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C ~ l k t oS~EomãoFilho

A SBGPEDAEPE LJVIePS$SQAL
O Calixto Salomão Filho

O mbrito de uma tese acadêmica deve aferir-se pela conjuga-


Direitos reservados desta edição por ção de vários elementos: l) a pesquisa realizada; 2) a estruture ex-
MALHEIROS EDITORES LTDA. positiva; 3) a clareza e precisão do rctciochio; 4) a csotribuição do
Riia Paes de Araújo, 29, conjunto 171 autor ao progresso da ciéncia ou da kcnica, em cujo campo se intse-
CEP 04531-940 -- São Paulo - SP re o trabalho acadêmico.
Td., (011) 822-9205 - Fcix: (01 1) 829-2495 Em relação ao primeiro t: ao quarto desses elementos de aferi-
ção do valor de uma tese, o autor cumpriu mui satisfatoria~lente
as conhecidas recomendações de CESARE VIVANTS,, no prefácio B
5 edição do seu T m t ~ z e di Diritto Commerciaile f 19291, a saber:
"Agli siudenii e agli siudiosi - ie due paraie no-: sono srmpre
sinoriime - che spesso me chiedono consigli e temi per fe iria0 dis-
serfazioni, io non passo daie per guida c k i1 metodo $ E me 3eguitc.
No3 si awenturino mi in alcuna trattazione ghridica se naxr co-
nososso a fmdo lia struttura lecniea e ia funzione wonomica deU'Iç -
tituto cfie è I'oggeeto dei lora studi. (..,) È una sledtà scieetifisã,
è un dífetto di probità pariare di un istituto pes fissarne la disciplina
Fotocomposição giuridica scnzza corioscrrio a fando andk sua realtj. C.. .) No11 si co-
Helvéitica Editorial Ltda. ~nincla scriuere se non quando ai è rico~postotzatfo Ifargornertto
xleflia proyria mente, secondo fe rrtecessiea logícke de1 suo rinnovat:,
comenulo, e nello s-criveresi gidi come punto di partenza 1'1Jtirna
i stndiosi pieedenti (...). SYncominci dovc
paroia cui sono g i ~ n rgti
i preçeaenti scrittori hanno firnito, perchf le ripetbioni C O S ~ ~ ~ U ~ ~ C O -
na !I più penoso isgarnbr~che I'íncontfi suga via degli studi giuri-
e rtun si deve accrescet'ne la mole yih enorme",
Impresso no Brasil
Printed in Brazil
03-1995 * O pn%Me preficiii i: reprsducã2 â c t o d d a do pareceF emitido pelo Prof
F. K . Comparato sobre a rzsc fent sua versão itaiiana), no prmesc de reconheci-
rrievto dri &tiici de dn~toradoestrangeii:, perante a Universidade dr SSio Paulo.
4 1
A SOCIEDADB UNIPESSOAL

O autor realizou criteriosa quisa de direito comparado e não


hesitou em sair do campo ente dogmático para perquirir as
funções exercidas pela na economia hodierna.
O estudo do Dr. CALIXTO S~LOMÃO FILHOrepresenta valiosa
contribuição ao progresso do dire/o comercial, numa matéria que,
desde a tese de cátedra do Professor SYLVIO MARCONDES MACHA-
DO, Limitação da Responsubili ade do Comerciante hdividuai
(1956), niio teve entre nós um t%tarnento tào amplo e profundo.
Quanto a estrutura expositivd e à clareza e precisão do raciocí-
nio - qualidades da maior importkncia para um aspirante a docen-
te - o trabalho examinado pareke-me irreprochável.
Oxalá tivéssemos sempre, e 4 nossa &caldade, teses de livre- 1- A sociedade unipessoal nu fronteiru do EBireEl'~I($ocier6frio
docência -e até de titu1aridade - tâo solidamente construidas quan-
to esta tese de doutoramento. 1. Introduçâo ......................................................
2. Propriedade e controle .................................... i 2
São / ~ a u f o I8
, de fevereiro de 1993. 3. Sociedade unipessoai e empresa.. .......................... 1 4
I 3.1 0. problema da limitação de responsabilidade do c:)-
i F A B IKowu~a
~ COMPARATO rnerciante indiuiduaf: origem da discussáa ama! . 15
3.1.1 A teoria fíccionista ............................. 15
3.1 *2As teorias do patíimônio de aferaqão . . . . . . I8
3.1.3 A concepção de (iierke ........................ 20
3.1.4 Relatividade histórica e vakr atual da dist t i i,

S%Q .............................................. 7"


:4
3.2 O problema da limitação de responsabilidade d o
merciante individuai em sua forma atual ..... ?6
3.2.1 A separação patrimonial d~ comercianrc
dividual: colocação do probiema ......... 3 )
3.2.2 Formas de limitaç2io de responsabilidade 1

comerciante individual.. ...................


a) As críticas a fórmula societdria . ,.. , .
b) As tentativas de construção en! forrna i,
societária.. ..................................
C)ConcIusão: sociedade unipessod ,4ersuSi
presa individual ........................ i

3.2.3 A limitação de responsabilidade do com


te individual no Brasil ......................
a) Patrimônio separado ....................
b) Sociedade unipessoal ................... >.
c) Conclusão.. ..................................
4. Contratuali~moversas instituciondis~ric, ............... ' 4
4.5 A teoria institucionalista... ......... ... . . + . S4 .

4.2 O contratualismo ...................................... >O


4.3 Efeitos das diversas teorias sobre o conceito de in- d) A teoria dos centros de imputação ..... 127
teresse social..,. ........................................... 53 e) Resultados aplicativos: a casuística
4.4 A situação no Brasil: entre contratualismo e ínsti- e. 1) Desconsideração atributivâ .......... 130
tucionalismo .............................................. 54 e.2) Desconsideração para fins de res-
5. A teoria do cantrato-organização ......................... 57 ponsabilidade .......................... 131
6. Efeitos aplicativos: sociedade unipessoal e sociedade e.3) Desconsideração em sentido inverso I33
sem sócio ........................................................ 61 e.4) Desconsideração em benefício do
I1 - A sociedade unipessoal singular: forma organiurtiva da sócio.. .....................................I36
3.3.2 Interpretação e aplicação da teoria da des-
pequena e média empresa consideração no BrasiI ........................ I38
3.3.3 k desconsideração da personalidade jurídica
I. Premissa: escopo econômico e forma jurídica ........ 67 como problema e como método ............. 144
1.1 Sociedade unipessoal singular e sociedade unipes-
3.3.4 Os "custos" da desconsideração ............ 1511
soa1 de grupo., ............................................
1.2 A forma societária das pequenas empresas: socie-
68 a) Responsabilidade limitada e livre mer-
cado .............................................150
dade anônima versus sociedade por quotas de res- h) Responsabilidade limitada em situação de
ponsabilidade limitada. ................................. 70 concorrência imperfeita .................... I5 I
2. A sociedade unipessoal como fattispecie ................ 74 c) Desconsideração coirio forma de redistn-
2.1 Os critkrios para apuração da unipessoalidade buição de riscos ............................. 153
2.1. E O critério nomindistico ou numerico. ...... 75 d) Recepçao Iegislativa das teorias no Brasil 154
2.1.2 O critério subjetivo ou dos centros de ativi- e) Os custos da sociedade unipessoai ...... 155
dade.. ................................................ 79 f ) Os limite. econômicos da desconsicieraçâo 156
2.2 A fattispecie sociedade unipessoal no Brasil 3.4 Organização interna
2.2.1 Sociedade unipessoal em sentido estrito.. . 84 3.4.1 Advertência i:~icial............................ 159
2.2.2 Sociedade unipessoal em sentido amplo.. .. 81 3.4.2 Pttblicidadu e teoria da aparência. .......... 159
3. A disciplina da sociedade unipessoal 3.4.3 Garantias do capital social ................... 163
3. i Formação da sociedade unipessoal .................. 89 3.4.4 Garantias organizativas da separação de
3.1.1 A fase pré-constitutiva .......................... 91 esferas ....-.........................................166
a) Sociedade irregular e sociedade de fato 9E 3.4.5 Regras organizativas internas versus regras
b) Pessoa jurídica, patrimônio separado ou externas ............................................ 169
sociedade ....................................... 95
c) Sociedade unipessoal irregular ............. 105 III - A sociedade taa@ê,rsoal como forma organizstiva dos
3.1.2 Constituição de sociedade unipessoal ....... 106 grupos
3.1.3 Constituição indireta de sociedade unipessoal 184
3.2 Disscrlução da sociedade unipessoal Direita Societário e concentração
3.2.1 Dissolução da sociedade e preservação da 1.1 O pi obiema da neutralidade do Direito Societário 142
empresa ............................................113 1.L Segie: o preço da concerztruçkio e as aplicações
3.2.2 Redução à unipessoaiidade e dissolução ... f f 5 específicas................................................. 174
3.3 Desconsideração da personalidade jurídica ....... I 18 1.3 Sociedade unipessoal e efeito concentracionista 177
3.3.1 A teoria da desconsideração i .4 O pras:~da conceníração fio Brasil ................ 180
a) Antecedentes ................................... i 19 1.4.1 O momento inicial .............................. 182
b) A teoria unitarista.. .......................... 121 1.4.1 PI. dístribui@o de poderes ..................... f 86
c) Resultados aplicativos: desconsideração e 1.4.3 O regulamento da responsabiiidade ........ 187
falência ................................e........ 124 1 - 5 A subs!'diárin intsprul .............................e....Í 88
'i
A SOCIEDAD UNIPESSOAL

i
1.6 O problema constit cional ........................... 189
2. O conceito de grupo: escopo econômico e forma
................... 190

a disciplina aplicável: comparatística ......... 1191


3.1 A sociedade

italiano.. 192 A SOCIEDADE UNTPlSSdPAE


NA FRONTEIRA DO DIREITO SOCIETAMO

........ 199
....... . .... 202
................... 207 1. Introdução
3.3 Efeitos das diversas teorias na organização dos
grupos .................................................. 208 O presente trabalho trata de um tema limítrofe no Direito So-
3.4 Efeitos das diversas tiorias sobre os interessei dos cietário, Situada conceirualmente entre as noções de sociedade e de
credores ...............i.. ................................. 21 1 empresa, ponto central de controvérsia na polêmica clássica entre
3.5 Conclusão ..............I...........................r.,.....2 13 contratualismo e institucionalismo, a sociedade unipessoal viu-se
4. O sistema brasileiro ............................ . ......... 215 sempre envolta em preconceitos e mitos que impediam que se fizes-
4.1 Os Órgãos da subsidikria integral e sua atuação se uma pesquisa te6rica séria e objetiva sobre o assunto. Até pouco
4.1.1 Conselho Físca ............................ .... 2 17
t
4.1.2 brgãos aáminiqtrativos ........................ 221
,
.
tempo atrás, a sociedade unipessoal era tratada como uma curiosi-
dade teórica, sem reconhecimento positivo. Como única exceção
4.1.3 Assembléia gerAl .................................223 citava-se a experiência ernblemática do Anstalt do Lichtenstein, cuja
4.2 A proteção dos fama de paraíso fiscal contribuía para criar uma forte sensação de
............................. 225 fraude quando se faiava de sociedade unipessoal com responsabili-
................... .
... .. 228 dade limitada.
I Na América Latina essa desconfiança se mantkrn. Poucas são
IV - Considerações conclusivas..;..................................232 as legislações que a reconhecem. Os poucos ordenamexltos em que
se reconhece a limitação de responsabilidade do comerciante indivi-
dud optam pela fórmula não-societária, da empresa individual com
responsabilidade limitada.
Bibliografia
i
................................................................23 5
I Dentre os países que compõem o Mercosul, o Brasil é o único
que reconhece expressamente as sociedades unipessoais (e mesmo
assim, como se verá, no limitado âmbito dos grupos de fato), Na
Argentina, o Projeto de Unificação da Legislação Civil e Comercial
propôs a introdução da sociedade unipessaaf tanto para a socieáa-
de por quotas de responsabilidade limitada como para a sociedade
anônima.' 8 projeto foi aprovado na Câmara dos Deputados e ris

1. Cfr. art. I do Anexo I1 do referido projeto; v., a respeito, D. Moçremans,


"Recepción de Ia sociedad unípersonal de responsabilidad limitada en e1 prayecto
-
de unificación civil y comercial en la Argentina Proteccián de 10s acreedores",
rn RDCO 1990 (a), p. 180.
10 A SOCIEDADE UNIPESSOAL

Senado, mas vetado pelo Presidente da Repúbli~a.~ Mantém-se, zou o reco~hecimentoda sociedade unipessoal com responsabilida-
portanto, a regra anterior, que não admitia a constituição unipes- de 1irnitadí1lno ambiente europeu. Reconhecimento que já se vinha
soaí e previa a dissoIução em três meses da sociedade reduzida a um impondo na Eurc~paantes da ckretiça. Ccm efeito, a Alemanha,12a
sócio, período durante o qual a responsabilidade daquele remanes- França,13a Bélgica,'4 a Holandat5 e a Dinamarca16já reconheciam
cente é ilimita~la.~ expressamente a sociedade unipessoal com responsabilidade limita-
No Paraguai, a lei do comerciante de 19834 prevê a possibili- da antes da t3iistPncia da diretiva. A diretiva, com a uniformização
dade de limitação de responsabilidade do comerciante individual da disciplina da sociedade unipessoal e a imposição do reconhecimento
jarts. 15-25). A forma é, no entanto, não-s~cietária,~ motivo pelo aos países que ainda não o faziam,17constitui mais um instrumento
qual permaneceu em vigor após a promulgação do novo Código Ci- de incentivo 3. pequena e média empresa, inserindo-se no programa
vil. Esse último, que unifica a legislação civil e c ~ m e r c i a lrequer
,~ comunitário de c-escimento da ocupaçãc7.'*
dois sócios para a constituição da sociedade (art. 959) e prevê a sua Evidentemate, o recon11ecimento da sociedade unipessoal em
dissoIução em caso de redução a um só (art. 1.003). outros ordrmmentos não implica um juizo positivo a prisri sobre
a eficiência de tcil forma. Significa apenas ser possível e necessário
Também a nova lei de sociedades comerciais uruguaia7 requer fazer uma pesquisa destinada a individualizar os fundamentos teó-
a presença de dois sócios para a constituição da sociedade ( a t . 1:).
ricos e c o r n p a ~o funcionaniento prático dos sistemas existentes.
A redução superveniente a um obriga o remanescente a dissolver a
sociedade ou admitir novo sócio no Prazo de um ano, período no Pressuposto da análise comparatística é a individualização dos
qual responderá ilimitadamente obrigações sociais (art. problemas te4ricos que acompanham o reconhecimento de um tipo
156).~-~ limite, conro é a wciedade unipessoal com responsabilidade Iimita-
da. Cumpre anaiisar, de um lado, as aiternativas a sociedade uni-
O mesmo não ocorre na Comunidade Econômica Européia. A pessoal com responsabilidade limitada que têm sido escolhidas por
recente XII Diretiva Comunitárialo em matéria societária generali- outros ordenmentos (em especial a forma não-societária represen-
tada pela empresa individual com responsabilidade limitada) e, de
2. Cfr. G. A. Borda, "Una medida necesaria: el veto a Ia ley de unificaci6n outro, as adzptayões te6ricas requeridas pela aceitação da socieda-
de Ia legislación civil y comercial", in ElDerecho 146 (1992), p. 882, que inclui entre de unipessoal e srus respectivos reflexos ao sistema societário. Esse
a? razões que justificaram o veto presidencial a previsão no art. 34, n. 4 da possibili-
dade de existência de pessoa jurídica com um ou sem nenhum sócio, un verdadero é o objetivo do primeiro capkulo.
sirisentido j y y i c o @. 884).
3. V. arts. 1 e 98 da lei n. 19.550 (lei das sociedades) de 1972 e também as ob- 11. A referência a sociedade com respmsabrlrdade limitada é proposital, indi-
savações de D. Moeremans, "Recepción" cit., p. 179. cando tanto a scaedade anônima quznto a sociedade por quotas de responsabilida-
4. Ley de1 comerciante, de 22.11.83 in Gaceta Judíciai 1 (1983), edicidn extra. de limitada.
5. V. nesse sentido J. Moreno Rufinelli, <'La ley de1 comerciante - novedad 12. GmhH Noielle, de 4.7.80, in Bundesgesenblatt, 1980 (11.6.80), I , p. 836.
jurídica" in Gaceta Judicial 1 (1983), edición extra, p. 23. 13. Lei n. 85-69? de 11.7.85 in .fournal Officiel de Ia République Française -
6. Lei n. 1.183, de 23.12.85. -
lois et décrets juim 1985 (12.7.85), p. 7862.
7. Lei n. 16.660 de 4.9.89, publicada no Diaria Oficial de 1.11.89. 14. Lei Je 14.7.37, iri Moniteur Beige. julho 1987 (30.7.871, p. 11.461.
8. Cfr. a respeito J. A. Astray, "Las sociedades comerciales - generalidades", 15. Lei l e 16.4.36, in Staaisbfod, 1986, 11, n. 275.
in La nueva ley de saciedades - cursillo realizado en la faculdad de derecho de1 Uni- 16. Lei n. 371, de 13.6.76, in Lo~tidendeforKongeriger Danmark, 1973, A.
versiaad de ia Rrpublica en setiembre-octubre de 1989, Montevideo, Fundación de n. XXXIV, p. 13.53.
a l t u r a Universitaria, 1990, p. 11 (21j. L7, Na Itália, an ?tuação d a XII diretiva, promulgou-se recentemente o dec-
9. A respeito dos demais países latitio-americanos, v. as informações de D. Moe- leg. 88, de 3.3.93. in Gazzeta Uffiaale n. 78, de 3.4.93.
11.
remans, "Recepción", cit., p. 170. Dentre esses países, destaca-se a legislação pe- i&. Nen&o e-plicita à sociedade unipessoal é fzita na Comunicazione della 0-
ruana (dec-lei n. 21.621, de 14.9.76). O legislador peruano opta pela solução não- missione su una polriica comunitaria per le imprese deli' 8 giagno 1988, onde se lê:
societária, ou seja, pela empresa individual com responsabilidade limitada, incluin- "per migliorare i3 contesto giuridico &lle imprese piu piccole, Ba Comissione ha pre-
do sua escolha dentro de uma política mais ampla de estímulo a o pequeno comer- sentato recenterente a1 Consigiio una proposta de diretiva a SQrrnecomunitarie per
ciante individual. A sua análise retoma-se a seguir, ao comparar as formas societá- Ia creazione d. società a sócio unico. Tale misura tende favoáre Ia creazione di im-
ria3 e não-societárias de limitação de responsabilidade do comerciante individual. prese autonome e m ~ zmodoi incoraggiare I'auto occupazione", cit. em G. M a o ,
10. Diretiva n. 891667, in Giornale Ufficiale delle Comunitu Europee, de "J-a dodicesirna direttiva CEE sulle societti unipersonali a respunsabilita limitata",
30.12.89, L.395. in Giurtsprudenz~Commerciale, 1991, 1, p. 30 (35, nota 10).
12 A SOCIEDAD~UNIPESSOAL NA FRONTEIRA DO DIREITO SOCIET~RIO f3

No segundo e no terceiro ca$tulos, 6 analisada a sociedade uni- A potencial contraposição de interesses que pode derivar de uma
i
pessoal nas suas duas possíveis tilizações econômicas: como for- tal situação é óbvia. Quanto menor a participação percentual do con-

I
ma organizativa do comerciante ndividual e como forma de estru-
turação dos grupos de empresas, Nesse estudo o sistema brasileiro
está ao centro. O material compaiatístico é utilizado como fonte de
trolador na sociedade controlada, maior será seu lucro em uma ope-
ração entre a sociedade e ele próprio (ou pessoas aele ligadas) que seja
feita em condições desvantajosaspara a sociedadee favoráveis a ele.22
reflexão doutrinária e sobretudo korno meio de individuaiização de Nesse contexto L'evolutivo", a sociedade unipessoal representa
problemas. É aí, e não na de soluções, que o direito com-
parado é realmente úti1.I9 necessário, é feito referência às um passo atrás. Passo atrás que paradoxalmente pode levar a uma
diversas soluções, sendo as circunstâncias legis- organização pré-capitalista ou altamente capitalista. Isso porque nela
lativas e econômicas voltam a se confundir as figuras de "controlador" e "propnetá-
*io=.2: O Direito Societário deve então determinar qual perfil as-
sume o sócio e qual o interesse que predomina, o de controlador
2. Propriedade e controle ou u de proprietário, para definir a disciplina aplicável: a disciplina
j das grandes sociedades modernas, aplicável ao "sócio único çon-
É conclusão pacífica da inveskigação societária moderna a diç- trotador" ou a disciplina que permita o incentivo de pequenas ees-

t
sociação operada pela economia ca italística entre propriedade e con-
trole. Na medida em que a organiz ção societária torna-se mais com-
plexa e profissional, tanto menor orna-se a influência do acionista
truturas destinadas basicamente a promover os iateresses dornianiais
de seu fundador, aplicrltvel ao sócio único "proprietário".

b
individual, transformado em mero i vestidor, nas decisões societárias.
Já em 1932, Berfe e Means falavam em posições até mesmo an-
A divisão fundamental desse trabalho corresponde t a m a a
essa distinção econômico-jurídica. As sociedades unipessoais a j o
sócio é uma pessoa física são, no caso típica, sociedades destimdaç
tagônicas assumidas por proprietários e c o n t r o l a d ~ r e s Esse
. ~ ~ an- simplesmente a organizar juridicamente a atividade ecnnUmim de

i
tagonismo aumenta na exata pro orção ein qilc diminui a partici- seu sócio, cujos interesses são basicamente os do "proprielária' que
pação acionaria do controlador. O seja, quanto maior a dispersão quer limitar sua responsabilidade.
acionária e menor a participação -ionAría necessária para que um
determinado grupo ou pessoa pos a ser considerado controlador, bas~ca,exatamente como feito por Berle-Means. A q u a l i f i ~ ~jurídicd
o 1 de
menor seu interesse como "propri tário5' e maior seu interesse pu- ambos os tipos de situações (do "controlador" e do "propriS&rio") é e x ~mm%en-~ ~
ro de "controlador" te difícil. A melhor definição d o mero "interesse de propriethio" na soci:.dt~tkrnô-
nima parece ser aquela de Comparato, ou seja, a de direito de credito ic:; 1 1.3aos
lucros da sociedade, i.e., o interesse do investidor (Gpnder decolttrole ric *>*-;.r&de
un6nima, Rio de Janeiro, Forense, 1983, p. 98, que citando G. Ripert fel L $Taris-
formação operada pelo capitalismo moderno dos propriethrins em credo, L ,''$an-
to ao interesse do "controlador", ao contrário, pode-se falar ern inter eis1 ' lar
da "propriedade dinâmica", o u seja, da propriedade exercida sobre os I1 ,uro-
dução, que "não tem por objetivo a produção, mas a produção de (ry.. '. ,s e
scrvíços, e por isso mesmo, implica uma relaçào de poder s&rr oi1irc3 ' , na

medida em que a produção sai da fase artesanal para a inWtríai" (i se,


portanto, que nenhuma das posições jurídicas é, rigorosameate, reduti, ?TO-
priet5rio. O proprietário de Berle-Means é na verdade um credor e o lidor
é um "proprietário" de bens de produção, com poderes e deveres es
22. v, A. Berle G. Means, The modern corporatron, cit., p. 114, í] 2-W-i-
ca: " ~ fsuch persons can make a profit of a rnillion doilarsfxoxn a sal :.wrty
ro the corporation, they can afford to suffer a loss of fh00,Wf throug~ s ICTS-

tion Pubiishers eni New Brunswick em 199{, esp. a p. 116. No Brasil, a teoria da hip of 60 per cent of the stock, since the transaction will staloet them 5 rdsand
the re~nainingstockholders will shoulder the corresponding loss".
a
separação entre propriedade e controle nil. gr ride empresa capitalista foi desenvolvi-
da por F. K. Comparato, Aspccfos jitrídicoa da nracro-e;npresa, Sáo Paulo, Rev. 23. No sentido definido n a nota 22 voltam a se confundg os intcrcssr r r "xo-
Tiib., 1970, pp. 69 e ss. prietário de fruição", aquele interessado exclusivamente nosbcros; e 6(i ",a ~ ~ i e -
21. Os termos propriedade e corrfrolcsão aqui iiti!iz,ados de maneira metafóri- thrio dinâmico", aquele interessado principalniente na orgmzação e uti; ? a i i se- ~
ca e atécnica do ponto-de-vista jurídico, apgrias para tranimitir a idéia econômica gundo seus interesses, dos fatores de produção.
14 A SOCIEDADE UNIPESSOAL NA FRONTEIRA DO DIREITO SOCIETÁRIO 15

, Nas sociedades unipessoais wntroladas por pessoa jurídica pre- rio (perfil subjetivo) e a grande empresa, entendida como institui-
domina, ao contrário, o perfil do controle. Elas são, em úItima aná- ção ou comunidade de interesses (perfil institucional). Em ambos
lise, formas de organização administrativa dos grupos. A sua utili- os casos, asfattispeci empresa e sociedade unipessoal se defrontam:
dade maior está, como se verá, na possibilidade de criação de um no primeiro (empresa-empresário), concorrendo; no segundo
profit center juridicamente aut6nomo sobre cuja administração o (empresa-instituição),completando-se. A seguir, são tratadas as duas
"sócio" tenha controle absoluto, podendo determinar livremente o hipóteses. A primeira, através da discussão d a forma organizativa
fluxo de recursos no interior do grupo de sociedades. mais compatísel com a limitação de responsabilidade do comerciante
A busca da melhor disciplina para essas complexas estruturas individual; a segunda é analisada indiretamente, quando do estudo
exige uma clara identificação da posição sistemática da sociedade da concepção societária mais adaptável a sociedade unipessoal: o
unipessoal no Direito Societário e no Direito Comercial em geral, contratualismo ou o institucionaiismo.
para os quais a sociedade unipessoal é sem dúvida um tipo limítro-
fe. É o que se procurará fazer a seguir. 3.1 O problema da lintitação dr7 responsabilidade do comerciante
individual: origem da discussão atual

3, Sociedade unipessoal e empresa É necessário, antes de passar à anáIise da questão como se co-
loca na forma atual, verificar as origens dos preconceitos teóricos
A primeira fronteira atingida pela sociedade unipessoal é poli- relativos à limitação de responsabilidade do comerciante individual
mórfica. Isso é devido aos diversos significados que assume o ter- e o contexto histórico em que sinrgiram. A análise está limitada a
mo "empresa", o grande concorrente, do ponto-de-vista termino- pandectística alemã do século XTX. Duas são as razões: primeiro,
lógico e conceitud, da sociedade unipessoal. Polimorfismo já des- porque uma análise histórica completa requereria o estudo da expe-
tacado por Asquini no trabalho, hoje clássico, intitulado Prqfili riência romana e medieval (sobretudo canonística) com relação à pes-
dell'impresa2 e que sobrevive, ainda que reduzido em diversos as- soa jurídica e às sociedades, não em via incldental riias principal,
pectos, nos ordenamentos que são objeto de análise.2sDois são os o que foge aos objetivos do presente trabalho. Depois, porque foi
"perfis" que mais interessam: a empresa concebida como empresá- na pandectística que os problemas relevantes para a presente pes-
quisa encontraram eiaboração teórica e, consequentemente, foi tam-
bém ali que os preconceitos tedricos tiveram origem.
24. A. Asquini, "Profili dell'impresa" in Rivista de1 Diritlo Commerciale, 1943,
1, P. 1. ,' Duas são as questões tratadas. A primeira é a possibilidade de
25. Como é sabido a discussão sobre a empresa foi particularmente rica na ItB- personificação (no sentido de criação de um novo centro de impu-
Iia, onde muito se escreveu sobre asorte dc.s quatro perfis individuados por Asquini. tação de direitos e deveres) de um ente não-coletivo. A segunda diz
C . Oppo identifica uma ligação entre os irkios perfis da qual "emerge gia una realta respeito a possibilidade de separação de uma parte do patrimônio
giuridica 'totale' quanto la realtk sociab" ("Realtà giuridica globale dell'impresa da pessoa natural para o exercício de uma determinada atividade.
neli'ordinamento italiano" in Rivista di Diritto Civile 1976, I , pp. 591-592). P. G.
Jaeger sustenta ao contrário que os quatro perfis se reduziram a um apenas não por Inicialmente são expostas as idkias dos líderes das principais escolas
fusão mas por compieto desaparecimento dos demais como "dati normativamente de pensamento (a teoria ficcionista de Savigny, a teoria do patrimô-
qualificanti" {in La nozione d'impresu daf codice allo statuto, Milano, Guffrè, 1983, nio de afetação de Brinz e Bekker e a chamada "teoria da associa-
p. 49). I? interessante observar, po~tanto,que ambos os autores consideram que uma ção" de Gierke) e depois é analisada sua relevância para a discus-
futtispecie irnpresa é identificável no ordenamento positivo itaiiano no perfil subjeti- são atual.
vo do termo, seja esse redutível (P.G. Jaeger, La nozione d'impresu, cit., p. 49-50)
ou não (G. Oppo, "L'impresa come fatzispecie" in Rivista di' Diritto Civile, 1982,
I , pp. 109-110) a noção de empresário. Trata-se de uma descrição sem dúvida fiel 3. I . 1 A teoria ficcionista
da abrângência atual da fattispecie empresa no campo privatístico. Não se deve es-
quecer, no entanto, que h redução de abrangência no campo privatístico correspon- Para entender bem a concepção de Savigny sobre as pessoas ju-
deu um ganho de importância naqueles selares influenciados pelo Direito público.
Principalmerite no que concerne a regulamentação pública da atividade econômica. r í d i c a ~é, ~necessário
~ ter bem clara a realidade dogmático-jurídica
Surge então a "grande empresa" como fattispecie. O elemento normativamente qua-
Iificante 6, nesse caso, a pluralidade de interesses envolvidos, que justificam a inter- 26. Faz-se referência, obviamente, a teoria exposta no System des heutigen ro-
venção pública em sede de direito concorrensial e societArio. rnischen Rechts, 11, Kerlin, Bei Deit und Comp, 1840.
NA FRONTEIRA DO DIREITO SOCIETARIO 17

que o autor tinha diante de si. Alele cabia explicar as pessoas jurídi- cas e sociaistvigentesS5poca. E'ín'1835 sobretudo na Alemanha vigo-
cas em um sistema que reconhdGiano homem o centro "natural" rava ainda um modo de produção pré-industrial, caracterizado pela

i
de direitos e deveres. Devia fazê 10, porém, não mais com base nos
postulados liberaisz7 da escoIa aturalista, mas sim com base em
conceitos jurídicos precisos, qu a "vocação de seu tempo para a
ciência jurídica" impunha. EraLreciso, portanto, dar ao conceito
inexistência de mercado nacional e de sistema bancário e creditício. Isso
fazia com que existisse, de um lado, grande necessidade de instrumen-
tos que permitissem o agrupamento de recursos e, de outro, grande
preocupação com a solvência das pequenas (e frequentemente sub-
uma tonalidade mais jurídica, lípermdo-o do "realismo social" a capitalizadas)empresas.31Daí a preocupação em facilitar a criação de
ele atribuído pelo racionalismo I j u r í d i c ~ . ~ ~ novos centros de imputação de direitos e deveres e a preocupação em

1i.
A opção de Savigny gela e pficação ficcionista ou normativa
da pessoa jurídica justifica-se, A ficção (I para ele um meio de afir-
mar o caráter artificial de tal atri uição, sem negar a realidade pró-
pria dos agrupainentos humanos aos quais é atribuída a personali-
dade jurídica. Savigny rmnca ne ou a smiale Realilaf des Verban-
des (realismo social da associaçãs). Acreditava, no entanto, que tal
negar a possibilidade de separação patrimonial livre.
Dito isso, fica mais fácil compreende: a posiqiics à prin~ejravis-
ta paradoxal de Savigny quanto as sociedades uoipessoais. De nrn
lado, com sua teoria ficcionista e a negação do "reaiisrno socíaI"
que ela pressupõe, abre caminho para posições posteriores permis-
sivas com relação a sociedade unipessoal. De outro lado, nega-se
to de pessoa jurídica.29 I
k
realismo, por ser excessivamente últiplo, não pertencia ao concei- a admitir ele mesmo a possibilidade de constituiqáo ~ n i p e s s o a l . ~ ~
Esse aparente paroxismo explica-se pelo intuito de lirrritar a f'or-
A capacidade jurídica ccziifdida a esses entes rião é, segundo mação indiscrimínada de centros de imputação. fk3as existe taii7 béin
Savigny, plena. Savig~iya ~ c d u z4 capacidade patrirnonial, abrindo uma razão teórica. O reconhecimento da sociedade unipessoa! tem,
caminho para a corxcretização da rilper.posiçãa ntnencionada supra como se verá, muito menos influência sobre o conceito de pessoa
entre personalidade jurídica e !in i f ~ ~de
i ã oresponsabilidade. Para
elc, a ficção do íegiâlaboc não p itie :ri q u d l q i ~ ~influência
as razões éticas e precormatii~as
r sobre
jurídica (discutido por Savigny) que sobre o c o n ~ ~ ide t oscciedatis
E a questão teorica reli.ti.7- definiçao de sociedade e 4 p~c<(,ívcl ii7-

mo as que envolve~rrdileitos das pes,roai,


I
le
y õ jrcridicas
~ ~ anòrnalas co-
ri4ap uu o direito de f a n ~ í l i a . ~ ~
serção da sociedade unipessoal nesse conceito sequer se punliq % épo
ca, dado o forte contratua1ismo reinante, herdeiro dtrztc! rias (*ars
cepções romanas sobre sociedade.
As concepções de S:ivigny siib cxpfic&veismenos a luz de rígi-
das posturas dogmátitas mak ex*iùnçáo das condições econômi-
I; Tanto isso é verdade, que a discussko prática sobre z uiil:~:çsc\.a-
lidade societária apresentava-se quase que exclusivmente t : i i ~ i i rela-

I
27. No sentido de não ligação a nenl um dlreito tradicional a ele atribuído por ção a um instituto do Direito anglo-saxão. Trata-se da c ~ r p o / !,)ri
i / ~ so-
H. Coing, Zitr G~schichtedes Privntr~yehrptpms, Frankfurt, Klostemann, 1962, le. Savigny rejeita-a expressamente,33com base no Fato de a r,. ' , i.ei-
p. 23, que esclarece as coi~aequ&iicias Se u na IA! afirmaçáo: "De Hemmungen, die sonalidadejurídica envolve relações patrimoni&s (saido por!; 2 (18 8

dem Streben nach systematisiller Eiiikieit d r I:istori,iche


~ Ciesralt des rómi.;cllen Rechts
entgegensetzen niusste, wurden darnit iib iwunden". Ermogensfdhigkeit), limitando-se ao campo do Breíic>p-:- '4- A
28. Cfr. F. Wieacker, "Ztli Theo~ieder i~ristischenPerson des Privatrechts" corporation sole, instituto do antigo Direito inglês, possuia 1 ;i /

in Festschr~fHuber, Gnttingen, Sch.d.~ , 1973, p 363.


29. Cfr. W. F!~~mc,/;:cgeaemvin~."' ?
' Trí hlii;'~iii<
lhe,: h ~ ;Rerhg
l I, 2, ?,ie;uristis- 31. Cfr. E,, Schanze, Einrnanrigesellschaft uild Currhgi?(flio?ru

1
che Ferson, B t i l i i ~- 1Ierdd3eig Nu\, l'o,i, - Itikic, Si riagcr, 1983, p. 4. O autor
vê, ao contrário, na teoria dc Windscheia un a íi~c;itono s a r o prbprio do termo porque
ali se nega efetivamente a realidade przjrrr à ~ c adas corooraç&es: "Dei Unterschied
zur Lehre Savignys bcsteht darin, dass nach Eavi~rfr37den ais juristische Person in Frage
kommenden sozialen Gebilden, deren Exilew nàclit in F r a g steht, durch die Fik-
tion rtur die Eigenscliaft dei Xeci~tsfahtktit ~ermogensfaliikeiíbeigetegt wird, wah-
tionalisienrngsprobiemegesellschaftrechtlicher Zurechn~rng,Pmkfun,
pp. 46-47, com outras referências bibliogr8Ficas.
32. F. C. Savigny, System, cit., vol. 11, pp. 275-276, ondco autor 9
cessários ao menos írês componentes para a constituição da swcdade. t:
notar, no entanto, que mesmo aqui a posição de Savigny nãoCac~iranien t

h, sociedade unipessoal. Isso porque o autor admite a perrnanbia oa ~oci


rend Windscheid nicht von dei Wirkliçhke t dei Gebilde, sonderti VOE der von ~ h m zida a unípessoal, solução que será a porta de entrada jurisyrwnçial par, ,Ia
angenommenen Subjektslosigkeit der Recl Ir sussgeht und die Filctíon der juristis- cimento total da sociedade unipessoal (p. 276, nota b onde oántor cita 1 !
chen Person nacli Windscheid riur ein Rzdu -fms der jurist;rchen Technik befriedigt" exatamente a mesma fonte que será utilizada pelo Reichsgerld@em 1868 r i-
íp.16). car a admissibilidade da permanência da sociedade seduzidas:inipesso:.'
30. Cfr. E. C. Savigiiy, .Tysfcm. c i t . , yc! i , p. 3 4 e~J comerrrario de F. Wieac- 33. F. C. Savigny, System, cit., p. 237, v. tambéni c cownt.irlo di \ i 1 7 , ~ ~ ,
ker, "Zur Theorie", clt., p. 362. Allgemeiner Teíl, cit., p. 10.
1s A SOCIEDADE UNIPESSOAL NA FRONTEIRA DO DIREITO SOCIETARIO 19
@
""
fortemente publicística, como meio de perpetuar certas funções ocu- tação deve ser diferenciado segundo a intensidade d a "atribuição". (1
padas por uma pessoa, como o rei ou o pároco, e os privilégios a Os casos de reconhecimento são também mais limitados que na teo-
elas ligados.34 ria ficcionista, pois se reconhecem casos de afetação natural, como c:., ICL\

o Estado, as comunidades e as prdprias corporações, sem necessi- .r-.


3.1.2 As teorias do patrimônio de afetação dade de autorização estatal. A esse maior liberalismo conesponde (\. ,J

F-.
uma menor diferenciação com respeito B responsabilidade. Para o ' .I

Sob esse nome, âgrupam-se as teorias de Brinz e Bekker, que autor, a pessoa humana pode estar no máximo em uma relação de e-.>
procuraram uma via afternativa, crítica com relação a teoria ficcio- representação com o patrimônio. Sua responsabilidade subsiste com "
k;
:
.
,

nista, para escapar do irnpasse criado pelo naturalismo ao concen- relação ao fim para o qual o patrirnônio existe.39
4q"P
b
W'i!l$
trar a reflexão jurídica sobre o homem.
Ambos os autores reafirmam o principio naturaiista segundo É por causa das dificuldades terjricas e m admitir a atribuição f@
de um patrimônio a um fim,40e também por causa dos problemas
o quaf apenas as pessoas humanas podem ser sujeitos de direitos e
obrigações. Admitem, como os ficcionistas, a existência de patri- praticos criados pela não-diferenci~ãoquanto à responsabiiidade, 4g
f-
rnònios que não podem ser atribuídos aos homens. Ao contrario des- que Bekker tenta uma solução intamediária entre a teoria do patri- ,..,

ses, no entanto, não vêem uma solução para o problema na exten- mônio de afetação e as teorias ficcisnistas," 0 autor procura co-
são do conceito de sujeito de direito.35 locar o patrimônio de afetação no centro da discussão sobre a per- , -.
sonalidade jurídica, sem contudo negar a possibilidade e utilidade
Para Bri~iz,atraves de um sujeito ficto, apenas uma situação do emprego desse último c o ~ i c e i t o . ~ ~ r--
ficta pode ser criada.36Procura, portanto, alargar o conceito de ti-
tular de. urn patrimônio (Vermbgenstrager). Segundo o autor, para Sua construção não 6 , porém, z e n m artificiosa. O autor iden- (?
a existência de um patrimônio é necessária não apenas a existência tifica o conteúdo da personalidade jurídica na disponibilidade e pos- *.,
de bens, mas também uma relação de "atribuição". Essa relação sibilidade de fruição de direitos (Ve~fugungsbefugnissuna' RechC- gg
não existe exclusivamente entre pessoas e bens, mas também entre genusses). Afirma que o que é exclusivo do homem não e a possibi-
@
fins e bens. 4) ordenamcnto pode determinar que uma coisa "m et- lidade de fruição, mas sim a própria frui~ãodos direitos. PossibiIi-
was odw fur etwas ist und gehci;rt5'(a algumacoisa ou para alguma dade de fruiçáo podem ter tambCrn coisas materiais ou relações ima- p
coisa é orr p r r t m ~ e )Brinz
. ~ ~ não é contrário a que esse patrimíjnio te ri ai^.'^ O ponto fraco 6 óbvio. A atribuição da possibilidade de ,-
seja em seguida personificado. Na reaiidade, ele também admite uma fruição feita gelo legislador reveste-se de discricionariedade ainda
ficção $&?yp segundo momento, quando se trata de personificar maior que o das teorias ficcionistas. c:"
L5

tal patrimbnici. O autor, consciente da aparente incoerência dessa A personalidade jurídica é pam ele Zwecksatzung mit Appa- *,-.
saa deckarâção com a critica precedente, declara que desse modo a rat. Atrav6s do termo Appurat, o eutor tenta exprimir o conceito i
personificação é subordinada ao patrimônio de afetação e não o con- de administração, as pessoas através das quais o objetivo pode ser (+-
'..
irário, tornando-se claro que as coisas pertencem não a um deter- atingido. Com Zwecksatzung, ao contrário, o autor vislumbra um
minado ente, ficto, mas sim a um fim,38 c
Arie~zilrechscfder VerfUgung,ou seja, aquele (ou aqueies) que cons-
Evidentemente, partindo de uma tal definição, o autor deve ne- tiiui o patrirn6nio de afetação e detamina o seu fim abre mão, atra- I
;;';
w
gar a distinção entre fins e comunidade de pessoas que serve de base vés desse ato, de u?naparte de seu poder de disposição (não apenas
i classific~ççàodas pessoas juridicas. Para de, o patrimônio de afe- @
39. CEr. A. Rrinz, Lehrbuch. cit., p. L.132. -9
34. Cfr. W. Blackstone, Cotnmentaries on the law of England, vol. 1, Lon-
dos, Cadelf, 1783, pp. 469-00.
40. Cfi, F. Wieacker, "Zur Theorie", cit., p. 365.
41. Dois são os seus trabalhos a respeito da tema: "Zweckvermogen, insbe-
r
<. ,

35. Cfr. W. Henkel, Zur Theorie der juristischen Person im 19. Jahrhundert, aondere l'eculium, Ha~ldeisvermogenund Mengeseiischaften" in ZHR 1861, pi 499 G^'
Gottiiigen, 1973, p. 163. e "Zur Lehre vom Mechtssubjekt" in fahrbkherfãv die Dogmatik des heutigen ro-
misclimn und deutschen PrlvilfrecfrtsXIX, vd. 12, Jena, 1872. , *-
36. Cfr. A. Brinz, Lehrb~chder Pandekten, 11, 1 , Erlangen, 1860, p. 982.
37. Aexpressão é de W. Henkel, Zur Thwrk, cit., p. 149; v. também A. Brinz, 4.Cfr. T. Raiser, Daf Unternefimenalzmmisntion, Berlin, de Gmytet , 1969,
Leitr3uch, cit., p. 9m. 0. 75.
38. Cf:. A. Brinz, Lehrburh, cit., p 997. 43. Cfr. E. I . Bekker, Zttr h h r e , cit, p+ I?.
4
ticularmente evidente na teoria e Savigny, do princípio da unida-
de do patrimônio, A precarieda e do sistema creditício da época
ma delas, mas se constrói a partir de todas, levando em considera-
ção os pontos problemáticos revelados por cada teoria.62
P
e a necessidade de encontrar me os capazes de agregar capital (co-
mo por exemplo as grandes socjedades anônimas) está a base de
Assim é que, em Savigny, é de particular importância o desta-
que dado aos pressupostos normativos para o reconhecimento da
sua formulação. I personalidade jurídi~a.6~ E através do reconhecimento da possibi-
O mesmo se pode dizer das &mais teorias. Ainda que partindo lidade de subsistência da sociedade que se tornou unipessoal e da
de princípios diametraimente opi>stos dos principios da teoria fic- afirmação da suficiência das garantias legais exigidas para a atri-
cionista, as teorias do Zweckver ogen terminam por negar a possi- buição da personalidade jurídica que se abriu caminho para o reco-
1
bilidade deseparação patrimonial No caso de Brinz, através de uma
obscura regra geral de responsabpdade do representante com rela-
ção ao fim, que admite tanto um interpretação absolutamente res-
nhecimento generalizado da sociedade unipes~oal.~~ Como já vis-
to, no entanto, o próprio Savigny não elaborou esses pressupostos
l
tritiva quanto uma responsabilida, e ilimitada genérica. Em Bekker,
entre graus de pertinência,
com relação a sociedade unipessoal, cuja constit~içãonão admitia.
Isso se fez sobretudo depois, como decorrencia das reflexões dou-
trinárias sobre a organização societária.
na sociedade anônima,
nesta última afir- Na teoria de Gierke, ao contrário, deve-se destacar o fato de
ter sido chamada a atenção para a realidade interna das socieda-
d e ~Com . ~ relação
~ a sociedade unipessoal em particular, é relevante
sua visão não-unitária do problema da subjetivi&de jurídica. Sua
exatamente em negar o valor ex$;Iicativo de tal elemento. critiea à possibilidade de tratamento unívoco do problema da im-
putação de direitos e deveres à pessoa jurídica foi mais tarde re-
Finalmente, em preocupação com tomada por Muller-Freienfels, com quem asmmiu sua forma
os corpos intermédios, elemento da sua concepção na- atual .66
cionalista das relações sociais. explica-se, em parte,
pelas circunstâncias do alemã, naçiio que Entre os teóricos do patzimonio de afetação, destaca-sr a jtres-
por tradição não se construiu em torno de um pó10 central de po- cupação com a refaç5io entre responsabilidade e sa3jetivid;~dejurí-
der e cuja unificação cons-uin uni movimento eminentemente cen- dica. Com efeito, na tentativa de distanciar-se da discusl-õ""C, 8 PeS-

1
trífugo. peito da personalidade jurídica, devem enfrentar o problem: cií. co-
Em conseqüência, parece bast nte arriscado procurar em qual- mo admitir a limitação de responsabilidade sem garantir i a r l ~ í jt .C:-
quer dessas teorias princípios para decisão sobre o reconhecimen- ra negocia1 autônoma para o patrimanio de afeta& criado. A c-.4qr.s-
to ou não da limitação de respons bilidade do comerciante indivi-
dual e sobre a forma preferida., pe sonificada ou ngo, de sua orga- 62. Cfr. P. Wieacker, "Zur Theorie", cit., p. 372, para qwm "Thc:
nização. A regra da gen in Wahrheit Entfaitungstufen der Problemreflexion sind (mbulanlo s ,
perde seu caráter abso- 63. Cfr. F. Wieacker, "Zur Theorie", cit., p, 371.
luto se confrontada com as economicas da segunda me- 64. Cfr. E. Schanze, Einrnanng~sellschqftundDurchgr$jhfi'ung, cl, :L
tade do s6culo XX, onde a crédito transformou-se de citando as famosas decisdes do Reichsgericht de 1888 (in RGE23, 202), t 7-
um problema de oferta em de demanda. Rclati~iza-se referência aos textos romanos no mesmo sentido utilizado pm Savigny r - o
também o realismo de dos Estados unificados caso Salornon vs. Salornon & Co, (io Law Reports, Appeai Ckm 1897, , >c
atuais e da existência autônoma do:direito piablicei (cuja negação é os juizes fazem referência à írrelevância do niímero de sócios "provided, I
se, the requirements of the statute have been complied witli md ffie c' 5s
o ponto de partida para a afirmação da 'kealidade" da vontade au- been valid constituted" (31.44).Ambas as decisdes demonstram, com efc tjc
tanoma dos agrupamentos). uma resposta as exigências práticas já a época reveladas, u m ciara ui 1'15
O fato de que as teorias náo sd'arn relevarites corno tentativas pressupostos ficcionistas (ainda que. como no caso da dccisa inglesa, c %ra

i
de explicação global do fenâmeno âo diminui seu valor para o es-
clarecimento da lirnitaçâo de respongabilidade do comerciante indi-
vidual. Essas teorias são, com efeiio, capazes de ajudar a formula-
inconsciente).
55.Cfr.F.Wieacker,"ZurTheorie",cit..p.371;W.Fl~e,Al~gei~
cii., p. 18, E, Schanze, Einrnanngesellschaft und Durchgr$&fiang, c
66. Cfr. E. Schanze, Einmanngese!&chaft und Durchgwqftung
ieil,
,, "i.
1. 61,
ção de um modelo complexo, que d o incorpora totalmente nenhu- v. tambkm infra, capitulo 11, n. 3.3.1, d.
tãp,ad%~@$~t&,e$t~~da~q~@g$i$o,inyers_o:,pmo Não se trata de procurar uma "definição especulativa", ou se-
admitir q ~ ~ - ~ j ~ ~ ~ 1 1 8 4 @ ~ $ ~ g 9 @ - & e & mcom
e n toetitularl do ja, não se quer fazer uma escolha arbitrária do sentido a ser atribuí-
-p~!""~.~~$u~sg~fu~p9~e3:99~fi@$$qLn~~66 sujeito de di- do aos conceitos (ou, querendo, do conteúdo a ser atribuído a um
p t o s ) passa t e r . ~ n h ~ ? e $ ~ darii.tuação0de iimitação da respon- determinado esquema organizativo). Pretende-se, ao contrário, fun-
sabi~idade?~Éinieressánte notar quéBri&, a& ter construido sua dar tal escolha em elementos concretos, representados exatamente
,
teoria inde*$oitemente do conceito de pessoa jurídica, a ele re- pelos dados comparatisticos. Mas, exatamente por serem diversos,
-tor,$a: á u t o $ ~ ~ ~ ? , q u e ' b ~ & ~ o i t 6a destacar
A,

nte a submissão da tais dados permitem a verificação de sua coerência interna e, conse-
personalidade. ao escopo.? Essa problemática é extremamente re- qüentemente, da admissibsdade tanto de suas regras especificas
levante par? á ai&ussão a s(r exposta a s@ sobre a "empresa in- quanto dos princípios que estão à sua base.
dividual com responsabilidadelimitada". ,Como se verá, tais entes,
~ormalmentequW1cados como patr&ônio separado, por implicar 3.2.1 A separação patrirnonid do comerciante individual: coloca-
uma subjetividade jurídica mais h t a d a que a solução personifica- ção do problema
da, gozam apenas de uma parcial limitação de re~ponsabilidade.~~
A expressão '^patrimônio separado" é equívoca. Tem na dou-
3.2. O problema da limitaç&oderesponsubilidadedo comerciante trina atuaI dois sentidos: em primeiro Iugar, fala-se em patrimônio
'
' ina'itidubf em sua "firma atual separado com relação Aquelas massas patrimoniais que ficam sujei-
C , ,

tas a um regime distinto dos demais coitiponentes do patrimônio de


Com base nas considerações feitas acima, parece conveniente uma pessoa. Assùrn por exemplo o dote e os bens dos conjuges em
pxoceder a uma análise concreta das experi~nciasrecentes conta "em- comunhão.7i
presa individual com responsabiiidade limitada" para que seja pos- Mas o sentido mais comum em que é entendida a expressão "pa-
sivei comparar s o k õ e s societárias e não-societárias para a M t a - trimonio separado" é o que de alguma forma vinmla a expressão
çáo de responsabiiidade do çomerclante individual. Analisando os à limitação de resp~nsa'úifidade.~~
efeitos prLzticoS de' ambos os esquemas, podem-se individuar efeti- Deve-se dizer "de alguma f~rraia'~, pois limitação de responsa-
vamente ascv&gens e demantágens de cada solução. Essa crítica bilidade tem por sua vez vários sentidas. Pode sigmc?r impossibi-
p d t e es$dmker'osésco~sperseguidos através da organização so- lidade de responsabilizar o "patrimônio separadoJ' pelas dívidas do
cietiaria 6 &sÚ6&r&o teórko mínimo sobre o qual deve basear-se, seu titular (é o caso do bem de famífia por exempâo), Pode aitrda
sendo e n t ~ p 6 s i i v k I v d equal
t ~ tisignificãdo
~ convém" atribuir significar que os credores por dívidas oriundas dos bens separados
a& term~"-~~soci~dade 'dp&sòál"; objeto espedfico do presente não terão acesso aos bens de seu titular (é o caso do espólio em rela-
ção ao herdeiro). Pode por fimsignificar ambas as coisas, ou se.ia,
> < L ' 8 * .-i&- ;-r7 , ' . 2 .::i < , h:--
a limitação em ambos os sentidos.
'*. 1, > "..*<:
-1 C I Y ?I

i
I
:&, 3 -,,*3 :a>+ e{ '";!h"

67. Cfr. O. Kuhn, ~troh&m&>d*ng bei ~ap!ta~~&elkchqften, ~iibingen, É esse o significado que mais interessa a este estudo, já citar 6
, w r , '964, p-
L *<i* o'
-& q + \ " l ~ P P ~:'*,'..v
<: 68.'Cfr: P. ~ i i i c k e r ',%r
js\q,.< ' , :, c
heoriei*; at., p. 371.
o mais ligado à gênese da separação patrimonial, individiri:~il -);i
na sua afetação a determinada atividade. A separacgão patrjier*.. i
- . . 69. A refer2nçia8éfeita r&;apeqs aòhtigm proposto na França ou aa ado- instrumental a essa afetação 6 exatamente aquela que permite 2%-
rado em Portugai, que estpdar-se40 a seguir, rnas tamb6m ao instituto da Eiiamann- 5

'io~eselkhqft ai*, entendida m o patnmbnio separado -v. i& cap. ii, n. 3.3.1. merciante limitar seu risco (impedindo que dívidas oriundas : i i ,
, -
70.*Quseja, tranforma-se usando as pdawas de F. D'Alessandro a ques-
@iade um problema de Sein em um problema de Solfen (cfr. Persone giuridiche e
- atividade comercial ameacem seu patrimonio pessoal) e gat : ' +
andisidei linguaggio, Padova, Cedam, $989,p. 46). Referida tranformaçãonão di-
miwi, de modo algum, o "rigor cientSficoY'da anáiise. Transformar o problema eni 71. Esse é o sentido atribuido ao termo, na doutrina brasileira pol "2 i r .
uma questão lingüística não implica necessariamente diminuir sua "cientificidade", O direito e a vida dos direitos, São Paulo, hlax Limonad, 19iPa , p. 367 > b i)
desk que se aceite a çoncepção moderna cfe cisncia, que deslocou o problema cienti- Gomes,Ilttrodução ao Direito Cfi~il,10: edição, Rio de Janeiro, lbense, 1991, ;
ficocentral da procura d~ "verdade" 4. busca do('rigorH:cfr. N. Bobbio, "Scienza 72. V, nesse sentido S. M.Machado, &obl&.rnasdeLt6feito k&fcantil, Sã;) P&xii<>,
de1 &rite0 e analisi de1 iinguaggio" in Rivista trimmtmile di Dirltlo eprocedum civi- Max íimor~aad, 1970, p. 97, que cítando Ferrara afirma que "o bico critCrin sepiri o
te, f940,p.355. " para reconhecer a existência do patrimônio separado é o da responsabilidad(*pzlas
dividas".
NA FRONTEIRA DO DIREITO SOCIETAIZI~O 29

credores por atividade praticada com o patri- A legislação comercial e societária forma wn todo-ipdissqlúyel:
mônio separado (assegurando I,
com as práticas comerciais costumeiras e os imperativos de ordem
econômica. Quanto às primeiras, vêm previstas expr-samente co-
credores particulares do mo fonte do direito nos arts. 130 e 131, n. 4, do ,Cddigo Comercial.
generdizadamente
E é contra esse uso Já a influência do fator econômico é tão marcante que chega ao pon-
to de colocar ramos inteiros do Direito, como o Direito Concorren-
cial e do Mercado de Capitais, em uma zona cinzenta entre o Direi-
w1
A teoria da unidade do patri ônio do indivíduo (comerciante}
reinou na França do século pass do. O subjetivismo antropocen-
trista do Código Napoleão impedii que se distinguisse personalida-
to Econômico e o Comercial.
Daí as legislações recentes que trataram do assunto da Emita-
de e patrimônio. A cada pessoa podia corresponder um $6 patrimô- ção de responsabilidade do comerciante individual manifestarem ex-
nio. Aquele que desejasse limitar lua responsabilidade deveria ne- pressa preocupação com os fatores de ordem econômica que justifi-
cessariamente submeter-se a forma ocietária e a seus requisitos (entre cam sua introdução. Entre eles figura o incentivo b empresas que
eles, a existência de mais de um s? d ~ i o ) . ~ ~ isso acarretaria, tanto porque 4 historicamente comprovado que mui-
to do sucesso da sociedade anônima é devido a limitação de respon-
Nessa concepção, o patrimônip acabava por pouco distinguir- sabilidade como porque a limitação de responsabilidade constitui
se da pers~naiidade.~~ É nessa corjfusão sujeito-objeto que se ba- '"ma força de resistência mais segura à tentação de confundir con-
seiam as principais críticas t e ó r i ~ a d Mas
. ~ ~ é sobretudo na necessi- tabilidade comercial e
dade de permitir aos comerciantes a "afetação" de parte de seu pa-
trímônio a fins específicos, perrnid ão que de resto está absoiuta- O incentivo econômico, no caso da empresa individual, dirige-
mente em linha com os princípios d[ autonomia da vontade estabe- se mormente aos pequenos e médios empresários, maiores usuários
lecidos pelo próprio Código Civil da forma empresarial unipessoai, Nesse sentido, a referência expressa
pais criticas ao princípio da da Exposição de Motivos da Décima Segunda Diretiva Comunita-
ria. A admissão da sociedade unipessoal com responsabilidade li-
mitada faz parte do programa comunitário de incentivo a pequena
vamente da falta de coergncia siste ática das teorias que os defen- e média empresa. Sobre os motivos de apoio a tal tipo empresarial,
diz textualmente a versão italiana: "l'incoraggiamento dell'accesso

{
diam. Aliás, no Direito Comercial oderno, poucos são os institu-
tos rejeitados exclusivamente por jn oerência sistemática. Normal-
mente, a incoerência sistemática é, 4é conveniente que seja, conse-
qüência de considerações de
degli imprenditori unici alla forma societáría, che rappresenta i1 con-
testo migliore per io sviluppo degli affari nel mercato interno, rien-
tra in questa politica. La Risoluzione dei Consiglio de 22 Dicembre
1986 sul programma d'azione per la crescita dell'occupazione sot-
O sistema do Direito sistema societário tolinea parimenti la necessità di incoraggiare I'impresa indivi-
não é auto-integrado,Não duaíe" .78
ca das codificações
considerar que a regra Do ponto-de-vista econômico, o problema que se coloca é: sa-
não-previstos e ao ber até onde a limitação de responsabitidade pode h p E w m a perda
de crédito por parte da empresa, decorrente da diminuigo da ga-
rantia patrimonial oferecida aos credores. Tal crítica pode ser con-
73. V. a respeito G. Ripert-R. Robiot, ~ d g i t ~ ~ ~ é m e n t a idroir
r e d etornrnercial, testada empiricamente, afirmando que é impossível determinar se
Paris, Librairie gknkrale de droit et jurisprudenb, 198G,cap. 11, Çeçáo 11, 8 2, p. 168. o desaparecimento da concorrência dos credores pessoais do sócio
74. Para os unitaristas, quatro são os pfncipíos a reger o patrimonio: a) 56 sobre o passivo social (outra decorrência da limitação de responsa,-
as pessoas, naturais ou jurídicas, podem ter p trimônio, @) toda pessoa tem neces-
"I
sariamente um patrimonio, (c) cada pessoa s6 pode ter tini pairiniônio, (df o patri-
77. V. C. Champaud, "L'entreprise personelle 1 respousabilite limitee" in Re-
mônio é inseparável da pessoa - v. O. GomBs, fnfroduçào,cit., p, 227.
vue trirnestrielfede Droit Commercial, 1979, p. 579.
75. V. critico 0. Gomes, Introdu:&, cit., p. 227.
78. Cfr. "Relazione Introduttiva alla Proposta di Dodicesima Direttiva de1 Con-
76. Cfr. S. M. Machado, Prohlernm, ci$., p. 99.
siglio in materia di diritto delle societ&", in Rivista delle società, 1988, p. 823.
30 A SOCIEDADE UNIPESSOAL

,&dade). não*,contrabalança ou até supera essa aparente rio campo das organizações unipessoais, sobretudo pelos problemas
de~vantagem~~. De todo modo parece claro que a contrapartida mí- teóricos relacionados ao reconhecimento de uma sociedade com ape-
nima da limitação de responsabilidade é a garantia do capital so- nas um sócio. Cumpre analisar a razoabilidade das críticas e a via-
cial. Assim sendo, deve ser escolhida uma forma jurídica que per- bilidade das propostas alternativas, em função da supra invocada
mita a total separação econômica de esferas. natureza específica do fenômeno empresarial.

