de 1981,
conceitua o meio ambiente como: “(...) conjunto de condições, leis, influências e interações de
ordem física, química e biológica, que permite, abriga e rege a vida em todas as suas formas.”
(Artigo 3º, I). Abranger a vida em todas as suas formas, inclui a vida humana, onde a saúde é uma
das condições que a permite, a abriga e a rege. Tem-se então, a noção de ambiente contida na noção
de ambiente sadio, com ligações com o campo sanitário.
Com os novos parâmetros ambientais, a interação entre a saúde humana e os fatores do
meio ambiente que a condicionam, abre um leque na área da saúde pública e na formulação de suas
políticas, no sentido de melhorar a qualidade de vida do ser humano, atentando em sua
sustentabilidade.
De acordo com a Lei Orgânica da Saúde nº. 8.080 de 19 de setembro de 1990, art.3 “caput:
Fórum Internacional do Meio Ambiente - A conferência da Terra 1329

“A saúde tem como fatores determinantes e condicionantes, entre outros, a alimentação,


a moradia, o saneamento básico, o meio ambiente, o trabalho, a renda, a educação, o
transporte, o lazer e o acesso aos bens e serviços essenciais; os níveis de saúde da
população expressam a organização social e econômica do País.”

Bem como o art. 3, parágrafo único, destina-se a garantir às pessoas e à coletividade,


condições de bem-estar físico, mental e social.
A prevenção dos distúrbios mentais e alterações do comportamento, relacionadas aos
agricultores expostos ao uso de agrotóxicos, baseiam-se nos procedimentos de vigilância
epidemiológica, vigilância sanitária e condições de trabalho. Utilizando conhecimentos médico-
clínicos, epidemiológicos, higiene ocupacional, toxicologia, psicologia, educação ambiental, entre
outros. Considerando a multiplicidade de fatores envolvidos na determinação dos mesmos
relacionados com o trabalho.

COMPREENDENDO O COMPROMETIMENTO DA QUALIDADE DE VIDA PELO USO DOS


AGROTÓXICOS
A contemporaneidade caracterizou-se, entre outros aspectos, por um intenso e contínuo
processo de avanços tecnológicos e, consequentemente, por mudanças organizacionais que
atingiram, de forma contundente, o mundo da produção, levando a grandes transformações as
relações de trabalho. A agricultura, que por séculos tem se constituído o meio de vida dos
agricultores e de suas famílias, converteu-se numa atividade orientada para a produção comercial
tendo como resultado o aumento da produtividade. Por trás destas mudanças, o impacto do uso de
agrotóxicos sobre a saúde humana tem merecido atenção da comunidade científica em todo o
mundo, sobretudo nos países em desenvolvimento, constituindo-se em um problema de saúde
pública e ambiental. Estes produtos utilizados na agricultura, como defensivos agrícolas, vêm
comprometendo a possibilidade de desenvolvimento social no que diz respeito à defesa e promoção
da qualidade de vida.
Essa questão é reiterada por Valdez (1995), quando afirma que o uso indiscriminado desses
produtos tem resultado em um sério problema de Saúde Pública e que a quantificação de seus
efeitos (morbidade e mortalidade) – sejam estes crônicos, agudos ou letais –, é imprecisa devido ao
grande número de sub-notificações, à falta de especificidade dos efeitos clínicos e ao pouco
conhecimento das equipes de saúde a respeito da ação desses produtos químicos e dos seus efeitos
nos indivíduos contaminados. Nessa abordagem, o autor aponta ainda para a preocupação com os
efeitos neurotóxicos, provocados pelos organofosforados, que se caracterizam por modificações
psíquicas, comportamentais e motoras e se manifestam dias ou meses após a exposição.
Os fungicidas de maior relevância toxicológica atualmente são os ditiocarbamatos. Estes
produtos são muito utilizados nas culturas de tomate, morango, figo e flores, entre outras, e
apresentam, do ponto de vista de intoxicação aguda, sintomas e sinais de irritação das mucosas,
como conjuntivite, rinite e faringite. Náuseas, vômitos e diarréia podem acompanhar o quadro
agudo. Nas exposições de longo prazo, pelo fato de alguns desses fungicidas apresentarem
manganês (metal pesado) na molécula, podem determinar um tipo de Parkinsonismo, com tremores
de extremidades que podem evoluir para um quadro irreversível.
Um estudo liderado pela Universidade de Aberdeen, na Escócia (edição eletrônica da
Revista New Scientist, maio, 2005), avaliou mais de três mil pessoas, sendo 767 portadoras do mal
de Parkinson, em cinco países europeus, mostrando que o uso de pesticidas tem uma influência
importante no risco ocupacional de desenvolvimento de Parkinson. "Nossa avaliação mostrou que o
uso de pesticidas tem uma influência importante no risco ocupacional de desenvolvimento de
Parkinson", disse à revista Anthony Seaton, que dirigiu a pesquisa.
Estudos realizados no Brasil abordam contaminações diferenciadas – ocupacional,
acidental ou suicida –, por via alimentar e ambiental, que segundo Moreira (2002), exigem uma
avaliação integrada em vista de sua natureza holística, da multiplicidade de rotas e da grande
variabilidade das causas do problema.
Fórum Internacional do Meio Ambiente - A conferência da Terra 1330

Pesquisas indicam que a maioria dos casos de intoxicação por agrotóxicos ocorre,
principalmente, devido a um descumprimento das normas de segurança para a sua aplicação devido
a irregularidades no armazenamento e na distribuição dos produtos, assim como à ausência de
políticas públicas de controle (OPAS/OMS, 1991).
Entretanto, a complexidade da questão requer cautela no julgamento, pois existe um
discurso que acaba isentando a responsabilidade das indústrias que lucram com esta situação,
localizando os problemas no nível dos usuários (PERES, 1999).
Meirelles (1995) afirma que o problema se perpetua pela falta de informação por parte da
população usuária que, somada à grande pressão das indústrias químicas interessadas no consumo
dos produtos, resulta no livre acesso aos agrotóxicos e na exposição a sua toxicidade, bem como na
falta de incentivo a outras práticas de agricultura (LEVIGARD, 2001).

AGROTÓXICO: REMÉDIO OU VENENO?


A utilização sistemática dos defensivos agrícolas iniciou-se na década de vinte, época em
que eram pouco conhecidos do ponto de vista toxicológico. Durante a Segunda Guerra Mundial
foram usados como arma química e, posteriormente, seu uso foi expandido, chegando a produção
mundial a atingir dois milhões de toneladas de agrotóxicos por ano (OPAS/OMS, 1997). No Brasil
foram primeiramente utilizados em programas de saúde pública e no combate a vetores e controle
de parasitas, passando a ser utilizados mais intensivamente na agricultura a partir da década de
1960. (GARCIA, 1997)
O termo defensivo agrícola foi substituído pela designação de agrotóxico, para denominar
os venenos agrícolas, colocando em evidência a toxicidade desses produtos para o meio ambiente e
a saúde humana.
A utilização dos agrotóxicos no meio rural tem trazido uma série de conseqüências, tanto
para o ambiente como para a saúde do trabalhador rural. Essas são, em geral, relacionadas ao uso
inadequado, à toxicidade de certos produtos, à falta de utilização de equipamentos de proteção e à
precariedade dos mecanismos de vigilância. Esse quadro é agravado pelo baixo nível
socioeconômico e cultural da grande maioria desses trabalhadores (OLIVEIRA-SILVA et al.,
2001).
A maior parte dos agrotóxicos utilizados na agricultura acaba atingindo o solo e as águas,
principalmente durante a sua aplicação no controle de ervas daninhas e lavagem das folhas tratadas,
através de lixiviação, erosão, aplicação direta em águas para controles de vetores de doenças,
resíduos de embalagens vazias, lavagens de equipamentos de aplicação e efluentes de indústrias de
agrotóxicos (WRI, 1996).
Dados coletados pela Fundação Oswaldo Cruz (FIOCRUZ, 2001) e analisados pelo
Sistema Nacional de Informações Tóxico-Farmacológicas (Sintox), revelam a distribuição dos
casos de intoxicações por agente tóxico e zona de ocorrência registrados em todo o país. Em 2001,
os agrotóxicos foram os responsáveis por 5.384 casos (7,15%) no Brasil, sendo que os agrotóxicos
de uso doméstico, produtos veterinários e raticidas contabilizaram 2.517 (3,34%), 973 (1,29%) e
5.110 (6,79%) casos de intoxicações humanas, respectivamente. A intoxicação por estes agentes no
Brasil corresponderam a aproximadamente 19% do total de casos de intoxicação registrados no país
em 2001. Além disso, a Organização Mundial da Saúde (WHO – World Health Organization)
considera que em países como o Brasil, nos quais existem graves problemas estruturais na rede
pública de saúde, ocorre um sub-registro de casos de intoxicações por agentes químicos em geral,
inclusive daqueles causados por agrotóxicos. Para estes, as agências estimam que os casos
registrados de intoxicações representem somente 2% do total de casos que ocorrem anualmente.

DISTÚRBIOS MENTAIS EM AGRICULTORES EXPOSTOS AO USO DE AGROTÓXICOS


Estudos têm demonstrado que alguns metais pesados e solventes podem ter ação tóxica
direta sobre o sistema nervoso, determinando distúrbios mentais e alterações do comportamento que
se manifestam por irritabilidade, nervosismo, inquietação, distúrbios da memória e da cognição,
Fórum Internacional do Meio Ambiente - A conferência da Terra 1331

inicialmente pouco específicos e por fim, com evolução crônica, muitas vezes irreversíveis e, até
incapacitantes.
Uma suspeita toxicológica atual refere-se à possibilidade da exposição de longo prazo
determinar lesões cerebrais e, consequentemente, problemas de locomoção e comportamento,
depressão profunda e sintomas de esquizofrenia. Esta hipótese tem sido investigada para algumas
classes de praguicidas como os organofosforados, mas até o momento os estudos não são
conclusivos (ROSENSTOK et al., 1991; FARIA et al., 1999).
No entanto, vale ressaltar a dificuldade de associação entre distúrbio mental e o uso de
agrotóxicos por parte dos enfermos devido a observação de sintomas vagos e difusos. Sintomas
inespecíficos, tais como dor de cabeça, vertigens, falta de apetite, falta de forças, nervosismo e
dificuldade para dormir, presentes em diversas patologias, e que freqüentemente são as únicas
manifestações aparentes da intoxicação por agrotóxicos, razão pela qual raramente se estabelece
diferente suspeita diagnóstica. Esta situação é agravada pela existência de outros problemas de
ordem sócioeconômica, tais como: alcoolismo e condições sanitárias precárias.
Direcionando-se o olhar aos agrotóxicos clorados e carbamatos, encontra-se os
organofosforados, mais tóxicos em termos de toxidade aguda e atuantes no sistema nervoso central
no que diz respeito à ação inibidora da enzima colinesterase na transmissão dos impulsos nervosos.
Sendo a permanência desses compostos no organismo de pequena duração, enquanto os seus efeitos
perduram (GOODMAN; GILLMAN, 1990).
Os organofosforados (OF) são prontamente absorvidos por todas as vias de exposição, em
função de suas características físico-químicas. As intoxicações acidentais e intencionais ocorrem
por via oral, que normalmente não se torna a via comum na exposição ocupacional. Nesses casos,
só ocorrem por descuidos nos hábitos higiênicos, no consumo de líquidos ou alimentos
contaminados ou, ainda, no descumprimento do prazo estabelecido como intervalo de carência para
a colheita dos alimentos – intervalo entre a aplicação do OF, e a colheita para consumo do produto
alimentício (LAMPE, 1986).
São eles rapidamente absorvidos pelo pulmão, pele, trato gastroentestinal e conjuntiva
(NAMBA et al, 1971), sendo as vias dérmica e respiratória as principais na exposição ocupacional.
A via respiratória é observada na exposição de trabalhadores da indústria e aplicadores do produto,
que desobedecem as normas de segurança ou utilizam inadequadamente o equipamento de proteção
individual – EPI (WHO, 1990).
Os OF são rapidamente distribuídos pelo sistema sanguíneo, sendo por ele carreado a
diferentes tecidos do organismo, na ordem direta da sua lipossolubilidade. Seu pico de maior
concentração sanguínea ocorre nas primeiras 12 horas após a exposição. Baixas concentrações
sanguíneas podem ser aferidas até 24 horas após a exposição (WHO, 1986).

Mecanismos de Ação Toxicológica dos Organofosforados (OF)


Os organofosforados são inibidores de uma enzima chamada acetilcolinesterase (AchE),
cuja função é degradar o neurotransmissor acetilcolina, A inibição da AchE resulta em acumulação
de acetilcolina endógena no tecido nervoso e órgãos efetores, por alteração no processo de síntese,
estocagem , liberação ou hidrólise do neurotransmissor. A intoxicação aguda ocorre por decorrência
de fosforilação persistente (bloqueio) no organismo de um grupo de esterases, ocorrendo um
decréscimo da oferta da enzima ativa (AchE) e um conseqüente excesso da oferta do
neurotransmissor acetilcolina (Ach), em terminais nervosos em diversas áreas do organismo. Entre
outras atribuições, esse neurotransmissor (Ach) desempenha importante papel no controle dos
estados afetivos.
Pesquisa científicas apontam evidências de uma relação entre a intoxicação por
agrotóxicos e alterações psíquicas e neurológicas. Segundo Amr, Halim e Moussa (1997), “(...) há
alta freqüência de distúrbios psiquiátricos nos grupos expostos, com diagnóstico predominante de
neurose depressiva, cujos sintomas freqüentes eram irritabilidade e disfunção erétil”. Em estudo na
África do Sul Yousefi (1999), descreve diferentes sintomas como alterações de personalidade,
Fórum Internacional do Meio Ambiente - A conferência da Terra 1332

lentidão de pensamento, distúrbios de memória e de cognição, além da sintomatologia comum


encontrada nos agravos à saúde dos agricultores.
De acordo com Faria et al. (2000), em estudo epidemiológico realizado com agricultores
na Serra Gaúcha, no Estado do Rio Grande do Sul, os autores apontam uma associação entre a
intoxicação por agrotóxicos organofosforados e a ocorrência do que denominam “transtornos
psiquiátricos menores”, referidos como “problemas de tristeza e desânimo”.

Efeitos Comportamentais
Em humanos, os sintomas apresentam-se como efeitos crônicos sobre o Sistema Nervoso
Central (SNC), do tipo neurocomportamental, como insônia e distúrbios do sono, ansiedade, retardo
de reações, dificuldade de concentração, e sintomas psiquiátricos, como apatia, irritabilidade,
depressão e esquizofrenia. Os quadros mais freqüentes são depressão e sintomas que compreendem
perda de concentração, distúrbios de memória e dificuldade de raciocínio (OMS, 1987).
Pesquisas que relacionam Distúrbios Comportamentais ao uso de Agrotóxicos. Entre elas,
de acordo com Soares (2003), podemos citar:
Na década de 60, o médico argentino Emílio Astolfi relacionou o uso de organofosforados
em Chaco (Bolívia) com o incremento dos suicídios entre agricultores;
Em 1996, a cidade Venâncio Aires (RS) registrou um alto percentual de suicídios em
trabalhadores rurais expostos ao uso de agrotóxicos. O Ministério da Saúde chegou a encomendar
um inquérito epidemiológico, mas não foi adiante;
Em Santa Cruz do Sul (RS), houve em 2001, 21 suicídios por 100 mil habitantes, a maioria
de agricultores – média nacional de 4 por 100 mil.
E ainda, segundo dados do Centro de Informações Toxicológicas de Goiás, evidencia-se o
elevado número de casos de tentativa de suicídio que representaram em 2001, 2002, 2003 e 2004,
respectivamente 42,45% (104), 35,91% (93), 49,81% (128) e 36,12% (108) das notificações de
eventos relacionados com agrotóxicos de uso agrícola.

CONSIDERAÇÕES FINAIS
O quadro sintomatológico provocado pelos agrotóxicos interage com sintomas pertinentes
à história biológica do indivíduo, evidenciando quadros complexos em que, muitas vezes, torna-se
invisível o limite entre os sintomas da intoxicação propriamente dita e as interações intrínsecas de
ordem psíquica, familiar e temperamental do próprio indivíduo. Tendo-se, pois, a necessidade de
uma avaliação que privilegie o doente e não só a doença. Que contextualize todos os sinais e
sintomas não só físicos, mas também psíquicos e emocionais, justificando a prevenção dessa classe
de intoxicações.
Por outro lado, além das questões intrínsecas relacionadas às intoxicações, a questão dos
agrotóxicos está inserida em uma rede complexa de fatores com implicações de ordem social,
política, econômica e, principalmente, ecológica.
Diante desse cenário, resultados de pesquisas científicas, hoje alvo de preocupações nas
áreas de toxicologia, saúde e meio ambiente, devido à intensa utilização de agrotóxicos nas lavouras
e conseqüente contaminação humana e ambiental, poderão ser utilizados pelas diversas autoridades
do setor das políticas públicas, viabilizando o desenvolvimento social no que diz respeito a ações
preventivas da saúde mental do trabalhador e a minimização dos possíveis impactos ambientais que
poderão ocorrer devido ao crescente uso dos agrotóxicos.

REFERÊNCIAS BILBIOGRAFICAS
AMR, M. M.; HALIM, Z.S.; MOUSSA, S.S. Psychiatric disorders among Egyptian pesticide
applicators and formulators. Cairo: Environmental Research Journal, vol. 73, n. 1-2, p. 193-199,
1997.
ANDRADE; Rui O. B. de; TACHIZAWA; Takeshy; CARVALHO, Ana B. de. Gestão ambiental:
enfoque estratégico aplicado ao desenvolvimento sustentável. São Paulo: Makron Books, 2002.
Fórum Internacional do Meio Ambiente - A conferência da Terra 1333

AUGUSTO, L.S.G. Exposição ocupacional a organofosforado em indústria química de Cubatão:


avaliação do efeito clastogênico pelo testes de micronúcleos. São Paulo: Unicamp, 1995.
[Dissertação de Mestrado]
BIBLIOGRAFIA
BRASIL. Lei de Política Nacional do Meio Ambiente – Lei 6.938 de 31 de agosto de 1981. art. 3, I.
BRASIL. Lei Orgânica da Saúde. Lei 8.080 de 19 de setembro de 1990. art. 3, caput; parágrafo
único.
FARIA, N. M. X.; FACCHINI, L. A.; FASSA, A. G.; TOMASI, E. Estudo transversal sobre saúde
mental de agricultores da Serra Gaúcha. São Paulo: Revista de Saúde Pública, v. 33, n. 4, p. 391-
400, 1999.
FARIA, N.M.X.; FACCHINI.A. A.; FASSA, A.G e TOMASI, E. – Estudo Transversal Sobre
Saúde Mental de Agricultores da Serra Gaúcha. Rio de Janeiro: Caderno de Saúde Pública, n. 16,
p. 115-128, 2000.
FIOCRUZ (Fundação Oswaldo Cruz). Sistema Nacional de Informações Tóxico Farmacológicas
SINITOX. Disponível: <http://www.fiocruz.br/cict/sinitox/tabela301999.html>. Acesso em: 23 set.
2007.
GARCIA, E. G. Pesticide Control Experiences in Brazil. Chichester: Pest. Saf., v. 2, p. 5, 1997.
GOODMAN, L. J.; GILLMAN, A. As Bases Farmacológicas da Terapêutica. Rio de Janeiro:
Macmillan Pub. Co, 8. ed., 1990.
LAMPE, K. F. Toxic effects of plant toxins. In: Klaassen CD; Amdur MO; Doull J, editores.
Casarett and doull’s toxicology: the basic science of poisons. 3 ed. New York: Macmillan, 1986.
LEVIGARD, Y. E. A interpretação dos profissionais de saúde acerca das queixas do nervoso no
meio rural: uma aproximação ao problema das intoxicações por agrotóxicos. Rio de Janeiro:
ENSP /FIOCRUZ, 2001. [Dissertação de Mestrado]
MEIRELLES, L. C. Controle de Agrotóxicos: estudo de caso do estado do Rio de Janeiro,
1985/1995. Rio de Janeiro: COPPE/UFRJ, 1995. [Dissertação de Mestrado]
MERGLER, D. Behavioral neurophysiology: quantitative measures of sensory toxicity. In:
Neurotoxicology: approaches and methods. London: Academic Press, 1995.
MOREIRA, J.; et al. Avaliação integrada do impacto do uso de agrotóxicos sobre a saúde humana
em uma comunidade agrícola de Nova Friburgo. Rio de Janeiro: Revista Ciência & Saúde Coletiva.
7(2). p. 299-311, 2002.
NAMBA, T; et al. Poisoning due to organophosphate insecticides: acute and chronic
manifestations. American Journal of Medicine. n. 50, p. 474-492, 1971.
OLIVEIRA, Maria Marly. Como fazer projetos, relatórios monografias, dissertações e teses.
Recife: Editora Bagaço, 2003.
OLIVEIRA-SILVA, J. J.; et al. Influência de fatores socioeconômicos na contaminação por
agrotóxicos. São Paulo: Revista Saúde Pública, v. 35, n. 2, p. 130-135, 2001.
OMS (Organização Mundial de Saúde). Glossaire de la pollution de l'air. Copenhague: 1987.
OPAS/OMS (Organização Pan-americana de Saúde/ Organização Mundial de Saúde). Manual de
Vigilância da Saúde de Populações Expostas a Agrotóxicos, Brasília: Representação do Brasil,
1997.
OPAS/OMS (Organização Pan-americana de Saúde/Organização Mundial de Saúde). Henao, S;
Corey, G. - Plaguicidas Inhibidores de las Colinesterasas. Mexico: Centro Panamericano de
Ecologia Humana y Salud, Programa de Salud Ambiental, Serie Vigilancia, n. 11, 1991.
PERES, F. É Veneno ou é Remédio? Os desafios da Comunicação Rural sobre Agrotóxicos. Rio de
Janeiro: ENSP/FIOCRUZ, 1999. [Dissertação de Mestrado]
ROSENSTOCK, L.; et al. Chronic Central Nervous System Effects of Acute Organophosphate
Pesticide Intoxication. Lancet: The Pesticide Health Effects Study Group, v. 338, p. 223–227, 1991.
SANTOS, Milton. A natureza do espaço: técnica e tempo, razão e emoção. São Paulo: Hucitec,
1997.
SEATON, Anthony. Edição eletrônica New Scientist Magazine, maio, 2005. Disponível em:
<http://www.newscientist.com >. Acesso em: 10 out 2006.
Fórum Internacional do Meio Ambiente - A conferência da Terra 1334

SOARES, W.; et al. Trabalho rural e fatores de risco associados ao regime de uso de agrotóxicos
em Minas Gerais. Rio de Janeiro: Caderno de Saúde Pública, v.19, n.4, 2003.
VALDEZ, N. E. C. Monitorização Biológica de Trabalhadores Expostos a Inseticida
Organofosforado Neurotoxicante: uma proposta de intervenção. Rio de Janeiro: ENSP/FIOCRUZ,
1995. [Dissertação de Mestrado]
WHO (World Health Organization). Organophosphorus Inseticide: a general introduction.
Environmental Health Criteria, 63, 1986.
WHO (World Health Organization). Principles for evaluating health risks to reproduction
associated with exposure to chemicals. Environmental Health Criteria, 225, 2001.
WHO (World Health Organization). Triclhorphon. Environmental Health Criteria, 147, 1990.
WRI (World Resources Institute). Pesticides and the Immune System: the public health risks. III-
Pesticide Exposure, p. 9-16, 1996.
YOUSEFI, V.O. Agrochemicals in South Africa. African Newsletter on Occupational Health and
Safety. v. 9 n. 1, p. 56-67, 1999.
Fórum Internacional do Meio Ambiente - A conferência da Terra 1335

LOGÍSTICA REVERSA E SUSTENTABILIDADE: UM ESTUDO DE CASO EM UMA


EMPRESA DE RECICLAGEM DE CARTUCHOS.

Adriana Dos Santos Bezerra


Universidade Estadual da Paraíba (UEPB) – PRODEMA, (Mestranda), Campina Grande-PB, Brasil.
adriana_bezerra@hotmail.com
Alcione Lino De Araújo
Universidade Federal de Campina Grande (UFCG) – Professora, Campina Grande-PB, Brasil.
alcionelino@yahoo.com.br
Laniza Ferreira Almeida
União de Ensino Superior de Campina Grande (UNESC) – Professora, Campina Grande-PB, Brasil.
lanizaferreira@yahoo.com.br

RESUMO
Recentemente tem se enfatizado a preocupação da sociedade com a realização de ações
efetivas que possam promover uma redução da degradação ambiental. Buscando atender as
crescentes exigências da sociedade relacionadas às questões ambientais, a logística reversa
apresenta-se como uma das opções para se alcançar à preservação ambiental e trazer benefícios às
organizações e a sociedade, considerando que é uma ferramenta de grande valia devido ao seu
potencial econômico, importância para preservação de recursos e do meio ambiente. Devido à
ênfase dada aos problemas ambientais, as empresas têm buscado desenvolver estratégias reversas
para uma destinação adequada de embalagens e materiais descartados. Nesse contexto, através de
pesquisa realizada em uma empresa de reciclagem de cartuchos, busca-se apresentar a logística
reversa como instrumento de contribuição para o desenvolvimento econômico e social do ambiente
no qual a empresa está inserido.
Palavras-chave: Meio ambiente; Logística reversa; Desenvolvimento Sustentável.

ABSTRACT
Recently has emphasized the concern of the society to the implementation of effective
actions that can promote a reduction of environmental degradation. Seeking meet the increasing
demands of society related to environmental issues, logistics reverse presents itself as one of the
options to achieve the environmental preservation and bring benefits to organizations and society,
whereas it is a tool of great value due to its economic potential, importance to preservation of
resources and the environment. Due to the emphasis given to environmental problems, companies
have sought to develop strategies reverse for a proper allocation of packages and discarded
materials. In that context, through research done in a company of recycling of cartridges, seeks to
present itself as a tool for reverse logistics contribution to the economic and social development of
the environment in which the company is inserted.
Keywords: Environment; Reverse Logistics; Sustainable Development

INTRODUÇÃO
É cada vez mais acentuada a preocupação da sociedade com a gestão dos recursos naturais,
preocupação que se manifesta através da busca de ações que promovam a redução da degradação
desses recursos. Tornou-se um desafio cada vez maior o alcance da sustentabilidade, onde encontrar
soluções para a poluição e para a escassez dos recursos naturais é uma tarefa complexa, visto que a
sociedade humana está em constante processo de mudança.
As empresas devem assumir sua responsabilidade social, passando a preocupar-se com
ações que proporcionem a redução dos impactos ambientais decorrentes das atividades por elas
desenvolvidas, buscando assim serem ecologicamente corretas e reconhecidas no mercado por
contribuir favoravelmente com o desenvolvimento sustentável.
Para Schenini (1999), o desenvolvimento sustentável busca o crescimento econômico, a
equidade social e o equilíbrio ecológico, todos sob o mesmo espírito holístico de harmonia e
responsabilidade comum.
Fórum Internacional do Meio Ambiente - A conferência da Terra 1336

Embora os princípios do desenvolvimento sustentável pareçam conflitantes dentro da


sociedade capitalista, a redução do impacto ambiental tornou-se uma exigência para as empresas
que desejam continuar atuando no mercado. Para permanecerem no mercado as organizações
precisam atualizar-se e buscar novas alternativas de produção e gestão que considerem as questões
ambientais.
O conceito de desenvolvimento sustentável é relativamente novo, tendo surgido a menos
de trinta anos e seu significado está longe de encerrar todo o ideário que ele pretende representar.
Esse conceito é, antes de tudo, uma representação simbólica de toda uma evolução, ainda em curso,
acerca da reflexão do homem sobre a maneira como ele explora econômica, social e
ambientalmente a Terra e de como esta exploração deve ocorrer para que não haja
comprometimento das condições de vida desta e das próximas gerações (RODRIGUES &
RODRIGUES, 2003).
Desenvolvimento Sustentável é a utilização equilibrada dos recursos naturais, de forma a
satisfazer as necessidades e o bem-estar da geração atual, preocupando-se com as gerações futuras,
por meio da conservação desses recursos.
De acordo com Philippi Jr. et al (2004), do ponto de vista do cidadão, a reciclagem tem
sido a única alternativa para o problema dos resíduos.
A crescente conscientização da sociedade e conseqüentemente dos consumidores tem
levado as empresas a desenvolverem ações ecologicamente corretas através de diversas ferramentas,
entre as quais a aplicação de tecnologias limpas, sistemas de gestão ambiental, responsabilidade
social e mais recentemente da logística reversa, que trata do fluxo reverso dos produtos e também
de resíduos de diferentes formas. Como reação aos impactos dos produtos sobre o meio ambiente, a
sociedade tem desenvolvido uma série de legislações e novos conceitos de responsabilidade
empresarial, de modo a adequar o crescimento econômico às variáveis ambientais. O conceito de
desenvolvimento sustentado, cujo objetivo é o crescimento econômico minimizando os impactos
ambientais, tem sido constantemente utilizado nos dias de hoje, baseado na idéia de atender às
necessidades do presente sem comprometer as gerações futuras no atendimento de suas
necessidades. (LEITE, 2003)
De acordo com Lacerda (2004), os clientes valorizam as empresas que possuem políticas
de retorno de produtos, pois isso garante-lhes o direito de devolução ou troca de produtos. Esse
processo envolve uma estrutura para recebimento, classificação e expedição de produtos retornados,
bem como um novo processo no caso de uma nova saída desse mesmo produto.

Breve histórico da logística


A logística existe desde os tempos mais remotos e teve tem sua origem nas atividades
militares. Na preparação das guerras os líderes militares já se utilizavam da logística para fazer
chegar aos locais de combate carros de guerra, grandes grupos de soldados e transportar
armamentos pesados. As guerras eram longas e nem sempre ocorriam próximo de onde estavam as
pessoas. Por isso, eram necessários grandes deslocamentos de um lugar para outro, além de exigir
que as tropas carregassem tudo o que iriam necessitar. Sendo assim, a logística foi desenvolvida
visando colocar os recursos certos no local certo, na hora certa, com um o objetivo de vencer
batalhas. Durante muitos séculos, a logística esteve associada apenas à atividade militar.
A partir da Revolução Industrial o volume de produção aumentou extraordinariamente e
para que as populações possam ter acesso aos bens industrializados a logística passou a ser
utilizada para diminuir o intervalo entre produção e demanda, de modo que os consumidores
tenham bens e serviços quando o onde quiserem e na condição física que desejarem. Para Ballou
(1993), a logística trata de todas as atividades de movimentação e armazenagem, que facilitam o
fluxo de produtos desde o ponto de aquisição da matéria-prima até o ponto de consumo final, assim
como dos fluxos de informação que colocam os produtos em movimento, com o propósito de
providenciar níveis de serviço adequados aos clientes a um custo razoável.
A distribuição física é o ramo da logística empresarial que trata da movimentação,
estocagem e processamento de pedidos dos produtos finais da empresa. Preocupa-se principalmente
Fórum Internacional do Meio Ambiente - A conferência da Terra 1337

com mercadorias que a empresa oferece para vender e que não planeja executar processamentos
posteriores.
Desde o instante em que a produção é finalizada até o momento no qual o comprador toma
posse dela, as mercadorias são responsabilidade da logística. Para fazer chegar mercadorias aos
consumidores a logística utiliza canais, ou seja, caminhos, chamados canais de distribuição. O canal
de distribuição consiste no caminho percorrido pela mercadoria desde o produtor até usuários finais.
Os canais de distribuição são os meios pelos quais o produto percorre até chegar ao seu destino final
e são compostos basicamente por Centros de Distribuição, Varejistas, Distribuidores, entre outros.

Logística reversa como instrumento de preservação ambiental


Uma parcela dos produtos que chegam aos consumidores finais e que precisam retornar ao
ciclo produtivo ou de negócios impulsiona o surgimento de uma logística reversa, ou seja, uma
logística de retorno de tais produtos. A logística reversa corresponde ao caminho inverso da
logística, ou seja, inicia-se no ponto de consumo dos produtos e materiais finalizando no ponto
inicial da cadeia de suprimentos, tendo como principal objetivo seu reaproveitamento e reciclagem
e conseqüente reutilização na cadeia de valor.
De acordo com Bowersox & Closs (2001), as necessidades da logística reversa também
decorrem do crescente número de leis que proíbem o descarte indiscriminado e incentivam a
reciclagem de recipientes de bebidas e materiais de embalagem. Em CLM (1993), logística reversa
é um amplo termo relacionado às habilidades e atividades envolvidas no gerenciamento de redução,
movimentação e disposição de resíduos de produtos e embalagens.
A logística reversa como é a área da logística empresarial que planeja, opera e controla o
fluxo e as informações logísticas correspondentes, do retorno dos bens de pós-venda e de pós-
consumo ao ciclo de negócios ou ao ciclo produtivo, por meio dos canais de distribuição reversos,
agregando-lhes valor de diversas naturezas: econômico, ecológico, legal, logístico, de imagem
corporativa, entre outros (LEITE, 2003).
Os canais de distribuição reversos, ou simplesmente CDRs, constituem todas as etapas ou
meios necessários para o retorno de uma parcela dos produtos comercializados, seja devido a
defeitos de fabricação, prazo de validade vencido, ciclo de vida útil encerrado ou reaproveitamento
de embalagens, ao ciclo produtivo da empresa. Segundo Fleury (2003), o fluxo logístico reverso
tem sido comum para boa parte das empresas. Como por exemplo, fabricantes de pneus, pilhas,
agrotóxicos, bebidas e alumínio.
Assim, a logística reversa se responsabiliza pelo retorno dos bens de pós-venda e pós-
consumo ao ciclo de negócios ou ao ciclo produtivo, agregando-lhes valor, utilizando dois tipos de
canais de distribuição reversos: canais de distribuição reversos de bens de pós-consumo e canais de
distribuição reversos de bens de pós-venda.
Os bens de pós-venda, com pouco ou nenhum uso, são produtos devolvidos por motivos
como prazos de validade vencidos, por haver estoques excessivos no canal de distribuição, por
estarem em consignação, por apresentarem problemas de qualidade e defeitos etc.
Os bens de pós-consumo são bens industriais classificados como duráveis ou semiduráveis
que depois de finalizada sua utilidade original podem retornar ao ciclo produtivo de alguma
maneira. O fluxo reverso desses bens é realizado por meio de dois grandes sistemas de canais
reversos de revalorização: o canal reverso de ‘desmanche’ e o de ‘reciclagem’. Na impossibilidade
dessas revalorizações, os bens de pós-consumo encontram a ‘disposição final’ em aterros sanitários
ou são incinerados.
‘Reciclagem’ é o canal reverso de revalorização, em que os materiais constituintes dos
produtos descartados são extraídos industrialmente, transformando-se em matérias-primas
secundárias ou recicladas que serão reincorporadas à fabricação de novos produtos. (CLM, 1993)
A reciclagem de cartuchos tem se destacado, exatamente por apresentar-se como uma
atividade promissora para o crescimento econômico, associada à responsabilidade social e
ecológica. A reciclagem proporciona benefícios para a população, como economia de recursos e
redução dos impactos nocivos ao meio ambiente. Os cartuchos, segundo Leite (2003), são bens
Fórum Internacional do Meio Ambiente - A conferência da Terra 1338

descartáveis, que apresentam duração de vida média de algumas semanas, raramente superior a seis
meses. Essa categoria de bens constitui-se tipicamente de produtos de embalagens, brinquedos,
materiais para escritório, suprimentos para computadores, artigos cirúrgicos, pilhas de
equipamentos eletrônicos, fraldas, jornais, revistas, entre outros.
De acordo com Lacerda (2004), os processos de logística reversa têm trazido consideráveis
retornos para as empresas. O reaproveitamento de materiais e a economia com embalagens
retornáveis têm trazido ganhos que estimulam cada vez mais novas iniciativas e esforços em
desenvolvimento e melhoria nos processos de logística reversa.
A remanufatura ou reciclagem é um conjunto de técnicas que visa o aproveitamento
de detritos e sua reutilização. Atualmente ela está presente em quase todos os processos que poluem
o meio ambiente, contribuindo para evitar que materiais de difícil decomposição gerem mais fontes
de poluição, representando assim, um processo realizado de maneira adequada e que permita a
obtenção de um cartucho em estado equivalente ao original. Sendo o termo reciclagem mais
comumente usado, para ressaltar o aspecto social e ambiental.
Segundo Leite (2003), o mercado secundário de bens usados ou remanufaturados
representa uma parcela importante no valor total da economia reversa nas sociedades atuais,
embora, na maior parte das vezes, seus valores sejam estimados e ainda pouco documentados.

