Você está na página 1de 4

RESENHA: BENAK DE ABREU, C.

Também com memes se ensina e se aprende


história: uma proposta didático-histórica para o Ensino Fundamental II. Palavras
ABEHrtas, [S. l.], n. 1, 2021. Disponível em:
https://palavrasabehrtas.abeh.org.br/index.php/palavrasABEHrtas/article/view/12

Nos últimos anos, foi possível perceber o boom das tecnologias digitais e a
consequente transformação social promovida por elas. Hoje, no tempo da geração
Homo Zappiens (VEEN; VRAKKING. 2009), é necessário, não abandonar
completamente as práticas educacionais tradicionais, mas adaptá-las e moldá-las ao
momento presente. Nesse contexto, a escola, um dos lugares mais primordiais de
socialização, produção e disseminação de ideias e de cultura, ainda se encontra em
um estado muito preambular de atuação para esse novo cenário.
A Dissertação de mestrado de Cíntia Benak de Abreu, sendo assim, traz
saberes valiosíssimos sobre a temática das mídias digitais e de novos recursos
pedagógicos para o ensino de história. Intitulada “Também com memes se ensina e se
aprende história: uma proposta histórico-didática para o ensino fundamental II”,
publicada pela editora da UERJ em 2020, o trabalho traz um elemento fundamental
para ajudar professores a ressignificar as formas de ensino-aprendizagem de modo
que faça mais sentido ao aluno: os memes. A pesquisa, fundamentada no conceito de
didática histórica de Rusen e Cerri, busca promover uma aprendizagem histórica
significativa a partir da análise e produção de memes com alunos dos 6° e 8° anos de
uma escola privada do Rio de Janeiro. Em outras palavras: “...desenvolver, a partir de
propostas didático-históricas, organizadas como aulas-oficinas, uma aprendizagem
histórica significativa em diálogo com os memes da Internet produtores de narrativas de
sentido histórico.” (p.17). Como produto, foi elaborado o Guia Didático online, artefato
didático escolar, que objetiva orientar e motivar outros professores do Ensino
Fundamental II a experimentarem com os memes em suas aulas.
Dividido em três capítulos, o texto inicia a partir do relato da autora sobre uma
fala de seu aluno, que, ao dizer “Não faz meme, professora”, e escutar os discursos do
resto da turma sobre a rotina enfadonha em sala de aula, repensa toda a sua prática
pedagógica. A conversa com seus estudantes, envolvendo debates sobre a vida online
e a cultura escolar a estimulou a refletir sobre novas maneiras de ajudar aqueles
sujeitos a conseguirem desenvolver uma consciência histórica de fato, dando
significado às suas ações.
O capítulo que inicia, nomeado por Benak de “Memes como artefato cultural
digital”, propõe a entender o contexto cultural em que vivemos agora e analisar a
importância dos memes nesse sentido. Ela situa o conceito de meme a partir de Leal-
Toledo (2009), afirmando que meme é tudo aquilo que determinado indivíduo pode
imitar ou aprender com outro. Ainda sobre o conceito da palavra, é dito que

“Esta pesquisa entende o meme como um artefato


cultural digital que se articula como uma linguagem com
alto potencial comunicativo e que se manifesta a partir
de gifs, links, palavras, imagens legendadas com figuras
famosas da cultura popular, videos e sons que se
popularizaram a partir de um formato próprio de se
propagar na rede” (p. 18)