3.2.2 Formas de limitação de responsabilidade do comerciante in- a) As críticas a fórmula societária - No primeiro grupo estão
dividual as criticas mais tradicionais a sociedade unipessoal. Trata-se do que
a recente lei portuguesa sobre o "estabelecimento comercial com res-
Afirmada a utilidade jurídico-econômica da limitação de res- ponsabilidade chama de "coerência sistemática". A ex-
ponsabilidade, o problema que em seguida se apresenta é o de de- posição de motivos tenta demonstrar como a solução do problema
terminar qual a melhor forma de instrumentalizar a introdução de da limitação de responsabiiidade do comerciante individual em ter-
tais objetivos. Para isso uma ressalva inicial é de rigor. As catego- mos societários é distante da tradição do direito societário portu-
rias civilisticas de patrimônio separado e universalidade até agora guês, que além de não admitir a unipessoalidade superveniente é tam-
utilizadas não se adaptam perfeitamente ao fenômeno empresarial. bém fortemente contratuaIistico. Essa é a principaI razão enuncia-
ISSOporque "se incluem nela as oportunidades e probabilidades, co- da pelo legislador português para a escolha da nova fórmula:
mo a clientela, a fama, a propaganda, e pois a empresa é mais que considerou-se muito menos traumática a introdução da limitação de
â soma de direitos".80 Conseqüência disso, de resto já analisada no
responsabilidade do comerciante individual, através de um forma
item n. 2 desse capítulo, é que não pode haver "direito real" sobre não-societária de patrimonio separado,83qual seja, o estabelecimen-
a empresa. to individual com responsabilidade limitada.
Assim sendo, qualquer utilização de conceitos civiiísticos co- 82. Decreto-lei n. 248/86, Exposição de motivos, n. 1 in Boletim do Ministério
mo patrimônio separado tt organização de uma empresa requer as da Justiça, Suplemento ao número 359, Lisboa, 1986, julho e agosto, p. 384 (385).
adaptações necessárias a essa fattispecie específica. 83. É interessante reproduzir a comparação feita pelo legisfador com a situa-
É portanto necessário analisar cuidadosamente as formas al- ção do Direito alemão, que teria permitido a introdução da sociedade unipessoal com
responsabilidade limitada naquele pais:
ternativas de organização empresarial. Sobretudo as não-societárias, Foram duas, no essencial, as razões que levaram o legislador alemão a optar
cuja gê,qcse não está ligada necessariamente à organização de estru- pela solução consagrada na GmbH Novelle de 1980:
turas empresariais. a A grande difusão que a Gesellschaft mit beschrankter Haftung unipessoal
conhecia na prhtica: há longo tempo admitida pela doutrina e jurisprudência, o pró-
A ligação entre sociedade e empresa, com efeito, é tradicional prio legislador a tinha jh reconhecido (assim, o 5 15 da Unwandlungsgesetz de 6 de
a ponto de a organização jurídica do fenômeno econômico empresa novembro de 1986). Mas há mais. A práxis não legitimava apenas a sociedade de
ser identificada com a própria sociedade. A empresa é vista como responsabilidade limitada que em certo momento, em virtude de vicissitudes normais
conceito econômico, como "organização objetiva dos fatores de pro- de sua existência jurídica, ficara reduzida a um s6 sócio: ia bastante mais longe, pois
monestava as próprias sociedades ab initio constituidas por um Único sócio verda-
dução'', e a sociedade como conceito jurídico, ou "organização ju- dei1o, secundado (por via das aparências)por um ou mais testas-qe-ferro(Strohman-
ridica da exploração empre~arial".~1 ner).
As tentativas de encontrar um sucedâneo ou,ao menos, um con- b) A maior facilidade em delinear um regime jurídico para essa situação: com
efeito, a admissão da sociedade de responsabilidade limitada de um Único sócio
corrente palra a sociedade, como forma de organização, aparecem (Einrnann-GmbH)apenas implicaria a adaptação de algumas normas do regime da
GmbH, ao passo que a outra opção -criação da empresa individual de responsabi-
79. Cfr. A. Grisoli, La societd con un solo m i o , Padova, Cedam, 1971, p. -
lidade limitada levantaria muito mais graves dificuldades".
64, nota 3. Em seguida, o legislador comerita as implicações institucionalistas de tal esco-
80. Cfr. F.C. Pontes de Miranda, Tratado de Direito Privado, 30 edição, Rio Iha e, afinal, faz a comparação com o ordenarnento português:
de Janeiro, Borsoi, 1970, tomo V, p. 366 e V. Rao, O direito e a vida dos direitos, "Quanto: porém, ao nosso pais, as coisas não se apresentavam do mesmo mo-
cit., p. 366. cio: as rzões a~ontadasnc número anterior não valem aqui com a mesma intensidade.
81. Cfr. F. K. Comparato, "Exclusão dos sócios nas sociedade por quotas de "É certo que a idéia de sociedade com um único sócio encontra hoje aceitação
responsabilidade limitada" in RDM 25/39. generalizada tanto na doutrina quanto na prática, e até o Novo Código das Socieda-
NA FRONTEIRA DO DIREITO SOCIETÁRIO 33

O pragmatismo da crítica (aliás, expressamente assumido pelo , i, A francesa; .não aprovada,~.merecedestaque pela originalidade
5 .

Iegislador português) é evidente.' do projeto apresentado, que propõe a criação de três massas patri-
Totalmente diferente é a jusfificativa do projeto francês de li- moniais. A primeira,.destinada a empresa, não poderia servir para
mitação de responsabilidade do domerciante individual, cronologi- garantir os credores pessoais do sócio. A segunda porção não seria
camente anterior à lei portugue/a. Trata-se do chamado projeto destinada ab initio a empresa, mas poderia sê-Io por iniciativa dos
Champaud, que leva o nome do 'residente da comissão constituída credores insatisfeitos (i.e. que não conseguiram receber seus crédi-
d
em 26 de outubro de 1977 pelo inistro da Justiça francês para es-
tudar a possibilidade e a forma Iais conveniente de introduzir a li-
tos) ou do próprio empresário individual. A terceira parcela é s as-
sim chamado patrimoine indisponible e insaisissable, o mínimo ne-
mitacão de responsabilidade do?mpres&rio individual no ordena- cessário à sobrevivência do empresário e de sua família. Para prote-
mento francês. O relatório final, d ' fevereiro de 1978, apresenta pon- ger a integridade desse. patrimônio prevê-se até mesmo a nuIidade
tos de grande interesse, sobrerudq pela análise das razões jurídicas das garantias pessoais prestadas. Em compensação, para a tutela dos
que aconselham a escolha da for/ma "não-societária". credores prevê-se a adesão obrigatória a uma Caisse de Garantie,
O legislador francês, ao contlário do português, parece plena- uma caixa comum à qual os empresários devem contribuir em pro-
mente convencido, por razões dogbáticas, da superioridade da fór- porção ao seu pecúlio.
mula não-societária. Argumenta que é preciso evitar as ficções so- Os objetivos econômicos são evidentes, Em primeiro lugar, evi-
cietárias, consistentes em Assemb Iéias Ordinárias, gestão colegiada tar o abalo de crédito descrito acima, através da existência de uma
\
etc. e que sobretudo nas sociedades unipessoais representam mera parte "flexível" do patrimônio. Em segundo lugar, eliminar os pri-
formalidade, contribuindo mais ' para enganar terceiros que para vilégios dos credores com maior poder de barganha, como os ban-
assegurar-lhes coerência, integridalde e objetividade das decisões de cos, que podem exigir garantias pessoais do einpreskrio individua1.
gestão do patrimônio afetado à ehpresa social".84 O próprio projeto reconhece, no entanto, que uma garantia efetiva
não foi criada. Sendo as aiiotas da Caisse de Garantie transferíveis,
b) As tentativas de cori~tnq7oem f o m a não-societúria - é Óbvio que os credores economicamente mais fortes poderão exigi-
As mais recentes e mais famosas :tentativas de resolução do pro- las como garantia.8s
blema em forma não-societária sãO exatamente a francesa e a por- A empresa individual, no projeto francês, não é dotada de per-
tuguesa. I sonalidade jurídica. Tal característica dificulta sua transferência, tan-
to inter vivos como mortis causa. A regra, na verdade, é a liquida-
des Comerciais, vencidas algumas hesitaçõd , lhe dará consagração igual àquela que ção da empresa por morte do titular,86podendo ser modificada ape-
um importante setor da doutrina nacionalideF; h& muito vinha preconizando.
nas em caso de previsão especifica no estatuto da empresa. Já n ces-
"Mas, em contrapartida, não deixa 4e ser verdade que entre nós (diferente- são inter vivos é possível, desde que tenha como objeto a empresa
iiiente do q u e ácontece na Alemanha) nunca se admitiu - entre outras razões por
fidelidade a idéia de sociedade contrato - a unipessoalidade originária. E não me- inteira. Nesse caso, considera-se existente uma cessão de débito e
atribui-se direito de oposição aos ~redores,~"
As desvantagens de um tal sistema são claras. Em primeiro Iu
gar, a perda de liquide2 da empresa. O interesse do empreç&ío a
I uma forma organizativa de difícil transferência só poderia ser redu-
"Eis porque, tudo pesado. não a figura da sociedade unipessoal, zido. Somando-se a tudo isso o sistema exageradamente compiica-
nos latos termos em que passou
Portugal o instrumento juridico do de separação patrimonial,88 entende-se perfeitamente o porquC
mitação de responsabilidadedo Mais /ó&icoe mais conforme
com os princípios tradicionais do nosso Direito se apresenta o outro caminho apon- 85. Cfr. C . Champaud, "L'entreprise personelle", cit., p. 605.

termina" - Boletim, cit., pp. 388 a 390.


I
tado: a criação de um novo instituto jurídic - o estabdecin~entomercantil indivi-
dual com responsabilidade limitada. Essa se afigura ser a solução preferível, apesar
da inovação que representa e das acrescidas ificuldades de regulamentação que de-

84. Cfr. C . Charnpaud, 'Yentreprise personellz", cit., p, 607.


86. C. Champaud, "L'entreprise personelle", cit., p. 630.
87. C. Champaud, "L'entreprise personelle", cit., p. 636.
88. A respeito do funcionamento prático do sistema v. R. Weigmann, *'L3 SCJ-
ciet8 unipersonale: esperienze positive e prospettive di diritto uniforme" in Corifm/-
to e impresa, 1986, p. 830 (841).
34 A SOCIEDADE UNIPESSOAL NA FRONTEIRA DO DIREITO SOCIETÁRIO 35

de sua rejeição e da prevalência da solução societária na lei n. 85.697, to, que tal construção só seria verdadeiramente coerente se o patri-
de 11 de julho de 1985, que introduziu no ordenamento francês a mônio separado não fosse dotado de subjetividade jurídica própria.
socieéade unipessoal com responsabilidade limitada. Não é o que ocorre. O estabelecimento participa do comércio em
Já a lei portuguesa tem um menor preconceito contra a forma nome próprio (v. art. 9). Parece assim bastante arriscado admitir
societária. Seu maior pragrnatismo revela-se não apenas na exposi- a concorrência de outros credores sobre essa garantia, sobretudo
ção de motivos, mas também nas regras específicas. Nota-se um grau considerando-se os interesses dos credores que negociaram com o
muito maior de aproximação das regras societárias. É o caso, por estabelecimentocom base na garantia oferecida pelo capital social.
exemplo, das regras relativas às formalidades e aos efeitos da cons-
É interessante destacar, finalmente, a solução proposta pelo ie-
tituição do estabelecimento (arts. 2-7), das regras sobre a integrali-
zação, modificação e proteção do capital social (arts. 12-26). gislador peruano, em muitos aspectos mais equilibrada que a fran-
cesa e a portuguesa. E& primeiro lugar, vincula apiicação da lei di-
Os problemas relativos à circulação permanecem, porbm, os retamente às dimensões da empresa ao fazer referência, em seu art.
mesmos do projeto francês. E não poderia esperar-se outra coisa 1'?,à pequena empresa, que por sua vez vem definida segundo as
de um organismo dotado de um limitado grau de autonomia nego- suas dimensões econômicas. O legislador peruano copia claramente
cial e patrimonial relativamente ao seu t i t ~ l a r . ~ ' as regras das sociedades, adaptando-as quando necessário: assim,
A morte do titular não implica a liquidação imediata da socie- são órgãos sociais obrigatórios o titular e a gerhcia (art. 36). De
dade, como no projeto francês. No entanto, se em noventa dias os outro lado, tenta obviar os problemas de transfergncia da empresa.
herdeiros não conseguirem chegar a um acordo sobre o destino a Prevê que o direito do titular sobre o patrimônio é um bem móvel
ser dado ao estabelecimento, qualquer um pode requerer sua liqui- incorpóreo (art. 25), que pode ser transferido por ato inter vivos ou
dação (art. 23, n. 3). A continuação da empresa pode, consequente- sucessão mortis causa (art. 27). Para o caso da sucessão rnortis cau-
mente, ser considerada na prática uma exceção. sa, os herdeiros têm um prazo de quatro anos para decidir a respei-
Problemas existem também com relação à circulação inter vi-
a to do destino do empreendimento, período durante o qi.21 9 p.npre-
vos. Não na medida dos existentes com relação ao projeto francês, sa será administrada por aquele a quem corresponderia a inventa-
pois a transferência não é considerada cessão de crédito. Mas tanto fiança do espólio (art. 31). Dentro desse período, a empresa deverá
lá como aqui é possível apenas a venda total do estabelecimento (art. ser transferida a um terceiro, adjudicada a um d a herdeiros ou en-
21). Nlcr existe qualquer dispositivo relativo a cessão parcial, o que tão transformada em uma sociedade comercial de responsabilidade
faz pens&r,quenão seja possível sem mudança de forma (ou seja, limitada.
conversã@-paraa forma societhria). ,
O grande mérito é, ao mesmo tempo, o grande depeito da legis-
cor& no projeto francês, a limitação de responsabilidade está lação peruana: a especificidade das regras. O legjsladi3r reescreveu
sujeita a restrições. Funciona em um único sentido, impedindo que uma lei de sociedades para o empresário individual, qeiando pode-
OS credores do "estabeleciinento" tenham acesso aos bens particu-
ria ter atingido o mesmo objetivo através da intr&uç$o de disposi-
lares do comerciante (art. 11, n. 1). O "estabelecimento", ao con- ções específicas que criassem e regulassem a sociedade ~ n i p e ~ c c ~ i i l . ~ '
trário, responde pelos débitos particulares do sócio caso seus bens Decorrência direta desse problema é a questão da apiicaçii~: Yual
sejam insuficientes (art. 22). Trata-se de solução tida pela doutrina 1 de regras. Adotando a formutação societária, as regras e 1: IOS
como coerente com a caracterização do "estabelecimento" como pa- organizativos do Direito das Sociedades serão sempre apJic4,s .4ão
trinabnio separado no ordenamento português.90 Parece, no entan-
ocorre o mesmo quanto a solução não-societária: as lacu;? ::,.ais V%

dão excessiva liberdade organizativa às partes, criando um i ; ,L de


89. Cfr. Boletim,cit ., pp. 390 e ss., Exposição de motivos n. 7, onde o legisla-
dor preocupa-se em defullr o "estabeteclmento" como patrimano separado, negando. incerteza para terceiros, credores ou não.
lhe qualquer tipo de personificação - com relação à definição do estabelecimento
com patnniônio separado v. em sentido crítico 3. O. Ascenção, "Estabelecimento do comerciante não inquina a sua qualificação como patridnio separli'lc, porque
comercial e estabelecimento individual de responsabilidade limitada" in Revista da "essa depende apenas da imunidade do patrimônio pessoa8"'.
ordem dor advog~dos(Portugal), 1987, p. 10. 91. A semeihança é tão grande a ponto de indu* o &servador esiraigeiro
90.1. O. Ascenção, "Estabelecimento comercial", que faz a afirmaçâo, bas- a considerá-la sociedade - C o que acontece com D. Moe?emanns, c'Recep~6n",
tante discsttível, segundo a qual a responsabilidade do estabelecimento pelos dtbitos cit,, p. 171,
j
I NA FRONTEIRA DO DIREITO SOCIETÁRIO 37

c) Conclusão: sociedade unij$essoalversus empresa inaividd- I


atravCs da empresa. Aliás, se um juízo aprrorístico devesse ser fei-
De um certo modo já foi a conclusão a ser tirada:Deve pri- to, seria necessariamente favorável a sociedade, forma organizativa
a escolha.de uma ou:outra~£orma dotada de plena subjetividadejurídica e com vocação especifica pa-
baseada em principiofógica. Como se verá no ra a separação de esferas.
'
A segunda crítica, de ordem sistemática, refere-se a inadapta-
predominante re- bilidade da sociedade unipessoal a ambientes fortemente contratua-
o reconhecimento lísticos, onde seria mais indolor a introdução de um tipo organizati-
vo não-societário.
Trata-se, porém, de argumento que poaco prova. Como se ve-
rA mais adiante, mesmo nos sistemas mais contratualísticos, como
o italiano, vem-se hoje admitindo a sociedade unipessoal, com bsse
na teoria do contrato-organização.
Mas o argumento mais forte a favor da solução societária pa-
rece vir da prática. Com efeito, argumentos de caráter sistemático
podem sustentar-se somente em situações ideais. No caso oro. em aná.
lise, dever-se-ia imaginar uma realidade de empresários que exerci-
tam todos a atividade em nome próprio e querem escolher a forma
organizativa mais conveniente para o exercício do comércio, Nesse
caso, e somente nesse caso, poder-se-ia pensar em escoih3s de poli-
fica legislativa, como a de manter a coerência sisternatica, ainda que
em prejuízo de um maior incentiva pequena e nédia empresa.
Uma tal situação, porém, não existe. E são os próprios legisla.-
dores a admiti-lo. A introdução de uma forma de Iimita~ãsde res-
ponsabilidade do comerciante individual decorre exclusivamenlc: do
reconhecimento de uma situaqão de fato, consistente na utilização
de sociedades fictícias, com um ou mais homens-de-palha (STroh-
rnann), introduzidos com o único objetivo de permitir a limitação
de re~ponsabilidade.~~

94. Cfr. C. Champaud, "L'entreprise personelle", cii., p. 594, que analisando


a situação francesa, afíma: "On peut estimer que ies 2/3 de quefques 140.000 S.A.
françaises (elles ne sont que 2 a 3.000 en Allemagne) sonr, en fait, dks entrcprises
personzlles. [Jne ênquete realisee en 1972 supres de 2i#: experts comptahlcs icvelc
que 53% au n~oinsdes 8.000 societés qu'ils conaissaicrit parfniteinent bieri kraier.r,
en realité, des entreprises purernent individuelles revêcues d'une forme socide" .
Na Alemanha, estima-se que antes da introdução da GmbH Noveile de 1980
um quarto das GmbH fossem n a realidade sociedades unipessoais: v H. Wiedernai~a
Geseilschaftsrecht, v01. 1, Munchen, Heck, 1980, p. E , nota 7 %
A luz de uma tal situação de fato parece indispenrável a existência de um coei
denamento entre os novos intrumentos e a realidade concreta. Nesse seatiao a critica
de Ascenção ao texto português: "Há uns anos tornou-se célebre esse hatr:ode de

92. Cfr. O. Gomes, Itzfrodução, cit., p. 209.


-
Pittigrilli: a melhor maneira de acabar com uma tentkçãa é ceder-lhe. Ta!vel nrls
se tenha inspirado o legislador português. Preocupado com o número 6,. ~ocieriacles
fictícias, com as quais se procurava afinal obter o resukado da iimitaçrio dc respon-
93. Cfr. O. Gomes, Introdução, cit., ~ p 210.
.
sabilidade mediante sócios pintados, o legislador entendeu que a melhor níanesra íie
JO A SOCIWADE UNIPESSOAL i

Frente a uma tal situação, é necess&io,levar,em.nsjder~@oi


L

I
sa em~cas61de~moite~do empresário. Objeto da sucessão são direta-
em primeira linha, as vantagens relativas"dexcada,umadas hipstet mente os bens da empresa e não, como nas sociedades de capital,
ses. Em caso de instituição de uma forma:qué pão ,ponhaàklisposir,
ção do empresário as mesmas vantagens .da~sociedade;íesse:conti-.
I
1 "os beiís de segundo grau" representados pelas aç6es e pelas quotas.
nuará a fazer uso das sociedades fictícias.05 E o interesse persegui- Foi exátamente com base na convicção de que a circulação e a
do pelo empresário não é, evidentemente, apenasa limit;?çãade res- continuidade da empresa são dois elementos jurídicos básicos para
ponsabilidade. Se fosse, em muitos dos ordenamentos citàdos a fi- ii que a forma organizativa seja realmente atrativa e proporcione ver-
gura do bem de família já serviria como parcial substituto â empre- dadeiro incentivo às pequenas e médias empresas que a Comissão da
sa individual ou à sociedade unipessoal. Na verdade, da maneira c& Comunidade Européia optou pela forma societária como modelo base
mo é concebido nos sistemas que o reconhecem, o bem de família de organização da empresa i n d i ~ i d u a l Evidentemente,
.~~ como ato
, relativo a uma comunidade de Estados, foi necessário levar em con-
permite a separação de um ou mais bens (normdmente irnóv~is)ne
cessários à sobrevivência da família e que não podem servir de ga- ta, para a escolha, a situação dos diversos ordenarnentos que deve-
rantia aos credores.96 riam sofrer seus efeitos. Verificou-se que a maioria (França, Alema-
nha, Bélgica, Holanda e Dinamarca) já reconhecia a forma societá-
Para o empresário, é de importância fundamental dispor de um ria com responsabilidade limitada e que apenas Portugal admitia uma
instrumento que lhe permita ao mesmo tempo organizar-se admi- forma não-societária. Ma versão final, adotou-se um? forma de com-
nistrativamente, ter acesso ao crédito, e que seja enfim separado de promisso político, estabelecendo a forma societária como paradig-
sua pessoa. Os exemplos estudados demonstram que se o primeiro ma para os Estados que não a reconheciam, mas admitindo a manu-
objetivo (e conseqiienteniente o segundo, que acompanha a criação tenção (art. 7) da forma não-societária nos ordenamentos que já a re-
de uma organização adaptável à separação patrimonial) pode s,*r con- conheciam antes da emanação da Diretiva (Portugal).
seguido até mesmo com uma forma não-societária, através da cria- Também com respeito à limitação de responsabilidade, as so-
ção de urna organização de tipo societário, o último, peIa subver- 1,1)-~ qão-societirias apresentam problemas. Como visto acima, a
siio sistemática que importaria, não é normalmente admitido. definição como patrimônio separado é equívoca, figo permitindo
A cansequêizcia das fórmulas não societárias é uma drástica re- I
identificar com precisão a regra de responsabilidade. Patrimônio se-
duçgo da ca.pâcidade de cfrculação da empresa e de sua liquidez. Es- parado pode existir tanto quando não há responsabilidade do titu-
ses problgpw traciwm-se na impossibilidade de venda pareial da lar por dívidas oriundas da atividade realizada com o patrirnônio
empresa SYXJI transformação de forma, OU seja, sem transformá-la I
I como quando o patnrn31llo scparado não responde pelas dívidas par-
previameqe em sociedade. Torna-se, portanto, mais difícil a venda I ticulares de seu titular, ou ainda quando ocorrem ambas as limita-
parcial com manutencão do controle, objetivando mera capitaliza- ) ções. Enquanto a soiilção portuguesa leva a uma limitação unilate-
ção. De outro lado, reduz-se a possibilidade de preservação da empre- ral (o comerciante individual não responde pelas dividas do estabe-
lecimento, mas o contrário não é verdadeiro), na França, apenas al-
acabar com elas seria acabar com a ilimitação de responsabiiidade do comerciante guns bens particulares do s0cio nâo respondem pelos dgbitos da em-
em nome inaividuai. Criou-se para isso a E.I.R.L. - sem, curiosamenteestcrbelecer presa. Esse tipo de lirnitaçau apenas parcial não atinge a duplo obje-
nenhuma ponte pela qual se ixtegrassem nestas as sociedades fictícias existentes" -
"Estabelecimento comercial", cit., p.7.
97. "Afin de amiiiorer le cadre juridique des très petites ecrrcpriset, !a Comis-
95. V. A. Grisoli, Luseciefà con un s o b socio. cit., p. 68, v. também as dúvi- sior, a présenté ai1 Coiiseii en rfiai 148.9 une proyssition de directitee diqa.nt à perrnet-
das levantadas por 3 . 0 . Asccnção para o qual o tnesmo tipo de raciocínio levaria Ire, dans l'ensembie dela Cornunauti., ia creation de societés à un seul associé. Cette
a ciei'ender a eliininação &s impostos para resolver o problema da fraude fiscal - mesure esi destinée à aider les individus Q créer Ieur propre entreprise e a encourager
v. "Estabelecimento comerci~l", cit., p. 7. Trata-se no entanto de um evidente exa-
gero. na medida em que não é possivel sequer comparar os efeitos juridicos e econô- aussi te travail indépendent, EIIe yermet a un homme d'affaire de passer du status
micos da eliminação dos impostas e do reconhecimento da sociedade unipessoal. de commerçant individitel à celui de societé sans I'obligation de trouver des partenai-
res fictifs ou de gérer une soçieté nultipersonelle. Cette proposition piévoit une dis-
96. Para o Direito francês v. a Loi du 12 juillet 1909, sub artigo 2.093, Code tinctisn entre les avoirs professionnels et pzrsonneis, une informatjon claire des tiers
Civil No Brarii, a figura é reconhecida nos artigos 70 a 73 do Código Civil. Na ver- sur les status de l'enlreprise et .facilite /e transferi de I'entreprise en cas de déces du
dade. apbs a ediçiio da lei n. 8.009 de 29.3.90, a residência do casal constitui bem proprietaire ou dans d'cutres circonstances. La societé à un seul associé peut ainsi
impenho14velpor disposigo iegal (art. i?), não precisando ser constituído e regis- constituer une étape sínificativedans ie dévdoppemeiit d9uneentreprise" - Unepo-
itacio como tal por dispozit;ão $e vontade das partes. titiquede I'entrepriscpour 1; ~ornrnutiniitP.agosto de 1989, Comissão CEE, p. 24.
NA FRONTEIRA DO DIREITO SOCIETÁRIO 41
Í
tivo &eir6pedir:queamína empr traga consigo a ruína pessoal Evidentemente, para ser coerente com a assertiva acima, o con-
(irresponsabilidade do pelas dívidas empresariais) ceito de grupo utilizado deve ser mais amplo, não incluindo apenas as
1 e garafitixaos credoressociais a do patrimônio empresa- sociedades unipessoais cujo sócio único é uma outra sociedade, mas
I rial, impedindo a concorrência particulares (irrespon- também aqueles casos de sócio único, pessoa física que tem interesses
sabilidade do patrimônio dívidas particulares). empresariais em outras sociedades nas quais detém uma participação
I
I Todos esses relevante. Em ambos os casos, existe a pluralidade de interesses empre-
, inadaptabilidade sarias, sendo provável a utilização de uma sociedade no interesse da
outra. O conflito de interesse decorre, nesse caso, iyso jure da posição
do sócio e consequentementeexige regras mais rigorosas de salvaguarda
dos direitos de terceiros.'* Foi reconhecendo essas diferenças que a
XII Diretiva Comunitáriadeu liberdadeaos países membros para prever
regras mais rigorosas relativamente às sociedades uriipessoais de gru-
po (entendida no sentido mais amplo especificado acitna). O assunto
será tratado mais profundamente no terceiro capítulo.
3.2.3 A limitação de responsabilidade do comerciante tndividuaI no
BrasiI

+
Nas pánii~asanteriores foram abordadas duas questões intimci-
chamá-la ou não de sociedade torn -se uma questão terminológica. mente ligádas: a conveniência e as conseqüências econ6mico-jurídicas
da limitação de responsabilidade do comerciante individual e a me-
A conclusão no sentido da preyalência da forma societária não Ihor forma de organizar a limitação de responsabilidade do comer-
implica qtie ewa esteja isenta de pr ciante Endividual.
ce ser a "ambigüidade funcional Verificou-se que o debate hoje na Europa desenvolve-se predo-
soa1 com minantemer-iteem torno da segunda questão. No Brasil, ao contra-
de que ela se apresenta como expressão rio, ainda não se chegou a um consenso a respeito da primeira.
a) Patrimônio separado - No Brasil, já h6 muito ternpo se debate
a respeito da conveniência ou não de se fazer uma exceção ao princí-
pio da responsabilidade integral da pessoa pelos seus débitos.ioi
Pela própria forma como se colocava a primeira questão, a se-
gunda, dela dificilmente cindível, vinha respondida em termos não-
societários. As opiniões favarhveis a lirnilaçio de responsabilidade
tendiam, de início, a defender a limitação de responsabilidade atrz-
vés da forma não-societária. Os poucos projetos iepislativus a re-
sentados, nenhum deles aprovado, eram todos nesse sentido.' A B
100. Cfr. V. Emmerich-J.Sonnenschein,Konzernrecht, Munçhen, Beck, 1989, p. 47.
101. Cfr. contra W. Ferreira, Tratadode Direito Comercial- O esralurodo coiner-
cinnle, vol. 2, São Paulo, Saraiva, 1960, pp. 261 ss.; W. Bulgarelli, A teoriajurídica da
empresa, São Paulo, Ed. Revista dos Tribunais, 1985, p. 416, a favor, S. ,V.Machado,
98. Cfr. a opinião de G . Scognamiglio idpsuuiida por L. Balsano in "Un semi- LimifaçcTode respomabilidadedocomerciante indrvidual, São Paulo, 1956;J. M.Othon
nario sulle imprese unipersonali a responsabiiifa limitata" in Giusttzia Civsle, 1988, Sidoii, "A atividadenegocial no anteprojeto do C6digo Civil" in RT46S/ll; E. S. -
11, p. 228 (229). I mo, "Sociedade unipessoal por quotas de responsabilidade limitada" in RF303/ 23.
99.Cfr, P. Behrens, The one man c o n l k ) ~Repor1
, o~7German Law, XIII 102. Cfr. W. Ferreira, Tratado, cit., p. 261 e 3. M. Othon Sidou, "Aatividade
International Congress of Comparative Law, Canada, 1990, pp. 5 ss. negocral", cit., p. 14, esse último comentando o projeto "Orlando Gomes"
I
I

A SOCIEDAD~UNIPESSOAL NA FRONTEIRA DO DIREITO SOCIETÁRIO 45

constituição da sociedade de 7 para 2 (are. 80, inc. i, da lei acioná- 4.1 A teoria institucionalista
ria de 1976). Dessa maneira, facilitou-se tremendamente a consti-
tuição das chamadas Strohmann@.sellschaften, sociedades de dois A primeira solução teve maior elaboração na Alemanha, não
sócios sendo um fictício, meramente por acaso a terra-mãe tanto do institucionalismo quanto da socie-
c) Conclusão - Se fosse necessário hoje descrever a situação dade unipessoal com responsabiiidade limitada.i06
do sistema brasileiro, deveria seridito que não existe o reconheci- O institucionalismo alemão remonta A formulação da doutrina
mento legislativo de qualquer forha de limitação de responsabili- do Unternehmen an sich desenvolvida por W . Rathenau no prisnei-
dade do comerciante individual. O que existe é apenas uma forma ro pós-guerra. O autor, economista e homem de negócios, infiuen-
+
de limitação de responsabilidade a subsidiária integral - ideali- ciado pela gravíssima situação econômica da Aiemanha no fim da
zada para os grupos, que não ateqde aos interesses da pequena em- i primeira guerra mundial, identificava em cada grande sociedade um
presa individuaI e que sobretudo não permite a diferenciação de dis-
ciplina exposta acima. A interpret#ção jurisprudencial tem tentado
!instrumento para o renascimento econômico do pais.'07
-%

cobrir essa lacuna, sobretudo atrav s da aplicação analógica dos prin- Rathenau não utiliza o termo empresa em acepção técnica,
1
cípios introduzidos pela Lei das S, ciedades Anônimas as socieda-
des por quotas de responsabilidade limitada.
identificando-a substancialmente com a grande sociedade anoaima,
como demonstra a utilização indiferenciada em sua obra dos ter-
mos Aktiengeselischaff e ~nternehmen.'~~ A origem econômica da
Portanto, hoje em dia o sisteba brasileiro tende mais para o teoria influenciou seus elaboradares no plano jurídico, que 1-130 se
reconhecimento da limitação de através da forma preocuparam excessivamente com uma construçlio teórica dos çon-
profundamente a ceitos. Alguns sustentam que o termo é coincidente com o de sacie-
extensão do possibilidades de dade por ações, outros que se trata de um conceito jurídico autsno-
mo e externo ao de sociedade.lm De qualquer forma, é inegávej que
o recurso ao termo Unternehmen é útil para o fim de identificar uma
.-.- ao interesse dos sócios.u0
instituição não-redutivel
..'
_C.._c

-- -"*...
*---*,--.--.e

Identificadas as vantagens e dksvantagens da solução societá- 106. Ainda que cronologicamente não tenha sido a primeira a reconhecê-la (na

i
ria como meio organizatlvo da enzp esa individual, segue-se Iogica- Buiopa, por exemplo, à parte a experiência do Liechtenstein, a Dinamarca passou
a admitir a sociedade unipessoal em 1973), foi na Alemanha que o instituto W e a
mente uma outra questão: como ju tificar, dentro do ordenarnento maior elaboração doutrinária.
societário, uma sociedade dotada e responsabilidade linaitada na 107. Cfr W. Rathenau, "La realtà della società per azioni, Riflessioni suggaite
qual não existe uma pluralidade de s jeitos? A questão pode ser for- dall'esperienza degli affari" in Rivistadellesociet~,1966, p. 412, tradução italiaaa da
mulada de outra maneira: como garantir o respeito a integridade -
obra Von aktienwesen einegeschqftlicheBefmhl~ng,Berlin, 1917 (não encontlada).
do capital social na ausência de plugalidade de interesses? Gomo se 108. Cfr. P. J. Jaeger, L'interesse sociale, Milano, 1964, p. 20.
verá, a experiência comparatística revela uma tendência a não con- 109. Como revela P. J. Jaeger, do ponto-de-vista normtivo é muito g m d e
a dificuldade em separar a disciplina do Ilnternehmen da dísciplina da sociedade:
fiar apenas em garantias formais cobo a publicidade, por exemplo. " ... seiribra impossibile tracciare una linea precisa fra attività della so&tA e
A admissão ou não da limitação de kesponsabilidade depende sem- attiviti delt'impresa, se ad esempio se può dire che Ia ripartizione degli utili frai soci
pre do conceito específico de iiltereste social vigente em cada orde- non torca in alcun modo gli interessi delle dtre parti rappremtate nell'impra, ta
namento. I jeliberazione reiativa aila parte dell'attivo da distribuire agii azionisti sotto ímma
di dividendi, e all'altra parte da imputare a riserve per i bisogai dell'impresa, irneste

I
Aqui se está diante de urna out a fronteira cio Direito Societá- invece in uguale misura entrambe i tipi di interesse. Tutravia nn giudizio defiskivo
rio alcançada pela sociedade unipes oal: a concepção da sociedade che faccia preferire l'una concezione all'altra deve naturalmeate fondarsi sul &&to
como contrato, de um lado, e de ou ro a sociedade concebida e or- positivo perche astrattamente nulla impedirebbe a1 legislatoredi superare queskddif-
ficoitit limitando la disciplina della società d regolamento dei r m r í i intemi ai g q p o
ganizada como instituição. A exper ência coinparaiística demons- dei soe e trasferendo la soluzione di ogni altro problema si51 piano dell'impías;tY'
tra a presença das duas soluções, que servirão de base presente -- L'interesse sociale, cit., p. 50. Não se tem notícia porém & introdução d e m a
análise teórica. tal distinção tanto na Alemanha como nos demais o r d e n a m t o s analisados.
110. Significativo é o emprego atual do termo Gesell&ffsinieresse ( k a l -
mente traduzido: "iuteresse da sociedade") para identificar oa interesses dos &ios
105. Cfr. J. L. Correa de Oliveira, A upla crise da personahdade ~uridica,
São Paulo, Saraiva, 1979, pp. 566-567. f e do termo Unternehmensinterese (literalmente traduzido: "iateresse da emprm")
para identificar o interesse social.
I 46 A SOCIEDADE UNIPESSOAL
i
, .'
Toda a construção da teoria de Rathenau 6 dirigida a traduzir besiG) de 1976. Tais leis devem ser consideradas uma continuação
_ em termos jurídicos a função econômica, de interesse público e não natural da doutrina do Unternehmen an s i ~ h . " ~
meramente privado, da macroempresa, Isso se faz através da valo- Com efeitts, até o advento de tais leis, tanto do ponto-de-vista
do órgão de administração da sociedade por ações,
órgão neutro, apto a defesa do Unternehmensinteresse jurídico quanto do político-econômico, observava-se e criticava-se ,/- -,
.,
empresarial). Procede-se a uma degradação relativa da im- a falta de u 2 a aplicação efetiva dos princípios instituciondistas na
da Assembléia, o que influenciará sobretudo os direitos lei de 1937. No piano jurídicc, acusava-se a doutrina do Unterneh- (':-..
.<*..v
sócios minoritários. 1 1 1 men an sich de não ser coerente com as premissas por ela mesmo '@
A recepção legislativa dessa teoria deu-se na Aktiengesetz 1937, afirmadas, que postulam o reconhecimento, na disciplina das socie-
que fez seus quase todos os princípios defendidos pela doutrina do dades por ações, das diversas categorias de interesse dos trabalha- 9)
Unternehmen an sich, assegurando à administração (VerwaItung)pre- dores, dos sócios e da coletividade, confiando a tutela de todos es-
ses interesses ao Vorstand, Ór;iio não apto, pela sua vinculação ao f7
dominância sobre a assembléia dos acionistas (Hauptversarnmlung).
Tal teoria entrou em crise a partir dos anos cinqüenta, sendo grupo de controle, a levar a ef-ilo essa complicada tarefa com a ne-
criticada sobretudo pelo segundo aspecto, denominado negativo e cessária irn~arcialidade."~ r?,
i....,

que se traduz em uma tendencial independência (e irresponsabilida- Evidentemate, os acontecimentos descritos acima não podem *.,
de) da administração com relação aos acionista^."^ A reação ser consideradês como de nalu-cil continuidade em um processo c-,
c"-
,

completou-se com a lei acionária de 1965, que reforçou o papel da "darwinianãmente" evolucionista. ..L.
Assembléia dos acionistas e os direitós
-.. dos acionistas minoritários,
--" -, .
""- Muito influiu para a ~natnrkçãode tzi3 leis, a particular situa- r,';
No intervalo entre a lei acionária de 1937 e a lei de 1965 existe, ção da Alenianha no seg~iiùaapiis-guerra.H5A necessidade senti-
i@

no entanto, toda uma rica construção doutrinária que não pode ser da pelas potências ocupantes e elos sindicatos de promover uma @
desprezada. No presente trabalho são analisadas somente as gran- "descartelização" e um enfraquximento geral dos centros de po-
des linhas dessa evolução, necessárias à compreensão do institucio- @ *Cd

der na indústria alemã ajudou 3 levar avantz os desejos dos sindica-


nalismo em sua forma atual.
tos de criação de uma real f.t4rt,.chaftsdemncratfe,como concebida
A característica fundamental desse período, mencionada em nos primeiros anos da República de Weimar. O fracasso na sua in- II
i ...
'.
,L -.
qualquer trabalho comparatístico como caracteri'stica distintiva do trodução era visto Aquela época ccmo uma das principais razões para
sistema societario demão, é o aparecimento das leis que regulamen- o advento s~cessivodo regime nacional-socialista.116
r;
. ,

tam a participação operária nos órgãos diretívos das grandes em- i


-.
presas (Mitbestimmungsgesetze). São elas: a Qesetz uber die Mit-
113. Para sustentar, d o ponto-de-'iista histórico-político, uma tal continuida- ,-
besfimmung der Arbeitnehmer in die Aufsichtsruten und Vurstan- de entre a doutr~nado Unrernehmen a4 s:ch e as híitbzstirnmungsges~zeé necessá- ~.
Çien der Unternehrnen des Bergbaus und der Eisen und Stahl erzeu- rio, no entanto, deskincular a doutrina co Unternehinen an sich e consequentemen- i;'
gende Industrie (MntaMitbestG 1951), a Betriebmerfasungsgesetz te, a própria lei acionária de 1937 da içeoiogia nazista. Se é verdade que muitos dos
$Y,

de 1952 e a Gesetz tiber die Mitbestimmung der Arbeitnehmer (Mít- principias da refxida doutrina mostraram-se muito úteis ao nazismo, também é ver- @
i dade que a formulaçâo da doutiina se deu no período da República de Weimar,
"& cujos princípios rente aplicar ao campo societái io - v. a respeito P. G . Jaeger, L'in- @
111. Os críticos dessa teoria argumentam ser ilógico considerar a administra-
IerrAse sociale, cit., 3 . 11.
ção (Yerwaltung) um 6 r ~ ã oneutro de defesa do interesse social. Dada a sua estreita
ligação aos interesses dos siicios majoritfirios, a autonomia e tendencial irresponsa- 114. Cfr. P. C. Jaeger, L'rnZere;~soeraie, cit., p. 47. ,r3
bilidade decorrente do recurso constante ao irikeresse social acaba funcionando fre- 115. Para uma ampla explicação do contexto sócio-político no qud nasceram r-.

qtentemente contra os interesses do sócio minoritário e no interesse do sócio contro- as Milbesfimmuzgsgese,'ze, v. M. J . Bonel!, Partecipazrone operaia e diritto dell'im- k,$
lador - cfr. P. J. Jaeger, L'inferesse sociaie, cit., p. 29. presa, Profili co:nparafisti, Milano, Giuffrè, 1983, p. 234 e ss.
Tal conclusâo não é , no entanto, absoluta, porque como demonstra Galgano, 116. Cfr. M. J. Bonelf, Partecipattane pueraia, cit., p. 236. É: interessante
a recepção legislativa parcial de tal teoria na I~ália(não aceita por grande parte da observar que a palavra usada, Mitbesiiinmung, foi empregada pela primeira vez r
-,
doutrina) levou a um inaioi equilíbrio entre os órgãos societários, sendo o órgáo ad- em sentido jurídko exatamente na Corsriruição da República de Weimar (Weima-
ministrativo menos influenciado pela "brana di alti dividendi dei soci" - F. Galga- rer Verfassungj Fara indicar o direito dos irabalhadores & participa60 na determi-
I-

<...
no, Dirifto cornm~.rciale,Lesocietà, 3! ediçjo, Bologna, Zanicheiii, 1987, pp, 361 ss. nação global da ordem econômica e :oc.at - v. H. Wiedemann, Geseiischafts-
I12. Cfr. H. Wiedemann, Gesellschafsrecht, cit., pp. 301-302. rechf, cit., p. 5s.
@
@
m
DO D I E I T O SOCIETÁRIO NA FRONTEIRA 51
I
Tais observações bastam pdra compreender a notáveí influên- Deve-se, no entanto, esclarecer os sentidos que pode assumir
cia que um tal ambiente teve sob' e a aceitação da sociedade unipes- o termo "contratualismo". Pode-se dizer que o sistema italiano é
i
soal. Evidentemente, conceber o Unternehmensinteresse como inte-
resse a preservação da empresa, &oncepçãoque das sociedades com
tradicionalmente contratualístico na medida em que nega que o in-
-
---- seja f a i e r a r q u i c ~ u ~ e r i ao
teresse social o r inte~ess,eresos-sócios.
participação operária propaga-se bara todo o Direito Societário, per- Trata-se, portanto, de um contratualismo definido por contraposi-
mite superar as restrições teóricas existentes contra a limitação de ção ao institucionali~mo.~~~ Talvez sua representação mais suges-
tiva seja a feita por Asquini no famoso artigo intitulado "I batteli
1
responsabilidade sem pluralidade de interesses. A tarefa torna-se pu-
ramente técnica e não mais princ piológica. Uma vez definido o in-
teresse social, pouco importa se é um ou se são vários sócios a
de1 Reno", cujo ponto de partida é exatamente uma frase atribuí-
da a um administrador do Norddeulscher Llyod, "i1 quale avrebbe
persegui-lo. Importa apenas criar garantias equivafentes aquelas exis- dichiarato in forma polemica che scopo delia sua società era non
tentes para a sociedade ~ n i p e s s q a l . ~ ~ ~ di distribuire utjli agli azionisti, ma di fare andare i battelli sul Re-
no (o suj mari)".127
Evidentemente, tal tarefa tornou-se mais fácil ein presença de
uma efetiva representação de interesses eni conflito, i.e,, nos casos Deste contratualismo por antonomásia podem-se deduzi1 dois
conceitos diversos: em um primeiro, o interesse social é depurado
de sociedades unipessoais sujeitas h Mitbetirnmting (co-gestão). Nes- de elementos externos. Define-se o interesse social sempre como o i,
<,:

'
sas últimas, as mutações organizativas introduzidas contribuíram pa- interesse dos sócios e somente dos sócios atuais. Uma segunda ver-
'

0
ra a procedirnentalização da ativi ade social, com a conseqüente di- tente inclui na categoria sócio não apenas os atuais como também
, minuição de poderes do sócio úni o. Com relação às sociedades não os futuros. A perspectiva a longo prazo do interesse social ganha I
I obrigadas a admitir a participação,operária, tornou-se necessário im- importância. Obviamente, nesse caso assume relevância também o I
por deveres mais rigorosos de pu6iicidade e documentação dos ne- próprio interesse à preservação da empresa, motivo pelo qual 1
gócios realizados. Deixa-se r>oré(i rua análise para o capitulo 11.

...- O- - contratualismo
&"4.2 --
Interessa estudar a
I
i
I
afirma-se que essa variante contratualista, na prática, pouco se dis-
tingue da teoria instituci~nalista,"~Interessa nesse momento mais
a primeira vers2Y. pbFiErmfxwsi(20 ao instituiionalismo i por
sua vig$ncia, ainda que parcial, no Brasil.
1
/ i

I
I
I
do interesse social, ou Trata-se de conceber o interesse social como referente apenas
p interesse do gru- ao grupo de sócios atuais.129 Um dos principais defensores desse
unipessoal. tipo de concepção é Jaeger. Para ele, o interesse social não consti-
tui um conceito abstrato, mas sim algo de concreto, defnivel ape-
nas quando comparado com o interesse do sócio para apiicaçgo das 1
41
É necessário, no entanto, faz r uma análise separada da lei, na
qual a concepção contratualista anifesta-se de forma prevalente
mas não exclusiva,125e de uma p rtici~lar(e hoje majoritária) in-
terpretação doutrinária, que veio e afirmando scbretudo a partir
regras sobre conflito de interesses.130
O autor chega a tal conclusâo a partir de sua concepç3o parti-
cuiar do contrato de sociedade: como o contrato social é de execz-
ção continuada e o iiiteresse social C o i~tetessedo grupo de $6
1
i

da metade dos anos sessestnta e qu&vê na disciplina societsiria Lima


I
disciplina exclusivamente contratyal. -
126. Cfr . F, Galgano, Diritto conzmerciale Le societd, cit ., p, 360, nota 9,
que afirma: "6 una teoiia che si autodefinisce, poleinicamente, 'coi~trattualistica'pe:
sottolineare i1 fatto che essa respinge la concezione della società come 'istituzione'
4
124. Cfr. H. Wiedernann, Geseikcha tstccilf, cit., p 7: "Sachlich 1st die An
nerkeilnung der Einmanngeseilsclial-t-- diq wirtschablich deni Bnzelkaufmartn mil
beschranktei Haftung enispricttt -- beiechtigr, well und wenn 6a Ei~imanrigesells-
staccata dalle persone dei soei e la configura, afl'opposto, quaie rapporto contrat-
tuale fra pii! persone, che non involge aitro interesse se non queilo delle parti
chafter die Voraussetzungen deu Gieuhiger und krheitnehmerschut~e$crfiilll, die bei contraentí".
h e i Mehrrnanngeseiischaft ~ondervermodcnsoidniinglind i-!afiungbe<chrankiiiig 127, Cfr. A. Asquini, ''I battellidel Reno", in Rivrsta dellesocietà, 1959, p. 617.
rechtfertigen" 128. Cfr. P.C . Jaeger, L'interesse soca'aie, cit., pp. 89 ss.
125. V . para a 1ndividual17dqãodor; lrayos ~iisi~tucicna!istasrio orcitnaniento 129. Cfr, F. Galgario, Diritto conrmerciale - Le societff, cit., p 361.
societkrio italiano, V. Galgano, Dirrlto comnieri.rult7-- Le socirta, cit., pp. 361 ss. 130. (3. P. G. Jaeger, L'inl'eresse soeiale, cil., 1). 218
52 A SOCIEDADE UNIPESSOAL NA FRONTEIRA DO DIREITO SOC~ETARIO 53

cios,131 aquele interesse social pode ser constantemente revisto e Iiano. Trata-se da única forma de contrabalançar o "direito" do só- i
. -: .

eventualmente desconsíderado de modo explícito quando se trata de cio único de utilizar a sociedade como "coisa própria".135 6
9
unânime dos sócios. É interessante notar como a referida substituição é imperfeita
Outros autores, preocupados com a possibilidade de interferên- do ponto-de-vista teórico. A responsabilidade ilimitada é uma re- @
ia1 na determinação do interesse social que sua nãodefinição gra de proteção dos credores, enquanto as regras sobre conflito de t?$ *'..
pode implicar, 132 preferem definir um interesse social abs- interesses são destinadas primariamente à tutela de interesses inter-
e típico. Traindo sua origem, inserem-no "nelio schema cau- , "\
n o ~ . Tal
' ~ imperfeição
~ revela o real pressuposto subjacente a 16gi- < ,

e1 contratto di società", reduzindo-o ao interesse à maximiza- ca da substituição operada na referida norma: ao impor a equiva- r:
lência entre contraposição interna de interesses e responsabilidade
esença de tais concepções do interesse social, não limitada, negando a subsistência da segunda na ausência da primei- c
por qne o desaparecimento da pluralidade dos só- ra, afirma-se sua indispensabilidade, ou seja, desconfia-se da orga- i-'
sível distinguir entre interesse do sócio e da socie- nização societária como meio de tutela da separação patrimonial na
nseqiientemente, exatamente o contrário do que ausência da normativa conflitual. i':
ocorreu na Alemanha: no caso da sociedade unipessoal, em vez de fg
reduzir o interesse do sócio ao interesse da sociedade, reduz-se o 4.3 Efeitos das diversas teorias sobre o conceito de in.'eresse social
interesse da sociedade ao interesse do s6ci0.'~~O passo seguinte @;
é considerar inaplicáveis as regras sobre conflito de interesses, já
que a contraposição de interesses não mais existe. Ao sócio é da- Da análise feita acima, conclui-se que as diferentes respostas h:.:(
e-,

~.-,

do, portanto, utilizar a sociedade em seu único e exclusivo interes- ein campo institucionalista e contratualista para o problema da so- , .

se, como "coisa própria". ciedade unipessoal baseiam-se sobretudo em um modo diverso de
Não é ainda o momento de indagar das conseqüências dogmá- compreender o interesse social.
ticas de tal concepqão. Por ora, interessa apenas destacar sua con- Na sociedade unipessoal, é indispensável que esse seja definido
seqGir2ncia mais irnportmte no plano legislativo: a responsabilidade de modo abstrato, de forma a distingui-lo do interesse do sócio e,
ilirnixada do sócio único, prevista no art. 2.362 do Código Civil ita- conseq6entemente, da causa do contrato de sociedade. Como visto
r*;
h+
131. O W o r faz uma difrrença entre "interesses de grupo", liitáveis tempo- 135. Cfr. S. Scotti-Camuzzi, "L'unico azionista", cit., p. 782:
ralmente por rer iesentarem osinte~essesde um grupo determinado de pessoas e "in- 'Si deve dire pertanto che i'art. 2.362 statuisce la responsabilita iIlimitata de1
teresses de sC&: fuja duraqãc, L naturalmente indefinida, pois representam sujeitos unico azionista, non perchè questo ha i1 potere di usare Ia sua societh nef suo perso-
não todos determinados e não todos exislentes ao mesmo tempo - cfr. P. G. Jae- nale interesse (i1 medesimo potere, e con gli siessi strumenti: delibera asseinbleare,
ger, L'inferesse sociale, cit., p. 128 ss. nomina e revoca degli atnministratori, pressioni sui medesirni, 10 ha anche l'a~ionis-
132. Cfr. A. Ganibino, I1 principio di correttezza nell'onlinamento delle societa ta o gli azionisti - di maggioranza) nia perchè ha i1 diritto di farlo: beninteso,
perazioni, Milano, Giuffrè, 1987, p. 216. Não é essa, no entanto, a única preocupação. però, rispettando le forme della soggetivizzazione e della organjzzazione societaria
O autor revela também sua premupação com a svirilizsazionedo contrato de socieda- ed osservando le norme stabilite a tutela dell'integritlt de1 patrimonio socialc. 1.Iori
de: "i1 paralleio tra i1 rifiuto de1contratto in una posizione istituzionale e Ia svirilizza- si trata di concepire ia posizione deii'unico azionista in termine di abuso, cir :;.rto
zione di esso, ridorto a schema procedimentale, in una concezione formale dei diritto (anche se legalmente presunto) ma di riconoscere che non vi può essere abuso, f i s i o
non é senzasignificato. In anibeduegli orientanzenti si avverteche l'ordinarnento sociale clie la normativa che ne sarebbe a preçuppnsto (se si p a l a di abuso é perclik c.i;:ta
ha una legge no riferibile ai prirzipi dell'atrliazione de1 contratto, che esigono Ia pun- regola relativa all'uso di un potere o ail'esercizio di iin diritto viene trasgrediifa: i i t ~ i l
ruale e integrale realizmzione ddla convenuta composizione di interessi. La giustifica- trova applicazione.
zione di tale singolarità viale data, in una visione formale, con l'implicito accoglimen- L'articolo 2362, pertanto, non costituisçe una norma íntesa a dettare isu5 $ali-
to di una nozione di contratlo a cui rnancano ie essenziaii caratteristiche funzionali; viene zione conlro una presa di potere che non può essere infatto contrastata ( d ~ t &':,çccii-
a
offerta, neii'izdirizzo istituzional~con 2 poslulare chei principi deii'ordinamentoopenno za di una minoranza all'oposizione), ma è una norma che, prendendo atto dr
già nella fase costitutiva della società. Viene smarrito in ambedue i casi i1 valore dell'at- (legittima) posizione di potere, e si11presupposto (implicito) ma necessario, e de1 tut-
to di autonomia privata, come nlontario regolamento degli interessi" (p. 133). ra corrispondenre alla situazione di fatto, che all'esercizio di tde potere non d lriù
133. A. Gambino, I1 principio di correrteza, cit., p. 232. post,to (perchè non ha più senbo) i1 vinco10 derivante dalla regola generale dei catiílír-
134. Cfr. S. Scotti-Camuzzi, "L'unico azionista" in Trattato dellesocietàper to di interessi, ne detta una òiscipiina aitemativa, sancendo Ia responsabilità patri-
azioni, coordenado por G. E. fJo1ombo e G. B. Portale, vol. 2, Tomo 2, Auoni, monia!e dell'unico azionista" .
Gruppi, Torino, UTET, 1991, 2. 782. 136. Cfr. S. Scoiti-Camuzzi, "L'unico azionista", cit., p. 783.
56 A SOCIEDADE UNIPESSOAL NA FRONTEIRA DO DIREITO SOCIETARIO 57

fato como de direito, que contém uma regulamentação bastante fz- dois sócios para a constituição e o art. 206, inc. I, letra d, prevê a
vorável às empresas conglomeradas, em prejuízo, muitas vezes, de dissolução em um ano das sociedades reduzidas a um só sócio, se
uma proteqão mais razoável dos interesses de terceiros.143Mriitas a piuralidade não for restabelecida. Também na lei acionária, por-
foram os questionamentos a respeito da constitucionalidade de tais tanto, a sociedade unipessoal é uma exceção.
regras. Sustenta-se que referidas disposições, claramente incentiva- É interessante notar que à natureza específica da hipótese não
.doras da formação de grupos, implicam um auxilio indireta a da- corresponde uma disciplina particular. A lei acionária não contém
minação do mercado, sendo conseqüentementecontrárias às regras nenhuma regra especial sobre a responsabilidade, sobre a regularnen-
constitucionais que regulamentam a liberdade de con~orrência.'~ tação do conflito de interesses, nem mesmo deveres especiais de pu-
Tentou-se, em segundo lugar, facilitar a capitalização das blicidade para a sociedade unipessoal.
presas atravks do mercado acionario. Em conseqüência, tornos-sr E como se o legislador brasileiro acreditasse na persecução es-
necessário criar regras que permitissem proteger os investidores con- pontânea do interesse social por parte do sócio único, ainda que sem
tra o arbítrio dos sócios controíadores, incentivando-os assima par- um sistema legal que o constranja a tal. Analisando-se mais profun-
ticipar das empresas. Procurou-se criar um sistema de proteçiio das damente a lei, vê-se que o institucionalismo limita-se a declaração
minorias acionárias, baseado, entre outras coisas, na institucbnali- de princípios. Enquanto todos, trabalhadores e até mesmo a coleti-
zação dos poderes e deveres do sócio controlador e dos administra- vidade (na qual dever-se-iam incluir, antes de tudo, os credores) são
dores. Manifestação dessa tendência é o art. 116, par. Único, que declarados co-titulares do interessesocial; para a demanda indeniza-
estabelece deveres genéricos para o acionista minori~áriocom reta- tória decorrente da atuação da sociedade controladora contra os in-
ção aos demajs acionistas da empresa. aos trabalhadores e à esmolu- teresses da controlada, apenas os acionistas têm legitimidade (art.
nidade em que atua. Sobre a utilidade desse tipo de declaração ge- 246). O interesse social na sociedade unipessoal torna-se, consequen-
nérica que não encontra tradução em regras organizativas, exktens temente, um interesse sem um defensor independente.
rnuitas dúvidas. Pode-se questionar se não acaba servindo, @ma A mesma "ingenuidade" do legislador não pode ser encontra-
ocorreu na AIemanha, para justificar atuações dos acionistasm j o - da quando se trata de sociedade unipessoal não de grupo, onde a
ritários e seus representantes no interesse próprio, ern nome 3e um inexistência de uma outra atividade por parte do sócio único dimi-
na1 defkido interesse nui até mesmo o risco de conflito de interesses. Para esse tipo de
sociedade, verifica-se ao coritrário uma rigidez extrema que leva ao
De qsakqiier forma, a partir dessa relação necessária, criada pro- não-reconhecimento da sociedade unipessoal. Sobre essa ambigui-
positacf&>eate pela lei, entre grande empresa e princípios iostitu- dade de fundo do sistema societário brasileiro será o caso de retor-
cionafisigs bS (ii;e deve ser entendida a admissão da sociedade uni- liar nos capítulos I1 e 111.
pssoal. Apenas desse modo pode-se entender a admissão da socie-
dade unipessoal apenas dentro dos grupos (de fato). Com efeito, ao
lado do art . 25 1, que admite a constituição de uma subsidiária inte- 5. A teoria do conbrtzto-organizaçiio
gral por parte de uma sociedade brasileira, encontram-se os princí-
pios contraiualistas tradicionais para o caso de sociedades cujo Gni- As teorias, como até aqui expostas e criticadas, parecem levar
c0 sócio é uma pessoa natural, O art. 80, inc. I, exige o mínimo de a um inpasse com relação ao tema tratado. De um lado, uma defi-
nic;ão contratudista tradicional da sociedade impede o reconheci-
i4?. P;!rc a ~riticada regra que prevê a responsabilidade limitada da i"idIdffi~ rnento da sociedade unipessoal, A apiicação pura e simples da t a -
e sobretudo do acio~lisladnico da subsidihria integral, v. F. K. Comparato, Opoder ria institucionaíista, por outro lado, não permite resolver todos os
. ss. O probien~aserá analisado com mais profundidade no
de controle, cit., p ~ 359 problemas, como por exemplo a definição da real amplitude do ín-
capítulo li1 do presente trabalho. teresse social e de seus titulares.
144. Cfr. M. Csrvaihosa, A nova lei dassociedades anônimas,seu moddo ec9-
nbmâo, 2: edição, Rio de Janeiro, Editora Paz e Terra, 1977, pp. 147 e 174, ande Na verdade, a forma mais correta de sistematizar os problemas
sustenta-se que a lei acio~hriaé contrliria ao artigo 160, V da Constitui~ãode !%i relativos à sociedade unipessoal é explicá-la a partir da teoria do
(artigo 173, $ 40 da Coristitiiição de 1988). A respeito do problema v. também i&c contrato-organização.
cap. 111, n. 1.6.
i45. Para uni& critica ria lei com respeito aos interesse dos acionistas mioorká- Essa construção baseia-se na diferença, proposta pela doutrina
rics v, M. Carvaihcsa, A nova fei, cit., pp. 113 e ss. moderrta, entre contratos associativos e contratos de permuta. Se-
l
i NA FRONTEIRA DO DIREITO SOCIETÁKIO 59

gundo ela, não se devem mais distinguir a b a s as figuras,,como,na I Adotada a teoria do contrato-organização, é no valor organi-
clássica lição de Ascarelli, a parttr da existência ou não de uma fi- zação e não mais na coincidência de interesses de uma piuralidade
nalidade comum. 146 Trata-se, isso,sim, de afirmar que o núcIeo dos de partes que se passa a identificar o elemento diferencial do con-
contratos associativos está na o r g w ç ã o criada, enquanto nos con- trato social.
tratos de permuta o ponto fund mental é a atribuição de direitos A especificidadeda causa do contrato de sociedade, a diferenciá-
da
subjetivos.147Ou seja, enquanto função dos contratos de permu-
ta é a criação de direitos subjetiv s entre as partes, a dos contratos
associativos é a criação de uma brganização.
10 do sinaiagma dos contratos de escambo, não está no fim comum
(de lucro) a ser buscado, mas sim na criação de uma organização,
apta a atribuir individualidade e perpetuidade ao patrimônio a esse
Organização, na acepção juijdica, significa a coordenação da fim destinado. Portanto, perde importância a pluralidade de sócios.
influência (jurídica) recíproca entie atos.148Ora, é evidente que, li- Tanto uma pluraIidade como um único indivíduo pode ter interesse
berado do conceito de direito sub'etivo e preso ao de organização, na criação de uma tal organização, 15'

A teoria do contrato-organizaçãoI
d
e identificado no ato de constitui ão de uma sociedade unipessoal
um caráter organizativo, resulta a missível caracterizá-lo como con-
trato associativo ou de ~0ciedade.I~~
torna o reconhecimento da
sociedade unipessoal possível mesbo em presença de uma concep-
Quanto a unipessoalidade superveniente, não existe um reai pro-
blema teórico. Aceitá-la não implica, em si, qualquer negação do
contratualismo. Com efeito, basta ignorar "le vicende de1 contrat-
to sulla personalita una volta che la fattispecie costitutiva si sia com-
pletata"ls2 para poder falar em unipessoalidade s~pervenienteem
ção contratual da sociedade. Corh ele é possível superar todos os um sistema contratud.
problemas relacionados ao reconhécimento da sociedade unipessoai. O que permanece a resolver é a definição do interesse social.
O primeiro deles é o da constituição unipes- Como já visto, a concepção contratualista tradicional do contrato
de sociedade não permite diferenciá-lo do interesse do sócio e, por-
tanto, dificulta o reconhecimento da limitação de responsabilidade.
Em presença de uma concepção organizativa, isso não ocorre.
A organização criada não mais justifica sua existência a partir ex-
da pluralidade de - cfr. T. Ascarei- clusivamente do interesse dos sócios. Partindo da premissa de que
ii, "O contrato plurilateraI" in Problemas dassociedadesanônimasedireirocompa- no contrato de sociedade não mais se vê um ato de criação de direi-
rado, 28 edição, São Paulo, Saraiva, 19691 p. 271. Ainda que admitindo a função tos subjetivos para os sócios, o interesse social não mais pode ser
à finalidade comum, 3.
qual a sua construção justificado exclusivamente a partir da conjugação de seus interesses.
não se desprende do tradicional no binômio ato-direito subjetivo. Existe um outro interesse, definido em função da vontzdc da
Para a critica desse tipo de I contratti associativi, Mi- parte(s) e das disposições legislativas. Se a forma escolhida (pelo fun-
lano, Giuffrè, 1976 , p. 107-121.
147. Cfr. P. Ferro-Luai, I confratti'assoiotivi,cit., pp. 121 ss. dador ou pelo legislador, ao prever apenas a sociedade unipessoal
I
148. V. P. Ferro-Luzzi, I contratti qsociativi, cit., p. 179.
149. Nesse seiltido K. Schmidt, Ge.seIt$chafsrecht, 2a edição, KoIn - Beríin, 151. Cfr. C, Angelici, "Societ8 unipersonale e progettomgentino di ~iiíifica
Bonn, Munchen, Carl Weymanns, 1991, p. 1 .@24, que a respeito do ato de constitui- zione dei codici" in Rivisfa dei diritfo commerciale, 1988, I , p. 61, que afim? "é
ção da sociedade unipessoal afirma: "Diesf Erklarung hat aüerdings Satzungscha- sul valore organizzativo de1 contratto sociale che deve essere puntata l'atteaiio~rc
rakter; insofem hat die Einheitsbezeichnung 'Gesellchaftsvertrag' fiir die Mehrper- un valore che 10 rende peculiare rispetto ai contratti di scambioe che, non tradiic eri
sonen - und Einmanngrundung durchaus Ietwas fur sich". dosi nelia formula tecnica de1 rapporto diritto soggettivo-obbli, crea una ssitii cio-
150. ]S. importante mencionar, no entdnto, que o problema teórico da consti- ne giuridica la quale prescinde dell'esigenza, tipica per quel.rapgwrto, di iadivir~uale

