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Introdução
O tema desta aula não é apenas “histórico” mas vital e existencial. Tem a ver
não apenas com um objeto de estudo da Primeira Modernidade mas com a minha
própria vida e, do meu ponto de vista, daquilo que o ser humano tem de melhor e está
opinião que é só sua e que, por isso mesmo, precisa de ser contrastada
Vamos começar por aí. O que se queria dizer quando se dizia que o homem era
um ser racional?
percebido, mas como é que é preciso pensar para perceber o mundo da maneira em
século XVIII em que a Igreja católica tomou posições mais rígidas com relação ao
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Probabilismo.
Vou começar por exemplos corriqueiros para situar o problema. Quando se fala
absoluta? A verdade não existe. Cada um tem a sua própria verdade. Verdade é o que
Vou continuar dando exemplos: uma coisa é afirmar que isto é um cavalo ou
uma árvore, outra é afirmar que o Brasil é o melhor país do mundo. Uma coisa é dizer
que eu sou o Rafael e outra dizer que eu sou um bom ou mau professor. Uma coisa é
dizer que o homem é um ser que morre e outra é dizer que o homem é alguém
movido só pelo egoísmo ou pelo instinto sexual. Uma coisa é dizer que o Brasil foi
descoberto pelo Cabral e outra é dizer que foi descoberto para ser explorado
econômicamente. Uma coisa é dizer que meu carro foi batido pelo seu e outra dizer
O que estou querendo dizer com todos esses exemplos? tentem juntá-los agora
com verdade absoluta/relativa: tem sentido falar que a verdade é absoluta? será que
nesses exemplos cabe isso? tem sentido falar que a verdade é relativa? tem sentido
isso? por exemplo: foi você o culpado da batida do carro? é uma verdade absoluta ou
circunstâncias e das coisas sobre as que se fala. E se fica falando sobre uma
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abstração: a verdade, sem nenhuma referência à frase que foi afirmada nem à coisa
sobre a que se está falando. E assim fica muito difícil entender-se. Quando alguém
querendo dizer?
coisas sobre as quais se pode ter conhecimento razoável ou provável. Há coisas sobre
as que se pode ter conhecimento incerto. E há muitas coisas sobre as que não temos
conhecimento.
discurso científico e discurso retórico ou político ou moral). É sobre tudo isto que
século XVII.
Aristóteles percebeu que havia uma relação entre o mundo do ser e o mundo do
conhecer. Antes dele isso já tinha sido percebido, mas ele conseguiu explicá-lo
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Que há coisas parece que é um dado evidente, a questão se coloca quando me
1º a gente vê que existem coisas, que elas mudam, e que mesmo assim
continuam sendo as mesmas só que com algumas mudanças. Isso que não muda foi
2º até aí já se tinha dado um bom passo. A realidade é fluida, muda, porém não
tudo, tem algo na realidade de cada ser que permanece. Uma rosa é uma rosa, mesmo
que com cores diferentes, cheiro mais forte, independente de ser uma ou um buquê,
Mas a grande descoberta de Aristóteles foi que para cada coisa havia uma
Adjetivo. Número. Pronome. Verbo ativo. Verbo passivo. Advérbio de lugar, de modo
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conhecê-las e 3º que podemos falar delas. E, mais ainda, que tudo isso está
É por isso que deveríamos ter pelo menos duas formas de conhecer: uma que
permita conhecer a substância, aquilo que não muda e que permanece igual, e outra
de Física sobre o qual se pode ter (ou não) um conhecimento certo. Para esse tipo de
sociais, por exemplo, sobre o qual não temos um conhecimento certo, mas incerto.
conhecimento foi criado o nome de Política e de Retórica. Tem também outro mundo
de coisas que é o formado pelas ações humanas, aí, se olhamos apenas para a
realização do ato, temos a técnica, que normalmente tem um conhecimento certo, mas
temos também a arte, que é incerto, e temos também a possibilidade de olhar para o
que se passa conosco quando agimos e temos, então, a Ética, que tem tanto
conhecimentos certos como incertos e que trata não do fazer, mas de como fazer, qual
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verdade absoluta ou relativa? A resposta seria: depende do que se esteja falando
Vou dar um exemplo moral: faz o bem e evita o mal. É absoluto. Mas que tipo
Depois de tudo isto, parece-me que fica mais claro que há uma relação
dizer isto é objetivo, a não ser que se esteja querendo dizer algo como isto é
verdadeiro, ou isto tem de ser aceitado por todo o mundo porque é assim....
que se pode falar de “verdade”? Vamos precisar avançar um pouco mais nos gregos.
