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Zoneamento urbano:

estabelecendo relações entre


as estruturas que dão sustentação à
produção do espaço urbano

Uso do solo/sistema viário/transporte público


O início do século XXI trouxe ao mundo ocidental, e consequentemente para o Brasil, a regula-
mentação das várias questões urbanas, editadas e definidas em leis, buscando organizar o espaço da
cidade como um todo, melhorando a vida de todos os cidadãos tanto do meio urbano quanto do meio
rural, buscando principalmente a ideia de cidades sustentáveis com preocupações sociais e ambientais,
visto que esse é um dos aspectos atuais de maior preocupação em todo o mundo.
O zoneamento urbano tem como função garantir a organização territorial, coordenando a locali-
zação das diversas atividades urbanas, buscando reduzir impactos e otimizar as relações de vizinhança
do ponto de vista econômico e também social.
O planejamento do uso do solo procura abranger uma precisa compreensão de todos os tipos
possíveis de ocupação do território como moradia, trabalho e lazer, colocando esses usos em harmonia.
Juntamente com o estudo do uso do solo deve estar o estudo do sistema viário e do transporte, que
dão as informações sobre o fluxo de pessoas e mercadorias dentro do território, sendo então esses três
fatores complementares entre si e fundamentais de serem planejados em conjunto.

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As diversas formas de utilização do solo urbano podem ser classificadas, de um modo geral, nas
seguintes categorias:
::: residencial;
::: comercial e de prestação de serviços;
::: exclusiva para transporte;
::: industrial;
::: institucional ou para edifícios públicos;
::: áreas de lazer;
::: áreas de conservação e preservação ambiental;
::: áreas desocupadas (vazios urbanos).
Não há padrão que determine o tamanho e a proporção de cada área dentro do planejamento
da cidade. Elas devem ser definidas de acordo com as atividades e a densidade populacional, sendo
necessário prever o futuro crescimento, normalmente dez anos, de acordo com a sua vocação e a pro-
jeção de crescimento da população, dado geralmente fornecido pelas pesquisas do Instituto Brasileiro
de Geografia e Estatística (IBGE).
Alguns serviços públicos como postos de saúde, escolas e creches, postos de polícia, entre outros,
possuem um raio de ação ideal, devendo atender certo número limitado de pessoas, de modo a não
sobrecarregar os serviços nem a ausência destes para a comunidade.
As cidades atuais guardam heranças dos preceitos previstos na Carta de Atenas (IV Congresso
Internacional de Arquitetura Moderna, Atenas, 1933). A proposição da cidade funcional deveria ter como
funções básicas: habitar, trabalhar, recrear e circular, para que o tecido urbano então existente pudesse
ser “recriado” de forma a atender as prementes necessidades urbanas.
Além da preocupação com o uso do solo, o planejamento urbano deve compatibilizar o sistema
viário da cidade com o sistema rodoviário municipal, como também com os meios de locomoção dos
indivíduos, buscando assegurar aos cidadãos um modo de vida saudável, proporcionando uma cidade
organizada, funcional e habitável, além de dotá-la de espaços para o lazer e diversão, e o acesso de todos
os cidadãos aos serviços públicos urbanos.
A introdução do veículo como meio fundamental de transporte dentro do meio urbano trouxe aos
cidadãos uma melhor maneira de aproveitar todo o território da cidade, do município e de seu entorno,
assim como facilitou o acesso aos locais de trabalho, lazer e moradia. Porém, seu grande contingente,
ocorrido atualmente, acabou por trazer também o caos à vida urbana e maus costumes à população,
que está, cada vez mais, trocando o transporte coletivo e os meios alternativos de locomoção por seu
veículo particular. As mudanças de hábitos se revelam também na saúde da população, que deixou de
exercitar o corpo com caminhadas e pedaladas, encarando somente o automóvel como meio de trans-
porte digno e rápido, justamente pelo cotidiano que se encontra cada vez mais acelerado.
O planejamento do sistema viário deve levar em consideração tanto as instalações dos usos exis-
tentes quanto as necessidades futuras da cidade e de seus moradores. Alguns aspectos devem estar
incluídos nesse planejamento como sinalização, corredores de tráfego, implantação de estacionamen-
tos, hierarquização das vias e localização de terminais de transporte, pois são as vias que induzem e
conduzem o tráfego de veículos e pessoas, assim como influenciam as ocupações pelo território.

