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1922‒ 1930
OSWALD DE ANDRADE (1890-1954)
Tarsila do Amaral
MANIFESTOS
Pau-Brasil (1924)
Antropófago (1928)
Manifesto da Poesia Pau-Brasil
(Excertos)
A poesia existe nos fatos. Os casebres de açafrão e de ocre
nos verdes da Favela, sob o azul cabralino, são fatos
estéticos.
No matriarcado de Pindorama.
(1925)
As Meninas da Gare
No baile da Corte
Foi o Conde d’Eu quem disse
Pra Dona Benvinda
Que farinha de Suruí
Pinga de Parati
Fumo de Baependi
É comê bebê pitá e caí
3 de Maio
(1927)
amor
humor
POESIA
(1945)
Erro de Português
(1924)
28. Porto Saído
(1933)
P R O P I C I AÇ ÃO
[...]
Domingo
Benedito Carlindoga, meu chefe na Escarradeira (vulgo Repartição
Federal de Saneamento) partiu para a Europa, a bordo do vapor Magellan.
Vai se babar ante o saracoteio desengonçado e lúbrico das personagens de
Guy de Maupassant.
[...]
Terça-feira
Dieta de cachorro por causa de um vinho Barbera que bebi ontem,
festa dos italianos, em companhia de meu prezado colega e amigo José
Ramos Góis Pinto Calçudo, a fim de celebrarmos a brecha de Porta Pia. [...]
Terça-feira
[...]
Continuo a levar uma vida acanalhada. Só vejo um remédio para me
moralizar ‒ cortar a incômoda mandioca que Deus me deu!
[...]
Domingo
Lalá me envelhece. Mas também me galvaniza. Tenho ímpetos de
largar esta gaita e dar o fora. Um fora sensacional!
[...]
Sexta-feira
O Manso relata-me que um tal Matatias, cunhado de um primo dele,
nunca teve nenhuma manifestação de sífilis, nem hereditária nem pegada
‒ mas eis que agora está com a vista e a espinha invadidas. Aconselha-me
a fazer exame de sangue em todos da casa.
[...]
Sábado
Lalá passou mal a noite. Não morreu.
[...]
Quarta-feira
Ontem, último dia de Carnaval, fizemos o Corso na Avenida Paulista.
Vaca com o Manso para pagar o táxi. Além disso, ele, gentilmente,
ofereceu uma bisnaga das grandes à Lalá. [...]
O Te r r e m o t o D o r o t e u
onde
(1944)
Portinari
POESIA
Carnaval (1919)
(Carnaval)
A Estrada
Esta estrada onde moro, entre duas voltas do caminho,
Interessa mais que uma avenida urbana.
Nas cidades todas as pessoas se parecem.
Todo o mundo é igual. Todo o mundo é toda a gente.
Aqui, não: sente-se bem que cada um traz a sua alma.
Cada criatura é única.
Até os cães.
Estes cães da roça parecem homens de negócios:
Andam sempre preocupados.
E quanta gente vem e vai!
E tudo tem aquele caráter impressivo que faz meditar:
Enterro a pé ou a carrocinha de leite puxada por um bodezinho manhoso.
Nem falta o murmúrio da água, para sugerir, pela voz dos símbolos,
Que a vida passa! que a vida passa!
E a mocidade vai acabar.
(O Ritmo Dissoluto)
POESIA
Libertinagem (1930) Estrela da Manhã (1936)
Pensão Familiar
Jardim da pensãozinha burguesa.
Gatos espapaçados ao sol.
A tiririca sitia os canteiros chatos.
O sol acaba de crestar as boninas que murcharam.
Os girassóis
amarelo!
resistem.
E as dálias, rechonchudas, plebeias, dominicais.
(Libertinagem)
Poética Voz : J u ca d e O l i v e i ra
Abaixo os puristas
Todas as palavras sobretudo os barbarismos universais
Todas as construções sobretudo as sintaxes de exceção
Todos os ritmos sobretudo os inumeráveis
(Libertinagem)
Evocação do Recife
Voz : M a n u e l B a n d e i ra
Recife
Não a Veneza americana
Não a Mauritsstad dos armadores das Índias Ocidentais
Não o Recife dos Mascates
Nem mesmo o Recife que aprendi a amar depois – Recife das revoluções
[libertárias
Mas o Recife sem história nem literatura
Recife sem mais nada
Recife da minha infância
De repente
nos longes da noite
um sino
Capiberibe
– Capibaribe
Novenas
Cavalhadas
Capiberibe
– Capibaribe
Recife...
Meu avô morto.
Recife morto, Recife bom, Recife brasileiro como a casa de meu avô
(Libertinagem)
Estrela da Manhã
Voz : M a n u e l B a n d e i ra
Eu quero a estrela da manhã
Onde está a estrela da manhã?
Meus amigos meus inimigos
Procurem a estrela da manhã Virgem mal-sexuada
Atribuladora dos aflitos
Ela desapareceu ia nua Girafa de duas cabeças
Desapareceu com quem? Pecai por todos pecai com todos
Procurem por toda parte
Pecai com os malandros
Digam que eu sou um homem sem Pecai com os sargentos
[orgulho Pecai com os fuzileiros navais
Um homem que aceita tudo Pecai de todas as maneiras
Que me importa?
Eu quero a estrela da manhã Com os gregos e com os troianos
Com o padre e com o sacristão
Três dias e três noites Com o leproso de Pouso Alto
Fui assassino e suicida
Ladrão, pulha, falsário Depois comigo
Te esperarei com mafuás novenas cavalhadas
[comerei terra e direi coisas
[de uma ternura tão simples
Que tu desfalecerás
(Estrela da Manhã)
Momento num Café
Quando o enterro passou
Os homens que se achavam no café
Tiraram o chapéu maquinalmente
Saudavam o morto distraídos
Estavam todos voltados para a vida
Absortos na vida
Confiantes da vida.
Opus 10 (1952)
Vi ontem um bicho
Na imundície do pátio
Catando comida entre os detritos.
(Belo Belo)
Consoada
Voz : M a n u e l B a n d e i ra
(Opus 10)
Antologia
A vida
Não vale a pena e a dor de ser vivida.
Os corpos se entendem mas as almas não.
A única coisa a fazer é tocar um tango argentino.
Quero descansar
Humildemente pensando na vida e nas mulheres que amei...
Na vida inteira que podia ter sido e que não foi.
Quero descansar.
Morrer.
Morrer de corpo e de alma.
Completamente.
(Todas as manhãs o aeroporto em frente me dá lições de partir.)
(Estrela da tarde)
O Pelicano
Para Manuel Bandeira