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Índice

1. O autor e a obra ................................................................................................................................................ 5


1.1. Informações biobibliográficas ................................................................................................. 5
1.2. Principais obras publicadas ....................................................................................................... 6

2. Contextualização histórico-literária ................................................................................. 10


2.1. Situação política e social ............................................................................................................. 10
2.2. O contexto cultural ............................................................................................................................ 11

3. As temáticas estruturantes ........................................................................................................... 13


3.1. Representação da cidade e dos tipos sociais ....................................................... 13
3.2. Deambulação e imaginação: o observador acidental ............................... 19
3.3. Perceção sensorial e transfiguração poética do real ................................... 20
3.4 O imaginário épico (em “O Sentimento dum Ocidental”) ................. 22

4. Os poemas em análise ......................................................................................................................... 24


4.1. “O Sentimento dum Ocidental” .......................................................................................... 24
4.2. “Num Bairro Moderno” .............................................................................................................. 29
4.3. “Cristalizações” ...................................................................................................................................... 32
4.4. “De Tarde” .................................................................................................................................................... 33
4.5. “De Verão” ................................................................................................................................................... 35
4.6. “A Débil” ........................................................................................................................................................ 37

5. Linguagem, estilo e estrutura ................................................................................................... 39


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5.1 Estrofe, metro e rima ....................................................................................................................... 39


5.2. Recursos expressivos ....................................................................................................................... 42

6. Avaliação ................................................................................................................................................................. 48

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Coleção Resumos – Poemas de Cesário Verde

2. Contextualização histórico-literária

2.1. Situação política e social


Do ponto de vista político-social, a época em que Cesário Verde viveu,

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a segunda metade do século XIX, é marcada por vários acontecimentos:
• rápido aumento populacional das cidades provocado pelo êxodo rural;
• bipolarização do país visível no contraste entre o desenvolvimento das
cidades e o atraso do campo;
• nascimento do proletariado urbano, com operários da indústria, da
construção civil (o mais importante e numeroso setor obreiro), dos
transportes, calafates, tanoeiros.
• falta de organismos de proteção social, quer a nível da saúde (a tuber-
culose atinge vastas camadas da população), quer a nível das situações
de desemprego;
• contraste acentuado entre ricos e pobres, entre governantes e governados;
• desenvolvimento contraditório e desumanizado da cidade (os candeei-
ros a gás e a eletricidade, a água canalizada a par das ruas de terra
batida, malcheirosas e escuras, a falta de higiene e uma precária saúde
pública);
• fomento agrícola;
• expansão do setor terciário, pelo desenvolvimento industrial e comercial;
• facilitação na comercialização dos produtos;
• crescente desenvolvimento dos transportes e vias de comunicação;
• aumento do consumo, do luxo e das classes trabalhadoras;
• aparecimento dos bairros burgueses e dos subúrbios populares;
• 
nascimento e propagação da causa republicana e dos movimentos
operários de inspiração socialista, consequência do clima de descon-
tentamento político-social que dominava o país;
• despertar do anticlericalismo.

[…] o tempo histórico de Cesário Verde é o momento privilegiado de vi-


vência coletiva de tensões sociais, fruto de conflitos mais ou menos paten-
tes, como o que opõe a modernização da indústria a um persistente conser-
vadorismo económico; o que confronta modos de vida urbanos e
cosmopolitas com modos de vida rurais e provincianos; e de um modo
geral, tudo o que estabelece o contraste entre o que é artificial com o que é
natural. […]

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2. Contextualização histórico-literária

No contexto do conflito entre o artificial e o natural, assume um signi-


ficado especial a anulação da escuridão noturna por processos de ilumina-
ção cada vez mais aperfeiçoados. Prolongando a luz natural do dia (ou
ampliando a luz natural da lua) por meio de processos artificiais relativa-
mente eficientes (o gás, depois a eletricidade), essa superação da noite não
é inconsequente: ela atribuirá um perfil diferente às coisas vistas, também
ele com alguma coisa de artificial, fonte e origem de uma nova relação do
sujeito com a realidade que o circunda. […]
Não é ainda o tempo da “dolorosa luz das lâmpadas elétricas da
fábrica”, como dirá Álvaro de Campos, mas para lá se caminha, porque a
sociedade vai mudando e, com essa mudança, o sujeito interroga-se sobre o
seu lugar e dimensão nessa sociedade. Essas interrogações passam não
raro pela via de diferentes (por vezes antagónicas) questionações ideológi-
cas. O tempo de Cesário é o tempo em que começam a multiplicar-se os
“ismos” que no fim do século […] hão de cruzar-se de forma quase patética.
As grandes orientações que atravessam a Geração de 70 – positivismo,
socialismo proudhoniano –, orientações nem sempre convergentes ou har-
moniosamente congraçadas, tentam ser a alternativa para a apatia ideoló-
gico-social em que estagnará a Regeneração fontista, ao que hão de suce-
der-se propostas tradicionalistas como o neogarrettismo; tudo isto a par da
crescente divulgação do ideário republicano, por vezes aproveitando habil-
mente eventos como o tricentenário de Camões (em 1880) ou, já depois da
morte de Cesário, o Ultimato.
Carlos Reis, “Cesário Verde: Realismo e criação poética”,
História da Literatura Portuguesa – o Realismo e o Naturalismo, vol. 5,
Lisboa, Alfa, 2001, pp. 412-413