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O sistema viário tem como principal objetivo estabelecer a comunicação entre todas as partes
do município. A cidade e sua respectiva região devem estar preparadas para formar uma rede de vias
compatibilizadas aos usos propostos, organizando a circulação dos mais diversos meios de locomoção.
É necessário haver a classificação e diferenciação das diversas vias, adequando à natureza dos veículos
a serem utilizados, evitando conflitos de usos, facilitando e incentivando os diferentes modos de loco-
moção.
A implantação de grandes polos geradores de tráfego como centros comerciais, estádios de futebol,
supermercados, entre outros, requer um estudo detalhado dentro da cidade, com determinação de vias
de acesso e locais de estacionamento apropriados, minimizando ao máximo o impacto causado em seu
entorno imediato.
A hierarquização do sistema viário proporciona:
::: garantia de acessibilidade aos diversos setores e zonas da cidade;
::: indução a uma estrutura urbana organizada;
::: equilíbrio dos fluxos da rede viária;
::: otimização das potencialidades das diversas vias, assim como dos setores da cidade;
::: definição de alguns corredores de comércio e serviços;
::: integração ao sistema de transporte coletivo e ao uso do solo;
::: legibilidade à cidade.
As cidades, para que consigam ser muito bem estruturadas, devem pensar o uso do solo, o sistema
viário e o transporte de forma compatibilizada, gerando uma interdependência entre eles.

O zoneamento de uso e ocupação do solo urbano


A Lei do Zoneamento de Uso e Ocupação do Solo Urbano de uma cidade procura estabelecer a
divisão do território em zonas ou setores, estabelecendo critérios e parâmetros com o objetivo de orientar
e ordenar os vetores de crescimento da cidade. É importante salientar que a lei deve possuir três tipos
de documentos: a parte descritiva, as tabelas com os diversos parâmetros e os mapas explicativos com
a localização espacial das diversas zonas ou setores.
Com o zoneamento podemos identificar a divisão do território da cidade, visando dar a cada
região melhor utilização em função do sistema viário, da topografia e da infraestrutura existente, por
meio da criação de zonas e setores de uso e ocupação do solo e adensamentos diferenciados. As zonas
e setores são delimitados por vias e logradouros públicos com seus respectivos acidentes topográficos
e divisas de lotes, e seguem alguns objetivos como:
::: estimular à produção do emprego e da renda, buscando incentivar o desenvolvimento de ati-
vidades e sua melhor distribuição na cidade;
::: compatibilizar o uso do solo com o sistema viário e com o transporte coletivo;
::: hierarquizar o sistema viário, garantindo o deslocamento ordenado de veículos, bem como o
adensamento habitacional e das diversas atividades comerciais;
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::: integrar as áreas periféricas ao espaço urbano mais central;


