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1.

Messianismo

A cultura profético-messiânica deriva da Antiguidade oriental, das tradições cristã,


judaica e muçulmana impregnadas durante o Império Romano na população da Europa
Ocidental. O movimento messiânico mais relevante na história do nosso país, contudo
não único nem primeiro, é o sebastianismo, que consiste na espera pelo retorno do rei
D. Sebastião, após o seu desaparecimento na Batalha de Alcácer-Quibir, ocorrida a 4
de agosto de 1578. O sebastianismo transcendeu o séc. XVI, pois fora transmitido
oralmente ao longo dos tempos, chegando a ser um tema recorrente na literatura
portuguesa. Mais adiante irei debruçar-me em três autores relevantes na literatura
portuguesa e no mito sebastianista: Padre António Vieira (séc. XVII), Fernando Pessoa
(séc. XX) e Miguel Torga (séc. XX). Este sentimento messiânico não assentava na
simples espera do rei, mas numa complexa tradição ibérica milenarista (crença no
milénio pacífico e feliz), escatológica (doutrina pós fim do mundo) e apocalíptica
(discurso profético). O fenómeno da espera de um salvador é muito antigo e constante
adaptando-se a cada cultura e momento histórico. Entre este fenómeno inserem-se
monarcas e reis como o nosso rei D. Sebastião, mas também Carlos Magno, Frederico
II e o rei Balduíno de Flandres. Além destes exemplos, temos o caso do Rei Artur, uma
figura lendária, já que a sua existência nunca fora comprovada, e que retomarei mais
adiante. Começando por tempos mais antigos, devemos falar de Santo Agostinho (séc.
IV/V), um dos antigos intérpretes das profecias que acreditava haver sete idades ao
longo da evolução da humanidade até ao encontro com Deus. Nos finais do séc. XII,
surge Joaquim da Fiore, um abade com ideias opostas à de St. Agostinho. O abade não
previa o fim do mundo, mas o fim de um mundo seguido de um tempo de renovação.
A sua explicação profética assentava em três idades, na do pai, do filho e do Espírito
Santo. A humanidade está alicerçada num percurso cíclico, inicia com o tempo do pai,
em que a humanidade age de forma infantil e controla-se com medo do castigo divino,
segue-lhe o tempo do filho, onde a humanidade melhora e cumpre a ordem divina por
amor a Cristo e finaliza com o tempo da iluminação/ espírito santo, onde a
humanidade atinge a perfeição, porque entende e viu a verdade. Esta repetição sem
fim do tempo mítico juntamente com o tempo litúrgico da igreja (calendário anual que
celebra os pontos religiosas marcantes da história da humanidade) visam a chegada de
alguém que termine e reformule esta cultura popular estagnada, de modo a seguir-lhe
o tempo do milénio, da destruição e da reconstrução (1000 anos). O joaquimismo foi
um incontestável contributo, que estimulou o aparecimento das utopias portuguesas,
principalmente pela sua propagação entre os pequenos comerciantes, e
consequentemente, os cristãos-novos. Temos o caso de Bandarra que através das suas
trovas prenunciava a desorganização social como prenúncio de uma nova era assente
na unificação pacífica, essa nova era ganhava sentido associado à nossa identidade
lusitana. De modo a complementar podemos referir a profecia da estátua de
Nabucodonosor, a estátua que representava os quatro impérios, pois a cabeça de ouro
era o império da Babilónia, o peito e os braços de prata eram o Império Medos, o
ventre e a coxas de bronze eram o Império Persa e as pernas e pés de fero eram o
Império Grego. Na profecia uma rocha derruba a estátua e, consequentemente os
quatro impérios, essa rocha simbolizava o reino messiânico. Por último, o messianismo
arturiano é a crença popular, na Bretanha, quanto ao retorno de um rei lendário,
Artur, suposto antepassado de linhagem de Carlos Magno. A sua nobreza é
comprovada quando milagrosamente retira uma espada cravada numa rocha, ato que
só poderia ser realizado pelo verdadeiro rei. A história messiânica arturiana não
envolve apenas o Rei Artur, mas também os seus melhores cavaleiros, reunidos na
távola redonda em nome do respeito e da igualdade.