ESTUDO DE CASO
O estudo de caso apresentado tem como objetivo caracterizar o processo da logística
reversa pela Par@í Informática, uma empresa paraibana que fabrica e comercializa diversos tipos
de produtos e insumos para reciclagem de cartuchos para todos os estados do País. A coleta de
dados foi realizada através de entrevistas com pessoas que atuam no processo de logística reversa
da empresa, além de observações in loco e acesso ao site da empresa.
A escolha da empresa se deu pelo fato de no Estado da Paraíba, a Par@í ter exclusividade
na comercialização de cartuchos de impressoras a jato de tinta por meio do processo de enchimento
a vácuo por conta de sua patente.

A empresa
Fundada em 1996 e no mercado de reciclagem desde 1998, o Grupo Par@í é considerado
hoje o maior do País na fabricação de máquinas e acessórias para reciclagem de cartuchos de tinta e
toner. No ano de 2000 depositou uma patente do processo de enchimento a vácuo (PI 0003237-9)
que revolucionou o mercado brasileiro, já que anteriormente a esta técnica os cartuchos eram
enchidos por injeção de tinta, o que deixava bolhas, causava vazamentos e propiciava falhas. As
máquinas criadas pela Par@í, que enchem cartuchos a vácuo, já estão presentes em 60 países e a
máquina INK Express, projetada para universidades e shoppings, foi escolhida como a segunda
melhor invenção do mundo em Best New Marketing Tools, em Las Vegas/2003 pela revista
especializada Recharger Magazine.
A Par@í tem seu parque industrial situado no município de Cabedelo, ficando a 15 Km do
centro da cidade de João Pessoa, sendo responsável pela fabricação de toda a linha de produtos para
reciclagem de cartuchos, exportada para outros estados e países. A fábrica e loja da Par@í, que
ocupam mais de 3.500 m², empregam mais de 110 funcionários e com sua tecnologia está presente
em 60 países, contribuindo de forma direta para o crescimento da Paraíba. A empresa conta com
mais de 50 funcionários para atender aos clientes de outros estados, através de um site na web.
A Par@í Informática recebeu em 2003 a certificação internacional de qualidade ISO 9001
concedida pela empresa alemã DQS. O relatório elaborado atesta que a Par@í Informática
implementou e mantém um rigoroso sistema de qualidade, que cumpre os requisitos da ISO 9001 e
tem certificação aceita em 29 países. A ISO 9001/2000 na Par@í foi implantada na fabricação de
máquinas, processo de enchimento de cartuchos, atendimento a clientes e manutenção de
impressoras.
Fórum Internacional do Meio Ambiente - A conferência da Terra 1339

Quanto ao destino final dos cartuchos que não servem mais para serem reciclados, os
mesmos vão sendo armazenados na empresa até formarem certa quantidade e são levados para um
aterro. O mesmo ocorre em relação aos resíduos líquidos (tintas inservíveis).
De acordo com as declarações da empresa, além da reciclagem de cartuchos ser uma
atividade lucrativa e gerar emprego e renda, as principais vantagens para os consumidores e o meio
ambiente são:
O consumidor tem uma economia de até 60%: Redução de custos: a reciclagem de
cartuchos proporciona uma significativa redução de custos que pode chegar a 60% do valor do
cartucho novo.
Age ecologicamente: Reutilizar cartuchos é ecologicamente correto. Para cada cartucho
reciclado, economiza-se 5 litros de petróleo, 40.000 toneladas de plástico e metal a cada ano,
diminuindo assim o lixo jogado no planeta. Cada cartucho leva 50 anos para se deteriorar na
natureza.
Aumento do poder de barganha do cliente: Além de proporcionar uma economia em torno
de 60% para o usuário, o preço do cartucho reciclado – com uma qualidade idêntica a do original –,
de maneira indireta, induz a redução do preço do cartucho novo, tendo em vista a sua forte
concorrência.
Não danifica a impressora: O cartucho reciclado não representa nenhum risco a vida útil da
impressora.

CONSIDERAÇÕES FINAIS
A realização dessa pesquisa possibilitou compreender a importância da logística reversa
para a questão ambiental, tão considerada nos dias atuais em todos os ramos de atividades,
sobretudo nas empresariais. As empresas estão se deparando com condições externas em constantes
mudanças, onde se percebe o aumento da conscientização ambiental dos consumidores, que não se
preocupam exclusivamente com a satisfação de suas necessidades, consideram também os impactos
causados pelos produtos ao meio ambiente.
Nesse contexto, o presente trabalho buscou conhecer o processo da logística reversa de
pós-consumo e analisar a sua importância para as organizações como um instrumento de motivação
para obtenção de objetivos econômicos e ecológicos.
O objetivo econômico da implementação da logística reversa de pós-consumo pode ser
entendido como a motivação para a obtenção de resultados financeiros por meio de economias
obtidas nas operações industriais, principalmente pelo aproveitamento de matérias-primas
secundárias, provenientes dos canais reversos de reciclagem, ou de revalorizações mercadológicas
nos canais reversos de reuso e de remanufatura (LEITE, 2003).
Verificou-se também que a necessidade de soluções contra agentes poluidores, visando à
gestão e conservação de recursos naturais tem crescido acentuadamente, e para supri-la,
empreendimentos que manifestem essa preocupação têm alcançado atualmente considerável
destaque, como é o caso da empresa Par@í Informática com a execução da atividade de reciclagem
de cartuchos para impressoras.
O objetivo ecológico da logística reversa de pós-consumo tem alcançado um destaque
significativo, tendo em vista sua relevância para a qualidade de vida das populações. Tendo a
sensibilidade ecológica, tanto da sociedade como das organizações empresariais, se desenvolvido
em decorrência da observância dos impactos negativos decorrentes das atividades humanas.
Nesse intuito, buscar o desenvolvimento econômico sem abrir mão do equilíbrio do meio
ambiente tornou-se um objetivo primordial para as economias mais avançadas.
Dessa maneira, a empresa objeto de estudo no presente trabalho, com o aprimoramento de
suas estratégias empresariais, tem alcançado tanto objetivos econômicos quanto ecológicos a partir
da utilização da logística reversa de pós-consumo, que tem se destacado por proporcionar além da
preservação dos recursos naturais, a geração de emprego e renda.
Fórum Internacional do Meio Ambiente - A conferência da Terra 1340

REFERÊNCIAS BIBLIOGRAFIA
BALLOU, R. H. Logística Empresarial: transportes, administração de materiais, distribuição física.
São Paulo: Atlas, 1993.
BARBOSA, Erivaldo Moreira. Direito Ambiental: em busca da sustentabilidade. São Paulo:
Scortecci, 2005.
BOWERSOX, D. J. & CLOSS, D. J. Logística Empresarial. São Paulo: Atlas, 2001.
C.L.M – Council Of Logistics Management. Reuse And Recycling Reverse Logistics
Opportunities. Illinois: Council of Logistics Management, 1993.
DIAS, Reinaldo. Gestão Ambiental: responsabilidade social e sustentabilidade. Atlas, 1ª edição,
2006.
FLEURY, P. Logística e Gerenciamento da cadeia de Suprimentos. São Paulo: Atlas, 2003.
http://www.parai.com.br> Acesso em 17 mar./2008
LACERDA, L. Logística Reversa - uma visão sobre os conceitos básicos e as práticas operacionais.
In: http://www.coppead.ufrj.br/pesquisa/cel/new/fr-ver.htm. Acesso em 04 jan./2008.
LEITE, Paulo Roberto. Logística Reversa: meio ambiente e competitividade. São Paulo: Pearson
Prentice Hall, 2003.
PHILIPPI JR., Arlindo; ROMÉRO, Marcelo de Andrade; BRUNA, Gilda Collet. Curso de gestão
ambiental. São Paulo: Manole, 2004.
RODRIGUES, A. M.; RODRIGUES, I. C. O desenvolvimento econômico regional no contexto do
desenvolvimento sustentável. In: Anais do XXIII Encontro de Engenharia de Produção (ENEGEP).
Ouro Preto: UFOP, 2003.
SCHENINI, P. C. Avaliação dos padrões de competitividade á luz do desenvolvimento sustentável:
o caso da Indústria Trombini de Papel e Embalagens S/A em Santa Catarina. 1999. 223 f. Tese
(Doutorado em Engenharia de Produção e Sistemas), Universidade Federal de Santa Catarina,
Florianópolis, 1999.
Fórum Internacional do Meio Ambiente - A conferência da Terra 1341

RECICLAGEM PLÁSTICA: O CASO DOS FRASCOS PLÁSTICOS DE POSTOS DE


GASOLINA

Aline Gisele Azevedo Lima


Faculdade Natalense de Ensino e Cultura –FANEC. Av. Prudente de Morais, 4890. Lagoa Nova. Natal/RN. Tel.: 84
3234-3637. aline_pep@yahoo.com.br
Ângela Araújo Gomes
Faculdade Piauiense – FAP. Av. Jóquei Clube, 710. Jóquei. Teresina/PI. Tel.: 86 3133-2616.
angelagomes@hotmail.com

RESUMO
Este estudo pretende mostrar como a reciclagem de plásticos, no caso específico de frascos
plásticos de postos de gasolina, pode ajudar a combater a degradação ambiental reduzindo os custos
e aumentando a competitividade empresarial do setor. Para tanto foi realizado um levantamento,
através da Internet, no site de busca www.google.com.br, primeiramente, com a frase exata
“reciclagem de plástico”, e depois “reciclagem de frascos plásticos” de onde foram coletados os
dados que serviram de base para as análises pertinentes, bem como para os resultados específicos
que demonstram o interesse que o tema desperta nas diversas áreas acadêmicas e nas empresas em
questão.
Palavras-chaves: Reciclagem plástica, Frascos plásticos.

ABSTRACT
This study aims to show how the recycling of plastics, in the specific case of plastic bottles
of gasoline posts, can help combat environmental degradation reducing costs and increasing the
competitiveness of the business sector. Thus a survey was conducted through the Internet, the site
of search www.google.com.br, first, with the exact phrase "recycling of plastic," and then
"recycling of plastic bottles", where data were collected that served as a basis for the relevant
analyses, as well as to the specific results that demonstrate the interest that the issue arises in
various academic areas and the companies concerned.
Key-words: Recycling plastic, Plastic bottles.

INTRODUÇÃO
O presente trabalho busca apresentar uma das muitas tecnologias ambientais, a reciclagem,
em particular do plástico, usando um caso específico os frascos plásticos de postos de gasolina.
Dentro deste contexto, objetiva-se mostrar como esse processo ajuda a combater a
degradação ambiental, reduzindo os custos e aumentando a competitividade da empresa, passando
por toda uma fundamentação para que se possa compreender o que é reciclagem, principalmente a
de plástico, com todas as suas fases e entender o objeto deste trabalho.
Para tanto, foi estruturado de forma a apresentar, inicialmente, a metodologia utilizada para
a coleta das informações. Em seguida faz-se uma fundamentação teórica sobre o plástico e a
reciclagem, mas principalmente a plástica, seguindo-se da explanação sobre o objeto de estudo do
presente trabalho, o processo de coleta e reciclagem dos frascos de plásticos dos postos de gasolina.
Ao final são apresentadas as conclusões e considerações pertinentes aos objetivos deste estudo.

METODOLOGIA
Inicialmente foi realizado um levantamento através de uma pesquisa on-line, via Internet,
no site de busca www.google.com.br, utilizando a pesquisa avançada e a frase exata “reciclagem de
plásticos”.
Considerando que a pesquisa no site citado apresentou inúmeras ocorrências, foi realizada
uma outra pesquisa utilizando a frase exata “reciclagem de frascos plásticos”, onde se apontou 32
ocorrências, e feita em seguida uma análise em cada um dos sites a fim de atestar se o assunto e o
enfoque estavam alinhados com as metas deste estudo.
Fórum Internacional do Meio Ambiente - A conferência da Terra 1342

A etapa seguinte deste estudo foi realizar um levantamento, nos sites sobre o termo geral
“reciclagem de plástico”, aleatoriamente, para aprofundar toda a fundamentação teórica encontrada.
Por fim, os dados das etapas anteriores foram organizados em forma de texto, a fim de
possibilitar uma análise mais embasada sobre o assunto reciclagem de frascos plásticos, bem como
permitir os comentários pertinentes e estabelecer conclusões a cerca do assunto.

RECICLAGEM
Reciclagem, segundo Biddle (1993), é um processo industrial que converte o lixo
descartado (matéria-prima secundária) em produto semelhante ao inicial ou outro. Reciclar é
economizar energia, poupar recursos naturais e trazer de volta ao ciclo produtivo o que é jogado
fora. A palavra reciclagem foi introduzida ao vocabulário internacional no final da década de 80,
quando foi constatado que as fontes de petróleo e outras matérias-primas não renováveis estavam e
estão se esgotando. Reciclar significa = Re (repetir) + Cycle (ciclo). Para compreendermos a
reciclagem, é importante "reciclarmos" o conceito que temos de lixo, deixando de enxergá-lo como
uma coisa suja e inútil em sua totalidade. O primeiro passo é perceber que o lixo é fonte de riqueza
e que para ser reciclado deve ser separado. Ele pode ser separado de diversas maneiras, sendo a
mais simples separar o lixo orgânico do inorgânico (lixo molhado/ lixo seco).
Na natureza nada se perde. Seres vivos chamados decompositores "comem" material sem
vida ou em decomposição. Eles dividem a matéria para que ela possa ser reciclada e usada de novo.
Esse é o chamado material biodegradável. Quando um animal morre, ele é reciclado pela natureza.
Quando um material é dividido em pequenas peças, as bactérias e fungos, os mais importantes
decompositores, já podem trabalhar.
A decomposição aeróbia é mais completa que a anaeróbia por gerar gás carbônico, vapor
de água e os sais minerais, substâncias indispensáveis ao crescimento de todos os vegetais, o qual
gera o húmus, ótimo adubo para o solo.
No processo anaeróbio, são gerados os gases (metano e sulfídrico), que causam um odor
desagradável; a decomposição anaeróbia produz um líquido escuro denominado chorume (líquido
com grande quantidade de poluentes) encontrado normalmente no fundo das latas de lixo. Este
chorume é o principal causador da contaminação dos rios e do lençol freático.

Benefícios da Reciclagem:
• Contribui para diminuir a poluição do solo, água e ar;
• Melhora a limpeza da cidade e a qualidade de vida da população;
• Prolonga a vida útil de aterros sanitários;
• Melhora a produção de compostos orgânicos;
• Gera empregos para a população não qualificada;
• Gera receita com a comercialização dos recicláveis;
• Estimula a concorrência, uma vez que produtos gerados a partir dos reciclados são
comercializados em paralelo àqueles gerados a partir de matérias-primas virgens;
• Contribui para a valorização da limpeza pública e para formar uma consciência ecológica.
A grande solução para os resíduos sólidos é aquela que prevê a máxima redução da
quantidade de resíduos na fonte geradora. Quando os resíduos não podem ser evitados, deverão ser
reciclados por reutilização ou recuperação, de tal modo que seja o mínimo possível o que tenha
como destino final os aterros sanitários.
A reciclagem surgiu, segundo Donaire (1994), como uma maneira de reintroduzir no
sistema uma parte da matéria (e da energia), que se tornaria lixo. Assim, desviados, os resíduos são
coletados, separados e processados para serem usados como matéria-prima na manufatura de bens,
os quais eram feitos anteriormente com matéria-prima virgem. Dessa forma, os recursos naturais
ficam menos comprometidos.
Fórum Internacional do Meio Ambiente - A conferência da Terra 1343

OS PLÁSTICOS
Plásticos são materiais formados pela união de grandes cadeias moleculares chamadas
polímeros, que, por sua vez, são formadas por moléculas menores, chamadas monômeros.
Para Pires (2003), os plásticos são produzidos através de um processo químico chamado
polimerização, que proporciona a união química de monômeros para formar polímeros.
Os polímeros podem ser naturais ou sintéticos. Os naturais, tais como algodão, madeira,
cabelos, chifre de boi, látex, entre outros, são comuns em plantas e animais. Os sintéticos, tais como
os plásticos, são obtidos pelo homem através de reações químicas.
O tamanho e estrutura da molécula do polímero determinam as propriedades do material
plástico.
A matéria-prima dos plásticos é o petróleo. Este é formado por uma complexa mistura de
compostos. Pelo fato de estes compostos possuírem diferentes temperaturas de ebulição, é possível
separá-los através de um processo conhecido como destilação ou craqueamento.
A fração nafta (fração de destilação do petróleo, constituída por hidrocarbonetos de baixo
ponto de ebulição, usada para fins energéticos e não energéticos) é fornecida para as centrais
petroquímicas, onde passa por uma série de processos, dando origem aos principais monômeros,
como, por exemplo, o eteno.
Assim, segundo Pires (2003), podem–se classificar as moléculas formadoras dos plásticos,
os polímeros, da seguinte forma, para poder entender quais podem ser reciclados:
Termoplásticos: são plásticos que não sofrem alterações em sua estrutura química durante
o aquecimento e que após o resfriamento podem ser novamente moldados. Exemplos:
- Polipropileno (PP)
Produtos: filmes para embalagens e alimentos, embalagens industriais, cordas, tubos
para água quente, fios e cabos, frascos, caixas de bebidas, autopeças, fibras para tapetes e utilidades
domésticas, potes, fraldas e seringas descartáveis, etc.
Benefícios: conserva o aroma, é inquebrável, transparente, brilhante, rígido e
resistente a mudanças de temperatura.
- Polietileno de Alta Densidade (PEAD)
Produtos: embalagens para detergentes e óleos automotivos, sacolas de
supermercados, garrafeiras, tampas, tambores para tintas, potes, utilidades domésticas, etc.
Benefícios: inquebrável, resistente a baixas temperaturas, leve, impermeável, rígido e
com resistência química.
- Polietileno de Baixa densidade (PEBD)
- Polietileno tereftalato (PET)
Produtos: frascos e garrafas para uso alimentício/hospitalar, cosméticos, bandejas
para microondas, filmes para áudio e vídeo, fibras têxteis, etc.
Benefícios: transparente, inquebrável, impermeável, leve;
- Poliestireno (PS)
Produtos: potes para iogurtes, sorvetes, doces, frascos, bandejas de supermercados,
geladeiras (parte interna da porta), pratos, tampas, aparelhos de barbear descartáveis, brinquedos,
etc.
Benefícios: impermeável, inquebrável, rígido, transparente, leve e brilhante.
- Policloreto de Vinila (PVC) –
Produtos: embalagens para água mineral, óleos comestíveis, maioneses, sucos. Perfis para
janelas, tubulações de água e esgotos, mangueiras, embalagens para remédios, brinquedos, bolsas
de sangue, material hospitalar, etc.
Benefícios: rígido, transparente, impermeável, resistente à temperatura e inquebrável;

Termofixos: são aqueles que uma vez moldados não podem ser fundidos e remoldados
novamente, portanto não são recicláveis mecanicamente. Exemplos: baquelite, Poliuretanos (PU) e
Poliacetato de Etileno Vinil (EVA), poliésteres, resinas fenólicas, etc.
Fórum Internacional do Meio Ambiente - A conferência da Terra 1344

Produtos: solados, autopeças, chinelos, pneus, acessórios esportivos e náuticos, plásticos


especiais e de engenharia, CDs, eletrodomésticos, corpos de computadores, etc.
Benefícios: flexibilidade, leveza, resistência à abrasão, possibilidade de design
diferenciado.

Vantagens do uso de Plásticos


Menor consumo de energia na sua produção;
Redução do peso do lixo;
Menor custo de coleta e destino final;
Poucos riscos no manuseio;
Além de práticos, são totalmente recicláveis.

Fatores que estimulam a Reciclagem


Redução do volume de lixo a transportar: tratamento e disposição;
Aumento da vida útil dos locais de deposição de lixo.
4.3 Reciclagem de Plástico
O lixo brasileiro contém de 5 a 10% de plásticos, conforme o local. São materiais que,
como o vidro, ocupam um considerável espaço no meio ambiente. O ideal é serem recuperados e
reciclados. Plásticos são derivados do petróleo, produto importado (60% do total no Brasil). A
reciclagem do plástico exige cerca de 10% da energia utilizada no processo primário.
Do total de plásticos produzidos no Brasil, só reciclamos 15%. Um dos empecilhos é a
grande variedade de tipos de plásticos. Uma das alternativas seria definir um tipo específico de
plástico para ser coletado.
Os plásticos recicláveis, segundo Biddle (1993), são: potes de todos os tipos, sacos de
supermercados, embalagens para alimentos, vasilhas, recipientes e artigos domésticos, tubulações e
garrafas de PET, que convertida em grânulos é usada para a fabricação de cordas, fios de costura,
cerdas de vassouras e escovas.
Os não recicláveis são: cabos de panela, botões de rádio, pratos, canetas, bijuterias,
espuma, embalagens a vácuo, fraldas descartáveis.
O plástico reciclado pode ser utilizado para fabricação de garrafas e frascos, exceto para
contato direto com alimentos e fármacos; baldes, cabides, pentes e outros artefatos produzidos pelo
processo de injeção; "madeira - plástica"; cerdas, vassouras, escovas e outros produtos que sejam
produzidos com fibras; sacolas e outros tipos de filmes; painéis para a construção civil.

Processos de Reciclagem de Plástico


a) Reciclagem Química
A reciclagem química re-processa plásticos, transformando-os em petroquímicos básicos
que servem como matéria-prima em refinarias ou centrais petroquímicas. Seu objetivo é a
recuperação dos componentes químicos individuais para reutilizá-los como produtos químicos ou
para a produção de novos plásticos.
Os novos processos desenvolvidos de reciclagem química permitem a reciclagem de
misturas de plásticos diferentes, com aceitação de determinado grau de contaminantes como, por
exemplo, tintas, papéis, entre outros materiais.
Entre os processos de reciclagem química existentes, destacam-se:
Hidrogenação: As cadeias são quebradas mediante o tratamento com hidrogênio e calor,
gerando produtos capazes de serem processados em refinarias;
Gaseificação: Os plásticos são aquecidos com ar ou oxigênio, gerando-se gás de síntese
contendo monóxido de carbono e hidrogênio;
Quimólise: Consiste na quebra parcial ou total dos plásticos em monômeros na presença de
Glicol/Metanol e água;
Pirólise: É a quebra das moléculas pela ação do calor na ausência de oxigênio. Este
processo gera frações de hidrocarbonetos capazes de serem processados em refinaria.
Fórum Internacional do Meio Ambiente - A conferência da Terra 1345

b) Reciclagem Mecânica
A reciclagem mecânica consiste na conversão dos descartes plásticos pós-industriais ou
pós-consumo em grânulos que podem ser reutilizados na produção de outros produtos, como sacos
de lixo, solados, pisos, conduítes, mangueiras, componentes de automóveis, fibras, embalagens não-
alimentícias e outros.
Este tipo de processo passa pelas seguintes etapas:
Separação: separação em uma esteira dos diferentes tipos de plásticos, de acordo com a
identificação ou com o aspecto visual. Nesta etapa são separados também rótulos de diferentes
materiais, tampas de garrafas e produtos compostos por mais de um tipo de plástico, embalagens
metalizadas, grampos, etc.
Por ser uma etapa geralmente manual, a eficiência depende diretamente da prática das
pessoas que executam essa tarefa. Outro fator determinante da qualidade é a fonte do material a ser
separado, sendo que aquele oriundo da coleta seletiva e mais limpo em relação ao material
proveniente dos lixões ou aterros.
Moagem: depois de separados, os diferentes tipos de plásticos, estes são moídos e
fragmentados em pequenas partes.
Lavagem: depois de triturado, o plástico passa por uma etapa de lavagem com água para a
retirada dos contaminantes. É necessário que a água de lavagem receba um tratamento para a sua
reutilização ou emissão como efluente.
Aglutinação: Além de completar a secagem, o material é compactado, reduzindo-se assim
o volume que será enviado à extrusora. O atrito dos fragmentos contra a parede do equipamento
rotativo provoca elevação da temperatura, levando à formação de uma massa plástica. O aglutinador
também é utilizado para incorporação de aditivos, como cargas, pigmentos e lubrificantes.
Extrusão: A extrusora funde e torna a massa plástica homogênea. Na saída da extrusora,
encontra-se o cabeçote, do qual sai um "espaguete" contínuo, que é resfriado com água. Em
seguida, o "espaguete" é picotado em um granulador e transformando em pellet (grãos plásticos).

c) Reciclagem Energética
É a recuperação da energia contida nos plásticos através de processos térmicos.
A reciclagem energética distingue-se da incineração por utilizar os resíduos plásticos como
combustível na geração de energia elétrica. Já a simples incineração não reaproveita a energia dos
materiais. A energia contida em 1 kg de plástico é equivalente à contida em 1 kg de óleo
combustível. Além da economia e da recuperação de energia, com a reciclagem ocorre ainda uma
redução de 70 a 90% da massa do material, restando apenas um resíduo inerte esterilizado.

RECICLAGEM DE FRASCOS PLÁSTICOS


O aumento do preço das resinas plásticas, pressionado pelas constantes flutuações do preço
do petróleo no mercado internacional, tem estimulado os transformadores de plásticos á procura de
resinas plásticas de menor custo e de boa qualidade. Normalmente o preço do plástico reciclado é
40% mais baixo do que o da resina virgem. Portanto, segundo Pires (2003), a substituição da resina
virgem pela reciclada, trás benefícios de redução de custo e aumento de competitividade.O aumento
da oferta de resinas plásticas recicladas esbarra na escassez de sucata plástica disponível para
consumo. A aprovação de leis ambientais, responsabilizando as empresas geradoras pela coleta e
destinação dos seus resíduos, resultará num impacto positivo, na oferta de matéria-prima para a
atividade de reciclagem de plásticos.
Nos estados do Rio de Janeiro e Rio Grande do Sul as leis estaduais n°. 3369 e 9921
respectivamente, já regulamentadas, responsabilizam as empresas distribuidoras de óleo lubrificante
e aditivos automotivos, pela coleta e destinação ambientalmente adequada das embalagens pós-
consumo.
Fórum Internacional do Meio Ambiente - A conferência da Terra 1346

Dados divulgados pela PLASTIVIDA158, indicam que somente 17,5% do plástico


produzido no país é reciclado. Os “gargalos” para o crescimento da indústria de reciclagem, residem
na coleta do plástico pós-consumo e no desenvolvimento de novos processos de reciclagem,
capazes de processar sucatas plásticas inadequadas para os processos existentes.
Os locais de troca de óleo (postos de gasolina, centros de troca, concessionárias de
veículos, etc.), descartam diariamente para o meio ambiente frascos plásticos de Polietileno de Alta
Densidade (PEAD), pós-consumo, contaminados com óleo lubrificante e aditivos, utilizados na
manutenção dos veículos automotores.
O óleo residual, contido nestes frascos, aumenta o índice de fluidez do plástico,
dificultando o processo de reciclagem, e prejudicando a qualidade dos artefatos reciclados
produzidos, devido à deformidade e presença de odor de óleo. Para evitar estes problemas, é
necessário desenvolver tecnologia para a remoção do óleo, e para o tratamento dos efluentes
gerados no processo de reciclagem.
A ausência de um processo de descontaminação, até há pouco tempo, e a falta de
consciência ambiental, como expões Pires (2003), faz com que alguns recicladores processem os
frascos contaminados com óleo, misturados aos frascos não contaminados. A parcela não coletada
(a mais volumosa) é enviada para as áreas de destinação de lixo, juntamente com o lixo urbano,
reduzindo a vida útil daquelas áreas, pois o tempo de biodegradação do PEAD é superior a 100
anos.
A disponibilidade de áreas adequadas, para implantação de projetos de destinação de lixo
(aterros e lixões), tornou-se um problema crítico, devido á expansão urbana e ás exigências da
legislação ambiental.
Além da perda do PEAD, o descarte destas embalagens no meio ambiente é também
preocupante, pelo potencial de contaminação dos recursos hídricos, causado pelo óleo contido
nestas embalagens.O óleo despejado nas águas consome oxigênio no processo de biodegradação, e
dificulta à passagem de luz, comprometendo desta forma a sobrevivência das espécies aquáticas.
Testes de extração de óleo lubrificante por hexano, realizados em frascos de um litro, pós-
consumo, revelaram a presença de 1% (em massa) de óleo residual (valor médio) por frasco.
Baseado no volume de óleo lubrificante comercializado no país em 2003 (868.353m³), divulgado
pelo SINDICOM159, estima-se que naquele ano foram consumidas 29.177 toneladas de PEAD na
fabricação de embalagens para óleo lubrificante. (Devido à falta de informações, não foi
considerado o PEAD consumido na fabricação das embalagens de aditivos automotivos).
A reciclagem destas embalagens através de um processo ambientalmente limpo resultaria
nos seguintes ganhos: evitar que cerca de 292 toneladas de óleo e 26.000 toneladas de PEAD
(perdas = 10%), fossem destinadas para o meio ambiente; abertura de 403 empregos diretos para a
reciclagem dos frascos; reaproveitamento de 26.000 toneladas de PEAD na fabricação de
embalagens plásticas de uso não-alimentício ou farmacêutico, tais como de óleo lubrificante e
aditivos automotivos, produtos de limpeza, produtos fitossanitários e de artefatos plásticos, como
conduítes elétricos, componentes de vassoura,etc.
Com base nos precedentes anteriormente descritos, estuda-se alternativas para o
desenvolvimento de um processo de reciclagem ambientalmente limpo, e viável economicamente,
para os frascos de óleo lubrificantes e aditivos automotivos.
Na planta projetada poderão também ser processados separadamente, frascos não
contaminados com óleo, tais como os de produtos de limpeza (PEAD) e de água mineral
(polipropileno).
Durante as pesquisas foram estudadas as seguintes alternativas:
1- Extrusão em cascata: foram usadas duas extrusoras para granular o plástico e remover o
óleo por volatilização e degasagem. Não ocorreu a remoção total do óleo neste processo. Os frascos
fabricados com os pellets produzidos apresentaram odor e imperfeições.

158
Instituto Sócio-Ambiental dos Plásticos. Site: www.plastivida.org.br
159
Sindicato Nacional das Empresas Distribuidoras de Combustíveis e de Lubrificantes. Site:
http://www.sindicom.com.br
Fórum Internacional do Meio Ambiente - A conferência da Terra 1347

2- Extração do óleo por solvente: os frascos moídos foram lavados com solvente orgânico
para extração do óleo. O processo é eficiente na remoção do óleo, porém foi abandonado devido à
alta inflamabilidade e periculosidade do solvente;
3- Lavagem com detergente: foi o processo escolhido por apresentar eficiência na remoção
do óleo e risco operacional reduzido. Consiste na lavagem dos frascos moídos com solução de
detergente para remoção do óleo. Após a separação do plástico, a emulsão água-óleo é tratada por
processo físico-químico. A água tratada é reciclada no processo e o resíduo sólido (óleo e
impurezas) é enviado para incineração. O plástico moído após enxágüe e secagem é extrusado para
obtenção de pellets reciclados, os quais são utilizados puros ou misturados com resinas virgens na
fabricação de artefatos plásticos.
Nas amostras de PEAD reciclado, foram realizados testes de Índice de Fluidez (MFI),
Espectroscopia de Infra-Vermelho (FTIR) e Calorimetria Diferencial de Varredura (DSC).
Os resultados obtidos, comparados aos do material virgem, indicaram que não houve
degradação, pelo menos em escala significativa, que pudesse comprometer o desempenho de
diferentes produtos fabricados a partir do material reciclado, produzido através deste processo de
reciclagem.
O material granulado foi testado no processo de extrusão-sopro, na produção de bombonas
de 20 litros para óleo lubrificante, e de frascos de um litro para água sanitária. No primeiro teste
foram utilizados 30% de material reciclado misturado á resina virgem. O segundo teste foi
conduzido com o uso de 100% de PEAD reciclado. Nos dois testes, as embalagens produzidas
foram aprovadas nos ensaios de controle de qualidade.

CONSIDERAÇÕES FINAIS
Assim, depois de toda essa fundamentação pode-se dizer que a fabricação de plástico
reciclado economiza 70% de energia, considerando todo o processo desde a exploração da matéria-
prima primária até a formação do produto final. Além disso, se o produto descartado permanecesse
no meio ambiente, poderia estar causando maior poluição. Isso pode ser entendido como uma
alternativa para as oscilações do mercado abastecedor e também como preservação dos recursos
naturais, o que podendo reduzir, inclusive, os custos das matérias-primas. O plástico reciclado tem
infinitas aplicações, tanto nos mercados tradicionais das resinas virgens, quanto em novos
mercados.
Para isso, precisa-se, da aprovação de leis ambientais, responsabilizando as empresas
geradoras pela coleta e destinação dos seus resíduos, que resultará num impacto positivo, na oferta
de matéria-prima para a atividade de reciclagem de plásticos.

REFERENCIAS BIBLIOGRAFICAS
BIDDLE, David. Recycling for Profit: the New Green Business Frontier. Havard Business Review.
V. 71, n. 6, Nov/Dec 1993, p.: 145-156.
DONAIRE, Denis. A interiorização da variável ecológica na organização das empresas. Curitiba.
Anais do XVIII Encontro Nacional de Pós-Graduação em Administração (ENANPAD), vol. 8
(Organizações), 1994ª, p. 257-271.
PIRES, Adilson Santiago. Reciclagem de frascos plásticos de postos de gasolina.
Niead/CCMN/UFRJ. 2003 (www.niead.ufrj.br)
Sites:
http://empresas.globo.com/Empresasenegocios/0,,ERA610348-2992,00.html – acessado no dia
24/01/2005
http://www.ambientebrasil.com.br/composer.php3?base=residuos/index.php3&conteudo=./residuos
/artigos.html - acessado no dia 24/01/2005
http://www.ambientebrasil.com.br/composer.php3?base=residuos/index.php3&conteudo=./residuos
/artigos/frascos_plasticos.html - acessado no dia 24/01/2005
http://www.resol.com.br/curiosidades2.asp?id=1676 – acessado no dia 25/01/2005
http://www.unisite.com.br/saude/reciclagem.shtml - acessado no dia 25/01/2005
Fórum Internacional do Meio Ambiente - A conferência da Terra 1348

http://www.helptreinamentos.com.br/news_04a.html - acessado no dia 25/01/2005


http://www.abrelpe.com.br/curioso/cur-0066.html - acessado no dia 25/01/2005
http://www.aomestrecomcarinho.com.br/mab/83.htm - acessado no dia 25/01/2005
http://www.pescacommosca.com.br/noticia/lernoticia.php?IdtNoticia=1278 - acessado no dia
25/01/2005
http://www.globo.com/Galileu/1,6993,ECT502777-1939,00.html - acessado no dia 25/01/2005.
http://www.valeverde.org.br/html/clipp2.php?id=1651&categoria=Reciclagem – acessado no dia
25/01/2005.
Fórum Internacional do Meio Ambiente - A conferência da Terra 1349

RESÍDUOS SÓLIDOS EM MARACANAÚ: PROPOSTAS DE GESTÃO INTEGRADA E


PARTICIPATIVA

Pedro Hermano Barreto Magalhães


Especializando em Gestão Ambiental Urbana – CEFET / CE. Graduando no Bacharelado em
Geografia – UFC. Graduado na Licenciatura em Geografia – UFC.
pedrohbmagalhaes@hotmail.com

RESUMO
Este trabalho consiste em fomentar um sistema de gestão de resíduos sólidos
compartilhado com os agentes envolvidos, através de parceria entre sociedade civil, governo e setor
produtivo. Pretende-se contribuir para o desenvolvimento de um modelo que preconize a
sustentabilidade, considerando, do consumo ao descarte, minimizando a destinação final através da
maximização do reaproveitamento e da reciclagem.
Palavra-chave: Resíduos Sólidos, Gestão Integrada, Reciclagem, Município de Maracanaú

ABSTRACT
This work is to promote a system of management of solid waste shared with the actors
through partnerships between civil society, government and productive sector. It is intended to
contribute to the development of a model that provides for the sustainability, considering by
consumption to discard, minimizing the final destination by maximizing the reuse and recycling.