!
tuição unipessoal perde relevância aplicativ a partir do momento que se admite a una pluralità di soggetti e di posizioni soggettive".
StrohmanngrUndung,ou seja, constituição a sociedade através da utilização de ho- 152. Cfr. G. Ferri, Le società, 3 0 edição, Torino, UTET, p. 390, que ezl?iic.ii:
mens de palha, que em seguida retiram-se d sociedade. Isso se dB com o reconheci- "come vi può essere una persona giundica sulla base di un c w a t t o nulIo, rtrG vi
mento da característica de neg6cio indireto ao ato de constituiç&oda sociedade - può essere una persona giundica quando i1 contratto è quiesce* ed una sola pei so-
cfr. T. Ascarelli, "O negácio indireto" in , oblemas das sociedades anonirnas, cit, na partecipa at capitale sociale, tanto più che ai di fuori di q m t a ipotesi io stesso
p. 136-137. O assunto ser&analisado mais qrofundamente abaixo (cap. If, n.3.1.3) sciogíimento de1 contratto non importa Ia estinzione delia soci& persona giurid~ca,
quando da análise das regras do Direito SOcietário brasileiro. ma soltanto una modificazione dell'oggetto".
uu A SOCIEDADE UNIPESSOAL

e não a empresa individual com responsabilidadelimitada) foi a or- e aqueles pragmáticos, que trazem consigo o perigo de aplicação li-
ganizativa societária, com atribuição de personalidade jurídica, o vre e arbitrária das normas.
interesse do fundador e do ordenamento é direcionado no sentido Na verdade, o que ocorre através da organização é a criação
da estabilização da estrutura organizativa econômica.1s3Portanto, de um centro autônomo de d e ~ i s õ e sA . ~organização
~~ nada mais
é inafastável considerar o interesse da organização assim criada co- é que um Apparat capaz de assegurar (ou de fazer presumir) a to-
mo composto pelo interesse ao lucro empresaria1 de seu criador e mada autônoma de decisões. Vistas sob essa perspetiva, a atribui-
também pelo interesse na autopreservação (Erhaliungsinteresse).E ção de capacidades ao ente personificado e a conseqüente caracteri-
em função da interação e do equilíbrio entre ambos que deve ser zação da pessoa jurídica como centro de imputago de direitos e de-
direcionada a atividade social. veres são mera decorrência do reconhecimento da o r g a n i z a ç ã ~ . ' ~ ~
As considerações acima baseiam-se em um raciocínio ainda mais Mas há ainda uma outra consequZncia de importância funda-
amplo. A organização é, na verdade, elemento central da própria mental para a sociedade unipessoal. O reconhecimento da capaci-
personalidade jurídica.lS4Uma tal argumentalyão não implica uma dade de uma tal organização de tomar decisões autônomas, a partir
postura unitária. Não se pretende erigir um tipo específico de orga- da procedimentalização das decisões sociais, implica admitir que a
nização em elemento central do conceito de pessoa jurídica.lS5 mesma pessoa seja a um tempo órgão social e titular de um interes-
A organização como fundamento da personaiidade jurídica Ie- se i n d i v i d ~ a l . Justifica-se
'~~ assim não apenas a prbpria existência
va necessariamente ao pluralismo. O ordenamento reconhece e atri- da sociedade unipessoal mas também, como se verá mais abaixo,
bui capacidade jurídica diversa segundo os diferentes tipos e dife- a aplicação da teoria da desconsideraçãc quando essa diferenciação
rentes graus de organização. E é esse conjunto de capacidades, de- interesse social-interesse individual na realidade não exista.
correntes da existência da organização societária, que constitui o
"conceito" de personalidade jurídica. Assim, ao buscar seu funda-
mento último na organização, o conceito de personalidade jurídica 6. Efeitos ap:;'l;;li,os: sociedade unipessoal e sociedade u
m ~&io
s
e
assume aqueIe caráter pluralistico necessário à obtenção do equilí-
Como visto, a aceitação da sociedade unipessoai parte da cons-
sitivos dogmáticos, nem sempre capazes de for- tatação de que uma vez vista a sociedade como instituição ou como
quada às rápidas mutações do Direito Societário, organização e uma vez introduzida uma disciplina compatível com
tal definição o número de sócios é absolutamente irrelevante.
153, A a:abiiização da estruturas organizativas é talvez, a principal função da
atribuição da personalidade jurídica, hoje -m dia. O reconhecimento da inutilidade Tiradas as conseqüências lógicas desse tipo de raciocínio, não
da discussão navecentesca a respeito da natureza da pessoa ~urídicaesta à base dessa apenas a sociedade unipessoal mas também a sociedade sem sócio
redução - v. nesse sentido C . Ott, Recht m d Realitaf &r t/ritert?&menskorpom- deve ser admitida.
tiun, Tiibingen, Mohr, 1977, pp. 36 ss. O autor vê também na perpetuação das es-
truturas organizativas possibilitada pela personificação juridica, uma função macro-
econômica: "Dze Staãiiitat, die sie dem eirzelnen Unternehmen verieiht, iibertragt 156. Nesse sentido U.John, Die organisierw Rechtspzrmn, cit., p. 72, expres-
sich auch auf dil- Organisation des Markta, Es geht dabei um Kcmzerne und Kartel. sa: "Die Rechtsperson ist also zunachst ein Entscheidungstrager. Da die Entschei-
-
le, es geht aber auch wie die vielfaltige Verwendung der GmbH, insbesondere auch dung auch nicht inhaltlich 'vmpr~~rammiert' sind und zwar auch nicht im Sinne ei-
-
im Zusarnmenhang der GnibH & Co. KG zeigt um bequeme Kooperationstechnik ner Weisungsabhangigkeit, ist die Rechlsperson ferner ein seibstandigen (verselbs-
tândigter) Entscheidungstraga" .
ausserhalb der Konzerne und KarteUe, um Ersatzformen" b.126).
854. V. nesse sentido U. John, Die organMerte Rechtsperson - System und 157. V. U. John, Die organisierle Rechfsptrson, cit., p. 313.
Probleme der Personifikntion im Ziviirecht, Berlin, Duncker & Humblot, 1977, pp. 158. É esse tipo de raciocínio que está à base do d%po;itivo da lei francesa que
72 ss. Para o autor são elementos da pessoa jurídica Handlungso~ganistafion, Haf- prevê que o sócio iInico não pode delegar seus pojeres e que suas decisões, tomadas
fungsverband e fdentifatsausstaftung.Na verdade, parece preferível identificar na no lugar da Assembléia, são yegistradas - art. 3 da lei 85-6'37(cit. nota 13), que
organização um Andamento e não um elemento da personalidadejuridica, para evi- introduz o art. 60-1 na lei 66-573 de 24.7.66.
tar confusões conceituais com o conceito de sociedade. É de resto, no conjunto de Na verdade, a mesma duplicidade de posiç&s - -
individlal-orgânica existe
capacidades atribuidas que a doutrina dominante identifica os eiemmtos da perso- no mandato, cujo ato constitucivo, a procuração, nálo por acaso é também caracteri-
nalidade jurídica - v. infra cap. 11, n. 3.3 1, d. zado como ato de organização - v. nesse sentido C. Angelici, "Socied unipersona-
155. Para a critica do unitarismo v. infra cap. 11, n. 3.3.1, d. le", cit., p. 61, v. também U. John, Die organkierte Reckfspefson, cit., p. 7 8 .
62 A SOCIED~E
UNIPESSOAL

redutivel ao interesse particular do A primeira hipótese é a da aquisição pela sociedade das ações
sócio e sendo definido, como a partir da interação entre inte- a título oneroso, Evidentemente, trata-se de hipótese delicada, pois
da empresa, a identidade implica distribuição de patrimônio. Nesse caso, dois são os interes-
sociedades serem cha- ses a serem tutelados.
madas de capital, de pessoas. Na
verdade, a De um lado, o dos credores que têm na garantia da intangibili-
perschaft alemã) é sua independpncia em relação,aos acontecimen- dade do capital a compensação pela limitação de responsabilidade.
tos e mudanças existentes no gru' o de sócios. 159 E essa independên- Para tutelar esse interesse, o importante é irnaedh que a distribui-
cia que faz com que uma socied&e possa existir sem nenhum sócio ção do patrimônio atinja o capital. Daí a Lei (asSociedades por
atual, mas apenas com a simples1perspetiva de um sócio futuro.160 Quotas prever que a aquisição só se fará com os fmdos disponíveis
e sem ofensa ao capital social (art. 80, dec. n. 3.708), e a Lei das
Essa não é a sedeprópria p a discorrer a fundo a respeito da Sociedades Anôminas prever que a aquisição só i%? faro até o valor
sociedade sem sócio. E necessdri no entanto, evitar uma confusão
conceitual. Exatamente como a bociedade unipessoal, a sociedade do saldo dos lucros ou reservas. Assim é que, no caso de aquisição
sem sócio não constitui uma contradição em termos, ou algo incom- integral, seria necessário que o saldo de lucros r,ão-&stribuídos, mais
a reserva de ultrapassasse o valor do mpital social.
patível com a própria definiçãoide sociedade.
Do ponto-de-vista positivo drasi~eiro,encontra-se em situação Mesmo não ultrapassando o valor do saldo dk lucros e reser-
semelhante à da sociedade uniipedsoal. Com efeito, o art. 206 da Lei vas, tal operação de aquisição da ações pode ser amlads caso possa
das Sociedades Anônimas prevê a 'dissolução da sociedade "pela exis- configurar causa, ainda que longínqua, de inisol~~&cia da sociedade
tência de um único acionista, verificada em Assembléia Gera1 Ordi- (art. 106 CC).
nária, se o mínimo de dois não fdr reconstituído até o ano seguinte, Outro interesse a ser tutelado é o dos sócicss~~irnoritários.
As-
ressalvado o disposto no artigo 241". Há referência expressa apenas sim, é importante garantir que a aqiiisição não se !%asade um só só-
à sociedade unipessoal e não a sodiedade sem sócio. Duas podem ser cio ou grupo de sócios, o que poderia implicar apc~ssibilidadede
r
as interpretações dessa norma: o I a literal, ou seja, permitir a per-
manência d a sociedade sem sócio,por tempo indeterminado, ou en-
favorecimento. Por isso, a Lei das Sociedades p~ Quotas dispõe
que a aquisição se fará "por acordo entre os s&ms" (art. 80). k
tão aplicar isoladamente aparte Lrr do àispositivo, que faz referência
I
ao número mínimo de dÓissócios, Mesmo nesse caso, no entanto, a
Lei das Sociedades Anônimas não dispõe expressmente sobre o as-
sunto. Parece, no entanto, que o deyer de lealdade& acionista cnii-
permanência da sociedade sem sóc40deveria ser permitida por, ao me-
d
nos, um ano. O mesmo princípio e preservação da empresa que tem
trolador, previsto como princípio geral no art. f l6,par. único, bem
como a qualificação como abuso de poder da coranacão entre acio-
k
levado a jurisprudência a permiti a manutenção da sociedade uni-
pessoal por períodos mais longos az preferir a primeira interpreta-
ção também com
nista e sociedade em condições de favorecimen:~pessoal (o que evi-
dentemente ocorreria se todas a s ações adquiridas pertencessem ao
controlador e a aquisição fossf feita até o iinaltt: mkimo possivel
ça, em função a permitir-lhe a manutenção 90 ~ ~art . 117, 5
controle), p r e r no
ao problema da 1o , letra f, já fornecem a esfirutma protetiva n~~~~*5sária,
disciplina a ser aplicada à Especificamente com r/ação as companhas~ertãs,a Instru-
da uma das possíveis à situação de inexistência
de sócios. ção CVM n. 10, de 14 de fevereiro de 1980, q u e m l a a aquisiqão
por companhias abertas de suas próprias açõeg ,gsoibiu a compra
pela companhia de ações de seu controlados. Esgmiiicarnente com
159. Cfr. A. PauIick, Die Grnbíil oHne Gesellschafier, Gottingen, WiRe Ver-
lagsgesellschaft, 1979, p. 66.
relação à aquisição de todas as ações, poder-se-kargume~~tar que
tal norma é desnecessária, Nesse caso, a tutela d a d c i o s rninoritá-

161. A respeito do conceito de saldo de lucros e resgpvâ$,v. PR. Carvaiiiosa,


Comentáriosa Lei de Sociedades Anônimas, voi. 1, São P a e kSaraiva, i 977, sub.
propriedade-controle A. Berlc-G. Means, lfke moifern corporation, cit., p. 116. art. 30, pp. 149-150.
66 A SOCIEDADB UNIPESSOAL

Uma tal tornando desnecessária, a atri-


buição do controle de com o fim de institu-
cionalizar as primeiras.

I
Mas, sobretudo, forneceria ma estrutura organizacional com-
patível para a grande empresa ins itucionalizada, onde não há inte-
resses pessoais de sócios a serem satisfeitos, mas que também não
pode ser gerida através da est utura pré-capitalística das fun- A SOCIEDADE UNIPEYSOAL SINGULAR:
dações. 167 I FORMA ORGANIZATIVA DA PEQUENA E
&LA EMPWSA

I . Premissa: escopo econômico e forma juvbdica

A análise da sociedade unipessoal exige considerações de cará-


ter jurídico e econômico. É bastante claro que o empresário indivi-
dual é, na sua forma típica, um pequeno e médio empresário, com
poucos dependentes e pouca utilização de capital,
É: exatamente nessa característica típica que a sociedade uni-
pessoal encontra sua justificação econômica mais evidente. O apoio
à pequena e média empresa é o principal fundamento econômico
para o reconhecimento ,da sociedade unipess~alcom responsabiii-
dade limitada. Se juridicamente a sociedade unipessoal aparece co-
mo uma forma centralizadora\de poder, economicamente, pelo me-
nos com relação as sociedades uY'pessoais não-grupais, ocorre exa-
tamente o contrário: permitir a orgqnização dos pequenos empresá-
rios implica um efeito global descentralizante.
A mencionada XII Diretiva CEE s bre a sociedade unipessoal
\
faz referência expressa a tal objetivo.' A iretiva faz parte do pro-
grama de ação em benefício das pequenas em6dias empresas, apro-
vado pelo Conselho das Comunidades Européias em 4 de n o ~ ~ e m -
bro de 1986 e que prevê a apresentação de propostas relativas ao
Direito Societário "com o objetivo de encorajar a criação e o de-
167. A respeito da semelhança sociedaue sem sócio-fundação, muito já se dis-
cutiu. Ambas as formas não podem ser co4fundidas e tampouco a sociedade sem senvolvimento das pequenas e mCdias empresas".
sócio deve ser vista como uma forma de frfudar as regras impositivas das funda-

e
ções. A diferença fundamental entre ambas b que enquanto nas fundações a ausên- 1. Cfr. "Relazione introduttiva alla proposta di dodicesima Direttiva de1 Con-
cia de "sócios" faz parte de sua essencia ti que esta 4 uma mera destinação patri- sigiio in materia di diritto delle societh" in Rivbta delle socielà, 1988, p. 823, onde
monial a um fim especifico dotada de perso alidade jvrídica), na sociedade sem s6- se afirma que o encorajamento a o acesso dos empresários individuais à forma socie-
cio a ausência de sócios é meramente eventu . Mais do que isso: na sociedade sem tátia, que representa o contexto meihor para o desenvolvirnento dos negócios no mer-
sócio, como em quaíquer sociedade de a organização e a estrutura jurídica cado interno, inclui-se nessa política global descentraiizante. A Resolução do Conse-
deve ser apta a proteger os interesses indeterminado (e futuro) - v. a lho de 22 de dezembro de 1986 sobre o programa de ação para o crescimento da ocu-
respeito A. Paulick, Die GmbN pação destaca da mesma forma a necessidade de encorajar a empresa individual.
68 A SOCIEDADE UNIPESSOAL FORMA ORGANIZA-TIVA DA PEQUEN.4 E MÉDIA EMPRESA 69

Para ser coerente com tal objetivo, não basta reconhecer gene- E evidente que tal tipo de distinção implica uma certa dicoto-
ricamente a sociedade unipessoal e atribuir-lhe indiscriminadamen- mia entre escopos politicos e formas jurídicas. Não se pode afastar
te responsabilidade limitada. Como a prática demonstra, a socieda- a possibilidade de uma sociedade unipessoal não de grupo atingir
de unipessoai é a ideale Konzerntochter (sociedade controlada ideal) proporção e poder econômico muito grandes. Em sentido inverso,
e'como tal utilizada frequentemente como forma organizativa das a fórmula demonstra-se mais coerente. Impor uma disciplina mais
grandes empresas.2 rígida para os grupos implica excluir uma grande parte das grandes
sociedades (ainda que não todas) das disposições mais favoráveis.
i.1 Sociedade unipessoal singul~re sociednde unipessoal de grupo Essa parcial dicotoaia entre formas jurídicas e objetivos políti-
cos não é grave. A superposição perfeita entre ambos não constitui ob-
A coerência com o objetivo citado e só com ele sugere duas pos- jetivo de políticalegisl~tiva.A regra juridica é influenciada em sua for-
sibilidades: a primeira, a fixação de uma quantidade máxima de ne- mação por outros determinantes, de ordem jurídica ou não, que im-
gócios, de lucro ou de dependentes como requisito para atribuição pedem a perfeitacoincid2ncia. O simples fato de a norma jurídica con-
da responsabilidade limitada. Tal limitação, porém, além de bas- seguir exprimir a tendência econômica desejada já é bastante positivo.
tante arbitrária, não encontraria qualquer justificação do ponto de
vista societário. Com efeito, uma vez admitida a sociedade unipes- Preocupante é a ncrma juridica que cria tendência exatamente
soa1 com responsabilidadr?lunitada, parece difícil justificar, com base contrária aquela indicada pelos objetivos econômicos. E o caso da
em fundamentos de Direito Societário, o estabelecimentode qual- atual disciplina societaria brasileira (onde, como visto, apenas a so-
quer diferença baseada nas dimensões econômicas da sociedade. ciedade unipessoal de grupo é admitida). Trata-se de caraterística
interessante sobretudo quando se t e n ~presente que no Brasil o tra-
Do ponto-de-vista societário, uma real distinção é justificável tamento favorecido da pequena e média empresa tem previsão cons-
apenas com relação a sociedade unipessoal gmpal. Nesse caso, a coe- titucional. A Constituigão incluiu entre os "Princípios Gerais da Ati-
xistência na mesma pessoa (física ou juridica) de dois interesses em- vidade Econômica" o tratamento favorecido das pequenas empre-
presariais e o fato de que em uma das empresas existe uma concen- sas de capital nacion~l(art. 170, IX).
tração de poderes capaz de submetê-la ao outro interesse empresa-
rial justificam a distinção, com aplicação de uma disciplina mais rí- Existe zité mesmo umâ iei, o Estatuto da Microempresa (lei n.
gida a essa Yltima (sociedade unipessoal grupalf. 7.252, de 27 de novembro de 19841, que contém dispositivos visan-
do a facilitar a atividade das pequelias empresas do ponto-de-vista
A AgDketiva seguiu-essa lógica. Mesmo fazendo parte do pro- fiscal, crediticio, administrativo, securitário, trabalhista e econômico.
grama delqcentivo da pequena e média empresa, a diretiva não es- Tal regulamento não ccntem, no entanto, qualquer dispositivo so-
tabele~eU~~udquer limite relacionado às dimensões da sociedade. cietárío. O art. 20 limita-se a afirmar que a lei é apiicá~elàs pessoas
Com relação aos grupos, a diretiva determina em seu art. 20 que jurídicas e aos empresários individuais com rendimento bruto não
os Estados podem prever disposições ou sanções especiais caso o só- superior a 10.000 OTNs.
cio único seja uma pessoa jurídica ou participe de outra ~ociedade.~ No Brasil, não existe qualquer forma para a limitação de res-
ponsabilidade do comerciante individual. Na própria definição ,das
2. Cfr. M. Lehmann, "Das Priviieg der beschrankten Haftitng und der Durch- fuffispeci sujeitas ao Btatuto da Microempresa, a igualdade deiira-
-
griff in Gesdfschafts- und Konzernrecht eine juristische und okonomische Analy- tamento é evidente. Fala-se indistintamente de "pessoas jurídicas
se" in ZGR 1986, p. 351, que aErma: "Aus der Tatsache der beschrdnkten Haftiing e firmas individuais", ou seja, procura-se facilitar da mesma forma
kann somit prinzipieii kein spezifischer Mittelstandschutz abgeleltet werden"; v. tam-
bém G. Scognamiglio, Un seminurio sulie imprese unipersonali, cit., noaa 70. o tratamento cteditício e econômico do empresário coletivo que go-
3. A versão final é muito mais branda que a proposta da comissão. Nesta últi- za de limitação de respansabilidade e do empresário individual, ili-
ma, deixavam-se duas possibilidades de escolha aos Estados em caso de sociedade mitadamente respons0vel.
unipessoal com sócio único pessoa juridica (art. 2 do projeto, in G.U.C.E. 2.8.88;
C , 73, 10): ou responsabilidadeilimitada tout court, ou sua limitação aos caso de
sociedade que superassem as dimensões previstas no art. 27 da IV Diretivs. (total do em consideração principabente as pressões da indústria alemã (apoiada pelo Bun-
balanço inferior a 4 milhões de ECU; total dos negbcios realizados inferior a 8 mi- destag e pelo Bundefraf),yue temiam que a regra de responsabilidade ali contida
invíabiihsse grande parte os grupos (de fato) existentes. Deixou-se, portanto, aos
lhões de ECU, numero de empregados inferior a 250).
países membros z escolha de prever ou não uma disciplina diversa para os grupos
Ou seja, pretendia-se restringir seu emprego iis pessoas fisicas e as pequenas
sociedades. Ka versão final, produto evidente de negociações políticas, levaram-se
- cfr. H. W. Ecftert, "DieHarmoniesi~ungdes Rechts der Einpersonen-GmbH",
i i ~Europaische Zeitschrift $r W'irfschaffsrechf,1990, p. 5 5 .
FORMA ORGANIZATIVA DA PEQUENA E M~~ÉDIA EMPRESA 71

I
,: Em do~trina,~tais.necessidades prziticas fizeram-sesentir de iní-
geiro a admissão da sociedade un são citadas pelo legisla- cio através de uma diferenciação tipológica. Assim, fala-se em ad-
dor apenas quando se trata de sociedade unipessoal de mitir a sociedade unipessoal apenas na sociedade por ações, onde
Lei das Sociedades Anô- existe uma suficiente separação s6cio-admini~tração.~ Na socieda-
nimas, ao justificar a integral, o le- de por quotas de responsabilidade limitada, a responsabilidade li-
gislador argumenta que a proibiçãq de constituiç50 unipessoal. seria mitada não seria conseqüência da limitação de poderes dos sócios,
inútil, em face da utilização de hgrnens-de-pa1haa4 não se justificando a não ser por razoes pragmática^.^ Não é de es-
1 pantar, portanto, que o primeiro reconhecimento legislativo da so-
1.2 A forma societária das empresas: sociedade anóninza ciedade unipessoal naquele país tenha ocorrido na Lei das Socieda-
versus sociedade por quotas d# responsabilidacte limitada des por Ações.Io
JLi. a admissão da sociedade unipessoal por quotas de responsa-
Outra questão intimamente da aos escopos econômicos é a bilidade limitada foi imposta por exigências práticas. Não é possi-
relativa à forma, anônima ou da sociedade unipessoal. vel sequer identificar uma clara intenção política do legislador de
'4 questiio que incentivo a pequena e média empresa, Ao contrário, foi exatamente
ao outro para a
a utilízação mais intensa da GmbH(socieclade por quotas) pelos pe-
Essa discussão já é antiga na Alemanha. Confunde-se com o quenos empresários que fez a sociedade unipessoal se impor por via
próprio probIema do reconhecimento jurisprudencial e doutrinário indireta." Em uma pesquisa do Ministério da Justiça alemão nos
da sociedade unipessoal. anos sessenta, constatou-se que 23,2% de todas as sociedades por
Na doutrina e na jurisprudência sentiu-se, desde o início do sé- quotas eram na realidade sociedades unipessoais. No rnesmo grupo
culo, a forte influência da Genossenpchuf~stheorie. Em face d o rea- pesquisado, constatou-se que 92% eram caracterizadas por tima de-
lismo atribuido ao grupo de sócios e conseqiientemente à socieda- pendência importante da pessoa do s6cio e 64% tinham um sóci:,
de, sempre existiram fortes resistçn4ias coutra a introdução da so- que era ao mesmo tempo administrador.
ciedade unipessoal. Havia hesitação k n admitir
~ a persoriificaçao ju- O reconhecimento da sociedade unipessoal correspondeai por-

1
rídica na ausência de I(orper.schuft. Na jurisprudência, na entan-
to, as resistências eram mais reduzi .as. Ali, as necessidades práti-
cas faziam-se sentir com maior intef sidade, iúão é de espantar que
o Heichsgerich t 5em sua pioneira deci *ãode 28 de novembro de 1885,
tenha feito referência exatamente as ecessidades do comercio (Ver-
kehrbedurfnisse) para admitir a con inuação, com responsabilida-
$
de limitada, de uma sociedade red zida Za unipessoalidade."ssa
tensão tecirico-prática explica s posi&o cautejosa, quase resignada,
tanto a uma exigência prática. A própria Exposição de Motivos da
GmbfINovelle 1980 faz referência Ct inutilidade da imposição de um
número mínimo de sócios em face da utilização de homens-de-palha
na fase de constituição da sociedade.12
É interessante notar, no entanto, que apjs a introducão da
GmbHNovelle, a GmbH tornou-se o protótipo ideal de sociedade
unipessoal, sempre lembrado quando o assunto é invocado.

1
do BGH em decisão de 11 de outu ra de 1956, ao afirmar que a
sociedade unipessoal é "uma figura ão-convincente do ponto-de-
vista teórico, que no entanto é recon eeida pelo direito costumeiro,
não-lesiva A economia phblica, com Irelag.50 :,raai existe :;ma x:e-
cessidade prática e contra a quãl, a rjigo ser elas relicêncjas teciri-
Após a introdução da lei, certa parte da doutrina passou a uti-
lizar como fundamento para admitir a sociedade iinipesçoíii o mrsms

8. Cfr. HaHstein, "Berichte uber die Sitzungen des Ausschusses fur CrnbH Rwhf
der Akademíe fur deutsches Recht", VII, 1938 in Akademie fiir dartsches Recki
cas, nada de importante pode ser o4osto". '? (1933-1945), Pmtokolle der Ausschiisse, Berlin-NAYYork, de Gisuyler, 1986, p. 473 (494).
5). Cfr. H. J. Mertens in Hachenburg Grosskommeníar zum GmbH Gesetd,
4. V. Exposição de Motivos do Ministro d/ Fazenda, cita,Lapiculo XX, Seção V. Berlin-New York, de Gruyter, 1979, (4.Lieferung), Q 13 Anh. 1, Kdn. I i .
5 . Cfr, 0. Kuhn, Sirohnzanngrundung, at., pp. 59 ss. 10. Faz-se referência ao 8 319 da Akfiengeseiz I965 sobre a Ernglirdeitci!g (que
6. RÇZ 23, p. 202. ser&abordada no último capítulo) e aos $8 3, 15 e 50 da l/mwandlungsgesefz 1909.
7 BGHZ 21, p. 384: "ein Gebilde, das zwar nicht ~ibeizeu- 11. v. E. Gessler, "Probleme der GmbH Rechtsreform" in GmbHRundschuz~
1966, p. 102 (104).
12. V. Deutscher Bundesfag, Drucksactie 8/1347 (Gruppe 91, nov. 1977 -- rníiiqi)
1978, sub 5 1.
74 A SOCIEDADE, UNIPESSOAL FORMA ORGANIZATXVA DA PEQUENA E MÉDIAEMPRESA 75

Resta saber se se pode inferir, de tudo o que foi dito, uma neu- 2.1 Os critérios para a apuração da unipessoalidade
tralidade econômica, de lege lata, das formas societárias previstas
2.1.1 O critério nominalístico ou numérico
por ações e as sociedades por
influenciam uma divisão O princípio sobre o qual se assenta o critério nominalístico ou
resposta como já visto cL numérico é muito simples e lógico: a impossibilidade de presumir
que o sbcio com pequena participacão seja um "homem-de-palha"
(Strohmann) sem interesse real na vida social. O &cio conr pequena
Essa difereaicia~ãotipológica baseada na realidade econômica, participação deve de todo modo assumir as obriga~õesde sócio: in-
pela correspondência realidade-ti& que tenta estabelecer, deve sem iegralização do capital, prestação de garantias para essa integraii-
dúvida ser favorecida.17 Como a estrangeira demonstra, zação quando for o caso etc. Desse modo, não é admissivcj previ-
o reconheciinento da sociedade quotas de responsa- mir sua má-fé.20A essa afirmativa corresponde a uegaçáo da prx-
bilidade limitada é aprofundar tal sibilidade de se utilizar um conceito amplo de sociedade unipesscai
diferenciação. que inclua também as sociedades com "homensde-palha",
Deve-se destacar que tal critério é extrerriarnente !ógico para os
2. A sociedade unipesssal coma fhttispecie ordenamentos que não reconhecem diferença suhtandal de discl .
I plina, quanto às relações externas, entre a sociedade pluripessoal c
Definir a sociedade unipessoal não é tarefa fácil. Obsetvando- unipessoal. Isso porque, com respeito as relações ktercas (entre so-
se os diversas sistemas, constata-se:que não é possíveI formular um cios), é muito arriscado propor um ampiiação dafartispeiic socie-
conceito univoco de sociedade unipcssaal, Existe uma pluraiidade dade unipessoalZ1,E o motivo é óbvio. Tal equip%açsío pobclia ser
de conceitos, forrriulados em sua aioaia cm sede doutrinária e ju- feita apenas desconsiderando os interesses dos outros ç6cihi;, si1 c?-
risprudenciai, mais amplos oii restritos de acordo com a disci- ja, presumindo que são homens-de-palha, sem interesse s u ~ ) a I »-
plina aplicada. Trata-se do feiiòniebo já identificado como "reação prio e a serviço do sócio majoritário. Dcscorisiderãr seus izriri c-sscs
em prol do sócio ú s c o correspcl~derianesse caso -prfeitame-\viaos

1
da disciplina sobre a Jcrffipslj~c;e"ue leva o intérprete a definir a
hipótese legal de i~lcidência('fu:ti.~pcie) segundo a disciplina que se
quer ou se deve aplicar, em um pr , cedimento inverso ao da tradi-
cional subsunção do Fato h norrng.'s
interesses dos sócios majoritários quc buscassem fraudar a lei. Se-
ria possível gozar das vantagens da pluripessoalidade (iimil8ç2.o dc
responsabilidade) sem ter que suportar seus Ônus, consistenlcc 11s
respeito aos direitos dos minoritários.
Obvia~nente,o corxceito de souiedade unipessoal apresenta re-
levância aplicativa apenas quando sociedade unipessoa1 niio é re- O mesmo critério já não parece tão ftbkio em píesencc ' \

conllecida ou a ela é aplicada urna ldisciplina diversa da sociedade sistema que reconheça urna diferença fundamental & I:scipii,iL
pl~iripessoal. exatamente por issd que na doutrina brasijeira oão respeito às relações externas, entre a sociedadl: plttrigesço: ' c

se discute a respeito da defin&iio dk "subsid49iia integral" (soae- ciedade unipessoal. É o caso do sistema italiano
dade unipessoal de
de grupo, ao 20. Cfr. para o problema, como era colocado anteriormate a um: , 1

de. Fala-se assim em em sentido amplo e em 1980, P.Ulmer, Hachetrbur. Grosskommentar zum CrnbBf G M z , 88 edis
sentido estrito. l9 New York, de Gruyter, 1990 (1. Lieferung), sub $ 2, Rdu. 55 9 5 . ; antes
GmbH Noveiie 1980, qire reconheceu a sociedade i~rúpessoal,a &utrína p o
favoravdmente a apticação do critério numérico, o que ckmmsini no c < . ;
i

autonoma dafattispecie, não influenciada pda disciplina - uí P. Ulrnei , 1 '


burg Grosskommentar m~n GmbH Gesetz, '78 edição, Berlin-Nw Yoik,6, i -
17. Cfr. nesse sentido N. Abrão, Socieífudepor quotas de ae~ponsabilidadek-
mitada, São Paulo, Ed. Revista dos 'Tribun ls, 1989, pp. 41-42.
1975, (2. Lieferung), sub 5 2, Rdn, 49 ss.; H. J . Mcrtens, Hai:frt?rrhitrgC::' . li-

18. Cfi. P. O . Jaeger, Lu nozione d ' i & p m , cif.. p. 54.


mentar, cit, Rdn. 22 ss., W. Sjebert, "Einmann GmbH urid Strohniannpi~~ I(', . f''
in BB 1954, p. 417.
19. Cfr. J. L. Corr ea de Oliveira, A dupln crise, c&., p. 61 1.
21. Cfr. F. K. Comparato, O poder de controi~,c I., ?8.
FORMA ORGANIZATIVA DA PEQUENA E MÉDIA EMPRESA 79

administração adeoutras sociedaqes controladas pelo sócio majori- volvida por essa sociedade era estranha as de um banco e o fato de
t á r i ~ Por
. ~ ~trás da decisão, ainda que não declarado explicitamen- que o banco permaneceu na posse das ações por apenas dez dias (pe-
te, está o entendimento de que d condição de empregado é incom- ríodo no qual constitui-se o débito), a Corte recusou-se a aplicar o
patível com a de sócio. art. 2,362 (que prevê a responsabilidade ilimitada do sócio único de
Interessante é menos o critério em si que a necessidade que ele sociedade de capitais em caso de falência), argumentando com base
representa. Em presença de um isistema que reconhece no critério na impossibilidade de caracterizar o banco como empresário. Com
numérico o único para a determi ação da unipessoaiidade, é neces- essa decisão a Corte, em um caso limite (tendo em vista o breve perío-
sário reduzir as situações à unipissoalidade real ou numérica atra- do de posse das ações), vinculou a aplicação do art. 2.362 aos fins do
vés de presunções, mesmo que d'p aceitabiiidade duvidosa. E inte- exercício do poder totalitário e considerou irrelevante o dado formal
ressante notar, aliás, que a CassaQão, analisando diretamente o pro- da atribuição de todas as ações ao alienante. Para isso desconsiderou
blema da diferença entre atribuição fiduciária e simulada de ações, a diferença, tão cara para a doutrina, entre fidúcia do tipo germâni-
co (em que não há transferência da propriedade e para a qual não se
I
aproximou ambas as figuras com base no poder do sócio majoritá-
rio de transmitir instruções vincalantes ao m i n ~ r i t á r i o . ~ ~ cogita de qualquer forma da aplicação do art. 2.362) e fidúcia do tipo
romano (em que há, como no caso, transferência da p r ~ p r i e d a d e ) , ~ ~
pretenso fidu- Os limites da teoria nominalística demonstram-se não apenas
ciário) não é um minoritária, mas
o próprio sócio único. pela justiça da solução mas por uma observação de ordem matemá-
é relevante a for- tica. Caso, por hipotese, fosse admitida a responsabilização do fi-
ma e o fim com que o
duciário, seria necessário reconhecer, no caso limite em que o alie-
dade das ações (de intenção de efetivo nante também fosse sócio único,31a presença de dois sócios únicos,
exercício do poder forma o exercita (fi- o que parece bastante arriscado ao menos do ponto-de-vista IOgico
dúcia do tipo romano ou A razão de todas essas ques-
tões é simples: é a efetiva coincidência entre 2.1.2 O critério subjetivo ou dos centros de atividade
poder de fato e atribuir ao fidu-
ao seu poder jurídi- Pelas razões expostas acima, tem sido defendida na doutrina a
necessidade de utilização de um conceito mais amplo de sociedade
unipessoal, para a aplicaçfio de determinadas regras específicas.
A teoria é oriunda da Alemanha, tendo sido desenvolvida so-
bretudo a partir dos problemas relacionados Q venda das quotas de
do período no qual todas as açõè/s desta última estavam na posse sociedades e da discutida possibilidade de aplicar a tal transação as
da Banca Nazionde del Lavoro. O banco agiu no interesse de ou- regras relativas a venda da empresa, ou seja, por exemplo, os dispo-
tras duas sociedades a quem deveiia sucessivamente transmitir em sitivos sobre resolução e anulação do contrato e sobre diminuição
partes iguais as ações. Levando {m conta que a atividade desen- do preço por vícios redibitóri~s.~~
27. Decisão da Corte di Appello di ~ h i l a n od e 5 de fevereiro de 1982 fApailo 30. Dessa maneira, a Corte segue a tese sustentada por P. C.Jaeger, "Suil'm-
France vs. Mangini e Massarf) in Giurispn<c('nzaCommerciaie, 1982,ll, p. 614, con- testazione di quote di società a responsabilità limitata" in Ciurisprudenza Commer -
firmada pela Cassação na decisão n. 7.152 de 29.1 1.83 in Giustizia Civile, 1984, I , crale, 1979, 1, p. 189.
1, p. 3.127. Tratava-se de demanda visandb a responsabilização u ait. 2 . 3 4 C.C. 31. Cfr. S. Scotti-Camuzzi, L'unico azronis&, cii., p. 91 1.
do sócio titular d e 99,9625% (Massari) da pociedade falida (Mangini). O titular do
restante (0,0375%), senhor Sala, tinha parhicipado da fundacão da sociedade corn
32. Não existe qualquer dúvida naquele pais a respeito de possibilidade de apli-
car as regras relativas à resoluçiio e anulação da venda de bens materiqis a venda
75% d o seu capital, participação reduzida por causa dos sucessivos aumentos de ca- da empresa. A razão invocada é que "es entpricht durchaus dei Lebens ;~irkliciikeii.
pital não subscritos. O senhor Sala era também membro da diretoria de outras socie- das Funktionieren eines solchen Betriebs durch das Ineinandergrcifen seiner Organi-
dades controladas pelo senhor Massari. sation und das Vorhandensein der fur de Zweck genugenden Mittei als Eigenscliaft
28. Cass. n. 7.152, de 29.11.83 in Gius(lzra Clvrle, 1, p. 3.127. des Betriebes, das Nicht-Funktionieren folglich ais Mangel anzusehen" - cfr. 13.
29. Cfr. Cass. n. 1.636, 9.3.84, Massqbno vs. Banca Nazronale delLavoro 111 P. Westermann, Munchener Kommentar zum BGB, 2: edição, vol. 3, Sctii~ldrecht,
Giurisprudenza Cornrnerc~ale1984, I I, p. 694 Besonderer Teil, Munchen, 1988, $ 459, Rdn. 44, p.199.
80 I A SOCIEDADE UNIPESS FORMA ORGANIZATIVA DA PEQUENA E MÉDIA EMPRESA 81

e início,: admitia-se a:~aplicação,~d&xdisciplina:da:c;ompra-e- parável ao direito de pr0priedade.~8Desse modo, adquirir o con-


quando se'tratasse'da vendarde! toaasas {quotas..A.justifica- trole não implica adquirir a empresa.
ção é que tal venda; ainda 'queiJuri&D~enteh3o'representea v a - Dado o indiscutível interesse na aplicação das regras da compra-
da da empresa, representa-a"éconoinicarnente2~Ihseguida, a p a i r e-venda à alienação de controle (muito mais completas que as da
sobretudo dos fundamentos de uma decisãb do BGH que não ad- cessão, no que se refere às regras protetivas do "sinalagma", ele-
mitia a aplicação de referidas regras, por tratsirsk de venda de ape- mento essencial em tais transferências), tem a doutrina admitido falar
nas 49% das q ~ o t â sm, ~a ~~' ~ u e ~ a d dem
i t i ateoria sua aplicação sem em compra-e-venda, apesar de reconhecer em teoria que a "especi-
venda de todas as quotas, coméçou-se a discutir a respeito dos limi- ficidade do negócio de cessão do controle'' impede sua redução "a
tes da identificação sócio-empresa. * , 1 tipologia tradicional dos coi~tratos".~~ Cumpre no entanto fixar
Para aiguns autores, o poder de d e t e d n a r a sorte da socieda- seus limites. Aplicá-la'só às sociedades unipessoais, em certos ca-
de já constitui titularidade da ernpre~a.3~ Outros sustentavam que sos, é de rigor excessiva; em outros, de rigor insuficiente.
o unitarismo econômico existe apenas em presença de uma maioria Comecemos pelo excesso. Desde que entendida no seu sentido
suficiente para permitir a mudança do estatuto social, ou seja, quan- econômico - único admissivel no caso, já que se está tratando de
do a venda é de ao menos 75% das quotas, segundo a legislação agentes econ6micos organizados sob a forma de sociedade -, a em-
aIemã (essa é a motivação da decisão do BGH supracitada). presa é a organização dos fatores de produção destinada à produ-
ção ou circulação de bens e serviços. Nesse sentido, ~ , ã ohá por que
Para a corrente dominante, entretanto, se a aquisição da empresa exigir para a aplicação da disciplina relativa à compra e venda da
significa pleno controle econômico da atividade empresarial, ent& empresa a aquisição de todas as ações ou de montante suficiente para
não deve existir qualquer minoria institucionalmentereconhecida, ca- fazer desaparecer qualquer centro de interesse institucionalmente re-
paz de contrapor-se, em qualquer modo, ao poder de quem a controla. conhecido. Basta a aquisição pura e simples do controle (5 1% do
Essa m i ~ o r i aseria de 10% na GrnbHe 5% na AG, ou seja, o núme- capital da empresa). Adquirir o controle da empresa implica aquisi-
ro de votos necessários para aconvocação da Assembléia Geral, se- ção de direitos sobre os destinos da organização, respeitadas as li-
gundo a legislação alemã ( 50 Abs. 1 GmbHG e § 258 AktG). Essa mitações legais. Dessa forma, vícios essenciais que impeçam o fun-
é também a tese com maior ressonância na juri~prudência.~~ cionamento da organizaçiio devem ter como conseqüência, confor-
?iilw#eoriavincula a f5tit$aridade da empresa" Q inexistência de me o caso, a uivalidação ou a redibição do negócio. Isso independe
outros qntros de atividade f~ktivitakzent&m) que se possam estabe- da presença ou não de acionistas minoritários e trabalhadores, cujos
,liti : direitos devem ser protegidos e respeitados tanto pelo vendedor quan-
Iecer e &uar na vida sociái paraleiamenteao sócio m a j ~ r i t á r i o . ~ ~ to pelo comprador,
A aplicação pura e simples das regras da compra-e-venda à trans- De outro lado, em certos casos a teoria peca pela falta. E im-
ferência de ações baseia-se todavia em imprecisões doutrinárias, al- possível passar do direito sobre a organização ao direito sobre os
gumas com conseqüências aplicativas que devem ser evitadas. bens da empresa, "tanto em caso de alienação de todas as ações co-
No sistema brasileira, existem ainda peculiafidades sistemáticas mo no caso de alienação simples do controle".
a impedir a referida aplicação. A compra-e-venda implica a transfe- O termo organização inclui, no máximo, os componentes ima-
rência do domínio (art. 1.122 Código O controle não 6 equi- teriais do fundo de comércio, como a clientela, por exemplo. É por
isso aceitável a tese dos que defendem a proibição de concorrência
33. Decisão de 12.1 1.75 m BGHZ 65. 246. . por parte do controlador que aliena o controle de sua empresa.
34. Cfr. P. Hommelhoff, "Zur Abgrenzung von Unteynehmenskauf und An- Novamente aqui, no entanto, não é necessária a existência de
teiberwerb" in ZGR 1982, p. 381.
um só sócio. Qualquer sociedade (tcnha ou não um Único sócio) po-
35. H. J. Hiddemann, "Leistungstoningen beim Unternehmenskauf aus der
Sicht der Rechtsprechung" in ZGR 1982, p. 440. de exigir o cumprimento do deber de não-concorrência por parte do
36. Cfr. P. Hommelhoff, "Zur Abgrenzung", cit., p. 378.
37. A respeito da natureza civil da compra e venda do controle, cfr. F. K. Com- 38. Cfr. F. K. Comparato, O pc-der de controle, cit., pp. 96 e ss.; v. também
parato, "A cessão do controIe acionário é negócio mercantil?" in Novos ensaios e supra n. 2.
pareceres de Direito Empresarial, Rio de Janeiro, Forense, 1981, pp. 245 ss. 39. Cfr. F. K. Compziato, O poder de controle, cit., pp. 220 e 228.
FORMA ORGANIZATIVA DA PEQUENA E MÉDIA EMPRESA 83

antigo controlador, ainda que n?+ expressamente declarado. Do rados co-titulares do interesse social. Sua presença impede qualquer
ponto-de-vista do contrato firmado; anaiisado como compra-e-venda análise do negócio em termos exclusivamente privatísti~os.~~

'
pura e simples, parece claro que ~ / ~ r i n c íutilizado
~io é o rebus sic
stantibus. Com efeito, o vendedo , por seu comportamento, alte-
rou substancialmente o equilíbrio onomico do contrato. Uma or-
ganização da qual fazia parte um$erta clientela passa a não mais
dela dispor.
Portanto, a única interpretação razoável é aquela que impede
qualquer aproximação entre a figura do sócio único e a do proprie-
tário. Admitir ficção que impute direito de natureza real ao sócio
único deverá ter, como necessária conseqüência, a transformação
de sua responsabilidade em ilimitada.
Mas não se pode ir dém.Os domponentes imateriais sáo o li- O critério dos centros de interesse auxilia, também, a diferen-
mite, N ~ se
Q pode considerar c o m componentes da organização ciação de disciplina em outros campos. O Direito alemão fornece
adquirida os elementos materiais dolestabelecimento. Por vános mo- alguns exemplos interessantes.
tivos. Primeiro, porque esses são de "propriedade" da sociedade
É o caso do Fj 181 BGB. Esse dispositivo, que veda os chama-
e não do controlador, antigo ou Depois, porque não são fun-
(outro deve ser o tralanlen- dos contratos consigo mesmo, é aplicável exclusivamente aos con-
to, obviamente, controlador descobre que tratos do sócio único com a sociedade unipessoal, por força do Fj
dessa venda deverá 35, Abs. 4 da GmbH Novelle. Jurisprudência e doutrina nunca se
forma, caso a em- demonstraram satisfeitas com a aplicação de tal proibição, que re-
a mesma utili- duzia a "capacidade negocial" da sociedade sem, em contraparti-
da, criar um sistema protetivo verdadeiramente eficiente. Pode-se,
deve ser ressarcido à sociedade e só &a é titular do direito subjetivo no entanto, perfeitamente excluir as sociedades sujeitas as Milbes-
de postular seu ressarcimento. timmungsgesetze (leis de participação operária), ainda que unipes-
soais, da aplicação do dispositivo. Tanto a Betribsverfassungsgeselz
Ser a sociedade unipessoal em qada a!tera tal situação: o com- (4 77) quanto a Milbestimmungsgesetz ($ 25) fazem referência ex-
prador não adquire o domínio sobre os bens da empresa, pressa ao 5 112 AktG, determinando sua aplicaçao também as
Desconsiderar a pessoa jurídica, permitindo a aplicação das re- GmbH. Esse artigo prevê que, nos negócios entre sociedade e admi-
gras da compra-e-venda diretamentd aos bens e direitos componen- nistradores, a primeira seja representada pelo Aufsichfsrat (os ad-
tes do ativo da empresa, implicaria a'dmitir a consideração dos bens ministradores são normalmente os representantes da sociedade).
como coisa própria do controla dor,'^^ seja, identificar controle a
direito de propriedade, o que não 4 a d m i ~ s í v e l . ~ Como o F, 35, Abs. 4 GmbH Gesetz exige para aplicação do
F, 181 que o sócio único seja ao mesmo tempo administradoi, os ne-
Para que tal desconsideração fo se admissivel, seria necessário gócios entre sácio e sociedade sujeitos ao F, 35 seriam também negó-
o desaparecimento completo dos de interesse internos a em- cios entre um administrador e a sociedade, que deverS. ser represen-
presa, Na Itália, tada pelo Aufsichtsr~t.~~ A presença dos trabalhadores, como cen-
interesse na sociedade tro de interesses institucionalmente protegido, garante a presença
desta afirmação, de um órgão não totalmente dominado pelo sócio único a negociar
é impor sua res- com ele, situaçáo muito análoga B da sociedade pluripessoa!, onde
também a vontade de quem controla a sociedade é dominante mas
a qual não se aplica o Fj 181 B G B . ~ ~

41.V. supra, cap. 1, n. 4.1, a respeito da teoria institucionaliçta, e n. 4.4, a res-


Ihadores. Como já visto, segundo o att. 116 eles devem ser conside- peito de sua aplicação ao Direito brasileiro.
42. Cfr. A. Kraft, KofnerKommentar zum Aktiengesetz,28 edição, Kain, Berlin,
40. É curioso notar que Comparato, rejeliando veementemente a equiparã$ão Bonn, Munchen, Carl Heymanns Verlag, 1988, 4 1, Rdn. 70.
do controlador ao "proprietário" da empresa, [chega,nesse tópico u resultados apii- 43. A discussão hoje em &a tem caráter meramente teórico, pois o BGIl en-
cativos que aproximam as duas figuras -- cfr. .!f K Comparato, (>poderdeconírti- controu outro modo, mais simples, de restringir a aplicabilidade do dispositivo.
(e, cit., i>. 229 e nota 21, a. Admite-se a conclusão de tais negócios, desde que isso seja previsto no contrato SO-
I 84 A SOCIEDADE UNIPESSOAL @

aaF30utros casos de aplicação do critério dos centros de atividade sócio na Assembléia, de onde poder-se-ia concluir que o legislador
serão mencionados a seguir, quando da análise da sociedade uni- entendeu relevantes para esse fim apenas os acionistas que dela par- r'
.,* ,.

I pessoal à,luz da leis e jurisprudência brasileiras, e a final, quando ticipam.


I da'angise das sociedades unipessoais de grupo. Deste jd parece cla- Uma análise sistemática da lei permite, no entanto, afastar tal i
ro, no entanto, que a procura dos centros de atividade (à parte o \,-,
interpretação. O art. 80, inc. I, ao tratar dos requisitos para consti- ,,--.
I cdativismo decorrente das normas que se quer aplicar e que impede tuição da sociedade, fala em "subscrição, pelo menos por duas pes-
2 sua utilização em outras fattispeci para ampliar o conceito de so- soas, de todas as ações em que se divide o capital sociaI fixado no
\ i-
ciedade unipessoal) tem a vancagem de pôr em evidência a irnpossi- estatuto". Basta, portanto, a existzncia de um outro tipo de ações, ,,,

bilidade de,vincular interesse institucionalmente reconhecido com com ou sem voto, para que se descaracterize a unipessoalidade e se- @
interesse representado na Assembléia. Na Alemanha, o princípio tem ja possível a constituição da sociedade (em caso de constituição por
qlicação com relação aos trabaíbadores, representados apenas no pessoa física, obviamente, já que a consutuit;ão por pessoa jurídica @i
Aufsichtsrat; no Brasil, tem aplicação com relação aos preferencia- é sempre possível em face do reconhecimento da subsidiária integral). m

listas, como se verá a seguir. A existência de ações com ou sem direito de voto é, portanto, irre- r'
levante. Mesmo as ações sem direito de voto representam um interesse
2.2 A fattispecie sociedade unipessoal no Brasil patrimonial interno. Também sua propriedade é necessária para a exis- ,Ec

c::
tência de um interesse patrimoníal interno único no sentido da lei.44 ,,".
2.2.1 Sociedade unipessoal em sentido estrito Ao argumento de natureza dogmári;a soma-se ainda argumen- !_.
to pragmático muita relevante. Uma drfini~ãorestritiva da socie- ("-
Nesse tópico, o objetivo é determinar, a partir do ordenamen- dade unipessoal parece necessária até mesmo para garantir a indis-
L'..

to positivo brasileiro e tendo em vista o exposto nos itens anterio- r?


pensavel aos valores mobiliázios representativos do capi- '..i.
res, quando é possível afirmar que existe sociedade unipessoal. tal. E fácil imaginar a situação de incerteza que criaria um sistema 9
A análise deve partir do art. 206 da Lei das Sociedades Anôni- que, sobretudo com relação i s companhias abertas, permitisse a dis-
mas. Esse dispositivo tem sido aplicado pela jurisprudência, ainda solução da sociedade em decorrência de um estado de unipessoali- g
que com atenuantes, também a s sociedades por quotas de responsa- dade com duração de mais de um ano (espaço entre duas Assem-
biiidade limitada. Por enquanto, para o estudo da fattisyecie, inte- bléias). A fluidez e variabilidade da composição acionária, típicos
ressa apends saber qual o critério a ser utilizado para caracterizar da sociedade cotada em Bolsa n& seria campatível com um sistema
a "'existên'eiz de um único acionista" mencionada no artigo. que reconhecesse a possibilidade de dissdução da sociedade em fun-
ção de uma temportiria e especifica composição acionária.
E preciso pois determinar qual critério utilizar para a definição ..-.
da unipessoalidade: a existência de um poder totalitário ou a con- É interessante notar que esse mesmo tipo de raciocinio permite ,. ..

centração do interesse patrimonial em uma única pessoa. A primei- resolver também aquelas situações em que a atribuiçãq de direito r-
ra alternativa importaria evidentemente exclusão dos "centros de ~ a r t u l a ar ~terceiro
~ faz indagar da possibilidade de caqacterização
de sociedade unipess3al (v. caso Massobrio vitado retrd; cap.11, n. ,,-- ,

atividade", ainda que reconhecidos pelo legislador, mas aos quais i,

ri50 fosse atribuído qualquer poder (de voto). Poder-se-ia argumen- 2.1.1). @
tar, portanto, adotando essa teoria, que a presença ou não de acio-
nistas preferenciais não influiria na caracterização da 44. V. nesse sentido F. Martins, Comentários à rei dassociedades crifcjrt/mas,
vol. 3, Rio de Janeiro, Forense, 1985,sub. art. 206.11. %93,pp. 8 ss. Evideni~riiente,
a
unipessoalidade. como ressalta F. Martins, urna tal interpretação Ornava muito difícil a c z ~ néncia @
Uma primeira análise do art. 206 poderia sugerir essa interpre- de unipessoalidade em caso de existência, como r épasa, de ações ao por:aiior - Fl
taçáo. O artigo determina a verificação da existência de um único v. tambtm E. L. Teixeira-J. A. T. Guerreiro, DE sociedades anônima$ na !brcito *.I

brasileiro, vol. 1 , São Pti.110, Bushatsky, I9?9, v. 622. p:


,,.
45. A palavra aqui é empregada no satido e:onimico de transferibQi6ade ou G,.

cid [na versão original ou por modificação sucessiva) e conseqüentemente acessível transmissibilidade. C I

-
aos credores através do registro de comércio cfr. em particular BGHZ 87, 59 (60), 46. Fala-se em direitt3 cartular para simplifiíxr, mas é evidente que o pioblema
-
demão de 28.2.93 e W. %lIner, Baumbach Hueck Kurz Kommentar zum GmbH se coloca tanto com relaça às sociedades por aç13r;~quanto com relabão as socieda-
,--

Gsrtz, Munchen, 1988, Q 35, Rdn. 79, p 461, com ampla referência i~jurisprudência. des por quotas de responsabilidade limitada.
86 A SOCIEDAD$ UNIPESSOAL 87
FORMA ORGAPIIZATIVA DA PEQUENA E MÉDW EMPRESA

Mas se, para caracterizar a sociedade unipessoal deve também O usufrutuário, ao contrário,iao qual foi atribuído na forma
inexistir qualquer outro interesse patrimonial interno além do inte- do art. 114 da Lei das Sociedades Anônimas o direito de voto, exer-
resse do sócio único, cumpre espd,cificar a noção de interesse patri- ce direitos típicos de sócio: tem o uso e gozo das ações ou quotas.
monial interno.
Pode, portanto, influir tanto na caracterização quanto na descarac-
Interesse patrimonial interno deve ser entendido como interes- terizaçáo da sociedade unipessoal. Basta, por exemplo, a presença
se do sócio enquanto tai, ou seja,!não um mero direito de crédito, de um usufrutuário de ações, ainda que o nu-proprietário seja pro-
mas um interesse na sociedade enquanto fonte de lucro presente e prietário pleno das demais ações ou quotas. O mamo com relação
futuro. Assim, nos casos de trandferência fiduciária de uma parte ao usufrutuário de todas as ações ou quotas: a sociedade da qual
das ações, não é relevante determiiiar se o fiduciante mantém (fidú- participa é unipessod.
cia germânica) ou não (fidúcia rqmana) a propriedade das ações.
Deve-se determinar, com base no çontrato, se o fiduciante mantém A mesma regra é aplicável quanto aos titulara de debêntures:
o interesse de sócio enquanto tal. U,m bom critério prático para fazê- sua presença não descaracteriza sociedade como wipessoal. Ainda
que tenham algum direito de voto (arts. 57, (i 20, e 5 I), não interfe-
.i
10 é evidentemente apurar a que são atribuídos os dividendos.
Na sociedade moderna, fundhental para a caracterização da
rem na caracterização da unipessoalidade. Seu inte~essepermanece
meramente creditício.
condição de sócio não é o poder da infiuir na gestão social. A perda Uma advertência final é necessária: os critérios aqui propostos
de importância dessa facuIdade decorre dietamente da dissociação en- servem para caracterizar ou descaracterizar a exisgncia da socieda-
tre propriedade e poder de gestão na ~ociedadeanônima, já encontrável de, mas não servem para determinar quem deve responder, em caso
nas antigas sociedades em comandith, mas que se generalizou nos tem- de fraude, pelos débitos sociais. Para responder a m a questão, é evi-
pos modernos através da criação dds chamadas ações preferenciais. dentemente necessário verificar quem detém o poder de decisão e se
Fundamental para a caracterid~ãoda condição de sócio é a frui- esse poder foi utilizado para desviar fundos da Para is-
ção das ações bem como o poder de delas dispor. so, não é necessário que exista sociedade unipessod Essa últiina afir-
Não se deve no entanto requisitos para a caracterização mação explica por que é razoável afirmar q u LI~p~&lernade atribui-
rização da sociedade como uni- ção de responsabilidade a o sócio de uma sociedadrrunipessoál é tal-
pessoal. Assim, o dos direitos de fruição (percep- vez quantitativamentemas não é qualitativamente &verso do rriesmo
ção de quotas sociais não é sócio úni- problema em uma sociedade pluripessoal com contmle rnajoritái
co e a sociedade não é unipessoal. AO contrário, basta a existência, ao A conseqüência, como se verá, é que a sociedade upJjpessoal não de-
lado do yroprietário da totalidade dks ações, de um titular dos direi- ve estar sujeita apriori à responsabilidade ilimitada,dev<ilndo-seapli-
tos referentes a percepção de dividenqosde uma só ação, para que a so- car a ela como a qualquer outra sociedade, nos casode fraudc, s eco-
ciedade não seja unipessoal, A preseoça do sócio na forma aqui defi- ria da desconsideração da personalidade jurídica.
nida serve portanto para "descaracterizar" mas não basta para "ca-
racterizar" a existência de uma sociebade unipessoal. Para isso, é ne- 2.2.2 Sociedade unipessoal em sentido amplo
cessária ainda a presença do poder tqtalitário. E os motivos para isso
são óbvios. Ainda que, teoricamente, existência de interesse patrimo- Antes de discutir a noção de sociedade unipasoal e
nial interno implique e presença de u p sbcio, a existência de uma re- amplo, deve-se definir a disciplina a ela correspoaiente.
gulamentação jurídica específica e restritiva para a sociedade unipes-
soal (não de grupo) justifica-se pela coqcentraçãode poder que ela acar- 47. É interessante notar que essa conclusão deve ser tira&também d'
reta e não pela concentraçãodo interesse patrimonial em uma só pessoa, do ordenamento italiano, que prevê a responsabiidadeilimitada&-&o úniiv~ 1
,