2. História

Virando-nos para o contexto histórico, iniciamos o ponto de situação com Carlos


Magno, o rei dos francos (França) e dos lombardos (Germânia) que foi coroado
imperador do Sacro Império Romano pelo Papa de Roma, após este lhe ter assegurado

proteção. O Sacro Império Romano-Germânico tornou-se na maior potência europeia


no século XIV e, posteriormente, no século XVI, durante o reinado de Carlos V.
Entretanto, de 1337 a 1453 dura a guerra dos cem anos entre Inglaterra e França. O
facto dos reis de Inglaterra acharem-se reis de França quando eram apenas vassalos,
juntamente com a ligação económica entre os países, desencadearam os conflitos
militares, económicos e sociais. Inglaterra tinha como aliança o papa de Roma,
enquanto que França tendo instalado o papado em Avinhão de 1309 a 1378
prenunciou graves dificuldades e discórdias em relação à Igreja ocidental. França tinha
como aliados Castela e Portugal. Contudo, devido aos confrontos entre Portugal e
Castela, Portugal passa a ser religiosamente fiel ao papa de Roma e,
consequentemente, submisso e dependente a Roma. A expansão marítima portuguesa
é apoiada por Roma, pois a expansão da fé torna as atividades malignas, como o
comércio de escravos, em algo legítimo. O conceito de reconquista transverte-se numa
feição religiosa, com a missão de limpar os infiéis à religião cristã. Também a cruzada,
batalha entre mouros e cristãos, além de uma feição política, apresenta uma feição
religiosa reformista. Com a expansão pelo norte de África segue-se o processo de
assimilação ao ensinar os mouros e judeus, contudo este processo transforma-se em
exterminação com o édito de expulsão dos infiéis à religião cristã. O rei D. Manuel
assina esse édito, contudo, não querendo perder os judeus, deu-lhes a possibilidade de
se converterem em cristãos-novos. Também em D. Manuel presidia a esperança de
uma união entre o nosso país e Espanha (Leão, Castela e Aragão), ou mais
precisamente em D. Miguel da paz, fruto do primeiro casamento do rei.
Desastrosamente, D. Miguel faleceu ainda bebé, o que impediu a união dos reinos.
Quem sucede ao rei D. Manuel I é D. João III, filho mais velho do rei, fruto do seu
segundo casamento. D. João III casa-se com Catarina de Áustria, filha de Joana de
Castela e de Filipe, o Belo, arquiduque da Áustria e Duque da Borgonha. A princesa de
Áustria é irmã de Carlos V, tendo grandes influências por todo o continente europeu.
Institui-se a inquisição em Portugal durante o reinado de D. João III, após ter sido
solicitado por D. Manuel I. Por influência das ordens monásticas e do ensino a jesuítas
e franciscanos, os imperativos morais da expansão da fé foram cobertos por questões
comerciais. Portugal entra numa desesperada crise sucessória, pois D. João III morre
com os seus nove filhos legítimos já enterrados. A última esperança dos portugueses
estava depositada no neto Sebastião, fruto da relação entre os primos João Manuel,
Príncipe de Portugal e Joana de Áustria, Princesa de Portugal. D. Sebastião nasce já
após a morte do seu pai e sobe ao trono muito jovem aquando da morte do seu avô,
ficando a sua avó como regente. Apelidam D. Sebastião como ‘O Desejado’,
personalidade envolta em mistério desde o nascimento e considerado o sucessor de D.
Afonso Henriques. Apesar de D. Afonso Henriques e D. Sebastião serem figuras
opostas, ambas levam Portugal por um caminho definido, glorioso e de fama. A
Península Ibérica e, particularmente, Portugal apresentavam uma conjuntura ideal

para o aparecimento de crenças messiânicas, tal como foi referido acima. D. Sebastião
como rei exerce o papel de força motriz do reino, contudo sendo o reino muito
pequeno, desregulado socialmente e popularmente insatisfeito acaba-se por dar um
passo maior que a perna como tentativa de alimentar uma aparência de glória. O
messianismo prende-se com a predestinação. O predestinado tem a missão de
concretizar o destino de salvação e felicidade eterna do seu povo. Os portugueses
acreditavam ser o povo eleito e tinham como predestinado D. Afonso Henriques, mas
sem a conclusão da missão, a concretização da mesma sobrevive através das dinastias