INTRODUÇÃO
A produção exagerada de resíduos e a falta de gestão adequada ocasionam imensos danos à
qualidade ambiental, além de sérios riscos a saúde humana. Essa abordagem passa por toda a
estrutura social em que se insere a cultura do consumo demasiado e descartável, intrínseco ao
sistema de produção capitalista e excludente.
Esse contexto global pode ser bem ilustrado no município de Maracanaú, situado em uma
região metropolitana com mais de três milhões de habitantes. Nesse país de enormes contrastes, o
elevado consumo produz, diariamente, milhares de toneladas de diferentes resíduos que serão
despejados distante de quem os produzem. Porém, aquilo que consideramos lixo é fonte de
sobrevivência para muitos. No Brasil, a catação de material reciclável é uma atividade em ascensão,
sobretudo, pelo fato de ser a única possibilidade de muitas famílias obterem renda. Essas pessoas,
muitas vezes crianças e adolescentes, realizam um trabalho de relevância ambiental, contudo, do
modo que vem sendo executado, causam graves riscos a integridade física e social desses
protagonistas.
Nesse sentido, torna-se necessário o desenvolvimento de pesquisas, projetos, programas e
ações que contribuam para promover uma cultura que adote o consumo e o descarte consciente,
valorizando o trabalho dos Agentes Recicladores e evitando enterrar riquezas com o pseudônimo de
lixo.
Portanto, através desse trabalho, pretende-se oferecer subsídios técnicos e legais para a
formulação de políticas públicas voltadas a uma maior sustentabilidade ambiental, pelo menos no
que se refere aos resíduos sólidos.

METODOLOGIA
Pesquisa qualitativa de caráter aplicado, tendo como procedimentos técnicos: levantamento
bibliográfico; pesquisa documental; levantamento; estudo de caso, através de Pesquisa ação e
participativa.
Inicia-se pela formação de um grupo de estudo multidisciplinar para o planejamento mais
detalhado das ações. O grupo será composto por técnicos da prefeitura e estagiários de diferentes
áreas acadêmicas, no sentido de utilizar diversas abordagens para o estudo dessa problemática nesse
espaço. Nesse momento será feito a análise e avaliação do Plano de Gestão Integrado de Resíduo
Fórum Internacional do Meio Ambiente - A conferência da Terra 1350

Sólido – PGIRS de Maracanaú, documento elaborado no final de 2007 e início de 2008, através do
convênio da Secretaria de Obras com a FCK Construções e Projetos e Instalações LTDA.
No segundo momento, será proposto parcerias com as associações comunitárias no sentido
de realizar o Cadastro dos Agentes Recicladores através de aplicação de questionário sócio-
econômico. Simultaneamente o grupo de pesquisa realizará visitas técnicas aos depósitos de
material reciclável e as usinas de reciclagem do município.
Em seguida, serão realizados encontros com representantes dos atores envolvidos na rede
municipal de reciclagem para escutar, de cada segmento, as conveniências e os problemas de suas
atividades, assim como suas possíveis soluções.
Após o levantamento será feito: revisão bibliográfica e documental; compilação dos dados
quantitativos e tratamento estatístico; análise dos depoimentos; e elaboração de um diagnóstico
situacional e propostas.
Ressalta-se que a pesquisa possui caráter interminável, além de que, serão concomitantes
as ações que favoreçam o desenvolvimento das propostas já existentes. A equipe se encarregará de
produzir documentos periódicos para comunicar os resultados obtidos. Vale salientar que a equipe
estará locada nas dependências da Secretaria de Meio Ambiente e contará com o aparato técnico da
Prefeitura de Maracanaú.

RESULTADOS PRETENDIDOS
È fundamental que as propostas do Sistema Integrado de Gestão de Resíduos Sólidos –
SIGRS sejam construídas com participação dos seus atores, contudo, algumas metas serão
previamente citadas no sentido de orientar as ações, como: 1) Elaborar estratégias para viabilizar a
utilização de tecnologia adequada para a reutilização, reciclagem e a destinação final dos resíduos
sólidos; 2) Atuar em parceria com o setor produtivo no sentido de promover mecanismos de
redução de resíduos, por meio de incentivos municipais, criando campanhas junto ao setor industrial
para redução de embalagem ou mesmo a utilização de embalagens menos poluidoras. O setor
comercial deve ser estimulado a substituir as sacolas plásticas por alternativas mais limpas; 3)
Propor legislação local mais especifica, pautadas em normas técnicas para a produção, transporte,
beneficiamento, comercialização, reciclagem, destinação final dos resíduos sólidos; 4) Implantar
um Sistema de Coleta Seletiva nas escolas, instituições públicas, indústrias e comércios através de
mobilização e incentivos; 5) Realizar a coleta de resíduos especiais, como: pilhas, baterias e outros
resíduos de reciclagem não convencional, como: óleo usado em fritura, óleo lubrificante, graxa,
etc.; 6) Participar da estruturação e gestão da Usina de Triagem e Beneficiamento de Resíduos de
Maracanaú UTBR em parceria com a Cooperativa Coomvida, contribuindo para o desenvolvimento
de mecanismos que agreguem valor aos resíduos, melhorando a renda dos cooperados; 7) Implantar
e gerenciar uma Usina de Compostagem; 8) Efetivar a Agenda Ambiental na Administração Pública
- A3P; 9) Criar um Centro de Referência do Lixo, servindo como base para as ações dessa natureza;
e 10) Promover fórum permanente para discutir e planejar as políticas voltadas para
desenvolvimento dessa atividade, contribuindo para organização e alto gestão desses atores em
cooperativas e associações. Nesse sentido, pretende-se garantir cidadania para os trabalhadores da
reciclagem, assim como, promover melhor qualidade ambiental e a economia dos recursos naturais.

Caracterização do espaço
Maracanaú, na linguagem Tupy, significa “lugar onde as Araras Maracanãs bebem água”.
Esse “título” faz alusão à lagoa de Maracanaú, a qual, nos meados do século XVII, surgiu em suas
margens a primeira aglomeração humana da região. Lamentável que a espécie que intitulou o
município, atualmente, não exista mais na natureza local.
“Historicamente, até as décadas de 1940 e 50, a ocupação urbana era muito incipiente, e
somente no fim da década de 1960, ocorre um fato que mudará por completo a feição espacial de
Maracanaú: a implantação do Distrito Industrial de Fortaleza – DIF. Entretanto, a instalação das
indústrias se deu efetivamente a partir da década de 1980. Nas proximidades do DIF, foram
construídos grandes conjuntos habitacionais, que totalizaram mais de 20.000 residências,
Fórum Internacional do Meio Ambiente - A conferência da Terra 1351

ocasionando um salto no número de habitantes e, conseqüentemente, no processo de expansão


urbana: de 37.844 habitantes em 1980, para 157.150 em 1991” (SANTOS, 1998 apud ALMEIDA,
2005).
A condição econômica do distrito e o crescimento vertiginoso da população impulsionaram
os grupos organizados locais a exigirem autonomia política. Em 1983, o município de Maracanaú
foi fundado através da lei estadual 10.811/83, ao desmembrar-se de Maranguape.

Figura 1: Localização do município de Maracanaú. Fonte: (Almeida, 2005).

Segundo dados do Instituto de Pesquisas Aplicadas do Ceará - IPECE (2007), o município


possui área de 105,70 km² e população de, aproximadamente, 196.422 indivíduos. A densidade
demográfica é de 1.858,3 habitantes por km², atingindo um índice de 99,69% da população vivendo
em área urbana.
O Distrito Industrial acrescenta, consideravelmente, a arrecadação tributária do município
refletindo na participação expressiva do PIB do estado e no seu elevado índice de PIB per capta:

Tabela 3: Produto Interno bruto por Habitante


Município PIB per capta Participação no PIB do CE
(R$) (%)

Euzébio 16.615 2,17

Maracanaú 10.463 7,93

Horizonte 8.986 1,37

Pacajus 7.638 1,46

Sobral 5.474 3,62

Fortaleza 4.673 42,59


Fonte: IPECE, 2002.

De fato, esses números não se manifestam na realidade, pois a quantidade de “riquezas”


produzidas em Maracanaú não condiz com a média do padrão de vida dos seus munícipes, além de
quê, o município apresenta graves problemas sociais e ambientais.
Conforme Almeida (2005), o modelo de desenvolvimento industrial adotado em
Maracanaú tem sido fator preponderante para a configuração de seu espaço físico e social e,
conseqüentemente, tem influenciado profundamente na construção de suas formas de sociabilidade.
Segundo técnicos da Secretaria de Desenvolvimento Econômico, o setor de serviços tem
apresentado dinamismo nos últimos anos, fato que pode ser retratado pela instalação de grandes
Fórum Internacional do Meio Ambiente - A conferência da Terra 1352

empreendimentos comerciais, como o Shopping Center Maracanaú e o Feira Center, que agrega
500 boxes e 50 lojas de fabricantes de roupas, acessório e artefatos da região. A vinda de grandes
redes de lojas e o surgimento de diversos pequenos negócios, assim como, o acréscimo do setor
informal, também contribuem para a consolidação da atividade comercio do município.
De acordo com a Secretaria Municipal de Educação, Maracanaú conta com uma ampla
rede de ensino, composta por 186 estabelecimentos, sendo: 83 escolas municipais; 19 estaduais; 52
creches comunitárias; 31 colégios particulares; e uma unidade do Centro Federal de Ensino
Tecnológico – CEFET, com ensino técnico e superior. Além disso, vinculados a Secretaria de
Assistência Social e Cidadania, existem cinco Pólos ABC’s que desenvolvem vários projetos sociais
voltado às crianças e adolescentes de famílias de baixa renda.
Conforme dados da Secretaria Municipal de Saúde, o município conta com 30 unidades
ligadas ao Sistema Único de Saúde - SUS, dessas, 25 são públicas e 5 são privadas. No que se refere
ao saneamento, segundo a Secretaria de Obras, o município possui 75% de cobertura de água
encanada, 45,83% de esgoto e 98% de domicílios atendidos pela coleta de lixo.
Conforme dados do IPECE, no ano de 2000, Maracanaú apresentou Índice de
Desenvolvimento Humano – IDH de 0,736, considerado o segundo melhor do Ceará. Em relação ao
Índice de Desenvolvimento Municipal – IDM, em 2004, o Município apresentou nota 55,88,
atingindo a quarta colocação no ranking do Estado.
As Políticas de Meio Ambiente em Maracanaú tiveram reconhecidos avanços a partir do
ano de 2005, com a criação da Secretaria de Meio Ambiente – SEMAM e em 2006, com a formação
do Conselho Municipal de Defesa do Meio Ambiente – CONDEMA. Esse progresso resultou na
conquista do título Município Verde de 2007, Programa do Governo do Estado que, através do
Conselho de Políticas e Gestão do Meio Ambiente – CONPAM, avalia e determina o índice de
gestão ambiental – IGA dos municípios cearenses inscritos, certificando-os em categorias,
conforme o desempenho de cada um.
Deste modo, as informações apresentadas servem para ter uma idéia da conjuntura do
município. Dessa forma, ajuda a reconhecer algumas vulnerabilidades e potencialidades
relacionadas ao desenvolvimento de um modelo de gestão integrada de resíduos sólidos.

Resíduos Sólidos em Maracanaú


Até o ano 2006 não existia nenhum setor específico que tratasse desse problema no
Município. Atualmente a Secretaria de Obras, através da Coordenadoria de Limpeza Urbana,
planeja, coordena e fiscaliza a execução do sistema de limpeza urbana do Município
O sistema está sendo operado por quatro empresas terceirizadas para a execução dos
serviços de limpeza urbana. Ao todo, são utilizados 39 veículos para a coleta e o transporte dos
resíduos gerados no município, sendo que, nenhum desses caminhões é de propriedade da
Prefeitura. O aterro recebe, em média, 265 toneladas de resíduos diariamente, sendo 159 toneladas
oriundas de Maracanaú e 106 toneladas de Maranguape e particulares. Segundo estatísticas da
empresa que opera o aterro sanitário, o saldo de vida útil do desse é de 118 anos.
Esse modelo tradicional de limpeza urbana é reconhecidamente insustentável, pois se
limita na coleta e despejo em aterro sanitário, sendo totalmente realizado por empresas privadas,
que obtém lucros por tonelada de lixo recolhido e aterrado. No entanto, existe um contingente
considerável de catadores, depósitos e recicladoras que realizam essa atividade sem um
planejamento integrado, o que favorece a exploração dos mais fracos, nesse caso, os catadores.
No que se refere ao tratamento dos resíduos sólidos, o município possui uma Usina de
Triagem e Beneficiamento de Resíduos – UTBR que se encontra desativada. Construída em 2006,
anexa ao aterro sanitário pela Secretaria de Infraestrutura do Estado, teve concessão de uso para o
convênio entre a Prefeitura de Maracanaú e a Cooperativa dos Catadores da Comunidade Vida
Nova – Coomvida. A Usina possui área total de 6.400 m2, sendo 800m2 de área construída, sendo
então equipada com um mini-trator do tipo carregadeira, duas esteiras de transporte para a triagem,
duas prensas hidráulicas, duas balanças, dois containeres e cinqüenta carrinhos de coleta. Alguns
dos motivos alegados por técnicos da prefeitura para o não funcionamento da UTBR foram: os
Fórum Internacional do Meio Ambiente - A conferência da Terra 1353

equipamentos incompletos; falta de organização da cooperativa, ausência de um setor do governo


municipal para essa atribuição.
Trabalhadores catando material reciclável em condições precárias ao lado da Usina de
Triagem desativada.

Arquivo SEMAM

Atualmente, 110 catadores cooperados possuem permissão para trabalharem na triagem e


comercialização de material reciclável no aterro sanitário, realizado em um pátio de transbordo, ao
lado da usina de triagem desativada, porém, em condições semelhantes à de um lixão.
Contudo, o município tem avançado nas políticas de gestão com a elaboração de um Plano
de Gestão Integrada de Resíduos Sólidos – PGIRS, realizado através de um contrato com uma
empresa de consultoria. Além disso, está sendo criado o Setor de Gestão de Resíduos, vinculado à
Secretaria de Meio Ambiente – SEMAM, que terá atribuição de: desenvolver políticas públicas que
contribuam para otimizar o sistema, atuando como regulador dos interesses envolvidos; acompanhar
as atividades da UTBR; promover parcerias com instituições, governamentais e não-
governamentais, para captação de recursos; executar o sistema de Coleta Seletiva em Maracanaú,
dentre outras.

Gestão Integrada de Resíduos Sólidos


Um sistema de gerenciamento integrado de resíduos sólidos urbanos é composto por etapas
que envolvem, desde a sua geração, até a disposição final. Suas ações se dão nos âmbitos: jurídico,
técnico e, sobretudo, cultural.
Vale salientar a dificuldade de gerir esse sistema complexo, que envolve muitos atores,
com diversos interesses, entendendo-se por sistema um conjunto de partes que, interligadas, visam
atingir determinados objetivos, nesse caso, um planejamento elaborado com fundamentação teórico-
metodológica.
Nunesmaia (1997) apresenta Gestão de Resíduos Sólidos Urbanos Socialmente Integrada
fundamentada em: “1) o desenvolvimento de linhas de tratamento (tecnologias limpas) de resíduos
sólidos, priorizando a redução e a valorização; 2) a economia (viabilidade); 3) a
comunicação/educação ambiental (o envolvimento dos diferentes protagonistas sociais); 4) o social
(a inclusão social, o emprego); 5) o ambiental (os aspectos sanitários, os riscos à saúde humana).”
Ele acrescenta ainda, que “a integração também concerne às categorias dos protagonistas: geradores
de resíduos, catadores, municípios e cooperação entre municípios; prestadores de serviços
(terceiros), indústrias (indústrias de reciclagem) e que o elemento principal do modelo é a
associação da redução de resíduos em sua fonte geradora, com políticas sociais municipais.”
Na esfera Jurídica, a Política Nacional do Meio Ambiente (Lei 6.938/81) mostra que
apesar de o município possuir autonomia político-administrativa, é necessário observar os
princípios e normas constitucionais e a legislação federal, estadual e municipal. Por tais motivos, os
projetos e programas que envolvam o gerenciamento dos resíduos devem estar adequados a estas
normas e leis. A união cabe legislar sobre as normas gerais, de caráter nacional; aos Estados a
legislação suplementar ou complementar de caráter regional; e aos Municípios cabe legislar no
interesse local, de caráter exclusivo através da Lei Orgânica, que deve fixar os princípios
norteadores da Política de Saneamento e Meio Ambiente. Tanto a Constituição Federal quanto as
Fórum Internacional do Meio Ambiente - A conferência da Terra 1354

estaduais e as leis orgânicas implicam na existência de leis complementares para o detalhamento de


seus preceitos.
Os municípios dispõem de vários instrumentos legais para o planejamento: o Plano Diretor
é instrumento básico de ações urbanísticas; o Código de Obras e Posturas é o documento que reúne
o conjunto das normas municipais, em várias áreas de atuação do poder público, regulando, na
instância municipal, as edificações civis e outras instalações afins, levando em conta os usuários
destes espaços e instalações, bem como a vizinhança, quanto aos aspectos de sossego, segurança e
saúde; a Lei de Parcelamento do Solo Urbano é complementar e está diretamente subordinada aos
requisitos definidos pela lei de zoneamento ou de uso do solo urbano.
Como afirma Barros (1995), estes instrumentos normativos devem considerar a questão
dos resíduos sólidos, abrangendo vários aspectos, de modo inovador, no que diz respeito ao
acondicionamento, transporte, seleção, tratamento, beneficiamento, deposição, incineração, etc.
Reconhecendo os diferentes tipos de geradores e aplicando as medidas cabíveis. A fiscalização e a
penalização são mecanismos de última instância, porém, também fundamentais nesse processo.
Em relação aos resíduos sólidos, Maracanaú ainda não dispõe de legislação específica para
esse assunto, portanto, é necessário, junto às leis federais e estaduais, elaborar com a participação
dos envolvidos, instrumentos jurídicos a nível municipal que permita planejar e executar a gestão
dos resíduos amparados pela legalidade.
No âmbito Técnico, deve-se considerar a catação como a primeira etapa desse processo.
Como foi proposto por Cury (2003), a forma predominante de recolher o material reciclável é
através dos catadores de rua, que fazem a triagem do lixo que é depositado nas calçadas. Outra
forma comum de recolher o material reciclável é a triagem do lixo nos lugares de destinação final
como lixões e estações de transbordo. Ambas as forma de segregar o material reciclável se torna
insalubre devido ao fato dos resíduos estarem misturados com outros materiais perigosos,
putrefatos, contaminantes ou cortantes, além de que, é realizado, na maioria dos casos, sem nenhum
equipamento de proteção.
O material recolhido pelos catadores é vendido aos depósitos de reciclagem, que agregam
valor segregando os materiais em categorias mais específicas e prensando para então serem
revendido para as recicladoras. Dados do Panorama dos Resíduos Sólidos no Brasil (ABRELPE,
2005), afirmam que os materiais mais comuns nesse negócio são: metálicos ferrosos e não ferrosos,
plásticos de vários tipos, vidro, papel e papelão, servindo de matéria para diversos segmentos
industriais, poupando os aterros sanitários, bem como os insumos a partir dos recursos naturais.
A Coleta Seletiva é uma importante ferramenta para otimização da reciclagem. Comum em
muitas cidades, sobretudo, naquelas de maiores índices educacionais, preconiza a segregação dos
diferentes tipos de resíduos no ato do descarte, diferenciando lixo orgânico do inorgânico,
facilitando a destinação adequada a esses. Ao mesmo tempo, é fundamental a organização dos
Agentes Recicladores para atuarem em conjunto com o sistema de coleta seletiva, ficando a
responsabilidade do poder público de realizar um planejamento de forma que concilie os diferentes
interesses.
Vários tipos de resíduos não se enquadram nas categorias aceitas pelo mercado de
reciclagem tradicional. Nesse sentido, é necessário desenvolver alternativas para agregar valor aos
demais resíduos, através de pesquisas de mercado e oficinas que desenvolvam técnicas de
reutilização desse material para criação e produção de artefatos. Outras tecnologias de reciclagem
requerem maiores investimentos, sendo necessária uma política de atração desses tipos de
empreendimentos ao município.
De acordo com Bennett (1999), algumas alternativas tem se tornado cada vez mais viável
aos municípios que adotam esses tipos de tecnologias, como por exemplo: 1) o método da
compostagem transforma a matéria orgânica em fertilizantes e adubos orgânicos, podendo
comercializá-los com o setor agropecuário, ou utilizar em programas de produção de mudas para
arborização e reflorestamento, somando ao crédito carbono; 2) a coleta e o armazenamento
adequado de óleos usados em frituras e lubrificantes de motor para a comercialização como matéria
prima de diversos tipos de produtos industrializados, além de quê, esses resíduos são considerados
Fórum Internacional do Meio Ambiente - A conferência da Terra 1355

nocivos aos corpos hídricos; 3) a reciclagem de resíduos de construção e demolição transforma o


entulho em blocos de concretos pré-moldados, que podem ser utilizado na construção de casas
populares.
No que se refere à questão cultural, Lutzenberger (1985), é bem-sucedido ao colocar que
“A insensatez do desperdício nos leva a supor que nosso pequeno e frágil planeta tem de um lado
um buraco infinito do qual extraímos infinitamente recursos, e do outro lado, um segundo buraco no
qual atiramos inesgotavelmente a poluição e o lixo que produzimos”, nesse contexto ele define,
“lixo não é outra coisa, senão, material bom no lugar errado”.
Faz parte da cultura da maioria das pessoas a não preocupação com o destino dos seus
resíduos, para isso, basta que estes não estejam ao alcance de suas visões e olfatos. Nesse sentido, a
Educação Ambiental tem sido ferramenta essencial para promover uma cultura que promova novos
comportamentos, pautados nos princípios do Desenvolvimento Sustentável, que preconizem o
consumo e o descarte consciente, o máximo de reaproveitamento e o favorecimento da reciclagem.
Em Maracanaú, de acordo com a Secretaria de Meio Ambiente, algumas ações tem sido
realizadas no sentido de sensibilizar a população para promover uma cultura mais desperta para as
causas ambientais, com: palestras isoladas atendendo a demanda espontânea das escolas e demais
instituições; eventos comemorativos em alusão ao calendário ecológico; o processo de construção
da Agenda 21 de Maracanaú; o “Programa de Educação Ambiental Conhecendo o Meio Ambiente
de Maracanaú”, curso de 8 horas aula, realizado nas escolas através de palestras com auxílio de
recursos audiovisuais e visitas de campo.
Contudo, essas práticas ainda são consideradas insuficientes no que se refere à questão dos
resíduos sólidos, pois não apresentam ações direcionadas a essa importante temática, sendo assim,
faz-se necessário a elaboração de campanhas efetivas voltadas para os diferentes segmentos da
sociedade.

CONSIDERAÇÕES FINAIS
Apesar de possuir um aterro sanitário e excelente serviço de coleta de lixo domiciliar, o
modelo de limpeza urbana do município de Maracanaú ainda não está pautado na sustentabilidade,
ficando uma lacuna, no que se refere à gestão integrada. Nesse sentido, faz-se necessário o
desenvolvimento de um sistema onde haja a participação dos atores envolvidos (sociedade, poder
publico, grandes geradores, catadores, atravessadores e recicladoras, etc.) na discussão e elaboração
de políticas norteadas a promover melhoria e humanização dessa atividade, tão saudável ao nosso
meio ambiente.
O Poder Público Municipal tem o compromisso de direcionar ações que visem reunir e
intermediar os diferentes interesses a fim de promover um modelo de gestão pautado no
desenvolvimento sustentável que atenda as demandas sociais e ambientais.
Portanto, esse projeto tem a finalidade de executar ações em diversos âmbitos, com
intenção de colaborar para melhorias ambientais e sociais, a partir da firmação da cultura dos R’s -
(reduzir, reutilizar e reciclar), promovendo maior sustentabilidade no município.
Por fim, ressalta-se que a proposta desse trabalho está de acordo em promover aos Agentes
Recicladores, maior justiça ambiental a qual, segundo Acseirad (2004), é “[...] o conjunto de
princípios que asseguram que nenhum grupo de pessoas, sejam grupos étnicos, raciais ou de classe,
suporte uma parcela desproporcional de degradação do espaço coletivo. Complementarmente,
entende-se como injustiça ambiental a condição de existência coletiva própria a sociedades
desiguais onde operam mecanismos sociopolíticos que destinam a maior carga dos danos
ambientais do desenvolvimento a grupos sociais de trabalhadores, população de baixa renda,
segmentos raciais descriminados, parcelas marginalizadas e mais vulneráveis da cidadania.”

REFERÊNCIAS BIBLIOGRÁFICAS
ALMEIDA, Lutiane Queiroz. Análise Geoambiental Como Subsídio ao Planejamento Territorial do
Município de Maracanaú, CE. (Dissertação do Mestrado Acadêmico em Geografia) Universidade
Estadual do Ceará. Fortaleza, 2005.
Fórum Internacional do Meio Ambiente - A conferência da Terra 1356

Associação Brasileira de Empresas Públicas e Resíduos Especiais. Panorama dos Resíduos Sólidos
no Brasil. 2005.
BENNET, Steven J. Eco Empreendedor. Ed. Makro Books, São Paulo, 1992.
CEARÁ. Instituto de Pesquisa Econômica Aplicada. Perfil Básico Municipal: Maracanaú.
Fortaleza, 2007.
CURY, Deyse. Outros Olhares Sobre o Lixo: aquilo que não se aprende nos manuais de engenharia.
(Dissertação de Especialização em Educação Ambiental) Universidade Vale do Acaraú. Sobral -
CE, 2003
HENRI, Acselrad; SELENE, Herculano; e PÁDUA, José Algusto. Justiça Ambiental e Cidadania.
Ed. Relure Dumará, Rio de Janeiro, 2004.
LUTZENBERGER, José Antônio. Fim do Futuro: Manifesto Ecológico Brasileiro. Ed. Movimento,
Porto Alegre, 1986.
MARACANAÚ, Prefeitura Municipal. Documento Básico do Plano Diretor de Desenvolvimento
Urbano do Município de Maracanaú. Maracanaú, CE, 1998.
NUNESMAIA, Maria de Fátima da Silva. Lixo: Soluções Alternativas (Projeções a Partir da
Experiência UEFS). Feira de Santana: UEFS, 1997.
PAIVA, Francisco Vieira, et al. Plano de Gestão Integrada de Resíduos Sólidos de Maracanaú.
Fortaleza, 2008.
Fórum Internacional do Meio Ambiente - A conferência da Terra 1357

GESTÃO AMBIENTAL: ESTUDO SOBRE O REUSO DA ÁGUA NO CURTUME DO


CENTRO DE TECNOLOGIA DO COURO E DO CALÇADO ALBANO FRANCO –
SENAI/PB

Yêda Silveira Martins Lacerda


Universidade Estadual da Paraíba – UEPB. yedasilveira@oi com.br
Francisco Cleber Teles dos Santos Filho
Universidade Estadual da Paraíba – UEPB
Rafael Rodrigues Lopes
Universidade Estadual da Paraíba – UEPB

RESUMO
Nas ultimas décadas a Gestão Ambiental vem ganhando força em meio às empresas,
Desenvolvimento Sustentável vem se tornando quase uma obrigação, e aquelas instituições que não
adotam tal gestão estão perdendo aos poucos espaço no mercado. A temática abordada neste estudo
aborda tal realidade, focando nossa atenção para o curtume do Centro de Tecnologia do Couro e do
Calçado (CTCC) Albano Franco - SENAI – PB, visto que o curtume é uma indústria muito
poluente, gerando uma grande quantidade de resíduos sólidos e de efluentes líquidos e gasosos. O
processamento de 01 tonelada (t) de peles salgadas produz aproximadamente de 200 a 250 kg de
couros acabados, e 600 kg de resíduos sólidos, o que apresenta um baixo rendimento médio, em
torno de 22,5%, e alto potencial poluidor. O objetivo geral dessa pesquisa foi mostrar a importância
da aplicação da Gestão Ambiental nas organizações, identificando os benefícios proporcionados às
empresas, a sociedade e principalmente ao meio ambiente. A metodologia utilizada foi uma
pesquisa informal, onde se entrevistou o responsável pelo setor ambiental do Centro de Tecnologia
do Couro e do Calçado (CTCC) Albano Franco - SENAI – PB. Após a análise dos resultados,
constatou-se a grande vantagem da adoção das técnicas de reuso da água para uma empresa deste
ramo, gerando uma economia mensal de R$ 1962, 71. Em síntese pode-se afirmar que a
implantação desse sistema é uma vitória para todos, sem distinção, já que os benefícios causados
são de grande valia para as organizações (que ganham de forma econômica e melhoram sua imagem
perante a sociedade), para o meio ambiente (que deixa de ser destruído e passa a ser preservado) e
para a sociedade (que terá condições de viver melhor, em harmonia e sem preocupações com suas
futuras gerações).
Palavras-Chave: Gestão Ambiental, Curtume, Reuso da Água.

ABSTRACT
In the last decades Environmental Management is gaining strength in medium businesses,
Sustainable Development is becoming almost an obligation, and those institutions that do not adopt
such management are gradually losing space in the market. The topics addressed in this study
addresses this reality, focusing our attention to the tanning of the Center for Technology of Leather
and Footwear (CTCC) Albano Franco - SENAI - PB, as the tanning industry is a highly polluting,
generating large quantities of waste solid and liquid and gaseous effluents. The processing from 01
tone (t) of salted skins produces approximately 200 to 250 kg of finished leather, and 600 kg of
solid waste, which presents a low average income, around 22.5%, and high potential polluter. The
general objective of this research was to show the importance of the implementation of the
Environmental Management in organizations, identifying the benefits offered to businesses, society
and especially to the environment. The methodology used was an informal search, where they
interviewed the person responsible for the environmental sector of the Center for Technology of
Leather and Footwear (CTCC) Albano Franco - SENAI - PB. After analysing the results, it was the
great advantage of adopting the techniques of reuse water for a company of this industry, creating a
monthly economy of $ 1962, 71. In summary one can say that the deployment of that system is a
victory for all, without distinction, since the benefits are caused great value to the organizations
(who earn so economical and improve its image before the company) for the half environment
Fórum Internacional do Meio Ambiente - A conferência da Terra 1358

(which ceases to be destroyed and will be preserved) and to society (which will have better
conditions to live in harmony and without worries about their future generations).
Key-Words: Environmental Management, tanning, reuse water.

INTRODUÇÃO
A temática abordada neste estudo foi à questão da Gestão Ambiental. Diante disso foi
identificado como essa nova linha de pensamento administrativo é utilizada nas organizações,
especialmente no curtume do Centro de Tecnologia do Couro e do Calçado (CTCC) Albano Franco
- SENAI – PB.
O objetivo geral dessa pesquisa foi mostrar a importância da aplicação da Gestão
Ambiental nas organizações, identificando os benefícios proporcionados às empresas, a sociedade e
principalmente ao meio ambiente. Esse novo modelo de gestão administrativa é especialmente
utilizado em indústrias efetiva ou potencialmente poluidoras, como é o caso do curtume e visa antes
de tudo à diminuição ou extinção dos impactos gerados, além de gerar vários outros benefícios
sociais e econômicos, ou seja, a aplicação da conscientização ambiental por parte das organizações
como também pela sociedade em geral, acarretando assim, benefícios e ganhos para todos.
Neste trabalho apresentar-se-á o reuso da água utilizada no curtume e a análise dos dados
apresentando o imenso favorecimento acarretado através da aplicação nos processos de
beneficiamento do couro do reuso do efluente líquido tratado no curtume do CTCC. Além da água
contaminada não ir parar no meio ambiente, agredindo-o, ou seja, não causando contaminação,
ainda gera ganhos sócio-ambientais.
A metodologia utilizada foi uma pesquisa informal, onde se entrevistou o responsável pelo
setor ambiental do Centro de Tecnologia do Couro e do Calçado (CTCC) Albano Franco - SENAI –
PB.

REVISÃO DE LITERATURA
Gestão Ambiental
Nas últimas décadas tem ocorrido uma grande mudança no ambiente em que as empresas
operam: as empresas que eram vistas apenas como instituições econômicas com responsabilidades
referentes a resolver os problemas econômicos fundamentais (o que produzir, como produzir e para
quem produzir) tem presenciado o surgimento de novos papéis que devem ser desempenhados,
como resultado das alterações no ambiente em que operam (DONAIRE, 1999).
O conceito de Gestão Ambiental está vinculado ao princípio de utilização múltipla dos
recursos naturais, sendo definido como a aplicação de estratégias de planejamento para alcançar a
produção máxima do uso racional dos recursos naturais de uma área específica, para os benefícios
de um grupo social e de seus sucessores.
A definição de Gestão Ambiental vem evoluindo, nas últimas décadas de forma
significativa. Antes dos anos 70, a Gestão Ambiental encontrava–se ainda na fase de
reconhecimento de problemas ambientais. Havia pouco conhecimento relativo a impactos
ambientais e resíduos perigosos, e uma existência limitada de requisitos e padrões ambientais.
Na década de 70, surge a chamada gestão reativa, onde a empresa apenas responde à
sinalização e à regulamentação dos órgãos de controle ambiental. A preocupação com o meio
ambiente limita-se a evitar acidentes e a controlar a poluição.
Nos anos 80, a repercussão negativa de acidentes como os acontecidos em Bhopal, na
Índia, e em Chernobyl ocasionaram um aumento da conscientização ambiental. Nesta década
surgiram atitudes preventivas como os estudos de impacto ambiental, o controle da poluição do
solo, a minimização de resíduos, e outros.
Nos anos 90 houve uma atuação mais responsável por parte das empresas, através da
adoção de um novo sistema de conceitos em relação ao meio ambiente, que incluiu: o
gerenciamento integrado (meio ambiente + segurança + saúde); a auditoria ambiental; a avaliação
do ciclo de vida do produto; e o sistema de gerenciamento ambiental. Eventos como a Conferência
das Nações Unidas para o Meio Ambiente e Desenvolvimento - Rio 92 deixaram clara a
Fórum Internacional do Meio Ambiente - A conferência da Terra 1359

importância do conceito de desenvolvimento sustentável, que embasou todas as Convenções


assinadas na ocasião (Biodiversidade, Florestas, Mudanças Climáticas), bem como os termos da
Agenda 21 - Agenda de Compromissos para Ações Futuras.
Partindo-se dessas premissas, a Gestão Ambiental foi definida por Maimon apud Knuth
(2001) como um conjunto de procedimentos para gerir ou administrar uma organização na sua
interface com o meio ambiente. Para Viterbo Júnior (1998, p. 51) gestão ambiental “nada mais é do
que a forma como uma organização administra as relações entre suas atividades e o meio ambiente
que as abriga, observadas as expectativas das partes interessadas, ou seja, é parte da gestão pela
qualidade total”.
Logo, pode-se dizer que a Gestão Ambiental é um processo primeiramente de
conscientização pessoal, devendo emergir da consciência de todos os cidadãos. Dessa forma, a
Gestão Ambiental é um sistema que vem evoluindo com o passar do tempo, pois a partir do
momento em que se observou à necessidade da preservação ambiental, foi-se também criando
meios e estratégias para a realização dessas ações, com o propósito de convivência sustentável e
harmoniosa Homem versus Natureza.