O termo “meme”, de acordo com a autora, surgiu a partir de uma analogia feita
por Richard Dawkins. Nessa analogia, ele afirma que, assim como os genes, os memes
são elementos de produção e reprodução, mas não do material genético, e sim de
cultura, dando origem, em consequência, à ciência genética. Ao longo do tempo, o
termo vai se ressignificando. Para Shifman, por exemplo, os memes são itens digitais
que compartilham características em comum, sendo criados em associação da
consciência uns dos outros (2014).
Seguindo adiante, é essencial a análise que a historiadora faz ao entender a
falta de sentido no processo de ensino aprendizagem. Isso é visto de perto por todos
os profissionais da área. Temos visto, apenas recentemente, uma estratégia diferente
de abordar os conhecimentos históricos, partindo do mais próximo ao sujeito ao mais
distante. Entretanto, o livro didático, ainda que compartilhem deste elemento,
continuam engendrados em uma mesma estrutura desinteressante ao alunado, o que
causa, muitas vezes, entre outras coisas, uma evasão exponencial de estudantes. O
ser humano contemporâneo é, segundo Caimi e Nicola, uma “nova espécie que atua
em cultura cibernética global com base na multimídia” (p. 28). Grupos diferentes, neste
caso, vão se enfrentar: os nativos digitais (alunos) e os imigrantes digitais (professores
anteriores à década de 1980). Isso nos levar ainda a refletir sobre a importância da
formação continuada na carreira docente, visto as constantes transformações da
humanidade.
Portanto, a construção de uma consciência histórica que permite o
desenvolvimentos de saberes e de sentidos da experiência do tempo para o homem
(RÜSEN, 2010) só será possível se essas experiências forem passadas através de
meios comunicacionais que dialoguem diretamente com o leitor e seu contexto sócio-
cultural.
No capítulo 2, “Meme como objeto de estudo no campo do ensino de história:
revisão bibliográfica” a autora se preocupa em fazer uma seleção das pesquisas mais
relevantes sobre o tema a partir da perspectiva da didática histórica de Rüsen, que
afirma que didática histórica é “... investigar o aprendizado histórico, uma das
manifestações e dimensões da consciência histórica.” (p. 53). Ela passeia por
importantes trabalhos, como o de Mendes e Costa (2016), pioneiro na produção de
uma escrita que relaciona memes com o ensino de história; de Sílvio Cadena, que se
preocupa em analisar os memes criticamente a partir de 4 etapas: verificar as
características da página onde foi encontrada, identificar os elementos imagéticos e
textuais e seus possíveis significados, expor o contexto das imagens e relacioná-las ao
tempo presente, como também ao passado a que se referem e tratar acerca das
discussões historiográficas sobre a temática abordada, sejam elas acadêmicas ou
escolares - ênfase no planejamento para uma prática significativa.
Outros trabalhos são citados por Benak, como o de Bárbara Zacher Vitória e o
de Alessandra Michelle Alvares de Andrade (2018), e o de Luisa Quarti Lamarão
(2019). Na segunda parte do capítulo, ela se debruça sobre nos relatos de docentes
que não tiveram a oportunidade de serem publicados, concluindo que o meme é um
elemento pedagógico bastante utilizado entre os professores do ensino básico
pesquisados na época.
Finalmente, no último capítulo, “Memes no ensino de história: aulas-oficina, a
professora relata como foi feito seu projeto, intitulado da mesma maneira que o
capítulo. Ele foi organizado em duas etapas: 1) Diálogos da linguagem memética com o
ensino de história; e 2) Organização prática das aulas oficinas. Na primeira etapa,
executada no segundo semestre de 2019, aconteceu a partir de atividades com
memes, em que a professora incitava os alunos, a partir da temática estabelecida, a
refletir e entender. Ela fez isso partindo das proposições de análise de Sílvio Cadena. A
segunda etapa, elaborada no ano de 2020, foi feita de maneira remota devido à
pandemia de COVID-19, mas caminhou normalmente, com três propostas: memes
contam histórias? Coronavírus: o presente por meio dos memes; varal de memes; e
memes em ambientes colaborativos. Após a criação dos memes pelos estudantes, uma
página no instagram foi criada, na esperança de promover uma história pública.
Ao final da dissertação, Cíntia Benak ainda disponibiliza um Guia didático on-line
que auxilia professores na utilização dos memes em sala de aula.
Em linhas gerais, o trabalho é bastante eficaz no que se propõe a fazer, sendo
bastante objetivo e claro em seus objetivos e métodos. É preciso se colocar enquanto
ser humano transformador da sociedade e que se transforma ao mesmo tempo.
Entender que a categoria do alunado de hoje em dia não aprende da mesma maneira
que o alunado de vinte anos atrás não é uma simples tentativa de promover melhorias
no processo de ensino-aprendizagem, é necessário. Sendo assim, o trabalho traça
caminhos para a construção de professores e professoras cada vez mais competentes.

Você também pode gostar