incidindo em D. Sebastião. Desta forma, podemos considerar três conceitos, a


predestinação, o providencialismo e o messianismo. A predestinação é um sinal
atribuído a um herói específico de forma a ter conhecimento que lhe cabe
desempenhar uma missão. O providencialismo é o termo que se refere à missão
assumida pelo predestinado e a classificação da mesma como desejo divino. Por
último, o messianismo é a crença proveniente de uma figura, que num tempo futuro,
concluirá a missão providencial e reporá a ordem no mundo. D. Sebastião é o
continuador da missão providencialista de Afonso Henriques, pois é seu descendente.
Contudo, com o seu desaparecimento na batalha de Alcácer Quibir a missão fica em
suspenso. Caber-lhe-á a D. Sebastião regressar para concluir a missão e trazer a glória
a Portugal. Portugal encontrava-se numa conjuntura perfeita ao aparecimento de
profecias: país pobre, sociedade sem regras, homens a partirem para alto mar,
expulsão da população judaica (marranos e a diáspora sefardita), Confrarias da
Misericórdia, onde não admitiam pessoas de sangue mourisco ou cristãos-novos,
roleta dinástica que poderia terminar com a soberania do país (ex. morte sucessiva dos
filhos de D. João III) e a insustentável defesa do norte de África paralelamente com o

controlo comercial no Oriente. Portanto, o século XVI surgem dois profetas, João de
Barros e Gonçalo Eanes Bandarra. João de Barros era fidalgo da casa real nas cortes de
D. Manuel I, o seu repertório é diversificado, sendo ‘Decadas da Asia’ a obra mais
monumental e ‘Grammatica da Língua Portuguesa’ a obra mais interessante para a
cultura portuguesa. Neste contexto, interessa-nos o seu romance de cavalaria, ‘A
crónica do Imperador Clarimundo’, obra encomendada por D. Manuel I para dedicar
ao filho D. João III, de quem João de Barros era aio. Esta obra encerra a estrutura de
criança roubada, substituída e dada por morta. O imperador Clarimundo aparece como
antecessor de D. Afonso Henriques, descendente do rei da Hungria. São relatadas as
aventuras do cavaleiro Clarimundo pelo mundo ao longo do seu percurso de vida
heroico e como se formou inimigo do turco (mouros). Após ficar ferido e perder a
memória, contam-lhe a história dos que serão seus descendentes, desde Afonso
Henriques até D. Manuel, como profecia e predestinação. Envolvem-se no discurso
acontecimentos fantasiosos e a realidade de forma a promover e dar credibilidade à

identidade e glorificação do reino. Gonçalo Eanes Bandarra foi um sapateiro de


Trancoso que teve um papel importante na construção da imagem de um Portugal que
desejava a vinda de um imperador para um mundo pacífico e unificado. Nas suas
trovas apelava profeticamente à vinda de um messias e, devido à sua ligação com os
cristãos-novos, foi detido pela inquisição e com ele as suas trovas foram apreendidas.
Anos mais tarde D. João de Castro mandou editar as suas trovas com as devidas
alterações. Essa manipulação teve por base as crenças sebastianistas, pois
aproximavam a imagem vaticinada de figura mítica, de encoberto, de rei sem
antecessor com ‘O desejado’. D. Sebastião nasce assim num ambiente socialmente
conturbado e politico-imageticamente agitado. Tanto Portugal como o mundo
necessitavam de uma nova ordem para estabelecer um bom caminho da redenção. A
construção da memória faz-nos crer erroneamente que morreu bastante jovem pela
inconsciência e impulsividade própria da idade, mas foi para a batalha já em idade
adulta, aos 24 anos. O ambiente pesado e restritivo da sua infância e adolescência
envolveram-no numa aura mística que o fez acreditar ser o segundo Afonso Henriques.
D. Sebastião nasceu pós a morte do seu pai, a sua mãe foi mandada embora para se
casar de novo, o seu avô morreu quando tinha três anos de idade e nisto a avó
formou-o contando-lhe os feitos antepassados. Impuseram-lhe ser o salvador, com o
peso do reino nos ombros, com a missão religiosa de converter os inimigos da fé,

primeiro os franciscanos e depois os jesuítas. Como Portugal não conseguia manter a