Economia Versus Gestão Ambiental


Num mercado cada vez mais globalizado, competitivo, em constantes mudanças e onde os
consumidores estão cada vez mais exigentes, a empresa que utiliza a prática da gestão ambiental,
sai na frente dos concorrentes e fica em “alta com a sociedade” no sentido de competitividade,
imagem e harmonia com a natureza.
Tachizawa (2002) e o site Horizonte Científico (2007) definem como gestão ambiental o
exame e a revisão das operações de uma organização da perspectiva ecológica, motivada pela
mudança dos valores e da cultura empresarial que ocorre em pelo menos duas instâncias: da
dominação para a parceria, da ideologia do crescimento econômico para a sustentabilidade
ecológica.
A crescente inserção dessa relação nas questões de comércio faz emergir um novo conceito
de gestão que incorpora a variável ambiental na busca pela maior eficiência quantitativa e
qualitativa do sistema produtivo. Hoje a tese de que os danos causados ao meio ambiente é o preço
inevitável a pagar pelo desenvolvimento, já não encontra mais sustentação e as empresas que
poluem o meio ambiente têm a sua imagem maculada perante a opinião pública. A relação entre
meio ambiente e desenvolvimento econômico deixou de ser vista como conflitante para ser
alcançada uma parceria, onde o crescimento econômico deve perseguir a conservação dos recursos
naturais.
Andrade, Tachizawa e Carvalho (2000, p. 46) afirmam que:
A perspectiva futura é que as questões relativas à preservação do meio ambiente deixem
de ser um problema meramente legal, com ênfase nas punições legais, para evoluírem
para um contesto empresarial pleno de ameaças e oportunidades, em que as decorrências
ambientais e ecológicas passem a significar posições competitivas que ditarão a própria
sobrevivência da organização em seu mercado de atuação.

Enfim, as organizações que se adaptarem ao sistema de preservação e cuidado com o meio


ambiente, têm maiores chances de uma vida duradoura dentro do mercado feroz, podendo até
ampliar suas expectativas de crescimento, já as outras organizações que não vislumbrarem o
cuidado com o meio ambiente como umas das prioridades organizacionais tenderão ao fracasso sem
volta.

Impactos Ambientais do Processamento do Couro


O curtume é uma indústria muito poluente, gerando uma grande quantidade de resíduos
sólidos e de efluentes líquidos e gasosos. O processamento de 01 tonelada (t) de peles salgadas
produz aproximadamente de 200 a 250 kg de couros acabados e 600 kg de resíduos sólidos, o que
apresenta um baixo rendimento médio, em torno de 22,5%, e alto potencial poluidor.
Fórum Internacional do Meio Ambiente - A conferência da Terra 1360

O curtume apresenta alto consumo de água, de 25 a 30 m3 por tonelada de pele salgada ou


630 l/t de pele salgada, em média, que varia em função dos processos utilizados e do
gerenciamento, entre outros fatores. Um curtume de porte médio, que processa 3000kg peles
salgadas/dia, consome aproximadamente 1.900 m3 de água/dia, equivalente ao consumo diário de
uma população de 10.500 habitantes, tornando-se um consumo médio per capita de 180 l/dia.
Assim, um curtume pode exercer alta pressão sobre os mananciais hídricos.
A etapa que mais consome água é a ribeira (média de 7 a 25 m3/t), seguida do acabamento
molhado (4 a 8m3/t), do curtimento (1 a 3m3/t) e do acabamento final (0 a 1 m3/t).
O consumo de energia varia entre 2.600 a 11.700 kWh/t de peles salgadas, conforme a
produção, os equipamentos usados, o tipo de tratamento dado aos efluentes e a existência ou não de
práticas de eficiência energética. As operações com maior consumo são as que envolvem banhos,
secagem e tratamento dos efluentes.
O curtume também consome grande quantidade de produtos químicos. O processamento
do couro gera 415 a 695 kg de resíduos sólidos por tonelada de pele salgada, nas etapas de ribeira e
acabamento. Esses resíduos são compostos por aparas, carniça e tiras curtidas.
Os efluentes líquidos provêm dos banhos e lavagens a que são submetidas às peles. Tendo
em vista o alto consumo de água e de produtos químicos, o volume de efluentes gerados é grande, a
maior parte dos quais é produzida na ribeira (67,6%), seguido do curtimento (21,7%) e do
acabamento (10,7%).

A Tecnologia Limpa como Solução Ambiental


A Tecnologia Limpa como Solução Ambiental refere-se aos processos e tecnologias
industriais que não geram, ou minimizam a geração de resíduos poluentes. Os processos de
produção utilizando tecnologias limpas não chegam a gerar (ou geram minimamente) resíduos,
diferentemente de uma tecnologia “fim de tubo” que visa reter ou reprocessar os resíduos após
terem sido produzidos.
Há um elevado nível de otimismo perante as expectativas do SGA, considerando que,
apesar do caráter voluntário, virtualmente, todas as corporações empresariais de qualquer porte
serão envolvidas nesse processo, simplesmente por se considerar a tecnologia limpa como a
vantagem competitiva no cenário comercial contemporâneo.
O conceito de tecnologia limpa deve ser contemplado nas políticas públicas, em especial,
nos processos industriais, mas principalmente na formação de uma cultura e consciência ambiental.
Nessa perspectiva, a poluição industrial, com todas as suas mazelas, teria, a partir de agora, seus
dias contados.

Produção mais Limpa


De acordo com o site do CNTL (2007), Produção mais Limpa significa a aplicação
contínua de uma estratégia econômica, ambiental e tecnológica integrada aos processos e produtos,
a fim de aumentar a eficiência no uso de matérias-primas, água e energia, através da não-geração,
minimização ou reciclagem de resíduos gerados em um processo produtivo. Esta abordagem induz
inovação nas empresas, dando um passo em direção ao desenvolvimento econômico sustentado e
competitivo, não apenas para elas, mas para toda a região que abrangem.
A Produção mais Limpa pretende integrar os objetivos ambientais aos processos de
produção, a fim de reduzir os resíduos e as emissões em termos de quantidade e periculosidade. São
utilizadas várias estratégias visando a Produção mais Limpa e a minimização de resíduos.
Minimizar a geração de resíduos e emissões também significa aumentar o grau de emprego
de insumos e energia usados durante o processo produtivo, isto é, fabricar produtos e não resíduos,
garantindo processos mais eficientes. Para a organização, a minimização de resíduos não é somente
uma meta ambiental, mas, principalmente um programa orientado para aumentar o grau de
utilização dos materiais, com vantagens técnicas e econômicas, além de aumentar a renda
(lucratividade empresarial) e ser uma vantagem altamente competitiva para as mesmas.
Fórum Internacional do Meio Ambiente - A conferência da Terra 1361

A aplicação do conceito de Produção mais Limpa aos curtumes pode trazer a redução
significativa da poluição, com a implantação de medidas de otimização da produção, como a
redução do consumo de água. Pode-se conseguir até 63% de economia de água, com a realização de
banhos curtos, o reuso da água dos banhos e a substituição de lavagens contínuas por lavagens por
carga, com volume de água padronizado.
Assim, a grande diferença entre a gestão convencional de resíduos e a Produção Mais
Limpa é que esta última não trata simplesmente do sintoma, mas tenta atingir as raízes do problema.

A importância da Água e seu Reuso


A água é o elemento fundamental da vida. Seus múltiplos usos são indispensáveis a um
largo espectro das atividades humanas, onde se destacam, entre outros, o abastecimento público e
industrial, a irrigação agrícola, a produção de energia elétrica e as atividades de lazer e recreação,
bem como a preservação da vida aquática.
As disponibilidades de água doce na natureza são limitadas pelo alto custo da sua obtenção
nas formas menos convencionais, como é o caso da água do mar e das águas subterrâneas. Deve ser,
portanto, da maior prioridade, a preservação, o controle e a utilização racional das águas doces
superficiais.
Reuso é o processo de utilização da água por mais de uma vez, tratada ou não, para o
mesmo ou outro fim. Essa reutilização pode ser direta ou indireta decorrente de ações planejadas ou
não. A água de reuso tratada é produzida dentro das Estações de Tratamento de Esgoto e pode ser
utilizada para inúmeros fins, como geração de energia, refrigeração de equipamentos, em diversos
processos industriais, em prefeituras e entidades que usam a água para lavagem de ruas e pátios, no
setor hoteleiro, irrigação/rega de áreas verdes, desobstrução de rede de esgotos e águas pluviais e
lavagem de veículos.
A tecnologia do reuso/reciclo acoplada com a regeneração da água surge como um esforço
de engenharia ambiental, buscando uma solução para a utilização mínima de água em um processo
produtivo e a máxima proteção ambiental como o menor custo possível. Além de ser uma medida
eficaz para resolver a questão do abastecimento, o reuso proporciona um ganho econômico, com a
redução na captação, na quantidade de químicos para seu tratamento e no lançamento de efluentes.

CARACTERIZAÇÃO DO OBJETO DE ESTUDO


O Centro de Tecnologia do Couro e do Calçado Albano Franco (CTCC) – SENAI –
Campina Grande – PB (CTCC) existe desde 1994, destacando-se no Nordeste como referência em
Educação Profissional e Desenvolvimento de Novas Tecnologias do Couro e do Calçado. Há treze
anos presta atividades em prol do desenvolvimento tecnológico do setor agraciando a sociedade
com grandes e significativas contribuições, que foram determinantes para a implantação e
consolidação do Pólo calçadista da Paraíba.
Possui um corpo funcional composto por 81 colaboradores, distribuído da seguinte forma.
Gerente da Unidade.
Departamento Administrativo.
Setor de Educação.
Planta de Couro.
Planta de Calçados.
Laboratório de Controle a Qualidade.
Setor de Meio Ambiente.
Artefatos.
Serviços Gerais.
Estagiários.

Sua missão enquanto negócio é contribuir para o fortalecimento dos segmentos industriais,
através da realização de ensaios laboratoriais, possibilitando o controle dos seus processos e
produtos, minimizando os impactos ambientais e promovendo a melhoria da qualidade.
Fórum Internacional do Meio Ambiente - A conferência da Terra 1362

O Centro de Tecnologia do Couro e do Calçado atinge um público bastante amplo e


diversificado devido a grande quantidade de produtos e serviços oferecidos, desta maneira, pode-se
afirmar que atende tanto Pessoa Jurídica (Empresas de calçados, clínicas, hospitais, cooperativas,
etc.) como Pessoa Física (criadores de animais, estudantes, pesquisadores, dentre outros),
abrangendo todo território nacional, muito embora se destacando como clientes mais significativos
a região Norte/Nordeste.
Sua missão é “proporcionar sistema de apoio à competitividade, contribuindo para o
fortalecimento do setor coureiro-calçadista e o desenvolvimento pleno e sustentável do país”,
promovendo a educação para o trabalho e a cidadania, a assistência técnica e a tecnologia, a
produção e a disseminação de informações e a adequação, geração e difusão de tecnologia.
Tendo como visão de futuro “ser impulsionador do desenvolvimento sustentável da
indústria de couro, calçado e vestuário, reconhecido nacionalmente e internacionalmente como
referência em educação para a competência e tecnologia: ágil, flexível e auto-sustentável, orientado
para o mercado, valorizando a cidadania, a ética e o meio ambiente”.

ASPECTOS METODOLÓGICOS DA INVESTIGAÇÃO


Os aspectos metodológicos adotados para elaboração desse trabalho foram métodos,
conceitos e técnicas utilizadas para viabilizar a investigação.
Com a escolha do tema, iniciou-se a pesquisa e/ou estudo com caráter experimental,
[...] que é utilizada somente no nível explicativo. Ela visa explicar as relações de causa e
efeito entre os conceitos envolvidos no fenômeno ou entre os fenômenos. Para isso o
pesquisador necessita manipular e controlar as variáveis independentes (aquelas que
causam ou explicam a outra variável) e verificar o que acontece com a variável
dependente (aquela que está tentando explicar). O controle é atividade característica do
método experimental. Por meio dele o pesquisador visa eliminar o efeito de outras
variáveis estranhas ao experimento (ditas variáveis incontroláveis) sobre a variável
dependente (ACEVEDO; NOHARA, 2004, p. 52).

Também se utilizou a pesquisa bibliográfica por ser “um estudo sistematizado


desenvolvido com base em material publicado em livros, revistas, jornais, redes eletrônicas, isto é,
material acessível, ao publico em geral” (VERGARA, 2003, p. 48).
O Universo da pesquisa foi o curtume do Centro de Tecnologia do Couro e do Calçado
Albano Franco - SENAI-PB, localizado no pólo calçadista de Campina Grande-PB. A amostra foi
realizada no mês de agosto de 2007 e é referente a 01 mês do consumo e reuso da água no curtume.
O instrumento utilizado para a pesquisa foi uma entrevista informal “assemelha-se a uma
conversa com o entrevistado, mas com o intuito de coletar dados sobre o problema investigado”
(GIL, 1996 apud ACEVEDO; NOHARA, 2004, p. 53).
A coleta de dados foi feita pelo próprio pesquisador através da entrevista informal entre os
dias 27 e 29 de agosto de 2007. As informações pertinentes são advindas da chefe do Departamento
Ambiental e do responsável pelo almoxarifado do CTCC SENAI – PB, como também do site da
Companhia de Água e Esgotos da Paraíba (CAGEPA – PB, 2007).
Foi feita uma comparação matemática entre o custo benefício do reuso do efluente líquido
tratado na própria Estação de Tratamento de Efluentes (ETEs) do CTCC e da água advinda da
CAGEPA-PB, onde analisou-se qual das duas situações é mais viável, econômica, social e
ambientalmente.

ANÁLISE E INTERPRETAÇÃO DOS RESULTADOS

O efluente líquido tratado é reutilizado para:


Preparar as soluções de tratamento do efluente (ETE – Estação de tratamento de efluentes).
O processo do couro, com porcentagem maior na etapa de Ribeira.
Lavagem de pisos do setor de produção.
Fórum Internacional do Meio Ambiente - A conferência da Terra 1363

Encher os fulões de madeira para que a mesma não seque.


Já a água advinda da CAGEPA – PB é utilizada para as operações onde se necessita de
uma maior qualidade de água e que se tenha um maior risco de contaminação dos seres humanos,
como nos casos dos chuveiros e torneiras das pias.
Por conseguinte, o efluente líquido tratado não pode ser utilizado nas descargas dos
banheiros, devido a grande quantidade de produtos químicos encontrados, o que pode causar
entupimento dos canos.
Por isso a partir de então, aprender-se-á a forma de análise financeira do cálculo do reuso
da água:
Produtos utilizados no tratamento de reuso da água:
Sulfato de Alumínio R$ 0,85 kg
Hidróxido de Sódio R$ 1,32 kg
Considerando-se em um mês, ou seja, em 22 (vinte e dois) dias úteis são tratados 187 m3 de
efluente líquido e se gasta para isso:
Sulfato de Alumínio: 50 kg – R$ 42,50
Hidróxido de Sódio: 50 kg – R$ 66,00
O gasto total com produtos químicos durante os 22 dias úteis para o tratamento do efluente
é de R$ 108,50.
Estima-se para o custo da mão de obra, e que é apenas necessário 01 (uma) hora de
trabalho diária e apenas 01 (um) trabalhador para se fazer o preparo da solução de tratamento e que
o salário mínimo é de R$ 380,00 podemos considerar:
A jornada de trabalho é de 8 horas diárias, resultando em 176 horas no referido mês de 22
(vinte e dois) dias úteis.
08 horas diárias x 22 dias úteis = 176 horas mensais
Fazendo-se os cálculos para obter quanto se custa as 22 (vinte duas) horas que será
necessário para o preparo da solução durante o mês de 22 (vinte dois) dias úteis, obteremos:
R$ 380 (salário mínimo) / 176 horas mensais = R$ 2,15909091 custo da hora de trabalho.
R$ 2,15909091 custo da hora de trabalho x 22 horas mensal necessárias para preparo da
solução = R$ 47,50 (é o custo da mão de obra empregada para o tratamento do efluente durante os
22 dias úteis).
Calculando o custo dos produtos químicos empregados e do custo da mão de obra
necessários para o tratamento de 187 m3 de efluente líquido no curtume do CTCC obtém-se um
custo total de R$ 156,00.
Custo dos produtos utilizados + Custo da mão de obra = Custo Total
R$ 108,50 + R$ 47,50 = R$ 156,00
Os mesmos 187 m3, se fossem provenientes da Companhia de Águas e Esgotos da Paraíba
– CAGEPA custaria R$ 2118, 71, ou seja, aproximadamente 14 vezes mais do que se for feito esse
tratamento na estação de tratamento de efluente do curtume do CTCC.
A economia é de R$ 1962, 71, ou seja, é muito significativa em termo de dinheiro e
também em relação à preservação devido a quantidade de efluentes tóxicos que não irão ser
lançados no meio ambiente.

CONSIDERAÇÕES FINAIS
Este Trabalho possibilitou aprender sobre a grande importância da Gestão Ambiental como
nova unidade administrativa que visa melhorar as relações Sociedade/Organizações versus
Natureza. Ela que vem evoluindo rapidamente e de forma bastante significativa, é hoje uma das
mais importantes idéias defendidas pelos gestores que pensam de forma estratégica e holística, pois
se sabe que num futuro não tão distante e que já em alguns lugares onde a conscientização
ambiental já está bem disseminada as organizações que realmente preocupam-se com o meio
ambiente vão estar sempre a frente das outras que não tem a mesma preocupação.
Observou-se com este trabalho que o CTCC é uma organização pioneira no tratamento de
seus efluentes líquidos, pois sendo uma atividade altamente poluidora, o curtume é alvo de atenção
Fórum Internacional do Meio Ambiente - A conferência da Terra 1364

redobrada por parte dos gestores e colaboradores, já que esses efluentes líquidos gerados nos
processos de curtumização têm recebido atenção especial desde o ano de 1995.
Percebeu-se que há uma grande vantagem financeira para a organização, haja vista que o
tratamento dos efluentes líquidos na própria ETEs do CTCC gera uma economia bastante
considerável na conta de água, além do mais deve-se considerar que com esse tratamento a
organização diminui de forma bastante considerável seus impactos sobre o meio ambiente, pois
esses efluentes altamente tóxicos não serão jogados na natureza, ficando a água de boa qualidade
para fins mais necessários, como no caso do consumo humano.
Em síntese pode-se afirmar que a implantação desse sistema é uma vitória para todos, sem
distinção, já que os benefícios causados são de grande valia para as organizações (que ganham de
forma econômica e melhoram sua imagem perante a sociedade), para o meio ambiente (que deixa
de ser destruído e passa a ser preservado) e para a sociedade (que terá condições de viver melhor,
em harmonia e sem preocupações com suas futuras gerações).
No ambiente industrial onde se utilizam muitos produtos químicos, a água tem que passar
por tratamento para ser reutilizada e dependendo do tipo dos produtos químicos, a sua reutilização
será bem maior, como no caso de descargas, lavagem das máquinas, lavagem dos carros, no
resfriamento dos equipamentos, para regar as plantas, para apagar possíveis incêndios, entre outros.
A principal recomendação a ser dada sobre esse estudo é que a conscientização deve ser o
elemento de base para a mudança de comportamento da sociedade e das organizações em relação
aos cuidados com o meio ambiente, pois, é através dessa que encontraremos as melhores soluções
para os problemas que venham a nos afligir.

REFERÊNCIAS BIBLIOGRAFICAS
ACEVEDO, C. R.; NOHARA, J. J. Monografia no curso de administração: guia completo de
conteúdo e forma. São Paulo, Atlas, 2004.
ANDRADE, R. O. B.; TACHIZAWA, T.; CARVALHO, A. B. Gestão Ambiental: enfoque
Estratégico Aplicado ao Desenvolvimento Sustentável. São Paulo, Makron Books, 2000.
ASSOCIAÇÃO BRASILEIRA DE NORMAS TÉCNICAS (ABNT). Informação e documentação –
citações em documentos – apresentação. Rio de Janeiro: NBR 10.000, 2002. Disponível em:
<http://www.abnt.org.br>. Acesso em: 29 ago. 2007.
COMPANHIA DE ÁGUA E ESGOTOS DA PARAÍBA (CAGEPA – PB).Aspectos gerais.
Disponível em <http://www.cagepa.pb.gov.br>. Acesso em: 29 ago. 2007.
CNTL. O que é produção mais limpa (PmaisL)?. Disponível em:
<http://www.rs.senai.br/cntl/cntl.htm>. Acesso em: 28 ago. 2007.
CONAMA. Resoluções do CONAMA. Disponível em: <http://www.lei.adv.br/conama.htm>.
Acesso em: 02 set. 2007.
DONAIRE, D. Gestão Ambiental na Empresa. 2. ed. São Paulo: Editora Atlas, 1999.
FAE. Sistemas. Disponível em:
www.fae.edu/publicacoes/pdf/IIseminario/sistemas/sistemas_13.pdf> Acesso em: 02 set. 2007.
GANEN, R. S. Curtumes: Aspectos Ambientais. Disponível em:
<http://www2.camara.gov.br/internet/publicacoes/estnottec/tema14/2007_1313.pdf>. Acesso em:
25 set. 2007.
HORIZONTE CIENTÍFICO. Gestão Ambiental e Parcerias: Um estudo de caso exploratório nas
empresas do distrito industrial de Uberlândia-Mg. Disponível em
<www.horizontecientifico.propp.ufu.br>. Acesso em: 27 ago. 2007.
KNUTH, K. R. Gestão ambiental: um estudo de caso para o setor têxtil – S.C. Dissertação
(Mestrado em Engenharia de Produção) – Programa de Pós-Graduação em Engenharia de Produção,
UFSC, Florianópolis, 2001.
PMAISL. Produção mais limpa. Disponível em:
<http://www.pmaisl.com.br/mambo/index.php?option=com_content&task=view&id=17&Itemid=4
1>. Acesso em: 29 ago. 2007.
Fórum Internacional do Meio Ambiente - A conferência da Terra 1365

SCHENINI, P. C. ; LEMOS, R. N. ; da SILVA, F. A. Sistema de Gestão Ambiental no segmento


hoteleiro. Disponível em: <www.fae.edu>. Acesso em: 20 ago. 2007.
TACHIZAWA, T. Gestão ambiental e responsabilidade socialcorporativa: estratégias de negócios
focadas na realidade brasileira. São Paulo: Atlas, 2002.
VERGARA, S. C. Projetos e relatórios de pesquisa em administração. 4. ed. São Paulo: Atlas, 2003.
VITERBO JÚNIOR, E. Sistema integrado de gestão ambiental: como implementar a ISO 14000 a
partir da ISO 9000, dentro de um ambiente de CQT. São Paulo: Ed. Aquariana, 1998.
Fórum Internacional do Meio Ambiente - A conferência da Terra 1366

CO-PROCESSAMENTO DE RESÍDUOS DE BORRACHA ESPONJOSA POR


INCINERAÇÃO

Yêda Silveira MARTINS LACERDA


Universidade Estadual da Paraíba – UEPB. yedasilveira@oi com.br
Francisco Cleber Teles dos SANTOS FILHO
Universidade Estadual da Paraíba – UEPB
Hildebrando Martins de OLIVEIRA JUNIOR
Universidade Estadual da Paraíba – UEPB

RESUMO
Dentro do contexto de destinação de resíduos sólidos, quer seja co-processamento,
incineração ou outro meio, torna-se imprescindível a definição de critérios para atendimento da
legislação aplicável e, como consequência a preservação do meio ambiente.
Nossa abordagem concentrou-se na queima de resíduos de borracha esponjosa em fornos
de cimenteira, para geração de energia, incorporação do resíduo ao cimento, não geração de
passivos ambientais e de forma mais ampla garantindo a preservação do meio ambiente e dos
recursos naturais.
A operação consiste na coleta de aparas de borracha esponjosa, trituração,
acondicionamento big-bags, transporte em veículos específicos, descarga em silos de resíduos,
alimentação do forno através de esteiras transportadoras, queima para geração de gases com
temperaturas médias de 800 ºC, incorporação das cargas minerais do resíduo ao cimento, não
propiciando dessa forma a geração de novos resíduos.
O processo inicialmente empírico , foi sendo aperfeiçoado através da alteração das
variáveis do processo, de modo a oferecer as melhores alternativas relacionadas ao poder calorífico
do resíduo, a incorporação total ao clinker sem que houvesse comprometimento da qualidade do
produto final e a não emissão de poluentes pela adoção de filtros compatíveis à demanda.
Os resíduos de aparas de sandálias de borracha esponjosa, na ordem 8% do combustível
total, representam em peso, algo próximo a 10 toneladas/dia e corresponde a um volume 40 m3/dia
(já triturado) e isso, seguramente, representa uma grande economia de recursos naturais, além da
correta e adequada destinação para preservação do meio ambiente.
Palavras-Chave: Gestão Ambiental, Resíduos Sólidos, Borracha Esponjosa.

ABSTRACT
Within the context of allocation of solid waste, co-processing, incineration or other means,
it is essential to define criteria for care of the law and, as a consequence of the environment.
Our approach focused on the burning of waste rubber sponge in the cement kilns, to
generate energy, incorporation of the cement residue, no generation of environmental liabilities and
a more extensive ensuring the preservation of the environment and natural resources.
The operation is the collection of scrap rubber, sponge, grinding, packaging big-bags,
transport vehicles in particular, discharge of waste into silos, feed the furnace through conveyor
belts, burning to gas generation with an average temperature of 800 ° C, incorporation loads of
mineral residue of the cement, thus not providing a new generation of waste.
The process initially empirical has been improved by modifying the variables of the
process, in order to offer the best alternatives related to the calorific value of the residue, the
incorporation total clinker without the commitment to see the quality of the final product and not
the emission of pollutants adoption of filters compatible demand.
Waste scrap of sponge rubber sandals, in the order 8% of the total fuel, are by weight,
something close to 10 tons / day and corresponds to a volume 40 m3/day (already ground) and it
certainly represents a large economics of natural resources, in addition to the correct and proper
allocation for preservation of the environment.
Key-Words: solid waste, rubber spong, environmental administration.
Fórum Internacional do Meio Ambiente - A conferência da Terra 1367

INTRODUÇÃO
Diante das atuais crises econômicas e sociais agravadas pelas problemáticas ambientais, o
Desenvolvimento Sustentável parece ser um caminho para a construção de uma nova sociedade.
Entretanto um aspecto importante a ser considerado é a insuficiência de ações efetivas que
promovam esse desenvolvimento. Corroborando essa perspectiva, a atual Ministra do Meio
Ambiente, ao se referir à reunião da Comissão de Desenvolvimento Sustentável da ONU, ocorrida
em maio de 2003, relata: “Vi muita gente boa, bem-informada, especializada, mas revelando certo
cansaço de falar e ouvir as mesmas coisas com tão pouco resultado prático. Era como se aquele
conhecimento avançado e aquela linguagem especializada nos apartassem do mundo corriqueiro das
pessoas.” (TRIGUEIRO, 2003, p.9).
A borracha é atualmente um dos principais resíduos poluidores, visto isso este artigo
aborda o co-processamento de resíduos de borracha esponjosa por incineração, mostrando sua
vantagens e desvantagens.

INCINERAÇÃO E CO-PROCESSAMENTO
O processo de destruição térmica, comumente chamando de incineração, é hoje bastante
aplicado em função da redução do peso dos resíduos em níveis superiores a 75%, do volume em
mais 90% e das características de periculosidade associada a alguns deles eliminando-se dessa
forma parte da matéria orgânica e características de patogenicidade (capacidade de transmissão de
doenças), quando o processo é desenvolvido atendendo a critérios relativos a combustão
controlada.
Em se tratando de co-processamento, na maioria dos casos, não ocorre geração de novos
resíduos (cinzas ou outros), assegurando-se um aproveitamento de 100% dos referidos, quer seja na
geração de energia ou como matéria prima para a fabricação de novos compostos.

Figura 1

Os cuidados estendem-se por todas as fases, desde a coleta, acondicionamento, transporte,


armazenamento, tratamento e disposição final, na tentativa de evitar-se efeitos danosos a saúde
humana e ao meio ambiente.
A conduta equivocada relativa ao encaminhamento de resíduos não tratados para lixões,
poderá provocar acidentes graves e gerar incremento nos problemas de saúde pública. Estima-se
que algo em torno de dois e meio milhões de toneladas/ano de resíduos que atendem a essa
característica, proporcionando o aparecimento de áreas contaminadas ou sob suspeita de
contaminação. Do universo de três milhões de toneladas/ano dos resíduos tratados, 16% vão para
aterros, 1% é incinerado. E os 5% restantes são co-processados, ou seja, transformam-se, por meio
de queima, em parte da matéria-prima utilizada na fabricação de cimento ou em energia térmica.
Fórum Internacional do Meio Ambiente - A conferência da Terra 1368

Figura 2

No Brasil, a destruição de resíduos pelas via do tratamento térmico conta com os


incineradores industriais e com o co-processamento em fornos de produção de clinquer (
cimenteiras ). A Resolução Conama 264/99 não permite que os resíduos domiciliares brutos e
certos resíduos perigosos venham a ser processados em cimenteiras, tais como os provenientes dos
serviços de saúde, os rejeitos radioativos, os explosivos, os organoclorados, os agrotóxicos e afins.

FUNDAMENTAÇÃO TEÓRICA
Desenvolvimento Sustentável
A revisão dos ideais de crescimento e de desenvolvimento econô mico e social,
consideradas as limitações dos recursos do planeta, toma uma maior visibilidade com a Conferência
de Estocolmo, ocorrida em 1972, em que se reuniram 113 países para traçar discussões sobre o
Meio Ambiente Humano. Em decorrência da evidente necessidade de proteção ao meio ambiente,
em 1983, as Nações Unidas criaram a Comissão Mundial para o Meio Ambiente e o
Desenvolvimento. Essa Comissão editou, em 1987, o relatório Brundtland, também conhecido
como “Nosso Futuro Comum”, um dos marcos que preconizaram “uma nova era de
desenvolvimento econômico ambientalmente saudável”.
Visto que “a Humanidade tem a capacidade de atingir o desenvolvimento sustentável, ou
seja, de atender às necessidades do presente sem comprometer a capacidade das futuras gerações de
atender às suas próprias necessidades”. (MINISTÉRIO DO MEIO AMBIENTE, 2005a) Além dessa
definição sobre o Desenvolvimento Sustentável consta nesse relatório a convocação da Conferência
sobre Meio Ambiente e Desenvolvimento pela Assembléia Geral das Nações Unidas. Essa
conferência, conhecida como “Eco 92” ou “Cúpula da Terra”, realizada no Rio de Janeiro em 1992,
teve como principal objetivo encontrar um equilíbrio justo entre as necessidades econômicas,
sociais e ambientais das gerações atuais e futuras, de maneira a estabelecer as bases para uma
associação mundial, bem como cooperação entre governos e setores da sociedade civil, baseadas na
compreensão das necessidades e interesses comuns.
O principal resultado dessa Conferência foi a aprovação da Agenda 21, documento que
busca guiar as nações para o desenvolvimento sustentável implicando diretrizes para a formulação
de políticas e práticas para a sustentabilidade. (MINISTÉRIO DO MEIO AMBIENTE, 2005a,
2005b).
Este acordo contém princípios que determinam que os Estados e Instituições devem:
· garantir atividades que não causem danos ambientais;
· cooperar para a erradicação da pobreza ;
· eliminar padrões de produção e consumo insustentáveis;
· promover a cooperação científica para a geração e disseminação de conhecimentos;
· criar uma legislação efetiva entre outras ações que gerem um sistema global sustentável.
Além disso, a Agenda 21 apresenta essas propostas em quatro seções: (MINISTÉRIO DO MEIO
AMBIENTE, 2005a, 2005b)
Fórum Internacional do Meio Ambiente - A conferência da Terra 1369

Segundo Almeida (2002, p.25), a noção de desenvolvimento sustentável envolve “o


reconhecimento da ‘insustentabilidade’ ou inadequação econômica, social e ambiental” em virtude
da “finitude dos recursos naturais e das injustiças sociais das sociedades contemporâneas”. Contudo
o autor acredita que a discussão sobre o Desenvolvimento Sustentável “está polarizada em duas
principais concepções”: de um lado, uma idéia discutida dentro da esfera econômica, em que “a
natureza passa a ser um bem de capital” e, de outro, “uma idéia que tenta quebrar a hegemonia do
discurso econômico e expansão desmesurada da esfera econômica que vai além da “visão
instrumental e restrita” proposta pela economia (ALMEIDA, 2002, p.26).

METODOLOGIA

Figura 3

Em função das características do produto utilizado no co-processamento através da


incineração de resíduos de borracha esponjosa, optou-se por metodologia experimental, onde os
registros, alterações e ajustes foram sendo evidenciados a medida em que novas experiências
aconteciam, as quais visavam à otimização do processo.
Por apresentar configuração granulométrica irregular e com características de difícil
transporte, tornou-se obrigatória a trituração do resíduo em moinhos, o que facilitaria não só a
movimentação do referido em função da redução do volume, como também permitiria o controle de
entrada no forno da cimenteira, o que se dá através de esteiras transportadoras com velocidade
controlada para movimentar um volume diário da ordem de 10 toneladas sem comprometer os
valores de temperatura e índice de incorporação de resíduos permitidos na operação.
Optou-se por inserir esse resíduo na entrada do forno, logo após a torre de pré-calcinação,
onde a temperatura poderia chegar até 800 ºC e quando da destruição do resíduo geraria gases
capazes de promover aquecimento da matéria prima (clinker) promovendo dessa forma economia
de energia térmica em etapas sub-sequentes.

Figura 4

Todas as etapas da operação são realizadas por pessoas treinadas, as quais são responsáveis
pela manutenção dos parâmetros definidos para o evento, e que permitirão a melhor relação custo x
Fórum Internacional do Meio Ambiente - A conferência da Terra 1370

benefício para a empresa e meio ambiente, tendo-se cuidados especiais com as emissões
atmosféricas emanadas em associação a outros combustíveis (coke, pneus queimados, etc).

AVALIAÇÃO DOS RESULTADOS


Em função da utilização de equipamentos obsoletos, operação inadequada ou falta de
critérios, a incineração, quer seja para destruição dos resíduos, para geração de energia ou
incorporação à outro produto como matéria prima, ganhou o conceito de poluidor, nocivo à saúde e
prejudicial ao meio ambiente, embora saiba-se que, sob vários aspectos, a incineração constitui o
processo mais adequado para a solução ambientalmente segura de problemas de disposição final de
resíduos.
A evolução das tecnologias aplicáveis , permitiram o aparecimento de novos sistemas para
a remoção de outros poluentes como NOx, dioxinas e furanos, além de tratamentos para a
produção de resíduos finais inertes, que podem ser reciclados ou dispostos sem nenhum problema
para o meio ambiente.
Nestes últimos anos, a maioria das instalações de tratamento de gases das principais
plantas de países altamente industrializados foram substituídas e hoje atendem às exigentes normas
de proteção ambiental. Além disso, a adoção de tratamentos prévios dos resíduos a serem
incinerados , proporcionam aumento da homogenização, reduzindo a umidade e melhorando o
poder calorífico, de tal forma a transformá-lo em um combustível de qualidade para a máxima
geração de energia. Sofisticam-se também os processos de combustão, com o aumento dos sistemas
de turbilhonamento, secagem, ignição e controle da combustão.

Figura 5

Apesar de algumas críticas de organizações não governamentais, instituições oficiais


comprovam a eficiência da incineração e do co-processamento em fornos de cimento, em função de
rigorosos e contínuos controles das variáveis de combustão em todas as câmaras do processo, bem
como, nas demais etapas de depuração de gases e geração de energia, sendo dessa forma entendida
como uma das principais políticas para a redução de resíduos.