::: buscar uma melhor qualidade de vida à população, em um espaço urbano adequado e funcional;
::: preservar a escala da cidade e seus meios naturais, culturais e paisagísticos;
::: promover a participação de toda a comunidade na gestão urbana.
Para se colocar em prática esses objetivos, alguns instrumentos devem nortear as ações na cidade.
Por isso devem ser observadas as concessões de alvarás de construção e de localização de usos e atividades
urbanas, a execução de planos, programas, projetos e obras referentes a edificações, a urbanização de
todas as áreas do perímetro urbano, assim como o parcelamento do solo.
De acordo com sua categoria, porte e natureza, em cada zona ou setor as atividades urbanas serão
consideradas como:
::: Permitidas – atividades que apresentam compatibilidade com as finalidades urbanísticas
definidas para a zona ou setor correspondente.
::: Toleradas – atividades admitidas em zonas ou setores onde as atividades permitidas lhes são
prejudiciais ou incômodas.
::: Permissíveis – atividades que dependerão de análise específica, pois necessitam de certa ade-
quação à zona ou ao setor. Essas atividades poderão ser apreciadas pelo órgão responsável do
Poder Público Municipal, que indicará as adequações a serem realizadas para implantação de tal
atividade, evitando a ocorrência de conflitos com o entorno e com o sistema de acessibilidade
e de mobilidade. A permissão para a localização de qualquer atividade de natureza perigosa,
incômoda ou nociva dependerá de licença ambiental expedida pelo órgão competente.
::: Proibidas – atividades de categoria, porte ou natureza consideradas perigosas, incômodas ou
incompatíveis com as finalidades da zona ou setor correspondente. Serão consideradas como
de uso proibido, em cada zona ou setor de uso, todas as atividades que não estejam relacionadas
nas outras tipologias de usos citados.
Cada zona deverá ter seu lote mínimo definido na legislação, a fim de garantir a ocupação homo-
gênea das diversas áreas da cidade, evitando que se formem ou permaneçam os vazios urbanos para
que a infraestrutura seja otimizada.
O uso do solo urbano pode ser classificado conforme as seguintes categorias:
::: Habitacional – destinado à habitação familiar permanente ou transitória.
::: Comunitário – destinado a atividades como: educação, lazer, cultura, saúde, assistência social
e culto religiosos.
::: Comercial e serviço – destinados à estabelecimentos onde ocorrem a circulação de mercadorias
e a prestação dos mais variados serviços.
::: Industrial – caracterizados por atividades de transformação de insumos e produção de bens.
::: Conservação – destinados a atividades que tenham baixo impacto na ocupação do solo.
::: Preservação – caracterizados por elementos naturais que necessitam de total preservação,
como rios, lagos, bosques e mangues.

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Em todas as zonas ou setores urbanos é permitido que aconteça o uso de mais de uma dessas
categorias dentro do mesmo lote, desde que sejam atendidas as classificações e regras estabelecidas
pela lei.
As atividades urbanas para uso comercial, serviços e industrial podem ainda ser classificadas pelas
seguintes características:
Porte:
::: Pequeno porte – área construída de até 100m².
::: Médio porte – área construída entre 100m² e 400m².
::: Grande porte – área construída superior a 400m².
Natureza:
::: Perigosas – atividades que possam dar origem a explosões ou incêndios, assim como possam
resultar na produção de gases, poeiras e detritos considerados danosos à saúde ou que repre-
sentam perigo à vizinhança.
::: Incômodas – atividades que possam causar perturbações à vizinhança.
::: Nocivas – atividades que envolvam manipulação de materiais que possam prejudicar a saúde,
ou ainda cujos resíduos possam poluir o meio ambiente.
::: Adequadas – atividades que são compatíveis com a zona ou setor em questão e que não se
enquadrem nas classificações anteriores.
::: De impacto – atividades que possam causar alteração no ambiente vizinho, por aumento con-
siderável no atendimento da infraestrutura local, ou ainda que exijam estudo de licenciamento
especial por parte dos órgãos competentes do município.
Cada zona ou setor possui ainda critérios para construção de edificações nos lotes, que são esta-
belecidos pelos seguintes parâmetros de ocupação:
::: Taxa de ocupação – percentual expresso pela relação entre a área de projeção da edificação
sobre a área do lote ou terreno onde se pretende edificar.
::: Coeficiente de aproveitamento – fator que, multiplicado pela área do terreno, define a área
máxima construída admitida nesse mesmo lote ou terreno (potencial construtivo).
::: Altura – dimensão vertical máxima da edificação, medida de seu ponto mais alto até o nível do
terreno, podendo ser expressa em metros ou pelo número de pavimentos.
::: Recuo – distância mínima entre a fachada da edificação e o alinhamento predial existente.
::: Afastamento – distância mínima permitida entre a edificação e as divisas laterais e de fundos
do lote.
::: Taxa de permeabilidade – percentual da área do terreno que deve ser mantido permeável,
livre de qualquer edificação ou pavimentação. Essa taxa poderá ser reduzida se implantados
mecanismos de contenção de cheias, como cisternas ou bacias de contenção.
::: Dimensão do lote – é estabelecida para fins de parcelamento do solo e ocupação do lote e
indicada pela testada e área mínima. Os terrenos de esquina terão acrescidos à testada mínima,
o recuo obrigatório previsto para a zona onde o terreno se localiza.
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A figura a seguir apresenta o zoneamento de Fortaleza, CE, objeto do Plano Diretor de 2006. Esse
zoneamento exemplifica o que foi relatado anteriormente, no que diz respeito à divisão da cidade con-
forme as diversas características locais.

