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PORTUGUÊS
BRASILEIRO
ESCRITO
Francisco Eduardo Vieira
Carlos Alberto Faraco
Direção: Andréia Custódio
Capa e diagramação: Telma Custódio
Revisão: Thiago Zillio
V715g
Inclui bibliografia
ISBN 978-85-7934-309-4
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PARÁBOLA EDITORIAL
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ISBN: 978-85-7934-309-4
© do texto: Francisco Eduardo Vieira e Carlos Alberto Faraco, 2023.
© da edição: Parábola Editorial, São Paulo, outubro de 2023.
Quando um rio corta, corta-se de vez
o discurso-rio de água que ele fazia;
cortado, a água se quebra em pedaços,
em poços de água, em água paralítica.
Em situação de poço, a água equivale
a uma palavra em situação dicionária:
isolada, estanque no poço dela mesma,
e, porque assim estanque, estancada;
e mais: porque assim estancada, muda,
e muda porque com nenhuma comunica,
porque cortou-se a sintaxe desse rio,
o fio de água por que ele discorria.
Ana Lima, Ana Maria Stahl Zilles, Ataliba T. de Castilho, Beth Marcuschi,
Carlos Franchi (in memoriam), Clerk Elísio, Cristina Altman, Cristovão Tezza,
Dante Lucchesi, Elisângela Maria da Silva, Emily Medeiros Ferreira,
Eurico Back (in memoriam), Gláucia Nascimento, Irandé Antunes,
José Borges Neto, José Carlos de Azeredo, Josyanne Louise, Juliene Pedrosa,
Leonardo Gueiros, Luiz Antônio Marcuschi (in memoriam), Marcelo L. dos Anjos,
Márcia Mendonça, Marcos Bagno, Marcos Marcionilo, Margarita Correia,
Marianne Cavalcante, Mário A. Perini, Nelly Carvalho, Normanda Beserra,
Olga Coelho, Orlene Carvalho, Rita Kramer, Roberto Mulinacci, Sérgio Rodrigues,
Siane Gois, Sílvia R. Vieira, Tatiana Luna, Tereza Cristina Vieira (in memoriam)
e Xoán Carlos Lagares.
5 – ORAÇÕES COORDENADAS................................................................................................107
5.1 O que é coordenar orações? ........................................................................................... 108
5.2 Orações coordenadas por “e”, “ou”, “nem”.................................................................. 109
5.3 Orações coordenadas por “mas”.....................................................................................114
5.4 Orações coordenadas por outros conectivos de oposição..........................................117
5.5 Orações coordenadas por conectivos de explicação................................................... 120
5.6 Orações coordenadas por conectivos de conclusão ................................................... 122
5.7 Estruturas justapostas (coordenação sem conectivos)................................................ 126
Sumário 9
7.5 Orações subjetivas reduzidas de infinitivo.................................................................... 154
7.6 Orações subjetivas introduzidas por infinitivo sem sujeito......................................... 156
7.7 Orações subjetivas introduzidas por elemento interrogativo..................................... 158
7.8 Voz ativa e voz passiva......................................................................................................161
7.9 Orações subjetivas em construções passivas................................................................ 164
12 – CRASE............................................................................................................................... 255
12.1 Entendendo a crase........................................................................................................ 256
12.2 Memorizar inúmeras regras de crase é de fato necessário?..................................... 258
12.3 Usar ou não o acento grave: últimas considerações................................................. 262
REFERÊNCIAS........................................................................................................................... 351
Sumário 11
POR UMA GRAMÁTICA
LÚCIDA E REALISTA
SÉRGIO RODRIGUES1
1
Escritor e jornalista, colunista de língua
e linguagem do jornal Folha de S.Paulo e autor
dos romances O drible e A vida futura e do almanaque
Viva a língua brasileira!, entre outros livros.
O
Brasil espera há duzentos anos por este livro. Em meio a tudo o que
faltou e ainda falta para consumar a independência plena do país,
inaugurada no plano político formal em 1822 pelo “grito do Ipiran-
ga”, a consciência de nossos direitos linguísticos é talvez a falha mais
importante no campo cultural, além de ser uma das mais evidentes no dia a dia
da população.