Daí decorrem situações que ali, como o recontiecimento da unipessoalidade implica rtsgonsabilii', L*-
tada do sócio único, o criterio para o reconhecimento da fa&pecie çoina- - , .
segundo o tipo de direito real
atribuído a terceiros. No hor ou alienação fiduciária de o criterio para a atribuição da responsabilidade, com as conseq&cias, nwi, t :':
coerentes, vistas acima. Esse é, sem dúvida "o custo" da presa@o de fraíiux-
vista pelo legislador italiano.
minar a extensão das pignoratício ou fiduciá- 48. Não se trata também de uma daquelas diferenças qmtitativas qiir, j l xo
rio não tem interesse seu porte, se transformam em diferenças qualitativas - v. a mpeito desse tq-c tle
não influi na transformação no direito societário F. K. Comparato, Asgectmrídicos da rca, ) i 1 -
empresa, São Paulo, Ed. Revista dos Tribuniús, 1970, p, 1.
E8 A SOCIEDADE UNIPESSOAL FORMA ORGANIZATIVA DA PEQUENA E MÉDIA EMPRESA 89

pode-se ter uma perfeita noção dos objetivos que devem guiar o in- coincide com a sociedade unipessoal em sentido estrito. 'Basta um
tkrprete na aplicação das regras. acionista para descaracterizar a sociedade como unipessoal.
Uma exclusão é necessária de início. É evidentemente bastante No Brasil, isso não ocorre. A lei brasileira atribui grande maioria
=riscado propor uma equiparação de sociedades com controle lar- dos direitos às chamadas minorias institucionais, ou seja, minoritá-
gamente majoritário à sociedade unipessoal em sentido estrito no rios detentores de uma quantidade mínima de ações. Ao acionista
que tange às relações internas da sociedade - sejam relações entre individual são reconhecidos apenas os direitos essenciais B própria
hrgãos sociais como também direitos e obrigações do sócio para com qualificação como acionista, como o direito aos dividendos.
a s0ciedade.4~O motivo é óbvio: para essa equiparação bastaria O número mínimo de ações para ter garantido o acesso aos di-
desconsiderar os interesses dos outros sbcios, presumindo que são reitos fundamentais de informação e de controle da administração
homens-de-palha, sem interesse próprio e a serviço do sócio majo- é 5% do capital social. Requer-se esse mínimo de ações para: reque-
ntário. rer judicialmente a exibição dos livros sociais (art. 105); solicitar in-
Tal equiparação, se for feita para defender uma disciplina me- formações aos administradores da companhia (art. 157); solicitar
LOS severa relativamente aos deveres internos do sócio "quase- informações aos membros do conselho fiscal (art. 163,s 60); reque-
hico", é obviamente muito arriscada, já que não protege peque- rer a convocação de assembléia geral de companhia fechada (art.
nos acionistas-investidores, realmente interessados na sorte da so- 124); propor ação de responsabilidade em face dos administrado-
&edade.49Mas mesmo feita para defeneer urna disciplina mais ri- res, caso a assembléia geral da companhia decida pela não-
gorosa tem os seus limites, já que pode implicar, como se verá mais propositura (art. 159, 40); propor ação à controladora por danos
adiante (infra, cap. 11, n. 3.4.4), uma ca9itis diminutio negocia) da causados a sociedade, independentemente de caução (art. 246,s 1o ,
sociedade, impedindo-a a priori de realizar determinados negócios a).S0
sociais. São todas faculdades fundamentais para o exercício de um mí-
Feita essa exclusão, surge a questão: e nas relações com tercei- nimo controle sobre o acionista majoritário e a administração. Di-
ros, é possível a equiparação? Até que limite pode-se pensar em uma reitos adicionais são atribuídos a acionistas detentores de 10% do
extensão da disciplina da sociedade unipessoal a sociedades com con- capital social (direito de eleger um membro do conselho fiscal, art.
trole largamente majoritário? 161, e requerer a adoção do voto múltiplo para eleição de membros
*%i%.v -
Comb@to quando da análise dos centros de atividade (Akti- do conselho de administração, art. 141). São esses os critérios que
v2fatszen&~-~~~ a fixação de critérios precisos de equiparação não podem ser usados para caracterizar uma sociedade unipessoal em
deixa de b n t e r grande dose de arbitrariedade. sentido lato, nas suas relaç6es com i'erceiros. Não basta, no entan-
É possível, no entanto, fixar parâmetros aproximativos que, jun-
to, que um sócio detenha mais de 95% do capital social para consi-
tamente com utilização dos critérios reconhecidos em doutrina para derar a sociedade unipessoal. É necessária a concorrência, em cada
a aplicação da disciplina da desconsideração da personalidade jurí- caso, dos requisitos de aplicação das regras de desconsideração da
&ca, permitam diminuir o grau de arbitrariedade. personalidade jurídica.
Tais parâmetros devem basear-se, sem dúvida, na existência ou
não de centros de atividade internos capazes de fazer frente ao p0- 3. A disciplina da sociedade unipessoal
der do sócio majoritário, E necessáirio, no entanto, que o direito po-
sitivo ou a interpretação jurisprudenciai reconheçam efetivamente 3.1 Formação du sociedade unipessoal
a existência de direitos de determinados centros de atividade inter-
nos (os direitos instituciona& já referidos). Dentro do tópico "formação das sociedades unipessoais", é es-
Nos sistemas que reconhecem pleno direito de informação e par- tudada não só a constituição unipessoal, mas também a redução da
ticipação ao sócio individual, independentemente da quantidade de
agões ou quotas possuídas, a sociedade unipessoal em sentido amplo 50. Para uma pormenorizada enumeração dos "direitos individuais" e dos "di-
reitos das minorias" cfr. M. Carvalhosa, Comentários à lei das sociedades anôni-
49. Cfr. F. K. Comparato, O poder de controle, cit., p, 38. mas, vol. 4, São Paulo, Saraiva, 1978, sub. art. 109, pp. 40 e ss.
,'. A WL1CUAL)E UNIPESSOAL 93
FORMA ORGANXZATiVA DA PEQUENA E MÉDIA EMPRESA

tência de sociedade, e sociedade irregular, aquela em que há contra- aconteceu é que oilegislador comercial resolveu nesse caso imputar
to ainda não r e g i ~ t r a d o . ~ ~ as relações diretamente ao sócio e não à sociedade. Assim sendo a
Não obstante a respeitabilidade dos nomes que defendem tal sociedade de fato não pode adquirir direitos para si, mas apenas para
teoria, parece que a distinção, por mínima que seja, se impõe, ao o sócio (ou sócios em condomínio)
menos para as sociedades reguladas no Código Comerciai, em face
da letra dos arts. 303 e 304. Com efeito, enquanto o primeiro dis- Quanto As obrigações, o regime e diferente. O art. 304 e seus
incisos constituem exemplos acabados de aplicação da teoria da apa-
põe que as demandas dos sócios entre si ou propostas por esses con-
tra terceiros s6 serão admitidas existindo contrato escrito, ou seja, rência: é ela evidentemente que justifica que as ações possam ser in-
sociedade ao menos irregular, para as ações de terceiros contra a tentadas contra "a sociedade em comum" mesmo em ausência de
sociedade, o art. 304 pre* que poderá ser parte também a socieda- contrato. E exatamente porque o reconhecimento de aigurna rele-
de de fato (se= contrato escrito). Assim sendo, mesmo que a ques- vância externa à sociedzide resulta apenas dos fatos. Enquanto as
tão se resumisse a um problema apenas de capacidade processual, sociedades irregdares podem adquirir aqueles limitados direitos e
já não seria correto equiparar os dois tipos. obrigações definidos na lei, as sociedades de fato podem apenas
obrigar-se. Pura e simplesmente porque a existência dessas últimas
Mas de capacidade processual não se trata. A diferença não é sociedades baseia-se exclusivamente naqueles fatos externos. É evi-
apenas processual mas também material. dente que na prática isso não acarretará qualquer prejuízo pois tu-
Ao dizer que toda ação que se fundar na existência da socieda- do se resumirá a um problema de ressaxcimento entre os sócios com
de requer a apresentação de contrato escrito, nega a contrario sensu base na existência de uma sociedade de fato,j9
que as sociedades crm que não há contrato escrito possam vir a juizo
pieirear seus direitos. Não porque Ihes falte capacidade processual 58. Não parece admissivel a argumentaçãc de W. Ferreira (ITcrado de Direito
para tanto: o art. 12, VII, CPC, não faz distinção entre sociedade Comercial, vol. 3, São Pado, Saraiva, 1963, p. 708,nota I), de que a demonstração
Ce fato e irregular e nZo permitiria uma tal c o n ~ l u s ã o .O~ ~que da inexistência de diferença entre sociedade de fato e sociedade irregular estaria no
art. 301, última alínea do Código Cornrr~~di, qui prevê não ter "validade" entre os
sócios o contrato não registrado. Já antes da elaboração do Cédigo Civil e das nor-
55. hssifii, expresso, J. L. Co:rea de Oliveira, A dupla crise, cit., p. 230 que mativas sobre as sociedades por quotas e an$iiir;:a, a aplicabilidade desse dispositivo
a3rma: "Desde kcgo fiqiie claro que, em companhia de boa parte da doutiina seria bastante discutivel em face de sua frontal colisão com o disposto no art. 303
aruel, negap$s q & @ ~ x i erelevancia
~ à distinção terminolbgica entre sociedades irre- que, como visto, estabelece il contrario setrsu, a Fuip obrigitéria entre as partes dos
gulwe~e d~,@d%-.rr(;&es qrte empregaremosindiferentemente". Também nSEo pa- contratos sociais escritos. A interpretação favcrriivela esso úkimo artigo fica refor-
rece atribuir $P'xf&ncia 2 tal dist-nçâo F.K. Comparato, Opoa'er de controle, cit., çada ainda pela existência, no próprio Cócligo Cmercial, de declarafio expressa do
p. 1 i7, que ezm %?cdcis termos como sinõminos, aplicando aos dois a prdprk de- princípio da f o r p obrigatbria dos contratos (art. 126).
n~m*iiai.ãocriedá dá de zrii comwr" que, segundo o autor, lhes teria sido atribuída Com o Decreto 3.708 de 1919 (lei das limitadas) a questão da aplicabilidade
pelo Código Comercial, do art. 301 parece definitivamente sepultada. O art. 2: do referido decreto faz refe-
57. Trata-se da que Arigelici caacte~izacomo a reprodução, para os fenôme- rência apenas aos arts. 300 e 302 para a discipl.na dos atos constitutivos, os quais
nos plurissub~etivos,da dicotomia capacidade de direito-capacidade de agir. O au- regulam os requisitos formais dos contratos de sociedade sem fazer qualquer meri-
tor, mesmo admiiindo a correção da analogia, considera "piii aderente a i Ioro (fe- ção à necessidadede registro. Esse entendimentoveio a ser confirmado pda lei 6.404
nt:neni pitinsogge~illi)sig~if~eato dinznico individuare una attivitã ad essi "propria" de 1976, (aplicávelãs sociedade por quotas por força do ari 18 daquele decretaf que
secm ia tiio!arità Çi diniti, piuttcsto che nferire a1 ente Ia seconda e non la prima". considera constituída a sociedade com a a p r o v ~ ã ode seu estatuto em Assembltia
E soiicli!i, analisando o problema em termos de personalidadejurídica: "Perciò, pur Geral (art, S7), identificando no registro uma "IO~malidadecomplementar" ilecer-
yzscindendo da uda valeirazizione dni merito, sembra p i reafistica~ l'opinione chc se sária apenas para a plcna aquisi~ãoda: personalidade jurídicn.
1 rrltt. ? ~ c n o ~iu;Fdica
n~ 11;i sua caracit8 e intera, cioè, riuiiisce in sé la c.d. capacità Deve-se obscrvw, &i&, que do ponto-de-'. $ 2 :e<lrico,a imposição do iegistro
JI diritto e ia c.d. c;ipüdiiià di eg!ie, mentre, se esso non 8 persona, questa ultima como requisrto ritcessário à "vadichde" do conirato de conbrauição da sociedade é
c3pacit8 rcsta scompagnata dalla pnri~ae, quindi, no basta a conferirgli ia personali- inadmissível no direito swetário moderno, Akkm de desconsiderar totalmente as c:í.
r!? (La socrelk nrifk, cit., p. 104, nota 195). ticas, a disciplina de r,ufidade 3as sociedades (v. a ehse respeito as críticas e tentativas
A o\,sei::li:io aplica-se ptrfeitainentr ao dcccompasso existente entrc o art. 12 de compatibiiização entre "fenômeno socit,tário" e "sisrenia de contratto" de C.
!:!'C e o ?;i. 307 CCo. O primeiro atribui capacidade de fato a todos os entes que Angzlici, La società nuilq, cii., pp. 41 e ss.) pare@ ver na sociedade somente um coii-
atuam de ialu, inctusive ,iqueles que como a sociedade de fato, não têm capacidade trato, desconsiderando o relacioraruei~tosocial (rapporto) decorreiite da atividade
juiidica (e. cCnbequcntementc, perxxalidade jiiridica). J & o dispositivo do Código realizada, que por sua vez te~rireflexos na esfera jurídica de teiceiros, necessaria-
inente atingidos por eventual iíutídade.
Co-cerclal atribui certo g-au de capacidadejuridica somente às sociedade que jh têm
urna existéficia crganiada, ainda cue incipiente, como t? a sociedade irregula-. 59.Essa 6 , como ctesvaciiTeixeira de Freita$,a Única interpretação do art. 303,
CCo capw de evitar injuscips: "Aproveitarei a ocasião para firmar a verdadeira in-
FORMA ORGANIZATIVA DA PEQUENA E ~ É D I A
EMPRESA 95

as sociedades irregulares pos- dade, dispõe apenas sobre a irregular, Todos os direitos da "socie-
suem a capacidade de e obrigar-se, as sociedades dade em organização, previstos, na referida lei, dizem respeito a um
de fato só podem Quanto aos direitos, momento posterior a existência do estatuto" (v.g., o art. 81). Ain-
são diretamente da que não aprovado em Assembléia, nesse momento já existe o acor-
do de vontades para a formação da sociedade, caracterizado pelo
pagamento do valor previsto no estatuto - a que não acontece na
sociedade de fato, onde se verificam apenas atos externamente qua-
lificáveis como sociais.
I
teligência do Código do Comércio, art. 3d3, de que os nossos Juizes e Tribunais tem Dessa forma, sempre que neste trabalho houver referência a so-
feito resultar consequéncias iníquas. As akões, que esse art. 303 do Código veda aos ciedade irregular, entenda-se sociedade em que nsa há contrato es-
sócios entre si e contra terceiros, se não f' rem logo acompanhadas do instrumento crito. Essa ressalva é necessária sobretudo com rehção à sociedade

d-
probatório da sociedade, não são todas as ações indistintamente, mas sóaqueias que
não tiverem outra causa possivel seniio a xistência de uma sociedade, E o que bem
se conhece pelas palavras do citado artigo "que fundar sua intenção na existência
da sociedade". E, na verdade, se essas p avras distinguem certas ações dos sócios
unipessoal. Considera-se possível falar em pr6-vida da sociedade uni-
pessoal apenas após a existência de um ato escrito que crie a organj-
zação societária, que, segundo a teoria aqui defendida, é a verda-
deira justificativa da admissão da constituição d a sociedades em
geral e em especial da sociedade unipess~al.~'
pagamento de dívidas (...) Quando não e4ista sociedade legalmente constituída, ou
-
contratada em forma legal, existiu todaviaiuma sociedade de fato uma comunhão 6) Pessoa jurldica, patrimônio separado ou swledaíie - flevc-
de bens ou de interesses; e ai temos urna c&sa jurídica das ações embora niío tenha- se em seguida determinar a natureza jiirídica da wciedade irregu-
mos a existência legal de urna sociedade. ~ b outra,
i o art. 303 do C6digo de Comér- lar. E aqui parece retornar o problema, recorrente nessz trabalho,
cio proíbe que, sem o instrumento social registrado, se venha a demandar er,i juizo
efeitos futuros do contrato di. sociedade exciliplo, par; .:,:e ~ ó ~ i:ea!i?c
ít de verificação da essência dos institiiros jurídicos Mais umti vez. a
a prometida entrada social; porém não veda que se'deniinde em ,;iizo por efeitos resposta será a mesma: negativa de procura da 'kssência", biascn
já produzidos, ou pelo que respeita ao passfdo, A não ser assirn autorimva-se a usur- "ao cor~trário",dos elementos que caracterizam a "existência" reaf
pação de bens alheios. Essa é a doutriaa deitodos os escritores franceses subre o con- do insrituto (portanto Sein und nlcht Wesen).
trato de soclcdade, doutrina tcndo por si â $oa razão e mesmo o siinples bom senso"
- A . Teixeira de Freitas, Consoiidaqio da4ieis civis, 3: edição, Rio dc Janeiro, Gar - Três são as tipificacões possíveis: pessoa jurídica, patrirnonio
nier, 1896, art. 747, nota 6, p. 462. separado e sociedade. Trata-se de tipos não excludentes mac t91n-
60. N a jurisprudência brasileira as rnanifestayões existentes a tespeito, ainda bém não necessariamente coincidentes.
que admitindo a diferença teórica entre sociedade de fato e sociedade irregular, afir-
mam a equivalência dos tipos do ponto-de-vista apiicativo v. nesse seniido RT 550/61, Em termos muito simples e com todas as ressafvas que o rigcr
TJSP, j. 19.2.81 e TJRJ, j. 21.9.79 apud f t M. hiruda AJvim, Cddigo d~ Procesro teórico exige e que serão tratadas mais adiante, pode-se dize; que
-
Civil e legrjlação extravagante AnoluqQeudejurisprudê~~cio e doutrina, Çao Pau- com rejação a pessoa jurídica u que está em jogo 6 a capacici3dr
lo, Ed. Revista dos Tribunais, 1985, p. 16. jurídica, ou seja, a possibilidade de atribuir direita e obrigarat a r,
Do ponto-de-vista prático, no entantp, quando se trata de sociedade de fato, um ente artificial. Com relação ao patrimônio separado, a q:~,-';$(i
a capacidade jurídica vem sempre negada, lgurnas vetes fa~endomenção B necessi-
;k
dade da existência dc contrato registrado ( T 599/217 - TJMC;, j. 23.i0.84). em
outras fazendo menção apenas à incxistênç~ade corizrato escrito (RT 4281250, i ?
central não P, a subjetividade jurídica, mas si~fi,coa@o prgprir l l ( \
me sugere, a possibilidade de separação de massas parrimor:ia/, $:e
TACSP, j. 10.3.71). um mesmo sujeito de direito.
Por outro lado, tratando-se de sociedhde meramente ~rreguiar(sem registro),
existem decisões declarando a validade de $eg<iciosjurfdico~celebrados "no ramo Quando se pensa em sociedade, ao contrário, a djscussâo , t
de negócios da sociedade" e considerando $ duplicata sacada com base nesse negó- tende determinar que tipo de direitos um contrato e a organi, ,-;>c7
cio "título hábil para decretação de falênclp da sociedade" - TJRJ', j. 21.9.76, in dele resultante criam em relação aos participantes dasa organi~~l:,+o
RT 531/240, v. também J. L. Correa de Oliveira (A drrpiç crise, cit., p. 2401, que entre si, entre eles e a própria organização e com reliaqão a terceij o s
comentando a jurisprudência existerite a sua kpoca. sfirri~a:"sob a aparência ae irie- I
ra discussão sobre a capacidade de ser parte (01, sem ia1 apar?i.,cial, r:m verdade iios-
sos tribunais ja haviam admiiido ser a sociedade irregular possivel credora de letras 61. Trata-se da teoria do contrato-organização, desenvolvitia na Itália pcil P.
de câmbio, ou de outros créditos, proplietár?a iniobilGria, rkulxr de domínio ou pos Ferro-Luu-, Iconlratt~associativi, cit. Na doutrina brasileira v. arespeito R ',zi:,jn,
suidora, locatária-sublocat8ria". Contrato de sociedade e formas societárias, São Paulo, Saraim, 1989.
de, só terápquando dosegistr.o.:~ordsso;~~~mesmo~art.?r81 'da Lei nêutica científica, o fundamento teleol6gico da wiorma nas necessi-
das Sociedades Anônimas fai referência à aquisição de personali- dades atuais e não na intenção do legislador, pode-se dizer que o
dade jurídica querendo significar,/evidentemente,<d pbrfeccionamen- que ocorre é uma atribuição de valor ao elemeao organização. É
to de sua capacidade c o m o ;reglstro:~i%('ia 1 ' " 5
à presença de uma organização já definida no m t r a t o social e já
Mais não se consegue ir 6 exatamente porque a pes;oa em incipiente funcionamento que o legislador atxibui importância,
jurídica adquire uma forma que ela se torna um Leerfor- a ponto de conceder certo grau de relevância Werna ao contrato
mel, ou seja, dela não se societário.
sárias. Ou seja, se a Mas é necessário fazer uma pergunta ulterh: em que tipo de
das capacidades sociedade enquadra-se a sociedade irregular? bidentemente a so-
ciedade irregular, como o contrato de compra e venda nulo, não
constitui tipo contratual e~pecífico.~' A resposta6portanto simples.
A sociedade é do mesmo tipo daquela que será earnstituída, com as
restrições de direitos que a falta de registro impHi~ar.~~ Essas limi-
quer conseqüência aplicativa (ver / respeito da caracterização da per- tações consistem naqueles aspectos relacionados à. proteção de ter-
sonalidade jurídica como Leerfolmel, infra, cap. II, n. 3.3.1). ceiros, para os quais a publicidade é fundamentad,Assim, por exem-
A segunda possibilidade é a da sociedade irregular plo, a limitação de responsabilidade s6 será pos&el após o registro
como patrimônio separado. - ato que dá conhecimento formal a terceiros existência da so-
atraente, sobretudo para a ciedade e apenas após o qual é possível. presunk o conhecimento
o probfema, diversamente daquele relacionado a personalidade ju- da existência da limitação de responsabilidade p a terceiro,, ,a as-
rídica, não é de utilidade mas de incompatibilidade com sunçâo do respectivo risco.
o direito positivo. Com o visto (supra, cap. I, r,. 2.1.3, As vantagens aplicativas de uma tal construgão são evicientes.
a), no Brasil não é voluntária de um patri- Pode-se adrnzitir a existência de ações e quotas jgnessa fase e con-
mônio separado comercial. seqiientementc sua negociabilidade inler vivos (oart. 29 da Ir.( não
expressarnen- contém, com efeito, qualquer limitação h negmiaçáo da< ações
antes do registro, desde que realizado trinta pr cento dtT rilAc,o
de emissão) e rnortis causa, impedindo-se d e s s a m e i r a a pgY( ivel
dissolução da companhia em caso de morte de uzí dos~fuulicl:t'6)res
j a, (o que seria possível se essa fosse considerada xm patrirm' +C- 7 1''

to, as desconhece ate o momento en que, chamada, por qualquer circunstância, a parado).
intervir no curso de sua vida, positivada a irregularidade. tem que resolver a situa- O mesmo ocorre com relação aos direitos arserem adi,
ção juridica por elas criada. I Evídeatemente, antes d o registro e da aquisição& plena c.,,
h

"Que se reserve esse nomen iurk para designar as sociedades regularmente cons-
rituidas ou que regularmente funcionam, nem por isso deixar&o jurista de conside- de jup-ídica, ngo It possivel adquirir direitos reaihpeto sirri, ,$ 111

rar as irregulares, ou constituídas de fato, h m o verdadeiras entidades, que se agi- de não ser possível iançar a sociedade, sem aind-eapienacar r tcX<
tam, como as outras, no mundo dos negócids, adquirido direitos e assumindo obri- e personalidade jurn'dica, no respectivo registro. "fovamerirl i>nr A

papel fundamental a proteção dos interesses deerceiros.

71, V. nesse sentido, com outra linha de argumenta@x>l+ Sztajii,


70. Solução semelhante 6 susten r parte da doutrina alemã, que v2 na de sociedade, cit ., p. 159.
EinmannvorgeselLFChqít um patrimônio -v. P,Ulmer-C. Ihrig, “Die Rwhts- 72. V. K. Schtnidt, Scholtz GmbHGeseiz Kommentar,?iBmdI, Koln, Sc1i,,i8di,
natur", cit., p. 377. Quanto à socieda lar pluripessoal é vista como uma Ge- 1993, srtb Q 11, Rdn 24, pp. 430-431, que afirma: "Nun ist W w bestreitci,, dass
es zwiçcheri der Vorgesellschaft und der fertigen GmbH Untarchiede in der Vcr ino-
se aproxima de um patrimônio separado eia comum.
-
gens und Organisationsverfassung geben kann, aber es &problernatis~.h, diese
8
mit der "Reciitsnatur" der Gesellschaft in Verbindung zu-bkgen".
I
100 A SOCIEDADE UNIPESSOAL c i FORMA ORGANIZATIVA DA PEQUENA E MÉDIA EMPRESA 101

Diversa é a solução com relação aos.direitos obrigacionais. Co-


mo sociedade anônima (ou por quotas) que já é, nada lhe impede
I sociedades regulares correspondentes não são aplicáveis. Nesse ca-
so faz-se necessário encontrar um grupo de regras que seja subsi-
de adquirir tais direitos. Assim, por exemplo,.a sociedade adquire
direito de crédito com relação aos sócios relativamente aos bens por
eles conferidos. Direito de crédito que tem efeito não apenas perante
1
I
diariamente aplicável à sociedade irregular.
Deve-se para isso identificar o fulcro da irregularidade. E esse
as partes mas também perante terceiros: daí poder-se falar em "efeito reside, na fase pré-consritutiva, na imperfeição da incipiente orga-
I nização societária. Essa irregularidade, relacionável a uma ativida-
real puro da organização". Existente o contrato de sociedade, os
bens componentes da quota a ser integralizada por cada sócio con-
!
de e não a um ato, tem como consequEncia não a invalidade, típica
tinuam a pertencer a eles. A sociedade irregular, não adquire direi- I da disciplina dos atos, mas sim a mudança t i p o l ó g i ~ a . ~ ~
to de propriedade, e nem poderia adquiri-lo por força de um con- A pergunta que se-segue e obviamente qual o tipo que mais
trato. Adquire no entanto, direito obrigacional contra o sócio de dela se aproxima, a permitir a aplicação subsidiária de sua regras.
exigir a integralização dos bens. Trata-se no entanto de direito opo- Para responder a essa questão é necessário tomar posição na ain-
nível não apenas ao sócio, mas também a seus credores: daí a "efi- da acesa polêmica a respeito da diferenciação forma e tipo no
cácia real" da transferência, decorrente não do contrato mas dava- Direito S~cietário?~ Parece que em um sistema societário como
loração atribuída pelo ordenamento ao "elemento organização",73 o brasileiro, que não contém qualquer regra impositiva de escolha
Outros problemas são resolvidos pela exata caracterização da das formas legais, é perfeitamente possível adotar o conceito eco-
sociedade irregular. Assim por exemplo, o art. 99, par. Gco, da namico de tipo. Ou seja, o tipo corresponde a estrutura organiza-
Lei das Sociedades Anônimas, exonera a companhia de responsabi- i tiva, jurídico-econômica, preteãldida pelas partes.78 Divide-se em
lidade pelos atos praticados pelos administradores antes da consti- dois núcleos: a disciplina das relações externas e das relações in-
tuição. A responsabilidade dos administradores, ao contrário do que . ~ ~ relação a eles as partes têm liberdade de escolha:
t e r n a ~ Com
a doutrina parece entender,74é extremamente discutível, na medi- assim escolhe-se uma sociedade com responsabilidade limitada ou
da em que o art. 99, caput prevê apenas a responsabilidade perante n&o, -um uma organização interna mais estruturada e de cornpe-
a companhia. A aplicação do art. 159 da mesma lei B sociedade ain- tência divididas ou com menor divisão orgânica e maior liberdade
da não registrada resolve a questão: a responsabilidade dos admi- de fo-mas.
nistradores pefânte terceiros depende da existência de prejuizo dire- Tendo em vista o cruzamento dessas características escolhidas,
to (8 70); < \ . t : I f
a lei determina a forma que meihor possibilite tutelar os interesses
~ u m p r kno
, entanto, verificar tambémáqueies direitos depen- de terceiros, proporcionando a melhor transparência possível ao ti-
dentes, por força de lei, diretamente do registro e que são portanto po escolhido. Evidentemente, na maioria das vezes as partes esco-
subtraídos h sociedades irregulares. Assim, por exemplo, ihes é proi-
bido pedir concordata preventiva ou suspensiva (decreto-lein. 7.661, 76. Cfr. nesse sentido R. Sztajn, Contrato de sociedade, cit., p. 152; é de se
art. 140, n. I) e tampouco podem pedir a falência de seus devedores notar, no entanto, que a autora não aceita a tese de que a sociedade não registrada
(decreto-lei n. 7.661, art. 90, a).75 é irregular, já que "nesse caso a irregularidade da sociedade será momentânea, pas-
sageira, e não parece ser adequado qumcar essa situação como irregular (especial-
Tipificar a sociedade irregular como a regular que lhe sucederá mente quando a lei n. 6.015/76, Lei de Registros Públicos, admite que o registro
não resolve porém todos os.problenas. Existe uma zona que per- feito na prazo de 30 dias da data d e assinatura do contrato faz retroagir àquela data
manece obscura, constituída por aquelas matérias que não podem todos a6 efeitos legais)"- p. 154.
ficar sem regulamentação, mas com relação As quais as regras das 77. A distinção nada mais é que a transposição, para o campo societhrio, da
diferenga elaborada por Engiscfi e Larenz entre conceito (BegrSfJ)e tipo (Typus). A
respeito do estado atual na doutrina alemã e italiana nessa matéria v. por todos P.
73. A expressão é de P. Ferro-Luzzi, icantrafiiassociadvi, cit., p. 340, nota 43. Spada, La tipicità delle società, Padova, Cedam, 1974, p. 20, nota 33.
74. V. J. L. Correa de Oliveira, A duplo crise, cit., p. 250 e L. G . B. Leães, 73. Trata-se do que Larenz d e f i como "Regelungskomplexe, deren Elemen-
Comentários a Lei das Sociedades Anônimas, vol. 2 (arts. 52-1201, São Paulo, Sa- te N o r d d t e mitsarnt den von ihnen gemeinten Leoensbezugen sind" - v. K. La-
raiva, 1980, p. 175. rem, Mthodenlehre der Rechtswisse)1schaftS44a edição, Springer, Beriin-Heidelberg,
75. Cfr. W. Fetreira, Tratado, cit., p. 207, com outras limitações aos direitos
das sociedades irregulares; v. taybém R. Requião, Curso de Direi80 Falimentar, 38
-
New York, 1979, p. 456, definição adotada pela doutrina brasileira v. R. Sztajn,
Contrm de sociedade, cit., p. 53.
edição, vol. 1, São Paulo, Saraiva, 1978, p. 90. 74. Cfr. P. Spada, t a tipicità, a:., p. 27.
FORMA ORGANIZATIVA DA PEQUENA E MÉDIA EMPRESA 103

lhem os tipos tendo em vista as formas existentes e de modo que


ção de cada elemento da estrutura escolhido, qual a forma mais pró-
haja superposição quase total.80 i
ximaq81
Mas caso isso não ocorra, a individuação da forma deve ser feita
Imagine-se o caso da sociedade anônima irregular. A Lei das So-
de modo a coadunar o mais possíbel o interesse das partes com o
interesse de terceiros. ciedades Anônimas não contém qualquer dispositivo a respeito da res-
' ponsabilidade dos sócios perante terceiros. O art. 92, que trata da res-
E é exatamente por isso que ai enumeração das formas sociais
a
não deve ser considerada numerus c l a ~ u sbasta
: que as partes es-
colham um tipo econômico-juridi o não redutível a nenhuma for-
ma existente para que seja possival e necessária a criação de uma
ponsabilidade dos fundadores, refere-se obviamente apenas aos pre-
juízos causados a sociedade ou diretamente a terceiros. Nada diz a res-
peito da responsabilidade pelos contratos firmados em nome ou no
interesse da sociedade. A falta de registro impede a limitação de res-
nova forma jurídica. É evidente q6e para que isso seja viável é ne- ponsabilidade, mas não define como será a responsabilidade (v.g. em
cessário que as partes encontrem uma forma que traduza perfeita- via principal ou subsidiária, parcial ou solidária, etc).
mente para os terceiros o tipo esc0 hido. Caso isso não seja possí-
d
vel, a qualificação deverá ser feita or semelhança as formas legais
existentes, sempre tendo em vista o{ interesses de terceiros e mesmo
Aplicada a regra acima referida, porém, pode-se definir perfei-
tamente a regra de responsabilidade, observando-se apenas o tipo
econômico escolhido pelas partes, O tipo escolhido nesse caso é de
que isso implique parcial desvirtuaqento do tipo realmente preten-
Lido pelas partes. uma sociedade que permita aos sócios a limitação de responsabili-
dade e a participação nas deliberações sociais. A lei responde a isso,
Aplicado esse raciocínio ao pr da irregularidade, pode- dividindo rigorosamente as funções administrativas das funções as-
se entender porque essa leva a na forma (e não no sembleares e criando a organização da forma anonima.
tipo de sociedade). Faltando algumd formalidade no processo cons-
Ocorre que, na fase de constituição da companhia, inexistindo
titutivo, como o próprio registro, 0x1 aiguma formalidade que o im-
ainda conselho de administração, suas competências serão transfe-
ridas à Assembléia. Portanto, ao sócio controlador, que tem o po-
der de voto majoritário, caberá fixar a orientação geral dos negó-
a que permita terceiros e que ao mes- cios da Companhia. Nâo se pode presumir outra coisa em tal fase,
escolhido pelas partes. em que, não hzvendo ainda organizaçâo definida, não há ainda uma
correta imputaçãu de funções. Ou seja, as funções administrativas
não se podem presumir realizadas de forma institucionai, mas sim
pelo sócio fundador e detentor do poder majoritário na sociedade,
segundo o definido no estatuto social. Os sócios minoritários fun-
cionam nessa fase como meros prestadores (subscritores) de capi-
tal, em nada se relacionando com a administração da sociedade.
Dessa forma, para efeitos externos, esse contrato s6 pode ser re-
lha doa tipos. O prbprio autor reconhece aiemdo, inexisfindo gido por uma forma organizativa que impute as rela~õesao sócio ge-
rente, deixando a salvo os sócios minoritários. Essa forma é a socieda-
de em c ~ m a n d i t aAs
. ~ suas
~ regras de responsabilidade são subsidia-
riamcnte aplicáveis à sociedade irregular. São as regras da sociedade
em cornandita que vão reger, portanto, a responsabilidade dos sócios.
ciplina que as partes escolhem (responsabilidaqe, regras sobre as relações externas).
Na forma, a o contrário, estão os elementos dá fattispecie, exatamente porque ela
se destina a proteger interesses de terceiros. Na wedida em que as formas correspon- 81. I(. Larenz (Meihodenkhre, cit., p. 455) as denomina Typenreihe, apenas
por parti1 do pressuposto acima referido da tendencial coincidência entre tipos e for-
dem &disciplinaescolhida, sempre tendo como parâmetro e limite a perfeita visibili-
dade externa e os interesses de terceiros, ocorre o jii identificado efeito da "discipli- mas, jB que aqueles são normalmente escolhidos em função destas.
na" sobre a fattbpecie (P. G. Jaeger, La nozihne d'irnpresa, cit., p. 54), desejável 82. Na lista d e tipos de K. Larenz (Mefhodenlehre, loc. ult. cit.) esse é com
do ponto-de-vista aplicativo. I efei:~o tipo de transição entre sociedades capitalistas e pessoais, sendo colocado em
seguida à sociedade por quotas.
104 A SOCIEDADE UNIPESSOAL , . FORMA ORGANIZATIVA DA PEQUENA E MÉDIA EMPRESA 105

Nela se preserva;g combinação,en& podeq de gestão e respon- Uma certa disposição do Código Comercial poderia causar dú-
sabilidade pretendida pelas partes. Os sócios minoritános, meros vidas a respeito da efetiva existência de tal preferência. Com efeito
prestadores de capital .cpmo são, e.que não tem qualquer relação o art. 323 do Código Comercial prevê que os fundos sociais não res-
com a gestão social, são eqGparados aos sócios comanditados. Te- pondem pelas dívidas do "sócio de indústria", dando a entender, a
rão responsabilidade apenas se, de qualquer modo, assumirem al- contrario sensu, que com relação ao sócio de capital a responsabili-
gum papel de gestão.'Já aos controladores cabe a gerência da socie- dade dos fundos sociais seria admissível. Como esse ultimo é o sbcio
dade atravis,de assembléia'ou mesmo do conselho de administra- solidário nas obrigações, típico das sociedades de pessùas, poder-se-
ção (em caso de funcionamento já incipiente). Trata-se de analogia ia entender que o referido artigo contém um principio geral vêfido para
que pode ser feita, já que nas sociedades de pessoas, em que inexis- todas as sociedades de pessoas, inclusive as sociedades em comandita.
te divisão orgânica, a "gerência" engloba tanto a "orientação geral Não é essa a interpretação mais correta, entretanto. Basta ler o
dos negócios" da sociedade, quanto a sua administração diáriá. Es- dispositivo com atenção para verificar que se a intenção fosse respon-
sas competências, estão, na sociedade anônima, divididas entre o sabilizar os fundos sociais desses sócios, a segunda parte do mesmo
conselho de administração (v. art. 142, I, Lei das Sociedades Ano- artigo, que dá acesso aos credores particulares do sócio de indústria
nimas) e a diretoria. Por isso os sócios majoritários são equipara- aos lucros que ihe couberzm "na partilha", deveria referir-se não ape-
dos aos comanditários na sociedade irregular. nas a esses mas também aos lucros não partilhados. Pois esses, ao me-
Essa regra pode ser vista como uma presunção de existência de nos juridicamente, são os únicos a estar em uma relação obrigacional-
controle dos administradores por parte do sócio fundador nessa ?a- societária com o sócio de indústria. Quanto aos lucros que lhe cou-
se pré-social. Na realidade é ele, o único a aparecer nessa fase pre- berem na partilha, já pertencem de toda maneira a seu patrimônio
societána, e dado o seu caráter ainda personalistico, o único a apa- particular (existindo sobre ele direito real de propriedade).
recer perante esses como verdadeiro sócio. Essa presunção é eviden- A Lei de Falências veio confirmar esse entendimento. Em seu
temente muito mais f k i l em caso de sociedade unipessoal, na qual art. 128, deixa claro o legislador falimentar que os credores particu-
existe apenas uma pessoa a transmitir as instruções e onde não se lares só poderão ter acesso aos bens sociais depois de totalmente sa-
deve temer uma regra geral de responsabilidade do fundadorSa3 tisfeitos os credores sociais. Na verdade eles jamais chegam a ter
Outra oonseqüência 'extremamente relevante da qualificaçiio da acesso aos bens sociais. O que ocorre é que, conforme dispõe o inc.
sociedade +õnima irreg~lar~comò sociedade (em comandita) de 11, havendo sobras, essas serão distribuídas aos sócios, passando a
pessoass4'Fa"a"~$ossibiaidade de satisfação dos credores pessoais so- compor portanto suas massas particulares. Só então OS credores par-
bre lo patrimôdio social'8ntes d è satisfeitos ,os credores sociais. ticulares poderão ter acesso a elas. Trata-se, portairto, do mesmo
i i i " 1. 1
principio previsto no art. 323 do Código Comercial, aplicado a fa-
3 . l? 5 I'> ' 3 ,
lência: os credores pessoais só podem ter acesso Aqueles bens que
83. A nova lei italiana sobre a sociedade ~ $ ~ e s s o aprevê
l com efeito, ao Izdo
da responsabilidadedos administradores, a responsabilidade do sócio fundador (&c. já caberiam normalmente a o sócio na partilha - o inciso 11 fala,
leg. 88, art. 3,que introduziu um segundo parágrafo ao art. 2.475 Codice Civile) com efeito, em diferentes massas particulares dos sócios. Daí
- v. também as observações de C. Angeiici a respeito do dispositivo na sessão de concluir-se que não há na realidade um simples direito de preferên-
28.4.93 da Cornissione per I'attuazione delle Direttive CEE in materia societarb pre-
-
sidida por F. D'Alessandro, instituída pelo Ministhrio da Justiça italiano v. exwa- cia, mas sim uma verdadeira limitação ao acesso dos credores parti-
tos da reunião de 28.4.92 no arquivo do "Ufficio Legislativo" do referido minísténo. culares aos bens sociais.
84. A possibilidade e utilidade da aplicação subsidihriadas regras das socieda-
des be pessoas é reconhecida por Teixeira de Freitas. Com efeito, em seu Esboço
do C6digo Civil, elaborado já a luz do Código Comercial, afirma no art. ?OE: '.Se -
c) Sociedade unipessoal irregular O que foi dito acima, de
um Iado facilita e de outro complica a análise da sociedade unipes-
qualquer corporação não tivzr existência legal como pessoa jurídica, serti considera-
da como simples sociedades civil ou comercial segundo o fim de sua instituição, sal- soal. Entendida a sociedade e a capacidade juridica a ela atribuída
vo quando for da classe das sociedades proibidas ou por qualquer modo se cpuser como efeito de uma atribuição de valor a organização, é perfeita-
ao bem puílico e à moral e bons costumes" (A. Teixeira de Freitas, Código Civil
- Esboço, Rio de Janeiro, De Laemmert, 1860). Antes, nos arts. 295 e 296 já havia mente possível reconhecer a existência de uma pré-vida tambkm à
ligado a personalidade jurídica à existência de total capacidade jurídica e de limita- sociedade unipessoal.
ção de responsabilidade, regra que implicaria a atribuição de personalidade juridica
apenas Bs sociedades de capital. Portanto, o efeito aplicativo das regras por ele suge- De lege lata é no entanto necessário reconhecer que o que foi
ridas seria exatamente a aplica(;go subsidkiria das regras das sociedades de pessoas. dito aqui aplica-se apenas aos casos em que o Direito positivo efeti-
108 A SOCIEDADE UNIPESSOAL FORh4A ORGANIZATIV.4 DA PEQUENA E MÉDIA EMPRESA 100

, tratuais como por exempb a cláusula rebus sic sfu~tibus. O proble- O caráter irregular da sociedade constituida com um só sócio
ma será determinar até que ponto terceiros, como os credores por é corroborado pela impossibilidade de obtenção de registro.
exemplo, podem fazer valer tais princípios. Para isso é necessário Analisando criticamente as regras de constituição de socieda-
recorrer à análise do interesse social e dos seus respectivos titulares des no Brasil deve-se dizer, no entanto, que sua característica maior
em cada ordenamento positivo (v. supra, cap. I, n. 4.3). e mais negativa C o fato de não se exigir a presença de um capital
O legislador brasileiro não incorporou essa teoria. Tampouco mínimo. Cria-se, assim, uma situação potencialmente perigosa e ju-
aceitou uma exceção aos princípios contratualísticos quando da cons- ridicamente contraditória: o critério de segurança do legislador é o
tituição. Observando-se o Direito positivo brasííeiro, o resultado e número de sócios e não a existência de uma dotação mínima de ca-
sem dúvida muito negativo com relação A admissão da fattispecie pital para o exercício da atividade.
u n i p e ~ s o a l Para
. ~ ~ as sociedades de capital, a constituição unipes-
soa1 não é possível. Com efeito, o art. 80, I, da lei n. 6.404'76 exige 3.1.3 Constittriçáo indireta de sociedade unipessoal
o número mínimo de dois sócios para a constituição da sociedade
por ações. Com relação às sociedades com responsabilidade limita- Existem ainda forxas indiretas de constituição unipessoal. São
da, o art. 20 do dec. n. 3.708/19 determina a aplicação do COdigo elas que interessam no momento. Allas, a discussão a respeito da
Comercial (art. 300 a 302) as sociedades por quotas de responsabili- possibilidade de constituição de sociedades através da utilização de
dade limitada no tocante ao título constitutivo. Esses artigos, que "homens-de-palha" assume importância no Brasil exatamente por
regulam a constituição das sociedades de pessoas, falam sempre de causa da impossibilidade de constituição de sociedade unipessoal em
sócios (art. 302, n. 1) e a sua interpretação pacifica na doutrina é sentido estrito. A utilização do "homem-de-palha" pode ser feita
no sentido de n2ct admitir-se a constituição u n i p e ~ s o a í . ~ ~ como meio de proporcionar os mesmos efeitos da constituição
A doutrina C muito mais reticente quanto às coxiseqüências da unipessoal.
constituição unipessoal. Por tudo quanto já exposto acima, parece não A própria lei acionária brasileira de 1976 em muito facilitou a
ser razoável sl-lstentar a nulidade do contrato de sociedade. Para isso utilização desse artifício. Com efeitõ. a redução feits pelo Iegisla-
seria necessário a existência de uma disposição expressa de lei hxpondo dor de 1976 do número mínimo de socios da sociedade anônima (e
a nulidade, tqndo em vista o disposto no art, 145, CC. Além do mais, conseqüentemente, em decorrência do árt. 18 do dec. 2. 3.708 tam-
do pontg4-9 doutriniirio, a redução da disciplina da sociedade bém das sociedades por quotas de responsabiIidade limitada) de se-
A discip11@,8eseu
, "fi"*-
alo de constituição não 6 logicamentesustentivel. te para dois facilitou tremendamente a constituição de "sociedacies:
Usaq:(~iinão o vocábulo nulidade 6 indiferente: o importante unipessoais em sentido amplo".
é observar que uma disciplina da nulidade das sociedades, ainda que O grande problema jurídico envolvido na utilizaçgo de homens-
existente, não se identifica com aquela das nulidades dos atos juri- de-palha é a possibilidade de caracterização de simulagão. Ma juris-
dicos. Esse princípio foi reconhecido expressamente pelo legislador prudência, frequentemente, a própria aplicação da teoria da descon-
brasileiro. O art. 17 do dec, n. 3.708, de 10 de janeiro de 1919, pre- sideração da personalidade jurídica acaba fundando-se no caráter
vê que "a nulidade do contrato de sociedade não =mera os sócios fictício ou simulado da c o n s t i t u i ç ã ~ . ~ ~
das prestações correspondentes As suas quotas, na parte em que suas Do ponto-de-vista estritamente positivo, a análise da situação
prestações forem necessárias para cumprimento das abrigaqões con- deve ser feita com base na disciplina geral dos atos jriridicos: diver-
traídas". Reconhece-se a produção de efeitos do contrato, mesmo samente da Itália, não existe uma disciplina independente da nuli-
em caso de nulidade, na medida necessária para o cu,nprimento das dade das sociedades que destaque a sua especificidade e permita ex-
obrigações perante terceiros: regime em tudo e por tudo semelhante cluir totalmente o recurso à disciplina geral dos atos j u r i d i c o ~ . ~ ~
ao da sociedade irregular.
94. Cfr. R T 592/172, 175, TJRS. j. 8.5.84.
92. Cfr. neste sentido 3. L. Correa de Oliveira, A dupla crise, cit., p. 567. 95. Esse é o raciocínio q.xe segundo Angdici está à base da discipiina &a nuli-
93. V. J. L. Correa de Oiiveira, A dupla crise, cit., p. 565 e N. Abrão, Sociedades dade das sociedades prevista no art. 2.332 do Código Civil italiano, ou seja, o fato
por quotas de responsabilidade limitada, 48 edição, São Paulo. Ed Rev~stados Tri- "che Ia lesione lamentara con quelle anomalie cor, attiene alla sua .esistenza1, ber.~i
bunais, 1989, p. 47. a1 fa:ro que una societ8 'valida' incide negativamente su determinate sfei: patrlmo-
FORMA ORGANIZATIy&DA PEQUENA E MÉDM EMPRESA 11 1

O primeiro argumento contka a caracteriza~ãoda constituição tutivo baque~esem que:o*mesmo$ermanece ainda que apenas for-
e utilização de um "homem-de-dalha" é o fato de inserir-se na dis- malmente após o fimzdo~processo constitutivo. Com efeito, o pro-
ciplina societária e portanto no !regulamento de uma "atividade" blema que aiui se discutd a utilização das regras sobre a constitui-
e não de uma ato.96 ção unipessoal p&afun$ar $ demanda dos credores contra o sócio
Não tendo sido a evoiução doutrinária que levou à diferencia- "único". O próprio argumento jw'dico sobre o qual se funda a ques-
ção entre ato e atividade acomp*hada por urna evolução legislati- tão, ou seja, a inexistencia de real intenção de formação de um vín-
va e jurisprudencial, ainda neqessário, de lege lata, recorrer, ao culo societário, não permite distingciir as duas h í f l t e s e ~ .É~eviden-
~
menos para a caracterização da fbttispecie, Bs categorias civilísticas te porém que, em face claç regras positivas do Dieito brasileiro, mui-
existentes. A conseqüênciajuridich da conduta é que poderá ser moi- to restritivas também com relação a redução da sociedade a um só
dada em face da especificidade da "atividade", aplicando-se, por çbcio (v. infra, cap. 11; n. 3.2.2), a situação prática mais frequente
exemplo, como se viu, a teoria da desconsideração da personalida- é a permanência meramente formal do sócio "de palha" na
de jurídica em vez: de invalidar o ato. Desse modo, ficam protegi- sociedade.
dos os terceiros que eventualmente já se envolveram em reiações ju- Do ponto-de-vista teórica, importa determinar se a constitui-
rídicas com a sociedade. $20 de sociedade através da utilização de um sócio meramente figu-
A questão a ser discutida é, portanto, a existência ou não de rativo, ""d palha", é ilm negócio simulado ou apenas um negócio
simnlaçào na constituição de um sociedade com um sócio "real9' jurídico indireto. Corno destaca Ascarelli, a característica do negG.
e doia o\i niais ibcior "de palha"b7 Faia a discussáo que se desen- cio indireto C que nele, diferentemente do negócio simulado, as par
volverá nesta sede, rião importa distinguir os casos em que o tes qiierezn efeti~amenteo negócio que realizam e suas conseqiàên-
"ftlomem-de-palha" efetivamente se retira apcis o processo consti- ciaç j ~ r í d í c a çE. ~o~que ocorre na hipótese aventada. As partes pre.
tendam rfetivacxnte constituir tima sociedade com a presenca de
dois SÓCIOS. Nã0 se pode p ~ e , , , ~ , a, ~n.50-seriedade
;, das intenções do
nialc ..." --- C. Arigelici , Lasocretà nulia, it, p. 254 Pard o autor, a disciplina deve
sei compreendida como dirigida A elirninaião da lesão e não da pr6pria sociedade. '6hhomern-de-palhs", sobretudo porque h assunçiio da posição de
Ijcnrro dessa linha de interpretação, a dishluçáo prevista para o caso de constitui- SfroZsmai?ncorresponde sz ãtribuiq50 da qualidade de sócio e das con-
cio tinipessoal e a responsabilidade i1ími:ada para o caso de unipessoalidade super- seqiierates o b ~ i g ã ç 6 e s . ~ ~
venieiiie aparecem coma formas paralelas $e sanção, a aparente rigidez excessiva da
primeira representando apenas uma necesqidade maior, sentida pelo legislador, de PL peculiaiidade do negócio que justifica sua caracterização co-
- mo indireto é que, com esse complexo de atos e intenções, busca-sc

i
tutelar O procedimento colistitutivo v. p .260 ss., em especiai nota 272. O dispo-
sitivo legal comentado (dissolução) não é ais aplicado no sistema italiano, tendo urn terceiro efeito, qud seja, a separação pstrimonial através da for-
a jurisprildência reconhecido a possibilidad de constituição unipessoal, hipótese em
que a sociedade será de responsabilidade $imitada. nza societ6tia.
96. CFr. C. Angelici, que ~nalisandod art. 2.332 do Codice Civile italiano afir- necessário, portanto, determinar a compatibilidade de tal efei-
ma tratar-se na realidade não de hipótese dk nulidade de um "ato", mas sim de um to final do neg6cio pretendido pelas partes com o efeito final pre-
caso ein que li50 se pode atingir a desejadb organização societária. Trata-se, para tendido :~eTuordenamcnto. Comcz se verá, para determinar a ma-
o .tiitor ~r&o de vício de um ato mas sim de hm procedimento que u faz concluir que
se a !~lpiitcsep.evjsta no arr. 2 332, n. 6 "nop potra 6sserecus?ruiía sul piano deli'at- n& e C:OT~OO nrber!;zinenio se pozicíone a respeito da separação :?a-
' 2 , i ~ i sal8
n yntadi pusiihiic utilizza~e10 sihema defia simulaziorie" - cfr. C. h- trir,:anial em rilaténisi sacielária, é preciso indi~iidualizaa norma que
, sonetò nuilo, cit., pp. 230 ss.
g d i ~ iIdu à diferença ato-atil.idade v. F.K. discipiina a unipessodidade superverxiente. Esse é, sem dúvida, o ele-
ron:r?*rato, O poder de controle, cit, p.
97. Para simplificar, a referência é a constituição iinipessoal, mas é evi-
dentç que a interpos~çãofiducihria ou pode também ocorrer deppis, Com 98. v. 3'.' ilscareiii, "O negócio indireto" in Problzmas das sociedades anôni-
efeito, Scotti-Camuzzi identifica três casos de ocorrência frequente: a aquisição de mas, cit., p. 133.
aqocs peio fiduciirio por conta do fiduciance, a venda fiduciária de parte das âçoes 99. V. 2'. Asr'ardii, "O negócio indireto", cit., pp. 110-111.
do sócio único a prestnnorni (homens-de-palha), a transformação do sócio real em 100. ?[r. P. Ulrner, fiuchenburg ~rosskommentff~ (1990), cit., $ 2, Rdn 55.
meio prestanome atravCs de vendas sucessi as de ações, em um procedimento por ic):. Cfr. T, Ascarelli, '$0 negbcio indireto", cit., pp. 134-135. Na doutrina
ile dcsoniinado '4costi<u~one dei rapportokduciario rei invsrsione de1 titolo", ti- brasixi1.a. opiniao favorh\lel $I caracterização da constituição unipessoal como nc-
picamente configurado no caso Marzoli vs. Massari relatado retro - v. Scotri- góçio j::ridico indireto t5 a de W. BulgareILi, A teoria jurjdica da empresa, cit.,
Camuzzi, L'unicc) azio~isfu,cit., pp. 902 ss. p. 416.
116 A SOCIEDADE UNIPESSOAL r r ir *
FORMA ORGANIZATIVA DA PEQUENA E MÉDIA EMPRESA 117

mitadas, além dos fundamentos .teleolÓgicos,ligados,à preservação organizativa na sociedade.lI5De um lado, deve-se admitir que não
da empresa, sncontra respaldo na própria lógica de nosso sistema basta a manutenção da personalidade jurídica prevista no art. 207
societário. Basta pensar que nas sociedades limitadas a convocação para justificar a manutenção da responsabilidade ilimitada, já que
da Assembléia Geral, ao contrário das sociedades anonimas, é fa- no Brasil a personalidade jurídica não é exclusiva das sociedades com
cultativa, o que torna tanto o dies a quo (da verificação da existên- responsabilidade limitada. De outro lado, a transformação em so-
cia de apenas um sócio) como o dies ad quem (do restabelecimento ciedade com responsabilidade ilimitada, pela sua atipicidade, exigi-
da pluralidade de sócios) incertos.l12 . ' - " :, ria disposição expressa.
Certas constatações de caráter exegético contribuem para de- Como será visto mais adiante, a pouca clareza dos textos legais
monstrar que a dissolução, ainda que decretada, é um perigo mais faz com que a questão da caracterização da fattispecie sociedade uni-
teórico que real. Relevante é o próprio fato que a dissolução não pessoal no Brasil se reduza à discussão sobre os requisitos para a
altera a natureza e o caráter da sociedade. A sociedade mantém a desconsideração da personalidade jurídica. Com efeito, o não cum-
personalidade jurídica e pode continuar a comerciar, até a liquida- primento da obrigação de proceder a liquidação é usado como ar-
ção (art. 207)."3 gumento para caracterizar a fraude e justificar a desco~isideração.
Tais opiniões parecem ser fruto de uma confusão conceitua1: a frau-
Quanto A liquidação, legitimados a promovê-la são apenas os de, tanto aos credores quanto a lei, é um vício do ato jurídico inci-
acionistas e o Ministério Público, a luz da comunicação da autori- dente sobre sua alid da de."^ Não pode incidir sobre a validade de
dade competmte (art. 209, I e 11). Essa última referência é aplicá- outros atos ou justificar uma responsabilização ulterior do agen-
vel, obviamente, aos casos de dissolução por extinção da autoriza- te."; A necessidade de operar uma tal transposição traduz na rea-
ção para operar (art. 206, I, e), Único caso no qual existe uma au- lidade o vício de tal tipo de raciocínio, qual seja, a tentativa de utili-
toridade competente para fazer a comunicação ao Ministério PÚ- zar categorias civilísticas, aplicáveis a "atos", a "atividade social".
b I i ~ o . " Na
~ sociedade unipessoai, ao contrário, legitimado a to-
mar a iniciativa da liquidação é apenas o próprio sócio único. Uma 115. O STF já se manifestou positivamente no sentido da manutenção da res-
eventuai legitimação dos credores não é positivamente prevista e ponsabilicade limitadz: j. 3.4.79 in RTJ92/884: "Sociedade por quotas constituida
não parece ser de qualquer maneira defensável. De um lado, é pouco por dois sócios. A morte de um deles não torna ilimitada a responsabilidade do sócio
remanescente, assim como a dissolução não altera a natureza da sociedade". A mes-
provável que queiram promover a liquidação do credor com o qual ma Corte mostrou-se indecisa em um caso mais recente, no qual não se pretendia
comerciam se esse for solvente. Se for insolvente, o dispositivo a responsabilizar uimitadamente o sócio mas sim dissolver a sociedade. Não se conce-
ser aplicado é a lei faiimentar, e não a Iiquidaão da lei acionária. deu a ~fissolu~o total, mas in obiter dictum afirmou-se que a sociedade transformar-
se-ia em " F i a individual" (conseqüentemente, com responsabilidade ilimitada do
Não se deve confundir o problema da dissolução com o da res- sócio) se o niimero &imo de sócios não fosse reconstituído no prazo legal - j.
ponsabilidade limitada. A lei não define a forma de responsabilida- 23.4.85, in RTJ 114/851 esp. 854. Essa é ali& uma declaração que pode ser encon-
de entre o momento de verificação da unipessoalidade e o da (even- trada na maioria das decisões que não admitem a dissolução, o que demonstra que
a jurisprudência brasileira ainda está longe de admitir a idéia da sociedade unipes-
tual) dissolução da sociedade. No dêncio da lei, parece ser mais ra- soa1 com responsabilidade limitada.
zoávef considerar que não existe qualquer modificação societária e 116. Cfr. com re1ac;ão à fraude à lei A. Lima, A fraude no Direito CiviÉ, São
Paulo, Saraiva, 1%5, pp. 313 ss. e Y. S. Cahali, Fraude confra credores, São Paulo,
Saraiva, 1990, pp. 57 ss.
mente de 31.10.89 e 7.12.89, ambos do TJSP);determinando a preservação da em-
presa, sem ser claro a respeito da forma e do prazo, cfr. TJRS, j. 1.11.88, citada 117. Ambas as hip6teses envolvem construções incompatíveis com a te&a da
por W. Bussada, Código civil brasileiro, c&., assim como TJRJ, j. 23.9.81, in R T desconsiderajSo que se quer apkcar. Com efeito, para postular o ressarcimenre, se-
C57/2I5 e j.14.10 75 in RT487/178. ria nec&a a demonsctração do nexo causal entre omissão e dano. O problema Lsnar-
se-ia portznto, claramente, de responsabilidade extracontratual. Quanto à primeira
112. V. R. Sztajn, Contrato de sociedade, cit, p. 89. hipótese (uivalidade do ato), parece difícil identificá-la. Com efeito, a contredade
113. Com base nesta característica certa parte da doutrina critica ate mesmo A lei ct3nsiste em uma abstenção (não ter promovido a liquidação) que de q u a u e r
o emprego do termo dissolução no art. 206. Teria havido uma confusão entre causas modo não pode ser considerada nula ou ineficaz. A única hipótese sustentad de
ce dissolução e a própria dissolução, que teria lugar apenas quando extinta a perso- transposição da invalidade do ato é sustentar que a vontade do credor ao conlratar
-
ralidade jurídica, ao fim da liquidação cfr. F. Martins, Comentários,cit, st~bart. com a sociedade era viciada, por causa da omissão dolosa do sócio que não &&ara
206, n. 890, pp. 2 ss. em particular pp. 4-5. a sua condição [art. 94, Código Civil). O negócio viciado e passível de anukgo é
114. Cfr. i?. Martins, Comentários, cjt., 8243 art. 209, n. 906, p. 29. porém o negócio entre sociedade e credor e não o contrato social.
FORMA ORGANIZATIVA DA PEQUENA E MÉDIA EMPRESA 119

"3.3DessConsideraçúo' da personalidade jurfdica da sociedade unipessoal foi facilitada pelo desenvolvimento da teo-
, . ria da desconsideração, vista como um meio de "domesticar" a so-
"De"há muito Se sustenta ser hma das tarefas mais importantes
"'2""" ciedade ~nipessoai.'2~ Na Itália, até muito recentemente (antes da
do Direito,Societário ~"combatefipela realidade das forma^"."^ A transformação em lei da XII Diretiva Comunitária), a disciplina da
medida que diminui o número de sócios, mais provável torna-se a sociedade unipessoal se resumia a responsabilidade ilimitada do só-
confusão de interesses e portantolmais importante torna-se tal tare- cio em caso de falência prevista no art. 2.362 do Código Civil. Por
fa. Ao reduzir-se a sociedade à e istência de apenas um sócio - e outro lado, a disciplina da desconsideração se resumia praticamen-