Disponível em: <www.sepla.fortaleza.ce.gov.br/images/stories/03%20-%20Zoneamento_Urbano.jpg>.


Zoneamento – Fortaleza, CE, 2006.

Parâmetros urbanísticos
A paisagem da cidade vai sendo formada conforme seus parâmetros estabelecidos pela Lei do
Zoneamento de Uso e Ocupação do Solo. Os diversos parâmetros permitem a diferenciação dos setores
da cidade, como áreas onde somente é permitida a construção de residências familiares com apenas
um pavimento, áreas onde é permitida a construção de pequenos edifícios com até quatro pavimentos,
ou áreas onde são permitidos arranha-céus, cada qual com menor ou maior adensamento habitacional,
formando então o panorama e a paisagem urbana. Os setores também podem ser percebidos conforme
seus usos, como os setores onde somente acontecem habitações, ou onde prevalece o comércio, ou
ainda, os usos industriais.
Nos diferentes setores da cidade, os usos, que devem ser definidos por lei, normalmente são divi-
didos nas seguintes zonas:

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::: Zona central – local onde ocorre grande concentração de atividades, contendo, geralmente,
o centro histórico da cidade.
::: Zona residencial – dividida de acordo com a maior ou menor possibilidade de adensamento1
do território urbano, tanto populacional quanto construtivo.
::: Zona de serviço – que acontece ao longo de grandes eixos viários urbanos, contendo ativida-
des comerciais e de serviços, sendo estas geradoras de grande tráfego de carros e pessoas.
::: Zona industrial – local destinado à implantação de atividades industriais de todos os portes,
podendo ainda ser classificada de acordo com a poluição a ser gerada.
::: Zona de uso misto – onde podem ocorrer várias atividades urbanas, sendo caracterizadas
como apoio às zonas industriais e de serviços.
::: Áreas de Proteção Ambiental (APAs) – são geralmente extensas áreas verdes, com certo
grau de ocupação humana, dotadas de tributos ambientais de relevante importância para a
qualidade de vida da população, e possuem como principal objetivo a proteção da diversidade
biológica, sendo necessária, portanto, a disciplina do processo de ocupação para assegurar a
sustentabilidade do uso dos recursos naturais ali presentes. Essas áreas geralmente compõem
as bacias de captação de água potável, denominadas de mananciais, e necessitam de restri-
ções para a sua ocupação. As APAs, como são denominadas, possuem leis ambientais federais
e estaduais específicas que devem ser observadas na legislação municipal de uso e ocupação
do solo.
::: Setor especial – área onde ocorre condição especial de ocupação, na qual são definidos cri-
térios que considerem as diretrizes de ocupação da cidade, porém com características que
a definam como área diferente em relação às demais, pois estão condicionadas por fatores
externos relevantes. Uma das áreas que devem ter especial atenção, por exemplo, diz respeito
às atingidas pelo cone da aeronáutica, ou seja, as que devem possuir restrições para o pouso
e decolagem de aeronaves. Essas áreas devem ser objeto de detalhados estudos, justamente
pelas inconveniências que veem apresentando às ocupações de seu entorno. Também as áreas
próximas a linhas férreas que cruzam linearmente as áreas urbanas devem possuir especial
tipologia para a ocupação.
Há ainda algumas áreas na cidade onde estão localizados certos espaços, tanto edificados como
espaços abertos, onde existe certa importância histórica relevante para o município. Tendo em vista a
proteção e preservação desse patrimônio, deve ser estabelecida condição especial de ocupação dessa
área, ou mesmo a transferência a terceiros do potencial construtivo permitido no imóvel, objeto de limi-
tações urbanísticas, aos que doarem ao município o imóvel sob proteção e preservação. Esses espaços
podem ter duas classificações: unidades de interesse de preservação e unidades de conservação.
Pode também se aplicar, nesses casos, a desapropriação parcial ou total de imóveis necessários
à adequação do sistema viário e à instalação de equipamentos urbanos e comunitários de uso público.
Essas ações, de total interesse da cidade, podem vir a ser objeto de aplicação de instrumento do Estatuto
da Cidade2 denominado Direito de Preempção, que deverá estar previsto pelo Plano Diretor Municipal e
que permite ao Poder Público a preferência na compra de áreas para esses fins.