Em salas de aula, bancas formuladoras de vestibulares e concursos públicos, de-
partamentos de revisão editorial e consultórios gramaticais da imprensa tradicio-
nal e da internet, continua a se perpetuar minuto a minuto, pronome por pro-
nome, regência por regência, o espectro de uma língua portuguesa carrancuda,
hostil, mesquinha.
Essa língua é cheia de pegadinhas e pontos de decoreba, regras arbitrárias e visão
estreita. “A mais difícil do mundo”, como muitos acreditam. A verdade é que ela
passa muito longe disso, mas, sendo eternamente estrangeira — o oposto de ma-
terna —, está sempre à espera de nossos tropeços inevitáveis, falantes de segunda
linha que supostamente somos.
Idealizada e irreal, com suas suíças e sua casaca, a língua de nossos manuais
escolares já era conservadora no século XIX e hoje só pode ser entendida como
piada. Uma piada sinistra e nada engraçada, como tantos fantasmas do atraso
nacional que vagam por aí. E bota atraso nisso. O escritor Mário de Andrade já
denunciava há cerca de um século essa “língua oficial emprestada e que não re-
presenta nem a psicologia, nem as tendências, nem a índole, nem as necessidades,
nem os ideais do simulacro de povo que se chama o povo brasileiro”.
Não, claro que a gramática de Vieira e Faraco não é a primeira a se debruçar
sobre a língua majoritária que se fala e se escreve no Brasil da vida real, isto é, a
língua brasileira — ou portuguesa brasileira, conforme a preferência do freguês,
embora o nome não importe tanto. O que se encontra nestas páginas é uma es-
pécie de súmula, síntese do saber acumulado ao longo de décadas em estudos sis-
temáticos, no campo da linguística, da sociolinguística e da gramática normativa
séria, sobre um idioma estruturalmente diferente do português europeu.
Trata-se de organizar algo que tais estudos, ora mais interessados em descrever
do que em prescrever, ora mais dedicados ao detalhe do que ao todo, costumam
deixar de lado: a fixação das linhas gerais de uma norma-padrão condizente com
a língua que os brasileiros de alta escolaridade praticam em textos formais, mo-
nitorados, sobretudo na imprensa e na academia.
Eis o que, paradoxalmente, torna esta gramática revolucionária: o fato de apre-
sentar, numa linguagem serena que se poderia chamar de conservadora, voltada
para o ensino, uma normatividade lúcida e realista. Seus quatro guias normativos
1
Espelho do HGEL no Diretório dos Grupos de Pesquisa no Brasil (Lattes/CNPq): https://bit.ly/2GoleXa.
Perfil do HGEL no Instagram: @hgel.ufpb.
Em que se fundamenta, para que serve e sobre o que versa esta Gramática? 19
Apesar disso, não se pode abrir mão de uma referência padronizadora porque a
norma-padrão é um construto sócio-histórico incontornável aos povos de cultura
escrita e parte das tradições discursivas que caracterizam as práticas monitoradas
de escrita. Desse modo, nosso desafio no Brasil é avançar no sentido de legitimar
um padrão conceitualmente entendido e concretamente instrumentalizado como
a gramática de referência da modalidade escrita formal do português brasileiro
contemporâneo.
É urgente, pois, o combate à subserviência a uma norma gramatical obsoleta,
incompreensível e inatingível, infelizmente ainda observada em muitos instru-
mentos linguísticos, pedagógicos e avaliativos produzidos no Brasil do século 21.
Nesse sentido, a Gramática do português brasileiro escrito fomenta o delineamento
de uma norma-padrão mais condizente com nossa realidade linguística contem-
porânea, isto é, de uma norma de referência efetivamente brasileira. Afinal, se
essa norma, por ser baliza da escrita formal, não equivale exatamente às diferen-
tes variedades orais dos brasileiros (mesmo daqueles escolarizados), também não
deve refletir uma norma idealizada e anacrônica, ancorada na literatura de língua
portuguesa dos séculos 16 a 19.