2.2. O contexto cultural


Do ponto de vista cultural e estético-literário, esta segunda metade
do século XIX é dominada pelo:
• analfabetismo da população superior a 80%;
• gosto da burguesia por uma poesia sentimentalista e grandiloquente;
• papel preponderante da Geração de 70, em especial de Antero de Quen-
tal, revelando já uma faceta de empenhamento social;
• relevo do Realismo e posterior evolução para o Naturalismo no ro-
mance, em particular o de Eça de Queirós;
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• surgimento da técnica impressionista da apreensão do real, quer na li-


teratura quer na pintura;
• aparecimento do quotidiano e das questões sociais na criação artística
(literatura e pintura).

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Coleção Resumos – Poemas de Cesário Verde

3.3. Perceção sensorial e transfiguração poética do real

Lavo, refresco, limpo os meus sentidos.


E tangem-me, excitados, sacudidos,
O tato, a vista, o ouvido, o gosto, o olfato!
“Cristalizações” [p. 37]

Inerente à dimensão pictórica, impressionista, da poesia de Cesário

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está, evidentemente, o seu carácter sensorial resultante das sensações
que a realidade exterior suscita no sujeito poético, que são veiculadas
através dos vários sentidos:

• o olfato:
Um cheiro salutar e honesto ao pão no forno.
“O Sentimento dum Ocidental” [p. 55]

• a visão:
– a luminosidade
A espaços, iluminam-se os andares,
E as tascas, os cafés, as tendas, os estancos
Alastram em lençol os seus reflexos brancos;
[…]
Mas tudo cansa! Apagam-se nas frentes
Os candelabros, como estrelas, pouco a pouco;
“O Sentimento dum Ocidental” [pp. 52-57]

Uma iluminação a azeite de purgueira,


De noite, amarelava os prédios macilentos.
“Nós” [p. 69]

– a cor
E abre-se-lhe o algodão azul da meia,
[…]
E pendurando os seus bracinhos brancos.
“Num Bairro Moderno” [p. 29]

• o paladar:
Ó minha loura e doce como um bolo!
“Em Petiz” [p. 64]

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3. As temáticas estruturantes

• a audição:
Entretanto, não há maior prazer
Do que, na placidez das duas horas,
Ouvir e ver, entre o chiar das noras,
No largo tanque as bicas a correr!
“Nós” [p. 73]

E o ferro e a pedra – que união sonora! –


Retinem alto pelo espaço fora,
Com choques rijos, ásperos, cantantes.
“Cristalizações” [p. 36]

• o tato:
Roçavam no veludo as guarnições das rendas;
“Humilhações” [p. 16]

Mas a poesia de Cesário Verde não contém apenas uma descrição ob-
jetiva da realidade. Na verdade, essa realidade, que o sujeito poético des-
creve minuciosamente, dá lugar à imaginação, que transfigura o real. A
realidade captada pelos sentidos, observada e descrita em pormenor, é
transformada noutras formas ou visões por meio da imaginação do
poeta. Ele vê uma coisa e imagina nela outra realidade.
Esta transfiguração do real permite ao sujeito poético a fuga, a evasão
de uma realidade exterior que oprime, que faz sofrer.
Vamos observar alguns exemplos:
• o sujeito poético, num dado bairro da cidade, observa e descreve uma
pequena hortaliceira que carrega um cesto de fruta pesado – os frutos
dão lugar à visão de um corpo humano (“Há colos, ombros, bocas, um sem-
blante / Nas posições de certos frutos. […] Surge um melão, que me lembrou
um ventre.” – “Num Bairro Moderno”, p. 31);
• ao deambular pelo cais da cidade, o sujeito poético observa os edifícios
e as pessoas mas tem a impressão de ver imagens do passado e ima-
gina nesse cais outras visões (“Luta Camões no Sul, salvando um livro a
nado! / Singram soberbas naus que eu não verei jamais!” – “O Sentimento
dum Ocidental”, p. 49);
• ao observar “árvores despidas”, realidade que descreve, o sujeito poético
imagina nelas “Mastros, enxárcias, vergas!”, isto é, objetos que fazem parte
dos barcos construídos com a madeira das árvores (“Cristalizações”, p. 36).
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De facto, constatamos na poesia de Cesário Verde um modo especial


de ver a realidade que cede lugar ao subjetivismo de um sujeito poético
que sabe poetizar a realidade concreta.

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