1 Relação habitantes ou metros quadrados construídos por território, normalmente a medida utilizada é m²/ha (hectare) ou hab/ha (hectare).
2 Lei 10.257, de 10 de julho de 2001.

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Todas as questões contidas na Lei de Uso e Ocupação do Solo Urbano vão sempre influenciar o
mercado imobiliário, pois as áreas serão mais ou menos valorizadas pela possibilidade de seu potencial
construtivo como também pela oferta de infraestrutura que possui.
É bastante importante estar sempre atento a essas observações, e à discussão para a revisão, o
aperfeiçoamento e modificações na Lei de Zoneamento de Uso e Ocupação do Solo, que a cada 10 (dez)
anos deve ser feita. Algumas vezes essas modificações podem mudar totalmente o panorama das valo-
rações imobiliárias.

Texto complementar
Proposta de revisão do Plano Diretor Estratégico do município: revisão ou
descontinuidade no planejamento de São Paulo?
(MAGLIO, 2007)
A legitimidade do Plano Diretor Estratégico do município de São Paulo (PDE) foi construída por
meio da transparência em sua elaboração, construção participativa e pela atualidade de aplicação
dos instrumentos da Lei Federal do Estatuto das Cidades em sua elaboração, que o transformaram
em paradigma para os municípios que desde 2002 vem atualizando seus planos diretores. Além disso,
o PDE 2002-2001 foi aprovado por unanimidade pela Câmara Municipal com a aprovação da Lei
Municipal 13.430/02 em 2002.
Dando consequência ao Plano Diretor Estratégico no período 2003-2004 e após cerca de 300
reuniões públicas, foram amplamente discutidos e finalmente aprovados os Planos Regionais Estra-
tégicos (PRES) para cada uma das 31 subprefeituras, em um processo que respeitou a diversidade
das regiões da cidade, em sintonia com uma nova disciplina de uso do solo, esta também aprovada
por meio da Lei Municipal 13.385/04.
Dessa forma, com a aprovação dessas legislações retomou-se de forma republicana o processo de
planejamento e criou-se um patrimônio da cidade e uma conquista democrática dos seus cidadãos.
Desde então poucas iniciativas foram tomadas pelo atual governo municipal para implementar o
PDE e os instrumentos urbanos por ele criados, e nenhuma delas buscaram vincular o PDE e os PRES ao
orçamento municipal, para que seus objetivos e ações estratégicas fossem consolidados de forma a ga-
rantir a continuidade do processo de planejamento e a melhoria da qualidade urbana em nossa cidade.
A continuidade nos processos de planejamento urbano vem sendo construída com sucesso
pelas metrópoles latino-americanas, como Bogotá e Santiago do Chile, que buscam solucionar seus