CONCLUSÃO
O co-processamento indica que a substituição de uma parte do combustível convencional
por resíduos borracha esponjosa, não se traduzirá em qualquer acréscimo de emissões nocivas,
dioxinas ou outras, se comparadas com as emissões oriundas da queima de combustíveis
convencionais, mas sim na geração de energia térmica, cargas minerais a serem incorporadas as
matérias primas tradicionais da composição do cimento e eliminação de qualquer que seja o passivo
ambiental, por não provocar impactos ao meio ambiente.
Com efeito, conclui-se de que não há emissões acrescidas numa cimenteira que queima
resíduos de borracha esponjosa, e que , a co-incineração não tem qualquer impacto na saúde
pública, pois zero emissões só pode ter zero impacto.
A incorporação total dos possíveis resíduos sólidos gerados quando da utilização do
combustível alternativo como energia térmica compatível com a fabricação de cimento, no caso
Fórum Internacional do Meio Ambiente - A conferência da Terra 1371

resíduos de borracha esponjosa além da preservação de jazidas naturais não renováveis, nos
permitem sugerir que o processo é recomendável não só do ponto de vista financeiro , como
também do ponto de vista ambiental.

REFERÊNCIAS BIBLIOGRÁFICAS
[CCI Vol1] Sebastião Fomosinho, Casimiro Pio, Henrique Barros, José Cavalheiro Parecer
Relativo ao Tratamento de Resíduos Industriais Perigosos, Volume I, Editora Principia, Maio de
2000, ISBN 972-8500-29-7
[CCI Vol2] Sebastião Fomosinho, Casimiro Pio, Henrique Barros, José Cavalheiro Parecer
Relativo ao Tratamento de Resíduos Industriais Perigosos, Volume II, Editora Principia, Dezembro
de 2000, ISBN 972-8500-42-4.
ASSOCIAÇÃO BRASILEIRA DE NORMAS TÉCNICAS – ABNT.
FARIAS, GIVANILDO GONÇALVES. Metodologia Científica, Notas de aula do CEGAMI -
Departamento de Química da UEPB. Campina Grande-PB, 2005.
NBR 13.221/94 - Transporte de resíduos sólidos.
NBR 13.463/95 - Coleta de resíduos sólidos.
Registros Técnicos da CIMPOR.
RESOLUÇÃO Nº 316/2002 - CONAMA. Sistemas de tratamento térmico de resíduos.
www.mma.gov.br/port/conama/res/res02/res31602.html
www.co-incineracao.online.pt/emissoeszero
www.co-incineracao.online.pt/emissoeszero.pdf
www.essencis.com.br/serv_inc.asp
www.paginas.fe.up.pt/~jotace/temaspolemicos/quercus.doc
Fórum Internacional do Meio Ambiente - A conferência da Terra 1372

DEPOSIÇÃO DOS RESÍDUOS SÓLIDOS NO MANANCIAL LAGOA DO MUCAMBINHO

Tereza Flávia Camilo de Assis


Universidade Estadual Vale do Acaraú/UVA
Cleire Lima da Costa Falcão – cfalcao@sobral.org
Universidade Estadual Vale do Acaraú/UVA

RESUMO
O presente trabalho aborda o uso e ocupação do solo relacionado à disposição de resíduos
sólidos em ambiente fluvial de área urbana. Objetivou-se verificar a influência dos resíduos sólidos
na Lagoa do Mucambinho, localizada no bairro Terrenos Novos, Sobral, CE.
Palavras-chaves: Mucambinho, Terrenos Novos, Lagoa

ABSTRACT
This paper addresses the use and occupation of land related to disposal of solid waste in a
river in the urban area. The objective was to check the influence of solid waste in the Mucambinho
Lagoon, located in the New Land neighborhood, Sobral, CE.
Keywords: Mucambinho, New Land, Lagoa

INTRODUÇÃO
A ocupação humana inadequada á natureza do bairro Cidade Dr. José Euclides, vem
causando sérios problemas de degradação ambiental e prejuízos econômicos e sociais a
comunidade. Dentre esses problemas, destacam-se a forma de como se usa ou ocupa as margens da
Lagoa do Mucambinho (ver figura 1), inserida no bairro. O reflexo do uso inadequado afeta
diretamente a comunidade local, além de causar prejuízos ao ecossistema desse ambiente.
Este fato já vem sendo abordado no meio acadêmico (MARCONDES, 1999, PACHÊCO,
2003 e REGO, 2005), como também, pela comunidade. Vale ressaltar que os ambientes lacustres
são detentores de funções especificas a manutenção da fauna e da flora, daí considerados áreas de
preservação ambiental.

A Proteção dos Mananciais


No início da história da civilização os sistemas urbanos dispunham de grandes quantidades
de água, mas esta abundância não resultou em equilíbrio contínuo com o meio ambiente. Pelo
contrário, desequilibrou e hoje, é bastante visível a situação no Brasil e no mundo, se tratando de
mananciais.
Até meados de 30, a lei que protegia os mananciais era dotada de um modelo que visava
preservar também os outros recursos naturais, inseridos na bacia hidrográfica, ou seja, preservava os
recursos naturais em sua totalidade.
Após a década de 40 essa prática de preservar os recursos hídricos em sua totalidade, ou
seja, a bacia hidrográfica por completo (ar, água e solo), tornou-se impraticável devido á extensão
das áreas a serem protegidas e o comprometimento do uso do solo pelos processos de urbanização e
atividades rurais. Com isso, se fez necessário criar uma lei que protegesse os recursos hídricos com
mais vigor, e então surgiu a legislação ambiental de proteção dos mananciais metropolitanos.
Entretanto, somente em 1970 essa lei foi promulgada.
Fórum Internacional do Meio Ambiente - A conferência da Terra 1373

Conforme Marcondes (1999),


Na década de 1970 foi promulgada a legislação ambiental de proteção dos mananciais
hídricos metropolitanos. Essa legislação ainda se encontra em vigor, pelo menos
enquanto não forem elaboradas as leis específicas para as áreas de proteção e
recuperação dos mananciais, estabelecidas pelas diretrizes e normas para a proteção das
bacias hidrográficas dos mananciais de interesse regional do Estado de São Paulo,
editada pela lei estadual, 9.866 de 1997. (p.64)

Vale ressaltar que a legislação ambiental estabeleceu um sistema de licenciamento e


controle das atividades em áreas de mananciais. Entretanto, com tantas atuações de
empreendimentos, como industriais e outros empresas nestas áreas, evidenciam a falta de
fiscalização com relação a dinâmica de uso e ocupação do solo e outras regras que não são aderidas,
principalmente,pelos donos de indústria.
A questão dos mananciais comparadas ás demais áreas de proteção ambiental nos sistemas
urbanos tornou-se mais crítica devido aos intensos processos de urbanização sobre os recursos
naturais, pois os mesmos apresentam vários problemas de gerenciamento como: insuficiência de
abastecimento de água e esgoto.

Uso e Ocupação da Lagoa do Mucambinho


Para compreender melhor a ocupação da lagoa do Mucambinho, faz-se necessário
conhecer um pouco da história do bairro, a qual ela se inseri, ou seja, a Cidade Dr. José Euclides,
popularmente, Terrenos Novos.
O bairro Cidade Dr. José Euclides foi instalado em uma área de 20 hectares de terras
improdutivas, pertencentes ao antigo IBDF, atualmente IBAMA. A referida área de terra foi divida
em 1.320 lotes, destinados a um programa de habitação popular que na época (1982) tinha a
finalidade de possibilitar pessoas carentes o acesso á casa própria.
Localiza-se no perímetro urbano da cidade de Sobral-Ce, limitando-se ao Norte pela
Avenida John Sanford e, ao Leste, Rua Presidente Geisel, ao Sul pela Avenida Ministro César Call
e a Oeste pelo perímetro urbano de Sobral.
Fórum Internacional do Meio Ambiente - A conferência da Terra 1374

A expansão do bairro se deu principalmente por pessoas provenientes da zona rural de


Sobral, proporcionando assim um aumento de pessoas no bairro e na cidade. Conforme Ferro
(2005), “a população do bairro é de 14. 771 habitantes”. Portanto é uma grande concentração de
pessoas.
Com o crescimento demográfico sem planejamento, o bairro, gerou um cenário urbano
com diversos problemas sociais e ambientais, como a questão habitacional que tem se agravado ao
longo dos anos no entorno da lagoa do Mucambinho. A mesma tem provocado o surgimento de
novas formas de organização do espaço. Como a periferização de moradias que são construídas ao
longo dos anos, ou seja, a construção da casa se prolonga por muitos e muitos anos em virtude dos
baixos salários, pois a maioria são feitas por pessoas pobres que vieram para o local em busca de
emprego.
A ocupação do bairro, através de lotes clandestinos, e ocupação por pessoas carentes, fez
com que a área de risco da lagoa do Mucambinho fosse ocupada desordenadamente. Com isto,
percebe-se que é cada vez mais frequente o loteamento de áreas inadequadas, como: planícies de
inundação de lagoas e açudes. Dessa forma gerou-se um série de problemas de ordem ambiental.
Segundo Pachêco em seu trabalho de 2003, “o destino final dos dejetos da área era ao ar
livre ou depositado em fossas, nesta época, existia ainda as 84 casas, onde foi constatado que 20%
eram ligadas a rede de esgoto e 80% que correspondiam os moradores do entorno da lagoa jogavam
ao ar livre. O serviço de água era oferecido pelo SAAE que na época representava 68% e chafariz
que eram 32%.
Percebe-se que antes o destino dos dejetos era ao ar livre, ou seja, jogava-se os dejetos no
solo, contaminando-o. E o abastecimento de água era pelo SAAE, além do chafariz.
Ainda, Pachêco (2003), afirma que existia também escoamento superficial a céu aberto
com destino a lagoa, como também a rede de coleta de esgoto-SAAE era construído para dentro do
manancial. Ainda, segundo a autora, as doenças mais comuns na época eram: infecções
respiratórias, infecções de pele e problemas intestinais e ainda afirma que a maioria das
enfermidades era causada pela água.
Associado a questão de insalubridade, tem-se o baixo índice de renda. Conforme Ferro
(2005), o padrão econômico desta população era o mínimo possível, refletindo nas condições de
moradia, entre as quais a falta de banheiro nas residências.
Segundo Ferro (2005), 100% dos domicílios do entorno da lagoa têm abastecimento de
água de responsabilidade do SAAE (Sistema de Abastecimento de Água e Esgoto), porém, nenhum
domicílio tem acesso a sistema de esgoto sanitário.
Ainda, segundo o autor, o que foi observado e constado na área é que a população não
contribui para a limpeza de sua rua, os depósitos distribuídos para ser coletado o lixo, fica sempre
vazio e o lixo jogado nos terrenos baldios.
De acordo com as pesquisas de 1999, 2003 e 2005, os principais problemas ambientais
detectados na área do entorno da lagoa foram: contaminação da lagoa provocada por lixo e dejetos
humanos; desmatamento indiscriminado das margens da lagoa para construção de casas; poluição
do ar tanto pela queima de lixo como pela fábrica de cimento; esgotos domésticos despejando
dentro da lagoa e ruas 24hs; animais como vaca, cachorro, porcos soltos no, meio da rua
aumentando a sujeira e proliferação de doenças; precariedade da maioria das habitações e
inexistência de esgotamento sanitário e precariedade da rede de abastecimento de água.
É importante ressaltar, que esta realidade continua sendo a cada dia, mais intensificada,
pois aumenta o número de pessoas no bairro e assim os problemas também duplicam, ou seja,
existem mais pessoas que não têm banheiro, famílias que não tem abastecimento de água e família
que não tem acesso ao carro coletor de lixo, pois os mesmos não passam com frequência.
É válido dizer também que estes mesmos problemas já existiam a muito tempo na área,
apenas em proporção menores, pois ainda existia poucas pessoas no bairro. Atualmente a situação
do entorno da lagoa está do mesmo jeito que estava nos anos de 1999, 2003 e 2005, se tratando de
saneamento básico. Continua existindo família que não tem banheiro, quando tem não possui infra-
estrutura, a coleta de lixo continua inexistindo nas ruas de difícil acesso assim como o esgoto.
Fórum Internacional do Meio Ambiente - A conferência da Terra 1375

Atualmente, as famílias do entorno da lagoa do Mucambinho só dispoem de


abastecimento de água. Enquanto que a maioria das pessoas não dispoe do abastecimento de esgoto,
apenas possui fossa a minoria, mas com destino á lagoa que é o mesmo de estar jogando dentro de
casa, já que as mesmas ficam muito próximas á lagoa.
Pode-se observar no bairro Cidade Dr. José Euclides alguns problemas relacionados ao uso
e ocupação inadequado do solo. Fato observado com a urbanização das margens da lagoa do
Mucambinho. Os reflexos resultam na poluição da água e do solo da mesma.
A lagoa encontra-se cada vez mais alterada. Existe grande perda da flora e fauna, pois
faziam parte de alguns pontos do entorno da lagoa que não era povoada, mas com o aumento da
população varias espécies já não existem. Mesmo porque, algumas espécies não conseguem
sobreviver em ambientes modificados.

A situação atual da lagoa do Mucambinho


Em conseqüência da urbanização nas margens de mananciais, os mesmos se transformaram
em verdadeiros depósitos de lixo e esgotos das populações residentes em seu entorno.
Estes problemas vêm acontecendo na lagoa do Mucambinho. As pessoas jogam seus
resíduos dentro do manancial, que ainda é poluída pelo esgoto proveniente de todo o bairro Cidade
Dr.José Euclides. A água da lagoa encontra-se contaminada, pois a mesma se tornou um esgoto a
céu aberto e um depósito de lixo.
A poluição da lagoa do Mucambinho se dá de várias formas pelo lançamento de esgotos
doméstico, dejetos de animais e por lixo. Todas essas formas de poluição são expressivas na lagoa,
onde as pessoas convivem com o risco de contrair várias doenças. Vale ressaltar que foram
detectados na área mais de 1000 casos de dengue no ano de 2007, casos estes evidenciam o
aumento de incidência de doenças pela água e má disposição de lixo, pois a mesma multiplica-se
em períodos chuvosos.
Os dejetos humanos podem ser veículos de germes patogênicos de várias doenças e por
isso, é indispensável afastá-los dos seres humanos, abastecimentos de água e alimentos das pessoas.
Não é o que acontece no entorno da lagoa do Mucambinho, pois as pessoas convivem com esgotos
e resíduos sólidos.
A disposição de resíduos sólidos no solo resulta em vários problemas, sendo os principais a
poluição da água, do solo e a proliferação de doenças. Na verdade, o acúmulo de lixo em lugares
impróprios é sempre um grande problema, pois o mesmo é fonte de doenças e germes patogênicos.
A poluição destes componentes do meio ambiente é feita principalmente pela chuva que
carrega os resíduos do solo até os mananciais, afetando a qualidade da mesma. Além de contaminar
a água e o solo, contamina também os vegetais quando em contato com o solo e água. Em contato
com este solo e ingerindo a água e os alimentos as pessoas podem contrair uma série de doenças.
É possível constatar este fato no entorno da lagoa do Mucambinho, pois as crianças vivem
descalças junto ao lixo e adquirem tais doenças. É possível também observar que nos locais onde há
o acúmulo de lixo existem muito mais insetos do que em outros lugares.
Desta forma é importante adicionar o sistema de esgoto no bairro com destinação
adequada, pois o mesmo é direcionado para dentro da lagoa causando a poluição maciça do corpo
d’água, afetando seus diversos usos e problemas higiênicos da população que antes a usava para
pescar e tomar banho.
Atualmente, a lagoa se encontra um depósito de material putrescível. Grande parte está
reduzida por causa do assoreamento de suas margens, com a eutrofização, desapareceram os
organismos que serviam de alimentos para os peixes e morreram por falta de oxigênio, a presença
de muito lixo e esgoto faz com que a água fique turva e mal cheirosa.
É importante o tratamento de esgotos para não contaminar população, margens de
mananciais, verduras, leites e evitar efeitos desastrosos e indesejáveis sobre mananciais que
abastecem cidades ou ficam próximos a bairros. Além disso, é um direito de todos, principalmente
das populações ribeirinhas.
Fórum Internacional do Meio Ambiente - A conferência da Terra 1376

Devido à falta de medida de saneamento básico e educação sanitária a população ribeirinha


da lagoa do Mucambinho tende a lançar seus dejetos e lixos diretamente no solo, criando situação
favorável para as doenças.
O lixo encontrado na área é formado pelo resíduo urbano que inclui o resíduo doméstico
produzido pela atividade residencial. Classificado (como orgânico (restos de alimentos, folhas) e
inorgânico que são as embalagens plásticas, latas, vidros, papéis), esses resíduos juntam-se aos
resíduos produzidos em instalações comerciais e restos de construções. Esse tipo de lixo é jogado
nas margens e dentro da lagoa, constituindo um problema sanitário, pois o mesmo passa muito
tempo exposto no solo favorecendo o criadouro de vários animais.
As moscas através de suas asas, patas, saliva e fezes são responsáveis pela contaminação
de alimentos e transmitem diversas doenças como: diarréia infecciosa, amebíase, salmonelose,
ascaridíase, teníase, difteria e tracoma (infecção nos olhos muito contagiosa que pode causar
cegueira).
Os ratos utilizam os resíduos como esconderijo e abrigo, sendo que estes roedores através
de suas mordidas, fezes, urina e pela picada de pulgas estão envolvidas na transmissão da peste
bubônica, leptospirose.
Além disso, as baratas eliminam seus excrementos que são invisíveis aos nossos olhos por
todo lugar onde passam, e assim um passeio de baratas em qualquer casa coloca em risco todos da
casa.
Os moradores também reclamam a presença de cobras que ás vezes chega próximas ás suas
casas. Os mesmos relatam que é porque existem muitos ratos e assim elas se alimentam segundo
uma moradora da área a cobra chegou até a comer um porco de um dos seus vizinhos.
As pessoas também podem se contaminar pelo contato direto com os resíduos, pois eles
contêm restos de água servida e de alimentos que poderiam ter sido consumidos pelos cachorros,
porcos, bois, galinhas, e patos.
De acordo com alguns moradores da área a presença dos animais citados é muito freqüente
em suas casas. Sabe-se que um inadequado acondicionamento do lixo favorece o aparecimento de
mosquitos que se desenvolvem nas águas acumuladas em latas, muriçocas, moscas, causadores de
doenças. Por isso, haverá sempre a possibilidade de contaminação do ser humano pelo contato
direto com o lixo ou massas d’águas, por este poluída.
No bairro Cidade Dr. José Euclides a coleta é feita em 3 dias da semana, sendo que é uma
coleta de sistema único, ou seja, o lixo não é separado, os restos de comida não são separados do
cisco. Sendo apenas separados os restos de comida das embalagens plásticas ou de vidro, atividade
nem sempre exercida por uma parcela da população. Essa coleta no bairro é ineficiente, pois é fácil
encontrar lixo jogado em todas as partes do bairro, principalmente no entorno da lagoa do
Mucambinho.
Nos sistemas urbanos, o lixo costuma ser deixado nos locais mais afastados da área urbana,
nos aterros sanitários, onde o lixo é colocado em valas especiais e onde recebe tratamento para não
contaminar a natureza, ou seja, o lixo não fica aparente, visível como nos lixões, por isso é
considerado atualmente a melhor forma de destino final do lixo.
Aterros sanitários são considerados uma maneira prática, barata de destinar os resíduos
urbanos e industriais. Por isso, é a forma mais utilizada para tratamento de lixo, onde utilizam
grandes áreas de terra, onde o lixo é depositado. Porém, inutilizam vários materiais que poderiam
ser reciclados, além de ser uma fonte de poluição do solo, rios, lagos e do ar. A poluição se deve ao
processo de decomposição da matéria orgânica que gera enormes quantidades de biogás que contém
metano, e chorume (líquido contendo componentes tóxicos que flui do lixo para o solo e
mananciais).
Se estivermos atentos, iremos perceber que tudo o que está velho, ultrapassado ou é
descartável estamos considerando como lixo. A garrafa de suco ou refrigerante que está sobre a
mesa do almoça depois de esvaziada passa a ser tratada como objeto sujo e é imediatamente
colocada na lata do lixo. Refletir sobre lixo é algo muito importante, pois nos pensar sobre a
Fórum Internacional do Meio Ambiente - A conferência da Terra 1377

natureza e seus ciclos, repensar os nossos valores, o que estamos desperdiçando. Precisa-se repensar
a relação com o lixo que na maioria das vezes é quere se livrar dele.
O preconceito com o lixo tem relação com os valores culturais da sociedade de consumo
onde é descartável. Só valoriza-se o que é novo, o que acabou de sair da loja. Assim, o bem que
poderia ser mais durável já não tem mais valor. As cadeiras que estão com defeito que poderiam
ser consertadas, logo, achamos que precisam ser trocadas por novas. Contudo, uma parcela da
população já despertou para a necessidade urgente de pensarmos em estratégias e formas de viver
que garantam a vida do Planeta Terra. A cada dia vemos mais pessoas, propagandas, apostilhas,
programas de TV e rádio falando sobre a reciclagem e reutilização.
Diante disso, pode-se afirmar que as condições ambientais influenciam positiva ou
negativamente na saúde. Uma vida saudável depende das condições adequadas de saneamento e de
outros elementos (alimentos, vestuário, habitação e transporte). Desta forma, o nível de progresso e
bem-estar de um país está diretamente ligado às condições sanitárias e ambientais. E o lixo de cada
família, grupo, cidade e país são diferentes, pois está diretamente relacionado á classe social, á
cultura e as condições sócias ambiental.

CONSIDERAÇÕES FINAIS
O resultado deste trabalho nos revelou grandes impactos vividos de um modo geral pelo
meio ambiente, mais precisamente pelos mananciais. Sendo que os principais responsáveis são os
seres humanos.
O resultado deste trabalho constata também que o bairro Cidade Dr.José Euclides sofreu
um processo acelerado e desordenado de crescimento populacional sem que houvesse a
preocupação de um planejamento ambiental. A conjunção desses fatores proporcionou o surgimento
de diversos problemas ambientais dentre eles, o uso e ocupação inadequada da margem da lagoa do
Mucambinho. É interessante ressaltar que as pessoas moram quase dentro da lagoa, e assim, todo o
lixo e dejetos são lançados dentro da mesma, degradando-a.
Verificou-se que as necessidades atuais das comunidades aumentaram devido o processo
tecnológico. No entanto, também proporcionou desigualdades sociais, consumismo acelerado,
desperdício, falta de moradia e desemprego. Percebeu-se que grande parte da população que ocupa
as margens da lagoa é pobre e não tem dinheiro para mudar de local, ou seja, para um local
adequado.
Durante a pesquisa realizada, caracterizaram-se resíduos urbanos encontrados nas margens
da lagoa do Mucambinho como sendo em sua maioria compostos por resíduos domiciliares e
entulhos. Todo esse material é produzido pela população do entorno da lagoa e dos moradores
circunvizinhos a área.
Tudo isso se traduz em crescentes problemas de coleta, tratamento e destino final de
resíduos. Pois a população alega que não passa o carro coletor e, além disso, afirma que todos
colocam então não há problema. O problema seria se apenas um colocasse.
Essa questão indica ao mesmo tempo um dilema e um desafio para todos, principalmente
para os estudiosos da área física, ou seja, o processo sociedade e natureza necessitam
constantemente de estudo e análise para poder compreender e ao mesmo tempo gerenciar os riscos
ambientais que podem causar danos muitas vezes irreversíveis tanto para o meio ambiente como
para a população. Isto porque os locais utilizados como depósitos constituem-se muitas vezes em
focos de mosquitos e roedores. Assim, todo esse material contribui para a deterioração do meio
ambiente e da qualidade de vida humana.
Como foi constatado no entorno da lagoa, onde a população sofre com vários problemas,
dentre eles, está o saneamento básico que é insuficiente e faz com que a população contraia várias
doenças, como: diarréia, dengue, verminoses e infecções de pele e respiratórias. Como relatou uma
entrevistada, disse que sentia muita falta de ar, não só ela, mas quase toda a família.
Com base nos problemas que foram identificados na área como lixo, abastecimento de
esgoto ineficiente, degradação da lagoa, é necessário implantar urgentemente nesta área ações de
controle e preventivas, principalmente preventivas, pois são mais vantajosas e mais baratas, além
Fórum Internacional do Meio Ambiente - A conferência da Terra 1378

disso, reduz ou eliminam situações de risco. Mesmo porque os moradores reclamam da falta de
poder público que não existe na área, pois são esquecidos. Um morador chegou a dizer que a rua
que eles moravam não existia na prefeitura e por causa disso não tinha saneamento básico, ou seja,
não faziam nada na rua.
É por isso que é importante a educação das pessoas no que se refere à área de preservação
ambiental para que não haja prejuízos nem para as pessoas nem para a prefeitura, pois em uma
situação dessas a prefeitura teria que deslocar as pessoas para outro lugar e isso causa grande
prejuízo. Se existisse uma lei proibindo à ocupação da área as pessoas não teriam ocupado.
Com isso, é necessário investir na educação do povo através de boas escolas, de
campanhas ambientais mais efetivas que mobilizem a população. Como no caso dos resíduos
sólidos não basta apenas o município investir em aterro sanitário, caminhões de limpeza e em
campanhas isoladas de coleta seletiva. É preciso explicar a população do que se trata tudo isso, a
função da coleta seletiva, suas melhorias na qualidade de vida, a renda que esses resíduos podem
gerar se reciclados, a importância da conscientização sobre a preservação do meio ambiente, e fazer
essa população aplicar na prática tudo que aprendeu, enfim, uma campanha mais voltada á
sociedade de maneira eficaz.
Atualmente, há técnicas para reutilizar e reciclar esses materiais, evitando desta forma seu
acúmulo descontrolado, protegendo a saúde pública e economizando os nossos preciosos recursos
naturais. De acordo com a SEMACE (2007), usando quatro ações, você pode dar uma grande ajuda
para reduzir o acúmulo de lixo e preservar os recursos naturais.
Primeiro R. (Reduzir) - diminua a quantidade de lixo que você produz desperdiçando
menos. Use produtos como pastas de dentes, sabonete e produtos de limpeza até o final. Não
desperdice alimentos. Evite produtos descartáveis. Utilize folhas de papel de ambos os lados. E o
mais importante: evite o consumismo, não compre coisas que você não está precisando.
Segundo R. (Reutilizar) - dê uma nova utilidade para materiais que você iria jogar no lixo.
Por exemplo: tente consertar os objetos quebrados, ao invés de jogá-los diretamente no lixo.
Terceiro R.(Reciclar) - separe metais, plásticos, papéis e vidros do reto do seu lixo. Se
recolhidos seletivamente, estes materiais podem ser reciclados. A reciclagem salva árvores,
economiza energia, gera renda e empregos e evita a poluição ambiental.
Quarto R.(Repensar) - todas essas ações visam fazer com que as pessoas repensem o uso
de recursos naturais com maior responsabilidade. Se todos usarmos somente o necessário, não vai
faltar para ninguém no futuro.
Veja um exemplo do que pode acontecer quando não reciclamos certos materiais e eles são
jogados na natureza. Comparando quanto tempo estes resíduos levam para se decompor. Latas de
alumínio podem levar 200 anos para se integrar á natureza, uma garrafa de plástico, em média, pode
levar 450 anos. Enquanto o ser humano pode durar apenas uns 90 anos.
Portanto, uma garrafa de plástico não reciclado pode poluir o ambiente em que vivem e
viverão você, seus filhos, seus netos e bisnetos. Por isso, lembre-se de reduzir, reutilizar, reciclar e
repensar seus princípios com relação à produção de lixo.
Sabe-se que ações de prevenção envolvem governo e sociedade. Contudo para se ter o
saneamento do meio ambiente acessível a todos, como água tratada, esgotamento sanitário e destino
final adequado para o lixo é necessário que o governo e a sociedade saibam exercer seus direitos e
deveres. No entanto, as pessoas que moram no entorno da lagoa e as que moram no bairro Cidade
Dr. José Euclides deverão receber informações sobre as preocupações ambientalistas e as
instalações futuras deverão obedecer a leis ambientais referentes ao uso e ocupação do solo para
que não haja impactos negativos resultantes do uso e ocupação do solo em outros lugares do bairro.

REFERÊNCIAS BIBLIOGRÁFICAS
FERRO, S. V. Problemas Ambientais Potencialmente Causadores de Agravos á Saúde da
População Ribeirinha da Lagoa do Mucambinho - Bairro Cidade Dr. José Euclides (Terrenos
Novos), Sobral-CE. Monografia do Curso de Geografia, UVA, 2005.
Fórum Internacional do Meio Ambiente - A conferência da Terra 1379

LIMA, E. C. Despoluição da lagoa do Mucambinho no bairro Cidade Dr. José Euclides (Terrenos
Novos) município de Sobral, seu reflorestamento e a implantação de hortas comunitárias para a
comunidade de baixa renda, Centro de Ciências Humanas da UVA, 1999.
MARCONDES, M. J. A. Cidade e Natureza: Proteção dos Mananciais e Exclusão Social. São
Paulo: Studio Nobel: Editora da Universidade de São Paulo: FAPESP, 1999.
PACHÊCO, A. P. P. Análise das interferências da sociedade na natureza: Uma leitura da paisagem,
contribuição para uma Educação Ambiental na Lagoa do Mucambinho. Curso de Especialização em
Educação Ambiental, UVA, Sobral-CE, 2003
Fórum Internacional do Meio Ambiente - A conferência da Terra 1380

ALTERNATIVAS PARA O CONTROLE DA POLUIÇÃO DO AR

Boaz Antonio de Vasconcelos Lopes


Dotorando em Recursos Naturais. UFCG. bboaz@bol.com.br

RESUMO
Entre os diferentes tipos de poluição observados no ambiente, a contaminação do ar tem
sido um dos temas de grande interesse para o meio científico nas últimas décadas, tendo em vista
sua implicação negativa sobre a saúde humana, ecossistemas e bens construídos. Caracterizando-se
como um fator de importância na busca do desenvolvimento sustentável. Estaremos neste trabalho
exemplificando, mediante o método da análise documental, o uso de algumas espécies de vegetais
como bioindicadores, tais como: vegetais superiores, musgos e liquens.
Palavras-chave: Indicadores biológicos; poluição atmosférica; monitores ambientais; Controle
ambiental

ABSTRACT
Between the different pollution types observed in the atmosphere, the contamination of the
air has been one of the themes of great interest for the scientific way in the last decades, tends in its
view negative implication on the human health, ecosystems and built goods. Being characterized as
a factor of importance in the search of the maintainable development. We will be in this work
exemplifying, by means of the method of the documental analysis, the use of some species of
vegetables as biological indicators, such as: superior vegetables, mosses and lichens.
Key-Words: Biological indicators; atmospheric pollution; environmental monitors; Control
environmental

INTRODUÇÃO
São vários os desastres ecológicos que temos como exemplo: a poluição do ar atmosférico
que causou a morte de 60 pessoas no Vale do Meuse na Bélgica (1930), cerca de 3000 pessoas em
Londres (1952), acidente com gás em Bhopal na Índia (1984); além dos constantes problemas com
chuva ácida, sem contar os crescentes níveis de poluição nas grandes cidades do mundo.
Uma das conclusões dos pesquisadores da área é que: sem que haja um sistema abrangente
de monitoramento, a qualidade do ar nas áreas urbanas e industriais tende a apresentar
concentrações descontroladas de contaminação. Dada a sofisticação dos métodos físicos e químicos
convencionais, que requerem custos elevados de implantação, operação, manutenção e custo testes,
cada vez mais, tem-se adotado métodos alternativos de biomonitoramento.
O biomonitoramento é um método experimental que permite avaliar respostas de
organismos vivos à poluição, oferecendo vantagens como: custos reduzidos, eficiência para o
monitoramento de áreas amplas e por longos períodos de tempo e, também, avaliação de elementos
químicos em baixas concentrações ambientais.
Segundo Hawksworth (1992), são considerados como bioindicadores organismos que
expressam sintomas particulares ou respostas que indiquem mudanças em alguma influência
ambiental, geralmente de forma qualitativa.
A diferença entre bioindicadores e biomonitores se dá unicamente pelo tipo de respostas
que eles podem fornecer. Enquanto os bioindicadores provêm informações sobre a qualidade do
ambiente ou de suas modificações, as "respostas" dos biomonitores possibilitam quantificar tais
modificações.
As medidas e registros efetuados por redes convencionais de monitoramento da qualidade
do ar permitem verificar se normas e limites estabelecidos ou recomendados pela legislação,
agências ambientais e órgãos de promoção da saúde humana estão sendo respeitados. Entretanto,
tais medições não permitem conclusões imediatas sobre as conseqüências de poluentes nos seres
vivos.
O biomonitoramento pode ser considerado, também, como um método complementar na
análise de poluentes, podendo constituir-se em um terceiro sistema de informações, além dos
Fórum Internacional do Meio Ambiente - A conferência da Terra 1381

inventários de emissões e de concentrações ambientais. Uma vez que as reações biológicas frente à
poluição do ar são sentidas por exemplares de agentes biológicos.
Além de expor uma base conceitual sobre qualidade do ar; estaremos neste trabalho
exemplificando, mediante o método da análise documental, o uso de algumas espécies de vegetais
como bioindicadores, tais como: vegetais superiores, musgos e liquens.

POLUIÇÃO ATMOSFÉRICA
Dentre os diferentes tipos de poluição observados no ambiente, a contaminação do ar tem
sido um dos temas de grande interesse para o meio científico nas últimas décadas, tendo em vista
sua implicação negativa sobre a saúde humana, ecossistemas e bens construídos. Caracterizando-se
como um fator de importância na busca do desenvolvimento sustentável.
As fontes emissoras de contaminação atmosféricas são classificadas em estacionárias ou
móveis. As principais fontes estacionárias estão ligadas a processos de combustão decorrentes da
produção industrial, de usinas termoelétricas ou da queima de resíduos sólidos, em serviços urbanos
de tratamento de resíduos. Quanto às fontes móveis, são representadas, principalmente, pelos
veículos automotores (BRASIL, 1990).
Classicamente os poluentes atmosféricos são divididos em duas categorias: poluentes
primários, quando emitidos diretamente pelas fontes; e poluentes secundários, formados por reações
químicas entre poluentes primários e outros constituintes da atmosfera.
A determinação sistemática da qualidade do ar deve limitar-se a um número restrito de
agentes, definidos em função de sua importância e dos recursos materiais e humanos disponíveis,
constituindo-se nos indicadores da qualidade do ar consagrados universalmente. No Estado de São
Paulo, a agência de controle ambiental, Companhia de Tecnologia de Saneamento Ambiental –
CETESB (1999) estabelece os seguintes indicadores da qualidade do ar:
a) Partículas totais em suspensão (PTS): de composição variada, incluindo metais pesados.
Material sólido ou líquido suspenso no ar na forma de poeira, neblina, aerosol, fumaça, fuligem,
com dimensões inferiores a 100 micrometros. São produzidas por indústrias, veículos, suspensão do
solo e queimadas;
b) Material particulado ou partículas inaláveis (MP10): material sólido ou líquido suspenso
no ar, na forma de poeira, neblina, aerosol, fumaça, fuligem, com dimensões inferiores a 10
micrometros. São produzidos nos processos de combustão industriais e veiculares;
c) Dióxido de enxofre (SO2): gás incolor, de odor forte. Precursor dos sulfatos e um dos
principais componentes das partículas inaláveis (MP10). É produzido na queima de óleo
combustível, em refinarias de petróleo e indústrias de papel. É o principal responsável pelas
doenças respiratórias provocadas por poluentes atmosféricos e pelo agravamento de doenças
cardíacas;
d) Dióxido de nitrogênio (NO2): gás marrom avermelhado, de odor forte e irritante. Pode
levar à formação do ácido nítrico, nitratos e compostos orgânicos tóxicos. Produzido na combustão
veicular, em processos industriais e de incineração, em condições de temperaturas elevadas.
Favorece a ocorrência de infecções respiratórias e provoca danos à vegetação, em decorrência da
formação de chuva ácida. Além do NO2, outros óxidos de nitrogênio fazem parte do grupo
genericamente chamado de NOx, tais como: o óxido nitroso (N2O), que se destaca na ciclagem do
nitrogênio, e o NO, que é tóxico e precursor do NO2;
e) Monóxido de carbono (CO): gás incolor, inodoro, insípido, formado na combustão
incompleta em veículos. Na presença de oxigênio molecular, forma o dióxido de carbono, que
contribui com o “efeito estufa”, responsável pela elevação das temperaturas do planeta;
f) Ozônio (O3): poluente secundário, formado por ação fotoquímica, a partir dos óxidos de
nitrogênio. Gás incolor e inodoro nas concentrações ambientais. Provoca irritação dos olhos e das
vias respiratórias, além de causar danos a plantios e vegetação em geral .