expansão e a defesa do norte de África, surgiu em 1571 uma batalha naval com os
turcos, em que os cristãos saíram vitoriosos. Este acontecimento estimulou o desejo
de D. Sebastião em vencer os muçulmanos do Norte de África. D. Sebastião estava
decidido em proteger a cristandade e espalhar a palavra de cristo, reencenando a
batalha de Ourique, pois a missão portuguesa caber-lhe-ia. Apesar dos mouros serem
mais numerosos, o nosso rei era a reencarnação do mítico Afonso Henriques e Cristo
ajudá-lo-ia a vencer. Assim, Afonso Henriques era o mito e a encenação da batalha o
rito. D. Sebastião fiel ao primeiro rei de Portugal quis canonizá-lo, visitou o Mosteiro
de Santa Cruz de Coimbra, pediu a sua espada e escudo para Alcácer Quibir. Mas o
valor mítico da arma de Afonso Henriques não o salvou da derrota. Apresentam como
explicação o esquecimento da espada e escudo no barco pela ansiedade do momento.
Afonso Henriques não voltou, porque o ritual não foi feito devidamente. A crença que
era apoiada pelo rei, corte, nobreza e clero ficou perdida nas areias do deserto, pois
em vez da reforma ao reino, fez o oposto. Assim, o mito passa de expansão para a

espera, pois o rei, apesar de desaparecer na batalha, nunca foi dado como morto.
Como o rei não deixou descendência entramos de novo numa crise de sucessão. O
Cardeal D. Henrique fica como regente durante dois anos até ao início da dinastia
filipina. As coroas de Portugal e de Castela juntam-se encarnando tudo aquilo que a
nata portuguesa ansiava, a geopolítica tradicional virada do avesso. Ao longo dos
tempos surgiam pessoas a fingir ser D. Sebastião até que a expectativa do seu regresso
se tornou num sonho. Instituiu-se o castelhano como língua de prestígio e o português
como língua do quotidiano, de forma a deprimir a identidade portuguesa. Os escritores

acabavam por escrever em ambos os idiomas. No diálogo descrito, da batalha de


Ourique, entre Afonso Henriques e Cristo, na crónica de Duarte Galvão, é referida a
proteção de Deus até à 16ª geração, ou seja, até D. Sebastião. Este episódio
concretiza-se na prática aquando do problema da 16ª geração e ultrapassagem do

mesmo através de um rei não descendente da coroa portuguesa, Filipe de Espanha.