Em que se fundamenta, para que serve e sobre o que versa esta Gramática? 21
5. UMA GRAMÁTICA PODE SERVIR DE BASE PARA O DESENVOLVIMENTO
DA CONSCIÊNCIA SINTÁTICA PARA A ESCRITA FORMAL
A gramática da fala espontânea é aprendida naturalmente logo nos primeiros anos
de vida, em meio às múltiplas atividades de interação social. Posteriormente, o fa-
lante, ao adquirir familiaridade com gêneros típicos de situações orais de caráter
formal, agrega, pela própria vivência, modos de dizer específicos dessas situações,
sem a necessidade de estudo sistemático. Já o domínio da gramática da escrita, so-
bretudo formal, costuma requerer práticas deliberadas de aprendizagem, dentre as
quais se destaca o estudo sistemático da multiplicidade das estruturas dos períodos
que constituem um texto do ponto de vista de sua gramática interna.
Um texto é, obviamente, mais que apenas a soma de seus períodos. Assim, a escri-
ta de um bom texto requer mais do que a capacidade de construir períodos bem
formados de acordo com a sintaxe da norma-padrão brasileira. No entanto, um
bom texto também decorre da habilidade do escritor em elaborar esses períodos e
articulá-los adequadamente entre si. Os períodos de um texto escrito apresentam
fronteiras muito bem definidas, assim como uma organização estrutural particu-
lar que precisa ser compreendida por quem escreve. Podemos denominar essa
compreensão das fronteiras e da estrutura dos períodos de consciência sintática.
Ter consciência sintática é poder jogar com as possibilidades estruturais dos pe-
ríodos na construção de um texto escrito. E a Gramática do português brasileiro
escrito ajuda a ampliar a consciência sintática de quem a consulta e estuda.
Em que se fundamenta, para que serve e sobre o que versa esta Gramática? 23
nitivas quase nunca explicitados e exercitados na gramaticografia tradicional — é
fundamental às reflexões sobre a estrutura sintática do período.
Em que se fundamenta, para que serve e sobre o que versa esta Gramática? 25
extenso de funções sintáticas e classificações. Só no âmbito da sintaxe do período
simples, temos sujeito simples, composto, oculto, indeterminado, inexistente; predi-
cado verbal, nominal, verbo-nominal; complemento verbal e nominal; objeto direto
e indireto; predicativo do sujeito e do objeto; aposto e vocativo; agente da passiva;
adjunto adnominal; adjunto adverbial de lugar, tempo, negação, modo, intensidade,
instrumento etc.
Uma boa alternativa a essa exuberância terminológica (e muitas vezes sem claros
propósitos pedagógicos) é a análise sintática por meio de diagramas coloridos
que representam as relações estruturais entre os constituintes SVCA de períodos
e orações:
S V C A
Sujeito Verbo Complemento verbal Adjunto adverbial
O¹ O²
V¹ C¹ S¹ A² S² V² C²
, em as corporações
as causas também responsáveis
qualquer de tecnologias
São muitas desse quadro , mas são pela desinformação
prisma digitais e as
alarmante política.
analítico, mídias sociais
uma espécie de
no entanto, elas favorecem
enlouquecimento coletivo
uma espécie de
elas , no entanto, favorecem
enlouquecimento coletivo
uma espécie
elas favorecem , no entanto,
de enlouquecimento coletivo
uma espécie de
elas favorecem , no entanto
enlouquecimento coletivo
Oração completiva
Por a ideia de
muito homofobia fez S V C
tempo, como doença o ônus do
que recaísse sobre a vítima.
preconceito
O modelo SVCA é uma espécie de chave mestra para a análise sintática de pra-
ticamente todos os períodos, simples e complexos, da modalidade escrita formal
do português brasileiro contemporâneo. Por sua vez, os diagramas coloridos são
recursos analítico-pedagógicos que canalizam a atenção de quem escreve aos as-
pectos formais do período.