6
ainda que não se acredite na magi dos números, capaz de transfor-
mar a natureza das coisasNp- é atura1 que a prevenção e sancio-
namento das formas irreais gan6e importância.
te as sociedades unipessoais, já que o art, 2.362 era visto como a
consagração legal de tal teoria e conseqüentemente como única hi-
pótese possível de descon~ideração.'~~
Pode-se dizer, conseqüentemente, sem nenhuma aspiração a ori-
ginalidade, que a problemática da Sociedade unipessoal centra-se em 3.3.1 A teoria da desconsideração
dois pontos: a prevenção da confpsão das esferas patrimoniais do
sócio e da sociedade e a identificqção de meios que permitam atri- a) Antecedentes - O conceito de personalidade jurídica, teori-
buir a obrigação ou o ônus corresppndenteà esfera efetivamente en- camente elaborado pela pandectística, foi durante longo tempo con-
volvida, nos casos em que essa fusão efetivamente ocorra, seja siderado intocável. Essa rigidez demorou muito a ser superada. Ape-
inevitável ou ao menos muito nas na segunda metade da década de 50, com a publicação do tra-
balho de R. Serick, ganharam impulso teorias que admitiam desco-
Nos países que reconhecem a tociedade unipessoal, procura-se nhecer a personalidade jurídica.
resolver o primeiro problema atravgs de instrumentos organizativos
internos - publicidade, regulameqtação especial dos negócios po- Não se pretende aqui analisar com profundidade todas as ieo-
tencialmeLi;, ,,nflituais, regras espbciais para a tutela do capital so- rias que trataram do assunto. Em primeiro lugar por não ser objeto
cial. Essas regras serão analisadas] no tópico seguinte. do presente trabalho. E em segundo por já dispor o Direito brasilei-
O segundo problema, aqui de 'ominadoproblema da desconsi- ro da aprofundada e crítica anA1ise de J.L. Correa de Oliveira (A
deração da personalidade jurídica,T é mais complexo. Com efeito,
d u p l ~crise da personalidade jurídica).
o conceito de desconsideração é mofivo ainda hoje de intermináveis O objetivo é analisar apenas as teorias mais importantes rela-
discussões na doutrina. 120 I cionadas ao tema aqui tratado, enquadrando-as segundo critérios
Indiscutível 6 , no entanto, a idportância da disciplina da des- úteis para o estudo que se pretende realizar.
consideração da personalidade jurfdica para a admissão e regula- É por isso que, antes de tratar das teorias da desconsideração
mentação da sociedade unipessoal. os países que hoje contém re- propriamente ditas, parece importante mencionar uma teoria, de
F
gulamentação da sociedade unipess al, a disciplina da desconside-
ração tem papel fundamental. Na (emanha, a própria admissão
grande difusão nos anos cinqüenta, que procurou atingir os mesmos
efeitos da desconsideração - e daí o seu pioneirismo - sem no en-
tanto Bdar com o conceito de pessoa jurídica. Trata-se da teoria de
118. A frase seria de F.Kfein, em r e f e r ~ k i aespecífica às sociedades por ações:
'%s wird das Los der Aktiengesetzgebung, uifaufhorlich um die Wahrheit der Form 121. E. Sctianze descreve metaforicamente o processo de aceitaçào da Einmann-
zu kampfen" -in Rathenau, "La reaità de114 societa per azioni", cit., p. 923, nota. geseílschaft na Alemanha: "Man kann das herrschende heutige Verstandniss dahin-
119. A referência irônica à magia dos números é de E.R.Latty, "A conceptua- getiend nisanimenfassen, dass d e Einmanngesellschaft ein bedenklicher, aber scliliess-
listic Tangle and the One or Two-Man Corporation", in Norfh Carolina Law Re- lich zugelassener Wildwuclis irn Recht der Kapitalgesellschaften ist, der aber mit zu-
view 34/477: "There is no magic in numbers apd there is no public policy which says nehmender Problernsetisibiliesierung endlich in dem - in einzelnen Voraussetzun-
that three men limit their Iiability and acquire a legal personafity different (for some g a l umstnttenen - Durchgriifskonzept sozusagen domestiziert wurde". V. E.Schanze,
purposes) from their individual personality, put that one man or two cannot". A Einan~nngeselisclzaflund Durchgrifi%aftung, cit., p. 13.
referência aos três sócios explica-se pelo fato de que a 6poca eram necessários três 122. Por outro lado, j i que, como visto acima (cap. 11, n. 2.1.1) a jurisprudên-
sbcios para a constituição de uma sociedade ina Carolina do Norte. cia. italiana adere ao conceito rígido (numkriw) de sociedade dpessoal, a consequência
120. Para uma analise comparativa das diversas teorias, v. J L. Correa de 01i- dessa iigação da desconsideração à sorte da sociedade unipessoal foi o pequeno de-
veira, A dupla crise, cit., pp, 294 ss. senvolvimento da afesconsideração em sede jurisprudencial naquele país.
W, Bigiavi, ~ént;ada*''$~ura
" ." ,'," i''
do;~~sdd~~tir&o~?> òu seja;'doZsócio do sbcis tirano, a ponto de o legislador criar uma presunção iuris
1 sdé faz 4çd a$ i$$eaad~&$ó: 'i'&~i$!$f&pria7?. 123.O*autorchega et de iure de tirania.126
B respoisabilidád&~ t kr ? .dZ á ; $ ~ ' ~ 8 c i o ~ f á f i 6 ' ' â t ~sua
,tq.yf.A a ~ 6equipa-
sde A desconsideração da personalidade jurídica que essa teoria im-
ração figúra,do empresár&o~&iiltolpara'a q u d jB havia deduzido plica é bastante evidente, ainda que assim não seja quaiificada ex-
uma regia de res$&abilidade $&~oal.~"Essa equiparacão 6 feita pre~sarnente,~~? Atualmente é pequeno o seu reconhecimento juris-
com baseno domínio por ele y ~ { ~ a d o : s o barsociedade, e domínio prudencial, tendo em vista a interpretação restri~ivaque vem sendo
qualificado; verdadeira tirarnafsegupd6pó'autor, que o transforma dada ao art. 2.362 do Codice Civile.IB
em empresário indireto.125A esse ponto parece já estar claro que
o modelo típico de tirania, o sScio único, deve ser invocado para b) A teoria unitarista - Na metade dos anas cinqüenta apare-
sustentar a teoria. Com efeito, o art. 2.362 do Codice Civile itaiia- ce a primeira sistematização da teoria da desconsideração da perso-
nalidade jurídica, feita pelo alemão Rolf Serick. É a seus estudos
no, que prevê a responsabilidade ilimitada do sócio único, C visto e sobretudo a sua teorização da jurisprudência americana que se deve
como uma confirmação do principio da responsabilidade ilimitada atribuir o desenvolvimento moderno da teoria da desconsideração
da personalidade jurídica. Em seu trabalho Rechtsform und Reali-
123. A teoria foi exposta por W. Bigiavi no iivro, hoje clássico, L'imprendito- tal juristischer Personen o autor define a desconsideração como um
rz ocmlto, Padova, Wam, 1954. Segnãrtm-se uma s&ie de outros trabafhos do au- conceito técnico específico, contraposto e excepcional com relação
tftr sobre o assunto, entre os quais destaca-se, pelo tratamento específico do tema
5 presente trabalho, "Società controii~tae società adoperata come cosa pmpria", ao princípio da separação patrimonial.
o Giurisprudenza Italiana, 1959, vai. I, 1, c. 623 ss. O autor adota um conceito unitário de desconsideração, ligado
124. Para deduzir essa regra, o autor parte do art. 147, inc. 11, da lei falirnen- a uma visão unitária da pessoa jurídica como ente dotado de uma
tar italiana, que nos casos de falência de uma sociedade de pessoas prevê tambhm
a rãlência do sbcio ilimitadamenteresporsKwe1, cuja existênciaera anteriormente des-
essência pré-jurídica, que se contrapõe e eventualmente se sobrepõe
mhecida dos credores. O autor identifica nessa regrz c ;;:..,ipio da responsabilida- ao valor específico de cada norma.'29 O unitarismo de Serick revela-
d:: pessoal do sócio oculto de uma sociedade. O segundo passo consiste em trabalhar
ccm a hipótese de uma sociedade com dois sócios, um dos quais é oculto. Trata-se, 126. Cfr. W. Bigiavi, L 'imprenditore occulto, cit., p. 193.
c~nsequentemente,também nesse caso, de uma sociedade oculta (de fato), jai que 127. Cfr. F.Galgano, "Struttura logica e contenuto noimativo de1 concetto di
ca Itália não se admitem sociedades de pessoas unipessoais. Para permitir a aplica- persona giuridica", in Rivista di Dirifto Civiie, 1965, vol. I, p. 553 (581, nota 9 3 ,
t;Éo do a.rt. 147 a a caso concreto (hão h&por que não o fazer, se o art. 147 não con- que critica a confusão da teoria de Bigiavi com a da descor.sideração, exatamente
;hqualquer dceção para a sociedade com dois sócios), é necesshio admitir a res- porque a primeira não parte de uma discussão crítica do conceito de pessoa jurídica,
pansabilidadpljes$oai do sócio ocuito de uma sociedade oculta, O autor identifica com seus requisitos e pressupostos de aplicação. Deve-se destscar, no entanto, a opi-
a m?io dessas duas normas na responsabiiização da pessoa <'sulpatrimonio deiia quale nião de S. Scotti-Camuzzi, segundo o qual a própria teoria Je Galgano nada mais
i :uzi non hanno contato nel momento in cui sorgeva I'obbiigazione, sempre che s'in- 6 "che la traslazione e opportuna trasformazione, sul piano mcietario, della teoria
t e d e queiia persona avesse Ia possibilittt di dirigere l'impresa su cui grava 1303bliga- che i1 Bigiavi aveva mantenuto sul piano dell'impresa" (cfr. s'Osservazionein tema
*e3' - W.Bigiavi, L'imprenditore occulto, cit., p. 31. ,Assim, o autor consegue di responsabilitii deii'unico azionista", in JUS 1977, p. 169j.
formular uma regra gemi, váiida tanto para o empresário individual quanto para o 128. Cfr., entre tantos outros, Cass. 29 de novembro ~ i 1983,
e in Giurispru-
awresário coletivo que exerce sua atividade atravbs de uma sociedade de capitais denza Commerciale, 1982, vol. 11, p. 694, que afirma que o ~ t t2.362,
. como regra
OR de uma sociedade de passoas. excepcional, não seria passível de aplicação analógica ou interpetação extensiva. Na
125. Cfr. W. Bigiavi, "SocietA controllata", cit., c. 624, onde o autor enume- doutrina, no mesmo sentido, v. G. Iudica, "Societa di comodo", cit., p. 153, nota
ra os requisitos para que uma sociedade possa ser considerada tiranhda: "6 rissa- 23; contra, v. G . Pelizzi, "Unico azionista", cit., p. 493, afirmando, com lógica,
p,infatti, che ad essa si potd fare ricorso non giii quando i1 socio sovrano si sia que a regra do art. 2.362 é apenas a repristinação da responsabilidade patrimonial
integral prevista no art. 2.740, excepcionada pelo art. 2.325 Gegra da responsabiii-
limitato a spadroneggiare neii'mbito deila societk, creata magari all'unico scqm di dade limitada nas sociedades).
cmsentirgli ii ricorso Gndiretto) ai beneficio della responsabifità Emitata, rna quan- 129.Tratã-se daquilo que Schanze chama de "qualifizierten Wesenbestimmung
da abbia degradato la s o c M a suo mero strumento, intendendo dire, con queste der juristischen Person" - "definição quaiificada da essência da pessoa jurídica"
parole, che egli ha usato delia societh come di 'cosa propria'. .. (cfr. E.Scha.nze, Einmanngcse/lschaft und Durchgrif~ftung,at., p. 60), que se tra-
"Anche in tal caso i1 socio (e perchè no un terzo) è i1 sovrano della sociP-ll, duziria em uma concepção pré e supra normativa da personalidade jurídica, caracte-
ma ne è per cosi dire i1 'sovrano qualificato', ii tirano che ha messo in non cale tutte rizada na seguinte afmação: "der Eigenwert des Rechtsmtituts &r juristischen Person
:e rígole de1 diritto societario, tale che egii pub essere considerato l'imprenditore in- steht dem Zweckwert einer einzelnen Norm gegenuber" - "o valor pritprio da pes-
diwo dell'impresa societaria. Come tak, cgíi deve rispondere con tutto ii suo palri- soa jurídica se contrapõe (e sobrepõe) ao objetivo de uma norma específica" (R. Se-
mcrio personaie e, nef caso, fallire." rick, Rechtsform undRealitlitjuristischer Personen, Berlin, Mohr-de Gruyter, 1955,
122 A SOCIED~DEUNIPESSOAL FORMA ORGANIZATIVA DA PEQUENA E MÉDIA EMPRESA 123

se também em outro plano: ajnão distinção entre tipos de pessoa mune, la legge ha previsto per determinati gruppi", disciplina'coni
jurídica, com relação a organi interna, motivo pelo qual não sistente em uma "somma di privilegi che, ricorrendo specifici pres-
vê nenhum motivo que tratamento diferenciado para suposti, i1 IegisIatore ha concesso ai membri".135 ''! "I" ' '"'' "li

a sociedade unipessoal. I3O O autor faz duras críticas à teoria de Serick que vê na persona-
lidade juridica um fenômeno unitário, ou seja, a regra e na sua des-
consideração a exceção. Argumenta que esse tipo de ragocinio regra-
nsideração de um ponto-de-vista exceção, sem uma conveniente crítica do conceito de pessoa jurídi-
critérios, não sempre de fácil ca, levaria a admitir a desconsideração com base em princípios va-
gos e de difícil determinação como os de eqüidade e justiça.136
Mas quando chega o momento não mais de criticar mas sim
de definir o conteúdo normativo de seu conceito de pessoa jurídica,
Uma outra corrente, na q d a ~se inclui o próprio Serick, tenta ou seja, em suas próprias palavras, a soma de privilégios que cons-
justificar a desconsideração a pgrtir do assim chamado subjektiver tituem a personalidade jurídica, o autor cria seu próprio unitaris-
Rechtsmissbrauch, identificando o elemento intencional na utiliza- mo: reduz o conteiido normativo do conceito de pessoa jurídica a
ção fraudulenta da forma ~0cidtária.l~~ responsabilidade limitada dos seus membros.137Assim procedendo,
Nessa última corrente inclui-se ainda Galgano. Mesmo partin- desconhece um elemento que, ainda que insuficiente, C necessário
do de uma declaração de princípios eminentemente anti-unitária, a a configuração da personalidade e da própria subjetividade. A des-
proximidade de resultados entrela sua teoria e a de Serick é eviden- consideração por ele imaginada mostra-se possível apenas em caso
te. O autor rejeita qualquer tipd de assimilação entre pessoa física de abuso e para o fim de atribuição de responsabilidade a sujeito
e juridica. Nega também que a personalidade jurídica seja fundada
em uma concessão de subjetividade jurídica aos grupos organiza- 135. Cfr. F. Galgano, "Struttura Iogica", cit, pp. 553-567.

r
dos por parte do legislador. Em ma análise muito vizinha a tradi-
cional doutrina i n s t r ~ m e n t a l i s t aGalgano
, ~ ~ ~ define a personalida-
de jurídica como "Ta speciale dis{iplina che, in deroga a1 diritto co-
136. F. Gaigano, '<Strutturalogica", cit., pp. 579-580. É interessante aqui fa-
zer um confronto da teoria de Galgano com a de Miilier-Freienfels, o mais conheci-
do crítico da teoria de Serick na Alemanha. Ambos partem de uma critica severa
do pressuposto fundamental da teoria de Serick, o unitarismo do conceito de pessoa
I juridica, concebido como sujeito de direito pleno jvollwertiges Rechtssubjecf),equi-
20. ed., p. 24). Na verdade, Schanze parece exagerar ao se referir a um cariiter pré parável As pessoas físicas. Enquanto, porkm, Gaigano nega que as pessoas jurídicas
e supra normativo. Serick reconhece exprkssamente que a pessoa juridica não é uma sejam sujeitos de direito e procura um conceito unitário substitutivo, o de responsa-
-
entidade pre-moldada (keine vorgegebend Erscheinung) entenda-se, pré-jurídica bilidade limitada, Müller-Freienfelsnão se preocupa em negar a subjetividade juri-
dica, mas sim em demonstrar o reiativismo de tal subjetividade. A pessoa jurídica
-, mas sim uma criação do ordenamento '(eineSchopfung der Rechtsordnung).Não
há dúvida, no entanto, que ao falar emlvalor próprio da personalidade juridica, concebida como um centro de imputação de normas é sustentável como tal apenas
aproxima-se das teorias realistas da pessoq jurídica, criando por assim dizer um rea- na medida cm que o escopo de cada regra o permita: W i e juristischer Person ist
lismo normativo que acaba por desembop no unitarismo supra mencionado. sonach nur ein bequemer, zusammenfassender Ausdnick für bestimmte Einheiten,
130. Cfr. R. Serick, Rechtsforrn u Realitat, cit,, pp. 20-22. ein 'passendes Symbol'. Sie bildet nur ein gedankliches Zusammenfassung von Tat-
bestanden, Beziehungen und Ncarmen, ein Ieicht begreifbares Yorstellungsbild...",
131. Representante de tal teoria é, exemplo, U. Immenga, Diepersonulis- cfr, "Zur Lskre voa sogennanten 'Durchgriff' bei junstischen Personen in Priva-
tísche Kupitalgesellschaj?, Bad trecht", in Arctiiv fur das civilistische Pruxis, 1957, p. 529.
132. Cfr. a respeito V. Emmerich, Skholz Kommenfar mm GmbH-Gesetz, 70 Essas diferenças de opinião em dois sistemas que têm realidades legislativas se-
ed., Koln, Schmidt, 1986, § 13, Rdn. 80, afirmando que a indeteminação dos crité- melhantes (tanto na Alemanha como na Itália a personalidade jurídica 4 concedida
rios é uma das maiores razdes para as crítiyas doutrinbias que são feitas a essa teo- apenas às sociedades de capital) explicam a diferença de extensão entre as duas teo-
ria hoje em dia.
rias, sobretudo com relação à desconsideração da personalidade jurídica. Enquanto
133. A esse grupo pertence não apenas o próprio Serick mas também U. Drob- Gaigano retorna ao conceito de abuso para a admissão da desconsideração, limitan-
nig, com seu clássico trabalho Haftungsdu(chgriff bei Kapita/gesellschuften,Beriin- do sua apiicaçao aos casos de atribuição de responsabilidade patrimonial ao sócio
Frankfurt, Metzner. 1959. limitadamente responsável, Muller-Freienfels, como visto acima, procura determi-
134. Cfr., v.g., T. Ascarelli, "Considerazione in tema di sorieta e personaiita nar o escopo de cada norma em particular para determinar a qual sujeito (sócio ou
giuridica", in Studi in onore di Giuseppe Valeri, vol. I , Milano, Giuffrè, 1955, p. sociedade) ela deve ser aplicada, Tal teoria encontra hoje reflexo na riquíssima série
21, e C. Arangio-Ruiz, Lapersona giirridica çome soggetto stmentale, Milano, Giuf- de hipóteses de desconsideração reconhecidas na doutrina e na jurisprud6ncia alemãs.
frè, 1952. 1.37. C ~ I F.
. Galgano, "Sttuttura fogica", cit., pp. 609 ss.
IL4 A , 4 SOCIEDADE UNIPESSOAL FORMA ORG.4NIZATIVA DA PEQUENA E MÉDIA EMPRESA 125

dit~rentedo devedor., Cg~equentemente,mesmo partindo de pres- negociais, sobretudo aos credores por débitos trabalhistas e ao fis-
supostos diversos, chega a resultadós muito semelhantes aos da teo- co, com relação aos quais não foi "negociada" qualquer taxa de
. , ,
ria por ele criticada. 3
risco (até por que isso seria materialmente impossível).
A sofução, portanto, pareceria caminhar para o reconhecimento
~ i d e w-~Aoacei-
"'"@ ~&iihdos a p ~ i ~ ~ ~ i v & : 2 d e s ~e~falência do privilégio de débitos fiscais e trabalhistas também com relação
'tação integral da teoria unitarista tem duas implicações necessárias: aos credores particulares do sócio. Esse privilégio não poderia be-
,&'primeiro lugar admitiria desconsideração apenas para atribuir neficiar no entanto os credores quirografários. Nesse caso, correr-
"'résponsabiiidade'? a sujeito diverso d o devedor e, em segundo lu- se-ia o rkco de haver desencadeado uma sucessão de processos de
gar, admitir a desconsideração, como evento excepcional que é, ape- insolvência sem qualquer resultado prático, pois é bem possível que
nas em Último caso, ou seja em caso de insolvência (e não impon- em presença das credores particulares os credores sociais resultas-
tualidade) do devedor (para a crítica desse desdobramento aplicati- sem tão insatisfeitos quanto ocorreria caso não tivesse sido descon-
vo v. infra cap. II, n. 3.3.3). siderada a personalidade jurídica.
.Levar a teoria unitária a suas últimas conseqüências implicaria Esse tipo de argumentação esbarra em alguns obstáculos no sis-
admitir a desconsideração apenas em caso de falência da sociedade, tema brasileiro. O sistema falimentar brasileiro, diferentemente do
no caso em que, mesmo após levantados os bens, ainda assim o pa- italiano, não reconhece a possibilidade de declaração de falência sem
trimônio não fosse suficiente ao pagamento das dívidas. Isso tudo é insolvência (ou impontualidade) própria do devedor. O art. 50 do
decorrência do fato de que para a teoria unitária fundamental é a tu- diploma faiimentar (decreto-lei n. 7.661, de 12 de junho de 1945)
tela da personalidade jurídica e por conseqüência do próprio deve- prevê que sequer os sócios ilimitadamente responsáveis podem ser
dor. Esse desdobramento, por mais esdrúxulo e incompatível com a
teoria da desconsideração que possa parecer, é conseqüência neces- formalmente declarados falidos em caso de falência da sociedade.
sária da aplicação da teoria unitarista. Dispõe também que se estenderão a eles os efeitos jurídicos da sen-
tença declaratória de falência, o que na prática implica que os bens
Tanto isso é verdade que no ordenamento italiano, fortemente pessoais dos sócios serão também a r r e ~ a d a d 0 s . l ~ ~
influenciado pela teoria unitarista, essa foi a solução adotada para
a sociedade unipessoaI. Como já visto, o art. 2,362 do Codice Civi- Quanto aos sócios de sociedade com responsabilidade limitada
le prevê, para o caso de redução da sociedade a um só sócio, a res- doutrina e jurisprudência são uníssonas ao afirmar a impossibilida-
ponsabilidade ilimitada do s6cio único em caso de falência. de de arrecadação dos bens do sócio (ou, na eufemística expressão
,..\ 7 *. 1'- **
do legislador, "extensão dos efeitos da falência a o s i t ~ i o " ) . ' ~ ~
0 rkh~iunamentobecessário entre d&consideração e falência
levanta $w@s problemas que devem ser considerados. Surge em pri- A desconsidexqâo não tem sido admitida durante a falência exa-
meirolugar a questão da proteção dos iriteresses dos credores parti- tamente com base na vedação da extensão dos efeitos da falência a o
culares. Pergunta-se: não seria mais justo realizar a p a r conditio cre- sócio limitadamenteresponsável.Exige-se que a massa falida faça valer
'(Ii<orurntambém com relação aos credores particulares do s b ~ i o ? ' ~ ~ os seus direitos através de processo de conhecimento. '41-142
1 : Em caso' de re~~osta'positiva uma sbrie de outras indagações Pelos motivos acima expostos, essa interpretação parece bas-
se Seguiriam; Por exemplo: em que posição na lista de credores en- tante correta, Não se pode dizer o mesmo com relação à justificativa
t r a r á ~os Credores particulares do sócio?
~acioein&dodo ponto-de-vista da análise econômica do direito, 139. Ainconsistêriciada nonna que aplica aos sócios os efeitos da falência foi cnti-
poder-se-ia argumentar que aqueles credores que negociaram com cada, aliAs, por W. Ferreira, que chegou a fazer proposta demodificação do dispositivo
por um outro que previsse expressamentea declaração de falência do sócio, projeto que,
a sociedade e tinham como garantia o seu capital exigiram para isso no entanto, não foiapm.ddo{cfr. R. Requião, Curso deDireitofalimentar, cit., pp. 46-47).
o pagamento de uma taxa de risco (risco de insolvência na socieda- 140. Cfr. TJGB, Z! de fevereiro de 1973, apud R. Requião, Curso de direifo
de), e que conseqüentemente não é correto que sejam privilegiados falimentar, cit., p. 50.
com relação aos credores particulares que nno tiveram tal benefí- 141. Decisão cit., nota anterior.
cio. Pode-se ainda argumentar que isso não se aplica aos credores não 142. No estado atual do Direito positivo e da jurisprudência brasileira, pode-se
afirmar que o sócio único {de sociedade unipessoal por quotas de responsabifidade
iimitada ou de sociedadepor ações que não seja subsidiária integral) deveria, de lege
138. Cfr., nesse sentido, A. Nigro, I/ fallimento de! socio illimitatamente res- lala, ser enquadrado entre os s0cios ilimitadamerite responsáveis, sendo-lhe portanto
ponsubile, Milano, Giuffrè, 1974, p. 536. estendidos os efeitosda falência da sociedade (inclusive com arrecadação de seus bens).
FORMA ORGANIZATTVA DA PEQUENA E MÉDIA EMPRESA
,-
!*:>j
-
128 A SOCIEDADE UNIPESSOAL 129
@
gelungstec/znik) que permite dar ~ ~ a ldiferenciado
or aos diversos con- tentes no Direito Civil e problemas de desconsideração em sentido
próprio para tuja caracterização seria necessário que de uma forma @
juntos norinativos. 146
A teoria de Muller-Freienfelspostula não apenas um maior piu-
ou de outra o principio da separação patrirnonial fosse atingido.15" 63
ralismo externo na aplicação diferenciada das normas, mas t a r n b h Na doutrina mais recente nota-se uma crescente preocupação ..-- \I

um pluralismo interno, com uma avaliação diferenciada dos divcr- em distinguir os casos segando o método e as conseqiiênciasjurídi- <
A
.',

cas dele provenientes. Ao mesmo tempo a personalidade jurídica co- r'


sos tipos de sociedade. Defende assim um tratamento diferericiado .'1
das sociedades ~ n i p e s s o a i s ,Também
'~~ entre as próprias soçieda- mo conceito técnico perde importância, sendo hoje considerado co- :
,-

mo mera S t i c h w o ~ t . ' ~ ~
des unipessoais afirma a necessidade de um tratameiito difeiencia- i --,
do segundo o diverso objetivo econômico da empresa.148 É interessante observar as opiniões desses teóricos a respeito
da sociedade uni~essod.Antes da GmbHhTovelle,que como visto --
A teoria de Miiller-Freienfels tem hoje grande aceitago doit-
consagrou a possibilidade de constituição unipessoal, considerava-
triniria e jurisprudencid na Alemanha, podendo ser considerada d3- se a sociedade unipessoal como um problema típico de atribuição @
minante. '49 de normas. A sociedade unipessoal era portanto considerada não 4%
Controvertida é amda sua classificação como uma teoria scbre como uma esfera totalmente separada do sócio mas sim como sujei- p-)
a desconsideração da personalidade jurídica. Alguns autores pro- ta a um variablesNormanwendungkonzept,ou seja, como um ente .. >

põem a distinção entre problemas de mera aplicação das normas ens- dotado de individualidade própria dependendo do escopo da nor- C,ii
,-7

ma a ser aplicada.lS2 r'


146.Cfr. I). Behrens, ' Der Durchgriff uber die Grenze". in RabeisZerrschr@, Depois da admissão da constituição unipessoaí, a sociedadeuni-
1982, pp. 308-314. pessoal deixou de receber um tratamento metodologicamente dis- i.':'
147. W. Mulfer-Freienfels, "Zur Lehre", cit., p. 532: "Die Einmanngese;ls-
chaft, die aus Grunden der Haftungsbeschrankung betrieben wird, uerdiente nicht
tinto. Não se trata mais de um caso paradigmático de atribuição d* (7
' ",
mit einer Familien GmbK gleichehandelt zu werden, die als Eibengemeinschaf: eiri normas, sendo ao contrário incluída no tratamento gzral da descon- i?>
erebtes Handeisuiiternrlimen fortfuhil. Diese Familiengeselischaft wiederum miiss sideração, ainda que continue a merecer tratamento especial na ca- '&J

wieder anders beweaet werden, wenn sie einen oder mehrere Geldgeber ais Mil@- suistica da desconsideração.Is3 @
scllschafter auf~irnnt.Von dieser sich zur 'normalen' CimbH entwickelndeg Einh-it
ist schlicsslicl~~ieGmbH als Verwaltungeinheit eines grossen Konzerns oder d s Ver- De tudo quanto foi dito acima pode-se derivar uma outra ca-
kaufeinh&$ei%s Syndikats íru unterscheiden usw".(A sociedade i~nipessoal,utiliza- racterística da teoria dos centros de imputação, sobretudo em sua @
da em fun*@ iimitação de responsabilidade, não pode receber tratamento indife- formulação moderna. É a convicção de que em certos casos, a apli-
renciado de unta sociedade fam-liar, que como comunidade de herdeiros sucede o
empreendimento comercial herdado, Essa sociedade familiar, por sua vez deve ser cação da teoria da desconsideração na forma supro definida perrni-
avaliada diferentemente quazdo ela aceita um ou mais prestadores de capital cor-io te substituir ou suprir as lacunas das regras organizativas internas.
s6cios. Finalmente deve também ser diferençiada a GmbK normal da sociedade @i- C'
lizada como unidade administrativa de um grande grupo ou então então como uni-
dade de vendas de um sindicato). 150. Nesse sentido, E. Rehbinder, Konzemaussenmht und altgemeines Priva- ,---

trecht, Berlin-Zurich, Gehlen, 1969, p. 108.


148. É interessante observar que, quanto B sociedade unipessoal, as ;sosicii~es
15 1. Cfr. ZI. J. Mertens, Hachenburg Grosskommentar, cit., Anh. 5 13. Rdn
/l-.

de Serick e Muller-Freienfels representam na realidade a transposição para uxn am- \...


biente em que já se reconhece a netessidade prática da Einmai~ngesellschBfi, da con- 36; K. Schmidt, Geselíschaftsrecht,cit., pp. 193-194; tambbm nesse sentido, propondo x".
-
trovérsia que a corrente pandectistica de Savigny e a hann'els vnd g~scbsch.aft2- a distinção hoje largamente aceita entre Uaftungsdurchgrjff e Zurechnungsáurch-
grgf, v. ti. Wiedemann, Gesellschirftrecht, cit., pp. 221 ss. O primeiro termo é em-
'
qj:
;
rechtlich orientierte, escola germadstica de Gierke, tinham susrentado no s&uio X:X
corn relação iunipessoalidade. 0 tratamento que Miiller-Freienfels d i h sociedade pregado para os casos de Missbrmrch (fraude), entendida no sentido objetívo, e o
segundo nos caso de imputação de mrmas. O primeiro tem caráter eminentemente
@
unipessoal é muito próximo h teoria do SonderverrtlO,een, e a aplicação espedfica
da teoria da desconsideração para a sociedade unipessoal que defende corrqonde, sancionatório, enquanto no segundo prevalece o perfil regulamentar. @
mutatis mutandis, A impossisilidade de permanência da Korperschaft em ausgncia 152. H. J. Mertens, Hachersburg Grosskomrnentar, cit., 5 13, Anh. 1 , Rdii. @
de pluralidade de componentes, sustentada por Gierke. A posição unitária e o racio- 41-42,E. Schanze, EinmanngeselbchqJt und DurchgrVflafung, cit ., p. 15.
cínio regra-exceção de Serick avizinham-se, ao contrhrio, da teoria ficcionista de Sa- 153. Interessante é notar que Mertens, no seu comentArio precedente a CimbH r.
L'.
vigny (cfr. E. Schanze, Einnanngesellschnft und Durchgrgfiaftung, cit., esp. Fp. Noveile (Hafhenburg Grosskommentur, 1979), bitulava o Anh 13 Emmanngr-
19 e 51). sellschaft und Durchgriffhaftung, eoquanto que no comentArio posterior (Hachen-
burg Grosskommentar, 1990) o titulo passou a ser Durchgriffhaftung.
(
,..,7
149. Cfr. H.J. Mertens, Hachenburg Grosskcrmmerztar.cit.. h h . 13, Rdn. 50. ,-.\
r
..
F
-
"&!%;:
FORMA ORGANIZATIVA DA PEQUENA E MÉDIA EMPRESA 13 1

Especialmente no caso da socie4ade unipessoal ,tais.regras-organi~ tivo o sócio não seria considerado terceiro em relação a
zativas seriam de pouca eficiênc'a em ausência da dialética interna sociedade; Is7

sonais. esses
4
baseada na pluralidade de inter ses, típica das,sociedadespluriper-
caso a aplicação da teoria da desconsiderafão permi-
- conhecimentos do sócio podem, em certos casos, ser atri-
buídos a sociedade. O caso típico de aplicação dessa regra decorre
tiria um "controle externo" da(organiza&io s o ~ i ' a l . ~ ~ ~ de uma peculiaridade do sistema alemão. É o caso de transferência
1 de propriedade, devido ia existência, no Direito alemão de uma re-
e) Resultados aplicativos: (r casulitica gulamentação específica para a aquisição de propriedade em boa-
fé. Nos negócios entre sócio único e sociedade não se aplicam as
e.1 Desconsideração atributha - Com essa expressão procura-
1
se traduzir o mais fielmente pos ível a aplicação da teoria da des-
corisideração para permitir a apl cação de certas formas em forma
coerente com o escopo do legislfidor.
regras de zquisiçã.~de boa-fé, pois não é1 possível sustentar que o
sócio úilico possa ignorar a existência do precedente víncuIo co11-
tratual entre essa e um terceiro (ou vice-versa).i58No Brasil, devi
do a inexistencia de uma tal regra, o fato de o negócio ter sido rezli-
São os seguintes os casos mais típicos de desconsideração atri- zado entre sócio único e sociedade poderia induzir no mhximo uma
butiva (ZurechnungsdurchgrifJ).Trata-se de casos muitos dos quais presunção simples de simulação, cabendo às partes no negócio (só-
i
de aplicação intuitiva, mas cuja s stematização permite visualizar o
grau de penetração que determinaidas normas tem (e devem ter) com
cio e sociedade) demonstrar o contrário;
relação a sociedade: I - proibições impostas ao sócio podem ser estendidas tanibbin
a sociedade (e vice-versa), É o caso das proibições de concorrência
- características pessoais d4 sócio podem ser atribuídas à so- impostas ao sócio que gravam também a sociedade.159

H
ciedade. Assim são passíveis de a u1ação por erro essencial quanto
à pessoa do destinatário declaraç es tendo como destinatária a so-
ciedade, em que haja erro esse! cial quanto à pessoa do sócio
hnic0; 155-156
- comportamentos do sóci ser atribuidos ri socieda-
Ainda com relação a desconsideração para atribuição de nor-
m a deve-se mencionar o caso da equipara(a&oa verida de todas as
quotas da i~ormativsreferente aos vicios da compra e venda, Trata-
se, na verdade, do caso paradigrnátíco de desconsideração para a
de. Assim por exemploj no caso terceiro, que para cons- sociedade unipessoal, que fevmtou.iniensa discussão sobre o pró-
tituir vício do ato jurídico exige $ue dele tenha conhecimento um prio conceito desociedade un.ipessodil,a cuja análíse se remete o lei-
tor (mpru, cap. 11, n. 2.1).
dos participantes do ato (art. 95 qC). Para aplicaçifo desse disposi-
.

i
154. Cfr. E. Schanze, Einmanngesd chaft uu*dDurchgr@j%aftutung,cit., p. 15:
que afirma: "Die These steht im Zusamm nhang mit der allgemeinen Beobachtung,
dass Wr privatwirtschaftlich organisierte nternehmensginheiten die traditionellen
gesellschaftrechtfich-organisatorischenPr bleme fSelbststeuerung der okonomische
Betgtigung durch geeignetc organisatoriscje A u s g d t u n g der Rechtsform) runeh-
mend an jmktischer Relevanzvuiieren und qurch rechtliche Anfordemngen von aussen
e..? Desconsidera~üopara fins de responsabilidade - Como
já ressmll-ado acima com relação a essa hipótese, ao menos nos
casos normais ngo S razoável fazer qualquer distinção a priori en-
tre sociedade unipessoal e piuripessoal. Os tres casos paradigmáti-
cos que serão tratados - confusão de esferas, siibcapitalização e
(2.B. Steuerung des Marktverhalten, Schutz sonial schvracher Glaubigergnippen z.T.
durch rechtsformunabharigige Losirngen) ~ubstituiertwerden". 1 9 . Cfr. comcatando rcgrn. atiriloga contida no 123, Ahs. 2 BGB, v. Eiii-
155, Cfr. Bmmerich, Scholz Kornmeritar, cit., $ 1 3 , Rdn. 72; G. Hueck, Buum- rncrich, Schnl7 Kommenfar, cir., 4 13, Rdil 13.
bach-Nueck, cit., $ 13, Rdn. 16, p. 193. / 158. Cfr. E. Schanze, E~nmanngesellschaftuundDurclzg~jff72aftung, cit., i).
104.
156. Existe interessante e recente exepplo de aplicação desse princípio na ju- V, ainda V. Emmericl~,ScholzKommenfar,cit., 8 13, Rdn. 73, que considera requi-
risprudência brasileira. Trata-se da decisão hue revogou a decisão concessiva da con- o a aquisigo m boa-fé a existência de uma transferência não apenas do ponto-
~ i t para
cordata de uma empresa, transformando-a pm falência, com base na falta de idonei- de-vista jimridico, mas também econômico.
dade do controlador, afirmando que "a não idoneidade do controlador contamina 159. Nesse campo, atualmente regulado pelo art. 86 do k t a d o C.E.E., a Corte
dc descrbdito o pedido de moratória da co~trolada". No caso, além da inexistência de Jusiiçã da Comunidade já firmou opinião de que se aplicam sociedade filha (se-
dos requisitos economicos para a concordatp, foram levados em conta os fortes indi- ja ou nao unipessoal) as proibiçoes existentes com relação a sociedade mãe (v. deci-
cios de que o controiador, através da concokdata de empresa holding por ele contro- são da Corte dc lusriça da C.E.E. de 6.3.74, n. 6-7/63, in Foro Italiano, 1974, IV,
lada, pretendesse pôr a salvo ações adquirfdas com cheques sem fundos - v. R T L. 261). No mesmo seriiido, sentença do Tribunal de Catânk, de 25 de janeiro de
6 9 / 8 6 , TfSP, acórdão de 25.4.90. 1977. iii RivLstu di Diritlo Conrnreraale, 1977, 11, p. 103.
132 A SOCIEDADE UNIPESSOAL FORMA ORGANIZATIVA DA PEQUENA E MÉDIA EMPRESA 133

abuso de forma - podem se configurar tanto em uma como em ou- quase impossíveis, é no mínimo muito arriscada. O mais correto pa-
tra hipótese. rece ser considerar a furação do montante do capital como compo-
A identificação dessas três hipóteses parece ligar-se intimamente nente da businessjudgement rule do sócio e admitir a desconsidera-
a uma configuração objetiva da desconsideração. No entanto, co- ção somente nos casos em que a subcapitalização for extremamente
mo se verá na formulação dos requisitos para a configuração das evidente (qualificada). Até porque, como será visto (v. infra n. 3.4.3),
referidas hipóteses, faz-se necessário misturar elementos objetivos existe remédio mais eficaz contra a subcapitalização, É muito mais
e subjetivos, o que faz com que na prqtica não se consiga eliminar conveniente nesses casos adotar uma vi3ão realista e ampla do capi-
totalmente os inconvenientes contidos na teoria subjetiva. tal, considerando como tal todos aqueles empréstimos (e não sZo
A confusão de esferas caracteriza-se em sua forma típica quan- raros) feitos peIos sócio a sociedade em situações de crise.
do a denominação social, a organização societária ou o patrimônio Enfim, há ainda'o abuso de forma. Pode-se distinguir ainda
da sociedade não se distinguem em forma clara da pessoa do sócio, entre o abuso de forma individual e o institucional. No primeiro ca-
ou então quando fmmalidades societárias necessárias a referida se- so há a utilização da personalidade jurídica com o objetivo específi-
p a r a s ~não são seguidas. Com relação ao primeiro caro (confusão co de causar dano a terceiro. Nesse caso só ele será legitimado a plei-
de denominação), pode-se mencionar o emprego de nomes semelhan- tear a desconsideração da personalidade jurídica. Trata-se do caso
tes o : de
~ fácil confusão com o nome da sociedade controladora para clássico de desconsideração da personalidade jurídica baseada em
designar a sociedade controlada. Evidentementeo caso aproxima-se critérios subjetivos. O segundo, ao contrário, caracteriza-se por uma
bastante das hipóteses de aplicaçao da teoria da aparência. 160Na ver- utilização do privilégio da responsabiliddde limitada contrária a seus
dade, s6 será possível distinguir ambos os casos mais adiante, depois objetivos e A sua função (zweck und funkfionswidrige Ausnutzurzg
da definição do "método" de desconsideração da personalidade ju- des Haftungsprivileg~e tem como característica diferencia1 o fato
rídica. os demais modos de identificação da confusão de esferas de implicar a possibilidade de desconsideração a fakor de qualque;-
baseiam-se sobretudo em critérios formais como a- existência de ad- ~ r e d 0 r . Exatamente
l~~ porque o que ocorre no caso, como se verá
rninistração e contabilidade separadas entre s6cio e sociedade4l6' mais adiante, é a desconsideração em sencido estrito (ou talvez pró-
Coni reIação à subcapitalização, faz-se a Cistin~ãoentre subca- prio), ou seja, aquela que vai buscar seus motivos na atividade so-
pitaIizaç2~simples e qualificada. Na última, o capital inicial é cla- cial e não em um determinado ato.
rame2ts: insuficiente ao cumprimento dos objetivos e da atkidade
sociaI e Jr'onsequentesnente o perigo criado pelo sório(s) no exercício e.3 Desconsideragão em sentido inverso - Esse tipo de descori-
do C O ~ & Fé suficiente
~ para caracterizar a responsabilidade. Quan- sideração merece tratamento distinto, em f~riçãoda peculiaridade
do, ao contrário, a subcapitalização não é evidente, 6 necesshrio de- dos princípios envolv.vidos e de suas conseqüências sistemáticas par-
monstrar o elemento subjetivo, ou seja, a culpa ou dolo do si>cio(s) ticulares, ainda que rnetodologicamentr seus casos possam ser en-
em não prover o capital suficiente à atividade social. A óbvia difi- quadrados em uma ou outra das categorias mencionadas acima.
culdade de produzir tal prova faz com que na maioria dos casos de Na doutrina e jurisprudência alemãs, a hipótese é de aplicação
subcapitalização simples a desconsideraçiio seja negada.162 restrita às sociedades unipessoais. O conceito de "pertinência eco-
Sancionar a subcapitalização nesses casos parece de um rigor nômica" do patrimônio social ao sócio, formulado pela jurispru-
excessivo. Com efeito, se o legislador não impõe obrigação de capi- dência, aplica-se apenas quando todas as quotas pertencem a um
tal rninimo, é difícil exigir do sócio que faça a previsão correta no só s 6 ~ i o . l ~ ~
momento de constituição da sociedade. A t r a n s p o s i ç ~de~ uma ta1 A aplicação exclusiva a sociedade unipessoal não parece corre-
teoria de uma economia sólida como a alemã para a brasileira, em ta, principalmente te~do-seem vista sua justificativa: impedir que
que previsões econômicas, sobretudo para atividades incipientes, são seja causado prejuízo aos demais sócios. Ora, na sociedade unipes-
soal, o prejuízo também existe. Apenas não será dos demais sócios,
160. Cfr. H. Wiedmann, Gesellschafisrecht, cit., p. 224.
161. H. Wiedemann, Gesellschafisrecht, cit... D.. 224. 163. Cfr. H. Wiedemann, Gesellsclzaftsrec~f, cit., p. 228.
162. Cfr. E. Schulte. "Reclitsprechuiig~b3rsichizuni Trennungpririzip bei ju- 164. Cfr. E. Schulte, Rechtsprechungsiiber~icht,cit., p. 8, citando decisão do
ristischc;i Personsn", i i i U'erfpapier Mllreilungen, 1979, Soriderbeilige. n. I , p. 7 . OLG Hamburg de 10 de novembro de 1976.
FORMA ORGANIZATIVA DA PEQUENA E MÉDIA EMPRESA 135

mas isimsdos :credores .sociais. *&ás é exatamente a necessidade de Mas pode-se ainda perguntar: mesmo nesses casos e ainda que
proteção do capital social, comd,garantia dos credores, uma das prin- não disponha o sócio de qualquer patrimônio pessoal livre, tudo não
cipaismzões invocadas para a limita ão da desconsideração em sen- se resolveria através da hoje largamente admitida penhora da parti-
'i . ç .
tido inverso.. Fala-se em incom atibilidade de uma tal desconside- cipação social do sócio (quotas ou ações)?167Essa não substituiria
P
ração com as regras societárias ,de conservação do capital. Por esse a desconsideração?
motivo, parte da doutrina alema admite a desconsideração em sen- A resposta decorre diretamente das considerações anteriores.
9
so inverso apenas quando se tr ta de aplicar ao sócio regras sobre
Vertrauenshaftung, ou seja, nq caso em que o sócio tenha criado
O interesse do credor é o recebimento de seu crédito e não a partici-
pação em ou mesmo a venda de quotas de uma sociedade a respeito
a aparência de negociar em noIpie da ~ociedade.'~~ Retorna aqui o da qual não tem qualquer informação. Mesmo o exercício do direi-
problema da superposição entrl institutos civilisticos e a desconsi- to de retirada ("disso1ução parcial") admitido em alguns casos pela
deração. Com efeito, a arece situar-se muito mais no cam- jurisprudência pode não ter qualquer utilidade, caso a sociedade te-
po da aplicação da aparência do que da teoria da nha patrimonio líquido negativo. Na verdade, essa constatação con-
desconsideração 166 . ! tábil nada mais é do que um reflexo da diferença jurídica entre pe-
contestações. Na ver- nhora de quotas e desconsideração, qual seja, respectivamente, a
dade, a mencionada entre desconsideração em sen- existência ou não de concorrência com os credores sociais. No caso
tido inverso e apenas se fosse cons- de penhora de quotas, a preferência é dos credores sociais, já que
Não é o que ocorre. A o pagamento dos haveres se faz pela particpação proporcional no
já auferido pela socie- saldo positivo do patrimônio líquido.
dade em função da transferência patrimonial que justificou a des- Além disso, do ponto de vista processual, existem vantagens
consideração, motivo pelo qual não é razoável que a responsabili-
dade da sociecimk ultrapasse o ,valor dessa transferência. da desconsideração inversa em relação a penhora de quotas.
Em primeira lugar, a desconsideração é mais eficiente para
Mesmo em relação aos credores sociais, a desconsideração em
favor de um credor particular não representaria qualquer preferência. o credor, evitando tanto a demora na avaliação das quotas ou
açõesí68como a propasitura frequente de embargos 3. arremata-
No caso imaginado, de traniferência indevida de recursos à so- ção que tornana o processo de execução extremamente lento. A
ciedade, a simples devÓlução da contrapartida dessa transferência penhora de dinheiro (nesse caso, numerário da sociedade) é, por
ao credor (devolução essa limitada ao valor da trans- determinação expressa de lei, a única que permite o recebimento
ferência) não de garantia. Nem do crédito pelo exequente imediatamente após o julgamento dos
mesmo qualquer agressão, diretajou indireta, ao capital da socieda- embargos de devedor em primeira instância, mediante prestação
de (já que a hipótese que se está ilaginando é a de uma transferência de caução idônea (art. 588, inc. 11, CPC). Em todas as outras,
sem contrapartida real, inclusive o caso de con- o recebimento do crédito deve esperar primeiramente o julgamen-
trapartida consistente capital contra emissão de ações to final dos embargos de devedor e em seguida todo o procedi-
ou quotas). Não há, lesão aos credores sociais. Inento a~rematatório.A diferença de tempo, que pode chegar a
até cinco anos, acaba por tornar a execução um instrumento a
165. V. H. J. Mertens, Hachenburq Grosskomrnentar, cit., Anh. 13, Rdn. 23 favor da prbpria inadirnplência. A desconsidvração é um dos meios
ss., p. 583.
166. Cfr. K.W. Canaris, Die Verfra emhaffung im deulschen Privatrecht, Mun-
de reduzir tal efeito.
ehen, Beck, 1971, p. 179, segundo o q u i náo se configura a desconsideraç50. por

!
não haver modificação no p610 ativo d a briga60 mas sim procura do verdadeiro
devedor. O autor ressalta, no entanto, o @tode que a Vertruuenshaftung é mais fa-
cifmente aplicável à responsabilização do Sócio por dívidas da sociedade do que vice-
167. Com relação às sociedade de capitais, a jurisprudência é praticamente unâ-
-
nime no sentido da adinissibilidade da penhora v. por exemplo recentemente R T
655/17L, TAKS, j. 29.3.90; RT645/109, l ? TACSP, acórdão de 26.6.89, ou então
versa. A razão seria que, no primeiro caso, a aparência de unidade é criada pelo re- RTJ 95/837, STF, i. 2 ! .10 80.
presentante e não pelo representado, o qbe permite a aplicaçáo das regras sobre a 165. No caso especifico ora em análise, não se pode esquecer a hipótese extre-
representação. Nesse caso, a aparência nâo seria mais meramente fatica mas tam- ma, de transferência dos bens a uma sociedade super-endividada (eventualmente até
bem jurídica. com dívidas fictícias), em que o resultado da avaiiaçãcl pode muito bem ser zero
138 A SOCIEDAPE UNIPESSOAL FORMA ORGANIZATIVA DA PEQUENA E MÉDIA EMPRESA 139

A aplicação de tal tipo de rhciocínio ao Direito brasileiro pare- cia ao objetivo da norma.179 Invoca o desvio de função da pessoa
ce, no momento, de pouca utili'dade. Com efeito, a jurisprudência jurídica como justificativa da desconsideração, A função da perso-
brasileira parece muito mais inclinada a ampliar o conceito de dano nalidade jurídica seria a criação de um centro de interesses autôno-
do que a reconhecer formas indiretas de legitimação extraordinária mo.180 Quando esse centro de interesses não estivesse presente, a
(tendo em vista sobretudo o disposto no art. 60 CPC, que prevê a desconsideração seria a solução.
excepcionalidade da legitimação extraordinária). Na identificação dos critérios que caracterizam a inexistência de
No Brasil, a desconsideraçdo benéfica para o sócio ou a socie- um centro de interesses autônomo, Comparatosubstitui, em uma aná-
dade parece mais útil no campo dontratuaí, para extensão de concei- lise na verdade semelhante àquela de ~ d g a n oo, unitarismo subjetivo
tos, como o de proprietário, por exemplo, do sócio para a sociedade por ele mesmo criticado por um método objetivo, mas da mesma ma-
neira unitário. Põe o çontrole ao centro de sua teoria.181 Vê nos gru-
e vice-versa. Um exemplo está n/ Súmula 486 do Supremo Tribunal pos (de direito) um controle qualificado,merecedor de tutela especial.
Federal, que permite o despejo, piara uso da sociedade, de um imóvel Quanto à sociedade unipessoal, a desconsideração não seria baseada
de propriedade do sócio único (&tendendo-se, portanto, o conceito em qualquer abuso, mas sim na inexistênciados"pressupostos legais
de proprietário que passa a ser adlicado não apenas ao efetivo dorni- da personalidadej~rídica''.'~~ Esses pressupostos inexistiriam na so-
nus mas também a sociedade poi ele controlada, ou vice versa).'16 ciedade unipessoal singular, pois a lei fixa um prazo máximo para a
permanência da unipessoalidade; e na sociedadeunipessoal de grupo
3.3.2 Interpretação e aplicação ?a teoria da desconsideração no (subsidiária integral) em que existe a confusão patrim0nia1.l~~ A con-
Brasil fusão patrimonial é, aliás, o critério básico no raciocínio de Compa-
1
rato p&a a desconsideraçãono caso de sociedadepluripessoal normaf,
A jurisprudência brasileira hão conhece uma casuística tão ri- não dotada de qualquer elemento "qualificativo". Permanece obscu-
ca como a acima exposta. A radão é muito provavelmente o fato ro como se ~ o d èemuma
, tal teoria, enquadrar o exemplo supracitado
da Siirnula 486, típico dos defensores da teoria dos centros de imputa-
i
de que, no Brasil, a discussão a espeito da desconsideração conti-
nua centrada no problema da es ência e da função da personalida-
de juridica. As soluções, mesmoI sem admiti-lo, tendem sempre a
ção. Qual seria o critério a identificar o desvio de função? A verdade
é que no momento que se identificana pessoa jurídica uma função uni-
tária, torna-se bastante difícil, pelo menos do ponto-de-vista teórico,
um raciocínio regra-exceção. ~ s i i m por , exemplo, no pioneiro es- flexibilizar a desconsideração.
tudo de R. Requião, em que se sentem fortemente os reflexos da No mesmo sentido propugnado por Comparato, orienta-se a
teoria de Serick. O autor identifica hipóteses de desconsideração em análise de J. L. Correa de Oliveira. Em sua teoria, a análise da des-
todos os casos em que a separaçãq patrimonial é utilizada com abu- consideração como conseqüência de uma disfunção da personalida-
so de direito ou para praticar uma fraude a lei.17' No fim do seu de jurídica é ainda mais evidente. A construção teórica da desconsi-
trabalho, inclui ainda uma advertência contra o emprego exagera- deração e sua rica aplicação prática são vistos pelo autor como sin-
do da teoria, que poderia levar a "destruir o instituto da pessoa ju- tomas de uma crise de função da pessoa jurídica. Para ele, a princi-
r í d i ~ a " . ' Não
~ ~ é surpreendente, portanto, que seu trabalho seja in- pal função da personalidade juridica é a separação p a t r i m ~ n i a l , ~ ~ ~
vocado pela maioria das decisões1que tentam limitar a desconside-
ração a sociedade unipessoal.
1?9. No caso àn regra que prevê a possibilidade de despejo para uso prdprio, in-
Menos evidente é o unitarisqo na obra de F. K. Comparato. vocad:~na Sumula 486, esse objetivo é claramente a proteçào, a mais ampla possível,
O aiitor nega a possibilidade de ltilização do instituto da fraude a
1
lei como elemento central da desc nsideração, afirmando que pode
ocorrer a desconsideração tambéd a favor do sócio (v. exemplo su-
do proprietário,
180. Cfr. F. K. Comparato, O poder de controle, cit., p. 286.
181. Cfr. F. K. Comparato, Opoderdecontrole,cit., p. 284, que afirma: "um
pracitado). Entretanto, para justificar sua opinião não faz referên- dado porém é certo. Essa desconsideração da personalidade jurídica t sempre feita
em função do poder de controle societário. É esse o elemento fundamental, que aca-
ba predominando sobre a consideração da pessoa jurídica, como ente distinto dos
176. Cfr. a respeito F. K. Comparato, O poder de controle, cit., y. 285. seus componentes".
177. Cfr. R. Requiáo, "Abuso de direito e fraude através da personalidade ju- 182. Cfr. F. K. Comparato, O poder de controle, cít., p. 350.
ridica", ín R T 410/15. I
J83. Cfr. F. K. Comparato, O poder de controle, eit., p. 350, nota 30.
178. Cfr. R. Requião, "Abuso de direito", cit., p. 24. 184. Cfr. 3. L. Correa de OIiveira, A dupla crise, cit., p. 263.
,r"
140 A SOCIEDADE UNIPESSOAL FORMA ORGANIZATIVA DA PEQUENA E MÉDIA EMPRESA 141
tc,?,
.. d
qw,por,sua ,vezl&vista como indicador da existência de um centro fica nos demais casos em que há imputação de ato próprio, com re-
autonomo de interesszs. Mesmo admitindo a não-coincidência en- lação aos quais drrer-se-iam aplicar os institutos civilístic~s.'~~
tre personalidade jurídica e responsabilidade limitada, identifica na i-)
Deixando por um momento de lado a discussâo sobre a possi- . .
limitação de responsabilidade a função básica da pessoa jurídica. bilidade de aplicação da teoria dualista à desconsideração (o que se c:>
Uma tal limitação da função da personalidade jurídica a separação fará mais adiante), é importante ressaltar que permanece pouco claro
%
... "

patrimoniai talvez justifique-se pelo objetivo, explicitado pelo au- o motivo da utiliz@o dessa teoria por Correa de Oliveira. Com efei- \".
tor, de analisar a crise da pessoa jurídica apenas com relação a so- to, é ele próprio que aponta, no processo de desconsideração, um @
ciedade com responsabilidade limitada.ls5 modo de fazer pre-valecera "realidade sobre a aparência", identifi-
Do ponto-de-vista teórico, Correa de Oliveira parte de uma ne- cando a pessoa que "realmente está a agif'.lgl Trata-se de afirma- @
gação do unitarismo de Serick, com base no raciocínio piuralista de ção muito mais próxima a imputação de uma atividade a uma de- r!
' ".*
Müller-Freienfels. Do pluralismo desse autor utiliza-se, no entanto, terminada pessoa da que da responsabilidade sem dívida propugna-
a.
apenas da primeira conseqüência, ou seja, a necessidade de trata- da pela teoria duaiista. '
. $i

mento diferenciado das diversas pessoa jurídicas. Faz referência a Na jurisprudência, fazem-se sentir fortemente as influências des- 'i
sociedade unipessoal e aos grupos de sociedades como casos espe- sa impostação funcional-unitaria da doutrina. Característico da ju-
i\" i

r
'
ciais, nos quais é maior o risco de confusão patrimoniai. risprudência brasileira é o valor paradigmático atribuído a pessoa i

O segundo e mais inovador aspecto da teoria de Muller- jurídica, que faz crim que a separação patrimoniai seja frequente- /"
C.
Freknfels, isto é, a critica à concepção da personalidade jundica co- mente reafirmada e sua desconsideração só seja admitida em pre-
sença de previsão kgal expressa ou de comportamentos considera- tG
mo fenomeno unitário com relação a todas as normas que lhe de-
vem ser aplicadas,186não é utilizado por J. L. Correa de Oliveira. dos fraud~ientos."~ As decisões brasileiras não são, conseqtiente-
O antor nega que se possa explicar a desconsideração como um pro- mente, classificáveis segundo o tipo de atuação a justificar a des- 43
blema de imputação.i87 Procura, portanto, distinguir os casos em consideração (confusão de esferas, subcapitalizaçãoou abuso de for-
que há imputação de um fato próprio, os quais deveriam ser resol- ma), mas segundo o fundamento jurídico invocado para funaamen-
tar a não-consideração da personalidade jurídica societária. Os ca- C,.l
.
vidos através da aplicação de institutos ciuilísticos, da aplicação da /:I
teoria da desconsideração, em que haveria responsabiiidade por dé- sos mais recorrentes de desconsideração para fins de responsabili- *,"*c>
bito de terceiro.'** zação são basicamente de dois tipos. Um primeiro grupo fundamenta /'.%i
a desconsideração em dispositivos legais: é o caso d a desconsidera-
~ h e g ~ o ' p o r éommomento de definir os casos de desconside- ção prevista na legislação trabalhista, a favor dos trabalhadores, e r
i
-
ração emsentido próprio, Correa de Oliveira retorna ao conceito por no Código Tributário Nacional, em favor da Fazenda, por débitos
>.

ele anteriormente negado, admitindo que mesmo nesses casos os pro- (7


x,.

blemas são frequentemente de imputação.1s9A única diferença real @


190. O que parece ficar claro nos seguintes trechos:
para o autor entre desconsideração e "mera" imputação de atos pare- "Para que se possa falar de verdadeira ttcnica desconsiderante, em tema de
ce, portanto, residir no fato t e que nos casos de desconsideração ocorre responsabilidade, será necessária a prebença do priiici~ioda subsid-ariedade, explici- Q
imputação de responsabilidade por divida alheia, o que não se veri- iado a luz de uma concepção dualista da obrigzião: a responsabLidade subsid~ariz
por dívida alheia" @. 610).
"Se essa separação não 6 escrupulosamente maniida, poderá haver caso de im-
185. Cfr. J. L. Correa de Oliveira, A dupla crise, cit., p. 262. -
putação de ato ao contraladar da sociedade para fins de responsabilidade civil ci
186. Cfr. W. Muller-Freienfels, "Zur Lehre". . cit... .II. 529.
187. J . L. Correa de Oliveira, A dupla crise, cit., p. 610: "Desde logo, portan-
- ou mesmo (ai em autêntica t6cnica desconsiderante) de mera inputação de res-
ponsabilidade por divida alheiz sendo a divida da sociedade e a responsabilidade (sub- c
to, não podem ser entendidos ccmo verdadeiros casos de desconsideracão todos aaueies sidiaria) do controlador" (p. 61 1). ic
casos de mera imputação de ato". 191. Cfr. J . L. Cama de Oliveira, A dupla crise, cit., p. 613. i..
188. Cfr. J. L. Correa de Oliveira, A dupla crise, cit., pp. 610412.
189. Cfr. J . L. Correa de Oliveira, A dupla crise, cit., p. 613, nota 82, onde
192. Cfr., v.g.. acórdãos do l? TACSP, respectivzmente de 14.8.73 ede29.8.73,
in RT456/151 e 457/141; preocupa-se em afirmar o valor da personalidade juridica
c r
afirma: "Os problemas ditos de 'desconsideração' envolvem frequentemente iim pro- tambkm o principal defenwr da teoria legalista da desconsideração, segundo a qual <,
'*.i
blema de imputação. O que importa basicamente 6 é verificaçáo da respoita adequa- a desconsideraçâa sá seria possivet em presença de disposição legal expressa. Cfr.
da ii seguinte pergunta: no caso em exame, foi realmente a pessoa juridica que agiu, C. Ramalhete, "Sistema de legalidade na desconsideração da personalidade jurídi- 6
ou foi ela m r o instrumento nas mãos de outras pessoas, físicas ou juridicas?". ca", in R T 586/9.
@
Q
O,"-
FORMA ORGANIZATIVA DA PEQUENA E MEDIA EMPRESA 147

imóvel. O mesmo pode-se dizer relação#aos C S O S ~ ap2içação


~ ~ como visto, através da atribuição da personalidade jurídica reco-
de institutos civilísticos, como da aparênciaciSem,duvida, nhece diversos graus de organização, atribuindo-lhes capacidade ju-
está-se diante de,um problema/de imputação de u&&-~brigaçãoa rídica diferenciada. Seria bastante coerente o sistema que, a um grau
um sujeito diferente do formal*te participante do ato.,CoIoca-se menor de organização societária fizesse corresponder menor atribui-
assim um problema de desconsiQeração, ainda que sua solução não ção de capacidades. Em um ordenamento como o brasileiro, que
seja societária. I ' I C reconhece a sociedade pessoal sem regular-lhe a organização, a des-
Coisa diversa 6 o "rnét~do"~ de desconsideração da personalida- consideração atributiva deve ser utilizada como disciplina cornple-
de juridica. Esse é dotado de pr' ssupostos específicos de apIica~ão. mentar, apta a suprir a lacuna de regras organizativas. Ao fazê-lo,
d
Com r~laçãoa ele, não é possív / misturar questões de responsabili- está indiretamente regulando a capacidade jurídica da sociedade, na
medida em que imputa a titularidade de certas relações jurídicas ti.$.
dade e de imputação. Essas últi as referem-se, o mais da vezes, a si-
tuqões potencialmente conflituqs "it (v. supra, o item a respeito da des- certos direitos) ao sócio e não à sociedade.
consideração atributiva, n, 3,3,l,ie,l). Ora, fazendo-se m a avaliação Com relação B desconsideração atributiva, rio entanto, ainda
preventiva (e não sancionatõria) idos interesses a proteger, verifica-se que lhe seja atribúida importância para a regulamentação da socie-
que é possível configurar apenas /luas situações: ou existe uin interes- dade unipessoal, não há possibilidade de ser definido um método.
se externo que justifique a atribuição da normas diretamente ao só- Para ela, muito mais relevante é a importância relativa de cada nor-
cio e então é indiferente o nhimedp de sócios, bastando a situação de ma e a razoakilidade ou não da preservação das formalidades.
c o n t r ~ I eou
, ~ então
~ ~ não existe tal norma (ou tal interesse). Quanto as questões de responsabilidade, ao contrário, 6 possí-
Nesse último caso, a atribufção de situações sitbjetivas ao só- vel e útil definir um método. Para precisá-10, é necessário fazer cer-
cio somente se justificará em sitidações em que seria irracional e for- tas exclusões. A desconsideração entendida como "método" não po-
malístico presumir o contrário. E aqui, a casuística demonstra que de ser confundida com uma aplicação da teoria dualista da obriga-
Inipcitese mais comum é a unipessoal -- v. por exemplo ção, ou seja, da imputação da rcsponsabilidadc a pessoa diferente
a atribuição de e conhecimeritos dc clo devedor.
Importante para os defensores desse tipo de equiparação é, so-
A sociedade unipessoai 6 n e$ernplo clássico de aplicação da des- bretudo, distinguir os casos de desconsideração das soluçoes basea-
consideração atributiva, não polque constitua protótipo de fraude das ria apliczção do Direito Civil.2*' Não pode ser esse u carhter dis-
à. iei, mas porque a imputação diferenciada de normas permite o tintivo da desconsideração. Enl primeiro lugar, do ponto-de-vista
"controle externo" da "sociedafle'', constituindo uma verdadeira metodológico parece bastante incorreto definir uma hipótese lega1
discipliiia supletiva da normativa societária. Seu empreio, útil mes- a partir da disciplina que não se quer (ou não se pode) aplicar.
mo em países como a Alemanha, (quedispõe de disciplina organiza-
Mas existe uma razão de fundo muito mais importante. Cal ac-
F
tiva específica para a sociedade un pessoal, é imprescindível em países
como o Brasil, que reconhecem a sociedade unipessoal (subsidiAria terística fundamental da responsabilidade sem dívida é a possibili-
integral), mas cujo ordenarnento não prevê para ela quaíquer disci- dade de ressarcimento do sujeito obrigado a pagar perante o deve-
plina organizativa especial (v. infra, cap. 111, n. 1.ã). dor.204Nas hipbteses de desconsideração aventadas, evidenternen-
ce nào e possível insaginar a possibilidade de reçsarcimentu do sócio
Na verdade, essa aplicaçso \Iada mais P do que canseqüincia perante a sociedade, Até mesmo do ponto-de-vista eqiiitativo. Bas-
das considerações desenvolvidas po primeiro capítulo a respeito da ta pensar que, crn se admitindo o regresso do sócio contra a socie-
relaç8o entre organiza~ãoe persoqalidade jurídica. O ordenamento, dade, essa seria onerada por uma situação que teve como beneficiá-
i

riu apenas o acionista c o n t r o l a d ~ r . ~ ~ ~


\
202. Novamente aqui, bom exemplo está na Súiiiula 486, já várias vezes referi-
da. Nela, o interesse em proteger o proprietário leva B equiparação da sociedade ao
203, Nesse sentido, J. L. Correa de Oliveira, A dupla crlse, cit., p. 61 i .
sócio que detém o controle, para fins de aplicação do art. 80 da Lei de Luvas (dec.
n. 24.250/34). A referida lei foi revogada,pela lei n. 8.245 de 18.10.91 (nova Lei do 204. Cfr F. K. Comparato, Essui d'analyse duuliste de I'obligatron en drotl
Inquilinato) que consolidou todas as regrfs existentes sobre locação de imóveis ur- pr!vé, Paris, Ualloz, 1964, p. 212.
banos. O art. 52 que regula a mesma matéria incorporou o ensinamento jurispru- 205. A iniqùidade C mais clara na sociedade pluripersonal, por causa da coe-
dencial. O inciso I1 admite expressamentelque o uso próprio pode ser tanto do loca- xistê~lciados interesse.; dos sócios minoritários, mas existe também na sociedade uni-
dor quanto de empresa cuja "maioria dd capital social" a ele pertença. pessoal, bastando para isso admitir-se a concepção institucionalista supra anal~sada.
148 A SOCIEDADE UNIPESSOAL FORMA ORGANIZATIVA DA PEQUENA E MEDIA EMPRS;,SA f 49