Segundo as indicações proféticas e a missão providencial, enquanto houver Portugal
há a missão de lutar contra os inimigos de Cristo, uma necessidade de refazer a
memória tendo em conta aquilo que queremos passar na atualidade. D. Sebastião é o
símbolo desta esperança, o imperador do quinto império.
3. Literatura e música atual
Chegamos a uma figura incontornável da literatura portuguesa, o Padre António Vieira,
que acreditava que Portugal estava predestinado a uma missão espiritual universal,
ideia retirada das suas interpretações dos textos bíblicos e das antigas profecias do
Bandarra, sapateiro e poeta de Trancoso. Assim, apresenta-se como teorizador
messiânico assente num império utópico em permanente expansão que engloba todos
os povos. Neste contexto, importa-nos debruçar na vertente profética do escritor
Padre António Vieira presente nos seus sermões. Para ele, Portugal tinha um destino
profetizado e essa profecia era o quinto império, correspondente a uma profecia
bíblica muito antiga. Segundo António Vieira a interpretação existente até à data era
muita antiga e portante incorreta, pois nessa altura não existia ainda Portugal nem os
descobrimentos portugueses. A descodificação dos sinais feita por António Vieira é
evolutiva e lida à luz dos tempos, conhecimentos e mensagens dos antigos profetas.
Devemos partir da desmistificação de Utopia, algo utópico não se pode situar no
espaço, pois é um ideal não realizável em terra. Contudo, o Padre António Vieira
acredita que se irá realizar espírito e fisicamente em Portugal, na capital, Lisboa, com o
rei de Portugal. As premissas que utilizava eram manipuladas para chegar ao resultado
pretendido assente num raciocínio lógico sofista. A crença sebástica pretendia o
regresso do rei D. Sebastião de forma a ultrapassar a dominação espanhola e voltar a
dar a capacidade resplandecente a Portugal. Como o imperador desejado não voltou
para instaurar Portugal e o quinto império, surgiram outras hipóteses que
interpretavam o encoberto da profetização de Bandarra com D. João IV. Mas D. João IV
faleceu sem concretizar o quinto império, assim a lógica baseou-se na crença da sua
ressurreição. Na teoria de Padre António Vieira, visto que a profetização de Bandarra
era fidedigna e ele a associou a D. João IV o cumprimento da mesma teria de ser
realizado mesmo após a sua vida. Padre António Vieira foi preso nos calaboiços da
inquisição escrevendo várias obras entre elas ‘A chave das profecias’ que apresentava
o método de descodificação do enigma do futuro, em latim, para tornar Portugal no
quinto império. Foi um transgressor que ousou contar aos homens o que Deus
guardava para si e ao contrário do ser espiritual que aparentava ser no filme ‘Palavra e
utopia’, na verdade ele era um homem mais terreno e pragmático. A eliminação dos
inimigos da fé não estava presente nas trovas de Bandarra, tal como a visão de paz
utópica do padre, contudo a realidade do mundo dividia os escolhidos e os não
escolhidos. Depois passamos para Fernando Pessoa. que publica a ‘Mensagem’, única
obra que edita em português, ligada à confraria e ideologia ocultista. Nesta obra,
Fernando Pessoa considera três profetas: o Padre António Vieira, Bandarra e ele
próprio. A Mensagem, a partir do sebastianismo e da crença no Quinto Império,
pretende avivar a superação e transcendência do tempo das navegações e profetizar o
destino de Portugal, o império cultural e ideológico descendente dos quatro impérios
que formaram a nossa cultura (Grécia, Roma, Cristandade e Europa). Fernando Pessoa
utiliza a poesia para demonstrar a crença que visa vencer o abatimento da época,
como tal escolhe D. Sebastião como representação dos sonhadores, loucos e mártires.
Esta figura é o símbolo do Quinto Império e é o ''protótipo da loucura heroica'' com
sinais de uma crença na esperança, de um tempo de glória que está por vir, um destino
assegurado por Deus, prometido desde os tempos de Ourique. A estrutura da
‘Mensagem’ divide-se em três partes: Brasão, Mar Português e O Encoberto que
correspondem ao nascimento de Portugal, à sua ascensão e o seu declínio,
respetivamente, ao qual se seguiria um suposto renascimento. O ENCOBERTO é o
tempo do sono, da espera pelo ressurgimento, pelo tempo da paz do Quinto Império,
em que se cumprirão as profecias e a vontade divina. O QUINTO IMPÉRIO, debruça-se
sobre a ideia do tempo prometido, o tempo em que Portugal se levantará como nova
civilização, um império espiritual e não material de ordem da alma e da cultura. Para
se chegar ao quinto império é preciso seguir o exemplo de D. Sebastião e vencer a
passividade, acomodação e conformismo. Por último, Miguel Torga n’Os Poemas
Ibéricos parte do louvor à terra, construindo um mito em que Portugal e Espanha são
apresentados como um único povo, possuidores do mesmo destino. Em contraposição
de Pessoa, vira as costas ao mar e às navegações, vendo o mar como traidor que afoga
o lavrador e que só se deverá usar para a agricultura. Torga aposta no iberismo
procurando resgatar as relações de Portugal com os outros povos da península ibérica,
atual Espanha. Os seus textos exaltam os laços históricos e culturais partilhados pelos
portugueses e pelos espanhóis. Miguel Torga recorre a Sancho Pança, personagem de
Miguel de Cervantes, como alegoria do povo ibérico trabalhador, simples, pobre e
humilde que deve lutar por uma vida melhor e mais justa. Comprovamos que o mito
sebastianista sobreviveu durante imenso tempo, prova disso foi a usurpação desta
crença durante o salazarismo, como pudemos observar no filme ‘Non’ ou a vã gloria do
mandar, o que levou o país a padecer. Ainda na atualidade, as marcas messiânicas
permanecem, essencialmente, na música. Exemplos disso são os temas ‘O Homem do
leme’ e ‘Portugal, Portugal’, d’Os Xutos e Pontapés e do Jorge Palma, respetivamente.
N’O homem do leme consegue-se fazer uma analogia com a Mensagem, a noite sem
rumo do predestinado que apesar de ir a direito não sabe onde vai. Por outro lado,
coincide com os Poemas Ibéricos pois o desfecho é acabar no fundo do mar. A religião
é nos imposta, não temos possibilidade de decidir, não temos futuro. Em Portugal,
Portugal, o nosso país está assente num esqueleto sebastianista e numa ilusão de que
não é nosso. O império marítimo caiu e entrámos na espera glória, que poderá chegar
ou não.

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