* * *
Esse conjunto de dez diretrizes teórico-metodológicas balizam, nesta Gramática
do português brasileiro escrito, o estudo do período, do arcabouço metalinguístico
que o analisa e das questões normativas que atravessam sua estruturação. Esse
estudo é planificado em dezesseis capítulos.
Os capítulos 1 e 2 desenvolvem uma discussão sobre o português brasileiro e sua
modalidade escrita formal. A argumentação dá visibilidade à nossa identidade
linguística como brasileiros e justifica as discussões e decisões normativas feitas
na gramática. Nesse sentido, as principais diferenças gramaticais entre um texto
falado e um texto escrito são abordadas, e a noção de “consciência sintática” é
discutida para mostrar a relevância do estudo da dinâmica estrutural dos períodos
no aprimoramento do domínio da escrita formal. Esses capítulos também distin-
guem os dois tipos de período (simples e complexo), revelam que a oração é um
conjunto de constituintes organizados hierarquicamente e destacam a importân-
cia da análise formal da oração para o desenvolvimento da consciência sintática.
O capítulo 3 explora os principais constituintes oracionais envolvidos na cons-
trução de períodos simples e complexos. São analisados, detalhadamente, os
constituintes do modelo analítico SVCA — sujeito, verbo, complemento verbal e
adjunto adverbial — e discutidos aspectos relativos à ordem desses constituintes
na oração, bem como seus efeitos sobre a pontuação. Também são trabalhados os
conceitos de aposto e estrutura parentética.
O capítulo 4 apresenta vários procedimentos para delimitar adequadamente os
constituintes de um período, considerando que essa segmentação é relevante à
boa formação sintática das frases verbais que escrevemos. O capítulo 5 detalha a
Em que se fundamenta, para que serve e sobre o que versa esta Gramática? 27
coordenação de orações, que é, em suas várias possibilidades, um dos processos
sintáticos fundamentais na construção de períodos complexos. Já no capítulo 6,
são analisados dois tipos de paralelismo sintático — as estruturas correlatas e
as estruturas com constituinte matriz —, ambos essenciais à produção de bons
textos escritos.
A subordinação de orações, processo sintático em que orações inteiras são encai-
xadas como constituintes de outras, é tema dos capítulos 7, 8 e 9. Caracterizam
esses capítulos tanto a simplicidade terminológica quanto o detalhamento exaus-
tivo das possibilidades estruturais envolvendo orações subordinadas subjetivas,
completivas e adverbiais — que correspondem, respectivamente, a sujeitos, com-
plementos verbais e adjuntos adverbiais de períodos complexos.
Os capítulos 10, 11 e 12 exploram a regência verbal, a regência nominal e, relacio-
nado a elas, o fenômeno sintático da crase. Nesses capítulos, é bastante relevante
a exposição de estratégias mais simples e seguras para o uso adequado do acento
grave, bem como a apresentação dos quase trezentos verbetes presentes nos guias
normativos da regência verbal e nominal na modalidade escrita formal do portu-
guês brasileiro contemporâneo.
Dá continuidade à abordagem da subordinação de orações o capítulo 13, que
explora as orações relativas restritivas e explicativas, isto é, os adjuntos adnomi-
nais e os apostos em forma de oração. Nele, também se destacam as discussões e
sistematizações normativas desenvolvidas a partir da análise do uso de pronomes
relativos em diferentes estruturas sintáticas.
Por fim, orientações normativas realistas também dão a tônica dos capítulos 14,
15 e 16, que versam sobre a concordância verbal e nominal, sobre a relação entre
transitividade verbal e pronomes oblíquos átonos e sobre a colocação pronomi-
nal. Nesses capítulos, os guias normativos da concordância verbal e da colocação
pronominal — sem purismos improdutivos, sem picuinhas gramaticais e sem um
apego a uma norma-padrão artificial e anacrônica — garantem ao consulente da
obra um domínio seguro das normas que norteiam a escrita formal contemporâ-
nea no Brasil, sendo um repositório útil para eventuais consultas.