Não é esse, portanto, o elemento distintivo da desconsideração. da negação do dualismo, é que o sujeito atingido pode ser resyon-
Nela, o sujeito respande por dívida própria, decorrente não de um sabilizado em via principal pelo credor. É devedor e não apenas ga-
ato mas de uma atividade abusiva. Trata-se da "responsabilidadeso- rante ou responsável. Pelos mesmos motivos, é impossível o exercí-
cietária", que não pode ser confundida com a responsabilidade civil cio de direito de regresso contra a sociedade (ou o sócio).
nem tampouco com a responsabilidade civil aplicada ao Direito So- A desconsideração também não implica qualquer alteração nas
cietário. Seu caráter distintivo está na prática de uma atividade lesi- esferas co-involtas. Assim, de um lado, permanece intacta a persona-
va e no fato de que o responsável será sempre seu beneficikio, que lidade juridica, valendo a desconsideração apenas para aquele caso es-
não se confunde necessariamente com os executores da "atividade le- pecífico. Nesse sentido, a desconsideração é um eficaz entídoeo con-
siva". Assim, em uma sociedade isolada, a desconsideração atingirá tra as situações falimentares,já que permite a proteção do patrinibnio
o patrimonio do controlador e não do administrador que executou social. Ou seja, ver na pessoa jurídica um centro de imputação de di-
suas ordens. Em uma sociedade pertencente a um grupo em que o be- reitos e deveres, como fazem com correção os seguidores de Muiier.,
nefício foi transferido a outra sociedade controlada e não a hslding, Freienfels, permite utilizar a desconsideração como meio atP mesrno
ser8 aquela e não essa última a ser atingida pela desconsideracão de evitar um pedido de falência, preservando a empresa. E possível des-
(trata-se da responsabilidade setorial, analisada no cap. 111).
considerar a pessoa jurídica para um determinado fim, preservando-
No~a-se,portanto, que o elemento característico do "método" a quanto aos restantes (o que seria inviável para os adeptos da teoria
de desconsideração da personalidadejurídica está em buscar seu fun- unitarista, ao menos em sua forma pura). De outro lado, a descortsi-
damento na "atividade" societária e não em um determinadoato. As- deração não influi sobre a validade do ato ou atos praticados, o que per-
sim, por exemplo, na confusão de esferas ou no abuso de forma. Não mite preservar direitos e interesses de terceiros de boa-fe.
se pode excluir, no entanto, que a lesividade da atividade caracterize-se
através de urn único ato de natureza societária. Nesse caso, será pre- Finalmente, a desconsideração é instrumeiiio para a efetividade
ciso que o ato exija participação da organização societária, servindo do processo executivo. Essa característica,aliada ao supraçitrzdo cafater
o próprio procedimento societário de aprovação do ato para dedocá- substitutivo da desconsideração em relação à falência, tem unta con-
lo para o campo da desconsideração da persondidade jurídica. seqiiencia importantíssima. A desconsideração não precisa ser decla-
rada ou obtida em processo autônomo. No próprio processo de e x u -
Apenas na ausência de participação da organização societária ção, não nomeando o devedor bens a penhora ou nomeado bens em
apIicar-sq-&a os institutos civilisticos em detrimento da teoria da quantidade insuficiente, ao invés de pedir a declaração de fdencia da
desconsii$g@go. Exeínplo típico é a teoria da aparência. Ali, trata- sociedade (art. 20, inc. 1, do dec.-lei n. 7.661, de 21.6.45), c credor po-
se de at@@'seqüência de atos) atinente As relações externas da so-
ciedzde,+e&^quenão hci participação da orga@zação societária. de e deve, em presença dos pressupostos que a~torizarna aplicaq50 do
método da desconsideração,definidos acima, pedir diremmenteape-
Outra característica do método da desconsideração é seu cará- nhora em bens do sócio (ou dasociedade, em caso de desçonsidem~ão
ter casuístico. A vantagem da desconsideração é exatamente a flexi- inversa).206A desconsideração nesse caso, além de atender melhor aos
bilidade, que permite modelar a separação patrimonial. Uma regra pr6prios interesses do credor, que seguramentenão pretenderá sujehtar-
gerai de responsabilidade, como aquela do ar$. 2.362 do Codice Ci- se ao concurso falimentar com OS demais credores, tem cotsequ6~cias
vile italiano, pode inffiair sobre a caracterização tipológica da socie- benéficas para a comunidade, na medida em que evita a falência.
dade dentro do sistema societário, não sendo, no entanto, manifes-
tação do método de desconsideração da pereon&dade jurídica. Evi- 3.3.4 Os custos da desconsidelac.30
dentemente, essa avaiiação casuislica 1120 pode ser feita sem pafâ-
rnetros. Em forma aproximativa, pode-se dizer que os parâmetros Em um campo como esse, parece imprescindível fazer uma aná-
são aqueles mesmos que foram presumidos para a atribuição da per- lise jurídico-economica das conseqüências de um método casuistico
sonalidade jurídica, ou seja, é necessário demonstrar, a contrario como o acima definido. Evidentemente, trata-se de verificar cpais
sensu, que a organização criada nâo foi suficiente para garantir a são os custos em termos de perda de segurança nas rela;õas qu.e um
existência de um centro de decisões autônomo. Isso pode ocorrer
eni uma série de situações.
206. Essa possibilidade foi expressamente admitida pelo Trib~nalde jastiça
Não só afattispecie, mas também a discipltna da desconsidera- de São Paulo, entre outros, no já referido acórdão de 3.3 8L,relatadc pcio des. Ran-
ção é específica. A primeira caracteristica da disciplina, decorrente geI Dinamarca, in RT 560/190,
150 s :, * : ' i a 3 I J ASOCIEDADE UNIPESSOAL

méto'do~ajaiaplicaçãoit5!'rarej jsevere and ~ n p r i n c i p l e d "impor-


~~~ 6) Responsabilidade limitada em situação de concorrência im-
ta, bem-como os \meios' para c mbater ou minimizar esses custos. perfeita - Uma primeira vertente, ainda vinculada a visão econô-
I'
Subsidiotpara esse estudo será ,a "análise econômica do direito", mica liberal, aceita a justificativa principal de Posner para a respon-
criada nos Estados Unidos e que nos últimos anos tem sido desen- sabilidade limitada, ou seja, a livre negociação dos riscos entre as
volvida também na Alemanha., partes, Argumenta, no entanto, que a realidade dos credores que
.Z ' - se apresentam na falência é muito diversa da imaginada pelo autor.
.. ,. o),~esponshbilidadelimitada e livre mercado - Os estudos ori-
:i , z \

Trata-se, em sua maioria, de credores pequenos e não-profissionais,


ginais sobre os custos da responsabilidade limitada e de sua descon- para os quais os "custos de informação" (i.e., de obtenção de in-
sideração foram feitos pela Escola de Chicago, em particular por formações sobre a sociedade) são muito altos e que, ainda que in-
R. A. Posner. Para ele, a respbnsabilidade limitada encontra sua formados, não teriam,condiçõesde negociar com a sociedade, exa-
4
justificativa econômica no neg cio jurídico realizado entre credor
e sociedade.208O credor assume,o risco da responsabilidade limita-
tamente por seu pequeno poder de barganha.="
A segunda e hoje predominante linha doutrinária, pelo menos
da (ou da ausência de responsapilidade dos sócios), exigindo uma em ambientes não influenciados pelas idéias liberais da Escola de
contraprestação por isso, consi tente na taxa de risco e traduzida
normalmente em juros mais ele; ados. 1 Chicago, ataca a premissa básica da teoria de Posner.
Para essa corrente, a justificativa de Posner para a responsabi-
Dois são os pressupostos de ia1teoria: em primeiro lugar, a plena lidade Iimitada, i.e. a livre negociação entre as partes, exige que se
informação de todos os agentesi e, em segundo, a hipótese de que jam feitas várias distinções, A primeira, óbvia, entre credores de con-
os agentes, informados, possaq negociar com a sociedade. trato e de delito. Mas mesmo dentro do grupo de credores contra.
Posner, atento ao primeiro pkoblema, consideranecessário dimi- tuais, i: necessário destacar dois tipos de credores que já a primeira
nuir os custos de informação e dk "supervisão" da manutenção do vista não podem estar sujeitos aos princípios gerais formulados por
capital social por parte dos credores. Pensa em regras de publicidade Posnrr: os fornecedores, que por sua dependência da sociedade (so-
I
dos atos sociais -,i: ;?ssam permit'r melhor informaçãopara terceiros.
A admissão como dado do segundo pressuposto deriva direta-
bretudo quando essa é de grandes dimeilsões) não têm condições de
negociar taxas de risco; e os empregados, tratados na falència como
mente de sua concepçã~liberal, que presume um mercado em con- credores, mas que são na realidade os maiores interessados na sorte
corrência perfeita e ampla possibpdade de negociação. Por isso, ad- da sociedade, aos quais de toda forma não é permitido negociar tal
mite uma exceção apenás para o credores que de direito e de fato
não negociaram com a sociedade,P ou seja, os credores oriundos de Mas o dado mais interessante e forte contra a teoria de Posner
atos ilíqitos (delitos civis) praticddos pela s o ~ i e d a d e . ~ ~ parece ser o prático, levantado por seus críticos. A análise evolutiva
Dentro dessa perspectiva do autor, a desconsideração parece das taxas de juros bancários não demonstra uma diferença entre ta-
agir negativamente sobre a expeokativa das partes e sobre os riscos xa de risco exigida pelos bancos para as sociedades com e sem res-
que assumiram e pelos quais fokam remunerados. Dessa forma, ponsabilidade limitada,213
dever-se-ia admitir a desconsideração em benefício dos credores ne- Derrubado o principal pressuposto da teoria de Posner, a livre
gociais apenas em casos excepcionais, nos quais o abuso cria um risco negociaçáo dos riscos entre as partes, resta determinar qual a justi-
adicional, não previsto pelas pai te^.^'^ ficativa da responsabilidade limitada em uni sistema que admite ex-
sido objeto de cerrada crítica na doutrina mais recente. Duas são
i!
O tratamento de ambos os pr ssupostos na teoria de Posner tem pressamente a iaexistência de um mercado em livre concorrência.
Para isso, é necessário analisar um dos pressupostos básicos da
as vertentes principais. escola de Chicago para orientação das normas jurídicas, o chama-
207. A fiase, com certa dose de exagero, é de F. Eastbrook, D. Fischel, "Limi- 21 1. Çfr. J. L. Landers, "Another word on parents, subsidiaries and affiliates
ted Iiability and the corporation", in University of Chicago Law Review 52/89. in bankruptcy", in University of Chicago t a w Review 43/529.
208. Cfr. R. A. Posner, "The rights of creditors of affiliated corporations", 212. Cfr. G. Roth, "&r economic analysis der heschrankten Haftung", in ZGR
in University of Chicago Law Review 431501. 1986, p. 375.

i
209. Cfr. R. Posner, "The rights o creditors,..", cit., pp. 507-508.
210. V. R. Posner, "The rights of reditors ...", cit., pp. 524 ss.
213. Cfr. "Stellungsnahme von M. Lehmann", sobre0 artigo de Roth, in ZGR
1985, p. 382.
F,

FORMA ORGANJZATIVA DA PEQUENA E MÉDIA EMPRESA 153 ..,\

do "princípio da eficiên~ia?~%~e&do'&se principio,-as normas ju- Parece fundamentai, portanto, buscar um caminho intermediário ,- ,\
I'
que permita aliar à eficiência a justiça d i ~ t r i b u t i v aA. ~esse
~ ~ último va-
% ,

rídicas são "eficientes'quando permitem a maximização da riqueza


global, mesmo que is'so'seja~feito'ticusta'de prejuízo a um agente lor deve-se dar obviamente muito mais importância relativa em países ;f
econômico especifico" .214 Em termos econômicos, essa definição li- de acentuadas desigualdades sociais e mais ainda naqueles casos em @
L*
beral de eficiência consiste na negação da definição de eficiência de que as conseqüências das diversas alternativascom relação à maximiza- &E
Pareto, segundo a q u ~ u m a ~ s o l u çéã oeficiente quando traz vanta- ção e alocaçãode riquezas são incertas. Foi baseado em um raciocínio ii *"'
gens a um dos participantesrsem prkjudicar os outros. O fundarnen- muito semelhante que o Bundesverfassungsgerichtalemão afirmou a h

to é a afirmação da insustentabilidade da definição de Pâreto em constitucionalidadeda lei de participação operária nas empresas, afir- (C-
um sistema de Direito privado, cnja idiia básica é a autonomia da mando em suas raz- que era duvidosa e não demonstrada a perda de \-.>

vontade e não a iguaIdade.?15 - - ? - ; . . I ; ~ 3. eficiência das empresas em função da co-gestão operária.219 i?.

Como solução, invoca-se o teorema de Kaldor-Hicks, segundo Segundo essa teoria, porIanto, o Direito não deve assumir uma *-_
o qual uma solução é injusta apenas quando o ganho dos favoreci- \,

dos supera a perda dos prejudicados e os primeiros não estão pron- âtitude neutra em relação ao mercado, mas sim nele influir, tentan-
tos a indenizar os Últimos. É importante destacar que, para os de- do minimizar os desequilíbrios existentes,
,,/~
i -
fensores dessa teoria, a indenização é potencial e não necessariamente g;t:
*-o_

'iV

real, ou seja, basta que teoricamente haja ou possa haver indeniza- c) Desconsidera_gGocomo forma de redistribuição de riscos -
ção. Evidentemente, um teorema assim formulado é absolutamente Negado o teorema de Kaldor-Hicks, desaparece a justificativa en- @
idêntico, nos resultados práticos, ao teorema liberal da maximiza-
ção de riqueza (ou eficiência).216
contrada por Posner para a responsabilidade limitada. Com efeito,
é o princípio da eficiência que justifica para Posner a responsabili-
e
i'"
O argumento básico contra esse tipo de teoria é que um princí- dade limitada. Para ele, admitida a livre negociação entre as partes,
pio geral de maximização de riqueza leva necessariamente à trans- prejuízos eventubente causados aos credores peIa limitação de res- rCI
A
:

Li,

ferência de riquezas àqueles que possuem maior pouer de barganha ponsabilidade encaixam-se perfeitamente na idéia liberal de maxi- c.,?-

nas transações, ou seja, àqueles que j& possuem riqueza. Consequen- mkação de ~iquezas, \
<,.-
..
temente, a teoria da eficiência (levariaà concentração de Já em uma visão que procure equilibrar a eficiência com a jus-
r
j
1

tiça distributiva (elemento que para Posner, como para Smith, é ob- r
.-..
h'% 'I

214. Yf,&, Kronman, "Weaith maximizcrtion as a normative principle", in The


i.
',
tido pela mão invisível do mercado), é preciso buscar outras justifi- c::
Journal ofL&pI Studies, 1980, p.,232; F:KÜWer;"Effizienx d s Rechtsprinzip", in cativas para a responsabilidade limitada.
Fe.stschr@ Steindorff, Berlin-New York,, de Gruyter, 1990, p. 694.
,215. V. F.Kiibler, 'SEffizienzpis Wsprinzip", loc.cit.; R. Posner, "Utilita- g
rism, Economics and Legai Theory", inbmThe +urna1 of Legal Studies, 1979, pp. O resultado é que, segundo o autor, os créditos dirigir-se-ãoaqueles naturalmente
116-117. ' ' ," .
,' ! \ , ,L , ,)
mais dotados. Esses seriam os resultados de seu hipotético leilão: "Even in the hypo- @"
' r?
&.A
216. Cfr. A. Kronman, ''Wealth maximizadon.:.", cit., p. 238. thetical auction dwigned toailocate rig:~tsof the most basic sort, the principie of weaith r-
, .i 217. Um exemplo muito claro de Kronman demonstra a iniqüidade a que pode maxirnization works to accentuate, rather than temper, nature's prior distrihution of
Ievar a adoção de uma tal teoria: ''Assume that no one owns anything, even his body
o r labour power, and that the rights to a11 this things are held in trust by an auctio-
advantages and disadvantages. These advantages and disadvantages are not thernsel-
ves entitlements. Theydo not become entitlements until the auction is concluded. For
c
4. A

neer who proposes to seli the various entitlements he holds to the highest bidder. that reason they cannot be eliminated by simply wiping away the legal landscape and 'r
The outcome of the auctionis certain to satisfy the principle of ~ 4 t maximization
h ietuming to the imaginary state in which no one yet owns anything at all" (p. 242).
since each right will be assigned to the person wiliing atid able to pay the most for Os resultados absurdos a que pode Ievar a teoria da maxirnização de riquezas r'
it. But how can people bid at the auction kfore they have any rights and therefore
any weaith? Since no one owns anything, a bid can be nothing more thact a promise
Scam claros quando se observa que Posner admite expressamente que a própria es-
craridão encontre justiftcaçâo, em casos extremos, na maximização da riqueza (V. L(
-
to pay for something out of the anticipated future income which the bidder hopes 1.Posner, Theethicalandpolitical brrsis of efficiencynorm in Common Law, apud C*
to realize from its use. Let us assume the auctioneer is prepared to extend credit to A. Kronman, "Wealth maxjmization", cit, p. 42). A conseqüência seria conclui^ que q$
each of the bidders by assigning them rights before the rights have been paid for (in a norma que impõe a escravatura 6 efiçiente e defensável do ponto de vista jurídico.
the same way a selier of goods might extend credit to the buyer). OE course Lhe arnount
of credit the auctioneer extend to a particular bidder bidding on a particular entitle-
218. Cfr., nesse sentido, G.Calabresi, "About law and economics: a lettcr to
R. Dworkin", in Hofstra Low Review, 1980, p. 558.
4
ment will depend upon the auctioneer's estimate of the magnitudeóf the income which
219. V. o famosoMifbestimmun~urteil, de 1.3.73, in BVerfGE 50, pp. 290-322,
@\ii.
the asset in question is likely to generate if this ownership iç given to the bidder ra-
ther than another". comentada por F. Kiibler, "Effizienr als Rechtsprinzip", cir., p. 700. ?j
.L

: 1
FORMA ORGANIZATIVA DA PEQUENA E MÉDIA EMPRESA 155

... Ao contrário da teoria liberal, passa-se a ver na regra da res- cada pelo legislador com base na livre negociação realizada entre
ponsabilidade limitada a exceção. Trata-se de uma exceção que leva credor e devedor, afirmando-se que o credor normabente exige ga-
a externalidades negativas em càso de falência, mas que se justifica rantias pessoais do sócio ou da sociedade c ~ n t r o l a d o r a ?É~pres-
~
na necessidade, absoluta do pohto-de-vista macro-econômico, de suposta, evidentemente, a existência de um poder de negociação en-
proporcionar aos agentes uma pqrta de saída do mercado sem cus- tre as partes. O resultado é o prejuízo da grande massa de pequenos
tos insuportáveis (como são aqueles da ruina pessoal).*0 A respon- credores que, como visto, não têm condições de negociar com a
sabilidade limitada é, portanto, y ma distribuição de riscos, forçada sociedade. ' I

mas necessária, feita pelo legislador.


Apenas no recente Código de Defesa do Consumidor nota-se
Conseqüentemente, a desconsideração, segundo essa visão, não uma menor preocupação com a neutralidade das leis e sua utiliza-
interfere (negativamente) em um@distribuição de riscos livremente ção com função substftutiva (Ersatdunktion) nas relações em que
negociada entre as partes, mas apknas redistribui os riscos, retoman- o mercado em si não consegue estabelecer um equilíbrio entre as par-
do a repartição desejada pelo legis/lador. Ou, mais claramente, a des- tes. O art. 28 prevê uma série de razões para a desconsideração: abuso
consideração enquadra-se em uma regra geral de repressão ao corn-
de direito, excesso de poder, fato ou ato ilícito, violação dos estatu-
portamento de free-rider, Comorree-rider define-se o agente que
quer gozar das vantagens mas ndo dos custos da responsabilidade tos ou do contrato social ou liquidação da sociedade por má admi-
limitada, ou seja, aquele agente que usa a responsabilidade limita- nistração. Os $9 20 ao 40 impõem a responsabilidade subsidiária das
da não passivamente, como um meio de salvação no caso extremo sociedades de grupo controladas e consorciadas pelos débitos pe-
de falência, mas ativamente, coxnp elemento estratégico para a ex- rante o consumidor sem qualquer demonstração de culpa. Finalmen-
ternalização de riscos em maneiraldiversa daquela prevista no orde- te, o 9 50 contém uma fórmula geral, capaz de dar liberdade ao juiz,
n a m e n t ~ . ~O' ordenamento deve intervir, conseqüentemente, pa- que prevê a desconsideração sempre que a personalidade jurídica
ra eliminar esses abusos e repristin* a distribuição de riscos desejada. for, de qualquer modo, um Óbice ao ressarcimento dos danos cau-
Essa perspectiva intervencionista (que vê no Direito não um cor- sados ao consumidor.
po de regras que devam buscar a neutralidade do ponto-de-vista eco-
- A amplitude das hipóteses é incompatível com a tese liberal,
nhmico, mas sim que devam influir nos desequilíbrios naturalmen- mesmo admitindo-se o reconhecimento de uma maior dificuldade
te criados pelo mercad0)'facilita a plicação mais ampla da descon- de informação por parte dos consumidores. Atd porque o Código

economicamente, desde que exis td


sideração. A prbpria desconsider ção atributiva torna-se aceitável
razões econí3micas (v.g, ,a pro-
teção dos interesses de grupos partfcuiarmente fracos etc.) a justifi-
amplia grandemente o acesso à informação, diminuindo fortemen-
te seus "custos". Se o pressuposto fosse liberd,ibastariarn as regras
de informação, não sendo necessária a desconsideração.
car uma diversa distribuição dos riecos (o que claramente não seria
aceitável na visão liberal). I e) Os custos da sociedade unipessoal - E a sociedade unipes-
soal? Quais as conclusões que sobre ela poder-se-ia tirar a partir da
d) Recepgdo legisiativa dm ieorias no Brasil - No Brasil, análise econômica do direito? 'Traz em si a sociedade unipessoal al-
9
destaca-se a recepção tardia e aind apenas parcial dessa teoria "in-
tervencionista", sem dúvida mais qdaptável a sua realidade econa-
gum custo adicional, digno de tutela especial através da desconside-
ração?
mica, I
A resposta de um liberal seria imediata: não. Um eventual ris-
A lei acionária de 1976 adotou; plenamente a teoria de Posner.
co mais elevado já estaria previsto na livre negociação entre as par-
A responsabilidade limitada nos gr pos de direito e nas sociedades
i
unipessoais (subsidi6rias integrais), esacompanhada de qualquer re-
gra especial de organização interna bu de desconsideração, é justifi-
t e ~Seria
. ~ necessário
~ apenas abaixar os custos de informação e re-

222. V. Sxposiçao justificativa do Ministro da Fazenda A lei n. 6.404, cap. 21,


seção I.
220. Cfr. M. Lehmann, Das Privileg @ beschrünkten Haftung, cit., p. 352. 223. R. Posner critica, na verdade, a distinção entre sociedade unipessoal e piu-
221. Cfr. M. Lehmann, DasPrivileg derpeschrankten Huftung, cit., pp. 362-363. ripessoal para fins de desconsideração - "The rights of creditors", cit., p. 525.
160 A SOCIEDADE ZUNIPESSOAL*, FORMA ORGANIZATIVA DA PEQUENA E MÉDIA EMPRESA 161 c--,:,
~....
r--,,
i'!
de unipessoal, mas sim a sociedade,formada por homens-de-paiha t i v a ~sój ~se~aplicaria
~ a sociedade unipesoai em face de uma nor-
(Strohrnanngesellschaft)que se retiram até três anos após sua cons- matiua que contivesse regras de responsabilidade de dificil determi- -'<,,, !

tituição. Ou seja, a pub1icidade:estaua intimamente ligada a uma nação e que não permitisse o conhecimento por terceiros das regras
de responsabilidade a serem aplicadas. Essa dificuldade de determi-
c-'
presunção de má-fé feita pelo legislador e não efetivamente ao au-
{'--.a
mento da possibilidade de informação por parte de terceiros. nação pode decorrer tanto da possibilidade de variação temporal do C..

No sentido da informação de terceiros orientou-se decididamente regiae de responsabilidade como da ligação da limitação de respon- g
a
sabilidade a um dado fático variável e incerto. *i;
a XII Diretiva CEE, ao exigir o imediato registro não apenas da redução
a um só sócio como também da identidade do sócio único (art. 3'?)."7 O sistema italiano fornece um bom exemplo de ambas as situa- @
ções. Trata-se do dec. Leg. n. 88, de 3 de março 1993, introduzido &$
A doufrina permanece, no 'entanto, cética com relação a efeti- em atuação da XII Diretiva Comunitária. Seu art. 70 prevê três hi-
vidade dos registros como meio de informação a terceiros. Observa pbteses possíveis de perda do privilégio da responsabilidade limitada. --.,
t.-,.. !
que a verificação dos registros não constitui um comportamento nor-
mal na prática comercial, na qual rzpidez e eficiência representam A mais relevante delas é o fato de ser o sócio Único também !Fj
imperativos absolutos que normalmente se sobrepõem às exigências único sócio de outras sociedades de capital. As dificuldades aplica-
tivas de um dispositivo desse tipo são evidentes. A existencia dessa 43
\.__
de segurança.228A ausência de verificação dos registros é tanto mais segunda participação é, primeiramente, uma situação de fato de di-
comum e tanto mais justificável, como já visto, quanto mais frágil (r<
ficil determinação e, em segundo lugar, uma situação variável. A ,"4

economicamente seja o credor.229


A tendência parece ser, portanto, defender a adoção de meios
sociedade pode em um momento ter um s6cio único participante de
outra sociedade e, no momento seguinte, esse mesmo sócio único
c:;,
mais econ6micos de publicidade para a sociedade unipessoal. Fala- pode vender suas quotas ou ações, transformando o regime de res- 0
se em substituição, com relação a sociedade unipessoal, do sistema ponsabilidade da primeira sociedade. E o caso de um sócio único @
de Rechtsformenwahrheit (realidade das formas) por um sistema de que adquira sucessivamente participação totalitária em outra socie-
Typenwahrheit (realidade dos tipos), que permita a itc!:rE:, da de- dade. Sua responsabilidade passa então, segundo a disciplina italia- fgij
nominação Eimanngesellichaft (sociedade unipessoal) na firma.230 na, de limitada a ilimitada na primeira sociedade (art. 7 0 , n. 1, a). "I
..
A inclusão da denominação ''sociedade unipessoai" na firma repre- A insegurança criada por regras de responsabilidade tiio mutáveis S
.+
.
>

é evidente. Basta imaginar a situação dos credores habituais, não ."?,


sentaria, smdúvida, um ganho multiplicado em publicidade, com "L ..,
melhor conhecimento da situação interna da sociedade e consequen- informados da mudança do regime de responsabilidade. Se a mu- *'-\,
dança importar na limitação de responsabilidade, seria razoável pre- 1. , j

temente ~~~;@$cos~invoívidos, já que Implicaria a reprodução do no-


me em rn,@as, adesivos e documéntos oficiais da sociedade.231 sumir que os credores teriam negociado com a sociedade se soubes- c<"'--,
i.
sem da existência de tal regra?
O argumento & u t r i n á r i o u t i ~ d ópara crcticar esse tipo de pro-
Vê-se, portanto, que o disposto no art. 70 da lei italiana torna
[r?
,.",+J
posição (segundo o qual os tipos $segammuito fluidos, não permi- quase inútil a regra do art. 20, que prevê a necessária menção da @
tindo a terceiros identificar perfeitamente as conseqüências aplica- situação de unipessoalidade nos atos e na correspondência da socie-
$ ' ' ' :, '-& ,: --'2 '*$ dade. Ou, rnelhar dizendo, a função deixa de ser a de advertir ter- @
227. Esse dispositivo j&foi introduzido na ~ m ~ e qbe t alemã
z ~ através da Ce- ceiros da existência de uma determinada situação de responsabili- TV
k$ji?
sefz zur Durchführung der ZwolffenRichtlinie des Rates der Europaischen Gsmeins- dade, passando a ser a de alertar quanto h absoluta fluidez do regi-
chaft auf dem Gebiet des GmellschftsrechtsbecreffendGeselkchaftenmil beschrankter me de responsabilidade. #".>
',. ,,
Haftung mif einem einzigen Gesellschafter, art. l ? , Absatz 3, a, in Bundesgfsetz-
blatt. 1991, vol. I , D. 2.206. Problema semeihante mas não idêntico existe no sistema ale-
228. Nesse sentido a decisão do Bundesgerichtshoff de 21.7.65, in 33 1965, mão. Um dos casos mais frequentes de aplicação da teoria da apa-
p. 1.202: "Das in Rechtsprechung und Lehre entwickelte Gebot, bei abgeleiteten Fimen rência na jurisprudência alemã é o do comerciante individual que
um der Firmenwahrheit willen den Geseilschaftszusatz zu strichen, dient in exster Li-
nie dem Schutz der Allgemeinheit, die meist das Handelsregister nicht einsieht und
mantém relações negochis habituais em nome próprio com um ter-
deshalb die innere Umwahrhaftigkeit einer ahgeleiteten Firma auch nicht erkennt". ceiro e que, repentinamente, tendo constit-~ídouma sociedade uni-
229. V . supra, cap. 11, 3.3.4, f.
230. Cfr. P. Buchmann, Registerpubli.zitZt und Glaubigerschutz, cit., p. 168. 232. Cfr. D. Sternberg, Der GeselIschaft$zus~fr
in der Handelsfirma, Berlin, ,@:
Ducker & Humblot, 1975, p. 87, ,.
231. V. P. Buchmann, Registerpublizi~t~ n Glaubigerschutz,
d cit., 9. 174. #

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r--w-)
$.$%:,
FORMA ORGANIZATIVA DA PEQUENA E MÉDIA EMPRESA 163

pessoal de responsabilidade limitdda, quer vaier-se deia para não res- bém menciona expressamente entre essas situações ex-
ponder pessoalmente perante esde credor, invocando para isso o 4 cepcionais a sociedade unipessoal na qual o é ao mesmo
15, Abs. 2, HGB.233 , tempo
Nesses casos, sobretudo quando o sócio é ao mesmo tempo ad- Como já observado acima, qualquer hipótese que implique uma
ministrador da sociedade, é extr4mamente difícil e sobretudo não- desconsideração em sentido inverso deve ser analisada com muito
exigível do fornecedor habitual q$e distinga a organização social da cuidado, em função da proteção do capital Parece justi-
pessoa do sócio. No ordenamento alemão, essa interpretação é fa- ficar-se apenas em caso de ausência total de atuação efetiva da or-
cilitada pela existência do 4 164, 'Abs. 2, BGB, segundo o qual in- ganização social no sentido da separação de esferas - da qual o
cumbe à pessoa que negocia em pome de um terceiro demonstrar exercício das funções administrativas pelo sócio é uma possível mas
que não negociava em nome próp'rio. Tal regra cria assim uma pre- não suficiente manifestação.
sunção simples de negociação em nome próprio. Nesse caso, para afastar a presunção da criação de aparência
Nesse caso, portanto, a resqonsabiiidade deve-se a uma mu- de negociação em nome da sociedade, parece ser necessário aliar a
dança não comunicada da "form " empresarial "comerciante in- regra de publicidade (ou seja, a demonstração da não-utilização do
i:
dividual" a "forma societária". I cumbe claramente ao sócio, por
força de regra legal, comunicar q mudança da forma.
nome social em qualquer documento escrito referente a negociação
reaiizada) a demonstração da existência de uma prática organizati-
va ou de um "procedimento" societário típico de tomada de deci-
Não ocorre o mesmo no sistema criado pelo legislador italia- sYes, utilizado habitualmente e que permita diferenciar claramente
no. Inexistindo qualquer regra qye determine ao sócio comunicar
entre decisões societárias (BeschlCsse)e decisões individuais (Enrs-
diretamente aos credores a mudanba de responsabilidade, a discus- ~hl2sse).~~' Esse Último topico é aprofundado mais adiante, quan-
são volta a basear-se na efetividate do registro. A dificuldade em do da análise das regras organizativas da separação de esferas.
configurar seu comportamento copo missbrcruchlich (abusivo) di-
ficulta a aplicação da teoria da a arência.
P
A teoria da aparência pode ser também aplicada no sentido in-
3.4.3 Garantias do capital socjal

verso, quando se trata de responsabilizar a sociedade pelos débitos A GnzM NrpvelJe 1980 introduziu uma série de normas inova-
pessoais do sdcio. Nesse caso, é ainha mais difícil atribuir a publici- doras a respeito da gaantia da capital social na sociedade unipessoal.
dade uma capacidade de definidão de linhas divisórias sócio- Quanto a garantia do capital social q u a n h da constituição da
sociedade. Por isso, Canaris, ao afirmar que a teoria da aparência sociedade, as preocupações são aquelas mesmas já demonstradas com
é apliczivel nesse sentido só em hipdteses excepcionais, exatamente relação às regras de publicidade. Ao 5 24 ÇmbW Gesetz, que prevb:
porque a aparência de unidade devè ser não apenas fática mas tam- a respox~sabilidade(partia.) dos demais sócios relativamente às quotas
ainda niia integralizadas,238 faz-se corresponder para a sociedade
233. Nesse sentido, definindo o compoitarnento do sócio como missbrauchiich,
v. a decisão do BGH de 6.10.77, in BB 1978, pp. 1.025-1.026:
"Wie der Senat in der Entscheidung 'h4HGB 5 15, Nr. 4 und sodann noch- 234. C f r . K. 9.'. Caaarjs, Uie Vertrauenshqfrung, cit., p. 179: "muss hier der
"i
mals in dern Urteil WM 1.976, 1.984 ausgeftihrt hat, kann ein Fall, in dern die Beru- Schein r e~btlicherund nicht ríur tatsàclilicher Einheit hervorgerufen worden sein".
235. Cfr. K. W. C:anarís, Die Veriraeunshqfhing, c&., p. 179, que justifica:
filng auf 5 15, Abs 2 HGB treuwidrig ist, inseesondere dann gegeben sein, wenn wah-
iend einer festen Geschaftsbeziehungder eine qler Beteiügten seine Haftung beschrimkt, "Denn hier werdeu haufig die Regeln uber die Vertretungsniacht, die auf die Schaf-
in der Folgezeit aber gleichwohl unter unverhnderter Benutzung der bisherigen Fir- fung eines Scheintatbestandes analog anzuwenden sind, zum Zuge kommen".
menbezeichnung seinem Geschaftspartner g Igenuber in der gleichen Weise auftritt 236. Nesse caso, redmente prejudicado, já que haverá responsabiiiição da so-
f
wie bisher, ohne diese auf die veranderteii Ve haltnisse hinzuweisen" - v. também,
no mesmo sentido, decisão do BGH de 30.11.78, in NJW 1980, p. 44 e 45.
ciedade sem ~ i d q u e contrapartida,
sidelação inversa.
r diferentemente dos casos analisados de descon-

A decisão está em linha com a tendência jurispmdencial de vincular a aplica- 237. V. a respeito C. AngeIici, "Ii progetto di áirettiva CEE suiia società uni-
çiio da teoria da aparência ao cornportament,o fraudulento (missbrauchlich) do só- personak" in Rivista de1 Diritto Commerciale, 1988, I, v . 406.
cio. Cfr. A. Baurnbach-K. Hopt-K. Duden, Hqndekgesdtzbuch, Munchen, Beck, 1989, 238. Dispos!tivo seinelhante, mas não idêntico, ao art. 90 do dec. n. 3.708 bra-
$ 15, Rdn.3, p. 77. Trata-se, portanto, de um regra excepcional - cfr. K. Schmidt,
a
"Sein-Schein-Handelregister", in Juristische Schuldung, 1977, pp. 209-212.
sileiro (Lei das Limitadas), Que revê a responsabilidade "solidária" dos demais sd-
cios p i a quota não-integ~aiizada,em caso de falência.
166 A SOCIEDADí3 UNIPESSOAL FORMA ORGANIZATIVA DA PEQUENA^E MÉDIA EMPRESA 167

(Kreditunfahigkeif), exigem a presença do requisito objetivo do su- prevêem o desaparecimento& &ssembl$iai ma&sim\oexercício dos
perendividamento real (determinfvel em situações normais através poderes pelo sócio único, que tomirá suas decisões por escrito e de-
de auditoria na empresa), ou ent'o presumido, em caso de créditos verlregistrá-las nos,livros sociaisPrkidéia fundamental dos tex-
concedidos para saneamento finlnceiro após a decretação da que- tos é coagir o sócio a distinguir, ao menos formalmente, suas deci-
bra."s I sões pessoais (Entschliisse) das decisões sociais (Beschlusse).
As mesmas regras aplicam-sq aos créditos concedidos a tercei- Trata-se de formalidade imprescindível &segurançado próprio
ros com garantia pessoal do sócjo ($ 32, a, Abs, 2), Nesse caso, sócio Único. Não havendo possibiiidade de difèienciar as decisões
considera-se o montante da garantia concedida como capital, se for tomadas pelo sócio único no exercício de suas funções das decisões
razoável presumir que na mesma Situação ordentliche KaufZeute te- tomadas a título particular, diminui a possibilidade de o terceiro dis-
riam feito um aumento de capital. tinguir, no negócio ou aegócios decorrentes da referida deliberação,
quem realmente está assumindo seus riscos. Daí a justificativa da
3.4.4 Garantias organizativas da separação de esferas possibilidade de desconsideração da personalidade jundica em caso
de confusão de esferas, como visto
O maior problema reiativamehte a apiicação das regras de or-
ganização societária $sociedade
i upipessoal é determinar quais são Outra normativa relevante no que concerne a separação orga-
as regras que regulam exclusivamente as relações entre sócios e das nizacional de esferas é a relativa aos negócios entre sócio e socieda-
quais, portanto, poder-se-ia em tese prescindir, e quais podem ser- de. A esse respeito, é interessante relatar a evolução legislativa ale-
vir a tutela de terceiros,246ainda kue indiretamente. mã e, mais recentemente, a comunitária, onde se pode individuali-
zar claramente a tentativa de determinação de uma fórmula organi-
A dificuldade existe exatamente com relação aquelas regras li- zativa que não restrinja em demasia a atividade econômica da so-
rnítrofes, ou seja, aqueles dispositivos que, aparentemente, tutelam ciedade, sem que com isso deixe desprotegidos os interesses de ter-
apenas as relações entre sócios ma$ que, na verdade, enquanto re- ceiros. Até a promulgação da GmbH Novelle 1980, Jn??trinae ju-
guladoras de um procedimento or'ganizativo, servem para tutelar risprudência reconheciam a possibilidade de realização de negócios
tarnbCm os interesses de terceiros.*47

r
I entre s6cio e sociedade. O 8 181BGB, que proibe os chamados con-
É o caso, por exemplo, das normas que regem as Assembléias tratos consigo mesmo, não era considerado aplicável à hipótese por
Gerais. Reduzidas a um sócio, a m nutenção de suas formalidades objetivar apenas a proteção do representante contra o representado
e xequisitos de publicidade pode pa ecer, em uma primeira análise, e não a de credores da s o c i e d a d e ~ n i p e ~ s o aAl . GmbH
~ ~ ~ Novelle
supérflua e formalistica. modificou
, a disciplina:'~impoddo, rio 'Ej '35,' Abs.:4, a aplicação do
-i<
, - ,% *
0. s, 7

Não foi esse o entendimento de grande parte das leis recentes . ie


sobre a matéria. A lei francesa e a r4cente diretiva comunitária não 248. V . na França, art. 60-1,lei"n. 85.697 de 11.7.85; na Alemanha, 3 48, 3,
da GmbH Novelle 1980; CEE,z3art. 40. da XII Diretiva ComunitBna. Na ItAlia,

1
na verificação da situação financeira da soci dade. V. H. J. Mertens, "Zur Banke-
nhaftung wegen GlaubigerbenachteiligungW n ZNíP 143 (1979), p. 188.
Constituem rodos eles cabos em que o banco não se comportou como ordenrli-
considerou-se mais conveniente para a atuação da regra comunitária simplesmente
omitir qualquer referência 21 Assembléia, fazendo desse modo aplicar em todo o seu
rigor as regras relativas às sociedades pluripessoais - v. dec-leg. a. 88, de 3.3.93.
No Direito brasileiro, não fazendo a lei qualquer diferença, devem-se entender
che KcruJleute. Sua responsabilidade e o equivalente eçoriômico, dessa vez imputado apliciveis à subsidiária integral, no que forem compatíveis, as regras reguladoras da
ao banco, da consideração do empréstimo feito pelo sócio como capital. Assembléia previstas na Lei das Sociedades Anônimas (artâ. 121-131). V. a respeito
245. BGHZ 75, pp. 334-336, decisão db 29.11.79. infra, cap. 111, n. 4.1.3.
246. Nesse sentido, v. R. Reinhardt, "Gyanken zum Identitatsproblem bei der 249. Não é o caso de voltar aqui a discorrer a respeito da comparação entre
Einmanngesellschaft" in Festschrift Lehmann, perlin, Tubigen, Frankfurt, De Gruy- invalidade e deswnsideração quando se trata de sancionar uma atividade irregular.
ter, Mohr, Schweitzer, Vahlen, 1956, p. 578, Que inclui no primeiro grupo aquelas A esse respeito, remete-se ao quanto dito supra, cap. 11, n. 3.3.3 e notas. E impor-
regras sobre a suspensão do direito de voto e$n casos de conflito de interesses e re- tante notar, no entanto, que essa foi a solução adotada em certos ordenamentos,
gras de publicidade voltadas à proteção dos $cios. No segundo grupo estariam as como o francês e, mais recentemente, o italiano (o qual, ao não prever qualquer re-
regras sobre constituição e manutenção do capital social, deveres de registro, presta- gime especial, sujeitou a assembléia ao regime geral da invalidade por vicio de forma
contêm todos regras de publicidade.
1
ção de contas, publicidade e controle; na verd de, o segundo, terceiro e quarto itens

247, Cfr. C. Angelici, "Societa uniperspnale", cit., p. 56.


previsto no art. 2.377 Codice Civile).
250. V. BGHZ75, p. 358, decisão de 19.11.79, e na doutrina U. Hubner, Inte-
ressenkotfflikt und Vertretungsmachf, Munchen, Beck, 1977, pp. 251 ss.
FORMA ORGANIZATIVA DA PEQUENA E MÉDIA EMPRESA 169 @

L
@

I (3 18 1 BGB à sociedade unipessoal, A jurisprudência, ao contrário, 3.4.5 Regras organizativas internas versus regrarexternas 2,> fAa
,e--?
nunca completamente convencida da conveniência de proibir a con- i .",*
tratação sócio-sociedaGe, procurava sempre uma forma de atenuar Das considerações feitas acima podem-se tirar algumas conclu- r"?
o rigor do dispositivo, admitindo a conclusão desse tipo de negócio sões. Como visto, em ausência de uma real pluralidade interna de in-
j7
desde que essa possibilidade estivesse prevista no contrato social e teresses, as normas organizativas reduzem-se de regras visando a regu- .t,' .,

fosse, conseqüentemente Cem teoria), acessível aos credores através lamentação dos confiitos decorrentes do pluralismo de interesses a re-
do registro de comércio.2s1 i_:
gras voltadas primariamente à procedimentalização da atividade so-
É exatamenteesse tipo de atenuação que forneceu a base para as cial, ou então a dar publicidade (ou ao menos possibilidadede conhe- -4

principais críticas a regulamentação dos contratos consigo mesmo. cimento) da existênciadeum Único sócio e dos atos intern~s à sociedade.
Sustentou-se,com efeito, que com essas exceções a proibição tornara-se As tentativas de ir além dessa regulamentação mínima demons-
4%
inútil, ou até prejudicial a terceiros. Para esses, seria muito mais efe- @
tram-se negativas. A proibição de realização de negócios pela socie-
tiva uma proteç& baseada na publicidade do próprio negócio que na dade implica sobretudo uma diminuição de capacidade negocial, sem
publicidade da possibilidade de sua realização.252 o correspondente aumento de segurança das relações.255A discus-
611
,."
A principal crítica advém, no entanto, de uma constatação eco- são jurisprudencial e doutrinária a respeito da aplicaçâo do $ 181 .-

nômica. Como já notado por Berle-Means, tanto maior será a ten- BGB à sociedade unipessoal demonstra a veracidade dessa afirma- i-,
t a $ ~do sócio realizar negócios ruinosos para a sociedade quanto ção, especificamente com relação aos contratos consigo mesmo.
mvnor for sua participação no capital, pois então maior será o seu /'--

luxo. Em uma sociedade unipessoal, a não ser que o sócio preten- A constatação da arbitrariedade dessas regras que tentam ir além ,. .
d ~exclusivamente
, lesar seus credores, ao lucro auferido pelo sócio. da simples publicidade ou procedimentalização da atividade social
não deve, no entanto, levar ao arbítrio em sentido inverso. Com a ,-
pwticularmente, corresponde idêntico prejuízo sociedade, já que
essa é controlada a 100%. Dessa maneira, se os contratos consigo expressão "arbítrio em sentido inverso" procura-se identificar aquele ,.,

posicionamento que, considerando ineficaz a regulamentação orga- @


mcsmo fossem proibidos ria sociedade unipessoal, deveriam a for-
tiori também sê-10 na sociedade pluripessoal. nizacional interna em ausência da pluralidade de interesses, defen-
de a regra da responsabilidade ilimitada indiferenciada do sócio Úni-
a,
Mas não é s6 isso. Uma regra que proíba contratos entre sócio 6:
e sociedade importa verdadeira capitis diminutio da sociedade. Tendo co. Para sustentar esse tipo de solução extrema, utiliza-se como re- i..

apiicação"indiferenciada,a proibição dos negócios entre sócio e so- gra de "compensação" o direito do sócio único de utilizar a socie- f.

ciedade acirba por atingir não apenas negócios potencialmente frau- dade no seu interesse L.

r-
~ per -
diilentosoi mas também aqueles benéficos h s o ~ i e d a d ea, ~qual Tal posição parece insustentavei. I? iiicontroverso que a con- :. '.
de efetivamente parte de sua capacidade negocial. traposição de interesses não existe na sociedade unipessoal e que em !" -'

Em face das críticas doutrinárias e jurisprudenciais a solução ale-


mã, a diretiva comunitária preferiu, corretamente, não adotar aquela
ausência dessa contraposição muitas regras da organiza@o societá-
ria perdem sentido. Parece entretanto excessivo que a partir daí tente-
"-
fórmula. A publicidade do próprio negócio é, com efeito, o sistema es- se transformar uma situação de fato em situação de &eito, como <-
que convidando o sócio à fraude. O direito, como conjunto de re-
-.%A

cdhicio pela diretiva (art. 5!, n. 1) -obrigação essa existente, no entan-


to: somente com rclação aos negócios não-habituais (art. 50, n. 2).254 @
Aqueles casos no quais a contratação consigo próprio seja expressamente prevista no @j
251. BGHZ 87,pp. 59-60, decisão de 28.2.83; v. Baurnbach - Hueck Kurz- contrato social -sem distinção entre negócio habituais e não habituais -v. 8 35, Abs.
kommentar, cit., 3 5 , Rdn. 75, p. 461, com ampla citação jurisprudencial. -
4, Satz 2 previsto no art. I?, n. 2, da Lei de Atuação. V. Bundasgesefzblaff,1991, 6
"%C
252. Cfr. U. Hubner, Interesseffkonflkt und Vertretungsrnacht, ut., p. 261. vol. I , p. 2.206, e a interpretação de H. W. Eckert, "Die Harmonisierung", cit., p. 57.
r
253. U. Hubner, Interesscnkorlfllskt und Verttetungsmaclzt,cit., p. 256, exemplifica 255. Nesse tópico, parece ter o legislador brasileiro adotado urna solução lou- i
com a decisão de 30.11.67 doWfi(inBGHZ 49,117), caso no qual considerou-seiião- vável na premissa, ao não proibir de per si os negócios entre sócio e sociedade, san- ;;,,(
obrigatório um aumento de capitd prometido pelo próprio sócio único, com base, entre cionando apenas aqueles feitos em condições de favorecimento pessoal (v. art. 117,
outros argumentos, no 5 181 BGB. O argumentoparece, entretanto, facilmente superável § l?,f, Lei das Sociedades Anônimas). Pode-se duvidar, no entanto, da eficácia da
para o caso, com a aplicação do priniipio que proíbe o venire contra factum proprio. sanção de ressarcimento prevista para restabelecer a situação anterior ao negócio lesivo.
-,,
254. Na Alemanha, a ap!ica,;ão dos disposirivos comunidrios permanece restrira. 256. Faz-se referência já anatisada opinião de S. Scotti-Camuzzi, "L'unico
porém, aos negócios em que c sóao único não seja ao mesmo tempo adminisuador oii azionista", cit., p. 783, nota; v. também texto supra, cap. I, n. 4.2.
:I
Q
@
.-
FORMA ORGANIZATIVA DA PEQUENA E MÉDIA EMPRESA 17 1

gras indicativas de comportamentos desejados, não pode basear suas No outro extremo, encontra-se a absoluta ausência de publici-
regras em uma presunção geral elindistinta de ma-fé, sob pena de dade. Essa induz necessariamente a responsabilidade ilimitada do
incentivar exatamente esse comp rtamento. Com relação especifi- sócio(s). É o que dispõe o art. 30, F) 20, do dec, n. 3.708, de 10 de
camente à sociedade unipessoal, lssa solução teria ainda o defeito janeiro de 1919, sobre as sociedades por quotas, ao prever que a
de não propiciar o desejado incentivo das atividades das pequenas ausência da denominação "limitada" na firma implica a responsa-
empresas. bilidade ilimitada dos sócios. O mesmo ocorre com o decreto legis-
A essas considerações juspolíticas somam-se outras, de nature- lativo italiano de atuação da XII Diretiva Comunitária, que entre
za sistemática. Com efeito, a expbriência demonstra a capacidade as várias hipóteses de alteração do regime de responsabilidade pre-
dos "meios vê que a sociedade unipessoal não será de responsabilidade "fino
Tal expressão, "meios a quando non sia stata attuata la pubblicith prescritta dall'art.
2.475-bis".
da desconsideração
da personalidade jurídica. fazer uma aplica- Outro bom exemplo é a subcapitalização. Nesse caso, a aplica-
ção seletiva do princípio Seletiva em ção da teoria da desconsideração mostrou-se inconveniente, na me-
dois planos. Em um primeiro plGo, na medida em que permite, dida em que criava excessivo grau de incerteza jurídica (cfr. supra,
as regras cujos cap. 11, n. 3.3.1, e 3.3.2). Daí sua substituição por regras de garan-
ao sócio. Em segundo 111- tia da manutenção do capital social que contivessem um conceito
gar, com relação a fins de responsabilidade, mais amplo de capital. Também aqui, no entanto, não é possível
na medida em que credores informados e falar em substituição perfeita. No caso de subcapitalização qualifi-
desinformados e entre aqueles que têm ou não capacidade de nego- cada (a qualifizierte Unterkapitaliesierung alemã), em que o capital
ciar com a sociedade (v. supra, caip. 11, n. 3.3.4). não é suficiente sequer para permitir o início das atividades, não é
possível afastar a possibilidade de desconsideração.
O problema mais sério e que qxige mais estudo são as formas
de inter-relacionamento entre amb os grupos de regras (organiza- Essa substituição constitui uma limitação necessária a teoria da
cionais "internas" e "externas"). evem-se buscar os graus dese- desconsideração da personalidade jurídica. Limitação necessária à
jáveis de complementariedade e substituição. preservação de um outro princípio: o da não responsabilidade pes-
soal de sócios e administradores por simples assunção do risco em-
Trata-se de tarefa complexa, Sobretudo com relação ao grau presarial (a chamada businessjudgement rule), ou seja, inexistência
de complementariedade desejado. E o caso, por exemplo, do rela- I da modalidade culposa de responsabilidade civil do controlador (ex-
cionamento entre as regras de publicidade e a desconsideração. O cluída de resto pelo art. 117 da lei n. 6.404). A responsabilização
aperfeiçoamento das normas de publicidade deve tender a possibili- só é possível quando o capital inicial for insuficiente para o próprio
tar que se presuma a assunção de riscos por parte dos credores e, início da atividade, situação que pode fazer presumir o dolo do sO-
conseqüentemente, que se afaste a ppssibilidade de desconsideração cio fundador.
(i~aturalmente,s6 com relação aqueles que se pode pressupor a pos-
sibilidade de negociar com a socieqade).
Evidentemente, porém, tais presunções só podem ser feitas em
presença de uma disciplina que perqiita relacionar regras claras de
responsabilidade com o tipo escolhitio. No caso, por exemplo, da
disciplina italiana, que prevê três hipbteses possíveis de mudança de
regime de responsabilidade, os custds da informação são exagera-
damente altos para que se possa prekumir o conhecimento real e a
conseqüente assunção dos riscos envglvidos. Seria necessário, nesse
caso, que o sócio demonstrasse ter informado diretamente o credor,
sobretudo da mudança de responsabqlidade. Caso contrário, não se
poderia afastar, a priori, a possibilidade de desconsideração.
,,--,
COMO FORMA ORGANLZATIVA DOS GRUPOS 173
IR

a tentativa de enfraquecer os centros de poder do que realmente a (-- 3


proteção dos ern~regadas.~
É bastante claro que a discussão, na forma como então se co-
locava, era f r ~ t de
o particulares condições político-econômicas. Não
se deve esquecer que, à época, a Alemanha não contava com uma @
lei anti-truste. O que se pretadia era, portanto, a atribuição de ca- @
A SOCIEDADE UNIP~SOAL ráter substitutivo'ao Direito Societário com relação ao direito con- a
COMO FORA44 ORGANIZATIVA DOS GRUPOS ~orrencial.~ '
r?
Hoje, evkientiente, a discussão assumiu outro tom. A dou- L.,.)
trina dominante nega a possibilidade de atribuição de uma tarefa
específicade defesa da liberdade de concorrência e controle da con-
r1
_.

I . Direito Societário e concentração

1.1 O problema da neutralidade do Direito Societário


centração as regras societária~.~
Aceitar tal afirmação não implica dizer, no entanto, que o
Direito Societário náo deva ser coerente com a ordem econômica
.A

rR
-
-
global. Com efeito, seria muito incoerente o ordenamento eco- % ,d

Desde os anos trinta discute-se a respeito da utrlização econô-


nômico que de um lado avaliasse negativamente um comporta- @
mento e de outro incentivasse sua prática do ponto-de-vista orga- @
mica do Direito Societário. Já àquela época, afirmava a escola ordo- nizativo.
liberal de Freiburg que a ordem econômica é caracterizada por uma
decisão fundamental (Grundentscheidung)a favor de uma ordena- A neutralidade é, assim, exigêficia mínima de coerência eco-
ção economicamente eficiente da sociedade. A essa ordenação nômica do Direito Societá-ic n problema surge, entretanto, exa-
tamente naqueles setores nos quais o direito societário é per se
submeter-se-iam todos os campos, tanto do Direito Público quanto
do Direito Privado. O combate a formas organizativas que levam não-neutro. Pergunta-se, nesses casos, até que ponto se jiistificam r
a distorções concorrenciais seria, portanto, tarefa inerente ao Di- "contra-medidas7' de natureza societária, fundadar apenas em mo- JII

reito Soci&io. L , i
tivos de ordem "concorrencial". Uma resposta genérica e por isso (A-

muito aproxi~ativadeve ser positiva. É necessário simplesmente


O su&so dessa tese, sobretudo na legislação 5 doutrina aíemãs restaurar a "neutralidade" perdida. E importante observar que i--
do imediato pós-guerra, explica-se por razões'hist6ricas."A'utiliza- as "contra-medjdas" permitem por vezes uma aplicação mais ate-
li.

ção do Direito Societário para fins concorrenciais,'como meio de nuada do direito concorrencial. Trata-se de regular, através de @
descartelização da indústria alemã, era intenção explícita das potên- disposições organizativas, situações para as quais uma resposta es- @
cias aliadas ocupantes. O projeto correspondia a politica geral de
, 3

enfraquecimento dos centros de poder econômico-Hidu~triais.~ A


utilização anti-concentracionista de disposições da organização so- 3. V. M. 3. Boneli, Partecfpuzione opraia, cit., pp. 234 ss., com referência
específica à aplicação dessa filosofia na lei sobre a participação operária no setor t
cietária interna foi acolhida em muitos textos Iegislativos da época, carbo-siderúrgico, não por acaso a primeira ae todas elas (Montan-Mitbestimmungs-
dentre os quais deve-se sem duvida mencionar as já referidas Mit- geselz, 1951). <-

bestimungsgesetze. A justificativa política dessa lei é muito mais 4. Cfr. H. Wiedenann, CeseiIschaftsrechl, cit., p. 725.
5. Nesse semtido v. W, Sasntaurg, "Akiienrecht als Organisationsrecht" in A G I
-
.
1. Cfr. H. Wiedemann, Gese~lschaftsrecht,cit. p. 725.
1965, p. 158; H. G. Kopgensteimr, "Faktischer Konzer n und Konzentration" ZGR
1973, p. 4; P. Behrens, "Rechtplitische Grundsatzfragen zu einer europaischen Re-
/"-

2. Cfr. 3.Grossfeld, Aktiengesellschaft, Unternehmenskonzentrution und Klei- gelung fur Ubernahmeangebote" in ZGR 1975, p. 449, contra B. Grossfeld, Aktien- F
naktionar, Tùbingen, Mohr, 1968, pp. 45-46, que vê na relação, feira ainda hoje, gese!lschaft, cit., pp. 50 âs. epassim. A questão, como é sabido, foi também discuti- L
entre utilização concorrencial do Direito Societárioe política militar de descarteliza- da quando da elaboração da lei acíonária aiemã de 1965, resultando ao final a afir- @
ção das potências aliadas ocupantes, uma das principais razões para a atual posição mação na exposição jusIificativa da lei da do-aptidão do Direito Societário para
negativa da doutrina com relação a atribuição de função concorrencial ao Direito resaker problemas concomciais - v. Deu~scherBuadesfag, 4. Wahiperíode, Ckrucks-
Societário. che n. iV/í71, p. 214. @
@
c
r
COMO FORMA ORGANIZA?-IVA DOS GRUPOS I75

tritamente em termoside,direitoicbncorrencialpoderia demonstrar- ço do crescimento interno", ou seja, como um meio de impedir que
se arbitrária.'j i $ o operador econômico seja organizativamente estimulado a proce-
1 der a uma política de expansão através de aquisições e eliminação
1.2 Segue: o preço da concentração e as aplicações espec$icas da concorrência, em prejuízo do crescimento interno ou então de
uma melhoria da eficiência p r o d ~ t i v a . ~
Para determinar os limites dqs "contra-medidas" societárias a O mesmo raciocínio aplica-se a disciplina da responsabilidade.
situações queper se incentivam a qoncentração, é necessário indivi- Uma sociedade à qual é atribuída responsabilidade limitada, mas
duar os pontos de contato entre pireito Societário e exigências de que não dispõe de regras suficientes para a tutela de sua autono-
ordem concorrencial. Ou, como se costuma dizer, os elementos que mia, é obviamente uma "mercadoria" barata para qualquer pretenso
definem o "preço da concentraçã~".~ O primeiro momento impor- futuro adquirente.
tante é o inicial, da concentraçãoem sentido próprio, É evidente,
entretanto, que atribuir ao sistema societário a tarefa de agir nesse Para identificar, por assim dizer, o efeito concorrencial da li-
momento em defesa da concorrên~iaimplicaria atribuir-lhe aquela mitação de responsabilidade, é necessário em primeiro lugar sepul-
função substitutiva do direito concorrencid criticada supra, que per- tar um mito. Trata-se da correspondência necessária, natural, entre
mitiria distinguir em sede societaria entre concentrações convenien- sociedade anônima e responsabilidade limitada. O argumento mais
tes e não-convenientes.* forte para tal é o histórico, ou seja, a não-coincidência histórica,
ao menos não-verificável em todas as legislações, entre a aparição
A tendência é, portanto, preferir a utilização de outras medi- das sociedades por ações e de responsabilidade limitada.'0
das, coligadas entre elas e capazes &einfiuir da mesma forma sobre
o "preço da concentração". A aquisição de uma outra sociedade, Não se trata apenas de observar que se encontram frequentes
sua incorporação ou fusão pode demonstrar-se menos ~antajosa, referências a sociedades por ações sem responsabilidade limitada,
mesmo em presença de uma regv??m-qtaçãoliberal do momento da mas sobretudo de notar que a atribuição de responsabilidade limi-
concentração, se o potencial adqudrente sabe que não poderá limi-
tar os riscos empresariais,acada uniqade empresarial individual (pelo 9. Cfr. E. J. Mestmacker, Eurupaisches WetIbeu~erbrecht,
Munchen, Beck, 1974,
p. 110; P. Behrens, "RechtpoIitischeGrundsatzfragen", cit., p. 450;H. Wiedemann,
menos não sem exceções) e que não gozará de poderes ilimitados, Gesellschuftsrecht,cit., p. 728.
tendo que respeitar os direitos dai minorias. 10. Assim reconstrói B. Grossfeld, Aktieng~sellsch~jf, cit., p. 104, do ponto-
Cada um dos t0picos acima rdferidosqerece análise especifi- de-vista alemão, os principais momentos do Direito acionário no século XIX: "Der
ca. Com relação aos poderes internbs, a neutralidade concorrencial Ausdruck 'Aktioar' taucht zum ersten Mal bei einer Versicherungsgesellschaft mit
NachscNusspflicht und Abandonierungsrecht auf, einem Gebilde also, dem man heute
do Direito Societário implica apenad afirmar que a garantia do equi- die Benenunng 'Aktiengesellschaft versagen wurde. Die Bezeichnung 'Aktie' wurde
líbrio de forças internamente à soc/dade pode servir também a re- auch fur Anteile an Kompanien gebraucht, bei denen eine unbeschránkte Haftung
gulamentação do equilíbrio de forças no mercado. Relevante, nesse bestand. Noch Von Martens hielt 1.798 die beschrankte Haftung bei Aktiengesells-
sentido, é o sistema protetivo das hinorias acionárias. Em termos chaftn zwar für ublich, nicht aber fur wesentlich. Art. 33 des franzosischen Code
de Commerce erhob die beschrankte Haftung erstmals zu einem generellen Merkmal
concorrenciais, a proteção das miqbrias pode ser entendida como der Aktiengesellshaft, Das hatte grossen Einfluss auf die Entwicklung in Europa.
um meio de igualar o "preço de aquisição" de uma empresa ao "pre- In den meisren Làndern wu:de die beschrankte Haftung der Aktionare jedoch nicht
eher als gegen Mitte des 19. Jahrhunderts ein normaler Bestandteii der Aktiengesells-
chaft, in England vvurde sie sogar erst durch die Limited Liability Act von 1,855 ai-
6 . Cfr. B. Grossfeld, Aktiengesellscha~t , cit., p. 190, que afirma: "Die Ein-

i
griffsintensitãt eines besonderen Antitrust esetzes braucht nicht so stark zu sein,
es entstehen weniger Anlasse zum Einschreit n, wenn die Konzentrationhemmenden
Krafte in der Aktiengesellschaft v011 zum Zuge kommen". O autor temia a atribui-
ção de excessivos poderes, passíveis de utilizaçêo discricionária, aos funcionários ad-
gemein zugelassen. Noch bis weit in das 19. fahrhundert hinein war aber der Gedan-
ke lebendig, dass die beschránkte Haftung nicht notwendig zum Begriff der Aktien-
gesellschaft gehort. Darauf wiesen z.B. Roesler, Renaud, und Levin Goidschmidt mit
nachdruck hin. Im Jahre 1.857 wurde auf den Nurnberger Beratungen zur Vorberei-
tung des ADHGB trotz beschrankter Haftung der Charakter der Aktiengesellschaft
ministrativos, motivo pelo qual afirma que a atuação do direito concorrenciai deve als jursitisclier Person verneint, anderseits fur die OHG trotz unbeschrankter Haf-
ser uma solução última, a ser aplicada após todas as outras possíveis (p. 189). tung die Aiinerkennung als juristische Person gefordert. Die beschrankte Haftung
7. A expressão é de U. Immenga, "Der Preis der Konzernierung", in Fests- iiat daher historisch nicht die Bedeutung, die ihr in der juristischen Diskussion oft
chrift Bohm, Tubingen, Mohr, 1975, p. 2531. beigenlessen wird. Sie ist nicht Ausdruck uralter Naturnotwendigkeit, sondern Er-
8. V. P. Behrens, "Rechtpolitische Grundsatzfragen", cit., pp. 450-451. gebnis junger, positiver Zwecksatzung".
COMO FORMA CTRGANIZATIVA DOS GRUPOS i??

tada não correspondia tapefias,& ~ ~ e c e s s i ~ a d e : ~ d i ; ~ r ~ € r & ~ . ~ w m


I
a limitação de responsabilidade não representaria qualquer privilé-
uma determinada atividade: masitambéh?à< nècessidade.$~;eírmn- gio, por ser acessível a todos, pequenos e grandes agentes econômi-
trar um meio de controlar os riscos~conômic'od~e'mBatividades per cos. l3 A afirmação da necessidade de distinção segundo o poderio
se muito arriscadas. É o,cspso,c*por;exemplo:;.idoa aimiidoresycuja econômico do sujeito não pode levar, entretanto, à atribuição de ii-
responsabilidade limitada justificava-se:em"funçãòdo risco da na- mitação de responsabilidade a uns e não a outros, mas apenas a de-
vegação marítima à é p o q e,do fato,?e que ,esses,@ pqdiqn exerci- fesa de uma aplicação diferenciada da disciplina da desconsideração.
tar qualquer poder sobre seu representante, o,capitão.do;nayio, nas
distantes colônias." , I# .> lv i i , T!. {.ia. . 1.3 Sociedade unipessoal e efeito concentracionista
Nos tempos modernos, desaparecidos tais fatores econômicos,
cumpre indagar cias justificativas para a responsabilidade limitada. Essas considerações, como ocorre frequentemente na análise
Pode-se fazê-lo com bases nos conceitos vindos da anáíise e ~ p ô m i - econômica, assumiram até aqui valor meramente analítico. E ile-
ca da responsabilidadelimitada acima analisados (v. supra, cap. 11, cessário agora verificar, com relação específica a sociedade unipes-
n. 3.3.4). A responsabilidade limitada deverão ser atribuídos efei- soal, a possibilidade de individualização de conseqüências aplicativas.
tos negativos do ponto-de-vista concorrencial, no momento em que A sociedade unipessoal traz consigo tal combinação de poder
essa não mais sirva de meio Último de proteção contra a ruína pes- absoluto e limitação de risco que já se chegou a sustentar em dou-
soal, mas sim como garantia de exercício da atividade com o máxi- trina que rigorosamente, em uma ordem econômica que pretende
mo de poder e o mínimo de risco possível (o comportamento do free ser coerente, ela não poderia ser reconhecida.14 O contra-argumento
rider). de que a mesma objeção poderia ser feita à sociedade com controle
Uma forma jurídica que facilita em muito tal tipo de compor- largamente majoritário e que então seriam necessarias presunções,
tamento e que portanto deve ser analisada com especial cuidado é também arbitrárias, para determinar onde deve ser fixado o limite,
o grupo de sociedrdes. Nde, o encadeamento de sociedades c o n ~L+>- leva a uma espécie de compromisso entre Direito Societário e regras
ponsabilidade limitada pemite a criação de uma situação de total concorrenciais. A responsabilidade limitada deve ser admitida, l5
discrepância entre poder e risco, representada pé10 fato de qúe a so- mas acompanhada de contra-medidas de carater societário e con-
ciedade de çomando (a hoidilPg)é frequentementea menor do ponto- correncial.
de-vista d8,dotação de cayjital." E É que o interessena-ut%zação Do ponto-de-vista econôznico, pode-se identificar na aquisição
estratégics%+ e nâo defensiva - da ?eSponsab'$idadêwtada . t n *>+i. $-.
é de todas as ações de uma determinada sociedade uma "fusão eco-
maior, p & e k m o já visto': km to@ do m e s .L,.L. m 8 , ~ m p ..~
a s ,>'"\
~~~o~~o~c~n- nômica" de duas estruturas empresariais. A separação jurídica ser-
tram-se dois ou mais ,interesses empre~ariaiS,;,gerid~~~~~.n~omi- ve tão-somente para formalizar a separação administrativa que se
tantemente
. . , . , ' ,e $ 1 ' ' . - ,-;,.:f.(j"k. <;>c'' -3: * pretende introduzir (ao menos essa é a presunção do ordenamento
u m a t a l consirução tem @versos efeitos: a p q q e q 4 ,q @&ti-
ficação do problema concomcial, não no ato d e o n c e n t r a ~ o n i a s 13. B. Grossfeld afirma com lógica que a extensão de um determinado privile-
na relação existente entre garantias organizati'itas da "separação de gio a todos os sujeitos de direito não é por si só suficiente quando a situaçâo fática
esferas e responsabilidade limitada. É nesse momenfo'que devem -
impede sua utilização generalizada Aktiengeselischaft, cit., p. 1 1 1.
14. Cfr. O. Kuhn, Strohrnanngründung, cit., p. 49.
agir as contra-medidas. Trata-se de tentar, Òbter o melhor binofnio 15. Cfr. H. Wiedemann, Gesehchaftsrecht, cit., p. 727 que, comentando as
(a) controle preventivo da assunção de riscos 4 (b) sanções contra razões de atribuição de responsabilidade limitada a despeito das restrisões de nature-
.
. . , .-*'
a utilização abusiva da respansabilidade $limitada. c a .-h
z
za concorrencial existentes, afirma, cam referência especifii à pequena e média em-
ri' r
presa: "Die Fordemngen der wettbewerbsrechtlichen SchuIe konnten sich insoweit
Um segundo efeito é a possibilidadé d e distinção exítre 0%efei- nicht durchsetzen. Die genereiie Haftungsãeschrankung ist rechtethisch gerechtfer-
tos da limitação de responsabilidade de acordo com aiposição eco- tigt, wenn eine korrekte Eigenkapitaiausstattung vorliegt. Sie ist wirtschaftspolitisch
nomica do agente, ou seja, a negação do postulado segundo o qud gerechtfertigt, um mittelstandischen Unternehmen die Teilnahme am Markt zu er-
halten. Sie dient schliessiich dazu, notleidende Gesellschaften sanieren und den Zu-
sammenbruch eines Unternehmens im Unternehmensverbund lokaliesieren zu kon-
nen. Auch aus der Sícht der Wettbewerbsordnung kann die Haftungsbeschrankung
mithin nicht ais per se schadlich angesehen werden".
182 A SOCIEDADE UNIPESSOAL COMO FORMA ORGANIZATIVA DO$ GRUPOS 183