De acordo com Derisio (2000) e Baird (2002), outros agentes são, também, indicados
como importantes modificadores da qualidade do ar, entre os quais se destacam:
Fórum Internacional do Meio Ambiente - A conferência da Terra 1382

a) Compostos orgânicos voláteis (VOCs) e hidrocarbonetos: formados a partir de eventos


naturais, na decomposição e queima de matéria orgânica ou eventos antrópicos, na combustão
incompleta de combustíveis fósseis, evaporação de solventes e de combustíveis armazenados;
b) Poluentes metálicos: Chumbo (Pb) presente na gasolina, Mercúrio (Hg) e aqueles
desprendidos durante a queima de carvão mineral, ou em processos industriais envolvendo
temperaturas elevadas;
c) Gás fluodrídrico (HF) e demais fluoretos gasosos, emitidos pelas indústrias de
fertilizantes, na produção do alumínio e em refinarias de processamento de matérias-primas que
contenham flúor, em altas temperaturas. São irritantes respiratórios e com ação desfoliante sobre a
vegetação.

O controle da qualidade do ar é tema de grande importância para os principais organismos


internacionais e nacionais de saúde, que estabelecem normas, padrões e recomendações nessa área.
A Organização Mundial da Saúde (OMS) recomenda limites máximos de concentração de alguns
agentes presentes na atmosfera, como SO2, NO2, CO e O3, conforme apresentado no quadro a
seguir:

Quadro 1 - Limites máximos de concentração de alguns agentes presentes na atmosfera


recomendados pela Organização Mundial da Saúde – 1995

Principais bioindicadores da poluição atmosférica


A partir de meados do século passado, iniciou-se o processo de utilização de organismos
vivos como método auxiliar de detecção de alterações perigosas da qualidade do ambiente, que foi
denominado de biomonitoramento.
Quando os bioindicadores reagem ao estresse pela acumulação de substâncias nos tecidos,
são reconhecidos como organismos resistentes e denominados de bioindicadores de acumulação.
Quando sofrem alterações morfológicas, fisiológicas, genéticas e etológicas, são considerados
organismos sensíveis e denominados de bioindicadores de reação, Klumpp et al. (2000). Dentre os
organismos bioindicadores, destacam-se os líquens, os musgos e as plantas superiores.
Líquens são organismos formados pela associação simbiótica permanente entre
fungos e algas e/ou cianobactérias. As algas, que são sempre clorofíceas ou cianofíceas, e as
cianobactérias são organismos fotobiontes, que atuam na síntese de glucídios de que carecem os
componentes da associação simbiótica. Os fungos, que podem ser ficomicete, ascomicete,
basideomicete ou fungo imperfeito, absorvem e armazenam a água necessária à sobrevivência do
conjunto.
O líquen forma uma estrutura sem raízes ou cutículas, dependendo principalmente da
atmosfera para a obtenção de nutrientes. São capazes de viver em ampla área geográfica e de
acumular elementos minerais além de suas necessidades vitais, o que os tornam excelentes
indicadores da qualidade do ar, Garty et al. (2002).
Os musgos são amplamente utilizados como bioindicadores, em virtude de características
favoráveis ao biomonitoramento, como: ampla distribuição geográfica; capacidade de sobrevivência
em ambientes poluídos, tendência de crescimento ao longo de todo o ano (sempre verdes); interação
Fórum Internacional do Meio Ambiente - A conferência da Terra 1383

mais direta com o ambiente onde vive, do que as plantas superiores, em virtude da anatomia simples
e ausência de cutícula; capacidade de bioacumulação, Aceto et al. (2003) e Adamo et al. (2003).
Esses organismos têm sido mais freqüentemente utilizados como acumuladores de
poluentes atmosféricos, pois retiram os nutrientes principalmente do ar, pela absorção de partículas
neles depositadas, provenientes do solo, de emissões marinhas e de emissões antropogênicas.
Quando são epífitas, crescendo sobre troncos e galhos de árvores, podem também se
utilizar dos vegetais como fonte de nutrientes. Como não dispõem de sistema vascular, praticamente
não ocorre o transporte de minerais entre segmentos de cada período de crescimento, o que propicia
o acompanhamento histórico dos níveis de poluição ambiental.
As plantas superiores (vasculares) estão compreendidas em cinco divisões: Cycadophyta,
Ginkgophyta, Coniferophyta, Gnetophyta, e Angiospermae. As quatro primeiras faziam parte da
divisão Gymnospermae, que foi mais recentemente subdivida, com base em análises filogenéticas e
dados moleculares observados em cloroplastos de organismos daquela divisão. São também
denominadas de não angiospermas com sementes, englobando as plantas que formam sementes
nuas.
Os gases poluentes são absorvidos por essas plantas através dos estômatos, por difusão
gasosa. Dissolvem-se no líquido interno, penetrando nas membranas celulares de acordo com o
gradiente de concentração existente. O gás é metabolizado ou decomposto no interior das células.
Alguns poluentes orgânicos são absorvidos por essas plantas e não são decompostos. Nessa
situação, poderá ocorrer um equilíbrio com as concentrações ambientais, limitando a capacidade das
folhas em absorver o poluente, Omasa et al. (2000).
Já os poluentes metálicos estão associados a materiais particulados atmosféricos, que se
depositam nas estruturas vegetativas de plantas, líquens e musgos, por deposição seca ou úmida.
Assim como os nutrientes, esses contaminantes passam para o interior das estruturas vegetativas,
inicialmente, por processo não metabólico, através de canículos existentes na cutícula das cavidades
estomatais, atingindo os espaços intracelulares e paredes celulares. Posteriormente, em processo
ativo e com dispêndio de energia, atravessam a membrana citoplasmática, atingindo o interior das
células, por gradiente de concentração.
Os bioindicadores vegetais são utilizados em ensaios de biomonitoramento basicamente
em dois métodos distintos:
a) Método passivo, quando são utilizadas plantas que já habitam a área de estudo;
b) Método ativo, quando estas plantas são introduzidas de forma controlada no local a ser
investigado.

A observação de respostas visuais de plantas, musgos e liquens à ação de poluentes é uma


técnica simples e pouco dispendiosa, que pode ser usada como método de verificação de toxicidade
ambiental. Na presença de poluentes como O3, SO2, NOx e F, espécies podem apresentar
problemas típicos nas folhas, ou ainda, apresentarem perdas foliares, redução de crescimento e/ou
alterações nos padrões de floração. Outros métodos visuais estão baseados na verificação da
freqüência e abundância de espécies sensíveis expostas a poluentes atmosféricos.
Mais recentemente, a determinação de composição química, alterações nos processos
fisiológicos e alterações genéticas em plantas têm sido utilizadas como base para a determinação de
impactos de longa duração, por demonstrarem antecipadamente, em relação aos sintomas visuais,
que as condições atmosféricas apresentam qualidade modificada.

Algumas pesquisas usando bioindicadores


Diversas instituições de pesquisa têm dedicado esforços na avaliação dos efeitos da
poluição atmosférica sobre sistemas vegetais terrestres, destinados à exploração florestal, em
ecossistemas naturais localizados junto a áreas de concentração industrial utilizando: os líquens, os
musgos e as plantas superiores.
Em 1866, Nyland notou que alguns liquens encontrados em certas espécies de árvores nos
arredores de Paris não eram encontradas nas mesmas árvores que estavam no centro da cidade. Ele
Fórum Internacional do Meio Ambiente - A conferência da Terra 1384

concluiu, então, que estes liquens haviam existido anteriormente na área urbana, porém haviam sido
mortos pela ação de poluentes presentes na atmosfera. Este liquenologista escandinavo foi quem
primeiro sugeriu a utilização de liquens como bioindicadores da qualidade do ar, Honda (1998).
Estudos preliminares foram realizados nas seguintes cidades: Recife, Poção, Pesqueira,
Garanhuns, e Campus da Universidade Federal de Pernambuco (UFPE), utilizando biomonitores
passivos da poluição do ar atmosférico, das quais foram extraídos e analisados os teores de
pigmentos. Para o caso de Recife, foi analisado o comportamento de biomonitores passivos (liquens
e plantas das áreas), através da quantificação de pigmentos. Este procedimento possibilitou uma
detecção precoce de efeitos de poluentes sobre a liquenoflora, enquanto os danos mais perceptíveis
(necrose, desaparecimento das espécies mais sensíveis, etc.) não são ainda evidentes, Pereira et al.
(1994).
Henriques (2005) realizou um experimento que consistiu numa avaliação das condições
aéreas do distrito industrial do município de Rio Grande do Sul, através do biomonitoramento ativo
com o musgo Sphagnum sp. Segundo o método moss-bag, adaptado aos fatores regionais
específicos,
No experimento, Henriques (2005), foram empregados saquinhos de nylon contendo o
musgo como biofiltro. A contaminação aérea por cádmio foi biomonitorada durante o período de 23
de setembro a 23 de outubro no ano de 2004. Após este período, os níveis de cádmio no musgo
foram medidos através do Espectrofotômetro de Absorção Atômica em forno de grafite e a
comparação dos resultados das análises do musgo exposto com o musgo não exposto à atmosfera
confirmou índices elevados do metal pesado e a excelente capacidade de retenção de agentes
contaminantes atmosféricos pelo musgo.
A Associação Florestal Americana (AFA, 1987) avaliou a ação da poluição do ar em
florestas e ecossistemas florestais, provocando principalmente a denominada “chuva ácida”, que se
forma em regiões onde a concentração de óxidos de enxofre no ar é elevada, por emissões
industriais, através da queima de combustíveis fósseis.
Backiel e Hunt (1986) verificaram variação de crescimento, presença de lesões foliares
mortalidade de indivíduos de diversas espécies de pinheiros, na presença de O3 e outros oxidantes
fotoquímicos, em localidades montanhosas da Califórnia, USA.
Rinne e Makienen (1988) avaliaram as variações de concentração de Cu, Fe, Pb, Zn, Mg
em duas espécies diferentes de musgos, em florestas de coníferas no norte e no sul da Finlândia e no
norte da Noruega, localizadas próximas a fontes de emissão atmosférica industrial, verificando
decréscimo significativo nas concentrações de Fe e Zn nas duas espécies de fungos, com o aumento
da distância das fontes de emissão.
Kaufman (1989) verificou que, em uma propriedade rural localizada em uma tranqüila
montanha em Vermont, a poucas milhas do sul do Canadá, diversos indivíduos florestais haviam
morrido nos últimos cinco anos, sendo o problema relacionado com a ação de chuva ácida e outros
agentes da poluição do ar.
No Canadá, o South Riverdale Community Health Centre (1995) relatou que os jardins das
residências podiam demonstrar a ocorrência de contaminação ambiental por Pb, quando próximos
de rodovias, de incineradores ou de outras fontes específicas de contaminação, pela ocorrência de
crescimento atípico nas plantas ou pela presença de injúrias.
Na região Sul do Brasil, nas proximidades da Usina Termoelétrica Presidente Médici,
também conhecida como CANDIOTA II, foram observadas deposições de cinzas nas pastagens
próximas, contendo concentrações de fluoretos acima do suportado pela atividade pecuária,
provocando lesões dentárias em bovinos e ovinos, Estrada (1990).
Mendonça e Silva (1991) avaliaram a influência da poluição atmosférica em espécies de
hortaliças, que apresentaram redução de crescimento, lesões, necroses e cloroses, em áreas de teste
próximas à fonte emissora, uma indústria têxtil, em Teresópolis, Rio de Janeiro.
Klumpp et al. (1994) expuseram plantas bioindicadoras à ação de poluentes atmosféricos
presentes em emissões do Complexo Industrial de Cubatão, Brasil, verificando a ocorrência de
fitoxidade por oxidantes fotoquímicos em uma extensa área da reserva florestal da Serra do Mar. O
Fórum Internacional do Meio Ambiente - A conferência da Terra 1385

estudo demonstrou viabilidade no uso de bioindicadores, com base em metodologia


tradicionalmente aplicada em regiões de clima temperado, nas regiões de clima tropical e
subtropical.
Em Porto Alegre, região sul do Brasil, Kammerbauer e Dick (2000) utilizaram plantas da
espécie Ricinus communis expostas a emissões de escapamentos de veículos, em vias públicas
urbanas. Verificaram-se diferenças significativas na taxa de crescimento, em atividades
enzimáticas, na concentração de clorofila, dentre outras, entre plantas expostas e plantas-controle.

CONSIDERAÇÕES FINAIS
Faz-se necessário ampliar estudos sistêmicos sobre controle do meio ambiente, em especial
da qualidade do ar, devido ao aumento da poluição atmosférica diante da expansão econômica das
regiões potencialmente poluídas como nos grandes centros urbanos e industrializados.
Metais pesados, compostos orgânicos tóxicos, dióxido de enxofre, óxidos de nitrogênio,
monóxido e dióxido de carbono, e fluoretos gasosos, dentre outros poluentes atmosféricos, são
permanentemente lançados na baixa atmosfera por veículos particulares, meios de transporte
coletivos e veículos de carga que trafegam nos centros urbanos; pelas indústrias, usinas
termoelétricas e incineradores que, por sua vez, são também geradores de gases e materiais
particulados, contendo substâncias prejudiciais ao conjunto de seres vivos que habitam cidades e
ecossistemas naturais.
Deve-se, aqui, considerar as qualidades dos sistemas já consagrados de monitoramento da
qualidade do ar, utilizando-se metodologia baseada em análises físico-químicas que, embora de
eficácia comprovada, são limitadas pelos altos custos de implantação e manutenção,
impossibilitando o seu emprego em larga escala, principalmente nos países em desenvolvimento,
que sofrem, tanto ou mais, dos mesmos problemas de contaminação ambiental por poluentes
atmosféricos que os mais ricos.
Como visto pelos exemplos dos tópicos anteriores, o uso de bioindicadores, tais como
liquens, musgos e vegetais superiores, tem comprovada eficácia quando empregados como
biomonitores; isto garante uma vantagem do ponto de vista econômico e estratégico, pois monitores
mecânicos (físicos) além de dispendiosos tanto no que se refere à manutenção quanto a sua
aquisição, nem sempre estão disponíveis em grande número. Por exemplo, ao longo de rodovias, ou
distribuídos em uma região metropolitana.
O modelo alternativo de biocontrole da poluição atmosférica poderá servir como um
importante instrumento de apoio à implantação de políticas públicas inovadoras, significando,
ainda, um passo decisivo na universalização dos cuidados com os ambientes social e natural,
promovendo e garantindo melhorias efetivas no padrão de qualidade de vida das sociedades atuais e
futuras.

REFERÊNCIAS BIBLIOGRAFICAS
ACETO, M.; ORNELLA A.; CONCA, R.; MALANDRINO, M.; MENTASTI, E.; SARZANINI, C.
The use of mosses as environmental metal pollution indicators. Chemosphere, v.50, p. 333-342,
2003. Disponível em: <http://www.sibi.usp.br/sibi /biblioteca/ revista/selecao.php>. Acesso em: 03
dez. 2006.
ADAMO, P.; GIORDANO, S.; VINGIANI, S.; COBIANCHI, R.C.; VIOLANTE, P. Trace element
accumulation by moss and lichen exposed in bags in the city of Napoles v.122, p.91-103, 2003.
Disponível em: <http://www.sibi.usp.br/sibi/biblioteca /revista/selecao.php>. Acesso em: 06 dez.
2006.
ALVES, Edenise Segala. Estudo anatômico foliar do clone híbrido 4430 de Tradescantia:
alterações, 2001. Disponível em: <http:// www.scielo.br/ scielo.php? pid= S0100-
84042001000500012& script=sci_arttext&tlng=en>. Acesso em: 06 dez. 2006.
BRASIL. Conselho Nacional do Meio Ambiente, CONAMA. Dispõe sobre os padrões da qualidade
do ar. Resolução n.º 3 de 28/06/90. Disponível em: <http ://www.
Mma.gov.br/port/conama/legiano1.cfm?codlegitipo=3&ano=1990>. Acesso em: 01 dez. 2006.
Fórum Internacional do Meio Ambiente - A conferência da Terra 1386

CETESB. Relatório de qualidade do ar no estado de São Paulo. Secretaria de Meio Ambiente. São
Paulo: CETESB, 1999. Disponível em: <http:// www.cetesb.sp.gov.br> Acesso em: 02 dez. 2006.
CETESB. Relatório de qualidade do ar no Estado de São Paulo. Secretaria do Meio Ambiente. São
Paulo: CETESB, 2002. Disponível em: <http:// www.cetesb.sp.gov.br> Acesso em: 02 dez. 2006.
DERISIO, J.C. Introdução ao controle de poluição ambiental. São Paulo: Signus Editora, 2000.
GARTY, J.; LEVIN, T.; COHEN, Y.; LEHR, H. Biomonitoring air pollution with the desert lichen
Ramalina maciformis. Physiologia Plantarum. v.115, p. 267, 2002. Disponível em:
<http://www.periodicos.capes.gov.br>. Acesso em: 12 dez. 2006.
HAWKSWORTH, D.L. The long-terms effects of air pollutants on lichen communities in Europe
and North America. IN: Woodwell, G. M.(Org.). Patterns and processes of biotic impoverishment.
Cambridge: Cambridge University Press, 1992.
HONDA, Neli Kika. A química dos liquens. Departamento de Química - Universidade Federal de
Mato Grosso do Sul. 1998. Disponível em: < http://www.scielo.br/pdf/qn/v22n1/1145.pdf>. Acesso
em: 05 dez. 2006.
HENRIQUES, Ariadne Ribeiro. O uso do Sphagnum no biomonitoramento da poluição aérea por
cádmio. Monografia de conclusão de graduação em Ciência Biológica pela Universidade Federal de
Pelotas. Rio Grande do Sul, 2005. Disponível em:
<http://www.ufpel.tche.br/prg/sisbi/bibct/acervo/biologia/2005/tcc_ariadne_ henriques. pdf>
Acesso em: 02 dez. 2006.
KLUMPP, G.; FURLAN, C;M.; DOMINGOS, M.; KLUMPP. A. Response of stress indicators and
growth parameters of Tibouchina pulchra Cogn. exposed to air and soil pollution near the industrial
complex of Cubatão, Brazil. The Science of Total Environment, v.246, p. 79-91, 2000.
KLUMPP, A.; KLUMPP, G.; DOMINGOS, M. Plants as bioindicators of air pollution at Serra do
Mar near the industrial complex of Cubatão, Brazil. Environmental Pollution, v.85, n.1, p.109-116,
1994.
KRAUS, J.E. & ARDUIN, M. Manual básico de métodos em morfologia vegetal. Rio de Janeiro:
Editora Universidade Rural, 1997.
OMASA, K.; TOBE, K.; HOSOMI, M; KOBAYASHI, M. Absorption ozone and seven organic
pollutants by Populus nigra and Camelia sasanqua. Environmental Science & Technology, v.34,
p.2498-2500, 2000. Disponível em: <http://www.sibi.usp.br/ sibi/biblioteca/ revista/seleção.php>.
Acesso em: 07 dez. 2006.
PEREIRA, E. C.; ANDRADE, L. H. C.; MOTA-FILHO, F.O.; SILVA, N. H.; LEGAZ, M. E.;
VICENTE, C. Avaliação da qualidade do ar na cidade do Recife, utilizando liquens como
bioindicadores. IV Encontro Regional de Estudos Geográficos, Pernambuco: 1994.
Fórum Internacional do Meio Ambiente - A conferência da Terra 1387

A AÇÃO ANTRÓPICA NO PROCESSO DE DEGRADAÇÃO AMBIENTAL DOS


ECOSSISTEMAS DE MANGUEZAIS: UM ESTUDO DE CASO NOS MUNICÍPIOS DE
AREIA BRANCA-RN E GROSSOS – RN

Dweynny Rodrigues Filgueira Ge


Técnico em Saneamento pelo Centro Federal de Educação Tecnológica do Rio Grande do Norte – CEFET/RN, e
graduando em Gestão Ambiental pela Universidade do Estado do Rio Grande do Norte – UERN – e-mail:
dweynny@hotmail.com;
Luana Cristina Fernandes Rodrigues
Técnico em Saneamento pelo Centro Federal de Educação Tecnológica do Rio Grande do Norte – CEFET/RN, e
graduando em Gestão Ambiental pela Universidade do Estado do Rio Grande do Norte – UERN – e-mail:
luanacristina_fr@hotmail.com
Joel Silva dos Santos
Bacharel e Licenciado em geografia pela UFPB; Mestre em Desenvolvimento e Meio Ambiente pelo programa de Pós-
graduação em Desenvolvimento e Meio Ambiente (PRODEMA/UFPB) – e-mail: joelgraphia@ig.com.br

RESUMO
O Brasil é um país que possui uma grande área de costa litorânea, abrigando assim, uma
grande faixa costeira coberta por grandes extensões de ecossistemas de manguezais, que se estende
de desde o Cabo Orange no Amapá até o município de Laguna, no estado de Santa Catarina. Esse
ecossistema possui características peculiares, pois se estabelece em regiões tropicais e subtropicais
do globo. Ele se origina basicamente do encontro da água salgada vinda do mar com a água doce
proveniente dos rios em suas desembocaduras, deixando a água com salinidade variável e criando
assim, um ecossistema perfeito para a constituição de uma grande biodiversidade. No passado, a
extensão dos manguezais brasileiros era muito maior: muitos portos, indústrias, loteamentos e
rodovias costeiras foram desenvolvidos em áreas de manguezal, ocorrendo uma degradação do seu
estado natural. Atualmente, existe a necessidade de se preservar e conservar esse ambiente, pois a
sua utilização inadequada compromete tanto o equilíbrio do ecossistema, como também a qualidade
de vida da população que reside próximo às suas margens. Sendo assim, este trabalho tem como
objetivo fundamental identificar os principais impactos ambientais causados pela ação humana nos
ecossistemas de manguezais, localizados ao longo da faixa litorânea dos municípios de Areia
Branca e Grossos no Estado do Rio Grande do Norte.
Palavras-Chaves: Manguezal, Degradação Ambiental, Ação Antrópica.

ABSTRACT
Brazil is a country which has a large seacoast area, thus having enormous varieties of
mangroves ecosystems which stretch from Orange Cape in the state of Amapá to the city of Laguna,
in the state of Santa Catarina. This ecosystem has peculiars characteristics, for it is found in tropical
and sub-tropical regions of the planet. It is originated essentially from the meeting of seawater from
the oceans and freshwater from the rivers at their discharge mouths, which causes the water to have
a variable level of salt and creates a perfect ecosystem for several biodiversity. In the past, the
extension of mangroves in Brazil was much larger: many ports, industries, land division and
highways were built in mangroves areas, causing degradation of its natural state. Today, there is the
necessity of preserving this environment, for its inadequate use compromises the ecosystem
balance, as well as the locals quality of life´. Therefore, this work has the fundamental objective of
identifying the main environmental impacts caused by human actions on the mangroves located
along the seacoast from the city of Areia Branca to Grossos in the state of do Rio Grande do Norte.
Key-Words: Mangroves, Environmental Degradation, Anthropic Action.

INTRODUÇÃO
Segundo Schaeffer-Novelli (1991), manguezal é um ecossistema costeiro de transição
entre os ambientes terrestres e marinho, característico de regiões tropicais e subtropicais, sujeito ao
regime das marés. É constituído por espécies vegetais lenhosas típicas, além de micro e macro
Fórum Internacional do Meio Ambiente - A conferência da Terra 1388

algas, adaptadas à flutuação de salinidade e caracterizadas por colonizarem sedimentos


predominantemente lodosos, com baixos teores de oxigênio.
Por ser considerado um ambiente de transição, o manguezal possui uma grande
importância econômica e ambiental para a sociedade, devido a sua riqueza em recursos naturais e
aos serviços ambientais que oferecem. Abrigam uma grande diversidade e abundância de plantas,
artrópodes, moluscos, peixes, aves e microorganismos, totalizando cerca de 800 espécies. Além da
função de berçário para várias espécies aquáticas e terrestres, o mangue regula a temperatura do
ecossistema marinho e controla a erosão do solo.
O Brasil é um país privilegiado, pois possui extensas áreas de manguezais ao longo de sua
região costeira, a área de mangues se inicia na foz do Rio Oiapoque, no estado do Amapá, até as
divisas de Laguna, no estado de Santa Catarina e cobrem de 10 mil a 25 mil km2, o que representa
de 6 a 15% dos manguezais no mundo. O litoral do Rio Grande do Norte possui 400 km de
extensão. A faixa litorânea que o compreende apresenta uma variada flora e fauna marinha com
espécies típicas da região Nordeste do Brasil. A vegetação predominante do litoral oriental é a mata
atlântica, com presença de restingas, caatinga, mangues e tabuleiros litorâneos, já no litoral
setentrional existe o predomínio da caatinga, da restinga, dos tabuleiros litorâneos e de algumas
faixas de manguezais.
Os manguezais potiguares são caracterizados por menores amplitudes de marés, reduzida
pluviosidade, estruturalmente menos complexo, estreitas franjas ao longo de estuários, sua
vegetação raramente atinge altura superior a 15 metros. O clima nesse ecossistema é tropical e
temperado, com temperaturas médias acima de 20ºC e mínimas não inferiores a 15ºC.
O Estado possui uma das menores áreas de manguezal preservado, perdendo, inclusive
para Estados com menos setores de estuários. Os manguezais potiguares se distribuem ao longo do
Litoral Oriental em 7 (sete) principais zonas estuarinas: Curimataú/Cunhaú, Potengi, Ceará-Mirim,
Nísia Floresta/Papeba/Guaraíra e ao longo do Litoral Norte nas zonas estuarinas Apodi/Mossoró,
Açu e Guamaré/Galinhos.
As cidades de Areia Branca e Grossos estão localizadas, na chamada Costa Branca, região
que compõe o litoral setentrional do Rio Grande do Norte e estão inclusas na zona de estuário da
bacia Apodi/Mossoró. Elas apresentam faixas de manguezais que gradativamente estão diminuindo,
devido à degradação causada pelo homem ao longo dos anos.

METODOLOGIA
Inicialmente foi realizado um levantamento bibliográfico a cerca da temática em questão,
levando em consideração a revisão bibliográfica através de artigos, teses e dissertações, sites na
internet e livros que retratem a temática em discussão. Em seguida, foi realizada uma visita técnica
na região de estuário dos municípios de Areia Branca e Grossos visando o reconhecimento da área
de estudo. E posteriormente com o intuito de aprofundarmos nosso olhar sobre o objeto de pesquisa,
foi realizado o trabalho de campo fazendo uso de técnicas de registro fotográfico e entrevista semi-
estruturada com os ribeirinhos, que nos possibilitou resgatar a história dos manguezais estudados e
captar o processo de degradação sofrido por estes ao longo do tempo através da ação antrópica. Os
critérios de escolha para a participação dos indivíduos na entrevista foram: ser maior de 18 anos de
idade; morar a mais de 10 anos na região ribeirinha e aceitar participar voluntariamente da
pesquisa.

RESULTADOS
O litoral de Areia Branca e de Grossos tem como característica mais marcante a
desembocadura do rio Mossoró, gerando uma área fortemente influenciada pela planície de maré
litorânea, de largura relativamente extensa e que diariamente sofre oscilação de marés. Por detrás da
faixa de praia encontra-se um extenso cordão de dunas móveis, que influencia toda a região
litorânea. Esta área é muito utilizada pela indústria salineira, como atividade econômica
predominante.
Fórum Internacional do Meio Ambiente - A conferência da Terra 1389

Atualmente a situação de preservação dos manguezais na região da bacia Apodi/Mossoró,


a qual engloba os municípios de Areia Branca e Grossos, é bastante problemática devido o setor
econômico persistir em utilizar os solos de mangue, indiscriminadamente e inadequadamente, para
a expansão de suas atividades.
Constata-se que na região litorânea setentrional do Estado, que o maior impacto a este
ecossistema provém das atividades salineiras, que invadem e desmatam as áreas de manguezais,
além de lançarem as águas mães, que é um subproduto das salinas, diretamente no rio
Apodi/Mossoró alterando a salinidade da água no mangue e comprometendo sua manutenção.

Foto 1 - Vista aérea da cidade de Areia Branca/RN. Presença de


salinas e manguezais.
Outro impacto negativo correlacionados às atividades econômicas da região é o
desmatamento dos mangues para o uso da agricultura, implementação de novas salinas, construção
de estradas na costa e a atividade de carcinicultura. Esta ação antrópica de desflorestamento leva a
perda da biodiversidade dos mangues, uma vez que todo ecossistema possui a necessidade de um
determinado período de tempo para a ciclagem e renovação das espécies (animais e vegetais). Os
manguezais desempenham importante papel como exportador de matéria orgânica para o estuário,
contribuindo para produtividade primária na zona costeira. É no mangue que peixes, moluscos e
crustáceos encontram as condições ideais para reprodução, berçário, criadouro e abrigo para várias
espécies de fauna aquática e terrestre, de valor ecológico e econômico.
Em ambas as cidades encontramos construções irregulares próximas às margens do rio,
evidenciando assim o não cumprimento do Código Florestal (art. 3, lei no. 4.771 de 15/09/65), que
afirma ser os manguezais considerados Área de Preservação Permanente. Empresários loteiam áreas
inadequadas visando o seu lucro abusivo, bem como áreas ribeirinhas que pertencem ao poder
público são ocupadas pela população de baixa renda. Na cidade de Grossos, parte deste bioma foi
destruído para a construção da estrada que liga o município às comunidades de Barra e
Pernambuquinho. É notável a morte de algumas espécies vegetais ao longo do percurso utilizado
para a implementação da mesma. Já em Areia Branca, quase toda a mata ciliar (composta por
mangues) do rio Apodi / Mossoró foi destruída em função da construção de empresas do ramo de
embarcações, além da sede do abatedouro municipal, que despeja todos seus resíduos diretamente
no rio.
Fórum Internacional do Meio Ambiente - A conferência da Terra 1390

Foto 2 – Vista lateral de uma vala do Foto 3 – Estrada construída em Grossos ao


abatedouro municipal (Areia Branca/ RN). lado do manguezal.

Foto 4 – Disposição das águas mães das Foto 5 – Área de mangue devastada devido
salinas diretamente no rio. ao desmatamento.

O rápido processo de urbanização e a carência em infra-estrutura, principalmente de


esgotamento sanitário e limpeza pública, contaminam o meio ambiente e comprometem a bacia
hidrográfica a qual estes ecossistemas estão inseridos. Os manguezais das cidades estudadas passam
por dificuldades semelhantes, pois à medida que a população ribeirinha cresce, o ecossistema vai
sendo ocupado de forma desordenada e sofre com a infra-estrutura precária, ocorrendo assim
poluição através de despejos domésticos lançados diretamente nos cursos d’água e também o
lançamento aleatório de resíduos sólidos pela própria população ribeirinha. Foi constatado através
da visita técnica aos locais pesquisados e de entrevistas semi-estruturadas, que o crescimento
populacional afetou diretamente na aceleração do processo de degradação do ecossistema. Segundo
relatos dos moradores, algumas espécies de animais (por exemplo, caranguejos) vêm desaparecendo
gradativamente conforme o processo de crescimento destas cidades.
O turismo na região surge como uma possibilidade de incremento econômico para o
município passando a ser uma fonte de renda para a população local, porém, à falta de
investimentos pelo poder público e privado, e, também a deficiente infra-estrutura citada
anteriormente, vem somar-se a outros problemas que aceleram o processo de degradação desse
ecossistema e comprometem a qualidade de vida das populações locais. Outro problema que
compromete o equilíbrio deste ecossistema na região é a pesca predatória, pois o mangue é um
habitat e berçário para animais aquáticos e fonte de recursos pesqueiros para a população ribeirinha.
Entretanto a extração deste recurso deve acontecer no período correto, do contrário, às espécies
tornam-se ameaçadas, pois não terão tempo suficiente para estabelecer seu ciclo de reprodução
natural.
Fórum Internacional do Meio Ambiente - A conferência da Terra 1391

Foto 6 – Lixo urbano às margens dos Foto 7 – Canalização de efluentes domésticos


manguezais – Areia Branca/RN. lançados diretamente no mangue. Comunidade
de Barra – Grossos/RN.

O manguezal foi sempre considerado um ambiente pouco atrativo e menosprezado, embora


sua importância econômica e social seja muito indiscutível. No passado, estas manifestações de
aversão eram justificadas, pois a presença do mangue estava intimamente associada à febre amarela
e à malária. Embora estas enfermidades já tenham sido controladas, a atitude negativa em relação a
este ecossistema perdura em expressões populares em que a palavra mangue, infelizmente, adquiriu
o sentido de desordem, sujeira ou local suspeito. A destruição gratuita, a poluição doméstica e
química das águas, derramamentos de petróleo, salinas em áreas de proteção e aterros mal
planejados são os grandes inimigos das áreas de manguezais.
Além dos aspectos biológicos, os manguezais possuem uma grande relevância, tanto
socialmente quanto economicamente para as comunidades costeiras, além de integrarem a Reserva
da Biosfera da Mata Atlântica, como ecossistema associado. Algumas áreas de mangue do Estado
vêm sendo transformadas ao longo do tempo para darem lugar às salinas, viveiros de criação de
camarão, constatando-se por outro lado a deposição do lixo e de efluentes domésticos e industriais.
A reconhecida funcionalidade dos ecossistemas ribeirinhos deve ser levada em conta para
uma correta aplicação das leis e manejo sustentável destes recursos. Para o efetivo manejo das
comunidades vegetais são necessárias pesquisas buscando o entendimento da funcionalidade de
cada ambiente para que corretos planos de gerenciamento sejam aplicados. Portanto, o ecossistema
manguezal necessita de preservação e manutenção da sua fauna e flora, visando a sustentabilidade
do ambiente.

RECOMENDAÇÕES FINAIS
Tendo em vista que o ecossistema manguezal é de suma importância para a manutenção da
biodiversidade marinha e terrestre, faz-se necessário de mecanismos que contribuam para sua
conservação, tais como:
Educação ambiental: A implementação deste projeto nas comunidades ribeirinhas é
essencial para o desenvolvimento sustentável desse bioma, já que o principal objetivo deste tipo de
educação é a disseminação do conhecimento sobre o ambiente, a fim de ajudar à sua preservação e
utilização adequada dos seus recursos. Isso poderia ser trabalhado desde a aprendizagem infantil
(escolas, grupos informais etc.) até a educação de jovens e adultos.
Práticas sustentáveis nos manguezais: Muitas atividades podem ser desenvolvidas nos
mangues sem lhes causar prejuízos ou danos, como por exemplo: pesca esportiva, artesanal e de
subsistência, desde que se evite a sobrepesca, a pesca de pós-larvas, juvenis e de fêmeas ovadas;
utilização da madeira das árvores, desde que se assegure a reflorestação; cultivo de ostras e outros
Fórum Internacional do Meio Ambiente - A conferência da Terra 1392

organismos aquáticos; cultivo de plantas ornamentais (orquídeas e bromélias); desenvolvimento de


atividades turísticas, recreativas, educacionais e de pesquisa cientifica.
Implementação de políticas públicas: O poder municipal juntamente com o estadual e o
federal deve realizar projetos de preservação e conservação do bioma manguezal, através de
fiscalizações regulares cabíveis aos órgãos competentes (IBAMA, IDEMA).
Saneamento básico: Construção de rede coletora de esgoto doméstico, efeciência na coleta
de lixo, drenagem urbana de águas pluviais e construção de um local adequado para a disposição
final dos resíduos, são algumas iniciativas que vêm a melhorar tanto a conservação do ecossistema
manguezal quanto a saúde pública do local.

