Estrutura e explicação do texto de Henrique de Lima Vaz. Escritos de Filosofia IV: Introdução e Cap. 1. Fenomenologia do Ethos 1. Introdução: objetivos 1. Objetivos: “Delinear o contorno semântico no âmbito do qual o termo “Ética” será designado” e “o objeto ao qual se aplicarão suas investigações e suas reflexões”, assim como “caracterizar a natureza e estabelecer os limites do tipo de conhecimento a ser praticado no estudo da ética.” (Lima Vaz, p. 11). 2. Introdução: duas questões 2. Duas questões se apresentam nesta tarefa, segundo Lima Vaz: A. histórica: estabelecer as origens linguísticas do termo “Ética”, sua transcrição para a língua filosófica grega e seu conteúdo semântico transmitido pela tradição (inscrição ao longo da história). 2. Introdução: duas questões B. histórico-teórica: a validade da Ética como leitura filosófica da conduta humana individual e social e também seu percurso histórico. • O estudo dessas duas questões permitirá examinar tanto a sistematicidade (natureza e estrutura) quanto os modelos históricos de Ética. 3. A questão histórica (A): etimologia dos termos “ética” e “ethos” • Segundo Lima Vaz, ethiké é um adjetivo que procede do substantivo ethos grafado mediante duas grafias distintas: • A. primeira grafia (“ethos” com êta): Morada, caráter, modo de ser. • B. segunda grafia (“ethos” com épsilon): Hábito, costume, tradição. • Inicialmente empregado para designar o covil ou morada dos animais, ethos passou a designar o âmbito da práxis (ação) humana para diferenciá-la do âmbito da physis (natureza). • Ausência de distinção entre Ética e Moral na Antiguidade e Idade Média. O termo grego “ethos” corresponde ao termo latino “mos”/ “mores” e “ethiké” ao termo “moralis”. 3. A questão histórica (A): etimologia dos termos “ética” e “ethos” Segundo Lima Vaz, a partir de Aristóteles o termo “ethiké” passou a ser usado como um adjetivo que qualificava uma forma de saber, primeiramente definido pelo próprio Aristóteles como uma reflexão acerca dos costumes (ethos), assim como um exercício da prática das virtudes (areté), saber esse contraposto ao saber teórico (theoría) e produtivo (poíesis). Posteriormente, o adjetivo se substantiva passando a significar uma disciplina filosófica junto com a Lógica e a Física, isso já no âmbito da Academia platônica em Atenas. 4. A questão histórica (A): etimologia e definição nominal de Ética
Para Lima Vaz, a partir do exame da etimologia
chegamos à definição nominal de Ética como ciência do ethos. O ethos, portanto, é o objeto da Ética. Dois problemas surgem a partir da definição nominal:
A. problema ontológico (a natureza do ethos como
objeto da Ética); B. problema epistemológico (a natureza da Ética como ciência do ethos). 4.1. Definição nominal de Ética e o problema ontológico: a natureza do ethos A. Definição de ethos: para Lima Vaz, a partir da etimologia podemos definir ethos como o conjunto de costumes normativos e prescritivos socialmente estabelecidos e legitimados, assim como a presença desse costume no comportamento habitual dos indivíduos inseridos nesse ethos- costume. B. Características gerais do ethos, segundo Lima Vaz: b.1. Social e individual: o ethos abrange a totalidade de um grupo social e se atualiza no âmbito da práxis (ação) dos membros de um grupo social. No mundo grego o ethos-costume se estruturou sob a forma de lei no âmbito social, e sob a forma de virtude no âmbito individual, dando origem a dois modelos interpretativos dos aspectos social e individual do ethos: a Política e a Ética. 4.1. Definição nominal de Ética e o problema ontológico: a natureza do ethos
b.2. Tradicional e histórico: o ethos é transmitido
geração após geração e se adapta às circunstâncias históricas. Persistente pela tradição, torna-se a fonte essencial da conduta individual pela educação, devendo se tornar conduta habitual no indivíduo. b.3. Particular e contingente: o ethos é sempre o conjunto de valores de uma dada cultura específica e não possui universalidade e necessidade, podendo ser melhor caracterizado em termos de quase- necessidade do hábito. 4.1. Definição nominal e o problema ontológico: a natureza do ethos C. O ethos, para Lima Vaz, como objeto da Ética, se apresenta com evidência imediata, sendo indemonstrável. Assim, é o primeiro princípio na esfera da práxis. Um axioma cuja formulação é esta: “É necessário fazer o bem, é necessário evitar o mal.” Suas constantes, que servem de substrato para a Ética, são: “a vida no bem”, “o agir segundo o bem”, “a vida feliz”, “a melhor vida”. 4.2. A definição nominal de Ética e o problema epistemológico: a natureza filosófica da Ética