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problemas comuns e criar um novo caminho para as metrópoles dos países em desenvolvimento,
tais como maior sustentabilidade ambiental, segurança, valorização do espaço público, habitação,
melhoria nos sistemas de transporte de massas.
Infelizmente, no caso da nossa tão sofrida São Paulo, o excesso de partidarização política da
administração pública e a tendência tradicional à subordinação ao mercado imobiliário vêm colo-
cando em risco a continuidade dessas conquistas duramente alcançadas após 32 anos de falta de
planejamento e casuísmos urbanísticos de toda espécie, com Planos Diretores que nunca saíram do
papel e com operações urbanas guiadas pelos interesses exclusivos do mercado.
Entretanto, as regras para a elaboração da revisão do PDE abrem a possibilidade de criar pro-
fundas alterações nos seus conteúdos, conceitos e diretrizes de zoneamento, indo além do que esta-
belecia o artigo 293 do PDE. Esse artigo prevê que o executivo deveria encaminhar à Câmara Munici-
pal o projeto de revisão do Plano Diretor Estratégico em 2006, adequando as ações estratégicas nele
previstas e acrescentando áreas passíveis de aplicação dos instrumentos previstos na Lei Federal
10.257/2001 – Estatuto da Cidade e, também, no parágrafo único desse mesmo artigo, que o execu-
tivo coordenará e promoverá os estudos necessários para a revisão prevista no caput desse artigo.
Porém, essa diretriz de revisão vem sendo desrespeitada e o que vem acontecendo contraria
flagrantemente a Lei Federal do Estatuto das Cidades e a Lei Orgânica do Município (artigo 123,
parágrafo 3.º), quanto às exigências de transparência na discussão e participação da comunidade em
todas as fases do planejamento municipal.
A proposta apresenta alterações estruturais, como a retirada das políticas de desenvolvimento se-
toriais e respectivos objetivos, diretrizes e metas, as regras que disciplinam e classificam as vias em re-
lação ao uso do solo, as ZEIS – Zonas Especiais de Interesse Social e o Coeficiente de Aproveitamento
Máximo para construir na cidade, previsto de quatro mudando-o para até seis vezes a área dos terrenos.
Assim, propõe-se a modificação, desses e outros conceitos fundamentais construídos durante a
discussão e formulação pública do PDE em 2004, rompendo com a transparência e com a construção
de um processo de planejamento construído após 32 anos de autoritarismo e de dificuldades viven-
ciados pela cidade. A elaboração do PDE retomou um processo de planejamento e transparência
que garantiu a possibilidade de participação da sociedade paulistana para que o Plano Diretor se
realize e sofra as devidas revisões de forma democrática.
Pelo site da Sempla apresenta-se uma minuta de revisão do PDE com cerca de 600 artigos apre-
sentados e lá pelas tantas somente um leitor atento vai perceber a “criação de uma anistia constru-
tiva interna ao próprio PDE com a proposta do Termo de Compensação Urbanística inserida para
anistiar imóveis irregulares em relação às leis de uso do solo”.
Essa e outras alterações são incluídas sem nenhuma justificativa, num exercício de “antiplane-
jamento”, onde políticas de desenvolvimento são retiradas, metas e objetivos são eliminados, sem
explicitar quais artigos ou itens são objeto de revisão e por quê. Que avaliação da implementação do
PDE levou à necessidade de mudanças tão profundas?
O que se pretende com essas e outras alterações?
O texto da revisão, pelo bem da transparência, deve esclarecer, avaliar e justificar o que está
sendo objeto de “revisão”, e não apenas repetir como “mantra” cerca de 600 artigos, vários deles