REFERÊNCIAS BIBLIOGRÁFICAS
GURGEL, Deífilo. Areia Branca: A terra e a gente. Natal, RN: D. Gurgel, 2002.
Instituto de Defesa do Meio Ambiente. Aspectos físicos do Rio Grande do Norte. Disponível em:
<http://www.rn.gov.br/secretarias/idema/perfilrn/Aspectos-fisicos.pdf>. Acesso em: 25 fev. 2008.
LACERDA, L.D. 1984: manguezais: floresta de beira-mar. Rev. Ciência Hoje, v.3, n013, p. 63-70.
MACIEL, N.C. 1989: manguezal. In: Eng. Ambiental, ano 2, nº. 5/ Janeiro-89, p. 31-36.
OLIVEIRA, M. F. DE & RIBEIRO NETO, F. B. 1989: Estratégias de sobrevivência de
comunidades litorâneas em regiões ecologicamente degradadas: o Caso da Baixada Santista. São
Paulo, Progr. Pesq. e Conserv. de Áreas Úmidas / F.Ford/ UICN/ IOUSP, l32p.
PANITZ, C.M.N. Manguezais um paradoxo: do conhecimento e legislação à destruição. IV
Simpósio de Ecossistemas Brasileiros, Águas de Lindóia - SP, Anais, 1: 1-5. 1998.
PHILIPPI JR., Arlindo, editor. Saneamento, saúde e ambiente: Fundamentos para um
desenvolvimento sustentável. Barueri, SP: Manole, 2005. – (Coleção Ambiental ; 2)
SCHAEFFER-NOVELLI, Y. & SUGIYAMA, M. 1995. A Flora do Manguezal. In: SCHAEFFER
NOVELLI,Y. Manguezal: Ecossistema entre a terra e o mar. Caribbean Ecological Research. São
Paulo.
Fórum Internacional do Meio Ambiente - A conferência da Terra 1393

A IMPORTÂNCIA DA COLETA DE RESÍDUOS SÓLIDOS PARA A GESTÃO


AMBIENTAL: O CASO DA EMPRESA COMÉRCIO DE METAIS NOSSA SENHORA DE
LOURDES NA CIDADE DE CAMPINA GRANDE – PB.

Alcione Lino de Araújo


Universidade Federal de Campina Grande (UFCG) – Professora, Campina Grande-PB, Brasil.
alcionelino@yahoo.com.br
Laniza Ferreira Almeida
União de Ensino Superior de Campina Grande (UNESC) – Professora, Campina Grande-PB, Brasil.
lanizaferreira@yahoo.com.br
Thiago de Araújo Palmeira
Universidade Federal de Campina Grande (UFCG) – Graduando, Campina Grande-PB, Brasil.
thipalmeira@yahoo.com.br

RESUMO
O mercado de sucatas tem se apresentado cada vez mais produtivo, uma vez que a
tendência mundial é a prática da reciclagem de resíduos sólidos como forma de preservar o meio
ambiente, baratear o custo da produção de alguns produtos e por ser fonte de renda para milhares de
pessoas que sobrevivem como catadores nas pequenas, médias e grandes cidades brasileiras.
Entendendo a preocupação com o meio ambiente apresenta evidenciada a coleta de resíduos sólidos.
Devido a esse aspecto relevante procurou-se também enfatizar a educação ambiental como condição
necessária para modificar o quadro de crescente degradação socioambiental, pretendeu-se neste
trabalho verificar se seus preceitos estão realmente sendo empregados a partir da análise de uma
empresa voltada para a compra e venda de resíduos sólidos: Comércio de Metais Nossa Senhora de
Lourdes. Para tanto, foram utilizados conceitos distintos e por meio da pesquisa descritiva e
participante elaborou-se a presente pesquisa. De forma que constatada a prática evidenciou-se, que
a nível local, inexiste a prática de políticas públicas voltadas para a conscientização que o lixo pode
vir a resultar em lucratividade de renda para a cidade e mais ainda por vir a facilitar a aquisição de
materiais por parte da empresa.
Palavras-Chave: Educação Ambiental. Sucata. Resíduos sólidos.

ABSTRACT
The market of the scrap metal has come and more productive, once that the world tendency
is the recycling pratice of the residues as way to preserve the envionment. Turning cheaper the cost
of the production of some goods and being the income source for thousand of people who survive
picking scrap metal in small, medium and big braziliam cities. Understanding the concern with the
environment evidenced in the collection of solid residues, which presents itself as a relevant aspect,
it is also emphasize environmental education as a necessary condition for changing the context of
increasing social degradation. Understading that the reverse logistic makes part of this tendency. It
was intended in this study to verify if its percepts are really being tied departuring from the analysis
of a company either the buying and selling of the solid residues from Nossa Senhora de Lourdes
Metal Business. Therefore, it was used distinct concepts and through this descriptive and
participating research the current study could be done. In a way to notice that the practice has
shown up that in a local level this does not exist the public pratice of politics turned to the
awareness that the trash might result in income profitability to the city and to facilitate the
acquisition of the materials by the company.
Key words: Environmental Education. . Scrap metal. Solid residues

INTRODUÇÃO
Ao longo da história da humanidade, o homem tem se apropriado indiscriminadamente dos
recursos naturais, para garantir a sua própria sobrevivência, ou seja, no aproveitamento desses
recursos como fonte de energia ou de matéria-prima. Nessa evolução, o homem não tem se dado
conta, que os recursos naturais podem ser fadados à escassez devido à má utilização, para isto é
Fórum Internacional do Meio Ambiente - A conferência da Terra 1394

preciso desenvolver uma consciência ecológica e voltar-se para a preservação ou racionalização dos
recursos ainda disponíveis.
Os dejetos produzidos pelas atividades humanas, sobretudo industriais, geram impacto ao
meio ambiente, podendo até levar a situações irreversíveis de contaminação e degradação, tanto no
meio urbano quanto no rural. Desta feita, de uns tempos para cá se percebe uma crescente
preocupação para que a evolução tecnológica alie evolução industrial à preservação ambiental.
Na busca por este sucesso, diversos segmentos se uniram na procura de soluções para o
desenvolvimento sócio-ambiental, neste sentido muitas empresas têm buscado auxílio na gestão e
educação ambiental.
Como a empresa analisada trabalha com a comercialização de materiais sucateados, ou
seja, resíduos sólidos passíveis de reaproveitamento, o que se denomina de reciclagem de materiais,
tais como: vidro, ferro, papelão, metais e plástico. Materiais estes, que, quando descartados no lixo
domiciliar, comercial e industrial, possui um grande potencial de reutilização e/ou reciclagem.
O crescimento da indústria de reaproveitamento de resíduos sólidos, ou recicladoras tem
registrado um crescimento considerável tornando-se uma tendência mercadológica com um futuro
promissor, a qual encoraja o crescimento deste mercado e viabiliza toda a infra-estrutura necessária,
geração de renda e grandes benefícios ambientais.
Tendo em vista ao amplo desenvolvimento da prática da reciclagem não apenas no cenário
mundial mais nacional como forma de minimizar os custos de matéria-prima bem como tornar
menos profundos os impactos gerados ao meio ambiente com a má utilização dos recursos naturais,
verifica-se que a atividade do mercado de sucatas deve adequar-se as novas necessidades de
mercado, onde a devida coleta de resíduos sólidos por tipo - papel, vidro, papelão, plástico,
alumínio, ferro, etc., - de fato auxiliaria na hora de comercializá-los ou quando da entrega de
grandes fluxos aos clientes já que o volume de materiais é estável e relativamente alto. Ademais, o
mercado apresenta-se cada vez mais exigente e faz com que as empresas busquem alternativa de
melhor aproveitamento de seus recursos, sejam estes físicos, humanos ou materiais.

REFERENCIAL TEÓRICO - LIXO


A palavra lixo, derivada do termo latim lix, significa “cinza”. No dicionário, ela é definida
como sujeira, imundice, coisa ou coisas inúteis, velhas, sem valor. Lixo, na linguagem técnica, é
sinônimo de resíduos sólidos gerado pelo homem em suas atividades, considerado pelos geradores
como inúteis, indesejáveis ou descartáveis.
Desde os tempos mais remotos até meados do século XVIII, quando surgiram as primeiras
indústrias na Europa, o lixo era produzido em pequena quantidade e constituído essencialmente de
sobras de alimentos.
A partir da Revolução Industrial, as fábricas começaram a produzir objetos de consumo em
larga escala e a introduzir novas embalagens no mercado, aumentando consideravelmente o volume
e a diversidade de resíduos gerados nas áreas urbanas. O homem passou a viver então a era dos
descartáveis em que a maior parte dos produtos — desde guardanapos de papel e latas de
refrigerante, até computadores — são inutilizados e jogados fora com enorme rapidez
(www.cagece.com.br).
Para Demajorovic (1995, pg. 83) “lixo é aquilo que se varre da casa, do jardim, da rua, e se
joga fora; entulho”.
Segundo Aisse et al. (1982), o termo “lixo” é o designativo daquilo que tecnicamente é
denominado resíduo sólido, sendo o mesmo resultante da atividade das aglomerações urbanas.

Resíduos Sólidos
Resíduos sólidos são definidos pela NBR 10004160 - Resíduos Sólidos da Associação
Brasileira de Normas Técnicas – ABNT como:

160
NBR 10004 – Norma Brasileira de Resíduos em vigor desde 1987 estabelece a metodologia de classificação dos resíduos
sólidos quanto aos seus riscos potenciais ao meio ambiente e à saúde pública com o objetivo exclusivo de adequar o manuseio
e o destino final dos mesmos.
Fórum Internacional do Meio Ambiente - A conferência da Terra 1395

“resíduos nos estados sólidos ou semi-sólidos ou que resultam da atividade da


comunidade, de origem industrial, doméstica, hospitalar, comercial, agrícola, de serviços
e de varrição. Considera-se também, resíduo sólido, os lodos provenientes de sistemas
de tratamento de água, aqueles gerados em equipamentos e instalações de controle da
poluição, bem como determinados líquidos cujas particularidades tornem inviável o seu
lançamento na rede pública de esgotos ou corpos d’água, exigindo para isso soluções
técnicas e economicamente viáveis face a melhor tecnologia disponível”.

Os resíduos sólidos podem ser objetos que não mais possuem valor ou utilidade, porções
de materiais sem significado econômico, sobras de processamento industrial ou sobras domésticas a
serem descartadas, ou seja, qualquer coisa que se deseje jogar fora. O termo “resíduo sólido”
diferencia-se do termo “lixo”, pois o último não possui qualquer tipo de valor, já que é aquilo que
deve ser apenas descartado, enquanto o primeiro possui valor econômico por possibilitar o
reaproveitamento no processo produtivo.

O comércio de resíduos sólidos no Brasil: a atuação das sucatas


Antes de adentrar na questão da sucata propriamente dita, é preciso verificar os
pressupostos legais que tratam da questão dos resíduos sólidos no país e suas formas de destinação.
O primeiro passo reside na promulgação da Lei nº 6.938, datada de 31 de agosto de 1981, a qual
dispõe sobre a Política Nacional de Meio Ambiente (PNMA).
Este princípio legal determina conceitos, princípios, objetivos, mecanismos de aplicação e
de formulação, instrumentos e penalidades, além de instituir o Sistema Nacional do Meio Ambiente
(Sisnama) e o Conselho Nacional do Meio Ambiente (Conama).
Apesar da existência de tais pressupostos e de órgãos específicos, as legislações estaduais e
federais ainda não alcançaram à eficácia pretendida no ato de sua criação, tornando-se, pois
ineficientes e esparsas.
A administração de recursos sólidos não é uma tarefa fácil, tendo em vista que no Brasil a
maioria destes resíduos não são aproveitados da maneira devida, por motivos de origem distinta,
questões de ordem social, política e cultural. No entanto, vale salientar que a própria situação
econômica têm propiciado o desenvolvimento de segmentos como o de sucatas, recicladoras e
catadores, e cooperativas de coleta de resíduos sólidos.
O reconhecimento do valor econômico dos resíduos sólidos (papel, papelão, plástico,
vidro, etc), tem de fato se mostrado atuante no que se refere à difusão do mercado de reciclagem e
contribuindo para o aumento da informalidade com redução das taxas desemprego e é claro dos
benefícios ambientais, já que o reaproveitamento diminui os riscos de danos ao meio ambiente, mas
tudo se processa ainda de forma amadora, na maioria das cidades não se aplica técnicas como a
coleta seletiva dos resíduos e o lixo é direcionado a aterros sanitários.
Além da implementação de políticas públicas que possibilitaram o aumento da quantidade
de iniciativas de gestão compartilhada, contemplando parcerias entre governos municipais e
cooperativas de catadores, expandiu-se significativamente o número de catadores de rua, sucateiros,
empresas recicladoras e outros empreendimentos privados interessados na coleta e comercialização
de resíduos sólidos recicláveis. (DMAJOROVIC et al, 2003, p.56).

Panorama da sucata no Brasil


Analisado a atuação do comércio de sucatas no Brasil, apresentamos os resíduos sólidos
mais viáveis no âmbito do comércio de sucata, onde passa-se agora a apresentação dos materiais de
maior valor comercial do ramo, conforme dispõem o quadro 1:
Fórum Internacional do Meio Ambiente - A conferência da Terra 1396

Quadro 1: Produtos de sucata


PRODUTOS DE SUCATA
CÓDI DESCRIÇÃO UNIDADE DE
GO MEDIDA
89.01.3 Amortecedor (Sucata) unidade
3-3
89.01.3 bandeja unidade
6-8
89.01.3 mola unidade
7-6
89.01.3 Ferro diversos quilo
8-4
89.01.4 escapamento unidade
0-6
89.01.4 catalisador unidade
1-4
89.01.4 Pastilha de freio unidade
2-2
89.01.4 Disco/tambor unidade
3-1
89.01.4 Bateria de veículo de unidade
5-7 passeio
89.01.4 Bateria de veículo pesado unidade
6-5
89.01.5 Roda de ferro unidade
0-3
89.01.5 Roda liga unidade
1-1
89.01.8 Raspa de pneu quilo
2-1
89.01.9 contrapeso quilo
0-2
89.01.9 papelão quilo
3-7
89.01.9 Plásticos diversos quilo
5-3
89.01.9 borracha quilo
6-1
Fonte: Andrade (2000, p.53).
Conforme dados apresentados no quadro 1, verifica-se que cada produto deve ser separado
conforme sua descrição e comercializado na unidade de medida adequada, que geralmente é
estabelecida por kilogramas (Kg), valendo salientar que cada produto ou grupo de produtos devem
ser acondicionados de forma a considerar seus aspectos ambientais (normas e destinos),
operacionalidade (armazenagem, manuseio e transporte) e o potencial comercial do produto ou
grupo como matéria-prima de reciclagem.
Tomando por base o fato que a questão ambiental vem sendo considerada cada vez mais
urgente e importante para a sociedade, uma vez que futuramente a tendência da reciclagem e da
coleta seletiva dos resíduos sólidos passarão a ser cada vez mais adotadas como solução para
minimizar os problemas causados pelo acúmulo destes, principalmente é preciso primar cada vez
mais pela exploração da sucata, não apenas a sucata do tipo “ferro velho”, mas a sucata relacionada
a todo e qualquer material passível de reciclagem.
Fórum Internacional do Meio Ambiente - A conferência da Terra 1397

O crescimento populacional fruto da evolução das cidades e a produção excessiva de


resíduos requerem então uma forma adequada de descarte e acondicionamento para que se possa
garantir a saúde e bem estar da população, a estética da cidade e a preservação ambiental, além de
gerar renda com sua devida exploração comercial. Na verdade, os projetos de gerenciamento,
especificamente do lixo, devem privilegiar o reaproveitamento e a reciclagem, onde os rumos
dependem da integração de todos os envolvidos (ILHA, 1999).

Gestão Ambiental
A gestão ambiental é a arte de se alinhar ações humanas às forças e resistências potenciais
ou existentes (incluindo seus poderes de autodepuração e recuperação) da própria natureza,
convertendo as ameaças ambientais em riscos gerenciáveis. Dessa forma, consegue-se levar, por
meio de intervenções sistêmicas, a relação homem/natureza a uma nova estabilidade benéfica,
embora longe, possivelmente, do equilíbrio original. Na maioria dos casos, a gestão ambiental não
objetiva a restauração perfeita dos ecossistemas ou sua manutenção num estado de preservação
permanente (sem contribuírem às atividades extrativistas). A gestão ambiental preconiza,
primordialmente, a intervenção do ser humano na natureza (GRIFFITH, 2005).
A gestão ambiental, segundo Andrade et al (2000), deve ser dotada de uma visão
sistêmica, global e abrangente, visualizando as relações de causa e efeito, com suas inter-relações
entre recursos captados e valores obtidos. Esta visão sistêmica abrangente, permite uma análise num
cenário de longo prazo, caracterizando os objetivos institucionais e suas estratégias para atingi-los.

Meio
Gestãoambiente
estratégica

Gestão Ambiental/gerenciamento
ecológico Operações

Figura 1: Enfoque Sistêmico. Fonte: Adaptado de Andrade et al (2000).

Através deste processo sistêmico torna-se possível a visão horizontal da organização,


permitindo a visualização do cliente, do fluxo de atividades da cadeia produtiva, de como são
processadas as etapas da produção e o relacionamento interno entre cliente-fornecedor, pelos quais
são produzidos os produtos ou serviços.
Com este enfoque sistêmico, conforme demonstrado na Figura 1, voltado para uma visão
macroscópica da organização, determina-se o ponto de partida para um modelo de gestão ambiental.
Para que se obtenha bons resultados nesta questão ambiental, é preciso que se recorra aos clientes e
fornecedores como forma de feedback para a apuração dos problemas, permitindo a correção dos
mesmos.
A partir deste enfoque a organização poderá definir o provável cenário de longo prazo,
possibilitando traçar os objetivos e estratégias a serem adotadas para alcançá-los. Com este sistema,
torna-se possível as ações dos recursos humanos e demais recursos necessários para o alcance dos
objetivos estratégicos.
No contexto da abordagem sistêmica, a organização deve ser visualizada de forma
conjunta, interagindo com o ambiente externo de forma a suprir constantemente e de forma mais
abrangente possível a conversão de recursos em produtos, bens e serviços.
Fórum Internacional do Meio Ambiente - A conferência da Terra 1398

Para Andrade et al (2000), a visão de sistemas torna possível visualizar o cliente, o produto
e o fluxo de atividades da cadeia produtiva, bem como o trabalho é realmente feito pelos processos
além das fronteiras funcionais e os relacionamentos internos entre cliente-fornecedor, por meio dos
quais são produzidos os produtos ou serviços.
Além da organização ser guiada pelos seus próprios critérios e feedbacks internos, o
mercado, através da concorrência leva a um cenário onde ocorre uma relação social, política e
econômica. Destas relações vislumbra-se novos caminhos a serem seguidos, de tal forma que os
resultados mantenham um equilíbrio entre as organizações.
Para as questões ambientais, levando em conta este enfoque sistêmico, dentro da visão
macroscópica, alguns exemplos podem servir de parâmetro a serem seguidos. A 3M, em 1993, num
esforço de redução de perdas, converteu US$ 199 milhões de libras de papel, plásticos, solventes,
metais em outros produtos. A IBM, em 1995, conseguiu economizar US$ 15,1 milhões em energia
elétrica.
Através destes resultados, independente do setor ou segmento de atuação de cada
organização, as mesmas atuam de forma a tornar visível a influência da filosofia institucional das
mesmas, levando em conta as missões, crenças e valores.

Educação Ambiental
A dimensão ambiental configura-se crescentemente como uma questão que envolve um
conjunto de atores do universo educativo, potencializando o engajamento dos diversos sistemas de
conhecimento, a capacitação de profissionais e a comunidade universitária numa perspectiva
interdisciplinar.
Nestes tempos em que a informação assume um papel cada vez mais relevante,
ciberespaço, multimídia, internet, a educação para a cidadania representa a possibilidade de motivar
e sensibilizar as pessoas para transformar as diversas formas de participação na defesa da qualidade
de vida. Nesse sentido cabe destacar que a educação ambiental assume cada vez mais uma função
transformadora, na qual a co-responsabilização dos indivíduos torna-se um objetivo essencial para
promover um novo tipo de desenvolvimento – o desenvolvimento sustentável. Entende-se, portanto,
que a educação ambiental é condição necessária para modificar um quadro de crescente degradação
socioambiental, mas ela ainda não é suficiente, o que, no dizer de Tamaio (2000), se converte em
mais uma ferramenta de mediação necessária entre culturas, comportamentos diferenciados e
interesses de grupos sociais para a construção das transformações desejadas. O educador tem a
função de mediador na construção de referenciais ambientais e deve saber usá-los como
instrumentos para o desenvolvimento de uma prática social centrada no conceito da natureza.
Assim, a educação ambiental deve ser acima de tudo um ato político voltado para a
transformação social. O seu enfoque deve buscar uma perspectiva holística de ação, que relaciona o
homem, a natureza e o universo, tendo em conta que os recursos naturais se esgotam e que o
principal responsável pela sua degradação é o homem.

ESTUDO DE CASO
O estudo de caso apresentado tem como objetivo analisar o processo da coleta de resíduos
sólidos pela empresa Comercial de Metais Nossa Senhora de Lourdes, uma empresa campinense
que comercializa diversos tipos de produtos recicláveis (sucata). A coleta de dados foi realizada in
loco com acessibilidade aos catadores de lixo.
A escolha da empresa se deu pelo fato de na cidade de Campina Grande ter um grande
volume de resíduos sólidos e poucas sucatas para a comercialização dos insumos produzidos pela
sociedade.

A empresa
A empresa objeto deste trabalho foi Comércio de Metais Nossa Senhora de Lourdes no
ramo de comércio atacadista de resíduos e sucatas metálicos. A empresa atua na compra e venda de
material reciclável, a exemplo de papel, papelão, plástico e metais, materiais estes frutos da coleta
Fórum Internacional do Meio Ambiente - A conferência da Terra 1399

de catadores autônomos, empresas comerciais e industriais, de vários bairros da cidade, como


também de sucateiros da própria cidade e de cidades circunvizinhas. Fundada em 1974, a empresa
tem 34 anos de atuação no mercado de sucatas. A empresa já possuiu duas filiais na Cidade de
Campina Grande-PB, voltadas para a coleta de materiais em áreas distintas da cidade, sendo uma,
na Avenida Assis Chateaubriand e uma na Avenida presidente Getúlio Vargas. Mais atualmente
ambas funcionam de forma independente na aquisição de resíduos sólidos.
A prática de responsabilidade social é de certa forma garantir o sustento de algumas
famílias com a compra de resíduos, contribuindo com o meio ambiente, ou seja, compra e venda de
produtos recicláveis de origens diversas como: papel, papelão, alumínio, plástico, ferro, etc.
Quanto à aquisição dos materiais ocorre via compra de seus fornecedores sejam catadores,
empresas ou sucateiros da própria cidade e de outras cidades do estado, que se dirigem a empresa e
vendem o quilo de material de origem diversa (domiciliar, comercial e industrial). O fluxo mensal
de comercialização de mercadorias na empresa gira em torno de 200.000 Kg (duzentos mil quilos),
o que acaba contribuindo para o desenvolvimento sustentável da região por se constituir em uma
excelente e até única fonte de renda para centenas de pessoas. Dessa forma na área social, podemos
dar ênfase ao trabalho de vários catadores de lixo, onde diariamente buscam no lixo resíduos que
serão vendidos e que lhes auxiliará na luta pela sobrevivência, como também na diminuição de
custos para várias empresas, através da venda de seus resíduos sólidos, dessa forma diminuindo os
impactos ambientais e sociais.

FIGURA 2 e 3: Catadores em busca de material para a venda nas ruas da cidade. Fonte: Dados da
pesquisa

Ou seja, os produtos chegam à empresa através de seus fornecedores que se dirigem ao


depósito e fazem à venda de suas mercadorias.
Desses fornecedores muitos são catadores que atuam diariamente nos bairros e na área
comercial recolhendo, sobretudo papelão e plásticos ao final de expediente nas lojas do centro da
cidade, sendo esses materiais os mais ofertados à empresa pelos catadores.
Materiais como metais ferrosos e não ferrosos em sua maioria provém da aquisição junto
às oficinas, fábricas ou sucatas especializadas na comercialização de peças automotivas localizadas
na área central e no Distrito dos Mecânicos, local de maior concentração deste tipo de atividade na
cidade.
A qualidade do material varia de acordo com o estado de conservação que os materiais são
entregues pelos fornecedores, alguns materiais quanto expostos ao sol ou a chuva podem se
degradar e diminuir o seu valor de venda e até ser rejeitado. O ideal que essas mercadorias
percorram um ciclo o mais rápido possível entre o descarte do consumidor e as empresas do ramo
de reciclagem.
Fórum Internacional do Meio Ambiente - A conferência da Terra 1400

Figura 4: Materiais prensados e ensacados Figura 5: Funcionário no setor de recebimento de


insumos

O mercado de atuação é bastante promissor, tendo em vista que a cada dia, a atuação de
empresas que utilizam materiais recicláveis dentro e fora do Estado da Paraíba é mais crescente, isto
também se processa a nível mundial.
Segundo Andrade (2000, p. 01), “os mercados de sucata são predominantemente locais e
seu grau de desenvolvimento se dá de acordo com a rota tecnológica preponderante em cada
região”. Ou seja, verifica-se a instalação de indústrias de implementos para abastecer os pólos
calçadistas, que necessitam do plástico para transformá-lo em matéria-prima, da reciclagem de
papel para baratear os custos da matéria-prima e ganhar vez no mercado bem como na siderurgia
onde os fornos de usinas, sobretudo as pernambucanas têm se revelado como excelentes clientes da
empresa com a aquisição de sucata ferrosa (aço e ferro).

CONSIDERAÇÕES FINAIS
Tomando por base a evolução do gerenciamento dos resíduos sólidos e o advento de
legislações específicas por instituições e órgãos governamentais e não-governamentais, verifica-se
que estes se tornam ineficientes no que tange a um melhor aproveitamento dos resíduos sólidos em
nosso país, especificamente no município de Campina Grande, uma vez que a falta de uma política
pública que viabilize a cultura e até mesmo a abertura de cooperativas direcionadas à coleta seletiva
dos resíduos sólidos, como meio de melhor aproveitamento destes no mercado de sucatas,
considerando que a qualidade dos resíduos seria ampliada devido à forma de acondicionamento do
lixo domiciliar e comercial.
Em relação à empresa analisada em face ao município onde se encontra estabelecida
verificou-se que uma das grandes fontes de resíduos sólidos por parte da empresa é também fruto da
recessão sócio-econômica que leva muitas pessoas a buscarem uma fonte de renda através da coleta
autônoma de lixo, o que torna a atividade dos catadores de lixo uma função cada vez mais presente
e de onde provêm 80% de todos os resíduos colhidos diariamente pela empresa na sede e nos
depósitos.
Observando a atividade desenvolvida pela empresa analisada, constatou-se que a
reciclagem e o reaproveitamento de resíduos sólidos é uma alternativa economicamente viável, uma
vez que possibilita a volta de vários materiais ao processo tradicional de suprimento, produção e
distribuição, e que esse retorno encontra-se diretamente ligado às atividades que a referida empresa
realiza para coletar, separar, embalar e expedir itens usados, danificados, obsoletos ou descartados,
dos pontos de coleta até os clientes.
As conversas informais mantidas com os funcionários da empresa foram de fundamental
importância para o levantamento de informações sobre o negócio, tendo em vista que as opiniões,
fincadas na experiência diária com a rotina da empresa ao longo do tempo transformam-se em
minúcias de detalhes que passam despercebidos apenas pela observação.
Dessa maneira, a empresa objeto de estudo no presente trabalho, com o aprimoramento de
suas estratégias empresariais, tem alcançado tanto objetivos econômicos quanto ecológicos a partir
Fórum Internacional do Meio Ambiente - A conferência da Terra 1401

da utilização do gerenciamento e educação ambiental, que tem se destacado por proporcionar além
da preservação dos recursos naturais, a geração de emprego e renda.

REFERÊNCIAS BIBLIOGRAFICAS
ABNT - ASSOCIAÇÃO BRASILEIRA DE NORMAS TECNICAS – ABNT. NBR 10.004.
Resíduos Sólidos – Classificação. Rio de janeiro, 1987.
AISSE, Miguel Mansur, OBLADEN, Nicolau Leopoldo, SANTOS, Arnaldo Scherer.
Aproveitamento dos Resíduos Sólidos Urbanos. Curitiba: CNPq/ ITAH/ IPPUC/ LHISAMA-
UCPr. 1982.
ANDRADE et al, Manuel Correia de. O Desafio Ecológico. São Paulo: Hucitec, 2000.
DEMAJOROVIC, Jacques. Da política tradicional de tratamento de lixo À política de gestão de
resíduos sólidos. As novas prioridades. Revista de Administração de Empresas. São Paulo, v. 35,
n.3, 1995, p.83-93.
GRIFFITH, J. J. Gestão Ambiental: Uma Visão Sistêmica. Viçosa, Departamento de Engenharia
Florestal, Universidade Federal de Viçosa, 2005. (Apostila das disciplinas ENF388 e ENF686).
ILHA, F. O Lixo que virou vida. Revista Ecos, Porto Alegre, n. 15, p. 11-15, julho 1999.
TAMAIO, I. A Mediação do professor na construção do conceito de natureza. Campinas, 2000.
Dissertação de Mestrado. FE/Unicamp.
Fórum Internacional do Meio Ambiente - A conferência da Terra 1402

A PROBLEMATIZAÇÃO DOS RESÍDUOS SÓLIDOS: UM ESTUDO DE CASO NO


MUNICÍPIO DE AREIA BRANCA/RN

Dweynny Rodrigues Filgueira Ge


Técnico em Saneamento pelo Centro Federal de Educação Tecnológica do Rio Grande do Norte – CEFET/RN, e
graduando em Gestão Ambiental pela Universidade do Estado do Rio Grande do Norte – UERN – e-mail:
dweynny@hotmail.com;
Luana Cristina Fernandes Rodrigues
Técnico em Saneamento pelo Centro Federal de Educação Tecnológica do Rio Grande do Norte – CEFET/RN, e
graduando em Gestão Ambiental pela Universidade do Estado do Rio Grande do Norte – UERN – e-mail:
luanacristina_fr@hotmail.com
Joel Silva dos Santos
Bacharel e Licenciado em geografia pela UFPB; Mestre em Desenvolvimento e Meio Ambiente pelo programa de Pós-
graduação em Desenvolvimento e Meio Ambiente (PRODEMA/UFPB) – e-mail: joelgraphia@ig.com.br

RESUMO
A problematização dos resíduos sólidos nos centros urbanos está diretamente ligada as
mais diversas atividades econômicas típicas das grandes cidades: como o comércio, os serviços em
geral, as indústrias e a grande densidade populacional presente nestes centros. A falta de uma
política de gerenciamento dos resíduos sólidos tem agravado ainda mais os problemas
socioambientais nas cidades brasileiras. Nos municípios brasileiros, o destino do lixo quando
lançado em lugares sem nenhuma espécie de controle ambiental, como valas e córregos além de
terrenos baldios em geral, tornou-se um grande problema de caráter socioambiental. Além de
degradar a paisagem e produzir odor desagradável, o lixo a céu aberto coloca em risco o meio
ambiente e a saúde pública da população. Sendo assim, diante de todo esse contexto a pesquisa
realizada teve como finalidade relatar a problemática da disposição de resíduos sólidos na cidade de
Areia Branca/RN, levando em consideração as condições de moradia da população e a falta de uma
política pública de gestão ambiental que trabalhe especificamente a questão dos resíduos sólidos na
área de estudo. Os resultados obtidos demonstram uma situação de insustentabilidade
socioambiental presente no município, tendo em vista as condições socioeconômicas a que está
submetida à população local, além da falta de uma conscientização ambiental e a ausência de
políticas públicas por parte dos órgãos governamentais.
Palavras-Chaves: Gestão dos Resíduos Sólidos, Problemas Socioambientais, Areia Branca/RN.

ABSTRACT
The problem of the solid residues in the urban centers is directly linked on the most diverse
typical economic activities of the great cities: as the commerce, the services on the whole, the
industries and the big population density in these centers. The lack of a politics of management of
the solid residues has aggravated still more the socio-environment problems in the Brazilian cities.
In the Brazilian cities, the destination of the garbage when thrown at places without no type of
environment control, as ditches and streams beyond uncultivated grounds on the whole, became a
huge problem of socio-environment character. Besides degrading the landscape and producing
disagreeable odor, the garbage at open places puts in risk the environment and the public health of
the population. Being thus, ahead of all this context the research had as purpose to tell the problem
of the disposal of solid residues in Areia Branca town in Rio Grande do Norte State, taking in
consideration the conditions of housing of the population and the lack of a public politics of
environment management that specifically works the question of the solid residues in the study
area. The results demonstrate a situation of socio-environment untenability in the town, having in
mind the socio-economic conditions to which the local population is submitted, beyond the lack of
an environment awareness and the absence of public politics on the part of the governmental
agencies.
Key words: Management of the Solid Residues, Socio-environment Problems, Areia Branca/RN.

INTRODUÇÃO
Fórum Internacional do Meio Ambiente - A conferência da Terra 1403

A produção de resíduos sólidos faz parte do cotidiano do homem. Não existiria um modo
de vida que não gere resíduos sólidos. A sociedade atual vive um momento de conturbação. O
modelo de produção acelerado, ocasionado pelo capitalismo, tem levado a um alerta global, pois já
são evidentes as conseqüências desse consumo desenfreado. Somente há pouco tempo surgiu a
conscientização de que os recursos naturais disponíveis são esgotáveis e que o planeta não suportará
por muito tempo esta extração demasiada e o despejo de resíduos gerados, no meio ambiente.
Assim por definição, segundo a Associação Brasileira de Normas Técnicas (ABNT), resíduos
sólidos são:
[...] resíduos no estado sólido e semi-sólido, que resultam de atividades da comunidade
de origem: industrial, doméstica, comercial, agrícola, de serviços e de varrição. Ficam
incluídos nesta definição os lodos provenientes dos sistemas de tratamento de água,
aqueles gerados em equipamentos e instalações de controle de poluição, bem como
determinados líquidos cujas particularidades tornem inviável o lançamento na rede
pública de esgotos ou corpos de água, ou exijam para isso soluções técnica e
economicamente inviáveis face à melhor tecnologia prática disponível (ABNT 1987,
p.1-2).

Os resíduos sólidos são classificados de acordo com a sua origem, podendo se encaixar nas
seguintes categorias: Resíduos sólidos domiciliares, industriais, comerciais, de serviços de saúde, de
serviços de transporte e de construção civil. Seu acondicionamento varia de acordo com a sua
categoria, por exemplo, os resíduos sólidos domiciliares são acondicionados corretamente em:
recipientes metálicos ou plásticos; recipientes de borracha (pneus de caminhão); sacos plásticos tipo
padrão; sacos plásticos de supermercado. Já o acondicionamento dos resíduos provenientes dos
serviços de saúde é realizado através de: sacos plásticos confeccionados com material incinerável
para os resíduos comuns; recipientes feitos com material incinerável como polietileno rígido,
papelão ondulado ou outro material com as mesmas características, para acondicionamento dos
resíduos infectantes. Os resíduos sólidos ainda necessitam de uma coleta regular e eficaz, um
transporte seguro e um tratamento ou uma destinação final adequada.
Historicamente, o gerenciamento dos resíduos sólidos se baseou na coleta e no afastamento
do lixo, que com o decorrer do tempo passou a ser responsabilidade das administrações municipais.
Quando executado com eficiência, esse tipo de serviço cria uma sensação na população de que os
resíduos simplesmente desaparecem de sua vista. Por isso, levou muito tempo para que a sociedade
percebesse as graves tendências relacionadas à quantidade, qualidade e às soluções para o
gerenciamento adequado dos resíduos sólidos.
Um dos graves problemas vivenciados hoje, em relação à resíduos sólidos, é a questão da
disposição final deste material. O crescente aumento do fluxo urbano ocasiona uma maior geração
de lixo, tendo em vista que as cidades não possuem infra-estrutura adequada para a absorção desse
contingente. Por isso, as pessoas acabam sofrendo um processo de segregação social, espacial e
territorial, acabando por se instalarem nas áreas de periferia.
Na cidade de Areia Branca/RN, é notável a falta de infra-estrutura em relação ao
saneamento básico. Isso gera vários problemas em meio às comunidades urbanas, a exposição dos
esgotos, as habitações precárias, a disposição do lixo em locais inadequados, a falta de drenagem de
águas pluviais entre outros são conseqüências da ausência de políticas públicas municipais,
acarretando diversos problemas socioambientais tais como: Degradação da paisagem; odor
desagradável; presença de insetos, que são vetores de varias doenças; ocasionando assim problemas
de saúde pública.