O ethos possui um duplo aspecto, de um ponto de vista
epistemológico: a) teórico e b) empírico. A Ética, como leitura filosófica do ethos, ocupa-se com o seu aspecto teórico (fundamentação dos valores) e não com os seus aspectos empíricos, sociais e históricos, estudados pelas ciências sociais e humanas como a Sociologia, Antropologia, História etc. Lima Vaz mostra que a vinculação da Ética aos mais elevados conceitos da razão (metafísica e antropologia), ao longo da história, evidencia o seu caráter filosófico jamais redutível aos aspectos empíricos, sociais e históricos do ethos em sua análise. 4.2. A definição nominal de Ética e o problema epistemológico: a natureza filosófica da Ética
Segundo Lima Vaz, é desafio de uma ciência filosófica do
ethos a elaboração de uma explicação e justificação racionais do ethos e da práxis nas quais ambos sejam explicáveis em termos universais, de modo a ser possível ultrapassar suas particularidades e contingências sociais e históricas, buscando-se assim uma teoria ética que admita uma necessidade racional compatível com a natureza aberta e indeterminada da práxis. A Ética pode ser definida, portanto, como a disciplina filosófica que investiga e justifica ou fundamenta racionalmente os princípios e as regras do agir e viver bem segundo o ethos, ou seja, segundo os valores. 5. A questão histórico-teórica (B): modelos históricos e sistematicidade da Ética
1. Abordagem histórica (que justifica a natureza filosófica da
Ética) : o nascimento e desenvolvimento de uma ciência do ethos na antiguidade se deu por meio do arcabouço conceitual filosófico tanto em Sócrates, quanto em Platão e Aristóteles. Segundo Lima Vaz, essa conceptualidade filosófica da Ética nasceu da tentativa de transcrição, para os códigos da razão, do ethos grego. Seu capítulo inicial, na Grécia antiga, se deu pelo confronto entre os sofista, que adotaram o logos persuasivo para defender o relativismo moral e a natureza convencional dos valores, com Sócrates, que adotou o logos demonstrativo em questões éticas e buscou sua fundamentação racional. 5. A questão histórico-teórica (B): modelos históricos e sistematicidade da Ética
2. Abordagem teórica (que justifica a natureza filosófica da Ética): Lima
Vaz também procura mostrar, pela análise das questões suscitadas pelas tentativas de fundamentação do ethos, que do ponto de vista de sua estrutura teórica, a Ética se afirma como uma tentativa filosófica de justificação racional dos valores. O empreendimento socrático nasceu como uma resposta à posição dos sofista na medida exata da incapacidade destes de se elevar acima dos aspectos empíricos e históricos do ethos, ou seja, pela sua defesa de um modelo de racionalidade que não conseguia ultrapassar o domínio da doxa (opinião) e conduzia fatalmente a um relativismo generalizado. Segundo Vaz, essa razão sofística era incapaz de justificar a racionalidade imanente ao ethos e à práxis, estruturados e ordenados em termos de categorias como a finalidade, o bem, o melhor e a virtude. 5. A questão histórico-teórica (B): modelos históricos e sistematicidade da Ética
Em sua estrutura teórica, duas disciplinas filosóficas são essenciais
para a fundamentação do ethos, segundo Lima Vaz: A. Metafísica: esta disciplina apresenta os fundamentos da Ética ao fornecer as noções universais (o bem, o verdadeiro, o belo, o melhor), originadas pela própria reflexão ética e em termos dos quais a práxis está estruturada e ordenada. Todos os grandes sistemas éticos se alicerçam em fundamentos metafísicos. B. Antropologia Filosófica: esta disciplina fornece uma concepção sobre a natureza humana, sem a análise da qual é impossível qualquer teoria ética. Pela Antropologia Filosófica pode-se estabelecer a relação entre o dever ser dos valores e o ser do agente, assim como a inerente eticidade de sua natureza racional. 6. Divisão da Ética como disciplina filosófica Para Lima Vaz, a Ética se divide da seguinte maneira: A. Metaética: investiga o aparato linguístico- formal utilizado pela Ética Fundamental na análise do ethos. B. Ética Fundamental: investiga os fundamentos ou a estrutura racional do ethos. C. Ética Aplicada: aplica os princípios da Ética Fundamental a problemas específicos.