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repetindo os da lei em vigor, para que se descubram ao longo do texto, artigos com mudanças es-
truturais ali escondidos. Por exemplo: a mudança da classificação do sistema viário municipal e as
alterações conceituais em relação às Zonas Especiais de Interesse Social (ZEIS 3), e artigos contendo
pérolas, tais como ”valem coeficientes de aproveitamentos máximos da legislação de uso do solo de
1972 no território das subprefeituras, mesmo que estes tenham sido reduzidos pelo próprio plano
regional”.
Ora, a revisão do PDE não foi prevista para alterar os fundamentos do PDE, sob pena de fazer o
planejamento urbano ficar ao sabor das administrações e partidos políticos e das pressões momen-
tâneas e aos jogos de interesse. Importante, como coloca o recém-lançado “Movimento Nossa São
Paulo, Outra São Paulo”, é dar maior estabilidade ao Plano Diretor, uma vez que este já é lei, e tornar
seu cumprimento cada vez mais exigido ao prefeito e toda a administração pública. É exatamente o
contrário de incluir uma anistia, como um antiplano que prevê formas simples e onerosas de corrigir
as atitudes de quem constrói sem atender a própria Lei do Plano Diretor.
Mais compromissos com a estabilidade, e não menos compromissos é o mínimo que se exige
daqueles que respeitam e querem construir uma cidade ambientalmente sustentável e inclusiva. Se
for para revisar, há bons elementos a serem incluídos, que poderiam aumentar a responsabilidade
social e ambiental do Plano, por exemplo, incluir indicadores ambientais de sustentabilidade como
metas a atingir na cidade: em relação à despoluição do Tietê, taxas de redução da ocupação dos ma-
nanciais, índices de aumento do transporte público, aumento das áreas de lazer e espaços públicos,
corredores de ônibus exclusivos e linhas de trens urbanos e de metrô, como se faz em Bogotá e
Santiago do Chile.
Uma revisão minimamente séria deve apresentar uma Avaliação Ambiental e Urbanística Estra-
tégica dos efeitos dos adensamentos de áreas propostos pelo PDE, pelo zoneamento, e pelas Opera-
ções Urbanas em relação a várias regiões com coeficientes de aproveitamento maiores do que um e
que já apresentam os impactos ambientais deles decorrentes, isto é, pelo aumento de viagens sem
suficiente rede de transporte de massa, pressão sobre infraestrutura de esgotos e poluição dos rios,
a poluição do ar e perda de espaços públicos, e outros problemas que estão, infelizmente, presentes
no dia a dia da cidade.
Os procedimentos de revisão do PDE adotados pela Secretaria de Planejamento do Município
de São Paulo contrariam flagrantemente o Estatuto da Cidade que exige participação direta dos
cidadãos no processo.
Manutenção e ampliação dos objetivos e das metas do PDE e inclusão de indicadores ambien-
tais! Não ao retrocesso de fazer revisões ao sabor das vontades do prefeito ou das pressões de gru-
pos de interesse!

Engenheiro Civil, Ph.D. em Saúde Ambiental, Consultor em Planejamento Urbano e Ambiental,


Coordenador da equipe do PDE e dos PRES na Gestão Marta Suplicy.

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Atividades
1. Observe 2 (duas) quadras da sua cidade e faça uma comparação entre o uso atual ocorrido nelas e
o uso proposto pela legislação de zoneamento de uso e ocupação do solo urbano.

2. Busque a Lei do Zoneamento de Uso e Ocupação do Solo do seu município e de outro e elabore
um estudo comparativo entre elas.

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Gabarito
1. Escolha uma rua, de preferência alguma rua central que seja de relevante importância para a sua
cidade, e faça um esboço de duas quadras que ocorrem ao longo dela, apenas dos terrenos volta-
dos para essa rua, dos dois lados dela;
Anote então, em desenho, qual o uso que está sendo praticado dentro dos lotes;
Após esse levantamento, consulte o mapa de zoneamento municipal e faça a comparação do uso
proposto e do uso levantado in loco1;
Perceba quais os lotes que realmente seguem o zoneamento e quais estão fora do padrão estabe-
lecido. Isso pode indicar futuros investimentos em edificações dentro dos padrões urbanísticos.

2. Observe as questões semelhantes entre as duas leis municipais, como parâmetros de ocupação
(taxa de ocupação, tamanho dos lotes, taxa de permeabilidade).
Observe também quais os principais parâmetros que se diferenciam, tentando identificar qual
seria o real motivo para isso, que podem variar tanto pelo relevo natural do município, quanto
pela indução da ocupação que se pretende dar para o município.

1 in loco – no local.

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