METODOLOGIA
Como procedimento metodológico foi adotado o estudo de caso, utilizando-se de
levantamento bibliográfico e sua posterior revisão através de pesquisa em artigos, teses e
dissertações, sites na internet, livros acerca do objeto de estudo. Realizamos também uma
Fórum Internacional do Meio Ambiente - A conferência da Terra 1404

observação direta por meio de uma visita técnica a pontos estratégicos da cidade, na qual foi
registrada fotograficamente a situação atual, do gerenciamento dos resíduos sólidos.
A pesquisa teve inicio com a leitura de algumas bibliografias, que serviram de base para o
levantamento de dados em torno do objeto de estudo. Passada a primeira fase do processo, com o
objetivo de aprofundarmos nossa visão sobre o tema em questão, realizamos trabalhos de campo
através de visitas as periferias da cidade, onde foram realizadas entrevistas informais com os
moradores, além da visita ao aterro controlado (“lixão”), que se localiza a 10 km do perímetro
urbano, no qual verificamos o inadequado e incorreto destino final dos resíduos sólidos da cidade de
Areia Branca.

RESULTADOS
A ineficácia do gerenciamento dos resíduos sólidos no município de Areia Branca não é
muito diferente do que é visto em todo o país. Por isso, a cidade, nos últimos trinta anos, passou por
grandes transtornos.
Por volta da década de 80, o manejo de lixo era extremamente delicado. Havia pouca
preocupação com a coleta e a destinação final do lixo, a primeira era realizada de forma irregular e
ineficiente; enquanto a segunda embora houvesse um local fixo na época, era notável a presença de
resíduos em locais proibidos, levando à graves danos sanitários e ambientais as populações
expostas.
Já em meados de 90, o município passa a ter o apoio da Petrobras e consegue construir um
aterro controlado, (que funciona até hoje) amenizando então a problemática da disposição de seus
resíduos. Além disso, a coleta passou a ser feita com mais freqüência, e campanhas foram realizadas
conseguindo maior responsabilidade e sensibilidade social, o que levou a diminuição de detritos em
via pública.
Atualmente, o serviço de limpeza pública é terceirizado e os resíduos são despejados no
aterro controlado, criado na última década e que na realidade é um lixão, localizado a 10 km do
perímetro urbano.

Foto 3 – Queima do lixo, causando poluição Foto 4 – Célula para disposição do lixo
do ar. saturada.
Fórum Internacional do Meio Ambiente - A conferência da Terra 1405

Foto 1 – Aterro Controlado da cidade de Areia Foto 2 – Presença de urubus no chamado


Branca. Aterro Controlável.

A coleta nos últimos anos nem sempre se fez de forma eficiente, havendo claros sinais de
paralisação e desorganização no processo de limpeza pública. Ela era feita somente três vezes por
semana e de forma irregular, ou seja, além de ser ineficaz não atendia a demanda de todos os bairros
da cidade. Assim, devido à falta de educação ambiental, a população passa a ser inimiga da limpeza
coletiva, descartando de forma incorreta o seu lixo.
A população das periferias da cidade (Moranguinho, Metrô, Nordeste, Nossa Senhora
Aparecida, Baixa da Maré) fica exposta a uma grande quantidade de resíduos sólidos, que são
depositados, geralmente nos dias em que o carro coletor não percorre nessas áreas, em locais
inadequados como na vala ou no rio. Como conseqüência a este problema, os moradores desses
locais ficam expostos a um forte odor e conseqüente poluição do ar respirado por material orgânico
em estado de putrefação.
Os problemas de ordem sanitária tais como: o acondicionamento, a coleta, o transporte e o
destino final do lixo são de ordem administrativa e para ser eficiente exige planejamento eficaz e
recursos adequados. O gerenciamento de resíduos sólidos urbanos pode ser compreendido como
uma série de ações normativas, de cunho operacional, disponibilização financeira e planejamento
baseado em critérios sanitários e ambientais como também econômicos para assim coletar, tratar e
dar destinação correta ao lixo.
Com relação ao esgotamento, a cidade de Areia Branca não possui serviço de rede coletora
de esgoto. Assim, de acordo com a Secretaria Municipal de Infra-Estrutura, mais de 84% dos
domicílios possuem fossas sépticas, o restante despeja seus dejetos em valas que deságuam no rio
Apodi/Mossoró. Essa situação apresenta-se principalmente nos bairros de periferia.
Fórum Internacional do Meio Ambiente - A conferência da Terra 1406

A falta de coleta eficaz e esgotamento sanitário é um componente importante do perfil


epidemiológico de uma comunidade, influenciando diretamente a incidência de doenças. Do ponto
de vista sanitário, é incorreto afirmar que o lixo é causa direta de doenças. Porém, está comprovado
o seu papel na transmissão de doenças provocadas por macro e microrganismos que vivem ou são
atraídos pelo lixo. Estes organismos encontram abrigo e alimento nos resíduos de natureza
biológica, como fezes ou restos de origem vegetal, e podem ser agentes responsáveis por
enfermidades transmitidas ao homem.
As crianças de regiões onde há deficiências na coleta de lixo tem 40% a mais de chance de
apresentar diarréias e doenças parasitárias e dermatológicas. As doenças mais comuns relacionadas
ao lixo são: disenteria, infecções, hepatite, doenças de pele, problemas de estômago, atribuídos ao
odor.
Na cidade de Areia Branca, a população das periferias convive em péssimas condições
sanitárias, com a vala sempre com lixo exposto e o esgoto a céu aberto. Quando há a ocorrência de
chuvas o problema se torna maior, parte dos domicílios é invadida por águas de chuvas e do esgoto,
acompanhadas do lixo próximo. Deve-se ressaltar que a responsabilidade por essa situação não cabe
somente ao poder público, e sim também aos moradores dessas comunidades, uma vez que eles
mesmos praticam o ato de deposição do lixo na vala.
O lixo disposto próximo às áreas de comunidades periféricas ou aos arredores de centros
urbanos tem se tornado um grande problema socioambiental. As condições que as populações
dessas áreas se encontram, demonstra a falta de planejamento e gestão, bem como a ausência de
políticas de infra-estrutura e saneamento básico. De fato, o modo de vida dessas pessoas, induz a
um pensamento que demonstra a distância para se alcançar a equidade social, como um principio do
conceito de desenvolvimento sustentável.

Foto 7 – Situação de moradia das áreas Foto 8 – Disposição de resíduos na periferia de


periféricas da cidade. Areia Branca/RN.

Foto 9 – Residências construídas de Foto 10 – Poluição da vala mesmo com a


forma irregular. presença de tambores de lixo.
Fórum Internacional do Meio Ambiente - A conferência da Terra 1407

No Brasil, os órgãos estão se preocupando apenas com os problemas de destinação de


resíduos, limitando-se ao planejamento imediato ou à solução ou reparação dos entraves já
concretizados. A falta de diretrizes nas três esferas governamentais, somada com a ausência de
recursos financeiros e técnicos para a resolução dos problemas, além da difícil aplicação das
determinações legais são a causa de inúmeras cenas criticas de poluição, relacionadas à ausência de
tratamentos e a má disposição dos resíduos, gerando a contaminação dos solos e dos recursos
hídricos.
Em Areia Branca/RN, a problemática dos resíduos sólidos aponta para uma política
pública voltada para o planejamento urbano e a gestão ambiental, articulados a uma política de
habitação que considere a melhoria da qualidade de vida dessas populações, alterando as atuais
condições socioambientais.
Com a adoção de medidas adequadas para o gerenciamento dos resíduos sólidos, estamos
dando um passo significativo visando construir um cenário de ordenamento e planejamento para a
gestão sustentável dos mesmos. Com isso, precisa-se ampliar o debate sobre a necessidade de
redução do consumo, de utilização de tecnologias limpas no processo produtivo e da assimilação
cada vez maior da cultura da reciclagem e da coleta seletiva no município de Areia Branca. Só a
busca e a implementação de soluções simples e objetivas para os problemas de disposição final dos
resíduos sólidos evitará que se relegue para gerações futuras um passivo ambiental com custos
imensuráveis de reparação de danos.

RECOMENDAÇÕES FINAIS
É notável que o gerenciamento adequado dos resíduos sólidos, reflete diretamente na
qualidade de vida da população. Para tanto, existe a necessidade da implementação de medidas que
contribuam para a reversão do quadro histórico que permanece até os dias atuais na cidade de Areia
Branca. Porém, encontramos muitas dificuldades para a adoção de políticas e iniciativas que
contribuam para a implantação correta de um sistema de gerenciamento de resíduos eficiente. Para
vencer esses obstáculos, as seguintes diretrizes são indispensáveis:
Conhecer a geração de lixo e a estrutura do mercado local: A caracterização correta dos
resíduos sólidos do município é de suma importância, só assim podemos indicar qual a destinação
final adequada para os tais.
Incentivar a instalação de empresas recicladoras localmente: A necessidade de transportar
os materiais para indústrias de reciclagem distantes pode causar problemas econômicos a cidade.
Por tanto, a implementação e o incentivo a indústrias locais é importante.
Capacitação de técnicos, empresários e catadores: As pessoas que vão trabalhar
diretamente com os resíduos e dele retirar seu sustento econômico devem possuir uma visão de
negócio integrada com a questão ambiental, para que trabalhem, dentro dos padrões sanitários
adequados e para que sejam multiplicadores e incentivadores da população.
Promover a educação ambiental: Aplicação de cursos e palestras para a comunidade local,
com o intuito de prover os conhecimentos sobre a questão dos resíduos sólidos, a fim de melhorar o
desempenho na implantação do programa de gerenciamento dos mesmos.
Criação e aplicação permanente de uma sistemática de acompanhamento da evolução do
programa de gerenciamento: Muitas vezes o programa torna-se insustentável, pois para obter
resultados eficientes o mesmo necessita de certo período de tempo. Muitos programas de
gerenciamento já fracassaram, pois a população, os políticos e técnicos não obtiveram resultados
imediatos.

REFERÊNCIAS BIBLIOGRÁFICAS
BARROS, Mário Thadeu L.; BRAGA, Benedito; CONEJO, João G. Lotufo; EIGER, Sérgio;
HESPANHOL, Ivanildo; JULIANO, MIERZWA, José Carlos; Neusa; NUCCI, Nelson; PORTO,
Mônica; SPENCER, Milton. Introdução à Engenharia Ambiental: o desafio do desenvolvimento
sustentável. 2ª. Ed. São Paulo: Pearson Prentice Hall, 2005.
CALDERONI, S. Os bilhões perdidos no lixo. São Paulo: Humanitas, 1998.
Fórum Internacional do Meio Ambiente - A conferência da Terra 1408

FUNASA. Manual de Saneamento. 3ª Edição Revisada, Brasília: Fundação Nacional de Saúde,


2004, 408 p.
MANO, Eloísa Biasotto; PACHECO, Élen Beatriz Acorde Vasques; BONELLI, Cláudia Maria
Chagas. Meio ambiente, poluição e reciclagem. 1ª ed. – São Paulo: Edgardi Blücher, 2005.
PHILIPPI JR, Arlindo, editor. Saneamento, saúde e ambiente: Fundamentos para um
desenvolvimento sustentável. Barueri, São Paulo: Manole, 2005. – (Coleção Ambiental ; 2).
PHILIPPI JR, Arlindo; ROMERO, Marcelo de Andrade; BRUNA, Gilda Collet, editores. Curso de
gestão ambiental. Barueri, São Paulo: Manole, 2004. – (Coleção Ambiental ; 1).
RODRIGUES, Arlete Moysés. Produção e consumo do e no espaço: problemática ambiental
urbana. São Paulo: Hucitec, 1998. 239 p.
RODRIGUES, Francisco Luiz. Cavinato, Vilma Maria. Lixo: de onde vem? Para onde vai? São
Paulo. Moderna, 2003.
Fórum Internacional do Meio Ambiente - A conferência da Terra 1409

ANÁLISE DAS PRESSÕES E AMEAÇAS NA APA DA LAGOA ENCANTADA E RIO


ALMADA, ILHÉUS - BA

Camila do Nascimento CARDOSO


Faculdade de Tecnologia e Ciências de Itabuna (Graduando em Engenharia Ambiental)
Orleane BRITO
Faculdade de Tecnologia e Ciências de Itabuna (Graduando em Engenharia Ambiental)
Fábio dos Santos MASSENA
Faculdade de Tecnologia e Ciências de Itabuna (Docente de Engenharia Ambiental) – fabiomassena@gmail.com

RESUMO
Na Bacia do Rio Almada encontra-se a Lagoa Encantada, Ilhéus, Bahia, local onde se
realizou esta pesquisa, relacionando os principais impactos ambientais. O trabalho a seguir aborda
sobre as pressões sofridas no local, geradas por um crescimento habitacional desordenado,
implantação de criatórios de animais, retirada de madeiras sem autorização, desmatamento das áreas
próximas do rio causando erosão e assoreamento. Durante o estudo foi observado que os ribeirinhos
utilizam a água do rio para afazeres domésticos, criam animais como porcos, aves de corte (frango e
pato), gado e búfalos, estes habitam encharcos, local de captação e abastecimento do leito de rios e
nascentes, causando uma poluição sanitária e visual para um local que deveria ser uma reserva
ecológica, mas como o local é habitado há muitas décadas, seria inviável a retirada dos moradores
do local, assim visto que os problemas gerados pelas comunidades que habitam a região da Bacia
do Rio Almada causam impactos severos e crescentes. Verifica-se a necessidade de implantação de
projetos que controlem o crescimento populacional e a poluição gerada pelas mesmas. Com base
em pesquisas literárias e pesquisas de campo será apresentado um trabalho de observação e
avaliação dos problemas encontrados durante a pesquisa.
Palavras-chave: Lagoa Encantada; ação antrópica; degradação.

ABSTRACT
In the Almada´s River Basin we meet Lagoa Encantada, visited area for students of the
Environmental Engineering course, where was done researches related the environment impacts.
The following project specified the pressures suffered by the place, generated by an inhabit
disordered growth, implantation of animals create areas, wood withdrawal without authorization,
deforestation of the areas next to the river causing erosion and river bed destruction. During the
visit it was observed that the population who live there use the river´s water for domestic tasks,
create animals as pigs, birds of abates (chicken and duck), cattle and buffalos, these inhabit places
covered by water, place of captation and supplying of the stream and rivers bed, causing a sanitary
and visual pollution for a place that would have to be an ecological reserve, but as the place inhabit
has many decades, it would be impracticable that they take the inhabitants out of the place. Thus,
since the problems generated by the communities that inhabit the region of the Almada´s River
Basin cause severe and increasing impacts, it would be good the implantation of projects that
controlled the population growth and the pollution generated for the same ones. On the basis of
literary research and field research will be presented a comment and evaluation work of the
problems found during the visit.
Keywords: Lagoa Encantada, human action, degradation.

INTRODUÇÃO
A partir do início da década de 90, a região sul da Bahia vem recebendo mais atenção em
relação à preservação e conservação, devido aceleração do desmatamento provocado pela crise na
lavoura cacaueira. Para compensar os prejuízos, muitos fazendeiros optaram pela exploração de
madeira de suas reservas de mata, aumentando o risco de extinção de algumas espécies. Mesmo
apresentando uma perturbação significativa, a floresta regional ainda possui uma grande
biodiversidade de fauna e flora.
Fórum Internacional do Meio Ambiente - A conferência da Terra 1410

Os conhecimentos detalhados sobre os potenciais ecológicos dos ambientes, possibilitam a


geração de estratégias para usos sustentáveis dos recursos naturais. Deste modo, tem-se, o
reconhecimento e a proteção dos ecossistemas mais frágeis, que são os ambientes costeiros e
marinhos.
Sendo assim, este trabalho tem como objetivo: analisar o plano de manejo implementado
na APA da Lagoa Encantada, analisando as pressões e ameaças provocadas no local, avaliando as
modalidades de utilização dos recursos naturais, assim como, os meios oferecidos para a satisfação
das populações nativas; fazer uma análise da utilização dos recursos naturais da área de estudo;
avaliar a conduta ética da comunidade e dos responsáveis pela mesma; avaliar se a comunidade e os
órgãos gestores cumprem obrigações, deveres e respeitam os direitos da sociedade; avaliar os
fundamentos e o valor dos princípios, das normas, dos códigos de conduta e das convicções morais
existentes e reconhecer que perspectivas morais norteiam as ações éticas dos moradores locais.

SISTEMA NACIONAL DE UNIDADES DE CONSERVAÇÃO (SNUC)


O SNUC, instituído pela Lei nº. 9.985 de 18 de julho de 2000, tem como objetivos
principais: contribuir para a manutenção da biodiversidade e dos recursos genéticos no território
nacional e nas águas jurisdicionais; contribuir para a preservação e a restauração da diversidade de
ecossistemas naturais; promover a utilização dos princípios e práticas de conservação da natureza
no processo de desenvolvimento; proteger paisagens naturais e pouco alteradas de notável beleza
cênica; proteger e recuperar recursos hídricos; recuperar ou restaurar ecossistemas degradados;
proporcionar meios e incentivos para atividades de pesquisa científica, estudos e monitoramento
ambiental; favorecer condições e promover a educação e interpretação ambiental, a recreação em
contato com a natureza e o turismo ecológico; definir, uniformizar e consolidar critérios para o
estabelecimento e gestão das Unidades de Conservação (FNMA, 2003).
Dentre os critérios estabelecidos no SNUC para a gestão das Unidades de Conservação, a
lei inovou ao garantir a participação da sociedade e das populações que habitam o interior ou
entorno daquelas Unidades, e assegurar mecanismos e procedimentos necessários para o seu
envolvimento com a gestão das mesmas (FNMA, 2003).
As Unidades de Conservação integrantes do SNUC são divididas em dois grupos:
Unidades de Conservação de Proteção Integral e Unidades de Conservação de Uso Sustentável.
Este último tem por objetivo básico compatibilizar a conservação da natureza com o uso sustentável
de parcela de seus recursos naturais. Dentre as categorias que compõem este grupo destacam-se, as
Áreas de Proteção Ambiental - APA’s, Florestas Nacionais, Florestas Estaduais, Florestas
Municipais e etc (FNMA, 2003).
Como um dos instrumentos utilizados para assegurar a participação da sociedade na gestão
de Unidades de Conservação de uso sustentável, a lei dispõe o estabelecimento de Conselhos, de
caráter consultivo ou deliberativo, definidos, como um espaço comum aos diferentes representantes
da sociedade (órgãos governamentais, populações locais e organizações da sociedade civil), cuja
função é conciliar os objetivos de conservação dos recursos naturais e a promoção do
desenvolvimento e da qualidade de vida das comunidades residentes na área da unidade,
privilegiando os processos participativos de interlocução, discussão, negociação e decisão afetam à
gestão da Unidade em detrimento a uma cultura que tende a centralizar esses processos (FNMA,
2003).
Cabe destacar que processos participativos buscam fomentar a interlocução de interesses e
direitos manifestados pelos diferentes atores sociais, resultando em medidas que atendam aos
anseios da coletividade, contribuindo também para fortalecer as relações entre estes atores e
aprimorar a qualidade de suas decisões (FNMA, 2003).
A captação de recursos tem sido ao longo do tempo, uma das maiores preocupações dos
Conselhos envolvidos com a Gestão de Unidades de Conservação. No caso da APA da Lagoa
Encantada e Rio Almada, em que pese o esforço despendido pelo Governo do Estado da Bahia, os
recursos são econômicos e muitas vezes não são alocados na mesma velocidade em que as
demandas exigem (CRA, 2000).
Fórum Internacional do Meio Ambiente - A conferência da Terra 1411

A Área de Proteção Ambiental, em geral extensa, possui certo grau de ocupação humana,
dotada de atributos abióticos, bióticos, estéticos ou culturais especialmente importantes para a
qualidade de vida e o bem-estar das populações humanas, e tem como objetivos básicos proteger a
diversidade biológica, disciplinar o processo de ocupação e assegurar a sustentabilidade do uso dos
recursos naturais (CRA, 2000).
Este tipo de área protegida é constituída por terras públicas ou privada. Respeitando os
limites constitucionais, podem ser estabelecidas normas e restrições para a utilização de uma
propriedade privada localizada em uma Área de Proteção Ambiental. As condições para a
realização de pesquisa científica e visitação pública nas áreas sob domínio público serão
estabelecidas pelo órgão gestor da unidade. Nas áreas sob propriedade privada, cabe ao proprietário
estabelecer as condições para pesquisa e visitação pelo público, observadas as exigências e
restrições legais. A Área de Proteção Ambiental disporá de um Conselho presidido pelo órgão
responsável por sua administração e constituído por representantes dos órgãos públicos, de
organizações da sociedade civil e da população residente, conforme se dispuser no regulamento da
Lei (MENDONÇA, 1996).
A área possui, como principais unidades fisiográficas, a linha de praia com restinga, a
planície flúvio-marinha com manguezal, a planície aluvial com várzea e brejos, as encostas das
falésias e, finalmente, os tabuleiros ou altiplanos, com vegetação em estágios distintos de
regeneração. A Lagoa Encantada e seus ecossistemas aquáticos adjacentes oferecem a possibilidade
de um passeio único entre meandros e florestas ribeirinhas, com a presença de rica avifauna
silvestre, semelhante aos ecossistemas típicos da Região Amazônica (CRA, 2006).
A vegetação local é típica do bioma da Floresta Atlântica com seus ecossistemas
associados, onde possuem fisionomia diversificada e características específicas. A Floresta
Ombrófila Densa caracteriza-se por apresentar predominância de árvores com grande porte, com
alturas que variam de 20 a 40 metros e folhagem sempre verde (CRA, 2006).
Segundo CRA (2006), de acordo com estudos feitos na região esse é o ecossistema mais
rico do mundo em número de espécies arbóreas, sendo considerada uma área prioritária para
conservação em nível mundial. Dentre as espécies arbóreas de importância econômica, destaca-se o
cedro, o vinhático e o Angelim.
A restinga apresenta plantas com características adaptadas às condições de elevada
salinidade, insolação e aos ventos fortes comuns na faixa litorânea, tendo, portanto, folhas coriáceas
e troncos retorcidos, com predominância de arbustos formando agrupamentos em alternância com o
estrato herbáceo. Sua flora abriga espécies de rara beleza e importância paisagística, tais como
bromélias, orquídeas e cactos (CRA, 2006).
Ainda conforme o CRA, os manguezais localizam-se, principalmente, nos estuários dos
rios, sofrendo influência das marés e das correntes fluviais, com solos periodicamente alagados e
comunidade vegetal especialmente adaptada. Apresenta um aspecto homogêneo com um restrito
número de espécies vegetais, com destaque para as espécies arbóreas, que possuem raízes escoras e
aéreas especiais (pneumatóforos), dentre outras adaptações fisiológicas.
Devido à riqueza de nichos ecológicos oferecidos pelos ecossistemas da Floresta Atlântica,
a fauna da região é muito diversificada, apresentando espécies raras e endêmicas, com destaque
para os mamíferos ameaçados de extinção: preguiça-de-coleira, sagüi-de-tufo-branco e a lontra
(ODUM, 1986).
A lagoa que dá nome a APA é uma formação dos rios Pipite e Caldeiras, e forma um
conjunto harmônico com a beleza e exuberância da Mata Atlântica. Além da floresta, cachoeiras,
nascentes e cavernas a APA abrangem uma área litorânea onde são encontrados restingas e
manguezais. Diversas Reservas Particulares estão implantadas ou em fase de implantação. Nas
margens do Rio Almada, existe uma vegetação entrelaçada que, ao se soltar das margens, formas
verdadeiras “ilhas flutuantes”, berçários de peixes e camarões, importantes para a perpetuação da
fauna aquática. Na região litorânea, podem ser observadas desovas de tartarugas marinhas,
caranguejo e guaiamuns em época de andada (VIEIRA, 2005).
Fórum Internacional do Meio Ambiente - A conferência da Terra 1412

As populações residentes na área são geralmente descendentes de índios e negros, com


hábitos inteiramente adaptados à vida ribeirinha. A presença da cultura indígena pode ser observada
nos nomes dos lugares e coisas, como por exemplo: Sambaituba, Urucutuca, Bacuparituba, Cuitatã,
dentre outros nomes. Estão dentro da APA os seguintes povoados: Aritaguá, Sambaituba,
Urucutuca, Areias e Castelo Novo (VIEIRA, 2004).
Para visitar a unidade - saindo da Cidade de Ilhéus em direção ao norte, da estrada que liga
Ilhéus a Uruçuca, pela margem esquerda do Rio Almada, chega-se a Sambaítuba, que, atualmente, é
o ponto de partida para a Lagoa Encantada. Aí, onde os visitantes estacionam seus carros, partem
barcos de passageiros para a lago (CRA, 2000).
As pressões são forças, ações ou eventos, que já tiveram um impacto prejudicial sobre a
integridade da unidade de conservação. As pressões abrangem as ações legais e ilegais e resultam
dos impactos diretos ou indiretos de tais ações. As ameaças são pressões possíveis ou iminentes
pelas quais um impacto pode ocorrer no presente ou continuar ocorrendo no futuro (WWF, 2000).
A interferência antrópica no meio ambiente afeta o estado de seus componentes e gera uma
resposta, imediata ou no, na sua qualidade. Como todo sistema complexo, o impacto da alteração de
um componente fomenta mudanças de acordo com a pressão que foi exercida sobre ele. Essas
interações de causa e efeito podem ser melhor vislumbradas quando se consegue ordenar os estados
dos componentes ambientais ligando-os com os respectivos fatores de pressão. Essa é uma forma
simples de obter os impactos ambientais baseados nas pressões que os geraram e, portanto, nas
possíveis ações de resposta de políticas que podem minimizá-los ou mesmo os anular.
A Avaliação Ambiental Integrada baseia-se nestas três categorias pressão-estado- resposta
- PSR. Com base na lógica da estr utura do PSR algumas alternativas mais detalhadas foram
desenvolvidas como o Spir, onde está incluído o impacto da pressão sobre o meio ambiente.
Dependendo das relações analisadas, alguns termos podem estar presentes em mais de uma dessas
categorias. Portanto, a estrutura Spir pode ser usada mais como uma metodologia de análise do que
como uma categorização rígida.
Segundo Camargo (1999), a construção da ética parte das exigências ou necessidades
fundamentais da natureza humana, estas não são aleatórias, mas existem no ser humano, limitando-
o e identificando-o para que ele possa descobrir-se a satisfazer o que lhe é solicitado para sua
realização. O desenvolvimento das potencialidades humanas é uma questão ética, assim, usando sua
racionalidade, o homem deve descobrir sua essência, seus valores e princípios universais que
determinam também como vivê-las. Estas constatações mostram que o objetivo da ética é apontar
rumos, descortinar horizontes para realização do próprio ser humano. Desta maneira, a ética não se
torna uma imposição ou obrigação aleatória e até extrínseca ao ser humano: seus fundamentos
objetivos têm que ser assimilados ou conscientizados pelo indivíduo humano concreto. Por isso a
ética antecede códigos, normas ou leis e analisa a mesma validade destas para o ser humano.
Conforme Modin (1982), a ética é o estudo da atividade humana com relação a seu fim
último, que é realização plena da humanidade. O problema ético toma dois aspectos principais: um
relativo ao fundamento e ao valor dos códigos, dos princípios, das normas, das convicções morais já
existentes; trata-se do problema crítico. O outro diz respeito às condições que possibilitam a ação
moral em absoluto, o critério daquilo que é moral e imoral para o homem, o fim último da vida
humana e os meios mais aptos para atingi-lo, sendo esse o problema teórico.
As morais construídas sobre o princípio do fim são chamadas de teleológicas, as
construídas sobre o princípio do dever chamam-se deontólogicas. No entanto, visto que os dois
princípios são suscetíveis de variadas interpretações, a moral teleológica se divide em moral
hedonista, utilitarista, eu demonismo e ética de valores, já a moral deontólogica se subdivide em
estoicismo e formalismo kantiano. O hedonismo adota como critério supremo da moralidade o
prazer, a moral utilitarista tem por finalidade o interesse, a vantagem, o eudemonismo tem como
principio a felicidade e a ética de valores concebe-se não tanto como fim último, mas como valor.
(MODIM, 1982).

METODOLOGIA
Fórum Internacional do Meio Ambiente - A conferência da Terra 1413

Área de Estudo
A APA foi criada pelo Decreto Estadual nº 2.217 de 14/07/93 com uma área de 11.800
hectares. Ampliou-se em 22/09/03 pelo Decreto Estadual de nº 8.650 para 157.000 hectares,
encontra-se no meridiano 39º00 e 39º30’ WG e nos paralelos 14º20’ e 14º30’ Sul. Fica localizada
no litoral sul do Estado da Bahia, no Município de Ilhéus, a 34 km da sede municipal, além do
município de Ilhéus a APA abrange também os municípios de Uruçuca, Itajuípe, Coaraci, Almadina
e Itabuna. Segundo Albuquerque (2004) a APA possui 23.778 moradores, distribuídos entre os
distritos de Aritaguá, Castelo Novo, Povoado de Sambaituba, Campinhos, Urucutuca, Laranjeiras,
Vila Olímpio, Ribeira das Pedras, Areias, Juerana, Loteamentos Mar e Sol e Jóia do Atlântico,
sendo Vila de Areias a comunidade receptiva do turismo desenvolvido na Lagoa Encantada.
O acesso até a Lagoa Encantada pode ser feito por água, através do Clube do Jóia (cerca de
2 horas de viagem) e por terra (34 Km do centro de Ilhéus, aproximadamente 50 minutos até a
Lagoa). Na figura 01, apresenta-se a área da APA da Lagoa Encantada.

Figura 01 - carta da área da APA


Fonte: www.ilheusamado.com.br

MÉTODOS DE ANÁLISE
Inicialmente, realizou-se uma pesquisa bibliográfica desenvolvida a partir de material já
elaborado, constituído principalmente de livros, monografias, sites, jornais, revistas, para definição
do sistema conceitual, fundamentação teórica e a caracterização geoambiental da área de estudo,
considera-se este método (dedutivo) como secundário, pois baseia-se em material bibliográfico.
Posteriormente elaborou-se os instrumentos que foram utilizados na coleta dos dados
primários: questionários e roteiros de entrevistas, com o objetivo de recolher e registrar de maneira
ordenada e sistemática os dados de campo sobre o tema estudado.
Foram analisados por meio do formulário os elementos propostos por Metodologia Rápida
Para Avaliação e Priorização do Manejo de Unidades de Conservação da WWF – Brasil, aplicou-se
também o questionário de ética baseado na observação sistemática da conduta dos moradores locais.

RESULTADOS E DISCUSSÃO
Análise da situação atual
Na área do entorno da Lagoa era grande a concentração de cultivos de cacau, estando
quase a totalidade da população residente nestas localidades, vinculada diretamente com esta
atividade econômica. Devido à crise do cacau com a vassoura-de-bruxa, as pressões da população
sobre o meio ambiente natural se agravaram, especialmente com o crescimento do número de
desempregado nas fazendas, a migração destes para os povoados ribeirinhos, na esperança de
conseguir o sustento com a caça e a pesca, além da retirada clandestina de madeira dos
remanescentes da Mata Atlântica na região.
Fórum Internacional do Meio Ambiente - A conferência da Terra 1414

A equipe de estudo só teve acesso a comunidade de Areias, local onde foram aplicados
questionários e realizadas observações. Areias é um povoado de ocupação recente, situando-se na
margem da Lagoa Encantada. É atualmente o ponto de chegada das embarcações vindas de
sambaituba, estando sua economia já integrada ao turismo de visitação.

Ameaças e pressões que foram observadas durante a visita:


Falta de Saneamento Básico e Lixo Domiciliar.
No povoado de Areias, um dos grandes problemas é a falta de saneamento básico, pois não
possui estação de tratamento de água e nem de esgoto. Segundo o Administrador da comunidade de
Areias, 40% das casas utilizam fossas sépticas, e as existentes são mal construídas e encontram-se
saturadas pelo nível do lençol freático, os outros 60% são despejados, uma parte na Lagoa e a outra
na Mata, alguns moradores utilizam essa mesma água da lagoa para banho. A grande maioria das
residências, aproximadamente 70%, não possui sequer sanitário nas casas.
O lixo domiciliar é recolhido pelo administrador da comunidade e logo após é queimado,
esse processo dar-se de um ano pra cá, pois anteriormente todo o lixo gerado pela comunidade era
jogado na mata, numa distância de aproximadamente 200 metros de distância das residências.

Ocupação Desordenada do Entorno da Lagoa


Observa-se uma ocupação desordenada do solo originado de construções habitacionais
inadequadas na área de proteção permanente – APP, na beira da lagoa. O povoado de Areias possui
situação bastante complicada, tendo em vista o seu surgimento ser decorrido de um assentamento
mal planejado do antigo povoado de Laranjeiras. Não existiu a configuração da desapropriação e os
herdeiros do Espólio do antigo proprietário da área, iniciaram um processo desordenado de venda
de lotes, com ausência total do poder público municipal.
Com a irregularidade fundiária, por ter sido a área uma doação, inclusive não tendo ainda o
ex-proprietário indenizado, os nativos beneficiados não possuem documentos de posse da terra e
muitos deles vendem sua área a pessoas de fora para em seguida ocupar uma nova área. Os novos
compradores têm comportamento oposto ao dos nativos e geram conflitos. Conforme os nativos
“eles não tem bom comportamento”. Isso acarreta que no verão há grande quantidade de turistas
sujando a área ao redor da lagoa, usando seus jet-skies e lanchas e estacionando seus carros na
margem da lagoa.

Caça e Pesca Predatória


Segundo moradores da própria comunidade de Areias, devido a grande diversidade de
animais e árvores na área, relataram que ocorre a ação criminosa de caçadores.
A pesca predatória praticada na lagoa é, sem dúvida, um dos principais impactos
observados, onde se utilizam redes-de-malha-fina e tarrafa, não respeitando o tamanho da malha da
rede recomendada pela Bahia Pesca e Colônia Z34, nem outras determinações, apesar da grande
placa com aviso na margem da lagoa. Durante a visita alguns pescadores que estavam próximos do
rio, afirmaram a redução do número de peixes. Alguns relatos afirmam a invasão de peixes de
outras regiões, isto traz desequilíbrio ecológico para a lagoa, porque estes peixes são predadores
agressivos, podendo extinguir espécies locais, essa é uma das principais ameaças no local, pois o
principal meio de sobrevivência dos moradores é a pesca.

Poluição do rio por produtos não biodegradáveis


A água vinda do remanescente estava apresentando uma espuma originada de produtos não
biodegradáveis (detergentes, sabão em pó e água sanitária), podendo ter sido provocada pelas
populações dos vilarejos ribeirinhas que lavam suas roupas e pratos nas águas do rio. Este evento
causa poluição e morte dos seres aquáticos.

Impacto sobre a Mata Atlântica


Fórum Internacional do Meio Ambiente - A conferência da Terra 1415

É extremamente preocupante a situação da Mata Atlântica na região cacaueira do Estado o


que inclui a área em estudo. Diversos profissionais e entidades não governamentais já se mobilizam
para encontrar alternativas para uma situação que produz conseqüências danosas não apenas a nível
local, mas afeta a integridade dos ecossistemas de forma geral. A retirada de madeira ainda é uma
prática existente na área.
A madeira é retirada tanto por grandes agricultores como por pequenos posseiros, sendo
que a derrubada é feita, principalmente, para consumo próprio, sendo utilizada para fabricação de
estacas de cercas, construção de casas e até mesmo para lenhas.
Verificou-se durante o estudo, um pescador transportando em sua c

Você também pode gostar