A avaliação econômico-jurídica do "preço da concentração" entrou em vigor apenas três~dias~ap6stqtpr,o.rop1ga@~ da leiiacioná-


requer uma análise mais ampla, não apenas da lei de 1976, mas tam- ria. No entanto, referido texto tem urn~ajcance~muito mais restrito
bém da legislação bolsística que a acompanhou. Também aqui será do que em uma primeira análise 6 , ,
pode,parecer.,
*.", " , r8
. ,
" 8

necessário renunciar ao aprofundamento maior que o tema merece- Nele, são previstos dois tipos 'de alienação de controle. Na pri-
ria com relação a diversos institu'tos do Direito Societario brasilei- meira, alienação em sentido estrito, existe m a negociação previa
ro, o que vai além dos objetivos( do presente trabalho. com o controlador ou grupo de coqrole, 3 qual o regulamento im-
Portanto, a análise será limitada aos três critérios supra indivi- põe que se siga a oferta de compra das ações de todos os minoritá-
duados (momento inicial, regulamento interno de poderes e limita- rios, nas mesmas condições e sem limitaçlo de quantidade (nn. 1
ção de responsabilidade) e tambéb será feita apenas na medida ne- e X, a). O segundo tipo de alienação é a oferta pública de aquisição
cessária a possibilitar o estudo da sociedade unipessoal de grupo, de ações, o take over do Direito norte-americano (ern uma versão
motivo pelo qual estudar-se-ão aqenas as fattispeci que possam in- regulamentada). Nesse Ultimo caso, não existe qudquer negociação
previa entre aiienante e adquirente do controle. O primeiro faz pu-
fiuenciar a decisão de recorrer a cpncentração totaIitária das ações.
blicamente a todos os acionistas, inclusive ao controlador, uma oferta
I de aquisição de ações até um certo limite necessário para a obtea-
1.4.1 O momento inicial ção do controle (nn. X, b, e XI).
O ordenamento brasileiro pope parecer, a primeira vista, res- Com relação aos requisitos objetivos para a configuração da
tritivo e rigoroso com relação a a uisição de controle. Com efeito, transferência de controle, o campo de aplicação da resolução é muito
enquanto na Europa discute-se ajnda a respeito da viabilidade de amplo. Em primeiro lugar, pela definição extensiva de controle que
contém. Com efeito, considera-se acionista controfador também o
uma diretiva que preveja tratamebto igualitário para os minoritá- acionista minoritário que teve maioria absoluta nas ultimas três As-
rios quando da aquisição de con role,24no Brasil tal regra existe
9
desde 2976. Trata-se da res. n. 4011 de 22 de dezembro de 1976, que
sembléias, em função da ausência dos outros acionistm (v IV). A
Comissão de Valores Mobiliários aplica também as regras sobre a
I aquisição de controle aos casos de controle indireto. Assim, aplica-
se a resolução no caso de duas sociedades controladas por uma ter-
ceira, que transferem ao adquirente suas participações em uma ou-
tra sociedade, participações que individualmeate consideradas não
seriam suficientes para caracterizar o contrale. O mesmo ocorre
quando se transfere o controle de'úma holding, sociedade não-cotada
VII, São Paulo, Saraiva, 1990,sub art. 171, p. 47.
24. Faz-se referência I? Proposta Mofificada de XIIi Diretiva em matéria de
em bolsa, que no entanto detém o controle de uma sociedade cota-
da. Em tal caso, fala-se em desconsideração da personalidade jurí-
a
Direito Societário relativa Bs ofertas públic s de aquisição de controle in C. U.C.E.
26 setembro de 1990, C.240, p. 7 ss., paraia proposta original v. C.U.C.E. 14 de
março de 1989, C.64, pp. 8 ss. Para os projetos iniciais e para a história precedente
dica da sociedade holding e aplica-se a discipiina da aquisição de
~ontrole.~s ' .'/I/

da proposta de diretiva v. R. R. Penington,[ "Relazione sufle offerte publiche di ac-


quisto di titoli a fini di controlo e sulle altrt bfferte pubbliche" in Riiiista dcl:e socie- Exceção é feita apenas no caso de aquisição realmente originária,
fà 1975, pp. 730 ss.; R. Weigmann, "0fferde publiched'acquisto (OPA)", in Enci ou seja, no caso em que não existe quaiquer bloco de controle de
clopedia Giuridica Treccani, vol. XXI, ~ o d a 1990, , p. 6 , com outras refcifnciss bi- início e o adquirente, partindo de uma posição minoriGria, consiga
bliogrhficas; na iitelatura alemã v. M. Pdtzer, "Ubern&hmeangeboie nach kunfei- obter o controle atro-vésde uma escdada na E isso por um
gen Europa-Recht und dessen Urnsetzung in deutsches Recht", in ZGR Sonderheft
9, 1990, pp. I79 ss. Apesar de a maioria dos países europeus contar com recentes niotivo muito simples: a regulamentação brasileira da aquisição do
leis sobre a oferta publica de aquisição de controle (Espanha - Real Decreto controle não visa a proteção do controle como um bem patrimonial
11.97/1991, de 26.7.91; Portugal - Código das Sociedades Comerciais - dec-lei do sócio majoritário, mas apenas à tuteia da igualdade de tratamento
11. 262186, de 2.9.86; Itdlia - lei n. 149, de 18.2.92), a aprovação da diretiva parece dos minoritários (v. art. 254, lei n. 6.404). Desse modo, naqueles
pouco provável, sobrçtudo em função das resistências alemãs ao projeto - v. para
um amplo quadro comparatístico, por últimp R. Weigmann, "Le offertepubbliche
d'acquisto" in Tratallo delle società per azioni, vol. 10, Tomo 11, Torino, UTET, 25. Cfr. L. L. Cantidiano, "Alienação eaquisição de controle" in RDM59í57.
1993, pp. 345 ss, 26. V. L. L. Cantidiano, "Alienação e aquisição de controle", loc. ult. cit.
186 A SOCIEDAD~UNIPESSOAL COMO FORMA ORGANIZATIVA DOS GRUPOS 187

1.4.2 A distribuição de pod suds'decisões não precisa sequer superar os obstáculos, ainda que
meramerite formais e procedimentais, consistentes em divisões de
O segundo elemento definid r do ','preço da conce competência com a administração) não é acompanhada por uma pro-
a distribuição de poderes teção efetiva das minorias. Não é ainda o momento de analisar mais
Os reais efeitos dos dispositivos societários só se tornam com- detalhadamente as regras de proteção! isso será feito nos nn. 2 e 3
preensíveis com conhecimento da]realidade da situação societária deste capitulo, com referência especial às regras de proteção dos mi-
no Brasil. Trata-se de uma realidaile de grande concentração. Para noritários da holding, as que verdadeiramente relevam para a socie-
demonstrá-lo, basta observar o resuitado de pesquisa reaíizada em dade unipessoal de grupo.
1985 pela Superintendência de Estpdos e Projetos da Comissão de
Valores Mobiliários entre 476 socldades anônimas brasileiras (re- 1.4.3 O regulamento da responsabilidade
presentando à época cerca de 90%l do patrimônio liquido total das
sociedades anônimas cotadas em bQlsa). Descobriu-se que o percen- Em presença de tal concentração de poderes, seria de se esperar
tuai médio de controle era de 69,8610 do capital com direito a voto. alguma regra especiaI de responsabilidade. A atribuição, tanto fáti-
Em 18,4% das sociedades, o contr4le chegava até mesmo a percen- ca quanto jurídica, de poder ao sócio controlador põe em discussão
tuais entre 90 e 100% do capital sua própria responsabilidade limitada. Admitindo-se o raciocínio no-
O sistema de repartição de poderes levou em conta tal realida- vecentesco, que permitiu a atribuição de responsabilidade limitada
de. Não tentou criar uma contra-tdndência, mas sim regulamentar as grandes sociedades anônimas, segundo o qual a responsabilidade
a realidade existente. Pode-se, com efeito, criticar o legislador bra- limitada dos acionistasjustificava-se pela sua não-participaçãona ad-
sileiro pela falta de idealismo mas não pela ausência de realismo. ministração e a irresponsabilidade dos administradores justificava-
O sistema foi elaborado em torno da figura do acionista controla- se pelo fato de não agirem em interesse prbprio mas sím no interesse
dor, verdadeiro centro decisório da ,sociedade.34Pode-se individuar dos acionista^,^^ o sócio controlador deveria ser "duplamente" ili-
a consagração de seu poder sobretu40 na criação de um órgão qua- mitadamente responsável, como acionista e administrador.
lificável como intermediário entre bs administradores e a Assem- A lei acionária não segue, no entanto, esse raciocínio. O acio-
bléia Geral. Trata-se do Conselho dk Administração, composto ex- nista controlador não é pessoalmente responsável, como tal ou co-
cfusivmente por acionistas, ao quai foram atribuídas algumas das mo membro do Conselho de Administração. É verdade que é pre-
principais decisões sociais, dentre d quais aifixação da orientação vista a responsabilidadedo controlador por "abuso de poder" (art .
geral dos negócios sociais (art. 142, (inc. I) e a qomeação, destitui- 117). Trata-se, entretanto, de uma norma de responsabilidade in-
ção e fixação das atribuições dos qdministradores (art: 142, inc. terna e não de uma regra d e responsabilidade externa corpo ri^,^^
111),35 I Uma interpretação ampliativa da norma, que procure atribuir aos
Essa concentração de poderes nas mãos dos acionistas (e, con- credores legitimidade para a propositura da demanda ressarcitória
seqüentemente, nas do acionista coqtroIador, que para fazer valer no interesse da sociedade, não encontra fundamento no direito po-
sitivo, Tratar-se-ia, no caso, de hipótese de 1egitimaçSa extraordi-
nária, que requereria previsão legal expressa (CPC, art. 60). Essa
33. Cfr. N. Eirik, "O mito do "controle gerencial" - Alguns dados empiri- previsão não existe. Ao contrário, o art. 246, !j 10, da Lei das Socie-
cos", in RDM 66/104. 1
34. Cfr. F. K. Comparato, "A reforma 4a empresa" in RDM 50168, que con- dades Anônimas, ao prever a s pessoas legitimadas para a demanda,
sidera esse reconhecimento "um dos grandes méritos da reforma do direito acioná- refere-se apenas aos aci0nistas.3~
rio no Brasil em 1976", sobretudo porque pedmitiu a identificação do empresário. A justificação do legislador para a não-existência de qualquer
35. Esse órgão de intermediação entre Assemblkia e administração existe tam-
bém na lei alemã. Trata-se do Aufsichfsrat que,nas grandes empresas (mais de 2.000 regra particular de responsabilidade externa corporis nos grupos (tan-
dependentes) 6 composto, e aqui está a diferenka mais relevante, por representantes
dos empregados e dos sócios, com participaçãd quase paritária. Se diz quase paritk- 36. Cfr. B. Grossfeld, Akiiengesellschaff, cit., pp. 109 ss.
ria porque apesar de a representação ser numedicamente igual, o presidente do colé- 37. Cfr. F. K. Comparato, O poder d e controle, cit., p. 308.
gio, ao qual é atribuído voto duplo em caso de dmpate é um representante dos sócios 38. Um dos grandes problemas da lei adonária de 76 é, como já ressaltado,
(5 29, 2 Mitbesfimmungsgesefz, 1976). exatamente a diferença entre a definição do titular(es) do interesse social e dos legiti-
188 A SOCIEDADE UNIPESSOAL COMO FORMA ORGANIZATIVA DOS GRUPOS 189

to de fato como de direito) é a pretensa constatação de que os cre- o crescimento*interno. Enquanto nesse último caso o crescimento
dores, em regra, seriam capazes de proteger-se sozinhos, através da empresarial é acompanhado pelo controle (ainda que de eficiência
exigência de garantias reais ou pessoais da sociedade (v. supra,,cap. relativa) dos minoritários, no caso da subsidiária integral é possível
11, 3.3.4, d). Exceções são feitas "apenas" para as dividas traba- esquivar-se a esse controle.
lhistas (art. 20, CLT) e, mais recentemente, para as dívidas perante Trata-se, conseqüentemente, de solução criadora de distorções
os consumidores (art. 28, Código de Defesa do Consumidor), Trata- do ponto-de-vista econbmico, jB que estimula a concentração de ri-
se de uma identificação, ainda excessivamente restrita, dos grupos queza (expansão externa) em detrimento dos investimentos produ-
de credores incapazes de negociar com a sociedade, contra os quais tivos (expansão interna). Evidentemente, tal situação jurídico-
não vale portanto a presunção "posneriana" da assunção de riscos. econômica gera perplexidadrs do ponto-de-vista constitucional.
1.5 A subsidiária integral 1.6 O problema constitucionai
A análise da sociedade unipessoal de grupo no Brasil, sobretu- Analisando-se a evolução constitucional brasileira, pode-se iden-
do quando feita em prrspectiva comparatistica, leva a concllusôes tificar também uma tendência "liberalizante" com relação as con-
claras: em primeiro lugar, a sociedade unipessoal na Lei das Socie- centrações. Essa tendênria é verificável na diferença entre a forrnu-
dades por Ações é apenas uma fattispecie e não uma disciplina. lação do principio da liberdade de concorrência da Constituição de
Com efeito, no titulo "subsidiária integral", existem apenas 1967 e nas demais que a seguiram (Emenda de 1969 e Constituição
três artigos: um, prevendo sua existência e constituição (art. 251); de 1988) e a mesma formulação na Constituição de 1946. Essa últi-
outro, sua constituição através de incorporação de ações (art. 252) ma, ao exemplificar os casos de abuso de poder econômico, fazia
e o último prevendo os direitos dos antigos acionistas d a socie- referência especifica à concentração ernpre~arial.~" Constituição
dade incorporada caso essa resolva admitir novos acionistas (art. de 1967 e as que a seguiram não contêm tal referência.@
253). Não existe qualquer regra de responsabilidade nem tampou- Se não é possível deduzir aesse rato um posicionamento favo-
co de organização ou publicidade especifica para a sociedade uni- rável à concentragiio, pode-se concluir pela inexistencia de qualquer
pessoal.
O resultado é a criação de distorsôes econômico-concorrenciais. 39. Dispunha o ars. 148 da Constrtuição de 1946: "A lei reprimirá toda e qual-
Em aus[ia&i de qualquer regra especifica para asociedade unipes- quer forma deabuso do poder tconômko, inclusiveas uniões ouagnipamentos de em-
presas individuaisousoaais, seja qual f m a sua natureza, que tenham por fim dominar
soa1 e i#ficando-se, conseqüentemente, as-iegras gerais do,Direito os mercadosnacionajs, &minar acorcou8ncíaeaumentar arbitrariamenteos lucros".
Societário (com os efeitos já analisadbs nositens'anteriorks); dirni- 40. O art. 157, VI da Constituic;áode 67, reproduzido no art. 160,IV incluía
nui significativamente o "preço da concentração". A situação, da entre os principias da ordem econômicõ a "repressão ao abuso do poder econômico,
maneira como prevista legislativamente, leva à diminuição do pre- caracterizadop& dmninio dos mercados, a eliminação da concorrência e o aumen-
to arbitrário dos lucrosy'.
ço relativo do crescimento externo com relação ao crescimento in- A Constituii;áode88 retirou-o dos principias da ordem econômica, substituindo-o
terno. A expansão empresarial atravb de aquisfçãci<oumesmo cria- pelo objetivo g&co de garantia dalívre concorrência fart. 170, IV). O postulado
ção de subsidiária integral mostra-se muito mais conveniente que vem, no entaxSo,repef;do em outro p m o , de forma um pouco alterada: "a lei repri-
mir&o abuso do poder econômico que vise à domiaação dos mercados, a eliminação
, ' da concorrência e ao aumento arbitrário dos lucros". De um ponto-de-vista estrita-
mados ativos para demandar societáiias, Esse problema é particularmente evidente mente literal dessa úkba formulação poder-se-ia deduzir quea nova Constituição é
na sociedade unipessoal e será analisado em detalhe no item 2 desse capítulo. Quan- ainda mais iibib-r&com relaçâo & concentra$ões,
i na medida em que o ''abuso do po-
to a questão ora em análise, ocorre o mesmo: o art. i 16, p d g r a f o iil'unicodefine co- der econômico", de f&nnulasn&rica, reassuntivade qualquer das três outras carac-
mo titulares do interesse social (entendido nesse caso, evidentemente, como interesse terísticas -n2 Constituiçãoanterior em já entendimentodomimte que se caraderi-
a manutenção da empresa) os acionis'tas,os empregados e os investidores de merca- zava o abuso pela presença de qualquer dos outros três elementos(v, F. K. Compara-
do. No entanto, em face da norma do art. 246 a doutrina tende a negar a possibilida- to, Opoder decontmk, rit ,,p. 382) -tarnou-se requisito a maisao qual deve somar-
de de atribuição de legitimidade ativa para a demanda a investidores e empregados se a presença de um dos outros três elementos. Trata-se, no entanto, de interpretação
- v. F. K. Comparato, Opcderde controle, cit., p. 301; v., contra, E. L. Teixeira- meramente literal, que 60se coadu~aríicom os princípios estawecidos no art. 170.
J. A. T. Guerreiro, Das sockdades anônimus, cit., p. 301. Finalmente, atribuição O pr6prio legislador oedin&riotratou atihde afastar tai interpretação, deixando dar0
de legitimadade aos credores fica completamente descartada já que o art. 116 não na nova lei sobrea coccwrência (lei n. 8,884, de 13.6.94) que b w a presença de qual-
faz sequer menção a eles ao definir os titulares do interesse social. quer dos três dementos para a caractsização do ilícito (art 20, caput e incisos).
COMO FORMA ORGANIZATIVA DOS GRUPOS 191
190 A SOCIEDASE UNIPESSOAL

proibição per s&no,brd.kname$$o brasileiro com' relação à forma- Qualidade de Unternehnzen para esses fins possuem todas aquelas
ção de g r u p o s : - ~ s ~ è ~ e n & & e nPcOn'firmado
!to pela lei n, 8.158, pessoas, físicas ou jurídicas, que perseguem algum interesse empre-
de 8 de janeiro de 199l?;s"form/tIão de conglomerados s6 é consi- sarial fora da sociedade. É o caso não apenas das sociedades que
derada ilegal quando vise a "inibir a livre concorrência" (art. 20, controlam outras sociedades, mas também das pessoas físicas que
alínea 8. i sejam igualmente empresários individuais ou participem em manei-
ra significativa de outras sociedades. Basta a concentração de mais
Evidentemente, em presen4 de tal nomativa concorrencial a de um interesse empresarial na mesma pessoa, de modo a fazer te-
nfvel constitucional'e ordinário; não é possível imputar ao Direito mer a utilização de um no interesse do outro, para caracterizar a
Societário qualquer agressão 21 (onstituição ou incompatibilidade fattispecie g r ~ p a l . ~ ~
com lei superveniente. É possível jfazê-10, no entanto, com base nos
dispositivos protetivos da pequena empresa expressos na O problema que obviamente surge devido a essa caracterização
Constituição. mais ampla da fattispecie grupai é o da diferenciação entre formas
concentrativas e pequena empresa. Evidentemente, na medida em
Na verdade, para considerai inconstitucional o privilégio de que se abre mão da forma societáría, buscando uma real pluralida-
constituição de uma sociedade upipessoai atribuído apenas hs so- de de interesses, o sistema criado é muito menos apto a distinguir
ciedades e não ao empresário inqividuai (art. 251, LSA), bastaria entre grandes e pequenas formas empresariais. Estender a discipli-
invocar o princípio da igualdade (le tratamento, presente em todas na também as pessoas físicas pode impedir a distinção entre disci-
as Constituições (art. 5, caput, Cionstituição de 1988). plina das grandes e das pequenas empresas. Mesmo sendo isso ver-
Mas com a Constituição de 1 b88 a inconstitucionaiidade é ain- dade, não se pode pretender a defesa a todo custo do interesse da
da mais flagrante. Isso porque neIa se preve, entre os princípios ge- pequena e média empresa. Nos casos em que o empresário cria uma
rais da ordem econômica, o "trataknento favorecido para as empre- estrutura empresarial mais arriscada, o tratamento deve ser mais rí-
sas de capital nacional de pequend porte" (art. 170, inc. IX). O fa- gido. Nesse caso, a disciplina da responsabilidade, muito mais do
to de incluir o tratamento favoreoil;e;:,;; os princípios gerais da que possuir caráter sancionatório, deve constituir um elemento or-
ordem econômica, devendo conse4uentemente guiar toda a legisla- ganizativo de prevenção de formas concentracionistas negativamente
ção que em qualquer modo possa influir na ordem econômica, faci- avaliadas43e, como tal, um instrumento jurídico que pemita in-
lita sua aplicação ao Direito Socidtário. A tendencial coincidência fluenciar a conformação econômica dos grupos.
entre estruturas empresariais de peiueno porte e empresa individual
já é mais que suficiente para caracyrizar a-infração constitucional.
<z *' +
3. O particularisrno da sociedade unipessoal de grupo e a
disciplina apliciível: anáiise comparatística
2. O conceito de grupo: escopo o4onômlco e forma jurídica
Se das experiências recentes fosse necessário deduzir uma ten-
Antes de passar à análise da disciplina específica dos grupos, i dência atual com relação a sociedade unipessoal, dever-se-ia segu-
é necessário esclarecer a qual fattiskecie se está fazendo referência. I ramente mencionar a tendência a distinguir entre disciplina da so-
ciedade unipessoal de grupo e não-de-grupo. Essa distinção visa a
No Brasil, o conceito de empresas refere-se apenas aos impor uma disciplina mais rigorosa à sociedade unipessoal de gru-
grupos de sociedade^.^' ao contrário, o conceito de
Konzern é mais amplo. de 65 refere-se sempre a em-
presas e n8,o a sociedades quando data de definir a relação de gru- 42. Essa opinião é dominante na jurisprudência desde a decisão do caso Ve-
ba/Gelsemberg peIo BGHem 13.10.77 (in BGHZ 69, p. 334 (337), em que se discu-
po. Na doutrina e na jurisprudêncfp, já é pacífica a possibilidade tia a caracterizaçáodo Estado como Unternehmeri.Apesar de não tratar princi'ali-
de caracterização de pessoas físicas como konzernierte Unternehmen. ter desse assunto, a corte afimou em obiter dictum a possibilidade de existência de
grupo (Konzern) com base na existência de dois interesses empresariais na mesma
I
41. Os capitulas XX, XXI e XXII da lei societária brasileira, que tratam dos
pessoa, abrindo caminho para a opinião fixada nas decisões sucessivas - v. V.
grupos de fato e de direito fazem referência apenas As sociedades - v. nesse sentido Emmerich-J. Sonnenscheín, Konzetnrecht, cit., p. 46, nota, com ampla citação da
também F. K. Comparato, "Os grupos societários na nova Lei das Sociedades por jurisprudência.
Ações", in RDM 23/93. 43. Cfr. P. Homnielhof, "Konzernpraxis nach Video" in DB 1992, p. 312.
192 A SOCIEDADE UNIPESSOAL '
..
'
'''
'i ' COMO FORMA ORGANIZATWA DOS GRUPOS 193

po, aproximando-a tanto quanto pOssiv~l'~a"disci~lin~ldos~rupos rakiocínio estão duas outras características, manifestas na doutri-
de direito. Neste parágrafo, tais tendênciaskãò 'anàlisadas e'britica- na: em primeiro lugar, a ilogicidade da cumulação da regra da res-
das. Inicia-se pela análise das relações entre'disciplina geral lios gru- ponsabilidade ilimitada com a disciplina do conflito de interesse^,^^
pos e disciplina da sociedade unípessoal em alguns ordenamentos em segundo a recusa em admitir que os credores sejam destinatá-
estrangeiros, análise essa que trark relevantes subsídios para o estu- rios das normas que regulam o conflito de interesse^.^^
do que se fará a seguir do ordenamento brasileiro. Ambas as idéias derivam da concepção italiana de interesse so-
, . " E ' - - r

cial. Como já visto no capítulo I, na verdade o que ocorre é uma re-


3.1 A sociedade unipessoal como paradigma para a dução do interesse da sociedade ao interesse do sócio, em linha com
regula~entaçãodas relaçõa de grupo: o sistema italiano a concepção contratualista de sociedade. O esvaziamento do conteú-
O direito italiano tem uma característica relativamente aos gru- do real desse interesse leva a sua definição em termos meramente pa-
pos de sociedades que o diferencia profundamente do sistema bra- trimoniais. O passo lógico sucessivo é considerar suficiente reduzir a
sileiro: a inexistência de uma disciplina específica dos grupos, tanto proteção da sociedade unipessoal a uma proteção patrimonial, ou,
contratuais quanto de fato. Esse posicionamento do Direito positi- transportando a crítica de D'Alessandro para a sociedade unipessoal,
vo é acompanhado por uma tendência, doutrinária e jurispruden- o recuo da linha de tutela da sociedade unipessoal do plano real ao
cial, de não considerar os problemas de tutela dos credores de uma plano ~ b r i g a t ó r i oA
. ~ligação
~ entre a primeira e a segunda afirma-
sociedade de grupo como "qualitativamente diversi (..,) rispetto ai ção, ou seja, a passagem de uni conceito vazio de interesse social a um
problemi di tutela dei creditori de una società a t o m ~ " . ~ sistema teoricamente coerente de proteção patrimonial da sociedade,
Real peculiaridade é reconhecida apenas à sociedade unipessoal. faz-se exatamente através da noção de conflito de interesse.
Mesmo nesse caso, e confirmando a regra acima, sempre houve re- É possível notá-lo claramente em duas das principais opiniões
lutância em fazer qualquer distinção entre sociedade de grupo e não- existentes sobre o tema. Como já visto <Y.cap. I, n. 4.2), enquanto
de-grupo. Só recentemente, por ocasião da atuação da XII Diretiva Jaeger procura não definir o interesse social, Gambino o define e
Comunitária, tal diferença foi introduzida limitadamente à SRC (so- o faz coincidir com o objetivo de lucro dos sócios.
ciedade por quotas).45 Em conseqüência, na primeira elaboração (de Jaeger), o con-
A característica principal do particularismo da sociedade uni- flito de interesse torna-se não-tipificável, individualizávelapenas em
pessoal no,&stema italiano'é a transformação do "agir em conflito presença de uma incompatibilidade absoluta, objetivamente reco-
de interessT'a, de um fato punível em um direito. O direito de agir nhecível, entre a posição e o interesse do sócio e o interesse do gru-
em conflito de interesses é a caracterislica'principal'da'sòciedade uni- po (de sócios). Com o requisito da incompatibilidade absoluta, que
pessoal na Itália, O fundamento está no art. 2.362 do Código Civil, pressupõe "una situazione oggetiva tale da rilevare in maniera tipi-
o qual, prevendo a responsabilidade limitada do sócio unico, servi- ca la possibilità di un conflitto tra socio e s ~ c i e t à " ,procura-se
~~ evi-
ria de substituto a disciplina do conflito de intere~ses.~~A base desse tar a livre avaliação do conflito de interesses, que permitiria um ree-

44. Cfr. descrevendo o esta& da doutrina itaiiana G . Scognamiglio, "La res- . tivo della responsabilith patrimmiai illimitata) va soggetto, se di tal si arroga di fat-
ponsabilith della società capogruppo: problemi e orientamenti" in I1 gmppo d'im- to I'esercizio, non alla illimitata responsabilità patrimoniale, ma alle norme sanzio-
prese nella realfàgiuridica italiana, Atti de1 Convegno di Verona (6-7 novembre 1987), natorie dell'abuso commesso".
Padova, Cedam, p. 51. 47. Cfr. P. G . Jaeger, L'intcrrse sociale, cit., p. 184, nota 10; S. Scotti-Camuzzi,
45. O legklador italiano limitou-se a modificar os artigos relativos à sociedade "L'unico azionista", cit., p. 786, nota 24.
por quotas, deixando intocado o a&. 2.362, que prevê II responsabilidade iiiitada 48. Cfr. A. Mignoli, "Interesse di gruppo e società a sovranità limitata", in
em caso de falência da sociedade unipessoal por ações. O art. 7, 1 do Decreto legisla- Contratto e impresa 1986, p. 720 (741); P. Spada, "L'amministrazione della società
tivo 88, que modifica o $20 do art. 2.497 C.C., adotou a noção "ampliada" degru- per azioni tra interesse sociaie ed interesse di gruppo", in Rivista di Diritto Civile
po, impondo, entre outras hipóteses, a responsabilidadeilimitada caso o sócio Único 1989,1, p. 233 (239); P. G. Jaege~,L'interesse sociiile, cit., p. 143; S. Scotti-Camuzzi,
seja pessoa juridica ou sácio único de outra sociedade de capital. "L'unico azionista", cit., p. 7%.
46. V. S. Scotti-Cmuzzi, "Unico azionista", cit., p. 783, nota 10, queafirma:
"l'unico azionista non è chi 'gestisce da solo' I'impresa societaria nel suo esdusiva 49. Cfr. F. D'Alessandro, "11 diritto delle società da "i barteiii de1 Reno" alle
"navi vichinge", in Foro ituiia~io,1988, V , c. 5-.
personaie interesse, ma cki ha diritto dí farlo, mentre, per converso, chi non ha questci
diritto (e cioè, non 6 unico azionisb, per i1 quate ia Iegge stabilisce i1 regime alterna- 50. Cfr. P. G. Jaeger, L'kleresse sociale, c%, p. 211.
194 A SOCIEDA@EUNIPESSOAL COMO FORMA ORGANIZATIYA IX,S GilUPOS 195

xame judicid do mérito da deliberação societária. O requisito do da- do conflito de interesses, já que no grupo "la situazione sospetta
no potencial é, entretanto, neceqsário e totalmente coerente com os di conflittualita coinvolge non già un socio qualsiasi i1 cui voto sia
pressupostos contratualistas dos ,quaisse partiu. Com efeito, reduzi- virtualmente marginale, ma i1 socio i1 cui voto è necessariamente mar-
do como está o interesse social, uma situação de claro conflito, se não ginale, in quanto manifestazione di un conlrollo p r e c o s t i t u i t ~ ~ ' , ~ ~
for potencialmente danosa, não pode ser negativamente avaliada.
Essa tendência, manifesta em lei para a sociedade unipessoal,
Na segunda elaboração (a qe Gambino), ao contrário, define- tem-se expandido na doutrina também para os grupos formados por
se o interesse social (ainda que em forma muito restritiva), tornan- sociedades pluripessoais.
do flexível o outro elemento da "equação", o interesse do sócio,
!
que é analisado separadamente em cada deliberação particular.s1 Defende-se a não-aplicação generaliza& da regra do conflito
Assim, procuram-se evitar os indonvenientes das concepções extre- de interesses aos grupos, com sujeição da sociedade controlada a
mas do conflito de interesses: a aoncepção típica que, com relação um interesse de grupo, determinado pela hcrlding, desde que essa
ao ordenamento alemão, peca p,ela falta e pelo excesso - de um compense os danos causados.55Trata-se de tendência amplamente
lado, não permite prever todas rjs hipóteses de conflito (exigindo, reconhecida no recente Progetto di Statuto dell'lmpresa da Comis-
portanto, 0 recurso a analogia, frequentemente de duvidosa efícá- são Ferri, que, tratando dos grupos não-contratuais, prevê no art.
cia); de outro, inclui casos não ycessariamente de conflito (como 20: "La società controllante può richiedere alla societa controllata
os contratos entre sócio e sociedqde), diminuindo a capacidade ne- i1 compimento o l'omissione di operazione nell'interesse proprio o
gocial da sociedade - e a concepqão totalmente atípica, que perrni- di altre societa da esse controllate, a condiziani che siano eliminati
te uma intromissão judicial excesj;iva nos negócios sociais, com re- gli oneri e le conseguenze dannose che dall'operazione derivano alla
visão do mérito das decisões sociais.S2 societa c ~ n t r o l l a t a " ,A
~ ~jurisprudência tem sido ainda mais per-
Com essa análise por assim dizer casuistica do interesse do só- missiva, admitindo em alguns casos até mesmo atuação em coilflito
de interesse sem obrigação de c o m p e n ~ a r . ~ ~
cio, ainda que baseada em critérios procura-se tutelar a "le-
galidade do procedimento indúbio que esse tipo de Tais tendências doutrinárias são qualificadas como institucio-
controle é o mais apto ao e a não obstruir uma nalismo grupal. Isso porque o que se faz é, na verdade, substituir
atividade procedimentai é a atividade social. o institucionaIismo societário tão combatido, por um outro institu-
Na sociedade unipessoal, entjetanto, não existindo o grupo de cionalisino, de grupo.S8Mas, em um sistema que, como o italiano,
sócios, não se diferencia o interesse social do interesse do sócio. O i 54. V . P. Spada, "L1amministrazione", cit., p. 239.
't
regulamento da responsabilidade t rna-se o elemento centrd da dis-
ciplina. O art. 2.362 do Cddigo Ci ii é, com efeito, até mesmo pela
ausência de uma disciplina dos gdpos, sua regra central no Direito
55. Cfr. P. Spada, "L'amministrazione", cit., p. 240; A. Mignoli, "Interesse
di gruppo", cit., pp. 739-740, esse último pondo em dúvida a obrigatoriedade da
compensação.
italiano. Com relação à estrutu* interna, inexistente a regra, 56. "Lo statuto dell'impresa" in Giurisprudenzu co~vmerciale,1984, I, p. 150.
argumenta-se com a reaíidade fátic . Com efeito, diz-se que nos gru- 57. Cass. 14.9.76, n. 3.150 in Rivisfa d~Díritto Commerciule, 1978, p. 220,
pos as transferências patrimoniaislentre sociedades, diretas e indi- considerando adrnissível o pagamento de um dbbito de uma sociedade coligada "tutte
retas, são a regra e não a exceção., Tais transferências seriam nor- le volte che l'atto 4 preordinato aila rcalizzazione di un interesse di gruppo". Digna
de nota é também a decisão citada por A. Mignoli, "Interesse di gruppo", cit.,
mais e justificáveis, pois visariam ao interesse do grupo. Defende- p. 739 que admite expressamente a atuação contra o interesse da sociedade e no
se, portanto, a não-sujeição do sóqio (sociedade do grupo) a regra interesse do grupo sem compensação (Cass. 25.2.59). Essas decisões, como ressalta
F. Galgano, se contrapõem a outras decisões da Cassação que, fora dos grupos
51. V. A. Gambino, Ilprincipio di cprrettem, cit., p. 387. de sociedades, consideram "viziata da conflitto di interessi la delibeiazione che au-
Lorizza la fideiussioni della societa per debiti de1 socio" (Cass. 20.6.58, n. 2.148,
52. Na realidade tamb6m a concessão t40rizada do interesse social poderia levar, in Giul~sprudenzattaliana, 1958, I, 1, c. 204; Cass. 25.10.58, n. 3.471, ivi, 1958,
do ponto de vista Idgico, a umaexcessiva intromissão nos negócios sociais: a tutela rigorosa I, 1, c. 869) - 'Qual è l'oggeto delia societa holding", in Contratto e impresa,
de um interesse social teorizado e rígido exigiria não apenas um controle negativo, mas 1986, 2, p. 334.
também um controle positivo, ou seja, não apenas das decisões tomadas como também
58. Cfr. F. D'Alessandro, "I1 diritto delle società", cit., c. 48, que afirma: "vero
daquelas não tomadas, o que obviamente implicaria uma intromissão judiciai desme-
-
dida na vida social v. A, Gambino, Ilprinçipio dicorretteau, cit., pp. 419 ss. è che dietro questa tendenza, como dietro tutte quelle che voltano )e spalle all'inte-
resse comune dei soci come alfa ed omega dell'istituto societaio, si nasconde un dogma
53. V. A. Gambino, I/ principio di correttezza, cit., p. 422. noto e vecchio: I'istitucionalismo (...I.
200 A SOCIEDADE UNIPESSOAL COMO FORMA ORGANIZATIVA DOS GRUPOS 20 1

mação foi objeto de muitas críticas na doutrina por não levar em der. A decisão afirma que o sócio pode eximir-se de responsabilida-
consideracão as peculiaridades dos grupos. de apenas demonstrando que qualquer outro administrador cum-
Com efeito, é exatamente com base no reconhecimento da pe- pridor de seu deveres legais e estatutários @+flichtgemasshandelnde
culiaridade dos grupos que se baseia a decisão do caso Autokran, Gesch.6ffsführer) de uma empresa independente teria gerido os ne-
de 16 de setembro de 1985.~~ Tratava-se de divida resultante de con- gócios da mesma maneira.69
tratos de leasing de máquinas. O autor era credor de sete sociedades O segundo ponto não é tratado em profundidade na decisão.
controladas por uma mesma hcrlding, que era sua sócia única de fa- Nega-se a possibilidade de aplicação do 5 302 BGB afirmando-se
to. A sociedade holding controlava não apenas f:nanceiramente o que, no caso da sociedade unipessoal, a inexistência de um interesse
caixa das sociedades ligadas, através de uma outra sociedade que interno autônomo não justifica a aplicação das regras de proteção
tinha a função de Hausbank, mas podia também determinar, como do patrimônio social, mas apenas das regras de proteção dos credo-
efetivamente fez, a transferência das máquinas de uma sociedade r e s , 7 T ~ mregra
o substitutiva, invoca-se o § 303 AktG, que obri-
a outra. Através de diversos artifícios, a sociedade biding havia con- ga a sociedade de comando do grupo a prestar garantias aos credo-
seguido transferir grande parte do patrimônio das controladas para res da sociedade subordinada que tenham feito o requerimento'até
seu patrimonio e para o patrimônio de seu sócio majoritário. Em seis meses antes do registro do fim da relação grupal. Tal regra é
presença de uma situação Mica tão clara, não foi difícil para o BGH utilizada, no entanto, mais para aproximar a hipótese da responsa-
afirmar que, nos grupos, a co-existência, no mesmo sujeito, de dois bilidade de grupo - formando assim um corpo de regras para o
interesses sociais, cumulada com a efetiva possibilidade de pôr um GmbH Konzern - do que em função de uma perfeita correspon-
interesse a serviço do outro, justifica a aplicação das regras previs- dência da disciplina à fattispecie.
tas na lei acionária para OS grupos de direito. A conclitsão de Aufokran é que, ainda que utilizando elemen-
Dois são os pontos discutíveis e discutidos na decisão: em pri- tos estruturais (a noção de qualifizierte faktische Konzern), o ele-
meiro lugar, a determinação dos critérios que permitem afirmar a mento subjetivo continua presente na caracterização da "responsa-
efetiva possibilidade de utilização de um interesse em função do ou- bilidade".
tro; em segundo, a justificativa da aplicação da normativa dos gru- E é exatamente essa possibilidade de exclusão de responsabili-
pos de direito aos grupos de fato. dade por demonstração da inexistência de culpa que caracteriza e
Com k@a@Xoao primeiro ponto, requer-se a existência do as- justifica a denomina@o responsabilidade de grupo subjetiva,
sim ~ h a r n d ~ ~ ~ " q u a t ~fiazkitei sr d~ze Konzern", OU seja, o sócio Essa não deve ser confundida com a responsabilidade subjeti-
único devqWfexercido a administração da sociedade de forma am- va pura, baseada na &monstração da intenção, Nesse caso, não me-
pIa e duradoura fdauernd und ~mfassená).~~ Trata-se claramente de receria a denominação grupal, pois nada teria de específico para o
requisito que limita muito o âmbito de aplicação da norma, sobre- grupo. Tratar-se-ia de mera aplicação da regra de res$onsabilidade
tudo na sociedade unipessoal, na qual o dado formal do exercício por ato ilícito do Código Civil.
da administração não é requisito essencial para o exercício do po- Por responsabilidade d e grupo subjetiva deve-se entender aquele
tipo de regra (legal ou jurisprudencial) que, com base em uma pre-
Unternehmen die abhangige juristische Person intensiver mit den eigenen Interesse determinada configuração da estrutura grupal, "presume" a exis-
verkiiupfen wird, als dies bei einem Privatgesellschafter der Fall ist. Dieser Urnstand
rechtfertigt jedenfalls nicht ohne weiteres e i n a allgemeinen urimktelbaren Hahungs- tência de um comportamento fraudulento. Presunção simples, mo-
durchgriff der Glaubiger gegen &e Muttergesellschaft, wie dies insbesondere aucfi tivo pelo qual a disciplina não se coafunde tampouco com a res-
ein Vergleich mit den konzernrecfitliche Vorschriften fiir die Ahiengeselischaft ($5 ponsabilidade objetiva. Permanece sempre possível para a socieda-
15 ff., 302 ff., 311 ff AktGf zeigt" @. 320).
66. V. P. UImer, "Der Glaubigerschutzim faktischen GmbH - Konzern ùeiin
Fehlen von Minderheitsgesellschaften" in ZriR 1984, p. 405. 69. BGHZ 95, p. 330 (334).
67. BGHZ 95. p. 330. 70. O rribunal afirma que tal proteção seria incompatível com a sociedade uni-
pessoal caso se admitisse que o interesse social i o interesse comum dos s0cios. Mes-
68. BGBI 95, p. 330 (333-3341, fazendo referência as dis~ussòesda ifrbeir- mo adotando-se uma noção mais ampla de interesse socid, que inclua credores e em-
kreis GmhH-R&rm (Thes~n und Vorschlage zur GmbH-Reforn 1972, vol. 2. pp. pregados, o tribunal consicera a proteção "externa" (do Cj 303 AktG) suficiente -
59 e 67) onde a expressão foi pela primeira vez utilizada. p. 346.
COMO FORMA ORGANIZATIVA DOS GRUPOS 203

de eximir-se de responsabilidade~demonstrandoque respeitou a in- dessa vez, no entanto, depurada de semitons subjetivos. A respon-
dependência patrimonial da sociedade ~ontrolada.~' sabilidade da'sociedade controladora não é influenciada portanto
pelos padrÕes.de comportamento do administrador médio. A so-
3.2.2 Responsabilidade estrutural ciedade controladora pode eximir-se de responsabilidade apenas se
demonstrar que os danos nada têm a ver com o exercício da adrni-
Com a expressão "responsabifidade estrutural" quer-se exprimir n i ~ t r a ç ã oO
. ~elemento
~ subjetivo (culpa) desaparece, permanecen-
a responsabilidade privativa dos giupos, aplicável em função da sim- do apenas a necessidade de demonstração do nexo de caasalidade.
pies existência de uma determinacia estrutrira grupai. Nesse grupo A necessidade de demonstrar o nexo de causalidade justifica-se exa-
incluem-seas decisões jurisprudedciais alemãs ulteriores ao caso Au- tamente por tratar-se de grupo de fato. Se com Autokran não se
tokran e a lei portuguesa dos grupqs, que são analisadas em seguida. havia inovado tanto, tratando-se nos resultados de mera responsa-
Sucessivamenteao caso ~ u t ó k ~ c ~o rBGHteve
t, de enfrentar o pro- bilidade por comportamento {Verhultenshafttrng), em Tiefluu
blema da responsabilidadenos quqlifiziertefaktische Konzern no ca- admite-se a responsabilidade com base apenas na existbncia de uma
estrutura de grupo e sua ligação causal ao dano (Strukturilaf-
so TiefZlau, decidido em 20 de fevhreiro de 1 9 8 9 .Tratava-se
~~ de de- t~ng).~~
4
manda proposta pelo síndico de u a massa falida em face de seu prin-
cipal financiador, um banco, que tinha exercido na prática, durante Os limites da aplicação das regras grupais são também fixados.
Com efeito, o tribunal afirma que ainda que o $ 302 não exija a
longo tempo, a direção dos negócios da sociedade através de fiduciá-
rios, transformados em sócios maj/oritáriosda sociedade. Um deles demonstração do nexo de causalidade entre o exercício do poder de
havia exercido também a administração financeira da ~ociedade.'~ direção e as perdas, a situação deve ser avaliada diversamentequando
Ainda que, como já explicado, essa decisão representasse uma decor- se trata de grupo de fato. A inexist2ncia de um conirato que impli-
rencia lógica da decisão do caso Autokran, pod,- se notar um menor que (como pode acontecer em presença de um Ge~~irznabflihrungs.
vertrag) a transferência dos lucros impede a aplicação de urna nor-
i
fervor pragmático e um maior empe rho dogmático por parte do BG,rl
em relação aquela decisão. Pode-seidizerque a decisão no caso Ti@-
mativa tão r í g ~ d a . ~ ~
Outra decisão que deve ser mencionada í: a do caso Video (de-
bau aplica os principias que e m ~ u t ~ k rtinham
an sido declarados mas
não aplicados. Enquanto em Auloh$arz I
tinhsr-se declarado o objetivo cisiio de 23.9.91).77 'Trata-se aqui novamente do sócio único de uiria
de aplicar urna disciplina semethanpe à konzernspezifsche fiaftung sociedade de responsabilidade limitada, que exercia paralelannente
mas, a final, acabou-se por aplicari uma disciplina semelhante ti da o cornkrcio em nome individual, além de ser sócio de outra socieda-
responsabilidade delitual, no caso Ti'eflau procura-se discutir os pres- de. O primeiro ponto de interesse é a própria caracterização do Kon-
supostos da responsabilidade grripai prevista na iei e determinar os zern. O tribunal, fazendo referência a uma interpretaqiio já consoli-
efeitos e limites de sua aplicação aqs grupos de fato. dada dos $8 15 ss. AktG, identifica o Konzern com base na existência
Afirma-se a aplicabiiidade do 9 302 AktG, ou seja, a obrigação 74. Muito incisiva é a declaraeo ''antisubjetivisía" do BGH nesse trecho: "Die
de compensar as perdas. O d e ~ a ~ a ~ ~ c i mdas e n dúvidas
to existentes Veriustubernahmepfíicait dient ntmindeçt auch h, die Ausserkiaftsetzung der Ka.
no caso Aufokran a respeito da aplicação desse dispositivo jiistifica-se piti?lsicherungsvorschnRenausmgleicheu. Sie kann daiier eiitgepen der Sishengen AI>-
sobretudo em funçao da particulari$ade da fattispecie, que envolve uahme d a Scnats nicht davon abhangen, ob das hfrrshende Unternehmen dic Çes-
clifffte der abhhgigezl GmbH pflichtgemass wie der Geschaftçfohrer einer selbstan-
responsabilidade societária (interna) e não responsabilidade peran- digen &Uschaft geführt hat, Kapitderhattungf:~nd&tzeund ordnungsgemásse Ges-
te os credores. O BGH, ao definir ps critérios para a aplicação de chtiftsfuhrung haben, p. 18.
tais regras, utiIiza a mesma noção de qualifzierte faktische Kónzern, 75, V. F. Kubler, "Maftungçtrennung und Glaubigerschutz", cit., p. 412.
76. Para o RGH deve-se distinguir entre os diveisos poderes de direção: "Im
ubrigen besteht nirischen der rein tatsachtichen Beherrschung iind der Ausubung der
71, Trata-se, portanto, de uma responsabilidade de natureza mista, que utiliza LcltungsmacEie aufgrund eines besonderen Vertrages ein Unterschied, der es nicht ge-
elementos da estrutura (Konzernstruktur)e 40 comportamento grupai (Konzernver- boten ewheinen f&sst, die entsprechende Anwendung der certragskonzernrechtlichen
halten) -v. nesse sentido 'P. Hommelhof, "klonzernpraxis nach Video", cit., p. 311. Bestimmungen weiter auszudehnen, als es nach den zugrundeiiegenden Wertiingen
, 72. BGHZ 107, p. 7. I
erforderlich ist" - p. 19.
73. BGHZ 107, p. 19. 71. LIB 1991, p. 2.176.
204 A SOCIEDADE UNIPESSOAL COMO FORMA ORGANIZATIVA DOS GRUPOS 205

de dois ou mais i~teressesempresariais n á m s m a pessoa - o sóbrio tispecie basta a existência do qualifizierte faktische Konzern e o lia-
único. A possibiiidade de pôr um interesse a serviço do outro é pre- me causal com o dano. A disciplina aplicada é preciguamente de
sumida, como nas decisões precedptes, a partir do exercício da admi- grupo ($302AktG). Finalmente, em Video pode-se identificar uma
nistração social. Determina-se, portanto, a aplicação do 5 303 AkrG. ulterior objetivização. Ainda que na definição da futtispecie se si-
A justificativa está na necessidade de proteger os credores sociais, gam os critérios de TiefSau, na disciplina adota-se a chamada sek-
que para o tribunal, no caso da sociedade unipessoal, na qual o s6- torale Durchgriff (desconsideração setorial), objetivando a persecu-
cio único exercita ao mesmo tempo a administração, não 6 menor ção do patrimônio e não dos "culpados".
que nos grupos de direito.78 Essa evolução jurisprudencial foi objeto de severa crítica dou-
Interessante na decisão é também uma afirmação feita em obi- trinária. A tentativa de estabelecimento de um sistema objetivo (.'
.'i
ter dicturn. Afirma-se que o sócio único responde pessoalmente com ou estrutural de responsabilidade foi criticada em diversos aspec-
todo o patrimônio, já que se trata normalmente de um empresário tos. A primeira crítica relaciona-se à própria indeterminação da 6
individual. No caso, entretanto, em que seu segundo interesse em- expressão qualifizierte jrkktische K o n ~ e r nexcessivamente
,~~ restri- 4
presarial fosse exercitado também com responsabilidade limitada, ta e ampla ao mesmo tempo. Restrita porque, ao exigir a adminis-
poder-se-ia pensar em responsabilização dessa outra sociedade. tração da sociedade pelo sócio único, exclui as hipóteses em que
Trata-se de responsabilidade setorial, ou seja, "eine Haftungsver- tal situação não exista formalmente, mas em que o exercício do i:
i[
band zwischen del; Einzelgesellschaften unter Schonung des Privat- poder por parte do sócio não se distingue na prática (nem quanti-
vermogens des Gesellschafters" ,'" tativa nem qualitativamente) da própria administração. Excessiva-
mente ampla porque, tendo como fundamento o exercicio do po-
Para ter uma idéia correta do esquema"evolutivo" - sem que
der e aplicando-se também a pessoas físicas, ameaça atingir aque-
h expressão deva ser atribuída, pelo menos no momento, qualqiier la hipótese que merece mais proteção do ponto-de-vista juspoliti- i;
função valorativa do tipo "darwiniano" -, é necessário não esque- co: a empresa média familiar.81
cer que, em todas as decisões, a caracterização como qualifi~ie,~te
fnkfische Konzem é uma presunção simples, mera inversão do 6nus Argumenta-se ainda que a definição dos qualifzierfe faktische
da prova. Anaiisandc-se a regra de responsabilidadejuntamente com Konzern, na forma como feita, com exigência de demonstração da
o elementqgresumido, pode-se ier uma idéia melhor das implica- existência formal de dois interesses empresariais em torno do sócio
ções teóri$&& regra estabelecida. Em Autokran, encontra-se uma Único, torna o esquema passível de fraude: basta introduzir entre
fattispeci~.&ier&nada em termas subjetivos, A contra-prova re- o real sbcio controlador e a sociedade controlada uma sociedade hol-
querida é do-eomportamento como administrador diligente de uma ding e impede-se a configuração da f ~ t t i s p e c i e .Nesse
~ ~ caso, o só-
sociedade independente. Portanto, para a caracterização da respan- cio "real" teria um Único interesse patrimoniai (o da holding), en-
sabilidade é necessária a existência da estrutura grupal, aliada ao quanto a sociedade holding teria dois interesses patrimoniais mas
comportamento contrário aos interesses da sociedade controlada, escasso patrimônio,
A essafattispecie definida em termos, por assim dizer, "subjetivos", A responsabilidade grupal não seria suficiente, exigindo-se sem-
corresponde uma disciplina também subjetiva. Determina-se a apli- pre uma desconsideração a o final para impedir a fraude. Não have-
cação do $ 303 AktG, que pouco se distingue do caso de responsa- ria por que recorrer ao esquema grupal e não diretamente ao da des-
bilidade por dano. A típica "responsabilidadey' de grupo, fundada consideração.
na obrigaçb de compensar as perdas (Cj 302), é negada. Mas as criticas mais intensas relacionam-se a mudança de orien-
Na segunda decisão (Tiefzta~t)),verifica-se uma clara objetivi- tação a partir de TIzfõau, com claro favorecimento de uma respon-
zação (da jatrispecie e da disciplina), Para a caracterização da f@t sabilidade objetiva ou baseada meramente na estrutura da empre-
sa. Do ponto-de-vista estritamente positivo, argumenta-se que tal
78. Para o BGH, mesmo realizando uma análise do tipo econbmico e verifi-
cando os riscos assumidas pelas partes n20 se pode presumir que o credor, em pre- 80. Cfr. F. Kubla, "Haftungstrennung und Glaubigerschutz", cit., p. 423.
sença de um grupo de fato de direção tão Integrada, não tenha contado com o patri- 81. V. a esse respeito P. Hommelhoff, "Konzernpraxis nach Video", cit., p. 312.
mônio da holding ao ccntratar com a saciedade controlada (p. 2.178). 82. Cfr. F. Kubler, "Haftungstrennung und Glaubigerschutz", cit., p. 422.
79. DB 1991, p. 2.176 (2.177).
1
A SOCIEDAD UNIPESSOAL
COMO FORMA ORGANIZATfirA DOS GRUPOS 207
tipo de responsabilidade; é+
de responsabilidade feitamente em linha com os dispositivos da XII Diretiva, aplicando-se
Atendendo a essa mar6 de da doutrina e em fun- portanto apenas aos grupos (no sentido amplo ali previsto).87
ção do amplo diálogo existente entre doutrina e juris- O legislador português, partindo do mesmo objetivo de dife-
prudência (em renciar claramente entre disciplina da sociedade unipessoal de gru-
no mais recente julgamento sobrei a materia: No chamado TBB Ur- po e disciplina do comerciante individual, previu para esse i8llimo
teil (29.3.93),84o tribunal aten~aisuaposição em relação à respon- uma fórmula não-societária de limitação de responsabilidade (esta-
t
sabilidade estrutural. Em umafatf pecie semelhante à de Video, i.e.,
um sócio único de várias sociedad s, o tribunal afirma que não bas-
ta a existência do quol@ziertefaRtische Konzern para gerar a,pre-
belecimento comercial com responsabilidade limitada v. supra cap.
li, n. 3.2.2, b). Quanto à sociedade unipessoal de grupo, optou por
uma fórmula ainda mais estrutural ou objetiva que a jurisprudên-
sunção de utilização de uma socidade no interesse da outra. E ne- cia alemã. A sociedade unipessoal de grupo (sócio único pessoa ju-
cessário que o autor demonstre dlpl fato. rídica) vem expressamente prevista nos arts. 488 e seguintes do Có-
A impressão inicial é, portantb, a de um retorno à teoria subje- digo das Sociedades, abrindo exceção a regra do art. 70 do mesrno
tiva. Na demonstração da utilizaç@ofraudulenta da sociedade esta- diploma Iegal, que prevê que as sociedades terão sempre, dois só-
riam implícitos o dolo ou ao medos a culpa. cios, a não ser nos casos previsto em lei. No art. 491, prev2-se ex-
Entretanto, analisando-se bem a decisão, nota-se que o retor- pressamente a aplicação a sociedade unipessoal de grupo ("grupo
no aos critérios subjetivos de respoIfsabilidadenão é tão amplo quan- constituído por domínio total", na terminologia da lei portuguesa)
to parece. Isso porque o tribunal estabelece um ônus de esclareci- das disposições sobre os grupos de direito farts. 501-504). O rcsul-
mento por parte do réu da sixuaçãv interna do Konzern. Não pres- tado é. a possibilidade de subordinação dos interesses da controlada
tados os esclarecimentos ou sendo eles insuficientes, os fatos alega- aos interesses da controladora (a sociedade controIadora tem o di-
dos são considerados provados.85l o u c o clara oerrnanece a situa- reito d: dar "instruções vinculantes", ainda que essas sejam "der-
ção do bnus da prova com relaçã aos esclarecimentos prestados. vaiitajosas para a sociedade subordinada" - art. 503, nn. 1-2), que,
7
Seguindo a Iágica da decisão e da,distribuição do 6nus da prova,
parece ser sirstentável, no entanto,~queo ônus incumba ao réu, de
n D entanto, é obrigada a compensar as perdas anuais da sociedade
controlada {subordinada) e responder integralmente por seus débi-
qilsm já é o dever de prestar esclqrecimentos. tos fart. 501, n. 1).
Confirmando-se essa orientaç-o tambCm qiianto ao ônus da O Código português consagra portanto a verdadeira r esporisa-

i
,
prova, noder-se% falar'em buscaJd *umasolução intermediária en- bilídade estrutural de grupo, decorrente exclusivamente da existên-
tre a responsabilidade grupal $ubj tiva e a estruturaLB6 cia da concentração e do direito de dar instruções vinculantes. Não
se confunde com a solução italiana, pois a responsabilidade pejas
O tribunal perdas é interna (relação controlada-controladora)e não externa (re-
lação com credores), o que implica sensível diferença quanto aos efei-
individual: Afirma que os tos jurídico-econômicos, como se verá mais adiante.
8 "