Características da coisa
Pensem em qualquer coisa existente, por exemplo, uma fruta, um ser humano,
qualquer coisa que existir, que se podem dizer de todas elas. São características
especial, mas, ao contrário, podem ser “predicadas” de qualquer coisa: que é una, que
é verdadeira, que é boa e que é bela. Aqui acaba de surgir a palavra verdadeira como
A primeira coisa que os gregos perceberam é que se uma coisa existe ela é
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verdadeira. Ela é o que ela é. Uma rosa é uma rosa. Um homem é um homem. Um
dólar falso é um dólar falso. Se não tivermos isto em conta, e não percebermos que
este dólar é falso, então vamos nos dar muito mal, porque ele é falso,
O que se tira daqui? tira-se que a primeira resposta que se pode dar a quem
Podemos achar que um aspargo é uma chave, mas não vamos abrir nenhuma porta
com ele. Podemos montar um modelo ótimo de vida, podemos ter um plano ótimo de
Só que o fato de saber que a coisa é verdadeiramente a coisa não nos resolve
A questão do conhecimento
Quando o sujeito conhece a coisa, a mente concebe a coisa, por meio do concebido
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nome, por meio do qual possamos reconhecer a coisa e comunicar-nos. Esse processo
Se o sujeito conhece a coisa por meio do conceito, então, se pode dizer que a
coisa verdadeira está na minha cabeça. Vamos ver como S. Tomás, a partir de
Da mesma forma que a vontade tende para o que é bom, ou seja para a bondade
da coisa (a coisa é boa e é por isso que nossa vontade tende para ela), a inteligência
formas: Santo Agostinho e a sua tradição diziam que a verdade é aquilo com o que
fica descoberto o que a coisa é. Ou, então, verdadeiro é o ser que se desvela, que fica
em evidência. Nessa mesma linha, Avicena, para falar de outra tradição, dizia que a
verdade de uma coisa é a propriedade do ser que está inerente nela. Como se vê,
S. Tomás vai dar uma definição que coloca o foco na inteligência: verdade é a
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definição agostiniana fala em desvelamento. A palavra grega para “verdade” era
alétheia. Está relacionada com o verbo lanthanó, que significa “ocultar, esconder,
No pensamento grego, as coisas não são apenas o que parecem, elas têm uma
vemos logo de cara são as aparências, os acidentes, mas isso que vemos não é
neste sentido, é uma epifania. A epifania daquilo que é. Nesse sentido, os gregos ao
falar da verdade se referiam em primeiro lugar àquilo que a coisa era mesmo, e, em
segundo lugar, àquilo que se podia dizer dela, logos (lembrem daquela relação que
Aristóteles fez entre o que a coisa é e o que se pode dizer dela). Dessa forma, o logos,
ou seja, a palavra, o que se diz da coisa, é precisamente o que nos permite ver a
ver, isto tem enorme importância para a tradição cristã. Tudo foi feito pelo Logos. As
enganoso. Sua origem é o verbo pseudomai que significa esconder, ocultar, dizer uma
falsidade.
Na tradição hebraica, o termo que designa verdade era emet, que estava
relacionado com duas outras palavras bem conhecidas: emunah, que significa fé, e
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amém, que exprime a solidez ou firmeza de algo inquebrantável nas coisas ou nas
palavras (podemos traduzi-lo como é isso mesmo. ou como assim seja. Tem, portanto,
dois sentidos, um de presente e outro de futuro. Por isso que no Sinai, uma vez dada a
Essa tradição relaciona verdadeiro ou verdade com justo, correto. Está mais
âmbito mais pessoal do que material. Uma coisa verdadeira é aquela na qual eu posso
histórica à verdade: a verdade enquanto aletheia é algo que já está dado e que precisa
ser desvelado; a verdade enquanto emet e´algo que precisa ser vivido, mantido,
realizado.