83. Cfr. W. Flume, "Das x~ideo-~rte?l und das CmbN-RecM" in DB 1992,


p. 26, que zfirma: "Seit der ~echtsprecfiunddes Reichfinatrzhofs war iirid ist auch
nach deni geltenden Steurrecht (I4 KStG) vo+tzung der steuerrechtlich anzuer-
kennenden Organschaft die wirtschaftliche, o ganisatorische und finanzielle Eiriglie- E na realidade dos grupos que se baseia a última alternativa aqui
cieiening der Organgesellschdft in das Unternekrnen des Organtr5gers. Uiese Einglie- tratada. Em comparação com as outras, constitui uma solução rnar-
derung ist das Leitbild fur die Regelung vod $4 302, 303 AktG". ginafí não tendo acolhimento em quaíquer dos sistemas analisados.
3
84. NJW 1993, p. 1.200.
85. NJW 1993, p. 1.203.
O máximo que se encontra é a já mencionada referência em obifer
86. Tudo indica que esse deve ser o enlendimento. Apesar de não se ter pro-
cdírturn no caso T/ideo.**
nunciado claramente sobre a matkria, a decis'o faz referência (p. 1.203) a outra de-
cisão do BGH (decisão de 17.337, in B O H . i00, 1951, na qual se impbe nso apenas 5'7. hlJW 1993, p. 1.204.
a obrigação de prestar esclarecimentos mas aambém de provar o que foi dito. 88. BB $991,p. 2.177, onde se afirma quea responsabilizaçáo pessoal do sócio
illilifira-se tambkm porque persegue seu oiitro interesse como comerciante individual,
208 A SOCIEDADE UNIPESSOAL COMO FORMA ORGANIZATIVA DOS GRUPOS 229

, ;*,z a&,,. -. i
A teoria baseia-se no fato de que os grupos* freq~erite'kek tritamente necessário as restrições de natureza socíetária à consti-
iI
te caracterizados pela existência de uma sociedade holding que:não tuição e atuação dos grupos com concentmção total. Isso se faz atra-
exercita atividade comei-cial prupria. I~so~sugere q~e,dq.tra~ferflll- vés da subordinação do interesse da sociedade controlada ao da so-
cias patrimo~iaise "medidas nointeresse do grupo" tiram proveito ciedade controladora, não acompanhado de uma obrigação siste-
sobretudo outros setores (outras sociedades) efetivamente empresa- inática de compensação das perdas.9'
riais do grupa. Uma disciplina dhecionada a-procurar sempre? H@- Analisando-se as consequêstcias econômicas de tal disciplina,
termann poderia, portanto, p r o v ~ ~ d i s t o r ç õ enão
s , chegando aos chega-se a um efeito bastante favorável com relação à formação dos
verdadeiros beneficiários das transferênciasa9e prejudicando de ma- grupos de estrutura centralizada, sem qualquer limite quantitativo.
neira indevida os minorit&rios da holding. ' Sequer a concentração total é desincentiiiada, na medida em que,
Pode-se cogitar, portanto, de uma responsabilidade seiorial que como visto, em primeiro Iugar a regra do conflito de interesses per-
permita atingir cada sociedade beneficiada, Evidentemente, tal am- de aplicação e, além disso, a responsabilidade do sQcio só será ili-
pliação da lista de possíveis devedores não admite qualquer tipo de mitada em caso de falência. O fato de a responsabilidadr, em caso
presunção, sobretudo se baseada na utilização do poder de controle de faiência ser a única regra especial para a sociedade unipessoai
com o fim de confusão de esferas. Atingir um beiaeficiário que não (no caso italiano) e não ser prevista uma obrigação de compensação
exercita qualquer poder de conuole com base em uma presunção das perdasg2indica a configuração econdmica de grupo que o le-
é evidentemente um absurdo, pois criaria situação de incerteza Jurí- gislador tinha em mente.
dica, insuportável para todas as sociedades do grupo e seus credo- A possibilidade de realizar as transferências patrirnonjais dese-
res.90 jadas durante a vida da sociedade, reálocando os bens na forma mais
A responsabilidade setorial diferencia-se ainda da responsabi- conveniente para o grupo, e a vinciilação do ~atriniônioda socieda-
lidade estrutural, porque não se contenta com dados objetivos. Exa- de controladora ao insucesso econômico da controlada çugerem o
tamente por pretender ir atrás da verdadeiro beneficiário, requer a tratamento da sociedade controlada (unipessoal) não como um pro.I
center independente, mas como um mero deparrarnento da socieda-
existência de confusão de esferas. Diferentemente da responsabili- de controladora (Betriebsabteiltr~g). Trata-se de solução economi-
dade subjetiva, no entanto, não vai atrás do "culpado" (6 contro- camente interessante para aqueles empresArios iilteressados ria total
ladoi), mas si= do verdadeiro beneficiário (eventualmente uma ou- fusão econômica das empresas, mas que queiram evitar os inconve-
tra socieda'dk5r,ctntrotada).' , #

nientes da fusão jurídica. Com ~r manutenção da personalidade ju-


i.*+- ' I * 1

, , C _ ' h
ridica, pretendem obter a perpetuação do good wiil da sociedade con-
3.3 Efeitos??& diversas teorias na organização d ~ grupos
s
trolada e não diminuir sua liquidez, o que certamente ocorreria em
+

a ,i r
caso de uma fusão jurídica e administrativa das empresas,93A dis-
Analisando os esquemas descritos acima, podem-se distinguir I tinção jurídica e administrativa, permitindo a mariutenção de estru-
três tipos diversos de soluções, diferenciáveis segundo suas diversas turas administrativas separadas, facilita sem dúvida uma filtura ven-
conseqüências econômico-jurídicas . i . da. A ligação da cIientela a empresa controlada, como pessoa jurí-
No primeiro grupo, em que se inciui a solução italiana e a ale- dica independente que é, aumenta sensivelmente seu valor.
mã da einggliederte Gesellschafi, procura-se limitar ao mínimo es- O segundo tipo de solução i ã do legislador português. Nesse
caso, incentiva-se a formação do grupo de domínio totalithrio, atrâ-
sem limitação de responsabilidade. Apenas se não o fizesse seria possive! a responsa-
bilização da outra cantrolada, deixando kento o patrim&nio d a s&io. A discussão
dos demais requisitos e conseqüências da aplicaçâo dessa regra não é, n o entanto, 91. Para caracterizar o "sistema italiano" utilizam-se aquelas decisões da Cas-
levada mais adiante. sação que permitem a subcrdinação de interesses sem compeíisação. E evidente, no
entanto, que adotando a linha do projeto Ferri ou da doutrina que defende a necessidade
89. Cfr. nesse sentido, G . Teubner, "Die "Politik des Ges-tzes" i n Recht
~ der de compensação, a solução se desloca para o segundo grupo. que seri analisado abaixo.
Konzernhaftung", in Festschrift Steindolrf. 1990, p. 278.
92. 0 que torna essa solu$to fundamentalníiente dife~enreda so1iic;ão portu-
90. C. Teubner, "Die Politik des Gesetzes", cit., p. 271, sugere, com efeito, guesa, por exemplo, ainda que em arnbaç seja admiirível, teoricamente, dat instrr-
a aplicação de tal esquema para os einfachefaktische Konzern e rião pala os qualifi- ções vinculântes contrárias ao interesse da s o ~ ~ e d a 0 e .
zierle faktische Koczerrr, já sujeitos a regra de responsabilidade baseada 1-,a presun-
ção de controle. 93. H. G. Koppensteiiier, Khflner Kom~irentar,!@c. i-i:
COMO FORMA ORGANIZATIVA DOS GRUPOS 21 i

vesfdoregulamento positivo expresso da sociedade unipessoal de gru- Finalmente, o quarto grupo é constituído pela responsabilidade
po.' Entretanto, os outros objetivos econômicos permanecem obs- setorial. Nesse tipo de solução, o incentivo à descentralização e à ma-
curos, Com efeito, enquanto de um lado não se incentiva a forma- nutenção de esferas aut6nomas é menor. Do ponto-de-vista dos con-
ção de profit cenfer totalmente /Independente, pois admite-se a su- troladores da sociedade holding, pode ser interessante fazer transfe-
bordinação dos interesses da conUrolada aos da controladora, de ou- rências no interior do grupo, realocando as atividades da forma que
tro não se incentiva a fusão econqmica total, na medida em que per- Ihes pareça ser mais conveniente, se sabem que a responsabilidade em
manece a obrigação de compens'ar as perdas. Essa ultima obriga- caso de insolvência de uma controIada caberá às demais controladas
ção, que se traduz na realidade rja exigência de manutenção da ca- e não à holding. Para eles, a fdrmula de responsabilidade pode ser-
pacidad? patrimonial inicial da sbciedade controlada, parece servir vir para diminuir os próprios riscos, na medida em que os dividem

t
de limitação do risco do grupo co o um todo, em caso de insucesso
da orientação econômica provenie te da sociedade controladora. Isso
porque a controladora será obriggda a repor as perdas do ramo do
grupo (sociedade) considerado mebos importante e consequentemen-
com os acionistas minoritários das sociedades controladas.
Analisada do ponto-de-vista econômico, essa solução tem por
efeito quase que uma fusão econômica entre as sociedades contro-
ladas, que passam a constituir economicamente departamentos de
te manter aquela sociedade ao m' nos como forma de hedging dos uma mesma "empresa", constituída pelo conjunto das sociedades
d
riscos assumidos nas outras ativiflades. \ controladas. O efeito final é, portanto, fortemente centralizante.
Entretanto, tal objetivo é coedente com os meios propostos ape-
nas nos grupos dotados de uma (trutura balanceada, nos quais a
z\ 3.4 Efeitos das diversas teorias sobre os interesses dos credores
sociedade unipessoal represente parte relevante do capital total do
grupo. Do ponto-de-vista dos credores, soluções que favorecem uma
responsabilidade objetiva, como as expressas nos dois primeiros gru-
O terceiro grupo, constituído Pelas soluções alemãs (tarito aque- pos e nas decisões de Tiefbau e Video, assemelham-se bastante, To-
las que impõem a responsabilidadd estrutural como as que impõem das elas, ao aplicar um rigoroso critério de responsabilidade estru-
a responsabilidade subjetiva), tem efeitos diversos. Não limitando tural (no sentido definido acima), não permitem distinções, inter-
o conceito de qualifizierte faktischd Konzern à sociedade unipessoal, nas ou externas. Em primeiro lugar, não é possível distinguir entre
incentiva a formação de grupos com estrutura descentralizada (ein- I comportamentos desejáveis e indesejáveis da sociedade controlado-
fache faktische Konzern)f4 que não se sujeitem às rigorosas regras ra. Em presença de uma regra geral de responsabilidade baseada na
elaboradas para os qualifiziertefaktische Konzern. É necessário notar estrutura grupal, o incentivo ao "bom comportamento" 4 mínimo.
que tanto a f6rmuia baseada na r$sponsabilidade estrutural (Tief-
bau e Video) quanto aquela baseaqa na responsabilidade subjetiva A impossibilidade de distinguir revela-se não apenas dentro como
(Autokran) têm o mesmo efeito. Deve-se recordar que, do ponto-
de-vista juspolítico, a descentralização assume valor apenas enquanto
I1 também fora da sociedade. Épreciso lembrar os limites da desconside-
ração analisadosno cap. 11, n. 3 -3.4.Com efeito, urna soluçãoque adota
meio de enfraquecimento dos centros de poder societários (v. su- uma f6rmuIa geral e objetiva de responsabilidadenão permite distin- ;- ,+
pra, cap. 111, n. l). Ora, isso se pode fazer também através de uma guir entre credores yoountários e iwI~nt$-ios,~~ Se a responsabiiida-
obrigação de respeito dos interesses da sociedade controlada, mas de objetiva é justificável com relação aos últimos, parece pelo menos
sem a existência de uma responsabilidade decorrente exclusivarnen- discutível do ponto-de-vista eqüitativo com relação aos primeiros.
te da estrutura grupal. Desse ponto-de-vista, as soluções de Autok- Não ocorre o mesmo com a responsabilidade subjetiva. Ela per-
ran e Tiefbau são equivalentes. mite proteger os empresários respeitadores da separação de esferas,
De outro lado, com relaçâo aos qualviziertefaktische Konzern no mínimo contra os credores contra tu ai^.^^ Mas também esse tipo
existentes, incentiva-se a formação de verdadeiros profit centers, sem
a presença de qualquer representante da sociedade controladora na 95. V. também F.Kubler, "Haftungstrennung und Glaubiierschutz", cit., pp.
413, 418 ss.
administração da controlada e (no caso da solução proposta em Au-
96. Permanece discutível se a mesma regra deve ser ou não aplicada com rela-
tokran e TBB) com respeito dos interesses da sociedade controlada. ção aos credores involuntários e àqueles que não negociaram com a sociedade - V.
a respeito F. Kubier, "Anmerkung zur TBB Entscheidung", i n N J W 1993, p. 1.204; \
94. Cfr. C. Teul.net, "Die Politik desl~esetzes", clt., pp, 268-269. v. também as considerações supra, cap. 11, n. 3.3.4, C.
,..e, A- b,u e U A U b UNIPESSOAL

caso a transferência tenha sido feita da ou para a sociedade unipes-


soal, esse benefício nem sempre existe. A sociedade unipessoal po-
de ser ao mesmo tempo ponto de partida como tambkm ponto de
chegada da transferência patrimonial. Sendo ponto de chegada, o
prejuízo dos minoritários da sociedade pluripessoal de onde partiu
a transferência é evidente. Mas mesmo sendo ponto de partida, é
necessdrio verificar o tipo de beneficio que a outra sociedade con-
trolada, por hipótese pluripessoal, auferiu. É necessário verificar se
ao benefício patrimonial correspondeu um benefício econômico. Essa
Não :edste, além disso, qualquer vínculo entre administração coincidência nem sempre ocorre. Imagine-se a transferzncia de uma
e responsabilidade.,Se o,gciqÚnico,da sociedade unipessoal responde atividade deficitária e dos bens necessarios para sua manutenção de
como sócio e não como administrador, ,pode-se indagar do sentido uma sociedade controlada unipessoal (sociedade A ) para outra plu-
da exigência de sua presença na administração social. No sistema ripessoal, do mesmo grupo (sociedade B). Tal operação, patrimo-
brasileiro, claro adepto,do esquema de responsabiiidade grupal sub- nialmente benéfica à sociedade destinatária da transferência e se-
jetiva, a questão da fixação dos critérios para formulação de pre- gundo a teoria da responsabilidade estrutural, geradora de respon-
sunções é a central. Isso porque, até o momento, como demonstra sabilidade, pode a curto prazo causar prejuízo para a sociedade B.
a casuística, a simples aplicação direta do art. 117 da Lei das Socie- O que teria ocorrido seria, consequentemente, um prejuízo dos mi-
dades Anônimas, com a necessidade de demonstração de dolo e cul- noritários da sociedade B em favor da controladora, que passa a
pa, tem-se demonstrado absolutamente insuficiente para sancionar ter na sociedade A uma atividade superavitária. Tudo com a agra-
todos os casos de abuso. Como frequentemente ocorre, a distribui- vante de, segundo as regras da responsabilidade estrutural, a res-
ção do ônus da prova acaba por influir diretamente sobre o direito ponsabilidade subsidiária por dividas da sociedade A passar a in-
material, Uma rmponsabilid2de ~1-bjetivaque exige para sua confi- cumbir a 3.
guração prova impossível de ser obtida é equivalente a uma regra Vê-se, portanto, que a tentativa de utilização das regras de res-
de isenção de responsabilidade. , ,
ponsabilidade externa para a proteção concomitante Cie interesses
+

Permanece por ser analisada a responsabilidade setorial. Quod internos e externos cria um sistema de resultados incertos, nem sem-
iuris com feI@ãoia ela. E M primeiro lugar, a persecução do patri- pre apto a tutelar corretamente a situação dos minoritários e dos
m ~ n i o : ~ r o ~essa~ steoria
~ ~ ocriaria
r uma situação de incerteza ju- credores do grupo. Parece muito mais simples e lógico deixar a pro-
rídica para @ias às sociedades do gmpo e para seus respectivos cre- teção dos interesses internos para as regras especificamente a eles
dores, que poderiam a qualquer momento estar sujeitos a concurso dirigidas na legislação societária, reservando as regras de responsa-
com os credores da sociedade devedora. Comparada As soluções an- bilidade apenas para regulamentação dos interesses de credores e da
teriores, não parece proporcionar um grau mais elevado de prote- sociedade.
ção patrimonial. Widentemente, o patrimônio da koiding do gru-
po, detendo todas as participações, representa garantia muito mais 3.5 Conclusão
significativa do pagamento das dividas do que o patrimônio das so-
ciedades controladas. Na solução setorial, conseqüentemente, o au- Criticadas as fórmulas existentes, permanece aberta a questão
mento da incerteza não é justificado por um aumento relevante do relativa ao melhor critério a ser utilizado. Uma resposta satisfatória
grau de proteção dos ~redores.~' a essa pergunta só pode ser dada, evidentemente, à luz das regras po-
A vantagem da solução setorial está na maior justiça com rela- sitivas de cada ordenamento. Portanto, rio momento, são feitas ape-
ção aos minoritários da sociedade controladora, indevidamente pre- nas observações de caráter geral que a análise das experiências legis-
judicados no caso da aplicação de critérios subjetivos. Entretanto, lativas estudadas e das suas consequênaas econômicas podem sugerir.
I
Do ponto-de-vista juspolítico, se o objetivo é o incentivo à for-
97. .V.'a respeito a critica de G . Scognamigfio, La responrabilità della società mação de grupos de estrutura descentralizada, sem entretanto criar
capogmppo, cit., p. 87.
um sistema que dificulte a Iimitação dos riscos dentro dos grupos
COMO FORMA ORGANZZATIVAnos GRUPOS 21s

(sistema com relação ao qual poqer-se-ia levantar a suspeita de não- Os critérios para a e~tensão~desse.ônusj~obtrasisi~"jies~int.er.;
neutralidade ou aberta às concentrações), a regulamen- nas são incertos. Pode-se perguntar até que limite 4;possivel~impor
tação da não deve ultrapassar o mínimo a s controlador o ônus de provar,fatos inter,no~~@~q$x&de..iFode-
se dizer que esses limites devem ser q n t o ~ a i s ~ l & ~ c o s , q u ~ , t o . m e -
Tal princípio não é de fácil ,tradução em termos jurídicos. A nor seja a possibilidade de confiar em um controle interno indepen-
formulação de presunções requer a fiação de limites com base não dente na sociedade. Q~anto~menos instrumentop,t$q , f m @ p , i n -
1
em critérios numéricos, mas sim m critérios qualitativos. Como já
visto com relação ;1sociedade unibessoal, a relevância desse proble-
terna existem, não só maior 6 a possibilidade de <tilização,da socie-
dade no interesse pessoal do sócio mas também - e isso é o,que
ma é tão grande que se chega a discutir sobre a prbpria definição mais interessa no momento - maior é a dificuldade de terceiros te-
da fattispecie sociedade unipessoal. rem acesso a informações sobre a sociedade. Simplesmente porque
não há discussão interna que faça resultar qualquer informação so-
Ora, como já visto, se a utililação do conceito amplo de socie- bre as operações sociais nos livros.
dade unipessoal não é admissível nos casos de aplicação de regras Nesses casos, impor ao credor a demonstração de fatos inter-
internas de organização - como a do conflito de interesses -, o nos à sociedade seria impor uma probafio diabolica e, na prgtica,
mesmo não ocorre com as regras externas, para as quais é admissí- impedir a responsabilização do controlador.
vel a equiparação do controle quase-totalitário ao totalitário.
Mas, como estabelecer o limile de equiparação? Um primeiro
critério de definição pode ser o quelidentifica a possibilidade de equi- 4. O sistema brasileiro
paração em todas aquelas concentraçõesempresariais que, pelo seu
grau de coesão, tornam impossível isolar as determinações indivi- As regras do ordenamento brasileiro relativas ao reconhecimenta
duais da sociedade controIadora e determinar seus respectivos efei- da sociedade unipessoal de grupo já foram descritas em suas carac-
. ~ ~momento, uma regulalentação societária baseada em
t o ~Nesse terísticas principais nos capítulos anteriores. Nesse momento, é ne-
critérios de responsabilidade subjetiya "pura" (não-presumida)e em cessário apenas sistematizar os principais resuitados obtidos, de modo
um sistema de invalidação dos ato$ lesivos perde sua eficácia (exa- a permitir uma análise da "disciplina" (geral das sociedades por
tamente porque é impossível identificar e coligar atos e efeitos). ações) à qual está sujeita a sociedade ynipessoal de grupo 40 Brasil.
Nesse casos, parece fazoável a'aplicação de um sistema análo- O modelo brasileiro,é baseado no incentivo aceap&ação eco-
go ao desenvolvido pelos tribunais alemães para distribuição do Ônus nômica, como visto em mais de uma oportunidade.,Esse incentivo
da prova em matéria societária. Reconhecendo as dificuldades es- se dá em primeiro lw,-tTãYirsaa $ii$$iã admissão d a unipessoa-
pecíficas que terceiros têm em tomar ciência de fatos internos à so- iidade nos grupos de fato, em caráter excepcional p m relação ao
ciedade, em várias oportunidades e muito recentemente com rela- sistema positivo brasileiro e a o próprio sistema da Lei Socieda-
ção aos qualifizierte faktische K o n ~ e r nos, ~tribunais
~ alemães im- des por Ações; em segundo lugar, através da ínexistência'de qual-
puseram ao sócio controlador a obriigação de prestar esclarecimen- quer regra organizativa ou d e responsabilidade es~&&;dp&ub-
tos sobre a situação social interna. Existe com relação a certos fatos sidiária integral, Dos três artigos dedicados à subsidiária integral,
específicos, além do ônus de prestar esclarecimentos, o ônus de com- o primeiro refere-se ao. reconhecimento da fattispecie (art. 251) e o
provar o que foi dito. É o caso, por exemplo, do emprego de quan- Último refere-se à admissão de novos sócios (art. 253) e, portanto,
tias sobre as quais o balanço não fprnece informações suficientes ao desaparecimento da sociedade unipessoal como tal.
e com relação às quais há uma sustentável suspeita de desvio. Nesse O dispositivo restante, que se refere à constituição de socieda-
caso, há a obrigação de demonstrar onde foram aplicados os recur- de unipessoal através da incorporação de ações, é o que mais tem
sos e quais os resultados provenientes dessa a p t i c a ~ ã o . ' ~ gerado incertezas (art. 252). Trata-se, na verdade, de forma espe-
cial de constituição que, objetivando limitar o desembolso de capi-
98. Cfr. V. Ernrnerich-J. Sonnenschein, Konzernrecht, cit., pp. 344-345. tal por parte da sociedade adquirente, permite que, após decisão po-
99. Trata-se da j á citada decisão do caso TBB (in NJW 1993, p. 1.200 (1.203). sitiva das Assembléias de ambas as sociedades, as ações dos acio-
100. BGHZ 100, 197. nistas minoritários da sociedade cujas participações são "incorpo-
216 A SOCIEDADE UNIPESSOAL COMO FORMA ORGANIZXTIVA DOS GRUPOS 217 fL .l.'

radas" sejam trocadas por ações da sociedade incorporadora (art. tias pessoais da sociedade c o n t r ~ l a d o r a ) Em
. ~ ~ um
~ primeiro mo- ?
252, esp. 8 30). mento, conseqüentemente, o legislador utiliza o Direiro Societário #--

para atingir seus objetivos concentracionistas; em um segundo mo- , --


A incorporação das ações tem sido freqüente e erroneamente con-
mento, afirma a necessidade de que esse Direito Socie:ário, já não
fundida com a incorporação da própria ~ociedade.'~' Argumenta-se mais neutro, porque organizado no sentido de favorecer a concen-
com o reenvio, feito pelo art. 252, aos arts. 224-225, que tratam do tração, permaneça neutro com relação as transações dos particula-
protocolo e da justificação na incorporação, sustentando-seque a hi- res. Tudo isso com base no pressuposto completamente enganoso
pótese do art. 252 constitui verdadeira incorporação, merecendo de que todos os credores têm a mesma possibilidade de I'negociar"
serem-lhe aplicados os demais artigos a ela referentes, inclusive a res- as condições contratuais e os riscos com os devedores.lo3
ponsabilidade total da controladora pelas dividas anteriores da socie-
dade controlada. 'Rata-se de afirmação que não se sustenta: o reen- Nos próximos parágrafos procura-se analisar as regras organi-
\-i0 se faz apenas aos artigos que tratam de requisitos formais da in- zativas gerais da Lei das Sociedade por Ações em sua ~plicaçãoes- I"
*s*

corporação; não pode haver qualquer assimilação Aquela em sentido pecífica a sociedade unipessoal. Dá-se particular importhcia ao cha-
material. Caso contrário, não se justificaria a natureza societária da mado perfil organizativo, analisando-se o funcionamento de cada (1
subsidiária integral (que por força de lei tem personalidade jurídica) órgão social na sociedade unipessoal. Esse estudo é fei,*O com base -'r
i '
%.<

pois tratar-se-ia de sociedade materialmenteincorporada, além de ser na convicção de que um sistema societário não se pode permitir ne- "6
absolutamente inútil o dispositiv~,bastando o disposto com relação &aruma forma desejada com base na argumentação de que seria
a incorporação para reger ambas as hipóteses. difícil garantir sua aplicação prática. Um esquema organizativo, por i
mais irreal que possa parecer, que exija a realização de assembléias
Confusão é feita também no plano comparatístico. Toma-se co- com uma só pessoa e outras "formalidades" do gênero, na medida C
mo termo de comparação para a sociedade unipessoal cujas a@es fo- em que procedimentaliza a atividade social, influencia a criação de
ram incorporadas a eingegliederte Gesellschaft da lei acionária afe- uma separação fática de esferas. Em presença de tal organização,
mã. Como já visto, tal tipo de sociedade corresponde a um grau mui-
to mais elevado de concentração econômica, com uma quase-fusão
o sócio único de má-fé que queira vioIar a separação patrirnonial 4
jurídica de ambos os empreendimentos, ao qual não se pode enão se 1 será constrangido a agredir as formas societárias, tornaado eviden-
te seu comportamento fraudulento.
F#
a.

deve, no estado atual do Direito positivo brasileiro, comparar a subsi- i


diária integral, As diferenças são óbvias: no Direito brasileiro, o sócio ia
4.1 Os órgãos da subsidiária integra! e sua atuação
único deve respeitar a autonomia da sociedade controlada. Aiém disso L
(e talvez emconseqüência disso), não responde pelas dívidas sociais. 4.1.1 Conselho Fiscal
Não existe qualquer regra organizativa especifica para a socie-
dade unipessoal. As justificativas dadas para isso pelo legislador che- No Brasil, ao contrário do sistema alemão e a semdhança do
gam a causar espanto: com efeito, é curioso ver como, para a ela- sistema italiano, o Conselho Fiscal é um órgão ao qual incumbe não
boração dessa lei, possam ter convivido concepções tão dispares, co- apenas o controle da legitimidade do comportamento da adminis-
mo a do PND (que nega a filosofia liberal americana da bi anti trus- I tração mas também o controle técnico contábif de sua atuação.lo4
te, afirmando a necessidade de incentivo às concentrações e à for- A ele incumbe, de um lado, fiscalizar a conformidade dos atos da
mação dos grandes conglomerados nacionais) e aquela liberal, de administração à lei e ao estatuto e, de outro, manifestar-se a cada
inspiração claramente "posneriana" (que faz com que a exposição três meses a respeito do balanço e das demonstrações financeiras ela-
de motivos da lei justifique a não-imposição de qualquer regra de boradas periodicamente pela administração social.
responsabilidade para a sociedade controladora com base na afir-
mação de que os credores podem e devem proteger-se sozinhos con- 102. V. "Exposição Justificativa do Ministro da Fazenda", Capkulo XXI, Se-
tra o eventual insucesso da empresa, atravbs da exigência de garan- ção I.
103. V. a esse respeito as considerações de F.K. Comparato, O poder de con-
trole, cit., p. 361.
10 1. Cfr . M. Zeitoune, Glüubigerschutz im brasilianlschen und deutschen Kon-
zernrecht, Schriften der deutsch-brasilianischen Suristenvereinigung 16, Frankfurt, 104. Cfr. W. Bulgarelli, O ConseihoFiscal nus companhimbrasiiekm, São Pau-
Peter Lang, 1993, p. 51. lo, Ed. Revista dos Tribunais, 1988, p. 127.
..*v N aw~LtlYAUb UNIPBSSOAL COMO FORMA ORGANIZATIVA DOS GRUPOS 22 1

A inclusão de terceiros como destinatários dos deveres (e titu- I Os $4 1: e 20 s6 podem ser entendidos como formas de dife-
lares do correspondente direito subjetivo a exigir o comportamen- renciar a responsabilidade individud da orgânica. Não há um tra-
to) do Conselho Fiscai é confirmado pelo próprio art. 163, inc. I. I tamento diferente da responsabilidade comissiva e o m i ~ s i v a . ~Is-' ~
A ampliação das funções do Conselho Fiscal levada a efeito pela so porque a responsabilidade por ato ilicito, prevista no 8 1o, inclui
lei de 1976, que o fez tornar-se fiscal do respeito à lei e dos estatutos também a responsabilidade por omissão (CC, art. 159). Se a isso
por parte dos órgãos da administração, importa reconhecer sua fun- se soma a existência de uma ampãa definição Iegal dos deveres dos
ção de tutela e de informaçãode terceiros, também destinatários da administradores (arts. 153 a 156, aplidiveis aos membros do Conse-
regra da legalidade,lflCom relação aos credores em particular, se lho Fiscal por força do previsto no art. 165, caput), cuja inobser-
não é razoável atribuir-lhes um direito de acompanhamento contí- vância caracteriza a atuação cuiposa ou dolosa do conselheiro (e por-
nuo da atividade sociat, é, no entanto, coerente criar um sistema tanto o ato ilícito), a diferença substancial entre as duas hipbteses
que Ihes permita informar-se a respeito da atuação da aárninistra- diminui de maneira significativa.
ção e do controlador, tornanzo possível determinar a existência ou Portanto, se a diferença entre os dois parágrafos não está no
não de um aumento dwpraporcional dos riscos. fundamento da responsabilidade s6 pode estar no seu prbprio tipo.
O segundo problema, igualmente relevante para a sociedade uni- O que ocorre é que, tratando-sede competência orgânica, a respon-
pessoal, é o da competência colegial ou individual do órgâc. O legis- sabilidade é solidária, caracterizando-se em todos os casos em que,
lador pronunciou-sede brma obscura, imputando a maioria das atri- havendo o dever de atuação do órgão, o membro não fez consignar
buições ao órgão, mas deixando certas iniciativas a cargo de qualquer em ata a discordância com relação à omissão. Em todos os outros
um dos seus titulares (como por exemplo o pedido de informaçcies pre- casos em que a competência é individual, o membro do Conselho
visto no (i 2'1 do art. 163). Domina e jurisprudência têm tendido a não se exime de responsabilidade simplesmente fazendo consignar
aumentar muito os poderes individuais dos membros, sobretudo dos em ata sua divergência. Cada um é responsável, individualmente (8
representantes da min~ria."~ Problema conexo é, evidentemente, o da I?), pornão ter atuado ou por t a atuado abusiva ou fraudutenta-
responsabilidadedos membros do Conselho. O sistema legal não é cla- mente. E evidente que, na medida em que se amnlia jurispruden-
ro, O (i l ? do art. 165 faia rm responsabilidade individual prios atos cialmente a competência individual, ampliam-se também as hipóte-
ilícitos praticados, enquanto no (i 20 o legislador refere-se a respon- ses de responsabilidade individuai, reduzindo-se proporcionalmen-
sabilidade solidária (e ccmseqGentementeorgânica) decorreate da in- te aquelas de responsabilidade orgânica.lis
fração aose@wreslegais. No próprio $2?,parte final, faz nova con- Essa atribuição individual de competência é especialmente im-
cessão à re~sggssabiiidadeindividual, referindo-se a possibilidade de portante na sociedade unipessoal, na qual ganha relevo o dever do
eximir-se q4aemhrodo Conselho Fiscal de responsabilidade através membro do Conselho Fiscal de atuar independentemente do con-
da manifestação por escrita do cIissenso da decisão tomada pelo Con- trolador (art. 154, 8 1o).
selho. li3
4.1.2 Órgãos administrativos
111. V. nesse sentido F. Martins. Comentários a Lei das Sociedcdes Anôni- A sociedade unipessoal apresenta uma particularidade interes-
mas, vol. 2, tomo I, Rio de Janeiro, Forense, 1984, pp. 435-436.
sante com relação aos Srgãos de admínistração. Na estrutura socie-
112. E. L. Teixeka e J. k T. Guerreiro derivam o caráter individus das fun-
-
ções da natureza individual da responsabilidade Das sociedades andnhas, cit., , tária normal, a administraçãoé repartida entre Conselho de Admi-
nistração e Diretoria. Enquanto o segundo órgão é de existência obri-
vol. 2, pp. 493-491. Já W. Bulgar?lli aYma que a atribuição de funções idviduais
aos membros decorre da naturezaespecSca de sua atividade (de fiscalizaqão) - que gatória, o primeiro C de existência meramente facultativa, podendo
segundo o autor deve ser autônoma ''para que seja eficiente e não meramente recla- não existir em caso de previsão estatuma expressa (a&. 138).
mat6riaY'- O ConselhoFkcal, c&., p. 286. O mesmo autor elenca os casos de reco-
nhecimento jurisprudeccial da função iadividual dos membros, como o poder indi- Relativamente a sociedadeugipessoat, o problema põe-se de for-
vidual do membro de contratar fiscal de contas, a possibilidade de prop~siturada ma diametralmente inversa. E discutível a própria utilidade do Con-
ação de exibição dos livros por parte do membro individual, bem como a afirmação selho de Administração.
geral da possibilidade dr atua* rndependente dos representantes dos ninorithrios
( p p 187-188, com as respectiva referências jurispnidenciais) 114. V. defendendo, ao contrário, a existência dessa distinção, W. Bulgarelli,
1 13. Para a critice do sistema lega1 v. W. Bulgaretli, O Conselho &cai, cit ., 0.Conselho Fiscal, cit., p. 221.
pp. 220 ss. 115. V. nesse sentido W, Bulgarelli. O Conselho Fiscal, loc. ult. cit.
COMO FORMA ORGANIZATIVA DOS GRUPOS 223

Para o sócio único, o ConseIho de Administração não tem qud- condução dos negócios sociais~fazern~com'que7."o~in"~~c&so~nego~ial
quer utilidade na sociedade unipessoal. Ele pode exercitar as mes- deva ser relacionado não apenas a decisõesbbaseadas xem um erro
mas atribuições, sem qualquer dposição e sem a responsabilidade de julgamento negocial, mas sim em uma estrategiarde grui>or$Ore-
prevista para os administradores1 (conselheiros e diretores) através sultado, em termos de responsabi1idade;~~~a~ampliação das-hipóte-
da Assembléia Geral. I ses de "abuso de direito" como fundamento para a responsabilida-
Em conseqüência, deve-se perguntar: não existindo Conselho de do controlador. Pode-se concluir portanto-que a atribuição de
de Administração na sociedade u$ipessoal, a que "órgão" se trans- funções administrativas ao controlador tem como efeito não a apli-
ferem suas atribuições e quais as ~nsequênciasdessa transferência? cação das regras de responsabilidade dos administradores, mas sim
uma ampliação das próprias hipóteses de sua responsabilidade.
Para responder a primeira recordar que, no Di-
reito brasileiro, o Conselho de é um órgão de inter- O outro órgão de administração é a Diretoria. A luz da siste-
mediação entre a Assembléia Ger'al e a Diretoria. Ainda que siste- mática da lei brasiieira, a discussão de sua estrutura administrativa
maticamente classificado pelo feg!slador como um órgão da admi- não tem particular interesse para a sociedade unipessoal. Como é
nistração, basta ler a lista de suas atribuições para entender que são sabido, nossa lei deixa a conformação e definição das atribuições
elas itens de competência da ~ss&mbléia Geral, excepcionalmente da Diretoria quase que completamente aos estatutos. Da lei podem-
transferidos a um outro órgão. Erfi ausência desse Órgão, é natural se deduzir apenas duas funções: representação da sociedade e práti-
que retornem a A ~ s e m b l é i aVejh-se,
. ~ ~ ~ por exemplo, o poder de es- ca dos atos relativos ao seu funcionamento regular (art. 1.440,
colha e fiscalização da Diretoria (drt. 142, incs. 11-III), o qual é re- traduzindo-se essa função na administração ordínária da socieda-
produ~ãodo previsto para a ~ssdmbiéiaGeral jart. 132, incs. X e de). Diferentemente do Conselho de Administração, a Diretoria não
111). O mesmo deve-se dizer com ,relação à "orientação geral dos se reveste, em ausência de determinação expressa do estatuto, de ca-
negócios da companhia" (art. 1421 inc. I). O retorno da competên- ráter colegial, As funções acima incumbem a cadadiretor (art. 143,
cia à Assembléia Geral justifica-s ' em razão da regra do art. 121, $ 20 e 144, caput), que responde pessoalmente por sua atuação.
C1
que, ao considerar competente a Assembléia para "todos os negó- Em doutrina, já se sustentou a lese de que a diretoria deveria
cios relativos ao objeto social da qompanhia e todas as resoluções ter carker colegial em ausência do Conselho de AdrninistrugZo, pois
que julgar convenientes à sua defesa e desenvolvimento", atribui nesse caso sua função não seria meramente executiva.1z7Essa afir-
competência residual genérica Assembléia Geral. mação faz retornar ao problema da definição do titular do poder
Tal transferência de funções dão é isenta de conseqüências ju- de orientação geral dos negócios da companhia em caso de inexis-
rídicas. Atribuir funções administrjtivas A Assembléia - e ao sócio tência do Conselho de Administração. Ainda'que seja louvável a atri-
único - diminui a diferença entre administrador e "controlador". buição de poderes mais amplos a diretoria, de modo a fazê-la per-
Essa diminuição corresponde a já exposta aproximação entre as fi- der o caráter meramente executivo, sobretudo fia sociedade unipes-
guras do controlador e do proprietário na sociedade impessoal (v, soa1 (na medida em que permite o reforço da separação "proprie-
cap. I, n. 2), com a prevalência, como visto, do perfil do controia- dade de ações - administração7'), não parece que se possa afirmar,
dor. A figura do controlador passa a ser dificilmente distinguível pelos motivos analisados acima, que tal transposiflo seja sustentá-
do administrador, ainda que a socqedade tenha diretor não-sócio. vel de /ege lata.
Portanto, em qualquer subsidiária jntegral brasileira pode-se iden-
tificar a presença de um qual~~zienfe faktische Konzern. 4.1.3 Assembléia Geral
Essa qualificação pode ter co~equênciasdiretas sobre as re-
gras de responsabilidade. A não-diferenciação clara entre adminis- Dentre os órgãos da subsidiária integral, a Assembléia Geral
tração e controle diminui a possibilidpde de utilização pelo sócio Yni- é o que suscita as maiores perplexidades do ponto-de-vista teórico.
co da buskness judgernent rule como fundamento para eximir-se de Na legislação brasileira, inexiste qualquer regra especifica para
responsabilidade. Seus poderes de oijientação geral e fiscalização da a Assembléia Geral da sociedade unipessoal. A interpretação siste-

116. V. nesse sentido F . Martins, Con2eri.litárrosà Lei das Sociedacles Anoni- 117. Cfr. J. C . Sampaio de Lacerda, Comentáriosa Lei & Sociedades Anôni-
mas, cit., p. 232. mas, cit., p. 166.
224 A SOClEDADE UNIPESSOAL COMO FORMA ORGANIZATIVA DOS GRUPOS 225

matica da lei fornece argumentos para sustentar sua obrigatorieda- 4.2 A proteção dos interesses envolvidos
de, Diferentemente do disposto no dec-lei n. 2.627, que definia a
Assembléia Geral como a "reunião dos acionistas" (art. 86), a lei 4.2.1 Interesses inttrnos
atual define a Assembléia Geral apenas pelo seu objeto (arts.
121-122). A passagem de uma definição do tipo subjetiva e baseada A referência a interesses internos compreende não apenas os
na pluraiidade de sujeitos a uma definição objetiva118facilita o re- da sociedade controlada (unipessoal), como também os da contro-
conhecimento de sua obrigatoriedade mesmo na sociedade unipes- ladora (pluripessoal).
s~ai.~lg Com relação a essa ÚItima, tanto a constituição quanto a sub-
Como já discutido acima, na concepção organizativa da socie- sistência cbe uma subsidiária integral podem dar lugar a situações po-
dade, a procedimentalizagão da atividade social e o cumprimento tencialmente conflituais; Na realidade, como já se viu, a constitui-
das formalidades societárias aparecem como requisito fundamental cão de uma sociedade unipessoal de grupo é um meio para descen-
para a separação de esferas. No caso dos grupos, no entanto, a essa tralização de atividades do grupo, com formação de novos profit
necessidade contrapõe-se uma outra: impedir o conflito de interes- centers. Tal procedimento, não-sancionável por si, deve, no entan-
ses ns holdmg. A realização de Assembléias exclusivamentecom um to, ser acompanhado por medidas que impeçam a concentração de
representante da holding pode servir como meio de fortalecer a po- poderes do sócio controlador da sociedade holding sobre parte reie-
sição de seu controlador em detrimento dos minoritários (v. supm, \.ante do patrimônio do grupo, em prejuízo do interesse das minorias.
cap. 111, n. 1.3). Um forma d:: compatibilizar essa exigência com O primeiro perlodo juridicamente relevante 6,portanto, o pró-
a primeira é sem dúvida a encontrada na já citada decisão Hoizmul- prio processo constitutivo. A lei acionária não cotaeém disposições
ler do BGN alemâo, que imputa as atribuições da Assembléia Geral gerais sobre a protec;ão dos acionistas da sociedade sontroladora em
da sociedade unipessoal diretamente a Assembléia Geral da hoiding. caso de constituição de uma subsidiária integral. O único dispositi-
Desse modo, as decisões podem ser consideradas verdadeiramente vo existente refere-se ao caso de sociedade unipessoal constituída
do sócio único, permitindo registrar todas as diferentes opiniões que através de incorporação de ações. Nesse caso, os acionistas dissi-
a compõem e nâo apenas a posição do controlador da holdiptg. dentes da sociedade adquirente têm direito de recesso (art. 252, 8
Opera-se na prática uma iransmissão da diajética maioria-minoria, 1:). Essa previsão, rmo entanto, nao basta. A criação de uma socie-
da sociedac$;eqcsntroladora à controlada. dade unipessoal pode dar-se através de constituição nnipessoal (cor-
A eqj@$o& dessa transmissão fica ainda mais evidente em uma respondente ao processo de descentralização descrito acima) ou atra-
hipótese particular de constituição de subsidiária integral: a incor- vés de transformação simples (sem incorporação de acôes).
poração de ações. Nesse caso, é bastante provável a existência de Com relação a essa última faftispecie (traíisformação simples),
ex-acionistas minoritários da subsidiária integral nos quadros sociais poder-se-ia até questionar se não seria necessário, do ponto-de-vista
da Íiolding (em função da troca de ações operada), Com relação a qiiitativo, aplicar analogicamente o dispositivo supaa. A excepcio-
eles, obrigados a trocar suas ações ou a retirar-se da sociedade pela nalidade da f a t t i ~ y ~"direito
e de recesso" e a conseqüente impos-
vontade da maioria (art, 252, 5 23, nada mais justo que continuem sibilidade de aplicação anaiógica dificultam a aceitação de tal
a participar diretamente das decisões tomadas na sociedade contro- interpretação.
lada, decisões que, afinal, podem produzir efeitos diretamente so- É necessário gorianto discutir a possibi!ida.de ou não de apli-
bre seu patrim0nio. car a tal tipo de constituição os arts. 135, inc, V, e 137 da lei acioná-
ria. Esses dispositivos prevêem respe~ivamntea necessidade de
i iS. TenCo em vista a afirmação contida na própria Exposição de Motivos da aprovação de pelo menos a metade mais um dos acionistas com direi-
lei, segundo a qual tentou-se manter sempre que possível a redação original do dec- to a voto nas decisões que implicam a transformação do objeto social
lei 11. 2,627, de'e-se presumir quc as alieraçdes introduzldas foram intencionais -- e o conseqüente direito de recesso dos acionistas dissidentes. É ne-
v. a respeito E. L. 'i'eixeira Pr J. A. T. Gunreiro, Das sociWes an8nitrzus, cit., p. 384.
119. Em São Paulo, com efeito, a Junta Comercia: confirmou a exigência de cessário determinar se a transferência da atividade pxodutiva h "sub-
realização de Assembléia Geral na subsidiána integral para a eszoIhz dos adniinis- sidiária Inttegral" e a u m s f o r n ~ a ~ ãdao sociedade mntroladora em
tradores -- v. W. Buigarelli, O Consrziho Fiscal, cit., p 173, nota 331. uma hoiding coaislibuem ou não mudança do objeta da companhia,
226 A SOCIEDADE UNIPESSOAL COMO FORMA ORGANIZATIVA DOS GRUPOS 22'9

No sistema da lei atual, não importa se a sociedade já exercita- a,essaÚ1timanudar;suaiáreade atuação através da mudança do ob-
va, com relação as outras socied des do grupo, a atividade de hol-
ding. Pouco importa também sei7 depois da criação da subsidiária
jeto da subsidiária integral, sem ter de dar direito de recesso aos acio-
nistas minoritário~.~2~ . ti .
r

integral, a sociedade holding coniinuarú ou não a exercitar ativida-


" Admitida a atribuicão do objeto da subsidiária integral a so-
de produtiva em via secundária. I$ portanto irrelevante tratar-se de
holding mista ou holding pura. Is$o porque, enquanto a lei anterior ciedade holding, ~"resultado é a não-transformação de objeto da so-
fazia referência ao "objeto essential" da sociedade, a lei atual faz ciedade qiiando'da'constituição de uma "subsidiária integral" atra-
referência ao objeto social. Esse aeve ser definido pelo estatuto "de vés da transferência da atividade produtiva da holding (que de mis-
modo preciso e completo", segundo dispõe o art. 20, li 20, da Lei ta passa a ser pura). Os acionistas minoritários, aos quais não foi
das Sociedades Anônimas. Com assa modificação e como escIarece oferecida a possibilidade de recesso, devem ser protegidos contra
a Exposição de Motivos, tentou-se ampliar a fattispecie, nela incluin- sucessivos atos abusivos da controladora na "subsidiária integral".
do também as modificações do objeto secundário (ou acidental).120 A lei acionária o faz parcialmente. Com efeito, em caso de venda
Com base apenas na exegese desses dispositivos não se pode excluir, de ações ou aumento de capital na "subsidiária integral", prevê que
apriori, o enquadramento da hipótese de constituição de subsidiá- os acionistas da controladora terão preferência em sua aquisiçáo ou
ria integral no art. 136, inc. V, da lei acionária, e a conseqüente atri- subscrição (art. 253, incs. 1-11).Tenta, dessa maneira, impedir a uti-
buição de direito de recesso. lização da sociedade unipessoal como meio indireto de diminuir a
participação relativa dos acionistas minoritários em uma parte rele-
O problema surge com relaçqo a distinção entre objeto da so- vante do "patrimônio d o grupo", De outro fado, é evidente que a
ciedade holding e objeto de suas 'controladas, pressuposto funda- previsão dessas duas hipóteses não é suficiente para cobrir todos os
mental para que se possa identificar na transferência de certa ativi-
casos de atuação potencialmente abusiva do acionista controlador.
dade produtiva para a subsidiária ;integraluma "mudança de obje-
to". O art. 20, $ 30, da lei acionária, prevê a possibilidade de exis- O poder de controle do sócio majoritário da sociedade controlado-
ra sob^^. a *~bsidiáriaintegral permite-lhe utilizar estrategicamente
tência da sociedade tendo como otijeto específico a participação em
o patrimônio "economicamente" separado através da subsidiária
outra sociedade, estabelecendo em seguida que, mesmo não previs-
ta no estatuto, a participação é permitida como meio de realizar o integral de várias maneiras, não redutíveis às duas acima menciona-
objeto social (nesse caso, uma atikidade produtiva ou comercial). das. No sistema da lei brasileira, a sanção a tais hipóteses fica a car-
Conseqüentemente, a não ser em caso de previsão estatutária expres- go das regras normais sobre conflito de interesse dos acionistas (art.
115) e de abuso de poder do sócio controlador (art. 117).
sa, o objeto da sociedade controiaba é diretamente atribiiído à hol-
ding. Parece inafastkvel uma interpretação desses dispositivos que leve
Mesmo no caso de sociedade constituída com o objetivo espe- à aplicação do sistema protetivo também àqueles casos nos quais
cífico de participar em outras sociejades, não parece admissivel uma a existência de um dano potencial resulte clara.'13 Em um raciocí-
total separação entre objeto da hqlding e o das sociedades partici- nio semelhante ao da doutrina italiana, trata-se de f i a r o interesse
padas, sobretudo quando tal separação pode potencialmente levar social e deixar à verificação casuística a existência ou não de vanta-
a fraudes.12' Um bom exemplo é a própria subsidiária integral. A gens pessoais para o sócio (ou seja, a determinação do interesse do
total separação entre seu objeto e o da sociedade holding permitiria sócio em cada caso). Apenas assim pode-se oferecer uma resj>osta
conveniente a todas aquelas utiliições da subsidihia que, sob cr man-
120. V. Exposição de Motivos do Ministro da Fazenda, Capítulo XI, Seção
to de uma estratégia de grupo e da não-possibilidade de ideritifica-
111, v. também E. L. Teixeira & J. A. T. Gherreiro, Das sociedades anônimas, cit., ção precisa dos seus efeitos patrimoniais, podem levar a excluir da
p. 424, afirmando, no entanto, que a novafatttspecze é exageradamente ampla e que fiscalização das minorias parte relevante do patrirngnio da grupo.
"mefhor teria sido, sem dúvida, a manutenção da formula adotada pelo dec-lei n.
2.627". 122. V. o exemplo aventado por R. Cristiano, A subsidiúrra rnlegrai rco Brasrl,
121. Cfr. nesse sentido F. K. Compalato, O poder de controle, cit., p. 135; São Paulo, Ed. Revista dos Tribunais, 1986, p. 67.
v. também na doutrina italiana F. Galgano, :'Qual è I'oggetto della società holding",
cit., com análise de decisões da Cassação, contrArias ao reconhecimento de um obje- 123. Nesse sentido J. A. T. Guerreiro, "Conflitos de interesse entre sociedade
to independente a sociedade holding. controladora e controlada e entre coligadas, tio exercício do voto em Assembléias
Gerais e reuniões sociais" in RDM 51/32.
Até aqui tratou-se apenas da proteção dor interesses internos da
sociedade com um Único acionista. Nada se dine sobre a protqão dos Com o desaparecimento do Conselho de Administração e a con-
interesses internos da própria sociedade unipessoal. Como já mencio- centração de suas atribuições na Assembléia Geral, o quadro deve
nado, sua análise demonstra a imensa diferença existente no Direito ser revisto. A aproximafão entre sócio única e adminiaação toma-se
brasileiro entre declaração e atuação dos princfpios institucionalistas jurídica e não meramente fática. O direito deve reagir a essa mu-
na lei acionária. Enquanto a lei declara, em seu art. 116, que titulares dança qualitativa. A primeira reação é. sem dúvida, a afirmação da
do interesse social são n h apenas os acionistas mas também os em- responsabilidade profissional do sjcio Unico. Isso significa que ao
pregados e a "comunidade em que atua" a sociedade, quando chega sócio único não 6 mais permitido eximir-se b responsabilidade ape-
o momento de definir os Legitimados ativos à demanda ressareitória nas invocando a bllnnessjudgement ruk. Isso porque não lhe é mais
mencionam-se apenas os acionistas (art. 246). Em ausência das mi- permitido esconder-se atrás de uma administrafiio da qual partici-
sorias e de outros legitimados internos às demandas ressarcitória ou pa e sobre a qual tem.um dever de f i d z q ã o . Por outro lado, o
mulatória, perde portanto aplicação todo o esqoema protetivo interno sócio único que seja pessoa juridica, enquaãto condutor dos negó-
baseado na regulamentaç.30 do conflito de interesses. cios sociais, está em uma posigáo de duplicidade de interesses em-
presariais que não pode ser desconsiderada. Em ausência de uma
4.2.2 Interesses externos regra especial de responsabilidade c o m a formulada pelo BGH pa-
ra os qualifiziertefchfirfhe Konzern (exatamente com base nos dois
É necessário finalmente analisar o sistemade proteção dos inte- fatores expostos: poder adminiitriltivo + doplicidade de interesses),
resses externos (credores}. Como já visto, o sistema brasileiro não con- uma separação absoluta de esferas, formal e substancial, é o Único
tém qualquer regra de responsabilidade especifica para a sociedade índice aceitável de uma administração não-fraudulenta.
unipessoal de grupo. A f h u l a escolhida (admi;'são da sociedade uni- A aproximaçãu entre administraflo e controle dB lugar tam-
pffsoal sem obrigação de compensação das perdas), sem regra parti- bém a uma outra ordem de considerataes teóricas. Trata-se da pos-
cular de responsabilidadee sem, de outra parte, direito de dar instru-
ções vinculantes à sociedade controlada, insere-se na lista elaborada sibilidade de caracterizar uma responsabilidade direta da sociedade
a c h a (cap. 111, n.3.3.), imediatamente após a nngegiiederte Geseils- controladora pelos ilícitos da contiolaüa. 0 problema foi recente-
chaft, entre as soluções mais incentivadoras das concentrações. Isso mente levantado em sede comparatistica em c~nsequênciada decisão
porque, do ponto-devista da estratégia grupal, a ineiistência do di- do caso Amoco C ~ d i z . 1Nele,
~ ~ afirmou-x a responsabilidade da
reito de dar instruçôes vinculantes contrdrias ao interesse social não sociedade controladora (Standard Oil Co.) pelos danos ao meio am-
chega a compensar a i n a b t h c i a da obrigação & cobertura das per- biente provocados por um navio de propriedade de uma sociedade
das e a inexistência de regras especificas de responsabilidade. De to- controlada (Amoco Transport Co.),qEe a a gerida por uma outra
do modo, a situação acionaria da sociedade unipasoal facilita a sub- sociedade controlada (Amoco Internaiiond OiI Co.). O fundamento
missão fática de seus interesses, mesmo em ausência de um permissi- principal da decisão foi a inexistgncia de controle efetivo e o fato
io legal. O combate a essa submissão, atrav6s da disciplina da des- de que a controladma tinha seguido o projeto e a construção do na-
consideração da personalidade jurídica, que pemitù.ia um reequili- vio, tendo também tomado parte nas decisões que se seguiram ao
brio da situação, não tem sido até o momento empreendido de ma- seu encãhe. Na doutrina, essa dscisão foi interpretada como uma
neira sistemática pela jurisprudência (v. supra, cap. 11, n. 3.3.2). aplicação em campo societário do princípio da responsabilidade do
preponente pelo ilicito do preposro.1" As conseqüências aplicativas
Em ausência dessas regras particulares, assumem importância de tal afirmação no Direito brasileiro são evidentemente relevantís-
as mutações organirativas dezarrentes da unipessoalidade (v. supra, simas. Admitido a princípio exposto, &e€=-se-ia quase a uma res-
cap. 111, n. 4.1) e de seus efeitos sobre os deveres e responsabilida- ponsabiiidade ilimitada da sociedade controladora pelos ilícitos da
des do sócio. Como visto, a característica da lei acionária brasileira
é a existência de sistemas de deveres e responsabilidades distintos
para administradores e sócias e o fato de que esse último sistema 125. United Stater Dirtrict Court, Northem fistrict of Illinois, Eastern Divi-
sion, 18.4.84, in Diritfo Commercide Infernnionul?, 1987, p. 347, com nota de F.
é direcionado precipuamente à proteção dos interesses internos. 124 Bonelii, "Ls respons&b:lita della hicietà contr~llasteper gli iileciti deiie proprie
wntrollate" .
124- Cfr- F. K. ~omparato,O poder de controle, cit., p. 308. 126. Cfr. F. Bonelli, " t a responsabitit3 &ellasoci& controllante", cit., pp.
348 ss.
CONSIDERACOES CONCLUSIVAS 233

Com relação especificamente à regulamentação positiva brasi-


leira da sociedade unipessoal, devem ser feitas algumas observações
conclusivas. Em primeiro lugar, é interessante observar os efeitos
negativos do tratamento da sociedade unipessoal corno exceção, não
totalmente integrada no sistema societário. Especiaín,ente negativa
demonstra-se a falta de regras organizativas e de responsabilidade
especifica para a sociedade unipessoal.
Parece faltar uma clara tomada de posição do ponto-de-vista
da politica legislativa. Sobretudo o fato de a sociedade unipessoal
só ser admissível nos grupos não corresponde de forma alguma as
necessidades econômicas brasileiras. A limitação de responsabilida-
de através da sociedade unipessoal permanece um privilégio das gran-
Da análise realizada destacam-se três perfis, caracterizadores des estruturas empresariais. Um país com um dos maiores índices
da sociedade unipessoal com responsabilidade limitada: a socieda- de concentração de riquezas do munda não se pode permitir reco-
de unipessoai como problema teórico, como necessidade econômi- nhecer apenas formas societárias que facilitem essa mesma concen-
ca e como disciplina jurídica. tração. Mas, mesmo independentemente da situa* econômica bra-
sileira, tal situação societária cria, como visto, sérias perplexidades
Espera-se ter sido demonstrado no primeiro capítulo que os es- I
do ponto-de-vista constitucional.
crúpulos teóricos relativos à sociedade unipessoal são hoje em dia
menos relevantes do que se imagina. Quanto a concepção da socie- A experiência comparatistica demonstra que o reconhecimento
dade como contrato, a teoria do contrato-organização permite jus- generalizado (nos grupos e fora deles) da sociedade rinipessoal é rele-
tificar a constituição unipessoal. vante até mesmo para a coersncia do ordenamento mcietário. Basta
observar que é melhor ter uma sociedade unipessoal reconhecida e re-
O segundo perfil, pelo números apresentados, é o mais revela- gulada que sociedades de fato unipessoais ("sociedades-fictícias") não
dor da importância da sociedade unipessoal. Os números relativos reguladas e incontroláveis. Sobretudo do ponto-de-vista da seguran-
a participa(;ão percentual das sociedades unipessoais nos países que ça jurídica. Em um campo tão próximo das exigências da prática eco-
as reconhejem 5 talvez sobretudo os relativos às sociedade fictícias, nômica, as soluções devem ser determinadas muito mais a partir da
nos paísesAque.'nãca reconhecem, falam por si,' O perfil econômi- existênaa real das formas sociais do que a partir de sua essência (cuja
co não se exaure, entretanto, no reconhecimento de uma realidade, própria existência pré-jurídbra é, como visto, dis~utível).~ Talvez a
Importante é a inhência exercida pelas formas jurídicas sobre essa formulação mais ponderada sobre o tema seja a de uma decisão do
realidade. Nesse aspecto, a sociedade unipessoal também se desta- BGHalmão, que já em 1956antecipava a ulterior ewluçã6 do direi-
ca, na medida em que permite o incentivo às estruturas empresa- to alemão e comunitário sobre o assunto: "A sociedade unipessoal é
riais pequenas e médias. uma figura não totalmente convincente do ponto-de-vista te6ticn; re-
O terceiro perfil deve permitir a compatibilização dos dois pri- conhecida pela prática, inofensiva do ponto-de-vista econSmico-
meiros. Escrúpulos teóricos são mais facilmente superáveis por ne- a político*necessária do ponto de vista prático e con- a qual, A !rxce-
cessidades econômicas em presença de uma conveniente disciplina ção de dúvidas de natureza teórica, n a d ~relevante pode ser pasto''.^
jurídica. Analisaram-se os dois pilares básicos da disciplina da so-
ciedade: as regras organizativas e a desconsideração da personali- 2. nesse sentido, eloquente a noção de F. K. Comparata, para quem "'iirge,
dade jurídica. Viu-se como, com relação à sociedade unipessod, a portanto, reconhecer que a elabora+;ão dos concritos e a pesq* das e s s ê ~ i r i ~
(as
s
famosas 'naturezas jurídicas') deve suceder e não preceder a a&se da vida j,ui idica
complementariedadeentre as duas disciplinas 6 fundamental ao fun- em sua evolução fática" (Aspectos jurídicos dc macroempres~~ cit, p. 3).
cionamento e A prevenção de fraudes através da sociedade unipes- 3. "Die Einmanngesellschaft ijt ein Gebildr, das rechtstheatrethsch zwar riicht
soal. uberzeugend begrundbar ist, das aber gewohnheitsrechtlich arwip-rkannt und voiks-
wirtschaftfich unschadlich ist, fur d i s ein praktisches Bediirfniss besteht und gegen
das ausser begrifflichen Bedenhen nichts Durchgseifendes g e l t d gemacht werden
1 . V . supra, cap. I , nota 94.
kann" - BGHZ 21, p. 384, dtcisão de 11 10 56.
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