Por que isto é importante? porque o mundo ocidental adentrou pela discussão
implicava o ser humano como um todo, podia ser apenas a sua mente.
fidelidade e isso tem uma implicação completa do ser humano e, mais ainda, uma
tenhamos a verdade, é ela quem nos tem. Daí que se possa entender agora melhor o
que pode significar duas frases de Cristo sobre a Verdade: Eu sou o caminho, a
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A questão da certeza
questão sobre a verdade muda de lugar. A questão que interessará será: me prova que
que esteja demonstrada. Ora, em tempos de Descartes isto era fácil a partir do
momento em que se aceitava que o único tipo de conhecimento era o científico. Por
que? porque era o único demonstrável. Daí que as ciências exatas e as empíricas, por
Acontece que, como já disse Sto Tomás (II, IIae, q. 70, art. 2) , lembrando
temas, porque a certeza demonstrativa não podia ser nem exigida nem esperada em
que era a que podia ser obtida nas coisas contingentes e mutáveis. Que coisas?
Aquelas que se davam circunstanciadamente. Ou seja, quase todas. Por quê? Porque a
Em termos concretos: Não existe isso que se chama de Justiça, a não ser no
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mundo conceitual. O que existe de verdade são atos, fatos, homens, coisas mais ou
Será aqui que surgirá o sentido daquelas questões iniciais. O que se está
objetiva, porque todo o mundo tem que aceitar. Porém, se for apenas uma opinião,
Não há muita dificuldade em aceitar que isto é uma cadeira, ou que dois mais
dois é igual a quatro. Aceita-se que seja algo objetivo, porque se não, o que se
verifica é que a pessoa é burra. Contudo, já é mais difícil de se aceitar que todos os
homens são livres, ou que o homem pode falar com Deus, ou que a virtude seja
necessária para ser feliz. Em todas essas questões não há demonstração possível, só
só uma opinião.
podem ser demonstradas. Ao saber que trata sobre isso se dá o nome de ciência.
Tem coisas, muitíssimas, que não podem ser demonstradas. Ao saber que trata
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ciência age por demonstração, a opinião por argumentação. Não é por ser opinião
atinge a verdade possível para aquele tipo de questão. Normalmente são questões
relativas a juízos e não a coisas. Não discutimos se isto é ou não uma pedra, mas se
posso ou não usar pedras contra a casa do vizinho. Todo o mundo aceita que isto é
um celular, mas não é todo o mundo que aceita que usar celular na direção causa
acidentes.
Voltando a Aristóteles, nos Tópicos, ele dizia que há principalmente dois tipos
aquelas coisas nas quais acreditamos em virtude de nenhuma outra coisa que não
sejam elas próprias, por exemplo, os princípios da ciência. São opiniões geralmente
aceitas aquelas que todo o mundo admite, ou a maioria das pessoas ou os sábios e
notáveis.
É por isso que a forma mais comum de se chegar à verdade de muitas coisas
onde se tenta ver se as coisas são ou não assim, havendo argumentos convincentes a
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favor de ambos pontos de vista.
E há pontos sobre os quais não temos mesmo nenhum argumento, por ser o
argumentar porque um homem que não sabe se devemos ou não honrar os deuses e
amar nossos pais necessitam de castigo, não de argumentaação, da mesma forma que
quem não sabe que a neve é branca necessita de percepção (Tópicos, 105a).
A questão da argumentação
preciso saber também de quem é esse argumento. Se eu quero saber o que é melhor
para cuidar do câncer, não é bom trabalhar com a opinião argumentada da Xuxa ou
do Jô Soares.
passa a ter uma autoridade enorme. Mas isso é uma das doenças dos tempos
modernos. O normal seria que para ter um conhecimento razoável sobre qualquer
vista.
autoridade vem não do muito saber, mas do muito ter vivido. Principalmente em tudo
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o que se relaciona com questões práticas do relacionamento humano.
Diferentes pontos de vista: qualquer tema pode ser analisado a partir de muitos
pontos de vista. E, em geral, é difícil encontrar alguém que consiga ver o assunto de
Normalmente, cada um consegue ver a partir do seu próprio ponto de vista, que
conhecimento se processa.
Para que haja diálogo é preciso haver um elemento prévio: humildade. Ter a
consciência de que o meu próprio ponto de vista pode estar enganado; ou pode estar
certo, mas não totalmente; ou pode estar totalmente certo, mas não é para aplicar
agora ou com esta pessoa. Ou seja, é preciso aceitar que temos de toda a realidade
Por isso há necessidade da conversa, que tem como origem a conversão. É por
meio de uma conversa dialógica sobre os mais distintos pontos de vista que se pode
conversão hoje ganhou outro sentido, tem a ver com imposição do próprio ponto de
vista, mas na origem, das muitas opiniões, das muitas versões, o processo dialógico
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prováveis e razoáveis.
Essa é uma das formas mais corriqueiras do ser humano chegar à verdade.
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